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Perfil dos Eletricistas do Setor Energético da Região Metropolitana de Vitória – ES Um Estudo de Base Ergonômica Autores: Denise Rozindo Bourguignon Everton Luiz Milanezi Ludário Colli Marcia Silva Campo Dall`Orto Marcio Denison Paiva Robinson Nunes do Nascimento Rúbia Ferreira Bastos Wesley Paulo Horsth Honório

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Perfil dos Eletricistas do Setor Energéticoda Região Metropolitana de Vitória – ES

Um Estudo de Base Ergonômica

Autores: Denise Rozindo BourguignonEverton Luiz MilaneziLudário ColliMarcia Silva Campo Dall`OrtoMarcio Denison Paiva

Robinson Nunes do NascimentoRúbia Ferreira BastosWesley Paulo Horsth Honório

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“... Então, resumindo: se a pessoa não tem – o eletricista – seele não tiver atenção, consciência e amor à vida... Que ‘cêtem que ter amor pelo menos a sua vida, se não meu filho, ‘cêtá ali... ‘cê não tá procurando outra opção, não. ‘Cê táprocurando um jeito de você se matar. Um caixão.(...) Se a gente não conseguir fazer uma consciência dessa, acabou! “

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Introdução

“Menina, tire o dedo daí senão você leva choque.”

Cresci ouvindo isto por diversas vezes. Choque, susto, medo deeletricidade, de raios que são a transfiguração da energia visualizada eque provocam tanto temor. Cuidado, é a palavra principal, quandopensamos em fios desencapados, ou troca de fusíveis, isto para nós,leigos, na arte de conviver com algo tão maravilhoso e assustador.

Que dirão então os Trabalhadores, que fazem do seu cotidiano aarte de conviver com este risco? Como enfrentam o seu dia-a-dia? Estasquestões que nos acompanharam durante este estudo e que agora sefazem necessárias serem pontuadas, servem para iniciarmos asreflexões que abaixo apresentamos.

A série de transformações, por que passou o setor elétrico nosúltimos anos, tem trazido graves consequências aos seus trabalhadores.As políticas governamentais de privatização vieram acompanhadas deaposentadorias e demissões no setor, que hoje trás a marca daterceirização como carro chefe na prestação de serviços em um campoconsiderado de vital importância no economia do país.

Os acidentes* no setor, muitas vezes graves e ou fatais, são arepresentação triste e dramática do exercício profissional em condiçõesinadequadas. Dados do Gridis (Grupo de Intercâmbio e Difusão deInformação Sobre Engenharia e Segurança do Trabalho) de 1998,informam que apesar dos índices de acidentes de trabalho terem caído,eles não refletem a melhoria da qualidade de vida do trabalhador, poisnem todas as empresas fornecem dados anualmente.

Casos de acidentes ligados a manutenção de rede, máquinas eequipamentos são comuns entre estes trabalhadores. O exercício dasatividades através de prestadores de serviço, com força de trabalho nemsempre capacitada e ou com experiência insuficiente tem se tornadoalgo de convivência “natural”, e que se somam as falhas de instalaçãoelétrica, energização indevida, não desligamento de circuito, fadiga porsobrecarga de serviço segundo dados do próprio Gridis (1995) e quetem interferência direta sobre a segurança dos eletricitários.

Em torno das questões iniciais do viver e trabalhar sobre tensão,surgiu o interesse em realizarmos este estudo, fruto da demanda do

* Dados do SINERGIA de 1994 a 1999 apontam para a mesma série histórica de 18 óbitos, 37acidentes graves sobre 246 acidentes registrados entre os trabalhadores eletricitários de sua base,sendo que ocorreu neste período uma redução de 1019 postos de trabalho em sua área de atuação.

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Ministério Público Estadual, que visa conhecer melhor os impactossobre a saúde mental dos eletricitários, que devido a natureza do seutrabalho, estão constantemente expostos ao risco de acidentes notrabalho.

Os dados que apresentaremos a seguir estão longe de esgotaremo assunto. Esperamos que possam servir de subsídios a discussão pormelhores condições de vida no trabalho, e assim sendo possamos entãocumprir um dos papéis presentes nas vertentes que orientam a atuaçãodo CRST no âmbito do Sistema Único de Saúde.

Agradecemos a confiança da direção do SINERGIA e aostrabalhadores de sua base, que responderam as nossas questões,através dos questionários e no grupo, nos fazendo depositários daesperança, que a vida podia ser, como diz o poeta, “bem melhor e será”.

Agradecemos também ao Ministério Público Estadual, na figura doDr. Luís Antônio S. Silva, procurador, que nos ajudou a demonstrar, queparcerias são possíveis entre os poderes públicos, que visam um bemcomum: A saúde e a segurança no exercício das atividades dostrabalhadores.

Denise Rosindo Bourguignon e Equipe do CRST.

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ORIGEM DA DEMANDA

A partir da denúncia do Sinergia ao Ministério Público Estadual,sobre a ocorrência de acidentes graves e fatais na base da suacategoria, fomos contactados com a finalidade de realizarmos umestudo sobre estes trabalhadores, que possibilitasse maioresinformações a respeito da sua saúde e a influência do ambiente detrabalho na produção de agravos sobre os mesmos.Tal solicitação seriaatendida em parceria com o Ministério Público Estadual, como forma decumprir uma das clausulas do acordo que existe entre a Secretaria deEstado da Saúde e aquela instituição.Por ocasião dos primeiroscontatos com o procurador responsável, procuramos construir umaproposta, que contemplasse a possibilidade de estudarmos os efeitossobre a saúde mental dos trabalhadores, do setor, que vem sofrendomudanças a partir da privatização do mesmo.

Para efetuarmos este estudo foram marcadas reuniões comrepresentantes da Escelsa (empresa estatal privatizada), representantesdas empreiteiras que prestam serviço através dela, no setor energético,e com representantes do sindicato em separado para explicarmos aproposta, bem como solicitar a colaboração dos mesmos na suarealização. Após as reuniões foi mandada cópia da ata com os acordosvia fax para todas as empresas convidadas.

OBJETIVOS

• Desenvolver um estudo com eletricitários de uma ex-empresa estatalprivatizada e suas maiores empreiteiras, com ênfase no perfil dotrabalhador com suas condições sócio-demográficas, aspectosrelativos a sua saúde mental e a sua percepção sobre a organizaçãodo trabalho em que se insere.

• Identificação das tarefas efetuadas nas diferentes funções queexecutam, bem como os riscos a que se submetem.

• Fornecer ao Ministério Público e aos representantes dostrabalhadores, informações que subsidiem a discussão sobre ascondições de trabalho do setor e sua relação no processo deadoecimento, visando a sua melhoria.

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MÉTODOS

Para alcançar os objetivos propostos neste estudo foramcombinados métodos e técnicas que se constituíram em:

1. Inquérito epidemiológico através de questionário auto – aplicável atodos os trabalhadores das empresas contadas.

2. Realização de trabalho de grupo através de entrevistas e técnicas de psicodrama.

3. Avaliação técnica “in loco” das tarefas prescritas aos trabalhadores.

PERFIL EPIDEMIOLÓGICO Por epidemiologia entende-se a ciência que estuda a relação dos

determinantes entre o adoecimento e a morte sobre uma população.No campo de saúde do trabalhador, diferentes categorias de

análise tem sido empregadas na expectativa de se contribuir, como nodizer de Facchini (1994), para o entendimento das conexões entre ainserção social e os problemas de saúde que os trabalhadoresapresentem.

Para isto temos nos utilizado de inquéritos epidemiológicos –verdadeiros achados que possibilitam através de seus dados efetuarmosreflexões que possibilitem estas conexões. Visando a chance destaconstrução, elaboramos este questionário, que contemplou aspectossócio-demográficos, de inserção na organização do trabalho econdições de saúde mental dos trabalhadores.

No aspecto de saúde mental trabalhamos com o SRQ-20 (SelfReporting Questionnaire) na identificação de transtornos mentaismenores (estado de ansiedade, depressão e somatização), o uso decalmantes e principais fontes de tensão e cansaço percebidos pelostrabalhadores.

O questionário foi distribuído a eletricistas das empresascontactadas, através de pessoal determinado por setores de R.H. dasmesmas e que após respondidos, foram depositados em várias urnasque foram colocadas pelos técnicos do CRST - previamente e apósabertas pela pesquisadora.

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Previamente à distribuição foi feita uma sensibilização pelosindicato através de jornal próprio e folders.

A obtenção do quantitativo de respostas foi acompanhado demuitos problemas no que tange à empresa estatal privatizada. Emprimeiro lugar, pelo fornecimento de diferentes números detrabalhadores eletricistas em seus quadros, em segundo, pelo baixonúmero de respostas obtidas em relação a unidade de Carapina, 44,6 %acompanhada da devolução de um elevado número de questionários embranco, em relação as unidades de Alto Lage (79,2%) e Aribiri (68,4%)de respostas.

Tal atitude nos levou a crer no desinteresse da distribuição dosmesmos, ou no número inexato do pessoal lotado em Carapina. Talsituação foi esclarecida no tocante ao fornecimento correto do númerode profissionais somente no período de tabulação final dos dados.

As duas maiores empreiteiras, Porto Azul e Soercel, tambémapresentaram baixo índice de respostas e por onde os técnicos foramrecebidos da forma mais resistente, tendo ocorrido problemas com arepresentação sindical, que por vezes os acompanhava.

Atribuímos este baixo retorno a condições já citadasanteriormente, bem como ao momento econômico que vivenciamos,onde o medo do desemprego tem sido a tônica, no mundo do trabalho, oque faz com que muitos trabalhadores não demonstrem interesse emresponder às pesquisas por medo de serem identificados.

Uma outra questão importante a ser considerada, é a resistência àfigura do sindicato, existente nos trabalhadores da Escelsa.

PERFIL SÓCIO-DEMOGRÁFICO

Dados obtidos junto as empresas pesquisadas informaram existirentre seus funcionários, 352 trabalhadores eletricistas nas diferentesfunções que fazem parte das tarefas que lhes são pertinentes.

Dos questionários distribuídos, 187 foram respondidoscorrespondendo a um total de 53,1% que passam a ser a representaçãoda realidade destes trabalhadores. Todos os trabalhadores pertencemao sexo masculino. A distribuição por empresa pode ser visualizada noquadro a seguir.

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INFORMAÇÕES SOBRE QUESTIONÁRIOS DISTRIBUÍDOS

Número de Questionários Distribuídos 352

Número de Questionários Devolvidos 187

Percentual de Devolução 53,1 %

FONTE: Setor de informações/CRST - Ano 2000

RELAÇÃO DE EMPRESAS PARTICIPANTES

EMPRESA

Número deQuestionáriosDistribuídos

Número deQuestionáriosDevolvidos pelostrabalhadores

Percentual deParticipaçãodosTrabalhadores

PORTO AZUL 73 40 54,8 %ESCELSA (Carapina) 117 65 55,6 %CIEL 24 13 54,2 %SETEL 13 12 92,3 %FURNAS 20 12 60,0 %ATIVE 12 11 91,7 %SOERCEL 50 11 22,0 %GECEL 20 7 35,0 %CONGER 6 6 100 %SALVADOR ENGENHARIA 10 6 60,0 %HT 7 4 57,1 %

TOTAL 352 187 -

FONTE: Setor de informações/CRST - Ano 2000

Em relação ao nível de participação no estudo, estando aqui nesteitem o percentual de 6,4% oriundos de FURNAS; 62,6% foram respostasoriundas de trabalhadores de empreiteiras e 34,5% da Escelsa.

No tocante à função desempenhada, o maior retorno deu-se emtorno dos eletricistas de corte e ligação (26,2%) e de eletricista de linhaviva (20,9% )conforme pode ser observado a seguir, na tabela.

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ENTREVISTADOS POR FUNÇÃO

FREQUÊNCIA FUNÇÃO

ABS PERCEletricista Corte Ligação 49 26,2%

Eletricista de Linha Viva 39 20,9%

Eletricista Esporeiro 37 19,8%

Meio Oficial 22 11,8%

Encarregado de Eletricista 14 7,5%

Eletricista Força Controle 07 3,7%

Eletricista Montador 05 2,7%

Em Branco 14 7,5%

TOTAL 187 100,0%

FONTE: Setor de informações/CRST - Ano 2000

No que tange à faixa etária, observamos uma maior concentração

nas faixas de 40 a 45 anos (20,3%) com um percentual de 54,0%declarando ter de 01 a 03 dependentes exclusivos de seu salário.

FONTE: Setor de informações/CRST – Ano 2000

15,5%

11,2%

11,2%

17,1%

20,3%

13,9%

2,10%

8,6%

0%

5%

10 %

15 %

20 %

25 %

E n trev is ta do s p o r F a ix a E tá r ia

20 |----------- 25

25 |----------- 30

30 |----------- 35

35 |----------- 40

40 |----------- 45

45 |----------- 50

50 |----------- 55

E m B ranc o

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ENTREVISTADOS POR NÚMERO DE DEPENDENTES

FREQUÊNCIA DEPENDENTES

ABS PERCNenhum dependente 02 1,1%

1 dependente 13 7,0%

2 dependentes 30 16,0%

3 dependentes 58 31,0%

4 dependentes 22 11,8%

5 dependentes 20 10,7%

6 dependentes 11 5,9%

7 dependentes 02 1,1%

8 dependentes 01 0,5%

Em Branco 28 15,0%

TOTAL 187 100,0%

FONTE: Setor de informações/CRST – Ano 2000

No que concerne ao nível de escolaridade dos entrevistadosobservamos que as maiores concentrações estão nas faixas de ensinofundamental incompleto (22,5%) e ensino médio completo (38,0%).

Em relação ao tempo de trabalho, o maior percentual informou teracima de 15 anos de trabalho (31,6%) ocorrendo um percentual de37,4% em trabalhadores com até 05 anos de atuação nestas funções.

ENTREVISTADOS POR TEMPO DE TRABALHO

FREQUÊNCIATEMPO DE TRABALHOABS PERC

Até 1 ano e 11 meses 26 13,9%

De 2 a 4 anos e 11 meses 44 23,5%

De 5 a 9 anos e 11 meses 24 12,8%

De 10 a 14 anos e 11 meses 29 15,5%

Acima de 15 anos 59 31,6%

Em Branco 05 2,7%

TOTAL 187 100,0%

FONTE: Setor de informações/CRST – Ano 2000

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PERFIL DE MORBIDADE

O processo saúde – doença é composto na sua gênese de umescopo de variáveis, nas quais a forma de inserção no trabalhodesempenha um papel importante na determinação da forma deadoecer e morrer dos trabalhadores. É a partir das condições concretasda materialidade onde os trabalhadores se inserem que os processos deadoecimento tem que ser visualizados. No tocante aos transtornos quelevam à morbi-mortalidade, os estudos que temos tido oportunidade derealizar inter-categorias, como a estiva (1995), policia civil (1995),bancários (1996), e enfermagem (1999), em conjunto com outros tantosefetuados por diferentes autores, têm mostrado um perfil deadoecimento similar na classe trabalhadora.

Os transtornos de ordem física se acompanham aos de ordemmental traduzindo formas comuns de sofrimento, que perpassam ostrabalhadores, a mostrar de maneira indireta as consequências domodelo econômico em que se inserem, na produção de agravos àsaúde.

Neste sentido optamos por efetuar neste estudo uma pesquisasomente sobre alterações psico-emocionais existentes nostrabalhadores eletricitários. Tal escolha deu-se em função dascaracterísticas do trabalho efetuado reconhecido socialmente comoperigoso devido às condições de trabalho, associadas às situaçõespsicossociais de trabalhar em linha viva, e à pressão social dos usuáriosquando da efetuação de corte de ligações, que os levam ao stresspermanente, conforme afirmam em etapa posterior deste trabalho.

Para efetuar este estudo utilizamos o SRQ-20 – instrumento daOMS (Organização Mundial da Saúde), que possibilita sua aplicação emestudos de rastreamento de transtornos mentais em gruposdeterminados. No Brasil autores como Borges (1990, 1997, 1999),Fernandes (1992), Pitta (1989), Jardim (1994), Ferreira (1994), temaplicado este instrumento como forma de possibilitar a detecção dedistúrbios psicoemocionais, fazendo parte do arsenal de instrumentos daepidemiologia psiquiátrica. Sua validação no Brasil deu-se através deestudos de Mari e Wilhams 1985 e tem se reafirmado nas validaçòes deFernandes 1992, Neto 1995, entre outros.

A versão que utilizamos adota 16 ítens sobre sintomaspsicoemocionais e 04 sobre sintomas físicos. A nota de corte adotada foiigual ou maior que 7.

A partir do ponto de corte estabelecido, encontramos a frequênciade 18,7% de suspeitos de distúrbios psicoemocionais. Todospertencentes ao sexo masculino e em igual número nas empreiteiras e

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na Escelsa. Entre estes 11,4% possuem escolaridade de ensinofundamental completo e 2,9% ensino superior.

Em relação à faixa etária, a maior concentração vai se situar nafaixa de 40 a 45 anos de idade (25,7%), conforme tabela abaixo.

ENTREVISTADOS POR FAIXA ETÁRIA(SRQ positivo >= 7)

FREQUÊNCIAFAIXA ETÁRIA

ABS PERC20 |----------- 25 06 17,1%

25 |----------- 30 04 11,4%

30 |----------- 35 04 11,4%

35 |----------- 40 06 17,1%

40 |----------- 45 09 25,7%

45 |----------- 50 04 11,4%

Em Branco 02 5.7%

TOTAL 35 100,0%

FONTE: Setor de informações/CRST- Ano 2000

No tocante ao cruzamento SRQ – 20 positivo e cargosobservamos que foram nas funções de eletricista de corte e ligação queencontramos a maior concentração (37,1%) e na linha viva (22,9%).Quanto ao cruzamento de SRQ – 20, por tempo de serviço observamosque 43,9% possuíam até 5 anos de trabalho e 37,1% acima de 15 anosde trabalho.

Em relação ao uso de ansiolítico, 8,6% de trabalhadores positivosindicaram fazer uso de calmantes.

Quanto à identificação das principais fontes de tensão e cansaçooptamos por apresentar as com percentual de respostas com 10% oumais de frequência e que podem ser visualizadas abaixo. Os dadospercentuais dão em sua totalidade mais de 100% devido à existência demais de uma resposta por entrevistado.

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FONTES DE TENSÃO

ENTREVISTADOS QUE RESPONDERAM ÀS PERGUNTAS DEFONTES DE TENSÃO NO GERAL

FONTES DE TENSÃO PERC

Má Remuneração pelo Trabalho que Realiza 52,4%

Riscos de Acidentes 41,7%

Pressão da População Usuária 38,5%

Pressão da Chefia 38,5%

Critérios Injustos nas Promoções 34,8 %

Grande Carga de Responsabilidade Social 32,1%

Trabalho muito Repetitivo 30,5%

Prolongamento da jornada de Trabalho/horas –extras 29,9%

Ritmo de Trabalho é muito Intenso 27,8%

Acúmulo de Funções que tem que Desempenhar 27,8%

Volume Elevado de Trabalho 27,8%

Não Ser Ouvido Pela Chefia no Planejamento das Tarefas 27,3%

Limitações na Possibilidade de Desenvolvimentoprofissional na Empresa

26,2%

Dificuldades de Acesso a Serviços de Saúde 24,1%

Necessidade de Executar Tarefas que não ConcordaTecnicamente

23,0%

Falta de Equipamentos para desempenhar; Funções/Equip.sem manutenção

20,3%

Deficiências de Algumas Áreas em Trabalhar CorretamentePrejudicando o Andamento dos Trabalhos e seusResultados

20,3%

Trabalho Noturno 18,7%

Confronto com a Morte de Colegas de Trabalho 15,0%

Treinamentos Inadequados 15,0%

Improvisação no Desenvolvimento das Atividades 13,9%

Falta de Coleguismo na Equipe 10,2%

FONTE: Setor de informações/CRST – Ano 2000

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A análise das principais questões elencadas no SRQ – 20 eexpostas na tabela abaixo demonstra que as mesmas são a tradução deum sofrimento que se representa no corpo destes trabalhadores e refleteindiretamente as condições em que desempenham suas tarefas.

QUESTÕES DO SRQ-20

QUESTÕES DO SRQ – 20 MAIS RESPONDIDAS %

Sente-se nervoso, tenso ou preocupado ? 94,3 %

Tem se sentido triste ultimamente ? 85,7 %

Faz uso de bebida alcoólica / 74,3 %

Dorme mal ? 65,7 %

Tem sensações desagradáveis no estômago ? 62,9 %

Você cansa com facilidade ? 62,9 %

Tem dores de cabeça freq6uentes ? 61,8 %

Tem dificuldades de tomar decisões ? 60,0 %

Tem dificuldades no serviço, seu trabalho é penoso, lhe causasofrimento ?

54,3 %

Tem má digestão ? 52,9 %

Assusta-se com facilidade ? 51,4 %

Encontra dificuldades para realizar com satisfação suas atividadesdiárias ?

51,4 %

Sente-se cansado o tempo todo ? 48,6 %

Tem dificuldade de pensar com clareza ? 42,9 %

Tem perdido o interesse pelas coisas ? 42,9 %

Tem chorado mais de que de costume ? 35,3 %

Tem falta de apetite ? 31,4 %

Tem tremor nas mãos ? 28,6 %

Você se sente uma pessoas inútil, sem préstimo ? 25,7 %

É incapaz de desempenhar um papel útil em sua vida ? 20,0 %

Tem tido a idéia de acabar com a vida ? 11,4 %

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A CONSTRUÇÃO COLETIVA SOBRE O SABER NO TRABALHO

Objetivos:

• Dar oportunidade aos trabalhadores eletricistas de participarem deuma atividade grupal voltada para a discussão da prática do exercíciocotidiano do seu trabalho, reconhecendo as diferenças que existemna relação com o trabalho e que implicam em modos determinadosde ser e agir.

• Ter acesso ao conhecimento sobre o trabalho real que se encontrana fala dos trabalhadores, reconhecendo nesta um saber sobre aatividade laboral que só é possível no desvelamento do desempenhoda função.

• Dar maior subsídio à avaliação ergônomica do trabalho, incorporandoà essa as questões levantadas no encontro do grupo.

MÉTODO

O trabalho com o grupo foi organizado com base na teoriapsicodramática – desenvolvida por Jacob Levy Moreno, que tem comopressuposto teórico a visão do homem como um ser essencialmentecriativo e espontâneo; um ser em relação.

É na inter-relação das pessoas que se encontra o dispositivocapaz de romper com a cristalização de conceitos e atitudes manifestosintra e intersubjetivamente. Para possibilitar que esse dispositivo sejaacionado, o psicodrama se utiliza de recursos técnicos, entre os quaisos jogos dramáticos e a construção de cenas (dramatização), que foramos utilizados neste trabalho.

Entendendo que o espaço grupal é constituído por uma rede derelações sociais, onde cada integrante do grupo é, ao mesmo tempo,representante de si próprio e de sua cadeia de relações sociais extra -grupo, cada participante e o grupo como um todo contêm em si umgrande potencial de transformação social.

Dentro deste enfoque, nos propusemos a dar visibilidade àsquestões que estão presentes no dia-a-dia destes trabalhadores (tantono que tange aos aspectos inerentes à função de eletricista quanto emrelação aos agravos pelas condições de trabalho), e a possibilitar a

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articulação dos diversos modos de pensar as experiências e açõesdesenvolvidas em campo, a partir do reconhecimento do saber de cadaum sobre o seu trabalho.

Nossa tarefa foi coletivizar e auxiliar a elaboração desse sabersubjetivo, do qual faz parte não apenas o conhecimento da atividade emsi, mas também a percepção das relações que se estabelecem notrabalho, da divisão e conteúdo das tarefas, do volume de trabalho, osuporte técnico (equipamentos, treinamento) oferecido pelo empregador– que consistem em uma dada organização do trabalho à qual estestrabalhadores se sujeitam - bem como as condições de negociação como mesmo. É na análise integrada destes aspectos que se encontram osdados para se repensar a relação trabalho-saúde.

Para a constituição do grupo foi estipulado um número de 15participantes, convidados pelo sindicato durante a entrega dos folhetosexplicativos sobre a pesquisa, tendo o mesmo sido reforçado quando dadistribuição dos questionários pela equipe do CRST.

Foram realizados 6 (seis) encontros, sendo apenas os 4 (quatro)últimos gravados em fitas K-7, conforme decisão do grupo.

Diante do baixo índice de comparecimento, as pessoas alireunidas definiram por reiterarem, elas próprias, o convite aos colegasde trabalho, na tentativa de mobilizá-los a contribuírem também comesta etapa da pesquisa.

Essa proposta foi bem recebida pela equipe coordenadora, por serum indicativo da compreensão do objetivo dos encontros grupais, bemcomo do comprometimento dos que ali se encontravam.

Essa tentativa resultou na presença de novos integrantes, porémde forma inconstante, de maneira que os encontros também secaracterizaram pela rotatividade dos participantes.

Neste sentido, o grupo ficou constituído por um núcleo fixo(formado pelas pessoas que compareceram desde o primeiro encontro)e por outros componentes que participaram de forma eventual.

Ao final do segundo encontro, as coordenadoras procederam auma avaliação da configuração grupal que se delineava, propondo queos encontros seguintes fossem gravados.

Isso imprimiu ao grupo a característica de estar aberto, a cadaencontro, a novos integrantes.

Essa problemática retorna como ponto de discussão no últimoencontro.

O local escolhido para realização dos encontros foi o consultórioda psicóloga, por se tratar de um ambiente neutro e em condições boasde acomodação e acesso, uma vez que a localização do CRST mostrou-se inadequada para o uso no horário definido para os encontros

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(segundas e quintas de 18:30 às 20:30 h e, posteriormente, aossábados de 09:30 às 11:30 h).

OS ENCONTROS

O grupo foi composto, em sua maior parte, por funcionários deempreiteiras, cujo trabalho se caracteriza pelas atividades demanutenção em rede de baixa tensão, serviços de corte e ligação deenergia, atendimento direto ao usuário. Havia, também, funcionários deuma empresa privatizada e de uma estatal. Esta composição foideterminante nas questões que surgiram no grupo.

Ao longo dos encontros foram discutidas as diferentes realidadesdas condições de trabalho de empreiteiras, empresa privatizada eestatal. Com isso, tornou-se possível também se delinear as questõescomuns à categoria.

As diferenças se apresentam na estrutura física (disposição dosespaços no ambiente de trabalho, instalações sanitárias, privacidade),no suporte técnico (treinamentos de capacitação para exercer a funçãode eletricista, treinamentos de proteção em primeiros socorros), nadistribuição dos equipamentos de proteção individual (EPI‘s). Os relatosapontam para a precariedade das instalações físicas das empreiteiras,no que diz respeito a condições de higiene e conforto para ostrabalhadores, ausência de treinamentos de capacitação de pessoal.

Quanto às relações no trabalho, as mesmas apresentamcaracterísticas distintas , de acordo com a empresa a que nos referimos.

Na estatal, ouvimos o relato de que há, de maneira geral, bomrelacionamento com a chefia, que respeita a organização estipuladapela equipe de trabalho (tendo esta, muitas vezes, poder de resoluçãosobre um problema circunstancial surgido na execução de umadeterminada tarefa).Também a forma e o tempo de serviço têm ogerenciamento mais a critério dos funcionários do que do encarregado.As atividades são definidas diariamente, de acordo com o tempo, deforma que não há, aqui, o imperativo de serem finalizadas no mesmodia. O mesmo ocorre com a empresa privatizada no que se refere àsatividades desenvolvidas em linha viva.

A organização do trabalho nas empreiteiras é apontada comosendo mais rígida, havendo pouca abertura ao diálogo entre oseletricistas (executores) e os encarregados (organizadores das folhas deserviços). Em uma empreiteira, particularmente, foi relatado ser comumo uso do horário de almoço para o trabalho (além da realização dehoras-extras) devido à necessidade de se “fechar” a folha de serviços

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entregue naquele dia. Cabe, ainda, ao funcionário entrar em contato portelefone com a empresa para saber se há alguma tarefa extra para serexecutada.

Quanto aos equipamentos de segurança1 e às ações educativasreferentes a ocorrência de riscos no ambiente de trabalho, primeirossocorros, e utilização de equipamentos de segurança, percebe-se umainsuficiência e falta de sistematização por parte das empreiteiras. Talfato aumenta o perigo, inerente a esta função.

Os eletricistas apontam que, além destes, existem outros fatoresque contribuem com a ocorrência de desgaste pessoal, tornando otrabalho mais arriscado: entre eles o acúmulo de funções, e a execuçãodas tarefas prescritas de forma isolada.

Podemos observar o acúmulo de funções, por exemplo, nassituações de corte de energia do usuário (onde o eletricista devetambém desempenhar a função de negociante do débito e da iminênciado corte com o próprio usuário) e como motorista do veículo utilizado.Isto ocorre na empresa privatizada e nas empreiteiras: na primeira, ocargo de motorista está em vias de extinção, sendo desempenhado porfuncionários antigos, mas apenas para dirigirem as carretas e algunscaminhões munk. Atualmente, não há vagas específicas para estecargo: os funcionários que são contratados para as funções deeletricista, operador ou técnico, acabam acumulando a função demotorista. Por esta tarefa extra, segundo as informações fornecidas nogrupo, o funcionário recebe um adicional (de R$0,11 a R$0,12) por Kmdirigido e o veículo utilizado pertence à empresa.

Quanto às empreiteiras, nestas não há o cargo de motorista e,geralmente, segundo os relatos, elas não possuem veículo próprio:alugam-no, cabendo ao dono do mesmo arcar com as despesas. Muitasvezes, este é o próprio eletricista que, para aumentar a renda salarial,utiliza seu carro particular.

Trabalho isolado é aquele em que o eletricista sai sozinho paraexecutar as tarefas nos postos de trabalho. Esta forma de trabalho éencontrada, particularmente, nas empreiteiras. É-nos relatado no grupoque ainda é possível encontrar na empresa privatizada, casos detrabalho isolado nas situações de plantão em regiões do interior doestado, devido à precariedade de pessoal. Para os plantões da região

1 Equipamentos de segurança necessários segundo os participantes: botina (resistente e comisolamento elétrico); cinto com talabarte ( o talabarte é uma tira de couro ou outro material resistenteque passa pela cintura e pelo poste para dar sustentação, facilidade de movimentação, destreza eliberação das mãos para a execução das tarefas); cordão umbilical (ligado ao cinto de segurança eanexado a uma parte fixa do poste ou estrutura metálica que permite, em caso de queda doeletricista, que o mesmo fique dependurado); capacete com jugular ( próprio para isolar energia,evitar impacto na cabeça a jugular impede que o capacete caia) ; luvas (luva isolante para altatensão, luva isolante para baixa tensão, e uma luva de couro sobre as outras, para proteção)

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metropolitana tem sido adotado, ultimamente, um sistema de trabalhoem equipe de, no mínimo, dois profissionais, sendo um deles funcionáriode empreiteira. Como a capacitação deste último, tanto para a tarefaprescrita quanto para uma intervenção em primeiros socorros éconsiderada insuficiente, o profissional melhor treinado termina porsentir-se solitário, temeroso em ter que depender de um auxiliar com tãopoucos recursos.

É apontado pelo grupo a importância de se trabalhar numa equipeentrosada, devido à confiança e ao respeito mútuo já estabelecidos,que permitem a cada um fazer uma auto-avaliação e dizer para osdemais companheiros da equipe como está se sentindo, se lhe épossível ou não assumir a frente de trabalho naquele dia ou se seriamelhor (mais prudente) atuar como auxiliar. Neste sentido, é comum quea entrada de um membro novo na equipe cause um certoestranhamento inicial, gere aumento de tensão.

“Um depende do outro, exclusivamente”.

Interferências externas, como noite mal dormida, doença nafamília, por exemplo, elevam o risco de acidente de trabalho.

“É aquela velha história: na hora que você vai para o seutrabalho, esquece seus problemas em casa! Isso não existe.”

A aceitação dos próprios limites e a percepção das implicaçõesdestes sobre a realização das tarefas têm uma relação direta com osaber sobre o seu trabalho, que leva ao reconhecimento do perigo e dacomplexidade embutidos em sua execução, `a cumplicidade que une osmembros da equipe nesse cotidiano arriscado, à valorização dasmedidas e equipamentos de segurança. Este conjunto de açõesconforta e torna possível o distanciamento do próprio medo provocadopela consciência do risco que correm.

Tal comportamento se insere no que Dejours2 classifica comoideologia defensiva: um conjunto de ações, de caráter coletivo, quesimbolizam um sistema de defesa organizado para controlar o medoproveniente da consciência do risco inerente ao trabalho desenvolvido.

2 C. Dejours : “A loucura do trabalho – estudo de psicopatologia do trabalho” p. 63-79

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Segundo Dejours, “o medo relativo ao risco pode ficarsensivelmente amplificado pelo desconhecimento dos limites deste riscoou pela ignorância dos métodos de prevenção eficazes. Além de ser umcoeficiente de multiplicação do medo, a ignorância aumentatambém o custo mental ou psíquico do trabalho “. 3

O corte de energia e a relação direta com o consumidor sãotarefas que se mostram altamente geradoras de tensão. De um modogeral, os trabalhadores desta área buscam fazer uma ponte (impossível)entre o posicionamento da empresa e o do consumidor. Buscam de fato,fazer a mediação (negociação) que lhes é cobrada pela empreiteira.

Estão em posição de absorção imediata do confronto de interesses(na‘ linha de frente’) sem, no entanto, estarem devidamentepreparados.

“São na maioria rapazes simples, é o primeiro emprego, (...) tãoaprendendo na rua.”

Além do que, a realidade apresentada pelo consumidor(endividamentos, dificuldade para manter o padrão de vida) é umespelho de sua própria realidade.

O processo de achatamento das classes média e daseconomicamente menos favorecidas é constatado por essestrabalhadores ao executarem os serviços de corte e ligação de energia.Vêem a realidade dos outros com tamanha angústia porque ali tambémestão vendo a si mesmos.

A fim de minimizar seu sofrimento, lançam mão de algumasestratégias – fazem um “jogo de cintura”(sic):

“Eu sempre alerto: olha, eu estou vendo a sua situação, souhumano e vou te ajudar também. Mas quero que você também meajude.Não vou te cortar a energia agora. Mas pelo amor de Deus!, vê sevocê paga todos os seus débitos até... Você tem 24 horas pra pagarisso. Dá seus pulos, vê se você pega dinheiro emprestado, porquecom certeza vai ter outra equipe, vai tirar seu relógio, e cortar narede. Vai ficar pior!”.

3 Idem páginas 66 - 7

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O trabalho em linha viva apresenta uma característica distinta dalinha morta, pois nela todos os procedimentos necessários sãoefetuados com a linha ligada, inclusive sua manutenção. Apenas emalguns finais de semana os trabalhadores operam com a rede desligada.

O fundamental na atividade de linha viva é a segurança, poisqualquer descuido ou acidente pode ser fatal.

Por mais paradoxal que possa parecer, na linha morta ocorre maisacidentes do que na linha viva. O risco de sofrer acidentes na linhamorta se torna maior porque apesar da linha viva estar energizada, hámais proteção para se trabalhar (EPI’s e EPC’s), portanto, ela se tornamais segura.

“... Nós relaxamos, sabemos que a linha está desligada e esse relaxamento pode provocar descuidos, mais acidentes...”

“... Se por um lado é melhor trabalhar na linha morta, porqueocorre menos perigo, por outro lado, pelo fato dele(trabalhador) estar mais relaxado e menos tenso, podemosestar mais propensos a acidentes...”.

“O perigo também torna-se individual...”.

Quanto à extra alta tensão, o trabalho é mais minucioso, delicado,portanto com maior grau de dificuldade para se operacionalizar osserviços, dada a distância em que se encontram os cabos dos fios.Normalmente, as chaves estão equidistantes uma da outra em apenas20 cm.

“... Qualquer descuido pode ser fatal...”.“... Tem que trabalhar com muita atenção, ligado econsciente do que se está fazendo...”.

Há um caráter diferenciado, no que diz respeito à pressão detempo para execução dos serviços sobre os trabalhadores da linha vivae da linha morta.

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Na linha viva há maior liberdade para a execução das atividades(administração do tempo) porque este tipo de atividade

“...não gera prejuízo para a companhia, porque como eletrabalha com a linha viva, está todo mundo com luz.”

Por outro lado, quem trabalha com linha morta tem um prazo deaté 06 horas para realização das atividades (desligamento programado).Ainda segundo os relatos, o encarregado que assume o compromissodo serviço, normalmente não tem a prática da realização das mesmas.Assume sem saber de fato o tempo real necessário para a suaexecução. Além disso, são atividades que se iniciam às 6 horas damanhã, o que significa que o funcionário tem que sair- dependendo deonde mora - “de madrugada de casa, na maior parte das vezes semcafé da manhã ”

“Chegando na obra, tem que fazer (...). De cada dezdesligamentos, um ou dois cumprem o horário; oito não temcondição de cumprir, não têm! Aí, ou faz uma parte de umamanobra e deixa a outra desligada , ou libera o tronco ,libera e deixa os ramais abertos...Tem que se fazer algumacoisa! Então, a pressão deles são muito maiores. (...) Se tivesse umplanejamento, o qual ... por exemplo: se é você que vai fazer, se osuperior chegasse pra você: - Vem cá, tem essa obra aqui parafazer cara: seis horas dá?”

Também foi ponto de discussão no grupo o nível de adesão àproposta de trabalho da pesquisa por parte da categoria dos eletricistas,apesar da divulgação e da reiteração do convite feita pelos próprioscolegas de trabalho:

“Muitas pessoas disseram que vinham, confirmaram quevinham, e não apareceram...Porque, aqui, o subsídio para pesquisaé informação. E quem pode dar informação, são os trabalhadores...E não estão aguçando a curiosidade de vir; nós mudamos até dehorário. Vocês estão vindo aqui, no sábado, fora de horáriotambém... Não sei por quê, alguns nem perguntam, né, ? Dapesquisa... “

“Eu não sei nem dizer, não quero nem me aprofundar muitopra mim não ficar triste e me decepcionar. (...) Já tô chateado comcertas questões, né ? Coisas de lá de dentro da empresa mesmo; eagora com os colegas de trabalho.”

Essas falas revelam um sentimento de impotência e desamparodos trabalhadores e sua desmobilização diante de um panorama social

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em processo de definição. Apontam, ainda, para seu distanciamento domovimento sindical.

Particularmente este último ponto, segundo relato dostrabalhadores de uma empreiteira, oportunizou a implementação de umoutro sindicato – paralelo ao SINERGIA – O SINDPREST (Sindicato dasPrestadoras de Serviço). O mesmo tem desconto compulsório na folhade pagamento e muitos são os trabalhadores que mantêm estacontribuição por desconhecerem que a filiação a um sindicato éopcional.

Por outro lado, também emergem falas que denotam consciênciada importância de seu papel de trabalhador, dono da força de trabalho,fundamental para a reprodução do trabalho.

“Se cada trabalhador conseguisse mostrar, ou conseguisseenxergar que ele também é importante, que o empresário sem eletambém não é empresário. (...) Quem dera se tivéssemos estepoder... Só que nós temos esse poder, basta nos conscientizarmos.A pessoa que vai entrar (na empresa) tivesse essaconscientização... Mas não tem.”

“Hoje poucos podem manifestar insatisfação com ascondições de trabalho e falar com o patrão: se quiser me mandarembora, que mande.”

As expectativas quanto à repercussão desta pesquisa, no sentidode possibilitar mudanças no cotidiano desta categoria (particularmenteno que tange à relação trabalhador/empregador) são muito grandes,conforme constatamos nas falas:

“(...) Vim porque se abriu uma porta... Se é uma oportunidadede mudar alguma coisa, ou pelo menos de tentar, vamos abraçá-la!

Porque às vezes a gente sai do serviço e vai para casa semperspectiva, se frusta... Se isso aqui pode evitar aquele medo dofuturo, se pode trazer alguma coisa do tipo: alertou / mostrou aopatrão alguma coisa... Pois nós temos muitos companheiros quenão têm nem escolaridade. Há o medo de perder o emprego e, seperdê-lo, até achar outro vai suar muito.”

“... Que esse relatório mostre realmente os problemas e umpouco da solução, que talvez seja a capacitação, né? Pode ser opróprio SEBRAE, o SENAI, o próprio sindicato procurar esse lado etambém uma luta. A classe está precisando de um apoio.”

“Fiquei feliz de ter participado, de ter ajudado, ter vistocolegas com mais dificuldades, mas querendo falar, ajudar.”

“... que o relatório mostre as dificuldades pela opressão que otrabalhador tem; a vontade de falar que ele tem, de sercapacitado...”

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CONSIDERAÇÕES

O trabalho de eletricista é de natureza coletiva e envolve risco epericulosidade, entendendo o risco como “inerente a qualquer sistemaelétrico, (...), onde haja qualquer possibilidade de acidente, mesmo demodo fortuito e incerto “ 4, e o perigo como “uma condição onde háiminência de ocorrer tal acidente, ou seja, é quando o risco, inerente aum sistema, está fora de controle e prestes a materializar o acidente “ 5.Envolve alto grau de concentração e atenção para a execução da tarefaprescrita e nas atividades desenvolvidas para realizá-la; uma rajadamais forte de vento, a passagem de um pedestre naquele setor detrabalho, ou de um automóvel em deslocamento, uma ligaçãoclandestina, tudo isso são variáveis independentes que podemdeterminar mudanças no ritmo de trabalho, gerar situações inesperadas,levando ao exercício das regulações necessárias para realizar asatividades. A gestão da variabilidade num trabalho de risco aponta paraoutra característica: a complexidade.

Requer, portanto, um trabalhador especializado, em boascondições de repouso, com possibilidade de reconhecimento de suadisponibilidade para assumir a frente de trabalho naquele dia, e quepossa contar, para isso, com o respaldo da empresa e dos colegas detrabalho.

Entretanto, o que observamos nos relatos é uma visão atual dotrabalho de eletricista como uma função que pode ser desempenhadapor qualquer trabalhador, sem necessidade de uma formaçãoprofissional séria. Tem-se, com isso, a desvalorização da profissão e,consequentemente, da pessoa que a executa.

“... um encarregado nosso era limpador de valão... Nem um éespecialista! Conhece o ramo devido ao tempo que ele trabalha.”

Cria-se, também, a idéia de um trabalhador que pode serfacilmente substituído, sem que haja ônus para o empregador.

“A rotatividade é muito grande...”

Um trabalho que se traduz pela convivência diária com aexposição ao perigo, onde um deslize pode ser fatal, torna-sedesqualificado por uma forma de gerenciamento empresarial na qual ao

4 Sérgio Santense Junior – Engenheiro de Segurança, em entrevista à Revista Proteção, 1998, p. 28.5 Idem

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trabalhador é facultado o papel de mero executor de tarefas, com ummínimo de possibilidade de intervenção sobre o modo operatório dasmesmas. Isto ocorre tanto em função da forma como se dá aorganização do trabalho quanto pela precariedade do conhecimentosobre a profissão.

" Eu acho que o pior mesmo é ele (o eletricista) não ter aatenção e o conhecimento. A consciência do que ele vai fazer.Porque, de todas as tarefas - elas todas são perigosas. Todas sãoperigosas! E você vê que a Companhia, ela não dá valor.

Isso que a gente está fazendo aqui, esses encontros, é muitoimportante!"

De fato, podemos observar que mesmo uma atividade consideradade simples execução, como a cobrança de contas de energia, encerraem si uma penosidade, determinada pela falta de preparo adequado dostrabalhadores e pelo estigma social que carregam - o de representantesde um modelo de sistema que não leva em consideração a condiçãosocial do usuário.

"O consumidor olha você como responsável."

Neste grupo, tivemos retratados três quadros distintos:trabalhadores de empreiteiras, subordinados a condições precárias detrabalho (incluindo-se aí condições ambientais e salariais); trabalhadoresde uma empresa privatizada, que assistiram a vários colegas seusserem demitidos, outros serem contratados sem direito aos mesmosbenefícios que eles mantêm; e trabalhadores de uma empresa estatal,que reconhecem não estarem longe de viver uma privatização. Apesardas diferenças na estruturação da forma e das condições de trabalho,que perpassaram o grupo ao longo dos seis encontros, algo os igualava:o fantasma do desemprego e o desejo de mudanças.

É interessante observar que as reivindicações por melhoria dascondições de trabalho pensadas no grupo não implicam em umatransformação da forma de organização do trabalho em si, como porexemplo: solicitação de um Curso de Direção Defensiva para atenuar odesgaste causado pelo trânsito, em vez de solicitarem o retorno (ou aabertura, no caso de empreiteiras) do cargo de motorista.

Esta demanda do grupo reflete bem o contexto social no qualtodos estão inseridos: aumento do número de desemprego,precarização das relações de trabalho, insegurança da economianacional, arrocho salarial, redução dos investimentos públicos e gastossociais, privatização.

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O quadro de instabilidade geral provoca revolta e medo. Oresultado desta ”mistura” é a imobilidade e a fragilização das relaçõesinterpessoais, a alienação na própria dor, o que se tornou evidente naquestão da participação no grupo.

Olhamos para este posicionamento da categoria com grandepesar, pois entendemos que num primeiro plano encontra-se o indivíduoe sua relação com o trabalho (satisfação pessoal, realizaçãoprofissional, possibilidade de controle sobre suas tarefas, etc.), e que éatravés da apropriação do conhecimento sobre seu processo detrabalho e da compreensão da repercussão deste em sua vida, que épossível ao trabalhador implicar-se na problemática saúde X trabalho, eassim transformar a sua queixa individual em ação coletiva.

Visamos, com a abertura de um espaço para a discussão grupal,propiciar um ponto de partida para este movimento. Nestes encontrosobservamos que há necessidade de realização de uma avaliaçãoergonômica do trabalho, principalmente nas funções onde o risco devida é maior.

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AVALIAÇÃO TÉCNICA

LOCAIS INSPECIONADOS

Empresas Escelsa e Furnas, Empreiteiras da Escelsa, ruas elogradouros na Região da Grande Vitória.

PERÍODO DA INSPEÇÃO

04/05/2000 a 09/12/2000.

METODOLOGIA APLICADA

• Visitas aos locais de trabalho no interior da empresa e campo;• Entrevista com funcionários das empresas;• Questionário enfocando as condições sanitárias e de conforto nos

locais de trabalho, de acordo com a Norma Regulamentadora - NR-23, portaria 3214 do MTb.

DESCRIÇÃO DO AMBIENTE DE TRABALHO

Vias e logradouros públicos nos bairros da Região da Grande Vitória eespaço físico das empresas.

TAREFAS EXECUTADAS PELAS EMPREITEIRAS• Instalação e manutenção de redes de distribuição de energia elétrica;• Ligação de unidades consumidoras ;• Corte de fornecimento de energia elétrica;• Corte de ligações clandestinas de energia elétrica.

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ATIVIDADES DESENVOLVIDAS PELOS ELETRICITÁRIOS

NA EMPRESA

• Toma conhecimento da ordem de serviço solicitada para posteriorexecução;

• Toma conhecimento do local do serviço;• Separa, inspeciona ferramentas e equipamentos de proteção

individual;• Carrega o veículo com ferramentas, equipamentos de segurança e

materiais necessários para realização dos serviços de campo;• Desloca-se para local de serviço designado em um veículo.

NOS LOCAIS DE TRABALHO - TRABALHO DE CAMPO

• Estaciona o veículo, aciona o pisca-alerta e sinaliza a área comcones apropriados;

• Identifica-se ao consumidor, antes do início de tarefas, quandonecessário;

• Separa ferramentas e materiais necessários para o trabalho;• Seleciona e equipa-se com os equipamentos de proteção

necessários;• Executa as tarefas contidas na Ordem de Serviço;• Recolhe ferramentas, materiais e equipamentos após o término das

tarefas;• Desloca-se para o local de execução da nova tarefa, ou retorna para

a empresa;• No final da jornada de trabalho, quando necessário, recolhe os

materiais e equipamentos do veículo e devolve ao almoxarifado.

NOTA: Quando não está disponível no veículo o braço hidráulico comguarda-corpo, o trabalhador utiliza escada manual no caso de postesconstruídos em concreto e esporas em caso de postes de madeira.

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RISCOS AMBIENTAIS NOS LOCAIS DE TRABALHO

Os riscos identificados através de observações assistemáticas e análisequalitativa foram:

Físico- Calor (carga solar);- Umidade ( em dias de precipitação ) ;- Ruído ( em algumas situações ).

Químicos - Manutenção de transformadores contendo ascarel;

Ergonômicos- Trabalho em pé;- Batenção e responsabilidade;- Esforço físico;- Trabalho em altura;- Exigência de posturas incômodas (de pé), agachado, curvado;- Espaço físico limitado.

Riscos de Acidentes

- Choque elétrico, queimaduras;- Queda de diferença de nível;- Corte e furos nas mãos e dedos;- Agressão física por parte dos consumidores de energia;- Acidentes de trânsito;- Quedas de ferramentas em geral.

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CONSIDERAÇÕES

• A empresa concessionária adota padrões operacionais e normas desegurança, baseadas na ABNT, e rotinas internas próprias;

• As contratadas (empreiteiras) são informadas a respeito depadronizações e normas a serem seguidas, inclusive de penalidades,caso não sejam cumpridas tais normas;

• Apesar das exigências da concessionária (ESCELSA), na observaçãode inspeção em algumas empresas contratadas não nos foiconstatado e informado sobre a existência de manual deprocedimentos, ou normas de trabalho escrito e divulgado aostrabalhadores;

• As atividades do eletricista são executadas em condições adversas,ou seja: corpo suspenso, sob sol ou chuva, espaço limitado, esforçofísico intenso, atenção, concentração e responsabilidade. Em funçãodisso, há um desgaste físico considerável, além de outras exigênciasdo trabalho, tais como: subir em postes, posições incômodas (de pé,agachado, mãos sobre a cabeça) durante um longo período levandoo trabalhador a fadiga;

• Nas inspeções realizadas nos locais de trabalho ficou claro que oritmo e as variabilidades faziam com que houvesse a necessidade doimproviso para a realização de tarefas;

• As refeições são realizadas a céu aberto, embaixo de árvores, nascalçadas, embaixo do veículo de trabalho, não existindo um localapropriado para as mesmas;

• As Empreiteiras fornecem auxílio alimentação para seus funcionários.

• As necessidades fisiológicas dos trabalhadores são feitas emterrenos baldios, bares, lanchonetes ou solicitada a moradores emsuas dependências. Não foi constatado banheiros químicos ou dequalquer natureza nos locais de trabalho( trabalho de campo );

• As áreas de vivência nas empreiteiras (vestiário, banheiros,refeitórios) não apresentavam condições satisfatórias de uso eestavam comprometidas pela falta de higiene (limpeza econservação) dos locais, constatado em inspeções realizadas nolocal. Das empresas vistoriadas apenas a ESCELSA e FURNAS

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encontravam-se em condições de uso e de acordo com a portaria doMTb, no que diz respeito às condições sanitárias e de conforto nolocal de trabalho. A GECEL estava transferindo-se para suas novasinstalações, onde constatamos que a mesma apresentava-se emboas condições de uso.

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CONCLUSÃO

O estudo que terminamos de apresentar teve como orientação aproposta metodológica de procurar compreender a saúde do trabalhadorno contexto em que este desenvolve suas atividades na expectativa deapreender o trabalho real. Longe de ser uma análise ergonômica dotrabalho devido a ausência de capacitação do grupo no seu empregometodológico, procuramos avançar para além da redução queencontramos nas inspeções em ambiente de trabalho nas quais porforça de formação cartesiana, tendemos a separar as condições deexecução do ato de trabalho em si.

Procuramos ultrapassar esta visão através do trabalho em grupo,espaço privilegiado de valorização da palavra, resgatando através dalinguagem oral a oportunidade de se conhecer a realidade dasatividades de trabalho e as representações que os trabalhadores fazemdelas.

Tentamos trabalhar dentro dos limites determinados pelascondições concretas de nossa materialidade, partimos de uma demandaoficial, e após a conclusão deste estudo apresentamos observações quemerecem ser pontuadas.

1. A força de trabalho masculina no setor aponta para razões histórico-sociais de um campo de trabalho exclusivo dos homens.

2. Que estão nas empreiteiras o maior foco empregador indicando aterceirização “como carro-chefe” do setor.

3. Que se encontram nas funções de corte e ligações (26,2%), linhaviva (20,9%), esporeiro (19,8%) as maiores concentrações deoportunidade de trabalho, estando (37,5%) com até 5 anos de médiade atuação.

No tocante ao nível de escolaridade (22,5%) informaram ter ensinofundamental incompleto o que pode vir a ser um elemento complicadorpara a compreensão das tarefas prescritas, bem como da adoção dasmedidas de proteção preconizadas para o setor.

Um dado que julgamos importante é a freqüência de 18,7% detrabalhadores com transtornos mentais menores, encontrados no SRQ-20. Este índice apesar de baixo frente a outras categorias, comopetroleiros, bancários, policiais civis, não pode ser menosprezados,incide com freqüência nas faixas etárias de ingresso na profissão e em

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faixa etária mais tardia 40 a 45 anos (25,7%) apontando tanto para afragilidade dos mecanismos de defesa, frente ao novo e desconhecido,bem como para o desgaste quando se expuser a situações inadequadasde trabalho.

Estes dados se agregam junto aos fornecidos pelo sindicato, queapontaram para perda de 1281 dias sobre 16 acidentes entre leves,moderados e graves ocorridos na ESCELSA em 1999 e 331 dias sobre18 acidentes nas empreiteiras em 1999, com graus variados de lesões.

Em estudo igualmente efetuado sobre 132 CAT`s de 1995 a 1997fornecidas pelo sindicato observamos que os tipos deacidentes/doenças de maior incidência sobre categoria por ordemdecrescente foram: impacto sofrido pela pessoa, queimaduras sofridaspor exposição à energia elétrica, queda de nível, esforço excessivo,ataque de ser vivo e doença osteomuscular relacionada ao trabalho.Estes mesmos tipos se repetem nas 25 CAT´s de 1999 e 28 de 2000 amostrar uma repetição das condições de trabalho vivenciadas pelosacidentados nestes últimos 5 anos.

Em relação a prováveis fatores determinantes de acidentes podemosentão elencar como causas, segundo análise do GRIDIS de 1995.

• Procedimentos e ferramentas inadequadas;• Falhas na instalação elétrica ;• Energização indevida;• Orientação errônea ou omissão de serviços de equipe;• Não desligamento de circuito;• Fadiga por sobrecarga no serviço.

Em relação ao trabalho efetuado com o grupo, as falas presentesapontaram todo o tempo, para a percepção de um cotidiano de risco,onde questões sociais se esbarram com um jeito perigoso de se viver otrabalho, não é sem significado que (37,5%) dos SRQ-20 positivos estãono pessoal de corte e ligação (22,9%) nos trabalhadores de linha viva.

As situações elencadas no grupo falaram igualmente sobre oconhecimento do processo de trabalho por muitos, da inexistência deuma política de prevenção sistemática de acidentes e do trabalho emcondições isoladas que gera nestes trabalhadores uma situação destress permanente. Os dados encontrados na pesquisa são com certezaa tradução do sofrimento psíquico que origina manifestaçõespsicossomáticas como as identificadas no SRQ-20 e são justificadosquando se reflete sobre o cotidiano destes trabalhadores. Todos esse

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dados têm que ser levados em consideração para serem construídasproposta de melhoria na qualidade de vida no trabalho

Tendo por base as observações técnicas realizadas, aconversação no grupo que possibilitou um desvelamento dodesempenho e as queixas apresentadas no inquérito epidemiológico,nos guiamos pelas seguintes questões para construção de um provávelpré-diagnóstico:

• Organização do trabalho rígido;• Ritmo intenso de trabalho;• Insuficiência e falta de sistematização no uso de EPI;• Falta de equipamento para desempenho de funções;• Posturas penosas e fatigantes no trabalho;• Acúmulo de funções;• Trabalho isolado;• Índice elevado de acidentes;• Índice de transtornos mentais em 18,6% dos trabalhadores que

responderam à pesquisa.

Tais questões nos levaram a apresentar o seguinte pré-diagnóstico:

Aparentemente os riscos do tipo calor, umidade, manutenção emtransformadores contendo ascarel, choque elétrico, em parceria comritmo intenso, atenção permanente no processo, tensão, esforço físico,trabalho em altura e com exigência de posturas incômodas, estãofazendo com que os trabalhadores eletricistas desempenhem suasfunções em condições desconfortáveis e inseguras o que é bemprovável que explique os acidentes de trabalho e doenças que osacometem.

As recomendações que apresentamos a seguir têm por base otrabalho executado e se referenciam em estudos preexistentes.

• Aplicar o conteúdo técnico das NR`s 1, 10, 6 e 15;

• Aumentar efetivamente a força de trabalho;

• Elaboração de manual técnico e procedimentos para o trabalho comeletricidade e divulgação permanente entre os trabalhadores.

• Ênfase nas atividades de recrutamento, seleção, treinamento edesenvolvimento de pessoal.

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• Incentivo ao desenvolvimento de trabalho em equipe.

• Adoção sistemática por parte da empresa contratante de serviçosterceiros, de fiscalização das condições de cumprimento do contrato.

• Planejamento das tarefas com participação dos executores.

• Substituição das escadas (para trabalho em alturas) por veículos comsistema de elevação hidráulica .

• Adequação da área de vivência (vestiários, banheiros, e refeitórios)às normas de vigilância sanitária do Ministério da Saúde .

• Adoção de pausas devido às características de sobrecarga física dasatividades que são exercidas em condições de intempéries.

• Realização de análise ergonômica do trabalho nas funções deeletricista e ligação e linha viva.

• Em dias de céu claro a temperatura efetiva nos locais de trabalhooscila entre 35º e 40º C, o que pode tornar o trabalho fatigante.Tendo em vista a necessidade de realização de trabalho a céuaberto, torna-se necessário o estabelecimento de pausas em dias detemperatura como as citadas. Devido às peculiaridades da atividadeonde são utilizados e necessários EPI´s, ferramentas manuaispesadas além da necessidade de movimentos vigorosos e atençãopermanente no processo de trabalho, por analogia a Legislação deexposição a calor (NR-15, anexo 3), deverá ser adotada pausa de 15(quinze) minutos a cada hora trabalhada.

• Manter as áreas de vivência das empreiteiras (banheiro, refeitórios,vestiário) em condições de uso, de acordo com a NR 23 do MTb;

• Fornecimento de camisa de malha de manga comprida na corbranca, objetivando minimizar os efeitos dos raios de sol;

Essas condições citadas são as mínimas possíveis de seremelencadas para uma melhoria das condições de trabalho em vigor. Aadoção de medidas emergenciais na área com acordos e termos dereajuste de conduta são sugestões que esperamos que possam seradotadas pelo Ministério Público, para que novas condições de trabalho

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possam ser ofertadas para estes trabalhadores. Se isto for efetivado,cumprem os serviços públicos, o papel a que se destinam, deinterventores da qualidade de vida da sociedade, razão maior de suasexistências.

REFERÊNCIAS

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Borges – L.H – Uso do SRQ-20 – Self Reporting Questionnaire emestudos sobre a Saúde Mental do Trabalhadores – in Jornal Brasileirode Psiquiatria vol. 46 nº 9, 1997.

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Choque na prevenção – Revista Proteção – páginas 18 a 25 vol. 44 –maio de 1995.