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UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ Centro de Educação de Ciências Humanas e da Comunicação – CECHOM
Curso de Pós - Graduação Stricto Sensu Programa de Mestrado Acadêmico em Educação – PMAE
NOME DO ACADÊMICO
UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ Centro de Educação de Ciências Humanas e da Comunicação – CECHOM
Posso fazer do meu jeito?: registros das estratégias de adultos desafiados a resolver problemas matemáticos aditivos.
Subtítulo (Opcional)
ITAJAÍ (SC) ANO 2004
MARIA ELISABET DA COSTA SANTOS
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Curso de Pós - Graduação Stricto Sensu Programa de Mestrado Acadêmico em Educação – PMAE
NOME DO ACADÊMICO
Posso fazer do meu jeito?: registros das estratégias de adultos desafiados a resolver problemas matemáticos aditivos.
Subtítulo (Opcional)
Dissertação apresentada como requisito parcial à obtenção do grau de Mestre em Educação – área de concentração: Educação – Desenvolvimento e Aprendizagem
Orientador: José Erno Taglieber Co Orientadora: Maria Helena Batista Vilares Cordeiro
ITAJAÍ (SC) ANO 2004
MARIA ELISABET DA COSTA SANTOS
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Agradecimentos
Ganhei o meu convite para o musical da vida e fui regida pelas mãos de Normélia e Irma
minhas mãe e avó.
Todos os meus sentidos estavam atentos: meus olhos viram, meus ouvidos ouviram e meu
coração bateu na harmonia das notas musicais de João e Cristina.
Meu ofício, neste musical, era o de tocar vários instrumentos. E, nas tentativas de tocá-los, cada
nota da melodia tinha um som próprio: ora de José Erno, ora de Maria Helena, maestros-
professores da sinfonia da vida.
Nessa orquestra, contei com coadjuvantes especiais: músicos amigos e amigas da Educação de
Pessoas Jovens e Adultas da Universidade do Vale do Itajaí.
Agradeço, então, a todos os participantes que me ajudaram a compor esta partitura musical da
minha vida e a tocá-la com toda emoção.
Obrigada, de coração.
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RESUMO
O Brasil, atualmente com uma visão globalizada sobre a educação, sofreu, no decorrer de sua história, longos processos de reestruturação em seu sistema de educacional, principalmente com relação à educação de pessoas jovens e adultas. Este trabalho envolve pessoas que retornaram aos estudos após longo tempo e apresentaram, enquanto estudantes, algumas dificuldades relacionadas aos registros e à compreensão dos enunciados de problemas matemáticos com estruturas aditivas. Fazendo referências aos pressupostos piagetianos, à teoria dos campos conceituais de Gèrard Vergnaud e trazendo uma visão andragógica sobre a arte de ensinar adultos, buscamos caracterizar e descrever as estratégias de registros utilizadas por essas pessoas quando desafiadas a resolver estes tipos de problemas. Numa pesquisa de caráter quali tativo, a interação entre pesquisador e pesquisados feita através de entrevistas e posterior filmagem, com análise das ações, das falas e dos registros através das quais pudemos observar que os sujeitos da pesquisa passavam por três fases distintas para chegarem às conclusões; a primeira era a visão global da situação, seguida de uma articulação das partes envolvidas para, finalmente, se chegar à estrutura da situação. Numa pré-análise, concordamos com Vergnaud ao afirmar que o conhecimento transparece quando se trabalha situações-problema contextualizadas ao cotidiano. Assim, essas pessoas podem conceituar número, adição, subtração, pois já convivem e interagem com estes conceitos nos seu dia-a-dia. Palavras-chave: Educação de Jovens e Adultos, andragogia, estratégias, notações, campos conceituais.
ABSTRACT
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Nowadays with a globalized vision about education Brazil has suffered along its history a long reestructuring process in the educational system, mainly towards the youth and adults’ education. This work involves persons that have returned to their studies after a long time and had presented while students some diff iculties related to the registries and comprehention of the mathematics problem headings with adding structures. Making references to the piagetians supposals to the conceptuals fields of G. Vergnaud and bringing an andragogical vision about the adults’ teaching art, we try to characterize and describe the registry strategics used by these persons when challenged to solve these kind of problems. In a quali tative research the interaction between researcher and researched ones was made through interviews and later filming, analysing their actions, way of speaking and registers through which we could observe that the research subjects passed through three distinct phasis to get to their conclusions: firstly there was the global vision of the situation followed by the articulation of the involved parts and finally to the situation structure. In a pre analysis we agreed with Vergnaud when he says that the knowledge shows up when we work with problem-situations contextualyzed in their quotidian. So these persons can evaluate numbers, adding or subtraction as they already live and interact with these concepts on their day by day. Key words: youth and adults’ education, andragogy, strategies, notation, conceptual fields.
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SUMÁRIO
RESUMO v
ABSTRACT vi
SUMÁRIO vii
LISTA DE ANEXOS ix
LISTA DE TABELAS x
LISTA DE QUADROS xi
LISTA DE FIGURAS xii
A busca de um caminho 13
Parte 1: As pegadas 16
1. Referencial teórico 16
1.1. Histór ia da educação de jovens e adultos no Brasil 16
1.1.1. O incentivo à futura pesquisa: PAS - Programa Alfabetização Solidár ia 23
1.1.2. A educação de jovens e adultos na UNIVALI 24
1.2. Andragogia: um novo olhar sobre a aprendizagem 27
1.2.1. Vantagens e desvantagens da andragogia 33
1.2.1.1. O ensino da matemática e a andragogia 34
1.3. Estudos sobre a gênese do conhecimento 37
1.3.1. Os sistemas de representação e de tratamento – SRTs 43
1.3.2. A construção do conhecimento no adulto e o ensino da matemática 45
1.3.2.1. Aspectos cognitivos no adulto e a resolução de problemas matemáticos 47
1.4. A teor ia dos campos conceituais: contr ibuições na adição e subtração 51
1.4.1. A classificação dos campos conceituais 53
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Parte 2: A construção do caminho 60
2. Os atos da Pesquisa 60
2.1. O problema e o método 60
2.2. Os sujeitos 61
2.3. Procedimentos 64
2.3.1. Procedimentos de coleta de dados 64
2.3.1.1. Instrumentos utilizados na coleta de dados 65
2.3.2. Procedimentos e análise dos dados 66
2.4. Análise e discussão dos resultados dos problemas 68
2.4.1. Análise e discussões das estratégias em função aos tipos de problemas 69
2.4.1.1.Análise e discussão em relação às estratégias dos sujeitos 77
2.4.2. Síntese dos resultados em relação às estratégias dos sujeitos 85
3. Considerações, porém não definitivas 88
REFERÊNCIAS BIBL IOGRÁFICAS 93
ANEXOS 97
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LISTA DE ANEXOS
ANEXO 1: TRANSCRIÇÃO E ANÁLISE DA RESOLUÇÃO DE PROBLEMAS 97
ANEXO 2: QUESTIONÁRIO DAS ENTREVISTAS 138
ANEXO 3: PROBLEMAS 139
ANEXO 4: PROBLEMAS RESOLVIDOS PELOS SUJEITOS 140
ANEXO 5: DECLARAÇÕES DOS SUJEITOS PESQUISADOS 141
ANEXO 6: FOTO DO GRUPO EM SUA FORMATURA 142
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LISTA DE TABELAS
Tabela 1: O analfabetismo no Brasil entre pessoas de 15 anos
ou mais, tendência 1920-2000 22
Tabela 2: Atendimento da UNIVALI nos municípios da Bahia 24
Tabela 3: Turmas de EJA na UNIVALI 26
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LISTA DE QUADROS
Quadro 1: Quadro comparativo da abordagem de Knowles 31
Quadro 2: Caracterização dos Problemas 68
Quadro 3: Freqüência das estratégias utili zadas pelos sujeitos em função da
utili zação ou não da unidade monetár ia 69
Quadro 4: Freqüência das estratégias utili zadas pelos sujeitos em função dos
efeitos do estado inicial ser menor ou maior que o final 70
Quadro 5: Freqüência das estratégias utili zadas pelos sujeitos em função de
se conhecer ou não a transformação em relação a se conhecer ou não o estado final 71
Quadro 6: Freqüência das estratégias utili zadas pelos sujeitos em função de se
conhecer ou não o estado inicial 72
Quadro 7: Freqüência das estratégias utili zadas pelos sujeitos em função de se
conhecer os efeitos do tipo de situação: transformação versus composição 74
Quadro 8: Freqüência das estratégias utili zadas pelos sujeitos em função de se
conhecer o tipo de situação: composição versus transformação 75
Quadro 9: Estratégias/Categorias utili zadas pelos sujeitos 77
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LISTA DE FIGURAS
Figura 1:Exemplo de resolução do problema 2 72
Figura 2: Exemplo de resolução do problema 1 75
Figura 3: Exemplo de resolução do problema 4 76
Figura 4: Exemplo de resolução do problema 7 76
Figura 5: Exemplo de resolução do problema 3 79
Figura 6: Exemplo de resolução do problema 8 80
Figura 7: Exemplo de resolução do problema 5 81
Figura 8: Exemplo de resolução do problema 6 82
A busca de um caminho
“ O mundo é um belo livro, mas pouco úti l para quem
não sabe ler” .
Carlo Goldini
A educação de pessoas jovens e adultas assume relevância particular em nosso mundo em
constante transformação, o qual exige da população adulta uma participação social cada vez
mais ativa e reflexiva. Penso que a arte de ensinar adultos diverge da ação pedagógica, pois os
princípios educacionais desta, introduzidos na sociedade no século VII , baseavam-se em
métodos de ensino para a educação de crianças.
O modelo pedagógico tradicional propõe ao professor poder para tomar decisões sobre o
que será ensinado, como e se foi aprendido. Nos pressupostos andragógicos reconhece-se o
adulto inserido na sociedade, levando-se em consideração a necessidade que ele tem de
aprender, sua conscientização e compromisso com o autodesenvolvimento.
De uma maneira diferente da usada para educar crianças, que necessitam de tutoria
presente nos seus processos de aprendizagem, os adultos se relacionam com o meio
educacional de forma independente, pois já estão inseridos na sociedade; porém, não estão
isentos da tutoria. Ao contrário, estão sempre procurando apoio e incentivo tanto do educador
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como dos colegas de classe. Portanto, é necessário a um pesquisador do tema considerar esse
outro perfil .
Em relação às crianças, pessoas jovens e adultas têm vivências diversificadas de vida,
rotinas de atividades muitas vezes cristalizadas. Têm interesse em aprender e discutir assuntos
relevantes e que trazem respostas imediatas para seu trabalho ou vida pessoal e seu aprendizado
está centrado num problema. Porém, assim como as crianças, essas pessoas pertencem a uma
sociedade organizada, heterogênea em necessidades e conhecimentos e, ao se confrontarem
com desafios que surgem no dia a dia, procuram administrá-los e solucioná-los de maneira que
consideram adequadas. Todavia, cada qual em situações diferenciadas. Enquanto a criança está
ainda construindo suas estruturas de conhecimento, o adulto já desenvolveu muitas delas e
adquiriu experiências e vivências ao longo de suas práticas e trocas sociais.
Por terem mais vivências e experiências, essas pessoas já se apropriaram de uma gama de
conhecimentos que lhes permitem, à medida que se defrontam com novos desafios, descobrir
meios para atingir seus fins, criando e desenvolvendo estratégias que lhes possibilitarão formas
de superá-los. À medida que estes desafios crescem e as relações sociais de poder se
complicam, essas pessoas, inseridas na sociedade, buscam cada vez mais interagir nela e,
conseqüentemente, retornam à escola a fim de buscar novos conhecimentos cada vez mais
elaborados que lhes possibili tarão respostas e soluções para os problemas enfrentados no
trabalho, nas relações de compra e venda e nas rotinas do cotidiano.
Ao retornarem à escola, os padrões de conhecimentos dessas pessoas revelam-se, muitas
vezes, inadequados à realidade escolar e aos padrões pré-estabelecidos pela sociedade em
constante transformação. Estas pessoas refletem sobre qual é o seu papel nessa sociedade e,
conscientemente, buscam nas escolas um ensino diferenciado, motivador, que as incentive e
aprimore seus conhecimentos historicamente construídos e não as exclua nem as discrimine
pelo seu meio social, pela sua cultura, sua raça ou seu gênero.
Para Oliveira (1999, p.101), “a escola é uma instância cultural que demanda atividades e
atitudes próprias”, ou seja, ela já possui características específicas que constituem uma cultura
escolar peculiar historicamente construída.
As instituições escolares prestigiadas por regimes políticos, principalmente pela
sociedade capitalista, assumem e valorizam a cultura das classes dominantes e, possuidora
desta cultura, muitas vezes, não conseguem adequar seus padrões e suas práticas aos aprendizes
advindos de culturas diferenciadas.
Vale ressaltar, conforme Soares (2000, p.15), o termo cultura entendido dentro de sua
especificidade como um conceito escolar criado por grupos sociais homogêneos e com
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costumes próprios, mas que convivem com os demais grupos plurais, heterogêneos com
características e estilos próprios. Então, a escola, com posição hegemônica de poder
naturalizado, ainda é o lugar de passagem obrigatório para crianças de todas as classes sociais.
É a cultura que, possivelmente, ocasiona a exclusão dessas pessoas com baixa
escolarização nas quais verificamos, além de uma linguagem própria, a presença marcante da
matemática oral e mental, através das quais elas conseguem resolver problemas. Sem contar
que costumam registrar as soluções sob a forma escrita convencional, pois muitas delas sabem
ler e escrever e possuem conhecimento do código numérico adquirido, tanto na escola, quanto
na vivência cotidiana.
Nesta relação entre conhecimento, vivências e escola, esta pesquisa tem como objetivo
geral identificar e caracterizar as estratégias utilizadas pelos alunos da educação de jovens e
adultos da UNIVALI na resolução de problemas matemáticos envolvendo estruturas aditivas
segundo a teoria dos campos conceituais de Gèrard Vergnaud.
Em suas pesquisas, Magina (2001, p.9) relata que “os conceitos matemáticos traçam seus
sentidos a partir de uma variedade de situações, e, cada situação, normalmente, não pode ser
analisada com a ajuda de apenas um conceito” . Portanto, na complexidade existente entre a
compreensão dos enunciados verbais dos problemas matemáticos e suas posteriores resoluções,
envolvem conceitos, conteúdos, estruturas e representações simbólicas que proporcionam
competências ao desenvolvimento e funcionamento cognitivos do sujeito quando este se
confronta com um problema.
Pretendo, ainda, verificar se as notações, verbalizações, linguagens, gestos e demais
expressões que os sujeitos fazem, servem de apoio ou suporte para o desenvolvimento do
raciocínio; verificar se os sujeitos adotam estratégias diferenciadas para resolver os diversos
tipos de problemas e, finalmente, comparar as relações entre as notações utilizadas pelos
sujeitos e os registros convencionais ensinados na escola.
Espero assim, para o futuro, subsidiar algumas formas de intervenções pedagógicas aos
professores da EJA.
Nesta perspectiva, a primeira parte deste trabalho consta de um relato histórico da
Educação de Adultos no Brasil, a proposta da EJA, abordando a questão de gênero, além de
propor um novo olhar no ensino de adultos através da Andragogia. Busco também a
compreensão teórica nas pesquisas de Jean Piaget e seus discípulos, como forma de elucidar os
princípios que explicam o desenvolvimento cognitivo dos sujeitos.
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Na tentativa de descrever as estratégias utilizadas pelos sujeitos da pesquisa, busco na
teoria dos campos conceituais contribuições necessárias para fundamentar e prosseguir nosso
trabalho.
A segunda parte consta dos atos da pesquisa, do método e dos procedimentos utilizados
no desenrolar do trabalho. Os dados pessoais para a pesquisa foram colhidos através de
entrevistas verbais e escritas e os procedimentos de resolução dos problemas matemáticos
propostos foram filmados e transcritos na sua íntegra. Na seqüência, apresento os
procedimentos da coleta de dados, o desempenho dos sujeitos, a análise, os resultados e as
considerações. Vale ressaltar que as considerações não são finais nem definitivas, visto que a
pesquisa pode e deve ser ampliada futuramente.
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Parte 1: As pegadas
“ O homem, o seu ambiente e a sua cultura não existem isoladamente. A criança,
para se tornar adulta e se humanizar, precisa reconstruir essa mesma cultura como forma
de adaptação a esse mesmo ambiente” .
Ernesto Rosa Neto
1. Referencial teórico
1.1. Histór ia da educação de jovens e adultos no Brasil
O termo educação de jovens e adultos1 é recente em nosso país. O trabalho com essas
pessoas teve início na época do Brasil Colônia, quando a educação para adultos referenciava-se,
de acordo com dados do Ministério da Educação e Cultura, “nas cousas da nossa santa fé”
(1999, p. 09). A população adulta também necessitava ser doutrinada já que, na época, o caráter
religioso era evidentemente mais forte do que o educacional.
Os tempos mudam e a escola tenta seguir as mudanças num processo de reformas
educacionais, como a ocorrida em 1876, apresentada pelo ministro José Bento da Cunha
Figueiredo que propôs o ensino noturno aos adultos (op.cit, p. 10). Porém, já em 1824, a
Constituição Imperial reservava “a todos cidadãos a instrução primária gratuita” (art.179,32),
restringindo-se seu ensino aos cidadãos livres ou aos libertos. Naquele momento político, num
país de poucos habitantes, agrícola, imenso geograficamente e escravocrata, a educação de seus
cidadãos não era prioridade. Esta situação sofreu críticas de Machado de Assis (1879, p.10)
A nação não sabe ler. Há só 30% dos indivíduos residentes neste país que podem ler; destes, uns 9% têem letra de mão. 70% jazem em profunda ignorância.(...). 70% dos cidadãos votam do mesmo modo que respiram: sem saber porque nem o quê. (...) A Constituição é para eles uma coisa inteiramente desconhecida. (...) As instituições existem, mas por e para 30% dos cidadãos. Proponho uma reforma no estilo político. Percebia-se, desde aquela época, a preocupação de algumas pessoas interessadas na
educação do povo brasileiro. Um dado importante a ser assinalado foi o Decreto nº 7.247 de
19/04/1879, de reforma do ensino, apresentado por Leôncio de Carvalho, que previa a criação
de cursos para adultos analfabetos, livres ou libertos, do sexo masculino, com duas horas
1 No decorrer de nosso trabalho adotaremos a expressão “educação de jovens e adultos” pois esta foi util izada em textos oficiais e, destacaremos o gênero dos sujeitos envolvidos na pesquisa, quando nos parecer relevante.
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diárias de duração no verão e três no inverno, com os mesmos conteúdos das demais escolas
públicas. Esta Reforma previu o auxílio de entidades privadas, incentivando-as na criação de
cursos voltados para esta modalidade de ensino.
Em 1891, a primeira Constituição Republicana foi proclamada, retirando de seu texto a
gratuidade da educação e condicionando à alfabetização o exercício de votar. Neste cenário, a
educação da população fica a cargo dos Estados, principalmente o estatuto da educação escolar
primária.
Os anos passam e o analfabetismo continua tomando proporções gigantescas e sendo
considerado um “mal nacional” e “uma chaga nacional” . Surgem movimentos em prol de um
ensino mais digno à população. Nos anos de 1920, na Conferência Interestadual de 1921, na
cidade do Rio de Janeiro, é sugerida a criação de escolas noturnas voltadas para a educação de
adultos, com a duração de um ano. Esta Lei ficou conhecida como Lei Rocha Vaz ou Reforma
João Alves. Porém, como obrigava a União a subsidiar os professores primários, a carência de
recursos provenientes dela fez com que esta reforma se tornasse sem efeito (Paiva, 1983).
A educação escolar passou por processos de reformas marcantes a partir da década de
1930, proveniente da Revolução de Trinta, que deu largo impulso à educação com a
implantação do ensino regular pela reforma Campos, em 1931. (Revista do PAS, 2002, p.95).
Em 1934, com a Constituição, é reconhecida em caráter nacional, “a educação como
direito de todos e deve ser ministrada pela família e pelos poderes públicos” (art.139). A partir
desta promulgação, o art. 150 inclui os adultos e estende a eles o estatuto da gratuidade e da
obrigatoriedade. Esta Constituição coloca o ensino primário extensivo aos adultos, obrigação
do Estado e um direito de todo cidadão.
Mais tarde, em 1942, a Lei Orgânica do Ensino Secundário, Decreto - Lei nº 4.244 de
9/4/1942, Título VII (Ribeiro, 1999, p. 19-23) relatava que a obtenção do certificado de licença
ginasial podia ser obtida para os maiores de 16 anos, mesmo que esta pessoa não tivesse
freqüentado a escola convencional.
Os documentos do MEC (Ação Educativa/MEC, s.d) relatam que, com o alto índice de
analfabetismo ainda vigorando no país e com a necessidade de melhor quali ficação de mão de
obra especializada, a educação de adultos passou a ter mais atenção e foi criado um fundo
destinado à população analfabeta e à alfabetização. Com o final da Ditadura Vargas, em 1945, a
UNESCO - Organização das Nações Unidas para a Educação, Ciência e Cultura - propõe e
incentiva os países integrantes a desenvolver mais programas voltados à escolarização de
adultos.
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Em conjunto com a Campanha de Educação de Adultos, em 1947 surgem discussões
sobre o analfabetismo e a educação de adultos no Brasil ; o adulto analfabeto é visto como um
sujeito incapaz e marginal. Então, Paiva (2001), fazendo referência àquela época, escreve:
O analfabeto padeceria de menoridade econômica, política e jurídica: produz pouco e mal e é freqüentemente explorado em seu trabalho; não pode votar e ser votado; não pode praticar muitos atos de direito. O analfabeto não possui, enfim, sequer elementos rudimentares da cultura de nosso tempo2. Recentes teorias da psicologia experimental realizada nos Estados Unidos nas décadas de
20 e 30 trazem à tona estudos psicológicos que desmentem o conceito de que a capacidade de
aprendizagem dos adultos seria menor que a das crianças, desmistificando postulados anteriores
que tinham uma visão preconceituosa sobre as reais capacidades de aprendizagem dos adultos.
Porém, as dificuldades com a educação das populações menos favorecidas e as críticas aos
métodos de alfabetização para essas pessoas despertaram a atenção do educador brasileiro
Paulo Freire (1997, p.24), que expressa seus anseios dizendo que a conscientização do sujeito
historicamente construído, fará com este mesmo sujeito vá em busca de sua afirmação, do seu
aprimoramento interior e de novos conhecimentos.
Com uma proposta inovadora envolvendo a problemática educacional e a social, Freire
apontou a pobreza e a marginalização como causas do analfabetismo, afirmando que era devido
a uma estrutura social de desigualdade. Na visão de Paiva (1983, p.23):
era preciso, portanto, que o processo educativo interferisse na estrutura social que produzia o analfabetismo. A alfabetização e a educação de base de adultos deveriam partir sempre de um exame crítico da realidade existencial dos educandos, da identificação das origens de seus problemas e das possibili dades de superá-los. Paulo Freire (op.cit) trouxe novos conceitos relacionados à educação: a alfabetização e a
educação se confundem e o homem é sujeito e não objeto de sua educação; ou seja, ele tem o
compromisso com a sua própria realidade e pode e deve intervir nela para tentar modificá-la.
Sua proposta para a alfabetização de adultos inspirou os principais programas de
educação e alfabetização iniciados na década de 1960. Surgem o MEB - Movimento de
Educação de Base - e os CPCs - Centros de Cultura Popular -, que reuniram artistas,
educadores, intelectuais e administradores escolares. O paradigma pedagógico objetivava a
interferência na estrutura social que produzia o analfabetismo. Os ideais pedagógicos tinham
como base o exame crítico da realidade social e política dos educandos, além da ética e o
compromisso dos educadores.
2 In I Telecongresso Internacional de Educação de Jovens e Adultos - SESI - 2001.
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Freire (Ação Educativa/MEC s.d) desenvolveu procedimentos pedagógicos constantes de
uma etapa preparatória - pesquisa sobre a realidade do educando - levantamento do “universo
vocabular” e criação de palavras geradoras para realizar o ato de escrever e ler. Esta proposta
visava levar os educandos a se posicionarem como sujeitos de sua aprendizagem, críticos e
responsáveis pelos seus atos.
Ao chegar neste estágio, conforme Paiva (1983, p.27) a educação sofreu reveses, como o
golpe mil itar de 1964, que aprofundou o abismo entre a educação popular, como dever do
Estado e direito de todo cidadão, e o acesso a ela, assim como o acesso a outros bens. Este
acesso se deu de maneira limitada e controlada.
A partir da implantação do Regime Mil itar, muito dos projetos educacionais,
principalmente aqueles que promoviam a cidadania e os voltados para a educação de adultos,
foram considerados uma grave ameaça à ordem nacional; seus promotores foram duramente
reprimidos, dentre eles, Paulo Freire. Diante dessa perspectiva, o governo permitiu apenas
programas para a educação de adultos cujos principais princípios pedagógicos refletissem um
ensino conservador e assistencialista.
Com a Lei 5.379/67, é criada uma fundação denominada Movimento Brasileiro de
Alfabetização - MOBRAL - que visa erradicar o analfabetismo brasileiro. Foi promulgada a Lei
nº 5.400 em 21 de março de 1968, que no seu art.1º visava: “os brasileiros, que aos dezessete
anos de idade, forem ainda analfabetos, serão obrigados a alfabetizarem-se”. Era a resposta
encontrada pelo regime mil itar diante a situação grave de analfabetismo no país. O MOBRAL
seguia as orientações metodológicas e os materiais didáticos seguiam algumas premissas
iniciadas nos anos de 1960, porém, não havia problematizações, nem se abriam margens para
críticas. A proposta era de uma alfabetização a partir de palavras-chave retiradas “da vida
simples do povo” ; com mensagens que apelavam para “um esforço individual dos adultos
analfabetos” ; que estes esforços os fariam integrarem-se numa sociedade boa e
moderna.(Revista do PAS, 2002, p.97).
Embora a Constituição de 1967 mantivesse, em seu art. 168, a educação como direito de
todos, e estendesse a obrigatoriedade escolar até os quatorze anos, também obrigava as
empresas a manter o ensino primário para seus empregados e os filhos destes, de acordo com o
art. 170, da mesma Constituição. Dessa maneira o termo jovem é incorporado ao artigo,
referenciando-se assim o início do ensino supletivo.
O MOBRAL surge na década de 1970. O PEI - Programa de Educação Integrada - que
possibilitava a continuidade dos estudos para os recém-alfabetizados e seguia os mesmos
métodos e conteúdos do curso primário.(Ribeiro, 1999, p.26). Em 1985, o MOBRAL,
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desacreditado, foi extinto e, ocupando seu lugar, surge a Fundação Educar que reforça críticas
às cartilhas de alfabetização, com palavras e frases isoladas do contexto social dos analfabetos.
As propostas pedagógicas de o Projeto Educar recomendam a incorporação em sua
metodologia de enunciados significativos, como os procedimentos de trabalhar com os nomes
dos alunos e textos coletivos, para que a educação de jovens e adultos se desenvolva dentro do
contexto social vivido por essas pessoas.
Por várias décadas, programas e projetos surgiram no Brasil , cujos objetivos eram
históricos, na perspectiva de Haddad (1992, p.3-12): combater o alto índice de analfabetismo
existente entre a população adulta. Contudo, a história da educação de jovens e adultos chega
ao ano de 1990 com inúmeros problemas relacionados às práticas pedagógicas, às propostas
metodológicas e a constatação do ainda alto índice de analfabetos.
Em 1997 aconteceu em Hamburgo, Alemanha, a CONFINTEA V - Conferência
Internacional para a Educação de Adultos - promovida pela UNESCO. conferência, entre
outros objetivos, visou vincular a educação de adultos ao desenvolvimento fundamentado na
justiça de igualdade e sustentabil idade humanas (Telecongresso, 2001, p.7)3.
Nesta conferência, elaborou-se o Decênio da Alfabetização que homenageou com justiça
o educador brasileiro Paulo Freire. Este ato previa que, no prazo de dez anos, programas para
erradicar o analfabetismo seriam implantados em países como o Brasil , que apresentava
elevados índices de analfabetos ou pouco escolarizados.
A Educação de Jovens e Adultos tomou rumos mais claros e definidos a partir da
CONFINTEA V, documentados na Constituição Brasileira e na LDBEN - Leis de Diretrizes e
Bases da Educação Nacional -, sob o nº 9394/96, Seção V em seus artigos 37 e 38, contidos no
Capítulo I, que tratam da educação básica e determinam as condições específicas de
funcionamento e suas características, dentre elas, a gratuidade, quando oferecida pelo poder
público, e adequação às características dos alunos, dos seus interesses e condições de vida e
trabalho (Brasil , 1999, p. 9).
O documento do MEC com Diretrizes para uma Política Nacional de Educação de Jovens
e Adultos (Brasil , 1994, p. 9) dá ênfase às camadas mais populares, às classes mais necessitadas
da população as quais não tiveram o direito ao acesso e permanência escolar nas idades
adequadas, bem como oferece contribuições para o processo de construção da cidadania e
interação social.
3 Alocução do Sr. Frederico Mayor, Diretor-Geral da Organização das Nações Unidas para a Educação, Ciência e a Cultura (UNESCO).
.(.
Uma das características marcantes nos programas de EJA é a heterogeneidade de faixa
etária, raça e de gênero. Atualmente, os freqüentadores são pessoas mais jovens, de ambos os
sexos, que buscam aprimorar e qualificar seus conhecimentos devido às exigências do mercado
de trabalho. Verifica-se também, nestes programas, a presença de pessoas de mais idade,
independentemente de sexo, devido às oportunidades oferecidas pelas instituições nas quais
trabalham e pelas suas próprias vontades de aprenderem a ler e a escrever seus nomes e cartas.
Neste cenário de constantes transformações, o baixo rendimento da economia brasileira
teve reflexos negativos no mercado de trabalho. O número de pessoas desempregadas cresceu
de 4,5 milhões em 1992 para 7,8 milhões em 20014. Entre o biênio 2001/2002, esta taxa
elevou-se de 7,1% para 10,5%, principalmente na faixa etária entre 16 a 24 anos, gerando,
segundo Di Piero (2003), aumento do trabalho informal e a redução de compra dos salários.
Com o surgimento de novos campos de empregos no mercado de trabalho, o cenário
econômico pouco favorável provocou competições, exigindo das pessoas maior grau de
escolaridade e aperfeiçoamento.
Ainda assim, apesar dos percalços e das dificuldades financeiras e graças ao
entrosamento entre professores e instituições escolares e a conscientização de grande parcela da
população, que procuravam estes programas para sua melhor e maior qualificação, tanto no
trabalho, quanto para seu conhecimento e aprendizagem, estes programas conseguiram alguns
resultados.
No ano de 2002, conforme sinopse estatística do MEC/INEP, verificou-se a inscrição de
aproximadamente 3,7 milhões de estudantes com mais de 15 anos de idade regularmente
matriculados na Educação de Jovens e Adultos - EJA - desde as classes de alfabetização até o
ensino médio, na sua grande maioria matriculados em instituições de ensino da rede pública.
Neste panorama, a influência dos avanços e da expansão do sistema educacional
observada nestes últimos trinta anos, tem 1,2 milhões de crianças e adolescentes (entre 7 a 14
anos) fora de instituição escolar, apesar de a LDB, Lei 9394/96, oferecer ensino público e
gratuito para o ensino fundamental, pois esse é dever do estado e direito dos cidadãos, o
sistema educacional brasileiro admite a participação e a iniciativa de empresas privadas na
educação de jovens e adultos.
De acordo com os resultados preliminares da amostra do Censo Demográfico realizado
pelo IBGE, no ano 2000, verifica-se que em relação à escolaridade da população brasileira,
30% da população com 15 anos ou mais possuíam menos de 4 anos de estudos, o que se leva a
4 IBGE - Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílio - PNAP, 2001.
/+0
suspeitar que existe um grande de um número de possíveis analfabetos funcionais. A média
desses anos de estudos constatada na tabela, oculta a desigualdade entre as classes sociais e as
questões étnicas raciais. Podemos observar na tabela 1 as altas taxas de analfabetismo vividas
no Brasil desde os anos de 1920 até o ano 2000.
Tabela 1: Analfabetismo no Brasil entre pessoas de 15 anos ou mais: tendência
1920/2000
Ano/Censo Total Analfabetos % 1920 17.557.282 11.401.715 64,90
1940 23.709.769 13.269.381 56,00
1950 30.249.423 15.272.632 50,50
1960 40.278.602 15.964.852 39,60
1970 54.008.604 18.146.977 33,60
1980 73.541.943 18.716.847 25,50
1991 95.837.043 19.233.758 20,07
1996 106.169.000 15.560.000 14,7
2000 119.533.048 16.294.889 13,63
Fontes: IBGE, Censos Demográficos;Contagem da População 1996.
INEP, Mapa do analfabetismo no Brasil , 2003.
No ano 2000, o analfabetismo absoluto5 registrava mais de 16 milhões de pessoas com
mais de 15 anos, perfazendo um percentual de 13,63% da população com essa faixa etária.
Ainda hoje se verifica um alto índice de analfabetos funcionais que apresentam
dificuldades em interpretar textos, ler e trabalhar cálculos matemáticos formais.
Dentre essas pessoas que retornam às escolas, é bem provável que sua grande maioria
seja constituída por adolescentes e jovens, do sexo masculino que, durante sua vida, tenham
sofrido reprovações, exclusões ou até tenham abandonado os estudos e encontram-se hoje
buscando novos caminhos e melhor quali ficação já que a realidade do mundo globalizado exige
desses jovens uma nova postura e uma visão mais crítica de mundo com relação as exigência
impostas pelo mercado de trabalho.
Pensando nessas pessoas com características marcantes da exclusão tanto da escola como
da sociedade, a Universidade do Vale do Itajaí, tornou-se parceira do PAS - Programa
Alfabetização Solidária -, procurando, assim, garantir a essas pessoas a entrada no universo do
saber escolar, a escrita e o conhecimento letrado.
5 É considerado analfabeto absoluto a pessoa que “não sabe ler e escrever um simples bi lhete”; e “analfabeto funcional”aquele com menos de quatro anos de escolaridade”. (Di Pierro, 2003, p.7)
1(2
1.1.1. O incentivo à futura pesquisa: PAS - Programa Alfabetização Solidária
O Programa Alfabetização Solidária - PAS - surgiu diante do inevitável: o analfabetismo
brasileiro e a sua progressão, apesar dos inúmeros programas implantados no passado. Diante
dessa realidade, o Conselho da Comunidade Solidária, criado no ano de 1995, elaborou o PAS
com o objetivo de combater o analfabetismo, enfrentar a pobreza e a exclusão social gerada por
ele. Para tanto, buscou nas parcerias entre os estados e a sociedade o suporte necessário para
prosseguir nesta tarefa. (Revista PAS, vol.2, 2002, p.83-84).
Este modelo de programa baseou-se na descentralização de poderes, o baixo custo,
gestão simplificada, com a participação de empresas, governos e prefeituras e instituições de
ensino, dirigindo-se principalmente, às regiões norte e nordeste do Brasil que apresentaram os
maiores índices de analfabetismo e desigualdades sociais.
Para atender esta demanda, o PAS elaborou etapas progressivas de desenvolvimento. A
primeira delas, a mobilização nacional que contemplou os espaços de atuação, acatou a
diversidade sociocultural e políticas, os métodos, além do apoio material do MEC - Ministério
da Educação e Cultura. A segunda, o projeto-piloto que, no decorrer da sua prática, sofreu
acompanhamentos, avaliações e aperfeiçoamentos. Este projeto piloto atendeu 38 (trinta e oito)
municípios brasileiros cujos índices de analfabetismo se aproximaram a 56% num universo de
pessoas ente 15 a 19 anos de idade de ambos os sexos.
A terceira foi a busca de parcerias dentro dos segmentos da sociedade como instituições
escolares, empresas, prefeituras, voluntários e pessoas interessadas em prestar algum tipo de
ajuda, pois um dos objetivos deste programa seria obter apoio da sociedade como um todo. A
quarta foi a avaliação que, para atingir seus fins com eficiência, precisaria de um trabalho
pedagógico envolvente, baseados em discussões, aprimoramentos, continuidade e posteriores
reflexões, a fim de assegurar a seriedade da ação.
Finalmente, buscou-se na mobili zação da juventude estudantil a parceria considerada
ideal e prioritária para a progressão do programa. Jovens estudantes (de ambos os sexos) dos
municípios cursando o 2º ano do magistério ou a 8ª série do 1º grau foram inicialmente
convidados, pré-selecionados com entrevistas orais e texto escrito, onde se pedia que se
expusessem idéias e ideais de um alfabetizador.
Após estes procedimentos, os estudantes eram capacitados em outra região do país onde
aprimoravam seus conhecimentos, eram convidados a dialogar e a questionar o programa e o
método para, finalmente, retornar aos seus municípios e dar continuidade ao programa.
3(4
Fazendo parte deste programa, a UNIVALI esteve presente desde os anos de 1997/2002,
atendendo 4 (quatro) municípios do estado da Bahia, conforme mostra quadro abaixo:
Tabela 2: Atendimento da UNIVALI nos municípios da Bahia Local Modalidade Período Nº Turmas Nº Alunos
Heliópolis 1º e 2º Ciclos 1997/2001 142 3.127
Pres. T. Neves 1º e 2º Ciclos 1997/2001 135 3.803
Lençóis 1º e 2º Ciclos 2001/2002 55 604
Alcobaça 1º e 2º Ciclos 2001/2002 60 694
Total 392 8.228
Fonte: Educação de Jovens e Adultos - Univali/2003 Nesta perspectiva, a proposta teórico-metodológica da Educação de Jovens e Adultos
referencia a construção histórica do sujeito, os estudos culturais, pois os sujeitos freqüentadores
da EJA possuem variadas identidades, além de viver e conviver com realidades diversificadas e
confli tantes. Portanto, é essencial traçar o perfil da proposta da EJA/UNIVALI que tenta com
isso compreender, inserir e construir estes sujeitos em suas relações sociais e teias históricas.
1.1.2. A Educação de Jovens e Adultos na UNIVALI
A história da Educação de Jovens e Adultos -EJA da UNIVALI é recente. Tem suas
bases fundamentadas no PAS e, após seu desligamento, voltou-se para sua própria realidade
regional. No ano de 1999, pesquisas foram iniciadas sobre o quadro de funcionários da
instituição e constatou-se a existência de alguns funcionários analfabetos e semi-analfabetos.
Então, o recente programa de EJA apresentou uma proposta que possibili tasse um trabalho
criativo expressivo a essas pessoas e que as mesmas tivessem acesso à leitura, à escrita e ao
cálculo convencionais.
Surgiu o projeto Ampliando os Conhecimentos dos Funcionários da UNIVALI num
enfoque criativo: uma proposta para o primeiro segmento do Ensino Fundamental (1ª a 4ª
série), tendo como eixo central o próprio universo de vida do aluno, procurando romper com a
reprodução dos conteúdos escolares, com a sua fragmentação e, conseqüentemente, a
reprodução dos currículos tradicionais.
Para tanto, a metodologia sugerida por Anacleto (Cadernos do Professor, 1999, vls. 1 e
2), partiu da idéia da não vinculação aos conteúdos considerados normais do ensino
5+6
fundamental, porém das histórias de vida dessas pessoas, vinculadas de maneira interdisciplinar
aos conteúdos das áreas do conhecimento, como Matemática, Português, Ciências, História,
entre outros. Nesse universo, as discussões, os debates foram uma constante, nas quais leituras
diversificadas estavam presentes e disponíveis e cuja finalidade era a de ampliar a visão de
mundo dessas pessoas.
A práxis metodológica seguiu as premissas de três eixos norteadores, que visaram
oferecer a essas pessoas, a sociabili dade, a cultura escolar, além de colocá-las diante de
oportunidades sociais e de culturas heterogêneas. Os três eixos norteadores, correspondentes ao
Ensino Fundamental de 1ª a 4ª série, são:
1. Nós e o espaço/tempo que ocupamos;
2. Nós, no mesmo espaço/tempo, mas muito diferentes;
3. Nós, neste espaço/tempo produzimos: O quê? Para quê? Como? Para quem?
Estes três eixos abrangem temas geradores divididos em dois ciclos: o 1º Ciclo
corresponde aos conteúdos de 1ª e 2ª séries e o 2º Ciclo, os conteúdos de 3ª e 4ª séries. Estes
ciclos envolvem graus de complexidade diferenciados e neles se busca trabalhar os conteúdos
de maneira interdisciplinar.
No primeiro eixo, os temas geradores que correspondem ao 1º Ciclo - Quem sou eu? Eu
e o outro e Onde eu Vivo, são trabalhados em termos de espaço histórico ocupado pelo sujeito,
a descoberta do corpo, sua própria história e da sua família, bem como as relações com os
meios sociais. No segundo eixo, o tema Nossas Origens parte da idéia de que apesar de
ocuparmos o mesmo espaço/tempo, somos seres humanos que pertencemos a uma mesma
sociedade, freqüentamos os mesmos grupos sociais, as mesmas escolas, participamos de uma
vida em comum, porém somos diferentes em sonhos, desejos, aparência física, com diferenças
culturais, econômicas, políticas e religiosas.
No terceiro eixo, o tema em discussão: Formas de Produção Local levanta a polêmica
da quali ficação da mão-de-obra, da produção local, dos empregos e sub-empregos, do trabalho
artesanal e a qualidade de vida das famílias que constituem a maioria da nossa sociedade, que
vai à escola em busca de aprimoramento, conhecimento e qualidade de vida.
Os eixos para o 2º Ciclo seguem as mesmas premissas do primeiro. O que difere são os
temas que vão se tornando mais abrangentes e complexos. Nos temas Relações com a
natureza e Relações com as organizações sociais são tratados os espaços geográficos e
históricos que nos rodeiam, a descoberta do nosso corpo como o primeiro espaço que
ocupamos, bem como o nosso envolvimento como seres integrantes e modificadores da
7(8
sociedade. Prosseguindo no desenrolar do 2º Eixo, temos como tema Brasil Multicultural,
abrangendo as culturas diversificadas do nosso país, a idéia de que somos diferentes,
principalmente por questões econômicas, crenças e apesar de tudo, somos cidadãos que temos
os mesmos direitos e deveres.
No eixo terceiro, o tema volta-se para as Formas de produção das diferentes regiões e
foi idealizado no sentido de que ocupamos no universo um espaço/tempo onde interagimos,
produzimos e nos apropriamos destas produções, o que desencadeia as grandes diferenças
socioculturais, econômicas, políticas e religiosa. Este tema envolve as relações comerciais, de
consumo, as importações e exportações, os impostos e os conceitos de exploração, mais valia,
alienação, entre tantos outros.
Os temas são apresentados por músicas populares brasileiras, de domínio popular e que
levam professores e alunos a questionar e discutir as questões sociais propostas pelos temas e
cujo papel desencadeador seria a apropriação da linguagem escrita e falada. Assim sendo, a
música é um elemento significativo e motivador que possibil ita aos sujeitos a compreensão de
palavras usualmente util izadas no cotidiano, como de novas palavras que, dentro de um texto
maior, ganham sentido e significados.
Dentro desta proposta iniciaram-se quatro turmas de EJA, assim discriminadas conforme
a tabela 3 abaixo:
Tabela 3: Turmas de EJA na UNIVALI
Local Modalidade Período Nº de alunos
Presídio Feminino de Itajaí (SC) 1º e 2º Ciclos 1999/1 a 2000/2 10
Presídio Masculino de Itajaí(SC) 1º e 2º Ciclos 2000/1 a 2001/1 10
Projeto Funcionários da UNIVALI 1º e 2º Ciclos 2000/1 a 2002/2 20
Projeto Funcionários da UNIVALI 1º e 2º Ciclos 2000/1 a 2002/2 08
Total 48
Fonte: Educação de Jovens e Adultos – Univali/2003. As matrículas não foram tão significativas como o esperado, porém o primeiro passo
havia sido dado. No decorrer da implantação da proposta, a procura para esta modalidade de
ensino se ampliou por todo município de Itajaí e municípios vizinhos, como Penha, Piçarras,
São José e Biguaçú.
Com a divulgação da proposta, podemos perceber o aumento gradativo das matrículas e a
EJA se ampliou para atender a demanda crescente de pessoas queriam continuar seus estudos
9(:
em outros ciclos de aprendizagem. Para isso foram criados os 3º e 4º Ciclos (5ª a 8ª série do
Ensino Fundamental) e 5º Ciclo (Ensino Médio). Atualmente, (2004), a EJA tem um total de 2
989 (dois mil novecentos e oitenta e nove alunos inscritos).
Finalmente, a abordagem curricular dinâmico-dialógica adotada nesta proposta (Processo
de Autorização da Proposta, 2003, p.13-21), se desenvolve dentro de um tema gerador, no qual
o currículo não é separado da totalidade social, pois o espaço da sala de aula não é singular; é
dinâmico e as diversidades culturais são uma constante. Assim, a pretensão é a de recuperar as
formações críticas, construtivas e criativas dos alunos juntamente com as do professor
mediador, ampliando as opções de trabalho com concepção, conhecimento e linguagem
diferenciados.
Por ser uma proposta voltada para os estudos culturais, onde é necessário se trabalhar
partindo do cotidiano, aceitando os sujeitos como seres individuais, rompendo com a questão
das disciplinas lineares e com novos olhares sobre a educação, a opção de se fazer alguns
registros sobre a questão de gênero sobre os sujeitos que freqüentam a EJA se tornou uma
necessidade já que a nossa pesquisa envolveu 4 (quatro) sujeitos do sexo feminino e apenas
1(um) masculino. Salientamos que convidamos outros sujeitos do sexo masculino, porém não
compareceram para participarem da pesquisa.
1.2. Andragogia: um novo olhar sobre a aprendizagem
...a fonte de maior valor na educação de adulto é a experiência do aprendiz.
Se educação é vida, vida é educação.
Lindeman
A educação de pessoas jovens e adultas assume relevância particular no mundo em
constante transformação, no qual se exige da população adulta uma participação social cada vez
mais ativa e reflexiva.
A arte de se ensinar adultos, segundo Madeira (2001) é uma arte divergente da ação
pedagógica cujos princípios educacionais, introduzidos na sociedade a partir do século VII ,
baseia-se em métodos de ensino para a educação de crianças.
O ensino desenvolvido na maioria das escolas do ensino fundamental e médio é eclético
nos seus fundamentos teóricos.
;=<
Apresenta ao mesmo tempo traços do behaviorismo (ou comportamentalismo),
apresentado por Watson e Skinner, teoria na qual sua proposta é o de “estabelecer leis
constantes, ligando o estímulo (S) e a resposta (R), que permitem prever o comportamento
conhecendo o estímulo” . (Pourtois; Desmet, 1997, p. 268). Das bases teóricas da pedagogia
humanista de Carl Rogers (o sujeito tem capacidades de se autodirigir); do construtivismo
piagetiano (o conhecimento encontra-se em constante reconstrução no mundo social); do
sociointeracionismo de Vygotsky (o desenvolvimento do ser humano está baseado na sua
inserção no ambiente histórico cultural) dentre outros modelos, temos Poutois; Desmet, (1997);
Castorina (1995), que recomendam ao professor o poder para tomar decisões sobre o que será
ensinado, como será ensinado. Porém, sem uma avaliação processual e formativa para se
verificar se o que foi ensinado, foi realmente aprendido.
Nas hipóteses andragógicas se reconhece o adulto inserido na sociedade, que além da
simples necessidade de aprender o conhecimento socialmente acumulado, habili dades e
competências, precisa conscientizar-se e comprometer-se com seu autodesenvolvimento.
Diferentemente das crianças, que necessitam de vivências novas e de novos
conhecimentos, as pessoas jovens e adultas já tiveram vivências e aprendizagens prévias,
muitas vezes negativas que as excluíram da sociedade produtiva, necessitam reconstruir seus
conhecimentos, habili dades, valores e competências tendo como parâmetro o conhecimento
socialmente acumulado e sistematizado para se inserir no contexto da sociedade globalizada de
hoje.
Por isso, o processo educativo de pessoas jovens e adultas não escolarizadas constitui-se
num processo de inclusão social.
Frigo (2001, p.104) define o adulto como um homem que se desenvolve historicamente,
tendo herdado a sua infância, caminha pela adolescência até a velhice, continuando num longo
processo de individualização de sua personalidade.
A partir destas constatações, podem-se inferir características essenciais e fundamentais
do conceito de adulto, como: a aceitação de responsabilidades, o predomínio da razão e o
equil íbrio da personalidade. Então, esse adulto, ou jovem ou adolescente que procura as escolas
após longo tempo fora dela (às vezes nunca a freqüentou), espera encontrar no ensino um
diálogo produtivo com suas vivências e experiências, um currículo diferenciado dos
tradicionais, professores e metodologias diferenciadas.
>@?
Conceituar uma pedagogia6 para adultos é bastante difícil . Em primeiro lugar, a palavra
pedagogia etimologicamente significar a arte de ensinar/conduzir crianças, por isso destinada a
essa faixa etária. Em segundo, a metodologia parte de pressupostos teóricos, também
específicos à essa idade. O objetivo fundamental deste ensino é a preparação global da criança
para a sociedade adulta. Isto é, a formação da cidadania. Duas correntes pedagógicas
antagônicas são utilizadas. Têm-se de um lado pedagogos que enfatizam a forma, a
metodologia do fazer, a dependência da relação educativa, às vezes em detrimento dos
conhecimentos/conteúdos considerados não essenciais e, por outro lado, a pedagogia
tradicional, concebida para defender os conteúdos considerados fundamentais numa forma mais
estruturada. Esta segunda vertente é a da escola oficializada que deu ênfase à instrução e da
concorrência e quantificação, como o principal objetivo para o desenvolvimento do trabalho
escolar.
Pode-se notar a grande inquietação voltada à educação, principalmente da criança e à
situação escolar de ensino. A concepção pedagógica é, portanto, diferente da concepção de
pessoas jovens e adultas como um processo de inclusão social. Um novo conceito de formação
de cidadãos está se constituindo: a concepção andragógica que surge e diferencia-se porque o
adulto já está psicologicamente em contato com a sociedade, mas culturalmente excluído dela.
Como o objetivo fundamental da educação é a constituição global da criança e do jovem
na sociedade adulta, esta concepção é diferente da educação andragógica7 porque o adulto já
está psicologicamente inserido na sociedade, se relaciona no trabalho e já tem
responsabil idades.
Gomes (2002), baseado em Knowles (1990), ressalta que poucos estudos e pesquisas
foram realizados sobre a educação de adultos, apesar de que, na Antigüidade, os grandes
mestres Confúcio, Lao Tse, Sócrates, Aristóteles e Platão eram professores de adultos e
desenvolveram outro conceito de ensino-aprendizagem, diferente do que domina a educação
formal atualmente. Esses grandes mestres entendiam a educação como um processo de
investigação mental e não como recepção dos conceitos transmitidos passivamente.
6 (Do grego paidagogia). Paidós = Criança; logos = tratado, estudo. Refere-se à educação das crianças. Também se refere à ciência da Educação; conjunto dos métodos utili zados para educar crianças e adolescentes, utili zando-se uma prática educativa em um domínio determinado. (Grande Enciclopédia Larousse Cultural, 1998,p.4504). 7 O termo andragogia, por sua vez, refere-se à educação de adultos. O termo grego (anhr, andros) refere-se ao varão ou elemento masculino. No contexto cultural em que se situaram as primeiras manifestações da preocupação com a educação de adultos, antes das grandes transformações do século XX, tratava-se apenas de educação de homens adultos. Hoje, a abordagem é mais ampla e abrange homens, mulheres, jovens e adultos. (Madeira, 2001,p.11)
A=B
O início da construção do modelo andragógico de educação se deu quando estudiosos,
como Malcolm Knowles (que, em 1970 publicou “The Modern Practice of Adult Education” :
Andragogy Versus Pedagogy”), a concebeu como a antítese do modelo pedagógico:
“Andragogia x Pedagogia”. Surgiu assim o termo andragogia referindo-se a arte e a ciência de
educar adultos.
Os pressupostos da Pedagogia baseiam-se nos princípios de ensinar e conduzir crianças,
introduzidos no ideário cultural da sociedade escolar durante o século VII e, progressivamente
organizados, fixou-se, gerando a Escola Pública do século XIX, que predomina nos dias atuais.
Já a andragogia, referenciada por Cavalcanti (1999) nos estudos de Lindeman, iniciou-se
nos anos de 1920, sob a égide dos princípios pedagógicos tradicionais, desde cedo sentiu as
diferenças entre os objetivos e os fundamentos teóricos para proporcionar a inclusão efetiva das
pessoas jovens e adultas no contexto da sociedade escolar.
Assim, essa forma de sistema educacional, incluindo toda a educação, permaneceu
inalterada dentro do mesmo modelo pedagógico, apesar dos avanços da sociedade humana, dos
novos estudos educacionais. Esta dicotomia entre os pressupostos andragógicos e a pedagogia
levou Knowles (1970) a elaborar um quadro que demonstra as oposições e os contrastes entre
ambos os processos educativos. Para ele, a andragogia é vista como uma “nova arte em
formação”.
C=D
Quadro 1: Quadro Comparativo da Abordagem de Knowles8
Construtivismo
Piagetiano Modelo Pedagógico
Tradicional Hipóteses Andragógicas
Pap
el d
a E
xper
iênc
ia
Corpo de conhecimento variável individualmente construído no mundo social, construído sobre o que o aprendiz trás.
A experiência daquele que aprende é considerada de pouca util idade. O que é importante, pelo contrário, é a experiência do professor (ou o autor do Manual ou dos materiais pedagógicos).
Os adultos são portadores de uma experiência que os distingue das crianças e dos jovens. Em numerosas situações de formação, são os próprios adultos com a sua experiência que constituem o recurso mais rico para suas próprias aprendizagens.
Von
tade
de
apre
nde
r
O conhecimento encontra-se em constante reconstrução ativa; a reestruturação de conhecimentos anteriores ocorre através de oportunidades múltiplas e diferentes processos para associar-se ao que já é conhecido, baseado em experiências e conhecimentos existentes.
A disposição para aprender aquilo que o professor ensina tem como fundamento critérios e objetivos internos à lógica escolar; ou seja, a finalidade de obter êxito e progredir, em termos escolares.
Os adultos estão dispostos a iniciar um processo de aprendizagem desde que compreendam a sua util idade para melhor afrontar problemas reais da sua vida pessoal e profissional.
Ori
enta
ção
da
apre
ndiz
agem
Desafio, pensamento orientado em direção a entendimentos mais complexos, tendo o professor como orientador e guia.
A aprendizagem é encarada como um processo de conhecimento sobre um determinado tema. Isto significa que é dominante a lógica centrada nos conteúdos, e não nos problemas.
Nos adultos, as aprendizagens são orientadas para a resolução de problemas e tarefas com que se confrontam na sua vida cotidiana (o que desaconselha uma lógica centrada nos conteúdos).
Mot
ivaç
ão
A aprendizagem ocorre à medida que o sujeito se desenvolve e suas estruturas vão se transformando, descobrindo novas formas para significar algo.
A motivação para a aprendizagem é fundamentalmente resultado de estímulos externos ao sujeito, como o caso das classificações escolares e das apreciações do professor (avaliação).
Os adultos são sensíveis a estímulos da natureza externa (notas, etc.), porém, são os fatores de ordem interna que motivam o adulto para a aprendizagem (auto-estima satisfação profissional, qualidade de vida, etc.).
Fonte: www.alu.por.ulusida.pt , acessado em 8/06/2003.
8 Quadro transportado de KNOWLES, Malcolm. The Adult Learner a Neglected Spcieis. Gulf Publichin Campano. Houston, 1990. Disponível em www.terravista.pt/Meco/4678/andragogia acessado em 10/06/2002 e com adaptação própria.
E�E
As hipóteses andragógicas estimulam os alunos a sair de dentro de si para refletir sobre
sua práxis e a do professor e, a partir delas, criar novos conhecimento. E por isso mesmo se
aproxima da maiêutica de Sócrates (469-399 a.C.) e da abordagem dialógica de Paulo Freire,
autores que dedicaram seus trabalhos à formação de adultos.
No mundo moderno, a educação de adultos iniciou seus passos após a primeira Guerra
Mundial, tanto nos Estados Unidos como na Europa, devido às especificidades e características
dos estudantes adultos. Cavalcanti (1999) cita os estudos de Lindeman feitos em 1926 que, ao
se interessar pelo tema, pesquisou as melhores maneiras de se ensinar adultos para a “American
Association for Adult Education” . Percebendo as deficiências dos métodos até então utili zados,
escreveu:
Nosso sistema acadêmico se desenvolveu numa ordem inversa: assuntos e professores são os pontos de partida, e os alunos são secundários... O aluno é solicitado a se ajustar a um currículo preestabelecido... Grande parte do aprendizado consiste na transferência passiva para o estudante da experiência e conhecimento de outrem.(Cavalcanti,1999, p.2)
As idéias de Lindeman não foram bem aceitas e pouco importância se deu às suas
anotações, porém, no ano de 1970, Malcolm Knowles o relembra e, posteriormente, em 1973,
em sua obra “The adult learner: a neglected species” , coloca o termo andragogia. Define-o
como A Ar te e Ciência de Or ientar Adultos a Aprender . A partir dessa data, muitos
educadores e instituições escolares se dedicaram ao tema, surgindo ampla literatura abrangendo
a Andragogia.
Referindo-se aos estudos de Knowles, Cavalcanti (1999, p.3-6), registra que existem
determinados princípios andragógicos bem definidos, que devem ser levados em consideração
em qualquer proposta de Educação de Jovens e Adultos, uma vez que os alunos adultos: F Passam de pessoas dependentes para indivíduos independentes, autodirecionados. G Acumulam experiências de vida que serão fundamento e substrato de seu aprendizado. G Seus interesses pelo aprendizado se direcionam para o desenvolvimento das habili dades
que utilizam no seu papel social, na sua profissão. G Passam a esperar uma imediata aplicação prática do que aprendem, reduzindo seu
interesse por conhecimentos a serem úteis num futuro distante. G Preferem aprender para resolver desafios e problemas, mais que aprender simplesmente
um assunto. G Passam a apresentar motivações internas (como desejar uma promoção, sentir-se
realizado por ser capaz de uma ação recém-aprendida, etc.), mais intensas que motivações
externas como notas em provas, por exemplo.
H=I
1.2.1 Vantagens e desvantagens da andragogia
Migrar de um ensino convencional e clássico para um ensino andragógico é tarefa
delicada, árdua e complicada, pois os pressupostos da pedagogia oferecem uma práxis, métodos
e estratégias totalmente voltadas para o ensino-aprendizagem de crianças e adolescentes. Este
método pedagógico tradicional direciona-se mais aos conteúdos e aos currículos pré-
preparados; o professor centra-se em aulas que atendam mais as necessidades escolares do que
as dos estudantes.
Apesar dos progressos que acontecem atualmente, ainda percebe-se o uso de livros
didáticos como prática usual no ensino regular. Na andragogia, as premissas questionam estas
práticas, pois, afinal, o adulto já não é criança; ele é o sujeito de educação e não o objeto da
mesma.
Portanto, considerando que o adulto reage e interage, ao meio em que vive, as vantagens
de se trabalhar na educação de jovens e adultos util izando a andragogia são de que se podem
empregar os conhecimentos prévios, os interesses e os objetivos que essas pessoas já trazem
consigo. Este universo heterogêneo pode ser explorado através de projetos de pesquisas,
métodos experienciais (voltados para a própria experiência acumulada dos aprendizes), grupos
de interesses, discussões dialógicas e questionamentos em grupos e num todo, além de
exercícios baseados em situações-problema vivenciados e contextualizados pelos grupos,
fundamentadas e referenciadas em leituras de vários autores.
Uma outra vantagem é a quebra da seqüência de um ensino por disciplinas, fragmentado,
para um ensino oferecido de forma interdisciplinar9; o que muitas vezes não acontece com a
pedagogia tradicional, que direciona seu foco de ensino para conteúdos específicos.
Outras vantagens de se trabalhar com princípios andragógicos são que eles envolvem as
facilidades da ciência em promover as interações interpessoais e organiza atividades
educativas, cujo ator principal é o participante adulto. Ao se reunirem em grupos, estes adultos
constituem um conjunto de recursos provenientes de suas especificidades e experiências; suas
vontades de aprender. Dessa maneira, cada um dos membros do grupo se converte num agente
de aprendizagem e o ambiente torna-se educativo. O grupo tem parte de sua responsabili dade
voltada para cada de seus participantes. O intercâmbio entre os grupos proporciona uma
transição dinâmica e efetiva da aprendizagem, tendo como mediador o educador andragógico.
9 Corresponde a uma nova etapa do desenvolvimento do conhecimento científico e de sua divisão epistemológica, e exigindo que as disciplinas científicas, em seu processo constante e desejável de interpretação, fecundem-se cada
J=K
Entretanto, este movimento de trocas nem sempre acontece, tornando-se uma das grandes
desvantagens do ensino pela andragogia. Muitas dessas pessoas apresentam algumas
dificuldades em realizar trabalhos de pesquisas ou projetos em grupos, visto que, em seus
passados escolares, as práticas eram direcionadas para a individualidade. Pode-se relembrar que
num passado nem tão distante, as escolas discriminavam meninos e meninas, fazendo-os
sentarem separados um dos outros ou em pares, justificando, assim, o poder centrado no
professor.
Pessoas jovens e adultas vivem e convivem com a realidade do dia-a-dia, relacionando-se
com uma diversidade sócio-cultural que é a nossa sociedade. Neste contexto, as desvantagens
de se trabalhar por métodos andragógicos estão, principalmente, no choque cultural que ocorre
quando essas pessoas migram do meio em que vivem para outra cultura, para outro meio.
Oliveira (1999) relata que os aspectos da aprendizagem e do conhecimento estão relacionados à
exclusão da escola, à afetividade e à auto-estima.
Além da referência ao lugar social ocupado pelos jovens e adultos, definido por sua
condição de excluídos da escola regular, suas especificidades culturais devem ser examinadas
com relação a outros aspectos que os vão definir como um grupo relativamente homogêneo no
interior da diversidade de grupos culturais da sociedade contemporânea.
O confronto entre culturas e suas relações interferem no desenvolvimento intelectual dos
sujeitos aprendentes. Estas problemáticas podem inibir a aprendizagem dessas pessoas e até
limitar seus conhecimentos quando elas se conscientizam que os seus conhecimentos prévios e
o senso comum estão e precisam ser fundamentados no conhecimento científico.
Além de se considerar os aspectos culturais, sociais, afetivos e emocionais, o educador
andragógico deve conhecer muito bem a clientela com quem vai trabalhar, visto tornar-se
difícil a aprendizagem de qualquer disciplina, principalmente a Matemática, pois sua clientela é
diversificada, proveniente de grupos culturais peculiares. São indivíduos excluídos pela própria
sociedade da qual pertence.
1.2.1.1. O ensino da matemática e a andragogia
A andragogia, enquanto ciência pautada no ensino, pode (re) significar e (re)ordenar a
prática do professor fornecendo à clientela da EJA uma gama diferenciada de conhecimentos
abrangendo as diversas áreas de ensino, aqui, especificamente, a Matemática.
vez mais reciprocamente, a interdisciplinaridade é um método de pesquisa e de ensino suscetível de fazer com que duas ou mais discipl inas interajam entre si.(Japiassu, 1999, p. 145).
L@M
Assim como os estudos piagetianos influenciaram na construção do pensamento
matemático, Gómez-Granell (2002) influenciou com seus estudos: “no marco de sua teoria, o
conhecimento matemático é uma construção do sujeito que aparece progressivamente como
conseqüência da reflexão deste sobre o resultado de suas ações”. Podemos perceber nos
pressupostos andragógicos, subsídios para outorgar ao professor papel ativo, incorporando na
sua prática as experiências prévias dos alunos, confrontando-as com o conhecimento científico
e, com isso, contribuir para o enriquecimento da aprendizagem.
A tentativa de passagem de um ensino convencional para um enfoque andragógico é um
trabalho repleto de barreiras: os educadores precisam quebrar elos e romper obstáculos para se
transformarem em mediadores eficientes, conscientes. Sobretudo, precisam demonstrar a
importância prática dos assuntos a serem debatidos e questionados, dando a certeza de que estes
assuntos trarão novos conhecimentos, além de proporcionar mudanças na vida dessas pessoas.
Podemos nos utili zar dessas (re) organizações, (re) significações e mudanças que têm
respaldo nas palavras de Lindeman, citadas no texto de Oliveira (2002):
Uma das grandes distinções entre a educação de adultos e a educação convencional é encontrada no processo de aprendizagem em si mesmo. Nenhum outro, senão o humilde pode vir a ser um bom professor de adultos. Ambos são compartilhados par-a-par.(...) Este caminho duplo reflete também a divisão de autoridade. Na educação convencional o aluno se adapta ao currículo oferecido, mas na educação de adultos, o aluno ajuda na formulação do currículo.(p.16) Ao buscar novos conhecimentos e tentar reverter o quadro de exclusão precoce da escola
regular que freqüentaram, essas pessoas esperam encontrar nesta nova escola um ensino
inclusivo e reflexivo, palco para a (re) significação das práticas pedagógicas. Portanto, essas
pessoas interagem quando em sala de aula, debatem e questionam temas da atualidade e da
realidade com a qual convivem, ajudando assim a construir o currículo argumentado e
fundamentado pelo professor mediador, pautado em suas vivências.
Os estudos de Fonseca (2001), nos dão esclarecimentos de que em matemática, antes de
tudo, os entendimentos constituem-se em ações exercidas com base nas vivências cotidianas
dos alunos. Sabemos que essas questões nos mostram que a relação entre o pensamento
matemático e o registro não acontece facilmente. O pensamento não é simples. Torna-se
bastante difícil registrar no papel o pensamento que esse adulto já construiu, pois os vários
(des) níveis de entendimentos ocorrem quando o adulto tenta compreender e entender suas
vivências cotidianas, os enunciados de problemas matemáticos e, conseqüentemente registrá-
los no papel a imagem ou imagens que estão em seus pensamentos .
N O
A matemática ofertada às pessoas da EJA segue uma linha de caráter instrumental,
ampliada pela linguagem. Apesar de ser considerada uma ciência abstrata, ela, a matemática,
necessita da linguagem para a expressão de idéias e raciocínios que parte do sociocultural e das
historicidades dessas pessoas.
Seguindo esses pressupostos, o ensino da matemática vincula-se às demais áreas do saber,
contextualizado na realidade e nas vivências dessas pessoas que, por já possuírem
conhecimentos matemáticos construídos no decorrer de suas vidas, precisam enriquecê-los,
reconhecendo as diferentes situações-problema e que conceitos estão ali inseridos para mostrar
que realmente se apropriaram daqueles conceitos ou procedimentos, de seus limites,
funcionamento, extensão e as reais possibilidades de aplicações práticas.
Neste cenário, temos em Goméz-Granell (2002), algumas sugestões que podem ser
amplamente utilizadas em práticas andragógicas: a) – o ensino da matemática deve pautar-se na
ajuda da construção das estruturas lógicas que estão na base dos conteúdos matemáticos
(operações de soma, subtração, número, entre outros) e não na prática pela mecanização ou
conteúdos isolados; b) – além do caráter conceitual, a aprendizagem da matemática deve ser
reflexiva – reflexão x ação = conhecimento matemático, pois “a linguagem deriva da dinâmica
de ação e está subordinada a ela” .
Sob o ponto de vista de M. Knowles , Oliveira, (2002, p.1-12), util iza seus ensinamentos
para salientar que na andragogia, os seguintes pressupostos servem de modelo de
aprendizagem: a) Os adultos têm de saber o porquê de se aprender algo; b) Adultos aprendem
experimentando; c) Seus aprendizados partem da resolução de problemas; e d) Seu melhor
aprendizado surge quando o conteúdo/tema é aplicado na prática. Portanto, em termos práticos,
considerando que jovens e adultos interagem diferentemente das crianças na relação
educacional, as premissas pedagógicas devem ser substituídas pela andragogia centrando mais
seus ensinamentos no processo. Temas contextualizados e estratégias como teatro, encenações
e auto-avaliações são bem vindas quando da prática em sala de aula.
Cientes da problematização relacionada com o pensamento matemático, sua aplicação e
registro, enquanto educadores temos que nos conscientizar de que: a). A matemática é a mais
antiga das ciências, já que, segundo Rosa Neto (1997), os homens a utili zavam desde a Idade da
Pedra e que seu uso se faz presente no decorrer dos tempos em função de necessidades sociais;
b). Está relacionada com a vida diária de todos nós; c). Os sujeitos que retornam aos estudos
têm uma história de vida; d). Os conhecimentos matemáticos desses sujeitos fazem com que
eles os guardem na memória a matemática escolar, socioculturalmente construída quando de
sua estada nos bancos escolares; e). A matemática da vida, construída ao longo da prática,
P=Q
vivenciada nas relações de trabalho, nas compras e vendas, nas trocas e no convívio com a
sociedade, é grandemente utili zada no cotidiano dessas pessoas.
A andragogia - definida como a arte e a ciência de orientar o adulto a aprender - deve e
pode ser considerada em salas de aulas, onde o educador não tem uma visão paternalista
voltada para o relacionamento educador x aluno, mas, ao contrário, se coloca como mediador
em igualdade de condições no processo ensino-aprendizagem.
Assim como na andragogia o aprendiz é visto como um ser ativo que estabelece relações
de troca (nos aspectos físico, pessoal e cognitivo) num sistema de relações vivenciadas e
significativas, buscamos nos fundamentos dos estudos piagetianos, explicações e suportes sobre
a gênese do pensamento racional.
1.3. Estudos sobre a gênese do conhecimento.
No universo complexo da educação de pessoas jovens e adultas, convivemos com uma
classe singular e ao mesmo tempo heterogênea de pessoas que pouco ou quase nada estudaram,
vivem e convivem com uma cultura própria num meio social considerado diferenciado e
excluído, mas que por elas mesmas saem em busca de conhecimentos e esclarecimentos.
Segundo Malglaive (1995, p. 19), ao retornarem à escola, os padrões de conhecimentos
dessas pessoas revelam-se inaptos à realidade escolar e aos padrões pré-estabelecidos pela
sociedade em constante evolução.
Eu pensava que era pobre. Aí, disseram que eu não era pobre, eu era necessitado. Aí, disseram que era autodefesa eu me considerar necessitado, eu era deficiente. Aí, disseram que deficiente era uma péssima imagem, eu era carente. Aí, disseram que carente era um termo inadequado. Eu era desprivilegiado. Até hoje eu não tenho um tostão, mas já tenho um grande vocabulário. (Cartum do humorista Faiffer, 2000, P.52)10. Este relato de Soares (2000, p.52-53) mostra o quadro de marginalização em que se
encontram as classes populares brasileiras e que, apesar de propostas e programas educacionais,
cujos objetivos são o de encurtar as diferenças e deficiências sócio-econômicas, culturais e
lingüísticas entre estas classes e as consideradas socialmente mais elevadas, resultam num
quadro pouco expressivo. Quando nos referimos à estrutura escolar, esta se revela pouco eficaz,
pois oferece poucas possibilidades de soluções, esquece as diferenças externas que ocorrem na
sociedade composta de pessoas que vivem e convivem com uma cultura própria, possuem
conhecimentos válidos e úteis, dominam algumas operações matemáticas básicas e detém
10 Monólogo de um sujeito popular, citado no Livro Linguagem e Escola: Uma perspectiva social, de Magda Soares.
R(S
muitos conhecimentos da sociedade e da natureza, independentemente de conteúdos escolares.
São conquistas cognitivas adquiridas no convívio das relações sociais de trabalho e de
vivências no cotidiano.
Neste universo singular buscamos referências em estudos piagetianos11 , fundamentos
para a compreensão da autonomia e do desenvolvimento cognitivo dessas pessoas.
Para Piaget (1977), a autonomia não se relaciona com o isolamento (escola
comportamentalista – aprender sozinho). O desenvolvimento do pensamento autônomo surge
em paralelo com a capacidade de estabelecer relações cooperativas. À medida que os
agrupamentos operatórios aparecem com articulações das instruções, o sr humano torna-se cada
vez mais apto e, conseqüentemente, cooperativo.
Nas pesquisas de Piaget (1977, p. 93), a privação de consciência do eu e a consciência
estruturada na autoridade do outro, impossibili tam a cooperação em relação ao
desenvolvimento comum. Isto, é, a consciência centrada no outro, elimina a ação do ser
humano enquanto sujeito da ação.
Na medida em que os indivíduos decidem com igualdade – objetivamente ou subjetivamente, pouco importa -, as pressões que exercem uns sobre os outros se tornam colaterais. [...] A razão tem necessidade da cooperação na medida em que ser racional consiste em ‘se situar’ para submeter o indivíduo ao universal. O respeito mútuo aparece, portanto, como condição necessária da autonomia, sobre o duplo aspecto intelectual e moral. Portanto, todo pensamento depende das ações e das relações criadas pelo sujeito a partir
de suas próprias ações com os objetos de seu interesse.
As ações do sujeito, segundo Centurión (1995, p.89), são internalizadas em
conseqüência: ele pensa e age com precisão e segurança. Um exemplo dessa ação é quando o
sujeito pega um livro da estante e pode recolocá-lo quando quiser. Este ato praticado foi
reversível no espaço, mas não no tempo. O sujeito não pode retornar no tempo, porém, sua ação
é irreversível em relação a ele.
Assim sendo, os pensamentos são reversíveis e irreversíveis; isto é, podem ser feitos e
refeitos, num caminho de ir e vir. À medida que o tempo passa, o sujeito cresce internamente e
externamente, desenvolve-se mais e suas ações ocorrem com mais consistência e consciência.
Garcia (2002, p.86), relata que “os processos construtivos consistem também num jogo
dialético que conjuga a organização das próprias ações com organização dos ‘dados’ do mundo
exterior”. O sujeito interagindo com o objeto de seu interesse, interferindo e (re)interpretando
os ‘dados’ que lhe são apresentados advindos das “assimilações e acomodações prévias” (op.cit
p.86).
T+U
Ao estabelecer relações com o objeto, o sujeito o compara e o transforma de forma a
adquirir outros conhecimentos e uma certa autonomia sobre os mesmos.
Para Garcia (ibid.,p.87), são nestas organizações que se encontra o estruturalismo
epistemológico da teoria construtivista: as estruturas não passam de formas organizativas
consideradas independentemente de seu conteúdo.
Estas formas resultam na assimilação dos objetos quando sofre a interação do sujeito
pelos esquemas de ação, permitindo uma posterior acomodação do esquema. Ou seja, o sujeito
tem a consciência de que suas próprias ações pelas ações sobre os objetos.
O desenvolvimento do conhecimento, segundo os estudos de Garcia(2002, p.88), é
composto por dois processos construtivos: o primeiro consiste na “organização das próprias
atividades do sujeito” , iniciando e coordenado suas ações, prosseguindo com o
desenvolvimento “dos mecanismos construtivos do conhecimento” e, chegando ao ápice, na
lógica. O segundo está no conhecimento empírico, atribuindo a ele significados, comparações,
correspondências e transformações, culminando na “interpretação de fenômenos estabelecendo
relações causais” .
Ambos os aspectos remetem a vários questionamentos sobre o que é e como se constrói o
conhecimento no ser humano, estabelecendo uma problemática entre o conhecimento e a
ciência; a base empírica e a científica; e os processos que permeiam o desenvolvimento
cognitivo vão, necessariamente, se introduzir na “dinâmica construtiva do desenvolvimento”
(op. cit p.89).
Pesquisadores da linha piagetiana como Klein (2000, p.64) estudam esse sujeito
cognoscente que se constitui de três aspectos: biológicos, psicológicos e sociais, apresentando
características diferenciadas entre si. Podem-se distinguir duas ordens que constituem o
sujeito: o sujeito psicológico e o biológico.
Os fatos psicológicos e sociais têm outra natureza, mas, é realmente no modelo
biológico que Piaget fundamenta sua interpretação do sujeito. Os processos psicológicos em
relação à biologia fundamentam-se na adaptação e na organização interna de cada
indivíduo.(op.cit. p.65).
O ser biológico, nos estudos de Kein (2000, p.65-66), convive com um comportamento
de interação e troca entre organismos e o meio. Na estrutura interna do ser biológico, define-
se a adaptação que, ativamente comporta dois processos diferentes: assimilação e
acomodação. Na assimilação o corpo biológico organiza-se pelos elementos externos para
11 Journal of Research in Science Teaching XI, nº 3, 1964, p.176-186. Tradução livre.
V(W
melhor compreender o mundo e na acomodação, ocorre o inverso, ele adapta-se pelas
organizações internas, modificando sus hipóteses anteriores às exigências dessa nova
situação.
É pela adaptação, durante o processo cognitivo12, que a inteligência torna-se “um caso
particular de adaptação biológica” . Isto é, o sujeito cognoscente nasce com um conjunto de
sistemas sensórios-motores que incluem funções e estruturas que o sujeito herda quando
interage com o meio. Este vai e vem designa-se “processo de equilibração” que está sempre
em movimento, resultando em desequil ibrações e, mais tarde, novos equilíbrios auto-
reguladores. Portanto, as estruturas estão sempre em movimento provocando estados de
equil íbrios e desequilíbrios, o que ocasiona transformações constantes no sujeito. Conclui-se
que a organização não se separa da adaptação. Os dois processos são indissociáveis e
dinâmicos. Conforme Klein (2000), a partir da organização,
a inteligência chega à estrutura muito mais notável, ao mesmo tempo em que muito mais diferenciada porque se é possível conceber a matematização de todas estruturas biológicas, todas estruturas matemáticas não são realizáveis no plano orgânico.(p.70).
A partir da complexidade da inteligência sensório-motora, este processo prossegue
chegando à idade adulta com o raciocínio lógico-matemático. É no pensamento científico que
o sujeito encontra a lógica que, para Piaget, é a maneira mais desenvolvida de inteligência.
Progressivamente, conforme Klein (op.cit p.70) o sujeito cognoscente segue tentando
alcançar e dominar o raciocínio lógico-matemático. Isto é explicado porque este sujeito é
psicológico e epistêmico - por ser humano e racional - este ser é social, psicológico e
biológico.
Percebe-se, então, que, se o primeiro sistema diz respeito ao ‘sujeito epistêmico’ , o
segundo refere-se ao ‘sujeito psicológico’ . Configura-se, assim, um ciclo epistêmico, regulado
pelas operações e afetividade, confirmando a existência do sujeito epistêmico e psicológico,
ligados integralmente na constituição do sujeito cognoscente.
Conforme essa teoria, constata-se que os seres humanos que possuem características
sociais, históricas, culturais e biológicas diferentes, interagem e reagem nas diversas áreas de
conhecimento diferentemente.
Quando nos referimos aos jovens adultos advindos de classes sociais e culturas próprias
estas pessoas buscam no seu conhecimento empírico, respostas ou suportes por elas
12 Diz-se de estados e processos relativos à identificação de um saber dedutível e à resolução de tarefas e problemas determinados. São princípios classificatórios derivados de constatações, percepções e/ou ações que
X(Y
considerados adequados, ás indagações que surgem à medida que convivem com desafios do
cotidiano. Assim, podem reagir de maneira diferente e chegar a conclusões diversas ou não
sobre um mesmo assunto.
Reflexões, tomadas de consciência e reestruturação das operações intelectuais são um
conjunto de sistemas que incluem funções e estruturas que estas pessoas herdam ao interagir
com o meio e este nelas. Este processo de ir e vir, já citado anteriormente, designa-se, segundo
Klein (2000, p. 69-70), “processo de equilibração”, que está sempre em movimento, novos
equil íbrios e desequil íbrios auto-reguladores, sempre em movimento.
Considerando que o sujeito vive num mundo das representações cognitivas “pode tornar-
se elemento do mundo ontológico” .13 Os fatores inerentes a esse mundo podem causar as
deficiências na aprendizagem e podem estar relacionadas com as relações de poder e com as
diferenças entre eles.
Conforme Soares (2000, p.53), a sociedade, especialmente a escola, entra como um
recurso cujo objetivo é o de superar as diferenças e as deficiências entre estes dois mundos nos
quais estão imbricadas as classes sociais. Percebemos a importância da escola na vida dessas
pessoas, apesar de elas já terem convivido e compartilhado deste universo escolar – seja por
pouco tempo – quando de suas infâncias repletas de sonhos e desejos, apesar destes nem
sempre serem percebidos por estes sujeitos.
Estas são, certamente uma das causas relacionadas ao fracasso escolar, pois tanto o
fracasso como o sucesso depende, necessariamente, segundo Fávero (1994, p.58), “direta ou
indiretamente, em abordar a questão do ensino-aprendizagem”. Ocorre que esta questão, por
sua vez, será entendida e abordada, em última análise, segundo a concepção que se tenha sobre
a interação entre o ser humano e o conhecimento.
O desafio será o de saber o conceito de conhecimento que se quer ensinar, seja ele
científico ou do senso comum e intrinsecamente, como se dará o ensino desses conhecimentos.
Segundo Fávero (1994, p.59) a ciência não pode agir com neutralidade. Ela está inserida
no meio sócio-cultural diversificado, onde culturas heterogêneas se misturam e convivem.
Portanto, a aquisição, a aprendizagem de novos conhecimentos deve partir da construção
histórica do sujeito. A autora ainda salienta que para entender como ocorre a construção do
conhecimento, é necessário saber como e quais valores sociais, quais informações e
norteiam a passagem das notações simbólicas à experiência. (Dicionário Houaiss da Língua Portuguesa, 2001,p.754). 13 Parte da fi losofia que trata do ser enquanto ser, do ser concebido como tendo uma natureza comum que é inerente a todos e a cada um dos seres. (Novo Dicionário Básico da Língua Portuguesa Folha/Aurélio, 1995, p.467).
Z+[
procedimentos estão postos pela sociedade na qual vivem esses sujeitos, bem como as ações
dos sujeitos nela.
A não continuidade dos estudos por pessoas jovens e adultas pode estar relacionada à
questão do sucesso ou fracasso escolar, que pode ser entendido em Fávero (id, ibidem, p.58),
como uma relação hegemônica entre o exercício do “espaço semiótico ou mundo intelectual”
no qual estão incluídos os seres humanos e a sociedade, e esta interagindo constantemente
“com o mundo intelectual dos seres humanos”. Prosseguindo, a autora salienta a importância do
espaço cultural, onde são criados meios diferenciados e “mediacionais” (grifo da autora) para
atingir os seres humanos.
Conforme a Proposta da EJA/UNIVALI (2003), temos, de um lado, as escolas que
representam a autoridade imposta de forma acrítica e, por outro, o sujeito autônomo, que volta
à EJA – Educação de Jovens e Adultos - esperando encontrar nela o diferencial que o motive a
permanecer nela e continuar seus estudos. Verificam-se, às vezes, as escolas atuando com
ineficiência porque ignoram as forças externas, como as da própria comunidade, dos pais e até
dos próprios professores, não dando sentido às transformações que ocorrem na sociedade. Ou
seja, como a escola foi criada pelo homem e inserida no mundo sócio-cultural, nas salas de aula
há uma diversidade de indivíduos que devem se entendidos como um mundo à parte, inseridos
num mundo maior que é a sala de aula e que esta se insere num outro mundo que é a instituição
escolar, que por sua vez, faz parte do mundo institucionalizado pela sociedade.
Então, segundo Fávero (1994, p.55) as produções humanas, sejam elas falas, oral e
escrita, os desenhos ou uma atividade qualquer desenvolvida, são produtos “da interação entre a
subjetividade de cada um, e o texto maior no qual ele se insere, podemos aprender, em última
análise, as representações sociais”.
Em se tratando de produções humanas, Malglaive (1995, p.118) afirma que
são todas as manifestações dos comportamentos, mesmo as mais simples, que mobili zam o conjunto de instrumentos motores e cognitivos para se integrarem, de imediato, numa estrutura, que é preciso, portanto, construir desde o começo de todo processo educativo. Assim, toda a ação e reação do sujeito aprendiz são elos que darão subsídios para o
crescimento deste enquanto ser humano e educando.
\(\
1.3.1. Os Sistemas de Representação e de Tratamento – SRTs14
Os SRTs - Sistemas de Representação e de Tratamentos - são compostos de uma
interiorização dos domínios de tarefas15 com os quais o sujeito se depara e neles desenvolve sua
atividade.
Os SRTs permitem aos sujeitos colocar em ordem um campo de representação que lhe
possibilite direcionar sua atividade por planos já contidos e disponíveis num esquema
representativo ou numa operação estruturada formalmente. Podemos considerar que estruturas
e representações são reciprocamente interligadas onde uma não pode se desenvolver sem o
auxílio da outra.
Como salienta Malglaive, (1995,p.147), as negociações produzidas ascendentes e
descendentes no sistema de processos representativos, podem ser substituídas por um trabalho
mental (quando possível), provocando desequili brações nas estruturas do sujeito epistêmico,
fazendo com que estas se liguem às necessidades particulares do sujeito psicológico. Porém,
para que estas negociações possam se ativar, é necessário a existência de “instrumentos
cognitivos ou de conhecimentos estruturais” (ibidem, p. 147) adquiridas ou a adquirir pelo
sujeito ao longo de sua vida. Ou seja, os SRTs intra e inter se coordenam de tal maneira que
podem ser adquiridos “por implicações significantes e/ou operações formais
estruturadas” (ibidem, ibidem).
Estes conhecimentos são construídos pelas operações lógicas que lhes são necessários.
Todavia, eles não avançam uniformemente, nem são universais a todos os sujeitos. As
operações lógicas são construídas paulatinamente, coordenando-se entre si até reorganizarem-
se em novas estruturas organizadas internamente onde cada fragmento pode localizar-se num
patamar de desenvolvimento diferenciado dos demais. Isto é, à medida que ocorre a evolução
cognitiva do sujeito, as operações lógicas se complementam numa reciprocidade, tornando
possível a formação das estruturas operatórias.
A noção de SRTs não é só a de um regulamento que representa definitivamente com
clareza o sistema processual do sujeito psicológico; ele ultrapassa isso lhe designando regras e
lhe dando autonomia com a finalidade de orientar a atividade desenvolvida pelo sujeito.
14 Modo como os adultos envolvidos na prática social apresentam funcionamentos cognitivos heterogêneos proposta por J.-M. Hoc em seu li vro Psycologie Cognitive de la planificacion, Grenoble, Presses Universitaires de Grenoble, 1987, citados por Malglaive, (1995) 15 Segundo J.-M.Loc (in Malglaive, 1995, p.140), é “um conjunto de estruturas de objetos, de descritores de propriedades destes objetos, de operações sobre eles, e que dizem respeito às tarefas objetivamente realizáveis neste conjunto em função dos objetos que contém, das suas propriedades e das suas l imitações”.
]_^
Retornando aos estágios de desenvolvimento da teoria piagetiana e referindo-se ao seu
aspecto estrutural, Malglaive (op.cit, 1995, p.148), cita os estudos de R. Garcia “que são
períodos de estabili dade relativa (...) que comportam todo o tipo de flutuações que nascem das
situações mutáveis com as quais os sujeitos são confrontados” . Assim, a idéia da universalidade
dos estágios no que se refere a adultos, é excluída, pois neles, o desenvolvimento dos estágios
descritos por Piaget pode ser considerado um retorno a esses estágios.
O adulto tende a ter ou ser mais problemático devido ao (dis) funcionamento das
estruturas cognitivas. Continuando, Malglaive (1995) cita os estudos de R. Garcia:
cada período, ou cada estágio, tem de específico os problemas que o sujeito é capaz de resolver, isto é, a situação que é capaz de aprender; (...) em cada período ou estágio, o sujeito utili za relações características.(1995, p.149) Este sujeito é capaz de util izar uma ou mais estruturas para realizar uma atividade ou
várias delas ao mesmo tempo, a contento. Afirmar que as estruturas características estão em
atividades em cada um desses estágios não é, portanto, afirmar que o estágio é definido por
uma única estrutura lógica. Então, os adultos utilizam-se de várias relações lógicas, várias
estruturas, interiorizadas sob a forma de um Sistema de Representações e de Tratamentos
SRTs. É nesse sistema que ocorrem situações mutáveis que o sujeito as enfrenta e onde estão as
implicações significantes e as operações formais que, estruturadas, irão constituir o
funcionamento e os estágios pelos quais os sujeitos passam.
Os SRTs não são fechados assim como as estruturas também não são. Na medida em que
o sujeito se confronta com novos problemas e tem a obrigação de resolvê-los, interioriza e
elabora novos SRTs para superar os obstáculos. São os confli tos e dificuldades cognitivas
instáveis e dinâmicas que ocorrem antes da chegada a um patamar superior, e que gera um novo
SRT. Os diferentes processos do desenvolvimento cognitivo descrito por Piaget como
assimilação, adaptação e acomodação são invariantes e definem os estágios de duas maneiras:
os SRTs que o sujeito já dispõe e os que compõem o conjunto de relações lógicas que o sujeito
busca para encontrar as possíveis soluções dos problemas do cotidiano.(Malglaive, p. 146-147)
Segundo R. Garcia (2002, p. 88) o conhecimento se desenvolve num duplo processo
construtivo: o primeiro está na organização das próprias ações do sujeito, que as coordena,
desenvolve-as com mecanismos construtivos, para se chegar “nas formas dedutivas e os
reforçamentos”. O segundo esta na organização do “material empírico” , ou seja: inicia-se com
os significados, seguidos das comparações que levam a “correspondências e transformações
elementares”, para, finalmente, interpretar os fenômenos e estabelecer relações entre eles.
`+a
No caminhar dessa pesquisa, o percurso das investigações sofreu influências de vários
pesquisadores. Embora seus trabalhos nem sempre estejam voltados para a Educação de Jovens
e Adultos e, especificadamente na área da Matemática, suas influências despertaram nossa
curiosidade e esclareceram detalhes sobre a epistemologia das crianças, jovens e adultos. Cito,
como exemplo, as pesquisas de Schliemann, (1983); Carvalho, (1995); Moura, (1999); Bail,
(2002); Fonseca, (2002) e Frigo (2001).
1.3.2. A construção do conhecimento e o ensino da matemática
Numa visão piagetiana, a construção do conhecimento e as pressões locais e lingüísticas
exercidas em interação com as possibil idades de desenvolvimento de cada sujeito ao longo de
sua vida transformam a própria estrutura do sujeito. Não somente o obriga a conhecer os fatos,
mas a agir com eles, construindo signos que lhe modificam o pensamento e propõem novos
valores e ensinamentos.
Fica evidenciado que a vida social modifica a inteligência do indivíduo pelas trocas
constantes, pelas normas impostas pela sociedade, pelas regras do convívio em família e pela
participação escolar.
Malglaive (1995, p.131), referindo-se aos estudos piagetianos, cita o aspecto funcional
dos estágios16 pelos quais passam os sujeitos a partir de suas aquisições sensório-motoras. São
eles: o sensório-motor, o pré-operatório, o operatório concreto e o operatório formal. Estes
estágios são assim denominados em função da natureza das estruturas lógico-matemáticas –
cognitivas – que o sujeito constrói para superar desafios. A partir destes estágios, a inteligência
não é herdada e sim decorrente de um organismo que vai sendo construído em contato com o
meio ambiente, dando significado ao mundo.
Os fatores que influenciam no desenvolvimento dos sujeitos são internos ao próprio
sujeito e da interação do sujeito com a realidade. A hereditariedade (maturação biológica) que
influencia no desenvolvimento é insuficiente para explicá-lo, já que a própria maturação é
dependente da atividade do sujeito e vai contribuir decisivamente na construção de novas
estruturas mentais.
A experiência física, a transmissão social e a cultura também são fatores influenciadores
do desenvolvimento. A primeira pode ser entendida como toda experiência que resulta das
ações realizadas materialmente. Este fator não é essencial visto que a lógica da criança não
16 O que é fundamental não são os estágios, mas a natureza das estruturas que funcionam como as ferramentas do pensamento/raciocínio.
b(c
resulta apenas dele. É preciso uma coordenação interna entre as ações que a criança exerce
sobre os objetos. A segunda refere-se à educação. Fundamental, porém não suficiente. Para que
ocorra a transmissão entre o adulto e a criança ou entre o meio social e a criança a ser educada,
é essencial que ela assimile o que o meio social lhe quer transmitir. Já a cultura difere das
demais em termos de linguagem natural, educação familiar peculiar, status e posturas que se
revelam diferentes diante de outras culturas.
Efetivamente, seja qual for o nível de desenvolvimento que o sujeito alcançou, qualquer
outra nova construção desencadeará o processo de equili bração - que é o fator essencial e
determinante no desenvolvimento do indivíduo neste processo de adaptação ao meio em que
vive. A equilibração se caracteriza pelos aspectos de articular entre si outros fatores de
desenvolvimento e equili brar a descoberta de uma nova noção com as outras já existentes. É
importante dizer que este fator de desenvolvimento depende essencialmente da ação do sujeito
ativo, sua participação no mundo em que vive e convive.
Prosseguindo nas pesquisas piagetianas Malglaive, (op.cit), diz que a construção do
conhecimento, procedimentos e estruturas estão intimamente ligadas ao processo cognitivo. No
decorrer de um procedimento, o sujeito faz uso de certas operações de uma estrutura que são de
domínio de seus atos e as estruturas de domínio de seu conhecimento previamente construído.
O que é possível dizer é que as estruturas são marcas do sujeito que as construiu no decorrer de
suas experiências cognitivas. O interessante é que erros e experiências ocorrem em todos os
seres humanos, é universal que todos os sujeitos construam estruturas enquanto pensam,
estabelecendo relações lógicas que suportam seus pensamentos/reflexões.
Estas considerações de como o sujeito desenvolve estruturas para conseguir realizar ou
operar problemas, quer de ordem matemática ou não, me levaram a refletir sobre a prática
escolar: a resolução de problemas é conceituada, segundo Torres (1992, p. 87- 89), como as
capacidades e habilidades cognitivas que o sujeito desenvolve para em resolvê-los. Porém,
saliento que a resolução de problemas não está limitada à prática escolar, em se falando de
pessoas adultas que pouco freqüentaram a escola; mas volta-se à prática diária dessas pessoas
nas suas capacidades de levantar hipóteses, analisá-las, entendê-las e, conseqüentemente,
resolver os problemas com eficácia ou não.
Voltando ao ensino da matemática na educação de jovens e adultos, reporto-me a Duarte
(1995, p. 8) que defende que o objetivo do ensino da matemática está em vinculá-la às
necessidades sociais e reais dessas pessoas; não esquecendo que a relação entre os conteúdos
matemáticos e a forma de transmissão – assimilação – se dá nessa mesma relação.
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A dificuldade dessas pessoas encontra eco em Oliveira (1999) ao relatar a limitação de
estudos na área da psicologia – processos cognitivos – para o aluno adulto:
As teorias do desenvolvimento referem-se, historicamente, de modo predominantemente à criança e ao adolescente, não tendo estabelecido, na verdade, uma boa psicologia do adulto. Os processos de construção do conhecimento e de aprendizagem dos adultos são, assim muito menos explorados na literatura psicológica do que aqueles referentes às crianças e adolescentes.(p.60).
Fonseca (2002, p. 20) cita a pouca li teratura voltada para o desenvolvimento cognitivo do
adulto; “ tradicionalmente encarado como um período de estabilidade e ausência de mudanças” .
Percebe-se, então, em relação aos acontecimentos matemáticos, falas e expressões que relatam
as dificuldades de se aprender e a solucionar problemas dessa ordem.
Palácio (1995, p. 312) afirma que “as pessoas humanas têm um bom nível de
competência cognitiva até numa idade avançada (desde logo, acima dos 75 anos)” . Ou seja, é
preciso redimensionar as condições de aprendizagem e a construção de conhecimento na idade
adulta, considerando o nível cultural e educacional, o bem estar físico e psicológico, além da
experiência profissional.
Nesse cenário, pergunto: o que é um problema?
Segundo Macedo (2002, p. 115), “são fragmentos relacionados com nosso trabalho, nossa
interação com as pessoas, nossa realização de tarefas, nosso enfrentamento de confli tos”.
Entende-se por problemas, as dificuldades dinâmicas e abertas, que são universais a todos e à
vida; é preciso, então, saber direcioná-las e saber superar os obstáculos e desafios. Um
problema solicita um posicionamento e nos convida a exercitar estruturas de um nível superior,
superando-as e alcançando outros níveis. De acordo com Piaget, problemas são, na verdade,
desafios para os quais nosso cognitivo ainda não conseguiu encontrar uma lógica...
1.3.2.1. Aspectos cognitivos no adulto e a resolução de problemas matemáticos
Em se tratando da Matemática, D’Ambrosio (1998, p.7) a interpreta como uma
...estratégia desenvolvida pela espécie humana ao longo de sua história para explicar, para entender, para manejar e conviver com as realidades sensíveis, perceptíveis e com seu imaginário, naturalmente dentro de um contexto natural e cultural.
A educação matemática e o ensino estão inseridos na sociedade; os sujeitos aprendizes a
utili zam como estratégia para resolver as mais diversificadas situações.
Em pesquisas realizadas por Carraher e Schliemann (1995) verifica-se que as pessoas, no
seu dia-a-dia, utilizam estratégias próprias para resolver situações matemáticas. Tais estratégias
fhg
diferem das ensinadas na escola formal. Por isso, os cálculos mentais estão presentes na vida
dessas pessoas.
Tal realidade não permite que elas registrem esses cálculos de maneira convencional.
Portanto, as experiências vivenciadas no dia-a-dia são fatores que interferem no seu
desenvolvimento intelectual. Ou seja, ao tentar resolver um problema, o adulto executa seu
registro com seus meios intelectuais, levando a termo seu raciocínio, tentando representá-lo
corretamente o que lhe está no intelecto, não se importando a maneira de como registrá-lo.
Observo que a solução e os registros de problemas matemáticos exigem certos
conhecimentos que esses adultos já vivenciaram na escola ou fora dela e trazem consigo. Essas
primeiras representações adquiridas na infância não desaparecem com a idade; porém, podem
ser representações não verdadeiras, concepções errôneas sob o ponto de vista do registro
formal. Mas lhes permitirão relacionar fatos com outros acontecimentos já vivenciados,
proporcionando, assim, uma melhor compreensão das situações matemáticas quando a elas
confrontados.
Quando o adulto pouco ou não escolarizado necessita efetuar seus registros matemáticos,
as barreiras se elevam de tal forma que ele se sente inseguro, pois acredita não conseguir
escrever números e operações de maneira convencional, ensinada pela escola. Ele usa cálculo
mental e oral e alguns dos seus registros têm características individuais. Dentro dessa realidade,
Duarte (1995) refere-se à estrutura dinâmica das capacidades fundamentadas na concepção de
saberes em uso desse sujeito que pode ser entendida como a ação do pensamento sobre os
saberes, estruturando novos saberes. Estão inclusos nestes saberes em uso o saber teórico ou
formal e o saber prático.
O saber teórico se define a partir da realidade na qual se insere o sujeito - o que é - no
momento que ele pratica a ação. Este saber torna-se saber técnico - o que se deve fazer -, e
metodológico - como fazer. No instante em que o conhecimento é gerado pela ação, tem-se o
saber prático, não formalizado, que se revela mais nas ações e menos na verbalização. Saberes
teóricos e práticos estão relacionados entre si e resultam nas estruturas das capacidades ou
competências de maneira dinâmica, autônoma e formal do pensamento sobre os saberes em
uso, gerando novos saberes.(Duarte, 1995, p.6)
Nessa perspectiva, qual o papel funcional das representações na resolução de problemas?
Durante a resolução de um problema, o sujeito utili za esquemas mentais e os aplica,
organizando-os e elaborando procedimentos que poderão ou não elucidar na construção de
i@j
noções17. O papel das representações, neste caso, tem importância funcional visto referir-se ao
sistema de esquemas ligados à função semiótica, que é a capacidade de representação que
permite ter um experimento não instrumental; uma ação interiorizada, um pensamento lógico.
Ao se confrontar com um problema, o adulto tenta resolvê-lo, agindo, interagindo e não
se importando com a maneira de registrá-lo. Nas pesquisas de Schliemann (1995, pp.21-22), o
jovem ou o adulto pouco escolarizado, que sobrevive dos trabalhos nas ruas, desconsidera as
representações formais adotadas pela escola para resolver seus problemas matemáticos devido a
não entendê-lo ou porque, para eles, o problema que é ensinado na escola não tem significado,
já que não é do cotidiano vivenciado por eles.
A escola desconsidera, muitas vezes, a resolução de um determinado problema pelo
adulto como correta, porque, na maioria das vezes, essas pessoas usam de outras estratégias ou
outros algoritmos com características próprias e, muitos educadores priorizam somente uma
fórmula para resolver tais problemas.
Schliemann (ibidem, p. 23), defende que o fracasso, tanto individual quanto de um
sistema social, faz com essas pessoas passem por dificuldades quando desafiadas a resolver
problemas matemáticos; em suas pesquisas, cita crianças e adolescentes que convivem com a
matemática elementar e apresentam poucas dificuldades em realizar cálculos operacionais
envolvendo as quatro operações básicas. “Com 10-11 anos, as crianças já podem ter seus
‘próprios negócios’ ou ajudar seus pais”.
Pessoas jovens e adultas, quando crianças, conviveram e passaram por experiências
variadas. Coll (1987, p.34), referindo-se à teoria piagetiana, explica as duas maneiras como
esses adultos, ainda crianças, aprenderam. A primeira é a experiência física: o sujeito faz
tentativas de compreender as “propriedades do objeto com o qual interage” dando-lhe
significações e, finalmente, assimilando-o. No segundo tipo de experiência, a lógico-
matemática, o sujeito experimenta suas “próprias ações, seus próprios esquemas” , abstração
entre as ações que exerce sobre os objetos.
Na educação de jovens e adultos, a Matemática não pode ser encarada como um
obstáculo à aprendizagem. É importante oportunizar o “ fazer e falar” matemática, dando
chances para explorar a linguagem oral em interação com os demais colegas, estimulando a
produção de registros e desenhos que busquem a solução do problema proposto. Nessa proposta
de “registro da fala”, a resolução de problemas surge como uma forma de conduzir o ensino e a
aprendizagem da matemática.
17 Conhecimento elementar ou superficial acerca de algo.Conhecimento imediato, intuiti vo de algo.(Dicionário Houaiss da Língua Portuguesa, 2001, p.2022).
khl
Neste universo complexo, torna-se necessário envolver o ensino, a aprendizagem e a
história dessas pessoas que saem em busca de seus sonhos em grandes teias para que essas
pessoas possam adquirir mais conhecimentos para aplicá-los em suas vidas e,
conseqüentemente, melhorá-las.
Diante do exposto, o desafio surge com B. Inhelder (1996), segundo a qual “uma coisa é
possuir estruturas, outra coisa é saber servir-se delas”. O educador tem um importante papel na
EJA, pois atua como mediador entre a necessidade de conhecimentos e a aquisição destes.
Trabalhando em conjunto, educadores e educandos conseguirão encontrar as soluções
almejadas pelo educando em sua vida cotidiana. Este caminho só poderá ser trilhado quando os
educando compreenderem que precisam de conhecimentos matemáticos para representar os
cálculos mentais que efetuam.
A referência aos problemas matemáticos nos transporta a Brito (2001, p.147-149), que
diz que a aprendizagem não fica limitada somente às memorizações de técnicas ou aos registros
mecânicos, nem à leitura de enunciados ou transmissões orais de educadores. Acontece o
contrário: o conhecimento lógico-matemático implica relações entre “a criação do sujeito e sua
relação com a situação em si, apoiados em abstrações reflexivas” (ibidem, p.147).
Encontramos fundamentos para estas afirmações na teoria piagetiana, com Brito
(ibid.ibidem, p. 147) que conceitua o desenvolvimento como “uma construção espontânea e
gradual das estruturas lógico-matemáticas” .
Assim, tendo como suporte a teoria de Piaget, o conhecimento não é uma mera
reprodução da realidade externa. Ele vem da interação entre o sujeito e o meio no qual ele está
inserido; o que contribui gradualmente com novas estruturas cada vez mais aprimoradas e que
acompanham a abstração reflexiva que age no processo de desenvolvimento.
Estas estruturas mentais são as regras, as ferramentas que cada sujeito usa para processar
as informações que recebe, não apenas por repetição ou imitação, mas, pelas experiências de
vida. Portanto, não adianta apenas observar ou receber passivamente uma informação para
aprendê-la. É fundamental experimentá-la.
Segundo Brito (ibidem, p. 148), estas estruturas vêm acompanhadas da abstração
reflexiva, na qual são caracterizadas pela experiência lógico-matemática. A abstração reflexiva
é constituída na mente do sujeito quando ele cria, representa e relaciona vários objetos e
coordena essas relações entre si.
Não se trata de abstração empírica que se apóia somente nas informações que o sujeito
tem do objeto, mas, nas informações e ações do sujeito no momento em que usa de objetos
manipuláveis e deles obtém as informações que consideram necessárias. (ibidem, p. 149).
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A evolução progressiva da abstração reflexiva é explicada por Brito (2001, p. 149) como
“ reflexionamento” e, a “reflexão”, abstrações reflexivas inseparáveis responsáveis pela
construção de novas aprendizagens, que auxili am no desenvolvimento das estruturas do
conhecimento.
Na busca de referenciais, encontro respaldo em Gérard Vergnaud (1990), estudioso do
funcionamento cognitivo do “sujeito em situação” , com sua Teoria dos campos conceituais (no
que se refere à matemática), nas questões de estruturas aditivas e multiplicativas; um eco para
meus objetivos.
1.4. A teor ia dos campos conceituais: contr ibuições para a adição e subtração
Proposta por Vergnaud (1990), a teoria dos campos conceituais pode ser definida como:
...uma teoria cognitivista que visa a fornecer um quadro coerente e alguns princípios de base para o estudo do desenvolvimento e da aprendizagem de competências complexas, notadamente das que revelam das ciências e das técnicas. (p.133).
Esta definição diz respeito à complexidade existente entre a compreensão dos enunciados
verbais dos problemas matemáticos e suas posteriores resoluções. Ao tentar resolvê-los, o
sujeito passa por vários processos que envolvem conceitos, conteúdos, estruturas e
representações simbólicas, que o levam a desenvolver competências necessárias à sua
compreensão. Em outras palavras, esta teoria enfoca o desenvolvimento e o funcionamento
cognitivo do sujeito quando este se depara ou se confronta com estes tipos de situações.
Fazem parte do campo conceitual específico da adição e a subtração; tanto com números
naturais como com números relativos. (Ambos estão dentro das atividades praticadas
diariamente nas escolas, tanto pelos estudantes - no seu dia a dia - como por educadores - nas
propostas de trabalho em sala de aula), do cotidiano escolar, a análise das dificuldades e dos
procedimentos pelos quais passam os estudantes ao tentar resolver problemas matemáticos
aditivos introduziu a distinção entre o cálculo numérico e o cálculo relacional. A diferença
entre ambos é que os cálculos numéricos são os procedimentos (corretos ou não) do uso de
algoritmos e o relacional envolve operações de pensamento necessárias para compreender as
relações envolvidas na operação.
Vergnaud (op.cit, p.158) reconhece a importância da teoria piagetiana em seus estudos,
dizendo que ela é fundamental para a investigação em Didática, Ciências e Matemática. Porém,
ele acredita que a essência da teoria está no conceito de esquema, introduzido por Piaget para
o@p
dar conta das formas de organização tanto das habilidades sensório-motora, como das
habili dades intelectuais. Os esquemas são, portanto, estratégias cognitivas entendidas como
atividades do sujeito que têm a intenção de diminuir as perdas e de aumentar os ganhos das
informações recebidas através de dados externos.
Campo conceitual é uma pragmática18 que faz apelos à noção de situação e das ações
dos sujeitos nas situações. É um conjunto informal e heterogêneo de problemas, situações,
conceitos, relações, estruturas, conteúdos e operações de pensamentos interligados. No
momento em que o sujeito se deparar com situações problemáticas, se servirá dessas
aquisições, conseguindo o domínio para resolvê-las. O domínio dos campos conceituais ocorre
lenta e gradativamente e é adquirido à medida que o sujeito se depara com dificuldades e estas
são enfrentadas.
O campo conceitual das estruturas aditivas envolve, necessariamente a adição e a
subtração, de forma isolada ou combinada entre si, juntamente com outros conceitos
matemáticos. Portanto, a teoria cognitivista de Vergnaud está baseada sobre os conhecimentos
anteriormente formados pelo sujeito que, ao mesmo tempo incorpora novos dados a eles,
desenvolve competências mais complexas aliadas a esses conhecimentos.
Assim sendo, nos reportamos a Vergnaud (1990, p.145), na teoria dos campos conceituais
há uma série de considerações fundamentais que vão interferir na formação de conceitos. Ele
utili za três conjuntos onde:
S. é um conjunto de situações que dão sentido ao conceito, onde a representação dos
elementos pertence à situação (referentes ou realidade). Está no conjunto de situações a
significação de um conceito;
I. é um conjunto de invariantes (propriedades, objetos e relações) sobre as quais estão
inseridas a operacionalidade do conceito. As informações estão num conjunto de situações
(argumentos) que darão significados no qual só um conceito não é suficiente para analisar uma
situação (significados). É necessário um conjunto de invariantes operatórias que, ao serem
identificadas, podem ser usadas pelo sujeito para dominar situações; e,
R. indica que é no conjunto de representações simbólicas (linguagem natural, gráficos,
tabelas, etc), que se encontram os invariantes e, conseqüentemente, os procedimentos para lidar
com as situações e como representá-las.
18 Em um sentido geral, pragmático”significa concreto, aplicado, prático, e opõe-se a teórico, especulativo, abstrato. (Japiassu, 1999,p.218).
qhr
Concluindo, o primeiro conjunto de situações refere-se ao referente do conceito; já o
segundo , de invariantes operatórios, é o significado do conceito e, finalmente o terceiro, das
representações simbólicas, é o significado.
Seguindo esses argumentos, apresento a classificação dos problemas das estruturas
aditivas, conforme campos conceituais de Vergnaud (1990). Tais elementos são essenciais para
o desenvolvimento e aplicação da pesquisa.
1.4.1. A classificação dos campos conceituais
Para dar sentido às dificuldades pelas quais passam os sujeitos aprendizes, a teoria dos
campos conceituais propõe que os conceitos que compõem as estruturas aditivas, no caso da
adição, o âmago do “desenvolvimento cognitivo”. Vergnaud (1990) lança mão de uma
classificação segundo as dificuldades dos problemas de estrutura aditiva e os raciocínios
requeridos para resolvê-los.
A classificação dos problemas é puramente conceitual, propondo momentos de “estado” ,
de “transformação” e de “estado e transformação” , sendo que “estado” significa um conjunto
de qualidades ou características com que as coisas se apresentam ou um conjunto de condições
em que se encontram em determinado momento, quando nos referimos ao cálculo numérico;
“ transformação” trata de situações em que a idéia temporal está sempre envolvida, ou seja, é
fazer passar de um estado inicial ou condição a outro. “Estado e transformação” de um estado
inicial tem-se uma quantidade que se transforma através de perdas ou ganhos.
O campo conceitual das estruturas aditivas envolve 6 (seis) tipos de problemas aditivos
básicos, assim categorizados por Vergnaud (1990, p. 164):
1ª categoria: Composição (entre duas medidas)
2ª categoria: Transformação (conecta duas quantidades)
3ª categoria: Comparação (entre duas quantidades)
4ª categoria: Composição de duas transformações
5ª categoria: Transformação de uma relação (liga dois relacionamentos estáticos) e, finalmente
6ª categoria: Composição de relações (entre dois relacionamentos estáticos)
Para a compreensão do leitor, segue a legenda que tentará esclarecer a estrutura dos
problemas conforme a classificação descrita anteriormente.(ibidem, p.165)
shs
LEGENDA:
Representa a medida (um elemento do conjunto dos números naturais).
Representa uma transformação (um elemento do conjunto dos números inteiros).
{ A composição dos estados (estados/medidas, estados/relativos)
A seta horizontal representa uma transformação (uma mudança de estado)
A seta na vertical representa uma relação (entre os estados).
Durante o ano de 1976, Vergnaud (1990, p. 133-159) propôs diferentes problemas de
adição aos alunos de uma escola primária na França, a partir das quais pôde constatar
diferenças no que se refere às dificuldades dos alunos em resolver as mesmas situações, em
problemas considerados parecidos quanto ao enunciado.
Diferentes classificações foram propostas por ele para tentar explicar as dificuldades
pelas quais passaram seus alunos e oferecer dados para a pesquisa e, conseqüentemente,
resoluções mais adequadas às situações propostas.
Para uma melhor compreensão, seguem as classificações detalhadas por Vergnaud (1990,
p. 166-169).
1. COMPOSIÇÃO (entre duas medidas)
Temos dois estados fixos que visam um terceiro estado fixo. Ou seja, em duas classes
problemas, encontra-se a incógnita sabendo os valores A e B. Também se pode encontrar A,
sabendo os valores de B e da incógnita; ou ainda, encontrar-se B, sabendo os valores de A e da
incógnita.
Diagrama 1.1.
A
t@u
+ {
EXEMPLO 1.1. Num jardim há 8 borboletas brancas e 5 borboletas verdes. Quantas
borboletas há no jardim?
EXEMPLO 1.2. Tenho 10 vasos de barro e 10 vasos plásticos. Quantos vasos tenho ao
todo?
Estes dois exemplos de problemas estão relacionados com a vida cotidiana das pessoas,
suas vivências e experiências fora e dentro da escola. Podemos então dizer que este tipo de
raciocínio é intuitivo por ter sido construído com espontaneidade, e, sem a criança perceber,
seguirá como exemplo, pelo seu caminhar na vida.
2. TRANSFORMAÇÃO (A operação numa medida resultante noutra medida)
Ela atua sobre um estado fixo com a finalidade de chegar a outro estado fixo. Ou seja, são
dados o estado inicial e uma transformação para se chegar a um estado final.
Diagrama 2.1.
EXEMPLO 2.1. João tinha 8 bolinhas de gude e ganhou 5 bolinhas de gude do seu pai.
Quantas bolinhas de gude João tem agora?
EXEMPLO 2.2. João tinha 8 bolinhas de gude e perdeu 5 bolinhas de gude no jogo.
Quantas bolinhas de gude João tem agora?
Estes problemas de transformação nos oferecem possibilidades de ganhos positivos (8 e 5
são números naturais e -3 é um número relativo no exemplo. 2.2) e negativos, no caso de perda.
São situações que podem ser chamadas de protótipos, pois são de fácil solução tanto pelas
crianças como pelos adultos porque está bem clara a associação de “ganho” com a adição e
“perda”, com a subtração.
B
?
+B
A ? A ?
-B
vhw
3. COMPARAÇÃO (Relação estática de duas medidas)
É uma classe de problemas na qual duas quantidades são comparadas. Uma delas é o
referente e, a outra, o referido.
EXEMPLO 3.1. Pedro tem 9 anos e sua irmã 3 anos. Qual a diferença de idades entre
eles?
Neste problema temos a idade de Pedro (9 anos), que é o referente em relação à idade de
sua irmã (3 anos). A idade da irmã é o referido, pois parte dela a obtenção da diferença que é
pedida no problema.
Diagrama 3.1.
4. COMPOSIÇÃO DE DUAS TRANSFORMAÇÕES (duas transformações que se
combinam numa transformação total)
Envolve dois tipos de problemas:
• Problemas de transformação com a transformação desconhecida;
• Problemas de composição com uma das partes desconhecidas.
Diagrama 4.1.
F > 1
Inicial Final
EXEMPLO 4.1. Luis Paulo tinha 8 figurinhas de jogadores de futebol quando entrou no
jogo. Depois do jogo, contou suas figurinhas e percebeu que tinha 12. O que aconteceu no
jogo?
?
A
B
I F ?
xhy
Diagrama 4.2.
F < 1
Inicial Final
EXEMPLO 4.2. Luis Paulo tinha 12 figurinhas de jogadores de futebol quando entrou no
jogo. Quando terminou o jogo, ele contou suas figurinhas e viu que tinha 6. O quê aconteceu no
jogo?
Nestes dois tipos de problemas, segundo Vergnaud (1990. p.167-168), a sua resolução
mais adequada é realizar uma operação de subtração, já que no enunciado está explícito que
tidpo de operação será a mais adequada.
Esta categoria, divididas em duas, podem gerar danos e perdas, quando os problemas
envolvem compra e venda. Algumas situações serão de ganho e a operação será a adição -
ganhar - e o resultado será positivo, já outras, serão de perdas, cujo resultado, obviamente, será
negativo.
Nestes exemplos, o procedimento para se realizar a operação é subtrair os números
conhecidos do enunciado para se saber as variações entre eles e, com isso, chegar à conclusão
quanto ganhamos ou perdemos.
Diagrama 4.3.
}
EXEMPLO 4.3. Num vaso há 7 flores nas cores vermelha e amarela. Três flores são
vermelhas, quantos são as flores amarelas?
?
I
F
?
X
Z
z�{
Este problema refere-se à classe da composição onde conhecermos uma das partes e o
todo. Precisamos encontrar a outra parte.
Nesta situação, o pensamento da criança, diferentemente do adulto, não é intuitivo
(Fonseca, 2001) porque a solução exige uma operação subtrativa, enquanto que a situação
parte-todo tem uma relação de operação aditiva.
Muitas resoluções ocorrem pelo processo da complementação. Ou seja, parte-se do menor
número como referente até alcançar o resultado solicitado. Exemplo: 3...4...5...6...7...8.
5. TRANSFORMAÇÃO DE UMA RELAÇÃO (envolve tanto a comparação quanto a
transformação)
São problemas considerados de difíceis soluções, pois envolvem um raciocínio mais
elaborado por parte daqueles que tentarão solucioná-lo.
Diagrama 5.1.
Ocorre quando uma transformação atua sobre um estado relativo e ocasiona um outro
estado relativo.
EXEMPLO 5.1. Marli deve 8 figurinhas adesivas a Carlos. Ela conseguiu devolver 3
dessas figurinhas. Quantas figurinhas ela lhe deve agora?
Quando relacionamos a palavra “devo” , ela sugere “perda”, então, para resolver a
situação, trabalha-se com números relativos (-8 e +3 = -5).
6. COMPOSIÇÃO DE RELAÇÕES (envolve dois estados relativos que se combinam
para originar outro estado relativo)
Diagrama 6.1.
}
B B
A C
A
B
C
|�}
EXEMPLO 6.1. Tarci deve 10 figurinhas a Aguinaldo, mas Aguinaldo deve 5 figurinhas
a Tarci. Como ficará a situação após ambos devolveram as figurinhas que devem?
EXEMPLO 6.2. Valci tinha alguns pirulitos e ganhou 3 piruli tos de sua tia, ficando com 8
pirulitos. Quantos piruli tos Valci tinha antes?
Esta situação envolve tanto a transformação quanto a comparação e são de difícil solução
e demanda mais atenção e um sofisticado raciocínio aditivo. Nesta situação está o problema de
transformação, onde se desconhece o estado inicial, assim como é desconhecido o referente de
comparação.
Este diagrama é considerado de 4ª extensão, ou seja, possui uma acentuada dificuldade
de resolução pois o estado inicial é desconhecido. Para resolvê-lo pode-se fazer uso da adição
ou da subtração.
A resposta considerada correta segue o caminho da transformação inversa que se aplica
ao estado final, pelo fato de o estado inicial ser desconhecido. Aqueles que o tentam resolver
não sempre sabem por onde começar e em conseqüência, não se tem certeza sobre o resultado.
EXEMPLO 6.3. Valdira tem alguns bombons e Sali tem 10 bombons a mais que Valdira.
Sabendo que Sali tem 16 bombons, quantos bombons têm Valdira?
Neste enunciado, aparece a classe de situação de comparação. Nele se pede para se achar
o referente, se conhece o referido e a relação que há entre eles. Também é de difícil solução,
pois faz pensar que é no referente que se pode encontrar o referido, quando, na realidade, o que
ocorre é o oposto.
Podemos constatar que Sali é a referência e Valdira está descrita em termos de quantos a
mais ou a menos Valdira tem em relação ao tanto que Sali tem (apesar desse “tanto” ser
desconhecido). Como não se tem um ponto de partida, a dificuldade está em relacionar o
cálculo mental com o escrito.Ou seja, o cálculo relacional e o cálculo numérico.
A partir dessas classificações, elaborei problemas que me dessem suporte aos meus
objetivos, evidenciados no início da pesquisa.
~��
E, me pergunto, o tem isso a ver com as estratégias e as notações util izadas pelos sujeitos
desafiados a resolver problemas matemáticos com estruturas aditivas, segundo a teoria
cognitivista e a dos campos conceituais?
O caminho construído e percorrido a seguir, procurará responder estas questões.
Parte 2: A construção do caminho
“ Não devemos esquecer que em Matemática existe apenas uma
resposta correta para um determinado problema,
porém os caminhos para se chegar a ela são
inúmeros” .
Sandra Magina, Tânia Campos, Terezinha Nunes e Verônica Giti rana
2. Os atos da pesquisa
2.1. O problema e o método
A relação das vivências diárias entre mim - educadora de pessoas jovens e adultas e
alunos da EJA/ UNIVALI -, o conhecimento e a escola proporcionou-me momentos de
curiosidade que me levaram a desenvolver esta pesquisa. Nesta parte, apresento os atos da
pesquisa, calcados em meus objetivos gerais e específicos, que visam identificar, caracterizar e
comparar as relações entre as notações, as estratégias utili zadas pelos sujeitos e as notações
convencionais ensinadas na escola. Para isso, utilizo problemas matemáticos envolvendo as
estruturas aditivas a partir dos enunciados verbais, segundo a teoria dos campos conceituais de
G. Vergnaud.
A pesquisa buscou na teoria cognitiva piagetiana, mais especificamente nos estudos de
Gerard Vergnaud e em outros pesquisadores já mencionados, assim como na recente arte de
ensinar adultos (Andragogia), subsídios para compreender como essas pessoas agem diante de
determinadas situações matemáticas.
Os dados coletados permitiram a descrição dessas pessoas, seus comportamentos, das
situações e dos acontecimentos. A análise da interação entre pesquisador e pesquisados pôde
ser feita com base nas ações, nas falas, nos registros produzidos pelos sujeitos, coletados nas
entrevistas como nas transcrições de filmagens, fotografias e anotações feitas pela
pesquisadora.
���
As falas que traduzem as perspectivas dos sujeitos pesquisados e os significados por eles
atribuídos às situações e à vida são dados essenciais, permitindo-me compreender a maneira
como essas pessoas enfrentam as situações com as quais são confrontadas. Minha tarefa é
participar, compreender e interpretar os dados coletados no desenrolar da pesquisa, tendo os
sujeitos pesquisados como co-participantes.
2.2. Os sujeitos19
Foram pesquisados cinco sujeitos freqüentadores do Grupo de Estudos da UNIVALI -
Primeiro Segmento do Ensino Fundamental (1ª a 4ª série). Todos freqüentaram por cerca de um
ano e meio (de fevereiro de 2000 a agosto 2001) a Proposta Expressiva Criativa na Educação
de Jovens e Adultos, apresentada e ofertada a todos os funcionários da instituição como
incentivo para complementar suas escolaridades e, conseqüentemente, aprimorar seus
conhecimentos e aprendizagens.
As histórias de vida das pessoas por mim convidadas para a pesquisa são repletas de
diversidades: essas pessoas possuem uma identidade sociocultural repleta de experiências,
responsabil idades e sentimentos - saudades, tristezas, alegrias - próprias da vida adulta e que
elas conhecem muito bem, pois conviveram em comunidades periféricas, longe de centros
urbanos. São trabalhadores esforçados que conhecem seu passado escolar, porém muitos
procuram esquecê-lo, já que este passado não lhes traz boas recordações.
Percebi, nessas pessoas, as marcas da exclusão escolar, acontecida precocemente e
refletindo uma situação marginal, o pouco acesso a outras culturas e a bens materiais e de
consumo.
No grupo, delineia-se a predominância feminina: são quatro as pessoas do sexo feminino
e somente uma do sexo masculino. Estas 5 (cinco) pessoas têm idades entre 43 (quarenta e três)
e 53 (cinqüenta e três) anos e 4 (quatro) delas vêm do interior do estado, com longos anos de
trabalho na agricultura.
Ao saírem em busca de melhores empregos e de qualidade de vida diferenciada, essas
pessoas chegam à cidade e conseguem, de certa forma, realizar alguns destes sonhos. Todos são
funcionários da Universidade do Vale do Itajaí exercendo a função de serventes e perfazendo
19 Conforme entendimentos com os sujeitos pesquisados e refletindo uma preferência dos mesmos, confirmada em documentos por eles assinados, os seus nomes verdadeiros foram mantidos.
���
uma carga de trabalho de 8 horas diárias. São pessoas diferentes entre si em atitudes, posturas e
valores.
Somente um deles tinha certificado de conclusão do Ensino Fundamental (1ª à 4ª série),
adquirido na infância; os demais tinham cursado entre a 1ª e a 3ª série e retornaram à escola
após terem permanecido aproximadamente 40 anos fora dela.
São eles:
Valdira Vicente
É a única do grupo que estudou até a 4ª série (Ensino Básico) e, com orgulho, diz que tem
o diploma. Como ficou fora do ensino regular por cerca de 34 anos, esqueceu quase tudo o que
aprendeu. Tinha 11 anos de idade quando interrompeu os estudos, por morar no sítio e lá não
possuir uma escola para o ensino, na época designado de “ginasial” , ou seja, a partir da 5ª série.
Ela lembra que meninos e meninas estudavam juntos, e, das muitas professoras que teve,
somente de uma ela não gostou, pois essa batia com a régua nos alunos que não se
comportavam conforme a disciplina estabelecida pela escola e por ela, além de comunicar aos
pais o comportamento de seus filhos. Em casa, os pais tornavam a bater nos filhos. Isso era
muito ruim, lembra Valdira. Ela ia à escola porque tinha que aprender a ler e a escrever e
porque onde morava não tinha aonde ir; os habitantes moravam uns longe dos outros, o que
dificultava a comunicação e a socialização entre eles. O meu pai pegava no pé. Tinha que
aprender. Lá na escola, se eu pudesse, escapava da aula, mas se não fosse para escola,
limpava a casa. De alguma coisa a gente não podia escapar. Hoje sei que ele estava certo. São
palavras que nos mostram os motivos que levaram Valdira a decidir continuar seus estudos
além da 4ª série.
Valci da Silva
É a mais idosa do grupo, com 53 (cinqüenta e três) anos, e a que menos estudou.
Freqüentou somente o 1º ano primário, quando tinha 8 (oito) anos, e não foi mais à escola.
Ficou longe de uma instituição escolar por 44 (quarenta e quatro) longos anos. Suas lembranças
são amargas, como as reguadas dadas pelo professor que só tinha um braço, e como este braço
era muito forte. Lembra também das aulas dadas pela filha do professor. Essa sim era boazinha,
uma menina de 14 (catorze) anos, apenas. Não recorda de nada do que estudou. O pouco que
aprendeu serviu para ser aprimorado no decorrer da vida e do trabalho nas casas das pessoas
porque os livros a atraíam muito. Sentia curiosidade em ler o que estava escrito naqueles livros
���
grossos. Até hoje eu leio muito. Sempre gostei de ler. Para Valci, estudar era muito importante.
Eu tinha vontade, gostava de conta. Eu gostava, mas era pobre e os castigos me ajudaram a
sair da escola e ir trabalhar na casa dos outros. O que ela recorda da escola são as quatro
salas de aula, de duas professoras “boas” para as crianças; dos meninos e meninas brincando
juntos sem maldade entre os sexos, de rodar pião e ratoeira. Ela lembra do carinho dos pais e da
pobreza da casa, declarando que, até aos 8 (oito) anos, era pobre mas feliz. Quando completou
9 (nove) anos, já era empregada doméstica, aí deixou de pensar no que era ser feliz.
No desenrolar da pesquisa, deu para perceber a nitidez com que ela pensava em voz alta, ao
realizar os problemas propostos.
Sueli Bechtold
Dentre os demais sujeitos da pesquisa, esta foi a única que não gostava da escola, muito
menos de estudar. Também era a mais nervosa, inquieta e irrequieta. Estudou até o 3º ano
primário, reprovando em todas as séries. Quando completou 13 (treze) anos, saiu da escola e
nunca mais retornou até o ano 2000, quando foi convidada pela EJA/UNIVALI a concluir seus
estudos e receber o certificado de 4ª série do ensino básico. Sueli lembra que o pai a obrigava a
estudar e ela sempre relutava, discutia, então ia para a escola de má vontade e sempre de mau
humor. Ela lembra de um casarão velho próximo da escola e que os professores alimentavam a
imaginação das crianças dizendo que lá havia bruxas, que era para ter muito cuidado. A época
da escola não lhe representa nada significativo, só recorda que o pai não dava margem a
discussões do que era certo ou errado. Ele mandava em tudo e os filhos tinham que acatar suas
ordens. Eu não pensava em nada, não tinha opção, não se deixava a gente discutir, nem ter
sonhos para o futuro. O meu pai até me incentivava e dizia que se a gente não estudasse, iria
trabalhar igual a ele na serraria.
No decorrer das sessões, durante a realização dos problemas, Sueli demonstrou seu nervosismo
e sua inquietação.
Luis Paulo Bernardi
Nasceu no ano de 1961 (é o mais novo e o único homem do grupo de pesquisa) e
freqüentou a escola durante 4 (quatro) anos, até os 13 (treze) anos, saindo para ajudar o pai na
carroça, prestando serviços de transporte de pequenas mercadorias, carregando terra, esterco,
etc. Morador da periferia desde a infância, lembra da escola velha, de madeira, da primeira
professora, Da. Neusa, e da merenda preferida: nescau com bolachas (como se alimentava
inadequadamente, a merenda era o máximo). Lembra também das brincadeiras escolares, onde
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tudo era mais livre, sem malícias. Meninos e meninas brincavam juntos. Para Luis, estudar não
tinha muito significado, não via motivos para aprender, não lembra se tinha sonhos ou desejos
futuros. Seu pai o obrigava a estudar para não ser um carroceiro (como ele), porém, ele não
pensava no futuro. Atualmente, retornou aos estudos e freqüenta a EJA/UNIVALI, cursando o
4º Ciclo, o que corresponde a 6ª série do 1º Grau do ensino regular. Ficou cerca de 28 anos fora
dos bancos escolares.
Sali Teodoro dos Santos
Nascida em 1953, estudou até início da 3ª série, saindo aos nove anos de idade da escola
porque a família não possuía bens suficientes para comprar roupas, sapatos e muito menos
caderno para que ela continuasse freqüentando a escola. Com o pai doente, foi trabalhar na roça
para ajudar no sustento familiar. Lembra da escola com nostalgia. Gostava de estudar apesar de
a professora bater nos alunos que não se comportavam; eu nunca apanhei; era boazinha. O
que Sali recorda da sua infância era que gostava de aprender a ler e a escrever. Não pensava
numa profissão. Não tinha sonhos. Gostava da escola e, principalmente, do recreio com
brincadeiras “de pegar” entre meninos e meninas. Hoje ainda é moradora da periferia, se diz
sofredora como tantas outras pessoas que trabalham e sofrem com os problemas que a
sociedade traz, como drogas, alcoolismo e desemprego. Somente retornou aos estudos com a
oportunidade dada pela UNIVALI e completou o ensino básico. Ficou cerca de 40 (quarenta)
anos fora da escola. Gostaria de continuar os estudos, mas tem que cuidar das netas que foram
deixadas pela mãe que foi embora da cidade.
2.3. Procedimentos
2.3.1. Procedimentos de coleta de dados
Os dados foram coletados a partir de solicitação informal, através da qual convidei 4
(quatro) homens e 4 (quatro) mulheres que, no desenlaçar dos acontecimentos, não
compareceram às sessões. Somente quatro mulheres e um dos homens compareceram, ficando
assim definido o grupo. Os homens se justificaram alegando excesso de trabalho e uma das
mulheres disse estar adoentada.
Após o convite, prossegui com entrevistas individuais, explicando com detalhes como
seria o episódio da pesquisa, e quais eram meus objetivos.
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A ação da pesquisa ocorreu em duas sessões: a primeira contou somente com a
participação de três mulheres; aconteceu em uma das salas de aulas da instituição, tendo seu
início marcado às 14h e seu término por volta das 16h30min. As carteiras foram colocadas uma
junto da outra, com a intenção de formar um retângulo para que todas as participantes ficassem
próximas para interagir em falas, olhares e gestos.
Cada um podia ver o trabalho do outro e trocar idéias relativas às situações que lhes
foram propostas.
A segunda sessão aconteceu no dia seguinte com os dois sujeitos que não compareceram
na primeira sessão (uma mulher e um homem), o que veio ao encontro das minhas
necessidades, pois assim conseguiria observar com maior atenção, já que os sujeitos iriam
tentar resolver 9 (nove) problemas matemáticos envolvendo estruturas aditivas.
Ambos receberam o convite de sentarem-se frente a frente, com as carteiras unidas,
porém, conforme acordo entre eles e a pesquisadora, sentaram-se lado a lado.
2.3.1.1. Instrumentos utilizados na coleta de dados
Para efeitos de pesquisa, foram propostos diferentes tipos de problemas seguindo a
classificação da teoria dos campos conceituais propostas por G. Vergnaud.
Procurei encontrar situações matemáticas que envolvessem o dia a dia da sala de aula e
fossem relacionados com o cotidiano do trabalho e das relações de compra no comércio local.
Tais problemas deram suporte para minha pesquisa e puderam contemplar os objetivos.
Os problemas matemáticos, em número de 9 (nove), estavam previamente escritos em
papel e foi sugerido aos sujeitos que efetuassem seus registros no próprio papel.
Foram ofertadas canetas pretas para que os registros ficassem evidenciados durante a
filmagem.
Todos os problemas estão transcritos no anexo 2 (dois). Outro recurso utilizado na
pesquisa para registro dos dados foi a filmagem em vídeo, considerada essencial, pois com ela,
pude, posteriormente, ter os registros das falas, dos gestos, das notações e fatos do desenrolar
da resolução dos problemas. Além disso, fiz anotações dos detalhes em caderno próprio, para
posterior análise. Nesta primeira sessão e na seguinte, o diálogo foi considerado essencial, pois
tinha a finalidade de chamar a atenção para que a pesquisa decorresse com interesse.
Os problemas foram apresentados aos sujeitos após convite e conversa inicial, lidos
pausadamente, relidos quando necessário, e os sujeitos da pesquisa incentivados a verbalizar,
���
escrever, desenhar; enfim, fazer uso de ferramentas que considerassem úteis para a resolução
das mesmas.
2.3.2. Procedimentos e análise dos dados
Ao submetermos à análise as resoluções apresentadas pelos nossos sujeitos nos
evidenciou as categorias discriminadas a seguir. Levei em consideração: as verbalizações
usadas pelos sujeitos; as notações produzidas por eles e as minhas próprias anotações,
produzidas durante o desenrolar dos episódios. As categorias, em sua maioria, foram
organizadas a posteriori, com base nos dados recolhidos durante as aplicações dos problemas,
pois se percebia que os sujeitos da pesquisa utili zavam algumas estratégias não descritas na
li teratura. Outras categorias foram identificadas com base na li teratura, em pesquisas que serão
citadas quando apresentar as categorias de estratégias e dificuldades, nas reações apresentadas e
utili zadas pelos sujeitos quando da realização dos problemas.
Categor ias
Algumas categorias foram adotadas de pesquisas feitas por Magina (2001), Carraher
(1995) e Golbert (2002) e, principalmente, na teoria dos campos conceituais de G. Vergnaud
(1990).
São elas:
(DN) Decomposição de Números: utiliza a decomposição dos números para resolver o
problema.
(PA) Princípio de Aproximação: usa como estratégia de resolução o princípio do
arredondamento ou aproximação.
(E) Estimativa: faz estimativa acerca dos resultados da situação-problema, associando as
operações desta às operações realizadas.
(AC) Algoritmo Convencional: faz uso do algoritmo convencional para registrar as
operações do problema.
Outra categoria se refere ao que os sujeitos conseguem ou têm dificuldade de realizar.
(DI) Dificuldades de identificação: apresenta dificuldade em identificar no enunciado da
situação-problema quais as idéias estão envolvidas e quais operações estão inseridas nela.
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Dentre as categorias enunciadas, posso citar a (E) - Estimativa - na qual o sujeito usa o
raciocínio intuitivo baseado em seu conhecimento de número e dos signos que o representam
por lidar, em sua vida cotidiana, com essas relações significado/significante.
Na categoria (DN) - Decomposição de Números - o sujeito se utiliza dessa estratégia para
resolver a situação-problema; esta foi assim enunciada porque esta forma de registro vem do
raciocínio mental e é desenvolvida pelo adulto quando criança, ao freqüentar a escola regular.
Esta observação foi baseada quando da realização da pesquisa. Conforme Inhelder (1996, p.36)
certos sujeitos garantiam-se na execução dos problemas pela acomodação dos conhecimentos
construídos empiricamente e que orientava suas ações.
A categoria (PA) - Princípio de Aproximação - usa o princípio do arredondamento ou
aproximação surgiu das observações feitas no decorrer da pesquisa.
Para identificar os sujeitos da pesquisa, utili zamos os seus próprios nomes, das letras f
(feminino), m (masculino), seguidas das idades, e para designar o pesquisador, colocamos a
letra E, de experimentadora.
Conforme as categorias citadas, para efeitos de análises dos problemas foram seguidos
critérios que me proporcionaram subsídios para identificações, comparações e verificações dos
resultados. Além disso, os critérios de análise dos problemas me ofereceram dados relevantes e
significativos sobre as estratégias de registros utilizadas pelos sujeitos, as quais transcrevo a
seguir.
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2.4. Análise e discussão dos resultados dos problemas
Os nove problemas foram agrupados de tal forma para que se pudesse verificar a
relevância das estratégias/categorias adotadas pelos sujeitos e dar clareza e entendimentos aos
mesmos. No quadro a seguir procurei demonstrar essa forma.
Quadro 2: Caracterização dos Problemas
TRANSFORMAÇÃO COMPOSIÇÃO COMPARAÇÃO Problemas
2 8 3 9 5 6 4 1 7
C Inicial, Par te ou Referente D
C Final, Todo ou Referido D
C Transformação Par te ou Relação D
C = Conhecido D = Desconhecido Estado Inicial, Par te ou Referente < Estado Final, Todo ou Referido Estado Inicial, Par te ou Referente > Estado Final, Todo ou Referido
Como mostra o quadro 4, os problemas de números 2, 3, 4, 5, 6, 8 e 9 são considerados
de transformação, pois a operação efetuada transforma o estado inicial em estado final.
Nos problemas 5 e 6, a transformação é desconhecida e os estados inicial e final são
desconhecidos.
Nos de números 2 e 3, o Estado Final é desconhecido, sendo que nos problemas 8 e 9,
são utili zadas unidades monetárias. Já no problema 4, é o estado inicial que é desconhecido.
O problema 1 faz parte da quarta categoria: composição. Nesta, a situação envolve parte-
todo. Ou seja, para resolvê-lo, se junta uma parte com outra parte para se obter o todo. Pode-se
fazer uso da subtração: subtrair uma parte do todo para se obter a outra parte.
O problema 7 é de comparação, em que o Referente é desconhecido e a relação e
Referido são conhecidos.
Fiz a análise comparativa dos problemas 2 com o 8 e 3 com o 9, verificando quais os
efeitos do uso da unidade monetária;
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A comparação dos problemas 2 com o 3; 8 com o 9 e 5 com o 6, me permitiu examinar
os efeitos do estado Inicial ser maior ou menor que o estado final.
Na comparação dos problemas 2 com o 6 e 3 com o 5, me permitiu observar os efeitos de
se conhecer ou não a transformação, em relação a se conhecer ou não o final.
Já a comparação dos problemas 2 com o 6 e com o problema 4, me permitiu observar os
efeitos das três situações em relação à posição da incógnita inicial: transformação e estado
final.
Comparando os problemas 5 e 6 com o problema 1, pude então observar os efeitos do
tipo de situação: transformação versus composição.
Finalmente, comparando os problema 4 com o problema 7, foi possível observar os
efeitos do tipo de situação: transformação versus comparação.
2.4.1. Análise e discussão das estratégias dos sujeitos em função aos tipos de problemas
Nos quadros abaixo pude acompanhar as estratégias desenvolvidas pelos sujeitos durante
a realização dos nove problemas propostos, conforme as categorias já levantadas no item 2.3.2.
de minha pesquisa.
Quadro 3: Freqüência das estratégias utili zadas pelos sujeitos em função da util ização, ou
não, de unidade monetár ia Problemas ESTRATÉGIAS (c a t e g o r i a s)
AC AC/Des. AC/Resp.Esc. DN/PA
2 3 1 - 1 8 3 - 2 -
Problema 2 – Antônio tinha 73 figurinhas. Ganhou 21 de seu pr imo. Quantas
figur inhas Antônio têm agora?
Problema 8 – Antônio tinha R$ 214,00. Ganhou R$ 82,00 de seu pr imo. Quanto
Antônio têm agora?
Percebe-se a predominância do uso da categoria AC (Algoritmo Convencional) como
estratégia na resolução dos problemas; sendo que um sujeito também utilizou o desenho para
representar a situação do problema 2. Outros dois escreveram suas respostas verbais, no
problema 8. Somente um sujeito fez uso da categoria DN (Decomposição de Números), no
problema 2..
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Com relação aos problemas 2 e 8, pude observar que o uso, no enunciado, das palavras
figurinhas, ganhou e do símbolo de dinheiro (R$) trouxeram uma certa despreocupação para os
sujeitos, pois puderam relacionar a situação apresentada com as suas vivências escolares ou do
cotidiano do trabalho.
Ambas as situações envolveram a transformação e a palavra ganhou foi significativa para
suas soluções, principalmente no problema 8, no qual , diante da palavra dinheiro, o comentário
foi de que o Antonio ficou com muito dinheiro. Então, os sujeitos se sentiram mais livres para
resolvê-lo, pois o enunciado expressava uma situação comum a todos.
No problema 2, o interessante foi o desenho da Valdira. Ela desenhou o Antonio
(personagem do enunciado) recolhendo as figurinhas com a sua pá de lixo. Ela tomou essa
atitude após a pergunta da Sueli: Posso fazer do meu jeito? e eu responder que a estratégia era
dela; enfim, ela poderia fazer do jeito que achasse melhor, até desenhar (Vide Figura 1).
Com relação ao problema 8, dois sujeitos da pesquisa: Valdira e Sali escreveram suas
respostas por escrito, após lerem a pergunta do enunciado.
Portanto, os dados sugerem que, em problemas prototípicos de transformação (estado
inicial e transformação conhecidos; estado final desconhecido), os sujeitos tendem a utilizar o
algoritmo convencional como estratégia de resolução, independentemente do uso de unidades
monetárias.
Quadro 4: Freqüência das estratégias utilizadas pelos sujeitos em função dos efeitos do
estado inicial ser menor ou maior que o final.
Problemas ESTRATÉGIAS (Categor ias)
AC AC/Des. AC/Resp.
Esc. DN/PA
E/RespEsc. C.
M ent.
E/ Resp.Esc. C.Ment.
2 3 1 - 1 - - 3 4 - - 1 - -
8 3 - 2 - - - 9 3 - 2 - - -
5 - - 3 - 1 1 6 1 - 1 - 3 -
Problema 2 – Antônio tinha 73 figurinhas. Ganhou 21 de seu pr imo. Quantas
figur inhas Antônio têm agora?
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Problema 3 – Antônio tinha 73 figur inhas e deu 32 para seu irmão. Quantas
figur inhas Antônio têm agora?
Problema 8 – Antônio tinha R$ 214,00. Ganhou R$ 82,00 de seu pr imo. Quanto
Antônio têm agora?
Problema 9 – Antônio tinha R$ 166,00 Deu R$ 35,00 para o Carmelino. Quanto ele
têm agora?
Problema 5 – Carmelino tinha 195 bolas de gude quando entrou no jogo. Depois do
jogo ele contou suas bolas de gude e percebeu que tinha 163. O quê aconteceu no jogo?
Problema 6 – Tarci tinha 57 figur inhas de jogador de futebol quando entrou no
jogo. Depois do jogo contou suas figurinhas e viu que tinha 98. O quê aconteceu no jogo?
Com relação aos problemas 2 e 3, o interessante foi perceber que em ambos, o estado
final ou a transformação eram conhecidos. Porém, o estado final, no problema 2, era maior que
o estado inicial. No seu enunciado, a palavra ganhou levou à interpretação de adição. No
problema de número 3, aconteceu o inverso; o estado final é menor e em seu enunciado, a
palavra deu esteve associada à subtração, ocasionado perdas.
Os problemas 8 e 9 também são de transformação e remetem a perdas e ganhos. No
primeiro, temos a palavra ganhar e, no segundo, deu, indicando que a solução para ambos,
respectivamente, requer uma adição e uma subtração.
A comparação do problema 5 com o problema 6 configura que o fato do estado inicial ser
maior ou menor que o estado final, parece não induzir ao uso de estratégias diferentes pelos
sujeitos.
Quadro 5: Freqüência das estratégias utili zadas pelos sujeitos em função de se conhecer ou não a transformação em relação a se conhecer ou não o estado final
Problemas ESTRATÉGIAS (Categorias)
AC AC/des. AC/Resp.Esc
E/Resp. Esc.
E/RespEsc. Cal. M en.
E/Cal. Men.
DN/PA
2 3 1 - - - - 1 6 1 - 1 3 - -
3 4 - - - - - 1 5 - - 3 1 1 - -
Problema 2 – Antônio tinha 73 figurinhas. Ganhou 21 de seu pr imo. Quantas
figur inhas Antônio tem agora?
�+�
Problema 6 – Tarci tinha 57 figur inhas de jogador de futebol quando entrou no
jogo. Depois do jogo contou suas figur inhas e viu que tinha 98. O quê aconteceu no jogo?
Problema 3 – Antônio tinha 73 figur inhas e deu 32 para seu irmão. Quantas
figur inhas Antônio tem agora?
Problema 5 – Carmelino tinha 195 bolas de gude quando entrou no jogo. Depois do
jogo ele contou suas bolas de gude e percebeu que tinha 163. O quê aconteceu no jogo?
Pude observar a evidência da categoria AC (Algoritmo Convencional) nos problemas 2 e
3 e, percebe-se a diversidade de estratégias utilizadas pelos sujeitos com relação aos problemas
5 e 6.
A transformação era conhecida nos problemas 2 e 3 e desconhecida nos problemas 5 e 6.
Portanto, os problemas 2 e 3 são problemas prototípicos que os sujeitos tendem a solucionar
utili zando estratégias aprendidas na escola (Algoritmo Convencional). Já os problemas de
transformação desconhecida (5 e 6), pouco trabalhada nas escolas, suscitam a util ização de
várias estratégias.
Quadro 6: Freqüência das estratégias utili zadas pelos sujeitos em função dos efeitos de se conhecer ou não o estado inicial
Problemas
ESTRATÉGIAS (c a t e g o r i a s)
AC AC/Des AC/Esc. DN/PA E/PA Resp. Esc.
E/Resp.Esc.
E/Cal. Ment.
E/Resp. Esc.Cal Mental
E/DI
2 3 1 - 1 - - - - - 6 1 - 1 - - - - 3 - 4 - - - - 1 - - 3 1
Problema 2 – Antônio tinha 73 figur inhas. Ganhou 21 de seu pr imo. Quantas figuras
Antônio têm agora?
Problema 4 – Sueli tinha algumas balas de goma e ganhou 32 balas de goma de sua
avó, ficando com 98 balas. Quantas balas de goma ela tinha antes?
Problema 6 – Tarci tinha 57 figur inhas de jogador de futebol quando entrou no
jogo. Depois do jogo contou suas figurinhas e viu que tinha 98. O quê aconteceu no jogo?
O problema 2 é um problema considerado protótipo, em que são dados o estado inicial e
uma transformação e se pede o estado final. Os sujeitos não tiveram dificuldades em resolvê-lo
porque houve associação com a palavra ganhou enunciada no problema e a pergunta final:
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Quantas figurinhas ele tem agora? Somente um sujeito fez uso da categoria DN
(Decomposição de Números) juntamente com a categoria PA (Princípio de Aproximação) para
resolvê-lo. Foi o caso da Valci que decompôs as dezenas 73 e 21. efetuando assim seus
registros: 70 + 20 = 90 e 3 + 1 = 4. Os demais sujeitos fizeram uso da categoria AC (Algoritmo
Convencional), sendo que um deles desenhou além do registro numérico. (Vide figura 2, p. 75).
Os procedimentos considerados corretos no problema 6 é a realização de uma operação
subtrativa, pois não faz sentido o uso da adição entre as duas medidas do enunciado do
problema. Assim, com exceção de dois sujeitos, que fizeram uso da categoria AC (Algoritmo
Convencional) os demais sujeitos usaram as várias categorias, como: E (Estimativa) e cálculo
mental, além das categorias PA (Princípio de Aproximação) e resposta escrita o raciocínio
subtrativo, já que suas estratégias foram a de subtrair unidade com unidade e dezena com
dezena para se chegar ao estado final.
Figura 1: Exemplo de resolução do problema 2 – Valdira faz um desenho
Já no problema 4: Quantas balas de goma ela tinha antes? envolve tanto a transformação
(o estado inicial se transforma em perdas ou ganhos, para se chegar ao estado final com outra
quantidade), quanto a comparação (comparam-se duas quantidades: uma é o referente e a outra,
o referido), o estado inicial era desconhecido e, quando da leitura do enunciado, a palavra
algumas (abstrata) remeteu à idéia de comparação, mas, não se conhecendo o referente, tornou-
se difícil a sua solução. Nesta situação todos os sujeitos utilizaram outras categorias, dentre as
quais DI (Dificuldade de Identificação) que se refere ao que os sujeitos conseguem ou têm
dificuldades de realizar os registros dos problemas, quais idéias estão envolvidas e quais
operações estão inseridas e PA (Princípio de Aproximação), usada como estratégia de solução
pelo sujeito quando o mesmo arredonda ou aproxima os números do enunciado. Também se
deve considerar que neste tipo de problema (4), o estado inicial é desconhecido, fazendo com
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que os sujeitos não saibam como proceder para iniciar a sua resolução, o que traz dificuldades
no momento de efetuar seu registro, seja ele correto ou não.
Portanto, com relação a estes problemas, nota-se a evidência da categoria AC (Algoritmo
Convencional), seguidos de desenho (problema 2), respostas escritas (problema 6), já que a sua
pergunta: “O quê aconteceu no jogo?” induziu os sujeitos ao uso de uma diversidade de
estratégias. Penso que essas diversidades nas respostas estavam nos próprios enunciados, pois
as perguntas incentivam os sujeitos a várias interpretações.
Quadro 7 : Freqüência das estratégias util izadas pelos sujeitos em função de se conhecer
os efeitos do tipo de situação: Transformação versus composição
Problemas ESTRATÉGIAS (c a t e g o r i a s)
AC DN/PA/ Res. Esc.
AC/Esc. DN/PA E/Cal. Ment.
Res.esc.
E/ Res. Esc.
E/Cal. Ment.
5 - - 3 - 1 1 - 6 1 - 1 - 3 - - 1 4 1 - - - - -
Problema 5 – Carmelino tinha 195 bolas de gude quando entrou no jogo. Depois do
jogo ele contou suas bolas de gude e percebeu que tinha 163. O quê aconteceu no jogo?
Problema 6 – Tarci tinha 57 figur inhas de jogador de futebol quando entrou no
jogo. Depois do jogo contou suas figurinhas e viu que tinha 98. O quê aconteceu no jogo?
Problema 1. Num aquário havia 137 peixes nas cores amarela e verde. 41 peixes são
amarelos. Quantos são os peixes verdes?
Interessante perceber a estratégia utilizada no problema 1 (de composição). Com exceção
da Valci, que utilizou as categorias DN/PA (Decomposição de Números e Princípio de
Aproximação) e resposta escrita. Ela arredondou o todo (137) para 100; uma parte (41), para
40; a seguir buscou uma parte do todo (37), retirando deste uma unidade a que tinha reduzido
no arredondamento e somando com o resultado obtido da operação 100 – 40 = 60. Para
confirmar, escreveu a resposta por extenso: ficou noventa e seis verde 41 amarelos. Todos os
demais sujeitos optaram pela categoria AC (Algoritmo Convencional), para efetuarem seus
registros.
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Figura 2: Exemplo de resolução do problema 1 – Valci usou decomposição
Seguindo os procedimentos anteriores, comparei também os problemas 5 e 6 com o
problema 1. Nos problemas 5 e 6 não percebi grandes dificuldades dos sujeitos em encontrarem
suas resoluções. Suas respostas seguiram caminhos diversificados, pois em ambos os problemas
as perguntas do enunciado assim os motivaram.
Já o problema 6, apenas dois sujeitos recorreram ao uso do algoritmo convencional (AC),
seguido de resposta escrita; os outros se utili zaram da categoria estimativa (E) ou outras
estratégias envolvendo o cálculo mental.
Quadro 8: Freqüência das estratégias utili zadas pelos sujeitos em função de se conhecer os efeitos do tipo de situação: composição versus transformação
Problemas ESTRATÉGIAS (c a t e g o r i a s)
E/PA Resp.Esc.
E/Resp. Esc.
E/Cal. Ment. E/Resp. Esc.Cal Mental
E/DI
4 1 - - 3 1 7 1 1 - 2 1
Situação- 4 – Sueli tinha algumas balas de goma e ganhou 32 balas de goma de sua
avó, ficando com 98 balas. Quantas balas de goma ela tinha antes?
Situação 7 – Marli tem algumas bolachas e José tem 13 bolachas a mais que Mar li .
Sabendo que José tem 28 bolachas, quantas bolachas Mar li têm?
O mesmo processo das situações anteriores aconteceu nas situações 4 e 7. Ambos os
problemas foram os mais difíceis de serem solucionados por todos os sujeitos, visto necessitar
de amplo raciocínio aditivo, além do cálculo relacional e do conceito de cálculo numérico. A
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palavra algumas, comum aos dois problemas, trouxe grandes discussões no grupo, já que, para
eles, algumas significava uma quantidade qualquer que não estava clara no enunciado e, em
suas mentes havia uma dúvida de “quanto” (um valor numérico), estava envolvendo a palavra.
Em ambos problemas pude perceber a evidência do uso da categoria E (Estimativa), na qual os
sujeitos estimaram acerca dos resultados do problema, associando as operações do enunciado às
operações realizadas, além do registro escrito e cálculo mental.
Figura 3: Exemplo de resolução do problema 4 – Sali usou o princípio de aproximação
A categoria DI (Dificuldade de Identificação), também ficou evidenciada, na qual o
sujeito apresenta dificuldades em entender no enunciado e qual operação pode usar para
resolver o problema, juntamente com a categoria PA (Princípio de Aproximação), que
representa uma estratégia de arredondamento ou aproximação.
Figura 4: Exemplo de resolução do problema 7 – Sueli tem dificuldade de identificar a operação a ser realizada
Percebi que, nestas duas situações, nenhum dos cinco sujeitos util izou a categoria AC
(Algoritmo Convencional) como estratégia de resolução e, conforme o exemplo da figura 4, a
Sueli nem se preocupou com a simbologia do sinal. Penso que, para ela, os sinais de Subtração
(-) e adição (+), não tinha significado.
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2.4.1.1. Síntese e discussão em relação às estratégias dos sujeitos
Apresento no quadro a seguir, uma síntese dos resultados das estratégias dos sujeitos
conforme a classificação dos problemas matemáticos aditivos. Elaborei o quadro nº 11 com a
finalidade de oferecer clareza e visualização das estratégias/categorias utilizadas pelos sujeitos
durante o percurso do episódio.
Quadro 9: Estratégias/Categor ias util izadas pelos sujeitos
P R O B L E M A S
Sujeitos
Categor ias 1 2 3 4 5 6 7 8 9
Valdira AC AC• AC E•* AC* E•* E•* AC AC
Luis AC AC AC E•* AC* AC* E* AC* AC*
Sali AC AC AC E/PA* E* • E* • E/PA* AC* AC*
Sueli AC AC AC E/DI AC* AC E/DI AC AC
Valci DN/PA* DN/PA DN/PA E•* E* E•* E• AC AC
* Refere-se ao Registro Escrito utili zado pelos sujeitos.
• Refere-se ao Cálculo Mental uti li zado pelos sujeitos.
Refere-se ao Desenho util izado pelo sujeito.
Todos os problemas relacionados nos quadros anteriores já foram citados no item 2.4.1.
Análise e discussão das estratégias dos sujeitos em relação aos tipos de problemas, portanto
tornando-se desnecessário transcrevê-los novamente. Porém, saliento que os problemas 2, 3, 4,
5, 6, 8 e 9, são considerados de transformação; o problema 1 é de composição e o problema 7,
de comparação.
Com relação ao problema 1, ele é um problema típico de composição, onde a parte e o
todo se relacionam, unindo-se para, pela adição ou subtração das duas partes conhecidas, se
encontrar uma terceira parte fixa.
Procurei analisá-lo sozinho por ser um problema que requer atenção, não é intuitivo,
precisa de cálculo relacional e seu resultado requerer uma operação de subtração, além de que a
situação parte-todo está relacionada com uma adição. Pode-se chegar à conclusão final com a
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idéia de completar, seguindo o seguinte raciocínio: de 41 peixes amarelos até o todo de 137
peixes verdes e amarelos.
Nesta pesquisa, quatro sujeitos a resolveram de forma convencional, fazendo uso da
categoria AC (Algoritmo Convencional) para registrar as operações onde a idéia de composição
não está em adicionar e sim de subtrair, juntando as partes conhecidas. Todos eles conseguiram
registrar numericamente a operação subtrativa: 137 – 41 = 096.
A estratégia usada pela Valci foi basicamente a do cálculo relacional, com a categoria
DN (Decomposição de Números), bem como da categoria PA (Princípio de Aproximação) para
resolver a mesma situação. Estas categorias ficaram evidenciadas quando verificamos seu
registro numérico. (Vide Figura 2, p.75).
Ela arredondou o todo (137) para 100; uma parte (41), para 40; a seguir buscou uma parte
do todo (37), retirando deste uma unidade a que tinha reduzido no arredondamento e somando
com o resultado obtido da operação 100 – 40 = 60. Para confirmar, escreveu a resposta por
extenso: ficou noventa e seis verde 41 amarelos. Ela buscou em seus esquemas mentais uma
representação que desse significado na notação de seu cálculo relacional. Ela conseguiu reter o
objeto (no caso, o problema), assimilou-o, adaptando-o ao seu nível de conhecimento, sofrendo
neste percurso desequili brações, para, ao longo do processo, (re) equilibrá-las. Segundo
Malglaive (1995, p.131), Valci também usou de certas operações de estruturas construídas no
decorrer de suas experiências cognitivas e por ela dominadas nos momentos de interação com o
objeto e seu conhecimento prévio.
O interessante foi perceber que, no enunciado, a quantidade de peixes era exagerada, 137,
(se consideramos os tamanhos deles como grandes) em relação à palavra aquário, pois se
levarmos em conta o tamanho dos peixes, o aquário logicamente teria que ser de bom tamanho
para caber esta quantidade de peixes. Esta variável não foi significativa para os sujeitos
pesquisados e nem sequer foi comentada.
Os problemas 2 e 3 possibili tam a associação entre perdas e ganhos, relacionadas à
transformações. São positivas quando acontece ganho; e negativas com perda. São de fáceis
soluções devido a clareza dos enunciados. As palavras: “ganha” e “perde”, inseridas no
enunciado, estão relacionadas com a operação de adição e subtração, respectivamente, além de
que se pode juntar ou tirar duas partes conhecidas para representar a operação. Este tipo de
problema é vivenciado pelos adultos no dia a dia, quando ele se depara com compras no
supermercado, aquisição de bens, salários, entre outros.
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Em ambos os problemas acontecem o mesmo tipo de raciocínio, apenas difere no tipo de
operação a ser realizada. A quantidade inicial se transforma à medida que uma ação
(ganhar/perder) é evidenciada e a pergunta do enunciado referir-se ao valor final.
Figura 5: Exemplo de resolução do problema 3 – Valci usa a decomposição de números.
Quanto aos problemas 8 e 9, também de transformações. Talvez por se ter trabalhado
com algarismos de três dígitos e se tratar de dinheiro (bastante conhecido pelos adultos), todos
os sujeitos pesquisados se utilizaram a categoria AC (Algoritmo Convencional) e não tiveram
dificuldades em realizar seus registros. Os enunciados dos problemas, de certa maneira,
retratavam as operações a serem feitas. As palavras: “ tinha” , “deu” e “ganhou”, contribuíram
para a compreensão dos mesmos.
A Valdira, Sueli , Sali e Luis nos problemas 2 e 3, registraram seus cálculos matemáticos
utili zando-se das estratégias da Categoria AC (Algoritmo Convencional), pois o enunciado do
problema indica relação de causa – efeito, cuja compreensão está em descrever a situação e
conseguir encontrar sua solução. No problema 2, Valdira se entusiasmou e desenhou o Antonio
recolhendo suas figurinhas com uma pá. (Ela associou, acertadamente, o nome Antonio do
enunciado ao seu amigo jardineiro que também foi aluno da educação de jovens e adultos e
trabalha na instituição).
A Valci seguiu uma linha de raciocínio diferenciada, usou as estratégias da categoria DN
(Decomposição de Números) e PA (Princípio de Aproximação) para resolver ambas as
situações, decompondo as dezenas 73 e 21. Seus registros no problema 2 (dois): 70 + 20 = 90 e
3 + 1 = 4, e no problema 3 (três): 70 - 20 = 40 e 3 – 2 = 1, nos levou a constatar que ela
decompôs os números pelo cálculo mental e à medida que compreendia o enunciado dos
problemas, ela alternava para mais ou para menos (aproximava) os números que manipulava
(decompunha). Ela chegou ao resultado final, seguindo os diferentes procedimentos de
decomposição.
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Nas situações 8 e 9, as estratégias util izadas pela Sali e pela Valdira seguiram a Categoria
AC (Algoritmo Convencional). Ambas resolveram escrever as respostas por escrito. Já o Luis
optou, além do registro do cálculo matemático, caracterizado na Categoria AC (Algoritmo
Convencional), pelo registro escrito, escrevendo li teralmente: Antonio tem agora cento e trinta
e um.
Com referência à situação 8, no registro do cálculo numérico da Sali (214 + 82 = 298) o
resultado não está correto, porém, não se pode afirmar que este resultado seja considerado um
erro; penso que foi mais uma falta de atenção ou nervosismo, pois a mesma tem domínio o
sistema numérico.
A Valci, nestes dois problemas, também seguiu a categoria AC (Algoritmo
Convencional), registrando seus cálculos convencionalmente, pelas continhas: 214,00 + 82,00
= 296,00 e 166,00 – 35,00 + 131,00; porém, resolveu não escrever suas respostas.
O interessante foi perceber que a Sueli não se importava com os sinais + (mais) ou –
(menos), nem com a colocação correta dos números nas parcelas e muito menos com as
vírgulas, conceitos ensinados convencionalmente nas escolas. Porém, isso não quer dizer que
ela tenha que lembrar dessa convenção. Somente os colocava quando se apercebia que os
demais colegas o faziam. Em suas notações, percebe-se a displicência relacionada a estes itens,
apesar de estarem corretas.
Figura 6: Exemplo de resolução do problema 8. Sueli não se preocupa com a colocação de vírgulas.
Os problemas de números 5 e 6 são situações de composição de duas transformações que,
ao se combinarem, transformam-se e envolvem dois tipos de problemas: a primeira é a
transformação desconhecida e a segunda de composição com uma das partes desconhecidas.
No problema 5, a Valdira (também escreveu seu registro) e o Luis a resolveram de
maneira formal. Fizeram uso da categoria AC (Algoritmo Convencional) para registrarem o
resultado, ou seja, eles conseguiram interpretar no problema, a quantidade inicial e a final, seu
enunciado e, com isso, a solução que encontraram foi considerada correta: subtraíram uma
parte do todo.
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Figura 7: Exemplo de resolução do problema 5. Sali somente escreve seu registro por escrito.
A Valci e a Sali resolveram escrever suas respostas por escrito e não se preocuparam em
registrar cálculos matemáticos de maneira formal. Escreveram: Ele perdeu 32 bolas (Valci) e
Aconteceu que Carmelino perdeu com os amigos que jogava (Sali , vide figura 6, p. 80). Ambas
fizeram uso da categoria E (Estimativa), pois, realizando o cálculo relacional, elas puderam
estimar mentalmente os resultados a serem alcançados. A Valci fez a interpretação mental do
problema, encontrando sua solução, já que na sua resposta escrita, constava o registro numérico
32. Penso que, ao utili zarem este tipo de respostas, ambas sentiram-se seguras e livres para
expressarem seus pensamentos, pois a pergunta do problema: O quê aconteceu no jogo?
influenciava a outras respostas.
A Sueli teve mais dificuldades, pois, em princípio, estava bastante nervosa, o que
dificultou sua compreensão do enunciado. Porém, nesta situação, usou da categoria AC
(Algoritmo Convencional), fazendo associações das operações do enunciado verbal da situação
às operações que pretendia realizar. O seu registro escrito do cálculo numérico foi aquele que
ela buscou em sua memória, aprendido nos bancos escolares da infância ou da própria EJA.
Entretanto, essa atitude pode-se levar ao questionamento: Será que a Sueli teve, realmente, a
compreensão do conceito de subtração e a lógica do problema proposto? Ou foi influenciada
pelas colegas, que a incentivaram a prosseguir? Ou será, que para ela, resolver este tipo de
situação é, simplesmente, juntar os valores numéricos e operar com eles? Todos estes
questionamentos requerem um estudo mais aprofundado e que, acredito ser deveras
interessante.
No problema 6, a Sali seguiu o mesmo raciocínio do problema anterior. utili zou a
categoria E (Estimativa) e escrevendo sua resposta por escrito, sem registrar o cálculo
numérico; isto é, fez uso do cálculo relacional.
A atitude do Luis foi interessante, já que ele, primeiramente escreveu sua resposta por
escrito para depois util izar o cálculo numérico de maneira formal, fazendo uso da categoria AC
(Algoritmo Convencional).
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Figura 8: Exemplo de resolução do problema 6. Luiz escreve seu registro por escrito e usa o algoritmo
convencional.
Os registros da Valci e da Valdira seguiram praticamente o mesmo raciocínio, ambas
utili zaram a categoria E (Estimativa), estimando mentalmente e usando a idéia de completar
(cálculo relacional) para resolver a contento suas situações. A Valci usou a primeira dezena do
enunciado (57), seguido do resultado final (41) desconhecido. Somou ambas as dezenas e
chegou ao valor numérico (98), proposto no enunciado. No registro da Valdira, sua estratégia
foi a de inverter os números, ou seja: 41(desconhecido) + 57 = 98 (conhecido), além de
escrever sua resposta por escrito: Ele ganhou 41 e uma figurinhas.
A Sueli efetuou seu registro na Categoria AC (Algoritmo Convencional). Seu
procedimento para se chegar ao resultado foi correto, apesar de que sua estratégia foi a de
inverter os números propostos no enunciado; além de colocar o sinal + (mais), realizou uma
operação de subtração: 57 (referente conhecido) + 98 (todo) = 41 (estado final). Penso que o
valor 98 foi uma variável significativa que serviu de apoio para ela chegar ao resultado
satisfatório, já que o número 98 é maior que 57. Penso que ela fez uso da idéia de
complementar. Eis seu registro:
57
+ 98
41
Para encontrar a solução que considerou correta, Sueli pode ter se utilizado do raciocínio
aditivo: primeiramente usando a unidade 7 (sete) para se chegar à unidade 8 (oito) e a dezena 5
(cinco) para se chegar à dezena 9 (nove). Ou poderia ser ao inverso: util izar-se da unidade 8 e
subtrair da unidade 7 (8-7=1); e da dezena 9, subtrair a dezena 5 (9-5=4). O que pude observar
de peculiar foi o fato de que ela sempre efetuava seu registro da esquerda para a direita.
Ambas as situações seguem o esquema de Vergnaud (1990, p.170-171):
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F > I F < I
Inicial Final Inicial Final
O procedimento considerado ideal para sua resolução é uma operação de subtração, pois,
quando ocorre a conscientização da quantidade que se tem antes de um acontecido, sabe-se a
sua quantidade final após o acontecido. A solução está na subtração de uma parcela menor da
maior para se chegar à conclusão, isto é, se houve perdas ou ganhos. Podemos colocar esta
situação, segundo Vergnaud (ibidem, p. 171), matematicamente assim: T = F – I . Neste tipo de
situação “o grau de dificuldade depende dos valores atribuídos aos estados: Inicial (I) e Final
(F)” .
A situação 4 envolve a transformação, na qual temos o estado final conhecido,
desconhecemos o inicial e sua transformação. A resposta é para se encontrar sua transformação.
Sua solução não é fácil, já que seu enunciado requer a prática de uma operação inversa.
Vergnaud (ibidem, ibidem, p.171), a transformação inversa pode ser expressa
“matematicamente assim: [Estado Inicial = T-1 (Estado Final)]” . No decorrer do episódio, pude
observar que todos os sujeitos tiveram dificuldades em iniciar o processo de resolução desses
dois problemas, o que, de certa maneira, ocasionou controvérsias quanto ao resultado final. Se
o mesmo estava ou não correto. Penso que todo o problema foi gerado pela palavra “algumas”
que consta no enunciado.
Com relação a este problema, o Luis, a Valci e a Valdira utilizaram a categoria E
(Estimativa) estabelecendo estimativas entre as idéias do enunciado do problema e quais
operações a serem realizadas, porém, penso que a Valci e o Luis registraram seus cálculos
numéricos utilizando a idéia de completar uma das partes (32) até o total (98). Ou podem ter se
utili zado do cálculo relacional (mental) e, nele ter encontrado a resposta. Assim chegaram à
conclusão esperada (66). Seus registros numéricos foram: 66 + 32 = 98.
O procedimento da Valdira seguiu também a estratégia da estimativa (E), seguida da idéia
de completar. Primeiramente usou uma das partes (32) e somou com o todo (98), o que resultou
I F
? ?
I F
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130. Ao verificar novamente o enunciado, a pergunta final: quantas balas ela tinha antes?e
trocar idéias, interagindo com a Valci, refez seu registro cálculo numérico para: 66 + 32 = 98.
A Sali se confundiu ao ler o enunciado. Primeiramente iniciou seu registro do cálculo
numérico utilizando o número 52 e 32, o que riscou em seguida. Fazendo uso das categorias PA
(Princípio de Aproximação) e E (Estimativa), raciocinado intuitivamente, ela escreveu: 42 + 56
= 98, quando, na realidade, os números constantes do enunciado são 98 e 32. Penso que ela
utili zou o arredondamento ou aproximação para conseguir encontrar a solução do problema.
A tentativa da Sueli para realizar este problema resultou somente no registro dos valores
numéricos que constavam no problema. Categorizei-a em E (Estimativa) e DI (Dificuldade de
Identificação), apresentando dificuldades em identificar no enunciado quais as idéias e quais
operações estão envolvidas no problema. Ela fez uso do cálculo relacional, estimando, porém
apresentando dificuldades em identificar quais operações poderiam ser utili zadas para efetuar
seu registro, correto ou não. Pude observar que ela não se preocupou em discutir com as
colegas ou tentar entender o enunciado do problema. Ela usou ambos os referentes: a parte e o
todo para chegar ao resultado que considerou correto.
Penso que seu procedimento foi seguir a idéia de completar, porém acreditou ter escrito o
resultado correto. Seu registro do cálculo numérico ficou assim: 32
+98
98
As notações efetuadas pelos sujeitos são encontradas nos bancos escolares e, nesta
situação, a palavra “algumas” está ligada mais à soma do que à subtração. Neste caso, concordo
com Vergnaud (1990) quando ele afirma que o conhecimento transparece à medida que o aluno
vivencia os problemas, contextualizando-se neles. Assim, torna-se mais fácil efetuar seus
registros.
A situação 7 (de comparação), também envolve uma transformação; não é fácil de
solucionar e, quando é proposta na prática escolar, requer refinados raciocínios (relacionais)
aditivos, conceitos lingüísticos mais apurados que os sujeitos buscam num constante processo
de construção, auto-regulação e auto-equili bração (Malglaive, 1995).
A ação que o sujeito ativo exerceu para realizar esta situação exigiu abstrações
empíricas, que é a ação de nível de cognição que retém os objetos a ela relativos – abstrações
essa observáveis acontecidas em todas as situações anteriores. Portanto, o problema aditivo de
número 7 pode ser considerado de difícil solução e requerendo uma construção aditiva anterior
estável.
¯@°
A situação 7 trouxe vários tipos de registros. O Luis e a Sali registraram suas respostas
por escrito logo após terem lido o enunciado várias vezes e salientarem a palavra “algumas” .
Esta serviu de referência à quantidade imaginária que ambos não conseguiam identificar. O Sali
pôde ser categorizada em E (Estimativa) e PA (Princípio de Aproximação), já que usou o
cálculo relacional além de escrever: Marli ti nha menos do que Josê 15 bolachas. O valor
numérico 15, nos leva a entender que ela também utili zou o cálculo mental para encontrar a
solução do problema. Já o Luis registrou: Marli ti nha quinze bolachas, seguindo os mesmos
princípios que a Sali .
Seguindo esta linha de raciocínio, tanto a Valci quanto a Valdira utilizaram como
estratégia a idéia de completar, do cálculo mental e da categoria E (Estimativa), para efetuarem
seus registros de cálculo numérico. No registro da Valdira, 15 – 13 = 28, o sinal de – (menos),
não teve o significado de subtrair, já que para ela este detalhe (sinal) não foi significativo. O
registro da Valci: 13 + 15 = 28 demonstrou que fez uso do cálculo mental, uma das partes
conhecidas e da idéia de completar para chegar à conclusão.
A resposta coerente e correta, para a situação 7, seria o de prosseguir buscando o
referente para se conhecer o referido e, com isso, encontrar o resultado final. Note-se que
“Marli” é a referência e que a quantidade estabelecida a José vem seguida da expressão
“quantas” e “a mais” José tem em relação à Marli. Nesta situação,o valor é desconhecido.
Percebe-se, então, que quando não se tem um ponto de partida, a dificuldade de se registrar o
cálculo relacional é evidente, pois temos dois estados considerados relativos que, ao se
combinarem, originam outro estado relativo.
Penso que a palavra “Maria”, escrita erroneamente, não foi significativa, apesar de mais
tarde, nas discussões, ter havido uma pequena confusão entre os nomes “Marli e Maria”. Já a
palavra “algumas” , por ser mais complexa, teve significado e serviu de apoio, indicando
quantidade (mesmo que inicialmente abstrata), e já havia sido util izada na situação 4,
ocasionando os mesmos tipos de dificuldades.
2.4.2. Síntese dos resultados em relação às estratégias dos sujeitos
Conforme os sujeitos resolviam os problemas, destaquei as estratégias (categorias) que
mais se evidenciaram. Nos problemas 1, 2, 3, 6, 8 e 9, a predominância da Categoria AC
(Algoritmo Convencional); já nos problemas 4, 6 e 7, o uso da Categoria E (Estimativa),
seguidos dos registros de cálculo mental e numérico; além da diversidade de categorias, no
±h²
problema 4. No problema 5 o uso da categoria AC (Algoritmo Convencional), seguido do
registro escrito.
À medida que os sujeitos prosseguiam na resolução dos problemas e efetuavam seus
registros, pude observar que, com relação aos problemas 2 com o 8, e 3 com o 9, as diferenças
nas estratégias utilizadas (categorias evidenciadas anteriormente), influenciaram somente na
resolução da Valci – problemas 8 e 9 – as palavras dinheiro ou quantidade, sugeridas nos
enunciados.
Nos problemas 2 com o 3; 8 com 9 e 5 com o 6, observei os efeitos da relação
quantitativa entre os estados inicial e final. Todos sujeitos os resolveram utilizando a categoria
AC (Algoritmo Convencional); exceto Valdira e Sueli , nos problemas 5 e 6 (transformação
desconhecida) e a incongruência semântica produzida no problema 6.
A Valdira fez uso das categorias AC (Algoritmo Convencional) no problema 5e E
(Estimativa) no problema 6. Já a Sueli utilizou-se das categorias AC (Algoritmo Convencional)
no problema 5 e E (Estimativa) no problema 6. Ambas, além do registro numérico, escreveram
verbalmente suas respostas.
Nos problemas 2 com o 6 e 3 com o 5, o desconhecimento da transformação teve um
efeito maior no problema em que existia incongruência semântica (problema 6). Percebe-se
com nitidez a diversidade de estratégias util izadas pelos sujeitos ao efetuarem seus registros.
Nos problemas 2 com o 6 e com o 4, os sujeitos adotaram diferentes estratégias de acordo
com a posição da incógnita: a palavra algumas (problema 4) – quantificador não numérico –,
indicava um estado inicial desconhecido; e, no problema 6, ocorria incongruência semântica.
Nos problemas 5 e 6 em relação ao problema 1 – situações diferentes –, quanto maior a
familiaridade e a congruência, maior a tendência para utili zar a categoria AC (Algoritmo
Convencional), os sujeitos conseguiam descobrir uma parte a partir do todo e a outra parte
parecia mais famili ar do que descobrir a transformação a partir dos estados inicial e final.
No problema 4 em relação ao problema 7, os sujeitos usaram a mesma estratégia (ER)
para encontrar o estado inicial em uma transformação e o inicial em uma comparação, exceto
Sueli e Sali , que fizeram uso das categorias E/PA; e E/DI, respectivamente.
Já no problema 7, ambas util izaram a categoria PA.
Estas constatações me remeteram a Malglaive (1995,p.131) que, adultos, ao reiniciarem
suas atividades escolares, buscam no seu desenvolvimento interno, construído em contato com
o meio ambiente e em suas próprias significações, suporte para solucionar problemas.
Com relação às estratégias, encontrei em respostas em Inhelder (1996, p.36), relatos de
alguns sujeitos que se garantem na resolução de problemas pelo processo de acomodação dos
³h³
conhecimentos construídos empiricamente, orientados para suas ações. Pois, como diz Klien
(2000, p.70), os fatos sociais e psicológicos fundamentam-se na organização interna do sujeito.
À medida que o ser biológico convive com um comportamento de interação e troca com o
meio, ele se adapta ativamente em dois processos diferentes: assimilação e acomodação. Ou
seja, na assimilação, o sujeito organiza-se pelos elementos externos para compreender o que
acontece ao seu redor; na acomodação, ele se adapta pelas organizações internas,
transformando suas hipóteses e, assim, reorganizando suas estruturas num outro patamar, num
processo de equili brações, desequil ibrações e (re)equili brações.
Estas reestruturações, tomadas de decisões, reflexões e (re)equil ibrações fazem parte do
mundo das representações cognitivas dos sujeitos e vão influenciar nas deficiências da
aprendizagem, pois, segundo Soares (2000, p.53), a escola, ao agir com exclusão, é uma das
causadoras destas deficiências.
Portanto, as estratégias utilizadas pelos sujeitos, unidas às categorias por mim levantadas,
encontram respaldo em Fávero (1994); as produções humanas: falas (oral e escrita), desenhos
ou qualquer outra atividade (estratégias) são produtos das representações sociais, “da interação
entre a subjetividade de cada um e o texto maior no qual ele se insere” (ibid. p.55).
São também manifestações dos comportamentos dos mais simples aos mais complexos
que irão mobil izar um conjunto de instrumentos cognitivos integrando-os a uma nova estrutura.
É preciso, segundo Malglaive (1995, p. 118), construir todo um processo educativo,
pois, a resolução de problemas, para esses adultos que pouco freqüentaram a escola, não se
limita à prática escolar, e sim, às suas práticas diárias, nas suas capacidades de gerar hipóteses e
interações com o meio.
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3. Considerações, porém não definitivas
“ A educação é possível para o homem porque este é inacabado e
sabe-se inacabado.”
Paulo Freire
As considerações que se seguem não são definitivas, visto que pesquisas futuras podem e
devem ser realizadas, pois as verdades não são absolutas. Com relação aos campos conceituais,
às estruturas aditivas, as categorias por nós levantadas, os mesmos podem sofrer avanços com
novas pesquisas e, conseqüentemente, novos entendimentos.
Como vimos inicialmente, a educação de pessoas jovens e adultas é uma arte
diferenciada cujos princípios educacionais podem ser aplicados com interdisciplinaridade nas
várias áreas do conhecimento, que não vem “pronto e acabado”, mas vivenciado e dialogado no
desenrolar do cotidiano das aulas.
Ficou evidenciado o uso do cálculo relacional como um instrumento deveras
significativo.
Fatos marcantes foram sendo delineados no decorrer da pesquisa: a auto-censura, as
leituras repetidas, a não exposição, o medo de errar e o pensamento de que o que estava sendo
feito era um teste, uma prova, além de perceber que os sinais + (mais) e – (menos) não eram
tão significativos quanto o uso do cálculo mental.
Como já foi exemplificado no item 2.3.1.1., dentre as categorias por mim levantadas, as
que estiveram em maior evidência foram as Categorias AC, aprendido nas escolas e
vivenciado no dia a dia dessas pessoas; nas quais os sujeitos já conheciam o conceito de
número e dos signos que os representavam; e DN, bastante utili zada por um dos sujeitos nos
problemas iniciais. As demais categorias, PA e ER foram pouco utilizadas.
A compreensão do enunciado dos problemas não quer dizer que eles esclareçam
detalhes e que a solução seja rápida. Para que tal aconteça, os sujeitos têm que “ traduzir” o
enunciado, transformando a informação em linguagem matemática, assimilando-o aos
conhecimentos previamente já adquiridos e registrando-os conforme seus cálculos
relacionais. Essa compreensão exigia a presença de conhecimentos matemáticos, lingüísticos
e semânticos, além de esquemas que possibilitassem sua interpretação e permitissem a sua
representação e solução em termos matemáticos.
¶¸·+¶
Aconteceu com um dos sujeitos, na situação 4, quando ele fez seu primeiro registro e
ficou em dúvidas. Ao interagir com os demais, percebeu seu “erro”, riscou seu registro e
conseguiu chegar à conclusão que considerou correta.
Pude também perceber que aconteceram dois procedimentos importantes durante o
episódio. O primeiro foi a atividade como processo construtivo, partindo do sujeito em ação,
defendida por Vergnaud (1990), em conceitos-em-ação, que são as várias estratégias que estão
implícitos na compreensão dos enunciados (número cardinal, ganhar, perder, transformações de
estados final e inicial) e que os sujeitos usam para resolver determinados problemas.
O segundo refere-se a interação entre os sujeitos que se ajudavam mutuamente. Dessa
maneira, a conseqüência foi um confronto saudável de trocas de idéias, com superações das
dificuldades durante as resoluções dos problemas matemáticos propostos.
Todos os sujeitos tinham algumas noções de número, de adição e subtração. Com
exceção de um dos sujeitos. Ele apresentou dificuldades quando necessitou fazer uso desses
conceitos. Teve dúvidas quanto ao valor posicional dos números no momento de efetuar o
registro de problemas relacionados com dinheiro. A questão das vírgulas, dos números
decimais foram um de seus entraves.
Outra constatação foi relembrar a matemática oferecida nas escolas da época dessas
pessoas, quando eram crianças em idade escolar. O currículo era centrado nas necessidades da
escola e não nas dos sujeitos que conviviam com a matemática rural e os problemas de
cálculos práticos diários. Na escola não se ensinava a pensar como resolvê-los ou o quê fazer
com eles, e, além disso, os problemas escolares não estavam contextualizados às realidades
vivenciadas no cotidiano desses sujeitos.
Nas considerações dos resultados do desempenho dos sujeitos em relação aos problemas
propostos pude perceber que os mesmos foram desafiados a mobili zar recursos tanto do cálculo
relacional (mental) como do escrito (numérico) para encontrar soluções e possíveis tomadas de
decisões. Os sujeitos leram os enunciados, interagiram com eles, tentaram interpretá-los e
registrar seus pensamentos.
Para isso, necessitaram raciocinar coordenando as informações. Porém, para que eles
conseguissem resolver estas situações, foi preciso saber interpretar quais eram as variáveis,
quais as informações que estavam disponíveis e quais operações estavam intrínsecas nos
enunciados; além de descobrir se estas informações confirmavam ou resolviam parcialmente o
que havia sido proposto. Ao registrar sua decisão, eles julgaram ser correta ou não para a
questão a qual se propuseram resolver.
¹¸º(»
Magina (2002, p.12-13), salienta que para considerar um problema é necessária a
representação e o conceito que estão inseridos nele. Ao descrever e analisar a progressão dos
alunos dentro do processo de aprendizagem e desenvolvimento é fundamental considerar a
competência e a concepção20.
Analisando os vários comportamentos dos sujeitos durante a pesquisa, percebi que os
seus conhecimentos transpareceram à medida que eles se sentiam seguros, relaxavam e,
conseqüentemente, liam e interpretavam os problemas.
Devido meu trabalho na Educação de Jovens e Adultos ser deveras envolvente, observei
naquelas pessoas que pouco freqüentaram a escola, a necessidade de efetuar seus registros
matemáticos formais. Porém, as barreiras, as regras e normas escolares se evidenciavam de tal
forma que elas se sentiam inseguras, pois acreditavam não possuir competências ou habili dades
para registrar ou escrever números e operações de maneira convencional, ensinada pela escola.
Dentro dessa realidade, estes adultos util izaram-se de várias relações lógicas, várias
estruturas, interiorizadas no Sistema de Representações e de Tratamento, os SRTs,
referenciados por Malglaive (1995, p. 149), e que é nele que ocorrem as situações de mudança,
as implicações significantes enfrentadas pelos sujeitos no decorrer de sua existência. Na medida
em que o sujeito se defronta com novos problemas, ele os interioriza, elaborando novos
esquemas que a sua estrutura dispõe, períodos de instabilidades e de conflitos cognitivos,
levando-o a um nível superior, com estruturas cada vez mais organizadas, num processo de
(re)equilibração.
Nessa prática, conforme Duarte (1995, p.8), a relação desses sujeitos com a matemática
está vinculada às suas necessidades sociais e reais e que a sua forma de transmissão -
assimilação - acontece nessa relação e na teoria da equili bração de Piaget corroborada por
Malglaive (idem, ibidem, p.131-136) na qual ocorre um desequil íbrio no momento em que os
sujeitos se deparam com situações conflituosas, desconhecidas, envolvendo desafios, eles se
desequili bram estruturalmente, reorganizam seus pensamentos num nível superior, levando-os a
superarem e crescerem em conhecimentos, adquirindo assim competências para realizar a
contento ou não as situações ou desafios nos quais são confrontados.
Observando os procedimentos e estratégias desenvolvidas pelos sujeitos durante as
sessões da pesquisa, pude também registrar momentos de dificuldades, como ansiedade,
nervosismo, autocensura, dúvidas que são vivenciadas pela criança no decorrer de sua
evolução cognitiva, no seu meio social, nas construções progressivas diferenciadas e
20 Conforme Magina (2002, p. 13), a competência é traçada pela ação do aluno diante das situações e as concepções podem ser traçadas por expressões verbais, escritas, gestos ou falas.
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integradas num todo coerente, mas que possibil itam a formação de estruturas operatórias
futuras.
Assim, o fracasso sócio-cultural e econômico dessas pessoas que pertencem às classes
mais populares e que, implicitamente estão relacionadas à matemática, são fatores que
interferem e privam essas pessoas, jovens e adultas do convívio letrado e, em conseqüência,
na resolução de problemas, que matemáticos ou não.
Esse fracasso, em sua ação, exclui e excluiu tanto crianças quanto adultos que foram
criados, conforme Schliemann (1995, p. 23), “em ambiente desfavorecido cognitivamente,
social e efetivamente”.
Nessa relação entre conhecimentos prévios, do senso comum, vivência do cotidiano
escolar, exclusão, e dia a dia desses sujeitos, a pesquisa procurou identificar e caracterizar as
estratégias usadas por essas pessoas; discorrer sobre os conhecimentos dos conceitos
matemáticos que eles já possuíam quando foram desafiadas a resolver problemas com
estruturas aditivas; pelas categorias levantadas; pelas entrevistas; pelos registros e falas dos
sujeitos e pela expressão que é o nome dessa dissertação: Posso fazer do meu jeito?
Outra constatação foi de que as notações, verbalizações, gestos e expressões, trocas de
idéias, serviram de apoio para o desenvolvimento do raciocínio, as estratégias adotadas
diferenciavam-se na medida em que os problemas eram interpretados e que o registro escolar
(sujeitos quando crianças e na EJA) foi relembrado ou evidenciado em quase todos os
problemas propostos.
Nesse universo descrito, me reporto à Andragogia, que, dentre suas vantagens, está a
quebra de um ensino fragmentado, a interação entre os grupos, as falas, as trocas de idéias e
os conhecimentos historicamente vividos pelos sujeitos. Assim, torna-se necessário uma nova
postura do professor, de sua prática em sala de aula. Por isso, a fala de Vergnaud, acontecida
em dezembro de 2001, em São Paulo, na II Conferência Nacional de Educação, Cultura e
Desporto sugere algum caminho:
Não há uma resposta definitiva, pois a mudança de práticas e atitudes é mais lenta do que a mudança das informações, mas é certo que o professor não pode trabalhar isoladamente. Devem ser criadas comunidades de ensino que se aproximem mais da prática diária da sala de aula. (2001).
Portanto, é necessário que o educador se questione diariamente sobre suas práticas,
buscando uma metodologia atrativa, para, dessa maneira, ao rever suas posturas, se questione
e possa ter atitudes críticas, rompa com paradigmas, melhorando e aprimorando seu papel de
mediador e construtor da aprendizagem e do conhecimento.
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Com relação à pesquisa em si, senti algumas limitações, como não ter anunciado
previamente que a pesquisa não era “um teste”, “uma prova”, pois, somente fui ter essa
percepção durante a segunda sessão, quando um dos sujeitos não quis mostrar como estava
resolvendo o problema.
Percebi que os sujeitos da pesquisa, assim como todo ser humano difere entre si, tem
habili dades e capacidades e que, é necessário aprofundar os estudos e pesquisas em condições
que permitam integrar os conhecimentos matemáticos prévios dessas pessoas, bem como a
influência que a matemática tem em suas vidas, respeitando seus limites.
Um dos pressupostos básicos da teoria dos campos conceituais e da teoria piagetiana,
afirma que o conhecimento é constituído e desenvolvido a partir da interação adaptativa do
sujeito em situações do dia-a-dia. Então, me questiono, enquanto educadora: como foi difícil,
para os sujeitos da pesquisa, registrarem seus cálculos numéricos, quer de maneira
convencional ou por outros meios não convencionais? Será que o longo tempo fora de uma
escola influenciou nessa dificuldade? Por que o cálculo mental ficou tão evidenciado?
São questionamentos reflexivos e um desafio ao educador, podendo levá-lo à nova
pesquisa.
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ANEXOS
ANEXO 1: TRANSCRIÇÃO E ANÁLISE DA RESOLUÇÃO DE PROBLEMAS 98
ANEXO 2: QUESTIONÁRIO DAS ENTREVISTAS 134
ANEXO 3: PROBLEMAS 135
ANEXO 4: PROBLEMAS RESOLVIDOS PELOS SUJEITOS 136
ANEXO 5: DECLARAÇÕES DOS SUJEITOS PESQUISADOS 137
ANEXO 6: FOTO DO GRUPO EM SUA FORMATURA 138
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ANEXO 1: Transcrição das sessões da pesquisa
Neste primeiro momento, transcrevo a primeira sessão e, posteriormente, a segunda, pois
a pesquisa transcorreu com duas sessões em dias alternados. Tal feito serviu de comparação
entre ambas; nesta segunda a presença masculina foi uma variável significativa.
1ª Sessão: Pesquisa com três sujeitos: Valci da Silva, Sueli Becthold e Valdira Vicente.
Anexo 1: Transcrição e análise da resolução dos problemas.
Problema 1: Num aquário havia 137 peixes nas cores amarela e verde. 41 peixes são amarelos. Quantos são os peixes verdes?
Sujeitos: Sueli (43, f); Valdira (44, f); Valci (53, f).
Transcrição Observações realizadas durante o desenvolvimento* do episódio
A Valci lê em voz alta, pontuando o enunciado com a caneta, levantando o rosto aos demais participantes, rindo e mexendo no papel.
Valci: “Os verde... Dá noventa e seis. Na minha conta. Ó, porque de cem eu tiro sessenta e os trinta e sete eu boto com sessenta e fica noventa e seis e do sete eu tiro um.”
No momento em que a Valci explica em voz alta o seu raciocínio, penso que esta sua fala pode ser escrita matematicamente:
100-60= 40
37+60= 97
7 - 1= 6
E: “Escreva isso ai para mim. Pode escrever para mim?”.
Peço para ela fazer o registro de seu raciocínio no papel.
Valci: “Entendeu agora? Eu não sei se está certo. Eu não sei se está certo o resultado”.
Risos... Ninguém entendeu o que ela está dizendo. Vira-se para a Sueli que está ao seu lado direito e ri.
(parece que está perguntando para si própria)
ÙÒÙ�Ú
própria)
Sueli: “Eu não sei” .
E: “(respondendo à Valci). Não se preocupe com as tuas explicações, pode falar e tente registrar dessa maneira que você fala. Da maneira que você fala, Valci” .
Valci (registra no papel):
100 60
-40 +36
60 96
Observo que seu registro é diferente da sua fala.
E: (Volto-me para a Valdira que está surpresa com a fala da Valci e pergunto):
“E você, entendeu, Valdira?”
Enquanto falo, a Sueli somente observa. Fica olhando as posturas das duas amigas, coloca a mão esquerda na perna, arruma a roupa, mexe no cabelo, balança a caneta e fica aguardando.
Valdira: “Eu não. Esta conta aqui eu não entendi direito” .
Valci: “Eu também, eu.. Ó, Bia, parece...”
(Faz sinal de não com a cabeça, resmunga algo incompreensível.)
E: “Então leiam o problema de novo! Leiam para entender!”
E: “Pode. Pode ser do jeito que você quiser” .
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Valci: ”Eu vou botar como eu sei, querida. Eu escrevo aqui embaixo?”
(Confirmo com a cabeça).
E: “Pode. Se quiser. Sei. É isso que eu quero que vocês façam. Como vocês sabem”.
Valdira: “Na minha conta também sobrou. Agora eu tenho que escrever no papel, no caso da resposta?”
Ao chegar ao resultado, Valdira percebe que subtraiu e pergunta se sua resposta deve ser também por escrito, tal como escreveu a Valci.
E: “Não. Pode deixar registrado ai como você quiser. Assim Valdira. Então escrever não precisa. Se quiser, não precisa”.
Valci: “Pode ser assim?”
(Olha para mim e para as amigas e além de registrar com números, escreve a resposta registrando a frase que acabara de falar):
[ficou noventa e seis verde 41 amarelos]
“Ó, ficou noventa e seis” .
Neste momento a Valci tem certeza e convalida seus registros no papel.
Nos mostra seu escrito.
Sueli: “Eu não sei. Estou nervosa” . (Olha para o registro da Valci e o da Valdira).
E: (Chamo a atenção da Sueli ).
“Não olhe para elas! Leia mais uma vez!”
Sueli: “Eu sei. Mas não sei como escrever. Eu não peguei mais” .
Entendo que esta fala “não peguei mais” quer dizer que faz algum tempo que ela não resolve situações formais escolares como aquela, nem está fazendo “continhas.”
Sueli: “Eu tenho que montar esses números aqui e esse aqui? Junto os dois primeiro e depois fazer a conta? É isso?”
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depois fazer a conta? É isso?”
(Aponta com a caneta para os números).
E: “Sim! É isso. É por ai. Tente entender o contexto do problema e ver como você vai resolver” .
(Ela fala assim e fica olhando o registro da Valdira que está à sua frente, à esquerda).
Sueli: “Não sei se é para diminuir. Parece que é para diminuir, né? (pausa) Ah, eu não vou escrever, não!”
(Faz careta e resmunga algo incompreensível e fica bastante nervosa. Pela sua expressão fico desconfiada que ela não vai escrever a resposta por extenso. E ela realmente não o faz).
E: “Tudo bem! Deu? Deu esse? Depois tem mais um aqui.”
Percebo que os registros foram feitos.
Sueli: “E agora tem que fazer outra conta?”
(Ela olha a conta dos outros sujeitos da pesquisa que estão ao seu lado e percebo que os olhares servem de suporte para o seu registro que é feito da maneira formal: 137 – 41 = 096).
A Sueli está insegura e indecisa. Tem certas dificuldades em registrar seus cálculos, apesar de eu pensar que ela sabe resolver a situação. Enquanto isso...
E: “Aha, sim”
A mais quieta é a Valdira que se concentra lendo com os olhos o enunciado. Pouco se agita. Somente faz gestos com as mãos, sorri, olha para o lado e se ajeita na cadeira.
Valci: “Ficou noventa e seis peixes verdes e quarenta e um amarelos. Deixe ver aqui.”
Sueli: “Eta! Valdira!!! Ela demora muito.”
(Ela chama a atenção da Valdira apontando para a Valci).
Valdira: “Ficou noventa e seis peixes” . Valdira somente sorri e confere a resposta apontando com a caneta e lendo em voz alta o seu registro.
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o seu registro.
E: “Isso ai! Valeu. Gostei! Legal! Agora vamos para a segunda sessão. Vamos ver se essa vocês conseguem fazer. Querem que eu leia para vocês?”
Todos: “Sim!”
Problema 2: Antonio tinha 73 figurinhas. Ganhou 21 de seu primo. Quantas figurinhas ele tem agora?
Sujeitos: Sueli (43, f); Valdira (44, f); Valci (53, f).
Transcrição Observações realizadas durante o desenvolvimento do episódio
Repito o mesmo processo anterior, lendo atentamente o enunciado do problema.
E: “Podem conversar, podem desenhar.”
Valci: “Eu só não posso dizer, né?!”
(A Valci está preocupada porque a Sueli lhe chamou a atenção durante a primeira situação, dizendo que ela falava muito).
E: “Não. Pode sim. Pode dizer, pode ir direto. Como quiser, pode falar...”
(Eu a incentivo a continuar, pois é esta a minha intenção).
Valci: “Noventa e quatro!” Surpresa geral. Foi tudo muito rápido.
E: “Você sabe como chegou a esse resultado?”
(Mais uma vez ela me surpreendeu).
Valci: “É, sei. Setenta e três mais vinte e um é igual a noventa e quatro. Ou então, setenta com vinte, dá noventa e três e um dá quatro. Então noventa com quatro, dá noventa e quatro” .
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setenta com vinte, dá noventa e três e um dá quatro. Então noventa com quatro, dá noventa e quatro” .
(Enquanto Valci já tem a resposta, Sueli ainda tenta seguir seu raciocínio).
Sueli: “É de mais também”?
No momento em que Sueli pergunta, os demais sujeitos a interrompem, pois estão concentradas e sabem como realizar o problema.
As outras: “você fala demais” .
Sueli: “Vocês não me respondem!”
(Sueli reclama com as amigas e continua nervosa. Seu olhar desnorteado pede ajuda. Ela fica afli ta, se agita bastante).
Acredito que não é por não saber resolver o problema e sim porque não consegue seguir com rapidez o mesmo raciocínio das amigas que são mais rápidas que ela.
Valci: “Ai então eu tenho que fazer a conta”?
E: “Se você quiser registrar desse jeito, pode, Valdira, digo, Valci, pode. Desculpa.”
(Confundi os nomes).
Valci: “Olha, eu faço assim, ó. E eu vou botar o noventa e quatro bem aqui” .
(Aponta para a direita da folha impressa com o problema.
Ela me mostra seu registro:
70 3 94
20 +1
90 4).
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E: “Isso! Tá certo! Tá certo! É tudo assim bem simples. Bem simples” .
Neste primeiro bloco de anotações, sua conta não tem sinal nem traço separando as parcelas do resultado. Ela me entrega o papel enquanto às demais continuam seus registros. Incentivo às demais continuarem.
Valdira: “Então eu posso até desenhar” .
(Ela desenha o Antonio juntando as suas figurinhascom a pá).
Risos descontraídos.
Valci: “É, ela tá desenhando” .
Sueli mexe na caneta, olha para o cálculo da Valdira e volta-se para o seu problema, faz a leitura em voz baixa, mexe o lápis e faz seu registro ao perceber que tanto Valci e Valdira já o fizeram.
Tenho dúvidas, mas me parece que ela, mais uma vez uti li zou cálculo mental e confirmou seu registro nos cálculos já efetuados pelos colegas.
Ao terminarem seus registros percebo uma descontração A Sueli está mais alegre.
Problema 3: Antonio tinha 73 figurinhas e deu 32 para seu irmão. Quantas figurinhas Antonio têm agora?
Sujeitos: Sueli (43, f); Valdira (44, f); Valci (53, f).
Transcrição Observações realizadas durante o desenvolvimento do episódio
åÒåØæ
E: “Vamos para o próximo que depois a gente vai relaxar. Vamos comer uma bolachinha. Eu trouxe umas bolachinhas” .
(Leio com atenção o enunciado após ter entregado o papel com o problema escrito).
Sueli: “É de mais também?” Fico só observando suas falas e gestos. A Sueli continua a mais nervosa.
Valdira: “Fala baixo. É de menos” .
Valci: “Não!. É. É de menos. Ele deu trinta e três, não ele deu trinta e dois. ele tinha... ficou com quarenta e um.”
E: “Como você chegou a esse resultado?”
(Pergunto para Valci que se agita bastante. Penso que por compreender o enunciado, consegue chegar às soluções mais depressa que os outros sujeitos).
Valci: “Esse resultado. Porque, ó, setenta tira trinta, fica quarenta e três tira um, digo dois, fica um.”
(Ela tenta me explicar).
Sueli: “O, Valci, ó, você fala demais!” Neste momento a Sueli i nterrompe o raciocínio da Valci. Está nervosa novamente.
E: “Você pode registrar para nós, Valci?”
(Pergunto e me viro para a Sueli , mexo a cabeça em sinal de aprovação).
Valci: “Registrar aqui? Como eu faço?”
E: “É. Como você falou para a gente.”
Valci: “Setenta tirando trinta. É. É menos, né. Tem que botar menos, né Bia? setenta menos trinta fica quarenta; do três menos dois, fica um. ai então eu boto quarenta mais um, e fica quarenta e um.
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mais um, e fica quarenta e um.
(Seu registro no papel fica assim:
70 3
- 30 - 2
40 1
Registra ao lado direito, em cima da folha, o número 41).
Valci Inicia seu registro falando alto sem se importar com as demais que estão tentando se concentrar e efetuar seus registros.
E: “Isso! Ah, vocês vão notar que escrevi o nome de vocês nas folhinhas, ta!”
As duas ficam somente olhando o entusiasmo da Valci. A Sueli um pouco contrariada, mas a Valdira sorri e me mostra seu registro feito da forma convencional, ensinada nas escolas:
73
-21
41
Também a Sueli fez seu registro igual:
73
-21
41
Valci: “Você quer que a gente anote o nosso nome?”
E: “Não, deixa que depois eu anoto. Agora vamos fazer o número quatro. É um pouquinho mais complicado, mas vocês vão ler devagar, conversar. Olha, vou ler.”
(Anotei os nomes em cima da folha onde está escrita a situação-problema).
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Problema 4: Sueli tinha algumas balas de goma e ganhou 32 balas de sua vovó, ficando com 98 balas. Quantas balas de goma ela tinha antes?
Sujeitos: Sueli (43, f); Valdira (44, f); Valci (53, f).
Transcrição Observações realizadas durante o desenvolvimento do episódio
Dou continuidade, agindo normalmente. Como agia desde o início, porém, me sinto mais segura para solicitar que os sujeitos falem, escrevem, desenhem...
E: “Ela tinha algumas. Aí, ela ganhou mais trinta e duas balas de goma de sua vó e ficou com noventa e oito balas. Quantas balas de goma ela tinha antes de completar essas?”
(Leio o problema em voz alta e dou explicações).
Faz-se um silêncio. Todas estão pensando, olhando para o enunciado da situação. Lêem o enunciado mexendo os lábios. Sueli coloca o lápis no cabelo. Ajeita-se na cadeira. A Valdira lê o enunciado silenciosamente e a Valci se agita na cadeira. Parece já saber a solução.
Valci: “Ficou com noventa e um?”
(Valci faz a pergunta, porém ninguém responde nem olham para ela).
E o silêncio continua. Não se ouve nada.
(Após longo silêncio, Sueli volta-se para Valdira):
Sueli : “Esta é mais difíci l. Achasse, Valdira?”
Valdira só olha para ela e não responde.
Valci: “Pera. noventa. Eu sei que ela tinha sessenta. Porque ela ganhou trinta e dois. Trinta e dois para noventa, dá sessenta. Bem, sessenta e seis. Ela tinha sessenta e seis. Só pode ser. Mas só que eu quero fazer certinho, né?”
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certinho, né?”
(A Valci “fala” seu raciocínio em voz alta).
Valdira: “Essas “algumas” balas tem uma quantidade, né?”
(Frisa bem a palavra “algumas”).
Valci: “Não. Tem, mas aqui dá. Se ficou com noventa e oito é porque ela tinha sessenta e seis. Porque sessenta e seis com trinta e dois, dá noventa e oito” .
Valci nega para logo voltar atrás.
E: “Então... Ela tinha ”algumas” e ganhou trinta e duas de sua avó e ficou no total com noventa e oito?”
(Saliento a palavra "algumas” , questionando, pois quero saber os seus registros, suas falas, desenhos... Todas se olham. Elas percebem que este é bem mais difícil que os anteriores).
Pelos olhares percebo que a situação não é de fácil solução. Todos os sujeitos se concentram, se mexem, se acomodam melhor nas cadeiras, enfim, talvez buscando reforços extras em algum lugar. Silêncio. Parece que a situação é um pouco mais complicada que as antecedentes.
Risos.....
Valci: “Ah, eu fiz assim. A Bia já conhece o meu jeito de montar.”
(Registra:
66
+32
98
Aponta para o enunciado e o lê novamente, interagindo com a Valdira. Enquanto a Sueli só as observa, sem interferir).
Valdira: “E o resultado deu cento e trinta. Não é assim?”
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Valci: “Não. Não é assim. Ó”.
(Como Valdira não está entendendo, Valci tenta explicar melhor. Aponta para o registro da Valdira, mostrando o seu registro).
Valdira: “Tá. To seguindo teu raciocínio, Valci” .
(Volta-se para a Valci e tenta acompanhar seu raciocínio).
Valdira: ”Não, a primeira não é assim”.
(Refere-se a sua primeira conta:
32
+98
130).
Sueli só observa, olha para o lado mexendo cabelo e se ajeitando na cadeira. Fica olhando os demais, às vezes se distrai olhando para mim e nesta situação, percebo que ela não compreendeu o enunciado e não se entusiasma em responder corretamente ou não quer copiar dos demais sujeitos.
Valci: “Então, sessenta e seis com trinta e dois. É porque ela tinha sessenta e seis. Então, se ela ganhou trinta e duas balas de sua avó, ficou com noventa e oito balas. Quantas balas ela tinha antes...”
E: “Ela tinha algumas e ganhou trinta e duas de sua avó. Ficou com um total de noventa e oito?”
Valdira: “É. Noventa e oito” .
Valci: “Aquelas algumas do total que ela ganhou significa que sessenta e seis que ela tinha. Então, se ela tinha algumas, aquelas algumas era sessenta e seis balas. Com mais trinta e duas, deu os noventa e oito”.
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trinta e duas, deu os noventa e oito”.
Sueli: “Sim!!!!! Eta cabeça embaralhada. Ela explicou. Ela explicou. Então tem que fazer a conta disso?”
(Sueli bate na cabeça com a caneta. Agita-se na cadeira e continua. Aponta para mim, mas demonstra não ter entendido a minha explicação).
Valci: “Eu somei! Eu somei! Tá aqui. Tá aqui explicado. Tudo explicado. Num pensamento só trinta e dois ela ganhou. Se ela ficou com noventa e oito é porque aquelas “algumas” balas que não no total é sessenta e seis balas. Entendeu agora? Então sessenta e seis com trinta e dois, dá noventa e oito. Aquelas “algumas” que não está escrito lá no canto é sessenta e seis. Com certeza.”
(Registra no canto direito da folha desse jeito:
66
+32
98
Torna a ler o enunciado, apontando com o lápis, olhando para mim e para os demais. Frisa bem, mostrando a quantidade com os dedos).
Valdira: “Ah, Entendi. Entendi. É, agora já sei. Entendi.”
(Risca a primeira conta, após ouvir as explicações da Valci).
E: “E outro jeito de fazer isso, Valdira. Você tem outro jeito para fazer?”
(Desafio-a a me mostrar outra maneira de resolver a situação).
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Valdira: “Agora só se pensar mais porque agora eu tenho que pensar na cuca. Ai dá, sem fazer conta. Na cuca vai” .
E: “Na cuca vai, então. Então fala pra mim, na cuca”.
Valdira: “Daí eu ia pensar do trinta e dois até o noventa e oito” .
(Mostra-me o registro e aponta para a primeira conta riscada, mostrando o zero, que serviu de ponto de partida.
Pega o lápis e escreve:
32 66
+ 98 +32
130 98).
E: “Isso! Também!”
Valdira: “E esse aqui é o zero. Esse aqui.”
(aponta para o 0 na conta 32+98=130).
(Aqui ela se entusiasma, sorri, tentando explicar de onde tirou o número sessenta e seis. Aponta sempre para a cabeça).
Valdira: “É... Eu tirei daqui” .
Sueli: “Eh, deu branco! Posso fazer do meu jeito?”
(Sueli faz seu registro colocando na primeira parcela o número 32, acrescenta 98 e o resultado também é 98. Assim:
32
+98
Sueli se sente só, um pouco desamparada, pois percebe que não consegue encontrar a solução sem ajuda. Creio que não consegue seguir o raciocínio da Valdira.
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98
Ao efetuar seu registro, descansa o lápis na mesa e me olha meio desconsolada).
E: “Pode. Pode fazer do teu jeito. Pode fazer do teu jeito.”
(friso bem a frase pode fazer do teu jeito).
Valdira: “E esse que eu fiz errado? Deixo?”
E: “Não se preocupe com isso. Isso é bom. Tudo isso eu vou considerar.”
(Ela me mostra a conta que riscou).
A minha fala representa que o que procuro são as estratégias dos registros que poderão ser util izadas durante as sessões. Percebo olhares de surpresas. Creio que esperavam fazer tudo da maneira formal, corretamente, sem erros e as lembranças do cálculo mental ficam reservadas nas falas, nos gestos, pois penso que têm medo de se expressarem através de outros modos.
Problema 5: Carmelino tinha 195 bolas de gude quando entrou no jogo. Depois do jogo ele contou suas bolas de gude e percebeu que tinha 163. O quê aconteceu no jogo?
Sujeitos: Sueli (43, f); Valdira (44, f); Valci (53, f).
Transcrição Observações realizadas durante o desenvolvimento do episódio
E: “Agora vamos para esse daqui. Esse é o do Carmelino.”
(Aponto para a outra situação-problema de número 5, apontando para o nome do Carmelino que também é um dos freqüentadores da EJA, foi convidado a participar da pesquisa e não compareceu. Dou todas as explicações novamente e Valci me pergunta):
Explico novamente a situação-problema nº 5, lendo o enunciado e uso palavras de incentivo.
Valci: “Então, pode fazer “de cabeça”?”
Valdira: “Concordo. É” .
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E: “Sim. Pode ser de cabeça, mas vocês falam e eu anoto, né. Depois vocês.... Vamos lá, gente!”
Sueli: “Ele perdeu! Valdira, ele perdeu as bolas!”
(Surpresa geral. Sueli respondeu logo após eu fazer a leitura do enunciado e também porque foi uma pessoa das que menos interagiu com o grupo até o presente momento).
Sueli se entusiasma ao perceber que conseguiu compreender o enunciado e assim pode se expressar sem medos, porém sua fala se dirige à Valdira.
Valdira: “Perdeu as bolas!”
Risos... Risos e mais risos. O ambiente fica bem descontraído.
E: “Tá gente, vamos lá! O quê que aconteceu?”
Sueli: “Perdeu. Agora o que ele perdeu no...”
(Confirmo com a cabeça. É interrompida pela Valci que não pára de rir. Mais risos).
Valdira: “Vamos lá. Ela fala e vocês...”
(Valdira se vira para mim, interrompe os risos e incentiva todos a continuar, pedindo silêncio através de gesto característico. Coloca o dedo na boca).
E: “Se ele perdeu, né? O quê que ele perdeu?”
(Pergunto para desafiar a outros tipos de respostas).
Sueli: “Trinta e duas.”
(Escreve li teralmente: “ Ele pedus 32” )
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Enquanto isso...
E: “Deu? Já? Puxa!”
(Fico surpresa com a rapidez da Valci).
Valci: “Será que está certo ou errado? Ai, meu Deus! Porque eu sei. Do cento e noventa eu to tirando quanto?”
Valdira: “O que foi que disseste, Valci?”
(Valdira se preocupa com a Valci).
Valci: “Ele perdeu trinta e duas bolas.”
E: “Escreva, Valci, escreva tudo isso que você fala para não esquecer” .
Valdira: “trinta e duas.”
(Valdira registra sua “continha” da forma convencional colocando primeiramente a parcela 195, seguido da segunda parcela, 163, para, finalmente, escrever o resultado correto: 032).
Valci: “trinta e duas. Ele perdeu trinta e duas bolas. É só assim para escrever? Não é? Não precisa fazer a conta?”
Então Valci decide somente fazer o seu registro escrito: “ Ele perdeu 32 bolas” .
E: “Tudo bem, então. Pode deixar assim. Não precisa, se não quiser”.
Penso que nesta situação as falas da Valci não foram tão consideradas e ela se sentiu à parte, visto que o entusiasmo da Sueli se torneou evidente, já que conseguiu chegar à solução rapidamente.
E: “Ah, menina boa tá aí!”
Problema 6: Tarci tinha 57 figurinhas de jogadores de futebol quando entrou no jogo. Depois do jogo contou suas figurinhas e viu que tinha 98. O quê aconteceu no jogo?
Sujeitos: Sueli (43, f); Valdira (44, f); Valci (53, f).
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Transcrição Observações realizadas durante o desenvolvimento do episódio
E: “Agora, vamos pegar o Tarci. Esse é o de número seis, tá?”
(Refiro-me ao Tarci nosso colega de classe, outro freqüentador da EJA).
(Seguindo os mesmos procedimentos anteriores, Leio o problema com atenção, pausadamente).
Valci: “O que está escrito aqui?”
(Valci aponta para a palavra “figurinhas” no enunciado).
E: “figurinhas”.
Valci: “Esse eu acho que é de mais, né? Ele tinha noventa e oito, agora ele entrou com? Ele tinha quanto Bia?”
(Ela volta-se para mim, pede auxílio para compreender melhor o enunciado).
E: “Ele tinha cinqüenta e sete quando ele entrou. Foi assim: Ele foi jogar figurinhas de futebol e tinha cinqüenta e sete figurinhas no seu montinho. Aí, quando acabou o jogo ele foi contar as figurinhas novamente e viu que tinha noventa e oito. O quê aconteceu nesse jogo?”
(Explico mais uma vez o enunciado para que todas possam compreendê-lo melhor).
Sueli : “Ele ganhou!” Sueli está entusiasmada e logo nos oferece a resposta.
Valdira: “Deu quarenta e um!”
Valci: “quarenta e um”! Isso, deu quarenta e um! Ele ganhou. Deu quarenta e um! Ele ganhou. Olhe: cinco e quatro dá nove; e sete e um, dá oito.”
Ela olha para Sueli que confirma com a cabeça. Faz seu registro bem no canto direito da folha.
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sete e um, dá oito.”
(Resolve a situação da esquerda para a direita, somando primeiramente 5+4=9 e 7+1=8.
57
+41
98).
Valdira: “Acho que é assim. Ele ganhou quarenta e um. É figura ou é bola?”
(A Valdira escreve a resposta primeiro: Ele ganhou 41 e uma figurinha.
41
+57
98).
Diferentemente da Valci, ela inverte a posição das parcelas e efetua a soma da direita para a esquerda, formalmente.
E: “Olha, é figurinhas.”
Valdira: “Não. É. Já. Figurinhas. Já. Ele ganhou quarenta e uma figurinhas no caso, né no jogo”.
A Sueli registra sozinha a sua “continha” e pude perceber que sua maneira de resolver a situação-problema foi a mais correta, se considerarmos aos ensinamentos aprendidos na escola. Sua tentativa foi a de escrever o cardinal de menor valor no minuendo e o de maior valor no subtraendo, além de acrescentar o sinal de + (mais) ao lado da conta: 57
��� �
lado da conta: 57
+ 98
41
E: “Vocês querem continuar? Não estão cansadas?”
Os demais sujeitos da pesquisa me entregam o papel e notei um pouco de cansaço, pois ouve suspiros e relaxamento de corpos.
Sueli : “Não, agora a gente vai até o fim.”
(Ela se vira para os demais pedindo consentimento, no que todos concordam).
Problema 7: Marli tem algumas bolachas e José tem 13 bolachas a mais que Marli. Sabendo que José tem 28 bolachas, quantas bolachas têm Marli?
Sujeitos: Sueli (43, f); Valdira (44, f); Valci (53, f).
Transcrição Observações realizadas durante o desenvolvimento do episódio
E: “Agora nós vamos fazer esse aqui com o nome da Marli . Vamos ver como é que vocês se saem com o nome da Marli . Vamos ver se a Marli ajuda vocês. Esse já é o de número 7. Já estamos no finalzinho, tá! Vamos lá! A Marli é o mesmo do caso anterior que tinha “algumas” que ela ganhou da avó.”
(Falo assim para lembrar a situação nº 4, já trabalhada).
E: “Então vamos lá! É Marli. Marli . Aqui é Marli e não Maria, tá. Eu errei aqui. Aqui, o nome correto é Marli e não Maria.”
(Leio a situação-problema e retifico o nome. Não sei se esta variável interferirá no entendimento ou não; se vai ocasionar alguma dificuldade na hora da resolução).
Acontece um pequeno erro de digitação neste problema com relação ao nome Marli . Literalmente está escrito assim: Marli tem algumas bolachas e José tem 13 bolachas a mais que Maria. Sabendo que José tem 28 bolachas, quantas bolachas têm Marli?
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Valdira: “Ah, sei”.
E: “Então vamos lá.”
(Mal eu acabo a leitura Valci responde):
Valci: “quinze” !
Risos... Todos se voltam para Valci e riem.
Sueli: “Puxa”!
E: “É? quinze? Como você sabe que é quinze?”
(Quero saber como ela chegou ao resultado).
Valci: “É. Não tou enxergando bem por causa do meu óculos. Alguém, alguém... tinha José, José tinha treze...”
(Valci busca na desculpa dos óculos, estratégias para conseguir efetuar seus registros).
Valdira: “Marli . É Marli que tinha algumas bolachas e José tem treze bolachas a mais do que Maria, digo Marli .”
(Valdira lê o enunciado pedindo ajuda das demais, chamando a atenção para os nomes corretos que estão no enunciado e frisando bastante as palavras “algumas”e “a mais” ).
Sueli: “É Marli, o nome.”
(Sueli registra a conta sem colocar sinal algum. 13
28
15)
Neste momento há uma pequena confusão com relação aos nomes Marli e Maria, porém percebo que não chega a atrapalhar o entendimento da situação.
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Usa o raciocínio mental e seu registro é mais formal. Percebo que ao registrar, mexeu com a caneta de baixo para cima. Ou seja, subtraiu a parcela debaixo para chegar na de cima.
Valci: “Treze bolachas...”
(Olha para os demais registros, mas não se preocupa em verificar se estão como o seu.
Valci faz seu registro sempre no canto direito da folha:
13
+15
28).
Valdira: “Continuando... Sabendo que José tem vinte e oito bolachas, quantas bolachas Marli tinha antes? É ai que entre a cuca.”
(Aponta para a sua cabeça, batendo com a caneta nela.
15
- 13
28
Usa o sinal da subtração).
Penso que ambas, Valci e Valdira tentam encontrar a resposta para o número 15, que é a resposta correta e não o conseguem porque têm dificuldades em registrar o cálculo mental.
Valci: “Marli ti nha quinze. Porque quinze e treze dá vinte e oito. É isso.”
Aqui eu aponto para os registros de Valci e Valdira e elas confirmam com a cabeça em sinal afirmativo. Percebo então que os sinais matemáticos de + (mais) e de - (menos), não são tão significativos, neste momento.
Sueli: “Bem na bucha!”
��� �
E: “Ah, então vocês somaram. Daí, ali, né! Hum... Então vamos agora sair da Marli e vamos lá para o Antonio.Agora vamos trabalhar com dinheiro. Estamos quase no fim, tá? E vem o Antonio de novo. Vamos lá?”
Suspiros... Percebo que estão cansadas, mas não comentam, pois querem colaborar com a pesquisa e, principalmente comigo, pois fui a professora delas durante 18 meses e nos conhecemos e nos respeitamos.
Problema 8: Antonio tinha R$ 214,00. Ganhou R$ 82,00 de seu primo. Quanto Antonio tem agora?
Sujeitos: Sueli (43, f); Valdira (44, f); Valci (53, f).
Transcrição Observações realizadas durante o desenvolvimento do episódio
E: “Probleminha número oito.”
(Leio o enunciado em voz alta, pausada e clara).
E: “Querem que eu leia de novo?”
(Leio novamente).
Pausa e silêncio... A leitura é feita individualmente e em silêncio. Somente Valci mexe com a boca, mas não se ouve nada. De repente...
Risos nervosos...
Mexidas nos cabelos, mãos se agitam, corpos remexem-se nas cadeiras. Olhares fugidios.
Valci: “É duzentos e noventa e seis?”
E: “Mulher boa. Mulher boa tá ai, ó. Mas é boa de cálculo mental, hein?”
Valci: “Eu to fazendo tudo de mais. Sei lá. Eu não sei fazer contas, dividir, essas coisas, querida. Eu só somo na cabeça. Eu sei que no meu cálculo, dá duzentos e noventa e seis?”
Valci se agita e começa a gesticular e resmungar palavras de difíceis entendimentos. Mexe com o lápis na cabeça, balança o corpo, sorri. Olha de lado.
����
noventa e seis?” lado.
E: “Então, como é que você chegou a esse duzentos e noventa e seis? Procurem fazer com o raciocínio de vocês. Um pouquinho. Tentem. Que assim vocês conseguem. Não se deixem levar pela Valci.”
(Desafio Valci a me responder e ao mesmo tempo chamo a atenção da Valdira e da Sueli , pois ambas estão se olhando, rindo e gesticulando muito. É também um chamamento para que não fiquem encantados com os gestos e as falas da Valci e assim tentem imitar seu registro).
Valdira: “Não. Eu to tentando com meu raciocínio. Sabe, ela faz mais de cabeça, né. E eu já... né?”
(Aponta para Valci que “pensa em voz alta” e já não fala tanto. Ambas referem-se aos seus próprios cálculos. Elas escrevem suas “continhas”, já a Valci, “fala” o seu cálculo mental. Talvez isso perturbe a ambas).
Risos... Risos e todos relaxam e se olham.
Sueli: “É. Eu também”.
Quer dizer que, às vezes, a fala da Valci as perturbam.
Valci: “É, eu, né...”
E: “Mas, pode continuar falando, tá, Valci? É isso que eu quero. Sueli também pode falar. Não se preocupem se está certo ou se está errado. Qualquer um deles, tá!”
Ao terminar minha fala, percebo que a Sueli já fez seu registro:
214,00
+82,00
296,00
Ela registrou sem se preocupar com a ordem das parcelas, nem em colocar vírgulas embaixo de vírgulas. Valdira faz seu registro formalmente e escreve a resposta por extenso: Antonio tem 296,00 R$.
����
R$.
Valci: “Porque Bia aqui tem duzentos. Aqui né. Porque é duzentos e quatorze, né? duzentos e quatorze. Então quatorze, aqui, ó. Então oito e um, dá nove e quatro e dois, dá seis. O nove que é o um que dá dez, que dá noventa. Então eu tenho que somar duzentos e quatorze mais oitenta e dois. Então é onde que dá o duzentos e noventa e seis. Eu posso até estar errada. Ah, gente, a minha cabeça é mal organizada”.
A Valci continua com sua explicação.
Ela aponta para o 214, dando a entender que ele vale 200.
Registra sua conta:
214,00
82,00
296,00
Não coloca o sinal, mas anota o resultado, mais uma vez, no canto direito do papel, acima. Mais uma vez resolve a conta da esquerda para a direita.
(Enquanto a Valci faz seu registro, pergunto para Sueli ):
E: “Estava fácil para você, Sueli?”
Sueli : “Sim. Eu consegui.”
Valdira também confirma com a cabeça. Dúvidas sanadas, partimos para a última situação. Neste último problema eu havia me esquecido de escrever os nomes.
Problema 9: Antonio tinha R$ 166,00. Deu R$ 35,00 para o Carmelino. Quanto ele tem agora?
Sujeitos: Sueli (43, f); Valdira (44, f); Valci (53, f).
Transcrição Observações realizadas durante o desenvolvimento do episódio
E: “Então vamos para a última, agora, ta”! Viram que legal! Até que foi rapidinho. Vou colocar o nome de vocês antes que eu esqueça. Então, ó.”
(Leio o enunciado e os sujeitos da pesquisa também o fazem junto comigo. E logo a Valci responde):
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Valci: “Já sei!”
Valdira: “Quanto ele deu?”
Valci: “cento e trinta e um. É. É. Cento e trinta e um.”
E: “Como você chegou a esse resultado, Valci? Pode falar, Valci, pode.”
(Eu a incentivo a falar ou a escrever).
Há uma pequena pausa, onde todas lêem silenciosamente a situação. Ela olha às demais, me olha, com receio de estar falando muito e perturbar as amigas.
Valci: “Porque ele tem, ele tem cento e sessenta e seis, né. Então o cem fica inteirinho ali . Então do sessenta eu tiro trinta, fica trinta e do seis eu tiro cinco, fica um. Então dá cento e trinta e um. Eu vou montar aqui também, né. Então dá cento e trinta e um. Ó. Antonio ficou com cento e trinta e um.”
(Porém o seu registro no papel foi assim:
166,00 131,00
- 35,00
131,00
mais uma vez no canto direito do papel).
Transportando seu raciocínio mental para o cálculo matemático escrito, podemos ter a decomposição do número 166 ( 100 + 60 +6 = 166) e da dezena 60, ela tirou 30 (do valor de 35 que o Antonio deu ao Carmelino). Das unidades 6, do número 166, ela subtraiu 5, correspondente à dezena 35.
Ou com a seguinte expressão numérica: 100+(60-30)+(6-5).
Tanto Valdira quanto Sueli não se preocupam com a Valci. Resolvem corretamente a situação, inclusive a Valdira escrev a resposta por extenso, porém Sueli, mais uma vez, não se preocupa com a ordem das parcelas e nem com o sinal, pois coloca o sinal de (+) mais na sua conta.
166,00 166,00
- 35,00 + 35,00
131,00 131,00
Valdira Sueli
E: “Ah! Perfeito, meninas!. Tá jóia!”
(Fico contente porque a solução foi encontrada rapidamente e sem maiores problemas).
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2ª SESSÃO: Pesquisa com Luis Paulo Bernardi e Sali Teodoro dos Santos Nesta sessão não colocaremos a análise dos problemas, já que os mesmos já foram analisados na sessão anterior. Tabela 7: Transcrição e análise de resolução dos problemas.
Problema 1: Num aquário havia 137 peixes nas cores amarela e verde. 41 peixes são amarelos. Quantos são os peixes verdes?
Sujeitos: Luis (43, m); Sali (51, f).
Transcrição Observações realizadas durante o desenvolvimento do episódio
Leio o enunciado com voz pausada, procurando ser bem clara na pronúncia das palavras.
Luis: “Noventa e seis”.
(Responde logo após fazer a leitura do enunciado junto comigo. Olha para a Sali e ri).
(Tento incentivar, mas ambos procuram realizar a atividade em silêncio).
E: “Como você chegou a essa conclusão? Se você quiser fazer a continha aqui para nós, pode fazer.”
Luis balança a cabeça em sinal de entendimento enquanto a Sali permanece quieta, seguindo o enunciado com os olhos, suas mão estão postas ao longo da carteira.
Luis: “Como eu cheguei? Eu olhei aqui para os peixes amarelos, né? A continha dele. Ai eu fui contar os amarelos, daí, né...”
E: “Tá, façam como vocês acharem melhor”.
(Ambos se voltam para o papel e escrevem seus registros sem darem muitas explicações de como chegaram ao resultado. O Luis se agita, mexe no nariz, olha, lê novamente o enunciado em voz baixa, mexe na perna e alisa o papel.
Sali também não fala e se expressa registrando no papel. Ambos não se olham e registram o resultado de forma igual, seguindo a maneira formal de registro aprendido na escala.
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137
- 41
96).
E: “Quando vocês disserem OK, tá bem? Digam acabei, tá! Não importa Luis se você fez antes...”
Deu-me a impressão que eles estão pensando que é um teste e que não se podem se olhar, conversar, desenhar, enfim, trocar idéias. Eu já havia explicado antes, porém ambos continuam a agir em silêncio.
Luis: “Se é só a continha. Tá pronta”.
(Sali se volta para ele e confirma com a cabeça, fazendo sinal de consentimento).
Ao terminarem o Luis levanta a cabeça e a Sali solta a caneta, colocando-a na carteira.
Problema 2: Antonio tinha 73 figurinhas. Ganhou 21 de seu primo. Quantas figurinhas ele tem agora?
Sujeitos: Luis (43, m); Sali (51, f).
Transcrição Observações realizadas durante o desenvolvimento do episódio
E: ”Então, olha aqui o segundo.”
E: “Tá, quer deixar embaixo, deixe.”
(Viro-me para a Sali que quer deixar o papel do primeiro problema embaixo do primeiro. Leio o enunciado e eles seguem com os olhos. Logo a Sali responde):
Sali : “Noventa e oito! Não, noventa e quatro, né.”
(Ambos se olham e confirmam a resposta com um sinal de cabeça e fazem seus registros:
73
+21
94).
E: “Pronto? Legal gente. Vocês estão bem.”
Ambos confirmam com a cabeça que sim.
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Problema 3: Antonio tinha 73 figurinhas e deu 32 para seu irmão. Quantas figurinhas Antonio têm agora?
Sujeitos: Luis (43, m); Sali (51, f).
Transcrição Observações realizadas durante o desenvolvimento do episódio
E: “Então vamos para o número três agora. Vocês podiam ler para mim? Podiam ler?”
(Luis lê o enunciado com voz alta e a Sali o acompanha. Ao terminarem, o Luis já faz o seu registro, a Sali resmunga algo incompreensível e registra seu cálculo sem dificuldades).
Sali : ”Olha aqui”.
(Sali me entrega o papel, mostrando o seu registro.
Como na situação anterior, o registro de ambos são iguais:
73
- 32
41).
E: “Já? Viu como vocês estão craques?
(ambos estão resolvendo com bastante facili dade)
Problema 4: Sueli tinha algumas balas de goma e ganhou 32 balas de sua vovó, ficando com 98 balas. Quantas balas de goma ela tinha antes?
Sujeitos: Luis (43, m); Sali (51, f).
Transcrição Observações realizadas durante o desenvolvimento do episódio
E: “Olha aqui a outra situação. Vamos para outra.”
(Entrego o papel para eles e logo percebo que cometi um erro. Entreguei a situação 5 ao Luis e a 4 à Sali . O nome “Carmelino” usado no problema é o nome do irmão dele. Foi proposital. Eu procurei usar os nomes dos freqüentadores da EJA nas situações. Tomo a decisão de deixar assim mesmo, pois o Luis já está interagindo no problema. Fico contrariada com o erro).
*,+-*
Tomo a decisão de deixar assim mesmo, pois o Luis já está interagindo no problema. Fico contrariada com o erro).
Luis: “Ó o meu irmão aqui! O Carmelino.” O Luis lê o enunciado em voz baixa.
E: “Ah, o teu tá diferente do outro. Da Sali”.
(incentivo ele a continuar).
E: “Dá pra registrar ai como é que você chegou a isso?”
Luis: “Eu já sei! Cheguei à conclusão que quando ele entrou no jogo percebeu que tinha cento e noventa e cinco. Ficou com cento e sessenta e três. O quê aconteceu no jogo? Eu sei que ele perdeu trinta e duas bolas.”
(Logo faz seu registro:
195
- 163
032).
Luis apóia as mãos no rosto, sorri, mexe no papel e lê o enunciado em voz baixa.
Enquanto isso, Sali continua tentando resolver sua situação lendo mentalmente a situação. Fica em dúvidas. Mexe-se e agita-se bastante. Faz que não com a cabeça. Está embaraçada.
Sali: “Deu trinta e quatro! Não, acho que é sessenta e quatro. Sessenta e quatro. Sessenta não, noventa. Até noventa e oito. Dá sessenta e seis. Tinha sessenta e seis balas, né? É, não sei...”
Ela toma a iniciativa de completar e não de subtrair.
(Desafio-a a prosseguir no seu cálculo mental e assim efetuar seu registro):
E: “Como é que você chegou à conclusão do 64 ali , Sali?”
.,/10
Sali : “Somando na cabeça, né. Somando na cabeça”.
(Registra:
56
32 risca e prossegue: 42
+56
98 ).
E: “O que você somou na cabeça?”
Sali : “O que eu somei? Ela tinha algumas balas, né e ganhou mais trinta e duas. Trinta e duas para noventa e oito. Acho que ela tava com sessenta e seis balas.”
E: “Foi assim que você fez”?
Sali : “Sim, foi assim que eu resolvi.”
(me questiona, mostrando no papel se é para escrever a resposta. Ela se refere ao problema do Luis).
Ela me entrega o papel sem muito olhar para ele, mas creio que ela tem dúvidas quanto ao resultado final, porém percebi na sua fala que seu cálculo mental estava correto, seu erro está no registro do número 42.
Problema 5: Carmelino tinha 195 bolas de gude quando entrou no jogo. Depois do jogo ele contou suas bolas de gude e percebeu que tinha 163. O quê aconteceu no jogo?
Sujeitos: Luis (43, m); Sali (51, f).
Transcrição Observações realizadas durante o desenvolvimento do episódio
E: “Tá. Ó, então pega o de número 5 aqui. Esse foi o que ele resolveu antes de você. Deu essa?”
(Leio o enunciado à Sali em voz baixa, para não interromper o raciocínio do Luis).
2'3)4
Luis: “É pra escrever a resposta?
(Luis me pergunta se é para escrever a resposta com uma frase, também).
Sali: “Tem que por a resposta?
(Sali também faz a mesma pergunta).
E: “Faça como você quiser.”
Sali: “O teu tá diferente do meu?” É neste momento que a Sali percebe a troca de problemas.
Luis: “Sim.”
E: “Sim.”
Sali: “Ah, tá.”
Esta variável, aparentemente, não a perturbou porque não interagiu com o Luis.
Fico um pouco constrangida, pois eles estão realizando as situações e não se aperceberam da troca.
Luis: ”É, tem que escrever, né?”
E: “Não. Só se vocês quiserem. Se vocês quiserem pode fazer do jeito que vocês souberem, tá? Podemos falar um pouco mais alto? Está difícil ouvi-los.”
(Como eles falam baixo e estou gravando em vídeo, o pedido é justo porque eu terei que ouvir suas falas).
Luis: “Ah, este é o quatro.”
(Troco os papéis. Entrego então a situação 5 à Sali e a 4 ao Luis).
E: “Quer que eu leia para você, Luis?”
Luis: “Sim.”
5,676
(Leio me dirigindo somente para ele, chegando mais perto dele).
E: “Sali , pode utili zar todo espaço. Você não se preocupe, tá.”
(Volto-me para Sali que prefere escrever a sua resposta bem em cima do papel). “ Aconteceu que carmelino perdeu com os amigos que jogava.)”
Enquanto isso, Luis está em dúvidas. Agita-se na cadeira, mexe com as pernas e com a caneta. Lê o enunciado em silêncio. Apoiando as mãos no queixo. Relê. Fica em dúvidas, pois olha de lado para outro. Mexe na caneta e se mexe na cadeira. Coça a barba, o nariz, agita-se sem tirar os olhos do papel.
Sali: “Sim. Será que é assim?”
(Mostra-me seu registro no papel: “ Aconteceu que carmelino perdeu com os amigos que jogava.)”
E: “Isso! Também pode ser assim.”
Luis: “Bom, este aqui não sei se está certo. Está como a senhora falou. Do trinta e dois fui até o noventa e oito.
Ele utili za a idéia de completar, mas penso que usa o número alcançado mentalmente (66), para efetuar sua conta:
66
+32
98
Problema 6: Tarci tinha 57 figurinhas de jogadores de futebol quando entrou no jogo. Depois do jogo contou suas figurinhas e viu que tinha 98. O quê aconteceu no jogo?
Sujeitos: Luis (43, m); Sali (51, f).
8'9):
Transcrição Observações realizadas durante o desenvolvimento do episódio
E: “Isso! Então agora vamos fazer o de número 6. Esse é o do Tarci”.
(Leio o enunciado atentamente. Ambos continuam não trocando palavras, só sorrisos e alguns olhares. O Luis se mexe muito. Fica agitado. A Sali resmunga algo, porém são palavras incompreensíveis, sempre olhando o enunciado. Permaneço quieta, só observando seus jeitos e trejeitos).
Percebo uma certa tensão e penso que ambos continuam com a idéia que o que estão fazendo é um teste, uma prova e que estão sendo avaliados por isso.
E: “Deu, Sali? Já? Deu também Luis?”
(Ambos confirmam fazendo sinal com a cabeça e não falam. Somente se olham e me olham).
Estes olhares fugidios já é um pequeno sinal de maior interação. Então sorrio mais relaxada.
E: “Ufa! Legal!”
(Ambos resolvem sem maiores dificuldades. O Luis faz a “continha” e escreve a resposta por extenso:
98
- 57
41
Tarci teve sorte ganhou quarenta e uma figurinhas.
Já a Sali somente escreve a resposta: Tarci ganhou as figurinhas no jogo que estava jogando).
Risos... Enfim, descontração um pouco.
Problema 7: Marli tem algumas bolachas e José tem 13 bolachas a mais que Marli. Sabendo que José tem 28 bolachas, quantas bolachas têm Marli?
Sujeitos: Luis (43, m); Sali (51, f).
Transcrição Observações realizadas durante o desenvolvimento do episódio
E: “Este é o de número sete. Então, estamos terminando. Agora é com a Marli. Querem que eu leia, ou não?”
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que eu leia, ou não?”
Sali: “Não. Eu leio.”
(Lê o enunciado com alguma dificuldade, então leio junto com ela e depois releio).
Luis: “É um problemão.”
(Ele se agita, mexe no nariz, faz trejeitos com a boca, sorri desconfiado).
(Sali solicita mais detalhes):
Sali: “Ele tinha treze. Agora, sabendo que tem vinte e oito, então... Sim, a bolacha que a Marli deu para ele, tinha, vai tirar vinte e oito?”
E: “Não. Ele já tinha. Ele já tinha vinte e oito bolachas.”
(tento argumentar, mostrando o enunciado).
Luis: “Aqui em cima. Aqui Marli ti nha “algumas” bolachas e José tem treze.
(Mais uma vez a palavra “algumas” (abstrata) interfere no raciocínio. Aponta para o enunciado, diante da palavra “algumas”).
Eu complemento a fala do Luis. Percebo que como no primeiro grupo, a palavra “algumas” é geradora de incompreensões porque não revela quantidade específica. Eles demonstram que têm poucos dados para resolver a situação.
E: “A mais que Marli . Tem treze a mais que Marli.”
(ajudo mais uma vez lendo novamente o enunciado do problema, com calma).
Sali: “Não entendi”.
Luis se agita e lê em voz alta. Volta-se para a Sali, trocam olhares, mas não se falam.
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Sali: “Ah... Ela tem algumas, mas ele tem treze a mais do que ela. Sabendo que José tem vinte e oito bolachas, quantas Marli tinha antes?”
(Eu os incentivo a registrar do jeito deles. Como eles estão pensando).
E: “Entendeu agora?”
Sali: “Mais ou menos. Está difícil.”
E: “Tentem escrever o que está ai no cérebro de vocês. Registrem isso, registrem. Vocês podem até desenhar.”
(Volto-me para o Luis e pergunto para ele me dar pistas de como conseguiu o resultado):
E: “Como você chegou a esse resultado, Luis?”
Penso na facilidade com que ambos e, mesmo os outros sujeitos da primeira sessão, têm em esquecer dados ou fatos vivenciados em curto espaço de tempo. Como os do problema 4, também de composição de relações e com a palavras algumas indicando quantidade.
Luis: “Eu resultei aqui que Marli tem algumas e José tem treze bolachas a mais que Marli . Sabendo que José tem vinte e oito bolachas, quantas bolachas Marli têm? Quinze bolachas.”
E: “E como é que você chegou a esse quinze?”
Luis: “Eu cheguei nesse quinze, raciocinando. Se ele tem vinte e oito. Se ele tem vinte e oito, José tinha treze a mais...”
Sali: “Quinze. Ela tem quinze.”
(Sali complementa a idéia do Luis).
Penso que ambos uti li zaram a idéia de completar. Do treze até o vinte e oito.
(como quero mais detalhes, volte-me para Sali):
E: “Mas como é que você fez?”
B'C)D
(Ela não responde e só me olha).
(Luis interfere. Lê o enunciado mais uma vez).
Luis: “Eu fiz uma conta assim. Vou ler de novo. Então quer dizer que ele tinha treze, é.”
Percebo que ambos têm dificuldades em demonstrar seus cálculos mentais, registrando no papel de alguma forma, seja com o registro formal aprendido na escola, seja de uma maneira não convencional.
(Sali interage na fala do Luis).
Sali: “Ele tinha treze a mais.”
Eles se agitam, me olham. Penso que esperam a minha confirmação. Se a solução é a correta ou não; ambos se voltam para si e se concentram no enunciado.
Luis: “Sim, então José tinha treze a mais. Ela sabia que ele tinha vinte e oito. José tinha vinte e oito. Quantas bolachas Marli tinha antes? Quantas bolachas têm Marli? São quinze, então. Minha letra é muito esquisita.”
E: “Não. Dá para entender bem.”
(Sua mão treme ao efetuar o registro. Não quero que ele se preocupe com este detalhe).
Luis: “Não, eu não sei escrever assim. Tem sempre que ter um negócio assim embaixo. Este papel é fino e a letra fica ruim”.
E: “Ah, tá. Não precisa se preocupar. Tá bom assim.”
(O convenço que do jeito que ele está fazendo, está ótimo).
Luis: “Não precisa, né, colocar um outro papel com linha embaixo. Escrevo de memória, né?”
(Luis se refere a escrever sem linhas).
E: “Está tendo dificuldades em fazer, Luis? Ou entender e escrever o problema?”
(Pergunto para ele, pois o percebo um pouco nervoso).
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pouco nervoso).
Luis: ”Não” .
E: “Não?”
Luis: “Não. Se está certo, não sei. Mas não tenho dificuldades.”
(Eis seu registro: “ Marli tinha quinze bolachas” ).
E: “Deu também ai, Sali?”
Sali : “Sim, deu” .
(Eis o registro da Sali : ”Marli tinha menos do que José 15 bolachas” ).
Ambos não se util izam qualquer tipo de cálculo numérico, mas penso que usam a idéia de completar. Ambos me entregam as respectivas folhas e os convido para a situação seguinte.
Problema 8: Antonio tinha R$ 214,00. Ganhou R$ 82,00 de seu primo. Quanto Antonio tem agora?
Sujeitos: Luis (43, m); Sali (51, f).
Transcrição Observações realizadas durante o desenvolvimento do episódio
E: “Então troque comigo. Esse é do Antonio, agora.”
Sali me entrega o problema 7 e eu lhe entrego o de número 8, aliás, entrego aos dois.
Ambos lêem em voz baixa seguindo minha fala. Luis se agita mais, morde a caneta, coça a cabeça e se mexe na cadeira, enquanto a Sali resmunga algumas palavras incompreensíveis.
Sali : “Duzentos e quatorze... oitenta e dois... Ele tem duzentos e noventa e seis.”
Sali foi rápida no cálculo mental.
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dois... Ele tem duzentos e noventa e seis.”
E: “Como você chegou a este resultado?”
Fico curiosa em saber como ela resolveu tão rápido.
Sali: “Se ele tem duzentos e quatorze, ganhou oitenta. Acho que é duzentos e noventa e seis. Deu duzentos e noventa e seis.”
(A Sali registra seu cálculo de maneira formal e também escreve a resposta: “Antonio ficou com 298,00 reais” .
214,00
82,00
298,00
Aqui ela comete um pequeno erro na hora de somar 4 +2 = 8)
Na sua resposta anterior, ela havia falado duzentos e noventa e seis.
Luis: “Então é duzentos e quatorze mais oitenta e dois. Então quer dizer que foi a mais” .
(Luis tenta resolver sozinho, resmungando palavras inteligíveis. Seu registro está correto:
214,00
+ 82,00
296,00
Ele não escreve a resposta por frase).
Luis: “Eu notei um detalhezinho. Não sei se dá para falar. Essa continha que eu faço, não sei se é preciso, o sinal é muito importante? Menos ou mais, né?”
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não sei se é preciso, o sinal é muito importante? Menos ou mais, né?”
(Ele fala assim porque percebeu que a Sali não havia colocado o sinal na sua conta, o que ela rapidamente o faz).
Sali : “Ah, eu não tinha botado. Agora botei.”
(Sali coloca o sinal de + (mais) na sua conta).
Luis: “Desculpa, desculpa.”
Sali : “Não. Eu boto, nas outras eu botei.” Ela não se chateia em ter que colocar o sinal.
E: “Deu? Deu para todos? Então vamos esperar um pouquinho que acabou a bateria da filmadora.”
Pausa. Relaxamos e prosseguimos após a troca de bateria na filmadora.
Problema 9: Antonio tinha R$ 166,00. Deu R$ 35,00 para o Carmelino. Quanto ele tem agora?
Sujeitos: Luis (43, m); Sali (51, f).
Transcrição Observações realizadas durante o desenvolvimento do episódio
Leio o enunciado enquanto a Sali escreve algo na mão e o Luis segue comigo na leitura.
Sali : “Deu cento e trinta e um!”
E: “Como é que você chegou a isso?”
(Mais uma vez a desafio a me responder como ela está elaborando seu cálculo mental).
Será que ela escreveu a resposta na mão, no momento em que lia o enunciado?
Risos...
Sali : “Somando”.
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(Ela não dá mais detalhes)
(Volto-me para o Luis e elogio a sua letra).
E: “Bonita letra.”
E: “Deu, Sali?”
Neste momento, ambos partem para o registro formal. Não se olham, não apresentam dificuldades no entendimento do problema e rapidamente escrevem tanto a resposta escrita, como o cálculo numérico.
Sali: “Sim, ó.”
(Ela me mostra o que fez:
166,00
- 35,00
131,00
“ Antonio te
Luis: “Agora aqui, eu consegui.”
(Logo a seguir o Luis também me mostra seu registro:
166,00
- 35,00
131,00
“Antonio ficou com 131,00 R$” ).
E: “Isso!.Pessoal, foi muito difícil para vocês?”
Sali: “Foi bem legal.”
E: “Bem legal?”
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Sali: “É, foi até divertido. Fazia tempo que eu não pegava na caneta.”
Luis: “É bom, foi bom porque mexe com a mente da gente. A gente exercita. É bom porque a gente só trabalha limpando as salas, então, é bom.”
E: “Bem, então agradeço a todos. Obrigado! Demais! E... acabou!! ”
(Os problemas acabaram e fico feliz que tudo tenha dado certo).
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ANEXO 2: QUESTIONÁRIO DAS ENTREVISTAS
Universidade do Vale do Itajaí – UNIVALI Mestrado em Educação Entrevista Nome:_________________________________________ D.N._____________
1. Até que série você estudou?
2. Quanto tempo faz que você parou de estudar? 3. Por que você parou de estudar?
4. O que você lembra da escola? Como era a escola que você estudou?
5. O que significava estudar, na época em que você freqüentava a escola?
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ANEXO 3: PROBLEMAS
Situação 1: Num aquário havia 137 peixes nas cores amarela e verde. 41 peixes são amarelos.
Quantos são os peixes verdes?
Situação 2: Antônio tinha 73 figurinhas. Ganhou 21 de seu primo. Quantas figurinhas Antônio
têm agora?
Situação 3: Antonio tinha 73 figurinhas e deu 32 para seu irmão. Quantas figurinhas Antonio
têm agora?
Situação 4: Sueli tinha algumas balas de goma e ganhou 32 balas de sua vovó, ficando com 98
balas. Quantas balas de goma ela tinha antes?
Situação 5: Carmelino tinha 195 bolas de gude quando entrou no jogo. Depois do jogo ele
contou suas bolas de gude e percebeu que tinha 163. O quê aconteceu no jogo?
Situação 6: Tarci tinha 57 figurinhas de jogadores de futebol quando entrou no jogo. Depois do
jogo contou suas figurinhas e viu que tinha 98. O quê aconteceu no jogo?
Situação 7: Marli tem algumas bolachas e José tem 13 bolachas a mais que Marli. Sabendo que
José tem 28 bolachas, quantas bolachas têm Marli?
Situação 8: Antonio tinha R$ 214,00. Ganhou R$ 82,00 de seu primo. Quanto Antonio tem
agora?
Situação 9: Antonio tinha R$ 166,00. Deu R$ 35,00 para o Carmelino. Quanto ele tem agora?