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Plantas transgênicas e o impacto ambiental: o caso da soja resistente a glifosato
Juliano Ricardo Farias a, Ervandil Corrêa Costa b*
a Universidade Federal de Santa Maria (UFSM), Centro de Ciências Rurais, Campus
Universitário, Bairro Camobi, Prédio 42, sala 3225, CEP 97105-900, Santa Maria, RS, Brasil.
[email protected], [email protected];
* Autor para correspondência: +55 (55) 3220 8015 – ramal 29. [email protected]
Palavras-chave: transgenia; escape gênico; plantas daninhas.
Título abreviado: Soja resistente a glifosato
ABSTRACT
Since agriculture was the ten thousand years man has to improve the plants. In the
beginning was used only to select individuals who had the feature required. Over time,
especially after the discovery of the Mendel´s laws, it started targeting the crosses of plants
and more recently with the discovery of DNA and the development of techniques of genetic
engineering, the transgenic. Many crops have been modified by genetic engineering
techniques, among them there is a soybean resistant to glyphosate herbicide, but much is
discussed about the environmental impacts about this crop, especially on the gene exhaust and
the massive use of glyphosate, which may lead to the development of resistant populations of
weeds. As gene exhaust the possibility is very small especially in Brazil. But the development
of weeds resistant to this herbicide, in Brazil today, is recorded four species resistant.
RESUMO
Desde que a agricultura surgiu a dez mil anos o homem passou a melhorar as plantas.
No inicio se utilizava somente da escolha dos indivíduos que apresentavam a característica
requerida. Com o passar do tempo, especialmente após a descoberta das leis de Mendel,
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iniciou-se os cruzamentos dirigidos de plantas e mais recentemente com a descoberta do DNA
e o desenvolvimento de técnicas de engenharia genética, a transgenia. Muitas culturas, já
foram modificadas por técnicas de engenharia genética, dentre estas se destaca a soja
resistente ao herbicida glifosato. Muito se discute quanto aos impactos ambientais dessa
cultura, especialmente quanto ao escape gênico e ao uso massivo de glifosato, que poderia
levar ao desenvolvimento de populações resistentes de plantas daninhas. Quanto ao escape
gênico a possibilidade é pequena, especialmente no Brasil. Porém quanto ao desenvolvimento
de plantas daninhas resistentes a esse herbicida, no Brasil, já são registrados quatro espécies
resistentes.
INTRODUÇÃO
A transição da fase de coleta e caça para a agricultura ocorreu há cerca de dez mil
anos. Naquela época iniciou-se a domesticação da maioria das espécies cultivadas, dando
início às atividades agrícolas (Borém & Milach, 1999) em uma região situada entre os rios
Nilo, Tigre e Eufrates, conhecida por Crescente Fértil (Almeida, 2009).
Com o passar dos tempos o homem passou de caçador-pescador-extrativista para
criador de animais e agricultor, mais tarde chegando a Revolução Agrícola (Borém & Milach,
1999), que é onde ocorreu um grande desenvolvimento de máquinas, uso da química (adubos
e agrotóxicos), bem como o desenvolvimento de cultivares mais produtivas, através de
programas de melhoramento genético de plantas (Burnquist, 1997). Isso possibilitou que dos
250 ha de terra para alimentar um homem por ano na pré-história, chegou-se a 1 ha por pessoa
por ano, atualmente (Borém & Milach, 1999).
O melhoramento de plantas não nasceu com a revolução agrícola e sim junto com a
agricultura. Na verdade é difícil precisar se foi à agricultura que incentivou a prática do
melhoramento de plantas pelos primeiros agricultores ou vice-versa. Provavelmente, ambos
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evoluíram paralelamente na direção de aumentos da qualidade e da produtividade das culturas
domesticadas pelo homem (Borém & Milach, 1999).
Após a redescoberta das leis de Mendel, e com o avanço de outros ramos científicos, o
melhoramento de plantas passou a um novo patamar, com a possibilidade de criação de novos
tipos de plantas, pela modificação dirigida dos caracteres hereditários (Borém & Milach,
1999). Porém o grande passo para a nova era do melhoramento de plantas, a da biotecnologia,
se deu com a descoberta do DNA. Somente depois da descoberta a estrutura do DNA foi
possível desvendar o código genético e um novo capítulo da genética teve início (Arias,
2004), a da era da biologia molecular (Borém & Milach, 1999) considerada como a terceira
revolução ou “biorevolução”, segundo Burnquist (1997).
Esse trabalho teve como objetivo discutir os principais impactos da soja transgênica
resistente ao glifosato no meio ambiente Brasileiro. O trabalho teve como ponto de partida as
plantas transgênicas, de modo geral, e após a origem e a evolução da soja como forma de
fundamentação para o foco principal que é o escape gênico e a resistência de plantas daninhas
ao glifosato. Como instrumento fundamental na elaboração deste trabalho foi usado o método
analítico.
DESENVOLVIMENTO
1. Transgênicos
1.1 Conceitos
Os transgênicos ou organismos geneticamente modificados (OGM) são plantas que
receberam genes desejáveis de outra espécie, o que não seria possível com o melhoramento
genético clássico. São plantas criadas em laboratório com técnicas de engenharia genética que
permitem "cortar e colar" genes de um organismo para outro, mudando a forma do organismo
e manipulando sua estrutura natural a fim de obter características específicas (Murassawa,
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2009). Para Nodari & Guerra (2001) pode se definir as plantas transgênicas como aquelas que
têm em seu genoma (conjunto de genes), uma ou mais seqüência de DNA manipulado em
laboratórios por técnicas de DNA recombinante ou engenharia genética.
O gene pode ser conceituado como a seqüência de ácidos desoxirribonucléicos (DNA)
que codifica as características herdáveis dos seres vivos (Borém, 2004), ou seja, é o segmento
do código genético capaz expressar (produzir) uma característica como a cor dos grãos de
feijão a estatura de plantas e a produtividade, sendo que algumas dessas características podem
ser expressas pela ação de mais de um gene. Como exemplo do tamanho do código genético o
das bactérias tem aproximadamente 5.000 genes, as plantas de 50.000 a 60.000 genes e os
seres humanos 100.000 genes (Gander & Macellino, 1997).
1.2 Culturas transgênicas
A revolução biotecnológica esta apenas no inicio e segundo Peres (2001) essa passará
por quatro ondas, onde a primeira que confere resistência a insetos e tolerância a herbicidas
esta apenas iniciando. A segunda onda, já esta bem adiantada e produzira plantas com maior
qualidade nutricional. A terceira e quarta onda será de produção de plantas como
características farmacêuticas e químicos específicos.
Em 2008, a área semeada com OGMs no mundo atingiu 125 milhões de hectares. Os
Estados Unidos lideram o ranking com 62,5 milhões de hectares, seguido da Argentina com
21 milhões hectares e o Brasil, com 15,8 milhões de hectares (Ogmespan, 2009). A área do
Brasil, portanto correspondeu em 2008 há 12,6% da área mundial de OGMs.
Mais de 95% de todas as plantas transgênicas cultivadas para fins comerciais
pertencem a quatro espécies: soja, milho, algodão e a colza. Em 2005, a soja representou
cerca de 62% da área com OGM, onde do total dessa cultura cerca de 60% da área mundial
era transgênica (Ogmespan, 2009). No Brasil dos 15,8 milhões de hectares com OGMs 14
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milhões de hectares são de soja, 1,4 milhões de milho e o restante de algodão (Bragança
Jornal Diário, 2009).
2. A cultura da soja
2.1 Origem e importância no Brasil
A espécie Glycine max popularmente chamada de soja tem como centro de origem a
região leste da China, onde sofreu domesticação por volta do século XI a.C. (Borém, 1999;
Embrapa, 2009). A origem do gênero Glycine é confuso e controverso. O nome Glycine foi
originalmente introduzido por Linnaeus. Glycine é derivado do Grego glykys (doce) e,
provavelmente, refere-se ao sabor adocicado dos tubérculos originalmente descritos como G.
apio (hoje Apios americana). A soja foi descrita por Linnaeus como Phaseolus max e
Dolichos soja, baseando-se em espécimes que ele mesmo observou e na descrição de outros
autores (Borém, 1999).
A soja cultivada em muitos países é muito diferente dos ancestrais que lhe deram
origem, espécies de plantas rasteiras. Sua evolução começou com o aparecimento de plantas
oriundas de cruzamentos naturais, entre duas espécies de soja selvagem, que foram
domesticadas e melhoradas por cientistas da antiga China (Embrapa, 2009). De acordo com
Borém (1999) a soja cultivada (Glycine max) nunca foi encontrada no meio ambiente como
uma planta silvestre. Do ponto de vista taxonômico, tanto as espécies anuais do subgênero
Soja quanto às perenes do subgênero Glycine são candidatas à troca de genes com a soja
cultivada e podem potencialmente ampliar a base genética disponível da espécie Glycine max.
. No Brasil, segundo Borém (1999) não existe nenhuma espécie nativa ou silvestre que
possa intercruzar com Glycine max. As únicas espécies silvestres que podem cruzar com a
soja cultivada são do gênero Glycine, porém elas não ocorrem naturalmente no Brasil.
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No Brasil a soja iniciou pela Bahia. Os primeiros testes de adaptação de cultivares
semelhantes aos conduzidos por Dutra na Bahia foram realizados no Instituto Agronômico de
Campinas, Estado de São Paulo (SP), no ano de 1981. Assim como nos EUA, a soja no Brasil
nessa época era estudada mais como cultura forrageira, sendo eventualmente também
produzindo grãos para consumo de animais da propriedade do que como planta produtora de
grãos para a indústria de farelos e óleos vegetais (Embrapa, 2009).
Em 1900 e 1901, o Instituto Agronômico de Campinas, SP, promoveu a primeira
distribuição de semente de soja para produtores paulistas e, nessa mesma data, têm-se registro
do primeiro cultivo comercial de soja no Rio Grande do Sul, onde a cultura encontrou
condições para se desenvolver e expandir, dadas as semelhanças climáticas da origem dessas
cultivares que chegaram ao Estado, vindas do Sul dos Estados Unidos (Embrapa, 2009).
A cultura da soja expandiu-se rapidamente no Brasil nas últimas décadas. Nos anos
70, a cultura ocupava uma área de aproximadamente 1,3 milhões de hectares no país (Silva,
1984). O crescimento foi tão expressivo que na safra 2007/08 foram cultivadas mais de 21
milhões de hectares, sendo considerada a cultura de maior relevância nas exportações de
grãos do país (Ibge, 2008). No balanço mundial do mercado da soja, o Brasil tem se destacado
como o segundo maior produtor desta leguminosa nos últimos oito anos (Agrianual, 2005).
2.2 Soja resistente a glifosato
A soja transgênica cultivada no Brasil é a resistente ao herbicida glifosato,
desenvolvida pela empresa Monsanto. Essa variedade recebeu um gene de outro organismo
(bactéria) que lhe confere resistência a esse herbicida, cujo produto comercial é o Round-Up
Ready®, também da Monsanto. Por ser resistente a esse elemento, toda a cultura pode ser
pulverizada com glifosato, sendo que somente as plantas daninhas serão eliminadas (Silva,
2004).
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O ingrediente ativo glifosato foi desenvolvido pela Monsanto, mas seu período de
patente válido por 10 anos já expirou e há no mercado pelo menos oito produtos comerciais
com esse ingrediente ativo, ou seja, com o mesmo efeito do Round-Up Ready® (Silva, 2004).
A molécula de glifosato age na planta através do bloqueio da enzima 5-enolpiruvato-
shiquimato-3-fosfato sintase (EPSPS), que faz parte da via de biossíntese de aminoácidos
aromáticos essenciais para o desenvolvimento da planta. Quando essa enzima é bloqueada, a
via metabólica é interrompida e, pela falta de aminoácidos, a planta morre (Pioneer, 2006).
O gene Roundup Ready, também conhecido como cp4-epsps, é o gene que confere às
plantas a tolerância à aplicação de glifosato. Esse foi desenvolvido e registrado pela
Monsanto, nos Estados Unidos, durante os anos 90 e mais recentemente, no Brasil. Esse gene
foi isolado da bactéria Agrobacterium spp., encontrada em um tanque de efluentes em uma
fábrica de produção do glifosato. A introdução do gene cp4-epsps nas plantas de soja se deu
pelo processo de biobalística, onde segmentos de DNA dessa bactéria foram introduzidos nas
células vegetais. No caso da cp4-epsps, o glifosato não consegue bloqueá-la e, assim, a via
metabólica de produção de aminoácidos aromáticos essenciais não é interrompida e as plantas
se desenvolvem normalmente (Pioneer, 2006).
2.3 Manejo de soja transgênica e convencional
A soja é uma cultura que se caracteriza pelo alto consumo de herbicidas. O controle
químico é o meio mais usual para controle de plantas daninhas, dada as características de
praticidade, eficiência e rapidez na execução de acordo com Gazziero (2005).
O manejo de plantas daninhas com herbicidas em soja pode ser realizado de diferentes
formas. Segundo Pedroso (2009), no Estado do Rio Grande do Sul, a seqüência de
procedimentos realizados em soja transgênica e convencional eram:
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Na dessecação que é uma fase anterior a semeadura da soja, com a finalidade de
eliminar as plantas invasoras, ou mesmo partes verdes das plantas de cobertura do solo. Em
soja transgênica era comum não dessecar, principalmente se a cultura de inverno tivesse boa
palhada (boa cobertura do solo) e, portanto, baixa quantidade de plantas daninhas. Porém,
quando a cobertura era de resteva de pastagem de inverno, campo nativo ou pousio, desseca-
se também, com 2 a 3 l.ha-1 de produto comercial a base de glifosato, óleo mineral e às vezes
2,4-D. Em soja convencional era comum a dessecação, visto que já se vislumbra a maior
dificuldade de controle das ervas daninhas precocemente emergidas na lavoura da soja
(usava-se 2 a 3 l.ha-1 de produto comercial a base de glifosato, além do óleo mineral e 2,4 D).
Na pré-emergência que é a fase que ocorre antes da emergência das plantas daninhas.
Esse processo é feito, normalmente, poucos dias após a semeadura da soja. Em soja
transgênica não se aplicava herbicidas pré-emergentes. Até o 27° dia após a emergência, a
soja não sofre com a competição de plantas daninhas (desde que semeadas em lavouras
limpas). O produtor esperava todas as plantas daninhas emergirem, para depois eliminá-las
com glifosato. Em soja convencional o uso é muito comum, quase em 100% dos casos. O tipo
de produto depende do histórico da área, sendo comum o uso de misturas de dois produtos.
Em pós-emergência que é realizado após a emergência das plantas daninhas, podendo
ser inicial (plantas daninhas na fase de plântulas, o que é mais comum) ou mais tardia
(quando as plantas daninhas estão maiores, normalmente 100% emergidas, sendo mais
comum para o controle de gramíneas invasoras). Em soja transgênica a aplicação é
obrigatória. A aplicação às vezes é feita no início (pós-inicial), quando surge o 2° trifólio da
soja, no caso de áreas com mais plantas daninhas, ou mais tarde (pós-tardia), aos 25-30º dias
após a emergência, em lavouras mais limpas, ou onde a 1a aplicação não foi suficiente. Em
soja convencional também é comum a aplicação de pós-emergente, podendo ser inicial ou
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tardia (quando há reinfestação, especialmente de gramíneas ou plantas daninhas de difícil
controle).
Dentro do manejo usado por esses agricultores pode se notar a dificuldade que era o
manejo das plantas daninhas em soja convencional, tanto do ponto de vista do momento da
aplicação, bem como, da escolhas dos produtos a serem aplicados. Aplicações tardias ou
doses erradas ocasionavam sobras de plantas daninhas que acabavam afetando a
produtividade da cultura, bem como dificultavam a colheita. Doses altas de produtos
poderiam causar efeito fitotóxico à cultura causando o atraso no desenvolvimento das plantas
de soja.
A introdução da soja transgênica facilitou o manejo de plantas daninhas, tanto pelo
fato de não se ter tanta preocupação com momento da aplicação (estágio das plantas
daninhas), bem como pelo uso de um único produto e também pelo menor número de entradas
com máquinas na área, reduzindo o custo com mão-de-obra e máquinas.
3. Problemas ambientais do cultivo de soja transgênica resistente a glifosato
3.1. Escape gênico
Na introdução de plantas transgênicas uma das maiores preocupações do ponto de
vista ambiental é o escape gênico ou fluxo gênico. De acordo com Borém (1999) o fluxo
gênico pode ser definido como a troca de alelos entre indivíduos, isto é a transferência de
alelos de uma variedade/espécie para outra. A dispersão de genes de espécies cultivadas para
silvestres e plantas daninhas é potencialmente um problema ecológico de grande importância.
O pólen de milho, por exemplo, pode percorrer distâncias superiores a 100 m pela
ação do vento. No caso da soja, o grão de pólen possui maior densidade e a única maneira de
dispersa-lo na natureza é de forma entomófila. Mesmo desta forma, a dispersão do pólen de
soja é extremamente limitada segundo Borém (1999). Portanto, no caso do escape gênico para
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cada espécie de planta deve se ter preocupação diferenciada, pois esse problema pode se
agravar em função da forma de fecundação, do tamanho e do tipo de dispersão do pólen.
A soja é essencialmente uma espécie autógama (autopolinizadoras) sendo que os
insetos, principalmente as abelhas, podem transportar o pólen e realizar a polinização de
flores de diferentes plantas, mas a taxa de fecundação cruzada é baixa. Os valores obtidos em
relação à fecundação cruzada em soja, em geral, são menores que 1%, e estes eventos
ocorrem principalmente entre plantas adjacentes com período de floração coincidentes
(Borém, 1999). A característica de autofecundação, onde a própria planta acaba se
fecundando, é o principal fator que reduz as preocupações com escape gênico nessa cultura.
Segundo Abud et al. (2003) em experimento para observar a freqüência de polinização
cruzada em soja concluíram que não houve efeito significativo do vento na freqüência de
polinização e que a freqüência de polinização de 2,1% obtida, pode ser considera alta em
comparação ao relatados por outros autores, porém estes autores justificam esse valor em
função do baixo uso de inseticidas durante o período de florescimento, sendo que nas
condições brasileiras é utilizado mais. Este fato pode ter contribuído no aumento das
populações de polinizadores e conseqüentemente na freqüência de polinização cruzada.
Quanto à preocupação que ocorre de ter variedades transgênicas de soja tolerantes a
herbicidas, no Brasil, poderiam resultar em plantas daninhas tolerantes aos herbicidas (as
superplantas daninhas), no entendimento de Borém (1999) é muito improvável do ponto de
vista científico. Pois de acordo com esse mesmo autor a dispersão gênica entre diferentes
espécies é extremamente complexa e requer a quebra de várias barreiras de isolamento
reprodutivo, algumas das mais freqüentes são: espécies com habitats distintos; espécies com
maturidade sexual em épocas distintas; incompatibilidade genética; fraqueza do híbrido;
esterilidade híbrida e dreno metabólico.
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Até a presente data não foi registrado qualquer caso de escape gênico de uma
variedade transgênica para espécies silvestres em lavouras comerciais. Porém no caso
específico da soja transgênica tolerante a herbicidas, o risco de escape de um gene para
espécies silvestres no Brasil é pequeno, em função da baixa taxa de cruzamento natural dessa
espécie e da inexistência de parentes silvestres sexualmente compatíveis com a soja no Brasil
(Borém, 1999). Portanto, dentro das maiores preocupações ambientais com a soja transgênica,
no Brasil, o escape gênico, até o momento não apresenta motivos para tanta preocupação, pois
do ponto de vista cientifico a probabilidade disso ocorrer é pequena, o mesmo não pode ser
afirmado para o centro de origem dessa cultura, a China.
3.2 Resistência de plantas daninhas a glifosato
A partir de 2005, quando a soja transgênica foi oficialmente liberada para semeadura
no País, esperava-se que ocorreriam profundas mudanças no controle de plantas daninhas
dessa cultura, tendo em vista que vários produtos ou combinações desses utilizados
atualmente seriam substituídos por um único produto, o glifosato, segundo Gazziero (2005).
Para Gazziero (2005) inicialmente seriam observados apenas os benefícios da nova
tecnologia, mas após três a cinco anos certamente começariam a surgir os problemas como a
seleção das espécies consideradas tolerantes e até mesmo à resistência, sendo que isso já tinha
sido relatado em países como os Estados Unidos, Chile, China, Austrália, Malásia e África do
Sul. No Brasil, isso já ocorria com dificuldade de controle de muitas plantas daninhas tidas
como tolerantes a esse herbicida.
Uma planta é sensível a um herbicida quando o seu crescimento e desenvolvimento
são alterados pela ação do produto. Já a tolerância é a capacidade inata de alguns indivíduos
sobreviverem e se reproduzir após o tratamento herbicida, mesmo sofrendo injúrias. Por outro
lado, a resistência é a capacidade adquirida de uma planta sobreviver a determinados
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tratamentos herbicidas que, sob condições normais, controlariam os integrantes da população.
Essas características estão relacionadas com a variabilidade genética natural e preexistente das
espécies (Borém, 1999). Portanto, em uma população de plantas daninhas (espécie) podemos
ter indivíduos sensíveis, tolerantes e resistentes, no caso dos resistentes é os que formaram a
totalidade da população no caso do uso continuo do mesmo ingrediente ativo.
Vargas et al (2007) em estudo com Buva (Conyza bonariensis) apresentaram que o
biótipo sensível dessa espécie é controlado pelo glifosato e pelos demais herbicidas avaliados
e que o biótipo resistente apresenta-se, altamente suscetível aos herbicidas com mecanismo de
ação distinto do glifosato, igualmente ao biótipo sensível. Entretanto, o biótipo resistente
mostra baixa resposta ao herbicida glifosato, mesmo se este for empregado em doses
elevadas, evidenciando que esse apresenta resistência a esse produto.
No Brasil, já foi confirmado quatro espécies de plantas daninhas resistentes a glifosato
que são o azevém (Lolium multiflorum) confirmado em 2003, as buvas (Conyza bonariensis e
Conyza canadensis) em 2005 e o capim-amargoso (Digitaria insularis) em 2008 (Weed
Science, 2009). Essa preocupação quando da introdução de soja transgênica no Brasil, se
confirmou como sendo um problema. No inicio, a soja transgênica foi comercializada para ser
utilizada em áreas onde as plantas daninhas eram realmente um grande problema e com a
redução desse, após alguns anos, se voltaria com a soja convencional. Porém isso não ocorreu
em função da facilidade de manejo de plantas daninhas com essa soja. Os agricultores
seguiram usando cultivares transgênicas e conseqüentemente o uso massivo do glifosato,
possibilitou a seleção de populações de plantas daninhas resistentes.
Para Borém (1999) a resistência de plantas daninhas a herbicidas, já registradas em
diferentes países, provenientes da seleção de tipos preexistentes na população nativa (não de
escape gênico), tem sido contornada com a adoção de técnicas adequadas de manejo que
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incluem rotação de princípio ativo do herbicida, rotação de culturas, mistura de herbicidas
com diferentes mecanismos de ação, controle cultural e cultivo mecânico, dentre outros.
CONCLUSÕES
A agricultura passou por vários estágios de desenvolvimento agrícola que impactaram
de forma negativa o meio ambiente. Hoje se esta no limiar de mais um processo evolutivo da
agricultura, a chamada era biotecnológica. Ainda não se tem o conhecimento de quais serão
seus impactos sobre o meio ambiente, se positivos ou não. No caso da soja transgênica os
impactos ainda não foram totalmente avaliados, porém alguns, já estão mais evidentes como o
escape gênico, onde a possibilidade de ocorrer é pequeno, especialmente no Brasil. Porém,
quanto ao desenvolvimento de plantas daninhas resistentes ao glifosato, inúmeras ocorrências
já foram registradas, provavelmente em função do uso massivo de glifosato e não do escape
gênico.
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