plantio de espÉcies nativas consorciadas com leguminosas … · consorciadas com 6 espécies de...

10
PLANTIO DE ESPÉCIES NATIVAS CONSORCIADAS COM LEGUMINOSAS EM SOLO DE CERRADO* RESUMO Em área degradada, originalmente ocupada por cerrado, localizada na Estação Experimental de Mogi Mirim-SP, instalou-se uma pesquisa para observar o comportamento silvicultural de 35 espécies arbóreas nativas consorciadas com 6 espécies de leguminosas arbustivas e herbáceas, utilizadas como adubação verde. Foi aplicado calcárío no solo e adubo orgânico nas covas, adotando o espaçamento de 3,0 m x 3,0 m. Após 4 anos observou-se que as condições físico-químicas e biológicas do solo melhoraram e que as leguminosas arbustivas tiveram um melhor desempenho que as herbáceas. Entre as espécies nativas, destacaram-se em crescimento: Dalbergia nigra, Sterculia chicha, Parida multijuga e Maclura tinctoria. Outras espécies não se adaptaram por problemas de solo, clima e grupo ecológico. Concluiu-se que o sistema adotado favoreceu a regeneração natural do cerrado e que pode ser recomendado para a recuperação de florestas naturais. Palavras-chave: recomposição florestal; regeneração de cerrado; adubação verde. 1 INTRODUÇÃO O interesse em programas de recuperação . de áreas degradadas com espécies nativas vem aumentando nos últimos anos, incentivados por órgãos estatais, municipais e empresariais, motivados por espírito conservacionista ou pela pressão da sociedade e da legislação florestal. Baseados em estudos realizados por universidades e institutos de pesquisa, os sistemas de restauração de ecossistemas alterados sofreram uma grande evolução na última década. Segundo Gandolfi & Rodrigues (1996), o método a ser empregado será definido conforme o grau de ações antrópicas que o ambiente sofreu, objetivos que se quer alcançar na recuperação c a proximidade de fontes de sementes e propágulos. (O) Aceito para publicação em abril de 2001. (••) tnstituto Ftorestal, Caixa Postal 1322, 01059-970, São Paulo, SP, Brasii. (000) Instituto Agronômico, Caixa Postal 28, 13801-970, Campinas, SP. Brasil. Rev. Inst. Flor., São Paulo, J 3(1 ):27-36,200 J. Demétrio Vasco de TOLEDO FILHO** José Eduardo de Arruda BERTONI*** ABSTRACT At a degraded area originally taken up by "cerrado" vegetation, localized into the Mogi Mirim Experimental Station, State of São Paulo, an investigation was installed to look at the silvicultural behavior of 35 native forest species associated with six species of shrubby and herbaceous leguminous plants used like vegetable manuring. Limestone has been applied on the soil and organic fertilizer has put into the hollow, by profiting 3.0 m x 3.0 m like spacing. Four years later it was observed that soil physicochemistry and biological conditions turn better and shrubby leguminous plants had better performance than herbaceous leguminous plants. Among native species the following were detached on growth: Dalbergia nigra, Sterculia chicha, Parida multijuga and Maclura finctoria. Another species did not adapt themselves due to problems from soi!, climate and ecological cluster of trees. It has followed that the accepted system did a favor to the natural regcneration of "cerrado" vegetation and it may be commended for natural forests recuperation. Key words: forest recuperation; "cerrado" regeneration; vegctable manuring. Para Carpanezzi (1998), ccossistema perturbado é aquele que sofreu distúrbio, mas dispõe de meios de regeneração biótica; ecossistema degradado é aquele que, após a ação antrópica, sua regeneração natural é muito difícil ou lenta, apresentando baixa resiliência ou capacidade de se auto-regenerar. Considera-se restauração de uma floresta o retorno das suas condições originais, e reabilitação a volta. de algumas características desejáveis. Em áreas degradadas, com a intervenção de tecnologia apropriada, pode-se acelerar a recuperação de parte do ecossistema primitivo, melhorando inicialmente as condições do sítio edáfíco, com a formação de um talhão inicial de floresta, que irá propiciar um processo de sucessão vegetal (Corrêa & Cardoso, 1998 e Ferretti, 1998)

Upload: others

Post on 25-Oct-2020

1 views

Category:

Documents


0 download

TRANSCRIPT

Page 1: PLANTIO DE ESPÉCIES NATIVAS CONSORCIADAS COM LEGUMINOSAS … · consorciadas com 6 espécies de leguminosas arbustivas e herbáceas, utilizadas como adubação verde. Foi aplicado

PLANTIO DE ESPÉCIES NATIVAS CONSORCIADAS COM LEGUMINOSASEM SOLO DE CERRADO*

RESUMO

Em área degradada, originalmenteocupada por cerrado, localizada na EstaçãoExperimental de Mogi Mirim-SP, instalou-se umapesquisa para observar o comportamentosilvicultural de 35 espécies arbóreas nativasconsorciadas com 6 espécies de leguminosasarbustivas e herbáceas, utilizadas como adubaçãoverde. Foi aplicado calcárío no solo e aduboorgânico nas covas, adotando o espaçamento de3,0 m x 3,0 m. Após 4 anos observou-se que ascondições físico-químicas e biológicas do solomelhoraram e que as leguminosas arbustivastiveram um melhor desempenho que as herbáceas.Entre as espécies nativas, destacaram-se emcrescimento: Dalbergia nigra, Sterculia chicha,Parida multijuga e Maclura tinctoria. Outrasespécies não se adaptaram por problemas de solo,clima e grupo ecológico. Concluiu-se que osistema adotado favoreceu a regeneração naturaldo cerrado e que pode ser recomendado para arecuperação de florestas naturais.

Palavras-chave: recomposição florestal; regeneraçãode cerrado; adubação verde.

1 INTRODUÇÃO

O interesse em programas de recuperação. de áreas degradadas com espécies nativas vemaumentando nos últimos anos, incentivados porórgãos estatais, municipais e empresariais, motivadospor espírito conservacionista ou pela pressão dasociedade e da legislação florestal.

Baseados em estudos realizados poruniversidades e institutos de pesquisa, os sistemasde restauração de ecossistemas alterados sofreramuma grande evolução na última década. SegundoGandolfi & Rodrigues (1996), o método a serempregado será definido conforme o grau de açõesantrópicas que o ambiente sofreu, objetivos que sequer alcançar na recuperação c a proximidade defontes de sementes e propágulos.

(O) Aceito para publicação em abril de 2001.(•• ) tnstituto Ftorestal, Caixa Postal 1322, 01059-970, São Paulo, SP, Brasii.(000) Instituto Agronômico, Caixa Postal 28, 13801-970, Campinas, SP. Brasil.

Rev. Inst. Flor., São Paulo, J 3(1 ):27-36,200 J.

Demétrio Vasco de TOLEDO FILHO**José Eduardo de Arruda BERTONI***

ABSTRACT

At a degraded area originally taken up by"cerrado" vegetation, localized into the MogiMirim Experimental Station, State of São Paulo, aninvestigation was installed to look at thesilvicultural behavior of 35 native forest speciesassociated with six species of shrubby andherbaceous leguminous plants used like vegetablemanuring. Limestone has been applied on the soiland organic fertilizer has put into the hollow, byprofiting 3.0 m x 3.0 m like spacing. Four yearslater it was observed that soil physicochemistryand biological conditions turn better and shrubbyleguminous plants had better performance thanherbaceous leguminous plants. Among native speciesthe following were detached on growth: Dalbergianigra, Sterculia chicha, Parida multijuga andMaclura finctoria. Another species did not adaptthemselves due to problems from soi!, climate andecological cluster of trees. It has followed that theaccepted system did a favor to the naturalregcneration of "cerrado" vegetation and it may becommended for natural forests recuperation.

Key words: forest recuperation; "cerrado" regeneration;vegctable manuring.

Para Carpanezzi (1998), ccossistemaperturbado é aquele que sofreu distúrbio, masdispõe de meios de regeneração biótica;ecossistema degradado é aquele que, após a açãoantrópica, sua regeneração natural é muito difícilou lenta, apresentando baixa resiliência oucapacidade de se auto-regenerar. Considera-serestauração de uma floresta o retorno das suascondições originais, e reabilitação a volta. dealgumas características desejáveis.

Em áreas degradadas, com a intervençãode tecnologia apropriada, pode-se acelerar arecuperação de parte do ecossistema primitivo,melhorando inicialmente as condições do sítioedáfíco, com a formação de um talhão inicial defloresta, que irá propiciar um processo de sucessãovegetal (Corrêa & Cardoso, 1998 e Ferretti, 1998)

Page 2: PLANTIO DE ESPÉCIES NATIVAS CONSORCIADAS COM LEGUMINOSAS … · consorciadas com 6 espécies de leguminosas arbustivas e herbáceas, utilizadas como adubação verde. Foi aplicado

28

TOLEDO FILHO, D. V. de & BERTONI, J. E. de A. Plantio de espécies nativas consorciadas com leguminosas em solo de cerrado.

Na composição de florestas do Sudestebrasileiro, existem centenas de espécies que podemser recomendadas para a recuperação de áreasdegradadas, citadas por Reitz et ai. (1978), Inoueetal. (1984), Lorenzi (1992), Crestanaetal. (1993)e Carvalho (1994). Muitas já são conhecidas, peladivulgação em publicações, de suas característicassilviculturais. Outras, por não serem ainda testadas,não são utilizadas nos programas de recomposição.

A utilização de adubação verde comespécies de leguminosas, há décadas vem sendoempregada na agricultura, com grande sucesso narecuperação das propriedades físicas e químicas dosolo. Na área florestal, esta prática é poucodifundida, sendo um importante recurso naturalpara diminuir os custos de implantação de florestasnaturais e acelerar a sua regeneração.

O objetivo da presente pesquisa foiestudar o comportamento silvicultural de 35espécies florestais nativas, analisar a consorciaçãocom 6 espécies de leguminosas recomendadas paraadubação verde, os beneficios causados para o sítioedáfico e a regeneração natural em área degradadaocupada primitivamente por vegetação de cerrado.

2 MATERIAL E MÉTODOS

O experimento foi instalado na EstaçãoExperimental de Mogi Mirim, pertencente aoInstituto Florestal, localizada a 22°27'S e 46°57'W.O tipo climático da região é Cwa, segundo Koeppen,mesotérmico de inverno seco, a altitude é de 640 m,precipitação média anual de 1.355 mm, temperaturamédia anual de 20,3°C e com déficit hídrico emtomo de 19 mm (Veiga, 1975).

O solo local pertence a unidade LVa,Latossol Vermelho-amarelo, fase arenosa, ácido epobre em nutrientes minerais, coberto primitivamentecom vegetação de cerradão (Toledo Filho et al., 1984).

Foram retiradas duas amostras de solo, naprofundidade de 0-20 em, antes da instalação dapesquisa e duas no terceiro ano, para acompanharas mudanças químicas do local.

A área onde foi implantado o experimentosofreu ações antrópicas com cultura de Pinus sp,seguida da ocorrência de fogo, destoca e retiradade terra da superficie, além de compactação einvasão de gramíneas, principalmente Brachiariadecumbens, apresentando baixa resiliência.

Antes do plantio, houve o controle deformigas cortadeiras e cupins, aplicação decalcário, sendo o solo gradeado mecanicamente. Adosagem do calcário dolomítico, para correção daacidez do solo, foi de 2,0 ton/ha, segundorecomendações de Gonçalves (1995).

As características e indicações dasleguminosas para adubação verde foram obtidascom base em Pedro Junior et ai. (1986) e Tranietal. (1991), conforme TABELA 1. A semeadura foirealizada em janeiro de 1996, intercalando-se duaslinhas de 1,0 m de distância entre as mudas dasárvores, as quais foram plantadas no espaçamentode 3,0 m x 3,0 m.

A área da pesquisa foi dividida em 12parcelas de igual tamanho de 262,5 m2

, onde foramsemeadas as 6 leguminosas, com 2 repetições,aleatoriamente. Na avaliação da consorciação comas leguminosas foram considerados os efeitos dosombreamento, cobertura morta, controle deplantas daninhas, efeito de trepadeira sobre asárvores e capacidade de auto-regeneração.

TABELA 1 - Espécies de leguminosas, de hábito arbustivo (A) e herbáceo (H), utilizadas como adubo verde,com informações do nome popular, porte, ciclo e produção de matéria seca.

Espécie Hábito Nome Popular Ciclo anos Fitomassa secaTon/ha/ano

Cajanus cajan A guandu Semi-perene 8 - 12

Crotalaria juncea A crotalária Anual 10 - 15

Tefrosia candida A tefrósia Semi-perene 10 - 12

Canavalia ensiformis H feijão-de-porco Anual 5 - 8

Dolichus lab-lab H lab-Iab Anual 5 - 7

Mucuna aterrima H mucuna preta Anual 6 - 8

Rev. Inst. Flor., São Paulo, 13(1):27-36, 2001.

Page 3: PLANTIO DE ESPÉCIES NATIVAS CONSORCIADAS COM LEGUMINOSAS … · consorciadas com 6 espécies de leguminosas arbustivas e herbáceas, utilizadas como adubação verde. Foi aplicado

TOLEDO FILHO, D. V. de & BERTONI, 1. E. de A. Plantio de espécies nativas consorciadas com leguminosas em solo de cerrado.

29

Foram utilizadas 35 espécies nativas arbóreas,com vasta distribuição nas matas e cerrados brasileiros(TABELA 2) com informações da região de ocorrênciae grupo ecológico. Algumas espécies, embora estivessemfora do seu habitat natural, foram incluídas para efeito de

. pesquisa, sendo que estavam se adaptando em coleçõesplantadas anteriormente em Mogi Mirim.

Utilizaram-se 10 mudas por espécie,totalizando 350 mudas, as quais foram distribuídas aoacaso no talhão em março de 1996, no compasso foi de3,0 m x 3,0 m, ocupando uma área de 3.150 m2

. Asmudas estavam embaladas em sacos plásticos de10,0 litros, com alturas variando de 1,0 a 1,5 m, sendoempregado 10,0 litros de esterco de curral na cova.

Como a área da pesquisa estavadominada por Brachiaria decumbens, foram feitasvárias capinas após a semeadura das leguminosas,até o ponto do pleno estabelecimento dasmesmas, no 1Q ano. Foram realizadas mediçõesde altura a partir dos dois anos, altura e DAPaos 3 e 4 anos.

No estudo da regeneração natural, foramanalisados os sistemas de reprodução através dedispersão de sementes e vegetativo, com base noscritérios de Seitz (1996) e Ferretti (1998). Foramfeitas observações de campo anotando-se asespécies que surgiram espontaneamente e qual osistema mais provável de dispersão.

TABELA 2 - Espécies arbóreas plantadas na Estação Experimental de Mogi Mirim, com nome popular,região de ocorrência e grupo ecológico a que pertencem.

Espécie Botânica Grupo EcológicoAspidosperma parvifoliumAspidosperma polyneuronAspidosperma ramiflorumAstronium graveolensBalfourodendron riedelianumBuchenavia tomentosaCaesalpinia echinataCalycorectes spCariniana estrel/ensisCariniana legalisCasearia sylvestrisCecropia glazioviiCentrolobium tomentosumCordia superbaCroton priscusDalbergia nigraFicus spGenipa americanaGustavia augustaJacaranda micranthaLuehea divaricataLuetzelburguia auriculataMachaerium scleroxylonMaclura tinctoriaNectandra megapotamicaOrmosia arboreaParapiptadenia rigidaParkia multijugaPatagonula americanaPera obovataPoecilanthe parvifloraSenna sy/vestrisSterculia chichaTabebuia vel/osoiTrema micrantha

Nome Popularguatambu-oli vaperoba-rosaguatambu-grandeguaritápau-marfimtarumaranapau-brasilbatingajequitibá brancojequitibá rosaguaçatongaembaúvaararibábabosa-brancacaixetajacarandá-da-bahiafigueirajerupapojeruparanacarobaaçoita-cavaloguaiçaracaviúnataiúvacanelinhaolho-de-cabraangico-da-matabenguêguajuvirapau-de-tamancocoração-de-negrocássia-amarelachicháipê amarelopau pólvora

Região de OcorrênciaBA, MG e GO atéRS, flor.est semid,e pluv. atlânt.BA, MG até o PI(, flor. est. semid. e pluv. atlânt.RJ e MG até SC, flor. pluv. atIânt.Sul da BA, ES, MG até RS, flor. est. semid.MG e MS até RS, flor. est. semid.TO, GO, BA, MG e MS flor. est. semid.CE ao RJ, flor. pluv. atlânt.MG até PR, flor. pluv. atlânt.Sul da BA até RS, flor. pluv. atlânt. e est. semid.ES, MG, RJ, SP e MS íkr.phrvalâot eest smidEm todo territ. brasileiro e formo vegetaisBA até o PR na flor. pluv. atlânt.GO, MG até norte do PR, flor. estaco semid.MG, SP e Estados adjacentes, na flor. est. semid.SP, MG, MS e norte PR flor. est. semid.BA, ES, MG até SP flor. pluv. atlânt.Espécie indeterminada, ocorre no Est. de SPTodo o Brasil em florestas de várzeasReg. Amazônica, de terra firmeMG até RS flor. est. semid.SuldaBA,MG, MS atéo RS, flor.atlânt.e est.semidMG, SP e PR na flor. est. semid.GO, MS, MG, até norte do PR flor. est. semid.Nas principais formo flor. do BrasilMG, RJ até RS na flor. pluv. atlânt.BA, MG, MS até SC flor. pluv. atlânt. e est. semid.MG e MS até o RS flor. atlânt. e est. semid.Reg. Amazônica de terra firmeSP até RS flor. est. semid.MG e RJ até SC, flor. est. semid. e cerradoMT, MS, SP até RS flor. est. semid.MG, SP flor. est. semid. e cerradoSul BA, ES até SP flor. pluv. atlânt.MG, GO, MS, RI e SP flor. pluv. atlânt.e cst. semid.GO, MG, RJ até RS várias formo florestais

TardiaTardiaTardiaTardiaTardiaClímaxTardiaTardiaTardiaTardia

PioneiraPioneiraTardiaTardia

PioneiraInicialTardiaClímaxTardiaTardiaInicialTardiaTardiaInicialClímaxTardiaInicialInicialInicialTardiaTardiaInicialClímaxTardia

Pioneira

Rev. Inst. Fior., São Paulo, 13(1 ):27-36,200 I.

Page 4: PLANTIO DE ESPÉCIES NATIVAS CONSORCIADAS COM LEGUMINOSAS … · consorciadas com 6 espécies de leguminosas arbustivas e herbáceas, utilizadas como adubação verde. Foi aplicado

30

TOLEDO FILHO, D. V. de & BERTONI, 1. E. de A. Plantio de espécies nativas consorciadas com leguminosas em solo de cerrado.

3 RESULTADOS E DISCUSSÃO

3.1 Alterações do Solo

Os resultados das análises químicas do soloindicam que os valores de pl-í, teores de bases trocáveis(CTC) e porcentagem de bases trocáveis (V%)continuam baixos (TABELA 3), havendo a necessidadede calagem e fertilização complementares, para elevaro V% para 60%, de acordo com recomendaçõespara espécies ornamentais arbóreas (Raij et ai., 1985).

Visualmente, as condições físicas do solomelhoraram, tomando-se mais poroso, sem sinaisde erosão laminar e sem manchas de compactação eexistência de termiteiros. Também houve umamelhora das condições biológicas do solo, com osurgimento de outras formigas sem ser cortadeiras,besouros, grilos e outros insetos. Para Sautter(1996), existe uma sucessão primária de meso emacrofauna nos solos, que é importante nareabilitação de áreas degradadas.

TABELA 3 - Resultados das análises químicas do solo antes do plantio (amostras 1 e 2) e aos três anos apóso plantio (amostras 3 e 4).

Amostra MO pH P Kg/dm ' 3' mg/dnr'mg/dm

1 13 3,6 3 0,3

2 12 3,8 10 0,4

3 13 5,6 4 0,3

4 14 4,5 12 0,4

Ca Mg SB H+AI CTC Vmmole/dm3 (%)

6 2 8,3 64 72,3 11

7 3 11,0 61 71,4 15

15 5 20,3 22 42,3 48

11 4 15,4 40 55,4 28

3.2 Avaliação das Leguminosas comoAdubação Verde

Segundo os critérios analisados, de modogeral as três espécies arbustivas suplantaram asherbáceas para os objetivos desejados.

Quanto ao efeito de sombreamento dasleguminosas nas mudas das espécies nativas,sobressaiu o guandu, seguido pela crotalária etefrósia, devido ao hábito de crescimento ereto dasarbustivas. As espécies herbáceas não tiveramnenhum efeito sobre o sombreamento.

Quanto à cobertura morta, pelas informaçõesde Pedro Junior et ai. (1986), as espéciesarbustivas são mais produtivas. O comportamentodas herbáceas e a crotalária, quanto a este aspecto,é menor por serem de ciclo anual, enquanto as outrasduas arbustivas, se não forem roçadas, permanecemvivas por 2 a 3 anos produzindo matéria seca.

Para o controle de plantas daninhas, asherbáceas e a crotalária, somente são eficazes noprimeiro ano, dando condições, a partir do segundoano, das pragas invasoras retomarem.

Como era de se esperar, para efeito detrepadeiras e lianas, as arbustivas e o feijão-de-porconão encobriram as mudas, ao contrário do lab-lab eprincipalmente da mucuna-preta, o que as tomaminviáveis como adubação verde consorciada com asárvores nativas.

Rev. Inst. Flor., São Paulo, 13(1):27-36,2001.

Quanto à capacidade de auto-regeneração,somente a tefrósia e a mucuna-preta conseguiramse regenerar em pequena escala, de um ano parao outro.

Concluiu-se que, entre as espécies deleguminosas estudadas para adubação verde, a quemelhor se comportou foi o guandu, seguido datefrósia e crotalária, atingindo até 6 m de altura. Asherbáceas, com exceção do feijão-de-porco, nãodevem ser recomendadas para os fins propostos.

Estas observações preliminares da utilizaçãode leguminosas em consorciação com espéciesnativas poderão ser aprofundadas e, futuramente,ser adotada como prática usual em silvicultura.

3.3 Comportamento das Espécies Nativas

Das 35 espécies inicialmente plantadas,4 deixaram de ser avaliadas, devido a taxa demortalidade ter' ultrapassado 50% no quarto ano.Cecropia glaziovii, provavelmente não suportou ascondições desfavoráveis do solo, sendo que algunsindivíduos remanescentes sobressaíram em altura.Gustavia augusta, Machaerium scleroxylon eNectandra megapotamica, apresentaram baixasobrevivência, talvez devido a um ou mais dosfatores de solo, clima e grupo ecológico.

Page 5: PLANTIO DE ESPÉCIES NATIVAS CONSORCIADAS COM LEGUMINOSAS … · consorciadas com 6 espécies de leguminosas arbustivas e herbáceas, utilizadas como adubação verde. Foi aplicado

TOLEDO FILHO, D. V. de & BERTONI, J. E. de A. Plantio de espécies nativas consorciadas com leguminosas em solo de cerrado.

31

Para as demais 3 I espécies, sãoapresentados os dados de altura, DAP e sobrevivênciana TABELA 4. Verificou-se que as 6 espéciesque apresentaram as maiores alturas aproximadasde 7 a 10m foram Dalbergia nigra, Sterculiachicha, Parida multijuga, Trema micrantha, Peraglabrata e Maclura tinctoria. Neste grupo,somente Trema micrantha é pioneira, sendo asdemais, secundárias iniciais e tardias, comoSterculia chicha e Pera glabrata.

A seguir, um grupo de 11 espéciesapresentou crescimento intermediário, com alturasque variaram de 4,0 a 5,5 m aos quatro anos deidade. Neste grupo, espécies iniciais como Crotonpriscus, Parapiptadenia rigida e Senna sylvestrisapresentaram os índices dendrométricos que foramaquém do esperado. Patagonula americana, apesarde ser uma espécie de mata e exigente cm solofértil, apresentou um bom crescimento. Buchenaviatomentosa, espécie clímax e de ocorrência fora doEstado de São Paulo, se destacou até aos 4 anos.

Um terceiro grupo de espécies,apresentando alturas entre 3,0 e 4,0 m, teve comodestaque Poecilanthe parviflora e Carinianaestrellensis. Estas duas espécies são de naturezatardia, que superaram Luehea divaricata eCasearia sylvestris, consideradas secundária iniciale pioneira, respectivamente. As demais do grupo,todas tardias e de mata, devem ter sofrido osrigores da luminosidade e pobreza do solo.

Finalmente, a TABELA 4 apresenta oquarto grupo das espécies menos desenvolvidas,com alturas inferiores a 3,0 m como Cordiasuperba, Calycorectes sp, Aspidosperma ramiflorae Tabebuia vellosoi não se adaptaram às condiçõesdo plantio e permaneceram dominadas no talhão.

Entre as 31 espécies até os 4 anos, houvealguns resultados inesperados, como Dalbergianigra, Parida multijuga e Patagonula americana,que poderão ser recomendadas para programas derecuperação de floresta estaciona I semidecidual.Buchenavia tomentosa, por apresentar 50% desobrevivência, só poderá ser recomendada paralocais de sítio edáfico menos adverso. Segundoobservações de Guimarães (1998), espéciesoriundas de outras regiões do Brasil se adaptarambem no cerrado de Brasília, como Dalbergia nigrae Swietenia macrophilla.

Para Gonçalves (1995), as essênciasflorestais típicas da Mata Atlântica são muito maisexigentes em fertilidade do solo do que as daregião dos cerrados.

ReI'. Inst. Flor., São Paulo, 13(1 ):27-36,200 I.

Entre as especies mais freqüentes docerrado, Pera glabrata teve um bom desempenho,Senna sylvestris foi regular e Casearia sylvestris,por ser de porte arbustivo, cresceu relativamente bem.

Quanto à sobrevivência (TABELA 4),Parida multijuga e Poecilante parviflora nãoapresentaram nenhuma falha. Senna sylvestris,Cariniana legalis, Astronium graveolens, Caseariasylvestris, Caesalpinia echinata, Luetzelburgiaauriculata e Calycorectes sp apresentaram 80% desobrevivência. Estas espécies de mata, com exceçãode Casearia sylvestris e Senna sylvestris que ocorremnos cerrados da região, demonstraram algumaadaptação neste ambiente, principalmente Caesalpiniaechinata, que ocorre somente na Mata Atlântica.

Estudando a recuperação de áreasdegradadas por mineração, Correa & Cardoso(1998) constataram que é comum a mortalidade de40 a 60% das mudas, causadas pelo estressehídrico do período seco, compactação do solo,baixa retenção de umidade do substrato e erosão dosolo desprotegido. Para aqueles autores, aadubação química ajuda nos primeiros estádios e oemprego de esgoto orgânico nas covas favoreceu ocrescimento das mudas.

Este quadro de posições das espécies,quanto aos índices dendrornétricos, poderá semodificar, com algumas espécies sobrepujandooutras em posição melhor, considerando quepertencem a grupos ecológicos diferentes e asucessão é um processo dinâmico.

Para Campello (1996), o uso deleguminosas arbóreas que nodulam e fixam o N2

auxiliam na recuperação de solos degradados,recomendando entre outras, espécies do gêneroAcacia, Albizia, Calliandra, Enterolobium, Inga,Mimosa e Piptadenia. Outros gêneros de importânciaflorestal, como Cassia, Delonix, Parida eSchizolobium, não nodulam.

Em pesquisa de competição de 9 espéciesarbóreas de cerrado, Toledo Filho (1988)selecionou como as mais viáveis, com osincrementos médios anuais de altura (m) aos 8anos, Anadenanthera macrocarpa (0,86), Dipteryxa/ala (0,79), Pterodon pubescens (0,57) ePlatymenia reticuiata (0,55). Estes valores sãobem inferiores aos do presente estudo, emboralenha de considerar que, com o passar dos anos, osincrementos anuais diminuem.

Page 6: PLANTIO DE ESPÉCIES NATIVAS CONSORCIADAS COM LEGUMINOSAS … · consorciadas com 6 espécies de leguminosas arbustivas e herbáceas, utilizadas como adubação verde. Foi aplicado

;oTA

BEL

A4

-D

ados

deso

brev

ivên

cia,

DA

Pe

altu

rada

ses

péci

esar

bóre

asao

s2,

3e

4an

os,

por

orde

mde

cres

cent

eda

sal

tura

sao

s4

anos

,co

m...,

w'"

oN

~an

ális

ees

tatís

tica

(test

eD

unca

n)de

DA

Pe

altu

raao

s3

e4

anos

.r

'"t'l

<.o

",...

O~

::lc ;-s

Espé

cie

Arb

órea

2an

os3

anos

4an

osr ::c

'".0

0>'

Sobr

ev.

(%)

Alt.

(m)

Sobr

ev.

(%)

DA

P(e

m)

Alt.

(m)

Sobr

ev.

(%)

DA

P(cm

)A

lt.(m

)o

!=i-e '"

Dal

berg

iani

gra

705,

570

8,28

ab7,

11ab

c60

12,2

5ab

9,50

a:<

" .õQ

.•....

Ster

culia

chic

ha10

04,

980

7,50

abc

7,52

ab50

11,0

0bc

9,40

ab"

~f1::

>

~Pa

rkia

mul

tijug

a10

05,

010

09,

80a

8,40

a10

010

,25

c8,

61ab

cto

;.:,t'l

-ITr

ema

mic

rant

ha70

6,4

5010

,6a

7,84

ab50

13,5

0a

7,90

bcde

~.:,., .0--

Pera

glab

rata

803,

660

5,11

cdef

g5,

96bc

de50

7,50

d6,

80cd

oN

.~o

Mad

ura

tinct

oria

100

4,0

805,

93bc

d6,

12bc

d60

7,33

d6,

75cd

o!-

•....C

roto

npr

iscu

sr'1

603,

460

4,75

cdef

g4,

73cd

ef60

5,91

def

5,53

deQ

.

Para

pipt

aden

iari

gida

903,

260

"4,4

1cd

efgh

4,75

cdef

605,

50de

f5,

45de

" ;>O

rmos

iaar

bore

a80

3,0

705,

21cd

ef4,

31de

f60

6,00

de5,

05ef

-eBu

chen

avia

tom

ento

sa80

3,0

803,

93de

fgh

3,77

efg

506,

00de

f5,

04ef

., aSe

nna

sylv

estr

is90

3,7

905,

05cd

efg

4,34

def

805,

87de

f4,

90ef

õ' Q. "

Pata

gonu

laam

eric

ana

602,

660

3,10

defg

h4,

68de

f60

4,03

fghi

4,90

efg

" ~C

arin

iana

lega

lis10

03,

090

3,33

defg

h4,

13de

fg80

4,68

fghi

4,73

efgh

". oC

entr

olob

ium

tom

ento

sum

802,

860

3,66

defg

h3,

96de

fg60

4,66

efgh

i4,

70ef

ghi

~.

:>Fi

cus

sp60

3,3

603,

91bc

de4,

20de

fg60

5,58

def

4,58

efgh

ija :::.

Baljo

urod

endr

onri

edel

ienu

m90

1,8

702,

33fg

h2,

67fg

504,

64ef

ghi

4,32

efgh

ijk~ o

A?tr

oniu

mgr

aveo

lens

902,

480

3,12

defg

h3,

57fg

805,

18ef

g4,

17ef

ghijk

o :> '"Po

eci/a

nthe

parv

iflor

a10

02,

510

02,

86ef

gh3,

53fg

100

3,82

efgh

i3,

89fg

hijk

s: o sC

arin

iana

estr

elle

nsis

802,

170

2,23

gh3,

20fg

605,

95ef

gh3,

76fg

hijk

~Lu

ehea

diva

rica

ta50

2,3

504,

40cd

efgh

3,14

fg50

4,94

hi3,

70fg

hijk

o oC

asea

ria

sylv

estr

is90

2,1

802,

50fg

h2,

8lfg

803,

12hi

3,45

ghijk

3 ".

Aspi

dosp

erm

apa

rvifo

lium

802,

070

2,11

gh2,

56fg

702,

62hi

3,34

ghijk

~C

aesa

lpin

iaec

hina

ta80

2,5

802,

84ef

gh3,

18fg

803,

08fg

hi3,

33gh

ijk2. :> o

Jaca

rand

am

icra

ntha

702,

150

1,90

gh2,

60fg

502,

70hi

3,30

ghijk

'"., '"Lu

etze

lbur

gia

auri

cula

ta10

02,

290

2,72

fgh

2,68

fg80

3,68

efgh

i3,

27hi

jk" 3

Gen

ipa

amer

ican

a10

02,

090

2,10

gh2,

53fg

602,

86ef

ghi

3,26

hijk

'"o ÕAs

pido

sper

ma

poly

neur

ol1

802,

070

2,78

fgh

2,68

fg70

3,86

hi3,

26ijk

Q. "

Cor

dia

supe

rba

100

2,5

70.3

,41

defg

h3,

10fg

503,

70et

ghi

2,96

jko "

Cal

ycor

ecte

ssp

100

1,4

801,

60h

1,80

g80

2,68

hi2,

87k

~ Q.As

pido

sper

ma

ram

iflor

um10

01,

690

2,26

gh1,

85g

702,

38i

2,78

k"

Tabe

buia

vello

soi

601,

360

2,13

gh1,

78g

603,

16fg

hi2,

66k

CV3

anos

(DA

P)=

35,5

4%e

(Alt.

)=

27,5

3%CV

4an

os(D

AP)

=32

,33%

e(A

lt.)

=24

,23%

Méd

ias

segu

idas

dele

tras

dist

inta

s,di

fere

men

tresi

aní

vel

de5%

depr

obab

ilida

depe

lote

ste

Dun

can.

Page 7: PLANTIO DE ESPÉCIES NATIVAS CONSORCIADAS COM LEGUMINOSAS … · consorciadas com 6 espécies de leguminosas arbustivas e herbáceas, utilizadas como adubação verde. Foi aplicado

33

TOLEOO FILHO, D. V. de & BERTONI, 1. E. de A. Plantio de espécies nativas consorciadas com legurninosas em solo de cerrado.

3.4 Regeneração Natural na Área zoocoria e autocoria. Para algumas espécies comoAnadenanthera falcata, Caryocar brasiliense,Copaiba langsdorffii, Dimorphandra mollis,Machaerium acutifolium, Qualea grandiflora,Q. multiflora e Tabebuia ochraceae, a regeneraçãotalvez tenha sido feita por dois sistemas. Estas espéciesde porte arbóreo, além de dispersarem muitas sementes,possuem um sistema radicular vigoroso, e depoisde abatidas emitem brotações pelas cepas e raízes.

No período de 4 anos houve regeneraçãonatural de 34 espécies arbustivas-arbóreas, através doprocesso vegetativo de cepas e raízes que perma-neceram no solo e por dispersão de sementes de umfragmento de cerrado existente nas proximidades.

Conforme TABELA 5, os sistemasprováveis de dispersão foram: anemocoria, ornitocoria,

TABELA 5 - Relação de espécies de cerrado que se regeneraram no local, família a que pertencem eprovável sistema de reprodução/dispersão: autocoria, ariemocoria, ornitocoria e zoocoria.

Espécie Família Reprod./Disp.

Aegiphila lhotzkyanaAnadenanthera falcataAndira inermisAnnona coriaceaAnnona speciosaBaccharis spBauhinia holophyllaBrosimum gaudichaudiiByrsonima intermediaCampomanesia guazumifoliaCaryocar brasilienseCasearia sylvestrisConnarus suberosusCopaifera langsdorffiiCoussarea hidrangeaefoliaDavilla ellipticaDydimopanax vinosumDimorphandra mollisJacaranda carobaLithraea molleoidesMabea fistuliferaMachaerium acutifoliumMyrcia spOuratea spectabilisPiptocarpha spPouteria tortaQualea grandifloraQualea multifloraROl/pala montanaSenna macrantheraSolanum spTabebuia ochraceaeSyagrus flexuosaZanthoxyllum rhoifolium

VerbenaceaeMimosaceaeFabaceaeAnnonaceaeAnnonaceaeAsteraceaeCaesalpiniaceaeMoraceaeMalpighiaceaeMyrtaceaeCaryocaraceaeFlacourtiaceaeConnaraceaeCaesalpiniaceaeRubiaceaeDilleniaceaeAraliaceaeCaesalpiniaceaeBignoniaceaeAnacardiaceaeEuphorbiaceaeFabaceaeMyrtaceaeFabaceaeAsteraceaeSapotaceaeVochysiaceaeVochysiaceaeProteaceaeCaesalpiniaceaeSolanaceaeBignoniaceaeArecaceaeRutaceae

Ornitoc.Veget./ Autoc.Veget./Zooc.Veget./Zooc.Veget./Zooc.Anemoc.Veget./ Autoc.Zooc.Zooc.Zooc.Veget./Zooc.Ornitoc ...Veget./Zooc.Veget./Zooc.Ornitoc.Veget./ Anemoc.Ornitoc.Veget./ Autoc.Anemoc.Anemoc.Anemoc.Veget./ Anemoc.Ornitoc.Ornitoc.Anemoc.Ornitoc.Veget./ Anemoc.Veget./ Anemoc.Anemoc.Ornitoc.Ornitoc.Veget./ Anemoc.Zooc.Ornitoc.

Rev. Inst. Flor., São Paulo, 13(1):27-36,2001.

Page 8: PLANTIO DE ESPÉCIES NATIVAS CONSORCIADAS COM LEGUMINOSAS … · consorciadas com 6 espécies de leguminosas arbustivas e herbáceas, utilizadas como adubação verde. Foi aplicado

34

TOLEDO FILHO, D. V. de-& BERTONI, J. E. de A. Plantio de espécies nativas consorciadas com leguminosas em solo de cerrado.

Outras espécies, de porte arbustivo epioneiras, a regeneração se dá somente porsementes, como Aegiphila lhotzkyana, Baccharissp, Casearia sylvestris, Piptocarpha sp, Sennamacranthera e Solanum sp.

Para Reis et ai. (1996), há uma grandeinteração planta-animal no processo de sucessãosecundária, através da polinização, dispersão eherbivoria, sendo este consórcio importante narecuperação de áreas florestais.

Estudando a dinâmica de uma plantaçãode espécies nativas e exóticas, com espaçamentoamplo e próximo de um fragmento florestal,Mariano et al. (1998) observaram que, das 22espécies plantadas inicialmente, passados 20 anos,foram recrutadas mais 55 espécies, sendo que osistema predominante de dispersão foi a anemocoria.

Bertoni (1992) realizou a recomposiçãode urna área de canavial abandonada, cuja vegetaçãooriginal era cerrado, e concluiu que o reflorestamentocom espécies nativas possibilitou, após quatroanos, o recobrimento do local, e foi um importantefator para acelerar a recomposição de áreas alteradas efornecer condições à regeneração do cerrado.

A técnica implantada no povoamentoestudado, com uma diversidade de 35 espécies,com aplicação de calcário, adubação verde eorgânica na cova, incrementou o processo deregeneração da área. Em áreas próximas ao localde estudo, que permaneceram sem intervenção,observou-se que a regeneração estava ocorrendolentamente. Isto se deve, sobretudo, à degradaçãodo solo e à infestação de Brachiaria decumbens,que impede o estabelecimento de sementesdispersadas, bem como dificulta a reproduçãovegetativa de espécies de cerrado. No entanto, aárea manejada através do controle de gramíneas,reflorestamento e o plantio de leguminosas favoreceme aceleram a regeneração natural.

Carvalho (2000) recomenda, entre osdiversos modelos de plantio de florestas naturais, oestabelecimento de povoamento com leguminosasarbóreas, com o objetivo de cobrir rapidamente oterreno, fixar nitrogênio, produzir biomassa no soloe facilitar a regeneração natural rica e diversificada.

Segundo Gandolfi & Rodrigues (1996), apósgarantir uma diversidade mínima de espécies,haverá uma auto-sustentabilidade da área, podendoprever-se que no povoamento formado artificialmente,haverá uma dinâmica de sucessão, com a morte dealgumas espécies que não irão se adaptar, dando espaçoe condições para o surgimento de novas espécies.

Rev. Inst. Flor., São Paulo, 13(1):27-36,2001.

Como o estudo envolveu dois sistemasdistintos, um de recuperação de floresta estacionalsemidecidual e outro de regeneração natural docerrado,' recomenda-se continuar as observaçõesapresentadas novamente passados alguns anos,para acompanhar a dinâmica e competição dasespécies, bem como o processo de reproduçãovegetativa do cerrado.

4 CONCLUSÕES

Após 4 anos de observações, verificou-seque algumas espécies apresentaram um crescimentoalém do esperado, como Dalbergia nigra, Sterculiachicha, Parida multijuga e Maclura tinctoria.

Muitas espécies não se adaptaram,provavelmente pela pobreza do solo, estressehídrico e excesso de luminosidade.

As técnicas de aplicação de calcário,adubação verde e conservação da área melhoraramas condições fisicas, químicas e biológicas dosítio edáfico.

O uso de adubo orgânico na cova ajudoua acelerar o crescimento das mudas nos primeirosanos, sendo uma prática recomendada para solospobres e alterados.

Entre as espécies de leguminosas paraadubação verde, o desempenho das arbustivasguandu, crotalária e tefrósia e da herbácea feijão-de-porco foram superiores aos das outras espéciesutilizadas para os fins de implantação eregeneração florestal.

O sistema utilizado, facilitou a regeneraçãodo cerrado e poderá ser recomendado também pararecuperação de florestas do Estado de São Paulo.

Recomenda-se a continuação deste estudopor mais alguns anos, tendo em vista a dinâmica daregeneração natural do cerrado em conjunto comas espécies plantadas.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

BERTONI, 1. E. A. Reflorestamento com essênciasnativas e a regeneração natural do _cerrado. In:CONGRESSO NACIONAL SOBRE ESSÊNCIASNATIVAS, 2., 1992, São Paulo. Anais... São Paulo:Unipress, 1992. p. 706-709. (Rev. Inst. Flor., SãoPaulo, v. 4, n. único, pt. 3, Edição. especial).

Page 9: PLANTIO DE ESPÉCIES NATIVAS CONSORCIADAS COM LEGUMINOSAS … · consorciadas com 6 espécies de leguminosas arbustivas e herbáceas, utilizadas como adubação verde. Foi aplicado

TOLEDO FILHO, D. V. de & BERTONI, 1. E. de A. Plantio de espécies nativas consorciadas com legurninosas em solo de cerrado.

35

CAMPELLO, E. F. C. O papel de leguminosasarbóreas noduladas e micorrizadas na recuperaçãode áreas degradada. In: CURSO DEATUALIZAÇÃO SOBRE RECUPERAÇÃO DEÁREAS DEGRADADAS, III, 1996, Curitiba.Curitiba: UFPR, 1996. p. 9-16.

CARP ANEZZI, A. A. Espécies para recuperaçãoambienta\. In: SEMINÁRIO ESPÉCIES NÃOTRADICIONAIS PARA PLANTIOS COMFINALIDADES PRODUTIVAS E AMBIENTAIS,1998, Curitiba. Anais ... Colornbo: EMBRAPA -CNEF, 1998. p.43-53.

CARVALHO, P. E. R. Espécies florestaisbrasileiras: recomendações silviculturais,potencial idades e uso da madeira. Brasília:EMBRAPA - CNPF/SP, 1994. 639 p.

____ o Técnicas de recuperação e manejo deáreas degradadas. In: GALVÃO, A. P. M. (Org.).Reflorestamento de propriedades rurais para finsprodutivos e ambientais. Brasília: EMBRAPA,2000. p. 251.

CORRÊA, R. S.; CARDOSO, E. S. Espécies testadasna revegetação de áreas degradadas. In: CORRÊA, R.S.; MELO FILHO, (Org.). Ecologia e recuperaçãode áreas florestais degradadas no cerrado.Brasília: Paralelo 15 Editores, 1998. p. 101-147.

CRESTANA, M. S. M.; TOLEDO FILHO, D. V.de; CAMPOS, 1. B. Florestas: sistemas de recuperaçãocom essências nativas. Campinas: CATI, Secretariade Agricultura e Abastecimento, 1993. 60 p.

FERR.ETTI, A. R. Recomposição florestal comespécies nativas de floresta tropical: basesteóricas e aplicações práticas. Campinas:CETATE (CATI), 1998. 18 p. (Apostila).

GANDOLFI, S.; RODRIGUES, R. R. Recomposiçãode florestas nativas: algumas perspectivas metcx!ológicaspara o Estado de São Paulo. In: CURSO DEATUALIZAÇÃO SOBRE RECUPERAÇÃO DEÁREAS FLORESTAIS DEGRADADAS, I1I, 1996,Curitiba. Curitiba: UFPR, 1996. p.83-100.

GONÇALVES, J. L. M. Recomendações deadubação para Eucalyptus, Pinus e espéciestípicas da Mata Atlântica. Piracicaba: EscolaSuperior de Agricultura "Luiz de Queiroz",Departamento de Ciências Florestais, Universidadede São Paulo, 1995. 23 p. (DocumentosFlorestais, 15).

Rev. Inst. Flor., São Paulo, 13(1):27-36,2001.

GUIMARÃES, D. P. Espécies não tradicionaispara reflorestamento no cerrado. In: SEMINÁRIOESPÉCIES NÃO TRADICIONAIS PARAPLANTIOS COM FINALIDADES PRODUTIVASE AMBIENT AIS, 1998, Curitiba. Anais, ..Colombo: EMBRAPA - CNEF, 1998. p.23.

INOUE, M. T.; RODERJAN, C. V.; KUNYOSHI,S. Y. Projeto madeira do Paraná. Curitiba:FUFEF, 1984. 260 p.

LORENZI, H. Árvores brasileiras: manual deidentificação e cultivo de plantas arbóreas nativasdo Brasil. Nova Odessa: Plantarum, 1992. 352 p.

MARIANO, G. et ai. Regeneração natural em áreaà margem de represa, no município de Piracicaba, SP.Rev. Inst. Flor., São Paulo, v. 10,n. I, p. 81-93,1998.

PEDRO JUNIOR, M. J. et al. (Org.). Instruçõesagrícolas para o Estado de São Paulo. 3. ed. rev.e atual. Campinas: Instituto Agronômico, 1986.229 p. (Boletim, 200).

RA IJ, B. V. et al. Recomendações de adubação eca1agem para o Estado de São Paulo. Campinas:Instituto Agronômico, 1985. 107 p. (BoletimTécnico, 100).

REIS, A.; NAKAZONO, ~. M.; MATOS, J. Z.Utilização de sucessão e das interaçõcs planta-animal na recuperação de áreas florestaisdegradadas. In: CURSO DE ATUALIZAÇÃOSOBRE RECUPERAÇÃO DE ÁREASFLORESTAIS DEGRADADAS, I1I, 1996,Curitiba. Curitiba: UFPR, 1996. p.29-43.

REITZ, R.; KLEIN, R. M.; REIS, A. Projetomadeira de Santa Catarina. Sellowia, Itajaí, v. 30,n. 28/30, p. 1-320, 1978.

SAUTTER, K. D. Meso e macrofauna narecuperação de áreas (solos) degradadas/os). 1n:CURSO DE ATUALIZAÇÃO SOBRERECUPERAÇÃO DE ÁREAS FLORESTAISDEGRADADAS, I1I, 1996, Curitiba. Curitiba:UFPR, 1996. p. 125-128.

SEITZ, R. A. As potencial idades da regeneraçãonatural na recuperação de áreas degradadas. In:CURSO DE ATUALIZAÇÃO SOBRERECUPERAÇÃO DE ÁREAS FLORESTAISDEGRADADAS, IIJ, 1996, Curitiba. Curitiba:UFPR, 1996. p.45-51.

Page 10: PLANTIO DE ESPÉCIES NATIVAS CONSORCIADAS COM LEGUMINOSAS … · consorciadas com 6 espécies de leguminosas arbustivas e herbáceas, utilizadas como adubação verde. Foi aplicado

36

TOLEDO FILHO, D. V. de & BERTONI, J. E. de A. Plantio de espécies nativas consorciadas com leguminosas em solo de cerrado.

TOLEDO FILHO, D. V. de. Competição deespécies arbóreas de cerrado. BoI. Técn. IF, SãoPaulo, v. 42, p. 61-70, 1988.

LEITÃO FILHO, H. de F.;RODRIGUES, T. S. Composição florística da áreado cerrado em Mogi Mirim (SP). BoI. Técn. IF,São Paulo, v. 38, n. 2, p. 165-175, 1984.

TRANI, P. E. et al. Adubação verde. Campinas:CATI, Secretaria da Agricultura, 1991. 13 p.(BoI. Técn., 197).

VEIGA, A. de A. Balanços hídricos dasdependências da Divisão de Florestas e EstaçõesExperimentais. São Paulo: Instituto Florestal,1975. 34 p. (mimeog.).

Rev. Inst. Flor., São Paulo, 13(1):27-36,2001.