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PESQUISA EM SAÚDE COLETIVA 1 PESQUISA EM SAÚDE COLETIVA Evânia Leiros de Souza Grasiela Piuvezam Paulo Rocha de Medeiros Severina Alice da Costa Uchoa Themis Pinheiro (Organizadores)

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P E S Q U I S A E M S A Ú D E C O L E T I V A

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PESQUISAEM SAÚDECOLETIVA

Evânia Leiros de SouzaGrasiela PiuvezamPaulo Rocha de MedeirosSeverina Alice da Costa UchoaThemis Pinheiro(Organizadores)

REITORA

Ângela Maria Paiva Cruz

VICE-REITOR

José Daniel Diniz Melo

DIRETORIA ADMINISTRATIVA DA EDUFRN

Luis Passeggi (Diretor)Wilson Fernandes (Diretor Adjunto)

Judithe Albuquerque (Secretária)

CONSELHO EDITORIAL

Luis Passeggi (Presidente)Ana Karla Pessoa Peixoto Bezerra

Anna Emanuella Nelson dos S. C. da RochaAnne Cristine da Silva Dantas

Christianne Medeiros CavalcanteEdna Maria Rangel de SáEliane Marinho SorianoFábio Resende de Araújo

Francisco Dutra de Macedo FilhoFrancisco Wildson Confessor

George Dantas de AzevedoMaria Aniolly Queiroz Maia

Maria da Conceição F. B. S. PasseggiMaurício Roberto Campelo de Macedo

Nedja Suely FernandesPaulo Ricardo Porfírio do NascimentoPaulo Roberto Medeiros de Azevedo

Regina Simon da SilvaRichardson Naves Leão

Rosires Magali Bezerra de BarrosTânia Maria de Araújo Lima

Tarcísio Gomes FilhoTeodora de Araújo Alves

EDITORAÇÃO

Kamyla Alvares (Editora)Natália Melão (Colaboradora)Heloise Souza (Colaboradora)

REVISÃO Andreia BrazKarla Jisanny

DESIGN EDITORIAL

Michele Holanda (Coordenadora)Rafael Campos (Capa e Miolo)

Fotografias: Pexels

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PESQUISAEM SAÚDECOLETIVA

Todos os direitos desta edição reservados à EDUFRN – Editora da UFRNAv. Senador Salgado Filho, 3000 | Campus Universitário

Lagoa Nova | 59.078-970 | Natal/RN | Brasile-mail: [email protected] | www.editora.ufrn.br

Telefone: 84 3342 2221

Pesquisa em saúde coletiva [recurso eletrônico] / organizadores Evânia Leiros de Souza... [et. al.]. – Natal, RN : EDUFRN, 2018.

296 p. : PDF ; 2.546 Kb.

Vários autores Modo de acesso: http://repositorio.ufrn.br

ISBN 978-85-425-0781-2

1. Saúde pública – Pesquisa. 2. Pesquisa qualitativa. 3. Qualidade de vida. I. Souza, Evânia Leiros de.

CDD 614RN/UF/BCZM 2018/09 CDU 614.001.5

Coordenadoria de Processos Técnicos Catalogação da Publicação na Fonte.UFRN / Biblioteca Central Zila Mamede

Elaborado por Gersoneide de Souza Venceslau – CRB-15/311

NATAL 2018

Evânia Leiros de SouzaGrasiela Piuvezam

Paulo Rocha de MedeirosSeverina Alice da Costa Uchoa

Themis Pinheiro(Organizadores)

PESQUISAEM SAÚDECOLETIVA

SUMÁRIO

Parte 1- PESQUISAS QUALITATIVAS EM SAÚDE ........................ 10

1.1 A técnica de grupo focal como instrumento metodológico de pesquisas qualitativas: do planejamento à análise dos dados ...............11Iris do Céu Clara Costa, Renata Paula Costa Trigueiro, Antônio Medeiros Júnior, Cláudia Christianne Barros de Melo Medeiros

1.2 Perspectivas metodológicas na área da saúde usando representações sociais ...................................................................35Antônio Medeiros Júnior, Ângela Maria Paiva Cruz, Iris do Céu Clara Costa, Renata Paula Costa Trigueiro, Francijane Diniz de Oliveira

1.3 Perfil multidimensional de diabéticos residentes em uma área coberta pela estratégia de saúde da família da região oeste de Natal – RN, Brasil .......................................................67Antônio Medeiros Júnior, Amanda Maria de Jesus Ferreira, Diana Paula de Souza Rêgo Pinto, Amanda Samara Davi de Lima, Bruna Alice de Lima Dias, Lenígia Maria de Alencar, Janmille Valdino da Silva

1.4 Longevidade e qualidade de vida .......................................................94Kenio Costa Lima, Flávia Cristiane de Azevedo Machado, Maria Regina de Macêdo Costa

1.5 Biossegurança, percepções e vivências de estudantes de odontologia sobre o atendimento ao paciente HIV positivo ..............112 Iris do Céu Clara Costa, Arthur Costa Rodrigues Farias, Georgia Costa de Araújo Souza, Antônio Medeiros Júnior, Cláudia Christiane Barros de Melo Medeiros

Parte 2 - PESQUISAS QUANTITATIVAS EM SAÚDE .................. 137

2.1 Qualidade de vida e sofrimento psíquico em professores do ensino público de Natal-RN, Brasil ................................................ 138Maurício Roberto Campelo de Macedo, Isa Maria Hetzel de Macedo,Grasiela Piuvezam, Daniele Brandão, Larissa da Silva, Marina Arruda Câmara, Miguel Rogério Segundo

2.2 Estudo transversal retrospectivo dos efeitos adversos para portadores de esquizofrência usuários de antipsicóticos atípicos Olanzapina e Risperidona......................................................... 161Gerlane Coelho Bernardo Guerra, Aurigena Antunes de Araújo, Katarina Melo Chaves, Susana Barbosa Ribeiro,Vanessa de Lima Silva, Grasiela Piuvezam

2.3 Enxaqueca e qualidade de vida em estudantes universitários .................................................................. 185

Maurício Roberto Campelo de Macedo, Isa Maria Hetzel de MacedoGrasiela Piuvezam, Ana Luísa Chaves de Oliveira, Érika Gabrielle Pinheiro Ximenes, Samara Camilo de Oliveira, Thiago Carlos

2.4 Perfil epidemiológico e fatores associados à utilização de medicamentos entre professores da rede pública de ensino na cidade de Natal, RN, Brasil ................................................................................ 199Grasiela Piuvezam, Gerlane Coelho Bernardo Guerra, Aurigena Antunes de Araújo, Juliana B. Cunha, Antônio C. Santos JúniorKenio O. A. Formiga, Nilce A. S. Santos

2.5 Distúrbios do sono e Burnout em professoresdo ensino fundamental ........................................................................... 222 John Fontenele Araujo, Grasiela Piuvezam, Hilkéa Carla de Souza Medeiros Lima, Jéssica Santos de Medeiros, Maria Luisa Nobre Medeiros e Silva, Layra Ribeiro de Sousa Leão

2.6 Aspectos relacionados à atuação do gestor na rede hospitalar ................................................... 242Vilani Medeiros de A. Nunes, Denise Nieuwenhoff Cardoso Ribeiro,Kyra Kadma Silva Fernandes de Medeiros, Laís Karen da Silva Magalhães, Priscylla Paiva de Lima, Yaracely Fernandes Mendes

2.7 Estudo epidemiológico do adenocarcinoma colorretal: análise de casos em hospital do Rio Grande do Norte ........... 260Raimundo Araújo Júnior, Isa Maria Hetzel de Macedo, Grasiela Piuvezam, Marília de Almeida Cardoso, Lilian Vital Pinheiro, Francisco Jakson Benigno Cavalcanti, Marcelo Cândido de Andrade Leitão

Autores ................................................................................... 275

Parte 1

PESQUISAS QUALITATIVAS

EM SAÚDE

1.1 A TÉCNICA DE GRUPO FOCAL COMO INSTRUMENTO

METODOLÓGICO DE PESQUISAS QUALITATIVAS:

DO PLANEJAMENTO À ANÁLISE DOS DADOS

Iris do Céu Clara CostaRenata Paula Costa Trigueiro

Antônio Medeiros JúniorCláudia Christianne Barros de Melo Medeiros

1.1.1 Retrospectiva histórica do uso do grupo focal

A técnica do grupo focal foi idealizada na década de 1950, pelo cientista social Robert Merton, juntamente com Fiske e Kendall, numa pesquisa a respeito da força do convencimento da propaganda, durante a Segunda Guerra Mundial. Apesar de terem usado essa técnica em outras pesquisas, praticamente não publicaram os resultados subsequentes, o que provavelmente levou-a a ficar relativamente esquecida durante algum tempo1.

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A respeito da técnica propriamente dita, a Psicologia Social e a Mercadologia reacenderam o seu uso nos últimos trinta anos. Paralelamente, as Ciências Sociais Aplicadas que utilizavam de forma mais frequente a observação participante e as entrevistas semiestruturadas, voltaram a utilizar as entrevistas em grupo, re-descobrindo a utilização dessa técnica qualitativa, que é ao mes-mo tempo uma entrevista em grupo e em profundidade, pelas ca-racterísticas e condições que proporciona para tal1,2. A técnica de grupo focal se estendeu para a área da saúde, especialmente, para a área de saúde internacional (para o entendimento das grandes epidemias e do reaparecimento de doenças já erradicadas), para a área de saúde familiar e, mais recentemente, para a área de saúde coletiva. Essa técnica envolve a abordagem, a organização e a con-dução de vários grupos de discussão, com o objetivo de uma me-lhor compreensão de atitudes, de comportamentos, e de práticas e valores, a respeito de um determinado assunto ou tema, comum a todos os componentes do grupo1,2,3,4 .

Embora seja uma técnica bastante antiga, uma vez que é uti-lizada em pesquisas mercadológicas, desde os anos de 1950, o uso do grupo focal no setor da saúde é relativamente recente. A partir dos anos de 1980, outras áreas do conhecimento como a Ergono-mia, a Ciência da Informação e as Ciências Médicas de uma forma geral, além das Ciências Sociais, passaram a utilizar essa técnica nas suas pesquisas5. Pode-se afirmar que mais recentemente, nos anos de 1990, e início deste novo século, na área da saúde, o seu uso foi intensificado e tem crescido enormemente o número de

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pesquisas que utiliza a técnica de coleta de dados, tanto sozinha, quanto associada a outros métodos qualitativos, como observação participante, surveys, outras formas de entrevista, técnica de asso-ciação livre de palavras, entre outros métodos6.

A partir de então, em função de suas características, vantagens e desvantagens que serão discutidas adiante neste capítulo, a Técni-ca de Grupo Focal foi incorporada por epidemiologistas, educado-res em saúde e por extensão a toda a área da Saúde Coletiva.

1.1.2 Características e utilizações do grupo focal

Como técnica de pesquisa qualitativa, o grupo focal tem

sido utilizado para se pesquisar temas mais variados, tais como: avaliação de serviços e de profissionais de saúde, uso de drogas, imunização, câncer, sexualidade, planejamento familiar, crenças populares, entre tantos outros temas. O grupo focal é uma técnica de pesquisa que proporciona obter dados de natureza qualitativa, por meio de grupos de discussão. O número de componentes de cada grupo pode variar de 6 a 15 pessoas que compartilham ca-racterísticas comuns, como gravidez, sexo, faixa etária, ocupação etc., que trocam ideias e experiências sobre um tema, que naquele momento serve de elo entre essas pessoas, tornando-as unidas por um foco comum 7,8.

Essa técnica faz uso das sessões grupais, como um espaço fa-cilitador da expressão de características culturais e psicossociais.

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Ela pressupõe a obtenção de dados, por meio de discussões cui-dadosamente planejadas, nas quais seus participantes expressam crenças, percepções, valores, expectativas, anseios, receios, atitu-des, dos seus universos cultural e vocabular, que compõem as suas percepções, a respeito de um determinado assunto, num ambien-te informal e descontraído. O grupo focal é reconhecidamente o método de se obter informações, por meio da livre expressão de falas e pensamentos, além das reações espontâneas que ocorrem de maneira informal1.

De todas as suas características, a dinâmica e a flexibilidade são as que mais motivam e chamam a atenção nessa técnica. Ela não se restringe à simples alternância entre as perguntas do pes-quisador e as respostas dos participantes. Ao contrário, permite uma dinâmica interação entre pesquisador e entrevistados. O gru-po focal permite a realização de entrevistas em profundidade, em que o tempo necessário para a coleta e análise dos dados, embora otimizado, nem sempre pode ser estabelecido cronometricamente.

O propósito do grupo focal é fazer comparações de segmen-tos distintos da população, a partir de características comuns como sexo, idade, estado de saúde, grupo étnico, condição socioeconômi-ca, agravo que sejam portadores, entre outras características. A aná-lise escrita de cada questão do roteiro de discussão deverá ser feita uma a uma pelo próprio pesquisador logo depois da discussão, para que ele avalie se cada uma delas foi devidamente contemplada e sinta ou não a necessidade de realizar outros encontros para alcance dos objetivos da pesquisa. Outra característica importante, a inte-

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ração social que ocorre nos grupos focais, proporcionada pela troca de experiências, desperta novas ideias e descobertas, promovendo um crescimento individual e coletivo, a partir da descontração e espontaneidade que caracterizam essa técnica9.

O grupo focal pode também ser usado como complementação de pesquisas com abordagem quantitativa para compreensão de al-guns pontos apresentados nos resultados, que estejam obscuros ou pouco esclarecedores. Diz-se nessa situação que o pesquisador está fazendo pesquisa investigativa, quando ele inclui num grupo focal, pessoas que individualmente possam explicar partes do problema. O moderador/pesquisador atua nesses casos como um detetive, juntando as peças do quebra-cabeça e preenchendo as lacunas dei-xadas por outras técnicas como questionários, entrevistas indivi-duais, observação e outros instrumentos de coleta utilizados10.

Essa técnica pode também ser usada na geração de novas ideias, conceitos, serviços ou produtos. Nesse caso específico, os participantes são solicitados a darem opiniões sobre um produto ou serviço, sugerindo modificações que possam trazer melhorias. Como todos participam, concordando, discordando ou modifi-cando a ideia do outro, tornando-a mais clara e explícita, ganha-se tempo no projeto de novos produtos e serviços, atendendo mais rapidamente as expectativas dos usuários reais11.

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1.1.3 Do planejamento à análise dos dados:

pontos fundamentais

Partindo-se do princípio essencial do planejamento de qual-quer atividade, duas perguntas básicas deverão ser respondidas na montagem, na condução e na análise de dados do grupo focal: “qual o tempo para realização da pesquisa?” “e quais os recursos financeiros disponíveis para executá-la?”. A partir dessas definições, podemos enumerar alguns pontos importantes, tais como: a) recru-tamento e número de participantes por grupo; b) escolha do mo-derador/observador; c) recursos a serem usados para o registro das sessões como filmagens e uso do gravador; d) local e tempo para realização dos encontros do(s) grupo(s); e) transcrição das entre-vistas; e finalmente, o item f) análise dos dados obtidos.

a) Recrutamento, número de participantes por grupo e nú-mero de sessões

Sobre o recrutamento dos participantes, é ponto pacífico e fundamental ressaltar que, a pesquisa com abordagem qualitativa, (e como uma das suas técnicas, o grupo focal) não tem base proba-bilística e nem a prerrogativa de inferência dos resultados encontra-dos na população em geral. Os dados obtidos por essa técnica em cada pesquisa referem-se apenas, e tão somente, ao entendimento do tema em foco na visão do grupo que está sendo estudado.

No recrutamento dos participantes, deve ser evitado colocar no mesmo grupo, pessoas do mesmo círculo de convivência ou

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amizade, pois se essa técnica tem a perspectiva de cruzar as per-cepções, as opiniões, as atitudes de seus participantes, sobre um fato, evento, fenômeno, produto ou serviço, e se essas pessoas já se conhecem, de certa forma já compartilham alguns pontos do seu ideário, do seu imaginário e, portanto, pouco teriam a trocar no processo de enriquecimento mútuo que o grupo proporciona. Por outro lado, colocar no mesmo grupo pessoas muito divergentes, pode fazer surgir opiniões muito polêmicas, que, inevitavelmente, acabam atrapalhando o andamento do grupo, pelo enfrentamento e provocações interpessoais que podem ocorrer.

Observados esses pontos, o recrutamento poderá ser feito pelo telefone, por anúncios em jornais de circulação local, por cartazes colocados em pontos estratégicos como murais de centros de saúde ou ambulatórios, por exemplo, ou ainda por meio de informantes-chave, que façam parte da população que esteja sendo estudada. Com relação ao número de grupos que precisam ser formados, varia muito segundo a literatura, em função dos objetivos da pes-quisa. Entretanto, existe um consenso aparente entre a maioria dos autores1,3,7,8,10,12, de que quando os participantes têm características etnográficas semelhantes como gênero, faixa etária, classe social etc., um mínimo de 4 grupos focais é suficiente. Cada caso deve ser analisado particularmente, levando-se em conta esses critérios. Uma coisa é clara: observa-se que, embora as pessoas não se conhe-çam, o fato de estarem unidas, ou terem sido agrupadas em função de um foco ou ponto comum a todas elas, torna o encontro bastante enriquecedor, no que tange ao aprofundamento das discussões.

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Quanto ao número de participantes por grupo, a literatura coloca: 6, 8, 10, 12 e até 15 componentes. Os de 12 e 15 pessoas tornam-se inviáveis, tanto na condução das discussões, quanto nas transcrições das falas, que se tornam inaudíveis em alguns momentos, dificultando a compreensão plena do contexto12. Aqueles com 8 e 10 componentes têm momentos de fácil condu-ção e outros, um tanto quanto tumultuados. Nesses casos, o mo-derador deve ter pulso firme para não perder o controle da situa-ção quando trabalha com grupos maiores. Sendo assim, depois de várias experimentações descritas na literatura, 6 é o número ideal de componentes para cada grupo, por possibilitar um controle do pesquisador, tanto no que se refere aos questionamentos, quanto na observação do ambiente de discussão, na estimulação à parti-cipação de todos, sem contar na redução e melhor organização do trabalho de transcrição das entrevistas12.

Sobre o número de sessões necessárias à exploração completa do tema, tudo depende do desempenho do grupo, da performance do moderador, do desenrolar das discussões e do nível de aprofun-damento que se deseja alcançar. O fundamental é estar atento aos objetivos do estudo e se o roteiro ou conjunto de tópicos, estrutu-rado para nortear a discussão do grupo focal está em consonância direta com esses objetivos, ou seja, a construção de qualquer ins-trumento de coleta deverá estar na mais perfeita harmonia com os objetivos, ou construído em função deles. Além disso, o critério de saturação ou redundância, na maioria das vezes, ajuda a definir o número de sessões necessárias. O chamado critério de saturação ou

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redundância consiste naquele momento em que os argumentos e respostas começam a se repetir, significando que, entrevistar uma maior quantidade de novos indivíduos, pouco ou nada acrescenta-ria ao conteúdo esperado das respostas1,9,13-15.

Importante lembrar que o fornecimento de algum incenti-vo como lanche após as sessões, sorteios de brindes, doação de vales-transportes para deslocamento nos dias dos encontros do grupo etc., possibilitam o sucesso do recrutamento, considerando que o interesse maior que as pessoas participem é do pesquisador. Portanto, ele tem que usar técnicas de motivação e convencimen-to para que as pessoas compareçam aos encontros. Finalmente, ressalta-se que qualquer que seja a forma de recrutamento esco-lhida, deve-se recrutar 20% a mais de pessoas, que possam suprir ausências inesperadas de alguns sujeitos, sob pena de inviabilizar a sessão pela falta de vários componentes ao mesmo tempo1,12,15.

b) Escolha do moderador/observador

Como se sabe, o grupo é norteado por um moderador, que representa o elemento fundamental para o bom desempenho dos trabalhos e tem a difícil tarefa de conduzir o grupo, ultrapassan-do o nível superficial e defensivo, normal quando pessoas des-conhecidas estão reunidas, mas sempre buscando resgatar o lado autêntico de cada participante. O moderador propõe aos partici-pantes várias questões, previamente testadas. A ele, cabe estimular a participação de todos e de cada um, para expressarem livre e es-pontaneamente seus sentimentos e opiniões sobre cada ponto de

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discussão. Além da estimulação, o moderador deve manter o foco da discussão, fazendo resumos quando necessário e retomando o assunto quando há dispersões12,15.

Em pesquisas acadêmicas, o próprio pesquisador assume o pa-pel de moderador, embora com a recente popularidade dessa técni-ca, já existam no mercado dos grandes centros urbanos, empresas especializadas em serviços de moderação para grupos focais.

A principal função do moderador é garantir de forma discreta e ao mesmo tempo firme, que o grupo não se perca em devaneios, trazendo-o de volta ao assunto em foco com objetividade, de ma-neira que a discussão cubra o roteiro preestabelecido, que por sua vez deverá contemplar os objetivos do estudo da forma mais direta possível. O trabalho do moderador, na verdade, começa quando o primeiro participante chega na sala de discussão. É responsabili-dade dele e quiçá do seu assistente (que poderá ser o observador) chegar antes de todos. Jamais chegar atrasado é sua primeira obri-gação com relação ao grupo, até mesmo para dar o exemplo, sem contar que deverá criar um clima agradável de espera, recebendo com cordialidade cada componente, interagindo com cada um e evitando que em conversas paralelas entre os membros do grupo antes do início da sessão o tema seja discutido, o que de certa for-ma, esvaziaria o calor das discussões. Uma estratégia é induzir as pessoas a conversarem sobre assuntos amenos, ou assuntos que foram alvo de alguma reportagem no dia anterior nos jornais da cidade, ou de alguma matéria de reportagem na televisão12.

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Outra sugestão para controlar esses momentos de espera con-siste em usar uma música ambiente suave, de preferência orques-trada, executada em volume baixo, para produzir certo relaxamen-to das tensões, tão comum no encontro de pessoas desconhecidas. Além disso, é interessante aproveitar esses instantes para o preen-chimento de uma ficha de cadastro, com informações básicas do participante (idade, sexo, profissão, telefone para contato, e-mail etc.), para um controle do grupo pela equipe de pesquisa12.

Estando presente todo o grupo, os trabalhos deverão ser ini-ciados pela apresentação pessoal do moderador, o qual deverá ex-plicar em primeiro lugar e sucintamente, os objetivos da pesquisa e o porquê do trabalho em grupo, isto é, da escolha da técnica. Isso deve ser feito de forma direta, objetiva e sem excessos de de-talhes. Em seguida, o moderador deve explicar ao grupo as regras de funcionamento, explicitando que apesar deles (os participan-tes), estarem ali “unidos” por um problema ou “foco” comum, não se espera que necessariamente que haja consenso de opiniões. Ao contrário, a divergência das expectativas a respeito do tema, bem como as experiências vividas, que são únicas e individuais, são extremamente bem-vindas e enriquecedoras para o propósito do estudo. Deve-se então fazer uma rodada de apresentações, para ajudar a quebrar o gelo inicial. Terminadas as apresentações, a ex-ploração do foco de estudo deve ser iniciada e não se deve permi-tir a partir daí a entrada de mais ninguém, o que só atrapalharia e quebraria o ritmo da discussão12.

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O moderador tem a liberdade para modificar a ordem das questões, bem como sua redação, objetivando o aprofundamento das respostas, e deverá a todo o momento estimular a participa-ção dos sujeitos, evitando respostas breves como sim ou não, con-cordo ou discordo, possibilitando ainda a discussão de conflitos e pontos de estrangulamento, que podem enriquecer o que foi dis-cutido. Ele deve promover a discussão sem se dirigir diretamente a este ou aquele participante, para que o grupo focal não se trans-forme, de repente, numa série de entrevistas individuais. O seu papel é mais passivo nesse sentido. Ele deve ser o mais instigador e motivador possível, promovendo a sinergia e não o consenso entre as pessoas. Poderá até haver consenso, mas não compulso-riamente. Quanto mais ideias surgirem, melhores e mais ricos são os resultados, e, portanto, mais próximos estaremos dos objetivos de interação a partir desse instrumento de coleta de dados.

Nessa técnica destaca-se também a figura do observador que, nas pesquisas acadêmicas, é um auxiliar, um anotador, ou assis-tente importante do moderador, cuja principal função é captar e anotar informações não verbais e outras ocorrências expressas e vivenciadas pelo grupo, as quais poderão ajudar o moderador a analisar e a compreender possíveis entraves na condução das ses-sões, além de observar a conduta do grupo, anotando ou descre-vendo acontecimentos que fujam ao controle do moderador1,10,12.

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c) Recursos usados

Pode-se usar para registro dos dados tanto a filmagem quanto a gravação, ou ambas. Entretanto, a partir da Resolução 196/96 do Conselho Nacional de Saúde, em todas as pesquisas que envolvam seres humanos, mesmo aquelas cujo instrumento de coleta seja apenas uma entrevista, para que as sessões do grupo sejam grava-das e/ou filmadas, o moderador/pesquisador deverá ter a permis-são prévia dos participantes por meio da assinatura do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE), garantindo o anoni-mato e a não exposição dessas pessoas a fatores de risco à saúde, isto é, respeitando-se e preservando-se os direitos dos cidadãos, sendo isso fundamental em qualquer trabalho científico, além de serem respeitados esses direitos em todas as fases da pesquisa12,16.

Partindo do princípio da discussão “focada” num tema gera-dor, é interessante que o roteiro dessa discussão tenha sido pen-sado previamente e que contenha no máximo cinco tópicos ou “perguntas geradoras”. Outro ponto recomendável é que esses tó-picos não devam ser colocados rigidamente para o grupo como uma pergunta, mas de forma sutil, como uma “dica”, um estímulo para se comentar ou descrever uma experiência vivida a respei-to do assunto. Essa não rigidez das perguntas geradoras deve ser entendida como um pouco de flexibilidade para pequenas modi-ficações no decorrer da sessão, em função de fatos ou ocorrências pertinentes. Além de “perguntas geradoras”, podem ser usadas

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outras técnicas estimuladoras como cartazes, gravuras, filmes etc., algo sucinto, mas objetivo o suficiente para estimular ou motivar a discussão12,16.

Na condução da discussão o moderador poderá quando achar necessário, pedir esclarecimento ou aprofundamento de al-gum ponto não suficientemente entendido. Ele somente deve lan-çar o tópico seguinte quando achar que o anterior já foi esgotado, estimulando as pessoas tímidas e controlando os tipos dominado-res que inibem os outros participantes “falando pelos cotovelos”. Na finalização da discussão, o moderador deverá organizar uma rodada de fechamento, estimulando comentários adicionais por parte de cada um, pois se o tema é interessante e a discussão aca-lorada, nesses momentos finais, é possível surgir alguma perspec-tiva inovadora e enfática sobre o tema discutido12,16.

d) Local e tempo para realização dos encontros do grupo focal

Sobre o local para a realização dos encontros do grupo, o ideal é que seja neutro a todos os participantes. Entenda-se essa neutralidade como um ambiente não coercitivo, em que as pes-soas não se sintam coagidas ou inibidas em função do ambiente. Por exemplo: se estivermos avaliando a oferta de serviços de uma Unidade de Saúde, a área física desta Unidade não serviria para a realização das sessões, porque os participantes poderiam se sentir constrangidos de falar a verdade e serem ouvidos por algum fun-cionário da Unidade, que num momento futuro, poderia revidar negando-lhes o acesso a uma consulta ou a qualquer outro pro-

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cedimento. Outras características do local é que seja acessível no que se refere ao deslocamento das pessoas até lá; que seja calmo; sem interferências de ruídos e barulhos externos, como telefones, campainhas etc.; com silêncio e privacidade necessários à obten-ção de uma boa gravação, audível o suficiente para permitir uma transcrição fiel do que foi discutido. Para maior comodidade dos participantes, o local deverá dispor de uma mesa retangular ou oval, que permita manter o gravador no centro, equidistante de todos os participantes, e que tenha cadeiras minimamente confor-táveis, que possam manter as pessoas discutindo entre uma hora, uma hora e meia (tempo médio estimado para duração de cada sessão), sem cansaço ou desconfortos físicos.

e) Transcrição das entrevistas

Para ser a mais próxima possível do real, a transcrição deverá ser feita conjuntamente pelo moderador e observador, para que um auxilie o outro a compreender as falas, correlacionando-as com as reações e/ou expressões anotadas. Quem falou e o que fa-lou; que perguntas causaram desconforto; quais as perguntas que o grupo mais valorizou etc. É importante cruzar as anotações do observador com a transcrição das discussões para que nenhum detalhe seja perdido. Boa parte dos autores que utiliza essa técni-ca refere-se à transcrição como sendo a parte mais difícil da sua execução. De fato, a transcrição das entrevistas é o ponto mais laborioso e demorado no emprego dessa técnica, vez que uma boa transcrição é o ponto essencial para que tudo que foi dito possa

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ser considerado. Essa tarefa não é difícil, mas cansativa e de muita labuta para a qual o pesquisador, poderá ou não buscar auxílio, uma vez que existem profissionais especializados nessa função12.

f) Análise dos dados

Sobre a análise dos dados, uma vez transcritas as entrevistas e de posse de todo o material gerado, existem várias técnicas que poderão ser utilizadas, desde aquelas especialmente criadas para analisar dados oriundos de abordagens qualitativas como a Aná-lise de Conteúdo17, os Sumários Etnográficos, a Técnica de identi-ficação de palavras-chave no contexto, até a utilização de técnicas de análise, a partir do uso de softwares como o Anthropac, o Eth-nograph15 e ainda de softwares especialmente usados para ana-lisar dados textuais como o ALCESTE18, o Tri-Deux-Mot19 (que combina a análise qualitativa com a quantitativa, fazendo inclusi-ve análise fatorial de correspondência das categorias e/ou de va-riáveis) e tantos outros que estão no mercado com essa finalidade. Existe ainda um software, o EVOC20, cuja utilização é muito co-mum quando o marco conceitual usado na pesquisa é a Teoria das Representações Sociais associada à Teoria do Núcleo Central14.

É importante ressaltar que nenhuma técnica de análise exclui a outra e nem se basta por si só. Além disso, a combinação de técnicas de análise funciona como uma validação entre si. Não a validação com significado estatístico, mas a checagem dupla ou coocorrência dos dados numa reanálise. Essa complementação

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melhora os níveis de compreensão dos fenômenos estudados e possibilita ampliar as formas de interpretação do conhecimento surgido por ocasião de uma pesquisa21, 22.

1.1.4 Vantagens e desvantagens do grupo focal

O grupo focal possui diversas vantagens. Entre tantas ou-tras, pode-se ressaltar que os participantes expressam suas ideias de maneira espontânea, além de ser conduzido em pequenos es-paços de tempo e com custo bem reduzido. Pela facilidade de utilização, pode ser empregado por pesquisadores que não te-nham formação específica em Ciências Sociais, o que se torna um aspecto relevante para sua utilização por pesquisadores de todas as áreas do conhecimento.

No que se refere ao uso dessa técnica, ela também é usada para se apreender crenças, valores, preconceitos, entre outros com-ponentes que constituem as Representações Sociais (RS), e tem uma grande vantagem em particular: possibilita entrevistar várias pessoas ao mesmo tempo, de forma dinâmica e interativa23,24.

Segundo Costa12, não é a participação em grupo que muda a posição cultural, do ideário e imaginário de um sujeito. Nos seus achados de pesquisa, a autora percebeu que cada sujeito tinha os seus valores, suas crenças etc., de tal forma arraigadas, que não era a conversa no grupo que o fazia mudá-las. Ao contrário, cada um defendia muitas vezes de forma veemente, o que realmente achava e sentia, a respeito de tal e qual pergunta que era lançada, ou seja, o

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fato das entrevistas serem grupais, não alterou a percepção de cada um dos participantes. Em princípio, o fato de as pessoas não se co-nhecerem e estarem juntas, pode até inibir um ou outro. Depois que a conversa começa a fluir, a situação se reverte. Cada um deseja contar sua experiência vivida a respeito do que está sendo discutido e a conversa no grupo passa a ser bem participativa e expressiva. Claro que isso pode ser facilitado, em função de um moderador atento, dinâmico e experiente, que perceba os participantes mais quietos, inibidos, e possa estimulá-los oportunamente.

Os usuários dessa técnica em geral sustentam-se no seguinte princípio: a energia gerada pelo grupo resulta numa maior diver-sidade e profundidade de respostas, isto é, a somatória das respos-tas individuais é superada pela riqueza de detalhes e informações que o esforço combinado do grupo é capaz de produzir. Enfim, a sinergia entre os participantes leva a resultados, que de longe ultrapassam a soma das partes individuais25.

É sempre importante fazer um estudo exploratório, uma es-pécie de estudo piloto, para ajustes das questões geradoras, que deverão estar sempre em consonância com os objetivos previa-mente estabelecidos, visando a um melhor entendimento por par-te dos sujeitos participantes, no que se refere à objetividade e à clareza das perguntas, bem como a forma sucinta de colocá-las, evitando a monotonia e o cansaço20,24.

Recomenda-se que as sessões dos grupos focais sejam regis-tradas de duas maneiras simultaneamente: por meio da gravação (com a prévia permissão do grupo) e por meio do observador, que

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anota possíveis ocorrências, expressões, reações dos participantes em uma espécie de diário ou relatório, em especial de fatos que es-capam da gravação. Em seguida, as gravações são transcritas, para serem adequadamente analisadas. A maior vantagem da transcri-ção é a originalidade da linguagem dos participantes, que é revista e rememorada, quantas vezes se fizer necessário1,12 .

Embora a literatura relate como maior desvantagem o tem-po que se gasta para transcrever as entrevistas, uma vez que uma sessão de cerca de uma hora leva três ou quatro horas para ser transcrita 1,9, a experiência tem mostrado que essa tarefa exigirá disponibilidade de tempo e que deve ser, portanto, planejada pelo pesquisador ou pela pessoa que irá transcrevê-las12,16. Nas expe-riências relatadas por Costa12, Costa; Saliba e Moreira 17, a maior dificuldade ou desvantagem é de fato se conseguir um horário que possa ser cômodo a todos os participantes do grupo, de maneira que o grupo esteja completo em todas as sessões.

1.1.5 Considerações finais

Com as mudanças paradigmáticas das Ciências do mundo moderno, nas mais diversas áreas do saber, o profissional que atua na Saúde Coletiva, especialmente, pela articulação e pluralidade de temas que essa área abrange, deverá estar apto a utilizar técni-cas de pesquisa que lhes permita melhor entender a construção do conhecimento, numa perspectiva integrada e multidisciplinar.

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Em função disso, é importante ressaltar que a popularidade do grupo focal, cada vez mais crescente na Saúde Coletiva, pode ser entendida como uma possibilidade salutar de ampliar a com-preensão do conhecimento, nem sempre explicado na sua plenitu-de, quando da utilização de técnicas mais tradicionais de pesquisa.

Finalmente, é importante enfatizar que o grupo focal é uma das técnicas mais usadas na abordagem qualitativa, que vem am-pliar o leque de opções na coleta de dados. Isso não implica que seja melhor que as outras, visto que a abordagem qualitativa não cria esse tipo de perspectiva. Cada técnica tem sua indicação e validade, em função do objeto e objetivos da pesquisa. Ao contrá-rio, nesse momento de transição que nos encontramos na área da saúde, em que as abordagens qualitativas, ou as abordagens mistas (quanti-quali) têm aumentado contínua e progressivamente, so-mente a utilização simultânea de mais de um instrumento de co-leta de dados possibilitará que a abordagem qualitativa aumente sua credibilidade e tenha a validade desejada pelos que a utilizam.

A validade aqui referida não significa a validação estatística propriamente dita, mas a confirmabilidade dos dados, cuja ob-servação deverá ocorrer quando se usa mais de um instrumento de coleta, o que possibilitará a repetição dos achados na pesqui-sa, que, de certa forma, fortalece os dados encontrados. Com isso ampliam-se as possibilidades, ganha a pesquisa enquanto abor-dagem metodológica, porque se fortalece pela reprodutibilidade. Assim, ganha a Saúde Coletiva e todas as áreas do saber que fazem uso dessa ferramenta metodológica.

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1.2 PERSPECTIVAS METODOLÓGICAS NA

ÁREA DA SAÚDE USANDO REPRESENTAÇÕES SOCIAIS

Antônio Medeiros JúniorÂngela Maria Paiva CruzIris do Céu Clara Costa

Renata Paula Costa TrigueiroFrancijane Diniz de Oliveira

1.2.1 Introdução

Este trabalho analisa perspectivas teórico-metodológicas das Representações Sociais (RS) no campo da saúde. Atualmente, três grandes vertentes teóricas complementares à teoria original de Moscovici2 têm se mostrado, por suas proposições e desenvolvi-mentos metodológicos, excepcionalmente úteis à operacionaliza-ção da noção de representações sociais para os fins da pesquisa empírica e da intervenção sobre as práticas sociais.

A primeira concebe o estudo das RS como um processo que reclama como necessário e indispensável à abordagem dos conteú-dos que são inerentes ao processo cognitivo. Com aproximações de

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natureza etnográfica, a tendência dos conteúdos opta prioritaria-mente, do ponto de vista metodológico, pela imersão do observa-dor na realidade social estabelecida na interação, na comunicação e na apreensão dos sentidos e das dimensões históricas e culturais do fenômeno, a partir de observações semiestruturadas, entrevis-tas e análise de dados, de natureza geralmente qualitativa.

A segunda vertente, originada a partir da Escola de Gene-bra, se propõe a articular a teoria das representações sociais com uma perspectiva mais sociológica, visando estudar as relações entre grupos e indivíduos, abrangendo as seguintes dimensões: a primeira estuda os processos intraindividuais na relação com o meio ambiente. A segunda interessa-se pela interação e expressão das dinâmicas sociais. A terceira refere-se às diferentes posições assumidas pelos indivíduos nos processos intergrupais e nas re-lações sociais. A quarta dimensão enfoca os sistemas de crenças, de representações, de avaliações nas relações sociais simbólicas, amplamente difundidas em uma população, influenciadas a partir das produções culturais e ideológicas que conferem significação aos comportamentos dos indivíduos e criam diferenciações so-ciais, a partir de princípios gerais1. Finalmente, a definição de an-coragem a partir de diferentes posições individuais e ancoragem desses posicionamentos nas dinâmicas sociais, bem como em suas causas e origens.

A terceira vertente afirma que a representação constitui um universo de opiniões e de crenças, organizadas em torno de uma significação central e em relação a um objeto determinado, tendo

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a estrutura interna de uma representação social como principal característica o fato de ser organizada em torno de um núcleo central, enquanto o sistema periférico admite variações interin-dividuais e intraindividuais, funcionando como um dispositivo flexível e adaptativo da representação.

É nosso propósito, neste capítulo, refletirmos sobre os funda-mentos teórico-metodológicos que os autores assumem quando propõem a Teoria das Representações Sociais (TRS) como uma forma de conhecimento adequado para compreendermos o mun-do, capaz de resgatar a importância do senso comum em sua di-nâmica utópica e libertadora, mobilizadora de ações reproduzidas livremente e que orienta as nossas vidas no mundo social.

1.2.2 Antecedentes teór icos

Em 1912, quando publicou “As formas elementares da vida religiosa”, Durkheim elaborou o conceito de representações cole-tivas, em que propôs um conjunto sistemático de elementos que tenta explicar uma multiplicidade de fenômenos sociais.1

Segundo Moscovici,2,3 as representações coletivas propostas por Durkheim, enquanto saberes partilhados, são estáveis na sua transmissão e reprodução, em oposição ao caráter efêmero das representações individuais. As ideias, uma vez difundidas, trans-formam-se, portanto, em representações coletivas autônomas e regidas por leis próprias.

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Essa interpretação dicotômica de um social estático e imper-meável à instabilidade das mudanças individuais, permeada por intensas influências psíquicas e emocionais, dissociada do dina-mismo inerente à vida social, tornou apagada por mais de meio século a teoria de Durkheim no mundo científico. A oposição entre individual e coletivo, pessoa e sociedade, estável e instável, sujeito e objeto, marca a falha na teoria do sociólogo francês sobre a noção das representações coletivas, assim como explica o fato de que esse conceito tenha sido negligenciado pelos estudiosos durante muito tempo1,4.

Nesta perspectiva, Lucien Lévy-Bruhl abandona a oposi-ção entre o individual e o coletivo e insiste sobre a oposição de mecanismos psicológicos e lógicos em dois tipos de sociedade: a primitiva e a civilizada. A primeira se orienta a partir do sobre-natural, enquanto que a segunda fundamenta-se sobre os séculos de exercícios rigorosos da inteligência e da reflexão. Orienta-se a partir da busca lógica de informações racionais relacionadas aos fenômenos e às causas que servem para explicá-los. Além disso, focaliza sua atenção sobre as estruturas intelectuais e afetivas das representações coletivas5.

Dois outros autores, Piaget e Freud, também contribuíram para a elaboração de uma teoria que explicasse o conhecimento do senso comum, as suas determinações, a sua origem, a sua di-nâmica e as influências que as nutrem. Piaget não concorda com o caráter homogêneo da sociedade e das representações coletivas, enfatizadas por Durkheim e Lévy-Bruhl. Para ele, no interior da

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sociedade existem várias sociedades, entre elas a sociedade espon-tânea das crianças, o que, por meio de seus estudos, procurava compreender suas especificidades e sua visão de mundo, e tam-bém ressaltava a importância do poder construtivo da sociedade5.

Mas, com os estudos de julgamento moral, Piaget mostra tam-bém que os julgamentos das crianças pequenas são próprios da idade em que vivem sob uma disciplina dos pais, numa sociedade gerontocrática. Ao crescer, o egocentrismo infantil diminui e elas compreendem melhor o ponto de vista do outro e interiorizam melhor as regras, aparecendo assim o respeito mútuo e uma coo-peração que associa as crianças em pensamentos e atos. Então, a realidade muda, e uma regra considerada intocável pela criança de sete anos aparece aos 12 como válida por consentimento mútuo5-6.

Já em seus conceitos sobre a sexualidade infantil, Freud7 mos-tra que as crianças criam teorias com os elementos provenientes da cultura que os rodeia, dos contos e lendas para responder a pergunta “de onde vêm esses bebês?”, por exemplo. Freud apre-senta um verdadeiro catálogo de como as crianças conhecem a se-xualidade: o horror do menino ao descobrir que a mulher não tem pênis, a inveja da menina. Ele introduz então um outro elemento, para além do domínio intelectual: a internalização, de natureza psíquica, que infunde realidade a imagens e símbolos que deixam sua marca em nossas vidas, a partir da infância, isto é, mais que a individualização de conceitos em mim ou em você, significa que teorias, objetos, símbolos interiorizados parecem peculiares ao indivíduo, mas também são parte de uma cultura comum. Freud

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mostra que as representações sociais são parte da mais íntima quí-mica psíquica, entrelaçadas na teia das motivações humanas6-7.

Acima de tudo, Freud enfatiza que o trabalho de interiori-zação que transforma os resultados coletivos em dados indivi-duais marca o caráter da pessoa e que as representações passam da vida de todos à vida de cada um, do nível consciente ao in-consciente. Enfim, é possível perceber que na edificação da teo-ria das representações sociais Moscovici também reporta-se aos estudos de Gramsci sobre o senso comum, transporta-se para o campo da psicologia, apropria-se de conceitos e estabelece ideias evolucionistas quanto às lacunas existentes na teoria de Piaget sobre os processos cognitivos, além de, cuidadosamente, deslo-car-se sobre a trilha da sociologia seguindo e transformando o pensamento de Durkheim6-7.

1.2.3 O concei to de representações socia is

A Teoria das Representações Sociais (TRS), formulada no final dos anos 50, do século passado, por Serge Moscovici, se apresenta como proposição de uma démarche epistemológica de interpretação da realidade cotidiana da vida moderna. Ela mar-ca uma nova etapa na história da psicologia, à medida que opera uma ruptura com os modelos funcionalistas e positivistas ainda em vigor nessa época. É por sua proposição em pensar o homem e os acontecimentos sociais, invertendo os princípios e a ordem do conhecimento psicológico até então estabelecidos, que a TRS

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vai encontrar resistência, notadamente, entre os paradigmas dos saberes dominantes na época – o behaviorismo e o marxismo do tipo mecanicista8-9.

No entendimento de Moscovici, o behaviorismo é um mo-delo que concebe o conhecimento de uma maneira muito limi-tada e programada. É preciso considerar antes o comportamento humano em sua perspectiva simbólica e/ou real, e perceber que a representação social torna-se um centro em torno do qual se es-truturam as informações, os afetos e as atividades susceptíveis de modificar a face do real. Essa estruturação se manifesta seja como um conteúdo, uma atitude ou uma direção do agir e é o resultado de uma reação seletiva8-10.

Antes do advento da TRS, o pensamento das massas, corren-temente denominado senso comum, era considerado como um corpus de conhecimento confuso, inconsistente, desarticulado e fragmentado. Em relação ao conhecimento científico, o senso co-mum era situado num polo extremo e oposto: como uma espécie de saber selvagem, profano, ingênuo e, até mesmo, de mentalida-de pré-lógica conforme classificavam a sociologia, a psicologia, a antropologia etc4.

No livro “A Psicanálise, sua imagem e seu público”, Moscovi-ci2 introduz a Teoria das Representações Sociais, tomando como objeto de pesquisa a apropriação da psicanálise pelo grande públi-co francês dos anos 50, que difunde esse saber científico, inédito, transformando-o numa forma de conhecimento socialmente ela-borado e partilhado como saber prático do senso comum. O que

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de fato Moscovici procura não é a tradição de um social prees-tabelecido das sociedades ditas arcaicas, como fizera Durkheim, mas ele se interessa pela inovação de um social móvel do mundo moderno no qual predominam mudanças constantes e o pluralis-mo de ideias e de doutrinas políticas, religiosas, filosóficas e mo-rais, transformado com a divisão social do trabalho e a emergên-cia de um novo saber, a ciência4,10.

Moscovici afirma que a noção de representação de Durkheim descreve ou identifica uma categoria coletiva que deve ser explica-da a um nível inferior. Nesse momento é que percebemos surgir a noção de representação social, originalmente desenvolvida na Psicologia Social, mas com potencial para estabelecer fronteiras com diferentes áreas do conhecimento, como a Sociologia, a An-tropologia, a Linguística e as Ciências Políticas. Ele afirma que as representações coletivas se tornam um conceito que está mais adequado ao estudo de contextos de sociedades menos complexas, e que as representações sociais se tornam mais adequadas para o estudo das sociedades modernas e até as pós-modernas, que se caracterizam pelo seu pluralismo e pela rapidez que as mudanças econômicas, políticas e culturais acontecem1,11.

Assim, Moscovici substitui a noção de representações coleti-vas pelo conceito de representações sociais. A razão dessa mudan-ça terminológica se justifica, de um lado, pela diversidade tanto da origem dos indivíduos quanto dos grupos. Por outro lado, pelo re-conhecimento da importância da comunicação como fenômeno que possibilita convergir os indivíduos (apesar de e por causa da

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divisão social do trabalho) numa rede de interações em que qual-quer coisa de individual pode tornar-se social e vice-versa. Nesse processo de comunicação, as representações sociais se elaboram na antinomia interativa em que são simultaneamente geradas e adquiridas. Para o autor, as representações sociais não são homo-gêneas nem partilhadas como tais, por toda a sociedade. E uma vez forjadas em condições socialmente desiguais, como resultado da divisão social do trabalho, as representações são, portanto, so-ciais, já que partilhadas, mas não homogêneas, porque são parti-lhadas na heterogeneidade da desigualdade social2,4.

Segundo Moscovici, as representações sociais possuem um caráter socializador e as ideias, os valores e as crenças comuns são percebidas como um caso particular da atividade coletiva de um grupo social. O universo de opiniões particulares que pertence a cada grupo é o produto de uma comunicação na qual a mensagem passa por uma decodificação, isto é, a mensagem é construída, diferenciada e mesmo deformada. A comunicação não se reduz ao fato de transmitir uma mensagem. Ela deforma, diferencia, traduz, da mesma forma que os grupos criam, deformam ou tra-duzem os objetos sociais ou as imagens dos outros grupos. Assim, o pensamento é socialmente condicionado e o estudo das repre-sentações sociais abrange as suas relações com a ideologia, com o imaginário social e com o sistema simbólico impregnado de car-gas afetivas, como resultado da partilha histórica das emoções e suas influências na orientação de condutas e das práticas sociais12.

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Do mesmo modo, implica na análise das formas históricas e culturais de expressão dos grupos, da organização e da transfor-mação dessa expressão e, finalmente, de sua função mediadora, criadora de valores entre os grupos, ou , mais geralmente, entre o homem e seu meio social. Recentemente, as Representações So-ciais do meio ambiente e os valores que contemplam as relações humanas têm sido foco de pesquisas por parte de orgãos governa-mentais e educadores sensibilizados com a importância da Educa-ção Ambiental no Brasil13.

Como se pode ver, o conhecimento social não é a acumula-ção de conhecimentos individualmente determinados, tendo em vista que resulta de condições e de práticas comuns, que o mo-delam e o nutrem, ao mesmo tempo. O social não é apenas uma tela de fundo, pois gera as representações sociais que são, essen-cialmente, fenômenos sociais, uma vez que, mesmo lenvantadas a partir de seu conteúdo racional individual, devem sempre ser compreendidas a partir do seu contexto social2,4,14.

Por fim, Moscovici considera que as representações sociais encarnam fenômeno típico das sociedades modernas, polirreligio-sas, pluripartidárias e mediáticas, em que não há mais mitos unifi-cadores como os gregos ou os indígenas e sim uma proliferação de conceitos e de imagens, que nascem e evoluem sob nossos olhos, sem terem tempo de se transformarem em tradições. Elas determi-nam nossa visão de mundo e nossa reação às pessoas e coisas. Seu impacto não provém da sua consistência, mas da penetração que tem, da visão que transmitem e da ação que encorajam6,15.

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Por refletirem um esforço incessante de tornar alguma coisa não familiar em alguma coisa familiar, as representações sociais ocorrem sob os processos da ancoragem e da objetivação. A anco-ragem esquematiza alguma coisa estranha que nos intriga, no nos-so sistema particular de categorias, classificando ou categorizando os pensamentos, denominando-os e colocando-lhe um nome. Essa colocação de nome é destinada ao que tem sido classificado. A ob-jetivação funciona como um processo de saturação de um conceito não familiar com a realidade, mudando-o em bloco de construção da realidade de si própria, transformando o abstrato em concreto, o mental em físico, e o desconhecido em conhecido16.

A conceituação das representações sociais é uma tarefa difí-cil. Moscovici em sua obra inaugural nos diz: “se a realidade das representações sociais é fácil de captar, o conceito não o é”. Soma-do a isso, ele resistiu a apresentar uma definição precisa das repre-sentações sociais, por considerar que uma tentativa nesse sentido poderia reduzir seu alcance conceitual. Essa resistência ou difi-culdade em determinar um conceito fechado às representações sociais talvez se deva à inclusão de variadas noções de campos cognitivos e culturais para compor seu conceito ou proporcionar-lhe parentescos analógicos17.

Sob essa ótica, as representações sociais aparecem como um conhecimento que não se caracteriza por uma contraposição ao saber científico. Trata-se, fundamentalmente, de uma forma de saber que, como os outros (mitologia, teologia, filosofia, ciência etc.), diferencia-se pelos modos de elaborações a que se destina cada um, respectivamente5.

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As representações sociais são observadas de uma maneira específica de compreender e comunicar o que já sabemos, pois têm como objetivo abstrair sentido do mundo e introduzir nele ordens e percepções que produzam o mundo de uma forma signi-ficativa. Assim, devemos compreendê-las como uma reabilitação do conhecimento do senso comum, da sua linguagem e da sua experiência presentes no cotidiano da vida, que podem contribuir para um conhecimento crítico do social. Elas são sempre um pro-duto de interação e de comunicação e tomam sua forma e configu-ração específicas em qualquer momento, como uma consequência do equilíbrio específico desses processos de influência social2,18.

1.2.4 Fragmentos da real idade no campo da

saúde

O campo da saúde é extremamente vasto e enriquecido de nuances que envolve a explicação de determinantes sociopsico-culturais do processo saúde-doença. Dessa forma, consideran-do que as representações sociais nas suas funções de saber e de orientação permitem compreender e explicar a realidade, para a partir desta guiar os comportamentos e as práticas, achou-se interessante descrever, a seguir, situações observadas na área da saúde que possibilitam a utilização da TRS, na tentativa de expli-car os fenômenos sociais, ambientais e de adoecimento comuns a essa área do conhecimento.

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O processo denominado Terceira Revolução Industrial ou Reestruturação Produtiva, entendido como uma nova forma de produzir, viabilizada pelos avanços tecnológicos e por novas for-mas de organizar e gerir o trabalho, com uma nova abrangência global, vem introduzindo mudanças radicais na vida e nas rela-ções das pessoas e de países, com consequências no viver e no adoecer das pessoas19.

Entre as consequências dessa universalização do mundo e das desigualdades crescentes, chamam a atenção à concentração do poder político e econômico, a deterioração da qualidade de vida, expressa na poluição e degradação ambiental, a intensificação do desemprego estrutural, da terceirização do trabalho e da amplia-ção do subemprego temporário, a intensificação da alienação dos trabalhadores, impossibilitando o controle coletivo do trabalho como um todo, o crescimento da violência, o recrudescimento de movimentos fundamentalistas, entre outras19-21.

No plano político, por outro lado, tem lugar a implementa-ção de políticas calcadas no ideário neoliberal definido como um sistema de receitas práticas para a gestão pública, cujas palavras-chave são agilidade, eficiência e eficácia, nada que diga respeito, portanto, à equidade e à justiça. Essas políticas se caracterizam pelos ataques frontais desferidos contra os direitos sociais, ardua-mente conquistados, desestabilizando o sistema de proteção e de garantias sociais decorrentes das chamadas políticas de bem-estar social, desestruturando, assim, as políticas de formatos univer-

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salizantes. Em troca, ganham relevo as políticas compensatórias emergenciais e focalizadas nos pobres e nos excluídos21-23.

Assim, segundo Vianna24, a tendência geral nas políticas so-ciais na América Latina, no período das duas últimas décadas, é de crescente reestruturação dos seus sistemas sociais, com base em princípios liberais. Há uma clara aproximação ao modelo libe-ral norte-americano, inclusive com relação à realidade brasileira, numa verdadeira americanização perversa.

No tocante ao mundo do trabalho, esse capitalismo sem freio vem provocando um desemprego massivo, fato que é geralmente atribuído ao rápido desenvolvimento tecnológico, mas que de-corre, na verdade, das restrições e da vulnerabilidade impostas ao trabalho, acarretando o surgimento de uma nova questão social em um cenário que aponta para o fim da própria sociedade sala-rial. A palavra-chave desse processo é a flexibilização. Ela decorre das exigências da concorrência e da competitividade em um mo-delo mundializado, no qual o trabalho passa a ser o alvo principal da redução dos custos. Trata-se de reduzir o preço da força de tra-balho, e, ao mesmo tempo, maximizar a sua eficácia produtiva25.

Apontada como solução paliativa para o desemprego, tem representado uma perda de conquistas históricas dos trabalha-dores, como o repouso semanal remunerado, férias e facilidades para a organização dos trabalhadores nos locais de trabalho. De-semprego massivo, vulnerabilidade e insegurança em decorrência dos ataques desferidos às garantias e aos direitos sociais, sinalizam

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para o desaparecimento do emprego, isto é, do trabalho com pro-teção e estabilidade22-25.

Nas especificidades das políticas de saúde (e seus sistemas), também se observa uma tendência semelhante nos casos do Chi-le, do México e da Argentina. No caso brasileiro, as características históricas próprias (avanços constitucionais e legais com a criação do SUS, em 1988) resultaram em fortes resistências ao desmonte neoliberal proposto pelos sucessivos governos, desde 1989, e pe-las orientações das agências internacionais. Isso tem resultado em uma esdrúxula acomodação e deterioração de um sistema de saú-de, avançado em suas concepções e paralisado na sua implemen-tação concreta23. Nesse sentido, cabe ao mercado o atendimento de uma fatia substancial das necessidades sociais das populações, conformando uma ampla mercadorização da saúde, da educação, da seguridade social e assim por diante22.

É importante também destacar que, no bojo desta globali-zação, observa-se no Brasil, acentuada queda da mortalidade por doenças infecciosas e parasitárias; ascensão das doenças crônico-degenerativas, com forte predomínio das doenças cardiovascula-res; aumento da expectativa de vida, além de abrirem-se novas perspectivas de revisão dos atuais sistemas de valores ético-polí-ticos e estéticos25.

A qualidade em saúde é também perspectivada numa ótica de Gestão pela Qualidade Total a partir da adoção, em alguns países do mundo, do modelo de excelência criado e desenvolvido pela European Foundation for Quality Management, o qual se baseia

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em nove conceitos básicos, a saber: orientação para os resultado; foco no cliente; liderança e consistência de intenções; gestão por processos e por fatos; desenvolvimento e envolvimento de pes-soas; aprendizagem contínua; inovação e melhoria permanente; desenvolvimento de parcerias; e responsabilidade pública19.

Nesse sentido, a qualidade de vida em saúde tem merecido uma crescente e prioritária atenção, a par do que acontece na atividade econômica. O próprio conceito evoluiu, no sentido da satisfação dos indivíduos ou populações, aparecendo os concei-tos de qualidade e de satisfação do cliente. Envolvendo aborda-gens técnicas (como estrutura, processo e resultados, assim como serviços), as relações interpessoais de atendimento e a qualidade em saúde têm acentuado a prioridade de intervenção na aces-sibilidade dos serviços, do acolhimento, da personalização, do acompanhamento e da continuidade dos cuidados. Para o futuro, considera-se imperioso centrar o sistema de saúde na pessoa, no cidadão e no profissional, garantindo efetiva participação, lide-rança e flexibilidade.

No contexto atual da sociedade brasileira, no instante em que se discute a humanização da atenção à saúde, conforme diretri-zes estabelecidas a partir da XI Conferência Nacional de Saúde, procurando estruturá-la em novas bases, considerando a comple-xidade do processo saúde/doença, a necessidade da intervenção integral e a incorporação de novos perfis profissionais – exigidos pelo dinamismo das transformações da sociedade e do sistema produtivo –, torna-se necessário que novos olhares se voltem para

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a atuação dos trabalhadores de saúde, tentando compreender suas limitações, suas formas fragmentadas de ver e de estudar o mun-do, resultantes de um modelo de formação profissional competiti-vo, hegemônico e ultrapassado.

1.2.5 A lgumas ref lexões metodológicas do uso

das representações socia is como marco teór ico

Até o final dos anos oitenta, a diversidade ou a pluralidade revelada nos estudos acerca das representações sociais era vista como um processo pacífico e harmonioso, reflexo da maturidade e da fecundidade que decorriam da riqueza inerente ao objeto das representações sociais10.

Atualmente, três grandes correntes teóricas complementa-res à teoria original de Moscovici têm se mostrado, por suas pro-posições e desenvolvimentos metodológicos, excepcionalmente úteis à operacionalização da noção de representações sociais para os fins da pesquisa empírica e da intervenção sobre as práticas sociais. A primeira dessas correntes, mais fiel à teoria original e associada a uma perspectiva etnográfica, deve-se à influência de Denise Jodelet, em Paris.

A orientação de pesquisa privilegiadora dos conteúdos con-cebe as representações sociais como um produto da atividade mental, procurando colocar em evidência a forma como a reali-

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dade é reconstruída pelo grupo e integrada ao seu sistema de va-lores. A partir de um objeto social determinado, busca-se definir o conjunto de elementos construídos pelo grupo, tendo-se em vista colocar em relevo o sentido dos conteúdos observados junto à po-pulação em estudo. Por meio de pesquisas profundas, resgatando e valorizando os aspectos históricos, culturais e sociais, procura-se tirar as conclusões relativas ao sujeito social em estudo.

Na verdade, Jodelet9,26-27 concebe o estudo das representações sociais como um processo que reclama como necessário e indis-pensável a abordagem dos conteúdos que são inerentes ao proces-so cognitivo. O fenômeno cognitivo como objeto de estudo ocorre a partir de conteúdos representativos colhidos em diferentes su-portes como linguagem, discurso, documentos, práticas e dispo-sitivos materiais. Com aproximações de natureza etnográfica, a tendência dos conteúdos opta, prioritariamente, do ponto de vista metodológico, pela imersão do observador no meio, observações semiestruturadas, entrevistas e análise de dados, de natureza ge-ralmente qualitativa. Essa pesquisadora concebe a metodologia de pesquisa das representações sociais a partir da coexistência de duas orientações harmoniosamente conduzidas, a estrutura e os conteúdos, dando uma ênfase especial aos conteúdos.

Nessa perspectiva, o papel do estudo estrutural é conside-rado de natureza complementar. Ao se apreender o conteúdo das representações, esse conteúdo é tratado seja como campo estrutu-rado seja como núcleo estruturante. No primeiro caso, são colhi-das informações, imagens, crenças, valores, opiniões, elementos

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culturais e outros. Já no segundo caso, busca-se o princípio da coerência que estrutura os campos de representação, a exemplo de organizadores socioculturais, atitudes, modelos normativos ou esquemas cognitivos26 .

Jodelet considera que a valorização dos conteúdos não impli-ca na negação da perspectiva estrutural. Como fenômenos cogni-tivos, as representações sociais implicam em pertença social dos indivíduos e implicações afetivas e normativas, interiorizações de experiências, de práticas de modelos de conduta e de pensamento, socialmente inculcados ou transmitidos10,26.

A segunda corrente se propõe a articular a teoria das re-presentações sociais com uma perspectiva mais sociológica e é liderada por Willem Doise, em Genebra. Doise, Clemence e Lorenzi-Ciold28 consideram como indispensáveis ao estudo das representações sociais três dimensões: a primeira dimensão iden-tifica os pré-construtos, as referências ou saber que são comuns ao grupo social. A segunda dimensão identifica as diferentes posi-ções assumidas pelos indivíduos, como indivíduos que se situam no seio de um grupo, isto é, determina a natureza do lugar ocu-pado pelo indivíduo. Por fim, a terceira dimensão, que concerne à definição da ancoragem e das diferentes posições, bem como suas causas e origens, determina de que maneira as pessoas hierarqui-zam as diferentes posições segundo, por exemplo, seus valores, crenças, ideias etc.

Explicitar as múltiplas imbricações entre pesquisas sobre ati-tudes e investigações sobre representações sociais permite dotar

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cada tradição das aquisições da outra. As pesquisas sobre as re-presentações sociais já permitem a integração num sistema mais amplo de dinâmicas atitudinais mais específicas, pois os estudos sobre as atitudes oferecem descrições detalhadas de processos que se situam em pontos precisos da articulação entre relações sim-bólicas e representações sociais. Mas tornar mais completos os estudos sobre as atitudes implica que as estudemos também como representações sociais28-29.

A terceira corrente enfatiza a dimensão cognitiva estrutural das representações e tem em Jean Claude Abric seu principal re-presentante, mas está também ligada a dois outros nomes de Aix-en-Provence: Claude Flament e Pierre Vergès, referidos por Sá30. A partir da teoria do núcleo central, Abric31 se ocupa de aprofun-dar a ideia embrionária colocada por Moscovici, quanto à existên-cia de um núcleo figurativo, a partir do qual é que se pode falar de uma mudança nos estudos de representações sociais.

Abric31 afirma que a representação constitui um universo de opiniões e de crenças organizadas, em torno de uma significação central e em relação a um objeto determinado, tendo a estrutura interna de uma representação social, como principal característi-ca, o fato de ser organizada em torno de um núcleo central. Em uma representação, o sistema central fundamenta a sua coerência e a sua permanência, possibilitando, assim, o consenso no seio de um grupo social específico. Já o sistema periférico admite va-riações interindividuais e intraindividuais, funcionando como um dispositivo plástico e adaptativo da representação.

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Assim, para Abric,31,32 é a identificação do núcleo central que permite o estudo comparativo das representações. Para que duas representações sejam diferentes, elas devem ser organizadas em torno de dois núcleos centrais diferentes. A simples identificação do conteúdo de uma representação não basta para o seu conheci-mento e especificação. No entanto, a organização desse conteúdo é essencial: duas representações definidas por um mesmo conteú-do podem ser radicalmente diferentes, caso a organização e a cen-tralidade desses elementos sejam diferentes.

Sem bruscas rupturas, tal processo adquiriu consistência à medida que se procurava dar um estatuto mais claro de cienti-ficidade às representações sociais. A acumulação de pesquisas, resultado de uma tendência que limitava o estudo das representa-ções sociais a uma procura de conteúdos, provocava insatisfação em vários pesquisadores, descontentes com a situação e ciosos de uma afirmação mais convincente das representações sociais do ponto de vista metodológico31.

Anadon e Machado10 afirmam que para compreender ver-dadeiramente as representações sociais não basta acumular pesquisas ou observações de casos e critica ainda o recurso à etnologia para demonstrar a cientificidade da pesquisa em re-presentações sociais, afirmando ser preciso passar da grafia à logia. Para eles, é importante identificar as estruturas e não os conteúdos, as estruturas e não a substância. Dito de outra for-ma, o conhecimento não deve ser descrito como uma substân-cia, mas como um acontecimento. Se a tendência dos conteúdos

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privilegia a representação social como produto, a perspectiva estrutural opta pelo estudo da representação social como pro-cesso, apoiando-se em duas ideias básicas: os componentes de uma representação social estão em interdependência e este tipo de organização interna dos componentes se coloca na origem da coerência do fenômeno representacional.

Assim, autores como Doise, Clemence, Lorenzi-Ciold28, de-fendendo a experimentação, concebem que é preciso ultrapas-sar a ideia de objetivação como a descrição direta e reificada de representações existentes em uma dada população, incapaz de perceber a variação existente entre indivíduos. Doise29 comple-menta que essas variações não se fazem ao acaso, pois são regidas por princípios organizadores, cuja análise constitui-se em uma fase indispensável dos estudos sobre representações sociais. Eles reforçam que se utilizando métodos centrados em fundamentos matemáticos, clarificação automática, análise fatorial de corres-pondências, análise de segmentação e análise discriminante, os autores veem a necessidade de superar a crítica feita por alguns ao estudo das representações sociais como uma pesquisa inca-paz de objetivar as diferenças e a heterogeneidade da realidade social, atendo-se apenas a uma visão consensual da realidade. Técnicas como a análise fatorial de correspondência permite a identificação de princípios organizadores que ressaltam as dife-renças entre respostas individuais29.

Abandonando o terreno da teorização, a análise estrutural procura identificar os elementos estruturais não variáveis com a fi-

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nalidade de explicar o funcionamento interno das representações sociais. A grande diversidade dos conteúdos é substituída pelo po-der preditivo do estudo e pela sua capacidade de generalização10.

Segundo Abric31, uma das primeiras contribuições das pes-quisas experimentais é justamente verificar se os comportamentos dos sujeitos ou dos grupos não são determinados pelas caracterís-ticas objetivas da situação, mas pela representação dessa situação. Numa grade de interpretação e de decodificação da realidade, as representações produzem as antecipações dos atos e dos compor-tamentos (seus e dos outros) e a interpretação da situação num sentido preestabelecido, graças a um sistema de categorização coerente e estável. Inibidoras das condutas, elas permitem sua jus-tificação em relação às normas sociais e à sua integração. O fun-cionamento operatório tanto dos indivíduos quanto dos grupos é diretamente dependente do funcionamento simbólico31.

Entretanto, Abric31-32 também reconhece que a abordagem experimental pode trazer apenas algumas respostas, que, embora fundamentais, são limitadas, pois é no campo que se elaboram, se vivem e se transformam as representações sociais. E ninguém que se interesse por essa temática pode considerar a abordagem ex-perimental como exclusiva. As enquetes e os estudos qualitativos constituem instrumentos indispensáveis e frequentemente mais ricos em informações, inclusive teóricas, para o conhecimento e a análise das representações sociais.

Trabalhando na perspectiva etnográfica, Jodelet26-27 enfati-za que é pela linguagem que o homem nasce para o mundo, ao

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se apropriar da palavra, na relação com o outro. Nessa relação, a humanidade vai descobrindo valores, normas, símbolos e sen-tidos que marcam e definem espaços e objetos. Ao se apropriar dos objetos em sua prática, tornando-os palavra proferida ou calada, o sujeito atribui-lhes sentido, numa (re)construção que o implica: ao circunscrever o objeto, ele próprio tem, nesse pro-cesso, delimitado seu espaço sociorrelacional. Assim, vai sendo construído, sempre potencialmente transformável enquanto vida existir, o sentido do gesto e da conduta em sua polissemia, e assim o homem comum se faz e se expressa na relação com o outro, ao mesmo tempo em que tem demarcado suas próprias condições de cognição e de afeto.

1.2.6 Cons iderações f ina is

Ao longo da história da humanidade, identifica-se como uma característica permanentemente presente a busca insaciável pelo conhecimento, já preconizada por Aristóteles33. Diferentes modelos explicativos da realidade foram, são e serão propostos como formas de analisar os fenômenos naturais e culturais inseridos em espa-ços sociais construídos temporalmente pela trajetória do homem na (re)construção do seu destino. Algumas concepções, apesar de possuírem especificidades conceituais próprias, estabelecem trocas mútuas com outras formas de conhecimento visando essencial-mente ampliar os modos de apreender as relações altamente diver-sificadas, e momentaneamente ininteligíveis, quando contextuali-zadas sob o formato enrijecido de uma única forma de pensamento.

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Quando propôs a Teoria das Representações Sociais (TRS) em 1961, Moscovici identificava as fragilidades dos saberes dominan-tes da época, na tentativa de explicar os fenômenos resultantes das profundas transformações típicas de uma sociedade plural, cada vez mais dependente de causas exteriores a nós mesmos, como in-divíduos, para a solução dos problemas vividos. Dessa forma, ele resgata a importância do senso comum, enfatizando que os aspec-tos gerais inerentes à vida humana – vistos numa perspectiva não reducionista –, geram representações sociais, compreendendo-as como algo conceitualmente inacabado e que são simultaneamente produto e processo de uma apropriação da realidade externa ao pensamento e de elaboração psicológica e social dessa realidade. Elas ficam no meio do caminho, entre o precepto e o conceito, e apresentam as duas faces: a icônica e a significante, que, por sua vez, são inseparáveis.

Na América Latina, destacam-se duas grandes vertentes de pesquisa no campo da TRS. Ambas apresentam aplicabilidade nas ciências da saúde, principalmente se trabalharmos na perspectiva ampliada do conceito de saúde. A primeira aponta para a super-valorização dos conteúdos representativos coletivos, desprezan-do diferenças intra e interindividuais e exigindo uma verdadeira imersão do pesquisador no meio ambiente estudado, resgatando em profundidade os aspectos históricos e sociais inerentes aos su-jeitos do estudo, optando por utilizar procedimentos metodológi-cos eminentemente qualitativos.

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A segunda vertente busca a abordagem das representações sociais no campo experimental, porque considera limitado o aporte metodológico que se contenta em coletar os dados do so-cial. Para esse grupo, representado por Abric, Doise, Clemence e outros, importa especificar, ao mesmo tempo, como esses pro-cessos se desenvolvem socialmente e como cognitivamente se or-ganizam, em termos de agenciamento de significações. Em bus-ca do reconhecimento científico, essa segunda vertente defende o uso de técnicas estatísticas como elementos indispensáveis na tentativa de compreensão das diferenças e heterogeneidades da realidade social, advindas das formas específicas da produção de significados gerados pelos grupos, dependendo de sua inserção no todo social.

A conclusão que se chega após esse estudo bibliográfico, que gerou tantas reflexões e a redação deste capítulo, é que entre as vá-rias críticas que se contrapõem à teoria das representações sociais está a questão consensual versus a heterogeneidade do conheci-mento, na medida em que as abordagens metodológicas que se vão diversificando sob o manto dos pressupostos teóricos elabo-rados por Serge Moscovici permitem, a partir do senso comum e sem fronteiras demarcatórias rígidas, melhor delimitar os as-pectos epistemológicos da dinâmica representacional. Assim, essa análise nos permitiu observar que as vertentes apresentadas pro-piciaram complementações à Teoria das Representações Sociais (TRS) frente ao enorme desafio de se apreender a complexidade do real, os seus significados advindos dos múltiplos processos re-

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lacionais constituintes do estatuto epistemológico das representa-ções presentes no mundo contemporâneo, e a sua infinita rede de modalidades comunicativas, por vezes imperceptíveis à condição humana. Reconhecemos a diversidade das opções metodológicas criadas com o uso dessa teoria e entendemos que a articulação de saberes consegue ampliar de forma cada vez mais decisiva a com-preensão dos fenômenos sociais estudados.

Finalmente, esta análise aponta que, diante da amplitude da realidade, o uso de outras abordagens metodológicas que in-corporam elementos como a convivência e a afetividade, capazes de nos ajudar a compreender as múltiplas dimensões do outro, aceitar as diferenças e interagir com seu sistema simbólico, si-multaneamente com a Teoria das Representações Sociais, poderá ampliar a compreensão dos fenômenos estudados, ajudando-nos a superar o etnocentrismo, abrindo novas possibilidades para o pensamento, na tentativa de perscrutar, a partir do senso comum, os aspectos epistemológicos da dinâmica representacional e uma melhor compreensão dos caminhos do conhecimento.

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1.3 PERFIL MULTIDIMENSIONAL DE DIABÉTICOS RESIDENTES

EM UMA ÁREA COBERTA PELA ESTRATÉGIA DE SAÚDE

DA FAMÍLIA DA REGIÃO OESTE DE NATAL-RN

Antônio Medeiros JúniorAmanda Maria de Jesus Ferreira

Diana Paula de Souza Rêgo PintoAmanda Samara Davi de Lima

Bruna Alice de Lima DiasLenígia Maria de AlencarJanmille Valdino da Silva

1.3.1 Introdução

O Diabetes Mellitus (DM) é considerada uma das grandes epi-demias mundiais, sendo, portanto, um problema de saúde coletiva global, atingindo diferentes países e continentes. Trata-se de um grupo heterogêneo de distúrbios metabólicos, cuja característica comum é o estado de hiperglicemia, ocasionado como resultado da deficiência na secreção e/ou na ação da insulina, podendo também apresentar-se associado a distúrbios lipídicos e proteicos1.

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De acordo com a American Diabetes Association2, o diabetes pode ser classificado como: Diabetes Mellitus tipo 1 (DM1), pre-sente em 5 a 10% dos casos; Diabetes Mellitus tipo 2 (DM2), pre-sente em 90 a 95% dos casos; Diabetes Mellitus gestacional, que tem início ou diagnóstico durante a gestação, podendo apresentar-se em 1% a 14% das gestações; e outros tipos específicos de diabetes.

A incidência mundial e a prevalência da doença são crescen-tes e atribuídas fortemente aos aspectos como o envelhecimento populacional e ao estilo de vida atual, com ênfase na redução da prática de atividade física e mudanças nos hábitos alimentares3. Os números relativos à prevalência de Diabetes Mellitus ressaltam a gravidade do problema de saúde que a doença representa, sen-do a quinta principal causa de morte no mundo, responsável por 5,2% do número de óbitos4. A estimativa mundial de indivíduos acometidos pelo diabiates demonstra que, em 2030, teremos cerca de 366 milhões de diabéticos, mais de duas vezes o número de diabéticos existentes no ano de 2002.

No Brasil, estima-se que cinco milhões de pessoas possuam DM, porém quase metade (46,5%) desconhece o diagnóstico. Calcula-se que, em 2020, esse número possa alcançar a casa das 20 milhões de pessoas. Fatores como o envelhecimento da po-pulação, o estilo de vida das pessoas, o sedentarismo e o padrão dietético seguido nos dias atuais, têm influenciado o número de pessoas afetadas5.

A Vigilância de Fatores de Risco e Proteção para Doenças Crônicas por Inquérito Telefônico (Vigitel) revela que em 2011,

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o percentual de adultos (acima de 18 anos) com diagnóstico mé-dico para diabetes era de 5,6%, acometendo predominantemente (21,6%) a população brasileira com idade superior a 65 anos, sem diferença entre os sexos. Já em relação ao diabetes autorreferido, estudo realizado em 2006, revelou que o percentual de indivíduos diabéticos no Brasil é de 5,3%. Em Natal, capital do Rio Grande do Norte, a doença atingia 4,5% da população. Do mesmo modo, o estudo demonstra que em todo o País, a doença atinge principal-mente a população com idade superior a 65 anos (36%)6-8.

No estudo Multicêntrico sobre Prevalência do Diabetes Melli-tus, realizado no Brasil em 1988, verificou-se que o aumento de prevalência da doença já ocorria proporcionalmente à idade e os autores já alertavam para a importância dessa enfermidade, em ra-zão do envelhecimento populacional que vem ocorrendo no Brasil9.

Grossi10 relata que, em geral, o Diabetes Mellitus nessa fai-xa etária é pouco sintomático e de começo insidioso devendo-se, em parte, ao aumento do limiar renal para a glicose. Seu estudo demonstrou que o diagnóstico do diabetes é feito, em 78% dos casos, por meio de exames de rotinas, em 8% por complicações do diabetes, e em 14%, por síndrome diabética aguda.

Um tratamento inadequado da doença resulta em complica-ções, disfunções e insuficiência de vários órgãos, especialmente olhos, rins, nervos, cérebro, coração e vasos sanguíneos. Conco-mitantemente, o diabetes e suas consequências estão relacionados a fatores que levam ao comprometimento da sobrevida dos indi-víduos, como a queda na produtividade e na qualidade de vida,

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com onerosos custos ao sistema de saúde para o seu tratamento. Estudos demonstram, que das despesas hospitalares do Sistema Único de Saúde, 9% estão relacionadas a internações de pacientes com diabetes 10.

Entre suas complicações, as macrovasculares e as microvas-culares, incluindo as doenças cardíacas isquêmicas, doença vas-cular periférica, doença cerebrovascular, retinopatia, e nefropa-tias, além de complicações neuropáticas possuem alta prevalência e resultam em graves comprometimentos dos órgãos e tecidos11,12.

As neuropatias ocorrem como consequência de todos os ti-pos de diabetes, afetando o sistema nervoso somático e autonô-mico, e fazem parte do grupo de complicações crônicas que mais acometem os diabéticos, presentes em 50% dos indivíduos, sendo essa prevalência ainda maior, de acordo com a evolução temporal da doença13,14.

A neuropatia diabética trata-se de alterações neurológicas identificadas por métodos laboratoriais ou por evidências clíni-cas, em pacientes diabéticos sem outros diagnósticos de neuropa-tias (SBD, 2009). Essas complicações neurológicas provavelmente resultam da interação entre fatores metabólicos e vasculares, em que a hiperglicemia é o fator mais relevante para o desencadea-mento dos distúrbios, entre eles o “pé diabético”14.

De acordo com o Glossário do Consenso Internacional, a SBD define “pé diabético”, como infecção, ulceração e/ou destrui-ção de tecidos moles associadas a alterações neurológicas e vários

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graus de doença arterial periférica nos membros inferiores14. Al-guns autores15-17 complementam que o termo é utilizado para ca-racterizar a lesão, decorrente da combinação da neuropatia sensi-tivo-motora e autonômica periférica crônica, da doença vascular periférica, das alterações biomecânicas que levam a pressão plan-tar anormal e da infecção, que podem estar presentes, agravando o estado geral.

Para Kozak, Giurini18, o pé diabético é entendido como um estado fisiopatológico multifacetado, caracterizado por lesões que ocorrem como consequência de neuropatia em 90% dos casos, de doença vascular periférica e de deformidades. As úlceras ou lesões geralmente decorrem de trauma e frequentemente se complicam com gangrena e infecção, ocasionadas por falhas no processo de cicatrização, que podem resultar em amputação, sendo, portanto, um considerável fator de incapacidade e invalidez, aposentadoria precoce e mortes evitáveis. Anualmente, de 2% a 3% das pessoas com diabetes podem desenvolver úlceras nos membros inferiores, e este percentual se eleva a 15% no transcurso de sua vida. É im-portante dizer que os gastos e as internações prolongadas causam grande prejuízo ao sistema público de saúde19,20.

Dessa forma, para que se previna tais agravos, estratégias são desenvolvidas no contexto da atenção básica, tais como educação abrangente dos pacientes quanto aos cuidados específicos com o pé, a pele e as unhas, e um programa para o uso de calçados te-rapêuticos, objetivando o estímulo da adesão ao tratamento e à prevenção de complicações21.

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A Estratégia de Saúde da Família (ESF) é uma das principais formas de aproximação da população com os serviços de saúde, que favorece o enfrentamento do diabetes no Brasil, possibili-tando tanto o estabelecimento de vínculos, quanto o trabalho multiprofissional22.

Baseando-se nesses fatores e levando em consideração a grande prevalência da DM na população idosa, que, por sua vez, trata-se de um público cuja saúde encontra-se fragilizada devido ao próprio processo natural do envelhecimento, observamos que é necessário analisar detalhadamente o perfil multidimensional da população mencionada, com ênfase na análise dos fatores de risco envolvidos no desenvolvimento do pé diabético, visando auxiliar no planejamento da saúde e da tomada de decisões das equipes de saúde. Sendo assim, é possível a readequação das ações e medidas de controle dos pacientes atendidos, sobretudo na prevenção das complicações decorrentes da doença23,24.

Dessa forma, este trabalho se propõe a traçar o perfil mul-tidimensional, com ênfase na análise do risco para desenvolvi-mento do pé diabético, em indivíduos acometidos por Diabetes Mellitus em uma área coberta pela Estratégia Saúde da Família da região Oeste de Natal, Rio Grande do Norte.

1.3.2 Método

Estudo descritivo desenvolvido em uma Unidade de Saúde da Família do Distrito Sanitário Oeste da cidade de Natal, Rio Grande do Norte, sendo esta Unidade de Saúde referência nesse

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distrito para o tratamento de lesões/feridas em pessoas diabéti-cas. A pesquisa foi apreciada pelo Comitê de Ética e Pesquisa da Universidade Federal do Rio Grande do Norte, sob protocolo n0 391/09, tendo obedecido todos os requisitos para sua aprovação. A população foi constituída por 241 pessoas com diabetes, sob a responsabilidade das três equipes de Saúde da Família da referida Unidade de Saúde e usuários dos seus serviços. Desta forma, a amostra foi constituída de 482 pés.

Previamente, foi construída uma ficha de avaliação que foi o instrumento de coleta de dados desta pesquisa. A partir de estudo prévio da literatura científica e baseado na avaliação de fichas exis-tentes em outros municípios da Federação, o nosso instrumento de coleta foi composto por quatro partes. A primeira incluiu as-pectos de identificação do participante e dados socioeconômicos; a segunda parte continha dados relacionados à doença, ao con-trole metabólico e fatores de risco; a terceira contemplou dados relacionados com a avaliação dos membros inferiores, incluindo condição dermatológica, estrutural, circulatória e neuropática, características dos calçados por ocasião da entrevista e higieni-zação dos pés; e, por último, a quarta parte identificou o grau de risco para lesão/ulceração nos pés dos participantes, utilizando uma classificação de risco para pé diabético, constituída por qua-tro categorias, de zero a 3, que são incluídos aspectos relevantes para intervenção precoce pela equipe de saúde 25,26.

A coleta de dados foi realizada por duas enfermeiras da Unida-de de Saúde no consultório, após assinatura do Termo de Consen-

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timento Livre e Esclarecido pelo paciente conforme os princípios éticos vigentes, procedendo-se, então, a entrevista, o exame dos pés e orientações sobre aspectos relevantes da doença e de seu controle, além dos cuidados preventivos com os pés e com os calçados.

Na avaliação dos calçados, consideraram-se quatro caracte-rísticas: estilo (modelo), largura, comprimento e material de fa-bricação. O estilo foi considerado apropriado quando era fechado, protegendo todo o pé na largura e no comprimento. Considerou-se aquele de tamanho adequado, ou seja, nem grande, nem peque-no, com espaço de um centímetro a mais da anatomia do pé e, no material, este devia ser confeccionado em couro macio ou lona/algodão21. Portanto, o calçado foi considerado apropriado quando as quatro características citadas estiveram presentes. A higieniza-ção dos pés foi considerada adequada quando eles apresentavam ausência de sujidades, sendo considerada boa higienização. Já a presença de areia e/ou aspecto sujo do pé foi considerada higieni-zação ruim 27-30.

Dados relacionados ao controle metabólico do diabetes fo-ram requisitados aos participantes por meio de exames labora-toriais. Para análise da pressão arterial, consideraram-se as me-tas propostas pela Sociedade Brasileira de Diabetes1 expressas no Consenso Brasileiro sobre Diabetes de 2002. Quanto ao índice de massa corporal (IMC), utilizou-se a classificação apresentada no Manual de Hipertensão Arterial e Diabetes Mellitus, de 1998, em consonância com a Organização Mundial de Saúde.

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Dados acerca do diabetes, condição socioeconômica, condi-ção dos pés, fatores de risco e lesões características do pé isquêmi-co e neuropático foram considerados para estas análises (quadros 1 e 2). Estes dados foram compilados no período de 2010 a 2012, em planilha do Excel e em seguida foram realizadas análises das médias e frequências no software SPSS versão 17.1.

Quadro 1- Variáveis analisadas a partir de dados do paciente, Natal-RN, 2012

Diabetes Tipo de diabetesClassificação de risco

Condições socioeconômicas

SexoIdadeEscolaridade

Condições dos pés

Higienização dos pésTipo de péUso de sapato adequado

Fatores de risco

EtilismoObesidadeTabagismoSedentarismoDietaUso de insulinaUso de hipoglicemiante oralHipertensão arterialCintura abdominalIMC

PASPAD

Fonte: Ficha de avaliação do pé da Unidade de Saúde da Família pesquisada.

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Quadro 2 - Variáveis analisadas segundo lesões observadas nos pés. Natal-RN, 2012

Lesões do pé isquêmico

Pele fina/brilhante

Cianose

Unhas atrofiadas

Rubor postural

Palidez à elevação

Pé frio

Ausência de pulsos

Enchimento capilar> 10 seg

Claudicação intermitente

Lesões do pé neuropático

Hipertrofia dos pequenos músculos

Acentuação do arco

Proeminência dos metatarsos

Dedos em garra

Calosidade

Vasodilatação dorsal

Pele seca/rachaduras

Pé quente

Alterações articulares

Fonte: Ficha de avaliação do pé da Unidade de Saúde pesquisada.

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1.3.3 Resultados e discussão

Observou-se que a maioria da população diabética estuda-da sofria do Diabetes Mellitus tipo 2 (98%), com maior parti-cipação do sexo feminino (71,3%), com idade média de 60,32 anos. 64% da população tinham ensino fundamental (completo e incompleto), enquanto que 17,1% consideravam-se uma popu-lação não alfabetizada, o que pode caracterizar essa população como de baixa escolaridade.

Um pouco menos da metade do grupo seguia regularmente a dieta recomendada pelo médico (49,8%); a grande maioria fazia uso de hipoglicemiantes orais (90,8%) e pouco mais de 7% eram usuários de insulina. A média da cintura abdominal foi de 103,05 cm e do índice de massa corporal foi de 30,02kg/m2, sendo quase um terço (30,2%) considerado obeso.

73% eram hipertensos controlados, com pressão arterial dias-tólica média de 80,95 mmHg e sistólica média de 134,55 mmHg. 64% eram sedentários, 13,9% eram fumantes e 5,2%, etilistas.

Quanto ao tipo anatômico de pé, observou-se que 13,1% possuíam pé cavo, 14,3%, pé plano, 71,1%, pé normal e 0,6%, pé amputado. Ao avaliar a condição de higiene do pé, somente 47,8% das pessoas realizavam uma higiene boa, enquanto 52,2% realiza-vam uma higiene ruim ou regular. Somente 11,2% faziam uso de sapatos adequados.

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Mais de dois terços dos pés avaliados estavam com classifi-cação de risco zero (73,1%), enquanto 9,2% com classificação de risco I, 15,3% com classificação II, e 2,0% com classificação de risco III. Os pés apresentaram mais características do pé neuro-pático, porém, características do pé isquêmico também foram encontradas em menor frequência (tabela 1 e tabela 2). Nenhum portador de Diabetes Mellitus tipo 1 apresentou lesões caracte-rísticas do pé diabético.

Tabela 1 – Frequência de características do pé isquêmico, Natal-RN, 2012

Pé isquêmicoSim Não

N % N %

Pele fina/brilhante 70 13,9 427 85,1

Cianose 20 4,0 477 95,0

Unhas atrofiadas 164 32,7 333 66,3

Rubor postural 30 6,0 467 93,0

Palidez à elevação 30 6,0 467 93,0

Pé frio 62 12,4 435 86,7

Ausência de pulsos 52 10,4 445 88,6

Enchimento capilar> 10 seg 24 4,8 473 94,2

Claudicação intermitente 84 16,7 413 82,3

Ausência de pêlos 122 24,3 375 74,7

Fonte: Ficha de avaliação do pé da Unidade de Saúde pesquisada.

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Tabela 2 – Frequência de características do pé neuropático, Natal-RN, 2012

Pé neuropáticoSim Não

N % N %

Hipertrofia dos pequenos músculos 132 26,3 366 72,9

Acentuação do arco 74 14,7 423 84,3

Proeminência dos metatarsos 110 21,9 387 77,1

Dedos em garra 79 15,7 418 83,3

Calosidade 257 51,2 240 47,8

Vasodilatação dorsal 151 30,1 346 68,9

Pele seca/rachaduras 335 66,7 162 32,3

Pé quente 74 14,7 423 84,3

Alterações articulares 06 1,2 491 97,8

Fonte: Ficha de avaliação do pé da Unidade de Saúde pesquisada.

A relevância do Diabetes Mellitus, como um sério problema de saúde coletiva traduz-se como importante na medida em que a maioria das complicações inerentes ao diabetes é altamente in-capacitante para a realização das atividades diárias e produtivas, uma vez que compromete a qualidade de vida e o tratamento des-sas complicações, sendo, portanto, extremamente oneroso para o sistema de saúde 31,32. Além disso, alguns fatores podem interferir no autocuidado dessas pessoas, como a idade avançada e o estilo de vida, sendo este último determinado pelas crenças e valores, além da condição econômica e de saúde no geral33.

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No estudo em questão, observou-se um predomínio de DM na população feminina em detrimento da população masculina. Achados semelhantes foram identificados em outros estudos, demons trando a predominância da doença nas mulheres33-35.

A maioria dos indivíduos do estudo eram aposentados ou afastados do trabalho devido ao DM. Um fator de grande difi-culdade evidenciado na literatura científica, para o controle e tratamento do diabetes, visto que a dieta e os medicamentos são importantes, quando não fornecidos pelos serviços de saúde, po-derão significar um acréscimo significativo nas despesas diárias36.

Outro fator pertinente está relacionado à questão da escola-ridade, pois representa um fator comum entre pessoas com dia-betes, em estudos nacionais e internacionais, em que o maior per-centual atingido possui baixo grau escolar37, constituindo-se em fator agravante para o desencadeamento de complicações crôni-cas, pela limitação do acesso às informações, devido ao possível comprometimento das habilidades de leitura, de escrita e de com-preensão das atividades de educação para o autocuidado preven-tivo e de controle33.

Souza et al. (2003),37 em um estudo sobre prevalência de Dia-betes Mellitus e fatores de risco em Campos dos Goitacazes-RJ relatou uma tendência para o aumento da prevalência do Diabetes Mellitus em indivíduos com baixo grau de instrução.

De acordo com os dados antropométricos registrados neste estudo, há porcentagem significativa de indivíduos acima do peso,

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segundo dados de IMC, e com risco muito elevado para o desen-volvimento de doenças cardiovasculares. Essa condição é preocu-pante, porque as complicações cardiovasculares são mais graves quando associadas ao diabetes37.

Segundo relatório recente da OMS sobre dieta, nutrição e pre-venção de doenças crônicas não-transmissíveis, a associação entre o ganho de peso, obesidade abdominal, sedentarismo e o desen-volvimento de Diabetes Mellitus 2 é convincente, e o consumo ali-mentar habitual é considerado um dos principais fatores passíveis de modificação relacionados ao desenvolvimento dessa doença38,39.

Aliado a isso, a alta incidência dos demais fatores de risco, as-sim como das patologias associadas, reforçam a necessidade de se-guimento desses indivíduos, principalmente na Atenção Primária e Secundária de Saúde, visando minimizar sua influência nas com-plicações da doença, direcionando as intervenções necessárias para promoção à saúde e à qualidade de vida dessa população39.

No entanto, embora sejam muitas as complicações sérias e dis-pendiosas que afetam os indivíduos com diabetes, tais como doen-ças do coração, problemas renais e cegueira, as complicações com os pés representam a maior parte: 40 a 70% de todas as amputações das extremidades inferiores estão relacionadas ao Diabetes Melli-tus, de acordo com o Consenso Internacional sobre Pé Diabético40.

Estudos vêm ressaltando a necessidade de os profissionais de saúde avaliarem os pés das pessoas com diabetes de forma minu-ciosa e com frequência regular, bem como desenvolverem ativi-

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dades educativas e aumento da autonomia, visando melhorar o autocuidado, principalmente a manutenção de um bom controle glicêmico33.

Se as lesões não forem tratadas a tempo, há o risco do desen-volvimento de úlceras diabéticas, que são desencadeadas por uma tríade patológica bastante clássica que envolve a neuropatia, a doen-ça vascular periférica e as infecções. Cada uma delas pode estar pre-sente de forma isolada ou em combinação com as outras, tornando o quadro clínico bastante complexo. O risco para o surgimento des-sas complicações crônicas aumenta quanto maior for a duração e a severidade da hiperglicemia ao longo dos anos da doença41.

Adicionalmente, o tabagismo, a hiperlipidemia e a hiperten-são arterial são co-fatores agravantes, porque causam ou aceleram o processo de aterosclerose, especialmente nas artérias tibiais40. Esses fatores associados ao trauma, irritação da pele, calçados impróprios, corpo estranho nos pés, corte inadequado das unhas e queimadu-ras, contribuem para o aumento de frequência do pé diabético e, consequentemente, para o aumento do risco de amputação41.

O Consenso Internacional do Pé Diabético40 afirma que a perda da sensibilidade (neuropatia) é o principal fator predispo-nente para o desenvolvimen to de úlceras nos pés. Se as condições dermatológicas dos pés estiverem comprometidas, qualquer pre-juízo na pele ou nos pés pode progredir até instalar-se uma lesão grave, que pode atingir tecidos profundos, especialmente se asso-ciadas a deformidades estruturais e perda da sensibilidade, a dor.

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Na avaliação dermatológica se detecta presen ça de calos, al-teração na umidade dos pés, presença de queratoses e rachaduras que podem se apresentar em decorrência da neuropatia autonô-mica, provocando um ressecamento da pele, pela falta de secreção sudorípara e sebácea24.

No presente estudo, observou-se um percentual significa-tivo de diabéticos com sintomas de neuropatia periférica, como câimbras, queimação e formigamento constantes. Além disso, observou-se a presença de fissuras e hiperceratose em cerca de 50% dos avaliados, e em menor percentual, a presença de micoses, de bolhas e de úlceras. Essas informa ções são importantes para a avaliação do pé do diabéti co, visto que auxiliam na detecção da neuropatia, pois, são marcadores de fatores de risco para o desen-volvimento de ulcerações33.

No que se refere à sensibilidade, observou-se alterações em cerca de 30% dos pacientes. Deve-se considerar que as pessoas da terceira idade apresentam (pelo próprio processo do envelheci-mento) diminuição da sensibilidade protetora, o que não está re-lacionado, necessariamente, com a neuropatia periférica. Por isso, ao fazer a avaliação dessa clientela, o profissional deve considerar as características da pele à procura de sinais de desidratação, de fissuras e de diminuição da transpiração em membros inferiores, bem como de descamação15,16.

Autores destacam que a diminuição da sensação protetora, ca-racterizada pela redução da sensação dolorosa de trauma na pele27-

30, assim como a ausência parcial ou total do reflexo Aquileu31,32

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constituem sinais precoces de futuros processos ulcerativos nos pés, significando alto risco para o desenvolvimento de complicações.

O comprometimento dos nervos sensitivos responsáveis pela sensibilidade dolorosa, térmica e do tátil ocasionam alterações ob-jetivas de diminuição ou ausência da sensibilidade dolorosa e dimi-nuição da sensibilidade térmica deixando os pacientes potencial-mente suscetíveis a traumas mecânicos, térmicos e químicos9,15,18.

A atrofia da musculatura intrínseca dos pés, decorrente da lesão dos nervos motores, ocasiona os dedos em garra, hálux em martelo e redução do coxim adiposo sobre as cabeças metatar-sianas o que favorece o atrito repetitivo contra os sapatos predis-pondo os pacientes à formação de calosidades, de hipertrofia das unhas e de ulcerações16-19. Essas alterações geralmente favorecem também o espessamento e encravamento das unhas e, consequen-temente, o desenvolvimento de úlceras17,19,20.

Deve-se ressaltar a importância do uso de sapatos adequados pelos indivíduos predisponentes à neuropatia diabética. Estudo prospectivo, realizado em hospital de ensino para avaliar pessoas com diabetes de alto risco, identificou menor recorrência de ulce-rações no grupo que havia recebido calçados especialmente con-feccionados34. Um outro estudo mostrou, também, menor recor-rência de úlceras e amputações entre aqueles que usaram calçados terapêuticos e receberam intenso treinamento educativo33.

Apesar do número de diabéticos classificados em risco zero no estudo, em relação à presença da neuropatia periférica ter sido

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o mais prevalente, encontrou-se uma alta frequência de indiví-duos classificados em risco II, que é caracterizado por neuropatia presente com deformidade, mostrando as possibilidades de des-fechos desfavoráveis no futuro, diante de todos os aspectos que já foram abordados.

De acordo com o Consenso Internacional sobre pé diabético (2001)23, nenhuma lesão no portador de DM deve ser considerada como trivial, pois, aparentemente, lesões mínimas podem levar à úlcera e atuar como por ta de entrada para uma infecção, com rápida dissemina ção. Portanto, calos, patologias das unhas e pele devem receber tratamento adequado25.

Muitas das alterações funcionais são reversíveis e passíveis de detecção, antes do aparecimento de lesões estruturais irreversíveis, daí a importância da educação em saúde, qualificação técnica, ma-nejo dos agravos e melhor capacidade instalada nos serviços para atender às necessidades de saúde da população. Existem evidências de que as alterações funcionais e estruturais iniciais criam condi-ções para que outros fatores, que não somente a hiperglicemia, se sobreponham na progressão dos processos patológicos. Desta for-ma, fatores agravantes como a hipertensão, o uso de álcool, o taba-gismo e os excessos e deficiências alimentares passam a ter papel primordial na irreversibilidade dessas complicações12.

O diagnóstico dessa situação pode e deve ser feito precoce-mente, já que uma adequada vigilância e assistência à saúde, alia-das a mudanças no estilo de vida e o controle da glicemia podem retardar o aparecimento da própria doença e prevenir, senão re-tardar suas complicações32,38.

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Desta forma, o presente estudo reforça os achados da lite-ratura em relação à necessidade de seguimento das pessoas com diabetes. Nesse sentido, para que isso ocorra, há a necessidade de garantir a profissionalização da gestão do Sistema Único de Saúde (SUS); o acesso, a escuta e o acolhimento do usuário; o aperfei-çoamento do planejamento e da avaliação das ações de saúde; as mudanças no financiamento dos serviços; a educação permanen-te dos trabalhadores; a identificação das condições de vida e das complicações advindas das doenças.

As atividades educativas preventivas e de acompanhamento constante dos sinais e sintomas da neuropatia diabética podem garantir a melhora na qualidade de vida dos pacientes, com redu-ção do número de amputações, e diminuição do ônus ao serviço de saúde. 

A carência existente no município do Natal quanto ao mo-nitoramento de pacientes diabéticos poderá ser suprida a partir da implantação da ficha de avaliação do pé diabético nas demais Unidades de Saúde, como forma de aprimorar o registro e a co-municação das informações importantes para as equipes multi-profissionais e a continuidade do cuidado prestado.

1.3.4 Considerações finais

Pode-se concluir que o perfil multidimensional com ênfase na análise do risco para o desenvolvimento do pé diabético envol-veu 241 pessoas com DM. Destas, a maioria sofre de DM tipo 2,

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é do sexo feminino, faz uso de hipoglicemiantes orais, tem ensino fundamental (completo e incompleto) e hipertensão controlada. Quase um terço é obeso e apresenta risco elevado para o desen-volvimento de doenças cardiovasculares concomitantes. Registra-mos também que mais de dois terços dos pés avaliados estão com classificação de risco zero e cerca de 30% das pessoas apresentam alterações de sensibilidade nos pés. Somente 11,2% dos pacientes fazem uso de sapatos adequados.

Esta análise possibilita que as equipes locais de saúde apri-morem o processo de trabalho e utilizem informações fidedignas para a comunicação entre si, para a qualificação do planejamento e avaliação das ações educativas, preventivas e de monitoramento dos sintomas da neuropatia diabética, visando à melhoria da qua-lidade de vida dos pacientes. Por outro lado, é importante destacar a relevância da educação em saúde para a autonomia dos usuá-rios, bem como a qualificação técnica e educação permanente dos trabalhadores da Unidade de Saúde da Família pesquisada, o que tem certamente contribuído para o manejo adequado dos agravos dos pacientes atendidos, para melhoria da capacidade instalada e reestruturação das redes de atenção do sistema de saúde e, conse-quentemente, para o atendimento das necessidades da população com o padrão de qualidade desejada.

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1.4 LONGEVIDADE E QUALIDADE DE VIDA

Kenio Costa LimaFlávia Cristiane de Azevedo Machado

Maria Regina de Macêdo Costa

1.4.1 Introdução

O envelhecimento populacional consiste em um fenômeno de amplitude mundial na atualidade, estando comumente asso-ciado às regiões mais desenvolvidas1. Tal processo iniciou-se no final do século XIX, em países da Europa Ocidental, espalhou-se pelo resto do Primeiro Mundo no século passado, e se estendeu, nas últimas décadas, por vários países do Terceiro Mundo, inclu-sive o Brasil1.

No Brasil, as transformações no padrão demográfico come-çam a ocorrer inicialmente e de forma tímida, a partir de1940, quando se nota um consistente declínio dos níveis gerais de mor-talidade, não acompanhado por um processo concomitante nos

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níveis de natalidade. O quadro de mudanças se acentua após a década de 1960, em decorrência de quedas expressivas da fecun-didade, a tal ponto que, quando comparado com situações viven-ciadas por outros países, o Brasil realizava uma das transições de-mográficas mais rápidas do mundo1.

Em 2050, estima-se que as pessoas com 65 anos ou mais cor-responderão a cerca de 19% da população brasileira2. Assim, o desafio é que esse aumento na longevidade esteja associado a uma qualidade de vida (QV) satisfatória para constituir-se numa con-quista real da sociedade como afirma Veras1.

A QV desejada é aquela em que o indivíduo dispõe de um mínimo de condições para desenvolver o máximo de suas poten-cialidades, podendo se basear em três princípios fundamentais: capacidade funcional, nível socioeconômico e satisfação 3,4,.

Portanto, o envelhecimento deve ocorrer com qualidade e manutenção da autonomia dos indivíduos, buscando preservar a oportunidade desses indivíduos continuarem a participar da sociedade, minimizando as possibilidades de exclusão social5-10. Sendo assim, o idoso que mantém sua independência e capacida-de de exercer sua autonomia é saudável mesmo em face de doen-ças crônicas1.

Essa independência pode ser de estrutura social (quando ocorre manutenção de seu papel ocupacional), afetiva, física (capa-cidade funcional para a realização de tarefas da vida diária) e com-portamental (consequência frequente da independência física) 11-13.

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A agregação de qualidade aos anos adicionais de vida depen-de de fatores relacionados às questões políticas da sociedade em que vivemos e às escolhas individuais que fazemos ao longo da vida. Portanto, a qualidade de vida envolve aspectos relacionados ao modo, às condições e aos estilos de vida14, bem como ao desen-volvimento sustentável, à ecologia humana, ao direito humano, ao direito social e às questões de democracia14.

O patamar material mínimo e universal para se falar em qua-lidade de vida diz respeito à satisfação das necessidades mais ele-mentares da vida humana, que são: alimentação, acesso à água potável, habitação, trabalho, educação, saúde e lazer; elementos materiais que têm como referência noções relativas ao conforto, ao bem-estar, e à realização individual e coletiva14.

Portanto, o envelhecimento bem-sucedido depende de Polí-ticas Públicas que respondam às demandas sociais de educação, de emprego, de saúde, de previdência social e, sobretudo, de cons-cientização da sociedade sobre a adoção de hábitos de vida pro-motores da saúde.

Uma das consequências da longevidade dissociada de condi-ções mínimas necessárias a uma QV satisfatória é a maior carga de doenças na população, maior procura dos serviços pela popu-lação idosa, maior frequência de internações hospitalares e au-mento de indivíduos com incapacidades1. Assim, a ampliação da população idosa (idade ≥ 60 anos) configura-se como um desafio às Políticas Públicas, especialmente às Políticas de Saúde1.

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Por conseguinte, o objetivo deste estudo foi discorrer sobre aspectos da longevidade e qualidade de vida para enfim, discutir o desafio que tal associação representa para as Políticas Públicas.

1.4.2 Envelhecimento e longevidade

O envelhecimento é um processo que no plano individual implica múltiplas trajetórias de vida e, no plano coletivo, se cons-trói sob diferentes influências de ordem sociocultural que acom-panham o curso da vida, se estendendo às suas fases tardias como a velhice15.

Neste sentido, enquanto o envelhecimento se define como processo sociovital multifacetado ao longo de todo o curso da vida, a velhice denota o estado de “ser velho”. Tal estado é uma condição resultante do processo de envelhecimento que gerações vivenciaram e vivenciam dentro de contextos sociais, políticos e individuais diversos15.

Portanto, o envelhecimento depende de todas as vivências anteriores do indivíduo, sob o ponto de vista biológico, socioe-mocional e econômico. Essas vivências influenciam a capacidade de enfrentamento das modificações, que ocorrem com o aumento da idade, traduzindo-se em diferentes modelos de velhice16-17.

O modelo de velhice almejado é aquele em que o indivíduo exerce suas atividades diárias básicas como alimentar-se, vestir-se, banhar-se; mantém seu papel social, por meio de um emprego

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ou por sua importância no núcleo da família ou de amigos, e, ain-da, possui condições dignas de moradia, de lazer e de alimenta-ção5, ou seja, é o modelo relacionado ao processo de envelhecer bem, com qualidade de vida, chamado de envelhecimento bem-sucedido, ativo ou robusto5. Desta forma, a longevidade somente é considerada uma conquista social, quando se agrega qualidade aos anos adicionais de vida1.

O envelhecimento bem-sucedido inclui a probabilidade baixa de doenças e de incapacidades relacionadas a essas doenças; alta capacidade funcional cognitiva e física; e engajamento ativo com a vida 5,18. Esses fatores foram comprovados em estudos como o de Moraes e Souza19, em que relações familiares e de amizade, saúde e bem-estar percebidos, capacidade funcional e suporte psicos-social apresentaram correlação significativa com envelhecimento bem-sucedido ao investigarem 400 idosos em Porto Alegre-RS5.

Portanto, a discussão sobre o envelhecimento da população e suas consequências deve perpassar pela temática da qualidade de vida. Isso porque o importante é atribuir vida aos anos do que anos à vida1. Esse é um dos motivos pelos quais a QV tem se destacado nos estudos das áreas sociais e da saúde coletiva como um todo.

1.4.3 Qualidade de vida

A QV se constitui em um compromisso pessoal na busca de uma vida saudável, estando associada às condições de vida como: saúde, moradia, educação, lazer, transporte, liberdade, trabalho,

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autoestima, entre outras condições4. Portanto, apesar da subjetivi-dade envolvida na concepção de qualidade de vida, seu conceito também engloba aspectos materiais, 4,14, 20,21. Além disso, não há como ter qualidade de vida sem a satisfação de necessidades bási-cas como alimentação, acesso à agua potável, habitação, trabalho, educação, saúde e lazer que remetem ao conforto, ao bem-estar e à realização individual e coletiva14.

Por conseguinte, a QV desejada é aquela em que o indivíduo dispõe de um mínimo de condições para desenvolver o máximo de suas potencialidades4. E sua avaliação pode se basear em três princípios fundamentais: capacidade funcional, nível socioeconô-mico e satisfaçã 3,4, podendo assim estar associada à capacidade física, ao estado emocional, à interação social, à atividade intelec-tual, à situação econômica e à autoproteção de saúde 4,20.

De forma geral, avaliar qualidade de vida consiste em compa-rar as condições disponíveis e as desejáveis13.

1.4.4 Qualidade de vida relacionada aos idosos

Não obstante, uma avaliação de QV em idosos deve abordar múltiplos critérios de natureza biológica, psicológica e socioestru-tural, visto que vários fatores são determinantes ou indicadores de bem-estar na velhice.

Segundo Neri12, longevidade, saúde biológica, saúde mental, satisfação, controle cognitivo, competência social, produtividade,

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atividade, eficácia cognitiva, status social, renda, continuidade de papéis familiares, ocupacionais e continuidade de relações infor-mais com amigos constituem esses fatores. A participação do idoso em atividades em grupo contribui para a conscientização da impor-tância do autocuidado, oportuniza a troca de experiências e gera sensação de bem-estar 17,22.

O idoso que mantém sua independência e sua capacidade de exercer sua autonomia é saudável mesmo em face de uma ou mais doenças crônicas1. Apesar de a idade ser um fator de risco para tais doenças, o envelhecimento não impede uma vivência autôno-ma1. Para Glass23, as doenças e limitações não impossibilitam a ex-periência pessoal de velhice bem-sucedida. Muitos idosos relatam estar envelhecendo bem, embora os resultados de testes clinica-mente objetivos demonstrem uma condição desfavorável de saúde5.

Em contrapartida, a dependência do idoso pode advir de uma questão social (quando ocorre a perda de papéis ocupacionais como a perda de emprego), afetiva, física (dependência na capaci-dade funcional para a realização de tarefas da vida diária) e com-portamental (consequência frequente da dependência física) 11,12,17.

O conhecimento de quais fatores estão relacionados à quali-dade de vida dos idosos é fundamental para orientar as políticas públicas em prol do envelhecimento bem sucedido24. Isso porque o incremento no número de idosos tem provocado um forte im-pacto nas demandas sociais, como educação, emprego, saúde e previdência social25, que precisam ser consideradas para formula-ção das Políticas Públicas. Tais políticas devem proporcionar qua-

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lidade de vida aos cidadãos como um todo, incluindo os idosos. Isso deve acontecer, sobretudo, nas políticas de proteção social em que se inserem as Políticas de Saúde26 .

1.4.5 A qualidade de vida e as políticas públicas para

idosos

Uma política direcionada aos idosos deve ter a melhoria da qualidade de vida como objetivo, devendo ser considerados as-pectos como capacidade funcional (capacidade de manter as ha-bilidades físicas e mentais necessárias para uma vida independen-te e autônoma) e necessidade de autonomia, de participação, de cuidado e de autossatisfação. É preciso também, atuar nos deter-minantes de saúde ao longo do curso da vida como um todo (so-ciais, econômicos, comportamentais, pessoais, culturais, ambien-te físico e acesso a serviços)1.

Entretanto, é importante reconhecer que a questão do idoso no País foi historicamente negligenciada pela maioria das políti-cas de atenção à saúde. A velhice era vista como doença e a apli-cação de recursos financeiros em políticas públicas sociais para o idoso era entendida como gasto, e não como investimento. Dessa forma, o Estado teve como foco a criação de infraestrutura econô-mica para expandir e desenvolver a lógica capitalista de acumula-ção financeira em detrimento à satisfação das demandas sociais27.

Com isso, a incorporação específica do idoso no âmbito das políticas públicas de Saúde no Brasil foi tardia. Apesar de que,

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desde 1986, na 8ª Conferência Mundial de Saúde, já ter-se con-siderado relevante uma Política Nacional para os idosos, e da Constituição Federal de 1988, representar um marco histórico em termos de conquistas para a população brasileira, inclusive para os idosos, somente a partir de 1994, é que o Brasil passou a dispor de uma política pública específica para o envelhecimento (Políti-ca Nacional do Idoso-PNI). A PNI posteriormente foi substituída pela Política Nacional de Saúde do Idoso (PNSI) 27.

A Política Nacional do Idoso (1994) teve por objetivo prin-cipal assegurar os direitos sociais do idoso (idade > de 60 anos), criar condições para promover sua autonomia, integração e parti-cipação efetiva na sociedade, com deveres atribuídos à família, ao Estado e à sociedade. Por sua vez, a PNSI efetuou um maior de-talhamento da PNI, ao mesmo tempo em que realizou sua fusão com a Lei Orgânica de Saúde Nº 8.080/90. Houve, portanto uma ampliação do escopo da política de saúde do idoso, na medida em que se estabeleceram diretrizes para nortear as ações relacionadas ao processo de envelhecimento27.

Os esforços de aprimoramento da legislação relativa à saúde do idoso avançaram ainda mais quando da criação do Estatuto do Idoso (2003), com a finalidade de assegurar os direitos das pes-soas idosas, reunindo em um só documento a síntese de todas as conquistas desse grupo etário27.

Em 2006, com a consolidação do Pacto pela Saúde, foi edi-tada a Política Nacional de Saúde da Pessoa Idosa (PNSPI), em substituição à PNSI27. A nova política é considerada uma estraté-

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gia norteadora voltada para o envelhecimento, assumindo, como principal finalidade, recuperar, manter e promover a autonomia e a independência dos idosos, direcionando medidas coletivas e in-dividuais de saúde, em consonância com os princípios e diretrizes do Sistema Único de Saúde.

Entretanto, é fundamental considerar os embates decorren-tes do confronto entre as demandas exigidas por essa política e as possibilidades de prestar esse serviço de forma efetiva, pois acar-reta mudanças no perfil de poder e de tomada de decisões dentro das famílias28.

Um dos fatores a ser considerado relaciona-se com o contex-to em que ocorre a escolha do cuidador, uma vez que nem sem-pre os cuidados são motivados por afetividade ou valores e, sim, frequentemente, em decorrência das necessidades impostas pela dependência, por instinto ou conjuntura, o que difere do ato de cuidar por vontade própria29.

Outra fragilidade é a responsabilização da família pela existên-cia de um idoso dependente no domicílio, que traz também conse-quências para a sociedade, uma vez que a condição de dependência exige cuidados específicos. É comum que algum familiar ou pessoa próxima se torne o cuidador do idoso em tempo integral, acarre-tando a exclusão do mercado de trabalho de uma pessoa potencial-mente produtiva. Os cuidadores não contam com políticas sociais efetivas de suporte em setores como auxílio domiciliar, assistência médica e serviços de orientação, além de as poucas ações vigentes serem insuficientes frente ao suporte que essas pessoas necessitam.

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Visando favorecer o apoio familiar aos idosos, é proposto pela PNSPI que as equipes de Saúde da Família avaliem o estresse do cuidador, favorecendo a manutenção de sua saúde, subsidian-do a prestação de cuidados adequados aos idosos, diminuindo o risco de violência doméstica e evitando a institucionalização da pessoa idosa. Vale salientar que uma inovação prevista pela PNS-PI inclui a criação do Programa de Internação Domiciliar no SUS que, além do atendimento propriamente dito ao idoso em seu do-micílio, prestado por uma equipe de saúde multiprofissional ca-pacitada, contempla, também, o treinamento de um integrante da família pela referida equipe multiprofissional para acompanhar o paciente. Entretanto, há poucas equipes implantadas, e sua meta de crescimento é gradativa. Caso essas responsabilidades de cui-dado sejam assumidas, será inquestionável o benefício para os idosos e suas famílias e, consequentemente, para a sociedade27.

Os profissionais de saúde constituem um grupo de atores-chave no campo da política de saúde em geral, e particularmen-te na PNSPI, em virtude do protagonismo que desempenham na atenção à saúde do idoso. Ao adentrarem no contexto em que vi-vem os idosos, esses profissionais se tornam parceiros do idoso se relacionando com a assistência às necessidades de saúde do idoso, atuando dentro do contexto familiar, incentivando o autocuidado, a implantação da Caderneta de Saúde da Pessoa Idosa, a implan-tação do Programa de Internação Domiciliar no SUS e identifi-cando o nível de dependência e de fragilidade do idoso.

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É importante considerar a dificuldade dos profissionais em prestar cuidados individualizados, integrais e humanizados às pessoas, devido às práticas tecnicistas arraigadas nos modelos de educação e formação profissional27. Os profissionais que trabalham com o processo de envelhecimento nas mais diversas áreas do saber (médicos, fisioterapeutas, enfermeiros, terapeutas ocupacionais e outros) devem tentar proporcionar, em todos os níveis de atenção à saúde (primário, secundário e terciário), o bem-estar biopsicosso-cial aos idosos, potencializando suas funções globais, a fim de ob-ter uma maior independência, autonomia e uma melhor qualidade para essa fase de vida. Esse fato se torna ainda mais crítico quando se considera a heterogeneidade biopsicossocial e a frequente com-plexidade clínica associadas ao envelhecimento. A própria política traz então implícitas, diretrizes relativas à capacitação dos profissio-nais, visando garantir o alcance de seus propósitos.

Verifica-se que, do ponto de vista normativo, as estratégias sugeridas pelas políticas públicas para a promoção do envelhe-cimento ativo, focadas na ESF e na capacitação profissional, são promissoras27.

A Política Nacional do Idoso, a Política Nacional de Saúde da Pessoa Idosa, e o Estatuto do Idoso são dispositivos legais que norteiam ações sociais e de saúde para garantir os direitos das pessoas idosas e obrigam o Estado a protegê-las. Porém, é sabido que a efetivação de uma política pública requer a atitude cons-ciente, ética e cidadã dos envolvidos e interessados em envelhecer de modo mais saudável possível. Assim, Estado, profissionais da

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saúde, idoso e sociedade em geral são corresponsáveis por esse processo do envelhecimento bem-sucedido.

As pesquisas na área do envelhecimento também devem es-timular a formulação de estratégias e ações sociais efetivas no to-cante à melhoria da qualidade de vida da população. O projeto Saúde, Bem-estar e Desenvolvimento (Sabe) e o estudo Bambuí 30,31 são exemplos dessa corrente. O Sabe faz uma coleta de infor-mações sobre as condições de vida dos idosos, tais como: estado de saúde, acesso e utilização de serviços, enquanto o Bambuí visa identificar fatores adversos à saúde de idosos.

Os programas sociais e de saúde devem buscar responder à necessidade premente de desmistificar os (pré) conceitos a respei-to da velhice, ancorados na moderna ciência do envelhecimento, para a construção de condições socioculturais propícias para uma velhice digna e prazerosa. Assim, construiremos um país consti-tuído de cidadãos e de pessoas incluídas e acolhidas em políticas sociais e de saúde, não importando sua faixa etária.

1.4.6 Considerações finais

A qualidade de vida deve ser a principal meta das políticas sociais. Cabe à sociedade lutar por esse direito, a fim de que o po-der público efetive, de fato, a qualidade de vida na agenda política.

Assim, ao poder público, cabe a incumbência de oferecer as melhores condições para que a sociedade possa desenvolver-se e

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envelhecer da melhor forma. Ao indivíduo, cabe a escolha de como vivenciar a sua vida. Sendo assim, cada um exercerá o direito de es-colher a maneira de se viver e de morrer. O que não pode acontecer é a falta de informações e subsídios para fazer essa escolha.

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30. Lebrão ML, Laurenti R. Saúde, bem-estar e envelhecimento: o estudo SABE no município de São Paulo. Rev bras epidemiol. 2005; 8 (2): 127-41.

31. Pinto RBR, Bastos LC. Abordagem das pesquisas em epidemiologia aplicada à gerontologia no Brasil. Rev bras epidemiol, 2007; 10 (3): 361-9.

1.5 BIOSSEGURANÇA, PERCEPÇÕES E VIVêNCIAS

DE ESTUDANTES DE ODONTOLOGIA SOBRE O

ATENDIMENTO AO PACIENTE HIV POSITIVO

Iris do Céu Clara CostaArthur Costa Rodrigues Farias

Georgia Costa de Araújo SouzaAntônio Medeiros Júnior

Cláudia Christiane Barros de Melo Medeiros

1.5.1 Introdução

Identificada em 1981, nos Estados Unidos, em estudos reali-zados nos Centers for Disease Control and Prevention (CDC), a Síndrome da Imunodeficiência Adquirida (AIDS) foi logo de iní-cio vinculada a comportamentos sexuais específicos e daí deno-minada nos meios de comunicação social como peste gay, câncer gay, entre outras, ocasionando percepção enviesada da magnitude do problema, além de contribuir para uma visão estigmatizante e discriminadora do paciente1.

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Estudos subsequentes2,3,4 esclareceram a sociedade que o ví-rus pode ser transmitido por meio de relações sexuais, de trans-fusão de sangue ou produtos sanguíneos, durante a gravidez, no parto e possivelmente, na amamentação.

Ainda na década de 1980, a partir do primeiro caso compro-vado de contaminação por acidente de trabalho, ocorrido num hospital da Inglaterra5, estava instaurada a neurose coletiva acerca do risco de contaminação com o vírus da AIDS para profissionais da saúde e até para outros pacientes, desencadeando um processo de forte segregação dos portadores da doença.

Outras pesquisas6,7,8,9 constataram a presença do vírus nas mais diversas matrizes biológicas, tais como secreções vaginais, lágrima, saliva, leite materno, entre outras matrizes biológicas, que contribuíram para ampliar a situação de alarme da classe mé-dica e de profissionais da área da saúde.

A disseminação da AIDS em todos os continentes, atingindo diferentes segmentos populacionais, trouxe à tona a necessidade de rever a formação dos profissionais da saúde, particularmente no que se refere ao comportamento pautado em valores humanísti-cos, éticos e técnico-científicos, capazes de responder às crescentes demandas da sociedade. Por outro lado, a pandemia também tem possibilitado enormes avanços no controle da infecção cruzada na prática odontológica, controle este que tem sido ressaltado em cur-sos de atualização e principalmente nos currículos universitários, em que a exigência da bioproteção ou biossegurança transcende

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ao uso adequado dos equipamentos de proteção individual (EPI), abrangendo também o modo de conduta e de comportamento e postura do profissional frente ao atendimento clínico.

Essa realidade exige uma mudança de concepção sobre a bios-segurança, já exercida por diversas faculdades estrangeiras, que engloba, na visão atual, tanto medidas materiais quanto compor-tamentais, algo idealizado pela academia odontológica brasileira, mas longe da situação ideal. Portanto, essa temática deve ser tra-balhada de uma forma didática mais enfática, sendo exigido, nas situações clínicas de rotina, que todos os pacientes sejam tratados da mesma maneira, independentemente de um conhecimento prévio da sua sorologia para HIV ou qualquer outra infecção.

Felizmente, as pesquisas têm avançado muito no que se re-fere à prevenção, ao tratamento e ao controle da AIDS, e tão im-portante quanto isso, será dar início também a uma etapa com-portamental com relação ao caráter social da doença, em que os soropositivos passam a ser mais respeitados e tratados com soli-dariedade, num processo de combate ao estigma da doença10.

Aliás, por causa do estigma associado ao HIV/AIDS, muitas pessoas podem se sentir envergonhadas e culpadas diante do diag-nóstico sorológico, indicando que são portadoras do HIV. Estar ex-posto à “aidsfobia”, à homofobia ou a qualquer tipo de preconceito é sempre uma situação dolorosa. Assim, o portador de HIV desen-volve estratégias de se proteger do preconceito, seja buscando pre-paro e amadurecimento emocional para lidar com possíveis situa-ções adversas, seja não revelando a sua condição de soropositivo.

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Desta forma, aqueles profissionais que não adotam medidas uniformes e irrestritas de prevenção e controle para qualquer pa-ciente ou que apenas se protegem quando atendem paciente que se declara portador, é irresponsável triplamente na medida em que se expõe, expõe a sua equipe, bem como os seus pacientes.

O contato constante com saliva e sangue experimentado por cirurgiões-dentistas e acadêmicos de odontologia reforça o con-tato destes com microrganismos patogênicos, inclusive o HIV. Embora o risco de infecção por HIV seja baixo por acidentes na clínica, estudantes de Odontologia podem ser um grupo particu-larmente vulnerável, por muitas razões, incluindo a falta de expe-riência e habilidade11.

Sobre isso, estudos conduzidos com acadêmicos de Odon-tologia identificaram atitudes discriminatórias, revelando que alguns preferiam não atender pacientes com hepatite e usuários de drogas intravenosas, devido ao aumento do risco de infecção nesses casos12, pois apresentam pouco conhecimento sobre o tema e, embora não temam um contato social, temem realizar o trata-mento em HIV positivos13. Os estudos mostram, pois, que a falta de conhecimento leva a atitudes imprudentes na clínica odontoló-gica, gerando condutas diferentes a depender do paciente. Porém é necessário expor que nem todos revelam suas patologias.

Partindo do exposto, este trabalho se propôs a conhecer o ní-vel de preparo dos concluintes do Curso de Odontologia da UFRN sobre o atendimento ao paciente HIV positivo, englobando a ve-rificação do uso das medidas de Biossegurança e a atualização de

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conhecimentos científicos, visto que o conhecimento é caminho para se vencer o preconceito e se obter mais tranquilidade na hora de agir, além da postura (positiva ou negativa) que eles demons-tram no que se refere a esse paciente.

1.5.2 Revisão da literatura

A inclusão da Biossegurança nos currículos universitários é uma medida de estimado valor, que veio reforçar o cuidado com a saúde de toda a equipe de saúde e dos pacientes. Uma vez que os estudantes tiverem um melhor contato com as normas para um atendimento de qualidade e noções do assunto, certamente será minimizada a presença de microrganismos patogênicos tão inde-sejáveis no ambiente de trabalho, onde tanto a saúde dos profis-sionais de saúde, quanto a da população atendida está em questão.

O número de pessoas infectadas por hepatites virais e HIV tem aumentando em todo o mundo, consequentemente, essas pessoas passam a procurar mais pelos atendimentos médicos e odontológicos12,14. Desta forma, torna-se importante desenvolver o comportamento dos estudantes de Odontologia frente a esse processo, pois é no momento da formação que se adquirem hábi-tos que vão perdurar por toda a prática profissional.

A esse respeito, conhecimentos e atitudes de universitários frente ao atendimento odontológico a pacientes com doenças transmissíveis vêm sendo estudados nos últimos anos11-15. Alguns resultados apontam que o nível de conhecimento das doenças in-

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fecciosas e suas rotas de transmissão aumenta a cada ano de estu-do, entre os acadêmicos de Odontologia e que mais conhecimento sobre o tema leva a menos atitudes discriminatórias em relação aos pacientes com HIV, HBV e HCV12.

Estudos anteriores4,5,7 apontavam o estigma relacionando ho-mossexualidade e infecção pelo HIV, que relataram que o nível de empatia e cuidado era negativamente afetado quando se percebia que o paciente era homossexual. Uma pesquisa com acadêmi-cos de Odontologia nigerianos encontrou uma resposta negativa quando um quarto dos entrevistados relatou ter uma atitude in-sensível para com os homossexuais em virtude do risco de conta-minação pelo HIV16.

Lopes, Quadros, Bonfim, Resende, Neves, Junior et al.17, após avaliarem a biossegurança na prática dos alunos de Odontologia, obtiveram como resultado que todos os alunos utilizavam equi-pamentos de proteção individual, embora nem sempre de forma correta e que é baixo o conhecimento sobre processos de esterili-zação. Assim, embora os alunos tivessem conhecimento razoável dos riscos e do controle de infecção, a falta consiste em incorporar procedimentos seguros como rotina na prática diária.

Outra pesquisa, realizada por Lal, Kumar, Ingle, Gulati18, com concluintes de uma escola de enfermagem, identificou que mais de um quarto dos entrevistados opinaram que a recusa de atendimento deveria ser de livre escolha e uma proporção igual opinou dizendo que isso é um ato discriminatório. A maioria foi a favor de se fazer testes de HIV para os vários grupos de risco,

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no sentido de aumentar a segurança, bem como as medidas de proteção de quem vai atender.

Para Discacciati e Vilaça9, o fato de o profissional saber que um paciente está infectado pelo HIV, ou que tem comportamento de risco para infecção, deve encorajá-lo a ser mais cuidadoso, po-rém sem exageros que intimidem o paciente ao invés de ajudá-lo. Na verdade, os profissionais de saúde devem considerar todos os pacientes como potencialmente infectados, sendo que os proce-dimentos de biossegurança devem ser adotados como rotina em todo e qualquer atendimento, indiscriminadamente.

Pela perspectiva da prática clínica, os profissionais deveriam tentar estabelecer uma relação de amizade confiável com seus pa-cientes para formular um plano de tratamento envolvendo uma ativa participação deles, correlacionando variáveis sociodemo-gráficas, médicas, terapias antirretrovirais, terapias alternativas e psicossociais, com a qualidade de vida em soropositivos19.

Tendo como argumento os resultados da pesquisa de Rezen-de 20, realizada com alunos e profissionais durante o II Congres-so Mundial de Odontologia de Londrina/PR, foi implantado um Programa de Assistência Odontológica para pacientes soroposi-tivos, no Curso de Graduação de Odontologia da Universidade Estadual de Londrina. O projeto tem como características levar o aluno a conhecer melhor a doença, quebrando o estigma que a en-volve, vivenciar os fundamentos da bioética na linha personalista e potencializar medidas de prevenção, buscando-se consolidar o desejo das instituições de ensino superior que é ajudar o aluno a

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construir seu projeto de vida de forma humanizada, proporcio-nando um espaço para reflexões e a busca da sensibilidade do ser humano, da solidariedade, do respeito ao outro e o aprender a conviver com as diferenças. Na opinião do autor, este é o caminho para sairmos da doutrinação, ensinando e aprendendo preceitos e códigos rígidos, de forma mais dialógica e humanizada.

Esses objetivos apontam para uma reflexão sobre a bioética, segundo a qual Gonçalves e Verdi21, perpassa casos comumente apontados como a eutanásia, a fecundação assistida e o DNA re-combinante. Envolve, pois, questões trazidas com a prática odon-tológica, marcada por conflitos éticos trazidos por: advento do HIV/AIDS, comércio de dentes humanos, descobertas de novas técnicas e biomateriais, paradoxos entre políticas públicas de saú-de e justiça social e constante busca da humanização e do respeito aos princípios éticos na relação entre profissional e paciente21.

Assim, estudos que revelam despreparo, preconceito e medo relacionados ao tratamento de soropositivos são comuns22-23 e apontam para a necessidade da implantação de programas siste-máticos de esclarecimento e atualização de conhecimentos para acadêmicos e dentistas.

Grande número de profissionais mostra-se pouco informa-dos a respeito do manejo e transmissão do HIV/AIDS, o que leva a atitudes equivocadas e em alguns casos o não atendimento ao portador do vírus23. A falta de conhecimento e despreparo dos profissionais conduz o profissional ao medo e ao erro no atendi-mento ao soropositivo.

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Discacciati e Pordeus24 e Ferreira25 mencionam que o cirur-gião Dentista deve informar seus pacientes, sobre as medidas de controle de infecção adotadas em sua prática rotineira, trazendo maior tranquilidade e segurança a essas pessoas. Os equipamen-tos para proteção individual (EPI) estão cada vez mais sendo utili-zados, encorajando os pacientes a continuarem o tratamento mes-mo sabendo que seu dentista atende paciente com AIDS.

Esforços adicionais para esclarecer profissionais e acadêmicos de Odontologia por meio de programas educacionais e de treinamento podem proporcionar que eles estejam alertas para o número crescente de indivíduos infectados pelo HIV, no sentido de diagnosticar e tratar precocemente as lesões bucais associadas, com biossegurança apro-priada, protegendo a todos os envolvidos na cadeia.

1.5.3 Metodologia

A coleta de dados foi realizada a partir de dois instrumentos, um teste de associação livre de palavras e uma entrevista estrutu-rada, aplicada individualmente entre os concluintes do Curso de Odontologia da UFRN, somando um total de 65 alunos.

Antes da entrevista, foi solicitado que o participante citasse cinco palavras que ele lembrava ao saber que iria realizar o trata-mento em um paciente HIV positivo. Em seguida, deveria marcar, entre as palavras evocadas, a mais significativa.

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Este procedimento metodológico possibilita identificar qua-litativamente a centralidade hipotética das palavras relevantes que apresentam alta frequência e baixa ordem média de aparecimento, características importantes de uma estrutura de elementos cogni-tivos, também delineada a partir de critérios quantitativos.

Desta forma, define-se a relevância de uma palavra por meio do cruzamento entre a ordem e a frequência. Uma palavra rele-vante deve aparecer nos primeiros lugares e sempre com frequên-cia elevada.

Os dados foram analisados a partir da categorização das respostas do roteiro da entrevista, que foram agrupadas em ca-tegorias emergentes do material textual. Além da categorização, analisou-se os dados obtidos pela Técnica da Associação Livre de Palavras, por meio da Teoria do Núcleo Central das Representa-ções Sociais dos entrevistados.

1.5.4 Resultados e discussão

Os dados analisados a partir da categorização das respostas foram agrupados em categorias emergentes dispostas no quadro 1, apresentando o número de evocações dessas categorias por or-dem de citação. A categoria mais citada foi Biossegurança, com 71,2% das evocações, seguida de Preconceito (15,1%), Conheci-mento (9%), Respeito (6,7%) e Controle (4,6%).

Dentro da categoria Biossegurança, a palavra com mesmo nome foi a mais evocada e considerada a mais significativa. Pro-

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teção aparece como a segunda palavra mais citada e também mais significativa nessa ordem, revelando uma forte preocupação dos alunos com o cuidado que deve ser dispensado durante o atendi-mento ao paciente HIV positivo.

Quadro 1. Número de evocações das categorias por ordem de citação, Natal/RN, 2012

CATEGORIA COMPONENTES 1ª 2ª 3ª TotalBiossegurança Atenção 2 2 3 7

Bata 0 1 0 1Biossegurança 28 1 3 32Certeza da soro positividade 0 1 0 1Contaminação 1 2 0 3Desinfecção 0 0 1 1Drogas 0 0 1 1EPI 3 2 2 7Esterilização 0 0 2 2Gorro 0 1 0 1Infecção Cruzada 0 3 1 4Instrumentos Pérfuro-cortantes 0 0 2 2Luvas 2 5 0 7Máscara 0 0 4 4Óculos 0 1 2 3Proteção 11 10 7 28Risco 1 4 4 9Sangue 0 0 1 1Transmissão 1 1 0 2Vulnerabilidade 0 1 0 1SUBTOTAL 49 35 33 117

Preconceito Insegurança 0 1 4 5Medo 8 5 4 17Não ter preconceito 0 1 0 1Preconceito 2 2 3 7

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SUBTOTAL 10 9 11 30Conhecimento Anamnese 0 0 2 2

Compreensão 1 0 0 1Diagnóstico 0 1 2 3Doença 0 0 1 1Exames complementares 0 1 0 1Manifestações orais 0 0 1 1Patologias 0 1 0 1Prevenção 5 6 5 16SUBTOTAL 6 9 10 25

Respeito Humanidade 0 1 0 1Respeito 1 3 5 9Solidariedade 0 0 2 2SUBTOTAL 1 4 7 13

Controle Controle 1 1 1 3Antivirais 1 0 2 3Orientação 0 3 0 3SUBTOTAL 2 4 3 9

Fonte: Dados dos autores. Natal/RN, 2012.

A literatura relata que o número de pessoas soropositivas cresce a cada dia, tanto por causa da disseminação do vírus HIV quanto pelo aumento da sobrevida propiciado pelo uso de medi-camentos antirretrovirais. Aquela visão antiga acerca da existên-cia de grupos de risco para AIDS acabou. Todo e qualquer pacien-te deve ser considerado potencialmente portador do vírus, pois é impossível identificar quando uma pessoa é portadora ou não apenas pela aparência. Então, as precauções devem se tornar pos-turas habituais nos serviços de saúde por meio do uso rotineiro e adequado de medidas universais de biossegurança26.

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No que se refere às medidas utilizadas na rotina clínica, pô-de-se observar que a maioria dos entrevistados se mostrou ciente quanto a esse aspecto, obedecendo às normas universais da bios-segurança, em que 72% fazem uso do Equipamento de Proteção Individual completo indiscriminadamente, e apenas 12% se limi-tam e abdicam o uso de alguns equipamentos de proteção como se verifica na tabela 1. Porém, quando colocados diante da situação de atendimento a um paciente HIV positivo, 39% do total assumiria uma postura mais preventiva através de um cuidado maior na lava-gem do material, durante os procedimentos cirúrgicos e durante o uso de instrumentos pérfuro cortantes conforme mostra a tabela 2.

Esse resultado revelou que uma parcela significativa dos alu-nos é acomodada quanto ao uso das medidas preventivas, sendo reforçada apenas quando conhecida a situação de perigo, embora esses procedimentos devam ser executados rotineiramente e inde-pendente da situação de saúde do paciente.

Tabela 1 – Medidas de biossegurança usadas pelos alunos no atendimento de rotina, Natal/RN, 2012

Medidas de Biossegurança N %EPI* completo 47 72

EPI completo + Álcool 70% em tudo 4 6EPI menos óculos 7 10

EPI e não usa “Rollpack” 1 1EPI completo + EPI p/ paciente 6 9

*Equipamento de Proteção Individual.Fonte: Dados dos autores. Natal/RN, 2012.

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Tabela 2 – Medidas acrescentadas pelos alunos se o paciente for portador do HIV, Natal/RN, 2006

Medidas acrescentadas se o paciente for HIV+ n %

+ cuidado nos procedimentos, principalmente os cruentos 11 17

+ cuidado na lavagem do material 6 10

+ atenção nos instrumentos cortantes 7 11

Não acrescentaria nada 11 17

Atenderia num consultório isolado 1 1

+ um par de luvas ou luvas cirúrgicas 29 42

Fonte: Dados dos autores. Natal/RN, 2012.

Esse comportamento pode ser originário da apropriação fragmentada do conhecimento, característica marcante do atual modelo hegemônico de formação profissional na área da saúde, que reproduz saberes dicotomizados e descontextualizados, gera-dos apenas no âmbito das fronteiras demarcadas pelas disciplinas. Entretanto, atualmente, reconhece-se que o conhecimento desco-nectado da realidade é impróprio ao desenvolvimento de práticas preventivas e terapêuticas eficientes.

Um dado interessante que pode ser observado na Tabela 3, é que 72% dos entrevistados declararam estar preparados para atenderem pacientes com AIDS, em que 40% afirmaram que aten-deriam como se fosse um paciente de rotina, como qualquer ou-tro, guardando-se os princípios universais da biossegurança. Es-ses dados mantêm entre si uma correlação significativa, revelando

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uma postura positiva do grupo entrevistado, evidenciando maior conscientização e uma adequação no uso das medidas de biosse-gurança como mostra a figura 1. Apesar de a maioria ter demons-trado uma postura positiva, a discriminação continua existindo, embora de forma mais sutil, em que 26% dos entrevistados alega-ram falta de preparo psicológico, medo e preconceito.

A falta de preparo psicológico e o medo da infecção podem ter várias origens, uma delas a própria representação social da AIDS, que desde o início da epidemia, afeta negativamente os profissionais de saúde9.

Tabela 3 – Nível de preparo para atender paciente portador do HIV segundo os entrevistados, Natal/RN, 2012

Quanto ao nível de preparação para atender um paciente HIV+SENTE-SE PREPARADO N %Nada contra, mas teria mais cuidado 9 14É um paciente como outro qualquer 26 40É só tomar precaução 10 16Nunca atendeu, mas gostaria de ter essa experiência 3 4SUBTOTAL 48 72NÃO SE SENTE PREPARADO N %Psicologicamente 3 4Teria medo 6 10Ficaria com receio (preconceito) 8 12SUBTOTAL 17 26TOTAL 65 100

Fonte: Dados dos autores. Natal/RN, 2012.

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Figura 1– Gráfico de dispersão das categorias mostrando uma correlação significativa entre as proporções das evocações rapidamente associadas e das consideradas mais importantes, Natal/RN, 2012

Fonte: Dados dos autores. Natal/RN, 2012.

Neste sentido, Jodelet, Ohana, Biadi, Rikou27 registram que a AIDS é o primeiro caso de doença cujas histórias social e médica se desenvolveram conjuntamente. Seu aparecimento tem como particularidade o fato de que a ausência de referências médicas conduziu a uma primeira qualificação social da doença (câncer gay, peste gay etc.). Posteriormente, ocorreu em reduzido espaço de tempo, uma interligação entre o progresso dos conhecimentos científicos e as imagens construídas sobre AIDS e o doente no es-paço público.

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Nesta pesquisa, 75% dos alunos revelaram que receberam suporte teórico quanto ao atendimento de pacientes HIV posi-tivos durante sua formação acadêmica, comentando, porém, que o assunto não é abordado de forma satisfatória e que esse tema deveria ser mais enfatizado, e 23% afirmaram não terem recebido nenhum tipo de preparo.

A falta de preparo dos acadêmicos de Cursos de Odontolo-gia também foi percebida em outros estudos11,16. Até mesmo com profissionais, os resultados do estudo de Corrêa, Bittar, Mene-ghim, Ambrosano, Pereira28 mostraram que menos da metade da amostra (42,1%) possuíam conhecimento e segurança para aten-der pacientes HIV/AIDS, revelando, pois, um nível de conheci-mento insatisfatório.

A maioria dos entrevistados revelou que é importante e ne-cessário um envolvimento maior das universidades no que se re-fere a uma abordagem mais profunda acerca dessas enfermidades, fornecendo ao alunado uma melhor formação científica por meio de reforço de conhecimento, assim como, mais contato com pa-cientes portadores do HIV, que deveria ser feito para desmistificar a doença e proporcionar um atendimento mais seguro.

Algumas sugestões foram formuladas pelos entrevistados no sentido de atualizar conteúdos programáticos de algumas disci-plinas. Uma parcela significativa (39%) sugere que esta temática seja reforçada no decorrer do curso, 42% pedem estágios práticos de atendimento a pacientes HIV positivos, 13% acham importan-te incrementar no meio acadêmico um programa de conscienti-

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zação do aluno e apenas 4% relatam que nada precisaria ser acres-centado, ou seja, o que já sabem é suficiente.

Os nossos resultados são corroborados por Sposto et al.13 e Re-zende20, que sugerem a inclusão da biossegurança nos currículos universitários da saúde, o que levará os alunos a conhecerem me-lhor as doenças e consequentemente, melhor proteger a si e aos seus pacientes, por meio de atitudes responsáveis, éticas e profissionais.

Corrobora esse apontamento o estudo de Jafari et al.15, em que após um programa educacional projetado para formandos do Curso de Odontologia em uma faculdade do Irã, sobre como cuidar de pacientes com HIV/AIDS, resultados positivos foram alcançados para os acadêmicos que vivenciaram esta intervenção, com melhora do conhecimento e atitudes sobre o tema.

Garantir acesso aos serviços odontológicos, oferecendo programas de educação e prevenção de doenças bucais é funda-mental para uma melhor qualidade de vida aos indivíduos com AIDS. Assim, importante e ético é que não se negue atendimento ao paciente portador do HIV ou da AIDS. Serviços mal estru-turados, em que há um elevado grau de despreparo estrutural e de conscientização por parte dos profissionais, são serviços que não deveriam estar aptos a atender nenhum tipo de paciente, pois o pessoal que ali trabalha e os próprios pacientes encontram-se num ambiente de elevado risco de contágio para qualquer tipo de doença infectocontagiosa. Assim, serviços da saúde devem apre-sentar condições de atendimento dentro dos padrões universais

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da biossegurança para estarem aptos a atender qualquer tipo de paciente e evitar a contaminação cruzada.

A ampliação de serviços voltados a esse público-alvo, com treinamento da equipe de saúde bucal e estudantes de Odonto-logia, na zona rural de Oregon fez aumentar de 10% para 65% os cuidados odontlógicos a pacientes HIV positivos, enquanto que a taxa de ausências diminuiu de 40% para 10%29. Percebe-se, por-tanto, o quanto um serviço de qualidade com profissionais capa-citados e infraestrutura apropriada pode trazer benefícios a inú-meros pacientes com HIV/AIDS, e menos riscos aos profissionais e demais pacientes.

Sobre atender pacientes soropositivos, a maior parte dos en-trevistados (58%) não se recusaria a atendê-los, mencionando que estes devem ser atendidos e respeitados como qualquer ou-tro paciente, pois também são merecedores da atenção à saúde (58%), outros revelaram que não se recusariam visto que, a recusa do atendimento é uma atitude discriminatória, constituindo-se em infrações éticas (17%) e 15% mencionaram que teriam certo receio, mas atenderiam. Apenas 9% dos alunos se recusariam a tratar o paciente HIV positivo por não possuir preparo suficiente ou por medo, revelando desinformação, temor e despreparo.

Resultados semelhantes foram encontrados no estudo de Myers, Myers, Wheat, Yin11, em que apenas 11.4% dos estudan-tes de Odontologia atuantes em clínica revelaram que não aten-deriam pacientes HIV positivos, e ainda menores em estudantes pré-clínica (4,1%). Por outro lado, no estudo de Azodo et al.16,

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48% dos acadêmicos expressaram relutância em tratar pacientes HIV positivos. Ao se dispor a tratar pacientes com HIV/AIDS, cumpre-se o direito ao atendimento, com respeito a todo paciente, garantindo acesso aos serviços de saúde sem qualquer discrimi-nação e o direito à saúde.

1.5.5 Conclusões

Observou-se que a maioria dos alunos faz uso do Equipa-mento de Proteção Individual completo indiscriminadamente. Esse comportamento revela uma postura positiva do grupo en-trevistado, evidenciando maior conscientização e uma adequação das medidas universais de biossegurança.

Todavia, pode-se apreender que parte dos estudantes perma-nece impregnada do medo e da vulnerabilidade diante da AIDS, convivendo contraditoriamente com o que armazenou de conhe-cimentos acerca da doença e das normas universais de biossegu-rança e, com o que vem sendo construído socialmente, ao longo do tempo, como representações dessa moléstia.

Grande parte dos entrevistados relatou que a Universidade precisa avaliar o papel que lhe compete sobre a inserção nos seus conteúdos curriculares, de temas emergentes como a AIDS, por exemplo, para assim formar profissionais aptos a exercerem suas obrigações legais e éticas. Neste sentido, para que a Universida-de acompanhe as mudanças, torna-se necessário um processo de capacitação permanente e educação continuada envolvendo pro-

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fessores, funcionários e alunos acerca do tema, com o objetivo de desmistificar a doença, de qualificar tecnicamente equipes multi-profissionais de saúde para o manejo de pacientes e compreensão dos aspectos sociais presentes na realidade epidemiológica, muitas vezes encoberta pelo sub-registro, estigma e preconceito. Isso cer-tamente propiciará um bom relacionamento profissional/paciente, oportunizando uma abordagem mais abrangente das necessidades de saúde individuais e coletivas, cada vez mais dinâmicas no mun-do moderno, favorecendo a formação de profissionais seguros, con-fiantes, de comportamento ético, e mais humanizados.

Sugere-se ainda, que essa questão seja abordada de forma satisfatória e frequente durante o transcorrer do curso. Que seja discutida, experimentada e vivenciada na academia, nas redes de atenção à saúde, nas instâncias gestoras e de controle social do sis-tema de saúde, enfim, em todos os espaços formativos, enfatizan-do o cuidado em suas dimensões social, humanista e biológica, considerando os diferentes fatores inerentes ao trinômio serviços de saúde-profissional-paciente e não apenas a ênfase às doenças.

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Referências

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PARTE 2

PESQUISAS QUANTITATIVAS

EM SAÚDE

2.1 QUALIDADE DE VIDA E SOFRIMENTO PSÍQUICO

EM PROFESSORES DO ENSINO PÚBLICO DE

NATAL-RN, BRASILMaurício Roberto Campelo de Macedo

Isa Maria Hetzel de MacedoGrasiela Piuvezam

Daniele BrandãoLarissa da Silva

Marina Arruda CâmaraMiguel Rogério Segundo

2.1.1 Introdução

A Organização Mundial de Saúde (OMS), por meio do Gru-po de Qualidade de Vida, The World Health Organization Quali-ty of Life Group (WHOQOL Group) (1995), define qualidade de vida (QLV) como “a percepção do indivíduo de sua posição na vida, no contexto da cultura e do sistema de valores em que vive e em relação aos seus objetivos, expectativas, padrões e preocupa-ções”1. Isso pressupõe que QLV é uma construção subjetiva, mul-tidimensional e composta por elementos positivos e negativos2, sendo essa a definição adotada neste trabalho.

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A QLV de docentes da rede pública brasileira, de maneira geral, recebe influência de diversos fatores associados. Entre eles, estão: excesso de tarefas burocráticas, alta exigência de trabalho, pressão do tempo, falta de autonomia e infraestrutura do ambien-te escolar, relações conflitantes com alunos e seus familiares, prin-cipalmente, baixa remuneração3. Gasparini e Barreto4 destacam ainda: instabilidade no emprego, mau relacionamento com cole-gas, falta de interesse de alguns estudantes nas aulas ministradas, abandono da educação pelas políticas governamentais, violência e responsabilidades extracurriculares.

Esses diversos fatores somados contribuem para o compro-metimento da saúde mental dos professores, levando ao sofrimen-to psíquico, à depreciação e à desqualificação social, psicológica e biológica dos docentes4. Porto et al.5, investigaram a relação entre sofrimento psíquico dos docentes com transtornos mentais, como os distúrbios psíquicos menores, classificados como distúrbios ansiosos, depressivos ou somatizações, mas que não necessaria-mente geram procura de tratamento especializado.

Neste contexto, sofrimentos psíquicos são situações que não podem ser consideradas doenças, mas que têm um impacto signi-ficativo na vida dos cidadãos.

Segundo Macedo, Macedo, França e Guerra6, no projeto de pesquisa “Qualidade de vida e saúde mental em Natal: uma con-tribuição para as políticas de saúde mental e atenção básica do SUS”, realizado na Universidade Federal do Rio Grande do Norte em 2007, é possível identificar problemas surgidos nos contextos

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da gravidez em adolescentes, das formas endêmicas de violência (doméstica, urbana, no trânsito), da instabilidade crescente no emprego, das rápidas mudanças culturais em curso que tendem a apagar referenciais de comportamento e constituir fontes contí-nuas de estresse e ansiedade.

Reforçando o exposto anteriormente, estudo realizado em Natal-RN (2009) mostrou que os professores da rede pública mu-nicipal tiveram uma avaliação global mais negativa da QLV refe-rente aos aspectos físicos e ambientais, analisados por meio do questionário WHOQOL-Bref.

Diante dessa problemática, o presente artigo teve por objeti-vo estimar a prevalência de sofrimento psíquico e sua associação com QLV em docentes da rede pública de Natal-RN, Brasil.

2.1.2 Métodos

Desenho do estudo

Trata-se de um estudo observacional do tipo transversal rea-lizado com professores da rede pública municipal de ensino de Natal-RN, no ano de 2010. A estrutura da pesquisa foi baseada no protocolo do Strengthening the reporting of observational studies in epidemiology (STROBE) para estudos seccionais7.

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Cálculo e critérios de seleção da amostra

De acordo com a Secretaria Municipal de Educação, em 2007, Natal apresentava uma população de 2651 professores da rede pú-blica municipal. A amostra probabilística aleatória simples consti-tuída de 348 professores foi calculada através de cálculo amostral específico para estudo seccional considerando o nível de signifi-cância de 95% e a margem de erro de 5% 7. A seleção das escolas foi realizada por conglomerado considerando a zona geográfica de localização da instituição. Assim, após o sorteio aleatório, fo-ram selecionadas 22 escolas da Zona Norte, 19 escolas da zona Oeste, 6 escolas da Xona Sul e 5 escolas da Zona Leste. O número total de escolas foi selecionado de forma que o número de profes-sores estabelecido no processo de amostragem fosse respeitado.

Os professores incluídos foram todos aqueles pertencentes à rede pública municipal de Natal e que no momento de reali-zação da pesquisa estavam em atividade de sala de aula. Foram excluídos aqueles que estavam em licença, que ocupavam apenas cargos administrativos na escola e aqueles que se recusaram a as-sinar o termo de consentimento. Quanto às escolas, foram excluí-das aquelas que funcionam apenas com o programa Educação de Jovens e Adultos (EJA), já que a Secretaria Estadual de Educação não dispõe de dados que viabilizem a análise.

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142

Coleta e análise dos dados

A coleta dos dados foi realizada a partir do preenchimento de um instrumento de pesquisa previamente elaborado e testado. A primeira parte do questionário inclui dados demográficos, so-cioeconômicos, hábitos de vida e dados ocupacionais. A segunda parte utilizada é constituída pelo questionário Self Report Ques-tionary-20 (SRQ-20) e, na terceira parte, aplicamos o questionário World Health Organization Quality Of Life-Bref (WHOQOL-Bref).

O SRQ-20, validado no Brasil por Mari, Willians8, é um ins-trumento para rastreamento de distúrbios psiquiátricos menores. O SRQ-24 compõe-se por 24 questões, estando estas subdividi-das em duas seções: a primeira com 20 questões elaboradas para detecção de transtornos não psicóticos e a segunda com quatro questões para detecção de transtornos psicóticos. Conforme o in-teresse do estudo, pode-se utilizar somente a primeira parte, com-posta pelas 20 questões, sendo esta última a opção adotada neste estudo para avaliar o sofrimento psíquico da população estuda-da. Cada resposta afirmativa pontua com o valor 1 para compor o escore final por meio do somatório desses valores. Os escores obtidos estão relacionados com a probabilidade de presença de transtornos não psicóticos variando de 0 (nenhuma probabilida-de) a 20 (extrema probabilidade). São considerados os casos com maior probabilidade de ter transtornos não psicóticos e, por con-sequência, de sofrimento psíquico, aqueles com uma pontuação no SRQ-20 maior do que 7. O escore do SRQ-20 é apenas sugesti-

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vo de distúrbio ou de sofrimento psíquico, não sendo um meio de diagnóstico5. Casos com somatório menor ou igual a 7 apresen-tam menor probabilidade9.

O WHOQOL-Bref, criado pelo Grupo de Qualidade de Vida da Organização Mundial de Saúde (OMS) e validado no Brasil por Fleck et al.10, é um instrumento de rápida aplicação na avaliação da QLV. Consta de 26 questões, sendo duas gerais (autoavaliação da QLV geral e da satisfação com a saúde) e 24 divididas em qua-tro domínios: físico, psicológico, relações sociais e meio ambiente. Para cada domínio da QLV expresso nesse questionário, o sujeito pode apresentar sua resposta por meio de escores que variam de um a cinco, sendo a pior condição relacionada ao menor número (zero) e a melhor relacionada ao maior número (cinco). Cada do-mínio é representado por várias facetas.

O domínio físico engloba a percepção do indivíduo sobre sua condição física. Suas facetas são: dor e desconforto; energia e fadiga; sono e repouso; mobilidade; atividades da vida cotidia-na; dependência de medicação ou de tratamentos; e capacidade de trabalho. O domínio psicológico envolve a percepção do in-divíduo sobre sua condição afetiva e cognitiva. Suas facetas são: sentimentos positivos; pensar, aprender, memória e concentração; autoestima; imagem corporal e aparência; sentimentos negativos; espiritualidade/religião/crenças pessoais. O domínio relacionado a relações sociais trata da percepção do indivíduo sobre os relacio-namentos sociais e os papéis sociais adotados na vida. Suas face-tas são: relações pessoais; suporte (apoio) social; atividade sexual.

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144

O domínio do meio ambiente refere-se à percepção do indivíduo sobre aspectos relacionados ao ambiente onde vive. Suas facetas são: segurança física e proteção; ambiente no lar; recursos finan-ceiros; cuidados de saúde e sociais (disponibilidade e qualidade); oportunidades de adquirir novas informações e habilidades; par-ticipação em, e oportunidades de recreação/lazer; ambiente físico (poluição/ruído/trânsito/clima); e transporte11,12.

Os escores dos domínios representam valores entre zero e cem, sendo piores os mais próximos de zero e melhores, os mais próximos de cem. Frente a essa diversidade, optamos por utilizar uma escala categórica e dicotomizada com ponto de corte no per-centil 50, obtendo-se os escores de alta e baixa valoração da QLV em cada domínio11.

Análise estatística

A análise foi realizada através do programa Stata10.0 (Sta-ta Corp., College Station, Texas). Foram calculadas frequências e medidas de tendência central para a descrição das variáveis. Ra-zões de prevalência e respectivos intervalos de confiança de 95% foram calculados com nível de significância de 5%.

Na análise bivariada, o teste Qui-quadrado foi utilizado para determinar a associação entre as variáveis independentes e o desfecho (QLV).

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Aspectos éticos

O projeto foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa do Hospital Universitário Onofre Lopes (CEP-HUOL) da Universi-dade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN), sob o número de protocolo 0013.0.294.000-09.

2.1.3 Resultados

Foram entrevistados 348 professores da rede municipal de ensino de Natal-RN, sendo a descrição da amostra apresentada na tabela 1. A maioria é do sexo feminino (294, 84,5%), casada ou em união consensual (192, 57,3%), com pós-graduação (188, 54,2%) e renda mensal acima de R$ 1600,00 (178, 54,1%). A média de idade foi de 41,09 ± 9,89 anos, sendo predominante a faixa etária entre 20 a 40 anos (170, 50,4%). Consumo de bebida alcoólica foi referido por 52,7% (183) dos entrevistados e o hábito de fumar por 3,8% (13). Quanto à experiência com drogas ilícitas, 3,6% (12) declararam resposta positiva. A realização de atividade física foi referida por 49,6% (170) da população.

O tempo de profissão como professor foi superior a 10 anos em 60,3% (207), com 65,5% (207) trabalhando abaixo de 40 ho-ras semanais. A maioria (195, 56,7%) lecionava em 2 ou 3 turnos e 60,2% (207) responderam que trabalhavam em outro emprego além daquele como professor na escola em que foi entrevistado. O meio de transporte mais utilizado pela população foi o ônibus, representando 52,9% (182) dos entrevistados.

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Tabela 1 – Características dos professores da rede municipal de Natal de acordo com características individuais, laborais e sociais, Natal-RN, 2010

VARIÁVEIS n % VARIÁVEIS N %

Características Individuais Horas trabalho/semana

Sexo ≥ 40 horas 111 34,5

Feminino 294 84,5 < 40 horas 211 65,5

Masculino 54 15,5 Turnos lecionados

Idade categorizada 2 ou 3 turnos 195 56,7

20 a 40 anos 170 50,4 Apenas 1 turno 149 43,3

41 anos ou mais 167 49,6 Tem outro trabalho

Estado civil Sim 207 60,2

Solteiro 102 30,4 Não 137 39,8

Casado/união consensual 192 57,3 Ambiente de trabalho

Separado/divorciado 36 10,7 Bom 317 91,9

Viúvo 5 1,5 Ruim 28 8,1

Escolaridade Autonomia no trabalho

Graduação 159 45,8 Sim 313 93,4

Pós-graduação 188 54,2 Não 22 6,6

Renda mensal Possibilidade de ser criativo

≤ 1.600,00 reais 151 45,9 Sim 326 96,2

> 1.600,00 reais 178 54,1 Não 13 3,8

Características laborais Episódio de agressão

Tempo de profissão Por parte dos alunos 199 60,9

≤ 10 anos 136 39,7 Por parte dos pais de alunos 109 31,7

> 10 anos 207 60,3 Por parte dos funcionários 38 11,2

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A maioria também considera que tem autonomia (313, 93,4%) e possibilidade de ser criativo (326, 96,2%) no trabalho, além de avaliar o ambiente de trabalho como bom (317, 91,9%). Quanto aos episódios de agressão ao professor, 60,9% declara-ram terem sofrido agressão por parte dos alunos, 31,7% sofreram agressão por parte de pais de alunos e 11,2% disseram ter sofrido agressão por parte de outros funcionários da escola. Na fi gura 1, temos a distribuição dos tipos de agressão.

Figura 1 – Percentual dos tipos de agressões sofridas pelos professores por parte dos alunos, pais de alunos e funcionários, Natal-RN, 2010

Fonte: Dados dos autores. Natal/RN, 2010.

A autoavaliação da qualidade de vida geral (WHOQOL-Bref) foi considerada pela maioria (216, 63,5%) como “boa” ou “muito boa” e pela minoria (7,4%) “ruim” ou “muito ruim”. Quanto à sa-tisfação com a saúde, 62,6% (213) disseram estar “satisfeitos” ou

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“muito satisfeitos”, enquanto 12,6% consideravam-se “insatisfei-tos” ou “muito insatisfeitos”.

Para efeito da análise estatística, as dimensões do WHO-QOL- Bref foram categorizadas, a partir do percentil 50 referente a cada domínio, em dois grupos (alta e baixa valoração da QLV), de acordo com o proposto por Nunes e Freire12.

Na tabela 2, é apresentada a estatística descritiva de cada do-mínio do WHOQOL- Bref. O domínio psicológico apresentou média de escores mais alta (72,6; DP=14,5), seguida pelos domí-nios de relações sociais (71,9; DP=19,6), físico (68,9; DP=16,0) e meio ambiente (55,3; DP=14,3). A maioria apresentou alta valora-ção da QLV em todos os domínios, sendo o domínio de relações sociais o que apresentou maior porcentagem (60,7%).

Tabela 2 – Medidas de tendência central, escores dos domínios de qualidade de vida do WHOQOL-Bref e percentagem de indivíduos em cada domínio na amostra de professores do ensino fundamental das escolas municipais, Natal-RN, 2010

Características DomíniosFísico Psicológico Relações Sociais Meio Ambiente

Média (dp) 68,9 (16,0) 72,6 (14,5) 72,1 (19,2) 55,3 (14,3)Mediana 71,4 75,0 75,0 56,2Mínimo-MáximoExcluídos

21-10010

13-10010

8-10010

16-9412

Baixo valor QLV Escores 21-70 13-74 8-74 16-55 n(%) 159 (47,0) 150 (44,4) 133 (39,3) 161 (47,9)Alto valor QLV Escores 71-100 75-100 75-100 56-94 n(%) 179 (53,0) 188 (55,6) 205 (60,7) 175 (52,1)

Fonte: Dados dos autores. Natal/RN, 2010.

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Na análise descritiva do SRQ, adotamos como ponto de corte ideal 7∕8, como proposto por Gonçalves et al [9]. O escore médio para o SRQ-20 em toda a amostra foi de 4,8 (DP=4,3). A media-na foi 4, tendo somatória mínima 0 e máxima, 19. Do total da amostra (n=343), 85 (24,8%) indivíduos apresentaram alguma probabilidade de sofrimento psíquico ou transtorno mental não psicótico e 258 (75,2%) não apresentaram probabilidade.

Na tabela 3, podemos observar a associação estatística en-tre os domínios do WHOQOL-Bref e as variáveis independentes, realizadas através do teste do Qui-quadrado.

Tabela 3 – Análise da associação estatística, através do teste Qui-quadrado, entre as variáveis independentes e cada domínio do WHOQOL categorizado, Natal-RN, 2010

Domínio Físico Domínio Psicológico

Variáveis Baixo valor QLV

Alto valor QLV p Baixovalor

QLVAlto valor

QLV p

n % n % n % n %SexoMasculino 24 47,1 27 52,9

0,99821 41,2 30 58,8

0,635Feminino 135 47,0 152 53,0 128 44,8 158 55,2Idade20 a 40 anos 74 44,8 91 55,2

0,55069 42,1 95 57,9

0,32241 anos ou mais 78 48,1 84 51,9 77 47,5 85 52,5

Estado civilSolteiro 48 49,0 50 51,0

0,870

47 48,0 51 52,0

0,040

Casado/União consensual

88 47,1 99 52,9 76 40,9 110 59,1

Separado/divorciado 15 42,9 20 57,1 18 51,4 17 48,6

Viúvo 3 60,0 2 40,0 5 100 0 0

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150

Horas de trabalho por semana40 horas ou mais 56 51,9 52 48,1

0,24054 50,5 53 49,5

0,064Menos de 40 horas 92 44,9 113 55,1 81 39,5 124 60,5

Quantidade de turnos que leciona2 ou 3 turnos 96 50,8 93 49,2

0,11391 48,1 98 51,9

0,092Apenas 1 turno 61 42,1 84 57,9 56 38,9 88 61,1

Ambiente de trabalhoRuim 19 73,1 7 26,9

0,00619 73,1 7 26,9

0,002Bom 139 45,0 170 55,0 130 42,2 178 57,8Agressão por pais de alunosSim 62 57,9 45 42,1

0,00660 56,1 47 43,9

0,003Não 95 41,9 132 58,1 88 38,9 138 61,1Agressão por alunosSim 106 54,6 88 45,4

<0,001101 52,1 93 47,9

<0,001Não 40 32,5 83 67,5 37 30,3 85 69,7Agressão por funcionários

Sim 22 61,1 14 38,90,068

21 58,3 15 41,70,074

Não 132 45,1 161 54,9 125 42,7 168 57,3SRQ-20Presença de Sofrimento psíquico (∑ ≥ 8)

72 85,7 12 14,3

<0,001

62 73,8 22 26,2

<0,001Ausência de Sofrimento psíquico (∑ < 8)

87 34,3 167 65,7 87 34,4 166 65,6

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Domínio das Relações Sociais Domínio do Meio Ambiente

Variáveis Baixo valor QLV

Alto valor QLV p Baixovalor

QLVAlto valor

QLV p

n % n % n % n %SexoMasculino 22 42,3 30 57,7

0,63524 47,1 27 52,9

0,913Feminino 111 38,8 175 61,2 136 47,9 148 52,1Idade20 a 40 anos 59 35,8 106 64,2

0,24972 43,9 92 56,1

0,18541 anos ou mais 68 42,0 94 58,0 82 51,3 78 48,8

Estado civilSolteiro 46 46,9 52 53,1

0,241

37 37,8 61 62,2

0,022

Casado/União consensual

65 34,8 122 65,2 90 48,6 95 51,4

Separado/divorciado 15 42,9 20 57,1 23 67,6 11 32,4

Viúvo 2 40 3 60 3 60 2 40Horas de trabalho por semana40 horas ou mais 48 44,4 60 55,6

0,10763 58,9 44 41,1

0,007Menos de 40 horas 72 35,1 133 64,9 87 42,6 117 57,4

Quantidade de turnos que leciona2 ou 3 turnos 82 43,2 108 56,8

0,082100 53,2 88 46,8

0,027Apenas 1 turno 49 33,8 96 66,2 59 41,0 85 59,0

Ambiente de trabalhoRuim 15 57,7 11 42,3

0,04717 65,4 9 34,6

0,063Bom 117 37,9 192 62,1 142 46,4 164 53,6Agressão por pais de alunosSim 56 51,9 52 48,1

0,00256 52,8 50 47,2

0,203Não 77 34,1 149 65,9 102 45,3 123 54,7

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Agressão por alunosSim 83 42,6 112 57,4

0,037102 52,8 91 47,2

0,028Não 38 30,9 85 69,1 49 40,7 73 59,8Agressão por funcionários

Sim 17 47,2 19 52,80,328

21 58,3 15 41,70,183

Não 114 38,8 180 61,2 136 46,6 156 53,4SRQ-20Presença de Sofrimento psíquico (∑ ≥ 8)

50 59,5 34 40,5

<0,001

60 71,4 24 28,6

<0,001Ausência de Sofrimento psíquico (∑ < 8)

83 32,7 171 67,3 100 39,8 151 60,2

Fonte: Dados dos autores. Natal/RN, 2010.

2.1.4 Conclusões

As diferenças entre os domínios (Tabela 2) apontam fragi-lidades desses trabalhadores nas quatro esferas avaliadas pelo WHOQOL-Bref, principalmente no que se refere ao domínio meio ambiente. Sob uma perspectiva de integralidade entre QLV e saúde, tais fragilidades devem ser consideradas em futuras pro-postas de promoção e atenção à saúde voltada aos docentes da rede municipal de Natal.

Vários estudos realizados com professores do ensino público mostraram resultados socioeconômicos semelhantes aos do pre-sente estudo, demonstrando homogeneidade nos aspectos relacio-nados ao trabalho e às características dos educadores brasileiros1,3,12.

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O expressivo percentual de mulheres como professoras do ensino fundamental é praticamente uma constante em estudos com essa população12, 13,14. Isso tem profundas implicações, tendo em vista a dupla jornada de trabalho, decorrente das obrigações socialmente atribuídas às mulheres, como cuidado com a casa e fi-lhos, somados às desenvolvidas no ambiente escolar. Dessa forma, o sexo feminino está sujeito a sofrer diversos problemas de saúde decorrentes da sobrecarga.

Na avaliação específica da QLV dos professores investiga-dos, os domínios físico e ambiental foram os mais afetados, tendo uma população considerável com baixa valoração da QLV nesses aspectos, o que corrobora os resultados encontrados na literatu-ra1,3,12. Isso sugere que essa população tem uma percepção negati-va do seu bem-estar físico e o que pode dificultar o seu desempe-nho em lidar com as tarefas do cotidiano causando desconforto e, possivelmente, levando ao indivíduo a sofrer. Os dados parecem demonstrar que há uma correlação entre essas duas esferas e o aparecimento de distúrbios psíquicos menores.

Do ponto de vista do ambiente de trabalho, houve correlação significativa entre a percepção ruim e uma baixa da QLV nos do-mínios físico, psicológico (73,1%) e das relações sociais (42,3%), indicando que uma visão negativa do trabalho impacta na valora-ção da QLV desses indivíduos. (Tabela 2).

Além disso, o sofrimento de agressões praticadas pelos alu-nos mostrou também reduzir significativamente a QLV dos do-centes em todos os domínios. Já a agressão perpetrada por pais de

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alunos não indicou significância apenas para o domínio ambien-tal. No entanto, o tipo de agressão (física, verbal e psicológica) não demonstrou importância para alterar a QLV dos professores, assim como agressões advindas de outros funcionários da escola (Tabela 3). Isso se deve, em parte, ao fato de 60,9% dos professores relatarem ter sofrido algum tipo de agressão por parte de alunos, enquanto dos pais, 31,7% e de funcionários, apenas 11,2%. Essa situação provavelmente decorre do maior contato e dispêndio da maior parte de tempo de trabalho do professor com o aluno.

Nesse contexto, tem-se que os professores passam a assumir uma postura de enfrentamento, o que gera uma situação angus-tiante, consumindo suas capacidades afetiva e cognitiva. Esse desgaste é demonstrado por meio dos escores do domínio psi-cológico, no qual cerca de metade dos sujeitos mostraram ter tal domínio afetado.

Na análise do domínio das relações sociais, observa-se uma fragilidade da relação aluno/professor, em decorrência das trans-formações sociais e educacionais; pois, hoje, o docente não é mais a fonte absoluta do saber, mas um facilitador do aprendizado do aluno. Além disso, há disseminação de novas tecnologias que tor-nam a informação mais acessível aos discentes propiciando um descrédito em relação à figura do mestre.

O domínio do meio ambiente mostrou-se o mais prejudi-cado, tendo relação estatisticamente significativa com os aspec-tos referentes ao estado civil, às horas de trabalho por semana, à quantidade de turnos que leciona, ao meio de transporte utilizado

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e ao episódio de agressão em ambiente de trabalho por parte de alunos (Tabelas 2 e 3).

Tal domínio engloba ainda os aspectos referentes à falta, à inadequação ou à insatisfação relacionados ao lazer, ao dinhei-ro, às informações, aos cuidados de saúde e sociais, à segurança física, à proteção e ao ambiente do lar. Nesse aspecto, evidencia a desvalorização do professor que, em função da remuneração insuficiente às suas necessidades, vê reduzidas as suas possibili-dades de investimento pessoal, social e profissional. Isso torna o trabalho descaracterizado em relação às expectativas, gerando um processo de permanente insatisfação e induzindo a sentimentos de indignidade, de fracasso, de culpa e desejo de desistir, entre outros sentimentos13. A problemática da degradação salarial, da precariedade e desqualificação social do trabalho docente vem sendo apontada como relevante nos estudos voltados às questões de saúde e qualidade de vida do professor2. Aparentemente, todas as facetas parecem ter contribuído para uma pior valoração da QLV dos profissionais.

Trabalho com uma alta carga horária em uma jornada se-manal pode ser um dos fatores responsáveis pelas dificuldades relacionadas com o domínio do meio ambiente, pois muitos pro-fessores trabalham em mais de uma instituição e tem mais de um turno de trabalho (56,7% trabalham em 2 ou mais turnos), o que reduz o tempo disponível para o lazer.

A redução da valoração da QLV, no que tange ao domínio do meio ambiente, gera uma sobrecarga mental, situação que culmi-

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156

na com a exaustão mental, em que o professor se sente exaurido emocionalmente. Disso, podem surgir diversos distúrbios da saú-de, como o aparecimento de distúrbios psíquicos menores.

Em todos os domínios, houve relação significativa com os resultados do SRQ-20 (Tabela 3), 85,7% dos casos compatíveis com sofrimento psíquico estão em professores que obtiveram um baixo valor no escore do domínio físico, 73,8% no psicológico, 59,5% no relacionamento social e 71,4% no meio ambiente. Isso indica um alarmante quadro de degradação da saúde mental dos docentes da rede municipal de ensino de Natal.

Em conclusão, apesar de os professores do ensino munici-pal de Natal mostrarem-se razoavelmente satisfeitos com a QLV e com a saúde que possuíam, o estudo apontou dificuldades na percepção dos sujeitos avaliados no que diz respeito ao processo saúde-doença. Esse conceito envolve vários aspectos que vão além da presença ou da ausência de uma enfermidade específica; há ainda seus fatores influenciadores e aspectos associados ao traba-lho, à QLV e à saúde. Tais nuances, provavelmente não percebidas pelos docentes e equivocadamente avaliadas, encontram-se desfa-vorecidas e, possivelmente, relacionadas a distúrbios psiquiátricos menores e a sofrimento psíquico, como demonstrado nas estatís-ticas da presente pesquisa. (Tabela 3).

De forma geral, os achados corroboram o que é encontrado na literatura, porém mais estudos devem ser feitos com o intuito de avaliar o impacto das mudanças sociais e educacionais na ativida-de dos professores que enfrentam a crescente falta de interesse dos

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alunos e da sociedade de maneira geral sobre a educação. Então, devem ser buscados estímulos à carreira docente para minorar o impacto dos aspectos negativos advindos das atuais condições de trabalho dessa profissão na qualidade de vida dos professores.

Skevington,15 em um estudo investigativo sobre a relação entre QLV, nível educacional e cultural, usando o questionário WHOQOL- Bref, com 9404 pessoas de 13 países diferentes, mos-trou que o domínio do meio ambiente da QLV cresce sequencial-mente daqueles sem educação escolar em direção àqueles com educação terciária. Os outros domínios (físico, psicológico e re-lações sociais) crescem apenas daqueles sem educação escolar em direção àqueles com nível secundário.

Indaga-se ainda até que ponto uma baixa QLV e sofrimento psíquico poderiam influenciar no desempenho desses profissionais e quais consequências trariam para o ensino das gerações vindouras.

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2.2 ESTUDO TRANSVERSAL RETROSPECTIVO DOS

EFEITOS ADVERSOS PARA PORTADORES DE

ESQUIZOFRêNCIA USUÁRIOS DE ANTIPSICÓTICOS ATÍPICOS OLANZAPINA E RISPERIDONA

Gerlane Coelho Bernardo GuerraAurigena Antunes de Araújo

Katarina Melo ChavesSusana Barbosa Ribeiro

Vanessa de Lima SilvaGrasiela Piuvezam

2.2.1 Esquizofrenia: aspectos epidemiológicos e terapêuticos

A esquizofrenia constitui o mais comum dos transtornos psi-quiátricos graves. Segundo uma revisão geral realizada por Jablen-sky, McGrath, Herrman, Castle, Gureje, Evans, et al.1, a prevalência de esquizofrenia varia de 1.4 a 4.6 por 1000 habitantes em risco. No Brasil, Santos, Lovisi, Legay, Abelh et al.2, realizaram um estudo de

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prevalência em um Hospital de Emergência no Rio de Janeiro onde o total de transtornos mentais encontrados foi de 71,9%, sendo a prevalência da esquizofrenia de 15,6%. Outro estudo realizado na cidade do Natal-RN, por Ferreira, Sena, Galvão, Felix, Mendonça, Guerra, et al.,3 em um Hospital de referência psiquiátrica no perío-do de 1999 a 2005, foi observado que portadores de esquizofrenia corresponderam a 35,35 % (4.501) do total de internações, a idade média foi de 38,7 ± 13,5 anos, a maioria dos pacientes era do sexo masculino (65,78 %), sendo a esquizofrenia paranoide a mais fre-quente, ocorrendo em 1.829 (40%) pacientes3.

A esquizofrenia crônica apresenta diferentes manifestações clínicas e os primeiros sinais e sintomas da doença aparecem mais comumente durante a adolescência ou início da idade adulta. Apesar de poder surgir de forma abrupta, o quadro mais frequen-te se inicia de maneira insidiosa. Sintomas inespecíficos, incluin-do perda de energia, de iniciativa e interesse, humor depressi-vo, isolamento, comportamento inadequado, negligência com a aparência pessoal e higiene, que podem surgir e permanecer por algumas semanas ou meses antes do aparecimento de sintomas mais característicos da doença que são alucinações e delírios, transtornos de pensamento e fala, perturbação das emoções e do afeto, déficits cognitivos e avolição4.

As estratégias e formas de tratamento para a esquizofrenia variam de acordo com a fase e a gravidade da doença. A interven-ção farmacológica é um componente essencial para o tratamento

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163

e seu manejo clínico, sendo realizada com um grupo de medica-mentos denominados de antipsicóticos5.

Os antipsicóticos levam dias a semanas para produzirem seus efeitos terapêuticos máximos. Sua principal ação consiste no bloqueio de receptores dopaminérgicos D2 no Sistema Ner-voso Central 6.

Os antipsicóticos são classificados em dois grupos: antipsi-cóticos de primeira geração (APGs), neurolépticos ou típicos e antipsicóticos de segunda geração (ASGs), ou atípicos.

Os APGs podem ser divididos em dois grupos de acordo com sua potência: os antipsicóticos de “alta potência” (como o haloperidol, flufenazina, trifluoperazina, tiotixeno) e os de “baixa potência” ou sedativos (como clorpromazina, tioridazina etc.).

Entre os sistemas dopaminérgicos cerebrais nos quais os an-tipsicóticos atuam, o mesocortical e o mesolímbico são os que provavelmente estão mais relacionados com a fisiopatologia da esquizofrenia. Já o bloqueio de receptores dopaminérgicos do sistema nigroestriatal é considerado responsável pelos efeitos ex-trapiramidais dos antipsicóticos, enquanto a ação no sistema tu-beroinfundibular parece ser responsável pelos efeitos endócrinos causados por esses fármacos7.

Além do efeito terapêutico, os antipsicóticos típicos causam efeitos colaterais clássicos. Estes incluem a síndrome parkinso-niana, reações distônicas agudas, acatisia, acinesia e síndrome neuroléptica maligna, sintomas denominados de efeitos adver-sos extrapiramidais8.

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Contrário aos efeitos adversos extrapiramidais apresentados na classe das butirofenonas, fenotiazina e tioxantenos (APGs), surgiu no final da década de 1960, a clozapina, um antipsicóti-co que inaugurou uma nova classe denominada de atípicos ou de segunda geração (ASGs), incluindo a risperidona, a olanzapina, quetiapina, ziprasidona, cuja principal vantagem é a redução dos efeitos adversos extrapiramidais9.

No Brasil, a melhoria do acesso aos cuidados e opções tera-pêuticas resultou em uma mudança do tratamento da esquizofre-nia e outras doenças mentais. A Reforma Psiquiátrica (2001) e os Centros de Atenção Psicossocial refletem uma política de inclu-são social para as pessoas com doenças mentais10. Outras polí-ticas adotadas pelo Governo Brasileiro têm melhorado o acesso à medicação antipsicótica para os doentes mentais, por exemplo, o Programa Especializado de Assistência Farmacêutica, que faz parte do Sistema Nacional de Saúde, foi criado para garantir a in-tegralidade do tratamento medicamentoso em pacientes ambula-toriais, cujo atendimento é definido em Diretrizes Terapêuticas e protocolos clínicos11. Além disso, a Portaria 364 (Protocolo Clíni-co e Diretrizes Terapêuticas – Esquizofrenia) determina que todos os antipsicóticos, exceto a clozapina, podem ser utilizados no tra-tamento da esquizofrenia, sem nenhuma ordem de preferência12.

No Estado do Rio Grande do Norte, Brasil, a partir de infor-mações do Setor de Alto Custo do Hospital Dr. João Machado, foi possível identificar que os dois antipsicóticos mais prescritos são a olanzapina e a risperidona13.

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A olanzapina, uma tienobenzodiazepina, é um novo an-tipsicótico que possui afinidade pelos sítios de ligação D1-D4, serotoninérgicos (5-HT2,3,6), muscarínicos (subtipos 1-5), adre-nérgicos (alfa1) e histaminérgicos (H1)14. Nos ensaios clínicos, sugeriu-se que a olanzapina diminui os sintomas positivos e os negativos da esquizofrenia, e possui baixa incidência de efeitos extrapiramidais15.

O principal efeito adverso relacionado à olanzapina são as alterações bioquímicas de glicose, triglicerídeos e colesterol, que podem levar à síndrome metabólica16,17.

A risperidona é um derivado benzisoxazólico, com forte efei-to bloqueador de receptores D2 e 5-HT2. Liga-se a receptores a1, a2, e H1, sendo ainda potente antagonista LSD14. É, no entanto, praticamente destituída de efeitos anticolinérgicos. A risperidona é eficaz nos sintomas positivos e nos negativos da esquizofrenia18.

A risperidona produz menos efeitos extrapiramidais do que o haloperidol, quando administrada em doses inferiores a 8 mg/dia. Há indícios de que essa vantagem seja perdida em doses supe-riores. Alguns outros efeitos colaterais comuns à risperidona são insônia, agitação, sedação, tontura, rinite, hipotensão, ganho de peso e distúrbios menstruais. Galactorreia pode estar presente. Há relatos de síndrome neuroléptica maligna18.

Considerando a crescente entrada dos antipsicóticos da se-gunda geração, principalmente da olanzapina e risperidona, para o tratamento da esquizofrenia no Estado do Rio Grande do Nor-

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te, Brasil, indicada para os pacientes portadores de esquizofrenia, existe a necessidade de investigação dos efeitos adversos relacio-nados a esses psicotrópicos.

2,2.2 METODOLOGIA

Desenho do estudo

Trata-se de um estudo transversal, formado por dois grupos de pacientes, utilizando os antipsicóticos atípicos de alto custo. O primeiro grupo foi de pacientes que utilizaram a olanzapina 10mg, e o segundo grupo, de pacientes usuários da risperidona 2mg.

A escolha dos antipsicóticos foi realizada porque esses dois fármacos são prescritos para aproximadamente 90% dos pacientes do Programa do “Componente Especializado da Assistência Far-macêutica”19, do Hospital Dr. João Machado, que é uma referência para tratamento da esquizofrenia no Estado do Rio Grande do Norte, RN, Brasil.

Critérios de inclusão

Apenas os indivíduos que fizeram uso desses antipsicóticos atípicos, durante pelo menos um ano, foram incluídos no estudo.

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Critérios de exclusão

Pacientes com idade menor que 18 anos, além daqueles, cujos familiares se recuraram a assinar o Termo de Consentimento Li-vre e Esclarecido; e tamanho da amostra.

O total de usuários de antipsicóticos atípicos no serviço am-bulatorial do Hospital Dr. João Machado era de 3.500 pacientes, a prevalência no uso de olanzapina foi de 53,4%, enquanto a rispe-ridona foi de 32%. Para calcular o tamanho da amostra, utilizou-se um intervalo de confi ança de 95% e um erro de amostragem tolerável de 10%. Assim, considerando-se a população fi nita e a prevalência da risperidona, a seguinte fórmula foi utilizada20:

em que:

n = tamanho da amostraα z / 2 = intervalo de confi ançaP = prevalênciaN = populaçãoε = erro amostral tolerável

O tamanho da amostra foi de 286 pacientes, 179 indiví-duos para olanzapina, enquanto 107 para risperidona, (n =

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107). A amostragem foi de conveniência, pois apenas os in-divíduos que aceitaram o convite e assinaram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido participaram do estudo.

Instrumento de coleta de desfechos clínicos

Os indivíduos responderam a um questionário de variáveis socioeconômicas, bem como os dados relativos aos resultados de tratamento, tais como reinternação, mudança de antipsicótico e medicação associada. Os efeitos adversos foram avaliados usan-do o Udvalg para Kliniske Undersøgelser (UKU) 21, que avalia a gravidade e percepção dos sintomas dos efeitos adversos. UKU é dividido em três seções: (1) os sintomas psiquiátricos (10 itens), (2) sintomas neurológicos (8 itens) e (3) sintomas autonômicos (10 itens). A gravidade de cada item é baseado em níveis de 0-3.

Análise estatística

A correlação não paramétrica do Qui-quadrado e Teste t de Student com significância de 5% foram aplicados na análise dos perfis socioeconômicos dos grupos estudados, e para a compara-ção dos efeitos adversos entre os grupos.

Considerações éticas

O projeto foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da UFRN, Número 001/06-CEP/UFRN Protocol (Brasil, 1996). O estudo foi conduzido de acordo com a Declaração de Helsinki22.

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2.2.3 Resultados

Os resultados quanto às variáveis socioeconômicas-demo-gráficas não mostraram diferenças significantes entre os grupos estudados. Mas podemos caracterizar um perfil para os grupos.

A maior parte dos pacientes é do sexo masculino (olanzapina 64% e risperidona 52,3%). Esses pacientes residem em sua maio-ria na Zona Rural (olanzapina 43,3 e risperidona 47,7%), são sol-teiros (olanzapina 60,7 % e risperidona 63,3%), e se definem como sendo de raça branca (olanzapina 56,7 % e risperidona 58,7%). A moradia é própria (olanzapina 75,3 % e risperidona 73,4%). Não recebe benefício da Assistência Social (olanzapina 65,7% e rispe-ridona 52,3%). A renda familiar varia de 1 a 2 salários mínimos (olanzapina 55,6% e risperidona 56,9%). Quanto à escolaridade, predomina o Ensino Básico completo ou incompleto, para a olan-zapina são 42,1% e risperidona 48,6%. A assistência médica em sua maioria é pública (olanzapina 53,4% e risperidona 66,1%), no entanto, boa parcela apresenta saúde suplementar (olanzapina 33,1% e risperidona 21,1%).

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Tabela 1 – Distribuição percentual das variáveis socioeconômicas-demográficas entre usuários de olanzapina e risperidona no Hospital Dr. João Machado, Natal-RN, Brasil, 2013

Variáveis Olanzapina Risperidona p X2

SexoMasculino 64,0 52,3

0.07 3.4Feminino 36,0 47,7

LocalidadeResidência

Cidade Zona Urbana 37,6 33,9

0.5 -Cidade Zona Rural 43,3 47,7

Outro 19,1 18,3

Estado Civil

Solteiro 60,7 63,3

0.39 1.89Casado 20,8 14,7

Outro 18,5 22,0

Grupo Étnico

Mestiço 18,5 20,2

0.09 8.1

Branco 56,7 58,7

Negro 21,9 12,8

Amarelo 2,8 7,3

Indefinido 0,0 0,9

Assistência Social

Sim 29,8 43,1

0.07 5.4Não 65,7 52,3

Outro 4,5 4,6

Tipo Moradia

Própria 75,3 73,4

0.16 5.11Alugada 15,2 14,7

Cedida 5,6 11,0

Outra 3,9 0,9

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Renda FamiliarEm SM*

<1 3,9 5,5

0.9 0.591<2 55,6 56,9

2- 5 2,2 2,8

>5 37,6 34,9

Escolaridade

Analfabeto 6,7 12,8

0.11 6.0

Ensino Básico completo ou incompleto 42,1 48,6

Ensino Médio completo ou incompleto 33,1 22,9

Ensino Superior completo ou incompleto 18,0 15,6

Assistência Médica

Pública 53,4 66,1

0.07 5.4Suplementar 33,1 21,1

Outra 13,5 12,8

*Salário Mínimo.Fonte: Dados dos autores. Natal/RN, 2013.

As variáveis relacionadas aos resultados clínicos de trata-mento, tais como reinternação (p> 0,97), mudança de antipsicóti-cos (p> 0,67), medicação associada (p> 0,38), não apresentaram diferença significante entre olanzapina e risperidona (Tabela 2). A caracterização entre eles, a maior parte dos pacientes foi rehos-pitalizado (olanzapina 57,9% e risperidona 56,9%), não mudou de antipsicótico (olanzapina 76,1% e risperidona 80,6%), e utiliza medicação associada (olanzapina 98,1% e risperidona 98,4%).

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Tabela 2 – Comparação de desfechos clínicos para usuários da olanzapina e risperidona Hospital Dr. João Machado, Natal-RN, Brasil, 2013

Variáveis Olanzapina Risperidona p

Rehospitalização Sim 103 (57.9%) 62 (56.9%)

0.97 Não 75 (42.1%) 47 (43.1%)

Mudança de antipsicótico

Sim 42 (23.9%) 21 (19.4%)

0.67 Não 134 (76.1%) 87 (80.6%)

Outro 2 (1.9%) 1 (1.6%)

Medicação Associada

Sim 102 (98.1%) 63 (98.4%)

0.38 Não 74 (97.4%) 46 (100.0%)

Outro 2 (2.6%) 0(0.0%)

Variáveis Olanzapina Risperidona p

Rehospitalização Sim 103 (57.9%) 62 (56.9%)

0.97 Não 75 (42.1%) 47 (43.1%)

Mudança de antipsicótico

Sim 42 (23.9%) 21 (19.4%)

0.67 Não 134 (76.1%) 87 (80.6%)

Outro 2 (1.9%) 1 (1.6%)

Medicação Associada

Sim 102 (98.1%) 63 (98.4%)

0.38 Não 74 (97.4%) 46 (100.0%)

Outro 2 (2.6%) 0(0.0%)

Fonte: Dados dos autores. Natal/RN, 2013.

Na tabela 3, pode-se verificar os efeitos adversos, segundo UKU. Pode-se verificar que a risperidona apresentou comprome-

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173

timento neurológico, como rigidez, hiposinesia/acinesia, acatisia e parestesia. Todos os feitos adversos autônomos foram apresen-tados pela risperidona, além de efeitos adversos relacionados com alterações nos níveis de prolactina, como menorragia, galactor-reia, ginecomastia, aumento e redução do desejo sexual, disfun-ção erétil, disfunção ejaculatória e disfunção orgásmica. Para olanzapina foi confirmado o efeito adverso ganho de peso.

Tabela 3 – Média dos Escores da Escala de Efeitos Adversos (UKU) entre pacientes usuários da Olanzapina e risperidona, Natal- RN, 2013;

Item da escala UKU Olanzapina Risperidona p

Efeitos Adversos PsiquicosDificuldade de Concentração 1,2 1,3 0,07Astenia/ Estafa/ Fatiga 0,8 1,3 0,27Sedação/Sonolência 0,8 1,2 0,38Dificuldade de Memória 1,2 1,4 0,95Depressão 1,2 1,3 0,12Tensão/Inquietação 1,0 1,2 0,41Aumento da Duração do Sono 0,6 1,0 0,46Redução da Duração do Sono 0,3 0,2 0,07Aumento da Atividade do Sonho 0,4 0,6 0,00*Indiferença Emocional 0,7 0,7 0,34

Efeitos Adversos Neurológicos

Distonia 0,9 0,4 0,00*Rigidez 0,5 0,6 0,03*Hiposinesia/Acinesia 0,3 0,4 0,03*Hipercinesia 0,1 0,1 0,50Tremor 0,6 0,5 0,01*Acatisia 0,2 0,3 0,00*Crises Epilépticas 0,1 0,1 0,30*Parestesia 0,1 0,4 0,00*

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Efeitos Adversos autônomos

Mudança na Acomodação Visual 0,2 0,5 0,00*Aumento da Salivação 0,2 0,4 0,00*Redução da Salivação 0,3 0,6 0,00*Náusea/vômito 0,2 0,4 0,00*Diarreia 0,0 0,2 0,00*Constipação 0,2 0,4 0,00*Perda de Controle da Micção 0,2 0,1 0,9Poliuria/Polidipsia 0,3 0,4 0,00*Tontura Ortostática 0,1 0,5 0,00*Palpitações/taquicardia 0,3 0,6 0,00*

Outros efeitos Adversos

Eritema 0,0 0,2 0,00*Prurido 0,0 0,2 0,00*Fotosensibilidade 0,2 0,5 0,00*Aumento da Pigmentação 0,1 0,2 0,00*Ganho de Peso 1,2 1,1 0,04*Perda de Peso 0,2 0,6 0,00*Menorragia 0,1 0,3 0,00*Amenorreia 0,5 0,5 0,35Galactorreia 0,0 0,4 0,00*Ginecomastia 0,0 0,1 0,00*Aumento do desejo sexual 0,1 0,2 0,02*Redução do desejo sexual 0,0 0,5 0,00*Disfunção Erétil 0,0 0,3 0,00*Disfunção Ejaculatória 0,1 0,2 0,02*Disfunção Orgásmica 0,0 0,4 0,00*Secura Vaginal 0,1 0,1 0,5Dor de Cabeça 0,3 0,6 0,00*Dor de Cabeça Tensional 0,2 0,3 0,00*Enxaqueca 0,1 0,2 0,24Outro tipo de dor de Cabeça 0,0 0,2 0,00*Dependência Física 1,3 0,7 0,93Dependência Psíquica 0,8 0,9 0,00*

*Diferença significante entre os grupos. Fonte: Dados dos autores. Natal/RN, 2013.

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2.2.4 Discussão

Os antipsicóticos convencionais apresentam elevada afinida-de pelos receptores D2 de dopamina, sendo eficazes contra os sin-tomas psicóticos, mas apresentam altas taxas de efeitos adversos neurológicos, tais como os efeitos extrapiramidais agudos (EPS) e a discinesia tardia 23,24.

Antipsicóticos de segunda geração (SGA) diferem farmaco-logicamente em sua menor afinidade com os receptores de dopa-mina D2 e maior afinidade para outros receptores, especialmente a serotonina. Em uma meta-análise de controles aleatórios, hou-ve uma superioridade dos SGA sobre antipsicóticos de primeira geração na redução dos sintomas psicóticos como alucinações, delírios, cognitivos (pensamento desorganizado) e sintomas de comportamento. No entanto, o SGA não é um grupo homogêneo e cada um dos antipsicóticos tem um perfil diferente de interação fármaco-receptor, de modo que as comparações demostram dife-renças na sua eficácia25.

Em relação aos efeitos adversos neurológicos apresentados pela risperidona, nosso estudo corrobora achados da literatura que confirmam a presença de efeitos adversos extrapiramidais. Uma revisão sistemática comparando a risperidona com os de-mais antipsicóticos atípicos demostrou que a risperidona produ-ziu mais efeitos extrapiramidais, comparado aos demais26. A ca-pacidade que a risperidona apresenta para desencadear os efeitos adversos extrapiramidais pode ser confirmada por Rummel-Klu-

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ge, Komossa, Schwarz, Hunger, Schmid, Kissling, et al.27, ao cons-tatar o uso de medicação antiparkisoniana associada ao uso da risperidona em maior proporção, quando comparado aos demais antipsicóticos. A explicação para esse efeito adverso está relacio-nada à ocupação dos receptores, D2 no striatum. Para a risperido-na, esta taxa de ocupação varia de 50-80% dependendo da dose, o que exige uma maior atenção para um regime de dose racional ao uso da risperidona 28.

Os efeitos adversos clínicos relacionados ao aumento nos níveis de prolactina quando do uso da risperidona, podem ser confirmados pelo nosso estudo. Pode-se verificar menorragia, galactorreia, ginecomastia, aumento e redução do desejo sexual, disfunção erétil, disfunção ejaculatória e disfunção orgásmica. Em um estudo anterior realizado pelo nosso grupo, ao aplicar este mesmo instrumento, foram confirmadas alterações nos efeitos adversos clínicos relacionados ao aumento nos níveis de prolacti-na, como galactorreia, redução do desejo sexual, disfunção erétil /orgasmo e secura vaginal13.

Hiper prolactinemia é um efeito colateral comum induzido por agentes antipsicóticos para o tratamento de esquizofrenia e pode resultar num certo número de consequências físicas, in-cluindo amenorreia, galactorreia, infertilidade, disfunção erétil, a ejaculação deficiente, e perda de libido29. Este efeito adverso está relacionado às taxas de ocupação do receptor D2, na glândula pi-tuitária anterior30.

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O estudo de Hong, Novick, Brugnoli, Karagianis, Dossen-bach, Haro31, verificou recaídas, sintomas extrapiramidais e ame-norreia / galactorreia, quando comparados a pacientes tratados com a risperidona.

A olanzapina apresentou como efeito adverso que corrobora os dados da literatura, o ganho de peso, sendo este, um achado usual nos estudos realizados com a olanzapina32-34. Esse sintoma verificado pelo paciente está relacionado a um quadro clínico que tende a ser agravar, em que a olanzapina pode ocasionar a Síndro-me Metabólica, que se constitui como um conjunto de fatores de risco metabólico que se manifestam num indivíduo e aumentam as chances de desenvolver doenças cardíacas, acidente vascular cerebral e diabetes. O uso de olanzapina ocasiona alterações nos níveis glicêmicos, alterações de colesterol, triglicerídeos, gordura abdominal e hipertensão arterial32,35.

A farmacovigilância é definida pela Organização Mundial de Saúde (OMS) como “a ciência e as atividades relativas à de-tecção de avaliação, compreensão e prevenção de efeitos adversos ou qualquer outro problema aos fármacos”36. O principal objeti-vo da farmacovigilância é o aumento de notificações espontâneas de reações adversas medicamentosas (ADRs). O estudo de rea-ções adversas associadas com um medicamento é um processo contínuo, a partir dos relatórios iniciais e representa a porta para estudos de farmacoepidemiologia, e a avaliação quantitativa do risco é muito relevante para novos medicamentos a entrarem no mercado de que não é possível conhecer todos os efeitos adversos, dadas as limitações dos ensaios clínicos.

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Os estudos clínicos não trazem dados confiáveis, em função do tamanho reduzido das amostras para a detecção de espécies raras de ADRs e, portanto, não são capazes de detectar ADRs com longos períodos de latência e excluir grupos frágeis, como crian-ças e idosos. Além disso, na maioria dos casos, a incidência e a prevalência de um ADR é estatisticamente diferente quando se considera toda a população, em comparação com o quadro clínico do grupo experimental37. Portanto, a monitorização contínua é a única ferramenta que permite a detecção antecipada de sinais, a fim de garantir uma relação benefício / risco para a população.

No Brasil, a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvi-sa), tem por objetivo promover a proteção da saúde da população por intermédio do controle sanitário da produção e da comercia-lização de produtos e serviços submetidos à vigilância sanitária, inclusive dos ambientes, dos processos, dos insumos e das tecno-logias a eles relacionados. Entre as ações da Anvisa, estão a vigi-lância dos efeitos dos medicamentos. Neste sentido, a farmacovi-gilância atua como uma ferramenta importante na saúde pública, que avalia o risco-benefício dos medicamentos e as consequências na sua utilização, servindo como suporte instrumental para as ati-vidades de vigilância sanitária.

2.2.5 Conclusões

O estudo chama atenção para os efeitos adversos clínicos apresentados pela risperidona, sendo eles neurológicos e relacio-nados à hiperprolactinemia. Além disso, o estudo corrobora da-

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dos anteriores, em que o principal efeito adverso da olanzapina é o ganho de peso, o que se constitui um risco para a síndrome metabólica. Chamamos atenção para a necessidade de vigilância contínua e de notificação aos efeitos adversos apresentados, o que pode antecipadamente prever o apareceimento de complicações para a saúde dos pacientes.

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2.3 ENXAQUECA E QUALIDADE DE VIDA EM

ESTUDANTES UNIVERSITÁRIOSMaurício Roberto de Macedo

Isa Maria de MacedoGrasiela Piuvezam

Ana Luísa Chaves de OliveiraÉrika Gabrielle Pinheiro Ximenes

Samara Camilo de Oliveira OliveiraThiago Carlos Bezerril de Oliveira

2.3.1 Introdução

Embora os relatos sobre a enxaqueca sejam milenares, essa doença ainda constitui um enigma a ser decifrado. A multiplicida-de e a irregularidade de suas manifestações clínicas exprimem a sua complexidade como fenômeno e seu estudo pode servir de modelo para refletir sobre a integração mente-corpo1, entre outras dimen-sões (sociais, econômicas e simbólicas) a serem consideradas.

Alguns estudos epidemiológicos têm posto em evidência que a enxaqueca pode trazer mais prejuízos à qualidade de vida dos indivíduos que a osteoartrite, o diabetes, a hipertensão arte-

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rial e a lombalgia, sendo tão incapacitante quanto à depressão2-4. Compromete também a capacidade profissional e intelectual, o convívio social e familiar, contribuindo para o surgimento de problemas físicos, emocionais e econômicos para o indivíduo e a sociedade2,3. A literatura epidemiológica também estabeleceu um consenso sobre ocorrência deste agravo à saúde: sua predominân-cia no sexo feminino e o início das crises antes dos 20 anos de idade, sendo o maior pico na adolescência2,5-6.

Entre os desencadeantes das crises, estão incluídos fatores alimentares, ambientais, sensoriais, bebidas alcoólicas, alterações do sono, menstruação, uso de contraceptivos orais, atividade se-xual, e fadiga. Também são descritos outros fatores associados: o nível socioeconômico, alterações hormonais, além de fatores nutricionais. O estresse é um fator frequentemente destacado na literatura por sua alta frequência na vida dos enxaquecosos 3,7-10.

Na busca de uma maior precisão conceitual, para orientar o raciocínio clínico-epidemiológico na definição de casos de enxa-queca, a International Headache Society11 definiu alguns critérios básicos para sua classificação: a ocorrência de cinco episódios de cefaleia (no mínimo); uma variação da duração média desses epi-sódios de 4 a 72h (quando não tratadas ou tratadas sem sucesso); presença de, pelo menos, duas das seguintes características: loca-lização unilateral, caráter pulsátil, intensidade moderada ou forte, agravada por causa de abandono das atividades físicas rotineiras. Além disso, durante a presença da dor (sintoma nuclear), deve ser considerada a presença de um dos sintomas seguintes: náuseas e/

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ou vômitos, fotofobia e/ou fonofobia. A cefaleia não deve ser atri-buída a outro tipo de transtorno.

Apesar do diagnóstico da enxaqueca ser essencialmente clí-nico, os médicos em geral fazem o diagnóstico de migrânea em apenas 45% dos indivíduos que os procuram com a doença12. Desta forma, a escassa busca de assistência médica, o baixo índice de diagnóstico e, sobretudo, o grande impacto que a enxaqueca tem sobre a vida daqueles que acomete, torna seu estudo e conhe-cimento na população não só necessário, como imprescindível.

Neste artigo, apresentamos os resultados de pesquisa junto à população de estudantes da Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN), compreendendo que, na universidade, o estu-dante é muitas vezes confrontado com situações geradoras de es-tresse emocional e não experimentadas em outros momentos da sua vida. Além do que, esta população é constituída basicamente por jovens, faixa etária de maior prevalência da enxaqueca.

A presente pesquisa teve como objetivos, portanto, identifi-car a prevalência de enxaqueca nesta população específica e exa-minar possíveis associações com a qualidade de vida e fatores de risco presentes em outros estudos, em busca de fatores associados ou não à vida acadêmica especialmente relacionada à qualidade de vida e que possam influenciar sua ocorrência e contribuir com o conhecimento geral acerca desse problema de saúde neste grupo da população.

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2.3.2 Métodos

Trata-se de um estudo de natureza exploratória e quantita-tiva, do tipo seccional, realizado a partir de uma amostra obtida entre os estudantes da UFRN. A estrutura da pesquisa foi baseada no protocolo do Strengthening the reporting of observational stu-dies in epidemiology (Strobe)13 para estudos seccionais.

A coleta dos dados foi realizada entre os meses de outubro a novembro de 2008, com os estudantes da UFRN escolhidos, entre três cursos de graduação. A seleção dos cursos foi feita com base na relação entre carga horária (CH) e duração do curso (D), con-templando a maior, a intermediária e a menor relação e, portanto, sendo encontradas, respectivamente, nos seguintes cursos: Medi-cina, Direito e História.

Neste sentido, considerando o total de estudantes de cada curso o universo (N) encontrado foi de 1953, sendo 532 acadêmi-cos do curso de Medicina, 523 do curso de História e 882 do curso de Direito. O processo para o cálculo da amostragem considerou o E= 0,04, encontrando uma amostra total (n) de 280 estudantes. Ao distribuir proporcionalmente entre os três cursos, encontrou-se 80 estudantes do curso de Medicina, 125 do curso de Direito e 75 estudantes do curso de História a serem pesquisados. O total desses alunos foi ainda distribuído de forma a contemplar os pe-ríodos de cada curso e garantir a aleatoriedade da amostra.

Os dados foram coletados por meio da aplicação de um ques-tionário composto por quatro partes: identificação, avaliação da

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enxaqueca (com critérios diagnósticos definidos pela International Headache Society)11, avaliação de possíveis fatores associados à en-xaqueca e avaliação da qualidade de vida (WHOQOL abreviado).

O WHOQOL foi desenvolvido pela Organização Mundial de Saúde (OMS) para avaliar a qualidade de vida. A versão abreviada (WHOQOL-Bref) foi validada para aplicação no Brasil14. Trata-se de um questionário composto por 26 itens, sendo dois itens de caráter geral e outros 24 elementos distribuídos entre quatro di-mensões ou domínios que interferem na qualidade de vida: físico, psicológico, relações sociais e meio ambiente15.

Previamente à realização da pesquisa, foi realizado um estu-do piloto com 10 estudantes do ensino superior do Instituto Fe-deral de Educação, Ciência e Tecnologia do Rio Grande do Norte (IFRN) com o objetivo de ajustar e validar o instrumento de co-leta de dados.

Na fase de aplicação do questionário, foram excluídos os indi-víduos que deixaram de responder às perguntas de triagem, o que impossibilitava a avaliação da presença ou ausência de enxaqueca, bem como indivíduos que não responderam ao WHOQOL-Bref. Assim, considerando as perdas das unidades amostrais, a amostra válida final considerada foi de 264 estudantes, sendo 67 do curso de História, 122 do curso de Direito e 75 do curso de Medicina.

No processo da análise estatística, foi utilizado o programa Stata 10.0 (Stata Corp., College Station, Texas). A descritiva foi rea-lizada por meio de frequências absolutas e relativas das variáveis

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qualitativas e médias e desvios-padrão para as quantitativas. Na bi-variada, foram utilizados os testes Qui-quadrado e Exato de Fisher. A magnitude do efeito das variáveis independentes sobre o desfe-cho foi expressa através da Razão de Prevalência (RP). Para todos os testes estatísticos, adotou-se um nível de confiança de 95%.

2.3.3 Resultados e discussão

A amostra foi constituída por 26,4% de estudantes de Me-dicina, 46,5% de Direito e 27,2% de História. A média de idade foi de 22,7, variando entre 17 e 54 anos. A maioria era do sexo masculino (55,5%) e tinha renda familiar maior que 10 salários mínimos (47,6%).

A prevalência geral de enxaqueca encontrada foi de 20,9%, um valor superior a estimativas realizadas em outras populações2,3,5,7. O curso de Medicina apresentou a maior prevalência (23,9%), seguido por Direito (20,3%) e História (18,8%). No entanto, a análise bivariada demonstrou não haver diferença estatística sig-nificativa entre os cursos. O mesmo ocorreu ao se correlacionar a presença de enxaqueca com a variável renda. Confirmando os dados disponíveis na literatura, as mulheres sofriam mais de en-xaqueca: 31% contra 12,8% no grupo masculino, uma diferença com significância estatística (ver Tabela 1).

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Tabela 1 – Análise bivariada entre a variável dependente presença de enxaqueca e as variáveis sexo, curso e renda com estudantes universitários da UFRN, Natal-RN, 2010

VARIÁVEISPresença de enxaqueca

Sim Nãopn % n %

Sexo

Feminino 35 31,3 77 68,80,000 a

Masculino 18 12,8 123 87,2

Curso

Medicina 16 23,9 51 76,1

0,756 aDireito 24 20,3 94 79,7

História 13 18,8 56 81,2

Renda

Menor de 2 salários mínimos 1 11,1 8 88,9

0,760 b3 a 10 salários mínimos 26 21,0 98 79,0

Maior de 10 salários mínimos 26 21,5 95 78,5

a. Teste Qui-quadrado; b. Teste Exato de FisherFonte: Autoria própria.

Fatores associados já descritos na literatura, como estresse, pri-vação de sono, fadiga e barulho também se correlacionaram com o início das crises em nosso estudo (Tabela 2). Considerando apenas a população com enxaqueca, 60,4% declararam estar sob alta carga de estresse e 56,6% disseram não dormir em intervalos regulares.

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Tabela 2 – Relação dos fatores considerados por estudantes universitários da UFRN, acometidos por enxaqueca ou cefaleia como desencadeantes da enxaqueca, em valores absolutos e relativos, Natal-RN, 2010

Fatores desencadeantes n % Estresse 58 73,4Privação do sono 54 68,4Menstruação* 29 56,9Fadiga 38 48,1Jejum 31 39,2Barulho 29 36,7Mudanças climáticas 17 21,5Odor 15 19Sono prolongado 11 13,9Esforço físico 11 13,9Alimentos 9 11,4Cafeína 8 10,1Consumo de álcool 7 8,9 Altitude 6 7,6Viagens 6 7,6Atividade sexual 0 0

* Considerada apenas a população feminina com cefaleia.Fonte: Autoria própria.

Para a análise dos dados referentes à qualidade de vida, rea-lizamos uma conversão de escalas. Cada pergunta do WHOQOL-Bref era respondida de acordo com uma escala que variava de 1 a 5 (escala tipo likert). As pontuações de cada item do questionário eram agrupadas em um dos quatro domínios aos quais eles per-tenciam, obtendo-se um escore para cada domínio15.

Utilizamos uma equação matemática para realizar a conver-são dos escores para uma escala mais ampla, que varia de 0 a 100.

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Quanto maior a pontuação nesta escala, melhor a qualidade de vida. Essa escala transformada tem ampla utilização nos estudos com o WHOQOL pela maior facilidade de visualização e análise dos resultados.

Ao comparar os índices de qualidade de vida dos enxaqueco-sos com os não enxaquecosos, através do teste Exato de Fisher, ob-serva-se diferença estatisticamente signifi cativa (p<0,05) apenas no domínio físico (Gráfi co 1). Além disso, a autopercepção global da saúde e da qualidade de vida é pior entre os enxaquecosos (Tabela 3). Essas análises sugerem haver relevante associação entre sofrer de enxaqueca e um maior prejuízo da qualidade de vida física.

Gráfi co 1 – Médias dos scores do WHOQOL-Bref em cada domínio em todos os cursos, comparando o grupo dos enxaquecosos com os não enxaquecosos, Natal-RN, 2009

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Tabela 3 – Análise bivariada entre a variável dependente presença de enxaqueca e as variáveis autopercepção de qualidade de vida, autopercepção de saúde e os quatro domínios do WHOQOL com estudantes universitários da UFRN. Natal-RN, 2010

VARIÁVEISPresença de enxaqueca

Sim Nãopn % n %

Autopercepção da qualidade de vida

Ruim 5 55,6 4 44,4

0,012* aRegular 15 26,3 42 73,7

Boa 33 17,6 155 82,4

Autopercepção de saúde

Insatisfeito 10 34,5 19 65,5

0,058* aRegular 81 24,7 55 75,3

Satisfeito 25 16,4 127 83,6

WHOQOL Domínio físico

Fracasso 2 16,7 10 83,3

0,000* bIndefinição 39 31,0 87 69,0

Sucesso 12 10,3 104 89,7

WHOQOL Domínio psicológico

Fracasso 4 40 6 60

0,260 bIndefinição 28 18,8 121 81,2

Sucesso 21 22,1 74 77,9

WHOQOL Domínio social

Fracasso 2 20 8 80

0,856 bIndefinição 20 19,2 84 80,8

Sucesso 31 22,1 109 77,9

WHOQOL Domínio ambiente

Fracasso 5 20,8 19 79,2

0,935 aIndefinição 33 21,6 120 78,4

Sucesso 15 19,5 62 80,5

Teste Qui-quadrado; b. Teste Exato de FisherFonte: Autoria própria.

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2.3.4 Conclusão

O estudo apontou que a prevalência de enxaqueca entre os estu-dantes pesquisados é superior à encontrada em outros grupos popula-cionais, sendo possível, a partir de outros estudos, levantar a hipótese da existência de condições específicas implicadas nessa diferença.

A maior prevalência que encontramos da enxaqueca em mu-lheres confirma os resultados de estudos anteriores. A maioria dos enxaquecosos relatou que fatores como privação de sono, fadiga e, principalmente, estresse, estão envolvidos no desencadeamento das crises. No sexo feminino, a menstruação também foi ampla-mente citada, o que nos leva a pensar em fatores hormonais, pos-sivelmente envolvidos16,17.

Associação significativa entre enxaqueca e qualidade de vida no domínio físico do WHOQOL foi encontrada em nosso estudo. Esse achado parece ser coerente ao observarmos os dados dispo-níveis na literatura, que descrevem o comprometimento do fun-cionamento do indivíduo pelas crises de enxaqueca e limitação das suas atividades cotidianas18,19,20. Entretanto, não encontramos diferença entre os enxaquecosos e não enxaquecosos em outros domínios da qualidade de vida.

De modo geral, os resultados obtidos com o WHOQOL não se adequaram completamente a alguns de nossos objetivos. Não foi possível identificar a relação de aspectos negativos da quali-dade de vida ou aspectos específicos da vida acadêmica com o aparecimento de crises de enxaqueca. Esse desfecho aponta para a

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necessidade de realização de um estudo qualitativo com essa po-pulação, a fim de melhor caracterizar a relação entre enxaqueca e qualidade de vida.

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2.4 PERFIL EPIDEMIOLÓGICO E FATORES ASSOCIADOS

À UTILIZAÇÃO DE MEDICAMENTOS ENTRE PROFESSORES DA REDE PÚBLICA DE ENSINO NA

CIDADE DE NATAL-RN, BRASILGrasiela Piuvezam

Gerlane Coelho Bernardo GuerraAurigena Antunes de Araújo

Juliana B. CunhaAntônio C. Santos Júnior

Kenio O. A. FormigaNilce A. S. Santos

2.4.1 Introdução

Os professores exercem um cargo de importância na educação e formação social, sendo uma categoria em que se exige muito em-penho das capacidades física, cognitiva e afetiva. Historicamente, no Brasil, o trabalho dos professores está associado a fatores como baixos salários, excesso de trabalho, falta de interesse dos estudan-

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tes, falta de autonomia, reconhecimento e valorização da classe, violência e tarefas extracurriculares, os quais aumentam a respon-sabilidade e requerem desses profissionais maior empenho e dedi-cação. O estresse a que estão sujeitos, torna esses docentes vulnerá-veis ao adoecimento físico e mental e, como conseqüência, ao uso de medicamentos, visando à melhora das condições de saúde 1- 2.

Estudos desenvolvidos têm demonstrado que esses profissio-nais estão sujeitos a diversas patologias desencadeadas ou agrava-das pela atividade laboral, como doenças respiratórias, lesões de esforço repetitivo e distúrbios osteomusculares, distúrbios diges-tivos, cardiovasculares, neurológicos, endócrinos, genitourinários e transtornos mentais 3-4.

Diante desses resultados, pode-se considerar que os profes-sores estão propensos ao uso irracional de medicamentos, seja ele devido à automedicação, à prescrição médica errônea, e ao uso abusivo ou em doses insuficientes. No Brasil, a facilidade em se obter fármacos sem receita médica e a carência de informação na população em geral favorecem a automedicação, que, tal como a prescrição incorreta, pode trazer como consequências efeitos in-desejáveis, enfermidades iatrogênicas e mascaramento de doenças evolutivas, representando, portanto, um problema de saúde públi-ca que demanda atenção 5, 6.

As doenças ou o efeito de medicamentos e outras substân-cias químicas podem ainda prejudicar o rendimento do docente e, como consequência, comprometer o aprendizado dos estudantes, criando um problema de maior dimensão. É importante, portanto,

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avaliar as necessidades de medicamentos nesse grupo, a quantidade de indivíduos expostos ao uso irracional de fármacos e o quanto estes podem afetar a vida do indivíduo e exercício da profissão7.

Considerando a carência de pesquisas abordando essa temá-tica, o presente estudo tem como objetivo estabelecer um perfil epidemiológico do consumo de medicamentos e da prática da au-tomedicação entre professores da rede pública municipal de ensi-no de Natal-RN, além dos fatores associados a esse consumo.

2.4.2 Métodos

Desenho do estudo

Trata-se de um estudo epidemiológico observacional trans-versal, realizado por meio da aplicação de questionários com pro-fessores das escolas públicas municipais da cidade de Natal-RN, Brasil, que foram selecionadas de acordo com as zonas geográficas do município. O estudo foi realizado no período de outubro de 2009 a outubro de 2010. A estrutura da pesquisa foi baseada no protocolo do Strengthening the reporting of observational studies in epidemiology (Strobe)8 para estudos seccionais.

Cálculo e critérios de seleção da amostra

A população do estudo foi formada por professores da rede pública municipal de Ensinos Fundamental e Médio, da cidade de Natal-RN, Brasil, excluídos os docentes das instituições que atua-

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vam apenas na Educação de Jovens e Adultos (EJA) e os que se encontravam exercendo apenas funções administrativas na escola.

O dados apresentados pela Secretaria Estadual de Educação (Seec) do Rio Grande do Norte (2008) mostraram que a cidade de Natal possui 66 escolas municipais de Ensinos Fundamental e Médio, nas quais estão alocadas 2250 professores. Obteve-se a amostragem das escolas por conglomerado, em que se considerou a zona que a instituição estava localizada (Norte, Sul, Leste e Oes-te). Para a seleção das escolas, foi realizado um sorteio aleatório por zonas em que cada escola foi identificada por uma numera-ção. O número de escolas sorteadas visou preencher o número de professores necessários para o presente estudo.

O cálculo baseou-se na fórmula proposta por Barbetta (2002)9, utilizando o número total de professores pertencentes às escolas municipais de Natal, um erro padrão de 5% e o nível de significância de 5%. Assim, a amostra foi composta por 340 pro-fessores distribuídos de forma proporcional em cada zona.

Aspectos éticos

O estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa do Hospital Universitário Onofre Lopes (CEP - HUOL), sob o protocolo 366/09. A adesão ao estudo foi voluntária e o ques-tionário aplicado após esclarecimentos sobre a pesquisa, lei-tura e assinatura de termo de consentimento. Esse estudo não apresenta conflito de interesses.

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Coleta dos dados

O ins trumento utilizado para a coleta de dados foi elaborado pelos pesquisadores e submetido a um pré-teste com 30 profes-sores selecionados ao acaso em escolas que não foram incluídas na pesquisa.

Baseado nas informações da literatura sobre os diagnósticos médicos e queixas relacionadas à saúde mais frequentes entre os professores 3-4,10-11, as informações sobre o uso de medicamentos para diversas patologias foram coletadas com perguntas do tipo: Atualmente, você usa medicamento para hipertensão arterial? Qual? Prescrito pelo médico? Foi considerado que o participante fazia uso de medicamento com prescrição quando todos os fár-macos utilizados por ele eram receitados pelo médico. Também foi questionado o uso de medicamento sem prescrição para al-guns sinais e sintomas (febre, dor de cabeça, dor de barriga, insô-nia, tosse etc.).

As variáveis dependentes consideradas no estudo foram uso de medicamentos, classe farmacológica, fonte de informação para uso (prescrito ou não). Os fármacos foram divididos por classes terapêuticas, de acordo com o Anatomical Therapeutic Chemical Classification System (ATC), da Organização Mundial da Saúde (OMS)12. Os medicamentos citados pelos entrevistados, que con-tinham mais de um princípio ativo, foram representados pelos seus respectivos compostos químicos, sendo contabilizado com um fármaco todas as vezes que foi citado. O estudo não consi-

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derou como medicamento as suplementações alimentares, as va-cinas, os compostos homeopáticos, bem como os chás e outras preparações fitoterápicas.

As variáveis independentes foram divididas em três grupos: dados sociodemográficos (sexo, idade, escolaridade, estado civil, renda pessoal mensal, bairro onde mora e tipo de moradia); há-bitos de vida (prática de exercícios físicos e consumo de bebida alcóolica, consumo de cigarro e experiência com drogas ilícitas); e dados sobre o trabalho (tempo de trabalho profissão e trabalho em outra atividade remunerada).

Análise de dados

Foi utilizado no processo da análise estatística o programa “Statistic Package for Social Sciences (SPSS) for Windows”, versão 13.0 (SPSS, 1999)13. Os dados coletados foram armazenados e processados no referido programa.

Utilizou-se o teste Qui-quadrado para determinar a associa-ção entre as variáveis independentes e o desfecho. A magnitude do efeito das variáveis independentes foi expressa através da odds ratio (OR). Para todos os testes estatísticos adotou-se um nível de confiança de 95%.

2.4.3 Resultados

Dos 348 professores que responderam ao questionário, 84,5% eram do sexo feminino e 49,6% dos participantes tinham idade maior ou igual a 41 anos. Entre os entrevistados, 57,3% eram ca-

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sados ou viviam em união consensual. A renda média mensal foi de aproximadamente 3,5 salários mínimos (SM) para 45,9% dos docentes. Da população estudada, 50,4% disseram-se sedentários, 52,7% informaram que faziam ingestão de bebida alcoólica e ape-nas 3,8% eram fumantes. Outras características individuais, labo-rais e de hábitos de vida encontram-se na Tabela 1.

Tabela 1 – Características individuais, laborais e sociais dos professores da rede pública municipal de Natal-RN, 2014

VARIÁVEIS N % VARIÁVEIS n %Características Individuais Hábitos de vida

Sexo Atividade FísicaFeminino 294 84,5 Sim 170 49,6Masculino 54 15,5 Não 173 50,4Idade Ingestão de Bebidas Alcoólicas20 a 40 anos 170 50,4 Sim 183 52,741 anos ou mais 167 49,6 Não 164 47,3Estado civil TabagismoSolteiro 102 30,4 Sim 13 3,8Casado/união consensual 192 57,3 Não 329 96,2Separado/divorciado 36 10,7 Experiência com drogas ilícitasViúvo 5 1,5 Sim 12 3,6Escolaridade Não 323 96,1Superior 159 45,8Especialização 170 49,0 Características laboraisMestrado/Doutorado 18 5,2 Tempo de profissãoRenda mensal * ≤ 10 anos 136 39,7≤ 3,5 SM 151 45,9 > 10 anos 207 60,3> 3,5 SM 178 54,1 Tem outro trabalho

Sim 207 60,2Não 137 39,8

*SM = Salário mínimo. Fonte: Autoria própria.

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O uso de algum tipo de medicamento no último mês foi re-latado por 232 professores (65,2% da amostra), não havendo cor-relação significativa entre o uso de medicamentos e as variáveis independentes, conforme pode ser visto na tabela 2.

Tabela 2 – Uso de medicamentos e forma de aquisição de acordo com as características dos professores rede pública municipal de Natal-RN, 2014

USO DE MEDICAMENTOS PRESCRIÇÃO MÉDICAVARIÁVEIS Sim Não Não Sim

n % n % OR p N % N % OR pCaracterísticas Individuais

SexoMasculino 33 61,1 21 38,9 0,810 0,489 13 40,6 19 59,4 1,428 0,364

Feminino 199 66,0 100 34,0 57 32,4 119 67,6

Idade20 a 40 anos 108 63,5 62 36,5 40 41,2 57 58,8 1,9

40 anos ou mais

110 65,9 57 34,9 1,108 0,653 28 27,2 75 72,8 0,036

Estado CivilSolteiro 69 67,6 33 32,4 --- 0,165 23 37,1 39 62,9 --- 0,678

Casado 131 68,2 61 31,8 40 33,3 80 66,7

Separado/Divorciado

18 50 18 50 4 22,2 14 77,8

Viúvo 4 80 1 20 1 25,0 3 75,0

Escolaridade

Graduação 102 64,2 57 35,8 0,924 0,725 35 36,8 60 63,2 1,283 0,397

Pós-graduação

124 66,0 64 34,0 35 31,3 77 68,8

Renda pessoal mensal≤ 3,5 SM 97 64,2 54 35,8 0,891 0,619 27 30,7 61 69,3 0,806 0,479

> 3,5 SM 119 66,9 59 33,1 39 35,5 71 64,5

ResidênciaZona Norte 71 64,5 39 35,5 --- 0,978 27 40,3 40 59,7 --- 0,310

Zona Sul 77 64,2 43 35,8 23 34,3 44 65,7

Zona Leste 35 66,0 18 34,0 7 21,2 26 78,8

Zona Oeste 39 67,2 19 32,8 13 34,2 25 65,8

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Imóvel de residênciaNão-próprio 31 50,8 30 49,2 0,489 0,012 13 48,1 14 51,9 2,026 0,087

Próprio 190 67,9 90 32,1 55 31,4 120 68,6

Hábitos de VidaAtividade FísicaNão 112 64,7 61 35,3 0,926 0,736 36 35,3 66 64,7 1,174 0,588

Sim 113 65,5 57 33,5 33 31,7 71 68,3

Bebidas AlcoólicasSim 120 65,6 63 34,4 1,015 0,941 40 37,4 67 62,6 1,413 0,305

Não 107 65,2 57 34,8 30 29,7 71 70,3

TabagismoSim 5 41,7 7 58,3 0,347 0,065 1 20,0 4 80,0 0,486 0,513

Não 222 67,3 108 32,7 69 34,0 134 66,0

Drogas ilícitasSim 8 66,7 4 33,3 1,042 0,947 4 57,1 3 42,9 2,951 0,147

Não 213 65,7 111 34,3 61 31,1 135 68,9

Características Laborais

Tempo de Profissão≤10 anos 89 65,4 47 34,6 0,642 0,961 36 46,8 41 53,2 1,828

> 10anos 136 65,7 71 34,3 33 25,6 96 74,4 0,002

Outra atividade remuneradaSim 131 63,3 76 36,7 0,816 0,381 41 34,2 79 65,8 1,075 0,809

Não 93 67,9 44 32,1 28 32,6 58 67,4

Fonte: Autoria própria.

Dos 208 que responderam quanto à prescrição médica, 33,7% (70 professores) afirmaram ter feito uso de medicamentos por conta própria nos últimos 30 dias. A automedicação apresen-tou relação significante com a idade e o tempo de profissão, sendo mais comum entre aqueles com idade maior ou igual a 41 anos (p=0,036 / OR=1,9) e os que trabalhavam há mais de 10 anos, como professor (p=0,002 / OR=1,828) (Tabela 2).

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208

Entre os entrevistados, 23,9% referiram uso de medicamen-tos para enxaqueca, 17,2% para gastrite, 14,1% para alergia e 13,2% para hipertensão. O uso de anti-hipertensivos foi relacio-nado à idade acima de 40 anos (p<0,001 / OR=5,599), à renda mensal de mais de 3,5 SM (p=0,022 / OR=2,160), à moradia pró-pria (p=0,015 / OR=3,620) e ao tempo de profissão maior que 10 anos (p<0,001 / OR=4,720). A utilização de medicamentos para o diabetes também teve relação com o maior tempo de profissão (p=0,026 / OR=3,119).

Os fármacos para problemas osteomusculares foram associa-dos à idade maior que 40 anos (p=0,038 / OR=3,593), ao ganho mensal maior que 3,5 SM (p=0,050 / OR=3,287) e a mais de 10 anos de profissão (p=0,001 / OR= 20,627). O uso de medicamen-tos para o tratamento da enxaqueca foi relacionado ao sexo fe-minino (p=0,016 / OR=2,865), idade menor ou igual a 40 anos (p=0,002 / OR=2,252), à graduação como nível de escolaridade (p=0,014 / OR=1,866) e ao tempo de profissão de até 10 anos (p=0,032 / OR=1,726).

A utilização de medicamentos antialérgicos foi mais comum entre as mulheres (p=0,029 / OR=3,218). O uso de fármacos para gastrite não teve associação significativa com nenhuma variável. Outras associações são vistas na Tabela 3.

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Tabela 3 – Uso de medicamentos de acordo com suas classes terapêuticas, Natal-RN, 2014

USO DE MEDICAMENTOS

VARIÁVEIS SIM NÃO

N % n % OR pPARA HIPERTENSÃO

Idade41 anos ou mais 40 24,0 127 76,0 5,599 <0,00120 a 40 anos 9 5,3 160 94,7Renda pessoal mensal≤ 3,5 SM 32 18,1 145 81,9 2,160 0,022> 3,5 SM 14 9,3 137 90,7Imóvel de residênciaPróprio 44 15,8 235 84,2 3,620 0,015Não próprio 3 4,9 58 95,1Tempo de profissão> 10anos 42 20,4 164 79,6 4,720 <0,001≤10 anos 7 5,1 129 94,9

PARA DIABETESResidênciaZona Norte 4 3,6 106 96,4 --- 0,039Zona Sul 6 5,0 113 95,0Zona Leste 8 15,1 45 84,9Zona Oeste 4 6,9 54 93,1Tempo de Profissão> 10anos 18 8,7 189 91,3 3,119 0,026≤10 anos 4 3,0 131 97,0

PARA DEPRESSÃOEstado CivilSolteiro 6 5,9 95 94,1 0,056Casado 4 2,1 188 97,9Separado/Divorciado 3 8,3 33 91,7Viúvo 1 20,0 4 80,0Experiência com drogas ilícitasSim 2 16,7 10 83,3 5,673 0,020Não 11 3,4 312 96,6Outra atividade remuneradaNão 9 6,6 127 93,4 3,596 0,026Sim 4 1,9 203 98,1

PARA INSÔNIAOutra atividade remuneradaNão 12 8,8 125 91,2 3,200 0,017Sim 6 2,9 200 97,1

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PARA PROBLEMAS ÓSSEOS E MUSCULARES

Idade41 anos ou mais 10 6,1 154 93,9 3,593 0,03820 a 40 anos 3 1,8 166 98,2Renda pessoal mensal≤ 3,5 SM 11 6,3 164 93,7 3,287 0,050> 3,5 SM 3 2,0 147 98,0Tempo de Profissão> 10anos 14 6,9 190 93,1 20,627 0,001≤10 anos 0 0,0 135 100,0

PARA INFECÇÃOEscolaridadeGraduação 19 12,1 138 87,9 1,985 0,071Pós-graduação 12 6,5 173 93,5ResidênciaZona Norte 16 14,7 93 85,3 --- 0,021Zona Sul 11 9,4 106 90,6Zona Leste 1 1,9 51 98,1Zona Oeste 2 3,4 56 96,6Experiência com drogas ilícitasSim 3 25,0 9 75,0 3,617 0,049Não 27 8,4 293 8,4

PARA ENXAQUECASexoFeminino 77 26,4 215 73,6 2,865 0,016Masculino 6 11,1 48 88,9Idade20 a 40 anos 52 30,6 118 69,4 2,252 0,00241 anos ou mais 27 16,4 138 83,6EscolaridadeGraduação 48 30,2 111 69,8 1,866 0,014Pós-graduação 35 18,8 151 81,2Tempo de Profissão≤10 anos 41 30,1 95 69,9 1,726 0,032> 10anos 41 20,0 164 80,0

ANTI-INFLAMATÓRIOSExperiência com drogas ilícitasSim 4 36,4 7 63,6 7,280 0,001Não 23 7,3 293 92,7

PARA ALERGIASexoFeminino 46 15,9 243 84,1 3,218 0,029Masculino 3 5,6 51 94,4

Fonte: Autoria própria

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211

Foi utilizado um total de 479 fármacos pelos participantes, uma média de 1,37 medicamentos (princípios ativos diferentes) por professor. As subclasses terapêuticas mais utilizadas nos 30 dias anteriores à participação no estudo foram os analgésicos – N02 (20,7% dos fármacos citados), os antiácidos e medicamen-tos para úlcera péptica – A02 (10,6%) e os anti-inflamatórios não esteroides – M01 (6,5%), de acordo com a figura 1. Os fármacos mais utilizados foram dipirona (9,6% dos medicamentos), parace-tamol (5,6%) e diclofenaco e metformina (3,8% cada) (Figura 1).

Figura 1 – Fármacos utilizados no último mês, Natal-RN, 2014

Fonte: Autoria própria.

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Quando questionados sobre automedicação em algum mo-mento da vida, os professores responderam que as classes tera-pêuticas mais usadas sem prescrição foram os analgésicos – N02 (64,4%), os anti-histamínicos sistêmicos – R06 (12,3%) e os rela-xantes musculares – M03 (7,9%). Os medicamentos mais utiliza-dos sem prescrição foram dipirona (33,3% dos fármacos), parac-etamol (20,7%), orfenadrina (7,7%) e clorfeniramina (6,9%).

2.4.4 Discussão

Um levantamento do Ministério da Educação14, realizado em 2007, mostrou que o Brasil conta com mais de 1,8 milhões de professores de ensino infantil, fundamental, médio e profissiona-lizante, desse total, 81,94% são do sexo feminino. No Rio Grande do Norte (RN), 77,97% dos docentes são mulheres, o que corro-bora a afirmação de Cardoso, Ribeiro, Araújo, Carvalho, Reis14, de que, atualmente, a educação é um campo profissional desem-penhado predominantemente pelas mulhe res15. Dos professores do RN, 50,77% têm entre 25 e 40 anos de idade, e mais de 90% têm nível superior14, dados semelhantes ao encontrado na nossa amostra. No que se refere ao tempo de trabalho como professor, observou-se que, assim como em outros estudos, o tempo de pro-fissão excede os 10 anos para a maioria (60,3%)4,15,16.

De acordo com dados do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais (Inep), de 2009, o salário médio do pro-fessor da educação básica com nível superior, de escolas públicas

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não federais, no RN, é de aproximadamente três salários mínimos 14. A maior parte da nossa amostra referiu renda mensal superior a esse valor, entretanto esse fato pode ser devido a 60,2% possuir outra fonte de remuneração.

Aproximadamente metade dos participantes do estudo (50,4%) é sedentária e refere consumo de bebida alcoólica (52,7%), o que são considerados fatores de risco para doenças crônicas não transmissíveis, como hipertensão arterial sistêmica e diabetes mellitus. O sedentarismo aumenta em cerca de 30% o risco de se desenvolver hipertensão arterial crônica17, também pode levar à obesidade quando associado a dietas inadequadas e juntos são responsáveis pelo aumento da incidência de diabetes18-19. O con-sumo de álcool em excesso além de estar relacionado ao ganho ponderal e suas complicações, pode elevar os níveis pressóricos 17-20. Apesar disso, apenas 3,8% declararam-se tabagistas e 3,6% experimentaram drogas ilícitas, o que é um ponto positivo para a população estudada, diferente da prevalência nacional de fuman-tes nas capitais brasileiras que é de 18,4% da população masculina e 12,4% da feminina21.

A literatura científica pouco aborda o tema da utilização de fármacos por docentes. Uma revisão de estudos de utilização de medicamentos publicados no Brasil e América Latina, somando um total de 27 artigos, evidenciou que nenhum deles estudava essa população22. Portanto, considerou-se para análise estudos de utilização de medicamentos com outros estratos populacionais.

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214

Nessa pesquisa, a prevalência do uso de medicamentos foi semelhante à prevalência de outros estudos nacionais que englo-ba uso de medicamentos em adultos23 e crianças24. As mulheres registraram um maior consumo, fato também apoiado pela lite-ratura e justificado pelo uso de anticoncepcionais e a terapia de reposição hormonal pós-menopausa e também pelas mulheres buscarem mais auxílio médico. A automedicação em homens foi mais prevalente que entre as mulheres, mas confirmando o que é encontrado na literatura, não foi encontrada diferença significati-va entre os sexos24-25.

A idade foi uma variável significativa em relação ao consumo de medicamentos sem prescrição, sendo que os adultos jovens se automedicaram mais. Arrais, Coelho, Batista, Carvalho, Righi, Ar-nau mostram que entre as mulheres, essa é uma prática frequente no grupo que tem entre 16 e 45 anos e entre os homens, nos ex-tremos das idades5. Um estudo argentino25 também mostrou que a automedicação é mais comum nas mulheres abaixo de 35 anos.

A utilização de fármacos está diretamente associada ao nível econômico. A pesquisa de orçamentos familiares 2008/2009 do IBGE mostrou que as despesas com medicamentos nas famílias com menor renda (até R$ 830,00) representa 4,2% do orçamento contra 1,9% no grupo com melhor salário (mais de R$ 10.000,00)26, ou seja, apesar de ser destinado um menor percentual para gastos com medicamentos, esse valor corresponde a um montante maior devido ao poder aquisitivo elevado. Nesse estudo, assim como em outros, confirmou-se um maior consumo de fármacos no grupo de melhor condição financeira 23,27-28. Entretanto, é válido lem-

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brar que o menor consumo de fármacos pela população de renda inferior não significa que esse grupo não necessita de medicamen-tos, possivelmente se deva à dificuldade de acesso à assitência à saúde e aos medicamentos.

Em relação ao tabagismo, percebeu-se que o consumo de fár-macos e a automedicação foi mais prevalente entre os não fuma-ntes, provavelmente isso sugere uma maior preocupação com a saúde nesse grupo. Bertoldi, Barros, Hallal, Lima também encon-traram maior uso de fármacos em não fumantes e ex-fumantes 22.

A prevalência do uso de medicamentes foi aproximada entre os que tinham mais de 10 anos e 10 anos ou menos de profis-são. No entanto, observou-se significância entre essa variável e o consumo de medicamentos sem prescrição, e os participantes que exerciam a docência por menos tempo se automedicavam mais. Não foi encontrado relato na literatura que o tempo de profissão influencie o consumo de medicamentos, mas os estudos sobre saúde e trabalho docente inferem que uma maior carga horária de trabalho, bem como um maior número de anos lecionando, expõem o professor a maior estresse físico e psíquico4,11,16, o que gera patologias e, consequentemente, consumo de medicamentos. A automedicação pode dever-se nesse caso, à sobrecarga de tra-balho, com mais horas de ensino por semana, em contraponto ao reduzido número de anos de profissão.

As patologias mais citadas pelos professores correspondem às encontradas nos estudos brasileiros (inclusive um realizado com professores natalenses) e em um estudo argentino 3, 4, 11, 16, 25. A

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literatura mostra que as mulheres são mais afetadas pela enxaque-ca, cerca de 40 a 50% têm ataques de enxaqueca antes, durante ou logo após a menstruação 29. Não foi encontrada associação entre sexo e uso de anti-histamínicos, pois essa significância pode ter se dado pelo maior percentual de mulheres na amostra.

A prevalência de hipertensão arterial sistêmica na população brasileira é entre 22,3% a 43,9% e o risco de desenvolver a doença aumenta com a idade, como evidenciado na amostra 17. O estudo foi realizado antes da publicação da resolução RDC nº 44/2010, da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), que regula-mentou a venda de antimicrobianos29.

Os resultados apresentados evidenciam que os professores encontram-se expostos a uma variedade de fármacos tanto pela suas patologias anteriores quando pelo estresse a que se subme-tem. No entanto, percebe-se a necessidade de mais estudos que proporcionem uma análise detalhada dos grupos de medicamen-tos utilizados por essa categoria profissional, principalmente por automedicação, e que avaliem a adequação do uso e as comorbi-dades apresentadas por essa população.

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2.5 DISTÚRBIOS DO SONO E BURNOUT EM PROFESSORES DO ENSINO FUNDAMENTAL

John Fontenele AraujoGrasiela Piuvezam

Hilkéa Carla de Souza Medeiros LimaJéssica Santos de Medeiros

Maria Luisa Nobre Medeiros e SilvaLayra Ribeiro de Sousa Leão

2.5.1 Introdução

A educação é parte constitutiva do processo social e, como tal, está articulada sistematicamente a processos sociais e elemen-tos como infraestrutura básica, políticas educacionais, profissio-nais envolvidos e alunado, tratando-se, portanto, de uma proble-mática multifatorial1,2.

O modelo econômico-social vigente requer um profissional cada vez mais capacitado tanto no âmbito profissional quanto no pessoal, exigindo desse profissional uma ampla série de habilida-des pessoais que não podem ser reduzidas ao âmbito da acumula-

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ção do conhecimento3,4. Somando-se a isso, as condições precárias de trabalho, os baixos salários, as classes superlotadas, o excesso de carga horária e a falta de segurança, contribuem significativa-mente para a geração de alterações físicas e mentais5.

Dessa forma, a saúde do professor vem sendo fonte de preo-cupação de segmentos variados da sociedade. Sendo essa pro-fissão identificada pela Organização Internacional do Trabalho (OIT) como de alto risco, e, ainda, considerada a segunda cate-goria profissional, em nível mundial, a portar doenças de caráter ocu pacional, sendo os transtornos mentais um dos agravos mais recorrentes nessa categoria4-6.

Os distúrbios do sono entram nesse contexto com uma das consequências desse estresse e estudos recentes evidenciam que mudanças nos seus padrões podem cursar com dores pelo corpo, irritabilidade, desânimo e mau humor7,8. Esses efeitos reunidos podem ser relacionados à presença da Síndrome de Burnout, nos profissionais em questão9.

A Síndrome de Burnout foi descrita pela primeira vez pelo psi-quiatra Freudenberger10, em 1974, para indicar a exaustão de ener-gia e desgaste ocorridos em voluntários e profissionais em tarefas assistencialistas quando eles se sentiam sobrecarregados. Posterior-mente, tal conceito foi refinado e três subdomínios foram incluídos na tentativa de explicar os tipos de sintomas da Síndrome de Bur-nout. São eles: a Exaustão Emocional (EE), que culmina na perda progressiva de energia seguida por um esgotamento físico e mental em relação à profissão; a Despersonalização (DE), na qual prevalece

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224

a dissimulação afetiva e uma forma de tratamento impessoal com a clientela, pois o indivíduo passa a tratar as outras pessoas com extrema frieza, insensibilidade e irritabilidade, podendo apresentar ainda desmotivação e descomprometimento com os re sultados de seu trabalho; e a baixa Realização Pessoal (EP), caracterizada pela tendência a se autoavaliar de forma negativa, levando falta de moti-vação e insatisfação com o trabalho11-13.

Nesse contexto, visando contribuir para o esclarecimento do quadro de saúde do professor, de acordo com os parâmetros apre-sentados, o presente estudo tem por objetivo estimar a prevalência dos distúrbios do sono e da Síndrome de Burnout nos professores da rede pública de ensino de Natal-RN, Brasil.

2.5.2 Metodologia

Desenho do estudo

O estudo, de corte transversal, foi realizado em escolas da rede pública do município de Natal-RN, no período de outubro de 2009 a outubro de 2010. A população de estudo foi constituída por professores do ensino fundamental e a estrutura da pesquisa foi baseada no protocolo do “Strengthening the reporting of ob-servational studies in epidemiology” (Strobe)14 para estudos sec-cionais. O estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética e Pesquisa da UFRN (protocolo 366/09), seguindo as normas estabelecidas pela resolução 196/96 do Conselho Nacional de Saúde, incluindo a assinatura do termo de consentimento.

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De acordo com a Secretaria Municipal de Educação, em 2007, Natal apresentava uma população de 2.651 professores da rede pú-blica municipal. A amostra probabilística aleatória simples consti-tuída de 348 professores foi calculada considerando o nível de sig-nificância de 95% e a margem de erro de 5%15. A seleção das escolas foi realizada por conglomerado considerando a zona geográfica de localização da instituição. Assim, após o sorteio aleatório, foram se-lecionadas 22 escolas pertencentes à Zona Norte, 19 escolas à zona Oeste, 6 escolas à Zona Sul e 5 escolas à Zona Leste. O número total de escolas foi selecionado de forma que o número de professores estabelecido no processo de amostragem fosse respeitado.

Foram excluídos do estudo os professores que estavam exer-cendo apenas funções administrativas na escola e os que se recu-saram a assinar o Termo de Consentimento.

Coleta e análise de dados

Após serem informados sobre os objetivos do estudo, os pro-fessores receberam um questionário dividido em três partes. A primeira parte apresentava questões relacionadas aos dados so-ciodemográficos (sexo, idade, estado civil, renda mensal, escola-ridade), hábitos de vida (atividades físicas, etilismo, tabagismo, experiência com drogas ilícitas), aspectos laborais (anos de profis-são, horas de trabalho, turnos lecionados, outros trabalhos, pos-sibilidade de autonomia e criatividade no trabalho, episódios de agressão) e percepção subjetiva da qualidade de vida e satifação

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com a saúde que foram aferidas, por meio do Questionário sobre Qualidade de Vida WHOQOL16.

A segunda parte se referia aos distúrbios do sono em que foram utilizalizados como instrumento de pesquisa a Escala de Sonolência de Epworth (ESE) e o Índice de Qualidade do Sono de Pittsburgh (IQSP)17,18. A ESE avalia o comportamento de sonolên-cia diurna e é composta por oito questões que verificam a possi-bilidade do indivíduo adormecer durante atividades realizadas ao longo do dia. As questões recebem uma pontuação que varia de 0 a 3, apresentando escore máximo de 24 pontos. Valores acima de 10 indicam sonolência excessiva17,19.

O IQSP avalia a qualidade subjetiva do sono, sendo composto por dezenove questões enquadradas em sete componentes: qua-lidade subjetiva do sono, latência do sono, duração do sono, efi-ciência habitual do sono, alterações do sono, uso de medicação para o sono, e disfunção diurna. Em cada componente é atribuído um escore que varia de 0 a 3, totalizando uma pontuação global que varia de 0 a 21. Valores abaixo de 5 indi cam boa qualidade de sono, enquanto os valores acima dos 5 indicam uma qualidade ruim de sono18,19.

Quanto à terceira parte, o instrumento utilizado para ava-liação da Síndrome de Burnout foi o Maslach Burnout Inventory (MBI)20, composto por vinte e duas questões distribuídas em 3 dimensões: exaustão emocional, despersonalização e realização pessoal.

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A presença dessas dimensões é avaliada de acordo com a es-cala tipo Likert que varia de 0 a 6. Para exaustão emocional, uma pontuação maior ou igual a 27 indica alto nível; de 19 a 26, nível moderado; e menor que 19, baixo nível. Para despersonalização, pontuações iguais ou maiores que 10 indicam alto nível, de seis a nove, nível moderado; e nível baixo, menores de seis. A pontuação relacionada à realização pessoal vai em direção oposta às outras, uma vez que pontuações de zero a 33 indicam alto nível; de 34 a 39, nível moderado; e maior ou igual a 40, baixo.

Segundo o MBI, indivíduo com a Síndrome de Burnout apre-senta pontuações altas em esgotamento emocional e despersona-lização e pontuações baixas em realização pessoal no trabalho20.

A análise estatística dos dados foi realizada utilizando o pro-grama Stata 10.021 sendo aplicado o teste Qui-quadrado (nível de significância de 5%), com o objetivo de verificar a relação entre as alterações de sono com as variáveis sociodemográficas, laborais, e as dimensões do Burnout. As variáveis idade, renda mensal, horas de traba lho semanais e tempo de profissão foram reco dificadas em variáveis categóricas tomando-se por base a mediana.

2.5.3 Resultados

O questionário foi aplicado em 348 professores, sendo a maioria composta por mulheres (84,5%) com idade média de 41,1 anos (SD=9,89). Em relação ao estado civil, 192 (57,3%) eram casados ou em união consensual e 102 (30,4%) solteiros. No to-

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cante ao grau de instrução, 188 (54,2%) eram pós-graduados e 159 (45,8%) graduados e 178 (54,1%) referiram ter renda pessoal mensal acima de R$ 1.600,00. Os dados sobre características labo-rais, dimensões do MBI e avaliação subjetiva da qualidade de vida e satisfação com a saúde estão expressos na tabela 1.

Tabela 1– Características laborais e dimensões do MBI em professores da rede municipal de Natal- RN

VARIÁVEISProfessores

(n=348) VARIÁVEISProfessores

(n=348)N % n %

Características laboraisAvaliação Subjetiva

Tempo de profissão Qualidade de Vida≤ 10 anos 136 39,7 Boa/Muito boa 25 7,4> 10 anos 207 60,3 Regular 99 29,1Horas de trabalho/semana Ruim/Muito ruim 216 63,5≥ 40 horas 111 34,5 Satisfação com a saúde< 40 horas 211 65,5 Boa/Muito boa 43 12,6Turnos lecionados Regula 84 24,72 ou 3 turnos 195 56,7 Ruim/Muito ruim 213 62,6Apenas 1 turno 149 43,3Tem outro trabalho Dimensões do MBI

Sim 207 60,2 Exaustão Emocional29,91 ±

9,62*

Não 137 39,8 Alto 160 48,6Autonomia no trabalho Moderado 75 22,8Sim 313 93,4 Baixo 94 28,6Não 22 6,6 Despersonalização 12,17 ± 5,93Possibilidade de ser criativo Alto 145 43,9Sim 326 96,2 Moderado 74 22,4Não 13 3,8 Baixo 111 33,6Episódio de agressão Realização Pessoal 23,7 ± 6,88Por parte dos alunos 199 60,9 Alto 142 43Por parte dos pais de alunos 109 31,7 Moderado 71 21,5Por parte dos funcionários 38 11,2 Baixo 117 35,5

* Média dos Escores ± desvio padrão.Fonte: Autoria própria.

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No que se refere aos hábitos de vida da amostra, 170 (49,6%) realizavam algum tipo de atividade física ao menos 2 vezes por se-mana, enquanto que 173 (50,4%) relataram sedentarismo. Quanto ao uso de drogas lícitas, obteve-se que 183 (52,7%) relataram o uso de bebida alcoólica e 13 (3,8%) referiram tabagismo. Relativo ao uso de drogas ilícitas, apenas 12 (3,6%) da amostra relataram o uso prévio.

A violência praticada contra os professores foi classificada em física, verbal ou psicológica. Entre os que sofreram agressão por parte dos pais de alunos, a forma verbal foi evidenciada por 64 (59,3%) docentes. Em relação à violência praticada por estu-dantes, 199 (57,2%) dos professores relataram ter sido vítimas dos quais 51,8% sofreram pelo menos 2 tipos de violência, sendo a agressão física relatada por 25 (12,7%) dos docentes. De acordo com o estudo, foi observado que 33,3%(115) dos pesquisados so-freram pelo menos 2 tipos de agressão.

A média do IQSP obtida foi 7,47 (± 3,14). Considerando a amostra total, 239 (70,5%) apresentavam qualidade ruim de sono, e 100 (29,5%) apresentavam boa qualidade de sono. Observou-se entre os componentes do índice que a eficiência habitual do sono (0,70±0,91) e o uso de medicamentos para dormir (0,98±0,45) mostraram os melhores escores.

A análise de dados referentes à ESE mostrou uma média de escore de 11,03 (±4,89), sugerindo que essa população apresentou sonolência excessiva durante o dia. Considerando a amostra total, observou-se que 128 (39,8%) indivíduos apresentaram sonolência

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diurna excessiva e em 194 (60,2%) a sonolência foi considerada normal. Os dados sobre a relação entre o IQSP e a ESE e as variá-veis independentes estão expressos nas tabelas 2 e 3.

Tabela 2 – Análise da amostragem relacionando IQSP, ESE e dados sociodemográficos e laborais

ESE IQSP

n= 348 n= 348

VariáveisSonolência excessiva

Sonolência normal

pPobre

qualidadeBoa

qualidadep

N % n % n % n %SexoFeminino 108 40,0 162 60,0

0,836199 69,8 86 30,2

0,530Masculino 20 38,5 32 61,5 40 74,1 14 25,9Idade20 a 40 anos 66 39,8 100 60,2

0,772122 76,7 37 23,3

0,011> 41 anos 60 41,4 85 58,6 108 63,9 61 36,1Renda mensal≤ 1.600,00 reais 56 39,4 86 60,6

0,869104 68,9 47 31,1

0,605> 1.600,00 reais 67 40,4 99 59,6 123 71,5 49 28,5Anos de profissão≤ 10 anos 54 41,2 77 58,8

0,72489 65,9 46 34,1

0,095> 10 anos 73 39,2 113 60,8 148 47,4 51 25,6Horas de trabalho≥ 40 horas 43 43,0 57 57,0

0,34184 78,5 23 21,5

0,49< 40 horas 75 37,3 126 62,7 142 67,9 67 32,1Outro trabalhoSim 79 40,1 118 59,9

0,893147 72,4 56 27,6

0,328Não 48 39,3 74 60,7 89 67,4 43 32,6AgressãoAlunos 81 43,1 107 56,9 0,071 143 73,0 53 27,0 0,175Pais de alunos 46 44,2 58 55,8 0,262 78 73,6 28 26,4 0,392Funcionários 17 48,6 18 51,4 0,272 28 77,8 8 22,2 0,298

Fonte: Autoria própria.

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Tabela 3 – Análise da amostragem relacionando IQSP, ESE e avaliação subjetiva da qualidade de vida, satisfação com a saúde e domínios do MBI

ESE IQSP

n= 348 n= 348

VariáveisSonolência excessiva

Sonolência normal

pPobre

qualidadeBoa

qualidadeP

N % n % n % n %Qualidade de VidaRuim/Muito ruim 11 45,8 13 54,2

0,07617 70,8 7 29,2

0,946Regular 46 47,4 51 52,6 71 72,4 27 26,7Boa/Muito boa 68 34,3 130 65,7 149 70,6 62 29,4Satisfação com a saúdeRuim/Muito ruim 20 50,0 20 50,0

0,02628 68,3 13 31,7

0,565Regular 38 48,1 41 51,9 56 67,5 27 32,5Boa/Muito boa 67 33,5 133 66,5 153 73,2 56 26,8Dimensões do MBIExaustão EmocionalAlto 56 38,6 89 61,4 106 69,3 47 30,7

0,575Moderado 26 36,1 46 63,9 0,343 50 66,7 25 33,3Baixo 41 46,6 47 53,4 68 73,9 24 26,1DespersonalizaçãoAlto 55 41,4 78 58,6

0,67195 67,9 45 32,1

0,740Moderado 23 35,4 42 64,6 52 72,2 20 27,8Baixo 45 41,7 63 58,3 78 71,6 31 28,4Realização PessoalAlto 45 34,6 85 65,4

0,04992 66,7 46 33,3

0,505Moderado 22 35,5 40 64,5 49 73,1 18 26,9Baixo 56 49,1 58 59,9 84 72,4 32 27,6

Fonte: Autoria própria.

Ao tomarmos a Síndrome de Burnout como variável depen-dente relacionada com as demais variáveis independentes, não foram obtidos valores estatisticamente significantes, exceto para

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a relação à dimensão despersonalização e tempo de trabalho. Foi evidenciado que 64 (49,2%) dos professores com menos de dez anos trabalho apresentaram alto nível de despersonalização (p=0,049).

2.5.4 Discussão

A literatura sobre qualidade de vida e estresse em profes-sores vem crescendo cada dia e evidencia uma forte correlação entre o alto índice de estresse e o exercício da profissão1-6,9. Cor-roborando esses achados, o presente estudo apresenta dados se-melhantes às demais regiões brasileiras, indicando que não se trata de uma problemática regional e sim uma questão de saúde pública no âmbito nacional.

As características sociodemográficas da amostra estudada como idade, sexo, estado civil e escolaridade indicam que a maio-ria eram mulheres com média de 40 anos, casadas e com alto grau de instrução. A presença marcante de mulheres no estudo pode ser explicada pela própria composição feminina dessa categoria profissional relatada também por outros autores21-22 e que trazem como explicação o papel cultural da mulher na educação dos fi-lhos, sendo então, essa profissão considerada como uma extensão do trabalho doméstico22. Já a elevada formação profissional ob-servada entre os professores, provavelmente se deve à Lei de Di-retrizes e Bases da Educação, de 1996, que exige o nível superior para todos os professores que atuam no ensino fundamental23.

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Outro fator a ser considerado é o de que mais da metade dos professores trabalhavam simultaneamente em outra escola ou desenvolviam outras atividades remuneradas além da docência. Esse fato evidencia a necessidade de complementação da renda e pode explicar a renda mensal média encontrada no presente es-tudo, bem como a elevada carga horária de trabalho semanal e a maioria precisar lecionar em 2 ou 3 turnos. Esse dado também foi evidenciado no estudo com professores da rede particular da Bahia21 e em Campinas22. Tais estudos trazem uma reflexão sobre as horas de trabalho dos professores que vão além da sala de aula e esses profissionais acabam por levar trabalho para casa, pois pre-cisam preparar aulas, provas, corrigir e orientar a produção do aluno, participar de reuniões, entre outras atividades burocráticas inerentes à instituição de trabalho.

Atrelado a essa alta carga horária de trabalho, o fato da maio-ria da amostra do presente estudo ser mulher e trabalhar por mais de 10 anos lecionando, pode sugerir que essa população está pre-disposta a sofrer alterações, que vão desde o âmbito físico até as desordens emocionais, uma vez que, além de profissional, a mu-lher tem que desenvolver suas atividades domésticas24. A sobre-carga física e emocional a que elas estão expostas abrem caminho para sentimentos de culpa e insatisfação predispondo essa classe ao aparecimento de várias patologias e falta de realização no am-biente de trabalho3,9,24.

O ambiente de trabalho vem sendo alvo de inúmeros estu-dos, uma vez que o processo saúde-doença é também construído

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no trabalho, pois neste espaço pode-se, com autonomia e cria-tividade, ter a reafirmação da autoestima, o desenvolvimento de habilidades, e a expressão das emoções e da personalidade, tor-nando-se também espaço de construção de identidade social4. No entanto, quando há quebra desse processo, o ambiente de trabalho passa a figurar como agente etiológico das doenças ocupacionais, comprometendo a saúde física e mental do professor12,21,24.

Em relação à amostra estudada, a maioria referiu ter auto-nomia no trabalho, assim como liberdade de expressar sua cria-tividade. No entanto, a onda de violência contra os profissionais aponta como fator estressor na quebra da harmonia do ambiente de trabalho. Os alunos se configuram como os principais agen-tes de agressão contra o professor e de forma alarmante, as agres-sões ultrapassam o âmbito das palavras, partindo para a agressão física propriamente dita. Já por parte dos pais dos alunos e dos funcionários, a agressão verbal é a forma preponderante, sendo a agressão psicológica bastante praticada por parte destes últimos. Estudos na Bahia21 e em Belo Horizonte3 mostram resultados se-melhantes e confirmam que as alterações nas relações sociais e no ambiente de trabalho são as responsáveis pelas doenças ocupacio-nais, bem como pelo surgimento de sintomas ligados à Síndrome de Burnout.

Embora o estresse profissional e a Síndrome de Burnout no ensino possivelmente ocorram entre os professores há muito tem-po, seu reconhecimento como problema de grande relevância tem sido mais explícito nos últimos anos4. O modelo teórico de Mas-

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lach descreve a Síndrome de Burnout como um processo em que a exaustão emocional é a dimensão precursora da síndrome, sendo seguida por despersonalização e, na sequência, pelo sentimento de baixa realização profissional2.

Após análise dos resultados, pode-se observar uma sinali-zação em direção à presença de Burnout na amostra estudada. Para Maslach, a síndrome nos professores de Natal encontra-se ainda em curso de instalação, pois ainda não foi observada uma repercussão tão expressiva nos dados referentes à Realização Pes-soal como foi observado nas dimensões de Exaustão Emocional e Despersonalização20. No entanto, outro autor aceita que se houver apenas uma dimensão em nível alto, independente de qual seja, pode-se fechar o diagnóstico da síndrome25.

Ao relacionar as atividades dos profissionais da educação com a Síndrome de Burnout, estudos trazem que o professor apresenta, além da diminuição da qualidade e rendimento do seu trabalho, sinais de perda de entusiasmo e criatividade, pas-sando a ver seu trabalho inconsistente e sem sentido, conflitan-do com o que tinham estabelecido como importante papel no início de sua carreira11,12.

Um ponto importante evidenciado é que a maioria dos pro-fessores do estudo afirma não praticar nenhum tipo de atividade física e fazem uso de bebidas alcoólicas. Segundo dados da Or-ganização Mundial da Saúde, a prática regular de atividade física reduz os riscos de diabetes, de hipertensão e de problemas cardio-vasculares, além de prevenir as dores músculo-esqueléticas pro-

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236

movendo o bem estar psicológico, reduzindo o estresse, a ansie-dade e a depressão22.

Estudos recentes trazem como manifestações clínicas do es-tresse e da depressão os distúrbios do sono e cerca de 50% a 95% dos pacientes portadores de transtornos do humor, apresentam queixas de sono fragmentado e superficial7,8,26. No outro extremo, temos a sonolência, função biológica definida como uma proba-bilidade aumentada para adormecer. Já a sonolência excessiva, ou hipersonia, refere-se a uma propensão aumentada ao sono com uma compulsão subjetiva para dormir, tirar cochilos involuntá-rios e ataques de sono, quando o sono é inapropriado26.

No presente estudo, foi observada uma alta prevalência da sonolência excessiva nos docentes, dado alarmante, uma vez que a associação significativa entre essa entidade clínica e a tentativa suicida já foi demonstrada27. Foi ainda demonstrado que os pro-fissionais com sonolência normal apresentavam uma satisfação com a saúde boa ou muito boa, em sua maioria. Além disso, foi observado que dos professores com alto nível de realização pes-soal pelo MBI, 65,4% apresentaram uma sonolência normal. Po-dendo inferir que os fatores que levam tanto à satisfação da pró-pria saúde, quanto à profissional, devem estar diretamente ligados à qualidade do sono do indivíduo.

Em relação à qualidade do sono, pode-se constatar que a maio-ria absoluta da amostra apresentava qualidade ruim do sono e a faixa etária mais atingida foi entre 20 e 40 anos, correspondendo à idade em que demonstrou ter mais alterações, como despersonali-

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zação e exaustão emocional. É nessa faixa, também, que foi encon-trado o maior número de docentes que apresentam outro emprego e que lecionam em 2 ou 3 turnos. Entretanto, não há na literatura, estudos sobre a qualidade do sono e seus distúrbios em professores. Apenas um estudo encontrou associação entre dificuldades para dormir e falta de exercício físico nesses profissionais22.

Diante do que foi discutido, pode-se observar que os pro-fessores constituem uma classe vulnerável aos desgastes que a profissão impõe e seus efeitos ecoam no campo físico, laboral e emocional. Assim, fica aqui um alerta sobre a importância de se conhecer a dinâmica da produção do desgaste gerado nesse tipo de trabalho para que se possam viabilizar programas de governo, voltados para a promoção à saúde, sendo necessárias mudanças nas condições de trabalho desses profissionais de tão grande im-portância em nossa sociedade.

2.5.5 Conclusão

Os professores da rede municipal do município de Natal apresentaram uma pobre qualidade do sono, sonolência excessi-va, alto nível de despersonalização e exaustão emocional que, jun-tos, podem atrapalhar o desempenho laboral desses profissionais. Novas pesquisas devem ser instituídas no sentido de gerar uma política de promoção à saúde para que a qualidade do ensino no município alcance um melhor patamar.

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2.6 ASPECTOS RELACIONADOS À

ATUAÇÃO DO GESTOR NA REDE HOSPITALAR

Vilani Medeiros de A. NunesDenise Nieuwenhoff Cardoso Ribeiro

Kyra Kadma Silva Fernandes de MedeirosLaís Karen da Silva Magalhães

Priscylla Paiva de LimaYaracely Fernandes Mendes

2.6.1 Introdução

O direito universal à saúde, garantido por um sistema políti-co, sendo ele hierarquizado, regionalizado e descentralizado (com ênfase na municipalização dos serviços) cria diversos desafios re-lacionados à questão dos recursos humanos. Segundo Bittar1 , es-ses desafios são referentes às competências necessárias para que os gestores ou gerentes do sistema de saúde, em âmbito local ou em âmbito mais amplo (regional e estadual), consigam desempenhar as tarefas que concretizarão o sistema.

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243

Atualmente, o serviço hospitalar faz parte de uma das mais complexas unidades, em termos de arranjos organizacionais, não apenas por sua amplitude, mas, sobretudo, por apresentar uma equipe multidisciplinar, com um grau de autonomia elevado, doando ao usuário uma assistência à saúde com caráter curativo e reabilitador. Azevedo² expõe que é um serviço que utiliza tecnolo-gia de ponta e se caracteriza por um espaço de prática de ensino- aprendizagem e produção científica.

O hospital característico dos dias atuais é algo contemporâ-neo. Para Gurgel e Vieira³, o hospital é “uma organização como instrumento de intervenção terapêutica com o objetivo de alcan-çar a cura de doentes, é uma invenção relativamente recente”.

Segundo Foucault4, antes do século XVIII, os hospitais eram locais onde os enfermos ficavam para ficar longe do convívio so-cial, para esperar a morte, não recebendo nenhuma intervenção sobre sua doença. Para Seixas e Melo5, a história da administração hospitalar se confunde com a história dos hospitais e da medici-na. Os hospitais aqui do Brasil foram administrados por médicos, enfermeiros e, até mesmo, pela própria comunidade, por serem vistos como instituições de caridade. O hospital é visto como uma empresa moderna, e, é claro, deve contar com os administrado-res. Inicialmente, só existiam cursos em nível de especialização, porém esses serviram de parâmetro para realização do curso de graduação, elevando assim, a necessidade da existência de profis-sionais especializados para atuarem nesta área específica, traba-lhadores que sejam aptos a desempenharem tal função.

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É comum encontrar outros profissionais da saúde atuando como gestores nas unidades hospitalares, desempenhando a fun-ção de gestor/gerente. Barquin6 afirma que os médicos e as enfer-meiras são preparados para a realização de tarefas técnicas, pres-tando serviço direto ao paciente. Por vezes, isso compromete a qualidade do serviço e da administração ou gerência.  

De acordo com Fajardo Ortiz7 (p10) “[...] a América Latina ne-cessita com urgência de verdadeiros administradores da atenção médica”. As instituições de saúde encontram-se com estruturas antigas e rígidas. Segundo o referido autor, a assistência depen-de, primordialmente, da forma como o hospital é gerenciado, do perfil do profissional que ali atua, assim como dos recursos tecnológicos disponíveis. Ele também enfatiza que todas as áreas são responsáveis, de alguma forma, pela saúde dos pacientes. Para Seixas e Melo5, de uma forma multidisciplinar os conhecimentos se encaixam produzindo informações em saúde.

O papel do gestor se torna assim, imprescindível no serviço, mas para isso, ele deve seguir alguns preceitos essenciais para que seu desempenho seja efetivo. Ainda segundo Fajardo Ortiz,7(p10) para se exercer a função de gestor hospitalar, é necessário saber coordenar as atividades para se atingir os objetivos; promover capacitações para os profissionais para subsidiar as inovações, pois sem renovação, o hospital irá declinar e morrer; e trabalhar a questão, também, motivacional do pessoal. E cabe ao diretor dar o exemplo de dedicação ao serviço, devendo ser um hábil negocia-dor, de forma que os profissionais projetem o hospital como uma

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instituição estável que além de realizar efetivamente suas ativida-des, perdure por longas gerações e que seja um multiplicador de benefícios sociais e econômicos.

Por fim, o administrador necessita, impreterivelmente, co-nhecer os aspectos éticos e legais que regem essa instituição, que se designa do direito à “saúde para todos”, em que a dignidade do ser integral deve ser respeitada e o atendimento deve ser universal e equânime; conhecer todas as funções e atividades que submer-gem o hospital; e compreender a visão como um todo do serviço, em que expõem Seixas e Melo5, manutenção da saúde, prevenção da doença, educação profissional e pesquisa.

Feuerwerker8 afirma que o hospital está nas duas pontas da questão da formação: como uma unidade de saúde que necessita de trabalhadores formados adequadamente – para a gestão e para a atenção – e, ao mesmo tempo, cumpre um papel fundamental na conformação do perfil dos trabalhadores da área da saúde, como espaço organizado voltado para aprendizagem durante a forma-ção técnica e profissional.

Partindo dessa perspectiva, o objetivo central deste artigo é abordar questões referentes ao papel do gestor/gerente perante um serviço de alta complexidade hospitalar, realizando as boas práticas de gestão no processo de tomada de decisão das organizações.

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2.6.3 Metodologia

Trata-se de um estudo descritivo, realizado por meio de uma revisão de literatura por meio de uma pesquisa – síntese de 31 (trin-ta e um) artigos científicos, cujos artigos foram buscados nas bases de dados da Biblioteca Virtual em Saúde (BVS) e do Scielo. Os ar-tigos pesquisados foram dos anos 2000 em diante. A pesquisa foi produzida no período de novembro de 2013 a dezembro de 2013. Utilizam-se critérios de inclusão artigos somente da língua portu-guesa. O enfoque do estudo é relacionado ao papel e à atuação do gestor na unidade hospitalar e de que forma ele contribui no servi-ço, retratando também um pouco do histórico da gestão hospitalar e da sua progressão, bem como a sua importância no serviço.

A complexidade hospitalar

Os hospitais estão entre os organismos mais complexos de serem administrados, pois neles estão reunidos diversos serviços e situações simultâneas. A instituição hospitalar deixou há pouco tempo de ser encarada como uma entidade protetora dos menos favorecidos, para se tornar uma forte influenciadora das mudan-ças sociais, diante dos benefícios de bem-estar promovidos pela instituição. Sendo detentora de uma infinidade de especialidades médicas advindas da evolução da ciência e da tecnologia, a insti-tuição hospitalar deve ser entendida e percebida com uma organi-zação que necessita de administração eficiente para garantir que seus objetivos e funções sejam alcançados satisfatoriamente 9,10.

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De acordo com Castro11, o hospital deve desempenhar as se-guintes funções:

- assistência médica continuada: deve conter uma gama de recursos diagnósticos e para tratamento a fim de que possibilite a reintegração do paciente ao seu meio, no menor tempo possível;

- assistência médica integrada: dentro de uma rede de servi-ços de complexidade crescente, o hospital compreende um lugar intermediário;

- assistência médica integral: quando o hospital faz parte de uma rede que promove a disponibilidade dos recursos necessários para solucionar cada caso;

- área de programação: a organização possui uma área de in-fluência que oferece seus serviços. Os resultados das ações desses serviços sobre a população devem ser avaliados;

- provedor de programas de saúde: o hospital desenvolve também programas preventivos e de promoção à saúde, formula-dos pela autoridade sanitária.

A complexidade do trabalho em saúde

Deluiz12 pondera algumas considerações sobre a complexi-dade do trabalho em saúde, ao abordar sobre um dos programas de Educação Profissional do Ministério da Saúde, o Projeto de Profissionalização dos Trabalhadores da Área de Enfermagem (Profae), ao afirmar que o modelo de competências na área da

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saúde não pode restringir-se à dimensão técnico-instrumental, tornando-se uma simples estratégia de adaptação às necessidades do processo produtivo. Afirma ainda, que, a produção e a presta-ção dos serviços de saúde têm como característica fundamental a função de acautelamento dos riscos e resguardo do direito à vida, com qualidade.

O administrador hospitalar

De acordo com Seixas e Melo5, para o administrador hos-pitalar desempenhar suas atividades burocráticas, é necessário exercer suas funções em parceria com as ações do médico, da enfermagem e dos demais profissionais, para que se possa obter apoio nas decisões a serem tomadas. Neste sentido, são necessá-rios também um trabalho em equipe e uma união das ações de assistência e gestão, estas últimas inseparáveis e indispensáveis para uma boa gestão. Esse gestor deve compreender o processo de trabalho em saúde, com uma visão integral dos serviços, ter autonomia e iniciativa para decidir apoiado nos princípios éticos, além de estar comprometido com a organização, com o trabalho em equipe multiprofissional e estar disposto a aprimorar seus co-nhecimentos diariamente.

Ainda de acordo com esses autores, o gestor precisa apreen-der os princípios éticos e legais que compõem essa organização, advindos do direito à “saúde para todos”, em que deve haver o respeito à dignidade da pessoa e a assistência às suas necessida-

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des deve ser garantida. Precisa-se também ter ciência de todas as funções que envolvem o hospital e ter entendimento da visão do conjunto por completo, a saber: manutenção da saúde, prevenção da doença, educação profissional e pesquisa.

Segundo Silva, Cunha, Capanema, e Lima13, “novos proces-sos para adequação e transformação das organizações públicas, visando atender a alguns condicionantes para que se estabeleça a gestão eficiente, eficaz e efetiva se fazem necessários”. Para tanto, valorizam-se os conhecimentos e as capacidades técnicas dos ge-rentes hospitalares, pelo fato destes desenvolverem funções-chave nessas organizações esperando que eles tenham a capacidade de responder aos anseios da sociedade. Em grande parte dos casos, a responsabilidade pela ineficiência e ineficácia da instituição é atri-buída à gestão. Segundo Moretto Neto, Silva e Schimitt14, a grande dimensão dos problemas administrativos e a complexidade quan-to à gestão de um hospital remete à necessidade de uma admi-nistração profissional, realizada por pessoas capacitadas para a administração dos negócios do hospital.

Papéis gerenciais de um líder

Para Quinn, Faerman, Thompson, Mcgrath et al,15 há os oito papéis de gerências correspondentes a cada modelo proposto por Quinn16. Elas são descrições genéricas de comportamentos geren-ciais que não estão necessariamente ligados a um nível específico da hierarquia administrativa, mas são cabíveis a algum papel de liderança. São eles:

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1. Papel mentor

Dedicação ao desenvolvimento das pessoas, a partir de uma orientação cuidadosa e empática. Requer uma compreensão de si mesmo e dos outros. O gerente deve ser atencioso, acessível aos demais funcionários, prestativo e justo, que escute e apoie suas reivindicações legítimas, além de proporcionar o aprimoramento de competências e o desenvolvimento individual dos empregados.

2. Papel facilitador

Baseia-se também no modelo das relações humanas. Desem-penha essa função o gerente que incentive os esforços coletivos, estabeleça a coesão e o trabalho em equipe e administre os confli-tos interpessoais.

3. Papel monitor

Neste aspecto, o gerente precisa estar ciente dos acontecimen-tos de sua unidade, averiguar se as pessoas estão cumprindo as re-gras e se o setor está fazendo a sua parte. Espera-se ser um bom analista e que domine os fatos e detalhes. É característico também desse papel o gosto por dados, pela análise e resposta a informações de rotina pela inspeção e vistoria e a revisão de relatórios.

4. Papel coordenador

Espera-se que como coordenador, o gerente ofereça sustenta-ção à estrutura e fluxo do sistema, como também, deve fazer jus à confiança e crédito que lhe foram atribuídos enquanto profissional.

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Este deve ser um facilitador do trabalho, utilizando-se de recursos como agendamento, organização e coordenação de esforços da equipe, enfrentamento e resolução de problemas de cunho tecnoló-gico, logístico e doméstico.

5. Papel diretor

No que se refere a este aspecto, o gerente deve expor expec-tativas por meio de processos, de planejamento e de delimitação de metas; e ser um deflagrador decisivo, que caracteriza os pro-blemas, defina objetivos, estabeleça papéis e tarefas, gere regras e políticas e forneça instruções.

6. Papel produtor

Enquanto produtor, o gerente deve orientar-se para tarefas, com foco no trabalho e apontar grau de interesse, motivação e ímpeto pessoal.

7. Papel negociador

O papel do negociador tem como característica a preocu-pação com a sustentação da legitimidade exterior e a obtenção de recursos externos. Os gerentes devem possuir astúcia política, persuasão, capacidade de influência e poder.

8. Papel inovador

Remete ao papel de facilitar a adaptação e a mudança, por isso, é necessário atentar para o ambiente externo em constante

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modificação. Para tal é imprescindível ser criativo, sonhador, inte-ligente, com visão ampliada, capacidade de vislumbrar inovações e persuadir os demais sobre a necessidade das inovações.

Em um estudo descritivo exploratório realizado por Silva, Cunha, Capanema, Lima,13 composto por hospitais da rede pú-blica da cidade de Belo Horizonte-Minas Gerais, um grupo de pesquisadores constatou que o “modelo de Quinn mostrou-se incompleto diante da realidade dos hospitais públicos de Minas Gerais. Desta forma, o papel político representa a adequação do modelo à realidade estudada.” Quanto a esta competência, per-cebeu-se que deve estar presente no gerente, sendo imprescin-dível nas relações de caráter político e podem influenciar nas atividades desenvolvidas no dia a dia do hospital e no volume de recursos arrecadados.

2.6.4 Resultados

Durante o mês de setembro de 2013, os autores do presente artigo realizaram visita técnica ao Hospital Universitário Onofre Lopes (huol) localizado em Natal/RN, a fim de observar na práti-ca, os conhecimentos acerca da gestão em si, como também, pon-derar a relação entre o território e o processo de organização da atenção à saúde, por meio da técnica de territorialização, que se faz necessária para que o processo da gerência cumpra bem seu papel institucional.

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Verificou-se com a inspeção, que os princípios institucio-nais, em que se pode caracterizar como sendo a visão e a missão do hospital, são de extrema importância para que o trabalho flua dentro dos padrões, bem como o perfil multiprofissional que o Onofre Lopes apresenta, justamente por ser um hospital escola de referência para todo o estado. De modo geral, pode-se frisar que o huol, mesmo que não atenda toda a demanda esperada, apesar de que seus níveis de atendimentos estejam acima do esperado, apre-senta um excelente perfil de qualidade profissional, ética e moral para com os profissionais e os usuários.

O perfil do gestor na instituição é bastante presente, notando por sua vez a preocupação voltada para todo o corpo profissional em prol de uma assistência de qualidade para com o usuário, apre-sentando como objetivo, a promoção de forma integrada com o ensino, a pesquisa, a extensão e a assistência, no âmbito das ciên-cias da saúde e correlatas, com qualidade, ética e sustentabilidade.

2.6.5 Discussões

Foram encontrados 31 (trinta e um) artigos científicos nas bases de dados consultadas que são referentes ao papel do gestor/gerente na unidade hospitalar, bem como seu perfil e suas carac-terísticas. A pesquisa traz um enfoque sobre a importância da ges-tão hospitalar perante a situação atual das unidades e a precariza-ção que, por vezes, esta atividade se encontra.

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O trabalho em saúde requer especificidades em que as deci-sões tomadas implicam na articulação de diversos saberes advin-dos de várias instâncias, sendo eles: o conhecimento científico, a formação profissional, as experiências de trabalho, sendo media-dos assim, pela dimensão técnica e política.

Identificou-se em nosso sistema público de saúde, serviços diferenciados que se iniciam, ou que deveriam iniciar, o caminhar da rede pelas Unidades Básicas de Saúde (UBS), até os serviços de alta complexidade, como os hospitais, que abrangem uma gama de serviços especializados e são voltados para promoção, proteção e recuperação da saúde. De acordo com Acurcio17, o sistema de saúde brasileiro, de uma forma geral, tem passado por constantes críticas ao longo de anos. Os hospitais públicos, principalmente, vivenciam a discrepância que há entre o conjunto de problemas e a capacidade do Estado em resolvê-los.

Além das críticas aos serviços especializados que o hospital oferece, a gestão também é alvo de julgamentos, sendo, muitas vezes, caracterizada como uma atividade que necessita ser inova-da, investida, e que ofereça instrumentos para tomada de decisão, tendo como base o planejamento e as estratégias, pois somente com o uso do material da tecnologia, o quadro não é revertido e, provavelmente, os problemas não serão amenizados.

Dessa forma, Lino18 diz que o sucesso de uma organização hospitalar possui infraestrutura de instalações, equipamentos, instrumentais, médicos, funcionários, recursos financeiros e, especialmente, usuários que ali se dirigem em busca de trata-mento ou consulta.

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Gerir não é somente colocar em prática tudo que está preco-nizado em leis, como também, atrelar a estas responsabilidades aos saberes culturais em que está englobada a instituição. Conhe-cimentos técnicos, científicos, culturais e lógicos devem andar lado a lado para almejarem um resultado de excelência.

Segundo Pio19, o administrador precisa oferecer às pessoas uma compreensão clara das responsabilidades inerentes à função, e depois, faz-se necessário dar-lhes a autoridade para assumir es-sas responsabilidades, estabelecendo e transmitindo os padrões de excelência que dizem às pessoas como desempenhar a sua função.

Quando se fala em gestão, estamos falando de um conjunto de técnicas e métodos de planejamento, direção e controle, que visam ao envolvimento e à mobilização dos atores hospitalares na con-cretização dos objetivos da organização, que devem ser acordados, segundo as diretrizes do SUS. Só assim, o hospital poderá cumprir seu papel social, exercendo uma assistência de qualidade a custos adequados consoante com as necessidades de saúde da população.

Atualmente, é perceptível a necessidade de um profissional qualificado para tomar a frente das decisões tecno-burocráticas da instituição, que pense no serviço como um sistema preparado para atender toda a demanda que se responsabiliza; que respeite os anseios profissionais e dos usuários; e que saiba pesar todas as decisões e consequências, sempre tendo o usuário como alvo principal para qualquer tomada de decisão.

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A gerência deve zelar pela multiprofissionalidade das equipes e garantir o acompanhamento da programação das ações de saúde e da destinação dos recursos financeiros dentro do plano de saúde que, por sua vez, estará de acordo com a Política de Saúde do Mi-nistério da Saúde. Esse exercício multiprofissional deve ser levado em consideração, para que os objetivos da instituição sejam vistos com clareza e precisão, e para que a missão institucional permeie junto os profissionais.

2.6.6 Considerações finais

A gestão da saúde, seja no atendimento, seja na qualidade técnica – burocrática, vem recebendo um maior enfoque nos úl-timos anos, devido ao aumento de sua complexidade assistencial e da situação crescente dos serviços de saúde e do sistema como um todo. As organizações de saúde e suas gestões necessitam instituir estratégias melhor consolidadas, com modelos mais es-truturados para melhor atender a demanda de usuários e orga-nizar melhor o serviço.

É imprescindível que os gestores hospitalares se adequem às transformações constantes que os serviços demandam, modernizando suas tarefas e modelos de gestão para que os resultados beneficiem todos os atores sociais envolvidos, principalmente os usuários.

O papel da gestão se fundamenta também nos recursos ma-teriais, físicos e humanos, fazendo sua distribuição adequada-

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mente e condenando suas atividades, ações e resultados. Dessa maneira, o gestor deve ter comprometimento com a melhoria contínua do serviço.

Não se deve esquecer que o gerenciamento na área da saúde é mais complexo do que em qualquer outro tipo de organização. Os objetivos de cada empresa atuantes nesse segmento necessitam estar adequados à sua estrutura e à sua organização. Para ser um gestor com postura adequada e tecnicamente eficiente, é necessá-rio compreender bem o que é saúde e como devemos enxergar os usuários e os prestadores de serviços em suas conjunturas, buscan-do conhecer a verdadeira realidade de cada indivíduo para que o possibilite enxergar o aparecimento ou gravidade de uma doença.

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2.7 ESTUDO EPIDEMIOLÓGICO DO

ADENOCARCINOMA COLORRETAL: ANÁLISE DE

CASOS EM HOSPITAL DO RIO GRANDE DO NORTE

Raimundo Araújo JúniorIsa Maria Hetzel de Macedo

Grasiela PiuvezamMarília de Almeida Cardoso

Lilian Vital PinheiroFrancisco Jakson Benigno CavalcantiMarcelo Cândido de Andrade Leitão

2.7.1 Introdução

Os tumores de intestino são uma causa importante de mor-bidade e de mortalidade. O cólon, incluindo o reto, é o órgão que mais hospeda neoplasias primárias, sendo o câncer colorretal supe-rado apenas pelo carcinoma broncogênico, entre os tumores fatais. O adenocarcinoma é o tipo histológico que predomina em relação a outros cânceres colorretais, constituindo cerca de 70% do total de neoplasias malignas que acometem o trato gastrointestinal1.

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O câncer colorretal é a quarta neoplasia mais incidente no Brasil2.. A incidência de neoplasia colorretal vem aumentando nos últimos anos, ocorrendo predominantemente na população idosa, sendo incomum em menores de 40 anos3,4,5, e com pico de incidência na sexta década de vida, de todos os cânceres colorre-tais, 2,1 a 14,6% ocorrem nesta faixa etária5,6,7,8,9,10,11. Para Marble et al.,12 a incidência dessa doença abaixo de 30 anos é ainda menor (em torno de 1%).

A prevalência é discretamente maior em homens, com taxas médias de 1,2-3 homens/1 mulher12. O tempo médio entre o iní-cio dos sintomas e o diagnóstico varia de 2,3 a 10 meses11,12.

Indivíduos com idade inferior a 40 anos, portadores de cân-cer colorretal, apresentam pior evolução. Controvérsias ainda existem quanto às características desses tumores e prognóstico nesta população7,17,18,19. Atraso no diagnóstico, grau do estadia-mento clínico da doença e agressividade do tumor foram explica-ções sugeridas para a evolução desfavorável7.

Vários fatores são relevantes no que diz respeito à etiologia do adenocarcinoma de colorretal (ACCR) na medida em que múltiplas etapas estão implicadas na sua patogênese. É provável que fatores exógenos e hereditários interajam no aparecimento desse tipo de câncer, variando a sua importância, no entanto, de acordo com cada caso. Entre os fatores exógenos, pode-se citar a idade, hábitos de vida como tabagismo, etilismo e dieta, doença inflamatória intestinal e caso semelhante na família2.

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A história familiar, bem como a associação sindrômica do câncer colorretal hereditário não polipoide (HNPCC) e polipo-se adenomatosa familiar (FAP), é pouco observada, talvez devido às dificuldades de rastreamento5,6. Liang et al.14 não encontraram maior incidência de história familiar quando compararam jovens e idosos.

Quanto à localização do tumor, observa-se maior predo-minância de envolvimento do reto16. A localização da neoplasia também se correlaciona com o prognóstico da doença, uma vez que um melhor prognóstico tem sido observado em tumores com localização em cólon direito e quanto mais distal a localização tumoral, pior o prognóstico15. O TNM é um parâmetro clínico feito avaliando-se o grau de invasão tumoral na mucosa do cólon (T), o grau de comprometimento dos linfonodos regionais (N) e a existência ou não de metástases à distância (M)23,24. Um outro parâmetro utilizado para avaliar uma neoplasia é o histopatológi-co, determinado pela avaliação de características como o grau de diferenciação das células do tumor, classificando-o em diferencia-do, moderadamente diferenciado e indiferenciado25.

Esses parâmetros em conjunto são utilizados para definir o prognóstico do paciente. Entretanto, segundo alguns autores, o melhor indicador prognóstico é o estadiamento clínico TNM no momento do diagnóstico20,21.

O objetivo deste trabalho foi traçar o perfil clínico-epidemio-lógico dos pacientes portadores de adenocarcinoma colorretal em hospital de referência do tratamento de câncer no estado do Rio

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Grande do Norte, assim como, correlacionar parâmetros clínicos como localização do tumor, idade e estadiamento clínico (TNM) com a evolução da doença.

2.7.2 Metodologia

Desenho do estudo

Trata-se de um estudo tranversal, feito a partir da análise de 521 prontuários de pacientes com adenocarcinoma colorretal e que foram atendidos no período de 1995 a 2005, no Hospital Dr. Luís Antônio – LIGA, em Natal-RN, Brasil.

O estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética do referido hos-pital – CEP/HLA/LIGA NORTE-RIO-GRANDENSE CONTRA O CÂNCER – e foi emitido um parecer determinante do proces-so pelos Membros do Conselho, sob o Protocolo N. 024/0030/06. Após essa etapa, iniciou-se a busca dos prontuários médicos dos pacientes com adenocarcinoma colorretal.

Cálculo e critérios de seleção da amostra

A amostra foi estabelecida segundo os seguintes critérios de inclusão: apenas pacientes com câncer de localização colorretal, do tipo histológico adenocarcinoma e que tenham sido diagnosti-cados e/ou tratados na LIGA, entre os anos de 1995 e 2005.

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Coleta e análise de dados

A extração dos dados foi realizada a partir de informações contidas nos prontuários de atendimento do hospital.

As variáveis coletadas foram: estadiamento clínico TNM – variável dependente – e sexo, cor da pele, faixa etária, histórico familiar, hábitos de vida (etilismo e tabagismo), localização do tumor primário, grau de diferenciação, tratamento e evolução – variáveis independentes.

Os prontuários foram preenchidos por médicos do serviço local, durante o tratamento e o acompanhamento de cada pacien-te. O diagnóstico de ACCR, além da propedêutica adequada, foi feito com a realização de biópsia em todos os casos.

2.7.3 Resultados

A partir dos dados coletados, observamos que 254 (49%) dos pacientes eram do sexo masculino, enquanto que 267 (51%) eram do sexo feminino.

Em relação à faixa etária, 340 (65,2%) dos casos analisados encontravam-se entre 51 e 80 anos de idade.

A cor predominante nos indivíduos estudados foi a par-da, com 301 (57,7%) indivíduos, seguida da cor branca, com 98 (18,8%). O número de prontuários sem informação foi 120 (23,0%).

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Quanto ao etilismo, 327 (62,7%) dos prontuários não cons-tavam com essa informação. 148 (28,4%) enquadraram-se como não etilistas e 46 (8,8%) como etilistas.

Quanto ao tabagismo, 294 (56,4%) dos prontuários não cons-tavam com informação a respeito do uso de tabaco. 105 (20,1%) dos pacientes eram usuários, enquanto que 122 (23,4%) negaram tabagismo.

Em 365 (70,0%) dos prontuários não constavam informações sobre histórico de câncer colorretal na família. 85 (16,3%) dos in-divíduos relataram ter parentes com algum tipo de neoplasia, en-quanto que 71 (13,6%) negaram.

Em 233 (44,7%) dos casos analisados, o tumor primário es-tava localizado no reto, seguido do retossigmoide, em 73 (14,0%) dos casos.

Quanto ao estadiamento clínico TNM, 122 (23,4%) foram classificados no estádio IV, 115 (22,0%) no estádio III, 118 (22,6%) no estádio II e 30 (5,7%) no estádio I. Quando agrupamos os está-dios I e II, observamos que juntos, eles correspondem a 148 casos (28,4%), enquanto que os estádios III e IV correspondem a 237 casos (45,4%).

Dos carcinomas analisados, 410 (78,6%) foram classificados como sendo medianamente diferenciados, 36 (6,9%) como indi-ferenciados e 27 (5,1%) como bem diferenciados; não constando essa informação em 48 (9,2%) dos prontuários analisados.

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O tratamento mais utilizado nesses pacientes foi a cirurgia associada à quimioterapia, em 174 (33,3%) dos casos. Observou-se que foi feito maior uso do tratamento cirúrgico, associado ou não à quimioterapia e/ou radioterapia.

Dos pacientes analisados, 124 (23,8%) ficaram livres da doença, 147 (28,2%) evoluíram para o óbito, 229 (43,9%) ainda estavam em tratamento até o momento de coleta de dados. Em 21 (4,0%) dos prontuários faltavam essa informação.

Quando correlacionamos o estadiamento com a evolução da doença, observamos que dos pacientes que estavam no estádio I, 12 (2,3%) ficaram livres da doença e apenas 1 (0,19%) foi a óbito, enquanto que os pacientes que estavam no estádio IV, apenas 4 (0,76%) ficaram livres da doença, enquanto 59 (11,3%) foram a óbito. 147 (28,2%) dos prontuários faltavam informações a respei-to do TNM e/ou da evolução da doença.

Quando correlacionamos a evolução com o estadiamento estratificado, ou seja, agrupando os estádios I-II e os estádios III-IV, observamos que dos pacientes que se encontravam no está-dio I-II, 59 (11,3%) ficaram livres da doença e apenas 24 (4,6%) foi a óbito, enquanto que os pacientes que estavam no estádio IV, apenas 37 (7,1%) ficaram livres da doença, enquanto 87 (16,6%) foram a óbito.

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2.7.4 Discussão

O câncer colorretal é o quarto câncer mais frequentemente diagnosticado e a segunda causa de morte por câncer nos Estados Unidos. Nos últimos 30 anos, houve uma redução significativa da mortalidade do câncer de cólon, possivelmente devido ao diag-nóstico precoce por meio dos programas de screening e das novas modalidades terapêuticas. (NCCN).

Neste estudo, observou-se discreto predomínio do ACCR no sexo feminino (51%), corroborando os achados de Carneiro et al. (54,5%)26 e Fahroud et al.27, porém, contradizendo o que Lupinac-ci et al. (42,4%)28 e Cruz et al.29 haviam demonstrado.

O impacto da idade sobre o câncer colorretal é mais signi-ficativo do que qualquer outro fator demográfico, com aumento da incidência a partir de 45 e 50 anos. (Section 12: Cólon Câncer Steven K. Libutti Leonard B. Saltz Joel E. Tepper). No presente estudo, os achados foram semelhantes, com 65,2% dos pacientes com idade entre 50 e 80 anos, assim como nos resultados obtidos por Farhoud et al.27 e Pereira et al.30

A cor predominante nos indivíduos estudados foi a parda (57,7%), seguida da cor branca e da negra, conforme observou Car-neiro et al., com 72,7% dos pacientes pardos26. Porém, Mahairy et al.31 comprovaram que a prevalência é maior em brancos. Pode-se atribuir a maior prevalência do ACCR em pardos encontrada neste estudo a predominância dessa cor na população da região estudada.

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A associação entre tabagismo e neoplasia colorretal é eviden-ciada em vários estudos, sendo mais determinante nos casos de adenoma do que nos casos de câncer, segundo Charles et al. Nos Estados Unidos, 1 em cada 5 casos de câncer colorretal é atribuído ao fumo de cigarros. Segundo Stern et al., o etilismo também é um fator de risco importante na gênese dessas neoplasias.

Aproximadamente, um terço dos casos de câncer colorretal nos Estados Unidos estão associadas com história familiar. Pa-cientes com parentes de primeiro grau portadores de adenoma ou câncer colorretal invasivo apresentam risco, isto é, aumento de desenvolvimento do câncer colorretal (NCCN). Carneiro et al. encontraram história familiar em 27,3% dos pacientes.

Neste estudo, 62,7% dos prontuários analisados não apre-sentavam informações sobre etilismo, 56,4% sobre tabagismo e 70% sobre história familiar, o que limita a obtenção de resultados acerca dessas variáveis epidemiológicas. Esse fato representa uma das principais dificuldades à realização de pesquisas com dados secundários, justificando a importância do preenchimento ade-quado dos prontuários pelos profissionais da saúde.

Na maioria dos casos analisados, o tumor primário estava lo-calizado no reto (44,7%), seguido do retossigmoide (14%). No estu-do feito por Pinho et al., 43% dos cânceres estavam localizados no reto34. Carneiro et aI. encontraram 63,6% dos casos de ACCR com localização retal e Lupinacci et al. com 72,7% dos casos estudados na mesma topografia, corroborando os achados do nosso estudo.

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O estadiamento clínico TNM é um importante fator prog-nóstico. Um estudo realizado com 119.363 pacientes para a de-terminação da sobrevida em 5 anos mostrou sobrevida de 91,2% em pacientes no estádio I; 84% a 72% de sobrevida em pacientes classificados como estádio II; 83,4% a 44,3% em pacientes no es-tádio III e 8,1% em pacientes no estádio IV.

Neste estudo, considerando as dificuldades da pesquisa em relação à obtenção dos dados descritos nos prontuários, foi obser-vada uma ausência de 26% nas informações relativas ao estadia-mento clínico TNM. Entretanto, dos prontuários adequadamente preenchidos, a maioria foi classificada nos estádios III e IV (62%), conforme dito por Carneiro et al. (2006) e Lupinacci et al.28, e por-tanto, com menores chances de sobrevida.

Dos carcinomas analisados, a maioria foi classificada como medianamente diferenciada (78,6%). Esse predomínio na classi-ficação histopatológica já havia sido mostrada por Carneiro et al. (63,3%)26 e Lupinacci et al. (81,8% dos tumores classificados como bem ou moderadamente diferenciados)28.

A dificuldade para a concretização deste estudo ocorreu, so-bretudo, pelo preenchimento inadequado dos prontuários, con-forme referido anteriormente, o que limitou os resultados obtidos pela pouca representatividade da amostra que continha informa-ções sobre tabagismo, etilismo, histórico familiar e estadiamento clínico TNM.

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AUTORES

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1. AMANDA MARIA DE JESUS FERREIRA: Graduada em Nutrição pela Universidade Federal do Rio Grande do Norte - UFRN (2013). Mestre em Educação Física, na área de Avaliação do Desempenho Humano, pelo PPGEF - UFRN, com foco em esportes de alta intensidade, ciclismo, carboidratos e hidratação (2016). Pós Graduada em Nutrição Clínica Funcional pela VP-Divisão, Ensino e Pesquisa (2016). Membro do Grupo de Estudos em Metabolismo, Exercício e Nutrição. Experiência como professora substituta nas áreas de Avaliação Nutricional e Epidemiologia na UFRN. Trabalhou como Nutricionista do Natal Hospital Center, com foco em paciente crítico, sendo membro do Núcleo de Segurança ao Paciente. Tem experiência nas seguintes áreas: Nutrição Hospitalar; Paciente crítico; Nutrição Esportiva; Docência em Ensino Superior; e Atendimento Clínico - Ambulatorial e Home Care. [email protected].

2. AMANDA SAMARA DAVI DE LIMA: Graduação em enfermagem pela Universidade Federal do Rio Grande do Norte (2009).

3. ANA LUÍSA CHAVES DE OLIVEIRA: Graduada em Medicina pela Universidade Federal do Rio Grande do Norte - UFRN. Atualmente, médica estagiária de dermatologia do Serviço de Dermatologia do Hospital Universitário de Taubaté - UNITAU. 

4. ÂNGELA MARIA DE PAIVA CRUZ: Licenciada e Bacharel em Matemática pela Universidade Federal do Rio Grande do Norte (1980), possui mestrado em Filosofia (área de Lógica) pela Universidade Federal da Paraíba (1993) e doutorado em Educação pela Universidade Federal do Rio Grande do Norte (2000). É professora titular do Departamento de Filosofia da UFRN e tem desenvolvido atividades acadêmicas na área de Lógica e Filosofia Formal, com ênfase nos temas de modelagem

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e lógica não-clássica, modelagem do discurso, representação do conhecimento, epistemologia e modelagem de conceitos. Atua na gestão universitária, em conselhos deliberativos, já desempenhou as funções de chefe de Departamento, Vice-Diretora de Centro de Ciências Humanas, Letras e Artes e Vice-Reitora no período de 2007-2011. Foi Reitora da Universidade Federal do Rio Grande do Norte no período de 2011 - 2015 e assumiu em 28 de maio de 2015 a segunda gestão desta insituição. [email protected].

5. ANTÔNIO C. SANTOS JÚNIOR: Graduado em Medicina pela Universidade Federal do Rio Grande do Norte - UFRN.

6. ANTÔNIO MEDEIROS JÚNIOR: Graduação em Odontologia(1982), Mestrado em Odontologia Preventiva e Social (1997) e Doutorado em Ciências da Saúde (2005) pela Universidade Federal do Rio Grande do Norte. Atualmente é Professor Associado do Departamento de Saúde Coletiva e membro integrante do Núcleo de Estudos em Saúde Coletiva da UFRN. Tem experiência em Saúde Coletiva com ênfase nas políticas de saúde, gestão do trabalho e da educação na saúde, avaliação de serviços, educação interprofissional e envelhecimento. [email protected].

7. ARTHUR COSTA RODRIGUES FARIAS: Graduação em Odontologia pela Universidade Federal do Rio Grande do Norte (2003). Mestrando em Odontologia/UFRN com área de concentração em Ortodontia. Atualmente atua como Ortodontista da Unidade de Defeitos da Face/FUNDEP, como professor do Curso de Aperfeiçoamento em Ortodontia Preventiva e Interceptativa/UFRN, como Ortodontista em clínica particular. Possui experiência na área de pesquisa: AIDS, patologias, atendimento, biossegurança, capacitação e representações sociais; e na especialidade da Ortodontia, com ênfase em índices oclusais, análise facial, qualidade de vida e desenvolvimento de softwares.

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8. AURIGENA ANTUNES DE ARAÚJO: Graduação em Odontologia pela Universidade Federal do Rio Grande do Norte (1995), mestrado em Odontologia Social pela Universidade Federal do Rio Grande do Norte (2002) e doutorado em Programa de Pós-graduação em Ciências da Saúde pela Universidade Federal do Rio Grande do Norte (2005). Atualmente é professor Associado I da Universidade Federal do Rio Grande do Norte. Tem experiência na área de Farmacologia, com ênfase em Farmacocinética, Farmacoepidemiologia e Farmacologia Experimental.

9. BRUNA ALICE DE LIMA DIAS: Fisioterapeuta formada pela Universidade Federal do Rio Grande do Norte - UFRN. Especialista em Fisioterapia em Terapia Intensiva pela Interfisio- Faculdade Redentor- RJ. Fisioterapeuta da Fisio AR Saúde- Com. e Serv. de Equip. Médicos ltda ME. Colaboradora do grupo de pesquisa em Avaliação e intervenção em Fisioterapia Cardiovascular- Departamento de Fisioterapia- UFRN. [email protected].

10. CLAUDIA CHRISTIANNE BARROS DE MELO MEDEIROS: Graduação em Ciências Biologicas pela Universidade Potiguar (2000), especialização em Biologia pela Universidade Potiguar (2001) e especialização em Educação de Jovens e Adultos pela Universidade Federal do Rio Grande do Norte (2007). Mestre em Saúde coletiva/UFRN (2012). Atualmente é Técnico em Higiene Dental da Universidade Federal do Rio Grande do Norte. Colaborador e membro de comissões, projetos e programa da própria instituição, atuando principalmente nos seguintes temas: avaliação, ensino-aprendizagem, tutoria, portfólio, avaliação da aprendizagem, formação profissional, PP, prevenção, saúde bucal e produção cientifica, saúde bucal, idoso.

11. DANIELE BRANDÃO: Graduada em Medicina pela Universidade Federal do Rio Grande do Norte - UFRN.

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12. DENISE NIEUWENHOFF CARDOSO RIBEIRO: Graduada em Gestão em Sistemas e Serviços de Saúde pela Universidade Federal do Rio Grande do Norte. Bolsista de Iniciação Cientifica da Pesquisa Desenvolvimento e validação de indicadores de boas práticas de segurança do paciente Projeto ISEP - Brasil. Tem experiência na área de Saúde Coletiva, atuando principalmente nos seguintes temas: patient safety, safety management e hospital communication system.

13. DIANA PAULA DE SOUZA RÊGO PINTO: Enfermeira, graduada pela Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN). Especialista em Saúde Coletiva com Ênfase no Programa Saúde da Família pela Faculdade Integrada de Patus (FIP). Mestre em Enfermagem pelo Programa de Pós-graduação em Enfermagem na UFRN (2013). Doutoranda em Enfermagem pelo Programa de Pós-Graduação em Enfermagem pela UFRN(2014- Atual). Bolsista CAPES no nível de doutorado. Membro do grupo de pesquisa Núcleo de Estudos e Pesquisas em Enfermagem Clínica (NEPEC). Tem experiência e interesse pelas seguintes áreas: Formação superior, Ensino, Tecnologias de ensino, Enfermagem em Urgência/Emergência, Enfermagem Clínica, Enfermagem Cirúrgica, Educação em saúde e Educação permanente em saú[email protected].

14. ÉRIKA GABRIELLE PINHEIRO XIMENES: Graduação em Medicina pela Universidade Federal do Rio Grande do Norte - UFRN.

15. EVÂNIA LEIROS DE SOUZA: Graduada em Biblioteconomia pela Universidade Federal da Paraíba. Especialista em Organização, Planejamento e Gestão de Programas Sociais pela Universidade Federal do Rio Grande do Norte. Ministrou a disciplina Metodologia da Pesquisa Científica nos cursos da área

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da saúde, professora aposentada do Departamento de Saúde Coletiva da Federal do Rio Grande do Norte. Tem experiência na área de Ciência da Informação, com ênfase em Técnicas de Recuperação de Informação. Possui publicações em revistas e anais de congresso. [email protected].

16. FLÁVIA CHRISTIANE DE AZEVEDO MACHADO: Possui graduação em Odontologia pela Universidade Federal do Rio Grande do Norte (2005). Cirurgiã-dentista (técnico administrativo) do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Rio Grande do Norte. Mestre em Saúde Coletiva pela Universidade Federal do Rio Grande do Norte. Doutora em Saúde Coletiva na UFRN defendendo tese na área de avaliação de serviços de saúde. Atua nas áreas de sua profissão, tendo maior interesse em saúde pública. Professora substituta do Departamento de Saúde Coletiva da UFRN. [email protected].

17. FRANCIJANE DINIZ DE OLIVEIRA: Possui graduação em Enfermagem pela Universidade Estadual Vale do Acaraú (2004). Mestranda em Saúde da Família pela Universidade Federal do Rio grande do Norte e RENASF. Preceptora da residência Multiprofissional de Saúde da Família da UPE, enfermeira psf da Prefeitura Municipal de Recife e tutor da Universidade Federal do Rio Grande do Sul, atuando principalmente nos seguintes temas: adaptação, tumor cerebral e cuidado em [email protected].

18. FRANCISCO JAKSON BENIGNO CAVALCANTI: Possui graduação em Medicina pela Universidade Federal do Rio Grande do Norte (2011) . Tem experiência na área de Medicina.

19. GEORGIA COSTA DE ARAÚJO SOUZA: Professora do Departamento de Odontologia da UERN. Doutora pelo Programa de Pós-graduação em Saúde Coletiva pela UFRN.

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Mestre em Odontologia pela UFRN, em 2009. Graduada em Odontologia pela UFRN, em 2006. Especialista em Saúde Coletiva. Graduada em Odontologia pela UFRN em 2006. Concluiu o Curso de Aperfeiçoamento/Qualificação Processo Educativo em Negociação do Trabalho no SUS pela Fiocruz, em 2010. Atuou como Professora Substituta da Disciplina de Estágio Supervisionado CRUTAC, do Departamento de Odontologia da UFRN. Atua nas áreas de Saúde Coletiva, Saúde Bucal Coletiva e Odontologia em Promoção da Saúde. Atuou como bolsista PIBIC/CNPq da base de pesquisa de Odontologia Preventiva e Social, UFRN. Desempenha atividades voluntárias em Projetos de Extensão, focados na Educação em Saúde.

20. GERLANE COELHO BERNARDO GUERRA: Farmacêutica pela Universidade Federal da Paraíba. Doutorado em Farmacologia pela Universidade de Granada-Espanha, e Pós-doutorado pela Universidade Federal de Pernambuco, atualmente é Professora Associada III do Departamento de Biofísica e Farmacologia – UFRN. Desenvolve pesquisas nas áreas de Farmacologia pré-clínica, com ênfase em atividade farmacológica de extratos vegetais. Atua também na área de Farmacoepidemiologia. Participa como professora colaboradora/orientadora no Programa de Pós-graduação em Ciências Farmacêuticas da Universidade Federal do Rio Grande do Norte.

21. GRASIELA PIUVEZAM: Doutora e mestre em Ciências da Saúde pela Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN). Especialista em Saúde Coletiva (2007) pela UFRN. Graduada em Odontologia pela Universidade Metodista de Piracicaba (1999). Atualmente, é professora Adjunto III do Departamento de Saúde Coletiva (DSC) da UFRN, ensinando na graduação aos cursos de Medicina, Nutrição e Gestão em Sistemas e Serviços de Saúde.

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Membro efetivo do NESC/UFRN (Núcleo de Estudos em Saúde Coletiva). Lidera o Grupo de Estudos em Epidemiologia da UFRN. Orientadora e Coordenadora do Mestrado Profissional em Gestão da Qualidade de Serviços de Saúde - PPGQualiSaúde que é oferecido numa parceria da UFRN, Universidade de Múrcia (UMU) na Espanha e Instituto de Salud Publica (ISNP) no México. Orientadora no Programa de Pós Graduação em Saúde Coletiva (PPGSCoL). Atua na área da Saúde Coletiva e Epidemiologia com ênfase nos temas: Avaliação da Qualidade em Saúde, Avaliação de políticas e programas de saúde e Envelhecimento humano. [email protected]

22. HILKÉA CARLA DE SOUZA MEDEIROS LIMA: Médica e Cirurgiã-Dentista graduada pela Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN). Mestre em Bioquímica, Especialista em Docência do Ensino Superior e em Ciências Morfológicas pela UFRN.

23. IRIS DO CÉU CLARA COSTA: Possui Graduação em Odontologia pela Universidade Federal do Rio Grande do Norte (1977). Mestrado em Odontologia (Odontologia Social) pela Universidade Federal Fluminense (1981). Doutorado em Odontologia Preventiva e Social pela Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho-Araçatuba (2000). Especialização em Ativação no processo de mudanças na formação profissional em saúde pela Escola Nacional de Saúde Pública/Rede Unida/Ministério da Saúde (2006) e Pós Doutorado em Psicologia Social pela Universidade Aberta de Lisboa-Portugal (2007-2008) . Atualmente é Professora Associada III da Universidade Federal do Rio Grande do Norte. Tem experiência na área de Saúde Coletiva, atuando principalmente nos seguintes temas: saúde ocupacional, processo de trabalho, educação em saúde, envelhecimento, qualidade de vida. [email protected].

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24. ISA MARIA HETZEL DE MACEDO: Possui graduação em Medicina pela Universidade Federal do Rio Grande do Norte (1976) e mestrado em Medicina Social pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro (1982) e é doutoranda em Saúde Pública na Universidade de Montreal-Canadá, em fase de redação de tese. Atualmente é professora adjunta IV da Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN), lotada no Departamento de Saúde Coletiva (DSC), e membro integrante do Núcleo de Estudos em Saúde Coletiva (NESC). Tem experiência na área de Saúde Coletiva, com ênfase em Gestão de Sistemas e Serviços de Saúde, Gestão Participativa na Saúde e Saúde Mental, atuando principalmente nos seguintes temas: complexidade e saúde, gestão participativa nos sistemas de saúde e saúde mental e qualidade de vida. Tem experiência, através de sua participação no NESC-UFRN, em consultorias e programas de capacitação de profissionais do sistema público de saúde. Sua experiência internacional inclui estágios nos sistemas de saúde italiano e canadense, além de ter trabalhado como pesquisadora convidada do Grupo de Pesquisas Psico-Sociais do Hospital Douglas/Mc Gill University, centro colaborador da OMS. Além de sua produção em Saúde Coletiva, atuou também como tradutora de autores como Henri Atlan e Ilya Prigogine. Desde 2008, vem coordenando o curso de graduação em Saúde Coletiva “bacharelado em Gestão de Sistemas e Serviços de Saúde” da UFRN. [email protected]

25. JANMILLE VALDIVINO DA SILVA: Graduada em Odontologia pela Universidade Federal do Rio Grande do Norte (2005). Especialista em Endodontia pela UFRN (2009). Mestre em Saúde Coletiva pela Universidade Federal do Rio Grande do Norte(2013). Cirurgiã-dentista do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Rio Grande do Norte. Doutoranda do Programa de Pós-graduação em Saúde Coletiva da UFRN. 

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26. JÉSSICA SANTOS DE MEDEIROS: Acadêmico da Universidade Federal do Rio Grande do Norte.

27. JOHN FONTENELE ARAUJO: Professor titular do programa de Pós-Graduação em Psicobiologia (Conceito 6 - CAPES - Área de Psicologia e professor de Neurofisiologia e Cronobiologia no departamento de Fisiologia. Graduação em Medicina na Universidade Federal do Piauí (1991), mestrado e doutorado em Psicologia (Área de Concentração Neurociências e Comportamento) no Instituto de Psicologia da Universidade de São Paulo, mas desenvolveu seus projetos de pesquisa no GMDRB do Departamento de Fisiologia do ICB da USP. Atualmente pesquisador na área da fisiologia do Sistema Circadiano, sobre o papel do Sistema circadiano na memória e na emoção, destacando aqui o papel do ciclo sono-vigília na memória e na aprendizagem. Integra o Núcleo Docente Estruturante do curso de medicina-UFRN. Atualmente é o coordenador da CEUA da UFRN. [email protected]

28. JULIANA B. CUNHA: Graduada em Medicina pela Universidade Federal do Rio Grande do Norte - UFRN.

29. KATARINA MELO CHAVES: graduação em Farmácia pela Universidade Federal do Rio Grande do Norte (2008).

30. KENIO COSTA LIMA: Graduação em Odontologia pela Universidade Federal do Rio Grande do Norte, mestrado em Odontologia Social pela Universidade Federal do Rio Grande do Norte, doutorado em Ciências (Microbiologia Médica) pela Universidade Federal do Rio de Janeiro e pós-doutorado pela Agência de Saúde Pública de Barcelona. Atualmente, é professor associado IV da Universidade Federal do Rio Grande do Norte, dos Programas de Pós-graduação em Saúde Coletiva e em Ciências da Saúde desta mesma universidade e bolsista de produtividade do

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CNPq . Atualmente coordenador do Programa de Pós-graduação em Saúde Coletiva da Universidade Federal do Rio Grande do Norte. Tem experiência na área de Odontologia, Saúde Coletiva e das Ciências da Saúde de um modo geral, com ênfase em estudos experimentais e epidemiológicos. Trabalha, principalmente, os seguintes temas: Envelhecimento e Saúde, Doenças infecciosas, Microbiologia aplicada e Epidemiologia aplicada à pesquisa em Saúde. [email protected].

31. KENIO OSMAR DE ARAUJO FORMIGA: Graduado em Medicina pela Universidade Federal do Rio Grande do Norte - UFRN.

32. KYRA KADMA SILVA FERNANDES DE MEDEIROS: Técnica em Alimentos pelo IFRN. Graduanda em Gestão em Sistemas e Serviços de Saúde pela UFRN; Experiências profissionais da Desenvolvimento de atividades no setor de recepção na instituição HOSPED, acolhendo os pacientes e os classificando por ordem de chagada, além de realizar tarefas auxiliares no SAME (Setor de Arquivo Médico e Estatísticas). Participou como bolsista de graduação no Programa de Melhoria e Acesso de Qualidade nos Serviços de Saúde (PMAQ); Atualmente classificada na seleção para o PET SAÚDE (redes de atenção psicossocial).

33. LAÍS KAREN DA SILVA MAGALHÃES: Possui ensino-médio-segundo-grau pela ITAECE Complexo Educacional (2010). Tem experiência na área de Saúde Coletiva.

34. LARISSA DA SILVA: Graduada em Medicina pela Universidade Federal do Rio Grande do Norte - UFRN.

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35. LAYRA RIBEIRO DE SOUSA LEÃO: Médica graduada pela Universidade Federal do Rio Grande do Norte. Atua principalmente nos seguintes temas: beta cells, rats, streptozotocin, diabetes e ileum interposition.

36. LENÍGIA MARIA DE ALENCAR: Possui graduação em Enfermagem pela Universidade Federal da Paraíba (1984), graduação em Fisioterapia pela Universidade Federal da Paraíba (1989), especialização em Habilitação em Enfermagem Médico Cirúrgico pela Universidade Federal da Paraíba (1984) e especialização em Enfermagem em Saúde Pública pela Universidade Federal do Rio Grande do Norte (1996). [email protected].

37. LILIAN VITAL PINHEIRO: Graduada em Medicina pela Universidade Federal do Rio Grande do Norte (2011). Residência-medica pela Universidade Estadual de Campinas (2016) e residencia-medicapela Universidade Estadual de Campinas(2014).

38. MARCELO CÂNDIDO DE ANDRADE LEITÃO: Graduado em Medicina pela Universidade Federal do Rio Grande do Norte - UFRN.

39. MARIA LUISA NOBRE MEDEIROS E SILVA: Estagiário do Hospital Central Coronel Pedro Germano.

40. MARIA REGINA DE MACÊDO COSTA: Possui graduação em Fisioterapia pela Faculdade de Reabilitação da Asce (1999). Atualmente está aguardando a defesa de mestrado na UFRN. Tem experiência na área de Fisioterapia e experiência em lecionar algumas disciplinas para graduação em cursos livres. [email protected].

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41. MARÍLIA DE ALMEIDA CARDOSO: Graduada em Medicina pela Universidade Federal do Rio Grande do Norte (2011), com Residência Médica na área de Clínica Médica pela Universidade de São Paulo-FMUSP (2012-2014) e Residência de Endocrinologia pela Universidade de São Paulo-FMUSP (2014-2016). Research fellowship in the Division of Endocrinology, Diabetes and Hypertension in Brigham and Women’s Hospital, Harvard Medical School. Experiência em Medicina, com ênfase em Endocrinologia e Metabolo.

42. MARINA ARRUDA CÂMARA: Graduada em Medicina pela Universidade Federal da Rio Grande do Norte (UFRN).

43. MAURÍCIO ROBERTO DE MACEDO: Graduação em Medicina pela Universidade Federal do Rio Grande do Norte (1974), mestrado em Medicina Social pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro (1980) e doutorado em Saúde Pública pela Universidade de Montreal, Canadá (2006). Atualmente é professor Titular do Departamento de Saúde Coletiva (DSC) da Universidade Federal do Rio Grande do Norte. No período 2007-2011 exerceu a chefia deste departamento, sendo o atual coordenador do Núcleo de Estudos em Saúde Coletiva (NESC). Depois de atuar mais de 20 anos como professor do curso de Medicina da UFRN, vem se dedicando atualmente ao curso de graduação em Saúde Coletiva “Gestão em Sistemas e Serviços de Saúde”, que ajudou a criar. Tem experiência na área de Saúde Coletiva, com ênfase em “Análise de Sistemas e Serviços de Saúde”, “Organização, Gestão e Políticas de Saúde” e “Saúde Mental”, atuando principalmente nos seguintes temas: “complexidade e saúde”, “descentralização dos sistemas de saúde”, “qualidade de vida e saúde mental” e “políticas de saúde mental”. Mais recentemente, tem se dedicado à temática “Álcool e Outras Drogas”. Nesse sentido, coordena o Observatório de Saúde

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Mental do NESC, é vice-coordenador do Centro de Referência em Formação para Álcool e Outras Drogas (CRR) da UFRN e coordenou o PET-Saúde Mental/Crack da UFRN até 2012. Tem desenvolvido atividades de parecerista de várias revistas nacionais e internacionais, além de atuar como consultor das pró-reitorias de Pesquisa e de Extensão da UFRN para avaliação de projetos. Sua experiência nos serviços públicos de saúde inclui atividades de assistência (como médico psiquiatra), de planejamento e assessoria técnica (no âmbito do INAMPS, da SSAP-RN e da SMS de Natal) e prestando consultorias a vários municípios do RN, através do NESC-UFRN. Sua experiência internacional inclui estágios nos sistemas de saúde italiano e canadense, além de ter trabalhado como professor convidado do Departamento de Administração da Saúde da Universidade de Montreal, como pesquisador convidado do Grupo de Pesquisas Psicossociais do Hospital Douglas/Mc Gill University, centro colaborador da OMS, e como membro do Grupo de Pesquisas Interdisciplinares em Saúde (GRIS) da Universidade de Montreal. Além de sua produção em Saúde Coletiva, atuou também como tradutor de textos de autores como Henri Atlan e Ilya Prigogine. [email protected]

44. MIGUEL ROGÉRIO SEGUNDO: Graduado em Medicina pela Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN)

45. NILCE ARIANE SPENCER SANTOS: Possui graduação em medicina pela Universidade Federal do Rio Grande do Norte (2011).

46. PAULO ROCHA DE MEDEIROS: Graduação em Medicina pela Universidade Federal do Rio Grande do Norte (1973), Mestrado em Medicina (Psiquiatria) pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (1979) e Doutorado pelo Instituto de Medicina

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Social/Universidade do Estado do Rio de Janeiro (1997). Pós-Doutorado no Instituto de Medicina Preventiva da Universidade de Lisboa - Portugal, em 2008, com bolsa CNPq. Atualmente é Professor Titular do Departamento de Saúde Coletiva da UFRN. Tem experiência na área de Saúde Coletiva, com ênfase em políticas, planejamento e gestão, atuando principalmente nos seguintes temas: saúde coletiva, sistema único de saúde, saúde da família, atenção primaria em saúde e avaliação em saúde. Exerceu chefia do Departamento de Saúde Coletiva e integrou Conselho Universitário da UFRN (2011-2014), foi médico do Ministério da Saúde S-III (aposentado). Coordenou, entre 2003-2006, a pesquisa avaliativa “Estudos de Linhas Base - PROESF”, realizado pelo Ministério da Saúde e Banco Mundial, e posteriormente (2011-2014) a coordenação das pesquisas avaliativas do “Programa de Melhoria do Acesso e da Qualidade da Atenção Básica” (PMAQ-AB), 1º e 2º ciclos, nos Estados do Piauí, Rio Grande do Norte e Ceará. Atualmente exerce atividades de coordenação na pesquisa do Programa Nacional de Avaliação de Serviços de Saúde (PNASS) em Estados Norte-Nordeste (AP, PI, CE, RN, PE, AL) e na pesquisa avaliativa do PMAQ-AB (3º ciclo) para os Estados do Rio Grande do Norte e Ceará. Integra o corpo docente do Programa de Pós-Graduação em Saúde Coletiva (PPGSCol) da UFRN, além dos Mestrados Profissionais em Saúde da Família (Rede Nordeste-UFRN) e de Gestão da Qualidade em Serviços de Saúde (em parceria com Universidade de Múrcia-Espanha). Docente do Internato em Saúde Coletiva, Curso Graduação em Medicina - UFRN, é Tutor do “Programa Mais Médicos” do Ministério da Saúde, no Rio Grande do Norte. [email protected]

47. PRISCYLLA PAIVA DE LIMA: Graduada em Gestão em Sistemas e Serviços de Saúde pela Universidade Federal do Rio Grande do Norte.

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48. RAIMUNDO FERNANDES ARAÚJO JÚNIOR: Desde 2006, atua na Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN), onde atualmente é Prof. Associado I no Departamento de Morfologia (área: Histologia e Patologia Geral). É lider do Grupo de Pesquisa Alterações morfológicas, modulação farmacêutica e nanomedicina com Pós doutorado em Oncologia Experimental pela Faculdade de Medicina da USP (2008-2010). Atua como membro do corpo editorial da Revista Científica Experimental and Toxicologic Pathology, e revisor das Revistas Plos One e Archives of Oral Biology, orientador permanente dos Programas de Pós-graduação em Ciências da Saúde (UFRN) e Pós-graduação em Biologia Estrutural e Funcional (UFRN). A área de atuação concentra-se na aplicação biológica e modulação farmacêutica de fármacos existentes e associados a nanopartículas sintéticas e naturais em modelos experimentais de inflamação e câncer in vitro e in vivo observando vias de sinalização (ex. apoptose, nf-Kb, AKT/mTOR, ) e o sistema do estresse oxidativo através da expressão proteíco-gênica celular e tecidual. Análise da progressão tumoral em cânceres humanos com temas de interesse em marcadores protéico/ gênico e carboidratos-dependentes (glicosilação) também são áreas de pesquisa.

49. RENATA PAULO COSTA TRIGUEIRO: Professora Orientadora de ensino a distância do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Rio Grande do Norte-IFRN. Turismóloga pela Universidade Federal do Rio Grande do Norte (2006). Mestre em Administração pela Universidade Federal do Rio Grande do Norte (2010). Tem experiência nas áreas de Turismo e Administração, com ênfase em Planejamento Sustentável do Turismo, atuando principalmente nos seguintes temas: turismo sustentável, turismo rural, planejamento, qualidade na prestação de serviços, metodologia da pesquisa, trabalho, comportamento

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organizacional, mercado, saúde, qualidade de vida, hospitalidade, empreendedorismo. [email protected].

50. SAMARA CAMILO DE OLIVEIRA: Graduada em Medicina pela Universidade Federal do Rio Grande do Norte - UFRN.

51. SEVERINA ALICE DA COSTA UCHOA: Médica com mestrado em Sociologia pela Universidade Federal da Paraíba (1994) e doutorado em Saúde Coletiva pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro (2003). Professora Associada do Departamento de Saúde Coletiva – da Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN). Lidera o Grupo de Estudos em Saúde Coletiva e é orientadora dos programas de pós-graduação em Ciências da Saúde e Saúde Coletiva da UFRN. Colabora com o Núcleo de Estudos em Saúde Coletiva-UFRN. Atualmente coordena a Avaliação Externa do Programa de Melhoria do Acesso e da Qualidade na Atenção Básica (PMAQ-AB), do Ministério da Saúde, nos Estados do Rio Grande do Norte e Ceará e integra a coordenação Programa Nacional de Avaliação dos Serviços de Saúde (PNASS- UFRN) em estados do nordeste brasileiro. Foi tutora do Programa Mais Médicos para o Brasil (2014-2015). Desde 2013 integra o Comitê Gestor da Rede de Pesquisa em Atenção Primária à Saúde. Atua nas áreas de Avaliação e Meta-avaliação de Políticas e Programas de Saúde; Atenção Primária em Saúde e Metodologia da Pesquisa Qualitativa. Atualmente é Bolsista de Pós-doutorado no Exterior do CNPq, na área de Avaliação de Políticas de Saúde no Instituto de Higiene e Medicina Tropical da Universidade Nova de Lisboa, Portugal. [email protected]

52. SUSANA BARBOSA RIBEIRO: Possui graduação em Farmácia pela Universidade Federal do Rio Grande do Norte (2007). Tem experiência na área de Farmácia, com ênfase em Farmácia Comercial. Concluiu o mestrado em Ciências

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Farmacêuticas pelo Programa de Pós-graduação em Ciências Farmacêutica da Universidade Federal do Rio Grande do Norte (2015). Atualmente desenvolve projeto de estudo experimental, relacionado a mucosite oral, na Universidade Federal do Rio Grande do Norte.

53. THEMIS XAVIER DE ALBUQUERQUE PINHEIRO: Administradora, com mestrado em Administração pela Universidade Federal do Rio Grande do Norte (1992) e doutorado em Saúde Coletiva pelo Instituto de Medicina Social da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (2003). Professora Adjunta do Departamento de Saúde Coletiva da Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN) e do programa de pós-graduação em Gestão da Qualidade em Saúde (UFRN em parceria com Universidade de Murcia-Espanha). Colabora com o Núcleo de Estudos em Saúde Coletiva (UFRN) e participa da Base de Pesquisa em Saúde Coletiva (UFRN). Coordena o Programa Nacional de Avaliação dos Serviços de Saúde no Rio Grande do Norte que abrange, além do RN, os estados de AL, AP, CE, PE e PI (PNASS- UFRN 2013-2016) do Ministério da Saúde em estados do nordeste brasileiro e integra a coordenação da Avaliação Externa do Programa de Melhoria do Acesso e da Qualidade na Atenção Básica no Rio Grande do Norte que, além do RN, abrange o estado do CE (PMAQ-AB/UFRN 2012-2015), do Ministério da Saúde, nos Estados do Rio Grande do Norte e Ceará. Trabalhou na Fundação Nacional de Saúde (FUNASA). É autora dos livros Meandros e Dilemas de uma Reforma em Saúde (2012) e Saúde Pública, História e Política (2015). Atua nas áreas de Gestão em Saúde, Modelos de Gestão, Planejamento e Avaliação de Políticas, Programas e Serviços de Saúde. [email protected]

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54. THIAGO CARLOS BEZERRIL DE OLIVEIRA: Graduado em Medicina em 2011 pela Universidade Federal do Rio Grande do Norte. Experiência na área de ensino relacionada a fisiologia humana e saúde mental; pesquisa e extensão na área de saúde coletiva. Atuação profissional centrada na atenção primária, com ênfase no cuidado em saúde mental, clínica ampliada e na coordenação e integralidade do cuidado; experiência em urgências clínicas.

55. VANESSA DE LIMA SILVA: Graduada em Farmácia pela Universidade Federal do Rio Grande do Norte – UFRN.

56. VILANI MEDEIROS DE ARAÚJO NUNES: Doutora em Ciências da Saúde (PPGCSA/UFRN) com tese na área da Gerontologia; Mestrado em Enfermagem (PPGENF), Sanitarista, Especialista em Saúde Pública/FIOCRUZ/UFRN), Especialista em Saúde da Família, Saúde do Idoso e Vigilância em Saúde (Epidemiológica e Sanitária/UNAERP). Professora Adjunta do Departamento de Saúde Coletiva da UFRN, atualmente nos cursos de Graduação em Medicina e Gestão em Sistemas e Serviços de Saúde (CCS/UFRN). Na Pós-Graduação, é membro permanente dos programas: (1) Mestrado Profissional Gestão da Qualidade em Serviços de Saúde (PPG QualiSaúde UFRN/UMU/INSP) e (2) Saúde da Família (RENASF), desempenhado as funções de docente e orientadora. Membro do Comitê de Ética em Pesquisa (CEP/HUOL/UFRN). Tem experiência profissional e atua como pesquisadora com temas relacionados à Atenção Primária em Saúde/Estratégia Saúde da Família, Envelhecimento Humano (Gerontologia), Vigilância em Saúde e Qualidade e Segurança do Paciente. [email protected]

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57. YARAACELY FERNANDES MENDES: Graduada em Gestão em Sistemas e Serviços de Saúde pela Universidade Federal do Rio Grande do Norte (2014).Tem experiência na área de Saúde Coletiva, com ênfase em Saúde Coletiva. Atuando principalmente nos seguintes temas: colegiado gestor, politica nacional de humanização, e gestão hospitalar.

Este livro foi projetado pela equipe da EDUFRN - Editora da Universidade

Federal do Rio Grande do Norte. Março de 2018