picasso e a arte - estudo

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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE CENTRO DE CIÊNCIAS HUMANAS, LETRAS E ARTES DEPARTAMENTO DE ARTES DISCIPLINA: ESCULTURA PROF. LUIZ MENEZES PERÍODO: 2006.2 - PICASSO E A ARTE - TRABALHO DE PESQUISA ALUNO: LUCAS FORTUNATO RÊGO DE MEDEIROS MATRÍCULA: 2003.0703-7 E-MAIL: [email protected]

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Artigo sobre a arte cerâmica de Pablo Ruiz Picasso. Parte da biografia do autor relativa a suas incursões na arte cerâmica bem como na escultura. Ensaio livre sobre o nomadismo psíquico e artístico de um dos mais renomados artistas do século XX.

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Pablo Ruiz Picasso nasce a 25 de outubro de 1881, em Mlaga, como primeiro filho de Don Jos Ruiz Blasco e de sua mulher Dona

Universidade Federal do Rio Grande do Norte

Centro de Cincias Humanas, Letras e Artes

Departamento de Artes

Disciplina: Escultura

Prof. Luiz Menezes

Perodo: 2006.2

- Picasso e a Arte -

Trabalho de Pesquisa

Aluno: Lucas Fortunato Rgo de Medeiros

Matrcula: 2003.0703-7

E-mail: [email protected], Abril de 2007

Todos sabemos que el arte no es verdad. El arte es una mentira que nos lleva a captar la verdad, al menos la verdad que somos capaces de captar como hombres. El artista tiene que conocer la manera de convencer a los dems de la veracidad de sus mentiras.

Pablo Picasso.

- Sumrio -

Introduo

4

Pablo Picasso e a arte pictrica

6

Picasso como escultor

12

Concluses

16

Referncias bibliogrficas

18

Anexos

19

Introduo

Este trabalho universitrio que ora se apresenta, tem por objeto privilegiado de estudo a atividade artstica do espanhol Pablo Ruiz Picasso. Sendo uma pesquisa a ser apresentada como avaliao da disciplina Escultura ministrada pelo ento Professor Luiz Menezes, e oferecida comunidade acadmica pelo Departamento de Artes da Universidade Federal do Rio Grande do Norte, no semestre letivo 2006.2 tem como foco principal a criatividade potico-artstica ligada produo de esculturas e, por conseguinte, peas cermicas de um dos maiores nomes do campo artstico do ltimo sculo.

A relevncia das obras artsticas de Picasso evidencia o carter singular de sua carreira ao longo de dcadas, sua inventividade, criatividade herclea, sabedoria mgica e estilo nomdico par excellence. Por isso mesmo, como veremos, sua produo nas artes da escultura e da cermica mantm um certo continuum com relao a suas outras manifestaes criadoras, como o desenho e a pintura, no sentido de que no manifesta nenhum estilo consumado ou acabado. As linhas de experimentao do espanhol se vo no espao liso povoadas de invenes maravilhosas, criao de estilos mutantes, renovadores do esprito incansvel do artista, rompendo barreiras at ento intocveis, fazendo de seu ofcio um misto de desconstrucionismo e inventividade nmade.

Picasso conhecidamente um pintor que galgou inmeros estilos pictricos, sendo ele mesmo um inovador radicalmente peculiar, como pode ser ilustrado, por exemplo, pelo caso da inveno da representao pictural denominada cubismo. Seu esprito profundamente indomvel, evidenciado claramente por uma simples retrospectiva de sua produo artstica ao longo dos anos, pode oferecer-nos uma imagem do que o artista representa para o sculo XX, tanto nas investigaes de materiais aplicados consecuo das obras de arte, quanto no seu modo de apresentao e nisso se insere tanto a pintura, quanto a escultura e a cermica.

Para efeito de apresentao do trabalho aqui exposto, dividiremos o corpo do texto em trs partes, sendo a primeira delas uma espcie de biografia do incio da carreira do artista, na qual exporemos o que os estudiosos da histria da arte classificam como os perodos azul e rosa, alm de uma pequena incurso pelas inovaes representacionais advindas da inveno do cubismo. Em seguida, na segunda parte, j nos referindo propriamente atividade criadora atrelada escultura, propriamente dita, indicaremos o resultado dos estudos bibliogrficos realizados com o intuito de apresentar sucintamente, como o caso, a relao que o artista manteve com a arte das trs dimenses por excelncia, a escultura, alm, claro, de sua relao com a arte cermica. Tendo por fim, uma concluso na qual algumas outras reflexes so elaboradas, como aprendizados proporcionados tanto pela feitura e estudos caros escritura deste trabalho escrito, quanto uma reflexo sobre a prxis artstica desenvolvida na disciplina ministrada pelo Professor Luiz Menezes.

Pablo Picasso e a arte pictrica

Pablo Ruiz Picasso nasce a 25 de outubro de 1881, em Mlaga, como primeiro filho de Don Jos Ruiz Blasco e de sua mulher Dona Mara Picasso y Lopez. Desde cedo, ainda quando criana, incentivado pelo pai a desenvolver os dotes artsticos de desenho e pintura. Seu pai ganhava a vida como professor de arte, e logo muito cedo invocava a paixo pela criao artstica em seu filho. De modo que, por volta dos 13 anos de idade, o prdigo jovem j havia alcanado um amadurecimento singular no aprendizado nas pinturas, a tal ponto de seu pai dar-lhe a paleta e os pincis com que trabalhava, todo o seu material de pintor fora passado para o filho, como ato simblico, prometendo desde ento no mais pintar, pois teria se realizado com a arte do jovem filho talentoso.

Os dez primeiros anos de sua vida, Pablo Picasso viveu em Mlaga, sua cidade natal. Logo em seguida, ao completar quatorze anos de idade, j conseguia satisfazer as exigncias de uma academia conceituada. Por essa poca, entre os anos 1895-1896, pintou seu primeiro trabalho a leo, intitulado A primeira comunho (fig. 1), pincelado com o objetivo de representar fielmente as cores que se via, afeitas a um realismo sensvel com a temtica simbolizada. Esse quadro chegou a ser exposto em conjunto com pinturas de precursores artsticos como Santiago Rusiol e Isidro Nonell na mais famosa exposio da poca em Barcelona.

Na sua juventude, ao se afastar do lar dos pais, ala vos independentes motivado ainda mais por viagens a Mlaga e Madrid, local onde instala um novo atelier, chegando a se inscrever na mais conceituada academia espanhola, San Fernando. Em suas andanas, em busca de estudar as belas artes da regio, logo pego pela intuio imaginria ao encarar as artes expostas no Museu Prado. Mas sua estadia em Madrid foi interrompida abruptamente. Prejudicado por escarlatina, Picasso chega inclusive a viajar a Horta de Ebro, nas montanhas, instalando-se na casa de um amigo, local que o abriga para a recuperao da doena de que foi acometido.

Retornando na primavera de 1899 a Barcelona, o gnio artista j inspirado pelas evolues na pintura espanhola, no tardou por entrar nos meios artsticos modernistas da poca. O local de encontro era o cabar Els Quatre Gats, no qual artistas se encontravam para muita conversa e troca de influncias, pintores, poetas e afins s belas artes e s bebedeiras poticas. Em 1900, aos dezenove anos, faz sua primeira exposio nas instalaes do caf.

Por essa poca, seus planos j vislumbravam a viagem Frana, alm da tentativa de manter uma publicao de artes, cujo fim logo se viu chegar, pois no foram publicados mais do que poucos nmeros iniciais. Mas isso no abalava o gnio grandioso do jovem pintor. Ele queria mais, no suportava o ar provincialesco de sua ptria. Sonhava com as cores de Paris, at que em maio de 1901 seu sonho se realizou. Acompanhado de seu fiel amigo e tambm pintor, Carlos Casagemas, chegaram metrpole das belas artes, Paris, na qual o modernismo espanhol havia encontrado as suas razes de influncias. No tardou para que Picasso incorporasse os novos aprendizados advindos das investigaes nas pinturas mais modernas. Em menos de um ano j havia conhecido as telas de Edgar Degas, Henri Tolouse-Lautrec e Paul Czanne. Num tal ambiente, o jovem pintor encantava-se com os ares libertinos comparativamente a sua terra natal. Embevecido pelas cores das vanguardas modernistas que ali tinham seu solo amadurecido, Picasso imaginava que seria o mais moderno dos modernos, pensamento que, sem dvida, orgulhosamente conseguiu realizar.

Nessa pocas, a beleza que buscava, a inspirao de que era acometido diariamente, fazia-o pintar cerca de trs quadros a leo por dia, numa produo inventiva bastante considervel. O artista j havia encantado at mesmo um jovem galerista, de nome Pedro Maach, que, entusiasmado com as pinturas de Pablo, props-lhe um contrato em troca de remessas regulares de algumas obras, o pintor recebia o equivalenten a 150 francos por ms.

Desde ento, Pablo Picasso se viu orientado a buscar seu prprio estilo, seu modo particular de expressar suas pinceladas e ambientar a psicogeografia pictural com uma paleta incomparvel.

A companhia do amigo Casagemas foi-lhe subitamente subtrada, devido ao fatdico suicdio do amigo de Barcelona, que no sendo correspondido num amor profundo, ps fim prpria vida num caf parisiense. Da em diante, com relao sua produo artstica, costuma-se falar da fase azul e rosa de Picasso, caracterizada pelas cores sorumbticas, expressas tambm por temas sombrios e melanclicos.

A fase azul comea com esse fato emotivo inigualvel. A morte do amigo havia desencadeado a fase azul. O pintor chegara a conceber a pintura no apenas como uma linguagem que se exprimia, pois, para ele, a pintura ensinava muito, fazia com que o mundo pudesse ser assimilado por meio da criao artstica. Uma desenvoltura aberta ao auto-descobrimento, o experimento consigo por meio da pintura, fez com que Picasso investigasse os sentimentos mais profundos do ser humano: as relaes inter-pessoais, o amparo emotivo de outrem, o abandono diante de um mundo estranho e alheio, a Vida e a Morte nuas, cruis e trgicas, feitas pinceladas nas telas mais enigmticas do gnio jovem pintor. De um tal processo de profunda reflexo acerca da vida, resultou trs retratos do amigo Casagemas, at chegar a conceber Evocao - O Funeral de Casagemas, do mesmo ano do suicdio do amigo, 1901 (fig. 2).

Nessa poca, os corpos lnguidos, o alongar da magreza expressa pelas figuras sensveis, tocadas pelo sentimento mais intimista, caracterizam as temticas povoadas pelas personagens que sonhara desperto, embevecido pela embriaguez lcida, ante as telas que coloria com os tons azuis. A pobreza e a doena pareciam espreitar tais personas enigmticas, que exprimiam o desamparo da condio humana, finita, desolada, e muitas vezes, fatdica.

A sensao de solido, o desejo de expressar blocos de sensaes inexprimveis por palavras, levaram o pintor a se debater com as figuras da desordem mental, o Caos vivenciado pela experincia artstica passara a ser evocada como algo constitutivo da experincia artstica mesma, sendo ela, a desordem, servindo at mesmo como estimulante, chegando realizao de altos feitios, desembocando no filosofar sobre a ordem e a desordem. Uma poca decerto conturbada para o esprito jovem de Pablo. Sua irrequietude f-lo produzir no muitos quadros, fazendo com que a mudana de stios expressasse uma certa busca, uma desero em direo ao experimental, ao fenomenal. Suas idas e vindas, de Barcelona a Paris, podem evocar a vontade de nomadizar suas vivncias to intensas.

Chegado o momento dos anos passarem, at que uma certa deciso possante e a valer, fez com que a retomada do flego pelo espanhol o fisesse assumir seu destino em Paris, na capital francesa. Ali conheceu poetas, freqentou crculos de vanguardas artsticas, pintou seus azuis e rseas. Encarou a vida conforme um decidido Sim. Os temas da solido, do amor, da condio humana diante da finitude, fizeram presenas encantatrias nos quadros do pintor.

Entre a fase azul e a rosa, podemos notar mudanas no somente nas composies formais, nos materiais da paleta e suas nuanas multifacetadas em tons sombrios. Fica claro que at mesmo as temticas e as figuras representativas das fases se distanciam a cada vez. Ao invs de mendigos, cegos, corpos franzinos e adoentados, que caracterizam a fase melanclica do azul variante, vemos um novo elenco povoar os quadros evocados pelas novas nuanas da paleta de Picasso. Encontram-se finos arlequins, saltimbancos, funmbulos, que vieram corroborar com uma sensao de avano na superao da melancolia aguda de que tinha sido tomado aquando a morte do amigo. Via-se tristes brincalhes querendo libertar-se do jugo da dor, ao mesmo tempo em que expressavam a triste vivncia experimentada pelos operrios do divertimento dos homens.

A tenso irresoluta entre a alegria e a tristeza se tornavam o centro emanador dos blocos de sensaes que Pablo pincelava a todo instante. Como se a pobreza e a depresso abrissem caminho a novas musas, novas cores, caras ao circo que o pintor freqentava na poca. Tais personas eram caras aos amigos da pintura, os poetas Apollinaire e outros, errantes aptridas, que, curiosamente, simpatizavam com os saltimbancos.

O quadro belssimo e de uma sensibilidade sem igual, intitulado A Famlia de Saltimbancos (Os Saltimbancos), data do ano de 1905, cujas dimenses de um leo sobre tela, 212,8 x 229,6 cm, atestam a tentativa de reproduo de personagens to grandes quanto o que seria o tamanho real. O fundo em tons areias aparentam um deserto de oceano areal, como que enquadrando a ambincia sensitiva dos personagens, nmades, sem destino ou rumo definido, mas ainda assim expressivos da vida que continua, com a velhice, o amadurecimento e a juventude, a prole composta de jovens crianas e uma mulher reflexiva e de olhar impvido ao canto direito (fig. 3).

Na fase seguinte da elaborao modernista de Picasso, uma das barreiras mais antigas da tradio das belas artes, a relao imitativa da perspectiva quatrocento, iria ser subvertida pelas investidas do pintor, com um modo muito particular para a poca de representar o espao e o tempo, a partir de novas perspectivas, inovadas pela percepo e argcia caras a Picasso.

No mais trs dimenses representadas pelas duas dimenses da tela, mas sim quatro dimenses, cinco ou quantas se quisesse. A nova maneira de representar figurativamente o espao transladava o costumeiro, caracterstico da tradio desde ao menos o Renascimento. Foi ento que o pintor fez vir abaixo um dos cones da representao ocidental, a perspectiva tridimensional. Ao invs dela, vemos a figura se fragmentar, se estilhaar em inmeros pedaos, agora em meio a uma figurao to particular quanto inovadora, na qual as dimenses se distendem, se confundem num mesmo plano que rompe com o modo fsico de representar o espao, como que incorporando o tempo, a simultaneidade e as dimenses em uma nica e mesma sincronia, capaz de levar a efeito inmeras perspectivas visuais at ento inditos.

O cubismo, como ficou conhecido, foi um estilo inventado pelo artista, tendo como cone dessa fase de sua pintura, o quadro Ls Demoiselles dAvignon, de 1907, um leo sobre tela, com dimenses 243,9 x 233,7 cm. Nesta obra prima do sculo XX, pode-se ver cinco figuras humanas distorcidas, pintadas de tal modo que mostram as influncias estticas advindas de mscaras africanas envoltas de um cenrio que se perde e se confunde com a superfcie representativa das prprias pessoas ali expressas. Com essa obra profundamente inovadora, Picasso sento ls bases de la primera revolucin del arte em el siglo XX (Cubismo, p. 7).

Os corpos fragmentados expressam essa nova esttica, capaz de inventar uma certa angstia sensvel, provocada decerto pela beleza rara que prope um novo paradigma artstico. Ento, no seria o momento de nos questionarmos se o cubismo seria um anti-paradigma? Talvez. O certo que durante alguns anos, Picasso desenvolveu essa forma de expresso at os ltimos limites. Cubismo analtico, cubismo sinttico, e tantos outros inominveis, compunham o cdigo semitico que passara por pinturas de pessoas conhecidas, naturezas mortas, paisagens pinceladas por linhas geomtricas, numa investigao experimental to frutfera, por assim dizer, que foi seguida por inmeros pintores da poca, fazendo escola em meio s vanguardas mais variegadas existentes na poca. A parceria que desenvolveu com Georges Braque, floresceu um sem nmeros de pinturas, quando Picasso j era aclamado pelo meio artstico europeu, momento a partir do qual crticos sagazes aproveitaram para retratar tais manifestaes radicais, investidas pelas pinceladas do espanhol, ora como algo absurdo, ora como arte incompreensvel, alm de fomentar debates muitas vezes infrutferos. Nas palavras do prprio artista,

El cubismo persigue objetivos plsticos. En l nicamente vemos un medio para expresar lo que percibimos con los ojos y con el espritu, aprovechando todas las posibilidades existentes en las caractersticas esenciales del dibujo y del color. Fue para nosostros una fuente de alegras inesperadas, una fuente de decubrimientos (Cubismo, p. 6).

Picasso como escultor

A carreira de Picasso como escultor sem estilo definido, como na pintura e no desenho, de modo varivel e at mesmo improdutivo durante certos perodos. Sua primeira escultura data de 1902, e uma composio de uma mulher sentada, parecida com as esculturas de Rodin, cujo ambiente emotivo expresso pelas formas artsticas do espanhol, manifestam uma profunda tristeza, cara a sua fase azul.

Em meados de 1906 e 1907, as incurses do artista pelas formas tridimensionais ganham formas mais inovadoras. No geral, as esculturas destes anos so figuras de madeira grosseiramente talhadas, sumariamente simplificadas nas suas formas femininas cujas influncias podem ser encontradas nas esculturas africanas, que muito agradavam ao interesse e gosto artstico de Picasso.

Essa espcie de retorno de Picasso s esculturas parece estar profundamente e diretamente relacionado com a descoberta dos seus quadros de colagens, os papiers colls, muito inovadores para a poca, uma vez que a bidimensionalidade das telas eram subvertidas com a insero de materiais colados por sobre a canvas, inventivo modo de incrementar o belo eterno com o efmero moderno, numa assemblagem deveras criativa.

Nessa altura das criaes e investigaes do artista, aventura-se tambm pelas construes de obras de arte um tanto curiosas. Uma srie de instrumentos musicais construdos com cartes, lato, arame, madeira pintada ou lato pintado e revirado, numa juno de vrios materiais diferentes, so colecionadas e esteticamente combinadas com o fim de compor um objeto de arte tridimensional, uma espcie especial de escultura que ganhava a luz com suas formas desembaraadas de quaisquer tradies.

De fato, um salto a mais na carreira de Pablo, com suas revolucionrias inovaes no campo da escultura no sculo XX. O teor dessa importncia pode ser vislumbrado pelas palavras de um estudioso da histria das artes, Ingo F. Walther:

Enquanto que as tcnicas plsticas tradicionais consistiam no construir de uma figura de barro e no destruir de um bloco de madeira ou pedra atravs do talhar, so criadas a partir de agora construes plsticas de estruturas variadas atravs do simples juntar de peas j prontas. Aqui comea de facto um novo captulo na escultura, a Escultura de Construo (Walther, Picasso, p. 46).

Nos anos seguintes, por volta de 1916, o artista se dedica quase que exclusivamente pintura, s cores multifacetadas na bidimensionalidade. Motivo pelo qual por volta de dez anos quase no se v obras tridimensionais propriamente de Picasso. Na verdade, deste perodo so conhecidas muito poucas esculturas suas.

Em meados de 1928, surgem novas investigaes artsticas por parte do gnio incontvel do espanhol. D-se incio a construes de obras construdas por arames e metais, cuja funo se inscrevia num plano de composio artstica que tentava moldar os materiais usados nessas esculturas com a inteno de levar tridimensionalidade, certas caractersticas da bidimensionalidade conseguida pelos pincis e lpis de desenhos; como possvel perceber numa tentativa de realizao no espao, quer dizer, na extenso geogrfica, do desenho linear de uma mulher baloiando. Algo como uma escultura sem massa e sem peso, desenhada no espao e flutuando no tempo aparentemente imvel, desenho e volume num casamento perfeito. Imagem forte e simptica invocada pea fora criativa do gnio de Pablo.

Mas suas obras tambm serviam para render homenagens a amigos, a refletir sobre acontecimentos histricos, como se sabe. Nessa poca, foi ento o momento oportuno encontrado pelo espanhol para louvar sua amizade com um grande poeta da Frana, o Guillaume Apollinaire, que havia falecido no ano de 1918.

As esculturas transparentes se apoderam do espao, representam em contrapartida mais um importante impulso para a histria da escultura, que viria a fecundar mesmo os maiores escultores (Walther, Picasso, p. 47).

Por volta de 1930, recomea outra vez a modelar sobretudo em barro e gesso. E suas esculturas desta poca mostram uma simplificao grosseira das formas que faz lembrar a idade da pedra. Como diz o estudioso,

No atelier de escultura de Boisgeloup so criados corpos de mulher feitos de rebordos pastosos, ligados negligentemente, cabeas monumentais compostas de formas esfricas que se sobrepem sobre pescoos distorcidamente longos, com narizes proeminentes em forma de rebordo (Walther, Picasso, p. 47).

De tantos inventos, tantas criaes, aps uma experincia intensivamente esgotada, volta a haver uma pausa neste tipo de criao plstica. Em 1943, entretanto, peas de metal, muitas delas encontradas ao acaso, formaro novas esculturas de composio fantasiosa. Em seguida, por meio de assemblagens, por volta de 1953, sero usadas tbuas pintadas e coloridas para a formao de obras esculturais de dimenses gigantescas at, alcanando vrios metros de altura.

Mas uma das obras mais importantes e conhecidas de Picasso, intitulada O homem com a ovelha, de 1944, foi composta com vrios materiais, seja barros, ls, peas achadas e tantas outras coisas servindo aqui para ilustrar a variegada maneira de trabalhar do artista multifacetado.

O modo de trabalhar do artista pode ser caracterizado pelo no repensar racional de efeitos grandiosos, mas a deciso espontnea e a sua execuo imediata, dominada pela emoo (Walther, Picasso, p. 48). Como possvel perceber nas suas esculturas feitas com objetos colecionados e j prontos, mtodo praticado na composio de esculturas com forte teor ldico-genial. Dir-se-ia que, a prxis artstica de Picasso pode ser caracterizada pelo mtodo bricoleur, figura mtica na Frana, caracterizada pela conexo de materiais disponveis, numa especial colagem de fragmentos ou objetos parciais muitas vezes usados tal como se apresentam, j prontos, para uma composio sinttica de teor estilstico, sem planejamento muito demorado, sendo mesmo algo um tanto improvisado, como se o pensamento e a intuio ocupassem o Fora, linha abstrata que vai ao desconhecido do pensamento, ocupando o espao liso como um turbilho de sensaes.

Com efeito, as suas ltimas esculturas so caracterizadas pelo retomar de formas planas e de superfcies pintadas e coloridas. Nos anos 1960, figuras monumentais em ao ou beto, chegam a alcanar alturas de mais de vinte metros! o que evidencia a obstinao do artista em querer sempre mais, o gnio de Picasso, que se caracterizou ao longo de toda a sua carreira artstica pelo nomadismo psquico, pinta a tela da vida com as cores mais lanscinantes de uma mquina artstica profundamente nomdica, instigada pelas inovaes e criaes mais inusitadas, capazes inclusive de subverter as tradies a muito custo mantidas por geraes.

Concluses

A obra de Picasso, como vimos, compreende uma variedade imensa de estilos e materiais utilizados na consecuo de peas artsticas. Devido versatilidade de sua produo tendo iniciado como pintor, mas tambm tendo escrito peas de teatro, passando pela estilizao de figurinos para outras peas teatrais, escreveu poemas, investiu habilidades no fabrico de esculturas e cermicas, alm de fazer cartazes, desenhos, litografias e tantas outras manifestaes estticas , Pablo Ruiz Picasso pode ser considerado um dos maiores gnios do sculo XX.

Com relao escultura, as inovaes levadas a termo pelo espanhol so de fundamental importncia para a histria das belas artes do ltimo sculo, e mesmo at de toda a longa trajetria das artes no Ocidente. Os mtodos de composio escultural feitos construes com materiais diversos, sendo que muitas vezes se utilizava de objetos j prontos, realizando uma sntese criadora ou assemblagem capaz de ornar os fragmentos com uma totalidade forjada, podia oferecer unidade da obra uma sutil ou extravagante capacidade de disposio esttica inovadora. O caso das esculturas transparentes, apresentada neste trabalho, representativo disso.

O desenvolvimento da pesquisa para a realizao deste trabalho nos proporcionou um importante saber sobre a vida e a obra do artista espanhol, bem como sobre parte da histria da arte, do ltimo sculo principalmente. O fato de tomar conhecimento sobre as singulares inovaes no fazer escultura, as possibilidades variegadas de usos de materiais para a composio tridimensional de uma obra de arte tambm foram deveras relevantes, uma vez que tais aprendizados proporcionados pela pesquisa bibliogrfica complementam aqueles estimulados ao longo do curso da disciplina Escultura.

A importncia da dedicao ao fazer artstico pode ser representada pela busca incessante de inovaes capazes de expressar esteticamente o inexprimvel, pela criao de um plano de composio que corta o Caos, dando-lhe cores e formas artsticas capazes de embelezar a vida.

Referncias bibliogrficas

Battistini, Matilde. Art Book Picasso: O gnio que resume a arte do sculo XX. Milo (Itlia): Nova Galicia Arte, 2001

Bernadac, Marie-Laure; Du Bouchet, Paule. Picasso, o sbio e o louco. Ed. Objetiva, s/d.

Gantefhrer-Trier, Anne. Cubismo. Madrid (Espaa): Taschen, 2004.

Harrison, Charles. Modernismo. So Paulo: Cosac & Naify Edies, 2001.

Schapiro, Meyer. A unidade da arte de Picasso. So Paulo: Cosac & Naify Edies, 2002.

Walther, Ingo F. Picasso. Taschen, 2000.

Anexos

PAGE 18