poluição eletromagnética

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POLUIO ELETROMAGNTICA

SADE PBLICA, MEIO AMBIENTE, CONSUMIDOR E CIDADANIA: IMPACTOS DAS RADIAES DAS ANTENAS E DOS APARELHOS CELULARES

So Paulo, 2004Ano 3 - Volume 6, n 2, abril/junho 2004

LOGO GOV. DO ESTADO

ESCOLA SUPERIOR DO MINISTRIO PBLICO DE SO PAULODiretor Assessores Lus Daniel Pereira Cintra Edgard Moreira da Silva Maria Amlia Nardy Pereira Oswaldo Peregrina Rodrigues Parisina Lopes Zeigler Edgard Moreira da Silva Rosana Sanches (MTb 17.993) Lus Antnio Alves dos Santos

Coordenador Editorial Jornalista Responsvel Capa

LOGO DA IMESPDiretor--presidente Diretor Vice-presidente Diretor Industrial Diretor Financeiro e Administrativo Ncleo de Projetos institucionais Projetos Editoriais

IMPRENSA OFICIAL DO ESTADO DE SO PAULOHubert Alqures Luiz Carlos Frigerio Teiji Tomioka Richard Vainberg Emerson Bento Pereira Vera Lcia Wey

Caderno Jrdico, co-edio ESMP/Imprensa Oficial do Estado de So Paulo, trimestral, com tiragem de 3 mil exemplares.

POLUIO POLUIO ELETROMAGNTICA OMAGNTICA ELETROMA

LOGO DA IMESPCaderno Jur., So Paulo, v 6, n 2, p 288, abril/junho 2004

Ficha catalogrfica elaborada pela Biblioteca da Imprensa Oficial do Estado de So PauloCaderno Jurdico. So Paulo: Escola Superior do Ministrio Pblico de So Paulo, 2001 Trimestral No circulou em 2003. ISBN: 85-7060-206-5 (Imprena Oficial do estado de So Paulo) A partir de 2004 os fascculos sero numerados continuamente e recomeam a cada novo volume 1. Direito - peridicos I. Escola Superior do Ministrio Pblico. de So Paulo

Escola Superior do Ministrio Pblico do Estado de So Paulo R. Minas Gerais, 316 - Higienpolis 01244-010 - So Paulo - SP - Brasil Tel.: (0xx11) 3017-7776/3017-7777 Fax: (0xx11) 3017-7754 www.mp.sp.gov.br/escolasuperior e-mail: [email protected]

Imprensa Oficial do Estado de So Paulo R. da Mooca, 1.921 - Mooca 03103-902 - So Paulo - SP - Brasil Tel. (0xx11) 6099-9800 Fax.: (0xx11) 6699-9674 www.imprensaoficial.com.br [email protected] SAC 0800-123401

NDICE

1. Apresentao..........................................................................................................7 Lus Daniel Pereira Cintra 2. Introduo................................................................................................................9 Edgard Moreira da Silva 3. Participantes da obra.............................................................................................13 4. O impacto das radiaes no ionizantes da telefonia mvel e o Princpio da Precauo........................................................................................................17 A. A. de Salles e C. R. Fernndez5

5. Campos Eletromagnticos e Cncer: Contribuies da Epidemiologia..............................................................................47 Contribuies das Cincias Biolgicas..................................................................73 Contribuies para a discusso sobre o estabelecimento de limites de exposio populacional e ocupacional a CEM de baixa freqncia.................... 99 Ines Mattos e Srgio Koifman 6. Poluio Ambiental e exposio humana a campos eletromagnticos: nfase nas estaes rdio-base de telefonia celular..........................................119 Adilza Condessa Dode e Mnica Maria Diniz Leo 7. As estaes de rdio-base de telefonia celular no contexto de uma sociedade de riscos............................................................................................139 Ana Maria Moreira Marchesan 8. Impacto dos campos eletromagnticos ambientais sobre a sade e a necessidade de adotar-se o Princpio da Precauo...........................................157 Franscisco de Assis Ferreira Tejo

Saude, Ecologia, Vigilncia to...............................................1978. Geila Radnz Vieira

Sanitria

e

Direi-

9. Anlise Comparativa dos critrios de normatizao das radiaes eletromagnticas no ionizantes no Leste Europeu (Rssia) e pases ocidentais........................................................................................................... 203 Nestor Raul Minhuey Mendez

10. Fenomenologia do desastre tecnolgico: Risco e precauo em sade........ 215 Renato Rocha Lieber e Nicolina Silvana Romano-Lieber

11. CEM Campos eletromagnticos - aspectos legais e impactos sobre a sade. Perspectivas e sugestes.........................................................2276

Ivens Drumond, Guilherme Franco Netto e Andr Fenner

12. Efeitos das radiaes eletromagnticas emitidas pela telefonia celular na sade humana.............................................................................................. 245 Vitor Baranauskas

13. O Direito ambiental face telefonia mvel: aplicao concreta do Principo da Precauo.................................................................................257 Gisele Borghi Bller e Guilherme Jos Purvin de Figueiredo

14. Parecer tcnico do ponto de vista da sade ambiental......................................271

APRESENTAO

A espantosa evoluo da humanidade nos ltimos anos trouxe incontestveis benefcios para a vida moderna no sistema de comunicao mundial. Todavia, em contrapartida ensejou enorme impacto sobre o meio ambiente e sobre a sade pblica, ante a constante radiao no ionizante dela decorrente, com efeitos comprovadamente nocivos.

Atenta a esta realidade, nossa Escola Superior preocupou-se no estudo mais aprofundado e tcnico da questo, no apenas em seus desdobramentos jurdicos, mas em seus aspectos cientficos e biolgicos, porque inquestionvel a atuao do Ministrio Pblico nesta seara, para salvaguarda dos interesses sociais e individuais indisponveis, protegendo o meio ambiente e outros interesses difusos e coletivos.7

Desse modo, com vistas ao aperfeioamento funcional e cultural dos Membros do Ministrio Pblico, atividade precpua desta Escola Superior, publica-se o presente Caderno Jurdico, versando sobre a questo da radiao no ionizante decorrente da telefonia celular mvel, como forma de auxiliar e fornecer maiores subsdios ao Promotor para o seu enfrentamento.

Lus Daniel Pereira Cintra, procurador de Justia, diretor da Escola Superior do Ministrio Pblico de So Paulo

Cad. Jur., So Paulo, v 6, n 2, p. 7, abr./jun. 2004

INTRODUOO aperfeioamento e o desenvolvimento de novas tecnologias, notadamente no campo das comunicaes por meio da telefonia mvel, tm suscitado, junto opinio pblica, ao meio cientfico e comunidade mdica, interessantes e intricados debates, particularmente em virtude dos riscos sade e das incertezas cientficas decorrentes da poluio eletromagntica. O ser humano moderno, principalmente em virtude do mercado de massa gerado pelo poder do marketing, dos meios de induo ao consumo de novos servios e produtos, pelo avano das tcnicas de publicidade, encontra-se cada vez mais dependente das facilidades trazidas pelos novos produtos eletrnicos e pelas novas tecnologias de produo e de fornecimento de servios. O automvel est a, ele indissocivel da vida de boa parte da populao. E a febre pelas facilidades das novas tecnologias seduz e hipnotiza, mais do que isso, domina a maioria dos seres humanos, mormente as crianas e adolescentes. Estamos no apogeu da telefonia celular. A publicidade e a oferta do momento so os telefones celulares. No Dia das Mes deste ano de 2004, o aparelho de telefonia celular era a grande coqueluche na oferta mercadolgica dos presentes em homenagem deusa geradora da vida terrena, figura divina encetada em Maria, genitora do filho de Deus. Todavia, essas comodidades e facilidades decorrentes das novas tecnologias e do avano dos meios de comunicao distncia trouxeram custos sade, vida humana, ao meio ambiente, patrimnio urbanstico, consumidor e cidadania. Mutatis mutandis, o dilema se aproxima do que ocorreu com os veculos automotores, que necessitaram passar por verdadeira revoluo no campo da segurana para salvaguardar a incolumidade dos condutores e dos pedestres, bem como a imposio de equipamentos de controle de trfego, de poluio do ar e de velocidade. A telefonia celular, na cidade de So Paulo, em dez anos, passou por crescimento inimaginvel no incio da ltima dcada do sculo XX. O nmero de aparelhos de telefonia mvel praticamente incalculvel, correspondendo, aproximadamente, a um telefone celular por pessoa. Nos tempos atuais, o aparelho de telefonia celular transformou-se em verdadeiro brinquedo de luxo nas mos de crianas, que detonam milhares de torpedos para amiguinhos, amiguinhas, namorados, namoradas, familiares etc. Muitos condutores de automotores no conseguem dirigir sem aquele aparelhinho ao p do ouvido. Para permitir toda essa comunicao, as empresas de telefonia mvel brindaram os consumidores e moradores da paulicia com mais de cinco mil antenas de telefonia mvel e outras centenas de estaes de comunicaes. O lucro econmico compensou tamanho investimento.

9

Cad. Jur., So Paulo, v 6, n 2, p. 9-12, abr./jun. 2004

Mas todo esse fenmeno tecnolgico veio, infelizmente, acompanhado de riscos e males humanidade, populao paulistana e brasileira. Nos ltimos anos, a poluio eletromagntica cresceu assustadoramente, evidenciando que o custo-benefcio no estaria a compensar os enormes avanos tecnolgicos obtidos no campo da telefonia mvel. Assim, a exemplo do que se verificou no caso do automvel, particularmente em virtude do princpio da precauo e dos interesses das geraes futuras, a sociedade civil organizada e a comunidade cientfica dotada de viso mais ampliada dessa problemtica procuram trazer novas reflexes e buscar debates cientficos e doutrinrios para salvaguardar o ser humano e sua qualidade de vida em harmonia com o meio ambiente. Nesse diapaso, a participao do Ministrio Pblico rgo constitucionalmente responsvel pela defesa da sociedade, do regime democrtico e dos interesses sociais -, essencial. Estudos de cientistas nacionais e estrangeiros indicam elevados riscos para o meio ambiente, o paisagismo, a segurana das edificaes, a sade do trabalhador, em resumo, a prpria qualidade de vida da pessoa humana. Assim, a sociedade civil no pode permanecer inerte, esperando a catstrofe para depois socorrer os feridos e sepultar os mortos. Primeiro essencial precaver e, depois, prevenir os riscos e combater os malefcios advindos da poluio eletromagntica. O princpio da precauo, em vista desses riscos, cujos malefcios ainda no possam ser, ao que alegariam alguns, comprovados cientificamente, ou meramente fantasiosos para os detentores do poder econmico da telefonia mvel, ou mesmo evidenciados em vrios casos concretos, com a ocorrncia de cncer na regio craniana de alguns pacientes, determina que sejam tomadas medidas para regular a produo e comercializao de equipamentos de telefonia celular, bem como proibir a instalao de antenas de telefonia celular sem prvio estudo de impacto ambiental e urbanstico, alm de respectivo licenciamento, sempre considerando os direitos do consumidor, o direito constitucional ao meio ambiente sadio e sustentvel, a preservao do paisagismo e preveno da poluio visual sob o prisma do valor urbanstico cultural e qualitativo de vida das grandes cidades e metrpoles. No havendo certeza absoluta quanto inexistncia de riscos sade e ao meio ambiente, impese obedincia estrita ao princpio da precauo para a preservao da vida com um mnimo de dignidade e de qualidade. O tema em epgrafe, poluio eletromagntica, mostra-se to relevante para a sociedade no momento em que vivemos que motivou a Escola Superior do Ministrio Pblico, em parceria com a ABRADECEL, a debater todas as temticas relacionadas a essa questo em seminrio a ser promovido no final do ms de julho de 2004. Como corolrio dessa importante e inolvidvel seminrio, o presente Caderno Jurdico busca marcar indelevelmente os estudos e as reflexes da maioria dos professores, cientistas e profissionais da rea jurdica que participaram do evento. A edio daCad. Jur., So Paulo, v 6, n 2, p. 9-12, abr./jun. 2004

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presente obra tem como objetivo abrir horizontes e apresentar informaes consistentes acerca da temtica poluio eletromagntica causada por equipamentos e aparelhos de telefonia mvel. Dessa forma, os profissionais da rea do Direito, particularmente os membros do Ministrio Pblico e da Magistratura, bem como cientistas e profissionais da rea de sade, podero dispor de material doutrinrio e de proeminente qualidade cientfica, elaborado por profissionais da mais elevada respeitabilidade e envergadura na comunidade cientfica brasileira e na prpria comunidade mundial. O presente Caderno Jurdico traz uma interessante coletnea de estudos atuais relacionados rea de sade, do direito, da fsica, da engenharia eltrica e da engenharia de comunicaes, que servir, inegavelmente, como valiosa fonte de consulta para todos os profissionais do direito que se interessam pelo tema nele tratado, razo pela qual tais estudos mostram-se aptos a determinar a interpretao de situaes concretas com que os operadores do direito se defrontam na labuta diria. Os trabalhos ora publicados entremostram uma preocupao constante com os valores fundamentais da pessoa humana, o que evidencia a base constitucional norteadora da tutela da sade, do meio ambiente, do consumidor e da cidadania em nosso pas. Assim, a Escola Superior do Ministrio Pblico, em vista da importncia do Ministrio Pblico para o Direito Ambiental nele includo o meio ambiente artificial (ambiente urbanstico e ambiente do trabalho) -, e do Consumidor brasileiro e para as conquistas alcanadas pela cidadania brasileira, particularmente pelo reconhecimento de seus direitos na Carta Magna de 1988, na legislao ambiental e no prprio Cdigo de Defesa do Consumidor, procura levar aos membros do Parquet paulista e aos demais operadores do direito essa coletnea de estudos sobre a temtica relacionada poluio eletromagntica, sempre considerando as transformaes que o incio de um novo sculo proporciona no mundo jurdico, no campo econmico e nas relaes humanas. A Escola Superior agradece ao Doutor Joo Carlos Rodrigues Peres. Coordenador Executivo da ABRADECEL, cujo trabalho hercleo no contato efetivo com os autores e na compilao dos artigos doutrinrios contidos no presente Caderno Jurdico possibilitou concretamente a sua edio e publicao. Por fim, agradecemos a todos os autores que escreveram os valiosos trabalhos cientficos que deram gerao presente obra, abrindo mo da respectiva contraprestao aos seus direitos autorais. Que esta coletnea provoque a aprendizagem, a reflexo e o debate recproco de argumentaes ricas e diversas, ensejadores da capacitao e aperfeioamento dos operadores do direito encarregados da preservao da vida e da justia. Com o presente trabalho, dentro da filosofia de ensino e de atuao da Escola Superior do Ministrio Pblico de So Paulo, calcada na oferta de material que tenhaCad. Jur., So Paulo, v 6, n 2, p. 9-12, abr./jun. 2004

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efetiva utilidade ao desempenho da atividade funcional dos membros do Ministrio Pblico de So Paulo, em particular, e Ministrio Pblico do Brasil, como fonte de pesquisa e reflexo, esperamos contribuir para uma compreenso mais adequada dos efeitos e riscos da poluio eletromagntica para a vida humana e dos reflexos das transformaes que se verificam na sade, no meio ambiente, no consumo e na qualidade de vida nas metrpoles brasileiras, no limiar deste sculo no mundo do Direito.

Edgard Moreira da Silva, promotor de Justia, assessor da Escola Superior do Ministrio Pblico de So Paulo

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Cad. Jur., So Paulo, v 6, n 2, p. 9-12, abr./jun. 2004

PARTICIPANTES DA OBRAAdilza Condessa Dode, eng. eletricista PUC-MG, ps -Graduada em Engenharia de Segurana do Trabalho PUC- MG, mestre em Saneamento, Meio Ambiente e Recursos Hdricos pela UFMG, profa. da Fundao de Ensino de Contagem, (FUNEC), e do Centro Universitrio Izabela Hendrix - BH, e do Curso de Ps-Graduao da FELUMA- Faculdade de Cincias Mdicas e do Centro Educacional So Camilo, engenheira de Segurana da Secretaria Municipal da Sade de Belo Horizonte. Ana Maria Moreira Marchesan, promotora de Justia de Defesa do Meio Ambiente de Porto Alegre, professora de Direito Ambiental e de Crimes Ambientais - ESMP/RS. Andr Fenner, Coordenao Geral de Vigilncia Ambiental em Sade, Secretaria de Vigilncia em Sade e Ministrio da Sade. lvaro A. de A. Salles, professor da Universidade Federal do Rio Grande do Sul UFRGS; doutorado em Engenharia Eltrica pela University of London, UL, Inglaterra, Mestrado em Engenharia Eltrica na PUC RJ, Brasil; Graduao em Engenharia Eltrica pela UFRGS, Brasil. Cludio Rodriguez Fernndez, engenheiro eletricista pela UNICAMP, mestre e doutorando pela UFRGS em Engenharia Eltrica, professor na UFRGS e no CEFET/ RS (Centro Federal de Educao Tecnolgica do RS). Francisco de Assis Ferreira Tejo, engenheiro eletricista pela UFPE, professor e coordenador da rea de Microondas e Eletromagnetismo Aplicados do Depto. de Engenharia Eltrica - Centro de Cincias e Tecnologia da UFCG; doutorado em Engenharia Eltrica UFCG e M. A.Sc. em Electrical Engineering, University of Waterloo, U.W., Canad. Geila Radzn Vieira, mdica da Secretaria Municipal de Sade de Porto Alegre, Coordenadora da Equipe de Controle e Vigilncia Sanitria dos Servios de Sade de Porto Alegre (ECVSSS), assessora tcnica da Gerncia de Regulao dos Servios de Sade da Secretaria Municipal de Sade de Porto Alegre (GRSS); membro dos GTs na elaborao da legislao sobre ERBs no municpio de Porto Alegre; titular da Cmara Tcnica das ERBs, no Conselho Municipal de Meio Ambiente de Porto Alegre; professora colaboradora do Curso de Ps-Graduao em Medicina do Trabalho da FFFCMPA/ABRASS; mdica auditora da Secretaria da Sade do Estado do Rio Grande do Sul; mdica perita da Justia Federal da 4 regio na rea de Sade Ocupacional.

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Cad. Jur., So Paulo, v 6, n 2, p. 13-14, abr./jun. 2004

Gisele Borghi Bller, advogada, scia do Escritrio Morais e Bller Advogados. Guilherme Franco Netto, coordenao Geral de Vigilncia Ambiental em Sade, da Secretaria de Vigilncia em Sade, Ministrio da Sade; Mdico da Fundao Nacional de Sade, do Ministrio da Sade do Brasil, coordenador-geral de Vigilncia Ambiental em Sade do Centro Nacional de Epidemiologia da FUNASA; doutor (Ph.D.) pela Escola de Graduao da Universidade Tulane, Nova Orleans, EUA; mestre em Sade Pblica pela Escola de Sade Pblica e Medicina Tropical da Universidade Tulane, Nova Orleans, EUA; Especializao, Residncia Mdica em Medicina Preventiva e Social, Universidade Federal Fluminense, RJ; Especializao em Sade Pblica, Escola Nacional de Sade Pblica, Fundao Oswaldo Cruz, RJ; mdico, Faculdade de Medicina, Universidade Federal Fluminense, Niteri, RJ. Guilherme Jos Purvin de Figueiredo, procurador do Estado de So Paulo, professor do Curso de Ps-Graduao em Direito Ambiental da Faculdade de Sade Pblica da Universidade de So Paulo e do Curso de Graduao da Universidade So Francisco Campus de So Paulo, presidente do Instituto Brasileiro de Advocacia Pblica, secretrio-geral do Instituto O Direito Por Um Planeta Verde. Ines Mattos, mdica e pesquisadora titular da Fundao Oswaldo Cruz FIOCRUZ RJ. Ivens Lucio do Amaral Drumond, consultor jurdico de Sade Ambiental da Coordenao Geral de Vigilncia Ambiental em Sade CGVAM Secretaria de Vigilncia em Sade - SVS, Ministrio da Sade. Mnica Maria Diniz Leo, professora doutora do Departamento de Engenharia Sanitria e Ambiental da Escola de Engenharia da Universidade Federal de Minas Gerais - UFMG - Belo Horizonte, doutora pelo INSA - Instituto de Cincias Aplicadas - Tulouse Frana. Nestor Raul Minhuey Mendez, Ph.D., Universidade do Extremo Sul Catarinense UNESC, Laboratrio de Foto e Radiobiologia Renato Rocha Lieber, professor doutor do Departamento de Produo da Faculdade de Engenharia da UNESP (campus de Guaratinguet). Vitor Baranauskas, professor da Faculdade de Engenharia Eltrica e Computao Departamento de Semicondutores Instrumentos e Fotnica - UNICAMP. Srgio Koifman, mdico e pesquisador titular da Fundao Oswaldo Cruz FIOCRUZ RJ.

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IMPACTO DAS O IMPACTO DAS RADIAES DA NO IONIZANTES DA TELEFONIA MVEL E O DA PRECAUO PRINCPIO DA PRECAUO

A. A. de Salles e C. R. Fernndez

O IMPACTO DAS RADIAES NO IONIZANTES DA TELEFONIA MVEL E O PRINCPIO DA PRECAUOA. A. de Salles e C. R. FernndezRESUMO: Neste trabalho so revisados os principais efeitos biolgicos das radiaes no ionizantes (RNI) incluindo os efeitos trmicos e os no trmicos, e so discutidas sucintamente as principais normas nacionais e internacionais disponveis que limitam a exposio dos seres humanos (trabalhadores e populao em geral) a estas radiaes. A seguir so resumidas as estimativas tericas e as medidas para os campos eletromagnticos irradiados por Estaes de Rdio Base (ERBs) tpicas, e estes resultados so comparados com aquelas normas. So tambm simuladas as taxas de absoro especficas (SAR) na cabea dos usurios de telefones mveis quando antenas convencionais (tipo monopolo) e quando antenas diretivas (planares) so utilizadas. Finalmente, observa-se que mesmo as normas mais restritivas (considerando o Princpio da Precauo), podem ser obedecidas pelas ERBs mantendo-se boa qualidade no sistema, e que as antenas diretivas podem ser utilizadas em uma nova gerao de telefones mveis, constituindo-se em uma alternativa conveniente para melhorar o desempenho destes transceptores, diminuindo tambm os riscos sade dos usurios.

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I. INTRODUO

A humanidade tem presenciado um crescimento admirvel na utilizao de sistemas de comunicaes mveis, com benefcios incontestveis em diferentes atividades profissionais e privadas. Nos primeiros meses de 2004 as estimativas oficiais mostravam que existiam mais de 1,3 bilhes de terminais mveis em utilizao em todo o mundo, e mais que 49 milhes no Brasil. Em paralelo com o vertiginoso crescimento da utilizao dos sistemas mveis por uma parcela substancial da populao, tem crescido tambm a preocupao da populao, dos usurios, das autoridades governamentais e da comunidade cientfica em relao aos riscos sade que esta tecnologia pode representar. Esta preocupao motivada essencialmente pelas incertezas cientficas, especialmente em relao aos efeitos no trmicos da absoro das radiaes no ionizantes (RNI) nos seres humanos. Os efeitos trmicos j so h muitas dcadas bem conhecidos, e so os considerados nas normas mais difundidas que limitam a exposio aos campos eletromagnticos no ionizantes. Entretanto, sobre os efeitosCad. Jur., So Paulo, v 6, n 2, p. 17-46, abr./jun. 2004

no trmicos ainda existem certas polmicas na comunidade cientfica, ainda que muitos destes j tenham sido repetidamente comprovados em experimentos com cobaias e in vitro . No caso das comunicaes mveis, em virtude de sua grande disseminao nas ltimas dcadas, as preocupaes tm se concentrado especialmente em relao aos dois tipos de transmissores, tanto os fixos (freqentemente chamados de Estaes de Rdio Base ERBs), bem como os mveis (p.ex., os telefones celulares). Ambos os aspectos merecem a maior ateno e considerao. Via de regra as ERBs emitem potncias substancialmente maiores que os telefones mveis, mas como normalmente as pessoas esto razoavelmente afastadas das antenas das ERBs (p. ex., mais que 50 ou 100 metros, em sua direo de maior irradiao), a taxa de absoro especfica (SAR - Specific Absorption Rate) calculada em qualquer regio do corpo em situaes tpicas, resulta em valores substancialmente abaixo dos limites das normas mais difundidas, especialmente aquelas que consideram somente os efeitos trmicos. Entretanto, na maioria dos casos prticos, tambm so respeitados os limites de normas mais restritivas, que consideram em parte o Princpio da Precauo (PP). Por outro lado, para o caso dos telefones mveis, observa-se que a SAR calculada na cabea dos usurios dos aparelhos que utilizam as antenas tipo monopolo convencionais, na condio normal de uso, significativamente maior que os limites das normas, mesmo daquelas que consideram somente os efeitos trmicos [Bernardi et al., 2001; Iskander et al., 2000; Jensen and Rahmat-Samii, 1995; Salles et al., 2001]. Obviamente, se fossem considerados tambm os efeitos no trmicos, a situao ento seria muito mais crtica para os usurios destes telefones mveis. O problema que a antena convencional (tipo monopolo) irradia de forma quase simtrica em um plano perpendicular a elas. Ento, na condio normal de uso, quando estas antenas so operadas muito prximas cabea (p.ex., 2,5 cm ou menos), a maior parte da energia irradiada absorvida na cabea (p.ex., nos tecidos do crebro, etc.), e uma parcela menor de potncia irradiada no sentido da ERB com a qual est se comunicando. Esta situao indesejvel, uma vez que se perde em qualidade de comunicao e o risco sade dos usurios torna-se ento maior. Alm disto, aumenta tambm o consumo da bateria. Uma alternativa eficaz para contornar este problema o uso de antenas planares de moderada diretividade. A utilizao destas antenas em transceptores mveis (como nos telefones celulares) foi proposta h algum tempo atrs por alguns autores [Jensen and Rahmat-Samii, 1995; Salles et al. 2001]. Estas antenas emitem mais no sentido oposto cabea, melhorando a qualidade da comunicao, reduzindo os riscos sade dos usurios e o consumo da bateria. Elas podem ser fabricadas com pequenas dimenses e de forma compacta, integrada prpria caixa dos celulares, e so de baixo custo, representando ento uma opo interessante para esta utilizao. Neste trabalho sero resumidos os principais efeitos trmicos e no trmicos das radiaes no ionizantes, so mencionadas as principais normas que limitam a exposio das pessoas (ocupacional e no ocupacional) a estas radiaes, so apresentadasCad. Jur., So Paulo, v 6, n 2, p. 17-46, abr./jun. 2004

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estimativas tericas e resultados medidos para os campos irradiados por Estaes de Rdio Base (ERBs) tipicamente utilizadas em sistemas mveis no Brasil, e estes resultados so comparados com as principais normas disponveis. tambm resumido o mtodo das Diferenas Finitas no Domnio do Tempo (FDTD) usado para o clculo da taxa de absoro especfica (SAR) na cabea do usurio de transceptores mveis com antenas tipo monopolo convencional e com antenas planares tipo patch retangular. So mostrados resumidamente o projeto, simulao do desempenho e os principais resultados medidos com estas antenas, para as regies de campo prximo (distncias da mesma ordem de grandeza ou menores que o comprimento de onda) e de campo distante (distncias maiores que alguns comprimentos de onda). Os resultados apresentados so discutidos em presena do Princpio da Precauo, observando-se que para o caso das ERBs tipicamente utilizadas, mesmo as normas mais restritivas so respeitadas mantendo-se boa qualidade no sistema. Finalmente, so discutidos os principais benefcios da utilizao das antenas diretivas em novas geraes de transceptores mveis.

II. PRINCIPAIS EFEITOS TRMICOS E NO TRMICOS19

Em freqncias tpicas de sistemas de comunicaes, p.ex., em RF (Rdio Freqncias) ou em microondas, os principais efeitos da absoro da radiao no ionizante podem ser divididos em dois tipos basicamente, que so denominados efeitos trmicos e no trmicos, que sero considerados a seguir.

II.1. Efeitos trmicos

Os efeitos trmicos so aqueles causados por um aquecimento direto dos tecidos biolgicos como resultado da absoro da energia eletromagntica num meio dissipativo ou com perdas, isto , nos meios dieltricos onde a permissividade (ou constante dieltrica) apresenta uma parte imaginria maior que zero. A parte imaginria (r) da permissividade relativa de um dieltrico dissipativo pode ser relacionada a uma condutividade equivalente:

= 2f o r" [ S / m ] ,

(1)

onde f a freqncia e o a permissividade do vcuo. Tanto os valores das partes real (r ) e imaginria (r ) da permissividade relativa (r = r + j .r ), bem como da condutividade equivalente variam substancialmente com a freqncia e com o tipo de tecido [Fischetti, 1993]. Ao contrrio das radiaes no ionizantes em comprimentos de onda menores (p.ex., no infravermelho, ou no visvel etc.), as radiaesCad. Jur., So Paulo, v 6, n 2, p. 17-46, abr./jun. 2004

em microondas e em rdio freqncia (RF) no so somente absorvidas pela pele, mas dependendo da freqncia, em camadas mais profundas de tecidos tambm. Uma vez que os sensores de temperatura do corpo humano esto localizados somente na periferia do corpo, efeitos prejudiciais aos tecidos podem ocorrer devido a aquecimentos excessivos em regies mais profundas (p. ex., nos tecidos do crebro) , sem serem percebidos pelas pessoas. Ento, genericamente, todos os efeitos que podem ser devidos a um aumento de temperatura nos tecidos so chamados efeitos trmicos. Estes efeitos trmicos tm sido estudados h muitas dcadas [Bernhart, 1992; Bronzino, 1995; Grant, 1981], e os resultados da absoro dos campos eletromagnticos por diferentes tipos de tecidos so relativamente bem conhecidos, existindo mesmo normas internacionalmente aceitas que estabelecem limites de exposio em funo da freqncia de operao, do tempo de exposio, do tipo de usurio, etc.. Entre estas, pode-se citar p.ex., as normas IEEE/ANSI e ICNIRP/CENELEC [ICNIRP, 1998; IEEE, 1991]. Recentemente a ANATEL, atravs da sua Resoluo no 303 [ANATEL, 2002], recomendou nveis comparveis aos da norma ICNIRP. Os limites de exposio so variveis com a freqncia, em parte por considerar ressonncias e tambm por considerar a menor profundidade de penetrao dos campos eletromagnticos em freqncias mais elevadas. A ressonncia importante, pois quando este fenmeno ocorre, resulta em maior absoro de energia. Por exemplo, o corpo humano de um adulto apresenta tipicamente ressonncias na faixa de 40 a 80 MHz, enquanto o corpo de uma criana pode apresentar ressonncias na faixa de 200 a 300 MHz. Por outro lado, a cabea de um adulto pode apresentar ressonncias na faixa de 400 a 500 MHz, e na cabea de uma criana a ressonncia pode ocorrer na faixa de 700 a 800 MHz [ICNIRP, 1998]. Ressonncias em tecidos e estruturas menores do corpo podem ocorrer em freqncias mais elevadas. Os limites de exposio podem ser estabelecidos em intensidade de campo eltrico (V/m) ou de campo magntico (A/m), ambos mais utilizados em freqncias mais baixas, p.ex., at algumas centenas de MHz, ou em densidade de potncia (mW/cm2 ou W/m2), normalmente mais utilizada acima de algumas centenas de MHz.. Por outro lado, um parmetro dosimtrico largamente utilizado a Taxa de Absoro Especfica (SAR), que definida como a derivada no tempo do aumento de energia W absorvida ou dissipada num elemento de massa m contida num elemento de volume V cuja massa especfica [Salles, 1996; Stuchly, 1995], e que analiticamente pode ser expressa por:

20

SAR =

W W = [mW / g ] , t m t (V )

(2)

da possvel, em outras palavras, dizer-se que a SAR quantifica a potncia absorvida por unidade de massa. Utilizando o teorema do Vetor de Poynting para camposCad. Jur., So Paulo, v 6, n 2, p. 17-46, abr./jun. 2004

eletromagnticos com excitao senoidal no domnio da freqncia, a SAR pode ser tambm expressa por [Salles, 1996; Stuchly, 1995]:

Ji 0 r " 2 2 SAR = Ei = Ei = [mW / g ] , 2 2 2

2

(3)

onde Ei e Ji so os valores de pico do campo eltrico e da densidade de corrente no local considerado. Observa-se que a SAR diretamente proporcional ao aumento local de temperatura que responsvel pelos efeitos trmicos:

T SAR [C / s ] , = CP t

(4)

onde T a temperatura em graus Celsius, e Cp o calor especfico do tecido [J/kg C]. Um critrio bsico utilizado pelas normas que consideram exclusivamente os efeitos trmicos que at um nvel de SAR de 4 W/kg o acrscimo de temperatura dos tecidos no ultrapassa 1 oC, o que foi considerado um limite para no haver dano por efeito trmico [ICNIRP, 1998; IEEE, 1991]. A exposio a campos mais intensos, produzindo valores de SAR acima de 4 W/kg, pode comprometer a capacidade termo-regulatria do corpo e resultar em nveis danosos de aquecimento dos tecidos [Bernhardt, 1992; ICNIRP, 1998]. Ento a partir da so atribudos fatores de segurana, dependendo se a exposio ocorrer em: (a) ambientes controlados, ou ocupacionais, (p.ex., trabalhadores que esto instrudos e treinados em relao aos riscos potenciais e alertados a tomar as devidas precaues, e tem condies de avaliar os nveis de campo, identificar situaes de maior risco e se proteger adequadamente, ou em (b) ambientes no controlados, ou pblico em geral, quando pessoas de diferentes idades e com situaes de sade variveis esto envolvidas, podendo incluir grupos ou indivduos mais suscetveis, e que via de regra no esto conscientes ou prevenidos dos riscos de exposio radiao no ionizante. Tambm, o limite em SAR depende do tipo de exposio. Para exposio do corpo inteiro, por exemplo, pode-se considerar a SAR mdia, que ser ento a relao entre a potncia total absorvida pelo corpo e sua massa. Entretanto, para aquecimentos localizados, como os produzidos pelos telefones celulares emitindo muito prximos da cabea do usurio (a 2,5 cm ou menos), deve ser usada a SAR local, que definida como a potncia absorvida por unidade de massa de tecido (p.ex. em mW/g ou em W/kg). Pela norma IEEE/ANSI [IEEE, 1991] o valor mdio de SAR, para um grama de tecido contnuo, de 1,6 mW/g no deve ser ultrapassado. Pela norma ICNIRP/CENELEC [ICNIRP, 1998] o nvel mximo da SAR (valor mdio para 10 g de tecido contnuo) deve ser 2 mW/g, o que coincide com o valor adotado pela ANATEL.Cad. Jur., So Paulo, v 6, n 2, p. 17-46, abr./jun. 2004

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II.2 Efeitos no-trmicos

Os efeitos no trmicos so, por exemplo, efeitos bioqumicos ou eletrofsicos causados diretamente pelos campos eletromagnticos induzidos, e no indiretamente por um aumento localizado ou distribudo de temperatura. Estes efeitos ainda esto sendo estudados, havendo atualmente resultados conflitantes na literatura cientfica internacio-nal. Alguns resultados de experincias com cobaias e in vitro mostraram que estes efeitos podem ocorrer em nveis de energia substancialmente inferiores (p.ex., dezenas ou centenas de vezes abaixo) queles correspondentes aos efeitos trmicos. Alguns efeitos no trmicos reportados na literatura incluem efeitos nos sistemas nervoso, cardiovascular e imunolgico, bem como no metabolismo e em fatores hereditrios [Bernhart, 1992; Bronzino, 1995]. Entretanto, nestas reas os resultados ainda so polmicos, no existindo concluses definitivas, o que poder ainda demorar muitos anos. Alguns resultados so mesmo conflitantes, especialmente devido a tcnicas experimentais no muito confiveis. Por exemplo, (a) os mtodos utilizados para caracterizar os sintomas em estudos epidemiolgicos; (b) dosimetria em RF e microondas, especialmente em campo prximo; e (c) a presena de influncias estranhas no consideradas na interpretao dos resultados. Efeitos que foram claramente demonstrados incluem a alterao no fluxo de ons atravs das membranas das clulas (afetando particularmente as propriedades eletro-fisiolgicas das clulas nervosas), alterao na mobilidade dos ons de clcio (particularmente nos tecidos do crebro), alteraes na sntese de DNA e na transcrio de RNA e efeitos na resposta de clulas normais a molculas sinalizantes (incluindo hormnios, neurotransmissores e fatores de crescimento) [Bernhart, 1992]. Alteraes no fluxo de clcio em clulas, na barreira hemato-enceflica (blood-brain barrier- BBB, que protege o crebro de certas toxinas) e no desenvolvimento de tumores cerebrais foram tambm reportados [Fischetti, 1993]. Entre outras, uma incerteza importante que est para ser confirmada se estes efeitos no trmicos podem ou no ocorrer em taxas de absoro especficas bem abaixo daquelas observadas para os efeitos trmicos. Efeitos no sistema imunolgico foram constatados em cobaias quando a SAR era maior que 0,4 mW/g, as clulas ner-vosas eram influenciadas quando os valores de SAR eram superiores a 2 mW/g e exposio a SAR entre 2 e 3 mW/g promoveu a ocorrncia de cncer ou carcinomas em ratos [Bernhart, 1992]. Alm disto, alteraes no sistema endcrino e na qumica sangnea foram relatados quando a SAR maior que 1 mW/g e alteraes nos sistemas hematolgicos e imunolgicos ocorrem quando a SAR igual ou maior que 0,5 mW/g para exposies prolongadas [Stuchly, 1995]. Alguns autores resumem os dados experimentais em cobaias sugerindo que os efeitos aparecem em SAR mdias entre 1 e 4 mW/g, e isto tem sido um critrio adotado nas normas mais recentes [Stuchly, 1995].Cad. Jur., So Paulo, v 6, n 2, p. 17-46, abr./jun. 2004

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Recentemente, os Drs. L. Salford (neurocirurgio) e B. Persson (biofsico) da Universidade de Lund na Sucia mostraram que nveis muito baixos de exposio (SAR = 0,002 W/Kg, durante somente 2 horas) podem alterar a barreira hemato-enceflica (Blood Brain Barrier- BBB), permitindo que substncias qumicas penetrem em neurnios no crtex, no hipocampo e em gnglios basais do crebro. Esta alterao permanecia ainda evidente 4 semanas aps uma nica exposio de 2 horas, mesmo naqueles nveis baixssimos de SAR [NIEHS, 2003]. Tambm recentemente, foi reportada a induo de protenas de choque trmico (HSP- Heat-Shock Proteins) em vermes do tipo nematides (Caenorhabditis Elegans) com exposio prolongada a campos eletromagnticos de baixa intensidade (SAR de 0,001 W/Kg, em 750 MHz), o que foi atribudo a mecanismos no trmicos que podem tambm ocorrer em tecidos humanos [De Pomerai et al., 2000]. Isto sugere ento que os limites atuais de exposio devem ser reconsiderados, por exemplo com a adoo do Princpio da Precauo (PP). Revendo a literatura, observa-se que, medida que as pesquisas avanam e novos resultados aparecem, as normas so atualizadas e novos limites mais restringentes so sugeridos. Entre as muitas dvidas que ainda esto por ser esclarecidas possvel ressaltar, por exemplo, como o campo eletromagntico atua em determinadas estruturas, como: (a) nos cromossomos ou nas molculas de DNA que constituem os genes [Fischetti, 1993], e (b) na alterao da mobilidade dos ons (p.ex., de clcio), particularmente em tecidos do crebro e nas propriedades eletro-fisiolgicas das clulas nervosas [Bernhart, 1995]. A prpria OMS - Organizao Mundial da Sade, est coordenando um projeto multinacional visando maior conhecimento dos efeitos no trmicos. Entre outros, reconhece que: ...existem brechas no conhecimento (gaps in knowledge) que foram identificadas para pesquisas subseqentes, para se ter melhor avaliao dos riscos sade. Deve demorar cerca de 3 a 4 anos para que a necessria pesquisa em RF seja concluda, avaliada e que os resultados de quaisquer riscos sejam publicados [WHO, 1996]. Por exemplo, em relao utilizao dos telefones mveis por crianas, a Dra. Gro Harlem Brundtland, Diretora Geral da OMS, declarou Eu evitaria deixar crianas utilizar telefones mveis por horas todos os dias, porque ns no conhecemos o suficiente sobre os danos [Bruntland, 2002]. Por outro lado, em reunio realizada no incio de 2003, a OMS decidiu que j existem evidncias cientficas suficientes para a aplicao do Princpio da Precauo - PP [WHO, 2003]. Segundo entendimento da OMS, o Princpio de Precauo (PP) um critrio de abordagem de riscos aplicado em circunstncias com um alto grau de incerteza cientfica, refletindo a necessidade de tomar atitudes em face de riscos potencialmenteCad. Jur., So Paulo, v 6, n 2, p. 17-46, abr./jun. 2004

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srios, sem esperar os resultados da pesquisa cientfica. A OMS declara tambm que... No basta obedecer s normas atuais. Os sistemas irradiantes devem usar nveis de radiao eletromagntica to baixos quanto possvel [WHO, 1996]. Este conceito representado pelas siglas ALARA (As Low As Reasonably Achievable) e ALATA (As Low As Technically Achievable) e est por trs dos nveis mais restritivos alcanados por um consenso maduro entre empresas prestadoras de servios e os legisladores, garantido-se tambm boa qualidade do servio p.ex., [Sua, 1999]. III. PRINCIPAIS NORMAS DISPONVEIS LIMITANDO AS RNI As normas disponveis mais utilizadas podem, genericamente, ser divididas em dois grupos: a) as que consideram somente os efeitos trmicos das RNI, que esto bem estabelecidos, entendendo que no h conhecimento cientfico suficiente para a adoo de limites mais restritivos; e b) aquelas que adotam nveis mais restritivos, considerando em parte os efeitos no trmicos das RNI e incorporando em parte o Princpio da Precauo (PP). Entre as primeiras esto as normas IEEE/ANSI e ICNIRP/CENELEC, sendo que os limites desta ltima foram tambm adotados pela ANATEL em sua Resoluo 303, como j mencionado anteriormente. Entre as normas que consideram em parte os efeitos no trmicos podem ser mencionadas as da Sua, Itlia, Luxemburgo, Blgica, Rssia, China, etc. A ttulo de exemplo, na tabela I abaixo esto resumidos alguns dos limites estabelecidos (em freqncias prximas a 850 MHz), pelas normas mais difundidas, . Os valores em SAR (para exposio localizada e para exposio de corpo inteiro) especificados pelas normas IEEE/ANSI e ICNIRP/CENELEC (mencionados na seo anterior) esto tambm includos nesta tabela.TABELA I - NORMAS DE EXPOSIO (EM 850 MHz)Valores mximos de exposio Normas de exposio humana Nmero Campo Eltrico E [V/m] Densidade SAR SAR de Potncia localizada corpo Umax (W/Kg) inteiro [W/m2] (w/kg) 5,7 4,3 4,3 4,3 0,1 0,043 0,043 Umax [W/m2] 0,024 1,6 2 2 0,08 0,08 0,08

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ANSI/IEEE (1991/92) ICNIRP (1998) ANATEL (2002) Porto Alegre (jan. 2000) Itlia (1998) Porto Alegre (abr. 2002) Sua (1999) Normas de Compatibilidade Eletromagntica IEC/ABNT (out. 1997) NBR IEC 60601-1-2

C.95.1 ENV 50166-2 Resoluo 303 8.463 381 8.896 814.710

46 40 40 40 6 4 4 E [V/m] 3

-

-

Cad. Jur., So Paulo, v 6, n 2, p. 17-46, abr./jun. 2004

Em relao aos telefones mveis, o IEEE estabeleceu um procedimento de medidas destes aparelhos (IEEE P 1528) que foi recomendado pela FCC nos EUA [FCC, 2001]. Na Comunidade Europia, o CENELEC tambm estabeleceu em meados 2000 um procedimento de medidas (EN 50360). No Brasil, em 2003 o CPqD Centro de Pesquisas e Desenvolvimento, em Campinas, SP, recebeu um equipamento para medidas de SAR. Tambm o INPE Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais em So Jose dos Campos, SP, dever receber em breve. Em 25/10/2001 foi sancionada no municpio de Porto Alegre, RS, a Lei Municipal No 8.797 (publicada no D. O. de Porto Alegre em 1/11/2001, pg. 2), que ...Dispe sobre a obrigatoriedade de confeco e distribuio de material explicativo dos efeitos das radiaes emitidas pelos aparelhos celulares e sobre a sua correta utilizao, e d outras providncias. Entre outros, determina que ...Art. 1o - Ficam as empresas que comercializam aparelhos de telefonia celular no Municpio de Porto Alegre, obrigadas a confeccionar e a distribuir, no ato da venda, material explicativo contendo informaes acerca das radiaes emitidas pelos aparelhos celulares e sobre as precaues necessrias sua correta utilizao. Esta Lei foi regulamentada pelo Decreto Municipal No 14.285 de 10/9/2003 (publicado no D. O . de P. Alegre em 22/9/2003, pgs. 2 e 3), que entre outros determina que: .....Art. 3o - O material explicativo de que trata o Art. 1o da Lei No 8.797/01 dever conter, no mnimo, as informaes constantes no anexo deste Decreto. Ento, no Anexo esto as Orientaes aos Usurios de Telefones Celulares , onde entre outros se l: ... O telefone celular um receptor e emissor de ondas de rdio freqncia (radiao eletromagntica), razo pela qual recomenda-se a observncia das seguintes orientaes: Uso indevido do telefone celular pode causar danos sade, logo a preveno uma estratgia de sade pblica. Telefone celular no brinquedo infantil, portanto, evite que as crianas o utilizem como brinquedo Evite o uso prolongado do celular.

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Esta legislao ainda que necessite melhorias, considerada importante pois a primeira no Brasil a tratar deste assunto de forma preventiva.

IV. CLCULO DAS DISTNCIAS A PARTIR DAS QUAIS AS NORMAS SO OBEDECIDAS EM ERBS TPICAS Para as ERBs tipicamente utilizadas em sistemas de telefonia celular no Brasil, foram efetuadas estimativas tericas e medidas dos campos irradiados, obtendo-se boa concordncia entre ambos. Os aspectos tericos dos clculos dos campos para as ERBs foram mostrados em [Salles et al., 2000]. Uma forma relativamente simples e prtica para visualizar os limites a partir das quais as normas so atendidas em cada caso, a representao atravs das Zonas de Excluso, que so os locais onde asCad. Jur., So Paulo, v 6, n 2, p. 17-46, abr./jun. 2004

normas so superadas, o que ser visto adiante. Inicialmente, as distncias a partir das quais as normas so obedecidas, so calculadas a partir da equao de Friis [Friis, 1946] para espao livre:R( , ) =

Pm Dm ( m , m ) N m , 4U max m =13

(5)

onde R(0,o) a distncia da antena para um azimute o e altura 0, Pm a potncia efetivamente irradiada pela antena por canal, Dm a funo de diretividade da antena, 0m o tilt ou ngulo de orientao vertical da antena, om o azimute ou ngulo de orien-tao horizontal da antena, Nm o nmero de canais (canais rdio) por setor e Umax o limite mximo de densidade de potncia para o qual se quer calcular a regio no qual este limite observado. Pode ser acrescentado um fator que leve em conta as reflexes, e margens de segurana, por exemplo, 2,51 e 2/3 respectivamente, de acordo com a Consulta Pblica 296/01 que deu origem Resoluo 303/2002 ANATEL [ANATEL, 2002]. Alternativamente, na norma da Sua [Sua, 1999], uma forma de tratamento de incertezas sugerida, o que est ilustrado na Figura 1. onde o diagrama de irradiao vertical de uma antena corrigido para efeitos de clculo, considerando uma margem de erro no tilt de 5o e 30 dB como ganho mnimo em qualquer direo.26

IV.1 Parmetros da ERB usada nos clculos Todos os clculos foram realizados para a pior situao, para uma ERB tpica. Esta ERB possui 3 setores simtricos de azimute 0o, 120o e 240o (para efeitos de clculo se assume que as antenas esto localizadas no mesmo ponto). As antenas no tm tilt (0o), e a ERB opera na faixa de 850 MHz. A potncia equivalente isotropicamente irradiada por canal (EiRP) de 150 W (52 dBm), sendo 12 canais por setor. O diagrama de irradiao vertical, e os diagramas de irradiao horizontais, de cada antena e do conjunto, encontram-se nas Figuras 1 e 2 respectivamente. O ganho das antenas de 15 dBi. IV.2 Regies de Excluso Nesta seo so mostradas as regies do espao para as quais as normas so superadas ou no. A regio externa superfcie representa situaes de atendimento norma enquanto a regio interna representa os pontos onde a norma superada (regio de excluso). Para tanto, so mostrados diagramas em perspectivas tridimensionais bem como projees horizontais e verticais. Na Tabela 2 esto resumidas as distncias de atendimento s diferentes normas. Observa-se que para a ERB estudada, as normas mais restritivas so atendidas aCad. Jur., So Paulo, v 6, n 2, p. 17-46, abr./jun. 2004

distncias horizontais a partir de cerca de 90 m e a distncias verticais a partir de cerca de 20 m. Nos exemplos a seguir, so calculadas as superfcies de contorno a partir das quais as normas so obedecidas, para uma ERB de mdia capacidade e mdia potncia:

freqncia de operao:Bandas A e B (~850MHz) nmero de canais por setor: potncia por canal: ganho das antenas: 12 10 W 2 dBi

TABELA II - DISTNCIAS DE ATENDIMENTO S NORMASNormas ANSI/IEEE (No C 95.1, 1991/ 92) ICNIRP (No ENV 50.166-2,1998) ANATEL (Resol. No 303, jul. 2002) Porto Alegre (No 8.463, jan. 2000) Itlia (No 381, 1998) Porto Alegre (No. 8.896, abril 2002) Sua (No 814.710, 1999) IEC/ABNT (NBR 60601-1-2,1997) Distncia horizontal [m] 5,7 6,3 6,3 6,3 42,8 63,3 63,3 87,3 Distncia vertical [m] 1,3 1,5 1,5 1,5 9,9 15,1 15,1 20,2

27

Fig. 1. Diagrama de irradiao vertical da antena (linha tracejada) e seu valor corrigido para efeitos de clculo (linha contnua) de acordo com a norma da Sua.

Fig. 2. Diagrama de irradiao horizontal de cada uma das antenas (linhas tracejadas) e o valor do somatrio obtido (linha contnua).

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A Figura 3 mostra os limites de atendimento da norma ICNIRP/CENELEC, que tem os limites anlogos aos da recomendao adotada pela ANATEL [ANATEL, 2002]. Para esta ERB, a partir de uma distncia de 6,3 m na horizontal ou de 1,5 m na vertical os valores limites da recomendao da ANATEL so atendidos.

28

Fig. 3. Zonas de excluso conforme a recomendao adotada pela ANATEL. Escala = 10 m. (a) perspectiva; (b) projeo horizontal; (c) projeo vertical.

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Na Figura 4 so mostradas as zonas de excluso referentes norma IEEE/ANSI [IEEE, 1991]. Observa-se que para esta ERB, a partir de uma distncia de 5,7 m na horizontal ou de 1,3 m na vertical os valores limites da norma IEEE/ANSI so atendidos. Nesta figura a escala foi alterada para 100 m, para comparar com as figuras seguintes que correspondem a normas que adotam em parte o Princpio de Precauo.

Distncia (m)

Distncia (m)

Distncia (m)

Fig. 4. Zonas de excluso conforme a norma IEEE/ANSI. Escala = 100 m (a) perspectiva; (b) projeo horizontal; (c) projeo vertical.

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Distncia (m)

Distncia (m)

Distncia (m)

Distncia (m)

Fig. 5. Zonas de excluso conforme a norma italiana. Escala = 100 m. (a) perspectiva; (b) projeo horizontal; (c) projeo vertical.

Distncia (m)

Cad. Jur., So Paulo, v 6, n 2, p. 17-46, abr./jun. 2004

Distncia (m)

Distncia (m)

Distncia (m)

Fig. 6. Zonas de excluso conforme a norma sua. Escala = 100 m. (a) perspectiva; (b) projeo horizontal; (c) projeo vertical.

30

Distncia (m)

Distncia (m)

Distncia (m)

Distncia (m)

Fig. 7. Zonas de excluso conforme a norma de compatibilidade eletromagntica. Escala = 100 m. (a) perspectiva; (b) projeo horizontal; (c) projeo vertical.

Distncia (m)

Cad. Jur., So Paulo, v 6, n 2, p. 17-46, abr./jun. 2004

Na Figura 5 so mostradas as zonas de excluso referentes norma da Itlia [Itlia, 1998]. Observa-se que para esta ERB, a partir de uma distncia de 42,8 m na horizontal ou de 9,9 m na vertical os valores limites da norma italiana so atendidos. Na Figura 6 so mostradas as zonas de excluso referentes norma da Sua [Sua, 1999]. Observa-se que para esta ERB, a partir de uma distncia de 63,3 m na horizontal ou de 15,1 m na vertical os valores limites da norma sua so atendidos. Na Figura 7 so mostradas as zonas de excluso referentes norma de compatibilidade eletromagntica do IEC/ABNT [ABNT, 1997]. Observa-se que para esta ERB, a partir de uma distncia de 87,3 m na horizontal ou de 20,2 m na vertical os valores limites da norma IEC so atendidos. Na Tabela III esto resumidos os valores limites (em freqncias prximas a 850 MHz) em campo eltrico e em densidade de potncia nas normas mais difundidas, e as distncias (horizontal e vertical) a partir das quais estes limites so respeitados.TABELA III - COMPARAES ENTRE DIFERENTES NORMASNormas de exposio humana Nmero Valores mximos de exposio E [V/m] Umax [W/m2] 5,7 4,3 4,3 4,3 0,1 0,043 0,043 0,001 Umax [W/m2] 0,024 Distncia para uma ERB tpica Horiz. [m] 5,7 6,3 6,3 6,3 42,8 63,3 63,3 ~430 E [V/m] 87,3 Vert. [m] 1,3 1,5 1,5 1,5 9,9 15,1 15,1 ~100 Umax [W/m2] 20,2

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ANSI/IEEE (1991/92) ICNIRP (1998/96) ANATEL (jul. 2002) Porto Alegre (jan. 2000) Itlia (decreto set. 1998) Porto Alegre (abr. 2002) Sua (norma dez. 1999) Salzburg, ustria Normas de Compatibilidade Eletromagntica IEC/ABNT (out. 1997)

C.95.1 ENV 50166-2 Resoluo 303 8.463 381 8.896 814.710

46 40 40 40 6 4 4 ~0,6 E [V/m]

NBR IEC 60601-1-2

3

Genericamente pode-se mencionar ento, que no caso das ERBs tpicas consideradas, desde que as antenas sejam instaladas em torres elevadas (p.ex., 20 ou 30 metros de altura, ou mais), mesmo os limites das normas mais restritivas consideradas (p.ex., norma da Sua) so atendidos em distncias maiores que cerca de 60 m na direo de mxima irradiao (i. a norma atendida desde que a antena esteja 15 m acima do ponto mais elevado num raio de 60 m, considerando tilt 0). Estes valores devem ser ajustados e calculados caso a caso. Assim, para ERBs de grande capacidade (i.. com um nmero maior de canais) e/ou grande potncia as distncias sero maiores que as da Tabela III. Inversamente, para ERB de menor capacidade e/ ou potncia, p.ex. mini-ERB, as normas sero atendidas em distncias menores.Cad. Jur., So Paulo, v 6, n 2, p. 17-46, abr./jun. 2004

V. MODELAMENTO DA SAR NA CABEA E DO DIAGRAMA DE IRRADIAO EM TELEFONES MVEIS COM ANTENAS CONVENCIONAIS E PLANARES Para o modelamento do problema foram desenvolvidos algoritmos baseados no mtodo das Diferenas Finitas no Domnio do Tempo (FDTD), representados no diagrama em blocos da Figura 8, e com as caractersticas resumidas a seguir.

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Fig. 8: Diagrama em blocos mostrando o solver FDTD

V.1 O Domnio do Problema Quando se desejam processar simulaes numricas de um dado problema necessrio contar com um modelo que represente adequadamente o espao fsico do mesmo. Modelos unidimensionais ou bidimensionais so possveis, tendo como vantagens a correspondente reduo na capacidade de memria, nos tempos de processamento e na complexidade necessria do equacionamento e dos algoritmos. Graas maior capacidade computacional disponvel, cada vez mais modelos tridimensionais, embora mais exigentes, so usados. Estes modelos tridimensionais podem ter geometria simples, de relativamente fcil implementao, como uma representao de cabea humana por camadas de elipsides de revoluo, ou modelos mais complexos. Para o presente estudo optou-se por um domnio tridimensional o mais aproximado possvel da realidade.Cad. Jur., So Paulo, v 6, n 2, p. 17-46, abr./jun. 2004

V.1.1 O domnio no campo prximo.

O modelo da cabea usado foi desenvolvido especificamente para este trabalho. Neste modelo, os diferentes tecidos que compem a cabea so tratados como materiais homogneos e invariantes definidos a partir de imagens mdicas disponveis: imagens de cortes (Figura. 9a), Raios-X e ressonncias magnticas (Figura 9b). Estas imagens, num total de 128, com espaamento D = 1,8 mm entre cortes contguos, foram tratadas individualmente usando tcnicas de reconhecimento de padres, automticas e manuais (p. ex., mscaras de cores do software CorelDraw com correo individual do reconhecimento de estruturas) para a conformao de um conjunto de arquivos de imagens bitmap (Figura 9c) dos quais foi extrada a malha do domnio: uma matriz tridimensional de 128 x 170 x 130 pontos ou pixels, totalizando aproximadamente 3 milhes de pontos (Figura 9d). Os diferentes tecidos ou materiais identificados correspondem a pele/gordura, msculos, ossos, crebro, olhos e o ar. Ento, uma vez que estes tecidos so considerados homogneos, as estruturas menores, como vasos capilares, no so levadas em considerao.33

(a)

(b)

(c)

(d)

Figura 9. Imagens mdicas originais: (a) corte sagital da cabea, e (b) imagem de ressonncia magntica do mesmo corte. (c) Imagem simplificada de um corte sagital da cabea com seus tecidos identificados por cores. (d) Ilustrao de um plano da matriz de domnio, onde cada ndice corresponde a um tecido.

Os parmetros eletromagnticos mdios dos diferentes tecidos presentes foram definidos de acordo com [Jensen and Rahmat-Samii, 1995] e com [Iskander et al., 2000] para a freqncia de 1900 MHz e constam na Tabela IV. Estes valores so prximos dos valores recomendados pelo FCC e IEEE [IEEE, 2001].TABELA IV - PARMETROS DOS TECIDOS USADOS NA SIMULAOTecido Pele/Gordura Msculo Osso Crebro Olho r 36,5 55,3 7,75 46,0 80,0 o [S/m] 0,700 2,000 0,105 1,650 1,900 o [kg/1] 1,10 1,04 1,85 1,03 1,02

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Dos valores na pgina anterior se observa que dever ocorrer uma elevada densidade de fluxo eltrico devido s constantes dieltricas elevadas, o que associado aos altos valores de condutividade, ir resultar em SAR elevada para alguns tecidos de acordo com a equao (3).

V.1.2 O domnio no campo distante: Malha multidimensional A malha fina de = 1,8 mm permite uma adequada representao dos diferentes tecidos biolgicos e dos detalhes da antena e do aparelho celular. Porm, para obter os diagramas de irradiao das antenas simuladas, foi implementada uma segunda malha, de menor detalhamento, com clulas de g = 27 mm, onde foram obtidos os valores de campo para uma distncia 10 para garantir que se est na regio de campo distante, que mais homognea. A figura 10 abaixo ilustra um domnio composto de duas malhas com clulas de dimenses diferentes [Iskander et al., 2001].

34 Fig. 10 Representao de uma malha com clulas de duas dimenses como a implementada.

A malha fina foi implementada com 23,04 x 30,60 x 32,40 cm3, (128 x 170 x 180), enquanto a malha grossa tem 3,51 x 3,645 x 4,59 m3 (130g x 135g x 170g). O acoplamento dos problemas nas duas malhas se d quando os valores calculados nos pontos extremos da malha fina so usados como valores de fonte para os pontos coincidentes da malha grossa [Salles et al., 2002].

V.2 Limitao do domnio, Estabilidade e Disperso Numrica.

A condio de contorno utilizada neste trabalho foi uma parede absorvedora, como a descrita por Mur (de 2da ordem) [Mur, 1981] dado que esta soluo exige menos recursos computacionais que outras solues como a PML, Perfect Matching Layer [Brenger, 1996; Taflove, 1998] e mantm uma boa atenuao da onda refletida na parede, suficiente para este tipo de simulao [Lazzi, 97]. Esta condio necessria para simular uma propagao em espao livre num domnio numrico que necessariamente deve ser truncado.Cad. Jur., So Paulo, v 6, n 2, p. 17-46, abr./jun. 2004

Alm das reflexes nas bordas do domnio, as simulaes podero divergir dependendo da relao entre o comprimento da onda propagada e as dimenses das clulas de discretizao, e tambm do nmero de iteraes. Neste caso, como o clculo de SAR no sensvel fase, pode ser tolerado certo grau de disperso na regio prxima. Na regio de campo distante (malha grossa) o nmero de pontos por comprimento de onda relativamente pequeno e o intervalo de convergncia da simulao fica, portanto, reduzido. Isto no comprometeria a obteno dos diagramas de irradiao desde que os mesmos podem ser determinados como medidas relativas de campo nas diferentes direes. Para contornar estas dificuldades solues baseadas nos potenciais vetoriais, em integrais do campo distante [Sullivan and Young, 2001] e outras variantes do mtodo FDTD como o mtodo Pseudo Espectral no Domnio do Tempo (PSTD), que requer apenas dois pontos de clculo por comprimento de onda [Liu and He, 2001], e alternativas incondicionalmente estveis (p.ex. Alternating Direction-Implicit-FDTD ou ADI-FDTD [Chung et al., 2003] ) foram propostas. V.3 O Algoritmo O mtodo FDTD resolve, num domnio de clculo previamente discretizado, as equaes diferenciais de Maxwell, numa forma explcita de diferenas finitas [Taflove, 1998]. Desta forma os clculos so realizados localmente, considerando apenas a vizinhana do ponto calculado e as solues avanam no tempo a cada iterao o que permite resolver problemas transientes e outros, como neste caso, nos quais a adequada representao do domnio de clculo exige matrizes de grandes dimenses. O algoritmo implementa equaes semelhantes (6), que diferem das equaes originalmente propostas, pelo fato de calcular ambos os campos, eltrico e magntico numa nica malha e no em malhas intercaladas, evitando a duplicao da malha. t 1 i, j,k n +1 2 i , j , h Ez = t i, j,k 1 + i, j,k 2 i , j ,h t n i, j ,k Ez + t i, j,k 1 + i, j ,k 2 i , j , k n +1 n +1 n +1 n +1 Hy Hy Hx Hx i, j,k i 1, j , k i, j,k i , j 1, k x y

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(6)

VI. PROJETO E SIMULAO DE ANTENAS PLANARES Uma vez que as clulas da digitalizao da cabea possuem um tamanho definido (), tanto as dimenses dos elementos presentes na simulao (telefone celular, antena etc) quanto o posicionamento relativo dos mesmos so mltiplos inteiros deste valor. Por exemplo, a distncia do telefone celular cabea 0,54 cm (3), ou seja, prxima a uma distncia tpica de utilizao.Cad. Jur., So Paulo, v 6, n 2, p. 17-46, abr./jun. 2004

O tempo total de cada simulao no supercomputador Cray T94 foi em torno de 2 horas (incluindo o tempo de espera) utilizando para tanto, uma memria de 820 MB para um total de 2400 iteraes na malha fina com t 3 ps correspondendo a um tempo total de 7,205 ns. Este nmero de iteraes corresponde a 160 iteraes na malha grossa para um tg 45 ps, pois a relao entre t e tg corresponde quela entre as dimenses das malhas, fina e grossa e g, garantindo a mesma velocidade de propagao em ambas as malhas, para um mesmo meio.

VI.1 Modelamento da Antena tipo Monopolo de de Onda

O modelo do aparelho celular porttil consiste numa caixa metlica, coberta com uma camada dieltrica (y= 2,1) de 1,8 mm, com dimenses totais de 45 x 19,8 x 117 mm (25 x 11 x 65). A antena foi modelada por uma haste metlica de 39,6 mm (22) de comprimento fixada na parte superior da caixa metlica. A freqncia de operao definida foi de 1,8926 GHz para que estas dimenses correspondam a /4.36

A alimentao feita atravs de um cabo coaxial que conecta a antena a uma softsource colocada numa clula imediatamente acima da parede absorvedora, onde forado o campo Ey (Figura 11a). VI.2 Projeto e Modelamento da Antena Planar

Diferentes antenas planares foram propostas [Kaneda et al., 2002; Nakano et al., 2002; Romeu and Soler, 2002; Yang et al., 2001]. Aqui ser apresentada uma antena em microstrip do tipo patch retangular simples porque suas caractersticas so adequadas para esta aplicao e seu projeto j bastante estabelecido [Balanis, 1997; Garg et al., 2001]. Nas simulaes foram utilizados os parmetros do substrato RT/duroid 5880 de baixas perdas, que foi usado na implementao da antena (er = 2,2, tgd = 0,0009 e h = 3,6 mm). A largura da antena deve ser compatvel com a largura do aparelho (45 mm = 25 ) e com as dimenses das clulas (voxels) da malha utilizada nas simulaes FDTD. Com esta limitao de largura, o plano de terra fica pequeno, os mtodos analticos clssicos usados para o projeto (bem como em algumas simulaes) apresentam ento resultados aproximados, sendo necessrias medidas ou simulaes mais adequadas (p.ex., FDTD) para uma caracterizao mais precisa. A antena foi projetada para ter uma largura W1 = 34,2 mm (19) e comprimento L1 = 54 mm (30), de forma que, usando as equaes para o modelo de cavidade [Garg et al., 2001], verifica-se que a ressonncia ocorre em 1,893 GHz (Figura 11b).Cad. Jur., So Paulo, v 6, n 2, p. 17-46, abr./jun. 2004

(a)

(b)

Fig. 11. (a) Representao do aparelho celular porttil modelado com antena tipo monopolo de de onda alimentada por cabo coaxial, e (b) com antena planar com alimentador coaxial.

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VI.2.1. Parmetros da Antena Patch Simulados no Ensemble A antena projetada foi simulada tambm utilizando o programa para simulao de estruturas planares Ensemble (SV v. 2.0.57) [Ansoft, 2002], obtendo-se, para os parmetros acima listados, uma taxa de onda estacionria de 1,014. A largura de banda calculada [Balanis, 1997] para uma taxa de onda estacionria (VSWR) = 3 foi de 11 MHz, e a simulada foi de cerca de 60 MHz de acordo com a Figura 16. Esta largura de banda pode ser melhorada com um projeto otimizado para este fim. Outros dados obtidos de clculos so os fatores de qualidade: de perdas no condutor, Qc = 6,61x103, de perdas no dieltrico, Qd = 1,20506x103, de irradiao, Qi = 211,83401, e total, Qt = 175,38344. Com isso a eficincia estimada de = 82,79%. Observa-se que este modo de alimentao no to adequado quanto a sonda coaxial utilizada em [Salles et al., 2002], obtendo-se maior eficincia e largura de banda ( = 86,17% e BW = 13 MHz), pois aqui a linha de transmisso de alimentao contribui tambm para a irradiao como se observa em [Salles et al., 2002] VI.3. Simulaes FDTD do campo prximo

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de Nas simulaesutilizando a foram comparados valores de SAR na cabea de um de onda; e b) efetuadas antena microstrip planar (patch retangular). O objetivo usurio de telefone celular porttil para duas situaes: a) utilizando antena monopolo desta comparao verificar a distribuio de campo no espao, bem como observar se ocorre diferena na SAR dos tecidos da cabea devido utilizao destes dois diferentes tipos de antenas. Na Figura 12 esto mostradas, respectivamente, as distribuies de campo eltrico (20log|E|) em cortes frontais (no plano da antena monopolo) e coronais (na base da antena monopolo). possvel observar-se que os nveis de campo no crebro so substancialmente inferiores (mais que 10 dB) quando a antena diretiva usada. Nas Figura 13 esto mostradas as distribuies em escala logartmica (em dB) para facilidade de leitura, da SAR (10log[SAR]) na cabea para os mesmos cortes frontais e coronais, respectivamente. Esses valores de SAR so normalizados para uma potncia entregue antena de Pdel = 600 mW (pior situao: potncia mxima irradiada por um telefone celular analgico ou um digital operando em roaming), onde 0 dB corresponde SAR = 1 mW/g. Da mesma forma, observa-se que os valores de SAR na cabea obtidos com a antena diretiva so pelo menos 10 dB inferiores aos obtidos com a antena convencional. possvel estimar nas Figura 13, o valor mdio de SAR para 10 g de tecido contnuo, a partir do clculo em volumes cbicos com cerca de 2,2 cm de aresta. Uma vez que a norma recomendada pela ANATEL [ANATEL, 2002] para o Brasil estabelece um limite mximo de SAR = 2 mW/g, observa-se nas Figura 13a e 13c que a antena convencional supera por muitas vezes aquela norma, nas condies mencionadas. Estes resultados so comparveis aos obtidos por outros autores [Bernardi et al., 2001; Dimbylow and Gandhi, 1991; Iskander et al., 2000; Jensen and Rahmat-Samii, 1995; Okoniewski and Stuchly, 1996; Watanabe et al., 1996]. Por outro lado, conforme mostrado em trabalhos anteriores [Salles et al., 2000, 2001] o maior afastamento entre a antena e a cabea pode levar ao atendimento da norma mesmo quando a antena convencional utilizada. No caso da antena diretiva, a reduo dos valores do campo e da SAR na cabea considervel, levando, via de regra, ao atendimento norma. Resultados anlogos tambm foram obtidos por outros autores [Bernardi et al., 2001; Jensen and Rahmat-Samii, 1995]. Uma vez que a potncia absorvida na cabea (que parte da potncia absorvida total, Pabs) menor, observa-se uma melhoria na eficincia de irradiao, = (Pdel Pabs)/Pdel, das antenas diretivas (em comparao com o monopolo), o que j havia sido assinalado por outros autores.

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(a)

(b)

(c)

(d)

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Figura 12. Imagens frontais (xy) da intensidade de campo eltrico (20log|E|) obtidas ao final das simulaes, onde utiliza-se: a) o monopolo de de onda e b) a antena diretiva, e imagens coronais (xz) para c) o monopolo de de onda e d) a antena diretiva.

(a)

(b)

(c)

(d)

Figura. 13. Imagens frontais (xy) da distribuio da SAR (10log(SAR)) obtidas ao final das simulaes, onde utiliza-se: a) o monopolo de de onda e b) a antena diretiva. Imagens coronais (xz) da distribuio da SAR (10log(SAR)) para c) o monopolo de de onda e d) a antena diretiva.

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VI.4. Simulaes FDTD do campo distante

O mtodo FDTD com a malha grossa foi utilizado para obter os resultados em campo distante (d 10l), com e sem a presena da cabea, tanto para a antena monopolo como para a antena diretiva, em cerca de 1,9 GHz. Os diagramas de irradiao obtidos, na forma polar no plano horizontal, esto apresentados na Figura 14, tanto da antena monopolo como da antena diretiva. Estes tm escala radial de 5 dB e, para efeitos de simplicidade na comparao, os campos esto normalizados na direo oposta cabea. Nas simulaes, a metalizao posterior da antena (ou seja, o plano terra) no est efetivamente aterrada, configurando uma situao mais prxima situao realmente encontrada no caso dos telefones portteis onde no existe um plano terra efetivo. Nesta situao, obteve-se um diagrama de irradiao horizontal com uma relao frente costas de cerca de 10 dB, como mostra a Figura 14b. Resultado semelhante foi obtido por [Iskander et al., 2000]. Tambm os resultados medidos e apresentados a seguir, so prximos deste valor e podem ser considerados adequados para a aplicao em antenas de transceptores mveis operados muito prximos cabea do usurio. Na Figura 14a aparecem os diagramas de irradiao no plano horizontal para a antena monopolo de de onda com (linha pontilhada) e sem (linha contnua) a cabea. Observa-se uma diminuio de cerca de 5 dB na direo do usurio devido presena da cabea, como tm sido usado no projeto de enlaces (Body Loss) [Holma and Toskala, 2000; Nielsen et al., 2002].Cad. Jur., So Paulo, v 6, n 2, p. 17-46, abr./jun. 2004

Fig. 14a. Diagrama de irradiao horizontal para a antena monopolo de de onda: Linha contnua sem a cabea, Linha pontilhada com a cabea.

Fig. 14b. Diagrama de irradiao horizontal em espao livre (sem a cabea): Linha contnua monopolo de de onda, Linha pontilhada antena diretiva.

Fig. 14c. Diagrama de irradiao horizontal na situao de uso (com a cabea): Linha contnua monopolo de de onda, Linha pontilhada antena diretiva.

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Na Figura 14c ambas antenas so comparadas quando operam na presena da cabea. A se observa ento, que no caso da antena diretiva (linha pontilhada) a relao frente costas se mantm pouco menor que 10 dB. Ento, para o caso de uma antena diretiva com baixas perdas e baixa taxa de onda estacionria, naturalmente a energia emitida na direo oposta cabea (direo preferencial de comunicao) maior do que no caso da antena convencional, o que seria benfico em termos de clculo do enlace (Power Budget).

VII. RESULTADOS MEDIDOS EM ANTENAS PLANARES Dois prottipos da antena projetada foram realizados sobre substratos RT/duroid 5880 de 1,8 mm de largura e utilizando conectores SMA.

Figura 15. Antena em microstrip tipo patch retangular medida.

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A taxa de onda estacionria simulada est mostrada na Figura 16a, e a medida (com o analisador de espectro S331A Wiltron) na Figura 16b. A freqncia de ressonncia medida foi de 1.828 MHz e a largura de banda para VSWR = 2 foi de 15 MHz.

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VSWR5,0 4,5 4,0 M1: 2,00 @ 1820,90 MHz M2: 2,04 @ 1835,80 MHz

V S W R

3,5 3,0 2,5 2,0 1,5M1 M2 Limit : 2,00

1,01800 1805 1810 1815 1820 1825 1830 1835 1840 1845 1850 1855 1860

Resolution: 130 BiasTee: OFF Date: Model: S331A

Frequency (MHz) CAL: ON(COAX) Output Power: Time: Serial #: 00709043

Figura 16. Taxa de onda estacionria para a antena patch: (a) simulada no Ensemble e (b) medida com o S331A.Cad. Jur., So Paulo, v 6, n 2, p. 17-46, abr./jun. 2004

Em seqncia foram realizadas medidas em cmera anecoica de 555 m3, usando como receptor um Analisador de Interferncia superheterodino EMC-60, Electro-Metrics, acoplado antena sob teste, e, como gerador, um Sintetizador de Freqncias 6745B, Wiltron, com um amplificador VZL6041-K1, Varian, e antena corneta padro. Desta forma foram realizados dois tipos de medidas: (a) medidas em que o plano terra da antena patch foi desconectado da malha de terra dos cabos do receptor para simular a situao de uso de um telefone celular (ou seja, sem plano de terra efetivo) e, (b) medidas com o conector normalmente soldado ao plano terra. Observa-se que quando o plano de terra no est efetivamente aterrado, tem-se uma relao frente costas de aproximadamente 10 dB e ngulo de meia potncia de 150, que so valores prximos aos obtidos nas simulaes FDTD. J com o plano terra efetivamente aterrado, verifica-se uma relao frente costas maior que 20 dB e ngulo de meia potncia de cerca de 110. As comparaes dos diagramas de irradiao no plano horizontal medidos para os dois tipos de aterramento e o diagrama obtido na simulao FDTD esto na Figura 17.

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Fig. 17. Diagramas de irradiao no plano horizontal medidos para antena patch com o plano terra efetivamente aterrado [azul], no aterrado[vermelho] e calculado com o FDTD [verde] (5 dB por diviso na escala radial).

VIII. COMENTRIOS E CONCLUSES Neste trabalho inicialmente so revisados os principais efeitos trmicos e no trmicos da radiaes no ionizantes, e as normas mais difundidas que limitam a exposio das pessoas a estas radiaes. A seguir, os valores obtidos de campo eltrico irradiado por uma Estao de Rdio Base (ERB) tpica so comparados com os limiCad. Jur., So Paulo, v 6, n 2, p. 17-46, abr./jun. 2004

tes de exposio estabelecidos por algumas destas normas. Os resultados so apresentados na forma de regies de excluso, no interior das quais os limites das normas so superados, e fora delas estes limites so respeitados. Algumas normas utilizadas para comparao consideram somente os efeitos trmicos da absoro da energia eletromagntica no ionizante (p.ex., normas IEEE/ ANSI, ICNIRP e ANATEL), e outras consideram em parte os efeitos no trmicos (p.ex., normas da Itlia e da Sua), adotando ento o Princpio da Precauo. Os resultados obtidos indicam que, para as situaes tipicamente encontradas nas ERB localizadas em torres elevadas (p.ex., cerca de 30 ou 40 m, ou mais) e sendo desobstrudas as direes de maior irradiao, as zonas de excluso normalmente esto substancialmente afastadas dos locais onde possam haver pessoas. Isto se verifica mesmo em comparao com as normas mais restritivas, indicando ento que estas podem ser adotadas sem inviabilizar a operao dos sistemas. Desta forma so resguardados os requisitos de adequada cobertura e qualidade de sinal, e, ao mesmo tempo, so contempladas as preocupaes de precauo quanto aos possveis riscos sade devidos as radiaes no ionizantes. Foram tambm resumidos a simulao da SAR absorvida na cabea do usurio de telefones mveis, dos campos irradiados nas regies prxima e distante com antenas convencionais e com antenas planares, bem como o projeto, as estimativas tericas e as medidas em uma antena planar simples em microstrip, tipo patch retangular, para a faixa de 1,9 GHz. O software Ensemble foi utilizado para simular a taxa de onda estacionria em sua entrada e sua largura de banda. O mtodo FDTD foi utilizado para determinar o diagrama de irradiao no plano horizontal e os valores dos campos irradiados na regio de campo prximo. Observa-se que quando no existe efetivo aterramento do plano de terra (situao anloga da operao tpica de um telefone celular), os resultados para o diagrama de irradiao medidos foram bastante prximos aos simulados usando o mtodo FDTD. Observa-se, p.ex., relao frente costas da ordem de 10 dB, e abertura de feixe de meia potncia da ordem de 150. Isto resulta numa reduo da SAR na cabea a um valor que pode ser suficiente para o atendimento das normas mais difundidas [ICNIRP, 1995; IEEE, 1991]. A largura de faixa obtida (cerca de 15 MHz,ver Figura 16b) ainda poder ser melhorada com um projeto otimizado. Outros valores estimados e medidos, p.ex., para a taxa de onda estacionria na entrada (menor que 2) e para a eficincia de irradiao da antena tambm se mostraram adequados para aplicaes em transceptores mveis. As antenas planares, apresentando moderada diretividade, sendo pequenas, compactas, integrveis na caixa do transceptor e de baixo custo, podero se constituir em alternativa desejada para utilizao em futuras geraes de transceptores mveis, com uma melhoria na qualidade do sinal, reduo no consumo da bateria, e reduo do risco sade dos usurios. Isto torna-se importante, especialmente porque as normas internacionais mais difundidas consideram unicamente os efeitos trmicos. Da, caso os efeitos no trmicos sejam efetivamente reconhecidos, ento os limites de exposio devero se tornar substancialmente mais restritivos, tornandoCad. Jur., So Paulo, v 6, n 2, p. 17-46, abr./jun. 2004

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ainda mais recomendvel a utilizao de antenas diretivas. Isto dever ser acompanhado de outras providncias objetivando a reduo dos nveis irradiados na direo da cabea do usurio, e visando o atendimento ao Princpio da Precauo.

A. A. de Salles e C. R. Fernndez, Depto. de Eng. Eltrica, UFRGS

AGRADECIMENTOS

Os autores agradecem aos engs. Mateus Bonadiman e Paulo Serafini, aos professores Jorge Amoretti Lisba e Francisco de Assis Tejo, e ao aluno Gabriel Fernando Lamas Sosa, por suas importantes colaboraes em diferentes etapas deste trabalho.

REFERNCIAS44

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CAPTULO CAPTULO I: CAMPOS ELETROMA OMAGNTICOS ELETROMAGNTICOS E CNCONTRIBUIES DA CER: CONTRIBUIES DA EPIDEMIOLOGIA EPIDEMIOLOGIA

Ines Mattos e Sergio Koifman

CAPTULO I: CAMPOS ELETROMAGNTICOS E CNCER: CONTRIBUIES DA EPIDEMIOLOGIAInes Mattos e Sergio KoifmanRESUMO: A possibilidade de uma associao entre exposio a campos eletromagnticos de baixa freqncia e ocorrncia de cncer, em grupos populacionais e de trabalhadores, vem chamando a ateno de grande nmero de pesquisadores em diferentes pases. Desde a publicao do primeiro estudo que mencionava a possibilidade de tal associao (Wertheimer e Leeper, 1979), tm sido realizadas inmeras pesquisas sobre este tema, travando-se uma grande discusso, no meio cientfico, sobre a veracidade, ou no, dos resultados obtidos. Decorridas mais de duas dcadas de intensa investigao e debate, ainda no foi possvel chegar a concluses definitivas sobre essa associao, mas pontos importantes tm emergido dos diferentes estudos realizados. A discusso deste e dos dois captulos seguintes pretende familiarizar profissionais de reas do conhecimento diferentes das cincias biolgicas e da sade, e o pblico em geral, com a discusso ora travada sobre o estudo da associao entre a exposio aos campos eletromagnticos e a ocorrncia de cncer. Com essa finalidade, necessrio, inicialmente, introduzir alguns dos conceitos tcnicos mais freqentemente empregados por epidemiologistas e cancerologistas, na investigao desse tema. Neste captulo, sero apresentados, inicialmente, conceitos utilizados na anlise de estudos epidemiolgicos, com o objetivo de introduzir o no especialista na linguagem tcnica empregada na segunda parte, onde se faz, luz da Epidemiologia, uma reviso crtica dessas investigaes. 49

1. EPIDEMIOLOGIA

A Epidemiologia o campo do conhecimento voltado para a anlise das causas e mecanismos relacionados distribuio das condies de sade em grupos populacionais humanos e animais (Lilienfeld et al., 1967). O raciocnio clnico, empregado na Medicina, busca associar sinais e sintomas (ex.:palidez, dor torcica sbita e intensa irradiando-se para o brao esquerdo, suor abundante) com caractersticas pessoais (pessoa obesa, sedentria, grande fumante), conduzindo formulao de um diagnstico clnico (ataque cardaco - infarto). ACad. Jur., So Paulo, v 6, n 2, p. 47-72, abr./jun. 2004

Epidemiologia, por sua vez, analisa caractersticas individuais ou coletivas de grupos populacionais, tentando estabelecer os mecanismos causais das doenas, e dessa forma, propor intervenes que melhorem as condies de sade das coletividades. Vrios exemplos ilustram as contribuies da Epidemiologia para o conhecimento, como as associaes entre hbito de fumar e vrios tipos de cncer; entre infeco por rubola no incio da gravidez e o aparecimento de malformaes no recm-nascido; entre a presena de nveis elevados de colesterol no sangue e a ocorrncia de doenas cardacas; entre muitos outros. (Gordis, 1997) A importncia da Epidemiologia para o conhecimento em sade, atravs da identificao das causas de ocorrncia das doenas, tornou-se to preponderante que, atualmente, qualquer associao de causa-efeito s considerada como verdadeira quando sustentada por evidncias obtidas atravs de estudos epidemiolgicos. por esta razo que o debate atual, no mbito epidemiolgico, sobre a associao entre a exposio aos campos eletromagnticos de baixa freqncia (CEM) e a ocorrncia de cncer assumiu uma importncia fundamental para a compreenso aprofundada deste tema.

1.1. O raciocnio epidemiolgico50

O mtodo epidemiolgico uma aplicao do mtodo cientfico na anlise da distribuio populacional das condies de sade, e nesse sentido, utiliza modernamente, um conjunto de conhecimentos originrios de vrios campos do conhecimento, sobretudo da Biologia (Gentica, Biologia Molecular, Imunologia, entre outros), da Estatstica e das Cincias Sociais. A ocorrncia de eventos (casos de cncer, mortes etc.) analisada em funo de sua freqncia relativa nos grupos populacionais de onde se o