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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE MINAS GERAIS Programa de pós-graduação em Ensino de Ciências e Matemática Dulcinéa Lopes de Oliveira OFICINA DE PANIFICAÇÃO: cidadania, ascensão socioeconômica, conhecimento científico e diálogo entre gerações Belo Horizonte 2014

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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE MINAS GERAIS

Programa de pós-graduação em Ensino de Ciências e Matemática

Dulcinéa Lopes de Oliveira

OFICINA DE PANIFICAÇÃO: cidadania, ascensão socioeconômica, conhecimento científico e diálogo entre

gerações

Belo Horizonte 2014

Dulcinéa Lopes de Oliveira

OFICINA DE PANIFICAÇÃO:

cidadania, ascensão sócio econômica, conhecimento científico e diálogo entre

gerações

Dissertação apresentada ao programa de Pós-graduação em Ensino de Ciências e Matemática da Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais, como requisito parcial para obtenção do título de mestre em Ensino de Ciências e Matemática.

Orientador: Profa. Dra. Cláudia de Vilhena Schayer Sabino

Belo Horizonte

2014

FICHA CATALOGRÁFICA

Elaborada pela Biblioteca da Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais

Oliveira, Dulcinéa Lopes de Oliveira

O48o Oficina de panificação: cidadania, ascensão socioeconômica, conhecimento

científico e diálogo entre gerações / Dulcinéa Lopes de Oliveira. Belo Horizonte,

2014.

123f.: il.

Orientadora: Cláudia de Vilhena Schayer Sabino

Dissertação (Mestrado)- Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais.

Programa de Pós-Graduação em Ensino de Ciências e Matemática.

1. Ciência - Estudo e ensino. 2. Aprendizagem por atividades. 3. Relações

entre gerações. 4. Panificação - ensino profissional. I. Sabino, Cláudia de Vilhena

Schayer. II. Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais. Programa de Pós-

Graduação em Ensino de Ciências e Matemática. III. Título.

CDU: 5:373

Dulcinéa Lopes de Oliveira

OFICINA DE PANIFICAÇÃO: cidadania, ascensão socioeconômica, conhecimento científico e diálogo entre

gerações

Dissertação apresentada ao programa de Pós-graduação em Ensino de Ciências e Matemática da Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais, como requisito parcial para obtenção do título de mestre em Ensino de Ciências e Matemática.

Profa. Dra. Cláudia de Vilhena Schayer Sabino (Orientadora) - PUC Minas

Prof. Dr. Márcio Antonio de Paiva - PUC Minas

Prof. Dr. Fernando Costa Amaral - PUC Minas

Belo Horizonte, 19 de março de 2014.

Àqueles que nunca deixaram morrer em mim a vontade de lutar sempre pelos meus ideais, aos meus pais, Afonso Soares de Oliveira e Esther Lopes de Oliveira, ao meu filho, Fernando Lopes Pimenta e em especial à minha netinha, Bruna Andrade Pimenta como exemplo de incansável busca pela sabedoria e crescimento espiritual.

AGRADECIMENTOS

Neste momento tão significante agradeço, primeiramente, a Deus e aos meus

guias espirituais por terem me dado força interior para superar dificuldades, me

mostrado os caminhos nas horas incertas e me suprido em todas as minhas

necessidades.

Ao meu irmão Adilson Lopes de Oliveira pelo incentivo para iniciar o

mestrado.

A todos os outros familiares pelo apoio e carinho nesta caminhada.

À minha Professora e Orientadora Dra. Cláudia de Vilhena Schayer Sabino

pelo apoio, incentivo e paciência com que me auxiliou nessa tarefa árdua, mas muito

gratificante, o meu grande abraço.

À minha colega e amiga Claudete Botaro de Matos pelas horas de estudo,

pela paciência de procurar e testar as receitas de pão que eu estava propondo e

principalmente pela verdadeira e bela amizade.

À Congregação “Filhas de Jesus”e a todos os funcionários da Obra Social

São José Operário por apoiar um trabalho voluntário tão bonito e satisfatório e, em

especial ao Arthur Moraes pelas produções artísticas e fotos dessa pesquisa.

Aos participantes da oficina de panificação, pela maravilhosa experiência de

romper a rotina e renovar as forças dos sentimentos que dão sentido à vida e

também por permitirem que eu compartilhasse de seus saberes.

Aos professores do mestrado pela paciência e em especial ao professor

Fernando Amaral pelo apoio e carinho.

À Secretaria do Mestrado em Ensino de Ciências e Matemática pela

competência e disponibilidade durante todo o curso.

À Dalva, minha prima, pela revisão ortográfica dessa dissertação.

A todos os colegas da turma 8 do Mestrado em Ensino de Ciências e

Matemática pela convivência tão gratificante.

A todos que, direta ou indiretamente, contribuíram para a realização este

trabalho.

Dialogar é descobrir.

Quanto mais avançarmos na descoberta dos outros,

tanto mais substituiremos as tensões por laços de paz.

Pelo diálogo, aprenderemos a respeitar

a pessoa humana, seus valores, sua cultura, sua autonomia legítima, sua autodeterminação;

olhar para além de nós mesmos, a fim de compreendermos

e apoiarmos o que há de bom nos outros; contribuir para um desenvolvimento

e crescimento justo; transformar a solidariedade e o diálogo

em características permanentes do mundo em que vivemos.

A paz é um valor sem fronteiras.

(Papa João Paulo II)

RESUMO

Uma das consequências drásticas do mundo atual, movido pelo capitalismo, é a

fragmentação do ser humano. Precisamos de uma educação inovadora no ensino de

Ciências, buscando novos olhares educacionais e ferramentas transformadoras da

sociedade, possibilitando uma aprendizagem prazerosa que cultive os sentimentos

de solidariedade, amizade, confiança, humildade e amor contribuindo para formação

de seres socialmente competentes. Entretanto, a insistência de se manter um ensino

tradicional ainda é muito forte na educação atual propiciando um grande

distanciamento entre o ensino de Ciências nas escolas e a apropriação do

conhecimento científico necessário para a formação de um cidadão crítico e

participativo. A presente pesquisa aborda os saberes envolvidos na produção de

pães caseiros, envolvendo os aspectos físicos, químicos, biológicos e ainda

históricos, culturais e sociais. Para tal foi proposta uma modalidade de trabalho

educativo voluntário, uma oficina de panificação, a partir do referencial de Paulo

Freire baseado nas relações de diálogo entre gerações com valorização daqueles

que detém o saber popular. Com a elaboração e realização da oficina de pães

caseiros objetivou-se contribuir para a reflexão e possíveis mudanças no ensino de

Ciências visando um saber mais compromissado com a ética, o desenvolvimento

humano e a cidadania, bem como viabilizar ações que contribuam para ascensão

socioeconômica de famílias com baixa renda.A parte empírica desta pesquisa de

caráter qualitativo incluiu técnicas de observação participante,entrevistas e

questionário, envolvendo um grupo de senhoras e jovens alunos da Obra Social São

José Operário, situada em Belo Horizonte. Constatou-se que as senhoras que

participaram da oficina de pães apresentaram grande interesse e alegria na

realização de pães caseiros de baixo custo almejando o início do seu próprio

negócio, para a melhoria da renda familiar. Os jovens alunos demonstraram

dificuldades para interpretar e explicar os “saberes populares” das senhoras, uma

vez que deixaram de dialogar com os mais velhos e, portanto não compreendem

suas experiências e vivências.Porém, há um entendimento por parte desses jovens,

da existência de uma aproximação entre “saberes populares” e escolares e da

importância da valorização da sabedoria dos mais velhos numa aprendizagem de

Ciências mais contextualizada. Verificou-se a promoção da alfabetização científica,

facilitando a exploração dos conteúdos interdisciplinares e a importância do papel da

Ciência na culinária e na sociedade, deixando claro que a educação “ dialógica” de

Paulo Freire pode transformar a escola num ambiente de aprendizagem mútua.

Como produto foi elaborada uma cartilha propondo um olhar diferente para o ensino

de Ciências no intuito que o educador descubra a importância dos pré-requisitos

para uma prática educativa mais humana, formadora de cidadãos.

Palavras-chave: Oficina de panificação. Diálogo entre gerações. Ciências

contextualizadas.

ABSTRAT

One of the drastic consequences of the present world, driven by capitalism, is the

human being fragmentation. We need an innovative education in science teaching

seeking for transformative tools for the Society, with new educational looks, providing

a pleasurable learning that cultivates feelings of solidarity , friendship, trust, humility

and love, contributing to the formation of socially competent human beings. However,

the insistence of a traditional education is still very strong in the current education,

providing a large gap between science teaching in schools and the appropriation of

knowledge necessary for the critical and participative citizen formation. The present

research issues the knowledge involved in the homemade breads production,

including the physical, chemical, biological and even historical, cultural and social

aspects.To this end, a form of voluntary educational workwas proposed, a workshop

of baking, from the benchmark of Paulo Freire, based on dialogue intergenerational

with appreciation of those who hold popular. The preparation and realization of

homemade breads workshop aimed to contribute to the reflection and possible

changes in science teaching seeking a knowledge more committed to ethics, human

development and citizenship, as well as enabling actions that contribute to

socioeconomic improvement of low-income families. The empirical part of this

research, of qualitative character, was guided in participant observation techniques,

interviews and questionnaires, involving a group of ladies and young students of the

“Obra Social São José Operário”, located in Belo Horizonte. It was noticed that the

ladies who attended the homemade breads workshop showed great interest and joy

in making low cost breads targeting the outset of their own business to improve

family income. Moreover, the young students showed difficulties to understand and

explain the ladies popular knowledge, since they are not used to with the elderly and

therefore do not know their life experiences. Nevertheless, there is an understanding

on the part of these young people, about the existence of a connection between

popular and scholarly knowledge and about the importance of valuing the wisdom of

the elders in more contextualized science learning. There was the promotion of

scientific literacy, facilitating the exploration of interdisciplinary content and the

importance of the role of science in cooking and in society, making clear that the

"dialogical" Paulo Freire education can transform the school into a mutual learning

environment. As a product, a booklet was drawn proposing a different look for

science teaching that allows the Educator to discover the importance of preconditions

that are essential for a more humane educational practice, forming citizens.

Keywords: homemade breads workshop. Intergenerational dialogue. Contextualized

science.

LISTA DE FIGURAS

FIGURA 1 - Pão àzimo .............................................................................................. 53

FIGURA 2 - Obra Social São José Operário ............................................................. 58

FIGURA 3 - Espaço onde se realizou a oficina de panificação ................................. 59

FIGURA 4 - Folder de divulgação da oficina ............................................................. 72

FIGURA 5 - Alunas pincelando pães em crescimento .............................................. 78

FIGURA 6 - Participantes da oficina de panificação. Módulo 1 ................................. 81

FIGURA 7 - Pães produzidos pelas participantes do primeiro módulo da oficina de panificação ................................................................................................................ 81

FIGURA 8 - Participantes da oficina de panificação. Módulo 2 ................................. 84

FIGURA 9 - Bolinha da massa de pão dentro do copo d'água .................................. 85

LISTA DE QUADROS

QUADRO 1 - Significado de percentuais de alguns alcoóis e suas principais utilizações.................................................................................................................. 74 QUADRO 2 - Ação germicida de várias concentrações de álcool etílico em solução aquosa contra o micro-organismo StreptococcusPyogenes. .................................... 75

LISTA DE TABELA

TABELA 1 - Custo de produção para 60 pãezinhos recheados com linguiça defumada .................................................................................................................. 82

LISTA DE SIGLAS CTSA - Ciência, Tecnologia, Sociedade e Ambiente

LDB - Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional

PCN - Parâmetros Curriculares Nacionais do Ensino Fundamental

PCNEM - Parâmetros Curriculares Nacionais do Ensino Médio

SEIAS - Educação Integral e de Assistência Social

SUMÁRIO 1 INTRODUÇÃO ....................................................................................................... 31 1.1 Justificativa e importância do trabalho ........................................................... 31 1.2 Objetivos ............................................................................................................ 35 1.2.1 Objetivo geral ................................................................................................. 35 1.2.2 Objetivos específicos ..................................................................................... 35 2 REFERENCIAL TEÓRICO ..................................................................................... 37 2.1 Introdução .......................................................................................................... 37 2.2 Abordagem, Ciência, Tecnologia, Sociedade e Ambiente (CTSA): relação entre o enfoque CTSA e a pedagogia de Paulo Freire como base para o ensino de Ciências contextualizado. ................................................................................. 42 3 A PRODUÇÃO ARTESANAL DE PÃES CASEIROS: UM TRABALHO VOLUNTÁRIO QUE, POR MEIO DE DIFERENTES CONHECIMENTOS E DIÁLOGO DE GERAÇÕES, BUSCA MELHORAR AS CONDIÇÕES SOCIOECONÔMICAS DE FAMÍLIAS DE BAIXA RENDA....................................... 49 3.1 A história do pão ............................................................................................... 49 3.2 Trabalho voluntário: uma forma de motivar as pessoas a realizarem um trabalho para o bem comum. ................................................................................. 55 3.3 A Obra Social São José Operário: um breve relato histórico do local onde foi realizado o trabalho voluntário. ........................................................................ 57 3.4 Oficina sócio educativa: espaço para diálogo, criatividade, inclusão social e cidadania .................................................................................................................. 59 4 PÃO E CIÊNCIA: CONSTRUINDO RELAÇÕES ENTRE O SABER ESCOLAR E A ELABORAÇÃO DO PÃO ...................................................................................... 63 4.1 Introdução .......................................................................................................... 63 4.2 Saberes populares da culinária do pão e interações com os saberes escolares: contribuição para um ensino de ciências contextualizado numa abordagem CTSA .................................................................................................... 65 5 METODOLOGIA .................................................................................................... 68 5.1 Pesquisa bibliográfica ...................................................................................... 68 5.2 Construindo a oficina de pães caseiros artesanais ....................................... 71 6 RESULTADOS E DISCUSSÕES ........................................................................... 73 6.1 Primeiro módulo ................................................................................................ 73 6.2 Segundo módulo ............................................................................................... 82 7 CONCLUSÕES ...................................................................................................... 89 REFERÊNCIAS ......................................................................................................... 91 APÊNDICE A - Questionário aplicado aos jovens alunos participantes da Oficina de Panificação ............................................................................................ 96 APÊNDICE B - Cartilha: Oficina de Panificação Caseira Artesanal .................... 99

ANEXO A - TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO (TCLE) ... 118 ANEXO B - RECEITAS DOS PÃES PRODUZIDOS .............................................. 120

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1 INTRODUÇÃO

Justificamos a escolha da temática a ser trabalhada pela identificação de

possíveis problemas políticos, sociais e históricos relacionados ao ensino de

ciências e, com base nessa asserção, apresentamos os objetivos do trabalho.

1.1 Justificativa e importância do trabalho

A escolha do tema foi baseada na minha experiência profissional como

docente e no trabalho voluntário que realizei com a professora colaboradora

Claudete Botaro de Matos na Obra Social São José Operário, quando atuei como

professora de Ciências e elaborei um projeto de extensão sócio educativo e sócio

profissional.

Durante os primeiros anos da minha caminhada docente, eram constantes as

preocupações com os aspectos políticos, sociais e históricos que o ensino de

ciências poderia enfocar. Entretanto, naquela época, eu estava atrelada aos

conteúdos programáticos e sem contextualização. Víamos um ensino centrado na

necessidade de fazer com que os estudantes adquirissem conhecimentos

científicos. Não se escondia o quanto a transmissão maciça de conteúdos era o que

importava. Essa forma tradicional de ensino-aprendizagem me fez levantar vários

questionamentos sobre o ensino de ciências e refletir sobre o ensinar e aprender.

Como exemplo, sabemos que a ciência tem várias áreas que podem ser exploradas,

vivenciadas e estudadas na escola. Por que então, muitas vezes, parece algo fora

do contexto da nossa vida? Porque os alunos não compreendem os conceitos

fundamentais da ciência a fim de aplicá-los na vida cotidiana e, assim, se tornar um

sujeito crítico e reflexivo? Por que os alunos não conseguem fazer relação entre

saberes popular e os da escola que, para eles, está bem distante dos seus

cotidianos? Que importância é dada pelo jovem aluno à sabedoria dos mais velhos

como, avós, pais e, até mesmo, os seus professores? Que sentimentos estão

envolvidos durante o processo ensino-aprendizagem que contribuem para melhorar

o convívio entre gerações?

Essas questões me incomodavam muito e as insatisfações ficaram mais

fortes quando passei a coordenar outros professores. Nós ansiávamos por

metodologias mais adequadas para o ensino de Ciências que favorecessem uma

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aprendizagem comprometida com as dimensões sociais, políticas e econômicas que

permeavam as relações entre Ciência, Tecnologia, Sociedade e Ambiente (CTSA).

“Hoje não se podem mais conceber propostas para um ensino de ciências sem

incluir, nos currículos, componentes que estejam orientados na busca de aspectos

sociais e pessoais dos alunos”. (CHASSOT, 2003, p.90). Porém a mudança da

prática pedagógica atual requer várias decisões interligadas, como por exemplo, a

elaboração de uma nova forma de planejar e desenvolver essa prática. Para Silva

(2008), o professor que está insatisfeito com os resultados ineficazes de

aprendizagem obtidos pelo seu trabalho, não deve ficar a espera de novas

determinações vindas de fora do contexto escolar, precisa refletir seu papel e propor

mudanças para melhorar esse sistema do qual faz parte e também é responsável.

Entretanto há vários fatores que matem o professor passivo diante da realidade

vivenciada nas escolas. Loguercio et al., relatam que o profissional que cumpre com

as propostas ditadas pelos livros didáticos e por outras culturas têm dificuldades

para modificar os conteúdos de acordo com suas realidades escolares.

Inseridos numa cultura de, no mínimo, um século de utilização de livros-textos e de conteúdos impostos por outras culturas somadas à desautorização dos professores para gerirem suas próprias práticas pedagógicas é, realmente, muito difícil para o professorado considerar a possibilidade de que esses conteúdos possam não ser os mais indicados para as suas realidades escolares. (LOGUERCIO et al., apud SILVA, 2008, p.15).

O ensino de Ciências é desafiador, porque os alunos precisam compreender

uma massa gigantesca de informações, estruturar esse conhecimento de forma

adequada para torná-lo acessível, e saber relacionar o que aprendem para

compreender, explicar e resolver os mais variados problemas práticos da vida

cotidiana. De acordo com os Parâmetros Curriculares Nacionais do Ensino

Fundamental (PCN Fundamental),

A educação em Ciências Naturais é um componente fundamental na formação do cidadão contemporâneo, pois vivemos em um mundo onde o conhecimento científico e a tecnologia que ele possibilita estão presentes em quase todas as atividades cotidianas, influenciando nosso estilo de vida e nossas possibilidades de participação. Atualmente, um cidadão que não tenha uma cultura científica bem desenvolvida terá muitas dificuldades em construir uma proposta autônoma de sobrevivência, compreendendo o mundo em que vive para inserir-se nas atividades sociais com independência e espírito cooperativo (BRASIL, 1998b, p.57).

33

Nesse sentido, Imbernon et al., (2009), corroboram relatando que os

professores de ensino de Ciências da Natureza não estão preparados para exercer

uma prática educativa que relacione os diferentes saberes buscando a integração do

conhecimento científico ao cotidiano do aluno. Consequentemente tem ocorrido um

grande distanciamento entre o ensino de Ciências observado regularmente na

escola, e a apropriação do conhecimento científico necessário para formação de um

cidadão crítico e participativo. Esse distanciamento é fruto da insistência de um

ensino tradicional que, apesar das tentativas de inovação, ainda é muito forte na

educação atual, principalmente na educação básica. É necessário que novas

estratégias sejam postas em prática, no sentido de minimizarem o desinteresse do

aluno e possibilitarem uma aprendizagem mais efetiva e significativa na Ciência e,

para isso, a participação do professor inovador e reflexivo é imprescindível. Não se

pode, entretanto, colocar exclusivamente a culpa dos problemas do ensino de

ciências nos professores. Há um conjunto complexo de causas, já analisado na

literatura pertinente. Dentre elas, é possível citar os cursos de formação deficientes,

que reforçam a aprendizagem passiva pelo formato expositivo das aulas, de modo

que “os futuros professores tornam-se mais habituados à recepção de

conhecimentos que ajudar a gerá-los”. (CARVALHO; GIL- PÉREZ, 1995, p.69). A

prática educativa precisa da interação dos docentes e discentes em torno de uma

situação que requer o diálogo problematizador que vise o fim efetivo que é a

aprendizagem. De acordo com Freire (2001), a educação problematizadora

caracteriza-se pela intencionalidade, afirmando e fundamentando que alfabetizar é

conscientizar, como capacidade de admirar, objetivar, desmistificar e criticar a

realidade envolvente do mundo no qual o homem ao descobrir-se seu construtor,

descobre-se sujeito da cultura e, como tal, se afirma como sujeito livre contra

qualquer regime de dominação que visa à massificação, numa luta pela

transformação e conquista e efetivação da sua liberdade alcançada pela práxis

(FREIRE, 2006). Além disso, Eric Hobsbawm, um historiador inglês, alerta, no final

do século passado, para o problema que o jovem aluno não valoriza as experiências

vividas pelos mais velhos, não conseguindo encontrar, no presente, perspectivas

para o futuro. E isso ainda persiste nos dias de hoje:

A destruição do passado - ou melhor, dos mecanismos sociais que vinculam nossa experiência pessoal a das gerações passadas - é um dos fenômenos mais característicos e lúgubres do final do século XX. Quase todos os

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jovens de hoje crescem numa espécie de presente contínuo, sem qualquer relação orgânica com o passado público da época em que vivem. [...] (HOBSBAWM apud REBELO; MARTINS; PEDROSA, 2008, p.13).

Inspirados na pedagogia de Paulo Freire e outros autores, que corroboram

com ele, neste trabalho, apresentamos uma proposta que pode servir de orientação

a professores, principalmente aos de Ciências, na realização de práticas

pedagógicas que busquem a aprendizagem contextualizada da ciência numa

abordagem CTSA, a inter-relação entre “saberes populares” e escolares, valorizando

a sabedoria dos mais velhos e os sentimentos envolvidos nas relações

interpessoais. Dessa forma, estaremos educando para que o aluno possa refletir e

criticar o mundo em que vive e, a partir daí, conseguir atuar como agente

transformador da realidade.

Considerando as informações acima e com o intuito de contribuir para a

reflexão e possíveis mudanças no ensino de ciências, elaboramos,testamos e

avaliamos uma oficina de panificação com o intuito de exemplificar para os futuros

professores de Ciências, como escolher conteúdos e práticas docentes, para que o

saber não seja visto apenas como algo a se aprender, mas como compromisso,

como aética, o desenvolvimento humano e a cidadania. Por meio do diálogo entre

gerações, buscamos alavancar valores e atitudes que contribuíram para aumentar a

autoestima dos participantes e facilitar a compreensão de conceitos fundamentais da

Ciência.

Esta pesquisa fundamenta-se na abordagem qualitativa e os dados coletados

foram predominantemente descritivos (ANDRÉ, 1995) e analisados indutivamente.

Como procedimentos de investigação foram utilizados o uso da observação

participante, questionário e entrevista semiestruturada. (LAKATOS; MARCONI,

2007).

A seguir, expõe-se a estrutura da dissertação, dividida em capítulos que serão

descritos resumidamente: o primeiro é esta “Introdução”, na qual relatei parte da

minha vivência profissional, o problema da pesquisa, a sua justificativa e objetivos.

No segundo capítulo, “Referencial teórico” apresentei a fundamentação

teórica utilizada para o desenvolvimento da pesquisa focada na educação

progressista de Paulo Freire, na forma de aprender Ciências de Santos e Mortimer

(2000), com enfoque CTSA. Já no terceiro capítulo, intitulado: “A produção artesanal

de pães caseiros” relatei o significado do trabalho voluntário e sua importância, uma

35

pequena história da Obra Social São José Operário, local onde foi realizado o

trabalho voluntário, a história do pão e, por último, oficina sócioeducativa como

espaço para diálogo, criatividade, inclusão social e cidadania. No quarto capítulo

intitulado: “Pão e Ciência” construí relações entre os “saberes populares” da

culinária do pão e os escolares, buscando resgatar a sabedoria dos mais velhos,

conferindo novos significados aos conhecimentos já adquiridos. No quinto capítulo

descrevi a metodologia utilizada, fazendo referência à amostra, ao instrumento

utilizado nesta investigação, os procedimentos efetuados, de forma a atender aos

objetivos deste trabalho, assim como todo o processo que decorreu desde a

pesquisa bibliográfica até a execução da oficina de panificação. No sexto capítulo,

“Resultados e Discussões” descrevi os resultados e discussões das respostas das

entrevistas, do questionário e das observações anotadas. Em seguida, no sétimo

capítulo intitulado: “Produto” sintetizei os passos da modalidade pedagógica

proposta. E, finalmente, as conclusões recuperaram resumidamente fatos essenciais

nesta pesquisa, enunciando a problemática e explicando, com os resultados

encontrados, o alcance dos objetivos propostos.

1.2 Objetivos

1.2.1 Objetivo geral

Elaborar, aplicar e avaliar uma oficina pedagógica de panificação caseira

artesanal, buscando o intercâmbio entre saberes de gerações diferentes, com o

intuito de viabilizar ações que contribuam para ascensão socioeconômica de famílias

com baixa renda, bem como, oportunizando o jovem a praticar a arte, aprender

ciência contextualizada por meio de uma abordagem CTSA exercendo a cidadania.

1.2.2 Objetivos específicos

a) Contribuir para a ascensão sócia econômica das famílias que estão em

situação de vulnerabilidade social com a produção de pães caseiros.

b) Compreender alguns conceitos fundamentais da ciência por meio dos

saberes popular da culinária do pão, resgatando a sabedoria dos mais velhos

pelo diálogo de gerações.

36

c) Estabelecer interações entre os “saberes populares” e escolares, a fim de

possibilitar ações que contribuam com o ensino de ciências contextualizado

numa abordagem CTSA, buscando a responsabilidade social diante do futuro.

37

2 REFERENCIAL TEÓRICO

O sujeito que se abre ao mundo e aos outros

inaugura com seu gesto a relação dialógica em que se confirma como inquietação e curiosidade, como

inconclusão em permanente movimento na História. (Paulo Freire)

2.1 Introdução

Nas escolas brasileiras, a prática pedagógica tradicional no ensino de

Ciências ainda é muito comum. Essa prática diária sinaliza a ocorrência de um

ensino centrado na figura do professor, que detém a autonomia do conhecimento,

gerando estratégias repetitivas, geralmente com aulas expositivas tradicionais. Os

professores depositam os conhecimentos nos alunos e nas alunas, narrando-os e

conduzindo-os à memorização mecânica dos conteúdos narrados, dificultando o

desenvolvimento do pensamento crítico do aluno, Segundo Freire (2001),essa

concepção “bancária” serve como instrumento de opressão.

A narração, de que o educador é o sujeito, conduz os educandos à memorização mecânica do conteúdo narrado. Mais ainda, a narração os transforma em “vasilhas”, em recipientes a serem “enchidos” pelo educador. Quanto mais vá “ enchendo”os recipientes com os seus “depósitos”,tanto melhor educador será.Quanto mais se deixem docilmente “encher”, tanto melhores educandos serão. (FREIRE, 2001, p.58)

Paulo Freire (2006) destaca o diálogo como a forma mais segura para a

educação e a libertação de todos os homens e todas as mulheres, opressores e

oprimidos. A forma imperativa de transmissão do conhecimento, característica do

modelo tradicional, só faz, segundo ele, reforçar a dominação cultural e política,

impedindo a conscientização dos homens e das mulheres. A “educação

problematizadora” ou “educação para a liberdade”, conforme propõe Paulo Freire,

ocorre numa relação horizontal, onde educador e educando estabelecem constante

diálogo, para que o último tenha consciência de que não apenas está no mundo, e

sim, com o mundo, buscando transformar a realidade.

O diálogo para Freire (2006) é um instrumento de libertação, sendo definido

dentro de uma linha ideológica e política. A educação dialógica freiriana se opõe à

concepção educacional bancária, de simples transferência de conhecimentos, e

valoriza a participação autônoma dos estudantes na construção de seus percursos

38

de aprendizagem.

O diálogo freiriano possui cinco pressupostos que norteiam a comunicação

educador-educando: amor, humildade, fé nos homens, esperança e um pensar

crítico.

Esses elementos estão na base de uma educação dialógica e

problematizadora. Paulo Freire não oculta o senso de afetividade de sua pedagogia.

Sem excluir a cognoscibilidade, a necessidade de formação científica e o domínio

técnico do educador, Freire (2007) compreende o querer bem aos educandos como

algo que dá sentido à prática educativa. É o que faz do educador um formador, mais

do que um treinador ou transferidor de saberes. De acordo com Freire (2006, p.42):

“Não há diálogo se não há um profundo amor ao mundo e aos homens”. Nesse

sentido, há que se valorizarem os conhecimentos, a cultura e as necessidades do

ser humano no exercício de uma pedagogia libertadora.

A humildade, segundo fundamento da educação dialógica, representa a

aceitação do outro, a capacidade de ouvi-lo, e um profundo respeito por suas ideias

e pensamentos. Sobre essa atitude, Freire (2006) afirma: “A pronúncia do mundo,

com que os homens o recriam permanentemente, não pode ser um ato arrogante”

(FREIRE, 2006, p. 92). Nesse tipo de interação, a autossuficiência dá lugar à

humildade, o que significa estar aberto às contribuições do outro. Dialogar implica no

desenvolvimento da capacidade de compreender-se mutuamente, da construção de

um saber coletivo. Assim, os sujeitos dialógicos aprendem e crescem nas diferenças

e no respeito a elas.

De acordo com Freire (2006), o diálogo também envolve fé nos homens: “[...]

fé no seu poder de fazer e de refazer. De criar e recriar. Fé na sua vocação de ser

mais, que não é privilégio de alguns eleitos, mas direito dos homens” (FREIRE,

2006, p. 93). Para Paulo Freire, o homem dialógico acredita no potencial do outro,

dando-lhe sempre a oportunidade de se colocar, de se posicionar criticamente,

jamais cerceando a liberdade de expressão de seu interlocutor. Isso se opõe à

chamada educação bancária, em que o educador se limita a depositar seus

conhecimentos nos educandos, tirando destes e de si próprio a oportunidade de um

aprendizado coletivo. Freire (2007) fala em educabilidade quando se refere a essa

capacidade do ser humano de aprender sempre, de crescer, de desenvolver-se no

contato com o outro. Trata-se de uma educabilidade não somente para se adaptar a

uma dada realidade, mas para nela intervir, recriando-a e transformando-a.

39

Outro pilar da educação dialógica é a esperança. “A esperança está na

própria essência da imperfeição dos homens, levando-os a uma eterna busca. Tal

busca, como já vimos não se faz do isolamento, mas na comunicação entre os

homens” (FREIRE, 2006, p. 94, 95). Na visão de Paulo Freire, o ser humano se

encontra num estado de permanente construção, a qual não pode ser feita

isoladamente, mas no diálogo entre os homens. O isolamento e a desesperança

levam-nos a um estado de estagnação, prejudicial ao seu desenvolvimento.

Por último, Freire (2006) defende o pensar crítico como um requisito

indispensável à educação dialógica. Os indivíduos envolvidos no diálogo devem

exercitar uma reflexão sobre a realidade que os cerca em uma atitude de não

conformidade. Conscientes de sua condição presente tornam-se aptos a lutar contra

o processo de desumanização, o que favorece uma transformação constante, tanto

objetiva (do mundo) quanto subjetiva (de si próprio). De acordo com Freire (2006),

essa postura crítica consiste em uma atitude de perceber a realidade como

processo, apreendendo-a em seu estado dinâmico e não como um produto, algo

acabado.

Portanto, o diálogo é formulado como eixo e “selo da relação gnosiológica”

(FREIRE, 1998, p.6). Nessa metáfora, percebe-se a importância do diálogo, que

caracteriza a relação pedagógica: o diálogo é o sinal, o distintivo que deve marcar a

produção do conhecimento na escola. É tanto que o título da sétima carta propõe:

“de falar ao educando a falar a ele e com ele; de ouvir o educando a ser ouvido por

ele”. A troca comunicacional, que tanto permite a autoridade própria da competência

docente quanto à participação ativa do alunado, integrando seus saberes, é

indispensável para evitar-se seja o autoritarismo, seja a licenciosidade.

Ela [a educadora democrática] sabe que o diálogo não apenas em torno dos conteúdos a serem ensinados, mas sobre a vida mesma, se verdadeiro, não somente é válido do ponto de vista do ato de ensinar, mas formador também de um clima aberto e livre no ambiente de sua classe. Falar a e com os educandos é uma forma despretensiosa, mas altamente positiva que tem a professora democrática de dar, em sua escola, sua contribuição para a formação de cidadãos e cidadãs responsáveis e críticos (FREIRE, 1998, p.87).

De acordo com Freire (1998), a efetiva participação do aluno na obtenção do

conhecimento é uma das chaves para que passe de seu comportamento de

passividade à responsabilidade pelo próprio aprendizado:

40

Estimular a pergunta, a reflexão crítica sobre a própria pergunta, o que se pode pretende com esta ou com aquela pergunta em lugar da passividade em face das explicações discursivas do professor, espécies de respostas a perguntas que não foram feitas. Isto significa realmente que devamos reduzir a atividade docente em nome da defesa da curiosidade necessária, a puro vai-e-vem (sic) de perguntas e respostas, que burocraticamente se esterilizam. A dialogicidade não nega a validade de momentos explicativos, narrativos em que o professor expõe ou fala do objeto. O fundamental é que o professor e alunos saibam que a postura deles, do professor e dos alunos, é dialógica, aberta, curiosa, indagadora e não apassivada, enquanto fala ou enquanto ouve. O que importa é que professor e alunos se assumam epistemologicamente curiosos. (FREIRE, 1998, p.94).

O respeito ao conhecimento prévio que o educando possui é de fundamental

importância, para que se possa propor, e nunca, impor o que, e como será

desenvolvido o trabalho em sala de aula.

Nesse contexto, Santos observa que:

um dos maiores problemas no ensino de Ciências decorre na maioria das vezes, da falta de sentido que os conteúdos científicos apresentam para o aluno e da ausência de uma conexão lógica entre os conteúdos desenvolvidos teoricamente e o mundo real em que vive o aluno. (SANTOS apud IMBERNON et al., 2009, p. 79-89).

Corroborando com Freire (1998), Vigostky (2001), afirma que construir

conhecimento decorre de uma ação partilhada, que implica num processo de

mediação entre sujeitos. Nessa perspectiva, a interação social é condição

indispensável para a aprendizagem. A heterogeneidade do grupo enriquece o

diálogo, a cooperação e a informação, ampliando consequentemente as

capacidades individuais.

O conhecimento deve ser expresso de forma consciente e deliberada e não

apenas repetida. De acordo com Vigostky:

Quando uma palavra nova, ligada a um determinado significado, é aprendida pela criança, o seu desenvolvimento está apenas começando; no início ela é uma generalização do tipo mais elementar que, à medida que a criança se desenvolve, é substituída por generalizações de um tipo cada vez mais elevado, culminando o processo na formação dos verdadeiros conceitos. (VIGOSTKY, 2001, p43).

Reafirmando as ideias de Freire (1998) e Vigostky (2001), Mortimer e

Machado (2001) relatam que a ausência de diálogo entre a realidade criada pela

ciência e a realidade da vida cotidiana, entre linguagem científica e a linguagem

41

cotidiana, não possibilita ao aluno rever seu conhecimento à luz das novidades que

aprende nas aulas de ciências. Não há, também, diálogo entre teorias científicas e

os fenômenos, entre os princípios científicos e os contextos sociais e tecnológicos

em que eles se materializam. Tudo isso torna a ciência escolar algo desinteressante

e sem sentido para a grande maioria dos estudantes.

Para Mortimer (2000), a aprendizagem de Ciências é um processo de

“enculturação”: “Aprender Ciências está muito mais relacionado a se entrar num

mundo que é ontológica e epistemologicamente diferente do cotidiano.”

(MORTIMER, 2000, p. 27).

Entende-se que aprender Ciências é um processo pelo qual um aluno entra

numa cultura diferente da sua, com uma linguagem própria, e toma consciência das

diferenças e das relações entre a linguagem da ciência e outras formas de falar e

compreender o mundo.

Mortimer (2000) utiliza o termo “enculturação científica” para designar o

objetivo do ensino de Ciências que almeja a formação cidadã dos estudantes para o

domínio e uso dos conhecimentos científicos e seus desdobramentos nas mais

diferentes esferas da vida.

Considerando-se o princípio do diálogo proposto por Freire (2006), constata-

se que a construção de conceitos em Ciências pelo aluno requer uma comunicação

eficiente do professor. Consequentemente esse diálogo, quando realizado numa

proposta pedagógica problematizadora que promova a autonomia e a criação,

requer que ocorra embasamento efetivo na construção de conteúdos teóricos e na

aplicabilidade dos conceitos no cotidiano do aluno. Porém, segundo Vigotsky (2001),

a relação entre aprendizagem e desenvolvimento remete ao entendimento da

relação entre os conceitos científicos e os conceitos espontâneos da criança: “o

desenvolvimento dos conceitos científicos deve apoiar-se forçosamente em um

determinado nível de maturação dos conceitos espontâneos.” (VIGOTSKY, 2001,

p.64).

Ressalta-se que “as aulas práticas podem ajudar neste processo de interação

e no desenvolvimento de conceitos científicos, além de permitir que os estudantes

aprendam como abordar objetivamente o seu mundo e como desenvolver soluções

para problemas complexos” (LUNETTA apud PRIGOL; GIANNOTTI, 2008, p. 3).

Numa oficina pedagógica, processo e produto compõem uma unidade

dialética. A modalidade de um processo educativo influencia na qualidade de seus

42

resultados. Na oficina deve-se preocupar com a adequação e a sequência dos

passos a serem dados para que se chegue ao objetivo proposto.

Contudo, Delizoicov destaca que “[...] na problematização, as situações reais,

conhecidas e vivenciadas pelos participantes de uma dada temática são

apresentadas para os estudantes manifestarem suas ideias e concepções a

respeito.” (DELIZOICOV apud FREITAS FILHO, 2010, p. 72). Dessa forma, o

professor vai conhecendo o pensamento dos alunos, problematizando o

conhecimento exposto por eles e selecionando aqueles necessários para a

compreensão da problematização inicial.

Entretanto

os aspectos pedagógicos da aplicação de ocasiões práticas e/ou concretas para a compreensão de conceitos partem do princípio de que o aluno só aprende aquilo que, de uma forma ou outra, venha a modificar seu comportamento e integrar sua personalidade. Trata-se, pois, de fazer o aluno participar e apropriar-se daquilo que lhe é ensinado, possível somente quando o ensino reflete as suas necessidades reais. (SANTOS apud IMBERNON et al., 2009, p.79-89).

Para Freire (2006), é o diálogo que possibilita o conhecimento do mundo, da

natureza e do social. É nas relações dialógicas que os indivíduos desenvolvem suas

ideias, sua visão de mundo, contrapondo suas concepções pessoais com as de seus

semelhantes. Portanto é possível pensar num ensino mais dialógico,

contextualizado, ético e político.

2.2 Abordagem, Ciência, Tecnologia, Sociedade e Ambiente (CTSA): relação

entre o enfoque CTSA e a pedagogia de Paulo Freire como base para o ensino

de Ciências contextualizado.

Se desejamos preparar os alunos para participar ativamente de decisões da sociedade, precisamos ir além do ensino conceitual, em direção a uma educação voltada para a ação social responsável, em que haja preocupação com a formação de atitudes e valores. (SANTOS; MORTIMER, 2001).

Nas décadas de 60 e 70, o desenvolvimento social e econômico geraram

insatisfações por parte dos estudantes e da própria sociedade, determinando novas

propostas de ensino.

43

Descobriu-se que o desenvolvimento científico e tecnológico não

correspondia a uma relação linear com o bem-estar social, e muito menos que o

cientificismo fosse capaz de resolver as grandes questões éticas, sociais e políticas

da humanidade. A ciência deixa de ser encarada como uma atividade neutra ou de

responsabilidade exclusiva de uma pequena elite social. A sociedade

corresponsabiliza os cientistas pelas agressões sociais e ambientais. Santos e

Mortimer afirmam:

O movimento CTS surgiu, então, em contraposição ao pressuposto cientificista, que valoriza a ciência por si mesmo, depositando uma crença cega em seus resultados positivos. A ciência era vista como uma atividade neutra de domínio exclusivo de um grupo de especialistas, que trabalhava desinteressadamente e com autonomia na busca de um conhecimento universal, cujas consequências (sic) ou usos inadequados não eram de sua responsabilidade. A crítica a tais concepções, responsabilidades e cumplicidades dos cientistas, enfocando a ciência e tecnologia como processos sociais. (SANTOS; MORTIMER, 2001, p.95).

O ensino de Ciências focado para a formação de atitudes cidadãs precisa,

além de desenvolver a compreensão de conceitos, aplicar os saberes adquiridos

para outras questões de caráter social, ambiental e tecnológico, uma vez que os

avanços dos conhecimentos científicos e tecnológicos repercutem de modo incisivo

nas sociedades modernas, influenciando também a escola e o seu público.

A contextualização tem sido utilizada no ensino para relacionar os

conhecimentos escolares com o contexto real do aluno. O ensino baseado nessa

perspectiva teve sua origem com o movimento CTS, na década de setenta, devido à

decorrência do impacto da ciência e da tecnologia na sociedade moderna, e também

a uma mudança de visão sobre a natureza da ciência e o seu papel na sociedade.

(SANTOS; SCHNETZLER apud MARCONDES et al., 2009).

Dessa forma, o ensino deveria se preocupar, além da construção de

conceitos, também com os impactos sociais relativos à aplicação da ciência e das

tecnologias para a formação cidadã. A implantação do movimento CTS, com a

intenção de propiciar um ensino com caráter interdisciplinar e contextualizado,

solicitou a adequação de materiais didáticos e, principalmente, a formação de um

novo perfil de educador preocupado com a pesquisa didática e com a interação do

ensino, cidadania e desenvolvimento sustentável. Surge, então, na década de

noventa, a preocupação com as questões ambientais e suas relações com a

44

Ciência, a Tecnologia e a Sociedade, surgindo o movimento CTSA (Ciência,

Tecnologia, Sociedade e Ambiente).

No Brasil, para guiar a prática docente e orientar a reconstrução curricular, o

Ministério da Educação, com a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional

(LDB), contida nos Parâmetros Curriculares Nacionais do Ensino Médio (PCNEM)

(BRASIL, 1996; BRASIL, 1999), orienta para a relevância de promover a interação

do aluno com a ciência e a tecnologia em todas as dimensões da sociedade,

oportunizando-lhe uma concepção ampla e social do contexto científico e

tecnológico e sugerindo a necessidade do desenvolvimento de valores e

competências para a formação do cidadão.

[...] desenvolver valores e competências necessárias à integração de seu projeto individual ao projeto da sociedade em que se situa; o aprimoramento do educando como pessoa humana, incluindo a formação ética e o desenvolvimento da autonomia intelectual e do pensamento crítico; a preparação e orientação básica para a sua integração ao mundo do trabalho, com as competências que garantam seu aprimoramento profissional e permitam acompanhar as mudanças que caracterizam a produção no nosso tempo; o desenvolvimento das competências para continuar aprendendo, de forma autônoma e crítica, em níveis mais complexos de estudos. (BRASIL, 1999, p. 23)

Santos e Mortimer (2001) argumentam que a necessidade de se estabelecer

controle social da ciência e da tecnologia foi fator determinante das mudanças nos

objetivos do ensino de ciências, que passa a buscar a preparação dos estudantes

para que possam atuar como cidadãos capazes de acompanhar a dinâmica social e

atender às demandas relacionadas ao desenvolvimento científico-tecnológico.

A ciência não é uma atividade neutra e o seu desenvolvimento está diretamente imbricado com os aspectos sociais, políticos, econômicos, culturais e ambientais. Portanto a atividade científica não diz respeito exclusivamente aos cientistas e possui fortes implicações para a sociedade. Sendo assim, ela precisa ter um controle social que, em uma perspectiva democrática, implica em envolver uma parcela cada vez maior da população nas tomadas de decisão sobre Ciência e Tecnologia. (SANTOS; MORTIMER, 2001, p. 96).

O principal objetivo do currículo CTSA é o letramento científico, tecnológico e

a importância das questões ambientais no ensino e suas relações com Ciência,

Tecnologia e Sociedade, ou seja, promover a educação científica e tecnológica dos

cidadãos, auxiliando o aluno a construir conhecimentos, habilidades e valores

vinculados aos interesses coletivos, como solidariedade, fraternidade, consciência

45

do compromisso social, reciprocidade, respeito ao próximo e generosidade,

necessários para tomar decisões e agir com responsabilidade social, conforme

Santos e Mortimer (2001).

Essa abordagem CTSA deve produzir transformações, levando o ensino a

formar pessoas críticas na sociedade. Devido às interações existentes entre a

abordagem CTSA e o cotidiano dos alunos, o ensino de Ciências, nessa

perspectiva, passa a representar a importante estratégia de inclusão dos indivíduos

na sociedade, como agentes ativos de mudanças e não simplesmente como

espectadores.

É fundamental transformar a educação científica num processo que permite aos alunos a leitura do mundo e a interpretação / reflexão sobre os acontecimentos presentes em nossa dura realidade. Não faz sentido concebermos uma educação científica que não contemple os problemas dessa sociedade se fechando num compartimento isolado onde só existem conceitos, fórmulas, algoritmos, fenômenos e processos, a serem memorizados acriticamente pelos educandos. (TEIXEIRA, 2002, p. 101).

É papel da escola, desenvolver nos estudantes, o pensamento crítico,

permitindo sua imersão não apenas nos aspectos conceituais da ciência, mas

possibilitando estabelecer relações desses com os outros de natureza social,

política, econômica e ambiental, interagindo a aprendizagem da ciência com as

questões problemáticas do meio em que estão inseridos. A introdução da

abordagem CTSA nas aulas de Ciências possibilita romper com a imagem neutra da

ciência. Com isso, melhora a capacidade crítica, ajudando na resolução de

problemas de ordem pessoal e social, permitindo maior consciência das interações

entre Ciência, Tecnologia, Sociedade e Ambiente e contribuindo para o

envolvimento mais atuante do aluno nas questões de ordem social, política,

econômica e ambiental.

O ensino de Ciências pode facilitar muito essa perspectiva. Segundo Santos e

Mortimer (2001), a contextualização pode ser entendida como uma estratégia

pedagógica para o ensino de conceitos científicos. Nesse caso, parte-se do

pressuposto de que a inserção de conteúdos socialmente relevantes facilite a

aprendizagem ou motive os estudantes a estudarem Ciências. Em outra perspectiva,

a contextualização é vista como princípio norteador no processo de ensino, onde os

contextos de estudo são objetos de conhecimento tão ou mais importantes que os

conceitos científicos.

46

Os conhecimentos tecnológicos e científicos devem possibilitar o

entendimento de questões sociais. Assim, o conhecimento científico a ser estudado

é definido em função do contexto social e tecnológico, para permitir ao aluno a

tomada de decisão sobre tais questões. Nessa visão, a compreensão da ciência e

da tecnologia e seus aportes sobre a sociedade darão subsídios para que o aluno vá

construindo conhecimentos, entendimentos e visões do mundo físico.

O êxito de aulas contextualizadas, segundo tais direcionamentos, pode ser

alcançado também com oficinas pedagógicas. A perspectiva CTSA revela a

importância de ensinar a resolver problemas, confrontar pontos de vista e analisar

criticamente argumentos, envolvendo atividades de investigação que privilegiem a

integração de inter-relações CTSA, podendo contribuir para o desenvolvimento de

capacidades, atitudes e competências que dificilmente seriam desenvolvidas em

abordagens baseadas em modelos tradicionais de ensino (CARVALHO, 2001).

Como educadores, precisamos estar constantemente reavaliando e nos

reeducando para contemplar novas possibilidades no contexto histórico que se

apresenta. A (re) construção de um currículo escolar nos remete, inicialmente, a um

olhar para aquilo que já fazemos. Depois precisamos perceber o que ainda é

possível fazer para, só então, propor novas alternativas e apontar novos rumos. É na

percepção do que antes não fora visto e percebido e na interação disso com o

mundo dos homens que a ciência busca evoluir. Ao se perceber o novo, não se

abandona o velho conhecimento e as velhas práticas, mas se reconstrói numa nova

perspectiva, num novo enfoque. Ao repensar a forma como encaramos os

conhecimentos do mundo das Ciências Naturais, estamos repensando a nossa

percepção do mundo, onde não é a objetividade nem a subjetividade que levam ao

conhecimento, mas a inter-relação entre sujeitos inseridos num meio social, num

contexto vivido e, portanto, cheio de significados. E, então, perceber que os

conhecimentos do mundo das ciências são construções humanas que se constituem

como um conjunto de paradigmas compartilhados por uma comunidade científica

aonde, na interlocução de sujeitos, chega-se ao consenso, sem verdades absolutas.

É perceber, ainda, que, ao ensinar essa ciência, não podemos fazê-lo como

imposição de verdades.

A socialização do conhecimento científico busca ir ao encontro da promoção

do bem comum e da melhoria da qualidade de vida para todos. Se for utopia,

busquemos construir no diálogo de saberes essa utopia. Hoje, passamos a perceber

47

a ciência de forma diferente e “os cidadãos comuns passam a cobrar o acesso à

informação e a contestar a antes irrefutável autoridade dos cientistas para

determinar o que é o melhor para o futuro de cada comunidade”. (MORTIMER,

1998, p. 108)

O acesso dos sujeitos a um saber sistematizado, não significa que eles

precisam abrir mão de um saber fazer e um saber ser que construíram na

cotidianidade da vida. O mais importante é a construção de uma visão de ensino de

Ciências associada à formação científico-cultural dos alunos, à formação humana

centrada na discussão de valores.

Assim, um ensino de Ciências em CTSA busca não só uma autonomia

discente como docente, legitimado por um olhar mais cuidadoso sobre o papel

científico nas questões sociais, onde, de acordo com Teixeira (2003), é necessário

construir: “[...] um novo perfil de educadores, que tenham visão mais ampla do papel

da escola na sociedade, como real instrumento para converter os súditos em

cidadãos, e para edificar uma nova realidade: justa, humana e, democrática [...]”.

(TEIXEIRA, 2003, p.188).

É dever de todos que se encontram envolvidos de alguma forma com a

educação e, mais especificamente, do ensino de Ciências e Tecnologia, buscar

alternativas dentro e fora das escolas, a fim de debater e articular propostas

pedagógicas que visem à construção da cidadania e ao exercício de princípios de

justiça social, almejando a transformação da sociedade.

A abordagem educacional CTSA comunga com a educação progressista de

Paulo Freire em vários pontos que são dinâmicos, porque dialogam entre si.

Ressalto:

a) Abordagem temática e seleção de conteúdos e materiais didáticos:

Tanto a abordagem educacional CTSA, quanto o método de investigação

temática proposto por Freire rompem com o tradicionalismo curricular do ensino de

Ciências, uma vez que a seleção de conteúdos se dá a partir da identificação de

temas que contemplam situações cotidianas dos educandos.

48

b) A perspectiva interdisciplinar do trabalho pedagógico e o papel de formação

de professores:

A metodologia da investigação temática de Freire (2006) requer a participação

de uma equipe interdisciplinar composta por professores das diversas disciplinas

escolares e por outros profissionais, como, por exemplo: assistentes sociais,

psicólogos, entre outros. A abordagem CTSA também ressalta a importância da

discussão de temas sociais a partir de um enfoque interdisciplinar. De acordo com

Teixeira (2003) “a grande preocupação com estratégias de ensino que efetivamente

promovam a interdisciplinaridade e a contextualização é uma das proposições do

movimento CTS (Ciência, Tecnologia e Sociedade)” (TEIXEIRA, 2003, p. 99).

c) O papel do educador no processo de ensino-aprendizagem e na formação

para o exercício da cidadania:

As propostas de Freire e as abordagens CTSA requerem um novo tipo de

profissional da educação já que, na concepção dialógica de educação, ele deixa de

depositar conteúdos na cabeça dos educandos, para assumir o papel de catalisador

do processo de ensino e aprendizagem. De acordo com essa concepção, “o

educador já não é o que apenas educa, mas o que, enquanto educa,é educado, em

diálogo com o educando que, ao ser educado, também educa”. (FREIRE, 1976,

p.78).

A figura de um professor que estimula a aprendizagem dos educandos

também se encontra presente nas abordagens CTSA.

Essas relações teóricas existentes entre as duas propostas asseguram uma

base educacional sólida e coerente para o enfoque CTSA e, por outro lado, para o

método freiriano, efetivam a contemplação de temas atuais de dimensão social,

política e econômica.

Nesse contexto, desenvolvemos um trabalho que devolva aos alunos o

interesse pela produção do conhecimento, desenvolvendo valores de respeito,

solidariedade, humildade e amor, popularizando o conhecimento científico pelo seu

uso social como formas elaboradas de resolver problemas humanos.

49

A PRODUÇÃO ARTESANAL DE PÃES CASEIROS: UM TRABALHO

VOLUNTÁRIO QUE, POR MEIO DE DIFERENTES CONHECIMENTOS E

DIÁLOGO DE GERAÇÕES, BUSCA MELHORAR AS CONDIÇÕES

SOCIOECONÔMICAS DE FAMÍLIAS DE BAIXA RENDA

3.1 A história do pão

Fica permitido que o pão de cada dia tenha no homem o sinal do seu suor. Mas que, sobretudo tenha sempre o quente

sabor da ternura. (MELLO, 2001)

É estimado que o pão surgiu à 12 mil anos na Mesopotâmia junto ao cultivo

do trigo. Era feito de farinha misturada com o fruto do carvalho. Os primeiros pães

eram achatados, duros, secos e muito amargos. Para ser ingerido, “o pão era lavado

várias vezes em água fervente e depois era assado sobre pedras ou embaixo de

cinzas.” (CANELLA-RAWLS, 2012, p. 36)

Conhecer a história do Pão é conhecer também a dos povos antigos, que

edificaram sua economia, religião e política em torno desse alimento. Desde os

primórdios da humanidade, os grãos têm sido muito importantes para a alimentação

humana. Segundo Jacob, 2003, caçadores mastigavam grãos encontrados na

natureza, como o trigo, a cevada, o arroz ou milho e esses grãos faziam parte da

dieta básica de nossos ancestrais, mas eram sem sabor e rústicos.

Jacob (2003), afirma que o trigo que cresceu no Egito não era ainda a

variedade de cereal que hoje cobre amplas regiões dos Estados Unidos, do Canadá

e da Rússia. Era uma forma mais primitiva. Só mais tarde os romanos

desenvolveram outras variedades a partir dessa, tendo depois cultivado uma delas

extensivamente no Egito. Aos romanos fica-se a dever, mais do que aos egípcios, o

fato de essa nova variedade de trigo se ter imposto como espécie dominante ao

redor do mar Mediterrâneo. A partir daí, a luz da história passa a ser um sol límpido

a refletir-se sobre as searas, e as variadas vicissitudes do cereal nos são

conhecidas. Em certa altura, deu-se um acontecimento estranho, comparável a uma

revolta de escravos e que havia de assinalar o aparecimento do centeio como cereal

alternativo ao trigo. No Ponto, à beira do Mar Negro, região de grandes searas de

trigo, os grãos eram carregados nos barcos que os haviam de levar para o sul da

Rússia. Num dos carregamentos, sem que se desse por isso, seguiram, à mistura

50

com o trigo, grãos de uma erva silvestre, à qual ninguém dava importância. Quando

se procedeu à semeadura num terreno que era demasiado árido para o trigo,

sucedeu um fato espantoso. O trigo dava-se mal, mas a dita erva silvestre vingou

sem dificuldade. Era o centeio que assim vinha ter com o homem, oferecendo-se à

domesticação. Nascia aí, então, um novo estilo de vida: era o conforto de ter os

grãos dos cereais selvagens à mão, dando-lhes tranquilidade por ser uma

alimentação. A vida tornou-se mais segura: evitaram as constantes perdas

humanas, o perigo sempre presente, a incerteza de ter ou nãouma refeição. Nascia

uma nova proposta que trouxe uma expectativa de vida mais longínqua e de melhor

qualidade. A antropologia nos revela que até os mais velhos, os doentes, as

mulheres, ganharam muito com isso, pois não foram vistos como empecilhos nos

seus trânsitos.

As relações entre homens e mulheres, velhos e novos modificaram-se, com o aparecimento de outros estatutos, ocasionando uma nova hierarquia. A presença de velhos nas sociedades deu origem à “nascença”de mais memórias,de tradições,de experiências,de verdadeiras raízes culturais.Iniciou-se uma cultura,e não será por acaso que assim se chama também o ato de trabalhar a terra para o nascimento dos cereais: nasceram,ao mesmo tempo,a cultura dos povos e a cultura das plantas. (SARAMAGO, 1997, p.119).

Para Jacob (2003), o homem reconheceu inteligentemente a oportunidade e,

em quase dois séculos, o centeio estava transformado em planta doméstica e dava

grandes colheitas em solos que pareciam estar exaustos pela produção de trigo. Na

sua fulgurante carreira, o centeio, com a ambição e a exuberância da juventude,

chegou mesmo a conquistar a França e a Inglaterra que, mais tarde, haviam de

voltar a serem territórios dominados pelo trigo. Aquilo a que chamamos de pão não

se consegue fazer com sorgo, aveia ou cevada. Assim, a história do pão assenta

fundamentalmente no trigo e no centeio.

Canella-Rawls (2012) relata que a palavra pão vem do latim “panis”. Sua

origem é muito diversificada: antes, a farinha fez escola, primeiro foi utilizada no

preparo de sopas e mingaus, depois passou a ser misturada no mel, azeite doce,

mosto de uva, tâmaras esmagadas, ovos e carnes moídas; dessas misturas

surgiram os bolos, que teriam precedido o pão.

De acordo com Jacob (2003), o pão, no sentido técnico da palavra, é uma

descoberta química. O pão é um produto obtido por cozedura no forno, feito a partir

51

de uma massa de farinha que é aglutinada e levedada por um fermento ou outro

agente semelhante.

O fermento foi descoberto por acaso. Segundo contam, um pedaço de massa

esquecida por alguém por mais tempo do que o necessário para concluir sua

confecção, exposto ao calor e à umidade, antes de colocá-la para assar, cozer, foi o

bastante. Ela, a farinha umedecida, entrou em processo de fermentação

espontânea: ganhou volume, ficou mais macia, mudou seu sabor. Foi assim que se

descobriu o princípio básico do pão. Essa lenda, de acordo com Jacob, 2003,

nasceu no Egito, precisamente às margens do rio Nilo, por volta de 2600 a. C. e, por

volta de 1750 a. C., os egípcios passaram a empregar, nas massas, o levedo de

cerveja, depois inventaram outros produtos, já químicos, para auxiliar no

crescimento das massas. Para Canella-Rawls (2012), só a química moderna pôde

determinar o que é exatamente o processo de fermentação. Fermentar é fazer

crescer uma massa pelo uso de material químico e/ou biológico que produza gás

dióxido de carbono. São vários os agentes expansores que podem ser combinados

para fazer a massa crescer, por exemplo: o vapor de água, o ar,o gás carbônico.

O ar contém uma quantidade enorme de micro-organismos que estão apenas

à espera de encontrar uma superfície onde possam alimentar-se. Foram

precisamente esporos e fungos de levedura que se lançaram sobre os restos de

açúcar contidos na mistura de água do Nilo e de farinha: em consequência da ação

desses micro-organismos, o açúcar divide-se em gás carbônico e álcool. As bolhas

do gás carbônico não conseguem escapar pelo material enrijecido na superfície e

fazem inchar a massa tornando-a fofa. Durante a cozedura, o gás carbônico e o

álcool acabam por escapar de fato. Este último que é tão importante no processo de

confecção da cerveja desaparece completamente na panificação. Já o gás carbônico

deixa seu vestígio na porosidade interior do pão. Os gases que se produzem no

interior da massa procuram libertar-se, mas os poros na superfície vão-se tornando

progressivamente mais rígidos por ação do calor.

Nessa altura, forma-se, então, a casca que envolve todo o miolo. Ora,

acontece que, de fato, só a massa de farinha de trigo e de centeio é capaz de conter

a saída dos gases, por razões que têm a ver com propriedades específicas das

proteínas desses dois cereais. O pão assim obtido com a utilização de um fermento,

pão que triunfou sobre todas as tentativas de substituí-lo por pasta de cereal ou por

bolos de farinha sem levedação, à maneira dos povos mais primitivos, está ligado à

52

civilização ocidental há seis mil anos. Nenhum outro produto, antes ou depois da sua

descoberta, dominou o mundo antigo, material e espiritualmente, como o pão foi

capaz de fazer. Os egípcios é que o inventaram e edificaram toda a vida

administrativa do país em torno dessa invenção, e os judeus, que transformaram o

pão em ponto de partida da legislação religiosa e social. Vieram depois os gregos e

criaram as mais profundas e mais solenes lendas para a sua igreja do pão, em

Elêusis. Jacob (2003) afirma que os romanos fizeram do pão o instrumento da sua

política: dominavam com o pão, conquistaram o mundo então conhecido por meio do

pão e foi ainda por causa do pão que voltaram a perder o Império. Até que um dia,

um homem surgiu e unificou tudo o que sobre o pão havia sido pensado, tudo o que

por causa dele tinha sido sentido e feito. E esse homem, Jesus Cristo, disse: “Tomai

e comei! Eu sou o pão [...]” (MATEUS, 26,26).

No mundo antigo, os egípcios eram chamados de “comedores de pão”.

Contudo, o pão era não só o alimento principal de todos, mas também uma unidade

de cultura, uma unidade de medida segundo a qual se organizavam a contagem. O

“número de pães” significava a riqueza e os fornos de pães espalhados pelo país

eram quase comparáveis a oficinas de produção de moedas.

O povo de Israel conheceu o pão no contato que teve com os egípcios.

Segundo o relato bíblico, a saída dos filhos de Israel do Egito foi tão apressada que

não tiveram tempo de confeccionar completamente o pão, que era preparado à

maneira egípcia, ou seja, amassado para ir ao forno: “E o povo levou a sua farinha

amassada antes de levedar, e sobre os ombros das suas amassadeiras envoltas

nos seus mantos”. Saíram em grande pressa. “E cozeram a farinha amassada com

que tinham saído do Egito em bolos sem fermento, pois não tinham fermento.

Tinham, na verdade, sido expulsos do Egito e não puderam demorar-se; nem sequer

fizeram provisões para si”. Então, Moisés disse ao povo: “Recordai-vos deste dia em

que saístes do Egito, da casa da servidão, pois foi com mão forte que o Senhor vos

fez sair daqui. Não se comerá pão fermentado”. Este dia deveria daí em diante, ser

celebrado anualmente na semana da páscoa hebraica: “Durante sete dias comer-se-

ão pães sem fermento, e no sétimo dia haverá uma festa em honra do Senhor[...]

observareis esta prescrição no tempo estabelecido, ano após ano” (ÊXODO,

13,1,16). A Jeová só ofereciam pão ázimo, sem fermento, o único que consomem

até hoje na Páscoa. Os pães eram redondos e tinham o aspecto de umas pedras

achatadas, vagamente elevadas no centro, mas pouco mais grossas que um dedo

53

(Figura 1)

Figura 1 - Pão àzimo

Fonte: ALMEIDA, 2011

A profissão de padeiro era considerada como um artesanato especializado. O

fato de serem artesãos constituía um incentivo: falava-se numa arspistorica, a arte

da panificação. Os donos das padarias eram quase sempre antigos escravos

libertos. O império de Roma cresceu à custa do pão, mas sua queda ficou a dever-

se igualmente ao pão. Foi nesse mundo do Império Romano que apareceu Jesus

Cristo. Era um mundo de carência, de verdadeira fome, um mundo em que os

especuladores retinham os cereais e o estado e o imperador serviam do pão para

fins políticos, dando alimento a quem apoiasse o seu poder. Cristo surgiu

exatamente nesse mundo. E apresentou-se dizendo que era o filho de Deus. Mas a

verdade é que esse mundo era atravessado por outra fome, uma fome espiritual.

Eram muitos os que sentiam que um mundo assim não podia ser verdadeiro. Na

Europa, o pão chegou por meio dos gregos de acordo com Jacob, 2003.

Com a queda do Império Romano e da organização por ele imposta ao

mundo, as padarias europeias desapareceram, retornando o fabrico doméstico do

pão na maior parte da Europa.

O senhor feudal permitia apenas o uso do moinho e dos fornos. Voltou a se

consumir, pela comodidade no fabrico, o pão ázimo, sem fermento e achatado, que

acompanhava outros alimentos, como a carne e sopas. Nessa época, conforme

Jacob (2003), somente os castelos e conventos possuíam padarias. No século XVII,

a França se tornou o centro de fabricação de pães de luxo, com a introdução dos

54

modernos processos de panificação, mas, desde o século XII, já era habitual o

consumo de mais de vinte variedades de pães naquele país. Depois, a primazia no

fabrico de pão passou a Viena, na Áustria. O trigo chegou à América na época dos

descobrimentos, quando Colombo trouxe algumas sementes da Europa. O trigo foi

plantado em Garanhuns (Pernambuco), Teixeira (Paraíba), Meruoca (Ceará),

chegando até a Ilha de Marajó (Pará). Mais tarde, desenvolveu-se também em

Minas Gerais e Goiás. Conforme escreveu o sociólogo e antropólogo Gilberto

Freyre, o Brasil conheceu o pão no século XIX. No início, sua fabricação, no Brasil,

obedecia a uma espécie de ritual próprio, com cerimônias, cruzes nas massas,

salmos para crescer, afofar e dourar a crosta, principalmente quando eram assados

em casa. Segundo Freyre (1975) a atividade da panificação no Brasil se expandiu

com os imigrantes italianos. Os pioneiros da indústria de panificação surgiram em

Minas Gerais. O pão permeia toda a história do homem, principalmente pelo seu

lado religioso. É o símbolo da vida, alimento do corpo e da alma, símbolo da partilha.

Ele foi sublimado na multiplicação dos pães, na Santa Ceia, e até hoje simboliza a

fé, na missa católica - a hóstia -, representando o corpo de Cristo. Segundo Frei

Alberto Beckhauser (2013), há os famosos pãezinhos de Santo Antônio que, ainda

hoje, são distribuídos aos pobres em várias igrejas no dia desse santo, 13 de junho,

para serem guardados em latas. Acredita-se que o que estiver junto a esse pãozinho

não faltará durante aquele ano. Esse costume português chegou até nós pelos

jesuítas.

O pão tem uma presença capital na história da humanidade, quer por sua

própria relevância para a aventura da sobrevivência, quer pelo simbolismo que

sempre o envolveu, como elemento fundamental de diversas culturas. O pão virou o

emissário da paz. Confirmo as palavras do antropólogo e fotógrafo Paulo Braga

(2007): “quando nos alimentamos geralmente nos sentamos à mesa, numa atitude

de partilha com as outras pessoas. E o pão é um alimento especial, praticamente

universal”. (BRAGA, 2007, p.31). A história do pão, como disciplina, lança raízes em

muitas e variadas áreas de especialização científica. É um território que vai da

botânica à história das religiões, da economia à medicina, da filosofia às ciências

políticas, da química agrícola às tecnologias da moagem e da panificação. É uma

história que continua a ser contada.

55

3.2 Trabalho voluntário: uma forma de motivar as pessoas a realizarem um

trabalho para o bem comum.

Existem várias definições para o trabalho voluntário que objetivam externar a

sua finalidade, como sendo o tempo doado para ajuda de uma necessidade em

busca de uma sociedade mais justa, o gesto de cidadania, dentre outras.

Voluntário é o ator social e o agente de transformação, que presta serviços não remunerados em beneficio da comunidade. Doando seu tempo e conhecimentos,realiza um trabalho gerado pela energia de seu impulso solidário e atende não só as necessidades do próximo, como também suas próprias motivações pessoais,sejam elas de caráter religioso, cultural, filosófico ou emocional. (FUNDAÇÃO ABRINQ apud DOMENEGHETTI, 2001 p.79).

A conscientização da sociedade, quanto à importância do trabalho voluntário,

faz com que a responsabilidade social passe a ser enfatizada como principio a ser

cumprido pelas empresas e empresários. Podemos afirmar também que a realização

dessas atividades contribui, de forma significativa, para o desenvolvimento pessoal e

profissional, possibilitando a descoberta de novas aptidões e trazendo a satisfação

da certeza de que é possível ajudar o próximo.

O voluntariado pode desenvolver atividades em diversas áreas: educação,

lazer, recreação, combate à miséria e meio ambiente. Além disso, o trabalho

voluntário deve ser encarado com comprometimento e profissionalismo. Não se

pode esquecer de que sempre há regras a serem seguidas e metas a serem

cumpridas, independentemente da causa ou da amplitude do projeto.

No Brasil, o voluntariado tem uma história que remonta aos primeiros anos da

colonização. No período posterior à Primeira Guerra Mundial, os países passaram a

desenvolver políticas públicas para prestar atendimento aos necessitados, criando o

chamado “Estado de Bem-Estar Social”. Nos anos 70, são criadas as primeiras

ONGs do País, estimuladas por organizações europeias, a fim de promover projetos

de desenvolvimento no Terceiro Mundo. No início da década de 80, o movimento

voluntário passa a ser reavaliado e questionado politicamente e, desse período até a

década de 90, surge um novo voluntariado. Para Peliano (2001) os anos 90 foram

decisivos no processo de consolidação da ação voluntariada voltada para o

preenchimento dos espaços não assistidos pelo Estado. A atividade é vista como

oportunidade para exercício da cidadania e intervenção social, uma vez que

56

possibilita a ação individual para o bem público. O novo modelo de voluntariado foi

possibilitado pela atuação de indivíduos motivados a exercerem a cidadania em prol

de causas comunitárias. É nesse contexto que o sociólogo Herbert de Souza, o

Betinho, articula a Ação da Cidadania Contra a Fome e a Miséria e pela Vida que,

sem ajuda financeira do governo, distribui toneladas de alimentos à população.

É dessa época a criação do Movimento pela Ética na Política, desdobrando-se na campanha da Ação da Cidadania contra a Fome, a Miséria e pela Vida. [...] No centro desse movimento destacou-se a participação de Herbet de Souza, o Betinho, então presidente do Instituto Brasileiro de Análises Sociais e Econômicas (IBASE), que lançou ampla campanha nacional convocando as empresas públicas e privadas para maior engajamento no combate à miséria e à elaboração de seu balanço sócia. (PELIANO, 2001, p.20).

Em 1996, o Programa Voluntários é criado para promover, qualificar e

valorizar o voluntariado no Brasil. Esse programa, que incentivou a criação de

Centros de Voluntários em todo o País, foi uma iniciativa do Conselho da

Comunidade Solidária - presidido pela antropóloga Ruth Cardoso.

Em 1998, foi implantada a Lei 9.608 que regulamentou o trabalho voluntário e

trouxe um considerável avanço para o desenvolvimento do voluntariado no Brasil.

Ela determina, em seu Art. 1º, que:

Considera-se serviço voluntário, para fins desta Lei, a atividade não remunerada, prestada por pessoa física a entidade pública de qualquer natureza, ou a instituição privada de fins não lucrativos, que tenha objetivos cívicos, culturais, educacionais, científicos, recreativos ou de assistência social, inclusive mutualidade. (BRASIL, 1998a)

Ainda, segundo a Lei, o serviço voluntário não gera vínculo empregatício nem

obrigação de natureza trabalhista, previdenciária ou afim. Logo, para ser

enquadrado no conceito dessa lei, o serviço voluntário não pode ser imposto ou

exigido como contrapartida de algum benefício concedido pela entidade ao prestador

de serviço ou a sua família; deve ser prestado por um indivíduo isoladamente, não

por uma organização da qual o indivíduo faça parte; deve ser prestado para entidade

governamental ou privada, sendo que elas devem ter fim não lucrativo e ser voltadas

para objetivos públicos.

O voluntário procura conhecer seus deveres. Coloca a ética em primeiro lugar

e em todas as suas decisões. Aproveita as habilidades desenvolvidas com o

57

trabalho voluntário e se capacita cada vez mais para aperfeiçoar sua atuação. Age

conforme os princípios da causa que defende coerente com os valores e a missão

da organização. Ser voluntário pode ser considerado um hobby ou uma profissão.

Do hobby, o voluntariado encontra o prazer, a alegria. Da profissão, agrega

responsabilidade, compromisso e competência. O voluntário pode exercer a

liberdade de escolha, a criatividade e o respeito à diversidade e na comunidade

aprende habilidades, faz amizades e vivencia várias experiências.

Ser voluntário é ser diferente e fazer a diferença porque visa à promoção do

cidadão, substitui o amadorismo pelo profissionalismo e reconhece o potencial

transformador de cada um na construção de uma sociedade mais justa, buscando

transformar as dificuldades em desafios a serem vencidos.

E bom salientar que não se pode confundir trabalho voluntário com obra de

caridade, pois, na caridade, há a simples doação sem nada em troca. No trabalho

voluntário, há a doação de um trabalho que necessita ser feito e que, em troca,

obtém-se experiência, como trabalho em equipe, integração, flexibilidade, visão de

futuro, otimismo e outros importantes nuances que podem ser vividas e aplicadas no

desenvolvimento pessoal e profissional, segundo Corullón e Medeiros Filho (2002).

A Organização Social e o Coordenador de Voluntários devem sempre

lembrar-se de que o trabalho voluntário é uma atividade espontânea, que precisa ser

realizada com alegria e prazer. Por isso, exige motivação e integração para que seja

um sucesso.

3.3 A Obra Social São José Operário: um breve relato histórico do local onde

foi realizado o trabalho voluntário.

Segundo o relato histórico da Diretora da Instituição, Professora Miriam Silva

Loureiro, a Obra foi criada em 1969, para ser um Ginásio Profissionalizante e

consolida-se como importante centro de ensino e de assistência social. No dia 4 de

maio de 1969, foi inaugurado o Ginásio Orientado para o Trabalho, com bênção da

Capela, das salas de aula, da secretaria e da cantina. No final do ano, chegaram as

máquinas prometidas pelo MEC e, no ano seguinte, teve inicio a 1ª série do Ginásio

São José Operário, com quase 100 alunos, na maioria filhos de industriários

residentes nos bairros próximos. Até 1974, o Ginásio foi mantido pelo Colégio

Imaculada Conceição. A partir de então, a obra tornou-se independente e passou a

58

ser mantida pela Sociedade de Educação Integral e de Assistência Social (SEIAS).

Em 1975, o ginásio recebeu a denominação de Escola de 1º grau São José

Operário. Além das instalações, a Obra São José Operário conta com uma área de

15 mil m2 para a recreação livre dos alunos, além de quadras de futebol e vôlei. De

1969 até hoje, muito se construiu na Obra Social São José Operário. De ginásio

profissionalizante de tipo industrial, conforme iniciou, hoje existe com uma Obra

Social, entidade que presta serviço de Assistência Social, que significa espaço de

proteção para crianças e jovens, além de ser também um espaço de promoção

humana e resgate de cidadania para crianças, jovens e adultos. ( Figura. 2)

Figura 2 - Obra Social São José Operário

Fonte: Foto de Arthur Moraes

Na parte da manhã, a Obra oferece Ensino Fundamental do 6º ao 9º anos. Os

estudantes do 6º e 7º permanecem na Obra das 7h20 às 16h, dentro do Projeto

“São José Integral”. Neste projeto, a Obra Social possui três eixos orientadores da

educação integral: educação ambiental, formação humano-cristã e corporeidade. No

turno da tarde, é acolhida a comunidade do entorno da Obra e desenvolvem-se

projetos socioeducativos e projetos sócios profissionais. Dentre os processos sócios

profissionais oferece-se a oficina de panificação que iniciou no ano de 2013, com a

colaboração das professoras voluntárias (Figura 3).

59

Figura 3 - Espaço onde se realizou a oficina de panificação

Fonte: Foto de Arthur Moraes

A Obra Social valoriza cada ação positiva, cada gesto solidário, cada ação

fraterna e cidadã. Com isso, querem resgatar a pessoa inteira, muitas vezes,

sufocada por uma realidade violenta e injusta.

Nessa caminhada a serviço da vida e da esperança, contextualizam os

projetos em consonância com a realidade vivenciada pela comunidade que acolhem,

priorizando, na missão, o processo humano de evolução, no sentido cristão.

3.4 Oficina sócio educativa: espaço para diálogo, criatividade, inclusão social e

cidadania

Ai daqueles e daquelas que, em lugar de visitar de vez em quando o amanhã,o futuro, pelo profundo engajamento com o hoje, com o aqui e com o agora, ai daqueles que, em lugar desta viagem constante ao amanhã, se atrelarem a um passado de rotina. (FREIRE, 1982).

Essas palavras de Paulo Freire resumem uma reflexão em torno da

necessária vitalidade do processo educativo. Na escola, muitas vezes, essa

vitalidade desaparece ou fica adormecida, quando professores e alunos são levados

a repetir práticas de ensino-aprendizagem clássicas, sem muito espaço para a

participação ou a criatividade. Entretanto, há dispositivos pedagógicos, bastante

60

acessíveis às escolas, que dinamizam o processo ensino-aprendizagem e estimulam

o engajamento criativo de seus integrantes. É o caso das oficinas pedagógicas, que,

segundo Corcione (1994), seriam espaços em que os ideais de transformação e

diálogo na escola são realidades em permanente construção, inseridas no processo

escolar, que são voltadas a trabalhos que intensifiquem a construção do ser humano

como um todo, proporcionando ações dinâmicas no processo ensino-aprendizagem.

É possível sonhar com um ensino que tenha, dentre seus objetivos, a

construção da cidadania, a formação de jovens que, ao mesmo tempo em que

conheçam os conteúdos da ciência contemporânea, também reflitam, por exemplo,

sobre os limites éticos da aplicação dessa ciência, ou ainda, é possível sonhar com

um ensino que forme alunos e alunas conscientes de seu papel para a construção

de uma sociedade mais justa e solidária.

Segundo Dallari:

A cidadania expressa um conjunto de direitos que dá à pessoa a possibilidade de participar ativamente da vida e do governo de seu povo. Quem não tem cidadania está marginalizado ou excluído da vida social e da tomada de decisões, ficando numa posição de inferioridade dentro do grupo social. (DALLARI, 1998, p.14).

Portanto, educar para a cidadania é adotar uma postura, é fazer escolhas, é

fazer de cada pessoa um agente de transformação. É também lutar pela justiça e

despertar para as consciências dos direitos e deveres. O valor da cidadania significa

reafirmar o valor da solidariedade contra o individualismo, da cooperação contra o

valor da competição. Para atingir esse propósito, é preciso construir o espaço de se

educar na cidadania e, nesse sentido, muda a postura do professor que, de cidadão

que somente exige seus direitos, passa a lembrar também de seus deveres.

De acordo com os Parâmetros Curriculares Nacionais, os PCNS, uma forma

de se trabalhar com os alunos os seus direitos de cidadão é utilizando a cultura. Ou

seja, os alunos podem descobrir por meio da pesquisa, teatro, poesia, oficinas

pedagógicas, conhecimentos necessários para que se possa fazer uma crítica dos

valores sociais, que, hoje em dia, estão cada vez mais voltados para os interesses

daqueles que detém o poder na sociedade.

É importante ressaltar que um dos pontos altos da Lei de Diretrizes e Bases

Educacionais (LBD) é o reconhecimento da importância do ensino e da

aprendizagem de valores vinculados à cidadania na educação escolar.

61

Nesse contexto, Azevedo (1996) apresenta a seguinte concepção de Escola:

A escola é um espaço vivo e democrático privilegiado da ação educativa, voltada

para o trabalho com as classes populares, uma vez que estas têm sido

historicamente excluídas dos bens produzidos pela sociedade como um todo; que

propicie práticas coletivas de discussão, garantindo a participação de toda a

comunidade escolar; que viabilize a descentralização do poder no que se refere às

definições do seu projeto de escola das responsabilidades da busca de soluções;

que oportunize o acesso ao conhecimento, sua construção e recriação permanente,

envolvendo a realidade dos alunos, suas experiências, saberes e cultura,

estabelecendo uma constante relação entre teoria e prática.

As oficinas sócias educativas, segundo Azevedo (1996) ,vêm ao encontro

com uma nova perspectiva pedagógica de educação e devem ser vistas como

importante instrumento de inclusão social, como medidas de apoio educativo e

complemento curricular que busquem contribuir para a igualdade de oportunidades,

de acesso e progressão escolar. Por meio dessas ações, consegue-se oportunizar

alunos a participarem de atividades extraclasses que visem o desenvolvimento de

diferentes habilidades. Tem, como intuito, um trabalho que considera o ser humano

na sua totalidade e que busca a efetivação do conhecimento com diferentes

atividades que possam resultar no reconhecimento e desenvolvimento de vários

talentos.

Elas também buscam atividades de cunho social e educativo, dirigidas aos

jovens e às famílias de baixa renda sujeitas à exclusão escolar e social, visando sua

inclusão e permanência na escola. Isso resulta na oportunidade de crescimento e

resgate da autoestima, da cidadania e da promoção social. São ações que devem

ser planejadas, acompanhadas e avaliadas, mantendo perfeita sintonia com o

projeto político-pedagógico das escolas.

De acordo com Freire (1976), aquele que busca estar no mundo e constrói a

sua realidade social tem que ter consciência de sua história para se tornar

consciente de sua cidadania, dos seus direitos, dos seus deveres e da sua

participação na vida comum em sociedade. Portanto, cidadania, para Freire (1976),

é conscientização mediada por uma educação dialógica, ou seja, a consciência

determina o agir e o estar do ser humano no mundo. A educação dialógica contribui

para a formação da cidadania a partir da conscientização do homem sobre seu

tempo e seu espaço no mundo, sobre a sua realidade social e filosófica, ou seja,

62

forma cidadãos enraizados, conscientes que se apropriam de sua cultura, não de

uma forma individualizada, mas no diálogo com o mundo e seus semelhantes.

Nesse contexto, a educação está dentro de um campo mais amplo, o da cultura,

definida por Paulo Freire como toda criação humana.

A cultura como o acrescentamento que o homem faz ao mundo que não fez. A cultura como resultado do seu trabalho. Do seu esforço criador e re-criador. O sentido transcendental de suas relações. A dimensão humanista da cultura. A cultura como aquisição sistemática da experiência humana. Como uma incorporação, por isso crítica e criadora e não como uma justaposição de informes ou prescrições doadas. (FREIRE; 1976, p.117).

Portanto, o educando descobriria que cultura é uma obra de um pintor, um

artesanato feito de argila pelos artistas, bem como a produção de pães caseiros

artesanais feitos por uma pessoa.

A educação correlacionada com esse conceito de cultura seria, para Paulo

Freire, um processo de conscientização que mudaria o comportamento humano

frente à realidade.

A sociedade atual tem uma ética, uma educação e uma cidadania que lhe são

próprias, porém os princípios da liberdade, igualdade, democracia e solidariedade

humana são aceitos pelos valores do individualismo, da competição, da busca do

lucro e acumulação de bens os quais configuram moral.

Uma nova cidadania acontece por meio dos currículos oficiais. É necessário

ensinar às crianças e jovens não apenas ler e escrever, mas olhar o mundo de uma

forma mais ampla. Ensinar a ouvir, falar e escutar, a desenvolver atitudes de

solidariedade,a aprender a dizer não ao consumismo e não ao individualismo. E,

como diz Paulo Freire: “É preciso plantar a semente da educação para colher os

frutos da cidadania”.

63

4 PÃO E CIÊNCIA: CONSTRUINDO RELAÇÕES ENTRE O SABER ESCOLAR E

A ELABORAÇÃO DO PÃO

As infinitas possibilidades de sofisticação, aliadas ao seu caráter primitivo, fazem do pão

o mais sedutor dos alimentos. (CANELLA-RAWLS, 2012,).

4.1 Introdução

Para Canella-Rawls (2012) o pão é resultado de um processo antigo de

milhares de anos que foi e está sendo repassado no decorrer de gerações e

culturas. Quando se elabora a massa de um pão, a cozinha é transformada num

laboratório de reações, aromas, sabores, odores e texturas. A receita do pão

representa, por meio de um trabalho de arte, um experimento científico. O pão é

resultado da cocção de uma mistura de farinha de trigo, água, sal e fermento,

podendo acrescentar outros ingredientes, cujo processo básico dessa mistura exige

que a farinha seja convertida numa massa, seguida de um processo de

fermentação, sova, modelagem e cocção. Os passos básicos na elaboração de pães

e as reações físico-químicas desencadeadas pela junção de certos componentes da

massa são o ponto central para o sucesso da operação.

Ainda, de acordo com Canella-Rawls (2012), a elaboração de pães consta de

várias etapas que envolvem o saber escolar num contexto interdisciplinar:

a) Higiene Pessoal: a principal causa de contaminação dos alimentos é a falta

de higiene na manipulação, por isso as pessoas que trabalham com culinária

devem praticar algumas regras básicas, como tomar banho antes de começar

suas tarefas, fazer uso de roupas limpas, de gorros ou toucas que prendam

todo o cabelo,usarem sapatos fechados, aventais e outros. É importante

também que as pessoas criem o hábito de lavar as mãos antes e depois de

manipular os alimentos.

b) Limpeza e sanitização do ambiente: a limpeza antecede a sanitização e se

resume na limpeza do local de trabalho com água, sabão ou detergente e,

logo após, o enxágue. Já a sanitização é um processo que procura diminuir o

número de micro-organismos patogênicos (bactérias) pela utilização de

produtos químicos (álcool a 70% ) ou uso de calor.

64

c) Escolha e pesagem exata dos ingredientes: a precisão da medida significa

que as receitas sairão perfeitas sem necessitar de ajustes na quantidade de

ingredientes.

d) Mistura dos ingredientes a fim de distribuir uniformemente os materiais.

Dependendo de como é feita a mistura, pode-se variar a viscosidade, o grau

de dispersão, a incorporação do ar e outros fatores. A mistura de massas

fermentadas abrange adição de farinha,dos ingredientes secos,do fermento e

da água que é variável, pois depende da capacidade higroscópica da farinha

utilizada. A farinha é composta basicamente por água, amido minerais,

gordura e proteína. O amido existe em maior quantidade na farinha e,por

meio de uma reação enzimática, ele é quebrado e forma o açúcar que é

capaz de ativar o fermento. As proteínas solúveis e insolúveis em água são

as responsáveis pela formação de um material elástico, que aprisiona os

gases produzidos pela reação química das enzimas do fermento no açúcar

que se denomina glúten. A etapa mais longa do processo da mistura é

quando o glúten desenvolve. Identifica-se a etapa final da mistura, quando a

massa é esticada entre os dedos.Se o glúten estiver bem desenvolvido

apresentará grande resistência e esticará até uma camada fina , quase

transparente.

e) O controle da temperatura é importante porque influencia a ação do

fermento.A velocidade do processo de fermentação aumenta em

temperaturas elevadas.

f) Fermentação: processo que faz crescer uma massa pelo uso de material

químico e/ou biológico que produza gás carbodióxido. Esse gás, no caso de

massas fermentadas (pães), é provocado pela utilização do fermento

biológico (por ação de uma bactéria ou fungo) e, no caso da produção de

pães rápidos, pelo uso de um produto químico de base ácida ou alcalina.

Durante a fermentação ocorre a transformação: a massa de pouco volume e

densa torna-se extensa, elástica e capaz de reter os gases que estão se

formando.

g) A “Sova” da massa pode ser considerada como o método de reduzir o volume

para a expulsão do gás carbodióxido, redistribuindo o fermento para futuro

crescimento, relaxando o glúten e balanceando a temperatura da massa.

65

A partir dessa etapa, surge a modelagem dos pães que estabelece padrões

de aparência e textura e aguça a criatividade de cada um para enrolar o pão.

Finalmente surge a etapa da cocção que é a transferência de calor de um recurso de

aquecimento para a massa.

A cocção de um pão de qualidade não termina na escolha do método certo, da farinha correta ou do forno ideal. É preciso entender que outras reações, além da imediata formação de um produto, estão ocorrendo simultaneamente: a microbiologia, a mecânica do desenvolvimento de uma massa por atrito físico , a variedade e implicações da agricultura do trigo, os aspectos de processamento dos ingredientes, as reações químicas levadas a cabo pelas reações físicas e tecnológicas.É preciso pensar fora da panela. (CANELLA-RAWLS, 2012, p. 20).

4.2 Saberes populares da culinária do pão e interações com os saberes

escolares: contribuição para um ensino de ciências contextualizado numa

abordagem CTSA

O futuro da humanidade está nas mãos daqueles que são capazes de transmitir às gerações do amanhã,

razões de vida. (Papa João Paulo II)

Paulo Freire faz uso do termo “saber da experiência feita”, ao se referir ao que

chamamos de saber popular. Para Freire, os “saberes populares” são elaborados na

experiência existencial, na dialogicidade da prática da vida comunitária em que

estão inseridos, no círculo dialógico homem-mulher-mundo. No livro Pedagogia do

Oprimido Freire explicita esse pensamento com a frase “[...] só existe saber na

invenção, na reinvenção, na busca inquieta, impaciente, permanente que os homens

fazem no mundo, com o mundo e com os outros”. (FREIRE, 2006, p.58)

Na nossa sociedade, ainda é comum a visão que se tem da ciência como

detentora da supremacia numa visão superior do saber. Essa visão cientificista é

também reproduzida na escola. Para Pomeroy (1994), o ensino-aprendizagem de

Ciências deve considerar o significado dessa ciência para a vida dos estudantes em

um mundo de diversidade cultural. Além disso, Pomeroy (1994) menciona que se

devem explorar as inter-relações entre Ciência, Tecnologia e Sociedade dentro da

realidade da vida dos alunos;

desenvolver currículos de Ciências em torno de conteúdos científicos que expliquem práticas e técnicas populares; explorar as crenças, os métodos, os critérios de validade e sistemas de racionalidade sobre os quais o

66

conhecimento do mundo natural de outras culturas é construído (POMEROY , 1994, p. 62; 65).

Nesse contexto, El-Hani e Sepúlveda (2006) citam que, a partir da década de

90, os educadores e pesquisadores passaram a questionar essa superioridade

epistemológica do saber científico e considerar as relações entre cultura e educação

científica. A cultura popular e o conhecimento cultural passaram a ser considerados

na orientação dos currículos de Ciências. Os saberes escolares (nas Ciências e em

outras áreas de conhecimento) devem estar comprometidos com o sentido coletivo

da vida e do trabalho, produzidos com criticidade, inventividade e responsabilidade

ambiental e social.

Devemos realizar práticas pedagógicas que busquem a inter-relação entre

saberes popular e os saberes escolares (saberes formais ensinados na escola). A

escola precisa aprender a valorizar os mais velhos e os não letrados como fontes de

conhecimentos que podem ser levados à sala de aula para dialogarem com os

jovens. O diálogo entre gerações chega a superar duas dimensões: uma, a

convicção de que há uma necessidade urgente de se preservarem saberes popular,

até porque muitos estão em risco de extinção; a outra, de como as ações envolve

uma dimensão social no fazer educação. Ocorre, com frequência, a surpresa do

jovem que vê a riqueza dos saberes detidos pelos mais velhos. Nesses se manifesta

a gratificação em ver a Academia valorizar aquilo que eles conhecem, geralmente

sem valor como conhecimento para muitos.

Como disse o Papa Francisco,

Atualmente há uma política mundial muito impregnada pelo protagonismo do dinheiro, uma política economicista sem qualquer controle ético, um economicismo autossuficiente que vai arrumando os grupos sociais de acordo com essa conveniência. [...] Os extremos da sociedade (jovens e idosos) são mal atendidos, não são cuidados e são descartados porque os idosos não produzem mais e os jovens produzem pouco e ainda precisam ser formados. Curiosamente os jovens são aqueles que têm a ilusão da utopia, ou seja, de respirar e olhar adiante e os idosos precisam transferir sabedoria para eles. Sem esses extremos, o mundo desaba,cai numa globalização da indiferença1.

Devemos procurar práticas pedagógicas que tragam para a sala de aula

conteúdos que abordem experiências de vida, interesses e necessidades dos

1 Informação oral - entrevista obtida em reportagem da Globo News, na visita ao Brasil , exibida em julho de 2013.

67

alunos, propiciando a reflexão e favorecendo a interação e o diálogo dinâmico. Ou

seja, a partir da interdisciplinaridade efetiva entre vários campos do saber,

estudantes, professores e pessoas leigas podem tornar-se conscientes e

conhecedoras das inter-relações entre ciência, cultura, tecnologia, ambiente e

sociedade, favorecendo o desenvolvimento de uma visão holística do mundo.

Atualmente, não é mais possível conceber propostas para um ensino de

Ciências sem incluir no currículo uma correlação com os aspectos sociais do aluno.

Dentre as manifestações da cultura popular, temos os chás medicinais, os

artesanatos, as cantigas de ninar, as mandingas e a culinária. Todas elas se

constituem como saberes popular que são transmitidos de geração em geração por

meio da linguagem falada, dos gestos e das atitudes.

É fato que o ser humano constitui-se a partir de uma diversidade de saberes

e, dentre eles, os “saberes populares”, tão presentes na cultura de nosso país e

desconsiderado em nossas escolas.

A valorização cultural na escola pode auxiliar a inter-relação entre as

pessoas, favorecendo o desenvolvimento de sentimentos de solidariedade e respeito

ao próximo, conferindo novos significados aos conhecimentos já adquiridos.

Nessa perspectiva, desenvolvemos uma proposta pedagógica de ensino na

qual escolhemos como cultura popular a produção artesanal do pão e similares e os

saberes detidos por um grupo de pessoas reunidas para essa fabricação. É uma das

várias alternativas de tornar os saberes popular em “saberes escolares”,

contribuindo para um ensino de Ciências mais contextualizado.

68

5 METODOLOGIA

Sempre há o que aprender,ouvindo,vivendo e sobretudo,trabalhando,mas só aprende quem se dispõe a rever as suas certezas.( RIBEIRO apud

FREIRE, 2006).

A motivação para esse trabalho de voluntariado surgiu após uma conversa

informal com o representante legal da congregação Filhas de Jesus de Belo

Horizonte, sobre a possibilidade de realizarmos um trabalho que oportunizasse uma

possibilidade de aprendizado com geração de trabalho e renda para a comunidade.

Após relatar o fato para a professora voluntária e amiga Claudete Botaro, que é uma

pessoa que ama fazer pão e, até mesmo, renova as energias quando realiza esse

ato culinário, pedimos para visitar a Obra Social São José Operário da congregação

Filhas de Jesus de Belo Horizonte. Após essa visita e conversas com a direção e,

principalmente, com a assistente social desse projeto, constatamos que muitas

mães da comunidade possuem filhos pequenos e não podem sair para trabalhar

muitas horas seguidas, pois não têm onde deixar as crianças. Propusemos ajudar a

comunidade com a realização de oficinas de pães caseiros e artesanais. Com a

produção de pães, as mães poderiam vendê-los a vizinhos ou até aos

estabelecimentos comerciais da própria comunidade. Estávamos exercendo a

cidadania.

5.1 Pesquisa bibliográfica

Uma Oficina pedagógica de panificação caseira foi elaborada e realizada por

professoras voluntárias que buscaram a educação a fim de que as pessoas

pudessem refletir e tomar decisões com responsabilidade social em relação aos

problemas éticos,ambientais e de qualidade de vida. Para a construção da oficina

foram realizados levantamentos bibliográficos que serão descritos a seguir.

Entende-se por oficinas pedagógicas, espaços e tempos de aprendizagem

coletiva, nos quais os sujeitos têm a oportunidade de produzir conhecimentos a

partir de interações em grupos. A oficina seria o local para dizer e ouvir relatos,

experiências, vivências as quais serão compartilhadas por todos os sujeitos que,

efetivamente, tornar-se-ão atores e atrizes sociais das suas histórias e dos seus

69

conhecimentos. Segundo Corcione:

Quem pensa em oficina, lembra logo, por associação de ideias, de trocas, peças, trabalho, conserto, reparo, criatividade, transformação, processo, montagem... São todas as ideias que compõem o significado da oficina que se constitui num espaço privilegiado de criação e descoberta. (CORCIONE, 1994, p.39).

A preocupação dessa modalidade metodológica é abrir espaço para as

relações interpessoais, onde os sujeitos alcancem os objetivos propostos,

interagindo,dialogando e partilhando ideias. Nesse espaço diferenciado de

aprendizagem, há que se considerar o próprio dimensionamento do fazer docente.

Ocorre o deslocamento da figura hegemônica do docente que passa a ser partilhada

nos grupos de trabalho.

Portanto, a presente pesquisa foi pautada na abordagem qualitativa tendo o

“ambiente natural como sua fonte direta de dados e o seu pesquisador como o seu

principal instrumento,” - os dados coletados foram predominantemente descritivos.

“A preocupação com o processo é muito maior do que com o produto”. (ANDRE;

LUDKE, 1986, p.11-13). Para André (1995), nesse tipo de abordagem, ocorre a

busca da interpretação em lugar da mensuração e assume-se que fatos e valores

estão intimamente relacionados.Em seu caráter natural,defende uma visão holística

dos fenômenos,levando em conta todos os componentes de uma situação em suas

interações e influências recíprocas.

A elaboração da oficina de panificação foi pautada nas responsabilidades da

educação para o presente e o futuro, que é “ter como centro a construção da

humanidade do ser humano” (SOUZA, 2001, p.18) e foi organizada em torno dos

pressupostos “amor, humildade, fé nos homens,esperança e o pensar crítico que

norteiam a ação e reflexão do diálogo” (FREIRE, 2006, p.32) e dos pilares do

conhecimento, predominando “aprender a conhecer”, “aprender a fazer”, aprender a

conviver” e “ aprender a ser” . (DELORS, 1999).

O sentido do “aprender a conhecer” vislumbrará “as possibilidades da

convivência dos diferentes com suas diferenças num contexto em que supere os

preconceitos, as subordinações, as desigualdades econômico-sociais e as

exclusões culturais” (SOUZA, 2001, p.63-64).

70

É necessário tornar prazeroso o ato de compreender, descobrir, construir e

reconstruir o conhecimento para que não seja transitório, para que se mantenha ao

longo do tempo e para que valorize a curiosidade, a autonomia e a atenção

permanentemente. É preciso também pensar o novo, reconstruir o velho e reinventar

o pensar.

O “aprender a fazer” mostra a coragem de executar, de errar mesmo na

busca do acertar. Nesse mundo atual, o indivíduo necessita estar apto a trabalhar

em equipe, desenvolvendo o espírito cooperativo e de humildade na re-elaboração

conceitual e nas trocas.

Finalmente o “aprender a ser” talvez seja o mais importante por explicitar o

papel do cidadão e o objetivo de viver. Para Romão (2004) “O conviver é a própria

essência” do conteúdo freiriano, vez que implica o diálogo entre os seres humanos.

Ao aprender a viver com o outro, também esse outro “aprende a ser”, ultrapassando

sua condição biológica para assumir sua condição histórica e cultural. (ROMÃO,

2004, p. 158).

Pesquisou-se, ainda, sobre a história do pão para dar início e significado aos

módulos da oficina. Foi realizada também a pesquisa sobre higiene e limpeza das

mãos, local de trabalho e utensílios de cozinha para relatos e demonstrações na

execução das receitas. Como procedimento de investigação foi feito uso da

observação participante, de questionário, de entrevistas que foram gravadas e

transcritas literalmente, preservando o anonimato dos participantes no sentido de

agregar ao trabalho seriedade e ética. Os dados foram analisados indutivamente,

isto é, partiu-se particularmente de uma oficina de produção de pães para alcançar

uma questão mais ampla de valores, atitudes e melhoria das condições

socioeconômicas de famílias envolvidas. Para Lakatos e Marconi:

Indução é um processo mental por intermédio do qual, partindo de dados particulares, suficientemente constatados, infere-se uma verdade geral ou universal, não contida nas partes examinadas. Portanto, o objetivo dos argumentos indutivos é levar a conclusões cujo conteúdo é muito mais amplo do que o das premissas nas quais se basearam. (LAKATOS; MARCONI, 2007, p.86).

A análise dos dados foi feita após a leitura das observações, questionário e

entrevistas, de forma indutiva, cuja preocupação foi a de perceber como os

participantes consideravam as questões abordadas. As entrevistas foram todas

71

transcritas a fim de ter uma quantidade significativa de material para análise. Os

dados foram agrupados e separados por unidades de significados, primeiro numa

perspectiva global, levando-se em conta as convergências das informações, depois,

numa perspectiva diferenciada,destacando-se os dados divergentes,que foram

apresentados de uma maneira descritiva. Não há receitas para se fazer uma boa

oficina. Toda experiência requer ingredientes adequados e combinados de forma a

corresponder a cada especificidade local e conjuntural, a cada público e objetivo. O

prazer de fazer oficina se fundamenta exatamente na consciência de estar

experimentando algo singular e de estar aprendendo a experimentar.

5.2 Construindo a oficina de pães caseiros artesanais

A oficina, então intitulada: O Pão de todos os dias: alimento mundial,

sustentável e de inclusão social, foi realizada em dois módulos que aconteceram em

junho e setembro de 2013. O primeiro módulo foi planejado com o objetivo de

contribuir para a ascensão sócio econômica das famílias que estão em situação de

vulnerabilidade social, buscando o conhecimento científico com o intuito de poder

criar novas receitas de pães. Para atingir esse objetivo, foi feita uma pesquisa de

receitas de pães que continham poucos ingredientes e de baixo custo, que seriam

de fácil acesso e que envolveriam a aprendizagem da Ciência para todas as

pessoas que precisavam começar seu próprio negócio. Houve também o cuidado

para escolher ingredientes básicos e saborosos a fim de facilitar a comercialização

dos pães.

O segundo módulo foi elaborado com o objetivo principal de promover o

diálogo entre gerações, envolvendo os sentimentos de respeito, amor, confiança e

solidariedade, com a finalidade de resgatar e valorizar a sabedoria dos mais velhos.

Dessa forma, buscou-se também a interação entre os diversos saberes popular e

escolares, contribuindo para um ensino de Ciências contextualizado numa

abordagem CTSA, almejando a responsabilidade social diante do futuro. Para tal,

foram pesquisadas receitas diferentes que envolvessem conceitos fundamentais da

Ciência como densidade, solubilidade, tipos de fermentos e velocidade de uma

reação. As receitas encontradas para os dois módulos estão anexadas nesta

pesquisa e foram analisadas e testadas para escolher as que melhor se adaptavam

aos objetivos propostos.

72

Em seguida, foram feitos levantamentos de todos os utensílios de cozinha,

necessários ao preparo das respectivas receitas de pães e os testes dos aparelhos

que seriam utilizados como fogão, forno etc.

Para o desenvolvimento das atividades, inicialmente foi feita a divulgação da

oficina por meio de folders (Figura 4), site da pastoral da Obra Social São José

Operário, de convites verbais aos pais e responsáveis pelos alunos da mesma Obra

Social e de propaganda nas comunidades no entorno do Bairro Bandeirantes.

Figura 4 - Folder de divulgação da oficina

Fonte: Elaborado por Arthur Moraes

Para o segundo módulo, elaborou-se uma cartilha contendo um breve relato

da história do pão, receitas escolhidas e poesias que traduzem sentimentos e ideias

por meio de uma linguagem coloquial. A avaliação dos módulos da oficina foi

realizada por meio de depoimentos e entrevistas dos participantes.

73

6 RESULTADOS E DISCUSSÕES

A parte empírica desta proposta de pesquisa foi desenvolvida no ambiente

escolar da Obra São José Operário, localizada a Avenida Otacílio Negrão de Lima,

7040, Bandeirantes,Belo Horizonte,Minas Gerais, demonstrando que “esse tipo de

pesquisa oferece elementos preciosos para uma melhor compreensão do papel da

escola” (ANDRÉ; LUDKE,1986, p.23).

A atividade contou com a participação de professoras voluntárias, alunos do

nono ano de Ensino Fundamental II da Obra Social São José Operário e de

senhoras, mães de alunos, e outras pessoas que residem no entorno da Obra

Social. Todos que participaram assinaram o Termo de Consentimento de

Participação da Pesquisa, anexado neste trabalho (Anexo A, p.118).

6.1 Primeiro módulo

No primeiro módulo, o grupo de pessoas participantes foi constituído de

mulheres de diferentes faixas etárias que possuíam diferentes saberes sobre o

processo que envolve a fabricação de pães. O grupo era formado por 12 alunas,

dentre as quais uma cozinheira da Obra Social, outra responsável pela alimentação

de uma creche em Belo Horizonte, uma irmã de caridade da própria congregação

que mantém a Obra Social e as outras são donas de casa e mães de alunos da

Obra Social.Todas estavam ali com o mesmo objetivo de melhorar e inovar a

alimentação onde praticavam a culinária. Algumas queriam melhorar a renda familiar

com fabricação de pães e similares. Para iniciar esse módulo, as participantes foram

acolhidas com carinho e respeito, ou seja, foram recebidas e cumprimentadas com

alegria verdadeira incentivando autoestima. Assim fomos todos envolvidos num

diálogo desinibido com as devidas apresentações, estreitando nossas relações.

Inicialmente foi relatado ao grupo a importância da higiene pessoal, a limpeza e

sanitização do local de trabalho, conforme pesquisa realizada anteriormente. No

momento seguinte, todas lavaram as mãos com água e sabão e procederam com a

limpeza e sanitização da bancada de trabalho com álcool a 70%, já que a cozinha

tinha sido previamente limpa e sanitizada. Todos receberam os materiais culinários,

aventais e toucas, além dos ingredientes necessários para a produção do pão.A

maioria dos participantes perguntou se o álcool a 70%era o mesmo vendido nos

74

supermercados. Nem sempre é do conhecimento das pessoas o motivo da

concentração do álcool, utilizado como anti-séptico e desinfetante, ser pelo menos

de 70%. Nesse ponto as professoras voluntárias fizeram uma intervenção,

explicando o significado dos percentuais do álcool.Algumas delas aprenderam,

naquele instante, que existe álcool anidro e misturado com água em diferentes

proporções para diferentes finalidades. Foi feito uso do Quadro 1 a seguir para

demonstrar alguns percentuais do álcool etílico e suas utilizações:

Quadro 1- Significado de percentuais de alguns alcoóis e suas principais utilizações

Percentuais de alguns alcoóis

Quantidade de álcool e água, em mL, para cada

100mL da mistura

Principais utilizações

92,8% em volume 92,8 mL de álcool e 7,2 mL de água

Álcool comercial utilizado nas indústrias farmacêuticas e de cosméticos.

70% em volume 70 mL de álcool e 30 mL de água

Anti-séptico de superfície de instrumentos. Pode ser usado na pele.

95,1% a 96% em volume

95,1mL a 96 mL de álcool e 4,9m La 4 mL de água

Álcool hidratado utilizado como

combustível automotivo

99,6% em volume 99,6 mL de álcool e 0,4 mL de água

Álcool anidro. É misturado à gasolina para baratear o combustível, aumentar sua octanagem e reduzir a emissão de poluentes.

Fonte: Elaborado pela autora

Além disso, completamos a nossa explanação com o Quadro 2 verificando

que a atividade antimicrobiana dos alcoóis depende de sua concentração em

relação à água, que deve ser de 70%, pois nessa concentração o álcool etílico não

desidrata a parede celular do microorganismo, podendo penetrar no seu interior,

onde irá desnaturar as proteínas e dissolver as gorduras. Dessa forma destrói o

microorganismo com maior eficiência do que em porcentagens menores ou maiores

de álcool. Nesse último caso, o álcool etílico evapora mais rápido, diminuindo o

tempo em que o mesmo fica em contato com o microorganismo, sendo, portanto

menos eficaz.

Em seguida, foi feito um breve relato sobre a história do Pão, propiciando a

interlocução dos participantes sobre o assunto, com a intenção de reafirmar a

75

importância mundial do pão e o seu significado como símbolo de vida, amizade e

partilha. Ressaltou-se a fala de uma das alunas: “O pão está presente na mesa de

todos independente da raça, religião, condição social ou financeira, além de ser

sustentável, por estar em constante renovação, podendo apresentá-lo de diversas

formas e sabores”.

Quadro 2 - Ação germicida de várias concentrações de álcool etílico em solução aquosa contra o micro-organismo StreptococcusPyogenes.

Concentração do álcool etílico (%)

10 s 20 s 30 s 40 s 50 s

100 - - - - -

90 + + + + +

80 + + + + +

70 + + + + +

60 + + + + +

50 - - + + +

40 - - - - -

- ausência de ação germicida (crescimento bacteriano)

+ ação germicida (ausência de crescimento bacteriano)

Fonte: TALBOT apud SANTOS et al., 2013.

Antes de iniciar a preparação da receita, houve um momento de

sensibilização com um relato da professora colaboradora, Claudete Botaro, sobre o

sentir bem ao preparar um alimento para saciar a fome de outras pessoas. Portanto,

o pão deveria ser preparado com carinho, muito amor e bons pensamentos, já que

ele simboliza amor,amizade,harmonia e tantos outros sentimentos.

O trabalho ou “mão na massa” começou com a formação de duplas a fim de

proporcionar uma integração e trocas de experiências pelo constante diálogo entre

as alunas. Em seguida, a receita (Anexo B, p. 120) foi executada passo a passo e,

durante o tempo de espera do crescimento do pão, houve um diálogo entre as

voluntárias e participantes sobre custo da receita,tipos de recheios mais baratos e

saborosos e formas de enrolar os pães para que ficassem mais atrativos.

76

Após assar os pães, houve um momento de confraternização para a

degustação dos pães e avaliação desse primeiro módulo da oficina com perguntas

sob a forma de entrevistas. Para orientar esta atividade, utilizamos os seguintes

questionamentos:

a) Você já sabia fazer pão?

b) A realização desta oficina de panificação contribuiu para você iniciar seu

negócio ou melhorar a sua produção de pães caseiros?

c) Como a troca de saberes culinários, durante a realização da oficina de

panificação, proporcionou ideias para inovar a arte de fazer pão?

d) Inicialmente foi falado que o pão simboliza “amizade”.Você percebeu esse

sentimento durante a produção do pão caseiro?

e) Alguns relatos foram selecionados como representativos do universo das

respostas dadas pelos participantes:

a) Você já sabia fazer pão?

Aluna 1:

“Eu sou cozinheira de uma cantina de escola e já tinha ideia de como fazer

uma massa”.

Aluna 2:

“Eu sei cozinhar, mas nunca fiz pão”.

Aluna 3:

“Não, nunca fiz”.

Aluna 4:

“Sim, mas não da forma que fizemos”.

Pelas respostas das participantes, podemos notar que só uma detinha o

conhecimento de preparar a massa de um pão, porém todos tinham noção de

preparos culinários e, com isso, facilitou a execução da receita do pão.

77

b) A realização dessa oficina de panificação contribuiu para você iniciar

seu negócio ou melhorar a sua produção de pães caseiros?

Aluna 1:

“Contribuiu muito porque aprendi a fazer uma massa que demora menos

tempo para ficar pronta,muito mais gostosa e de baixo custo. Dessa forma, posso

começar a inovar a merenda dos meninos”.

Observamos que a aluna 1 preocupou-se com o tempo de execução da

massa, visto que o recreio dos meninos tem tempo determinado para ocorrer. Além

disso, o baixo custo dos ingredientes facilita a inovação da massa, buscando outros

sabores. No entanto, a aluna 2 prefere reproduzir a receita do pão que ela executou

na oficina, a fim de iniciar o seu comércio.

Aluna 2:

“Sim, eu quero iniciar um pequeno negócio. Onde eu moro não tem padaria

perto,assim fica mais fácil para vender os pães que vou produzir”.

Contudo, como verificamos na resposta da aluna 3,ela prefere inovar o que já

faz e vende com o intuito de facilitar a comercialização.

Aluna 3:

“Sim, eu sou dona de casa e já faço alguns salgados para vender. Gostaria de

variar os meus produtos para ajudar a aumentar a renda da minha casa”.

Aluna 4:

“Sim, eu sou Irmã de caridade da congregação e pretendo ensinar para várias

donas de casa a produzir pão para começar o seu próprio negócio e, assim,

poderem melhorar a renda familiar e, consequentemente, a autoestima”.

A aluna 4 optou por realizar um trabalho voluntário, ajudando outras donas de

casa a buscarem a independência financeira, melhorando a renda familiar.

78

c) Como a troca de saberes culinários, durante a realização da oficina de

panificação, proporcionou ideias para inovar a arte de fazer pão?

Essa pergunta envolveu o grupo numa discussão calorosa entre “saberes

populares” e escolares. Alguns participantes tinham o conhecimento popular de

deixar a massa descansar antes de levar ao forno para assar, pois estávamos

usando um fermento biológico. Nesse momento, as professoras voluntárias

participaram da discussão, explicando a levedação, ou seja, a fermentação alcoólica

anaeróbica efetivada pela ação de agentes fermentadores nos açúcares presentes

em uma massa. Foi explicado que o fermento biológico típico é uma cultura de

micro-organismos, não tóxica, de seres microscópicos capazes de alimentar-se,

reproduzir e eliminar suas próprias sobras (CO2) que, nesse caso, era um dos

responsáveis pela expansão da massa. (Figura 5)

Figura 5 - Alunas pincelando pães em crescimento

Fonte: Foto de Arthur Moraes

Foi proveitosa, também, a explicação de como a temperatura influi no

crescimento do fermento biológico e as senhoras entenderam a parte científica que

explica o saber popular de muitas cozinheiras que colocavam as massas dos pães

para descansar em locais com temperaturas mais elevadas. Foram selecionadas

respostas de alunas que comprovaram o que foi relatado:

79

Aluna 1:

“Com as conversas entre as participantes, fiquei encantada com as várias

formas de enrolar a massa, compreendi cientificamente porque tinha que deixar a

massa descansar antes de levar ao forno e, assim, obter pães mais bonitos”.

Aluna 2:

“Como eu nunca tinha feito pão,tudo que foi colocado pelas colegas é uma

ideia nova pra mim, inclusive a parte da Ciência”.

Aluna 3:

Por meio das nossas conversas, cada uma de nós trouxe ideias novas de corte da massa e formas de enrolar os pãezinhos e, assim, a gente pôde criar coisas diferentes. Achei interessante aprender que a temperatura altera o crescimento das massas. Foi útil porque vou também melhorar as massas dos meus salgados.

Aluna 4:

As ideias começaram a surgir com as partilhas das experiências e os passos realizados para produzir a massa. Dessa forma, aprendemos analisar receitas e massas a fim de nos possibilitar a escolha dos ingredientes, dos tipos de fermentos, conhecer a textura da massa, a arte de enrolar o pão e o momento de levá-lo ao forno para assar.

Foi observado pelas falas das alunas que o diálogo entre todos que

participaram da oficina de pães, a troca de experiências e a solidariedade

contribuíram para o crescimento e a aprendizagem do grupo.

d) Inicialmente foi falado que o pão simboliza “amizade”.Você percebeu

esse sentimento durante a produção do pão caseiro?

Pelas respostas dessa pergunta, pode-se testemunhar que o pão é sinônimo

de vida e trabalho, alimento do corpo e da alma e que aproximou as pessoas

durante a sua execução e degustação:

80

Aluna 1:

“Não só esse sentimento como também a solidariedade, a alegria. Posso

complementar que essa oficina é memória de uma tarde muito rica em saberes e

que passou depressa demais”.

Aluna 2:

“Sim, porque fiz novas amizades e gostei muito de tudo”.

Aluna 3:

“Claro que sim,a produção do pão nos aproximou, fortalecendo a nossa

amizade, ou mesmo começando uma nova”.

Aluna 4:

“Olha, eu acho que é bonito ver como algo tão simples pode unir pessoas de

todos os jeitos e feitios”.

Por intermédio das análises das entrevistas, percebeu-se que o grupo de

participantes é heterogêneo em relação aos saberes culinários do pão. Com

isso,inicialmente houve certa dificuldade em relação a alguns passos da execução

da receita do pão.Porém, com o passar do tempo, observaram-se diversas trocas de

experiências culinárias com grande entrosamento entre os participantes, facilitando

a aprendizagem da execução do pão. A partir desse momento, a oficina transcorreu

num clima de harmonia, solidariedade, respeito (Figura 6) e os participantes

apresentaram-se mais confiantes para socializar suas experiências culinárias e, até

mesmo, relataram o que pretendiam realizar depois que aprendessem a fazer o pão.

A qualidade dos pães produzidos demonstrou o elevado grau de interesse e

empenho dos participantes (Figura7).

81

Figura 6 - Participantes da oficina de panificação - Módulo 1

Fonte: Foto de Arthur Moraes

Figura 7 - Pães produzidos pelas participantes do Primeiro Módulo da oficina de panificação

Fonte: Foto de Arthur Moraes

O ato de fazer o pão, empregando matérias-primas de baixo custo, de

combinações saborosas contribuiu para a renda familiar. Observou-se através da

planilha de custo elaborada (Tabela 1), que a receita escolhida favoreceu um lucro

razoável. Considerando as quantidades dos ingredientes da receita, as senhoras

82

conseguiram produzir 60 pãezinhos totalizando um gasto em setembro de 2013 de

R$18,00 reais.

Tabela 1 - Custo de produção para 60 pãezinhos recheados com linguiça defumada

Ingredientes Quantidade Valor¹

Farinha de trigo tradicional 550 gr R$ 2,50 Sopa de cebola 1 envelope R$ 1,80 Linguiça defumada 500 gr R$ 4,15 Fermento biológico 25 gr R$ 1,30 Queijo parmesão ralado 20 gr R$ 1,18 Margarina culinária 125 gr R$ 1,39 Leite integral 200 mL R$ 0,60 Ovo 1 und R$ 0,40 Outros² R$ 4,68 Total R$ 18,00 (¹) Valores referentes às quantidades determinadas com base em Setembro/2013. (²) Hora trabalhada, gás, material de sanitização.

Fonte: Elaborado pela autora.

Portanto o preço de custo para cada pãozinho foi de 30 centavos. Sabendo

que o preço em média de 1 pãozinho de sal é de 50 centavos e que a receita

executada é de um pão caseiro recheado com linguiça, as senhoras poderiam

vender o seu produto num valor acima de 50 centavos. Dessa forma elas também

guardariam um pouco do lucro para formar o capital de giro, ou seja, um valor que

será utilizado para novas compras de ingredientes e materiais. Ao término do

módulo 1, propiciou-se um bem-estar social, elevando-se a autoestima do grupo, em

virtude da possibilidade do aumento da renda familiar através produção de pães de

qualidade e da valorização pelos familiares e pela comunidade local.

6.2 Segundo módulo

No segundo módulo, que ocorreu em setembro de 2013, o objetivo maior foi

de resgatar saberes populares por meio do diálogo entre gerações e, assim,

proporcionar aos jovens um olhar diferente para os idosos pela convivência,

respeito,confiança,humildade.O jovem pode, também, entrar num mundo diferente

do seu cotidiano e tomar consciência das diferenças e das relações entre a

linguagem da ciência e outras formas de falar. Dessa forma, segundo Mortimer

83

(2000), o ensino de Ciências nortearia para a formação cidadã do jovem.

Para a realização desse módulo, foram escolhidas senhoras que participaram

do primeiro e jovens alunos do nono ano da Obra Social. As senhoras foram

escolhidas de acordo com as diversidades de saberes culinários e envolvimento na

realização do primeiro módulo. A escolha dos jovens foi aleatória. Formamos, assim,

duplas de um jovem e uma senhora para produzir pães. Na sequência,expressou-se

às senhoras que as suas participações e seus dizeres eram muito importantes para

o desenvolvimento da pesquisa em questão e que elas procurassem ser “sinceras”

nas suas falas,trazendo, naquele momento,um pouco de sua vivência cotidiana

sobre o ato de fazer pão.

Foram selecionadas e testadas três receitas diferentes de pães, anexadas

nessa pesquisa (Anexo B, p. 120), a fim de trabalhar com uma Ciência

contextualizada e diversificada, buscando conceitos já estudados e outros

interdisciplinares. As receitas escolhidas foram: o pão ázimo que é o pão sem

fermento e achatado, servido na páscoa hebraica, o pão com linguiça, utilizando

fermento químico e o pão recheado com chocolate, utilizando fermento biológico.

Depois das devidas apresentações, iniciou-se o segundo módulo da oficina

com todas as informações dadas no primeiro, ou seja, a limpeza das mãos e local da

produção do pão e a entrega de uma cartilha, anexada à pesquisa, contendo um

breve relato da história do pão e as receitas selecionadas. Além disso, justificou-se

que a história do pão, como disciplina,lança raízes em muitas e variadas áreas de

especialização científica. É um território que vai da Botânica à História das Religiões,

da Economia à Medicina, da Filosofia às Ciências Políticas, da Química Agrícola às

Tecnologias da Moagem e da Panificação. É uma história que continua a ser

contada.

Foi lida em voz alta a prosa de Carlos Drummond de Andrade: “Antigamente”,

possibilitando reflexões sobre a língua e proporcionando aos participantes a

fascinação pela capacidade criativa e inovadora do poeta, favorecendo a formação

de leitores críticos. Para os mais velhos, essa prosa fez relembrar seu passado e

para os jovens essa prosa foi reescrita numa linguagem atual, demonstrando a

importância da sabedoria dos idosos no propósito de ajudar os mais novos a

“respirarem e seguirem adiante” e, como disse Paulo Freire (1976) “[...] todo amanhã

se cria num ontem, através de um hoje [...]. Temos de saber o que fomos, para

saber o que seremos”. (FREIRE, 1976, p.33) “mão na massa” iniciou com a

84

produção da receita de cada dupla e interação entre os participantes por meio de

diálogos dinâmicos, favorecendo o desenvolvimento de sentimentos e adquirindo

novos conhecimentos ou novos significados de conhecimentos adquiridos (Figura 8).

Durante o crescimento da massa do pão, os jovens responderam um questionário

(Apêndice A, p. 96) contendo duas questões fechadas, a fim de verificar como eles

estavam compreendendo o conhecimento da ciência envolvido nos saberes popular

e duas questões abertas com o intuito de avaliar os novos olhares dos jovens e

idosos nesse diálogo de gerações.

Ficou claro para os jovens alunos que algumas tradições na produção do pão

dialogavam diretamente com conhecimentos científicos já estabelecidos. Por

exemplo: ao substituir o fermento caseiro pelo industrializado, aumenta a velocidade

de fermentação do pão. Já a sova da massa em duas etapas distintas permitiu

trabalhar melhor a massa formada durante a mistura dos ingredientes e obter um

produto mais macio e leve. Constatou-se também a aprendizagem de novos

conhecimentos como, por exemplo, o que é glúten e sua função e quais os efeitos

da temperatura e da concentração dos ingredientes sobre a velocidade da

fermentação e a densidade da massa.

Figura 8 - Participantes da oficina de panificação. Módulo 2

Fonte: Foto de Arthur Moraes

Quando questionados sobre a contribuição da oficina de pães para a

compreensão de termos, conhecimentos e conceitos fundamentais da Ciência, a fim

de poder entender pequenas informações e situações do dia a dia, os jovens

85

apresentaram opiniões convergentes como aparece relatado nas respostas a esta

questão:

“A oficina de pães me possibilitou enxergar com mais clareza as

transformações químicas que ocorrem no dia a dia e os fatores que alteram essas

transformações”.

A oficina de pães me mostrou, de uma forma muito descontraída, coisas relacionadas à Ciência que, muitas vezes, passava despercebido como, por exemplo, a fermentação de uma massa de pão, a densidade dos materiais e também pude ver que, nos pequenos atos, pode haver muita ciência.

“Essa oficina contribuiu muito para o meu aprendizado. Eu sempre li em

rótulos de produtos: não contém glúten, mas não sabia o que era. Agora ficou claro

para mim o seu significado e a sua função na massa”.

Quando as senhoras realizaram o procedimento de colocar uma bolinha da

massa de pão dentro de um copo com água, ela afundou e depois de certo tempo

ela flutuou indicando o momento de colocar os pães no forno para assar, observou-

se um interesse dos jovens para explicar cientificamente esse “saber popular” das

senhoras. (Figura 9)

Figura 9 - Bolinha da massa de pão dentro do copo d'água

Fonte: Foto de Arthur Moraes

Houve um incentivo à livre expressão dos jovens, solicitando explicações

dentro da ciência. Ressalto aqui algumas explicações:

86

“[...] a bolinha de massa inicialmente era mais densa que a água e depois ela

tornou-se menos densa que a água”.

“Eu acho que a fermentação da massa libera gás carbônico, aumentando o

seu volume. E aí a bolinha fica menos densa que a água”.

Após várias hipóteses levantadas, conseguiram explicar cientificamente,

utilizando o conhecimento da fermentação biológica e do conceito da densidade.

Durante a execução das receitas de pães, os jovens ficaram atentos às

explicações culinárias e sabedorias das senhoras. Houve momentos nos quais eles

escutaram os idosos e outros que dialogaram com eles, motivados pelos seus

saberes e experiências vividas.

Uma das senhoras que é irmã de caridade, contou a história do pão ázimo, já

que executava a sua receita. A jovem componente da sua dupla relatou que:

poderia pesquisar no Google, na bíblia ou outro livro,mas através da emoção envolvida, quando a Irmã relatou a história do pão ázimo,eu senti um momento mágico de respeito e comunhão, e aí a história ficou mais interessante e eu tive vontade de aprofundar o conhecimento.

A fala dessa jovem demonstrou a valorização pública do idoso. Foi uma

experiência humanizadora.

Uma dona de casa, componente de outro grupo, encantou-se com a forma

como o jovem da sua dupla aprendeu a fazer e enrolar a massa do pão que estavam

produzindo. O jovem é do sexo masculino e não sabia nada sobre culinária.

Observou-se que pela simplicidade e carisma da senhora,o jovem conseguiu

aprender e, até mesmo, mostrou os seus dotes artísticos de enrolar o pão. Segundo

o jovem, a oficina foi boa e “aprendi que o trabalho compartilhado é mais fácil e

enriquecedor. A tarde de hoje foi melhor que as normais. Além disso, a confiança na

minha parceira foi um sentimento que me ajudou muito”.

Outra dupla formada por uma cozinheira e uma jovem teve mais tempo para

dialogar e se conhecer melhor, devido ao fato de estar produzindo um pão com

fermento biológico e ter que esperar a reação da fermentação ocorrer. A jovem

relatou que, hoje em dia, as pessoas quase não conversam umas com as

outras,devido ao uso constante e viciado da tecnologia.As conversas por meio dos

87

aparelhos não têm o mesmo envolvimento e sentimento daquelas que ocorreram

aqui. “Eu me senti amada, confiante ao dialogar com minha dupla e aprendi muito

com os saberes dela”.

As senhoras que trabalharam com os jovens partilharam um diálogo

horizontal com eles, permeado pelo respeito, amor, humildade e confiança, como foi

demonstrado pelas falas de algumas:

A partir do momento que agente aproxima do jovem, agente ouve e ele nos ouve também. É uma questão de aproximação e, de repente, agente começa a descobrir que tem muito a aprender um com o outro. Eu achei interessante porque, no começo, o jovem não sabia fazer nada e, de repente, eu vi uma menina abrindo uma massa, me perguntando sobre a espessura da massa, trocando experiências e trocando descobertas.

Achei muito rica a partilha. Vi o quanto você pode dar e receber. Partilhei com minha dupla que a vida é como fazer o pão, você vai misturando os diferentes elementos da receita: farinha, água, leite, açúcar, etc. e, no fim, sai uma coisa bonita e saborosa.

“A confiança e a simplicidade me fizeram dialogar com o jovem da minha

dupla e, assim, fortalecer o nosso convívio durante a realização da receita. Fiquei

feliz com o resultado”.

Em seguida, foi lida a poesia de Olavo Bilac: “Velhas Árvores” para que os

jovens percebessem que estão envelhecendo e aceitassem o fato de forma feliz.

Assim os idosos se lembram do que fizeram na juventude e sabem que

aproveitaram muito bem sua vida. Agora ensinam os mais novos a sabedoria da

vivência. Após assar os pães, houve uma confraternização com o momento da

degustação e foram realizados depoimentos a respeito do trabalho e interações

entre gerações, dos sentimentos envolvidos,da aprendizagem e da convivência com

os demais que já foram relatados acima. (CD Anexo)

Não existe uma “receita” perfeita para se conseguir formar cidadãos críticos,

autônomos e participativos porque a convivência entre as pessoas não é uma

relação que caiba numa “receita”. Portanto não pretendemos aqui estabelecer

nenhuma receita para professores, mas apenas fazer uma reflexão sobre o ensino

das Ciências Naturais: é possível trabalhar de uma forma interdisciplinar, discutir

temas relacionados com valores e formas de encarar as conexões da Ciência com

88

as ideologias (por exemplo, a capitalista) e, finalmente, é possível escolher

conteúdos científicos que são, verdadeiramente, relevantes para a vida das

pessoas.

Nesse contexto, propomos uma cartilha (Apêndice B, p. 99), contendo os

passos seguidos para a elaboração e execução da oficina de panificação,uma

modalidade pedagógica que possibilita ao aluno vivenciar situações diversas que

favoreçam o aprendizado, capacitando ao diálogo com a comunidade e à

participação da vida em todos os seus âmbitos: científico,cultural, social e político.

(BRASIL, 1997). Caso o professor tenha interesse em aprofundar o tema, propomos

algumas sugestões de leitura no final da cartilha.

89

7 CONCLUSÕES

Nessa pesquisa, foi elaborada e aplicada uma alternativa didática, uma oficina

pedagógica de panificação caseira e artesanal em forma de um projeto vivencial,

onde a dialogicidade foi essencial na relação entre as pessoas com desigualdade de

saberes e uma variedade de interpretações sobre o mundo natural. Verificou-se a

oportunidade de interligar as atividades com a realidade dos alunos, dando ênfase

às questões sócio educativas e sócio profissionais. Nesse contexto, essa pesquisa

propiciou um diálogo democrático entre gerações, buscando um intercâmbio de

saberes populares e escolares, pautado nos pressupostos: amor, humildade, fé nos

homens, esperança e pensar crítico que ,segundo Paulo Freire, norteiam a

comunicação educador-educando. Observou-se um grande interesse do jovem

aluno em compreender, interpretar e relacionar os saberes populares dos mais

idosos com os saberes escolares do ensino de Ciências. Além disso, constatou-se a

exploração de conteúdos interdisciplinares como promotores da alfabetização

científica de maneira adequada. Observou-se também que a aprendizagem do aluno

é mais significativa, quando se combina estudo com projetos sem descuidar da

imersão em atividades sociais e culturais com grupos de trabalho diferentes dos

habituais. Essa conclusão pôde ser confirmada de forma generalizada no

questionário respondido pelos alunos, nas entrevistas e filmagens realizadas.

Percebeu-se a solidariedade, a alegria, a motivação dos idosos quando dialogavam

com os jovens num ambiente de aprendizagem mútua.

É notório que o ensino de Ciências deve fornecer estímulos ao conhecimento

e desenvolver nos estudantes a possibilidade de participarem ativamente da

sociedade. O foco da educação não pode permanecer no nível pessoal, individual,

na preparação só para o trabalho. Por isso, é importante salientar o desenvolvimento

social, o empenho na construção de uma sociedade mais justa, o compromisso do

conhecimento pessoal com os que convivem conosco, com o país, com o planeta,

com o universo. A educação precisa que cada aluno se insira na comunidade e

desenvolva a sua capacidade de assumir responsabilidades e direitos, seja um

aluno cidadão. Porém, o individualismo, fortemente incentivado pela sociedade de

consumo, pela mídia que enaltece valores diferentes dos da escola dificulta a

formação desse aluno. Além disso, a formação intelectual valoriza mais o conteúdo

oral e textual, separando razão e emoção. O professor não costuma ter uma

90

formação emocional afetiva. Por isso, tende a enxergar mais os erros que os

acertos. A falta de valorização profissional também interfere na autoestima. Se os

professores não desenvolvem sua própria autoestima, se não se dão valor, se não

se sentem bem como pessoas e profissionais, não poderão educar num contexto

afetivo. Refletindo sobre os resultados obtidos nessa pesquisa, concluímos que é

possível elaborar modalidades pedagógicas que dinamizem ações para que alunos

e professores desenvolvam sua autoconfiança, sua autoestima; que tenham respeito

por si mesmos e acreditem em si; que percebam, sintam e aceitem o valor pessoal e

o dos outros . Assim será mais fácil aprender e comunicar-se com os demais numa

relação horizontal. Politicamente, precisamos fazer todo o esforço possível para que

a escola seja um lugar de colaboração, de inclusão, de aumento de consciência. A

educação social é importante para poder compreender as raízes da desigualdade e

para encontrar meios de diminuí-la.

Finalmente, concluímos que o processo ensino-aprendizagem de Ciências, a

partir dessa via metodológica alternativa, proposta como produto dessa dissertação,

pode corroborar e superar o processo de ensinar e aprender fragmentado,

disciplinar, descontextualizado, unilateral, direcionador, dissociado da existência

social e natural do Planeta que se constata na maioria das escolas. Ressaltamos,

ainda, que todos os programas, em todos os níveis educacionais, podem incorporar

tempos específicos de prestação de serviços, de colaborar com os menos

favorecidos, de retribuir o que a sociedade nos oferece para que nos dediquemos

muitos anos a aprender.

91

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96

APÊNDICE A - Questionário aplicado aos jovens alunos participantes da

Oficina de Panificação

Pesquisa em Ensino de Ciências.

Oficina de Panificação

Caros Jovens,

Agradecemos imensamente as contribuições dadas durante nossa oficina de

panificação, e pedimos a gentileza de, responder com carinho e seriedade as

perguntas a seguir.

Profₐ Dulcinéa Lopes de Oliveira

“Quando se compartilha a vida, sempre sobram experiências; quando se compartilha o pão e o fruto do trabalho cotidiano, sempre haverá menos

injustiças”. Papa Francisco

1) Quando elaboramos uma massa de pão transformamos a cozinha em um

laboratório de reações, aromas, sabores e texturas. A textura leve e porosa

do pão é devido à presença de duas proteínas (gliadina e glutenina) na

farinha de trigo. Ao misturar-se com um líquido e ser amassada, a farinha

forma uma material elástico denominado glúten.

ASSINALE a opção que melhor explique a função do glúten:

a) O glúten tem a habilidade de esticar-se e aprisionar as bolhas de gás

formadas durante a fermentação e que farão o pão crescer.

b) O glúten confere ao pão uma massa dura e sem sabor.

c) O glúten é o responsável pela coloração dourada do pão depois de assado.

d) O glúten é o responsável pelo crescimento da massa do pão.

2) De acordo com o “saber popular”, uma maneira de verificar o momento de

levar a massa de determinado pão ao forno é colocar uma bolinha da massa

dentro de um copo com água. Quando a bolinha subir para a superfície do

copo, o pão está pronto para assar.

97

ASSINALE a alternativa que explica cientificamente o “saber popular” citado:

a) A bolinha da massa é mais pesada que a água e inicialmente vai pro fundo do

copo. Ela subirá para a superfície do copo porque fica mais leve que a água.

b) A explicação é simples: quando a fermentação ocorre, a bolinha se enche de

gás carbônico e aumenta de volume, o que diminui sua densidade. Então, ela

flutua.

c) A explicação deve-se ao fato da bolinha da massa ficar menos solúvel em

água com o passar do tempo causando a flutuação da mesma.

d) A bolinha da massa do pão flutuará porque após a fermentação ocorreu

aumento da massa e diminuição do volume e consequentemente diminuição

da densidade.

3) A oficina de pães contribuiu para a compreensão básica de termos,

conhecimentos e conceitos científicos fundamentais da ciência a fim de poder

entender pequenas informações e situações do dia-a-dia?

SIM ( )

Justificativa:

___________________________________________________________________

___________________________________________________________________

___________________________________________________________________

NÃO ( )

Justificativa:

___________________________________________________________________

___________________________________________________________________

___________________________________________________________________

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4) À luz do pensamento freiriano, entendemos o diálogo como uma relação de

comunicação estabelecida horizontalmente pelas pessoas, e permeada pelo

respeito, a morosidade, humildade e confiança entre elas e principalmente

pela fé na sua essência humana.

Ao dialogar com as pessoas durante a realização da oficina de pães, CITE e

JUSTIFIQUE quais desses sentimentos facilitaram e fortaleceram a aprendizagem e

a convivência com os demais.

___________________________________________________________________

___________________________________________________________________

___________________________________________________________________

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APÊDICE B - Cartilha: Oficina de Panificação Caseira Artesanal

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118

ANEXO A - TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO (TCLE)

Eu Dulcinéa Lopes de Oliveira responsável pela pesquisa: Oficina de

Panificação: cidadania, ascensão socioeconômico, conhecimento científico e

diálogo entre gerações, estamos fazendo um convite para você participar como

voluntário deste nosso estudo.

Esta pesquisa pretende elaborar e avaliar uma oficina pedagógica de

panificação caseira oportunizando ao aluno a viabilidade de um aprendizado

contextualizado da ciência através do diálogo de gerações. Acreditamos que ela seja

importante porque resgata os saberes populares das pessoas mais velhas e ao

mesmo tempo vivenciamos a solidariedade, fraternidade, respeito ao próximo

buscando a responsabilidade social diante do futuro. Para sua realização será feito o

seguinte: elaboração de receitas básicas de pães visando o diálogo entre os

participantes, entrevistas e questionário.

Os benefícios que esperamos como estudos são: oportunizar um aprendizado

da ciência contextualizada, buscar atitudes e ações que valorizem a convivência e o

sentimento com o próximo.

Durante todo o período da pesquisa você tem o direito de tirar qualquer

dúvida ou pedir qualquer outro esclarecimento, bastando para isso entrar em

contato, com algum dos pesquisadores ou com o Conselho de Ética em Pesquisa.

Você tem garantido o seu direito de não aceitar participar ou de retirar sua

permissão, a qualquer momento, sem nenhum tipo de prejuízo ou retaliação, pela

sua decisão.

As informações desta pesquisa serão confidencias, e serão divulgadas

apenas em eventos ou publicações científicas, não havendo identificação dos

voluntários, a não ser entre os responsáveis pelo estudo, sendo assegurado o sigilo

sobre sua participação. Serão também utilizada imagens como fotos e vídeos. Os

gastos necessários para a sua participação na pesquisa serão assumidos pela

pesquisadora. Fica também garantida indenização em casos de danos,

comprovadamente decorrentes da participação na pesquisa, conforme decisão

judicial ou extrajudicial.

119

Autorização:

Eu, ----------------------------------------------------------------------------------------------------após

a leitura deste documento e ter tido a oportunidade de conversar com a

pesquisadora responsável, para esclarecer todas as minhas dúvidas, acredito estar

suficientemente informado, ficando claro para mim que minha participação é

voluntária e que posso retirar este consentimento a qualquer momento sem

penalidades ou perda de qualquer benefício. Estou ciente também dos objetivos da

pesquisa, dos procedimentos aos quais serei submetido, da garantia de

confidencialidade e esclarecimentos sempre que desejar. Diante do exposto

expresso minha concordância de espontânea vontade em participar deste estudo.

----------------------------------------------------------------------------------------------------------------

Assinatura do voluntário ou do representante legal

Dados da pesquisadora:

Dulcinéa Lopes de Oliveira

Rua Oliver 225 apto 400 Bairro União

(31)96412484

Endereço eletrônico: [email protected]

120

ANEXO B - RECEITAS DOS PÃES PRODUZIDOS

a) Receita para o primeiro módulo da oficina de panificação: Pãozinho recheado especial

Ingredientes:

a) 550g de farinha de trigo tradicional (4 copos de requeijão bem cheios).

b) 1 envelope de sopa de cebola.

c) 125 g de margarina culinária ou forno e fogão.

d) 25 g de fermento biológico (1 tablete e ½).

e) 250 mL de leite morno (1 copo bem cheio de requeijão).

f) 1 colher de sopa rasa de açúcar.

g) Gema para pincelar.

h) 1 pacote de queijo parmesão

Modo de preparo:

a) Preparo do fermento:

Numa tigela de vidro adicione o leite morno, o açúcar, 1 colher de sopa rasa

de farinha e misture bem. Em seguida adicione o fermento bem esfarelado e misture

até ficar homogêneo.Reserve.

b) Numa bacia peneire a farinha de trigo, adicione a sopa de cebola e misture

bem.

c) Adicione a margarina que foi retirada da geladeira ½ hora antes de usar e

misture bem.

d) Adicione o fermento preparado no item 1 e misture com a colher até

incorporar tudo.

e) Amasse com as mãos até obter uma massa que solte das mãos. Deixe

descansar por 15 minutos.

f) Abra a massa com um rolo e corte um quadrado de aproximadamente 10 cm

de lado.

121

g) Coloque o recheio e feche fazendo a arte de sua preferência.

Recheio: a gosto. Pode se salsicha, linguiça, carne seca, peito de frango. b) Receitas para o segundo módulo da oficina de panificação:

1) Pão com linguiça utilizando fermento químico Ingredientes: 4 xícaras de farinha de trigo 2 colheres (sopa) de banha 2 colheres (sopa) margarina 1 colher (sobremesa) rasa de fermento comum 1 copo de leite Pedaços de linguiça para recheio Procedimento:

a) Misturar todos os ingredientes secos. b) Adicionar as gorduras (banha e margarina) e misturar até incorporar a gordura

na massa. c) Adicionar aos poucos o leite e misturar. Se a massa ficar seca colocar um

pouco mais de leite. d) Sovar bem até que a massa fique homogênea. e) Dividir a massa em pequenas porções e abrir com o rolo cada porção

separadamente numa camada não muito fina. f) Cortar a massa em pedaços retangulares e colocar o recheio (linguiça) para

ser enrolado. g) Pincelar cada pãozinho com gemas e leve ao forno para assar.

2) Pão recheado com chocolate utilizando fermento biológico

Ingredientes:

1 kg de farinha de trigo 1xícara de açúcar 1 colher (sopa) de sal 150g margarina 4 gemas 60g de fermento biológico 2xícaras de leite morno Pedaços de chocolate

122

Procedimento:

a) Dissolver o fermento no leite com metade do açúcar e reservar por 5 minutos. b) Adicionar os demais ingredientes e amassar bem. Deixar descansar por 30

minutos. c) Dividir a massa em 4 partes e abrir cada uma delas em forma circular. d) Cortar cada círculo em forma de fatias de pizza. e) Colocar o pedaço de chocolate na borda maior e enrolar. f) Pincelar com gema e colocar para crescer até dobrar de volume ou fazer uma

bolinha de massa e colocá-la num copo com água. Quando a bolinha subir para a superfície do copo, o pão está pronto para assar.

g) Assar em forno numa temperatura de 180 °C por 25 a 30 minutos.

3) Pão ázimo

Ingredientes:

1 xícara de farinha de trigo integral

1 e 1/2 xícaras (aproximadamente) de farinha de trigo branca

1 colher de sopa de suco de limão

2 colheres de sopa de manteiga amolecida

sal (cerca de 2 colheres rasas de chá)

1 e 1/2 colher de sopa do complemento de sua preferência (gergelim, linhaça,

kümmel, ervas finas, orégano etc.)

Leite morno

Procedimento:

a) Misturar bem a manteiga, o sal, o suco de limão e a farinha integral.

b) Acrescentar o leite e o complemento escolhido.

c) Adicionar aos poucos a farinha branca até que a massa fique consistente e

desgrude da mão.

d) Dividir a massa em quatro pedaços e abra com o rolo até que fique bem fininha. Se houver necessidade polvilhe a massa com farinha.

e) Cortar a massa aberta em retângulos disponha-os em uma assadeira (não precisa untar!) e asse em fogo médio.

f) Fique de olho na massa enquanto assa. Ela vai começar a despregar do fundo da assadeira e você pode se quiser virar os pedaços para assarem mais uniformemente.

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Existem duas maneiras de assar o pão ázimo. Pode ser assado em fornos ou

ser frito em frigideira.