pedro a.h. paixão - museu do dinheiro · moedas, medalhas, camafeus. da loucura do capitão ahab...

84
Sic transit gloria mundi Pedro A.H. Paixão

Upload: others

Post on 17-Oct-2020

1 views

Category:

Documents


0 download

TRANSCRIPT

Page 1: Pedro A.H. Paixão - Museu do Dinheiro · moedas, medalhas, camafeus. Da loucura do Capitão Ahab de Melville, que convence a tripulação a deixar a pesca por um dobrão, para se

Sic transit gloria mundiPedro A.H. Paixão

Page 2: Pedro A.H. Paixão - Museu do Dinheiro · moedas, medalhas, camafeus. Da loucura do Capitão Ahab de Melville, que convence a tripulação a deixar a pesca por um dobrão, para se
Page 3: Pedro A.H. Paixão - Museu do Dinheiro · moedas, medalhas, camafeus. Da loucura do Capitão Ahab de Melville, que convence a tripulação a deixar a pesca por um dobrão, para se

3 2016

As efígies, representadas em desenhos de moedas, compõem parte de um amp-lo ciclo gráfico de trabalhos a encarnado que Pedro A.H. Paixão desenvolve des-de 2007. Retratos de um passado para além da história, do reconhecimento ou da figuração, grotescos, fantasmáticos, expõem o passar de vozes deste mun-do, anónimas mas gloriosas. Figuras sem nome e sem reino que subvertem a ordem e o poder ao serem inscritas em moedas, medalhas, camafeus.

Da loucura do Capitão Ahab de Melville, que convence a tripulação a deixar a pesca por um dobrão, para se dedicar à procura suicida de Moby Dick, ao recon-hecimento da tradição das hobo nickel, propõe-se aqui uma ideia de dinheiro que pensa a sua estrutura narrativa e representativa e investe numa parábo-la – receber, transformar, dar – em si, também, a parábola da tarefa artística.

Nestes desenhos não se “cunham” so-beranos, divindades ou talismãs. Dá-se luz e voz a figuras cruciais que eviden-ciam o valor de troca ou de partilha hu-mano.

Museu do Dinheiro | Money Museum Plano Tangente 2016

These effigies, represented on drawings of coins, are part of a vast drawing work, using the color red, that Pedro A.H. Paixão has been developing since 2007. Ghostly and grotesque, these are portraits of a past beyond history, figuration, or recog-nition. Portraits that reveal the coming and going of voices of this world, anon-ymous and glorious. Without name or kingdom, these figures subvert order and power when they are inscribed on coins and medals.

From Ahab’s folly, who, with the aid of a gold doubloon convinces his crew to commit themselves to the suicidal hunt of Moby Dick, to the recognition of the hobo nickel tradition, the artist proposes a notion of money that considers its nar-rative and representational structure and invests in a parable – to receive, to trans-form, to give – that is, in itself, also the parable of the artistic practice.

In these drawings we do not “coin” sover-eigns, divinities or talismans, we give light and voice to essential figures that em-phasize the value of partaking or human sharing.

Sic transit gloria mundi Pedro A.H. Paixão

Ensaio – Paulo Pires do Vale

Sic transit gloria mundi Pedro A.H. Paixão

Essay – Paulo Pires do Vale

Page 4: Pedro A.H. Paixão - Museu do Dinheiro · moedas, medalhas, camafeus. Da loucura do Capitão Ahab de Melville, que convence a tripulação a deixar a pesca por um dobrão, para se
Page 5: Pedro A.H. Paixão - Museu do Dinheiro · moedas, medalhas, camafeus. Da loucura do Capitão Ahab de Melville, que convence a tripulação a deixar a pesca por um dobrão, para se
Page 6: Pedro A.H. Paixão - Museu do Dinheiro · moedas, medalhas, camafeus. Da loucura do Capitão Ahab de Melville, que convence a tripulação a deixar a pesca por um dobrão, para se
Page 7: Pedro A.H. Paixão - Museu do Dinheiro · moedas, medalhas, camafeus. Da loucura do Capitão Ahab de Melville, que convence a tripulação a deixar a pesca por um dobrão, para se
Page 8: Pedro A.H. Paixão - Museu do Dinheiro · moedas, medalhas, camafeus. Da loucura do Capitão Ahab de Melville, que convence a tripulação a deixar a pesca por um dobrão, para se
Page 9: Pedro A.H. Paixão - Museu do Dinheiro · moedas, medalhas, camafeus. Da loucura do Capitão Ahab de Melville, que convence a tripulação a deixar a pesca por um dobrão, para se
Page 10: Pedro A.H. Paixão - Museu do Dinheiro · moedas, medalhas, camafeus. Da loucura do Capitão Ahab de Melville, que convence a tripulação a deixar a pesca por um dobrão, para se

10 Sic transit gloria mundi – Pedro A. H. Paixão

Nesse dia olhei para as mãos como nunca as vira antes. Eram especiais, como são todas as mãos. Apercebi-me o quanto atravessadas por exigências estavam, quão longe, densas, muito para além de um simples «eu». Apercebi-me da precariedade desta coisa que somos e sob a qual estão, sob um nome apenas, sinal ínfimo num mar de intensidades que passam, se cruzam, trespassam, vêm sabe-se lá de onde. Do fundo nada é nosso ou de ninguém.

Vi-me passagem feito mãos, modos de viragem, apertos, toques, gestos, sopros, as margens de um rio imaterial. Nesse dia, na miséria, estava em corpo e em seu peso, massa inerme que barrava, filtrava, agarrava o fluxo eterno. Nesse dia, do fun-do mais fundo dos fundos – que nem ne-gro era, nem escuro ou índigo azul – foi possível dizer «chega»; escarlate era.Vi-me percorrido por infernos e céus serenos, por catástrofes e o bem estar. Foi um dia novo, era o primeiro e o último.

On that day I saw my hands as I had never seen them before. They were special, as all hands are. I realized how many exigencies criss-crossed them, how far and dense they were, much more than a simple “I”. I saw the precariousness of this thing we are and of which they lie beneath, under a name – just a name – a tiny sign in a sea of passing, intersecting and transverse intensities. Coming from where, nobody knows. Of the deep, we own nothing and nothing is owned.

I saw myself as a way of hands, turns, handshakes, touches, gestures and blows, the banks of an immaterial river. On that day, miserable, I was a body and its weight, a helpless mass blocking, sifting, and grasping the eternal flux. On that day, from the deepest of the deep – which was not even black, or dark, or blue indigo – it was possible to say “enough”: scarlet it was. I saw hells and serene skies passing through me, devastation and comfort. It was a new day, the first and the last.

MDCCCLI2016

3,3 x 3,3 cmMoedas gravadas, cobre | Carved coins, copper

Colecção do artista | Artist collection

Page 11: Pedro A.H. Paixão - Museu do Dinheiro · moedas, medalhas, camafeus. Da loucura do Capitão Ahab de Melville, que convence a tripulação a deixar a pesca por um dobrão, para se

11 2016

Page 12: Pedro A.H. Paixão - Museu do Dinheiro · moedas, medalhas, camafeus. Da loucura do Capitão Ahab de Melville, que convence a tripulação a deixar a pesca por um dobrão, para se

12 Sic transit gloria mundi – Pedro A. H. Paixão

Heads or Tails2016

Video 16:9, 9-Inch color monitor, stereo8’39” loop

Colecção do artista | Artist collection

A guerra tirou-nos a casa e fomos sabe-se lá para onde. De casa em casa vivi, com ajudas do mal e do bem. O ser especial assim.

Estranhei o gesto de pedir, de ir pedindo. O que pedia? Que pedinte era? Ia pedindo, ia dando.

O sangue vinha de longe. Sabe-se lá de onde vem, passa e trespassa. Transporta. Tenhamos por favor cuidado – há que o deixar passar, sem medo – no dar lugar a outras mãos.

Cada desenhar transporta um dom, trans-porta o tempo das mãos que nele se de-morou. Há que cuidar deles e delas.

War robed us of our home and we went toplaces unknown. I lived hoping from hometo home, with the help of evil and good. To be special like that.

Begging, begging my way, there was a strangeness to that. What was I begging? What kind of beggar was I? I begged along, I gave along.

Blood came from afar. Who knows from where it comes, where it passes and in-trudes. From crimson to dense scarlet red.Please let’s be careful – one must let it pass, without fear – as we give place to other hands.

Each drawing practice, the action, carries agift within, carries the time of the hands that lingered in it. We must care for one and the other.

Page 13: Pedro A.H. Paixão - Museu do Dinheiro · moedas, medalhas, camafeus. Da loucura do Capitão Ahab de Melville, que convence a tripulação a deixar a pesca por um dobrão, para se

13 2016

Page 14: Pedro A.H. Paixão - Museu do Dinheiro · moedas, medalhas, camafeus. Da loucura do Capitão Ahab de Melville, que convence a tripulação a deixar a pesca por um dobrão, para se

14 Sic transit gloria mundi – Pedro A. H. Paixão

The Gift2016

21 x 26,1 cmLápis de cor sobre papel | Colored pencil on paper

Colecção do artista | Artist collection

Page 15: Pedro A.H. Paixão - Museu do Dinheiro · moedas, medalhas, camafeus. Da loucura do Capitão Ahab de Melville, que convence a tripulação a deixar a pesca por um dobrão, para se

15 2016

Page 16: Pedro A.H. Paixão - Museu do Dinheiro · moedas, medalhas, camafeus. Da loucura do Capitão Ahab de Melville, que convence a tripulação a deixar a pesca por um dobrão, para se

16 Sic transit gloria mundi – Pedro A. H. Paixão

O espaço encarnado abriu. E eles regres-saram como pedintes, não todos. Eram demasiados e poucos, eram o que eram.

O que tinham para nos dizer? Davam-nos incondicionalmente, sem recorrer às da-tas nem aos nomes. Inquietavam, abriam, espaçavam, sensibilizavam, dissolviam.

The red space opened. And they came back as beggars, but not all. They were too many and just a few, they were what they were.

What had they to say? They gave uncon-ditionally, without using dates, titles or names. They unsettled, they opened, cre-ated space, they sensitized, they dissolved.

Page 17: Pedro A.H. Paixão - Museu do Dinheiro · moedas, medalhas, camafeus. Da loucura do Capitão Ahab de Melville, que convence a tripulação a deixar a pesca por um dobrão, para se

17 2016

Page 18: Pedro A.H. Paixão - Museu do Dinheiro · moedas, medalhas, camafeus. Da loucura do Capitão Ahab de Melville, que convence a tripulação a deixar a pesca por um dobrão, para se

18 Sic transit gloria mundi – Pedro A. H. Paixão

Nomisma 12011-14

14,8 x 21 cmLápis de cor sobre papel | Colored pencil on paper

Colecção Figueiredo Ribeiro | Figueiredo Ribeiro Collection Ambos os lados cortados | Both sides cropped

Page 19: Pedro A.H. Paixão - Museu do Dinheiro · moedas, medalhas, camafeus. Da loucura do Capitão Ahab de Melville, que convence a tripulação a deixar a pesca por um dobrão, para se

19 2016

Page 20: Pedro A.H. Paixão - Museu do Dinheiro · moedas, medalhas, camafeus. Da loucura do Capitão Ahab de Melville, que convence a tripulação a deixar a pesca por um dobrão, para se

20 Sic transit gloria mundi – Pedro A. H. Paixão

Nomisma 22011

10,4 x 14,3 cmLápis de cor sobre papel | Colored pencil on paper

Colecção Figueiredo Ribeiro | Figueiredo Ribeiro Collection

Page 21: Pedro A.H. Paixão - Museu do Dinheiro · moedas, medalhas, camafeus. Da loucura do Capitão Ahab de Melville, que convence a tripulação a deixar a pesca por um dobrão, para se

21 2016

Page 22: Pedro A.H. Paixão - Museu do Dinheiro · moedas, medalhas, camafeus. Da loucura do Capitão Ahab de Melville, que convence a tripulação a deixar a pesca por um dobrão, para se

22 Sic transit gloria mundi – Pedro A. H. Paixão

Nomisma 32011

10,4 x 14,8 cm Lápis de cor sobre papel | Colored pencil on paper

Colecção Figueiredo Ribeiro | Figueiredo Ribeiro Collection

Page 23: Pedro A.H. Paixão - Museu do Dinheiro · moedas, medalhas, camafeus. Da loucura do Capitão Ahab de Melville, que convence a tripulação a deixar a pesca por um dobrão, para se

23 2016

Page 24: Pedro A.H. Paixão - Museu do Dinheiro · moedas, medalhas, camafeus. Da loucura do Capitão Ahab de Melville, que convence a tripulação a deixar a pesca por um dobrão, para se

24 Sic transit gloria mundi – Pedro A. H. Paixão

Nomisma 42011

10,4 x 14,3 cm Lápis de cor sobre papel | Colored pencil on paper

Colecção Figueiredo Ribeiro | Figueiredo Ribeiro Collection

Page 25: Pedro A.H. Paixão - Museu do Dinheiro · moedas, medalhas, camafeus. Da loucura do Capitão Ahab de Melville, que convence a tripulação a deixar a pesca por um dobrão, para se

25 2016

Page 26: Pedro A.H. Paixão - Museu do Dinheiro · moedas, medalhas, camafeus. Da loucura do Capitão Ahab de Melville, que convence a tripulação a deixar a pesca por um dobrão, para se

26 Sic transit gloria mundi – Pedro A. H. Paixão

Nomisma 52011

10,4 x 14,5 cm Lápis de cor sobre papel | Colored pencil on paper

Colecção Figueiredo Ribeiro | Figueiredo Ribeiro Collection

Page 27: Pedro A.H. Paixão - Museu do Dinheiro · moedas, medalhas, camafeus. Da loucura do Capitão Ahab de Melville, que convence a tripulação a deixar a pesca por um dobrão, para se

27 2016

Page 28: Pedro A.H. Paixão - Museu do Dinheiro · moedas, medalhas, camafeus. Da loucura do Capitão Ahab de Melville, que convence a tripulação a deixar a pesca por um dobrão, para se

28 Sic transit gloria mundi – Pedro A. H. Paixão

Nomisma 62011-16

10,4 x 14,3 cm Lápis de cor sobre papel | Colored pencil on paper

Colecção Figueiredo Ribeiro | Figueiredo Ribeiro Collection

Page 29: Pedro A.H. Paixão - Museu do Dinheiro · moedas, medalhas, camafeus. Da loucura do Capitão Ahab de Melville, que convence a tripulação a deixar a pesca por um dobrão, para se

29 2016

Page 30: Pedro A.H. Paixão - Museu do Dinheiro · moedas, medalhas, camafeus. Da loucura do Capitão Ahab de Melville, que convence a tripulação a deixar a pesca por um dobrão, para se

30 Sic transit gloria mundi – Pedro A. H. Paixão

Nomisma 72014

10,4 x 13,7 cm Lápis de cor sobre papel | Colored pencil on paper

Colecção Figueiredo Ribeiro | Figueiredo Ribeiro Collection

Page 31: Pedro A.H. Paixão - Museu do Dinheiro · moedas, medalhas, camafeus. Da loucura do Capitão Ahab de Melville, que convence a tripulação a deixar a pesca por um dobrão, para se

31 2016

Page 32: Pedro A.H. Paixão - Museu do Dinheiro · moedas, medalhas, camafeus. Da loucura do Capitão Ahab de Melville, que convence a tripulação a deixar a pesca por um dobrão, para se

32 Sic transit gloria mundi – Pedro A. H. Paixão

Nomisma 82014-16

10,4 x 14,9 cm Lápis de cor sobre papel | Colored pencil on paper

Colecção Figueiredo Ribeiro | Figueiredo Ribeiro Collection

Page 33: Pedro A.H. Paixão - Museu do Dinheiro · moedas, medalhas, camafeus. Da loucura do Capitão Ahab de Melville, que convence a tripulação a deixar a pesca por um dobrão, para se

33 2016

Page 34: Pedro A.H. Paixão - Museu do Dinheiro · moedas, medalhas, camafeus. Da loucura do Capitão Ahab de Melville, que convence a tripulação a deixar a pesca por um dobrão, para se

34 Sic transit gloria mundi – Pedro A. H. Paixão

Nomisma 92014-16

10,5 x 13,9 cm Lápis de cor sobre papel | Colored pencil on paper

Colecção Figueiredo Ribeiro | Figueiredo Ribeiro Collection

Page 35: Pedro A.H. Paixão - Museu do Dinheiro · moedas, medalhas, camafeus. Da loucura do Capitão Ahab de Melville, que convence a tripulação a deixar a pesca por um dobrão, para se

35 2016

Page 36: Pedro A.H. Paixão - Museu do Dinheiro · moedas, medalhas, camafeus. Da loucura do Capitão Ahab de Melville, que convence a tripulação a deixar a pesca por um dobrão, para se

36 Sic transit gloria mundi – Pedro A. H. Paixão

Nomisma 102015

9,9 x 9,9 cm Lápis de cor sobre papel | Colored pencil on paper

Colecção Figueiredo Ribeiro | Figueiredo Ribeiro Collection

Page 37: Pedro A.H. Paixão - Museu do Dinheiro · moedas, medalhas, camafeus. Da loucura do Capitão Ahab de Melville, que convence a tripulação a deixar a pesca por um dobrão, para se

37 2016

Page 38: Pedro A.H. Paixão - Museu do Dinheiro · moedas, medalhas, camafeus. Da loucura do Capitão Ahab de Melville, que convence a tripulação a deixar a pesca por um dobrão, para se

38 Sic transit gloria mundi – Pedro A. H. Paixão

Nomisma 112015

9,9 x 9,9 cm Lápis de cor sobre papel | Colored pencil on paper

Colecção Figueiredo Ribeiro | Figueiredo Ribeiro Collection

Page 39: Pedro A.H. Paixão - Museu do Dinheiro · moedas, medalhas, camafeus. Da loucura do Capitão Ahab de Melville, que convence a tripulação a deixar a pesca por um dobrão, para se

39 2016

Page 40: Pedro A.H. Paixão - Museu do Dinheiro · moedas, medalhas, camafeus. Da loucura do Capitão Ahab de Melville, que convence a tripulação a deixar a pesca por um dobrão, para se

40 Sic transit gloria mundi – Pedro A. H. Paixão

Nomisma 122015

9,9 x 9,9 cm Lápis de cor sobre papel | Colored pencil on paper

Colecção Figueiredo Ribeiro | Figueiredo Ribeiro Collection

Page 41: Pedro A.H. Paixão - Museu do Dinheiro · moedas, medalhas, camafeus. Da loucura do Capitão Ahab de Melville, que convence a tripulação a deixar a pesca por um dobrão, para se

41 2016

Page 42: Pedro A.H. Paixão - Museu do Dinheiro · moedas, medalhas, camafeus. Da loucura do Capitão Ahab de Melville, que convence a tripulação a deixar a pesca por um dobrão, para se

42 Sic transit gloria mundi – Pedro A. H. Paixão

Nomisma 132015

9,9 x 9,9 cm Lápis de cor sobre papel | Colored pencil on paper

Colecção Figueiredo Ribeiro | Figueiredo Ribeiro Collection

Page 43: Pedro A.H. Paixão - Museu do Dinheiro · moedas, medalhas, camafeus. Da loucura do Capitão Ahab de Melville, que convence a tripulação a deixar a pesca por um dobrão, para se

43 2016

Page 44: Pedro A.H. Paixão - Museu do Dinheiro · moedas, medalhas, camafeus. Da loucura do Capitão Ahab de Melville, que convence a tripulação a deixar a pesca por um dobrão, para se

44 Sic transit gloria mundi – Pedro A. H. Paixão

Nomisma 142015

9,9 x 9,9 cm Lápis de cor sobre papel | Colored pencil on paper

Colecção Figueiredo Ribeiro | Figueiredo Ribeiro Collection

Page 45: Pedro A.H. Paixão - Museu do Dinheiro · moedas, medalhas, camafeus. Da loucura do Capitão Ahab de Melville, que convence a tripulação a deixar a pesca por um dobrão, para se

45 2016

Page 46: Pedro A.H. Paixão - Museu do Dinheiro · moedas, medalhas, camafeus. Da loucura do Capitão Ahab de Melville, que convence a tripulação a deixar a pesca por um dobrão, para se

46 Sic transit gloria mundi – Pedro A. H. Paixão

Nomisma 152015

9,9 x 9,9 cm Lápis de cor sobre papel | Colored pencil on paper

Colecção Figueiredo Ribeiro | Figueiredo Ribeiro Collection

Page 47: Pedro A.H. Paixão - Museu do Dinheiro · moedas, medalhas, camafeus. Da loucura do Capitão Ahab de Melville, que convence a tripulação a deixar a pesca por um dobrão, para se

47 2016

Page 48: Pedro A.H. Paixão - Museu do Dinheiro · moedas, medalhas, camafeus. Da loucura do Capitão Ahab de Melville, que convence a tripulação a deixar a pesca por um dobrão, para se

48 Sic transit gloria mundi – Pedro A. H. Paixão

Nomisma 162012-16

7,6 x 8,5 cm Lápis de cor sobre papel | Colored pencil on paper

Colecção Figueiredo Ribeiro | Figueiredo Ribeiro Collection

Page 49: Pedro A.H. Paixão - Museu do Dinheiro · moedas, medalhas, camafeus. Da loucura do Capitão Ahab de Melville, que convence a tripulação a deixar a pesca por um dobrão, para se

49 2016

Page 50: Pedro A.H. Paixão - Museu do Dinheiro · moedas, medalhas, camafeus. Da loucura do Capitão Ahab de Melville, que convence a tripulação a deixar a pesca por um dobrão, para se

50 Sic transit gloria mundi – Pedro A. H. Paixão

Sem título | No title2014-16

10,5 x 13,9 cm Lápis de cor sobre papel | Colored pencil on paper

Destruído | Destroyed

Page 51: Pedro A.H. Paixão - Museu do Dinheiro · moedas, medalhas, camafeus. Da loucura do Capitão Ahab de Melville, que convence a tripulação a deixar a pesca por um dobrão, para se

51 2016

Page 52: Pedro A.H. Paixão - Museu do Dinheiro · moedas, medalhas, camafeus. Da loucura do Capitão Ahab de Melville, que convence a tripulação a deixar a pesca por um dobrão, para se

52 Sic transit gloria mundi – Pedro A. H. Paixão

Sem título | No title2011

10,5 x 13,9 cm Lápis de cor sobre papel | Colored pencil on paper

Primeiro trabalho do grupo, oferecido em 2012a Giorgio Agamben, no seu septuagésimo aniversário | First work of thegroup offered in 2012 to Giorgio Agamben on his seventieth aniversary.

Page 53: Pedro A.H. Paixão - Museu do Dinheiro · moedas, medalhas, camafeus. Da loucura do Capitão Ahab de Melville, que convence a tripulação a deixar a pesca por um dobrão, para se

53 2016

Page 54: Pedro A.H. Paixão - Museu do Dinheiro · moedas, medalhas, camafeus. Da loucura do Capitão Ahab de Melville, que convence a tripulação a deixar a pesca por um dobrão, para se

54 Sic transit gloria mundi – Pedro A. H. Paixão

Page 55: Pedro A.H. Paixão - Museu do Dinheiro · moedas, medalhas, camafeus. Da loucura do Capitão Ahab de Melville, que convence a tripulação a deixar a pesca por um dobrão, para se
Page 56: Pedro A.H. Paixão - Museu do Dinheiro · moedas, medalhas, camafeus. Da loucura do Capitão Ahab de Melville, que convence a tripulação a deixar a pesca por um dobrão, para se

56 Sic transit gloria mundi – Pedro A. H. Paixão

E a embarcação? Eram os estultos e os assassinos, os vislumbrados e os bêba-dos, os bandidos e os religiosos. Eram os fortes e os fracos. Era o Leviatã sem a ba-leia. Era um tratado e era a arte. Era o ódio e a aventura. A fome, o novo mundo e a ganância. Não era o desenho.

Eu ia desenhando, respirando.

A baleia morreu e poderia ter não morrido. Homem ignorante e mau.

O seu pensamento era o meu e o meu o seu. Nadamos já sem rumo, horizonte adentro, sem nos importamos com o mar turvo, nem com a transparência do mean-dro escuro.

And the boat? Fools and murderers, the dazzled and the drunkards, the pious and the bandits. It was the strong, the weak and the slain. Leviathan without the whale. A treatise and art. It was hate and adven-ture, the vanquished bellicose and the glo-rious that pass on. It was hunger, greed and the new world. It was not drawing.

I kept on drawing, breathing

The whale died but could have not died.Ignorant evil man.

His though was mine, and mine was his; it was one. Astray, aimless, we swim. We head towards the horizon unruffled by the turbidity of the sea; there and within, with the transparency of the meandering dark.

Page 57: Pedro A.H. Paixão - Museu do Dinheiro · moedas, medalhas, camafeus. Da loucura do Capitão Ahab de Melville, que convence a tripulação a deixar a pesca por um dobrão, para se

57 2016

Page 58: Pedro A.H. Paixão - Museu do Dinheiro · moedas, medalhas, camafeus. Da loucura do Capitão Ahab de Melville, que convence a tripulação a deixar a pesca por um dobrão, para se

58 Sic transit gloria mundi – Pedro A. H. Paixão

The sleeping galgo2016

29,7 x 40,3 cmLápis de cor sobre papel | Colored pencil on paper

Colecção do artista | Artist collection

Page 59: Pedro A.H. Paixão - Museu do Dinheiro · moedas, medalhas, camafeus. Da loucura do Capitão Ahab de Melville, que convence a tripulação a deixar a pesca por um dobrão, para se

59 2016

Page 60: Pedro A.H. Paixão - Museu do Dinheiro · moedas, medalhas, camafeus. Da loucura do Capitão Ahab de Melville, que convence a tripulação a deixar a pesca por um dobrão, para se

60 Sic transit gloria mundi – Pedro A. H. Paixão

Page 61: Pedro A.H. Paixão - Museu do Dinheiro · moedas, medalhas, camafeus. Da loucura do Capitão Ahab de Melville, que convence a tripulação a deixar a pesca por um dobrão, para se

61 2016

Rubro Rumor | Red RumorPaulo Pires do Vale

«Sábio, onde está a Fonte da Vida?», perguntei. «Nas trevas», respondeu. (…)

«De que lado está o caminho?», perguntei.«Por onde fores, se és um verdadeiro

peregrino, realizarás a viagem», respondeu.

Monstruoso é quem nasceu das entranhas de uma mulher morta.

E eu, feto adulto, navegomais moderno do que todos

os modernos a procurar irmãos que não existem mais.

‘Where is the Spring of Life’, I asked.‘In the Darkness’, he said. (...)

‘In which direction is the way?’, I asked.‘In any direction you go’, he said.

‘If you go, you will arrive’

Monstrous is he who is bornfrom the womb of a dead woman.

And I, adult fetus, wander more modern than any modern looking

for brothers who are no more.

Suhrawardi, O Intelecto Vermelho Suhrawardi, The Red Intellect

Pasolini, Poesia em forma de rosa Pasolini, Poetry in the shape of a rose

Page 62: Pedro A.H. Paixão - Museu do Dinheiro · moedas, medalhas, camafeus. Da loucura do Capitão Ahab de Melville, que convence a tripulação a deixar a pesca por um dobrão, para se
Page 63: Pedro A.H. Paixão - Museu do Dinheiro · moedas, medalhas, camafeus. Da loucura do Capitão Ahab de Melville, que convence a tripulação a deixar a pesca por um dobrão, para se

63 2016

1. Confessa-nos Ishmael: «(…) Tenho o hábito de embarcar quando começo a ver tudo turvo e a sentir o ar pesado nos pul-mões (…).»1

2. Embarcar é, aqui, outra forma de es-crever desenhar: procurar ver melhor. Não, apenas, o mundo exterior ou o que já existe, mas os próprios olhos e o que está por vir. Isso que vem do fundo de si, de lugares recônditos e obscuros, avessos à luz. Para chegar a isso é preciso atraves-sar a longa cegueira aquática: «De resto, nenhum homem pode sentir plenamente a sua própria realidade, excepto de olhos fechados; como se as trevas fossem efec-tivamente o elemento próprio das nossas essências, sendo a luz mais congénita com a nossa natureza material.»2

3. «“O que indica a região das Trevas?”, perguntei ao Sábio. “A obscuridade de que tomas consciência – respondeu –. Pois tu estás nas Trevas, mas não estás consciente disso. Quando aquele que em-preendeu o caminho se vê a si mesmo nas Trevas, compreendeu que estava na Noite, e que jamais a claridade do Dia tinha al-cançado o seu olhar. Esse é o primeiro pas-so dos verdadeiros peregrinos. Só a partir daí se podem elevar.”»3

4. O elemento essencial ao homem, a escuridão, permanece no desenho. Rev-ela-se aí. Como o rumor das asas de Ga-briel, o Anjo Vermelho, segundo o filósofo e místico islâmico Shihab al-din Yahya Suhrawardi: a asa direita é feita de luz,

1. Ishmael tells us: “(…) I am in the habit of going to sea whenever I begin to grow hazy about the eyes, and begin to be over con-scious of my lungs (…).”1

2. Going to sea is akin to drawing: a way to try and see better. Not just the outside world or what already exists, but the eyes themselves and what is to come. What is it that comes from within, from the obscure and secret places unwelcoming of light? In order to get it, one needs to go across the long aquatic blindness: “Because no man can ever feel his own identity aright except his eyes be closed; as if darkness were in-deed the proper element of our essences, though light be more congenial to our clay-ey part.”2

3. '‘What is the sign of Darkness?’, I asked. ‘Blackness’, he said. ‘And you yourself are in the Darkness, but you don’t know it. He who goes, when he sees himself in the Darkness, knows that he has been in the Darkness prior to that and that he has nev-er seen light. So the first step of those who would go is this, and from here one can progress.’'3

4. An essential element to man, darkness perseveres in drawing. It is revealed in drawing. Just like the sound of Gabriel’s wings, the Red Angel, according to the Islamic mystic and philosopher Shihab al-din Yahya Suhrawardi: the right wing is

Page 64: Pedro A.H. Paixão - Museu do Dinheiro · moedas, medalhas, camafeus. Da loucura do Capitão Ahab de Melville, que convence a tripulação a deixar a pesca por um dobrão, para se

64 Sic transit gloria mundi – Pedro A. H. Paixão

a esquerda tem a sua parte de treva4 – e precisa das duas para ser o mensageiro, para poder errar pelo mundo, ser o per-pétuo peregrino5. Carnal e espiritual, físico e mental, imanente e transcendente, não-ser e ser: é essa mescla de dia e noite que lhe dá a cor rubra. No caso deste Desenho – no singular, porque estes trabalhos pert-encem a um amplo ciclo de trabalhos a encarnado sobre papel, iniciado em 2007, que é um desenho, apenas um, sempre em redor da mesma procura e exigência – essa luta entre luz e escuridão revela-se como uma espécie de nevoeiro vermelho que permitirá ver melhor. Que traz à luz, à matéria, incarnando, o que sem ele ficaria por mostrar. Mas, aí, fica ainda em aber-to, inacabado, como espaço potencial. In-telecto sensível operando.

5. O intelecto, outro nome para o anjo, é rubro6. A cor «vermelho purpúreo» é a da aurora e do crepúsculo, fronteira entre o dia e a noite, quando se tocam. Mistura de luz e obscuridade: «Se um objecto bran-co, cuja brancura é indissociável da luz, se mistura com o negro, aparece então aver-melhado. (…) O crepúsculo e a aurora são um momento intermédio: um lado para o dia, que é brancura, e outro para a noite, que é a negritude, daí o tom purpúreo do crepúsculo da manhã e do crepúsculo da tarde. (…) Uma simples lâmpada mostra a mesma condição: em baixo, a chama é branca, em cima é fumo negro; no meio aparece avermelhada.»7. Este anjo, este in-telecto, não é feito de pura idealidade, mas

pure light, and the left has traces of dark-ness4– and he needs them both in order to fulfil his role of messenger, in order to travel the world, the eternal pilgrim.5 Both carnal and spiritual, physical and mental, immanent and transcendent, being and non-being: this is the mix between day and night that gives him the color red. In this Drawing – and I use the singular because these works are part of a vast cycle of red works on paper initiated in 2007 that is a single drawing, just one, always around this same field of research and exigency – this fight between light and darkness is revealed as a kind of red fog that makes us see clearer. Something that brings to light, that embodies, that makes incar-nate what would otherwise remain unseen while leaving it open, unfinished, a poten-tial space. A sensitive intelligence in action. 5. The intellect, or angel, is red.6“Purplish red” is the color of dawn and dusk, the boundary between day and night. Red is a mix between light and darkness: “Every white thing that is connected to light ap-pears red when admixed with black, like the sunset at the beginning of evening or the end of dawn, which is white where it is connected to the sun’s light. One side of it is toward the light, which is white, while the other side is toward the night, which is black. Therefore it appears red. (…) A flame has the same quality. Below it is white .and above is black smoke. Between the fire and smoke it appears red.”7This angel, or intellect, is not made of pure ideality, but it incarnates. He is also not pure materiality,

Page 65: Pedro A.H. Paixão - Museu do Dinheiro · moedas, medalhas, camafeus. Da loucura do Capitão Ahab de Melville, que convence a tripulação a deixar a pesca por um dobrão, para se

65 2016

incarna. Também não é pura materiali-dade, mas ascende. É meio. A inteligência do desenho é vermelha porque é mistura desequilibrante de luz e escuridão. Dá a ver e a não-ver.

6. Esclarece-nos o desenhador: «Essa trans- parência a que chamo desenho tem de ser cuidada para se manter vibrante e viva, não se pode saturar demasiado, com ri-sco de se perder o pensável. É como saber tomar conta de uma coisa evanescente. Porque o importante é a transparência e não os signos – a transparência que per-mite que os signos existam. Mas a trans-parência é, precisamente, transparente, é difícil de se ver.»8

7. Tal como a aventura marítima, o desen-ho é deambulação em busca de um fan-tasma. O ímpeto vem, segundo Ishmael, da «imagem do inalcançável fantasma da vida; e é esta a chave de tudo»9 – O mais íntimo em cada um, o que permitirá o seu estado de nascimento e a verdadeira obra, não será esse confronto matricial com os seus fantasmas? Interior intimo meo.

8. «O desenho – afirmou Pedro A.H. Paixão – é muito próximo à experiência dos fan-tasmas. (…) O desenho permanece com um aspecto vago que foge permanente-mente, é mais fantasma que imagem. E quando ele está apenas dentro da nossa cabeça torna-se mais complexo e daqui a necessidade de o alargarmos para alguma coisa fora de nós, normalmente com reg-istos rápidos, inconsistentes.»

but he ascends. He is medium. The intel-lect of this drawing is red because it is a mix that unbalances both light and dark-ness. It veils and unveils.

6. The artist explains: “This transparency I call drawing has to be cared for so that it remains alive and vibrant, I can’t allow it to saturate too much without the risk of los-ing what is thinkable. It is like knowing how to care for something that is evanescent. Because the important is the transparency and not the signs – the transparence that allows for the existence of the signs. But the transparence is, precisely, transparent, it is something hard to see.”8

7. Just like the maritime adventure, drawing is a search for a phantom. Ishmael tells us that the drive for this search is “the image of the ungraspable phantom of life; and this is the key to it all.”9– The most intimate within each of us, the thing that allows for this state of birth and for the true work of art, is it not this original confrontation with one’s ghosts? Interior intimo meo.

8. According to Pedro A.H. Paixão “drawing is very close to the experience of phantoms. (…) Drawing always remains as something vague that continually escapes us, more a phantom than an image. And when it’s only inside our head, it becomes more complex. That’s why we need to expand it into something that exists outside, usually with swift and inconsistent graphemes.”

Page 66: Pedro A.H. Paixão - Museu do Dinheiro · moedas, medalhas, camafeus. Da loucura do Capitão Ahab de Melville, que convence a tripulação a deixar a pesca por um dobrão, para se

66 Sic transit gloria mundi – Pedro A. H. Paixão

9. Desenhar é perseguir algo que chama pelo desenhador. É isso a baleia. A baleia é o isso. O artista é o arpoador. O próprio Ishmael o afirma, ao escrever sobre a sua tarefa: «Vou pintar, o melhor que me for dado fazê-lo, sem tela nem tintas, a verdadeira forma da baleia, tal como a avista o baleeiro quando a vê amarrada ao costado do navio.»10Mas uma baleia amarrada, é ainda uma baleia?

10. O problema é sempre o do ponto de vis-ta limitado sobre a realidade. Haverá forma de escapar a ele? Ishmael crítica violenta-mente as representações que se fizeram da baleia: dos templos Indus à pintura renas-centista, das gravuras de livros de história natural às tabuletas de restaurantes. Sempre fracassadas. Ela parece, invariavel-mente, escapar: «A baleia viva, em toda a sua plena e significativa majestade, só pode ser vista no mar, nas águas insondáveis, e, quando flutua, a sua vasta massa encon-tra-se submersa como um navio de guer-ra; é impossível para um homem mortal retirá-la para fora do seu elemento con-servando-lhe a plena e viva pujança.»11

11. Como o Deus de Moisés, que não se pode figurar, de quem só vemos as costas, porque ver a sua face implicaria morrer, assim a baleia, de quem só ve-mos a cauda: «somos obrigados a con-cluir que o grande leviatã é a única cria-tura do mundo impossível de retratar. Uns retratos podem possuir certo nível

9. To draw is to pursue something that calls for a draftsman. That is the wale. The wale is the it. The artist is the harpooneer. Ishmael himself declares that when he writes: “I shall ere long paint to you as well as one can without canvas, something like the true form of the whale as he actually appears to the eye of the whaleman when in his own absolute body the whale is moored alongside the whale-ship so that he can be fairly stepped upon there.”10 But is a moored whale still a whale?

10. Our limited point of view on reality is always the problem. Is there a way to es-cape this? Ishmael is a harsh critic of whale imagery, from Hindu to Renaissance paint-ings, from the woodcut prints in natural history books to restaurant signs. They al-ways fail to capture the animal: “The living whale, in his full majesty and significance, is only to be seen at sea in unfathomable wa-ters; and afloat the vast bulk of him is out of sight, like a launched line-of battle ship; and out of that element it is a thing eternal-ly impossible for mortal man to hoist him bodily into the air, so as to preserve all his mighty swells and undulations.”11

11. Like the God of Moses, who cannot be represented and of whom we can only see the back, because seeing his face would imply our death, we can only see the tail of the whale: “the great Leviathan is that one creature in the world which must remain unpainted to the last. True, one portrait may hit the mark much nearer than another, but none can hit it with any very

Page 67: Pedro A.H. Paixão - Museu do Dinheiro · moedas, medalhas, camafeus. Da loucura do Capitão Ahab de Melville, que convence a tripulação a deixar a pesca por um dobrão, para se

67 2016

de semelhança, mas nenhum pode as-pirar a ser exacto. Não há portanto nen-hum meio de saber-se como é a baleia sem irmos caçá-la. Simplesmente isso corresponde ao risco de uma pessoa ser esmagada pelo peso da sua curiosidade e depois arrastada para o fundo do mar. Portanto, aconselho ao leitor que modere a sua curiosidade a respeito das baleias.»12

12. Da viagem do desenhador, só vemos o resultado. Há camadas sobrepostas, apa-gamento e acréscimo, muito tempo per-dido, um exercício de lentidão para deixar aproximar da superfície do papel o longín-quo. Mas ficam invisíveis esses mergulhos demorados aonde a luz não chega, para tocar algo desse fundo insondável e infor-mulável. O que resta: uma cauda.

13. Desenhar, caçar a baleia, implica as-sumir o fracasso e a possibilidade de ser esmagado. Talvez isso só se revele na falha.

14. Desenhar é deixar vir à superfície, deixar que alguma coisa surja nessa dis-tância entre o medium e o artista, nessa extimidade: exterioridade que lhe é íntima – mas sem a poder domar em absoluto. Manifesta-se no papel o que estava enco-berto – mas que se mantém ainda como tal, numa estranheza que pode espantar e incomodar o próprio artista. É ele que obedece a isso, as mãos deixam de ser

considerable degree of exactness. So there is no earthly way of finding out precisely what the whale really looks like. And the only mode in which you can derive even a tolerable idea of his living contour, is by go-ing a whaling yourself; but by so doing, you run no small risk of being eternally stove and sunk by him. Wherefore, it seems to me you had best not be too fastidious in your curiosity touching this Leviathan.”12

12. We only see the end result of the art-ist’s journey. Stretching the surface of the paper to the far reaches of the inaccessible implies an exercise of slowness, working over many overlapping layers of erasure and accretion. But those prolonged dives into the places inaccessible to light in or-der to touch a part of that fathomless and unspeakable underwater reaches, those remain invisible. What is left is a tail.

13. To draw, to hunt the whale, implies to accept failure and the possibility of being crushed. Maybe it can only be revealed in failure.

14. To draw is to wait for something to surface, to allow it to emerge somewhere between the artist and his medium, in that extimity: an intimate exteriority – over which he has no real control. The hidden is materialized on the paper – but is remains as such, a strangeness that has the power to surprise or even disturb the artist. He is the one obeying it, his hands are no longer his. This is the only way one can go beyond

Page 68: Pedro A.H. Paixão - Museu do Dinheiro · moedas, medalhas, camafeus. Da loucura do Capitão Ahab de Melville, que convence a tripulação a deixar a pesca por um dobrão, para se

68 Sic transit gloria mundi – Pedro A. H. Paixão

suas. Só assim o ponto de vista limitado do eu poderá ser ultrapassado. E só é possível porque, dessa viagem ao fundo sem fun-do, fica muito por dizer, por mostrar, por testemunhar. Há uma inteligência no de-senho, claro, mas o que aí se pode revelar ultrapassa o entendimento – é um mun-do sensível não dominado pela razão. Re-sultado do bater das duas asas. Intelecto vermelho.

15. «Vender a cabeça? Que diabo de história é essa que você me quer impingir?»13, disse Ishmael, furioso, ao dono da estalagem no-vaiorquina onde ía passar a noite, depois de este lhe ter dito que o homem com quem partilharia o quarto deveria andar pela ci-dade a «vender a cabeça»:

«Pretende convencer-me de que o ar-poador anda neste momento, numa noite de sábado, ou melhor, de domingo, de por-ta em porta, a tentar vender a cabeça?» «É isso precisamente o que foi tentar fazer – respondeu o estalajadeiro –, apesar de eu o ter prevenido que seria difícil, pois o mercado aqui está saturado.

– Saturado de quê? – bradei eu.

– De cabeças, com mil diabos; ou não acha que já há demasiadas cabeças neste mundo?»14

16. Contra o império da razão moderna, de uma racionalidade redutora, é assim que Pedro A.H. Paixão desenha: «Não me interessa que um desenho transmita um

one’s self limited point of view. And this is only possible because, from that journey to the deepest of the deep, there is a lot that remains invisible and unspeakable. There is an intelligence in drawing, obviously, but what is revealed therein goes beyond our understanding – it is a sensible world where reason has no power. The conse-quence of the beating of those two wings. Red intellect.

15. “Can’t sell his head? – What sort of a bamboozling story is this you are tell-ing me?”13 Told a furious Ishmael to the innkeeper after being told that the fellow he was supposed to share a bed with that same night was out trying to “sell his head”:

'‘Do you pretend to say, landlord, that this harpooneer is actually engaged this bless-ed Saturday night, or rather Sunday morn-ing, in peddling his head around this town?’ ‘That’s precisely it,’ said the landlord, ‘and I told him he couldn’t sell it here, the mar-ket’s overstocked.’'

‘With what?’ shouted I.

‘With heads to be sure; ain’t there too many heads in the world?’”14

16. Against the hegemony of modern rea-son and reductive rationality, this is how Pedro A.H. Paixão draws: “I’m not interest-ed in a drawing that conveys knowledge or

Page 69: Pedro A.H. Paixão - Museu do Dinheiro · moedas, medalhas, camafeus. Da loucura do Capitão Ahab de Melville, que convence a tripulação a deixar a pesca por um dobrão, para se

69 2016

conhecimento ou algo homogéneo, in-teressa que cuide bem da exigência e nos deixe algo sempre por pensar.»

17. Dizia Ahab, dirigindo-se à cabeça cor-tada de uma baleia:

«Fala pois, ó grande e venerável cabeça, (…) revela-me o teu segredo. Tu que mergulhas mais fundo do que qualquer mergulhador. Cabeça iluminada agora pelo sol, já circu-laste entre os alicerces do mundo onde se oxidam esquadras e apodrecem homens anónimos, onde se desfazem muitas es-peranças junto das âncoras enferrujadas; onde, na sua doca assassina, a terra se en-contra lastrada com os ossos de milhões de afogados; aí, nesse reino terrível das águas, achaste o teu lar favorito.»15 Mas a cabeça permaneceu no seu majestoso silêncio. Ela que conhecia os esteios obscuros do mun-do. Talvez por isso mesmo.

18. Diante do silêncio dos signos, interpre-tamos e projectamos. Como nessa manhã em que Ahab, ao passar pelo dobrão que estava pregado ao mastro, «pareceu no-vamente atraído pelas estranhas figuras e inscrições ali gravadas, como se, pela primeira vez, começasse a interpretar para si próprio, de certa maneira, qualquer significação ali oculta. Todas as coisas pos-suem uma certa significação, sem a qual não valem nada (…).»16 Esse desejo de um sentido, uma ordem em todas as coisas, incapazes de lidar com o vazio, não será essa a nossa maldição? Ahab revia-se nos

something homogenous, the important is that it cares for the exigency [which mobi-lizes us] and always leaves us with some-thing untought.”

17. Addressing the head of a decapitated whale, Ahab muttered:

“Speak, thou vast and venerable head (…) speak, mighty head, and tell us the secret thing that is in thee. Of all divers, thou hast dived the deepest. That head upon which the upper sun now gleams, has moved amid this world’s foundations. Where unrecorded names and navies rust, and untold hopes and anchors rot; where in her murderous hold this frigate earth is ballasted with bones of millions of the drowned; there, in that awful water-land, there was thy most familiar home.”15 But the head remained majestically silent. It knew the deepest recesses of the world. That might explain it.

18. Confronted with the silence of the signs, we project and interpret. Just like happened the morning when Ahab, “turn-ing to pass the doubloon, (…) seemed to be newly attracted by the strange figures and inscriptions stamped on it, as though now for the first time beginning to inter-pret for himself in some monomaniac way whatever significance might lurk in them. And some certain significance lurks in all things, else all things are little worth (…).”16 This want for a meaning, the desire of an order that encompasses all things, this failure to tolerate emptiness, is it not this

Page 70: Pedro A.H. Paixão - Museu do Dinheiro · moedas, medalhas, camafeus. Da loucura do Capitão Ahab de Melville, que convence a tripulação a deixar a pesca por um dobrão, para se

70 Sic transit gloria mundi – Pedro A. H. Paixão

desenhos da moeda. Depois dele, aproxi-mou-se do dobrão Starbuck: nos signos da moeda, onde Ahab se revia, ele via a Trin-dade: «Esta moeda fala-me com sageza, com brandura, com verdade, se bem que nela se possa também encontrar tristeza. Vou abandoná-la, com medo de que a verdade enfraqueça a minha falsidade.»17 A seguir, aproximou-se da moeda Stubb: «Olé! aqui temos signos e maravilhosa-mente verdadeiros!»18 e perscruta nela o Zodíaco que aí encontra. De seguida, é o pequeno King-Post que a observa desilu-dido e materialista: «Não vejo nada aqui, a não ser uma coisa feita de ouro e esta coi-sa redonda pertencerá a quem descobrir uma certa baleia. Não compreendo por que razão tanto a observam; deve valer dezasseis dólares, é certo, e a dois cênti-mos o charuto, isso representa novecen-tos e sessenta charutos.»19 Ainda Flask, Queequeg e Fedallah, todos passaram di-ante da moeda e a interpretam de maneira diferente. Até que chega Pip e, não a inter-pretando, diz: «Eu olho, tu olhas, ele olha; nós olhamos, vós olhais, eles olham.»20 Não vê tanto o observado, mas os obser-vadores. O ponto de vista.

19. O que é uma moeda? Uma abstracção que incorpora uma valorização social, definida por uma determinada comuni-dade – e por essa razão, nela se inscrevem signos que indicam posição de poder ou importância simbólica para essa so-ciedade. As moedas foram, ao longo da história, lugar de representação: o lugar da efígie do imperador ou do monarca, do

our curse? Ahab saw himself in the draw-ing on the coin. After the captain, Starbuck approached the doubloon: in the signs on the coin, where Ahab saw Ahab, he saw the Trinity: “This coin speaks wisely, mild-ly, truly, but still sadly to me. I will quit it, lest Truth shake me falsely.”17 And after him Stubb: “Halloa! here’s signs and won-ders truly!”18, recognizing the Zodiac in it. Next, little King-Post looks at the coin dis-illusioned and materialistic: “I see nothing here, but a round thing made of gold, and whoever raises a certain whale, this round thing belongs to him. So, what’s all this staring been about? It is worth sixteen dol-lars, that’s true; and at two cents the cigar, that’s nine hundred and sixty cigars.”19 Af-ter them, Flask, Queequeg, and Fedallah, all see different things on that coin. And finally, Pip refuses to interpret the coin: “I look, you look, he looks; we look, ye look, they look.”20 He looks at the observers, not at what is observed. He looks at their point of view.

19. What is a coin? An abstraction that incorporates a value defined by society, by a certain community – and because of this, we inscribe signs indicative of power or symbols of importanceon its surface. Throughout history, coins have been ve-hicles of representation: depicting the ef-figies of emperors and kings, coats of arms or anything that would be important to

Page 71: Pedro A.H. Paixão - Museu do Dinheiro · moedas, medalhas, camafeus. Da loucura do Capitão Ahab de Melville, que convence a tripulação a deixar a pesca por um dobrão, para se

71 2016

escudo real ou dos elementos a valorizar. Forma de disseminação do poder, de se tornar presente, ou melhor, omnipres-ente. Foi com isso que o próprio Cristo, se-gundo o Evangelho de Mateus, soube jog-ar: os fariseus perguntaram a Jesus, para o testar: «É lícito pagar o tributo a César, ou não? Jesus, porém, conhecendo a sua malícia, disse: Por que me experimentais, hipócritas? Mostrai-me a moeda do trib-uto. E eles apresentaram-lhe um dinheiro. E ele diz-lhes: De quem é esta efígie e esta inscrição? Disseram-lhe eles: De César. Então, Ele disse-lhes: Dai pois a César o que é de César, e a Deus o que é de Deus.» (Mt 22:17-21). Ou seja, o seu reino não é deste mundo.

20. Que rostos são estes, desenhados nes-tas moedas – e que nos olham de volta? Também eles poderiam dizer que o seu reino não é deste mundo. Inscritos em moedas, tornam-se aí uma subversão da ordem e do poder. Vêm de fundos in-sondáveis. Mais ou menos remotos, mais ou menos reconhecíveis. Em vez de sur-girem de perfil, enfrentam-nos, olham-nos. Estes retratos transportam uma den-sidade que está para lá do reconhecimento da personalidade ou da figuração miméti-ca: tornam-se expressionistas, grotescos, fantasmáticos. Demoníacos – um daimon pessoal revela-se aí.

21. Uma imprecisão parece atingir esses rostos: em desmembramento, empasta-dos, disformes. Como o de Gaius Julius

ascribe value to. Coins have always been means to disseminate power, of making power present or, even better, omnipres-ent. Jesus Christ knew this, and knew how to subvert it. In the Gospel of Mathew we can read that the Pharisees asked Jesus, at-tempting to entrap him: “Is it lawful to pay the census tax to Caesar or not?” Knowing their malice, Jesus said, “Why are you test-ing me, you hypocrites? Show me the coin that pays the census tax.” Then they hand-ed him the Roman coin. He said to them, “Whose image is this and whose inscrip-tion?” They replied, “Caesar’s.” At that he said to them, “Then repay to Caesar what belongs to Caesar and to God what be-longs to God” (Mt 22:17-21). His kingdom is not of this world.

20. What faces are these, drawn on these coins, looking back at us? One could also say that their kingdom is not of this world. Inscribed on coins, they become a subver-sion of order and power. They come from the unfathomable deep. More or less re-mote, more or less recognizable. Instead of appearing in profile, they confront us, they look at us. These portraits convey a density that is beyond the recognition of a char-acter or mimetic figuration: they become expressionist, grotesque, and phantasma-gorical. Demonic – a personal daimon is revealed therein.

21. Imprecision seems to strikethrough these faces: slurried, disintegrating, mis-shapen. Like Gaius Julius Civilis is portrayed

Page 72: Pedro A.H. Paixão - Museu do Dinheiro · moedas, medalhas, camafeus. Da loucura do Capitão Ahab de Melville, que convence a tripulação a deixar a pesca por um dobrão, para se

72 Sic transit gloria mundi – Pedro A. H. Paixão

Civilis, no Juramento dos batavos, de Rem-brandt. Rosto do vencido e não do vence-dor. Desse que, pouco depois da morte de Jesus, também contrariou o Império Ro-mano, nos actuais Países Baixos, e perdeu. Mas fracassou lutando.

22. Nestes trabalhos, Pedro A.H. Paixão recuperou uma tradição americana, dos finais do século XIX e inícios do XX, de nómadas sem abrigo, ditos hobo, ini-cialmente desapossados da Guerra Civil americana, vencidos e marginais, que habitavam, por opção e temporariamente, próximo de estações de comboio, e esta-vam sempre em deslocação, em viagem, sem morada permanente, e que, nos tem-pos livres, entre um biscate e outro, grava-vam moedas que recebiam – e tantas vezes as ofereciam de volta como forma de agradecimento por alojamento ou co-mida. As moedas que lhes eram dadas, por caridade ou pequenos trabalhos, eles colo-cavam de novo em circulação, mas inter-vencionadas: e aí onde, tradicionalmente, deveria estar o soberano poderoso, figura-vam-se a eles mesmos, outros anónimos ou aquele que lhes deu tecto ou pão. Uma forma de gratidão. Uma resposta à dádiva recebida: é isso também a obra de arte. O artista está sempre de mãos abertas: à es-pera, para transformar o que recebe e de-pois o dar. A obra é sempre um contra-dom.

23. Num filme apresentado nesta ex-posição, alguém de mão estendida recebe uma moeda, entalha-a com uma cauda de baleia, regressa à rua e oferece essa

in Rembrandt’s Conspiracy of Claudius Civi-lis. It is the face of a defeated man, not the face of a victor. A man that, not long after Jesus’s death, fought the Roman Empire in what is now the Netherlands, and lost. But he lost fighting.

22. In these works, Pedro A.H. Paixão recov-ers an American tradition from the late 19th and early 20th century, a tradition carried through by nomads and homeless people, known as hobo, that had fell into poverty as the consequence of the Civil War. Often camping in the proximity of train stations, by option and temporarily, these defeated and marginalised persons were travelling most of the time. Without permanent ad-dress, they would carve these figures on the few coins they were given in exchange for this or that odd-job. Often they would just give them back in exchange for food or shelter. These coins they sculpted these figures into, given to them as pay or char-ity, they would put into circulation again, replacing the effigy of the US presidents by their own portrait, or the portrait of some-one who had given them bread or shelter. A kind of gratitude. A reply to a gift: the work of art is also this. The artist always has his hands open: waiting to transform what he receives and giving it back. The work of art is always a counter-gift.

23. This exhibition includes a film that shows us a person with a begging hand re-ceiving a coin, engraving the tail of a whale on it and going back to the street, with

Page 73: Pedro A.H. Paixão - Museu do Dinheiro · moedas, medalhas, camafeus. Da loucura do Capitão Ahab de Melville, que convence a tripulação a deixar a pesca por um dobrão, para se

73 2016

moeda na mão estendida, recolocando-a em circulação, já outra. Fica de mão aber-ta à espera de outra moeda, que recebe, e que volta a intervencionar, e que depois oferece novamente, e assim continua-mente. Uma parábola da tarefa artística: da herança que se recebe e do trabalho de alteração e desvio dessa herança; da dádi-va de outros e o modo como responde a esse dom. O trabalho artístico é um mov-imento de espera, recebimento e partilha, de dom recebido e contra-dom efectuado. E por esse contra-dom, introduz um des-vio nos modelos de expectativa, de or-ganização e circulação habitual da infor-mação. A obra actua como um vírus num sistema formatado.

24. A moeda intervencionada pelo arti-sta é vitoriana, de 1851, do mesmo ano da primeira edição de Moby-Dick – onde Melville lembra uma lei inglesa segun-do a qual o Rei de Inglaterra tem direito sobre qualquer baleia apanhada no seu Império: «de todas as baleias capturadas por qualquer [um] nas costas desta terra [Inglaterra], o rei, como Grande Arpoador Honorário, tem o direito à cabeça enquan-to a rainha será respeitosamente pre-senteada com a cauda»21. A cabeça para o Rei, a cauda para a Rainha. Ao gravar a cau-da da baleia na efígie invertida da Rainha Victoria, Pedro A.H. Paixão parece cumprir esse desígnio. Mas ao esconder a sobera-na sob a cauda, usando a técnica dos ho-bos americanos, desses que se revoltaram contra o império inglês; ao juntar o grande relato épico americano do séc. XIX ao

the coin on the palm of his hand, offering back the coin and putting it back into cir-culation, now a different coin. The person remains on the street, hand outstretched, and the process is repeated. A parable of the artistic task: of the heritage we are gifted with and of the work of transfor-mation and deviation of that same her-itage; of the gifts of others and how one answers to them. Artistic work is a waiting game that implies sharing and recipiency, gift and counter-gift. And because of this counter-gift, it introduces a shift in the tra-ditional models that organise and dissem-inate information. The work of art is like a virus in a formatted system.

24. The artist worked on a Victorian coin from 1851, the year Moby-Dick was first published, a book where Melville cites an old British law that declares that the King of England has rights over all the whales captured within the borders of his empire: “that of all whales captured by anybody on the coast of that land, the King, as Honorary Grand Harpooneer, must have the head, and the Queen be respectfully presented with the tail.”21 Heads or tails. The head for the King and the tail for the Queen. Engraving the tail of the whale on Queen Victoria’s inverted effigy, Pedro A.H. Paixão seems to adhere to this logic. Hiding the queen under the tail using the technique of the American hobos, the same people who revolted against the British Crown, juxtaposing the 19th centu-ry great American epic novel with money

Page 74: Pedro A.H. Paixão - Museu do Dinheiro · moedas, medalhas, camafeus. Da loucura do Capitão Ahab de Melville, que convence a tripulação a deixar a pesca por um dobrão, para se

74 Sic transit gloria mundi – Pedro A. H. Paixão

dinheiro – preocupação que atravessa, afinal, o livro, como depois se verá também na crítica de Melville à sociedade obcecada pela produtividade, em Bartleby, O Escrivão; Pedro A.H. Paixão faz do desenho uma prática crítica. E, num museu feito para a moeda, deixa essa moeda preciosa e out-ras iguais por si esculpidas, no chão, fora do sítio, sem visibilidade imediata. Cria desvios no valor dos signos. Põe em causa o ponto de vista.

25. Uma parábola evangélica, onde Cristo se refere a dinheiro e a investimentos, foi sempre, para mim, motivo de estranheza e incompreensão, quer pela violência inu-sual das palavras, quer pela aparente falta de misericórdia do final. É por causa des-sa parábola que a palavra talento passou a designar, na nossa cultura, uma aptidão ou característica pessoal, um dom que se pode desenvolver. Mas nessa parábola, tal-ento é o nome de uma unidade monetária. Um homem, que tem de partir, distribuiu talentos, de forma desigual, pelos servos. A um deu 5, a outro 2, a outro 1 (já esta desigualdade é estranha). Quando regres-sa da viagem, pede-lhes contas: aquele a quem deu 5, tinha conseguido duplicar para 10. O que recebeu 2, conseguiu mais 2 talentos. O que tinha recebido apenas 1, teve medo, escondeu o talento, e deu-lhe apenas o mesmo que tinha recebido. E o senhor disse-lhe: «Servo mau e preguiço-so, sabias que ceifo onde não semeei e que recolho onde não joeirei? Devias, então, ter entregado o meu dinheiro aos ban-queiros e, vindo eu, teria recebido o que é

– a concern that we can also identify in the book, and later on, in Melville’s great critic to a society oriented towards productivi-ty; Bartleby, the Scrivener – the artist uses drawing as a critical practice. In a muse-um dedicated to coin, he abandons this precious coin (and others which he also sculpted) on the floor, he leaves them out of their place and not immediately visible. He corrupts the value of their signs. He challenges a point of view.

25. I always though as odd and incom-prehensible an evangelical parable where Christ refers to money and investment, both because of the violence of its words and of its apparent mercilessness. It is to this parable that we owe the current meaning of the word talent, an individual characteristic or aptitude, a gift one can develop. But in that parable, talent is a cur-rency unit. About to go on a journey, a man gives talents to his servants: to the first he gives 5, to the second 2, and to the third 1 (this disparity is already strange). When he returns from his trip, he settles accounts with them: the one who had received 5 talents came forward with another 5, after investing them; the one who had received 2 came forward with another 2, and the one who had received one, being afraid to lose it had buried it, so he gave his master the coin he had received from him. And the master told him: “You wicked, lazy servant! So you knew that I harvest where I did not plant and gather where I did not scatter? Should you not then have put my money in the bank so that I could have got it back

Page 75: Pedro A.H. Paixão - Museu do Dinheiro · moedas, medalhas, camafeus. Da loucura do Capitão Ahab de Melville, que convence a tripulação a deixar a pesca por um dobrão, para se

75 2016

meu com juros. Tirai-lhe, pois, o talento e dai-o ao que tem os dez talentos; porque a todo o que tem, dar-se-lhe-á, e terá em abundância; mas ao que não tem, até o que tem, ser-lhe-á tirado» (Mt 25,14-30). Terríveis e misteriosas palavras: porquê retirar ao que nada tem para dar ao que tem mais? Os dons recebidos têm de ser investidos, exercitados, assumindo apos-tas e riscos. Recebemos, temos que de-volver multiplicado. Ficar pelo que temos, não é simplesmente estagnar, é retroced-er. É preferível fracassar, ser incompreen-dido – fazer obra para os mortos ou para os que ainda não nasceram – do que en-terrar a nossa herança, o que somos, por medo de falhar.

26. No dia 3 de Março de 1849, depois de ter assistido a uma conferência de Emer-son, Melville escreveu numa carta para Evert A. Duyckinck: «Gosto de todos os homens que mergulham. Qualquer peixe pode nadar à superfície, mas só uma grande baleia pode descer a profundi-dades de cinco milhas ou mais...»22

with interest on my return? Now then! Take the talent from him and give it to the one with ten. For to everyone who has, more will be given and he will grow rich; but from the one who has not, even what he has will be taken away” (Mt 25,14-30). Terrible and mysterious words: why does the master take from the one who has the least in or-der to give to the one who has the most? One must invest, exercise the gifts one re-ceives, one has to accept the risk. What we receive, we must multiply and give back. To be satisfied with what we have is not sim-ply to stagnate, it is to regress. It is better to fail, to be misunderstood – to create for the dead or for the still unborn – than to just bury our inheritance, ourselves, be-cause we are afraid to fail.

26. In March 3, 1849, after attending a conference where Emerson spoke, Melville wrote in a letter to Evert A. Duyckinck: “I love all men who dive. Any fish can swim near the surface, but it takes a great whale to go down stairs five miles or more…”22

Page 76: Pedro A.H. Paixão - Museu do Dinheiro · moedas, medalhas, camafeus. Da loucura do Capitão Ahab de Melville, que convence a tripulação a deixar a pesca por um dobrão, para se

76 Sic transit gloria mundi – Pedro A. H. Paixão

Notas

1. Herman Melville, Moby-Dick, trad. Alfredo Margarido e Daniel Gonçalves, Relógio D’Água, Lisboa, 2005, cap. I, p. 32.2. Ibidem, cap. XI, p. 82.3. Suhrawardi [Sihaboddin Yahya Sohravardi], “El arcangel teñido de púr-pura” in El encontro con el ángel. Tres relatos visionarios comentados y anotados por Henri Corbin, Editorial Trotta, Madrid, 2002, p. 65.4. Suhrawardi, “El rumor de las alas de Gabriel”, ibidem, pp. 84-86.5. Sou um perpétuo peregrino – disse o Sábio –. Viajo sem cessar em redor do mundo, contemplando as suas maravilhas» (ibidem, p. 51). Cada intelecto que o anjo ilumina, é uma paragem desta viagem.6. No título Aql´e sorkh, traduzido por Henri Corbin como «Anjo purpúreo», a palavra árabe aql significa «intelecto» – na sua dimensão «humana», «potencial» ou «material» –, mas pode designar também as Inteligências querubínicas ou, em Suhrawardi, o «Intelecto activo», enquanto Gabriel na hierarquia angélica. Sorkh significa, por sua vez, «vermelho», carmesim. As-sim, o título poderia ter sido traduzido, mas o tradutor julgou incompreensív-el, por «Intelecto vermelho». Cfr. Henri Corbin in ibidem, p. 40.7. Suhrawardi, “El arcangel teñido de púrpura”, ibidem, p. 51.8. Todas as citações de Pedro A.H. Paixão provêm de uma entrevista conce-dida a Cristina Robalo – entre Janeiro e Fevereiro de 2016 – a ser publicada em breve. Agradeço a ambos a possibilidade de acesso a este trabalho inédito e podê-lo citar aqui.9. Herman Melville, op. cit., cap. I, p. 31.10. Ibidem, cap. LV, p. 292.11. Ibidem, p. 29512. Ibidem.13. Ibidem, cap. III, p. 45.14. Ibidem.15. Ibidem, cap. LXX, p. 343.16. Ibidem, cap. XCIX, p. 461.17. Ibidem, p. 463.18. Ibidem.19. Ibidem, p. 465.20. Ibidem, p. 466.21. Ibidem, cap. XC, p. 428.22. Merrel R. Davis e William H. Gilman (edd.), The letters of Herman Melville, Yale University Press, New Haven, 1960, p. 78.

Notes

1. Herman Melville, Moby-Dick (London: Penguin, 1986), p. 95.2. Ibidem, p. 149.3. Shihab al-din Yahya Suhrawardi and others, The Philosophical Allegories And Mystical Treatises (Costa Mesa, Calif.: Mazda Publishers, 1999), p. 23.4. Ibidem, p. 17.5. “‘I am a traveler’ he said. ‘I continually wander about the world and look at marvelous things’”, in ibidem, p. 22. Each intellect visited by the angel is a stop in his journey.6. In the title Aql´e sorkh, translated by Henri Corbin to the French lan-guage as l’Archange empourpré (the reddened archangel) [Suhrawardi and Henri Corbin, L'archange Empourpré (Paris, 1976)] the Arab word aql can be read as “intellect” – in its “human”, “potential”, or “material” dimen-sions – but it can also refer to the Cherubic Intellects, or, in the case of Suhrawardi, the “active Intellect”, in the place of Gabriel in the angelic hierarchy. In its turn, sorkh means “red” or “crimson”. Considering all these, Corbin decided to translate the expression as Reddened Archangel. In English language translations, however, the option has been always to translate it as Red Intellect. We decided to use both versions in this text.7. Ibidem.8. All the Pedro A.H. Paixão quotes were taken from an interview he gave to Cristina Robalo – January-February 2016 – to be published soon. I would like to thank them both for giving me the possibility to read and use the still unpublished materials.9. Herman Melville, op. cit., p. 95.10. Ibidem, p. 366-367.11. Ibidem, p. 370.12. Ibidem, p. 371.13. Ibidem, p. 110.14. Ibidem.15. Ibidem, p. 417.16. Ibidem, p. 540.17. Ibidem, p. 542.18. Ibidem, p. 543.19. Ibidem, p. 544.20. Ibidem, p. 545.21. Ibidem, p. 508.22. Merrel R. Davis and William H. Gilman (ed.), The letters of Herman Mel-ville (New Haven: Yale University Press, 1960), p. 78.

Page 77: Pedro A.H. Paixão - Museu do Dinheiro · moedas, medalhas, camafeus. Da loucura do Capitão Ahab de Melville, que convence a tripulação a deixar a pesca por um dobrão, para se

Pedro A.H. Paixão é um artista plásti-co, investigador e editor português.

Nasceu no Lobito (Angola), em 1971. Vive e trabalha entre Milão e Lisboa. Iniciou os seus estudos em Artes Plásticas no Ar.Co em Lisboa.

É Mestre em Belas Artes, pela The School of the Art Institute of Chicago, e Doutora-do em Filosofia, pela Faculdade de Letras de Universidade do Porto, graus obtidos cum laude.

Foi bolseiro das Fundações Luso-Ameri-cana, Calouste Gulbenkian, Fundação para a Ciência e Tecnologia, em Lisboa, e Solo-mon R. Guggenheim (N.Y.), em Veneza.

Ensinou Estética na Università IULM e foi visiting professor in research na Università Cattolica del Sacro Cuore, Milão.

Fundou e dirige o projeto editorial Dis-ciplina Sem Nome, para a editora Assírio & Alvim / Documenta, com o apoio das Fundação Calouste Gulbenkian e Fundação Carmona e Costa, Lisboa.

Foi Guest editor do numero 130, da revista nova iorquina New Observations. Nume-ro apresentado na New York Art Book Fair 2014, no PS1/MoMA (NY).

É membro do Instituto de Filosofia da Uni-versidade do Porto e o seu trabalho artístico é representado em Portugal pela Galeria 111 em Lisboa.

Pedro A.H. Paixão is a Portuguese art-ist, researcher and editor.

He was born in Lobito (Angola) in 1971. He lives and works between Milan and Lis-bon. He began his Visual Arts studies at Ar.Co (Lisbon).

He has a Master of Fine Arts from The School of the Art Institute of Chicago and a PhD in Philosophy from the Faculdade de Letras of the Oporto University, degrees obtained «with distinction».

He was recipiend of Fundação Luso-Amer-icana para o Desenvolvimento, Fundação Calouste Gulbenkian, Fundação para a Ciência e Tecnologia (Lisbon) e Solomon R. Guggenheim Foundation (NY/Venice).

He taught Aesthetics at the Università IULM (Milan) and was visiting professor in research at the Università Cattolica del Sacro Cuore (Milan).

He founded and directs the editorial project Discipline without name, for the publisher Assírio & Alvim / Documenta, with the support of Fundação Calouste Gulbenkian and Fundação Carmona e Cos-ta (Lisbon).

He was guest editor of issue # 130 of New Observations magazine (NY), presented at the New York Art Book Fair 2014, at the PS1/MoMA (NY).

He is member of the Instituto de Filoso-fia of the Oporto University. His artwork is represented in Portugal by Galeria 111 (Lisbon).

Page 78: Pedro A.H. Paixão - Museu do Dinheiro · moedas, medalhas, camafeus. Da loucura do Capitão Ahab de Melville, que convence a tripulação a deixar a pesca por um dobrão, para se

78 Sic transit gloria mundi – Pedro A. H. Paixão

Sem título | Untitled2011-15

9,5 x 9,7 cm Lápis de cor sobre papel | Colored pencil on paper

Colecção Figueiredo Ribeiro | Figueiredo Ribeiro Collection

Page 79: Pedro A.H. Paixão - Museu do Dinheiro · moedas, medalhas, camafeus. Da loucura do Capitão Ahab de Melville, que convence a tripulação a deixar a pesca por um dobrão, para se

79 2016

Page 80: Pedro A.H. Paixão - Museu do Dinheiro · moedas, medalhas, camafeus. Da loucura do Capitão Ahab de Melville, que convence a tripulação a deixar a pesca por um dobrão, para se

80 Sic transit gloria mundi – Pedro A. H. Paixão

Exposição

Plano Tangente é um programa de ex-posições temporárias do Museu do Dinhei-ro que visa a divulgação da criação artística emergente, nas suas várias disciplinas.

O programa contempla a apresentação do trabalho de artistas portugueses contem-porâneos, em diálogo com a arquitetura do museu e as suas coleções.

9 de abril a 4 de junho 2016

Agradecimentos

O autor agradece ao Banco de Portugal, a Claudia Romano, Nuri Paixão, aos seus pais, Luisa e Manuel Paixão, a Andreas Seegatz, Afonso Sousa, Mariana Amaral, Rodrigo Brito, Fernando Ribeiro, Rui Brito, Paulo Sousa, à Galeria 111, a Micheline Jenner e ao Centre for Whale Research Western Australia.

Exhibition

Plano Tangente is a program of temporary exhibitions of the Money Museum that aims at disseminating the emerging artis-tic productionz in various media.

The program presents the work of Por-tuguese contemporary artists in dialogue with the museum architecture and the col-lections.

April 9 to June 4 2016

Museu do Dinheiro, 2016 | Money Museum, 2016 Autor Author © Pedro A.H. Paixão | Ensaio Essay Paulo Pires do Vale | Tradução Translation José Roseira | Imagens Photographs pp. 4-5, 60 – © Micheline Jenner, CWR (Centre for Whale Research Western Australia) | Imagens Photographs p. 56 – © Afonso Sousa | Design Banco de Portugal | Impressão Printing Banco de Portugal Tiragem Issue 250 Depósito legal Legal deposit 408782/16 ISBN (impresso print) 978-989-678-429-4

Page 81: Pedro A.H. Paixão - Museu do Dinheiro · moedas, medalhas, camafeus. Da loucura do Capitão Ahab de Melville, que convence a tripulação a deixar a pesca por um dobrão, para se
Page 82: Pedro A.H. Paixão - Museu do Dinheiro · moedas, medalhas, camafeus. Da loucura do Capitão Ahab de Melville, que convence a tripulação a deixar a pesca por um dobrão, para se
Page 83: Pedro A.H. Paixão - Museu do Dinheiro · moedas, medalhas, camafeus. Da loucura do Capitão Ahab de Melville, que convence a tripulação a deixar a pesca por um dobrão, para se
Page 84: Pedro A.H. Paixão - Museu do Dinheiro · moedas, medalhas, camafeus. Da loucura do Capitão Ahab de Melville, que convence a tripulação a deixar a pesca por um dobrão, para se

84 Sic transit gloria mundi – Pedro A. H. Paixão

MUSEU DO

DINHEIROBANCO DE PORTUGAL