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UNIVERSIDADE FEDERAL DE UBERLÂNDIA INSTITUTO DE GEOGRAFIA CURSO DE GRADUAÇÃO EM GEOGRAFIA POLÍTICAS PÚBLICAS, DESENVOLVIMENTO AGRÁRIO E DESAFIOS NO PÓS-CONQUISTA DA TERRA: a criação de assentamentos rurais no Triângulo Mineiro/ Alto Paranaíba (1986-2009) LUCIANA CARVALHO E SOUZA Uberlândia 2010

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UNIVERSIDADE FEDERAL DE UBERLÂNDIA

INSTITUTO DE GEOGRAFIA

CURSO DE GRADUAÇÃO EM GEOGRAFIA

POLÍTICAS PÚBLICAS, DESENVOLVIMENTO

AGRÁRIO E DESAFIOS NO PÓS-CONQUISTA DA

TERRA: a criação de assentamentos rurais no Triângulo

Mineiro/ Alto Paranaíba (1986-2009)

LUCIANA CARVALHO E SOUZA

Uberlândia

2010

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LUCIANA CARVALHO E SOUZA

POLÍTICAS PÚBLICAS, DESENVOLVIMENTO

AGRÁRIO E DESAFIOS NO PÓS-CONQUISTA DA

TERRA: a criação de assentamentos rurais no Triângulo

Mineiro/ Alto Paranaíba (1986-2009)

Monografia apresentada ao Instituto de

Geografia da Universidade Federal de

Uberlândia como requisito à obtenção

do título de Bacharel em Geografia.

Orientador: Prof. Dr. João Cleps

Junior

Uberlândia

2010

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Luciana Carvalho e Souza

POLÍTICAS PÚBLICAS, DESENVOLVIMENTO AGRÁRIO E

DESAFIOS NO PÓS-CONQUISTA DA TERRA: a criação de

assentamentos rurais no Triângulo Mineiro/ Alto Paranaíba

(1986-2009)

Uberlândia 16 de dezembro de 2010

Banca Examinadora

_______________________________________________

Prof. Dr. João Cleps Junior - Orientador

_______________________________________________

Prof. Dr. Marcelo Cervo Chelotti

_______________________________________________

Prof. Msc. Murilo Mendonça Oliveira de Souza

Page 4: POLÍTICAS PÚBLICAS, DESENVOLVIMENTO AGRÁRIO E …€¦ · POLÍTICAS PÚBLICAS, DESENVOLVIMENTO AGRÁRIO E DESAFIOS NO PÓS-CONQUISTA DA TERRA: a criação de assentamentos rurais

A minha avó Eurides.

Meu exemplo maior de dignidade, força e amor.

A você minha eterna admiração.

Obrigada pela presença...

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AGRADECIMENTOS

A defesa de uma monografia significa a conclusão de uma etapa importantíssima

para o aluno de graduação. É a partir desse momento que paramos para refletir sobre

todos os momentos difíceis e também felizes que passaram, vendo agora, de maneira tão

rápida. É nesse momento também que percebemos o quanto foi importante a presença

de pessoas queridas ao nosso redor, que nos auxiliaram, deram força e acreditaram no

nosso potencial, muitas vezes, mais do que nós mesmos. Para isso, agradeço aqueles

que me fizeram chegar até aqui.

Primeiramente obrigada minha família querida. Mamãe, Tia Vera, Tia Fátima,

Tio Valdir, Roger e Joe. Sem vocês eu não sou ninguém. Para vocês meu amor

verdadeiro e o melhor de mim.

Meus queridos amigos da faculdade e com certeza amigos para a vida inteira.

Obrigada pelas conversas, pelos apoios, pelos trabalhos, pelas discussões proveitosas,

pelos conselhos e, claro, por todas as cervejas e torresmos compartilhados em todos os

momentos que, com certeza, foram essenciais para continuar a caminhada.

Aos meus amigos de longa data, que mesmo distantes geograficamente, pude

sentir o carinho de vocês próximo a mim e que ao lembrar do passado me encho de

alegria e saudade.

A minha segunda, e não menos importante família: Pai-pai Pedro, Mãe-mãe

Vanessa e meu querido e companheiro Pedrinho. Obrigada, obrigada, obrigada! Saibam

que levo vocês no meu coração.

Obrigada amigos e companheiros de luta do LAGEA aos quais pude

compartilhar idéias e ideais de vida e de conhecimento.

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Meu muito obrigada a meu orientador João Cleps Junior, em que me concedeu a

oportunidade de crescimento acadêmico e com o qual aprendi o valor da pesquisa

cientifica. Juntos pudemos conquistar prêmios e títulos que foram extremamente

importantes para minha vida. Obrigada João pelos livros, pela leitura e pela confiança.

Também, deixo aqui meus agradecimentos para a Fundação de Amparo a

Pesquisa de Minas Gerais – FAPEMIG, a que me fora concedida bolsas de Iniciação

Científica por três anos a qual me auxiliou a prosseguir com meus estudos.

E, OBRIGADA DEUS! Sem sua palavra confortante e ensinamentos preciosos

nada disso teria se realizado.

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“Penso que cumprir a vida seja simplesmente

compreender a marcha e ir tocando em frente.”

Almir Sater – Tocando em Frente

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LISTA DE ILUSTRAÇÕES

Gráfico 1 - Criação de assentamentos em Minas Gerais por período

governamental

44

Mapa 1 - Minas Gerais: Espacialização Municipal dos Principais

Movimentos de Luta pela Terra com Maior Número de Ocupações

de 1988 a 2009

40

Mapa 2 - Assentamentos criados durante o governo de FHC de 1995 a 2002

50

Mapa 3 - Assentamentos criados durante o Governo de Lula de 2003 a 2009

53

Quadro 1 - Minas Gerais: Movimentos Socioterritoriais Atuantes no Estado,

Número de Ocupações, Famílias e Municípios com Ocupações de

1988 a 2009

38

Quadro 2 - Classificação dos Movimentos Socioterritoriais atuantes em Minas

Gerais

42

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LISTA DE TABELAS

Tabela 1 - Assentamentos Rurais Criados no Estado de Minas Gerais

Durante o Governo Sarney (1986 a 1989)

46

Tabela 2 - Assentamentos Rurais Criados no Estado de Minas Gerais

Durante os Governos Collor e Itamar (1990 a 1994)

47

Tabela 3 - Número de Assentamentos Criados pelos Governos e participação

de Minas Gerais de 1985 a 2009

54

Tabela 4 - Grau de escolaridade dos assentados da Fazenda São Domingos

73

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LISTA DE SIGLAS

ACRQ – Associação das Comunidades dos Remanescentes de Quilombos

ACRQBC – Associação das Comunidades Remanescentes de Quilombo Brejo dos

Crioulos

ACUTRMU – Associação Comunidade Unida e Trabalhadores Rurais

ANOTER – Associação Nacional de Órgãos Estaduais de Terra

ASTST – Associação dos Trabalhadores Sem Terra

BNDES – Banco Nacional do Desenvolvimento

CCL – Comissões Camponesas de Luta

CLST – Caminho de Libertação dos Sem Terra

COERCO – Cooperativa Agropecuária Mista de Empreendimento Rural Comunitário

do Assentamento São Domingos

CONTAG – Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura

CPT – Comissão Pastoral da Terra

CUT – Central Única dos Trabalhadores

DATALUTA - Banco de Dados da Luta pela Terra

FETAEMG – Federação dos Trabalhados da Agricultura de Minas Gerais

FETRAF – Federação da Agricultura Familiar

FST – Fórum Sindical dos Trabalhadores

IBGE- Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística

IDH - Índice de Desenvolvimento Humano

IDS - Índice de Desenvolvimento Social

INCRA - Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária

ITER/ MG - Instituto de Terras de Minas Gerais

LAGEA - Laboratório de Geografia Agrária

LCP – Liga dos Camponeses Pobres

LOC – Liga Operária Camponesa

MAB – Movimentos dos Atingidos por Barragens

MDA – Ministério do Desenvolvimento Agrário

MIRAD - Ministério da Reforma e do Desenvolvimento Agrário

MLST – Movimento de Libertação dos Sem Terra

MLSTL – Movimento de Libertação dos Sem Terra de Luta

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MLT – Movimento de Luta pela Terra

MLUPT – Movimento Luta Unida pela Terra

MPRA – Movimento pela Reforma Agrária

MPST – Movimento Popular pelos Sem Terra

MST – Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra

MTL – Movimento Terra Trabalho e Liberdade

MTR – Movimento dos Trabalhadores Rurais

MTST – Movimentos dos Trabalhadores Sem Teto

N.I – Não Informado

OLST – Organização pela Libertação dos Sem Terra

OTC – Organização de Trabalhadores no Campo

P.A. – Projeto de Assentamento

PACTo – Programa de Apoio Científico e Tecnológico nos Assentamentos de

Reforma Agrária na Região do Triângulo Mineiro

PCB – Partido Comunista Brasileiro

PCH – Pequena Central Hidrelétrica

PIB – Produto Interno Bruto

PNRA – Plano Nacional de Reforma Agrária

PROGER RURAL – Programa de Geração de Emprego e Renda Rural

PRONAF – Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar

PROVAP – Programa de Valorização da Pequena Produção Rural

PSA – Programa de Segurança Alimentar e Nutricional em Acampamentos e Pré-

Assentamentos de Reforma Agrária

STR – Sindicato dos Trabalhadores Rurais

UDR – União Democrática Ruralista

UFU – Universidade Federal de Uberlândia

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SUMÁRIO

Introdução.................................................................................................................. 14

1. A NOVA CONFLITUALIDADE DO CAMPO BRASILEIRO:

agricultura familiar e agronegócio no centro das discussões da reforma

agrária............................................................................................................ 18

1.1 A importância do campesinato nas questões fundiárias e

agroecológicas............................................................................................................. 22

1.2 A Reforma Agrária como via de desenvolvimento................................... 26

2. A LUTA PELA TERRA E AS POLÍTICAS PÚBLICAS DE

FORMAÇÃO DOS ASSENTAMENTOS RURAIS: a criação de

projetos nacionais de reforma agrária e o reflexo territorial no campo

mineiro........................................................................................................... 33

2.1 Considerações da luta pela terra no Brasil................................................ 33

2.2 Os movimentos sociais de luta pela terra e suas atuações em Minas

Gerais.......................................................................................................................... 36

2.3 As políticas de 1986 a 2009 de Reforma Agrária e a criação dos

assentamentos rurais em Minas Gerais....................................................................... 42

2.3.1 O Governo José Sarney (1985 a 1989): os impactos do I PNRA e o

surgimento dos primeiros assentamentos mineiros..................................................... 45

2.3.2 O Governo Collor e Itamar (1990 a 1994): a extinção de uma

proposta de Reforma Agrária...................................................................................... 47

2.3.3 O Governo Fernando Henrique Cardoso (1995 a 2002): o

neoliberalismo e a Reforma Agrária de Mercado....................................................... 49

2.3.4 O Governo Luiz Inácio da Silva (2003 a 2010): o apoio dos

movimentos sociais de luta pela terra e a manutenção das políticas de Reforma

Agrária......................................................................................................................... 51

3. CARACTERIZAÇÃO DE EXPERIÊNCIAS EM ASSENTAMENTOS

RURAIS NO TRIÂNGULO MINEIRO/ ALTO PARANAÍBA............... 56

3.1 PA Cruz e Macaúbas – Santa Vitória........................................................ 56

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3.2 PA Nova Santo Inácio Ranchinho – Campo Florido............................... 59

3.3 PA Rio das Pedras – Uberlândia.............................................................. 62

3.4 PA São Domingos – Tupaciguara............................................................ 65

3.4.1 O cooperativismo como alternativa de produção em assentamentos: o

exemplo da COERCO................................................................................................. 68

Considerações Finais................................................................................................. 76

Referências................................................................................................................. 79

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14

Introdução

A presente pesquisa busca apresentar dados básicos referentes à questão agrária

na mesorregião Triângulo Mineiro/ Alto Paranaíba, principalmente no que tange a

análise das políticas públicas de Reforma Agrária adotadas principalmente a partir da

Nova República, bem como a criação de assentamentos rurais na região, realizando uma

análise ampla da atual situação dos assentados frente a uma crescente expansão do

agronegócio na região pesquisada e como isso reflete nos aspectos referentes ao

desenvolvimento econômico e meio ambiente.

Assim, buscando alternativas para a dicotomia no campo, surgem os

movimentos de luta pela terra. Estes participam ativamente, no estado e na região,

principalmente a partir da década de 1980, em meio ao processo de luta pela Reforma

Agrária e redemocratização do país. Para conseguir tais objetivos, os movimentos

desempenham seus papéis participando de decisões políticas e sociais que, de certa

forma, tendem a forçar o Governo a regulamentar e acelerar o processo da Reforma

Agrária e, ao mesmo tempo, encontrar um mecanismo de busca real da cidadania e de

justiça social.

Nesse período, surgem também os primeiros projetos de assentamentos no

estado de Minas Gerais, projetos estes que vêm se desenvolvendo a partir de diferentes

modos de organização e de produção, baseados, majoritariamente, na agricultura

familiar, com grande diversidade de produção e de organização do trabalho.

O tema sobre Reforma Agrária e assentamentos rurais no Brasil acumula um

expressivo conjunto de pesquisas realizadas, tanto de caráter censitário como de estudos

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de casos, porém ainda não existe uma série histórica de dados que permitam

compreender as diferentes situações e experiências dos assentamentos no campo.

Como metodologia desta pesquisa, utilizou-se os dados referentes aos

assentamentos rurais, obtidos do Banco de Dados da Luta pela Terra – DATALUTA

que sistematiza as informações sobre assentamentos a partir de fontes como Instituto

Nacional de Colonização e Reforma Agrária (INCRA) e Associação Nacional de

Órgãos Estaduais de Terra (ANOTER). A versão “DATALUTA Assentamentos” dispõe

de informações sobre os assentamentos rurais no Brasil desde 1969. Durante a

sistematização dos dados, constatam-se divergências entre alguns dados referentes aos

anos de origem dos assentamentos, número de famílias, tipologia, área e até mesmo na

própria localização, o que justifica parte desta pesquisa.

É importante salientar que, por intermédio do DATALUTA, foi possível

analisar, sistematizar e espacializar a luta pela terra no estado de Minas Gerais, através

do fornecimento de dados também referentes às ocupações de terra, movimentos

socioterritoriais e estrutura fundiária, facilitando, desta forma, a maior compreensão da

dinâmica territorial e a problemática da questão agrária, em âmbitos estadual e federal.

Há, contudo, muitas informações a serem exploradas nesse diversificado e rico

universo, principalmente no que tange a luta dos assentados no pós-conquista da terra e

a dicotomia entre agronegócio e agricultura familiar que permeia a atual estrutura

agrária brasileira.

Também como etapa metodológica da presente Monografia, foi realizada uma

pesquisa bibliográfica acerca do tema proposto, ao qual auxiliou a formação e discussão

teórica presente neste estudo. Além disso, se fez necessário o trabalho de campo em

alguns assentamentos rurais criados na região sendo estes escolhidos pelo ano de

criação. Assim, foram selecionados um assentamento por período governamental desde

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a redemocratização brasileira, sendo eles o PA Cruz e Macaúbas, criado no período do

então presidente José Sarney; PA Nova Santa Inácio Ranchinho, instituído no período

Collor/Itamar; PA Rio das Pedras, criado no governo Fernando Henrique Cardoso e PA

São Domingos, originado no período governamental de Luiz Inácio da Silva.

A pesquisa de campo foi realizada com o fim de se estabelecer algumas

percepções da luta dos assentados e agricultores familiares em permanecer ligados a

terra e em outro momento, poder compartilhar de suas perspectivas futuras de vida e de

produção. Assim, foram realizadas entrevistas com as lideranças locais e com a

população assentada, o que contribuiu essencialmente para a concretização desta

pesquisa.

O tema proposto para o referido estudo se justifica, principalmente, pelo fato de

que o todo o processo de luta dos trabalhadores da terra envolve novas territorialidades.

Nesse sentido é importante maior conhecimento e sistematização das ocupações,

acampamentos e assentamentos em que os mesmos poderão ser utilizados para

elaboração de projetos de políticas públicas e pesquisas realizadas tanto pelas

organizações de trabalhadores quanto pelo público em geral.

Assim, o mesmo surge através de estudos realizados ao longo de três anos, por

meio de Iniciações Científicas e participação em projetos desenvolvidos pelo

Laboratório de Geografia Agrária – LAGEA da Universidade Federal de Uberlândia –

UFU acerca da temática em questão, em que se propôs em estudar as contradições do

desenvolvimento capitalista na agricultura e, sobretudo, a dinâmica dos assentamentos

rurais mineiros bem como o processo de ação dos movimentos de socioterritorialização

da luta pela terra.

Este trabalho está dividido em três capítulos, onde são colocadas as discussões e

análises realizadas durante a elaboração do referido estudo, organizados em:

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O primeiro capítulo fundamenta-se na discussão referente à dicotomia entre

agricultura familiar e o agronegócio, tão presentes na mesorregião Triangulo Mineiro/

Alto Paranaíba. Para tanto, foram analisados e discutidos conceitos como território,

crescimento e desenvolvimento econômico, camponês, segurança e soberania alimentar

que são de suma importância para a compreensão do tema desenvolvido.

O segundo capítulo apresenta um breve histórico da questão agrária brasileira,

buscando a partir da criação dos movimentos sociais de luta pela terra e com o

surgimento da “Nova República”, análises acerca das políticas nacionais de Reforma

Agrária e o surgimento das primeiras ocupações de terra e, conseqüentemente, dos

primeiros assentamentos rurais mineiros.

O terceiro e último capítulo, descreve sobre as especificidades dos

assentamentos rurais mineiros bem como o relato de algumas experiências de

assentamentos criados nas ultimas décadas na região estudada, principalmente o que

tange o modo de vida e a organização de produção no interior dos mesmos.

Por último, são apresentadas as considerações finais desta pesquisa, ao qual são

realizadas algumas reflexões sobre a (não) implantação de políticas de Reforma Agrária

coerentes com a real necessidade do campo brasileiro e, mais especificadamente, em

Minas Gerais.

Esperamos que esta pesquisa possa contribuir para uma melhor compreensão da

luta pela terra no estado de Minas Gerias e da atual conjuntura ao qual se encontra os

assentamentos rurais brasileiros, facilitando assim, percepção das ações e a

espacialização dos movimentos sociais de luta pela terra e a importância das políticas

públicas de criação e incentivo aos assentamentos rurais como condição essencial ao

acesso da população aos seus direitos de cidadania.

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18

1 A NOVA CONFLITUALIDADE DO CAMPO BRASILEIRO:

agricultura familiar e agronegócio no centro das discussões da reforma

agrária

Desde meados da década de 1980 o Brasil é regido por políticas neoliberais, cuja

principal característica se refere a uma intervenção cada vez menor do Estado nas

relações econômicas, sociais e de produção, dando desta maneira, maior liberdade de

articulação e dominação do agronegócio sobre e sob o campo brasileiro, atingindo de

maneira direta o pequeno agricultor e a agricultura familiar que agora tem como seu

maior oponente não mais o latifúndio, mas sim o agribusiness.

Para tanto é importante refletirmos sobre onde e como surge o agronegócio.

Segundo Almeida (2008),

O agronegócio não é novo, seu ideário é fruto da Revolução Verde ou Modernização da Agricultura como alguns denominam. O novo aí, se podemos chamar de novo, é aquele que agora aparece como categoria homegeneizadora, com isso o latifúndio perde o foco. (ALMEIDA, 2008, p. 309)

Através da expansão do agronegócio no campo brasileiro, temos o surgimento

de várias territorialidades dentro de um mesmo território em disputa sendo a agricultura

familiar centrada na família, no trabalho e na terra apenas mais uma perspectiva de

atuação frente à tomada de poder do agronegócio cujos princípios baseiam-se na lógica

do lucro e na produção de renda. Neste caso, entende-se territorialidade como sendo

“um fenômeno social, que envolve indivíduos que fazem parte de grupos interagidos

entre si, mediados pelo território; mediações que mudam no tempo e no espaço”

(SAQUET, 2010, p. 115).

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19

Na atual fase capitalista, as alterações nas formas e nas relações de produção

tendem a se intensificar, tornando-se cada vez mais acelerada tendo desta forma o

território como grande alvo de disputa e de conseqüentes redefinições sendo necessário

que se faça um maior debate acerca das definições conceituais do mesmo. Segundo

Paulino (2008),

Considerando que não é o princípio da acumulação simples, mas o da acumulação ampliada a força motriz deste modo de produção, o que supõe uma avidez progressiva sobre quaisquer bens passiveis de converterem-se em mercadorias, atentar para a ordenação do território ganha relevância ímpar, porque é este que comporta as ações de produção, circulação e consumo, o tripé da valorização capitalista culmina na apropriação desigual da riqueza socialmente produzida (PAULINO, 2008, p .214).

Principalmente a partir do modelo neoliberal, o conceito de território vem

ganhando novas formas e funções sendo utilizado como controle social frente aos

interesses do capital financeiro das multi e transnacionais. Porém, o território é formado

por vários agentes modificadores, que através de tais políticas são sufocados e privados

de seus direitos de organização e reprodução do espaço.

Os camponeses são um desses grupos que por possuírem menor poder político

de decisão nas políticas públicas sofrem de maneira direta com as novas configurações

do campo, que passa de um território necessário à sobrevivência social e natural do

homem para um território que atenda os novos anseios do mercado configurando dessa

maneira, a formação da disputa entre agronegócio e campesinato sendo as ocupações de

terra a materialização dessas conflitualidade. Desta forma, Fernandes (2007) afirma que,

[...] a luta pela terra e a Reforma Agrária formam o principal fator de territorialização do campesinato no território nacional. O desenvolvimento territorial e Reforma Agrária são processos

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20

indissociáveis. Portanto, a obtenção de terras e o desenvolvimento dos assentamentos são processos inseparáveis. O capital forma os seus territórios e se territorializa, ou seja, se expande multiplicando o controle de enormes áreas em todas as regiões. Na atualidade, no campo brasileiro, o capital tem o nome de agronegócio, que procura se apropriar das terras e subalternizar o campesinato através da terceirização da produção (que muitos chamam de integração) ou expropriá-lo através da verticalização da produção, controlando todos os sistemas que o compõe (FERNANDES, 2007, p. 86).

É necessário que se pense o território em toda a sua complexidade, buscando

compreender os diversos interesses que acabam por gerar disputas e divergências de

caráter tanto conceitual quanto político e social que permeiam as relações entre

campesinato e agronegócio. A compreensão das disputas em questão é fundamental uma

vez que as escalas de ação para o enfrentamento dos desafios impostos à segurança

alimentar passam por diversos atores tais como o Estado, os governos sub-nacionais,

movimentos sociais, empresas privadas e públicas.

Mesmo que possa parecer tênue a relação entre segurança alimentar e disputas

territoriais, tais disputas estão alicerçadas a uma política comumente chamada de “nova

ordem mundial”, em que no campo restabeleceu novas formas de produção através da

implantação de técnicas, baseadas no uso de agrotóxicos e de uma produção voltada

essencialmente para a exportação, advindas principalmente pela disseminação da

Revolução Verde, colocaram em risco a soberania alimentar no Estado brasileiro.

Ademais, uma questão central tomada como referência nesta monografia é que

segurança alimentar transcende o conceito simples de deficiência alimentar e, em seu

entendimento deve-se buscar além dos seus conceitos, fatores como a desigualdade

social, de modo que o enfoque sobre a temática seja dado por uma visão intersetorial,

que reflita a complexidade da questão alimentar e os múltiplos fatores que a afetam

(MALUF, 2007).

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21

Através da monocultura, o agronegócio expande suas fronteiras e atinge cada

vez mais regiões, ecossistemas e pequenos agricultores que vêem suas propriedades

cercadas por extensas plantações de soja e cana-de-açúcar, não tendo alternativa se não

arrendar suas terras sendo assim, muitas vezes, privados de seus direitos de escolha

autogerenciamento de produção ou até se vêem coagidos a venderem seus lotes para

grandes empresas.

Segundo Szmrecsányi (2007),

Dentro dessa perspectiva, as principais ameaças à soberania alimentar dos que de fato a possuem origina-se de um lado da expulsão do campo dos pequenos produtores agrícolas independentes, e, do outro, do aumento do desemprego, aberto ou disfarçado, tanto no campo como nas cidades. A primeira diminui a oferta local de alimentos para a população e provoca um aumento de seus preços, enquanto que o segundo reduz a demanda efetiva (ou solvável) dos mesmos. Ambas essas tendências acabam requerendo uma ampliação do assistencialismo compensatório, traduzindo-se isso facto num decréscimo da soberania alimentar. (SZMRECSÁNYI, 2007, p.151)

Através do Censo Agropecuário de 2006 publicado recentemente pôde-se

observar a importância da agricultura familiar no abastecimento da população brasileira

e a sua participação na economia nacional. Apesar de ocupar apenas um 25% da área

total cultivada no Brasil, a agricultura familiar responde por 38% do valor da produção

de alimentos, que abastecem o mercado interno e emprega quase 75% da mão de obra

no campo (IBGE, 2009).

Considerando os assentamentos rurais como um grande instrumento de

fortalecimento da agricultura familiar, os mesmos também participam de uma parcela

significante na produção e geração de renda no campo. Portanto, partindo deste

pressuposto, estudos acerca da problemática em questão são fundamentais para melhor

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22

compreensão das políticas de Reforma Agrária desenvolvidas nos últimos anos bem

como compreender a importância da criação dos assentamentos rurais como forma de

garantir a segurança alimentar regional, principalmente em áreas de conflitualidade

territorial como é o caso do Triângulo Mineiro/ Alto Paranaíba.

1.1 A importância do campesinato nas questões fundiárias e agroecológicas

A concentração de riqueza, a má distribuição de renda e também a grande

concentração fundiária, são fatores decisivos para a existência e reprodução da condição

da desigualdade social e da exclusão econômica, tanto da população urbana quanto da

população rural, em sua grande maioria, visto que campo-cidade estão altamente

relacionados.

Assim, cada vez mais, a população está vivendo com mais precariedade, sem

condições adequadas de moradia, de saúde, de educação e, principalmente, de

alimentação, visto que grande parte do que é produzido é destinado ao mercado externo,

através de grandes empresas agroindustriais, que defendem o modelo de produção

baseado na monocultura, que impacta negativa e intensamente o meio ambiente. Em

meio a esse sistema, surgem à discussão sobre a Reforma Agrária, agricultura familiar e

questões ecológicas como forma de buscar compreender e analisar tais problemáticas e

atenuar a concentração fundiária brasileira.

Neste sentido, se faz imprescindível considerar o papel da agricultura familiar e

do modo de vida camponês na sociedade contemporânea, além de procurar responder

questões, como quais são os fatores que permitem que tal configuração se estabeleça.

Atualmente, novos paradigmas que envolvem o campesinato e suas formas de

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23

representação vêm sendo discutidos e, assim, colocados em reavaliação estudos

referentes ao capitalismo agrário.

Segundo Abramovay (1998),

Nada mais distante da definição do modo de vida camponês que uma racionalidade fundamentalmente econômica. Apesar disso, entretanto, o campesinato caracteriza-se não só por sua organização social específica, mas pela forma como se insere na sociedade global através de laços econômicos particulares (ABRAMOVAY, 1998, p. 115).

Percebe-se claramente a posição contrária do autor no que se refere às obras

clássicas que se propõe a uma análise do camponês e da questão agrária, como as

defendidas por Marx, Lênin e Kautsky que tratam o campesinato através,

principalmente, de noções de cunho econômico as quais não se encaixam nas categorias

sociais que determinam o modo de produção capitalista.

Todavia, Abramovay trabalha com o pressuposto que, o campesinato tende a sua

extinção perante o atual modelo de organização econômica e social. O autor se baseia

na idéia de que o camponês se configura como um sujeito cuja principal característica

de reprodução se estabelece a partir de relações extra-econômicas, o que faz sua

reprodução possível apenas em meios sócio-culturais bastante particulares.

A proposta então levantada pelo autor sugere uma espécie de transição, ainda

contínua, do camponês em agricultor familiar, ao qual se assume características de

mercado, o que o acaba por inserir e participar de maneira ampla e direta no sistema

econômico vigente. Assim temos que,

As mudanças sofridas pela produção familiar na agricultura de hoje são tão profundas que se não se encaminharam no sentido da diferenciação social, por outro lado não permitiam que as características centrais da produção camponesa permanecesse (ABRAMOVAY, 1998, p.57).

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24

Esta inserção se dá pautada nas novas relações econômicas que a agricultura

familiar camponesa assume. Tal postura, tende a se diferenciar nos países centrais em

relação aos periféricos no que tange principalmente ao modo e a organização de

produção que estão diretamente interligados com o capital financeiro local.

É possível compreender a nova dinâmica do capitalismo agrário e as novas

perspectivas que assume a agricultura familiar camponesa. Neste caso, vale ressaltar

que a decisão da produção que irá determinar o período de safra é tomada

conjuntamente entre os membros familiares, pois os impactos destas decisões afetam a

vida e inclusive o padrão de consumo desses indivíduos.

Todavia, é notória a participação das agroindústrias na economia e também no

que se diz respeito à sua representativa nas questões fundiárias. Os avanços dessas

grandes empresas acabam por sufocar a agricultura familiar, colocando os camponeses

em situações de risco principalmente em relação à manutenção de suas propriedades.

Verifica-se que muitos agricultores, até mesmo assentados rurais, têm arrendado suas

terras e feito parcerias com tais empresas, pois esta seria uma das únicas formas de

conseguirem manter-se economicamente.

Ao analisar tal realidade do campo brasileiro, percebe-se que os autores como

Marx e Engels estavam corretos a respeito do desaparecimento do campesinato, pois

neste sentido, o camponês e a agricultura familiar se tornam reféns da burguesia (classe

social conceituada pelos mesmos), em que o campesinato e também sua propriedade

rural são explorados pelo grande capital, o que o torna um operário na lógica marxista.

Apesar de suas adaptações ao mercado, a agricultura familiar encontra novos

desafios, e vem resistindo de maneira significativa às práticas levantadas pela economia

neoliberal. Partindo do pressuposto de que, todo desenvolvimento econômico implica

em um conflito ambiental, estes camponeses vêm se superando e fazendo frente ao

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agronegócio através de formas de produção que não sejam tão agressivas ao meio

ambiente e que de certa maneira, ainda o insere no mercado. Assim, podemos

considerar inclusive que “a agricultura familiar deveria ser eleita núcleo do

desenvolvimento sustentável no espaço rural.” (MOREIRA, 2007, p. 163).

Neste sentido, chegamos às contribuições de Joan Martínez Alier. Segundo o

autor, a corrente de pensamento conhecida como “Ecologismo dos Pobres”, a qual

inclusive dá nome a uma de suas principais obras, surgem com a intenção de tratar a

natureza e o meio ambiente como formas imprescindíveis a sobrevivência e a

subsistência dos pobres na atualidade. Assim, nota-se o interesse e a participação cada

vez maior de movimentos sociais e agricultores familiares em adotarem este

pensamento e formas de produção conhecido como agroecologia.

Segundo Alier (2007),

No terceiro mundo, a combinação da ciência formal com a informal, a concepção de “ciência com pessoas”, antes que uma “ciência sem as pessoas”, caracteriza a defesa da agroecologia tradicional de grupos camponeses e indígenas, com os quais há muito que ser aprendido através de um autentico dialogo de saberes” (ALIER, 2007, p.36).

Por mais que os agricultores familiares não assumam, muitas vezes, um discurso

especialmente ambientalista, eles são fundamentais na construção de pensamento

complexo que relacione produção familiar, desenvolvimento e uso sustentável dos

recursos naturais. Isso tem sido reconhecido, sobretudo, a partir das convenções

internacionais que discutem a questão ambiental.

De outro lado, os movimentos de luta pela terra, como o MST (Movimento

Trabalhadores Rurais Sem-Terra) que declarou ser contra o cultivo de transgênicos, tem

um papel importante na preservação da sociobiodiversidade. Isso revela, ainda, o

combate a questões que podem colocar em risco a saúde da população e ao meio

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ambiente além de repudiar ações de grandes empresas do agronegócio multinacional

como a Monsanto e a Syngenta que possuem grande representatividade no Brasil.

A partir de então, percebe-se que a visão ambientalista defendida por Alier, se

move em torno também dos grupos que são afetados pela produção em larga escala, que

utiliza práticas predatórias e ambientalmente insustentáveis ao longo do tempo e que são

complacentes ao Estado, o que torna a questão agrária um assunto repleto de grandes

dicotomias.

A agroecologia, ou economia ecológica, se sustenta em uma crítica à economia e

às práticas de produção convencional, adotadas por grande parte dos países do mundo e

que encontram respaldo no sistema capitalista. O que se propõe a partir de então, entre

outros fatores já mencionados, é a inclusão dos passivos ambientais na contabilidade

das empresas e até mesmo do poder público, o que tornará possível mensurar e corrigir

os impactos ambientais da região.

Por fim, falar em meio ambiente e questões fundiárias é ressaltar a importância

dos direitos humanos à saúde, educação, segurança alimentar, a trabalho e moradia.

Além disso, torna-se de suma importância a discussão acerca de como e onde estão

ocorrendo tais impasses de desenvolvimento ambiental e econômico principalmente nos

países do Sul, como o Brasil, retomando assim os embates acerca da dívida ecológica

bem como das trocas e relações comerciais desiguais, principalmente de produtos

primários internacionalmente.

1.2 A Reforma Agrária como via de desenvolvimento

A globalização, emergente a partir do século XX, é entendida entre muitos como

a quebra das barreiras territoriais, ampliação do mercado multinacional e do grande

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acúmulo de riquezas, sendo todas essas características facilitadas pelos avanços da

comunicação, nos remeteu durante algum tempo a noção de que havíamos alcançado a

idéia de desenvolvimento econômico. Tal processo, também atingiu de maneira

determinante a produção agrícola e colaborou para a manutenção de uma estrutura

fundiária altamente concentradora.

Ao analisarmos não apenas a economia, mas também às questões sociais,

culturais e de acesso à população às condições mínimas de sobrevivência, nos

deparamos com a fome, a miséria, o desemprego e vários outros problemas deste

caráter, tanto nos centro urbanos quanto e, principalmente, no meio rural.

A diferença entre desenvolvimento e crescimento econômico é indispensável

para compreendermos a sociedade capitalista atualmente, bem como o modo de

produção vigente na sociedade. Neste sentido, estudiosos como José Eli da Veiga,

Amartya Sen e Celso Furtado, possuem pesquisas fundamentais para distinguir ambas

as idéias, o que nos auxilia “a nos defender dos falsos “consensos” que nos impingem as

metrópoles imperiais” (FURTADO, 2002, p.7).

O desenvolvimento já foi, e ainda é, muitas vezes, tratado apenas como algo

economicista, como por exemplo, o comparando ao PIB (Produto Interno Bruto) de um

país ou região, no qual envolve apenas o que se é produzido. Também é comum nos

depararmos com a noção de que o desenvolvimento é um mito ou até mesmo uma ilusão

utilizada como forma de alienação de alguns Estados.

Inicialmente, tomando como referência as contribuições de José Eli da Veiga

adotando como base o livro “Desenvolvimento Sustentável: o desafio no século XXI”

em que o conceito de desenvolvimento é amparado pelo de sustentabilidade, assim o

autor entende que desenvolvimento não deve ser entendido apenas pelos aspectos

econômicos e sociais, mas também por meio de um conjunto de características que

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permite o entendimento da evolução humana no ambiente e quais são seus reflexos no

tempo e espaço.

É importante discutir se o desenvolvimento vem ou não sendo característica

principal das economias globais. Para Veiga (2005),

O desenvolvimento tem sido exceção histórica e não regra geral. Ele não é o resultado espontâneo da livre interação das forças do mercado. Os mercados são tão somente uma entre as várias instituições que participam do processo de desenvolvimento (VEIGA, 2005, p. 80).

A partir desta afirmação, pode-se perceber que a condição de desenvolvimento

não atinge a maior parte dos países do mundo, e assim fica clara a idéia de que o

crescimento econômico não deve ser considerado sinônimo deste processo, e sim uma

variante do mesmo.

Conclui-se, assim, que a quantificação do desenvolvimento é extremamente

complicada, visto que índices como o IDH (Índice de Desenvolvimento Humano), PIB

ou o IDS (Índice de Desenvolvimento Social) apesar de trazer alguns aspectos sociais e

estruturais, não possuem a capacidade de mensurar a participação da população e

também dos movimentos socioterritoriais nas tomadas de decisões e sua liberdade de

ação em busca de melhores condições de vida e até mesmo de felicidade, assim, tais

valores simbólicos torna difícil a concepção através de índices e números.

Por outro lado, aparece a noção de desenvolvimento sustentável, ao qual o autor

se baseia na obra de SACHS (2002) que trabalha a sustentabilidade a partir de três

parâmetros básicos: “1) preservação do potencial da natureza para a produção de

recursos renováveis; 2)limitação do uso de recursos não renováveis; 3) respeito a realce

para a capacidade de autodepuração dos ecossistemas naturais” (VEIGA, 2005, p.171).

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Percebe-se que seguindo tais parâmetros para atingir o ápice do

desenvolvimento, é necessário fundamentalmente que se re-elabore e re-articule novas

concepções de produção agrícola bem como retomar a discussão referente à questão

agrária e fundiária brasileira.

Para VEIGA (2005), a adoção do termo desenvolvimento sustentável surgiu a

partir das necessidades de colocar em pauta que o crescimento econômico é muitas

vezes incompatível com o meio ambiente, e conseqüentemente, das necessidades de

mudanças de alguns paradigmas relacionados com o processo de industrialização e

mecanização do campo. O desenvolvimento sustentável pode ser considerado uma

utopia, numa referência direta ao autor, uma vez que se trata de um conjunto de planos e

metas que a sociedade moderna projeta para o futuro.

Já Furtado (2002), considera que no caso brasileiro, vários fatores são

condicionais para o (não) desenvolvimento do Estado nacional. Dentre eles, o autor

ressalta no início de seu livro “Em busca de novo modelo: reflexões sobre a crise

contemporânea” o endividamento externo construído historicamente e criado no intuito

de produzir a noção de “potência emergente”. Nesse sentido, parte dos recursos que

deveriam ser investidos no país é destinado ao pagamento da dívida o que compromete

diretamente a economia brasileira.

É importante salientar, que parte da divida assumida pelo Estado brasileiro

também se deu a partir da Revolução Verde, como forma de participar de maneira

íntegra dos novos “avanços” que a agricultura passava durante o período.

Grande parte do nosso “subdesenvolvimento” advém de um processo de

industrialização tardio amparado nos moldes e nos padrões europeus e norte-

americanos. Porém, o Brasil é um país cujas características tanto a nível econômico,

social e cultural, se distinguem de maneira considerável desses países que participam de

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um modelo clássico de industrialização, o que acaba por tornar tal processo ainda mais

atrasado e repleto de contradições.

Tais incoerências são materializadas na desigualdade social que é refletida,

sobretudo, na carência alimentar e no padrão de consumo da sociedade brasileira. Desta

forma, partindo do pressuposto que desenvolvimento não pode ser confundido com

crescimento econômico, Celso Furtado defende que o legítimo desenvolvimento só

poderá acontecer onde ocorrer atenção e projetos voltados a extinguir a exclusão social.

Assim, temos que

[...] a maior preocupação industrial local é a de apresentar um artigo similar ao importado e adotar métodos de produção que o habilitem a competir com o importador. Assim sendo, os processos produtivos que se afiguram mais vantajosos são aqueles que permitem reproduzir com exatidão os artigos importados, e não os que facilitam a transformação da estrutura econômica pela absorção do setor de subsistência. (FURTADO, 2002, p. 31).

Desta maneira, uma das práticas possíveis para atingir uma menor exclusão

social e, conseqüentemente, alcançar um nível maior de desenvolvimento, é a

reestruturação fundiária a partir, principalmente, de políticas que estabeleçam, de

maneira direta, uma Reforma Agrária condizente com a realidade nacional.

Outra temática relevante nos trabalhos de Furtado é a noção de cultura. Como

vimos em VEIGA (2005), a lógica do desenvolvimento deve ser pautada também nos

fatores sociais ao qual se insere os aspectos culturais. Entende-se que quanto mais

acesso uma população possui aos bens culturais, mais se aproxima do conceito de

desenvolvimento. Contudo, a partir da difusão de um padrão cultural pré-estabelecido

pelas grandes potências mundiais, acabam por descaracterizar a cultura local e, portanto,

levar a uma crise de identidade. Então, pode-se afirmar que o Brasil se torna “frágil em

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um mundo dominado por empresas transnacionais que tiram partido dessas

desigualdades.” (FURTADO, 2002, p. 42).

Resumidamente, através das análises realizadas das obras de Celso Furtado, é

possível pensar no ser - humano como um agente transformador da realidade em que

sua representatividade extrapola o “eu” e passa pelas questões organizacionais da

economia, da sociedade e do meio ambiente. Assim, o planejamento político de

desenvolvimento torna-se necessário, sobretudo, para que as pessoas tenham as mesmas

condições de acesso às atividades produtivas, a terra e a bens necessários para a

reprodução da vida.

Nota-se que a partir de uma leitura das obras, de Veiga como de Furtado, ambas

estão respaldadas nos escritos e as noção de desenvolvimento de Amartya Sen. Tal

embasamento teórico torna-se claro à medida que vão sendo construídas as idéias de

cultura e sustentabilidade.

Contudo, Sen enfoca como parte integrante do processo de desenvolvimento a

liberdade. Liberdade esta que, condicionaria os indivíduos a terem o poder de escolher o

que melhor atende suas necessidades e perspectivas de vida, sem imposição do Estado

ou até mesmo de modelos prontos e fabricados nos moldes de países economicamente

desenvolvidos.

Para que seja possível o cumprimento da liberdade, em que as pessoas possam

escolher o que consideram importantes para sua existência, Sen (200) trabalha com o

conceito de funcionamentos, que nada mais é do que o conjunto daquilo que o indivíduo

considera fundamental a sua existência e como alcançar tais preciosidades, ou seja, sua

capacidade de ação.

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Entretanto, para que a capacidade se concretize é necessário que a população

esteja inserida em um ambiente participativo e democrático onde se faz imprescindível

o uso de liberdades políticas, facilidades econômicas e oportunidades sociais.

Temos assim, que o desenvolvimento conceituado por Sen (2000) é, “[...] a

eliminação de privações de liberdade que limitam as escolhas e as liberdades das

pessoas de exercer ponderadamente sua condição de agente” (SEN, 2000, p.10).

Enfim, torna-se extremamente difícil,

[...] entender como uma ordem mundial compassiva pode incluir tanta gente atormentada pela miséria extrema, pela fome persistente e por vidas miseráveis e sem esperança, e por que a cada ano milhões de crianças inocentes têm de morrer por falta de alimento, assistência médica ou social (SEN, 2000, p.320).

Este pensamento de Amartya Sen, retrata de maneira simples e dolorosa os

caminhos encontrados para um desenvolvimento justo e igualitário no momento atual e

que caracteriza muito o que foi buscado nas questões abordadas , e que enquanto não se

alcançar o desenvolvimento a partir também de políticas voltadas ao setor agrário,

entendido a partir dos conceitos trabalhados até então, não será possível almejar uma

melhor qualidade de vida e de acesso a bens fundamentais para a sobrevivência e

reprodução do campesinato

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33

2 A LUTA PELA TERRA E AS POLÍTICAS PÚBLICAS DE

FORMAÇÃO DOS ASSENTAMENTOS RURAIS: a criação de

projetos nacionais de reforma agrária e o reflexo territorial no campo

mineiro

2.1 Considerações da luta pela terra no Brasil

Para entender melhor como se dá a luta pela terra no Brasil e o seu caráter

político atual, é necessário que se faça uma revisão histórica pela qual se possa

compreender a fundo o processo em que passou a formação e reestruturação da questão

agrária brasileira e, principalmente a questão fundiária.

Com a chegada dos portugueses ao Brasil, a terra recebeu um caráter novo, isto

é, passou de algo essencialmente natural, sem valor, para um meio de produção. Mesmo

que não tivesse valor comercial até a Lei de Terras de 1850, ela conseguia transferir

valor para os produtos originados dela. Portanto, podemos dizer que já apresentava,

mesmo sem ser mercadoria, um caráter mercadológico.

Com a chegada dos titulares das capitanias hereditárias no Brasil colônia, a

distribuição de terras aos sesmeiros (titulares das sesmarias) tornou-se uma prioridade,

pois foi a partir das sesmarias que a produção de açúcar, (plantations) se consolidou no

território. A partir deste momento, foi consolidada uma estrutura que passou a favorecer

o domínio das grandes propriedades no território nacional. Desde então, a sociedade

brasileira foi marcada pela concentração tanto de terra quanto de renda tornando-se, um

dos países com maior concentração de terras do mundo, o que se torna necessária a

discussão referente à limitação do tamanho da propriedade rural. Além disso, a não

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34

existência de uma política de reestruturação e redistribuição dessas terras faz com que o

latifúndio, e atualmente o agronegócio, se torne cada vez mais um grande impasse

àqueles que dependem da terra para viver.

Apesar de se verificar durante toda a história do Brasil essa desigualdade quanto

à distribuição de terras e a hegemonia das grandes propriedades no campo brasileiro, as

resistências dos índios, escravos e trabalhadores rurais se mostraram durante todo o

período de colonização do país.

Outro fator que colaborou com tal desdobramento no setor rural brasileiro foi a

Lei de Terras estabelecida em 1850 que regulamentou o modelo da grande propriedade

no Brasil que é base legal até os dias atuais. Stédile (2005) afirma que:

Sua característica principal é, pela primeira vez, implantar no Brasil a propriedade privada de terras. Ou seja, a lei proporciona fundamento jurídico à transformação da terra – que é um bem da natureza e, portanto, não tem valor do ponto de vista da economia política – em mercadoria, em objeto de negócio, passando, portanto, a partir de então, a ter preço. A lei normatizou, então, a propriedade privada da terra. (STÉDILE, 2005, p. 22-23).

O caminho que a luta pela terra trilhou até a década de 1930 foi bastante

sacrificante. Várias guerras foram travadas durante todo o período: Palmares, Canudos,

Contestado, greves nos cafezais paulistas enfim, tantas outras batalhas que

reivindicavam por melhores condições de trabalho e acesso a terra no Brasil.

Em meados de 1945, ocorreu a formação das Ligas Camponesas. Naquele

momento que a luta pela terra no Brasil passa a constituir-se politicamente. Elas foram

criadas em vários estados brasileiros e organizaram milhares de camponeses a lutas

mais bem conduzidas e elaboradas. As mesmas eram vinculadas e dependentes do

Partido Comunista Brasileiro (PCB). “Em 1947, o governo Dutra declarou o PBC ilegal

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35

e, como a repressão generalizada, as Ligas foram violentamente reprimidas, muitas

vezes pelos próprios fazendeiros e seus jagunços” (FERNANDES, 2000, p. 33).

Com o Golpe Militar de 1964, a tentativa do processo de Reforma Agrária então

iniciado pelo presidente João Goulart, foi totalmente extinguido. O autoritarismo

vivenciado na época era justificado como um “acelerador” da modernização. Porém,

segundo Becker (1994), “a modernização da agricultura foi extremamente desigual, com

implicações negativas nos preços dos alimentos e na renda real dos trabalhadores rurais”

(BECKER, 1994, p. 143).

O período da ditadura militar de 1964 a 1978 foi marcado pelo fim da

democracia e pelas incessantes repressões aos camponeses e suas lutas. Foi criado na

época pelo militares o Estatuto da Terra que tinha como função reter os conflitos

latifundiários e desarticular os camponeses. Toda construção e organização que os

trabalhadores até ali tinham constituído foram aniquiladas, os camponeses foram

reprimidos e violentados, quando não eram assassinados e exilados.

Todavia, não há opressão capaz de calar por muito tempo a população. Logo os

camponeses começaram a reagir e a resistir ao despotismo estabelecido. Já no final da

década de 1960 e início da de 1970, a luta pela terra emergiu. Como resultado nasceu

em 1975 a Comissão Pastoral da Terra, criada pela Igreja Católica com o compromisso

de ajudar as comunidades rurais. Já em 1979 começou a se formar na região sul do país

o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) onde foram articuladas as

primeiras experiências de ocupações da terra no Brasil.

Desde então, a luta pela terra se intensifica em todo país. Movimentos sociais,

comissões e grupos de pessoas interessadas em combater as injustiças praticadas no

campo vêm crescendo a cada dia e com isso a luta pela terra vem tomando um caráter

cada vez mais político e social.

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36

2.2 Os movimentos sociais de luta pela terra e suas atuações em Minas

Gerais

Para compreender o processo de formação e estruturação dos assentamentos

rurais mineiros, é imprescindível que inicialmente se discuta a ação dos movimentos

sociais de luta pela terra no estado, sendo os mesmos os grandes responsáveis pela

tentativa de reformular a estrutura fundiária atual.

A partir da análise da dinâmica de atuação dos movimentos socioterritoriais de

Minas Gerais, devemos compreender, antes de tudo, que estes são formados por pessoas

que possuem um anseio transformador em comum, principalmente quando este se diz

respeito à realidade em que vivem, travando, muitas vezes, embates nas esferas

políticas, físicas e legais, conforme destaca Fernandes (2004),

[...] movimento social e movimento socioterritorial são um mesmo sujeito coletivo ou grupo social que se organiza para desenvolver uma determinada ação em defesa de seus interesses, em possíveis enfrentamentos e conflitos, com objetivo de transformação da realidade. (FERNANDES, 2004, p.52).

Dessa forma, alguns movimentos transformam espaços em territórios, também

se territorializam e são desterritorializados e, por conseguinte, se reterritorializam,

carregando em suas ações pretensões de suas territorialidades.

Lembramos que a transformação do espaço em território acontece por meio da

conflitualidade, sendo que os territórios se movimentam, também, pela mesma, uma vez

que as formas de organização social, as relações e as ações acontecem no espaço, como

apontado por Fernandes (2004).

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37

Assim, o conceito de movimento socioterritorial é uma tentativa de

desfragmentação do espaço e do território. Pode-se, então, fazer uma leitura mais ampla

a partir do conceito de movimento socioterritorial, pois conforme destaca Fernandes

(2004) “ela sempre será uma leitura parcial, porque a totalidade da realidade é um

processo coletivo que só pode ser compreendida no movimento de todos”

(FERNANDES, 2004, p.53).

A existência de inúmeros movimentos socioterritoriais no Brasil é uma

realidade. Porém, muitos deles, são formados para realizarem apenas uma ocupação, e

logo depois não há mais atuação. Também, existe o caso de movimentos que se

configuram apenas como socioespaciais, não ocupando terras diretamente. Assim, os

movimentos,

[...] são agências de mediação, [...] são sempre representações da reivindicação, de espaços e ou de territórios[...] Não são sujeitos reivindicando um território. [...] são entidades de apoio ou contrárias aos movimentos socioterritoriais e socioespaciais, são agências intermediárias, que produzem espaços políticos e se espacializam. (FERNANDES, 2005, p. 31).

Em Minas Gerais, surgiram de 1988 (ano em que inicia o processo de obtenção

de dados referentes às ocupações) a 2009, de acordo com o Projeto DATALUTA–MG1,

mais de 26 movimentos socioterritoriais atuantes em todo o estado, 477 foram

realizadas por movimentos nomeados, e 154 ocupações efetuadas por movimentos com

nomes não identificados ou por quilombolas e indígenas, visto que esta nomenclatura é

abrangente e pode ser designada a mais de um movimento que possui certa identificação

com os mesmos. Juntos, os movimentos sociais de luta pela terra foram responsáveis

por 641 ocupações de terras, conforme os dados do Quadro 1.

1 O projeto é responsável por catalogar as ocupações de terras em Minas Gerais e, por conseguinte, os movimentos que participam dessas ações.

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38

Movimentos Socioterritoriais Ocupações Famílias

Municípios

com Ocupações

MST – Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra

224 26349 86

N.I – Não Informado 146 11535 66

CONTAG – Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura

103 7522 57

MLST – Movimento de Libertação dos Sem Terra 35 6441 10

LCP – Liga dos Camponeses Pobres 22 1802 17

LOC – Liga Operária Camponesa 19 1323 10

MTL – Movimento Terra Trabalho e Liberdade 15 1455 5

FETRAF – Federação da Agricultura Familiar 10 480 4

Quilombolas 6 637 3

MLSTL – Movimento de Libertação dos Sem Terra de Luta

5 665 4

MPST – Movimento Popular pelos Sem Terra 5 547 3

MLT – Movimento de Luta pela Terra 5 202 4

ACRQBC – Associação das Comunidades Remanescentes de Quilombo Brejo dos Crioulos

4 370 2

MPRA – Movimento pela Reforma Agrária 4 256 2

OTC – Organização de Trabalhadores no Campo 3 330 3

Via Campesina 3 240 1

CPT – Comissão Pastoral da Terra 3 160 2

FST – Fórum Sindical dos Trabalhadores 2 200 1

OLST – Organização pela Libertação dos Sem Terra 2 180 1

CLST – Caminho de Libertação dos Sem Terra 2 91 2

ACRQ – Associação das Comunidades dos 2 80 2

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39

Remanescentes de Quilombos

MTR – Movimento dos Trabalhadores Rurais 2 79 1

Índios 2 78 2

CCL – Comissões Camponesas de Luta 1 100 1

ACUTRMU – Associação Comunidade Unida e Trabalhadores Rurais

1 40 1

MTST – Movimentos dos Trabalhadores Sem Teto 1 35 1

MAB – Movimentos dos Atingidos por Barragens 1 26 1

ASTST – Associação dos Trabalhadores Sem Terra 1 20 1

MLUPT – Movimento Luta Unida pela Terra 1 6 1

ASTT 1 5 1

Quadro 1: Minas Gerais: Movimentos Socioterritoriais Atuantes no Estado, Número de Ocupações, Famílias e Municípios com Ocupações de 1988 a 2009 Fonte: LAGEA, DATALUTA-MG, 2009. Org.: SOUZA,L.C. 2010.

Dentre os movimentos apresentados, observa-se que o Movimento dos

Trabalhadores Rurais Sem Terra – MST foi o mais atuante em Minas Gerais entre os

anos de 1988 a 2009, realizando 224 ocupações de terras (cerca de 35% do total) e

mobilizando também o maior número de famílias nessas ocupações (que totalizam

26349), o que representa 43% do total.

No entanto, esse número de famílias não expressa diretamente o número de

famílias que foram assentadas ou até mesmo que estão no movimento, mas sim o

somatório de famílias que participaram das ocupações registradas de 1988 a 2009 em

Minas Gerais. Isto se explica pelo fato de que antes mesmo de conquistarem a terra,

muitos são aqueles que acabam por desistir de seus lotes pelas dificuldades encontradas

no período de acampamento, ou também pode acontecer de algumas famílias se

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40

deslocarem para outros acampamentos para mobilizar mais força durante o período da

ocupação.

Quando espacializados os dados dos municípios ocupados pelos movimentos de

luta pela terra com mais de 10 ocupações no estado, verificamos as diferentes coberturas

espaciais que estes desenvolvem, são eles: MST, CONTAG, MLST, LCP, LOC, MTL e

FETRAF (Mapa 1).

Mapa 1 – Minas Gerais: Espacialização Municipal dos Principais Movimentos de Luta pela Terra com Maior Número de Ocupações de 1988 a 2009.

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41

Essa espacialização e atuação dos movimentos em Minas nos remetem à teoria

do processo geográfico dos movimentos de luta pela terra, no qual os movimentos

socioterritoriais podendo ser classificados como movimentos isolados ou

territorializados.

Segundo Fernandes (2005), os movimentos socioterritorias isolados são aqueles

que atuam em uma determinada microrregião ou num espaço geográfico equivalente

(2005, p. 32) como municípios concentrados, e os movimentos socioterritorias

territorializados, segundo o próprio Fernandes são,

[...] aqueles que atuam em diversas macrorregiões e formam uma rede de relações com estratégias políticas que promovem e fomentam a sua territorialização. Todos os movimentos territorializados começam como movimentos isolados. Estes ao se territorializarem e romperem com a escala local, se organizam em redes e ampliam suas ações e dimensionam seus espaços. (FERNANDES, 2005, p. 31).

Dessa forma, constatamos que, através do número de ocupações e de municípios

ocupados pelos movimentos é possível traçar um panorama de quais movimentos

podem ser classificados como isolados e territorializados no estado.

Para isso, considerou-se que os movimentos isolados seriam aqueles com até

cinco municípios ocupados e os movimentos territorializados seriam os que possuíssem

mais de seis municípios com registros de ocupações, entre os anos de 1988 a 2009

(Quadro 2). Para essa análise, foram excluídos os movimentos com nomes não

identificados, os movimentos Quilombolas e Indígenas, uma vez que seria errôneo tratá-

los apenas como um movimento.

Page 42: POLÍTICAS PÚBLICAS, DESENVOLVIMENTO AGRÁRIO E …€¦ · POLÍTICAS PÚBLICAS, DESENVOLVIMENTO AGRÁRIO E DESAFIOS NO PÓS-CONQUISTA DA TERRA: a criação de assentamentos rurais

42

Classificação Sigla do Movimento

Territorializados CONTAG, FETRAF, LCP, LOC, MLST, MST e MTL

Isolados

ACRQ, ACRQBC, ACUTRMU, ASTST, ASTT, CCL, CLST, CPT, FST, MAB, MLSTL, MLT, MLUPT, MPRA, MPST, MTR, MTST, OLST, OTC e Via Campesina

Quadro 2: Classificação dos Movimentos Socioterritoriais atuantes em Minas Gerais Fonte: LAGEA, DATALUTA-MG, 2009. Org.: SOUZA,L.C. 2010.

A partir dos dados apresentados, é possível concluir a importância de se estudar

a espacialização da luta pela terra em Minas Gerais e como este estado, tem grande

representatividade no que tange a formação e atuação de vários movimentos

socioterritoriais.

Assim, verificamos a existência sete movimentos socioterritoriais

territorializados e de 20 movimentos socioterritoriais isolados no estado de Minas

Gerais de 1988 a 2009.

Além disso, apesar de se mostrarem numerosos e, muitas vezes, desarticulados,

pois alguns são desmembramentos de movimentos maiores, verifica-se que a quantidade

de movimentos representa a importância da luta pela terra no estado de Minas Gerais e

que a atuação destes movimentos é verdadeiramente responsável pela distribuição de

terras e formação grande parte dos assentamentos rurais no campo mineiro.

2.3 As políticas de 1986 a 2009 de Reforma Agrária e a criação dos

assentamentos rurais em Minas Gerais

As políticas públicas referentes à Reforma Agrária possuem amplo alcance e um

expressivo impacto, tanto social quanto econômico, e com distintos níveis de

articulação, têm a habilidade de alavancar um novo padrão de desenvolvimento rural,

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43

em todo o território. Por outro lado, elas ainda são marcadas pela exclusão, pela

dominação e pela fragilidade perante o Estado.

O tema do desenvolvimento rural ocupa espaço considerável no debate

acadêmico e no bojo das políticas públicas nacionais em diversos países do mundo. No

Brasil, notadamente a partir da década de 1960, não apenas o debate, mas especialmente

a ação pública ficou bastante concentrada em uma visão produtivista, deixando ao largo

questões sociais, dentre elas, a mais importante: a questão agrária. Contudo, as

discussões sobre concentração fundiária, luta pela terra e Reforma Agrária continuam

sendo temas além de importantes, bastante controversos no debate acadêmico.

É inegável o avanço agrícola pelo qual passou o país como um todo e mais

especificadamente, o estado de Minas Gerais. Porém, os impactos positivos da

modernização agrícola não se estenderam à totalidade do meio rural. O país não contou

com políticas consistentes de Reforma Agrária que visasse uma distribuição mais justa

de ativos fundiários. A elevada produtividade da agricultura brasileira, a partir da

modernização agrícola, fortaleceu o argumento de que mudanças na estrutura agrário-

produtiva do campo estariam ultrapassadas. Mesmo na ausência de política de Reforma

Agrária, no período principalmente no período pós ditatorial que foram criados grande

parte dos assentamentos rurais no país e em Minas Gerais.

As análises subseqüentes retomarão o período de 1986 a 2009, em que se

estabelecem as primeiras políticas voltadas essencialmente à questão agrária como a

elaboração do I Plano Nacional de Reforma Agrária (PNRA), o surgimento da atuação

dos movimentos socioterritoriais em Minas Gerais e concomitantemente a formação dos

primeiros assentamentos, além da disponibilidade de dados para este mesmo período.

Com isso, os governos analisados são respectivamente José Sarney, Collor,

Itamar, Fernando Henrique Cardoso e Lula. Assim é possível a partir dos dados

Page 44: POLÍTICAS PÚBLICAS, DESENVOLVIMENTO AGRÁRIO E …€¦ · POLÍTICAS PÚBLICAS, DESENVOLVIMENTO AGRÁRIO E DESAFIOS NO PÓS-CONQUISTA DA TERRA: a criação de assentamentos rurais

44

referentes à criação dos assentamentos (Gráfico 1) perceber a importância das políticas

públicas e as ações governamentais na criação dos assentamentos mineiros.

Gráfico 1: Criação de assentamentos em Minas Gerais por período governamental Fonte: LAGEA, DATALUTA-MG, 2010. Org: SOUZA, L.C., 2010

Como pode ser observados através do gráfico, existem entre os períodos

governamentais demonstrados, momentos em que a criação de assentamentos rurais foi

negligenciada, como durante o mandato de José Sarney e Collor/Itamar enquanto que

em outros, houve um significativo aumento nos assentamentos rurais em Minas Gerais,

como nos primeiros mandatos dos presidentes Fernando Henrique Cardoso e Lula.

Assim, a análise das políticas públicas de Reforma Agrária é fundamental para análise

da questão agrária brasileira e compreender como se configura a luta pela terra no

estado.

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45

2.3.1 O Governo José Sarney (1985 a 1989): os impactos do I PNRA e o

surgimento dos primeiros assentamentos mineiros

No início do seu mandato, em 1986, o então Presidente da Republica José

Sarney, criou em seu governo o Ministério da Reforma e do Desenvolvimento Agrário

(MIRAD) e também elaborou um plano pautado sobre o Estatuto da Terra que visava

em sua íntegra, a redemocratização da distribuição da terra no país, esse plano ficou

conhecido como Plano Nacional de Reforma Agrária (PNRA). Segundo Stédile (2005),

O PNRA buscava, a principio, atender às demandas sociais mais urgentes no âmbito rural, visando a desapropriação que permitissem o assentamento de trabalhadores sem terra nas áreas de maior potencial de conflito do país, sobretudo no Norte - Pará e Maranhão – e o Nordeste. Sintomaticamente, no entanto, os mais virulentos ataques ao PNRA partiram – para surpresa de seus idealizadores – não de latifundiários “tradicionais”, mas justamente de São Paulo, capitaneando outros Estados “desenvolvidos” do Sul e Sudeste. (STÉDILE, 2005, p. 92)

Além da redemocratização quanto ao acesso e à distribuição de terra, o plano

estabelecia metas de longo, médio e curto prazo quanto à extensão das áreas a serem

desapropriadas e o número de famílias a serem assentadas propondo, assim, o

estabelecimento de zonas prioritárias de Reforma Agrária em todo território brasileiro.

Porém, diante de pressões contrárias à Reforma Agrária, o PNRA sofreu

alterações significativas, dificultando assim grande parte do processo de desapropriação.

Segundo estudo, “o número de beneficiários de projetos de Reforma Agrária no final do

governo Sarney (1990) não atingiu 10% da meta inicial” (RANIERI, 2003, p. 13).

Mesmo com um baixo número de assentamentos concluídos e efetivados, foi

nesse período, mais especificadamente no ano de 1986, que se estabeleceram os

primeiros assentamentos rurais no estado de Minas Gerais (Tabela 1).

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46

Tabela 1: Assentamentos Rurais Criados no Estado de Minas Gerais Durante o Governo Sarney (1986 a 1989)

Mesorregião Município Nome Do

Assentamento

Capac. De

Famílias Obtenção Criação

Forma de obtenção

Triângulo Mineiro/ Alto Paranaíba

Limeira Do Oeste

PA Iturama 131 1985 1986 Desapropriação

Noroeste De Minas

Unaí PA Palmeirinha 174 1984 1986 Desapropriação

Norte De Minas

Urucuia PA Vereda Grande 250 1983 1986 Desapropriação

Jequitinhonha

Padre Paraiso PA Córrego Comprido 43 1986 1987 Desapropriação

Jequitinhonha

Pedra Azul PA Aliança 95 1986 1987 Desapropriação

Noroeste De Minas

Unaí PA Bálsamo 63 1986 1987 Desapropriação

Norte De Minas

Manga PA Japoré 102 1987 1988 Desapropriação

Norte De Minas

Riachinho PA São João Do

Boqueirão 600 1987 1988 Desapropriação

Triângulo Mineiro/ Alto Paranaíba

Santa Vitória PA Cruz e Macaúbas 24 1987 1988 Desapropriação

Noroeste De Minas

Arinos PA Mimoso 59 1988 1989 Desapropriação

Norte De Minas

Riachinho PA Brejo Verde 63 1988 1989 Desapropriação

Norte De Minas

Verdelândia PA Boa Esperança 30 1988 1989 Desapropriação

Fonte: Projeto DATALUTA, 2009. Org. SOUZA, L.C., 2010

De acordo com os dados da tabela 1, podemos observar que o número de

assentamentos foi muito pequeno, quando comparado com a real demanda e com a

grande concentração fundiária situada em Minas Gerais. Apenas quatro, das 12

mesorregiões mineiras, foram contempladas com assentamentos rurais, sendo elas

Triângulo Mineiro/ Alto Paranaíba, Noroeste de Minas, Norte de Minas e

Jequitinhonha. Porém, vale ressaltar que mesmo com poucos assentamentos criados no

período, todos ocorreram a partir de desapropriações de terra, ou seja, com a

redistribuição de terras que não estavam exercendo seu papel social, de acordo com a

Constituição Federal.

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47

2.3.2 O Governo Collor e Itamar (1990 a 1994): a extinção de uma proposta

de Reforma Agrária

No governo Collor (1990-1992), o MIRAD foi extinto e, juntamente com o

órgão, a proposta de Reforma Agrária, visto que, durante o período, não foram

realizadas criações de assentamentos através de desapropriações de terras, sendo obtido

e criado em Minas Gerais apenas o PA João Pinheiro, no município de Funilândia,

através de um processo de doação de terras.

No governo seguinte, de Itamar Franco (1992-1994), as iniciativas de projetos de

Reforma Agrária foram resgatadas. A partir de uma medida emergencial, o Governo

retomou a desapropriação para fins de Reforma Agrária e criou o Programa de

Valorização da Pequena Produção Rural – PROVAP, cujo objetivo era destinar créditos

com taxas mais baixas aos agricultores familiares. Porém, os recursos do Programa

eram concedidos pelo BNDES, o que dificultava, aos pequenos produtores, atenderem

as exigências do sistema financeiro. Na tabela seguinte, apresentam-se a relação dos

assentamentos criados em Minas Gerais e a forma como foram legitimados durante os

governos Collor e Itamar.

Tabela 2: Assentamentos Rurais Criados no Estado de Minas Gerais Durante os Governos Collor e Itamar (1990 a 1994)

Mesorregião Município Nome Do

Assentamento

Capac.

De

Famílias

Obtenção Criação Forma

Jequitinhonha Minas Novas PA Adrião Capivari 14 1992 1992 Compra

Norte De Minas

Urucuia PA Água Branca 20 1991 1992 Desapropriação

Jequitinhonha Novo Cruzeiro PA Aruega 24 1988 1992 Desapropriação

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Noroeste De Minas

Bonfinópolis

De Minas PA Assa Peixe 50 1989 1992 Desapropriação

Metropolitana De Belo Horizonte

Funilândia PA João Pinheiro 21 1991 1991 Doação

Jequitinhonha Sen. Modestino

Gonçalves PA Lagoa Bonita 53 1988 1991 Desapropriação

Norte De Minas

Jaíba PAMocambinho 176 1986 1992 Reconhecimento

Triângulo Mineiro/ Alto Paranaíba

Campo Florido PA Nova Santo

Inácio Ranchinho 118 1991 1994 Desapropriação

Norte De Minas

Januária PA Picos Januária 65 1989 1992 Desapropriação

Noroeste De Minas

Pres. Olegário PA Prata Dos Netos 21 1988 1991 Desapropriação

Vale Do Mucuri

Itaípe PA Santa Rosa/

Córr. das Posses 34 1992 1992 Desapropriação

Noroeste De Minas

Unaí PA São Pedro Cipó 80 1988 1992 Desapropriação

Norte De Minas

Montalvânia PA Vaca Preta 85 1989 1991 Desapropriação

Jequitinhonha Minas Novas PA Adrião Capivari 14 1992 1992 Compra

Fonte: Projeto DATALUTA, 2009. Org. SOUZA, L.C., 2010

Como demonstram os dados, foram criados e obtidos apenas seis assentamentos

no período de 1990 a 1994, sendo que dois foram obtidos por compra, um por doação e

quatro por desapropriação de terras. Os oito assentamentos relacionados na tabela foram

apenas legitimados no período, ou seja, já haviam sido obtidos pelo governo anterior.

Na mesorregião Triângulo Mineiro/Alto Paranaíba, foi criado apenas um assentamento,

na cidade de Campo Florido, o PA Nova Santo Inácio Ranchinho com capacidade para

118 famílias.

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49

2.3.3 O Governo Fernando Henrique Cardoso (1995 a 2002): o

neoliberalismo e a Reforma Agrária de Mercado

Durante o Governo Fernando Henrique Cardoso (1995 a 2002), foi adotada uma

política neoliberal que na área rural, que dentre suas características destaca-se a

prioridade da produção para atender o mercado externo, deixando em segundo plano o

abastecimento interno. Além disso, o fato do Estado não intervir de forma direta na

economia, fez com que a economia agrícola brasileira se subordinasse aos interesses dos

países mais ricos e das grandes transnacionais que monopolizam o setor de produção de

insumos e o comércio de produtos nesse setor. Segundo Alentejano (2004) houve

durante aquele período,

Eliminação praticamente absoluta das restrições às importações (inclusive de produtos agrícolas); abertura para a entrada maciça do capital estrangeiro, particularmente os de natureza especulativa, provocando forte vulnerabilidade; crescimento da dívida externa, apesar do pagamento de juros crescentes; entrega do patrimônio nacional ao capital estrangeiro através do processo de privatização. Somados, estes processos se traduzem num aumento da vulnerabilidade brasileira frente às grandes empresas transnacionais e às principais potências estrangeiras, particularmente, os EUA (ALENTEJANO, 2004, p.3).

Percebendo que as medidas usadas no governo FHC acabariam dificultando o

processo de Reforma Agrária no país, os movimentos sociais de luta pela terra se

organizaram e reivindicaram por melhores condições de vida no campo. A pressão feita

pelos movimentos sociais com a ampliação das ocupações nesse período pressionou o

governo FHC a ampliar as áreas de assentamento (Mapa 2) e também alguns programas

sociais voltados ao campo como o Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura

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50

Familiar (PRONAF); o Programa de Geração de Emprego e Renda Rural (PROGER

RURAL) e a Previdência Rural. -50

-50

-45

-45

-40

-40-20 -20-15 -15

N

50 0 50 Kilometers

Nº de Assentamentos01 - 45 - 89 - 1213 - 17

Mesorregiões

LEGENDA

Fonte: LAGEA, DATALUTA-MG, 2009.Base: www.geominas.com.br, 2009.Org.: GONZAGA, H. T.; SOUZA, L. C. 2009.

Mapa 2 – Assentamentos criados durante o governo de FHC de 1995 a 2002

Porém, grande parte desses programas não passaram de medidas compensatórias

e que o os financiamentos de custeio com recursos do programa apresentaram encargos

totais muito superiores a todas as taxas que aferem o processo inflacionário. Além disso,

foi atestado que o financiamento era destinado apenas aos produtores que eram

integrados às empresas agroindustriais ou por cooperativas por elas ministradas. Para

Fernandes (2001),

Essas políticas têm o capital e o mercado como principais referências, de modo que procura destituir de sentido as formas históricas de luta dos trabalhadores. A luta pela terra, que tem como princípio o enfrentamento ao capital, defronta-se com esse programa, por meio do qual pretende convencer os pequenos agricultores e os sem-terra a aceitarem uma política em que a integração ao capital seria a melhor forma de amenizar os efeitos da questão agrária (FERNANDES, 2001, p.21).

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51

Outro marco importante no Governo FHC foi a criação do Banco Terra. O

projeto constituía-se em um mecanismo criado para compra e venda de terras destinadas

a Reforma Agrária através do Banco Mundial, assim temos que

As políticas do Banco Mundial voltaram-se para ações que pudessem promover alguma desconcentração deste bem, a fim de contribuir nesse sentido. Outra motivação diz respeito aos baixos investimentos realizados no meio rural [...] logo nada mais oportuno que promover programas voltados para a atração de investimentos privados para essas áreas rurais que se articulem. Por fim, a preocupação, meramente retórica de redução ou alivio da pobreza (e não com sua eliminação). (RAMOS FILHO, 2005 p.03)

Mais uma vez atuação do Governo foi criticada, pois além de encarecer o preço

da terra, o processo de arrecadação de terras e seleção das famílias era descentralizado,

ou seja, ficava sob responsabilidade dos municípios gerando assim um fortalecimento

das elites locais e dificultando a pressão popular que reivindicava uma Reforma Agrária

que não fosse à de mercado adotada pelo presidente.

2.3.4 O Governo Luiz Inácio da Silva (2003 a 2010): o apoio dos movimentos

sociais de luta pela terra e a manutenção das políticas de Reforma Agrária

Foi nesse cenário que Luiz Inácio Lula da Silva assumiu a presidência da

República no ano de 2003, com o apoio de grande parte das entidades populares de luta

pela terra. Tal apoio fez com que entidades, como o MST e a Contag, tivessem o poder

de indicar pessoas influentes, dentro de suas coordenações, a assumirem cargos

importantes dentro do Governo, como os presidentes do Incra e MDA.

Mesmo com a significativa participação dos movimentos, durante o Governo

Lula, a bancada ruralista foi responsável por indicar o nome que assumiria o Ministério

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da Agricultura, o que manteve o padrão de desenvolvimento no campo voltado

essencialmente para agronegócio e a exportação. Além disso,

Com o forte apoio da mídia, os ruralistas mobilizaram-se contra a política agrária do governo Lula e conseguiram anular a primeira desapropriação executada no município de São Gabriel, no Estado do Rio Grande do Sul. Também se organizaram em todo o país, realizando marchas a cavalo ou carreatas, cercando acampamentos de famílias sem-terra e obstruindo estradas com o gado. Com a intensificação da reação dos ruralistas, aumentou o número de trabalhadores sem-terra mortos por pistoleiros. (FERNANDES, 2003, p.38)

Durante sua campanha, Lula apresentou um plano de metas para o setor agrário

brasileiro. Dentre essas estavam: a ampliação do programa de fortalecimento da

agricultura familiar e dos assentamentos de Reforma Agrária; o crédito rural; educação

para o meio rural; luz para todos; associativismo e cooperativismo entre tantas outras

que, como a maioria destas citadas, não conseguiu alcançar seu objetivo, pois,

A Reforma Agrária no governo Lula não tem capacidade de alterar a estrutura fundiária. Os únicos resultados positivos se referem ao Pronaf (Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar), o que é pouco para sustentar a afirmativa de que Reforma Agrária de qualidade está a ser efetivada. O que ainda diferenciava o governo Lula dos demais era a sua postura em relação aos movimentos sociais. Agora, nem isso. Sua política é inócua ao latifúndio. Não atinge o monopólio da terra (CARVALHO FILHO, 2006, s/p).

Porém, dentre as políticas adotadas durante o período, a que mais teve destaque

foi à elaboração do o II Plano Nacional de Reforma Agrária (II PNRA), que retomava a

necessidade de se estabelecer políticas coerentes voltadas ao pequeno produtor e a

criação de novos assentamentos rurais no Brasil (Mapa 3).

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53

Mapa 3 – Assentamentos criados durante o Governo de Lula de 2003 a 2009

O II PNRA foi concebido com a participação dos movimentos sociais. Porém,

mais uma vez, as metas do programa não foram atingidas em sua totalidade,

É possível perceber a critica de diversos setores da sociedade, tais como a Igreja Católica, partidos políticos, dentre outros, em relação a política adotada pelo Governo Lula. Em vez de realizar mudanças na estrutura agrária, com políticas públicas de criação e desenvolvimento de assentamentos, preferiu apoiar e incentivar ainda mais o desenvolvimento do agronegócio brasileiro. (CARDOSO, 2010, p. 27)

Além disso, muitos dados foram inflados, maquiando assim a realidade do

campesinato brasileiro. Segundo Oliveira

“[...] tudo indica tratar-se de reconhecimento das famílias já assentadas para fins de sua inserção nas políticas do governo, mas nunca, novos assentamentos do governo LULA. São, portanto, casos típicos de reordenação de assentamentos antigos“ (OLIVEIRA, 2006).

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54

Assim, considerando as recentes políticas de Reforma Agrária abordadas no

presente trabalho, podemos, verificar a participação efetiva dos governos federais na

implementação de assentamentos rurais no estado de Minas Gerais (Tabela 3).

Tabela 3: Número de Assentamentos Criados pelos Governos e participação de Minas Gerais de 1985 a 2009

Anos Governos

Assentamentos criados Relação do n° de assentamentos

criados em MG e no Brasil (%)

MG Brasil

1985 - 1989 SARNEY 12 516 2,3

1990 - 1994 COLLOR / ITAMAR

13 369 3,5

1994 - 1998 FHC 1 102 2329 4,4

1998 - 2002 FHC 2 85 1975 4,3

2002 - 2006 LULA 1 108 2383 4,5

2006 - 2009* LULA 2 29 836 3,4

TOTAL 349 8408 4,1

Fonte: PROJETO DATALUTA, 2009. Org.: SOUZA, L. C., GONZAGA, H.T.; 2010.

Estes expressivos números explicam-se pelo fato de que Minas Gerais ainda ser

um estado com grande concentração fundiária, o que torna a criação de assentamentos

rurais uma necessidade. Tal fator justifica a alta concentração de assentamentos rurais,

principalmente nas mesorregiões do Triângulo Mineiro/ Alto Paranaíba e Norte de

Minas, sendo um dos principais motivos da concentração dos assentamentos, nessas

regiões, a grande concentração fundiária e as políticas de incentivo ao agronegócio,

fazendo, desta maneira, com que as ocupações de terra, nesses locais, sejam mais

pontuais e numerosas.

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Devemos compreender os assentamentos como uma forma de representação

territorialmente construída, ou seja, são os espaços produzidos pelos movimentos

socioterritoriais. No entanto, as políticas (compensatórias) de criação de assentamentos

rurais têm sido implantadas a partir da concepção de mundo neoliberal exercida pelos

governos, nas últimas décadas

Além disso, grande parte dos assentamentos rurais mineiros ainda possuem

grandes dificuldades quanto suas formas de organização e permanência do trabalhador

no campo. Tais barreiras são encontradas independentemente do ano de criação desses

assentamentos, evidenciando a ineficácia e até mesmo ausência de políticas públicas

compatíveis com a real necessidade do sem-terra e da concretização de uma agricultura

familiar sólida.

Apesar de apresentar números significativos no que tange à questão agrária

como um todo, é importante ressaltar que os números de assentamentos rurais existentes

no estado de Minas Gerais ainda são muito inferiores a real necessidade e que a região

exige, o que torna a luta e a conquista pela terra um processo que demanda dos

movimentos muita articulação, lutas e sacrifícios.

Assim, o presente trabalho busca, através da pesquisa de campo, compreender

como se estabelece a estrutura e a organização nos assentamentos rurais, bem como as

famílias, agora assentadas, enfrentam novos desafios no pós-conquista da terra. Para

isso, foram analisados quatro assentamentos rurais localizados na mesorregião

Triângulo Mineiro/ Alto Paranaíba criados em períodos governamentais diferentes,

sendo possível, uma análise comparativa das políticas públicas efetivamente

implementadas e seus impactos territoriais.

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3 CARACTERIZAÇÃO DE EXPERIÊNCIAS EM

ASSENTAMENTOS RURAIS NO TRIÂNGULO MINEIRO/ ALTO

PARANAÍBA

Os assentamentos analisados foram escolhidos pela forma de obtenção, ano de

criação e histórico de luta. Para tanto, utilizou-se como base inicial de dados o projeto

DATALUTA. Neste primeiro momento foram coletadas informações no que se refere à

localização, o ano de criação, a área do assentamento e a capacidade de famílias

assentadas.

No momento da escolha dos assentamentos, houve a preocupação em selecionar

aqueles próximos do município de Uberlândia e também criados em períodos

governamentais diferentes, pois além da facilidade de locomoção para as visitas de

campo, também como parte metodológica, se sustenta de maneira mais eficiente uma

análise comparativa.

Posteriormente, por meio de pesquisas bibliográficas, foram utilizados trabalhos

e pesquisas que analisavam os assentamentos escolhidos, facilitando assim uma análise

mais aprofundada sobre o tema. Em uma etapa final foram realizados trabalhos de

campo onde foi possível vivenciar o cotidiano das famílias assentadas através de

entrevistas e conversas com lideranças e a comunidade assentada como um todo.

3.1 PA Cruz e Macaúbas – Santa Vitória

O PA Cruz e Macaúbas localiza-se no município de Santa Vitória, próximo ao

distrito de Chaveslândia, ambos localizados na mesorregião Triângulo Mineiro/ Alto

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Paranaíba, com uma distância de aproximadamente 50 km da sede municipal e 25 km

da sede do distrito.

O assentamento foi criado em 1986 durante o período de governo de José

Sarney, sendo um dos primeiros PA´s implementados em Minas Gerais. Desta

maneira, sua forma de obtenção foi bastante peculiar e diferenciada da maioria dos

assentamentos rurais da região.

A Fazenda Cruz e Macaúbas pertencia ao fazendeiro Joaquim Júlio que há

muito tempo não produzia no local. Após laudos realizados pelo INCRA, em 1986, foi

constatado que a fazenda, de aproximadamente 693 hectares, não estava cumprindo

com sua função social e assim, estaria passível de desapropriação.

Como forma de agilizar o processo de desapropriação da fazenda, o Sindicato

dos Trabalhadores Rurais de Santa Vitória realizou uma ocupação relâmpago que,

segundo informações de um dos assentados do PA Cruz e Macaúbas, que participou da

ação, esta foi aconselhada pela INCRA, que cerca de 11 pessoas permaneceram

acampadas por 10 dias na área. Após o período, o INCRA realizou a ordem de despejo

do proprietário.

Em 1989, através de sorteio, foram selecionadas as famílias assentadas e

divididos os lotes da fazenda. Inicialmente foram assentadas 24 famílias, todas ligadas

ao STR da região, em lotes que variam de 22 a 35 hectares. Vale ressaltar que o

módulo rural da região é de 30 hectares, ou seja, alguns lotes possuem área inferior a

um módulo, o que dificulta a produção para o auto-consumo.

Por ter sido o segundo assentamento rural criado na região do Triângulo

Mineiro/ Alto Paranaíba, todo o processo legal foi bastante rápido. Após um ano, os

assentados receberam o um incentivo governamental, no valor de R$20.000,00, o que

os auxiliou na construção de casas e na compra de sementes e gado. Já em 1992, três

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anos após a divisão e distribuição dos lotes às famílias, o assentamento foi

emancipado.

Todavia, segundo alguns assentados, tal processo não contribuiu, de maneira

significativa, para as famílias, de uma maneira geral, visto que, depois de emancipado,

o assentamento perdeu alguns recursos. Desta maneira, acredita-se que a emancipação

ocorreu pela de articulação de alguns grandes fazendeiros da região, como forma de

desestabilizar o assentamento, visto que, após a emancipação, os assentados tiveram

que pagar seus lotes além de deixarem de receber alguns benefícios.

O PA Cruz e Macaúbas também contou, por algum tempo, com uma escola no

interior do assentamento, que atendia crianças de toda a região. Porém, em 2002, a

escola foi deslocada para o PA Nova Jubran, também localizado em Santa Vitória,

devido a uma maior demanda de alunos e crianças em idade escolar. Atualmente

(2010), a escola foi nomeada Escola Municipal Luiz Dib e atende um total de 100

crianças da educação infantil, até o nono ano, e segue um regime convencional de

ensino.

Durante as décadas de 1980 e 1990, o principal produto cultivado no

assentamento era a mandioca. Seguindo certa tendência da regional, todos os lotes têm,

como principal fonte de renda, a criação de gado de corte e também leiteiro. Porém, o

gado não é suficiente para o abastecimento das famílias; desta forma, também há

produção de hortaliças, fabricação de polvilho e criação de peixes.

Além disso, grande parte dos produtores trabalham em uma usina de cana-de-

açúcar que se localiza próxima ao PA Cruz e Macaúbas, como forma de garantir a

manutenção das famílias, visto que a falta de incentivos faz com que a produção seja

insuficiente para as necessidades daquelas.

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Recentemente (2010), restam apenas oito famílias que participaram da

formação do assentamento desde o princípio. Cerca de 16 lotes foram vendidos para

terceiros, sendo que dois destes foram arrendados para a produção de cana-de-açúcar.

Assim, podemos verificar que, apesar de inicialmente o processo de desapropriação da

fazenda e emancipação do assentamento ter acontecido de maneira ágil, isto não foi o

suficiente para que as famílias permanecessem na terra e ali constituíssem uma

agricultura familiar sólida.

3.2 PA Nova Santo Inácio Ranchinho – Campo Florido

O processo de criação do PA Nova Santo Inácio Ranchinho iniciou-se no dia

24 de janeiro em 1990, quando cerca de 200 trabalhadores rurais sem-terra vinculados

a CUT, FETAEMG, STR e CPT, ocuparam a Fazenda Colorado, de mais de 5000 ha,

localizado no município de Iturama, Minas Gerais.

Um dia após a ocupação, as famílias acampadas foram despejadas da fazenda

pela Polícia Militar, respaldada pela União Democrática Ruralista – UDR. Desta

maneira, os trabalhadores rurais sem-terra se dirigiram ao centro da cidade e lá

acamparam como forma de manifestação contra o ocorrido e de pressão para que o

INCRA desapropriasse a fazenda, que era considerada improdutiva.

Porém, após conflitos com a polícia e também com algumas entidades públicas,

o movimento decidiu transferir o acampamento para a BR 497. Segundo Guimarães

(2002, p. 73), “desta forma, o acampamento nas margens de uma rodovia federal

tornou as lutas dos trabalhadores visíveis para a sociedade local, constituindo-se como

locus das práticas de resistência e organização”.

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Parte do grupo permaneceu durante nove meses acampados na BR 497 entre os

municípios de Uberlândia e Iturama, aguardando, sem sucesso, providências do

INCRA e do Governo Federal para a desapropriação do latifúndio. Desta maneira, os

sem-terra decidiram ocupar a Fazenda Varginha, também localizada na região, e que se

encontrava improdutiva. Porém, desta vez, a reação dos membros da UDR e da Polícia

Militar foi instantânea. A expulsão dos trabalhadores aconteceu de forma

extremamente violenta; as famílias foram humilhadas e alguns trabalhadores foram

amarrados e afogados e suas esposas sexualmente agredidas.

Segundo Guimarães (2002),

A violência exercida pela polícia contra os trabalhadores marcou a presença dos fazendeiros, declarando a luta aberta contra os ocupantes da terra. Nesse sentido, a ação do Estado sobre os conflitos no campo foi permeada por práticas repressivas sobre os movimentos, ora abertas como intervenções policiais nos conflitos, ora veladas, pela omissão quanto às ações das milícias privadas dos grandes proprietários (GUIMARÃES, 2002 p. 77).

Mesmo depois de ter sofrido tantas atrocidades, o grupo de trabalhadores sem-

terra não desistiu de lutar e fazer valer seus direitos. Voltaram para o acampamento na

BR 497 e restabeleceram-se moral, física e psicologicamente, realizando freqüentes

manifestações como forma de mobilizar a sociedade em prol da luta pela Reforma

Agrária.

É nesse momento que a Fazenda Nova Santo Inácio Ranchinho, de 3.890 ha,

em Campo Florido, foi indicada como área passível de desapropriação, para fins de

Reforma Agrária. Foi por meio de muita luta e, principalmente, de pressão exercida

pelos sem-terra ao INCRA que, em 16 de abril de 1991, foi realizada a desapropriação

da fazenda. Porém, apenas em 1993 as famílias se fixaram na propriedade.

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Durante a fase de acampamento no PA Nova Santo Inácio Ranchinho, os

trabalhadores rurais buscaram, coletivamente, conquistar e defender seus direitos no

pós-conquista da terra. O parcelamento dos lotes foi realizado com 107 famílias por

meio de sorteio, seguindo critérios de afinidade e parentesco entre os membros. Além

disso, também foram demarcadas áreas de uso coletivo.

Todavia, a organização coletiva no assentamento não durou muito tempo, pelo

fato de algumas ações serem questionadas e não acordadas de maneira única pelo

grupo. Assim, os assentados, principalmente após a definição dos lotes, decidiram por

um modelo de produção individual, o que, conseqüentemente, acabou distanciando os

trabalhadores.

Após várias tentativas de produção e frustrações, grande parte dos assentados

vem arrendando suas propriedades para usinas de cana-de-açúcar. Silva (2007) ressalta

que:

O arrendamento de parte das parcelas a fazendeiros vizinhos ao assentamento não começou com a cana. Antes dela, devido ao alto valor alcança.do pela soja no mercado daquele período (em torno do ano 2000), a demanda por áreas do seu plantio aumentou significativamente. Assim, principalmente durante os poucos anos nos quais a cotação da soja esteve em seu auge, alguns assentados arrendaram parte de suas parcelas para fazendeiros que já produziam em suas terras e naquele momento buscavam novas áreas (SILVA, 2007 p. 123).

Mesmo indo, muitas vezes, contra seus valores e identidade de luta, a maioria

dos assentados do PA Nova Santo Inácio Ranchinho não vislumbra uma alternativa

mais eficiente, economicamente, tendo em vista as dificuldades encontradas durante

todo o período de pré e pós-conquista da terra, como perseguições e falta de

incentivos. Porém, ainda vale destacar que, mesmo grande parte dos assentados tendo

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aderido ao arrendamento, muitos acreditam e esperam que tal situação seja temporária

e que, em breve, haja condições de se reerguerem na agricultura familiar.

3.3 PA Rio das Pedras – Uberlândia

A ocupação da Fazenda Rio das Pedras, localizada no município de Uberlândia

nas margens da BR 365, sendo considerada a primeira ocupação de terras ocorrida no

município, deu-se em abril de 1997, quando cerca de 170 famílias do Movimento de

Libertação dos Sem-Terra – MLST ocupou o local.

Contudo, o proprietário da então fazenda entrou com um mandato de

Reintegração de Posse, que foi concedida ainda no mês de abril e estipulou um prazo

de 72 horas para que as famílias sem-terra desocupassem a área. Por meio de um

acordo entre advogados do movimento e a Polícia Federal, foi estipulado um novo

prazo para a desocupação da área. Durante esse período, o MLST entrou com um

mandato de segurança contra a reintegração de posse e, após vistoria do INCRA, a

propriedade de 1900 hectares, foi considerada improdutiva, pois apenas 20% dela eram

utilizados, para o cultivo de soja. Segundo definições do órgão em questão, para não

ser considerada improdutiva a propriedade deveria ser utilizada, para produção, em

pelo menos 80% de sua área.

Das 170 famílias que participaram do processo de ocupação da área, apenas 87

foram assentadas, cerca de um ano e meio após a ocupação, período no qual ficaram

acampadas onde hoje se encontra a sede do assentamento. Na época, orientadass pelo

MLST, as famílias foram selecionadas e organizadas, cada uma em lotes com cerca de

20 hectares. Nos últimos anos, aproximadamente metade das famílias assentadas já

não reside mais no PA.

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Segundo Medeiros (2008),

Todo período de ocupação da fazenda Rio das Pedras transcorreu de modo pacífico não havendo violência policial, fato este que se justifica, em parte, pela conduta do proprietário da fazenda que não colocou empecilhos, ou seja, muitas objeções para que a fazenda fosse desocupada imediatamente, preferindo, assim, esperar os resultados dos trâmites legais (MEDEIROS, 2008 p. 129).

Na ocasião da ocupação da propriedade pelas famílias, pouco restava da fauna

e da flora originais. Na área da fazenda e nas propriedades vizinhas , predominavam na

época e hoje, mais ainda, imensas áreas para a prática da pecuária extensiva e para o

cultivo, principalmente de soja.

No intervalo de tempo marcado pela ocupação até a consolidação do

assentamento, as famílias experimentaram o cultivo coletivo de gêneros de

subsistência, como arroz, feijão, milho, mandioca e hortaliças, mas tal prática não teve

continuidade, após a distribuição dos lotes.

Predominam, no assentamento, áreas para a criação de gado leiteiro de baixa

linhagem. Em muitos casos, a criação do gado bovino no assentamento caracteriza-se

como um problema, pois é comum encontrarmos animais utilizando áreas de nascentes

e veredas como locais de pastagem. O pisoteamento do solo por estes animais destrói a

vegetação nativa, compactando o solo e introduzindo espécies invasoras como

gramíneas e leguminosas. Essas áreas vêm sofrendo intenso impacto antrópico, que

afeta, principalmente, a preservação das áreas de abastecimento natural de água para o

assentamento.

Outro fator que afeta os recursos hídricos são os desvios dos cursos d’água,

realizados para disponibilizar água para as áreas de plantações. Quase que em sua

totalidade, os rios e córregos da região não dispõem de água própria para o consumo

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humano, pois se encontram contaminados por esgoto e por agrotóxicos utilizados nas

grandes lavouras das fazendas vizinhas. As fontes de água boa para o consumo ficam,

então, por conta das cisternas e poços artesianos espalhados por todo o assentamento.

A disposição de lixo e esgoto não é feita de forma sustentável. É comum

encontrarmos nos lotes valas em que o lixo é jogado e, posteriormente, queimado sem

nenhum tipo de manejo, seleção ou coleta.

A criação de suínos e de aves é outra atividade comum para os assentados,

apesar de não se configurar como uma atividade comercial. O modo de criação dos

porcos é bastante interessante, pois reflete a técnica adquirida pelo trabalhador rural

em experiências anteriores. Existem dois ambientes em que os porcos são criados: o

chiqueiro, no qual o animal é colocado com a finalidade da engorda para o abate, e o

mangueiro, no qual geralmente são colocados um macho e uma fêmea, com o intuito

da reprodução para o aumento do rebanho. Tal técnica reflete a sabedoria adquirida

pelo trabalhador do campo, configurando-se em algo que modela a paisagem de acordo

com a aplicação da cultura.

As áreas de cultivo do assentamento são geralmente para a exploração de

espécies que servem de alimento para a criação, como cana, o milho entre outros.

Outro aspecto relevante é que tais plantações não são feitas de forma coletiva, assim

como todo cultivo de hortaliças é feito de forma individual. Desta maneira nota-se que,

no assentamento, não há o espírito de trabalho em grupo, ou seja, cada lote configura-

se como uma propriedade particular, em que cada proprietário produz, sozinho, aquilo

que necessita.

O PA Rio das Pedras possui uma área comunitária onde se localiza a sede, além

de um amplo espaço para a realização de reuniões entre os assentados. É importante

ressaltar que o PA participou do Programa de Apoio Científico e Tecnológico nos

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Assentamentos de Reforma Agrária na Região do Triângulo Mineiro – PACTo,

desenvolvido pela Universidade Federal de Uberlândia – UFU, com a participação de

vários institutos e faculdades. Durante o projeto (de 2001 a 2006), foram elaborados e

sugeridos modelos de trabalho coletivo, por meio de cooperativas; todavia, tais

projetos não foram efetivamente implantados.

Outro projeto, também desenvolvido durante o PACTo, foi a instalação de um

viveiro de mudas, que seria utilizado por toda a comunidade assentada, porém, apesar

de a estrutura ter sido montada, ela não está sendo utilizada, o que demonstra grande

dificuldade de articulação e integração entre as famílias assentadas.

Na mesma área há o projeto de uma farinheira. A farinheira encontra-se

praticamente completa, com todo o maquinário instalado e pronto para ser utilizado.

Não há, contudo, incentivos públicos financeiros ou técnicos para que se possa iniciar

a produção de farinha dentro do assentamento.

Por fim, é interessante observar e compreender as transformações sociais e

espaciais ocorridas na área do PA Rio das Pedras. Mesmo com a participação em

projetos de vínculo direto com a Universidade Federal de Uberlândia, os assentados

ainda encontram barreiras a serem transpostas, não apenas na inter-relação pessoal,

mas também na falta de apoio público e políticas eficazes; e não apenas em

implementação de projetos e maquinários, mas, sobretudo, no acompanhamento das

famílias no campo.

3.4 PA São Domingos – Tupaciguara

A história de criação do PA São Domingos inicia-se não como a maioria dos

assentamentos do Triângulo Mineiro, e até mesmo do Brasil, mediante a luta pela terra,

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ou seja, em que a ocupação “é tida como principal forma de acesso ‘a terra’” (GOMES,

2004). Nesse sentido, Fernandes destaca que “para os sem-terra a ocupação como

espaço da luta e resistência representa a fronteira entre o sonho e a realidade, que é

construída no enfrentamento cotidiano com os latifúndios e o Estado” (FERNANDES,

2001).

O assentamento inicia-se com um processo considerado até mesmo pacífico, no

que tange à não ocupação da propriedade, posto que, foi através de uma solicitação de

vistoria da terra da Fazenda São Domingos, localizada no município de Tupaciguara-

MG, no ano de 1997, reivindicada pelo Movimento de Libertação dos Sem Terras –

MLST junto ao Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária – INCRA que

iniciou a desapropriação da área.

Nessa solicitação do movimento ao INCRA, foi apontado o caráter improdutivo

da fazenda, esta não atendendo sua função social, como destacado pelo Estatuto da

Terra, de 1964, e incorporado às constituições posteriores, que em geral enfatiza que

quando a terra, não atingir os índices de produtividade de cultura por área, bem como

não cumprir sua função social, esta pode ser desapropriada, com fins para Reforma

Agrária.

Com a vistoria da área, a fazenda foi considerada improdutiva em primeira

instância, atendendo aos requisitos legais para desapropriação e criação do

assentamento. Mas, em decorrência do alto valor solicitado pelo proprietário da terra,

para que a mesma fosse desapropriada, o processo de criação do assentamento foi

encerrado naquele momento, mediante o INCRA não concordar em pagar mais do que

os preços tabelados para a compra de terras, esse fator sugere que o valor cobrado para

que a terra não fosse desapropriada foi planejado, possivelmente pelo proprietário de

terra, que queria manter sua propriedade.

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Durante alguns anos a área deixou de ser foco dos movimentos sociais para a

criação de um assentamento. Porém, em 23 de Junho de 2003, o Movimento Terra

Trabalho e Liberdade – MTL, originado em decorrência de problemas internos do

MLST, ocupou a Fazenda São Domingos com cerca de 400 pessoas. Mas, pouco tempo

depois, foi emitido um mandato de reintegração de posse ao proprietário da fazenda.

Mesmo assim, os manifestantes voltaram a ocupar a área, sendo muitas vezes forçados a

desocupar a terra mediante reintegrações de posse.

Somente em 2004, após uma nova reintegração de posse da área, os

manifestantes deixaram as mediações da fazenda, uma vez que estes foram levados para

alojamentos montados no aterro da cidade, resultado de acordo feito entre o INCRA e a

prefeitura local. Esta ação foi aceita como alternativa para famílias se instalarem até que

o INCRA encontrasse uma localidade para alojá-las. Outro fator reside que, naquele

momento, o proprietário da área conseguiu mandatos de segurança impedindo que

novas ocupações ocorressem na Fazenda São Domingos.

No alojamento do aterro da cidade, os trabalhadores viviam em situação

precária, e decidiram abandonar a área e continuar suas manifestações em outras

localidades. Assim, os militantes foram divididos em dois grupos, o primeiro foi

enviado para ocupar a Fazenda Água Viva enquanto o segundo grupo foi direcionado

para ocupar a Fazenda Taperão. É importante salientar que nessa última ocupação

ocorreram fortes discussões ente os manifestantes e a polícia, que fazia a segurança da

propriedade, porém os manifestantes conseguiram ocupar a área.

Pouco tempo depois, alguns integrantes da ocupação da Fazenda Água Viva

foram deslocados, juntamente com outros militantes do MTL da região, para uma nova

ocupação da Fazenda São Domingos. Porém, como a fazenda possuía um mandato de

segurança judicial, que impedia a ocupação da terra, os militantes montaram acamparam

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as margens das estradas próximas à fazenda, e de certa forma controlaram o fluxo de

entrada e saída de pessoas das áreas próximas da propriedade.

Esse processo de conquista da terra mediante a ocupação da área foi cessado,

porém os embates políticos para a transformação da área em assentamento não pararam.

Tanto que o MTL apresentou junto ao Ministério Público Federal e a Justiça Federal,

projetos de implantação de cooperativas de produção comunitária, coordenada pelo

movimento.

Mediante esse processo, o INCRA se viu forçado pelo Ministério Público

Federal e a Justiça Federal, a agilizar o processo de compra de terras para a implantação

do projeto de cooperativa. O MTL reivindicou, junto às entidades, que o projeto

ocorresse na Fazenda São Domingos, assim o INCRA intensificou suas ações de

negociação para a aquisição da terra e, em 25 de maio de 2006, foi cedido ao MTL à

posse da Fazenda São Domingos, sendo que esta repassada a cooperativa do

movimento, nomeada de Cooperativa Agropecuária Mista de Empreendimento Rural

Comunitário do Assentamento São Domingos – COERCO.

3.4.1 O cooperativismo como alternativa de produção em assentamentos: o

exemplo da COERCO

É importante salientar neste trabalho que em todo o Brasil ocorrem experiências

de cooperativismo em assentamentos rurais, em Campo Florido, Uberlândia e Unaí.

Porém, estes são criados e auto-geridos pelos assentados, cuja posse da terra é atribuída

aos trabalhadores. Neste caso, a proposta de cooperativa, coordenada pelo movimento

MTL e implantada no assentamento São Domingos desde sua criação foge a essas

características comuns apontadas dos outros assentamentos.

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A cooperativa orienta as diretrizes de coletividade no que tange principalmente o

trabalho, atribuindo funções, cargos e responsabilidades aos associados. Quanto à posse

da terra, esta fica ao MTL, pois “não há divisão de lotes entre as famílias e os lucros são

repartidos proporcionalmente às horas de trabalho nas lavouras” (SOUSA, 2007).

Dessa forma, os “assentados”, não possuem áreas do tamanho comum a outros

assentamentos de Minas Gerais, que variam em média de 17 a 30ha. Os associados, da

COERCO, são locados numa área de uso individual de cerca de 2ha de terras, na qual

podem construir sua moradia e fazer a escolha de uso de produção nesse pequena área,

sendo os lucros obtidos nessa área individual não vinculados ou repassados a

cooperativa.

O restante da área da fazenda, excluindo-se as áreas de uso individual, é

destinada à cooperativa onde o uso e o tipo de produção que serão realizados no local

são votados entre os cooperados, mediante a indicação de possibilidades de produção

idealizadas pelo MTL, que é objetivada através de reuniões.

Os recursos obtidos pela COERCO são divididos entre os associados de forma

igualitária, respeitando o trabalho desenvolvido por cada um. Porém, um fator que

ocorre de forma bastante generalizada, é o retorno do lucro obtido repassado para a

própria COERCO. Como destacado a seguir,

Grande parte dos assentados retorna para a cooperativa, o que recebeu na divisão dos lucros. Ilda Pereira Araújo, tesoureira da Coerco, disse que isso se deve ao “sonho de ver dar certo o projeto”. “Mesmo morando em barracos de lona, queremos ver a cooperativa se tornar uma grande empresa e por isso estamos investindo.” (SOUSA, 2007)

Pode-se verificar que os lucros são divididos de forma igualitária e o serviço

também, todavia deve-se destacar que às mulheres e as crianças são atribuídas funções

menos penosas do que o trabalho braçal do campo, como a debulha de milho, além de

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que a essas mulheres é reservado um período para o desenvolvimento de trabalhos

domésticos de dona de casa. Conforme destacado por Sousa,

A divisão dos trabalhos e as demandas coletivas são discutidas em assembléias que acontecem uma vez por semana e, extraordinariamente, em situações emergenciais. “Todos tem voz e vez. O que fica deliberado é o que prevalece, pois o que vale é o coletivo”, afirmou Claudete Souza, casada com um dos cooperados. De acordo com ela, as mulheres fazem trabalhos coletivos, mas exercem funções consideradas menos penosas, como descascar manualmente o feijão e separar os grãos pretos dos de feijão carioquinha. “Além disso, há o trabalho doméstico de cada dona de casa.” As cerca de 50 crianças e adolescentes, além de irem à escola, fazem trabalhos mais leves. “Debulhar o milho, por exemplo, acaba em brincadeira e diversão para eles”, disse Claudete Souza. (SOUSA, 2007)

Outro fator, que de certa forma acaba sendo um pouco contraditório e que ocorre

na COERCO, é que a área de uso individual é passível de reivindicação do movimento

mediante o não desenvolvimento das tarefas do assentado para com a cooperativa,

sendo este expulso do assentamento, sem a possibilidade de obter o valor da terra em

que ocupava. Somente as benfeitorias que o assentado realizou na área individual, é que

são pagas pela cooperativa ao ex-associado, verificando-se assim que o “assentado” não

possui a posse de sua terra.

Devemos deixar claro que a maioria dos assentados da Fazenda São Domingos,

não são mais, os mesmo que participaram da ocupação inicial e final da terra, mas

famílias ligadas ao MTL que optaram em trabalhar no assentamento, concordando com

os termos e as premissas de funcionamento da mesma.

Conforme destacado pelo dirigente da COERCO, em entrevista ao “Página 9”,

entidade informativa ligada a Universidade Federal de Uberlândia, foi informado que “a

cooperativa acertou com o Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária

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(INCRA) que teriam assento no projeto apenas famílias quem concordasse com o

modelo de assentamento coletivo”.

De acordo com o MTL e as lideranças do assentamento, além da COERCO, os

motivos de funcionamento desse sistema de cooperativa estão baseados na tentativa de

criação de um modelo de política de Reforma Agrária diferenciada, que possibilite os

assentados serem instalados como cooperados de uma associação. Através da

coordenação de um movimento, os assentados podem de maneira mais igualitária ser

beneficiados por políticas governamentais.

Com isso, esperam-se mudar a atual realidade para com o acesso à terra e os

assentados, onde estes são individualmente postos na terra, porém dificilmente recebem

auxilio, técnico e financeiro, para o desenvolvimento de atividades em seus lotes.

Atualmente (2010) o assentamento possui 62 unidades familiares assentadas em

uma área de 2144 hectares. A expectativa e limite máximo a serem assentadas são de

100 famílias. O tipo de produção, como já destacado, é decidida entre os cooperados da

COERCO.

Um importante fator que deve ser ressaltado é que toda a produção, e

conseqüentemente os seus meios, são realizados manualmente, com quase nenhum uso

de maquinário, implemento ou insumo químico-industrial, voltando assim suas

atividades à aplicação de sistemas agro-ecológicos, como realizados em algumas

experiências de agricultura familiar da região do Brasil e disseminado em alguns países

europeus.

Na safra de 2007, foram cultivadas manualmente cerca de 726 ha de hortaliças e

frutas, voltados para a subsistência das famílias da cooperativa. Além de produzirem

arroz em 39 ha, 29 ha de feijão e 24 ha de milho, estes foram comercializados por R$

350 mil, de acordo com a COERCO. Essa produção foi a primeira safra comercializada

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pela cooperativa. De acordo com Sousa (2007), nessas áreas de produção apresentadas,

foram colhidas 1,2 mil sacas de arroz, 40 sacas de feijão preto, 34 sacas de feijão

carioquinha, além de dezenas de sacas de milho.

Desta produção, o arroz e feijão foram comercializados com a COCAL

Alimentos, enquanto que o milho foi vendido a CEMILHO Comércio, Importação e

Distribuição de Alimentos. Deve ser observado que, uma pequena parte desta produção

foi repassada para os assentados, para o consumo próprio. As expectativas dos

assentados é de crescimento da produção, mediante os recursos obtido e do aumento da

força da COERCO, conforme entrevista realizada com o dirigente da cooperativa,

cedida ao correio e reproduzida pela “Página 9”.

Além das expectativas mencionadas pelos dirigentes da cooperativa, existem

ainda outras possibilidades de crescimento da mesma, como o aumento da horta criada

inicialmente para suprir as demandas do assentamento, que passará da área atual para

3ha. Isso ocorrerá mediante o fornecimento de alface, couve, agrião, cebolinha, jiló e

chuchu, para canteiro de obras da pequena central hidrelétrica (PCH) de Malagone, que

se instalará na foz do rio Uberabinha no rio Araguari, para as refeições dos

trabalhadores da usina.

Outra possibilidade de crescimento para a cooperativa reside em sua inserção no

Programa de Segurança Alimentar e Nutricional em Acampamentos e Pré-

Assentamentos de Reforma Agrária no Estado de Minas Gerais – PSA, criado pelo

Instituto de Terras de Minas Gerais – ITER/MG, que inicialmente disponibilizou as

sementes para iniciar a produção no assentamento.

Dessa forma, é possível verificar que o assentamento São Domingos,

coordenado pela COERCO, tende a ampliar seus horizontes de crescimento focando

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assim sua força. Isso pode também ser constatado mediante o não abandono das

famílias do assentamento desde o início das atividades da cooperativa.

Já quando analisado o perfil de escolaridade dos moradores no assentamento São

Domingos, observamos que grande dos entrevistados, possuem pouca instrução, tanto

que a maioria não conseguiu iniciar o ensino médio, conforme tabela 4.

Tabela 4 – Grau de escolaridade dos assentados da Fazenda São Domingos

Grau de escolaridade anunciado Quantidade Porcentagem (%)

analfabeto(a) / ou não informado 1 8

1ª série 1 8 2ª série 1 8 3ª série 3 23 4ª série 1 8 5ª série 0 0 6ª série 1 8 7ª série 2 15 8ªsérie 0 0 Ensino médio 2 15 Superior icompleto 1 8 Superior completo 0 0

Total: 13 100 Fonte: CLEPS JR, J. et all, 2007.

Porém, isso não impediu que estes assentados desenvolvessem suas atividades

produtivas de forma eficiente. Suas experiências de vida no campo superaram, em

grande parte, os problemas resultantes da falta de instrução.

É importante ressaltar que o assentamento possui uma escola localizada nas

dependências do Projeto Assentamento São Domingos - Escola Família Rural, que está

situada na antiga sede da fazenda e oferece aulas de ensino médio com técnico agrícola,

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porém ainda não acessível aos cooperados da COERCO ou aos filhos dos associados

por não possuírem idade para o mesmo.

Ainda não existem indicativos de desenvolvimento de programas voltados à

educação e alfabetização dos adultos assentados. Os filhos dos assentados em idade

escolar estão matriculados nas escolas em Tupaciguara–MG, estes vão para a cidade de

Vans que a prefeitura local disponibiliza.

A Escola Família Rural que está instalada dentro do assentamento São

Domingos, iniciou suas atividades no PA Tangará (município de Uberlândia-MG), em

2004, com alunos que cursavam o ensino médio concomitante ao técnico, voltado às

diretrizes da proposta da pedagogia da terra, com focos ao desenvolvimento educacional

de técnicos agrícolas com formação agro-ecológicas.

Nesse período inicial, a escola ficava junto ao acampamento do pré-

assentamento Tangará, onde era possível observar, em alguns momentos, certos

conflitos mediante o funcionamento de uma escola voltada ao nível médio e

profissionalizante, enquanto que os filhos dos pré-assentados da Fazenda Tangará, de

diferentes idades e escolaridades, tinham que se deslocar para as escolas municipais e

estaduais do entorno, que chegava a mais de 15 km de distância. Além disso, houve o

problema de que na fase de pré-assentamento existiam muitos jovens com idade

compatível para freqüentarem os cursos, porém por motivos, não confirmados na

pesquisa, esses eram impedidos de freqüentar a escola.

Concomitantemente ao problema identificado, ocorreram dois fatores que

culminaram na mudança da escola para atual localidade, PA São Domingos, os pré-

assentados conseguiram a distribuição dos lotes na Fazenda Tangará e era chegada à

conclusão e formatura da turma de estudantes da Escola Família Rural.

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Dessa maneira, apoiado pelo MTL, decidiu-se mudar a sede da escola para a

Fazenda São Domingos, mediante a difusão de um projeto diferenciado de

assentamento rural que se instalava na São Domingos e que o apoio que a Escola

Família Rural poderia dar a COERCO, gerariam pontos fundamentais para a mudança

de localidades e crescimento do projeto da escola.

Independente do problema, atualmente os alunos que estudam na Escola Família

Rural não pertencem ao assentamento, e sim são advindos de cidades próximas e em sua

maioria não possui vínculo nenhum com a terra.

Dessa maneira ocorre uma distorção sobre o papel da escola no PA São

Domingos, visto que esta foi trazida para atender a demanda de estudantes do

assentamento, dando-lhes formação política e pratica para trabalharem com a terra e

fortalecerem o movimento.

Assim, é possível constatar que historicamente a Escola Família Rural, pouco

desenvolveu diretamente, aos assentados dos PA’s em que ela se instalou ações que

visassem unir as atividades educativas da escola para com estes no que tange a falta de

interação de filhos ou assentados do PA como alunos da escola ou até mesmo o

desenvolvimento de atividades dos alunos em parceria técnica para com a COERCO.

Uma vez resolvidos esses problemas, o PA São Domingos poderia tornar-se,

mais do que uma referência no desenvolvimento da agricultura em assentamentos rurais

através de uma associação, passando também a ser um modelo de assentamento, ao unir

a educação técnica de uma escola para assentados com um modelo diferenciado de

assentamento rural gerido por uma cooperativa e por um movimento de luta pela terra.

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Considerações Finais

A partir de uma análise temporal das políticas de Reforma Agrária nos últimos

25 anos, principalmente a partir da década de 1980, com a “Nova República”, e também

com a formação dos principais movimentos sociais de luta pela terra, é possível

estabelecer uma discussão relativa à territorialização da luta pela terra no estado de

Minas Gerais e compreender a formação e a estruturação dos assentamentos rurais na

mesorregião Triângulo Mineiro/Alto Paranaíba.

Verifica-se uma diversidade de realidades e situações, protagonizada por

diversos atores sociais, especialmente as lutas empreendidas pelos movimentos de luta

pela terra, as políticas usadas setores governamentais e contra-ofensiva de demais

segmentos sociais, como entidades, partidos políticos, etc.

As iniciativas de organização política dos trabalhadores rurais, no bojo do

processo de modernização da agricultura, na década de 1970, tiveram grande

importância ao surgimento da luta por acesso à terra, que aparece como uma das

questões centrais da mobilização dos movimentos sociais do campo na década de 1980

e anos seguintes, no estado de Minas Gerais.

Neste sentido, os movimentos socioterritoriais vêm-se organizando, nos últimos

anos, de maneira diferenciada e articulada, lutando por melhores condições de vida e

acesso à terra. De acordo com o projeto DATALUTA, em Minas Gerais somam-se,

atualmente (2010), mais de 25 movimentos sociais e organizações de luta pela terra,

com atuação em todo o estado. Desta maneira, começam a surgir, no estado os

primeiros assentamentos rurais, criados, essencialmente, a partir da luta desses

movimentos pela Reforma Agrária.

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Com a estruturação dos projetos de assentamentos, têm início os desafios de

reprodução socioeconômica das famílias beneficiárias, em garantir níveis satisfatórios

de renda e boas condições de vida. Neste contexto, as reivindicações dos movimentos

de luta pela terra e das famílias assentadas, alcançam outro patamar de negociação, e

primam pela reivindicação por ações e medidas governamentais que garantam a

viabilidade econômica e social dos assentamentos, como crédito, assistência técnica,

qualidade ambiental, educação, saúde etc.

Apesar dos fatores naturais, culturais e sociais serem extremamente importantes

entre as diversas regiões do estado, o fator humano ainda é decisivo para o sucesso e a

construção da trajetória das questões agrárias, bem como a materialização das

perspectivas que os assentados trazem para o seu cotidiano.

Na verdade, há casos em que nem o ambiente e nem a questão cultural em si

constituem o elementos principais de sucesso, mas sim a história dos beneficiários e sua

real relação com a terra, bem como suas perspectivas de vida para aquilo que os levaram

a ser participantes do processo de reforma agrária.

Por meio da pesquisa, foi demonstrada a presença de assentamentos rurais,

principalmente na região do Triângulo Mineiro/ Alto Paranaíba e no Norte de Minas,

sendo um dos principais motivos da concentração dos assentamentos, nessa região, a

grande concentração fundiária e as políticas de incentivo ao agronegócio, fazendo, com

que as ocupações de terras, sejam mais pontuais e numerosas.

Conclui-se que os assentamentos representam uma forma territorialmente

construída, ou seja, são os espaços produzidos pelos movimentos socioterritoriais. No

entanto, essa política (compensatória) de assentamentos rurais tem sido implantada a

partir da concepção de mundo neoliberal exercida pelos governos do século XX.

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Foi possível verificar, de maneira clara, que os assentados ainda possuem

grandes dificuldades quanto sua organização e permanência no campo. Tais barreiras

são encontradas em todos os períodos e governos trabalhados, evidenciando a ineficácia

e até mesmo ausência de políticas públicas compatíveis com a real necessidade do Sem-

Terra e da concretização de uma agricultura familiar sólida.

Por fim, o presente trabalho buscou compreender a realidades dos assentamentos

no estado de Minas Gerais, em especial a mesorregião Triângulo Mineiro/ Alto

Paranaíba, de maneira que foi possível através dos dados do DATALUTA, apresentar

um pouco da realidade em que se encontra o processo de Reforma Agrária, bem como

demonstrar que as políticas nacionais vêm sendo aplicadas de maneira excludente e

monopolizadora.

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