percepção de dificuldade e comportamento locomotor de ... · da-silva mv, gobbi lt (2005)....

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Da-Silva MV, Gobbi LT (2005). Percepção de dificuldade e comportamento locomotor de idosos ao descer degraus de ônibus. Motricidade 1 (2): pp-pp. 96-105 RESUMO Paraanalisarqualitativamenteocomportamento locomotordeidososdescendodegrausdeônibuse relacioná-locomapercepçãodedificuldadepara realizaratarefa,66idosos(60-85anos),distribuídos emcincogruposetários,foramfilmadosemsituação realeentrevistados.Osidososconsideraramo descerdegrausdeônibusumatarefafácileaforma deexecuçãofoidiferentedopadrãoutilizadoem outrasescadas.Osidososempregaramestratégias mais conservadoras, posicionando os pés lateralmenteemrelaçãoaodegrau,utilizandoos membrossuperioresnoscorrimãoseunindoos passosacadadegrau.Assim,idososapresentam comportamentolocomotoradaptativodurantea descida de degraus de ônibus visando maior segurança,oquefavorecetantoarealizaçãocomo apercepçãodadificuldadedatarefa. Palavras-chave: envelhecimento, locomoção, transportes, percepção, acidentes por quedas. data de submissão: 07-02-2005 data de aceitação: 27-03-2005 ABSTRACT Perception of dificulty and locomotor behaviour of elderly descending bus steps. Inordertoanalyzequalitativelythelocomotor behaviorinelderlywhilesteppingdownonbusstair andtorelateitwithdifficultyperceptiontoperform thetask,66oldpeople(60-85year-old),distributed infiveagegroups,wereinterviewedandrecorded inarealsituation.Participantsconsideredstepping downonbusstairaneasytaskandtheyuseda differentpatterntowalkdownstairs.Oldpeople utilizedmoreconservativestrategies,lateralfoot placement on the step, handrail support, and steppingbothfeetinthesamestep.Weconclude thatoldpeopleshowadaptivelocomotorbehavior whilesteppingdownonbusstairseekingformore safetythatfavorsboththeperformanceandthe difficultyperceptionofthetask. Key words:aging,locomotion,transportation, perception,andaccidentalfalls. Percepção de dificuldade e comportamento locomotor de idosos ao descer degraus de ônibus. Da-Silva MV 1,2 ,Gobbi LT 1 . 1 Laboratório de Estudos da Postura e da Locomoção, Departamento de Educação Física – IB – UNESP/RC – Brasil, 2 Curso de Educação Física, Instituto Santanense de Ensino Superior – São Paulo – Brasil. INVESTIGAÇÃO

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Da-Silva MV, Gobbi LT (2005). Percepção dedificuldade e comportamento locomotor de idososao descer degraus de ônibus. Motricidade�1 (2):pp-pp. 96-105

RESUMO

Para�analisar�qualitativamente�o�comportamentolocomotor�de�idosos�descendo�degraus�de�ônibus�erelacioná-lo�com�a�percepção�de�dificuldade�pararealizar�a�tarefa,�66�idosos�(60-85�anos),�distribuídosem�cinco�grupos�etários,�foram�filmados�em�situaçãoreal� e� entrevistados.� Os� idosos� consideraram� odescer�degraus�de�ônibus�uma�tarefa�fácil�e�a�formade�execução�foi�diferente�do�padrão�utilizado�emoutras�escadas.�Os�idosos�empregaram�estratégiasmais� conservadoras,� posicionando� os� péslateralmente�em�relação�ao�degrau,�utilizando�osmembros�superiores�nos�corrimãos�e�unindo�ospassos�a�cada�degrau.�Assim,�idosos�apresentamcomportamento�locomotor�adaptativo�durante�adescida� de� degraus� de� ônibus� visando� maiorsegurança,�o�que�favorece�tanto�a�realização�comoa�percepção�da�dificuldade�da�tarefa.Palavras-chave: envelhecimento,� locomoção,transportes,� percepção,� acidentes� por� quedas.

data de submissão: 07-02-2005data de aceitação: 27-03-2005

ABSTRACT

Perception of dificulty and locomotor behaviourof elderly descending bus steps.In� order� to� analyze� qualitatively� the� locomotorbehavior�in�elderly�while�stepping�down�on�bus�stairand�to�relate�it�with�difficulty�perception�to�performthe�task,�66�old�people�(60-85�year-old),�distributedin�five�age�groups,�were�interviewed�and�recordedin�a�real�situation.�Participants�considered�steppingdown�on�bus�stair�an�easy�task�and�they�used�adifferent�pattern�to�walk�down�stairs.�Old�peopleutilized�more�conservative�strategies,�lateral�footplacement� on� the� step,� handrail� support,� andstepping�both�feet�in�the�same�step.�We�concludethat�old�people�show�adaptive�locomotor�behaviorwhile�stepping�down�on�bus�stair�seeking�for�moresafety�that�favors�both�the�performance�and�thedifficulty�perception�of�the�task.Key words:�aging,� locomotion,�transportation,perception,�and�accidental�falls.

Percepção de dificuldade ecomportamento locomotor de idososao descer degraus de ônibus.Da-Silva MV1,2,Gobbi LT1.1Laboratório de Estudos da Postura e da Locomoção, Departamento de Educação Física – IB– UNESP/RC – Brasil, 2Curso de Educação Física, Instituto Santanense de Ensino Superior– São Paulo – Brasil.

INVESTIGAÇÃO

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comportamento�locomotor�de�idosos�de�diferentesfaixas� etárias� durante� a� descida� de� ônibus� emsituação�real,�considerando�a�idade�e�a�prática�regularde�atividade�física�entre�outras�características�dosidosos�usuários�de�ônibus.�Para�isso,�idosos�foramobservados�e�filmados�durante�a�descida�de�degrausde� ônibus� e� as� estratégias� empregadas� foramanalisadas.�O�perfil�dos�idosos�que�utilizam�estemeio� de� transporte� também� foi� computado.

METODOLOGIA

Amostra

Este�estudo,�aprovado�pelo�Comitê�de�Ética�emPesquisa�do�IB/UNESP/RC�respeitando�as�normasinternacionais�de�experimentação�com�humanos(Declaração�de�Helsínquia�de�1975),�contou�com�aparticipação�de�80�passageiros�das�linhas�de�ônibusda�cidade�de�Rio�Claro/SP.Dos�80�indivíduos�filmados,�7�tinham�idade�inferiora�60�anos�e,�em�outros�7�participantes,�a�filmagemnão�permitiu�que�as�estratégias�comportamentaisfossem�observadas�(erros�na�coleta,�perda�deimagem�ou�obstruções).�Sendo�assim,�os�dados�de66�idosos�foram�utilizados�para�análise.�Essesparticipantes�foram�distribuídos�em�5�grupos�etárioscom�amplitude�de�5�anos�(Tabela�1).

Procedimentos

Os�participantes�foram�filmados�ao�descer�degrausde�ônibus,�com�uma�câmera�marca�Sony�modeloHandycam�CCD-TR413PK,�em�3�pontos�da�cidade.�Acâmera�registrou,�no�plano�frontal,�a�descida�dosdegraus�do�ônibus�até�o�contato�com�o�solo.�Devidoao�local�de�parada�do�veículo�ser�variável,�a�câmerafoi�segura�nas�mãos�do�experimentador.�Após�adescida�dos�degraus,�o�participante�foi�abordado,para�informá-lo�a�respeito�da�pesquisa�e�solicitarseu�consentimento�para�participação�no�estudo.Após�o�consentimento,�foram�realizadas�algumasquestões�referentes�a�data�de�nascimento,�práticade�atividade�física,�ocorrência�de�quedas�nos�últimos12� meses,� utilização� de� meios� de� transporte� epercepção�subjetiva�de�dificuldade�para�subir�edescer�degraus�de�ônibus.

INTRODUÇÃO

O�andar�constitui�uma�das�ações�mais�realizadas�pelosseres�humanos�ao�longo�de�todo�o�ciclo�vital�e�permiteao�homem�lidar�com�terrenos�dos�mais�diversos,�comopor�exemplo,�escadas�e�rampas.�Com�o�processo�deenvelhecimento�ocorre�uma�série�de�alterações�morfo-funcionais�que�afetam�a�locomoção,�com�destaquepara�a�diminuição�da�velocidade�do�andar,�o�aumentodo�tempo�de�reação�e�a�redução�da�acuidade�visual.Assim,�o�idoso�não�realiza�algumas�atividades�comoem� sua� juventude� e� pode� alterar� sua� forma� derelacionamento�com�o�ambiente,�tanto�dentro�decasa�como�na�comunidade.Idosos�costumam�relatar�dificuldades�em�realizaralgumas�tarefas�de�seu�cotidiano�como�sentar�elevantar,�e�subir�e�descer�escadas1.�A�locomoçãosobre�degraus�é�uma�das�cinco�tarefas�consideradasmais�difíceis�de�executar�por�indivíduos�acima�de60�anos7,13.�A�ocorrência�de�acidentes�em�escadasaumenta�com�a�idade�e,�quando�envolvem�idosos,normalmente� resultam� em� hospitalizações� emúltiplas�lesões11,12.Durante�a�locomoção�sobre�degraus,�os�acidentespodem�ocorrer�em�função�tanto�da�estrutura�daescada,� quanto� pelas� características� de� seususuários12,14.�A�locomoção�sobre�degraus�de�ônibusé�uma�situação�diferente�da�locomoção�em�escadasencontradas�em�ambientes�públicos�e�domésticos.Particularmente� nesta� tarefa,� o� indivíduo� sofreinfluência�do�deslocamento�do�ônibus�até�sua�paradatotal� para� efetuar� a� descida.� A� informação� daaceleração�linear�desse�movimento,�captada�pelosistema�vestibular,�é�utilizada�para�realizar�ajustesposturais.� Os� degraus� possuem� dimensõesdiferentes�de�acordo�com�o�modelo�do�ônibus,�alémde�alguns�possuírem�dimensões�variadas�de�umdegrau� para� o� outro,� em� virtude� das� portas� ecorrimãos.�A�distância�entre�o�último�degrau�e�osolo�é�outra�preocupação�para�os�idosos,�pois�nemsempre�a�parada�do�ônibus�ocorre�próxima�à�calçada.Se�um�ônibus�executar�a�parada�longe�da�calçada,por�exemplo,�o�indivíduo�deve�superar�uma�altura15�cm�(altura�padrão�da�calçada)�maior�do�que�se�oônibus�parar�próximo�ao�meio-fio.�Além�disso,�atarefa�de�descer�degraus�de�ônibus�possui�umalimitação� temporal.� A� descida� deve� ocorrerrapidamente�em�razão�tanto�do�fluxo�de�outraspessoas�para�executar�a�mesma�tarefa�como�dapartida�do�ônibus.Considerando� a� falta� de� pesquisas� envolvendoespecificamente�a�locomoção�em�degraus�de�ônibus,este�estudo,�de�caráter�exploratório,�teve�comoobjetivo� realizar� uma� análise� qualitativa� do

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RESULTADOS

A�Tabela�2�apresenta,�para�cada�grupo�etário,�ascaracterísticas�quanto�à�ocorrência�de�queda,�práticade�atividade�física,�transporte�preferencial�e�utilizaçãosemanal�do�ônibus.�Foram�considerados�ativos�aquelesidosos�que�praticavam�atividade�física�regular,�pelomenos�3�vezes�por�semana,�com�uma�hora�de�duraçãocada�sessão�e�por�um�tempo�mínimo�de�6�meses.�Aamostra� foi� composta� predominantemente� porindivíduos� sedentários� (78,8%),� sendo� que� o� G5apresentou�maior�incidência�de�idosos�ativos.�Dosidosos�entrevistados,�19,7%�declararam�ter�sofridopelo�menos�uma�queda�nos�últimos�12�meses.�Das�13quedas�registradas,�4�ocorreram�durante�o�uso�dotransporte�público.�Pode-se� inferir,�por�meio�daobservação�da�Tabela�2,�que�os�indivíduos�de�G3�e�G4relataram�mais�ocorrências�de�quedas�que�os�demaisgrupos.� Estes� grupos� também� apresentaramporcentagens�altas�de� indivíduos�sedentários.�Oônibus�é�o�meio�de�transporte�preferencial�para�62,2%dos� idosos�entrevistados,�seguido�de�andar�a�pé(28,8%),�bicicleta�(6,1%)�e�de�carro�(3%),�sendo�queo�ônibus�é�o�transporte�preferencial�em�todos�osgrupos,�com�exceção�do�G5�que�foi�superado�pelaopção�de�andar�a�pé.

Através� da� Tabela� 2,� pode-se� observar� que� otransporte�coletivo�é�muito�utilizado�pelos�idososde�qualquer�grupo.�No�geral,�83,3%�utilizam�o�ônibus

No�momento�da�descida�de�cada�participante,�foiregistrada�a�altura�entre�o�último�degrau�e�o�solo,por�meio�de�uma�trena,�com�precisão�de�milímetros.Este�dado�também�foi�registrado�na�ficha�de�coletajuntamente�com�a�identificação�do�ônibus�e�linha.Em� visita� posterior� à� garagem� de� ônibus� daempresa,�as�dimensões�de�todos�os�degraus�doônibus�foram�registradas.Após�a�filmagem,�as�informações�comportamentaisforam�obtidas�diretamente�por�meio�de�observaçãodo�conteúdo�das�fitas�em�velocidade�lenta.�Estasinformações�foram�codificadas�em�três�estratégiascomportamentais:�a)�posicionamento�dos�pés�nosdegraus:�pés�posicionados�de�frente,�lateralmenteou�de�costas�em�relação�ao�degrau;�b)�tipo�de�passo:pisar�com�um�pé�ou�ambos�os�pés�em�cada�degrau;e�c)�utilização�dos�membros�superiores:�uso�de�uma,ambas� as� mãos� ou� nenhuma� nos� corrimãos� eestruturas�próximas�(portas,�por�exemplo).�Doisobservadores�treinados�registraram�as�estratégiasempregadas�por�participante.�Em�caso�de�respostasdiscrepantes�entre�estes,�um�terceiro�observadorfoi�consultado.

Estatística

Foram�adotadas�como�variáveis�dependentes�asestratégias�comportamentais�(posicionamento�dospés,� tipo� de� passo� e� utilização� dos� membrossuperiores).�Os�dados�obtidos�nas�filmagens�e�noquestionário�foram�tratados�através�de�porcentagemde� ocorrência.� Foram� empregadas� Análises� deRegressão�Múltipla�(stepwise),�em�cada�variáveldependente,� para� verificar� as� relações� entre� asestratégias� comportamentais,� os� dados� doquestionário�e�a�altura�dos�degraus,�com�significânciapré-estabelecida�de�p<0,05.

Tabela 1. Caracterização dos grupos etários com número departicipantes (n), idades mínima e máxima dos participantesde cada grupo (amplitude), média de idade, desvio-padrão(dp) e gênero.

Tabela 2. Percentual (números absolutos) de indivíduos, porgrupo etário, para nível de actividade física, ocorrência dequedas nos últimos 12 meses, transporte preferencial eutilização semanal de ônibus.

INVESTIGAÇÃO

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Dos� idosos� filmados,� 53%� posicionaram� os� pélateralmente,�enquanto�que�47%�posicionaram�ospés� de� frente� durante� a� descida� dos� degraussuperiores.�Na�descida�do�último�degrau�em�direçãoao� solo,� 34,8%� realizaram� a� descida� de� frente,enquanto�que�63,6%�desceram�de�lado.�A�Figura�2apresenta�a�porcentagem�de�indivíduos�que�adotaramcada� estratégia� em� função� do� grupo� etário.

Observa-se�na�Figura�2A�que�durante�a�descida�dosdegraus�superiores�a�maioria�dos�participantes�deG2,� G4� e� G5� posicionou� os� pés� no� sentido� da

mais�de�1�vez�por�semana,�caracterizando�a�amostracomo�usuários�freqüentes�deste�meio�de�transporte.A�Tabela�3�apresenta�a�percepção�de�dificuldadepara�o�subir�e�descer�degraus�de�ônibus�por�grupoetário.�Os�idosos�não�consideram�difícil�a�tarefa�desubir� e� descer� degraus.� Para� subir,� 62,2%� dosparticipantes�consideraram�a�tarefa�fácil/muito�fácilde�ser�executada,�enquanto�que�57,5%�consideraramo�mesmo�para�o�descer.�Observa-se�na�Tabela�3�que,independentemente�do�grupo,�subir�e�descer�degrausé�uma�tarefa�considerada�fácil�pela�maioria�dosidosos.�Foram�poucos�os�participantes�que�em�seusrelatos�manifestaram�algum�tipo�de�dificuldade�emrelação�a�subir�e�descer�degraus�de�ônibus.�De�todosos� ônibus� utilizados� pelos� participantes� desteestudo,�a�altura�média�dos�degraus�foi�de�27,39�cm(variando�de�18�até�29�cm).�A�altura�média�entre�oúltimo�degrau�e�o�solo�foi�de�33,59�cm�(variandoentre�27,50�e�48,50�cm).Devido�à�grande�variação�encontrada�nasdimensões�dos�degraus�de�ônibus,�optou-se�poranalisar�o�emprego�das�estratégiascomportamentais�nos�degraus�superiores�e�noúltimo�degrau,�separadamente.

A�estratégia�de�posicionamento�dos�pés�identificaa�forma�de�colocação�dos�pés�sobre�os�degraus,�quepoderiam�ser�posicionados,�em�relação�ao�degrau:de�frente,� lateralmente�ou�de�costas.�Descer�osdegraus� posicionando� os� pés� no� sentido� daprogressão� constitui� o� padrão� de� movimentohabitualmente�utilizado.�Descer�de�lado�e�de�costassão�estratégias�adaptativas�empregadas�para�realizara� tarefa.� A� Figura� 1� ilustra� as� formas� deposicionamento�dos�pés�encontradas�neste�estudo.

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Tabela 3. Percepção de dificuldade na tarefa de subir e descerdegraus de ônibus em porcentagem (números absolutos)

Figura 1. Formas de posicionamento dos pés: A) participanteposicionando os pés de frente para o sentido da progressão;B) participante posicionando os pés lateralmente ao degraue C) participante executando a descida de costas.

Comportamento locomotor de idosos descendo degraus.Da-Silva MV, Gobbi LT.

Figura 2. Posicionamento dos pés durante a descida em funçãodo grupo etário: A) nos degraus superiores e B) no últimodegrau.

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Dos� idosos� observados� durante� a� descida� dosdegraus�superiores�e�do�último�degrau,�75%�e�84,8%,respectivamente,�utilizaram�a�estratégia�adaptativade�pisar�com�ambos�os�pés�em�cada�degrau.�A�Figura4� apresenta� a� porcentagem� de� indivíduos� queutilizaram� os� tipos� de� passo� por� grupo� etário.

Observa-se� pelos� gráficos� da� Figura� 4� que,independentemente�do�degrau�da�escada�(superiorou�último�degrau)�e�do�grupo�etário,�predominou�oemprego�da�estratégia�adaptativa�de�unir�os�pés�nodegrau.�Interessante�notar�visualmente�que,�durantea� descida� do� último� degrau� (Figura� 4B),� aporcentagem� de� indivíduos� que� empregaram� aestratégia�de�unir�os�pés�no�degrau�aumentou�emcomparação�a�descida�dos�degraus�superiores�(Figura4A).A�Análise�de�Regressão�Múltipla�(stepwise)�verificouas�variáveis�preditoras�do�tipo�de�passo�durante�adescida�dos�degraus�superiores�e�do�último�degrau,que�estão�apresentadas�na�Tabela�5.

progressão.�Entretanto,�durante�a�descida�do�últimodegrau�(Figura�2B),�em�todos�os�grupos,�a�maioriados� indivíduos� deixou� de� utilizar� o� padrão� deposicionamento�dos�pés,�adotando�a�estratégia�deposicionar�os�pés�lateralmente�ao�degrau.�Apenasum�participante�de�G5�efetuou�a�descida�de�costas,posicionando�os�pés�com�os�calcanhares�voltadospara�frente.A�Análise�de�Regressão�Múltipla�(stepwise),�realizadapara�verificar�as�relações�entre�as�respostas�doquestionário,�as�estratégias�empregadas�e�a�idadeno�posicionamento�dos�pés�(Tabela�4),�identificouque�as�variáveis�tipo�de�passo�e�grupo�de�idadeexplicam� 23,6%� do� emprego� de� estratégias� deposicionamento� dos� pés� durante� a� descida� dosdegraus�superiores.�A�mudança�do�tipo�de�passo,de�alternado�para�o�de�pisar�com�ambos�os�pés�emcada�degrau,�favoreceu�o�emprego�da�estratégia�deposicionar�os�pés�lateralmente�ao�degrau,�enquantoque�indivíduos�mais�velhos�tenderam�a�utilizar�maiso�posicionamento�dos�pés�de�frente�para�o�degrau.

Durante�a�descida�do�último�degrau,�o�tipo�de�passoe� a� dificuldade� para� descer� degraus� de� ônibusexplicam�34,8%�do�posicionamento�dos�pés,�daseguinte�forma:�o�emprego�da�estratégia�adaptativa(posicionamento�dos�pés�de�frente�ou�de�costas)acontece�juntamente�com�o�emprego�da�estratégiade�passo�unido�combinada,�quando�a�percepção�dedificuldade�para�descer�é�maior.O�tipo�de�passo�normalmente�adotado�durante�adescida�de�degraus�é�o�de�passadas�alternadas,pisando�com�apenas�um�dos�pés�em�cada�degrau.Portanto,�descer�unindo�os�pés�a�cada�degrau�é�umaestratégia�adaptativa�para�realizar�esta�tarefa,comumente�utilizada�por�idosos11.�A�Figura�3�ilustraa�descida�de�dois�participantes:�um�executando�opadrão�alternado�e�outro�adotando�a�estratégiaadaptativa�de�pisar�com�ambos�os�pés�em�cada�degrau.

Tabela 4. Variáveis que explicam o emprego das estratégiasde posicionamento dos pés durante a descida dos degraussuperiores e do último degrau.

Figura 3. Tipo de passo: A) descida com passadas alternadas,cada degrau é tocado com apenas um dos pés; B) os pés sãounidos em cada degrau antes da descida para o degrau seguinte.

Figura 4. Porcentagem de indivíduos que utilizou cada tipo depasso por grupo etário durante a descida dos degraussuperiores (A) e durante a descida do último degrau (B).

INVESTIGAÇÃO

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Durante�a�descida�dos�degraus�superiores�e�do�últimodegrau,�a�maioria�dos�idosos�utilizou�uma�ou�ambasas�mãos�(respectivamente,�53%�e�42,5%;�53%�e40,9%)�A�Figura�6�apresenta�a�porcentagem�deindivíduos�que�utilizaram�os�membros�superiorespor�grupo�etário.

Pode-se�inferir�a�partir�da�Figura�6�que,�independentedo�grupo�etário�e�do�momento�de�descida�(degraussuperiores�ou�último�degrau),�a�utilização�de�um�ouambos�os�membros�superiores�foi�predominante�namaioria�dos�idosos.�Entretanto,�durante�a�descidado�último�degrau,�esta�utilização�foi� levemente

O� posicionamento� dos� pés� e� a� utilização� dosmembros�superiores�explicam�20,7%�da�variabilidadedo�tipo�de�passo�adotado�durante�a�descida�dosdegraus� superiores.� As� duas� variáveis� têm� umrelacionamento�positivo�com�o�tipo�de�passo,�ouseja,�a�adoção�de�estratégias�mais�conservadorascomo�a�utilização�de�corrimão�e�o�posicionamentodos�pés�lateralmente�ao�degrau�levam�ao�empregoda�estratégia�adaptativa�do�tipo�de�passo,�que�é�ode� pisar� com� ambos� os� pés� em� cada� degrau.Durante� a� descida� do� último� degrau,� oposicionamento� dos� pés� explica� 22,3%� davariabilidade�do�tipo�de�passo�empregada.�Da�mesmaforma�que�durante�a�descida�dos�degraus�superiores,a�adoção�de�uma�estratégia�adaptativa�conservadorade�posicionamento�dos�pés�também�leva�à�estratégiade�unir�os�pés�a�cada�passada.A�realização�da�tarefa�de�descer�degraus�de�ônibuspode�ser�auxiliada�através�da�utilização�dos�membrossuperiores�nos�corrimãos�e�estruturas�próximas.�Oindivíduo�pode�escolher�utilizar�uma,�ambas�ounenhuma�das�mãos.�A�Figura�5�ilustra�as�formas�deutilização�dos�membros�superiores�durante�a�descidados�degraus�de�ônibus.

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Tabela 5. Variáveis que explicam a variabilidade no tipo depasso empregado durante a descida dos degraus superiorese do último degrau.

Figura 5. Estratégias de utilização dos membros superiores: A)participante descendo os degraus do ônibus sem auxílio dosmembros superiores; B) participante utilizando apenas uma dasmãos para realizar a tarefa; C) participante utilizando ambas asmãos para descer os degraus do ônibus.

Figura 6. Porcentagem de utilização dos membros superiorespor grupo etário durante a descida dos degraus superiores(A) e durante a descida do último degrau (B).

Comportamento locomotor de idosos descendo degraus.Da-Silva MV, Gobbi LT.

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física�(transporte�de�objetos),�características�doterreno� (presença� de� escadas,� elevadores,obstáculos)�e�transições�posturais�(mudanças�naposição� do� corpo� durante� a� locomoção).� Estasdimensões�só�conseguiram�ser�identificadas�com�aobservação� de� idosos� em� ambiente� real.Considerando�que�o�objetivo�deste�estudo�foi�realizaruma� análise� qualitativa� do� comportamentolocomotor�de�idosos�durante�o�descer�degraus�deônibus,� os� resultados� encontrados� permitemlevantar�algumas�considerações�a�respeito�da�tarefade� descer� degraus� de� ônibus,� a� percepção� dedificuldade�de�idosos�realizando�esta�tarefa�e�asestratégias�comportamentais�por�eles�adotadas.Características�da�escada�de�ônibus:�Verificou-seque� o� idoso� se� depara� com� um� ambienteextremamente�variável�durante�a�locomoção�sobredegraus�de�ônibus.�Isso�é�observado�nas�diferençasencontradas� nas� dimensões� dos� degraus� e� nadisposição�de�corrimãos.�Ainda�existem�fatoresadicionais�como�a�distância�do�ônibus�da�calçada,visto�que�o�veículo�pára�em�vários�pontos�da�cidade,com�características�diferentes.As�alturas�observadas�nos�degraus�mostram�doisproblemas,�também�levantados�por�Roy8:�os�degrausde� uma� mesma� escada� são� diferentes(principalmente�quando�se�compara�o�último�degraucom�os�demais)�e�as�alturas�dos�degraus�registradassão�bem�maiores�do�que�os�níveis�consideradosseguros.�A�variação�nas�condições�ambientais�exigedo� indivíduo� adaptação� às� suas� demandas.A�presença�de�características�físicas�no�ambiente,que� podem� transmitir� algum� risco� à� locomoção(dentre�elas�a�presença�de�escadas),�levam�idosos�aevitar�tais�ambientes,�particularmente�quando�sãoportadores� de� incapacidades� de� mobilidade.Conseqüentemente,�isso�causa�uma�restrição�norepertório�motor�de�um�indivíduo,�favorecendo�adeterioração�da�condição�física�e�dificultando�ainteração�social10.A�percepção�de�dificuldade�de�idosos:�Apesar�datarefa�de�descer�degraus�de�ônibus�ocorrer�em�umambiente� complexo,� os� idosos� não� deixam� deexecutá-la,�o�que�é�notado�pela�grande�utilizaçãodeste�meio�de�transporte.�Os�idosos�participantesdeste�estudo�declararam�considerar�a�tarefa�dedescer�degraus�de�ônibus�fácil�de�se�executar,�o�quenão�corrobora�com�o�que�vem�sendo�relatado�naliteratura1,4,7,13.A� dificuldade� auto-relatada� para� realização� deatividades�da�vida�diária�pode�ser�utilizada�paraidentificar� indivíduos� com� incapacidades5.Entretanto,�Grimby�et�al.4,�avaliando� indivíduosvítimas�de�fraturas,�encontraram�a�dificuldade�auto-

menor,�o�que�pode�ser�decorrente�de�muitos�ônibusnão� possuírem� corrimãos� no� último� degrau,restringindo�este�comportamento.�Outro�fator�quepoderia�comprometer�a�utilização�dos�membrossuperiores� seria� o� transporte� de� algum� tipo� deobjeto.� Dos� participantes� deste� estudo,� 42,2%transportavam�algum�tipo�de�carga�(bolsas,�carteiras,sacolas,�guarda-chuva)�em�suas�mãos.�A�Análise�deRegressão� Múltipla� (stepwise)� executada� paraverificar� as� relações� entre� as� respostas� doquestionário,�estratégias�empregadas�e�idade�nautilização� dos� membros� superiores� confirma� ainfluência� do� transporte� de� objetos� (Tabela� 6).

Como�mostrado�na�Tabela�6,�o�transporte�de�objetose� o� gênero� predizem� 27,3%� da� utilização� dosmembros�superiores�durante�a�descida�dos�degraussuperiores.�Além�disso,�mulheres�também�utilizammais�estratégias�de�utilização�de�membros�superioresdo�que�homens.�Durante�a�descida�do�último�degrau,o�transporte�de�objetos,�o�tipo�de�passo�e�a�alturado�último�degrau�até�o�solo�explicam�25,4%�dautilização�dos�membros�superiores.�Não�transportarobjetos,�adotar�a�estratégia�adaptativa�de�passounido�e�em�situações�onde�a�altura�entre�o�degraue�o�solo�é�maior,�implicam�no�contato�dos�membrossuperiores� nos� corrimão� e� portas� do� ônibus.

DISCUSSÃO

A�observação�de�uma�tarefa�realizada�em�ambientereal�permite�identificar�características�que,�muitasvezes,�não�são�passíveis�de�serem�reproduzidas�emlaboratório.�Shumway-Cook�et�al.9,�por�exemplo,conseguiram�identificar�que�algumas�dimensões�sãodeterminantes�para�a�mobilidade�na�comunidadecomo:�fatores�temporais�(velocidade�de�andar),�carga

INVESTIGAÇÃO

Tabela 6. Variáveis que explicam a utilização dos membrossuperiores durante a descida dos degraus superiores e doúltimo degrau.

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da�tarefa�real�têm�efeitos�mais�positivos�do�que�aatividade�física�generalizada.Quando�se�compara�a�percepção�de�dificuldade�comas�estratégias�empregadas,�percebe-se�que,�apesarde�considerar�a�tarefa�fácil,�os�idosos�utilizaramestratégias�mais�conservadoras�para�descer�o�lancede�degraus.�Talvez,�se�os�idosos�utilizassem�o�padrãolocomotor�normalmente�utilizado�por�adultos�jovens,a�tarefa�se�tornaria�mais�difícil.�Assim,�seria�possívelconsiderar�que�o�emprego�de�estratégias�adaptativasdiminuísse�a�percepção�de�dificuldade,�o�que�explicaos�resultados�obtidos�neste�estudo.Williamson�e�Fried13�observaram�uma�diferença�naresposta�de� idosos�com�relação�à�percepção�dedificuldade�em�realizar�atividades�da�vida�diária:�osidosos�atribuíram�a�dificuldade�ou�incapacidade�emrealizar� determinada� tarefa� pela� presença� depatologias,� enquanto� mudanças� na� maneira� derealizar�a�tarefa�foram�relacionadas�com�alteraçõesdecorrentes�do�envelhecimento.�Além�disso,�idososcostumam�perceber�a�dificuldade�em�realizar�tarefasde�mobilidade�quando�estes�mudam�a�forma�derealizá-las�ou�executam-nas�mais�lentamente3.�Nestesentido,� os� participantes� do� presente� estudopoderiam� não� ter� observado� suas� mudançascomportamentais�para�realizar�a�tarefa,�atribuindoa� facilidade� em� descer� degraus� de� ônibus� pelacapacidade�de�realizá-la�independentemente,�coma�adoção�de�estratégias�adaptativas.As�estratégias�comportamentais:�A�locomoção�sobredegraus�é�considerada�como�uma�das�tarefas�maisdifíceis�de�se�realizar�na�vida�diária�em�função�dasa l t e r a ç õ e s � p o s t u r a i s � d e c o r r e n t e s � d oenvelhecimento13.Através�das�Análises�de�Regressão�verificou-se�quehá� um� relacionamento� íntimo� entre� essasestratégias,�podendo-se�dizer�até�que�se�trata�deuma�estratégia�conjunta�mais�conservadora.�Estaestratégia�conjunta�conservadora�pode�ser�descritapelo� posicionamento� dos� pés� lateralmente� nodegrau,�utilização�dos�membros�superiores�e�uniãodos�passos�a�cada�degrau.A�adoção�das�estratégias�de�descer�de�lado�ou�decostas�pode�transmitir�maior�segurança,�pois,�casouma�queda�ocorra,�a�região�anterior�do�corpo�estariaprotegida.� Além� disso,� descer� de� costas� pareceprovocar�uma�menor�oscilação�do�corpo�à�frente,�oque�favorece�a�manutenção�da�projeção�do�centrode�massa�dentro�da�base�de�suporte.�A�posiçãolateral�ao�sentido�da�descida�também�provoca�umaposição�protetora�da�parte�anterior�do�corpo�nocaso�de�uma�queda�ou�perda�súbita�de�equilíbrio.Outra�alternativa�pode�estar� relacionada�com�autilização�mais�eficiente�do�corrimão�como�fonte

relatada� em� níveis� mais� altos� do� que� o� grau� dedependência�real�dos�pacientes�para�utilização�dotransporte�público.�A�superestimação�da�dificuldade,neste�caso,�pode�ter�sido�devida�à�condição�físicados�participantes,�que�após�dois�dias�da�fratura,apresentam�maior�percepção�de�dificuldade,�o�quefoi� explicado� pela� finalidade� de� manter� maiormargem�de�segurança�para�realizar�tarefas.�Já�paraidosos,�Langlois�et�al.5�evidenciaram�a�tendência�doaumento� da� percepção� de� dificuldade� com� oaumento�da�idade,�principalmente�em�mulheres.�Osresultados�obtidos�no�presente�estudo�mostrarampercepções�de�dificuldades�semelhantes�para�todosos� grupos� de� idade,� o� que� gera� o� seguintequestionamento:�por�que�os�indivíduos�mais�velhosnão�teriam�relatado�maior�dificuldade?�Uma�possívelrazão�talvez�seja�a�alta�incidência�de�utilização�doônibus�e�do�andar�conforme�o�relato�dos�indivíduos.Ao�lidar�com�estes�ambientes,�os�idosos�desenvolvemcomportamentos�adaptativos,�o�que�permite�menorpercepção�de�dificuldade.Entrevistando�idosos,�Andreotti�e�Okuma1�encontrarama�tarefa�de�subir�e�descer�degraus�de�ônibus�como�amais�difícil�de�se�executar�entre�uma�série�de�atividadesda�vida�diária.�Entretanto,�os�autores�não�apresentamdados�sobre�a�incidência�de�utilização�de�ônibus�pelosparticipantes.� Além� disso,� o� estudo� envolveuparticipantes�residentes�em�uma�metrópole,�onde�otráfego�de�veículos�possui�características�diferenciadas,como�maior�fluxo�de�carros�e�ruas�irregulares,�quelimitam�a�parada�do�ônibus�por�períodos�mais�longose�em�locais�apropriados.�Diante�destas�considerações,é� possível� que� estes� idosos� não� sejam� usuáriosfreqüentes�de�ônibus�e,�ao�serem�questionados�sobrea�dificuldade�em�realizar�esta�tarefa,�poderiam�tersuperestimado�a�dificuldade,�em�função�de�como�elesavaliaram�as�condições�em�que�a�tarefa�é�realizada.Por�outro�lado,�o�estudo�também�não�especifica�opadrão� locomotor� a� ser� empregado� ao� utilizar� otransporte� público,� sendo� que� os� participantespoderiam�até�ter�pensado�em�realizar�a�tarefa�sem�ouso�de�estratégias�comportamentais�(passo�unido,utilizando�o�corrimão,�etc).�É�interessante�observartambém�que�o�estudo�de�Andreotti�e�Okuma1�foicomposto�por�idosos�ativos,�enquanto�que,�na�amostrado�presente�estudo,�prevaleceram�idosos�sedentáriose�com�grande�freqüência�de�utilização�de�transportespúblicos.� Isso� pode� suscitar� o� seguintequestionamento:�seria�a�prática�de�uma�atividade�davida�diária�capaz�de�treinar�os�indivíduos�adaptando-os�melhor�a�essas�circunstâncias?�Se�este�for�o�caso,pode-se� especular� que,� para� a� percepção� dedificuldade,�a�realização�específica�da�locomoção�emescadas�de�dimensões�elevadas�e�a�prática�extensiva

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CORRESPONDÊNCIA:

Lilian�Teresa�Bucken�GobbiAv.�24-A,�nº�1515�–�Bela�Vista13.506-700�–�Rio�Claro�–�São�Paulo�–�BrasilTelefone/Fax:�+�55�19�3526-4321e-mail:�[email protected]

de�suporte,�principalmente�em�modelos�de�ônibusque� não� oferecem� corrimão� dos� dois� lados� dosdegraus.� Em� contrapartida,� ao� utilizar� estasestratégias�adaptativas,�a�captação�das�informaçõesvisuais�é�prejudicada�pelo�campo�visual�mais�restritono�sentido�da�progressão.A� adoção� de� estratégias� conservadoras� estevepresente� na� maioria� dos� idosos.� Mudar� a� açãoalternada�dos�membros�inferiores�para�o�de�unir�ospés�a�cada�degrau�já�foi�observado�por�Startzell�etal.11.� A� utilização� dos� membros� superiores,dependendo�da�força�aplicada,�pode�servir�de�apoiom e c â n i c o � e / o u � fo n t e � d e � i n fo r m a ç ã osomatossensorial,�como�a�superfície�de�contatofuncional�utilizada�por�Barela�et�al.2�ao�estudar�odesenvolvimento�do�controle�postural.�Seu�uso�comofonte�de�suporte�adicional,�pode�atenuar�a�cargados�membros�inferiores,�que�apresentam�menorforça� e� massa� muscular� em� virtude� doenvelhecimento6.�O�medo�de�quedas�também�podefavorecer�o�uso�dos�corrimãos.�A�estratégia�deposicionar�os�pés�lateralmente�ao�degrau�pode�levara�alterações�nos�ângulos�articulares�dos�membrosinferiores,� facilitando� a� descida.� Também� foiobservado�que�o�transporte�de�objetos�nas�mãosinfluencia�a�utilização�de�seus�membros�superioresdurante� a� realização� da� tarefa,� podendocomprometer� uma� fonte� de� suporte� adicional.Os�resultados�deste�estudo�permitem�concluir�que:a�escada�existente�nos�ônibus�possui�característicasque�são�fatores�de�risco�para�a�ocorrência�de�quedas;os� idosos� usuários� de� transporte� público� sãomajoritariamente�indivíduos�com�baixos�níveis�deatividade�física;�idosos�utilizam�mais�estratégiascomportamentais�(posicionamento�lateral�dos�pésem�relação�ao�degrau,�passo�unido�e�utilização�doscorrimãos),�principalmente�quando�a�altura�entre�odegrau� e� o� solo� aumenta.� A� utilização� destasestratégias�faz�com�que�a�percepção�de�dificuldadeem�realizar�a�tarefa�diminua.

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