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Bertha de Borja Reis do Valle (coord.) / Ana Maria Alexandre Leite Eliane Ribeiro Andrade/ Eloiza da Silva Gomes de Oliveira José Luiz Cordeiro Antunes / Maria Fernanda Rezende Nunes Maria Inês do Rego Monteiro Bomfim / Marly de Abreu Costa Osmar Fávero / Suely Pereira da Silva Rosa 2009 POLÍTICAS PÚBLICAS EM EDUCAÇÃO

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Page 1: Politicas Publicas Em Educacao(Full Permission)

Bertha de Borja Reis do Valle (coord.) / Ana Maria Alexandre LeiteEliane Ribeiro Andrade/ Eloiza da Silva Gomes de Oliveira

José Luiz Cordeiro Antunes / Maria Fernanda Rezende NunesMaria Inês do Rego Monteiro Bomfim / Marly de Abreu Costa

Osmar Fávero / Suely Pereira da Silva Rosa

2009

POLÍTICAS PÚBLICAS EM EDUCAÇÃO

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© 2003-2009 – IESDE Brasil S.A. É proibida a reprodução, mesmo parcial, por qualquer processo, sem autoriza-ção por escrito dos autores e do detentor dos direitos autorais.

Capa: IESDE Brasil S.A.

Imagem da capa: Steve Woods

IESDE Brasil S.A. Al. Dr. Carlos de Carvalho, 1.482. CEP: 80730-200 Batel – Curitiba – PR 0800 708 88 88 – www.iesde.com.br

Todos os direitos reservados.

V181 Valle, Bertha de Borja Reis do (coord.) ; Leite, Ana Maria Alexandre; Andrade, Eliane Ribeiro. et al. / Políticas Públicas em Educação /

Bertha de Borja Reis do Valle; Ana Maria Alexandre Leite; Eliane Ribeiro Andrade. et al. — Curitiba: IESDE Brasil S.A. 2009.296 p.

ISBN: 978-85-387-0136-1

1. Ensino Fundamental. 2. Políticas públicas. 3. Administração da Educação. 4. Avaliação Institucional. 5. Perspectivas Educa-cionais. I. Título.

CDD 379

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Bertha de Borja Reis do Valle

Ana Maria Alexandre Leite (Ana Leite)

Doutora em Educação pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), Mestre em Educação pela Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-RJ) e Graduada em Pedagogia pela Universidade do Estado do Rio de Ja-neiro (UERJ). Professora adjunta da Universidade do Estado do Rio de Janeiro e professora titular da Faculdade de Filosofia Santa Doroteia. Experiência na área de Educação, com ênfase em Planejamento e Avaliação Educacional atuando princi-palmente em Formação de Professores, Políticas Públicas, Planejamento e Gestão da Educação.

Mestrado em Educação Brasileira. Possui graduação em Psicologia, licen-ciatura em Psicologia e é Psicóloga na Universidade Gama Filho (1986). Atualmen-te atua na Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro no Convênio Unirio-Projovem. É Diretora Pedagógica do GESTAR (Grupo de Estudos e Ação Racial de Nova Iguaçu e Maricá). Tem experiência na área de Educação com ênfase em Edu-cação Inclusiva e desenvolve pesquisas nas áreas de Juventude, Relações Raciais na Escola.

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Cursa o Doutorado na Universidad Nacional de Buenos Aires, na Argentina. Mestre em Educação pela UERJ (1991). Possui graduação em Pedagogia pela Uni-versidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ-1985). Atuou nos diferentes níveis/etapas/modalidades da Educação Básica. É professor Assistente da Universidade Federal Fluminense (UFF).

José Luiz Cordeiro Antunes

Doutora em Educação pela Universidade Federal Fluminense (UFF-2004). Mestre em Educação pelo Instituto de Estudos Avançados em Educação-IESAE, da Fundação Getúlio Vargas (FGV-1993) e Pós-Graduação em Avaliação de Progra-mas Sociais e Educativos pelo International Development Research Center (1985) e Instituto Interamericano de Cooperação para a Agricultura. Possui graduação em Ciências Sociais pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ-1978) e em Comunicação Social pela Universidade Estácio de Sá (UNESA-1980). Atualmente é professora adjunta da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ). Professora do Programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro (UNIRIO). Técnica em Assuntos Educacionais. Tem experiência na área da Educação, atuando principalmente nos seguintes temas: Educação de Jovens e Adultos, juventude e políticas públicas.

Eliane Ribeiro Andrade

Doutora em Educação pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). Professora adjunta, coordenadora do Laboratório de Estudos da Aprendizagem Humana (LEAH) e do Curso de Pedagogia a distância da Faculdade de Educação da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ). Atua na área de Psicologia, com ênfase em Aprendizagem e Desempenho Acadêmicos.

Eloiza da Silva Gomes de Oliveira

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Doutora em Educação pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ-2005). Mestre em Educação pela Universidade do Estado do Rio de Ja-neiro (UERJ-1995). Possui graduação em Psicologia pela Pontifícia Universi-dade Católica do Rio de Janeiro (PUC-Rio). Atualmente é técnica em Assuntos Educacionais da Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro (UNIRIO). Professora do Programa de Pós-Graduação em Educação da UNIRIO. Profes-sora adjunta da PUC-Rio. Tem experiência na área de Educação, com ênfase em Educação Pré-Escolar, atuando principalmente em Educação Infantil, Alfabe-tização e Currículo.

Maria Fernanda Rezende Nunes

Cursa Doutorado em Educação na Universidade Federal Fluminense (UFF). Mestre em Educação pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ-2002). Possui Licenciatura em Pedagogia, pela Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-Rio). Atualmente, é pesquisadora da Fundação Oswaldo Cruz. Tem experiência na área de Educação, com ênfase em Ensino Médio e em Educação Profissional, atuando principalmente nos seguintes temas: Formação Docente, Ensino Médio e Políticas Públicas.

Maria Inês do Rego Monteiro Bomfim

Marly de Abreu Costa

Doutora em Educação pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ-1995). Mestre em Educação pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ-1985). Possui graduação em Pedagogia pela UERJ (1965). Atualmente é professora adjunta da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ). Tem experiência na área de Educação, com ênfase em Avaliação Educacional, de Instituições, Sistemas e Programas Educacionais, atuando principalmente nos seguintes temas: Avaliação, Formação de Professores, Avaliação da Aprendizagem e Ensino Fundamental.

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Osmar Fávero

Doutorado em Filosofia da Educação pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP-1984). Mestrado em Educação pela Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-Rio). Possui graduação em Matemática pela Uni-versidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ-1970). Atualmente é professor titular (aposentado) da Universidade Federal Fluminense (UFF), vinculado como profes-sor permanente especial ao Programa de Pós-Graduação em Educação. Tem ex-periência na área de Educação, atuando principalmente em Educação de Jovens e Adultos e Educação Popular.

Suely Pereira da Silva Rosa

Especialista em Supervisão Educacional e Educação. Graduada em Pe-dagogia com habilitação em Supervisão Educacional e Administração Escolar. Professora de Língua Portuguesa e Literatura Portuguesa e Brasileira. Autora de textos e livros sobre Educação.

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Sumário

Ciência política e políticas públicas de Educação: aspectos históricos ....................................... 17

Ciência política: evolução do conceito .............................................................................. 17

Contexto mundial no final do século XX e o início do novo milênio ..................... 19

Contexto político brasileiro .................................................................................................. 22

Contexto nacional da Educação nas décadas de 1980 e 1990 ................................. 23

A nova Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional .............................................. 25

Condicionantes sociais e políticas da Educação ........... 33

Conquista da cidadania plena .............................................................................................. 33

Democracia como ideal político .......................................................................................... 37

Governabilidade e globalização .......................................................................................... 38

Formação de professores e as políticas de Educação .................................................. 41

Enfoque das políticas públicas recentes em Educação ............................................................ 49

A Educação Básica ..................................................................................................................... 51

A Formação Profissional .......................................................................................................... 55

O Ensino Superior ...................................................................................................................... 58

Concluindo .................................................................................................................................. 59

Concepção da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional – Lei 9.394/96 ................... 67

Recordando a história .............................................................................................................. 67

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Fórum Nacional de Educação em Defesa da Escola Pública na LDB....................... 68

Continuando a história ............................................................................................................ 69

Fórum Nacional de Educação/Conselho Nacional de Educação ............................. 73

Concluindo .................................................................................................................................. 74

Modificações introduzidas pela Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional – Lei 9.394/96 ................ 83

O que modificou? ...................................................................................................................... 84

Impasses e políticas atuais ..................................................................................................... 87

Finalizando nossa conversa ................................................................................................... 90

Organização e funcionamento da Educação Básica .......99

Um pouco de história ............................................................................................................100

A concepção de Educação Básica ......................................................................................102

A organização curricular da Educação Básica: a discussão da formação básica comum/formação comum/base nacional comum ............104

Os Parâmetros Curriculares da Educação Básica .........115

Como surgem os Parâmetros Curriculares Nacionais? ..............................................117

Impasses e políticas atuais em relação à Educação .....127

Primeiro grande desafio para os educadores: o PNE – Plano Nacional de Educação, o PEE – Plano Estadual de Educação e o PME – Plano Municipal de Educação que queremos ..........................................129

Segundo grande desafio para os educadores: discutindo a gestão democrática ......................................................................................134

Terceiro grande desafio para os educadores: o financiamento da Educação ............................................................................................136

Quarto grande desafio para os educadores: construindo uma política global de valorização dos trabalhadores(as) em Educação (professores, funcionários técnicos-administrativos) .....................138

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Perspectiva educacional de inclusão ..............................147

Educação Especial ...................................................................................................................151

Educação Básica de Jovens e Adultos .............................163

Educação de Jovens e Adultos no Brasil de hoje .........................................................163

As diretrizes curriculares .......................................................................................................166

Os fóruns e os encontros nacionais de Educação de Jovens e Adultos ...............167

Algumas experiências em EJA ............................................................................................168

As relações políticas nacionais/políticas locais ............................................................172

Descontinuidade e falta de integração das políticas públicas ...............................175

Desafios da Educação Infantil ............................................183

Neoliberalismo: uma pausa para a história ....................................................................183

Educação Infantil e a legislação: letra morta .................................................................188

O MEC e a Educação Infantil: confrontando a realidade ...........................................191

Educação Infantil: implicações na prática ......................................................................192

Ensino Médio: a última etapa da Educação Básica.....201

O Ensino Médio na LDB .........................................................................................................203

A responsabilidade pela oferta de Ensino Médio ........................................................204

A autonomia das escolas: é preciso ousar ......................................................................204

A organização curricular do Ensino Médio: os avanços possíveis .........................206

A preparação geral para o trabalho no Ensino Médio: possibilidades.................208

Educação Profissional: o desafio de formar trabalhadores ...................................221

A Educação Profissional e a formação baseada em competências .......................222

A LDB e a legislação de Educação Profissional .............................................................224

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A avaliação institucional no Brasil ....................................235

Um pouco da história da avaliação institucional .........................................................236

Sistema Nacional de Avaliação da Educação Básica (Saeb) e Prova Brasil ..........240

Exame Nacional do Ensino Médio (Enem)......................................................................241

Exame Nacional de Cursos (Provão) .................................................................................243

Sistema Nacional de Avaliação da Educação Superior (Sinaes) .............................244

Perspectivas futuras das políticas públicas ...................253

Gabarito .....................................................................................267

Referências ................................................................................285

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Apresentação

Neste livro de Políticas Públicas em Educação você terá a oportunidade de refletir e de trocar ideias com seus colegas sobre a questão política da Educação em nosso país.

Nas duas aulas iniciais, você poderá fazer uma análise do conceito de ciên-cia política e do que entendemos por políticas públicas, além de refletir sobre os condicionantes sociais e políticas da Educação.

As aulas seguintes abordam enfoques recentes das políticas públicas, a concepção da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (Lei 9.394/96) e as modificações introduzidas na Educação a partir de sua promulgação.

Outros assuntos que você terá oportunidade de estudar serão a organiza-ção e o funcionamento da Educação Básica em nosso país, os Parâmetros Curricu-lares Nacionais e os impasses e políticas atuais em relação à Educação.

As últimas aulas procuraram enfocar as políticas dos diferentes níveis e modalidades da Educação Básica, como a questão da Educação Inclusiva, da Edu-cação de Jovens e Adultos, os desafios da Educação Infantil, do Ensino Médio e do Ensino Profissionalizante.

Como últimos assuntos de leitura e estudo, você refletirá sobre as polí-ticas de avaliação institucional no Brasil e as perspectivas futuras da educação brasileira.

Este trabalho foi elaborado, sob a coordenação da Prof. Bertha do Valle, pelo grupo de pesquisadores da cidade do Rio de Janeiro – os demais autores do livro, que vêm, juntos, discutindo há vários anos a Educação Básica, em todos os seus níveis e modalidades, e o Ensino Superior no Brasil e participam de diversos fóruns de debates em defesa da educação pública e de qualidade para todos.

Esperamos que estes textos colaborem para a sua melhor compreensão das políticas públicas em nosso país.

Boa leitura!

Bertha de Borja Reis do Valle

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Bertha de Borja Reis do ValleNesta disciplina – Políticas Públicas em Educação – você irá ler e refletir

sobre as influências que a ação do homem, nos seus espaços de poder, têm trazido para as populações. No caso particular que estamos estudan-do – o campo da Educação – estas influências não têm sido menores. Ao contrário, o poder político da Educação, ao longo do tempo, tem produzi-do inúmeros indicadores de desigualdade, assim como incontáveis histó-rias de sucesso social.

Nesta aula você compreenderá a abrangência do campo de estudo da ciência política. Você verá historicamente como as ideias políticas do-minam e influenciam as decisões dos governos em todos os campos de conhecimento e as políticas públicas de Educação no mundo e em nosso país.

Ciência política: evolução do conceitoEm vários textos acadêmicos, vamos encontrar as expressões ciência

política, teoria política e sociologia política como sinônimas, gerando al-gumas confusões quanto ao objeto de estudo. Giner afirma que “o objeto da ciência política não apresenta grandes dificuldades: é a ciência da au-toridade dos governantes, do poder” (GINER, 1986, p.184).

A noção de ciência política não é recente. Está presente desde a Grécia Antiga, se lembrarmos das ideias e das reflexões de Aristóteles – que nos legou a primeira grande obra: Política, e de Platão, criador de um sistema político, em seu livro República, no qual o modelo de sociedade deveria adotar um sistema de Educação em que todos os cidadãos teriam igual-dade de condições.

Ciência política e políticas públicas de Educação: aspectos históricos

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Séculos separam a Grécia Antiga dos fatos históricos que culminaram com a Revolução Francesa, com a Revolução Industrial e com as lutas pela independên-cia dos países da América de colonização europeia. Neste longo período histó-rico, a visão política das populações era estática, baseando-se na ideia medieval de que o governante tem direitos e obrigações complementares e sua soberania estava acima dos poderes dos súditos.

A Revolução Francesa levou ao poder a burguesia e provocou mudanças ide-ológicas no povo; mas somente a partir do século XIX é que diferentes tendên-cias políticas se formaram, em oposição aos efeitos da Revolução Francesa, ao liberalismo, à grande indústria e mesmo ao capitalismo. Passa-se a admitir que a sociedade pode ser mudada.

No século XIX, Marx e Engels criam um modelo próprio de explicação cientí-fica para as lutas políticas do proletariado, por meio da análise dialética da pers-pectiva social da classe dos trabalhadores. Participaram ativamente das lutas po-líticas e a partir da crítica à economia da época e ao socialismo utópico, elaboram uma teoria de formação, desenvolvimento e dissolução da sociedade capitalista, criando o materialismo histórico e tor nando-se os principais representantes do comunismo no pensamento moderno.

O início do século XX, em continuidade ao pensamento marxista iniciado nos anos anteriores, apresenta um cenário mundial convulsivo, com a dominação do ideário comunista em várias regiões da Europa, culminando com a Primeira Guerra Mundial (1914-1918), liderada pela Alemanha. O crescimento do comu-nismo e a criação da União das Repúblicas Socialistas Soviéticas (URSS), tendo Moscou, capital da Rússia, como o grande centro do poder dos comunistas, con-tribuiram para a divisão do mundo em socialismo e capitalismo.

O fim da Primeira Guerra não trouxe a paz. Anos depois, a Alemanha, domi-nada pelo pensamento antijudaico sob a liderança de Hitler e seus aliados, leva-riam o mundo à Segunda Guerra Mundial, que foi o fato histórico-político mais importante do século XX.

A ciência política trabalha com os cenários atuais, com vistas a uma prospec-tiva. Nos diferentes momentos históricos ela se incumbe da crítica aos fatos his-tórico-sociais, analisando os que acenam para o futuro e poderão contribuir para o delineamento de projetos e de ações governamentais e sociais que conduzam ao bem-estar social.

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Ciência política e políticas públicas de Educação: aspectos históricos

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Contexto mundial no final do século XX e o início do novo milênio

O final da Segunda Guerra Mundial (1939-1945), assim como a da Primei-ra, não trouxe a paz ao mundo. A ebulição de ideias políticas que se sucede e as transformações sociais e tecnológicas que marcaram a segunda metade do século XX foram acompanhadas de grandes transformações políticas, resultan-tes da divisão dos países em dois grandes blocos – comunistas e capitalistas – tendo a Alemanha no centro, dividida pelo muro de Berlim, construído para im-pedir a circulação das pessoas de um mundo para o outro.

O cenário dos anos 1980 continuou marcado por uma polarização político--filosófica entre as correntes socialistas – de origem marxista – e, no campo es-pecífico da Educação, altamente influenciadas pelo pensamento de Gramsci e Althusser e as correntes liberais, por vezes, de forte cunho conservador, outras, utilizando discursos progressistas de liberdade e igualdade.

No final dessa década, fatos políticos de repercussão mundial abalaram a di-visão dos países em dois grandes blocos: os seguidores do ideário capitalista americano e os adeptos do pensamento comunista soviético.

O fim da Guerra Fria (1945-1989) entre os dois grandes líderes político-eco-nômicos – União Soviética e Estados Unidos – veio contribuir para acelerar um processo de transformação no equilíbrio de forças que se mantinha desde o fim da Segunda Guerra Mundial.

Entre 1984-1985, com o advento da liderança de Mikhail Gorbachev, na URSS, inicia-se a perestroika, com reflexos políticos não só para seu próprio país, mas também para o mundo. Setenta anos após a implantação do comunismo, este líder soviético passou a pregar uma nova revolução, que geraria profundas mu-danças em todos os campos no final do século XX. Em seu país, liderou a transi-ção soviética da economia planificada para a economia de mercado.

Paralelamente, foi tomando forma nos países europeus a necessidade de ex-tinção das barreiras políticas e econômicas que os separavam, ampliando o pro-cesso iniciado em 1987, com o Tratado de Roma, que criou a Comunidade Eco-nômica Europeia, com objetivos econômicos para contrabalançar com o peso comercial dos Estados Unidos. O ano de 1993 foi determinado, pelo Tratado de Maastricht, para ser o início da União Europeia com as fronteiras abertas para os cidadãos de todos os países-membros, tendo a economia com caráter integra-

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dor e as discussões políticas voltadas para a melhoria da qualidade de vida e do bem-estar social dos europeus, conduzindo a lutas comuns pela preservação do meio ambiente, pela defesa dos direitos humanos: saúde, habitação, segurança, transporte e Educação.

Em 1989, com a queda do muro de Berlim, principal símbolo da Guerra Fria, que separava a Alemanha em duas nações, e a unificação germânica em 1990, as discussões sobre a União Europeia foram retardadas. Nesse mesmo ano, fez-se a unificação política alemã, passando Berlim, em 1991, a ser a capital do país.

Outros fatos políticos viriam a abalar as relações mundiais no final da década de 1980 e início dos anos 1990, entre eles a guerra contra o Iraque, originada pela invasão do Kwait, que foi liderada pelo presidente Saddam Hussein e de-flagrada, a partir do que fora considerado pela Organização das Nações Unidas (ONU), uma agressão à soberania de um país-membro da ONU e um acinte à democracia mundial. Meses antes, a ONU determinara o bloqueio econômico do Iraque, como forma de pressioná-lo a desocupar o país vizinho. Como tal medida não surtiu o efeito desejado, em 27 de janeiro de 1991 iniciou-se a Guerra do Golfo Pérsico, sob a liderança dos Estados Unidos, que duraria cerca de 40 dias, terminando com a vitória dos países aliados.

A Guerra do Golfo Pérsico acentuou as divergências históricas entre árabes e judeus, aumentou as dificuldades das políticas econômicas e sociais, provo- cou vários desastres ecológicos devido à explosão de poços de petróleo, destruiu vários sítios arqueológicos de inestimável valor histórico que estavam sendo pesquisados e exacerbou sentimentos nacionalistas até então adormecidos.

O ano de 1991 terminou com o cenário mundial totalmente diverso no leste europeu devido ao caos econômico da transição do comunismo para o livre mercado, que teve como consequências o fim da União das Repúblicas Socialis-tas Soviéticas (URSS), a independência da Geórgia, Letônia, Estônia e Lituânia e a criação da Comunidade dos Estados Independentes (CEI), que reuniu a Rússia e as demais repúblicas soviéticas numa tentativa de criar um mercado comum, que apesar da moeda comum (rublo) continua difícil até hoje. A queda do impé-rio soviético, porém, tem trazido problemas nacionais, étnicos, políticos e eco-nômicos, recrudescendo os nacionalismos e os ódios religiosos. Depois de um longo período de crescimento, o mundo socialista mergulhou numa crise que vem provocando mudanças ideológicas e geopolíticas em todo o mundo.

A onda neoliberal, que grassou no mundo a partir da década de 1980, reva-lorizou os princípios teóricos do capitalismo. Os ideais de sociedade na política

Políticas Públicas em Educação

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Ciência política e políticas públicas de Educação: aspectos históricos

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neoliberal colocam o desenvolvimento espontâneo da economia de mercado como a meta de perfeição para a sociedade humana. O homem deve deixar que opere o mercado livre, organizando a economia em função do ideal humano.

Por outro lado, o velho conflito entre árabes e judeus, que em 1993, por meio do chamado acordo Gaza-Jericó – a Declaração de Princípios sobre os Acordos Internos de Autonomia – nos fazia entrever alguns acordos de paz e de reconhe-cimento de territórios ocupados, caminha para a estagnação ou mesmo para o retrocesso. Israel afirma que não aceitará a criação de um Estado Palestino, nem a divisão de Jerusalém. Isso provocou um tremor no mundo árabe e um novo ciclo de violência entre judeus e muçulmanos.

Com efeito, o desmantelamento soviético encerrou a era dos Estados-nação, surgidos a partir da Revolução Francesa (1789-1799), com uma população relati-vamente homogênea. Atualmente, vivemos em sociedades pluralistas. A mobi-lização do homem e dos capitais questiona a lógica territorial na qual se baseia nossa sociedade. A confrontação Leste-Oeste retraiu durante algum tempo esse movimento, do qual pode ser esperado todo tipo de consequências.

Em 2001, logo no início do século XXI, o mundo foi abalado por uma das mais ousadas e cruéis ações terroristas de toda a História: os atentados de 11 de setembro, uma série de ataques suicidas, contra alvos civis nos Estados Unidos, coordenados pela Al-Qaeda, organização fundamentalista islâmica internacio-nal, que tem como objetivo reduzir a influência não-islâmica sobre assuntos is-lâmicos. Na manhã deste dia, quatro aviões comerciais americanos, lotados de passageiros civis, foram sequestrados. Dois deles colidiram contra as torres do World Trade Center, conjunto de sete prédios comerciais de grande movimen-tação, localizados em Manhattan, na cidade de Nova York. Um terceiro avião, foi direcionado pelos terroristas para uma colisão contra o Pentágono, sede do Departamento de Defesa dos Estados Unidos na capital americana – Washing-ton. Os destroços do quarto avião foram encontrados espalhados num campo da Pensilvânia, estado americano, localizado na região Centro-Atlântico do país. Os atentados causaram a morte de mais de três mil pessoas e foi transmitido ao vivo pelas cadeias de TV do mundo inteiro. Tal ataque, sem precedentes em toda a história da humanidade, causou um grande impacto emocional em todo o mundo e superou, em muito, os efeitos sociais e políticos impostos a toda a humanidade em todas as guerras anteriores e podem ser sentidos até hoje.

Esse rápido olhar político sobre o final do século XX e o início do século XXI nos chama a refletir sobre as discussões contemporâneas da ciência política

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e, por conseguinte, a urgência de um novo enfoque das ciências sociais, com óbvias consequências sobre as políticas educacionais. Evidentemente, estamos demandando novos conceitos de Estado, Nação, Democracia, Cidadania, Edu-cação e um repensar sobre a formação político-pedagógica do professor desta nova era.

Contexto político brasileiro No Brasil, engessado por séculos de um período colonial, no qual nossas ri-

quezas eram levadas para a Europa e a escravidão era o grande comércio, as diferentes tentativas de revolução foram abafadas pelo colonizador português. Mesmo após a independência do Brasil, durante todo o Império, as ideologias políticas que estavam em discussão em diferentes países pouco afetavam a rea-lidade social e educacional brasileira.

As políticas educacionais do Brasil sempre se mostraram inconsistentes. Na verdade, a história da Educação brasileira não registra, ao longo do período colonial, nem do Império, preocupação com políticas públicas de Educação.

As primeiras décadas do século XX marcaram a política educacional brasi-leira pela criação da Universidade do Rio de Janeiro, em 7 de setembro de 1920 ( depois Universidade do Brasil e hoje Universidade Federal do Rio de Janeiro – UFRJ). O movimento da Escola Nova, liderado pelos reformadores da época, leva à criação da Associação Brasileira de Educação (ABE), em 1924, pelos inte-lectuais da Educação com o objetivo de influir na implantação de novas políticas de Educação.

Em 1930, a 14 de novembro, logo no início da Era Vargas, foi criado o Minis-tério da Educação e Saúde. Entretanto, os intelectuais renovadores da Educa-ção, entre eles Anísio Teixeira, Lourenço Filho, Fernando de Azevedo e outros, não tiveram suas propostas políticas de transformação da Educação brasileira apoiadas pelo movimento de 1930, que iria culminar com o período de ditadura de Getúlio Vargas e o autoritarismo do Estado Novo (1937-1945).

Do Manifesto dos Pioneiros, em 1932, ao Manifesto dos Educadores, em 1959, houve toda uma história de lutas por uma escola melhor. Nos anos seguintes, as reformas educacionais previstas nas Leis 4.024 (de 1961, que estabelecia as diretrizes e bases da Educação Nacional), a 5.540 (de 1968, que fixava as normas do Ensino Superior) e a 5.692 (de 1971, que implantou o ensino de 1.º e 2.º graus) sofreram, e ainda sofrem, críticas severas de todos os setores.

Políticas Públicas em Educação

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Ciência política e políticas públicas de Educação: aspectos históricos

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Convém lembrar que, nos anos 1960, acreditávamos ingenuamente que a Educação era a alavanca do desenvolvimento e não enxergávamos os limites da prática pedagógica. Nos anos 1970, as ideias da teoria da reprodução abran-daram o entusiasmo com que muitos educadores haviam abraçado o binômio Educação e desenvolvimento. Lembrar dos anos 1960 e 1970 é rememorar um período marcado por movimentos estudantis – reflexo das dificuldades por que passavam os educadores, inseridos na massa brasileira, oprimida pelo movimen-to de 1964. E o ano de 1968 será sempre um marco na história política do Brasil, pelo endurecimento das ações da ditadura. No campo social foi um período marcado pela influência velada e oprimida por força da repressão da ditadura, das ideias de Karl Marx, de Marcuse e pelas leituras do pensamento de Althusser e Gramsci.

Com a chegada dos anos 1980, inicia-se uma revisão do exagero das teorias reprodutivistas, uma postura menos ingênua e mais realista em relação ao papel social da Educação. Percebe-se com clareza que há limites econômicos, ideológi-cos, culturais e de classe, que fazem com que a Educação não possa fazer tudo o que pensávamos. Há uma distância entre a adesão intelectual às ideias progres-sistas e a inserção na prática progressista. A mudança só se sela quando a prática político-pedagógica ultrapassa a reflexão e passa à ação.

Assim, o início da década de 1980 é marcado por movimentos sociais, pela or-ganização de diferentes categorias em associações, pela mobilização dos profes-sores por melhores salários, melhores condições de trabalho, melhor formação profissional, melhores escolas. Surgem, em todo o Brasil, entidades nacionais representativas dos educadores, sem contar com inúmeros sindicatos e outras associações estaduais, e até municipais, que passaram a congregar grupos de professores por especificidade de atuação pedagógica.

As Conferências Brasileiras de Educação (CBE) foram, nos anos 1980 e no início da década de 1990, fóruns de debates das questões educacionais, nos quais as políticas educacionais foram temas de simpósios e painéis.

Contexto nacional da Educação nas décadas de 1980 e 1990

A “década perdida” – como os economistas chamaram os anos 1980 – foi, poli-ticamente falando, para os brasileiros, a década da busca da cidadania. Iniciou-se

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com grande movimentação da sociedade civil, organizando-se em associações e sindicatos – que passaram a liderar as greves e as lutas por melhores salários e condições de vida. As eleições diretas para governador, após vários anos de elei-ções indiretas, fizeram os brasileiros vibrar por seus candidatos.

Fato marcante na primeira metade desta década foi o movimento popular pelas eleições diretas para presidente. A campanha das “Diretas já” mobilizou mi-lhões de brasileiros em todo país. Inutilmente, porém. O máximo que o povo or-ganizado conseguiu foi a retirada de candidaturas de diferentes partidos de opo-sição ao governo e a aglutinação de forças em torno do nome do governador de Minas Gerais, Tancredo Neves. A sua vitória no Congresso foi tranquila, mas ele fa-leceu, não chegando a tomar posse, deixando para o vice-presidente, José Sarney, a tarefa de levar adiante o plano da Nova República que, entre outras coisas, suge-ria: constituinte para 1986, congelamento de preços da cesta básica de alimentos, negociação da dívida externa e escola universal e gratuita em todos os níveis.

A segunda metade da década correspondeu ao governo de José Sarney e foi marcada economicamente por uma inflação nunca experimentada pelo Brasil. Foi ainda durante o governo Sarney que se instalou a Assembleia Constituinte para elaborar a Constituição da República Federativa do Brasil, promulgada pelo Congresso Nacional e sancionada pelo Presidente em 5/10/1988, e denominada de “Constituição Cidadã” por Ulisses Guimarães, presidente da Assembleia Na-cional Constituinte. Esta Constituição apresentou, pela primeira vez na história das constituições brasileiras, um capítulo inteiro dedicado à Educação pública.

Em 1989, como determinava a “Constituição Cidadã”, realizou-se, finalmente, a eleição, pelo voto direto e secreto, para presidente e vice-presidente da Repú-blica, após decorridos quase 30 anos das últimas eleições presidenciais.

Em outubro de 1990, o presidente anunciou à nação o Programa Nacional de Alfabetização e Cidadania (PNAC), cuja versão preliminar foi divulgada às univer-sidades e redes de 1.º e 2.º graus pelo Ministério da Educação, no qual Fernando Collor reafirma suas preocupações com a valorização profissional do professor e com o combate ao analfabetismo.

O programa previa estrita colaboração inter e intragovernamental e a con-jugação de esforços da sociedade civil, dos sindicatos e dos empresários para atingir a meta de, até março de 1995, alfabetizar 70% dos analfabetos do país. O PNAC, porém, não chegou a apresentar resultados, nem priorizou o ensino público. A distribuição de verbas beneficiou mais as entidades não-educacionais do que ao ensino regular.

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Apesar de o PNAC apresentar em sua concepção aspectos altamente positivos, sua implementação atropelava a proposta: as verbas de 1990, do Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE) – órgão do Ministério da Edu- cação que coordenava o programa juntamente com a Secretaria Nacional de Educação Básica (Seneb) – foram repassadas com meses de atraso, gerando grande confusão e descontentamento, principalmente porque os critérios de repasse não foram claros, nem explicados.

Como podemos perceber, as considerações que formulamos apresentam um cenário político-educacional bastante complexo para a época, no qual diferen-tes temas e diferentes tendências político-ideológicas se alternaram, ora em pri-meiro plano, ora como fundo de cena.

Nos anos 1980 e 1990, podemos desenhar as cenas do campo educacional em duas versões principais: uma, declaradamente socialista, que defendia a uni-versalização em todos os graus de ensino da escola pública e gratuita e outra, de caráter liberal, que propunha liberdade para o ensino e que discutia amplamen-te as concepções de ensino público e de verbas públicas. Os anos 1990, embora com menos ênfase, mantiveram essas tendências.

A nova Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional

Em 1988, a “Constituição Cidadã”, cercada das expectativas populares de que mudaria o Brasil, propunha uma série de leis complementares para serem discu-tidas e promulgadas a posteriori. Para os professores, as diretrizes e as bases da Educação, um dos temas a serem transformados em lei, já era assunto de deba-tes nos congressos e seminários, muito antes da promulgação da Constituição.

Já em 1986, quando da Conferência Brasileira de Educação realizada em Goi-ânia, as diretrizes desejadas pelos educadores brasileiros estavam explícitas no documento Carta de Goiânia. Em abril de 1988, na Reunião Anual da Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Educação (Anped), o professor Der-meval Saviani discursava e divulgava o texto no qual propunha as modificações necessárias à Educação brasileira, o qual gerou intensas discussões e deu origem ao projeto da LDB e à organização do Fórum Nacional em Defesa da Escola Pú-blica na LDB.

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O projeto original propunha uma reorganização do sistema educacional, o fortalecimento da escola pública e a gestão democrática das instituições públi-cas de ensino. A carreira dos professores era contemplada em diferentes artigos que abordavam não só as questões salariais como sua formação, propondo in-clusive, em um dos artigos, a existência de uma base comum nacional nos currí-culos de todos os cursos de formação de professores.

O Fórum Nacional em Defesa da Escola Pública na LDB, formado por 26 en-tidades nacionais sindicais, estudantis, científicas, lutou intensamente para que a escola pública fosse fortificada e que as verbas a ela destinadas fossem sufi-cientes para mantê-la dignamente e torná-la eficiente. A luta foi árdua e con-tínua, mas o projeto construído durante anos pela sociedade civil foi vetado no Senado Federal e, algum tempo depois, o projeto do Senador Darcy Ribei-ro, discutido no Congresso Nacional e aprovado pelo presidente da República, tornou-se a Lei 9.394, Lei de Diretrizes de Bases da Educação Nacional, em de-zembro de 1996, chamada de Lei Darcy Ribeiro.

Como puderam ver nesta aula, a construção das políticas públicas de Educa-ção não tem sido fácil para os educadores brasileiros. O ideal de uma escola que conduza todas as crianças, jovens e adultos a uma realização social, profissional e de cidadania plena parece ainda uma meta a ser alcançada pela população brasileira.

Texto complementar

Lei 9.394, de 20 de dezembro de 1996

Estabelece as diretrizes e as bases da educação nacional

O PRESIDENTE DA REPÚBLICA Faço saber que o Congresso Nacional de-creta e eu sanciono a seguinte Lei:

Título I

Da Educação

Políticas Públicas em Educação

Ingrids2Ricardo
Realce
Ingrids2Ricardo
Realce
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Ciência política e políticas públicas de Educação: aspectos históricos

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Art. 1.° A educação abrange os processos formativos que se desenvolvem na vida familiar, na convivência humana, no trabalho, nas instituições de ensino e pesquisa, nos movimentos sociais e organizações da sociedade civil e nas manifestações culturais.

§1.° Esta Lei disciplina a educação escolar, que se desenvolve, predomi-nantemente, por meio do ensino, em instituições próprias.

§2.° A educação escolar deverá vincular-se ao mundo do trabalho e à prá-tica social.

TÍTULO II

Dos Princípios e Fins da Educação Nacional

Art. 2.° A educação, dever da família e do Estado, inspirada nos princí-pios de liberdade e nos ideais de solidariedade humana, tem por finalidade o pleno desenvolvimento do educando, seu preparo para o exercício da ci-dadania e sua qualificação para o trabalho.

Art. 3.° O ensino será ministrado com base nos seguintes princípios:

I - igualdade de condições para o acesso e permanência na escola;

II - liberdade de aprender, ensinar, pesquisar e divulgar a cultura, o pensa-mento, a arte e o saber;

III - pluralismo de ideias e de concepções pedagógicas;

IV - respeito à liberdade e apreço à tolerância;

V - coexistência de instituições públicas e privadas de ensino;

VI - gratuidade do ensino público em estabelecimentos oficiais;

VII - valorização do profissional da educação escolar;

VIII - gestão democrática do ensino público, na forma desta Lei e da legis-lação dos sistemas de ensino;

IX - garantia de padrão de qualidade;

X - valorização da experiência extraescolar;

XI - vinculação entre a educação escolar, o trabalho e as práticas sociais.

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TÍTULO III

Do Direito à Educação e do Dever de Educar

Art. 4.° O dever do Estado com educação escolar pública será efetivado mediante a garantia de:

I - ensino fundamental, obrigatório e gratuito, inclusive para os que a ele não tiveram acesso na idade própria;

II - progressiva extensão da obrigatoriedade e gratuidade ao ensino médio;

III - atendimento educacional especializado gratuito aos educandos com necessidades especiais, preferencialmente na rede regular de ensino;

IV - atendimento gratuito em creches e pré-escolas às crianças de zero a seis anos de idade;

V - acesso aos níveis mais elevados do ensino, da pesquisa e da criação artística, segundo a capacidade de cada um;

VI - oferta de ensino noturno regular, adequado às condições do educando;

VII - oferta de educação escolar regular para jovens e adultos, com carac-terísticas e modalidades adequadas às suas necessidades e disponibilidades, garantindo-se aos que forem trabalhadores as condições de acesso e perma-nência na escola;

VIII - atendimento ao educando, no ensino fundamental público, por meio de programas suplementares de material didático-escolar, transporte, alimentação e assistência à saúde;

IX - padrões mínimos de qualidade de ensino, definidos como a varieda-de e quantidade mínimas, por aluno, de insumos indispensáveis ao desen-volvimento do processo de ensino-aprendizagem.

Art. 5.° O acesso ao ensino fundamental é direito público subjetivo, po-dendo qualquer cidadão, grupo de cidadãos, associação comunitária, or-ganização sindical, entidade de classe ou outra legalmente constituída, e, ainda, o Ministério Público, acionar o Poder Público para exigi-lo.

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§1.° Compete aos Estados e aos Municípios, em regime de colaboração, e com a assistência da União:

I - recensear a população em idade escolar para o ensino fundamental, e os jovens e adultos que a ele não tiveram acesso;

II - fazer-lhes a chamada pública;

III - zelar, junto aos pais ou responsáveis, pela frequência à escola.

§2.° Em todas as esferas administrativas, o Poder Público assegurará em primeiro lugar o acesso ao ensino obrigatório, nos termos deste artigo, con-templando em seguida os demais níveis e modalidades de ensino, conforme as prioridades constitucionais e legais.

§3.° Qualquer das partes mencionadas no caput deste artigo tem legi-timidade para peticionar no Poder Judiciário, na hipótese do §2.° do art. 208 da Constituição Federal, sendo gratuita e de rito sumário a ação judicial correspondente.

§4.° Comprovada a negligência da autoridade competente para garantir o oferecimento do ensino obrigatório, poderá ela ser imputada por crime de responsabilidade.

§5.° Para garantir o cumprimento da obrigatoriedade de ensino, o Poder Público criará formas alternativas de acesso aos diferentes níveis de ensino, independentemente da escolarização anterior.

Art. 6.° É dever dos pais ou responsáveis efetuar a matrícula dos menores, a partir dos seis anos de idade, no ensino fundamental. (Redação dada pela Lei 11.114, de 2005)

Art. 7.° O ensino é livre à iniciativa privada, atendidas as seguintes condições:

I - cumprimento das normas gerais da educação nacional e do respectivo sistema de ensino;

II - autorização de funcionamento e avaliação de qualidade pelo Poder Público;

III - capacidade de autofinanciamento, ressalvado o previsto no art. 213 da Constituição Federal.

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Atividades1. A Constituição Federal de 1988 apresentou, pela primeira vez na história das

constituições brasileiras, um capítulo inteiro dedicado à Educação. É o Capí-tulo III que, do Artigo 205 ao Artigo 214, aborda vários enfoques políticos da educação brasileira. Procure ler este capítulo no texto da Constituição que se encontra no site: <www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituiçao.htm>. Escolha os três artigos deste capítulo que mais lhe chamaram atenção e faça um resumo.

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Ciência política e políticas públicas de Educação: aspectos históricos

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2. Vários fatos históricos estão relacionados com a educação brasileira no sé-culo XX. Faça uma listagem e/ou linha do tempo com os fatos que foram citados no texto desta aula.

3. Agora, leia os artigos 3.º e 4.º da Lei 9.394/96 – a Lei Darcy Ribeiro, Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional. Eles contêm os princípios e fins da Educação Nacional. Analise cada um deles e veja se todos foram atingidos pela política pública de Educação de sua cidade.

Dicas de estudoNo livro Os Intelectuais da Educação, de Helena Bomeny, você ficará sabendo

mais sobre como os intelectuais da educação, já nas primeiras décadas do século XX, se mobilizaram na missão de modernizar o país através da Educação. Eles tinham um projeto de nação para o Brasil, e o Manifesto dos Pioneiros, por eles redigido e assinado, refletia todos os seus ideais. Personalidades como Anísio Teixeira, Lourenço Filho, Darcy Ribeiro e Paulo Freire são falados no livro e suas ideias ainda desafiam nossa luta como cidadãos brasileiros pela construção de um sistema educacional democrático.

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Condicionantes sociais e políticas da Educação

Bertha de Borja Reis do ValleAs políticas públicas são influenciadas pelo contexto social, econômico

e político de cada época da história. Nesta aula, vamos conversar sobre os condicionamentos sociais e políticos que atingem a Educação. Vere-mos que a conquista da democracia plena ainda é um ideal político a ser atingido e que a governabilidade de cada sistema político é influenciado pelo grau de globalização existente. Como pano de fundo deste cená-rio, veremos que a formação de professores se reveste de fundamental importância.

Conquista da cidadania plenaAs tendências no campo da formação do professor nos levam a olhar

o estado atual das relações políticas no mundo e, mesmo com as dificul-dades de se fazer projeções no quadro nacional que estamos vivendo, perceber que a luta pela reconquista da hegemonia econômica pelos Es-tados Unidos e seus aliados – nos quais o Brasil se inclui – afeta “vários níveis de organização social, pois repercute no desenvolvimento tec-nológico, na composição da classe trabalhadora, no papel do estado e, também, na organização da Educação nacional – incluída aí a formação do educador” (FREITAS, 1991, p. 8).

No início deste milênio, as previsões feitas a partir dos estudos do Ins-tituto Brasileiro de Economia Aplicada (Ipea), juntamente com a Organi-zação das Nações Unidas (ONU), eram de um Brasil menos pobre. No rela-tório sobre o desenvolvimento humano no Brasil, no qual foram levados em conta, além dos índices econômicos, os aspectos sociais, foi constata-da a existência de três grandes regiões socioeconômicas em nosso país: uma, constituída pelos Estados das regiões Sul e Sudeste (excluído Minas Gerais), o Mato Grosso do Sul e o Distrito Federal; a segunda, incluindo as regiões Norte (exceto Pará e Acre), Centro-Oeste (sem o Mato Grosso do Sul) e Minas Gerais; a terceira, composta pelos Estados da região Nordeste

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e mais Pará e Acre. A cada uma destas regiões correspondem índices de qualida-de de vida que vão de padrões de alto desenvolvimento humano, comparados à Bélgica, no caso da primeira região apontada, passando por índices médios semelhantes à Bulgária, até alcançar um baixo desenvolvimento na região Nordeste, comparado à Índia. Assim, não teríamos mais os dois “Brasis”, como denominou Jacques Lambert em sua obra sobre nosso país, mas três “Brasis”, não mais “Belíndia” e sim “Belbulíndia” (LAMBERT, 1973).

Um dos indicadores usados nessa análise foi a escolaridade da popula-ção, incluindo-se as taxas de alfabetização de adultos e a qualificação profis-sional dos trabalhadores, o que evidencia, mais uma vez, a importância dos investimentos em Educação e, particularmente, na formação dos professores.

Na atual conjuntura, estamos com um desafio à nossa frente: criarmos novas estratégias de desenvolvimento social, que permitam acelerar o processo de de-mocratização da cidadania para todas as regiões. Somente envidando esforços para que a consciência de cidadania cresça entre a população, poderemos espe-rar mudanças no quadro de desigualdades que constatamos no dia-a-dia e que as estatísticas têm comprovado. Não estaremos senão cumprindo o preceito constitucional contido no artigo 1.º de nossa “constituição-cidadã”, que diz:

A República Federativa do Brasil [...] constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos:

I - a soberania;

II - a cidadania;

III - a dignidade da pessoa humana;

IV - os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa;

V - o pluralismo político.

As concepções de democracia e cidadania são complementares e têm sofrido mudanças por meio da história. Estão intimamente ligadas às discussões que cada período histórico e cada sociedade faz a respeito dos conceitos de Estado, nação, povo, direitos e deveres. Sofrem também influências das crises políticas nacionais e internacionais que provocam transformações nas relações de poder dentro e fora de cada país.

Nas ciências políticas, a ideia de cidadania é bem ampla, e sua evolução tem se dado no bojo das mudanças de concepção dos direitos do homem, dos di-reitos legais para os políticos, e desses para os direitos sociais. Em 1960, Brogan (1960, p. 177) argumentava que a ideia de cidadania tem

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Condicionantes sociais e políticas da Educação

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[...] dois aspectos. O primeiro [...] é a pressuposição de que todo cidadão tem o direito de ser consultado sobre a direção da sociedade política e o dever de contribuir com algo para essa consulta geral. O segundo aspecto é o inverso do primeiro. O cidadão que tem o direito de ser consultado, está adstrito aos resultados da consulta.

Svarlien (1986, p. 177) definia cidadania como “o estatuto oriundo do relacio-namento existente entre uma pessoa natural e uma sociedade política, conheci-da como o Estado, pelo qual a pessoa deve a este obediência e a sociedade lhe deve proteção”.

A cidadania estaria, portanto, calcada na regra da lei e no princípio da igual-dade. Atualmente, Boff (1994, p. 23) nos ensina que cidadania é “o processo histórico-social mediante o qual a massa humana consegue forjar condições de consciência, de organização e de elaboração de um projeto que lhe permitem deixar de ser massa e passar a ser povo, como sujeitos históricos capazes de im-plementar o projeto elaborado”.

Hoje, porém, percebemos que a substituição da concepção dos direitos natu-rais – trabalho, Educação, saúde – vai sendo substituída pelo sentido de direitos a serem adquiridos na competição e por esforço pessoal.

Já não se entende mais como direito do cidadão, a Educação, a saúde, o trabalho. Diz-se, por oposição, que o cidadão deve ter condições de igualdade para ter acesso a estes benefícios, mas ele deve demonstrar competência para obtê-los, para competir no mercado e conquistá-los. Desloca-se, portanto, a concepção de direitos do cidadão para outro ponto, para a competição, reforçando-se o individualismo na obtenção destes direitos. (FREITAS, 1991, p. 12)

A mundialização do mercado “debilita e reduz a cidadania nacional”. É im-perativo que se diminua o Estado. “O neoliberalismo que se implantou após a implosão da ordem socialista possui altíssimas taxas de exclusão, seja no nível internacional, seja no interior dos próprios países” (BOFF, 1994, p. 24).

A consciência da cidadania plena não pode ser definida somente pela inser-ção do sujeito no sistema produtivo. A construção da cidadania começa com uma base social e não se realiza apenas face ao Estado, mas também diante de outro cidadão, por meio da solidariedade e da cooperação que se expressa pela consciência de concidadania (BOFF, 1994).

Para que se alcance essa dimensão de concidadania é preciso um traba-lho político-pedagógico de Educação integral, no qual se desenvolva um processo de conscientização dos cidadãos, enquanto sujeitos capazes de assu-mir sua autodeterminação, como nos ensinou Paulo Freire.

Muito se tem escrito e estudado no Brasil e no mundo sobre Paulo Freire. O cerne de seu pensamento está em dois pontos: a conscientização e a Educação

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como prática da liberdade. Pretende educar o povo para a participação cons-ciente e crítica na realidade política do país, mostrando como lutar contra as “explorações opressoras e enganadoras”, ou seja, como ser um cidadão pleno.

A alfabetização, como leitura do mundo, se realiza a partir da reflexão dos alunos sobre sua capacidade de pensar acerca de suas vivências, seu próprio trabalho e transformação da realidade. Ler e escrever passam a ser uma neces-sidade para sair de dentro de si mesmo, para conhecer o que está à sua volta. É o despertar da consciência, do pensamento crítico e da cidadania.

Por meio do diálogo entre educador e seus educandos, dos educandos entre si, e de todos com as realidades naturais e culturais da comunidade, as popula-ções caminharão para o autogoverno e para a participação dos homens na cons-trução da vida coletiva. A escola assumirá sua função libertadora, pela utilização do debate e do diálogo como métodos, tendo o professor como animador do grupo, a sala de aula como um grande espaço de pesquisa, investigação e exer-cício da concidadania (SIMÕES, 1979).

Cardoso (1994, p. 265), discutindo a transição do autoritarismo para a demo-cracia no Brasil, aborda também a questão da tomada de consciência e aponta a prática da dominação “marcando os dominados na sua subjetividade” e na “sua visão de mundo”. E conclui: “a boa consciência não é a consciência ingênua ou espontânea, mas a consciência crítica que dê conta dos problemas gerais que afetam a sociedade”.

A pluridimensionalidade do mundo em que vivemos exige, porém, que seja desenvolvida, em cada cidadão, não apenas a consciência crítica voltada para o jogo político mas uma múltipla consciência – epistemológica, ética e política – que nos possa conduzir a uma sociedade democrática, como nos fala Ernesto Laclau:

... conciencia epistemologica, en la medida que el progreso científico se nos presenta como una sucesión de paradigmas cuya transformación y remplazo no se funda en ninguna certeza algoritmica; conciencia ética, en tanto de la defensa y afirmación de valores se funda en movimientos argumentivos que no reconducen a ningún fundamento absoluto; conciencia política, en la medida en los logros históricos se nos presentan como el producto de articulaciones hegemonicas contingentes y, como tales, siempre reversibles, y no como la resultante de leyes inmanentes de la historia. (LACLAU, 1989 p. 31)

No caso da Educação brasileira, a tomada de consciência do problema por parte da população em geral e dos professores, em particular, se inicia na cons-tatação do dia-a-dia das escolas e com a convivência com a população escola-rizável. Os dados estatísticos apenas comprovam matematicamente as dimen-sões da situação real.

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Condicionantes sociais e políticas da Educação

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Democracia como ideal políticoHoje, diante do turbilhão político em que se encontra o nosso planeta, das

discussões intensas sobre se o mercado ou se o Estado seria o grande regulador das políticas, crescem os debates sobre democracia/totalitarismo e suas diferen-tes visões.

Já no final do século XX, não podíamos mais pensar o mundo dividido sim-plesmente em direita e esquerda ou, como mais comumente temos ouvido ul-timamente, em socialismo e neoliberalismo. “Na base e na origem das primeiras dúvidas sobre o desaparecimento da distinção, ou ao menos sobre a sua menor força representativa, estaria a chamada crise das ideologias” (BOBBIO, 1995). Há que se perceber que, entre um extremo e outro, há diferentes tendências in-fluenciando os pensadores que, neste momento, estão escrevendo e refletindo sobre as questões políticas da atualidade.

Nestes debates políticos fica em jogo, muitas vezes, o conceito de democra-cia, as diferenças, às vezes sutis, entre ditadura e totalitarismo. A ditadura, en-quanto poder da força que impõe ideias, persegue os que pensam diferente, implanta o medo de agir, tem plenitude no hoje. Já o totalitarismo parte da he-gemonia de uma ideia, na aniquilação completa das ideias dos “traidores”, elimi-nando ideias diferentes implantando o medo de pensar e a mística do amanhã (ARENDT, 1978).

Frei Betto (1990) diz que a crise do socialismo real colocou o conceito e as discussões sobre democracia no centro do debate das concepções de socialismo e apresentou novos desafios à Educação política.

Sobreviverá a democracia como ideal político no século XXI? Essa é a per-gunta que fazem não só estudiosos de todo o mundo, mas também os cidadãos comuns. Razões de preocupação não faltam: crise geral da política em todos os países, interrogações sobre o futuro das relações internacionais, renascimento dos fanatismos, crescimento do poder asiático.

Hoje, as grandes concentrações de poder terão de ceder espaço a uma ver-dadeira encruzilhada de questões, como a noção de comunidade humana, a preservação da liberdade e controle dos poderes em um planeta que vem se mostrando influenciado pelo conformismo e pelo jogo de interesses. O próprio conceito de paz, enquanto ausência de guerra, no momento em que tantos con-flitos explodem simultaneamente no mundo, fica vazio de sentido. Há espaço ainda para o socialismo? Toda comunidade socialista é democrata?

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“O verdadeiro nome do socialismo é democracia”, nos dizia o sociólogo Her-bert de Souza. Democracia e socialismo, porém, não são iguais. A democracia implica em igualdade, liberdade, participação, solidariedade, diversidade, está, portanto, além de toda e qualquer proposta já pensada para a humanidade.

“O socialismo pode não ser democrático. A democracia pode não ser socialista e não é capitalista.” Tanto marxistas como liberais disputam a democracia. Os primeiros buscam, muitas vezes, coincidir socialismo com democracia e diminuem sua abrangência. Os segundos não permitem sua entrada no terreno da econo-mia. A discussão sobre democracia é interminável, é inacabável (SOUZA, 1990).

Na análise de Frei Betto (1990) existe uma democracia formal que determina como deve se dar a participação popular nas decisões, mas não o que deve ser decidido. É um governo do povo, mas será ou não para o povo. Já a democra-cia substancial centraliza-se nos fins; os meios para alcançá-los são irrelevantes. Caracteriza-se como um governo para o povo. A síntese dessas duas posições, é, por enquanto, uma utopia, pois nenhum regime político jamais conseguiu a democracia como valor e método.

Para Lafer (1951), o fundamental nesta discussão é buscar uma fusão de princí-pios entre os diversos direitos do homem, dos mais formais aos mais complexos. A democracia clássica se caracteriza pela soberania popular; já a democracia mo-derna, pelos direitos humanos. Para que alguém participe da soberania do povo (como eleitor(a)) é preciso ter reconhecidos seus direitos como cidadão/cidadã.

Governabilidade e globalizaçãoAs reflexões sobre democracia estão intimamente relacionadas com as dis-

cussões sobre a capacidade de governar, sobre como garantir a operação demo-crática do Estado. Já nos anos 1960 e 1970, os debates incluíam uma outra preo-cupação, que hoje emerge com vigor, para o debate político: a governabilidade. Oliveira (1995, p. 61) entende por governabilidade a “capacidade de governar apoiada em tendências muito concretas na sociedade e dirigida no sentido de um processo de liquidação das desigualdades sociais”.

A governabilidade é apontada por Lafer (1951, p. 168) como o grande desafio dos governantes e, citando Habermas, chama a atenção para as crises de gestão e de apoio político que derivam do desencanto dos governados. O problema da governabilidade/ingovernabilidade surge para os cidadãos como a capacida-de/incapacidade dos governantes de “servir à cidadania” e para os governados

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“como um excesso de demandas da cidadania que o sistema político não tem capacidade de processar e atender”.

É necessário frisar que hoje, face às “tensões contidas na busca simultânea de eficiência e de democracia” (REIS, 1995), aos acontecimentos mundiais relatados e aos que advirão do exacerbamento dos nacionalismos, do crescimento dos conflitos religiosos, do recrudescimento do nazismo e de outros movimentos racistas, já encontramos a formação de blocos de aliados políticos e econômicos, a emergência de regimes supranacionais com reflexos para o nosso país, como no caso da União Europeia, dos países do cone sul (Mercosul), dos países africa-nos de língua portuguesa, dos países norte-americanos (Nafta) e, mais recente-mente, ainda em calorosa discussão, da Aliança do Livre Comércio das Américas (Alca), da qual o Brasil tem feito parte, colocando-se em contraponto com as propostas norte-americanas.

A remoção das fronteiras conduzirá a novos modelos de governabilidade, que nos próximos anos estarão associados “a um programa destinado a as-segurar a homogeneização internacional das políticas econômicas de corte li-beral-conservador” (FIORI, 1995, p. 161). A governabilidade democrática, nessa nova ordem econômica, em países periféricos como o Brasil, será tão mais difícil quanto mais tensas e descoordenadas forem as relações entre as três grandes potências mundiais: Estados Unidos, Alemanha e Japão (FIORI, 1995).

Nesse novo cenário mundial, o processo de inovação ou alternação das re-lações econômicas e políticas internacionais vem sendo chamado de globali-zação, processo que se apresenta como o grande desafio político do final do século, pois como argumenta Fiori (1995, p. 172):

...o trade-off que se anuncia neste final de século entre globalização e governabilidade democrática tem quase tudo a ver, em última instância, com o fato de que os comportamentos que mais ameaçam hoje a nossa governabilidade têm origem fora das fronteiras e da alçada dos nossos governos nacionais.

A emergência de regimes supranacionais, como a comunidade europeia, que vem se organizando para – além de derrubar as fronteiras e discutir seus pro-blemas comuns – a unificação da moeda e da língua é o efeito mais visível da globalização. Habermas (1995) vê esse processo como uma maneira de esca-par ao impasse criado pela remoção das fronteiras e à consequente ameaça do Estado-nação.

Alguns analistas políticos apontam o lado perverso da globalização. A as-sociação das inovações tecnológicas e da automação, aliada ao progresso das telecomunicações, exige cada vez menos empregados e maior e melhor qua-

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lificação profissional de cada um. Os custos caem e o desemprego cresce. Ao mesmo tempo, a demanda por mais Educação e por melhores currículos esco-lares aumenta.

Boff (1994, p. 18) prescreve a necessidade de uma pedagogia para a globali-zação, em virtude da emergência do novo paradigma: a comunidade planetária, que deverá estar muito mais voltada para a ecologia, enquanto “uma nova forma de organizar o conjunto de relações dos seres humanos entre si, com a natureza e com seu sentido neste universo”.

O alargamento das fronteiras já se faz notar no campo educacional, por meio da luta pela democratização da escola básica como valor universal, do fortaleci-mento e da criação de entidades representativas do magistério de caráter mun-dial, das quais o Brasil tem participado, enviando delegações aos congressos realizados e trocando produção de conhecimento sobre a formação e a situação dos professores dos diferentes países envolvidos.

No contexto das iniciativas da ONU para obter a participação, insumos e a re-presentação de todas as regiões do mundo para traçar estratégias de ação con-junta que atendam à modernização e à globalização, além da Conferência Mun-dial sobre Educação para Todos (1990), tivemos no final do século XX: a Década Mundial de Desenvolvimento Cultural, promovida pela Unesco (1988-1997), a Década Mundial de Desenvolvimento, promovida pelo PNUD (1991-2000), a Conferência sobre Meio Ambiente, no Rio de Janeiro (ECO-92), a Conferência Internacional sobre População, no Cairo (1994), a Conferência Internacional da Mulher (1995).

Em julho de 1997, quando da realização da V Conferência Internacional de Edu-cação de Adultos (Confitea V), realizada em Hamburgo, foi discutida a possibili-dade da participação de todos na construção do desenvolvimento sustentável e equitativo e promover uma cultura de paz, baseada na liberdade, na justiça e no respeito mútuo. O documento-base para a Confitea V, que subsidiou os debates, enfatizava o desenvolvimento de algumas tendências favoráveis à mudança das políticas e práticas da Educação como a descentralização da gestão educacional, a melhoria do ambiente de aprendizagem (incluindo aí currículos e materiais didáti-cos), a formação inicial e a capacitação em serviço dos professores, a melhoria das remunerações dos docentes etc. O Brasil foi o país escolhido pela ONU para sediar a VI Conferência Internacional de Educação de Adultos (Confitea VI), em 2009.

A criação da Comissão Internacional sobre Educação no século XXI preten-de responder a uma série de questões sobre as novas funções a serem assumi-

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das hoje pelos professores, confrontados com as informações tecnológicas; as necessidades de formação contínua em serviço e pré-serviço para desenvolver as qualidades profissionais e humanas dos professores; a motivação dos jovens para a escolha do magistério e a garantia de prestígio social para os profissionais da Educação.

Formação de professores e as políticas de Educação

A formação do professor e seu nível de participação nas decisões políticas da Educação assumem papel relevante no processo pedagógico de qualquer grau de ensino. Outrossim, temos percebido a incoerência com que o discurso polí-tico dos professores tem sido transplantado para a prática. O que se tem visto é uma oscilação entre ideias progressistas e práticas conservadoras.

Temos vivenciado, por longos anos, experiências em diferentes níveis de ensino e sentimos, muitas vezes, as deficiências na formação dos professores, tanto nas suas dimensões pedagógicas específicas quanto em sua dimensão po-lítica, enquanto cidadãos críticos e conscientes de seu papel social.

Por outro lado, apesar de a produção sobre esse tema ter sido bastante nu-merosa nos últimos anos e as discussões estarem envolvendo interlocutores de diferentes tendências, os estudos não têm avançado sobre a figura do professor, enquanto cidadão, formador de outros cidadãos, um sujeito histórico, concreto, relacionado com um certo lugar, um certo tempo, inserido na adversidade do cotidiano das escolas brasileiras.

Desde os anos 1970 até hoje, as discussões sobre a escola e seu papel en-fatizam a formação do professor em todos os graus de ensino como requisito indispensável à democratização e à melhoria da qualidade da escola, bem como à construção de uma sociedade crítica, solidária e consciente. É preciso reafirmar que o preparo profissional do professor não pode ser estudado em apenas um de seus níveis de formação, uma vez que há uma interligação entre os diferentes graus. Consequentemente, a deficiente competência profissional em qualquer etapa, afetará as demais.

Por outro lado, não podemos esquecer também que qualquer reflexão sobre a formação do professor, apontará para discussões político-pedagógicas so- bre a sociedade que se pretende, o que se entende por cidadania, o papel social

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da escola neste contexto, os tipos de vinculação existentes entre as demais políticas públicas e a Educação e as formas de participação dos professores na formulação das políticas do país.

Há, portanto, outro lado da formação do professor a ser estudado – o do ci-dadão, visto que sua atuação tem duas dimensões políticas: no nível do ensino, com respeito ao currículo desenvolvido dentro da sala de aula, e, com o que se constrói fora dela – o currículo oculto, que explicita relações de poder, formas de organização interna da escola e de relação da escola com a comunidade e, em nível sindical ou associativo, na construção de seu próprio currículo oculto, en-gajado nas lutas comuns dos professores e dos trabalhadores em geral, ambas sinalizando para a construção de uma sociedade, na qual a igualdade de direitos humanos não seja encarada como utopia.

Como você viu nesta aula, os condicionantes das políticas públicas de Edu-cação são bastante complexos e, muitos deles, de solução ainda demorada. Em vista das discussões e dos problemas observados na formação do educador bra-sileiro, limitados pela falta de consciência crítica e de exercício da cidadania, dos problemas de governabilidade, do emperramento das instituições de Ensino Superior na formulação e reformulação de seus currículos, das indefinições em relação ao papel das escolas de Ensino Médio e da Educação Profissional, dos re-sultados frustrantes do ensino no Brasil – vemos como necessário um pensar co-letivo de quantos se acham envolvidos no problema, para encontrarmos, a partir de nossas angústias e reivindicações, caminhos de transformação da realidade atual, calcados em estudos e reflexões teórico-pedagógicos contemporâneos.

Texto complementar

O que é democracia?(RIBEIRO, 2008)

A democracia diretaA palavra DEMOCRACIA vem do grego (demos, povo; kratos, poder) e signi-

fica poder do povo. Não quer dizer governo pelo povo. Pode estar no governo uma só pessoa, ou um grupo, e ainda tratar-se de uma democracia – desde

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que o poder, em última análise, seja do povo. O fundamental é que o povo es-colha o indivíduo ou grupo que governa, e que controle como ele governa.

O grande exemplo de democracia, no mundo antigo, é Atenas, especial-mente no século 5 a.C. A Grécia não era um país unificado, e portanto Atenas não era sua capital, o que se tornou no século 19. O mundo grego, ou helêni-co, se compunha de cidades independentes.

Inicialmente eram governadas por reis – assim lemos em Homero. Mas com o tempo ocorre uma mudança significativa. O poder, que ficava dentro dos palácios, oculto aos súditos, passa à praça pública, vai para tó mésson, “o meio”, o centro da aglomeração urbana. Adquire transparência, visibilidade. Assim começa a democracia: o poder, de misterioso, se torna público, como mostra Vernant. Em Atenas se concentrava esse novo modo de praticar – e pensar – o poder.

Os gregos distinguiam três regimes políticos: monarquia, aristocracia e democracia. A diferença era o número de pessoas exercendo o poder – um, alguns ou muitos. Monarquia é o poder (no caso, arquia) de um só (mono). Aristocracia é o poder dos melhores, os aristoi, excelentes. São os que têm aretê, a excelência do herói. Assim, a democracia se distingue não apenas do poder de um só, mas também do poder dos melhores, que se destacam por sua qualidade. A democracia é o regime do povo comum, em que todos são iguais. Não é porque um se mostrou mais corajoso na guerra, mais capaz na ciência ou na arte, que terá direito a mandar nos outros.

A praça é do povoEm Atenas e nas outras cidades democráticas (não era toda a Grécia: Es-

parta era monárquica), o povo exercia o poder, diretamente, na praça públi-ca. Não havia assembleia representativa: todos os homens adultos podiam tomar parte nas decisões. A lei ateniense, no século 4 a.C., fixa reuniões or-dinárias por ano na ágora, que é a palavra grega para praça de decisões. Isso significava uma assembleia a cada nove dias.

Essa é a maior diferença entre a democracia antiga e a moderna. Hoje elegemos quem decidirá por nós. Mesmo em cidades pequenas, delegamos por vários anos as decisões ao prefeito e aos vereadores. Os gregos, não. Eles iam à praça discutir as questões que interessavam a todos.

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O pressuposto da democracia direta era a liberdade. Os gregos se orgu-lhavam de ser livres. Isso os distinguia de seus vizinhos de outras línguas e culturas. Ser grego ou helênico não era uma distinção racial, mas linguística e cultural. Quem falasse grego era grego, não importando o sangue que cor-resse em suas veias. Os gregos consideravam os outros povos, tais como os persas, inferiores, mas – ao contrário dos racistas modernos – não por uma diferença genética, e sim por não praticarem a liberdade. (Ter a liberdade significava praticá-la.) Só eles, que decidiam suas questões, eram livres.

Dá para entender por que ainda hoje quem fala em democracia evoca com um suspiro a cidade de Atenas? Sua assembleia reunia poucos milhares de homens, e sua democracia durou apenas uns séculos. Regimes democrá-ticos só voltaram à cena em fins do século 18, mais de 2 mil anos depois. E, no entanto, parece que nada jamais se igualará a Atenas.

O sorteioTalvez o mais estranho, na democracia antiga, fosse que nela mal havia

eleição. Na verdade, não havia cargos fixos, ou eles eram poucos. Havia en-cargos. Uma assembleia tomava uma decisão; era preciso aplicá-la; então se incumbia disso um grupo de pessoas. Mas estas não eram eleitas, e sim sorteadas.

Por quê? A explicação é simples. A eleição cria distinções. Se eu escolher, pelo voto, quem vai ocupar um cargo permanente – ou exercer um encargo temporário, minha escolha se pauta pela qualidade. Procuro eleger quem acho melhor. Mas o lugar do melhor é na aristocracia! A democracia é um regime de iguais. Portanto, todos podem exercer qualquer função.

Um exemplo é o júri. A frequência à ágora era grande, chegando a alguns milhares, numa Atenas que tem de 30 mil a 40 mil cidadãos. Mas os principais julgamentos são atribuídos a um tribunal especial, cujos membros são sor-teados, o que hoje chamamos júri. Temos um caso célebre, histórico: o julga-mento de Sócrates. O filósofo é julgado, em 399 a.C., por 501 pessoas. Como 281 o condenam e 220 votam pela absolvição, ele é sentenciado à morte.

A maior exceção à regra da escolha por sorteio é óbvia: os chefes milita-res. Deles, e de poucos outros, se exige uma competência técnica que não se requer nas tarefas cotidianas. Nestas um nível de desperdício é tolerado,

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porque é mais importante a igualdade (isonomia) entre os cidadãos do que a perfeição na execução das tarefas.

As festasMas o que esses cidadãos mais decidem? A sociedade grega não conhece

a complexidade da economia moderna. Os cidadãos tratam da guerra e da paz, de assuntos políticos, mas parte razoável das discussões parece girar em torno da religião e das festas, também religiosas.

Imaginemos o que é uma pólis grega. Uma assembleia a cada nove dias, sim, mas não para tratar de assuntos como os de grêmio estudantil (que é o órgão moderno mais próximo de sua militância). E sim, com alguma frequên-cia, para discutir festas e dividir as tarefas nelas.

Não é fora de propósito imaginar que o Rio de Janeiro, Salvador, o Recife e Olinda dariam excelentes cidades-estado, se decidissem adotar a democra-cia direta. Fariam constantes festas ao deus Dioniso (o Baco dos romanos) e, à volta disso, organizariam a vida social. E é bom pensar numa comparação nada acadêmica como esta, porque a tendência dominante, falando da de-mocracia grega, é acentuar sua seriedade – como se fosse um regime feito para tratar das mesmas questões que nos ocupam. Não é o caso. A políti-ca era provavelmente mais divertida, até porque era bem próxima da vida cotidiana.

E poucos foram aqueles, como Platão e outros críticos da democracia, que questionaram a competência do povo simples para tomar as decisões políticas, alegando que para governar seria preciso ter ciência. Ora, um prin-cípio da democracia grega – e de todo espírito democrático – é que, se há ofícios em que o fundamental é a capacitação técnica, a cidadania não está entre eles. Aqui, na decisão do bem comum, na aplicação dos valores, todos são iguais – não há filósofo-rei nem tecnocrata.

Os excluídosEm meio aos elogios dos modernos à democracia ateniense, uma críti-

ca reponta: ela negava participação na ágora às mulheres, aos menores de idade, aos escravos e estrangeiros. Hoje aceitamos a exclusão dos menores, mas não a das outras categorias. O trabalho manual, considerado degra-

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dante, cabia, sobretudo a escravos. Na condição de estrangeiro (em grego, meteco), incluíam-se todos os não-atenienses e mesmo seus descendentes: muitas pessoas nascidas em Atenas, mas de ancestrais estrangeiros, jamais teriam a cidadania ateniense.

Atividades1. Paulo Freire deixou-nos um legado que não pode ser esquecido. Assinale os

pontos de seu pensamento citados no texto desta aula, que mais lhe chama-ram a atenção.

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2. Escreva como você conceitua democracia e as diferenças entre democracia clássica e democracia moderna.

Dicas de estudo“Ser cidadão não é só ter uma certidão de nascimento, não! É também pra-

ticar a cidadania, exigir nossos Direitos, ser Gente Boa e não ter preconceitos, respeitar as leis de Trânsito e fazer um Test Drive, conhecer nosso papel na Demo-cracia. Que tal começar agora?”

É assim que começa a nossa dica de estudo desta aula. Acesse o site <www.canalkids.com.br/cidadania>, como você irá perceber, é um portal destinado a crianças, mas que traz lições de “gente grande” sobre cidadania, direitos, alimen-tação, cultura e muitos outros assuntos. Não deixe de acessá-lo e, de uma forma divertida, você poderá refletir mais sobre a aula que acabou de estudar.

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Suely Pereira da Silva RosaA história da educação brasileira nos aponta para o fato de encontrar-

mos as lutas entre conservadores e progressistas, sempre presente, por ocasião do processo de discussão e votação das Leis de Diretrizes e Bases da Educação Nacional. Assim, anunciou-se por ocasião da Lei 4.024/61, que não conseguiu aprofundar as questões educacionais, apresentando questões genéricas.

Convém lembrar que quando esta lei de ensino foi aprovada, a socie-dade brasileira se encontrava em meio a uma turbulência político-social, em decorrência da falta de consenso político entre as diferentes correntes, assim como crescia o descontentamento da classe trabalhadora diante da escalada inflacionária que provocava recessão em virtude do refluxo do crescimento da economia nos últimos anos. Em função disto, os princípios desenvolvimentistas que atrelavam a Educação a um modelo determina-do com visão unilateral, ficaram diluídos na LDB, provocando sua quebra de rigidez e o surgimento de um certo grau de descentralização.

Esta visão histórica ainda nos faz lembrar a luta pelo processo de implantação do sistema capitalista, que imputou à sociedade dife-rentes concepções de Educação. Esta situação tem se traduzido em diferentes leis que buscam, pela legalidade, consolidar as ideias dominan-tes, bem como aponta para a compreensão de como se desenvolveram os sistemas educacionais.

Não se pode, portanto, negar que a escola tem estado atrelada aos interesses do estado, representando, com isso, a classe dominante, que tenta moldar a produção de conhecimento como forma de construir e consolidar uma certa forma de pensar, de agir, de usar os objetos, de fazer política, de falar e de viver, garantindo, assim, o consenso de que a bur-guesia é a representante de todos nós, conforme Marx (1985, p. 36) nos chama a atenção:

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A produção de ideias, de representações, da consciência, está, de início, diretamente entrelaçada com a atividade material e com o intercâmbio material dos homens, com a linguagem da vida real. O representar, o pensar, o intercâmbio espiritual dos homens aparecem aqui como emanação direta de seu comportamento material. O mesmo ocorre com a produção espiritual, tal como aparece na linguagem, na política, nas leis, na moral, na religião, na metafísica etc. de um povo.

A escola acaba por contribuir na formação do consenso, disseminando a ideo-logia do grupo dominante, garantindo o status quo deste grupo, que se reorgani-za no poder, e que mantém os seus interesses, como sendo o interesse de todos.

Com a abertura democrática em nosso país, a Educação vem ocupando es-paços no cenário nacional, em busca de um caminho que efetive o anseio da própria população brasileira e principalmente de seus profissionais da Educação – uma escola pública, democrática, laica, de qualidade, para todos.

Nos fins dos anos 1970 e durante a década de 1980 os debates sobre a de-mocratização do Estado e a liberdade de expressão começam a tomar conta das associações representativas da sociedade civil, fortalecidos pelos movimentos sindicais, que elaboraram vários atos de contestação como as greves por melho-res salários e condições de trabalho, ajudando no fervilhar da necessidade de repensar a organização social brasileira. Estes movimentos serviram de pressão aos deputados federais constituintes por ocasião da elaboração da Constituição Federal, apresentando propostas à Carta Magna, através do documento de Goi-ânia, elaborada por ocasião da IV Conferência Brasileira de Educação, em 1986, seu marco histórico, já que continha contribuições do professorado que dela participava que acabaram incluídas sob a forma de princípios.

Muitas foram as discussões para se buscar o consenso dentro do que fosse possível. Este era um momento ímpar na participação da sociedade civil organi-zada, que se fez presente nas discussões sobre a nova Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, fazendo chegar à Comissão de Educação da Câmara Federal inúmeras propostas que queriam ver acolhidas.

Nossa preocupação em situar a elaboração desta nova lei de ensino repre-senta nosso horizonte para os comentários que faremos na aula de hoje acerca de alguns itens que consideramos importante para o desenvolvimento de nosso trabalho profissional, assim como estaremos cuidando das alterações que vêm se processando na legislação educacional. É muito importante que você também esteja atento, pois a lei de ensino normativa a estrutura e a ação educativa em território nacional, ou seja, o desenvolvimento de nossa organização escolar e de nossa prática educativa.

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Promulgada em 1996, a Lei 9.394/96 aponta os caminhos políticos na área de Educação para as próximas décadas. Um pinçar destas políticas são os eixos de nossa aula de hoje, sabendo que muitas outras discussões continuam a ocorrer, a fim de que seja possível sua operacionalização.

A Educação BásicaNomenclatura adotada para identificar a nova composição dos níveis escola-

res, que não mais privilegia o ensino começando aos sete anos, mas reconhecen-do o direito das crianças de 0 a 6 anos, conforme o art. 21:

A Educação escolar compõem-se de:

I - Educação Básica formada pela Educação Infantil, Ensino Fundamental e Ensino Médio.

Na lei anterior – Lei 5.692/71 – tínhamos apenas um artigo que se referia à Educação Infantil e que definia: “os sistemas de ensino velarão para que as crianças de idade inferior a sete anos recebam convenientemente Educação em escolas maternais, jardins-de-infância e instituições equivalentes”. Não havia, portanto, a explicitação do dever do Estado para com estas crianças, sendo a primeira vez que uma lei dá conta desta faixa de idade, garantindo-lhes o direito à Educação. A Lei 9.394/96 contém, ainda, alguns artigos que passam a nortear a organização da Educação Infantil em todo o território nacional.

Com o objetivo de garantir essa matrícula, o art. 6.° foi alterado pela Lei 11.114 de 16 de maio de 2005, que passa a ter a seguinte redação: “é dever dos pais ou responsáveis efetuar a matrícula dos menores a partir de seis anos de idade, no ensino fundamental”.

Entendemos como avanço esta nova estrutura, uma vez que a definição dessa etapa da Educação, bem como o estabelecimento de suas finalidade e objetivos, ajudam na organização de projetos pedagógicos, em qualquer localidade deste país.

Os arts. 29, 30 e 31 apontam a Educação Infantil enquanto modalidade de Educação, reconhecida como “primeira etapa da Educação Básica”, fazendo parte do sistema de Educação e não do antigo sistema de ensino, expressando a finalidade da Educação Infantil e a preocupação com o desenvolvimento das crianças.

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Com a justificativa de melhorar a qualidade da educação pública no Brasil, foi apresentado pelo senador Cristovam Buarque (PDT/DF), o Projeto PLS 4/06 cuja relatoria coube ao senador Mão Santa (PMDB/PI), ampliando o entendimento do inciso VIII, do artigo 4.°, quanto ao termo assistência à saúde. O novo texto apro-vado prevê que a assistência à saúde garantida ao Ensino Fundamental, também inclua o atendimento médico e odontológico de caráter preventivo e de identifi-cação e correção precoce de problemas que coloquem em risco a aprendizagem do aluno.

Encontraremos também, nos artigos citados, a definição das instituições que poderão oferecer Educação Infantil, bem como indicação de que a avaliação deverá ser feita mediante registros sobre o desenvolvimento da criança, elimi-nando o perigo de se escolarizar a pré-escola.

Embora reconheçamos o avanço que significa ter a Educação infantil as- segurada como sistema de Educação, precisamos nos alertar para o fato de que a indicação de creches ou entidades equivalentes para as crianças de 0 a 3 anos ainda são oferecidas basicamente por entidades privadas, carecendo de maior empenho governamental para este atendimento. Já no atendimento para a faixa de 4 a 6 anos, a atuação governamental supera o setor privado, atingindo, inclu-sive, áreas urbanas de populações de baixa renda.

Esta foi a primeira vez que a Educação Infantil se fez presente em uma lei de ensino e, por este motivo, acreditamos que deva servir como marco de reflexão para os profissionais que atuam neste setor, a fim de que os aspectos pertinentes ao desenvolvimento do trabalho, tais como currículos e programas, política de recursos humanos, materiais didáticos, dentre tantos outros, possam continuar como alvo de discussões, em busca da melhoria da Educação Infantil.

O projeto pedagógico da escolaA Lei 9.394/96 em seus artigos 12, 13 e14 estabelece de forma bastante enfá-

tica a responsabilidade da escola e de seus profissionais, “respeitadas as normas comuns e as do sistema de ensino” a elaboração do projeto pedagógico, confor-me se pode constatar nos artigos citados e seus incisos:

Art. 12. Os estabelecimentos de ensino, respeitadas as normas comuns e as de seu sistema de ensino, terão a incumbência de:

I - elaborar e executar sua proposta pedagógica;

[...]

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VII – informar os pais e responsáveis sobre a frequência dos alunos, bem como sobre a execução de sua proposta pedagógica;

Art.13. Os docentes incumbir-se-ão de:

I - participar da elaboração da proposta pedagógica do estabelecimento de ensino;

II - elaborar e cumprir plano de trabalho, segundo a proposta pedagógica do estabelecimento de ensino [...];

Art.14. Os sistemas de ensino definirão as normas de gestão democrática do ensino público na Educação Básica, de acordo com as suas peculiaridades e conforme os seguintes princípios:

I - participação dos profissionais da Educação na elaboração do projeto pedagógico da escola [...]

Acreditamos que a repetição da expressão “proposta ou projeto pedagógico”, cujo grifo é por nossa conta, além de estimular os profissionais da Educação e sua comunidade escolar na condução do fazer pedagógico, ressalta a possibili-dade de gestão democrática, explícita nos princípios do Artigo 15, asseguran-do “progressivos graus de autonomia pedagógica e administrativa e de gestão financeira”.

É muito importante reconhecermos, ainda, que pela primeira vez se busca redimensionar a importância da escola e de seus profissionais, cabendo aos sis-temas de ensino o papel de coordenação, apoio e incentivo às escolas, abando-nando práticas autoritárias. No entanto, ainda verificamos que muitas unidades escolares não se aperceberam da responsabilidade e importância que represen-tam estes artigos e deixam de cumpri-los, contribuindo para que não assegu-remos a gestão democrática na escola. Somente mantendo a organização e a participação de todos os envolvidos no processo educacional, conseguiremos impor a vontade do grupo e, consequentemente, assegurar a gestão democrá-tica em nossas escolas.

O destaque, evidenciado pela lei de ensino quanto à proposta pedagógica, coloca, bem, a importância de se buscar um projeto que possa melhorar a qua-lidade da educação em nosso país. Cabe, porém, esclarecer que muitos auto-res utilizam a expressão proposta político-pedagógica por entenderem que a ação pedagógica se constitui em ato político, considerando que o trabalho a ser executado deve visar à formação do cidadão para uma determinada sociedade. E esta sociedade, com certeza, estará cobrando da escola uma formação que propicie competência profissional e vivências democrática, crítica, responsável e ética. O princípio adotado pela Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional regula as normas e a efetividade de nossas ações. Assim sendo, o projeto peda-

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gógico se torna nosso instrumento de trabalho, uma vez que define as políticas e os princípios filosóficos, otimiza os recursos pedagógicos e financeiros, mobi-lizando os diferentes setores para a consecução dos objetivos. Não elaborá-lo significa abrir mão de um documento que legitima nossas ações.

O financiamento da EducaçãoQuestão que sempre gera grandes discussões, principalmente por ser a mola

que indica as prioridades dos governantes para os assuntos educacionais quer em nível federal, estadual ou municipal.

À luz da nova Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional – Lei 9.394/96, segundo Valle e Costa, a questão dos recursos financeiros se “apresenta mais es-clarecedora do que o capítulo correspondente que constava das antigas LDBs, sobretudo as Leis 4.024/61 e 5.692/71”. (In: Múltiplas Leituras da Nova LDB, p. 138). Isso se dá porque temos, pela primeira vez, a definição do que signifi-ca “manutenção e desenvolvimento de ensino” (art. 70), bem como explicita o que não pode ser considerado como manutenção e desenvolvimento de ensino (art. 71), a fim de que se evite a utilização da verba da Educação sob qualquer pretexto, que não esteja definido nos artigos mencionados.

Há de se acrescentar que o art. 68 explicita de forma bastante clara a origem dos recursos destinados à Educação, a saber: receita de impostos próprios da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios; receita de transferên-cias constitucionais e voluntárias; receita do salário-Educação e de outras contri-buições sociais; receita de incentivos fiscais; e outros recursos previstos em lei. Estes cuidados vieram resolver problemas anteriores, de uso indevido da conta da Educação, alegando-se interpretações, mesmo que equivocadas. Esse cuida-do que os legisladores tiveram em redigir os referidos artigos deve ser entendi-do sobre a importância que assume a questão financeira da Educação na atua-lidade, “talvez pela extensão dos desperdícios de recursos verificados na gestão do ensino público brasileiro” (VALLE; COSTA, 1997, p. 138).

O detalhamento dos artigos 70 e 71 procuram evitar as interpretações ina-dequadas, uma vez que se encontram explicitadas as ações entendidas como manutenção e desenvolvimento do ensino, procurando impedir o uso incorreto dos recursos da Educação. Não resta dúvida de que a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional atual procura valorizar a Educação Básica em nosso país, não só pelos artigos relativos ao financiamento, mas pelo seu próprio corpo legisla-

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dor. Acrescente-se, ainda, nesta questão a criação do Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino Fundamental e de Valorização do Magistério, criado pela Lei 9.424 de 24 de dezembro de 1996.

Mesmo diante de todos os cuidados contemplados nos artigos da Lei, quere-mos chamar a atenção dos profissionais da Educação e da sociedade civil orga-nizada para o fato de que neste país, nem sempre as leis vêm sendo cumpridas. Não basta o texto da lei, há de se ter organização para que se busque os cami-nhos indicadores de ações concretas, considerando o compromisso assumido pelo país quanto à erradicação do analfabetismo, a universalização do Ensino Básico e mais recentemente o processo de inclusão.

No entanto, dez anos se passaram e o Fundo Nacional de Desenvolvimento para o Ensino Fundamental (Fundef) deixa de existir. Seu prazo expirou, porém, com o objetivo de ampliar o acesso à escola, melhorar a distribuição de renda, gerando a cidadania foi criado o Fundo Nacional de Desenvolvimento da Edu-cação Básica (Fundeb), que ampliou sua área de destinação – deixou de atender apenas ao Ensino Fundamental, e passou a incluir a Educação Infantil, o Ensino Médio e a Educação de Jovens e Adultos, onde 60% dos recursos se destinam ao pagamento dos profissionais do magistério em exercício, e seu prazo de vigên-cia será até 2020 (Lei 11.494/2007).

A formação profissionalUma discussão que parece não ter fim! Se na questão do financiamento a lei

foi bastante clara quanto às especificações do assunto, o mesmo não aconteceu em relação à formação dos profissionais da Educação.

Cabe aqui uma volta ao passado. A questão da formação dos profissionais da Educação é discussão antiga, recordamos da criação do Comitê Pró-Formação do Educador, em 1983, sendo transformado, em 1990, em Associação Nacio-nal pela Formação dos Profissionais da Educação (Anfope), que vem tratando esta questão desde então. Embora não haja uma definição única para a trans-formação do curso de Pedagogia e demais licenciaturas, isso não acarretou um imobilismo dos profissionais, que têm procurado caminhos para esses cursos, traduzidos nas iniciativas de alteração curricular, principalmente nas universi-dades públicas, buscando relacionar a atividade teórica à atividade prática, bem como articular experiências com o compromisso democrático e a competência profissional.

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Este breve flashback nos mostra a complexidade do tema. Talvez, por isso, a Lei 9.394/96 não tenha conseguido apresentar soluções para estes problemas e acabasse traduzindo as mesmas polêmicas em seu corpo de definições.

Mesmo diante desse quadro complexo, a LDB lança algumas alternativas, tais como a valorização do profissional e o aperfeiçoamento profissional conti-nuado (Art. 67, II), acatando o indicativo de que o aprimoramento faz parte da profissão. Reforçando essa discussão, o Senado aprova, com validade a partir de 01/01/2008, a licença remunerada para o aperfeiçoamento profissional a cada sete anos de trabalho (grifos nossos). Esta medida abre espaço para o entendi-mento de que a capacidade de fazer o aluno aprender se amplia, através da atu-alização do professor.

A nova lei determinou o fim das licenciaturas de curta duração, assim como dos conhecidos “avanços progressivos” previstos na Lei 5.692/71. Mantendo o campo das polêmicas em evidência, encontramos o Art. 61, I, indicando como um dos fundamentos o “aproveitamento da formação e experiências anterio-res em instituições de ensino em outras atividades, sem que se explicite o tipo dessas atividades.

Outra polêmica fica por conta de onde e como serão formados os profissionais da Educação. Embora o art. 62 diga que a formação de docentes para atuar na Educação Básica deva ser de nível superior, continua admitindo como formação mínima a ser oferecida em nível médio, na modalidade Normal.

A lei cria, ainda, os Institutos Superiores de Ensino, que à luz do modelo fran-cês, destinam-se exclusivamente à formação de profissionais da Educação, in-cluindo-se o Curso Normal Superior, cuja finalidade é formar profissionais para atuarem na Educação Infantil e para as primeiras séries do Ensino Fundamental.

No art. 64, ao falar mais uma vez dos profissionais da Educação, fica claro que está se referindo aos antigos especialistas – supervisores e orientadores educa-cionais, planejadores, administradores e inspetores – que deverão ter formação em Pedagogia, podendo ser em nível de graduação ou pós-graduação, obser-vando os cursos uma base comum nacional.

Os listados neste artigo necessitarão de dois anos de experiência docente para que possam exercer outras funções do magistério, conforme normatizada pela Câmara de Educação Básica, por meio da Resolução CEN/CNE 3/97.

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Em maio de 2007, o Senado aprova o Projeto PLS 4/06 que dentre vários con-teúdos, encontra-se explicitada a questão da formação do professor. A principal novidade é a obrigatoriedade de diploma de Ensino Superior a todos os pro-fessores que se formarem a partir de dezembro de 2007. Isto significa dizer que quem fizer magistério no Ensino Médio não mais poderá dar aula. No entanto, não haverá nenhuma alteração para os professores que já lecionam. Quem já está trabalhando não (nosso grifo) terá de fazer adaptação ou curso superior, o que se torna contraditório para quem faz uso do discurso de melhoria da quali-dade do ensino. Em verdade, esta atitude visa contemplar a situação de alguns professores de regiões mais pobres do país, que nem completaram o Ensino Médio, a continuar lecionando. Segundo o novo Decreto, o Curso Normal Supe-rior que detinha o poder na formação para o ensino infantil e os quatro primei-ros anos do Ensino Fundamental teve alterado sua condição, de vez que o termo “exclusividade” foi substituído pelo termo “preferencialmente”.

A partir dessa nova concepção, a Universidade deverá rever sua estrutura, que necessitará incluir a habilitação “licenciatura” para dar condição aos forman-dos de atuarem em sala de aula.

O Senado ainda aprova, com validade a partir de 01/01/2008 o prazo para a licença remunerada com vista ao aperfeiçoamento profissional continuado, pre-vista na LDB para a cada sete anos de trabalho. Este é um fato bastante interes-sante já que resgata o entendimento de que o aprimoramento profissional faz parte da profissão.

A questão da formação vem se perpetuando na medida em que envolve questões políticas internas das universidades, que se consubstanciam nas dis-cussões sobre a licenciatura de pedagogia e as chamadas específicas. A própria estrutura dos cursos de formação indica seus pontos de estrangulamento.

Um outro aspecto modificado na nova LDB que vale ser ressaltado diz res-peito a criação do piso salarial nacionalmente unificado, introduzido pela Lei 11.738/08, que estabelece um valor de R$950,00 (novecentos e cinquenta reais) reajustado anualmente, vigorando em 2009, para os professores com regime de 40 (quarenta) horas semanais, mantendo 1/3 do tempo para as demais ativida-des: reunião pedagógica na escola, atualização e aperfeiçoamento, atividade de planejamento e avaliação, além de correção de trabalho dos estudantes. A pro-posta de piso nacionalmente unificado é antiga dentro da categoria que preci-sará analisar seus termos e valores como opções desejáveis.

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O Ensino SuperiorPela primeira vez temos uma única lei de ensino que dá conta da Educação

Básica e do Ensino Superior, uma vez que anteriormente tínhamos a Lei 4.024/61, que continha os princípios filosóficos da Educação, tínhamos a Lei 5.691/71, que versava sobre a Educação de 1.º e 2.º graus (5.692/71); a Lei 5.540/68, que organi-zava o Ensino Superior, e surgida em 1982, tivemos a Lei 7.044, que alterou alguns dispositivos da Lei 5.692, referentes à profissionalização do ensino de 2.º grau.

A partir da nova legislação sobre a Educação brasileira, temos incluso na LDB o ensino universitário, cabendo-lhe um capítulo exclusivo dentro do Título V – Dos níveis e das modalidades de Educação e ensino –, Capítulo IV – Da Educação Superior –, obedecendo o princípio da verticalidade na organização do ensino.

Apesar de mantidas algumas polêmicas sobre a Educação Superior, há de se ressaltar a preocupação com a autonomia universitária, garantida pelo art. 53, seus incisos e parágrafo único, bem como pelo art. 62, já mencionado anterior-mente, que conferem às universidades a formação dos docentes para atuarem na Educação Básica em cursos com outra designação (art. 63). Várias resoluções da Câmara de Educação Superior vêm tentando dirimir dúvidas ou explicitar ar-tigos da lei.

Uma novidade trazida pela nova legislação é sobre a avaliação institucional, gerando grandes expectativas junto ao professorado universitário, uma vez que os critérios de avaliação não estejam claros, existe o Decreto 2.207/97 que indica as metas que deverão ser alcançadas pelas universidades e que servirão de bases para a avaliação. Há prazos, inclusive, para a realização das metas e isso talvez esteja trazendo muita ansiedade ao corpo de profissionais universitários. Porém, é inegável que mantidas pelo poder público, estas instituições precisam compro-var seus serviços de qualidade à sociedade. “Mantidas por recursos públicos, as instituições têm sido instadas a comprovar que oferecem à comunidade que as sustenta a retribuição da verba investida, sob a forma de produtos e serviços de inequívoca relevância social” (VILARDI, 1997, p. 169-170).

Vários outros temas sobre o Ensino Superior continuam a circular nas discus-sões organizadas pelo magistério, destacando o próprio curso de Pedagogia, a

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indissociabilidade entre ensino, pesquisa e extensão, os critérios de avaliação institucional, os recursos financeiros e muitos outros.

ConcluindoFinalizando nossa aula, queremos lembrar aos colegas que dentro de cada

modalidade de ensino sempre haverá temas polêmicos, pois muitas vezes não encontramos dentro da própria categoria de profissionais de Educação um único caminho para os vários temas. Encontramo-nos em período de transição, em que resoluções têm sido elaboradas com o intuito de interpretar os artigos da lei.

É nosso dever de cidadão conhecer bem a lei que nos rege e acompanhar permanentemente os andamentos das discussões e as novas resoluções que estão sendo apresentadas pelo Conselho Nacional de Educação.

É importante, portanto, que cada um de nós, profissionais da Educação, es-tejamos participando destas discussões a fim de podermos contribuir para uma legislação que favoreça o desenvolvimento de nosso próprio trabalho e conse-quentemente o desenvolvimento de nosso aluno.

Em nossa aula, apontamos algumas modificações que têm ocorrido na Lei 9.394/96 por conta de explicitação de artigos, ou por força de alguns lobbies; tais como: inclusão obrigatória do ensino de Educação Física (Lei Federal 10.328/01), acréscimo dos artigos 26-A e 79-B, tornando obrigatório o ensino de História e Cultura Afro-Brasileira e Indígena e introduzindo, no calendário, o dia 20/11, como Dia Nacional da Consciência Negra, ou, ainda, a introdução dos estudos de Filosofia e Sociologia no Ensino Médio, entre outros que se encontram em fase de disputa política. A não discussão série sobre a questão curricular acaba proporcionando essa “colcha” que longe de ter como fundo a discussão da me-lhoria da educação, cai no campo do corporativismo. Para evitar esse trajeto, precisamos voltar a participar das discussões sobre aspectos importantes que precisam ser incluídos em nossa lei de ensino. Não deixe de procurar em sua cidade a organização – quer em nível sindical, quer em nível acadêmico – que tem coordenado essa discussão.

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Texto complementar

A nova LDB: ranços e avanços(DEMO, 1997)

[...] Parece inegável o esforço dos legisladores de garantir, no espíri-to da lei, mas igualmente em muitos detalhes concretos, uma propos-ta muito flexível de organização dos sistemas. Pode-se sempre arguir que essa visão corre o risco de permanecer letra morta, por conta da tradição centralizadora da União, o que é um contra-argumento potente e reitera-damente comprovado. Como a lei não faz a realidade, é bem possível que, apesar desse texto, tudo continue como antes. Mas temos, pelo menos, um texto arejado. Na prática, não aparece um horizonte propriamente revolu-cionário, até porque se restringe ao plano dos meios (modo de organiza-ção), que pode ser novo mantendo os conteúdos velhos. Sem descurar dos meios, em educação, são sempre mais relevantes os fins. Assim, será pos-sível encontrar uma escola dotada de boa gestão democrática, em regime participativo convincente, mas enredada em baixíssimo rendimento escolar dos alunos. É claro o que vale sempre a máxima: se o aluno não aprender bem, nada adianta, embora disso não decorra que, para o aluno apren- der bem, vale tudo, inclusive a ditadura. A aprendizagem humana não pode ocorrer de maneira digna em ambientes draconianos, por serem estes intrin-secamente deseducativos. Ao mesmo tempo, educação não pode se bastar na qualidade formal, porque seu signo mais profundo é a qualidade política, que é fim (DEMO, 1995d).

Não obstante todas as cautelas críticas, vale assinalar que o texto da Lei está imbuído de grande interesse pela flexibilização da organização dos sistemas educacionais, seguindo aí uma coerência necessária: não se pode educar bem dentro de uma proposta organizativa em si já deseducativa. É congruente que a própria organização dos sistemas reflita, ostensivamente o compromisso educativo. Na verdade, isso é muito mais decisivo do que declarações, na prática ocas, de compromisso com a democracia, a solida-riedade, o humanismo, que acabam tendo apenas o efeito nulo de qualquer “moralismo”. A Lei também contém essas “inocuidades”, na tradição brasileira de leis tão eloquentes quanto inócuas [...]

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Nessa parte, a intenção flexibilizadora atinge níveis ainda mais sur-preendentes, tornando-se quase uma obsessão, tamanha é a insistência. No Art. 23 diz-se: “A educação básica poderá organizar-se em séries anuais, período semestrais, ciclos, alternância regular de períodos de estudos, grupos não-seriados, com base na idade, na competência e em outros crité-rios, ou por forma diversa de organização, sempre que o interesse do proces-so de aprendizagem assim o recomendar”. Encontramos aqui uma inovação de grande profundidade, a começar por colocar todos os meios a serviço do fim maior, que é o processo de aprendizagem. Na prática, o texto, ao desfilar alternativas de organização, simplesmente afirma que, por conta do proces-so de aprendizagem, vale toda forma de organização que lhe for necessária e útil. É quase um “vale-tudo”, no bom sentido. O aluno precisa, definitivamen-te, aprender. Para tanto, cabe organizar por séries anuais, períodos semes-trais, ciclos etc., parecendo uma ladainha sem fim e essencialmente aberta.

[...] O nível maior de liberdade aparece na possibilidade de classificar o aluno de maneira independente da escolarização anterior, desde que exista avaliação dento de regulamentação pertinente. Pode-se alegar que isso já é demais. Entretanto, se lembrarmos do empurrão que a Lei oferece na dire-ção da autonomia de cada escola, essa formulação, por mais surpreendente que pareça, é, no fundo, coerente. A possível suspeita de certa leviandade é compensada pela exigência de avaliação e regulamentação, que impediria a tentação de se classificar de qualquer maneira, sob o impacto da “politica-gem”, por exemplo. Além disso, quando se fala da promoção como forma de classificação, acrescenta-se que supõe “aproveitamento” por parte do aluno. Embora isso vá, com certeza, servir aos mais variados golpes escusos, se o espírito da Lei forem minimamente respeitados, é possível colocar a forma sob controle dos fins educativos.

No inciso III, aparece a possibilidade de “progressão regular por série”, ad-mitindo “formas de progressão parcial, desde que preservada a sequência do currículo, observadas as normas do respectivo sistema de ensino”. Reafir-ma-se o cuidado em fazer o aluno progredir, mas não de qualquer maneira, porque é mister preservar a sequência do currículo, bem como observar as normas do respectivo sistema. Assim, parece claro que a insistência se volta menos para progredir de qualquer maneira do que para garantir o direito do aluno à aprendizagem. É coerente, de novo, essa maneira de ver, porque, tendo estabelecido que a educação, em particular o ensino fundamental, é

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direito e dever de todos (Art. 2.°), cada aluno tem o direito e o dever de cursar o 1.° grau inteiro (entender como a educação básica – texto anterior à modi-ficação da LDB), devendo cada escola assumir o compromisso explícito de garantir essa progressão, desde que com o devido aproveitamento. [...] (p. 19 a 22, grifo nosso).

Atividades1. Levante aspectos da Educação Básica que você acha relevante para uma

Lei de Educação. Constate se esses aspectos estão ou não contemplados na Lei 9.394/96 e elabore uma listagem dos principais aspectos.

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2. A Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (Lei 9.394/96) propõe uma nova composição quanto aos níveis escolares. Identifique na legislação onde se encontra garantida esta nova composição e comente sobre ela.

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3. Esta aula demonstrou a importância que a lei de ensino dá para a elaboração do projeto político-pedagógico pela escola e seus profissionais. Você con-corda com a importância dada pela legislação? Justifique.

4. A nova legislação de ensino garante a você, professor, o direito à educação continuada, uma das antigas reivindicações do magistério. Teça comentários sobre este importante direito assegurado.

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Dicas de estudoVimos como a aprovação de uma Lei depende da correlação de forças exis-

tentes no Congresso, no entanto, para se lutar é necessário que se conheça o conteúdo das propostas. Assim sendo, é conveniente analisar um capítulo de fundamental importância, que aponta a nossa formação e define nossa respon-sabilidade, são eles: Art. 12, 13 e 14; Art. 67 inciso II, e a Lei 11.738/08. Com isso é importante visitar o site <www.mec.gov.br/cne>, para ter conhecimento desses artigos.

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Suely Pereira da Silva Rosa

Recordando a históriaVoltemos aos anos 1980. O país vivia seu início de efetiva democra-

tização. Elegíamos nossos representantes para comporem a Assembleia Nacional Constituinte. Era o momento de elaborarmos uma nova Consti-tuição Federal. Crescia o clima de participação e as entidades organizadas da sociedade civil e do movimento sindical iniciaram a chamada de seus afiliados para a elaboração de suas propostas.

Neste clima, realizava-se a IV Conferência Brasileira de Educação (CBE), na cidade de Goiânia, em 1986, com a participação de professores de todos os Estados brasileiros e de todos os níveis de ensino. O tema do encontro era organizar as diferentes propostas sobre as questões educa-cionais, com vista a encaminhá-las aos Constituintes, para sua inclusão no capítulo da Educação, considerando que em diversas esferas educacionais o debate tinha sido rico. Assim, nascia o documento contendo as propos-tas aprovadas a serem encaminhadas à Assembleia Nacional Constituinte. Este documento ficou conhecido como a Carta de Goiânia e teve suas pro-postas incluídas na Constituição Federal, sob a forma de princípios.

A primeira etapa das discussões estava se fechando e novos cami-nhos de participação se abrindo. Promulgada a nova Constituição em 05/10/1988, era preciso se preparar para a elaboração da nova Lei de Di-retrizes e Bases da Educação Nacional. Se já tínhamos os princípios, era necessário defini-los e detalhá-los com vista a contemplar os interesses dos setores menos favorecidos da sociedade. Cada categoria de profissio-nais de Educação, em todos os Estados brasileiros, enviavam propostas para suas entidades nacionais, fruto de debates, seminários, conferências, congressos acadêmicos e sindicais e/ou assembleias locais, contemplan-do os seguintes princípios básicos: garantia de verbas públicas somente para as escolas públicas, gratuidade do ensino, gestão democrática da

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Educação, valorização dos profissionais da Educação por meio de um piso sala-rial profissional. Fervilhavam as ideias e os ideais de uma Educação pública de qualidade para todos.

Em abril de 1988, na cidade de Porto Alegre, aconteceu a XI Reunião Anual da Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa (ANPEd), onde o Prof. De-merval Saviani apresentou um texto contendo esboço de um projeto de Lei de Diretrizes e Bases, com base nos princípios da Carta de Goiânia. A partir desses documentos, o Deputado Octávio Elísio apresentou à Comissão de Educação, Cultura e Desporto o Projeto de Lei 1.258, que fixava as diretrizes e as bases para a Educação nacional. O primeiro passo estava dado. Nos meses seguintes, outros projetos de lei ou emendas foram sendo apresentados e anexados ao texto ini-cial do projeto.

No ano seguinte, 1989, o deputado Ubiratan Aguiar, então presidente da Co-missão de Educação, designou o deputado Jorge Hage como relator do projeto, sendo criado um grupo de trabalho, sob a coordenação do falecido deputado Florestan Fernandes, que tinha como incumbência a análise e o debate de todo material chegado à Comissão de Educação. Durante os meses de abril a junho, em audiência pública, todos os representantes de entidades e dirigentes de órgãos ligados à Educação foram ouvidos e apresentaram suas propostas, ha-vendo, ainda, a contribuição de pesquisadores da área educacional. No mês de agosto, ficou pronta a primeira versão do substitutivo e foi apresentada à Comis-são de Educação por seu relator, dando início às discussões internas entre os de-putados, em sessões abertas ao público, que não deixou de comparecer. Neste ano, ainda, foi realizado um simpósio sobre os temas polêmicos, sendo convida-dos palestrantes de renome nas áreas específicas: Educação de Jovens e Adultos, Recursos Financeiros, Educação e Trabalho, Ensino Superior, entre outros.

O resultado destes encontros e debates deu origem à segunda versão do pro-jeto, sendo apresentada para discussão, ao final de 1989.

Fórum Nacional de Educação em Defesa da Escola Pública na LDB

Como vimos, as entidades sociais, acadêmicas, estudantis e sindicais liga-das à Educação não deixaram de ter representantes em nenhum momento de discussão e apresentação de propostas tanto para a Constituição Federal como

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para o projeto de diretrizes e bases da Educação nacional. Assim, optaram em reunir esforços para uma luta mais organizada e consciente sobre os anseios que gostariam de ver contemplados no Projeto de Lei, criando o Fórum Nacional de Educação em Defesa da Escola Pública na LDB, cujo objetivo era reunir esforços para o que havia de consenso entre elas e buscar novos consensos onde havia divergências. Foram inúmeras as reuniões de trabalho em busca da unidade ne-cessária em prol de acompanhar junto com os parlamentares todas as discus-sões sobre o projeto. Seu papel foi de fundamental importância no processo de encaminhamentos e decisões sobre o texto da lei.

Continuando a históriaChegamos ao ano de 1990 e com ele as modificações na composição da Co-

missão de Educação. Sai o deputado Ubiratan Aguiar e assume em seu lugar o ex-ministro da Educação, o deputado Carlos Sant´Ana, mantendo o deputado Jorge Hage como relator de Projeto de Lei. Inicia-se neste momento o maior movimento de construção coletiva e de negociação política para um projeto de lei que se tem notícia. Começava o tortuoso caminho para se obter os avanços necessários no sentido de se ter uma lei de ensino que contemplasse os pontos fundamentais apontados no início de nossa conversa. Todos os capítulos e arti-gos foram discutidos e analisados, sempre buscando o entendimento onde fosse possível, transformando este processo num ato de democracia e representativo do espírito público.

Após esta exaustiva etapa de discussões e articulações, o relator – Jorge Hage – monta a terceira versão do Projeto de Lei e o apresenta em junho à Comissão de Educação. Embora pronto e aprovado nas diferentes comissões da Câmara, não houve tempo hábil de colocá-lo em votação no plenário, uma vez que chegava ao fim o mandato dos que se elegeram para a Assembleia Nacional Constituinte. Porém, por meio de novas discussões e articulações garantiu-se que o mesmo não seria arquivado e que se salvaguardaria todo o processo de discussão.

Infelizmente, não houve o retorno de muitos parlamentares que se identifica-vam com o Projeto, ou porque não foram reeleitos em seus estados, ou porque optaram por outras atividades, trazendo novos atores para um palco que se en-contrava pronto, e, portanto, novos embates, novas discussões e mais peregrina-ções pelos corredores daquela Casa, em busca de convencer os novos parlamen-tares a conhecer o projeto e votar a favor dele. Dos deputados que participaram

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do processo de elaboração do Projeto de Lei e que se identificavam com as ideias do Fórum Nacional em Defesa da Escola Pública, somente retornou à Câmara o deputado Florestan Fernandes.

Dentro da nova composição política, oriunda do resultado das urnas eleito-rais, assume como relatora do projeto a deputada Ângela Amin, que tudo fez para promover o arquivamento do projeto. Alegava desconhecimento do con-teúdo por não ter participado das discussões iniciais, pedia tempo para que pu-desse se organizar e chegou a propor o início de uma nova discussão, alegando que a maioria dos deputados eleitos desconhecia o projeto. Por fim, após muitas negociações, o projeto foi encaminhado ao plenário, tendo recebido mais de mil emendas, que precisavam ser analisadas, sem falar dos destaques acrescidos durante sua tramitação.

O Fórum em Defesa da Escola Pública não esmoreceu o seu trabalho de acom-panhar todo o processo de tramitação do Projeto de LBD. “Manteve-se reunido permanentemente, acompanhando essas negociações, numa contínua ‘inserção na trama legislativa.’” (VALLE, 1994, p. 16).

As dificuldades em viabilizar a maioria das propostas apresentadas provoca-ram o retardamento do processo de aprovação da LDB, que se encontrava na ordem do dia desde novembro de 1992. Era visível o descontentamento dos setores mais tradicionais e não-aceitação à proposta de Educação contida no Projeto de Lei. A partir daí começaram a surgir críticas, tais como: “é um proje-to muito detalhista”, “interpretativo de seus próprios artigos”, “com tantas defi-nições que acabam provocando um engessamento nos recursos” e assim por diante. Sabemos que um dos aspectos que muito dificultou a aplicabilidade das leis anteriores foi o fato de permitir interpretações, que muitas vezes eram uti-lizadas de acordo com os interesses de seus governantes. Qualquer desculpa servia para impedir que a votação acontecesse.

Quanto mais o tempo passava, mais complicava a situação, uma vez que eram necessárias as conhecidas conciliações políticas, para fazê-lo caminhar a passos de tartaruga. Cresciam os lobbies, as pressões e os interesses financeiros se expandiam, tendo o Fórum Nacional em Defesa da Escola Pública se tornado mediador dessas conciliações.

Em 1993, viria o grande golpe governista. O senador Darcy Ribeiro (PDT/ RJ) apresenta um projeto de sua autoria à Comissão de Educação do Senado, com alguns aspectos que se antagonizavam com o projeto que se encontrava na Câmara dos Deputados. A aprovação deste projeto colocaria fim em todos os

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esforços de construção coletiva, considerando que o regimento do Congresso prevê que, se aprovado no Senado, ele se sobreporia ao texto em discussão.

Mais uma vez a pressão do Fórum Nacional em Defesa da Escola Pública sobre os setores conservadores fez com que o Projeto 1.258/88 fosse aprovado em 13 de maio de 1993, após quatro anos e meio de angustiosas articulações, negociações e debates, e fosse encaminhado ao Senado Federal.

Ao chegar ao Senado, recebe o n. 101/93 e começa a ser revisado pelo se-nador Cid Sabóia. Na ocasião, o Fórum Nacional em Defesa da Escola Pública se apresentou ao senador levando um documento onde informava todas as ações feitas pelas entidades que integravam o Fórum, com vistas a acelerar não só a votação como garantir a participação democrática na elaboração da lei. Nesse sentido, no documento são reafirmados os princípios da

[...] democratização e universalização da Educação, valorização da Educação e de seus profissionais, gestão democrática na administração, base nacional do conhecimento, concepção ampliada da Educação Básica, verbas públicas para a Educação Pública e piso salarial profissional nacionalmente unificado. (Fórum Nacional em Defesa da Escola Pública na LDB In: VALLE, 1994, p. 17)

No entanto, ao chegar ao Senado, configurou-se um cenário de disputa entre dois projetos distintos: o substitutivo do senador Cid Sabóia, expressando as propostas do Fórum, elaboradas com a participação de toda a comunidade aca-dêmica, social, estudantil e sindical, reflexos de esforços democráticos, e o pro-jeto Darcy Ribeiro, articulado com a base governista presente no Senado e na Câmara dos Deputados.

Vale lembrar que no projeto que saiu da Câmara já havia forte influência dos grupos privatistas, resultado de um debate franco e aberto e, por isso, mereceu amplo apoio. Tão logo terminou a eleição presidencial – 1994 – e o novo presi-dente – Fernando Henrique Cardoso – foi empossado, a matéria passou a ser apreciada e o senador Darcy Ribeiro, que elaborou o projeto, foi nomeado o seu relator. Esse processo que reforçou e legitimou as manobras regimentais fez com que o projeto Darcy Ribeiro substituísse o originário da Câmara dos Deputados, fechando as portas para a participação, fazendo com que o espaço do Fórum se limitasse à apresentação de emendas ao texto em discussão no Senado Federal, exigindo lobbies sistemáticos junto aos senadores, até que a matéria fosse apro-vada naquela casa. Foi um momento muito desgastante e um golpe no processo democrático elaborado na Câmara dos Deputados, conforme depoimentos dos que vivenciaram aquela situação.

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Diante das diferentes manobras regimentais já anunciadas, o projeto que sai do Senado aprovado apresenta profundas diferenças em relação ao enviado pela Câmara dos Deputados, e ao retornar a esta Casa foi votado “a toque de caixa”, sem a menor discussão, e com certeza, sem que a imensa maioria dos parlamentares tivesse conhecimento de seu conteúdo.

É preciso que se explicite a manobra utilizada pelo senador Darcy Ribeiro, para que possamos entender porque foi rápida a votação do projeto do senador. Numa manobra regimental bastante questionável, de forte cunho de desrespei-to com toda a comunidade educacional, ele utilizou o PL 45/91 do deputado Florestan Fernandes, que tratava da concessão de bolsas de estudo para os pro-gramas de Mestrado e Doutorado, que já se encontrava em trâmite no Senado Federal, para apensar o seu Projeto de Lei de Diretrizes e Bases da Educação Na-cional, que além de não ter nenhuma participação dos educadores, ainda utiliza o espaço alheio para fazer valer seus objetivos.

A tramitação da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional se deu numa conjuntura muito desfavorável para o movimento social e sindical expressa na correlação de forças no Congresso Nacional, onde os setores populares e demo-cráticos eram minoria. Basta que lembremos a vocês de que a LDB tramitou em três legislaturas diferentes e os setores conservadores, que em alguns momen-tos se encontravam fragilizados, naquele momento estavam fortemente agluti-nados em torno do projeto neoliberal que estava sendo revivido pelo governo de Fernando Henrique Cardoso.

Uma análise mais geral do projeto nos permite afirmar que a nova Lei de Di-retrizes e Bases, sancionada em 20 de dezembro de 1996, seguia a mesma con-cepção que norteava as demais políticas governamentais, sejam as que eram tratadas na Reforma Administrativa, seja a da Previdência, assim como as edu-cacionais implementadas pelos governos estaduais. Houve, portanto, sintonia entre a lei aprovada e as reformas em pauta na agenda nacional, na perspec-tiva da redução de direitos e de minimização do papel do Estado nas questões sociais.

O texto da Lei 9.394/96 difere do projeto aprovado inicialmente pela Câmara dos Deputados. Com certeza, não é o que desejava cada entidade presente nas negociações e que compunha o Fórum Nacional em Defesa da Escola Pública na LDB. Isso significa dizer que o Fórum, com sua representatividade, deixou claro a sua discordância em relação ao processo final e ao conteúdo da nova Lei de Diretrizes e Bases, denunciando a farsa e as manobras políticas que levaram à

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Concepção da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional – Lei 9.394/96

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sua aprovação. Não há, porém, como negar a resistência e a pressão permanente do Fórum, que apesar de sua ação, não conseguiu alterar o projeto do senador Darcy Ribeiro.

O Fórum, através de documentação, encaminhou à Presidência da Comissão de Educação do Senado todas as denúncias que circulavam ao redor do Projeto Darcy Ribeiro e mesmo assim, o senador Roberto Requião se manteve irredutí-vel, encaminhando de forma mais rápida possível o projeto para votação, conse-guindo aprová-lo na forma de seu substitutivo (PCL 101/93).

Fórum Nacional de Educação/ Conselho Nacional de Educação

O projeto original previa um Conselho Nacional de Educação, de caráter deli-berativo e com atribuições capazes de permitir a articulação entre os diferentes níveis do poder, inclusive do setor privado, no que se refere a diretrizes e bases pedagógicas. Previa, também, um Fórum Nacional de Educação, coordenado pelo Conselho Nacional de Educação com a colaboração das Comissões de Edu-cação da Câmara e do Senado e do próprio Ministério da Educação, integrado majoritariamente por representantes indicados pelos vários segmentos sociais, assumindo instâncias de articulação com a sociedade civil, a reunir-se quinque-nalmente para avaliação do processo educativo e propor uma política nacional de Educação na perspectiva de valorizar permanentemente a Educação pública no país.

Diante dos fatos relatados, encontramos um texto na Lei 9.394/96 que aponta para o agigantamento do Ministério da Educação na definição dos rumos da política educacional, excluindo a participação da sociedade, permitindo que, a cada governo, a Educação tome rumos diferentes, impedindo o processo perma-nente de uma ação que valorize a Educação e que permita a correção de rumos. Faz desaparecer o Sistema Nacional de Educação, mantendo a desarticulação e acentuando a desagregação entre os diferentes sistemas estaduais e munici-pais da Educação, agravando, com isso, a fragilização dos mesmos. Desaparece, também, o Fórum Nacional de Educação e o Conselho Nacional de Educação perde o seu caráter deliberativo, passando a ser apenas um órgão de assessoria do Ministro da Educação, de acordo com o projeto de lei de conversão, anterior-mente aprovado em função de medida provisória editada.

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ConcluindoDiante do que foi colocado, podemos afirmar que há um longo caminho pela

frente e precisaremos fazer um grande esforço para buscar a consolidação de uma escola pública de qualidade para todos que necessitarem dela.

Não adianta lastimarmos. Um país para ser democrático exige a participação de sua sociedade. Vimos que as forças políticas definem as situações que se en-contram em fase de decisão. Não devemos nos deixar levar pelo ceticismo que nos faz abandonar a luta necessária para galgarmos mais uma etapa de nossa vida profissional. Somente por meio do grupo coeso, com projetos definidos cla-ramente e com a participação de todos os envolvidos na escola estaremos em condições de voltar a pressionar o Congresso Nacional para as etapas que ainda se fazem necessárias na definição de pontos importantes que constam na Lei 9.394/96.

Ao finalizarmos nossa aula, queremos relembrar um fato importante para a história e para nosso próprio conhecimento: outras Leis de Diretrizes e Bases da Educação Nacional também tiveram suas origens no Poder Executivo – no Con-gresso Nacional. As Leis 4.024/61 – que tratou das Diretrizes e Bases da Educação Nacional, a 5.540/68 que regulamentou a Reforma Universitária e 5.692/71 que também tratou das Diretrizes e Bases da Educação Nacional, após dez (10) anos de vigência de Lei anterior, indicam não só a influência e o poder do Congresso Nacional na legislação educacional em nosso país, como se percebe a alteração de sua função primeira: apresentar emendas a fim de adequar a legislação aos anseios sociais.

Percebemos que as manobras políticas e regimentais foram vergonhosas. A verdade é que o Congresso Nacional, naquele momento, se compunha mais de correntes tradicionais, de setores reconhecidos como conservadores, do que de setores progressistas, e isso se constituiu em grande entrave para avançarmos em aspectos fundamentais para a organização do sistema nacional de Educa-ção. O tempo decorrido entre o início do projeto e sua votação – foram oito anos, atravessamos três eleições presidenciais e três composições diferenciadas do Congresso Nacional, sem nos esquecermos do impeachment do ex-presidente Collor – dificultou a votação da nova Lei de Diretrizes e Bases.

Um primeiro passo na lição de democracia foi dado. Precisamos de organi-zação para continuarmos o nosso caminho e contamos com você, professor, su-

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pervisor, coordenador, orientador, diretor, aluno, funcionário e responsável. Em nossa organização estaremos, com certeza, dando mais passos rumo à democra-cia neste país.

Texto complementar

Educação, Estado e Sociedade: questões sobre o reordenamento da educação brasileira

na nova LDB(PINO, 1997,p. 6-7)

As análises do processo de elaboração da LDB têm sido realizadas sob diferentes ângulos, ressaltando-se ora conteúdos, comparação e ou contra-posição de projetos de diversas origens partidárias e de grupos do campo.

Abrindo espaço para setores organizados da sociedade, no caso o campo educacional, estes partidos não só receberam as demandas destes setores desenhadas sobre os interesses da sociedade como um todo, integrando-as no processo de elaboração da nova LDB, como mobilizaram suporte político para sustentá-las, incorporando no processo de formulação da Lei o Fórum Nacional que se dispôs a coadjuvar a causa da LDB comprometida com os interesses maiores da sociedade brasileira.

Este processo de reciprocidade política legitimou a presença do Fórum no Congresso ao mesmo tempo em que ele era um importante interlocutor sobre a teoria e a prática da educação. O Fórum mobilizou educadores no país promovendo, à níveis nacional, estadual e municipal, congressos, semi-nários, palestras, debates, reuniões, manifestações, atos públicos. Em vários Estados surgiram iniciativas de entidades de criação de fóruns que se arti-cularam ao Fórum Nacional. Em momentos de definições políticas e/ou de diretrizes de conteúdo partiam, para Brasília, caravanas e/ou pesquisadores de vários Estados, de Universidades, de Centros de Pesquisa, técnicos de Se-cretarias de Educação, professores de escola básica e ensino técnico, ligados aos fóruns estaduais ou entidades como as sindicais.

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Estes atores coletivos, atribuindo ao Estado Moderno uma função redistri-butiva, concebiam-no como um Estado de bem estar-social, cabendo-lhe o papel de assegurar as políticas globais e articuladas como moderadoras das desigualdades econômicas e sociais e de responder ao aumento das deman-das no contexto de uma maior divisão do trabalho e expansão do mercado, na sociedade de massas. A educação, como política social, é portanto dever do estado e direito do cidadão. Como valor social é concebida como “instru-mento da sociedade para a construção da cidadania e do desenvolvimento pessoal”, cabendo à educação em geral e à escola em particular o processo de formação cidadã, considerando a formação para o trabalho como uma das suas dimensões, tendo em vista o exercício de direitos e obrigações típi-cas da democracia.

Entretanto, a evolução das ideias relativas à educação, polarizando-se em torno do seu valor econômico, ocorre, nos anos 1990, com grande velocida-de, como consequências do rápido desenvolvimento tecnológico e da nova ordem globalizada. A educação passa a ser central para o novo modelo de desenvolvimento e para a posição dos países no processo de reinserção e realinhamento no cenário mundial.

Novos requerimentos são colocados aos sistemas de educação relativos à qualificação e competências disponibilizados ao mundo do trabalho e à qua-lidade de ensino, em todos os níveis, particularmente na educação básica. Esse movimento é acompanhado de forte crítica ao Estado como paternalis-ta, ineficiente e corporativo.

Esse movimento de ideias no Brasil, identificando-se com o ideal neoli-beral, que avançou fortemente nos países centrais na década de 1980 para entrar em declínio nos anos 1990, inspira tendências em educação no Gover-no Collor e está na base do programa do Governo Fernando Henrique Cardo-so, onde a educação, subassumida à economia, tem lugar privilegiado, pelo seu valor econômico, enquanto base do novo estilo de desenvolvimento.

Dentre as ações iniciais do Governo em relação à educação, definidas pelo MEC no documento “Planejamento Político-Estratégico 1995/1998”, (NMC, maio, 1995), “a necessidade de rever e simplificar o arcabouço legal normativo e regulamentar para estimular (e não tolher) a ação dos agentes públicos...” passa a ser da mais alta importância. Consequentemente, decorre a estratégia desenvolvida com o objetivo de “aprovar uma nova Lei de Di-

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retrizes e Bases que possibilite a diversificação institucional: novos cursos, novos programas, novas modalidade” e “retirar da Constituição dispositivos que engessam a gestão do sistema educacional [...] instituir um novo Conse-lho Nacional de Educação mais ágil e menos burocrático; modificar regula-mentações para garantir maior autonomia à escola [...] e transferir a ênfase dos controles formais e burocráticos para a avaliação de resultados”.

Para tanto foram traçadas estratégias no sentido de impedir a aprovação no Senado do Substitutivo Cid Sabóia, já na mesa do plenário aguardan-do votação, de impedir a possibilidade do retorno do projeto aprovado na Câmara dos Deputados; de trazer à cena o projeto do senador Darcy Ribeiro, elaborado no Governo Collor com a participação do MEC.

Porém, o projeto deveria sofrer grandes modificações, ocorridas duran-te sua tramitação no Senado, que permitissem ao MEC as novas bases e as novas diretrizes para a nova concepção da relação Educação/Estado/Socie-dade e Economia vigente no atual Governo. Estas modificações permitiram a adequação e articulação da lei com as políticas em formulação no MEC.

A estratégia desenvolvida pelo MEC foi vitoriosa com a aprovação da Nova Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, inspirada no estilo político da relação Legislativo/Executivo, retomando este Poder o comando das formu-lações das leis em educação, redefinido o campo político do Legislativo, no qual circulava o Fórum, movimento invisível para o Executivo.

A LDB Darcy Ribeiro cumpre o papel de ancorar as políticas apresentadas pelo Executivo, segundo a urgência da matéria, mediante medidas provisó-rias ou projetos de lei.

Como âncora o projeto tomou uma forma genérica, excluindo matérias que passam a ser objeto de leis específicas ou de resoluções do Executivo, como a carreira do profissional da Educação, Conselho Nacional da Educa-ção, Educação a Distância.

O nível de generalização da LDB é de tal importância que o torna menos importante como lei maior da educação nacional, isto é, as diretrizes e bases da educação nacional que reordenam de fato a educação caminha por fora da LDB: nas medidas provisórias, emendas constitucionais, projetos de lei encaminhados pontualmente ao Congresso pelo Executivo e nas resoluções do MEC. A LDB tem sobretudo um papel legitimador das grandes reformas

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que estão sendo feitas com grande velocidade na educação, tanto por inicia-tiva do MEC, quanto de alguns Estados e Municípios. Dentro deste prisma as mudanças introduzidas no Título IV “Da Organização da Educação Nacional” são indicadores privilegiados deste novo papel da LDB.

A organização da educação nacional, aparentemente, é fragmentada, ou como prefere o MEC é “descentralizado”, pois caberá a cada esfera do gover-no (União, Estados e Municípios e o Distrito Federal) organizar os respectivos sistemas de ensino, em regime de colaboração.

Portanto, a Lei não assume a organização da educação nacional em sis-tema nacional e nem os princípios decorrentes que estariam na base da sua organização. No entanto, contraditoriamente, assume uma política nacional da educação de responsabilidade da União – que deverá coordená-la, assu-mindo a função normativa, redistributiva e supletiva.

Ora, se existe uma política nacional de educação, existem os princípios que a ordenarão, que não estão explicitados na Lei, mas em documentos do MEC, que, além de ser o seu formulador é também o seu coordenador. [...]

Esta análise aponta mais para um processo de centralização e desconcen-tração do que, realmente, de descentralização.

A Lei silencia sobre a participação da sociedade em sua relação com o Estado no “esforço organizado e autônomo pela educação” e desaparece dela o Fórum Nacional de Educação.

Estas são algumas modificações da LDB que indicam as profundas refor-mas que acontecem na educação brasileira e que precisam ser acompanha-das atentamente pelos educadores.

AtividadesHoje recordamos para os que viveram e estamos tendo a oportunidade de

informar aos que não participaram do momento da elaboração da nova Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, sobre como é difícil provocarmos mu-danças, mesmo quando elas são necessárias.

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1. Relacione os aspectos que você considerou importantes na luta do Fórum Nacional em Defesa da Escola Pública e na LDB.

2. Liste algumas estratégias que poderiam ter sido utilizadas pelo movimento (Fórum Nacional em Defesa da Escola Pública, na LDB).

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Dicas de estudoUm pouco da história foi revivida nesta aula. Conheça um pouco mais deste

momento histórico-educacional, através de quem esteve presente nestas discus-sões: A Nova LDB da Educação: trajetória, limites e perspectivas, Demerval Saviani, Campinas, São Paulo, Autores Associados, 1999. O livro indicado reconstrói a tra-jetória da lei, colocando em evidência os embates entre as diferentes propostas, os limites do texto aprovado e as perspectivas de superação. Este trabalho ainda contribui para a compreensão objetiva e crítica da nova lei geral que passou a reger a Educação brasileira.

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Suely Pereira da Silva RosaO processo de discussão para a elaboração do projeto de lei que daria

origem à nova Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional durou oito anos, conforme o registro histórico desse processo. Com um tempo tão elástico, e com um Congresso renovável a cada quatro anos, era difícil manter uma discussão dentro de um nível de consenso geral. Foram na verdade três legislaturas, mais o impeachment do Collor, considerando, ainda, que as propostas começaram a ser apresentadas durante a Assem-bleia Constituinte. Estas mudanças, por ocasião do processo de votação, trouxe novos atores que apresentaram uma correlação de forças políticas desfavoráveis às propostas elaboradas pelas diferentes entidades ligadas ao magistério, o que se traduziu em um corpo de lei que não contemplou inúmeras propostas levadas pelo Fórum Nacional em Defesa da Escola Pú-blica na LDB.

A retirada de alguns pontos considerados fundamentais foi a causa do descontentamento do grupo, já que muitos assuntos ficaram sem defini-ção, permitindo o uso de interpretações do grupo, quase sempre equivo-cadas e de justificativa para ações governamentais que nem sempre en-contram eco no texto da lei, e nesses casos, na intenção da lei.

Apesar da correlação das forças políticas não ter permitido mudanças que ultrapassassem o tradicional e que apontassem para uma gestão de-mocrática de escola, abrindo seus espaços para a participação de todos os envolvidos no processo educacional, o momento é de grande relevância para a Educação brasileira, que conseguiu promover ações que levaram muitos a discutirem a escola brasileira. Foi um marco histórico, se levar-mos em conta o grande número de entidades sindicais, acadêmicas e so-ciais que compuseram os diversos fóruns de discussão.

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Reservamos uma discussão sobre algumas modificações, lembrando também que a ação do Fórum Nacional não foi totalmente eficaz, mas conseguiu alterar o projeto inicialmente apresentado pelo senador Darcy Ribeiro.

No entanto, precisamos considerar que nossa discussão não tem a preten-são de abranger a totalidade deste debate enquanto proposta aprovada ou não, dada a complexidade de muitas questões, até entre as entidades participantes. Trabalharemos com os consensos não aproveitados.

O que modificou?A partir de nossos pressupostos é possível entendermos por que não po-

demos reduzir a nossa análise a uma posição de busca de perdas e ganhos ou de ranços e avanços, mas estaremos apresentando nosso balanço, levando em conta o contexto de sua elaboração.

As mudanças se corporificam quando a Comissão de Justiça do Senado, na figura do senador Hugo Napoleão, emite parecer de inconstitucionalidade do projeto que vinha da Câmara dos Deputados. Com certeza, mais uma das mano-bras políticas das forças governistas, na medida em que o projeto substitutivo havia passado por todas as comissões daquela Casa, que se constitui de forma idêntica ao do Senado e aprovado sem restrições pelas respectivas Comissões. Há ainda a se considerar que o projeto foi votado na plenária da Câmara e restrições por ressalva foi apresentada, apesar da quantidade de emendas e destaques que o substitutivo teve até chegar à plenária. Só nos resta acreditar em mais uma das manobras ardilosas criadas para impedir a apreciação do projeto aprovado na Câmara dos Deputados no Senado. Inconstitucional deveria ter sido considera-da a indicação para a relatoria do Projeto Darcy Ribeiro, o próprio apresentador da proposta. Inconstitucional deveria ter sido a falta de democracia que se deu no Senado quanto à discussão do projeto da senador Darcy Ribeiro que impediu a participação pública durante a tramitação do Projeto.

Analisando o texto da lei, podemos constatar que as modificações acabaram produzindo dubiedades e omissões a fim de escamotear a intervenção centra-lizadora do governo federal. Sob a justificativa de que era preciso ter uma lei “enxuta” como defenderam os seus criadores, acabamos com um documento que necessita de várias regulamentações, promovendo várias resoluções por parte do Conselho Nacional de Educação sem que democraticamente as mesmas sejam discutidas com o professorado.

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Vejamos o caso dos Parâmetros Curriculares Nacionais. No art. 8.º do Título IV a Lei estabelece que “a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios organizarão, em regime de colaboração, seus respectivos sistemas de ensino”, deixando de aproveitar neste artigo e nos subsequentes a redação do Projeto da Câmara que previa uma organização sistêmica mais articulada. No entanto, ao falar no “regime de colaboração”, o parágrafo 1.º deixa claro que

[...] por exercer a coordenação da política nacional de Educação, sendo responsável pela articulação dos diferentes níveis e sistemas, e tendo função normativa, entre outras, pode procurar estabelecer com Estados e Municípios uma relação de subordinação real. ( OLIVEIRA; GONDRA, 1997, p. 69-70)

Por outro lado, o art. 9.º define as incumbências da União e nos subsequen-tes as relativas aos estados e municípios, deixando claro que este último deve “organizar, manter e desenvolver os órgãos e instituições oficiais de seus siste-mas de ensino, integrando-os às políticas e planos educacionais da União e dos Estados”, cabendo à União a elaboração da política nacional de Educação e das competências e diretrizes para a Educação Básica, explicitando-se assegurar a formação básica comum. Diante do exposto percebe-se a preocupação em ga-rantir o controle da União sobre a implantação dos chamados “Parâmetros Cur-riculares Nacionais” elaborados sob a coordenação da Secretaria de Educação Básica, aprovado por meio do Parecer 3/97 do Conselho Nacional de Educação, com total ausência de consulta ao professorado – público-alvo.

O anunciado regime de cooperação se apresenta como acessório da Lei e o papel do professorado que deveria ser de participação vira de “espectador passivo”. Embora o parecer sobre os Parâmetros Curriculares tenha enfatizado que eles não se constituem em uma proposição pedagógica obrigatória, cabem ainda duas indagações:

O processo de avaliação do rendimento escolar referido no art. 9.º, inciso 1. VI da LDB considerará o estabelecido nos PCN?

Por que os PCN foram elaborados antes do Conselho Nacional de Educa-2. ção emitir parecer sobre as Diretrizes Curriculares Nacionais?

Para a primeira questão, caso seja afirmativa a pergunta, estaremos incons-titucionalizando os PCN como modelo curricular único para o país, caso contrá-rio, entendemos que será efetivamente contribuição aos sistemas e às escolas. Quanto à segunda questão, não temos clareza dos motivos que levaram à apre-sentação dos PCN sem que as Diretrizes Curriculares Nacionais estivessem expli-

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citadas. Acreditamos que tenha sido por excessiva centralização da União sobre os Estados e Municípios.

Esperamos que as equipes pedagógicas dos estados e municípios possam propor a ampliação deste debate e chegarem ao “pluralismo de ideias e de con-cepções pedagógicas” explicitada no art. 3.º, III, da Lei 9.394/96.

Outro ponto que gostaríamos de chamar a atenção diz respeito à estrutura e funcionamento do ensino, considerando que o Título V – Dos Níveis e das Moda-lidades de Educação e Ensino – resgata algumas ideias do Projeto da Câmara em detrimento das propostas do Projeto Darcy Ribeiro. O art. 21 divide a Educação escolar em dois níveis – Educação Básica, formada pela Educação Infantil, Ensino Fundamental, Ensino Médio e Educação Superior. O Projeto Darcy Ribeiro apre-sentava uma concepção diferente de Educação e, portanto, constata-se a ausên-cia do termo Educação Básica.

O art. 22 define as finalidades da Educação Básica com redação equivalente à da Câmara. Por obedecer a um critério diferente quanto aos níveis de Educação, o Projeto Darcy Ribeiro previa: I – Educação Infantil; II – Ensino Fundamental; III – Ensino Médio, dividido em: a) ginásio e b) curso preparatório para o Ensino Su-perior e IV – Ensino Superior. A proposta, ainda, para dar conta dos dois níveis do Ensino Médio, propunha a redução de oito para cinco anos, prejudicando, com certeza, a formação básica do cidadão, considerando que a Educação Básica es-taria dividida em dois ciclos com terminalidade.

O objetivo do Ensino Médio se apresenta como preparação para o Ensino Superior, contrário ao aprovado: etapa final da Educação Básica.

O projeto aprovado também propõe inovações quanto às possibilidades de organização da Educação Básica: séries anuais, períodos semestrais, ciclos, alternância regular de períodos de estudo, grupos não-seriados e outras (art. 23), contrariando a proposta de Darcy Ribeiro que previa a manutenção das séries anuais, períodos semestrais ou outros, a critério do respectivo sistema de ensino.

Fechando este bloco, vale ressaltar que o projeto do senador Darcy Ribeiro exclui a concepção de Educação Infantil, predominando o caráter assistencialis-ta que era contraditório com outros artigos de seu próprio projeto. A Educação Infantil seria Educação escolar, mas não no sistema de ensino.

Muitas outras questões poderíamos estar apontando entre perdas e ganhos apresentados pelo texto aprovado. No entanto, não era de nosso propósito nos

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estender em demasia neste ponto. Resolvemos optar pela estrutura e funciona-mento da Educação Básica e os Parâmetros Curriculares Nacionais por entender-mos que fazem parte direta em nosso cotidiano escolar.

Registramos, ainda neste texto, a manutenção de oito anos para o Ensino Fundamental e o caráter obrigatório, além da gratuidade na escola pública. O Projeto Darcy Ribeiro reduzia esse tempo para quatro ou cinco anos.

Acreditamos que esta comparação poderá ser continuada por cada um de vocês que tiverem interesse em conhecer os principais debates ocorridos duran-te a elaboração e tramitação da Lei 9.394/96.

Assim, a análise até aqui destacada focaliza temas importantes para a nossa categoria profissional, lembrando o alerta que nos é trazido pelo Prof. Pedro Demo:

[...] as insatisfações que a Lei deixou ou manteve, diga-se ainda que toda Lei importante sofre, no Congresso, inevitavelmente sua marca histórica própria, sobretudo a interferência de toda sorte de interesses, muitas vezes pouco “educativos”. (DEMO, 1997, p. 10)

A partir desse pressuposto e conhecendo a composição do Congresso, não poderíamos, mesmo, esperar uma Lei que apontasse para uma abertura demo-crática, com a participação da sociedade.

Impasses e políticas atuaisReforçando os conceitos desta aula, um impasse que tem provocado inúme-

ras discussões nos encontros educacionais é a exacerbação do caráter centrali-zador do governo federal ao retirar do texto aprovado a construção de um Sis-tema Nacional de Educação e criado um Conselho Nacional de Educação (CNE) dividido em duas Câmaras: a de Educação Básica e a de Educação Superior, com “funções normativas e de supervisão e atividade permanente”.

Quanto à gestão dos sistemas e instituições educacionais, prevaleceu a visão de reforçar as prerrogativas centralizadoras e impositivas das chamadas “autori-dades educacionais”, derrotando a concepção de participação da comunidade em todas as instâncias deliberativas e órgãos colegiados, na escolha dos diri-gentes, nos financiamentos, por meio de uma prática transparente dos recursos educacionais.

Outras omissões encontram-se na lista dos impasses criados pelo novo texto da Lei 9.394/96 que vamos abordar neste momento.

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A omissão em relação ao número de alunos/classe, deixando a decisão �para os sistemas de ensino a partir das características regionais e locais, é no mínimo fechar os olhos para os “inúmeros estudos e a prática que comprovam os prejuízos que turmas muito numerosas acarretam para os resultados finais” (VALLE, 1994, p. 17). Nas disposições transitórias este assunto retorna sob a forma de “meta a ser alcançada.” Vale a pena nos lembrarmos que vivemos hoje a discussão do processo de inclusão dos alunos portadores de necessidades educativas especiais, que precisam de atendimento de qualidade e que não é possível fazê-lo com 40 crianças em uma sala de aula.

Na busca de uma Educação Básica mais democrática, o art. 11 possibilita o �estabelecimento de um Sistema Único de Educação Básica, o que exigirá não só a articulação dos setores envolvidos, bem como a ampliação para outros setores da sociedade civil organizada.

Embora a lei incorpore a concepção de Educação Básica, no momento �de determinar recursos não se verificou a ampliação destes e o Ensino Fundamental passa a ter prioridade sobre a Educação Infantil e o En- sino Médio. O Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino Funda-mental e de Valorização do Magistério (Fundef) provoca uma contradição no espírito da LDB, pois exclusivisa recursos apenas para o Ensino Funda-mental. Este fato hoje superado, uma vez que o prazo de funcionamento do Fundef terminou, sendo aprovada a Lei 11.494 que cria o Fundeb, com atendimento a todos os segmentos da Educação Básica.

O art. 67 da nova LDB destina aos sistemas de ensino a valorização dos �profissionais da Educação, assegurada em estatutos e planos de carreira do magistério. Como fazê-lo sem recursos disponíveis? Este artigo con-templa ainda uma antiga reivindicação da categoria: o aperfeiçoamento profissional continuado, inclusive com licenciamento periódico remune-rado para esse fim, tais como a aprovação da lei que garante a educação continuada, com remuneração e licença a cada sete anos. No entanto, al-guns pontos carecem de regulamentação.

O piso salarial profissional, ainda que lembrado, é genericamente tratado �no texto da lei, o que significa que continua distante a sua regulamentação. No entanto, foi assinada a lei que concede piso nacionalmente unificado para os professores. Procure acompanhar a proposta, pois a lei possui regras a serem observadas.

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O texto de lei convoca, em muitas passagens, a participação efetiva dos �profissionais da escola na elaboração do projeto pedagógico nos “perío-dos dedicados ao planejamento, à avaliação e ao desenvolvimento pro-fissional”, art. 13, inciso V, porém sabemos que a questão da carga horária do professor se constitui em grave empecilho e a lei não faz referência “às obrigações paralelas de remuneração e planejamento por parte dos estabelecimentos e sistemas de ensino, de modo a manter respeitados os horários, carga horária e direitos trabalhistas dos docentes”(OLIVEIRA; GONDRA, 1997, p. 79).

Mesmo com os recursos escassos, anunciados sistematicamente, não se �conseguiu garantir a proposta de verbas públicas apenas para as escolas públicas.

Em muitos outros Títulos e Capítulos encontraremos dubiedades, omissões, impasses e obstáculos que deverão tomar conta de nosso interesse com o ob-jetivo de organizarmos discussões e propostas a serem encaminhadas à repre-sentação local do magistério que tem como obrigação defender nossos direitos. Porém, cada um precisa cumprir a sua parte para que o seu sindicato possa assu-mir a representatividade do seu grupo de profissionais.

Essas dubiedades, omissões, impasses ou obstáculos acabam se traduzindo em prejuízos para a Educação. No entanto, dada a correlação de forças, o gover-no necessitava de uma lei que desse conta de seu projeto político, assegurando--lhe o comando das formulações das leis em Educação, bem se aproveita para “redefinir o campo político do Legislativo, no qual circulava o Fórum, movimento invisível para o Executivo” (PINO, 1997, p. 6).

O Projeto do senador Darcy Ribeiro, segundo a Prof.ª Ivany Pino (1997, p. 6), cumpre o papel de ancorar as políticas apresentadas pelo Executivo, segundo a urgência da matéria, mediante medidas provisórias ou projetos de lei.

Estes fatos nos permitem compreender por que o substitutivo da Câmara sofria críticas de detalhista. Quanto mais genérica fosse, mais necessitaria de medidas provisórias, emendas constitucionais, projetos de leis e resoluções do próprio Ministério da Educação, permitindo, com isso, a reordenação da Lei de Diretrizes e Bases, por meio de tais mecanismos. Neste sentido, justificam-se a quantidade de resoluções baixadas pelo Conselho Nacional de Educação, os Projetos de Lei aprovados e os que se encontram em tramitação na Câmara dos Deputados.

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Sob este prisma, a LDB assume um papel legitimador das reformas que estão sendo apresentadas e aprovadas, não só por iniciativa do Ministério da Educa-ção como de alguns Estados e Municípios.

É verdade que esta Lei de Diretrizes e Bases não representa o sonho dos edu-cadores, no entanto, ela avançou no que foi possível, tais como na questão da estrutura e funcionamento da Educação, englobar em uma única lei toda a legis-lação de ensino, reconhecer a Educação Infantil enquanto sistema de Educação, permitir a organização do ensino de acordo com as necessidades de cada loca-lidade, dentre outros.

Finalizando nossa conversaNão podemos negar a importância do Fórum Nacional em Defesa da

Escola Pública na LDB enquanto interlocutor sobre a teoria e a prática da Edu-cação, considerando conforme já explicitado, o conjunto de entidades que o legitimavam. Esse fórum mobilizou educadores de cada canto deste país. Pro-moveu em nível nacional, estadual e municipal vários seminários, palestras, encontros, debates e congressos a fim de se buscar coletivizar as propostas de cada entidade representativa. As consensuais eram imediatamente incorporadas à pauta de reivindicações e as divergentes eram colocadas em processo de discus-são e votação. Em vários Estados e Municípios foram criados fóruns locais a partir de entidades organizadas, que contribuíram não só nas discussões, mas princi-palmente nos momentos de definições políticas e/ou de diretrizes de conteúdo, mobilizando seus grupos que partiam de cada Estado, em caravana, para Brasília, o que fazia aumentar e consolidar a representatividade do fórum. Estas caravanas se compunham de pesquisadores de vários Estados, de universidades, de centros de pesquisa, de técnicos de Secretarias de Educação, professores de escola básica e ensino técnico, ligados aos Fóruns Estaduais ou entidades sindicais.

A estes atores coletivos cabia “o papel de assegurar as políticas globais e ar-ticuladas como moderadoras das desigualdades econômicas e sociais e de res-ponder ao aumento das demandas no contexto de uma maior divisão do traba-lho e expansão do mercado, na sociedade de massas” (PINO, 1997, p. 6).

Vimos como as forças conservadoras se organizaram para traçar estratégias que impedissem a aprovação no Senado do Substitutivo Cid Sabóia, a fim de

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incluir o projeto do senador Darcy Ribeiro, elaborado ainda no Governo Collor, com a participação do Ministério de Educação, conforme relata a Prof.ª Ivany Pino (1997, p. 7).

Reforçando esta avaliação, cabe mencionar a visão do Prof° Pedro Demo, que define com muita propriedade a relação LDB e o Congresso Nacional:

[...] a LDB é uma “pesada”, que envolve muitos interesses orçamentários e interfere em instituições públicas e privadas de grande relevância nacional como escolas e universidades. Não teria qualquer condição de passar com um texto “avançado”, no sentido de ser a “lei dos sonhos do educador brasileiro”. Como o Congresso Nacional é sobretudo um “pesadelo”, as leis importantes não podem deixar de sair com sua cara, e são, pelo menos em parte, também um pesadelo. Lei realmente “boa” só pode provir de um Congresso “bom”. Não é, obviamente, nosso caso, pelo menos por enquanto. (DEMO, 1997, p. 10)

É importante registrarmos a necessidade da sociedade civil ocupar seu as-sento na condução das políticas públicas em nosso país se queremos a demo-cratização das relações sociais. Não podemos permitir a acomodação e a manu-tenção das linhas conservadoras nas questões educacionais. É um trabalho lento que precisa de todos nós!

Como diz a Prof.ª Bertha Valle (1996) “não basta o texto da lei, há de se partir para uma ação político-social, a fim de sairmos das boas intenções para concre-tizarmos as ações”, e isso só acontecerá a partir da mobilização da sociedade civil como um todo.

Se as metas forem colocadas – reduzir o analfabetismo, universalizar a Edu-cação Básica e promover o processo de inclusão, com efetiva qualidade – esta-remos caminhando rumo a um novo horizonte educacional, que dependerá da participação de cada um de nós, no sentido de fazer nossos governantes apre-sentarem ações concretas para cada uma das metas anunciadas.

As modificações aqui apresentadas nos indicam as profundas reformas que acontecem na Educação brasileira e que não podem deixar de ser acompanha-das atentamente pelos educadores.

Procure fazer parte destas discussões, conhecendo em sua cidade as organi-zações que fazem parte do Fórum Nacional de Educação, apresentando suges-tões, entendendo que uma das dificuldades para os problemas educacionais é a descontinuidade das políticas públicas para a área.

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Texto complementar

Por uma educação democrática(Diretoria da APEOESP, 2008)

Nenhuma lei é capaz, por si só, de operar transformações profundas, por mais avançada

que seja, nem tampouco de retardar, também por si só, o ritmo de progresso da sociedade,

por mais retrógrada que seja.

Otaíza Romanelli

Consideramos, no início desta exposição, a dificuldade de fazermos um balanço da nova LDB sem levarmos em conta o contexto de sua elaboração para que a análise não se reduzisse a uma posição esquemática e polarizada do ganhou/perdeu. Desta forma, abordaremos alguns pontos mais impor-tantes da Lei, iniciando pelos seguintes artigos, recuperados da lei anterior-mente aprovada na Câmara dos Deputados:

Por pressão do Fórum Nacional e dos partidos comprometidos com os interesses populares, o artigo 4.°, que trata do direito à Educação e do dever de educar, acabou recebendo uma redação que garante, embora não tão plenamente como seria desejável, itens importantes como: a oferta de educação escolar para jovens e adultos adequada às necessidades e dispo-nibilidades; programas de atendimento ao educando; e padrões mínimos de qualidade do ensino, definidos como variedade e quantidade mínimas, por alunos, de insumos indispensáveis ao desenvolvimento do processo de ensino-aprendizagem.

O artigo 11, que trata da organização da Educação Nacional, prevê a pos-sibilidade dos municípios optarem por se integrar ao sistema estadual de ensino ou de compor com ele um sistema único de ensino ou de compor com ele um sistema único de Educação Básica. No atual contexto, em que a municipalização do Ensino Fundamental está em discussão, a possibilidade de lutarmos pela constituição de um sistema único de Educação Básica pode se tornar um forte eixo de mobilização da sociedade na perspectiva da ga-rantia de escola pública para todos.

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Outro ponto recuperado é o artigo 23 do capítulo que trata da organi-zação da Educação Básica. O projeto inicial do senador Darcy Ribeiro previa a organização da Educação Básica dividida em ciclos com terminalidade. O texto atual deixa livre esta organização. Estabelece as formas possíveis de organização da Educação Básica: séries anuais, períodos semestrais, ciclos, alternância regular de períodos de estudo, grupos não seriados e outras.

No artigo 26, que trata da estruturação curricular da Educação Básica, observa-se uma alteração do teor do Projeto Darcy Ribeiro sobre o ensino de Arte e Educação Física, colocando-as como componentes curriculares obrigatórios. Neste artigo, recupera também os pontos do texto da Câmara sobre: a obrigatoriedade do estudo da Língua Portuguesa e da Matemática, o conhecimento do mundo físico e natural e da realidade social e política e o ensino de, pelo menos, uma Língua Estrangeira Moderna, a partir da 5.ª série.

O artigo 32 determina a duração mínima de 8 anos para o Ensino Funda-mental (o projeto a reduzia para 4 ou 5 anos), além de assegurar seu caráter obrigatório e a gratuidade na escola pública.

O artigo 67, no ponto que trata da formação dos professores, assegura o aperfeiçoamento profissional continuado, inclusive com “licenciamento pe-riódico remunerado para esse fim”. Observa-se a incorporação do projeto da Câmara.

O artigo 69 assume capital importância para a garantia da manutenção e desenvolvimento do Ensino Público, pois estabelece os percentuais mínimos para aplicação (União: 18%, Estados, DF e municípios: 25% ou o que constar nas constituições estaduais ou leis orgânicas). Além disso, prevê o repasse, a cada 10 dias, dos recursos vinculados à Educação. Ou seja, a cada dez dias o poder executivo, em todas as esferas, sob pena de responsabilidade civil e criminal, deverá repassar, no mínimo 25% da arrecadação efetuada e das transferências recebidas às respectivas secretarias de Educação. O artigo 70 especifica as despesas consideradas como manutenção e desenvolvimento do ensino e o artigo 71 relaciona as despesas que não devem ser incluídas como tal.

Outras questões também foram recuperadas, mas sabemos da limitação de sua implantação. É o caso da composição da Educação Básica, assim de-

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finida no artigo 21: “A Educação escolar compõe-se de: I - Educação básica formada pela educação infantil, ensino fundamental e médio; [...]”. Verifica--se neste dispositivo a incorporação da concepção de Educação Básica re-querida pelas entidades da Educação. No entanto, no momento de destinar recursos para a manutenção da Educação Básica, na verdade, não se verifica a ampliação destes e o Ensino Fundamental passa a ser prioritário, em detri-mento da Educação Infantil e do Ensino Médio.

A Lei 9.424/96, que regulamentou o “Fundo de Manutenção e Desenvolvi-mento do Ensino Fundamental e Valorização do Magistério” confirma nosso destaque anterior. Ela está em contradição com o espírito da LDB, neste ponto, pois trabalha com a ideia de desmembramento da Educação Básica e exclusivisa a atenção do governo e da sociedade para com o Ensino Funda-mental. [...]

AtividadesNesta aula você pôde conhecer um pouco mais das ardilosas estratégias que

acontecem no Congresso Nacional e como as omissões e as dubiedades dificul-tam o avanço da Educação brasileira.

1. Houve várias ocorrências, conforme relatadas no texto, deixando o Fórum em Defesa da Escola Pública na LDB desgastado; no entanto, um fator pro-vocou um grande descontentamento no grupo. Após identificá-lo no texto, justifique o ocorrido.

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2. Um dos pontos a ser destacado na proposta da sociedade civil organiza-da era o de participação nas definições das políticas públicas da educação. Aponte ações onde se percebe a não-participação da sociedade nos rumos educacionais.

3. O artigo 22 da LDB ao definir as finalidades da Educação Básica apontou para avanços na organização desse segmento educacional. Teça comentários so-bre estas possibilidades organizativas.

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4. Identifique os pontos positivos da Lei 9.394/96 e os correlacione com o coti-diano de seu trabalho profissional.

Dicas de estudoAlgumas alterações são de fundamental importância para o desenvolvimen-

to do ensino, como é o caso dos recursos financeiros. Aprovada a Lei 11.494, em 20/06/2007 que cria o Fundeb em substituição ao Fundef que deixa de exis-tir, considerando que seu prazo de funcionamento era de 10 anos e, portanto, acabou. Assim sendo, sugerimos a leitura da seguinte página na internet: <www.planalto.gov.br/Ccivil_03/Ato2007-2010/2007/Lei/L11494.htm>, que traz aspec-tos sobre essa nova lei, que além do prazo, traz outras observações que precisam ser acompanhadas.

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José Luiz Cordeiro AntunesUma política nacional de Educação é mais abrangente do que a legislação proposta

para organizar a área. Realiza-se também pelo planejamento educacional e financiamen-

to de programas governamentais, em suas três esferas, bem como por uma série de ações

não-governamentais que se propagam, com informalidade, pelos meios de comunicação.

Realiza-se, para além desses espaços, por meio da difusão de seu ideário pelas publica-

ções oficiais e oficiosas. A reforma do ano de 1990 também envolveu e comprometeu

intelectuais em comissões de especialistas, análises de parâmetros curriculares, elabora-

ção de referenciais e pareceres [...]

(SHIROMA et al., 2000, p. 87).

Esta unidade tem por objetivo discutir como ficou organizada e como funciona a Educação Básica no Brasil, a partir de um extenso corolário de-senvolvido na metade da década de 1990 e que atravessa o século atual. Convém ressaltar que o programa de reformas educativas do governo fe-deral (principais políticas e ações), não se dá de forma tranquila, no qual a resistência dos movimentos sociais organizados e as negociações possí-veis dão concretude às propostas para o campo da Educação.

Não é demais pontuar que tivemos e temos sempre na história da or-ganização social e política de nosso país e, especificamente, para as ques-tões do campo da Educação escolar, projetos em disputa de grupos com interesses variados. É no embate, tensionado permanentemente, que o campo da Educação vem se organizando.

Para a construção de um outro projeto educativo e de uma nova socie-dade, em outras relações, cabe, principalmente, aos trabalhadores (as) da Educação, dada a especificidade de sua função, fazer a leitura e a neces- sária análise do projeto pedagógico em curso (projeto neoliberal), de modo a, tomando por base as circunstâncias concretas, participarem da organização coletiva em busca da construção de alternativas que articu-lem a Educação aos demais processos de desenvolvimento e consolida-ção de relações sociais verdadeiramente democráticas.

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É claro que isso passa, por um lado, pela formação inicial e continuada destes trabalhadores, por outro, pela prática política e pedagógica nos locais de traba-lho, pois será dessa forma que participaremos da construção da escola pública de qualidade socialmente referenciada.

Para isso, é bom lembrar as diferentes normatizações, políticas e ações coti-dianas dos diferentes sujeitos educativos da nossa história. Trabalhar com dados históricos é importante, pois, ao revisitarmos nosso passado, podemos compre-ender com propriedade o nosso presente para poder intervir e construir melhor o nosso futuro.

Um pouco de históriaComo nos lembra o Fórum Nacional em Defesa da Escola Pública, “a histó-

ria do Brasil tem sido uma história de perdas, de exclusões e de manutenção de [determinados] privilégios de minorias” (PNE – Plano Nacional de Educação / Proposta da Sociedade Brasileira, p. 71).

Assim é que a defesa e luta por uma Educação pública, laica, popular, de-mocrática e de qualidade socialmente referenciada não é recente na história da humanidade, tanto no plano internacional como no nacional. Entendida como direito de todos e dever do Estado, vem mobilizando muitos setores da socieda-de para a sua concretude.

É a partir das transformações ocorridas nas relações sociais e no mundo do trabalho que a questão educativa escolar vem sendo alvo das atenções de muitos e na atualidade diversos são os desafios postos para a sociedade como um todo, mas especialmente para os profissionais da Educação – um dos sujei-tos concretos que constroem a escola.

Os diagnósticos apresentados por diferentes setores/atores da sociedade re-gistram os grandes déficits e expressam a condição subalterna da Educação na sociedade brasileira. Estes déficits se ampliam devido às grandes reformas pro-postas na década de 1990, muitas delas patrocinadas/incentivadas pelas agên-cias internacionais e organismos multilaterais, tais como: o Banco Mundial (BID), o Banco Interamericano de Desenvolvimento (BIRD), o Fundo Monetário Inter-nacional (FMI), a Organização Mundial do Comércio (OMC) e a Comissão Eco-nômica para a América Latina (CEPAL). Representando os interesses dos “arau-tos do capital internacional e nacional”, colocam a Educação como mercadoria com função meramente econômica, ou seja, a formação de cidadãos produti-

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vos, pois as novas bases materiais de produção trazem profundas implicações para o campo educativo, uma vez que o estágio de desenvolvimento das forças produtivas gesta um projeto pedagógico que comporte as suas demandas de formação de intelectuais, tanto dirigentes quanto trabalhadores, fazendo com que ambos passem por um processo de escolarização e consequentemente de formação com uma intenção explícita, ou seja, exige-se um novo trabalhador para responder às necessidades do capital.

As reformas/modelos em todo continente americano foram/são implemen-tadas de modo autoritário, tendo como eixos norteadores a privatização, o indi-vidualismo, a produtividade. Esta concepção mercadológica desresponsabiliza o Estado de sua função provedora – lema do Estado Mínimo1, entretanto, fortalece a sua função centralizadora e normatizadora. Deixa de fora a participação e o controle social. Percebe-se, dessa maneira, a posição neoliberal do governo da época, ainda que não claramente assumida – primeira gestão do presidente Fer-nando Henrique Cardoso – FHC (GROSSI, 1999). Os caminhos da Educação hoje ainda estão pautados pelo modelo neoliberal.

É um modelo que privilegia o mercado e as necessidades do capital, no qual os sujeitos encontram-se aprisionados e reproduzem as relações sociais e que dissemina valores como competitividade e individualidade, aligeiramento e ra-pidez na qualificação profissional, fragmentação, espaços diferenciados de for-mação, e uma formação voltada para as competências e resoluções de proble-mas que auxiliam no processo de exclusão deflagrado em nossa sociedade.

Entretanto, é bom esclarecer que há um outro projeto gestado pelos diferen-tes setores da sociedade civil que se contrapõe aos interesses do capital. Este projeto é gestado pelas próprias contradições oriundas do modelo econômico- -político adotado na atualidade. Isso implica dizer que há dois projetos ou mo-delos de construção de sociedade, de Educação, de escola, de formação de tra-balhadores (as), e por assim dizer de cidadãos.

Neste projeto, a gestão se faz de forma coletiva, encontrando-se a serviço dos trabalhadores, na qual valores como solidariedade, democracia, coletivida-de, liberdade, pluralismo de ideias, emancipação dos cidadãos e da cidadania, buscam ser concretizados. Assim, também a Educação/escola é tida como direi-to do cidadão, enfatizando a Educação Básica, que no seu processo de constru-

1 Na Constituição de 1988, no seu art. 205 diz: a Educação, direito de todos e dever do Estado e da família, será promovida e incentivada com a colaboração da sociedade, visando ao pleno desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o exercício de cidadania e sua qualificação para o trabalho. Já na LDB 9.394/96 há uma inversão, pois em seu art. 2 diz: a Educação, dever da família e do Estado, inspirada nos princípios de liberdade e nos ideais de solidariedade humana, tem por finalidade o pleno desenvolvimento do educando, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho. Percebe-se, assim, a posição neoliberal do governo da época, ainda que não claramente assumida (a gestão do presidente Fernando Henrique Cardoso – FHC).

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ção ajuda na desconstrução/compreensão/interpretação da realidade em que estão imersos os diferentes sujeitos para a construção de uma sociedade mais justa, igualitária, fraterna e democrática.

A concepção de Educação BásicaO conceito de Educação Básica começou a ser formulado com o início da

construção do projeto da LDB na Câmara Federal (Projeto Jorge Hage) e com o debate desencadeado pelo processo constituinte nos anos 1980. A LDB 9.394/96 absorveu o conceito, que em verdade faz parte de um projeto político-educati-vo, na medida em que não é um conceito isolado, mas parte de um projeto base-ado em uma outra concepção de Educação, construído e discutido por inúmeros intelectuais, e os movimentos sociais organizados, para a concretização da for-mação de cidadãos críticos, emancipados, transformadores de sua realidade.

O Projeto de LDB da Sociedade Civil, abortado no Congresso Nacional, face às injunções políticas realizadas pelo senador Darcy Ribeiro e o MEC e a extrema concordância, dadas as diferentes e muitas emendas; trazia inicialmente como pressupostos a discussão do trabalho como princípio educativo, a concepção de formação politécnica e de escola unitária2, que difere, em muito, da LDB aprova-da em 1996.

Assim, ainda que encampada no art. 21 da LDB 9.394/96: a Educação escolar compõe-se de: Educação Básica, formada pela Educação Infantil, Ensino Funda-mental e Ensino Médio; a primeira fragmentação/desarticulação que se percebe refere-se à Educação para crianças de 0 a 6 anos (Educação Infantil = creche de 0 a 3 anos e pré-escola de 4 a 6 anos)3 e ao Ensino Médio, na medida em que, para este nível de ensino, fica demarcado a histórica dicotomia/dualidade estrutural entre Formação Geral, Ensino Técnico e Educação Profissional (Decreto 2.208, de 17 de abril de 1997).

A segunda fragmentação/desarticulação diz respeito às próprias modalida-des que aparecem, ora no corpo da lei, ora como disposições gerais ou tran-sitórias. Referimo-nos às modalidades de Educação de Jovens e Adultos (arts. 37 e 38), Educação Profissional (arts. 39 a 42), Educação Indígena (arts. 78 e 79), Educação a Distância (arts. 80 e in ciso III do art. 87), Educação da População Rural

2 NOGUEIRA Maria Alice. Educação, Saber e Produção em Marx e Engels. São Paulo: Cortez, 1990 e NOSELLA, Paolo. A Escola de Gramsci. Porto Alegre: Artes Médicas, 1992; sistematizam as discussões/propostas/concepção de Educação apresentadas por Marx, Engels e incorporado/refletido por Gramsci. 3 O parecer da ANPEd do Grupo de Trabalho Educação de 0 a 6 anos, sobre o documento Referencial Curricular Nacional para a Educação Infantil apresenta uma série de críticas.

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(art. 28), Educação Especial (art. 58 a 60), e mais recentemente a Educação de afro-descendentes/afro-brasileiros (Lei 10.639/03, de 9/1/2003, que inclui no cur-rículo oficial da rede de ensino a obrigatoriedade da temática “história e cultura afro-brasileira – arts. 26 A, 79 A e 79 B”); modalidades estas que atravessam toda a Educação Básica, mas que por serem tratadas na LDB de forma compartimen-talizada, não são consideradas e não se reconhece a riqueza dos possíveis proje-tos e processos em relação à concepção de Educação Básica; como também as diferenças encontradas nos sujeitos específicos presentes nas modalidades, haja vista a distância em que são colocados os considerados “outros”.

A terceira fragmentação que encontramos na Educação Básica está em seu caráter de integralidade, dado que não vem sendo tratado pelas iniciativas go-vernamentais, no que tange ao financiamento e inclusão dentro dos respectivos sistemas de ensino (federal, estadual ou municipal). O que se percebe é a ausên-cia de inversão pelo Estado, ainda que tenhamos alguns programas construídos por meio de parcerias e por diferentes órgãos do poder executivo. Entretanto, verificamos o enorme controle do Estado Mínimo como órgão provedor, mas Estado Máximo quanto às medidas centralizadas e centralizadoras4. Por exem-plo, em seu art. 4, somente o Ensino Fundamental é obrigatório e gratuito, in-cluindo aqueles que não tiveram acesso na idade própria. No tocante ao Ensino Médio, fala-se em progressiva extensão da obrigatoriedade e gratuidade. Sobre a Educação Infantil, pelo atendimento gratuito em creches e pré-escolas para as crianças de 0 a 6 anos de idade, não fica claro quem será o responsável.

Em seu art. 11, no inciso V, a lei aponta que os Municípios incumbir-se-ão de oferecer a Educação Infantil, tendo de priorizar o Ensino Fundamental e só sendo permitida a atuação em outros níveis após o atendimento das necessidades de sua área de competência e se os recursos estiverem acima dos percentuais míni-mos vinculados pela Constituição Federal à manutenção e desenvolvimento do ensino. Na lei ainda é caracterizada a finalidade da Educação Infantil (art. 29), o oferecimento (art. 30), a avaliação (art. 31) e a integração ao respectivo sistema de ensino (art. 89, das disposições transitórias). Entretanto, a Educação Infantil e o Ensino Médio são os “patinhos feios”, que dependem sempre da vontade po-lítica do poder executivo e da compreensão que este possua em relação a estes níveis de ensino para o desenvolvimento integral do educando. Ainda para estes níveis de ensino que ficam de fora, em seu inciso IV do art. 9 demarca que, a União deve estabelecer, em colaboração com os Estados, o Distrito Federal e os

4 Destacamos aqui os Parâmetros Curriculares Nacionais, as Diretrizes Curriculares Nacionais, os Referenciais Curriculares Nacionais, as intervenções de natureza avaliativas – Saeb, Enem, ENCCEJA etc.

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Municípios, competências e diretrizes5 que nortearão os currículos e seus conte-údos mínimos6, de modo a assegurar formação básica comum.

Como sinaliza o PNE – Proposta da Sociedade Brasileira (2002, p. 101-102),

[...] as políticas de gestão e financiamento da Educação, assim como os programas educacionais fragmentados e seletivos, que não consideram “a formação integral do indivíduo”, são exemplos claros desta desarticulação. Está ameaçada, portanto, por força das medidas governamentais, na concepção de Educação Básica necessária para dar respostas à dívida social com a população brasileira e preparar o aluno [cidadão] da escola pública para as novas exigências sociais, formando-o para a inserção consciente no mundo do trabalho [na vida social e política do país] e para o exercício de cidadania.

A organização curricular da Educação Básica: a discussão da formação básica comum/forma-ção comum/base nacional comum7

A LDB reconhece os diferentes espaços de formação humana. Em seu art. 1.°, “a Educação abrange os processos formativos que se desenvolvem na vida fami-liar, na convivência humana, no trabalho, nas instituições de ensino e pesquisa, nos movimentos sociais e organizações da sociedade civil e nas manifestações culturais”. Várias são as passagens que, em uma primeira leitura, poderíamos dizer o quanto ela é inovadora:

[...] poderão organizar-se classes ou turmas, com alunos de séries distintas, com níveis equivalentes de adiantamento na matéria, para o ensino de línguas estrangeiras, artes, ou outros componentes curriculares. (art. 24, IV)

[...] aproveitamento de estudos concluídos com êxito. (art. 24, V, “d”)

Os sistemas de ensino assegurarão gratuitamente aos jovens e aos adultos, que não puderam efetuar os estudos na idade regular, oportunidades educacionais apropriadas, consideradas as características do alunado, seus interesses, condições de vida e de trabalho, mediante cursos e exames. (§ 1.° do art. 37)

5 Diretrizes Curriculares Nacionais são o conjunto de definições doutrinárias sobre princípios, fundamentos e procedimentos na Educação Básica expressas pela Câmara de Educação Básica do Conselho Nacional de Educação, que orientarão/orientam as escolas brasileiras do sistema de ensino, com determinada perspectiva, na organização, na articulação, no desenvolvimento e na avaliação de suas propostas pedagógicas.6 Pareceres e Resoluções são criados para estes níveis de ensino: Educação Infantil – Parecer CEB 022/98, de 17 de dezembro de 1998, que institui as Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação Infantil, Parecer CEB 002/99, de 29 de janeiro de 1999, que institui o Referencial Curricular Nacional para a Educação Infantil; Ensino Fundamental – Os Parâmetros Curriculares Nacionais de 1.ª a 4.ª séries (1997) e 5.ª a 8.ª séries (1998), Parecer CEB 004/98, de 29 de janeiro de 1998, que estabelece as Diretrizes Curriculares Nacionais para o Ensino Fundamental e Resolução CEB 002/1998, de 7 de abril de 1998, que institui as Diretrizes Curriculares Nacionais para o Ensino Fundamental; Ensino Médio – Parecer CEB 015/98, de 1 de junho de 1998, que define Diretrizes Curriculares Nacionais para o Ensino Médio e Resolução CEB 003/1998, de 26 de junho de 1998, que institui Diretrizes Curriculares Nacionais para o Ensino Médio.7 Fizemos questão de apresentar os três termos, pois são assim que estão expressos na LDB, em diferentes momentos e artigos, principalmente no que toca à questão curricular. Em sua essência apresentam o mesmo significado; ou seja, vinculam-se aos conteúdos mínimos necessários à forma-ção em todo território nacional e a um conjunto de conhecimentos organizados na perspectiva hierarquizada e disciplinária.

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O Poder Público viabilizará e estimulará o acesso e a permanência do trabalhador na escola, mediante ações integradas e complementares entre si. (§ 2.° do art. 37)

O conhecimento adquirido na Educação profissional, inclusive no trabalho, poderá ser objeto de avaliação, reconhecimento e certificação para prosseguimento ou conclusão de estudos. (art. 41)

Para esta primeira leitura apressada é importante refletirmos. Como aborda Alves (1997), é importante que pensemos sobre as múltiplas discussões sobre a diversidade cultural/diferenças culturais, a formação comum, por meio de uma base nacional comum e parte diversificada, a concepção do próprio processo de construção de conhecimento no movimento de formação humana, como as próprias possibilidades de organizações diferenciadas de currículo. Segundo a autora, sobre as organizações diferenciadas,

[...] foram incorporadas de maneira variada e, algumas vezes, nada coerente. Ainda de maneira inicial, se pode afirmar que elas aí estão presentes como realidades que não se pode ignorar mas para qual não se encontra uma solução verdadeiramente diferente. Assim é que na lei estão presentes: “as comunidades indígenas”, “as opções religiosas”; “o ensino e a Educação”, em suas variedades; as peculiaridades da vida rural e de cada região etc. No entanto, falta coerência em muitas medidas propostas. (ALVES, 1997, p. 5)

É importante, então, chamarmos a atenção para a presente flexibilidade pro-posta nas organizações diferenciadas do currículo, pois elas não estão desarti-culadas e não se desvinculam das relações de poder e da necessidade que tem o poder político via seu projeto político-pedagógico de Educação, de continuar mascarando a realidade, e de tentar imprimir determinado processo de marca-gem nos sujeitos individuais e coletivos, em muitos dos casos, descaracterizando as propostas reais destes sujeitos, que são construídas coletivamente, resultado de processos variados e de identidades distintas.

Assim, o processo de marcagem pode passar tanto pela destinação de verbas/ financiamento para os níveis e modalidades presentes na Educação Básica como também inculcando determinados valores, um tipo de formação profissional aligei-rada para o mercado globalizado, trabalhando com a lógica do próprio mercado, restringindo toda a riqueza possível na formação/construção do cidadão pleno.

A própria proposta da formação comum por meio de uma Base Nacional Comum8 = Núcleo Comum (centralizada pelo Estado Nacional) e uma Parte Di-versificada9 (para complementar a formação, “respeitando as diversidades cultu-

8 Refere-se ao conjunto de conteúdos mínimos das áreas de conhecimentos, representando as “noções e conceitos essenciais sobre fenômenos, processos, sistemas e operações, que contribuem para a constituição de saberes, conhecimentos, valores e práticas sociais. Por sua dimensão obrigatória dos currículos nacionais – certamente âmbito privilegiado da avaliação nacional do rendimento escolar – a Base Nacional Comum deve preponderar substancialmente sobre a dimensão diversificada” (Diretrizes Curriculares Nacionais para o Ensino Fundamental, 1998).9 Envolve os conteúdos complementares, escolhidos por cada sistema de ensino e estabelecimentos escolares, integrados à Base Nacional Comum, de acordo com as características regionais e locais da sociedade, da cultura, da economia e da clientela (art. 26 da LDB).

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rais regionais e locais” , mas mantendo os ditames do Estado centralizador, por exemplo, a introdução de uma língua moderna; a serem organizadas pelos siste-mas de ensino intermediários – Estados e Municípios) não se afasta da proposta que encontrávamos na última Lei da Educação, da época da Ditadura Militar, a Lei 5.692/71, que propunha a Reforma do Ensino de 1.° e 2.° graus.

Em verdade, o que queremos chamar a atenção, tanto para o setor público quanto para o setor privado, é para aquelas escolas que não prezam pela qualidade e formação do cidadão, na medida em que seu interesse é o lucro puro e simples, ao desenvolverem as práticas educativas/projetos político-pedagógicos de Edu-cação, ao se apropriarem de determinada concepção, agem irresponsavelmente, materializando/imprimindo a lei do Estado Mínimo e a lei do Deus Mercado10.

Como salienta Alves (1997, p. 9), as possíveis inovações apontadas pela Lei Nacional devem ser

[...] acompanhadas por associações da sociedade civil e pelos interessados [alunos, pais e professores], estes aspectos poderão ser de grande proveito [refere-se às organizações diferenciadas do currículo de formação de professores e educando], já que é preciso considerar que a prática tem sido vista pelos estudiosos como elemento fundamental de formação [...] Cabe, então, nos colocarmos a pensar e a fazer experiências que possam ser analisadas e criticadas, sobre a variada gama de possibilidades de unir a prática à teoria e esta à prática, de se incorporar a prática concreta a cursos de formação.

Alves (1997) vai salientar em seu texto os aspectos e as questões propostas para se pensar a formação do educador. Situa principalmente o movimento de educadores que pensa uma Base Comum Nacional – BCN, para a formação dos profissionais da Educação, diferente da Base Nacional Comum – BNC, apre-sentada pelas Diretrizes do CNE para a Educação Básica. A BCN do movimento dos educadores, especificamente construída pela ANFOPE – Associação Nacio-nal pela Formação dos Profissionais da Educação11, é entendida/concebida não como um currículo mínimo ou elenco de disciplinas, e sim como uma concepção básica de formação do educador e a definição de um corpo de conhecimento fundamental, partindo de princípios gerais e eixos norteadores, “o que indica tanto de novidade em conteúdo quanto em método de organização” (ALVES, 1997). O que buscamos recuperar em nossa aula de hoje são os pressupostos teórico-epistemológicos e teórico-metodológicos do movimento para pensar-mos nossa concepção curricular para a Educação Básica. Neste sentido, gostarí-amos de recuperar os conceitos já sinalizados anteriormente, desenvolvidos por Nogueira (com base em Marx e Engels) e Nosella (com base em Gramsci), sobre

10 O uso da expressão “Deus Mercado” tem sido bastante utilizado por alguns profissionais ao se referirem às questões do capitalismo e da relação capital/trabalho. Esta construção adquire um cunho metafórico, já que deseja enfatizar o poder do mercado sobre nós. 11 ANFOPE. Formação dos profissionais da Educação e base comum nacional: construindo um projeto coletivo. Documento Final do XI Encontro Nacional: Florianópolis – SC, 2002.

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a concepção de trabalho como princípio educativo, a formação politécnica e a escola unitária.

Por outro lado, queremos atentar para o retrocesso/conservadorismo presen-te na LDB, nos Parâmetros e Diretrizes Curriculares Nacionais que desconhecem estudos realizados por vários autores que concebem currículo, formação humana e construção de conhecimentos, por exemplo, na perspectiva de construção em rede12. Como nos diz Grossi (1999), “sem incorporação das novas descobertas sobre o aprender”, e diria mais, sem reconhecer os lugares de pertencimentos e da produção das redes de conhecimentos, não é possível pensar um processo de Educação emancipatória para a formação de cidadãos. Assim, é uma outra forma de se pensar e fazer a escola que queremos pública, laica, democrática, popular e com qualidade socialmente referenciada.

Esperamos que as discussões pontuadas em nossa aula possam levá-lo a rea-lizar uma nova inserção no espaço social local, regional e nacional.

Texto complementar

12 OLIVEIRA, Inês Barbosa; ALVES, Nilda (Orgs.). Pesquisa no/do Cotidiano das Escolas – sobre rede de saberes. Rio de Janeiro: DP&A, 2002.

A construção de uma base comum nacional para a formação de profissionais da educação no Brasil

(SCHEIBE; BAZZO, 2008)

IntroduçãoO movimento pela construção de uma base comum nacional para a for-

mação dos profissionais da educação vem ocupando um lugar de destaque na história da educação brasileira das últimas décadas. Esta expressão “base comum nacional” foi cunhada pelo Movimento Nacional de Formação do Educador, no início da década de 1980, num momento em que as forças so-ciais empenhavam-se na luta pela redemocratização do país. Os educadores mobilizaram-se pela reformulação do curso de Pedagogia e das licenciatu-ras, contrapondo-se à imposição de reformas definidas nas instâncias ofi-ciais, tendencialmente desprofissionalizadoras da área.

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Este movimento, que se iniciou em 1978, durante o I Seminário de Edu-cação Brasileira, realizado em Campinas-SP, no contexto das lutas contra o regime militar, criou, pouco depois (1980), o Comitê Nacional Pró-Formação do Educador, cuja evolução originou em 1990 a ANFOPE – Associação Nacio-nal pela Formação dos Profissionais da Educação e, mais ou menos concomi-tantemente, o FORUNDIR – Fórum dos Diretores das Faculdades de Educa-ção das Universidades Públicas Brasileiras. Entre outras entidades que foram sendo criadas no país, no interior da intensa mobilização dos educadores pela melhoria das condições educacionais, a ANFOPE e o FORUNDIR desta-caram-se pelo acompanhamento que deram e continuam dando à constru-ção coletiva de uma base comum nacional para a formação dos profissionais da educação. Ao mesmo tempo, destacam-se pelo seu empenho na luta po-lítica para assegurar os princípios que orientam esta formação, construídos coletivamente.

A presente comunicação contextualiza a problemática da formação ini-cial dos profissionais da educação no interior da sua trajetória e apresenta as orientações, que foram sendo gestadas no interior do movimento, pela construção de uma base comum nacional para esta formação.

A trajetória das políticas públicas de formação docente no paísÉ possível afirmar que a profissionalização dos docentes no Brasil, dado o

descompromisso dos governos com a educação popular, vêm sendo histori-camente derrotada. Estratégias de redução do conhecimento e da ação pe-dagógica, da perda aquisitiva do salário e da criação de escolas de diferentes qualidades para a formação do mesmo profissional, entre outras, têm servi-do para descaracterizar a feição profissional. Já na década de 1930, quando foram criadas as primeiras grandes universidades brasileiras, e quando se es-truturava a carreira profissional docente, foi boicotada a iniciativa de formar todos os professores em nível superior, frustrando, assim, a constituição da área da educação como área acadêmica.

Junto com a instalação das universidades e fazendo parte de seus cursos criaram-se as licenciaturas para a formação dos professores das escolas se-cundárias. Estas licenciaturas foram vinculadas às Faculdades de Filosofia, Ciências e Letras que, ao lado do preparo dos professores, propunham-se

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a formar pesquisadores e especialistas. Essas faculdades foram organizadas em quatro grandes grupos: filosofia, ciências (matemática, geografia, histó-ria, ciências sociais, física, química, história natural), letras (anglo-germânicas e neolatinas) e pedagogia. O Curso de Pedagogia destinava-se a formar o técnico de educação para atuar junto ao sistema educacional, campo profis-sional muito vago quanto às suas funções, e o professor para o Curso Normal, campo não exclusivo dos pedagogos. Esvaziava-se, dessa forma, o signifi-cado do pedagogo “visto não mais como filósofo e/ou político, mas como técnico a serviço do Estado, retirando-se dele a instância mais prestigiada de consagração intelectual” (NUNES, 2000, p. 26).

As leis gerais reguladoras dos cursos de formação docente continuaram reforçando escolas de diferentes qualidades para a formação do mesmo profissional, em termos de critérios diferentes de admissão, duração e currículos.

A Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB) de 1961 deu força à diferença existente.

A LDB 5.692 de 1971 propôs, pela primeira vez, a formação do professor primário em nível universitário nos cursos de licenciatura plena. Esta lei criou um modelo de organização que permitia ao professor acumular, aos poucos, anos de escolaridade e atuar em séries cada vez mais avançadas do sistema escolar. Vinculou os níveis salariais do professor ao seu nível de formação. Ao tornar compulsória a profissionalização no nível médio, porém, transformou o magistério numa das habilitações do ensino de segundo grau, descaracte-rizando as Escolas Normais e os Institutos de Educação.

Essa legislação foi precedida pela Lei 5.540 de 1968, a Lei da Reforma Uni-versitária, que substituiu a antiga Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras pela Faculdade de Educação. Mesmo a instalação destas faculdades, com a finalidade de nelas centralizar a formação dos profissionais da educação, não superou o modelo vigente das licenciaturas. No Curso de Pedagogia, que agora poderia legalmente formar o professor para o ensino de primeiro grau, este magistério, tal como ocorreu ao nível de segundo grau, tornou-se uma habilitação dentre outras.

A Lei de Diretrizes e Bases de 1996 aboliu as licenciaturas de curta dura-ção e os avanços progressivos de escolaridade e exercício profissional. Expli-cita, no entanto, a possibilidade de aproveitamento de estudos e experiên-

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cias anteriores. Manteve a proposta da LDB/71 de formar o profissional da educação em curso superior, tornando-a obrigatória. Instituiu, no entanto, a possibilidade de que professores com o mesmo nível de formação possam ser remunerados de forma diferenciada, de acordo com o nível em que trabalham.

A criação dos Institutos Superiores de Educação surgiu como a grande novidade. Suas atribuições na nova lei são bastante amplas e esvaziadoras das tarefas realizadas pelas Faculdades de Educação.

No sentido de contrapor-se à conjuntura vigente, já no início da década de 1980, o movimento dos educadores firmou o princípio de que a docência constitui a base da identidade profissional de todo educador [...]

A especificidade do trabalho do profissional da educaçãoAs bases materiais que caracterizam a produção (reestruturação produti-

va), a economia (globalização) e a política (neoliberal), neste início de século, trazem profundas implicações para a educação e, consequentemente, para o estabelecimento de uma base comum para a formação dos profissionais da educação, uma vez que cada estágio de desenvolvimento das forças pro-dutivas gesta um projeto pedagógico correspondente às suas demandas de formação.

Aos profissionais da área cabe, portanto, fazer a leitura e a necessária aná-lise do projeto pedagógico em curso, de modo a participar da organização coletiva em busca de alternativas que articulem a educação aos demais pro-cessos de desenvolvimento e consolidação de relações sociais verdadeira-mente democráticas.

O educador não pode ser apenas um distribuidor dos conhecimentos so-cialmente produzidos. Há que se buscar em sua formação exigentemente a condição de produtor de uma ciência pedagógica, cujo objeto serão as concepções e as práticas pedagógicas escolares e não-escolares determina-das pelas relações sociais e produtivas de seu tempo. Para isso é preciso que domine os conteúdos escolares, enquanto “traduções” do conhecimento científico-tecnológico e histórico-crítico, em expressões assimiláveis pelos educandos, considerando as finalidades e estratégias de cada modalidade

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Atividades1. Com base nos Pareceres e Resoluções que instituem as Diretrizes para a Edu-

cação Básica (Educação Infantil, Ensino Fundamental e Ensino Médio), sinali-zados na nossa aula, organize uma síntese apresentando as principais ideias do documento. Trabalhe com os documentos, respeitando a sua prática pe-dagógica atual.

de educação; a escolha das formas metodológicas adequadas a cada con-teúdo, a cada objetivo, a cada educando; a familiaridade com as formas de organização e gestão, escolares e não escolares, institucionalizadas e não institucionalizadas, que os processos pedagógicos assumirão; a capacidade de entender e intervir nas políticas educacionais.

O eixo de formação deste profissional é, portanto, o trabalho pedagógico, escolar e não escolar, que tem na docência, compreendida como ato educa-tivo intencional, o seu fundamento. É a partir dessa compreensão que, no processo de formação de profissional da educação, as demais ciências serão utilizadas no suporte à investigação e à intervenção.

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2. Quais são os questionamentos acerca da Base Nacional Comum: seus princí-pios, objetivos e fundamentos. Que proposta poderíamos contrapor?

3. Descreva como estão vigorando as políticas educacionais na atualidade. E responda qual a relação que estabelecem com a construção do projeto polí-tico-pedagógico?

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Dicas de estudoTemos falado muito nas desarticulações/fragmentações da nova Lei de Dire-

trizes e Bases, para tanto aconselhamos a leitura de alguns artigos da Lei indica-dos para que você possa entender melhor esta desarticulação. São eles: art. 21 (Educação Escolar); art. 26-A, 79-A e 79-B – (obrigatoriedade da temática “histó-ria e cultura afro-brasileira; art. 37 e 38 (Educação de Jovens e Adultos).

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José Luiz Cordeiro Antunes[...] sendo o Brasil um imenso país, com enorme diversidade, exige uma Educação

que, para contribuir na construção da unidade nacional, precisa ser pensada também

ela, na unidade. A questão que se origina desta constatação é a seguinte: é preciso uma

decisão centralizada sobre currículo para garantir a unidade ou esta pode ser obtida em

outro processo? A segunda questão, tão repetida historicamente quanto a anterior, tem a

ver com a autonomia do país frente a modelos alternativos para a Educação pensados do

exterior e o surgimento de propostas alternativas nacionais (regionais e locais). Os dois

processos existem? Como convivem?

(ALVES; VILLARDI, 1997)

A reflexão que buscamos apresentar na nossa aula de hoje sobre “Os Parâmetros Curriculares da Educação Básica” nos faz levantar quatro ques-tões basilares. As duas primeiras, como nos sugere o fragmento do texto de Nilda Alves, diz respeito à questão da centralização das políticas edu-cativas via Estado Nacional, e quando pensada especificamente a ques-tão curricular, incluindo os parâmetros na discussão, recorrem a modelos alternativos exógenos, tendo como premissa básica a necessidade de se garantir a integração nacional e a inserção do país nas questões interna-cionais da contemporaneidade.

Ainda que reconheçamos a necessidade de se pensar a integração na-cional, colocada aqui como preocupação histórica de diferentes governos e entendermos a necessidade da inserção de nosso país nas questões in-ternacionais, perguntamos:

a) Em que medida garantimos a diversidade/pluralismo cultural, re-gional e local, do povo brasileiro em todos os seus aspectos, den-tro das políticas esboçadas por nosso Estado Nacional?

b) No discurso da inserção do país nas questões internacionais, de que forma queremos nos inserir?

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c) De que ordem são as questões internacionais apresentadas, no mundo contemporâneo? O que esta inserção representa para a nossa soberania nacional e liberdade/emancipação do nosso povo?

A terceira questão se refere ao exercício da cidadania de homens e mulheres, de crianças, jovens e adultos, com distintos lugares de pertencimentos (classe social, raça, etnia, credo religioso, convicção política, geração, necessidades edu-cativas especiais etc.), tudo isso, objetivando a construção de uma sociedade democrática, com democracia econômica, política e social, construída coletiva-mente pelos diferentes sujeitos presentes no rincão brasileiro. Assim, voltamos a nos perguntar: como organizar um currículo ou termos um parâmetro curricular nacional para dar conta da finalidade pretendida?

A quarta grande questão se relaciona com as três primeiras na medida em que para se refletir a integração/diversidade, a inserção/soberania, e a cidadania/emancipação, deve-se pensar numa concepção de Educação, cuja base de for-mação conceba a Educação escolar como um direito de todo cidadão e cidadã e que, alicerçada em princípios democráticos, seja um instrumento que possibilite a construção da cidadania plena. Daí indagamos:

a) As bases dos Parâmetros Curriculares Nacionais – PNC, em relação, por exemplo, à formação básica comum, proposta na LDB 9.394/96, respon-de às necessidades/demandas/anseios da cidadania pretendida pelos diferentes setores sociais?

b) Qual é a relação dos parâmetros com as diretrizes estabelecidas para a Educação Infantil, do Ensino Fundamental e do Ensino Médio e/ou se-cundário?

c) O que representam seus fundamentos e objetivos (dos parâmetros e das diretrizes)?

Vale a pena também mencionar que uma leitura atenta de nossa Carta Magna (Constituição do Brasil, promulgada em 1988), da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (Lei 9.394, 20 de dezembro de 1996), dos Planos Nacionais de Educação, as Diretrizes Curriculares da Educação Infantil, do Ensino Fundamental e do Ensino Médio e dos próprios Parâmetros Curriculares Nacionais, que você, como professor da rede municipal, estadual ou da rede privada possui, será um instrumento valioso para a discussão que pretendemos estabelecer, pois o que queremos trazer ao debate é a relação entre Estado – sociedade civil, democra-cia – participação coletiva, cidadania – concepção de Educação, para se pensar/elaborar/implementar qualquer projeto de construção de sociedade.

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Para as indagações apresentadas, vocês também serão participantes respon-sáveis em nossa aula pelas respostas, pois para o processo de Educação inicial ou continuada dos sujeitos, para além da transformação dos comportamentos e inserção na realidade social, a capacidade de pensar, interrogando/questionan-do sempre é de fundamental importância. Este deve ser o verdadeiro sentido da Educação escolar.

Como surgem os Parâmetros Curriculares Nacionais?

Apresentado para todos os professores como um referencial de qualidade para a Educação no Ensino Fundamental do país, segundo o documento é sua função:

[...] orientar e garantir a coerência dos investimentos no sistema educacional, socializando discussões, pesquisas e recomendações, subsidiando a participação de técnicos e professores brasileiros, principalmente daqueles que se encontram mais isolados, com menor contato com a produção pedagógica atual. (BRASIL, PCN, 1997)

Sua origem está relacionada ao processo de construção da reforma educativa geral e, especificamente da Educação Básica, logo após a promulgação da LDB 9.394/96 e dentro do projeto político pensado pelos sujeitos educativos1, para o campo escolar ou dos sistemas educacionais, presentes no contexto internacio-nal e nacional. Isso significa dizer que se encontra inserida dentro do processo de discussão iniciado na década de 1990 do século XX, principalmente por meio da Conferência Mundial de Educação, em Jomtiem – Tailândia (convocada pela Unesco, Unicef, PNUD e Banco Mundial) e da Década da Educação/Plano Dece-nal de Educação (1993-2003), levando-se em consideração a transformação do mundo do trabalho, pela reestruturação produtiva (face às novas tecnologias e novas formas de gestão), a transnacionalização e globalização da economia e a adoção da proposta neoliberal.

Se no contexto brasileiro é pensada uma Política Nacional de Educação para assegurar o “acesso e a permanência” na escola: Diretrizes Curriculares, Programa Acorda Brasil, Tá na hora da escola, Aceleração da Aprendizagem, Guia do Livro Didático – 1.° ao 5.° ano; o bolsa-escola; proposta de financiamento da Educação por meio dos fundos e programas – Fundeb, Fundescola, Renda Mínima e Di-

1 Sujeito educativo é uma categoria construída pela historiadora latino-americana Adriana Puigroós para designar os sujeitos individuais e coletivos que pensam e elaboram as políticas para o campo da Educação. Cabe ressaltar que vários são os sujeitos educativos presentes nas sociedades, o que faz com que tenhamos um processo de tensão e de disputa constantes, na medida em que, muitos deles, apresentam projetos distintos de Educação.

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nheiro Direto na Escola; Programa de Expansão Profissional – PROEP; programas vinculados à adoção de tecnologias de informação e comunicação (TV Escola, Programa Nacional de Informática na Educação, Programa de Apoio à Pesquisa em Educação a Distância – PAPED e Programa de Modernização e Qualificação do Ensino Superior), intervenções de natureza avaliativa – Saeb, Enem, ENCCE-JA, Provão (SHIROMA et al., 2000) para todos os níveis e modalidades da Educa-ção Básica2; os Parâmetros Curriculares Nacionais vão fazer referência específica, como um dos instrumentos previstos para a reforma do ensino fundamental, obedecendo às posições consensuais no que diz respeito às necessidades bá-sicas de aprendizagem para todos os cidadãos, tornando universal a Educação Fundamental e ampliando as oportunidades de aprendizagens para crianças, jovens e adultos.

É importante esclarecer que a Educação Fundamental, para os sujeitos edu-cativos hegemônicos e nos diferentes documentos, presentes no contexto in-ternacional e nacional, é entendida como aquela oferecida dos 6 aos 14 anos, nosso antigo ensino de primeiro grau e que hoje corresponde ao nosso Ensino Fundamental.

No plano do discurso, o Estado é o responsável pela Educação em geral, como provedor e normatizador. Entretanto, percebemos que, em muitos momentos, documentos são negados, enquanto que a universalização da Educação Infantil e do Ensino Médio, elementos integrantes da Educação Básica e que são defendi-dos pelos setores do movimento social organizado na sociedade civil brasileira.

Apesar da visão reducionista que apresenta, ou seja, Educação Fundamental = Ensino Fundamental, não deixa de criar diversos atos normativos, construí-dos pelo poder executivo, para controlar e reformar estes níveis de ensino. Veja, por exemplo, as Diretrizes Curriculares para a Educação Infantil e para o Ensino Médio e respectivos instrumentos de natureza avaliativa.

A Constituição de 1988 (art. 210), afirma a necessidade e a obrigação do Estado elaborar parâmetros claros no campo curricular: “serão fixados conteú-dos mínimos [entendidos como núcleo comum/parâmetros] para o Ensino Fun-damental, de maneira a assegurar formação básica comum e respeito aos valo-res culturais e artísticos, nacionais e re gionais”; assim como a LDB 9.394/96, em seu artigo 22, para a Educação Básica e o Ensino Fundamental como integrante desta, devem assegurar a “formação comum indispensável para o exercício da cidadania e fornecer-lhes meios para progredir no trabalho e em estudos poste-riores”. Mais adiante no caput do art. 26, diz:

2 A Educação Básica, segundo a LDB 9.394/96 é formada pela Educação Infantil, Ensino Fundamental e Médio.

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[...] os currículos do Ensino Fundamental e Médio [não fazem referência à Educação Infantil] devem ter uma base nacional comum a ser complementada, em cada sistema de ensino e estabelecimento escolar, por uma parte diversificada, exigida pelas características regionais e locais da sociedade, da cultura, da economia e da clientela.

Tem-se claro, então, a ideia da formação básica comum, como aquela forma-ção indispensável para o cidadão produtivo, observando-se que a base nacional comum é entendida como currículo mínimo e único para todo território nacio-nal a ser complementada por uma parte diversificada. Essa ideia passa de um lado pela noção de integração nacional, dada a imensidão territorial do nosso país, a ser construída por este currículo mínimo, e por isso é necessário o estabe-lecimento de decisões centralizadas e centralizadoras.

Em verdade, como nos aponta Alves,

[...] a razão destas [decisões centralizadas e centralizadoras] precisa ser buscada, no que se refere ao Brasil, na concepção de “povo” que as classes dominantes possuem há muito tempo, e nas maneiras com que julgam ser necessário lidar com os chamados grupos subalternos ou com o que em certo período se chamava de as minorias, em um processo de inversão de sentido que buscava dividir os grupos sociais majoritários, vendo que estes iniciavam uma mobilização por questões específicas quase inexistentes [....] Só um Estado centralizado e centralizador poderá conduzir e conter os que se entendem como incapazes de determinar seu próprio destino ou de fazer escolhas, porque nunca a isto foram “ensinados”. Por este motivo, basicamente, se tem optado por “determinar” aquilo que todos devem ter o direito de receber tanto na escola quanto em outros setores sociais. (1997, p. 3).

Por outro lado, no que diz respeito à inserção do país nas questões interna-cionais, via o discurso da entrada do país na modernidade, dada pelas trans-formações das relações sociais contemporâneas e pelo projeto político hege-mônico atual, pensada pelos setores econômicos, faz-se a exigência de que os parâmetros sejam apresentados como fórmula mágica, na qual a Educação es-colar, como uma prática social, tem um sentido utilitarista, instrumentalizadora e técnica, o que pode ser visto pela criação das diferentes competências dos cidadãos produtivos, como solucionadores de problemas.

Interessante verificar também que em momento algum é colocada a ne-cessidade de aprender a apreender as diferentes circunstâncias/situações que vivem/passam homens e mulheres, crianças, jovens, adultos e idosos. Para nós, o aprender a apreender para a construção de alternativas para os problemas sociais, a serem resolvidos com radicalidade, exige de todos os sujeitos a capaci-dade constante de pensar a realidade, o que torna possível a capacidade destes mesmos sujeitos pensarem e transformarem circunstâncias, situações e realida-des; ou seja, que num movimento dialético se transformem juntos.

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Nossas críticas se referem ao próprio documento (PCN, 1997 – 5.a a 8.a séries), quando diz:

[...] essa Educação, ao longo da vida, está fundada em quatro pilares: aprender a conhecer, que pressupõe saber selecionar, acessar e integrar os elementos de uma cultura geral, suficientemente extensa e básica, com o trabalho em profundidade de alguns assuntos, com espírito investigativo e visão crítica; em resumo, significa ser capaz de aprender a aprender ao longo de toda a vida; aprender a fazer, que pressupõe desenvolver a competência do saber se relacionar em grupo, saber resolver problemas e adquirir uma qualificação profissional; aprender a viver com os outros, que consiste em desenvolver a compreensão do outro e a percepção das interdependências, na realização de projetos comuns, preparando-se para gerir conflitos, fortalecendo sua identidade e respeitando a dos outros, respeitando valores de pluralismo, de compreensão mútua e de busca da paz; e aprender a ser, para melhor desenvolver sua personalidade e poder agir com autonomia, expressando opiniões e assumindo as responsabilidades pessoais.

A respeito da parte diversificada, busca-se dar espaço às diversidades cultu-rais das regiões presentes, no entanto, não reconhecem os sujeitos em situações concretas da vida em sua construção cotidiana. Na LDB (Art. 23, art. 26 e respec-tivos parágrafos, art. 27 e art. 28), “as múltiplas discussões sobre as diferenças culturais bem como as possibilidades de organizações diferenciadas de cur- rículo, foram incorporadas de maneira variada e, algumas vezes, nada coerente.” (ALVES, 1997). O mesmo percebe-se no que se refere aos Parâmetros Curricula-res Nacionais. Sua organização é a seguinte:

Parâmetros Curriculares Nacionais 1.ª/4.ª séries

Parâmetros Curriculares Nacionais 5.ª/8.ª séries

1 – Introdução 1 – Introdução

2 – Língua Portuguesa 2 – Língua Portuguesa

3 – Matemática 3 – Língua Estrangeira

4 – Ciências Naturais 4 – Matemática

5 – História e Geografia 5 – Ciências Naturais

6 – Arte 6 – História

7 – Educação Física 7 – Geografia

8 – Apresentação dos temas Transversais e Ética 8 – Arte

9 – Meio Ambiente e Saúde 9 – Educação Física

10 – Pluralidade Cultural e Orientação Sexual

10 – Temas Transversais: Ética, Saúde, Meio Am-biente, Orientação Sexual, Pluralidade Cultural, Tra-balho e Consumo

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Os Parâmetros Curriculares da Educação Básica

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Percebe-se em sua organização, ainda que em seu texto seja apresentado como uma forma aberta e flexível de se conceber/fazer currículo, que a propos-ta obedece aos ditames dos campos disciplinares hierarquizados, advindos da modernidade, desconhecendo os sujeitos multifacetados que se criam/se cons-troem em múltiplas relações cotidianas. Referimo-nos à população indígena, aos brasileiros afro-descendentes, aos trabalhadores do campo, aos jovens e adul-tos, à população em situação de risco social, aos portadores de necessidades educativas especiais etc.

É deixado para os Temas Transversais o tratamento da questão da diferença e da pluralidade cultural, que em nossa compreensão não é somente uma questão local/regional, ou de responsabilidade específica dos Estados e Municípios, mas sim de “outros sujeitos” específicos que não são levados em conta, pois como diz o próprio documento

[...] passou-se por um processo de discussão em âmbito nacional em 1995 e 1996, do qual participaram docentes de universidades públicas e particulares, técnicos de secretarias estaduais e municipais de Educação, de instituições representativas de diferentes áreas de conhecimento, especialistas e educadores.

Estes “outros”, também sujeitos educativos, na história da Educação brasileira e da gestão da coisa pública, nunca foram chamados à mesa para pensarem uma proposta para a construção de sua cidadania.

Alves (1997, p. 6) nos alerta:

[...] é preciso acrescentar a esta discussão, todo o debate que vem se desenvolvendo em torno da necessidade (exigência cultural e científica) e da possibilidade (alternativas já vividas) de propostas curriculares que entendem outros modos de se construir a unidade, partindo-se da diversidade, bem como a ideia de propostas curriculares que se articulem para além das disciplinas, que são herança de um momento histórico que não se justifica ou muito pouco, hoje, nem para a cultura, nem para o desenvolvimento da ciência, nem para o mundo do trabalho, nem para os movimentos sociais.

Neste sentido, o que faltaria aos condutores da política educacional de nosso país seria, antes de querer inventar a roda da reprodução, pois a mesma já existe a muito tempo e de variadas formas, verificar em que medida os avanços ad-vindos de diferentes campos e de suas experiências desenvolvidas, poderiam contribuir para a construção de uma política nacional de Educação que garanta realmente a presença de outros sujeitos, com seus variados modelos/concep-ções plurais, na perspectiva de se garantir/ajudar a concretização de uma escola pública, laica, popular, de qualidade referenciada socialmente para todos os brasileiros.

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Texto complementar

Parâmetros Curriculares Nacionais e autonomia da escola

José Mário Pires Azanha(*)

Os PCN e os Estados e MunicípiosA parte introdutória do texto que apresenta os PCN, após algumas con-

siderações sobre a suficiente expansão do Ensino Fundamental nos últimos anos, detém sua atenção na qualidade desse ensino, com suas altas taxas de evasão e repetência, para finalmente concluir que “o modelo educativo que vem orientando a maioria das práticas pedagógicas não atende mais as necessidades apresentadas pelo atual cenário sociopolítico-econômico do país”. (1, 1)

Essa conclusão baseia-se, em parte, nas análises feitas no âmbito de um projeto de pesquisa que examinou, sob alguns aspectos, as “propostas cur-riculares para o ensino de 1.°grau elaboradas pelas Secretarias de Educação de 21 estados e do Distrito Federal nos últimos 10 anos e, na sua maioria, em vigência nos respectivos sistemas de ensino”. (2, 1)

Em face desse estudo e de outros, concluiu-se que “uma tarefa essencial na busca da melhoria da qualidade do ensino passa a ser a de elaborar parâ-metros claros no campo curricular, capazes de orientar as ações educativas nas escolas”. (1, 3)

O quadro é o seguinte: a insuficiência e a fragmentação das ações educa-tivas, no âmbito das Unidades Federadas, exigiriam esforços que garantissem a generalização “no país, das orientações mais atualizadas e condizentes com o avanço dos conhecimentos no mundo contemporâneo” (1, 4) como condi-ção para que alcancemos “padrões de qualidade” no ensino fundamental.

Como se percebe, os PCN apresentam-se como uma nova reforma do Ensino Fundamental brasileiro com todas as suas amplas consequências na formação e no aperfeiçoamento dos professores, na revisão de livros didáti-

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cos etc. Em face da relevância social da iniciativa, convém que examinemos alguns dos argumentos adiantados como justificativa do que se pretende.

Ora, um desses argumentos, como já foi dito, parte do estudo comparati-vo das propostas curriculares estaduais e municipais elaboradas a partir do início da década de 1980 e vigentes ainda. Essas propostas, nos termos dos PCN, compõem um quadro nacional confuso, fragmentado, com diferentes níveis de elaboração e de justificação que dificultaria uma política global de melhoria do ensino fundamental.

É claro que a proposição dos PCN pressupõe que não valeria a pena uma atuação corretiva e reorientadora das várias tentativas estaduais e munici-pais que há anos se esforçam para consolidar orientações pedagógicas de seus respectivos sistemas. A opção foi a de substituí-las por “uma referência curricular para todo o país”.

O texto introdutório dos PCN reconhece o caráter redutivista de suas des-crições das tendências prevalecentes nas orientações das práticas pedagó-gicas brasileiras, mas esse reconhecimento é meramente formal, pois o que se propõe é uma substituição radical do que existe por uma nova ordenação curricular. [...]

(*) Professor da Faculdade de Educação da USP e membro do Conselho Estadual de

Educação de São Paulo.

Atividades1. Com base nos Parâmetros Curriculares Nacionais, organize uma síntese, apre-

sentando as ideias principais. Trabalhe com o documento que você preferir.

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2. Registre as ideias/questionamentos/polêmicas que você achou mais interes-sante nesta aula.

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Os Parâmetros Curriculares da Educação Básica

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3. Que experiências/alternativas curriculares você apresentaria tendo como base a discussão do texto apresentado em nossa aula?

Dicas de estudoÉ interessante conhecer as normas que regem a Educação brasileira, conside-

rando serem as norteadoras da prática educativa. O conhecimento leva ao pensar, a avaliar e a criar propostas novas. Assim sendo, recomendamos a leitura da Re-solução CEB 02 de 07 de abril de 1998, que apresenta as Diretrizes Curriculares Nacionais, visitando o site do Ministério de Educação: <www.mec.gov.br/cne>.

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José Luiz Cordeiro AntunesO déficit em termos absolutos tende a aumentar mesmo quando o Poder Públi-

co detém a iniciativa de formular políticas educacionais que, dentro dos parâmetros

vigentes, visam equacionar o problema reduzindo as taxas relativas. O quadro acaba por

se agravar, atingindo limites intoleráveis, num contexto como o de hoje em que o Poder

Público, em especial a União, busca demitir-se de suas responsabilidades transferindo-as

para outras instâncias.

Uma situação como essa só poderá ser revertida com a clara determinação de se

assumir a Educação como prioridade I, com a consequente vontade política de realizar as

ações concretas em que se expressa essa prioridade.

É evidente que, dado o imenso déficit histórico decorrente do fato de que deixa-

mos de fazer aquilo que os principais países fizeram a partir do final do século passado

quando se empenharam em implantar os respectivos sistemas nacionais de Educa-

ção, a questão não pode ser equacionada em termos dos recursos orçamentários

convencionais.

(SAVIANI, 1999, p.128)

Começar nossa aula de hoje com as afirmações apresentadas por Sa-viani nos mostra quais são os verdadeiros desafios para o campo educa-tivo e para os setores da sociedade preocupados com a construção de um outro quadro para a Educação Nacional – luta por uma outra política educacional, com a perspectiva da construção de um outro mundo, base-ado em novas relações sociais, que permita a inclusão de todos e o desen-volvimento pleno do ser humano, numa perspectiva unilateral.

Pensar e desenvolver ações para a transformação do campo educa-cional foi, por exemplo, a luta do FNDEP – Fórum Nacional em Defesa da Escola Pública, de parlamentares, intelectuais e outros. É bom resgatar que este movimento surgiu nos anos 1980 – década da reorganização da so-ciedade civil, face ao processo de abertura política, como parte do embate político na busca da construção das liberdades democráticas.

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Foi no bojo das discussões da constituinte que as discussões da LDB e, mais adiante, o Plano Nacional de Educação, fizeram com que os sujeitos políticos se organizassem, mobilizassem os atores/autores e propusessem novos caminhos para o campo da Educação. Por meio do Plano Nacional de Educação, elaboram-se propostas para a Organização da Educação Nacional, definindo o Sistema Na-cional da Educação, cuja instância máxima de deliberação é o Fórum Nacional de Educação, responsável pela política nacional de Educação e, principalmente, pela definição de diretrizes, prioridades e metas dos planos nacionais de Educa-ção e sobre a execução orçamentária para a área.

A partir disso constroem-se alternativas para o desenvolvimento da gestão democrática na/da coisa pública: implantação, acompanhamento e controle social das instituições e das ações do estado, pelos cidadãos/entidades. Discute-se projetos de financiamento da Educação para a garantia/concretização do ofe-recimento (acesso e permanência) da Educação Básica (Educação Infantil, Ensino Fundamental e Ensino Médio) e da Educação Superior, trazendo a questão do orçamento participativo, dos fundos e do Produto Interno Bruto (PIB), como re-ferência. Elaboram-se também propostas de políticas globais para valorização dos trabalhadores(as) em Educação: formação inicial e continuada, condições de trabalho, condições materiais de vida – salários e planos de carreira. Estes são os quatro grandes eixos presentes no PNE, o nosso grande desafio na atualidade e que apresenta questões centrais que comportam tantas outras. Isso é que discu-tiremos no nosso encontro de hoje.

Para o leitor desavisado, é bom recordar que os desafios apresentados não estão desarticulados do contexto sociopolítico-econômico nacional e interna-cional, na medida em que a discussão das políticas sociais, entre elas a Educação, passa pela disputa de projetos diferenciados – o PNE do MEC e o PNE – Proposta da Sociedade Brasileira, com interesses antagônicos.

Importante ressaltar a sinalização de Valente (2001, p. 11), que através de sua análise aponta: “a apresentação das duas proposições materializava mais do que a existência de dois projetos de escola, duas propostas opostas de política edu-cacional: elas de fato traduziam dois projetos antagônicos de país”.

Nossa discussão de hoje nos subsidiará para o desenvolvimento de novas ações e inserções sociais.

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Primeiro grande desafio para os educadores: o PNE – Plano Nacional de Educação, o PEE – Pla-no Estadual de Educação e o PME – Plano Muni-cipal de Educação que queremos

O Plano Nacional de Educação é uma lei, prevista na Constituição da Repúbli-ca Federativa do Brasil (1998):

[...] a lei estabelecerá o plano nacional de Educação, de duração plurianual, visando à articulação e ao desenvolvimento do ensino em seus diversos níveis e à integração das ações do Poder Público que conduzam à: I. erradicação do analfabetismo, II. universalização do atendimento escolar, III. melhoria da qualidade do ensino, IV. formação para o trabalho e V. promoção humanística, científica e tecnológica do país. (art. 214).

Também são encontradas referências na Lei de Diretrizes e Bases da Educa-ção Nacional (Lei 9.394/96) no art. 9.° inciso I que diz: “a União incumbir-se-á de: I. elaborar o Plano Nacional de Educação, em colaboração com os Estados, o Distrito Federal e os Municípios” e mais “a União, no prazo de um ano a partir desta Lei, encaminhará ao Congresso Nacional o Plano Nacional de Educação, com diretrizes e metas para os dez anos seguintes, em sintonia com a Declaração Mundial sobre Educação para Todos” (§1.° do art. 87).

Compete também aos Estados e Municípios (art. 2.° da Lei 10.712, de 9/01/2001) fomentarem a construção dos seus respectivos planos: PEE – Plano Estadual de Educação e PME – Plano Municipal de Educação, criando as bases necessárias para a sua formulação. A sociedade civil organizada entende que devem ser salvaguardadas as conquistas dos direitos sociais e resguardadas as políticas públicas educativas das descontinuidades, dada a rotatividade e os desmandos de diferentes governos.

Na construção democrática da sociedade, os planos devem ser elaborados pelo conjunto da sociedade e pelo Poder Público (Nacional, Estadual, Munici-pal) fixando objetivos, diretrizes e metas para todos os níveis e modalidades de ensino. Seu objetivo maior, então, é o de garantir aos cidadãos que a Educação escolar, enquanto política social, direito de todos e um dever indeclinável do Estado, seja oferecida com qualidade, permitindo o acesso e a permanência do conjunto da população à escola. Várias, entretanto, têm sido as formas para a sua

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elaboração e materialidade. Desse modo, ora são gestionados de formas mais democráticas – garantindo os processos participativos; ora por comissões cria-das pelo Poder Político.

O PNE – Plano Nacional de Educação – ficou conhecido como Proposta da Sociedade Brasileira (Projeto de Lei 4.155/98),

[...] é uma das mais importantes produções político-educacionais de nossa história. Ao ser apresentado à Câmara dos Deputados, no dia 10 de fevereiro de 1998, ele compeliu o governo Fernando Henrique Cardoso – que, como os fatos comprovam, não tinha interesse num plano efetivo – a desengavetar o seu projeto, apresentando-o ao Parlamento (Projeto de Lei 4.173/98) no dia seguinte. Tal cronologia conferiu à tramitação do PNE uma situação inusitada: o projeto de FHC foi anexado ao da Sociedade na discussão e deliberação da matéria no Congresso.(VALENTE, 2001, p. 11)

Mais adiante, o autor prossegue dizendo que o PNE governamental elaborou sua proposta

[...] à moda tecnocrática, com restrita audiência social e política, de modo a garantir o essencial da política do Banco Mundial, agência que, como anteriormente assinalado, vem dando a tônica do elenco de medidas implementadas, para todos os níveis e modalidades de ensino, nestes anos de predomínio no MEC da coligação (PSDB, PFL, PMDB e outras siglas) que sustenta o Executivo Federal. (p. 11)

Neste sentido, a organização e mobilização permanente da sociedade são instrumentos fundamentais para que, além de garantir os direitos sociais, se ga-ranta também a sua construção – a gestão democrática, com a participação po-pular, evitando os experimentos de gabinete.

As duas propostas – a da Sociedade Brasileira (PNE) e a do governo – foram elaboradas com base em um amplo diagnóstico realizado sobre a situação do povo e do país. No entanto, diante das injunções políticas no Congresso Nacio-nal, a primeira proposta foi substituída por um subscrito, cujo relator reponsável foi o deputado Nelson Marchesan (PSDB/RS), que encaminhou tal documento para uma brevíssima discussão, ou melhor, para uma discussão “encomendada”, já que nas audiências públicas foram convidadas e ouvidas apenas as autorida-des e os técnicos vinculados às posições oficiais, a fim de se utilizarem do dis-curso de que houve participação social (VALENTE, 2001, p. 13). As emendas de diversos parlamentares e a pressão da sociedade civil permitiram que peque-nos avanços fossem conquistados, principalmente no que se refere ao financia-mento da Educação. Mesmo se afastando dos 10% do PIB previstos pelo PNE – Proposta da Sociedade Brasileira, alcançou 7% do PIB, o que frente ao PNE do MEC consistiu em uma das suas principais virtudes. Todavia, após a aprovação

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do substitutivo (Lei 10.172/2001), pelo Congresso Nacional, o Executivo Federal, desrespeitando toda a discussão realizada pela comunidade educacional, efe-tuou nove vetos ao PNE:

atender, pelo Programa de Garantia de Renda Mínima, a 50% da clientela 1. nos três primeiros anos da vigência do PNE e a 100% até o sexto ano;

ampliar a oferta de Ensino Superior público numa proporção de pelo 2. menos 40% das matrículas totais;

criar, no âmbito federal, o Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do 3. Ensino Superior, com pelo menos 75% dos 18% vinculados ao ensino;

ampliar o crédito educativo para atingir, no mínimo, 30% da clientela do 4. Ensino Superior privado, com prioridade para os de menor renda;

triplicar, em dez anos, os recursos de financiamento público para a pesqui-5. sa científica e tecnológica, por meio de agências federais e estaduais;

implantar, em um ano, planos de carreira para os profissionais técnico- 6. -administrativos;

elevar, na década, pelo esforço conjunto da União, Estados, Distrito Fede-7. ral e Municípios, o percentual de gastos públicos em relação ao PIB, apli-cados em Educação, para atingir o mínimo de 7%, por meio da ampliação anual de 0,5%, nos quatro primeiros anos, e de 0,6%, no quinto ano;

no prazo de dois anos, alocar valores anuais por aluno que correspondam 8. a padrões mínimos de qualidade de ensino, definidos nacionalmente; e

garantir recursos do tesouro nacional para pagamento de aposentados da 9. área de Educação fora dos recursos vinculados ao ensino.

Estes aspectos não devem ser tratados de forma fragmentada, pois cada um deles será o elemento que dará concretude a outros.

Como se pode perceber, a maior parte dos vetos do presidente dispõe sobre a utilização de recursos, prazos e financiamentos para a garantia do acesso à Educação escolar e possível inclusão dos cidadãos para a implementação de metas a serem observadas pela União, pelos Estados e Municípios. Sem essas ga-rantias, o PNE se transformou em mera carta de intenções. Importante também

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observar que dois vetos tratam da questão dos trabalhadores em Educação: dizem respeito ao plano de carreira para os profissionais técnico-administrativos e recursos do tesouro para os aposentados da área de Educação.

Para termos uma visão geral do que aborda os dois Planos Nacionais, apre-sentamos o quadro sinóptico, elaborado por Valente. O quadro nos permite fazer uma comparação de quatro grandes eixos:

Organização do Sistema Nacional de Educação.1.

Gestão Democrática. 2.

Financiamento da Educação Nacional. 3.

Trabalhadores(as) em Educação. 4.

Comparando o PNE – Proposta da Sociedade Brasileira e o PNE do MEC:

PNE da Sociedade Brasileira PNE aprovado pelo Governo em 2001

(VA

LEN

TE, 2

001)

Consolidar um Sistema Nacional de Educação. Não trata deste tema (na verdade opõe-se a esse instrumento).

Assegurar os recursos públicos necessários à superação do atraso educacional e ao paga-mento da dívida social, bem como à manu-tenção e desenvolvimento da Educação es-colar em todos os níveis e modalidades, em todos os sistemas de Educação. Assegurar a autonomia das escolas e universidades na elaboração do projeto político-pedagógico de acordo com as características e neces- sidades da comunidade, com financiamento público e gestão democrática, na perspecti-va da consolidação do Sistema Nacional de Educação.

Redução das desigualdades sociais e regionais no tocante ao acesso e à permanência, com su-cesso, na Educação pública.

Universalizar a Educação Básica (nos seus diversos níveis e modalidades) e democra-tizar o Ensino Superior, ampliando as redes de instituições educacionais, os recursos humanos devidamente qualificados e o nú-mero de vagas e fortalecimento do caráter público, gratuito e de qualidade da Educa-ção brasileira, em todos os sistemas de Edu-cação.

Garantia de Ensino Fundamental obrigatório de oito anos a todas as crianças de 7 a 14 anos, assegurando o seu ingresso e permanência na escola e a conclusão desse ensino [...] Ampliação do atendimento nos demais níveis de ensino – Educação Infantil, o Ensino Médio e a Educação Superior [...]

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Garantir a gestão democrática nos sistemas de Educação e nas instituições de ensino.

Democratização da gestão do ensino público, nos estabelecimentos oficiais, obedecendo aos princípios de participação dos profissionais da Educação na elaboração do projeto pedagógi-co da escola e a participação das comunidades escolar e local em conselhos escolares ou equi-valentes.

Garantir a valorização dos profissionais da Educação (professores, técnicos, funcioná-rios administrativos) em sua formação bási-ca e continuada, carreira e salário.

Valorização dos profissionais da Educação. Parti-cular atenção deverá ser dada à formação inicial e continuada, em especial dos professores. Faz par-te dessa valorização a garantia das condições ade-quadas de trabalho, entre elas o tempo para es-tudo e preparação, a preparação de aulas, salário digno, com piso salarial e carreira de magistério.

Definir a erradicação do analfabetismo como política permanente – e não como conjunto de ações pontuais, esporádicas, de caráter compensatório – utilizando, para tanto, todos os recursos disponíveis do po-der público, das universidades, das entida-des e organizações da sociedade civil.

Garantia de Ensino Fundamental a todos os que a ele não tiveram acesso na idade própria ou que não o concluíram. A erradicação do analfabetis-mo faz parte dessa prioridade, considerando-se Educação de jovens e adultos como ponto de partida e parte intrínseca desse nível de ensino.

Garantir a organização de currículos que assegurem a identidade do povo brasileiro, o desenvolvimento da cidadania, as diver-sidades regionais, étnicas, culturais, articu-ladas pelo Sistema Nacional de Educação. Incluindo, nos currículos, temas específicos da história, da cultura, das manifestações artísticas, científicas, religiosas e de resis-tência da raça negra, dos povos indígenas, e dos trabalhadores rurais e suas influências e contribuições para a sociedade e a Educa-ção brasileiras.

Não trata do tema em nível de prioridade.

Instituir mecanismos de avaliação interna e externa, em todos os segmentos do Sistema Nacional de Educação, com a participação de todos os envolvidos no processo educa-cional, por meio de uma dinâmica democrá-tica, legítima e transparente, que parte das condições básicas para o desenvolvimento do trabalho educativos até chegar a resulta-dos socialmente significativos.

Desenvolvimento de sistemas de informações e de avaliação em todos os níveis e modalida-des do ensino, inclusive Educação Profissional, contemplando também o aperfeiçoamento dos processos de coleta e difusão dos dados, como instrumentos indispensáveis para a gestão do sistema educacional e melhoria do ensino.

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Segundo grande desafio para os educadores: discutindo a gestão democrática

O processo de construção da gestão democrática está assegurado na Cons-tituição Federal (inciso VI do art. 206) e pela LDB (inciso VIII do art. 3.°), como em diferentes discursos e que apresentam concepções bastantes distintas. A temáti-ca/processo da gestão democrática vincula-se às lutas pela democratização das instituições sociais e do espaço público.

Najjar, referindo-se que esta deve ser a grande discussão do professor e da escola, questiona a sociedade civil organizada, sobre qual o conceito/concepção de gestão democrática deve nortear a organização da escola, e por assim dizer dos sistemas de ensino (federal, estadual e municipal), na medida em que várias são as concepções presentes na sociedade.

A escola deve ser entendida como perseguidora de sonhos e de ideais de uma sociedade, e não apenas como espaço de transmissão de conhecimento. Alargando a compreensão da relação democracia, gestão democrática e escola, faremos com que a ótica privatista que há muito tempo perdura no nosso estado [faz referência ao Estado do Rio de Janeiro] seja extinta e que com isto definamos uma política séria de Educação, inclusiva para todos os cidadãos. (NAJJAR apud ANTUNES, 2002, p. 28)

A questão da gestão democrática passa pela efetiva divisão do poder, na so-ciedade – relação entre sociedade política e sociedade civil – enfatizando as deci-sões políticas necessárias para a construção de um projeto de nação; e na escola, fazendo com que os atores da comunidade escolar (alunos, pais, professores, funcionários) e comunidade local, a construa, representando/respeitando as de-mandas e os interesses da coletividade. Permitir a construção do cidadão crítico, transformador da realidade social, é fazer com que estes atores conquistem a voz e o voto nos processos de decisões políticas necessárias para o trabalho es-colar. Gestão democrática não é uma mera técnica gerencial ou está relacionada apenas às questões administrativas. Em verdade vai além destas questões.

Mais adiante, o autor diz que a gestão democrática ou o exercício de demo-cracia na escola deve ser concebido como princípio, meio e fim:

[...] princípio, porque a escola, mais do que uma instituição socializadora de um tipo específico de conhecimento (a ciência), é uma das instituições fundamentais em nossa sociedade no que tange à formação humana. Na escola, além de Matemática, Português, Geografia etc. aprendemos comportamentos, hábitos, habilidades, valores. Assim, forjar um homem profundamente marcado por ideais democráticos não é algo acessório ou marginal às atividades da escola, mas um princípio básico que dá sentido à existência dessa instituição.

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Meio, porque a gestão democrática do sistema escolar é fundamental para que a escola se organize de forma a dar conta das demandas colocadas pela sua complexidade. Só a democratização do seu cotidiano e de sua administração permitirão dar voz e poder à multiplicidade de sujeitos presentes na instituição. Só assim serão superadas as práticas tecnocráticas – que tanto têm marcado e prejudicado a Educação em nosso estado [refere-se ao Estado do Rio de Janeiro] – bem como a “política do zig-zag”, ou seja, a perspectiva eternamente “inauguracionista” de nossos governantes, que não permite a continuidade das políticas educacionais, na medida em que cada nova acaba por destruir tudo (de bom ou de ruim) que foi feito pela gestão anterior.

Fim, porque a democracia deve ser o objetivo último que a escola deve perseguir, deve ser a Utopia que lhe dá alento para funcionar. (ANTUNES, 2002, p. 28)

Ainda que seja a instituição escolar, focalizada em maior parte pelo autor, cremos que no âmbito das políticas e gestão macro da sociedade, especifica-mente, o que até aqui vimos tratando, ou seja, o campo das políticas educati-vas, seus pressupostos devem se fazer presente, por exemplo, em todo sistema educacional.

É por meio do processo de gestão que podemos eleger nossos dirigentes, nossos representantes para o parlamento, compor as diferentes instâncias de-cisórias e estruturas que organizam e criam formas de controle social, dos siste-mas educacionais, do estado (SNE – Sistema Nacional de Educação, Conselhos de Educação – CNE, CEE, CME; Constituinte Escolar, Conselhos Escolares – na Educação Básica e Conselhos/Colegiados – na Educação Superior, Orçamento Participativo etc.) ou ao elegermos nossos diretores e diretores-adjuntos nos processos escolares. Hoje, por sinal, com o projeto de lei que tramita no Congres-so Nacional, a escolha de nossos dirigentes encontra-se ameaçada, representan-do um verdadeiro retrocesso na gestão da coisa pública, ou seja, da escola, dos sistemas e os próprios caminhos da democracia em nossa sociedade.

O segundo retrocesso que evidenciamos diz respeito à ausência de gestão democrática nas/das instituições de ensino da rede privada. Como diz a lei em seu art. 14;

[...] os sistemas de ensino definirão as normas da gestão democrática do ensino público na Educação Básica, de acordo com as suas peculiaridades e conforme os seguintes princípios: I. participação dos profissionais da Educação na elaboração do projeto pedagógico da escola; II. participação das comunidades escolar e local em conselhos escolares ou equivalentes.

E o retrocesso prossegue em seu art. 15, face à concessão do Poder Público: “os sistemas de ensino assegurarão às unidades escolares públicas de Educação Básica que os integram progressivos graus de autonomia pedagógica e adminis-trativa e de gestão financeira, observadas as normas gerais de direito financeiro público”.

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Terceiro grande desafio para os educadores: o financiamento da Educação

Nosso país representa, diante das outras nações, aquele que tem investido pouco em Educação. A grande contradição que se observa é sua colocação em 9.° lugar na economia mundial, mas o 68.° no ranking do Índice de Desenvolvi-mento Humano (IDH).

Desse modo, em nossa compreensão, não podemos falar da organização da Educação (nacional, estadual e municipal), da própria gestão democrática, como também dos recursos humanos e infraestutura necessárias, sem que toquemos na questão do financiamento da Educação, como uma política específica, haja vista que serão as dotações orçamentárias que permitirão: a universalização do atendimento da Educação Básica; a am pliação e democratização do acesso ao Ensino Superior; a garantia de um padrão mínimo de qualidade para os níveis e modalidades de ensino; a integração das ações do Estado e dos municípios, garantindo aos mais pobres iguais condições de um atendimento educa cional de boa qualidade (ARAÚJO apud ANTUNES, 2002).

Lembremo-nos, por exemplo, do último tema do IV Congresso Nacional de Educação (IV CONED – São Paulo, 2002): garantir direitos, verbas públicas e vida digna – uma outra Educação é possível.

O financiamento da Educação diante das reformas dos anos 1990 teve, e ainda tem, quatro documentos basilares para a sua organização: a Emenda Constitucio-nal n. 14, de 13 de setembro de 1996 (modifica os arts. 34, 208, 211 e 212 da CF, e dá nova redação ao art. 60 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias), a LDB 9.394, de 20 de dezembro de 1996 (arts. 68 a 77), a Lei 9.424, de 24 de dezem-bro de 1996 (Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino Fundamental e de Valorização do Magistério), a Lei 10.172/2001 – Plano Nacional de Educação.

Valle e Costa (1997) e Araújo (2002), em suas análises, nos chamam atenção para algumas questões que demonstram os avanços e recuos das legislações:

É na Lei 9.394/96 que se define “manutenção e desenvolvimento do ensi- �no – MDE” pela primeira vez. Entretanto, quando se omite a palavra públi-co em relação ao inciso V do art. 70: realização de atividades-meio neces- -sárias aos sistemas de ensino, no qual estão incluídas as escolas particu-lares, parece-nos que é um elemento para beneficiamento destas escolas. Continuando, as autoras se referem também ao inciso VII do art. 70: amor-

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tização e o custeio de operações de crédito (as bolsas de estudos a alunos de escolas privadas e atividades-meio dos sistemas de ensino), o que nos leva a pensar sobre o mau uso dos poucos recursos públicos (desperdícios e má distribuição): canalizados para a rede privada ou a ser utilizado por governantes mal-intencionados para injunções políticas escusas/interes-ses próprios. Há incoerência da LDB, que ora permite, ora restringe a con-cessão de verbas para as escolas da rede privada (comunitárias/filantrópi-cas), com a própria Ementa Constitucional.

Os vetos da Presidência da República sobre o PNE inviabilizam o atendi- �mento amplo dos cidadãos (acesso e permanência) na Educação Básica (principalmente na Educação Infantil e no Ensino Médio) e das modalida-des como a Educação Especial e a Educação de Jovens e Adultos, assim como a possível am pliação/democratização da Educação Superior.

A utilização da palavra prioridade e progressiva extensão vai estabelecer o �lugar que ocupa o Poder Público (nacional, estadual e municipal), frente à sua responsabilidade provedora. Não se tratando aqui, simplesmente, de uma questão semântica.

Se atentarmos para o PNE de Fernando Henrique Cardoso/Nelson Mar- �chezan, as metas para as políticas inclusivas na Educação Infantil e Ensino Médio não atendem às demandas do contingente populacional (vejam os índices de atendimento educacional no plano). Assim, “priorizou-se” prin-cipalmente o Ensino Fundamental, com a criação do Fundef, cujo prazo de vigência se expirou, sendo substutuído pelo Fundeb em julho de 2007.

De acordo com as considerações acima apresentadas, o embate que restou aos setores da sociedade civil organizada apontou para três direções:

A primeira é a luta pela criação do Fundeb – Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica, incorporando todas as modalidades, ainda que apresentem polêmicas para alguns setores e a criação do Fundepes – Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino e da Pesquisa na Educação Superior.

A segunda diz respeito à concretização dos Planos de Carreira em cada esfera da administração, “de modo que assegurem remuneração condigna aos professores, estímulo ao trabalho em sala de aula e melhoria da qualidade do ensino” (VALLE; COSTA, 1997), estamos falando de melhores condições de trabalho e formação inicial e continuada.

A terceira diz respeito à necessidade da transparência do financiamento, no que se refere, principalmente, ao orçamento participativo, no qual, para nós, a atuação dos conselhos, para acompanhamento e fiscalização dos recursos dos fundos/dotações orçamentárias “deveria ser estendida ao controle da aplicação em cada esfera administrativa dos recursos públicos destinados ao ensino público, com o propósito de reduzir repasses para projetos de interesses restritos e desperdícios com atividades não-prioritárias”. (VALLE; COSTA, 1997)

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A luta muitas vezes constrói caminhos invisíveis nos embates políticos, pos-sibilitando o surgimento de leis que acabam abrindo perspectivas para um novo caminhar. Assim podemos interpretar a lei que criou o Fundeb, em substituição ao Fundef, estendendo o financiamento para todas as modalidades da educação básica. Neste mesmo patamar, podemos citar a Lei 11.738, sancionada pelo pre-sidente Lula, em 16/07/2008, que cria o sonhado piso nacionalmente unificado.

A passos lentos caminha a Educação, porém seus profissionais precisam, também, continuar seu caminho em busca não só de conhecer as referidas leis, como avaliá-las enquanto real provedora de melhoria nas condições de trabalho. O texto da lei por si só não garante sua aplicação, e, portanto, há de se buscar mecanismos de acompanhamento das estratégias que serão utilizados pelos di-ferentes governos, como justificativa pelo não cumprimento de seu propósito. Há de se acrescentar que da própria análise séria sobre os conteúdos apresenta-dos, novas propostas surgirão alimentando as lutas da categoria por melhores condições de trabalho e salários.

Quarto grande desafio para os educadores: construindo uma política global de valorização dos trabalhadores(as) em Educação (professo-res, funcionários técnicos-administrativos)

No que pese o momento, tanto em nível nacional como estadual e munici-pal, há uma diversificação de políticas, ainda que se apresentem de forma frag-mentadas e justapostas, estão extremamente articuladas ao projeto neoliberal adotado por nossa classe dirigente. Com isso precisamos continuar combatendo como vimos fazendo, tendo em vista o período anunciado pelo resultado das urnas nas eleições e pelas iniciativas tomadas pelo governo do presidente Lula.

As relações entre Estado e sociedade civil, no que tange aos trabalhadores e trabalhadoras da Educação, são extremamente antidemocráticas, buscando-se influenciar o imaginário destes profissionais por meio de vários atos normativos formulados para organizar e dar materialidade ao projeto hegemônico. São me-

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didas provisórias, leis, decretos-leis, pareceres e resoluções, parâmetros e diretri-zes curriculares nacionais, de Educação a distância, sem a escuta e intervenção dos sujeitos, que vão organizando a Educação e a formação destes trabalhadores. No campo da formação inicial e continuada, por exemplo, existe a concepção de Base Comum Nacional, para a formação em todos os níveis e modalidades, que representa o acúmulo de propostas que as universidades, nas suas funções de ensino, pesquisa e extensão junto com os movimentos sociais vêm construindo. É esta a concepção que tem de ser conquistada e implementada1.

O estabelecimento das diretrizes curriculares para a formação profissional em nível médio e superior, para todas as profissões, e especificamente para a formação dos profissionais da Educação, faz com que se insista na criação de agências centralizadoras para a certificação das competências, cuja concepção encontra-se assentada em uma lógica racionalista-mercantilista e pragmática.

Foi com base nisso que, a partir da Portaria CNE/CP 004, de 03 de julho de 2002, instituiu-se uma comissão com a finalidade de estabelecer diretrizes ope-racionais para a formação de professores da Educação Básica, buscando conso-lidar todas as regras numa só resolução. Lembramos que a Portaria n. 1.403, de 09/06/2003, institui o Sistema Nacional de Certificação e Formação Continua-da de Professores. A lógica reprodutivista do modelo hegemônico adotado nos anos 1990 continua dando o tom para a formação dos professores.

Como já existem alguns instrumentos de avaliação, teremos agora o Exame Nacional de Certificação de Professores, que avaliará, promoverá parâmetros de formação e mérito profissionais. Este é o novo/recente embate que se dará entre os movimentos sociais organizados e o Poder Público.

Se fica claro o estabelecimento/a defesa de políticas para o magistério pelo poder executivo, para os trabalhadores(as) técnico-administrativos, não é expli-citada nenhuma proposta que garanta a formação inicial e continuada destes trabalhadores. Também, nem a LDB nem o PNE de FHC/Nelson Marchezan fazem menção à formação destes profissionais.

1 A docência como base da formação profissional de todos aqueles que se dedicam ao estudo do trabalho pedagógico, o trabalho pedagógico como foco formativo, a sólida formação teórica em todas as atividades curriculares, nos conteúdos específicos e nos conteúdos especificamente pedagógicos para o desenvolvimento da Educação básica, em todos os níveis e modalidades, a ampla formação cultural, a criação de experiências curriculares que permitam contato dos futuros profissionais com a realidade da escola desde o início do curso, a incorporação da pesquisa como princípio formativo, a possibilidade de vivência pelos futuros profissionais de formas de gestão democrática, o desenvolvimento do compromisso social e político da docência, a reflexão sobre a formação para o magistério (PNE – Proposta da Sociedade Brasileira, 2002 e ANFOPE, 2002).

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Sobre as condições de trabalho (tempo para aperfeiçoamento, acesso a livro e a bibliotecas, número de alunos por turma condizente com o desenvolvimento do trabalho pedagógico, a falta de infraestrutura, principalmente para meren-deiras e serventes na realização de suas tarefas, realização de centros/grupos de estudo, tempo para planejar e corrigir as atividades pedagógicas dos alunos) e condições materiais de vida (salário digno), para os trabalhadores(as) em Edu-cação são um dos elementos fundamentais para a concretização da escola de qualidade socialmente referenciada. Qual a realidade concreta que temos hoje? Há nas salas de aulas e nos espaços-tempo educativos da escola um contingente muito maior de alunos que de professores e funcionários, seja da rede pública ou privada de ensino.

Se não há condições dignas de trabalho e condições materiais, o acúmulo de funções que estes trabalhadores são obrigados a assumir não só compromete o trabalho pedagógico, mas também a sua condição de ser humano, na medida em que o surgimento de doenças (orgânicas, mentais e emocionais) fazem parte de suas vidas.

Texto complementar

As razões e os princípios do PDE, segundo o MEC(BOLETIM EBULIÇÃO, 2008)

No dia 7 de outubro de 2007, o ministro Fernando Haddad apresentou o documento “O Plano de Desenvolvimento da Educação (PDE) – razões, prin-cípios e programas”. O texto, que procura explicitar as razões e princípios, e demonstrar sua relação com o conjunto de mais de 40 medidas e ações alinhavados no PDE, foi lançado publicamente durante a cerimônia de aber-tura do 30.° Encontro Anual da Associação Nacional de Pesquisa em Edu-cação (ANPEd) , que reuniu cerca de 2.000 educadores e pesquisadores em educação de todo o país.

O documento responde, em parte, às críticas quanto ao fato de o conjun-to de ações, programas e projetos anunciados pelo MEC em abril, sob a de-nominação “PDE”, não ter vindo acompanhado de justificativas e princípios

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norteadores. Este foi um dos aspectos destacados por diversos expositores durante o seminário organizado pela Ação Educativa, conforme demons-tram os artigos formulados para este Ebulição, refletindo as discussões em-preendidas naquele evento.

O texto toca também em temas que se tornaram polêmicos no debate sobre o Plano, empreendido por meio dos jornais, durante o período de março a setembro de 2007. No vácuo das informações precisas, setores da sociedade fortemente marcados pela presença do empresariado passaram a disputar o sentido do Plano. Os jornais ficaram repletos de declarações elo-giosas que atribuíam ao PDE um esforço de controlar a qualidade do ensino mediante um sistema de recompensas e punições ao desempenho dos edu-cadores, e não por meio da ampliação dos recursos. Saudaram como a che-gada da gestão empresarial à educação.

No documento oficial lançado em outubro, no entanto, o MEC afirma ser um “equívoco comum” a defesa de sistema de incentivos formado por prêmios de caráter pecuniário para as redes educacionais ou escolas que cumprem metas. Explica que a restrição de recursos às unidades que não cumpriram metas significa punir duplamente os alunos que não tiveram as-segurado seu direito a aprender.

A distribuição de recursos para as unidades escolares e redes, segundo o MEC, deve ser utilizada para “equalizar as oportunidades educacionais pelo aumento do financiamento”. Assim, deve ser prevista ampliação de transfe-rências automáticas de recursos para as escolas e redes educacionais que demonstrarem condições de “avançar com suas próprias forças”.

Para aquelas cujos alunos apresentarem dificuldades em atingir índices satisfatórios de aprendizagem, deve ser garantido apoio técnico e aumento de transferências de recursos condicionado à elaboração e cumprimento de um plano de trabalho.

Já respondendo às críticas de que esta interferência do Ministério fere a autonomia assegurada às redes de ensino e unidades escolares, o MEC situa a discussão no campo do conflito entre direitos. O direito à autonomia por parte das redes e escolas, e o direito dos educandos ao aprendizado. “Em educação, tem precedência o direito do educando, caso em que uma ação reparadora se justifica.”

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No que tange à polêmica entre financiamento e gestão, o MEC se posicio-nou, pelo menos formalmente. Admitiu a insuficiência do atual investimento em educação, em torno de 4% do PIB, considerado satisfatório por aqueles que insistem em afirmar que o fato de esse valor ser similar ao utilizado pelos países desenvolvidos, por si só significa que o problema não está no valor do recurso, mas na sua gestão. Afirmando que esta abordagem “perde de vista nosso baixo PIB per capita e nossa elevada dívida educacional”, o documento do Ministério afirma a necessidade de investimentos da ordem de 6 a 7% do PIB, conforme previa ao Plano Nacional de Educação.

O documento do MEC não cita o veto do presidente Fernando Henri-que ao Plano Nacional da Educação (PNE), mantido pelo governo Lula, que previa, no prazo de 10 anos a partir de 2001, elevação dos investimentos em educação para um mínimo de 7% do PIB. No entanto, sua formulação remete à comparação ao estabelecido no PNE originariamente, que assegurava que este percentual final deveria ser atingido por esforços conjuntos entre União, Estados, Distrito Federal e Municípios, e à razão de aumento anual de 0,5% do PIB nos quatro primeiros anos, e 0,6% no quinto ano.

O texto “Razões, princípios e programas” afirma que a complementação da União ao Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica (Fundeb), a partir do seu quarto ano de lançamento, acrescenta R$19 bilhões anuais ao orçamento do MEC, o equivalente a 0,7% do PIB, “apenas como contrapartida da União”. O resultado da comparação é óbvio: estamos atra-sados em quase 10 anos. De certa forma, pode-se considerar que o PDE dia-loga com este atraso na ampliação dos recursos para a educação, ao adiar o balanço dos resultados da ação do Estado para 2022, por meio das metas estabelecidas no Compromisso Todos pela Educação.

Por que não o PNE?O desenvolvimento do Índice de Desenvolvimento da Educação Básica

(IDEB) e das metas formuladas pelo movimento Compromisso Todos pela Educação foram apresentados no texto como mecanismos necessários à incidência sobre a qualidade da educação, e responsabilização dos entres federados em sua garantia.

O MEC justifica que as metas do PNE não puderam ser adotadas por es-tarem referenciadas na abrangência do atendimento, desconsiderando a

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qualidade da educação ofertada. Afirma que o Plano Nacional de Educação fixa meta para correção de fluxo, mas, em relação à aprendizagem, não de-termina prazo para a definição de “indicadores básicos de qualidade”, exceto na educação especial.

A formulação do IDEB foi uma resposta à necessidade de diagnosticar a qualidade da educação, considerando e combinando o desempenho e o fluxo dos educandos, para evitar a simples retenção, ou estímulo à evasão, dos alunos com desempenho insatisfatório. “O PDE partiu do diagnóstico de que a indústria da aprovação automática é tão perniciosa quanto a indústria da repetência”, diz o documento.

O Plano de Metas é apresentado pelo MEC como uma possibilidade para inaugurar um novo regime de colaboração, “fundado em diretrizes e con-substanciado em um plano de metas concretas, efetivas, voltadas para a me-lhoria da qualidade da educação”.

Nesse novo regime de colaboração, no entanto, o papel dos estados não está definido objetivamente. Em todo o documento só há referências aos gestores municipais. O Decreto n. 6.094 (24/4/2007), que estabeleceu o Plano de Metas Compromisso Todos pela Educação, na seção II, que dispõe sobre o Plano de Ações Articuladas (PAR), no §3.° define que a participação dos estados nos instrumentos firmados entre a União e o município, nos termos do §2.°, será formalizada na condição de partícipe ou interveniente. Já o §2.° estabelece que os estados poderão colaborar, com assistência técnica ou fi-nanceira adicionais, para a execução e o monitoramento dos instrumentos firmados com os municípios.

O MEC afirma que o PAR seria a garantia de uma ação permanente, não suscetível a mudanças de governos ou equipes, o que é apontado como o “maior impeditivo do desenvolvimento do regime de colaboração”. O cará-ter atemporal do PAR estaria assegurado por ser plurianual, construído com a participação dos gestores e educadores locais, baseados em diagnósticos desenvolvidos em processos participativos.

Apesar dessas afirmativas e expectativas, a atuação colaborativa entre as esferas de governo para a implementação do PDE ainda está por ser cons-truída. Não raro, disputas partidárias entre governantes de diferentes esferas têm impedido o desenvolvimento de muitas ações, inclusive no campo da educação. Assim como qualquer outro programa ou ação de governo, sua

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permanência para além de gestões partidárias, ou mesmo pessoais, depen-de de seu “enraizamento” social. Assim, em que pese os esforços do MEC e a sofisticação da elaboração do PAR, o fiel da balança para sua execução será mesmo a adesão da comunidade.

Atividades1. A aula apontou para a existência de dois projetos de Educação que

se confrontam, permanentemente, na arena das decisões. O quadro- -síntese apresentado na aula delineia aproximações e diferenças entre eles, assim como se encontram apoiados em quatro grandes eixos. Identifique-os e teça comentários sobre eles.

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2. Reflita e registre suas conclusões sobre as ideias, os questionamentos e as polêmicas que você achou mais interessante.

3. O Plano Nacional de Educação é uma lei que já se encontrava prevista des-de a Constituição Federativa do Brasil, em 1998, e assim sendo, contem-plada em artigos da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional. Você apresentaria alguma crítica ao Plano Nacional de Educação aprovado pelo Congresso Nacional?

Dicas de estudoO sonhado piso nacionalmente unificado vira realidade. O professorado pre-

cisa conhecê-lo para verificar em que pontos são realmente benéficos e o que propor para adequá-lo às necessidades da categoria. Facilitando, indicamos o site do planalto para a busca da Lei 11.738 de 16/07/2008: <www.planalto.gov.br/ccivil/_03/_Ato2007-2010/2008/Lei/L11738.htm>.

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Ana Maria Alexandre LeitePara mim, o utópico não é o irrealizável;

a utopia não é o idealismo;

é a dialetização dos atos de denunciar

a estrutura desumanizante e de anunciar a estrutura humanizante.

Por essa razão, a utopia é também, um compromisso histórico.

Paulo Freire

Nesta aula, não se pode deixar de destacar o fato de que, nas duas úl-timas décadas, em decorrência das pressões de diferentes setores da so-ciedade, as políticas educacionais apresentaram sensíveis mudanças, le-gitimadas em vários documentos oficiais: a Constituição de 1988, a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (Lei 9.394/96), as Diretrizes Cur- riculares Nacionais para a Formação de Professores da Educação Básica, em nível superior (2001), e as Diretrizes Nacionais para a Educação Espe-cial na Educação Básica (2001).

Entretanto, ainda inquietam os educadores algumas questões referen-tes à escolarização dos alunos com necessidades educacionais especiais: Como se dará, por exemplo, a articulação entre a Educação Especial e a regular no sentido de promover a inclusão dos alunos com necessidades educacionais especiais nos sistemas de ensino? De que maneira estará sendo contemplada, no projeto pedagógico das escolas, a formação con-tinuada do(a) professor(a) do ensino regular que conta com alunos com necessidades educacionais especiais em sua classe? Até que ponto a in-clusão se torna uma ameaça para alguns de nós que ainda temos uma visão funcionalista do ensino, rejeitando tudo o que pode abalar os esque-mas de trabalho já incorporados na rotina do dia-a-dia?

Você sabe como surgiu o conceito de Educação Inclusiva?

A proposta de Educação Inclusiva tem sua gênese na Conferência Mundial de Educação para Todos, promovida pela Unesco, em 1990, na Tailândia. Nesse evento, por meio de um Plano de Ação, foi estabelecida

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uma orientação político-filosófica relativa às propostas educacionais dirigidas aos alunos com necessidades educacionais especiais para contemplar questões básicas de aprendizagem.

A referida Conferência, cujos resultados foram assinados por todos os países presentes, pretendeu ampliar o conceito de aprendizagem para todas as crian-ças, jovens e adultos, incluindo aqueles com necessidades educacionais espe-ciais. A esse respeito, cabe lembrar o seu art. I:

Essas necessidades compreendem tanto os instrumentos essenciais para a aprendizagem (como a leitura e a escrita, a expressão oral, o cálculo, a solução de problemas) quanto os conteúdos básicos da aprendizagem (como conhecimentos, habilidades, valores e atitudes) necessários para que os seres humanos possam sobreviver, desenvolver plenamente suas potencialidades, viver e trabalhar com dignidade, participar plenamente do desenvolvimento, melhorar a qualidade de vida, tomar decisões fundamentadas e continuar aprendendo. ( p. 1)

Em 1994, representantes de governos de alguns países do mundo, reunidos em Salamanca, na Espanha, reafirmaram os princípios, as políticas e as estra-tégias de atendimento às necessidades educacionais especiais, bem como as linhas de ação para efetivá-las por meio de um documento que ficou conhecido internacionalmente – a Declaração de Salamanca. Esse documento aponta para a necessidade de os países reverem as bases filosóficas e metodológicas de suas políticas educacionais no sentido de garantirem, efetivamente, Educação para todos, sem discriminações ou privilégios. Portanto, todos, deficientes ou não, têm igual direito de exercitar a sua cidadania e construir, na escola, conhecimen-tos, atitudes e habilidades que possibilitem sua participação social contributiva. Dessa forma, seria superada a visão de valorização da socialização que predomi-nou no espaço escolar, em detrimento da escolarização desse alunado.

A concepção de inclusão, na Declaração de Salamanca, considera também a existência de diferenças sob a perspectiva da diversidade sociocultural e da de-sigualdade econômica. Assim, além das chamadas crianças deficientes, passam a ser consideradas alvo das políticas de inclusão: “ [... ] crianças [...] superdotadas, crianças de rua e que trabalham, crianças de origem remota ou de população nômade, crianças pertencentes a minorias linguísticas, étnicas ou culturais e crianças de outros grupos marginalizados” (UNESCO, 1994).

A Educação Inclusiva defende como princípio a inclusão de todos os alunos no ensino regular e a criação de mecanismos na escola que garantam o respeito às necessidades diversas de seus alunos. Com base nessa concepção de Educa-ção, espera-se que as pessoas sejam capazes de superar sentimentos de aver-são e medo que são erguidos como defesa quando se separam os alunos, tendo como critério a deficiência.

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A Declaração de Salamanca resultou na ampliação do conceito de neces- sidades educacionais especiais. Dessa forma, não só os alunos que apresentam deficiências (mental, visual, física, motora, auditiva e múltipla, condutas típicas, síndromes diversas e quadros neurológicos e psiquiátricos ou com altas habili-dades) são contemplados. Essa nova abordagem passa também a incluir aqueles que apresentam dificuldades de aprendizagem decorrentes de inúmeros outros fatores.

A expressão “necessidades educacionais especiais” deve ser utilizada em re-ferência a crianças e jovens cujas necessidades decorrem de sua dificuldade ou de sua elevada capacidade para aprender, não estando o termo, portanto, vin-culado à deficiência. Ao contrário, o paradigma da inclusão surgiu em oposição ao conceito de deficiência, sendo tema recorrente em diversos trabalhos dos pesquisadores. Em sociedades modernas e complexas, verifica-se a existência de múltiplas possibilidades do sujeito construir identidades socioculturais por meio de redes de relações e a utilização de novas tecnologias que favorecem uma vida mais próxima do normal quanto possível.

Para as Diretrizes Nacionais para a Educação Especial na Educação Básica/MEC, as dificuldades de aprendizagem absorvem uma diversidade de necessida-des educacionais especiais e podem estar associadas sobretudo a:

[...] dificuldades específicas de aprendizagem, como a dislexia e disfunções correlatas; problemas de atenção, perceptivos, emocionais de memória, cognitivos, psicolinguísticos, psicomotores, motores, de comportamento; e ainda a fatores ecológicos e socioeconômicos, como as privações de caráter sociocultural e nutricional. (BRASIL, 2002, p. 44)

Atuar na direção de uma Educação efetivamente inclusiva significa, com cer-teza, mudanças profundas no cotidiano escolar, nas condições de trabalho do professor, permitindo-lhe refletir sobre sua prática e usufruir da formação con-tinuada, o que pelas precárias condições de trabalho não tem sido fácil. Nesse quadro, muitas vezes inviabilizam-se a troca de saberes e dúvidas dos profes-sores com os seus pares e a construção de uma proposta de trabalho coletivo – um projeto pedagógico – que atenda a essa diversidade.

A inclusão de alunos com necessidades educacionais especiais em classes comuns do ensino regular exige um trabalho integrado entre o(a) professor(a) da classe comum e os professores(as) dos serviços especializados. Caso isso não ocorra, o educando corre o risco de não atingir um desenvolvimento satisfatório no campo acadêmico com reflexos em várias dimensões de sua vida.

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Infelizmente, numa atitude de incompreensão do conceito de inclusão, alguns sistemas de ensino vêm desmantelando as equipes e serviços de Educa-ção Especial, sem que se instale um sistema unificado de Educação que, de fato, englobe todos os alunos. Carvalho observa que os esforços nessa direção têm sido liderados pelos profissionais ligados à Educação Especial:

As reflexões sobre a inclusão, com essa denominação, foram desencadeadas pelos grupos ligados à Educação Especial. Apesar dos esforços governamentais de incluir todos os professores nesta urgente discussão, os mais frequentes interlocutores têm sido os professores de classes e escolas especiais, das salas de recursos e os itinerantes. Entre outras, essa razão explica porque, ao se pensar em inclusão, associa-se, de imediato, a proposta com o alunado da Educação Especial. (CARVALHO, 1999, p. 12)

A meta da inclusão é não deixar ninguém fora do sistema escolar, portanto, este deve adaptar-se às especificidades de cada um dos alunos, buscando confi-gurar-se como um caleidoscópio que precisa de todas as partes que o compõe. Quando se retira pedaços dele, o desenho se torna menos complexo, menos rico (MANTOAN, 1999).

Assim, entende-se que a inclusão deva ser uma prática presente na comu-nidade escolar, pois ao privarmos crianças da convivência com seus pares es-peciais, tiramo-lhes toda a oportunidade de se exercitarem na construção de valores e da cidadania. Para tanto, os professores especializados deverão atuar de forma conjunta com os professores de ensino regular capacitados no sentido de prover atendimentos aos alunos com necessidades educacionais especiais. E o processo de construção do projeto pedagógico da escola deverá ser tecido le-vando em consideração a diversidade dos sujeitos nele inscritos – incorporando as necessidades comuns e especiais de seu alunado – e estimulando a participa-ção dos envolvidos.

Um amplo debate, portanto, deve ser realizado com toda a comunidade intra e extraescolar no sentido de também contemplar a possibilidade do estabele-cimento de parcerias com instituições que possam subsidiar, tanto os aspectos concernentes às especifi cidades de seu alunado quanto o aperfeiçoamento do corpo docente para melhor qualificar suas ações.

Face aos princípios e diretrizes da Educação Inclusiva, é possível afirmar que o Brasil ainda não reúne condições de efetivar tal projeto em toda a sua dimensão. Ainda hoje, o precário atendimento às necessidades escolares do aluno brasilei-ro é responsável pelos elevados índices de evasão e repetência escolar. O que dizem as pesquisas? Vamos conferir?

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O Estudo do INEP mostra que 41% dos estudantes não terminam o Ensino Fundamental, de cada grupo de 100 alunos que ingressam na primeira série do Ensino Fundamental 59 conseguem terminar a oitava série desse nível de escolarização e os outros 41 param de estudar no meio do caminho. Para aqueles que entraram no Ensino Médio, a expectativa de conclusão é maior: 74% conseguem terminá-lo. Os estudantes que concluem sem interrupção essas etapas educacionais levam, em média, de 10,2 anos para completar as oito séries do Ensino Fundamental e 3,7 anos para passar pelas três séries do Ensino Médio. Se concluir o Ensino Fundamental e Médio separadamente demonstra ser difícil, o caminho da primeira série do Fundamental à terceira série do Médio é ainda mais árduo. Do total de alunos que entra no nível educacional obrigatório, apenas 40% concluem o Ensino Médio, precisando para isso, em média, 13,9 anos. O tempo que os estudantes brasileiros ficam na escola seria suficiente para a conclusão das oito séries do Ensino Funda-mental e das três do Médio. Eles passam, em média, 8,5 anos no primeiro nível e 3,2 no segundo. Mas como as taxas de repetência e evasão ainda são significativas, o tempo de permanência não corresponde à quantidade de anos de estudo. No Fundamental, os alunos concluem, em média, 6,6 séries e, no Médio, 2,6 (BRASIL/MEC/INEP, 2001).

Educação EspecialDepois de tudo isso, você deve estar se perguntando: a Educação Especial

teria deixado de existir nos sistemas de ensino? Não. No art. 59 da Lei de Diretri-zes e Bases da Educação Nacional (Lei 9.394/96) são apresentadas as condições que os sistemas de ensino devem assegurar aos educandos com necessidades educacionais especiais. Encontra-se também referência aos currículos, métodos e recursos educativos e a organizações específicas para atendimento às necessi-dades destes alunos, bem como destaca-se a importância do professor de ensino regular capacitado para integrar os alunos nas classes comuns.

As Diretrizes Curriculares da Educação Especial na Educação Básica, em con-sonância com a LDB e com a Política Nacional de Educação Especial (1994), ga-rantem que esses serviços continuarão a ser oferecidos nas escolas na forma de equipamentos materiais e humanos capazes de atuar na relação pedagógica no

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sentido de assegurar uma resposta educativa de qualidade às necessidades edu-cacionais especiais. Os serviços permanecerão disponíveis não somente ao pú-blico-alvo, mas a todos os alunos que necessitarem de apoio em qualquer etapa ou modalidade da Educação Básica. O documento recomenda que os sistemas de ensino implantem um setor responsável pela Educação Especial, dotado de condições materiais e humanas que possam viabilizar e sustentar um processo de Educação Inclusiva.

Os dados a seguir, publicados pelo MEC/SEESP, registram o aumento de ma-trículas reservadas aos alunos com necessidades educacionais especiais em classes regulares, mas é notória a persistência do atendimento especializado e segregativo.

Dos 503,570 mil alunos com necessidades educacionais especiais, matriculados no ano de 2003, 29% já são atendidos em classes comuns da rede regular de ensino. Os demais 71% estão matriculados em classes especiais e escolas especializadas. Dos 61 milhões de crianças e adolescentes de 0 a 17 anos, apontadas pelo censo do IBGE de 2000, 2,9 milhões apresentam algum tipo de deficiência. O censo indica que o número de crianças com deficiência fora das escolas é mais que o dobro do número de crianças normais que não estão na escola; e que o número de crianças com deficiência não-alfabetizadas é o dobro das crianças sem deficiências não-alfabetizadas. (MEC/SEESP, 2003)

Diante disso, é necessário que o Estado reveja suas estratégias de consoli-dação da política nacional de Educação Especial após ter passado mais de uma década de sua implantação. Com isso, poder-se-ão, talvez, superar os entraves muitas vezes subjetivos ou objetivos vinculados aos estigmas presentes no ima-ginário das pessoas e instituições.

É importante você saber que o aluno com necessidades educacionais especiais é definido como aquele que “[...] por apresentar necessidades próprias e diferentes dos demais alunos no domínio das aprendizagens curriculares relativas à sua idade, requer recursos pedagógicos e metodologias específicas”. (MEC/SEESP, 2003)

Assim, objetivando a uniformização de termos e conceitos, a Secretaria de Educação Especial – MEC, no documento “Educação Especial: um direito asse-gurado” (1994) propõe as seguintes características referentes às necessidades especiais dos educandos:

Altas habilidades (superdotados)Notável desempenho e elevada potencialidade em qualquer dos seguintes

aspectos isolados ou combinados:

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capacidade intelectual geral; �

aptidão acadêmica específica; �

pensamento criativo ou produtivo; �

capacidade de liderança; �

talento especial para artes; �

capacidade psicomotora. �

Condutas típicasManifestações de comportamento típico de portadores de síndromes e

quadros psicológicos, neurológicos ou psiquiátricos que provocam atrasos no desenvolvimento e podem trazer prejuízos no relacionamento social, em grau que requeira atendimento educacional especializado.

Deficiência auditivaPerda total ou parcial, congênita ou adquirida, da capacidade de compreen-

der a fala por intermédio do ouvido. Pode manifestar-se como:

surdez leve/moderada – � perda auditiva de até 70 decibéis, que pode di-ficultar, mas não impedir o indivíduo de autoexpressar oralmente, bem como perceber a voz humana, com ou sem a utilização de um aparelho auditivo;

surdez severa/profunda – � perda auditiva acima de 70 decibéis, que pode impedir o indivíduo de entender, com ou sem aparelho auditivo, a voz humana, bem como de dominar por processos naturais os códigos lin-guísticos.

Deficiência físicaUma variedade de condições não-sensoriais que afetam o indivíduo em sua

mobilidade, na coordenação motora geral ou na fala, como consequência de lesões neurológicas, neuromusculares e ortopédicas, ou malformações congê-nitas ou adquiridas.

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Deficiência mentalTem por característica registrar um funcionamento intelectual geral significa-

tivamente abaixo da média, oriunda do período de desenvolvimento do indiví-duo, em concomitância com limitações em duas ou mais áreas de conduta adap-tativa ou da capacidade do indivíduo responder adequadamente às demandas sociais, nos seguintes aspectos:

comunicação; �

habilidades sociais; �

cuidados pessoais; �

independência na locomoção; �

desempenho na família e na comunidade; �

saúde e segurança; �

desempenho escolar; �

lazer e trabalho. � (Associação Americana de Deficiência Mental/AAMD,1992)

Deficiência visualÉ a redução ou perda total da capacidade de ver com o melhor olho e após

melhor correção óptica. Manifesta-se como:

cegueira � – perda da visão, em ambos os olhos, de menos de 0,1 no melhor olho após correção, ou um campo visual não-excedente a 20 graus, no maior meridiano do melhor olho, mesmo com o uso de lentes de correção. No âmbito educacional, a cegueira representa a perda total ou o resíduo mínimo da visão que leva o indivíduo a ter de utilizar o Braille como me-diador de leitura e escrita além de outros recursos e equipamentos espe-ciais;

visão reduzida � – acuidade visual entre 6/20 e 6/60, no melhor olho, após correção máxima. O resíduo visual permite que o indivíduo leia impressos a tinta, desde que se empreguem recursos didáticos e equipamentos es-peciais.

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Deficiência múltiplaÉ a associação, no mesmo indivíduo, de duas ou mais deficiências primárias

(mental/auditiva/física/visual) com comprometimento que acarretam atrasos no desenvolvimento global e na capacidade adaptativa. As principais necessidades educacionais serão priorizadas por meio das habilidades básicas, nos aspectos sociais, de autoajuda e de comunicação.

Texto complementar

Como texto complementar desta aula, colocamos os primeiros artigos da Resolução CNE/CEB n. 1, de 11 de setembro de 2001, publicada no Diário Oficial da União, no dia 14 de setembro de 2001. Leia o texto abaixo que dá as definições sobre a Educação Especial e, caso deseje ler o restante da Resolução, acesse o endereço eletrônico:<portal.mec.gov.br/cne/arquivos/pdf/CEB0201.pdf>

Resolução CNE/CEB n.º 1, de 11 de Setembro de 2001

Diário Oficial da União, no dia 14 de setembro de 2001

O Presidente da Câmara de Educação Básica do Conselho Nacional de Educação, de conformidade com o disposto no Art. 9.°, §1.°, alínea “c”, da Lei 4.024, de 20 de dezembro de 1961, com a redação dada pela Lei 9.131, de 25 de novembro de 1995, nos Capítulos I, II e III do Título V e nos Artigos 58 a 60 da Lei 9.394, de 20 de dezembro de 1996, e com fundamento no Parecer CNE/CEB n. 17/2001, homologado pelo Senhor Ministro de Estado da Educa-ção em 15 de agosto de 2001,

RESOLVE:

Art. 1.° A presente Resolução institui as Diretrizes Nacionais para a edu-cação de alunos que apresentem necessidades educacionais especiais, na Educação Básica, em todas as suas etapas e modalidades.

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Parágrafo único. O atendimento escolar desses alunos terá início na edu-cação infantil, nas creches e pré-escolas, assegurando-lhes os serviços de educação especial sempre que se evidencie, mediante avaliação e interação com a família e a comunidade, a necessidade de atendimento educacional especializado.

Art. 2.° Os sistemas de ensino devem matricular todos os alunos, cabendo às escolas organizar-se para o atendimento aos educandos com necessida-des educacionais especiais, assegurando as condições necessárias para uma educação de qualidade para todos.

Parágrafo único. Os sistemas de ensino devem conhecer a demanda real de atendimento a alunos com necessidades educacionais especiais, median-te a criação de sistemas de informação e o estabelecimento de interface com os órgãos governamentais responsáveis pelo Censo Escolar e pelo Censo De-mográfico, para atender a todas as variáveis implícitas à qualidade do pro-cesso formativo desses alunos.

Art. 3.° Por educação especial, modalidade da educação escolar, entende--se um processo educacional definido por uma proposta pedagógica que assegure recursos e serviços educacionais especiais, organizados institu-cionalmente para apoiar, complementar, suplementar e, em alguns casos, substituir os serviços educacionais comuns, de modo a garantir a educação escolar e promover o desenvolvimento das potencialidades dos educandos que apresentam necessidades educacionais especiais, em todas as etapas e modalidades da educação básica.

Parágrafo único. Os sistemas de ensino devem constituir e fazer funcionar um setor responsável pela educação especial, dotado de recursos humanos, materiais e financeiros que viabilizem e deem sustentação ao processo de construção da educação inclusiva.

Art. 4.° Como modalidade da Educação Básica, a educação especial con-siderará as situações singulares, os perfis dos estudantes, as características bio-psicossociais dos alunos e suas faixas etárias e se pautará em princípios éticos, políticos e estéticos de modo a assegurar:

I - a dignidade humana e a observância do direito de cada aluno de reali-zar seus projetos de estudo, de trabalho e de inserção na vida social;

II - a busca da identidade própria de cada educando, o reconhecimento e

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a valorização das suas diferenças e potencialidades, bem como de suas ne-cessidades educacionais especiais no processo de ensino e aprendizagem, como base para a constituição e ampliação de valores, atitudes, conheci-mentos, habilidades e competências;

III - o desenvolvimento para o exercício da cidadania, da capacidade de participação social, política e econômica e sua ampliação, mediante o cum-primento de seus deveres e o usufruto de seus direitos.

Art. 5.° Consideram-se educandos com necessidades educacionais espe-ciais os que, durante o processo educacional, apresentarem:

I - dificuldades acentuadas de aprendizagem ou limitações no processo de desenvolvimento que dificultem o acompanhamento das atividades cur-riculares, compreendidas em dois grupos:

a) aquelas não vinculadas a uma causa orgânica específica

b) aquelas relacionadas a condições, disfunções, limitações ou deficiências;

II – dificuldades de comunicação e sinalização diferenciadas dos demais alunos, demandando a utilização de linguagens e códigos aplicáveis;

III - altas habilidades/super dotação, grande facilidade de aprendizagem que os leve a dominar rapidamente conceitos, procedimentos e atitudes.

Art. 6.° Para a identificação das necessidades educacionais especiais dos alunos e a tomada de decisões quanto ao atendimento necessário, a escola deve realizar, com assessoramento técnico, avaliação do aluno no processo de ensino e aprendizagem, contando, para tal, com:

I - a experiência de seu corpo docente, seus diretores, coordenadores, orientadores e supervisores educacionais;

II - o setor responsável pela educação especial do respectivo sistema;

III - a colaboração da família e a cooperação dos serviços de Saúde, Assis-tência Social, Trabalho, Justiça e Esporte, bem como do Ministério Público, quando necessário.

Art. 7.° O atendimento aos alunos com necessidades educacionais espe-ciais deve ser realizado em classes comuns do ensino regular, em qualquer etapa ou modalidade da Educação Básica.

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Art. 8.° As escolas da rede regular de ensino devem prever e prover na organização de suas classes comuns:

I - professores das classes comuns e da educação especial capacitados e especializados, respectivamente, para o atendimento às necessidades edu-cacionais dos alunos;

II - distribuição dos alunos com necessidades educacionais especiais pelas várias classes do ano escolar em que forem classificados, de modo que essas classes comuns se beneficiem das diferenças e ampliem positivamente as experiências de todos os alunos, dentro do princípio de educar para a diversidade;

III - flexibilizações e adaptações curriculares que considerem o significa-do prático e instrumental dos conteúdos básicos, metodologias de ensino e recursos didácticos diferenciados e processos de avaliação adequados ao desenvolvimento dos alunos que apresentam necessidades educacionais especiais, em consonância com o projeto pedagógico da escola, respeitada a frequência obrigatória;

IV - serviços de apoio pedagógico especializado, realizado, nas classes comuns, mediante:

a) atuação colaborativa de professor especializado em educação especial;

b) atuação de professores-intérpretes das linguagens e códigos aplicá-veis;

c) atuação de professores e outros profissionais itinerantes intra e interins-titucionalmente;

d) disponibilização de outros apoios necessários à aprendizagem, à loco-moção e à comunicação.

V - serviços de apoio pedagógico especializado em salas de recursos, nas quais o professor especializado em educação especial realize a complemen-tação ou suplementação curricular, utilizando procedimentos, equipamen-tos e materiais específicos;

VI - condições para reflexão e elaboração teórica da educação inclusiva, com protagonismo dos professores, articulando experiência e conhecimen-to com as necessidades/possibilidades surgidas na relação pedagógica, in-

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Perspectiva educacional de inclusão

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clusive por meio de colaboração com instituições de ensino superior e de pesquisa;

VII - sustentabilidade do processo inclusivo, mediante aprendizagem co-operativa em sala de aula, trabalho de equipe na escola e constituição de redes de apoio, com a participação da família no processo educativo, bem como de outros agentes e recursos da comunidade;

VIII - temporalidade flexível do ano letivo, para atender às necessidades educacionais especiais de alunos com deficiência mental ou com graves de-ficiências múltiplas, de forma que possam concluir em tempo maior o cur-rículo previsto para a série/etapa escolar, principalmente nos anos finais do ensino fundamental, conforme estabelecido por normas dos sistemas de ensino, procurando-se evitar grande defasagem idade/série;

IX - atividades que favoreçam, ao aluno que apresente altas habilidades/superdotação, o aprofundamento e enriquecimento de aspectos curricula-res, mediante desafios suplementares nas classes comuns, em sala de recur-sos ou em outros espaços definidos pelos sistemas de ensino, inclusive para conclusão, em menor tempo, da série ou etapa escolar, nos termos do Artigo 24, V, “c”, da Lei 9.394/96.

Atividades1. A Declaração de Salamanca resultou na ampliação do conceito de neces-

sidades educacionais especiais e em uma abordagem de Educação Inclusiva. Escreva quais são os alunos que demandam essa modalidade educacional.

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2. Faça um quadro sinóptico sintetizando as características referentes às neces-sidades especiais dos educandos.

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Perspectiva educacional de inclusão

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Dicas de estudoComo você leu nesta aula, em 1994, em Salamanca (Espanha) o Brasil as-

sinou a Declaração de Salamanca, que foi o ponto de partida para as políticas de educação inclusiva. Se você quiser saber mais sobre este assunto, visite o site do Centro de Documentação e Informação do Portador de Deficiência (CEDIPOD): <www.cedipod.org.br>, que é uma entidade sem fins lucrativos, organizada a partir da constatação da falta de uma entidade especializada na coleta, organi-zação e divulgação de informações sobre pessoas com necessidades especiais. Neste portal, você encontrará muitas outras informações, textos e depoimentos sobre a Educação Inclusiva.

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Osmar Fávero Eliane Ribeiro Andrade

Nesta aula, vamos conversar sobre as políticas públicas para a Educação de Jovens e Adultos e como essa modalidade de ensino tem sido relegada por diferentes administradores da Educação. Contaremos a vocês algu-mas experiências que vêm sendo desenvolvidas por governos estaduais e municipais, por organizações da sociedade civil e por universidades.

Educação de Jovens e Adultos no Brasil de hoje

A Educação de Jovens e Adultos (EJA), no Brasil, sempre ocupou espaço reduzido nos sistemas educativos, com um caráter estritamente compen-satório e quase que exclusivo dos desprovidos de valor social. Os currícu-los, conteúdos, métodos e materiais didáticos utilizados na Educação de Jovens e Adultos geralmente reproduzem inadequadamente os modelos voltados às crianças.

A origem dos problemas está na não-universalização do Ensino Fun-damental e no afastamento do poder público no que se refere à definição e implementação de políticas públicas que garantam o atendimento de jovens e adultos trabalhadores.

As ações definidas para a EJA configuram-se como campanhas ou movimentos, em geral desenvolvidos a partir do governo, com envolvi-mento de organizações da sociedade civil para a realização de propos-tas de eliminação do analfabetismo ou de formação de mão-de-obra, em curtos espaços de tempo. Essas políticas não têm atingido as causas do problema, perdem-se na descontinuidade administrativa e são associadas ao ensino noturno supletivo que absorve jovens e adultos que não conse-guiram concluir o ensino básico na idade regular.

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Atualmente, para se pensar políticas nacionais da EJA no Brasil, torna-se sig-nificativo entender o processo que vem ganhando visibilidade, desde o início da década de 1990: a realocação das atribuições da Educação Básica em geral, e da EJA em particular, das esferas federal e estadual para a esfera municipal. Esse deslocamento foi reforçado pela novas Diretrizes e Bases da Educação Nacional – Lei 9.394/96, que conferem maior responsabilidade aos Municípios no que diz respeito ao Ensino Fundamental. Coerente com a Constituição Federal de 1988, a LDB estabelece também que os sistemas de ensino deverão assegurar gratui-tamente aos jovens e adultos, que não puderam efetuar os estudos na idade regular, oportunidades educacionais apropriadas, considerando as característi-cas do alunado, seus interesses, condições de vida e de trabalho. A lei determina ainda que os sistemas de ensino devem viabilizar e estimular o acesso e perma-nência do trabalhador na escola, mediante ações integradas e complementares entre as diversas esferas públicas.

É importante você verificar que a LDB apresenta recuos significativos em relação ao texto da Constituição de 1988, no sentido da quebra da obrigação do Estado com essa modalidade educativa, em especial não mantendo o com-promisso de eliminação do analfabetismo em 10 anos, como constava do texto original da Constituição Federal e foi alterado por emenda constitucional. O art. 208 da Constituição afirma que o dever do Estado com a Educação será efetivado mediante a garantia de “Ensino Fundamental obrigatório, assegurada, inclusive, sua oferta gratuita para todos os que a ele não tiveram acesso na idade própria”. O art. 37 da LDB, porém, referente à Educação de Jovens e Adultos, estabelece que “os sistemas de ensino assegurarão gratuitamente aos jovens e adultos, que não puderam efetuar os estudos na idade regular, oportunidades educacionais apropriadas”. A mudança parece mínima, já que mantém a gratuidade, mas retira a obrigatoriedade que estava assegurada no texto da Constituição.

A LDB reserva os arts. 37 e 38 para a EJA e determina que o poder público viabilizará e estimulará o acesso e permanência do trabalhador na escola, além de reduzir a idade de acesso aos exames supletivos para 15 e 18 anos, respecti-vamente, para o Ensino Fundamental e o Médio. Essa diminuição da idade vem trazendo sérios problemas, como é o caso da maquiagem nas estatísticas do ensino público, pelo afastamento do ensino regular dos jovens com 15 anos; e da ampliação desordenada, na rede particular, de “cursinhos” de Educação Su-pletiva, permitindo lucros fáceis, pelos baixos custos e pela baixíssima qualidade desses “cursinhos”. É preciso analisar as perdas e os ganhos dessa decisão legal.

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Ainda no campo das legislações, deve-se considerar o Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino Fundamental e Valorização do Magistério (Fundef – Lei 9.424/96), que regulamentou a redistribuição dos recursos financeiros destinados ao Ensino Fundamental para os Estados e Municípios. O Fundef não considerava as crianças da Educação Infantil e os alunos de Ensino Supletivo na contagem do censo educativo nas redes estaduais e municipais, o que significa-va que esses alunos, bem como aqueles vinculados a outros projetos alternati-vos de jovens e adultos, não eram incluídos na definição dos recursos financeiros a serem alocados. Atualmente, com a substituição do Fundef pelo Fundeb, me-lhorou a situação financeira da Educação de Jovens e Adultos.

Originalmente, a Lei 9.424/96 incluía os alunos do supletivo para fins de trans-ferência dos recursos financeiros. Entretanto, por meio de veto do presidente da República, essa possibilidade foi retirada da lei aprovada pelo Congresso Nacio-nal. Como consequência desse veto, observou-se diminuição de matrículas nos cursos supletivos e a ampliação do atendimento no ensino regular noturno.

Pouco tem sido feito para melhorar o atendimento de jovens e adultos nesses cursos regulares noturnos. Um dos grandes desafios enfrentados pelas redes municipais é a elaboração e a implantação de projetos político-pedagógicos que atendam satisfatoriamente jovens e adultos trabalhadores. Apesar de algumas iniciativas consistentes, articuladas a projetos educativos inovadores, a grande maioria dos municípios, além de encontrar imensa dificuldade em dar conta do atendimento, não consegue romper com os modelos do ensino regular para a infância.

Frente a tal quadro, cabe retomar as disposições do art. 211 da Constituição, que aponta para a necessidade de uma atuação solidária dos sistemas de ensino da União, dos estados e dos municípios, os quais devem responder solidaria-mente à crescente demanda e estimular inovações que possibilitem a organiza-ção de estratégias afirmativas entre parceiros. Tal iniciativa pode contribuir para o avanço no campo das políticas públicas e de um apoio efetivo aos poderes locais, na composição de um quadro de limites e possibilidades de uma Educa-ção de Jovens e Adultos trabalhadores, concebida não como estratégia de com-pensação, reposição, suplência ou adequação ao mercado, mas, principalmente, como meio de formação ampla e integral de homens e mulheres.

Na trajetória da EJA deve-se considerar a participação dos organismos in-ternacionais como mecanismos de pressão na elaboração de políticas públicas.

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Desde a primeira Conferência Mundial de Educação de Adultos (Elsinore, 1949), convocada pela Unesco, até a V Conferência Internacional sobre Educação de Adultos (Confitea V, Hamburgo, 1997), percebe-se um papel indutor decisivo junto aos governos nacionais.

A tendência atual, desenhada na Confitea V, aponta para a construção de um novo paradigma baseado na Educação continuada de pessoas jovens e adultas, procurando informar políticas educativas apoiadas nos princípios de integração e participação, colocando-a como poderoso argumento em favor do desenvol-vimento ecológico sustentável. As conferências internacionais trazem questões que, de diferentes formas, invadem a sala de aula. O desenvolvimento susten-tável, ainda pouco explorado no campo de jovens e adultos, poderá constituir um importante mote para o trabalho educativo nos próximos anos tendo como tema do debate da VI Conferência Internacional sobre Educação de Adultos (Confitea VI), em 2009, no Brasil.

Em termos de iniciativas brasileiras para a EJA, duas ações merecem desta-que, sendo que a primeira refere-se às diretrizes curriculares aprovadas pelo Conselho Nacional de Educação, de autoria do prof. Carlos Roberto Jamil Cury; e a segunda aos fóruns estaduais e os encontros nacionais de EJA.

As diretrizes curricularesA partir de ampla consulta a representantes dos órgãos normativos e execu-

tivos dos sistemas, das várias entidades educacionais e associações científicas e profissionais da sociedade civil hoje existentes no Brasil, o parecer que estabele-ceu as diretrizes curriculares para a Educação de Jovens e Adultos significou um avanço no campo democrático da elaboração de políticas da EJA no Brasil.

O parecer reafirma que a titularidade do direito público subjetivo face ao Ensino Fundamental, estabelecido pelo §2.º do art. 208 da Constituição Fede-ral de 1988, continua plena para todos os jovens, adultos e idosos, desde que queiram se valer dele. E ressalta que o não-cumprimento ou omissão por parte das autoridades incumbidas implica em responsabilidade da autoridade com-petente. Destaca também que a EJA não pode mais ser tratada em termos de “suplência”, como definida pelo Parecer CFE 669/72, sendo agora uma modali-dade da Educação Básica, nas suas etapas Fundamental e Médio. Entende essa modalidade com perfil próprio e feição especial. Ressalta, ainda, que dizer que os cursos da EJA e os exames supletivos devem habilitar ao prosseguimento de

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estudos em caráter regular (art. 38 da LDB) significa dizer que os estudantes da EJA devem se equiparar aos que tiveram acesso à escolaridade regular e nela puderam permanecer.

O contingente de jovens e adultos, predominantemente marcado pelo traba-lho, é o destinatário primeiro e maior da EJA. Muitos já estão trabalhando, outros tantos querendo e precisando se inserir no mercado de trabalho. Cabe aos siste-mas de ensino assegurar oferta adequada, específica a este contingente que não teve acesso à escolarização no momento da escolaridade universal obrigatória, via oportunidades educacionais apropriadas. Para tanto, os estabelecimentos públicos dos respectivos sistemas deverão viabilizar e estimular a igualdade de oportunidades e de acesso aos cursos e exames, sob o princípio da gratuidade. Cabe também às instituições formadoras o papel de propiciar profissionalização e qualificação de docentes dentro de um projeto pedagógico em que as diretri-zes considerem os perfis dos destinatários da EJA.

Os fóruns e os encontros nacionais de Educação de Jovens e Adultos

Como estratégia de resistência frente às dificuldades enfrentadas, os educa-dores de jovens e adultos estão construindo um movimento nacional, articula-do pelos fóruns estaduais e pela realização de encontros nacionais de EJA. Os participantes desses encontros – representantes de organizações não-governa-mentais, universidades, movimentos sociais, secretarias municipais e estaduais de Educação dos diversos Estados brasileiros, Senai, Senac, e sindicatos – ma-nifestaram indignação com a não-implementação de uma política educacional que contemple efetivamente a Educação de Jovens e Adultos como modalidade da Educação Básica.

Estes fóruns discordavam das políticas governamentais no atendimento à EJA, fracionadas entre os Ministérios do Trabalho, da Reforma Fundiária e da Educação, por meio de programas que se efetivavam na modalidade de “cam-panhas”, de caráter compensatório, como a Alfabetização Solidária e do Pronera do Incra, que não atendiam às demandas sociais, provocando descontinuidades e significativas fragilidades no trabalho pedagógico. Neste sentido, reafirmaram a necessidade da construção conjunta entre governo e sociedade civil, de polí-ticas públicas que viabilizem uma Educação de qualidade, de direito e universal para jovens e adultos.

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Algumas experiências em EJAVocê vai ler agora a respeito da ação governamental em relação à EJA e co-

nhecer algumas experiências em Educação de Jovens e Adultos que têm sido desenvolvidas em nossas cidades.

Programa Brasil AlfabetizadoEm 2003, no início do governo de Luiz Inácio Lula da Silva, foi anunciada, pelo

Ministro da Educação, a ação política que seria implementada para a Educação de Jovens e Adultos: o Programa Brasil Alfabetizado. Esse programa tem como característica, desde o seu início, a continuidade de todos os projetos governa-mentais e não governamentais que tivessem como foco a eliminação do analfa-betismo e o aumento da escolarização da população. O programa é coordenado, fiscalizado e conduzido pela Secretaria de Educação Continuada, Alfabetização e Diversidade (Secad/MEC), e tem recursos garantidos pelo Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE/MEC), com transferência para estados, municípios, empresas, universidades, organizações não-governamentais e ins-tituições civis. O Programa Brasil Alfabetizado tem provocado um crescimento da parceria entre o Ministério da Educação (MEC), estados e municípios no com-bate ao analfabetismo. A quantidade de alunos atendidos aumentou em todas as regiões.

No site do Ministério da Educação estão sintetizadas as ações do Programa Brasil Alfabetizado:

O programa enfatiza a qualidade e o maior aproveitamento dos recursos públicos investidos na educação de jovens e adultos e inclui:

Ampliação do período de alfabetização de seis para até oito meses; �

Aumento de 50% nos recursos para a formação dos alfabetizadores; �

Estabelecimento de um piso para o valor da bolsa paga ao alfabetizador, aumentando a quan- �tidade de turmas em regiões com baixa densidade populacional e em comunidades populares de periferias urbanas;

Implantação de um sistema integrado de monitoramento e avaliação do programa; �

Maior oportunidade de continuidade da escolarização de jovens e adultos, a partir do aumen- �to de 42% para 68% do percentual dos recursos alocados para estados e municípios. (Disponí-vel em: <portal.mec.gov.br/secad>.)

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O Mova – Movimento de AlfabetizaçãoA experiência do Mova, promovida pela Secretaria de Educação do estado

do Rio de Janeiro, inspirou-se no Mova, projeto desenvolvido no município de Angra dos Reis que, por sua vez, foi influenciado pela experiência paulista, de-senvolvida na gestão de Paulo Freire na Secretaria Municipal de Educação de São Paulo. A implantação do Mova no âmbito do estado do Rio de Janeiro teve início no primeiro semestre de 1999, sob a coordenação de Sandra Salles, que havia coordenado o Mova em Angra dos Reis.

O Mova é desenvolvido por meio de convênios com associações de morado-res, igrejas, organizações não-governamentais etc., que se responsabilizam pelo local das aulas, formação das turmas e pagamento dos educadores. A seleção dos educadores, orientadores pedagógicos e assessores é realizada pela coordenação com o apoio de assessores externos ou dos que já compõem a equipe. Apesar de não haver supervisão, essa função é considerada estratégica, para assegurar a veracidade das informações e a qualidade dos convênios. Segundo estimativas da coordenação, até setembro de 2000, já haviam sido atendidos pelo programa, aproximadamente, 60 000 alunos, em todo o estado do Rio de Janeiro.

A meta inicial do programa foi duplicada e o atendimento se estendeu aos quilombolas do Município de Parati, às aldeias indígenas dos guaranis de Angra dos Reis com oito turmas; turmas no Pinel, e uma turma em horário integral com duração de três meses, atendendo população de rua em um de seus programas.

O objetivo do Mova é possibilitar o início ou o reinício do processo de es-colarização e de construção de conhecimento, além de integrar o aluno à rede escolar. Com funcionamento inicial paralelo com a rede escolar, na segunda coordenação tornou-se prioritária a integração do Mova com a política da Secre-taria de Estado de Educação, tendo como desafio a continuidade. Para isso, deve-ria ser feito um levantamento de todos os alunos interessados em continuar seus estudos para atendê-los e facilitar seu encaminhamento aos cursos de ensino supletivo ou ao Centro de Ensino Supletivo (CES). O problema é que a proposta dos CES é desenvolvida por meio de módulos, em regime semipresencial, o que representa uma grande diferença para os alunos do Mova, comprometendo a pretendida continuidade. Também não é fácil a inserção dos alunos do Mova nas escolas da rede, inclusive por não terem certificação; as secretarias municipais de Educação consideram que esses alunos apenas iniciam uma etapa de escola-rização, sem concluí-la.

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O Programa de Alfabetização Solidária O Programa de Alfabetização Solidária (PAS) teve início, em caráter piloto, no

ano de 1997, atingindo os municípios mais pobres, sobretudo na região Nordes-te, que concentrava maiores índices de analfabetismo. O esforço de alfabetização está voltado para as áreas de maior concentração de analfabetos jovens, a partir de um ranking dos municípios elaborado segundo as taxas de analfabetismo.

Atua por meio de parcerias entre o MEC – Conselho de Reitores das Universi-dades Brasileiras (CRUB), universidades, empresas privadas e comunidades dos municípios selecionados. Cada parceiro contribui conforme sua área: as univer-sidades com recursos técnicos e humanos; as comunidades com recursos huma-nos; o governo e as empresas com recursos financeiros.

A cada módulo, que tem a duração de seis meses, novas turmas de alfabetiza-dores são formadas. Este procedimento não permite acumulação de conheci-mentos por parte daqueles que já passaram pela formação inicial, provocando um eterno recomeçar e reforçando a impressão de que o programa também pre-tende atenuar o grave problema do desemprego, sobretudo entre os jovens.

O PAS parece ter um modelo inalterável, pois apesar das numerosas avalia-ções críticas que sofreu por parte de algumas universidades que dele se desli-garam e pela própria avaliação interna, considerada um fator de avanço, quase nada foi modificado em termos de estrutura e modo de funcionamento.

Com um estilo de intervenção massiva, nos moldes de campanha, de curta duração e poucos recursos, acaba servindo mais como sensibilização para a al-fabetização do que propriamente um processo de alfabetização consequente. Em relação à formação dos alfabetizadores e à alfabetização propriamente dita, a maior contradição está presente no exímio tempo e no excesso de burocra-cia. Enquanto política pública, é de curto prazo e pontual, não aprofundando a necessidade, a compreensão e os sentidos de Educação continuada de jovens e adultos. Apesar dessas críticas, não se pode negar, entretanto, a magnitude em termos de atendimento, embora apenas inicial, e a indução para o trabalho de alfabetização de jovens e adultos a municípios e estados, envolvendo associa-ções diversas e empresas.

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Sobre a questão da continuidade para os alunos que participam do PAS, as-pecto dos mais problemáticos, o Governo Federal anunciou para 2001 o Progra-ma de Apoio à Educação de Jovens e Adultos (Paeja), que pretendia ser uma res-posta à questão da continuidade, institucionalizando uma oferta de Educação de Jovens e Adultos nas redes de ensino onde atua o PAS1. Estavam prometidos recursos no montante de R$247 milhões (oito vezes o valor orçado para o ensino de jovens e adultos em 2000, ou seja R$31 milhões) para os Estados e Municí-pios com menores índices de desenvolvimento humano (IDH inferior a 0,5). O dinheiro proviria do Tesouro e faria parte do combate à pobreza denominado IDH 14, rebatizado como Alvorada. Não se tem notícia, no entanto, a respeito de sua implantação.

O programa IntegrarO programa Integrar surgiu na atual conjuntura de transformação do mundo

do trabalho e da sociedade: automação, globalização, precarização, mudança nas forças produtivas, desemprego estrutural. Os principais motivos de sua criação foram as questões que tal panorama fazia emergir entre os trabalhadores: perda da autoestima e da confiança, culpabilização, graves dificuldades de prover a so-brevivência, baixa escolaridade etc., nasce como um projeto de Educação Básica e requalificação dos trabalhadores metalúrgicos desempregados, tentando dar uma resposta ao crescente desemprego no Brasil, agravado a partir de 1995, e com a intenção propositiva de atenuar os seus efeitos entre os trabalhadores.

A experiência do projeto Integrar tem trazido importante contribuição para a construção de um modelo educacional voltado para o adulto trabalhador. Ao lado de programa basicamente idêntico implantado pela CUT/CNM no Rio Grande do Sul, é hoje uma referência nacional, fazendo com que uma entidade sindical volte de fato sua atenção para o direito à Educação de milhares de traba-lhadores desempregados. O programa devolve nesses trabalhadores sobretudo a esperança, não só por prepará-los melhor para um mercado de trabalho, cada vez mais competitivo, como também por reforçar sua capacidade de exercício da cidadania nos diferentes espaços que interagem. O material didático por ele elaborado é seguramente um dos poucos materiais inovadores que têm surgido nas experiências de EJA.

1 Dados veiculados em Informação em rede. São Paulo: Ação Educativa, outubro de 2000, ano 4, n. 30.

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As relações políticas nacionais/políticas locaisA análise das experiências em Educação de Jovens e Adultos tem mostra-

do um painel variado como evidencia, de um lado, algumas problemáticas comuns, sobretudo as que se referem ao financiamento e à descontinuidade das políticas públicas e, de outro, questões específicas que merecem maior aprofundamento.

Entre essas questões podemos destacar a “precarização”2 da Educação de Jovens e Adultos, a problemática do desemprego e a exigência de escolarização, a questão da formação cidadã e as relações entre Educação e cultura nos proje-tos de EJA, a formação de professores e a qualidade de material didático. Além do grave problema da descontinuidade das políticas públicas tanto no que se refere às mudanças de governo quanto às dificuldades de financiamento e as tensões entre as políticas e orientações nacionais e as práticas e necessidades locais.

Algumas experiências, como o programa Integrar e o Curso Elevação de Es-colaridade com Qualificação no Setor de Alimentos desenvolvido pela Universi-dade Federal Fluminense (PROALE/UFF), trazem mais especificamente algumas questões sobre o tema: escolaridade e desemprego, apesar das diferenças que marcam a origem, o contexto e o desenvolvimento de cada uma. Ambas rece-bem recursos da mesma fonte: o Fundo de Amparo ao Trabalhador do Ministério do Trabalho, e procuram atender a demanda dos trabalhadores por qualificação profissional e elevação de escolaridade.

No entanto, essa questão perpassa todas as experiências, desde as mais espe-cíficas que oferecem aumento de escolaridade e qualificação profissional até as que oferecem apenas escolaridade. As experiências demonstram uma migração da EJA do campo da Educação para o campo do trabalho, relacionando essas duas esferas em projetos que, na sua maioria, têm função compensatória: obje-tivando um ensino que não se deu na idade adequada ou que está defasado no tempo em função das mudanças que vem sofrendo o mundo do trabalho.

A partir da observação das propostas desses programas no campo da qualifi-cação profissional, percebeu-se um desassossego envolvendo os trabalhadores: os sentidos do trabalho vêm se modificando e já não há mais emprego para todos. Se fosse conseguida igualdade no atendimento e boas condições de es-

2 Tomamos emprestado o termo para qualificar os problemas levantados na EJA como: aligeiramento, aceleração, má qualidade do ensino, falta de definição explícita na origem dos recursos destinados à EJA etc.

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colaridade a todos os alunos de EJA, boa parte deles não conseguiria trabalho e muito menos emprego. Isso demonstra que o problema maior não é a baixa escolaridade para a entrada no mercado de trabalho, cada vez mais competitivo, mas uma profunda mudança estrutural nas condições de produção e reprodu-ção da vida em sociedade, no atual estágio do capitalismo, em que o problema do desemprego é bem mais complexo. A exigência de escolaridade cada vez maior, inclusive para o exercício de atividades que necessariamente não depen-dem dela, como é o caso do economista, que é selecionado para o cargo de digitador ou do porteiro de prédio que precisa ter o Ensino Médio, acaba ser-vindo como elemento de controle e dominação em um mercado cada vez mais excludente. (ANTUNES, 1999).

Sem dúvida, os que têm mais escolaridade dispõem de mais oportunidades do que aqueles que não a têm, mas a questão fundamental é que, no modelo atual de desenvolvimento, não há lugar para todos. Essa questão retorna como um bumerangue para a EJA, que em muitos momentos titubeia, procurando adequar-se ao mercado de trabalho, inclusive deslocando, em termos de políti-cas públicas, o que seria obrigação do Ministério da Educação para o Ministério do Trabalho e, principalmente, perdendo seu papel mais profundo de formação de cidadãos, de fortalecimento do sentido do humano, de aprimoramento na qualidade de ensino e não apenas a preocupação dominante com o mercado.

A partir dessas constatações, o Governo Federal lançou o ProJovem para per-mitir aos jovens além do processo educacional, uma qualificação profissional e acesso a ações de cidadania, esporte, cultura e lazer. Até 2010, serão oferecidas mais de 4 milhões de vagas para atender aos jovens que tenham entre 15 e 29 anos e que vivam em situação de vulnerabilidade social. A gestão do ProJovem é compartilhada entre diferentes órgãos governamentais: a Secretaria-Geral da Presidência da República, por meio da Secretaria Nacional de Juventude e os Mi-nistérios do Trabalho e Emprego, do Desenvolvimento Social e Combate à Fome e da Educação. O programa se subdivide em quatro modalidades: ProJovem Adolescente, ProJovem Urbano, ProJovem Campo e ProJovem Trabalhador.

Pesquisas recentes demonstram que se o sistema de ensino público conse-guiu avançar na universalização do atendimento à população infantil, no Ensino Fundamental ainda não se avançou em termos de qualidade educacional. Além dos conhecidos baixos índices de permanência e progressão, mesmo os alunos aprovados continuam engrossando as fileiras do analfabetismo funcional. Em re-lação à EJA, as pesquisas indicam também a necessidade de pelo menos quatro anos de escolaridade para que de fato haja apropriação da leitura e escrita e pos-

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sibilidade de uso social das mesmas com autonomia. Embora saibamos que a qualidade do ensino precisa urgentemente melhorar, também sabemos que não é necessariamente essa melhora que possibilitará a todos acesso a emprego ou trabalho.

Diante desse quadro, que relaciona e problematiza desemprego e Educação, que condiciona a transferência de deveres e atribuições entre os ministérios e revela contradições entre o que apontam as pesquisas atuais e o que é de fato realizado, constata-se, de um lado, que a questão do desemprego é bem mais complexa não se limitando apenas a qualificações, capacitações ou elevação do nível de escolaridade, e que a EJA precisa ter seu campo melhor definido, seja em termos de políticas públicas ou em termos de orientação que ultrapasse a esfera apenas do compensatório.

Outra constatação se refere ao espaço intervalar entre Educação e trabalho e o pouco intercâmbio que há entre esses campos. Essa problemática aumenta o desafio da EJA. Deve-se mais do que nunca perguntar: Por que ensinar? Para que ensinar? O que ensinar? Ou melhor: que contribuição a EJA está dando para uma formação cidadã? Qual o papel da EJA nesse impasse entre Educação e trabalho? Basta optar pela superfície, pelo simulacro ou deve-se assumir em profundidade os problemas diante das adversidades?

Apesar do comprometimento de educadores e de algumas secretarias com a EJA, tentando atender à crescente demanda de escolarização, principalmente em nível do Ensino Médio, em termos de recursos ainda estamos longe de fazer valer a regulação proposta na Constituição de 1988, que estendeu o direito de Ensino Fundamental gratuito e obrigatório para todos os que a ele não tiveram acesso na idade apropriada. Como foi dito, esse preceito é reforçado pelo art. 37 da Lei 9.394/96:

Os sistemas de ensino assegurarão gratuitamente aos jovens e aos adultos, que não puderem efetuar os estudos na idade regular, oportunidades educacionais apropriadas, consideradas as características do alunado, seus interesses, condições de vida e de trabalho, mediantes cursos e exames.

Celso Beisiegel (2000) faz interessante análise da redefinição das políticas pú-blicas da União em relação à EJA. A concentração de esforços e recursos para o Ensino Fundamental de crianças e a ausência de prioridade com a EJA foi se confirmando ao longo da década de 1990. O deslocamento da responsabilidade com a Educação Infantil e com o Ensino Fundamental para os municípios, e do Ensino Médio para os Estados e a competência da União em “garantir equaliza-ção de oportunidades educacionais e padrão mínimo de qualidade de ensino

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mediante assistência técnica e financeira aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios”, concretiza-se na centralização das decisões essenciais (diretrizes curriculares, conteúdos, avaliação) na União, e na descentralização da execução das atribuições das modalidades de ensino, incluindo aí a Educação Fundamen-tal de jovens e adultos, para os Estados e sobretudo para os Municípios.

Na prática, verifica-se que a União se desobrigou de suas responsabilidades com a EJA e os Estados e Municípios, de modo geral, ainda não assumiram ple-namente o que seria parte de suas atribuições, com o agravante do Fundef ter excluído, por mais de uma década, a matrícula de alunos de cursos supletivos nos cálculos realizados pelo Fundo Nacional de Desenvolvimento do Ensino (FNDE), para fins de financiamento.

Em termos de EJA, considerando-se a Constituição de 1988, as Diretrizes e Bases da Educação Nacional (Lei 9.394/96) e da legislação que a complementa, pode-se afirmar que tanto as ações desenvolvidas pelo MEC como as políticas e práticas locais são com elas conflitantes. Constata-se forte tensão/contradição entre o direito constituído e as políticas públicas para a área. A partir das leis maiores, não se encontra justificativa para a criação do Programa de Alfabetiza-ção Solidária (PAS), promovido pela Comunidade Solidária que, a partir de 1999, adquiriu o estatuto de organização não-governamental. No que diz respeito aos Estados e especialmente aos Municípios, debatem-se entre antigas formas de atendimento em curso, sem conseguir resolver seus impasses, e a incapacidade de gerar novos projetos, pela rigidez das normas vigentes e pela falta de experi-ência para a elaboração desses projetos. Esse quadro é agravado pela desconti-nuidade político- administrativa, que veremos a seguir.

Descontinuidade e falta de integração das políticas públicas

A intenção de cada governo imprimir sua marca original nos programas, sem considerar o que, nas gestões anteriores, foi bem-sucedido ou tem possibilidade de continuar, gera um eterno recomeçar que dificulta um acúmulo substancial e acarreta um desperdício de recursos.

Alia-se a este fato as alianças partidárias na composição de quadros técnico--administrativos que nem sempre conseguem superar as diferenças ideológicas em prol de um projeto comum.

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A questão dos recursosTodas as experiências que observamos revelam a insegurança dos recursos

financeiros, que interferem tanto na continuidade quanto no cumprimento de prazos e no atendimento realizado. As que trabalham com recursos do Fundo de Amparo ao Trabalhador (FAT) enfrentam a fragmentação e a demora na li-beração dos mesmos, o que condiciona o funcionamento dos cursos, especial-mente a contratação dos professores, acarretando interrupções, mudanças do calendário, saída de professores e custo alto com as demissões. Esses problemas poderiam ser minimizados se os recursos fossem efetivamente garantidos e sua liberação fosse mais ágil e contínua.

O uso das verbas do FAT traduz uma postura essencialmente política. É um recurso do trabalhador, geralmente usado pelos empresários por meio do cha-mado “Sistema S” e também pela CUT. Mas essa posição tem causado muita po-lêmica dentro da CUT e da Confederação Nacional dos Metalúrgicos, onde ainda hoje há resistências ao uso desse dinheiro, por exigir observância do sistema de prestação de contas governamental e prestar-se ao uso político dos resultados.

No período de vigência do Fundef, das experiências que analisamos, desta-camos a da Secretaria Municipal de Educação do Município de São Gonçalo (RJ), que trazia um aporte interessante: a verba disponível era dividida entre todas as modalidades de atendimento da rede municipal, garantindo a valorização de todos os professores. Por sua vez, os recursos destinados à EJA eram provenien-tes da verba pública específica do município.

A EJA entre o aspecto compensatório e a formação cidadã: Educação, cultura e política

Os sistemas de ensino, pressionados pela demanda, em particular para o Ensino Médio, vêm tentando ampliar a oferta da EJA. Suas propostas, porém, raramente vêm acompanhadas de preocupação em oferecer ensino adequado à população jovem e adulta, que prime pela qualidade e restabeleça as conexões entre Educação, cultura e política.

O problema é que ainda não foi superado o aspecto compensatório, o que limita o atendimento a políticas de curto prazo, associando-o, no plano meto-dológico, ao aligeiramento e à aceleração da aprendizagem. Embora algumas experiências e discussões venham alargando a dimensão da EJA para o cumpri-

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mento de um direito adquirido, este direito não se expressa como permanente e como necessidade continuada.

Em um mundo que passa por profundas e constantes transformações, talvez a maior pergunta a ser feita é: que homem queremos formar? Que Educação queremos oferecer-lhe, tendo em vista um futuro mais humanizante? É óbvio que não se tem respostas claras e definidas para tais perguntas, mas dispõe-se de algumas pistas, experiências bem-sucedidas e possibilidades na construção desse processo.

Uma dessas pistas está na multidimensionalidade do humano que é feito, ao mesmo tempo, da racionalidade, da afetividade, do trabalho e também do jogo, da sabedoria e da loucura, do prosaico e também da poesia, do angelical e do demoníaco, que habitam esse mesmo homem.

Os processos educativos são marcados por uma racionalidade que separa e divide, em vez de aproximar e integrar essas dimensões do humano.

Neste sentido, os processos educativos que visam atender aos jovens e adultos são mais do que nunca desafiados nesse momento de transição a in-tegrar em suas propostas a incorporação dos saberes, experiências e interesses dos educandos, extraindo o que está presente, de forma latente e ampliando o autoconhecimento dos mesmos, a partir das dimensões cultural, social e política nas quais o objetivo maior seja a formação de um cidadão participativo no fluxo das mudanças em que vivemos e na construção de uma sociedade verdadeira-mente democrática.

Texto complementar

A Educação de Jovens e Adultos no contexto contemporâneo

(HAMZE, 2008)

As principais características das ações do governo em relação à Educação de Jovens e Adultos, no século XX, foram de políticas assistencialistas, po-pulistas e compensatórias. A Educação de Jovens e Adultos no Brasil come-

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çou com os Jesuítas na época do Brasil colônia, através da catequização das nações indígenas. A Educação dada pelos jesuítas tinha preocupação com os ofícios necessários ao funcionamento da economia colonial, constando de trabalhos manuais, ensino agrícola e, muito raramente, leitura e escrita. No Período Imperial (1822 a 1889), a partir do Decreto n. 7.031, de 6 de setem-bro de 1878, foram criados cursos noturnos para adultos analfabetos nas es-colas públicas de educação elementar, para o sexo masculino, no município da corte. Foi somente a partir da década de 1940, que a Educação de Jovens e Adultos, começou a se delinear e se constituir como política educacional.

Na Constituição Federal, no seu art. 208, a Educação de Jovens e Adultos tem a primeira referência à garantia de ensino público fundamental obriga-tório, inclusive “para todos os que a ele não tiveram acesso na idade própria”. O Art. 208 afirma “O dever do Estado com a educação será efetivado median-te a garantia de: I - ensino fundamental, obrigatório e gratuito, assegurada, inclusive, sua oferta gratuita para todos os que a ele não tiveram acesso na idade própria; [...] §1.° O acesso ao ensino obrigatório e gratuito é direito público subjetivo.

A partir do desenvolvimento do conceito – direito público subjetivo, pas-sou-se a reconhecer situações jurídicas em que o Poder Público tem o dever de dar, fazer ou não fazer algo em benefício de um particular. Como todo di-reito cujo objeto é uma prestação de outrem, ele supõe um comportamento ativo ou omissivo por parte do devedor (DUARTE, C. S. Direito Público Subje-tivo e Políticas Educacionais).

Em 1990, aconteceu o “Ano Internacional da Alfabetização”. Uma conquis-ta importante para a Educação de Jovens e Adultos foi a Resolução n. 075/90, que garantia aos alunos ingressarem no Ensino Fundamental, através dos exames de classificação, eliminando a obrigatoriedade de apresentação de comprovante de escolaridade anterior para a matrícula na rede pública.

Na Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (Lei 9.394/96), em re-lação à Educação de Jovens e Adultos, nos artigos 37 e 38 estão elencados: “oportunidades educacionais apropriadas”, segundo as características do alunado; mero estímulo genérico, pelo Poder Público, a ações que mante-nham o trabalhador na escola; exames (supletivos e de aferição de conheci-mentos e habilidades informais).

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As Diretrizes Curriculares Nacionais abrangem os processos formativos da Educação de Jovens e Adultos como uma das modalidades da Educa-ção Básica nas etapas dos ensinos fundamental e médio, nos termos da LDB 9.394/96.

A identidade própria da Educação de Jovens e Adultos (modalidade da Educação Básica) considerará entre outras: as situações, os perfis dos estu-dantes, as faixas etárias desse alunado. Além disso, considerará:

o princípio da equidade1. – a distribuição específica dos componentes curriculares a fim de propiciar um modelo igualitário de formação e restabelecer a igualdade de direitos e de oportunidades face ao direi-to à educação.

o princípio da diferença 2. – a identificação e o reconhecimento da alte-ridade própria e inseparável dos jovens e dos adultos em seu processo formativo, da valorização do mérito de cada qual e do desenvolvimen-to de seus conhecimentos e valores.

o princípio da proporcionalidade3. – a disposição e adequação dos componentes curriculares face às necessidades próprias da Educação de Jovens e Adultos com espaços e tempos nos quais as práticas peda-gógicas garantam aos seus estudantes identidade formativa comum aos demais participantes da escolarização básica.

a proposição de modelo pedagógico próprio 4. – apropriação e con-textualização das diretrizes curriculares nacionais.

As políticas públicas em curso, que estão voltadas à Educação de Jovens e Adultos no Brasil, são: Brasil Alfabetizado, ProJovem, Fazendo Escola, Fundeb.

Devemos lembrar que o aluno da Educação de Jovens e Adultos já desen-volve os conteúdos, envolvendo-se nas práticas sociais. Falta-lhe sistemati-zar. A dimensão política e social deve fazer parte das discussões em aula a partir do momento em que o interesse do jovem e do adulto, trabalhador ou não, é estar engajado e participante no contexto social e cultural em que está inserido.

Eu sou um intelectual que não tem medo de ser amoroso, eu amo as gentes e amo o mundo. E é porque amo as pessoas e amo o mundo, que eu brigo para que a justiça social se implante antes da caridade. ( Paulo Freire)

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Atividades1. O Governo Federal lançou em 2008 o ProJovem para melhorar o atendimen-

to educacional. Registre as características deste programa federal.

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2. O parágrafo 2.°, do artigo 208 da Constituição da República Federativa do Brasil (1988) determina que todos os jovens, adultos e idosos têm o direito público subjetivo ao Ensino Fundamental, desde que queiram se valer dele. Registre como se caracteriza o não cumprimento ou omissão deste preceito legal pelas autoridades competentes.

Dicas de estudoSe você deseja saber mais sobre o ProJovem, acesse o site <www.projo-

vem.gov.br/2008>. É uma página da Presidência da República, em que você poderá obter todas as informações sobre esse programa e ainda cadastrar o seu e-mail para receber as novidades sobre as ações políticas a ele relaciona-das, que estão ocorrendo em todos os estados brasileiros.

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Maria Fernanda Rezende NunesNesta aula, vamos conversar sobre uma das preocupações dos edu-

cadores brasileiros comprometidos com a Educação Básica: a Educação das crianças de 0 a 5 anos. Você relembrará algumas das reflexões sobre as influências políticas do liberalismo no campo educacional. Verá como a legislação educacional tem deixado a Educação Infantil em segundo plano e as dificuldades de obtenção de recursos financeiros para atender às crianças desta faixa etária.

Neoliberalismo: uma pausa para a históriaA história do Brasil tem sido escrita com muitas marcas de dependên-

cia e exclusão. Ter sido colônia parece uma condição que ainda não foi superada totalmente. O hemisfério Norte, em diferentes momentos da nossa história, parece realmente nortear nossos corações e mentes.

Este verbo singelo – nortear – usado irrefletidamente como orientar e dirigir, na década de 1990 se apresentou com uma roupagem nova: o neoliberalismo. Mais que uma nova versão do capitalismo, uma ideologia, uma abstração, uma teoria, segundo Bourdieu “originariamente dissocia-lizada e desestoricizada que hoje, mais que nunca, tem meios de produzir verdades empiricamente verificáveis” (1998, p. 1). O discurso neoliberal hegemônico conquista o imaginário das pessoas em diferentes pontos do planeta, criando desejos, naturalizando a desigualdade, reificando o livre mercado.

O Brasil, espelhando-se nos países do primeiro mundo, compra sua “passagem” para o norte que, como diz Przeworski:

[...] trata-se de uma estratégia para adotar padrões políticos, econômicos e culturais (democracia, mercados e individualismo consumista) dominantes no mundo capitalista avançado. Modernização torna-se sinônimo de internacionalização.

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[...] a estratégia da modernização pela internacionalização explicitamente aceita uma submissão pelo menos parcial da soberania nacional nos domínios político, econômico e cultural. Essa estratégia abre os mercados locais à penetração estrangeira, abole as barreiras culturais e busca moldar as instituições políticas conforme modelos desenvolvidos em outros lugares. A Coca-Cola não é mais a droga imperialista, mas o néctar da prosperidade universal. (1993, p. 222-223)

Esta submissão explícita, uma nova versão colonialista, não passa impu-nemente. O néctar da prosperidade universal não é tão doce quanto parece. E, como o mesmo autor afirma, a corrida pela modernização terá vencedores e perdedores. E estes últimos “não serão Estados Nacionais, mas regiões, seto-res, indústrias e grupos sociais específicos. A consequência será um acentuado aumento da desigualdade regional, setorial e social entre nações e no interior delas” (PRZEWORSKI, 1993).

O neoliberalismo nasceu nos países capitalistas da Europa e da América do Norte, logo depois da Segunda Guerra Mundial. Segundo Perry Anderson (1998, p. 9):

[...] foi uma reação teórica e política veemente contra o Estado intervencionista e de bem-estar. Seu texto de origem é O Caminho da Servidão, de Friedrich Hayek, escrito já em 1944. Trata-se de um ataque apaixonado contra qualquer limitação dos mecanismos de mercado por parte do Estado, denunciada como uma ameaça letal à liberdade, não somente econômica mas também política.

As ideias liberais que surgiram no final do século XVIII contra o absolutismo, vão, aos poucos, sedimentando a noção de dever do Estado e direito do cidadão. Mas foi a partir da década de 1940, quando o socialismo já havia se instalado em vários países do leste europeu, mostrando a força do seu desenvolvimento econômico e social, que as ideias de Keynes dão sustentação a esse conceito, introduzindo, nos países capitalistas, as políticas de intervenção direta do Estado no desenvolvimento econômico e social. É a política de “Estado do Bem-Estar Social” em que o Estado é compreendido como o coordenador e planejador da macroeconomia, empreendedor em setores estratégicos e, principalmente, como provedor social, garantindo para todos a Educação, saúde, segurança e uma política de pleno emprego. Durante a Guerra Fria esta política keneysiana da “mão invisível” do Estado ganha espaço nos países capitalistas. Porém, ela é fortemente combatida pelas ideias de Hayek e, na década de 1950, pelo pragma-tismo de Milton Friedman, da Escola de Chicago, que propõe iniciativas descen-tralizadas, coordenadas pelas leis do mercado.

O neoliberalismo, então, entra no cenário mundial difundindo a crença no mercado, o Estado mínimo, a exaltação da empresa privada e o darwinismo social, com a naturalização dos índices de desemprego. As políticas passam a se

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dirigir para a privatização, o corte dos gastos públicos, entre eles os benefícios sociais. Entretanto, o desmonte do Estado do Bem-Estar Social nos países que foram efetivamente beneficiados por ele, não é nem tem sido tão fácil quanto a formulação teórica sugere, pois os trabalhadores organizados têm forças para lutar pela garantia das suas conquistas. Esse desmonte tem sido mais fácil de acontecer nos países em desenvolvimento como o Brasil, que viveu um incha-ço da máquina estatal, distorcido pelas políticas de clientelismo, pela corrup-ção e pela fragilidade das conquistas na área social, saúde e Educação. O Estado brasileiro, que na verdade conheceu muito pouco deste “Bem-Estar Social”, pela fragilidade das suas conquistas, pela dependência econômica que se submeteu com as grandes dívidas externas, pode ser desmontado facilmente, sem vozes contra-hegemônicas para defendê-lo.

Como você já está percebendo, dessa forma, o discurso neoliberal vai entran-do “como uma luva” no Brasil, sendo defendido por tendências políticas diver-gentes. Quem pode ser contra a diminuição da máquina estatal, num país de privilégios e “cabides” de emprego? Quem pode discordar da estabilização da moeda, apesar dos prejuízos sociais? Do que vale algumas vozes discordando da venda das estatais (como foi o caso da Companhia Vale do Rio Doce), se a maio-ria do Congresso foi e tem sido favorável às privatizações?

Esse discurso, muito bem articulado, tem um léxico com significados bas-tante adequados aos seus propósitos – liberdade associada à livre escolha, ao livre mercado, à livre iniciativa individual –, pois perde a dimensão coletiva e o olhar sobre a dependência das inter-relações sociais imbricadas nas escolhas. A igualdade, substituída por equidade, significa que a condição, o ponto de par-tida, a garantia de todos terem “direito ao direito”, subjacentes ao significado de igualdade, são substituídos pela ênfase na diferença, pelo reforço na ideia de desigualdade contidos no significado da palavra equidade. O global e universal passam a ser palavras de ordem, uniformizando, anulando e desvalorizando o regional e o particular. Espelha-se no modelo de modernização do Norte, sem levar em conta as condições sociais, políticas, econômicas e culturais do país.

Com tudo isso, vivemos numa situação em que o darwinismo social, abso-lutamente injusto, acirra as diferenças, ampliando as desigualdades, tão marca-das no nosso país. Multiplicam-se excluídos sem forças para lutar por empregos, saúde, moradia, previdência social e Educação.

Este Estado que, pela lógica neoliberal, precisa tornar-se mínimo, com funções e poderes limitados, vai minguando sua ação precocemente, deixando espaços

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que permanecem vazios ou são tomados pela iniciativa privada, atendendo uma parcela restrita da população. O mercado se autorregula, dando liberdade para alguns e segregando outros, naturalizando esta ordem social.

A hegemonia neoliberal impõe uma nova geografia política e econômica mun-dial, redefinindo mercados e relações de trabalho. A competitividade entre em-presas, grupos e indivíduos se exacerba. O mercado mundial exige o domínio do conhecimento, da ciência e da tecnologia, como chave para a modernização.

Os países menos avançados ou em desenvolvimento, diante desta nova ordem mundial, passam a preocupar os órgãos internacionais como o Banco Mundial (BM), o Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID) e agências da ONU, como o Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD), a comissão Econômica para a América Latina e o Caribe da Unesco (CEPAL) e a Fundação das Nações Unidas para a Infância (Unicef ). Para tentar evitar que essa mundialização/globalização amplie ainda mais as diferenças e exclusões, nesses países, esses órgãos formulam algumas perspectivas de políticas sociais que, segundo Miranda (1997, p. 38), “apesar das diferenças em seus objetivos, concepções e propostas políticas, as temáticas recorrentes nas suas proposições são importantes para a compreensão dos programas sociais, especialmente os educacionais na América Latina”.

Todos os documentos, cada um da sua forma, mesmo variando do humanis-mo da Unesco, com os quatro pilares básicos da Educação (aprender a conhecer, aprender a fazer, aprender a viver junto e aprender a ser), ao economicismo do BM, vinculando Educação à produtividade, enfatizam a importância da Educa-ção para o desenvolvimento da sociedade. Todos ressaltam a centralidade do conhecimento nas novas formas de organização do trabalho e da produção; re-ferem-se à necessidade de se caminhar para a equidade entre as pessoas, trazem a importância da qualidade da Educação, já que o acesso já estaria consolidado (será verdade em todos os países?) e sugerem novas formas de gestão para a Educação (descentralização).

Nos anos 1990, a Educação aparece como o caminho para a modernização da sociedade, como melhoria de vida e até mesmo como investimento, com taxas de retorno que justificam os seus gastos e melhor produtividade das empresas. A Educação faz parte da própria lógica neoliberal que não questiona a respon-sabilidade do governo em garantir o acesso de todos ao nível básico de ensino, porém propõe um tratamento para o sistema educacional que leve em conta:

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a divisão ou transferência de responsabilidades administrativas com o se- �tor privado;

a competitividade e o aquecimento do mercado; �

a qualidade na oferta dos serviços; �

livre escolha dos pais; �

diminuição do corpo burocrático, do monopólio do estado, da máquina �administrativa e dos gastos públicos;

a prioridade para o Ensino Fundamental. �

Na década de 1990, o governo brasileiro, diante das diferentes recomenda-ções, visando melhorar a qualidade do ensino, a ampliação do acesso à Educa-ção e aumento da escolaridade, tomou algumas iniciativas: elaborou uma nova Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (Lei 9.394/96), formulou Parâ-metros Curriculares Nacionais, organizou avaliações sistemáticas (Saeb, Provão), criou um Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino Fundamental e Valorização do Magistério (Fundef) e buscou parcerias com a sociedade civil, por meio de diferentes programas, para acabar com o analfabetismo (Programa de Alfabetização Solidária) e qualificar para o trabalho (Fundo de Amparo ao Traba-lhador – FAT), entre outras medidas.

Todas essas iniciativas do governo mereceram ampla discussão, tanto em re-lação às formas com que elas foram implantadas quanto aos seus conteúdos e intenções, consonâncias e dissonâncias com as políticas de cada um daqueles órgãos.

Nesta aula, vamos discutir a Educação Infantil frente a esse contexto. Reflita sobre estas perguntas:

Como a legislação vigente tem tratado esta modalidade de ensino? �

Como fica a Educação Infantil diante de uma política educacional toda �orientada para o Ensino Fundamental?

Quais as consequências de um fundo (Fundef) que não destina verbas �para a Educação Infantil?

Como está agora a Educação Infantil, após a implantação do Fundo de �Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica (Fundeb)?

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Educação Infantil e a legislação: letra mortaA Educação Infantil é um tema que vem, gradativamente, alcançando espaço

na legislação brasileira. Entretanto, a despeito desses avanços, a política e os programas formulados pelo Ministério da Educação para a área têm sido extre-mamente excludentes, criando enormes desafios para que a sociedade possa usufruir os direitos arduamente conquistados.

No Brasil, a Educação Infantil, somente no final dos anos 1980, adquiriu status de serviço educacional e de direito da criança. Anteriormente, a legislação exis-tente sobre o tema separava a creche e a pré-escola, conforme veremos a seguir:

Consolidação das Leis do Trabalho – CLTA CLT foi promulgada em 1943, e determinava que as empresas, com pelo

menos 30 mulheres com mais de 16 anos, deveriam oferecer espaço para a guarda das crianças lactantes, ou seja, creches. Entretanto, não tendo sido definidos em lei os mecanismos de controle e fiscalização do serviço, o atendimento ficou à mercê de cada empresário e da capacidade de pressão dos(as) trabalhadores(as). Vale destacar que esse serviço foi pensado visando à relação mulher/produção econômica, não considerando as necessidades e os direitos das crianças.

Lei de Diretrizes e Bases (5.692/71)Esta lei que fixou as diretrizes e as bases para o ensino de 1.º e 2.º graus, desta-

ca no art. 19, parágrafo 2.º que “os sistemas de ensino velarão para que as crian-ças de idade inferior a sete anos recebam conveniente Educação em escolas ma-ternais, jardins e instituições equivalentes”. A pré-escola, desvinculada da creche, tinha como função primeira o caráter compensatório. Assim, tal função de pre-paro para o ensino de 1.° grau era explicitado nos pareceres números 2.018/74, 1.600/75 e 2.521/75 do então Conselho Federal de Educação.

Constituição FederalA Constituição da República Federativa do Brasil, que foi promulgada em

1988, reconheceu o direito da criança de 0 a 6 anos de idade à Educação em creches e pré-escolas. Tal reconhecimento foi fruto de uma história de lutas e

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reivindicações de diferentes setores da sociedade civil. O artigo constitucional n. 208 ressalta que “o dever do Estado com a Educação será efetivado mediante garantia de: [...] IV. atendimento em creche e pré-escola às crianças de 0 a 6 anos de idade” (BRASIL, 1988), o que vem caracterizar a creche como equipamento primordialmente educacional. A definição legal aponta para a superação do ca-ráter assistencial, até aqui dominante, e passa a exigir uma atuação efetiva do sistema educacional nas suas diferentes instâncias: federal, estadual e municipal. Em relação a essas três esferas definem-se os percentuais mínimos da receita de impostos que devem ser destinados ao ensino: 18% pela União e 25% pelos Estados e Municípios (art. 212), prevendo a intervenção, em caso de não-cumpri-mento de tal exigência (art. 35).

No caso específico dos Municípios, estabelece-se que “[...] atuarão prioritaria-mente no Ensino Fundamental e pré-escolar” (art. 211, parágrafo 2.º), sendo que é de sua competência a manutenção, com a cooperação técnica e financeira da União e do Estado, de programas de Educação Pré-escolar e Ensino Fundamental (art. 30, inciso VI). A Constituição de 1988 reafirma, e reforça, portanto, a ideia de que a criança é um sujeito possuidor de direitos. O texto da Constituição Federal de 1988 (capítulo VII, art. 227) legitima novos princípios e diretrizes de ação em relação à infância e juventude, reconhecendo a condição peculiar da pessoa em desenvolvimento e a necessidade de proteção contra toda forma de negli-gência, discriminação, exploração, violência, crueldade, opressão e com priori-dade para os direitos fundamentais: à vida, à saúde, à alimentação, à Educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade, à convivência familiar e comunitária e à proteção especial.

Estatuto da Criança e do Adolescente – ECA Criado por meio da Lei 8.069, de 13 de junho de 1990, sob intensa mobilização

da sociedade civil, o Estatuto da Criança e do Adolescente visa regulamentar o direito constitucional da criança e do adolescente. Com a preocupação de ga-rantir tal direito, o estatuto parte do pressuposto que a criança e o adolescen-te são cidadãos independentes de sua condição social, concepção que os dife-renciam fundamentalmente das legislações anteriores voltadas exclusivamente para o atendimento à infância pobre, daqueles considerados em “estado de risco” (Código de Menores de 1927) ou em “situação irregular” (Código de Menores de 1979). O ECA configura-se, portanto, num grande instrumento para efetiva-ção de uma democracia participativa no trato dos interesses das crianças e dos adolescentes.

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Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional – LDB 9.394/96

O texto da Lei 9.394/96, que estabelece as diretrizes e bases da Educação na-cional, concebe o atendimento à criança de 0 a 6 anos de idade como “primeira etapa da Educação Básica” (art. 29), trazendo em seu texto uma seção dedicada à Educação Infantil. Nessa seção, define creche e pré-escola como partes da Edu-cação Infantil, sendo a primeira destinada às crianças de 0 a 3 anos e a segunda às crianças de 4 a 6 anos (art. 30).

Essa determinação continua mantida, mesmo após a nova redação dada pela Lei 11.274, de 6 de fevereiro de 2006, ao Artigo 32 da LDB que passou a ter a seguinte redação: “O ensino fundamental obrigatório, com duração de 9 (nove) anos, gratuito na escola pública, iniciando-se aos 6 (seis) anos de idade, terá por objetivo a formação básica do cidadão [...]”.

Campos considera que a “nova LDB” contribui para a superação da situação predominante:

[...] na faixa de 0 a 6 anos de idade, consolidaram-se dois tipos de atendimento paralelos: o que se convencionou chamar de creche, de cunho mais assistencial e de cuidado, e a Pré-escola, ligada ao sistema educacional e refletindo suas prioridades de caráter instrucional.

Pelos dados disponíveis, sabemos que, tanto uma quanto outra conferem maior cobertura às faixas mais próximas dos 7 anos. Mesmo a creche, que objetiva atender a criança desde o primeiro ano de vida, apresenta um menor número de matrículas nas faixas de idade mais baixas.

Além disso, não necessariamente, a creche atende em período integral e a Pré-escola em meio período [...] (CAMPOS, 1992, p. 104)

Uma outra preocupação que tem se acentuado na última década, e que também está contemplada na lei, é quanto à formação de profissional de educa-ção em creche. A LDB determina que a formação de docentes para atuar na Edu-cação Básica far-se-á em nível superior, admitida, como formação mínima para o exercício do magistério na Educação Infantil e nas quatro primeiras séries do Ensino Fundamental, oferecida em nível médio, na modalidade normal (art. 62).

Segundo Aquino (1997), ao incluir a Educação Infantil no sistema de ensino, determinando que seus profissionais pertençam à carreira de magistério, deven-do agora ser observados os direitos definidos no art. 67, os sistemas de ensino deverão promover a valorização dos profissionais da educação, assegurando- -lhes, inclusive nos termos dos estatutos e dos planos de carreira do magistério

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público: ingresso exclusivamente por concurso público de provas e títulos; aper-feiçoamento profissional continuado, inclusive com licenciamento periódico re-munerado para esse fim; piso salarial profissional; progressão funcional baseada na titulação ou habilitação, e na avaliação do desempenho; período reservado a estudos, planejamento e avaliação, incluído na carga de trabalho (Lei 9.394/96).

O MEC e a Educação Infantil: confrontando a realidade

Embora a legislação tenha avançado no sentido de entender a criança como cidadã, sujeito, portanto, de direitos sociais, o mesmo não pode ser dito quanto à política e aos programas do MEC para a área da Educação. Nesta seara, vem-se enfrentando uma série de desafios para a efetivação das conquistas alcançadas, principalmente aquelas relativas às crianças das classes populares, tradicional-mente excluídas das políticas públicas.

Esforços existem, por exemplo, os documentos “Plano Decenal de Educa-ção para Todos”, “Política de Educação Infantil”, “Por uma política de formação dos profissionais de Educação Infantil” e “Propostas pedagógicas e currículo em Educação Infantil” (BRASIL, 1993, 1994 e 1996, respectivamente), que, dentre os vários objetivos, afirmam a importância de fortalecer as redes de Educação In-fantil. No entanto, apesar de oferecerem orientações importantes, explicitando critérios de qualidade e normas de funcionamento, tais documentos, por si só, não são o bastante. Também é preciso ação e metodologia de implantação para que os fatos oficiais não se tornem “letra morta”.

Em relação às ações municipais passíveis de financiamento pelo MEC/FNDE, nesses anos destacaram-se as construções de creche de acordo com as normas preconizadas pelo Programa Comunidade Solidária e o apoio para a compra de material didático-pedagógico para os alunos do pré-escolar.

Argumentar que a Educação Infantil é de competência do Município, não isenta de responsabilidade as esferas federal e estadual com a área. Acima de compromissos políticos, temos nossa Carta Magna que define a competência dos Municípios com o Ensino Fundamental e a Educação Infantil, sendo que “A União [...] exercerá, em matéria educacional, função redistributiva e supletiva, de forma a garantir a equalização de oportunidades educacionais e padrão mínimo de qualidade de ensino mediante assistência técnica e financeira aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios” (BRASIL, 1988, art. 211, parágrafo 1.º).

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Em 1997, percebemos que as Classes de Alfabetização (CA) tinham um tra-tamento à parte da Educação Pré-escolar e do Ensino Fundamental. O número de alunos matriculados no CA era bastante expressivo, considerando que essa modalidade de ensino representa apenas um ano de vida escolar do aluno. O mesmo não podemos dizer da Educação Pré-escolar e do Ensino Fundamental.

É verdade que o CA foi uma distorção criada pelos sistemas de ensino para reduzir a repetência na 1.ª série do Ensino Fundamental. Em geral, as secretarias de Educação ficavam bastante confusas ao conceber e conceituar a proposta pedagógica para o CA dentro do projeto educativo do Município. Metodologia de ensino, espaço, número de alunos por turma, idade, características do mobi-liário, material didático-pedagógico e formação dos profissionais envolvidos são alguns elementos que podem nos ajudar a ver como se tem entendido a Educa-ção Pré-escolar e o Ensino Fundamental. Com certeza, as obrigações legais das secretarias de Educação também estão implicadas nesse processo.

Encontramos algumas mudanças no Censo Escolar de 2002, ao verificar a porcentagem dos alunos matriculados na pré-escola, no CA e no Ensino Fun-damental. O número de alunos no CA é praticamente inexistente. Quais teriam sido, então, os fatores determinantes para a configuração desta situação e suas implicações político-pedagógicas? Você talvez já tenha previsto a resposta. Veja, a seguir, algumas razões para essa situação.

Educação Infantil: implicações na práticaDesde a implantação do Fundef, convivemos com, no mínimo, dois grandes

impasses na oferta, atendimento e ampliação de vagas em creches e pré- -escolas:

O primeiro é explicitado na própria denominação do Fundo, onde se enuncia sua vinculação ao “Ensino Fundamental” excluindo-se a Educação Infantil; o segundo decorre de sua gestão orçamentária. Dos 25% da receita de impostos e transferências destinados à Educação, serão suficientes para cobrir as necessidades do Ensino Fundamental os 60% a ele alocados constitucionalmente? É possível garantir que os 40% restantes sejam canalizados para os demais segmentos da Educação? (NUNES; ESTEVES, 1998, p. 3)

Durante a vigência do Fundef, o desdobramento de tais questões, quando observadas regionalmente foram bastante interessantes. No estado do Rio de Janeiro, por exemplo, constatou-se que dos 89 municípios que, em 1997, apre-sentavam 131 891 alunos nas classes de alfabetização e, em 2003, perfaziam um total de 400 alunos matriculados.

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Seguindo a lógica de que aluno do Ensino Fundamental “valia dinheiro” no 1.º segmento do Ensino Fundamental, concluimos que, nesse período, houve uma migração de alunos do CA para o Fundamental. Entretanto, perguntamos: as se-cretarias municipais de Educação expandiram de oito para nove anos o seu Ensino Fundamental mesmo antes da Lei 11.274, de 2006?

A situação das crianças que atualmente ingressam no Ensino Fundamental com seis anos exige das secretarias de educação a reorganização desta etapa de escolarização, com sua expansão legal de oito para nove anos, obrigatoria-mente a partir de 2010. A preocupação dos educadores com essa inovação para todas as escolas brasileiras levou o Conselho Nacional de Educação, em resposta a uma solicitação da Secretaria de Educação Básica, a aprovar o Parecer CNE/CEB n. 04, homologado pelo Ministro da Educação em junho de 2008. Nesse Parecer, seu relator – Prof. Murilio de Avellar Hingel – dá orientações sobre os três anos iniciais do Ensino Fundamental, denominando esse período de escolarização de ciclo da infância e alertando para a necessidade de reorganização da Educação Infantil.

A ampliação do Fundef para Fundeb, incluindo as creches e pré-escolas na redistribuição dos recursos financeiros, traz também uma nova visão do aten-dimento às crianças de zero a cinco anos e onze meses de idade, devendo os gestores da Educação pública estar atentos para o atendimento democrático e competente a todas as comunidades sob sua responsabilidade político-social.

Reconhecer a especificidade da infância – sua capacidade de criação e imagi-nação – requer que medidas concretas sejam tomadas e que posturas concretas sejam assumidas. A Educação Infantil tem o papel de valorizar os conhecimentos que as crianças possuem e garantir a aquisição de novos conhecimentos, mas para tanto, é fundamental um profissional que reconheça as características da infância. Observar as particularidades infantis, promovendo a construção cole-tiva de espaços de discussão da prática exige embeber a formação na crença de que não há “déficit” na criança, nem no profissional que a ela se dedica, a ser com-pensado; há saberes plurais e diferentes modos de pensar a realidade. Apesar de, com ou sem projetos do MEC ou de secretarias, os profissionais designados para essa tarefa, os que atuam com crianças precisam assumir a reflexão sobre a prá-tica, o estudo crítico das teorias que ajudam a compreender as práticas, criando estratégias de ação, rechaçando receitas ou manuais. O eixo norteador precisa ser a prática aliada à reflexão crítica, tendo a linguagem como elemento central que possibilita a reflexão, interação e transformação dos processos de formação em espaços de pluralidade de vozes e conquista da palavra.

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Texto complementar

O Plano Nacional de Educação e a Educação Infantil

(PIMENTEL, 2003)

Existem no Brasil discussões muito amplas acerca da concepção de Edu-cação Infantil. Durante muito tempo, as instituições destinadas a crianças em seus primeiros anos de vida serviram de apoio exclusivo às famílias de baixa renda, assumindo com isso um caráter assistencialista, com aplicações orçamentárias insuficientes, atendimentos ineficazes, precariedade de insta-lações, formação aligeirada de seus profissionais etc. Essas instituições eram marcadas por uma visão que estigmatizava a população mais pobre.

Mudar este quadro significa atentar para várias questões que vão além dos aspectos legais. Envolve a concepção sobre a infância, as relações entre classes sociais, as responsabilidades da sociedade e o papel do Estado diante das crianças pequenas.

A importância do trabalho na Educação Infantil está em criar “janelas de oportunidades” para o desenvolvimento da inteligência e do potencial humano. Democratizar a ciência a favor da criança significa olhar o desen-volvimento humano de forma inusitada e oferecer a todos o direito à educa-ção desde o nascimento.

A elaboração de propostas educacionais deve estar fundamentada em concepções acerca de como educar para o desenvolvimento e para o conhe-cimento a ser construído ao longo de toda a Educação Básica.

A situação da Educação Infantil no BrasilA Educação Infantil no Brasil tornou-se uma necessidade social. Além dos

direitos da criança garantidos, a Constituição Federal também assegura aos pais trabalhadores o direito à Educação de seus filhos e dependentes de 0 a 6 anos. Para as famílias de renda insuficiente, é necessário o Estado prover os

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meios para a educação e o cuidado de seus filhos pequenos e garantir um desenvolvimento global das crianças, com boa qualidade neste acompanha-mento da Educação Infantil.

Por uma questão histórica, o atendimento às crianças de 0-3 anos teve até pouco tempo, um caráter assistencial, com cuidados físicos, saúde e ali-mentação, principalmente às mães que trabalhavam fora de casa. Só agora, depois da LDB 9.394/96, é que as creches começam a registrar-se como órgãos educacionais. Estimativas precárias indicavam até alguns anos atrás, um número de 1 400 000 crianças atendidas nesta faixa de 0-3 anos. Segun-do o diagnóstico da Educação Infantil, contido no Plano Nacional de Educa-ção (PNE), qualquer número de atendimentos é uma quantidade pequena diante dos 12 milhões de crianças dessa faixa etária.

Segundo dados mais consistentes, o atendimento em maior número se dá nas idades mais próximas à escolarização obrigatória, ou seja, dos 4 aos 6 anos. Cerca de 4,3 milhões de uma população de mais ou menos 9,2 milhões de crianças estavam matriculadas em pré-escolas no final do século XX.

Observou-se que a distribuição das matrículas nos anos iniciais desta década teve um grande aumento na esfera municipal, enquanto nas esferas públicas estaduais e na iniciativa privada, houve uma acentuada redução. Esse fenômeno está relacionado à prioridade constitucional de atuação dos municípios nesse nível.

Há dados levantados pelo MEC/INEP que mostram um crescimento maior de pré-escolas na área do Nordeste (47,5%). É interessante notar que quase a metade atende até 25 alunos, o que caracteriza pequenas unidades pré- -escolares com apenas uma sala. Essa questão, o número de crianças por pro-fissional, é muito importante, já que nesta faixa etária é necessário um aten-dimento mais individualizado. No setor público, é de aproximadamente 21 crianças por professor e, no setor privado, a média é um pouco menor: 18,7.

Com relação ao nível de formação do profissional para a Educação Infan-til, houve, a partir da LDB, um aumento do índice de diplomados em nível superior trabalhando na Educação Infantil, graças às legislações criadas nos últimos anos e ao crescimento dos cursos universitários de formação de professores para a Educação Infantil e para os anos iniciais do Ensino Fundamental.

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Quanto à infraestrutura, o que o diagnóstico do PNE aponta é que muitas pré-escolas e creches não têm abastecimento de água, principalmente no Nordeste. Registra-se também que 20% dos estabelecimentos da área rural não possuem energia elétrica, privando-os da possibilidade de acesso aos meios mais modernos da informática, como instrumentos lúdicos de apren-dizagem. Mais grave ainda é que 58% dessas crianças frequentam estabele-cimentos sem sanitários adequados e sem saneamento básico.

Além disso, 70% dos estabelecimentos infantis não têm parquinho e muitas pré-escolas são anexadas a escolas de Ensino Fundamental, onde o acesso à área externa é restrito e tem que ser dividido com muitos outros alunos. Esse problema deve merecer atenção especial do poder público, por ser a Educação Infantil o espaço para um desenvolvimento integrado para uma criança indivisível, devendo os brinquedos livres, criativos e grupais nessa faixa etária, serem valorizados nos projetos político-pedagógicos em todos os momentos das atividades escolares.

Finalmente, uma intervenção na infância, através de programas de de-senvolvimento infantil, que englobem ações integradas de educação, saúde, nutrição e apoio familiar deve ser vista como um importante instrumento de desenvolvimento econômico e social do país.

As estatísticas da Educação Básica, no final da década de 1990 mostra-vam uma redução de matrículas na pré-escola. Provavelmente, essa redução deveu-se à implantação do Fundef, que contemplou apenas o Ensino Fun-damental. Assim sendo, muitas pré-escolas foram fechadas ou tiveram seu quantitativo de alunos reduzido. Na próxima década, o Fundeb deverá ser uma das soluções para as diversas demandas, sem prejuízo da prioridade constitucional do Ensino Fundamental.

Principais diretrizes de Educação InfantilA Educação Infantil terá um papel cada vez mais importante na formação

da pessoa, no desenvolvimento de sua capacidade e inteligência. Todas as pesquisas resultantes do Sistema Nacional de Educação Básica (Saeb) nos dão bastante segurança em afirmar que o investimento em Educação Infan-til obtém uma taxa de retorno econômico e social superior a qualquer outro, pois os alunos do Ensino Fundamental que iniciaram sua escolarização na pré-escola, têm desempenho melhor em todas as avaliações já aplicadas.

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Para que a Educação Infantil possa ser de qualidade, beneficiando a todos as crianças desta faixa etária, deverão ser tomadas medidas de natureza política, medidas econômicas e medidas administrativas que atendam aos direitos e às necessidades das crianças em todas as áreas como Educação, Assistência Social, Justiça, Trabalho, Cultura, Saúde e Comunicação Social, como já está explicitado no Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA - Lei 8.069/1990).

Compete às três esferas de governo – Municípios, Estado e União – uma ação conjunta, em corresponsabilidade com a família, no que se refere ao conhecimento de processos de educação, valores e expectativas, a fim de que a educação familiar e a escolar se complementem e se enriqueçam, produzindo aprendizagens amplas, coerentes e significativas. Os Estados e a União darão apoio técnico e financeiro aos Municípios, sempre que neces-sário. Todo o investimento financeiro para cumprir as metas de abrangência e qualidade na primeira etapa de vida terá taxas de retorno garantido, como indicam os dados educacionais de países com desenvolvimento econômico semelhante ao nosso.

A qualificação do profissional para atuar na faixa de 0 a 5 anos inclui o conhecimento do desenvolvimento da criança, com bases científicas. Além da formação acadêmica, o profissional deverá estar se renovando constante-mente, em contínuo processo de formação.

Se começarmos agora, no período de dez anos, o Brasil poderá chegar a uma Educação Infantil que englobe toda a faixa etária de 0 a 5 anos, promo-vendo a superação da dicotomia creche/pré-escola, garantindo um processo contínuo, sem passagens traumáticas que exigem “adaptação” entre as cre-ches e a pré-escola e entre esta e o primeiro ano do Ensino Fundamental.

O PNE também propõe a oferta pública de Educação Infantil para famílias de baixa renda, situando as instituições em áreas de maior necessidade e nelas concentrando o melhor de seus recursos técnicos e pedagógicos. Por se acreditar que os efeitos positivos da Educação Infantil sobre o indivíduo, já constatado por pesquisas nacionais, garantem o desenvolvimento da in-teligência e da personalidade nestes primeiros anos de vida, devemos lutas por uma educação pública de qualidade para todos, porém, prioritariamente para as crianças sujeitas às exclusões ou vítimas dela.

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Atividades1. Relacione a maior diferença da aplicação dos recursos financeiros, após a im-

plantação do Fundeb em substituição do Fundef.

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2. Houve aumento do atendimento à Educação Infantil (crianças de 0 a 5 anos) nos últimos dois anos em diversas cidades do Brasil. Escolha dois municípios e obtenha os dados diretamente na página do Inep, no Sistema de Consulta à Matrícula do Censo Escolar, disponível em: <www.inep.gov.br/basica/cen-so/Escolar/matricula>, ou no link Sinopses Estatísticas.

Dicas de estudoÉ indispensável que você leia o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA),

pois, como educador, é importante que você conheça como a educação foi ana-lisada nesta importante legislação brasileira. Você poderá ler o ECA em seu texto original ou conhecer seus detalhes de forma divertida junto com a Mônica, o Cebolinha, a Magali, o Cascão, e outros personagens criados por Maurício de Souza, acessando o site: <www.fundacaofia.com.br/ceats/eca_gibi/capa.htm>.

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Maria Inês do Rego Monteiro BomfimNa aula de hoje, você vai ler e verificar que trataremos de uma das

etapas mais desafiantes da Educação Básica brasileira: o Ensino Médio.

A nossa atual LDB (Lei 9.394/96) define o Ensino Médio como a etapa final da Educação Básica, aquela considerada indispensável para o de-senvolvimento pessoal, o exercício da cidadania, o acesso às atividades produtivas e aos níveis mais elevados de estudo. Básico, nos diz o Dicioná-rio Aurélio, é aquilo que serve de base, o que é essencial e que, portanto, todos deveriam receber.

Apesar de indispensável diante das exigências do mundo atual e das necessidades da nossa sociedade, o Ensino Médio equivalente aos 10.º, 11.º e 12.º anos de escolarização, após a implantação do Ensino Funda-mental de nove anos, definido pela atual legislação como “pós-obriga-tório”. O compromisso do Estado é apenas com o Ensino Fundamental e com a progressiva extensão da obrigatoriedade e gratuidade do Ensino Médio.

Assim, apesar do avanço da nossa atual LDB, quando considera o Ensino Médio como parte da Educação Básica, a escolarização nesse nível para todos os brasileiros ainda está longe de ser alcançada no nosso país.

Para compreender melhor a atual situação do Ensino Médio é preciso voltar no tempo, percorrer a história da Educação brasileira. É aí que vamos encontrar a tradição de duas ofertas diferenciadas de Ensino Médio: uma escolarização para as classes mais altas da sociedade (preparação para a universidade), e outra para as camadas populares (preparação para o tra-balho). Se é verdade que as diferenças sociais não nascem na escola não é possível deixar de observar que a oferta diferenciada de escolarização pro-move e cristaliza diferenças presentes na estrutura da nossa sociedade.

Vale lembrar que nossa herança escravocata e senhorial excluiu por séculos a maior parte dos brasileiros do direito à Educação. Destinada ao

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preparo das elites, a Educação não precisava se ocupar nem dos escravos, nem dos índios nem dos cablocos. Olhando sob esse enfoque, fica mais claro com-preender porque o Ensino Médio ou o Ensino Secundário, como também já foi chamado, não esteve, ao longo da nossa história, disponível para a maioria.

Apesar da expressiva expansão da oferta pública pelas redes estaduais de ensino, ainda existem muitos jovens brasileiros sem acesso ao Ensino Médio. No ano de 2000, um terço dos brasileiros com idade entre 15 e 19 anos estava fora da escola. Na realidade, uma boa parte desses jovens já estava trabalhando para garantir o seu sustento ou o de sua família. Entre aqueles que estavam estudando, o Censo de 2000, do IBGE, mostrou que menos da metade (46%) estava nas classes de Ensino Médio. A maior parte deles (48%) estava ainda no Ensino Fundamental.

Para os que conseguem estudar, nem sempre a qualidade da oferta de Ensino Médio está garantida. As condições precárias, em especial na escola noturna, se re-velam na frequente inexistência de laboratórios de informática e de ciências ou na indisponibilidade da biblioteca, na insuficiência do próprio conteúdo, na ausência de condições de trabalho e no despreparo e na falta de habilitação do professor.

Observe agora o gráfico a seguir. Procure analisar como os recursos disponí-veis nas escolas de Ensino Médio, no ano de 2001, eram insuficientes, sendo tal situação agravada, muitas vezes, pela dificuldade dos professores em utilizá-los.

84,3%

62,5%55,9%

48,1% 45,6%

Biblioteca TV Escola Lab. Informática Lab. Ciências Ligada àInternet

%

Fonte: MEC/INEP, 2001

Figura 1 - Proporção de escolas de ensino médio com recursos disponíveis aos alunos

(MEC

/INEP

, 200

1)

Na realidade atual, em que as exigências são tantas para quem quer continuar estudando ou para quem precisa trabalhar podemos nos perguntar:

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De que forma os professores de Física, Química e Biologia poderão garan- �tir um ensino de qualidade para todos os alunos se em tantas escolas não há laboratórios?

Que possibilidade de acesso a um maior conhecimento podem ter os alu- �nos do Ensino Médio e que estudam em escolas onde não há bibliotecas?

A escola de Ensino Médio mal-equipada, sem acesso à internet e labora- �tórios estará contribuindo para ampliar as desigualdades já existentes na nossa sociedade?

Este pequeno retrato do Ensino Médio brasileiro e que esconde também dife-renças regionais (há estados brasileiros em que as condições são mais precárias do que em outros), nos permite concluir que os alunos brasileiros têm acesso diferenciado ao saber e que estão sendo ampliadas na escola as desigualdades sociais já existentes.

O Ensino Médio na LDBA LDB, em 1996, trouxe mudanças para o Ensino Médio, assim como as Di-

retrizes Curriculares Nacionais definidas, em 1998, pelo Conselho Nacional de Educação. Veja no quadro, a seguir, algumas dessas alterações que repercutiram no dia-a-dia das escolas.

Características Ensino Médio depois da LDB

Carga Horária Mínimo de 2 400h

Dias letivos Mínimo de 200 dias

Carga horária anual Mínimo de 800h

Áreas de conteúdo Linguagens, Códigos e suas Tecnologias, Ciências da Natureza, Matemática e suas Tecnologias, Ciências Humanas e suas Tecnologias.

Organização curricular Base Nacional Comum e Parte Diversificada

Responsabilidade maior pela oferta Sistemas Estaduais de Educação

Projeto pedagógico Autonomia escolar

Neste tema, elegemos alguns destaques para nossa reflexão sobre o Ensino Médio: a responsabilidade pela oferta, a autonomia das escolas, a organização curricular e a preparação para o trabalho.

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A primeira questão que queremos destacar é a responsabilidade da oferta. A quem cabe oferecer um Ensino Médio de qualidade para todos?

A responsabilidade pela oferta de Ensino MédioNo seu art. 10, a LDB define que os Estados devem oferecer, com prioridade,

o Ensino Médio. Aos municípios, cabe oferecer a Educação Infantil em creches e pré-escolas, e, com prioridade, o Ensino Fundamental, permitida a atuação em outros níveis de ensino somente quando estiverem atendidas plenamente as necessidades de sua área de competência e com recursos acima dos percentuais mínimos vinculados pela Constituição Federal à manutenção e desenvolvimen-to do ensino.

Pensando na oferta educacional da sua cidade e nas escolas existentes você poderá perceber que essas competências estão sendo assumidas, o que também está ocorrendo na maior parte do Brasil. Como sabemos, a oferta de Ensino Médio é essencialmente estadual. Em todas as Unidades da Federação foram promovidas mudanças significativas no desenho dessa oferta. A principal mudança foi a extinção da oferta integrada de Ensino Médio e Ensino Técnico, especialmente a partir de 1998.

A partir de 2008, porém, este cenário passa a ter mudanças, pois a Lei 11.741, promulgada em 16 de julho deste ano, alterou artigos da LDB (Lei 9.394, de 20 de dezembro de 1996), que passou a vigorar acrescida de uma nova Seção, denomi-nada “Da Educação Profissional Técnica de Nível Médio”, e dos Artigos. 36-A, 36-B, 36-C e 36-D. O Artigo 36A determina que “o Ensino Médio, atendida a formação geral do educando, poderá prepará-lo para o exercício de profissões técnicas”.

A autonomia das escolas: é preciso ousarAssim como no caso do Ensino Fundamental, os estabelecimentos de Ensino

Médio, a partir da LDB, deverão criar e desenvolver, com a participação da equipe docente e da comunidade, alternativas institucionais com identidade própria, voltadas para a Educação do jovem, usando ampla e destemidamente as várias possibilidades de organização pedagógica, espacial e temporal, e de articula-ções e parcerias com instituições públicas ou privadas, abertas pela LDB.

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Toda escola de Ensino Médio deve ter seu próprio projeto político-pedagó-gico, respeitando as diretrizes gerais definidas pela LDB e buscando atender às demandas dos alunos que a procuram. Mas, como você sabe, para trabalhar de forma diversificada e com qualidade é preciso ter recursos, equipamentos, pro-fessores das áreas necessárias e muita disposição para ousar. Essas condições não estão presentes na maioria de nossas escolas, tanto públicas como particu-lares e o Ensino Médio oferecido hoje está, muitas vezes, distante da realidade do aluno que o procura.

A legislação (Decreto 2.208/98) que regulamentou a LDB definiu que o Ensino Médio, como vimos, não podia ser oferecido de forma integrada à Educação Pro-fissional, em uma só proposta, apenas. Isso significou que o aluno que buscasse uma profissão em nível médio teria de cursar ao mesmo tempo ou depois de concluir o Ensino Médio um curso de Educação Profissional, em nível técnico.

As intensas discussões que ocorreram no Brasil, pelo desagrado que o De-creto n. 2.208/98 provocou, levaram o governo a repensar esta situação e deter-minar através do Decreto n. 5.154, de 23 de julho de 2004, que a articulação da Educação Profissional de nível técnico e o Ensino Médio dar-se-á de forma integra-da, concomitante (mesma ou distintas instituições) ou, subsequente.

Ao pensar na realidade do Estado do Paraná, por exemplo, onde segundo o Censo de 2000, 24,8% dos jovens com idade entre 15 e 17 anos trabalhava e es-tudava ao mesmo tempo e outros 12,5% só trabalhavam, podemos pensar: uma proposta de formação geral e que não assegura uma profissão em nível médio é a que melhor atende aos interesses desses alunos? Provavelmente não. E há pesquisas que sinalizam essa necessidade para os alunos. Os estudos de Sallas et al. (1999, p. 189), promovidos pela Unesco e pelo Instituto Ayrton Senna, em Curitiba, no Paraná mostram que:

Um aspecto fundamental revelado pela fala dos jovens estudantes de escola pública da periferia de Curitiba é o seu assombro, diante do estreitamento efetivo de suas oportunidades de trabalho. Nesse grupo de jovens trabalhadores, a palavra que não foi mencionada foi Universidade, que deixa de existir em seu horizonte de expectativas como fato e como representação. Para eles, o que conta é ter o quanto antes uma profissão, e não compreendem o processo de retirada dos cursos profissionalizantes dos currículos das escolas estaduais de segundo grau, que transformaram seus currículos em Educação Geral. (SALLAS et al., 1999, p.189)

Entretanto, a LDB em vigor é mais indicativa do que prescritiva e no caso do Ensino Médio há brechas para se repensar essa etapa da Educação Básica, priorizando as necessidades dos alunos. Como já dissemos, isso exige recursos,

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equipamentos, mas requer também conhecer em profundidade nossos alunos e suas demandas. Mais do que isso, exige compromisso dos professores para en-frentar os desafios de uma realidade tão complexa e tão desigual como a nossa. Este, aliás, é um dos compromissos de quem é educador.

Compreendendo que nossos jovens alunos são o verdadeiro sentido da escola de Ensino Médio, devemos, com os pés no chão:

analisar a situação atual do Ensino Médio da maneira como ela se apre- �senta. Por que tem sido assim? Em que realidade ela se insere? Poderia ser diferente?

conhecer em profundidade os alunos. Quem são eles e o que esperam da �escola? São trabalhadores? Precisam trabalhar para continuar estudando? Que experiência, como trabalhadores, eles trazem?

pensar que plano curricular, que metodologias e que concepção de ava- �liação poderiam facilitar esse processo. O que seria preciso mudar?

discutir que organização pedagógica, incluindo a definição dos tempos e �espaços escolares, pode atender às necessidades dos alunos. O calendá-rio, a duração de cada tempo de aula, o horário do curso está adequado? Pode ser diferente?

garantir espaços de participação efetiva por todos. Estamos, de fato, abertos �a ouvir e acolher a rica experiência que nossos alunos trazem para a escola?

Neste momento, assim como você, muitas pessoas estão também refletindo sobre o Ensino Médio, suas finalidades e possibilidades. Tais discussões estão presentes nas escolas, nos sindicatos, nas representações dos educadores e também no próprio Ministério da Educação. Procure, também, participar dessas discussões.

A organização curricular do Ensino Médio: os avanços possíveis

No seu art. 36, a LDB prevê que o currículo do Ensino Médio destacará a Educa-ção tecnológica básica, a compreensão do significado da ciência, das letras e das artes; o processo histórico de transformação da sociedade e da cultura; a Língua Portuguesa como instrumento de comunicação, o acesso ao conhecimento e o

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exercício da cidadania. Prevê, ainda, que o Ensino Médio adotará metodologias de ensino e de avaliação que estimulem a iniciativa dos estudantes e que será incluída uma Língua Estrangeira Moderna, como disciplina obrigatória escolhida pela comunidade escolar e, uma segunda, de caráter optativo, de acordo com as possibilidades da instituição.

Quando relembramos da realidade do Ensino Fundamental, nas dificul-dades pelas quais passam as escolas e os professores, de forma geral, você considera que a proposta contida na LDB para o Ensino Médio é viável? Compreendemos que avançar na direção de uma escola mais democrática de Ensino Médio no nosso modelo de sociedade, tão excludente e repleto de desi-gualdades, não é tarefa fácil, como sabemos.

Por isso mesmo, acreditamos, como Kuenzer (2001, p. 37-43) que, nesse quadro, “não há que se tomar de desânimo, e sim buscar o avanço possível, em face aos recursos disponíveis, da escola concreta com suas possibilidades e li-mitações, na contramaré da exclusão”. Estamos aqui propondo que você reflita sobre as possibilidades de avançar na direção da escola média e democrática para todos nas condições concretas e historicamente dadas da nossa realidade.

Assim, entendemos que a escola média deverá ser capaz de, articulando ciência, trabalho e cultura, exercer a função universalizadora e que as finalidades postas para o Ensino Médio na LDB devem ser tomadas como ponto de chegada, orientando as ações que considerem a escola e o jovem como referência.

Para tanto, a escola de Ensino Médio precisa deixar de ser enciclopédica para ser capaz de oferecer a todos que a procuram uma proposta que integre conhe-cimentos capazes de articular teoria e prática, pensamento e ação.

Ainda segundo a atual legislação, os currículos do Ensino Fundamental e Médio devem ter uma base nacional comum a ser contemplada, em cada siste-ma educacional de ensino e estabelecimento escolar, por uma parte diversifica-da do currículo, que não deverá ultrapassar a 25% da carga horária total, isto é, 600h, exigida pelas características regionais e locais da sociedade, da cultura. A parte específica, articulada à parte geral do currículo, não se apresenta neces- sariamente na forma de disciplinas, podendo inclusive ser desenvolvida com base em projetos que envolvam vários professores de diferentes disciplinas. Para professores e alunos, discutir e propor formas diferenciadas de ensinar e apren-der que extrapolem os próprios muros da escola, é uma possibilidade concreta de articular a escola com a comunidade.

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A preparação geral para o trabalho no Ensino Médio: possibilidades

Como já vimos, de acordo com a atual legislação, o Ensino Médio não prepara para nenhuma profissão. Tal preparação está no âmbito da Educação Profissio-nal, de nível técnico que, a partir do Decreto n. 5.154/2004, pode ser integrada a esta etapa da Educação Básica. Mas o Ensino Médio, diz a LDB, deve preparar para o trabalho.

Mencionada no art. 35, da LDB, vinculando essa preparação à possibilidade do educando de continuar aprendendo, de modo a ser capaz de se adaptar com flexibilidade a novas condições de ocupação ou aperfeiçoamento posteriores, o assunto foi detalhado nas Diretrizes Curriculares Nacionais de Nível Médio: a preparação será básica, ou seja, aquela que deve ser base para a formação de todos e para todos os tipos de trabalho.

Entretanto, essa forma mais genérica de tratar a questão da preparação para o trabalho no Ensino Médio trazia, como risco, a possibilidade de não se conse-guir chegar a nenhum lugar, reproduzindo o velho e conhecido modelo enciclo-pédico de Ensino Médio/Secundário, característico no nosso país: um pouco de cada coisa e muita desarticulação. Esse tipo de Ensino Médio, certamente, não interessa a todos que o procuram e que têm na escola a sua possibilidade maior de acesso ao conhecimento e à preparação para o trabalho.

Se o Ensino Médio não está voltado para o preparo de um profissional es-pecífico não é possível desconsiderar que o trabalho está fortemente presente na escola média por meio de seus alunos. Como você pôde ver, uma parcela expressiva dos alunos de hoje já trabalha. Diante disso, qual seria a proposta que melhor atenderia aos interesses dos diferentes alunos?

Acreditamos que, na nossa realidade, a proposta mais democrática de Ensino Médio é a que assegure para todos e de forma concreta as finalidades que a própria LDB define para este nível de ensino. Tal proposta se opõe ao ensino tradicional que beneficia os já incluídos e também se distancia de um ensino profissionalizante estreito, do tipo tecnocrático, voltado para a produção em série de especialistas que aprendem a fazer, apenas, mantendo-se condenados à pobreza cultural.

É esse o desafio maior da escola de Ensino Médio, o ponto de chegada de propostas mais democráticas e que não acentuem as desigualdades já exis-

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tentes na nossa sociedade. O ponto de partida será sempre nosso aluno e suas demandas.

Texto complementar

Excelentíssimo Senhor Presidente da República(BUARQUE, 2008)

Como bem sabe Vossa Excelência, a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, ao definir o Ensino Médio como última etapa da Educação Básica, buscou superar a histórica dualidade da educação secundária do país que configurava, por um lado, a vertente preparatória para o prosseguimento de estudos superiores e, por outro, a vertente preparatória para o mundo do trabalho. Compreendido como Educação Básica, o Ensino Médio passa a ter um fim em si mesmo e não em algo externo ou posterior a ele: o vestibular ou o mercado de trabalho.

Por isso, em suas finalidades incluem-se tanto a consolidação dos conhe-cimentos adquiridos no Ensino Fundamental quanto a preparação básica para o trabalho e o exercício da cidadania. A cidadania é uma condição que se conquista e se exerce desde a infância, mediante a garantia dos direitos dos estudantes. Se o Ensino Médio é uma etapa da Educação Básica cursada, predominantemente, por adolescentes e jovens, esses devem ser conside-rados também como sujeitos de direitos. Dentre os seus direitos deve estar a garantia de que a organização pedagógica atenda às suas diversas neces-sidades, sejam elas de caráter social, cultural, econômico ou cognitivo.

Nesse sentido, deve-se tanto incentivar quanto admitir que, garantindo- -se a base unitária comum de formação geral no Ensino Médio, sua organiza-ção seja diferenciada dentro do sistema nacional de educação e nos sistemas de ensino, quando isto se justificar para atender às necessidades da popula-ção jovem, principalmente aquelas advindas das classes trabalhadoras. Com isso estamos dizendo que as finalidades do Ensino Médio não podem estar no vestibular ou no mercado de trabalho, mas sim nas necessidades de seus estudantes. Dentre essas, inclui-se a sua preparação social e intelectual para realizar escolhas após a conclusão da Educação Básica. O acesso ao Ensino

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Superior e/ou ao mercado de trabalho, dentre outras possibilidades, deve ser o resultado das escolhas possibilitadas por um Ensino Médio de qualidade, não a razão deste. Esta não é uma mudança propriamente formal, mas sim cultural, cuja tradução se resume em considerar os sujeitos humanos como referência para o Ensino Médio.

A Educação Básica tem como finalidade o desenvolvimento do cidadão, assegurando-lhe meios para progredir no trabalho e em estudos posterio-res. Esta última finalidade deve ser desenvolvida de maneira precípua pelo Ensino Médio, uma vez que entre as suas finalidades específicas incluem-se “a preparação básica para o trabalho e a cidadania do estudante”, a serem de-senvolvidas por um currículo que destacará a educação tecnológica básica, a compreensão do significado da ciência, das letras e das artes; o processo histórico de transformação da sociedade e da cultura; a Língua Portugue-sa como instrumento de comunicação, acesso ao conhecimento e exercício da cidadania. A valorização da diversidade étnico-racial e cultural do povo brasileiro resgata a importância, ainda, do ensino bilíngue, garantindo aos indígenas a educação na sua língua materna.

Não há dúvidas de que a lei definiu que o Ensino Médio deve consolidar uma formação básica que contemple a compreensão dos princípios cientí-fico-tecnológicos, sócio-históricos que organizam a produção e as relações sociais modernas, visando à formação de cidadãos plenos. No entanto, essa perspectiva educativa deve se efetivar no projeto escolar, compreendido pelo currículo formal e pelas relações pedagógicas que se processam no in-terior da escola, definido de acordo com uma concepção educacional clara que tem como eixos a ciência, o trabalho e a cultura.

A compreensão que temos de trabalho não é exclusivamente econômica ou produtiva, mas ele se constitui o meio pelo qual o ser humano produz as condições de sua existência. Igualmente, quando falamos em ciência, referimo-nos ao conhecimento produzido socialmente ao longo da história, que permite aos homens compreender, transformar e apropriar-se dos fenô-menos naturais e das relações sociais. Esses conhecimentos, a cujo acesso todos os cidadãos têm o direito, são transmitidos e apreendidos nas escolas de forma sistematizada. Por isso a escola cumpre um papel importante na ampliação dos conhecimentos da população ao promover a democratização do acesso a eles, assim como possibilita a socialização da cultura que carac-teriza uma sociedade e os diversos grupos sociais. Com isto queremos resga-

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tar o princípio da educação tecnológica ou politécnica para o Ensino Médio, definida como a educação que tem por base a produção de conhecimentos como um processo histórico, desenvolvidos e apropriados socialmente para a transformação das condições naturais da vida e a ampliação das capacida-des, das potencialidades e dos sentidos humanos. Esse tipo de Ensino Médio, ao proporcionar aos jovens as bases dos conhecimentos que lhes permitam analisar e compreender o mundo da natureza e o mundo humano, social, político, cultural e estético, possibilita o desenvolvimento de capacidades criadoras que lhes assegurem condições de escolhas após a conclusão da Educação Básica, seja em direção ao Ensino Superior, ao mercado de traba-lho ou a outras opções.

Deve-se destacar, ainda, que para uma significativa parcela dos jovens brasileiros, a obtenção de uma formação profissional em nível médio é uma necessidade e, poder fazê-lo como complementação da formação geral, em um mesmo currículo, é a estratégia que garante a obtenção simultânea da escolaridade com uma profissão. O Decreto no 2.208/97, ao regulamentar a Educação Profissional, incluindo o parágrafo 2.° do artigo 36, impossibilitou qualquer perspectiva profissionalizante no Ensino Médio.

Pelo modelo definido por aquele decreto, o cidadão que deseja/necessita obter uma profissão técnica na etapa média da Educação Básica, que antes disputava uma matrícula visando ao atendimento dessa dupla necessidade, foi obrigado a disputar duas matrículas. Fazendo a opção por ambas as for-mações concomitantemente, a dupla jornada escolar, para a maioria, passou a ocorrer em condições precárias (alimentação imprópria, permanência des-confortável na mesma escola, ou traslados cansativos de uma escola para outra, além da despesa financeira muitas vezes difícil de ser arcada). Na im-possibilidade de enfrentar as condições anteriores, os filhos das classes mais desfavorecidas acabam abandonando, seja a própria educação regular, seja a Educação Profissional, restando a esses, na melhor das hipóteses, a escola-ridade mínima obrigatória e os cursos de qualificação profissional.

Não há dúvida de que a configuração dos processos produtivos no Brasil, os tipos de oportunidades que se apresentam aos jovens e as suas necessi-dades de cultivar uma identidade própria aliadas à de construir múltiplas possibilidades para o seu futuro, exige que se retome a possibilidade de o Ensino Médio preparar o cidadão para o exercício de profissões técnicas, tal como já apregoa a LDB, desde que assegurada a sua formação geral. Sob

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essas condições, a oferta de Ensino Médio integrado à formação profissional é uma necessidade propalada pelos próprios jovens. Essa organização curri-cular exigirá a ampliação da duração do Ensino Médio em um ano letivo ou mais, totalizando pelo menos 4 (quatro) anos.

Não podemos desconsiderar, porém, que ao longo dos seis anos em que vigorou o impedimento desta modalidade, os sistemas e as instituições de ensino procuraram soluções para o atendimento da necessidade de profis-sionalização dos jovens. Assim, passaram a oferecer cursos técnicos a serem cursados pelos estudantes concomitantemente ou após o Ensino Médio. A despeito das críticas merecidas por este modelo, tal como já discorremos acima, não se pode negar que alguns sistemas têm logrado êxito, principal-mente nos casos em que não é possível oferecer um Ensino Médio de quatro anos, mas se constata a necessidade de se oferecer a profissionalização nesta etapa de escolaridade. Com isso, vemos experiências importantes de Ensino Médio articulado à Educação Profissional; experiências essas que não devem ser impedidas. Não obstante, é imperioso que, nesta modalidade, ambas as etapas, mesmo sendo cursadas em diferentes instituições e/ou sistemas de ensino, haja um planejamento conjunto dos planos de curso, visando à cons-tituição de uma coerência curricular, bem como ao desenvolvimento, pelo estudante, de uma trajetória formativa com uma orientação adequada aos seus interesses e possibilidades.

Mantemos ainda, com este decreto, o formato da Educação Profissional como educação continuada, a qual o concluinte do Ensino Médio poderá ter acesso a qualquer tempo. Por ter esta configuração e visar ao atendimento principalmente de pessoas que já cursaram o Ensino Médio e não obtiveram uma profissão e assim o desejariam, ou mesmo daqueles que buscam uma nova profissão, os cursos técnicos podem ser cursados após o Ensino Médio, que o tenham como pressuposto.

É preciso falar sobre os trabalhadores com baixa escolaridade. No Brasil há cerca de 70 milhões de jovens e adultos que não concluíram a Educação Básica. Fala-se de um público que hoje, teriam na Educação Profissional uma possibilidade não somente de formação para as ocupações, mas também e principalmente, de elevação de escolaridade. Consideramos ser imperio-so determinar às instituições, que ofertem cursos de qualificação básica de forma conjugada com a elevação da escolaridade do trabalhador, no mínimo ao Ensino Fundamental. Sabemos que as políticas de formação profissional

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dos últimos anos não considerou esse problema, tendo-se desenvolvido sem qualquer articulação com a política educacional, principalmente de educação de jovens e adultos. É essa articulação que pretendemos construir, inclusive com a princípio de integrar os cursos em itinerários formativos, sob uma orientação das instituições formadoras, em diálogo permanente com instâncias coletivas de regulação do trabalho.

Diante de todos os motivos apresentado, Sr. Presidente, a consolidação do Ensino Médio como etapa da Educação Básica que possibilite aos jovens a realização de escolhas e a ampliação da política da Educação Profissional coerente com as necessidades dos trabalhadores no sentido de sua emanci-pação, é imperioso que a regulamentação proposta para os artigos 35 e 36 da LDB, que dispõem sobre o Ensino Médio, para os artigos de 39 a 42, que versam sobre a Educação Profissional venha acompanhada da revogação do Decreto no 2.208/97.

Estamos certos de que, com essas medidas, garantiremos a melhoria da qualidade do Ensino Médio como etapa da Educação Básica, ao mesmo tempo em que ampliaremos as oportunidades para os nossos jovens e adul-tos brasileiros, em busca de uma profissão e/ou de novos horizontes em suas vidas.

Atividades1. Você conhece esta música do Gabriel O Pensador? Leia, cante também se

souber a música e depois responda: Você conhece outras formas de se viver o Ensino Médio? Na sua opinião, pode ser diferente? Como?

Estudo erradoGabriel O Pensador

Eu tô aqui pra quê?

Será que é pra aprender?

Ou será que é pra aceitar, me acomodar e obedecer?

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Tô tentando passar de ano pro meu pai não me bater

Sem recreio de saco cheio porque eu não fiz o dever

A professora já tá de marcação porque sempre me pega

Disfarçando, espiando, colando toda prova dos colegas

E ela esfrega na minha cara um zero bem redondo

E quando chega o boletim lá em casa eu me escondo

Eu quero jogar botão, videogame, bola de gude

Mas meus pais só querem que eu “vá pra aula!” e “estude!”

Então dessa vez eu vou estudar até decorar cumpádi

Pra me dar bem e minha mãe deixar ficar acordado até mais tarde

Ou quem sabe aumentar minha mesada

Pra eu comprar mais revistinha (do Cascão?)

Não. De mulher pelada

A diversão é limitada e o meu pai não tem tempo pra nada

E a entrada no cinema é censurada (vai pra casa pirralhada!)

A rua é perigosa então eu vejo televisão

(Tá lá mais um corpo estendido no chão)

Na hora do jornal eu desligo porque eu nem sei nem o que é inflação

– Ué não te ensinaram?

– Não. A maioria das matérias que eles dão eu acho inútil

Em vão, pouco interessantes, eu fico pu. .

Tô cansado de estudar, de madrugar, que sacrilégio

(Vai pro colégio!!)

Então eu fui relendo tudo até a prova começar

Voltei louco pra contar:

Manhê! Tirei um dez na prova

Me dei bem tirei um cem e eu quero ver quem me reprova

Decorei toda lição

Não errei nenhuma questão

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Não aprendi nada de bom

Mas tirei dez (boa filhão!)

Quase tudo que aprendi, amanhã eu já esqueci

Decorei, copiei, memorizei, mas não entendi

Quase tudo que aprendi, amanhã eu já esqueci

Decorei, copiei, memorizei, mas não entendi

Decoreba: esse é o método de ensino

Eles me tratam como ameba e assim eu num raciocino

Não aprendo as causas e consequências só decoro os fatos

Desse jeito até história fica chato

Mas os velhos me disseram que o “porque” é o segredo

Então quando eu num entendo nada, eu levanto o dedo

Porque eu quero usar a mente pra ficar inteligente

Eu sei que ainda num sou gente grande, mas eu já sou gente

E sei que o estudo é uma coisa boa

O problema é que sem motivação a gente enjoa

O sistema bota um monte de abobrinha no programa

Mas pra aprender a ser um ingonorante [...]

Ah, um ignorante, por mim eu nem saía da minha cama (Ah, deixa eu dormir)

Eu gosto dos professores e eu preciso de um mestre

Mas eu prefiro que eles me ensinem alguma coisa que preste

— O que é corrupção? Pra que serve um deputado?

Não me diga que o Brasil foi descoberto por acaso!

Ou que a minhoca é hermafrodita

Ou sobre a tênia solitária.

Não me faça decorar as capitanias hereditárias!! [...]

Vamos fugir dessa jaula!

“Hoje eu tô feliz” (matou o presidente?)

Não. A aula

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Matei a aula porque num dava

Eu não aguentava mais

E fui escutar o Pensador escondido dos meus pais

Mas se eles fossem da minha idade eles entenderiam

(Esse num é o valor que um aluno merecia!)

Íííh...Sujô (Hein?)

O inspetor!

(Acabou a farra, já pra sala do coordenador!)

Achei que ia ser suspenso mas era só pra conversar

E me disseram que a escola era meu segundo lar

E é verdade, eu aprendo muita coisa realmente

Faço amigos, conheço gente, mas não quero estudar pra sempre!

Então eu vou passar de ano

Não tenho outra saída

Mas o ideal é que a escola me prepare pra vida

Discutindo e ensinando os problemas atuais

E não me dando as mesmas aulas que eles deram pros meus pais

Com matérias das quais eles não lembram mais nada

E quando eu tiro dez é sempre a mesma palhaçada

Refrão

Encarem as crianças com mais seriedade

Pois na escola é onde formamos nossa personalidade

Vocês tratam a Educação como um negócio onde a ganância a exploração e a indiferen-ça são sócios

Quem devia lucrar só é prejudicado

Assim cês vão criar uma geração de revoltados

Tá tudo errado e eu já tou de saco cheio

Agora me dá minha bola e deixa eu ir embora pro recreio...

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2. Os Parâmetros Curriculares Nacionais para o Ensino Médio (PCNEM) estão or-ganizados em três partes: Linguagens, Códigos e suas Tecnologias, Ciências da Natureza, Matemática e suas Tecnologias e Ciências Humanas e suas Tec-nologias. Os PCNEM não são obrigatórios para serem seguidos pelos siste-mas de ensino, mas a LDB e as Diretrizes Curriculares Nacionais precisam ser respeitadas pelos projetos político-pedagógicos das escolas. Acesse: <www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/L9394.htm>. É o site do governo federal que mostra o texto da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB), com as mais recentes alterações de diferentes Artigos. Leia o Artigo 36, seus inci-sos I, II, III e IV e o §1.°, incisos I e II. Estes dispositivos legais contêm as diretri-zes gerais para o currículo do Ensino Médio. Registre por escrito os aspectos positivos e negativos sobre estas determinações.

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Dicas de estudoPara você ficar mais informado sobre o Ensino Médio – tema desta aula –

indicamos o site: <www.redebrasil.tv.br/salto>. Nele, você poderá ler todos os boletins que complementam o programa Salto para o Futuro, que vai ao ar dia-riamente pela TV Brasil.

Sobre o tema Ensino Médio, já foram produzidas várias séries de programas. Sugerimos que, ao abrir o portal do Salto para o Futuro, você clique em “Acesse o Boletim”, para poder ler todos os textos relativos aos programas já produzidos desde 2001.

Nossa dica de estudo para esta aula é que você selecione entre os boletins de 2007 a série de cinco artigos intitulada “Orientações Curriculares para o Ensino Médio”, que foi coordenada pelo Prof. Halien Gonçalves Bezerra (UFG) e inclui reflexões sobre a identidade do Ensino Médio, o projeto político-pedagógico e metodologias, conteúdos disciplinares e competências, princípio pedagógico da interdisciplinaridade e a contextualização no ensino.

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Maria Inês do Rego Monteiro BomfimNeste tema, vamos discutir Educação Profissional depois da LDB. Para

tanto, convidamos você a refletir, inicialmente, sobre as mudanças no mundo do trabalho e o significado de ser trabalhador nos dias de hoje.

Quando o desemprego em massa e a instabilidade das situações profis-sionais são visíveis para toda a sociedade, inserir-se ou manter-se no mer-cado estão dentre as preocupações de todos os que vivem do trabalho.

É em especial a partir de 1970 que os efeitos das atuais mudanças no processo de produção podem ser observados, afetando a forma de ser da classe trabalhadora. A revolução microeletrônica modificou os processos de trabalho, atingiu os trabalhadores e acabou por gerar redução signifi-cativa no número de empregos, exclusão de jovens e idosos do mercado, aumento das formas precárias de trabalho etc. Tais mudanças não são ca-suais e expressam a necessidade da forma capitalista de produção ajustar--se para continuar sobrevivendo e garantindo lucros.

Os efeitos dessas transformações e que podem nos parecer complexas também estão presentes no nosso dia-a-dia. Podemos percebê-las nos níveis de desemprego, na dificuldade de conseguir que a carteira de tra-balho seja assinada, na ênfase nos contratos temporários, na desvaloriza-ção da força de trabalho.

Diante dessa realidade, quando pensamos em educar trabalhadores não estamos falando em preparar robôs ou pessoas adestradas para cum-prir ordens, saber fazer o que lhe for mandado. Pensamos em formação humana de trabalhadores porque, para nós, o ser humano é a medida de todas as coisas. Estamos falando de uma Educação Profissional voltada para a formação de sujeitos autônomos e protagonistas da emancipação humana (FRIGOTTO, 2002).

A escola, em cada sociedade, vem sendo chamada a contribuir para a formação de trabalhadores capazes de se ajustar às exigências do mundo

Educação Profissional: o desafio de formar trabalhadores

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do trabalho. Dentre os seus desafios, a instituição escolar deverá preparar os alunos para compreender e analisar criticamente a visão de mundo e de traba-lho predominante na nossa sociedade.

Nesse sentido, espera-se que a escola formadora de profissionais ultrapasse a visão de Educação como treinamento, recuperando para o espaço pedagógico de Educação Profissional valores como justiça, solidariedade, cooperação, igual-dade, respeito às diferenças, em oposição à competição e ao mérito individual, ao preconceito, tarefas prioritárias de uma escola democrática. Fazer da sala de aula espaço permanente de diálogo e debate coletivo é um caminho para resistir às pressões atuais. Mas é essa a pedagogia que vem servindo de modelo para a formação de trabalhadores nas escolas? É sobre isso que vamos tratar a seguir.

A Educação Profissional e a formação baseada em competências

Você já ouviu falar de polivalência? Polivalente, diz o Dicionário Aurélio, é aquele que é versátil, eficaz em vários casos diferentes. Numa sociedade em que há poucos empregos, a ideia da polivalência do trabalhador acabou ganhan-do destaque no setor produtivo e espaço dentro da escola. Da mesma forma, a “pedagogia das competências” que tem a sua origem no setor empresarial não é uma formulação apenas pedagógica, descomprometida e neutra. Surge para atender às demandas do processo produtivo.

Os modelos de qualificação e os paradigmas de formação não são constru-ções abstratas, nem desvinculadas da realidade social em que se vive, já que as necessidades de formação se originam nas mudanças ocorridas no mundo do trabalho e nas relações sociais, cenário, portanto, a ser considerado quando se procura refletir, de forma crítica, por que se faz e como se faz em Educação Pro-fissional. Neste tema, o que queremos deixar claro é que a nossa escola precisa construir e reconstruir suas propostas, comprometer-se com a formação ampla de seus alunos-trabalhadores e não apenas para um mercado que está sempre se modificando.

A política de Educação Profissional tem hoje no país o “ensino por competên-cias” como um dos seus eixos principais. Aliás, essa é uma realidade em muitos outros países, especialmente a partir dos anos 1980. O assunto para nós é rela-

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tivamente novo e também polêmico, inserindo-se dentro das discussões mais amplas da Educação Profissional.

Perrenoud (1999, p. 53), sociólogo, antropólogo e professor da Universidade de Genève, na Suíça, é uma das referências internacionais da atualidade nesse assunto, diz que:

[...] a abordagem por competências junta-se às exigências da focalização sobre o aluno, da pedagogia diferenciada e dos métodos ativos, pois convida, firmemente, os professores a:

considerar os conhecimentos como recursos a serem mobilizados;•

trabalhar regularmente por problemas;•

criar ou utilizar outros meios de ensino;•

negociar e conduzir projetos com seus alunos;•

adotar um planejamento flexível e indicativo e improvisar;•

implementar e explicitar um novo contrato didático;•

praticar uma avaliação formadora em situação de trabalho;•

dirigir-se para uma menor compartimentação disciplinar.•

O conceito de competência que vem servindo de referência às escolas de Educação Profissional no Brasil é o que consta da Resolução n. 4, do Conselho Nacional de Educação: “Entende-se por competência profissional a capacidade de mobilizar, articular e colocar em ação valores, conhecimentos e habilidades necessários para o desempenho eficiente e eficaz de atividades requeridas pela natureza do trabalho (art. 6.º)”.

A proposta de um “modelo de competências”, ocupando lugar central nas po-líticas de Educação Profissional, continua na pauta de discussões dos educadores. As críticas, em geral, acentuam, no contexto das mudanças dos novos paradig-mas de produção capitalista, o “modelo de competências” como uma pedagogia adaptativa, servindo aos interesses do capital e não dos trabalhadores. Discute- -se, ainda, com base no caráter universal que as políticas educacionais conferem a esse modelo a sua distância das condições reais de trabalho da maioria dos traba-lhadores (FRIGOTTO, 2001; RAMOS, 2001; FERRETTI, 2000; KUENZER, 2001).

Marise Ramos (2001), que vem estudando cuidadosamente o assunto há anos, explica que existe uma grande diversidade de formas de implantação de sistemas de competência na Europa e nos EUA. Conclui também que a mudança

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do conceito de qualificação, assumido anteriormente, para o de competência não traduz, apenas, um novo modismo na Educação Profissional.

Nosso entendimento sobre a questão das competências procura afastar-se da perspectiva de adaptação dos indivíduos às necessidades do setor produti-vo. Seguindo os caminhos percorridos por Neise Deluiz (2001), acreditamos que há princípios que devem nortear a noção de competência em uma abordagem crítica, isto é, comprometida com as necessidades de transformação da nossa realidade social. Essa autora nos lembra, entre outros princípios, que:

a noção de competência deve ser ressignificada, atribuindo-lhe um sentido que atenda aos •interesses dos trabalhadores;

a formação não deve pautar-se pela ótica estrita do mercado, mas levar em conta a dinâmica •e as contradições do mundo do trabalho;

as competências no mundo do trabalho devem ser investigadas e identificadas a partir dos •que vivem as situações de trabalho, ou seja, dos próprios trabalhadores, confrontando os saberes formais dos educadores e os saberes informais dos trabalhadores;

a aprendizagem dos saberes disciplinares deve ser acompanhada da aprendizagem dos •saberes gerados nas atividades de trabalho: conhecimentos, valores, histórias e saberes da experiência, articulando-se teoria e prática;

é fundamental enfatizar a construção de competências para a autonomia e para a •emancipação de relações de trabalho alienadas, para a compreensão do mundo e para a sua transformação;

é fundamental construir competências para uma ação autônoma e capaz nos espaços •produtivos mas, igualmente, voltada para o desenvolvimento de princípios universalistas – igualdade de direitos, justiça social, solidariedade e ética – no mundo do trabalho e da cidadania.

Como você está vendo nesta aula, as escolhas em Educação não são neu-tras. Portanto, essa forma de entender o sentido das competências também não o é. Sugerimos que você releia esses princípios e procure também pensar na sua própria formação como professor e trabalhador da Educação. É dessa forma que você está construindo as competências necessárias à sua atuação como professor?

A LDB e a legislação de Educação ProfissionalNa LDB (Lei 9.394/96), o Capítulo III, em seu Artigo 39, define a Educação Pro-

fissional. A Educação Profissional, integrada às diferentes formas de Educação, ao trabalho, à ciência e à tecnologia, conduz ao permanente desenvolvimento de aptidões para a vida produtiva. O aluno matriculado ou egresso do Ensino

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Fundamental, Médio e Superior, bem como o trabalhador em geral, jovem ou adulto, contará com a possibilidade de acesso à Educação Profissional (art. 39).

Como modalidade de ensino, a Educação Profissional será desenvolvida em articulação com o ensino regular ou por diferentes estratégias de Educação con-tinuada, em instituições especializadas ou no ambiente de trabalho (art. 40). O conhecimento adquirido na Educação Profissional, inclusive no trabalho, poderá ser objeto de avaliação, reconhecimento e certificação para prosseguimento ou conclusão de estudos (art. 41).

Em abril de 1997, o Governo Federal regulamentou a Educação Profissional por meio do Decreto n. 2.208 definindo três níveis: básico, técnico e tecnológico.

Separada do Ensino Médio, admitindo-se a concomitância, a Educação Pro-fissional de nível técnico transformou-se em modalidade de Educação. Por força do Decreto n. 2.208, deixaram de existir os cursos técnicos de nível médio e que articulavam a formação profissional à formação geral (Ensino Médio).

Às escolas de Educação Profissional em nível técnico coube, com base na aná-lise do processo de trabalho de sua área, de uma matriz de referencial de com-petências gerais, propostas pelo MEC e das definições estaduais dos respectivos conselhos de Educação, a elaboração de seus projetos pedagógicos e planos de curso com a necessária aprovação desses conselhos estaduais de Educação.

Tais planos deveriam conter, segundo indicação da Resolução CNE/CEB 4/99 (Art. 10):

justificativa e objetivos; �

requisitos de acesso; �

perfil profissional de conclusão; �

organização curricular; �

critérios de aproveitamento de competências; �

critérios de avaliação; �

pessoal docente e técnico envolvido; �

certificados e diplomas. �

Portanto, no período de 1997 a 2004, para se fazer Educação Profissional era preciso considerar:

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a LDB – Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional; �

o Decreto n. 2.208/97; �

as Diretrizes Curriculares Nacionais de Nível Técnico (Parecer 16/99/CNE) e �a Resolução CNE/CEB 4/99 e seus anexos, em que estão definidos os perfis de competências, acompanhados das respectivas cargas horárias mínimas a serem obedecidas pelas escolas;

a regulamentação do Conselho Estadual de Educação. �

Desde a sua publicação, em 17 de abril de 1997, o Decreto n. 2.208 provocou descontentamento em toda a comunidade de pesquisadores e professores do Ensino Médio e da Educação Profissional, por ter impossibilitado qualquer pers-pectiva profissionalizante no Ensino Médio. Com a posse de Luiz Inácio Lula da Silva na Presidência da República e a nomeação de Cristóvam Buarque para o Mi-nistério da Educação, os debates ganharam densidade e o próprio ministro as-sumiu a liderança da discussão e encaminhou uma carta ao presidente, fazendo ponderações sobre a situação dos jovens brasileiros que necessitam concluir o Ensino Médio com uma formação profissional integrada a esses anos de estudo.

A organização das entidades educacionais teve seus argumentos reconhe-cidos pelo governo federal e, em 2004, através do Decreto n. 5.154, ficou deter-minada a possibilidade de articulação do Ensino Médio com a Educação Profis-sional de nível técnico. A formação profissional de nível técnico passou a ter três formas possíveis: integrada, concomitante ou subsequente ao Ensino Médio.

Em 2005, os dados do Censo Escolar MEC/INEP apontaram para uma quanti-dade excessiva de nomenclaturas, cerca de 2 700 denominações distintas para os 7 940 cursos técnicos de nível médio em oferta, a partir dos dados do Cadastro Nacional dos Cursos Técnicos. O Ministério da Educação solicitou então, ao Con-selho Nacional de Educação que emitisse um parecer sobre o assunto. Após dis-cussão no plenário da Câmara de Educação Básica, foi aprovado o Parecer CNE/CEB n. 11/2008, em 12 de junho de 2008. Por este Parecer ficou determinado que o MEC deveria definir a carga horária mínima para cada um dos cursos, se-guindo a lógica do conhecimento, da inovação tecnológica e dos novos modos de organização da produção, organizando os cursos por eixos tecnológicos, se-melhante a adotada em relação ao Catálogo Nacional de Cursos Superiores de Tecnologia, no âmbito dos cursos de graduação.

Como consequência desse parecer, o ministro da Educação homologou a Resolução CNE nº 3, em 9 de julho de 2008, para disciplinar a instituição e a

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implantação do Catálogo Nacional de Cursos Técnicos de Nível Médio nas redes públicas e privadas de Educação Profissional. Esta Resolução define que o Ca-tálogo deve ser organizado por eixos tecnológicos definidores de um projeto pedagógico que contemple as trajetórias dos itinerários formativos e estabeleça exigências profissionais que direcionem a ação educativa das instituições e dos sistemas de ensino na oferta da Educação Profissional Técnica. Os Conselhos Es-taduais de Educação têm a incumbência de definir as normas complementares para os respectivos sistemas de ensino em relação à implantação do Catálogo Nacional de Cursos Técnicos de Nível Médio.

Finalmente, neste histórico das legislações decorrentes da LDB em relação ao Ensino Profissional, e consolidando o Parecer n. 3/2008 do Conselho Nacional de Educação e a Resolução n. 3, dele decorrente, temos a Lei n. 11.741, promulga-da em 16 de julho de 2008, que teve como finalidade redimensionar, institucio-nalizar e integrar as ações da Educação Profissional Técnica de nível médio, da Educação de Jovens e Adultos e da Educação Profissional e Tecnológica. Por essa Lei, foram alterados artigos da LDB, que passa a vigorar acrescida de uma nova Seção: Da Educação Profissional Técnica de Nível Médio e dos Artigos 36-A, 36-B, 36-C e 36-D.

É bom lembrar que a autonomia da escola de Ensino Médio e Educação Pro-fissional existe e está também garantida na LDB, devendo ser exercida plena-mente no sentido de garantir que a proposta atenda aos interesses da escola e, especialmente, dos seus alunos. E como avançar nessa direção?

Entendemos que em Educação não há receitas, nem fórmulas mágicas, mas há caminhos que podem se traduzir em princípios para a nossa ação, se o que se quer é de fato transformar. Por isso defendemos uma Educação Profissional que:

associe uma visão global da sociedade, da organização do trabalho (frag- �mentado técnica e socialmente) e da prática profissional;

desenvolva a capacidade dos alunos de escolher e decidir formas melho- �res de atuar;

contribua para que todos disponham das possibilidades culturais e cien- �tíficas, não existindo, portanto, separações entre os que pensam e os que fazem.

Como em qualquer nível, etapa ou modalidade educacional a Educação Pro-fissional também exige compromissos do professor. O compromisso do pro-

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fessor revela-se, dessa forma, nas suas próprias escolhas, na defesa do direito à Educação, da dignidade dos docentes, da oferta de um serviço educativo de qualidade para todos. Expressa-se, ainda, na maneira como se relaciona com seus alunos, no que ensina, para que ensina e como ensina.

Texto complementar

Lei 11.741, promulgada em 16 de julho de 2008Faço saber que o Congresso Nacional decreta e eu sanciono a seguinte

Lei

Art. 1.° Os artigos 37, 39, 41 e 42 da Lei 9.394, de 20 de dezembro de 1996, passam a vigorar com a seguinte redação:

“Art. 37.

§3.° A educação de jovens e adultos deverá articular-se, preferencialmen-te, com a educação profissional, na forma do regulamento.”

“Art. 39. A educação profissional e tecnológica, no cumprimento dos ob-jetivos da educação nacional, integra-se aos diferentes níveis e modalidades de educação e às dimensões do trabalho, da ciência e da tecnologia.

§1.° Os cursos de educação profissional e tecnológica poderão ser orga-nizados por eixos tecnológicos, possibilitando a construção de diferentes itinerários formativos, observadas as normas do respectivo sistema e nível de ensino.

§2.° A educação profissional e tecnológica abrangerá os seguintes cursos:

I - de formação inicial e continuada ou qualificação profissional;

II - de educação profissional técnica de nível médio;

III - de educação profissional tecnológica de graduação e pós-graduação.

§3.° Os cursos de educação profissional tecnológica de graduação e pós-graduação organizar-se-ão, no que concerne a objetivos, características e

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Educação Profissional: o desafio de formar trabalhadores

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duração, de acordo com as diretrizes curriculares nacionais estabelecidas pelo Conselho Nacional de Educação.” (NR)

“Art. 41. O conhecimento adquirido na educação profissional e tecnológi-ca, inclusive no trabalho, poderá ser objeto de avaliação, reconhecimento e certificação para prosseguimento ou conclusão de estudos.

“Art. 42. As instituições de educação profissional e tecnológica, além dos seus cursos regulares, oferecerão cursos especiais, abertos à comunidade, condicionada a matrícula à capacidade de aproveitamento e não necessaria-mente ao nível de escolaridade.”

Art. 2.° O Capítulo II do Título V da Lei 9.394, de 20 de dezembro de 1996, passa a vigorar acrescido da Seção IV-A, denominada “Da Educação Profissio-nal Técnica de Nível Médio”, e dos seguintes artigos 36-A, 36-B, 36-C e 36-D:

“Seção IV-A

Da Educação Profissional Técnica de Nível Médio

Art. 36-A. Sem prejuízo do disposto na Seção IV deste Capítulo, o ensino médio, atendida a formação geral do educando, poderá prepará-lo para o exercício de profissões técnicas.

Parágrafo único. A preparação geral para o trabalho e, facultativamente, a habilitação profissional poderão ser desenvolvidas nos próprios estabeleci-mentos de ensino médio ou em cooperação com instituições especializadas em educação profissional.

Art. 36-B. A educação profissional técnica de nível médio será desenvolvi-da nas seguintes formas:

I - articulada com o ensino médio;

II - subsequente, em cursos destinados a quem já tenha concluído o ensino médio.

Parágrafo único. A educação profissional técnica de nível médio deverá observar:

I - os objetivos e definições contidos nas diretrizes curriculares nacionais estabelecidas pelo Conselho Nacional de Educação;

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II - as normas complementares dos respectivos sistemas de ensino;

III - as exigências de cada instituição de ensino, nos termos de seu projeto pedagógico.

Art. 36-C. A educação profissional técnica de nível médio articulada, pre-vista no inciso I do caput do art. 36-B desta Lei, será desenvolvida de forma:

I - integrada, oferecida somente a quem já tenha concluído o ensino fun-damental, sendo o curso planejado de modo a conduzir o aluno à habili-tação profissional técnica de nível médio, na mesma instituição de ensino, efetuando-se matrícula única para cada aluno;

II - concomitante, oferecida a quem ingresse no ensino médio ou já o esteja cursando, efetuando-se matrículas distintas para cada curso, e poden-do ocorrer:

a) na mesma instituição de ensino, aproveitando-se as oportunidades educacionais disponíveis;

b) em instituições de ensino distintas, aproveitando-se as oportunidades educacionais disponíveis;

c) em instituições de ensino distintas, mediante convênios de intercom-plementaridade, visando ao planejamento e ao desenvolvimento de projeto pedagógico unificado.

Art. 36-D. Os diplomas de cursos de educação profissional técnica de nível médio, quando registrados, terão validade nacional e habilitarão ao prosse-guimento de estudos na educação superior.

Parágrafo único. Os cursos de educação profissional técnica de nível médio, nas formas articulada concomitante e subsequente, quando estru-turados e organizados em etapas com terminalidade, possibilitarão a obten-ção de certificados de qualificação para o trabalho após a conclusão, com aproveitamento, de cada etapa que caracterize uma qualificação para o trabalho.”

Artigo 3.° O Capítulo III do Título V da Lei 9.394, de 20 de dezembro de 1996, passa a ser denominado “Da Educação Profissional e Tecnológica”.

Artigo 4.° Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação.

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Artigo 5.° Revogam-se os §§ 2.° e 4.° do art. 36 e o parágrafo único do art. 41 da Lei 9.394, de 20 de dezembro de 1996.

Brasília, 16 de julho de 2008; 187.° da Independência e 120.° da República.

Luiz Inácio Lula da Silva

Fernando Haddad

Atividades1. Como vimos nesta aula, há mudanças no significado de ser trabalhador nos

dias de hoje. Com base na sua experiência procure analisar os impactos des-sa mudança para os trabalhadores em Educação, tais como oferta de empre-gos, condições de contrato, valorização/desvalorização profissional etc.

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2. A LDB diz que: “O aluno matriculado ou egresso do Ensino Fundamental Mé-dio e Superior, bem como o trabalhador em geral, jovem ou adulto, contará com a possibilidade de acesso à Educação Profissional”. (art. 39). Analise essa afirmação e aponte aspectos positivos e negativos que passou (ou não) a vigorar.

3. Vimos neste tema que educar com base em competências pode ter mais de um sentido. Agora reflita e indique: o que é ser um professor competente?

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Dicas de estudoComo dica de estudo desta aula recomendamos a leitura do livro Trabalho,

Consumo e Empreendedorismo, de Carlos Aquiles Siqueira, publicado pela Edito-ra DP&A. O autor fala do papel da escola na Educação das crianças e dos jovens na perspectiva da participação em relações sociais, políticas e culturais; abor-dando a discussão sobre trabalho e consumo o livro nos mostra que adolescen-tes e jovens vivem as contradições de sua inserção no mundo do trabalho, assim como os dilemas diante dos apelos para o consumo dos produtos valorizados por seu grupo. As reflexões sobre o tema trabalho e consumo são acrescidas de um elemento novo: o empreendedorismo.

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Marly de Abreu Costa Eloiza da Silva Gomes de Oliveira

Vamos discutir o conceito de avaliação institucional, apresentar um pouco da sua evolução, historicamente, e a forma como ela vem sendo estruturada em nosso país e comentar algumas das políticas do governo federal, em relação a ela.

Antes de mais nada, vamos destacar a naturalidade dos atos de avalia-ção, e a forma como eles estão inseridos no cotidiano das nossas vidas.

Em um debate desenvolvido no Seminário de Avaliação, realizado em maio de 2002 na Faculdade de Educação da Unicamp, dizia Bernardete Gatti (2003, p. 26):

Quando desenvolvo um processo de avaliação, estou construindo sua existência. Processos avaliativos, em geral, fazem parte do nosso cotidiano. A gente avalia até para escovar os dentes. Quando eu vou escovar os dentes, de manhã, eu avalio a força que eu vou imprimir para não me machucar, a força suficiente para limpar. E isto me acompanha o dia inteiro, eu não percebo, mas eu estou avaliando para poder andar, eu avalio o terreno, avalio a força muscular, o movimento; eu avalio se consigo ou não fazer um determinado trabalho, se vou dar conta no fim do dia, enfim, o processo de avaliação em geral está embutido, de certa maneira, nas nossas formas de existir, sejam individuais, sejam sociais.

Trata-se, neste caso, de avaliações realizadas informalmente, sem a preocupação com a validade, a fidedignidade e a ética que revestem as avaliações científicas, que se tornam, inevitavelmente, investigações da realidade (ou pesquisas).

No âmbito da Educação ela pode ser de três tipos:

Avaliação de produto – busca identificar se os resultados foram al- �cançados, se o processo de ensino e aprendizagem foi satisfatório e se os objetivos traçados foram atingidos.

A avaliação institucional no Brasil

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Avaliação de processo – serve como um instrumento de controle de quali- �dade, visando a intervenções corretivas ao longo da realização do proces-so de ensino e aprendizagem, buscando assegurar resultados favoráveis.

Avaliação institucional – tem relação direta com cursos, instituições ou sis- �temas de ensino, tem natureza mais ampla e, consequentemente, mais complexa. Tem como objetivos, por exemplo, aprimorar, comparar e for-necer elementos que possam servir de subsídios para a manutenção ou correção de ações que conduzam à qualidade da produção e transmissão do conhecimento.

Estabelecendo esta distinção, segundo Belloni (1998), a avaliação educacio-nal refere-se à avaliação da aprendizagem ou do desempenho escolar e à avalia-ção de currículos; a avaliação institucional destina-se à avaliação de instituições ou políticas.

A avaliação institucional pode ser concebida, portanto, como um processo sistemático de busca de subsídios para a melhoria e o aperfeiçoamento da qua-lidade institucional, incidindo sobre processos, fluxos, resultados e estruturas e fornecendo subsídios para o processo de planejamento institucional, por meio da identificação de insuficiências e de vantagens relativas, da sugestão de dire-trizes e critérios para as políticas e metas e da produção de informações para a tomada de decisões.

Ela é o alicerce fundamental da gestão, dando condições de verificar qual a eficácia da configuração estratégica adotada pela instituição, qual a sua adequa-ção aos objetivos institucionais, a concepção de Educação adotada e a prática efetiva do cotidiano.

Promove, dessa forma, condições para que a instituição consiga identificar as suas práticas, refletir sobre os seus limites e possibilidades e explicite as suas políticas, os seus objetivos e o seu projeto para o futuro.

Um pouco da história da avaliação institucionalPara entendermos melhor o nosso objeto de estudos, vamos ver como a ava-

liação institucional evoluiu no nosso país. Para isso, é necessário saber que ela começou a ser valorizada no contexto da avaliação do Ensino Superior.

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As iniciativas e programas que incluiremos na categoria de avaliações insti-tucionais são entendidas como o questionamento da praxis, da relação entre o pensar e o fazer em cada Instituição de Ensino Superior (IES). Sobrepuja o mero julgamento de mérito e de padrão de excelência, apontando para o aprimora-mento das atividades e a transformação da face da universidade que se volta para o social.

Segundo Amorim (1992, p. 17):

A instituição é o lugar concreto onde o trabalho acadêmico se desenvolve, onde se realizam as atividades de ensino, pesquisa e extensão, e diferentes decisões são tomadas, levando em conta sempre um determinado ponto de vista, uma visão social de mundo, o institucional é o vivido, o lugar onde ocorrem os confrontos acadêmicos – no caso da universidade – e as relações sociais se projetam mais aguçadamente.

Na década de 1970, é conveniente lembrar, a Capes já avaliava os cursos de mestrado e doutorado. Após esse período, em que experiências pioneiras de avaliação surgiram – como na Universidade de Ribeirão Preto, na Universidade Federal do Rio Grande do Norte e na Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) – as décadas de 1980 e 1990 pontuaram a importância deste processo. A própria Capes realizou, de 1983 a 1986, o “Programa de Avaliação da Reforma Universitária” e o Conselho de Reitores das Universidades Brasileiras (CRUB), em julho de 1986, definiu a avaliação de desempenho como um compromisso social das universidades.

Dessa política surgem linhas de ação amplas, que apontam para a realização das atividades de avaliação em si, para a criação de bases de dados, para o estí-mulo ao desenvolvimento de metodologias de avaliação e para a democratiza-ção do acesso às informações obtidas.

Quanto às experiências desenvolvidas por universidades brasileiras, Paul, Ri-beiro e Pilatti (1992) apresentam interessante estudo que divide as citadas expe-riências em três blocos: dimensão da instituição, dimensão do ensino de gradu-ação e dimensão do curso.

Na impossibilidade de citar todas as experiências relatadas, optamos por destacar algumas de cada grupo estabelecido pelos autores, mesmo correndo o risco de omitir projetos importantes.

Em relação à instituição como um todo, devemos citar a experiência pioneira da Universidade de Ribeirão Preto em 1974, atualmente realizada pela Subreito-ria de Graduação da UERJ, promovendo a construção coletiva de um Projeto de Avaliação do Ensino de Graduação, que fazia parte do Programa de Avaliação

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Institucional da Universidade (PAIUB) e tinha como finalidade assessorar, acom-panhar e orientar tecnicamente o processo nos diferentes centros e faculdades, por meio de reuniões sistemáticas com docentes representantes de todas as unidades, visando, assim, fornecer subsídios para a formulação de propostas de avaliação dos cursos de graduação.

No que se refere ao ensino de graduação, também as Universidades de Caxias do Sul e de São Carlos, por exemplo, desenvolvem sistemas de avaliação que têm como objeto central o currículo dos cursos de graduação, com ênfase especial nas licenciaturas. Nunca é demais citar a experiência da Unicamp, desenvolvida em três etapas: autoavalia ção e diagnose, avaliação externa e reavaliação.

Finalmente, na dimensão que os autores chamam “de curso”, temos, por exemplo, as avaliações dos cursos de Pedagogia, Letras e Enfermagem da UFSC – continuidade do pioneiro processo iniciado na década de 1970 – e do curso de Medicina e Cirurgia da Unirio.

Ainda podem ser citadas, com destaque, as experiências da USP, que se ini-ciaram com a polêmica valoração de professores produtivos e improdutivos e evoluiram para a formação de comitês de avaliação que incluíam a metade de avaliadores brasileiros e a outra metade estrangeiros, e a da Universidade de Brasília (1987), em que um grupo de trabalho começou o mapeamento dos as-pectos julgados relevantes pela própria instituição. Tentando conjugar procedi-mentos metodológicos diversos e conceitos variados de avaliação existentes no seio da Universidade, e utilizando a avaliação interna conjugada com a externa, a UnB priorizou os currículos dos cursos e os aspectos essenciais da infraestrutu-ra, além do conceito de competência, utilizado como critério de avaliação.

Quando se pensa em avaliação institucional, não se pode deixar de citar o Programa de Avaliação Institucional das Universidades Brasileiras (PAIUB), surgi-do em 1993 e já desativado.O que diferenciava o PAIUB era sua proposta avalia-tiva, englobando as atividades de ensino, pesquisa, extensão e gestão das IES, em todos os seus aspectos. Ele integrava, na sua metodologia, os resultados das avaliações conduzidas pelo MEC, com o objetivo de articular informações e as-segurar uma visão de conjunto da qualidade da instituição.

Para o PAIUB, a avaliação institucional era “um processo de contínuo aperfei-çoamento do desempenho acadêmico e de prestação de contas à sociedade, constituindo-se em ferramenta para o planejamento da gestão e do desenvolvi-mento da Educação Superior”.

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Na perspectiva adotada, a avaliação apresentava-se com um caráter pedagó-gico e imprescindível no processo de desenvolvimento da instituição. O respeito à identidade institucional – perfis, missões, condições, necessidades, aspirações – era outra característica do PAIUB.

A sua legitimidade decorria do envolvimento e participação dos diferentes segmentos da instituição na elaboração e execução do seu Projeto Pedagógico Institucional e do seu correspondente Plano de Desenvolvimento Institucional, que se constituíam em importante instrumento de fortalecimento da autono-mia e consolidação das universidades.

Como decorrência, entre os anos de 1994 e 1995, houve uma duplicação de projetos de avaliação em Instituições de Ensino Superior no Brasil, o que demons-tra o impacto desses processos e a importância de que se revestiram na universi-dade brasileira. Segundo Dias Sobrinho (1999, p. 149-50), a avaliação institucional da universidade consubstanciou um avanço: “[...] um novo campo de debates, pesquisas e práticas está se constituindo, principalmente no âmbito da Educação Superior, portador de possibilidades novas e de grande potencial de disputas”.

O próprio uso do termo disputas denuncia uma preocupação que comparti-lhamos com o autor: a de que a crise gerada pela crescente retração do Estado em relação às políticas públicas de Educação venha a acarretar para a universi-dade pública o agravamento de uma crise já instalada.

Trata-se do comprometimento da identidade institucional da universidade. En-fraquecida por contendas internas e forçada a lançar-se no mercado, competindo pelos recursos disponíveis no setor produtivo, ela passa a funcionar de acordo com outra lógica a ser regida por outras normas – as que decorrem deste mercado.

O autor conclui com propriedade:

De fora para dentro, a crise acarreta a exigência da avaliação que, desse ponto de vista, corresponde mais à prestação de contas da gestão universitária, da administração financeira, da eficiência da universidade em apresentar os produtos requeridos, e a busca de comprovações da seriedade institucional na utilização de recursos para a produção e o desenvolvimento do capital intelectual, que passa a ser disputado como o mais importante instrumento do desenvolvimento econômico. Os temas relacionados à gestão, quase sempre adjetivados com os atributos da racionalidade técnica, adquirem importância e atualidade. Por essas razões, a avaliação demandada pelos governos é, em geral, muito mais voltada à política e à administração da Educação Superior do que para o processo de ensino--aprendizagem e de produção científica, tecnológica, cultural e de formação da cidadania. (DIAS SOBRINHO, 1999, p. 151-2)

Há algum tempo, portanto, a expressão “avaliação institucional” ganhou im-portância no cenário educacional brasileiro. O próprio poder público vem de-

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senvolvendo uma prática de procedimentos avaliativos: Programa de Avaliação Institucional das Universidades Brasileiras (PAIUB), Sistema de Avaliação da Edu-cação Básica (Saeb), Exame Nacional do Ensino Médio (Enem), Exame Nacional de Cursos – ENC – (o conhecido Provão) e, substituindo este último, o Sistema Nacional de Avaliação da Educação Superior (Sinaes), todos do governo federal, são exemplos de tais iniciativas.

Temos, portanto:

As principais iniciativas do “Estado avaliador”

Programa de avaliação Ano

Sistema Nacional de Avaliação da Educação Básica (Saeb) 1990

Exame Nacional de Cursos (Provão) 1996

Exame Nacional de Ensino Médio (Enem) 1998

Sistema Nacional de Avaliação da Educação Superior (Sinaes) 2003

A multiplicação, nos últimos anos, das iniciativas governamentais de avalia-ção das instituições de ensino fez com que se chamasse a esse conjunto políticas “ ancoradas” na avaliação institucional, de “Estado avaliador”, como fizemos no título deste tópico. Tem-se clareza, conforme aponta Vianna (2003) que o Estado como avaliador vem sofrendo muitas restrições, mas não restam dúvidas de que uma avaliação com fins de atestar as competências ao término de um curso é algo que se impõe, inclusive com o apoio generalizado da sociedade.

Sistema Nacional de Avaliação da Educação Básica (Saeb) e Prova Brasil

O Saeb foi criado em 1990, gerido e organizado pelo Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais (Inep), época em que se começou a discutir de forma mais ampla uma política de avaliação da Educação Básica, focalizando-se os efeitos do ensino sobre o desempenho dos alunos em função das condições de trabalho na escola, reveladas por suas instalações e equipamentos; pela dis-ponibilidade de acesso a livros e outros materiais pedagógicos; pela presença de professores qualificados; e pelas formas de gestão. Neste contexto, surgiu o Saeb, tomando por pressupostos básicos que, se por um lado o desempenho dos alunos reflete a qualidade do ensino ministrado, por outro lado nenhum fator determina, isoladamente, essa qualidade.

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O objetivo do Saeb é gerar e organizar informações sobre a qualidade, a equi-dade e a eficiência da Educação nacional, de forma a permitir o monitoramento das políticas brasileiras, fornecendo subsídios para a melhoria da qualidade da Educação no Brasil. A esse respeito, há quem afirme que a maior vantagem do Saeb é a de gerar informações e propiciar uma base para tomada de decisões nas administrações educacionais.

É um sistema de avaliação por amostra, com a participação das diversas uni-dades da Federação – Estados e o Distrito Federal, fazendo parte da amostra alunos de escolas públicas e privadas da 4.ª e 8.ª séries do Ensino Fundamental e da 3.ª série do Ensino Médio.

Além dos testes de desempenho aplicados aos alunos, o Saeb aplica quatro questio nários: os do diretor, do professor, do aluno e sobre a escola. Tais instru-mentos têm como propósito levantar informações sobre a origem familiar dos alunos, seus hábitos e condições de estudo, assim como os estilos de ensino de seus professores e a forma de gestão nas escolas. Essas informações têm sido utilizadas em conjunto com os resultados desses testes.

A partir de 2005, foi criada a Prova Brasil, visando complementar a avalia-ção feita pelo Saeb. A Prova Brasil é censitária, ou seja, avalia todos os alunos das escolas públicas urbanas de 4.ª e 8.ª séries do Ensino Fundamental. Por este motivo, expande o alcance dos resultados oferecidos pelo Saeb, porque oferece dados não apenas para o Brasil, regiões e unidades da Federação, mas também para cada um dos municípios e escolas participantes.

Uma vez que a metodologia das duas avaliações é a mesma, as duas provas pas-saram a ser operacionalizadas em conjunto, desde 2007, avaliando Língua Portu-guesa (com foco em leitura) e Matemática (com foco na resolução de problemas).

Exame Nacional do Ensino Médio (Enem)O Enem, instituído pelo Inep, em 1998, foi criado com o objetivo fundamen-

tal de avaliar o desempenho do aluno ao término da escolaridade básica, para aferir o desenvolvimento de competências fundamentais ao exercício pleno da cidadania. Desde então, o MEC passou a implantá-lo com o objetivo de criar uma forma alternativa para o ingresso em cursos superiores. É um exame individual, de caráter voluntário, oferecido anualmente aos estudantes que estão concluin-do ou que já concluíram o Ensino Médio em anos anteriores.

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A rapidez com que as mudanças sociais se processam e alteram nossa vida cotidiana impõe um padrão mais elevado para a escolaridade básica, e o projeto pedagógico da escola deve objetivar o desenvolvimento de competências com as quais os alunos possam assimilar informações e utilizá-las em contextos ade-quados, interpretando códigos e linguagens e servindo-se dos conhecimentos adquiridos para a tomada de decisões autônomas e socialmente relevantes.

Essas premissas já estão delineadas na atual Lei de Diretrizes e Bases da Educa-ção Nacional (LDB/96), que introduz profundas transformações no Ensino Médio, desvinculando-se do vestibular, ao flexibilizar os mecanismos de acesso ao Ensino Superior e, principalmente, delineando o perfil de saída do aluno da escolaridade básica, ao estipular que o educando, ao final do Ensino Médio, demonstre domí-nio dos princípios científicos e tecnológicos que presidem a produção moderna; conhecimento das formas contemporâneas de linguagem; domínio dos conheci-mentos de Filosofia e de Sociologia necessários ao exercício da cidadania.

É nessa perspectiva que o Inep vem realizando o Enem, para o universo de alunos concluintes e de egressos do Ensino Médio.

Esse exame difere de outras avaliações já propostas pelo Ministério da Edu-cação. Centra-se na avaliação de desempenho por competências e vincula-se a um conceito mais abrangente e estrutural da inteligência humana. O exame é constituído de uma prova única, com 63 questões de múltipla escolha e uma redação, abrangendo as várias áreas de conhecimento em que se organizam as atividades pedagógicas da escolaridade básica do Brasil.

Em muitas Instituições de Ensino Superior (IES), o Enem já está substituindo o vestibular, reservando uma porcentagem das vagas aos alunos que têm uma quantidade mínima de acertos, cujo valor é estipulado por cada instituição.

Em 2008, cerca de 500 instituições de Ensino Superior utilizaram os resulta-dos do Enem em seus processos de seleção, seja de forma complementar ou em substituição ao vestibular. Muitas universidades já substituíram ou estudam substituir o vestibular pelo Enem.

Outro incentivo para o aluno participar do Enem, é a possibilidade de ganhar uma bolsa de estudos do Programa Universidade para Todos (ProUni). Esse pro-grama concede bolsas de estudos integrais e parciais para estudantes de baixa renda comprovada, nos cursos de graduação de inúmeras instituições privadas de Educação Superior. É bom lembrar que somente os participantes do Enem podem se inscrever no ProUni.

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Certamente, esses motivos levaram ao crescimento do número de inscritos no exame, que tem atingido mais de 4 milhões de pessoas.

Ao participar do Enem, o aluno poderá avaliar sua capacidade de utilizar os conhecimentos adquiridos na escola para a resolução de problemas presentes no seu dia-a-dia, interpretando dados e informações que estão cada vez mais disponíveis nos livros, nos jornais, nas revistas, na televisão, na natureza e na nossa vida social. Em ambientes tão complexos como os da sociedade em que vivemos, é muito importante pensar por si mesmo e saber expor as ideias.

O Enem poderá mostrar, enfim, em que áreas o aluno precisa se esforçar ainda mais para ter sucesso pessoal e profissional. Desse modo, ele terá uma avaliação do seu potencial e poderá tomar decisões mais adequadas aos seus desejos e às suas escolhas futuras.

Há sigilo absoluto com relação a seus resultados individuais. Eles são remetidos pelos Correios, ao endereço indicado no ato da inscrição. Os possíveis usuários (universidades, cursos pós-médios, empresas e outras instituições do mercado de trabalho) poderão conhecê-los apenas mediante expressa autorização do aluno.

Por todos esses motivos, o Enem tem demonstrado ser de grande valia, mas peca por ser opcional, pois não podemos obter um resultado do desempenho escolar da globalidade dos alunos do Ensino Médio, com apenas uma parcela dos concluintes que fazem opção por prestar o exame.

Exame Nacional de Cursos (Provão)O Exame Nacional de Cursos (ENC – Provão) foi um exame aplicado aos for-

mandos no período de 1996 a 2003, com o objetivo de avaliar os cursos univer-sitários de graduação. Tratava-se de exames obrigatórios, realizados a cada ano, pelos alunos concluintes. As provas, elaboradas por comissões de especialistas, eram formadas de questões objetivas e discursivas, tendo como base conteúdos mínimos de cada curso, competências e habilidades, previamente divulgados. Esse exame era complementado pelas visitas às Instituições de Ensino Superior, de comissões que as avaliavam, em relação a indicadores de qualidade.

A atual LDB (Lei 9.394/96) estabelece uma finalidade clara de identificar limi-tes e potencialidades para a melhoria e a expansão do Ensino Superior. Em seu art. 46 determina que: “A autorização e o reconhecimento de cursos, bem como o credenciamento de instituições de Educação Superior, terão prazos limitados, sendo renovados periodicamente, após processo regular de avaliação.”

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A Portaria do MEC 963/97 regulamentou o ENC, determinando que as diretrizes do mesmo que fossem definidas pelas comissões de cursos formadas por especialistas de notório saber, atuantes na área, designados por Portaria mi-nisterial após consulta à SESu/MEC, ao CRUB e aos conselhos federais de profis-sões regulamentadas, associações científicas e associações nacionais de ensino. Coube a essas comissões definir, para cada área, os objetivos específicos, o perfil desejado do graduando, habilidades e conteúdos a serem avaliados e o tipo de prova a ser aplicado.

Começando em 1996 com três cursos avaliados (Engenharia Civil, Direito e Administração), o Provão foi pontuado pelas manifestações contrárias de profes-sores e de estudantes, chegando a 12% o total de provas entregues em branco.

Em sua última edição, realizada em 2003, participaram do exame mais de 470 mil formandos de 26 áreas, a saber: Administração; Agronomia; Arquitetura; Urbanismo; Biologia; Ciências Contábeis; Direito; Economia; Enfermagem; Enge-nharias Civil, Elétrica, Mecânica e Química; Farmácia; Física; Fonoaudiologia; Ge-ografia; História; Jornalismo; Letras; Matemática; Medicina; Medicina Veterinária; Odontologia; Pedagogia; Psicologia e Química .

Muitas são as críticas que ainda hoje persistem contra o Provão, mesmo após sua revogação em 2004, quando foi substituído pelo Exame Nacional do Desem-penho do Estudante – Enade. A Comissão Especial de Avaliação da Educação Su-perior (CEA), designada pelas Portarias MEC/SESu n. 11e n. 19, de maio de 2003, informou em seu relatório final:

O ENC tem como foco o Curso, em sua dimensão de ensino, e tem função classificatória, com vistas a construir bases para uma possível fiscalização, regulação e controle, por parte do Estado, baseado na lógica de que a qualidade de um curso é igual à qualidade de seus alunos. (INEP, 2007, p. 24)

O relatório final do CEA trouxe também a proposta de nova sistemática de avaliação, constituindo o atual Sinaes.

Sistema Nacional de Avaliação da Educação Superior (Sinaes)

O Sinaes, criado pela Lei 10.861/2004 determina que “a avaliação do desem-penho dos estudantes dos cursos de graduação será realizada mediante a aplica-ção do Exame Nacional do Desempenho dos Estudantes – Enade” e revoga a Lei 9.131/1995, que trata da criação do Provão (INEP, 2007, p. 141).

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A avaliação institucional no Brasil

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O atual sistema é composto por uma autoavaliação institucional, pela avaliação institucional externa, pela avaliação das condições de ensino, e por instrumentos de informação (censo e cadastro de instituições e cursos).

Os resultados do Sinaes possibilitam traçar um panorama da qualidade da Edu-cação Superior no país e fundamentar as decisões do MEC sobre o reconhecimen-to de cursos e credenciamento de instituições.

É o sistema que objetiva integrar todos os instrumentos de avaliação da Educa-ção Supe rior. O Sinaes terá como enfoque central a instituição, isto é, leva em conta os pilares que sustentam a instituição e que, portanto, influenciam diretamente os seus cursos, departamentos, programas e atividades de ensino, pesquisa, exten-são e administração. Suas características básicas serão: a avaliação participativa, a integração, o rigor, a eficácia informativa, a flexibilidade e a institucionalidade.

Terá, como indicadores da avaliação institucional, entre outros:

a missão institucional à vocação. �

a política de seleção, contratação e capacitação do corpo docente e técnico. �

a política de aquisição de acervo bibliográfico. �

a inserção social e o compromisso com a justiça. �

compromisso com o avanço das artes e das ciências. �

O Enade faz parte do Sinaes e vem sendo aplicado, periodicamente, de três em três anos, com a utilização de procedimentos amostrais, aos alunos de gra-duação ao final do primeiro e do último ano do curso. Assim, os cursos que foram avaliados em 2004, foram reavaliados em 2007, os avaliados em 2005, foram re-avaliados em 2008.

Foi criado como componente curricular obrigatório de todos os cursos de graduação, mas, ao mesmo tempo, mostra-se ambíguo quando utiliza procedi-mentos amostrais e considera a possibilidade de o estudante ter dispensa oficial pelo MEC, desde que justifique a sua ausência. Vale ressaltar que a participa-ção do aluno no Enade vem registrada no histórico escolar como cumprimento desse componente curricular.

Em relação ao Provão (ENC), o Enade obteve um avanço, ao prever um teste de entrada aos alunos. O exame somente ao final do curso era uma das prin-cipais críticas do ENC, pois o desempenho dos alunos poderia estar associado

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não ao curso, mas à sua formação prévia, frequentemente associada ao perfil socioeconômico.

Segundo a proposta do MEC, há diferenças sensíveis entre o Enade e o Provão. Vejamos:

Enade Provão

É um processo de avaliação da trajetória da área ao longo do tempo.

Era um exame de verificação do rendimento.

Avalia os conhecimentos dos alunos, ini-ciantes e concluintes do curso.

Avaliava o curso com base no pressuposto de que o desempenho dos alunos em uma prova é igual à qualidade do curso.

É realizado por amostragem. Era obrigatório a todos o alunos.

Cada área é avaliada de três em três anos. Era aplicado apenas aos concluintes do curso.

Gera informações qualificadas que vão além dos conteúdos específicos da área profissio-nalizante.

Atribuía conceitos que não permitiam definir um padrão de qualidade para os cursos.

Longe de ser modismo, a avaliação institucional é uma exigência atual da Educação de qualidade.

Texto complementar

Aluno de baixa renda ganha espaço nas universidades

De 2004 a 2006, total de estudantes com renda de até 3 salários mínimos subiu 49%

ProUni, aumento de vagas e expansão da classe média foram responsáveis pelo aumento; segmento, porém, ainda é subrepresentado

(PINHO, 2008)

Puxada pelo ProUni, pelo aumento de vagas e pelo alargamento da classe média, a participação de alunos de baixa renda no ensino superior do Brasil cresceu nos últimos anos.

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A avaliação institucional no Brasil

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De 2004 a 2006, a Pnad (Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios) registrou um aumento de 49% na proporção de universitários com renda familiar mensal de até três salários mínimos – de 10,1% para 15,1%, segundo dados tabulados pelo pesquisador Simon Schwartzman, do Iets (Instituto de Estudos do Trabalho e Sociedade).

Na população em geral, a proporção de pessoas com essa faixa de renda subiu apenas 8%. Embora tenha ganhado mais espaço, esse segmento ainda está sub-representado no ensino superior, já que, em 2006, o total de brasi-leiros com renda de até três salários mínimos era muito maior -55,2%.

Considerando a baixa base de comparação, especialistas apontam que o ProUni tem impacto significativo no movimento de ingresso de alunos mais pobres no ensino superior: em 2006, entraram 360 mil alunos de baixa renda a mais do que em 2004; o programa do governo federal, que começou em 2005, ofereceu 204 mil bolsas no período.

Regina Vinhaes, da UnB (Universidade de Brasília) acrescenta que, nos úl-timos dez anos, a oferta de vagas no ensino superior mais do que quadrupli-cou, puxada principalmente pela rede particular.

Ryon Braga, da Hoper Consultoria, aponta ainda a ampliação do financia-mento educacional e a queda dos preços cobrados por instituições privadas como explicações. Estudo feito por ele mostra que, em 1996, o valor médio da mensalidade era de R$840,00 em valores corrigidos. Hoje, é de R$427,00.

Em médio e em longo prazo, porém, a sustentabilidade desse movimento de abertura do ensino superior à população de baixa renda ainda é incerta.

“Uma dificuldade para a expansão é que o Ensino Médio não está forman-do gente suficiente, e o ProUni já tem dificuldade de encontrar candidatos”, aponta Schwartzman. “Além disso, vai depender da capacidade das pessoas de pagarem, o que vai depender, também, da economia”, afirma.

Desde 2000, o patamar de alunos que concluem o Ensino Médio está es-tacionado em cerca de 2 milhões. Já o ProUni tem alto índice de bolsas ocio-sas -39% na última seleção.

Responsável pelo programa, o secretário de Educação Superior do Mi-nistério da Educação, Ronaldo Mota, argumenta que os jovens egressos do

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Ensino Médio são apenas parte do público que passou a entrar na universi-dade. “Mais de 40% dos ingressantes vêm do mundo do trabalho, já se for-maram há muito tempo e não tiveram oportunidade na época”, diz.

LimitaçõesLíder de uma associação que reúne bolsistas do ProUni, Adriana Ferreira,

42, é um exemplo tanto do quadro traçado pelo secretário como das limi-tações do programa. Ex-assistente administrativa em Minas, ela entrou na universidade 22 anos após se formar no Ensino Médio. Separada, mãe de três filhos e com renda de um salário mínimo, ela diz que, sem o ProUni, não conseguiria se manter por três semestres no curso de Letras.

Por problemas de saúde, porém, parou de trabalhar, ficou inadimplente e perdeu a sua bolsa, que era parcial. Adriana lamenta –”eu ia ser a primeira pessoa a ter nível superior na minha família”–, mas diz que só tentará voltar à universidade se conseguir um salário melhor. “Mesmo se eu tivesse bolsa integral, teria problemas para pagar a locomoção e a compra do material.”

EnadeO aumento do total de pessoas de baixa renda no ensino superior é cor-

roborado pela comparação entre os questionários socioeconômicos res-pondidos nas edições de 2004 e de 2007 do Enade (Exame Nacional de De-sempenho de Estudantes), que avaliou as áreas de saúde, ciências agrárias e serviço social. USP e Unicamp não participam. Nesses cursos, a proporção de calouros com renda de até três salários mínimos cresceu de 24% para 40%. O percentual é maior na rede privada do que na rede pública - 37% contra 31%, respectivamente.

Se forem consideradas as áreas examinadas, medicina tem a maior pro-porção de alunos que cursaram todo o Ensino Médio na rede privada - 80,9%. Já no curso de serviço social, os estudantes oriundos da escola particular são minoria - apenas 15,4%. “Em medicina, as universidades públicas oferecem muito poucas vagas, e as particulares são muito caras”, afirma Ryon Braga.

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A avaliação institucional no Brasil

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Atividades1. À luz do que conversamos na nossa aula de hoje, comente os objetivos ge-

rais da avaliação institucional de uma escola, que apresentamos a seguir:

desencadear um processo de avaliação institucional, como atividade per- �manente de autoconhecimento das próprias potencialidades e dificulda-des da escola.

construir uma cultura de avaliação permanente, como meio de obter infor- �mações para repensar e replanejar constantemente as atividades desenvol-vidas no ensino, tendo como meta a busca da excelência acadêmica.

buscar, por meio da avaliação institucional, instrumentalizar a gestão, em �suas diversas instâncias, buscando a melhoria da eficiência e eficácia ad-ministrativa.

identificar, por meio da avaliação institucional, os pontos fortes e fracos �das relações da escola com a sociedade, tendo em vista a sua relevância pública e social.

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2. Pesquise na internet os últimos resultados de uma das avaliações realizadas pelo Inep (Prova Brasil, Enem e Enade) e escreva um texto com as suas con-clusões. O endereço eletrônico para a pesquisa é o do Inep – Instituto Na-cional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira, disponível em: <www.inep.gov.br/>.

Dicas de EstudoAssista ao filme O Preço do Desafio, sob a direção de Ramon Menendez, pro-

tagonizado por Andy Garcia. O filme se passa numa escola, onde um professor de informática (latino-americano) vai dar aulas de Matemática. O enredo enfoca a questão do preconceito existente nas áreas social e econômica em relação à avaliação numa comunidade carente, também composta de latino-americanos. Você poderá refletir a respeito de como ocorre a avaliação aplicada aos alunos no filme e os resultados obtidos.

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Bertha Borja Reis do ValleComo você deve vir acompanhando pelos jornais, o governo do presi-

dente Luiz Inácio Lula da Silva tem apresentado propostas na área da Edu-cação, notadamente, com relação às questões do analfabetismo e da ava-liação institucional, como é o caso do Enem, do Enade e do Saeb. Muitas destas políticas públicas de Educação dão continuidade a propostas do governo anterior – Fernando Henrique Cardoso. Ao mesmo tempo, os go-vernadores e prefeitos brasileiros pedem por mais recursos financeiros, para que possam colocar em prática as políticas públicas que promovam a melhoria da Educação em suas regiões.

Nesta aula sobre as perspectivas futuras das políticas públicas de Edu-cação no Brasil, faremos um breve comentário sobre como o neoliberalis-mo vem exercendo sua influência e comentaremos algumas das políticas em ação no campo educacional, que pretendem inserir o Brasil, cada vez mais, no cenário do mundo moderno.

Você sabe que a busca por um Brasil moderno não é isolada do resto do mundo. O mundo está sendo varrido por revoluções modernizadoras. A valorização da economia de mercado, a modernização e a competitivi-dade perpassam os vários continentes. A América Latina foi invadida por uma onda neoliberal, que vem tentando apontar caminhos para o desen-volvimento, enfatizando a desregulação do mercado de trabalho.

Embora as influências do socialismo sejam flagrantes em quase toda a literatura pedagógica dos últimos anos no Brasil, a sucessão de propostas educacionais tem pendido mais para o liberalismo, sem que consigamos acompanhar sua aplicação e, muito menos, avaliá-los. É importante que sejam amplamente discutidas formas de participação dos professores, re-velando coletivamente suas aspirações e valorizando sua atuação em sala de aula. Assim, professores comprometidos politicamente com a forma-ção de cidadãos se sentirão mais contemplados nas políticas públicas da Educação.

Perspectivas futuras das políticas públicas

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Pensamos que o professor brasileiro deste século XXI deve ter uma proposta de transformação, aumentar sua própria capacidade de visão e a do educando. Que aja, programe, projete, avalie, tenha “práxis”.

Ao mesmo tempo, crescem as indefinições em torno da Educação Infantil, da Educação Fundamental, do Ensino Médio, da Educação Profissional, da Educação de adultos, da Educação Superior, da Pós-graduação, num burburinho de ideias, desorganizado e repetitivo. Como pano de fundo deste cenário, toma corpo a questão do papel das instituições formadoras de professores.

Como podemos perceber, as considerações que formulamos apresentam um cenário político-educacional bastante complexo e impreciso, em que diferentes temas e diferentes tendências político-ideológicas se alternam, ora em primei-ro plano, ora como fundo de cena. Muitas vezes, encontramos ideias de cunho socialista, mas que não são aplicáveis de imediato; outras vezes, são propostas liberais, disfarçadas por um populismo que empolga as populações.

Neste ponto de nossa aula, vamos refletir um pouco sobre este ideário neoli-beral do qual tanto se fala, para que você conheça melhor suas reflexões e possa perceber as alternativas que se delineiam nas propostas de Educação.

O neoliberalismo se apoia no jogo do mercado, o qual, embora necessário à criação da riqueza e do desenvolvimento, não garante a liberdade porque “não é capaz por si só de prover uma série de requisitos e oportunidades para o exer-cício mais pleno e mais significativo da individualidade de muitos” (MERQUIOR, 1983, p. 94).

A eliminação de subsídios fiscais é um passo importante numa política neoli-beral, para estimular a competitividade e favorecer melhor alocação de recursos em políticas sociais, inclusive a Educação.

Merquior (1983, p. 15) afirma que o liberalismo “não é uma doutrina antiesta-do. É uma doutrina antiestatismo.” E, continua esclarecendo: “Trata-se de saber qual é o tipo de Estado que você precisa para aumentar a liberdade.” Mais adian-te conclui: “Acredito que, no ideário liberal, a chamada revolução educacional seja a prioridade gritante. Absolutamente gritante.”

A proposta liberal, enquanto cultura da liberdade, implica em grau histori-camente alto de desenvolvimento econômico, e isso não será conseguido sem, no mínimo, classes médias razoavelmente instruídas e massas alfabetizadas. A interpenetração entre desenvolvimento, Educação e liberdade tem de ser con-cretizada nas ações governamentais.

Políticas Públicas em Educação

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Perspectivas futuras das políticas públicas

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Dahrendorf, neoliberal alemão, autor de inúmeras obras sobre teoria política, em entrevista a Vicenzo Ferrari, comenta que o “neoliberalismo pode ser uma nova corrente de pensamento, [...] um modo de pensar diferente dos tradicio-nais [...]” (1990, p. 60).

Nesta mesma entrevista, Dahrendorf fala que liberdade “significa confli-to, debate aberto, liberdade significa em outros termos, que deve haver uma aspiração forte assim como um governo que assuma a iniciativa” (1990, p. 3). Outra vez, ele explica como vê o liberalismo “[...] força eficaz na sociedade atual e futura para defesa das regras do jogo pelo aprimoramento concreto da socie-dade humana” (p. 15).

O neoliberalismo, tal como o veem os seguidores de Dahrendorf, faz críticas à igualdade que, segundo eles, embora favorável, reduz as oportunidades de par-ticipação individual, limitando, portanto, a liberdade. E essa posição vai influen-ciar na sua visão de escola, pois acham que, embora a Educação seja um direito civil, o sistema escolar deve ser mudado de maneira a proporcionar uma espécie de representação proporcional de todos os grupos, na qual todas as pessoas tenham oportunidades de desenvolver suas habilidades e desejos. A igualdade é vista como condição, não como meta, para que sejam possíveis aos homens, escolhas desiguais, e a emersão das desigualdades invisíveis: “A nova liberdade significa que a igualdade existe para as pessoas serem diferentes, não para as diferenças humanas serem niveladas e abolidas” (DAHRENDORF, 1983, p. 44).

Os neoliberais defendem a escola pluralista e a iniciativa particular na Edu-cação. Ralf Dahrendorf afirma: “Ao liquidar, por inanição, as escolas privadas e equivocar a ideia de Educação compreensiva, enquanto visando à integração em vez de à diferenciação, sacrificamos a realidade da liberdade pela aparência da igualdade” (1990, p. 430).

O pensamento educacional neoliberal vê a escola como o espaço de desen-volvimento de talentos, hábitos, de preparação para desafios, conectada com a atividade geral das vidas humanas, “pois a nova liberdade é a política do con-flito regulado e a economia social da maximização de oportunidades da vida intelectual” (DAHRENDORF, 1990, p. 150).

No caso brasileiro, a escola pública tem se mostrado incompetente para atender à massa de alunos que nela ingressa. A repetência, a evasão, a qua-lidade do trabalho docente e outros fatores têm sido apontados, em diferen-tes estudos, como responsáveis pela situação degradante do nosso ensino em todos os graus.

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Os neoliberais argumentam que, quando o sistema universaliza o ensino gra-tuito, independentemente da condição financeira dos alunos ou de suas famílias – em nome da igualdade – contribui para aumentar a desigualdade de oportuni-dades, uma vez que as famílias de baixa renda, de um modo geral, só têm acesso à escola de baixa qualidade. As famílias de maior renda podem optar por escolas particulares de qualidade. Na visão liberal,

se você não educa a massa, finge que está melhorando a vida dela, mas está aprofundando o fracasso que separa os brasileiros. Outra razão [...] é a eficiência [...], o que se desperdiça em termos de talento no Brasil, porque não se educa as crianças. É uma coisa trágica. [...] uma cultura capitalista, baseada como é, na inovação, requer talento. (MERQUIOR, 1983, p. 150)

No ideário liberal, os homens são iguais enquanto seres humanos, mas dife-rentes em suas habilidades e aspirações. Em nome da liberdade, é preciso que não se neguem as diferenças e as desigualdades.

No âmbito das circunstâncias atuais e das perspectivas do futuro, pode-se associar a plausibilidade de continuação (ou não) desses cenários, ou a prepon-derância de um deles a fatores que poderão atuar como condicionantes:

a) a capacidade dos governos federal, estadual e municipal de implemen-tarem ações conjuntas que assegurem a integração e a qualidade do en-sino em todos os níveis, incluindo-se a formação dos professores como etapa indispensável.

b) o crescimento político dos municípios, investindo em projetos de Educa-ção Básica, com resultados a curto e médio prazos.

c) a organização de movimentos da sociedade para lutar por uma escola melhor e por professores mais bem-formados e mais valorizados.

d) a tomada de consciência, pelo conjunto dos professores, da potenciali-dade de seu papel político e social e de que sozinhos não reverterão o quadro da Educação no Brasil.

As ações governamentais assegurarão a melhoria da qualidade da Educação no país se conseguirem atender às demandas, com base em análise das necessi-dades expressas nos resultados das pesquisas realizadas pelo próprio MEC e por diferentes programas de pós-graduação. Isso tem a ver com o grau de governa-bilidade que conseguirmos atingir.

A divulgação dos resultados da aprendizagem dos alunos, realizada pelo Saeb (Sistema de Avaliação da Educação Básica), além de levantamento de dados sobre os prédios escolares, os recursos pedagógicos, os recursos financeiros, os

Políticas Públicas em Educação

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Perspectivas futuras das políticas públicas

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diretores das escolas e os professores das turmas envolvidas na amostra, aponta para a necessidade de ações mais intensas em todo o Brasil, com mais ênfase nas regiões norte e nordeste. Os dados numéricos confirmam a existência de “três brasis”, com comprovação de grande contingente de professores leigos, haven-do uma relação estatística direta, como confirmam as tabelas e os gráficos, entre a formação docente e o desempenho dos alunos, agravados pelas condições socioeconômicas encontradas.

As discussões sobre o Plano Nacional de Educação e os Planos Estaduais e Municipais, sobre os Parâmetros Curriculares Nacionais, sobre a transformação do Fundef em Fundeb (Fundo de Desenvolvimento do Ensino Básico e de Va-lorização do Magistério), têm contribuído para uma grande movimentação de projetos de ação educacional principalmente após a divulgação e a implemen-tação, pelo Ministério da Educação, do Plano de Desenvolvimento da Educação (PDE). Há expectativas no magistério de que se consiga organizar uma agenda adequada às discussões que vêm sendo travadas no interior das escolas e das associações de professores, com vistas a propor diretrizes e linhas de ação para uma política nacional de formação e profissionalização do magistério.

O Plano de Desenvolvimento da Educação (PDE), apresentado pelo minis-tro da Educação, em abril de 2007, estabeleceu metas a serem alcançadas até 2022. Tem como prioridade uma Educação Básica de qualidade para todos. As mais de 30 ações que estão sendo implementadas pelo Ministério da Educa-ção, em parceria com os sistemas estaduais e municipais de Educação, buscam o envolvimento de pais, alunos, professores e gestores, para alcançar o suces-so e da permanência do aluno na escola, completando os seus estudos básicos com conhecimento das ciências, das artes, da língua escrita e falada etc. Procu-ra também, em algumas de suas ações, investir na Educação Profissional e na Educação Superior, que estão interligadas com todo o processo educativo. O plano prevê ainda que os municípios com baixos indicadores de ensino terão acompanhamento e assessoria direta do MEC, para que superem as dificuldades apresentadas.

A criação do piso salarial nacional para todos os professores é uma das metas já alcançadas pelo PDE. Nenhum professor do Brasil poderá receber menos de R$950,00 mensais para uma jornada de 40 horas semanais. Foi também garanti-do por lei que um terço da carga horária docente deverá ser dirigida para ativi-dades fora da sala de aula, o que permitirá a correção de trabalhos, planejamen-to de aulas, participação em seminários, atendimento individual aos alunos e outras atividades que o projeto pedagógico da escola tenha previsto.

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Para articular melhor a realização das ações previstas no PDE, foi criado o movimento Compromisso Todos pela Educação, que deu impulso a uma ampla mobilização social e foi assinado por todas as secretarias de Educação estaduais e municipais do Brasil. A adesão ao Compromisso significa que governadores e prefeitos se comprometem a colocar em prática as diretrizes definidas pelo Plano de Desenvolvimento da Educação, entre elas, garantir que as crianças sejam alfabetizadas até os oito anos de idade e a definição de critérios para a nomeação de diretores e gestores das escolas.

A partir da assinatura do Compromisso Todos pela Educação, o MEC insti-tuiu o Plano de Ações Articuladas (PAR), pelo qual, cada município, a partir do diagnóstico da realidade educacional, faz o planejamento das ações vol-tadas para quatro eixos: 1.°) gestão educacional; 2.°) formação de professo-res e de profissionais da rede pública; 3.°) práticas pedagógicas de avaliação; 4.°) infraestrutura física e recursos pedagógicos. O Plano de Ações Articuladas de cada município, ao chegar ao Ministério da Educação, é encaminhado para a Secretaria de Educação Básica e passa por uma análise técnica quanto ao atendi-mento dos requisitos dos quatro eixos. Logo após a aprovação, serão assinados um termo de cooperação técnica e o convênio para o repasse dos recursos fede-rais ao município.

É em nível municipal, dadas as diversas experiências bem-sucedidas de pre-feituras de diferentes partidos políticos, que a governabilidade tem se expres-sado mais enfaticamente, aliada ao crescimento da consciência de cidadania e de democracia. Já se registram, no Brasil, inúmeras experiências em que o envol-vimento de grupos sociais e de organizações não-governamentais para lutar por uma escola melhor e por melhor formação de seus professores têm sido vitorio-sas. O crescimento do sentimento de concidadania e a luta por uma sociedade menos desigual e mais democrática, com tendência ao crescimento em vários pontos do país, fortalecerão estes movimentos da sociedade.

Hoje, um grande problema enfrentado pelos governos e um desafio para os professores são os reflexos da pouca aprendizagem dos que frequentam a escola e que já se fazem notar até na produtividade da indústria nacional, comprome-tendo a competitividade de nossas fábricas em tempos de globalização da eco-nomia. O Conselho Nacional da Indústria encaminhou ao governo federal pro-postas de fortalecimento do ensino e apontou como prioridades o Ensino Básico, a valorização do professor, a implantação da gestão de qualidade nas escolas, a requalificação de profissionais do magistério e a contribuição das universidades no desenvolvimento da competitividade industrial e na formação do magistério.

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Perspectivas futuras das políticas públicas

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O desenvolvimento da consciência crítica dos professores irá conduzi-los à certeza de que sem o envolvimento da sociedade não será possível reverter o estado caótico de incontáveis escolas e de muitos cursos de formação, nem os dados estatísticos de nosso ensino, nem mesmo se lhes assegurarão salários e condições de trabalho adequados.

Já estão ocorrendo algumas experiências em que parcerias de governos com universidades e de universidades entre si começam a ocorrer, com o objetivo de desenvolver programas de formação contínua e em serviço do pessoal de magistério e projetos voltados para a inserção de estudantes universitários no dia-a-dia das escolas, como parte de seus estágios profissionalizantes.

As tecnologias de ponta geradas pela revolução científica da informatização e das comunicações aumentaram a produção, mas dispensam cada vez mais a mão-de-obra humana e os poucos humanos necessários para produzir os bens a serem consumidos precisam, cada vez mais, de conhecimentos, de escolariza-ção, de melhores escolas. As ações políticas para reversão do empobrecimento que aflige a maioria da população – enquanto uma minoria, concentrada em algumas regiões mais ricas e representada pela elite econômica, usufrui de um progresso material fantástico – ainda não estão dando conta de reduzir as mortes prematuras de milhões de crianças, nem a subnutrição que afeta popula-ções inteiras. Nestas regiões, os projetos educacionais têm sido obstruídos pelos problemas sociais e reclamam por ações urgentes de políticas públicas voltadas para a inserção dessas pessoas no mundo letrado.

O futuro não acontece por acaso, ao contrário do que a maioria das pessoas imagina. É construído com base nas percepções sobre o presente e nas ações de resposta a essas percepções. As opções adotadas hoje na reformulação de um curso de formação de professores só começarão a ganhar visibilidade, no mínimo em cinco anos, quando os primeiros formandos por estas opções já es-tiverem em atuação. Acrescente-se a isso que professores são formadores de ci-dadãos, o que alonga ainda mais no tempo os efeitos da formação profissional que esses cursos proporcionarem.

Ao mesmo tempo que a preocupação com o analfabetismo, a repetência e os métodos pedagógicos permeiam as discussões sobre a escola, deveriam ser incluídas as preocupações com o desenvolvimento da ciência e da tecnologia, não como elementos neutros, mas como instrumentos do processo de cresci-mento industrial e de acumulação de capital e de possibilidades de um futuro mais democrático.

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Os professores não podem fingir que ignoram as antenas parabólicas, vídeos, fax, computadores, laser. Mesmo nas menores cidades, não há desconhecimen-to desses progressos tecnológicos e eles precisam ser incorporados com compe-tência à rotina das escolas e à formação dos professores.

Os relatórios do Sistema Nacional de Avaliação da Educação Básica (Saeb) e da Prova Brasil revelam as condições dos recursos pedagógicos das escolas brasileiras: a maioria dos estudantes brasileiros estuda em escolas que dispõe de recursos pedagógicos básicos para seu funcionamento, mas que não são utiliza-dos pela maioria dos professores e alunos.

A partir de 2005, o Saeb passou a ter dois processos:

Avaliação Nacional da Educação Básica � – recebe o mesmo tratamento e mantém a mesma denominação – Saeb e continua a ser realizada por amostragem das redes de ensino, em cada unidade da Federação e tem foco no desempenho dos alunos e nos sistemas educacionais.

Avaliação Nacional do Rendimento Escolar � – mais detalhada que o Saeb, tem como foco cada escola pública, avaliando os dois segmentos do En-sino Fundamental, respectivamente, em seus anos finais. Pelo seu caráter de universalização do processo avaliativo, recebe o nome de Prova Bra-sil e foi aplicada, pela primeira vez, em 2005. A partir dessa avaliação do rendimento dos alunos, passamos a ter o Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (IDEB)

Os recentes debates sobre avaliação da Educação Fundamental têm se dado nas discussões sobre o IDEB, criado e divulgado pelo Ministério da Educação, dentro das ações do Plano de Desenvolvimento da Educação (PDE).

O IDEB é um indicador da qualidade educacional, que combina o Saeb, a Prova Brasil e a taxa de aprovação de cada escola e de cada município, conside-rada como o tempo médio que o aluno leva para concluir uma série. Foi criado com o propósito de nortear as políticas educacionais do país, a fim de melhorar a qualidade do processo ensino-aprendizagem. Este índice analisa, no mesmo indicador, o desempenho dos alunos nas avaliações aplicadas pelo MEC nas redes públicas de todo o país e as taxas de evasão e repetência destas mesmas escolas.

A divulgação dos resultados do IDEB tem apontado que poucos municípios brasileiros estão em um nível considerado ideal. A realidade dos dados aponta que, em sua grande maioria, as melhores cidades em desempenho dos alunos

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são pequenas, com baixa população, onde, certamente, a participação dos pro-fessores e da comunidade no dia-a-dia das escolas é mais intensa do que nas cidades grandes.

Em junho de 2008, o ministro da Educação, Fernando Haddad, em entrevis-tas à imprensa, comentou que, apesar das notas ruins, houve um aumento do último IDEB, e, segundo ele, “as metas de 2007 foram superadas e as de 2009, já atingidas. Vencemos uma etapa, um pequeno trecho de nosso longo percurso. A hora é de comemorar um pouquinho e trabalhar muito”.

As perspectivas futuras das políticas públicas de educação em nosso país, indicam que para os próximos anos, as Instituições de Ensino Superior têm papel decisivo na definição do cenário educacional brasileiro para os próximos anos, principalmente na formação de novos professores e na atualização e aperfeiço-amento de todos os profissionais da Educação.

É preciso que as universidades reassumam seu papel inovador de produção de conhecimento e de desenvolvimento da ciência e tecnologia, que sejam rom-pidas as barreiras entre as faculdades de Educação e os demais institutos dos centros universitários. As universidades têm de partir para projetos interdeparta-mentais, interuniversitários, complementando-se e contribuindo para o desen-volvimento social e tecnológico e o crescimento da consciência de cidadania.

Quase oito séculos e meio se passaram desde a criação da universidade. As universidades devem entender que mudanças são necessárias em cinco níveis amplos: a) Voltar à posição de ser a última palavra em termos de geração de conhecimentos. b) Voltar a ser garantia legítima de futuro dos estudantes. c) Voltar a ser o principal player em termos de distribuição de conhecimentos. d) Assumir a responsabilidade ética e o compromisso de um futuro para a humanidade livre de exclusão social. e) Reconhecer que a universidade não é uma instituição isolada, mas uma instituição que faz parte de uma rede global. (BUARQUE, 2003, p. 4)

Texto complementar

Petróleo e qualidade da educação(HADDAD, 2008)

Expandir o acesso à educação de qualidade depende de assegurar fontes estáveis de financiamento

A ideia de destinar recursos provenientes do pagamento de royalties do petróleo à educação não é nova. A antiga Lei do Petróleo (Lei 2.004/53) foi

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alterada em 1969 pelo Decreto-Lei 523 para prever que a indenização devida a Estados e territórios, correspondente a 5% do valor do óleo extraído, cabe-ria ao Ministério de Minas e Energia e ao Ministério da Educação, em partes iguais, no caso de extração da plataforma continental. Competia ao MEC in-vestir o recurso no “incremento da pesquisa e do ensino de nível superior no campo das geociências”. Em 1973, o Decreto-Lei 1.288 excluiu o MEC ....

O constituinte foi além, ao afirmar que “o acesso ao ensino obrigatório e gratuito é direito público subjetivo” (artigo 208, parágrafo 1.°). Deu, assim, a largada para a universalização do Ensino Fundamental, cujo atendimento atingiu 93% das crianças de sete a 14 anos em 1997, um ano antes da efetiva entrada em vigor do antigo Fundef.

Em 1995, a Educação sofreu dois duros golpes: entrou em vigor o disposi-tivo que desvincula 20% da receita de impostos para a Educação (DRU) e foi renegado o Pacto Nacional pela Educação firmado um ano antes, que previa o estabelecimento de um piso nacional para o magistério.

Na esteira desse processo, a Emenda Constitucional 14, de 1996, revogou o dispositivo que ordenava: “[até 1998,] as universidades públicas descentra-lizarão suas atividades, de modo a estender suas unidades de ensino supe-rior às cidades de maior densidade populacional”. A Lei 8.649, de 1998, por sua vez, proibiu a expansão da rede federal de escolas técnicas ao determi-nar que “a expansão da oferta de educação profissional, mediante a criação de novas unidades de ensino por parte da União, somente poderá ocorrer em parceria com Estados, DF e municípios, que serão responsáveis pela ma-nutenção e gestão dos novos estabelecimentos de ensino”.

Finalmente, em 2001, foi vetado o item do Plano Nacional de Educação que lhe daria sustentabilidade financeira e que estipulava a seguinte meta: “elevação, na década, através de esforço conjunto da União, Estados, Distrito Federal e municípios, do percentual de gastos públicos em relação ao PIB, aplicados em educação, para atingir o mínimo de 7%”.

Entre 1995 e 2001, a proficiência em matemática e leitura dos alunos do Ensino Fundamental e Médio caiu sistematicamente.

É verdade que vários estudos demonstram que, não raramente, o proces-so de universalização do acesso à educação vem acompanhado da queda de qualidade do ensino. As razões apontadas são as mais variadas.

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Atividades1. Retire do texto as características das políticas neoliberais que mais lhe cha-

maram a atenção. Relacione-as com as políticas educacionais, que você tem acompanhado no seu dia-a-dia, pessoalmente ou através da mídia impressa e falada.

Contudo, é forçoso reconhecer que o aumento do atendimento educa-cional não engendrou esforço nacional pelo aumento do investimento em educação, muito pelo contrário.

Desde 2004, o país trilha o caminho do desenvolvimento sustentável, e o governo federal faz esforço considerável para reforçar o orçamento da Edu-cação. A proposta orçamentária para 2003 previa recursos de R$20,2 bilhões para a Educação. A proposta para 2009 prevê R$48 bilhões.

Essa nova realidade permite consolidar os programas do Plano de Desen-volvimento da Educação, que conta com a adesão formal dos 27 governado-res e 5 563 prefeitos do Brasil.

O novo patamar de financiamento permite consolidar o novo Fundeb e o piso nacional do magistério, dobrar as vagas de ingresso nas universidades públicas e triplicar as das escolas técnicas federais, instalar 850 polos de for-mação do magistério da Universidade Aberta do Brasil (UAB), construir 500 creches e pré-escolas ao ano, renovar 20% da frota de veículos escolares ao ano, instalar internet banda larga em todas as escolas públicas urbanas, além de apoiar todas as escolas e redes públicas de ensino cujo Índice de Desen-volvimento da Educação Básica (IDEB), medido pelo MEC, esteja abaixo da média nacional – que, aliás, saltou de 3,8 para 4,2, entre 2005 e 2007, para os anos iniciais do Ensino Fundamental.

Expandir o acesso à educação de qualidade depende de assegurar fontes estáveis de financiamento. Acelerar o passo exige da nação duas providên-cias: derrubar a DRU da Educação e garantir que parte dos royalties do petró-leo seja destinada à educação.

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2. Analise os resultados da Prova Brasil e o IDEB de sua cidade e de três escolas nela localizadas, que você conheça. Escreva um comentário sobre os resul-tados alcançados por elas, informando se as comunidades que estas escolas atendem estão satisfeitas com o desempenho apresentado por seus alunos. Para obter as informações, acesse o endereço: <http://ideb.inep.gov.br/Site> e siga as orientações passo a passo.

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Dicas de estudoO Ministério da Educação criou o Portal do Professor que pode ser acessado

através do endereço: <http://portaldoprofessor.mec.gov.br>. Nesse site você en-contrará muitas informações e muita ajuda no planejamento de suas aulas. Nele há os links: Espaço da Aula, Jornal do Professor, Recursos Educacionais, Cursos e Materiais, Interação e Comunicação. Você poderá também ter acesso à página dos Ministérios da Educação e da Ciência e Tecnologia, além de muitos outros links, que possibilitarão aumentar o seu conhecimento no campo educacional e das políticas públicas em educação.

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Ciência política e políticas públicas de Educação: aspectos históricos1. O aluno deverá escolher três dos artigos relacionados abaixo:

Art. 205. A educação, direito de todos e dever do Estado e da família, será promovida e incentivada com a colaboração da sociedade, visan-do ao pleno desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho.

Art. 206. O ensino será ministrado com base nos seguintes princípios:

I - igualdade de condições para o acesso e permanência na escola;

II - liberdade de aprender, ensinar, pesquisar e divulgar o pensamento, a arte e o saber;

III - pluralismo de ideias e de concepções pedagógicas, e coexistência de instituições públicas e privadas de ensino;

IV - gratuidade do ensino público em estabelecimentos oficiais;

V - valorização dos profissionais da educação escolar, garantidos, na forma da lei, planos de carreira, com ingresso exclusivamente por con-curso público de provas e títulos, aos das redes públicas;

VI - gestão democrática do ensino público, na forma da lei;

VII - garantia de padrão de qualidade;

VIII - piso salarial profissional nacional para os profissionais da educa-ção escolar pública, nos termos de lei federal.

Parágrafo único. A lei disporá sobre as categorias de trabalhadores considerados profissionais da educação básica e sobre a fixação de prazo para a elaboração ou adequação de seus planos de carreira, no âmbito da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios.

Gabarito

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Art. 207. As universidades gozam de autonomia didático-científica, adminis-trativa e de gestão financeira e patrimonial, e obedecerão ao princípio de indissociabilidade entre ensino, pesquisa e extensão.

§1.° É facultado às universidades admitir professores, técnicos e cientistas estrangeiros, na forma da lei.

§2.° O disposto neste artigo aplica-se às instituições de pesquisa científica e tecnológica.

Art. 208. O dever do Estado com a educação será efetivado mediante a ga-rantia de:

I - ensino fundamental, obrigatório e gratuito, assegurada, inclusive, sua oferta gratuita para todos os que a ele não tiveram acesso na idade própria;

II - progressiva universalização do ensino médio gratuito;

III - atendimento educacional especializado aos portadores de deficiência, preferencialmente na rede regular de ensino;

IV - educação infantil, em creche e pré-escola, às crianças até 5 (cinco) anos de idade;

V - acesso aos níveis mais elevados do ensino, da pesquisa e da criação artís-tica, segundo a capacidade de cada um;

VI - oferta de ensino noturno regular, adequado às condições do educando;

VII - atendimento ao educando, no ensino fundamental, através de progra-mas suplementares de material didático-escolar, transporte, alimentação e assistência à saúde.

§1.° O acesso ao ensino obrigatório e gratuito é direito público subjetivo.

§2.° O não-oferecimento do ensino obrigatório pelo Poder Público, ou sua oferta irregular, importa responsabilidade da autoridade competente.

§3.° Compete ao Poder Público recensear os educandos no ensino funda-mental, fazer-lhes a chamada e zelar, junto aos pais ou responsáveis, pela frequência à escola.

Art. 209. O ensino é livre à iniciativa privada, atendidas as seguintes condições:

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Gabarito

I - cumprimento das normas gerais da educação nacional;

II - autorização e avaliação de qualidade pelo Poder Público.

Art. 210. Serão fixados conteúdos mínimos para o ensino fundamental, de maneira a assegurar formação básica comum e respeito aos valores culturais e artísticos, nacionais e regionais.

§1.° O ensino religioso, de matrícula facultativa, constituirá disciplina dos ho-rários normais das escolas públicas de ensino fundamental.

§2.° O ensino fundamental regular será ministrado em língua portuguesa, assegurada às comunidades indígenas também a utilização de suas línguas maternas e processos próprios de aprendizagem.

Art. 211. A União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios organizarão em regime de colaboração seus sistemas de ensino.

§1.° A União organizará o sistema federal de ensino e o dos Territórios, finan-ciará as instituições de ensino públicas federais e exercerá, em matéria edu-cacional, função redistributiva e supletiva, de forma a garantir equalização de oportunidades educacionais e padrão mínimo de qualidade do ensino mediante assistência técnica e financeira aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios.

§2.° Os Municípios atuarão prioritariamente no ensino fundamental e na educação infantil.

§3.° Os Estados e o Distrito Federal atuarão prioritariamente no ensino fun-damental e médio.

§4.° Na organização de seus sistemas de ensino, os Estados e os Municípios definirão formas de colaboração, de modo a assegurar a universalização do ensino obrigatório.

§5.° A educação básica pública atenderá prioritariamente ao ensino regular.

Art. 212. A União aplicará, anualmente, nunca menos de dezoito, e os Esta-dos, o Distrito Federal e os Municípios vinte e cinco por cento, no mínimo, da receita resultante de impostos, compreendida a proveniente de transferên-cias, na manutenção e desenvolvimento do ensino.

§1.° A parcela da arrecadação de impostos transferida pela União aos Esta-dos, ao Distrito Federal e aos Municípios, ou pelos Estados aos respectivos

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Municípios, não é considerada, para efeito do cálculo previsto neste artigo, receita do governo que a transferir.

§2.° Para efeito do cumprimento do disposto no “caput” deste artigo, serão considerados os sistemas de ensino federal, estadual e municipal e os recur-sos aplicados na forma do art. 213.

§3.° A distribuição dos recursos públicos assegurará prioridade ao atendi-mento das necessidades do ensino obrigatório, nos termos do plano nacio-nal de educação.

§4.° Os programas suplementares de alimentação e assistência à saúde pre-vistos no art. 208, VII, serão financiados com recursos provenientes de contri-buições sociais e outros recursos orçamentários.

§5.° A educação básica pública terá como fonte adicional de financiamento a contribuição social do salário-educação, recolhida pelas empresas na forma da lei.

§6.° As cotas estaduais e municipais da arrecadação da contribuição social do salário-educação serão distribuídas proporcionalmente ao número de alunos matriculados na educação básica nas respectivas redes públicas de ensino.

Art. 213. Os recursos públicos serão destinados às escolas públicas, podendo ser dirigidos a escolas comunitárias, confessionais ou filantrópicas, definidas em lei, que:

I - comprovem finalidade não-lucrativa e apliquem seus excedentes financei-ros em educação;

II - assegurem a destinação de seu patrimônio a outra escola comunitária, filantrópica ou confessional, ou ao Poder Público, no caso de encerramento de suas atividades.

§1.° Os recursos de que trata este artigo poderão ser destinados a bolsas de estudo para o ensino fundamental e médio, na forma da lei, para os que de-monstrarem insuficiência de recursos, quando houver falta de vagas e cursos regulares da rede pública na localidade da residência do educando, fican-do o Poder Público obrigado a investir prioritariamente na expansão de sua rede na localidade.

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Gabarito

§2.° As atividades universitárias de pesquisa e extensão poderão receber apoio financeiro do Poder Público.

Art. 214. A lei estabelecerá o plano nacional de educação, de duração pluria-nual, visando à articulação e ao desenvolvimento do ensino em seus diver-sos níveis e à integração das ações do Poder Público que conduzam à:

I - erradicação do analfabetismo;

II - universalização do atendimento escolar;

III - melhoria da qualidade do ensino;

IV - formação para o trabalho;

V - promoção humanística, científica e tecnológica do País.

2. O aluno deverá fazer uma lista com os seguintes fatos:

1920 - Criação da Universidade do Rio de Janeiro, em 7 de setembro, depois denominada Universidade do Brasil e hoje Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ).

1924 – Criação da Associação Brasileira de Educação (ABE).

1930 – Criação do Ministério da Educação e Saúde.

1932 – Manifesto dos Pioneiros.

1959 – Manifesto dos Educadores.

1961 – Lei 4.024, que estabelecia as diretrizes e bases da educação nacional.

1968 – Lei 5.540, que fixava as normas do Ensino Superior.

1971 – Lei 5.692, que implantou o ensino de 1.° e 2.° graus.

Conferências Brasileiras de Educação (CBE) nos anos 1980 e no início da década de 1990.

1990 – O presidente anunciou à nação o Programa Nacional de Alfabetiza-ção e Cidadania (PNAC).

1996 – Lei 9.394, Lei de Diretrizes de Bases da Educação Nacional (Lei Darcy Ribeiro).

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3. A leitura dos artigos 3.° e 4.° da Lei 9.394/96, que se encontram no Texto complementar, contêm os princípios e fins da educação nacional. As respos-tas podem ser diversas, os alunos poderão considerar que alguns itens da lei foram atingidos enquanto que outros não, devido à falta de incentivo dos poderes públicos, da sociedade em cobrar seus direitos etc.

Condicionantes sociais e políticos da Educação1. O aluno deverá redigir um texto que tenha algumas das características abaixo:

O cerne do pensamento de Paulo Freire está em dois pontos: a conscientiza-ção e a educação como prática da liberdade. Ele desejava educar o povo para a participação consciente e crítica na realidade política do país. Dizia que a alfabetização, como leitura do mundo, se realiza a partir da reflexão dos alunos sobre sua capacidade de pensar acerca de suas vivências, seu próprio trabalho, sobre a transformação da realidade. Sua metodologia de ensino se desenvolvia através do diálogo do educador com os educandos.

2. O aluno deverá responder que a democracia é o governo do povo e para o povo e que a democracia clássica se caracteriza pela soberania popular, en-quanto a democracia moderna caracteriza-se pelos direitos humanos.

Enfoque das políticas públicas recentes em Educação1. Esta primeira questão tem por objetivo verificar o grau de comprometimen-

to do professor/aluno com uma Lei que sedimenta sua profissão, a estrutura e o funcionamento do sistema educacional e da escola e que aponta para as questões de gestão e formação. Portanto, os artigos relativos à Educação Bá-sica não podem ser deixados de lado. É importante não só o texto da Lei, mas principalmente como ela se encontra ou não direcionando o profissional no cotidiano de seu fazer pedagógico.

2. A nova organização quanto aos níveis escolares incorpora a Educação Infan-til, o Ensino Fundamental e o Ensino Médio, em uma única denominação, conhecida, hoje, como Educação Básica. Esta nova concepção não mais pri-vilegia o ensino começando aos sete anos e, portanto, passa a reconhecer o direito das crianças de 0 a 6 anos. Esta é a primeira vez que uma lei de ensino incorpora a Educação Infantil enquanto modalidade de ensino, o que pode ser considerado como um avanço significativo, principalmente porque de-

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Gabarito

fine finalidades e objetivos que servirão de subsídios para a elaboração de projetos pedagógicos em qualquer cidade de nosso país.

3. Evidencia-se o papel de relevo dado ao projeto político-pedagógico como instrumento de responsabilidade e importância no desenvolvimento do tra-balho educacional, explicitado nos artigos 12, 13 e 14 do Título IV que trata da “Organização da Educação Nacional”. Um projeto pedagógico elaborado pelos profissionais da escola e sua comunidade é passo certo rumo à cons-trução de um processo democrático, onde se efetiva o pensar de um grupo.

4. É interessante que diante de avanços e retrocessos se tenha conseguido as-segurar um procedimento bastante importante para a profissão de quem necessita estar sempre se atualizando diante das modificações do mundo. A garantia de licença remunerada a cada sete anos de trabalho indica que o aprimoramento profissional se torna reconhecido enquanto parte de nossa profissão.

Concepção da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional – Lei 9.394/961. Naquele momento, década de 1980 e 1990, a reunião de diversos setores da

sociedade civil organizada, muitas vezes apresentando divergências entre si, mas reconhecendo a importância histórica do que significava estar junto, construir junto a partir das convergências e dentro das divergências, procu-rar construir novas possibilidades, além de demonstrar o grau de amadure-cimento dos grupos, isso permitiu a construção de um lastro de democracia importante para o país. É importante mostrar que a luta foi grande, com oito anos de duração, sem que o grupo tenha se desarticulado durante o perío-do. Não se pode deixar de registrar a respeitabilidade que o grupo adquiriu durante os encontros públicos, de vez que as propostas apresentadas repre-sentavam anseios de diferentes categorias, que trouxeram propostas para a elaboração da lei de ensino.

2. Ao analisarmos os fatos narrados, percebemos que uma das estratégias que poderia ter sido utilizada seria a movimentação, em cada estado, de manifes-tação que deixasse a comunidade legislativa preocupada com seu processo de votação. No entanto, dada a realidade do Congresso (acordos internos nem sempre democráticos e nem sempre dentro de um padrão de ética acei-tável) fazia com que a data indicada para votação de um projeto acontecesse

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dessa forma. A distância da capital federal também fez com que se tornasse difícil o acompanhamento de grande número de pessoas aos debates e vota-ções naquela Casa, considerando que para estar lá, havia necessidade de re-cursos financeiros muitas vezes insuficientes nos sindicatos ou associações.

Modificações introduzidas pela Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional – LDB 9.394/961. A retirada de pontos considerados como fundamentais em defesa da escola

pública foi um fato que provocou o aborrecimento, fazendo com que muitos assuntos ficassem sem definição, permitindo as interpretações equivocadas e as ações governamentais justificadas na “intenção da lei”.

2. As resoluções do Conselho Federal de Educação ao serem editadas apon-taram desde o início para o isolamento da sociedade civil. As resoluções chegaram ao cenário brasileiro prontas, elaboradas por técnicos, sem que democraticamente tivessem sido discutidas com o professorado. Assim se deu com os Parâmetros Curriculares Nacionais, anunciando que o anunciado regime de cooperação ficaria como acessório da Lei.

3. Pela primeira vez encontramos uma lei de ensino que apontasse para uma grande flexibilização na organização da Educação brasileira. Os sistemas po-derão prever séries anuais, anos, ciclos, períodos semestrais, e outras que favoreçam os sistemas locais. Isto significa dizer que o importante é aprendi-zagem da criançada, seja de uma ou outra forma. A Lei está privilegiando o processo educacional.

4. Mais uma resposta de cunho pessoal. Porém, achamos importante que cada profissional individualmente ou reunidos possam estabelecer uma relação da norma (LDB) com o seu fazer cotidiano, levantando aspectos que estão em vigor e dos que não estão, apontar quais fatos impedem que seja coloca-da em prática a atual LDB, propondo alternativas que podem fazer vigorar a LDB 9.394/96. É importante que o grupo conheça bem a legislação de ensino que torna a organização das turmas, da escola e o fazer pedagógico dentro de um campo definido.

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Gabarito

Organização e funcionamento da Educação Básica 1. Um viés interessante é o artigo que indica a organização da Educação Bási-

ca. Para se garantir a aprendizagem a Lei abre um leque de possibilidades reais de organização; permite a reclassificação do aluno; dá permissão sobre a adequação de calendário, respeitadas as peculiaridades locais, assim como determina a estrutura e o funcionamento do sistema escolar.

2. Um grande questionamento que se verifica de imediato é a falta de discus-são quanto aos conteúdos curriculares apontados como favorável ao desen-volvimento dos alunos. É a velha técnica: o governo pensa e os professores executam. É a tradicional política da centralização do poder que não con-sidera o grupo, o professor, a comunidade, a escola, abrindo caminho para decisões contraditórias, ficando a mercê das lutas políticas que através dos lobbies conseguem introduzir algumas alterações da lei de ensino. Uma nova proposta significa uma nova visão sobre a Educação, que longe de ficar presa a questões de currículo mínimo e elenco de disciplinas, centra seu foco na formação do educador e na definição de um corpo de conhecimentos fun-damentais. Acreditamos que estes dois eixos permitirão a elaboração de um currículo que possa atender à diversidade da escola.

3. Observamos dentro dos textos estudados que as políticas educacionais se encontram, como hoje, sendo o resultado de entraves políticos, em que as forças majoritárias asseguram a concepção de Educação a ser adotada e con-sequentemente o papel da escola. No entanto, hoje, com a possibilidade das escolas organizarem seu projeto político-pedagógico, aprovado pela Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, percebemos uma possibilidade do professorado assumir as rédeas da Educação brasileira. Este é um momento de grande responsabilidade do professorado e da escola, que precisam ter clareza do que sua comunidade indica como desejo e juntos caminharem em busca das possibilidades concretas de sucesso, construindo uma Educa-ção emancipatória para a formação de cidadãos.

Os Parâmetros Curriculares da Educação Básica1. A grande proposta dos Parâmetros Curriculares seria transformar o ensino em

algo significativo, repleto de informações que pudesse instrumentalizar o alu-

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no para a vida, ajudando-os a construir seu próprio conhecimento. Para tanto, não poderia deixar de ouvir os sujeitos para quem o documento foi pensado e muito menos os que desenvolverão as propostas – os professores.

O documento se estrutura: referencial nacional; meta educacional; propostas curriculares dos Estados e Municípios; elaboração de propostas curriculares de cada instituição escolar; realização da programação das atividades.

2. Resposta de cunho pessoal, porém dentre as respostas possíveis, acredita-mos que os questionamentos devem se originar das polêmicas contidas na própria legislação tanto diretamente na Lei de Diretrizes e Bases quanto nas complementares que explicitam os artigos da Lei. Como uma lei com ca-ráter normativo pode apresentar uma visão reducionista? Como uma base comum se apresenta de forma centralizadora? Como respeitar as peculiari-dades locais (espaço para as diversidades) se não reconhecem os sujeitos em situações concretas de vida? Outras questões poderão ser levantadas.

3. Outra resposta de cunho pessoal, considerando que a opção dependerá da postura política que norteará o trabalho educacional. Numa visão tradicional, terá concordância com o encaminhamento apresentado pelo texto. Porém, se houver uma visão efetiva quanto à qualidade do ensino, a estratégia a ser adotada será a discussão do coletivo, chamando o professorado a discutir e apresentar propostas no grupo. Com certeza o currículo estará sendo pensa-do para concretizar uma escola pública, popular, de qualidade referenciada para todos os brasileiros.

Impasses e políticas atuais em relação à Educação 1. Os quatro eixos que dão suporte às propostas de educação são: organização

da Educação nacional, gestão democrática, financiamento da Educação e profissionais da Educação.

Obs.: a partir deste momento, respostas individualizadas, dependendo da formação de cada profissional, bem como das crenças tecidas ao longo da prática pedagógica.

No entanto apresentamos alguns eixos que poderão estar contemplados nos comentários.

Organização da Educação nacional – seria bem importante que pudés- �semos ter, através de uma discussão séria, com os diferentes setores da so-

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Gabarito

ciedade organizada e o poder público federal, normas de orientação aos estados e municípios na condução do sistema educacional. Esta estratégia evitaria a quantidade de medidas provisórias enviadas à Câmara e os equí-vocos de interpretação da legislação. O atual PNE só prevê “redução das desigualdades sociais e regionais no tocante ao acesso e à permanência, com sucesso, na Educação pública”, porém não indica como se chegar ao objetivo.

Gestão democrática – a atual legislação até favorece a construção desta �gestão democrática, porém é necessário que os atores façam parte das negociações, levando propostas e apresentando encaminhamentos para o sucesso do trabalho escolar. A participação da comunidade escolar tam-bém é particularmente importante, pois assegurará o direito de seus filhos a uma educação de qualidade. Vários organismos favorecem este tipo de gestão, dependendo dos encaminhamentos oriundos das discussões.

Financiamento da Educação nacional – tendão de Aquiles dos governos, �que não gostam de ter responsabilidades (gastos) definidas. Apesar de se encontrarem presos a percentuais mínimos para a Educação, a todo e qualquer momento buscam justificativa para burlar a legislação. Este é um aspecto a ser muito debatido, pois sem ele não se garante qualidade de ensino, gestão democrática, redução das desigualdades sociais; Educação Inclusiva, e qualquer proposta de avanço nas questões educacionais.

Se pararmos para analisar, não há discurso político que não fale em res- �gatar a dignidade do magistério, porém a prática se distancia, em mui-to, deste sedutor discurso. Muitos tentam ignorar que o magistério não é composto de apenas professor e aluno, mas que há todo um grupo pro-fissional controlando a dinâmica de funcionamento da escola. Resgatar a dignidade do magistério é garantir a valorização dos profissionais da Educação (professores, técnicos e funcionários administrativos) em sua formação básica e continuada, carreira e salário.

2. Partindo do pressuposto de que dois projetos de Educação circulam no meio da sociedade e que seus pressupostos são muitas vezes bastante diferen-ciados, a polêmica se estabelece de forma quase natural. Se os caminhos percorridos se assentam em visões diferenciadas quanto ao direcionamento das políticas públicas, é evidente que o confronto das ideias se encaminhem para o Congresso Nacional, espaço das decisões políticas em nosso país. O confronto que se dá é pela garantia de se ter a condução política do país.

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Não é apenas a Educação que sofre, mas outros setores se encontram em situação até pior. A visão política determina o projeto que se quer implemen-tar na sociedade.

3. De cunho bastante individual. Sugerimos como indicativo a falta de partici-pação da sociedade nas discussões, considerando que seu objetivo maior é garantir aos cidadãos, enquanto política social, que a Educação é um direito de todos e um dever do Estado, e, portanto, precisa ser oferecida com quali-dade a fim de permitir além do acesso, a permanência da população na esco-la. Uma questão que foge da ética e o direito da comunidade educacional se colocar para a discussão de um documento que tem como papel coordenar a política educacional brasileira, ver, com desrespeito, o veto a questões im-portantes para o bem da Educação.

Perspectiva educacional de inclusão1. O aluno deve citar que a ampliação do conceito determina que a Educação

Inclusiva atenda todas as crianças que apresentem deficiências (mental, vi-sual, física, motora, auditiva e múltipla, condutas típicas, síndromes diversas e quadros neurológicos e psiquiátricos ou com altas habilidades), além das crianças de rua e que trabalham, crianças de origem remota ou de popula-ção nômade, crianças pertencentes a minorias linguísticas, étnicas ou cultu-rais e crianças de outros grupos marginalizados.

2. O aluno deverá sintetizar as ideias do texto da aula citadas abaixo

Altas habilidades (superdotados) – notável desempenho e elevada potencia-lidade em qualquer dos seguintes aspectos isolados ou combinados: capa-cidade intelectual geral, aptidão acadêmica específica, pensamento criativo ou produtivo, capacidade de liderança, talento especial para artes, capacida-de psicomotora.

Condutas típicas – manifestações de comportamento típico de portadores de síndromes e quadros psicológicos, neurológicos ou psiquiátricos que provo-cam atrasos no desenvolvimento e podem trazer prejuízos no relacionamen-to social, em grau que requeira atendimento educacional especializado.

Deficiência Auditiva – perda total ou parcial, congênita ou adquirida, da ca-pacidade de compreender a fala por intermédio do ouvido. Pode manifes-tar-se como: surdez leve/moderada – perda auditiva de até 70 decibéis, que

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Gabarito

pode dificultar, mas não impedir o indivíduo de autoexpressar oralmente, bem como perceber a voz humana, com ou sem a utilização de um aparelho auditivo; ou surdez severa/profunda – perda auditiva acima de 70 decibéis, que pode impedir o indivíduo de entender, com ou sem aparelho auditivo, a voz humana, bem como de dominar por processos naturais os códigos linguísticos.

Deficiência Física – variedade de condições não-sensoriais que afetam o in-divíduo em sua mobilidade, na coordenação motora geral ou na fala, como consequência de lesões neurológicas, neuromusculares e ortopédicas, ou malformações congênitas ou adquiridas.

Deficiência Mental – funcionamento intelectual geral significativamente abaixo da média, oriunda do período de desenvolvimento do indivíduo, em concomitância com limitações em duas ou mais áreas de conduta adaptati-va ou da capacidade do indivíduo responder adequadamente às demandas sociais, nos seguintes aspectos: comunicação, habilidades sociais, cuidados pessoais, independência na locomoção, desempenho na família e na comu-nidade, saúde e segurança, desempenho escolar, lazer e trabalho.

Deficiência Visual – redução ou perda total da capacidade de ver com o melhor olho e após melhor correção óptica. Manifesta-se como: cegueira – perda da visão, em ambos os olhos. No âmbito educacional, a cegueira re-presenta a perda total ou o resíduo mínimo da visão que leva o indivíduo a ter de utilizar o Braille como mediador de leitura e escrita além de outros recursos e equipamentos especiais: Visão reduzida – acuidade visual entre 6/20 e 6/60, no melhor olho, após correção máxima. O resíduo visual permite que o indivíduo leia impressos a tinta, desde que se empreguem recursos didáticos e equipamentos especiais.

Deficiência Múltipla – associação, no mesmo indivíduo, de duas ou mais defici-ências primárias (mental/auditiva/física/visual) com comprometimento que acarretam atrasos no desenvolvimento global e na capacidade adaptativa.

Educação Básica de Jovens e Adultos1. O aluno, a partir da leitura do texto da aula, deverá registrar por escrito que o

ProJovem é um programa que permite aos jovens, além do processo educa-cional, uma qualificação profissional e acesso a ações de cidadania, esporte, cultura e lazer. Poderá acrescentar que até 2010 serão oferecidas mais de 4

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milhões de vagas para atender aos jovens que tenham entre 15 e 29 anos. Uma resposta mais completa deverá incluir que a gestão do ProJovem é com-partilhada entre a Secretaria-Geral da Presidência da República, por meio da Secretaria Nacional de Juventude e os Ministérios do Trabalho e Emprego, do Desenvolvimento Social e Combate à Fome e da Educação. Será interes-sante também, se o aluno acrescentar a subdivisão do ProJovem em quatro modalidades: ProJovem Adolescente, ProJovem Urbano, ProJovem Campo e ProJovem Trabalhador.

2. O aluno deverá responder que se trata de crime de responsabilidade da au-toridade competente e que o Ministério Público deverá ser acionado para as devidas providências legais.

Desafios da Educação Infantil1. O aluno deverá responder que a criação do Fundo de Manutenção e Desen-

volvimento da Educação Básica (Fundeb), em substituição ao Fundef, ex-pandiu os recursos financeiros para o Ensino Médio e a Educação Infantil, incluindo creches e pré-escolas.

2. Esta informação poderá ser obtida diretamente na Secretaria de Educação do Município ou na página do Inep: <www.inep.gov.br>. O aluno poderá comparar os dados dos censos escolares que ali se encontram no link Sinop-ses Estatísticas, verificando assim os dados de matrícula de todos os estados brasileiros desde 1995 até o ano atual.

Ensino Médio: a última etapa da Educação Básica1. Os alunos deverão fazer uma crítica à metodologia utilizada pelos profes-

sores nas salas de aula. A letra da música retrata o que pensam os jovens a respeito da escola e do marasmo que tem permeado muitas salas de aula. Eles deverão fazer sugestões de alternativas didáticas que possam dinamizar o dia-a-dia de nossas escolas.

2. Os registros feitos pelos alunos deverão apontar para as normas legais e para as disciplinas que estão sendo desenvolvidas nas escolas de Ensino Médio. A exigência de inclusão das disciplinas de Filosofia e de Sociologia ainda não

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Gabarito

está sendo cumprida com rigor em muitas escolas e, certamente, os incisos I e II, do Artigo 36 serão os mais questionados.

Educação Profissional: o desafio de formar trabalhadores1. Os alunos verão que há inúmeras mudanças na questão da Educação Profis-

sional e que atinge diretamente os trabalhadores em Educação. Assim pode-se citar que há concursos públicos municipais e estaduais para professor e que os planos de carreira e os salários, apesar do piso salarial nacional deter-minado por lei, apresentam muitas diferenças entre os sistemas de ensino, não só na questão salarial, como também nas condições de trabalho.

2. Esta atividade vai levar os alunos a concluírem sobre a necessidade de maio-res investimentos do campo educacional, na formação profissional e na pre-paração dos jovens para o mundo do trabalho.

3. Pelo conceito de competência explicitado no texto da aula, o aluno poderá fazer uma análise avaliativa de professores que ele conheça e até de seus próprios professores e sua prática pedagógica.

A avaliação institucional no Brasil1. Os alunos deverão descrever se já observaram, nas escolas, como tem sido

o processo de avaliação institucional, se o projeto político-pedagógico parte de uma avaliação com base em algum dos objetivos listados na questão. A gestão das escolas poderá ser o foco desta atividade, pois ela deve ser en-tendida, não apenas como a atuação de um diretor, mas de toda a equipe pedagógica da escola, incluindo-se nela o corpo docente.

2. Nesta atividade, como o aluno terá liberdade para escolher o tipo de avalia-ção que desejar, podemos ter diferentes opções de resposta. Se a escolha for pelo Prova Brasil ou pelo Enem, provavelmente, serão analisados os resul-tados de um município ou de uma das escolas deste município. Se for pelo Enade, a análise feita pelo aluno poderá ser de uma Instituição de Ensino Superior ou de um dos cursos de graduação avaliados pelo Enade.

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Perspectivas futuras das políticas públicas1. O aluno poderá utilizar recortes de jornais e revistas ou programas de televi-

são para base de sua análise. O texto da aula dá uma fundamentação teórica sobre o neoliberalismo, o que deverá auxiliá-lo na realização da atividade.

Nesta aula, o aluno estudou e refletiu sobre as propostas neoliberais e leu que o neoliberalismo se apoia no jogo do mercado, o qual, embora neces-sário à criação da riqueza e do desenvolvimento, não garante a liberdade. A política neoliberal estimula a competitividade. A proposta liberal, enquanto cultura da liberdade, implica em grau historicamente alto de desenvolvimen-to econômico, e isso não será conseguido sem, no mínimo, classes médias razoavelmente instruídas e massas alfabetizadas. A interpenetração entre de-senvolvimento, educação e liberdade tem de ser concretizada nas ações go-vernamentais. Para os neoliberais, liberdade significa conflito, debate aberto. O neoliberalismo faz críticas à igualdade que, segundo eles, embora favorá-vel, reduz as oportunidades de participação individual, limitando, portanto, a liberdade. E esta posição vai influenciar na sua visão de escola, pois acham que, embora a Educação seja um direito civil, o sistema escolar deve ser mudado de maneira a proporcionar uma espécie de representação propor-cional de todos os grupos, onde todas as pessoas tenham oportunidades de desenvolver suas habilidades e desejos. A igualdade é vista como condição, não como meta, para que sejam possíveis aos homens, escolhas desiguais, e a emersão das desigualdades invisíveis. Os neoliberais defendem a escola pluralista e a iniciativa particular na Educação. O pensamento educacional neoliberal vê a escola como o espaço de desenvolvimento de talentos, hábi-tos, de preparação para desafios, conectada com a atividade geral das vidas humanas.

2. Ao acessar o endereço informado o aluno terá de escolher a opção Sistema Municipal. O segundo passo é escolher o estado e a seguir o município que deseja. Os dados referentes aos anos finais e aos anos iniciais da cidade serão fornecidos em relação ao ano de 2005 e de 2007, bem como as metas proje-tadas para os próximos biênios até 2021. Com os dados disponíveis, o aluno deverá dar continuidade ao trabalho, selecionando as escolas que conhece para analisar os resultados do IDEB, comparando-os com a opinião das co-munidades.

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