pedagogia histórico-crítica e história da educação ... · pedagogia histórico-crítica e...
TRANSCRIPT
1
Pedagogia Histórico-Crítica e História da Educação: contribuições à
formação docente
MOLINARI, Andressa Cristina (G – UEL) [email protected]
SANTOS, Ana Carla de Miranda (G – UEL)
FRANCO, Sandra Aparecida Pires – UEL
AGÊNCIA FINANCIADORA: Secretaria da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior
(SETI- PR)
Resumo: O presente trabalho tem como tema analisar as contribuições da elaboração de
planos de aula para a formação continuada de professores. A pesquisa foi realizada a
partir das atividades teóricas desenvolvidas em um Curso de Extensão vinculado ao
projeto: “Teoria e Prática: União Sem Fronteiras entre Universidade e Educação Básica
para a Prática Cidadã na Periferia de Londrina”, que teve por objetivo o resgate da
cidadania e autoestima das comunidades escolares com baixos índices de
Desenvolvimento da Educação Básica (IDEB), atendendo quatro escolas situadas na
periferia de Londrina - Paraná. Especificamente, procurou-se como referencial teórico-
metodológico os estudos com bases na História da Educação brasileira, bem como os
pressupostos teóricos da Pedagogia Histórico-Crítica. Para tanto, buscou-se como objeto
de trabalho a prática da elaboração de planejamentos para a execução de novas formas
de direcionamento dos conteúdos, fazendo com que os educadores fossem capazes de
perceber que há possibilidades de correlacionar as questões sociais com os
conhecimentos científicos a fim de que o aluno conceba tais conteúdos. Nesse sentido, o
presente artigo trata-se de um relato de experiência, utilizando-se como instrumento de
investigação a entrevistas em que foi possível verificar que as temáticas abordadas no
decorrer do curso contribuíram tanto para o processo de formação continuada dos
professores participantes, como também o alcance de significativas mudanças no âmbito
escolar de cada instituição beneficiada pelo projeto, especialmente no que se refere à
reflexão da práxis, direcionando assim a tomada de decisões corretas quanto à escolha
dos fins, objetivos e meios para a efetivação do ensino e promoção da aprendizagem.
Palavras-chave: Formação Continuada. História da Educação. Pedagogia Histórico-Crítica
Introdução
O presente artigo é resultado de umas das ações de intervenção realizada pelo
Projeto de Extensão: “Teoria e Prática: União Sem Fronteiras entre Universidade e
Educação Básica para a prática cidadã na periferia de Londrina” realizada pela área de
Educação do Departamento de Educação da Universidade Estadual de Londrina, situada
2
no Estado do Paraná. A referente intervenção efetivou-se por meio de um Curso de
Extensão oferecido à equipe pedagógica e funcionários de quatro escolas localizadas
nos bolsões de pobreza da cidade de Londrina, que apresentaram um baixo rendimento
no IDEB, a fim de consolidar a junção teoria e prática do trabalho pedagógico no
cotidiano escolar, e assim contribuir para a superação dessas dificuldades e para a
formação da prática cidadã.
O curso foi realizado com a finalidade de contribuir com reflexões referentes à
realidade que tais escolas se encontram, e então, compreender como proceder com os
conhecimentos científicos sem que haja rupturas com o contexto social. Por isso,
durante os encontros com a equipe pedagógica, os estudos direcionados tiveram enfoque
principalmente, na História da Educação e na elaboração de planejamentos dentro dos
pressupostos da Pedagogia Histórico-Crítica.
Condigno, de os professores participantes serem licenciados em áreas
específicas, e terem defasagens nos conhecimentos abordados no curso, tornou-se
importante aos mesmos a participação efetiva para melhor contribuir com suas práticas
educacionais, haja vista a necessidade de uma atenta reflexão acerca da formação
continuada, pois sabemos que são muitos os desafios enfrentados por estes educadores
no contexto da nossa sociedade.
Portanto, o curso teve o interesse em criar reflexões pautando-as nos
conhecimentos da História da Educação e da Pedagogia Histórico-Crítica com a
integração dos professores, principalmente, entre as escolas, a fim de conhecerem a
realidade umas das outras e buscarem juntos soluções para o baixo IDEB, sobretudo
realizando uma junção entre teoria e prática.
Os estudos basearam-se nas pesquisas de educadores importantes para a área de
educação, tais como Saviani (2003), Gasparin (2005), Nóvoa (2005) entre outros. Tais
autores vêm contribuindo significativamente para compreensões históricas, teóricas e
práticas pedagógicas, e por este mesmo motivo foram os norteadores do Curso de
Extensão e também do projeto ainda em desenvolvimento.
Da estrutura à prática
3
O curso ofertado pelo projeto passou pelas seguintes etapas: discussões sobre a
História da Educação; reflexões acerca dos pressupostos teóricos da Pedagogia
Histórico-Crítica, e a elaboração do planejamento na mesma perspectiva. Desta forma, a
primeira etapa do trabalho teve como intenção contextualizar a importância da História
da Educação na formação docente, pois de acordo com Nóvoa (2005), a história nos
permite compreender e analisar nossas origens, as transformações, rupturas e
permanências pelas quais passaram as sociedades.
Apoiando-se nas conjecturas marxianas, Vazquez (1997) nos expõe que a
história é produto da ação do homem sobre o meio e sobre o social. O homem ao
transformar a natureza, transforma o seu meio e a si mesmo, tornando-se produto das
relações sociais. Dessa forma, sua individualidade está condicionada pelas relações
históricas e sociais da qual fazem parte.
Portanto, o processo histórico se caracteriza pelo desenvolvimento de forças
produtivas, pelo progresso tecnológico e pela divisão social do trabalho, que estão em
constantes transformações, constituindo as relações sociais de produção e de classes
(Marx, 1982). Podemos afirmar aqui, que a história é um legado deixado pela sucessão
de diversas gerações anteriores que vão transformando a atividade transmitida,
modificando assim, velhas circunstâncias.
É, portanto, à caminhada da humanidade, que damos o nome de processo
histórico, e, não se pode admitir o surgimento de uma situação nova sem ligação com as
anteriores, pois o homem é um ser finito, temporal e histórico. Para a história, o tempo
só interessa nessa perspectiva tripla. Diante disso, mesmo estudando o passado mais
remoto, a história ajuda a explicar a realidade presente, indagando seus problemas,
podendo diagnosticar ações futuras.
Ademais, a História da Educação tem por objeto de estudo a problemática
educacional, dessa forma, contribui para que o educador construa um patrimônio
cultural sobre a área na qual atua. Para Nóvoa (2005), a pergunta “para que a História da
Educação?” elenca quatro motivos que segundo ele são: a) para cultivar um saudável
ceticismo, b) para compreender a lógica das identidades múltiplas, c) para pensar os
indivíduos como produtores de história, d) para explicar que não há mudança sem
história. Assim, torna-se necessário:
Desenvolver uma atitude crítica face às modas pedagógicas, de
analisarmos o jogo de identidades no espaço educativo, de situarmos a
4
nossa própria existência na narrativa histórica e de compreendermos
que a mudança se faz a partir de pessoas e de lugares concretos
(NÓVOA, 2005, p. 11).
Portanto, a História da Educação deve servir para que o educador entenda o
passado, torne-se mais cuidadoso nas opções dos métodos de ensinos utilizados no
presente, e compreenda “quem somos e como fomos”. A História da Educação nos
permite construir o patrimônio da profissão docente, tornando-nos profissionais críticos
e reflexivos, pois todo educador deve conhecer sua história, a fim de formar uma
identidade profissional, pois entender o passado nos ajuda a compreender o presente.
Logo, conscientes da importância da História da Educação na formação docente,
procuramos fazer com que os participantes envolvidos percebessem as relações
históricas e sociais que envolvem o contexto escolar, pois muitos problemas que
encontramos atualmente nas escolas são resquícios do nosso passado histórico. Dessa
forma, entendemos que a compreensão do processo histórico é imprescindível para a
análise crítica e reflexiva da realidade. Em se tratando de educação, é extremamente
importante este movimento, pois a partir desta dialética conseguimos traçar uma linha
do tempo que nos ajuda a visualizar quais foram, e quais são os objetivos desta
instituição social que tem o papel de humanizar o homem, assim, a existência da
educação inicia-se com a da humanidade.
Em um segundo momento, objetivou-se a reflexão teórica sobre a Pedagogia
Histórico-Crítica e o planejamento de ensino, partindo da reflexão sobre a concepção de
homem na perspectiva do materialismo histórico e dialético, com o intuito de discutir a
educação enquanto processo de humanização do homem. Além disso, foram colocadas
em pauta as alterações acerca das tendências pedagógicas brasileiras, a fim de
abordarmos o planejamento de ensino a partir desta perspectiva.
Para Saviani (2003), nascemos dotados de características humanas, e herdamos
da espécie capacidades que podem ser desenvolvidas por meio da apropriação da cultura
historicamente produzida pela humanidade. Assim, o homem se humaniza na relação
com outros homens, ou seja, é um ser sócio-histórico. Tudo o que o homem produz é
fruto de seu trabalho realizado perante as relações estabelecidas com outros homens,
portanto, toda a cultura historicamente produzida pela humanidade deve ser
disponibilizada para todos. Este acesso é viabilizado por meio da educação
sistematizada. Desta forma, é dever da educação instrumentalizar o sujeito para que
todos tenham condições de prover a sua existência.
5
A este respeito, a educação faz parte do trabalho humano, um trabalho não
material que se refere às produções humanas historicamente construídas pela
humanidade, assim como as demais naturezas do trabalho. É uma ação intencional que
supõe uma finalidade específica, é um fenômeno próprio da natureza humana, é a forma
pela qual o homem se apropria da humanidade. Para Saviani (2003, p. 13), a educação
pode ser classificada como:
Ideias, conceitos, valores, símbolos, hábitos, atitudes, habilidades, tais
elementos, entretanto, não lhe interessam em si mesmos, como algo
exterior ao homem [...] é o ato de produzir, direta e intencionalmente,
em cada individuo singular, a humanidade que é produzida
historicamente e coletivamente pelo conjunto dos homens.
Nesse sentido, a educação é um trabalho produzido pelos homens, na qual os
próprios homens estão inclusos nesta produção, pois o homem aprende a ser humano a
partir das relações que estabelece em seu meio. Cabe à educação sistematizada, a tarefa
de selecionar os elementos da cultura historicamente produzida pela humanidade, a fim
de propiciar ao sujeito, a aquisição de instrumentos que possibilitem o acesso ao saber
elaborado.
Sendo a escola um espaço que visa contribuir para a humanização do homem,
torna-se imprescindível discutir as tendências pedagógicas que norteiam a
sistematização do ensino escolar. Para essa discussão tomamos como pressupostos
teóricos as análises elaboradas por Saviani (1995), acerca das correntes pedagógicas que
norteiam a prática pedagógica em nossas instituições de ensino.
Saviani (1995) classifica as tendências pedagógicas adotadas no Brasil em dois
grupos. O primeiro grupo é designado como as teorias não-críticas, no qual ele inclui a
pedagogia tradicional, a escola nova e pedagogia tecnicista. Segundo Saviani (1995),
nas teorias não-críticas, a figura central é o professor, que tem como função transmitir o
conhecimento sistematizado de forma mecânica e gradual aos alunos, e a estes ficavam
somente a tarefa de assimilar os conhecimentos transmitidos pelo professor. Essa teoria
não foi bem sucedida por não considerar as diferenças individuais dos alunos.
Saviani (1995) classifica o segundo grupo como as teorias crítico-
reprodutivistas, que postulam que a educação está condicionada a organização da
sociedade, no qual a educação é um instrumento de reprodução social, que reforça o
modo de produção e a organização capitalista. Por meio da obra de Pierre Bourdieu e J.
6
C. Passeron (1975), Saviani (1995), faz uma análise da educação como fato social, no
qual explica que a violência simbólica é todo poder que impõe significações como
legítimas, procurando dissimular as forças materiais, ou seja, a dominação econômica
exercida pelos grupos ou classes dominantes sobre grupos ou classes dominados. Essa
dominação simbólica se concretiza por meio da influência dos meios de comunicação de
massa.
De acordo com a teoria, “a função da educação é a reprodução das desigualdades
sociais” (SAVIANI,1995, p. 31), ou seja, a ação pedagógica serve como instrumento da
classe dominante para impor uma cultura à classe dominada, contribuindo dessa forma
para a reprodução social. Nessa mesma perspectiva, Saviani (1995) cita Althusser, que
procura fazer uma diferenciação entre aparelhos repressivos do Estado e os aparelhos
Ideológicos do Estado.
Neste contexto, a educação apenas reproduz a relação própria do sistema
capitalista, ou seja, reproduz nas relações de produção uma sociedade dividida em
classes, de explorados e exploradores, no qual a grande parte da população (operários e
camponeses) cumpre apenas a escolaridade básica e é introduzido no processo de
produção e os que conseguem avançar no processo de escolarização, mas acabam por
interrompê-lo passando a integrar os quadros médios, ou seja, são os pequenos
burgueses. Somente aqueles que conseguem chegar ao topo da pirâmide escolar vão
ocupar os postos próprios dos “agentes da exploração” no sistema produtivo, dos
“agentes da repressão” (nos aparelhos repressivos do estado) e dos “profissionais da
ideologia” (nos aparelhos ideológicos do Estado). Nesse contexto, a escola é
considerada um instrumento da burguesia para garantir e perpetuar seus interesses.
Saviani (1995) realiza também a análise da teoria da escola dualista, que foi
elaborada por C. Baudelte R. Establet. Segundo esses autores, a escola é um aparelho
ideológico do Estado capitalista, no qual se divide em burguesia e proletariado. Nessa
perspectiva, a função da escola é a inculcação da ideologia burguesa feita de forma
explícita e a imposição disfarçada da ideologia proletária, pois a mesma qualifica o
trabalho intelectual e desqualifica o trabalho manual, sujeitando o proletariado à
ideologia burguesa sob um disfarce pequeno-burguês. Porém, essa teoria considera que
o proletariado possui uma força autônoma que tem origem fora da escola em
organizações próprias e a escola tem por missão impedir o desenvolvimento da
ideologia do proletariado e a luta revolucionária.
7
De maneira geral, Saviani (1995) pressupõe que as teorias crítico-reprodutivistas
explicam somente a razão do suposto fracasso, mostrando que na realidade a verdadeira
função das escolas é reproduzir as relações de produção da sociedade capitalista.
Conforme afirma Saviani (1995, p. 40) “a impressão que nos fica é que se passou de um
poder ilusório para a impotência”, pois essas tendências não apresentam nenhuma ação
para mudar a realidade expressa no contexto escolar. Dessa forma, Saviani (1995)
chama a atenção para a necessidade de uma teoria-crítica que seja formulada tendo em
vista os interesses dos dominados, que permita colocar nas mãos dos educadores o
exercício de um poder real de lutar contra a seletividade, a discriminação, a fim de
oferecer as camadas populares um ensino de qualidade como forma de superação da
marginalidade. Para tanto, o autor utiliza-se da teoria da “curvatura da vara” enunciada
por Lênin, no qual o mesmo afirma que “quando a vara esta torta, ela fica curva de um
lado e se você quiser endireitá-la, não basta colocá-la na posição correta. É preciso
curvá-la para o lado oposto” (LÊNIN apud SAVIANI, 1995, p. 48-49).
A ideia aqui apresentada por Saviani descreve sua teoria que parte do princípio
de unir forma e conteúdo, denominada Pedagogia Histórico-Crítica. Saviani (1995)
apresenta a Pedagogia Histórico-Crítica como “à medida que se diferencia no bojo das
concepções críticas; ela diferencia-se da visão crítico-reprodutivista, uma vez que
articula um tipo de orientação pedagógica que seja crítica sem ser reprodutivista”
(SAVIANI, 1995, p. 65), ou seja, uma pedagogia que não seja nem tradicional, nem
escolanovista.
Na terceira etapa do Curso de Extensão tivemos a pretensão de esclarecer aos
professores envolvidos a diferença entre planejamento e plano de ensino, enfatizando
que o primeiro é a ação pensada anteriormente ao plano, sendo o plano: a estrutura.
Assim, a proposta apresentada aos envolvidos no curso foi de elaboração de um plano
de unidade. Para tanto, utilizou-se da Didática da Pedagogia Histórico-Crítica,
elaborada por Gasparin (2003), e pautado em Saviani, apresentando aos professores o
passo a passo do planejamento (Primeiro passo: Prática Social Inicial; Segundo passo:
Problematização; Terceiro passo: Instrumentalização; Quarto passo: Catarse; Quinto
passo: Prática Social Final).
Justifica-se essa abordagem pelo fato de, a partir de 2006, a Pedagogia
Histórico-Crítica ser a linha pedagógica adotada no Estado do Paraná, porém, esta
tendência pedagógica pouco foi explicada aos professores. Vale salientar que no
decorrer do curso foi possível observar que alguns professores não tinham
8
conhecimento sobre esta tendência e ao menos conheciam quais eram os princípios
teóricos desta linha. De acordo com Gasparin e Peternucci (2012, p.3):
O educador, conhecendo a teoria que sustenta a sua prática, pode
suscitar transformações na conscientização dos educandos e demais
colegas, chegando até aos condicionantes sociais, tornando o processo
ensino-aprendizagem em algo realmente significativo, em prol de uma
educação transformadora, que supere os déficits educacionais e sociais
atuais.
Desta forma, a proposta de fazer este planejamento foi o de trazer para a
percepção dos envolvidos no Curso de Extensão de que todos os conteúdos científicos
trabalhados em sala de aula devem estar atrelados à prática social dos alunos, pois,
somente em poder dos conteúdos historicamente acumulados pela humanidade é que os
sujeitos estarão instrumentalizados para promover uma transformação social. A
proposta de Saviani visa transformar a importância da escola e dos conhecimentos
científicos enquanto ferramenta de inserção social, oportunizando uma formação do
sujeito enquanto ser crítico e reflexivo, autor da sua própria história. Segundo Saviani
(2003, p. 69),
Tais métodos situar-se-ão para além dos métodos tradicionais e novos,
superando por incorporação as contribuições de uns e de outros. Será
métodos que estimularão a atividade e iniciativa dos alunos. Serão
métodos que estimularão a atividade e iniciativa dos alunos sem abrir
mão, porém, da iniciativa do professor; favorecerão o diálogo dos
alunos entre si e com o professor, mas sem deixar de valorizar o
diálogo com a cultura acumulada historicamente; levaram em conta os
interesses dos alunos, os ritmos de aprendizagem e o desenvolvimento
psicológico, mas sem perder de vista a sistematização lógica dos
conhecimentos, sua ordenação e gradação para efeitos do processo de
transmissão-assimilação dos conteúdos cognitivos.
Saviani (2003) propõe que o ponto de partida seja a prática social comum ao
professor e alunos, ou seja, articular a experiência pedagógica com a prática social do
qual participam. O segundo passo seria a problematização do conteúdo, que consiste em
detectar as questões que necessitam ser resolvidas e o conhecimento que é necessário
dominar. No passo seguinte, o professor deverá instrumentalizar o aluno por meio de
elementos teóricos e práticos para que o mesmo possa equacionar os problemas
detectados inicialmente e chegar a “catarse” que seria a incorporação dos elementos
culturais que permitirá ao aluno transformar o meio social pela prática social. Este
método consiste em levar o aluno da síncrese à síntese por meio da mediação da análise.
9
[...] a “pedagogia revolucionária”, não é outra coisa senão aquela
pedagogia empenhada decididamente em colocar a educação a serviço
da referida transformações das relações de produção (SAVIANI,
2003, p. 76).
Teorizar e fundamentar a ação docente na perspectiva proposta foi de
fundamental importância para resignificar a ação docente dentro de um contexto
histórico. Assim, foi possível demonstrar aos professores envolvidos que é viável a
utilização do planejamento de ensino na perspectiva da Pedagogia Histórico-Crítica.
Dizeres dos professores
Como uma forma de acompanhar o processo de aprendizagem dos professores
envolvidos, sujeitamo-nos a entrevistar um dos mesmos, a fim de verificar a
importância e a diferença que o Curso de Extensão pode provocar em sua prática
pedagógica, atentando-nos ao fato de que eram especialistas nas áreas de: Língua
Portuguesa, Biologia, Educação Artística, Educação Física, Ciências e Matemática.
Sendo alguns professores do Ensino Fundamental I e II, outros do Ensino Médio.
Portanto, com o intuito de identificar qual estaria sendo a contribuição do Curso
de Extensão em seu processo de Formação Continuada, foi realizado um levantamento
de informações por meio de uma pequena entrevista com alguns professores, sendo que
ao analisar todas as respostas pode verificar que havia semelhanças em seus discursos
em relação a suas formações acadêmicas e a importância do desenvolvimento e
envolvimento de/em cursos de Extensões Universitárias. Com isso, tomamos como
referência um dos professores para expor nesta pesquisa. A primeira pergunta realizada
foi: “O curso de extensão tem contribuído para o seu processo de formação
continuada?”:
Com certeza, acreditamos que qualquer curso que o professor possa
fazer mesmo que tenha concluído um curso de pós-graduação, será
extremamente importante, pois há essa troca com companheiros de
outras áreas de conhecimento. Pelas próprias discussões que a gente
tem feito com o pessoal, tanto com os colegas da mesma escola tanto
com os das outras escolas, tem nos proporcionado novas ideias e
contribuindo com as que já tínhamos. Tem feito a gente rever muitas
práticas, descobrir qual é a pedagogia que esta vigente e tem feito a
gente repensar a maneira de abordar nossos conteúdos que é uma
coisa que com o passar do tempo você vai deixando para trás, porque
no dia a dia você não repensa muito isso e é bom dar uma parada para
10
rever. Um curso de extensão é uma forma de crescer enquanto
profissional.
A segunda pergunta foi: “Professor, em seus processos de formação, você teve
contato com conteúdos que foram abordados neste curso de extensão, como
História da Educação e Práticas Pedagógicas?”:
Não durante nossas graduações. Em alguns cursos, como
especializações ou de formação continuada é que temos visto o básico
em relação a estes conteúdos. Portanto, este curso está sendo muito
importante, pois é um conhecimento novo, é algo que pode ser
agregado a cada disciplina para enriquecer nosso trabalho em sala de
aula.
A terceira pergunta se referiu: “Você acredita que na educação possa haver
mudanças significativas se professores como vocês buscarem participar cada vez
mais de projetos com este desenvolvidos pelas universidades?” A resposta deixa
claro que:
Sim, se houver o dia que a gente deixar de acreditar que vai ter
mudanças na educação, a gente tem que parar de trabalhar. A
educação é um organismo vivo, então ela tem que estar
constantemente sendo abastecida para ela mudar, se não, nós não
vamos crescer enquanto educadores e nem nossos educandos vão
conseguir modificar a situação em que eles vivem. Por ela ser
constante, temos que sempre buscar e implantar novos conhecimentos.
Quando o educador se dispõe em fazer um curso como esse, a entrar
em contato com professores de outras áreas, a trocar informações, a
fazer um trabalho compartilhado, entrar nessa área ampla da educação
- Porque quem estuda suas disciplinas, acaba afastando um pouco da
área da educação - então só tem como contribuir sim. Participando da
elaboração destes projetos (planejamentos) esta sendo muito
enriquecedor, porque você acaba trocando com os companheiros,
trocando com vocês que vem com todo esse conteúdo para gente,
então é importante sim.
Achamos fundamental essa quebra de barreiras entre o ensino
fundamental I, o ensino fundamental II e médio e com a própria
faculdade. Ver que professores e acadêmicos estão em parceria com
as escolas públicas é fantástico, portanto, este projeto esta sendo muito
enriquecedor.
Por meio desta breve entrevista foi possível perceber pelas repostas dadas que o
Curso de Extensão pode contribuir positivamente para o aprendizado e Formação
Continuada de cada integrante do Curso de Extensão, assim também propulsou o
11
aprimoramento das questões educacionais que se ancoram nos pressupostos teóricos da
elaboração de planos de aula na perspectiva Histórico-Crítica, favorecendo
substancialmente na integração dos professores com a equipe pedagógica da mesma
escola, como também com os outros professores das outras escolas envolvidas,
provocando a interação e produtividade de acordo com os diferentes aprendizados que o
curso em si pode oferecer.
Interessante destacar a importância que o curso ganhou também no aspecto de
transmissão de conhecimentos proponentes da educação, como a História da Educação e
prática didática dos diversos conhecimentos, os quais são poucos abordados ou até
mesmo nem o são nos períodos de formação gradual dos especialistas. Portanto, se fez
necessário a contemplação dos mesmos tendo uma receptividade e retorno muito eficaz
tanto para os professores quanto as pesquisadoras.
Compreendemos e julgamos que um Curso de Extensão tende a ampliar os
conhecimentos já praticados ou não, daqueles que são considerados mediadores de
conhecimentos diversos e que sentem a necessidade de complementar sua própria
formação por meio da colaboração de outras pessoas possíveis de dialogar e criar
situações de interatividade com o objetivo de atingir toda uma comunidade. E, neste
caso, dentro da educação fica nítido por meio da entrevista, o quanto precisa se manter
atualizado e receptivo ao que há de novo a fim de proporcionar melhorias e qualidade
na educação em sentido amplo.
Considerações finais
O trabalho educativo é o ato de produzir direta e intencionalmente nos
indivíduos elementos culturais que precisam ser assimilados para que os mesmos se
tornem humanos e descubram formas adequadas para atingir esse objetivo. Porém, para
atingir esses objetivos é necessário distinguir entre o essencial e o acidental, o principal
e o secundário, o fundamental e o acessório, ou seja, constituir um critério para seleção
do trabalho pedagógico e criar formas adequadas para desenvolvê-los. A
institucionalização do pedagógico por meio da escola cria uma especificidade da
educação, que consiste em socializar o saber elaborado e sistematizado, a fim de
humanizar o homem.
Com base nestes aspectos, ao fazer uma análise da entrevista realizada com um
dos referidos professores participantes do Curso de Extensão, foi possível verificar que
ocorreu uma mudança significativa na execução dos seus trabalhos pedagógicos. O
12
destaque dentro do curso, além da História da Educação que norteia a realidade escolar,
foi a questão dos estudos dos pressupostos teóricos da Pedagogia Histórico-Crítica, pois
a mesma vem com uma perspectiva educacional que contempla as exigências de
transformações sociais que ocorrem no contexto escolar.
Portanto, ao colocarem em prática os pressupostos teóricos apreendidos no
decorrer do Curso de Extensão, os professores demonstraram um interesse significativo,
pois o mesmo fez com que fosse perceptível a necessidade de novas soluções para
integrar a realidade escolar de cada conteúdo científico com o conhecimento prévio dos
alunos, buscando melhorias não só nos números do IDEB, mas também resgatando o
interesse dos alunos para o conhecimento científico e para a transformação da sociedade
em que vivem.
Concomitantemente, salienta-se a importância desta reflexão teórica no seio da
Formação Continuada para estes profissionais da educação, uma vez são muitos os
desafios enfrentados por estes educadores no contexto da nossa sociedade, haja vista
que, as transformações decorrentes do capitalismo e da globalização não estão inerentes
ao processo educativo, e elas vem implicar também no ser e no fazer docente. Daí
deriva-se a importância de contribuir para a futura prática destes professores. Nesse
sentido, compreendemos que a contribuição do referido trabalho realizado amplia-se,
ultrapassando os limites dos muros das escolas e da Universidade, e rompendo as
fronteiras entre o conhecimento científico e a cultura escolar.
Referências
GASPARIN, J. L. Uma Didática para a Pedagogia Histórico-Crítica. 3. ed.
Campinas:Autores Associados, 2005.
GASPARIN, João Luiz; PETENUCCI, Maria Cristina. Pedagogia Histórico Crítica:
Da Teoria À Prática No Contexto Escolar. Ver:
http://www.diaadiaeducacao.pr.gov.br/portals/pde/arquivos/2289-8.pdf. Acesso em
21/12/2012.
MARX, Karl. Para a crítica da economia política. São Paulo: Abril Cultural, 1982.
NÓVOA, Antonio. Apresentação. In: STEPHANOU, Maria e BASTOS, Maria Helena
Câmara. Histórias e Memórias da Educação no Brasil: século XX.v. III. Petrópolis:
Vozes, 2005. (p. 9 a 13).
BOURDIEU, P; PASSERON, J. C. A reprodução . Elementos para uma teoria do
sistema de ensino. Rio de Janeiro: Francisco Alves, 1975.
13
SAVIANI. Dermeval. Sobre a Natureza e Especificidade da Educação. In: Pedagogia
Histórico-crítica. 5 ed. Campinas, SP: Autores Associados, 1995. p. 9-28.
_________. Pedagogia histórico- crítica. Campinas, São Paulo: Autores Associados,
2003.
SAVIANI, Dermeval. Escola e Democracia: teorias da educação, curvatura da vara,
onze teses sobre educação e política. 33.ª ed. revisada. Campinas: Autores Associados,
2000.
VAZQUEZ, Adolpho Sanchez. Filosofia da Práxis. Rio de Janeiro, Paz e Terra, 1977.