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POBREZA POLÍTICA Pedro Demo (2008) 1[1] Quando falamos de pobreza, a parte mais conhecida é a material, econômica, quantitativa, expressa em múltiplas carências como de renda, moradia, emprego, alimentação, etc. A pesquisa científica contribui para esta visão unilateral, à medida que prefere, por causa de seu método experimental, cenários mensuráveis, induzindo que o mais importante no fenômeno da pobreza é a dimensão que o método pode medir, não aquilo que mais compromete a vida do pobre. Esta “ditadura do método” (Morin, 2002), extremamente confiante em “evidências empíricas” típicas da perspectiva metodológica positivista/empirista (Haack, 2003. Giere, 1999. Demo, 1995), reduz o fenômeno àquilo que se pode mais facilmente manipular, deixando de lado o que talvez seja a dinâmica mais profunda da pobreza: sua politicidade. Ser pobre não é apenas não ter certas coisas. É principalmente ser destituído de ter e, em especial, de ser, um tipo de exclusão que tem em sua origem não só em carências materiais, mas mormente em imposições mobilizadas por processos de concentração de bens e poder por parte de minorias. Mera carência não gera pobreza necessariamente. Por exemplo, falta de chuva em certas regiões gera problemas de acesso à água, mas, sendo esta falta comum a todos os habitantes, não origina, por si só, pobres. Pobreza é carência politizada, no sentido de a carência servir para o favorecimento de alguns em detrimento de muitos. Seca gera pobreza quando aparece a “indústria da seca” (Demo, 2007), através da qual uma carência material se 1[1] Professor Titular Aposentado da Universidade de Brasília (UnB). PhD em Sociologia pela Universität des Saarlandes (Saarbrücken/Alemanha), 1971. Pós-doutor pela University of California at Los Angeles (UCLA), 1999-2000. http://pedrodemo.sites.uol.com.br

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POBREZA POLÍTICA

Pedro Demo (2008)1[1]

Quando falamos de pobreza, a parte mais conhecida é a material, econômica, quantitativa, expressa em múltiplas carências como de renda, moradia, emprego, alimentação, etc. A pesquisa científica contribui para esta visão unilateral, à medida que prefere, por causa de seu método experimental, cenários mensuráveis, induzindo que o mais importante no fenômeno da pobreza é a dimensão que o método pode medir, não aquilo que mais compromete a vida do pobre. Esta “ditadura do método” (Morin, 2002), extremamente confiante em “evidências empíricas” típicas da perspectiva metodológica positivista/empirista (Haack, 2003. Giere, 1999. Demo, 1995), reduz o fenômeno àquilo que se pode mais facilmente manipular, deixando de lado o que talvez seja a dinâmica mais profunda da pobreza: sua politicidade. Ser pobre não é apenas não ter certas coisas. É principalmente ser destituído de ter e, em especial, de ser, um tipo de exclusão que tem em sua origem não só em carências materiais, mas mormente em imposições mobilizadas por processos de concentração de bens e poder por parte de minorias. Mera carência não gera pobreza necessariamente. Por exemplo, falta de chuva em certas regiões gera problemas de acesso à água, mas, sendo esta falta comum a todos os habitantes, não origina, por si só, pobres. Pobreza é carência politizada, no sentido de a carência servir para o favorecimento de alguns em detrimento de muitos. Seca gera pobreza quando aparece a “indústria da seca” (Demo, 2007), através da qual uma carência material se converte em ocasião para angariar privilégios e impor exclusões.

Estudos e políticas centram-se, como regra, na pobreza dita “absoluta” - que compara o pobre consigo mesmo -, evitando discutir a pobreza dita “relativa” - que compara o pobre com as partes mais ricas da população. Pobreza não é situação isolada e isolável, que diria respeito apenas aos pobres, mas questão social que reflete a própria dinâmica socioeconômica e política da sociedade. Ninguém é pobre sozinho. É pobre em relação a outros, em contexto de polarização dialética. Pobreza não é simplesmente algo dado, por isso também inevitável ou próprio da sociedade, mas algo socialmente causado, imposto, mantido. Pode, pois, ser mudada. Prefere-se, porém, isolar o pobre, para alegar que o problema é dele, por vezes de sua incompetência ou indolência, isentando assim as outras partes da população, ou sugerindo políticas que não impliquem mudanças estruturais na sociedade. No fundo da dinâmica excludente da pobreza existe confronto político entre uns poucos que se apropriam de bens e poder e muitos que ficam de fora.

1[1] Professor Titular Aposentado da Universidade de Brasília (UnB). PhD em Sociologia pela Universität des Saarlandes (Saarbrücken/Alemanha), 1971. Pós-doutor pela University of California at Los Angeles (UCLA), 1999-2000. http://pedrodemo.sites.uol.com.br

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“Ficar de fora” não é termo correto, porque, sendo pobreza parte integrante desta sociedade, os pobres estão dialeticamente incluídos, embora na margem, na periferia, tal qual numa unidade de contrários.

Busco discutir neste texto a importância de introduzir nos estudos de pobreza a noção de pobreza política, sugerindo que a carência de cidadania possivelmente seja a dimensão mais grave nos pobres, porquanto esta carência impede que se tornem protagonistas de sua própria emancipação. Programas sociais atuais tendem, através de propostas apenas assistenciais, a manter os pobres como meros beneficiários, evitando que estes se confrontem com os mais ricos da sociedade. Não se trata de depreciar a questão material da pobreza, que continua muito grave. Ao contrário, propomos que é urgente agregar à preocupação com a questão material, a preocupação com a questão política, possivelmente ainda mais grave.

I. POBREZA DA POBREZA

É pobre o conceito corrente de pobreza, quando se reduz a carências materiais (Demo, 2003). Existe aí também um interesse neoliberal, no sentido de promover políticas sociais assistenciais apenas, voltadas para benefícios materiais, em geral, transferência de renda. No âmbito da assistência social já se tornou “paradigma” a política social reduzida a transferência de renda (Yazbek et alii, 2004), embora não passe, como analisam Oliveira e Rizek (2007), de “gestão da pobreza”: a pobreza é habilmente gerida, ou seja, acomodada nas periferias, sem que se tornem necessárias medidas estruturais de mudança; é “domesticada e despolitizada” (Paoli, 2007). Estudando periferias pobres da cidade de São Paulo, Oliveira e Rizek (2007) observaram que as políticas sociais, muitas vezes decantadas como estratégias de inclusão social, tendem fortemente a produzir efeitos superficiais, tal qual os próprios benefícios oferecidos. Por exemplo, o orçamento participativo em grande medida é uma farsa, em que pese a boa intenção sempre possível: i) apenas ínfima parcela é colocada à decisão pública participativa; ii) a pressão sobre esta parcela continua dentro do mesmo formato da política antiga, de tendência clientelista; iii) movimentos sociais, em geral, não possuem qualidade satisfatória para representar as maiorias, sem falar que facilmente fazem negociações dúbias com o governo; iv) o que é aprovado publicamente nem sempre é efetivado, mantendo o governo poder de veto ou postergação. Orçamento participativo foi, assim, uma proposta de “limitado alcance” (Bello, 2007. Rizek, 2007). Telles (2007), nesta mesma obra de Oliveira e Rizek, estudando as periferias pobres de São Paulo, analisa problemas profundos que vão muito além das carências materiais, apontando para a dimensão da pobreza política: neste mundo complexo e complicado, a separação entre formal e informal, legal e ilegal, lícito e ilícito, público e privado torna-se ambígua e por vezes desaparece; o líder comunitário que negocia o orçamento

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participativo pode ser, ao mesmo tempo, o líder religioso e do tráfico de drogas; o representante da comunidade pode ser (ou querer ser) empregado do governo; os coreanos que, antes, sentiam-se explorados pelo brasileiros, agora exploram os bolivianos; tudo, ao final, é um jeito de incluir-se no negócio da sobrevivência, cujos limites da decência se esvaem. Certamente, é um mundo marcado por carências gritantes, mas ainda mais marcado por tramas e tramóias políticas que fragilizam a cidadania a ponto de benefícios mínimos comprarem a alma do pobre.

Apesar de pobreza política parecer tema novo, sempre apareceu na história humana, em especial nos momentos em que excluídos, oprimidos, escravos, pobres se sublevaram contra seus algozes. É marcante o relato do Gênesis nas primeiras páginas da bíblia, onde se tenta dar uma explicação para a condição precária humana, submetida à morte, sofrimento, frustração, velhice etc. A explicação estaria no pecado original, em geral pintado como deslize sexual. Na verdade, a questão foi bem outra: Adão e Eva comeram da árvore do conhecimento e assim o fizeram porque queriam ser como deuses. A questão era o confronto da criatura contra o criador, usando a habilidade de conhecimento. De fato, este confronto somente ocorre quando o excluído “sabe pensar”, ou seja, elabora suficiente consciência crítica e organização política para combater a exclusão. Da condição de objeto precisa passar à condição de sujeito capaz de história própria. Sócrates apontava para esta direção, quando definia conhecimento principalmente como autoconhecimento, não vendo nele apenas uma questão lógica, mas igualmente uma ambição política. Foucault (1971; 1979) iria elaborar, mais que outros, a relação fina e profunda entre conhecimento e poder. Ao contrário do positivismo que aposta em neutralidade e objetividade, o conhecimento é energia política não por defeito ou deslize, mas por natureza, algo que tem sido realçado na pesquisa pós-colonialista (Harding, 1998; 2004; 2006). Neste sentido, sempre existiu a noção de “politicidade” da sociedade humana (Demo, 2002), indicando a habilidade de não ser objeto passivo do destino ou dos outros. Como Maturana (2001) vai dizer na segunda metade do século XX, todo ser vivo é movido de dentro para fora, por “autopoiese”, através da qual elabora suas condições de autonomia relativa. Não consegue autonomia completa, porque nenhum ser vivo é completo, sem falar que autonomias completas não saberiam conviver com outras autonomias.

Na primeira metade do século passado foi importante a obra de Brecht (1994; 2003) sobre “teatro político” ou “analfabetismo político”, noções que sempre integraram sua obra de cunho eminentemente engajado à esquerda. Pretendia, através do teatro sobretudo, contribuir para a formação da consciência crítica dos participantes e, conseqüentemente, motivar iniciativas de cidadania organizada e mudança. A Escola de Frankfurt também, a seu modo, investiu muito contra a “indústria cultural”, interpretada à época como imbecilizante. A “teoria crítica” tinha como mensagem crucial o desafio de não tomar as teorias e a própria ciência como aparatos politicamente neutros ou objetivos, mas como construções a serviço de interesses em geral escusos. Tentou instalar algo que hoje é parte das propostas de “desconstrução” (Bogost, 2002), ou seja, o compromisso crítico perante qualquer proposta oriunda do mundo dito científico, dominado pelo

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positivismo e, por isso, conservador. Houve excessos, ao estigmatizar toda indústria cultural como imbecilizante (Kellner, 1995), já que, mesmo em ambiente de mercado liberal, nem tudo é necessariamente negativo. Hoje, possivelmente o charme da teoria crítica se esgotou, talvez principalmente pelo fato notório de que foi crítica, mas pouco autocrítica (Wiggershaus, 2002). Esta falha tornou-se mais clara com o levante dos estudantes em 1968 (maio de 1968 em Paris), quando, procurando apoio em seus gurus da Escola de Frankfurt (em especial Marcuse), perceberam que eles eram mais que tudo “teóricos”, sem maior vinculação com a práxis histórica.

Dentre as influências da teoria crítica pode-se citar o movimento da “pesquisa participante” (Demo, 2004), surgido em ambiente educacional no Canadá no fim da primeira metade do século passado e identificado com a politicidade da educação tal qual entendia Paulo Freire (1997; 2006) e com o “intelectual orgânico” de Gramsci (Morton, 2007. Giroux, 1988). Continha uma crítica ardorosa contra o positivismo, ao mesmo tempo que pleiteava um tipo de pesquisa comprometido com as maiorias pobres: papel do “intelectual orgânico” seria formular a contra-ideologia, participando dela ativamente com todos os riscos. Visavam-se não apenas resultados metodológicos alternativos, mas principalmente proveito político e material em favor dos desprivilegiados da sociedade capitalista. Pretendia-se um tipo de educação voltado para a emancipação de modo flagrante e militante, afastando-se claramente das pretensões consideradas farsantes da objetividade e neutralidade. Esta visão passou, posteriormente, a incluir modalidades menos exigentes (a exigência mais drástica era assumir o destino político da comunidade, mesclando pesquisa e participação) como “pesquisa-ação” (Thiollent, 1986) e similares: nesta devolvem-se à comunidade os dados coletados e analisados, mas não se supõe que o pesquisador se identifique ideologicamente e assuma todas as conseqüências políticas. Hoje, fala-se mais comumente de “pesquisa qualitativa” (Demo, 2001), como contraponto não dicotômico da pesquisa quantitativa, em ambientes já menos sensíveis à politicidade do conhecimento dito científico (Turato, 2003).

O welfare state, construído no pós-guerra, trouxe, de um lado, um formato bem mais humano do aparato estatal, mas, de outro, através de proteções públicas crescentes, de certa forma acalmou os ânimos, sobretudo dos sindicatos. Garantidas as necessidades básicas e com relativa estabilidade laboral, a luta arrefeceu consideravelmente, algo que se converteu em fato consumado pela razão inversa da crise do welfare state, na década dos 70. Tornando-se mais difícil financiar as proteções estatais, também porque as condições laborais começaram a mudar dramaticamente, a sociedade organizada, em particular, os sindicatos viram-se contra a parede. A relativa despolitização provocada pelo bem-estar agora se via motivada pelo receio do mercado que emergia como regulador solitário da sociedade. Instalava-se o pensamento único de teor neoliberal: a única maneira de organizar a sociedade e a economia era a proposta neoliberal de mercado, desregulado, sobranceiro, tal qual ocorreria com a teoria da seleção natural na natureza: assim é, e ponto final. As exuberantes proteções estatais oferecidas ao tempo do welfare

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state decaíram para a distribuição de benefícios cada vez mais minúsculos, sob a alegação de que somente isso era viável aos olhos do mercado.

Mesmo assim, em 1990 entrou no ar o Índice de Desenvolvimento Humano (IDH), do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD) (Undp, 1990/2008), construído sobre a noção de “oportunidade”, francamente vinculado à politicidade do desenvolvimento. Buscava-se rechaçar a proposta neoliberal do Banco Mundial, restrita ao crescimento da economia e incapaz de perceber a politicidade da pobreza das nações. Esta discordância de fundo pode facilmente ser vista nos relatórios de 2005 de ambas as instituições (The World Bank, 2005. United Nations, 2005), nos quais o Banco Mundial já se mostra um pouco mais flexível, embora continue apostando tudo no mercado liberal, enquanto o PNUD insiste que crescimento não basta para reduzir a pobreza, em particular a pobreza relativa. Em 1997, este Relatório incluiu a noção de “pobreza humana”, passando a monitorar, entre outras dimensões, as “democracias”. O charme dos Relatórios do Desenvolvimento Humano já declinou consideravelmente, tendo em vista que as promessas de desenvolvimento não se efetivam minimamente (Sachs, 2005). Embora chame muito a atenção as taxas de crescimento vertiginoso de países como China e Índia, é notório que se trata de crescimento extremamente desigual, sem falar nos custos ambientais já irreversíveis. Mesmo assim, o esforço do PNUD foi e continua importante, porque aponta para a farsa que é vender o mercado como instância neutra e objetiva, à qual teríamos de nos curvar passivamente.

Continua a haver levantes pelo mundo afora, mas são, quase sempre, muito localizados e minúsculos face às forças da globalização. Expressão desta perspectiva é a proposta de Holloway (2005), que preconiza “mudar o mundo sem tomar o poder”. Pode-se entender bem esta idéia, mas acaba tornando-se desmobilizadora, já que é improcedente pretender realizar mudanças de profundidade sem envolvimento político explícito. O lado pertinente desta expressão é que revolucionários, chegando ao poder, facilmente tornam-se piores que os reacionários anteriores, ao sucumbirem às benesses do poder. Mas este risco não desfaz a necessidade de exercer um contrapoder. A imagem mais forte hoje é de sociedades desmobilizadas (Demo, 2001a). Pior que isso, tal desmobilização é induzida em troca de benefícios irrisórios. É o triunfo do neoliberalismo, de alto a baixo, globalizado.

Mesmo assim, existem reações importantes como os “novos estudos de pobreza” (Goode/Maskovsky, 2001), voltados para a análise de aspectos antropológicos, culturais e políticos das populações pobres, numa crítica clara ao estilo positivista e quantitativista da pesquisa vigente. Procura-se também desfazer estigmas historicamente acumulados na relação com a pobreza em sociedade, tais como a indolência do pobre, sua acomodação face a benefícios recebidos em contrapartida, inferioridade cultural e étnica, e assim por diante. Num país como os Estados Unidos, no qual o mercado a tudo regula religiosamente (Bakan, 2004), a questão da pobreza continua sendo um incômodo pouco suportável, embora esteja crescendo teimosamente. Sob as alegorias fantasiosas do “self made man” ou do “American way of life”, pobre tende

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a ser visto como fracassado, depositando-se sobre seus ombros exclusivamente a desfortuna da vida. Uma das análises mais clarividentes e mesmo surpreendentes é a de O’Connor (2001) sobre “o conhecimento da pobreza”, na qual se descreve o progresso incessante da pesquisa e da produção de conhecimento em torno da pobreza, em especial seu financiamento público e privado, enquanto a pobreza como tal não recua no mundo, também nos Estados Unidos. Na prática, pobreza virou bom negócio para acadêmicos, universidades e institutos de pesquisa, sabendo-se dela hoje detalhes de toda sorte, mas que nunca resultam em melhorias visíveis para os pobres. São apenas objeto interessante de estudo.

Certamente, não se espera que o pobre faça sua própria teoria da pobreza, uma vez que faz parte da pobreza, para além da destituição material, índices baixos de educação (Ioschpe, 2004). Por conta disso, inventou-se o “intelectual orgânico”, de origem gramsciana, com a obrigação de vincular teoria e prática. Permanece, no ambiente educacional latino-americano, o jargão da “educação transformadora”, sempre iluminada por Freire e Gramsci, tendo como uma das propostas atuais a assim dita “pedagogia histórico-crítica” (Saviani, 2005). Embora de qualidade teórica reconhecida, a proposta tende a restringir-se a visões teóricas, nas quais o marxismo apregoado em geral é apenas senha do grupo. Bastaria levar em conta o baixíssimo desempenho escolar em países como o Brasil (Demo, 2004a), ao lado de práticas fraudulentas como a progressão automática dos alunos. Pretendendo-se, com justa razão, combater a reprovação, já que esta não se mostra capaz de aprimorar as condições de aprendizagem, os professores adotam a posição cômoda de não avaliar e fazer progredir a todos os alunos, quer aprendam ou não. Esta idéia faz parte da assim dita “teoria dos ciclos” (Mainardes, 2007), uma teoria pobre para o pobre, redundando na proposta oficial de alfabetizar as crianças em até três anos. Nenhuma teoria minimamente séria sustenta esta idéia, porque qualquer criança, mesmo a mais pobre, pode se alfabetizar em um ano, desde que encontre na escola condições adequadas, em especial professores bem preparados e comprometidos (Grossi, 2004)2[2].

Percebe-se, então, que a pobreza da pobreza aparece não só à direita em visões neoliberais, mas igualmente à esquerda, quando, pretendendo-se partir do pobre, toma-se pobreza como ponto de partida e de chegada. Facilmente, aparece um senso de compaixão fora de lugar: sendo o pobre tão desvalido, há que facilitar as coisas, reduzir o esforço, oferecer receitas prontas, deixá-lo três anos parado no mesmo patamar. Chamo a isto de educação pobre para o pobre. É correto partir do pobre, se o quisermos como sujeito participativo, mas é contraditório deixá-lo na pobreza. Parte-se da pobreza para sair dela.

Concluo que é necessário rever nossa concepção de pobreza, pois é mais pobre que a própria pobreza, praticando principalmente uma injustiça ostensiva contra os pobres. Reduzidos esses a beneficiários passivos, impede-se que se tornem protagonistas de seus destinos. Não

2[2] É conhecida no Brasil a proposta de E. Grossi (2004) de alfabetizar em três meses. Talvez exigente demais, mostra no entanto que alfabetizar em três anos significa fazer do pobre um repetente.

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me aventuro a sugerir que pobreza poderia ser extinta na sociedade, mesmo que esta não fosse capitalista, já que desigualdade social parece ser estrutural na história conhecida, pelo menos no sentido de que diferenças podem evoluir para desigualdades. Deve-se isso à dinâmica dialética das relações sociais, sempre polarizadas e politizadas, o que faz da convivência em sociedade uma engenharia complexa não linear de solução sempre incompleta e insatisfatória. No entanto, parece não menos claro que os níveis atuais de pobreza, em especial de pobreza relativa, não são “naturais”, “inevitáveis”, mas produto de circunstâncias histórias que podem ser alteradas, pelo menos em parte. A própria diversidade de formatos nos países capitalistas - alguns possuem igualdade interna apreciável, como na Escandinávia, enquanto outros são extremamente desiguais -, indica que, mesmo no capitalismo, é possível conceber e praticar modos mais toleráveis de convivência social.

II. COMBATE À POBREZA, HOJE

Apesar da iniciativa do IDH desde 1990, o combate à pobreza, hoje, mantém pretensões bem modestas, compatíveis com a expectativa neoliberal. Como pobreza é ou deveria ser resto (mesmo que, em muitas sociedades, os pobres sejam maioria), seu combate só poderia ser proposto com restos orçamentários. A mentalidade prevalente orienta-se pela idéia da “transferência de renda”, considerada já como novo paradigma (Yazbek et alii, 2004), ofuscando neste gesto expectativas bem mais generosas de antes, em especial nos inícios do welfare state. De modo geral, aceita-se que o primeiro formato do welfare state foi muito influenciado por dois fatores, para além da sustentação econômica (Plano Marshal): cidadania organizada, em especial dos sindicatos laborais, que conseguiram obrigar as empresas a negociar com os trabalhadores, aprimorando, então, a legislação trabalhista em favor dos empregados; nível educacional da população, já com o ensino fundamental amplamente resolvido. De certa forma, via-se na “qualidade política” da população um trunfo fundamental para a igualdade de oportunidades.

Em parte ironicamente, em parte naturalmente, o próprio welfare state, ao implantar certa estabilidade no mercado e proteções sociais generosas, contribuiu para o arrefecimento dos sindicatos, que, ao invés de continuar a luta por uma sociedade mais igualitária, foi restringindo os pleitos à melhoria de benefícios. É irônico, porque, tendo a cidadania como origem importante, o bem-estar alcançado pode implicar impactos funcionais, no sentido da acomodação útil. É natural, porque, não se divisando mais problemas de gravidade extrema na sobrevivência da população, a preocupação se reduziu a manter e a ampliar a situação. Advindo a crise do welfare state na década dos 70 (Castel, 1995. Paugam, 1991; 1996. Rosanvallon, 1995), ressurge a ideologia liberal (sob o rótulo de neoliberalismo), tendo, entre outras conseqüências, o enfraquecimento dos sindicatos, colocados na defensiva, agravando-se a

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situação com a desregulação do mercado. Começa-se a falar de globalização, primeiro como aceno de novas oportunidades para todos, mas, logo a seguir, como cenário ambíguo tendente a agravar as condições sociais, em particular pela queda do emprego face a novos formatos da economia dita competitiva. Novas oportunidades aparecem para trabalhadores sofisticados, em particular capazes de acompanhar as evoluções tecnológicas, mas não para a grande massa semi ou desqualificada. Aumentando o desemprego, as políticas sociais submetem-se ao desafio da sobrevivência imediata, deixando de lado as expectativas anteriores de “bem-estar”. Passa-se a aceitar, primeiro tacitamente, depois abertamente, que, na nova economia, não há como inserir a todos os trabalhadores, porque, mais que as anteriores, é impiedosamente seletiva. Uma multidão terá que ser mantida pela assistência pública. Em países avançados, este grupo pode ser menos volumoso, mas também cresce. Em países em desenvolvimento, há maiorias nesta condição, o que já basta para garantir que as duas formas de pobreza são muito diferentes: uma coisa é ter de proteger minorias, outra é ter de proteger maiorias. Tratando-se de minorias, normalmente restos orçamentários são suficientes. No caso de maiorias, a questão se torna grave, porque, ou se oferecem benefícios relevantes para poucos, ou se oferecem benefícios minúsculos para muitos. Porquanto, o parâmetro não é a necessidade do pobre, mas o que o mercado pode aceitar como financiamento dos programas3[3].

1. Combate à pobreza através da transferência de renda

Este dilema teve, no Brasil, uma evolução típica. Desde os anos 80, Eduardo Suplicy (político do Partido dos Trabalhadores, hoje Senador) propunha uma transferência de renda para famílias mais pobres, com valor relativamente significativo (por volta de 700 dólares mensais, ou bastante acima do salário mínimo, este por volta de 300 dólares). Esta idéia evoluiu na década dos 90 para outra proposta, mais de calibre europeu (o exemplo aludido é Alasca, onde ela existe), de garantir a todos os cidadãos, indistintamente, uma renda básica (Suplicy, 2002), tendo sido aprovada pelo Congresso no primeiro Governo Lula, mas nunca posta em prática. Quando Buarque (hoje também senador e filiado a partido de esquerda) foi governador de Brasília na década dos 90, a proposta de Suplicy foi reduzida a um montante próximo de 70 dólares, num programa de apoio a famílias pobres, vinculado à obrigatoriedade de as crianças freqüentarem a escola (por isso, chamava-se “Bolsa-Escola”). No governo Fernando Henrique Cardoso (fim da década dos 90 e início da primeira década deste século) esta renda básica foi aprovada no Congresso, sob proposta do então Ministro da Educação (Paulo Renato

3[3] Cabe lembrar que uma das preocupação das políticas públicas voltadas ao combate à pobreza é encontrar artifícios para reduzir seu número. Um deles foi distinguir entre “pobreza absoluta” e “pobre relativa”: a primeira refere-se à pobreza extrema, e o segundo menos extrema. Embora ambas sejam muito preocupantes, uma vez aceita a distinção, esquece-se da pobreza relativa, sem falar que se mudou o sentido dos termo: pobreza relativa é apenas outro patamar menos grave da pobreza absoluta, não se referindo mais à comparação com os mais ricos. Em nome da pobreza absoluta, as políticas se reduzem a transferências de renda, tipicamente residuais (Demo, 2003).

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de Souza)4[4], mas com valor inicial de mais ou menos 10 dólares (podendo chegar a 30 dólares em famílias com três ou mais filhos na idade escolar). Mesmo deixando de lado a primeira expectativa de Suplicy, em geral considerada fantasiosa e eleitoreira, cabe observar que a trajetória da renda básica de 700 dólares para 10 dólares representa cruamente como se pratica o combate à pobreza em situação neoliberal rígida e periférica.

A proposta de Buarque não foi mantida com a mudança de governo no Distrito Federal, considerada excessiva. No entanto, seu sucessor (governador Roriz, conhecido por práticas assistencialistas focadas em acolher pobres em Brasília e angariar seu voto) manteve muitos benefícios aos pobres, em valor bem mais expandido, dentro de um fogo cruzado composto por críticas da esquerda (contra o assistencialismo) e da direita (benefícios excessivos levariam o pobre à indolência). Embora seja, em geral, leviana a idéia de que pobre quer se acomodar, quando a transferência de renda se torna benefício “elevado” e começa a rivalizar com o salário mínimo, escancara o quanto este é insuficiente para sustentar a família de um trabalhador. Tornou-se, aos poucos, comum que municípios conduzidos por prefeitos de esquerda adotassem a idéia da transferência de renda (Yazbek et alii, 2004). À medida que isto se tornava novo paradigma da política social, implantava-se a expectativa ingênua/perversa de que transferência de renda seria algo natural e fácil de se garantir, ignorando-se, de novo, sua politicidade: i) em especial em ambiente neoliberal, não há renda disponível, muito menos para os mais pobres; ii) não é assim que, havendo necessidade de manter os pobres, o orçamento público acolha isto sem problemas; o orçamento está já todo apropriado por interesses da elite, não da sociedade; iii) no máximo, parcela diminuta do orçamento é destinada a políticas assistenciais, dentro do princípio liberal de que nenhuma transferência de renda pode causar impacto estrutural no perfil atual de concentração de renda; iv) destinar renda para os pobres significa sempre luta renhida, de estilo declaradamente político, na qual se confrontam ricos e pobres da sociedade. Ainda que sobrevivência seja reconhecida como direito de cidadania pela via de assistências, o ambiente neoliberal conduz este tipo de política para níveis residuais, tendo em vista não compromete a lógica do sistema.

No Governo Lula surgiu o Programa “Bolsa-Família” (PBF), que transfere mensalmente para famílias pobres valores próximos a 70 dólares em média, tendo-se também explicitado bem mais a vinculação das famílias à obrigatoriedade escolar dos filhos e a cuidados de saúde familiar. Este programa, embora padeça de laivos assistencialistas, é bem diferente dos anteriores. Pobreza absoluta caiu no Brasil visivelmente, não só por causa deste programa, mas também por causa de outras políticas que focam as classes mais baixas (controle da inflação, acesso a crédito, agricultura familiar, reforma agrária, alguma melhoria no poder de compra dos salários, efeitos positivos do crescimento econômico, etc.). A

4[4] Muito estranhamente, este Ministro publicou um livro - quase uma prestação de contas movida por má consciência - de típica megalomania, sob o título de “Revolução Gerenciada” (Souza, 2004)! Sociologicamente falando, uma “revolução gerenciada” não faz sentido.

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renda, porém, não se desconcentrou, porque a pobreza relativa não foi atingida. Uso aqui dados de pesquisa recente sobre “repercussões do Programa Bolsa-Família na segurança alimentar e nutricional das famílias beneficiadas”, do Ibase (2008), uma ONG vinculada ao nome do falecido sociólogo Betinho, ícone fundamental do combate à pobreza, em parte por ter sido líder desta idéia no governo Itamar Franco (primeira metade da década dos 90).

Primeiro, constavam no cadastro do PBF pouco mais de 11 milhões de famílias (dados de março de 2007). Trata-se de abrangência considerável, o que já retira o programa do rol daquelas assistências esporádicas e ralas. Mesmo sendo os gastos orçamentários muito pequenos (por volta de 10 bilhões de reais anuais), próprios de toda assistência neoliberal, não se pode negar que o programa é extremamente inclusivo, pelo menos na intenção. Persistem problemas de cadastro, já que é sempre complexo decidir qual família entra ou sai do programa, também por conta do cálculo facilmente obscuro da renda familiar, sem falar que a entrada no programa tende a ser inversamente proporcional à necessidade da família (quanto mais pobre, mais difícil é ter acesso). Segundo, embora os valores da bolsa sejam pequenos, não se pode subestimar sua importância para as famílias pobres. Este reconhecimento é ambíguo certamente, porque aparece nele um certo “consolo” em parte perverso, no sentido da coisa pobre para o pobre, mas, por outro lado, é fato que muita gente se alimenta melhor. Este tipo de assistência é direito de cidadania, por mais que seja entendido como mero benefício. Não seria o caso criticar a assistência, mas o assistencialismo, ou seja, o abuso da assistência (Demo, 2000). Terceiro, sendo a bolsa entregue, como regra, nas mãos da mulher na família através de cartão magnético bancário, aparece um impacto interessante de gestão feminina do benefício, não só em geral mais confiável, como também indicativa de autonomia da mulher. O uso do cartão magnético busca evitar fraudes no acesso aos benefícios. Quarto, apesar da exigüidade dos recursos transferidos, há impacto importante na economias local, em especial na compra de alimentos e também de vestuário e remédios. Este reconhecimento igualmente é ambíguo, não só porque os impactos são pequenos em termos absolutos, como sobretudo porque não se pode imaginar que a economia local possa ser remediada com aportes residuais. Quinto, o programa insiste fortemente na vinculação com outras políticas públicas, em especial de educação básica e saúde, ainda que esta pretensão seja contraditada flagrantemente pela própria extrema falta de qualidade de tais políticas (Demo, 2004a).

A pesquisa do Ibase centrou-se nas repercussões alimentares e nutricionais, abrangendo cinco mil titulares do cartão Bolsa-Família, em 229 municípios, realizada em setembro e outubro de 2007. Foram ainda ouvidos (pesquisa qualitativa) 170 titulares em 15 grupos focais (entre junho e julho de 2006), gestores municipais e membros de instâncias de controle. Antes de passar à crítica do programa, exponho brevemente resultados desta pesquisa. Quase todos os titulares eram mulheres (94%), e desses, 27% eram mães solteiras. Dois terços dos titulares eram pretos ou pardos (64%). Pouco mais de 80% sabem ler e escrever, e 56% estudaram apenas até ao ensino fundamental.

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Quase 90% dos recursos eram gastos com alimentação (questão de múltipla escolha, com opção de até três respostas); 46% indicaram gastos com material escolar, 37% com vestuário, 22% com remédios. O gasto médio com alimentação foi de R$ 200 mensais (130 dólares). Quanto mais pobre a família, maior o gasto com alimentação. A tendência é aumentar o consumo de alimentos mais calóricos e menos nutritivos, também porque se compram os mais básicos e baratos. Apesar do programa, 21% das famílias apresentavam ainda insegurança alimentar grave (fome entre adultos e/ou crianças da família); 34% apresentavam insegurança alimentar moderada (restrição na quantidade de alimentos); 28% indicavam insegurança alimentar leve (não há falta de alimentos, mas preocupação com o consumo futuro); 17% detinham segurança alimentar adequada. A vulnerabilidade era mais grave entre titulares pretos e pardos, ou que não tinham trabalho formal, ou que não sabiam ler e escrever, ou rurais, ou que não tinham acesso a saneamento básico. A alimentação escolar apareceu como segunda forma mais importante de acesso à alimentação. Quase 40% das famílias possuíam pelo menos uma pessoa com problemas crônicos de saúde; 37% tiveram anemia; 42% não tinham acesso à rede de esgotos.

Quanto ao trabalho, a pesquisa mostra que praticamente todos os titulares não deixaram de fazer algum tipo de trabalho após incluir-se no programa, sugerindo que o temor neoliberal de indolência não parece ser fato. No entanto, apenas 44% tiveram trabalho remunerado no mês anterior à pesquisa, do que segue grau elevadíssimo de informalidade; dos que trabalharam, apenas 16% tinham carteira assinada. Dos que não trabalharam no mês anterior à pesquisa, mais de dois terços estavam desempregados. Quase metade dos domicílios teve renda mensal (incluído aí o benefício do programa), no mês anterior à pesquisa, inferior a R$ 380,00 (253 dólares), valor este correspondente ao salário mínimo da época. A referência mais surpreendente da pesquisa, entretanto, emergiu na percepção muito difundida entre os beneficiários (73%) de que os benefícios seriam passageiros: 27% responderam: “até quando necessitamos”; 22%, “até que os filhos estejam no mercado de trabalho”; 19%, “para sempre”; 13%, “enquanto os filhos estiverem na escola”; 8%, “até que os chefes de família possam se estabilizar no emprego”; 3%, “até que os filhos atinjam a maioridade”. Dessas respostas, apenas 19% alimentavam a expectativa de programa perene e de situação perene de beneficiário. Assim, o programa não parece promover a acomodação das famílias.

O programa preocupa-se em propalar o “controle social”, entendido esse como ações de beneficiários e não beneficiários voltadas para resguardar a qualidade programática e transparência. Há denúncias constantes de beneficiários que não poderiam estar no programa ou que nele entraram por vias escusas, bem como de outros que deveriam estar no programa e não estão ou não conseguem estar. Corrupção é tema diário no Brasil, e não poderia ser diferente também num programa voltado para os mais pobres da sociedade. Aparece aqui a face da pobreza política dos beneficiários, ao lado da destituição socioeconômica: 68% diziam não saber como fazer denúncias de irregularidades; 90% diziam não conhecer em seu município algum conselho ou outra forma de

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participação; falta ainda canal de denúncia sem identificação do denunciante; ainda, os conselhos locais, a par de sua obscura indicação por vezes, são compostos em geral por assistentes sociais sobrecarregados de funções.

Face a tais dados, pode-se oferecer uma crítica mais circunstanciada. Primeiro, o programa é tipicamente tecnocrático: feito nos gabinetes de Brasília, aparece a população pobre como mera beneficiária. A preocupação com o “controle social” é muito meritória, sem falar que se investe em seu aprimoramento, mas não passa de “consolo”. Lembra programas típicos do Banco Mundial, criticados veementemente por Caufield (1998) sob a alegação de “mestres da ilusão” (masters of illusion): mesmo quando se propõe a participação comunitária local, é monitorada facilmente, seja por conta do despreparo dos agentes locais, seja pela sagacidade dos técnicos governamentais.

Segundo, sendo o programa tipicamente assistencial (a vinculação com outras políticas é tênue/ineficaz), corre o risco de assistencialismo, à medida que não consta, ao lado da porta de entrada, a de saída. O programa preocupa-se com isso, tendo até uma secretaria voltada para o aceno com a inserção no mercado (nova Secretaria de Oportunidades). Entretanto, não se escapa de reconhecer que, dada a situação atual do mercado, é impraticável imaginar que todos os pobres nele caibam de maneira minimamente adequada. Esta tendência corre contra a expectativa de grande parte dos beneficiários que gostariam de poder sobreviver com autonomia. O resultado mais prático e perverso desta condição é que, no fundo, o governo “contrata” o pobre como uma espécie de funcionário público mal pago, impondo-lhe como duradoura uma situação que deveria ser passageira5[5]. Diriam os críticos mais duros: o pobre agradece e vota; que mais se haveria de querer? Com razão a pesquisa do Ibase aponta, nas recomendações finais, a urgência de “políticas emancipatórias”. Isto não desfaz a necessidade da assistência, mas é fundamental ir além dela. É crucial superar carências socioeconômicas gritantes, mas é ainda mais decisivo superar a pobreza política dos beneficiários. Quando o pobre é apenas beneficiário, pode até alimentar-se melhor, mas não vislumbra possibilidade de libertar-se da condição de pobre, porque não constrói habilidades políticas capazes de retirá-lo da condição de objeto.

Terceiro, o programa cabe bem no ambiente neoliberal de combate à pobreza. Gasta-se muito pouco, não comprometendo o orçamento público a ponto de prejudicar os atuais acessos privilegiados. Assim, distribui-se alguma renda, mas não se “redistribui”. Entende-se por “redistribuição de renda” o efeito na pobreza relativa, de tal sorte que se reduza a concentração da renda, seja pela iniciativa de taxação crescente das rendas mais elevadas, em especial das grandes fortunas, seja pelo investimento conseqüente na qualidade da educação básica pública, abrindo caminhos aos alunos mais pobres, seja pelo cuidado com o mercado de trabalho mais sensível à demanda de trabalhadores pobres,

5[5] Pude constatar a reação de mulheres pobres chefes de família contra o assistencialismo em outra pesquisa (Demo, 2005): vivendo na extrema miséria, não tinham como expectativa principal viver de ajuda, mesmo pública, mas poder, um dia, não precisar disso, em especial para seus filhos.

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seja pelo aprimoramento institucional do associativismo (sindicalismo, sobretudo), e assim por diante. O neoliberalismo compatibiliza-se facilmente com “distribuição de renda”, porque significa custo tolerável e evitam-se mudanças estruturais. Toda política de redistribuição de renda compromete o orçamento de modo significativo, agredindo a lógica neoliberal. Na prática, nunca fomos capazes disso, a não ser excepcionalmente6[6]. A lógica é a mesma: oferecendo algum resíduo ao pobre, este pode até apreciar, e, acima de tudo, nada muda no sistema social e produtivo. Neste sentido, o PBF faz “gestão da pobreza”, não confronto com a pobreza (Oliveira/Rizek, 2007). Parece incorreto supor que os pobres apreciem acomodar-se, mas as políticas sugerem fortemente esta acomodação funcional.

Quarto, sendo um programa assistencial de estilo mais ou menos emergencial, não estrutural, fica sempre a pergunta: terminado este governo, vai continuar? Quando Betinho instituiu seu programa de combate à pobreza, no governo Itamar Franco, tinha a expectativa de que não haveria volta. Ledo engano. No governo Fernando Henrique Cardoso, sua proposta restringiu-se a um programa palaciano (“Solidariedade”) (Silva e Silva, 2001), no qual o próprio Betinho não conseguiu sobreviver (afastou-se logo dele). No governo Lula o programa adquiriu dimensões muito respeitáveis, honrando, em parte, as promessas de campanha, mas não foi além de um gesto neoliberal, mesmo em parte generoso. Pobreza precisa de assistência, sem dúvida. Mas assistência não se confronta com a pobreza, pois no máximo distribui renda residual. Não é propriamente vício da assistência, mas limite próprio. A questão mais profunda, estrutural, é que não conseguimos inserir os pobres na dinâmica produtiva e política, já que não passam de beneficiários.

2. Pobreza política da juventude

Utilizo aqui pesquisa recente do jornal Folha de São Paulo (2008) sobre a juventude brasileira (16 a 25 anos de idade). Foram feitas 130 perguntas para 1.541 jovens em 168 cidades, dentro da metodologia comum de levantamentos estatísticos deste tipo. Na população geral esses jovens representam mais de 35 milhões, sendo mais de 50% de cor parda/preta. 35% só trabalham, 25% trabalham e estudam, 25% só estudam, e 15% não estudam, nem trabalham; 4% fazem parte da elite econômica, 27% da classe média alta, 53% da classe média baixa, e 16% da classe baixa; 23% são estudantes, 22% são assalariados registrados, 16% assalariados sem registro, 13% são free-lancer ou fazem bico, 9% estão desempregados. Somente 16% recebem “mesada”, o que indicaria a necessidade precoce de cuidar sozinho da sobrevivência; 77% ganham, em seu trabalho, pouco mais de 500 dólares mensais (até R$ 760,00). Em vista disso, a pesquisa sugere que “a economia soterrou o sonho” (p. 3): 40% têm como sonho maior apenas cuidar da vida, encontrar um lugar ao sol, ter um emprego decente, ou seja, acomodar-se no sistema vigente.

6[6] Uma dessas exceções foi a inclusão de idosos rurais na previdência social (pensão), sem contribuição delas. Foi um programa também tecnocrático, mas, por incrível que pareça, redistributivo de renda.

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Temem sobretudo a morte e a violência: 60% têm medo de sair de casa; 30% do total e 49% dos mais ricos já foram vítimas de assalto.

Mais da metade dos jovens (54%) repetiu pelo menos um ano na escola, o que proporciona à pesquisa falar de “quadro negro”, literalmente7[7]. 39% leram livros não exigidos na escola; 32% não leram nada; 27% só leram o que a escola exige. 31% lêem em inglês, 30% escrevem em inglês, 18% falam inglês, o que denota os avanços da globalização e o inglês como alfabetização. 68% estudam na escola pública. 20% desses jovens já são pais. As percentagens de reconhecimento de quem, entre as mulheres, faz aborto são sempre ínfimas (entre 2 e 7%), mas a percentagem referente a amigas que fariam aborto são sempre superiores a 30%.

Surpreendente ou já típico é que o jovem se organiza mais facilmente na igreja. Pode ser já típico, porque alguns estudiosos da globalização sugerem que religião é uma de suas forças importantes, ao lado das econômicas e financeiras (Berger/Huntington, 2004). A religião parece estar crescendo sustentadamente nas classes mais baixas de renda, em suas versões “evangélicas” (enquanto a religião católica estaria recuando claramente)8[8]. Seus efeitos são clássicos: ao lado de satisfazer necessidades religiosas (reconhecidas cada vez mais como estruturais também), oferecem consolo e apoio para dificuldades familiares, de saúde, de emprego, de dívidas, de expectativas. De um lado, cobra-se de todos o “dízimo”, de outro, garante-se que se pode ter tudo na terra, desde que se tenha fé. Num gesto bem contrário a tradições católicas, que, sobretudo em ordens religiosas, se valoriza a pobreza, as novas denominações evangélicas apostam na riqueza que todos podem alcançar pela via da fé (a quem crê, tudo será dado, ainda nesta vida). Por mais que se possam questionar tais procedimentos, ocorre que religião está entre os fenômenos humanos mais arcaicos e profundos, rivalizando facilmente com expectativas econômicas e materiais (Demo, 2008). Pode-se sempre falar de exploração da fé, um tema eterno que nada tem de novo, mas também é fato que muitas pessoas encontram aí o consolo que não encontram em outro lugar, em especial quando a vida se torna insuportável e insustentável.

Uma pesquisa da Unesco (2004) já apontava para este apreço da religião por parte dos professores básicos (Tabela 1). Habitualmente, os professores se associam na igreja ou em torno de interesses religiosos em 40,8% dos casos, uma cifra que estava muito acima de qualquer outra, inclusive do sindicato (apenas 16%). Somente 5,5% dos professores se associavam em bairros, indicando que, mesmo sendo o professor um dos artífices da cidadania popular via educação básica, em especial pública, ele mesmo mora no bairro por acaso. Não parece interessar-se pela sorte do bairro. Somente 6,6% estavam filiados a partidos, 3,8% a associações ecológicas ou de direitos humanos, 11,2% a associações filantrópicas. Também apareciam cifras elevadas de não

7[7] Esta expressão é politicamente incorreta (uso indevido do adjetivo “negro”). Mas estou deixando de lado esta questão, até porque é usada pelo Jornal e vai por conta dele.

8[8] Na pesquisa, 59% dos jovens se disseram católicos; 24% evangélicos (pentecostais ou não); 10% sem religião. Tomando-se em conta que há 50 anos o país era “católico” maciçamente, a cifra de 59% de jovens católicos indica recuo considerável.

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participação em associações: metade dos professores nunca se havia sindicalizado, enquanto somente 20% nunca haviam participado de organização religiosa.

Tratando-se de professores, as cifras de inserção religiosa parecem muito elevadas, não porque se deveria ter alguma coisa contra a adesão religiosa, mas porque as outras cifras eram muito baixas, em especial a de sindicalização. Esta indicaria que o professor, em geral tendente a reclamar muito de seus salários, condições de trabalho, estilo de vida, o faz na expectativa de beneficiário, não de protagonista. Espera do opressor sua libertação, muito contraditoriamente. Não seria capaz de realizar em si mesmo a cidadania que imagina estar fomentando no aluno. Esta questão me parece das mais graves em termos de pobreza política: um dos próceres mais requisitados para superar a pobreza política parece sofrer dela em dose impressionante. Numa pesquisa mais antiga, de 1996, o Ibge9[9] pesquisou o associativismo na população brasileira (Demo, 2001a), aparecendo já esta marca: o associativismo mais comum era o religioso, em mais de 20% dos casos pesquisados.

Tabela 1. Percentagem de professores, segundo freqüência da participação em associações - 2002

Tipo de Associação Freqüência da ParticipaçãoHabitualmente Ocasionalmente Alguma

vez no passado

Nunca

Associação ou clube esportivo

13.4 23.9 19.7 43.0

Paróquia ou associação religiosa

40.8 25.6 13.8 19.8

Assoc. de bairro (vizinhança, fomento)

5.5 18.9 15.5 60.1

Centro cultural (musical, cineclube)

7.2 26.0 19.3 47.4

Sindicato 16.0 21.8 12.6 49.6Partido político 6.6 14.0 11.9 67.5Associação ecológica/direitos humanos

3.8 18.2 12.4 65.6

Associação de consumidores

1.1 8.0 8.2 82.8

Cooperativa 3.5 8.5 11.1 76.9Entidade filantrópica 11.2 18.1 12.8 57.9

Fonte: Unesco, 2004:106.

Não admiraria, pois, que entre os jovens este traço compareça também. Assim, a pesquisa do Datafolha indicou que 39% participam de organização religiosa, de longe a maior cifra, vindo a seguir 24% de participação em trabalho voluntário/comunitário (uma cifra certamente interessante), sendo que 45% não participam de nada. Dois pontos chamam a atenção: de um lado, a preferência por organização religiosa, de outro o tamanho dos que em nada participam. Embora não se possa facilmente comparar ou aproximar os dois lados, têm algo em comum. Na igreja certamente não se questiona a problemática socioeconômica, até

9[9] Instituição brasileira de produção de estatísticas oficiais e que faz, entre outras coisas, os censos.

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porque igreja não é propriamente lugar de questionamento. Em certo sentido, porém, a freqüência à igreja coincide com não participar das questões socioeconômicas, já que estas são aí tratadas de maneira “religiosa”, não política. Até ao ponto em que apego à religião pode se correlacionar com táticas para dar conta da desesperança, pode tratar-se de fuga, não de confronto com os desafios socioeconômicos e políticos. Calligaris, analisando os dados desta pesquisa, assim conclui: os jovens “são tão caretas quanto a gente, se não mais” (2008:3).

De fato, suas opiniões são muito semelhantes às dos pais. Somente 47% acompanham o noticiário político. Enquanto 28% se dizem de esquerda, 37% se dizem de direita. Metade é a favor da pena de morte. Mais de 70% são contra fumar maconha. Nada menos que 39% sugerem que a maioridade penal fosse definida abaixo dos 16 anos. Estão bem mais interessados em modelar o corpo: 42% das mulheres e 16% dos homens querem fazer alguma plástica. Sobretudo gostam de consumir: 69% admitem ser consumistas; moda é importante para 70%. Mais de 70% usam a internet; orkut é acessado por 81%; embora 79% acessem páginas de notícias, dificilmente o interesse é “político”. Preocupação importante é o uso de drogas: 43% dos pais sabem que seus filhos usam! Mais de 20% dos jovens masculinos admitem ter usado e mais de 10% entre as mulheres.

Esta pesquisa chama a atenção para a despolitização da juventude. A proposta neoliberal comanda suas expectativas vastamente: preocupam-se com emprego, acomodando-se ingenuamente às regras de um mercado sem regras; não antevêem futuros alternativos, não alimentam utopias; antes, os jovens são consumistas assumidos; no mundo digital, procuram relacionamentos funcionais, não discussão política; querem, em grande parte, o que a geração anterior quis, em especial um bom emprego. Para tanto, o questionamento e a organização política não aparecem como desafio fundamental, já que a maioria é de direita. São aliados do sistema, declaradamente.

Na prática, os jovens brasileiros são similares à pessoas inseridas no Bolsa-Família: beneficiários. Longe de questionar a proposta, pretendem nela inserir-se com a melhor vantagem possível. São também politicamente muito pobres.

III. PAPEL DA EDUCAÇÃO

Não se pretende fazer qualquer tratado sobre educação e sua relação com desenvolvimento, mas apenas discutir preliminarmente seu papel no confronto com a pobreza, em especial a pobreza política. Entre as políticas públicas de combate a pobreza sempre se aponta para educação. Tomando em conta que cidadania é referência crucial do combate à pobreza, porque este combate requer protagonista, não apenas beneficiário, educação pública assume papel estratégico. No fomento à cidadania, o papel do Estado é importante, mas não exclusivo,

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já que faz parte dela o controle democrático do Estado. Não se trata de combater o Estado. Muito ao contrário. Mas existe certamente a necessidade de constituir o sujeito político adequado e isto não pode provir apenas do Estado, mas, em grande medida, da sociedade civil. Este termo é muito ambíguo, a começar pela suposição neoliberal de que sociedade civil é contra o Estado e a favor da proposta liberal de mercado. Em muitos casos, sociedade civil representa apenas um jargão para indicar aquela parte dominada da sociedade, em especial não a elite econômica e política. Talvez a designação mais apropriada seja, se ainda quisermos usar o termo, considerar sociedade civil a parte da sociedade interessada no bem comum e que se organiza politicamente para tanto. É neste sentido que uso aqui. Trata-se, em grande parte, de valorizar a habilidade de controle democrático de todas as instâncias de poder, inclusive do mercado, para que o bem comum prevaleça. Difícil, impossível diriam muitos, na organização liberal do mercado, já que este, tendo se desregulado, regula a cidadania, não o contrário. Seja como for, educação poderia ter este impacto: formar gente que sabe pensar, a ponto de se apresentar como sujeito capaz de regular seu próprio destino, até certa dimensão. É possível sonhar com isso, mas demandaria extraordinária qualidade da educação.

Na história ocidental, cabe não ocultar que educação, também a básica, sempre foi valorizada principalmente à luz do mercado, e, nesta sombra, para disciplinar as pessoas. A tese da reprodução linear, como aparece na obra de Bourdieu e Passeron (1975), está superada, mas não se duvida que educação possui esta tendência endêmica: reproduzir o sistema (Demo, 2004b). Isto pode ser visto na pecha comum em países menos evoluídos de ainda ser, na sua versão pública principalmente, “coisa pobre para o pobre”. Faço aqui uma rápida análise da educação básica brasileira, com o objetivo de mostrar sua impressionante falta de qualidade, comprometendo profundamente a qualidade política da população (Demo, 2004a). O próprio discurso neoliberal insiste na qualificação da população para dar conta dos novos desafios da produtividade e competitividade. Não se interessa, obviamente, pela qualidade política, mas aprecia a qualidade formal. Reconhece-se, em geral, que educação (reduzida a anos de estudo) possui impacto considerável na renda pessoal (mais de 80% em análises de regressão) (Ioschpe, 2004), mas disto não decorre que seja investimento também político na população. Funcionalizada a serviço do mercado, educação tende a ser vista como “instrução”, domínio de conteúdos, absorção irrefletida e capacidade de resposta memorizada. O instrucionismo é a regra, a ponto de, aumentando as aulas, quase sempre diminui o aproveitamento escolar, como se vê na Tabela 2. Nesta série histórica de 1995 a 2005, observa-se que a proficiência tende a cair sistematicamente, tendo ocorrido a maior queda em 1999, como resultado provável do aumento do ano letivo para 200 dias na lei aprovada no fim de 1996 (LDB - Lei de Diretrizes e Bases). Embora não se possa garantir que a queda espetacular se deva apenas a isso, não é possível mostrar que o aumento dos dias letivos tenha tido qualquer efeito benéfico. A mensagem parece ser: a didática instrucionista é de tal forma precária, que se a aumentarmos, torna-se ainda mais contraproducente.

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Tabela 2. Média de proficiência em LP e M - SAEB Brasil - 1995-2005.Anos 1995 1997 1999 2001 2003 2005

4a série EF 188,3 -1.8 -15.8 -5.6 4.3 2.9 (172,3)LP 8a série EF 256,1 -6.1 -17.1 2.3 -3.2 -0.1 (231,9)

3a série EM 290,0 -6.1 -17.3 -4.3 4.4 -9.1 (257,6)4a série EF 190,6 0.2 -9.8 -4.7 0.8 5.3 (182,4)

M 8a série EF 253,2 -3.2 -3.6 -3.0 1.6 -5.5 (239,5)3a série EM 281,9 6.8 -8.4 -3.6 2.0 -7.4 (271,3)

Fonte: INEP/MEC. EF = Ensino Fundamental. EM = Ensino Médio. LP - Língua portuguesa; M - Matemática. Média esperada para a 4ª série: 200 pontos; para a 8ª série: 300 pontos; para a 3ª série do ensino médio: 350 pontos.

Note-se que em 2005 a queda também foi expressiva na 8ª série do ensino fundamental e na 3ª série do ensino médio. Os resultados de 2005 estão muito abaixo daqueles de 1995, não se prenunciando tendência positiva até então. Dados para 2003 (Tabela 3) sugerem que aprendizagem “adequada” era excepcional: por exemplo, somente 3,3% dos estudantes brasileiros teriam tido desempenho “adequado” em matemática na 8ª série do ensino fundamental. Quase 20% tiveram desempenho “muito crítico” em língua portuguesa (esta cifra era de 30% no nordeste). Na 3ª série do ensino médio, 62,3% dos estudantes tiveram desempenho “crítico” em matemática. Na coluna do desempenho “adequado” nenhuma cifra chega a 10%.

Tabela 3. Estágios de aproveitamento escolar: língua portuguesa e matemática - Brasil - 2003 (%).Estágios Muito crítico Crítico Intermediário Adequado4ª série EF – L. Port.

18,7 36,7 39,7 4,8

4ª série EF – Matem.

11,5 40,1 41,9 6,4

8ª série EF – L. Port.

4,8 22,0 63,8 9,3

8ª série EF – Matem.

7,3 49,8 39,7 3,3

3ª série EM – L. Port.

3,9 34,7 55,2 6,2

3ª série EM – Matem.

6,5 62,3 24,3 6,9

Fonte: INEP/MEC. EF = Ensino Fundamental. EM = Ensino Médio.

Inúmeras são as causas da má aprendizagem. Muitas provêm de fora da escola e sobre elas a escola tem pouca/nenhuma influência, como pobreza familiar, políticas ineptas, desvio de recursos, ambiente neoliberal. Outras provêm da própria escola e seus professores, não por culpa (este conceito não faz sentido analítico), mas por má formação original e permanente, salários muito precários, condições muito adversas de trabalho (por exemplo, jornadas de mais de oito horas diárias), e também descompromisso. O resultado é que os alunos aprendem muito mal e, assim parece, tendem a aprender cada vez pior. Em parte, os maus resultados se devem ao instrucionismo: didáticas fortemente reprodutivas, baseadas em apostilas feitas para serem reproduzidas, aulas copiadas feitas para serem copiadas, professores muito mal

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formados, alfabetizadores que não sabem alfabetizar. Em muitas regiões faltam professores de matemática, física, química, pela razão de que poucos se interessam em fazer um curso mais complexo para terem, depois, uma profissão tão desvalorizada. Na prática, porém, o pobre brasileiro só tem esta chance na vida: uma boa escola pública. Se esta existisse, poderia, aprimorando sua qualidade política, tornar-se protagonista de sua história. Sabendo analisar minimamente sua condição de pobre e descobrindo que pobreza não é sina, mas produção histórica imposta, poderia movimentar-se, organizar-se, questionar, mudar.

No entanto, a própria política oficial apadrinha esta educação pobre para o pobre. Em abril de 2007, foi instituído o Ideb (Índice de Desenvolvimento da Educação Básica), um índice que mede o nível educacional de cada escola no país, correlacionando desempenho escolar com o tempo requerido para alcançá-lo. Foi uma tática do Ministério da Educação para tentar obrigar os prefeitos e governadores a assumirem o compromisso com a qualidade da educação, focando a aprendizagem e o cuidado de aluno por aluno. Firmam-se convênios oficiais, em torno de 28 itens, que prevêem também apoio técnico e financeiro, exercendo, assim, pressão sem precedentes sobre as escolas. Os dados usados são do Ministério (colhidos a cada dois anos pela “Prova Brasil”). Em 2008 foram divulgados dados do Ideb, oferecendo o ranking de todas as escolas do país, municípios e estados. Para se ter uma idéia, entre os municípios das capitais, o melhor colocado foi Campo Grande (Mato Grosso do Sul), cuja média foi de 5,1 (numa escala de 0 a 10). Embora tenha ocorrido, pelo menos nos dados, uma melhoria pequena em comparação com anos anteriores, a situação é ainda inacreditável. O maior incômodo no Ideb é que o Ministério da Educação reserva até três anos para a alfabetização, proposta que não encontra qualquer apoio teórico e prático, a não ser em teorias pobres para os pobres, aparentemente de origem “crítica” (certa esquerda pedagógica).

Primeiro, confunde-se aula com aprendizagem. Ter mais aula não garante, jamais, melhor aprendizagem. Pode facilmente ocorrer o contrário. Segundo, qualquer criança pode aprender bem, desde que tenha condições favoráveis, em especial um bom professor. Quem precisa de três anos, não é a criança, mas a escola mal preparada. Terceiro, se é fundamental saber partir da criança pobre, não é o caso tomar a pobreza como parâmetro, mas sim estratégias de sair dela. Mais que ninguém, a criança pobre precisa poder se alfabetizar bem na 1ª série. Prever uma alfabetização em até três anos é impor a esta criança pobre a condição de repetente desde logo. Quarto, crianças ricas não conhecem o problema, pois se alfabetizam, quase sempre, já no pré-escolar. Quinto, isto somente agrava a inferioridade da escola pública fundamental, onde, no Brasil, estudam 90% dos alunos. Esta condição revela que não somente a direita neoliberal prejudica o desempenho escolar, por conta do instrucionismo e do atrelamento ao mercado, mas igualmente certa esquerda, quando confunde atenção focada no pobre com compaixão. Ele precisa de oportunidade, não de compaixão.

Reconhecemos hoje que o grande desafio está nos professores. Se eles não aprendem bem, não haveria como imaginar que as crianças

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aprendam bem. Como vimos acima, não só se lhes oferecem cursos precários (pedagogia e licenciatura), em geral os mais precários na universidade, como também sua cidadania é frágil. Estão muito mais vinculados a entidades religiosas que sindicais e populares. Sua profissão é aviltada. Isto se pode observar nos salários (Tabela 4), por mais que, tratando-se de grande médias, elas sejam muito opacas para um país tão desigual como o Brasil.

Tabela 4. Salário Médio (em R$) - Professores de educação básicaUF 2006 2006=100 UF 2006 2006=100Distrito Federal 3371 100 Santa Catarina 1274 37Rio de Janeiro 2108 63 Goiás 1165 35Sergipe 2012 60 Minas Gerais 1119 33Roraima 1790 53 Espírito Santo 1068 32São Paulo 1767 52 Pará 1046 31

Amapá 1747 52Rio Grande do Norte 1018 30

Acre 1597 47 Maranhão 1013 30Mato Grosso do Sul 1508 45 Piauí 1008 30Paraná 1483 44 Tocantins 986 29Rio Grande do Sul 1415 42 Bahia 957 28Rondônia 1395 41 Alagoas 955 28BRASIL 1369 41 Paraíba 906 27Mato Grosso 1291 38 Ceará 866 25Amazonas 1274 37 Pernambuco 831 24

Obs.: Renda do trabalho principal padronizada para 40 horas semanais. Fonte: PNAD/IBGE. Tabulação: INEP/MEC.

Para 2006, a melhor remuneração média mensal foi observada no Distrito Federal, com R$ 3.371,00 (2.250 dólares), bastante acima das demais. A próxima, do Rio de Janeiro, era de R$ 2.108,00 (1.400 dólares), ou seja, apenas 63% daquela do Distrito Federal. A remuneração no Distrito Federal não era particularmente elevada, ainda que num país como o Brasil já fosse significativa. Ao final da Tabela aparecia Pernambuco onde os professores recebiam apenas R$ 831,00 (550 dólares), 24% da remuneração do Distrito Federal. Duas coisas chamam a atenção de maneira muito negativa: i) disparidades gritantes, como se se tratasse de outro país; ii) a falta de qualidade em Pernambuco não eram muito maior que aquela do Distrito Federal. Se observássemos São Paulo, o estado de longe mais rico do país, a remuneração média era de R$ 1.767,00 (1.180 dólares), apenas 52% daquela do Distrito Federal. Estamos, assim, cercados de problemas angustiantes por todos os lados, entre eles que não alcançamos ainda vincular melhoria salarial do professor com melhoria da aprendizagem no aluno. Isto é visto, pelos neoliberais, como ocasião para questionar os professores e até mesmo defender queda salarial como movimento natural do mercado (Ioschpe, 2004).

É preciso, no entanto, defender remuneração adequada dos professores, em primeiro lugar, para que representem a dignidade social da qual são artífices cruciais. Em segundo lugar, para que possam garantir a aprendizagem de seus alunos. Estamos longe de entender que

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salário docente é investimento. Provavelmente, é mister introduzir iniciativas de avaliação docente, ao lado de oferta generosa de formação continuada, acesso a novas tecnologias (computador e internet de banda larga), atualização constante cultural, movimentação acadêmica para manterem-se em dia com sua área profissional, e assim por diante. É muito comum - muitos dirão que já é curricular - a greve na escola pública. Em vez de revelar qualidade política docente, decai para um piquenique esticado que em geral não acaba em nada. Ao final, depois de acordos triviais, repõem-se aulas, exatamente aquilo que é menos importante na escola.

A valorização docente é peça chave também das novas alfabetizações, tecnologicamente corretas. Se pensarmos que, no futuro próximo, todas as crianças de hoje terão de usar computador e outros equipamentos eletrônicos, já é atraso alfabetizar sem computador. Mesmo nas escolas de tempo integral, o uso permanente do computador no processo de aprendizagem docente e discente é raro. Hoje, as crianças que possuem acesso ao computador e internet, primeiro aprendem por si mesmas a lidar com tais equipamentos. Não fazem curso, nem aprendem antes a ler. Depois, com o tempo (que em geral é muito breve), sentem a necessidade de ler e escrever, não porque a escola exige e o estado impõe, mas porque querem comunicar-se eletronicamente (receber/enviar emails, sobretudo). Chama-se a isto de “aprendizagem situada” (Gee, 2004), quase sempre inspirada em “bons” jogos eletrônicos (Gee, 2007. Prensky, 2001; 2006). Diz Prensky que crianças são nativas, enquanto os adultos são imigrantes, para indicar que as crianças lidam com novas tecnologias muito mais fácil e habilmente. Essas novas tecnologias, dinamizadas em parte por expressões culturais populares eletronicamente mediadas (iMing, iPod, MP3 e seguintes, Fanfiction, Blogs, Anime, Manga etc.), permitem que a aprendizagem seja realizada no contexto de vida das crianças, evitando-se a situação abstrata da escola. Usando-se ainda a web 2.0, cujo signo pode ser visto sumariamente em blogs e pela wikis, deixa-se a condição de mero consumidor, absorvedor, copiador da internet, para assumir o desafio da autoria (Mika, 2007. Stauffer, 2008. Warlick, 2007). Ainda que esta autoria seja muito díspar - vai desde o remix que é quase cópia, até a wikipedia com textos de grande qualidade acadêmica (Weinberger, 2007) - acena com a potencialidade de servir, para além da qualidade formal, também para a qualidade política da criança. Uma das expressões mais comuns é a “peer-university”, formada online por interessados de toda ordem, por exemplo, por jogadores de videogames (Lei et alii, 2008).

Tudo pode ser facilmente banalizado, porque na internet - bem sabem os professores - tudo se copia, nada se cria! Mas a potencialidade existe e deveria ser aproveitada. Muitos autores valorizam este horizonte, desde a possibilidade de um novo modo de produção solidário, visível em produções gratuitas de textos como a wikipedia e software livre (Benkler, 2006), a formação de uma esfera pública virtual, ao estilo de Habermas, na qual deveria prevalecer a força sem força do melhor argumento (Sunstein, 2006), até modos virtuais de trabalho em equipe próprios já da economia globalizada (Tapscott/Williams, 2007) e de valorização do esforço coletivo, mais que individual (Sawyer, 2007), incluindo-se ainda

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ambientes virtuais já mais ou menos em voga como moodle e similares. A escola está perdendo espaço para outros rivais, em geral em casa, onde a criança tem acesso a novas tecnologias e se movimenta mais à vontade. Não creio que a escola venha a desaparecer, mas precisa fazer parte do século XXI.

A muitos ocorre que ambientes virtuais, contaminados até ao âmago pelo consumismo e cada vez mais privatizados (Fabos, 2008. Lessig, 2004), dificilmente contribuem para esta esfera pública do cultivo do bem comum. De fato, deixar de analisá-los criticamente seria risco enorme. Mas não se podem ignorar as potencialidades positivas, se não fosse por outros argumentos, pelo argumento próprio das crianças: elas preferem internet à escola, jogos eletrônicos às aulas, a peer-university online aos exercícios obrigatórios escolares. Tudo isso só surte efeito, de novo e sempre, se cuidarmos dos professores. Falamos hoje de “inclusão digital”, com justa razão, porque este tipo de inclusão define, em grande parte, as oportunidades futuras (Dijk, 2005). Esquecemos, porém, que inclusão digital bem feita só pode ser aquela da alfabetização, para que faça parte definitiva da vida e da aprendizagem das crianças. Isto depende, acima de tudo, de professores dotados de qualidade pedagógica e tecnológica inequívoca. Podemos questionar os professores como quisermos - e isto é necessário -, mas não escapamos de admitir que são peça chave da cidadania popular e das habilidades do século XXI. Entre tais habilidades precisamos, impreterivelmente, incluir a cidadania popular capaz de saber pensar, também virtualmente.

Nos mundos virtuais, o mesmo problema da pobreza política pode retornar, à medida que a questão maior sequer é acesso material (ter computador e internet), mas como usar ambientes virtuais na condição de fomento a estilos críticos e criativos de aprendizagem. Exclusão digital é menos ficar para trás materialmente, do que não participar como protagonista das habilidades do século XXI. E aqui aparece uma face muito pertinente da pobreza política: não somente os socioeconomicamente pobres podem ser politicamente pobres; também os mais ricos podem sofrer de pobreza política, à medida que não desenvolvem cidadania adequada. Por exemplo, pretender resolver a pobreza das nações através de “ajuda ao desenvolvimento” é sinal de clamorosa pobreza política por parte dos países ricos, porque, em última instância, não só se transferem resíduos financeiros, como sobretudo se mantêm os países pobres como dependentes de ajuda sem fim e ridícula (United Nations, 2005).

COMO CONCLUSÃO

Não tememos um pobre com fome. Assistência resolve. Tememos um pobre que sabe pensar. Exigindo ser visto como protagonista, requer direitos, não apenas benefícios.

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É muito pobre nossa concepção de pobreza. Escondemos sob a capa superficial, por vezes até mesmo fútil, de estudos e políticas focados em benefícios materiais, um oceano de problemas muito mais graves, em especial o extermínio do sujeito capaz de história própria. Concebemos pobreza como nos convém, não como convém ao pobre. Segue que a ele reservamos, com naturalidade fria, propostas pobres.

Dominando o mercado liberal como regulador único de tudo, a questão da cidadania é apagada do mapa, porque indesejável: um protagonista que questiona o mercado estaria fora de lugar. Hoje parece um dinossauro. Como vimos, nossos jovens são mais de direita do que de esquerda. Não formulam utopias. Bastam-se com benefícios do sistema e com consumo.

Políticas sociais se reduzem, cada vez mais, a ofertas assistenciais encurtadas, empobrecidas, realizando uma inclusão na margem. Os pobres estão dentro do sistema, mas na periferia, pois lá é o lugar deles! A despolitização da sociedade deveria nos preocupar, porque, ao contrário do que o mercado sugere (ou seja, que expectativas alternativas não fazem mais sentido), a despolitização é o signo seguro de uma politização em marcha impiedosa. Querem-nos como marionetes, massa de manobra. A juventude, assim parece, já é.

Seria importante repensar nossos sistemas educacionais, até porque são, hoje, um investimento mais ou menos perdido. Sendo a escola pública no fundo a única chance real do pobre, sua qualidade é decisiva para o futuro da cidadania popular e para a democracia. Bons professores são chave para a cidadania popular e para novas alfabetizações digitais críticas e criativas.

Em termos de pobreza, tudo é muito grave. Mas nada é mais grave que a pobreza política.

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