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51 ANO VII / Nº 12 Ilha de Itamaracá está localizada no litoral norte de Per- nambuco, nas proximidades da cidade de Recife, a uma distância de 47km, e que, percorrida por estrada de roda- gem, demanda cinqüenta minutos. Itamaracá é uma palavra de origem indígena que significa pedra que canta ou pedra sonante. O povoado surgiu em 1508 e foi elevado à categoria de vila em 1540. De águas cristalinas e esverdeadas, típica do mar nordes- tino, com vegetação rica em coqueirais e manguezais, possui 16km de praias lindíssimas e um rico patrimônio histórico e cultural que atrai, diariamente, expressivo número de turistas àquela região. O Forte Orange foi construído nessa ilha pelos holandeses, em 1631. Vamos nos aproximar dele e conhecer sua história e curio- sidades, como a do personagem Zé Amaro, ex-presidiário, que se apaixonou pelo forte e, quando foi libertado, retornou ao local, A “Dentro da barra da ilha de Itamaracá apresenta-se em primeiro lugar o forte Orange, situado sobre um baixo de areia separado de terra firme por uma angra que é vadeável, de baixa mar. Este forte domina a entrada do porto,visto que como os navios que entram têm que passar por diante dele a tiro de arcabuz...” Breve discurso de Maurício de Nassau, em 14 de janeiro de 1638. Paulo Roberto Rodrigues Teixeira FORTE ORANGE Praia de São Paulo Igreja de São Paulo Eng. Amparo Vila Velha Estuário do canal Eng. São João Eng. Velho Ponte Getúlio Vargas Jaguaribe Bola do Rio Pontal Queimadas Pilar (centro) Salinas NE NO SE SO O E N S ILHA DE ITAMARACÁ

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Page 1: Paulo Roberto Rodrigues Teixeira - Amazonas BikeNas operações de guerra ou nos exercí-cios, a rotina tranqüila do forte transformava-se. Pelas rampas de acesso ao terrapleno, fazia-se

51ANO VII / Nº 12

Ilha de Itamaracá está localizada no litoral norte de Per-

nambuco, nas proximidades da cidade de Recife, a uma

distância de 47km, e que, percorrida por estrada de roda-

gem, demanda cinqüenta minutos.

Itamaracá é uma palavra de origem indígena que significa

pedra que canta ou pedra sonante.

O povoado surgiu em 1508 e foi elevado à categoria de vila

em 1540. De águas cristalinas e esverdeadas, típica do mar nordes-

tino, com vegetação rica em coqueirais e manguezais, possui 16km

de praias lindíssimas e um rico patrimônio histórico e cultural que

atrai, diariamente, expressivo número de turistas àquela região.

O Forte Orange foi construído nessa ilha pelos holandeses,

em 1631. Vamos nos aproximar dele e conhecer sua história e curio-

sidades, como a do personagem Zé Amaro, ex-presidiário, que se

apaixonou pelo forte e, quando foi libertado, retornou ao local,

A

“Dentro da barra da ilha de Itamaracá apresenta-se em primeiro lugar o forte Orange, situado sobre um baixo

de areia separado de terra firme por uma angra que é vadeável, de baixa mar. Este forte domina a entrada

do porto,visto que como os navios que entram têm que passar por diante dele a tiro de arcabuz...”

Breve discurso de Maurício de Nassau, em 14 de janeiro de 1638.

○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○

Paulo Roberto Rodrigues Teixeira

FORTEORANGE

Praia deSão Paulo

Igreja deSão PauloEng. Amparo

VilaVelha

Estuáriodo canal

Eng. São JoãoEng. Velho

PonteGetúlio Vargas

Jaguaribe

Bola do Rio

Pontal

Queimadas

Pilar(centro)Salinas

NEN

O

SE

SO

O E

N

S

ILHA DE ITAMARACÁ

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onde permanece até hoje. Apre-

ciaremos, ainda, as característi-

cas e fases de sua construção. A

primeira, pelos holandeses, a se-

gunda, pelos portugueses, refe-

rências que o qualificam como

um dos cartões postais de Recife.

História

A colonização portuguesa no

Norte e no Nordeste teve seu pon-

to central no Estado de Pernam-

buco. Foi lá que, em 1516, os portugueses instalaram

uma Feitoria Régia. Posteriormente, em 1535, desem-

barcou, nesse mesmo local, o primeiro donatário da Ca-

pitania de Pernambuco, Duarte Coelho, acompanhado

de sua mulher.

A região prosperou muito e os engenhos de açú-

car se multiplicaram, pois a terra era fértil e produti-

va. Além do açúcar, escoava por essa área produtos do

extrativismo local, entre eles o pau-brasil.

Entre 1580 e 1640, período de união das coroas

portuguesa e espanhola, os holandeses tomaram a

decisão de invadir o Brasil, pelo Nordeste, com o obje-

tivo de garantir-lhes o cobiçado comércio de açúcar

e enfraquecer economicamente

a Espanha. Em 15 de fevereiro de

1630, desembarcaram na Praia de

Pau Amarelo e, posteriormente,

marcharam e ocuparam a cidade

de Olinda, apesar da resistência

dos pernambucanos.

Em 1631, partiram para a

Ilha de Itamaracá, situada mais ao

norte. O Canal de Santa Cruz, que

separa a ilha do continente, era a

principal via de acesso às áreas

produtivas. Constituía-se em um

ponto estratégico, o qual domina-

va a entrada do canal e que con-

trolava o acesso marítimo a Igarassu, à Vila da Concei-

ção e as demais áreas de escoamento das riquezas. Em

uma primeira tentativa de ocupação, foram repelidos

pelo Capitão Salvador Ribeiro, que comandava a guar-

nição portuguesa. Regressando ao Recife, o Tenente-

Coronel Steyn Callenfels determinou que fosse cons-

truído um forte com 33 bocas-de-fogo.

Essa pequena instalação, erguida na região sudes-

te da ilha, tinha o objetivo de apoiar operações futu-

ras. A edificação, inicialmente, executada em “taipa de

pilão”, um sistema rudimentar de levantamento de pa-

redes e muros, muito utilizado na época, foi projetada

pelo Engenheiro Pieter Van Buerin e coordenada pelo

O Forte Orangeconstruído pelos holandesesem 1631,na Ilha de Itamaracá.

Desembarque dosholandesesem Recife e Olindano ano de 1630.

Desembarque dosholandesesem Recife e Olindano ano de 1630.

Desembarque dosholandesesem Recife e Olindano ano de 1630.

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Tenente-Coronel Steyn. Foi denominado Forte Oran-

ge, em homenagem ao príncipe Frederico Henrique de

Orange, que descendia de Guilherme, o Taciturno, tio

de Maurício de Nassau.

A concentração das forças holandesas ocorreu

nesse local e de lá, sob o comando de Schkoppe, parti-

ram para o ataque a Itamaracá, onde derrotaram as

tropas portuguesas.

A estrutura da posição de defesa do forte foi am-

pliada e tornou-se, mais tarde, um complexo defensivo,

com paliçadas e hornaveques. Era o suficiente para pro-

teger a Barra de Itamaracá, que dava acesso ao antigo

Porto de Pernambuco e às vilas de Igarassu (Pernam-

buco) e da Conceição, depois Vila Schkoppe (Itamaracá).

Em fins de 1632, os luso-brasileiros, sob comando

de Bagnuolo, tentaram tomar o forte. O sigilo das ope-

rações era fundamental para o êxito da missão, o que

não ocorreu.Os holandeses se cientificaram do ataque,

prepararam-se, resistiram e foram vitoriosos na opera-

ção de guerra. Bagnuolo retirou-se, deixando, para os

holandeses, as peças de artilharia usadas no combate.

Foram quatro de bronze, que pertenciam ao Forte Real

do Bom Jesus.

Em 1640, esse forte serviu de prisão para frades

carmelitas, são-bentenses e franciscanos, considerados,

pelos holandeses, espiões e contrários à expansão do

calvinismo no Brasil.

Em 1654, quando pouco restava sob o domínio

holandês, a instalação foi abandonada por suas tropas

e, em seguida, ocupada por luso-brasileiros, sob o co-

mando de Francisco de Figueiroa. De seu armamento

constavam 25 peças de diferentes calibres de 10 e 20

As muralhas debruçadas sobre o mar,construídas pelos portugueses.

A entradado forte. Em cima

da porta deacesso, o frontãoguarda o símbolo

da Coroaportuguesa.

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tenente; um sargento; um condestável (chefe dos ar-

tilheiros) e duas companhias dos terços de Recife, com

artilheiros especializados.

Reformado em 1777, o forte foi ocupado pelo

Padre Tenório, em 1817, durante a Revolução Per-

nambucana. Ainda que houvesse um planejamento

de reforma, sua construção não chegou a ser concluí-

da nos moldes previstos no projeto.

Em 1971, foram realizadas várias escavações,

dentro e fora do forte, pelo laboratório de arqueolo-

gia da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE),

chefiada pelo Arqueólogo Marcos Albuquerque,

oportunidade em que identificaram a cozinha, a ca-

pela, os alojamentos e os paióis. Foram resgatados,

também, vários objetos de uso pessoal dos holande-

ses, como munições e canhões de vários calibres. Em

um deles, havia a seguinte inscrição: Anno Domini

1622 Joanes Sithof Me Fecit Bruxeles.

Em 1973, foi parcialmente restaurado pela Se-

cretaria do Patrimônio Histórico e Artístico Nacio-

nal (SPHAN).

Em 1980, o Ministério do Exército realizou al-

gumas reformas, transferindo sua administração pa-

ra a Prefeitura Municipal de Itamaracá. Surgiu, nesse

período, o personagem José Amaro de Souza Filho,

ex-presidiário e artesão, que passou a ser o guardião

do forte, situação que perdura até os dias atuais.

A partir de 1991, foi criada a Fundação Forte Oran-

ge pelo próprio José Amaro, que se tornou o presi-

dente da entidade. Esta começou a se encarregar da

administração do forte até 1988, quando o patrimô-

nio foi retomado da prefeitura e transferido para o

Ministério da Cultura e, logo após, para a Fundação

de Apoio ao Desenvolvimento da Universidade Fe-

deral de Pernambuco (FADE/UFPES).

A FADE coordenou projetos de pesquisa ar-

queológica com recursos do Governo holandês, em

fevereiro de 2002, de defesa da estrutura contra o

mar, com verbas da Prefeitura Municipal, bem como

de intervenção de restauro, e instalação de um mu-

polegadas. Derrotados os holandeses, o forte ficou em

ruínas, sendo reconstruído pelos portugueses, que coloca-

ram, sobre o portão de entrada, as armas do Reino de

Portugal, passando a denominar-se Fortaleza de Santa

Cruz de Itamaracá.

Foi reconstruído em 1696, e sua guarnição possuía a

seguinte constituição: um sargento-mor; um capitão; um

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A muralha de pedras guarnecidapelos canhões.

Um dos canhões coloniais em posição,de frente para o mar.Um dos canhões coloniais em posição,de frente para o mar.Um dos canhões coloniais em posição,de frente para o mar.

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seu, com os testemunhos arqueológicos encontrados

nas escavações, com apoio financeiro do Governo do

Estado de Pernambuco e do Instituto do Patrimônio

Histórico e Artístico Nacional (IPHAN).

O Forte“...é um forte quadrangular com quatro

baluartes, elevados, tendo em certo trecho um fosso,

mas pouco profundo e seco;

está cercado por uma forte estacada...”

Relatório sobre o estado das capitanias conquistadas

no Brasil (4 de abril de 1640).

O Forte Orange possui uma estrutura

arquitetônica das mais belas e seguras de to-

dos aqueles que foram edificados no perío-

do colonial. Seus quatro baluartes permi-

tiam a segurança em todas as direções, quer

a ameaça fosse por terra ou por mar. Prote-

gia o acesso ao embarque e ao desembarque

de navios que se destinavam aos portos de

Igarassu e Vila da Conceição, cujo nome veio

a ser mudado para Vila Schkoppe. Era cerca-

do por uma estacada em alvenaria de pedra bruta, situa-

da em posição estratégica, dominando todo acesso as

duas importantes povoações. Seu armamento constava

de 25 peças de diferentes calibres.

A região do forte é uma área de incidência muito

intensa de correntes de ventos que se alteram segundo a

Frente do Forte Orange. Ao ladoa planta baixa do projeto.

Museu instalado nointerior do forte.

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época do ano. Apesar da grande quantidade

de detritos trazidos pelo rio que deságua en-

tre a ilha e o continente, conserva-se um ca-

nal com profundidade suficiente para hoje

navegarem embarcações de até nove metros.

Formam-se bancos de areia que, movidos pe-

los ventos, deslocam-se de um lugar para o ou-

tro. O forte sofre com as intempéries e, muitas

vezes, as areias ameaçam atingir o topo das

muralhas, invadindo os terraplenos.

O mar também deixa suas marcas nas pa-

redes de pedras, ora cavando perigosamente

as bases, ora depositando grandes volumes de

areia a seus pés. Até mesmo sua entrada, vol-

tada em direção oposta ao mar, muitas vezes

é entulhada pela areia movimentada pelos

ventos. O frontão, acima da porta de acesso,

guarda o símbolo da Coroa portuguesa. É

um belíssimo trabalho de cantaria, executa-

do em calcário. O forte, em sua maior parte,

foi construído em pedra calcária, principal-

mente suas muralhas.

As paredes do trânsito, que dão acesso

para o forte, dispõem de seteiras, de onde os

homens disparavam contra o inimigo que pe-

netrasse em seu interior, após rompida a bar-

ragem dos fogos de artilharia.

Uma segunda linha de defesa era a por-

ta, tipo guilhotina, coberta por fogos cruza-

dos do defensor. A terceira linha, a porta no

limite da praça de armas, constituía-se no

último obstáculo a vencer por quem invadis-

se a edificação.

Sobre o trânsito, o corpo da guarda e de-

mais dependências encostadas às contramu-

ralhas da cortina de entrada, corria um piso

em madeira, o assoalho de um sobrado, que

seria, provavelmente, as acomodações do co-

mandante e de seus assessores. No intuito de

vencerem o amplo vão do corpo da guarda e

As seteiras, ao longo da entrada,protegiam o homemque atirava contra o invasor.

As seteiras, ao longo da entrada,protegiam o homemque atirava contra o invasor.

As seteiras, ao longo da entrada,protegiam o homemque atirava contra o invasor.

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cadeia, usaram arcos romanos para a susten-

tação do piso superior, sem que fosse perdido

o espaço necessário às operações realizadas

pelos soldados na defesa do forte.

A capela destacava-se no interior do for-

te, dominando a visão de quem chegasse na

porta de entrada. O alojamento a seu lado dava

início a uma sucessão de dependências que

contornavam a praça das armas. No centro

do pátio, uma cacimba garantia o abasteci-

mento de água, que era salobra, para algu-

mas necessidades.

Nas operações de guerra ou nos exercí-

cios, a rotina tranqüila do forte transformava-

se. Pelas rampas de acesso ao terrapleno, fazia-

se uma intensa movimentação, abastecendo-

se cada bateria com os apetrechos necessários.

As paredes dos alojamentos eram de pe-

dra e cal, já se podendo perceber uma maior

heterogeneidade do material. Calcário, are-

nitos, cortados, muitas vezes, nos arrecifes,

concreções areníticas, extraídas nas barreiras,

bem como fragmentos de corais, conhecidos

como “cabeça-de-carneiro”.

A base que suporta em balanço as gua-

ritas elevadas do solo, fechando os bastiões, é

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de cantuária. Elas permanecem até hoje como

se continuassem o trabalho das antigas senti-

nelas a observar o horizonte.

Curiosidade

“... e Deus ouviu as minhas orações”.

(Zé Amaro. 15 de maio de 2007.)

José Amaro de Souza Filho, mais conhe-

cido como Zé Amaro, é um personagem per-

nambucano, cuja história é um exemplo de per-

severança, determinação e, sobretudo, de fé.

Na década de 1970, com mais de 20 anos,

foi condenado a passar 16 anos na prisão por

crime de homicídio. Foi uma experiência amarga,

mas que marcou o início de uma operação de trans-

formação em sua vida.

Foi conduzido, inicialmente, à Casa de De-

tenção do Recife, depois transferido para a recém-

construída Penitenciária Agrícola de Itamaracá.

Sua responsabilidade diária era colher cocos ver-

des e manter limpo o Forte Orange. No decorrer

dos anos, apaixonou-se pelo forte e começou a bus-

car ajuda de Deus para que, quando terminasse o

cumprimento da pena, viesse a morar nele e cuidar

da sua manutenção.

Por haver cometido um ato de indisciplina,

foi transferido para outro presídio, também na

Ilha de Itamaracá. Lá, desenvolveu sua veia artísti-

ca. Dedicou-se ao artesanato de entalhes em ma-

deira, desabrochando, então, um artista cujos tra-

balhos o tornariam conhecido em todo o Brasil.

Ao sair da prisão, por livramento condicio-

nal, cumpriu-se o que pedira a Deus: foi morar no

forte, autorizado pelo Ministério do Exército e

pelo Serviço de Patrimônio da União. Enfrentou

um período muito difícil, uma vez que o patri-

mônio estava totalmente abandonado, envolvi-

do pela vegetação, à mercê de marginais e vicia-

dos que lá se instalavam, dificultando o acesso do

Portas que davam acessoao pátio interno.

A guarita, onde a sentinela observava o setorde vigilância, à sua frente.A guarita, onde a sentinela observava o setorde vigilância, à sua frente.

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público à visitação. Estava só, para cumprir a ár-

dua tarefa. Contou, no entanto, com o apoio do

Exército e, em várias oportunidades refere-se elo-

giosamente ao Gen Valdir, Gen Pamplona, Cel

Sombra e outros comandantes, que muito o aju-

daram. Sem medir esforços, foi bem-sucedido e

conseguiu preservá-lo.

Hoje é o presidente da Fundação Forte Oran-

ge, que ele mesmo criou, em 1991. Em 1994, inau-

gurou um museu, com precioso acervo de relíquias,

deixadas pelos holandeses e portugueses, as quais

foram por ele próprio encontradas.

A história de Zé Amaro prossegue. Todos o

conhecem como o “Guardião do Forte”, designa-

ção que lhe foi outorgada pelo povo.

Homem simples, ex-presidiário que, pela fé, viu

o cumprimento do grande sonho de sua vida. En-

contra-se lá até hoje e, cordialmente, recebe os visi-

tantes, expressando com orgulho o trabalho que rea-

lizou, consciente de que Deus continua a ampará-

lo e que viverá o resto de sua vida cuidando do forte.

As muralhas foram construídasem pedras de calcário.

Zé Amaro, junto de umadas suas esculturas.

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Encerramento

Atualmente, existem ao redor do forte inúmeras pousadas e

um hotel de luxo, para atender aos turistas que procuram se deleitar

nos fins de semana, especialmente nos períodos de férias.

Os restaurantes e os quiosques oferecem farta e saborosa ali-

mentação, predominando, no cardápio, os frutos do mar. A natureza

encanta os visitantes com suas belíssimas praias, as dunas, a brisa do

mar, os manguezais. Enfim, um cenário maravilhoso, que valoriza a

herança recebida de nossos antepassados.

A revitalização do Forte Orange está para se concretizar.

Em breve, disporemos do patrimônio histórico totalmente res-

taurado. O projeto foi aprovado e os recursos, provenientes do Banco

do Nordeste do Brasil (BNB), permitirão que sejam executadas obras

de contenção, restauração arquitetônica, musealização, gestão e pla-

nos de financiamento das ações, que, sem dúvida, contribuirão para

valorizar o precioso acervo cultural, orgulho do povo pernambucano.

Paulo Roberto Rodrigues Teixeira – Coronel de Infantaria e Estado-Maior, é natural do Rio de Janeiro. Tem o curso

de Estado-Maior e da Escola Superior de Guerra. Atualmente é assessor da FUNCEB e redator-chefe da Revista DaCultura.

... um cenário maravilhoso, que valoriza a herançarecebida de nossos antepassados.