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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC/SP EDUARDO MOLAN GABAN Monopólio postal à luz do direito constitucional e do direito antitruste - um estudo comparado das experiências européia e norte-americana. DOUTORADO EM DIREITO SÃO PAULO 2011

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Page 1: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC/SP · fundamentos econômicos e jurídicos subjacentes ao caso do monopólio postal brasileiro. A partir desse estudo, foi possível

PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO

PUC/SP

EDUARDO MOLAN GABAN

Monopólio postal à luz do direito constitucional e do direito antitruste

- um estudo comparado das experiências européia e norte-americana.

DOUTORADO EM DIREITO

SÃO PAULO

2011

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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO

PUC/SP

EDUARDO MOLAN GABAN

Monopólio postal à luz do direito constitucional e do direito antitruste

- um estudo comparado das experiências européia e norte-americana.

Tese apresentada à Banca Examinadora da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, como exigência parcial para a obtenção do título de Doutor em Direito do Estado / Constitucional, sob a orientação da Profa. Dra. Maria Garcia.

SÃO PAULO

2011

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Banca Examinadora

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“Ao que lhe respondeu Jesus: ‘Se podes...?

Tudo é possível ao que crê.’”

Marcos 9:23.

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Dedico este trabalho aos meus avós:

Álvaro Molan (in memorian) e Iracema Hilário

Molan que, com simplicidade, pureza e muito

trabalho são, até hoje, meus grandes

professores.

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AGRADECIMENTOS

A Deus, que me deu a oportunidade e capacitação para desenvolver este

estudo.

A minha amada esposa, Juliana Oliveira Domingues, por ter me estimulado a

seguir em frente com este projeto. A ela também agradeço pela constante e

profunda troca de idéias no campo jurídico, econômico e pela brilhante idéia e

apoio incondicional para que eu me candidatasse ao programa de Doutorado

Sanduíche nos EUA. Apenas em razão disso é que foi possível o

aprofundamento do tema deste trabalho, especialmente para realizar, a

contento, a comparação do sistema brasileiro com os sistemas norte-

americano e europeu.

Aos meus familiares: Sonia Maria Molan Gaban, Antonio Roberto Gaban,

Sandra Mendonça Oliveira Domingues, Jayro Domingues, Luiz Fernando

Molan Gaban, Ana Paula Molan Gaban e Jordana Oliveira Domingues, pelo

carinho e constante apoio, sobretudo no período que estive nos EUA.

Agradeço especialmente à Comissão Fulbright Brasil, nas pessoas do Dr. Luiz

Valcov Loureiro e Glayna Braga, pela confiança depositada em mim e em meu

projeto de pesquisa, bem como à CAPES pelas mesmas razões. À New York

Universtity School of Law, nas pessoas do Professor Harry First e da

Professora Eleanor Fox, que me abriram as portas para um universo até então

por mim desconhecido do ensino jurídico e, particularmente, do estudo do

Direito Antitruste numa acepção globalizada. Sou muito grato também ao

Institute of International Education (IIE) of the US Department of State, pelas

excelentes experiências ao longo do ano que vivi em New York.

Agradeço aos meus colegas e amigos da NYU Law pela convivência em New

York, bem como pela sempre enriquecedora troca de idéias sobre o Direito

Antitruste e sobre o tema deste trabalho: Kojiro Fujii, Aris Limjoco Gulapa,

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Alexander Mirkin, Jorge Grunberg, María José Henríquez, Aditi

Gopalakrishnan, Friederik Fronius, Giacomo Pailli, Nicole Arzt, Linda Smalls e

Marina Highland. Da mesma forma, agradeço aos meus colegas fulbrighters

que convivi em New York e pude debater bastante sobre o tema deste trabalho:

Alexander Jensen e Apurva Pandya.

A minha orientadora, Professora Dra. Maria Garcia, pelas sempre profundas e

enriquecedoras reuniões de orientação e lições de vida, desde à época do

curso de graduação em Direito na PUC/SP, durante o Mestrado em Direito na

PUC/SP e, agora, no Doutorado em Direito na PUC/SP.

Agradeço o auxílio da acadêmica Mariana Vilella, da Faculdade de Direito da

USP, que me ajudou no levantamento bibliográfico e juridprudencial brasileiro,

bem como pelas proveitosas discussões em torno do tema deste trabalho.

Agradeço igualmente ao meu colega Bruno Droghetti Magalhães Santos, pelo

auxílio no levantamento e atualização da jurisprudência nacional e igualmente

pelas ricas discussões sobre o tema deste trabalho. Agradeço a minha

Secretária, Andrea Zefira Vicente, pelo auxílio no período que estive nos EUA

bem como na elaboração da lista de siglas deste trabalho.

Agradeço aos professores Gesner de Oliveria (FGV/SP), Peter Carstensen

(University of Wisconsin), Dale Collins (NYU), Irving Scher (NYU), Ivo Waisberg

(PUC/SP), Jacinto Arruda Câmara (PUC/SP), André Ramos Tavares (PUC/SP),

Tercio Sampaio Ferraz Jr. (USP) e Alberto Amaral Jr. (USP) que de formas

diversas contribuíram para a concretização deste projeto.

Por fim, agradeço ao escritório Machado Associados, na pessoa do Dr. José

Maurício Machado, que me concedeu uma licença para que eu pudesse me

ausentar e completar essa etapa tão importante em minha vida profissional e

acadêmica.

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RESUMO

O presente trabalho refere-se à elaboração de proposta de linha hermenêutica

para o monopólio postal com a finalidade de demonstrar sua incompatibilidade

com a Constituição Federal de 1988, por intermédio de abordagem

multidisciplinar embasada nas disciplinas do direito constitucional e do direito

antitruste. Buscou-se analisar pela ótica dos efeitos à sociedade, se, de modo

geral, deveria o Brasil manter o modelo de monopólio legal operado por

empresa estatal (ECT) para os serviços postais. De modo particular, foi

analizado se teria a Constituição de 1988 recepcionado a legislação

infraconstitucional anterior (que constitui base jurídica para o monopólio postal

no Brasil), reconhecendo sua compatibilidade/harmonização com os princípios

constitucionais da livre iniciativa e livre concorrência que estruturam a ordem

econômica vigente. Foi realizado um estudo comparado das experiências

norte-americana e européia, a partir do que foi possível melhor avaliar os

fundamentos econômicos e jurídicos subjacentes ao caso do monopólio postal

brasileiro. A partir desse estudo, foi possível elaborar propostas positivas para

aprimorar o modelo brasileiro de serviços postais. Em síntese, concluiu-se que

o modelo de monopólio legal exercido por empresa estatal não é o mais

indicado para os serviços postais, sendo que, no caso do Brasil, não seria

compatível com a Constituição Federal de 1988, razão pela qual, não seria

possível harmonizar a legislação anterior, que instituíra o monopólio legal, com

a Constituição de 1988.

Palavras-chave: serviço postal, monopólio, antitruste, constituição, bem-estar

social.

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ABSTRACT

The paper refers to the elaboration of a hermeneutic line of investigation for the

postal monopolies, aiming to demonstrate its incompatibility with the 1988

Federal Constitution, through a multidisciplinary approach grounded in the

disciplines of constitutional and antitrust law. Through an optical analysis of the

possible effects to society, the question of whether Brazil should maintain its

legal monopoly within the postal services was discussed; more specifically,

would the 1988 Constitution have approved the infraconsitutional legislation

(which constitutes the legal basis for the postal monopoly in Brazil) recognizing

their compatibility/harmonization with the constitutional principles of free

economic enterprise and free competition, which structure the current economic

order. A comparative study was developed on the US and EU experiences,

which contributed to better evaluate the arguments and the grounds underlying

the Brazilian postal monopoly. Therefore, good propositions emerged to

improve the Brazilian model for the postal services. It was concluded that the

monopoly model, used by State owned companies, is not the ideal model for

the postal services. In Brazil’s specific case, it is not compatible with the 1988

Federal Constitution. It would, therefore, not be possible to harmonize the

previous legislation, which instituted the legal monopoly (Legal Decree n.

509/1969 and Law n. 6538/1978).

Key words: postal service, monopoly, antitrust, constitution, social-welfare.

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LISTA DE SIGLAS

ABRAED Associação Brasileira de Empresas de Distribuição

ACC 1 Agências de Correios Comercial do tipo 1

ACD Annual Compliance Determination Report

ADPF Ação por Descumprimento de Preceito Fundamental

AGESPISA Águas e Esgotos do Piauí S/A

AGU Advocacia Geral da União

ANATEL Agência Nacional de Telecomunicações

ANP Agência Nacional do Petróleo BETA Brazilian Express Transportes Aéreos Ltda.

BPO British Post Office

B2B Business-to-Business

B2C Business-to-Consumer

CA Council of Administration

CADE Conselho Administrativo de Defesa Econômica

CANADA POST Canada Post Corporation

CE Comissão Européia

CEPT European Conference of Postal and Telecommunications

Administrations

CF/88 Constituição Federal de 1988

CFR Code of Federal Regulations

CPMI Comissão Parlamentar Mista de Inquéritos

DBP Deutsche Bundespost Posdienst

DC Distrito de Columbia

DCT Departamento de Correios e Telégrafos

DEMASA Departamento Municipal de Meio Ambiente e Saneamento

DPAG Deutsche Post AG

DPWN Deutsche Post World Net

ECT Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos

EEC Treaty Establishing the European Community

EFD Essential Facilities Doctrine

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EUA Estados Unidos da América

FTC Federal Trade Commission

FEDEX Federal Express

FUNDAP Fundação do Desenvolvimento Administrativo

GCR Global Competition Review

GD NET GD NET BV

IB International Bureau

ICN International Competition Network

IECC International Express Carriers Conference

IEEI Instituto de Estudos Estratégicos e Internacionais

IISD International Institute for Sustainable Development

IPO Initial Public Offering

IPTU Imposto Predial e Territorial Urbano

NYU New York University School of Law

OCDE Organização para Cooperação e Desenvolvimento

Econômico

OMC Organização Mundial do Comércio

OSHA Occupational Safety and Health Administration

PAEA Postal Accountability and Enhancement Act

PES Private Express Statutes

POC Postal Operations Council

PRA Postal Reorganization Act

PRC Postal Regulatory Commission

PTT POST PTT Post BV

RPN Rede Postal Noturna

SAAE Serviço Autônomo de Água e Esgoto de Lagoa da Prata

SABESP Companhia de Saneamento Básico do Estado de São

Paulo

SBDC Sistema Brasileiro de Defesa da Concorrência

SPPL Singapore Post Private Limited

STF Supremo Tribunal Federal

TCU Tribunal de Contas da União

TFEU Treaty on the Functioning of The European Union

TPG TNT Post Group

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TPO The Post Office of UK

UE União Européia

UN United Nations

UNCTAD United Nations Conference on Trade and Development

UPS United Parcel Service

UPU Universal Postal Union

USC United States Code

USO Universal Service Obligations

USP Universal Service Provider

USPS United States Postal Service

VAT Imposto Sobre Valor Agregado

VoIP Voz sobre Protocolo de Internet

WB World Bank

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO.....................................................................................................1

CAPÍTULO I. ANTITRUSTE E BEM-ESTAR SOCIAL 1.1 Introdução………………………………………………………………………….5

1.2 Antitruste para a erradicação da pobreza e combate à corrupção?..............7

1.2.1 Antitruste e erradicação da pobreza...........................................................8

1.2.2 Antitruste e combate à corrupção.............................................................15

1.3 Monopólio natural, serviço universal e interesse público……………………23

1.3.1 Serviços postais: monopólio natural?.......................................................24

1.3.2 Serviço universal: é necessário o serviço postal ser público?..................35

1.3.2.1 Externalidades negativas decorrentes do controle e gerência estatal dos

serviços postais.................................................................................................35

1.3.3 Serviço universal: é indispensável o monopólio legal?............................40

1.4 Considerações finais...................................................................................45

CAPÍTULO II. OS SERVIÇOS POSTAIS NOS EUA

2.1 Introdução...................................................................................................46

2.2 Histórico......................................................................................................49

2.3 Normas jurídicas e jurisprudência...............................................................52

2.4 Ambiguidades, exceções e isenções no Private Express Statutes............63

2.4.1 Isenções e exceções...............................................................................66

2.4.1.1 A exceção do letters of the carrier........................................................68

2.4.1.2 A exceção do extremely urgent letters..................................................71

2.5 Cumulação de funções de concorrente (i.e., player) e regulador................75

2.6 Abuso do poder de monopólio e da função reguladora...............................77

2.7 USPS: isenção antitruste.............................................................................80

2.8 Postal Accountability and Enhancement Act of 2006..................................87

2.9 Considerações finais...................................................................................88

CAPÍTULO III. OS SERVIÇOS POSTAIS NA UNIÃO EUROPÉIA 3.1 Introdução...................................................................................................93

3.2 Histórico......................................................................................................95

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3.3 Normas jurídicas e jurisprudência..............................................................107

3.3.1 Limites do monopólio postal...................................................................110

3.3.1.1 Jurisprudência sobre limites do monopólio postal...............................129

3.3.2 Transparência e não discriminação........................................................133

3.3.2.1 Acesso às redes postais (postal networks)..........................................135

3.3.2.2 Princípios para definição de tarifas (ou preços)...................................143

3.3.2.3 Jurisprudência sobre transparência e não discriminação....................148

3.3.3 Terminal dues (“tarifas de interconexão de redes postais”)....................164

3.3.3.1 Jurisprudência sobre terminal dues.....................................................165

3.3.4 Separação de funções de gestão empresarial (player) das funções

regulatórias......................................................................................................170

3.3.4.1 Jurisprudência sobre separação de funções de player e regulador....174

3.5 Considerações finais..................................................................................178

CAPÍTULO IV. OS SERVIÇOS POSTAIS NO BRASIL 4.1 Introdução..................................................................................................182

4.2 Histórico.....................................................................................................184

4.3 Normas jurídicas e jurisprudência..............................................................191

4.3.1 Decreto Lei nº 509/1969.........................................................................191

4.3.2 Lei nº 6.538/1978....................................................................................195

4.3.3 Os serviços postais na Constituição de 1988.........................................199

4.3.3.1 A teoria da recepção na Constituição de 1988....................................201

4.3.3.2 A regra geral da livre iniciativa (livre mercado)....................................203

4.3.3.3 Exceções à regra do livre mercado (i.e., monopólios legais)..............207

4.3.3.3.1 Incompatibilidade formal das “leis da ditadura” com a Constituição de

1988.................................................................................................................208

4.3.3.3.2 Incompatibilidade material (ou contrassenso histórico)....................212

4.4 Serviço público ou atividade econômica: esse debate faz sentido para os

serviços postais?.............................................................................................215

4.4.1 Os diversos conceitos e classificações de serviços públicos.................217

4.4.2 O conceito de serviço público adotado neste trabalho...........................227

4.5 ADPF 46-7: Avanço ou retrocesso?..........................................................229

4.6 Monopólio postal e corrupção no Brasil....................................................243

4.6.1 A corrupção na Rede Postal Noturna (RPN)..........................................246

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4.7 Ampliação dos limites do monopólio postal para entrega de contas de

consumo..........................................................................................................248

4.7.1 Entrega de contas de consumo de água e esgoto.................................248

4.8 Considerações finais.................................................................................252

CAPÍTULO V. RESULTADOS DA EXPERIÊNCIA INTERNACIONAL

5.1 Introdução..................................................................................................255

5.2 Lições da experiência internacional...........................................................259

5.2.1 Serviço universal não necessita de monopólio postal............................260

5.2.2 Segurança e privacidade não decorrem da prestação estatal................263

5.3 Diferentes modelos, diferentes resultados.................................................264

5.3.1 Nova Zelândia.........................................................................................265

5.3.2 Suécia.....................................................................................................267

5.3.3 Holanda...................................................................................................268

5.3.4 Alemanha................................................................................................270

5.4 Considerações finais..................................................................................271

CONSIDERAÇÕES FINAIS............................................................................273

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS...............................................................277

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1  

INTRODUÇÃO

A proposta central deste estudo é desenvolver uma interpretação e

depuração do debate e dos argumentos jurídicos (no plano constitucional) e

econômicos envolvidos na questão do monopólio postal no Brasil, por

intermédio da instrumentalização proporcionada pela teoria antitruste e

aproveitando-se das experiências norte-americana e europeia sobre o tema.

Não se pretende com o presente, vale frisar, elaborar regra dedutiva como

espécie de proposta abstrata de releitura do imbróglio jurídico existente, mas,

sim, pretende-se, sob a ótica dos incentivos e dos efeitos ocasionados à

sociedade (decorrentes da estrutura atualmente existente), propor-se uma

linha hermenêutica que mais se adeqúe à Constituição. Isto é, uma linha

hermenêutica que, antes de qualquer outro objetivo atinente à maximização

de bem-estar individual, esteja mais relacionada e comprometida com os

ditames do bem-estar social, livre iniciativa, livre concorrência, proteção do

consumidor e desenvolvimento econômico.

O Brasil vive momento crucial relativo ao serviço postal. Após mais de

20 anos da promulgação da Constituição Federal de 1988, tramitou

recentemente no Supremo Tribunal Federal (STF), bem como tramitam em

diversas varas e tribunais (Estaduais e Federais) ao longo do território

brasileiro, inúmeras ações envolvendo a Empresa Brasileira de Correios e

Telégrafos (ECT), nas quais se discute, de alguma forma, o monopólio legal

dos serviços postais à luz da Constituição de 1988. Sob argumentos como

defesa do interesse público, segurança dos consumidores e universalização

do serviço postal, procura-se argumentar, com certo viés ideológico e

ufanista (possivelmente por razões político-partidárias), que o melhor modelo

para o Brasil é o monopólio legal dos serviços postais exercido pela empresa

pública ECT.

Particularmente, pouco se observa nos debates, até então realizados

no Judiciário brasileiro, um aprofundamento dos testes de validade fática e

jurídica dos argumentos utilizados pela ECT para preservar esse modelo,

bem como quais seriam os efeitos de sua manutenção nos dias de hoje.

Nesse sentido, além dos argumentos puramente ideológicos, defende-se que

o Decreto-Lei nº 509/1969 e a Lei nº 6.538/1978 foram recepcionados pela

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CF/88 e, com base nisto, mantem-se os serviços postais em regime de

monopólio legal e possibilita-se à ECT ampliar tal reserva legal1 na medida

em que entenda que um dado serviço (como por exemplo, de leitura e

cobrança de saneamento básico) inclui-se no conceito de serviço postal.

Dessa forma, o espaço para a competição de outros agentes

econômicos (i.e., diversas empresas nacionais e multinacionais que operam

e tem potencial de operar de forma eficiente em parte e na totalidade os

mercados postais e correlatos no Brasil) é cada vez menor e até inexistente.2

Tudo sob o argumento de que, para universalizar o serviço, a ECT necessita

contar com as receitas provenientes tanto dos serviços postais quanto dos

mercados vizinhos ou correlatos.

As inúmeras empresas privadas afetadas vão de pequenas a grandes

empresas, empregam centenas de milhares de pessoas, proporcionam

centenas de milhares de reais em arrecadações tributárias e movimentam a

economia nacional, regional e local em níveis não desprezíveis, ao mesmo

tempo em que, por serem privadas, têm de operar de forma eficiente e sob o

regime de livre concorrência, o que, por si só gera diversos benefícios à

sociedade, principalmente ao bem-estar do consumidor (e.g., melhores

preços, melhor qualidade, aumento da diversidade da oferta, inovação

tecnológica, customização etc.). A indagação geral que se coloca, portanto,

é: seria a vontade da Constituição de 1988 preservar o modelo de monopólio

postal prestado por empresa pública, controlada e gerida pelo Governo

Federal?

Mais que um embate polarizado entre agentes econômicos

preocupados com a maximização do bem-estar individual, a questão toma

proporções sem precedentes e acaba por abranger diretamente o interesse

da sociedade, notadamente, o bem-estar social, pois, em perspectiva

estática, no tema estão abrangidos pontos como a manutenção de milhares

de empregos diretos e centenas de milhares de empregos indiretos, a

                                                                                                                         1 Entende-se por reserva legal a limitação, por lei, do número de ofertantes em um dado mercado. Isto é, diz-se reserval legal quando a lei reserva uma dada atividade econômica para ser exercida por apenas um agente econômico, ou, por um monopólio. 2 Para Nusdeo a concorrência é uma questão de grau. Ela é máxima nos mercados cujas estruturas os aproximam do modelo da concorrência perfeita e mínima ou inexistente no extremo oposto do monopólio bilateral. NUSDEO, Fábio. Curso de economia – introdução ao direito econômico. 4°. ed. rev. atual. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2005, p. 283.  

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3  

limitação artificial da livre concorrência resultando em preços

supracompetitivos e escassez de ofertas alternativas ao consumidor.

Em perspectiva dinâmica, a questão é ainda mais preocupante, pois

estão ameaçados incentivos como inovação tecnológica, investimentos no

setor, aliados à perda ou desvio de recursos econômicos que, ao invés de

fomentarem o desenvolvimento econômico e social, voltam-se aos preços

supracompetitivos praticados pelo agente monopolista.

Nesse contexto, o presente trabalho propõe-se a enfrentar a questão

sob enfoque multidisciplinar, não apenas sob uma perspectiva puramente

jurídico-constitucional, mas sim com auxílio das premissas e teorias do

antitruste e da rica experiência em direito comparado dos Estados Unidos da

América (EUA) e da União Européia (UE). Em complemento à abordagem

multidisciplinar e até mesmo com intuito de potencializá-la, realizou-se

profunda investigação normativa e jurisprudencial do tema nos EUA, berço

das teorias que sustentam as disciplinas do direito antitruste3, onde também

foi possível realizar profunda investigação normativa e jurisprudencial do

tema na UE, que possui equivalente, senão superior, experiência com o trato

do tema específico (monopólio postal) se comparada aos EUA.

Os EUA e a UE se mostraram referenciais muito interessantes para

dialogar com o problema central deste trabalho, qual seja, deveria o Estado

Brasileiro adotar o modelo de monopólio legal operado por empresa pública

para os serviços postais? O arcabouço teórico que embasou o presente

trabalho, assim como a análise da experiência casuística, ou jurisprudencial,

                                                                                                                         3 “O antitruste é um ramo do direito que procura disciplinar as relações de mercado entre os

agentes econômicos visando o estabelecimento de um ambiente de livre concorrência cujos destinatários finais são os consumidores. Deste modo, ele procura tutelar, sob sanção, o pleno exercício do direito à livre concorrência como instrumento da livre iniciativa, em favor da coletividade. Não existe um conceito único de direito de concorrência. Todavia, costuma-se considerar que o direito da concorrência corresponde a um conjunto de regras relacionadas ao combate de acordos que restringem a concorrência, o abuso de posição dominante e as tentativas de fechamento de mercado por meio de concentrações empresariais. Cabe ressaltar, neste início, que apesar de o ‘direito da concorrência’ e de a ‘política de concorrência’ serem termos muitas vezes usados indistintamente, estes possuem diferenciação importante. A política de concorrência na verdade corresponde a um conjunto de medidas e instrumentos utilizados pelos governos com a finalidade de determinar as condições de concorrência existentes em seus mercados. Desse modo, as leis de concorrência estariam inseridas nas políticas de concorrência.” GABAN, Eduardo M.; DOMINGUES, Juliana O. Direito Antitruste: o combate aos cartéis. 2a ed. São Paulo: Saraiva, 2009, p.89-90.

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4  

nos EUA e UE no trato de questões diretamente relacionadas ao tema,

notadamente com relação ao direito antitruste e à regulação do setor postal,

se mostraram muito relevantes para o detalhamento do problema brasileiro,

para sua análise crítica construtiva e, sobretudo, para a proposta de

soluções.

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5  

CAPÍTULO I. ANTITRUSTE E BEM-ESTAR SOCIAL

“That the Multitude is wiser and more constant in general than a

Prince.”4

Nicholas Machiavel (1517)

“Being exposed to competition brings out the best in institutions. A

famous economist once said that the best of all monopoly profits is

a quiet life. You don’t want a quiet life for a firm; you want it forever

trying to improve its productivity.”5

Robert Solow, the Growth Report (2008)

1.1 Introdução

Muitos estudos foram desenvolvidos a partir da década de 1990 no

sentido de demonstrar os efeitos de práticas anticoncorrenciais sobre os

consumidores e produtores, tanto em países desenvolvidos quanto em

desenvolvimento. Ficou demonstrado que, embora tais efeitos sejam

prejudiciais a ambos os tipos de países, os danos decorrentes de tais

práticas aos países em desenvolvimento possuem implicações mais intensas

no tocante ao poder de compra dos consumidores6 em razão da elevação

dos preços. De forma semelhante, produtores são afetados igualmente de

forma intensa nos países em desenvolvimento por meio da elevação das

barreiras à entrada, da criação de restrições artificiais à informação, à

tecnologia e, via de consequência, à inovação.

                                                                                                                         4 Tradução livre: “A Multidão é mais sensata e constante, em geral, que o Príncipe”. MACHIAVEL, Nicholas. First Book of Political Discourses. The Works of Nicholas Machiavel, Secretary of State to the Republic of Florence. Newly Translated from the Originals by Ellis Farnworth, M.A. Vol. II. London: Printed for Mr. James Hoey, junior, at Dublin. MDCCLXII (1762), p. 145. 5 Tradução livre: “A exposição à livre concorrência proporciona a formação das melhores instituições. Um economista famoso disse uma vez que o melhor dos lucros de monopólio é uma vida tranquila. Você não quer uma vida tranquila para uma empresa; você quer que ela sempre busque melhorar sua produtividade.” COMMISSION ON GROWTH AND DEVELOPMET. The Growth Report of 2008 - Strategies for Sustained Growth and Inclusive Development. Disponível em: <http://cgd.s3.amazonaws.com/GrowthReport Complete.pdf>. Acesso em: 22 Mar. 2011, p.44. 6 Entende-se por poder de compra dos consumidores a possibilidade de escolha por pordutos alternativos face a um aumento de preços por parte do vendedor.

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6  

Embora, de modo geral, seja difícil demonstrar de forma quantitativa

os danos decorrentes de práticas anticoncorrenciais em países em

desenvolvimento, a prática de cartéis7 e o abuso de posição dominante por

parte de agentes econômicos (i.e., players) que detenham poder de mercado

(como é o caso de empresas detentoras de reservas legais, ou de

monopólios legais) tornam óbvios os resultados negativos à sociedade,

expressos em aumentos de preços, restrições na oferta e variedade de

produtos e serviços no mercado etc. Nesses casos, embora toda a sociedade

sofra perdas em seu bem-estar, os consumidores são direta e

majoritariamente prejudicados.

Dentre as opções de políticas públicas disponíveis para remediar tais

situações, está a aplicação do direito antitruste voltada a atuar,

concomitantemente, de forma preventiva (i.e., ex ante) e repressiva (i.e., ex

post).8 As relações existentes entre o direito antitruste e outras políticas

públicas, como direito do consumidor, políticas macroeconômicas, políticas

de combate à corrupção e programas de erradicação da pobreza

desempenham importantes papéis de catalisadores para o desenvolvimento

econômico e melhores condições de subsistência por parte da população. As

sinergias decorrentes do direito antitruste e direito do consumidor merecem

especial ênfase no tocante ao aumento do bem-estar dos consumidores.9

                                                                                                                         7 “Em sentido amplo, cartel representa a restrição e até a eliminação da concorrência entre um conjunto de empresas, com a finalidade de auferir lucros maiores. A estrutura de oferta vigente é fixada e as participações são mantidas. Com a ação coordenada, cada empresa tem condições de praticar preços e conseguir lucros maiores. (...) Os cartéis, em síntese, são arranjos comportamentais que podem abranger tanto relações horizontais quanto verticais de mercado, que artificialmente alteram variáveis relevantes à competição com vistas a restringir e até eliminar a concorrência. A título exemplificativo, não taxativo e não excludente, o cartel pode abarcar acordos sobre preços (e.g., aumento de preços), sobre condutas para excluir rivais (e.g., boicotes, aumento de custos dos rivais) e até sobre regras de concorrência (e.g., divisão de clientes, de fornecedores, de distribuidores e para fraudar licitações ou concorrências privadas) para o mercado em que atua.” GABAN, Eduardo M.; DOMINGUES, Juliana O. Direito Antitruste: o combate aos cartéis. 2a ed. São Paulo: Saraiva, 2009, p.164-166. 8 Entende-se por controle ex ante a modalidade exercida antes da conclusão dos negócios jurídicos, isto é, de fusões, aquisições incorporações etc., com base nos Artigos 54 e seguintes da Lei nº 8.884/94 (Lei Antitruste Brasileira). Por controle ex post entende-se a aplicação da Lei Antitruste Brasileira contra atos ilícitos previstos em seus Artigos 20 e 21, cujas hipóteses de incidência configuram infrações à ordem econômica. 9 UN. United Nations Conference on Trade and Development (UNCTAD). The effects of anti-competitive business practices on developing countries and their development prospects. UNCTAD/DITC/CLP/2008/2. Hassan Qaqaya and George Lipimile Editors. United Nations, New York and Geneva, 2008.

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1.2 Antitruste para a erradicação da pobreza e combate à corrupção?

Direito antitruste e defesa do consumidor são políticas públicas

complementares que se fortalecem mutuamente. De um lado, a livre

concorrência gera, ou amplia, a eficiência econômica e estimula a inovação.

A concorrência também gera incentivos à diferenciação de produtos e

serviços, ao mesmo tempo em que impulsiona seus padrões (ou níveis) de

qualidade. Assim, o regime de livre concorrência aumenta o bem-estar dos

consumidores, pois lhes aumenta o poder de escolha por melhores produtos

e serviços a melhores preços (i.e., mais competitivos).

De outro lado, a defesa do consumidor fortalece a livre concorrência

nos mercados, isto é, consumidores decidem por melhores produtos e

serviços nos respectivos mercados quando estão bem informados. Dessa

forma, a concorrência entre as empresas aumenta e, como resultado,

aumenta-se a eficiência e/ou qualidade e preços dos respectivos produtos e

serviços, o que acaba por beneficiar os consumidores.10

As eficiências econômicas decorrentes da aplicação de um regime de

livre concorrência nos mercados podem ser categorizadas em eficiências

produtivas, alocativas, estáticas e dinâmicas.11 Nem sempre é possível, por

                                                                                                                         10 FOX, Eleanor M. Competition Policy, Growth and Development: The Flash Points. Presentation made during UNCTAD Conference held in Geneva, on 15.07.2008. Disponível em: <http://www.unctad.org/sections/ditc_ccpb/docs/ditc_ccpb0004_en.pdf>. Acesso em: 21 Mar. 2011, p. 11: “Competition Law is law to preserve competition, which should produce efficiency, keep markets accessible on the merits, and benefit consumers and [potentially] efficient, innovative firms (…) Competition translates to: anticompetitive agreements, abuse of dominance, mergers.” 11

“Como se sabe, praticamente toda a análise normativa em economia está baseada na relação biunívoca estabelecida entre bem-estar social e eficiência econômica. Dentre os conceitos de eficiência econômica, os mais conhecidos são os de eficiência alocativa [ou estática] e produtiva [ou dinâmica]. O primeiro é de longe o mais usado em economia, até porque se supõe que implique todos os demais: trata-se da aplicação a uma economia competitiva do conceito de eficiência de Pareto, por intermédio dos chamados teoremas fundamentais do bem-estar, formulados originalmente por Pareto e desenvolvidos desde então em aparato formalizado, em paralelo aos modelos de equilíbrio geral. O segundo corresponde basicamente à eficiência na utilização dos insumos para cada nível de produto, equivalendo à melhor aplicação da tecnologia disponível [e, portanto, decorre da inovação]. Nas aplicações antitruste, além desses dois conceitos, costuma-se considerar um terceiro, o de “eficiência distributiva”, que corresponde à eliminação de ganhos supracompetitivos para maximizar o excedente do consumidor em dado mercado. Como esse resultado não é assegurado pela eficiência alocativa, justifica-se o surgimento de fortes controvérsias normativas e de política nessa área.” (apartes inseridos no texto original). POSSAS, Mario Luiz. Eficiência Seletiva: uma Perspectiva Neo-Schumpeteriana Evolucionária sobre

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meio de uma intervenção antitruste, gerar-se os três tipos de eficiências,

razão pela qual se cria um trade-off12 entre os diversos tipos nos casos

concretos.

Um trade-off pode ser observado entre as eficiências estática e

dinâmica, ao passo que outro pode ser observado entre as eficiências

produtiva e alocativa. Nesse último caso, por exemplo, embora os

consumidores não percebam, no curto prazo, ganhos decorrentes das

eficiências dinâmicas resultantes da inovação, provavelmente serão

grandemente beneficiados no longo prazo em razão dessa mesma

inovação.13

1.2.1 Antitruste e erradicação da pobreza

O direito antitruste tem uma estreita relação com a erradicação da

pobreza nos países em desenvolvimento. A pobreza é uma realidade na

quase totalidade dos países (desenvolvidos e em desenvolvimento), em

várias dimensões e magnitudes. Negar esse fato apenas cria obstáculos para                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                            Questões Econômicas Normativas. Revista de Economia Política, vol. 24, nº 1 (93), janeiro-março/2004, p.73-94. Disponível em: <http://www.rep.org.br/pdf/93-6.pdf>. Acesso em: 26 Mar. 2011. Mais sobre o conceito de eficiência produtiva, ver Dicionário de Economia. Nota Positiva. Disponível em: <http://www.notapositiva.com/dicionario_economia/eficienciaprodut.htm>. Acesso em: 26 Mar. 2011: “A eficiência produtiva verifica-se quando não é possível a uma economia, dadas a tecnologia e as quantidades de factores produtivos disponíveis, aumentar a produção de um determinado bem sem reduzir a produção de um outro. Por outras palavras, eficiência produtiva significa que a economia se encontra sobre a sua fronteira de possibilidades de produção. Pelo contrário, ineficiência produtiva significa que é possível produzir mais de um bem sem sacrificar a quantidade produzida de outros: a ineficiência produtiva ocorre em situações de desemprego de factores ou em situações em que a tecnologia disponível não está a ser utilizada da melhor forma.” 12 Sobre o conceito de trade off, ver MELLO, José Vicente Bandeira de. A Logística como ferramenta para a melhoria do desempenho em pequenas empresas. Revista FAE Business, nº 8, maio 2004. Disponível em: <http://www.fae.edu/publicacoes/pdf/revista_da_fae/fae_v8_n1/rev_fae_v8_n1_08_vicente.pdf>. Acesso em: 27 Mar. 2011. Nota de Rodapé nº 4: “Trade-off é um conceito utilizado em economia, sem tradução adequada em português, que exprime a idéia de que, para se obter algo que se deseja, é necessário sacrificar ou abrir mão de alguma coisa que se tem. As empresas devem buscar o equilíbrio do trade-off.” 13 UN. United Nations Conference on Trade and Development (UNCTAD). The effects of anti-competitive business practices on developing countries and their development prospects. UNCTAD/DITC/CLP/2008/2. Hassan Qaqaya and George Lipimile Editors. United Nations, New York and Geneva, 2008. No mesmo sentido, ver FOX, Eleanor M. Economic Development, Poverty and Antitrust: The Other Path. New York University School of Law. Public Law & Legal Theory Research Paper Series. Working Paper No. 07-12. Law & Economics Research Paper Series. Working Paper No. 07-26. July 2007. Disponível em: <http://ssrn.com/abstract=1002637>. Acesso em 21 Mar. 2011.

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combatê-la. A pobreza pode decorrer de inúmeras causas, desde políticas

públicas (mal dimensionadas) à ausência de crescimento econômico (lato

sensu). Alguns fatores geradores de pobreza podem ser identificados

especialmente em países em desenvolvimento, como a ausência de

progressivo crescimento econômico,14 elevadas taxas de crescimento

populacional, falta de infra-estrutura básica (seja para subsistência como

para suportar o crescimento dos setores produtivos), elevadas dívidas

(interna e externa), elevada desigualdade social entre os ricos e pobres, ou

entre os que podem explorar as oportunidades disponíveis na economia e

aqueles que não podem.

Muitos autores em antitruste têm sustentado em estudos que a

aplicação de regimes de livre concorrência em países em desenvolvimento

tende a proporcionar melhores e mais sustentáveis níveis de crescimento

econômico, bem como de aumento de renda per capita. Segundo o The

Growth Report of 2008, a aplicação efetiva de uma política antitruste pode

assegurar acesso aos mercados por parte de novas empresas (i.e., players

entrantes), o que permite a tais players rivalizarem com as empresas já

estabelecidas em tais mercados e, portanto, gerarem eficiências dinâmicas

                                                                                                                         14 Nesse particular, é interessante observar breve trecho referente ao Brasil no COMMISSION ON GROWTH AND DEVELOPMET. The Growth Report of 2008 - Strategies for Sustained Growth and Inclusive Development. Disponível em: <http://cgd.s3.amazonaws.com/GrowthReportComplete.pdf>. Acesso em: 22 Mar. 2011, p.21: “Box 2: Brazil’s slowdown Brazil was one of the first countries to achieve sustained, high growth (its run began in 1950) and the first to lose its momentum (in 1980). At first glance, Brazil’s case sits uneasily beside the other 12 on our list. Unlike those countries, it is best known for a strategy of “import substitution,” sheltering its domestic industries so they could compete for the home market against foreign rivals. During its first phase of import substitution, however, Brazil in fact succeeded in diversifying its exports, branching out from coffee into light manufacturing with the help of foreign direct investment. Exports as a percentage of GDP more than doubled from 5 percent in the early-1950s to about 12 percent in the early 1980s, even as coffee’s share of exports fell dramatically. Brazil also had the twin advantages of a sizable domestic market and abundant agricultural resources. These two endowments allowed it to reach very high growth rates despite a modest engagement with the world economy. Why did it slow down? The causes are hard to disentangle, just as the slowdown has been hard to reverse. Brazil’s problems began after the first oil shock in 1973, which left the country suffering from inflation and an overhang of debt. In response, the government in 1974 turned further inward. It began a “second phase” of import substitution, which went beyond light manufacturing to promote heavy industries and capital goods production, a strategy that was heavily dependent on the recycling of petrodollars. When dollar interest rates spiked after 1979, Brazil plunged into a debt and high inflation crisis from which it took more than a decade to emerge. In the process, Brazil’s exports declined from 12 percent of GDP in the early 1980s to 6 percent in the mid-1990s, losing nearly all of the ground they had gained in the high-growth period.”

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que contrastam com as eficiências estáticas proporcionadas pelos players

mais antigos.

Assim, The Growth Report of 2008 concluiu que a igualdade de

oportunidades é um ingrediente essencial para a estratégia de crescimento

econômico.15 Nessa mesma linha, FOX afirma que são ingredientes para o

crescimento / desenvolvimento econômico apropriados para países em

desenvolvimento estabelecer uma política antitruste que seja efetivamente

aplicada aos diversos mercados, não se adotando qualquer espécie de

exceção no sentido de proteger players ineficientes da concorrência, bem

como não criando poder de mercado ou poder econômico à pecha de

proteger os “campeões nacionais”.

A adoção de tais ingredientes deve levar à coerência, à integração e

ao desenvolvimento dos mercados, o que, por sua vez, deve levar ao

desenvolvimento /crescimento econômico. Mais do que proteger a livre

iniciativa dos players dominantes, o antitruste deve proteger oportunidades

para novos players competirem no mérito com os players já estabelecidos,

devendo a política antitruste atentar para a mobilidade, acesso, abertura e

crescimento econômico inclusivo.16

Com base nessas premissas gerais, bem como nas premissas

específicas largamente aceitas em grande parte das jurisdições no sentido de

que barreiras à livre concorrência impedem a inovação, crescimento

econômico e prosperidade, a ONU lançou em 1980 o UN Set of Multilaterally

Agreed Equitable Principles and Rules for the Control of Restrictive Business

Practices, proposta de ferramenta multilateral sobre política antitruste

                                                                                                                         15 COMMISSION ON GROWTH AND DEVELOPMET. The Growth Report of 2008 - Strategies for Sustained Growth and Inclusive Development. Disponível em: <http://cgd.s3.amazonaws.com/GrowthReportComplete.pdf>. Acesso em: 22 Mar. 2011, p. 43-44. 16 FOX, Eleanor M. Competition Policy, Growth and Development: The Flash Points. Presentation made during UNCTAD Conference held in Geneva, on 15.07.2008. Disponível em: <http://www.unctad.org/sections/ditc_ccpb/docs/ditc_ccpb0004_en.pdf>. Acesso em: 21 Mar. 2011. Para mais referências, ver FOX, Eleanor M. Economic Development, Poverty and Antitrust: The Other Path. New York University School of Law. Public Law & Legal Theory Research Paper Series. Working Paper No. 07-12. Law & Economics Research Paper Series. Working Paper No. 07-26. July 2007. Disponível em: <http://ssrn.com/abstract=1002637>. Acesso em 21 Mar. 2011.

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contendo uma série de regras para o controle de práticas

anticoncorrenciais.17

Mesmo diante das evidências, a relação da política antitruste com a

redução/erradicação da pobreza não é um tema pacífico. Há basicamente

duas correntes: (i) a primeira, representada majoritariamente por países

desenvolvidos, entende que o antitruste deve ser restrito à idéia agregada de

eficiência e bem-estar do consumidor, afirmando que qualquer aplicação

mais abrangente da defesa da concorrência no sentido de proteger pequenos

players afetaria a eficiência econômica de modo geral. Para essa linha de

pensamento, a livre iniciativa dos players, ainda que detentores de elevado

poderio econômico, deve ser preservada se eles demonstrarem gerar

eficiências aos mercados (ainda que no longo prazo). A idéia de eficiência

alocativa da Nova Escola de Chicago pode ser relacionada a essa corrente

de pensamento;18 (ii) a segunda, representada majoritariamente por países

em desenvolvimento, argumenta que a política antitruste deve se encarregar

também de problemas relativos à concentração de poder econômico. Para

essa segunda corrente, defende-se que o antitruste deve ser utilizado para

balancear a distribuição do poder econômico nos mercados, de modo a

viabilizar aos pequenos players (bem como aos potenciais players) chances

de ingresso nos mercados e de concorrer de forma efetiva com os grandes e

poderosos players já estabelecidos. Em outras palavras, viabilizando

princípios como mobilidade e acesso aos diferentes mercados por parte dos

pequenos atores econômicos, gerar-se-iam eficiências várias à sociedade, o

que estaria mais próximo da idéia de bem-estar dos consumidores,

principalmente com base na premissa de variedade de oferta, pressão                                                                                                                          17 UN. United Nations Conference on Trade and Development (UNCTAD). The effects of anti-competitive business practices on developing countries and their development prospects. UNCTAD/DITC/CLP/2008/2. Hassan Qaqaya and George Lipimile Editors. United Nations, New York and Geneva, 2008. 18 Mais relacionado a essa linha de pensamento está a Nova Escola de Chicago. Para maiores referências, ver GABAN, Eduardo M.; DOMINGUES, Juliana O. Direito Antitruste: o combate aos cartéis. 2a ed. São Paulo: Saraiva, 2009, p.116-118: “Diferentemente de seus predecessores, os teóricos da nova Escola de Chicago enfatizaram as explicações sobre eficiência para vários fenômenos, incluindo concentrações industriais, fusões e restrições contratuais, que a lei antitruste [dos EUA] desfavoreceu severamente nos anos 1950 e 1960. (...) [a nova Escola de Chicago] trouxe, por meio da análise econômica, um novo instrumento, que é a eficiência alocativa do mercado. Essa modalidade de análise econômica permite que sempre sejam avaliados os benefícios aos consumidores. Veja-se inclusive que essa premissa é válida independentemente de o agente ser monopolista ou sujeito à competição.” (apartou-se sobre o texto original).

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competitiva por melhores preços e qualidade, resultados da corrida por

inovação.19

Nesse contexto, a política antitruste vem sendo defendida como uma

das ferramentas para combater a pobreza nos países em desenvolvimento. O

antitruste deveria assim ser utilizado como uma das políticas públicas

disponíveis para expandir as bases empresariais, por meio da proibição de

acordos anticoncorrenciais (no âmbito do controle de estruturas), bem como

da promoção de efetiva concorrência nas indústrias de infra-estrutura.

Energia, telecomunicações, serviço postal e mercados financeiros, por

exemplo, são importantes pilares do crescimento econômico e também

contribuem para a criação de empregos diretos e indiretos, o que, por sua

vez, é essencial para a erradicação da pobreza, sem, contudo, proteger

pequenos concorrentes não eficientes.

A proteção defendida por essa corrente de pensamento deve recair

sobre concorrência e não sobre os concorrentes, i.e., parte-se do princípio

geral de que a diversidade de players deve gerar melhores resultados para a

economia vis-à-vis sociedade.20 Agentes econômicos específicos não podem

                                                                                                                         19 UN. United Nations Conference on Trade and Development (UNCTAD). The effects of anti-competitive business practices on developing countries and their development prospects. UNCTAD/DITC/CLP/2008/2. Hassan Qaqaya and George Lipimile Editors. United Nations, New York and Geneva, 2008. No sentido da validade dessa segunda corrente, ver COMMISSION ON GROWTH AND DEVELOPMET. The Growth Report of 2008 - Strategies for Sustained Growth and Inclusive Development. Disponível em: <http://cgd.s3.amazonaws.com/GrowthReportComplete.pdf>. Acesso em: 22 Mar. 2011. Nesse mesmo sentido, ver ainda FOX, Eleanor M. Economic Development, Poverty and Antitrust: The Other Path. New York University School of Law. Public Law & Legal Theory Research Paper Series. Working Paper No. 07-12. Law & Economics Research Paper Series. Working Paper No. 07-26. July 2007. Disponível em: <http://ssrn.com/abstract=1002637>. Acesso em 21 Mar. 2011. 20 COMMISSION ON GROWTH AND DEVELOPMET. The Growth Report of 2008 - Strategies for Sustained Growth and Inclusive Development. Disponível em: <http://cgd.s3.amazonaws.com/GrowthReportComplete.pdf>. Acesso em: 22 Mar. 2011. “Some companies, for example, will argue they should be sheltered so that they can attain a big enough size to be efficient. The case is thought to be more compelling the smaller the economy. But it is a static argument. It dwells on the unit costs of big firms compared with small ones in an otherwise unchanging world. While incumbent firms press this case with the government, new companies or technologies may be waiting in the wings that will overturn the industry’s cost structure or supplant the industry altogether. The static analysis, so commonly deployed, is simply misleading and a poor approach to productivity gains and growth. In fact, some empirical studies suggest that economies owe most of their progress to the entry of new, more productive firms, and the exit of ailing ones. Improvements in the efficiency of incumbent firms play a smaller role. The dynamic productivity gains from entry and exit can overwhelm the static efficiency gains from scale. This means that entry and the threat of entry are important to ensure competition.”

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ser alvo de proteção por parte da política de concorrência, mesmo sob a ótica

dessa corrente. A experiência de países em desenvolvimento tem

demonstrado que a aplicação prudente de uma política antitruste pode

viabilizar a inclusão / acomodação de mais players em setores específicos da

economia, como zonas rurais mais pobres. Nesses casos, por exemplo, o

combate às condutas anticoncorrenciais (como prática de cartéis), bem como

o controle de estruturas21 bem aplicado visando a manutenção de acesso

aberto ao mercado podem barrar efeitos negativos à concorrência e,

portanto, contribuir com o fluxo de crescimento econômico da região, o que é

fundamental para a redução e, até, erradicação da pobreza.22

Muitos países em desenvolvimento apresentam algumas

características peculiares, as quais tornam intuitiva a utilização do antitruste

de forma mais abrangente como peça importante na estratégia de

desenvolvimento econômico, particularmente no tocante à erradicação da

pobreza. Algumas dessas características são: o estatismo23; a corrupção; a

existência de mercados fechados por barreiras artificiais e privilégios (na

maioria das vezes concedidas pelo Estado); existência grande economia

informal; infra-estrutura pobre ou pouco desenvolvida; elevada concentração

de poder econômico (ou poder de mercado) 24; fraca governança corporativa;

mercado financeiro fraco ou com baixo desempenho.

FOX sugere a aplicação mais abrangente do direito antitruste para os

países em desenvolvimento, de modo a viabilizar os princípios do acesso ao

mercado por players pequenos e/ou novos (i.e., entrantes), a geração de

                                                                                                                         21 Controle de estruturas caracteriza-se pelo controle antitruste ex ante exercido sobre operações empresariais (i.e., fusões, incorporações ou qualquer tipo de colaboração entre empresas) tendo em vista evitar-se a concentração excessiva de poder econômico e, via de conseqüência, a restrição da concorrência. 22 UN. United Nations Conference on Trade and Development (UNCTAD). The effects of anti-competitive business practices on developing countries and their development prospects. UNCTAD/DITC/CLP/2008/2. Hassan Qaqaya and George Lipimile Editors. United Nations, New York and Geneva, 2008. No mesmo sentido, ver COMMISSION ON GROWTH AND DEVELOPMET. The Growth Report of 2008 - Strategies for Sustained Growth and Inclusive Development. Disponível em: <http://cgd.s3.amazonaws.com/ GrowthReportComplete.pdf>. Acesso em: 22 Mar. 2011, p.44. 23 Presença excessiva de participação direta do Estado na economia, i.e., predominância de empresas estatais na economia. 24 Sobre o conceito de poder de mercado ver GABAN, Eduardo M.; DOMINGUES, Juliana O. Direito Antitruste: o combate aos cartéis. 2a ed. São Paulo: Saraiva, 2009, p.142: “(...) poder que permite ao agente agir de forma independente e com indiferença com relação aos comportamentos dos demais agentes, em razão da ausência de concorrência.”

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mais eficiências dinâmicas como a inovação, em contraste com as eficiências

estáticas (defendidas pelos players dominantes), e, assim, a criação de maior

igualdade de oportunidades.

Além dessa aplicação mais abrangente do antitruste, a própria

UNCTAD25 no documento The Growth Report of 200826, FOX27 e outros28,

reconhecem ainda que deve haver uma colaboração dos países

desenvolvidos para que seja efetivamente possível proporcionar

desenvolvimento econômico nos países em desenvolvimento, principalmente

quando mazelas concorrenciais são causadas por players situados em

países desenvolvidos, como é o caso dos efeitos gerados pelos cartéis de

exportação.29

                                                                                                                         25 UN. United Nations Conference on Trade and Development (UNCTAD). The effects of anti-competitive business practices on developing countries and their development prospects. UNCTAD/DITC/CLP/2008/2. Hassan Qaqaya and George Lipimile Editors. United Nations, New York and Geneva, 2008. 26 COMMISSION ON GROWTH AND DEVELOPMET. The Growth Report of 2008 - Strategies for Sustained Growth and Inclusive Development. Disponível em: <http://cgd.s3.amazonaws.com/GrowthReportComplete.pdf>. Acesso em: 22 Mar. 2011, p.44: “Developing countries cannot grow without the support of the advanced economies. In particular, they need access to the open global trading system.” 27 FOX, Eleanor M. Competition Policy, Growth and Development: The Flash Points. Presentation made during UNCTAD Conference held in Geneva, on 15.07.2008. Disponível em: <http://www.unctad.org/sections/ditc_ccpb/docs/ditc_ccpb0004_en.pdf>. Acesso em: 21 Mar. 2011, p. 16: “They need to be free from harm from world cartels, especially those targeted at them from developed nations, and they cannot get this on their own.” 28 KAIRA, Thulasoni. The role of competition law and policy in alleviating poverty – the case of Zambia. UNITED NATIONS. United Nations Conference on Trade and Development (UNCTAD). The effects of anti-competitive business practices on developing countries and their development prospects. UNCTAD/DITC/CLP/2008/2. Hassan Qaqaya and George Lipimile Editors. United Nations, New York and Geneva, 2008. 29 “A análise realizada voltou-se à prática dos cartéis de exportação, que são isenções antitruste em grande parte das jurisdições e que podem prejudicar o processo de desenvolvimento. Os cartéis de exportação podem gerar distorções ao comércio internacional, especialmente aos países menos desenvolvidos ou em desenvolvimento que não possuem expertise para lidar com essas condutas. Esse tema tem sido pouco debatido até mesmo por tratar-se de conduta com muitas particularidades e que conta, muitas vezes, com o apoio governamental. (…) Os cartéis de exportação podem ser formados por produtores de um único país ou podem ser cartéis internacionais formados por produtores de diversos países, mas com um mercado alvo que não é mercado doméstico dos membros desse tipo de cartel.” DOMINGUES, Juliana O. Defesa da concorrência e comércio internacional no contexto do desenvolvimento: os cartéis de exportação como isenção antitruste. Tese de Doutorado. PUC/SP/Direito. 2010. Disponível em: <http://www.dominiopublico.gov.br/pesquisa/DetalheObraForm.do?select_action=&co_obra=201297>. Acesso em: 22 Mar. 2011.

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1.2.2 Antitruste e combate à corrupção

Além da erradicação da pobreza, o direito antitruste é também uma

poderosa ferramenta para lidar com outro problema bastante frequente nos

países em desenvolvimento, a corrupção30, sobretudo nas hipóteses de

empresas controladas, ou que de qualquer forma sejam favorecidas pelo

Estado.

A relação do direito antitruste com a redução da corrupção é intuitiva e

está diretamente ligada aos princípios de transparência e de não-

discriminação, pressupostos da existência de um regime de livre

concorrência no mercado, conforme estabelecem as regras de comércio

                                                                                                                         30 Corrupção pode ser entendida, em síntese, como a prática de atos ilícitos que, de modo geral e mediante a troca de favores ou vantagens (muitas vezes de ordem pecuniária), visam influenciar decisões públicas (ou políticas) das mais variadas categorias, como a realização de negócios jurídicos com o poder público, a elaboração de atos administrativos, a flexibilização de normas jurídicas (ou simplesmente sua não aplicação) de forma contrária ao disposto em suas respectivas hipóteses de incidência etc. No Brasil as práticas de corrupção caracterizam crimes contra a administração pública e estão previstos no Código Penal (Artigos 321 à 359) e na legislação penal especial, como a Lei de Improbidade Administrativa (Lei nº 8.429/92). Mais sobre o conceito de corrupção, ver Mundo Educação. Geografia Humana. O que é corrupção?. Disponível em: <http://www.mundoeducacao.com.br/geografia/o-que-corrupcao.htm>. Acesso em: 27 Mar. 2011: “Corrupção vem do latim corruptus, significa quebrado em pedaços. O verbo corromper significa ‘tornar pútrido’. A corrupção pode ser definida como utilização do poder ou autoridade para conseguir obter vantagens, e fazer uso do dinheiro público para o seu próprio interesse, de um integrante da família ou amigo. [No Brasil e em grande parte das jurisdições] a corrupção é crime, veja alguns itens que revelam práticas corruptas: Favorecer alguém prejudicando outros; Aceitar e solicitar recursos financeiros para obter um determinado serviço público, retirada de multas ou em licitações favorecer determinada empresa; Desviar verbas públicas, dinheiro destinado para um fim público, e canalizado para as pessoas responsáveis pela obra; Até mesmo desviar recursos de um condomínio. A corrupção é presente (em maior evidência) em países não democráticos e de terceiro mundo. Essa prática infelizmente está presente nas três esferas do poder (legislativo, executivo e judiciário). O jogo de interesse dos corruptos atinge o todo, o uso do cargo ou da posição para obter qualquer tipo de vantagem é denominado de tráfico de influência. Toda sociedade corrupta sacrifica a camada pobre, esses dependem puramente dos serviços públicos, mas fica difícil suprir todas as necessidades sociais (infra-estrutura, saúde, educação, previdência etc.) se os recursos são divididos com a área natural de atendimento público e com os traficantes de influência (os corruptos). Quando o governo não tem transparência em sua administração é mais provável que haja ou que incentive essa prática, não existe país com corrupção zero, embora os países ricos democráticos tenham menos corrupção, por que sua população é mais esclarecida acerca dos seus direitos sendo assim mais difíceis de enganar. Atualmente existe uma organização internacional que tem como finalidade desenvolver pesquisas nos países para ‘medir’ o nível de corrupção, e a partir daí é feita uma classificação de acordo com a nota que vai de 0 a 10, alguns dados revelam que o primeiro lugar com nota 9,7, que corresponde à margem de confiança é a Finlândia, o Brasil ocupa 54º lugar com nota 3,9, margem de confiança de 37-41%”. (aparte incluído no texto original).

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internacional (I.e. regras da Organização Mundial do Comércio – OMC).31

Como pontuado pela UNCTAD e pelo The Growth Report of 2008, uma das

medidas a serem adotadas pelos países em desenvolvimento no sentido de

atingir um desenvolvimento econômico sustentável é estabelecer um sistema

de igualdade de oportunidades de acesso aos mercados.32

A eliminação dos tratamentos diferenciados e desiguais, subjacentes à

idéia de corrupção, é o ponto focal dessa estratégia, pois, na maioria das

vezes, tais privilégios são ilegais em grande parte das jurisdições. O

antitruste, idealizado sobre os pilares da transparência e da não-

discriminação, traz a possibilidade de eliminação dos privilégios por

intermédio da possibilidade de monitoramento das práticas anticoncorrenciais

por parte das autoridades de defesa da concorrência, dos concorrentes e dos

consumidores.

Transparência, coerência e não-discriminação são princípios

incompatíveis com a corrupção, razão pela qual o controle antitruste pode

mitigar consideravelmente a corrupção na relação do Estado com os

mercados, principalmente quando este último desempenha uma intervenção

direta na economia na qualidade de agente econômico.

De modo geral, seja como uma ferramenta voltada a auxiliar o

desenvolvimento como um todo, seja como arma específica para impulsionar

o desenvolvimento regional visando aliviar a pobreza e reduzir a corrupção, o

direito antitruste vem sendo adotado progressivamente no mundo,

principalmente pelos países em desenvolvimento. Isso fica bem claro no

diagrama abaixo que denota o crescimento da adoção de legistações

antitruste no mundo:

                                                                                                                         31 “As funções da OMC no sistema internacional têm evoluído ao longo dos anos, não só como fórum de negociações e supervisão das regras do comércio internacional, mas também como tribunal diplomático-jurídico de conflitos comerciais, no âmbito do seu Mecanismo de Solução de Controvérsias. Os princípios básicos que norteiam a OMC são a não-discriminação entre nações (Princípio da Nação Mais Favorecida), a não-discriminação entre produto nacional e importado (Princípio do Tratamento Nacional), e a transparência de toda a legislação do comércio internacional.” Instituto de Estudos Estratégicos e Internacionais (IEEI). OMC – de Doha a Hong Kong. Disponível em: <http://www.ieei.pt/publicacoes/artigo.php?artigo=68>. Acesso em: 13 de Jun. 2011. 32 COMMISSION ON GROWTH AND DEVELOPMET. The Growth Report of 2008 - Strategies for Sustained Growth and Inclusive Development. Disponível em: <http://cgd.s3.amazonaws.com/GrowthReportComplete.pdf>. Acesso em: 22 Mar. 2011, p.45.

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Figura 1 – Países com lei antitruste em 1980 (esquerda) e em 2005 (direita)

Fonte: ICN (2005) 33

O Brasil é um País em desenvolvimento e tem adotado, efetivamente

desde 1994, uma consistente política antitruste, baseada principalmente na

Constituição de 1988 e na Lei nº 8.884/94. Como na maioria dos países que

adotam a política antitruste, o Brasil foi fortemente influenciado pelos EUA e

pela UE, apresentando, em síntese, dupla esfera de atuação: o controle de

atos de concentração (ou merger review), mais conhecido como controle de

estruturas, preventivo ou ex ante; e o controle de práticas anticoncorrenciais,

mais conhecido como controle de condutas, repressivo ou ex post.

O controle de estruturas se destina, basicamente, a avaliar as

operações de fusão, aquisição, incorporação, colaboração etc., em que

agentes econômicos possam influenciar as estruturas dos mercados34 e a

livre concorrência. Já o controle de condutas destina-se a investigar e punir                                                                                                                          33 BERGEIJK, Peter A.G.van. What could anti-trust in the OECD do for developing countries? Working Paper No. 473. Institute of Social Studies. May 2009. Disponível em: <http://publishing.eur.nl/ir/repub/asset/18290/wp473.pdf>. Acesso em: Mar. 2011. P.8. 34 Entende-se por estruturas de mercado as formas como particularmente se organizam os mercados, com base nas relações entre oferta, demanda e número de players existentes. Basicamente, a teoria econômica indica ao menos quatro modelos referenciais de estruturas de mercado, os quais se iniciam com o modelo de concorrência perfeita (representado principalmente pela presença de elevado número de players, ausência de barreiras à entrada, ausência de posição dominante e, portanto, presença de preços equivalentes aos custos marginais) e se encerram com o modelo de monopólio ou monopsônio (caracterizados pela existência de apenas um vendedor ou comprador, barreiras à entrada intransponíveis, existência de poder de mercado e, portanto, preços significativamente superiores aos custos marginais, o que proporciona ao único player elevado nível de markup e, à sociedade, peso-morto, ou deadweight-loss). Há entre tais extremos (i.e., concorrência perfeita e monopólio, ou monopsônio), os modelos de concorrência imperfeita (caracterizado pela presença de vários players, baixas barreiras à entrada, elevada concorrência entre produtos não-homogêneos) e oligopólio ou oligopsônio (em que há poucos e concentrados vendedores ou compradores, há barreiras à entrada significativas e poder de mercado, porém menor que o atingido nas situações de monopólio ou monopsônio). Nesse sentido ver ROSSETTI, J.P. Introdução à economia. 18 ed. São Paulo: Atlas; 2000. GARCIA, M. E.; VASCONCELLOS, M. A. S. Fundamentos de economia. São Paulo: Saraiva, 2002.

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práticas ilícitas contra a livre concorrência, como por exemplo, cartéis de

preços ou divisão de mercados e abuso de posição dominante (e.g., recusa

de venda, vendas casadas, discriminação injustificada de clientes ou

fornecedores etc.).

Tanto no controle de estruturas como no controle de condutas, a Lei

Antitruste brasileira adota a mesma lógica normativa linear (ou, em outras

palavras, a mesma metodologia de análise), fundamentada fortemente em

critérios econômicos edificados a partir de um juízo de possibilidade e

probabilidade.

Tal metodologia pode ser representada basicamente por cinco etapas

de análise, necessariamente subsequentes entre si e nessa ordem: definição

do mercado relevante35; identificação das participações de mercado, de

modo a identificar se as partes envolvidas possuem ou não posição

dominante (ou poder de mercado) 36; avaliação das barreiras à entrada

existentes37; avaliação da rivalidade atual existente ou não nos mercados

                                                                                                                         35 Sobre o conceito de mercado relevante, ver GABAN, Eduardo M.; DOMINGUES, Juliana O. Direito Antitruste: o combate aos cartéis. 2a ed. São Paulo: Saraiva, 2009, p.133-140: “A delimitação do mercado relevante é essencial para que seja possível o estabelecimento de uma análise antitruste, sendo que, no Brasil, é pressuposto de incidência da Lei nº 8.884/94. Assim, para iniciar-se a investigação sobre condutas anticoncorrenciais, preliminarmente averigua-se a real dimensão do mercado que está sendo afetado para se delimitar o universo material e territorial das investigações por parte das autoridades antitruste.” 36 Sobre o conceito de posição dominante, ver GABAN, Eduardo M.; DOMINGUES, Juliana O. Direito Antitruste: o combate aos cartéis. 2a ed. São Paulo: Saraiva, 2009, p.141-144: “A participação substancial de mercado (ou market share) guarda íntima relação com o desempenho de posição dominante em determinado mercado relevante; contudo, configura condição necessária mas não suficiente à sua viabilização. (...) Determina-se assim, por presunção legal relativa, que a participação equivalente a 20% (vinte por cento) em mercado relevante delineia, a priori, viável exercício de poder de mercado, sendo, portanto, comum que a análise estrutural inicie-se com a avaliação do mercado relevante e da parcela de mercado de cada agente econômico participante. Este método pode ser visto como o mais utilizado pelas cortes e autoridades antitruste, na medida em que a participação de mercado é tida como um forte indício (necessário, embora insuficiente) sobre a existência, ou não, de posição dominante.” 37 Sobre o conceito de barreiras à entrada, ver GABAN, Eduardo M.; DOMINGUES, Juliana O. Direito Antitruste: o combate aos cartéis. 2a ed. São Paulo: Saraiva, 2009, p.145: “Considera-se como barreira à entrada qualquer fator em um mercado que ponha um potencial competidor eficiente em desvantagem com relação aos agentes econômicos estabelecidos. Entre os fatores que constituem importantes barreiras à entrada, é importante citar alguns: (a) custos fixos elevados; (b) custos afundados (ou irrecuperáveis); (c) barreiras legais ou regulatórias; (d) recursos de propriedade das empresas instaladas; (e) exigências consideráveis de economias de escala ou de escopo para o ingresso de um novo competidor; (f) grau de integração da cadeia produtiva; (g) fidelidade dos consumidores às marcas estabelecidas; e (h) ameaça de reação dos competidores instalados. (...) se há barreiras à entrada elevadas o suficiente no mercado, verifica-se que o exercício de poder de mercado é possível e pode causar danos ao setor, como a imposição de disciplina aos rivais,

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analisados, para ser possível a avaliação de contestabilidade do player com

posição dominante por parte dos rivais (seus concorrentes atuais) no

mercado; e, por fim, avaliação das eficiências proporcionadas pela operação

analisada, no caso do merger review, ou as justificativas racionais para

práticas investigadas, no caso do controle de condutas. Tudo isso para se

concluir, ao final, se a operação de concentração analisada ou a conduta

investigada são lícitas.38

Embora com pouco menos de 17 anos de aplicação efetiva do direito

antitruste (a Lei n. 8.884/94 passou a viger em outubro de 1994), o Brasil tem

apresentado resultados expressivos no cenário mundial. Evidência disso é o

prêmio recente de Melhor Agência das Américas (Agency of the Year,

Americas: Brazil’s CADE) que o Conselho Administrativo de Defesa

Econômica (CADE) recebeu em 2011 de uma das mais conceituadas revistas

internacionais especializadas em antitruste.39

Contudo, boa parte das características peculiares aos países em

desenvolvimento ainda estão presentes no Brasil, como é o caso do nível de

corrupção, mercados fechados por barreiras artificiais e favorecimentos

Estatais (o que de certa forma decorre de um perfil ainda estatista esboçado

pelo Governo), relevante fatia da economia doméstica que é informal e a

                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                           e/ou a exclusão de concorrentes eficientes e/ou ainda a limitação à entrada de novos agentes econômicos. (…) se estas [barreiras à entrada] forem consideradas baixas, espera-se que não haja obstáculos à entrada de novos concorrentes no mercado, porquanto a mera detenção de parcela substancial de mercado não caracteriza a detenção de posição dominante.” (apartou-se o texto original). 38 Sobre a última etapa de análise, ver GABAN, Eduardo M.; DOMINGUES, Juliana O. Direito Antitruste: o combate aos cartéis. 2a ed. São Paulo: Saraiva, 2009, p.153: “É dizer, havendo poder de mercado na situação sob análise, (…) qualquer atitude negocial e/ou comportamental levada a efeito pelos agentes de mercado inseridos na análise antitruste pode representar malefícios ao mercado e à livre concorrência, representando possivelmente também afronta à Lei e à Constituição. (…) a situação de posição dominante sujeita o agente privado a ser investigado pela autoridade de defesa da concorrência; entretanto, não o sujeita, per se, a ser condenado ou a ver sua liberdade restringida [no âmbito do merger review], sem que haja o devido processamento da investigação [e análise dos efeitos da operação] e sem que haja razões suficientes para tanto. Esse juízo deve obedecer ao seguinte critério: provas, para uma decisão de condenação, ou evidências empíricas/probabilísticas/razoáveis, para uma decisão de restrição da livre iniciativa [i.e., demonstração, na última etapa de análise, que os efeitos de redução da concorrência decorrentes da operação superam as eficiências geradas pelo negócio].” (apartou-se o texto original). 39 Global Competition Review (GCR), Best Agency of the Americas 2011. Disponível em: <http://www.cade.gov.br/Default.aspx?390c1aef0116ea28f24010263219>. Acesso em: 27 Mar. 2011.

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elevada concentração de poder de mercado em indústrias importantes

(principalmente no tocante à infraestruturas).

Assim, é fundamental que o Brasil mantenha uma linha coerente de

desenvolvimento econômico e elimine as estruturas políticas e normativas

que geram espaço à corrupção, à criação de barreiras artificiais à

concorrência e às diversas espécies de favorecimento (que, por sua vez,

alimentam a corrupção, num claro círculo vicioso contra o interesse público e

bem-estar social). Precisamente, a aplicação do regime de livre concorrência

em setores plenamente a ele vocacionados já representaria um excelente

passo rumo à concretização do desenvolvimento econômico em alguns

mercados nacionais.

A idéia de viabilizar princípios como a mobilidade, acesso e efetiva

concorrência nos mercados é perfeitamente aplicável no Brasil, na maioria

dos mercados, salvo raras exceções (i.e., setores portadores de falhas de

mercado como serviço de saúde pública). Os resultados da aplicação mais

abrangente do antitruste observados em outros países em desenvolvimento

já podem ser observados também no Brasil, nos setores em que foi aplicado

o regime de livre concorrência, como é o caso das telecomunicações, energia

etc.40 É preciso eliminar os resquícios do estatismo que predominou nas

                                                                                                                         40 MELO, M. C. S.; CÁRIO, S.A.F. Trajetória tecnológica do setor de telecomunicações no Brasil: a tecnologia VoIP. XI Encontro Regional de Economia – ANPEC-Sul 2008. Economia e Tecnologia. Universidade Federal do Paraná. Disponível em: <http://www.economiaetecnologia.ufpr.br/XI_ANPEC-Sul/artigos_pdf/a4/ANPEC-Sul-A4-16-trajetoria_tecnologica_d.pdf>. Acesso em: 27 Mar. 2011: “O setor de telecomunicações sofreu grandes transformações no Brasil no período pós-privatização. De um setor totalmente defasado, com cobertura e serviços limitados e péssima qualidade dos serviços para um dos mais importantes campos modernos. Esse avanço se deve em grande parte aos investimentos exigidos das empresas vencedoras do processo de privatização, mas também dos avanços tecnológicos dos últimos anos. A revolução da microeletrônica nos anos 80, o consequente progresso do setor de informática e seus desdobramentos em software e hardware, têm grandes implicações para as telecomunicações, no que tange à capacidade de processamento e novas aplicações. Da evolução e enorme relacionamento do setor de informática e telecomunicações em um ambiente cada vez mais globalizado, onde a informação ganha velozmente mais valor e o conhecimento se torna rapidamente mais defasado, surge o setor de Tecnologia da Informação e Comunicação, praticamente presente e necessário em todos os setores econômicos. Um dos grandes impactos deste novo setor se refere à convergência tecnológica, que se torna possível, pela inter-relação entre os diversos segmentos que o compõe. Tal convergência possibilita a oferta de diversos produtos e serviços, como voz, dados e internet, em conjunto de forma a reduzir custos e acirrar a concorrência, além, é claro, de criar novas oportunidades e novos serviços. Entre os novos serviços que foram criados, o destaque é a tecnologia conhecida como VoIP (Voz sobre Protocolo de Internet). Com o VoIP é possível realizar ligações através do acesso à internet, com custos inferiores aos cobrados pelas empresas de telecomunicações tradicionais. A diferença com o modelo tradicional é que não existem “caminhos” dedicados.

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décadas de 1960 e 1970 a fim de que boa parte das causas de “doenças”

como corrupção e favorecimentos possam sem verdadeiramente combatidas

e, assim, dar espaço à geração de bem-estar social, nos termos da

Constituição de 1988.

Como observado, há hipóteses restritas em que o regime de livre

concorrência não gera os resultados positivos naturalmente esperados em

favor dos consumidores, ou seja, pode resultar, por exemplo, elevação dos

switching costs (ou custos de troca, ou substituição de um produto por outro)

e perdas de qualidade. Usualmente, tais situações estão presentes em

mercados portadores de falhas, como monopólios naturais, assimetria de

informação externalidades negativas etc.41 Nessas hipóteses, o direito

                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                           Enquanto no serviço tradicional a rede é totalmente dedicada para o tráfego de voz (comutação por circuitos), a tecnologia VoIP transforma a voz em pacote de dados e a envia pela rede (comutação por pacotes), sem criar caminhos dedicados que não maximizam a utilização da rede. Tal serviço possui diversas modalidades e entre as mais disseminadas encontramos os softphones para realizar ligações gratuitas computador a computador, como Skype e MSN Messenger. Entretanto, o serviço começou a se disseminar no mercado corporativo, como forma de redução de custos, mediante a adoção de aparelhos adaptadores, telefones e PABX e mais recentemente também têm chegado ao mercado residencial. (…) Dentre os principais autores que tratam da questão da inovação, Schumpeter enfatiza a importância da inovação tecnológica. Em sua obra, Schumpeter (1988) a define como a força central no dinamismo do sistema capitalista. Na sua abordagem teórica, a inovação tecnológica assume um papel de extrema relevância na explicação do desempenho econômico, tornando-se um fator de diferenciação competitiva entre as empresas e o elemento principal da dinâmica capitalista. O autor parte do modelo de fluxo circular, no qual uma economia estacionária se reproduz sem que ocorram alterações substanciais. O fluxo circular é caracterizado pela existência da propriedade privada, da concorrência livre e da ausência de incerteza quanto ao futuro. Nas palavras de Possas (1987, p.170), ‘a atividade econômica retratada pelo sistema [fluxo circular] não apresenta mudanças importantes, quantitativas ou qualitativas, convertendo-se em mera prática rotineira’. Entretanto, não implica um estado estacionário rígido, mas apenas lentamente mutável. O desenvolvimento se caracterizaria, portanto, pela ruptura deste fluxo circular, através de grandes inovações tecnológicas que ocorreriam descontinuamente ao longo do tempo. As fontes para tais inovações podem ocorrer pela introdução de um novo bem, pela introdução de um novo modo de produção, pela abertura de um novo mercado, pela conquista de uma nova fonte de matéria-prima ou pelo estabelecimento de uma nova organização industrial.”. 41 Entende-se por falhas de mercado problemas naturalmente decorrentes de algumas estruturas específicas de mercado que as impedem de funcionar em regime de livre concorrência. Segundo a teoria econômica, três são as hipóteses de falhas de mercado, quais sejam, o monopólio natural, a presença de externalidades negativas (i.e., efeitos não desejados e prejudiciais à sociedade decorrentes de uma atividade econômica) e a existência de assimetria de informação (diferença de repertório entre os players envolvidos em uma relação de mercado e/ou entre esses e os agentes reguladores). Presume-se, nos dois últimos casos, volume ou intensidade significativa de ocorrência para caracterizar a falha de mercado, não sendo suficiente sua mera existência. As falhas de mercado fundamentam a intervenção do Estado, via regulação econômica, para proporcionar (ou ao menos aproximar) o desempenho do mercado ao que seria se fosse possível submetê-lo ao regime de livre concorrência. Sobre o conceito de falhas de mercado ver CAMPOS, Humberto Alves. Falhas de mercado e falhas de governo: uma revisão da literatura sobre

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antitruste deve ser combinado com a regulação econômica, por meio da qual

se busca mitigar as falhas de mercado em prol da geração de eficiências

econômicas e/ou resultados positivos para os consumidores.

Há, dessa forma, atividades econômicas que devem ser desenvolvidas

por apenas um agente, em regime de monopólio legal, para que seja possível

a geração de benefícios aos consumidores e, portanto, à sociedade.

Particularmente com relação aos debates sobre o tema específico deste

trabalho, indaga-se: estaria o serviço postal, no todo ou em parte, inserido

nessa espécie de atividade a ser desempenhada por apenas um player?

Deveria tal agente ser controlado pelo Governo (ou Estado) ou ser decorrente

da iniciativa privada? Deveria tal agente ser regulado por uma autoridade

independente?

As respostas a essas e outras indagações serão desenvolvidas de

forma fundamentada ao longo deste trabalho, todavia, não há prejuízo em se

adiantar, em brevíssima síntese, as principais conclusões que esse estudo

buscará trazer: no Brasil, os serviços postais, no todo e em parte, não

representam hipótese de falha de mercado, mas sim são plenamente

vocacionados ao regime de livre concorrência, sobretudo no contexto atual.

Dessa forma, entende-se que não deveriam ser desempenhados em regime

de monopólio legal. Entretanto, se por critérios puramente ideológicos, for

escolhido modelo de monopólio legal, esse não deveria ser exercido por

empresa controlada pelo Governo. Mas, se mesmo assim forem ignoradas

essas opções de escolha pública, a empresa monopolista deveria receber

regulação por parte de uma entidade autônoma e independente, com

autoridade para limitar os abusos naturalmente decorrentes da situação de

ser monopolista em um mercado.42

                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                           regulação econômica. Programa de Fortalecimento da Capacidade Institucional Para Gestão em Regulação. Presidência da República Federativa do Brasil. Prismas: Dir., Pol. Publ. e Mundial. Brasília, v. 5, nº 2, p. 341-370, jul./dez. 2008. p.341-370. Disponível em: <http://www.regulacao.gov.br/publicacoes/artigos/prismas-regulacao-economica>. Acesso em: 27 Mar. 2011. No mesmo sentido e sobre o conceito de assimetria de informação ver GABAN, Eduardo Molan. Regulação econômica e assimetria de informação. Revista do IBRAC, São Paulo, v. 9, nº 5, 2002, p. 97-167. 42 A Teoria Econômica possui uma máxima de que o indivíduo busca maximizar seu bem-estar individual, seja qual for o resultado social decorrente dessa ação. Se esse indivíduo possui poder de mercado, o reflexo da maximização de seu bem-estar individual pode ser prejudicial à concorrência e, logo, à sociedade. Em uma situação de monopólio, essa mesma premissa subsiste em paralelo ao fato de que o indivíduo (i.e., monopolista) possui poder de

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1.3 Monopólio natural, serviço universal e interesse público

O principal argumento econômico utilizado para defender a idéia de

que os serviços postais deveriam ser realizados sob o modelo de monopólio

legal é reconhecer-lhes como sendo um monopólio natural. Daí decorrem

essencialmente outros tantos argumentos jurídicos e econômicos no sentido

de que, e.g., a aplicação do regime de monopólio legal aos serviços postais

implicaria maior atendimento aos primados do interesse público e interesse

nacional.43

Especificamente para fundamentar a premissa de que os serviços

postais seriam classificados como monopólio natural, utiliza-se o argumento

econômico da universalização dos serviços, isto é, argumenta-se que fosse

aplicado o regime de livre concorrência sobre os serviços postais como um

todo, haveria partes (ou segmentos) deles que não receberiam investimentos

por parte da iniciativa privada e, portanto, não seriam suficientemente

prestados de modo a atender os consumidores, afetando-se assim o

interesse social, ou interesse público. Em outras palavras, haveria

consumidores excluídos do serviço postal, principalmente aqueles

consumidores mais pobres habitantes dos confins dos territórios nacionais.

Esse argumento é especialmente sensibilizante e pode ser expresso

em outras palavras: a aplicação de regime de livre concorrência sobre os

serviços postais geraria exclusão social. Esse conjunto encadeado de

argumentos não é novo e muito menos foi criado no Brasil, tendo-se registros

de sua utilização nos primórdios dos serviços postais em várias localidades,

como nos EUA, como se verá no Capítulo II, na UE, como se verá no

Capítulo III, e no Brasil, como se verá no Capítulo IV, onde foi e permanece                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                            mercado incontestável. Dessa forma, presume-se que um agente monopolista buscará maximizar seu bem-estar individual nos limites de seu orçamento e, caso existam, das normas jurídicas (e regulatórias) que disciplinem sua atividade no mercado. O caso da prática de cartéis, por exemplo, equivale à situação um monopólio, em que os membros do cartel, comportando-se de modo uniforme, buscam maximizar o bem-estar individual de cada membro em detrimento dos consumidores. Nesse sentido, ver CONSIDERA, Cláudio. Perdas e danos dos cartéis. Jornal A Folha de São Paulo. 31.05.2002. Disponível em: <http://www.seae.fazenda.gov.br/central_documentos/textos_artigos/2002-1/5-artigoperdasedanos>. Acesso em: 27 Mar. 2011. 43 Entende-se por interesse público ou nacinoal o interesse da coletividade, isto é, do povo coletivamente considerado, da sociedade, nos termos da Constituição Federal de 1988.  

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sendo utilizado até os dias atuais de forma frequente pela Empresa Brasileira

de Correios e Telégrafos (ECT) em várias demandas administrativas e

judiciais.

Dentre os casos em que a ECT se valeu dessa mesma argumentação

destaca-se a Ação por Descumprimento de Preceito Fundamental nº 46-7

(ADPF 46-7), em que influenciou o Supremo Tribunal Federal (STF) para, em

2010, decidir que a ECT, empresa controlada pela União Federal envolvida

em diversos escândalos de corrupção e lavagem dinheiro e outros tantos

abusos de seu poder econômico, deve desfrutar do monopólio legal sobre os

serviços postais. A mais alta Corte brasileira, ao interpretar de forma histórica

e sistemática a Constituição Federal de 1988 no sentido de decidir pela

melhor opção em termos de bem-estar social, acolheu tal raciocínio, por

maioria de votos sem, contudo, avaliar de forma crítica as premissas arguidas

pela ECT, bem com apontar a necessidade de qualquer controle regulatório

independente das atividades da ETC.44

1.3.1 Serviços postais: monopólio natural?

Um mercado (ou tecnologia) é caracterizado como monopólio natural

se apenas uma empresa pode ofertar os produtos ou serviços a custos

inferiores que os mesmos produtos e serviços seriam ofertados por duas ou

mais empresas no mesmo mercado. Essa definição de monopólio natural é

baseada em uma função de custos que atribui custos totais à oferta. Essa

função de custos possui propriedades (ou características) de monopólio

natural se o player (isoladamente considerado), utilizando tal função, possui

menores custos para ofertar os produtos e serviços no mercado que

possuiriam dois ou mais players dividindo os volumes ofertados entre si,

utilizando-se exatamente da mesma função de custos. Assim, se a tecnologia

de entrega de correspondências apresentasse propriedades de monopólio

natural, apenas um player poderia construir uma rede postal e operar a oferta                                                                                                                          44 BRASIL. Supremo Tribunal Federal (STF). Arguição de descumprimento de Preceito Fundamental nº 46-7. Arguente: Associação Brasileira das Empresas de Distribuição. Arguido: Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos. Relator: Ministro Marco Aurélio. Brasília, 15 de junho de 2005. Disponível em: <http://redir.stf.jus.br/estfvisualizadorpub/jsp/consultarprocessoeletronico/ConsultarProcessoEletronico.jsf?seqobjetoincidente=2182784>. Acesso em 11 Mar. 2011.

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de serviços postais no mercado a custos menores que incorreriam dois ou

mais players. Diz-se, nessa hipótese e sob essas circunstâncias, que esse

player teria custos subaditivos (subadditive costs).45

Dessa forma, haveria necessidade de normas jurídicas que

reservassem os serviços postais para serem operados apenas por um player,

viabilizando-se, assim, a geração de eficiências estáticas por meio do

estabelecimento de uma estrutura industrial menos custosa, i.e.,

representada apenas por uma única empresa. Todavia, tendo em mente os

resultados gerais que regimes de livre concorrência proporcionam aos

mercados, como eficiências produtivas (ou de custo) decorrentes da

consolidação de processos produtivos (seja mediante expansão, fusões ou

contratos de fornecimento), inovação, variedade na oferta de produtos e

serviços, diluição do poder de mercado etc., fica difícil sustentar que os

serviços postais (ainda que considerados como portadores de custos

subaditivos) sejam exercidos sob o regime de monopólio legal.

Seria necessário, para tanto, demonstrar que os serviços postais

representam um monopólio natural insustentável, sendo que haveria maiores

ganhos para a sociedade (em termos de bem-estar social) preservar-se

apenas um player, que os já conhecidos ganhos econômicos e sociais

decorrentes do regime de livre concorrência (e.g., maior inovação, maior

variedade de produtos e serviços, menores custos administrativos, melhores

preços e maior qualidade etc.). Nesse sentido, é muito importante entender

as nuances do conceito de monopólio natural para que este seja

corretamente aplicado e, ao mesmo tempo, que este não implique a adoção

errônea de um modelo sacrificando-se os ganhos de bem-estar social.46

A definição de monopólio natural pressupõe a existência de uma

tecnologia conhecida (known technology), a qual é representada pela função

de custos do monopólio natural. Para se concluir que um dado mercado ou

uma indústria é um monopólio natural, é necessário assumir a premissa de

que existe apenas uma e melhor tecnologia, a qual é de conhecimento

público e perfeitamente acessível por terceiros, no mercado. É necessário                                                                                                                          45 SIDAK, J. G.; SPULBER, D. F. Protecting Competition from the Postal Monopoly. American Enterprise Institute for Public Policy Research. 1996, p. 40 e ss. 46

SIDAK, J. G.; SPULBER, D. F. Protecting Competition from the Postal Monopoly. American Enterprise Institute for Public Policy Research. 1996, p.41-42.

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assumir, ainda, que caso tais terceiros operassem essa tecnologia, não lhes

seria possível obter melhor desempenho (sejam eles dois ou mais, em

número de players) que o player, individualmente considerado no mercado,

obteria.

Particularmente, a função de custos do monopólio natural é uma

função de custo de longo prazo, de modo que o investimento pode ser

ajustado para atingir o nível eficiente de rentabilidade requerido para a

operação a custos mínimos por cada nível de oferta. Para se avaliar a

possibilidade e pertinência de aplicação do argumento do monopólio natural

aos serviços postais, é imprescindível demonstrar-se em que medida os

aspectos componentes do conceito (acima colocados) seriam aplicáveis à

rede postal, no contexto atual, i.e., diante da presença de diferentes

tecnologias existentes para a oferta do serviço postal, bem como da

existência de diversos tipos de serviços postais e players (da iniciativa

privada) disponíveis e com elevado interesse em ofertar, no todo ou em

parte, os diversos tipos de serviços postais.

Assim, com base no conceito padrão ora adotado, a função de custos

para uma dada tecnologia de produção possui propriedades de monopólio

natural se apresente economias de escala superiores ao alcance relevante

da oferta, i.e., economias de escala são tidas como existentes e superiores

ao alcance relevante da oferta quando o custo unitário47 declina com o

aumento do volume de produção. Em indústrias dependentes de redes

físicas, como telecomunicações, transporte ferroviário, gás natural

(gasodutos), eletricidade, saneamento básico etc., os custos fixos48

representam uma fonte importante de economias de escala.

A necessidade de evitar-se a duplicação de infraestruturas,

particularmente a duplicação de custos fixos com a instalação e manutenção

de um sistema físico de rede, é um importante componente do argumento do

monopólio natural quando utilizado para a entrega de cartas. Isto é, alega-se

que deve ser vedada a entrada de concorrentes nos serviços postais porque

                                                                                                                         47 Custo para se produzir uma unidade adicional de produto ou se ofertar uma unidade adicional de serviço. 48 Custos que não variam em razão do volume de produção, ou utilização da infraestrutura, i.e., não há elevação dos custos de transmissão de energia elétrica, por exemplo, em razão do volume de energia transmitida pelas linhas ou fios.

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os custos de instalação e manutenção da infraestrutura (i.e., rede postal)

seriam minimizados pela não duplicação da rede postal.49

Esse argumento faria sentido, por exemplo, na hipótese de um novo

mercado decorrente de uma nova infraestrutura, cujo custo de construção

teve de ser suportado por um único player. A construção de uma usina

hidrelétrica para a geração de energia pode ser um bom exemplo, como

também a construção de uma rede de saneamento básico, ou ainda de um

gasoduto. Só haveria incentivos econômicos para o investimento em tais

infraestruturas se, depois de construídas, o player que se encarregou de sua

construção pudesse operar exclusivamente no mercado, por um tempo, a fim

de que fosse possível, no longo prazo, atingir o nível de rentabilidade

requerido para operar a custos mínimos e, portanto, não ser obrigado a

cobrar tarifas excessivas dos consumidores.

Os serviços postais não apresentam uma infraestrutura física tal e qual

observada nos casos do saneamento básico, gasodutos etc. Tampouco, na

grande maioria das jurisdições, podem os prestadores de serviços postais ser

considerados como responsáveis pelos investimentos nas redes postais,

compostas, em sua maioria, por rotas postais (que nada mais são que

estradas ou ferrovias que são utilizadas para transporte em geral), bem como

pelas caixas de correio, centros de distribuição e agências postais.50

Mesmo se admitindo que empresas privadas se encarregaram da

construção das redes postais, o que dificilmente corresponde à realidade

(dado que em grande parte dos casos, as redes postais foram criadas com

investimentos diretos dos tesouros nacionais), o tempo transcorrido da

construção de tais elementos até o presente momento já fora, na maioria dos

                                                                                                                         49 SIDAK, J. G.; SPULBER, D. F. Protecting Competition from the Postal Monopoly. American Enterprise Institute for Public Policy Research. 1996, p.41-42. 50 Entende-se por rede postal o sistema de organização e recursos de todos os tipos utilizados pelo prestador (ou prestadores) de serviço universal para, particularmente, as seguintes finalidades: (i) coleta de itens postais depositados nos pontos de acesso; (ii) identificação e encaminhamento de tais itens postais dos pontos de acesso postal ao centro de distribuição; e (iii) distribuição dos itens postais para os destinatários neles identificados. Nesse sentido, ver EU. Directive 97/67/EC of The European Parliament and of The Council of 15.12.1997 on common rules for the development of the internal market of Community postal services and the improvement of quality of service. Disponível em: < http://eur-lex.europa.eu/LexUriServ/LexUriServ.do?uri=OJ:L:1998:015:0014:0025:EN:PDF>. Acesso em: 4 Nov. 2010.

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casos (e.g., EUA, países da UE e Brasil), mais que suficiente para a

recuperação dos investimentos realizados.

Poderia se alegar ainda que, afora a questão dos investimentos para a

construção da rede postal, haveria ineficiências decorrentes da utilização dos

mesmos ativos (i.e., caixas de correio, agências postais, centros de

distribuição e veículos para a coleta e entrega de correspondências) por parte

de concorrentes, dado que poderia haver limitação na capacidade de oferta

dos serviços postais, sendo que, havendo obrigação de compartilhamento,

não haveria como se gerar economias de escala. Esse argumento também

não apresenta embasamento na realidade, dado que não há uma

demonstração de que haveria esgotamento da capacidade de produção em

razão do compartilhamento das caixas de correio com terceiros. Afora os

EUA, que limitaram, sob outros argumentos, o uso das caixas postais (i.e.,

caixas de correio)51, tanto no Brasil quanto na UE, isso jamais foi objeto de

alegação por parte das empresas monopolistas dos respectivos setores

postais. Com relação aos demais ativos, entende-se que não representam

estrutura de custos sobre as quais possa se aplicar o conceito de monopólio

natural, representando custos de entrada administráveis por parte de players

do setor privado.

Os serviços postais, na verdade, apresentam características típicas de

atacadistas e varejistas prestadores de serviços gerais de entregas (ou

serviços de logística). Basicamente, esses serviços envolvem três

componentes: (i) contratação de transporte de longa-distância (i.e.,

abrangendo todo o território nacional e transportes internacionais); (ii) triagem

e transporte regionais (i.e., abrangendo diferentes regiões dentro de um

mesmo país, como estados ou províncias); e (iii) coleta, triagem e entregas

locais (i.e., abrangendo grupos de municípios ou municípios individualmente

considerados).

Veja-se que não há razões fáticas e econômicas para se presumir que

a tecnologia utilizada para a operação de tais componentes do serviço postal,

sejam eles considerados isolada ou conjuntamente, exiba propriedades de

                                                                                                                         51 Segundo a Seção 1725, do Código Penal dos EUA, proíbe-se o depósito de “coisas despacháveis pelo correio” (i.e., “mailable matter”) não seladas em caixas postais aprovadas pelo Serviço Postal. Esse tema será analisado mais detidamente no Capítulo II.

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monopólio natural. Em outras palavras, nenhum dos componentes do serviço

postal, i.e., contratação de transporte de longa-distância, triagem e transporte

regionais e coleta, triagem e entregas locais possuem propriedades de

monopólio natural. Não há fundamentos relativos à eficiência produtiva que

sustentem a restrição da entrada de concorrentes nos mercados postais.52

Economias de escopo também são utilizadas para justificar a reserva

legal de mercados postais multiprodutos, sob o mesmo argumento do

monopólio natural. Em complemento, a possibilidade de atingirem-se

economias de escopo adicionais é utilizada para fundamentar o aumento da

abrangência da reserva legal (i.e., do monopólio legal) para mais e mais

mercados. Isso fica claro, por exemplo, nos EUA (Capítulo II), em que o

monopólio legal foi sendo progressivamente ampliado (ao longo da história)

para abranger entrega de bens e documentos (parcel post), cartas urgentes

(express mail) e outros mercados, sob o fundamento de que haveria ganhos

crescentes em decorrência do desenvolvimento exclusivo de tais atividades

em conjunto com a coleta e entrega de cartas simples. Esse mesmo

argumento, travestido do termo “universalização”, foi utilizado na UE

(Capítulo III) 53 e no Brasil (Capítulo IV).54

Seja como for, uma tecnologia é tida como portadora de economia de

escopo se uma única empresa pode produzir dois produtos a um custo

inferior que duas empresas distintas produziriam, de forma separada, os

mesmos produtos. O custo de se produzir isoladamente um produto é

denominado como stand-alone cost. Entende-se que há economias de

escopo se a soma dos stand-alone costs de dois produtos excede o custo de

sua produção conjunta. No caso de multiprodutos, entende-se que a

tecnologia de produção apresenta propriedades de monopólio natural se uma

empresa, isoladamente, pode produzir um conjunto de produtos (e.g., carros

e caminhões, ou entrega de cartas e bens) a custos inferiores que duas ou

                                                                                                                         52

SIDAK, J. G.; SPULBER, D. F. Protecting Competition from the Postal Monopoly. American Enterprise Institute for Public Policy Research. 1996, p.43-55. 53 Nesse sentido, ver casos em que a CE não reconheceu procedência a tal argumento: CE v. Kingdom of the Netherlands - PTT Post BV – 90/16/EEC; CE v. Kingdom of Spain – Ordenanza Postal of 19 May 1960 – 90/456/EEC; Régie des Postes v. Paul Corbeu; e CE v. Slovenská Postá. Esse tema será desenvolvido no Capítulo III. 54 Nesse sentido, ver caso ECT v. SABESP (Ação Ordinária 2008.61.00.020752-4, sediada na 5ª Vara Cível Federal de São Paulo) e outros no mesmo sentido. Esse tema será desenvolvido no Capítulo IV.

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mais empresas o fariam. Economias de escopo frequentemente decorrem do

compartilhamento de custos agregados e comuns a uma séria de serviços.55

A utilização, por exemplo, de sistemas de hub-and-spoke (abaixo

ilustrado) em indústrias de rede geram economias de escopo se a densidade

de utilização é maior em cada agência (ou ponto) em comparação com o

sistema point-to-point.56 O compartilhamento de linhas de caminhões para

conectar múltiplos pontos em uma rede cria economias de escopo em

comparação com um sistema stand-alone que duplica a estrutura de linhas

de caminhões.57

Ora, pelas mesmas razões que não é plausível classificar os serviços

postais como monopólio natural em decorrência da tecnologia utilizada, é

também implausível reconhecer que há substanciais economias de escopo

                                                                                                                         55 SIDAK, J. G.; SPULBER, D. F. Protecting Competition from the Postal Monopoly. American Enterprise Institute for Public Policy Research. 1996, p.43-55. 56 Sobre o conceito de sistema ou modelo de hub-and-spoke, ver OWYANG, Jeremiah. Web Strategy. Report: Companies should organize for social media in a “hub and spoke” model. 25.06.2009. Disponível em: <http://www.web-strategist.com/blog/2009/06/25/report-companies-should-organize-for-social-media-in-hub-and-spoke/>. Acesso em: 27 Mar. 2011: “The Hub and Spoke (Cross Functional): Like the hub on a bicycle wheel, a cross-functional group that represents multiple stakeholders across the company assembles in the middle of the organization. The hub facilitates resource sharing and cross-functional communications (via the “spokes” in the wheel) to those at the edge of the organization (or the “tire”).” 57 SIDAK, J. G.; SPULBER, D. F. Protecting Competition from the Postal Monopoly. American Enterprise Institute for Public Policy Research. 1996, p.55-56.

 

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nos serviços postais, ainda que se utilizem sistemas de hub-and-spoke, como

também o fazem grande parte (senão a maioria) das empresas privadas que

operam no mercado de prestação de serviços de logística.

Considerando que o serviço de transporte é (ou pode ser) terceirizado

(i.e., contratado com empresas independentes do prestador de serviço

postal), não há realização de economias de escopo nesse estágio. O fato de

que múltiplos players prestam de forma independente o serviço de transporte

é uma evidência negativa de que haveria significativas economias de escopo

na hipótese desses serviços serem prestados por apenas um player. Na

mesma linha, a triagem e transporte regionais podem gerar economias de

escopo apenas se dois tipos distintos de correspondências são operados

pelas mesmas unidades produtivas, ou ativos de produção (i.e., mesma

agências postal, mesmo centro de distribuição, mesmos veículos etc.).

Esse mesmo raciocínio se aplica à entrega local, podendo esta exibir

alguma economia de escopo se a coleta, triagem e entrega das

correspondências utilizarem-se exatamente dos mesmos ativos de produção,

e desde que as correspondências (de tipos distintos) sejam coletadas,

selecionadas e entregues conjuntamente (i.e., exatamente nas mesmas

viagens). Mesmo assim, a presença de economias de escopo não seria

suficiente a caracterizar um monopólio natural, pois múltiplos players que

realizam o serviço de coleta, triagem e transporte podem também atingir

economias de escopo se houver uma oferta multiproduto. Isso já seria

suficiente para apontar que a existência de vários players ofertando o mesmo

serviço (multiproduto) geraria melhores resultados em termos de eficiência

produtiva, maior qualidade, maior inovação e, portanto, mais bem-estar aos

consumidores.

Em outras palavras, economias de escopo não justificariam a adoção

do regime de monopólio legal, sob pena de se eliminar a possibilidade dos

consumidores serem beneficiados por uma oferta multiproduto mais eficiente

por parte de agentes econômicos da iniciativa privada.58

Um agente privado que decida entrar no mercado deve avaliar se o

stand-alone cost para um dado produto será inferior ao preço praticado para                                                                                                                          58

SIDAK, J. G.; SPULBER, D. F. Protecting Competition from the Postal Monopoly. American Enterprise Institute for Public Policy Research. 1996, p.56-57.

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tal produto naquele mercado. É claro que o player entrante tem a liberdade

de ingressar por meio da oferta conjunta de dois ou mais produtos, por meio

da qual possa obter economias de escopo. Por exemplo, se uma empresa

que presta serviços de entrega de propagandas (ou panfletos) comerciais em

certa vizinhança decide entrar no ramo de entrega de cartas simples, na

mesma vizinhança, seu custo de entrada não será o stand-alone cost da

entrega de cartas simples, mas sim, será representado pelo custo adicional

(i.e., ou incremental, incremental cost) de realizar a entrega de cartas além

de sua atividade de entrega de propagandas (ou panfletos) comerciais, pois

tal player já arca com o custo de entrega de propaganda não endereçada (ou

comerciais).

O custo para tal player entrar do mercado de cartas simples seria

representado pelo stand-alone cost da entrega de cartas simples menos as

economias de escopo (em bases unitárias) derivadas da realização de

entrega conjunta das propagandas comerciais (não endereçadas) com as

cartas simples. A mesma análise de custos incrementais de entrada seria

aplicável para as atividades postais multiproduto, no caso de não serem

desempenhadas por empresa controlada pelo poder público.

Em cada jurisdição, há distintas classificações dos tipos de serviços

postais, em suma em razão do volume (i.e., peso), sensibilidade ao prazo de

entrega, existência ou não de endereços e até em razão do conteúdo (se

individual e pessoal, ou se similar e coletivo). Em termos fáticos e

econômicos, entretanto, é possível simplificar para critérios de análise, e

inserir os serviços postais em poucas e precisas categorias, tais como as

indicadas acima, em razão da etapa da cadeia de produção e natureza geral

do serviço, isto é, contratação de transporte de longa-distância, triagem e

transporte regionais e coleta, triagem e entregas locais.

Em complemento, a distinção se dá em razão de algumas

características específicas de cada tipo de serviço, como: cartas urgentes (ou

express letters); entrega de bens e documentos (parcel post); cartas

comerciais endereçadas (como faturas de cartão de crédito, contas de

consumo de água, luz etc.); cartas comerciais não endereçadas (como

propagandas etc.); e, finalmente, das cartas simples (não urgentes).

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Nos EUA, por exemplo, há cinco tipos de serviços postais (como se

verá com mais detalhe no Capítulo II), sendo que apenas um é “aberto” a

terceiros, qual seja o mercado de express letters. Se, por hipótese, houvesse

concorrência em quatro tipos de serviços postais nos EUA, não seria

necessário ao prestador do único tipo de serviço reservado (i.e., em regime

de monopólio legal) oferta-lo em conjunto com um ou mais dos serviços

postais não reservados (ou abertos à livre concorrência), mesmo se com a

oferta conjunta obtivesse ganhos de escopo.

Essa assertiva decorre da premissa de que a abrangência dos

serviços a serem desempenhados pelo prestador público (ou controlado pelo

Estado) deve ser restrita aos limites da falha de mercado que tal intervenção

do Estado visa neutralizar. A abrangência da prestação de serviços

diretamente pelo ente estatal não deve ser balizada em objetivos de

minimização de custos da empresa pública que opera tanto com produtos

inseridos em regime de livre concorrência quanto com produtos inseridos em

monopólio legal, pois isso levaria à inevitável prática de subsídios-cruzados59,

os quais acabariam por prejudicar seriamente os mercados sob regime de

livre concorrência.

Isto é, se existem significativas economias de escopo entre produtos

sob regime de livre concorrência e produtos reservados, o modelo geral para

todos os serviços postais deveria ser o de livre concorrência e a prestação

deveria ser privada, havendo, no máximo, a intervenção estatal via regulação

setorial, com o estabelecimento, por exemplo, de normas para regular

preços, alocar custos, estabelecer critérios de não-discriminação para acesso

às infraestruturas (quando bottlenecks60) etc. Esse raciocínio, em síntese,

subjaz a Diretiva 97/67 da União Européia, a qual se destinou a dar início à                                                                                                                          59 Para conceito de subsídio-cruzado, ver GERADIN, D.; HENRY, D. Regulatory and Competition Law Remedies in The Postal Sector. Remedies in Network Industries: EC Competition Law vs. Sector-Specific Regulation. Damin Geradin (Editor). Intersentia. Antwerp, Oxford, UK, 2004, p.134: “(...)cross-subsidies as the technique by which ‘an undertaking bears or allocates all parts of the costs of its activities in one geographical or product market’” 60 Entende-se por bottleneck a obstrução existente em uma cadeia industrial, representada, e.g., por uma infra-estrutura (como uma rede de telefonia, ou duto para transporte de gás natural etc.) que necessita ser acessada pelos agentes econômicos para que seja viável a operação nos mercados situados a montante e a jusante. Mais sobre esse tema, ver GABAN, Eduardo Molan. Análise da restrição recusa de venda no controle de condutas infrativas à ordem econômica nos termos da lei nº 8.884/94. Revista de Direito da Concorrência. Brasília: Thompson IOB, abril de 2006.

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abertura normativa gradual dos serviços postais à livre concorrência (o que

será analisado com maior pormenor no Capítulo III).61

Dessa forma, se a concorrência é factível em alguns tipos de serviços

postais, como incontestavelmente é o caso das cartas urgentes (express

mail), bem como das cartas comerciais endereçadas (como faturas de

cartões de crédito, contas de água, luz, telefone etc.) e entrega de bens e

documentos, então não há falha de mercado, sendo desnecessário (e até

não recomendável) o envolvimento do governo, sobretudo na prestação

direta do serviço, concorrendo com os agentes privados. Nessa hipótese, a

falha de mercado não existente dá espaço à falha regulatória que, dada sua

impertinência, gera mais externalidades negativas (i.e., redução de bem-estar

social) que a suposta falha de mercado propriamente dita.62

O mesmo raciocínio se aplica à abrangência geográfica dos serviços

privados que os agentes econômicos são capazes de prestar, isto é, não há

necessidade do poder público prestar serviços em locais onde agentes

privados possuem incentivos econômicos para fazê-lo (i.e., podem prestar os

serviços de forma lucrativa). Em suma, a prestação em regime de monopólio

legal deveria se ater exatamente àqueles serviços postais que não possam

ser explorados de forma lucrativa por parte dos agentes privados, em regime

de livre concorrência.

Quanto mais demonstravelmente competitivo for o mercado, menos

provável é a necessidade da intervenção do Estado, seja para reservar

legalmente um dado segmento seja, sobretudo, para desempenhar

diretamente uma dada atividade (o que, além de problemático do ponto de

                                                                                                                         61 SIDAK, J. G.; SPULBER, D. F. Protecting Competition from the Postal Monopoly. American Enterprise Institute for Public Policy Research. 1996, p.57-58. EU. Directive 97/67/EC of The European Parliament and of The Council of 15.12.1997 on common rules for the development of the internal market of Community postal services and the improvement of quality of service. Disponível em: <http://eur-lex.europa.eu/LexUriServ/LexUriServ.do?uri=OJ:L:1998:015:0014:0025:EN:PDF>. Acesso em: 4 Nov. 2010. EU. Directive 2008/6/EC of The European Parliament and of The Council of 20.02.2008 amending Directive 97/67/EC with regard to the accomplishment of the internal market of Community postal. Disponível em: <http://ec.europa.eu/internal_market/post/doc/legislation/2008-06_en.pdf>. Acesso em: 25 Fev. 2011. 62

Nesse sentido, ver POSNER, Richard. Natural Monopoly and its Regulation. 30th anniversary edition. Washington D.C.: CATO Institute, 1999. No mesmo sentido, ver GABAN, Eduardo Molan. Regulação econômica e assimetria de informação. Revista do IBRAC, São Paulo, v. 9, nº 5, p. 97-167, 2002.

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vista concorrencial, possui outras externalidades negativas como a

corrupção, nos casos dos países em desenvolvimento, como o Brasil).63

1.3.2 Serviço universal: é necessário o serviço postal ser público?

Dentre as razões para sustentar a adoção de um regime de monopólio

legal para os serviços postais, afora o argumento de se tratar de um

monopólio natural (que, como se viu, carece de evidências podendo ser

considerado falacioso), utiliza-se frequentemente outros argumentos, tais

como: (i) universalização de acesso / provimento, sobretudo para regiões

mais remotas e mais pobres dos países; (ii) continuidade dos serviços; (iii)

unidade ou modicidade tarifária; e, finalmente, (iv) segurança dos usuários

(basicamente com relação ao sigilo de correspondência).

Tais argumentos são concatenados de forma não-lógica, mas

ideológica (e até romântica), no sentido de induzir a conclusão de que, além

de ter de ser exercidos sob o modelo de monopólio legal, os serviços postais

deveriam ser prestados diretamente pelo Estado. Esse raciocínio, também

carece de evidências e pode ser entendido como falacioso (como se passa a

demonstrar), e pode ser observado em várias jurisdições, como nos EUA, na

UE e, no Brasil, onde até hoje é utilizado (como se verá no Capítulo IV).

Ao contrário do que se afirma, o pior modelo para os serviços postais é

o de controle e gestão pelo Estado, dele decorrendo ainda maiores e mais

importantes externalidades negativas que o modelo de monopólio legal

propriamente dito. No caso do Brasil, como se verá no Capítulo IV, essa

afirmação fica bem clara, sobretudo em razão da ausência de qualquer

controle autônomo e independente sobre as atividades da ECT.

1.3.2.1 Externalidades negativas decorrentes do controle e gerência estatal dos serviços postais

Devido ao fato de ser uma entidade controlada exclusivamente pelo

Estado, as empresas públicas que prestam serviços postais, de forma distinta                                                                                                                          63

SIDAK, J. G.; SPULBER, D. F. Protecting Competition from the Postal Monopoly. American Enterprise Institute for Public Policy Research. 1996, p.59-60.

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das empresas privadas. isto é, não necessitam cumprir metas de

desempenho econômico-financeiro relativo às suas atividades, não

necessitam remunerar seus acionistas com os lucros decorrentes de uma

atividade econômica desempenhada de forma eficiente. Mesmo se gerem

lucros (ou excedentes financeiros), o “dono” não recebe dividendos, tal como

ocorre no setor privado.

Assim, não se pode comercializar ações ou dividendos da empresa

pública. Os “investidores” da empresa pública (no caso os tesouros

nacionais) não realizam um monitoramento constante das atividades

desempenhadas por elas, tal como o fariam seus acionistas controladores

para assegurar taxas de retorno satisfatórias de seus investimentos. Na

mesma linha, diferentemente das participações acionárias (ou de capital) das

empresas privadas, as quais conferem aos seus titulares direitos de voto e de

auferir dividendos, o controle exercido sobre a empresa pública prestadora de

serviços postais normalmente não confere ao seu titular a mesma habilidade

de interferir na governança da empresa por intermédio sistemas de controle

de eficiência, ou processos de controle de eficiência de produtos (proxy

process).64

A empresa privada maximiza lucros pois, dessa forma, maximiza o

valor da empresa para os seus acionistas. A empresa pública prestadora de

serviços postais, entretanto, não maximiza lucros, mas maximiza algo de

acordo com os interesses de seus dirigentes, como, por exemplo, numero de

empregados, número de agências postais (ou casas de correio), rotas

postais, volume de cartas coletadas e entregues etc. Se essa premissa for

verdadeira (mesmo que em parte), uma primeira externalidade negativa

importante se observa: a empresa pública prestadora de serviços postais não

utiliza eficientemente seus recursos de produção e não minimiza seus custos.

Uma segunda externalidade negativa também se observa: as empresas

privadas, que trabalham de forma eficiente para maximizar seus lucros,

provavelmente terão dificuldade para competir com a empresa pública

prestadora de serviços postais (que opera tanto em áreas reservadas como

não-reservadas – sob regime de livre concorrência), particularmente em                                                                                                                          64 SIDAK, J. G.; SPULBER, D. F. Protecting Competition from the Postal Monopoly. American Enterprise Institute for Public Policy Research. 1996, p.89-90.

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razão da existência de subsídios-cruzados. Uma terceira externalidade

negativa também se observa: como não é guiada pela obtenção de lucros,

mas por objetivos não clara e objetivamente definidos (simplesmente

colocados como “interesse público”), mesmo que experimente prejuízos em

uma dada atividade ou linha de produtos/serviços, a empresa pública não

descontinuará tal atividade, como o faria uma empresa privada. Dessa última

externalidade, já se observa um efeito direto no bem-estar dos consumidores,

qual seja, a eliminação da concorrência, e, portanto, de seus efeitos

benéficos à sociedade, em mercados vizinhos ou de alguma forma

relacionados aos serviços reservados a cargo da empresa pública.65

Interesse público, entendido como o interesse da coletividade ou da

sociedade66, não é compatível com o fato de desfrutar de um monopólio

legal, sem fundamentação econômica (o que por si só gera uma séria de

malefícios à economia), e sem qualquer controle regulatório independente,

pois a coletividade dificilmente é beneficiada pelos atos da empresa pública,

mas sim pequenos grupos de interesse representados, por exemplo, por seus

empregados, beneficiários diretos (como franqueados, no caso da ECT) e

colaboradores, como políticos e burocratas que se valem de esquemas

(lícitos e ilícitos) para manterem-se no poder. Diferentemente de uma

empresa privada que possui conselho de administração com objetivos

bastante claros, a partir dos quais opera no mercado buscando sempre mais

eficiência para obter melhor desempenho financeiro sob a disciplina rigorosa

do sistema jurídico como a lei antitruste, lei de defesa do consumidor, carga

tributária etc., a empresa pública muitas vezes opera em função de

interesses do governo da ocasião, os quais são difíceis de dimensionar e

objetivar e, não raras vezes, são contrários ao interesse público, como se                                                                                                                          65 SIDAK, J. G.; SPULBER, D. F. Protecting Competition from the Postal Monopoly. American Enterprise Institute for Public Policy Research. 1996, p.89-90. 66 Aliado ao conceito de interesse público está a idéia de interesse nacional, que pode ser caracterizada como o interesse de todo o país (de toda a nação, coletivamente considerada), isto é, de todo o povo, comunidade, habitantes do território nacional, infere-se que o interesse da coletividade (ou interesse público) nele está contido. Por consequência, a livre concorrência, prescrita como bem jurídico da coletividade (conforme o Artigo 1o. Da Lei nº 8.884/94) é caracterizada pela garantia da livre iniciativa numa acepção universal (i.e., contra o abuso da livre iniciativa numa acepção individual – ou abuso do poder econômico), está contida no conceito de interesse público, e por consequência, de interesse nacional. Isto fica ainda mais claro quando consideramos não somente o texto legal e constitucional, mas também os efeitos que um regime de livre concorrências proporciona para a economia do país e, por consequência, para a sociedade como um todo.

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observou e ainda se observa no caso da ECT com o Escândalo do Mensalão,

tema mais detidamente tratado no Capítulo IV.

Por outro ângulo, em organizações despidas de objetivos claramente

definidos bem como de fiscalização / monitoramento constante e

independente, seus dirigentes tendem a maximizar seus objetivos pessoais

(individuais), como normalmente, aumentar sua autoridade (ou poder),

aumentar sua remuneração, ou reduzir suas responsabilidades. A ECT, cujo

presidente e cujos diretores são indicados e demissíveis ad nutum pelo

Presidente da República, é monitorada diretamente pelo Ministro de Estado

das Comunicações, igualmente indicado e demissível ad nutum pelo

Presidente da República. Não há arcabouço normativo que discipline

diretamente suas atividades no tocante aos serviços reservados, bem com

aos serviços não-reservados que realiza, quanto mais sobre a relação dos

primeiros com os últimos (para se preservar os mercados livres da utilização

de subsídios-cruzados decorrentes dos mercados reservados). Não há,

assim, qualquer limitação, ainda que normativa e não concreta, à

maximização dos interesses individuais de seus dirigentes diretos e indiretos

(i.e., Presidência da República, Ministério das Comunicações e políticos

membros de seus partidos políticos).67

Nesse contexto, é intuitivo que os dirigentes da empresa pública

prestadora de serviços postais procurem sempre alargar a abrangência do

monopólio legal para, num círculo vicioso, maximizar seus interesses

individuais, buscando sempre um maior volume de serviços prestados em

linhas de negócio cada vez mais diversificadas. Essa inferência ficará

fortalecida com exemplos históricos observados nos EUA (Capítulo II), na EU

(Capítulo III) e no Brasil (Capítulo IV).

Quanto maiores forem os resultados em termos de número de

funcionários, números de agências postais, volume financeiro obtido

(independentemente do fato de decorrerem de negócios lucrativos ou não e,

muito menos, se à custa da eliminação da concorrência e do bem-estar dos

consumidores) mais terão os dirigentes da empresa pública maximizado seus

bem-estares individuais. Isto porque terão mais chances de aumentar suas

                                                                                                                         67 Mais detalhes sobre os sistema postal no Brasil, ver Capítulo IV deste trabalho.

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remunerações e seus benefícios, ou regalias, fruto da troca de favores com

políticos e membros do Poder Executivo. E de forma progressiva, pois quanto

mais funcionários estiverem sob seu rol de influência, maior será seu poder

de persuasão dos dados, muitas vezes fabricados para “inglês ver” (dada a

total ausência de isenção na elaboração dos resultados).

Os políticos e membros do Poder Executivo, por sua vez, terão todos

os incentivos para “agradar” os dirigentes da empresa pública, pois terão

“números importantes” para mostrar à sociedade como resultado de uma

“boa” gestão, isto é, volumes sempre crescentes de correspondências

transportadas, número de agências postais por todo o território nacional e

resultados financeiros significativos e, portanto, “bem-estar social”.68 A

população terá acesso a tais resultados, preparados com a maior “isenção e

honestidade” por parte da empresa pública titular do monopólio postal. Isso,

por exemplo, fica claro nas declarações e dados divulgados pela ECT fora do

Brasil.69

Afora a questão de corrupção e objetivos ilegais observados em larga

escala nos países em desenvolvimento, como o Brasil, há ainda outros

objetivos, em princípio lícitos, que também potencializam o círculo vicioso

acima descrito, quais sejam, o senso de grande importância e satisfação

pessoal por parte dos dirigentes da empresa pública em estarem à frente de

um negócio que gera receitas altíssimas.

Em síntese, o modelo de empresa pública para os serviços postais os

tornam sobremodo suscetíveis à influências políticas. Normalmente a

empresa pública recebe pressão para aumento e manutenção de empregos,

bem como aumento de salários, de modo que, como não maximiza lucros e

não tem que minimizar os custos operacionais (como salários), acaba se

moldando às pressões, mantendo os níveis de maximização de bem-estares

                                                                                                                         68

SIDAK, J. G.; SPULBER, D. F. Protecting Competition from the Postal Monopoly. American Enterprise Institute for Public Policy Research. 1996, p.93. 69 IANNI, Juan B. Postal reform in developing countries: challenges and choices. Handbook of Worldwide Postal Reform. Edited by Michael A. Crew, Paul R. Kleindorfer, James I. Campbell Jr. Cheltenham, UK. Northampton, MA, USA. 2008, p. 410: “As a result, it [ECT] has been recognized in public surveys as having the highest level (90 percent) of credibility among all public and private institutions (including religious and educational institutions) in Brazil (Siciliano, 2006). It [ECT] also has been able to consistently maintain profitability and pay a portion of its proceeds into the Public Treasury without subsidies from the State (UPU, 2007).” (apartes inseridos no texto original).

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individuais de seus dirigentes, fazendo com que os concorrentes de

mercados livres e, principalmente, os consumidores, que não têm escolha,

“paguem a conta”.

1.3.3 Serviço universal: é indispensável o monopólio legal?

Em grande parte das jurisdições onde, em algum ponto da história,

houve (e, em alguns casos, ainda há) monopólios legais para os serviços

postais, o argumento da universalização, juntamente com o argumento da

existência de falha de mercado (i.e., monopólio natural), foi (e é) utilizado

para manter as reservas legais e, muitas vezes, ampliá-las para mercados

além dos postais (como é o caso dos EUA e do Brasil). Basicamente, o termo

“universalização” oculta quatro elementos, ou valores buscados na prestação

dos serviços postais: (i) a cobertura integral dos territórios nacionais,

sobretudo dos lugares mais remotos e economicamente menos

desenvolvidos; (ii) a continuidade do serviço postal; (iii) preços ou tarifas

uniformes ou módicas; e (iv) segurança, ou simplesmente preservação do

sigilo de correspondência pessoal.

Embora em algum ponto da história tais valores sustentassem a

escolha do modelo de monopólio legal exercido diretamente pelo Estado, no

atual contexto, nenhum deles se mostra aplicável para fundamentar a

manutenção da reserva legal dos serviços postais. Cobertura integral,

continuidade e preços uniformes (ou, em alguns casos, simplesmente

modicidade tarifária, aceitando-se variações nos preços) representam a

essência da ideia de universalização.

A cobertura integral refere-se à oferta do serviço postal em todo o

território de um país, tanto nas áreas urbanas mais desenvolvidas e, portanto,

atrativas em termos econômicos, quanto nas áreas rurais menos

desenvolvidas e, assim, menos ou nada atrativas em termos econômicos. A

universalização pressupõe que o prestador de serviços postais esteja apto a

atender tanto as áreas mais desenvolvidas, quanto as menos desenvolvidas,

de modo a proporcionar aos consumidores acesso universal, ou ubíquo, aos

serviços postais. A continuidade surge como fundamento complementar à

universalização, no sentido de que os serviços precisam ser prestados de

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forma abrangente e continua, isto é, não pode haver interrupções

injustificadas, como por exemplo, decorrentes de ausência de crescimento

econômico em uma região (ou de ausência de potencial de pagamento por

parte da demanda). Os preços uniformes (ou modicidade tarifária) possuem,

por sua vez, uma importância de ordem instrumental para viabilizar a

universalização, vez que surgem como alternativas de proporcionar aos

consumidores mais pobres a possibilidade de se valerem dos serviços

postais, i.e., de serem incluídos nos serviços postais independentemente de

seu potencial de pagamento (presumivelmente inferior ao do consumidor

localizado em grandes centros urbanos).

O modelo de preços uniformes contem em si um poderoso argumento

de efeito distributivo pois, dadas as diferenças entre áreas urbanas e rurais,

implicaria que os consumidores com maior potencial de pagamento

subsidiariam os consumidores com menor potencial de pagamento. A

questão que se coloca é a seguinte: precisaria a universalização (i.e.,

cobertura abrangente, contínua e com preço uniforme ou módico) decorrer de

um monopólio legal exercido por uma empresa pública?

A resposta é negativa. A primeira razão decorre do fato de que

abrangência, continuidade e preços uniformes podem ser perfeitamente

garantidos por parte de empresas privadas, em regime de livre concorrência.

No caso do modelo de preços uniformes, a mesma premissa de subsídios

entre os diferentes tipos de consumidores poderia ser adotada pelos players

privados, só que em um contexto de livre concorrência em que os diferentes

prestadores dos serviços postais concorreriam, inclusive, nos modelos de

alocação de custo, a partir do que, os modelos mais eficientes gerariam

melhores desempenhos.70

Uma segunda razão decorreria do fato de que os agentes privados

têm mostrado maior habilidade de prestar serviços de maior qualidade e

menores custos que a empresa pública. Nessa linha, diversas opções

distintas do modelo de monopólio legal exercido por empresa pública e com

melhores resultados em termos econômicos e sociais estariam disponíveis

para se atender ao princípio da universalização. Uma primeira opção seria                                                                                                                          70

SIDAK, J. G.; SPULBER, D. F. Protecting Competition from the Postal Monopoly. American Enterprise Institute for Public Policy Research. 1996, p.72-73.

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realizar uma análise de quais seriam, particularmente, as áreas mais remotas

e economicamente menos desenvolvidas do país, sobre as quais não haja

incentivos econômicos para a oferta privada de serviços postais e, caso

existam, realizar licitações (na forma de leilão em que a empresa privada que

apresentasse o menor valor a ser subsidiado pelo governo, seria vencedora)

apenas para o provimento de serviços postais para tais regiões menos

favorecidas.

Os consumidores em tais regiões continuariam pagando o preço ou

tarifa uniforme nacional para as correspondências. A empresa vencedora do

leilão deveria manter uma estrutura jurídica (e.g., uma sociedade de

propósito específico) e contábil separada de suas outras atividades, no caso

de prestar outros serviços postais. Essa sugestão de modelo, por exemplo,

afastaria alguns dos principais problemas existes no modelo de monopólio

legal exercido por empresa pública.71

No caso do Brasil, essa sugestão não diferiria muito, por exemplo, dos

leilões para construção de usinas hidrelétricas.72 Outra alternativa possível

seria o Estado, uma vez mapeadas as regiões menos favorecidas, subsidiar

diretamente os consumidores das áreas menos favorecidas de modo a

incluir-lhes nos serviços postais em funcionamento em regime de livre

concorrência, i.e., com múltiplos agentes econômicos competindo em termos

de preços (que refletiriam seus custos reais) e qualidade.73

O último argumento utilizado para sustentar a adoção do modelo de

monopólio legal exercido por empresa pública é a segurança, ou

basicamente a preservação do sigilo das correspondências, valor

especialmente protegido por lei em muitos países, como no Brasil. Aliada à

preservação do sigilo está a garantia de entrega e não violação do conteúdo

das mensagens. A garantia de sigilo não é compatível com correspondências

do tipo “propagandas comerciais” dado que são públicas. Com relação às

correspondências pessoais ou que demandam proteção / privacidade, a

                                                                                                                         71

SIDAK, J. G.; SPULBER, D. F. Protecting Competition from the Postal Monopoly. American Enterprise Institute for Public Policy Research. 1996, p.72-73. 72 GABAN, Eduardo Molan. O caso do rio madeira. In: GABAN, E. M.; DOMINGUES, J. O. (Orgs.). Est. de Direito Econômico e Economia da Concorrência. 1a ed. Curitiba: Juruá, 2009. 73

SIDAK, J. G.; SPULBER, D. F. Protecting Competition from the Postal Monopoly. American Enterprise Institute for Public Policy Research. 1996, p.73.

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pergunta que se coloca é a seguinte: seria uma empresa pública e

monopolista mais confiável que empresas privadas em regime de

competição? A resposta é negativa.

O controle dos serviços postais pelo Estado não é necessário para

garantir maior segurança, por pelo menos cinco razões. A primeira razão

reside no fato de que empresas privadas já oferecem alternativas bastante

confiáveis para os consumidores em termos de serviços de entrega expressa

(ou urgente) de bens e documentos (e.g., FEDEX, DHL, UPS etc.), o que já

reflete a confiança depositada por consumidores em seus serviços. Não

fossem confiáveis, não haveria clientes dispostos a contratá-los.

Ora, se realizam de forma confiável os serviços de entregas

expressas, poderiam facilmente realizar os serviços postais de forma

confiável, como a entrega de cartas. Assim, o argumento da segurança e

confiabilidade se mostra obsoleto, pois além de ignorar a existência de oferta

eficiente por parte dos players privados, não considera a existência de outros

meios de comunicação como o e-mail e o próprio telefone.

A segunda razão decorreria do fato de que as empresa privadas de

entregas expressa e logística de bens e valores já oferecem uma ampla

variedade de seguros (ou garantias) sobre os bens e documentos

transportados, além de uma série de valores que são agregados aos serviços

de transporte propriamente ditos, e.g., bar code tracking systems etc., a partir

do que é possível ao cliente localizar exatamente o local da entrega, mesmo

antes de atingir o destinatário. Tais inovações verificadas nos produtos e

serviços ofertados pelos agentes privados decorrem do fato de que as

necessidades por segurança variam em função de cada tipo de cliente. Por

outro lado, as empresas públicas prestadoras de serviços postais

normalmente ofertam apenas garantias gerais de segurança (de não violação

de sigilo bem como de entrega ao destinatário) e não customizadas (tailored)

aos interesses específicos da demanda.

A terceira razão decorre da inexistência de fundamento econômico

para a comercialização dos serviços postais em conjunto (ou sob a forma de

venda casada) como o seguro pela perda ou destruição das

correspondências. Na maioria dos casos, os serviços postais ofertados por

empresas públicas (como se pode observar, por exemplo, nos EUA e Brasil)

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não possuem seguro “automático”, a não ser que os consumidores

expressamente o queiram e paguem valor adicional para tanto. Em um

ambiente de livre concorrência, além dos serviços postais em si, haveria

concorrência por melhores coberturas e menores preços para os seguros de

correspondências.

A quarta razão decorre do fato de que as empresas públicas

prestadoras de serviços postais normalmente terceirizam o transporte para

empresas privadas de transporte terrestre (caminhões, trens, carros etc.) e

aéreo, o que indica, por si só, que os governos não se consideram as únicas

partes confiáveis envolvidas na prestação de serviços postais.74

Por fim, a quinta razão para a desnecessidade do regime de

monopólio legal operado por empresa pública para garantir a segurança

reside no fato de que em muitas jurisdições, como é o caso do Brasil, há leis

com punições severas para quebras de sigilo de correspondências, bem

como por perda de bens e valores, já sendo os prestadores privados civil e

criminalmente responsáveis e, no caso de relações de consumo,

objetivamente responsáveis por qualquer violação e/ou destruição de

correspondências.75

                                                                                                                         74

SIDAK, J. G.; SPULBER, D. F. Protecting Competition from the Postal Monopoly. American Enterprise Institute for Public Policy Research. 1996, p.76-80. 75 BRASIL. Código Penal Brasileiro (Decreto-Lei nº 2.848/1940). SEÇÃO III - DOS CRIMES CONTRA A INVIOLABILIDADE DE CORRESPONDÊNCIA. Violação de correspondência. Art. 151 - Devassar indevidamente o conteúdo de correspondência fechada, dirigida a outrem: Pena - detenção, de um a seis meses, ou multa. Sonegação ou destruição de correspondência § 1º - Na mesma pena incorre: I - quem se apossa indevidamente de correspondência alheia, embora não fechada e, no todo ou em parte, a sonega ou destrói; Violação de comunicação telegráfica, radioelétrica ou telefônica II - quem indevidamente divulga, transmite a outrem ou utiliza abusivamente comunicação telegráfica ou radioelétrica dirigida a terceiro, ou conversação telefônica entre outras pessoas; III - quem impede a comunicação ou a conversação referidas no número anterior; IV - quem instala ou utiliza estação ou aparelho radioelétrico, sem observância de disposição legal. § 2º - As penas aumentam-se de metade, se há dano para outrem. § 3º - Se o agente comete o crime, com abuso de função em serviço postal, telegráfico, radioelétrico ou telefônico: Pena - detenção, de um a três anos. § 4º - Somente se procede mediante representação, salvo nos casos do § 1º, IV, e do § 3º. Correspondência comercial Art. 152 - Abusar da condição de sócio ou empregado de estabelecimento comercial ou industrial para, no todo ou em parte, desviar, sonegar, subtrair ou suprimir correspondência,

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1.4 Considerações finais

O Brasil é um País em desenvolvimento que, como outros, lida com

problemas como pobreza, corrupção, abuso do poder econômico, tudo com a

finalidade maior de proporcionar desenvolvimento à economia nacional e,

principalmente, elevar o nível de bem-estar do povo, como determina a

Constituição de 1988. Tem adotado, assim, a política antitruste de forma

consistente e abrangente (na linha da segunda corrente de pensamento

sobre o tema) com o objetivo eliminar o abuso de poder econômico e impedir

a formação de estruturas de mercado impenetráveis por parte de novos

players, proporcionando, assim, maior diversidade na oferta de bens e

serviços, maiores níveis de inovação na indústria e, via de consequência,

elevação constante dos padrões de qualidade dos produtos e serviços para

os consumidores.

Claro é, todavia, que há setores que necessitam de maior intervenção

antitruste que outros. Há ainda setores no Brasil que não possuem

tratamento antitruste, mesmo tendo plena vocação para tanto (i.e., mesmo

não apresentando falhas de mercado): é o caso dos serviços postais.

Como se observou, não há razões econômicas para manter o modelo

de monopólio legal para os serviços postais pois: (i) não constituem

monopólio natural (i.e., não apresentam falha de mercado); e (ii) não terão

sua prestação universal reduzida ou de qualquer forma prejudicada em razão

da mudança para o regime de livre concorrência. Se em teoria isso ficou claro

neste capítulo, a experiência internacional não deixará dúvidas de que o

modelo de monopólio legal exercido por empresa pública é ultrapassado e

gera muito mais prejuízos que ganhos ao bem-estar social, particularmente

ao bem-estar dos consumidores.

                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                           ou revelar a estranho seu conteúdo: Pena - detenção, de três meses a dois anos. Parágrafo único - Somente se procede mediante representação. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil/decreto-lei/Del2848.htm>. Acesso em: 6 Mai. 2011.

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CAPÍTULO II. OS SERVIÇOS POSTAIS NOS EUA

“The general rule in the American economy is that attempted

monopollization is a crime, but when it comes to delivering letters it

is attempted competition that is a crime”.76

SIDAK; SPULBER (1996)

“Innovation and antitrust, we have been keeping our eye on the

wrong ball. We have been protecting dominant firms, rather than

empowering mavericks.”77

Eleanor M. Fox (2011)

2.1 Introdução

Reconhecido como um dos principais berços do direito antitruste,

senão o principal, o sistema jurídico norte-americano tem sido referência para

muitas jurisdições (i.e., países) no que concerne aos principais padrões

normativos e instrumentais para a criação e a implementação de uma boa

política de defesa da concorrência.78

Todavia, esse discurso não pode ser reproduzido para o caso dos

serviços postais. De forma diversa da maioria dos mercados, sobre os quais

se aplica de forma integral a política de defesa da concorrência, os serviços

postais contam com um regime especial de monopólio legal, dotado de

privilégios e imunidades, o qual acaba possuindo características singulares

que o distinguem da grande maioria dos setores da economia norte-

americana.79

                                                                                                                         76 SIDAK, J. G.; SPULBER, D. F. Protecting Competition from the Postal Monopoly. American Enterprise Institute for Public Policy Research. 1996, p. 153. Tradução livre: “A regra geral na economia Americana é que a tentativa de monopolização é crime, mas quando se trata da entrega de cartas, a tentativa de concorrência é que é crime.” 77 New York University School of Law web site. Disponível em: <http://www.law.nyu>. Acesso em: 7 Abr. 2011. Tradução livre: “Inovação e antitruste. Nós temos mantido nosso olho na bola errada. Nós temos protegido as firmas dominantes ao invés de dar poder aos mavericks (entrantes).” 78  GABAN, Eduardo M.; DOMINGUES, Juliana O. Direito Antitruste: o combate aos cartéis. 2 ed. São Paulo: Saraiva, 2009, p. 89-102.  79 SIDAK, J. G.; SPULBER, D. F. Protecting Competition from the Postal Monopoly. American Enterprise Institute for Public Policy Research. 1996, p. 2.  

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O monopólio legal dos serviços postais nos EUA é exercido por uma

empresa pública, integralmente controlada pelo Governo dos EUA, cujo nome

é United States Postal Services (mais conhecida pela sigla “USPS”, ou

simplesmente por “Serviço Postal”). Essa empresa possui uma série de

regalias tais como isenção (ou imunidade) ao imposto de renda, ausência de

obrigações para com acionistas, tais como pagamento de dividendos e

alcance de metas de desempenho tendo em vista taxas de retorno ao

investimento realizado, não sujeição a uma série de regras administrativas ou

regulatórias (que refletem custos operacionais às operações normais no setor

privado), tais como Occupational Safety and Health Administration (OSHA).80

Em complemento, a USPS possui a prerrogativa de ter seus contratos

de empréstimo, bem como contratos comerciais, interpretados sob o prisma

das leis federais norte-americanas de common law (i.e., federal common

law), ao invés das leis estaduais (mais severas e restritas). Além disso,

possui a mesma preferência dispensada ao Governo dos EUA (U.S.

Government) no tocante ao pagamento de débitos de falências, ao mesmo

tempo em que pode realizar empréstimos diretamente do Tesouro dos EUA

ou realizar empréstimos de terceiros com base na mesma fé-pública e crédito

do Governo dos EUA.81

                                                                                                                         80 SIDAK, J. G.; SPULBER, D. F. Protecting Competition from the Postal Monopoly. American Enterprise Institute for Public Policy Research. 1996, p. 2. No mesmo sentido, ver GEDDES, R. Richard. Anticompetitive Behavior in Postal Services. Competing with the Government: Anticompetitive Behavior and Public Enterprises. Rick Geddes (Org.). Disponível em: <http://www.hoover.org/publications/books/8350>. Acesso em: 22 out. 2010. p.86: “Commentators often focus on legally enforced monopoly as the main source of economic value (or rents) with which to subsidize competitive activities. However, the USPS receives a variety of additional special dispensations that artificially improve its ability to compete with private firms. Special privileges enjoyed by the USPS can be grouped into two categories: (1) monopoly and suspension powers and (2) a set of special privileges and immunities stemming from government ownership or sponsorship”. Ainda nesse sentido, GEDDES (p.90) afirma que: “It is exempt from taxation. Because it can borrow from the Federal Financing Bank, it enjoys an explicit government guarantee of its debit. It remains government owned and is thus exempt from paying investors an expected rate of return on their invested capital; that is, it benefits from captive equity. It is not subject to a bankruptcy constraint. It has the power of eminent domain. It is exempt from a host of costly government regulations including antitrust law and SEC disclose requirements. It is immune from parking tickets for its vehicles and from paying for vehicle registrations. It does not have to apply for building permits or conform to local zoning regulations, etc. All of the government-granted benefits enumerated above are valuable and allow the USPS to artificially reduce its price below those of more efficient rivals”. 81 SIDAK, J. G.; SPULBER, D. F. Protecting Competition from the Postal Monopoly. American Enterprise Institute for Public Policy Research. 1996, p. 2.

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Segundo o Private Express Statutes, um conjunto de leis que prevêem

o monopólio postal nos EUA, a USPS possui monopólio sobre a “entrega de

cartas”. Ao mesmo tempo, além dessa prerrogativa e da série de privilégios

em comparação às empresas privadas, a USPS concentra funções de

regulação e fiscalização no mercado de serviços postais, podendo realizar

até buscas e apreensões no caso de suspeitar de violação do monopólio

postal por parte de concorrentes e/ou clientes.82

Tal estrutura, resultado da outorga ao Congresso dos EUA de

competência para legislar sobre matéria postal e criação de rotas postais,

pela Constituição dos EUA83, foi desenvolvida ao longo dos anos e culminou

com a formação de uma empresa imensa e muito poderosa dentro do

contexto norte-americano.84 Poderosa o bastante para, ainda nos dias de

hoje, pôr em cheque alguns dos valores mais defendidos naquele país, como

é o caso da livre concorrência a do combate ao abuso do poder econômico

(ou attempt to monopolize).85

                                                                                                                         82 SIDAK, J. G.; SPULBER, D. F. Protecting Competition from the Postal Monopoly. American Enterprise Institute for Public Policy Research. 1996, p. 3. 83  EUA. The Constitution of the United States. Article I. Section 8: “The Congress shall have Power to lay and collect Taxes, Duties, Imposts and Excises, to pay the Debts and provide for the common Defense and general Welfare of the United States; but all Duties, Imposts and Excises shall be uniform throughout the United States; (…) To establish Post Offices and post Roads;”. Disponível em: <http://72.32.50.200/constitution/constitution.pdf>. Acesso em: 8 Jan. 2011. 84 Segundo o relatório anual da USPS, publicado em seu website no primeiro trimestre de 2011, em 2010, a USPS foi responsável pelo envio de cerca de 170,5 bilhões de correspondências, dentre as quais cerca de 78,2 bilhões de First-Class Mail e cerca de 82,5 bilhões de cartas simples (Standard Mail). Em termos de faturamento, o First-Class Mail foi responsável pelo montante de cerca de 34 bilhões de dólares, enquanto a carta simples por cerca de 17,3 bilhões de dólares (em conjunto, First-Class Mail e Standard Mail representaram cerca de 77% do faturamento da USPS). Como resultado da crise de 2009, a USPS registrou uma receita operacional de 67.052 bilhões de dólares (em 2008, e.g., registrara 74,932 bilhões de dólares). Em setembro de 2010, a USPS possuia 583.908 empregados somados a 87.779 colaboradores (empregados, mas não de carreira), totalizando cerca de 760 mil empregados dentro dos EUA. Para mais informações, ver US. USPS. 2010 Annual Report – United States Postal Service. Disponível em: <http://www.usps.com/financials/_pdf/usps2010annual-report.pdf>. Acesso em: 6 Mai. 2011.  85 EUA. Sherman Act. Section 2 (Monopolizing trade a felony; penalty): “Every person who shall monopolize, or attempt to monopolize, or combine or conspire with any other person or persons, to monopolize any part of the trade or commerce among the several States, or with foreign nations, shall be deemed guilty of a felony, and, on conviction thereof, shall be punished by fine not exceeding $10,000,000 if a corporation, or, if any other person, $350,000, or by imprisonment not exceeding three years, or by both said punishments, in the discretion of the court.” Disponível em: <http://www.stolaf.edu/people/becker/antitrust/statutes/sherman.html>. Acesso em: 8 Jan. 2011.  

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Nesse sentido, para se ter a correta impressão do contexto em que se

encontra a USPS, bem como os reflexos disso para o objeto deste trabalho

(sobretudo com relação ao modelo brasileiro e os aspectos que se pode

utilizar para o estabelecimento de uma crítica positiva e embasada do modelo

pátrio), passa-se a analisar alguns dos principais aspectos das normas

jurídicas e da jurisprudência que constituem monopólio postal norte-

americano.

2.2 Histórico Idealizado como uma espécie de resposta à necessidades de

integração nacional, fortalecimento político e militar, o serviço postal norte-

americano teve seu início em 1775 - período em que os EUA ainda eram

considerados colônias do império inglês. Segundo se pode depreender dos

primeiros documentos legislativos que serviram de base à criação do sistema

postal norte-americano, uma rede postal eficiente era tida como crucial para a

comunicação entre os comandantes militares e os primeiros representantes

eleitos, bem como entre estes últimos e seus eleitores – os jornais,

transportados pelo serviço postal naquela ocasião, permitiram aos norte-

americanos iniciar sua participação na vida política daquela nação. Outro

motivo bastante frequente nos registros históricos é a integração nacional

entre os territórios da costa leste com o norte, sul e oeste dos EUA. Em 1791,

o Presidente George Washington declarou que a importância do serviço

postal e das rotas postais em um plano suficientemente liberal e abrangente

– contando com rapidez, segurança e facilidade da comunicação - é

aumentada por sua instrumentalidade em difundir o conhecimento das leis e

procedimentos do Governo dos EUA.86

Nesse sentido, nos primeiros anos da república, o serviço postal norte-

americano representou uma das principais instituições que incorporavam o

espírito do Governo Federal bem como um símbolo poderoso de

conectividade nacional. As cartas e jornais eram, na ocasião, os principais                                                                                                                          86  EUA. United States Postal Service. Universal Service and the Postal Monopoly: a Brief History. Disponível em: < http://www.usps.com/postallaw/_pdf/UniversalServiceandPostalMonopolyHistory.pdf>. Acesso em: 6 dez. 2010, p.1-3.

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meios para os debates políticos, religiosos e econômicos, tendo o

comprometimento do Governo Federal dos EUA com o serviço postal

contribuído com parte da formação das fundações para o crescimento

econômico daquele país. Contudo, a importância política e econômica

atribuída ao serviço postal não representou sua difusão no país, pois sua

utilização era considerada muito custosa e, portanto, acima do potencial da

maior parte dos norte-americanos, os quais, principalmente em razão do

preço elevado, não se habituaram a incorporar a comunicação por cartas em

seu cotidiano.87

Interessante se mostra a possível razão para a definição dos preços

elevados do serviço postal norte-americano em seus primórdios: as cartas

deveriam servir de plataforma para financiar o negócio principal do serviço

postal, qual seja, a circulação de notícias políticas, permitindo que pessoas

residentes em locais distantes dos grandes centros participassem da vida

política do país. Dessa forma, os preços elevados para o envio de cartas

privadas e comerciais serviriam de subsídio aos preços extremamente baixos

para a postagem de jornais. Nos dias de hoje, esse trade off pode parecer

irracional (em termos econômicos) e injusto, contudo, historiadores como

HENKIN defendem que, nos primórdios da república norte-americana, a

vinculação do serviço postal com a imprensa fazia todo o sentido para a

integração nacional e fortalecimento político de um país que acabara de se

formar como república independente.88

Em meados de 1800, precisamente a partir de 1845, o Congresso

norte-americano redefiniu a metodologia de preços para a oferta de serviços

postais, reduzindo-os significativamente. Dessa forma, os EUA, já como

Estado independente, experimentaram o início de uma mudança de cultura

proporcionada pela assunção da necessidade de cada vez mais se

comunicar. Essa necessidade se intensificou nos períodos pré-guerra civil e

durante a guerra civil ocorrida naquele país. A necessidade de integração

nacional, explícita nos propósitos da guerra em razão das divergências entre                                                                                                                          87 HENKIN, David M. The Postal Age – The emergence of Modern Communications in Nineteenth-Century America. The University of Chicago Press. Chicago and London. 2006, p.16-17.  88  HENKIN, David M. The Postal Age – The emergence of Modern Communications in Nineteenth-Century America. The University of Chicago Press. Chicago and London. 2006, p.21.  

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os estados do norte e do sul dos EUA (como por exemplo, a escravidão), se

somava à intenção da maioria dos norte-americanos de manter contato com

seus parentes, entes queridos, parceiros de negócios etc., distanciados em

razão da guerra.89

Esse conjunto de motivações talvez possa explicar o imenso valor

atribuído ao serviço postal nos EUA e, portanto, o volume de investimentos e

incentivos a ele direcionados a partir de então que, ao longo dos anos,

resultara na criação de um dos maiores sistemas postais do mundo.90

Desde sua criação, o serviço postal norte-americano era

desempenhado por uma autoridade administrativa denominada Postal Office

Department, ligada diretamente ao Poder Executivo Federal daquele país.

Em 1970, o Congresso norte-americano, por meio de Postal Reorganization

Act, transformou o antigo Postal Office Department em um estabelecimento

independente e auto-sustentável chamado United States Postal Services

(USPS), o qual existe até hoje e opera no mercado postal dos EUA. Dentre

vários objetivos pretendidos com tal reforma e com a criação da USPS,

pretendeu-se atribuir mais autonomia ao agente econômico USPS no cenário

nacional, de modo a atribuir-lhe mais eficiência preservando-lhe, ao mesmo

                                                                                                                         89 “(...) mail came to assume a particular burden in the maintenance of long-term relationships that were threatened (or simply structured) by physical separation, especially of family members. This burden assumed dramatic proportions in the context of the two most publicized internal mobilizations of this period in American history – the California Gold Rush and the Civil War – when large numbers of Americans, mostly (though by no means exclusively) men, left their homes for what their hoped or instead was a short period of time, expecting in the interim to maintain some symbolic presence within those homes. These two events created communities on both sides of a postal divide where the daily rituals of mail delivery assumed especially high stakes, habituating new groups of Americans to the postal culture and dramatizing scenes of mail call for a national readership. At the same time, the dramatic public spectacle of separated kin using the post to perform family obligations and affirm family intimacy helped shape the meaning of mail in American culture.” HENKIN, David M. The Postal Age – The emergence of Modern Communications in Nineteenth-Century America. The University of Chicago Press. Chicago and London. 2006, p.11. 90 “Describing the changes that took place during the middle of the nineteenth century as the emergence of a new postal culture does not imply that those changes took place exclusively in the realm of ideas or that the history of the post is best glimpsed through the study of works of art or symbolic representation. Nor should the word culture be misunderstood to suggest that the impact of the mail was determined largely by features of the American national character or by those entrenched systems of belief that historians sometimes have in mind when they characterize their interpretations as cultural. The new postal culture was a cluster of new practices, attitudes, norms, discussions, and, crucially, habits – of communication, inquiry, and expectation – that grew up around a modern postal system.” HENKIN, David M. The Postal Age – The emergence of Modern Communications in Nineteenth-Century America. The University of Chicago Press. Chicago and London. 2006, p.4-5, 22.  

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tempo, alguns de seus mandatos originais, como a prestação de um serviço

universal.91

Como se verá nos tópicos seguintes, desde o princípio, o serviço

postal norte-americano foi idealizado sob o modelo de monopólio, tendo esse

modelo prevalecido, mesmo diante das várias reformas do sistema postal dos

EUA. Os fundamentos econômicos e políticos que embasaram a escolha do

modelo de monopólio postal nos EUA, contudo, embora tenham sido

mantidos nos estatutos de geração em geração, foram perdendo substrato

fático (i.e., sentido prático) a medida da evolução da economia dos EUA e,

sobretudo, da tecnologia e dos meios de comunicação, representando, nos

dias de hoje, um intrigante paradoxo que merece reflexão.

2.3 Normas jurídicas e jurisprudência

Embora a Constituição dos EUA apenas preveja a competência do

Congresso daquele país para legislar em matéria de serviços e rotas postais,

interpretou-se extensivamente tal prerrogativa a ponto de se aceitar que

fosse criada uma empresa pública que, em regime de monopólio legal, se

                                                                                                                         91  EUA. United States Postal Service. Universal Service and the Postal Monopoly: a Brief History. Disponível em: < http://www.usps.com/postallaw/_pdf/UniversalServiceandPostalMonopolyHistory.pdf>. Acesso em: 6 dez. 2010, p. 2-3. No mesmo sentido e no mesmo documento, ver p. 18-19, a saber: “The Postal Reorganization Act of 1970 gave the United States Postal Service the freedom to make many – but not all – of its own business decisions. Some of the most important decisions – rate-setting and labor negotiations, affecting its greatest source of revenue and its greatest expense – were still largely decided externally. Rates were set by the Postal Rate Commission (now called the Postal Regulatory Commission) and the independent Governors of the Postal Service, and if postal management and employee unions could not agree on contract terms, the terms were decided by third-party arbitration panel”. Em sentido diverso, i.e., de que o Postal Reorganization Act de 1970 acabou por atribuir, de fato, total liberdade à USPS, ver GEDDES, Richard. R. Anticompetitive Behavior in Postal Services. Competing with the Government: Anticompetitive Behavior and Public Enterprises. Rick Geddes (Org.). Disponível em: <http://www.hoover.org/publications/books/8350>. Acesso em: 22 out. 2010. p. 92: “The Postal Service itself is thus able to determine critical variables, such as the number of deliveries per day or week and the speed of deliveries, giving it latitude for redistribution on that additional margin. Overall, the act effectively transferred control of Postal Service pricing from Congress to the USPS itself. John Tierney has stated, ‘It hardly seems appropriate that a government agency enjoying a monopoly over certain of its services has the ultimate power to put into effect whatever rates it chooses.’ That may be somewhat too strong because USPS pricing is not entirely unconstrained. The commission’s decision does force the board to be unanimous in overruling it. Additionally, Congress exercises oversight through committee hearings, and Senate has input into board memberships”.

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encarregasse dos serviços postais, nos primórdios tido apenas como a

entrega de cartas.

Esse entendimento foi respaldado, desde o início, pela Suprema Corte

dos EUA, pela qual “o poder detido pelo Congresso acoberta a regulação

integral do sistema postal no país”.92 Dessa forma, o Congresso criou o

Private Express Statutes e uma empresa revestida de poder de monopólio.

                                                                                                                         92 EUA. U.S. Supreme Court. Associated Third Class Mail Users v. United States Postal Service (No. 78-1820, October 1, 1979), cert. denied. Cit. 444 U.S. 837, 100 S.Ct. 73, 62 L.Ed.2d 48. Disponível em: <https://web2.westlaw.com/result/default.wl?fmqv=s&sv=Split&vr=2.0&sskey=CLID_SSSA4234020469121&rs=WLW11.01&utid=1&action=Search&db=ALLCASES&eq=search&fn=_top&srch=TRUE&rp=%2fSearch%2fdefault.wl&cfid=1&rlt=CLID_QRYRLT2296520469121&rltdb=CLID_DB1134020469121&origin=Search&mt=LawSchoolPractitioner&service=Search&query=TI(ASSOCIATED+%2f5+THIRD+%2f5+CLASS+%2f5+MAIL+%2f5+USERS+%26+UNITED+%2f5+STATES+%2f5+POSTAL+%2f5+SERVICE)&method=TNC>. Acesso em: 12 Jan. 2011. EUA. U.S. Court of Appeals for the District of Columbia Circuit. Association Third Class Mail Users v. United States Postal Service (No. 78-1065, March 9, 1979). Cit. 600 F.2d 824, 195 U.S.App.D.C. 10. Disponível em: <https://web2.westlaw.com/find/default.wl?tf=-1&rs=WLW11.01&serialnum=1979113485&fn=_top&sv=Split&tc=-1&pbc=6236F403&ordoc=1979230481&findtype=Y&db=350&utid=1&vr=2.0&rp=%2ffind%2fdefault.wl&mt=LawSchoolPractitioner&RLT=CLID_FQRLT8833433499121&TF=756&TC=1&n=1>. Acesso em: 12 Jan. 2011. EUA. U.S. District of Court of Columbia. Association Third Class Mail Users v. United States Postal Service (Civ. A. No. 76-1768, Nov. 29, 1977). Cit. 440 F.Supp. 1211. Disponível em: <https://web2.westlaw.com/find/default.wl?tf=-1&rs=WLW11.01&serialnum=1977126896&fn=_top&sv=Split&tc=-1&pbc=6236F403&ordoc=1979230481&findtype=Y&db=345&utid=1&vr=2.0&rp=%2ffind%2fdefault.wl&mt=LawSchoolPractitioner&RLT=CLID_FQRLT9117551610121&TF=756&TC=1&n=1>. Acesso em: 12 Jan. 2011. EUA. U.S. Court of Appeals for the Second Circuit. United States Postal Service v. Patricia H. BRENNAN et al (No. 741, Docket 78-6002, April 13, 1978). Cit. 574 F.2d 712. Disponível em: <https://web2.westlaw.com/find/default.wl?tf=-1&rs=WLW11.01&serialnum=1978103456&fn=_top&sv=Split&tc=-1&pbc=36A2E623&ordoc=1979231821&findtype=Y&db=350&utid=1&vr=2.0&rp=%2ffind%2fdefault.wl&mt=LawSchoolPractitioner&RLT=CLID_FQRLT2480611210121&TF=756&TC=1&n=1>. Acesso em: 12 Jan. 2011. EUA. U.S. Supreme Court. Patricia H. BRENNAN et al v. United States Postal Service (No. 78-653, January 15, 1979). Cit. 439 U.S. 1115, 99 S.Ct. 1018, 59 L.Ed.2d 73. Disponível em: <https://web2.westlaw.com/result/default.wl?fmqv=s&sv=Split&vr=2.0&sskey=CLID_ SSSA98807271110121&rs=WLW11.01&utid=1&action=Search&db=ALLCASES&eq=search&fn=_top&srch=TRUE&rp=%2fSearch%2fdefault.wl&cfid=1&rlt=CLID_QRYRLT16416281110121&rltdb=CLID_DB21807271110121&origin=Search&mt=LawSchoolPractitioner&service=Search&query=TI(UNITED+%2f5+STATES+%2f5+POSTAL+%2f5+SERVICE+%26+BRENNAN)&method=TNC>. Acesso em: 12 Jan. 2011. EUA. U.S. Court of Appeals for the Tenth Circuit. United States of America v. Robert Eugene BLACK and Alternate Systems, Inc. (Nos. 76-1780 and 76-1781, March 27, 1978). Cit. 569 F.2d 1111, 43 A.L.R. Fed. 659. Disponível em: <https://web2.westlaw.com/find/default.wl?rs=WLW11.01&fn=_top&sv=Split&cite=569+F.2d+1111&utid=1&vr=2.0&rp=%2ffind%2fdefault.wl&mt=LawSchoolPractitioner>. Acesso em: 12 Jan. 2011. EUA. U.S. District Court of Kansas. United States of America v. Robert Eugene BLACK and Alternate Systems, Inc. (No. 76-48-CR2, June 28, 1976). Cit. 418 F.Supp. 378. Disponível em:

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O Private Express Statutes é, em síntese, um conjunto de leis federais

de natureza penal e administrativa - promulgadas no período de 1777 à 1934

-, que possui seus principais dispositivos no Código Penal dos EUA (United

States Criminial Code). Assim, violações ao monopólio postal nos EUA são

punidas principalmente com sanções de natureza penal, como pena de

reclusão, multa e até proibição de operação no mercado geral de serviços

postais.93

Alguns dispositivos de referido diploma legal merecem mais detida

análise, pois expressam bem a tônica que os EUA atribuem aos serviços

postais. A seção 1694 do Título 18 (Código Penal dos EUA) do United States

Code, por exemplo, proíbe a utilização das rotas postais para o transporte (ou

carregamento) de cartas, sob pena de multa.94 De forma semelhante,

observa-se, na seção 1695, a proibição de carregamento de cartas em

navios, mas com um complemento: inclui-se a pena de reclusão.95 Ainda, a

                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                           <https://web2.westlaw.com/find/default.wl?rs=WLW11.01&serialnum=1976126978&casecite=569+F.2d+1111&fn=_top&sv=Split&pbc=3F1E7F52&ordoc=1978102460&findtype=0&caseserial=1978102460&utid=1&vr=2.0&rp=%2ffind%2fdefault.wl&mt=LawSchoolPractitioner&RLT=CLID_FQRLT93799552910121&TF=756&TC=1&n=1>. Acesso em: 12 Jan. 2011. EUA. Circuit Court of Appeals for the Eighth Circuit. Williams v. Wells Fargo & Co. Express (No. 3,047, March 3, 1910). Cit. 177 F. 352, 101 C.C.A. 328, 21 Am.Ann.Cas. 699. Disponível em: <https://web2.westlaw.com/find/default.wl?rs=WLW11.01&fn=_top&sv=Split&pbc=3F1E7F52&cite=177+F.+352+&utid=1&vr=2.0&rp=%2ffind%2fdefault.wl&mt=LawSchoolPractitioner>. Acesso em: 12 Jan 2011. EUA. Circuit Court, S.D. New York (June 4, 1883). Blackham v. Gresham et al. Cit. 21 Blatchf. 354, 16 F. 609. Disponível em: <https://web2.westlaw.com/find/default.wl?rs=WLW11.01&fn=_top&sv=Split&pbc=3F1E7F52&cite=16+F.+609+&utid=1&vr=2.0&rp=%2ffind%2fdefault.wl&mt=LawSchoolPractitioner>. Acesso em: 12 Jan. 2011. No mesmo sentido ver SIDAK, J. G.; SPULBER, D. F. Protecting Competition from the Postal Monopoly. American Enterprise Institute for Public Policy Research. 1996, p. 12. 93 EUA. United States Postal Service. Universal Service and the Postal Monopoly: a Brief History. Disponível em: < http://www.usps.com/postallaw/_pdf/UniversalServiceand PostalMonopolyHistory.pdf>. Acesso em: 6 dez. 2010, p.12-14. De forma semelhante, ver SIDAK, J. G.; SPULBER, D. F. Protecting Competition from the Postal Monopoly. American Enterprise Institute for Public Policy Research. 1996, p. 13. 94 EUA. United States Code (U.S.C.). Title 18 (Crimes and Criminal Procedure), Section 1694. “Whoever, having charge or control of any conveyance operating by land, air, or water, which regularly performs trips at stated periods on any post route, or from one place to another between which the mail is regularly carried, carries, otherwise than in the mail, any letters or packets, except such as relate to some part of the cargo of such conveyance, or to the current business of the carrier, or to some article carried at the same time by the same conveyance, shall, except as otherwise provided by Law, be fined under this title.” Disponível em: <http://www.law.cornell.edu/uscode/html/uscode18 /usc_sec_18_00001694----000-.html>. Acesso em: 8 Jan. 2011. 95 EUA. United States Code (U.S.C.). Title 18 (Crimes and Criminal Procedure), Section 1695. “Whoever carries any letter or packet on board any vessel which carries the mail, otherwise than in such mail, shall, except as otherwise provided by law, be fined under this

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seção 1693 estende a proibição para a coleta, recebimento ou transporte de

cartas de forma contrária ao previsto no Private Express Statutes, sob pena

de multa e reclusão.96

Para robustecer o rol dos incentivos negativos à concorrência no

mercado postal, a seção 1696(a) tipifica como crime, com pena de multa e

reclusão, a criação de uma rede privada de distribuição capaz de concorrer

com a USPS.97 Para completar a proteção do monopólio legal, o Private

Express Statutes vai além de estabelecer punições para os empresários e

alcança os consumidores (ou clientes). Assim, segundo a seção 1696(b),

qualquer consumidor de empresa privada que tenha violado a seção 1696(a)

está sujeito à multa.98 Da mesma forma, segundo a seção 1697, qualquer

pessoa que transporte um violador das normas estampadas no Private

Express Statutes.99

Em suma, o arcabouço normativo criado para atribuir eficácia ao

monopólio postal nos EUA, de caráter penal (dadas as consequências do

descumprimento das hipóteses de incidência previstas) não se ateve apenas                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                            title or imprisoned not more than thirty days, or both.” Disponível em: <http://www.law.cornell.edu/uscode/html/uscode18/usc_sec_18_00001695----000-.html>. Acesso em: 8 Jan. 2011. 96 EUA. United States Code (U.S.C.). Title 18 (Crimes and Criminal Procedure), Section 1693. “Whoever, being concerned in carrying the mail, collects, receives, or carries any letter or packet, contrary to law, shall be fined under this title or imprisoned not more than thirty days, or both.” Disponível em: <http://www.law.cornell.edu/uscode/ html/uscode18/usc_sec_18_00001693----000-.html>. Acesso em: 8 Jan. 2011. 97 EUA. United States Code (U.S.C.). Title 18 (Crimes and Criminal Procedure), Section 1696(a). “Whoever establishes any private Express for the conveyance of letter or packets, or in any manner causes or provides for the conveyance of the same by regular trips or at stated periods over any post route which is or may be established by law, or from any city, town, or place to any other city, town or place, between which the mail is regularly carried, shall be fined not more than $500 or imprisoned not more than six months, or both.” (...) “This section shall not prohibit any person from receiving and delivering to the nearest post office, postal car, or other authorized depository for mail matter any mail matter properly stamped.” Disponível em: <http://www.law.cornell.edu/uscode/html/uscode18/usc_sec_18_00001696----000-.html>. Acesso em: 8 Jan. 2011. 98 EUA. United States Code (U.S.C.). Title 18 (Crimes and Criminal Procedure), Section 1696(b). “Whoever transmits by private express or other unlawful means, or delivers to any agent thereof, or deposits at any appointed place, for the purpose of being so transmitted any letter or packet, shall be fined under this title.” Disponível em: <http://www.law.cornell.edu/uscode/html/uscode18/usc_sec_18_00001696----000-.html>. Acesso em: 8 Jan. 2011. 99 EUA. United States Code (U.S.C.). Title 18 (Crimes and Criminal Procedure), Section 1697. “Whoever, having charge or control of any conveyance operating by land, air, or water, knowingly conveys or knowingly permits the conveyance of any person acting or employed as a private express for the conveyance of letters and packets, and actually in possession of the same for the purpose of conveying them contrary to law, shall be fined under this title.” Disponível em: <http://www.law.cornell.edu/uscode/html/uscode18/usc_sec_18_00001697----000-.html>. Acesso em: 8 Jan. 2011.  

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às normas acima descritas, mas abrangeu diversos regulamentos100, tudo

com o objetivo de tornar a proibição o mais abrangente possível para o

exercício privado de qualquer atividade diretamente relacionada ao serviço

postal, desempenhado com exclusividade pela USPS.

Dado o intuito generalizante da proibição, as hipóteses normativas

acabaram por portar termos genéricos e vagos, os quais, ao menos em tese,

não deveriam existir em normas de natureza penal. Essa questão suscitou

uma série de debates no âmbito do poder judiciário norte-americano, tendo

diversos casos chegado à Suprema Corte daquele país (U.S. Supreme

Court). Embora sempre tenha sido desafiado na justiça norte-americana, de

1976 (provavelmente decorrência da maior autonomia da USPS

proporcionada Postal Reorganization Act de 1970) a 2004, o monopólio

postal gerou uma infinidade de casos nas cortes de primeira instância e

tribunais de apelação nos EUA, alguns dos quais ensejaram importantes

posicionamentos da U.S. Supreme Court no tocante ao mérito do mercado

postal e, particularmente, no tocante à constitucionalidade do Private Express

Statutes. Isto foi importante para avançar-se bastante na consolidação

normativa do monopólio postal naquele país.

Dentre os casos mais interessantes encontram-se: United States

Postal Service v. Flamingo Industries (USA) Ltd. (2004), Air Courier

Conference of America v. American Postal Workers Union (1991), Regents of

University of California v. Public Employment Relations Board (1988), Perry

Education Ass’n v. Perry Local Educators’ Association (1983), United States

Postal Service v. Council of Greenburg Civic Associations (1981), Associated

Third Class Mail Users v. United States Postal Service (1979), Patricia H.

Brennan et al v. United States Postal Service (1979).

No caso Air Courier Conference of America v. American Postal

Workers Union, o Chief Justice Rehnquist reconheceu que o Private Express

Statutes poderia ser classificado como uma tentativa de coibir o

desenvolvimento de um verdadeiro mercado no âmbito privado em nome da

viabilização da prestação de um serviço universalizado e a preços uniformes.

Segundo ele, o monopólio postal foi criado pelo Congresso norte-americano                                                                                                                          100 SIDAK, J. G.; SPULBER, D. F. Protecting Competition from the Postal Monopoly. American Enterprise Institute for Public Policy Research. 1996, p. 15.  

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como uma forma de proteger as receitas do serviço postal público (leia-se,

USPS) de modo a habilitá-lo a cumprir a sua missão. Para o magistrado, o

monopólio legal impede que empresas privadas ofertem serviços em rotas

postais de baixo custo (i.e., mais atrativas economicamente) a preços

inferiores àqueles da USPS, deixando a esta última o ônus de arcar com as

rotas de alto custo (i.e., menos atrativas) com meios insuficientes de cumprir

seu mandato de prestação de serviço universal a preços uniformes em todo o

território nacional, inclusive nas áreas mais remotas e menos povoadas.101

O raciocínio desenvolvido pelo magistrado norte-americano, conforme

descrito acima, não pode simplesmente ser classificado como incorreto, mas,

talvez, equivocadamente aplicado sobre um setor da economia que não

necessariamente opera com as premissas econômicas típicas àqueles

mercados revestidos de falhas.102

Ou seja, é natural que o agente privado que assume uma atividade

econômica em um mercado com falhas, como é o caso do monopólio natural

de uma rede de distribuição de energia elétrica, de uma rede de dutos para a

distribuição de gás natural ou até mesmo de uma rede para serviços de

telefonia fixa, arque com ônus significativo em termos de investimento em

infraestrutura para provimento universal do serviço em troca de certa

proteção (ou garantia) do regulador para que recupere o investimento (em

bases de mercado) ao longo do tempo (sem enfrentar a concorrência típica

do livre mercado).

Isso poderia ser visto como espécie de compensação pelo custo

elevado de provimento do serviço, normalmente a preços fixos

(independentemente dos custos reais) e em caráter universal (i.e., em

                                                                                                                         101   EUA. U.S. Supreme Court. Air Courier Conference of America v. American Postal Workers Union et al. (No. 89-1416, February 26, 1991). Cit. 498 U.S. 517, 111 S.Ct. 913, 136 L.R.R.M. (BNA) 2545, 112 L.Ed.2d 1125, 59 USLW 4140 Disponível em: <https://web2.westlaw.com/find/default.wl?rs=WLW11.01&fn=_top&sv=Split&findjuris=00001&cite=498+U.S.+517&utid=1&vr=2.0&rp=%2ffind%2fdefault.wl&mt=LawSchoolPractitioner>. Acesso em: 12 Jan. 2011. No mesmo sentido, ver EUA. U.S. Supreme Court. Regents of University of California v. Public Employment Relations Board (No. 86-935, April 20, 1988). Cit. 485 U.S. 589, 108 S.Ct. 1404, 128 L.R.R.M. (BNA) 2009, 99 L.Ed.2d 664, 56 USLW 4334, 45 Ed. Law Rep. 972. Disponível em: <https://web2.westlaw.com/find/default.wl?rs=WLW11.01&fn=_top&sv=Split&cite=485+U.S.+589&utid=1&vr=2.0&rp=%2ffind%2fdefault.wl&mt=LawSchoolPractitioner>. Acesso em: 12 Jan. 2011. 102 Sobre o conceito de falhas de mercado, vide Capítulo I deste trabalho.

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respeito a regras de universalização), caso contrário não haveria incentivos

econômicos a qualquer agente privado para assumir atividades desse jaez.103

Contudo, a pergunta que se faz é: estaria o serviço postal inserido em

um mercado com falhas, como o monopólio natural? Como se viu no Capítulo

I, a resposta parece ser negativa, ou seja, não há qualquer falha de mercado

no setor de prestação de serviços postais, e isso ficará claro ao longo deste

trabalho.

Em assim sendo, a indagação que emerge seria a que pretexto um

país como os EUA, onde a livre iniciativa (privada) possui uma das mais

fortes plataformas de expressão, preserva até os dias de hoje um monopólio

legal para a prestação de serviços postais? A resposta a essa indagação

será também explicitada ao longo deste trabalho, contudo, já se pode ter uma

idéia de qual seja, pela análise de outro trecho da decisão da Suprema Corte

dos EUA no caso Air Courier Conference of America v. American Postal

Workers Union, em que, referindo-se à história legislativa do monopólio

postal104 (a partir foi promulgado o Post Office Act de 1792105), registrou-se

                                                                                                                         103 SIDAK, J. G.; SPULBER, D. F. Protecting Competition from the Postal Monopoly. American Enterprise Institute for Public Policy Research. 1996, p. 16-17. 104 “The advent of ubiquitous, instantaneous, and inexpensive telecommunications” EUA. United States Supreme Court. Air Courier Conference of America v. American Postal Workers Union. 498 U.S. 527, 519 (1991).Ver nesse sentido, SIDAK, J. G.; SPULBER, D. F. Protecting Competition from the Postal Monopoly. American Enterprise Institute for Public Policy Research. 1996, p. 17. 105 History.com. American Revolution. “Feb 20, 1792: Postal Service Act regulates United States Post Office Department - On this day in 1792, President George Washington signs legislation renewing the United States Post Office as a cabinet department led by the postmaster general, guaranteeing inexpensive delivery of all newspapers, stipulating the right to privacy and granting Congress the ability to expand postal service to new areas of the nation. William Goddard, a Patriot printer frustrated that the royal postal service was unable to reliably deliver his Pennsylvania Chronicle to its readers or deliver critical news for the paper to Goddard, laid out a plan for the Constitutional Post before the Continental Congress on October 5, 1774. Congress waited to act on the plan until after the Battle of Lexington and Concord on April 19, 1775. Benjamin Franklin promoted Goddard's plan and served as the first postmaster general under the Continental Congress beginning on July 26, 1775, nearly one year before the Congress declared independence from the British Crown. Franklin's son-in-law, Richard Bache, took over the position on November 7, 1776, when Franklin became an American emissary to France. Franklin had already made a significant contribution to the postal service in the colonies while serving as the postmaster of Philadelphia from 1737 and as joint postmaster general of the colonies from 1753 to 1774, when he was fired for opening and publishing Massachusetts Royal Governor Thomas Hutchinson's correspondence. While postmaster, Franklin streamlined postal delivery with properly surveyed and marked routes from Maine to Florida (the origins of Route 1), instituted overnight postal travel between the critical cities of New York and Philadelphia and created a standardized rate chart based upon weight and distance.

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que as normas de proteção de receita (i.e., de preservação do monopólio da

USPS) não possuem um fim em si mesmas, nem servem de meio para

assegurar certos níveis de empregos públicos, mas sim foram idealizadas

como meio de proporcionar uma integração nacional e assegurar que todas

as regiões dos EUA recebessem um tratamento isonômico da USPS, isto é,

fossem abrangidas pela oferta de serviços postais.106

As motivações para a criação de um monopólio legal sobre os serviços

postais expostas pela Suprema Corte dos EUA no caso analisado no

parágrafo acima certamente fizeram sentido nos primórdios da formação das

redes e rotas postais nos EUA, bem como no período histórico em que a

comunicação ainda não tinha experimentado a evolução tecnológica trazida

pela telefonia e, mais recentemente, pela internet, as quais proporcionam

alternativas eficazes de comunicação ubíqua, instantânea e de baixo custo

(para utilizar a terminologia do Congresso norte-americano - 1845107).

Contudo, diante da evolução tecnológica e da consolidação da integração

nacional norte-americana, talvez os motivos que sustentem o monopólio

postal naquele país sejam exatamente a manutenção de níveis de empregos,

bem como o atendimento a interesses políticos decorrentes da imensa

empresa pública que é a USPS, os quais não necessariamente condizem

com os interesses gerais da população daquele país (i.e., com o interesse

social ou interesse público).

                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                           Samuel Osgood held the postmaster general's position in New York City from 1789, when the U.S. Constitution came into effect, until the government moved to Philadelphia in 1791. Timothy Pickering took over and, about a year later, the Postal Service Act gave his post greater legislative legitimacy and more effective organization. Pickering continued in the position until 1795, when he briefly served as secretary of war, before becoming the third U.S. secretary of state. The postmaster general's position was considered a plum patronage post for political allies of the president until the Postal Service was transformed into a corporation run by a board of governors in 1971.” Disponível em: <http://www.history.com/this-day-in-history/postal-service-act-regulates-united-states-post-office-department>. Acesso em: 16 Jan. 2011. No mesmo sentido, ver HENKIN, David M. The Postal Age – The emergence of Modern Communications in Nineteenth-Century Amercia. The University of Chicago Press. Chicago and London. 2006, p. 8. 106 EUA. U.S. Supreme Court. Air Courier Conference of America v. American Postal Workers Union et al. (No. 89-1416, February 26, 1991). Cit. 498 U.S. 517, 111 S.Ct. 913, 136 L.R.R.M. (BNA) 2545, 112 L.Ed.2d 1125, 59 USLW 4140 Disponível em: <https://web2.westlaw.com/find/default.wl?rs=WLW11.01&fn=_top&sv=Split&findjuris=00001&cite=498+U.S.+517&utid=1&vr=2.0&rp=%2ffind%2fdefault.wl&mt=LawSchoolPractitioner>. Acesso em: 12 Jan. 2011.  107   EUA. Postal Act 1845. Disponível em: <http://www.jcampbell.com/Reference/us/184503_law.pdf >. Acesso em: 17 Jan. 2011.  

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60  

Em complemento ao argumento contextual com base na tecnologia, a

reserva legal para a operação no mercado postal possuiu também real

importância econômica (não apenas a título de proteção de receitas), pois

certamente houve um período na história em que os agentes privados não

possuíam incentivos econômicos para assumir a prestação de um serviço

que, embora gerasse receitas atrativas em algumas regiões, gerava perdas

noutras a ponto de os prestadores não aceitarem o desafio da

universalização como condição para operarem no mercado postal (i.e., tal

desafio pode ser resumido em ganhar em algumas áreas geográficas e

perder noutras para poder ofertar o serviço, atingindo o ponto de equilíbrio

nesse contexto). Isso, aliado à ausência de ferramentas de regulação

econômica aptas a operar uma redistribuição de incentivos econômicos tal

que motivasse o investimento privado no campo do serviço postal universal.

Contudo, é preciso atualizar as premissas (ou motivos) para o

estabelecimento de um monopólio legal, sob pena de, mantendo-o sob

premissas ultrapassadas, gerar-se externalidades negativas em volume tal

que, o que antes fora um remédio para o desenvolvimento e integração de

um país, se converta em uma doença em termos econômicos e sociais, de

difícil trato no campo político, jurídico e social.

Outro ponto que reforça o poder de monopólio da USPS (criando

desvantagens competitivas aos agentes privados) pode ser verificado na

norma sobre as caixas de correio nos EUA. Segundo a Seção 1725, do

Código Penal dos EUA, proíbe-se o depósito de “coisas despacháveis pelo

correio” (i.e., “mailable matter”) não seladas em caixas postais [i.e., caixas de

correio] aprovadas pelo Serviço Postal.108

                                                                                                                         108  EUA. United States Code (U.S.C.). Title 18 (Crimes and Criminal Procedure), Section 1725. “Whoever knowingly and willfully deposits any mailable matter such as statements of accounts, circulars, sale bills, or other like matter, on which no postage has been paid, in any letter box established, approved, or accepted by the Postal Service for the receipt or delivery of mail matter on any mail route with intent to avoid payment of lawful postage thereon, shall for each such offense be fined under this title.” Disponível em: <http://www.law.cornell.edu/uscode/html/uscode18/usc_sec_18_00001725----000-.html>. Acesso em: 8 Jan. 2011. Com o intuito de aplicar essa previsão, foram criadas as normas contidas no EUA. Domestic Mail Manual. Sections 155.41, 155.43, 156.311, 156.51 e 156.54, incorporadas por referência ao EUA. Code of Federal Regulations (C.F.R.). Título 39, Chapter I, pelas quais regulamentou-se as formas, dimensões ou tamanhos específicos das caixas postais, que deveriam ser utilizadas exclusivamente para receber correspondências entregues pela USPS.  

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61  

A extensão do monopólio às caixas correio dos consumidores possui

três importantes efeitos econômicos. O primeiro é o de aumentar o custo dos

rivais, como FEDEX, DHL, UPS etc., pois não podem deixar as

correspondências (cartas e/ou pacotes) nas caixas de correios, mas têm que

entregá-las pessoalmente ao destinatário, a não ser que o emissor autorize

que a correspondência seja deixada em frente a residência do destinatário.

Isso, em outras palavras, impõe que os agentes privados suportem um

sistema de logística no mínimo mais custoso que o da USPS, seja em razão

de ter sido construído em regime de monopólio legal (i.e., sem contar com

competição de terceiros e, portanto, contando com receitas

supracompetitivas), seja em razão da frequência de entregas pessoais das

correspondências (que certamente é superior à entrega domiciliar na caixa-

postal – que pode receber entregas em qualquer horário independentemente

do destinatário encontrar-se em casa).

O segundo efeito é o de impedir qualquer integração vertical por parte

das empresas prestadoras de serviços públicos (como eletricidade, água e

esgotamento, telefonia) e bancos com os consumidores, o que geraria

significativas economias de escala e escopo, possivelmente resultando a

redução dos preços e tarifas dado o numero elevado de correspondências

enviadas aos consumidores para a entrega de contas (ou faturas), por

exemplo. O terceiro efeito é o de aumentar o custo de substituição, pelos

consumidores, do serviço da USPS por fontes alternativas (como FEDEX, por

exemplo), i.e., de ampliar o efeito lock in (i.e., de aumento dos custos de

substituição) sobre os consumidores109, pois para poder receber as

correspondências por meio das empresas privadas, teriam os consumidores

de construir, às suas próprias expensas, uma caixa postal especialmente

para essa finalidade.110

A vedação do uso de caixas de correio de consumidores para a

recepção de entregas diversas da USPS (i.e., por seus concorrentes

privados) foi contestada no caso United States Postal Service v. Council of

                                                                                                                         109 Sobre efeito lock in, ver GABAN, Eduardo Molan. Análise da restrição recusa de venda no controle de condutas infrativas à ordem econômica nos termos da lei nº 8.884/94. Revista de Direito da Concorrência. Brasília: Thompson IOB, abril de 2006. 110   SIDAK, J. G.; SPULBER, D. F. Protecting Competition from the Postal Monopoly. American Enterprise Institute for Public Policy Research. 1996, p. 34-35.  

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Greenburgh Civic Associations. Nesse caso, a Suprema Corte dos EUA

avaliou em que medida a Seção 1725, do Código Penal dos EUA, violaria a

Primeira Emenda à Constituição dos EUA (The First Amendment111) – que

garante a liberdade de expressão e de imprensa - com base na alegação de

que a caixa postal é um “public forum" e, portanto, estaria sujeita à regra de

liberdade de expressão e utilização. Em outras palavras, segundo a Primeira

Emenda, o Governo dos EUA pode regular o tempo, a forma e o lugar de

uma manifestação em lugar público (“public forum"), mas as pessoas não

podem ser impedidas inteiramente de acessar os public forum.112

Especificamente nesse caso, a USPS notificou uma associação cívica

de Greenburgh que a prática de entregar mensagens aos residentes do

bairro deixando-as nas caixas de correio de suas residências contrariava a

Seção 1725 e, em caso de persistência, a associação poderia ser multada. A

associação entrou com uma ação contra a USPS alegando que a aplicação

da Seção 1725 inibiria sua comunicação com os residentes locais e, portanto,

negar-lhe-ia a liberdade de expressão e de imprensa, garantida pela Primeira

Emenda. A Suprema Corte dos EUA entendeu que a Seção 1725 não

contraria a Primeira Emenda das Constituição dos EUA, pois é neutra com

relação ao conteúdo das mensagens entregues nas caixas postais. Entendeu

ainda que os consumidores têm direitos limitados sobre a utilização de suas

próprias caixas de correio e, sem suma, manteve a aplicação da Seção 1725

e, portanto, a extensão do monopólio sobre as caixas postais.113

Em suma, a partir da decisão da Suprema Corte dos EUA no caso

United States Postal Service v. Council of Greenburgh Civic Associations, o

                                                                                                                         111  EUA. The Constitution of the Unites States. Amendment I: “Congress shall make no law respecting an establishment of religion, or prohibiting the free exercise thereof; or abridging the freedom of speech, or of the press, or the right of the people peaceably to assemble, and to petition the Government for a redress of grievances.” Disponível em: <http://72.32.50.200/constitution/constitution.pdf>. Acesso em: 8 Jan. 2011.  112  EUA. U.S. Supreme Court. United States Postal Serv. v. Council of Greenburg Civic Associations (No. 80-608, June 25, 1981). Cit. 453 U.S. 114, 101 S.Ct. 2676, 69 L.Ed.2d 517, 7 Media L. Rep. 1505. Disponível em: <https://web2.westlaw.com/find/default.wl?rs=WLW11.01&fn=_top&sv=Split&cite=453+U.S.+114&utid=1&vr=2.0&rp=%2ffind%2fdefault.wl&mt=LawSchoolPractitioner>. Acesso em: 12 Jan. 2011.  113  EUA. U.S. Supreme Court. United States Postal Serv. v. Council of Greenburg Civic Associations (No. 80-608, June 25, 1981). Cit. 453 U.S. 114, 101 S.Ct. 2676, 69 L.Ed.2d 517, 7 Media L. Rep. 1505. Disponível em: <https://web2.westlaw.com/ find/default.wl?rs=WLW11.01&fn=_top&sv=Split&cite=453+U.S.+114&utid=1&vr=2.0&rp=%2ffind%2fdefault.wl&mt=LawSchoolPractitioner>. Acesso em: 12 Jan. 2011.

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monopólio postal que antes, em tese, se aplicava às cartas, passou a se

aplicar às caixas postais (ou caixas de correio), tornando os EUA o único país

com monopólio legal sobre caixas postais.114

2.4 Ambiguidades, exceções e isenções no Private Express Statutes

O Private Express Statutes criou o monopólio postal e estabeleceu as

condições pelas quais os agentes privados podem transportar cartas.

Contudo, as previsões normativas são sobremodo vagas, principalmente com

relação aos conceitos de “carta”. Assim, o detalhamento normativo do que

estaria abrangido nas atividades econômicas reservadas à USPS e o que

estaria aberto ao setor privado foi transportado para o campo infralegal, no

qual a USPS opera com funções legislativas (aptas a um regulador de

mercado) ao mesmo tempo em que possui uma enorme influência no campo

político e, obviamente, no mercado.

Dessa forma, como não poderia deixar de ser (à luz da premissa de

maximização dos interesses individuais), a USPS, como empresa

monopolista do mercado postal norte-americano, trabalhou no campo

legislativo para reservar ao máximo para si a maior parte das espécies de

serviços existentes e relacionados ao mercado postal. Além disso, adotou e

tem adotado uma série de medidas para reduzir e/ou eliminar a concorrência

nos mercados correlatos ao serviço postal, mediante o exercício de sua

atividade de regulação do mercado postal, (pela qual, pelo menos até

dezembro de 2006, pôde realizar buscas e apreensões, impor sanção etc.,

caso suspeitasse de violação do monopólio postal por parte de agentes

privados).115

                                                                                                                         114 “The United States is the only country that has a mailbox monopoly”. GEDDES, R. Richard. Anticompetitive Behavior in Postal Services. Competing with the Government: Anticompetitive Behavior and Public Enterprises. Rick Geddes (Org.). Disponível em: <http://www.hoover.org/publications/books/8350>. Acesso em: 22 out. 2010. p.88. 115   SIDAK, J. G.; SPULBER, D. F. Protecting Competition from the Postal Monopoly. American Enterprise Institute for Public Policy Research. 1996, p. 38. No mesmo sentido, ver GEDDES, R. Richard. Anticompetitive Behavior in Postal Services. Competing with the Government: Anticompetitive Behavior and Public Enterprises. Rick Geddes (Org.). Disponível em: <http://www.hoover.org/publications/books/8350>. Acesso em: 22 out. 2010. p.87: “The USPS definition of a letter, adopted by the Postal Service in 1974, differs from earlier definitions and is much more expansive. Indeed, the Post Office and then the Postal Service has consistently expanded the scope of its monopoly over a 200-year period. Such

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Um bom exemplo desse comportamento da USPS no mercado norte-

americano é o caso Association Third Class Mail Users v. United States

Postal Service, envolvendo o third class mail, espécie de correspondência

comercial caracterizada, em síntese, por propagandas (i.e., circulares

comerciais) e contas para pagar (como faturas de cartão de crédito etc.).

Segundo a USPS, considera-se o third class mail como sendo “carta”,

para efeitos do exercício do poder de monopólio, na medida em que

contenha um endereço de alguém. Essa posição foi desafiada no caso

Association Third Class Mail Users v. United States Postal Service, tendo a

U.S. Court of Appeals do Distrito de Columbia (D.C.) referendado a posição

da USPS, registrando que a legislação falhou ao definir o conceito de “carta”

tendo a USPS adotado um critério razoável (i.e., da existência ou não de

endereço) para definir o que se enquadraria ou não no conceito de carta e,

logo, estaria acobertado pelo monopólio postal. Ainda, a U.S. Court of

Appeals do Distrito de Columbia (D.C.), embora tenha reconhecido a

vaguidade dos termos contidos no Private Express Statutes, delegou à USPS

a tarefa de definir o significado de “carta”, diante do que, acabou a USPS por

incluir, na prática, a quase totalidade dos third class mail em seu

monopólio.116

A combinação de uma definição abrangente de “carta” com a

possibilidade de discricionariamente suspender a aplicação do Private

Express Statutes (por meio de exceções ou isenções), como se verá, acabou

por atribuir à USPS o papel de efetivamente dizer o que estaria ou não

abrangido pelo monopólio postal. Dessa forma, enquanto a USPS

“suspendia” o monopólio postal para alguns tipos de “cartas” (como aquelas

mais sensíveis ao tempo de entrega, ou mais urgentes), expandia o

monopólio postal para contas (ou faturas), recibos ou notas fiscais e outros

                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                           an expansive definition leads naturally to monopolization of materials not intuitively considered letters, such as bills and advertising matter. According to the Postal Service’s definition, an addressed grocery store advertisement is a letter”. 116 EUA. U.S. Court of Appeals for the District of Columbia. Association Third Class Mail Users v. United States Postal Service (No. 78-1065, March 9, 1979). Cit. 600 F.2d 824, 195 U.S.App.D.C. 10. Disponível em: <https://web2.westlaw.com/find/default.wl?tf=-1&rs=WLW11.01&serialnum=1979113485&fn=_top&sv=Split&tc=-1&pbc=6236F403&ordoc=1979230481&findtype=Y&db=350&utid=1&vr=2.0&rp=%2ffind%2fdefault.wl&mt=LawSchoolPractitioner&RLT=CLID_FQRLT8833433499121&TF=756&TC=1&n=1>. Acesso em: 12 Jan. 2011.

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documentos comerciais. Normalmente, sempre que um serviço de express

mail era desenvolvido – o que naturalmente poderia render aos agentes

privados responsáveis pela inovação elevadas taxas lucratividade – a USPS

procurava primeiro incluí-lo no conceito de monopólio postal para, depois,

suspender a aplicação do monopólio postal sobre alguns aspectos desse

novo serviço.117

Dessa forma, fica clara a possibilidade (e probabilidade) de

comportamento anticoncorrencial por parte da USPS ao exercer o monopólio

sobre a entrega de correspondências e sobre as caixas de correio. Isto

porque a USPS poderia manejar seu poder de monopólio para obter os

maiores receitas ao mesmo tempo em que mitigaria potencial oposição

política ao monopólio (e seu exercício abusivo) por intermédio de seu poder

se suspender a aplicação do Private Express Statutes. Em outras palavras,

por meio de uma atuação “ponderada” no sentido de obtenção de lucros

extraordinários, a USPS eliminou a competição no mercado postal e, para

reduzir as pressões políticas – que poderiam culminar com a eliminação do

monopólio postal nos EUA – acabou por “suspender” o monopólio para

alguns serviços (e.g., express letters) e, portanto, amenizar a aplicação do

Private Express Statutes de modo a minimizar a reação de alguns agentes

privados poderosos. Todavia, como se verá mais à frente, a suspensão do

monopólio não equivale à eliminação dos preços de monopólio, nem

tampouco às outras regalias que desfruta a USPS, o que acabou por

possibilitar-lhe acesso a receitas de monopólio que são utilizadas para

competir com agentes privados.118

                                                                                                                         117 “The combination of an expansive definition of a letter, combined with the ability to selectively suspend the delivery monopoly, means with that the USPS can effectively decide what falls under its monopoly. (...) While the service has ‘suspended’ its monopoly for certain letters (such as time-sensitive materials), it has also expanded its monopoly by defining letters to include bills, receipts, IBM cards, magnetic tapes, and other business documents. Typically, as new services such as express mail have developed, the Postal Service has first asserted that these services fall within its monopoly and then announced a suspension of the monopoly with respect to some aspects of the new service”. GEDDES, R. Richard. Anticompetitive Behavior in Postal Services. Competing with the Government: Anticompetitive Behavior and Public Enterprises. Rick Geddes (Org.). Disponível em: <http://www.hoover.org/publications/books/8350>. Acesso em: 22 out. 2010. p.89.  118  “The implications for anticompetitive behavior of the delivery and mailbox monopolies and the suspension ability are clear. The powers related to the postal monopoly are unlike those of the other utility monopolies. The USPS is able to micromanage its monopoly power to garner the greatest economic rents while mitigating potential political opposition to the monopoly through the suspension power. Those shielded economic rents can be used to

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2.4.1 Isenções e exceções

O Private Express Statutes possui algumas isenções e exceções ao

monopólio postal. Todavia, antes de garantir a existência de alguma

competição em alguns tipos específicos de serviços postais nos EUA, tais

normas acabam por facilitar ainda mais o funcionamento da USPS como

monopólio, pois lhe permite escolher dentre o grande universo de serviços

postais aqueles mais lucrativos, deixando aos agentes privados a

possibilidade de participar daqueles serviços postais cujo custo de

oportunidade não se mostra vantajoso à USPS.119

É importante ponderar, contudo, que apesar da abundância de

ferramentas regulatórias pelas quais a USPS pode interferir na dinâmica do

mercado postal com vistas à maximizar seu bem-estar individual (o que

passa a ser desenvolvido neste trabalho), as fortes pressões sociais por parte

de agentes privados com forte representatividade nos EUA acabam por

limitar de certa forma a exclusão total do setor privado do universo dos

serviços postais. Em outras palavras, pressões de atores sociais como

grandes clientes da USPS e concorrentes de peso como FEDEX e UPS,

embora não coíbam, têm tornado no mínimo mais complexa e menos

explícita a atuação anticoncorrencial da USPS.

A título elucidativo tem-se a isenção genérica para cartas que

recolham a tarifa postal cheia (bears the full postage) e preenchem certas

condições120, bem como seis exceções gerais, quais sejam121: cartas anexas

                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                           compete with private rivals not enjoying monopoly power. The monopoly and suspension powers, however, are not the only government-granted privileges the USPS receives. There are a host of additional special USPS benefits, all of which can be used to artificially lower costs in activities where it faces competition”. GEDDES, R. Richard. Anticompetitive Behavior in Postal Services. Competing with the Government: Anticompetitive Behavior and Public Enterprises. Rick Geddes (Org.). Disponível em: <http://www.hoover.org/publications/books/8350>. Acesso em: 22 out. 2010. p.90.  119 SIDAK, J. G.; SPULBER, D. F. Protecting Competition from the Postal Monopoly. American Enterprise Institute for Public Policy Research. 1996, p. 19-31. 120 EUA. United States Code (U.S.C.). Title 39 (Postal Service). Section 320.6 (Suspension for extremely urgent letters), (a): “The operation of 39 U.S.C. 601(a) (1) through (6) and §310.2(b) (1) through (6) of this chapter is suspended on all post routes for extremely urgent letters if the conditions of either paragraph (b) or (c) of this section, and of the other paragraphs of this section, are met.” Disponível em: <http://ecfr.gpoaccess.gov/cgi/t/text/text-idx?c=ecfr&sid=8770caea1cf8d0bd5421e3486f44287d&rgn=div8&view=text&node=39:1.0.1.5.41.0.1.6&idno=39 >. Acesso em: 8 Jan. 2011.

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à cargas (letters accompanying cargos) 122, cartas do transportador (letters of

the carrier) 123, cartas privadas gratuitas, ou, sem compensação financeira

pela entrega (letters by private hands without compensation) 124, cartas por

mensageiros especiais, como seria o caso de “motoboys” (letters by special

messenger) 125, transporte de cartas antes e depois de postadas pela USPS

                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                           121 EUA. Code of Federal Regulations (C.F.R.). Title 39. Section 310.3 (Exceptions). Disponível em: <http://ecfr.gpoaccess.gov/cgi/t/text/text-idx?c=ecfr&sid=3ce05df853aa333fbebfec6afabc7eec&rgn=div8&view=text&node=39:1.0.1.5.40.0.1.3&idno=39 >. Acesso em: 8 Jan. 2011.  122   EUA. Code of Federal Regulations (C.F.R.). Title 39. Section 310.3(a): “Cargo. The sending or carrying of letters is permissible if they accompany and relate in all substantial respects to some part of the cargo or to the ordering, shipping or delivering of the cargo.” Disponível em: <http://ecfr.gpoaccess.gov/cgi/t/text/text-idx?c=ecfr&sid=3ce05df853aa333fbebfec6afabc7eec&rgn=div8&view=text&node=39:1.0.1.5.40.0.1.3&idno=39 >. Acesso em: 8 Jan. 2011.  123  EUA. Code of Federal Regulations (C.F.R.). Title 39. Section 310.3(b): “Letters of the carrier. (1) The sending or carrying of letters is permissible if they are sent by or addressed to the person carrying them. If the individual actually carrying the letters is not the person sending the letters or to whom the letters are addressed, then such individual must be an officer or employee of such person (see §310.3(b)(2)) and the letters must relate to the current business of such person. (2) The fact that the individual actually carrying the letters may be an officer or employee of the person sending the letters or to whom the letters are addressed for certain purposes does not necessarily mean that he is an officer or employee for purposes of this exception. The following factors bear on qualifications for the exception: the carrying employee is employed for a substantial time, if not fulltime (letters must not be privately carried by casual employees); the carrying employee carries no matter for other senders; the carrying employee is a regular salaried employee and shares in all privileges enjoyed by other regular employees (including employees not engaged primarily by the letter carrying function), including but not limited to salary, annual vacation time, absence allowed for illness, health benefits, workmen's compensation insurance, and retirement benefits. (3) Separately incorporated carriers are separate entities for purposes of this exception, regardless of any subsidiary, ownership, or leasing arrangement. When, however, two concerns jointly operate an enterprise with joint employees and share directly in its revenues and expenses, either of the concerns may carry the letters of the joint enterprise.” Disponível em: <http://ecfr.gpoaccess.gov/cgi/t/text/text-idx?c=ecfr&sid=3ce05df853aa333fbebfec6afabc7eec&rgn=div8&view=text&node=39:1.0.1.5.40.0.1.3&idno=39 >. Acesso em: 8 Jan. 2011.  124  EUA. Code of Federal Regulations (C.F.R.). Title 39. Section 310.3(c): “Private hands without compensation. The sending or carrying of letters without compensation is permitted. Compensation generally consists of a monetary payment for services rendered. Compensation may also consist, however, of non-monetary valuable consideration and of good will. Thus, for example, when a business relationship exists or is sought between the carrier and its user, carriage by the carrier of the user's letter will ordinarily not fall under this exception; or, when a person is engaged in the transportation of goods or persons for hire, his carrying of letters “free of charge” for customers whom he does charge for the carriage of goods or persons does not fall under this exception.” Disponível em: <http://ecfr.gpoaccess.gov/cgi/t/text/text-idx?c=ecfr&sid=3ce05df853aa333fbebfec6afabc7eec&rgn=div8&view=text&node=39:1.0.1.5.40.0.1.3&idno=39 >. Acesso em: 8 Jan. 2011.  125  EUA. Code of Federal Regulations (C.F.R.). Title 39. Section 310.3(d) (1) e (2): “Special messenger. (1) The use of a special messenger employed for the particular occasion only is permissible to transmit letters if not more than twenty-five letters are involved. The permission granted under this exception is restricted to use of messenger service on an infrequent, irregular basis by the sender or addressee of the message.

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(carriage of letters before or after mailing) 126 e, a principal, cartas para

entrega em regime de extrema urgência (extremely urgent letters).127

Tendo em vista o foco deste trabalho, não se dará ênfase ao estudo

exaustivo de todas as isenções e exceções ao Private Express Statutes, mas

somente àquelas com maior relevância para a demonstração de como a

USPS tem se comportado com relação ao mercado como um todo, em razão

das prerrogativas que dispõe (i.e., o monopólio legal, a função legislativa,

reguladora e fiscalizadora – grande parte delas vigentes até dezembro de

2006) e, dessa forma, como tem afetado a concorrência. Assim, passa-se

brevemente a abordar as exceções das cartas do transportador (letters of the

carrier) e das cartas para entrega em regime de extrema urgência (extremely

urgent letters).

2.4.1.1 A exceção do letters of the carrier

As proibições relativas ao transporte de cartas por agentes privados,

contidas na seção 1694, apresentam uma exceção às cartas ou pacotes

relacionados ao negócio do carregador (cartas do transportador – letters of

the carrier), isto é, o envio ou transporte de cartas e/ou pacotes é permitido

                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                           (2) A special messenger is a person who, at the request of either the sender or the addressee, picks up a letter from the sender's home or place of business and carries it to the addressee’s home or place of business, but a messenger or carrier operating regularly between fixed points is not a special messenger.” Disponível em: <http://ecfr.gpoaccess.gov/cgi/t/text/text-idx?c=ecfr&sid=3ce05df853aa333fbebfec6afabc7eec&rgn=div8&view=text&node=39:1.0.1.5.40.0.1.3&idno=39 >. Acesso em: 8 Jan. 2011.  126   EUA. Code of Federal Regulations (C.F.R.). Title 39. Section 310.3(e) (1) e (2): “Carriage prior or subsequent to mailing. (1) The private carriage of letters which enter the mail stream at some point between their origin and their destination is permissible. Except as provided in paragraph (e)(3) of this section, however, the carriage of letters from a place where they have been opened, read, separated, or otherwise utilized, does not fall within this exception even though such letters had previously been in the mail stream. Similarly, the carriage of letters to a place where they will be consolidated or otherwise utilized does not fall within this exception even though they will subsequently enter the mail stream. (2) Examples of permitted activities are the pickup and carriage of letters which are delivered to post offices for mailing; the pickup and carriage of letters at post offices for delivery to addressees; and the bulk shipment of individually addressed letters ultimately carried by the Postal Service.” Disponível em: <http://ecfr.gpoaccess.gov/cgi/t/text/text-idx?c=ecfr&sid=3ce05df853aa333fbebfec6afabc7eec&rgn=div8&view=text&node=39:1.0.1.5.40.0.1.3&idno=39>. Acesso em: 8 Jan. 2011.  127  EUA. Code of Federal Regulations (C.F.R.). Title 39. Section 320.6. (a), (b), (c), (d), (e) e (f). Disponível em: <http://ecfr.gpoaccess.gov/cgi/t/text/text-idx?c=ecfr&sid=470486850326a420ef5c894e41ae08c0&rgn=div8&view=text&node=39:1.0.1.5.41.0.1.6&idno=39>. Acesso em 8 Jan. 2011.  

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69  

se tais objetos são enviados por, ou endereçados à própria pessoa que os

está transportando. Essa permissão se estende aos empregados de tais

pessoas (ou empresas) e as entregas / transportes necessitam estar

diretamente relacionados ao objeto do negócio de tais pessoas, ou seja, ao

objeto negocial da empresa que envia ou à qual é endereçada a

correspondência.128

A exceção se aplicaria, por exemplo, às correspondências internas de

uma pizzaria (contas a pagar, cheques e duplicatas mercantis recebidas,

livros comerciais etc.), caso transportadas por seu proprietário ou por seu

empregado, ou às correspondências de um escritório de advocacia, caso

transportadas por um de seus sócios ou empregados, ou até mesmo

documentos internos de uma empresa aérea, ou de uma transportadora

rodoviária, caso transportadas nas aeronaves ou caminhões de tais agentes

econômicos, respectivamente.

Todavia, o que poderia parecer uma boa saída (em termos

econômicos) para o transporte de correspondências para consumo cativo,

isto é, pela própria empresa, recebeu outro tratamento da Suprema Corte dos

EUA, que acabou por deixar esta exceção com aplicação muito restrita. No

caso Regents of the University of California v. Public Employment Relations

Board, um sindicato de empregados da Universidade da Califórnia tentou, a

titulo de organizar um evento, enviar cartas aos funcionários pelo sistema

interno de correspondências da universidade. A universidade recusou a

entregar as cartas e, por essa razão, foi processada pelo sindicato. O caso

chegou à Suprema Corte que decidiu que as cartas do sindicato não se

enquadravam na exceção do letters of the carrier, pois não se relacionavam

ao “negócio atual” (“current business”) da universidade, mas as cartas se

relacionavam aos esforços do sindicato para organizar certos empregados da

                                                                                                                         128 EUA. United States Code (U.S.C.). Title 18 (Crimes and Criminal Procedure), Section 1694. Regulamentando o disposto na seção 1694, do Título 18 do U.S.C., ver: EUA. Code of Federal Regulations (C.F.R.). Title 39. Section 310.3(b)(1): “(b) Letters of the carrier. (1) The sending or carrying of letters is permissible if they are sent by or addressed to the person carrying them. If the individual actually carrying the letters is not the person sending the letters or to whom the letters are addressed, then such individual must be an officer or employee of such person (see §310.3(b)(2)) and the letters must relate to the current business of such person.” Disponível em: <http://ecfr.gpoaccess.gov/cgi/t/text/text-idx?c=ecfr&sid=3ce05df853aa333fbebfec6afabc7eec&rgn=div8&view=text&node=39:1.0.1.5.40.0.1.3&idno=39>. Acesso em: 8 Jan. 2011.

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universidade em uma unidade de barganha, o que, segundo a Suprema

Corte, pode ser classificado como o “negócio atual” do sindicato, não da

universidade.129

Essa decisão possui alguns pontos interessantes. O primeiro ponto

indica que a aplicação da exceção depende do conteúdo da carta, isto é,

caberia à autoridade responsável pela fiscalização do serviço postal (leia-se,

a USPS) avaliar o conteúdo das cartas e reconhecer tratar-se ou não de

hipótese de aplicação da exceção do letters of the carrier. Isto, sem dúvida,

abriu espaço para medidas invasivas por parte da USPS. O segundo ponto

abriu um vasto espaço para se definir o que seria o “negócio atual” do

transportador da carta, em outras palavras, ampliou o campo, de forma

significativa, para o exercício de uma discricionariedade, de modo que

fenômenos similares passaram a poder receber tratamento diferenciado em

virtude da interpretação das autoridades do que viria a ser o “negócio

atual”.130

Em síntese, tal decisão acabou por legitimar a USPS a adentrar no

conteúdo das correspondências para avaliar se tratava ou não de hipótese de

aplicação da exceção letters of the carrier. Contudo, talvez não tenha sido

ponderado pela Suprema Corte dos EUA que a USPS teria incentivos para

não realizar um julgamento isento, isto é, não teria incentivos para

reconhecer a exceção nos casos em que deveria ser reconhecida na

hipótese de tal reconhecimento implicar elevadas perdas de receitas para a

USPS. Mas, ao contrário, como agente monopolista, teria incentivos para

reconhecer a exceção apenas nos casos em que lhe fosse conveniente, bem

como poderia se valer de seu poder de polícia para inibir agentes privados a

transportar correspondências, ainda que perfeitamente suscetíveis de

enquadramento na hipótese legal da exceção.131

                                                                                                                         129 EUA. U.S. Supreme Court. Regents of University of California v. Public Employment Relations Board (No. 86-935, April 20, 1988). Cit. 485 U.S. 589, 108 S.Ct. 1404, 128 L.R.R.M. (BNA) 2009, 99 L.Ed.2d 664, 56 USLW 4334, 45 Ed. Law Rep. 972. Disponível em: <https://web2.westlaw.com/find/default.wl?rs=WLW11.01&fn=_top&sv=Split&cite=485+U.S.+589&utid=1&vr=2.0&rp=%2ffind%2fdefault.wl&mt=LawSchoolPractitioner>. Acesso em: 12 Jan. 2011. 130   SIDAK, J. G.; SPULBER, D. F. Protecting Competition from the Postal Monopoly. American Enterprise Institute for Public Policy Research. 1996, p. 23.  131  No sentido de reconhecer a utilização das “brechas” legislativas para maximizar seu bem-estar, veja-se PRIEST, George L. The History of the Postal Monopoly in the United States.

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71  

2.4.1.2 A exceção do extremely urgent letters

A exceção mais importante contida no Private Express Statutes é a

relativa às cartas para entrega em regime de extrema urgência, ou

simplesmente extremely urgent letters. É por meio dessa exceção, também

conhecida como suspensão ou isenção do Private Express Statutes pelo

Serviço Postal, ou USPS, que empresas como Federal Express (FEDEX),

United Parcel Service (UPS), DHL dentre outras, podem operar no mercado

norte-americano e “competir” com o First-Class mail da USPS. Para receber

a exceção do extremely urgent letters, os agentes privados necessitam

preencher duas condições primárias e, então, várias condições secundárias

(de caráter mais técnico).132

Antes de passar às condições para a aplicação da suspensão do

extremely urgent letters, vale observar que, segundo reconhece a própria

USPS, essa exceção – de fato aplicada pela USPS a partir de 1979 -

decorreu de intensa pressão política (do setor privado) para que o

abrangente monopólio postal fosse reduzido e para que os consumidores

pudessem ter acesso a uma fonte alternativa de serviços para entregas

urgentes, dada a incapacidade da USPS de suprir toda a demanda (i.e.,

necessidade dos consumidores e clientes) nesse sentido.133

As condições primárias da exceção do extremely urgent letters podem

ser resumidas em: precisão ou tempestividade da entrega (timeliness of

delivery) e preço absoluto ou preço relativo (absolute or relative price) em

                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                           Journal of Law & Economics. Vol.18. No. 1 (April 1975). The University of Chicago Press. Disponível em: <http://www.jstor.org/pss/725246>. Acesso em: 5 Fev. 2011. p.79: “In the 1973 Report the Governors announce for the first time that they possess and that they will exercise the authority to suspend the private express statutes at their discretion. No Postmaster General has ever claimed the power to repeal or to ‘suspend’ the private express statutes by administrative order. But the Governors have discovered an obscure postal regulation which allows them, with sympathetic interpretation, to surrender bits and pieces of their exclusive grant in ways to preserve the substance of the monopoly”.  132 SIDAK, J. G.; SPULBER, D. F. Protecting Competition from the Postal Monopoly. American Enterprise Institute for Public Policy Research. 1996, p. 26. 133  EUA. United States Postal Service. Universal Service and the Postal Monopoly: a Brief History. Disponível em: <http://www.usps.com/postallaw/_pdf/UniversalServiceandPostalMonopolyHistory.pdf>. Acesso em: 6 dez. 2010, p. 18-19.  

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comparação ao First-Class mail (um dos principais produtos da USPS134). A

condição da tempestividade da entrega (timeliness of delivery) se baseia na

premissa de que o valor ou utilidade da carta poderiam ser perdidos ou

significativamente diminuídos se ela não for entregue dentro de um limite

temporal. Tal limite é definido nas normas que regulam o setor e variam de

acordo com a distância da entrega. Para cartas despachadas dentro de 50

milhas do destino pretendido, a entrega de tais cartas despachadas no

horário do almoço (i.e., por volta das 12:00 P.M.) devem ser completadas

dentro de 6 horas ou até fim do horário comercial regular do endereço do

destinatário, no mesmo dia e prevalecendo como limite o que for mais tarde.

Entregas despachadas após o horário do almoço (i.e., por volta das 2 P.M. e

em diante) e antes da meia-noite (12:00 A.M.) devem ser completadas por

volta das 10:00 A.M. do dia seguinte do local de endereço do destinatário.

Para outras cartas, a entrega deve ser completada dentro de 12 horas ou por

volta do horário do almoço do primeiro dia útil subsequente no endereço do

destinatário.135

Por sua vez, a condição de preço absoluto e relativo será aplicada se,

depois de preenchida a primeira condição (timeliness of delivery), o total pago

pelo transporte privado da correspondência for, no mínimo, três dólares

superior ou duas vezes superior ao preço aplicável ao First-Class mail da

                                                                                                                         134 Segundo informação divulgada pela USPS em 2008, o First-Class mail representou o produto de maior receita para empresa no período de 1990 a 2007: “Traditionally, First-Class Mail has yielded the most revenue.” EUA. United States Postal Service. Universal Service and the Postal Monopoly: a Brief History. Disponível em: <http://www.usps.com/postallaw/_pdf/UniversalServiceandPostalMonopolyHistory.pdf>. Acesso em: 6 dez. 2010, p. 6.  135 EUA. Code of Federal Regulations (C.F.R.). Title 39. Section 320.6, 320.6(b)(1): “For letters dispatched within 50 miles of the intended destination, delivery of those dispatched by noon must be completed within 6 hours or by the close of the addressee's normal business hours that day, whichever is later, and delivery of those dispatched after noon and before midnight must be completed by 10 A.M. of the addressee's next business day. For other letters, delivery must be completed within 12 hours or by noon of the addressee's next business day. The suspension is available only if the value or usefulness of the letter would be lost or greatly diminished if it is not delivered within these time limits. For any part of a shipment of letters to qualify under this paragraph (b), each of the letters must be extremely urgent.” Disponível em: <http://ecfr.gpoaccess.gov/cgi/t/text/text-idx?c=ecfr&sid=470486850326a420ef5c894e41ae08c0&rgn=div8&view=text&node=39:1.0.1.5.41.0.1.6&idno=39>. Acesso em: 8 Jan. 2011. Os limites temporais não se aplicam a lugares situados fora dos territórios contíguos dos 48 estados dos EUA.

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73  

USPS (incluindo-se os priority mails), prevalecendo como referencia o maior

valor.136

Antes de dar andamento à análise dessa condição, vale observar que

a condição do preço absoluto e relativo não permite uma real competição por

preços entre o First-Class mail e outras alternativas, pois esse produto da

USPS sempre possuirá um preço no mínimo duas vezes inferior à alternativa

concorrente. Essa regra possui duas importantes implicações no campo

concorrencial. A primeira delas refere-se à possibilidade da USPS praticar

preços de monopólio (i.e., muito superiores ao custo marginal) e, assim,

continuar a obter renda supracompetitiva, pois não enfrentará competição por

preços de seus rivais (FEDEX, UPS, DHL etc.) e não perderá demanda, em

razão da inelasticidade da demanda no caso de consumidores mais sensíveis

a preços (i.e., os consumidores não têm outra opção a preços compatíveis).

A segunda implicação, consequência da primeira, caracteriza-se pela

possibilidade da USPS continuar a utilizar a receita supracompetitiva obtida

com o First-Class mail para subsidiar outros produtos (não exatamente

postais) que oferta ao mercado em regime de livre competição com outros

agentes privados e, portanto, afetar a concorrência em tais mercados.137

                                                                                                                         136 EUA. Code of Federal Regulations (C.F.R.). Title 39. Section 320.6(c): “It will be conclusively presumed that a letter is extremely urgent and is covered by the suspension if the amount paid for private carriage of the letter is at least three dollars or twice the applicable U.S. postage for First-Class Mail (including priority mail) whichever is the greater. If a single shipment consists of a number of letters that are picked up together at a single origin and delivered together to a single destination, the applicable U.S. postage may be computed for purposes of this paragraph as though the shipment constituted a single letter of the weight of the shipment. If not actually charged on a letter-by-letter or shipment-by-shipment basis, the amount paid may be computed for purposes of this paragraph on the basis of the carrier's actual charge divided by a bona fide estimate of the average number of letters or shipments during the period covered by the carrier's actual charge.” Disponível em: <http://ecfr.gpoaccess.gov/cgi/t/text/text-idx?c=ecfr&sid=470486850326a420ef5c894e41ae08c0&rgn=div8&view=text&node=39:1.0.1.5.41.0.1.6&idno=39>. Acesso em: 8 Jan. 2011. 137 Para maior detalhamento dos mercados não postais que a USPS atua, ver GEDDES, R. Richard. Anticompetitive Behavior in Postal Services. Competing with the Government: Anticompetitive Behavior and Public Enterprises. Rick Geddes (Org.). Disponível em: <http://www.hoover.org/publications/books/8350>. Acesso em: 22 out. 2010, p.97: “Express mail package deliveries are not the only competitive activities into which the USPS has entered, however. The USPS has initiated many new activities outside its core area of delivering letters. It has expanded into selling mugs, T-shirts, phone cards, passport photos, and a variety of e-commerce services such as eBill Pay, NetPost Cardstore, and NetPost Certified Mail. It has done so without receiving the prior approval of the Postal Rate Commission. The USPS has lost money on many of those services and in the process has weakened or driven private firms out of the market. The USPS is able to pass the losses from those services along to customers, who are captive to its delivery monopoly”.  

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74  

Voltando ao exame das condições primárias, na prática, dada a

dificuldade de monitoramento do timeliness of delivery, bem como a

conveniência em termos econômicos, para a USPS, do critério do preço

absoluto e relativo, esta última condição é a que tem prevalecido como

condição primária única para a aplicação da exceção do extremely urgent

letters. Isto é, com a fixação de um preço base para os seus rivais, no mínimo

duas vezes superior ao seu First-Class mail, a USPS preserva um

considerável potencial de cobrar preços de monopólio dos consumidores

norte-americanos ao mesmo tempo em que se protege de uma oferta mais

eficiente por parte de seus rivais.138

As condições secundárias, por sua vez, podem ser resumidas a

critérios formais que devem ser adotados pelas empresas privadas que

operem ou pretendam operar na zona de exceção do extremely urgent

letters. Em síntese, tratam de regras sobre o conteúdo e o formato dos

termos que devem constar na parte exterior dos envelopes ou pacotes

transportados por tais agentes privados (como FEDEX, UPS, DHL e outros),

como por exemplo, deve estar contido no envelope ou pacote (parte exterior),

os termos “Extremely Urgent” ou “Private Carriage Authorized by Postal

Regulations (39 CFR 320.6)”, ou ainda termos similares identificando se tratar

de prestador de serviço postal privado operando na zona de exceção do

Private Express Statutes.139

Outras duas regras que estão incluídas no rol das condições

secundárias são a inclusão do nome e endereço do transportador bem como

do destinatário na capa do envelope ou pacote transportado, e a gravação

(ou registro) do tempo de entrega da correspondência, que deve estar

                                                                                                                         138 SIDAK, J. G.; SPULBER, D. F. Protecting Competition from the Postal Monopoly. American Enterprise Institute for Public Policy Research. 1996, p. 28.  139  EUA. Code of Federal Regulations (C.F.R.). Title 39. Section 320.6(d): “The sender must prominently mark the outside covers or containers of letters carried under this suspension with the words ‘Extremely Urgent’ or ‘Private Carriage Authorized by Postal Regulations (39 CFR 320.6)’ or with a similar legend identifying the letters as carried pursuant to this suspension. (…)” Disponível em: <http://ecfr.gpoaccess.gov/cgi/t/text/text-idx?c=ecfr&sid=470486850326a420ef5c894e41ae08c0&rgn=div8&view=text&node=39:1.0.1.5.41.0.1.6&idno=39>. Acesso em: 8 Jan. 2011.

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75  

estampado no envelope ou pacote entregue ou mantido em arquivos por

parte da empresa privada de extremely urgent letters.140

Embora em princípio meramente formais, as condições secundárias

possuem uma dupla e importante função, a de distinguir a oferta das

empresas privadas da USPS (que sempre emprestou e sempre procura

emprestar a reputação do Governo dos EUA na oferta de seus serviços à

população) 141 e, principalmente, a função de facilitar a fiscalização /

monitoramento das atividades das concorrentes privadas, porquanto a USPS,

além de operar como agente econômico, exerce poder de polícia, como

agente regulador do mercado postal, sobre as mesmas empresas privadas

com as quais concorre.

Nesse sentido, para efeitos de fiscalização, a USPS poderia fazer

valer (e efetivamente o fez) a regra do timeliness of delivery, o critério do

preço absoluto e relativo, bem como as condições secundárias formais, tudo

a título de manejar os incentivos para a ampliação ou redução dos serviços

postais privados no mercado de extremely urgent letters e, principalmente, e

outros mercados relacionados serviço postal.

2.5 Cumulação de funções de concorrente (i.e., player) e regulador

Como se observa até aqui, a USPS já conta com ferramentas bastante

robustas para interferir significativamente na distribuição de incentivos no

mercado postal norte-americano, de modo a estabelecer o melhor cenário

possível para exercer seu poder de monopólio nos mercados estritamente

postais e, como se verá, para transferi-lo para outros mercados.

                                                                                                                         140  EUA. Code of Federal Regulations (C.F.R.). Title 39. Section 320.6(d): “(…) In addition, each outside container or cover must show the name and address of the carrier, and the name and address of the addressee. Carrier records must be sufficient to show that the delivery of the letters was completed within the applicable time limitations, if carried under the authority of paragraph (b) of this section, and must be made available for inspection at the request of the Postal Service. The required records may be either in the form of notations on the containers or covers of any letters asserted to be carried under this suspension, or in the form of records kept by employees of the actual times they pick up and deliver such materials.” Disponível em: <http://ecfr.gpoaccess.gov/cgi/t/text/text-idx?c=ecfr&sid=470486850326a420ef5c894e41ae08c0&rgn=div8&view=text&node=39:1.0.1.5.41.0.1.6&idno=39>. Acesso em: 8 Jan. 2011.  141 Sobre a importância da reputação como variável de competição, ver Assimetria de Informação e barreiras à livre concorrência. Revista do IBRAC, v. 11, São Paulo: Editora Singular p. 83-106, 2004.  

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76  

Contudo, talvez pela importância da exceção do extremely urgent

letters para o setor privado, isto é, única verdadeira exceção em razão de sua

relevância em termos de faturamento para o setor privado e, inclusive, para a

USPS (no seu first classe mail), o conjunto de normas de que dispõe a USPS

para interferir nesse segmento engloba poderosas sanções, que abrangem

desde multas em valor equivalente ao montante que seria faturado pela

empresa privada pelo serviço de entrega de correspondência concretizado

(ou a ser concretizado), à suspensão da aplicação da exceção da extremely

urgent letters por período de até 1 ano, isto é, da proibição de atuação no

mercado por até 1 ano.142

Em complemento, a revogação da aplicação da exceção do extremely

urgent letters (ou simplesmente a proibição de operar no mercado de express

mail) acompanha um processo administrativo perante a autoridade judicial

ligada ao Serviço Postal (Judicial Officer of the Postal Service, leia-se,

USPS). Essa autoridade revestida de poderes judiciais, conforme a própria

terminologia normativa empregada, é encarregada aplicar tal sanção bem

como de determinar sua duração (que pode ser duplicada para até dois anos,

ou 24 meses), utilizando para tanto fatores mitigantes ou agravantes em

função da extensão da perda de receita por parte da USPS em razão da

violação verificada, bem como da presença ou ausência de “erro de boa-fé”

(ou simplesmente, presença ou ausência de dolo) e de reincidência.143

                                                                                                                         142  EUA. Code of Federal Regulations (C.F.R.). Title 39. Section 310.5(a): “Upon discovery of activity made unlawful by the Private Express Statutes, the Postal Service may require any person or persons who engage in, cause, or assist such activity to pay an amount or amounts not exceeding the total postage to which it would have been entitled had it carried the letters between their origin and destination.” Disponível em: <http://ecfr.gpoaccess.gov/cgi/t/text/text-idx?c=ecfr&sid=10fa99fae9353bd47676668c18c0f87a&rgn=div8&view=text&node=39:1.0.1.5.40.0.1.5&idno=39>. Acesso em: 8 Jan. 2011. E Section 320.6(e): “Violation by a shipper or carrier of the terms of this suspension is grounds for administrative revocation of the suspension as to such shipper or carrier for a period of one year in a proceeding instituted by the General Counsel, following a hearing by the Judicial Officer Department in accordance with the rules of procedure set out in Part 959 of this chapter. (…).” Disponível em: <http://ecfr.gpoaccess.gov/cgi/t/text/text-idx?c=ecfr&sid=e37a3943bb3f81492f70a1e8b7ad640d&rgn=div8&view=text&node=39:1.0.1.5.41.0.1.6&idno=39>. Acesso em: 8 Jan. 2011.  143 EUA. Code of Federal Regulations (C.F.R.). Title 39. Section 320.6(e): “(…) The period of the revocation may be reduced or be extended for not to exceed one additional year by the Judicial Officer, depending on such mitigating or aggravating factors as the extent of the postal revenue lost because of the violation and the presence or absence of good faith error or of previous violations. (…)” Disponível em: <http://ecfr.gpoaccess.gov/cgi/t/text/text-idx?c=ecfr&sid=e37a3943bb3f81492f70a1e8b7ad640d&rgn=div8&view=text&node=39:1.0.1.5.41.0.1.6&idno=39>. Acesso em: 8 Jan. 2011.

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O processo de suspensão da exceção do extremely urgent letters,

segundo as normas aplicáveis, não limita outras medidas cabíveis, no âmbito

civil e criminal, contra o agente privado que tenha violado a lei. Em adição,

caso o agente privado investigado por violação das regras da exceção falhe

em cooperar como uma inspeção ou auditoria conduzida por um inspetor

postal, cria-se uma presunção de violação ao Private Express Statutes,

deixando a cargo do agente privado investigado o ônus de provar que de fato

cooperou e coopera com as investigações.144

Naturalmente, como resultado da cumulação de funções de agente

econômico e regulador do mercado postal, a USPS - de acordo com a velha

máxima emprestada da teoria econômica pela qual o indivíduo busca

maximizar seu bem-estar individual -, acaba por possuir incentivos para

utilizar seu poder regulador para maximizar seu poder econômico, manejando

as perdas esperadas de uma suposta violação da exceção do extremely

urgent letters por parte de concorrente seu, alegando que tal agente privado

teria falhado ao cooperar com as investigações, alterando assim o ônus da

prova em seu desfavor.145

2.6 Abuso do poder de monopólio e da função reguladora

Os exemplos são vários de práticas que poderiam ser caracterizadas

como abuso da função regulatória da USPS. Vale observar algumas delas,

como a ocorrida em 1993, em que inspetores postais armados ingressaram

na matriz da empresa Equifax Inc. (uma grande empresa de cadastro e

reporte de crédito, i.e.,credit reporting company), em Atlanta, com o objetivo

de averiguar em que medida todas as correspondências que aquela empresa                                                                                                                          144 EUA. Code of Federal Regulations (C.F.R.). Title 39. Section 320.6(e) “(…) The failure of a shipper or carrier to cooperate with an authorized inspection or audit conducted by the Postal Inspection Service for the purpose of determining compliance with the terms of this suspension shall be deemed to create a presumption of a violation for the purpose of this paragraph (e) and shall shift to the shipper or carrier the burden of establishing the fact of compliance. Revocation of this suspension as to a shipper or carrier shall in no way limit other actions as to such shipper or carrier to enforce the Private Express Statutes by administrative proceedings for collection of postage (see §310.5) or by civil or criminal proceedings”. Disponível em: <http://ecfr.gpoaccess.gov/cgi/t/text/text-idx?c=ecfr&sid=e37a3943bb3f81492f70a1e8b7ad640d&rgn=div8&view=text&node=39:1.0.1.5.41.0.1.6&idno=39>. Acesso em: 8 Jan. 2011.  145 SIDAK, J. G.; SPULBER, D. F. Protecting Competition from the Postal Monopoly. American Enterprise Institute for Public Policy Research. 1996, p. 31.

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despachara por intermédio da Federal Express (FEDEX) eram realmente

urgentes, a ponto de estarem acobertadas pela exceção do extremely urgent

letters. Os inspetores postais indagaram por que a Equifax não estava

despachando cheques de pagamento de salários (paychecks) para filiais

(outlying offices) por carta simples (ou correspondência comum) e, por essa

razão, queriam abrir as correspondências para avaliar seu conteúdo. A

empresa concordou em pagar uma multa para a USPS no valor de $ 30 mil

dólares. Na ocasião, o jornal Los Angeles Times classificou essa multa como

sendo uma espécie de taxa para utilização pela Equifax dos serviços da

FEDEX para os próximos anos, sem qualquer intimidação por parte da

USPS.146

O fato reportado acima possui especial importância se analisado na

perspectiva antitruste, isto é, o fato da USPS deter o monopólio da entrega

de correspondências cuja abrangência é por ela própria definida é

significativo no tocante à possibilidade de comportamento anticompetitivo.

Principalmente se for considerado no sentido de prejudicar rivais atuais e

impedir a entrada de rivais potenciais no mercado. Assim, concorrentes

atuais e potenciais provavelmente possuem incentivos negativos para entrar

no mercado, investir em ampliação de capacidade e inovação, ou mesmo em

expandir suas atividades na medida em que temem sofrer concorrência da

USPS e seus consequentes reflexos abusivos. Isto poderia ser diferente caso

os limites do monopólio fossem claramente definidos (ou circunscritos), de

modo que rivais poderiam ficar mais seguros no tocante à aplicação das

receitas advindas do monopólio a mercados onde há competição.147

De 1991 a 1994, o Serviço Postal coletou cerca de $ 521 mil dólares

de cerca de 21 empresas seguindo o mesmo procedimento adotado com a

Equifax. Há relatos de que, no mesmo período, a USPS teria arrecadado                                                                                                                          146   SIDAK, J. G.; SPULBER, D. F. Protecting Competition from the Postal Monopoly. American Enterprise Institute for Public Policy Research. 1996, p. 31.  147   Nesse sentido, ver GEDDES, R. Richard. Anticompetitive Behavior in Postal Services. Competing with the Government: Anticompetitive Behavior and Public Enterprises. Rick Geddes (Org.). Disponível em: <http://www.hoover.org/publications/books/8350>. Acesso em: 22 out. 2010. p.88: “The fact that the USPS holds a well-enforced letter delivery monopoly over which it effectively defines the scope is significant for anticompetitive behavior. Competitors or potential competitors are likely to be reticent about entering, investing in, or expanding activities in which they fear competition from the USPS. Were the delivery monopoly more circumscribed, rivals would be less fearful of the redistribution of monopoly rents towards competitive activities”.

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mais de $ 1 milhão de dólares em multas por procedimentos semelhantes ao

investigar cerca de 41 empresas. Em complemento, a USPS começou a

investigar agências federais pelo uso de serviços de cartas urgentes

(overnight mail) ofertados por empresas privadas apos saber que a General

Services Administration (órgão do Governo Federal dos EUA) teria negociado

com a FEDEX para ter overnight mail entregue por $ 3,45 dólares, preço

inferior ao da USPS para o mesmo serviço ($ 9,95 dólares) e ao preço

padrão da FEDEX para o mesmo serviço ($ 15,50 dólares).148

O aumento das investigações da USPS contra as empresas privadas

acabou por movimentar o Congresso norte-americano, de modo que, em

1994, foi introduzida emenda ao Competition Act determinando que a USPS

suspendesse temporariamente buscas e apreensões, auditorias e/ou

inspeções até que se realizassem estudos sobre a suspensão permanente de

tais ferramentas de aplicação da lei pelo próprio Serviço Postal.149

Na mesma linha, foi introduzida norma pela qual a USPS ficou proibida

de multar ou, de qualquer forma, sancionar agentes privados (clientes) que

utilizassem transportadoras privadas (i.e., couriers) para despachar

correspondências que aquelas empresas entendessem como urgentes. Tais

emendas foram propostas pelo Senador Paul Coverdell, do estado da

Geórgia, e foram aprovadas de forma unânime pelo Senado norte-

americano.150

Embora o Congresso norte-americano tenha tentado mitigar o uso da

função fiscalizadora de modo a prejudicar de forma indevida a concorrência

no setor de extremely urgent letters, a USPS não cessou suas práticas no

sentido de estender cada vez mais o âmbito do monopólio que lhe fora

                                                                                                                         148   SIDAK, J. G.; SPULBER, D. F. Protecting Competition from the Postal Monopoly. American Enterprise Institute for Public Policy Research. 1996, p. 32. Sobre a estatística de $ 1 milhão de dólares, ver HOUSTON, P.; SHOGAN, R. Washington Insight, L. A. Times, Apr. 4, 1994, at A5: “In the last five years, postal inspectors have marched into 41 businesses and collected more than $ 1 million in ‘postage due’ from companies that allegedly sent non-urgent mail by express service.”  149  140 Cong. Rec. S2589 (daily Ed. FEB. 22, 1994) (amendment no. 1481) Apud SIDAK, J. G.; SPULBER, D. F. Protecting Competition from the Postal Monopoly. American Enterprise Institute for Public Policy Research. 1996, p. 32.  150  Postal Fairness Act, S. 1541, 103d Cong., 1st Sess. (1993). Representative Fred Upton of Michigan introduced a similar Bill in the House. H.R. 3796, 103d Cong., 2d Sess. (1994) – 140 Cong. Rec. S3182, S3197 (daily Ed. Mar. 17, 1994). Apud SIDAK, J. G.; SPULBER, D. F. Protecting Competition from the Postal Monopoly. American Enterprise Institute for Public Policy Research. 1996, p. 32.  

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atribuído pelo Private Express Statutes e, assim, prejudicar a concorrência

em uma série de mercados. Assim, mesmo diante das constantes decisões

da Suprema Corte dos EUA no sentido de preservar o poder da USPS bem

como as proteções normativas para o exercício do monopólio postal e, logo,

a obtenção de lucros extraordinários face à inexistência de concorrência, a

política antitruste, enraizada na economia norte-americana desde os

primórdios, poderia ser a principal, senão única, barreira à extensão desse

poder a mais e mais mercados, notadamente aqueles mercados relacionados

ao serviço postal como um todo e de difícil inclusão no âmbito de incidência

do Private Express Statutes.

2.7 USPS: isenção antitruste Nesse sentido, após cessar inspeções e multas às empresas privadas

tal como a aplicada à Equifax, a USPS passou a exercer um comportamento

menos explícito e mais voltado às relações verticais que mantinha com

fornecedores de serviços acessórios ao serviço postal como um todo, o que

rendeu uma séria de demandas judiciais no período de 1995 a 2003, ocasião

em que a Suprema Corte dos EUA, no caso United States Postal Service v.

Flamingo Industries (USA) Ltd. (mais conhecido como caso Flamingo) voltou

a enfrentar a questão, agora na perspectiva de aplicação do Sherman Act à

USPS.

No caso, a USPS foi processada por um ex-fornecedor em razão do

encerramento não justificado de um contrato de fornecimento de sacos para

correspondências. A Flamingo Industries (USA) Ltd., após ter seus contratos

de fornecimento de sacos para material postal à USPS rescindido sem

justificativa, entrou com uma ação contra a USPS com fundamento,

principalmente, na alegação de que a USPS procurou eliminar a concorrência

e, logo, tentou estender seu poder de monopólio (i.e., attempted to

monopolize) ao mercado de fornecimento de sacos para correspondências. A

District Court for the Northern District of Carolina não conheceu da ação

(juldando o caso deforma antecipara sem adentrar seu mérito), contudo, o

Ninth Circuit Court of Appeals reverteu a decisão de primeira instância. O

caso chegou à Suprema Corte dos EUA a qual, conforme se verá, decidiu

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que a USPS se equipara ao Governo dos EUA e, portanto, não pode ser

considerada uma “pessoa” para efeitos de responsabilidade antitruste, com

base no Sherman Act, mesmo diante da suspensão de imunidade para

“processar-e-ser-processada” (“sue-and-be-sued”) decorrente do Postal

Reorganization Act (PRA).151

Em suma, por considerar a USPS como um membro do Governo dos

EUA (o que foi favorecido pela mistura dos papéis de agente econômico com

regulador e fiscalizador do setor postal), bem como atentando para seus

objetivos estatutários (i.e., contidos no Private Express Statutes e demais

normas jurídicas aplicáveis), isto é, de provimento de um serviço público e

universal, de não geração de lucro e, principalmente, com o intuito de não

criar um precedente perigoso para o Governo dos EUA, no sentido de

atribuir-lhe responsabilidade antitruste (Sherman Act) no sentido de lhe

submeter aos treble-damages152, a Suprema Corte dos EUA afastou a

aplicação da legislação antitruste da USPS. Isto, de forma totalmente

paradoxal a toda a política antitruste norte-americana, acabou por perpetuar

o comportamento anticoncorrencial daquela empresa nos EUA.

Segundo a Suprema Corte, a suspensão da imunidade para “processar-

e-ser-processado” (i.e., “sue-and-be-sued”), contida no Postal Reorganization

Act (U.S.C. Title 39, Section 401), é insuficiente para atribuir à USPS

responsabilidade antitruste segundo o Sherman Act. A Suprema Corte

avaliou o caso com base no precedente FDIC v. Meyer, 510 U.S. 471, 484,

114 S.Ct. 996, 127 L.Ed.2d 308 (mais conhecido como caso Meyer), pelo

qual se estabeleceu a regra de suspensão de imunidade decorrente da

soberania afeita ao Governo dos EUA (“sovereign immunity”). Assim, como a

                                                                                                                         151 EUA. U.S. Supreme Court. United States Postal Service v. Flamingo Industries (USA) Ltd. (No. 02-1290). 540 U.S. 736, 124 S.Ct. 1321. U.S., 2004: “Held: The Postal Service is not subject to antitrust liability. In both form and function, it is not a separate antitrust person from the United States but is part of the Government, and so is not controlled by the antitrust laws. Pp. 1324-1330”. Disponível em: <http://lawschool.westlaw.com/desktopdefault.aspx>. Acesso em: 9 Jan. 2011. 152 West's Encyclopedia of American Law, Edition 2. Copyright 2008. The Gale Group, Inc.: “A recovery of three times the amount of actual financial losses suffered which is provided by statute for certain kinds of cases. The statute authorizing treble damages directs the judge to multiply by three the amount of monetary damages awarded by the jury in those cases and to give judgment to the plaintiff in that tripled amount. The Clayton Act (15 U.S.C.A. § 12 et seq.), for example, directs that treble damages be awarded for violations of antitrust laws.” Disponível em: <http://legal-dictionary.thefreedictionary.com/Treble+damages>. Acesso em: 10 Jan. 2011.  

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Corte considerou a USPS como parte do Governo dos EUA e, diante do

Postal Reorganization Act, o primeiro pré-requisito para se aplicar o caso

Meyer’s estaria preenchido.

Contudo, de forma curiosa, a Suprema Corte não identificou fundamento

para a aplicação do segundo pré-requisito, qual seja, o da existência de uma

violação por parte da USPS que se subsumisse às hipóteses previstas no

Sherman Act. Isto, frise-se, independentemente da prática apontada pela

Flamingo Industries como sendo prejudicial à concorrência e, portanto,

passível de enquadramento na hipótese do attempt to monopolize (Section 2,

do Sherman Act) 153 – o que parece coerente pois muito se assemelha a uma

prática de discriminação vertical (punível, por exemplo, em diversos outros

casos naquele país e, inclusive, no Brasil).

De outro lado, a Suprema Corte entendeu que, pelo fato do Sherman

Act imputar responsabilidade para “pessoas” - termo cujo significado

abrangeria “corporações, ou empresas, e associações existentes sob ou

autorizadas pelas leis dos Estados Unidos” (U.S.C. Title 15, Section 7) -, a

USPS (como parte do Governo dos EUA) não poderia ser caracterizada

como uma pessoa. Assim, como o Governo dos EUA não está autorizado a

propor ação de treble-damages por violações à norma antitruste por parte do

próprio Governo dos EUA (segundo o caso United States v. Cooper Corp.,

312 U.S. 600, 606-607, 61 S.Ct. 742, 85 L.Ed. 1071 – mais conhecido como

caso Cooper -, em que se concluiu que o Governo dos EUA não poderia ser

inserido no conceito de “pessoas” para efeitos da legislação antitruste), se o

Governo dos EUA fosse incluído no conceito de “pessoa” introduzido na

legislação pelo Postal Reorganization Act, seria passível de ser processado

por treble-damages diante de uma possível ofensa à legislação antitruste, o

que, segundo a Suprema Corte, estaria em desacordo com a intenção do

Congresso norte-americano ao editar o Postal Reorganization Act.

                                                                                                                         153 EUA. Sherman Act. Section 2 (Monopolizing trade a felony; penalty): “Every person who shall monopolize, or attempt to monopolize, or combine or conspire with any other person or persons, to monopolize any part of the trade or commerce among the several States, or with foreign nations, shall be deemed guilty of a felony, and, on conviction thereof, shall be punished by fine not exceeding $10,000,000 if a corporation, or, if any other person, $350,000, or by imprisonment not exceeding three years, or by both said punishments, in the discretion of the court.” Disponível em: <http://www.stolaf.edu/people/becker/antitrust/statutes/sherman.html>. Acesso em: 8 Jan. 2011.

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Portanto, mesmo diante das normas antitruste posteriores (que

“emendaram” o Sherman Act e permitiram que o Governo dos EUA pudesse

propor ações por violação às leis antitruste, conforme o U.S.C., Title 15,

Section 15 “a”), a Suprema Corte dos EUA entendeu que o legislador (i.e., o

Congresso norte-americano) não alterara a definição normativa de “pessoa”,

de modo que, a conclusão do caso Cooper de que o Governo dos EUA não

poderia ser considerado uma pessoa, em particular uma pessoa para efeitos

da legislação antitruste, foi preservada. Em outras palavras, o meio que o

Congresso norte-americano utilizou para emendar a lei antitruste

implicitamente ratificou a conclusão atingida no caso Cooper de que os EUA

não podem figurar no polo passivo de uma ação antitruste.154

Afora o intenso exercício de hermenêutica empreendido pela Suprema

Corte dos EUA, parece inconsistente a conclusão de que a USPS,

estatutariamente caracterizada como uma entidade independente do

Governo dos EUA, seja, em primeiro lugar, equiparada a este para efeitos de

“isenção antitruste”, ainda mais se considerarmos que o Governo dos EUA

pode propor ações no campo antitruste. Em outras palavras, não parece

fazer sentido operar-se uma isenção apenas no tocante a figurar no polo

passivo de ações antitruste e poder figurar no polo ativo (i.e., poder propor

ações no campo antitruste). Seja como for, vale observar outros pontos

levados em consideração pela Suprema Corte dos EUA para que se possa                                                                                                                          154 “(...) (a) The waiver of immunity from suit provided by the Postal Reorganization Act (PRA) - which gives the Postal Service the power ‘to sue and be sued in its official name,’ 39 U.S.C. § 401 - does not suffice by its own terms to subject the Postal Service to liability under the Sherman Act. The two-step analysis of FDIC v. Meyer, 510 U.S. 471, 484, 114 S.Ct. 996, 127 L.Ed.2d 308, applies here. Meyer's first step is met because the PRA's sue-and-be-sued clause effects a waiver of sovereign immunity for actions against the Postal Service. However, Meyer's second step for finding liability-whether the Sherman Act's substantive prohibitions apply to the Postal Service - is not satisfied. The Sherman Act imposes liability on any “person,” defined ‘to include corporations and associations existing under or authorized by the laws of ... the United States.’ 15 U.S.C. § 7. In holding that the United States is not a person authorized to bring **1323 a treble-damages claim for its own alleged antitrust injury under the Sherman Act, United States v. Cooper Corp., 312 U.S. 600, 606-607, 61 S.Ct. 742, 85 L.Ed. 1071, this Court observed that, if the definition of ‘person’ included the United States, the Government would be exposed to liability as an antitrust defendant, a result Congress could not have intended, id., at 607, 609, 61 S.Ct. 742. Although the antitrust statutes were later amended to allow the United States to bring antitrust suits, see 15 U.S.C. § 15a, Congress did not thereby change the statutory definition of “person.” So, Cooper' s *737 conclusion that the United States is not an antitrust ‘person,’ in particular not a person who can be an antitrust defendant, was unaltered by Congress' action; indeed, the means Congress used to amend the antitrust law implicitly ratified Cooper's conclusion that the United States is not a proper antitrust defendant. Pp. 1324-1328”. Disponível em: <http://lawschool.westlaw.com/desktopdefault.aspx>. Acesso em: 9 Jan. 2011.  

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ter um panorama dos reais motivos que permearam essa opção pela isenção

antitruste da USPS.

Segundo a Suprema Corte, para efeitos da legislação antitruste, a

USPS não deve ser vista como separada da pessoa do Governo dos EUA.

Mesmo diante da norma contida no Postal Reorganization Act, em que a

USPS é caracterizada como “um estabelecimento independente da agência

executiva do Governo dos Estados Unidos” (U.S.C. Title 39, Section 201155).

Para a Suprema Corte dos EUA, a conclusão deveria ser o contrário,

isto é, apesar do PRA atribuir à USPS elevado grau de independência, a

empresa ainda continua sendo parte do Governo dos EUA. Para a Corte,

como o Sherman Act define “pessoas” no sentido de corporações

(empresas), se o Congresso norte-americano realmente tivesse tido a

intenção de incluir a USPS nesse conceito, teria definido a USPS como “uma

corporação” (ou empresa) do Governo, e não um “estabelecimento

independente”, como de fato foi feito.

Afora outros argumentos, outro ponto levado em consideração pela

Suprema Corte para reforçar o argumento de ausência de intenção legislativa

foi o de que o PRA não atribuiu, explicitamente, responsabilidade antitruste à

USPS. Isso porque o PRA faz menção a outras leis de modo a atribuir

isenção à USPS em alguns casos e noutros não. Em complemento à

argumentação no campo hermenêutico, a Suprema Corte recupera os

tradicionais argumentos utilizados desde os primórdios para a defesa do

monopólio legal no campo postal, quais sejam, o de que a USPS possui

função pública (com deveres especiais como universalização do serviço

postal, prestação gratuita a algumas classes de pessoas e, mais

recentemente, importante função fiscalizadora ligada à segurança nacional) e

propósitos de existência distintos das empresas privadas, dentre os quais o

mais importante é não buscar lucros.156

                                                                                                                         155   “There is established, as an independent establishment of the executive branch of the Government of the United States, the United States Postal Service” EUA. United States Code (U.S.C.). Title 39 (Postal Service). Chapter 2. Section 201. Disponível em: <http://openjurist.org/united-states-code>. Acesso em: 25 Dez. 2010.  156 “(...) (b) For purposes of the antitrust laws, the Postal Service is not a separate person from the United States. The PRA's designation of the Postal Service as an ‘independent establishment of the executive branch of the Government of the United States,’ 39 U.S.C. § 201, is not consistent with the idea that the Postal Service is an entity existing outside the Government. Indeed, the designation indicates just the contrary. The PRA gives the Postal

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Finalmente e para sacramentar a isenção antitruste da USPS, a

Suprema Corte assinala que a USPS possui muitos poderes e características

que a assemelham mais ao Governo dos EUA que à empresas privadas,

como por exemplo, (a) o fato de constar como titular do monopólio estatal

para a entrega de correspondências e (b) deter poderes para assinar tratados

internacionais sobre serviço postal. Ainda, considera que a liberdade da

USPS é bem mais limitada que a liberdade das empresas privadas, pois não

possui liberdade para definir os seus preços bem como para fechar agências

postais. Assim, de acordo com a Suprema Corte (que considerou o fato de

que a USPS opera em vários mercados distintos do serviço postal

estritamente considerado), suas características públicas e seu rol de

responsabilidades indicam que a USPS deve ser tratada como parte do

Governo dos EUA para efeitos da legislação antitruste.157

É possível observar que a Suprema Corte dos EUA analisou apenas

parte do universo de atuação da USPS para concluir pela sua isenção à

                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                           Service a high degree of independence from other Government offices, but it remains part of the Government. The Sherman Act defines ‘person’ to include corporations, 15 U.S.C. § 7, and had Congress chosen to create the Postal Service as a federal corporation, the Court would have to ask whether the Sherman Act's definition extends to the federal entity under this part of the definitional text. Congress, however, declined to create the Postal Service as a Government corporation, opting instead for an independent establishment. The choice of words likely was more informed than unconsidered, because Congress debated proposals to make the Postal Service a Government corporation before it enacted the PRA. Although the PRA refers explicitly to various federal statutes and specifies that the Postal Service is exempt from some and subject to others, 39 U.S.C. §§ 409-410, it makes no mention of the Sherman Act or the antitrust laws. This silence leads to no helpful inference one way or the other on the question at issue. However, the other considerations the Court has discussed lead to the conclusion that, absent an express congressional statement that the Postal Service can be sued for antitrust violations despite its status as an independent establishment of the Government, the PRA does not subject the Postal Service to antitrust liability. This conclusion is consistent with the nationwide, public responsibilities of the Postal Service, which has different goals from private corporations, the most important being that it does not seek profits, § 3621. It also has broader obligations, including the provision of universal mail delivery and free mail delivery to certain classes of persons, §§ 3201-3405, and, most recently, increased public responsibilities related to national security.” Disponível em: <http://lawschool.westlaw.com/desktopdefault.aspx>. Acesso em: 9 Jan. 2011.  157  “(...) Finally, the Postal Service has many powers more characteristic of Government than of private enterprise, including its state-conferred monopoly on mail delivery, § 601 et seq., and the powers of eminent domain and to conclude international postal agreements, §§ 401, 407. On the other hand, but in ways still relevant to the antitrust laws' nonapplicability, the Postal Service’s powers are more *738 limited than those of private businesses, since it lacks the power unilaterally to set prices or to close a post office, § 404. Its public characteristics and responsibilities indicate it should be treated under the antitrust laws **1324 as part of the Government, not a market participant separate from it. The fact that the Postal Service operates some nonpostal lines of business beyond the scope of its mail monopoly and universal service obligation does not alter this conclusion. Pp. 1328-1330.” Disponível em: <http://lawschool.westlaw.com/desktopdefault.aspx>. Acesso em: 9 Jan. 2011.  

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legislação antitruste. Em outras palavras, será que o propósito de existência

de não buscar lucros, bem como de proporcionar serviço universalizado

afastam os efeitos prejudiciais à economia provenientes de um monopólio

legal, sobretudo se forem considerados os vários setores da economia sobre

os quais sua existência gera efeitos importantes? No caso, por exemplo, do

mercado de sacos para correspondência, em que atuava a Flamingo

Industries, estaria a USPS imbuída de dever de universalização? Será que as

variáveis “preço” e “fechamento de agências postais” seriam as mais

importantes para a USPS a ponto de representar verdadeiramente uma

limitação de sua liberdade e, logo impedir o abuso de sua posição, ou poderia

a USPS dispor de outras variáveis mais importantes sobre as quais poderia

maximizar o seu bem-estar individual em detrimento do interesse público

(interesse social)? Como se analisou no Capítulo I, a resposta, em síntese,

para essas perguntas aponta para um equívoco por parte da U.S. Supreme

Court no sentido de que a decisão prejudicara o bem-estar social naquele

país.

Em suma, parece não fazer sentido entender que a USPS não possui

incentivos para maximizar o seu bem-estar individual (em detrimento do

interesse público) em razão de não poder auferir lucro, conforme previsão

estatutária, e de não poder fechar agências postais. Ainda que se admitisse o

cumprimento rigoroso de tais normas, tal argumento não deveria sustentar a

aquiescência da transferência do poder de monopólio que a USPS detém no

setor postal para mercados relacionados (como sacos para correspondências

e outros), o que de fato acabou ocorrendo com a decisão da Suprema Corte

no caso Flamingo, em que se atribuiu isenção antitruste à USPS. Todavia, a

maximização do bem-estar individual permanece válida como premissa

comportamental por parte da USPS, pois, como se viu no Capítulo I, por se

tratar de empresa pública, a rede de incentivos políticos e individuais que

motivam a movimentação daquela empresa não são suficientemente

afetados ou mitigados pelas normas sobre lucro e fechamento de agências

postais em função da consecução dos interesses da coletividade.

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2.8 Postal Accountability and Enhancement Act of 2006 Em Dezembro de 2006 foi publicado o Postal Accountability and

Enhancement Act (PAEA), possivelmente como resultado da pressão feita

sobre o Congresso por parte das empresas privadas de express mail e outros

inúmeros de interessados em colocar limites às atividades da USPS,

notadamente aquelas relacionadas ao abuso de sua função regulatória. O

PAEA realizou modificações importantes no escopo da reserva legal da

USPS bem como realizou mudanças em sua administração. Duas novas

exceções foram adicionadas ao monopólio legal da USPS. A primeira delas

refere-se às cartas com peso equivalente ou superior a 12.5 onças (i.e.,

354,3 gramas). A segunda exceção refere-se às cartas cujo preço for ao

menos seis vezes superior ao preço cobrado pela USPS pela primeira onça

(28,4 gramas) de uma unidade de first-class mail. Se o agente privado

preencher uma ou outra exceção estará livre para comercializar seu

produto/serviço.158

Em princípio, o PAEA eliminou a possibilidade de a USPS emitir

normas regulatórias para definir o escopo de seu monopólio postal, embora

tenha mantido sua competência para regular outros temas relativos à

“execução das suas funções”. Tal norma ainda estabeleceu previsão

expressa no sentido de proibir a USPS de criar normas regulatórias cujo

efeito restrinja ou de qualquer forma estabeleça os termos da concorrência,

ao menos que a própria USPS demonstre que dada norma não resulta

vantagem competitiva desleal para si própria ou para qualquer de suas

entidades. O PAEA eliminou, ainda, a possibilidade de a USPS suspender a

aplicação do Private Express Statutes (i.e., conceder isenções a sua reserva

legal), dado o histórico da utilização discricionária e espúria do instituto pela

USPS.159

                                                                                                                         158   CAMPBELL JR., James I. A brief history of the United States postal monopoly Law. Handbook of Worldwide Postal Reform. Edited by Michael A. Crew, Paul R. Kleindorfer, James I. Campbell Jr. Cheltenham, UK. Northampton, MA, USA. 2008, p. 276. 159 “Whenever protests against the monopoly were gaining ground in Congress, the Postal Service [USPS] would adopt a narrowly drawn suspension that was sufficiently inclusive to satisfy most of the agitators.” CAMPBELL JR., James I. A brief history of the United States postal monopoly Law. Handbook of Worldwide Postal Reform. Edited by Michael A. Crew, Paul R. Kleindorfer, James I. Campbell Jr. Cheltenham, UK. Northampton, MA, USA. 2008, p. 275-276. Aparte incluído no texto original.

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Finalmente, o PAEA inovou positivamente no ordenamento norte-

americano no sentido de minimizar o poder regulatório da USPS, atribuindo

mais competência para um órgão independente, Postal Regulatory

Commission, que ficou encarregada de realizar estudos para avaliar a

necessidade de prosseguir com as medidas legislativas no sentido de

proporcionar mais ganhos aos mercados postais nos EUA. Até 2008,

contudo, tanto a Postal Regulatory Commission como o Poder Judiciário

norte-americano não encontraram oportunidade para detalhar ou avaliar as

mudanças trazidas pelo PAEA.160

2.9 Considerações finais

O fenômeno do monopólio postal ocorre no país com grande tradição

antitruste, senão a maior de todo o mundo. Entende-se que o monopólio

postal nos EUA pode ser equiparado a uma “doença de difícil trato” nos dias

de hoje, dadas as raízes sociais e até mesmo culturais, das quais decorrem

raízes políticas, o que caracteriza verdadeira rede de interesses voltada a

manter o monopólio postal (a qualquer custo) e, assim, os benefícios dele

decorrentes àqueles a ele direta ou indiretamente relacionados. Leia-se,

sacrificando-se o quanto de bem-estar-social que decorreria de um regime de

livre competição nos serviços postais e nos mercados correlatos.

Para que fique mais evidente o fundamento dessa inferência, vale

observar recentes (de 2011) dados divulgados sobre o Serviço Postal dos

EUA, pela própria USPS e pela Postal Regulatory Commission. Segundo o

Relatório Anual da USPS de 2010, publicado em seu website no primeiro

trimestre de 2011, a USPS foi, em 2010, responsável pelo envio de cerca de

170,5 bilhões de correspondências, dentre as quais cerca de 78,2 bilhões de

First-Class Mail e cerca de 82,5 bilhões de cartas simples (Standard Mail).

Em termos de faturamento, o First-Class Mail foi responsável pelo montante

de cerca de 34 bilhões de dólares, enquanto a carta simples por cerca de

                                                                                                                         160 “Neither the Postal Regulatory Commission nor the courts have yet had occasion to address postal monopoly provisions for the PAEA.” CAMPBELL JR., James I. A brief history of the United States postal monopoly Law. Handbook of Worldwide Postal Reform. Edited by Michael A. Crew, Paul R. Kleindorfer, James I. Campbell Jr. Cheltenham, UK. Northampton, MA, USA. 2008, p. 277.

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17,3 bilhões de dólares (em conjunto, First-Class Mail e Standard Mail

representaram cerca de 77% do faturamento da USPS). Como resultado da

crise de 2009, a USPS registrou uma receita operacional de 67,052 bilhões

de dólares (em 2008, e.g., registrara 74,932 bilhões de dólares). Em

Setembro de 2010, a USPS possuía 583.908 empregados somados a 87.779

colaboradores (empregados, mas não de carreira), totalizando cerca de 760

mil empregados dentro dos EUA. Mesmo diante dessas grandezas, a USPS

registrou déficit em 2010, fechando o período com despesas operacionais de

75,426 bilhões de dólares (i.e., um prejuízo de 8,505 bilhões de dólares), que

demandou recursos do tesouro norte-americano (por meio dos Consolidation

Appropriations Act of 2010 e de 2011) e que está motivando mudanças

legislativas no sentido de, por exemplo, reduzir o comprometimento da

companhia com o fundo pensão de funcionários de carreira aposentados e

com a manutenção estatutária de agências postais.161

Em 29 de março de 2011, a Postal Regulatory Commission publicou o

Annual Compliance Determination Report (ACD of 2010), pelo qual, dando

cumprimento ao PAEA, avaliou o desempenho da USPS no ano de 2010.

Segundo a Comissão, a USPS, apesar dos grandes esforços observados,

não tem registrado desempenho satisfatório no último triênio (i.e., 2008, 2009

e 2010), intensificado em razão da crise que abrangeu o último trimestre de

2008 e início de 2009. Segundo a Comissão, parte dos problemas da USPS

decorre de uma estruturação de custos imprópria que, mesmo nos mercados

onde possui posição dominante (em razão das reservas legais), as receitas

auferidas não foram suficientes para cobrir os custos (attributable costs). Isso

estaria diretamente relacionado ao elevado custo da USPS como um todo, o

que leva a um outro e principal problema identificado pela Postal Regulatory

Commission, qual seja, a necessidade da USPS antecipar um fundo para

custear planos de saúde premium para os futuros funcionários aposentados

(future retiree health benefit premiums), algo que se entende decorrer da

matriz política (“political-driven”) da USPS. Segundo a Comissão, nos últimos

quatro anos, a USPS pagou 21,9 bilhões de dólares para esse fundo. Sem a

necessidade de antecipar tais recolhimentos, a USPS deixaria de fechar o                                                                                                                          161 US. USPS. 2010 Annual Report – United States Postal Service. Disponível em: <http://www.usps.com/financials/_pdf/usps2010annual-report.pdf>. Acesso em: 6 Mai. 2011.

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90  

período em prejuízo, tendo registrado um pequeno resultado positivo. Para

2011, estima-se que a USPS vá recolher cerca de 5,5 bilhões de dólares para

esse fundo. De forma consistente com o Relatório Anual de 2010 da USPS, a

Postal Regulatory Commission identificou que desde 2007, a USPS vem

registrando resultados negativos: 5,4 bilhões de dólares, em 2007; 2,8

bilhões de dólares, em 2008; 3,8 bilhões de dólares, em 2009; e 8,5 bilhões

de dólares em 2010; num total de 20,2 bilhões de dólares no último

quadriênio. Estima-se que, em 2011, a USPS terá um resultado negativo de

2,7 bilhões de dólares.162

Diante desse cenário, como se imaginou no início deste estudo e de

acordo com boa parte da doutrina norte-americana, entende-se que é preciso

atualizar as premissas (ou motivos) para o estabelecimento de um monopólio

legal, sob pena de, mantendo-o sob premissas ultrapassadas, gerar-se

externalidades negativas em volume tal que, o que antes fora um remédio

para o desenvolvimento e integração de um país, se converta em uma

doença em termos econômicos e sociais, de difícil trato no campo político,

jurídico e social. Em outras palavras, não há razões econômicas e jurídicas

para atribuir qualquer espécie de isenção antitruste à USPS.163

Por outro lado, embora seja paradoxal o tratamento dispensado à

USPS no contexto liberal norte-americano, parece intuitiva a solução adotada

pelos EUA, qual seja, a de minimizar os abusos de autoridade por parte da

USPS, com a edição, ainda que tardia, do Postal Accountability and

Enhancement Act, em Dezembro de 2006, pelo qual se minimizou

sobremodo as funções de regulação exercidas pela USPS, tendo aquelas

sido delegadas a um órgão independente.

Se, por outro lado, o contexto político norte-americano fosse

ponderado nessa análise, esta poderia ser a melhor medida possível a ser                                                                                                                          162 U.S. Postal Regulatory Commission. Annual Compliance Determination Report of 2011 (Fiscal Year 2010). Disponível em: <http://www.prc.gov/PRC-DOCS/UploadedDocuments/ACD%202010_1697.pdf>. Acesso em: 20 Abr. 2011, p.1-2. 163 Nesse sentido, veja-se GEDDES, R. Richard. Anticompetitive Behavior in Postal Services. Competing with the Government: Anticompetitive Behavior and Public Enterprises. Rick Geddes (Org.). Disponível em: <http://www.hoover.org/publications/books/8350>. Acesso em: 22 out. 2010. p. 107: “A case currently before the Supreme Court, United States Postal Service v. Flamingo Industries, will determine whether or not the U.S. Postal Service is subject to the antitrust laws. Regardless of the decision in that case, the analysis in this chapter suggests that explicitly subjecting the USPS to the antitrust laws is an appropriate policy change”.  

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adotada pelo Estado, que já contava com liberdade restrita de reforma diante

da força política da USPS e das garantias que a U.S. Supreme Court

outorgara ao longo da história a essa empresa estatal. Seria isso suficiente

para eliminar os reflexos negativos da existência de um monopólio postal nos

EUA, tanto no tocante aos efeitos negativos diretos percebidos nos mercados

postais, stricto sensu, quando nos mercados vizinhos (como no fornecimento

de produtos ou serviços à USPS etc.)? A resposta é, obviamente, negativa.

Contudo, tendo-se como fatos inexoráveis o crescimento dos meios

alternativos de comunicação devido à rápida evolução tecnológica e de

cobertura da Internet, por exemplo, é bem possível que muitos políticos

encarregados da aplicação da política de concorrência naquele país

ponderem os ganhos e perdas de um intervenção mais severa em curto

prazo na USPS (o que teria um significativo peso político negativo) e, com

base numa reflexão apenas de longo prazo,164 prevaleça, mais uma vez, a

idéia de eficiência alocativa,165 da tradicional Escola de Chicago.  

                                                                                                                         164 Isto é, sacrificando-se o bem-estar social por um bom período. Veja-se, por exemplo, as perdas quantificadas pela operação ineficiente da USPS no último quadriênio. Isto aliado às outras perdas não quantificáveis, mas existentes e imensas, decorrentes de seu perfil comportamental anticoncorrencial/sua reserva legal de mercado. 165“Diferentemente de seus predecessores, os teóricos da nova Escola de Chicago enfatizaram as explicações sobre eficiência para vários fenômenos, incluindo concentrações industriais, fusões e restrições contratuais, que a lei antitruste [dos EUA] desfavoreceu severamente nos anos 1950 e 1960. (...) [a nova Escola de Chicago] trouxe, por meio da análise econômica, um novo instrumento, que é a eficiência alocativa do mercado. Essa modalidade de análise econômica permite que sempre sejam avaliados os benefícios aos consumidores. Veja-se inclusive que essa premissa é válida independentemente de o agente ser monopolista ou sujeito à competição.” (apartou-se o texto original). GABAN, Eduardo M.; DOMINGUES, Juliana O. Direito Antitruste: o combate aos cartéis. 2a ed. São Paulo: Saraiva, 2009, p.116-118.

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CAPÍTULO III. OS SERVIÇOS POSTAIS NA UNIÃO EUROPÉIA

“Increased competitiveness should furthermore enable the postal

sector to be integrated with alternative methods of communication

and allow the quality of the service provided to evermore

demanding users to be improved.

(...)

In a fully competitive environment, it is important, both for the

financial equilibrium of the universal service as well as for limiting

market distortions, that the principle that prices reflect normal

commercial conditions and costs is only departed from in order to

protect public interests. This objective should be achieved by

continuing to allow Member States to maintain uniform tariffs for

single piece tariff mail, the service most frequently used by

consumers, including small and medium-sized enterprises. Member

States may also maintain uniform tariffs for some other mail items,

such as, for example, newspapers and books, to protect general

public interests, such as access to culture, ensuring participation in

a democratic society (freedom of press) or regional and social

cohesion.”166

Diretiva 2008/6 do Parlamento Europeu e do Conselho da

União Européia (2008)

                                                                                                                         166 EC. Directive 2008/6/EC of The European Parliament and of The Council of 20.02.2008 amending Directive 97/67/EC with regard to the accomplishment of the internal market of Community postal services. Disponível em: <http://ec.europa.eu/internal_market/post/doc/legislation/2008-06_en.pdf>. Acesso em: 25 Fev. 2011. Tradução livre: “O aumento da concorrência deve habilitar o setor postal a se integrar aos métodos alternativos de comunicação e permitr um aumento de qualidade dos serviços prestados à uma demanda sempre crescente de usuários. (...) Em um ambiente totalmente competitivo, é importante, tanto para o equilíbrio financeiro do serviço universal como para limitar distorções no mercado, que o princípio de que os preços reflitam os custos em condições normais de mercado sejam desconsiderados apenas para proteger o interesse público. Esse objetivo deve ser atingindo pela manutenção da permissão de que os Estados Membros mantenham tarifas uniformes para a carta simples individual, serviço mais frequentemente utilizado pelos consumidores, incluindo-se pequenas e médias empresas. Estados Membros podem também manter tarifas uniformes para outros itens postais, como por exemplo, jornais e livros, para proteger o interesse público geral, como o acesso à cultura, assegurando-se a participação em uma sociedade democrática (liberdade de imprensa) ou coesão regional e social.”

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93  

3.1 Introdução

A defesa da concorrência, princípio adotado pelo Tratado de Roma

que estabeleceu as Comunidades Européias, de 1957, (“Tratado de Roma”

ou “Tratado CE”), decorreu de um esforço conjunto dos Estados-Membros no

sentido de proporcionar instrumentos que viabilizassem a integração

econômica da União Européia (UE). Em outras palavras, fazendo frente ao

crescimento econômico dos EUA, o Tratado de Roma incorporou o antitruste

inicialmente como um dos meios (i.e., políticas de Estado) à viabilização da

integração econômica da UE, basicamente com base nas premissas do

aumento de eficiência econômica e competitividade dentro dos mercados

nacionais (i.e., de cada Estado-membro) e, principalmente, entre os diversos

mercados nacionais (dadas as diferenças de culturas, sistemas econômicos,

relações dos Estados com os respectivos setores privados etc.), no contexto

do comércio comunitário.

Assim, a política antitruste passou a ser utilizada pela UE

principalmente como um dos meios de viabilizar a integração econômica da

UE, gerando paralelamente um resultado importante: a repressão ao abuso

do poder econômico por parte dos agentes econômicos nacionais (tanto

públicos como privados) no contexto comercial comunitário, o que, por sua

vez, implicou a eliminação progressiva das diversas espécies de

favorecimentos e/ou tratamentos discriminatórios decorrentes de proteções

estatais a mercados internos, ou até a empresas específicas (como foi o caso

do mercado de serviços postais na Alemanha, por exemplo), os quais

geravam prejuízos à concorrência no âmbito comunitário e, por sua vez, nos

mercados nacionais dos Estados-membros, prejudicando a integração

econômica da UE.167

Originalmente, as principais regras de defesa da concorrência da UE

estavam contidas no Tratado de Roma, artigos 81 e 82, os quais,

basicamente, disciplinavam os acordos entre concorrentes (como cartéis, por

exemplo) e práticas de abuso de posição dominante (como abuso do poder

de monopólio etc.). Em 1 de Dezembro de 2009, o Tratado de Roma passou

                                                                                                                         167 GABAN, Eduardo M.; DOMINGUES, Juliana O. Direito Antitruste: o combate aos cartéis. 2 ed. São Paulo: Saraiva, 2009, p.103-104.  

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por uma revisão, da qual resultou o Tratado sobre o Funcionamento da União

Européia, ou Treaty on the Functioning of the European Union (“TFEU”),

diploma atualmente vigente que contempla as principais regras de defesa da

concorrência da UE, precisamente nos artigos 101 e 102 (versões

atualizadas dos artigos 81 e 82, respectivamente). O artigo 101 (antigo artigo

81 do Tratado de Roma) prevê, em suma, que acordos cujos objetos ou

efeitos sejam a restrição ou distorção da concorrência nos mercados internos

(i.e., comunitário) devem ser proibidos.168 O artigo 102, por sua vez, proíbe

toda forma de abuso por um ou mais agentes econômicos que detenham

posição dominante dentro do mercado interno (i.e., comunitário) ou em

parcela substancial do mercado comunitário, na medida em que tais práticas

sejam incompatíveis com o mercado interno e que possam afetar o comércio

entre os Estados-membros.169

                                                                                                                         168   EU. Treaty on the Functioning of the European Union (TFEU). Disponível em: <http://eur-lex.europa.eu/LexUriServ/LexUriServ.do?uri=OJ:C:2008:115:0047:0199:EN:PDF>. Acesso em: 9 Fev. 2011: “Article 101 (ex Article 81 TEC). 1. between undertakings, decisions by associations of undertakings and concerted practices which may affect trade between Member States and which have as their object or effect the prevention, restriction or distortion of competition within the internal market, and in particular those which: (a) directly or indirectly fix purchase or selling prices or any other trading conditions; (b) limit or control production, markets, technical development, or investment; (c) share markets or sources of supply; (d) apply dissimilar conditions to equivalent transactions with other trading parties, thereby placing them at a competitive disadvantage; (e) make the conclusion of contracts subject to acceptance by the other parties of supplementary obligations which, by their nature or according to commercial usage, have no connection with the subject of such contracts. 2. Any agreements or decisions prohibited pursuant to this Article shall be automatically void. 3. The provisions of paragraph 1 may, however, be declared inapplicable in the case of: - any agreement or category of agreements between undertakings, - any decision or category of decisions by associations of undertakings, - any concerted practice or category of concerted practices, which contributes to improving the production or distribution of goods or to promoting technical or economic progress, while allowing consumers a fair share of the resulting benefit, and which does not: (a) impose on the undertakings concerned restrictions which are not indispensable to the attainment of these objectives; (b) afford such undertakings the possibility of eliminating competition in respect of a substantial part of the products in question.”  169 EU. Treaty on the Functioning of the European Union (TFEU). Disponível em: <http://eur-lex.europa.eu/LexUriServ/LexUriServ.do?uri=OJ:C:2008:115:0047:0199:EN:PDF> Acesso em: 9 Fev. 2011: “Article 102 (ex Article 82 TEC) Any abuse by one or more undertakings of a dominant position within the internal market or in a substantial part of it shall be prohibited as incompatible with the internal market in so far as it may affect trade between Member States.

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Nesse contexto, os serviços postais na UE que, por razões várias

vinham sendo desenvolvidos em diversas jurisdições sob o modelo de

monopólio estatal, passaram a sofrer ajustes em razão das normas

comunitárias que disciplinam a concorrência. Em outras palavras, ao longo

dos anos, os Estados-membros que adotavam (e que continuam adotando) o

modelo de monopólio legal para os serviços postais tiveram que se ajustar às

normas concorrenciais (principalmente aquelas contidas no artigo 82, ou

atualmente, no artigo 102 do TFEU – que tratam do abuso de posição

dominante) à medida que tais monopólios geravam efeitos anticoncorrenciais

em outros Estados-membros.

Assim, independentemente do nível de harmonização dos modelos

nacionais adotados para os serviços postais, isto é, se de monopólio ou de

livre competição, ou ainda modelos mistos (em que parcela dos serviços é

reservada legalmente a um único player – estatal ou não – e parcela aberta à

competição), os serviços postais receberam na Europa uma progressiva

disciplina antitruste, o que pode ser observado em alguns casos importantes

no âmbito comunitário (i.e., da Comissão Européia), bem como em âmbito

nacional, onde boa parte das normas de concorrência comunitária fora

reproduzida nas legislações de cada Estado-membro.

3.2 Histórico

Os serviços postais começaram a receber disciplina antitruste na UE

por meio de decisões em casos concretos. Em Dezembro de 1989,

analisando um caso de ampliação dos limites do monopólio legal para

serviços postais na Holanda, por meio de uma lei nacional de 1988 e de

modo a abranger o mercado de express mail, até então aberto à livre

concorrência (caso CE v. Kingdom of Netherlands - PTT Post BV–

                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                           Such abuse may, in particular, consist in: (a) directly or indirectly imposing unfair purchase or selling prices or other unfair trading conditions; (b) limiting production, markets or technical development to the prejudice of consumers; (c) applying dissimilar conditions to equivalent transactions with other trading parties, thereby placing them at a competitive disadvantage; (d) making the conclusion of contracts subject to acceptance by the other parties of supplementary obligations which, by their nature or according to commercial usage, have no connection with the subject of such contracts.”

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90/16/EEC), a CE decidiu, em síntese, que referida lei holandesa era

incompatível com o Artigo 90(1) e com o Artigo 86, ambos do Tratado da CE.

Basicamente, a lei holandesa contestada pela CE previa que, a partir de

Dezembro de 1988, seria reservada à PTT Post BV (empresa controlada pelo

governo holandês) a coleta, transporte e distribuição de itens postais

expressos (i.e., express mails), cujos pesos equivalessem a até 500 gramas,

e cujos preços não excedessem Fl 11,9 (para destinos em Estados-

membros) e Fl 17,5 (para destinos em terceiros países não integrantes da

UE). Além disso, aqueles agentes privados que pretendessem permanecer

no mercado de express mail na Holanda deveriam registrar anualmente suas

tarifas perante a autoridade holandesa e deveriam prestar um serviço de

qualidade superior à PTT Post BV.170

Alguns pontos dessa decisão são bem interessantes, e merecem

comentário. O primeiro deles refere-se ao fato de que os limites de preços

colocados pela lei eram superiores aos preços praticados pelos private

express couriers em referido mercado na Holanda. O segundo ponto recai

sobre os fundamentos econômicos utilizados pela autoridade holandesa, os

quais podem ser resumidos em: (i) o monopólio legal estaria limitado ao

quanto necessário para a prestação do serviço universal; (ii) tal monopólio

existia desde 1807 e o serviço de express mail merece proteção legal; e (iii)

                                                                                                                         170   EU. Commission Decision of 20 December 1989 concerning the provision in the Netherlands of express delivery services 90/16/EEC (case EC v. Kingdom of Netherlands - PTT Post BV – 90/16/EEC). Disponível em: <http://www.jcampbell.com/Reference/eu/198912_nl_express.pdf>. Acesso em: 6 Mar. 2011: “The measure in question [Subject matter] - By Articles 2 and 12 of the Law of 26 October 1988 on the operation of the postal service (postal code), the Netherlands prohibit all undertakings other than the franchise of the postal service, i.e. the undertaking PTT Post BV, from collecting, transporting and distributing letters weighing up to 500 grammes, unless the undertakings satisfy all three of the following conditions: they must be registered; they must provide a significantly better service than that provided by the Post Office as regards delivery times and supervision during carriage; the price for such services must be not lower than the minimum established by the implementing Decree (algemene maatregel van bestuur). The Government of the Netherlands adopted a Decree on 19 December 1988 (Besluit minimumtarieven koeriersdiensten) fixing the minimum in question at Fl 11,90 for inland deliveries or to other Member States and at Fl 17,5 for the service to non-Community countries. The minimum is not applicable to the PTT Post BV or to its EMS service. The amounts laid down by the Decree are higher than some rates charged previously by private express couriers operating in the Netherlands, both for deliveries with the Netherlands and for those to other Member States.”  

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sem as receitas provenientes do mercado de express mail, não seria possível

perfazer a prestação de serviço universal.

Em apertada síntese, a CE não encontrou bases fáticas para acatar os

argumentos de defesa expostos pelas autoridades holandesas, notadamente

com relação à necessidade de reserva legal do mercado de express mail

para a consecução do serviço universal, pois, ao avaliar o cenário anterior à

referida lei, a PTT Post BV registrou crescimento geral de receitas face ao

ambiente de livre concorrência para o express mail. Assim, entendeu a CE

que referida lei implicaria abuso da posição dominante detida pela PTT Post

BV nos mercados postais na Holanda, bem como que representaria

imposição de condições e preços injustificáveis, bem como caracterizaria

restrição na oferta de serviços no mercado holandês com reflexos em outros

Estados-membros. A impossibilidade de oferta alternativa de express mail,

bem como a preços mais competitivos (i.e., menores), dentre outros reflexos,

foram sopesados pela CE para a conclusão de que tal lei afetaria sobremodo

o bem-estar dos consumidores na UE, pois que não teriam como acessar

serviços alternativos e menos custosos que os ofertados pela empresa

monopolista holandesa.171

                                                                                                                         171 EU. Commission Decision of 20 December 1989 concerning the provision in the Netherlands of express delivery services 90/16/EEC (case EC v. Kingdom of Netherlands - PTT Post BV – 90/16/EEC). Disponível em: <http://www.jcampbell.com/Reference/eu/198912_nl_express.pdf>. Acesso em: 6 Mar. 2011: “(…) [Netherlands’ defense arguments] - By letter dated 16 January 1989, the Netherlands authorities also replied to the substance of the questions put by the Commission. Their arguments are as follows: the legal monopoly is limited to what is necessary in order to provide the general postal service; the express service also deserves protection and the monopoly has existed since 1807. (…) [Abuse of dominant position] - An abuse of a dominant position within the meaning of Article 86 is committed where an undertaking holding a dominant position on a particular market reserves to itself or to an undertaking belonging to the same group an ancillary activity which might be carried out by another undertaking as part of its activities on a neighbouring but separate market, with the possibility of eliminating all competition from such an undertaking.1 The effect of the new Law is to reserve for. PTT Post BV the section of the express delivery market concerning mail handled for a charge not exceeding Fl 11,9 in which, prior to the entry into force of the Law, it competed against private express delivery undertakings. The Law of 26 October and the Decree of 19 December 1988 thus extend the dominant position of PTT Post BV to the express delivery market, which is separate from that of the basic service. In future, PTT Post BV will hold a dominant position on this market not only because of its infrastructure which covers the whole of the Netherlands, but also because the Law prohibits its competitors from providing an express service for less than Fl 11,9, thus reserving a whole section of that market for itself. Competition on the remaining part of the market does not exclude such a dominant position since PTT Post BV is able to adopt a market strategy, which takes no account of that competition, without thereby suffering any

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Essa decisão da CE sinalizou, em síntese, que não seriam toleradas

normas jurídicas nacionais que ampliassem o escopo material dos diferentes

monopólios postais presentes nos diferentes países da UE, mas ao contrário,

passaria a cada vez mais considerar com profundidade os argumentos de

necessidade de reserva de receitas para justificar a reserva legal de

mercados. Um aspecto interessante que emerge é a semelhança da lei

holandesa com a exceção do extremely urgent letters nos EUA, precisamente

no tocante ao aspecto de fixação de preço mínimo aos concorrentes, preço

este superior ao praticado pelos monopolistas. Para lembrar, nos EUA a

USPS permite às empresas privadas como FEDEX e UPS operarem no

mercado de express mail, desde que ofertem seus produtos a preços duas

vezes superiores ao do First-Class Mail, o que não enseja verdadeiramente

                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                           detrimental effects. There will be no constraints on any strategy PTT Post BV adopts with regard to the express delivery service it offers major customers since its competitors will not be able to offer discounts below the legal minimum. (…) [Imposition of unfair prices and conditions] – (…) numerous undertakings made use of private express courier services. They considered that the Post Office services did not cater as adequately for their needs, as regards either price or quality. Those undertakings now no longer have the choice of using the post office services or private couriers for the express delivery of mail weighing up to 500 grammes in the category of prices not exceeding FL 11,9. The Law requires them to use the PTT Post BV express services on the terms laid down by the latter, whether or not they correspond to their needs. (…) [Restriction of supply] - The new measure will adversely affect the number of providers and the quality of the service. Since private couriers can no longer provide their services at a price below Fl 11,90, their customers no longer have a service of the same quality, as the Netherlands post office and its EMS service are not as yet offering an express delivery service of comparable reliability or speed. Customers therefore clearly suffer from a disadvantage since, if they wish to continue to use this service, it will cost them at least Fl 11,9 per item, instead of the lower rate charged previously. Furthermore, the measure prevents post office competitors which provide an express service for consignments weighing more than 500 grammes from offering a full range of fast delivery services and therefore places them at a disadvantage in comparison with the post office. The Netherlands post office can take advantage of the fact that it alone is able to provide services for less than the minimum price in order to provide its customers with other services at a price approaching their marginal cost, whereas its competitors will have to charge all their collection and transport costs against solely those services not covered by the monopoly. By reserving the market for express deliveries at a price below the legal minimum to the Post Office, the Netherlands are creating discrimination even in the services that are not reserved. (…) [Decision] - Articles 2 and 12 of the Netherlands Law of 26 October 1988 on the operation of the postal service, together with the provisions of the implementing Decree of 19 December 1988 which reserves for PTT Post BV the express collection, transport and distribution of postal items weighing up to 500 grammes, at a price not exceeding Fl 11,9 for EEC destinations, and Fl 17,5 for non-EEC destinations, and the obligation to register all tariffs beforehand imposed by the Decree of 12 May 1989, are incompatible with Article 90 (1) of the EEC Treaty, read in conjunction with Article 86 of that Treaty.”

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um regime de competição entre os prestadores privados e a USPS, haja vista

que não podem competir verdadeiramente por preços.172 Essa foi uma das

intenções da lei holandesa, a qual, de forma diversa dos EUA, fora atacada

pela CE e não chegou sequer a viger.

Em Agosto de 1990, a tendência registrada no caso CE v. Kingdom of

Netherlands - PTT Post BV – 90/16/EEC se confirmou no caso CE v.

Kingdom of Spain – Ordenanza Postal of 19 May 1960 – 90/456/EEC. Nesse

caso, a CE decidiu que um conjunto de leis espanholas que reservavam o

mercado de express mail de itens postais até 2 quilos para a empresa

monopolista controlada pelo governo daquele país eram incompatíveis com o

Tratado da CE. Em síntese, tais leis foram apontadas como incompatíveis

com o Tratado da CE por uma associação de empresas courier da Espanha

em 1987, a partir do que a CE abriu uma investigação a qual, ao final, acabou

por apontar que tais normas não eram compatíveis com o Artigo 90(1) e com

o Artigo 86, ambos do Tratado da CE.173

                                                                                                                         172 EUA. Code of Federal Regulations (C.F.R.). Title 39. Section 320.6(c): “It will be conclusively presumed that a letter is extremely urgent and is covered by the suspension if the amount paid for private carriage of the letter is at least three dollars or twice the applicable U.S. postage for First-Class Mail (including priority mail) whichever is the greater. If a single shipment consists of a number of letters that are picked up together at a single origin and delivered together to a single destination, the applicable U.S. postage may be computed for purposes of this paragraph as though the shipment constituted a single letter of the weight of the shipment. If not actually charged on a letter-by-letter or shipment-by-shipment basis, the amount paid may be computed for purposes of this paragraph on the basis of the carrier's actual charge divided by a bona fide estimate of the average number of letters or shipments during the period covered by the carrier's actual charge.” Disponível em: <http://ecfr.gpoaccess.gov/cgi/t/text/text-idx?c=ecfr&sid=470486850326a420ef5c894e41ae08c0&rgn=div8&view=text&node=39:1.0.1.5.41.0.1.6&idno=39>. Acesso em: 8 Jan. 2011. 173 EU. Commission Decision of 1 August 1990 concerning the provision in Spain of international express courier services (CE v. Kingdom of Spain – Ordenanza Postal of 19 May 1960 – 90/456/EEC). Disponível em: <http://www.jcampbell.com/Reference/eu/199008_spain_express.pdf>. Acesso em: 6 Mar. 2011: “The measure in question [Subject matter] - Pursuant to Articles 10 to 13 of the Ordenanza Postal adopted by Decree No 1113/1960 of 19 May 19601 and Articles 19 to 22 of the Regulation on postal services adopted by Decree No 1653/1964 of 14 May 19642, as amended by the Ministerial Decree of 12 July 1966,3 Spain prohibits all undertakings other than the Post Office from collecting, transporting or distributing letters1 - a letter being any written document of a personal and immediate nature, including commercial, legal or administrative documents - from one place to another weighing less than two kilograms, as well as post-cards. The prohibition prevents private courier services from providing an international express courier service for written or other documents defined or regarded as letters as this service is exclusively reserved for the Post Office. (…) [Decision] - The provisions of Articles 10 to 13 of the Ordenanza Postal adopted by Decree No 1113/1960 of 19 May 1960 and Articles 19 to 22 of the Regulation on Spanish postal

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100  

Em suma, as autoridades espanholas utilizaram três argumentos de

defesa: (i) o serviço postal espanhol não poderia ser considerado como um

“undertaking”, isto é, como uma “pessoa” sujeita à aplicação da regra contida

no Artigo 90(2)174 do Tratado da CE tendo em vista que integrava o governo

espanhol; (ii) o equilíbrio financeiro do serviço postal espanhol estaria

ameaçado caso o mercado mais rentável – international express mail – fosse

aberto à livre concorrência; e (iii) não haveria um mercado específico de

express mail, sendo este integrante do mercado postal, em uma acepção

mais genérica. A CE não encontrou fundamentos para acolher nenhum dos

argumentos de defesa colocados pelas autoridades espanholas, sendo o

primeiro incompatível com a regra do Artigo 90(1) do Tratado da CE, pelo

qual basta a oferta de serviços em um mercado para que o ofertante seja

considerado como um “undertaking”.

Assim, ainda segundo o Artigo 90(1), undertaking para os quais

tenham sido atribuídos direitos exclusivos estão sujeitos às regras de

antitruste contidas no Artigo 86 do Tratado da CE. Com relação ao segundo

argumento de defesa, a CE encontrou evidências de que o mercado de

international express mail – pontuado como o mais rentável pelas autoridades

espanholas – teria representado apenas 0,00039% do total das atividades

postais desempenhadas pelo serviço postal espanhol, o qual, mesmo

enfrentando alguma competição, no plano internacional, de empresas como

DHL, TNT, UPS e FEDEX, registrou crescimento de 35% em suas receitas

anuais. O último argumento foi rapidamente desconsiderado diante dos

                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                           services adopted by Decree No 1653/1964 of 14 May 1964 which reserve for the Post Office the international express collection, transport and distribution of letters are incompatible with Article 90 (1) in conjunction with Article 86 of the EEC Treaty.” 174 EU. Treaty establishing the European Community (EEC Treaty). Version of 2002. Disponível em: <http://www.ena.lu/>. Acesso em: 9 Mar. 2011: “Article 90 1. In the case of public undertakings and undertakings to which Member States grant special or exclusive rights, Member States shall neither enact nor maintain in force any measure contrary to the rules contained in this Treaty, in particular to those rules provided for in Article 6 and Articles 85 to 94. 2. Undertakings entrusted with the operation of services of general economic interest or having the character of a revenue-producing monopoly shall be subject to the rules contained in this Treaty, in particular to the rules on competition, in so far as the application of such rules does not obstruct the performance, in law or in fact, of the particular tasks assigned to them. The development of trade must not be affected to such an extent as would be contrary to the interests of the Community. 3. The Commission shall ensure the application of the provisions of this Article and shall, where necessary, address appropriate directives or decisions to Member States.”  

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101  

precedentes sobre definição de mercados relevantes, os quais, no mínimo,

apontavam uma diferença clara em termos de preços e qualidade entre os

serviços postais comuns e os serviços postais expressos.175

                                                                                                                         175 EU. Commission Decision of 1 August 1990 concerning the provision in Spain of international express courier services (CE v. Kingdom of Spain – Ordenanza Postal of 19 May 1960 – 90/456/EEC). Disponível em: <http://www.jcampbell.com/Reference/eu/199008_spain_express.pdf>. Acesso em: 6 Mar. 2011: “The measure in question (…) [Spain’s defense arguments] - the Post Office is not an undertaking and, even if it were, Article 90 (2) of the EEC Treaty would be applicable; the financial equilibrium of the Post Office would be threatened if free competition were allowed in the provision of the most profitable postal services such as the international express service; there is no specific postal market for express deliveries. (…) [Threat to financial equilibrium] - Spain considers that if free competition were allowed in the provision of an international express courier service, it would jeopardize the financial equilibrium of the Post Office which is essential for the operation of the tasks assigned to it. In 1988, however, the Post Office's international express service - 'EMS-IPC' - handled only 20 000 consignments, representing only 0,00039 % of the 5 075 million objects handled by the Post Office. At present, the international express service in question forms part of the EMS-IPC network, which is operated by a company governed by private law competing against private international express couriers such as DHL, TNT, UPS and Federal Express. Although the network is faced with some competition, its revenue grows annually by 35 %. (…) [Abuse of dominant position] - An abuse of a dominant position within the meaning of Article 86 is committed where an undertaking holding a dominant position on a particular market reserves to itself or to an undertaking belonging to the same group, without any objective necessity, an ancillary activity which might be carried out by another undertaking as part of its activities on a neighbouring but separate market, with the possibility of eliminating all competition from such an undertaking. Articles 10 to 13 of the Ordenanza Postal of 19 May 1960 and Articles 19 to 22 of the Regulation on postal services of 14 May 1964 thus reserve for the Post Office, according to the interpretation of the Spanish authorities, not only the basic letter collection, transport and distribution service but also the new international express service for letters. The Spanish Post Office provides an international express courier service, which is limited in that it does not cover the entire national territory, nor all of the countries in the world. On the one hand, the service on Spanish territory is only provided from post offices situated in the capital city of each province and in certain other large towns. On the other, the international express courier network in which the Spanish Post Office participates - the EMS-IPC network - covers only the largest European countries and certain others (Canada and the United States). In this situation, the demand for door-to-door express courier services is not satisfied in respect of customers resident outside the provincial capitals and a few other large towns, nor as regards customers living in countries or cities not served by the EMS-IPC network. Due to the monopoly held by the Spanish Post Office, competitors are unable to offer a service to such customers. In addition, users of international express courier services for sending letters to or from Spanish territory are denied the choice of services offered by other express delivery companies, which compete at international level with the Express Mail Services-International Post Corporation but are excluded from the Spanish market, although their services might be better suited to users' specific needs and requirements as regards prices and quality. Consequently, the State measure in question, together with the behaviour of the Spanish Post Office, has the effect of limiting supply and technical development within the meaning of Article 86, thus constituting an infringement of Article 90 in conjunction with Article 86 (b) of the Treaty.”

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102  

Em Dezembro de 1991, a CE analisou e aprovou, no âmbito do

controle de estruturas (i.e., merger review), a formação de uma Joint Venture

(JV) pela empresa TNT Ltd. (TNT), de um lado, e cinco empresa

monopolistas de serviços postais, controladas por diferentes Estados, quais

sejam, Canada Post Corporation (Canada Post), Deutsche Bundespost

POSDIENST (DBP POSTDIENST), La Poste, PTT Post BV (PTT Post) e

Sweden Post, sendo tais estatais representadas na JV por uma empresa

formada especificamente para esse propósito, a GD NET BV (GD Net).

Nesse caso, mais conhecido caso TNT / Canada Post, DBP Postdienst, La

Post, PTT Post & Sweden Post, a CE, embora tenha decidido por sua

compatibilidade com o Tratado da CE, impôs algumas restrições

comportamentais, as quais, por sua vez, já sinalizavam outros pontos de

preocupação da CE com relação aos entraves para a liberalização dos

serviços postais à livre concorrência na UE: (i) eliminação de subsídios

cruzados (cross-subsidies)176; (ii) viabilização de acesso em bases

isonômicas e não discriminatórias (i.e., em condições similares às

contratadas entre a JV e os serviços postais nacionais) de concorrentes a

serviços postais reservados (ou em regime de monopólio legal), e, da mesma

forma, viabilização de acesso a redes postais públicas (operadas em regime

de exclusividade pelas empresas monopolistas nacionais); (iii) para fins de

                                                                                                                         176 Sobre o conceito de subsídio cruzado, ver International Institute for Sustainable Development (IISD). Global Studies Initiative. Disponível em: <http://www.globalsubsidies.org/en/resources/a-subsidy-primer/cross-subsidies>. Acesso em: 5 Mar. 2011: “A cross subsidy is a market transfer induced by discriminatory pricing practices within the scope of the same enterprise or agency. Typically it exists when a government-owned enterprise, such as a public utility, uses revenues collected in one market segment to reduce prices charged for goods in another. Some definitions also include similar practices carried out by private firms, as when an integrated airline allocates part of the costs of its activities in a highly contested geographical or product market (e.g., the transport of freight) to another market (e.g., passenger transport) that is better able to bear those costs. For example, some airports cross-subsidize costs associated with serving airline passengers through sales on duty-free goods. One of the most common forms of cross subsidy is that between consumers of electricity and consumers of irrigation water. Managers of large hydro-electric works that store and channel water for irrigation as well as generate electricity have to decide how to allocate the costs that are common to both activities (notably, the construction and maintenance of the dam and reservoir) between farmers and buyers of electricity. Government regulations will often dictate that an even smaller portion of the costs be allocated to irrigation than would be efficient according to established pricing principles. Not all instances of price discrimination are evidence of cross subsidies, however. For example, differences in the volume (if there are economies of scale in delivery) and interruptibility of service, among other factors, can lead to different price schedules for different classes of customers.”

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monitoramento, aplicação de regras de transparência, pelas quais as partes

da JV deveriam registrar, durante um ano a contar da decisão da CE, todas

as operações entre a JV e os serviços postais nacionais bem como entre

estes e os concorrentes da JV, de modo a viabilizar a análise do

cumprimento dessa norma por parte da CE e das autoridades regulatórias

nacionais competentes; e (iv) viabilização de acesso em bases isonômicas e

não discriminatórias (i.e., em condições similares às contratadas entre a JV e

os serviços postais nacionais) de concorrentes a serviços de entrega de itens

postais e de bens ou encomendas (parcel177 services).178

                                                                                                                         177 Sobre o conceito de parcel service, ver EU. Green Paper on the development of the single market for postal services. COM (91) 476. Disponível em: <http://aei.pitt.edu/1173/1/postal_gp_COM_91_476.pdf>. Acesso em: 25 Fev. 2011: “(…) Standard service refers to the universal service of basic postal items. These include both communications (letters, postcards and printed papers) and goods-bearing items (packets and parcels).”  178 EU. Commission Decision of 02.12.1991 declaring a concentration to be compatible with the common market according to Council Regulation (EEC) No 4064/89 - Case No IV/M.102 - TNT / CANADA POST, DBP POSTDIENST, LA POSTE, PTT POST & SWEDEN POST. Disponível em: <http://www.jcampbell.com/Reference/eu/199112_gdnet_jv.pdf>. Acesso em: 26 Fev. 2011: “Notification of 28 October 1991 pursuant to Article 4 of Council Regulation No. 4064/89. The proposed operation concerns a joint venture (JVC) between, on the one hand, TNT Ltd (TNT), and on the other hand, five postal administrations - Canada Post Corporation (Canada Post), Deutsche Bundespost POSTDIENST (DBP POSTDIENST), La Poste, PTT Post BV (PTT Post) and Sweden Post - which will participate in the JVC through GD NET BV (GD Net), a company set up for this purpose. (…) Unless the postal organisation concerned can demonstrate to the reasonable satisfaction of the Commission or, as the case may be, the competent national regulatory bodies (including national courts) that it does not cross-subsidise from its exclusive concession the ITCD related services it provides to the JVC, it will, if requested, provide these services to competitors of the JVC on terms and conditions which are similar to those offered to the JVC, to the extent that the transactions are equivalent. Account will be taken of factors including but not limited to, volume, range, and frequency of service to be performed, features, area and density of geographic coverage, financial compensation, liability, and payment terms, and length of contract. In order to allow verification with respect to these assurances, the four postal organisations will keep records of the terms and conditions, on which they have provided ITCD related services to third parties, including the JVC, available for inspection on a confidential basis by the Commission or the competent national regulatory bodies (excluding the national courts) for a period of one year from the relevant event. In addition, the postal organisations recognise that they are subject notably to non-discrimination obligations as set forth in national postal and competition laws or in the competition rules (Article 85-90) of the EEC Treaty. For greater certainty, nothing in this undertaking shall be construed as an acknowledgement of a dominant position by the postal organisations with respect to any of the services covered by this undertaking. In order to allay any concerns that the remail activities of the JVC might be favoured by any or all of the postal organisations participating in GD Net, the four European postal organisations have given the following assurances to the EEC Commission. If they act as `B' countries in the remail chain, they will, if requested, provide mail and parcel services to competitors of the JVC on terms and conditions, which are similar to those offered to the JVC, to the extent that the transactions are equivalent. Account will be taken of factors including but not limited to, volume, range, and frequency of service to be performed,

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Em junho de 1992, a CE publicou um Green Paper no qual expressou

sua intenção de assegurar a abertura dos serviços postais à livre

concorrência, já incorporando as principais variáveis verificadas nos casos

concretos como entraves ao estabelecimento do regime concorrenciais nos

mercados postais, quais sejam, a delimitação precisa das abrangências dos

monopólios legais de serviços postais, a definição de regras de acesso, em

bases isonômicas e não discriminatórias, às redes e serviços postais

operados pelas empresas monopolistas, a eliminação dos subsídios cruzados

e a aplicação de regras de transparência como meio de viabilizar o

monitoramento de tais players por parte da CE e autoridades regulatórias

nacionais. Embora boa parte dos serviços postais já desfrutasse à época de

um regime de livre concorrência, notadamente aqueles revestidos de maior

valor agregado como os express mail (i.e., entregas urgentes, mercado onde

atuam empresas como FEDEX, UPS, DHL dentre outras), empresas

monopolistas detidas pelos governos nacionais se encarregavam da grande

maioria dos serviços postais básicos. O Green Paper da CE também

registrou a importância de se harmonizar regras sobre qualidade e preços

razoáveis para os serviços postais na UE, bem como, por outro lado,

reconheceu que para se viabilizar a prestação de um serviço universal seria

necessário reservar-se, ainda que em caráter limitado, bem definido e por um

período, uma parcela dos serviços postais para a prestação por um único

agente econômico (ou seja, em regime de monopólio legal).179

                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                           features, area and density of geographic coverage, financial compensation, liability, and payment terms, and length of contract.” 179 EU. Green Paper on the development of the single market for postal services. COM (91) 476. Disponível em: <http://aei.pitt.edu/1173/1/postal_gp_COM_91_476.pdf>. Acesso em: 25 Fev. 2011: “(…) The main objectives for the Community's postal sector are (…) 1. TO ESTABLISH A COMMUNITY DEFINITION OF THE UNIVERSAL POSTAL SERVICE REQUIRED; THEN TO ENSURE ITS PROVISION THROUGHOUT THE COMMUNITY A T PRICES AFFORDABLE TO ALL THROUGH THE ESTABLISHING (INASMUCH AS IT WAS NEEDED IN MEMBER STATES INDIVIDUALLY) OF A SET OF RESERVED SERVICES WHICH WOULD CONFER SOME SPECIAL AND EXCLUSIVE RIGHTS, IN ORDER TO MAINTAIN THE RESOURCES NECESSARY FOR THE UNDERTAKING OF THE PUBLIC SERVICE MISSION IN SOUND CONDITIONS; A T THE SAME TIME, CONSISTENT WITH THIS OBJECTIVE, TO HA VE THE LARGEST POSSIBLE PART OF THE SECTOR OPERATING IN FREE COMPETITION. 2. TO HAVE COMMON OBLIGATIONS FOR THE UNIVERSAL SERVICE OPERATORS OF THE COMMUNITY IN RESPECT OF THE SPECIAL AND EXCLUSIVE RIGHTS GRANTED TO THEM BY THE RESERVED SERVICES IN ORDER TO PROVIDE UNIVERSAL SERVICES, IN PARTICULAR WITH REGARD TO THE QUALITY OF SERVICE PROVIDED.

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Como resultado do Green Paper e dos casos que a CE vinha

enfrentando (alguns dos quais serão estudados mais à frente), em janeiro de

1998, foi publicada a Diretiva 97/67, a qual criou uma série de regras voltadas

principalmente ao desenvolvimento do mercado comunitário para serviços

postais com foco no aumento da qualidade dos serviços como um todo e

tendo como princípio a harmonização normativa.180

Assim, além das normas gerais de defesa da concorrência contidas no

Tratado de Roma, e mais recentemente, no TFEU, os princípios e normas

específicos da abertura do setor postal à livre concorrência encontram-se

previstos na Diretiva 97/67181, bem como na Diretiva 2002/39182, que

                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                           3. TO MAKE ANY NECESSARY EFFORTS TOWARDS COMMUNITY COHESION THROUGH APPROPRIATE HARMONISATION MEASURES. (…) These main policy objectives therefore treat general regulatory issues, the obligations of the reserved service provider and, thirdly, the subjects of harmonisation and cohesion. Under these three headings, the main policy options break down into the detailed options shown (…) PART I: GENERAL REGULATORY ISSUES 1. ESTABLISH AND ENSURE THE COMMUNITY SET OF UNIVERSAL SERVICES 2. DEVELOP THE DEFINITION OF UNIVERSAL AND RESERVED SERVICES 3. ENSURECOMP A TIBILITY OF OTHER MEMBER STATE COMMITMENTS WITH COMMUNITY LEGISLATION AND POLICIES 4. SEPARATE REGULATORY AND OPERATIONAL FUNCTIONS PARTII: OBLIGATIONSOFUNIVERSALSERVICEPROVIDER 5. ACCESS CONDITIONS TO UNIVERSAL SERVICES TO BE SAME FOR ALL 6. TARIFFS OF UNIVERSAL SERVICES TO BE RELATED TO COSTS 7. INTER-ADMINISTRATION COMPENSATION TO REFLECT DELIVERY COSTS 8 SERVICE STANDARDS FOR UNIVERSAL SERVICES TO BE SET AND PERFORMANCE MONITORED PARTIII: HARMONISATIONANDCOHESION 9. HARMONISATION APPROPRIATE WHERE BENEFICIAL TO THE CUSTOMERS 10. COHESION ASPECTS TO BE TAKEN INTO ACCOUNT”.  180 EU. Directive 97/67/EC of The European Parliament and of The Council of 15 December 1997 on common rules for the development of the internal market of Community postal services and the improvement of quality of service. Disponível em: < http://eur-lex.europa.eu/LexUriServ/LexUriServ.do?uri=OJ:L:1998:015:0014:0025:EN:PDF>. Acesso em: 4 Nov. 2010. Nesse sentido, ver GERADIN, D.; HENRY, D. Regulatory and Competition Law Remedies in The Postal Sector. Remedies in Network Industries: EC Competition Law vs. Sector-Specific Regulation. Damin Geradin (Editor). Intersentia. Antwerp, Oxford, UK, 2004, p.125: “European Community law has played a pivotal role in opening to competition economic sectors previously under the control of public monopolies. As with other sectors such as telecommunications, air transport, electricity, gas, and rail, the postal sector has succumbed to the wave of liberalization. Liberalization in the postal sector has forced stagnant state-owned monopolies to modernise themselves in order to compete with new entrants which are nibbling at the fringes with innovative business strategies.” 181   EU. Directive 97/67/EC of The European Parliament and of The Council of 15 December 1997 on common rules for the development of the internal market of Community postal services and the improvement of quality of service. Disponível em: <http://eur-lex.europa.eu/LexUriServ/LexUriServ.do?uri=OJ:L:1998:015:0014:0025:EN:PDF>. Acesso em: 4 Nov. 2010.  182  EU. Directive 2002/39/EC of The European Parliament and of The Council of 10 June 2002 amending Directive 97/67/EC with regard to the further opening to competition of

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derrogou e emendou a Diretiva 97/67, e, posteriormente, na Diretiva

2008/6183 (que emendou / derrogou as duas Diretivas anteriores), normas

estas que conferiram aplicação, prorrogaram a validade e concretizaram a

evolução da liberalização dos serviços postais na UE.

Ressalta-se que um ponto interessante que serviu de fundamento para

a elaboração do presente capítulo neste trabalho caracteriza-se pelo fato de

que, independentemente das motivações à escolha do modelo de monopólio

para os serviços postais em cada jurisdição na UE, pode-se observar

semelhantes padrões comportamentais por parte dos agentes econômicos

monopolistas em várias jurisdições na UE de forma semelhante ao que se

passa nos EUA e, como se verá, no Brasil. E, frise-se, essa linha

comportamental anticoncorrencial se intensifica na medida em que as

empresas monopolistas possuem maior conexão com os poderes públicos

locais, leia-se, quanto mais ligadas ao Estado e favorecidas pelo Estado,

maior é a amostragem de problemas para a concorrência.

Dessa forma, passa-se a analisar as principais normas comunitárias

relativas aos serviços postais e à sua abertura à livre concorrência, sua

evolução normativa e jurisprudencial para que seja possível avaliar-se as

medidas normativas e casuísticas adotadas, tudo com o intuito de se avaliar

quais são os principais problemas enfrentados no campo concorrencial e se

tais problemas realmente estão ligados à escolha do modelo de monopólio

para os serviços postais, bem como o eventual favorecimento (ou tratamento

diferenciado) por parte dos Estados-Membros às respectivas empresas

monopolistas. Em razão do grande número de reformas nos sistemas postais

nacionais ocorridas na UE, bem como dado o elevado número de países e a

diversidade de sistemas nacionais (em termos de harmonização jurídica,

regulatória e econômica), o presente trabalho não se propôs a exaurir o tema

no âmbito da Europa, mas sim, a título de ilustrar os tipos de problemas

                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                           Community postal services. Disponível em: <http://eur-lex.europa.eu/LexUriServ/LexUriServ.do?uri=OJ:L:2002:176:0021:0025:EN:PDF>. Acesso em: 4 Nov. 2010. 183 Directive 2008/6/EC of The European Parliament and of The Council of 20.02.2008 amending Directive 97/67/EC with regard to the accomplishment of the internal market of Community postal. Disponível em: <http://ec.europa.eu/internal_market/post/doc/legislation/2008-06_en.pdf>. Acesso em: 25 Fev. 2011.  

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concorrenciais decorrentes do monopólio para os serviços postais,

selecionou-se os principais casos analisados em âmbito comunitário.

3.3 Normas jurídicas e jurisprudência

As Diretivas 97/67184, 2002/39185e 2008/06186desempenharam e ainda

desempenham um papel muito importante na implementação de concorrência

nos serviços postais no âmbito da UE. Afora os princípios especificamente

aplicados ao setor postal, tais normas, basicamente, tratam de fundamentos

tanto ao funcionamento do serviço postal como um todo dentro da UE,

quanto à introdução do regime de livre concorrência em tais mercados, a

saber: (a) delimitação do escopo (ou abrangência) das áreas reservadas às

empresas monopolistas; (b) regras para acesso a redes de distribuição ou

prestação de serviços postais; (c) princípios para a definição de tarifas (ou

preços) para alguns tipos de serviços, notadamente àqueles sujeitos à regras

de universalização, ou Universal Service Obligations (USO); (d) critérios de

transparência contábil sobre USO e sobre serviços sujeitos às regras de livre

concorrência, principalmente para limitar subsídios cruzados (i.e., cross-

subsidization187) entre mercados reservados para monopólios e mercados

                                                                                                                         184   EU. Directive 97/67/EC of The European Parliament and of The Council of 15 December 1997 on common rules for the development of the internal market of Community postal services and the improvement of quality of service. Disponível em: <http://eur-lex.europa.eu/LexUriServ/LexUriServ.do?uri=OJ:L:1998:015:0014:0025:EN:PDF>. Acesso em: 4 Nov. 2010.  185  EU. Directive 2002/39/EC of The European Parliament and of The Council of 10 June 2002 amending Directive 97/67/EC with regard to the further opening to competition of Community postal services. Disponível em: <http://eur-lex.europa.eu/LexUriServ/LexUriServ.do?uri=OJ:L:2002:176:0021:0025:EN:PDF>. Acesso em: 4 Nov. 2010. 186 Directive 2008/6/EC of The European Parliament and of The Council of 20.02.2008 amending Directive 97/67/EC with regard to the accomplishment of the internal market of Community postal. Disponível em: <http://ec.europa.eu/internal_market/post/doc/legislation/2008-06_en.pdf>. Acesso em: 25 Fev. 2011. 187 Sobre o conceito de subsídio cruzado para a CE, ver Comunicação da Comissão de 6.02.1998 relativa à aplicação das regras de concorrência ao setor postal e à apreciação de certas medidas estatais referentes aos serviços postais (98/C 39/02). Jornal Oficial nº 039 de 6 fev 1998, p. 0002-0018. Disponível em: <http://eur-lex.europa.eu/LexUriServ/LexUriServ.do?uri=OJ:C:1998:039:0002:0018:PT:PDF>. Acesso em: 6 Dez. 2010: “3. SUBVENÇÕES CRUZADAS. a)!Princípios de base. 3.1. As subvenções cruzadas significam que uma empresa imputa a totalidade ou parte dos custos das suas actividades num mercado geográfico ou de produto às suas actividades num outro mercado geográfico ou de produto. Em certas circunstâncias, a prática de subvenções cruzadas no sector postal, em que quase todos os operadores desenvolvem actividades

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sujeitos a regimes de livre concorrência; e (e) terminal dues – espécie de

tarifa que o operador postal responsável pelo envio de uma correspondência

internacional (dentro da UE), i.e., cross-border mail, deve pagar ao operador

postal do país receptor da correspondência para sua respectiva entrega ao

destinatário.188 Boa parte dos serviços postais no âmbito de UE já estão

inseridos em regime de livre concorrência189, razão pela qual torna-se

interessante analisar brevemente trechos de tais diplomas normativos para

que se possa avaliar, face ao cenário normativo da UE, em que medida a

experiência Européia poderia ser utilizada para favorecer a análise e solução

de alguns dos principais problemas concorrenciais existentes nos mercados

postais brasileiros e, portanto, em que medida as lições apreendidas na UE

poderiam sustentar reformas e/ou decisões (judiciais e/ou administrativas) no

Brasil que, de certa forma, antecipem efeitos econômicos e sociais benéficos

que somente puderam ser experimentados na Europa após muitos anos de

esforços da CE no sentido de abrir os mercados postais à livre concorrência.

Basicamente, é possível sintetizar os principais objetivos das normas

jurídicas da UE, bem como as decisões da CE no campo antitruste, no

sentido de proporcionar a gradativa liberalização dos mercados postais na

UE à livre concorrência. Assim, entende-se que toda a matriz normativa e

jurisprudencial desenvolvida ao longo de mais de 20 anos (se contarmos a

partir da decisão do caso CE v. Kingdom of the Netherlands - PTT Post BV –                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                            reservadas e não reservadas, é susceptível de falsear a concorrência, permitindo, por exemplo, apresentar propostas com preços inferiores a outros concorrentes graças não à eficiência (incluindo economias de escala) e ao desempenho, mas graças a subvenções cruzadas. É assim crucial para o desenvolvimento do sector postal evitar as subvenções cruzadas que conduzem a uma concorrência desleal.” 188 Dada a semelhança em termos conceituais com o mercado de telecomunicações, mais precisamente de telefonia, utilizar-se-á por analogia, com o propósito de se tornar mais rápida a compreensão, o termo “tarifa de interconexão entre redes postais” para o termo “terminal due”. A tarifa de interconexão de rede em telefonia pode ser entendida, em síntese, como o preço pago pela operadora de telefonia em cuja rede se originou a chamada pelo uso da rede de outra operadora a fim de que a chamada originada em outra rede possa chegar ao destino pretendido pelo consumidor. Segundo a Lei Geral de Telecomunicações (Lei nº 9.472/97): “Art. 147. É obrigatória a interconexão às redes de telecomunicações a que se refere o art. 145 desta Lei, solicitada por prestadora de serviço no regime privado, nos termos da regulamentação. (…) Art. 152. O provimento da interconexão será realizado em termos não discriminatórios, sob condições técnicas adequadas, garantindo preços isonômicos e justos, atendendo ao estritamente necessário à prestação do serviço.” 189 Nesse sentido, ver GERADIN, D.; HENRY, D. Regulatory and Competition Law Remedies in The Postal Sector. Remedies in Network Industries: EC Competition Law vs. Sector-Specific Regulation. Damin Geradin (Editor). Intersentia. Antwerp, Oxford, UK, 2004, p.127.  

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90/16/EEC, de 1989 até os dias de hoje) focaram quatro questões cruciais

para a garantia de um ambiente de livre concorrência em face da presença

de monopólio legal com capacidade de influência direta ou indireta na

dinâmica dos mercados a que esteja de alguma forma relacionado, quais

sejam: (i) a limitação clara dos limites da reserva legal de mercado (i.e., do

monopólio legal), para se evitar problemas como o apontado nos EUA, em

que a empresa monopolista sempre buscou, ao longo da história, aumentar a

abrangência do monopólio legal e, portanto, afetou a livre concorrência em

uma série de mercados; (ii) a transparência geral de custos, de fluxo de

investimentos do setor monopolizado para setores sob regime de competição

e vice-versa e a transparência de gestão, tudo com vistas a, principalmente,

evitar-se a utilização de subsídios cruzados voltados à dominação de

mercados e/ou à lesar a concorrência e à avaliação periódica do nível dos

preços dos serviços universais (isto é, se estavam compatíveis com os custos

ou se acima a ponto de gerar lucros extraordinários); (iii) a não discriminação

de forma geral e irrestrita, expressa de forma variada, isto é, desde não-

discriminação de acesso à infraestrutura (leia-se redes postais, post offices

etc.), à não discriminação de preços, condições contratuais para recepção ou

contratação de serviços etc.; e (iv) a separação de funções de gestão

empresarial (típicas aos agentes econômicos) das funções regulatórias, com

vistas a evitar-se desvios de finalidade bem como distorções no mercado e

na concorrência decorrentes de confusão de incentivos (como por exemplo

tem sido apontado nos EUA, em que, em síntese, acusa-se a USPS de

legislar em causa própria para ampliar seu poder).

Houvesse, por hipótese, a Diretiva 97/67 adotado o caminho em tese

mais simples, isto é, eliminado qualquer espécie de reservas para serviços

postais, isto é, qualquer espécie de monopólios postais, não haveria espaço

(como se verá) para grandes problemas e, via de consequência, para tais

preocupações. As quais são imanentes a um ambiente misto (em que há

regime de livre competição convivendo com um regime de reserva legal), no

tocante à separação dos serviços que estariam incluídos no regime de

competição daqueles que permaneceriam reservados, bem como da relação

entre ambos, o que poderia variar (e de fato variava de país para país).

Sendo que a aplicação da legislação antitruste, ao menos em tese, serviria

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de instrumento básico para regular as relações entre os agentes econômicos

(contra abuso de posição dominante, prática de cartéis, preços predatórios

etc.), bem como, entre esses e os consumidores.

Contudo, possivelmente em razão da complexidade político-

econômica existente na grande maioria das jurisdições, aqui por razões

semelhantes às verificadas nos EUA – papel dos serviços postais no cenário

político e econômico dos países, empregos gerados, força política etc. – a

escolha da CE pela eliminação dos monopólios postais foi gradual, de modo

que foi necessário todo um trabalho de detalhamento dos vários tipos de

serviços postais existentes para que fosse possível, após defini-los e ao

longo do tempo, liberaliza-se os diversos mercados de forma gradual até que,

após mais de 10 anos a partir da Diretiva 97/67, se chegasse a um ambiente

de livre concorrência. A pergunta que se faz é: poderia o Brasil aprender com

essa experiência e antecipar algumas medidas? A resposta será dada ao

longo deste trabalho e, principalmente, nas considerações finais.190

3.3.1 Limites do monopólio postal

O primeiro passo adotado pela Diretiva 97/67 foi o de identificar o

fundamento fático, ou melhor, econômico, a partir do qual um dado serviço

postal seria ou não aberto à livre competição. Assim chegou-se à idéia de

serviço universal. Sobre esse tema, a Diretiva dedicou o Artigo 2 para o

estabelecimento dos conceitos, e Artigos 3 e 7 à delimitação qualitativa dos

conceitos, isto é, à indicação precisa dos mercados - no aspecto produto e no

aspecto geográfico - que poderiam ser considerados como incluídos na idéia

de serviço universal, bem como à delimitação quantitativa, a qual serviria, ao

longo do tempo, como uma das variáveis utilizadas para a redução gradativa

das reservas legais (i.e., dos monopólios postais na UE). O Artigo 2

basicamente descreve os conceitos contidos na Diretiva 97/67, sendo

importante neste momento observar apenas alguns deles, pois serão

necessários para a melhor compreensão deste tópico, quais sejam o de                                                                                                                          190  EU. Comunicação da Comissão relativa à aplicação das regras de concorrência ao setor postal e à apreciação de certas medidas estatais referentes aos serviços postais (98/C 39/02). Jornal Oficial nº 039 de 6 fev 1998, p. 0002-0018. Disponível em: <http://www.anacom.pt/render.jsp?contentId=966656>. Acesso em: 6 Dez. 2010.

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“serviços postais”, “item postal”, “item de correspondência”, “cartas diretas”

(direct mail), “cartas transfronteiriças” (cross-border mail), “item registrado”

(registered item), “item segurado” (insured item), “prestador de serviço

universal” (universal service provider) e “usuário”. Há outros conceitos

contidos no Artigo 2, os quais serão explorados no decorrer deste capítulo,

sempre que necessário for.

Assim, entende-se por serviço postal a operação de coleta de itens

postais depositados nos pontos de acesso, a triagem, transporte e entrega de

tais itens aos seus destinatários. Por “item postal” entende-se envelope

endereçado e postado, isto é, pronto para ser transportado para o

destinatário cujo endereço deve estar nele (item postal) indicado, pelo

prestador de serviço universal. No conceito de item postal, incluem-se, por

exemplo, livros, catálogos, jornais, revistas ou periódicos, envelopes

contendo propagandas com ou sem valor pecuniário. Além dos “itens

postais”, há os “itens de correspondência”, os quais englobam a comunicação

em forma escrita contida em qualquer tipo de suporte (ou meio) físico a ser

transportado e entregue nos endereços indicados pelo emissor diretamente

no documento ou no envelope (ou invólucro) que o contenha. Livros,

catálogos, jornais, revistas ou periódicos não devem ser considerados itens

de correspondência.

As “cartas diretas” caracterizam-se apenas por anúncios publicitários,

de propaganda e marketing, ou material publicitário os quais abranjam uma

mensagem idêntica, exceto pelo nome, endereço e outros termos (desde que

não alterem a natureza da mensagem) que identifiquem o destinatário, os

quais sejam enviados para um número significativo de destinatários, a ser

transportados e entregues no endereço indicado pelo emissor diretamente

nos itens ou em seus envelopes (ou invólucros).

As autoridades regulatórias nacionais deveriam interpretar o termo

“número significativo de destinatários” dentro de cada Estado-membro e

deveriam publicar uma definição apropriada nesse sentido. Contas para

pagamento, faturas ou cobranças, documentos bancários e outras

mensagens não idênticas não deveriam ser consideradas como sendo cartas

diretas. A comunicação que combine cartas diretas e outros itens dentro de

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112  

um mesmo envelope não deveriam ser consideradas como sendo cartas

diretas.

Cartas diretas abrangem cartas nacionais e transfronteiriças. “Item

registrado” caracteriza-se, por sua vez, como o serviço de custo uniforme

consistente na garantia contra risco de perda, furto ou dano da

correspondência (de modo geral), e, a depender de requisição do emissor, de

envio a este último de prova de envio do item e/ou de entrega no destino.

“Item segurado” consiste em serviço de seguro sobre o item postal contra

perda, furto ou dano até o limite do valor declarado pelo emissor. “Carta

transfronteiriça” pode ser entendida como a enviada entre Estados-membros

ou entre esses e um terceiro país. “Prestador de serviço universal” (Universal

Service Provider - “USP”) é o ente público ou privado encarregado do

fornecimento do serviço postal universal ou de parcelas do serviço postal em

caráter universal dentro dos Estados-membros, cuja identidade já seja de

conhecimento da CE (em razão da norma contida no Artigo 4, da Diretiva

97/67).191 Por fim, entende-se por “usuário” qualquer indivíduo ou pessoa

jurídica que se beneficie da prestação de serviço universal como emissor ou

endereçado.192

                                                                                                                         191   EU. Directive 97/67/EC of The European Parliament and of The Council of 15 December 1997 on common rules for the development of the internal market of Community postal services and the improvement of quality of service. Disponível em: <http://eur-lex.europa.eu/LexUriServ/LexUriServ.do?uri=OJ:L:1998:015:0014:0025:EN:PDF>. Acesso em: 4 Nov. 2010: “Article 4 - Each Member State shall ensure that the provision of the universal service is guaranteed and shall notify the Commission of the steps it has taken to fulfill this obligation and, in particular, the identity of its universal service provider(s). Each Member State shall determine in accordance with Community law the obligations and rights assigned to the universal service provider(s) and shall publish them.” 192 EU. Directive 97/67/EC of The European Parliament and of The Council of 15 December 1997 on common rules for the development of the internal market of Community postal services and the improvement of quality of service. Disponível em: <http://eur-lex.europa.eu/LexUriServ/LexUriServ.do?uri=OJ:L:1998:015:0014:0025:EN:PDF>. Acesso em: 4 Nov. 2010: “Article 2 For the purposes of this Directive, the following definitions shall apply: 1. postal services: services involving the clearance, sorting, transport and delivery of postal items; (...) 4. clearance: the operation of collecting postal items deposited at access points; 5. distribution: the process from sorting at the distribution centre to delivery of postal items to their addressees; 6. postal item: an item addressed in the final form in which it is to be carried by the universal service provider. In addition to items of correspondence, such items also include for instance books, catalogues, newspapers, periodicals and postal packages containing merchandise with or without commercial value;

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Segundo o Artigo 7(1), da Diretiva 97/67, na medida necessária à

manutenção do serviço universal, os serviços que poderiam ser reservados

para cada Estado-membro a um ou mais prestadores do serviço universal

são a coleta, triagem, transporte e entrega de correspondências internas (ou

nacionais), sejam ou não realizadas por distribuição acelerada, sendo que

tais atividades deveriam possuir preço inferior ao quíntuplo da tarifa pública

de um envio de correspondência do primeiro escalão de peso da categoria

padrão mais rápida (i.e., do express mail), se esta existir, desde que

pesassem menos de 350 g.193 Essencialmente, esse dispositivo,

possivelmente influenciado pela experiência nos casos CE v. Kingdom of the                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                            7. item of correspondence: a communication in written form on any kind of physical medium to be conveyed and delivered at the address indicated by the sender on the item itself or on its wrapping. Books, catalogues, newspapers and periodicals shall not be regarded as items of correspondence; 8. direct mail: a communication consisting solely of advertising, marketing or publicity material and comprising an identical message, except for the addressee’s name, address and identifying number as well as other modifications which do not alter the nature of the message, which is sent to a significant number of addressees, to be conveyed and delivered at the address indicated by the sender on the item itself or on its wrapping. The national regulatory authority shall interpret the term ‘significant number of addressees’ within each Member State and shall publish an appropriate definition. Bills, invoices, financial statements and other non-identical messages shall not be regarded as direct mail. A communication combining direct mail with other items within the same wrapping shall not be regarded as direct mail. Direct mail shall include cross-border as well as domestic direct mail; 9. registered item: a service providing a flat-rate guarantee against risks of loss, theft or damage and supplying the sender, where appropriate upon request, with proof of the handing in of the postal item and/or of its delivery to the addressee; 10. insured item: a service insuring the postal item up to the value declared by the sender in the event of loss, theft or damage; 11. cross-border mail: mail from or to another Member State or from or to a third country; 12. document exchange: provision of means, including the supply of ad hoc premises as well as transportation by a third party, allowing self-delivery by mutual exchange of postal items between users subscribing to this service; 13. universal service provider: the public or private entity providing a universal postal service or parts thereof within a Member State, the identity of which has been notified to the Commission in accordance with Article 4; (...) 17. users: any natural or legal person benefiting from universal service provision as a sender or an addressee;” 193 EU. Directive 97/67/EC of The European Parliament and of The Council of 15 December 1997 on common rules for the development of the internal market of Community postal services and the improvement of quality of service. Disponível em: < http://eur-lex.europa.eu/LexUriServ/LexUriServ.do?uri=OJ:L:1998:015:0014:0025:EN:PDF>. Acesso em: 4 Nov. 2010: “Article 7. 1. To the extent necessary to ensure the maintenance of universal service, the services which may be reserved by each Member State for the universal service provider(s) shall be the clearance, sorting, transport and delivery of items of domestic correspondence, whether by accelerated delivery or not, the price of which is less than five times the public tariff for an item of correspondence in the first weight step of the fastest standard category where such category exists, provided that they weigh less than 350 grams. In the case of the free postal service for blind and partially sighted persons, exceptions to the weight and price restrictions may be permitted.”  

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114  

Netherlands - PTT Post BV – 90/16/EEC194e CE v. Kingdom of Spain –

Ordenanza Postal of 19 May 1960 – 90/456/EEC195, possui um núcleo

normativo bem interessante se comparado, por exemplo, à exceção do

extremely urgent letters, do Private Express Statutes dos EUA. Tal como

lembrado no início deste capítulo, enquanto nos EUA, a USPS permite às

empresas privadas como FEDEX e UPS operarem no mercado de express

mail, desde que ofertem seus produtos a preços duas vezes superiores ao do

First-Class Mail (cujo nome, por mera coincidência, é bastante semelhante à

“correspondência de primeiro escalão” ou “first weight step”, de acordo com a

Diretiva 97/67), o que não enseja verdadeiramente um regime de competição

entre os prestadores privados e a USPS; na UE, cujo mercado de express

mail já estava inserido em regime de livre competição antes mesmo do início

da vigência da Diretiva 97/67196, os serviços postais reservados deveriam

possuir preços cinco vezes inferiores ao preço do “First-Class Mail” europeu.

Assim, enquanto nos EUA, opera-se claramente uma reserva de

markup197 para a USPS, no mercado mais rentável para àquela companhia,

na Europa operou-se verdadeiramente, ao menos em princípio, uma redução

do nível de markup para aqueles players que desfrutassem de regimes de

monopólio legal para certos serviços postais. Essa tendência de verdadeira

abertura do mercado postal na Europa para a livre concorrência ficará mais

clara mais à frente.

                                                                                                                         194 EU. Commission Decision of 20.12.1989 concerning the provision in the Netherlands of express delivery services 90/16/EEC (case EC v. Kingdom of Netherlands - PTT Post BV – 90/16/EEC). Disponível em: <http://www.jcampbell.com/Reference/eu/198912_nl_express.pdf>. Acesso em: 6 Mar. 2011. 195 EU. Commission Decision of 1 August 1990 concerning the provision in Spain of international express courier services (CE v. Kingdom of Spain – Ordenanza Postal of 19 May 1960 – 90/456/EEC). Disponível em: <http://www.jcampbell.com/Reference/eu/199008_spain_express.pdf>. Acesso em: 6 Mar. 2011.  196   “(...) This assessment should, however, be qualified by the fact that an important part of the postal services market (e.g., express mail services) was open to competition prior to the adoption of Directive 97/67.” Foot note 19. GERADIN, D.; HENRY, D. Regulatory and Competition Law Remedies in The Postal Sector. Remedies in Network Industries: EC Competition Law vs. Sector-Specific Regulation. Damin Geradin (Editor). Intersentia. Antwerp, Oxford, UK, 2004, p.128.  197 “1. The amount (percentage) by which price exceeds marginal cost. A profit-maximizing seller facing a price elasticity of demand η will set a markup equal to (p-c)/p=1/η. One effect of international trade that increases competition is to reduce markups.” Deardorffs’ Glossary of International Economics. The Terms of the Trade and Other Wonders. Markup. Disponível em: <http://www-personal.umich.edu/~alandear/glossary/m.html>. Acesso em: 5 Mar. 2011.

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115  

Ainda no mesmo dispositivo, o Artigo 7(2), da Diretiva 97/67,

prescreveu que na medida necessária para garantir a manutenção do serviço

universal, as correspondências transfronteiriças (i.e., cross-border mail) e a

publicidade endereçada poderiam continuar a ser reservados, desde que

respeitassem os limites de preço e peso previstos no Artigo 7(1).198 A

preocupação da CE com a estrita necessidade de preservar o serviço

universal como fundamento econômico para a reserva legal das atividades

econômicas listadas no Artigo 7(1) e (2), fica bem clara no Artigo 7(3), em

que se definira os próximos passos que seriam seguidos pela UE a partir de

então. Em tal dispositivo, fixou-se que, no intuito de dar mais um passo rumo

à plena liberalização dos serviços postais (i.e., de eliminação dos monopólios

ou reservas legais), o Parlamento Europeu e o Conselho deveriam decidir até

1 de janeiro de 2000 sobre uma futura, gradual e controlada liberalização

adicional do mercado postal, em especial no tocante à correspondência

transfronteiriça e à publicidade endereçada.

No mesmo sentido, deveriam tais autoridades da UE decidir sobre

uma nova revisão dos limites de preço e peso contidos no Artigo 7(1), os

quais passariam a viger a partir de 1 de janeiro de 2003, tendo em conta a

evolução, em especial o desenvolvimento econômico, social e tecnológico

registrados até aquele momento. Questões como equilíbrio financeiro do

prestador ou prestadores do serviço universal também deveriam ser

ponderadas pelas autoridades no sentido da consecução das finalidades da

Diretiva 97/67.199

                                                                                                                         198   EU. Directive 97/67/EC of The European Parliament and of The Council of 15 December 1997 on common rules for the development of the internal market of Community postal services and the improvement of quality of service. Disponível em: <http://eur-lex.europa.eu/LexUriServ/LexUriServ.do?uri=OJ:L:1998:015:0014:0025:EN:PDF>. Acesso em: 4 Nov. 2010: “Article 7. (...) 2. To the extent necessary to ensure the maintenance of universal service, cross-border mail and direct mail may continue to be reserved within the price and weight limits laid down in paragraph 1.”  199   EU. Directive 97/67/EC of The European Parliament and of The Council of 15 December 1997 on common rules for the development of the internal market of Community postal services and the improvement of quality of service. Disponível em: <http://eur-lex.europa.eu/LexUriServ/LexUriServ.do?uri=OJ:L:1998:015:0014:0025:EN:PDF>. Acesso em: 4 Nov. 2010: “Article 7. (...) 3. As a further step towards the completion of the internal market of postal services, the European Parliament and the Council shall decide not later than 1 January 2000 and without prejudice to the competence of the Commission, on the further gradual and controlled

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116  

Em complemento ao Artigo 7, o Artigo 3(1) previa que os Estados-

membros assegurassem aos usuários acesso a um serviço universal

caracterizado por uma oferta permanente de serviços postais com qualidade

especificada, os quais fossem prestados ao longo de todo o território nacional

a preços acessíveis a todos os usuários.200 Para tanto, os Estados-membros

deveriam prover redes postais suficientemente abrangentes ao atendimento

das necessidades dos usuários ao longo dos territórios nacionais (Artigo

3(2)).201

Conforme o Artigo 3(3), os Estados-membros deveriam ainda viabilizar

condições para que o prestador ou os prestadores do serviço universal

garantissem pelo menos uma coleta e uma entrega de correspondências

todos os dias úteis, i.e., pelo menos cinco dias por semana para indivíduos

ou grupos, salvo circunstâncias ou condições geográficas excepcionais,

podendo as autoridades reguladoras nacionais conceder exceções ou

derrogações de tais pré-requisitos, devendo nesses casos ser a CE e todas

as demais autoridades nacionais notificadas de tal exceção e/ou derrogação

concedida.202 O Artigo 3(4), por sua vez, previa que o serviço universal

                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                           liberalisation of the postal market, in particular with a view to the liberalisation of cross-border and direct mail, as well as on a further review of the price and weight limits, with effect from 1 January 2003, taking into account the developments, in particular economic, social and technological developments, that have occurred by that date, and also taking into account the financial equilibrium of the universal service provider(s), with a view to further pursuing the goals of this Directive. Such decisions shall be based upon a proposal from the Commission to be tabled before the end of 1998, following a review of the sector. Upon request by the Commission, Member States shall provide all the information necessary for completion of the review.”  200   EU. Directive 97/67/EC of The European Parliament and of The Council of 15 December 1997 on common rules for the development of the internal market of Community postal services and the improvement of quality of service. Disponível em: <http://eur-lex.europa.eu/LexUriServ/LexUriServ.do?uri=OJ:L:1998:015:0014:0025:EN:PDF>. Acesso em: 4 Nov. 2010: “Article 3. 1. Member States shall ensure that users enjoy the right to a universal service involving the permanent provision of a postal service of specified quality at all points in their territory at affordable prices for all users.”  201   EU. Directive 97/67/EC of The European Parliament and of The Council of 15 December 1997 on common rules for the development of the internal market of Community postal services and the improvement of quality of service. Disponível em: <http://eur-lex.europa.eu/LexUriServ/LexUriServ.do?uri=OJ:L:1998:015:0014:0025:EN:PDF>. Acesso em: 4 Nov. 2010: “Article 3. (…) 2. To this end, Member States shall take steps to ensure that the density of the points of contact and of the access points takes account of the needs of users.”  202   EU. Directive 97/67/EC of The European Parliament and of The Council of 15 December 1997 on common rules for the development of the internal market of Community postal services and the improvement of quality of service. Disponível em: <

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117  

deveria incluir, no mínimo, a coleta, triagem, transporte e distribuição de

correspondências de até 2 Kg, de encomendas postais de até 10 kg, bem

como serviços de envios registrados e de envios com valor declarado.203

O Artigo 3(5) estabelece que as autoridades reguladoras nacionais

poderiam aumentar o limite de peso da cobertura do serviço universal para as

encomendas postais até o limite de 20 kg, sendo-lhes possível fixar regimes

específicos para a distribuição a domicílio dessas encomendas postais. Essa

medida se aplicaria tanto às encomendas postais nacionais, quanto às

provenientes de outros Estados-membros. O Artigo 3(6) conecta a Diretiva

97/67 à Convenção e ao Acordo relativo às Encomendas Postais adotados

pela União Postal Universal, pois prescreve que as dimensões mínimas e

máximas dos envios postais serão fixadas de acordo com tais documentos.204

                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                           http://eur-lex.europa.eu/LexUriServ/LexUriServ.do?uri=OJ:L:1998:015:0014:0025:EN:PDF>. Acesso em: 4 Nov. 2010: “Article 3. (…) 3. They shall take steps to ensure that the universal service provider(s) guarantee(s) every working day and not less than five days a week, save in circumstances or geographical conditions deemed exceptional by the national regulatory authorities, as a minimum: — one clearance, — one delivery to the home or premises of every natural or legal person or, by way of derogation, under conditions at the discretion of the national regulatory authority, one delivery to appropriate installations. Any exception or derogation granted by a national regulatory authority in accordance with this paragraph must be communicated to the Commission and to all national regulatory authorities.”  203   EU. Directive 97/67/EC of The European Parliament and of The Council of 15 December 1997 on common rules for the development of the internal market of Community postal services and the improvement of quality of service. Disponível em: <http://eur-lex.europa.eu/LexUriServ/LexUriServ.do?uri=OJ:L:1998:015:0014:0025:EN:PDF>. Acesso em: 4 Nov. 2010: “Article 3. (…) 4. Each Member State shall adopt the measures necessary to ensure that the universal service includes the following minimum facilities: — the clearance, sorting, transport and distribution of postal items up to two kilograms, — the clearance, sorting, transport and distribution of postal packages up to 10 kilograms, — services for registered items and insured items”. 204 EU. Directive 97/67/EC of The European Parliament and of The Council of 15 December 1997 on common rules for the development of the internal market of Community postal services and the improvement of quality of service. Disponível em: <http://eur-lex.europa.eu/LexUriServ/LexUriServ.do?uri=OJ:L:1998:015:0014:0025:EN:PDF>. Acesso em: 4 Nov. 2010: “Article 3. (…) 6. The minimum and maximum dimensions for the postal items in question shall be those laid down in the Convention and the Agreement concerning Postal Parcels adopted by the Universal Postal Union.” Para informações gerais sobre a Universal Postal Union, bem como seu mecanismo de funcionamento normativo por meio de Conventions, ver UNIVERSAL POSTAL UNION (UPU). The UPU. About history. About Acts. Disponíveis em: <http://www.upu.int/en/the-upu/the-upu.html>, <http://www.upu.int/en/the-upu/history/about-history.html> e <http://www.upu.int/en/the-upu/acts/about-acts.html>. Acesso em: 5 Mar.

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118  

Por fim, o Artigo 3(7) trata da abrangência geográfica das regras sobre os

serviços universais, as quais são aplicáveis tanto aos serviços nacionais

quanto aos transfronteiriços.205

Dando continuidade à política de abertura dos serviços postais à livre

concorrência, em 2002 foi publicada a Diretiva 2002/39, a qual emendou e

derrogou trechos da Diretiva 97/67 (que permaneceu vigendo como a

Diretriz-base da liberalização dos serviços postais na UE). De fato, essa

norma cumpriu com seu objetivo de dar continuidade à liberalização dos

serviços postais na UE, determinando, em síntese, que os Estados-membros

deveriam, até 1o. de janeiro de 2003, abrir para o regime de livre

concorrência os seguinte serviços postais: entrega de cartas com peso

superior a 110g, ou cujo preço fosse mais de três vezes superior ao preço da

carta simples; envio de correspondências transfronteiriças (i.e., cross-border

mails), sendo possível ao Estado-membro manter esse mercado reservado

desde que demonstrasse precisar dessas receitas para manter o serviço

                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                           2011: “The UPU: Established in 1874, the Universal Postal Union (UPU), with its headquarters in the Swiss capital Berne, is the second oldest international organization worldwide. With its 191 member countries, the UPU is the primary forum for cooperation between postal sector players. It helps to ensure a truly universal network of up-to-date products and services. In this way, the organization fulfils an advisory, mediating and liaison role, and provides technical assistance where needed. It sets the rules for international mail exchanges and makes recommendations to stimulate growth in mail, parcel and financial services volumes and improve quality of service for customers The UPU consists of: 4 bodies; The Congress; The Council of Administration (CA); The Postal Operations Council (POC); The International Bureau (IB); 2 cooperatives; Telematics Cooperative; EMS Cooperative. (…) About Acts: Constitution - The Constitution of the Universal Postal Union is the fundamental Act containing the organic rules of the Union. It is a diplomatic Act, ratified by the competent authorities of each member country. Amendments to it can be made only at Congress and are recorded in an Additional Protocol, which is also subject to ratification. Rules - The common rules applicable to the international postal service and the provisions concerning the letter-post and parcel-post services are given in the Convention and its Regulations. The Regulations of the Convention are agreements concluded by the member countries elected by the Congress to the Postal Operations Council (POC). The POC has the authority to amend the Regulations at its annual sessions. The Convention and its Regulations are binding on all member countries. The Postal Payment Services Agreement and its Regulations are binding only on the countries that are parties to the Agreement.” 205   EU. Directive 97/67/EC of The European Parliament and of The Council of 15 December 1997 on common rules for the development of the internal market of Community postal services and the improvement of quality of service. Disponível em: <http://eur-lex.europa.eu/LexUriServ/LexUriServ.do?uri=OJ:L:1998:015:0014:0025:EN:PDF>. Acesso em: 4 Nov. 2010: “Article 3. (…) 7. The universal service as defined in this Article shall cover both national and cross-border services.”  

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119  

universal. A reserva legal para a recepção de correspondências

transfronteiriças foi preservada.

Ainda segundo essa Diretiva, a partir de 1o. de janeiro de 2006, a

entrega de cartas com peso superior a 50g, ou cujo preço fosse mais de duas

vezes e meia superior ao preço da carta simples, deveriam ser abertas ao

regime de livre competição. Por fim, referida Diretiva manteve a previsão

inicial de que os serviços postais na UE deveriam estar completamente

abertos à livre concorrência até 2009. Isso com base em estudos levados a

efeito pela CE sobre os efeitos das Diretivas 97/67 e 2002/39 sobre o setor

postal na UE, que deveriam ser submetidos ao Parlamento Europeu ao

Conselho da União Européia até 31 de Dezembro de 2006. Tais estudos

deveriam confirmar a previsão de total abertura dos mercados postais ao

regime de livre concorrência em 2009, ou determinar qualquer outra medida

em sentido diverso em decorrência das conclusões atingidas.206

                                                                                                                         206  EU.  Directive 2002/39/EC of The European Parliament and of The Council of 10 June 2002 amending Directive 97/67/EC with regard to the further opening to competition of Community postal services. Disponível em: <http://eur-lex.europa.eu/LexUriServ/LexUriServ.do?uri=OJ:L:2002:176:0021:0025:EN:PDF>. Acesso em: 4 Nov. 2010: “Article 1. Directive 97/67/EC is hereby amended as follows: 1. Article 7 shall be replaced by the following: “Article 7. 1. To the extent necessary to ensure the maintenance of universal service, Member States may continue to reserve services to universal service provider(s). Those services shall be limited to the clearance, sorting, transport and delivery of items of domestic correspondence and incoming cross-border correspondence, whether by accelerated delivery or not, within both of the following weight and price limits. The weight limit shall be 100 grams from 1 January 2003 and 50 grams from 1 January 2006. These weight limits shall not apply as from 1 January 2003 if the price is equal to, or more than, three times the public tariff for an item of correspondence in the first weight step of the fastest category, and, as from 1 January 2006, if the price is equal to, or more than, two and a half times this tariff. (…) To the extent necessary to ensure the provision of universal service, direct mail may continue to be reserved within the same weight and price limits. To the extent necessary to ensure the provision of universal service, for example when certain sectors of postal activity have already been liberalised or because of the specific characteristics particular to the postal services in a Member State, outgoing cross-border mail may continue to be reserved within the same weight and price limits. (…) 3. The Commission shall finalise a prospective study which will assess, for each Member State, the impact on universal service of the full accomplishment of the postal internal market in 2009. Based on the study’s conclusions, the Commission shall submit by 31 December 2006 a report to the European Parliament and the Council accompanied by a proposal confirming, if appropriate, the date of 2009 for the full accomplishment of the postal internal market or determining any other step in the light of the study’s conclusions.” Favorável à opinião de que essa Diretiva ampliou a liberalização do mercado postal na UE, ver GERADIN, D.; HENRY, D. Regulatory and Competition Law Remedies in The Postal Sector. Remedies in Network Industries: EC Competition Law vs. Sector-Specific Regulation. Damin Geradin (Editor). Intersentia. Antwerp, Oxford, UK, 2004, p.129.

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120  

Entre 2005 e 2006 foram publicados os resultados dos estudos e

pesquisas que estavam sendo desenvolvidos no âmbito da UE no sentido de

avaliar os serviços postais como um todo, bem como se seria mantida a meta

de abertura total do mercado em 2009. Em Outubro de 2005, a CE (Special

Eurobarometer 219) publicou os resultados de uma pesquisa intitulada

Services of General Interest, ou seja, “serviços de interesse geral” (ou de

interesse público). Nessa pesquisa, realizada diretamente junto aos

consumidores Europeus ao longo de todo o território da UE, concluiu-se

basicamente que os serviços postais representavam um dos mais

importantes serviços de “interesse econômico geral”, i.e., à época da

pesquisa em Novembro de 2004, 77% dos consumidores entrevistados

apontaram que serviços postais desempenhavam um papel muito importante

no âmbito da UE.207

Em fevereiro de 2006, o Parlamento Europeu publicou Resolução

sobre a aplicação dos serviços postais na UE e, na ocasião, reafirmou a

intenção de abertura total dos mercados até 2009 enfatizando a importância

social e econômica dos serviços postais dentro do contexto da Estratégia de

Lisboa (Lisbon Strategy).208 Nessa ocasião, a UE indicou que os resultados

positivos observados no setor postal Europeu, tais como melhoria da

qualidade dos serviços, maior eficiência e melhor orientação dos usuários

(better user-orientation), já podiam ser atribuídos às medidas normativas de

abertura dos mercados postais à livre concorrência implementadas pela

Diretiva 97/67 (e desenvolvidas pelas posteriores normas em âmbito

comunitário). Todavia, ainda sensível ao receio de que a abertura total à livre

concorrência poderia gerar efeito negativo à prestação do serviço universal

(i.e., à universalização), o Parlamento Europeu, nessa mesma ocasião,                                                                                                                          207 EU. Commission Special Eurobarometer 219/Wave 62.1 – TNS Opinion & Social. Services of general interest. Fieldwork November 2004. Publication October 2005. Disponível em: <http://ec.europa.eu/public_opinion/archives/ebs/ebs_219_report_en.pdf>. Acesso em: 25Fev. 2011. 208   A   Lisbon   Strategy   pode   ser   entendida   como   um   plano   de   desenvolvimento   elaborado   pelo  Parlamento  Europeu  e  pelo  Conselho  da  União  Européia  por  meio  do  qual  se  pretendia  implementar  mudanças   importantes na economia da UE no período de 2000 a 2010. Dentre as principais metas encontrava-se a abertura à livre concorrência de mercados de gás, eletricidade, serviços postais e transporte. Em 2005, a Lisbon Strategy foi atualizada (Lisbon Strategy of the European Council of 22 and 23 March 2005). Nesse sentido, ver EU. Council of the European Union. 23.03.2005. Presidency Conclusions. Disponível em: <http://www.consilium.europa.eu/uedocs/cms_data/docs/pressdata/en/ec/84335.pdf>. Acesso em: 20 Mar. 2011.

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121  

chamou a atenção da CE para levar especialmente em consideração, nos

estudos que estavam sendo realizados, os diversos níveis de

desenvolvimento nacionais presentes na UE, a qualidade dos serviços

universais bem como o financiamento (ou suporte financeiro necessário para

mantê-los) e o propósito de tais serviços, ou seja, sugeriram à Comissão que,

no contexto dos estudos, fossem bem delineadas a definição, escopo e

medidas de suporte financeiro apropriadas para os serviços universais.209

Em Outubro de 2006, a CE concluiu os estudos e os reportou ao

Parlamento Europeu por meio do Commission's Work Plan item

2006/MARKT/006 on Postal Services, os quais, basicamente, versaram sobre

os efeitos das Diretivas 97/67 e 2002/39 sobre os mercados postais na UE,

bem como sobra a possibilidade de manutenção da previsão inicial de

abertura total dos mercados postais em 2009. Em síntese, o Commission's

Work Plan item 2006/MARKT/006 on Postal Services levou em consideração

os resultados de seis grandes estudos sobre os mercados postais europeus

desenvolvidos pela Comissão entre 2004 e 2006, bem como 10 workshops

públicos realizados e outros 14 estudos desenvolvidos a partir de 1997. Além

disso, a Comissão também: considerou o Special Eurobarometer 219;

discutiu com diversos Estados-membros sobre os avanços até então

atingidos no setor postal bem como as opções de políticas públicas que

poderiam ser adotadas no futuro para a abertura integral dos mercados

postais à livre concorrência; e, ainda, considerou 2.295 respostas e 103

petições recebidas em razão de consulta pública realizada para os propósitos

da conclusão dos estudos.

O contexto a partir do qual a Comissão desenvolveu suas conclusões

decorreu de quatro premissas básicas: (i) a obrigação da CE de viabilizar a

formação completa de um mercado interno (i.e., comunitário) e sem qualquer

reserva legal (i.e., sem monopólios) para os serviços postais indicando

qualquer outra medida nesse sentido à luz dos estudos que estavam sendo

realizados, de acordo com o Artigo 7, da Diretiva 97/67 (e Diretiva 2002/39);

                                                                                                                         209 EU. European Parliament Resolution of 2.02.2006 on the application of the Postal Directive (Directive 97/67/EC, as amended by Directive 2002/39/EC) (2005/2086(INI)). Disponível em: <http://eur-lex.europa.eu/LexUriServ/LexUriServ.do?uri=OJ:C:2006:288E:0077:0079:EN:PDF>. Acesso em: 25 Fev. 2011.

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122  

(ii) o fato de que, de acordo com o Artigo 27, da Diretiva 97/67 e diante da

ausência de proposta em sentido diverso por parte da CE, a partir de

31.12.2008 os serviços postais na UE estariam sujeitos às regras de defesa

da concorrência do Tratado da CE (particularmente ao Artigo 86 – atualmente

Artigo 106, do TFUE); (iii) o Application Report210 sobre a aplicação da

Diretiva 97/67, bem como o Prospective Study211 (sobre os impactos da

abertura integral do mercado sobre os serviços universais) concluíram que,

adotadas algumas medidas de salvaguarda, a abertura integral do mercado

poderia ser atingida até 2009 por parte de todos os Estados-membros; e (iv)

o fato de que muitos Estados-membros já se encontravam em rápido

desenvolvimento rumo à abertura total dos mercados -- desenvolvimento

esse acompanhado pelo aumento na qualidade dos serviços postais – não

tendo isso prejudicado a universalização dos serviços.212

A conclusão final dos estudos levados a efeito pela CE foi de que,

mediante algumas adaptações na Diretiva 97/67 no limite do necessário,

seria possível manter a meta de, até 2009, promover a integral abertura à

livre concorrência dos mercados postais na UE; em outras, palavras, a total

eliminação dos monopólios postais até 2009 era plenamente factível e não

representava riscos ao provimento universal do serviço bem como à sua

qualidade e, em sentido negativo, preços.213

                                                                                                                         210 EU. Commission REPORT FROM THE COMMISSION TO THE COUNCIL AND THE EUROPEAN PARLIAMENT of 10.2006 on the Prospective study on the impact on universal service of the full accomplishment of the postal internal market in 2009. Disponível em: <http://ec.europa.eu/internal_market/post/doc/legislation/prospective-study_en.pdf>. Acesso em: 14 Mar. 2011.  211 EU. Commission REPORT FROM THE COMMISSION TO THE COUNCIL AND THE EUROPEAN PARLIAMENT of 18.10.2006 on the Prospective study on the impact on universal service of the full accomplishment of the postal internal market in 2009. Disponível em: <http://eur-lex.europa.eu/LexUriServ/LexUriServ.do?uri=COM:2006:0596:FIN:EN:PDF>. Acesso em: 14 Mar. 2011. 212 EU. Commission Staff Working Document of 18.10.2006 on Accompanying document to the Proposal for a DIRECTIVE OF THE EUROPEAN PARLIAMENT AND OF THE COUNCIL amending Directive 97/67/EC concerning the full accomplishment of the internal market of Community postal services Executive Summary of the Impact Assessment. Disponível em: <http://ec.europa.eu/internal_market/post/doc/legislation/assessment-summary_en.pdf>. Acesso em: 14 Mar. 2011. 213   EU. Commission Staff Working Document of 18.10.2006 on Accompanying document to the Proposal for a DIRECTIVE OF THE EUROPEAN PARLIAMENT AND OF THE COUNCIL amending Directive 97/67/EC concerning the full accomplishment of the internal market of Community postal services Executive Summary of the Impact Assessment. Disponível em:

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123  

Alguns pontos específicos que serviram de base a essa conclusão

merecem maior observação, dada a importância que podem representar para

o debate sobre o tema realizado no Brasil. O primeiro ponto levado em

consideração pela CE foi em que medida seria verdadeira a premissa de que,

uma vez aberto o mercado à livre concorrência, quanto maior a cobertura (ou

abrangência) dos produtos postais sujeitos à universalização, maior seria o

risco de não haver incentivos econômicos suficientes a atrair agentes

privados para ofertar os serviços universais (em substituição aos antigos

monopólios legais). E, portanto, a questão que se colocou era se seria ou não

vantajoso harmonizar-se além do que dispunha a Diretiva 97/67 a cobertura

(ou abrangência) dos serviços postais sujeitos à universalização, entre os

diferentes Estados-membros, antes de se proceder à liberalização dos

mercados.

A Comissão concluiu que essa premissa não era verdadeira dado que

as necessidades dos consumidores variavam de região para região ao

mesmo tempo em que a concorrência ocorreria em velocidade variada ao

longo do território da UE, opinando pela manutenção das regras da Diretiva

97/67 com relação à abrangência geral dos serviços sujeitos à

universalização.214

                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                           <http://ec.europa.eu/internal_market/post/doc/legislation/assessment-summary_en.pdf>. Acesso em: 14 Mar. 2011: “(…) CONCLUSION - In the light of the impacts and recommendations on specific policy issues, high level option D has been proposed: to adapt the existing Directive to the extent necessary for an open postal market, ensuring a high level of universal postal service.” 214 EU. Commission Staff Working Document of 18.10.2006 on Accompanying document to the Proposal for a DIRECTIVE OF THE EUROPEAN PARLIAMENT AND OF THE COUNCIL amending Directive 97/67/EC concerning the full accomplishment of the internal market of Community postal services Executive Summary of the Impact Assessment. Disponível em: <http://ec.europa.eu/internal_market/post/doc/legislation/assessment-summary_en.pdf>. Acesso em: 14 Mar. 2011: “(…) 1) Universal service scope: it means the permanent and obligatory range of postal products that should be subject to universal service. The more extensive the scope, the greater the risk it would not be provided by commercial/market forces alone in the absence of a monopoly. The issue at Community level is whether to harmonise the scope of universal service more narrowly for all Member States. (…) Regarding universal service scope - restricting the universal service scope to postal products that would not be provided for by market forces cannot be harmonised at this point because competition will occur at varied speeds across the EU, and national markets and users' needs differ. Option 1 is recommended – i.e. the main Community obligations concerning the general scope of postal services that must be provided should remain unchanged.”

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124  

Outro argumento levado em consideração pela Comissão referiu-se

aos padrões (ou standards) de serviços universais, ou seja, a Diretiva 97/67

previa regras específicas sobre a coleta e entrega de itens postais por, pelo

menos, 5 dias úteis por semana ao longo de todos os pontos os territórios

dos Estados-membros, bem como regras de preços módicos e acessibilidade

por parte dos consumidores, permitindo, inclusive, a adoção de tarifas

uniformes em cada Estado-membro. A questão colocada foi em que medida a

CE deveria, antes de promover a abertura dos mercados, mudar tais regras,

particularmente, aquela relativa aos preços uniformes.

Embora dos resultados das pesquisas tenha sido observada uma

demanda muito reduzida pela redução harmonizada das regras e limites à

discricionariedade dos Estados-membros com relação à aplicação de metas

de qualidade e/ou preço uniforme, a Comissão considerou que a adoção de

preço uniforme para os serviços universais poderia, em um ambiente de livre

concorrência, representar um incentivo à entrada ineficiente no mercado, pois

a impossibilidade de adequada remuneração do capital do entrante (para o

serviço universal) poderia comprometer o financiamento de tal atividade dado

que tal player não seria capaz de ajustar seus preços de acordo com o

mercado e as regras gerais de oferta, demanda e concorrência; isso

implicaria prejuízos aos consumidores em alguns segmentos específicos do

mercado postal.

Dessa forma, a CE optou por recomendar uma mudança mínima nas

regras da Diretiva 97/76 no sentido de restringir a liberdade dos Estados-

membros em adotar fixar tarifas uniformes, de modo que isso fosse apenas

possível para um leque bem restrito de itens postais como a carta simples

(single item mail) e apenas outros poucos itens postais. De certa forma, essa

recomendação da Comissão acabou por atender ao pedido de muitos players

no sentido de que a obrigação de universalização passasse a recair apenas

sobre os serviços tidos como de “rede de segurança do consumidor”

(consumer safety net).215

                                                                                                                         215 EU. Commission Staff Working Document of 18.10.2006 on Accompanying document to the Proposal for a DIRECTIVE OF THE EUROPEAN PARLIAMENT AND OF THE COUNCIL amending Directive 97/67/EC concerning the full accomplishment of the internal market of Community postal services Executive Summary of the Impact Assessment. Disponível em:

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125  

Outro argumento levado em consideração foi a necessidade de se

adotar modelos de financiamento dos serviços universais diante da

eliminação das áreas reservadas (i.e., dos monopólios legais strictu sensu).

Em resposta a esse argumento, a Comissão deixou bem claro que, de acordo

com a experiência, a mera existência de qualquer reserva legal acaba por

gerar distorções à livre concorrência, seja qual for o monitoramento existente,

razão pela qual reafirmou que não haveria como manter qualquer reserva

legal no âmbito da UE.

Contudo, embora àquela altura (i.e., outubro de 2006) os principais

mercados postais já estivessem plenamente liberalizados ou em vias de ser

liberalizados (e.g., UK, Suécia, Finlândia dentre outros já haviam abolido

totalmente os monopólios postais, enquanto Alemanha e Holanda já haviam

se programado para abolirem completamente as reservas legais em 2008), a

CE, provavelmente em atenção aos Estados-membros dotados de mercados

postais menos desenvolvidos, recomendou que se definissem alternativas,

para utilização em caráter excepcional por parte dos Estados-membros, para

que financiassem (por meio de recursos dos respectivos tesouros nacionais

ou mecanismos de subsídios estatais) serviços de compras públicas (public

procurement), ou simplesmente atribuíssem subsídios estatais, criassem

tributo setorial ou fundo para ratear o custo de universalização dos antigos

serviços reservados.216

                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                           <http://ec.europa.eu/internal_market/post/doc/legislation/assessment-summary_en.pdf>. Acesso em: 14 Mar. 2011: “(…) 2) Universal service standards: the Postal Directive places specific standards on Member States regarding collection and delivery at least 5 working days a week to all points of a Member State's territory, requires affordability and accessibility, and permits uniform tariffs. The issue at Community level is whether to change any of these standards, in particular, the application of uniform tariffs. (…) Regarding universal service standards - there is limited demand for a harmonised reduction of the standards or for limiting Member States' discretion to apply quality and service standards in excess of the minimum Community level. However, following market opening, uniform tariffs on competitive postal products could create an incentive for inefficient market entry, which in turn could undermine the ability of the present incumbent to finance universal service. Yet individual users value tariff uniformity, and its contribution to social cohesion. Option 5 is recommended – i.e. a minimum change of restricting Member States' freedom to apply tariff uniformity to single item mail and certain other items only. It also addresses one of the principal underlying motivations for stakeholders who are advocating the need for a narrower universal service scope which would merely serve as a 'consumer safety net'.” 216 EU. Commission Staff Working Document of 18.10.2006 on Accompanying

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126  

As duas premissas finais avaliadas pela Comissão antes da conclusão

dos estudos referiram-se a acesso à infraestruturas, no todo ou em parte,

componentes da rede postal (antiga rede postal pública, agora denominada

apenas como “postal network”, ou rede postal, provavelmente para abranger

também as redes postais detidas por agentes privados, em grande parte

antigamente controlados por governos nacionais). Basicamente, a CE se

encarregou de avaliar o acesso geral (ou os meios de acesso), por parte de

terceiros (i.e., concorrentes do prestador de serviço universal) a certas

infraestruturas como caixas de correio, base de dados de códigos postais e

endereços, centros de triagem e distribuição etc.

As questões examinadas pela Comissão podem ser resumidas a: (i)

em que medida seria vantajoso, em um ambiente revestido de vários

operadores postais, fortalecer as Autoridades Regulatórias Nacionais com

mais poderes para fiscalizar, determinar acesso compulsório às

infraestruturas e a estabelecer procedimentos que assegurem a integridade

da confiança dos usuários nas correspondências; e (ii) em que medida as

competências das Autoridades Regulatórias Nacionais para intervenções ex

ante (i.e., estruturais, ou no âmbito do merger review) deveriam continuar a

co-existir com as atribuições da CE, ou se deveriam ser tais competências

                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                           document to the Proposal for a DIRECTIVE OF THE EUROPEAN PARLIAMENT AND OF THE COUNCIL amending Directive 97/67/EC concerning the full accomplishment of the internal market of Community postal services Executive Summary of the Impact Assessment. Disponível em: <http://ec.europa.eu/internal_market/post/doc/legislation/assessment-summary_en.pdf>. Acesso em: 14 Mar. 2011: “(…) 3) The reserved area: it is the largest barrier to the completion of the Internal Market as the provision of letters up to 50g (that accounts for the majority of all postal items) may still be monopolised. So far, FI, SE and UK have already abolished the reserved area while DE and NL intend to abolish their reserved areas entirely by 2008. Several other Member States have opened up the market of direct mail and other mail streams in advance of the 2009 target date. The issue at Community level is whether to confirm the EU legislator's target date of 2009 for the abolition of the reserved areas. 4) Alternative financing mechanisms to a monopoly: without a reserved area the issue at Community level is whether alternative measures for financing universal service are needed, if so which ones, and if the Directive should offer any choice in this respect. (…) Regarding the reserved area and financing models – maintaining the reserved area would continue to distort competition; however in order to finance the universal service in the absence of a monopoly, it is necessary to have a range of alternative options for exceptional use. Option 9 is recommended i.e. abolition of the reserved area and therefore leaving Member States a choice of financing options to include: public procurement of services (as an indirect source of public financing), state aids, a sector fee and a universal service cost sharing fund as alternatives to the reserved area.”

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127  

endereçadas exclusivamente à CE no plano do merger review e no tocante a

determinar acesso a infra-estruturas situadas no nível downstream da cadeia

industrial de serviços postais (e.g., a centros de coleta e distribuição de itens

postais).

Com relação à primeira questão, a Comissão recomendou,

basicamente, que as atribuições das Autoridades Regulatórias Nacionais

fossem explicitamente previstas na Diretiva no tocante ao monitoramento e

decisão de acesso à infraestruturas em condições isonômicas e não-

discriminatórias. Com relação à segunda questão, a Comissão entendeu que

devido ao fato de que em poucas (ou, se de fato houvesse) hipóteses em que

elementos da rede postal poderiam ser considerados como “essential

facility”217, imposições de acesso compulsório não se justificariam em nível

comunitário. Paralelamente, a CE também entendeu que não seria justificável

ao legislador comunitário restringir o desenvolvimento de concorrência pelo

acesso às infraestruturas. Dessa forma, recomendou a CE que as decisões

sobre esse tema permanecessem sob a competência dos Estados-membros

(i.e., das Autoridades Regulatórias Nacionais), concluindo que as regras da

Diretiva 97/67 não deveriam ser alteradas nesse particular.218

                                                                                                                         217 OECD. Policy Roundtables. The Essential Facility Concept. 1996. Disponível em: <http://www.oecd.org/dataoecd/34/20/1920021.pdf >. Acesso em: 20 Mar. 2011: “An ‘'essential facilities doctrine’ (EFD) specifies when the owner(s) of an ‘essential’ or ‘bottleneck’ facility is mandated to provide access to that facility at a ‘reasonable’ price. For example, such a doctrine may specify when a railroad must be made available on ‘reasonable’ terms to a rival rail company or an electricity transmission grid to a rival electricity generator. The concept of ‘essential facilities’ requires there to be two markets, often expressed as an upstream market and a downstream market. (The case of two complementary products is logically the same, but confusing in exposition.) Typically, one firm is active in both markets and other firms are active or wish to become active in the downstream market. (See below for a fuller discussion of the market configurations found by some commentators to be relevant to an EFD.) A downstream competitor wishes to buy an input from the integrated firm, but is refused. An EFD defines those conditions under which the integrated firm will be mandated to supply. While essential facilities issues do arise in purely private, unregulated contexts, there is a tendency for them to arise more commonly in contexts where the owner/controller of the essential facility is subject to economic regulation or is State-owned or otherwise State-related. Hence, there is often a public policy choice to be made between the extension of economic regulation and an EFD under the competition laws. Further, the fact of regulation of pricing through economic regulation, State-control, or a prohibition of ‘excessive pricing’ in the competition law, has implications for the nature of an EFD.” 218 EU. Commission Staff Working Document of 18.10.2006 on Accompanying document to the Proposal for a DIRECTIVE OF THE EUROPEAN PARLIAMENT AND OF THE COUNCIL amending Directive 97/67/EC concerning the full accomplishment of the internal market of Community postal services Executive Summary of the Impact Assessment. Disponível em: <http://ec.europa.eu/internal_market/post/doc/legislation/assessment-summary_en.pdf>.

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128  

Em fevereiro de 2008 foi publicada a Diretiva 2008/6, a qual, seguindo

as recomendações resultantes dos estudos levados a efeito pela CE,

emendou a Diretiva 97/67 provendo a total eliminação da possibilidade de

reservas legais para serviços postais na UE. Em síntese, a Diretiva 2008/6

atribuiu nova redação ao Artigo 7, da Diretiva 97/67, a partir do qual os

Estados-membros não deveriam garantir ou manter em vigor qualquer direito

exclusivo ou especial para a prestação de serviços postais.

Com base em critérios apresentados na conclusão dos estudos

realizados pela CE sobre a abertura do mercado postal (outubro de 2006), a

possibilidade de que os Estados-membros financiassem a prestação de

serviços universais foi mantida, ainda que em caráter bastante restrito e

temporário, tendo em vista que a vigência da Diretiva foi estendida até 31 de

Dezembro de 2012. Além disso, a limitação dos monopólios postais na UE foi

garantida apenas aos mercados postais menos desenvolvidos (i.e., República

Checa, Grécia, Chipre, Letônia, Lituânia, Luxemburgo, Hungria, Malta,

                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                           Acesso em: 14 Mar. 2011: “(…) 5) Access to certain facilities/means of the postal infrastructure: at national level there are many legal restrictions on the use (or 'access') of postal infrastructure elements such as postal and delivery boxes, postcode and change of address databases. These may restrict the development of competition and could also undermine users' confidence if mail quality standards fell. The issue at Community level is whether, in a multi-operator postal environment, to strengthen Member States' or National Regulatory Authorities' role in the monitoring and /or in mandating of access to such facilities, and in the establishment of procedures that will ensure integrity and users' confidence in mail. 6) Downstream Access: it refers to access by third parties to the incumbent operator's infrastructure, particularly its sorting and delivery facilities. This is currently not explicitly regulated by the Postal Directive. The issue is whether the natural development of different models of competition or, where that Member State judges it necessary, the facilitation or imposition of one model, may continue to co-exist or call for ex-ante Community intervention. If so, the follow on issue is whether the Community should harmonise and/or strengthen Member State's ex-ante role in the monitoring or mandating of downstream access. (…) Regarding access to essential means of the postal infrastructure - it is advantageous for users, and existing and potential market entrants, that the benefits of competition are not diluted because market players fail to agree on the terms of access to such means. Option 12 would explicitly authorise the National Regulatory Authority to intervene if required to avoid this, and is therefore recommended. Regarding downstream access to sorting and delivery networks - because few (if any) elements of the core postal network are an 'essential facility', strengthened provisions or the mandatory imposition of such downstream access do not seem justified at Community level. Equally however, it does not seem appropriate for the EU legislator to restrict the development of access competition. Option 16 is recommended, i.e. decisions on mandatory downstream access could still be taken at Member State level, taking into account relevant economic and competitive factors. Access may be judged appropriate for some national markets but not in others, but the current Postal Directive is not proposed to be changed in this respect.”

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Polônia, Romênia e Eslováquia), os quais permaneceram com a possibilidade

de, em caráter bem restrito, manter até 31 de Dezembro de 2012 reservas

legais com o propósito de manter a continuidade dos serviços universais.

Com isso, é possível afirmar que o monopólio postal na Europa foi

praticamente extinto, tendo-se registrado uma melhoria significativa nos

níveis de qualidade, preços e, portanto, bem-estar social (principalmente por

parte dos consumidores) naquela região.219

3.3.1.1 Jurisprudência sobre limites do monopólio postal

Além dos casos CE v. Kingdom of the Netherlands - PTT Post BV –

90/16/EEC220 e CE v. Kingdom of Spain – Ordenanza Postal of 19 May 1960

– 90/456/EEC221, julgados anteriormente à publicação do Green Paper, em

1992, outros casos de ampliação dos limites dos monopólios postais

passaram pelo crivo das autoridades da CE, bem como das Cortes da UE.

Um deles é o caso Régie des Postes v. Paul Corbeu, em que a

empresa monopolista do setor postal da Bélgica, controlada pelo governo                                                                                                                          219 EU. Directive 2008/6/EC of The European Parliament and of The Council of 20.02.2008 amending Directive 97/67/EC with regard to the accomplishment of the internal market of Community postal. Disponível em: <http://ec.europa.eu/internal_market/post/doc/legislation/2008-06_en.pdf>. Acesso em: 25 Fev. 2011: “8. Article 7 shall be replaced by the following: ‘Article 7 1. Member States shall not grant or maintain in force exclusive or special rights for the establishment and provision of postal services. Member States may finance the provision of universal services in accordance with one or more of the means provided for in paragraphs 2, 3 and 4, or in accordance with any other means compatible with the Treaty. (…) Article 3 1. By derogation to Article 2, the following Member States may postpone the implementation of this Directive until 31 December 2012, in order to continue to reserve services to universal service provider(s): Article 3 1. By derogation to Article 2, the following Member States may postpone the implementation of this Directive until 31 December 2012, in order to continue to reserve services to universal service provider(s): Czech Republic, Greece, Cyprus, Latvia, Lithuania, Luxembourg, Hungary, Malta, Poland, Romania, Slovakia.” 220 EU. Commission Decision of 20.12.1989 concerning the provision in the Netherlands of express delivery services 90/16/EEC (case EC v. Kingdom of Netherlands - PTT Post BV – 90/16/EEC). Disponível em: <http://www.jcampbell.com/Reference/eu/198912_nl_express.pdf>. Acesso em: 6 Mar. 2011. 221 EU. Commission Decision of 1 August 1990 concerning the provision in Spain of international express courier services (CE v. Kingdom of Spain – Ordenanza Postal of 19 May 1960 – 90/456/EEC). Disponível em: <http://www.jcampbell.com/Reference/eu/199008_spain_express.pdf>. Acesso em: 6 Mar. 2011.  

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Belga, processou criminalmente o Sr. Paul Corbeu, executivo do ramo postal,

por ter violado a legislação belga relativa ao monopólio postal

(especificamente, Moniteur Belge of 30-31 December 1956, p.8619).

Recebendo o caso, o Tribunal Correctionnel de Liège, Bélgica, entendeu por

bem suspender a análise do caso e enviar a questão à Corte de Justiça de

UE no sentido de, em síntese, saber se a legislação belga em questão (que

aplicava sanção penal pela violação do monopólio postal) era compatível com

o Tratado da CE e, dessa forma, obter direcionamento de como tratar o caso

concreto à luz da legislação comunitária.

A Corte Européia decidiu em síntese que a legislação belga não era

compatível com o Artigo 90 do Tratado da CE, pois não se podia proibir, sob

ameaça de sanção criminal, um agente econômico estabelecido no país de

ofertar um serviço específico dissociado dos serviços de interesse geral,

sendo que tais serviços atendem a uma demanda especial por parte de

clientes sensíveis a serviços de maior valor agregado, não ofertados pela

empresa controlada pelo governo e detentora de direitos exclusivos sobre os

serviços postais tradicionais, ainda mais se tais serviços especiais (rapid

delivery services) não comprometem o equilíbrio econômico-financeiro dos

serviços postais tradicionais desempenhados pelo monopolista estatal.222

                                                                                                                         222 EU. European Court of Justice. Decision of 19.05.1993 on the Case C-320/91 (Régie des Postes v. Paul Corbeu – rapid delivery service). Disponível em: <http://www.jcampbell.com/Reference/eu/199305_ecj_corbeau.pdf>. Acesso em: 7 Mar. 2011: “GROUNDS [Subject matter] - 1 By judgment of 13 November 1991, received at the Court on 11 December 1991, the Tribunal Correctionnel de Liège (Criminal Court, Liège) referred to the Court for a preliminary ruling under Article 177 of the EEC Treaty four questions on the interpretation of Articles 86 and 90 of the Treaty in order to enable it to determine the compatibility with those articles of the Belgian rules on the postal monopoly. 2 The questions were raised in criminal proceedings before that court against Paul Corbeau, a businessman from Liège, charged with infringing the Belgian legislation on the postal monopoly. 3 In Belgium the Law of 26 December 1956 on the postal service (Moniteur Belge of 30-31 December 1956, p. 8619) and the Law of 6 July 1971 establishing the Régie des Postes (Moniteur Belge of 14 August 1971, p. 9510) confer on the Régie des Postes, a legal person under public law, an exclusive right to collect, carry and distribute throughout the Kingdom all correspondence of whatever nature, and lay down penalties for any infringement of that exclusive right. 4 It may be seen from the documents in the main proceedings which have been sent to the Court, from the written observations submitted and from the oral argument presented at the hearing, that Mr. Corbeau provides, within the City of Liège and the surrounding areas, a service consisting in collecting mail from the address of the sender and distributing it by noon on the following day, provided that the addressee is located within the district concerned. As regards correspondence destined for addressees outside that district, Mr. Corbeau collects it from the sender's address and sends it by post.

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131  

Esse caso é interessante, pois, em mais uma ocasião, as autoridades

da UE, agora a Corte de Justiça Européia, afirmam a tendência de limitação

de tentativas de ampliação das reservas legais (i.e., monopólios legais) no

âmbito da UE, sendo este caso relacionado ao mercado de rapid delivery

service, espécie de serviço (distinto do express mail) de entrega comum de

correspondências, porém, com maior valor agregado que o serviço postal

tradicional devido a sua natureza customizada, caracterizada, por exemplo,

pela maior rapidez da entrega, pela flexibilidade de mudança de rotas e

destinos durante o transporte (tracking and tracing), por possuir maior

credibilidade ou confiabilidade (e.g., entrega com hora marcada, pessoal e

em endereços específicos). Além disso, outro ponto desta decisão que

merece destaque é reafirmação de que o ônus de demonstrar que o regime

de livre concorrência ameaça a prestação do serviço universal é da empresa

monopolista, e não do competidor.223

                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                           5 Upon complaint from the Régie des Postes, the Tribunal Correctionnel de Liège decided, in view of its doubts with regard to the compatibility of the Belgian rules in question with Community law, to stay the proceedings and to refer the following questions to the Court of Justice for a preliminary ruling: (a) To what extent is a postal monopoly, such as that organized under the Belgian Law of 26 December 1956 on the postal monopoly, in conformity, as Community law now stands, with the rules of the Treaty of Rome (and in particular with Articles 90, 85 and 86) and with the rules of derived law in force which are applicable in this area? (b) To what extent, if at all, must such a monopoly be modified in order to comply with the Community obligations imposed on the Member States in this area, and in particular with Article 90(1), and with the rules of derived law applicable in this area? (c) Is an undertaking in which a statutory monopoly is vested and which enjoys exclusive rights analogous to those described in the Belgian Law of 26 December 1956, subject to the rules of European competition law (and in particular to Articles 7 and 85 to 90 inclusive) by virtue of Article 90(2) of the EEC Treaty? (d) Does such an undertaking hold a dominant position in a substantial part of the common market within the meaning of Article 86 of the Treaty of Rome, a position deriving either from a statutory monopoly or from the particular circumstances? (…) [Decision] - 21 The answer to the questions referred to the Court by the Tribunal Correctionnel de Liège should therefore be that it is contrary to Article 90 of the EEC Treaty for legislation of a Member State which confers on a body such as the Régie des Postes the exclusive right to collect, carry and distribute mail, to prohibit, under threat of criminal penalties, an economic operator established in that State from offering certain specific services dissociable from the service of general interest which meet the special needs of economic operators and call for certain additional services not offered by the traditional postal service, in so far as those services do not compromise the economic equilibrium of the service of general economic interest performed by the holder of the exclusive right. It is for the national court to consider whether the services in question in the main proceedings meet those criteria.” 223 EU. European Court of Justice. Decision of 19.05.1993 on the Case C-320/91 (Régie des Postes v. Paul Corbeu – rapid delivery service). Disponível em: <http://www.jcampbell.com/Reference/eu/199305_ecj_corbeau.pdf>. Acesso em: 7 Mar. 2011: “GROUNDS

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Em 2008, a CE novamente se posicionou sobre o tema, no caso CE v.

Slovenská Postá. Em 2004, foi publicado o Postal Act of the Slovak Republic

(2004), o qual reservou à empresa controlada pelo governo (Slovenská

Posta) o direito de prestar o serviço universal de coleta e entrega de cartas.

Não estava englobada nessa lei a prestação de serviço de hybrid mail

(correspondência eletrônica transmitida eletronicamente para o prestador de

serviço, o qual a imprimia, colocava em um envelope e a entregava ao

destinatário).

A Slovak Telecom abriu uma concorrência para enviar suas faturas por

hybrid mail, a partir de duas empresas privadas para a recepção, conversão e

entrega do hybrid mail. Tais empresas passaram a operar em suas áreas, as

quais correspondiam a cerca de três quartos da população da Eslováquia, e

utilizaram a rede postal pública da Slovenská Posta para cobrir o restante da

                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                           (…) [Rapid mail services] - The rapid delivery service - which should not be confused with the ordinary "Express" mail, which falls within the sphere of the normal postal service (Green Paper, pages 365 and 366) - is a specific service which has been steadily developing, particularly in recent years, to deal with the requirements of special categories of users (above all undertakings and the professions). It must be stated that, as is quite clear from the Green Paper, the rapid delivery service - of which legislation gives no definition - is no different from the basic postal service as regards either the content or weight of the objects delivered or - it should be emphasized - by greater speed. In one of the passages of the Green Paper the Commission observes in this respect: "In what way can an express item be easily distinguished from a letter? Its dimension, weight and contents may be the same. Even the speed of delivery may be similar. The essential difference lies in the value (whatever form it takes) added by express service providers and perceived by customers. The most effective way of determining the extra value perceived is to consider the extra price that customers are prepared to pay". What characterizes the rapid delivery service is in general the added value which it presents as compared with the basic service, an added value which, in its turn, consists in one or more additional services such as: - collection of the correspondence from the sender' s address; - a greater speed or reliability of distribution (resulting for example from delivery by a certain time or to the addressee personally or again with confirmation to the sender that delivery has been effected); - the possibility of changing the destination during transport (tracking and tracing); - the possibility of shaping the service according to the individual requirements of customers (personalized services). (16) The rapid delivery service may also operate in a territorial area of variable size: international, national or even infra-national. (17) In particular the Green Paper specifies, with regard to "city mail", that "This is a service operated by private operators. It usually refers to mail which is collected in an urban area for delivery in that area." However, there is nothing to prevent international rapid delivery undertakings from performing "city mail" services. (…) [Brief of the question] - 16 The question which falls to be considered is therefore the extent to which a restriction on competition or even the exclusion of all competition from other economic operators is necessary in order to allow the holder of the exclusive right to perform its task of general interest and in particular to have the benefit of economically acceptable conditions.”

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população do país. Após três anos, o Parlamento da Eslováquia emendou o

Postal Act de 2004 estendendo a reserva legal para o mercado de hybrid

mail.

A CE abriu uma investigação contra a Slovenská Posta por violação ao

Artigo 86, combinado com o Artigo 81, ambos do Tratado da CE. Na mesma

linha dos casos CE v. Kingdom of the Netherlands - PTT Post BV –

90/16/EEC,CE v. Kingdom of Spain – Ordenanza Postal of 19 May 1960 –

90/456/EEC e Régie des Postes v. Paul Corbeu, a Slovenská Posta alegou

que a ampliação dos limites da reserva legal era necessária para manter a

prestação do serviço universal, utilizando para tanto projeções de custos e de

perdas futuras diante da não ampliação do monopólio para o mercado de

hybrid mail. A Comissão entendeu que tais projeções de custos e de perdas

não eram confiáveis nem factíveis, decidindo pela violação do Tratado de

Roma.224

3.3.2 Transparência e não discriminação

Como colocado acima, a UE desenvolveu um arcabouço normativo

voltado a introduzir a matriz concorrencial nos serviços postais com base em

quatro premissas básicas: a delimitação clara e precisa dos limites do

monopólio postal, transparência, não discriminação e separação de funções

de agente econômico e regulador. A delimitação da reserva legal, sua

progressiva e gradual redução foram demonstradas acima, passando-se

agora a se avaliar as normas relativas à transparência e não discriminação.

Nesse sentido, a Diretiva 97/67 pode ser segmentada, para critérios de

análise, em três frentes: acesso às redes postais, princípios de definição de

tarifas e terminal dues (o que se denomina, neste trabalho, de “tarifas de

interconexão entre redes postais”). O acesso às redes postais foi tratado pelo

Artigo 11, da Diretiva 97/67, pelo qual o Parlamento Europeu e o Conselho da

UE deveriam adotar medidas de harmonização normativa, caso fosse

                                                                                                                         224 EU. Commission Decision of 7.10.2008 relating to a proceeding under Article 86(3) of the EC Treaty on the Slovakian postal legislation relating to hybrid mail services (Case COMP/F-1/39.562). Disponível em: <http://eur-lex.europa.eu/LexUriServ/LexUriServ.do?uri=OJ:C:2008:322:0010:0011:EN:PDF>. Acesso em: 9 Mar. 2011.  

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necessário, para assegurar que os usuários e o fornecedor (ou fornecedores)

de serviços universais tivessem acesso à rede postal pública (postal public

network) em bases transparentes e não-discriminatórias.225

Para entender a extensão desse dispositivo, torna-se necessário

analisar o que se entende por “rede postal pública”. O Artigo 2(2), da Diretiva

97/67, traz expressamente o significado de tais termos, sendo “rede postal

pública” o sistema de organização e recursos de todos os tipos utilizados pelo

prestador (ou prestadores) de serviço universal para, particularmente, as

seguintes finalidades: (i) coleta de itens postais depositados nos pontos de

acesso; (ii) identificação e encaminhamento de tais itens postais dos pontos

de acesso postal ao centro de distribuição; e (iii) distribuição dos itens postais

para os destinatários neles identificados. Mais tarde, a Diretiva 2008/6

simplesmente alterou o termo para “redes postais”, pois, como se observou

acima, provavelmente pretendeu abranger as redes postais detidas pelas

empresas privadas anteriormente controladas por governos nacionais.226

Alguns termos referidos no Artigo 2(2), bem como outros a ele

relacionados, merecem pontuais esclarecimentos. Por “pontos de acesso”,

entende-se as estruturas físicas, incluindo caixas de correio disponibilizadas

para uso público tanto em ruas ou avenidas, como nos estabelecimentos do

prestador de serviço universal (i.e., USP). Por “distribuição”, entende-se a

                                                                                                                         225   EU. Directive 97/67/EC of The European Parliament and of The Council of 15 December 1997 on common rules for the development of the internal market of Community postal services and the improvement of quality of service. Disponível em: < http://eur-lex.europa.eu/LexUriServ/LexUriServ.do?uri=OJ:L:1998:015:0014:0025:EN:PDF>. Acesso em: 4 Nov. 2010: “Article 11 The European Parliament and the Council, acting on a proposal from the Commission and on the basis of Articles 57(2), 66 and 100a of the Treaty, shall adopt such harmonisation measures as are necessary to ensure that users and the universal service provider(s) have access to the public postal network under conditions which are transparent and non-discriminatory.” 226 EU. Directive 2008/6/EC of The European Parliament and of The Council of 20.02.2008 amending Directive 97/67/EC with regard to the accomplishment of the internal market of Community postal. Disponível em: <http://ec.europa.eu/internal_market/post/doc/legislation/2008-06_en.pdf>. Acesso em: 25 Fev. 2011: “2. Article 2 shall be amended as follows: (…) (c) in point 2 the words ‘public postal network’ shall be replaced by ‘postal network’;”  

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atividade (ou processo) de triagem realizada em centro de distribuição e

voltada à entrega dos itens postais aos seus destinatários.227

3.3.2.1 Acesso às redes postais (postal networks)

O acesso à rede postal pública garantido pelo Artigo 11 encarta,

basicamente, uma norma programática pela qual o acesso à rede postal

pública deve ser garantido, em bases isonômicas e não discriminatórias,

àqueles que delas necessitem utilizar-se para o envio ou recebimento de

itens postais ou itens de correspondências. Em outras palavras, usuários

finais (consumidores) e também agentes econômicos que atuem em

determinados segmentos da “cadeia de industrial” dos serviços postais. Havia

certa controvérsia se esse dispositivo serviria de base à elaboração de

normas para acesso de concorrentes às redes postais públicas utilizadas

pelo prestador de serviço universal (i.e., monopolista). Alegava-se que essa

utilização poderia causar uma desvantagem ao player monopolista e, em

tese, prejudicar a prestação do serviço universal.228

Todavia, em uma interpretação histórico-sistemática da Diretiva 97/67,

à luz, inclusive, da jurisprudência, entende-se que a principal função desse

dispositivo seria destinar-se à garantia de acesso à rede postal pública por

                                                                                                                         227 EU. Directive 97/67/EC of The European Parliament and of The Council of 15 December 1997 on common rules for the development of the internal market of Community postal services and the improvement of quality of service. Disponível em: <http://eur-lex.europa.eu/LexUriServ/LexUriServ.do?uri=OJ:L:1998:015:0014:0025:EN:PDF>. Acesso em: 4 Nov. 2010: “Article 2 For the purposes of this Directive, the following definitions shall apply: (...) 2. public postal network: the system of organisation and resources of all kinds used by the universal service provider(s) for the purposes in particular of: — the clearance of postal items covered by a universal service obligation from access points throughout the territory, — the routing and handling of those items from the postal network access point to the distribution centre, — distribution to the addresses shown on items; 3. access points: physical facilities, including letter boxes provided for the public either on the public highway or at the premises of the universal service provider, where postal items may be deposited with the public postal network by customers; (...) 5. distribution: the process from sorting at the distribution centre to delivery of postal items to their addressees;”  228   GERADIN, D.; HENRY, D. Regulatory and Competition Law Remedies in the Postal Sector. Remedies in Network Industries: EC Competition Law vs. Sector-Specific Regulation. Damin Geradin (Editor). Intersentia. Antwerp, Oxford, UK, 2004, p.130-131.  

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parte de agentes econômicos diversos, principalmente dos concorrentes. O

ponto interessante é que, nesse sentido, esse dispositivo acabara por

representar redundância às normas de defesa da concorrência contidas no

Tratado de Roma, especificamente ao Artigo 82 (abuso da posição

dominante), atualmente Artigo 102 (a) e (c), no TFUE.229

Explica-se: como a rede postal era utilizada principalmente pelo

prestador de serviços universais, em regime de monopólio legal, haveria, por

parte deste último, uma posição dominante no tocante ao provimento de

acesso à rede, isto é, à fixação do preço e condições de acesso, a partir do

que poderia abusar de sua posição de modo a prejudicar a concorrência. A

verossimilhança desse raciocínio ficará demonstrada ao longo deste trabalho,

notadamente à luz dos casos analisados e a serem analisados no âmbito da

CE. Com a publicação dos Commission's Work Plan item 2006/MARKT/006

on Postal Services e, após, da Diretiva 2008/6, esse entendimento ficou

pacificado no sentido de que o acesso à rede postal deveria, sim, ser

garantido em bases isonômicas, por critérios transparentes e não

discriminatórios aos concorrentes do prestador de serviços universais. Isso

pode ser claramente observado na nova redação atribuída ao Artigo 11 da

Diretiva 97/67, bem como ao Artigo 11a, pela Diretiva 2008/6.230

                                                                                                                         229  Vale observar, nesse sentido, os termos do Artigo 82(a) e (c), do TFUE. EU. Treaty on the Functioning of the European Union (TFEU). Disponível em: <http://eur-lex.europa.eu/LexUriServ/LexUriServ.do?uri=OJ:C:2008:115:0047:0199:EN:PDF>. Acesso em: 9 Fev. 2011: “Article 102 (ex Article 82 TEC) Any abuse by one or more undertakings of a dominant position within the internal market or in a substantial part of it shall be prohibited as incompatible with the internal market in so far as it may affect trade between Member States. Such abuse may, in particular, consist in: (a) directly or indirectly imposing unfair purchase or selling prices or other unfair trading conditions; (…) (c) applying dissimilar conditions to equivalent transactions with other trading parties, thereby placing them at a competitive disadvantage;” 230 EU. Directive 2008/6/EC of The European Parliament and of The Council of 20.02.2008 amending Directive 97/67/EC with regard to the accomplishment of the internal market of Community postal. Disponível em: <http://ec.europa.eu/internal_market/post/doc/legislation/2008-06_en.pdf>. Acesso em: 25 Fev. 2011: “12. Article 11 shall be replaced by the following: ‘Article 11 The European Parliament and the Council, acting on a proposal from the Commission and on the basis of Articles 47(2), 55 and 95 of the Treaty, shall adopt such harmonisation measures as are necessary to ensure that users and the postal service provider(s) have access to the postal network under conditions which are transparent and non-discriminatory.’; 13. the following Article shall be inserted:

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137  

Em complemento, o entendimento exposto no parágrafo acima se

fortalece se analisado na perspectiva de racionalidade econômica, isto é,

para que haja realmente um ambiente de não discriminação nos serviços

postais na UE, é necessário eliminar-se todos os pontos (ou gargalos) que

distorçam artificialmente a concorrência, ou desnivelem o campo de livre

competição (“the level playing field”). O acesso à rede postal pública é um

deles, sendo que o acesso discriminado ou, na pior das hipóteses, a vedação

de acesso a seus ativos (como, por exemplo, caixas de correio), geraria

claros efeitos negativos à dinâmica concorrencial, criando benefícios ao

monopolista em detrimento dos demais agentes econômicos.

Nesse particular, vale breve comparação com o sistema dos EUA,

mais precisamente com relação à Seção 1725 do Código Penal dos EUA231,

bem como à decisão da U.S. Supreme Court no caso United States Postal

Service v. Council of Greenburgh Civic Association232, em que o monopólio

sobre as caixas de correio ficou definitivamente garantido à USPS, o que,

como pontuado no Capítulo II, representou uma desvantagem competitiva

clara, em termos econômicos, aos rivais da USPS no mercado de express

mail.

Por razões econômicas (ou fáticas), transparência e não discriminação

podem ser entendidas como soluções normativas intrinsecamente

                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                           ‘Article 11a Whenever necessary to protect the interest of users and/or to promote effective competition, and in the light of national conditions and national legislation, Member States shall ensure that transparent, non-discriminatory access conditions are available to elements of postal infra-structure or services provided within the scope of the universal service, such as postcode system, address database, post office boxes, delivery boxes, information on change of address, re-direction service and return to sender service. This provision shall be without prejudice to the right of Member States to adopt measures to ensure access to the postal network under transparent, proportional and non-discriminatory conditions.’;” 231 US. United States Code (U.S.C.). Title 18 (Crimes and Criminal Procedure), Section 1725. “Whoever knowingly and willfully deposits any mailable matter such as statements of accounts, circulars, sale bills, or other like matter, on which no postage has been paid, in any letter box established, approved, or accepted by the Postal Service for the receipt or delivery of mail matter on any mail route with intent to avoid payment of lawful postage thereon, shall for each such offense be fined under this title.” Disponível em: <http://www.law.cornell.edu/uscode/html/uscode18/usc_sec_18_00001725----000-.html>. Acesso em: 8 Jan. 2011. 232 US. U.S. Supreme Court. United States Postal Serv. v. Council of Greenburg Civic Associations (No. 80-608, June 25, 1981). Cit. 453 U.S. 114, 101 S.Ct. 2676, 69 L.Ed.2d 517, 7 Media L. Rep. 1505. Disponível em: <https://web2.westlaw.com/find/default.wl?rs=WLW11.01&fn=_top&sv=Split&cite=453+U.S.+114&utid=1&vr=2.0&rp=%2ffind%2fdefault.wl&mt=LawSchoolPractitioner>. Acesso em: 12 Jan. 2011.

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relacionadas, de modo que as normas para garanti-las acabam também por

relacionar-se intrinsecamente. Isso acontece, por exemplo, com as normas

de acesso à rede postal pública que devem não somente prever o acesso,

mas garantir que seja concedido em bases isonômicas e não

discriminatórias. Para que seja possível monitorar se o acesso obedece a tais

parâmetros, é preciso haver transparência. Essa premissa é expressa na

Diretiva 2008/6233 e se aplica também à definição dos preços ou tarifas

relacionadas ao serviço universal e ao acesso à rede postal. O nível dos

preços (ou tarifas) possui impacto imediato no serviço universal e nas

condições de concorrência nos serviços postais como um todo.234

Nesse sentido, o Artigo 12, da Diretiva 97/67, prevê que os Estados-

membros deveriam adotar as medidas necessárias para assegurar que as

tarifas (ou preços) de cada serviço (ou segmento) integrante da prestação de

serviço universal respeitassem os seguintes princípios: preços devem ser

suportáveis e devem ser fixados em montantes tais que permitam a todos os

usuários acesso ao serviço universal; os preços devem ser guiados pelos                                                                                                                          233 EU. Directive 2008/6/EC of The European Parliament and of The Council of 20.02.2008 amending Directive 97/67/EC with regard to the accomplishment of the internal market of Community postal. Disponível em: <http://ec.europa.eu/internal_market/post/doc/legislation/2008-06_en.pdf>. Acesso em: 25 Fev. 2011: “(…) (41) In view of the transition towards a fully competitive market, and in order to prevent cross-subsidies from adversely affecting competition, it is appropriate to continue to require Member States to maintain the obligation on universal service providers of keeping separate and transparent accounts, subject to necessary adaptations. This obligation should provide national regulatory authorities, competition authorities, and the Commission with the information necessary to adopt decisions related to the universal service and to monitor fair market conditions until competition becomes effective. Cooperation between national regulatory authorities in continuing to develop benchmarks and guidelines in this area should contribute to the harmonised application of these rules. Keeping separate and transparent accounts should provide Member States and their national regulatory authorities with accounting information of sufficient detail to: — adopt decisions related to the universal service, — be used as an input when determining whether the universal service obligations imposed entail a net cost and represent an unfair financial burden on the universal service provider, — ensure that the tariffs applied to the universal service comply with the principles on tariffs as set out in this Directive, — ensure compliance with the principles on terminal dues as set out in this Directive; and, — monitor fair market conditions until competition becomes effective. (…) (48) Due to the frequent involvement of different national bodies in the exercise of regulatory functions, it is appropriate to introduce transparency in the allocation of tasks and require the different relevant bodies charged with sector regulation, the application of competition rules and with dealing with consumer issues to cooperate in order to ensure the effective accomplishment of their tasks.” 234 GERADIN, D.; HENRY, D. Regulatory and Competition Law Remedies in the Postal Sector. Remedies in Network Industries: EC Competition Law vs. Sector-Specific Regulation. Damin Geradin (Editor). Intersentia. Antwerp, Oxford, UK, 2004, p.130-131.  

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custos (i.e., devem ser compatíveis aos custos, não servindo, em outras

palavras, de plataforma para a geração de lucros extraordinários), podendo

os Estados-membros decidir para adoção de preço uniforme (ou único) para

os serviços em todo o território nacional; a adoção de preço uniforme não

excluiria a possibilidade do prestador de serviços universais negociar tarifas

diferenciadas em bases individuais com seus clientes; os preços (ou tarifas)

devem ser transparentes e não-discriminatórios, i.e., a função de custo do

serviço universal deveria, ao menos em tese, ser pública, da mesma forma os

preços, sendo esses últimos aplicáveis a todos os tipos de clientes, sem a

possibilidade de discriminação.235

É interessante tecer algumas observações sobre esse dispositivo no

tocante ao seu papel na redistribuição de incentivos no setor e, portanto,

potencialização da matriz competitiva nos mercados postais. O primeiro

ponto decorre do fato de que a determinação de que os preços deveriam ser

suportáveis de modo a permitir acesso a todos os usuários, subjaz a idéia de

modicidade tarifária. E não preços uniformes, que passaram a ser opcionais.

Isso, em outras palavras, é um importante sinal para o mercado - leia-se

tanto para empresas públicas como privadas que naturalmente almejariam

receitas polpudas – de que provavelmente não seria possível, ao menos em

tese, obter lucros de monopólio com a exploração do monopólio legal. O

ponto fraco dessa medida é que não ficou claro na Diretiva o que equivaleria

a preços suportáveis, restando aos Estados-membros a definição dessa

                                                                                                                         235 EU. Directive 97/67/EC of The European Parliament and of The Council of 15 December 1997 on common rules for the development of the internal market of Community postal services and the improvement of quality of service. Disponível em: <http://eur-lex.europa.eu/LexUriServ/LexUriServ.do?uri=OJ:L:1998:015:0014:0025:EN:PDF>. Acesso em: 4 Nov. 2010: “Article 12 Member States shall take steps to ensure that the tariffs for each of the services forming part of the provision of the universal service comply with the following principles: — prices must be affordable and must be such that all users have access to the services provided, — prices must be geared to costs; Member States may decide that a uniform tariff should be applied throughout their national territory, — the application of a uniform tariff does not exclude the right of the universal service provider(s) to conclude individual agreements on prices with customers, — tariffs must be transparent and non-discriminatory.”

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questão236 – o que na prática acabou por garantir uma sobrevida às

empresas monopolistas no tocante a preços mais altos.

O segundo ponto decorre de outro sinal normativo que reforça o

primeiro, também pelo menos em tese, qual seja, de que os preços (ou

tarifas) para os serviços universais deveriam ser guiados pelos respectivos

custos de respectivos serviços universais (e não de qualquer outra atividade

desempenhada pela empresa, pública ou privada, prestadora do serviço

universal em regime de monopólio legal). Embora não a perca, esse princípio

acaba por ter sua força relativizada pelo fato de que, caso os Estados-

membros optem por um sistema de preços uniformes, ainda poderiam se

valer de subsídios-cruzados para obter, em algumas regiões (como grandes

centros urbanos), remunerações superiores aos níveis que seriam verificados

em um mercado competitivo - para manter o serviço a preços uniformes em

mercados pouco ou nada rentáveis (como áreas rurais e/ou muito pouco

povoadas).237

Outra questão que se colocaria, contudo, seria: como monitorar

efetivamente a metodologia de precificação da empresa monopolista?

Pressupondo que esta não possui qualquer incentivo para abrir totalmente

sua função de custos, ou seja, sempre procurará ludibriar o agente regulador

de modo a defender maiores receitas para si. O último ponto sobre esse

dispositivo traz parte da resposta àquela pergunta, i.e., os preços (leia-se

custos e preços) deveriam ser transparentes e não discriminatórios.

Por essa mesma razão, a prática de subsídios cruzados, quando da

escolha do modelo de preço uniforme, não teria tanta força para sustentar

práticas anticoncorrenciais. Esse raciocínio acabou sendo reforçado pela

Diretiva 2002/39, Artigo 1(2), pelo qual os preços e condições do prestador

de serviços universais deveriam ser aplicados de forma equânime tanto a

diferentes terceiros, quando entre terceiros e as atividades equivalentes (ou

concorrentes) desempenhadas pelo mesmo prestador de serviços universais

(e.g., os preços praticados pelo prestador de serviço universal para utilizar                                                                                                                          236 GERADIN, D.; HENRY, D. Regulatory and Competition Law Remedies in The Postal Sector. Remedies in Network Industries: EC Competition Law vs. Sector-Specific Regulation. Damin Geradin (Editor). Intersentia. Antwerp, Oxford, UK, 2004, p.132.  237   GERADIN, D.; HENRY, D. Regulatory and Competition Law Remedies in The Postal Sector. Remedies in Network Industries: EC Competition Law vs. Sector-Specific Regulation. Damin Geradin (Editor). Intersentia. Antwerp, Oxford, UK, 2004, p.132.

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caixas de correio para a prestação de serviço de express mail deveria ser o

mesmo praticado com seus concorrentes para a utilização das caixas

postais).238

No mesmo sentido, operou a Diretiva 2008/6, sacramentando as

premissas de tratamento isonômico, transparente e não discriminatório entre

os players do setor postal europeu.239 Afora a validade normativa dessa

premissa, a tutela concorrencial também deveria ser aplicada no caso de

comportamentos anticoncorrenciais por parte dos prestadores de serviços

universais.240

De fato, a defesa da concorrência, a qual já continha em si regras

contra a discriminação, acabou sendo o principal meio para aplicar tais

princípios, inclusive o de transparência, dado que quase na totalidade dos

casos em que remédios foram adotados a transparência serviu de meio para

monitorar regras de não discriminação fixadas nas decisões da CE, tais como

a decisão do caso TNT / Canada Post, DBP Postdienst, La Post, PTT Post &

Sweden Post (1991), bem como em outros casos analisados mais à frente.

Mesmo assim, os problemas comportamentais imanentes à existência de                                                                                                                          238 EU. Directive 2002/39/EC of the European Parliament and of the Council of 10.06.2002 amending Directive 97/67/EC with regard to the further opening to competition of Community postal services. Disponível em: <http://eur-lex.europa.eu/LexUriServ/LexUriServ.do?uri=OJ:L:2002:176:0021:0025:EN:PDF>. Acesso em: 4 Nov. 2010. No mesmo sentido, ver CE. Comunicação da Comissão de 6.02.1998 relativa à aplicação das regras de concorrência ao sector postal e à apreciação de certas medidas estatais referentes aos serviços postais (98/C 39/02). Jornal Oficial nº 039 de 6 fev 1998, p. 0002-0018. Disponível em: <http://eur-lex.europa.eu/LexUriServ/LexUriServ.do?uri=OJ:C:1998:039:0002:0018:PT:PDF>. Acesso em: 6 Dez. 2010. 239 EU. Directive 2008/6/EC of The European Parliament and of The Council of 20.02.2008 amending Directive 97/67/EC with regard to the accomplishment of the internal market of Community postal. Disponível em: <http://ec.europa.eu/internal_market/post/doc/legislation/2008-06_en.pdf>. Acesso em: 25 Fev. 2011. 240 “Finally, whilst the tariffs of postal operators must comply with the principles set out in Article 12, they must equally conform to the competition rules of the EC Treaty. In this regard, one should recall that the Commission’s postal notice underlines that dominant postal operators will be found to have abused their market power if imposing excessive, discriminatory or predatory prices.” GERADIN, D.; HENRY, D. Regulatory and Competition Law Remedies in The Postal Sector. Remedies in Network Industries: EC Competition Law vs. Sector-Specific Regulation. Damin Geradin (Editor). Intersentia. Antwerp, Oxford, UK, 2004, p.133. Nesse sentido, ver Comunicação da Comissão de 6.02.1998 relativa à aplicação das regras de concorrência ao setor postal e à apreciação de certas medidas estatais referentes aos serviços postais (98/C 39/02). Jornal Oficial nº 039 de 6 fev 1998, p. 0002-0018. Disponível em: <http://eur-lex.europa.eu/LexUriServ/LexUriServ.do?uri=OJ:C:1998:039:0002:0018:PT:PDF>. Acesso em: 6 Dez. 2010.

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monopolistas convivendo no mesmo ambiente com empresas totalmente

submetidas ao regime de livre concorrência somente se findaram nos casos

em que todas as reservas legais foram eliminadas. Nesse sentido se

manifestou a OCDE, em estudo realizado em 1999.

Segundo concluiu a OCDE, seja em mercados integralmente ou

parcialmente liberalizados, problemas concorrenciais podem continuar a

existir quando os prestadores de serviço universal (USP) tenham acesso a

fundos (bem como outras vantagens) não acessíveis pelos demais agentes

privados, sobretudo pelos entrantes. Tais fundos ou vantagens possivelmente

devem advir dos serviços reservados (quando o mercado não seja

integralmente liberalizado) ou diretamente do Estado (especialmente nos

casos em que esse controla o prestador de serviços postais), ou ainda de

outras fontes (como fundos para universalização de serviços). O USP

provavelmente utilizará esses fundos ou vantagens para incorrer em práticas

anticoncorrenciais, como a prática de preços artificiais (i.e., predatórios,

discriminatórios etc.). Para que seja possível um controle efetivo de tais

comportamentos anticoncorrenciais, é necessário eliminar-se tais fontes de

fundos ou vantagens por meio da abertura dos mercados postais à livre

concorrência, privatização ou separação estrutural (i.e., em empresas

distintas) entre os serviços sujeitos ao regime de livre concorrência e os

serviços postais reservados.241

Seja como for, inegável se mostra o aspecto positivo dessa norma

(Artigo 1(2), da Diretiva 2002/39), tanto em termos de instrumento de

sinalização econômica aos agentes de mercado e aos Estados-membros,

como em termos de princípios para a aplicação da matriz concorrencial nos

mercados postais. Especificamente, com a aplicação do princípio da

transparência tarifária e da não discriminação, houve uma automática

desmistificação do argumento da universalização como legitimador de preços

de monopólio à práticas anticoncorrenciais em mercados correlatos.

                                                                                                                         241 OECD. Promoting Competition in Postal Services. DAFFE/CLP(99)22 of 1 October 1999. Disponível em: <http://www.oecd.org/dataoecd/35/36/1920548.pdf>. Acesso em: 25 Feb. 2011, p.60.

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3.3.2.2 Princípios para a definição de tarifas (ou preços)

Ainda no tocante à transparência, vale analisar-se o Artigo 14, da

Diretiva 97/67. Segundo o Artigo 14(1), os Estados-membros teriam dois

anos a contar da data da entrada em vigor da Diretiva para adotar as

medidas necessárias para assegurar que a contabilidade dos prestadores de

serviços universais fosse conduzidas de acordo com os critérios de

transparência contidos no Artigo 14 (2) à (8). Conforme o Artigo 14(2), os

prestadores de serviço universal deveriam manter estruturas contábeis

separadas dentro de sua estrutura contábil interna de modo a, pelo menos,

separar os serviços reservados sob uma estrutura e os demais serviços

(sujeitos à livre concorrência) sob outra estrutura contábil. Um dos objetivos

principais dessa norma era fazer com que a contabilidade dos serviços

nãoreservados fosse claramente distinta dos serviços reservados, ou seja,

que a estrutura de custos e receitas fosse totalmente transparente de modo a

tornar transparente o fluxo financeiro cruzado entre tais universos (reservado

e não-reservado). O mesmo Artigo 14(2) ainda previa que tais sistemas

contábeis internos deveriam operar de forma consistente e objetiva com base

nos princípios de “custos justificáveis” (justifiable cost accounting principles).

De modo a atribuir maior grau de especificidade ao Artigo 14(2), o

Artigo 14(3), por sua vez, determinava, em síntese, quais seriam os meios

que os sistemas contábeis tanto dos serviços reservados quando dos sujeitos

à livre concorrência devem ser estruturados. Assim, segundo o Artigo

14(3)(a), os custos que pudessem ser atribuídos a um serviço específico

deveriam ser contabilizados de forma separada de outros custos. O Artigo

14(3)(b) prescrevia que os custos comuns (i.e., que não pudessem ser

contabilizados de forma independente), deveriam ser contabilizados: (i)

sempre que possível, com base na análise direta de sua origem; (ii) quando

não fosse possível determinar a análise direta de origem, com base em uma

relação indireta com outra categoria de custos, ou outro grupo de categorias

de custos, cuja contabilização direta fosse possível, sendo que a relação

indireta deveria ser baseada em uma estrutura de custos comparável; (iii)

quando nem medidas diretas ou indiretas de alocação de custos fossem

possíveis, a categoria de custos deveria ser contabilizada em bases de

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alocação geral computada utilizando a razão de todas as despesas

contabilizadas direta ou indiretamente para, de um lado, cada um dos

serviços reservados e para, de outro lado, os demais serviços (não-

reservados).

O Artigo 14(4), à sua vez, garantia a possibilidade de outros sistemas

contábeis serem aplicados, apenas se fossem compatíveis com Artigo 14(2)

e tivessem sido aprovados pela autoridade regulatória nacional. A CE deveria

ser informada antes que tal aplicação fossa realizada. As autoridades

regulatórias nacionais, segundo o Artigo 14(5), deveriam assegurar, por meio

da análise de um corpo técnico independente do prestador de serviço

universal, que a estrutura contábil adotada fosse compatível com uma das

estruturas listadas no Artigo 14(3) ou no Artigo 14(4). Os Estados-membros

deveriam assegurar a publicação periódica de uma avaliação de adequação

da estrutura contábil dos prestadores de serviço universal. Segundo os

Artigos 14(6) e 14(7), as autoridades regulatórias nacionais deveriam manter

disponíveis informações sobre a estrutura de custos e contabilidade – em

adequado grau de detalhamento - adotada pelos prestadores de serviço

universal, devendo, sob requerimento, submete-las à CE, enquanto os

prestadores de serviço universal deveriam disponibilizar detalhes contábeis

de seu sistema contábil à autoridade regulatória nacional e à CE, caso

fossem instados para tanto. Por fim, segundo o Artigo 14(8), os Estados-

membros que não estabelecessem monopólio legal para os serviços postais,

bem como não subsidiassem (implícita ou explicitamente) os prestadores de

serviço universal (ou não estabelecessem qualquer fundo para custear suas

atividades) sujeitando-os integralmente ao regime de competição, poderiam

deixar de aplicar os dispositivos do Artigo 14, de (2) à (7), devendo, por

intermédio de suas autoridades regulatórias nacionais, informar a CE de tal

decisão.242

                                                                                                                         242   EU. Directive 97/67/EC of The European Parliament and of The Council of 15 December 1997 on common rules for the development of the internal market of Community postal services and the improvement of quality of service. Disponível em: <http://eur-lex.europa.eu/LexUriServ/LexUriServ.do?uri=OJ:L:1998:015:0014:0025:EN:PDF>. Acesso em: 4 Nov. 2010: “Article 14 1. Member States shall take the measures necessary to ensure, within two years of the date of entry into force of this Directive, that the accounting of the universal service providers is conducted in accordance with the provisions of this Article.

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Após breve análise do teor dos dispositivos contidos no Artigo 14, fica

claro que, em síntese, estes principalmente se destinam a atribuir elevado

grau de transparência e separação contábil entre os serviços universais e os

demais sujeitos ao regime de livre concorrência a fim de combater a prática

de subsídios-cruzados (cross-subsidies), por meio da qual as empresas

monopolistas acabam por distorcer a concorrência em razão da má alocação

de recursos de uma atividade noutra atividade (ou de má-fé), ou financiando

perdas em um mercado com ganhos extraordinários obtidos noutro mercado.

Seja pela má alocação, seja pelo “financiamento”, a concorrência é

prejudicada de forma semelhante, isto é, enquanto alguns produtos acabam

                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                           2. The universal service providers shall keep separate accounts within their internal accounting systems at least for each of the services within the reserved sector on the one hand and for the non-reserved services on the other. The accounts for the non-reserved services should clearly distinguish between services which are part of the universal service and services which are not. Such internal accounting systems shall operate on the basis of consistently applied and objectively justifiable cost ac- counting principles. 3. The accounting systems referred to in paragraph 2 shall, without prejudice to paragraph 4, allocate costs to each of the reserved and to the non-reserved services respectively in the following manner: (a) costs which can be directly assigned to a particular service shall be so assigned; (b) common costs, that is costs which cannot be directly assigned to a particular service, shall be allocated as follows: (i) whenever possible, common costs shall be al- located on the basis of direct analysis of the origin of the costs themselves; (ii) when direct analysis is not possible, common cost categories shall be allocated on the basis of an indirect linkage to another cost category or group of cost categories for which a direct assignment or allocation is possible; the indirect linkage shall be based on comparable cost structures; (iii) when neither direct nor indirect measures of cost allocation can be found, the cost category shall be allocated on the basis of a general allocator computed by using the ratio of all expenses directly or indirectly assigned or allocated, on the one hand, to each of the reserved services and, on the other hand, to the other services. 4. Other cost accounting systems may be applied only if they are compatible with paragraph 2 and have been approved by the national regulatory authority. The Commission shall be informed prior to their application. 5. National regulatory authorities shall ensure that compliance with one of the cost accounting systems described in paragraphs 3 or 4 is verified by a competent body which is independent of the universal service provider. Member States shall ensure that a statement concerning compliance is published periodically. 6. The national regulatory authority shall keep avail- able, to an adequate level of detail, information on the cost accounting systems applied by a universal service provider, and shall submit such information to the Commission on request. 7. On request, detailed accounting information arising from these systems shall be made available in confidence to the national regulatory authority and to the Commission. 8. Where a given Member State has not reserved any of the services reservable under Article 7 and as not established a compensation fund for universal service provision, as permitted under Article 9(4), and where the national regulatory authority is satisfied that none of the designated universal service providers in that Member State is in receipt of State subvention, hidden or other- wise, the national regulatory authority may decide not to apply the requirements of paragraphs 2, 3, 4, 5, 6 and 7 of this Article. The national regulatory authority shall inform the Commission of all such decisions.”

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por ter um preço supracompetitivo (principalmente nos mercados com

reduzida ou inexistente elasticidade preço-da-demanda – como é o caso dos

serviços reservados), outros produtos acabam por possuir preços inferiores

aos custos (ou preços predatórios).243

Esse princípio foi mantido pela Diretiva 2002/39, muito embora com

espaço aberto para certa discricionariedade por parte dos Estados-membros,

pois, segundo a emenda introduzida no Artigo 12 da Diretiva 97/67 (pelo

Artigo 1(2), da Diretiva 2002/39), os subsídios-cruzados deveriam ser

proibidos, exceto até o montante estritamente necessário ao atendimento (ou

suporte) de obrigações específicas de prestação de serviço universal em

situação de livre concorrência (exceto nos casos de Estados-membros que

não possuem qualquer área reservada à competição). O ponto sensível

dessa norma repousa no fato de que haveria espaço para interpretações

diversas sobre o que venha a ser o “montante estritamente necessário”,

devendo essa demonstração ser levada a efeito pelo próprio prestador de

serviço universal, o que acabaria por manter a possibilidade da concessão de                                                                                                                          243 Para mais impressões sobre o Artigo 14, da Diretiva 97/67, bem como o papel dos subsídios-cruzados, ver GERADIN, D.; HENRY, D. Regulatory and Competition Law Remedies in The Postal Sector. Remedies in Network Industries: EC Competition Law vs. Sector-Specific Regulation. Damin Geradin (Editor). Intersentia. Antwerp, Oxford, UK, 2004, p.134: “The importance of these principles cannot be properly understood without an examination of the concept of ‘cross-subsidies’ as the accounting requirements outlined above seek to prevent this practice from distorting competition. In the notice on the application of the competition rules to postal sector, the Commission defines the concept of cross-subsidies as the technique by which ‘an undertaking bears or allocates all parts of the costs of its activities in one geographical or product market’. Pursuant to this definition, cross-subsidies arise when an undertaking fails to properly allocate costs between two or several different activities. Other definition emphasise a transfer of revenue between activities: cross-subsidies arise when revenues generated in one activity are used to subsidise losses incurred in another activity of the same company. In both cases (misallocation of costs and transfer of revenues), the economic effect is the same: while some products or services will be over-priced, others will be sold at prices that do not cover costs.” Sobre o conceito de subsídio-cruzado, ver CE. Comunicação da Comissão de 6.02.1998 relativa à aplicação das regras de concorrência ao setor postal e à apreciação de certas medidas estatais referentes aos serviços postais (98/C 39/02). Jornal Oficial nº 039 de 6 fev 1998, p. 0002-0018. Disponível em: <http://eur-lex.europa.eu/LexUriServ/LexUriServ.do?uri=OJ:C:1998:039:0002:0018:PT:PDF>. Acesso em: 6 Dez. 2010: “3. Subvenções Cruzadas. a)!Princípios de base. 3.1. As subvenç�es cruzadas significam que uma empresa imputa a totalidade ou parte dos custos das suas actividades num mercado geogr�fico ou de produto " suas actividades num outro mercado geogr�fico ou de produto. Em certas circunst�ncias, a prática de subvenç�es cruzadas no sector postal, em que quase todos os operadores desenvolvem actividades reservadas e n�o reservadas, e suscept�vel de falsear a concorr�ncia, permitindo, por exemplo, apresentar propostas com preços inferiores a outros concorrentes graças n�o a efici�ncia (incluindo economias de escala) e ao desempenho, mas graças a subvenç�es cruzadas. � assim crucial para o desenvolvimento do sector postal evitar as subvenç�es cruzadas que conduzem a uma concorr�ncia desleal.”

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subsídios-cruzados que, via de consequência, poderiam afetar a

concorrência e inibir novas entradas nos diversos mercados postais.244

A Diretiva 2008/6 foi além, pois eliminou a possibilidade de subsídios-

cruzados, mesmo para a finalidade de financiar os serviços universais. Como

apontado acima, foi mantida a possibilidade de, em caráter excepcional, os

Estados-membros financiarem os serviços universais, porém mediante

métodos diversos dos subsídios-cruzados, obedecidos também os princípios

de transparência e não discriminação e em limites estritamente necessários.

O Artigo 12 da Diretiva 97/67 passou, dessa forma, a ter uma redação

voltada exclusivamente ao tratamento isonômico, transparente e não

discriminatório que deveria ser dispensado no tocante aos preços dos

serviços universais.245

                                                                                                                         244 EU. Directive 2002/39/EC of The European Parliament and of The Council of 10.06.2002 amending Directive 97/67/EC with regard to the further opening to competition of Community postal services. Disponível em: <http://eur-lex.europa.eu/LexUriServ/LexUriServ.do?uri=OJ:L:2002:176:0021:0025:EN:PDF>. Acesso em: 4 Nov. 2010. “Article 1 (…) 2. the following indents shall be added to Article 12: (…) ‘— cross-subsidisation of universal services outside the reserved sector out of revenues from services in the reserved sector shall be prohibited except to the extent to which it is shown to be strictly necessary to fulfill specific universal service obligations imposed in the competitive area; except in Member States where there are no reserved services, rules shall be adopted to this effect by the national regulatory authorities who shall inform the Commission of such measures.’;” Sobre o risco de manutenção dos subsídios-cruzados face à falta de precisão normativa e, portanto, seus efeitos prejudiciais à livre concorrência, ver GERADIN, D.; HENRY, D. Regulatory and Competition Law Remedies in The Postal Sector. Remedies in Network Industries: EC Competition Law vs. Sector-Specific Regulation. Damin Geradin (Editor). Intersentia. Antwerp, Oxford, UK, 2004, p.134-135: “It is of course open to interpretation what is meant by ‘strictly’ necessary and by ‘specific’ universal service obligations. Cross-subsidiation is a serious matter in the postal field and it is to be hoped that the exception contained in Article 12 will not be interpreted extensively. There is indeed a risk that cross-subsidiation of competitive services by revenues generated from reserved services could lead to efficient suppliers being excluded from the market. A permissive approach to cross-subsidiation could thus jeopardise the beneficial effects of liberalization by allowing incumbents to use resourced generated by their reserved activities to forestall the entry of new operators on markets on which they face competition.” 245 EU. Directive 2008/6/EC of The European Parliament and of The Council of 20.02.2008 amending Directive 97/67/EC with regard to the accomplishment of the internal market of Community postal. Disponível em: <http://ec.europa.eu/internal_market/post/doc/legislation/2008-06_en.pdf>. Acesso em: 25 Fev. 2011: “(…) 14. Article 12 shall be replaced by the following: ‘Article 12 Member States shall take steps to ensure that the tariffs for each of the services forming part of the universal service comply with the following principles: - prices shall be affordable and must be such that all users, independent of geographical location, and, in the light of specific national conditions, have access to the services provided.

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3.3.2.3 Jurisprudência sobre transparência e não discriminação

Na perspectiva jurisprudencial, i.e., de controle antitruste de estruturas

com base no Tratado de Roma (merger review), a CE manteve a tendência

sinalizada no caso TNT / Canada Post, DBP Postdienst, La Post, PTT Post &

Sweden Post (1991), de modo que, mesmo decidindo pela compatibilidade

das operações analisadas com o Tratado da CE, adotava remédios

comportamentais diretamente relacionados aos possíveis entraves para a

liberalização dos serviços postais à livre concorrência na UE - principalmente

decorrentes da manutenção de reservas legais por parte de empresas

monopolistas, em grande parte controladas por governos nacionais. Esse foi,

por exemplo, o perfil da decisão da CE no caso PTT Post / TNT / GD Express

Worldwide (1996), em que a PTT Post adquiriu o controle da empresa TNT,

empresa privada de capital aberto com atividades nos mercados de logística,

aviação civil, leasing de aeronaves e turismo. Ambas empresas (PTT Post e

TNT) eram sócias e integravam o bloco de controle da Joint Venture GD

Express Worldwide.

Nesse caso, a CE concluiu que a concentração empresarial não

gerava, a priori, preocupações de ordem concorrencial, porém, adotou

remédios comportamentais muito semelhantes (senão idênticos) aos do caso

TNT / Canada Post, DBP Postdienst, La Post, PTT Post & Sweden Post

(1991), quais sejam: (i) eliminação de subsídios cruzados (cross-subsidies);

                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                           Member States may maintain or introduce the provision of a free postal service for the use of blind and partially-sighted persons, - prices shall be cost-oriented and give incentives for an efficient universal service provision. Whenever necessary for reasons relating to the public interest, Member States may decide that a uniform tariff shall be applied, throughout their national territory and/or cross-border, to services provided at single piece tariff and to other postal items, the application of a uniform tariff shall not exclude the right of the universal service provider(s) to conclude individual agreements on prices with users, - tariffs shall be transparent and non-discriminatory, - whenever universal service providers apply special tariffs, for example for services for businesses, bulk mailers or consolidators of mail from different users, they shall apply the principles of transparency and non-discrimination with regard both to the tariffs and to the associated conditions. The tariffs, together with the associated conditions, shall apply equally both as between different third parties and as between third parties and universal service providers supplying equivalent services. Any such tariffs shall also be available to users, in particular individual users and small and medium-sized enterprises, who post under similar conditions’.  

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(ii) viabilização de acesso em bases isonômicas e não discriminatórias (i.e.,

em condições similares às contratadas entre a JV e os serviços postais

nacionais) de concorrentes a serviços postais reservados (ou em regime de

monopólio legal), da mesma forma a viabilizar acesso a redes postais

públicas (operadas em regime de exclusividade pelas empresas

monopolistas nacionais); (iii) para fins de monitoramento, aplicação de regras

de transparência, pelas quais as partes da JV deveriam registrar, durante um

ano a contar da decisão da CE, todas as operações entre a JV e os serviços

postais nacionais bem como entre estes e os concorrentes da JV, de modo a

viabilizar a análise do cumprimento dessa norma por parte da CE e das

autoridades regulatórias nacionais competentes; e (iv) viabilização de acesso

em bases isonômicas e não discriminatórias (i.e., em condições similares às

contratadas entre a JV e os serviços postais nacionais) de concorrentes a

serviços de entrega de itens postais e de bens ou encomendas (parcel

services).246

                                                                                                                         246 EU. Commission Decision of 08.11.1996 – Case No IV/M.843 – PTT Post / TNT / GD Express Worldwide. Disponível em: <http://www.jcampbell.com/Reference/eu/199611_ptt_tnt.pdf>. Acesso em: 7 Mar. 2011: “[Subject matter] - II THE OPERATION 6. On 2 October 1996 PTT Post announced the initiation of a public bid by its subsidiary KPN (Australia) Ltd for the purchase of the entire issued share capital of TNT. The acquisition by PTT Post of sole control of TNT will also entail the consequence that GD Express will pass from joint control by PTT Post and TNT to sole control by PTT Post. 7. The operation accordingly constitutes a concentration within the meaning of Article 3(1)(b) of the Merger Regulation. (…) [Behavioral remedies] - ANNEX B Undertaking of the parties concerning sub-contracting (...) Unless the postal organisation concerned can demonstrate to the reasonable satisfaction of the Commission or, as the case may be, the competent national regulatory bodies (including national courts) that it does not cross-subsidise from its exclusive concession the ITCD related services it provides to the JVC, it will, if requested, provide these services to competitors of the JVC on terms and conditions which are similar to those offered to the JVC, to the extent that the transactions are equivalent. Account will be taken of factors including but not limited to, volume, range, and frequency of service to be performed, features, area and density of geographic coverage, financial compensation, liability, and payment terms, and length of contract. In order to allow verification with respect to these assurances, the four postal organisations will keep records of the terms and conditions, on which they have provided ITCD related services to third parties, including the JVC, available for inspection on a confidential basis by the Commission or the competent national regulatory bodies (excluding the national courts) for a period of one year from the relevant event. In addition, the postal organisations recognise that they are subject notably to non-discrimination obligations as set forth in national postal and competition laws or in the competition rules (Articles 85- 90) of the EEC Treaty.

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Em 1998, já na vigência da Diretiva 97/67, a qual, como visto, já

representava um substancial marco normativo no sentido de fixar regras de

não discriminação e transparência para garantir a gradual liberalização dos

serviços postais à livre concorrência, a CE adotou semelhante padrão de

decisão no caso DHL/Deutsche Post (1998), em que a empresa monopolista

controlada pelo governo alemão passaria a deter parcela minoritária do

capital social (i.e., 22,498%) da empresa DHL, cuja principal atividade era

express cross-border delivery of parcels and documents (entrega expressa e

transfronteiriça de bens e documentos) de até 50 kg.

Nesse caso, a CE concluiu que não haveria preocupações, a priori,

relativas aos efeitos concorrenciais da operação para os mercados Europeus

tendo, contudo, adotado os seguintes remédios comportamentais

direcionados a Deutsche Post: (i) abstenção do uso de receitas provenientes

do monopólio postal da Deutsche Post AG na Alemanha para subsidiar

custos operacionais da DHL, i.e., particularmente, qualquer relação financeira

e comercial entre ambas as companhias deveria ser baseada em condições

de mercado; (ii) em até 6 meses da decisão da CE, manutenção de

estruturas contábeis independentes para cada tipo de serviço postal, isto é,

uma estrutura contábil para cada um dos serviços reservados (i.e., uma para

coleta de cartas, outra para distribuição e assim por diante) e outra para cada

tipo de serviço desenvolvido no ambiente de livre competição, como parcel

service (entrega de bens), de acordo com a Diretiva 97/67; tais estruturas

contábeis deveriam ser certificadas por auditores independentes e seus

dados financeiros básicos (e.g., cash flow e P&L statements), incluindo as

informações sobre os critérios e metodologia utilizados para a alocação dos

                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                           For greater certainty, nothing in this undertaking shall be construed as an acknowledgment of a dominant position by the postal organisations with respect to any of the services covered by this undertaking. In order to allay any concerns that the remail activities of the JVC might be favoured by any or all of the postal organisations participating in GD Net, the four European postal organisations have given the following assurances to the EEC Commission (Sweden Post Group gives these assurances for the event that the EES Treaty, adopting the principles of Articles 85-90 of the EEC Treaty, enters into force). If they act as ‘B’ countries in the remail chain, they will, if requested, provide mail and parcel services to competitors of the JVC on terms and conditions, which are similar to those offered to the JVC, to the extent that the transactions are equivalent. Account will be taken of factors including but not limited to, volume, range and frequency of service to be performed, features, area and density of geographic coverage, financial compensation, liability and payment terms, and length of contract.’"

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custos e receitas entre os serviços reservados e os serviços não-reservados,

deveriam ser publicados no Relatório Anual da Deutsche Post AG; e (iii)

obrigação de prestação de serviços aos concorrentes da DHL, de forma

semelhante e com condições semelhantes àquelas aplicadas a DHL. Essa

obrigação se estendeu a qualquer serviço similar aos prestados a DHL.

Ainda, essa obrigação abrangeu todo e qualquer serviço que utilizasse

a infraestrutura (i.e., rede postal pública) que a Deutsche Post AG utilizava

para a oferta dos serviços postais nacionais a ela reservados. Terceiros (i.e.,

concorrentes) deveriam ter acesso a termos e condições que não os

discriminassem com relação à DHL, desde que os negócios fossem

equivalentes. Deveria ser levado em consideração, para tanto, fatores como

volume, abrangência, frequência do serviço a ser contratado, características

específicas, área e duração do contrato. De modo a viabilizar o

monitoramento desta decisão por parte da CE, a Deutsche Post AG deveria

manter cópias dos termos e condições relativos às operações realizadas com

a DHL e terceiros (concorrentes) para inspeção, a qualquer momento, por

parte da Comissão.247

                                                                                                                         247 EU. Commission Decision of 26.06.1998 - Case No IV/M.1168 – DHL/Deutsche POST. Disponível em: <http://www.jcampbell.com/Reference/eu/199806_dp_dhl.pdf>. Acesso em: 26 Fev. 2011: “[Subject matter] - II THE OPERATION (…) 7. DHL’s core business is the provision of cross-border express delivery for documents and parcels up to 50 kg through an international delivery network. As an integrator DHL provides integrated transport services with pre-established transit times. DHL organises a door to door pick up and delivery service, which is faster, provides a number of value added services and is more expensive than basic postal services. DHL operates some aircraft, but relies substantially on uplift capacity purchased from airlines. DHL provides domestic express services only as an add on to international services, i.e. a service offered only to international customers in order to complete a comprehensive service offering. 8. Deutsche Post intends to acquire a 22,498 % minority interest in DHL. Through voting rights and board representation for Deutsche Post it is intended that it will share control of DHL with Lufthansa and JAL, who will maintain their present share holdings of 25,001 % each. 9. According to the parties, the international express delivery will be jointly branded under DHL/Deutsche Post, but it will only be handled by DHL once it leaves the Deutsche Post network. Deutsche Post will subcontract the outbound delivery of its express business to DHL, thus terminating a corresponding agreement it has had with KPN/TNT. (…) [Behavioral remedies] - Deutsche Post AG undertakes as follows: 1. that it will abstain from using the revenues earned from its national exclusive postal concession to subsidise the operational costs of DHL, in particular, that any financial and commercial relationship with DHL will be at arm’s length conditions; 2. that it will, within six month of the Commission’s clearance of the present concentration, keep separate accounts within its internal accounting systems for each of its services within

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No mesmo sentido do caso DHL/Deutsche Post, a CE não encontrou

objeções à aprovação da operação de aquisição do controle da Securicor,

empresa do ramo de seguros, distribuição e comunicação, pela Deutsche

Post. A decisão positiva da CE, todavia, contou com a assunção voluntária

por parte da Deutsche Post das mesmas obrigações comportamentais

impostas pela CE no caso DHL/Deutsche Post, possivelmente face à

oposição de concorrentes e interessados manifesta durante a análise da

operação na CE.248 A CE adotou decisão semelhante no o caso PTT Post /

                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                           the reserved sector on the one hand and for its non-reserved services (including parcels) on the other, in accordance with Directive 97/67/EC; such accounts will be certified by independent auditors and basic financial data relating thereto (operating cash flow and P&L statements [Kosten- und Erlösrechnung]) will be published within Deutsche Post AG’s annual report, including information on the criteria employed to allocate revenues and costs between the reserved services (Briefpost) and the non- reserved services (Frachtpost); and 3. that it will, if requested, provide the services it may at any time in the future provide to DHL, to competitors of DHL. This will extend also to any services similar to those provided to DHL. This undertaking covers any and all services, which use the same infrastructure which Deutsche Post AG uses for its national exclusive postal concession. Third parties will be given terms and conditions which do not discriminate between them and DHL, to the extent that the transactions are equivalent. Account will be taken of factors including but not limited to, volume, range and frequency of service to be performed, features, area and density of geographic coverage, financial compensation, liability and payment terms, and length of contract. In order to allow verification with respect to these assurances, Deutsche Post AG will keep records of the terms and conditions on which Deutsche Post AG has provided such services to third parties, including DHL, available for inspection on a confidential basis by the Commission.” 248 EU. Commission Decision of 23.02.1999 - Case No IV/M.1347 – Deutsche POST/SECURICOR. Disponível em: <http://eur-lex.europa.eu/LexUriServ/LexUriServ. do?uri=OJ:C:1998:392:0009:0009:EN:PDF>. Acesso em: 26 Fev. 2011: “1. On 12 January 1998, the Commission received a notification of a proposed concentration pursuant to Article 4 of Council Regulation (EEC) No 4064/891 (“ECMR”) by which the undertaking Deutsche Post AG (‘Deutsche Post’) acquires within the meaning of Article 3(1) (b) of the Council Regulation joint control of the distribution business of the undertaking Securicor plc ("Securicor"). As a consequence of the transaction, the business concerned, which includes Securicor Group Limited and a number of other subsidiaries of Securicor, will become a joint venture between Deutsche Post and Securicor. 2. This notification has been declared incomplete on 5 January 1999. Subsequently, the notifying parties have provided the further information required, so that the notification was completed and became effective on 12 January 1999. 3. After examination of the notification, the Commission has concluded that the notified operation falls within the scope of Council Regulation No 4064/89 and does not raise serious doubts as to its compatibility with the common market and with the functioning of the EEA Agreement. (…) VII. COMMENTS FROM INTERESTED PARTIES 44. Several interested parties expressed to the Commission their concerns that the acquisition by Deutsche Post of a share of the joint venture's capital has been possible only as a result of Deutsche Post’s revenues from its exclusive mail concession in Germany or from other forms of State financing. In addition, they argued that Deutsche Post cross-subsidises the development of its activities in the commercial field through revenues from its letter monopoly. However, it shall be noted that the present decision, based on the Merger Regulation, can only deal with the effects of the concentration on the market. 45. Furthermore, the Commission notes that Deutsche Post has submitted an undertaking,

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TNT / GD Express Worldwide (2007), em que a empresa monopolista do

setor postal da Bélgica intencionava contratar fornecedores para os serviços

de parcel e courier. A CE decidiu que as condições de isonomia, não

discriminação e transparência, contidas na Diretiva 97/67, estavam

presentes, razão pela qual não opôs objeções ao negócio.249

Como se pode observar, na decisão no caso DHL/Deutsche Post

(1998), a CE foi bastante cautelosa no sentido de aplicar ao caso concreto o

modelo de separação contábil previsto na Diretiva 97/67, o qual, aliado aos

outros remédios comportamentais adotados deveria, ao menos em tese,

eliminar a possibilidade de distorções à concorrência, decorrentes de

                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                           similar to that submitted in the context of the procedure in the Deutsche Post/DHL case, to keep separate accounts for reserved and non-reserved services and publish the basic financial data relating thereto in its annual reports. In addition, Deutsche Post has submitted that the purchase of its interest in the joint venture is being financed by the sale of real estate that was the capital endowment for Deutsche Post when it was made into a company.” 249 EU. Commission Decision of 16.03.2007 establishing that Article 30(1) of Directive 2004/17/EC of the European Parliament and of the Council coordinating the procurement procedures of entities operating in the water, energy, transport and postal services sectors applies to certain courier and parcel services in Denmark (2007/169/EC) – Case No IV/M. 843 – PTT Post/TNT/GD Express Worldwide. Disponível em: <http://eur-lex.europa.eu/LexUriServ/LexUriServ.do?uri=OJ:L:2007:078:0028:0030 :EN:PDF>. Acesso em: 26 Fev. 2011: “[Decision] - (9) One parameter to take into account is the market shares of the main players on a given market and another is the degree of concentration. Whether measured in terms of turnover or in terms of number of dispatches, Post Danmark’s market share on any of the six markets concerned varies, according to the information given, between less than 1 % (2) up to 35-40 % (3), which are acceptable levels, considering also the degree of concentration on these markets. Post Danmark is the largest single operator on just two of these markets, respectively that for domestic parcel services and the one for domestic courier and express services (4). On both of these markets, the combined market share of Post Danmark’s two biggest competitors is comparable to or greater than that of Post Danmark (5). On those markets on which Post Danmark does not have the largest market share, the aggregate market shares of its two biggest competitors are several times greater(6) than Post Danmark’s market share. These factors should therefore be taken as an indication of direct exposure to competition. (10) In view of the abovementioned indicators, the condition of direct exposure to competition laid down in Article 30(1) of Directive 2004/17/EC should be considered to be met in respect of the parcel and courier services in Denmark, which are specified in Recital 4 (7). As noted above in recital 7, the further condition of free access to the activity must be deemed to be met. Consequently, Directive 2004/17/EC should not apply when contracting entities award contracts intended to enable the parcel and courier services concerned by this request to be carried out in Denmark nor when they organise design contests for the pursuit of such an activity there.” Sobre o Artigo 30(1) da Diretiva 2004/17/EC, ver EU. Directive 2004/17/EC of The European Parliament and of The Council of 31.03.2004 coordinating the procurement procedures of entities operating in the water, energy, transport and postal services sectors. Disponível em: <http://eur-lex.europa.eu/LexUriServ/LexUriServ.do?uri=OJ:L:2004:134:0001:0113:en:PDF>. Acesso em: 25 Fev. 2011: “Article 30 - Procedure for establishing whether a given activity is directly exposed to competition 1. Contracts intended to enable an activity mentioned in Articles 3 to 7 to be carried out shall not be subject to this Directive if, in the Member State in which it is performed, the activity is directly exposed to competition on markets to which access is not restricted.”

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154  

eventual relação “espúria” (i.e., calcada na prática de subsídios-cruzados,

tratamento discriminatório e, principalmente, em meios de burlar as regras de

transparência) entre o monopólio legal e a atuação da Deutsche Post nos

mercados sujeitos ao regime de livre competição. Contudo, apesar de a

redistribuição de incentivos proposta pela Diretiva 97/67 aparentar ser

suficiente à preservação de um ambiente de livre concorrência, ao menos em

tese, houve diversas denúncias sobre a suposta utilização de subsídios

cruzados por parte da Deutsche Post para, principalmente, adquirir outras

empresas.250 A CE não chegou a uma conclusão contrária à empresa alemã

                                                                                                                         250 EU. Commission STATE AID - Invitation of 23.10.1999 to submit comments pursuant to Article 88(2) of the EC Treaty concerning aid measure C 61/99 (ex NN 153/96) # State aid to Deutsche Post AG (1999/C 306/05) Disponível em: <http://www.jcampbell.com/Reference/eu/199910_ invite_dp_stateaid.pdf>. Acesso em: 8 Mar. 2011: “1. Complaints The Commission received complaints from private operators in the German parcel market, alleging ongoing State aid for the parcel service of Deutsche Post AG (DP) by, inter alia, covering of losses and cross-subsidisation of the parcel service by monopoly revenues from DP's letter post activities. Within the framework of several merger investigations regarding DP, a number of competitors raised questions about the financing of DP's acquisitions and alleged that DP used funds from its monopoly operations to finance its purchases. 2. Background On 15 December 1997 the European Parliament and the Council adopted the Postal Directive (1) which provides the general framework for a partial liberalisation of the postal sector on Community level. In this connection the Commission then adopted the Postal Notice (2) setting out how the Commission intends to apply the competition rules of the Treaty to the postal sector in individual cases. According to the Postal Directive and in line with Article 86(2) of the EC Treaty Member States shall ensure a universal service involving the permanent provision of a postal service of specified quality at all points in their territory at affordable prices for all users. This universal service includes letter and parcel services. In order to allow the universal service providers to render the universal service, certain activities might be reserved by the Member States for them, as far as this is necessary for the provision of the universal service. The same principle of proportionality can be found in Article 86(2) of the EC Treaty. DP is the successor of the former postal administration and delivers postal services in the whole of Germany. For the standard letter service it has a legal monopoly. The stamp duties are fixed by the State. Standard letter and standard parcel services have to be provided by DP as universal services throughout the country. The standard and the business parcel services are not reserved activities. Both parcel services of DP have been making losses since 1984. The letter service activities have at the same time been procuring profits. 3. Assessment By granting a legal monopoly and fixing the stamp duties, the State creates a secure income for DP. This is intended to cover the costs of the universal services. However, it is clear from the data that the reserved activities generate higher income then in fact necessary to allow DP to fulfill its public service obligations. Such overcompensation constitutes State aid and cannot be justified either under the Postal Directive or under Article 86(2) of the EC Treaty. (…) Competitors of DP also have been increasingly raising questions about the financing of the recent spate of acquisitions by DP. They allege that mainly income from the monopoly activities was and is used for that purpose. Additional allegations concern the setting-off of claims against the State within the acquisition of Postbank AG and the operation of the Post-Unter- stützungskasse. Furthermore, it is alleged by competitors that DP benefits from

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no sentido de que teria realmente se valido de state aids para a realização de

diversas operações. De qualquer modo, entende-se que, possivelmente, a

CE se deparou com a dificuldade prática de se “auditar” as informações

financeiras e contábeis da Deutsche Post AG a ponto de determinar a

existência ou não de subsídios-cruzados bem como de ajuda financeira por

parte da Alemanha.

Isso talvez possa ser reforçado pelos resultados dos casos posteriores

analisados pela CE, como é o caso The Post Office/TPG/SPPL, em que a

Comissão aprovou a operação mediante desinvestimento parcial por parte

das empresas envolvias na operação. No caso The Post Office/TPG/SPPL,

cujo objeto foi a formação de duas Joint Ventures entre TPG (empresa do

grupo PTT Post BV, da Holanda), TPO (The Post Office of UK) e SPPL

(Singapore Post Private Limited.), para a operação no mercado de outbound

cross-border parcels (transporte transfronteiriço de bens e documentos).

Diante dos elevados índices de concentração decorrentes do negócio (e.g.,

superiores a 60% no UK e a 80% na Holanda) e, principalmente, diante do

fato de que duas empresas monopolistas do setor postal estavam envolvidas

(TPO e TPG), a CE decidiu condicionar a aprovação da operação à uma

obrigação de desinvestimento parcial, a qual, em apertada síntese, procurou

neutralizar os danos à concorrência no tocante à infraestrutura (rede postal

pública) na Holanda no sentido de viabilizar acesso de concorrentes à rede

postal, bem como a serviços postais, em patamares isonômicos e não

discriminatórios.251

                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                           various exemptions from laws and liabilities and special rights granted by the State. According to DP, the acquisitions are financed mainly by the sale of property which is not (anymore) necessary for its operations and by cash flow and that no funds from the monopoly activities are used for this purpose. Given the circumstances of the present case, the Commission preliminary examination would not support the conclusion, at this stage, that no State aid was involved in these operations.” 251 EU. Commission Decision of 13.03.2001 declaring a concentration to be compatible with the common market and the functioning of the EEA Agreement - Case COMP/M.1915 — The Post Office/TPG/SPPL (2004/236/EC). Disponível em: <http://eur-lex.europa.eu/LexUriServ/LexUriServ.do?uri=OJ:L:2004:082:0001:0019:EN:PDF>. Acesso em: 26 Fev. 2011: “The Operation (7) The operation consists of the formation of two joint ventures between TPG, TPO and SPPL which are to be active in the provision of outbound cross-border mail services and to a limited extent in providing outbound cross-border parcel services. They will not provide express services. (…) [Decision] - COMMITMENTS TO ENSURE THE DIVESTITURE

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156  

A utilização dos remédios comportamentais também pode ser

observada no controle antitruste de condutas no âmbito da CE, exercido em

uma perspectiva repressiva (ou ex post). A dificuldade de controle da relação

entre as atividades monopolizadas e as sujeitas aos regimes de livre

                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                           a. Access to the network and the know-how The commitments provide for access to the network and the know-how, which are essential parts of the business, for a period of two years after the divestment. This period will give the eventual purchaser the time to conclude new cooperation agreements with various services providers, such as airlines, PPOs and independent postal operators and to build up the necessary know-how implicit in the routing matrix. In order to be able to run the divested business as a viable independent competitor after the transitional period a purchaser would have to fulfill a number of criteria. Such a purchaser would have to have to be able to establish its own network for the upstream and downstream services temporarily provided to the divested business by or through TPG within the transitional period. The purchaser would furthermore have to be able to generate the necessary amount of mail volume that would enable it to purchase network services, which in turn would enable it to sell its services at competitive prices. These volumes would have to be sufficient to enable the divested business to sell its outbound cross-border mail services at prices that are competitive to those which TNT IM Netherlands is currently able to offer. This would imply furthermore, that the purchaser would need to be able to offer mail distribution at competitive prices globally, like TNT IM Netherlands currently can, and not just limited to certain routes on which it might be particularly competitive. The divested business would lose its customer base and with it its viability, as soon as it would not be able anymore to offer its customers the prices and services which TNT IM Netherlands is presently able to offer. Since contracts are not long term and not exclusive, customers can and will switch to service providers that offer the best price/service package. (155) The success of the remedy depends to a large extent on the characteristics of the purchaser. The current proposal suffices to ensure that a viable purchaser is in a position to continue the business in the short term and to develop the business in the long term. (…) c. Non-compete (157) With the commitment not to compete for the existing customers of the business for the duration committed to, the existing goodwill of the divested business should be protected. (158) The exception relating to the Universal Service Obligation ensures that TPG through its national postal operator PTT Post is in a position to comply with the requirements of the law relating to the Universal Service Obligation. The Dutch legislation allows PTT Post to comply with the Universal Service Obligation by offering individually negotiated contracts to its customers rather than standard tariffs and rebates. In doing so PTT Post must act in a non-discriminatory way. This may lead to an obligation for PTT Post to enter into such contracts with customers on their request, provided similar contracts are already in existence. Under the terms of the commitments the Trustee has the necessary powers, in particular powers to monitor and to impose measures, in order to ensure the respect of this obligation and in particular to avoid any circumvention. This will ensure that this exception will not enable TPG to circumvent the non-compete obligation. (159) As described above there is another exception relating to the customers currently dealing with both TNT IM Netherlands and TPO in the Netherlands. This exception limits the turnover that TPO and the JV may continue to achieve with each of these customers [...]. The scope of this exception is therefore clearly delineated and will preserve the status quo with regard to these customers and is therefore unlikely to threaten the goodwill that will be divested. d. TNT Name (160) By having the right to refer to the Divestment Business as the former business of TNT International Mail and the inverse obligation on the parties not to present themselves as TNT, the transition between these services being provided by TNT IM Netherlands and by the eventual purchaser will be smoothed. Therefore, the purchaser should be able to establish itself as a credible competitor in the Dutch market for outbound cross- border business mail.”

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157  

concorrência fica mais clara à medida que se analisa casos de abuso de

posição dominante analisados pela CE. Em 2001, a CE analisou dois casos

ilustrativos nesse sentido, ambos envolvendo abuso de posição dominante

por parte da Deutsche Post AG. No primeiro caso, UPS v. Deutsche Post

(março de 2001), a empresa monopolista alemã é acusada pela United

Parcel Service (UPS) de praticar preços predatórios, por meio de descontos

em uma política de fidelidade (fidelity rebates) junto a clientes, no mercado de

parcel services na Alemanha, utilizando-se para tanto de subsídios-cruzados

provenientes de sua atividade como monopolista do mercado de serviços

postais na Alemanha.252

A CE, após profunda instrução do caso, concluiu em síntese que: (i) a

Deutsche Post detinha posição dominante, o que lhe impedia de praticar

fidelity rebates de acordo com a jurisprudência consolidada a partir do caso

Hoffmann-La Roche (Case 85/76 [1979] ECR 461); (ii) tal política de

fidelidade acabou por criar uma exclusividade de fato que beneficiava a

empresa alemã em detrimento de seus concorrentes e, portanto, era

perfeitamente aplicável à hipótese do caso Hoffmann-La Roche; (iii) a

Deutsche Post praticou preços predatórios no mercado de parcel service na

Alemanha, de acordo com a jurisprudência consolidada no Tribunal de

Justiça Europeu a partir dos casos AKZO v. Commission (Case C-62/86

[1991] ECR I-3359) e BPB Industries and British Gypsum (Case T-65/89

[1993] ECR II-389); (iv) a prática de fidelity rebates e preços predatórios

geraram efeitos prejudiciais à concorrência em âmbito comunitário.253

                                                                                                                         252 EU. Commission Decision of 20.03.2001 relating to a proceeding under Article 82 of the EC Treaty - Case COMP/35.141 – Deutsche Post AG – (2001/354/EC). Disponível em: <http://eur-lex.europa.eu/LexUriServ/LexUriServ.do?uri=OJ:L:2001:125:0027:0044:EN:PDF>. Acesso em: 4 Nov. 2010: “[Brief of the complaint] - (3) In the application it lodged under Article 3 of Regulation No 17 in July 1994, UPS alleged that DPAG was using revenue from its profitable letter-post monopoly to finance a strategy of below-cost selling in parcel services, which are open to competition. Without the cross-subsidies from the reserved area, DPAG would not have been able to finance below-cost selling there for any length of time. The applicant therefore calls for a prohibition of sales below cost and the structural separation of the reserved area and the parcel services open to competition. Otherwise, UPS contends, an efficient firm would not be able to compete and at the same time cover the cost of providing parcel services, which are open to competition.” 253 EU. Commission Decision of 20.03.2001 relating to a proceeding under Article 82 of the EC Treaty - Case COMP/35.141 – Deutsche Post AG – (2001/354/EC). Disponível em: <http://eur-lex.europa.eu/LexUriServ/LexUriServ.do?uri=OJ:L:2001:125:0027:0044:EN:PDF>. Acesso em: 4 Nov. 2010 (…)

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158  

Diante desse cenário, a CE condenou a Deutsche Post por ter

infringido o Artigo 82, do Tratado da CE, em razão de ter garantido preços

e/ou condições especiais (para utilização dos serviços postais) a clientes de

parcel services, em troca de tais clientes somente utilizarem a Deutsche Post

como prestadora dos serviços de parcel service. A CE determinou imediata

cessação de tais práticas por parte da Deutsche Post e aplicou-lhe uma multa

equivalente a EUR 24 milhões.254

                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                           Effects on competition (37) Contrary to what DPAG maintains, all of the disputed fidelity rebates are likely to have an effect on the opportunities that other suppliers of mail-order parcel services have to compete. Successful entry into the mail-order parcel services market requires a certain critical mass of activity (some 100 million parcels or catalogues) and hence the parcel volumes of at least two cooperation partners in this field. By granting fidelity rebates to its biggest partners, DPAG has deliberately prevented competitors from reaching the ‘critical mass’ of some 100 million in annual turnover. This fidelity rebating policy was, in precisely the period in which DPAG failed to cover its service-specific additional costs (1990 to 1995), a decisive factor in ensuring that the ‘tying effect’ of the fidelity rebates for mail-order parcel services maintained an inefficient supply structure: — in that economic resources were wasted in such a way that the dominant supplier does not cover the incremental costs of providing a specific service and thus created a permanent need for ‘cross-subsidisation’ from the reserved area, — in that economically efficient alternatives that would cover costs without such: ‘subsidisation’ were hindered, — in that, as a result, scarce resources beyond what is strictly necessary were uses to provide mail-order parcel services and — in that customers in the reserved area were forced to finance unnecessary wastage of scarce resources. The fidelity rebates agreed between DPAG and four of its partners since November 1997 demonstrably had the same effect as the exclusive purchase obligations. The parcel volumes actually delivered by DPAG as part of the cooperation arrangement made up almost [...] % of each customer's requirements in all the years for which the Commission has figures (63). The fidelity rebate policy has also hindered competition from the mail-order trade itself. Alternative delivery services, even if they initially serve to cover their own parcel or catalogue delivery requirements, might subsequently develop into competing infrastructures (64). Once an infrastructure reaches the critical mass, it can become a comprehensive, complete alternative to DPAC (65). The agreements on fidelity rebates deterred mail-order traders from setting up alternative delivery structures as long as this might conflict with their duty of fidelity and thus jeopardise the special price. This prevented the development of potential competition from alternative infrastructures.” 254 EU. Commission Decision of 20.03.2001 relating to a proceeding under Article 82 of the EC Treaty - Case COMP/35.141 – Deutsche Post AG – (2001/354/EC). Disponível em: <http://eur-lex.europa.eu/LexUriServ/LexUriServ.do?uri=OJ:L:2001:125:0027:0044:EN:PDF>. Acesso em: 4 Nov. 2010: “(…) [Brief of the decision] – Article 1. 1. From 1974 to 2000, Deutsche Post AG (DPAG) infringed Article 82 of the EC Treaty by granting a special price to customers for mail-order parcel services only in exchange for requiring the customer to send via Deutsche Post AG its entire requirements or a high percentage of those requirements of non-bulky parcels weighing up to 20 kg or 31,5 kg as the case might be or of catalogues weighing over 1 kg (heavy Infopost). 2. From 1990 to 1995, DPAG infringed Article 82 of the EC Treaty by supplying mail-order parcel services at prices below the additional costs of providing those services. Article 2

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159  

No mês de julho do mesmo ano (2001), a CE julgou outro caso relativo

à mesma empresa alemã, caso British Post Office (BPO) v. Deutsch Post.

Nesse caso, a BPO acusou a Deutsche Post de abusar de sua posição

dominante por se recusar a distribuir seus cross-border bulk mails255

enviados do UK para a Alemanha, a não ser que a BPO pagasse uma sobre-

taxa à Deutsche Post, que seria correspondente à diferença da tarifa

doméstica alemã e da terminal due aplicável, uma vez que a Deutsche Post

classificava os cross-border bulk mails da BPO como A-B-A remail (espécie

de remailing em que, em razão da diferença tarifária, a correspondência

doméstica acaba sendo distribuída como internacional). Além desse fato, que

por si só caracterizaria um tratamento discriminatório, segundo a BPO, a

Deutsche Post, mesmo recebendo a quantia exigida da BPO, atrasava por

várias ocasiões a entrega dos cross-border bulk mails, o que prejudicava a

BPO e seus clientes, dada a sensibilidade ao tempo de entrega existente

nesse mercado.256

                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                           1. DPAG AG shall immediately bring to an end the infringements referred to in Article 1(1) and shall refrain in future from repeating any act or conduct described in Article 1(a). 2. At the end of each accounting year of its new commercial parcel services subsidiary (Newco), DPAG shall submit to the Commission a statement of the costs and revenue of Newco. In addition DPAG shall each year submit an itemised statement of the transfer prices paid by Newco for all goods or services procured from DPAG. This obligation shall begin with Newco's first accounting year, and shall end with Newco's third accounting year. DPAG shall submit to the Commission any agreements providing for rebates, which Newco concludes with its six largest mail-order customers. This obligation shall begin with Newco's first accounting year, and shall end with Newco's third accounting year. Article 3 1. For the infringement referred to in Article 1(1), a fine of EUR 24 million is hereby imposed on Deutsche Post AG. 2. The fine shall be paid in euro, within three months of the date of notification of this Decision, into bank account No 642-0029000-95 (IBAN BE 76642002900095, code SWIFT: BBVABEBB) of the European Commission with Banco Bilbao Vizcaya Argentaria BBVA Avenue des Arts 43, B-1040 Brussels. After the expiry of that period interest shall be automatically payable at the interest rate applied by the European Central Bank to its main refinancing operations on the first working day of the month in which this Decision is adopted, plus 3,5 percentage points, resulting in an overall interest rate of 8.28 %.” 255 Cartas transfronteiriças agrupadas ou empacotadas. 256 EU. Commission Decision of 25.07.2001 relating to a proceeding under Article 82 of the EC Treaty – Case COMP/C-1/36.915 – Deutsche Post AG – Interception of cross-border mail – (2001/892/EC). OJE 15 dec. 2001. Disponível em: <http://eur-lex.europa.eu/LexUriServ/LexUriServ.do?uri=OJ:L:2001:331:0040:0078:EN:PDF>. Acesso em: 4 Nov. 2010: “[Brief of the complaint] – (3) On 4 February 1998 the BPO filed a complaint against DPAG pursuant to Article 3 of Regulation No 17. In the complaint it was alleged that, since 1996, the BPO had faced an increasing number of refusals from DPAG to distribute cross-border bulk mailings coming from the UK, unless the BPO paid a surcharge corresponding to the German domestic tariff minus terminal dues. The BPO maintains that the contested mailings constitute

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Analisando o caso, a CE entendeu, em síntese, que a Deutsche Post

abusou de sua posição dominante, basicamente: (i) por aplicar tratamento

discriminatório à BPO, uma vez que tratou de forma diferente os cross-border

mails da BPO com relação aos demais cross-border mails, apenas por

entender, de forma discricionária e não justificada, que os da BPO seriam

diferentes dos demais e constituiriam A-B-A remail (o que não ficou

demonstrado); (ii) por, de fato, se recusar a prestar o serviço de distribuição

de cross-border mail para a BPO, pois exigia, para tanto, sobretaxa despida

de fundamento econômico, e por atrasar sem motivo razoável a entrega dos

itens da BPO; (iii) por impôr preço excessivo e injusto para a prestação de

serviço (unfair selling prices), i.e., cerca de 25% superior ao valor econômico

médio estimado para o serviço; e (iv) por limitar a produção no mercado

alemão de transporte e entrega de cross-border mails recebidos em prejuízo

dos consumidores, por limitar que operadores postais do UK concorram pelo

envio de cross-border mails para clientes na Alemanha, também em prejuízo

dos consumidores alemães.257

                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                           ordinary cross-border mail, whereas DPAG states that these mailings are so-called A-B-A remail (see section D below). (4) The BPO alleged that DPAG had repeatedly delayed the release of contested mailings even though the BPO had — in order to get the mail released — agreed to pay the difference between the terminal dues (see section D below) payable for delivering cross-border mail and the full domestic tariff. Since mailings of the contested type are often time-sensitive, additional delays harm the BPO and its customers commercially as well as financially. The BPO stated that DPAG's repeated refusal to deliver cross-border mailings unless a surcharge is paid, on the incorrect basis that these mailings are A-B-A remail, constitutes an abuse of a dominant position contrary to Article 82 of the EC Treaty. Moreover, the delayed release of intercepted mailings — despite the agreement of the BPO to meet DPAG's claims — allegedly constitutes another abuse of a dominant position.” 257 EU. Commission Decision of 25.07.2001 relating to a proceeding under Article 82 of the EC Treaty – Case COMP/C-1/36.915 – Deutsche Post AG – Interception of cross-border mail – (2001/892/EC). OJE 15 dec. 2001. Disponível em: <http://eur-lex.europa.eu/LexUriServ/LexUriServ.do?uri=OJ:L:2001:331:0040:0078:EN:PDF>. Acesso em: 4 Nov. 2010: “(…) [Brief of the grounds for decision] – Abuse (120) DPAG's behaviour in the present case — i.e. the interception, surcharging and delaying of normal incoming cross-border letter mail — can be characterised as an infringement of Article 82 of the Treaty on the basis of four separate legal arguments. These arguments are set out below. Discrimination (…) (134) The Commission finds that DPAG's policy of intercepting, surcharging and delaying certain incoming cross-border letter mail is an application of dissimilar conditions to equivalent transactions. DPAG abuses its dominant position in the German market for incoming cross-border letter mail in a manner which puts other trading parties at a competitive disadvantage. In this context, the trading parties are the senders of the disputed

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161  

Por essas razões, a CE entendeu por bem condenar a Deutsche Post

pela prática de tais infrações. Contudo, um ponto interessante, que se infere

tenha decorrido da dificuldade de demonstração da falta de razoabilidade dos

preços praticados pela empresa monopolista no mercado sujeito à livre

concorrência, reside no fato de que a sanção imposta pela Comissão foi                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                            mailings and the BPO. Even in the absence of substantial negative effects on these trading parties, the behaviour of DPAG has direct negative effects on consumers. These consumers are the senders of the disputed mailings and/or the German addressees. DPAG's behaviour thus constitutes an abuse of Article 82 of the EC Treaty and in particular subparagraph (c) of its second paragraph. Refusal to supply (…) (153) As regards the mailings from the four companies where it has been demonstrated that the senders of the mailings were resident outside Germany (i.e. Ideas Direct, Fidelity Investments, Gant and Multiple Zones), there were no grounds for DPAG to delay the release of these mailings beyond what is strictly necessary in order to identify the sender. DPAG's counter-argument that these delays were in part caused by the BPO's inability to respond to DPAG's claims is irrelevant since these claims were unjustified in the first place. The terms on which DPAG would supply its forwarding and delivery service for these mailings are thus tantamount to a constructive refusal to supply on DPAG's part. The negative impact of these refusals was aggravated by the ensuing delays. In some cases, these delays were long enough to weaken substantially the commercial impact of the mailings. (154) The Commission concludes that DPAG abused its dominant position in the German market for the forwarding and delivery of incoming cross-border letter mail by refusing to deliver these mailings unless the sender or the sending postal operator agrees to pay the full domestic tariff. By doing so, DPAG de facto refuses to supply its forwarding and delivery service. The negative effects of this abusive behaviour were reinforced by DPAG's delaying the delivery for a period of time extensive enough to weaken substantially the commercial impact of the mailings. The Commission finds that this behaviour constitutes a contravention of Article 82 of the EC Treaty. Imposition of unfair selling prices (…) (166) In the absence of any substantive evidence that the average economic value of delivering an incoming cross-border mail item to its German addressee exceeds EUR 0,45 (80 % of the domestic tariff), the Commission concludes that the price charged by DPAG for incoming cross-border mail which it considers to be virtual A-B-A remail (EUR 0,56) exceeds the average economic value of that service by at least 25 %. (167) The Commission — bearing in mind DPAG's status as monopolist and the abovementioned peculiarities of postal services — concludes that the tariff charged by DPAG has no sufficient or reasonable relationship to real costs or to the real value of the service provided. Consequently, DPAG's pricing exploits customers excessively and should therefore be regarded as an unfair selling price within the meaning of Article 82. In conclusion, the Commission finds that DPAG has abused its dominant position in the German market for the forwarding and delivery of incoming cross-border letter mail by imposing on customers an unfair selling price corresponding to the full domestic tariff. The imposition of this tariff cannot be objectively justified. DPAG therefore contravenes Article 82 of the Treaty and in particular subparagraph (a) of its second paragraph. Limitation of production, markets and technical development (…) (178) As regards DPAG's handling of cross-border letter mail coming from the UK, the Commission finds that DPAG: (i) limits the production of services on the German market for the forwarding and delivery of incoming cross-border letter mail to the prejudice of consumers and (ii) limits postal operators opportunities to compete on the UK market for outgoing cross-border letter mail bound for Germany to the prejudice of consumers. DPAG's behaviour in this respect therefore infringes Article 82 of the Treaty and in particular subparagraph (b) of its second paragraph.”

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162  

simbólica, isto é, seu valor foi de EUR 1.000,00 (mil euros).258 Entende-se

que esse fato constitui mais um indício da dificuldade de se regular a

convivência de um player monopolista no mercado postal com outros agentes

econômicos, todos em um regime de livre concorrência.

Seja como for, embora as Diretivas 97/67, 2002/39 e 2008/6 tenham

dispensado considerável esforço para separar as contas dos serviços

reservados daqueles não reservados, dentro de uma mesma estrutura

contábil adotada pelos prestadores de serviços universais, na prática, tais

hipóteses normativas acabaram por possuir difícil, senão impossível,

aplicação. Segundo fora antecipado no estudo realizado pela OCDE (1999),

tais normas tanto não proporcionariam garantia de detecção e prevenção de

preços distorcidos como, por exemplo, a fronteira entre os serviços postais

sujeitos ao regime de livre concorrência e os serviços postais sujeitos ao

regime de monopólio legal muito provavelmente não corresponderia às linhas

divisórias (ou “chinese walls”) 259 supostamente criadas dentro da mesma

                                                                                                                         258 EU. Commission Decision of 25.07.2001 relating to a proceeding under Article 82 of the EC Treaty – Case COMP/C-1/36.915 – Deutsche Post AG – Interception of cross-border mail – (2001/892/EC). OJE 15 dec. 2001. Disponível em: <http://eur-lex.europa.eu/LexUriServ/LexUriServ.do?uri=OJ:L:2001:331:0040:0078:EN:PDF>. Acesso em: 4 Nov. 2010: “(…) [Brief of the decision] – Article 1. Deutsche Post AG has infringed Article 82 of the EC Treaty by intercepting, surcharging and delaying incoming cross-border letter mailings from the UK sent by senders outside Germany but containing a reference in its contents to an entity residing in Germany. Article 2. Deutsche Post AG shall immediately bring to an end the infringement referred to in Article 1 in so far as it has not already done so and shall refrain in the future from repeating any act or conduct described in Article 1. Article 3. For the infringement referred to in Article 1, a fine of EUR 1 000 is hereby imposed on Deutsche Post AG.” 259 Sobre o conceito de “chinese wall” em economia, ver The Free Dictionary. Chinese wall. Disponível em: <http://www.thefreedictionary.com/Chinese+wall>. Acesso em: 5 Mar. 2011: “A barrier, especially one that seriously hinders communication or understanding. (…) 1. (Economics, Accounting & Finance / Stock Exchange) a notional barrier between the parts of a business, especially between the market makers and brokers of a stock-exchange business, across which no information should pass to the detriment of clients. 2. an insurmountable obstacle.” Para outra definição de “chinese wall”, ver também INVESTOPEDIA. Chinese Wall. Disponível em: <http://www.investopedia.com/terms/c/chinesewall.asp>. Acesso em 5 Mar. 2011: “What does chinese wall mean? - The ethical barrier between different divisions of a financial (or other) institution to avoid conflict of interest. A Chinese Wall is said to exist, for example, between the corporate-advisory area and the brokering department of a financial services firm to separate those giving corporate advice on takeovers from those advising clients about buying shares. The "wall" is thrown up to prevent leaks of corporate inside information, which could influence the advice given to clients making investments, and allow staff to take advantage of facts that are not yet known to the general public. Investopedia explains Chinese Wall

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163  

companhia para dividir as estruturas contábeis relativas aos serviços

reservados e aos serviços sujeitos à livre competição.

Segundo a OCDE, a abertura de contas do prestador de serviços

universais corresponderia, segundo os parâmetros das Diretivas, a uma

“companhia fictícia” dentro da companhia (ou empresa) real. Tal companhia

fictícia se envolveria em várias operações/transações e, apenas no plano

contábil (e não na realidade), dividiria custos significativos com as divisões

restantes da companhia, abrindo espaço para, na prática, a companhia

prestadora de serviço universal manipular sua estrutura geral contábil (de

custos e receitas) de acordo com seus interesses, i.e., de modo a maximizar

seu bem-estar individual e, na maioria das vezes, prejudicar a concorrência e,

por consequência, o desempenho das empresas inseridas no regime de livre

concorrência.260

Entende-se que a solução real dos problemas de manipulação de

estruturas contábeis somente decorre de medidas de total separação

estrutural entre empresas com serviços reservados de empresas sem

serviços reservados, adotadas caso a caso. Em complemento, entende-se

que a solução real dos problemas de distorção da concorrência decorreria da

total eliminação da existência de monopólios postais, aplicando-se o regime

de livre concorrência e a tutela antitruste para regular a relação entre os

diversos agentes econômicos nos diversos mercados postais existentes.

                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                           Maintaining client confidentiality is crucial to any firm, but particularly large multiservice businesses. Where firms are providing a wide range of services, clients must be able to trust that information about themselves will not be exploited for the benefit of other clients with different interests. And that means clients must be able to trust in Chinese Walls. Some Wall Street scandals in recent years, however, have made some people doubt the effectiveness of Chinese Walls, as well placed executives of respectable firms have traded illegally on inside information for their own benefit.” Em sentido semelhante, ver New Oxford American Dictionary Oxford American Writer's Thesaurus. Disponível em: <http://itunes.apple.com/us/app/oxford-american-writers-thesaurus/id302367745?mt=8>. Acesso em: 5 Mar. 2011: “Chinese Wall - an insurmountable barrier, esp. to the passage of information or communication.”  260   OECD. Promoting Competition in Postal Services. DAFFE/CLP(99)22 of 1 October 1999. Disponível em: <http://www.oecd.org/dataoecd/35/36/1920548.pdf>. Acesso em: 25 Feb. 2011.  

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164  

3.3.3Terminal dues (“tarifas de interconexão entre redes postais”)

O último ponto mais diretamente relacionado à questão da

transparência e não- discriminação contido na Diretiva 97/67 refere-se às

terminal dues, espécie de remuneração paga ao prestador de serviço

universal em razão da distribuição de cross-border mails abrangendo itens

postais provenientes de outro Estado-membro ou de terceiro país (não

integrante da UE).261 Por questão de simplificação e por analogia ao mercado

de telecomunicações (mais precisamente de telefonia), adota-se para o

presente trabalho o termo “tarifa de interconexão de redes postais” como

sinônimo de terminal dues. Assim, segundo o Artigo 13(1), os Estados-

membros deveriam estimular seus prestadores de serviço universal a, em

seus acordos para fixação de tarifas de interconexão de redes postais (i.e.,

terminal dues), adotar os seguintes princípios: (i) as terminal dues deveriam

ser fixadas com base nos custos de processamento e entrega de cross-

border mails recebidas; (ii) os níveis de remuneração deveriam decorrer da

qualidade dos serviços prestados; e (iii) as terminal dues deveriam ser

transparentes e não discriminatórias.

Segundo o Artigo 13(2), a implementação de tais princípios poderia

envolver a realização de acordos transitórios elaborados para evitar efeitos

desastrosos nos mercados postais nacionais ou situações desfavoráveis aos

prestadores de serviços universais tanto emissores quanto receptores de

cross-border mails dado o fato de que havia diferentes contratos de terminal

dues vigentes à época do início da vigência da Diretiva 97/67.

Como os acordos de terminal dues são claros para fixação de preços e

uniformização condições comerciais (i.e., verdadeiros “cartéis”), a parte final

do Artigo 13(2) prevê expressamente que tais acordos devem ser restritos ao

                                                                                                                         261 EU. Directive 97/67/EC of The European Parliament and of The Council of 15 December 1997 on common rules for the development of the internal market of Community postal services and the improvement of quality of service. Disponível em: <http://eur-lex.europa.eu/LexUriServ/LexUriServ.do?uri=OJ:L:1998:015:0014:0025:EN:PDF>. Acesso em: 4 Nov. 2010: “Article 2 For the purposes of this Directive, the following definitions shall apply: (…) 15. terminal dues: the remuneration of universal service providers for the distribution of incoming cross- border mail comprising postal items from another Member State or from a third country;”  

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165  

mínimo necessário para a consecução dos objetivos da uniformização das

tarifas de interconexão de redes postais.262 Importante lembrar que, além

disso, os acordos sobre terminal dues são isentos da aplicação do Artigo

81(1), do Tratado da CE (atualmente, artigo 101, do TFUE), i.e., que regulam

a prática de cartéis no âmbito da UE.

3.3.3.1 Jurisprudência sobre terminal dues

Vale observar que previamente à regulamentação do setor na UE, por

muitos anos houve muitos conflitos entre os diferentes Estados-membros,

precisamente entre seus respectivos prestadores de serviço universal,

decorrentes das terminal dues. Isso porque os diferentes operadores dos

serviços postais não eram adequadamente remunerados no tocante às

terminal dues, tendo as tarifas resultado, na ocasião, algumas “arbitragens”263

denominadas “remailing”.264

                                                                                                                         262   EU. Directive 97/67/EC of The European Parliament and of The Council of 15 December 1997 on common rules for the development of the internal market of Community postal services and the improvement of quality of service. Disponível em: <http://eur-lex.europa.eu/LexUriServ/LexUriServ.do?uri=OJ:L:1998:015:0014:0025:EN:PDF>. Acesso em: 4 Nov. 2010: “Article 13 1. In order to ensure the cross-border provision of the universal service, Member States shall encourage their universal service providers to arrange that in their agreements on terminal dues for intra-Community cross- border mail, the following principles are respected: — terminal dues shall be fixed in relation to the costs of processing and delivering incoming cross-border mail, — levels of remuneration shall be related to the quality of service achieved, — terminal dues shall be transparent and non-discriminatory. 2. The implementation of these principles may include transitional arrangements designed to avoid undue disruption on postal markets or unfavourable implications for economic operators provided there is agreement between the operators of origin and receipt; such arrangements shall, however, be restricted to the minimum required to achieve these objectives.” 263 Sobre o conceito de “arbitragem”, ver TERA Consultants. Draft Final Study report on Study on the Future of Interconnection charging methods. European Commission. Ref. 2009-70-Future Interconnection Charging Methods. Disponível em: <http://www.teraconsultants.fr/assets/publications/PDF/2009-70-MR-draft-final-study(consult).pdf>. Acesso em: 5 Mar. 2011: “From an economic point of view, an arbitrage opportunity is the opportunity to buy an asset at a low price then immediately selling it on a different market for a higher price. Arbitrage opportunities in telecommunications occur whenever services are functionally similar but not necessarily equivalent (especially from the point of QoS) and arbitrageurs can find and exploit price margins created by regulation within a country or different competitive conditions amongst countries (ex: accounting rate amongst different countries, accounting rate vs. domestic interconnection rates, retail fixed to mobile vs. retail mobile to mobile...).”  264 Sobre o conceito de “remailing”, ver GERADIN, D.; HENRY, D. Regulatory and Competition Law Remedies in The Postal Sector. Remedies in Network Industries: EC Competition Law vs. Sector-Specific Regulation. Damin Geradin (Editor). Intersentia. Antwerp, Oxford, UK, 2004, p.136, Footnote 39: “Remail refers to mail which is posted in a

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166  

Assim, durante a conferência de 1969 da Universal Postal Union

(UPU)265, um método e compensação foi estabelecido, a partir do qual os

operadores de serviços postais nacionais poderiam receber um determinado

pagamento por quilograma de cross-border mail recebido, processado e

distribuído. Esse sistema não funcionou, basicamente por não ter levado em

consideração as diferenças estruturais presentes em cada operador postal

nacional na UE, boa parte dos quais passaram a adotar uma diferente

fórmula de cálculo embasada na estrutura da European Conference of Postal

and Telecommunications Administrations (CEPT).266

Esse método, se comparado ao método da UPU, acabou por gerar um

aumento substancial nas terminal dues para os operadores postais                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                            country other than the country in which the person who sends the mail resides. International mail is taken from that country where the mail is produced to another country where lower international or domestic postage tariffs can be found than in the first country.” 265   Universal   Postal   Union.” Para informações gerais sobre a Universal Postal Union, bem como seu mecanismo de funcionamento normativo por meio de Conventions, ver UNIVERSAL POSTAL UNION (UPU). The UPU. About history. Disponíveis em: <http://www.upu.int/en/the-upu/the-upu.html> e <http://www.upu.int/en/the-upu/history/about-history.html>. Acesso em: 5 Mar. 2011: “The UPU: Established in 1874, the Universal Postal Union (UPU), with its headquarters in the Swiss capital Berne, is the second oldest international organization worldwide. With its 191 member countries, the UPU is the primary forum for cooperation between postal sector players. It helps to ensure a truly universal network of up-to-date products and services. In this way, the organization fulfils an advisory, mediating and liaison role, and provides technical assistance where needed. It sets the rules for international mail exchanges and makes recommendations to stimulate growth in mail, parcel and financial services volumes and improve quality of service for customers. The UPU consists of: 4 bodies; The Congress; The Council of Administration (CA); The Postal Operations Council (POC); The International Bureau (IB); 2 cooperatives; Telematics Cooperative; EMS Cooperative.” 266 European Conference of Postal and Telecommunications Administrations (CEPT). About CEPT. Disponível em. <http://www.cept.org/>. Acesso em: 5 Mar. 2011: “The European Conference of Postal and Telecommunications Administrations - CEPT - was established in 1959 by 19 countries, which expanded to 26 during its first ten years. Original members were the monopoly-holding postal and telecommunications administrations. CEPT's activities included co-operation on commercial, operational, regulatory and technical standardisation issues. In 1988 CEPT decided to create ETSI, the European Telecommunications Standards Institute, into which all its telecommunication standardisation activities were transferred. (...) The following countries have held the Presidency: The United Kingdom from 1st October 2001; Portugal from 1st October 2002; Switzerland from 1st October 2003; Romania from 1st October 2004; Germany from 1st October 2005; Netherlands from 1st October 2006. Malta took over the Presidency on 1st October 2007. The Presidency was extended until April 2009. An Extraordinary Assembly on the 19-20 March 2009 replaced the rotating Presidency with a co-presidency of the Chairmen of the three Committees: ECC, CERP and Com-ITU. Administrations from the following 48 countries are members of CEPT: Albania, Andorra, Austria, Azerbaijan, Belarus, Belgium, Bosnia and Herzegovina, Bulgaria, Croatia, Cyprus, Czech Republic, Denmark, Estonia, Finland, France, Georgia, Germany, Greece, Hungary, Iceland, Ireland, Italy, Latvia, Liechtenstein, Lithuania, Luxembourg, The Former Yugoslav Republic of Macedonia, Malta, Moldova, Monaco, Montenegro, Netherlands, Norway, Poland, Portugal, Romania, Russian Federation, San Marino, Serbia, Slovakia, Slovenia, Spain, Sweden, Switzerland, Turkey, Ukraine, United Kingdom, Vatican.”  

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167  

localizados nos Estados-membros receptores (ou de destino) de cross-border

mails, ao passo que uma rápida redução do custo de distribuição dos

mesmos itens postais para os operadores postais situados nos Estados-

membros emissores (ou originários) dos cross-border mails.

Em 1993, a International Express Carriers Conference (IECC)

formalizou uma denúncia perante a CE contra o acordo do CEPT, a partir do

que a CE formalizou uma investigação contra os membros da CEPT e, por

meio de um statement of objections267, reconheceu que o acordo violava o

Artigo 81(1) do Tratado da CE dado que havia fixação de uma tarifa uniforme

para a distribuição de cross-border mails recebidos.268

Contudo, a CE não decidiu negativamente (isto é, não condenou os

envolvidos) no intuito de não impedir a elaboração de um novo acordo, agora

consistente com as condições estabelecidas no statement of objections. Tal

novo acordo, mais conhecido como REIMS I, foi de fato elaborado e assinado

por operadores postais públicos de 15 jurisdições, não tendo, contudo,

entrado em vigor em razão da recusa por parte do operador postal público da

Espanha. Dessa forma, em 1997, o REIMS I expirou dando lugar ao REIMS

II, o qual foi notificado à CE em Outubro de 1997 e recebeu da Comissão

uma isenção antitruste, com base no Artigo 81(3).269

                                                                                                                         267 EU. Commission MEMO/07/314 of 27.07.2007. Competition: Commission confirms sending of Statement of Objections to Intel. Disponível em: <http://europa.eu/rapid/pressReleasesAction.do?reference=MEMO/07/314>. Acesso em: 6 Mar. 2011: “Background - A Statement of Objections is a formal step in Commission antitrust investigations in which the Commission informs the parties concerned in writing of the objections raised against them. The addressee of a Statement of Objections can reply in writing to the Statement of Objections, setting out all facts known to it which are relevant to its defense against the objections raised by the Commission. The party may also request an oral hearing to present its comments on the case. The Commission may then take a decision on whether conduct addressed in the Statement of Objections is compatible or not with the EC Treaty’s antitrust rules. Sending a Statement of Objections does not prejudge the final outcome of the procedure.” 268 EU. Commission proceeding against system of compensation between postal administrations of 5.04.1993 - Case IV/32.791 – Remail Statement of Objections (International Express Carriers Conference - IECC v. CEPT Terminal dues agreement). Disponível em: <http://www.jcampbell.com/Reference/eu/199304_remail_stmt_obj.pdf>. Acesso em: 7 Mar. 2011.  269 EU. Commission Decision 1999/951 of 15 September 1999 relating to a proceeding under Article 81 of the EC treaty and Article 53 of the EEA Agreement (Case No IV/36.748 - REIMS II). (26.10.1999 - O.J. L275/17). Disponível em: <http://www.jcampbell.com/Reference/eu/199910_reims2_notice2.pdf>. Acesso em 6 Mar. 2011. EU. Treaty on the Functioning of the European Union (TFEU). Disponível em: <http://eur-lex.europa.eu/LexUriServ/LexUriServ.do?uri=OJ:C:2008:115:0047:0199:EN:PDF> Acesso em: 9 Fev. 2011: “Article 101 (ex Article 81 TEC). (…)

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168  

Os princípios da Diretiva 97/67 estão incorporados no acordo REIMS

II, o qual, todavia, gera preocupações de ordem concorrencial, pois embora

não fixe uma tarifa uniforme, seu sistema de uniformização do nível das

terminal dues em forma percentual impede a livre fixação de preços para a

entrega de cross-border mails recebidas, o que é muito semelhante, senão

idêntico, à prática de cartel. Por outro lado, sua função de viabilizar aos

serviços postais nacionais uma operação mais embasada nos custos para a

definição das terminal dues, bem como a potencialização dos incentivos para

a melhoria de qualidade na prestação dos serviços de entrega de cross-

border mails resultante do acordo, sustentaram a concessão da isenção

antitruste.270

O REIMS II teve sua isenção antitruste prorrogada até 31 de

Dezembro de 2006. A isenção antitruste também acabou se estendendo a

terceiros (não prestadores de serviço universal) uma vez que os 17

operadores postais nacionais (prestadores de serviço universal) signatários

do REIMS II deveriam entregar cross-border mails recebidos de terceiros não

signatários (os quais passaram a requerer acesso ao serviço dada a abertura

à livre concorrência do mercado de emissão de cross-border mails a partir de

1o. de janeiro de 2003)271 nos mesmos termos e condições aplicados para

eles próprios (signatários).272

                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                           3. The provisions of paragraph 1 may, however, be declared inapplicable in the case of: - any agreement or category of agreements between undertakings, - any decision or category of decisions by associations of undertakings, - any concerted practice or category of concerted practices, which contributes to improving the production or distribution of goods or to promoting technical or economic progress, while allowing consumers a fair share of the resulting benefit, and which does not: (a) impose on the undertakings concerned restrictions which are not indispensable to the attainment of these objectives; (b) afford such undertakings the possibility of eliminating competition in respect of a substantial part of the products in question.” 270 EU. Commission Decision of 15.09.1999 relating to a proceeding under Article 81 of the EC Treaty and Article 53 of the EEA Agreement (Case No IV/36.748 — REIMS II). Disponível em: <http://www.jcampbell.com/Reference/eu/199910_reims2_notice2.pdf>. Acesso em: 8 Mar. 2011. 271 EU. Directive 2002/39/EC of The European Parliament and of The Council of 10.06.2002 amending Directive 97/67/EC with regard to the further opening to competition of Community postal services. Disponível em: <http://eur-lex.europa.eu/LexUriServ/LexUriServ.do?uri=OJ:L:2002:176:0021:0025:EN:PDF>. Acesso em: 4 Nov. 2010: “(…) (16) General reductions to 100 grams in 2003 and 50 grams in 2006 in the weight limit of the services which may be reserved to the universal service providers, combined with opening outgoing cross-border mail fully to competition with possible

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169  

Em 1 de janeiro de 2008 foi assinado um novo acordo, agora

envolvendo 16 operadores postais nacionais, tendo sido esse acordo

denominado de “REIMS III”. Com base nas melhores informações públicas

disponíveis, várias foram as objeções a tal acordo, por parte de operadores

postais importantes como o Royal Mail (UK) e o TNT (Holanda), razão pela

qual estão negociando a elaboração de um novo acordo, o REIMS IV, no

sentido de possibilitar sua assinatura já no contexto de livre concorrência

proporcionado aos mercados postais para conclusão da liberalização

                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                           exceptions to the extent necessary to ensure the provision of universal service, represent relatively simple and controlled further phases which are nevertheless significant.” 272 Sobre o histórico do terminal dues na CE, REIMS I, REIMS II, bem como isenções antitruste, ver GERADIN, D.; HENRY, D. Regulatory and Competition Law Remedies in The Postal Sector. Remedies in Network Industries: EC Competition Law vs. Sector-Specific Regulation. Damin Geradin (Editor). Intersentia. Antwerp, Oxford, UK, 2004, p.136-137: “(...) The contentious aspect of this matter essentially arises from the fact that, previously postal operators have not been fully compensated for the costs incurred by the treatment and distribution of the mail. In addition, terminal dues have led to some ‘arbitrage’ called remailing. As a result, during the 1969 Universal Postal Union (UPU) Conference, a compensation method was established whereby postal operators would receive a set amount for each kilogram of incoming cross-border mail treated and distributed. This system remained inadequate because it failed to take into account the different cost structures of postal operators. The inadequacy of this system led postal administrations of several European countries to adopt a different calculation formula in the framework of the European Conference of Postal and Telecommunications Administrations (CEPT). Compared to the system introduced under the auspices of the UPU, this method led to a substantial increase of terminal dues falling short, however, of fully accounting for the treatment and distribution costs in the country of destination. In 1993, the international Express Carriers Conference (IECC) lodged a complaint to the Commission against the CEPT agreement. The Commission issued a statement of objections to the CEPT members in which it stated that the agreement was caught by Article 81(1) in so far as there was a single tariff for the distribution of incoming cross-border mail. The Commission, however, decided not to adopt a formal negative decision in order not to hinder the adoption of a new agreement that would take into account the objections of the Commission. This new agreement, signed by the public postal operators of 15 countries and known as ‘REIMS I’ never entered into force due to the refusal of the Spanish postal operator to accede to it. It expired on the 30 September 1997 and a new agreement ‘REMS II’ was notified to the Commission in October 1997. An exemption was issued under article 81(3). The principles laid down in Article 13.1 of Directive 97/67 are embodied in the REIMS II Agreement. There are, however, competition concerns with the agreement. The system of a common level of terminal dues in the form of a percentage of the domestic tariff in the receiving country comes under the cartel prohibition. The absolute amounts of terminal dues are not fixed, but the automatic fixation of terminal dues in the form of a percentage of the tariff for the domestic delivery impedes the freedom to set the prices for the delivery of incoming cross-border mail. The reason an exemption was given is that it allows postal operators to operate a more cost-based system of charging each other for the delivery of incoming cross-border mail. Also the incentives to improve the quality of services lead to a better service as concerns cross-border mail. The Reims II Agreement has recently been exempted once again until the 31 December 2006. Third party operators and not the postal incumbents should benefit most from the exemption for the recent Decision stipulates that the 17 signatory postal operators must deliver incoming cross-border mail for those parties on the same terms that they apply among themselves. Private operators require access to this service since outgoing cross-border mail has been opened to competition since the 1 January 2003.”

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170  

decorrente da Diretiva 2008/6, a qual, como se viu, emendou a Diretiva

97/67.273

3.3.4 Separação de funções de gestão empresarial das funções regulatórias

As distorções à concorrência decorrentes da confusão de funções de

regulador e agente econômico, desde o princípio motivaram a CE a advogar

a separação de funções para os serviços postais. Já no Tratado da CE é

possível encontrar normas que vedam tal hipótese, quais sejam Artigos 86 e

89.274

                                                                                                                         273 TNT. Annual Report 2009. Regulatory Environment. Disponível em: <http://group.tnt.com/annualreports/annualreport09/governance-and-ir/mail-services.html>. Acesso em: 20 Mar. 2011: “REIMS. Most European postal operators view the UPU target terminal dues system as inadequate for its purposes. As a consequence a significant majority of them are party to the separate, multilateral "REIMS III agreement" where terminal dues are related to a higher percentage of domestic tariffs and to a certain extent to service quality as well. TNT has not entered into the REIMS III agreement. TNT feels that this agreement does not contain a sufficiently strong incentive/penalty system that would guarantee improvement of the quality of service, and furthermore that REIMS III does not allow TNT to compete successfully in the current competitive environment in its home market. Instead, TNT has concluded commercially oriented bilateral agreements with most of the major European postal operators. TNT will continue its policy of negotiating bilateral agreements with European postal operators. To make the REIMS agreement survive in a competitive environment, the REIMS parties have negotiated the terms of a new, REIMS IV, agreement. In view of increased competition on the Dutch domestic market and the markets for import and export of mail volumes, TNT decided not to become a party to this new agreement but to continue its policy of bilateral agreements.” Mais referências, podem ser encontradas em UNIVERSAL POSTAL UNION (UPU). Postal Operators Council of 11.09.2009. Committee 4 (Standards and Technology). Standards Board. Disponível em: <http://www.upu.int/document/2009/an/cep_c_4_gn_ep_4-3/d010.pdf>. Acesso em: 20 Mar. 2011.  274 EU. Treaty on the Functioning of the European Union (TFEU). Disponível em: <http://eur-lex.europa.eu/LexUriServ/LexUriServ.do?uri=OJ:C:2008:115:0047:0199:EN:PDF>. Acesso em: 9 Fev. 2011: “Article 106 (ex Article 86 TEC) 1. In the case of public undertakings and undertakings to which Member States grant special or exclusive rights, Member States shall neither enact nor maintain in force any measure contrary to the rules contained in the Treaties, in particular to those rules provided for in Article 18 and Articles 101 to 109. 2. Undertakings entrusted with the operation of services of general economic interest or having the character of a revenue-producing monopoly shall be subject to the rules contained in the Treaties, in particular to the rules on competition, in so far as the application of such rules does not obstruct the performance, in law or in fact, of the particular tasks assigned to them. The development of trade must not be affected to such an extent as would be contrary to the interests of the Union. 3. The Commission shall ensure the application of the provisions of this Article and shall, where necessary, address appropriate directives or decisions to Member States.

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Esse tema, de certa forma, sempre esteve no rol de preocupações da

CE, desde os primeiros casos analisados no sentido de limitação do escopo

do monopólio postal nacional, como por exemplo o caso CE v. Kingdom of

Netherlands - PTT Post BV – 90/16/EEC275, na Holanda, em que a

abrangência do monopólio legal fora ampliada por uma lei nacional, aos

demais casos de vedação de subsídios cruzados ou qualquer forma de

favorecimento, como por exemplo o caso TNT / Canada Post, DBP

Postdienst, La Post, PTT Post & Sweden Post276, e, que, embora aprovado

pela CE, as partes tiveram de assumir compromissos comportamentais

abrindo mão de concessão de subsídios cruzados e/ou de qualquer forma de

concessão de tratamento diferenciado advindo das empresas monopolistas

controladas pelos Estados-membros envolvidos na Joint Venture. A

separação de funções de regulação e concorrência assumiu claramente a

vertente de Política de Estado no Green Paper, de 1992, onde passou a

constar como uma das questões regulatórias gerais a ser adotadas pela UE

no sentido de liberalizar os serviços postais à livre concorrência.277

A Diretiva 97/67 possui duas previsões relativas à separação de

funções entre regulação e operação como agente econômico nos mercados

postais. A primeira delas integra parte dos “considerandos” da Diretiva, i.e.,

                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                           (…) Article 109 (ex Article 89 TEC) The Council, on a proposal from the Commission and after consulting the European Parliament, may make any appropriate regulations for the application of Articles 107 and 108 and may in particular determine the conditions in which Article 108(3) shall apply and the categories of aid exempted from this procedure.” 275 EU. Commission Decision of 20 December 1989 concerning the provision in the Netherlands of express delivery services 90/16/EEC (case EC v. Kingdom of Netherlands - PTT Post BV – 90/16/EEC). Disponível em: <http://www.jcampbell.com/Reference/eu/198912_nl_express.pdf>. Acesso em: 6 Mar. 2011. 276 EU. Commission Decision of 02.12.1991 declaring a concentration to be compatible with the common market according to Council Regulation (EEC) No 4064/89 - Case No IV/M.102 - TNT / CANADA POST, DBP POSTDIENST, LA POSTE, PTT POST & SWEDEN POST. Disponível em: <http://www.jcampbell.com/Reference/eu/199112_gdnet_jv.pdf>. Acesso em: 26 Fev. 2011.  277 EU. Green Paper on the development of the single market for postal services. COM (91) 476. Disponível em: <http://aei.pitt.edu/1173/1/postal_gp_COM_91_476.pdf>. Acesso em: 25 Fev. 2011: “(…) These main policy objectives therefore treat general regulatory issues, the obligations of the reserved service provider and, thirdly, the subjects of harmonisation and cohesion. Under these three headings, the main policy options break down into the detailed options shown (…) PART I: GENERAL REGULA TORY ISSUES (...) 4. SEPARATE REGULATORY AND OPERATIONAL FUNCTIONS.”

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172  

surge como uma espécie de princípio geral da Diretiva que deve ser

ponderado na atividade de sua interpretação e aplicação.

Trata-se do “considerando” (39) pelo qual, de modo a assegurar o

funcionamento dos serviços universais e, ao mesmo tempo, evitar-se

distorção na concorrência nos mercados não-reservados, é importante

separar as funções de regulação, de um lado, e de operação no mercado

postal, de outro lado; sendo que nenhum operador do setor postal na UE

pode ser juiz e parte interessada, vez que isso resultaria conflito de

interesses. Os Estados-membros deveriam definir estatutariamente (i.e., por

meio de leis nacionais) uma ou mais autoridades regulatórias a se encarregar

dos respectivos mercados postais.

De forma mais expressa, a Diretiva 97/67, no Artigo 22, definiu que

cada Estado-membro deveria designar uma ou mais autoridades regulatórias

para os respectivos mercados postais, devendo tal ou tais autoridades ser

legalmente separadas e operacionalmente independentes dos operadores

dos mercados postais.278 A Diretiva 2002/39 não trouxe inovações nesse

particular, apresentando apenas um considerando relativo ao tema, por sinal

muito parecido com a Diretiva 97/67.279

                                                                                                                         278 EU. Directive 97/67/EC of The European Parliament and of The Council of 15.12.1997 on common rules for the development of the internal market of Community postal services and the improvement of quality of service. Disponível em: < http://eur-lex.europa.eu/LexUriServ/LexUriServ.do?uri=OJ:L:1998:015:0014:0025:EN:PDF>. Acesso em: 4 Nov. 2010: “(…) (39) Whereas, in order to ensure the proper functioning of the universal service and to ensure undistorted competition in the non-reserved sector, it is important to separate the functions of the regulator, on the one hand, and the operator, on the other; whereas no postal operator may be both judge and interested party; whereas it is for the Member State to define the statute of one or more national regulatory authorities, which may be chosen from public authorities or independent entities appointed for that purpose; (…) Article 22 Each Member State shall designate one or more national regulatory authorities for the postal sector that are legally separate from and operationally independent of the postal operators. Member States shall inform the Commission which national regulatory authorities they have designated to carry out the tasks arising from this Directive. The national regulatory authorities shall have as a particular task ensuring compliance with the obligations arising from this Directive. They may also be charged with ensuring compliance with competition rules in the postal sector.” 279 EU. Directive 2002/39/EC of The European Parliament and of The Council of 10.06.2002 amending Directive 97/67/EC with regard to the further opening to competition of Community postal services. Disponível em: <http://eur-lex.europa.eu/LexUriServ/LexUriServ.do?uri=OJ:L:2002:176:0021:0025:EN:PDF>. Acesso em: 4 Nov. 2010: “(…) (27) Directive 97/67/EC established that Member States are to designate one or more national regulatory authorities for the postal sector that are legally separate from, and operationally independent of, the postal operators. In view of the dynamics of the European Postal markets, the important role national regulatory authorities

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A Diretiva 2008/6, de modo a sacramentar a aplicação desse princípio

geral da UE nos serviços postais, também previu, dentre seus princípios

específicos (i.e., considerandos), que os Estados-membros deveriam garantir

a independência das autoridades regulatórias nacionais dos players

encarregados da prestação de serviços universais, sobretudo naqueles casos

em que ainda havia áreas reservadas. Além de impedir distorções na

concorrência, naturalmente decorrentes da mistura (ou confusão) de tais

funções em uma mesma entidade (como se pode observar no caso dos EUA,

Capítulo II, em que a USPS acumula funções de regulação ao mesmo tempo

em que desempenha o papel de agente econômico no mercado postal norte-

americano), o objetivo da UE seria garantir decisões imparciais por parte das

autoridades regulatórias nacionais.

Nesse sentido, a Diretiva 2008/6 ainda previu, em seu Artigo 1, que

uma das regras comuns que deveriam ser inseridas na Diretiva 97/67 seria a

criação de autoridades regulatórias nacionais independentes, as quais

deveriam regular os serviços postais, principalmente o serviço universal e sua

relação com os demais mercados.280

Em complemento e na mesma linha da Diretiva 97/67, porém de forma

um pouco mais abrangente, a Diretiva 2008/6 previu na nova redação do

Artigo 22 que cada Estado-membro deve designar uma ou mais autoridades

regulatórias para os respectivos mercados postais, devendo tal ou tais

                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                           play should be acknowledged and furthered, in particular concerning the task of ensuring that the reserved services are respected, except in Member States where there are no reserved services. Article 9 of Directive 97/67/EC allows Member States to go beyond the objectives of that Directive.” 280 EU. Directive 2008/6/EC of The European Parliament and of The Council of 20.02.2008 amending Directive 97/67/EC with regard to the accomplishment of the internal market of Community postal. Disponível em: <http://ec.europa.eu/internal_market/post/doc/legislation/2008-06_en.pdf>. Acesso em: 25 Fev. 2011: “(47) The role of national regulatory authorities is likely to remain crucial, in particular in those Member States where the transition to competition still needs to be completed. In accordance with the principle of separation of regulatory and operational functions, Member States should guarantee the independence of the national regulatory authorities, thereby ensuring the impartiality of their decisions. This requirement of independence is without prejudice to the institutional autonomy and constitutional obligations of the Member States and to the principle of neutrality with regard to the rules in Member States governing the system of property ownership laid down in Article 295 of the Treaty. National regulatory authorities should be provided with all necessary resources, in terms of staffing, expertise and financial means, for the performance of their tasks. (…)1. Article 1 shall be replaced by the following: ‘Article 1 This Directive establishes common rules concerning: (…) — the creation of independent national regulatory authorities”.

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autoridades ser legalmente separadas e operacionalmente independentes

dos operadores dos mercados postais. Nos casos em que os Estados-

membros mantenham-se no controle de empresas operadoras do mercado

postal, exige-se que haja absoluta separação estrutural entre as funções

regulatórias e as funções de agente econômico, i.e., que entidades distintas

desempenhem, de forma independente, uma as funções de regulação, e

outra as funções de agente econômico.281

3.3.4.1 Jurisprudência sobre separação de funções de player e regulador

Na perspectiva jurisprudencial, a CE já possui uma posição

consolidada com relação à necessidade de separação de funções de

regulação e operação como agente econômico nos mercados, de modo

geral, inclusive em se tratando de serviços postais. Segundo a CE e o

Tribunal de Justiça da UE, presume-se o abuso de posição dominante, isto é,

a incidência do Artigo 102, do TFEU, caso uma lei nacional atribua ambas

funções a um agente econômico, notadamente se tal agente desfruta de

exclusividade para atuar em algum mercado, como para a prestação de

serviços postais.

Especificamente sobre o mercado postal, vale analisar brevemente o

caso CE v. La Poste (monopolista do mercado postal na França, controlada

pelo governo Francês). Nesse caso, a legislação postal francesa foi

                                                                                                                         281 EU. Directive 2008/6/EC of The European Parliament and of The Council of 20.02.2008 amending Directive 97/67/EC with regard to the accomplishment of the internal market of Community postal. Disponível em: <http://ec.europa.eu/internal_market/post/doc/legislation/2008-06_en.pdf>. Acesso em: 25 Fev. 2011: “20. Article 22 shall be replaced by the following: ‘Article 22 1. Each Member State shall designate one or more national regulatory authorities for the postal sector that are legally separate from and operationally independent of the postal operators. Member States that retain ownership or control of postal service providers shall ensure effective structural separation of the regulatory functions from activities associated with ownership or control. Member States shall inform the Commission which national regulatory authorities they have designated to carry out the tasks arising from this Directive. They shall publish the tasks to be undertaken by national regulatory authorities in an easily accessible form, in particular where those tasks are assigned to more than one body. Member States shall ensure, where appropriate, consultation and cooperation between those authorities and national authorities entrusted with the implementation of competition law and consumer protection law on matters of common interest.”

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contestada pela CE no sentido de que não seria compatível com as normas

de concorrência comunitárias, pois atribuíam à La Poste a qualidade de

regulador dos níveis a montante do mercado postal (i.e., mercado de mail

preparation service – caracterizado pelas etapas anteriores à postagem, tais

como a montagem das correspondências, envelopagem, coleta domiciliar,

transporte e entrega à La Poste)282, de operador monopolista do mercado a

jusante e de agente econômico do mercado a montante (por intermédio de

suas subsidiárias).

Esse caso se originou de denúncias por parte de concorrentes da La

Poste no mercado de mail preparation service no sentido de que, em síntese,

a La Poste estava aplicando tratamento discriminatório (relativo a preços e

condições contratuais) a eles em comparação às subsidiárias da La Poste

que atuavam no mercado de mail preparation service. As denúncias também

continham alegações de que a La Poste flexibilizava a aplicação de normas

regulatórias às suas subsidiárias, o que acabava por distorcer a concorrência,

                                                                                                                         282 EU. Commission Decision of 23 October 2001 on the lack of exhaustive and independent scrutiny of the scales of charges and technical conditions applied by La Poste to mail preparation firms for access to its reserved services – (2002/344/EC). Disponível em: <http://eur-lex.europa.eu/LexUriServ/LexUriServ.do?uri=OJ:L:2002:120:0019:0037:EN:PDF>. Acesso em: 4 nov. 2010: “[Mail preparation market] - (1) This Decision relates exclusively to the relations between La Poste (the French postal service) and those of its commercial partners which are mail preparation firms operating in markets upstream of its own main activity, namely basic postal services. These commercial partners can be regarded both as: (i) users in so far as they act as a proxy for originators of mail, who entrust them with the delivery of their items to the offices of La Poste, and (ii) suppliers of La Poste, in so far as they provide certain services in place of the public postal operator, upstream of the operations lying within the scope of its reserved area. Mail preparation is in all cases an activity upstream of acceptance of the items by La Poste as part of the services it provides within the reserved area. The very nature of mail preparation involves use of the reserved services. From a conceptual standpoint, and although in practice the various tasks involved are interlinked (1) in a continuum of services that are often provided by the same firms, the term ‘mail preparation’ covers two different types of activity (2) Mail preparation may firstly cover a service provided for the benefit of a mail originator. In such cases, the activity involves making up items (printing, enveloping or plastic wrapping, labeling, addressing and franking), collecting, bundling and sorting them and delivering them to the offices of La Poste. (3) Performing this type of activity for customers generating mail items could be likened to operating a mail room on behalf of larger companies (3). The Commission notice on the application of the competition rules to the postal sector and on the assessment of certain state measures relating to postal services(4) points out that ‘mail rooms of larger companies are now often operated by intermediaries, which prepare and presort mail before handing it over to the postal operator for final distribution’. Mail preparation firms engaged in this activity can be treated as independent ‘intermediaries’ between senders and La Poste. They alone are liable for the prepayment of postage to the latter.”  

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dado que não flexibilizava a aplicação das mesmas regras para os

concorrentes de suas subsidiárias.283

Analisando o caso, bem como a legislação francesa sobre o setor

postal, a CE verificou que realmente havia sobreposição de funções de

agente econômico e regulador na La Poste, no mercado de mail preparation

services, sendo esta monopolista no mercado downstream (de serviços

postais básicos). Em atenção à jurisprudência do Tribunal de Justiça

Europeu284, a CE reconheceu que a mera sobreposição de funções é

classificada como “conflito de interesses” o qual cria uma presunção de

descumprimento do Artigo 102, do TFUE, isto é, presunção de abuso de

posição dominante. Aplicando essa presunção ao caso da La Poste, a CE

concluiu, em síntese, que o conflito de interesses identificado na legislação

francesa levaria a uma ausência de neutralidade na supervisão das

                                                                                                                         283 EU. Commission Decision of 23 October 2001 on the lack of exhaustive and independent scrutiny of the scales of charges and technical conditions applied by La Poste to mail preparation firms for access to its reserved services – (2002/344/EC). Disponível em: “(...)[Brief of the complaint] - (30) On 30 June 1998, the Syndicat national des entreprises de logistique de publicité directe lodged a complaint against the French State concerning La Poste’s mail preparation activities. The SNELPD is a trade association governed by French law, which, according to its statutes, defends the interests of its members, which are mail preparation firms. The SNELPD represents 62 firms, i.e. most of those present on this market. (31) The complainant alleges that La Poste grants discounts to its direct customers and to its own subsidiaries active in the area of mail preparation services, which are not generally offered to mail preparation firms. Moreover, the complaint alleges that La Poste lays down conditions, which, although in principle uniformly applicable, are disadvantageous to firms competing with La Poste and its subsidiaries. According to the complainant, conditions such as the quantities of mail required to qualify for advantageous scales of charges are fixed at levels, which effectively exclude small mail preparation firms. The complainant alleges, for example, that the threshold of 3 million mail items required to qualify for so-called quantity and presentation contracts with La Poste is not based on cost savings for La Poste but is fixed arbitrarily in a manner which limits the number of eligible mail preparation firms. (32) Moreover, the complainant claims that La Poste is less rigorous in verifying compliance with the conditions for handing over mail by its subsidiaries than by the firms competing with them. In addition, rules not intrinsically discriminatory are applied in a discriminatory fashion by La Poste. In this context, the complainant cites numerous examples of cases in which subsidiaries of La Poste had not complied with the rules on the quantities to be delivered to post offices, format, presentation, handover times and places, and content but in which they nevertheless received discounts.” 284 Sobre a necessidade de separação de funções entre agente econômico e regulador, sobretudo quando há monopólio legal, ver EU. European Court of Justice. Judgment of 13 December 1991 in Case C-18/88 RTT v GB- Inno-BM [1991] ECR I-5941, points 24 and 25; judgment of 19 March 1991 in Case C-202/88 French Republic v Commission [1991] ECR, I-1223, point 51; judgment of 27 October 1993 in Joined Cases C-46/90 and C-93/91 Procureur du Roi v Lagauche and others [1993] ECR I-5284, point 44. Disponíveis em: <http://eur-lex.europa.eu/LexUriServ/LexUriServ.do?uri=CELEX:61988J0018:EN:HTML>. Acesso em: 9 Mar. 2011.

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atividades da La Poste, bem como à possibilidade de efeitos negativos à

concorrência em função das condutas da La Poste.285

                                                                                                                         285 EU. Commission Decision of 23 October 2001 on the lack of exhaustive and independent scrutiny of the scales of charges and technical conditions applied by La Poste to mail preparation firms for access to its reserved services – (2002/344/EC). Disponível em: “(…) [Brief of the grounds for decision] - 2.5. Infringements of the competition rules 2.5.1. The conflict of interest facing La Poste (62) Article 86(1) of the Treaty lays down that, in the case of undertakings to which Member States grant special rights, Member States shall neither enact nor maintain in force any measure contrary to the rules contained in the Treaty, in particular to those laid down by Articles 12 and 81 to 89. (63) The Court of Justice has acknowledged in this respect that a measure by which a Member State confers on an undertaking present on a market the power to lay down rules with which its competitors must comply result in competition being distorted and the principle of equal opportunities between different economic operators being violated. The economic power which the holder of the exclusive right has over the other undertakings active on the upstream markets gives rise to a conflict of interest. La Poste is led to give preference directly or indirectly to its own subsidiaries to the detriment of its competitors on the upstream market. Such conduct gives rise to abuses within the meaning of Article 82. (64) The Court indicated in its judgment of 13 December 1991 in Case C-18/88 GB-Inno-BM (ECR I-5941, point 25.) that a conflict of interest constitutes an abuse in itself. In this Case, the Court was called on to rule on legislation which gave the dominant telephone operator, which also marketed telephone equipment, the right to approve its competitors’ telephone equipment. The Court stated that ‘a system of undistorted competition, as laid down in the Treaty, can be guaranteed only if equality of opportunity is secured as between the various economic operators. To entrust an undertaking which markets terminal equipment with the task of drawing up the specifications for such equipment, monitoring their application and granting type-approval in respect thereof is tantamount to conferring upon it the power to determine at will which terminal equipment may be connected to the public network, and thereby placing that undertaking at an obvious advantage over its competitors’ (65) In reply to RTT’s arguments, the Court also indicated (59) that the fact that RTT had not in fact committed any abuses could not be invoked to justify the legislation in question. (66) The Court’s reasoning in the GB-Inno-BM judgment is applicable in this case. La Poste has a monopoly over the transport of mail and packages not exceeding 350 grams in weight. It is therefore the only available partner for firms in the mail preparation sector which has to make use of its reserved services. It is therefore in a position to impose on mail preparation firms contractual clauses which contain price conditions and technical standards unilaterally determined by itself, despite apparently consulting the partners concerned in some cases. In particular, technical standards governing access to special scales of charges are laid down by ‘instructions’ drawn up by La Poste and published in the Bulletin Officiel de La Poste. (…) 2.5.2. Lack of neutrality in ministerial supervision of La Poste (77) Legislation that does not provide for an independent monitoring authority with sufficient guarantees of neutrality in relation to a public undertaking placed in a situation of a conflict of interest infringes Article 86(1) read in conjunction with Article 82 of the Treaty. More specifically, the absence of an authority providing such guarantees leads to infringements of Article 82 of the Treaty where the State does not effectively monitor how the incumbent operator with an exclusive right conducts itself on the upstream markets that are not covered by the exclusive right and on which the operator with the exclusive right is itself present. (78) Where a public undertaking is faced with a risk of a conflict of interest, it is the responsibility of the State to ensure that an effective monitoring system is in place such as will re-establish equal opportunities between operators. This is the conclusion of the Court’s reasoning in its judgment in GB-Inno-BM: ‘the maintenance of effective competition and the guaranteeing of transparency require that the drawing up of technical specifications, the monitoring of their application, and the granting of type-approval must be carried out by a body which is independent of public or private undertakings offering competing goods or services’ (See also the judgment of 27 October 1993 in Case C-69/91 Criminal proceedings

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178  

3.5 Considerações finais

A implementação do regime de livre concorrência nos mercados

postais vem sendo tratada de forma consistente na União Européia. Não por

acaso, pois a indústria postal é tida como uma das principais indústrias na

UE. Em 2004, por exemplo, registrou-se que os serviços postais foram

responsáveis pelo faturamento de cerca de 90 bilhões de euros,

aproximadamente 1% do PIB da UE, naquele período. Paralelamente, os

serviços postais responderam por cerca de 1,6 milhões de empregos diretos

na UE. Embora na última década tenham enfrentando forte rivalidade de                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                            against Decoster [1993] ECR I-5335, point 19). (…) 2.5.3. Possible effect of the conflict of interest on the conduct of La Poste (87) The conflict of interest itself constitutes an abuse. It is not necessary to wait for the undertaking concerned actually to commit an abuse before finding that there is an infringement. It is sufficient that the undertaking is placed by the legislation itself in a situation that leads it to commit an abuse as soon as it is in its interest to do so. The creation and maintenance of a dual conflict of interest as described above must be considered in itself contrary to Article 86(1) read in conjunction with Article 82 of the Treaty, even in the absence of evident abuses (Judgment of 13 December 1991 in Case C-18/88 RTT v GB-Inno-BM [1991] ECR I-5941, points 23 and 24; Case C-163/96 Criminal proceedings against Silvano Raso and others [1998] ECR I-533, points 27 and 31). (…) (89) First, La Poste has the power to impose on its mail preparation partners technical and financial conditions unrelated to the relevant economic reference point. La Poste could set technical and financial conditions that, while apparently applicable equally, would in fact put competitors of La Poste and its subsidiaries at a disadvantage. There is nothing to show, for example, that the volume thresholds set by La Poste for access to certain types of technical contract, or the remuneration ‘per thousand’ granted to mail preparation firms for preparation and sorting work, are based on indisputable economic and technical data (saving on processing for La Poste, economies of scale, value added, etc.). On the contrary, there is a risk that La Poste is using its position as an unavoidable partner to conduct the negotiations leading to the conclusion of these contracts as it chooses. It is therefore possible that the terms set by La Poste, while apparently non-discriminatory, result in difficulties for mail preparation competitors or certain categories of mail preparation competitor. (…) (92) Second, in applying the technical standards referred to previously, La Poste may also be tempted to be less strict with its own subsidiaries and with major originators of mail with which it deals directly than with competing mail preparers. La Poste could thus apply in a discriminatory fashion standards which themselves comprise no discriminatory element. The complainant gave examples of cases where subsidiaries of La Poste had not complied with the rules on quantity, format, presentation, and times and places of delivery, or with rules on the nature of the mail, but had none the less benefited from contractual discounts and access to preferential rates. This situation had also been identified by La Poste’s general management. (…) [Brief of the decision] - Article 25 of Law No 90-568 of 2 July 1990 and Articles 22, 23 and 33 of La Poste’s service obligations, together with Articles 4 and 6 of Decree No 93-1272 of 1 December 1993 as amended and the Order of 2 November 1998 on the organisation of DiGITIP, are contrary to Article 86(1), read in conjunction with Article 82 of the EC Treaty, to the extent that they allow only limited scrutiny of the non-discriminatory nature of the scales of charges and technical conditions applied by La Poste to mail preparation firms, and to the extent that this partial scrutiny is furthermore exercised by a public authority that is insufficiently independent and neutral in relation to La Poste.”

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179  

outros meios de comunicação, como as correspondências eletrônicas,

telecomunicações etc., ainda desempenham um papel fundamental na UE,

sendo ainda classificados como serviços de interesse econômico geral.

Como se pode observar, ao longo de mais de mais de 20 anos (i.e., a

partir do caso CE v. Kingdom of the Netherlands - PTT Post BV - 1989),

esforços consistentes no plano normativo e jurisprudencial vem sendo

aplicados sobre os mercados e players europeus no sentido de liberalização

à livre concorrência em benefício dos consumidores e da economia européia

como um todo.

Todavia, a luta pela abertura dos mercados não tem sido fácil, haja

vista a existência de forças nacionais enraizadas, muitas vezes decorrentes

da utilização dos mercados postais para atendimento de funções sociais ou

políticas locais como empregabilidade e conexão a grupos de interesses

regionalizados (não necessariamente consistentes com o interesse social

comunitário).286

Nesse contexto, após as três Diretivas Postais (i.e., 97/67, 2002/39 e

2008/6), chega-se ao cenário atual de liberalização do setor postal na UE

(Agosto de 2010): cerca de 95% do mercado europeu, correspondente a 16

Estados-membros, está sob o regime de livre concorrência. O restante dos

Estados-membros deverá adequar-se às Diretivas Postais e, até 31 de

Dezembro de 2012, deverão promover a total abertura dos respectivos

mercados postais.287

Mesmo assim, eliminadas as reservas legais no plano formal (i.e.,

normativo), o que inegavelmente representa um avanço significativo, ainda

haverá um esforço de aplicação das regras de livre concorrência,

particularmente dos princípios de transparência e não discriminação, por

parte das autoridades regulatórias nacionais, em esforço conjunto com as

autoridades nacionais e comunitárias de defesa da concorrência. E, afirma-

                                                                                                                         286 EU. Report from The Commission to The Council and The European Parliament of 22.12.2008 on the application of the Postal Directive (Directive 97/67/EC as amended by Directive 2002/39/EC). Disponível em: <http://ec.europa.eu/internal_market/post/doc/reports/report_en.pdf>. Acesso em 20 Mar. 2011. 287 EU. EU Postal Legislation. Legislative and regulatory timetable for market opening process. Last update: 25.08.2010. Disponível em: <http://ec.europa.eu/internal_market/post/legislation_en.htm#legislative>. Acesso em: 20 Mar. 2011.  

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se, isso se dará principalmente na relação dos prestadores de serviços

universais com os demais agentes econômicos situados nos vários elos e

mercados da cadeia industrial dos serviços postais.

Desafios como a eliminação de vantagens comparativas diversas (tais

como a isenção do VAT – imposto sobre valor agregado - sobre os USP)

deverão ser levados a efeito pelas autoridades européias. Tudo com o

objetivo de efetivamente aplicar o princípio do “the level playing field” nos

mercados postais europeus, de modo que seja criado um único e verdadeiro

mercado postal ao longo de todo o território da UE, a partir do que, em

decorrência do regime de livre concorrência, possa-se gerar os mais variados

ganhos de bem-estar social, como aumentar os incentivos a investimentos

para a entrada nos diversos segmentos existentes, elevar a competição por

preços e qualidade dos serviços, aumentar os incentivos à inovação e, e.g.,

criar serviços de maior valor agregado que atendam a expectativas cada vez

mais específicas dos consumidores (como o hybrid mail etc.).

Nesse sentido, isto é, de aplicar e monitorar consistentemente as

regras de livre concorrência do Tratado da CE (agora TFUE) nos mercados

postais, a Comissão criou, em 11 de Agosto de 2010, o Grupo de Agências

Reguladoras Européias para os Serviços Postais (European Regulators

Group for Postal Services), o qual é formado basicamente por 27 autoridades

regulatórias nacionais dos setores postais relativas a cada Estado-membro

da UE.

O European Regulators Group for Postal Services possui como

objetivos principais, em síntese: (a) dar suporte à CE para a consolidação do

mercado postal Europeu; (b) aconselhar ou assistir a CE em qualquer

questão relacionada ao setor postal em matérias de competência comunitária

(como a aplicação das regras de defesa da concorrência); e (c) realizar, de

forma aberta e transparente, consultas, de acordo com a CE, aos

participantes do mercado postal, consumidores e clientes.288

O arcabouço jurídico e econômico desenvolvido na UE (i.e., casos,

normas e estudos) representa um rico material que pode servir de base para                                                                                                                          288 EU. Commission Decision of 10.08.2010 establishing the European Regulators Group for Postal Services (2010/C 217/07). Disponível em: <http://eur-lex.europa.eu/LexUriServ/LexUriServ.do?uri=OJ:C:2010:217:0007:0009:EN:PDF>. Acesso em 20 Mar. 2011.

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a avaliação de uma série de sistemas postais, tais como os EUA e,

principalmente, o Brasil. Alguns pontos, nesse particular, merecem breve

menção, ainda que à título meramente introdutório (ou provocativo), dado o

conteúdo dos próximos capítulos deste trabalho: (i) a reserva legal não é

condição para a universalização do serviço postal. Não é possível afirmar o

contrário sem incorrer em premissas falsas (ou de difícil demonstração diante

das evidências empíricas até aqui demonstradas). A acumulação de funções

de regulação e operação no mercado postal gera distorções à concorrência e

ao mercado como um todo, ao contrário do que sustentavam as autoridades

postais norte-americanas até dezembro 2006, momento em passaram a

concordar em parte com essa premissa (como visto no Capítulo II).

Até o presente momento, o controle estatal de empresas prestadoras

de serviços postais só tem gerado problemas e distorções, não havendo

exemplos de benefícios decorrentes desse modelo de escolha pública (a não

ser o atendimento de interesses particulares).

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CAPÍTULO IV. OS SERVIÇOS POSTAIS NO BRASIL

“O correio é para servir o bem público e não somente aumentar o

erário régio”

D. João VI, Imperador do Brasil (1829)289

"O correio, sagrada responsabilidade do Estado internacionalmente

pactuada, tornado uma pilhéria, constitui entre nós um dos mais

tristes sintomas da falta de saúde da administração."

Gilberto Amado (1887-1969)290

“Do mesmo modo, as investigações desta CPMI, os citados

procedimentos da Câmara dos Deputados e o próprio

comportamento dos acusados contribuíram para provar – provas

essas que serão reiteradas no presente Relatório Final – sem

deixar margem a dúvidas, que os ilícitos, amplamente conhecidos

sob o epíteto mensalão, de fato existiram, e que sua denúncia, os

processos instaurados que dela resultaram e, notadamente, a

presente investigação constituem uma contribuição fundamental do

Congresso Nacional ao fortalecimento do Estado de Direito

Democrático no Brasil.”

CPMI “dos Correios” (2006)291

4.1 Introdução

Como em outras jurisdições, o “serviço de correios”, primeira

denominação aos serviços postais no Brasil, foi criado e desenvolvido

diretamente pelo Estado. Na ocasião, início dos anos 1800, ausente meios

alternativos de comunicação e de interesse econômico por parte de agentes

privados para desenvolvê-lo, apenas o Estado poderia criar e desempenhar

essa função. Com o passar do tempo, todavia, a presença do Estado foi se

                                                                                                                         289 ALBUQUERQUE, Cícero Cavalcanti de. Correios e Legislação Postal Brasileira. 2ª ed. Rio de Janeiro: A. Coelho Branco F.º., 1965, p. 30. 290 MIGALHAS No. 2.590 de 17 de março de 2011. Disponível em: <http://www.migalhas.com.br/mig_hoje.aspx>. Acesso em: 17 Mar. 2011. 291 BRASIL. Comissão Parlamentar Mista de Inquéritos (CPMI) dos Correios. Relatório Final aprovado por 17 votos a 4 em 05.04.2006 (Vol. I, II e III). Disponível em: <http://www.cpmidoscorreios.org.br/relatorios/Final%20Vol1.pdf>. Acesso em: 1 Mai. 2011, p. 4.

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mostrando desnecessária, no sentido de que o próprio mercado começou a

proporcionar soluções em termos de transporte de bens e documentos em

atenção às mais variadas classes de demandas por parte dos clientes e/ou

consumidores. Algumas jurisdições, como a UE, incorporaram essas

inovações emergentes nos mercados postais propriamente ditos, como em

mercados vizinhos ou de certa forma relacionados aos serviços postais. Por

outro lado, outras jurisdições, como os EUA, passaram a adotar mecanismos

legais para, artificialmente, impedir a implementação de livre concorrência

nos serviços postais e, portanto, bloquear os naturais efeitos da inovação que

derivam de um regime de livre mercado. As razões para a implementação de

um regime de livre concorrência nos mercados postais são abundantes e

podem ser observadas ao longo dos três capítulos anteriores. Por outro lado,

as razões para a manutenção do regime de monopólio legal, i.e.,

universalização de acesso e modicidade tarifária em razão da existência de

falha de mercado (monopólio natural), carecem de fundamentação, embora

possam ser observadas até hoje em algumas jurisdições como os EUA e,

como se passa a estudar, o Brasil.

Desmistificados os argumentos da existência do monopólio natural

para os serviços postais e, assim, da necessidade da adoção do modelo de

monopólio legal exercido por empresa pública, interesses de pequenos e

poderosos grupos acabam por sustentar a manutenção dessa modalidade de

escolha pública, a qual acaba por gerar efeitos negativos gerais importantes

para a sociedade e, particularmente, para os consumidores, impactados

grandemente em seu bem-estar social. No caso de países em

desenvolvimento, como o Brasil, tais efeitos negativos são potencializados,

dando margem à outra rede de efeitos negativos (i.e., externalidades

negativas) que engloba a geração de pobreza e criação de ambientes

propícios à corrupção. Em outras palavras, até o presente momento, a

manutenção dos monopólios legais para serviços postais participa de um

círculo vicioso frontalmente contrário aos resultados do círculo virtuoso

decorrente do regime de livre concorrência nos mercados. O presente

capítulo analisa a estruturação do modelo de monopólio postal no Brasil, face

ao estudo comparado até aqui levado a efeito e a Constituição de 1988, tudo

com intuito de se avaliar em que medida as premissas e resultados

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identificados nos EUA e na UE podem ser observados no Brasil e, portanto,

qual seria a melhor alternativa a ser adotada para os serviços postais no

Brasil com vistas ao melhor atendimento dos ditames de bem-estar social.

4.2 Histórico

Neste tópico pretende-se demonstrar o histórico e a evolução do

serviço postal brasileiro. A perspectiva adotada será tanto relativa aos

aspectos fáticos quanto normativos. A importância de se analisar a história

nesse contexto é verificar se o tratamento legal conferido aos serviços

postais acompanha a evolução do serviço em si, o qual, como se sabe, não

ficou alheio às inovações tecnológicas e ao crescimento do setor privado.

Essa indagação pode ser resumida nas palavras do Ministro Marco Aurélio

em sede da ADPF 46-7/DF, STF:

Nesse contexto, qual o significado do teor do inciso X do artigo 21 [da Constituição de 1988]? Será que o sentido da expressão “manter o serviço postal” é hoje o mesmo de duzentos anos atrás, quando, pelo Alvará de 20 de janeiro de 1798, instituiu-se que competia aos Poderes Públicos o processo de organização postal dos Correios Terrestres? Será que se está condenado a ficar permanentemente atrelado ao passado, ignorando que os sentidos das normas também é condicionado pela evolução da vida, da vida em sociedade?292 (aparte inserido sobre o texto original).

Daí a importância de se investigar a evolução histórica do serviço,

como meio de se entender o atual sentido que pode ser extraído da norma

constitucional. Cada interpretação deve estar inserida em um contexto, por

isso, para se entender ou justificar a evolução de determinado instituto é

salutar que se conheça a evolução histórica que permeia sua interpretação. A

importância de se voltar ao contexto histórico para a busca do real sentido

das normas sobre o serviço postal é salutar, sendo que nem a norma e nem                                                                                                                          292 BRASIL. Supremo Tribunal Federal (STF). Arguição de descumprimento de Preceito Fundamental nº 46-7. Arguente: Associação Brasileira das Empresas de Distribuição. Arguido: Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos. Relator: Ministro Marco Aurélio. Brasília, 15 de junho de 2005. Disponível em: <http://redir.stf.jus.br/estfvisualizadorpub/jsp/consultarprocessoeletronico/ConsultarProcessoEletronico.jsf?seqobjetoincidente=2182784>. Acesso em 11 Mar. 2011.

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a atividade postal trazem em si um sentido do monopólio. Assim, a

permanência ou não desse monopólio depende unicamente do resultado de

uma interpretação voltada à história e contexto do instituto.

Os serviços postais possuem uma dupla ascendência. Num primeiro

momento, tratava-se de um serviço administrativo por excelência. Neste

sentido está a criação dos correios como uma instituição para uso exclusivo

do governo, prestado nos primórdios de modo gratuito ao público e, mais

tarde, em troca de certa remuneração. É o que se deu na Europa de modo

geral. Com base nessa ascendência, desenvolveu-se a teoria do ato

administrativo, segundo a qual a entrega de correspondências constitui um

ato administrativo unilateral sem relação com oferta e demanda, de modo que

a contraprestação pelo serviço teria natureza fiscal.293

Noutro sentido, contudo, em decorrência da segunda ascendência

apontada, a saber, a de serviço no sentido econômico da expressão, o

serviço postal está ligado intimamente com a idéia de transporte. Essa

ligação o torna espécie de serviço comercial, sujeito aos constantes

desenvolvimentos técnicos e, portanto, com características em permanente

mudança. Tal dinamicidade atribuiu ao serviço postal um lado econômico que

prevaleceu sobre o lado público na medida em que o interesse privado na

exploração desses serviços cresceu ao longo da história. Daí a coexistência

de outra teoria, chamada de teoria do ato de comércio, para a qual o serviço

postal seria espécie de serviço comercial, sujeito assim a regras comuns de

direito privado, inclusive às regras de livre concorrência. Para a teoria do ato

de comércio, há uma lógica contratual nos serviços de correio, de forma que

o pagamento / contraprestação possuiria natureza privada, e não fiscal. O

Estado, ao prestar tal serviço, visava, assim, muito mais a satisfação de

interesses próprios (i.e., dos governantes do momento) do que de um

interesse público. A forma como o Direito delimitou um ato de natureza

controversa como a prestação dos serviços postais, a princípio, não foi

                                                                                                                         293 FERRAZ JR, Tercio S. A atividade postal e os monopólios constitucionais. Direito Constitucional. São Paulo: Manole, 2007, p. 460.

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problemática, tendo em vista que, independentemente da natureza jurídica

que se atribuía a tal atividade, somente o Estado era capaz de prestá-la.294

Poder-se-ia falar até em espécie de monopólio natural, no qual a

natureza pública e a econômica do serviço convergiam em um único ente,

notadamente em razão da ausência de interesse econômico por parte dos

particulares para a exploração dessa atividade, mesmo diante de sua

importância para o desenvolvimento do país. No Brasil, a situação não era

outra. Nesse sentido, o modelo de monopólio legal era inevitável, por

ausência de condições estruturais que permitissem o ingresso de empresas

privadas. Além das dimensões continentais do País, faltava investimento nos

transportes. Nenhuma empresa à época (leia-se, de 1800) estava preparada

para executar esta atividade em condições desse modo adversas.295  

Assim, observa-se que a história brasileira dos serviços postais não

foge do padrão internacional, mais precisamente do que se passou nos EUA

e na UE. Isto é, se mostra marcada por um início intrinsecamente estatal,

antes de qualquer definição da natureza deste serviço, principalmente

motivado pela ausência de infraestrutura, interesse econômico pela atividade

e até mesmo agentes econômicos aptos a realizá-la. A evolução tecnológica

e do setor privado, no entanto, bem como o gradativo afastamento do Estado

de seu papel de agente econômico direto, abriram caminho para que

empresas privadas ganhassem capacidade técnica e espaço para ingressar

nesse mercado. Esse processo, aliás, é verificado em outros setores, como o

de telecomunicações, no qual hoje o Estado atua apenas como regulador da

execução do serviço, e não como prestador direto.

No caso dos correios brasileiros, cabe destacar, a título de

investigação histórica, que mesmo antes da configuração desse monopólio

legal houve a tentativa de prestação do serviço por particulares. Apontam os                                                                                                                          294 FERRAZ JR, Tercio S. A atividade postal e os monopólios constitucionais. Direito Constitucional. São Paulo: Manole, 2007, p. 462. 295 Além dos conceitos explorados no Capítulo I, sobre o conceito de Monopólio Natural, ver POSNER, Richard A. Natural Monopoly and its Regulation. 30th anniversary edition. Washington D.C.: CATO Institute, 1999, p. 1: “The term does not refer to the actual number of sellers in a market but to the relationship between demand and the technology of supply. If the entire demand within a relevant market can be satisfied at lowest cost by one firm rather than by two or more, the market is a natural monopoly, whatever the actual number of firms in it. If such a market contains more than one firm, either the firms will quickly shake down to one through mergers or failures, or production will continue to consume more resources than necessary.”

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historiadores que o Correio começou a funcionar no Brasil à época do Vice-

Reinado de D. Vasco de Mascarenhas, instituído por um regimento de 25 de

janeiro de 1663. Por ato real de 19 de dezembro do mesmo ano, a entidade

denominada “Officio de Correyo da Capitania do Rio de Janeiro” foi atribuída

aos comandos do alferes João Cavalheiro Cardozo, funcionando assim como

entidade paraestatal.296

Por volta de 1710, o serviço postal estava sob responsabilidade da

firma particular de Antonio Alves da Costa, mas devido à má gestão do

serviço ofertado por este particular, o governo do Vice Reinado avocou para

si a inteira execução dos serviços postais, quando este já detinha relevância

popular. Data de 1791 o estabelecimento de um concreto serviço postal

público no Rio de Janeiro por ordem das Cortes de Lisboa. Em 1799 o

Correio deixava completamente de ser um patrimônio de famílias para se

tornar parte dos Serviços da Coroa. Com a vinda da família real portuguesa

ao Brasil, é levada a cabo no governo de D. João VI uma grande

reorganização administrativa no país. Dentre as medidas mais importantes

estava criação da imprensa e a reorganização dos correios. Tratou-se de

período de desenvolvimento do comércio com a abertura dos portos,

efervescência cultural e intenso progresso do país. Como não poderia ser

diferente, as mudanças na realidade econômico-social e política

demandaram uma reestruturação dos serviços administrativos, dentre eles o

Correio.

Nota-se, assim, como os serviços postais estão intimamente ligados

às características, sempre em evolução, da sociedade em que se insere. No

Governo de D. João VI, considera-se publicado o primeiro regulamento da

atividade postal. O Monarca se preocupava imensamente com as atividades

postais e atribui-se a ele grande parte da evolução no tratamento e

organização deste serviço. Relata-se como de sua autoria frase

exemplificativa dessa preocupação: “O correio é para servir o bem público e

não somente aumentar o erário régio.”297

                                                                                                                         296 ALBUQUERQUE, Cícero Cavalcanti de. Correios e Legislação Postal Brasileira. 2ª ed. Rio de Janeiro: A. Coelho Branco F.º., 1965, p. 28. 297 ALBUQUERQUE, Cícero Cavalcanti de. Correios e Legislação Postal Brasileira. 2ªed. Rio de Janeiro: A. Coelho Branco F.º., 1965, p. 30.

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Posteriormente, a independência nacional conferiu destaque à

atividade postal, frente à necessidade, agora maior, de se manter relações

com as Províncias do Império. O jovem Imperador baixou o Decreto de

05.03.1829 com a intenção de conferir maior celeridade ao serviço postal,

regulamentar questões trabalhistas e estabelecer sedes administrativas pelo

território. A primeira referência constitucional aos serviços postais ocorreu na

Constituição de 1891. Essa carta política declarava em seu art. 34, inciso XV,

a competência privativa do Congresso Nacional para legislar sobre o serviço

dos correios e telégrafos federais. Note-se que não havia menção à

competência de exploração ou manutenção do serviço, mas apenas à

competência legislativa federal (tal como se observa na história dos serviços

postais nos EUA). Daí em diante a história demonstra a constante

preocupação dos governos com a estruturação dos serviços postais,

preocupação esta que, adentrando pela República, se demonstrava pela

extensa quantidade de regulamentos os quais cada vez mais foram

aproximando a estrutura dos Correios a uma empresa privada, inspirando-se

nas modernizações internacionais. Além dos elementos já citados,

instituíram-se tarifas, sistema de seguro, autonomia administrativa etc. A

reestruturação culminou na criação do Departamento de Correios e

Telégrafos (DTC) em 1932.298

A partir da Constituição Federal de 1934, contudo, a previsão se

amplia, fixando-se competência privativa da união para manter o serviço

postal (art. 5º, inciso VII). O mesmo se repetiu na Constituição de 1937 (art.

15, inciso VI). Em ambas as Cartas, a competência para manutenção dos

serviços postais era expressamente exclusiva da União.299Já na Constituição

de 1946 seguiu-se a competência da União para manter os serviços postais

(art. 5º, inciso XI), mas já não se fala mais em exclusividade. A redação em

1946 era a seguinte: “Art 5º - Compete à União: (...) XI - manter o serviço

postal e o Correio Aéreo Nacional”. A despeito de não haver, no diploma de

1946, o termo “privativamente”, a Constituição trazia em outro artigo previsão

                                                                                                                         298 ALBUQUERQUE, Cícero Cavalcanti de. Correios e Legislação Postal Brasileira. 2ª ed. Rio de Janeiro: A. Coelho Branco F.º., 1965, p. 45. 299 Constituição de 1934: “Art 5º - Compete privativamente à União: (…) VI - manter o serviço de correios;”, Constituição de 1937: “Art 15 - Compete privativamente à União: (…)VI - manter o serviço de correios.”

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genérica de que outras atividades poderiam ser monopolizadas. Trata-se do

art. 146, o qual autorizava, mediante lei especial, a intervenção pela União no

domínio econômico e a monopolização de indústria ou atividade.300 Tem-se

aqui outro importante marco histórico. A partir da Constituição de 1946, o

fundamento normativo (i.e., o substrato de validade normativa) do monopólio

postal passa a ser outro. Até 1937 a própria Carta trazia a previsão acerca da

exclusividade na prestação dos serviços de correios. Com a Constituição de

1946, o fundamento passa a ser uma vaga previsão em texto constitucional

permitindo que a União monopolizasse outras atividades que não as

expressas na Constituição. Esse quadro se repete nas Cartas posteriores,

mas não na Constituição Federal de 1988.

Em 1967 (art. 8º, inciso XI) e na Emenda Constitucional nº 1, de 1969

(art. 8º, inciso XIII), a redação constitucional manteve-se definindo apenas a

competência da União para manter os serviços postais. Contudo, conforme já

descrito anteriormente, em ambos os diplomas havia previsão conferindo à

União a possibilidade de explorar em forma de monopólio outras atividades

(art. 157, § 8º, CF 1967 e art. 163, Emenda 1/69). Assim, o monopólio foi

mantido, mas com fundamento em norma infraconstitucional (Decreto Lei nº

509 de 20 de março de 1969 e Lei nº 6.538 de 22 de Junho de 1978).301

Como se verá mais adiante, se aqui se verifica uma tendência de

aproximação ao modelo empresarial, visando a celeridade e eficiência do

                                                                                                                         300 FERRAZ JR, Tercio S. A atividade postal e os monopólios constitucionais. Direito Constitucional. São Paulo: Manole, 2007, p. 465. 301 Constituição de 1967: “Art 157 - A ordem econômica tem por fim realizar a justiça social, com base nos seguintes princípios: I - liberdade de iniciativa; II - valorização do trabalho como condição da dignidade humana; III - função social da propriedade; IV - harmonia e solidariedade entre os fatores de produção; V - desenvolvimento econômico; VI - repressão ao abuso do poder econômico, caracterizado pelo domínio dos mercados, a eliminação da concorrência e o aumento arbitrário dos lucros. (…) § 8º - São facultados a intervenção no domínio econômico e o monopólio de determinada indústria ou atividade, mediante lei da União, quando indispensável por motivos de segurança nacional, ou para organizar setor que não possa ser desenvolvido com eficiência no regime de competição e de liberdade de iniciativa, assegurados os direitos e garantias individuais.” Emenda 1/69: “Art. 163. São facultados a intervenção no domínio econômico e o monopólio de determinada indústria ou atividade, mediante lei federal, quando indispensável por motivo de segurança nacional ou para organizar setor que não possa ser desenvolvido com eficácia no regime de competição e de liberdade de iniciativa, assegurados os direitos e garantias individuais.”  

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Correio, mais tarde, com a transformação do DCT em Empresa Pública, a

opção pela forma de empresa se exprimiu por completo, muito embora isso

fosse inconsistente com a idéia de monopólio legal. Todo o histórico relatado

destaca, mais uma vez, a natureza ambivalente do serviço postal, algo

presente em toda sua história. Por questão de soberania e sigilo das

correspondências transportadas, diversos foram os Decretos e Resoluções

do Império ressaltando o caráter público do serviço e sua sujeição a atos de

Império.302 Por outro lado, sua ligação intrínseca com o serviço de transporte

e o desejo do Governo de instituir eficiência empresarial ao serviço, fez que

com que fosse submetido a dispositivos privados. Ocorre, contudo, que dada

a extensão continental do país e os altos custos iniciais para implantação do

serviço, não havia outro modo de executá-lo que não por meio do aparato

administrativo e da força de lei.303

Dessa forma, durante muito tempo coexistiram de modo harmônico,

sem grandes controvérsias jurídicas, as duas facetas do serviço postal. Como

visto, até a Constituição de 1934, nem havia previsão quanto à exclusividade

de prestação do serviço, limitando-se o texto constitucional a versar sobre a

competência legislativa da União em matéria de correios. Percebe-se, de

antemão, que na medida em que essa convergência (do caráter público e

econômico do serviço em um único ente) foi deixando de se tornar natural, as

normas passaram a explicitar a instituição de um monopólio, isto é, o que não

era naturalmente um monopólio, passou a sê-lo por força de lei. Em outras

palavras, na medida em que o contexto econômico impulsionava a atividade

postal para o regime de livre concorrência, passa-se a notar a criação de

normas jurídicas voltadas a garantir a reserva legal das atividades postais.

Ocasionalmente, observa-se que o mesmo movimento ocorreu nos

EUA (de forma mais intensa que no Brasil) e em alguns países da UE,

embora nesse caso a tendência tenha sido invertida pela aplicação das

regras de concorrência do Tratado de Roma e da liberalização do setor.

Como visto no ao longo deste trabalho, fica claro que o modelo de monopólio

                                                                                                                         302 Para maiores detalhes sobre a história dos Correios brasileiros, veja-se: ALBUQUERQUE, Cícero Cavalcanti de. Correios e Legislação Postal Brasileira. 2ª ed. Rio de Janeiro: A. Coelho Branco F.º., 1965, p. 27-52. 303 FERRAZ JR, Tercio S. A atividade postal e os monopólios constitucionais. Direito Constitucional. São Paulo: Manole, 2007, p. 464.

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postal não só representa um descompasso com a realidade fática em muitas

jurisdições como um grande problema em termos de bem-estar social. Como

se verá neste capítulo, isso se repete no Brasil, mesmo diante da ausência

de previsão constitucional.

4.3 Normas jurídicas e jurisprudência

Ainda em relação a marcos históricos, cabe destacar um momento

importante na história dos correios, tanto no que tange ao modelo de gestão,

quanto à sua posição frente ao direito-positivo. Trata-se da publicação da

norma que extinguiu o antigo Departamento de Correios e Telégrafos (DCT),

instituindo em seu lugar a Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos

(ECT). Alguns autores entendem que essa passagem de Departamento para

Empresa Pública é tida como elemento indicador de que, desde então, os

serviços postais já não se enquadravam mais no rol dos serviços públicos,

pois deixavam de pressupor o exercício de um Poder estatal.304 Em verdade,

desde quando passou a haver interesse privado na operação dos serviços

postais, entende-se que já não se tratavam de serviços públicos, mas de

atividades econômicas como outras que, devido à ausência de falhas de

mercado, não demandavam a intervenção estatal. Por essa razão, o regime

de direito público deveria ser substituído por regime de direito privado. A

partir desse momento histórico, portanto, está-se tratando do monopólio legal

de atividade econômica por parte uma empresa específica.305

4.3.1 Decreto Lei nº 509/1969306

A norma que promoveu a mudança do DCT para ECT foi o Decreto Lei

nº 509, de 20 de março de 1969. A constituição vigente à época (Constituição

de 1967 emendada pela Emenda Complementar nº 1 de 1969) não dispunha                                                                                                                          304 BARROSO, Luís Roberto. Regime constitucional do serviço postal. Legitimidade da atuação da iniciativa privada. Revista dos Tribunais, ano 90, v. 786. São Paulo: abr. 2001, p. 131-159. 305 FERRAZ JR, Tercio S. A atividade postal e os monopólios constitucionais. Direito Constitucional. São Paulo: Manole, 2007, p. 466. 306 Para acessar o texto legal vigente, ver BRASIL. Presidência da República. Decreto Lei nºº 509 de 20 de março de 1969. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil/decreto-lei/Del0509.htm>. Acesso em: 3 Abr. 2011.  

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sobre a exclusividade da União na manutenção do serviço postal, contudo,

tanto na Carta Original como na Emenda constava dispositivo autorizando

monopolização de atividade pelo Estado por meio de Lei Federal (Artigo 157,

§ 8º e art. 163 respectivamente). Com base nesse dispositivo constitucional,

o Decreto Lei nº 509/69 constituiu a ECT como empresa pública e lhe

reservou, com exclusividade, a operação dos serviços postais no Brasil: “À

ECT compete: I - executar e controlar, em regime de monopólio, os serviços

postais em todo o território nacional” (Artigo 2). Assim, embora tenha definido

a essência do modelo de monopólio legal para os serviços postais exercido

por empresa pública, o Decreto Lei não detalhou quais seriam

especificamente os tipos de serviços postais e, dessa forma, quais seriam

exclusivos da ECT e quais não seriam. Isto ficou a cargo da Lei nº 6.538, em

22 de Junho de 1978, como mais à frente se verá. De qualquer modo, alguns

pontos do Decreto Lei merecem maiores considerações, pois inauguraram

diversas das características que até o presente momento revestem o modelo

brasileiro para os serviços postais.

O primeiro ponto refere-se à gestão governamental dos serviços

postais, isto é, à ligação direta entre o Poder Executivo Federal e a ECT.

Segundo o Artigo 3, a ECT seria administrada por um Presidente, demissível

"ad nutum", indicado pelo Ministro de Estado das Comunicações e nomeado

pelo Presidente da República. Em outras palavras, a definição das

estratégias empresariais por parte da ECT estaria a cargo de uma pessoa

escolhida discricionariamente (e por critérios de livre nomeação e

exoneração) por parte do Governo Federal (ou, mais precisamente, do

partido político dominante na ocasião). Aliado ao esse fato, a “supervisão”

das atividades da empresa monopolista ficaria a cargo do Ministro de Estado

das Comunicações (Artigo 19), investido no cargo nas mesmas condições de

livre nomeação e exoneração a critério discricionário do Presidente da

República.307

Ora, como se avaliou no modelo dos EUA e, após, no modelo

Europeu, para se garantir uma operação isenta (i.e., sem comflito de

                                                                                                                         307 BRASIL. Presidência da República. Decreto Lei n.º 509 de 20 de março de 1969. “Artigo 19 - Compete ao Ministro das Comunicações exercer supervisão das atividades da ECT, nos termos e na forma previstos no título IV ao Decreto lei nº 200, de 25 de fevereiro de 1967.”

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interesses) por parte da empresa monopolista, é fundamental que seja

independente do Governo e, sobretudo, receba fiscalização por parte de

autoridade autônoma e independente. Caso contrário, a confusão de

incentivos políticos com a gestão da companhia fica evidente e, da mesma

forma, os prejuízos ao bem-estar dos consumidores e, de modo geral, ao

bem-estar social. O círculo vicioso se instaura dando margem à utilização da

ECT para a implementação de interesses político-partidários e do próprio

dirigente da estatal que, muitas vezes não correspondem com o interesse

público. Em síntese, esse modelo de gestão e supervisão equivaleria à total

ausência de supervisão, sempre que esta for conflitante com os interesses

particulares de Governantes.

Aliado a esse fato, nota-se igualmente a confusão de papéis de agente

econômico e regulador de mercado, de forma semelhante ao observado em

outras jurisdições. O Artigo 13 traz uma previsão genérica no sentido de que

cabe à ECT, em síntese, manter serviços de vigilância para zelar, no âmbito

das comunicações, pelo sigilo da correspondência, cumprimento das leis e

regulamentos relacionados com a segurança nacional, e garantia do tráfego

postal-telegráfico e dos bens e haveres da ECT ou confiados à sua guarda.

Ora, se tal previsão não se reserva apenas às atividades postais da própria

ECT, certamente abrange a fiscalização das atividades de terceiros, desde

que se relacionem de forma direta ou indireta com os serviços postais

propriamente ditos.

Como, de fato, a competência para zelar pelo sigilo de

correspondência e segurança nacional é constitucionalmente outorgada à

Polícia Federal (Artigo 144, da CF/88), restaria à ECT a possibilidade de

apenas utilizar esses argumentos para ampliar a abrangência do monopólio

postal para mercados vizinhos aos serviços postais propriamente ditos. Outra

função desse dispositivo seria a de persuadir os magistrados (como o STF)

de que o monopólio legal dos serviços postais é necessário por imperativos

de segurança nacional e proteção do sigilo das correspondências, o que

pode ser entendido como uma falácia, pois, como já se viu, a premissa

econômica para a escolha do modelo de monopólio legal é a existência de

falhas de mercado, como o monopólio natural. A segurança nacional, no atual

contexto, em nada está relacionada com a reserva legal dos serviços postais

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a uma empresa pública, dada a existência de uma miríade de alternativas

mais eficientes e mais céleres de comunicação à disposição do Poder

Público (como o telefone, a televisão, o e-mail etc.).

Embora na atualidade, a ECT se valha do argumento da

universalização do acesso, subjacente à idéia de monopólio natural, para

sustentar a manutenção (e expansão) do monopólio postal, não se observa

no Decreto Lei qualquer vinculação da reserva legal à existência do

monopólio natural e, portanto, da universalização do acesso / oferta. Pelo

contrário, no Artigo 18308, observa-se a possibilidade da contratação de

terceiros para realização de partes importantes (senão principais) do serviço

postal, e.g., o transporte, serviços administrativos, serviços de agência postal

(i.e., franquias).

Isso está de acordo com o que se analisou no Capítulo I, isto é, não há

razões fáticas e econômicas para se presumir que a tecnologia utilizada para

a operação de (i) contratação de transporte de longa-distância, (ii) triagem e

transporte regionais e (iii) coleta, triagem e entregas locais tais componentes

do serviço postal (sejam eles considerados isolada ou conjuntamente), exiba

propriedades de monopólio natural (i.e., a função de custos para uma dada

tecnologia de produção apresenta economias de escala superiores ao

alcance relevante da oferta).

Em outras palavras, o Artigo 18 do Decreto Lei é uma evidência

normativa de que legislador brasileiro reconhece, desde 1969, que os

serviços postais no Brasil não exibem propriedades de monopólio natural e,

via de consequência, objetivos como universalização de acesso não estão

condicionados à reserva legal das atividades postais. Mesmo assim, por

questões ideológicas e de escolha pública então vigentes (isto é, nos idos de

1969), reservou-se legalmente os serviços postais para operação exclusiva

da ECT, revestindo-se essa empresa estatal da mais variada gama de

“privilégios” vigentes até o presente momento, como isenção de imposto de

importação sobre materiais e equipamentos destinados aos seus serviços,

                                                                                                                         308 BRASIL. Presidência da República. Decreto Lei n.º 509 de 20 de março de 1969. “Art. 18 - A ECT procurará desobrigar-se da realização material de tarefas executivas recorrendo, sempre que possível, à execução indireta, mediante contratos e convênios, condicionado esse critério aos ditames de interesse público e às conveniências da segurança nacional.”  

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imunidade tributária direta e indireta, impenhorabilidade de seus bens, rendas

e serviços, privilégios processuais etc. (Artigo 12).

4.3.2 Lei nº 6.538/1978309

Em 22 de junho de 1978, foi publicada a Lei nº 6.538, que

sacramentou, no plano infraconstitucional, a escolha do modelo de monopólio

legal exercido por empresa pública para os serviços postais no Brasil. De

forma equivalente ao Decreto Lei nº 509/1969, a Lei nº 6.538/1978 trouxe

características importantes ao modelo brasileiro que vigem até o presente

momento e, portanto, merecem maior consideração.

O primeiro ponto refere-se ao detalhamento dos serviços postais

sujeitos ao monopólio legal e a criminalização do instituto. Segundo os

Artigos 7, 25 e 47, constitui serviço postal o recebimento, expedição,

transporte e entrega de objetos de correspondência (entendendo-se por

correspondência toda comunicação de pessoa a pessoa, por meio de carta,

através da via postal, ou por telegrama), valores e encomendas, entendendo-

se por telegrama toda mensagem transmitida por sinalização elétrica ou

radioelétrica, ou qualquer outra forma equivalente, a ser convertida em

comunicação escrita, para entrega ao destinatário (conceito muito próximo do

hybrid mail, na UE).

Entende-se por objetos de correspondência: “carta” (objeto de

correspondência, com ou sem envoltório, sob a forma de comunicação

escrita, de natureza administrativa, social, comercial ou qualquer outra, que

contenha informação de interesse específico do destinatário); “cartão-postal”

(objeto de correspondência, de material consistente, sem envoltório,

contendo mensagem e endereço); “impresso” (reprodução obtida sobre

material de uso corrente na imprensa, editado em vários exemplares

idênticos); “cecograma” (objeto de correspondência impresso em relevo, para

uso dos deficientes visuais, considerando-se também cecograma o material

impresso para uso dos deficientes visuais); e “pequena-encomenda” (objeto

                                                                                                                         309  Para acessar o texto legal vigente, ver BRASIL. Presidência da República. Lei n.º 6.538 em 22 de junho de 1978. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/L6538.htm>. Acesso em: 3 Abr. 2011.  

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de correspondência, com ou sem valor mercantil, com peso limitado,

remetido sem fins comerciais).

Segundo os mesmos dispositivos legais, constitui serviço postal

relativo a valores a remessa de dinheiro através de carta com valor

declarado, a remessa de ordem de pagamento por meio de vale-postal e o

recebimento de tributos, prestações, contribuições e obrigações pagáveis à

vista, por via postal. Ainda, entende-se por serviço postal relativo a

encomendas a remessa e entrega de objetos, com ou sem valor mercantil,

por via postal.

Referida Lei também estabelece, em seus Artigos 8 e 26, quais seriam

as atividades correlatas ao serviço postal e ao serviço de telegrama: (i) venda

de selos (estampilha postal, adesiva ou fixa, bem com a estampa produzida

por meio de máquina de franquear correspondência, destinadas a comprovar

o pagamento da prestação de um serviço postal), peças filatélicas, cupões

resposta internacional (título ou documento de valor postal permutável em

todo país membro da União Postal Universal por um ou mais selos postais,

destinados a permitir ao expedidor pagar para seu correspondente no

estrangeiro o franqueamento de uma carta para resposta), impressos e

papéis para correspondência; (ii) venda de publicações divulgando

regulamentos, normas, tarifas, listas de código de endereçamento e outros

assuntos referentes ao serviço postal; (iii) exploração de publicidade

comercial em objetos de correspondência; (iv) venda de publicações

divulgando regulamentos, normas, tarifas, e outros assuntos referentes ao

serviço de telegrama; e (v) exploração de publicidade comercial em

formulários de telegrama.

Após definir de forma básica os serviços postais e serviços correlatos,

a Lei nº 6.538/1978 explicita a abrangência da reserva legal, isto é, do

monopólio legal (Artigo 8, parágrafo único, Artigo 9 e Artigo 27), a saber: (i)

inserção de propaganda e a comercialização de publicidade nos formulários

de uso no serviço postal, nos serviços de uso de telegrama, bem como nas

listas de códigos de endereçamento postal; (ii) recebimento, transporte e

entrega, no território nacional, e a expedição, para o exterior, de carta e

cartão-postal; (iii) recebimento, transporte e entrega, no território nacional, e a

expedição, para o exterior, de correspondência agrupada (reunião, em

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volume, de objetos da mesma ou de diversas naturezas, quando, pelo menos

um deles, for sujeito ao monopólio postal, remetidos a pessoas jurídicas de

direito público ou privado e/ou suas agências, filiais ou representantes); (iv)

recebimento, transmissão e entrega de mensagens escritas nos serviços de

telegrama; e (v) fabricação, emissão de selos e de outras fórmulas de

franqueamento postal.

Além de reservar à ECT a execução exclusiva de tais atividades

econômicas, referida Lei reservou à estatal outras funções regulatórias

importantes: (a) de controlar a entrada de players na venda de selos e outras

formas de franqueamento postal; (b) de controlar a entrada de players na

fabricação, importação e utilização de máquinas de franquear (ou realizar a

triagem) de correspondências, bem como de matrizes para estampagem de

selo ou carimbo postal; (c) de controlar a entrada de players na edição de

listas de códigos de endereçamento postal (Artigo15); e (d) fiscalização e

aplicação de sanção para os clientes e consumidores que descumpram as

regras de remuneração dos serviços postais (Artigo 35).

Da análise desses dispositivos, ao menos duas observações

emergem: o monopólio legal da ECT abrange serviços postais e não postais

propriamente ditos (como a comercialização de publicidade comercial e a

elaboração de listas de endereços) e concentra na empresa estatal

atividades de agente econômico e regulador, não havendo qualquer

disposição sobre o controle efetivo, autônomo e independente de suas

atividades.

Na linha do Decreto Lei nº 509/1969, a Lei nº 6.538/1978 preserva a

possibilidade de subcontratação de empresas no mercado para a realização

de boa parte dos componentes dos serviços postais e não-postais (como

listas de endereços e códigos postais), o que representa mais uma evidência

da ausência de propriedades de monopólio natural em tais atividades. Apesar

de preservar e ampliar as evidências normativas de que não se estava

reservando tais atividades à operação exclusiva da ECT por conta de

possuírem propriedades de monopólio natural, mas sim por qualquer outro

motivo (político-ideológico), nota-se no Artigo 3 interessante disposição no

sentido de que a ECT seria obrigada a assegurar a continuidade dos

serviços, observados os índices de confiabilidade, qualidade, eficiência e

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outros requisitos fixados pelo Ministério das Comunicações. Além desse

dispositivo, observa-se no Artigo 4 outra norma interessante, qual seja: “É

reconhecido a todos o direito de haver a prestação do serviço postal e do

serviço de telegrama.” Ambos dispositivos podem ser relacionados à idéia de

universalização, particularmente, a continuidade e o direito de acesso

universal (ou “direito de todos”). Outros pontos como qualidade e eficiência,

podem ser agregados à idéia de serviço universal, embora não sejam

condições para tanto. Seja como for, tais elementos não são suficientes para

a reserva legal, principalmente quando há interesse privado no

desenvolvimento eficiente da atividade sem a geração das externalidades

negativas naturais da presença do Estado como gestor da atividade

econômica (como bem explorado no Capítulo I).

As exceções ao monopólio postal também foram previstas nessa Lei,

quais sejam: (i) transporte de carta ou cartão-postal, efetuado entre

dependências da mesma pessoa jurídica, em negócios de sua economia, por

meios próprios, sem intermediação comercial (exceção muito semelhante à

exceção do letters of the carrier, dos EUA); e (ii) transporte e entrega de carta

e cartão-postal; executados eventualmente e sem fins lucrativos, na forma

definida em regulamento.

Além das exceções, há um interessante trecho na Lei relativo aos

custos e às premissas para sua definição. O Artigo 33 dispõe que na fixação

das tarifas, preços e prêmios "ad valorem", seriam levados em consideração

a natureza, o âmbito, o tratamento e demais condições de prestação dos

serviços postais, devendo as tarifas ou preços proporcionar (i) a cobertura

dos custos operacionais e (ii) a expansão e melhoramento dos serviços.

Assim, observa-se que os preços dos serviços postais deveriam estar

balizados para cobrir os custos - o que impediria, pelo menos em tese, a

prática de preços predatórios, mesmo para ingresso em novos mercados - e,

portanto, essa norma não estaria de acordo com algumas práticas de

subsídios-cruzados.

Em complemento, a norma de que tais preços deveriam suportar a

expansão não deixa claro se trata da universalização da prestação do serviço

postal ao longo do território nacional, ou se refere-se à expansão das

atividades da ECT para outros mercados não previstos na Lei, o que de certa

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forma foi e continua sendo feito pela ECT (como se verá mais à frente) e

inegavelmente amplia os efeitos da distorção da concorrência na medida em

que a ECT, portadora de diversos privilégios, passaria a concorrer com

empresas privadas comuns submetidas ao regime de livre mercado.

Posteriormente ao Decreto Lei nº 509/1969 e à Lei nº 6.538/1978,

diversas normas infralegais foram publicadas sem, contudo, alterar a

essência de referidos diplomas legais no tocante ao monopólio postal. Ou

seja, sem restringir a abrangência do monopólio legal, mas atribuindo-lhe

aplicação abrangente e conferindo poderes regulamentares à própria ECT.310

4.3.3 Os serviços postais na Constituição de 1988

Na Constituição Federal de 1988 mais uma vez é mantida a redação

relativa aos serviços postais, no sentido de que cabe a União mantê-los

(Artigo 21, inciso X). Em relação a esta previsão, nada mudou. Todavia, não

consta no texto constitucional de 1988 previsão sobre a exclusividade na

prestação dos serviços postais e, tampouco, possibilidade de o Estado

escolher discricionariamente setores da economia para reservar a

monopólios legais. Nesse contexto, trava-se grande debate acerca da

possibilidade dessa “manutenção” dos serviços postais continuar se dando

por meio de exercício de monopólio pela ECT, diante do fato de que, no

capítulo “Da Ordem Econômica e Financeira” da atual Constituição, não há

previsão ou abertura a outros monopólios, na forma como ocorria com as

Cartas de 1946, 1967 e 1969.

Desse modo, se a proposição normativa específica sobre os serviços

postais nas Constituições pouco evoluiu, o mesmo não se pode dizer do                                                                                                                          310 Nesse sentido, ver BRASIL. Ministério das Comunicações. Portaria nº 245/1995. Cria os conceitos de “carta social ou não comercial”, remetida por pessoa física com limite máximo de peso igual a 10 gramas e com endereçamento manuscrito contendo a indicação “carta social”, e de “carta comercial”, aquela emitida por pessoa jurídica. BRASIL. Ministério das Comunicações. Portaria nº 386/2001. Autoriza a Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos - ECT a realizar procedimentos licitatórios para seleção de interessado em operar Agências de Correios Comercial do tipo 1 - ACC1. BRASIL. Ministério das Comunicações. Portaria n. 1/2001. Norma que estabelece os critérios e disciplina os procedimentos para seleção de interessados em obter permissão para operação de Agência de Correios Comercial Tipo I - ACC I da ECT. BRASIL. Ministério das Comunicações. Portaria n. 518/2003. Fixa metas para modernização tecnológica para a atividade de franqueamento. BRASIL. Ministério das Comunicações. Portaria n. 500/2004. Serviço de logística postal integrada prestado pela ECT.

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objeto dessa norma. Como visto, inicialmente somente o Estado poderia (no

sentido de ter interesse e capacidade para) executar o serviço de correios.

Hoje o cenário é completamente diferente. Muitas são as empresas com

capacidade e interesse em entregar correspondências, de forma tão ou até

mesmo mais eficiente do que a empresa estatal ECT. Hoje o serviço postal

está indubitavelmente inserido no mercado. Uma vez que o serviço evoluiu,

não há mais a mesma base fática para se manter um monopólio estatal do

serviço postal, isto é, a incapacidade de outro ente, que não Estado, de

prestar tal serviço.

Se as normas garantidoras de tal monopólio faziam sentido à época

em que só o Estado era capaz de executar o serviço de correios, hoje

claramente essas normas não encontram mais suporte na realidade, além de

confrontarem com os princípios da atual Constituição da República. Essa

incompatibilidade entre o monopólio postal, a realidade do serviço e o próprio

ordenamento se aflora à medida que se passa a considerar as disposições

específicas da Constituição de 1988. Assim, pergunta-se: haveria

possibilidade de harmonização do modelo de monopólio legal dos serviços

postais exercido por empresa pública (ECT), tal como adotado pelo Decreto

Lei nº 509/1969 e pela Lei nº 6.538/1978, com a Constituição de 1988?

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4.3.3.1 A teoria da recepção na Constituição de 1988

Como característica fundamental de uma Constituição rígida311, como

o é a Constituição Federal Brasileira de 1988, encontra-se o princípio da

supremacia da constituição, segundo o qual a Carta Magna é o topo de toda

a ordem jurídica nacional. Segundo a doutrina, a Constituição “é a lei

fundamental e suprema do Estado brasileiro”, de forma que “todas as normas

que integram a ordenação jurídica nacional só serão válidas se se

conformarem com as normas da Constituição Federal”. De acordo com o

princípio da supremacia da constituição, portanto, não se pode aceitar a

existência de qualquer situação jurídica em desconformidade com os

preceitos e princípios constitucionais vigentes.312

Isso porque toda a ordem jurídica vigente tem como fundamento de

validade a Constituição.313 Assim, se a validade das normas decorre da

Constituição, de caráter originário, duas consequências podem ser inferidas:

(i) a chegada de uma nova Constituição revoga integralmente a Constituição

anterior; (ii) as normas infraconstitucionais devem harmonizar-se com a nova

Carta para que possam ter suas validades mantidas, uma vez que a nova

Constituição será seu novo fundamento (ou substrato) de validade.

A primeira afirmação acima é uma decorrência lógica da própria idéia

de Constituição. Se essa é a Lei maior que confere validade a todos os

demais ordenamentos jurídicos, não há como se pensar na coexistência de

duas ou mais Constituições. Nem mesmo normas de uma determinada

Constituição podem ser mantidas em outra. Tudo se altera. O fundamento se

altera e as premissas normativas infraconstitucionais devem com ele se

harmonizar, sob pena de invalidade. Assim a mera repetição de um texto é

unicamente uma coincidência, sem qualquer relevância jurídica. Há hipótese

                                                                                                                         311 SILVA, José Afonso da. Curso de Direito Constitucional Positivo. 23ª Ed., São Paulo: Malheiros, 2004. p.42: “Rígida é a constituição somente alterável mediante processos, solenidades e exigências formais especiais, diferentes e mais difíceis que os de formatação das leis ordinárias ou complementares. Ao contrário, a constituição é flexível quando pode ser livremente modificada pelo legislador segundo o mesmo processo de elaboração das leis ordinárias.” 312 SILVA, José Afonso da. Curso de Direito Constitucional Positivo. 23ª Ed., São Paulo: Malheiros, 2004. p.46. 313 BASTOS, Celso Ribeiro. Curso de Direito Constitucional. 20ª ed. São Paulo: Saraiva, 1999, p.76.

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excepcional de preceito constitucional anterior permanecer vigente, no caso

de se tratar da chamada recepção expressa. Nesse caso, a nova

Constituição traria em seu texto uma referência ao dispositivo constitucional

anterior para manter a eficácia do mesmo.314

Já no que tange à segunda afirmação (sobre a continuidade da

validade de normas infraconstitucionais anteriores), o advento de uma nova

Constituição implica o nascimento, para aquela sociedade, de um novo

ordenamento jurídico. Ocorre, contudo, que nesse processo seria inviável

pensar que o Legislador pudesse criar, juntamente com a nova Constituição,

todo um novo conjunto de normas infraconstitucionais. Tais normas, ao

contrário, continuam vigentes e plenamente aplicáveis, porém, passam a

retirar seu fundamento de validade não mais da Constituição revogada, mas

da nova Constituição. Esse fenômeno de manutenção da vigência da

legislação infraconstitucional anterior face ao novo fundamento de validade

recebe o nome de “recepção”. A recepção caracteriza-se por um processo

abreviado de elaboração de normas, no qual a nova Constituição acolhe o

conteúdo de leis já existentes e lhes confere validade, substituindo assim o

que seria um processo de criação legislativa tradicional. O mesmo conteúdo,

no entanto, não implica tratar-se de leis idênticas, pois, reitere-se, difere-se a

razão de validade. Só podem ser objeto desse processo abreviado de

renovação da validade de normas aquelas compatíveis com esse novo

fundamento de validade.315

Nota-se assim, que haveria dois caminhos: o primeiro, posicionado no

plano ideal, seria a edição de novas normas a partir de novas Constituições;

o segundo, posicionado no plano real, seria incorporar as normas

anteriormente editadas, desde que conformes à nova Constituição. O

fenômeno da recepção atuaria nesse plano real. Isto é, mantém-se parte da

legislação infraconstitucional anterior, porém sem deixar de se utilizar o

parâmetro que advém do novo texto constitucional. Assim, o que passa a

informar a validade das normas são os princípios materiais da nova

                                                                                                                         314BASTOS, Celso Ribeiro. Curso de Direito Constitucional. 20ª ed. São Paulo: Saraiva, 1999, p. 77 315BASTOS, Celso Ribeiro. Curso de Direito Constitucional. 20ª ed. São Paulo: Saraiva, 1999, p.78. No mesmo sentido, ver MORAES, Alexandre de. Direito Constitucional. 21ª ed. São Paulo: Atlas, 2007, p. 618.

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Constituição. Esses novos fundamentos constituem o obstáculo que as

normas infraconstitucionais devem transpor para se manterem válidas e,

portanto, aplicáveis.316 Toda e qualquer espécie de norma jurídica conflitante,

explícita ou implicitamente, com a nova Constituição deve ser considerada

como não integrante do “novo” ordenamento jurídico.317

No processo de recepção das normas infraconstitucionais dá-se o que

BASTOS denominou “novação”, que nada mais é do que a já referida

submissão das mesmas normas a um novo fundamento de validade. Essa

novação possui três corolários: (i) todos os princípios gerais de Direito

passam a ser os advindos da nova Constituição; (ii) leis e regulamentos

serão reinterpretados à luz da nova Carta, podendo permanecer totalmente

ou parcialmente válidos; e (iii) normas contrárias à nova Constituição não

serão recepcionadas, sejam elas ofensivas a mandamentos preceptivos ou

programáticos.318

Nessa linha, o princípio geral da livre iniciativa, que edifica a ordem

econômica constitucional, bem como seu espelho social, i.e., o princípio da

livre concorrência, passaram, a partir de 1988, a ditar a regra geral do livre

mercado no Brasil. Diante disso, qualquer norma anterior que caminhasse em

sentido contrário não poderia harmonizar-se com a atual Constituição. É

claro, todavia, que exceções à regra geral da livre iniciativa (i.e., livre

mercado) podem existir. Contudo, tais exceções necessitam estar expressas

no próprio texto constitucional, de modo a compor o todo harmônico

pretendido pelo legislador constituinte de 1988, revestidos desse mandato

pelo povo Brasileiro.

4.3.3.2 A regra geral da livre iniciativa (livre mercado)

Conforme já estudado, a ordem econômica da Constituição de 1988 é

edificada por princípios constitucionais presentes, majoritariamente, nos

Artigos 170 a 192 do Texto Constitucional, de forma explícita e implícita, e

                                                                                                                         316 BASTOS, Celso Ribeiro. Curso de Direito Constitucional. 20ª ed. São Paulo: Saraiva, 1999, p.78. 317 MORAES, Alexandre de. Direito Constitucional. 21ª ed. São Paulo: Atlas, 2007, p. 618. 318 Bastos, 1999 p.78.

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ainda de forma esparsa ao longo da Constituição.319 Tais princípios

funcionam como alicerces da Ordem Econômica e constituem um paradigma

axiológico para atuação de todos os agentes econômicos, sejam eles

públicos ou privados. Veja-se, por exemplo, o art. 170, o qual dispõe que:

Art. 170. A ordem econômica, fundada na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa, tem por fim assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social, observados os seguintes princípios: [...] III - função social da propriedade; IV - livre concorrência; V - defesa do consumidor; [...] Parágrafo único. É assegurado a todos o livre exercício de qualquer atividade econômica, independentemente de autorização de órgãos públicos, salvo nos casos previstos em lei. Destaca-se para o presente trabalho, o princípio da livre iniciativa, ao qual se agrega o disposto no art. 1º, inciso IV, da Constituição de 1988, a saber: Art. 1.º A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos: [...]

IV - os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa;

Em complemento, na composição dessa Ordem Econômica, tem-se o

preceito trazido pelo art. 173, § 4º:

Art. 173. Ressalvados os casos previstos nesta Constituição, a exploração direta de atividade econômica pelo Estado só será permitida quando necessária aos imperativos da segurança nacional ou ao relevante interesse coletivo, conforme definidos em lei. [...] § 4º - A lei reprimirá o abuso do poder econômico que vise à dominação dos mercados, à eliminação da concorrência e ao aumento arbitrário dos lucros.

Tais princípios presentes na Ordem Econômica da Constituição de

1988 interagem em uma relação de coalescência e dominância. Isso significa

                                                                                                                         319 GABAN, Eduardo M.; DOMINGUES, Juliana O. Direito Antitruste: o combate aos cartéis. 2ª ed. São Paulo: Saraiva, 2009, p.74.

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que um pode sobrepor-se ao outro, conforme as exigências do caso concreto

em que serão aplicados. Trata-se de uma relação dialética na qual, de um

lado, figura o princípio da livre iniciativa como regra geral do sistema, a

garantir a liberdade dos agentes como premissa maior. E de outro, estão os

princípios da proteção do consumidor, função social da propriedade e

repressão ao abuso de poder econômico sintetizados no princípio

complementar ao da livre iniciativa, que é a livre concorrência. O princípio da

livre concorrência, em suas diversas aplicações, funciona como instrumento

balizador e limitador da livre iniciativa individual, apto a ser aplicado pelo

Estado quando os agentes econômicos abusarem da liberdade garantida

pelo princípio da livre iniciativa. Percebe-se, assim, que a Ordem Econômica

se equilibra por meio dessa dialética, na qual nenhum princípio se mostra

absoluto, mas figura a livre iniciativa como regra geral.320

Torna-se assim clara a afirmação de que a livre iniciativa é mais do

que uma regra ou garantia, consubstanciando-se como verdadeiro vetor de

unidade valorativa,321 norteador de todo o ordenamento. Sua proteção,

conforme Artigo 1º do texto republicano, alicerça o próprio Estado

Democrático de Direito. Ao lado da livre iniciativa, e cumprindo um papel de

calibrá-lo tendo em vista o bem-estar social, encontram-se princípios como a

defesa do consumidor, a livre concorrência e a proteção social do trabalho.

Se forem esses os fundamentos da atual Ordem Econômica, qualquer

exceção a tais princípios deve constar expressamente na mesma

Constituição e ainda de forma taxativa, ou seja, sem possibilidade de

ampliação por lei infraconstitucional. Nessa linha, os chamados monopólios

estatais constituem exceções à regra da livre iniciativa e demais princípios

estruturadores da Ordem Econômica constitucional. Os monopólios

                                                                                                                         320 GABAN, Eduardo M.; DOMINGUES, Juliana O. Direito Antitruste: o combate aos cartéis. 2ª ed. São Paulo: Saraiva, 2009, p. 76-83. 321 Nesse sentido, ver GABAN, Eduardo M.; DOMINGUES, Juliana O. Direito Antitruste: o combate aos cartéis. 2ª ed. São Paulo: Saraiva, 2009, p. 70: “Cumprindo funções de edificação do quantum valorativo presente no sistema jurídico, os princípios representam valores axiológicos insculpidos predominantemente em sua estrutura semântica, figurando como expedientes que determinam as vertentes de significação de cada subconjunto de normas jurídicas, aos quais são eles subjacentes, compondo-lhes a essência. [...] No cerne de um sistema jurídico, os princípios constitucionais exercem uma função axiologicamente mais expressiva, cuja desconsideração/violação representa danos ampliados em comparação à violação de uma simples regra.”

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constitucionalmente aceitos encontram-se rigidamente expressos no Artigo

177, CF/88:

Art. 177. Constituem monopólio da União: I - a pesquisa e a lavra das jazidas de petróleo e gás natural e outros hidrocarbonetos fluidos; II - a refinação do petróleo nacional ou estrangeiro; III - a importação e exportação dos produtos e derivados básicos resultantes das atividades previstas nos incisos anteriores; IV - o transporte marítimo do petróleo bruto de origem nacional ou de derivados básicos de petróleo produzidos no País, bem assim o transporte, por meio de conduto, de petróleo bruto, seus derivados e gás natural de qualquer origem; V - a pesquisa, a lavra, o enriquecimento, o reprocessamento, a industrialização e o comércio de minérios e minerais nucleares e seus derivados, com exceção dos radioisótopos cuja produção, comercialização e utilização poderão ser autorizadas sob regime de permissão, conforme as alíneas b e c do inciso XXIII do caput do art. 21 desta Constituição Federal.

Como se observa, pela literalidade do artigo o serviço postal não está

incluído nesse rol. Se a Constituição não deliberou de forma expressa acerca

da existência de monopólio da ECT no que tange aos serviços postais, as

normas infraconstitucionais que o fazem, a saber, Lei nº 6.538/1978

juntamente com o Decreto Lei nº 509/1969, não foram recepcionadas, uma

vez que as restrições aos princípios constitucionais só podem ser feitas pela

própria Constituição. E não é só. Não é apenas a ausência do dispositivo

expresso que corrobora a tese de não recepção do monopólio postal da ECT.

Tem-se ainda, claras incompatibilidades entres seus dispositivos e os

princípios constitucionais tais como os aqui lembrados. De acordo com toda a

teoria acerca da recepção de normas infraconstitucionais exposta neste

tópico, os referidos diplomas em análise não foram recepcionados pela

Constituição Federal de 1988 por não ultrapassarem o obstáculo da

compatibilidade com o novo ordenamento, em linha com o pensamento de

BASTOS.322

                                                                                                                         322 BASTOS, Celso Ribeiro. Curso de Direito Constitucional. 20ª ed. São Paulo: Saraiva, 1999, p.78.

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207  

Dessa forma, se não há previsão expressa na Constituição de 1988

sobre a existência de um monopólio postal, que é claramente contrário à

idéia de livre mercado, normas infraconstitucionais anteriores que contenham

mandamentos nesse sentido devem ser consideradas como não integrantes

do atual ordenamento jurídico. Isto é, como procura-se demonstrar neste

trabalho, não houve recepção pela Ordem Constitucional de 1988 do

chamado monopólio postal pela ECT fundamentado no Decreto Lei nº

509/1969 e na Lei nº 6.538/1978.

Ainda que se entenda, todavia, que há possibilidade de recepção, o

que se admite apenas por argumentação, pergunta-se, deveria o Brasil

adotar o modelo de monopólio postal nos dias de hoje, tendo em vista os

comprovados malefícios dele decorrentes para o bem-estar econômico e

social? Seria essa a vontade original expressa na Constituição de 1988,

analisada de forma sistemática à luz do contexto de 2011? As respostas

decorrentes das evidências empíricas e econômicas indicam que a livre

concorrência proporcionaria melhores resultados sociais que o modelo de

monopólio legal para os serviços postais.

4.3.3.3 Exceções à regra do livre mercado (i.e., monopólios legais)

Conforme apontado, os serviços postais brasileiros receberam

tratamento constitucional desde a primeira Constituição Republicana de

1891. Com a Constituição de 1934 incluiu-se a competência da União para

manter os serviços postais, competência essa que foi mantida em todas as

demais Cartas Políticas, mas cujo caráter de exclusividade só foi conferido

pelas Constituições de 1934 e 1937. Assim, desde a Constituição de 1946,

ao se referir à manutenção dos correios, os textos constitucionais não se

valiam mais do termo “privativamente”. Ocorre, contudo, que a despeito de as

cartas subsequentes a de 1937 não prever expressamente o monopólio

postal, até a Emenda nº 1/69, havia nas Constituições outros dispositivos, os

quais desempenhavam o mesmo papel. Tratam-se dos artigos que conferiam

à União competência para intervir no domínio econômico e monopolizar

indústrias ou atividades (Artigo 146 da Constituição de 1946; Artigo 157, §8º

na Constituição de 1967; e Artigo 163 na Emenda nº 1/69). Ou seja, por mais

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que, a partir da Carta de 1946, as Constituições não mais previssem,

expressamente, a exclusividade da União para a prestação dos serviços

postais, limitando-se em instituir seu dever de mantê-lo, havia dispositivos

que permitiam que fosse feita a opção política de reservar mercados,

bastando para tanto a edição de lei especial ou federal.

Com o advento da Constituição de 1988, contudo, tais normas

deixaram de existir, não sendo mais possível à União, ou à quaisquer dos

poderes instituídos, reservar mercados, i.e., monopolizar mercados, sejam

eles quais forem, inclusive, a prestação de serviços postais. As poucas e

exaustivas (numerus clausus) hipóteses de monopólios legais no Brasil estão

expressamente previstas na Constituição, não podendo ser ampliadas.

Assim, antes de 1988, dada a presença de dispositivos autorizadores

de monopolização de atividade econômica pelo Estado por critério de política

de governo, as leis infraconstitucionais que instituíam o monopólio dos

serviços postais mantiveram-se recepcionadas. Porém, destaca-se: como

uma Constituição revoga integralmente a outra, o único sustentáculo jurídico

a atribuir substrato de validade ao monopólio postal a partir da Carta de 1946

foi a existência de dispositivos que deslocavam ao plano infralegal e por

fundamentos políticos (ou de política de governo) a decisão de preservar a

exclusividade de uma atividade econômica.

4.3.3.3.1 Incompatibilidade formal das “leis da ditadura”323 com a Constituição de 1988

Foi demonstrado que não há norma expressa determinando monopólio

específico dos serviços postais (na forma como é feito com as atividades

expressas no Artigo 177) e nem mesmo dispositivos autorizando monopólio

de outras atividades (como se dava com as Constituições de 1946, 1967 e

Emenda 1/69). Portanto, não há compatibilidade entre a Constituição de

1988, o Decreto Lei nº 509/1969 e a Lei nº 6.538/1978 (“Leis da ditadura”).

Não é possível desenhar-se uma interpretação que admita compatibilidade                                                                                                                          323 Utiliza-se o termo “Leis da ditadura” apenas para posicionar historicamente o período em que emergiram tais diplomas legais, sem qualquer intenção de crítica ao modelo escolhido naquela ocasião, posto que acredita-se pode ter sido a melhor escolha diante das necessidades então existentes.

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tácita, face ao fato de que a manutenção da validade de tais normas

infraconstitucionais equivaleriam a exceções à regra constitucional geral da

livre iniciativa (ou livre mercado).

Em complemento, é de se destacar que, se em todas as Constituições

foi mantida a competência da União, privativa ou não, para manter os

serviços postais, isso é decorrência do caráter estratégico desse serviço

quanto à integração nacional e sua consequente necessidade de

universalização, ou seja, sua faceta pública. Não há que se negar que o

serviço de correios se trata de serviço essencial à nação, daí a competência

da União de sempre mantê-lo. Contudo, com a entrada eficiente de empresas

no mercado, mostra-se mais conveniente ao interesse social que a União

passe a manter os serviços postais de forma indireta (i.e., como regulação) e

não direta (i.e., como agente econômico).

Interpretando-se a norma constitucional (art. 20, X) à luz do atual

contexto histórico, não pode ser outro o sentido de “manter os serviços

postais”. Destaca, nesse sentido, o pontuado pelo Ministro Marco Aurélio

Mello em seu voto na ADPF 46-7/DF, STF. Se ao longo de todas as

Constituições, o texto da norma se mantém o mesmo, ou seja, sempre a

dizer que a União deve manter os serviços postais, o mesmo não se dá em

relação ao alcance do verbo manter. Esse mudou, e de outra forma não

poderia ser para se harmonizar com a atual Constituição (unidade valorativa),

bem como à realidade fática e normativa.324

No momento em que a Lei nº 6.538/78 e o Decreto Lei nº 509/1969

foram submetidos ao novo fundamento de validade (a CF/88), não se deu a

necessária compatibilidade dos diplomas com a Constituição, para que esses

não restassem revogados juntamente com a ordem antiga. A manutenção de

vigência de tais normas amplia, de fato, a exceção taxativa do Artigo 177, da

Constituição de 1988. A eficácia desse dispositivo constitucional acaba for

ser enfraquecida caso se aceite a introdução de novos monopólios por meio

de comandos normativos infraconstitucionais. Isso porque o princípio                                                                                                                          324 BRASIL. Supremo Tribunal Federal (STF). Arguição de descumprimento de Preceito Fundamental n.º 46-7. Arguente: Associação Brasileira das Empresas de Distribuição. Arguido: Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos. Relator: Ministro Marco Aurélio. Brasília, 15 de junho de 2005. Disponível em: <http://redir.stf.jus.br/estfvisualizadorpub/jsp/consultarprocessoeletronico/ConsultarProcessoEletronico.jsf?seqobjetoincidente=2182784>. Acesso em 11 Mar. 2011.

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norteador da interpretação da atuação do Estado (Administração) brasileiro é

o princípio da estrita legalidade, segundo o qual à administração pública é

permitido fazer o que a Lei expressamente determinar. Nada além. Enquanto

aos administrados é facultado fazer tudo o que a lei não proibir, a atuação do

Estado está adstrita unicamente ao que a lei lhe outorgue. Não há

possibilidades implícitas. O princípio da estrita legalidade, demonstrado, por

exemplo, nos Artigos 5º, II, 37 e 84, IV da Constituição, impõe grande rigor à

atuação do Estado, não deixando válvulas de escape para que este atue de

forma diversa àquela expressa em previsão legal. Aplica-se a legalidade

estrita a todo ato administrativo, inclusive a promulgação de decretos. Os

atos só poderão complementar as leis no que tange a sua forma de

concreção. Isto é, não pode a Administração criar novas regras que limitem a

liberdade dos administrados. Nunca lhe será facultado impor originariamente

qualquer cerceio aos direitos dos particulares.325

Em relação ao Artigo 177, o qual estabelece monopólios de atividades

econômicas, ou seja, exceções constitucionais ao direito fundamental da livre

iniciativa (Art. 1o, IV, da CF/88), é clara a incidência da estrita legalidade.

Criar novo monopólio sem que a Constituição o preveja expressamente é

impor originariamente restrição aos particulares sem apoio do princípio da

legalidade.

Conforme já demonstrado, há ainda clara afronta aos princípios

norteadores da Ordem Econômica na Constituição de 1988, a saber, Art. 1º,

IV, juntamente com o Art. 170, IV e parágrafo único. Tais dispositivos

consagram a livre iniciativa. A manutenção de monopólio de uma atividade

que poderia ser plenamente prestada por empresas privadas, conforme sua

vocação econômica já demonstrada, constitui uma afronta à livre iniciativa.

A esse respeito manifestou-se o Ministro Ricardo Lewandowski na

ADPF 46-7/DF, afirmando que a livre iniciativa é princípio fundamental da

Constituição de 1988 e deve ser referência ao se interpretar todos os outros

dispositivos Constitucionais, mesmo os que estabelecem competências da

União. Por ser assim fundamento norteador da ordem democrática, qualquer

exceção ao seu mandamento merece interpretação restrita, seja ela um                                                                                                                          325 MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de Direito Administrativo. 17ª ed. São Paulo: Malheiros, 2004.

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211  

monopólio de atividade econômica ou um privilégio de execução de serviço

público.326

Também se encontra violado o art. Art., 173, § 4º o qual veda o abuso

de poder econômico, na medida em que a posição monopolista usufruída

pela ECT promove dominação dos mercados, eliminação da concorrência e

ao aumento arbitrário dos lucros. Disso conclui-se que o próprio consumidor

se prejudica, uma vez que fica sujeito aos arbítrios de uma única empresa, e

não desfruta dos inegáveis benefícios da livre concorrência, como visto no

Capítulo I.

A Lei nº 6.538/78 inclusive impõe sanções penais aos que romperem a

barreira do monopólio. Essa imposição teve sua constitucionalidade

questionada em sede da ADPF 46-7/DF e recebeu STF interpretação

conforme à Constituição para restringir a incidência do artigo 42 da Lei nº

6.538/78 às hipóteses do art. 9º desta mesma lei, de forma a evitar abusos

por parte da ECT nas investidas em sede criminal para manutenção e, na

maioria dos casos, ampliação dos limites de seu monopólio para outros

mercados além dos serviços postais propriamente ditos (tal como se observa

nas jurisdições que mantiveram ou mantém regimes de monopólio legal para

os serviços postais exercidos por empresas públicas).

Conforme demonstrado, inúmeros são os preceitos constitucionais,

implícitos ou não, violados pela manutenção do monopólio postal previsto na

Lei nº 6.538/78. Assim, entende-se não houve recepção da Lei nº 6.538 de

22 de Junho de 1978, bem como do Decreto Lei nº 509 de 20 de março de

1969 pela Constituição Federal de 1988, por instituírem monopólio postal

contrário a atual Ordem Econômica e ausente dos restritos casos de exceção

a seus princípios. Soma-se ainda a esta conclusão parcial o fato de que a

não recepção demonstrada se opera tanto do ponto de vista normativo, dada

a mudança do arcabouço principiológico constitucional relativo à intervenção

do Estado no domínio econômico, quanto fático, dada a irracionalidade

                                                                                                                         326 BRASIL. Supremo Tribunal Federal (STF). Arguição de descumprimento de Preceito Fundamental n.º 46-7. Arguente: Associação Brasileira das Empresas de Distribuição. Arguido: Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos. Relator: Ministro Marco Aurélio. Brasília, 15 de junho de 2005. Disponível em: <http://redir.stf.jus.br/estfvisualizadorpub/jsp/consultarprocessoeletronico/ConsultarProcessoEletronico.jsf?seqobjetoincidente=2182784>. Acesso em 11 Mar. 2011.

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econômica dessa exclusividade, tendo em vista a vocação da atividade postal

para o regime de competição.

4.3.3.3.2 Incompatibilidade material (ou contrasenso histórico)

A Constituição de 1988 prevê regimes de monopólio legal de forma

extremamente restrita e excepcional. Mesmo o art. 173, que estabelece a

possibilidade de exploração direta de atividade econômica pelo Estado, além

dos casos previstos na Constituição, se houver imperativo de segurança

nacional ou relevante interesse público, não fala em monopolização, e

garante ainda a vedação à dominação de mercados (i.e., à monopolização).

Isto é, se por motivos imperativos de segurança nacional ou relevante

interesse público decide o Estado atuar como agente econômico, deve operar

em regime de direito privado, sem qualquer vantagem (financeira, tributária

etc.) em comparação aos agentes privados. Inclusive não há, na Constituição

de 1988, menção a qualquer privilégio que possa ser conferido à empresa

estatal instituída para qualquer finalidade, o que é claramente inconsistente

com os diversos privilégios atribuídos à ECT pelo Decreto Lei e pela Lei

instituídos no contexto ditatorial (e.g., isenção de imposto de importação

sobre materiais e equipamentos destinados aos seus serviços, imunidade

tributária direta e indireta, impenhorabilidade de seus bens, rendas e

serviços, privilégios processuais etc.). Dessa forma, infere-se que não

apenas a análise formal do arcabouço normativo revela a incompatibilidade

do monopólio conferido à ECT no exercício das atividades postais.

A partir da análise da experiência norte-americana (Capítulo II), em

que se observa, pelo menos até 2006, o que “não deveria ser feito”, da

experiência Européia (Capítulo III), em que se observam providências

positivas que em parte podem ser reproduzidas no Brasil, bem como da

análise da própria natureza dos serviços postais (Capítulo I), onde ficou

evidente que não possuem propriedades de monopólio natural, mas sim

plena vocação para o regime de livre concorrência, infere-se que não há

racionalidade econômica, nem jurídica, para se preservar o monopólio legal

da ECT no Brasil, nos dias de hoje.

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Relembrando o desenvolvido no Capítulo I, há setores na economia

com vocação para regimes de monopólio e outros com vocação para regimes

de competição. Essa vocação está além de qualquer classificação jurídica ou

nomenclatura que se possa atribuir à natureza da atividade, se “serviço

público” ou se “atividade econômica”, em suas diversas variações. Refere-se

aqui à vocação econômica do serviço, num plano extrajurídico ou fático,

conforme suas características práticas.

Um serviço destinado à construção de uma usina hidrelétrica, por

exemplo, tem em si algumas características estruturais que lhe conferem

uma vocação para ser exercido em regime de monopólio. Isso porque se

trata de serviço com enorme investimento inicial, custos afundados (sunk-

costs), economias de escala etc. Faz sentido, em termos econômicos, que

em troca de toda a estrutura construída, a qual será de propriedade da União,

a empresa possa auferir sozinha os lucros advindos do investimento. Desde

que, é claro, tal lucro seja regulado por rígidos critérios de transparência e

atrelamento aos custos por meio do contrato de concessão e pelas

autoridades administrativas competentes. Setores como esse possuem

propriedades de monopólio natural (e.g.,custos irrecuperáveis, economias de

escala significativas etc.) o que significa que o investimento na construção da

estrutura para o serviço é tão grande que o monopólio torna-se, mais do que

justificável, mas economicamente necessário. De outra forma, não haveria

incentivos para investimentos nesses setores.

Um outro exemplo de setor que não admite competição durante o

regime de concessão (importa destacar que antes da concessão, a

competição é plenamente admissível, e até recomendável, como ocorre nas

licitações) pode ser encontrado na construção de rodovias. A construção de

uma rodovia tem custos iniciais que podem ser comparados aos da

construção de uma hidrelétrica de grande porte e, portanto, é racional que se

conceda o monopólio legal temporário de sua exploração. Do contrário,

outras empresas do ramo se valeriam da estrutura já montada e entrariam no

mercado com enorme vantagem competitiva em relação a primeira que arcou

com todo o investimento, gerando assim incentivos negativos a posteriores

investimentos no setor. Assim, como se procurou demonstrar no Capítulo I,

há setores onde o monopólio é admissível e necessário do ponto de vista

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econômico, ou seja, devido à falhas de mercado como o monopólio natural, a

geração de bem-estar depende da oferta singular de um bem ou serviço. Já

está mais do que claro que os serviços postais não se enquadram nessa

hipótese, sendo perfeitamente permeáveis ao regime de livre concorrência.

Ressalte-se, novamente, que essa análise independe das

nomenclaturas jurídicas adotadas. Sob o ponto de vista econômico,

chamando-se o privilégio conferido à ECT de um monopólio de atividade

econômica ou de exclusividade de serviço público, os efeitos são os mesmos.

A dicotomia é meramente formal. Trata-se na realidade de atividade

organizada para fins de lucro em que não há fundamento econômico para se

permitir qualquer espécie de monopólio, pelas diversas razões fáticas e

econômicas desenvolvidas no Capítulo I e outros pontos deste trabalhado,

dentre as quais, vale lembrar, há incentivos para a assunção, no todo ou em

parte, dos serviços postais pelo setor privado.

No contexto atual, o mercado postal está vocacionado ao regime de

livre concorrência, havendo empresas capazes de entrar de forma eficiente

nesse mercado e atender às diversas classes de necessidades dos

consumidores. Essa conclusão fica ainda mais forte se utilizarmos o conceito

econômico de serviço público,327 qual seja, serviço público caracteriza-se por

toda atividade revestida de relevância social e sobre a qual não haja

incentivos econômicos por parte de particulares para desenvolvê-la em bases

regulares de mercado, i.e., em regime de livre concorrência.328

Depois de evidenciada a melhor experiência internacional para o trato

dos serviços postais (Capítulos II e III - principalmente a experiência de mais

de 20 anos na Europa), bem como após analisados os principais argumentos

que foram utilizados para criar e manter os serviços postais sob regime de

monopólio legal em várias jurisdições (i.e., propriedades de monopólio

natural, universalização, qualidade e confiabilidade) fica difícil, senão

impossível, sustentar nos dias de hoje que ditames como bem-estar social, à

pecha de universalização do serviço, e interesse público sustentariam a

                                                                                                                         327 Mais sobre os diferentes conceitos de serviço público será desenvolvido no item 4.4, do presente capítulo.  328 COMANDINI, Vicenzo Visco. Postal Services. The Liberalization of State Monopolies in the European Union and Beyond - European Monographs. Damien Geradin Editor. Kluwer Law International. The Hague, London, Boston, 2000, p. 138.

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escolha do modelo de monopólio legal para os serviços postais, quanto mais

exercido por uma empresa estatal. A conclusão é justamente o contrário, isto

é, o modelo de monopólio legal para os serviços postais exercidos por

empresa estatal é antagônico aos ditames de bem-estar social e interesse

público, principalmente em uma jurisdição como o Brasil, cuja regra geral que

estrutura a economia é o livre mercado decorrente da dominância do

princípio constitucional da livre iniciativa.

Dessa forma, o exercício de interpretação histórico-sistemática das

Constituições Federais com foco na atual Constituição de 1988 demonstra

que não haveria espaço para se defender a manutenção do monopólio postal

no país. Mas pode haver quem alegue que, no Brasil, circunstâncias fáticas

impedem a comparação do modelo pátrio com outras jurisdições, de modo

que não haveria similares padrões de condutas por parte da empresa ECT e

outras empresas monopolistas noutras jurisdições e, portanto, não haveria

efeitos prejudiciais para a concorrência similares aos verificados na Europa

ou nos EUA, por exemplo.

Ficará claro, ao longo deste capítulo, que esse argumento é falacioso.

Há inúmeras semelhanças entre os resultados negativos do modelo brasileiro

com os resultados negativos observados na UE e nos EUA. Há problemas

similares à concorrência e ao bem-estar social, os quais poderiam receber

remédios similares (por que não?) aos já experimentados em outras

jurisdições. Seja como for, voltando ao plano constitucional, a análise do

arcabouço normativo concernente à atuação do Estado no domínio

econômico, bem como da vocação das atividades postais enquanto setor

compatível com um regime de competição, revelam a contrariedade do

monopólio postal com os ditames da Constituição de 1988.

4.4 Serviço público ou atividade econômica: esse debate faz sentido

para os serviços postais?

O Direito acompanha a realidade dos fatos sociais, com a finalidade de

regular as condutas intersubjetivas a fim de viabilizar coexistência de um

povo em comunidade, em um dado território. Dessa forma, a alteração dos

fenômenos no campo do “real” deve dirigir a alteração dos fenômenos

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216  

“normativos”, ou jurídicos. Quando os fenômenos normativos desconectam-

se do real a ponto de gerar mais resultados negativos ou neutros, que

positivos, é necessário operar-se uma renovação de tais fenômenos

normativos. Isso, afirma-se, ocorre no nível do direito-positivo, bem como se

reproduz no nível da ciência do direito.

Segundo PEIRCE, a validade do conceito está contida no potencial de

representação do “real” que dado conceito pode proporcionar aos intérpretes

e, portanto, levar a resultados positivos decorrentes da utilização de tal

conceito.329 As ciências contemporâneas têm passado por um processo de

renovação no sentido de se tornarem mais permeáveis entre si com o

objetivo de alcançar melhores padrões de compreensão da realidade, cada

vez mais complexa, e, portanto, lograrem maiores níveis de eficácia de suas

representações de metalinguagem.

Essa permeabilidade tem recebido a denominação de

interdisciplinaridade. No caso do direito-positivo, as taxas de eficácia podem

ser observadas pelo sucesso das normas jurídicas criadas, em termos de

alcance do melhor arranjo na distribuição de incentivos sociais para as

finalidades pretendidas pela Constituição. No caso da ciência do direito, a

eficácia pode ser medida pelo potencial de apreensão dos fenômenos

jurídicos representados, sempre tendo-se em conta as finalidades do direito-

positivo.                                                                                                                          329

“Assim, uma concepção pragmática válida seria capaz de gerar, ou ao menos possibilitar a geração de uma conduta igualmente válida, é dizer, preparada para servir de fundamento e móvel a uma conduta futura. Ou seja, a conduta presente representa um fundamento racional para uma conduta futura, seja para repeti-la, seja para mudá-la, seja para reprimi-la. Peirce assinala que o pensamento é racional somente na medida em que ele se recomenda para um futuro pensamento. Em outras palavras, a racionalidade do pensamento reside em sua referência a um futuro possível, de modo que uma concepção positiva, ou seja, que supõe ter um objeto real, deve prever o curso futuro da experiência”.  GABAN, Eduardo M.; DOMINGUES, Juliana O. Direito Antitruste: o combate aos cartéis. 2ª ed. São Paulo: Saraiva, 2009, p.21. Nesse sentido, veja-se trecho do voto do Ministro Eros Grau, na ADPF 46-7/DF: “HESSE sustenta que a Constituição está condicionada pela realidade histórica, razão pela qual (...) não se pode separar da realidade concreta de seu tempo e a pretensão da eficácia de suas normas somente pode ser realizada se for levada em conta essa realidade. Perece a força normativa do direito quando ele já não corresponde à natureza da finalidade dos seus textos que estejam em conflito com a realidade e ele se transforma em obstáculo ao pleno desenvolvimento das forças sociais. Ao intérprete incumbe, então, sob o manto dos princípios, atualizá-lo.” BRASIL. Supremo Tribunal Federal (STF). Arguição de descumprimento de Preceito Fundamental n.º 46-7. Arguente: Associação Brasileira das Empresas de Distribuição. Arguido: Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos. Relator: Ministro Marco Aurélio. Brasília, 15 de junho de 2005. Disponível em: <http://academico.direito-rio.fgv.br/ccmw/images/d/d6/206_ADPF_46_-_Voto_Eros_Grau.pdf>. Acesso em 11 Mar. 2011, p.5.  

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217  

Este trabalho traz em si a idéia de interdisciplinaridade (conforme

descrito na Introdução), notadamente entre o direito e a economia,

fundamentalmente em função da complexidade dos fenômenos que se

propôs analisar.

Nesse contexto, passa-se a refletir sobre os conceitos jurídicos de

serviço público e de atividade econômica, trazidos de forma bastante simples

pelo direito-positivo (Constituição Federal de 1988, leis e jurisprudência) e

interpretados pela doutrina (ou ciência do direito). Adverte-se que o presente

trecho dedica-se, mais por deferência que por utilidade, a tanger conceitos

explorados há tempos pela tradicional doutrina jurídica (com enfoque mais

“purista” ou “monodisciplinar”) com o objetivo de identificá-los e criticá-los.

Adianta-se que, dada sua predominância no campo subjetivo, não se

encontrou na teoria jurídica conceito de serviço público ou de atividade

econômica que pudesse ser perfeitamente utilizado para representar o

fenômeno econômico dos serviços postais, sem contanto ingressar-se numa

miríade de classificações que mais provavelmente causariam a confusão do

leitor do que proporcionariam a cristalina compreensão dos fenômenos ora

estudados.

Assim, como se verá ao final deste trecho, elegeu-se um conceito bem

simples e ao mesmo tempo suficientemente abrangente para expressar o que

se entende por serviço público e por atividade econômica. Esse conceito,

adianta-se, é extrajurídico. Contudo, tal como a Constituição Federal de 1988

(e a seu exemplo, uma série de normas jurídicas) possuem conceitos

exógenos para expressar e regular fenômenos da realidade, entende-se que

essa metodologia seria perfeitamente aceitável no plano da Ciência do

Direito, isto é, do presente trabalho.

4.4.1 Os diversos conceitos e classificações de serviços públicos

A dicotomia de serviço público versus atividade econômica há muito se

faz presente no âmbito do direito-positivo e da ciência do direito, sendo alvo

de intensos e, aparentemente, intermináveis debates doutrinários e

jurisprudenciais. Muitas são as classificações possíveis, assim como os

critérios utilizados, para conceituar uma determinada atividade como um

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serviço público ou uma atividade econômica. Tem se tornado constante entre

os doutrinadores o entendimento de que esta dicotomia não é estanque, ou

seja, está sujeita a fatores que vão além das características do objeto o qual

se pretende classificar (i.e., da atividade em si).

Assim, a doutrina sugere que mais do que o atrelá-lo às características

da atividade analisada, é necessário verificar o contexto histórico que envolve

essa apreciação, compreendendo-se, assim, a realidade econômica e política

na qual o objeto de análise insere-se. Desse modo, o que é atividade

econômica hoje pode ser serviço público em outra sociedade com tendências

políticas mais centralizadoras. Ou seja, uma atividade própria ao regime de

livre concorrência pode receber tratamento de reserva legal a depender da

linha liberal ou estatizante do território onde seja analisada.

Sugere-se ainda que, até na mesma sociedade, o conceito pode

evoluir e vir a agregar esta ou aquela atividade, de maneira que caberia ao

intérprete não simplesmente repetir as interpretações e conceitos do

passado, mas analisar o contexto político e econômico presente a cada vez

que for se utilizar dessa dicotomia.

Entende-se, por outro lado, que os conceitos de serviço público e

atividade econômica, ao menos no contexto da atual Constituição, não

podem variar no campo infraconstitucional, uma vez que a vontade política já

fora estabelecida em 1988, bem como nas ocasiões posteriores por parte do

Poder Constituinte Derivado.

Em complemento, entende-se que, por princípio, é perigoso dissociar-

se a atividade normativa das características fáticas que revestem o fenômeno

que se visa regular, sendo tal caminho aceitável em caráter

excepcionalíssimo e calcado em razões expressas de interesse público (i.e.,

social). Quando se trata de atividade econômica, uma intervenção jurídica

que desconsidere as características da realidade pode gerar efeitos

desastrosos para a economia e para o bem-estar social, o que acaba sendo

contrário, em última análise, à “vontade” da Constituição.

A Constituição de 1988 traz aquilo que o Poder Constituinte Originário

optou por instituir como serviços públicos. Tais previsões encontram-se

dispostas nos artigo 21, XI e XII (serviços públicos a cargo da União); artigo

25, § 2º (serviços públicos a cargo dos Estados) e art. 30, V (serviços

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públicos a cargo dos Municípios). Em todos esses dispositivos destaca-se a

utilização de termos como “organizar e prestar” ou “explorar diretamente” ou

a opção por “explorar mediante autorização, concessão ou permissão” (art.

175, CF). Ou seja, a partir da linguagem utilizada pela Constituição, serviços

públicos seriam aqueles que o Estado presta diretamente ou por meio de

contratos administrativos de regime de direito público, como o exemplo

clássico da concessão. Não haveria livre participação das empresas

privadas, pois ainda que se trate de exploração indireta pelo Estado, a

participação dessas empresas dependeria da sujeição a regime de direito

público, de processo licitatório etc.

Esses serviços públicos corresponderiam à categoria que BARROSO

denomina serviços públicos por escolha política ou por opção do legislador.

Por sua própria natureza os serviços públicos seriam atividades econômicas,

ou seja, poderiam facilmente ser prestados por empresas privadas, contudo,

o Estado mediante previsão constitucional decorrente de uma escolha política

originária traz a si este serviço, torna-o público para que seja prestado

conforme o art. 175, CF/88.330

Em paralelo, têm-se ainda aqueles serviços chamados de essenciais

ou próprios ou ainda serviços públicos em sentido estrito (ou inerentes). Aqui

se incluiriam aquelas atividades ligadas à própria essência do Estado, as

quais de nenhuma forma poderiam ser prestadas por particulares. Trata-se

de serviços cuja execução se dá pelo uso da supremacia da Administração

em relação aos administrados. São exemplos dessa categoria de serviços

públicos a prestação de segurança nacional, saúde, higiene e polícia.331 Os

serviços públicos inerentes dispensam previsão legal que informe que o

Estado os prestará diretamente. Estes estariam inseridos em esfera

tipicamente pública, de forma que não haveria necessidade de uma norma

para dizer que serão explorados pelo Estado.332

                                                                                                                         330 BARROSO, Luís Roberto. Regime constitucional do serviço postal. Legitimidade da atuação da iniciativa privada. Revista dos Tribunais, ano 90, v. 786. São Paulo: abr. 2001, p. 140. 331 MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Administrativo Brasileiro. 14ª ed., atualizada pela Constituição de 1988. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1989. p.290. 332 BARROSO, Luís Roberto. Regime constitucional do serviço postal. Legitimidade da atuação da iniciativa privada. Revista dos Tribunais, ano 90, v. 786. São Paulo: abr. 2001, p. 141.

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A Constituição Federal, por exemplo, diz que compete à União a

emissão de moeda (art. 21, VII), mas não precisa dizer que se trata de um

serviço público explorado diretamente pela União, pois isso se reputa óbvio.

O mesmo em relação à Segurança Nacional (art. 21, III) ou manutenção das

relações exteriores (art. 21, I). Já no que tange aos serviços de gás

canalizado (art. 25, §2º) ou ainda os serviços de telecomunicações (art. 21,

XI), não é obvia a classificação como serviços públicos, pois não são

atividades essenciais, ligadas à própria natureza ou soberania do Estado,

mas poderiam ser prestadas por particulares. Tratar-se-iam, assim, de

serviços públicos por opção legislativa. BARROSO afirma que esses

serviços, na verdade, constituem exceção ao princípio da livre iniciativa, pois

seriam tipicamente de natureza privada, tanto que podem ser prestados por

entes privados mediante concessão, por exemplo, sendo possível a

classificação como serviço público unicamente por meio de expressa

previsão constitucional.333

Em verdade, atividades como a prestação de serviços de

telecomunicações, bem como de gás canalizado, embora devam ser

exercidas sob regime de direito público (i.e., a entrada em tais mercados

dependa de concessão, autorização ou permissão), não poderiam ser

caracterizadas como exceções ao princípio da livre iniciativa, pois, seja na

fase anterior ao contrato de concessão, seja concomitantemente a ele,

devem contar com regime de livre concorrência. Nesse sentido, coloca-se

ARAGÃO, para quem a lógica da concorrência deve ser aplicada à

exploração empresarial das atividades de serviço público.334 Não há mais

                                                                                                                         333BARROSO, Luís Roberto. Regime constitucional do serviço postal. Legitimidade da atuação da iniciativa privada. Revista dos Tribunais, ano 90, v. 786. São Paulo: abr. 2001, p. 142. 334 “(…) A lógica da concorrência deve ser aplicada à exploração empresarial das atividades de serviço público, desenvolvida pela iniciativa privada sob a concepção da lucratividade. Daí segue a aplicação de princípios peculiares ao âmbito não estatal, tais como a tutela à propriedade privada, à livre iniciativa e à livre concorrência. Mesmo diante da hipótese de inviabilidade absoluta de competição, é possível a competição por comparação ou ‘yardstick competition.’ Ou seja, é viável a submissão do tratamento de todos prestadores de serviço público a padrões comparativos, através de instrumentos destinados a produzir efeitos similares aos gerados pela concorrência. A experiência internacional menciona que as licitações para a concessão de serviços públicos às vezes acabam impondo limitações desnecessárias à concorrência. Nesse sentido, a autoridade canadense de defesa da concorrência atenta para ao menos quatro efeitos anticompetitivos frequentemente encontrados em procedimentos licitatórios: (a) inibição da concorrência entre competidores, (b) redução do acesso de potenciais entrantes

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prestação direta pelo Estado Brasileiro em dadas atividades. Em outras

palavras, a livre concorrência deve ocorrer, seja no processo de licitação

e/ou, quando possível, durante o regime de concessão por intermédio de

uma entidade pública de regulação setorial (como é o caso das

telecomunicações, com a ANATEL, e do mercado de gás natural, com a

ANP). Veja-se que, até para tais atividades, onde incontestavelmente

encontram-se as falhas de mercado, (i.e., monopólios naturais) o legislador

constituinte claramente aplicou o princípio da livre iniciativa (Art.1, IV). Seja

como for, dá-se continuidade à avaliação das demais classificações da

doutrina jurídica.

Admite-se ainda uma terceira hipótese de serviços públicos, os quais

poderiam ser prestados concomitantemente pelo Estado e pela iniciativa

privada, mediante uma licença prévia de autoridade competente. Trata-se do

caso da educação (art. 209), saúde (art. 199) e previdência (art. 201). A

característica que tornaria esses serviços merecedores de categoria

diferenciada é a possibilidade expressa na Constituição de serem prestados                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                            ao procedimento licitatório, (c) limitação da possibilidade de novas empresas prestarem serviço ao governo, e restrição da possibilidade de empresas que não estavam prestando serviço ao governo se tornarem fornecedoras. Assim, a regra é a aplicação do princípio da concorrência, mesmo em atividades fortemente reguladas como os serviços públicos, sendo que qualquer exceção à aplicação desse princípio deve ser pontual, de forma a se evitarem as disfunções que a sua não aplicação pode ocasionar. No mesmo sentido, Gesner Oliveira e João Grandino Rodas destacam que ‘a definição dos critérios de preço é frequentemente estabelecida nos contratos de concessão. Mas as autoridades de defesa da concorrência podem opinar sobre este e vários outros assuntos em sua função de promoção da concorrência. Assim, a maior adequação ou não ao critério de preço-teto para um determinado segmento ou o próprio desenho de um leilão ou de um contrato de concessão são temas que merecem exame e opinião das autoridades de defesa da concorrência’. Os princípios concorrenciais devem, então, nortear as decisões do poder concedente quanto a prazo, condições de participação dos agentes econômicos, exigências para participação e objeto de licitação, de forma a propiciar a presença do maior número possível de agentes, evitando-se ao máximo a limitação à concorrência no processo licitatório e na execução dos futuros contratos. Não há de se admitir, salvo excepcionalmente, o afastamento por completo do princípio da livre concorrência, sob a alegação de que o futuro concessionário terá obrigações de universalização do serviço. Deve-se, através da proporcionalidade, determinar o quantum de concorrência que essa estrutura prestacional admite, de maneira que, ainda que o serviço deva ser prestado em regime de exclusividade, seria imprescindível a aplicação dos princípios concorrenciais quando da formatação do certame e do contrato de concessão, adotando-se, inclusive, sempre que possível, a assimetria regulatória pró-concorrencial, deixando fora da exclusividade atividades correlatas que possam ser exploradas em concorrência sem prejudicar as obrigações especiais de serviço público.” ARAGÃO. Alexandre Santos de. Competências Antitruste e Regulações Setoriais. Disponível em: <http://download.rj.gov.br/documentos/10112/312688/DLFE-28573.pdf/CompetenciaAntitruste.pdf>. Acesso em: 6 Mai. 2011.  

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pelo Estado sem impedimento a que os particulares também venham a

explorar a mesma atividade em razão de um interesse público de que haja a

maior oferta possível de tais serviços. BARROSO considera a possibilidade

de os serviços postais virem a se enquadrar nesta categoria, mas afasta

imediatamente a hipótese por considerar que se trata, na verdade, de

atividade econômica.335

MELLO, por sua vez, entende que a Constituição indica

expressamente alguns serviços de alçada do poder público, sendo

obrigatoriamente serviços públicos os arrolados como de competência das

entidades públicas (pois estariam volvidos à satisfação da coletividade em

geral). Para ele, atividades como o serviço postal, o correio aéreo nacional,

telecomunicações, serviço de radiodifusão sonora (rádio ou televisão),

serviços de instalações de energia elétrica e aproveitamento energético dos

recursos d’água seriam obrigatoriamente serviços públicos. Para MELLO, o

serviço postal e de correio aéreo deveriam ser prestados diretamente pelo

Estado, jamais por concessão, permissão ou autorização, com base em uma

interpretação literal do Art. 21, da Constituição.336

Ocorre que o Art. 21 da Constituição, em nenhum momento, associa

ao termo “manter” à idéia de exclusividade ou monopólio, como o faz, por

exemplo, para a pesquisa, lavra, enriquecimento e reprocessamento,

industrialização e o comércio de minérios nucleares e seus derivados (Art.

12, XXIII). Ainda, como os serviços postais nada mais são que a realização

conjunta (ou em pacotes) dos serviços de coleta, triagem, transporte e

entrega de correspondências, o mesmo Art. 21 nada diz a respeito do

monopólio de tais segmentos que compõe o serviço de correios. Se

considerar-se, ainda, os serviços postais como espécie de serviços de                                                                                                                          335 BARROSO, Luís Roberto. Regime constitucional do serviço postal. Legitimidade da atuação da iniciativa privada. Revista dos Tribunais, ano 90, v. 786. São Paulo: abr. 2001, p. 145. 336 “22. Há duas espécies de serviços que só podem ser prestados pelo próprio Estado, isto é, que não podem ser prestados por concessão, permissão ou autorização. São eles os de serviço postal e correio aéreo nacional, como resulta do art. 21, X. Isso porque, ao arrolar no art. 21 competências da União quanto à prestação de serviços públicos, menciona, nos incisos XI e XII (letras “a” e “f”) diversos serviços. A respeito deles esclarece que a União os explorará diretamente ou “mediante autorização, concessão ou permissão”. Diversamente, ao referir no inciso I o serviço postal e o correio aéreo nacional, não concedeu tal franquia. Assim, é visível que não quis dar o mesmo tratamento aos vários serviços que considerou.” MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de Direito Administrativo. 17ª ed. São Paulo: Malheiros, 2004, p.634-637.

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comunicação, o que de fato é caso, o Art. 21 expressamente fixa que

poderiam tais atividades ser exercidas pela iniciativa privada (Art. 21, XI, in

fine). Como se verá, a Constituição Federal não inclui os serviços postais nas

hipóteses de serviço público (Art. 175), bem como nas hipóteses de

monopólio legal (Art. 177).

Observa-se que a própria União Federal não entende que os serviços

postais devam ser prestados apenas, i.e., diretamente e exclusivamente, pela

ECT. Isto fica claro no sistema de franquias ou agências postais contidos na

Portaria do Ministério das Comunicações nº 386/2001, em que autoriza-se a

ECT a realizar procedimentos licitatórios (com base na Lei nº 8.666/93) em

todo o território nacional para a seleção de pessoas jurídicas interessadas em

prestar serviços e vender produtos postais, em unidades de atendimento,

denominadas de Correios Comercial do Tipo I (art. 1o). Tal delegação seria

objeto de contrato, pelo instituto da permissão, que seria celebrado entre a

ECT e a empresa privada vencedora da licitação (Art. 2o).337

Em proposta mais concisa, DI PIETRO entende que serviço público é

toda atividade material atribuída ao Estado por lei, para que este a exerça

seja diretamente, seja mediante constituição formal de delegados, sempre

com a presença (total ou parcial) de regime de direito público.338 Essa

proposta seria suficiente para abranger serviços como telecomunicações e

gás canalizado, mas não seria suficiente para abranger os serviços postais,                                                                                                                          337   BRASIL. Ministério das Comunicações. Portaria n. 386/2001. Disponível em: <http://www.mc.gov.br/images/servicos-postais/legislacao/portarias/portaria_386_17_julho_2001.pdf>. Acesso em: 1 Mai. 2011. No mesmo sentido, veja-se BRASIL. Ministério das Comunicações. Portaria n. 1/2001. Disponível em: <http://www.mc.gov.br/images/servicos-postais/legislacao/portarias/portaria_01_23_outubro_2001.pdf>. Acesso em: 1 Mai. 2011. Por mais que as portarias do Ministério das Comunicações utilizem o termo “permissão” e realizem os certames sob a Lei n. 8.666/93, há quem entenda em sentido contrário, isto é, que isso não seria suficiente para caracterizar um regime de delegação. Nesse sentido, veja-se: “O fato de o serviço postal ser prestado pela Empresa Brasileira da Correios e Telégrafos – ECT -, empresa pública, ou seja, prestação descentralizada, não configura a concessão do serviço: os recursos aplicados continuam a ter origem pública; não se transfere a prestação do serviço para esfera estranha à da administração pública; e o regime jurídico não se altera (JUSTEN FILHO, 2009; GRAU, 2008; SILVA, 2008). Esse é o entendimento de grande parte dos mais influentes doutrinadores, como Geraldo Ataliba, Adilson Abreu Dallari (Apud JUSTEN FILHO, 2009), Eros Grau (2008) e José Afonso da Silva (2008).” DUARTE Jr., Ricardo Ferreira. Serviço Postal: Serviço público ou atividade econômica? Revista Âmbito Jurídico. Disponível em: <http://www.ambito-juridico.com.br/site/index.php?n_link=revista_artigos_leitura&artigo_id=6746> Acesso em: 2 Mai. 2011.  338 DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito Administrativo. 22. ed., Atlas, São Paulo, 2009, p.102.

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dada a ausência de previsão constitucional no sentido de classificá-los como

públicos.

Por outro lado, em espécie de oposição à idéia de serviço público, a

doutrina jurídica também se encarregou a classificar o que seriam atividades

econômicas. Segundo GRAU, atividade econômica em sentido amplo divide-

se em serviço público e atividade econômica em sentido estrito.339 Ou seja, o

Estado poderia atuar na esfera ampla de atividades econômicas de duas

formas: prestando serviços públicos ou exercendo atividade econômica.

Assim, GRAU entende que serviço público seria o tipo de atividade

econômica cujo desenvolvimento compete preferencialmente ao setor público

(i.e., não exclusivamente – dada a possibilidade de delegação ao setor

privado por concessão, permissão ou autorização). Em outras palavras, os

serviços públicos poderiam ser entendidos como atividades econômicas

reservadas por lei à operação preferencial (não-exclusiva) do Estado.340

Ocorre que a Constituição Federal arrola exaustivamente as hipóteses

em que o Estado desenvolverá diretamente uma atividade econômica, sejam

em regime de livre concorrência (Art. 173, quando houver imperativos da

segurança nacional ou relevante interesse coletivo)341, seja em regime de

monopólio legal (Art. 177)342. Afora essas hipóteses, atividades econômicas

                                                                                                                         339 GRAU, Eros Roberto. A Ordem Econômica na Constituição de 1988 (interpretação e crítica). 5ª ed. revista e atualizada. São Paulo: Malheiros, 2000, p.132. 340 GRAU, Eros Roberto. A ordem econômica na Constituição de 1988. 6a Edição. São Paulo: Malheiros, 2001, p.133-134. 341 Art. 173. Ressalvados os casos previstos nesta Constituição, a exploração direta de atividade econômica pelo Estado só será permitida quando necessária aos imperativos da segurança nacional ou a relevante interesse coletivo, conforme definidos em lei. § 1º A lei estabelecerá o estatuto jurídico da empresa pública, da sociedade de economia mista e de suas subsidiárias que explorem atividade econômica de produção ou comercialização de bens ou de prestação de serviços, dispondo sobre: I - sua função social e formas de fiscalização pelo Estado e pela sociedade II - a sujeição ao regime jurídico próprio das empresas privadas, inclusive quanto aos direitos e obrigações civis, comerciais, trabalhistas e tributários; [...] § 2º - As empresas públicas e as sociedades de economia mista não poderão gozar de privilégios fiscais não extensivos às do setor privado. [...] § 4º - A lei reprimirá o abuso do poder econômico que vise à dominação dos mercados, à eliminação da concorrência e ao aumento arbitrário dos lucros. 342 Art. 177. Constituem monopólio da União: I - a pesquisa e a lavra das jazidas de petróleo e gás natural e outros hidrocarbonetos fluidos; II - a refinação do petróleo nacional ou estrangeiro; III - a importação e exportação dos produtos e derivados básicos resultantes das atividades previstas nos incisos anteriores;

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devem ser exercidas pela iniciativa privada sob regime de competição. Essa

foi a vontade expressa pelo Poder Constituinte (em sua dúplice forma de

expressão, i.e., originário e derivado). Os serviços postais não são

mencionados em nenhum desses dispositivos. Pergunta-se, teria o Poder

Constituinte pretendido que fora reservado e operado diretamente pelo

Estado? Entende-se que não.

BARROSO sistematiza tais possibilidades, conforme dois critérios: a

forma de prestação e a necessidade do ponto de vista constitucional, ou seja,

a obrigatoriedade de prestação. Quanto à forma, o parágrafo anterior já

delineou as hipóteses, quais sejam, regime concorrencial ou monopólio. Em

relação à necessidade, as atividades podem ser (i) obrigatórias, por expressa

previsão constitucional ou (ii) facultativas, por opção legislativa.343

É nesse ponto que se encontra o fundamento de classificar-se o

serviço postal como atividade econômica. Por essa visão, é possível

harmonizar-se os artigos 173 e 20, X da Constituição Federal da melhor

forma possível, de acordo com os princípios balizadores da Ordem

Econômica vigente. O art. 20, X, utilizado por parte da doutrinária para

sustentar que os serviços postais seriam serviços públicos, na verdade,

define apenas a obrigatoriedade de a União manter, não especificando se

diretamente (na hipótese do Art. 173), ou se indiretamente, por delegação

(concessão, permissão ou autorização) e regulação setorial.

Em verdade, não haveria uma terceira alternativa, isto é, via exercício

de monopólio legal por empresa estatal, dada a ausência de previsão

constitucional. Assim, fosse entendido tratar-se de imperativos da segurança

nacional ou relevante interesse coletivo, os serviços postais poderiam ser

desenvolvidos diretamente pela ECT, porém sem qualquer reserva legal e

                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                           IV - o transporte marítimo do petróleo bruto de origem nacional ou de derivados básicos de petróleo produzidos no País, bem assim o transporte, por meio de conduto, de petróleo bruto, seus derivados e gás natural de qualquer origem; V - a pesquisa, a lavra, o enriquecimento, o reprocessamento, a industrialização e o comércio de minérios e minerais nucleares e seus derivados, com exceção dos radioisótopos cuja produção, comercialização e utilização poderão ser autorizadas sob regime de permissão, conforme as alíneas b e c do inciso XXIII do caput do art. 21 desta Constituição Federal.  343 BARROSO, Luís Roberto. Regime constitucional do serviço postal. Legitimidade da atuação da iniciativa privada. Revista dos Tribunais, ano 90, v. 786. São Paulo: abr. 2001, p. 147.

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privilégios que os diferenciassem dos prestadores privados, pois assim prevê

o Art. 173, §§ 1o. a 4o., da CF/88.

Caso contrário, não há previsão constitucional para o exercício de tal

atividade econômica diretamente pelo Estado. Os serviços postais de entrega

de correspondências enquanto atividade econômica inserem-se plenamente

na matriz de livre iniciativa, ou livre competição. Contudo, não significa que o

serviço deva ser deixado ao largo no mercado, sem qualquer atuação Estatal

complementar. O Estado pode e deve atuar como regulador, garantindo a

universalização do serviço e a livre concorrência.

No caso dos serviços postais, entende-se que o Estado deveria

apenas atuar como regulador concorrencial (i.e., regulação geral)344 e não

prestador direto, podendo os incentivos à universalização ser estabelecidos

como condições de entrada nos diversos mercados existentes ou, no

máximo, regulados via regulação setorial. Como demonstrado no Capítulo I,

os serviços postais não demandam a intervenção estatal, sendo muito

sensíveis às evoluções tecnológicas (inovação) e à dinamicidade do

mercado.

A transformação do papel do Estado em relação às atividades de

grande interesse nacional é uma tendência em todas as economias e em

diversos setores. O exemplo mais comum é o de telecomunicações. Nesse

mercado há grande eficiência na conjugação da capacidade e especialização

tecnológica das empresas privadas, com a regulação normativa do Estado

fazendo valer seu poder para garantir um serviço universal e fiel aos

interesses sociais. Nesse sentido, destaca-se a evolução apontada por

ARAGÃO, que em muito reflete a evolução dos serviços postais. A idéia

tradicional de regulação dos serviços públicos, marcada pelo contrato de

concessão que retirava a atividade do mercado e lhe entregava a um

concessionário exclusivo vem sendo substituída. Hoje, a regulação dos

serviços públicos evita a exclusividade. Há uma abertura maior aos agentes

                                                                                                                         344 “Torna-se interessante e necessário estabelecer as bases conceituais para as estratégias de equilíbrio de mercado, (...) há (1) uma regulação geral, que abarca tanto a atividade antitruste quanto a defesa do consumidor, e (2) uma regulação setorial, a qual abarca a regulação de setores específicos da economia (...).” GABAN, Eduardo Molan. Regulação econômica e assimetria de informação. Revista do IBRAC, São Paulo, v. 9, n. 5, p. 97-167, 2002. p. 108.  

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econômicos e à possibilidade de prestação do serviço fora do regime público,

integrando o mercado no âmbito da regulação de atividades essenciais.345

Pode ser que a ECT não tenha capacidade de se manter em regime

de livre competição, dado que demandaria ajustes internos em prol da

consecução de melhores patamares de eficiência econômica. Contudo, este

argumento (não-jurídico) não é necessário nem suficiente para defender a

recepção dos diplomas que lhe garantiram o monopólio postal anteriormente

à Constituição de 1988.

Se pretende ser competitiva, deveria a ECT modernizar-se e combater

os entraves burocráticos presentes em sua estrutura. Os cargos políticos

deveriam ser substituídos por cargos ocupados por técnicos e profissionais

da área. Essa modernização é difícil, sem dúvida, mas a inércia da empresa

não pode servir de justificativa para o Estado mantê-la e, principalmente, para

lhe reservar o mercado. São grandes as pressões políticas que utilizam o

argumento de que o fim do monopólio levará ao fim da empresa em si, mas

não se pode desviar o foco da questão e esquecer que o interesse público

não está na existência da ECT, mas sim no serviço postal.

Como se pode observar, as propostas não indicaram uma clara

separação dos conceitos de serviço público e atividade econômica, antes

atribuíram maior grau de complexidade às classificações, de modo que fica

ainda mais difícil entender e validar juridicamente o que seria atividade

econômica e, assim, quando seria distinta de serviços públicos, quando não

seria e, na prática, qual regime jurídico deveria prevalecer.

4.4.2 O conceito de serviço público adotado neste trabalho

Assim, antes de se propor nova classificação ou novo conceito aos

serviços públicos, procura-se com o presente trabalho identificar qual regime

jurídico que a CF/88 atribuiu ao serviço postal. Segundo voto do Ministro

Marco Aurélio na ADPF 46-7/DF, certas definições são contaminadas por

dogmas jurídicos de classificação que propõem uma natureza estática e

imutável das coisas. Assim ocorre com a clássica dicotomia serviço público e                                                                                                                          345 ARAGÃO, Alexandre Santos de. Serviços Públicos e Concorrência. Revista de Direito Administrativo. Volume 233. julho/setembro de 2003, Rio de Janeiro: Renovar, p. 314.

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atividade econômica. Percebe-se, atentando para a história, uma natureza

inicial de serviço público que poderia ser atribuída ao setor postal, tanto por

escolha política (imperativos de integração nacional e garantia de sigilo de

correspondência), como por questões econômicas (setor privado não tinha

capacidade econômica de ingressar no serviço). No entanto, restou

demonstrado que o afastamento do Estado do papel de prestador direto de

serviços e as evoluções tecnológicas foram gradativamente atuando sobre a

natureza dos serviços postais de modo a torná-los muito mais próximos à

típica atividade econômica. Nesse sentido, a intervenção estatal tomando o

serviço como público quando na realidade não o é, representaria interferência

indevida do ente público na esfera privada.346

A escolha política do Estado em atribuir a certa atividade status de

serviço público ou de atividade econômica deve estar de acordo com a

realidade fática e o melhor interesse social. Isto é, a escolha deveria se

basear na estratégia de aumentar o bem-estar social. Se assim não for,

tratar-se-á de ingerência indevida em atividade privada. Ou seja, a opção por

serviço público ou por atividade econômica depende de escolhas políticas

feitas pelo Estado, mas destaca-se aqui que, para ser legítima, essa escolha

deve ser feita com base na realidade econômica do país e não em interesses

de minorias voltadas à maximização de seu bem-estar individual. É nesse

contexto que entende-se deva ser interpretada a Constituição Federal de

1988, cuja escolha referente aos serviços postais já foi feita pela Poder

Constituinte Originário.

Para o presente trabalho, assim, adota-se o conceito econômico de

serviço público, qual seja, aquele que necessita ser prestado pelo Estado em

razão da ausência de agentes privados interessados em prestá-los pelas

suas próprias iniciativas (ou interesse empresarial).347 Isto é, o Estado

deveria operar diretamente alguns serviços essenciais à população em razão

                                                                                                                         346 BRASIL. Supremo Tribunal Federal (STF). Arguição de descumprimento de Preceito Fundamental n.º 46-7. Arguente: Associação Brasileira das Empresas de Distribuição. Arguido: Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos. Relator: Ministro Marco Aurélio. Brasília, 15 de junho de 2005. Disponível em: <http://redir.stf.jus.br/estfvisualizadorpub/jsp/consultarprocessoeletronico/ConsultarProcessoEletronico.jsf?seqobjetoincidente=2182784>. Acesso em 11 Mar. 2011. 347 COMANDINI, Vicenzo Visco. Postal Services. The Liberalization of State Monopolies in the European Union and Beyond - European Monographs. Damien Geradin Editor. Kluwer Law International. The Hague, London, Boston, 2000, p. 138.

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da existência de falhas de mercado ou de ausência de perspectivas de

ganhos econômicos (financeiros) por parte dos agentes privados. Esse

conceito dialoga perfeitamente com os serviços públicos eleitos como tal pela

Constituição de 1988.

Se ao longo da história, tais serviços experimentassem novas

tecnologias as quais os tornassem atrativos à iniciativa privada, o Estado

deveria reavaliar sua participação direta e dar espaço à iniciativa privada,

restringindo-se a atuar diretamente apenas no tocante aos serviços que

possuem falhas ou não atraem a operação privada. Se, por outro lado, ao

longo da história verificarem-se falhas de mercado (como a existência de

excessivas externalidades negativas) em setores submetidos em princípio ao

regime de livre iniciativa, é possível operar-se a mudança de seu tratamento

mediante exercício do Poder Constituinte Derivado.  

4.5 ADPF 46-7/DF: Avanço ou retrocesso?

O tema do monopólio postal foi levado ao Supremo Tribunal Federal

(STF), por meio de Arguição por Descumprimento de Preceito Fundamental

(ADPF), uma medida de controle de constitucionalidade concentrado que

visava obter da mais alta Corte do País uma resposta que viesse a pacificar

as incertezas jurídicas e econômicas que pairavam sobre as atividades

postais por todo o território nacional.348 A ação foi proposta em 14 de

novembro de 2003 pela Associação Brasileira de Empresas de Distribuição

(ABRAED) com objetivo de reparar lesões a diversos direitos fundamentais,

perpetradas pela atuação da ECT. Em síntese, a ABRAED é uma associação

de cerca de 15 mil empresas de logística responsáveis por mais de um 1,2

                                                                                                                         348 "A Constituição Federal determina em seu § 1°, do art. 102, introduzido pela Emenda Constitucional n° 3, de 17-3-1993, que a arguição de descumprimento de preceito fundamental decorrente da Constituição será apreciada pelo Supremo Tribunal Federal, na forma da lei. Trata-se, portanto, de norma constitucional de eficácia limitada, que depende de edição de lei, estabelecendo a forma pela qual será apreciada a arguição de descumprimento de preceito fundamental decorrente da Constituição. Como destacado por Andrade Filho, ‘trata-se de matéria em que a situação do Poder Legislativo é imprescindível para estabelecer os contornos processuais em que esse direito possa ser exigido e quais as pessoas que estariam legitimadas a apresentar essa arguição’.” MORAES, Alexandre de. Arguição de descumprimento de preceito fundamental: análises à luz da Lei n° 9.882/99. André Ramos Tavares, Walter Claudius Rothenburg (organizadores). – São Paulo: Atlas, 2001. p. 16.

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milhão de empregos diretos. Seus associados estão distribuídos ao longo do

território brasileiro e, basicamente, operam nos mercados de logística,

movimentação de materiais, manuseio e distribuição de malotes, revistas,

periódicos, pequenas encomendas, leitura e entrega de conta de luz e gás e

outras atividades autorizadas pelos entres federativos (União, Estados e

Municípios). Os membros da ABRAED não operam a coleta, distribuição e

entrega de cartas, entendidas como correspondências de cunho pessoal,

íntimo e sigiloso. A Associação acusou a ECT de ter iniciado “uma verdadeira

cruzada nacional para expurgar a concorrência e banir do mercado todas as

empresas” associadas à ABRAED ligadas ao ramo de distribuição sob o

argumento de que possuiria o monopólio postal absoluto e, assim, toda e

qualquer correspondência, seja ela uma lista telefônica, uma conta de luz,

água, ou uma encomenda, estaria incluída no conceito de “carta”, i.e., papel

escrito metido em envoltório fechado, que se envia de uma parte a outra para

comunicação entre pessoas distantes.349

No que tange à tese jurídica, aduziu em síntese a ABRAED que o

referido monopólio legal não teria sido recepcionado pela Constituição

                                                                                                                         349 BRASIL. Supremo Tribunal Federal (STF). Arguição de descumprimento de Preceito Fundamental n.º 46-7. Arguente: Associação Brasileira das Empresas de Distribuição. Arguido: Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos. Relator: Ministro Marco Aurélio. Brasília, 15 de junho de 2005. Disponível em: <http://redir.stf.jus.br/estfvisualizadorpub/jsp/consultarprocessoeletronico/ConsultarProcessoEletronico.jsf?seqobjetoincidente=2182784>. Acesso em 11 Mar. 2011: “A seguir, em tópico intitulado “dos fatos”, relata-se a criação, no território nacional, de diversas empresas de distribuição, visando a atender à demanda do mercado de serviço de logística, movimentação de materiais, manuseio, distribuição de malotes, revistas, periódicos, pequenas encomendas, leitura e entrega de conta de luz e gás e outras atividades autorizadas pelos entes federativos – União, Estados e Municípios, sendo que em momento algum as empresas pretenderam entregar ou distribuir cartas, entendidas essas como correspondência de cunho pessoal, íntimo e sigiloso. Ter-se-ia iniciado “uma verdadeira cruzada nacional para expurgar a concorrência e banir do mercado todas as empresas congregadas pela arguente (na verdade, todas as empresas do ramo de distribuição) sob o argumento de que a arguida possuiria o monopólio postal absoluto e, assim, toda e qualquer correspondência, seja ela uma lista telefônica, uma conta de luz ou uma encomenda, estaria sob o conceito de carta, ou seja, papel escrito metido em envoltório fechado, que se envia de uma parte a outra para comunicação entre pessoas distantes; manuscrito fechado com endereço (Dicionário Brasil Contemporâneo)” (folha 10). Aponta-se como objetivo único de tal empreitada a eliminação da livre concorrência e do primado da iniciativa privada, buscando–se o desempenho exclusivo e a liberdade total de preços. Assevera-se que somente se tem monopólio nas atividades taxativamente referidas no artigo 177 da Constituição Federal e que as decisões sobre o tema vêm variando, ora concluindo o Judiciário pela existência do monopólio postal, ora pela necessidade de manutenção do serviço postal. As empresas de distribuição estariam sob ameaça de fechamento, muito embora prestando serviços de qualidade, a preços competitivos, gerando empregos e recolhendo impostos, tudo ocorrendo com a aprovação dos entes federativos.”

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Federal de 1988, daí a proposição de uma ADPF, em que os pedidos foram:

(i) reconhecimento de uma situação de violação da livre iniciativa, livre

concorrência, e livre exercício de qualquer trabalho, perpetrados pelos atos

da ECT na qualidade de representante do Poder Público; (ii) declaração de

inconstitucionalidade da Lei nº 6.538/78, especialmente no que tange à

previsão de monopólio de entrega de correspondências; e (iii) declaração

pelo STF do que se entendia por carta, restringindo tal conceito à missiva

particular e confidencial sem qualquer caráter comercial, esta sim, segundo a

ABRAED, devendo permanecer como prerrogativa do Estado, em regime de

exclusividade.

Em sua manifestação escrita e juntada aos autos, a ECT, por

intermédio da AGU (acompanhada pelo MPF), utilizou-se basicamente de

argumentos formais e doutrinários no sentido de que, assumindo prestar

serviços públicos (e não atividades econômicas), estaria fora do alcance das

regras de livre mercado previstas na Constituição (Art. 173). Em outras

palavras, argumentou que a Constituição teria, tacitamente, previsto o

monopólio dos serviços postais e, portanto, recepcionado as leis

anteriores.350

Extra-autos (i.e., em sede de memoriais e audiências com os Ministros

do STF), acredita-se ter a ECT, para convencer o STF, se valido do

argumento de que para a prestação universal dos serviços postais, seria

imprescindível contar com as receitas extraordinárias decorrentes dos

segmentos mais lucrativos do mercado postal, quais sejam, transporte de

correspondências comerciais, bens e valores. Além desse argumento,

acredita-se que tenha também utilizado-se de sua reputação para a garantia

da segurança e privacidade, tudo em prol do interesse social.351

                                                                                                                         350 Conforme manifestação da AGU (fls.978 e ss.) dos autos da ADPF 46-7/DF. No mesmo sentido, manifestou-se o MPF (fls. 1032 e ss.). Disponíveis em: <http://redir.stf.jus.br/estfvisualizadorpub/jsp/consultarprocessoeletronico/ConsultarProcessoEletronico.jsf?seqobjetoincidente=2182784>. Acesso em 11 Mar. 2011. 351 Como as decisões em sede de controle concentrado de constitucionalidade não necessitam aprofundar-se nos motivos (materiais), segundo a legislação que regulamenta tais medidas (Lei n. 9.868/1999 e Lei n. 9.882/1999), bem como diante do histórico de argumentos utilizados em diversos casos pela ECT, presume-se que a ECT tenha se valido de tais argumentos, estrategicamente não colocados nos autos, mas sim em audiências e memoriais entregues aos Ministros (os quais, embora possuam força persuasiva, igualmente costumam não ser juntados aos autos).

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A ação tramitou no STF durante quase seis anos. Nesse período,

entre pedidos de vistas, adiamentos, alteração de votos e confusos debates

no Plenário, a ECT continuou exercendo suas atividades protegida pelo

monopólio legal. Ao final do julgamento, o STF, por maioria de votos,

declarou a improcedência dos pedidos da ABRAED, mas ainda deixou

dúvidas quanto à interpretação do monopólio postal que foi consagrada pelo

Tribunal, restando o questionamento acerca dessa decisão: a jurisprudência

constitucional avançou ou retrocedeu nesse sentido?

Adiante, analisar-se-á alguns pormenores dessa decisão, que muito

movimentou o cenário jurídico e político nos últimos anos. Numa primeira

análise, pode-se dizer que a questão dificilmente será pacificada por esse

resultado. Os Ministros não proferiram votos que dialogassem uns com os

outros e isso possivelmente provocou um resultado no mínimo confuso, como

os próprios debates no Plenário demonstraram. Em outras palavras, não se

debateu com profundidade se o modelo de monopólio legal exercido por

empresa estatal é realmente consistente com a Ordem Econômica vigente.

Adentrando na análise do julgamento propriamente dito, adianta-se

que três correntes formaram-se no Tribunal ao longo desses quase seis

anos. As três serão aqui abordadas, destacando-se o Ministro que melhor

expressou cada umas delas. A primeira é adotada exclusivamente pelo

Ministro Marco Aurélio. Tendo sido voto vencido e solitário, ele declarava a

procedência total da ADPF.

A segunda corrente, formada pelos Ministros Celso de Mello, Gilmar

Mendes e Ricardo Lewandowski, declarava a procedência em parte. O voto

do Ministro Gilmar Mendes é o que mais claramente afirmou os termos dessa

procedência parcial.

A terceira e vencedora posição compôs-se dos votos dos Ministros

Eros Grau, Ellen Gracie, Cármen Lúcia, Joaquim Barbosa, Cezar Peluso e

Carlos Ayres Britto. Os termos do voto do Ministro Eros Grau, o qual

inaugurou a divergência em relação ao primeiro relator (Ministro Marco

Aurélio) foram acompanhados pelos outros, tendo ele inclusive se tornado

relator para o acórdão do julgamento. Dessa forma, analisar-se-á os

argumentos desse voto, como representante da corrente majoritária do

Tribunal.

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Por fim cabe esclarecer que será atribuída alguma atenção

diferenciada ao Voto do Ministro Britto, pois, apesar de se enquadrar na

corrente dos vencedores, o Ministro havia proferido um primeiro voto em

outros termos, mas, ao esclarecê-lo ao final do julgamento, acabou

produzindo efeito diverso, o que foi determinante ao resultado final da

votação, que até então estava empatada.

Como dito, a ação foi proposta em Novembro de 2003. O julgamento

iniciou-se em 15 de Junho de 2005 com o voto do Ministro Relator original,

Marco Aurélio, pela procedência total da ADPF, ou seja, declarando a não

recepção do monopólio postal pela Constituição de 1988, em qualquer de

seus termos. Em seguida, o Ministro Eros Grau proferiu seu voto inaugurando

a divergência, ao declarar a improcedência total e assim, a recepção do

monopólio. O julgamento então foi interrompido pelo pedido de vista do

Ministro Joaquim Barbosa.

O Ministro Marco Aurélio proferiu um voto extenso e profundo,

atentando para diversos fatores que permeiam a discussão sobre o

monopólio postal. Tratou-se de voto com muitas considerações históricas,

tanto no que tange à prestação material de serviços postais, como ao seu

tratamento pelas Constituições Brasileiras. Afirmou o Ministro que se o

serviço postal já foi considerado um serviço público, o foi por absoluta

impossibilidade de as empresas privadas o prestarem, o que dialoga com o

conceito econômico de serviço público adotado neste trabalho. Nesse

sentido, apela o Ministro para uma evolução na interpretação constitucional

de forma a manter a Carta de acordo com seu tempo e afirma que, no

contexto atual, as características dos serviços postais impedem que o verbo

“manter” inscrito na Constituição seja interpretado como sustentáculo de um

monopólio.

Continua o Ministro, afirmando que em sendo clara atividade

econômica, os serviços postais não poderiam ser monopolizados senão pela

própria Constituição, o que não foi feito como demonstra o Artigo 177. Desse

modo, a lei infraconstitucional que limita a iniciativa privada para monopolizar

uma atividade que pode ser prestada por particulares não pode ter sido

recepcionada pela CF/88. Marco Aurélio ainda tece considerações teóricas

sobre a reforma do Estado brasileiro e seu gradativo afastamento da

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condição de prestador direto de atividades, para tornar-se ente regulador e

fiscalizador das mesmas, atuando apenas de forma subsidiária. E afirma ser

essa a maneira mais eficiente de prestar serviços à população. Essa posição

dialoga muito bem com a experiência Européia (Capítulo III) e com as

premissas da intervenção antitruste (Capítulo I).

Em corrente oposta, o Ministro Eros Grau se prende a uma análise

menos histórica e mais dogmática (i.e., doutrinária) da Constituição para

afirmar que, conforme demonstra o artigo 21, X e a extensa jurisprudência do

STF (a qual não foi especificada em seu voto), o serviço postal é serviço

público, não havendo que se falar em livre iniciativa e livre concorrência, pois

estes princípios estão fora da lógica de prestação de serviços públicos.

Afirma que não há violação ao Artigo 177, CF/88, pois o que se tem é

um regime de exclusividade e não de monopólio, na medida em que

monopólio é termo restrito a atividades econômicas. O Ministro afirma isso

mesmo diante do conteúdo de seu próprio livro, em que, ao conceituar

serviço público, sugere ser um tipo de atividade econômica preferencialmente

(e não exclusivamente) exercida pelo Estado.352

Percebe-se que o Ministro se apega à aparente “solução”

terminológica e classificatória do problema, ou seja, em sendo serviço

público, não há mais nada que se analisar. Tratar-se-ia de prestação

exclusiva do Estado, a não ser que a própria Carta tivesse previsto

expressamente a possibilidade de abertura à iniciativa privada, tal como fez

com saúde e educação. Se quanto aos serviços postais não existe essa

previsão, a exclusividade deveria ser mantida. Por fim, ao contrário da visão

de Estado transparecida pelo Ministro Marco Aurélio, Eros Grau afirma que a

atuação do Estado não pode ser subsidiária quando se trata de prestar

                                                                                                                         352 “Serviço público – dir-se-á – é o tipo de atividade econômica cujo desenvolvimento compete preferencialmente ao setor público. Não exclusivamente, note-se, visto que o setor privado presta serviço público em regime de concessão ou permissão. Desde aí poderemos afirmar que o serviço público está para o setor público assim como a atividade econômica está para o setor privado. (...) Ao afirmar que o serviço público é tipo de atividade econômica a ela atribuí a significação de gênero no qual se inclui a espécie, serviço público. Ao afirmar que o serviço público está para o setor público assim como a atividade econômica está para o setor privado, a ela atribuí a significação de espécie. Daí a verificação de que o gênero – atividade econômica – compreende duas espécies: o serviço público e a atividade econômica.” GRAU, Eros Roberto. A ordem econômica na Constituição de 1988. 6a ed. revista e atualizada. São Paulo: Malheiros, 2001, p.134.

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serviços públicos. Enaltece a exigência de um Estado forte e atuante para

cumprir com os preceito constitucional da existência digna.

Como dito, o Ministro Eros Grau inaugurou a divergência em plenário,

tendo sido acompanhado por diversos ministros posteriormente. Seu voto e o

do Ministro Marco Aurélio representam as duas principais formas de abordar

e resolver a questão do monopólio postal, sendo todas as outras apenas

variações dessas duas. Daí a preocupação deste trabalho em pormenorizar

os termos desses dois pronunciamentos.

Retomado o julgamento em 17 de novembro de 2005, os Ministros

Joaquim Barbosa e Cezar Peluso votaram pela improcedência da ação, na

linha do voto de Eros Grau. Em seu voto, todavia, o Ministro Joaquim

Barbosa reconheceu não fazer sentido manter-se a exclusividade da ECT

para o mercado de cartas comerciais, tendo, contudo, entendido que isto

seria matéria a ser resolvida em plano infraconstitucional. Nota-se também no

voto do Ministro certa influência dos argumentos da universalização

provavelmente colocados pela ECT em sede de memoriais, dado que

expusera o Ministro certo receio de que, caso eliminado o monopólio legal, as

empresas privadas só estariam interessadas em participar dos segmentos

mais lucrativos (nos grandes centros urbanos), deixando as regiões menos

desenvolvidas sem a devida cobertura.353

Também votaram nesse momento os Ministros Carlos Britto e Gilmar

Mendes, inaugurando uma terceira possibilidade de decisão, que foi a

procedência parcial da ADPF. Nesse primeiro pronunciamento, o Ministro

Britto declarou o serviço postal como um serviço público de prestação

exclusiva da União, ressalvadas, contudo, as comunicações de caráter

eminentemente mercantil, as quais poderiam ser abertas às empresas                                                                                                                          353 “Barbosa afirmou que não é mera faculdade do poder público colocar o serviço postal à disposição da sociedade, que deve ter acesso irrestrito ao serviço. Salientou que as empresas privadas querem atuar no setor mais lucrativo e se restringem aos grandes centros urbanos, não alcançando municípios pequenos e distantes. O Ministro ressaltou que a possibilidade de quebra do regime de monopólio em relação ao serviço especial de entrega de correspondência comercial deve ser tratado pelo legislador ordinário, a quem cabe estabelecer as hipóteses de prestação desse serviço pela iniciativa privada por meio de contratos de concessão e permissão. “Não cabe a esta Corte substituir o papel do legislador e fixar as formas de prestação desse serviço”, concluiu Barbosa”. DUARTE Jr., Ricardo Ferreira. Serviço Postal: Serviço público ou atividade econômica? Revista Âmbito Jurídico. Disponível em: <http://www.ambito-juridico.com.br/site/index.php?n_link=revista_artigos_leitura&artigo_id=6746> Acesso em: 2 Mai. 2011.  

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privadas. Veja-se, assim, que o Ministro Britto (de certa forma semelhante,

nos motivos, ao Ministro Joaquim Barbosa), num primeiro momento declarou

a recepção parcial da Lei nº 6.538/78, interpretando-a de forma que o

monopólio da ECT só seria mantido em relação as correspondências

privadas ou não comerciais (i.e., cartas simples, cartões-postais etc.) e

comunicação telegráfica.

É possível notar nesses pronunciamentos (i.e., dos Ministros Barbosa

e Ayres Britto) uma tendência, ao menos no tocante às razões para a reserva

legal de uma dada atividade econômica, de reconhecer a existência de

interesse privado suficiente para operar as correspondências comerciais em

bases eficientes de mercado – o que corresponde à idéia de que o Estado

deveria intervir apenas no setor onde houvesse certa falha de mercado (i.e.,

no caso o monopólio natural – subjacente à idéia de serviço universal).354

Pergunta-se: teria o tema recebido decisão diversa por parte de tais Ministros

caso ficasse evidente que não há falhas de mercado e, logo, não há

preocupação factível quanto à universalização dos serviços postais

integralmente considerados (tanto as cartas / correspondências simples

quanto comerciais) e que, fossem empresas privadas responsáveis pelos

serviços postais, diversas externalidades negativas (como efeitos decorrentes

de corrupção, favorecimentos, superfaturamentos etc.) poderiam ser

eliminadas? Acredita-se que a resposta é positiva.

Também pela procedência parcial votou o Ministro Gilmar Mendes,

declarando a não-recepção somente dos artigos 42, 43, 44 e 45 da lei

impugnada, os quais tipificavam penalmente a atividade das empresas

privadas, criminalizando a violação ao monopólio postal da União. Nesse

momento, com um voto pela procedência total, dois pela procedência parcial                                                                                                                          354 “Carlos Ayres Britto afirmou que a atividade exclusiva da União garante a integração nacional e o sigilo das correspondências. Por outro lado, questionou o que viria a ser realmente a correspondência epistolar a que se quer proteger. Ayres Britto afirmou que seu conceito de carta ‘não é reducionista’, pois abrange as correspondências comerciais, por exemplo. Para ele, está excluída do conceito de serviço postal a entrega de impressos (periódicos, por exemplo) e de encomendas e, portanto, esses itens ficariam fora do privilégio dos Correios. Contudo, ele reconheceu estar mais alinhado à corrente que votou pela improcedência do pedido da ADPF porque acredita ‘no Estado como carteiro entre o emissor e o destinatário da mensagem’.” DUARTE Jr., Ricardo Ferreira. Serviço Postal: Serviço público ou atividade econômica? Revista Âmbito Jurídico. Disponível em: <http://www.ambito-juridico.com.br/site/index.php?n_link=revista_artigos_leitura&artigo_id=6746> Acesso em: 2 Mai. 2011.  

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e três pela improcedência, o julgamento foi novamente suspenso, após

pedido de vista de Ellen Gracie. A Ministra Ellen Gracie proferiu seu voto já

em 12 de junho de 2008, acompanhando a corrente da improcedência da

ação, para declarar recepcionado o monopólio da ECT. Mais uma vez o

julgamento é interrompido por novo pedido de vista, dessa vez do Ministro

Menezes Direito.

Com retomada em 03 de agosto de 2009, nesta sessão o Ministro

Gilmar Mendes reajustou seu voto, e foi além da não recepção da parte do

monopólio referente aos tipos penais para declarar interpretação da Lei nº

6.538/78 no sentido de que só incidiria no monopólio as cartas, cartões-

postais e correspondências agrupadas, nos termos do art. 9º da mesma,

excluindo de seu alcance a distribuição jornais, livros e quaisquer periódicos,

bem como de boletos em geral (boletos bancários, contas de luz, de água

etc.). Os Ministros Ricardo Levandowski e Celso de Mello acompanharam a

interpretação dada por Gilmar Mendes.

Na mesma linha dos comentários feitos aos votos dos Ministro

Joaquim Barbosa e Carlos Ayres Brito, infere-se que o posicionamento de

tais Ministros (Gilmar Mendes, Ricardo Levandowski e Celso de Mello) pela

procedência parcial da ADPF, no tocante às “correspondências comerciais”,

tenha sido motivada pela idéia subjacente à clara matriz concorrencial que

reveste tais serviços e, aparentemente, não revestiria os demais, i.e., cartas

simples, cartões postais etc., pois que estariam as correspondências não-

comerciais “contaminadas” pelos argumentos da universalização, da

segurança e privacidade, o que provavelmente influenciara os Ministros.

Em seguida, mais uma vez demonstrando-se sensibilizado pela

ausência de razões econômicas para se preservar a reserva legal para os

serviços postais atrativos na perspectiva do setor privado – sobre os quais os

argumentos da segurança e privacidade não encontravam eco -, o Ministro

Britto também reajustou seu voto, para excluir do monopólio legal a entrega

de impressos como jornais, revistas e outros periódicos (sem contanto

detalhar as contas de telefone, água, luz etc.). Com esse pronunciamento

seu voto manteve-se na corrente da procedência parcial. Em seguida votou a

Ministra Carmen Lúcia, julgando a ação improcedente nos termos da corrente

inaugurada por Eros Grau. Com a declaração de suspeição pelo Ministro

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Menezes Direito, neste momento todos os votos já haviam sido proferidos,

mas a declaração do resultado ficou para sessão posterior. Chegado o

momento de tal declaração, em 5 de agosto de 2009, os votos proferidos

agrupavam-se da seguinte forma:

Tabela I

Improcedência Procedência Parcial Procedência total

Eros Grau Gilmar Mendes Marco Aurélio

Joaquim Barbosa Lewandowski

Cezar Peluso Celso de Mello

Ellen Gracie Carlos Britto

Carmen Lúcia

Lembrando que, nesse momento, improcedência significava recepção

total do monopólio postal; procedência parcial implicaria em recepção, com

exceção das chamadas “correspondências comerciais”; e procedência total

significaria a declaração de total inconstitucionalidade da lei que instituía o

monopólio da ECT e, portanto, não recepção do diploma pela Constituição de

1988.

Deu-se, contudo, um grande impasse no momento da declaração do

resultado, a ponto de os Ministros não saberem, ao final do julgamento, quais

seriam os efeitos concretos da decisão; e mais, qual teria sido a corrente

vencedora no plenário: a procedência, improcedência ou procedência parcial.

Explica-se: ao fazer o pedido na petição inicial, a ABRAED, como já referido,

requereu a declaração de inconstitucionalidade da Lei nº 6.538/78, pedindo

ao Tribunal que declarasse ainda o que entendia por “carta”. Desejava a

associação que fosse dada interpretação restritiva ao conceito de carta de

forma a excluir expressamente desse conceito as correspondências de mala-

direta, revistas, jornais e periódicos, encomendas, contas de luz, água e

telefone, cartões de crédito e cheques. Afirmou ainda a ABRAED que por

motivos de segurança e privacidade, o que restasse abarcado no conceito de

carta continuaria como prerrogativa da União. Assim, se procedente a ação, o

STF estaria afirmando um conceito de carta delimitado como papel escrito,

metido em envoltório fechado, selado, que envia de uma parte a outra, com

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conteúdo único, para comunicação entre pessoas distantes contendo

assuntos de natureza pessoal e dirigido, produzido por meio intelectual e não

mecânico.355

Tendo em vista os pedidos da ABRAED, formou-se o desentendimento

no Plenário, conforme demonstram os debates em torno dos termos e

alcance dos votos, principalmente daqueles da corrente da procedência

parcial. A Ministra Ellen Gracie dá início ao debate, ao relembrar os Ministros,

inclusive em tom de crítica à ABRAED, alegando que, sob o pretexto de

questionar a inconstitucionalidade da Lei nº 6.538/78, pretendia obter uma

interpretação do conceito de “carta” que lhe fosse favorável, ou seja,

excluindo as correspondências mercantis que lhe dão lucro, e mantendo só

as missivas pessoais, nas quais não tem interesse comercial.

Independentemente de o pedido ser criticável ou não, era exatamente isso

que constava na petição da ABRAED, de forma que a procedência ou

improcedência da ação dependia estritamente da interpretação e

abrangência que o STF daria ao conceito de “carta”.

Nesse sentido, em última análise, a contabilização dos votos deveria

levar em conta essa interpretação, atentando para o fato de ela incluir ou não

as correspondências comerciais no monopólio postal. Voltando à Tabela I da

página anterior, observa-se que neste momento, o julgamento estaria

empatado, pois tanto a corrente da procedência parcial, como o

posicionamento do Ministro Marco Aurélio (procedência total) levariam à

interpretação restrita do conceito de “carta”, conforme desejava a

Associação, restando assim procedente a ADPF. Desse modo, ao longo dos

debates, atentou-se para a seguinte situação:

                                                                                                                         355 Conforme pedidos da ABRAED na petição inicial, p.36, ver BRASIL. Supremo Tribunal Federal (STF). Arguição de descumprimento de Preceito Fundamental n.º 46-7. Arguente: Associação Brasileira das Empresas de Distribuição. Arguido: Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos. Relator: Ministro Marco Aurélio. Brasília, 15 de junho de 2005. Disponível em: <http://redir.stf.jus.br/estfvisualizadorpub/jsp/consultarprocessoeletronico/ConsultarProcessoEletronico.jsf?seqobjetoincidente=2182784>. Acesso em 11 Mar. 2011.

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Tabela II

Improcedência: para uma

interpretação ampla de carta,

mantendo-se o monopólio tal como

definido na lei nº 6.538/78:

Procedência: para uma interpretação

restritiva do termo carta, excluindo as

correspondências comerciais do monopólio

da ECT:

Eros Grau Gilmar Mendes

Joaquim Barbosa Lewandowski

Cezar Peluso Celso de Mello

Ellen Gracie Carlos Britto

Carmen Lúcia Marco Aurélio

Tendo em vista esse cenário o debate prossegue. Embora a maioria

tenha, em princípio, concordado em restringir os limites da reserva legal aos

serviços postais não comerciais, alguns deles acabaram por alterar seus

posicionamentos em razão de, com o resultado, beneficiar a ABRAED. De

fato, as empresas privadas associadas à ABRAED seriam beneficiadas com

a eliminação da reserva legal sobre as correspondências “comerciais”.

Contudo, mais que a ABRAED, tal decisão permitiria a aplicação do regime

concorrencial sobre os serviços postais “comerciais”, possibilitando, via de

consequência, os efeitos positivos da concorrência como um todo, não

apenas relacionado à ABRAED, mas abrangendo os potenciais entrantes e,

principalmente, os consumidores (tal como detalhados no Capítulo I).

Infelizmente, isso não foi levado em consideração pelos Ministros na decisão

da ADPF 46-7/DF (o que não impede o seja em futura apreciação da

matéria). Em última análise, é somente depois de proferidos os 10 votos que

os Ministros definem de forma clara e homogênea o que afinal estavam

decidindo.

Particularmente, o Ministro Carlos Britto reflete essa falta de consenso

sobre os termos da decisão. Questionado sobre os limites de sua

interpretação, após reajustar o voto para excluir do conceito de carta os

jornais, revistas e periódicos, o Ministro declara que os boletos de pagamento

estariam incluídos no que considera serviço postal. É nesse instante que

esclarece que, quando proferiu voto pela recepção parcial da Lei nº 6.538/78,

mediante exclusão das correspondências de caráter estritamente mercantil,

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queria dizer somente exclusão dos jornais, revistas e periódicos e não dos

boletos bancários, contas de luz, água etc. Não fica expresso no voto do

Ministro, bem nas discussões em plenário, as razões para essa mudança

significativa de posicionamento. Todavia, isto provavelmente resultara de

memoriais entregues pela ECT, nos quais deve ter defendido a manutenção

da reserva legal nas correspondências ditas “comerciais” para subsidiar a

universalização do acesso aos demais serviços postais em todo território

nacional. Arrisca-se tal inferência pois, embora esse argumento não tenha

sido abertamente colocado na ADPF, é utilizado largamente pela ECT nas

diversas ações que promove em todo o território nacional para a manutenção

e ampliação do monopólio postal. Esse argumento é muito persuasivo se

verdadeiro fosse, pois uma decisão no sentido de eliminar a reserva legal dos

serviços postais “lucrativos” invariavelmente eliminaria a universalização do

acesso aos rincões do Brasil, isto é, à população mais pobre.356

Ocorre que, esclarecido o “impasse”, vem à tona no Plenário o fato de

que jornais, revistas e periódicos nem eram objeto de discussão, na medida

em que eles já não faziam parte do monopólio legal na acepção da própria

ECT. Com isso a classificação dos votos é novamente alterada. Se o Ministro

Britto não queria excluir do monopólio as correspondências comerciais, de

forma que reduzisse o conceito de “carta” apenas às missivas particulares,

então ele se alinhava à corrente da improcedência da ação. Isso porque,

como resultado prático de seu voto, o monopólio permaneceria da mesma

forma, isto é, plenamente válido. Chegaram então os Ministros finalmente a

um acordo sobre os termos dos votos de cada um. Alterada a classificação

do voto de Britto, restou o seguinte resultado final:

Tabela III

Improcedência Procedência Parcial Procedência total

Eros Grau Gilmar Mendes Marco Aurélio

Joaquim Barbosa Lewandowski

Cezar Peluso Celso de Mello

Ellen Gracie

                                                                                                                         356  Mais sobre essas ações será visto no Capítulo V.  

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242  

Carmen Lúcia

Carlos Britto

E, assim, foi decidida a ADPF 46-7/DF, vencendo a corrente que, ao

interpretar o serviço postal como um serviço público, manteve a exclusividade

da ECT na sua prestação, nos termos da Lei nº 6.538/78, alterando-se

apenas os dispositivos referentes à criminalização das condutas das

distribuidoras privadas, por meio de interpretação conforme. Nesse sentido,

veja-se o dispositivo do acórdão:

Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministro do Supremo Tribunal Federal, em sessão Plenária, sob a presidência do Senhor Ministro Gilmar Mendes, na conformidade da ata de julgamentos e das notas taquigráficas, por maioria de votos, em julgar improcedente a arguição de descumprimento de preceito fundamental. O tribunal ainda deu interpretação conforme ao artigo 42 da Lei 6.538/78 para restringir a sua aplicação às atividades postais descritas no artigo 9º do referido diploma legal. Brasília, 5 de agosto de 2009.357

De maneira geral, a decisão não representou um avanço para o

desenvolvimento dos serviços postais, bem como para o aumento do bem-

estar social, dado que os limites do monopólio postal no Brasil foram

mantidos tal qual estabelecidos no período ditatorial. Ao que parece, tudo fica

como estava antes, conforme pretendido pela ECT, tirando o fato de que as

empresas privadas, isto é, seus executivos, não podem mais ser punidos

penalmente por qualquer violação ao monopólio. Assim, o STF teve a chance

de esclarecer e pacificar uma questão crucial na construção de um conceito

contemporâneo de serviço público. O debate acerca do monopólio dos

serviços postais insere-se num contexto de reforma do Estado e da

emergência de cada vez mais novas, dinâmicas e complexas relações de

                                                                                                                         357 Conforme acórdão publicado em 19/08/2009, ver BRASIL. Supremo Tribunal Federal (STF). Arguição de descumprimento de Preceito Fundamental n.º 46-7. Arguente: Associação Brasileira das Empresas de Distribuição. Arguido: Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos. Relator: Ministro Marco Aurélio. Brasília, 15 de junho de 2005. Disponível em: <http://redir.stf.jus.br/estfvisualizadorpub/jsp/consultarprocessoeletronico/ConsultarProcessoEletronico.jsf?seqobjetoincidente=2182784>. Acesso em 11 Mar. 2011.

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direito administrativo, as quais põem em cheque as classificações e conceitos

clássicos da matéria.

Seja como for, apesar do resultado, nota-se que a maioria dos

Ministros se mostrou sensível aos argumentos econômicos que permeiam o

tema e que, frise-se, não poderiam deixar de ser considerados para a melhor

interpretação e aplicação da Constituição de 1988. Em uma visão

progressista da decisão, entende-se que o tema, se re-enfrentado pelo STF,

poderá (e deverá) receber abordagem distinta, caso desmistificados os

argumentos utilizados pela ECT para sustentar até os dias de hoje sua

reserva legal de mercado, principalmente aquele relativo à necessidade de

obter lucros extraordinários em segmentos do mercado postal para subsidiar

a universalização – o que não corresponde à realidade conforme se pôde

experimentar em diversas jurisdições (Capítulos III e V).

4.6 Monopólio postal e corrupção no Brasil

Como apontado no Capítulo I, a política antitruste, de modo geral, é

uma poderosa ferramenta para combater a corrupção, pois implementa mais

transparência às práticas de mercado com vistas a eliminar tratamentos

discriminatórios. No Brasil, um país em pleno desenvolvimento, além dos

problemas naturalmente decorrentes da adoção do regime de monopólio para

os serviços postais, como a geração de ineficiências econômicas, prejuízos à

concorrência, aos incentivos à inovação por parte da indústria, à redução da

escolha dos consumidores etc., há também o fator “corrupção” que recai

sobre a ECT e seu “monopólio” dos serviços postais.

De certa forma, até semelhante aos EUA, o Brasil vem demonstrando

que o seu “monopólio postal” está entre uma de suas mazelas políticas e

sociais que caminham na “contramão” do desenvolvimento do país. Vários

são os escândalos de corrupção envolvendo a ECT, sobre os quais se realiza

breve abordagem a título meramente exemplificativo, pois seu estudo

aprofundado não compõe objeto deste trabalho. De qualquer modo, vale

observar um episódio específico para que seja possível inferir como a

aplicação de um regime de concorrência nos serviços postais brasileiros

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aliada ao fim da gestão estatal pode contribuir para a eliminação dessa

doença chamada “corrupção”.

Em maio de 2005, foi divulgado na rede televisiva nacional um vídeo

em que um então funcionário da ECT (então Chefe do Departamento de

Contratação dos Correios), Sr. Maurício Marinho, foi flagrado recebendo

propina (i.e., dinheiro ilícito) de empresários em troca de favores

administrativos junto à ECT. Esse evento desencadeou um dos maiores

escândalos de corrupção já presenciados no país. Tal funcionário da ECT era

aliado ao então deputado federal, Sr. Roberto Jefferson, ambos integrantes,

juntamente com outra série de pessoas da ECT, políticos, lobistas e

membros da União Federal naquela gestão, de um esquema de corrupção

que consistia, dentre outras finalidades ilícitas, em pagamentos regulares de

elevadas quantias em dinheiro, por parte da União aos parlamentares, a fim

de que estes últimos sempre se posicionassem, nos diversos processos

legislativos existentes, favoravelmente à União Federal.358

A ECT, empresa pública controlada integralmente pela União Federal,

portadora de lucros extraordinários e totalmente permeável à influência

político-partidária da gestão então vigente, foi utilizada como um dos

principais meios para concretizar tal esquema de corrupção. A relação

espúria que resultara em diversos crimes envolvendo a ECT, seus dirigentes

e empregados (contratados em bases de favorecimento pessoal e não

eficiência) deixa claro o equívoco de se preservar, na atualidade, a gestão

estatal de uma companhia e, sobretudo, não sujeitá-la ao regime privado de

livre concorrência. Esse efeito desastroso à sociedade não é exclusivo do

Brasil, mas antes fora verificado tanto na Europa quanto nos EUA, razão pela

qual defende-se a separação do Estado da gestão das empresas operadores

dos setores postais e sua gradual inserção no regime de livre concorrência.

Em decorrência da gestão estatal da ECT, tal como descrito nos

capítulos anteriores (principalmente nos Capítulos I e III), seus gestores

tinham mais incentivos para operarem de forma a maximizar o bem-estar

individual num ciclo vicioso de favorecimentos pessoais em prol da

                                                                                                                         358 REVISTA ÉPOCA. Entenda o escândalo do mensalão. Disponível em: <http://revistaepoca.globo.com/Revista/Epoca/0,,EDR78680-6009,00.html>. Acesso em: 6 Abr. 2011.

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manutenção do poder e de sua constante ampliação, que buscar lograr

melhores patamares de eficiência e qualidade em prol dos consumidores.

Esse claro desvio de finalidade da ECT ficou evidente nos relatórios

finais da Comissão Parlamentar Mista de Inquéritos (CPMI) da Câmara dos

Deputados, em que foram detalhadas as práticas da ECT, as quais, frise-se,

dificilmente existiriam no caso de não haver um monopólio legal dos serviços

postais exercido por uma empresa estatal. Diversos são os crimes

investigados e provados pela CPMI, os quais, ainda objeto de ações penais

várias ao longo do país, não constituem objeto deste trabalho.359 Contudo, é

possível observar uma linha comportamental da ECT, a qual decorre

diretamente do fato de deter monopólio legal para os serviços postais. Trata-

se do tratamento discriminatório na contratação de clientes e fornecedores

para os mais diversos tipos de serviços, como por exemplo, Rede Postal

Noturna, rede franqueada, serviços de informática, serviços de publicidade

etc.

Por ser a empresa monopolista do setor postal, tais contratações não

necessitaram obedecer a critérios de eficiência, qualidade e menor preço,

pois, invariavelmente, não haveria pressão competitiva nas fases posteriores

às contratações, de modo que, mesmo firmando contratos desvantajosos

para a estatal do ponto de vista puramente econômico, a ECT continuaria a

lograr “lucros” em razão dos preços de monopólio praticados junto aos

consumidores, paralelamente ao fato de fomentar o círculo pernicioso de

maximização do bem-estar individual de seus dirigentes. Como não há

necessidade de prestação de contas a acionistas, bem como distribuição de

dividendos, recolhimento de tributos etc., o resultado “positivo” no caixa da

ECT acabava por esconder um péssimo desempenho do ponto de vista

empresarial para a Companhia, sem contar os prejuízos sociais decorrentes

de seu perfil de atuação.

Embora tenham sido robustos os resultados da CPMI no tocante às

diversas espécies de favorecimento / tratamento discriminatório levados a

efeito pela ECT, a título de exemplo comenta-se o ocorrido com a Rede

                                                                                                                         359 BRASIL. Comissão Parlamentar Mista de Inquéritos (CPMI) dos Correios. Relatório Final aprovado por 17 votos a 4 em 05.04.2006 (Vol. I, II e III). Disponível em: <http://www.cpmidoscorreios.org.br/relatorios/Final%20Vol1.pdf>. Acesso em: 1 Mai. 2011.

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Postal Noturna (RPN), o qual evidencia como poderia ser diferente se a ECT

não detivesse o monopólio postal e fosse empresa privada submetida ao

regime de livre concorrência.

4.6.1 A corrupção na Rede Postal Noturna (RPN)

Como evidenciado ao longo do presente capítulo, a ausência de

propriedades de monopólio natural nos serviços postais pode ser observada

pela contratação de terceiros, da iniciativa privada, para a operação dos

serviços de logística e transporte de itens postais. Afora a possibilidade de

tais medidas com base nas leis da ditadura (Decreto Lei nº 509/1969 e Lei nº

6.538/1978), a ECT, de longa data, conta com a contratação de serviço

privado de transporte aéreo noturno de carga, mais conhecido como Rede

Postal Noturna (RPN).

Segundo o Relatório Final da CMPI “dos Correios”, esse serviço,

fundamental para a logística da operação da ECT, foi operado em bases

discriminatórias e de favorecimento de 2000 a 2005, de modo que as

licitações realizadas para a contratação de empresas privadas não foram

verdadeiras, isto é, apenas serviram para escamotear um conluio entre os

funcionários da ECT e seus comparsas do setor privado. Os contratos

firmados, segundo a CPMI, foram em sua maioria superfaturados. Veja-se

trecho das conclusões da CPMI sobre as investigações do ECT na RPN:

A competição, como demonstraremos neste Relatório, na verdade, não houve. O que se viu, efetivamente, e as investigações o demonstram à larga, foi uma articulação com vistas a promover fraude à licitação, um consórcio informal entre empresas que anunciam disputar um jogo que, observado de perto, é claramente de cartas marcadas.360

A RPN, caracterizada por contratos da ECT com empresas privadas

de transporte aéreo noturno, é vista como a base do sistema logístico da

ECT. A partir dessa modalidade de operação, é possível à ECT efetuar a

                                                                                                                         360  BRASIL. Comissão Parlamentar Mista de Inquéritos (CPMI) dos Correios. Relatório Final aprovado por 17 votos a 4 em 05.04.2006 (Vol. I, II e III). Disponível em: <http://www.cpmidoscorreios.org.br/relatorios/Final%20Vol1.pdf>. Acesso em: 1 Mai. 2011, p. 109.  

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entrega de correspondências e encomendas dentro do prazo, como é o caso

de um objeto postado ser entregue, no intervalo de um dia, entre quaisquer

das capitais dos Estados-membros do Brasil.

Antes da década de 1990, a ECT realizava contratações de empresas

privadas de aviação civil, sem licitação, para realizarem o transporte aéreo de

correspondências. A partir da década de 1990, por força de recomendação

do Tribunal de Contas da União (TCU), a ECT passou a realizar licitações

para a contratação de empresas aéreas para o transporte de cargas. As

principais linhas aéreas utilizadas pela ECT eram as linhas “A”

(Fortaleza/Salvador/Rio de Janeiro/São Paulo/Brasília/Manaus), “C”

(Manaus/Brasília/São Paulo/Rio de Janeiro/Salvador/Fortaleza) e “F”

(Recife/Salvador/São Paulo/Porto Alegre e volta). As linhas “A” e “C” foram

operadas pela Skymaster Airlines Ltda. (“Skymaster”) de junho/2001 a

abril/2005, e a linha “F”, pela Brazilian Express Transportes Aéreos Ltda.

(“BETA”) de julho/2000 a abril/2005. A CPMI concentrou-se no processo de

contratação de tais empresas privadas em razão de estarem envolvidas nas

denúncias veiculadas pela imprensa que originaram as investigações, bem

como pelo fato de deterem, no período investigado, os contratos de maior

faturamento junto à ECT, no segmento de transporte aéreo de carga postal.

Das investigações, constam indícios robustos de irregularidades na

contratação, pela ECT, de tais empresas para o transporte aéreo.

Especificamente, a CMPI levantou indícios de fraude à licitação,

superfaturamento de contratos, direcionamento de certames licitatórios,

corrupção ativa e passiva, formação de quadrilha e tráfico de influência

envolvendo dirigentes da ETC e representantes da Skymaster e da BETA.361

Diante de tais fatos, emerge a seguinte pergunta: caso fosse aplicado

o regime de livre concorrência sobre os serviços postais, haveria uma

redução, ou até eliminação, dos níveis de corrupção da ECT, dada a

necessidade de ser eficiente para concorrer com os agentes privados, bem

como de não contar mais com as rendas de monopólio para sustentar

políticos e esquemas relacionados? Obviamente, submetida ao controle                                                                                                                          361  BRASIL. Comissão Parlamentar Mista de Inquéritos (CPMI) dos Correios. Relatório Final aprovado por 17 votos a 4 em 05.04.2006 (Vol. I, II e III). Disponível em: <http://www.cpmidoscorreios.org.br/relatorios/Final%20Vol1.pdf>. Acesso em: 1 Mai. 2011, p. 110-111.  

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privado, bem como aos incentivos de uma empresa privada, num contexto de

regime de livre concorrência, haveria muito menos espaço para a prática de

corrupção.

4.7 Ampliação dos limites do monopólio postal para entrega de contas de consumo

Além dos problemas com corrupção, resultantes de favorecimentos e

tratamentos discriminatórios decorrentes da relação estatutária da ECT com

o Governo Federal, observa-se semelhante padrão comportamental ao que

foi observado na UE e nos EUA, no tocante à constante tentativa de ampliar

os limites de sua reserva legal, i.e., de seu monopólio postal, de modo a

maximizar seu bem-estar individual. O mais interessante é que a ECT utiliza

argumentos muito semelhantes aos argumentos que as empresas estatais da

Europa e dos EUA se valeram em referidos casos.362 Isto é, que é necessário

à ECT manter e ampliar seu monopólio postal (ainda que sacrificando novos

mercados) pois, somente assim, poderá manter a prestação universal dos

serviços postais.

Dentre as várias condutas levadas a efeito pela ECT, selecionou-se

aquela que mais exprime seu perfil comportamental e onde foi possível

observar a franqueza da argumentação desenvolvida pela estatal. Trata-se

da luta da ECT para manter o monopólio sobre o envio das contas de

consumo das empresas prestadoras para os consumidores.

4.7.1 Entrega de contas de consumo de água e esgoto

Tradicionalmente, as empresas prestadoras de serviços de água e

esgoto utilizam-se da ECT para o envio das contas de consumo aos

consumidores. Todavia, fruto do desenvolvimento tecnológico, tais empresas

desenvolveram um sistema pelo qual, ao realizar a leitura do consumo,

emitem simultaneamente a fatura ao consumidor. Esse sistema possibilitou

                                                                                                                         362 Nos EUA, caso Air Courier Conference of America v. American Postal Workers Union (1991). Na UE, casos CE v. Kingdom of Netherlands - PTT Post BV – 90/16/EEC (1989), CE v. Kingdom of Spain – Ordenanza Postal of 19 May 1960 – 90/456/EEC (1990), Régie des Postes v. Paul Corbeu (1993) e CE v. Slovenská Postá (2008).

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redução de boa parcela dos custos para a leitura e cobrança pelo consumo

dos serviços de água e esgoto, vez que um elo do processo produtivo passou

a ser desnecessário, i.e., não mais seria necessário à empresa prestadora de

serviços de água e esgoto adquirir material para a envelopagem das contas e

contratação da ECT para sua coleta e entrega, na forma de correspondência,

na residência do consumidor. Além da economia de custos, as empresas de

saneamento básico acabaram por resolver um problema que possuíam, qual

seja, a entrega das contas em lugares não cobertos pela ECT. Em suma,

com esse novo sistema, as empresas de saneamento básico

experimentariam uma clara economia de escopo ao utilizarem-se de seus

ativos para, de forma simultânea, realizar as atividades de leitura, cobrança e

(em alguns casos) recebimento dos pagamentos por parte dos consumidores,

na exata abrangência geográfica equivalente à cobertura dos serviços de

saneamento básico.

Contudo, se de um lado haveria claros efeitos positivos decorrentes da

eficiência da adoção dessa nova tecnologia, de outro, haveria uma

significativa perda de receita por parte da ECT, que deixaria

progressivamente de ser contratada pelas empresas de saneamento básico.

Dessa forma, com a finalidade de preservar as receitas provenientes do envio

de contas de consumo de água e esgoto, a ECT iniciou várias lides contra as

empresas de saneamento básico que passaram a adotar o novo sistema de

cobrança. Nos diversos casos, foi possível observar a mesma linha de

argumentação por parte da ECT.

Basicamente, a ECT alega que o serviço postal é um serviço público e

que a exclusividade de seu exercício fora recepcionada pela Constituição de

1988, razão pela qual, não poderiam as empresas de saneamento básico

utilizarem-se dessa inovação tecnológica, dado que não está prevista na

legislação como exceção à regra do monopólio postal. Para sustentar o

argumento de ser um serviço público, a ECT compara suas atividades à

emissão de moeda.363

                                                                                                                         363 “(...) imagine-se, por mais absurdo que se possa parecer, que alguém constituísse uma empresa (que não a Casa da Moeda) e “emitisse” moeda ilegalmente. Ora, tal qual é impensável esse acontecimento em relação à emissão de moeda, devendo ser prontamente proibido pelo Estado, também o é em relação ao serviço postal; tanto a emissão de moeda quanto o serviço postal têm fundamento constitucional no mesmo artigo e a violação de

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Além disso, a ECT utiliza-se do argumento de que qualquer mudança

que possa prejudicar sua atividade como monopolista implicaria prejuízo ao

erário público, na medida em a ECT é uma empresa pertencente ao Estado e

que, portanto, as tarifas auferidas com a entrega das contas de água

configuram receita pública, independentemente do fato do consumidor ter

acesso a uma tarifa menor pela prestação de serviços de saneamento

básico.

Em conjunto com o argumento da perda de receita pública a ECT

explora o principal argumento (utilizado praticamente em todas os processos)

de que é necessário preservar as receitas provenientes do serviço de entrega

de contas de consumo como correspondências para viabilizar a manutenção

da prestação do serviço universal nas regiões mais pobres do país (i.e.,

“locais mais remotos ou de menor interesse lucrativo”, segundo a

terminologia regularmente utilizada pela ECT). Em outras palavras, a ECT

argumenta que é imprescindível fazer subsídio-cruzado em razão de suas

reservas legais para que, somente assim, possa manter a prestação do

serviço universal.

A ECT ainda se vale, em caráter secundário, do argumento de que

estaria investida da missão de zelar pelos direitos fundamentais ao sigilo e

intimidade imanentes às correspondências, os quais prevaleceriam sobre o

interesse das empresas privadas em ingressar nesse mercado. Segundo a

ECT, abrir-se o mercado para todos significaria por em risco a vida privada

dos usuários do serviço postal. Isso mesmo diante do fato de que as contas

de água e demais papéis entregues são documentos abertos dirigidos ao

imóvel e não ao indivíduo (i.e., consumidor).

Como se pode observar, a ECT, tal como a USPS (caso Air Courier

Conference of America v. American Postal Workers Union - 1991), bem como

a Holanda (caso CE v. Kingdom of Netherlands - PTT Post BV – 90/16/EEC -

1989), a Espanha (caso CE v. Kingdom of Spain – Ordenanza Postal of 19

                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                           ambos é considerada CRIME. A única diferença é que o crime em relação à emissão de moeda tem uma pena bem mais acentuada.” Petição Inicial da Ação Ordinária 2008.61.00.020752-4, 5ª vara federal de São Paulo, p. 25. BRASIL. Tribunal Regional Federal da 3a Região. Ação Ordinária n. 2008.61.00.020752-4 - ECT v. SABESP. Disponível em: <http://www.trf3.jus.br/trf3r/index.php?id=26&op=Consulta&Processo=200861000207524&TFases=1>. Acesso em: 5 Mai. 2011.

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May 1960 – 90/456/EEC - 1990), a Bélgica (caso Régie des Postes v. Paul

Corbeu - 1993) e a República da Eslováquia (caso CE v. Slovenská Postá -

2008), envidou todos os esforços para ampliar sua reserva legal de modo a

impedir que as empresas de saneamento básico desfrutassem de ganhos de

escopo e, via de consequência, redução de custos face o desenvolvimento

de uma nova tecnologia (não prevista quando da outorga do Decreto Lei nº

509/1969 e da Lei nº 6.538/1978).

As decisões judiciais não são uniformes, porém já é possível observar

uma tendência do Poder Judiciário no sentido de rever a aplicação dos

argumentos históricos utilizados pela ECT. Em um dos casos, ECT v.

Companhia de Saneamento Básico do Estado de São Paulo – SABESP,364 a

decisão de primeira instância foi favorável à ECT, de modo a impedir que a

empresa de saneamento básico prosseguisse com a utilização do novo

sistema. O caso, contudo, ainda não recebeu posicionamento definitivo.

Por outro lado, nos casos: ECT v. Serviço Autônomo de Água e

Esgoto de Lagoa da Prata (SAAE),365ECT v. Município de Campo Belo

(MG),366ECT v. Departamento Municipal de Meio Ambiente e Saneamento

(DEMASA)367e ECT v. Águas e Esgotos do Piauí S/A (AGESPISA);368 as

decisões de primeira e segunda instâncias foram desfavoráveis à ECT,

indicando que:

(...) não viola o monopólio postal conferido à ECT a entrega diretamente aos contribuintes, por agente de empresas concessionárias de serviço público de distribuição de água e esgoto, de energia elétrica, ou, ainda, a entrega de carnês de cobrança do IPTU, por agentes municipais tendo em vista que tais ações não se inserem no conceito de serviço postal, de que trata o art. 9º da Lei nº 6.538/1978.369

                                                                                                                         364 BRASIL. Tribunal Regional Federal da 3a Região. Ação Ordinária n. 2008.61.00.020752-4 - ECT v. SABESP. 365 BRASIL. Tribunal Regional Federal da 1a Região. Apelação Cível n. 2005.38.00.026770-3/MG - ECT v. SAAE. 366 BRASIL. Tribunal Regional Federal da 1a Região. Agravo de Instrumento n. 2005.01.00.072574-4/MG - ECT v. Município de Campo Belo (MG). 367 BRASIL. Tribunal Regional Federal da 1a Região. Apelação Cível n. 2007.38.15.000129-8/MG - ECT v. Departamento Municipal de Meio Ambiente e Saneamento (DEMASA). 368 BRASIL. Tribunal Regional Federal da 1a Região. Apelação Cível n. 2000.40.00.003535-4/PI - ECT v. Águas e Esgotos do Piauí S/A (AGESPISA). 369 BRASIL. Tribunal Regional Federal da 1a Região. Apelação Cível 2005.38.00.026770-3/MG. ECV v. SAAE.  

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252  

Embora o fundamento jurídico utilizado na maioria dos casos para

negar os pleitos da ECT sejam formais, i.e., não se contesta a vigência do

monopólio legal dos serviços postais, em uma visão progressista dessas

decisões, pergunta-se: teriam os membros do Poder Judiciário da 1a. Região

tido semelhante reflexão que os Ministros do STF Joaquim Barbosa, Carlos

Ayres Britto e demais que contestaram, ao menos nos debates em plenário, a

aplicação da reserva legal para as correspondências comerciais (incluindo-se

contas de consumo)? A resposta é positiva e sugere que essa reflexão é

mais que intuitiva no contexto atual.

4.8 Considerações finais

As origens do monopólio postal no Brasil se aproximam das

verificadas em grande parte das jurisdições na UE e nos EUA: a necessidade

de integração nacional aliada à ausência de incentivos econômicos ao

desenvolvimento da comunicação por cartas (serviço postal) levaram os

Estados a financiarem a criação de seus respectivos sistemas postais. Com o

passar do tempo, as economias nacionais se desenvolveram, tal qual as

indústrias experimentaram significativa evolução tecnológica, passando a

atuação estatal direta no provimento dos serviços postais a ser questionada.

O interesse econômico dos serviços postais passou a ser

incontestável, de modo que, sucessivamente, muitos Estados passaram a

deixar de atuar diretamente (como prestadores de serviços) e passaram a

regular (uns por meio de regulação geral apenas – como na UE, nos dias de

hoje – e outros também com regulação setorial). Os resultados positivos da

eliminação das reservas legais nos mercados postais são evidentes e

abundantes em uma série de jurisdições (como se verá com mais substância

no próximo capítulo).

A Constituição Federal de 1988 contém a escolha feita pelo Poder

Constituinte pela vigência da regra geral da livre iniciativa (Art. 1º, IV), de

modo que as exceções, i.e., monopólios legais (Art.177) e regimes especiais

chamados “serviços públicos” (Art.175) foram expressamente previstos. Ou

seja, o contexto normativo para a atualização do ordenamento

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253  

infraconstitucional já está estabelecido para os serviços postais: regime de

livre iniciativa (Art.173).

Não se pode admitir a inclusão de exceções tácitas ou implícitas à

regra geral estabelecida pela Constituição. Operar de forma diversa seria

inaugurar caminho muito perigoso e dar espaço a arbitrariedades contrárias à

vontade do povo, expressa pelo Poder Constituinte. Afora essa questão

puramente hermenêutica, a experiência internacional aplicada ao histórico

comportamental da ECT e de seus funcionários demonstra que semelhantes

práticas contrárias ao interesse social vêm sendo perpetradas pela ECT, tal

qual o foram por empresas então estatais em outros lugares do mundo, como

por exemplo Alemanha, Holanda, França e EUA.

Além disso, problemas decorrentes da ingerência político-partidária

afetam constantemente a ECT e, via de consequência, os consumidores, que

acabam tendo que pagar a conta da ineficiência estatal na gestão dos

serviços postais. A ECT, à sua vez, sempre busca ampliar seu poder de

monopólio para mercados vizinhos aos serviços postais propriamente ditos,

em nítido exercício de seu principal incentivo (expresso na idéia de

maximização de seu bem-estar individual) de se manter sempre política e

economicamente forte.

Dessa forma, conclui-se o presente capítulo com um apelo para

deixar-se de lado questões puramente ideológicas e “místicas” (e.g., se

eliminar-se a reserva legal nos mercados lucrativos, os mercados não

lucrativos ficarão sem serviço postal, a privacidade é melhor garantida por

uma empresa estatal etc.), e passar-se a atentar para as evidências da

realidade nacional e internacional de modo a, honestamente, reconhecer o

contexto para aplicar-se a Constituição de 1988.

Não há mais espaço para se tomar decisões apenas em crenças

despidas de indícios de realidade. É chegada a hora de enfrentar-se a

questão da renovação do papel do Estado Brasileiro também no setor postal.

Em outras palavras, não se propõe aqui a “substituição do Estado pela

sociedade civil, vale dizer pelo mercado”, mas sim adequar-se a atuação do

Estado à forma e, principalmente, ao conteúdo da Constituição de 1988,

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resultado da expressão soberana do povo brasileiro.370

                                                                                                                         370 Em seu voto na ADPF 46-7/DF, o Ministro Eros Grau deixa bem claro a base ideológica sobre a qual construiu seu voto, a saber: “A proposta de substituição do Estado pela sociedade civil, vale dizer, pelo mercado, é incompatível com a Constituição e certamente não nos conduzirá a um bom destino.” BRASIL. Supremo Tribunal Federal (STF). Arguição de descumprimento de Preceito Fundamental n.º 46-7. Arguente: Associação Brasileira das Empresas de Distribuição. Arguido: Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos. Relator: Ministro Marco Aurélio. Brasília, 15 de junho de 2005. Disponível em: <http://academico.direito-rio.fgv.br/ccmw/images/d/d6/206_ADPF_46_-_Voto_Eros_Grau.pdf>. Acesso em 11 Mar. 2011, p.6.

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255  

CAPÍTULO V. RESULTADOS DA EXPERIÊNCIA INTERNACIONAL

“We are smarter than me!”371 Libert and Spector (2007)

5.1 Introdução

O conceito de um serviço público para o envio de documentos

desenvolveu-se gradualmente com o desenvolvimento da Europa após a

idade média. No Século XII, papéis de baixo custo (em oposição ao

pergaminho) passaram a ser utilizados. Mercadores venezianos

empreendedores, do Século XIV, organizaram um sistema privado de courier

para entregar documentos comerciais, ampliando a cobertura de seus

serviços para as regiões no interior da Alemanha. Após muitos anos de

repressão, observou-se, no período renascentista, o ressurgimento de trocas

de idéias acadêmicas / científicas. Monastérios e universidades, como a

Universidade de Paris, passaram a contar com seus próprios sistemas de

mensageiros. No Século XV, a disseminação de idéias experimentou uma

aceleração em razão da invenção da impressora por pressão com fontes

móveis (printing press with movable type). Os primeiros Estados nacionais

emergiram durante os Séculos XV e XVI, como França e Inglaterra. Como

parte do processo de consolidação de suas autoridades estatais (poder

político), as monarquias buscaram eliminar os serviços privados de

mensageiros, especialmente os internacionais, passando a adotar o sistema

de monopólios postais exercido pelo Estado. Ao mesmo tempo, para

viabilizar e apoiar o comércio, serviços estatais de courier (antes de utilização

exclusiva por parte dos reis) passaram a ser abertos à utilização privada.372

No Século XIX, o surgimento de novas tecnologias decorrentes da

Revolução Industrial fez com que muitas instituições tradicionais fossem

                                                                                                                         371   PINTSOV, L. A.; OBREA, A.; Postal reform and product innovation. Handbook of Worldwide Postal Reform. Edited by Michael A. Crew, Paul R. Kleindorfer, James I. Campbell Jr. Cheltenham, UK. Northampton, MA, USA. 2008, p. 176. Tradução livre: “’Nós’ somos mais espertos que ‘eu’”. 372 CREW, M. A.; KLEINDORFER, P. R.; CAMPBELL JR., J. I. Postal Reform: introduction. Handbook of Worldwide Postal Reform. Edited by Michael A. Crew, Paul R. Kleindorfer, James I. Campbell Jr. Cheltenham, UK. Northampton, MA, USA. 2008, p. 1.  

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256  

revistas e reformuladas, dentre as quais os serviços postais estatais. Em

1840, a Grã Bretanha reduziu e simplificou radicalmente as taxas postais,

bem como introduziu a prática do selo pré-pago (ou taxa postal pré-paga),

com tarifa uniforme, independentemente da origem e destino da

correspondência. Essa prática se disseminou na Europa fazendo com que,

pela primeira vez na história, o serviço postal ficasse acessível à grande

maioria das populações nos diversos países onde fora adotada. O volume de

cartas cresceu exponencialmente criando base para o desenvolvimento do

moderno, acessível e universal serviço postal, tal como hoje é conhecido.

Dessa forma, o serviço de correios se originou como função governamental e

assim permaneceu em grande parte dos países até recentemente. Por essa

razão histórica, não surpreende o fato de que os serviços postais estatais

funcionassem até recentemente como departamentos do Estado (i.e.,

burocracias governamentais) e não como empresas comerciais. A partir da

metade do Século XX, passou-se a observar reformas estatais para a

renovação dos serviços postais de modo a transformá-los em empresas

comerciais controladas pelo Estado, ao invés de departamentos estatais. A

reforma mais significativa nesse sentido foi observada nos EUA, com o Postal

Reorganization Act de 1970, quando foi criada a USPS.373 O Brasil

acompanhou esse movimento, transformando o Departamento de Correios e

Telégrafos na Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos (ECT), por meio

do Decreto Lei nº 509/1969, bem como estabelecendo a reserva legal da

ECT para operação exclusiva dos serviços postais, com a Lei nº 6.538/1978.

No final do Século XX, uma nova onda de inovação tecnológica

implicou significativas transformações nos setores de infraestrutura e

indústrias de rede bem como motivou uma redefinição dos papeis do Estado,

o qual foi gradualmente substituindo a estratégia de intervenção direta pela

regulação.374 Um dos setores em que essa transformação fica bem clara é o

setor de telecomunicações, ao qual o setor postal foi ligado desde o princípio.

                                                                                                                         373  CREW, M. A.; KLEINDORFER, P. R.; CAMPBELL JR., J. I. Postal Reform: introduction. Handbook of Worldwide Postal Reform. Edited by Michael A. Crew, Paul R. Kleindorfer, James I. Campbell Jr. Cheltenham, UK. Northampton, MA, USA. 2008, p. 1-2. 374 GABAN, Eduardo Molan. Regulação econômica e assimetria de informação. Revista do IBRAC, São Paulo, v. 9, n. 5, p. 97-167, 2002, p.99-106.  

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De forma semelhante ao setor de telecomunicações, o serviço postal

experimentou uma nova onda de mudanças, as quais visaram atribuir-lhe

ainda mais caráter empresarial, tendo em vista a melhoria do bem-estar dos

consumidores, afastando-se completamente a participação do Estado de sua

gestão. Acredita-se que os principais marcos dessa renovação dos serviços

postais possam ser atribuídos à UE, com o início, em 1988, da aplicação das

regras de concorrência do Tratado de Roma aos diversos serviços postais

nacionais (com a finalidade da criação de um mercado postal comunitário). A

partir de então, a renovação dos serviços postais se ampliou para várias

jurisdições, tendo-se como marcos os seguintes eventos: European Postal

Green Paper (1992); Australian Industry Commission Report (1992)375;

abolição do monopólio postal na Suécia (1993); privatização substancial da

Dutch Post Office (1994), na Holanda; adoção da European Postal Directive

97/67; publicação de uma data final para a eliminação total do monopólio

postal na Alemanha e a criação da agência reguladora do setor postal na

Alemanha com o Postreform III (1997); eliminação total do monopólio postal

na Nova Zelândia (1998); criação da agência reguladora do setor postal                                                                                                                          375 Esse documento reporta estudos e conclusões atingidas pela Australian Industry Commission, órgão ligado ao Governo Australiano, sobre a necessidade e possibilidade de modernização do setor postal, especificamente, com a eliminação das barreiras à concorrência, aumento das eficiências e a renovação do perfil da prestadora estatal dos serviços postais para uma empresa “profit-driven”, a saber: “There is substantial private involvement in providing mail services through mailing houses, document exchanges, and letterbox distribution networks. The courier and parcel services industry is operated largely by the private sector and is characterised by dynamic growth and few government imposed impediments. Most concerns about the efficiency of all these private sector activities stem from the fact they are affected by Australia Post’s operations. This report therefore examines closely the role and activities of Australia Post. It looks at options to improve the efficiency and quality of services provided by public and private sector operators. Australia is not the only country reviewing the provision of mail, courier, and parcel services. In a changing postal environment, the United Kingdom, Sweden, Canada, New Zealand, and the European Community are re-assessing the need for government involvement in, and regulation of, postal services. The terms of reference direct the Commission to identify those reforms which offer the greatest efficiency gains and those where early action is practicable. Changes which can be implemented within the existing legislative framework are typically those where early action is practicable. It is possible to implement these changes now. They would allow Australia Post to take maximum advantage of reform to date. However, in order to achieve greater gains, it is necessary to push the reform process further and change the legislative framework within which the industry operates. Only then will the full benefits of a dynamic, flexible, and innovative industry be realised.” AUSTRALIA. Industry Commission. Mail, Courier and Parcel Services. Report No. 28 of 30 October 1992. Australian Government Publishing Service. Canberra. Disponível em: <http://www.pc.gov.au/__data/assets/pdf_file/0005/6980/28mail.pdf>. Acesso em: 5 Mai. 2011.

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258  

Britânico com autoridade para eliminar totalmente o monopólio postal no UK

(2000); privatização substancial da Deutsche Post (2000); privatização do

serviço postal japonês, Japanese Post Office (2005); a Initial Public Offering

(IPO) do serviço postal austríaco, Österreichische Post (2007); adoção da

European Postal Directive 2008/6 fixando data para a eliminação de todos os

monopólios postais na UE (2008), sendo 2011 para a maioria dos países

(95%) e 2013 para os remanescentes; e o efetivo cumprimento da European

Postal Directive 2008/6 pela grande maioria dos países da UE (2010).376

Como se pode observar, o movimento de reforma dos serviços postais

em várias jurisdições seguiu o movimento de privatizações das indústrias de

rede. A premissa subjacente a tal movimento foi a de que a utilização das

forças de mercado bem como a adoção da matriz empresarial, ao invés de

estruturas burocráticas nos principais setores da economia tende, em um

contexto de livre concorrência, a gerar mais bem-estar social. Setores como

aviação civil, telecomunicações e energia lideraram a aplicação dessa

premissa, que se estendeu para outros setores da economia, em razão dos

resultados positivos observados nas primeiras experiências. O Brasil tem

acompanhado essa tendência.377

Empresas estatais detentoras de reservas legais experimentaram

privatização e eliminação das reservas legais controladas pelo estado, isto é,

deixaram de ser monopólios legais, dando espaço a novas formas de

regulação (como a defesa da concorrência / antitruste, defesa do consumidor

e as regulações setoriais), eliminação das barreiras à entrada e outras formas

de liberalização / abertura dos mercados, sempre com foco na melhoria do

bem-estar social, precisamente, dos consumidores. Os serviços postais

pareciam estar imunes a esse movimento, contudo, a necessidade crescente

de integrar os serviços postais a outros mercados, como o de logística

(transporte em geral), de comunicações eletrônicas, bem como o fato de

haver uma série crescente de meios alternativos de comunicação (fruto da

rápida evolução tecnológica) que passaram a rivalizar com o tradicional setor                                                                                                                          376 CREW, M. A.; KLEINDORFER, P. R.; CAMPBELL JR., J. I. Postal Reform: introduction. Handbook of Worldwide Postal Reform. Edited by Michael A. Crew, Paul R. Kleindorfer, James I. Campbell Jr. Cheltenham, UK. Northampton, MA, USA. 2008, p. 1-2.  377  CREW, M. A.; KLEINDORFER, P. R.; CAMPBELL JR., J. I. Postal Reform: introduction. Handbook of Worldwide Postal Reform. Edited by Michael A. Crew, Paul R. Kleindorfer, James I. Campbell Jr. Cheltenham, UK. Northampton, MA, USA. 2008, p. 1-2.  

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259  

postal, têm pressionado os serviços postais para a direção do regime de livre

concorrência.378

O único entrave que tem impedido que o regime concorrencial se

implemente nos mercados postais, proporcionando, assim, os benefícios dele

decorrentes, é a manutenção das barreiras artificiais à concorrência em tais

mercados (na maioria das vezes decorrentes da existência de monopólios

legais). Essas barreiras, além de impedir que tais mercados se desenvolvam

a contento (em benefício da sociedade), acabam por gerar efeitos reflexos

negativos em mercados vizinhos ou de certa forma relacionados aos

tradicionais mercados postais.

5.2 Lições da experiência internacional O contexto de abundância de interesse privado para o ingresso nos

mercados postais, bem como de tecnologias alternativas que rivalizam com o

tradicional serviço postal acaba por deixar as empresas estatais (despidas de

real objetivo de maximização dos lucros, sensíveis à ingerência político-

partidária e portadoras de uma série de privilégios) sem alternativas: elas

passam a lutar com as “armas” que possuem contra a concorrência. O

problema é que as “armas” que se valem as estatais, bem como as

finalidades pretendidas, nem sempre estão de acordo com o ordenamento

jurídico, principalmente se a pedra fundamental do sistema jurídico adotou

como regra geral o regime de livre concorrência, como o fez, por exemplo, a

União Européia e os EUA.

Observou-se ao longo da história dessas duas jurisdições uma série

de casos em que as empresas estatais titulares do monopólio postal

adotaram práticas prejudiciais à concorrência e que, ao final das respectivas

análises, foram entendidas como prejudiciais ao bem-estar social. Isto foi

observado em vários casos envolvendo diferentes empresas em diferentes

localidades, como bem explorado nos Capítulos II e III. Interessante é o fato

de que foi possível identificar-se semelhantes linhas comportamentais entre

                                                                                                                         378  CREW, M. A.; KLEINDORFER, P. R.; CAMPBELL JR., J. I. Postal Reform: introduction. Handbook of Worldwide Postal Reform. Edited by Michael A. Crew, Paul R. Kleindorfer, James I. Campbell Jr. Cheltenham, UK. Northampton, MA, USA. 2008, p. 1-2.  

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diferentes empresas estatais titulares de monopólios postais com a linha

comportamental da ECT, no Brasil. Nos países em que o bem-estar social é

valorizado no curto e médio prazos, os resultados dos casos serviram de

base para a reforma das legislações postais de modo a eliminarem-se as

reservas legais e, em muitos casos, também eliminar-se o controle estatal.

Nos EUA, onde o bem-estar social é mais valorizado no longo prazo e,

devido às particularidades políticas e sociais que revestem o caso norte-

americano (como bem explorado no Capítulo II), a experiência nos casos,

bem como a tradição antitruste não foram suficientes (pelo menos até o

momento) para alterar completamente o modelo de monopólio legal exercido

por empresa estatal.

Especificamente, algumas lições merecem destaque. Dado o histórico

de sua criação e desenvolvimento como parte integrante dos governos

nacionais, os serviços postais estatais possuem força política e social, na

maioria das vezes representada pelo grande número de pessoas que

emprega e pelo volume de capital que destina ao financiamento de políticos,

sendo que qualquer alteração de modelo não é simples. Tais forças políticas

e sociais, evidentemente, não se sobrepõem (nem se sobrepuseram) ao

bem-estar social que experimentaria (e de fato experimentou, em muitos

casos) a população, no caso de liberalização dos mercados postais. Assim,

grande parte do esforço verificado nos países que enfrentaram a questão

repousou na atualização e desmistificação de alguns argumentos históricos

que vinham sendo utilizados para preservar o regime original dos monopólios

postais, a partir do que foi possível implementar-se medidas que culminaram

com o fim do monopólio legal para os serviços postais.

5.2.1 Serviço universal não necessita de monopólio postal

O primeiro argumento histórico é o da necessidade da reserva legal

para a universalização dos serviços postais. Ele pode ser observado nos

EUA, no caso Air Courier Conference of America v. American Postal Workers

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Union (1991)379, bem como na UE, nos casos CE v. Kingdom of Netherlands -

PTT Post BV – 90/16/EEC (1989)380, CE v. Kingdom of Spain – Ordenanza

Postal of 19 May 1960 – 90/456/EEC (1990)381, Régie des Postes v. Paul

Corbeu (1993)382e CE v. Slovenská Postá (2008)383. Esse argumento

esconde (ou explicita) a necessidade de se permitir a prática de subsídios

cruzados para que uma região “rica” subsidie uma região “pobre” e, portanto,

o país desfrute de um serviço postal universal. Com o passar do tempo, e na

medida dos casos, percebeu-se que esse argumento era mais falacioso que

verdadeiro, não podendo ser aceito e aplicado de forma absoluta, chegando-

se à conclusão de que seria verossímil apenas para uma pequeníssima

parcela dos serviços postais (ditos desvestidos de interesse econômico) e

que, ainda que verdadeiro, não poderia contar com subsídios- cruzados, mas

com qualquer outra forma de custeio, menos prejudicial à sociedade.384

                                                                                                                         379  Como visto no Capítulo II (2.3), no caso Air Courier Conference of America v. American Postal Workers Union, o Chief Justice Rehnquist reconheceu que o Private Express Statutes poderia ser classificado como uma tentativa de coibir o desenvolvimento de um verdadeiro mercado no âmbito privado em nome da viabilização da prestação de um serviço universalizado e a preços uniformes. Segundo ele, o monopólio postal foi criado pelo Congresso norte-americano como uma forma de proteger as receitas do serviço postal público (leia-se, USPS) de modo a habilitá-lo a cumprir a sua missão. Para o magistrado, o monopólio legal impede que empresas privadas ofertem serviços em rotas postais de baixo custo (i.e., mais atrativas economicamente) a preços inferiores àqueles da USPS, deixando a esta última o ônus de arcar com as rotas de alto custo (i.e., menos atrativas) com meios insuficientes de cumprir seu mandato de prestação de serviço universal a preços uniformes em todo o território nacional, inclusive nas áreas mais remotas e menos povoadas. 380 Como visto no Capítulo III (3.2), no caso CE v. Kingdom of Netherlands - PTT Post BV – 90/16/EEC, as autoridades holandesas utilizaram o argumento de que sem as receitas provenientes do mercado de express mail, não seria possível perfazer a prestação de serviço universal. As autoridades holandesas não demonstraram nem provaram tal argumento, razão pela qual a CE não acolheu o argumento do serviço universal. 381 Como visto no Capítulo III (3.2), no caso CE v. Kingdom of Spain – Ordenanza Postal of 19 May 1960 – 90/456/EEC, as autoridades utilizaram-se do argumento de que o equilíbrio financeiro do serviço postal espanhol estaria ameaçado caso o mercado mais rentável – international express mail – fosse aberto à livre concorrência. As autoridades espanholas não demonstraram nem provaram tal argumento, razão pela qual a CE não acolheu o argumento do serviço universal.  382 Como visto no Capítulo III (3.3.1.1), no caso Régie des Postes v. Paul Corbeu, as autoridades belgas adotaram o mesmo argumento mas receberam decisão negativa da CE em razão de não terem provado/demonstrado que seria necessário manter a reserva legal para ofertar o serviço universal. 383   Como visto no Capítulo III (3.3.1.1), no caso CE v. Slovenská Postá, as autoridades eslovacas adotaram o mesmo argumento mas receberam decisão negativa da CE em razão de não terem provado/demonstrado que seria necessário manter a reserva legal para ofertar o serviço universal.  384 “It is generally agreed that the need to finance the USO [Universal Service Obligation] or expand into new markets does not justify the extraction of monopoly rents from captured mailers or the use of predatory pricing against competitors.” CREW, M. A.; KLEINDORFER, P. R.; CAMPBELL JR., J. I. Postal Reform: introduction. Handbook of Worldwide Postal

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262  

Isso porque, concluiu-se, as empresas estatais estavam se utilizando

dos subsídios-cruzados mais para prejudicar seus concorrentes em

mercados vizinhos que custear a universalização. Segundo as melhores

informações públicas disponíveis, todas as medidas regulatórias elaboradas

para fiscalizar-se a utilização de subsídios-cruzados mostraram-se

insuficientes para eliminar o problema. Isso ficou claro nos diversos casos

envolvendo a empresa alemã Deutsche Post e no estudo concluído pela

OCDE (1999).385

Por essas razões e diante da frequênte limitação de recursos por parte

das autoridades regulatórias em várias jurisdições, a lição extraída é a de

que, se há reserva legal, esta deve ater-se aos mercados ditos “desvestidos

de interesse privado” os quais não devem ser explorados pela mesma

empresa que explora os mercados ditos “lucrativos”. A questão que se coloca

é: haveria realmente tais mercados no Brasil? Em caso positivo, a

recomendação seria identificá-los por intermédio de estudos e, assim, realizar

licitação (por exemplo, no modelo de pregão por critério de menor preço)386

para sua cobertura. Outra lição da experiência internacional é que,

preservando-se a reserva legal, sempre haverá problemas concorrenciais

entre os players que operem dentro da reserva legal com aqueles que

operem no regime de livre concorrência, mesmo que submetidos os

prestadores de serviços postais, principalmente nos mercados reservados e

portadores de redes postais, à regras rígidas de transparência e não-

discriminação. Sejam estatais ou privadas, as empresas titulares de reservas

legais nos mercados postais tendem a discriminar rivais e a praticar

subsídios-cruzados.

                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                           Reform. Edited by Michael A. Crew, Paul R. Kleindorfer, James I. Campbell Jr. Cheltenham, UK. Northampton, MA, USA. 2008, p. 3. Aparte incluído no texto original. 385 Como visto no Capítulo III, casos DHL/Deutsche Post (1998), UPS v. Deutsche Post (março de 2001) e British Post Office (BPO) v. Deutsch Post (julho de 2001). 386 Pregão é a modalidade de licitação, realizada pelo critério de julgamento "menor preço", destinada à aquisição de bens e à prestação de serviços comuns, qualquer que seja o valor estimado da contratação, em que a disputa é realizada por meio de propostas e lances sucessivos em sessão pública. Para mais informações sobre Pregão, ver BRASIL. Governo do Estado de São Paulo. Secretaria de Gestão Pública. Regulamento da licitação na modalidade Pregão da FUNDAP – Fundação do Desenvolvimento Administrativo. Disponível em: <http://www.pregao.sp.gov.br/legislacao/portaria/portariafundap3.htm>. Acesso em: 5 Mai. 2011.  

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263  

Como possuem mais informações sobre os próprios custos que as

autoridades que as fiscalizam, não raras vezes poderão manipular os dados

a ponto de tornar as medidas regulatórias inócuas. De certa forma, essa

premissa foi a razão da grande maioria dos casos na UE durante a transição

dos regimes de monopólios legais para a livre concorrência (isto é, de 1989

até 2008), mesmo após a vigência da Diretiva 97/67.

5.2.2 Segurança e privacidade não decorrem da prestação estatal

Outro argumento é o de que haveria maior segurança e respeito à

privacidade do consumidor no caso dos serviços postais serem operados por

empresas estatais. Esse argumento foi mais facilmente derrubado pelo fato

de que em grande parte das jurisdições, senão na sua totalidade, as

empresas privadas com excelente desempenho no mercado de parcel post

(transporte de bens ou valores) e express mail (correspondências urgentes)

teriam, para tanto, que contar com a confiança dos consumidores, dada a

necessidade, na maioria dos casos, de garantia de segurança e privacidade

dos bens e correspondências transportados.

Tal desempenho positivo, muitas vezes, fora obtido mesmo tendo as

empresas privadas que cumprir obrigação de fixar seus preços três vezes ou

mais acima do produto concorrente da empresa estatal (como é o caso da

USPS, nos EUA). A pergunta que se coloca é a seguinte: seria necessário

ser o Estado o operador postal? Mesmo para as regiões “pobres” em que não

há, em tese, interesse privado para tanto? A resposta é negativa. Ao

contrário, outra lição que se extrai da experiência internacional é a de que é

melhor separar o Estado da gestão dos serviços postais e preservar-lhe

apenas a função regulatória.

Outra lição extraída é de jamais atribuir ao prestador do serviço postal

função regulatória, pois ele tende a abusar dessa posição em detrimento da

sociedade, como de fato ocorreu nos EUA e da UE (caso CE v. La Poste387).

                                                                                                                         387 Como visto no Capítulo III (3.3.4.1), no caso CE v. La Poste a legislação postal francesa foi contestada pela CE no sentido de que não seria compatível com as normas de concorrência comunitárias, pois atribuíam à La Poste a qualidade de regulador dos níveis a montante do mercado postal , de operador monopolista do mercado a jusante e de agente econômico do mercado a montante (por intermédio de suas subsidiárias). Esse caso se

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264  

Como visto, segundo a CE e o Tribunal de Justiça da UE, presume-se o

abuso de posição dominante, isto é, a incidência do Artigo 102, do TFEU,

caso uma lei nacional atribua ambas funções a um agente econômico,

notadamente se tal agente desfruta de exclusividade para algum mercado,

como para a prestação de serviços postais. Nos EUA, a mistura de funções

na USPS também gerara problemas sendo que, em 2006, o Postal

Accountability and Enhancement Act acabou por separar bem as funções, de

modo a evitar que a USPS se valesse de sua função regulatória para

prejudicar os rivais no mercado.

5.3 Diferentes modelos, diferentes resultados

Hoje, o Brasil adota o modelo de monopólio legal exercido por

empresa estatal para os mercados postais. Diante das evidências

decorrentes da experiência internacional, pergunta-se: qual seria o modelo

ideal para os serviços postais na atualidade? Embora seja recente a abertura

dos mercados domésticos à livre concorrência, já é possível colher resultados

positivos decorrentes da eliminação dos monopólios legais sobre os serviços

postais em uma série de jurisdições.

Basicamente, os modelos observados consistiram na eliminação das

reservas legais e na privatização, possuindo essa última três níveis: (i) a

retirada total do Estado do controle e capital da empresa prestadora dos

serviços postais, no intuito de transformá-la realmente em uma empresa

“profit-driven” (i.e., guiada por lucro), ao invés de uma empresa “political-

driven” (i.e., guiada por interesses políticos); (ii) a alienação do controle

acionário à iniciativa privada, porém com a manutenção da participação

estatal, em caráter minoritário, no capital da companhia, com os mesmos

objetivos da privatização total mas com a possibilidade de alguma

interferência na gestão por parte do Estado; e (iii) a pseudoprivatização, em

                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                           originou de denúncias por parte de concorrentes da La Poste no mercado de mail preparation service no sentido de que, em síntese, a La Poste estava aplicando tratamento discriminatório (relativo a preços e condições contratuais) a eles em comparação às subsidiárias da La Poste que atuavam no mercado de mail preparation service. As denúncias também continham alegações de que a La Poste flexibilizava a aplicação de normas regulatórias às suas subsidiárias, o que acabava por distorcer a concorrência, dado que não flexibilizava a aplicação das mesmas regras para os concorrentes de suas subsidiárias.

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265  

que o capital social permanece detido integralmente pelo Estado, porém

altera-se os critérios de governança para atribuir à empresa caráter “profit-

driven”, mediante a contratação de corpo diretivo no mercado com base em

critérios profissionais/técnicos e não políticos.

Além da eliminação das reservas legais (i.e., monopólios postais), bem

com da privatização (em alguma medida), houve a eliminação dos privilégios

que as companhias, até então sob controle estatal, desfrutavam (como

isenção tributária, imunidade processual etc.), bem como a aplicação irrestrita

das regras de defesa da concorrência (i.e., do regime antitruste).

Nesse contexto, elegeu-se alguns exemplos para se demonstrar como

a abertura do mercado postal é factível e gera resultados positivos. Não é

objetivo do presente trabalho exaurir os casos em que os mercados postais

passaram por um processo de liberalização, mas apenas dar uma idéia de

que os argumentos até aqui desenvolvidos fazem sentido e se ancoram em

evidências empíricas colhidas em outras jurisdições.

5.3.1 Nova Zelândia

A New Zeland Post (Nova Zelândia) e a Sweden Post (Suécia) foram

as primeiras empresas estatais a deixarem de operar com reservas legais e a

passarem totalmente a ser “profit-driven”. Paralelamente à eliminação das

reservas legais, a New Zeland Post passou por uma pseudoprivatização, isto

é, embora tenha permanecido sob o controle integral do governo

neozelandês (suas ações são detidas pelo Ministro das Finanças e pelo

Ministro das Empresas Controladas pelo Governo), a companhia passou a

adotar verdadeira estrutura empresarial e “profit-driven” com a contratação de

profissionais no mercado para sua gestão. Suas políticas foram redefinidas,

sendo a principal a de gerar ganhos financeiros aos seus acionistas em

função do capital investido.388

Ao mesmo tempo, a companhia, em acordo fixado com o governo,

ficou responsável por manter um nível mínimo de serviços postais nacionais

                                                                                                                         388  CREW, M. A.; KLEINDORFER, P. R.; CAMPBELL JR., J. I. Postal Reform: introduction. Handbook of Worldwide Postal Reform. Edited by Michael A. Crew, Paul R. Kleindorfer, James I. Campbell Jr. Cheltenham, UK. Northampton, MA, USA. 2008, p. 5.  

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266  

(universalização). Desde Abril de 1998, a New Zeland Post tem cumprido

seus objetivos em um contexto de integral abertura de mercado à livre

concorrência (isto é, sem a existência de qualquer reserva legal e de

qualquer privilégio decorrente de seu controle estatal). Os executivos da

empresa vivenciam um sistema do bônus em função de seu desempenho

técnico-profissional, tais quais os adotados pelas empresas privadas com as

quais compete a New Zeland Post (nos serviços postais e por talentos

gerenciais).389

Não há regulador setorial responsável pelo setor postal na Nova

Zelândia, sendo apenas aplicável a regulação geral (i.e., antitruste e defesa

do consumidor) e um sistema de registro para operação no mercado (i.e.,

espécie de simples autorização ou alvará de funcionamento). A combinação

de estrutura corporativa (empresarial), profissionalizada e “profit-driven”, os

incentivos próprios para a gerência profissional (i.e., não política) aliados à

regulação geral têm proporcionado resultados positivos à New Zeland Post.

Reflexo das mudanças e do aumento da eficiência empresarial da

companhia, as receitas por empregado mais que dobraram em termos

nominais, enquanto o preço real por selo foi reduzido quase que três vezes

durante o período de 1987 à 2004.390

O exemplo da Nova Zelândia é interessante, mas ao mesmo tempo

perigoso, pois, embora se tenha avançado com a eliminação das reservas

legais e dos privilégios, ao menos explícitos, a manutenção do Estado no

controle da companhia é suficiente para criar um cenário desbalanceado de

concorrência, sempre deixando espaço para alguma forma de favorecimento

que, em algum momento, poderá resultar problemas concorrenciais e, via de

consequência, perda de bem-estar social.

Em outras palavras, se o Estado experimenta uma gestão político-

partidária consciente e responsável, os reflexos negativos ao setor postal

podem ser nulos, contudo, se alterada a gestão bem como linha de

intervenção política, há espaço para problemas no setor postal, dada a                                                                                                                          389  CREW, M. A.; KLEINDORFER, P. R.; CAMPBELL JR., J. I. Postal Reform: introduction. Handbook of Worldwide Postal Reform. Edited by Michael A. Crew, Paul R. Kleindorfer, James I. Campbell Jr. Cheltenham, UK. Northampton, MA, USA. 2008, p. 5.  390  CREW, M. A.; KLEINDORFER, P. R.; CAMPBELL JR., J. I. Postal Reform: introduction. Handbook of Worldwide Postal Reform. Edited by Michael A. Crew, Paul R. Kleindorfer, James I. Campbell Jr. Cheltenham, UK. Northampton, MA, USA. 2008, p. 5.

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possibilidade de ingerência político-partidária. Seja como for, ainda que

parcialmente, a experiência neozelandesa deixa clara uma conclusão: não é

necessário reservar o mercado para lograr resultados positivos e

universalizar os serviços postais.

5.3.2 Suécia

A Suécia abriu integralmente os mercados postais à livre concorrência

em 1994, com a Sweden Post (conhecida como Sverige Posten AB)

mantendo-se responsável pela prestação dos serviços universais. Por outro

lado, seu capital social permaneceu integralmente detido pelo governo

Sueco. O preço unitário do selo aumentou significativamente, em torno de

38%, entre 1993 e 1997, mas foi subsequentemente moderado. Em

complemento, a Sweden Post alterou a forma de prestação dos serviços

universais: o número de colaboradores com dedicação integral (i.e.,

trabalhadores em tempo integral) foi reduzido significativamente após a

liberalização, e o sistema de franquias foi adotado de forma considerável.391

De forma similar, nas áreas rurais de alto custo (i.e., menos

desenvolvidas), os colaboradores em tempo integral foram substituídos por

carteiros/carteiras rurais (i.e., habitantes de tais regiões) os quais passaram a

entregar cartas e comercializar outros produtos e serviços postais. Essas e

outras mudanças levadas a efeito pela Sweden Post acabaram por reduzir os

custos da companhia e aumentar a qualidade dos serviços universais

(medida pelo percentual de entregas face à frequência mínima de entregas

fixadas nas obrigações do serviço universal).392

Em função da intensa rivalidade existente nas áreas urbanas face à

abertura dos mercados à livre concorrência, a Sweden Post foi obrigada a

reestruturar-se para melhor alinhar à demanda seus custos, valores e preços

de seus produtos e serviços. Embora tenha-se mantido sob controle estatal, a

Sweden Post foi obrigada a alterar sua cultura para “profit-driven”, servindo,                                                                                                                          391  CREW, M. A.; KLEINDORFER, P. R.; CAMPBELL JR., J. I. Postal Reform: introduction. Handbook of Worldwide Postal Reform. Edited by Michael A. Crew, Paul R. Kleindorfer, James I. Campbell Jr. Cheltenham, UK. Northampton, MA, USA. 2008, p. 5.  392 CREW, M. A.; KLEINDORFER, P. R.; CAMPBELL JR., J. I. Postal Reform: introduction. Handbook of Worldwide Postal Reform. Edited by Michael A. Crew, Paul R. Kleindorfer, James I. Campbell Jr. Cheltenham, UK. Northampton, MA, USA. 2008, p. 5.

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268  

não raras vezes, como um bom exemplo de reestruturação fruto da

concorrência que gera benefícios à sociedade.

Por outro lado, sua relação com o governo Sueco acabou por gerar

problemas concorrenciais. Um de seus principais concorrentes, CityMail,

moveu ações no campo antitruste contra a Sweden Post em razão de

possível discriminação de preços e outras condutas anticoncorrenciais. O

caso acabou em acordo; contudo, a manutenção do controle estatal ainda

levanta importantes questionamentos, como conflito de interesses. Isso

porque, atuando em regime de livre concorrência, a Sweden Post está sujeita

às regras de antitruste. Assim, o governo Sueco teria conflito de interesses

em aplicar a legislação antitruste contra sua própria empresa, tal como

ocorreu nos EUA (em que a U.S. Supreme Court isentou a USPS de

responsabilidade antitruste em razão do argumento de que o governo não

poderia estar sujeito a treble damages).393

5.3.3. Holanda

A Holanda mudou a estrutura de seus serviços postais em 1989,

quando converteu a empresa estatal prestadora de serviços postais (Dutch

Post Office) em empresas privada cujo capital passou a ser integralmente

detido pelo governo holandês. Esse fora o primeiro passo para a futura

privatização total da companhia. A Dutch Post Office iniciou um

relacionamento comercial com a TNT, empresa multinacional de origem

australiana que operava no mercado de express carrier (transportes

expressos). Em 1994, o capital da Dutch Post Office, como parte integrante

da KPN (empresa que combinava operações em telecomunicações e no

setor postal), foi aberto e suas ações passaram a ser negociadas na

Amsterdam Stock Exchange (bolsa de valores de Amsterdam). Em 1996, a

KPN adquiriu a TNT. Em 1998, a KPN se dividiu em duas companhias, a

                                                                                                                         393 “Commercialization without privatization thus introduces inevitable anomalies. While legal institutions may provide adequate safeguards, at a minimum public ownership makes the application of competition law less straightforward than when two privately owned companies are parties to an antitrust dispute.” CREW, M. A.; KLEINDORFER, P. R.; CAMPBELL JR., J. I. Postal Reform: introduction. Handbook of Worldwide Postal Reform. Edited by Michael A. Crew, Paul R. Kleindorfer, James I. Campbell Jr. Cheltenham, UK. Northampton, MA, USA. 2008, p. 5.

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nova KPN, voltada para o segmento de telecomunicações, e a TNT Post

Group (TPG), voltada para os mercados postais e de transportes. Em 2005,

as várias linhas dos negócios principais foram reagrupadas e renomeadas

em TNT.394

Após todo esse processo de privatização integral e remodelagem

empresarial da Dutch Post Office, agora TNT, observam-se diversos

resultados positivos. Em 2005, a TNT possuía cerca de 128 mil empregados

(comparados com os cerca de 59,3 mil, quando Dutch Post Office, em 1989).

Em 1989, todos os empregados trabalhavam em regime de tempo integral,

sendo que, em 2005, o número de empregados no regime de tempo integral

era de 77,447 mil. A divisão postal da TNT registrara receitas decorrentes

dos serviços postais de cerca de 10,1 bilhões de Euros (sendo que, em 1989,

a Dutch Post Office registrara cerca de 1,9 bilhão de Euros). O preço unitário

da carta simples registrou um pequeno aumento nominal (de 0.34 Euros, em

1989, para 0.39, em 2005), tendo experimentado uma redução real

significativa, reflexo das eficiências resultantes da reestruturação.395

Atualmente, no contexto de um mercado inserido no regime de livre

concorrência, a TNT é uma das principais empresas de cobertura global,

tanto para o mercado de entregas urgentes (express mail/parcel), quanto

para o mercado de correspondências (cartas). A partir de seu status de

empresa 100% privada, a TNT aprimorou suas relações com investidores e

mercados para obter vantagens em várias áreas promissoras nos campos do

business-to-business (B2B) e business-to-consumer (B2C).396

Como se pode observar, o modelo holandês foi caracterizado pela

eliminação total das reservas legais e pela privatização total. Ambas as

medidas resultaram vários benefícios à própria empresa e à sociedade, com

o aumento da eficiência de seus produtos e serviços, resultado da pressão

competitiva existente no livre mercado, bem como do aumento do número de

                                                                                                                         394 CREW, M. A.; KLEINDORFER, P. R.; CAMPBELL JR., J. I. Postal Reform: introduction. Handbook of Worldwide Postal Reform. Edited by Michael A. Crew, Paul R. Kleindorfer, James I. Campbell Jr. Cheltenham, UK. Northampton, MA, USA. 2008, p. 6. 395  CREW, M. A.; KLEINDORFER, P. R.; CAMPBELL JR., J. I. Postal Reform: introduction. Handbook of Worldwide Postal Reform. Edited by Michael A. Crew, Paul R. Kleindorfer, James I. Campbell Jr. Cheltenham, UK. Northampton, MA, USA. 2008, p. 6.  396 CREW, M. A.; KLEINDORFER, P. R.; CAMPBELL JR., J. I. Postal Reform: introduction. Handbook of Worldwide Postal Reform. Edited by Michael A. Crew, Paul R. Kleindorfer, James I. Campbell Jr. Cheltenham, UK. Northampton, MA, USA. 2008, p. 6.

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270  

empregos em face do crescimento da companhia. É importante notar que até

a concretização da Diretiva 2008/6, a TNT, já privatizada, também se

encarregou da prestação dos serviços universais na Holanda.

5.3.4 Alemanha

Em 1989, a Alemanha deu início ao processo de privatização de sua

empresa estatal responsável pelos serviços postais, a Deutsche Post. O

programa que deu início ao movimento foi denominado de Postreform I e

voltou-se a, primeiramente, criar departamentos separados dentro do

Ministério Postal e de Telecomunicações da Alemanha para os setores de (i)

serviços postais, (ii) banco postal e (iii) telecomunicações. Foi eleito novo

Board of Directors (Conselho de Diretores) para a agência postal, Deutsche

Bundespost Postdienst (German Federal Postal Service), o qual introduziu

um estilo de gestão privada e de contabilidade privada ao serviço postal

alemão.397

Posteriormente, a legislação foi alterada bem como foram adotadas

mudanças operacionais no serviço postal, o que culminou, em 2000, com a

oferta pública (IPO) de um terço das ações da companhia em bolsa de

valores (i.e., privatização de um terço da companhia). Em 2008, investidores

privados já detinham 69% do capital da empresa atualmente denominada de

Deutsche Post World Net (DPWN). Em paralelo às mudanças estruturais da

Deutsche Post, em 1 de janeiro de 2008, as reservas legais (i.e., monopólios

legais) foram totalmente eliminadas.398

A DPWN se tornou um dos modelos de mudança no cenário mundial

dos mercados postais. A privatização da companhia permitiu que uma

estrutura burocrática dormente ser transformasse em uma das maiores

multinacionais do setor. A estrutura foi alterada, administradores técnicos e

profissionais foram importados de outras indústrias, a rede de

correspondências e a rede de bens e documentos foram modernizadas                                                                                                                          397  CREW, M. A.; KLEINDORFER, P. R.; CAMPBELL JR., J. I. Postal Reform: introduction. Handbook of Worldwide Postal Reform. Edited by Michael A. Crew, Paul R. Kleindorfer, James I. Campbell Jr. Cheltenham, UK. Northampton, MA, USA. 2008, p. 7.  398 CREW, M. A.; KLEINDORFER, P. R.; CAMPBELL JR., J. I. Postal Reform: introduction. Handbook of Worldwide Postal Reform. Edited by Michael A. Crew, Paul R. Kleindorfer, James I. Campbell Jr. Cheltenham, UK. Northampton, MA, USA. 2008, p. 7.

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271  

dentro da Alemanha, e novos produtos foram desenvolvidos (como hybrid

mail, e-commerce etc.).399

Atualmente, a DPWN possui participações não apenas no mercado

tradicional de serviços postais (correspondências e documentos), mas

também nos mercados de express mail, logística, serviços bancários, dentre

outros. A DPWN tornou-se uma companhia com faturamento de cerca de

44.6 bilhões de Euros, em 2005, (em 1989, registrara faturamento de cerca

de 9.3 bilhões de Euros). Em 2005, a DPWN possuía aproximadamente 350

mil empregados, comparados aos cerca de 272,5 mil, em 1989. Com a

renovação da companhia, os postos tradicionais de trabalho deram espaço a

novas funções e vagas que cresceram em função do crescimento sustentável

da companhia (e não mais em função de apoio político partidário). O preço

unitário da carta simples teve um pequeno acréscimo nominal, de 0.51, em

1989, para 0.55, em 2005, tendo experimentado uma redução real

significativa, o que reflete os melhoramentos e eficiência operacional

resultantes da reestruturação. A qualidade dos produtos e serviços aumentou

significativamente, evidenciando que não era verdadeiro o temor de que uma

companhia “profit-driven” deixaria de lado o fator qualidade.400

5.4 Considerações finais

A abertura dos mercados postais à livre concorrência é um fenômeno

que pode ser observado em várias jurisdições. O fim dos monopólios legais

e, em muitos casos, a privatização integral das empresas vêm se mostrando

como modelo ideal para se renovar os serviços postais permitindo-lhes novos

padrões de eficiência, qualidade e inovação, resultantes naturais do regime

de livre concorrência.

A ausência de falhas de mercado no setor postal simplificam, de certa

forma, a possibilidade de reformá-lo, isto é, uma vez eliminadas as reservas

legais e privatizada a empresa prestadora de serviços postais (a partir do que                                                                                                                          399  CREW, M. A.; KLEINDORFER, P. R.; CAMPBELL JR., J. I. Postal Reform: introduction. Handbook of Worldwide Postal Reform. Edited by Michael A. Crew, Paul R. Kleindorfer, James I. Campbell Jr. Cheltenham, UK. Northampton, MA, USA. 2008, p. 8.  400 CREW, M. A.; KLEINDORFER, P. R.; CAMPBELL JR., J. I. Postal Reform: introduction. Handbook of Worldwide Postal Reform. Edited by Michael A. Crew, Paul R. Kleindorfer, James I. Campbell Jr. Cheltenham, UK. Northampton, MA, USA. 2008, p. 8.  

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272  

se elimina toda e qualquer vantagem artificial), o Estado deve fiscalizar suas

atividades apenas por meio da regulação geral, isto é, por meio do controle

antitruste, defesa do consumidor etc.

A integração dos tradicionais serviços postais com outros mercados,

como logística, telecomunicações, comunicação eletrônica (hybrid mail etc.) é

algo que depende da redistribuição de incentivos naturalmente decorrente da

eliminação das reservas legais e da ingerência política sobre as empresas

atuantes nos mercados postais.

Nesse contexto, após incursão na experiência internacional, fica claro

que o modelo ideal para os serviços postais é sua separação do Estado

(como gestor) e sua abertura à livre concorrência, com a eliminação das

reservas legais e de quaisquer vantagens comparativas e artificiais que

desnivelem o campo de competição (“the level playing field”).

Tal como os países que já eliminaram as reservas legais e

privatizaram os serviços postais, o Brasil também poderia obter semelhantes

benefícios à sociedade, como melhor serviço, melhores preços, menos

externalidades negativas, como corrupção, abusos da posição dominante da

ECT e outros.

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273  

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Os serviços postais podem ser caracterizados como uma forma de

transporte ou de comunicação para a entrega de bens e/ou informações de

um ponto a outro. Nesse sentido, como resultado de um processo de grande

evolução tecnológica, os prestadores de serviços postais concorrem com

uma grande variedade de outros prestadores de serviços de

transporte/entrega ou de comunicação, incluindo, sobretudo, serviços de

logística de bens e valores e serviços de telecomunicações. Os serviços

postais se diferenciam de outros serviços de transporte de bens e valores em

razão da natureza física e do volume das correspondências, razão pela qual

os operadores postais podem desfrutar de economias de escala e escopo no

transporte e entrega de correspondências e bens/valores.401

Dessa forma, operadores postais tradicionais concorrem com

empresas de entregas expressas de bens e valores (express, parcel e point-

to-point delivery services). Serviços de telecomunicações (e.g., fax, email e

serviços de pagamento eletrônico) são importantes substitutos para uma

parcela significativa de certas categorias de correspondências, como é o

caso das contas de consumo.402

É assente que o regime de livre concorrência, aplicado integralmente

para setores sem falhas de mercado (e calibrado pela regulação setorial para

setores portadores de falhas de mercado), gera diversos benefícios à

economia e aos consumidores, sintetizando ganhos ao bem-estar social. Se

havia questionamentos sobre a aplicação do regime de livre concorrência nos

serviços postais, dado o temor de comprometer-se a sua prestação universal,

a experiência internacional vivenciada na União Européia, bem como em

países como Austrália e Nova Zelândia, deixa claro que a eliminação dos

monopólios postais aliada à privatização das antigas empresas estatais

resultara diversos benefícios à sociedade (i.e., às empresas em si, que

passaram a ser rentáveis – e não deficitárias - e mais eficientes, à economia                                                                                                                          401   OECD. Promoting Competition in Postal Services. DAFFE/CLP(99)22 of 1 October 1999. Disponível em: <http://www.oecd.org/dataoecd/35/36/1920548.pdf>. Acesso em: 25 Feb. 2011, p.7.  402 OECD. Promoting Competition in Postal Services. DAFFE/CLP(99)22 of 1 October 1999. Disponível em: <http://www.oecd.org/dataoecd/35/36/1920548.pdf>. Acesso em: 25 Feb. 2011, p.7.

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local, dado que com o crescimento sustentável, aumentaram-se as ofertas de

postos de trabalho, e, principalmente, aos consumidores, que passaram a

contar com ofertantes alternativos de serviços postais que passaram a

concorrer por melhores preços e qualidade junto aos clientes).

Ainda no plano internacional, ficou claro que a manutenção das

reservas legais e do controle estatal, na atualidade, apenas tem

proporcionado resultados negativos, isto é, empresas inchadas (dado o

critério de contratações políticas), ineficientes, deficitárias que prejudicam a

concorrência e a oportunidade em mercados vizinhos em razão do abuso de

sua posição dominante garantida por lei, tudo num ciclo vicioso que em nada

contribui para o desenvolvimento local (como é o caso da USPS, nos EUA).

No Brasil, não há questionamentos de que a Constituição de 1988

fixara a livre iniciativa como regra geral para a ordem econômica brasileira.

Contudo, o STF (na ADPF 46-7/DF), com base em um debate

dogmático/ideológico entre serviços públicos e atividades econômicas,

referendou o entendimento da ECT no tocante à recepção das leis da

ditadura (Decreto-Lei nº 509/1969 e Lei nº 6.538/1978), mesmo não havendo

previsão expressa na Constituição no sentido de incorporar o monopólio

postal (ou exclusividade da ECT) como exceção à regra geral da livre

iniciativa. Paralelamente, nos debates da ADPF 46-7/DF, ficou claro que a

maioria dos Ministros do STF intuitivamente se inclinara a não encontrar

respaldo para a manutenção das reservas legais para as correspondências

comerciais.

A ECT, empresa integralmente controlada pela União Federal, opera

sem sombra de dúvida na matriz “political-driven”, ao invés de “profit-driven”.

A estatal possui um histórico repleto de ingerências políticas o que culminou,

por exemplo, com seu envolvimento no maior escândalo de corrupção

vivenciado no Brasil (segundo entendeu a Câmara dos Deputados no

relatório final da CPMI “dos Correios”, em 2006). Além desse fato, a ECT

também apresenta em seu histórico perfil comportamental anticoncorrencial,

na maioria das vezes tentando ampliar o escopo de suas reservas legais, tal

como observado na história de outras jurisdições (várias, na Europa, e nos

EUA).

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Todavia, o Poder Judiciário brasileiro, talvez em razão da mesma

intuição que surgiu na maioria dos Ministros do STF nos debates da ADPF

46-7/DF, vem se posicionando de forma contrária à ampliação dos limites do

monopólio postal da ECT, ao menos no tocante às contas de consumo.

Nesse ponto, conclui-se o presente estudo com um apelo às autoridades do

Poder Legislativo e do Poder Judiciário no sentido de que, como procurou se

fazer durante todo o presente trabalho, se aprofundem nos argumentos

históricos apresentados pela ECT (que, como se demonstrou, não diferem

daqueles apresentados por empresas estatais em outras jurisdições), para

avaliar se são de fato válidos em termos econômicos e reais, e não

simplesmente os aceite como verdade na elaboração de políticas públicas e

decisões judiciais.

Isto para, caso cheguem à mesma conclusão deste estudo, seja

eliminado integralmente o monopólio postal no Brasil e, ao mesmo tempo,

seja o Estado (União Federal) afastada completamente da gestão da ECT,

que deveria ser privatizada e reformada para se tornar uma empresa “profit-

driven” desvestida de privilégios e incentivos para servir de plataforma à

corrupção. Essa seria a medida que mais se adequa à Constituição Federal

de 1988, porquanto seria a melhor estratégia de maximizar o bem-estar

social e minimizar-se as externalidades negativas, como o desvio de

finalidade, a sobreposição de interesses individuais sobre o interesse público,

e, via de consequência, corrupção.

Finalmente, o presente estudo não tem a pretensão de exaurir o tema,

bem como de afirmar que os sistemas norte-americano ou europeu são

equivalentes ao sistema brasileiro e, portanto, basta importarmos modelos.

Não é disto que se trata, mas sim de aprendermos com os erros e acertos

alheios, mediante a devida contextualização. Contudo, pretende-se sim com

este estudo alertar as autoridades brasileiras de que a ECT, caso siga como

empresa “political-driven”, titular de reservas legais sem o devido controle

(sobretudo antitruste), pode se tornar uma USPS que (segundo seu próprio

Relatório Anual de 2010) gerou um prejuízo aos cofres públicos norte-

americanos de 20,2 bilhões de dólares no último quadriênio, sem contar os

prejuízos não quantificáveis de impedir a entrada de novos players nos

mercados a montante e a jusante de suas reservas legais e, assim, gerar

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incontáveis perdas em termos de bem-estar dos consumidores norte-

americanos. A sociedade brasileira e, particularmente, os consumidores

brasileiros não deveriam estar sujeitos a semelhantes prejuízos. Não é isso

que prescreve a Constituição de 1988.

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