patrimonio cultural

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  • Patrimnio Cultural

    Fernanda Cordeiro de Almeida

  • Jouberto Ucha de MendonaReitor

    Amlia Maria Cerqueira UchaVice-Reitora

    Jouberto Ucha de Mendona JuniorPr-Reitoria Administrativa - PROAD

    Ihanmarck Damasceno dos SantosPr-Reitoria Acadmica - PROAC

    Domingos Svio Alcntara MachadoPr-Reitoria Adjunta de Graduao - PAGR

    Temisson Jos dos SantosPr-Reitoria Adjunta de Ps-Graduao

    e Pesquisa - PAPGP

    Gilton Kennedy Sousa FragaPr-Reitoria Adjunta de Assuntos Comunitrios e Extenso - PAACE

    Jane Luci Ornelas FreireGerente do Ncleo de Educao a Distncia - Nead

    Andrea Karla Ferreira NunesCoordenadora Pedaggica de Projetos - Nead

    Lucas Cerqueira do ValeCoordenador de Tecnologias Educacionais - Nead

    Equipe de Elaborao e Produo de Contedos Miditicos:

    Alexandre Meneses Chagas - Supervisor Ancjo Santana Resende - CorretorClaudivan da Silva Santana - DiagramadorEdivan Santos Guimares - DiagramadorGeov da Silva Borges Junior - IlustradorMrcia Maria da Silva Santos - CorretoraMatheus Oliveira dos Santos - IlustradorMonique Lara Farias Alves - WebdesignPedro Antonio Dantas P. Nou - WebdesignRebecca Wanderley N. Agra Silva - DesignRodrigo Sangiovanni Lima - AssessorWalmir Oliveira Santos Jnior - Ilustrador

    Redao:Ncleo de Educao a Distncia - NeadAv. Murilo Dantas, 300 - FarolndiaPrdio da Reitoria - Sala 40CEP: 49.032-490 - Aracaju / SETel.: (79) 3218-2186E-mail: [email protected]: www.ead.unit.br

    Impresso:Grfica GutembergTelefone: (79) 3218-2154E-mail: [email protected]: www.unit.br

    Copyright Universidade Tiradentes

    A447p Almeida, Fernanda Cordeiro de.Patrimnio cultural. / FernandaCordeiro de Almeida.

    Aracaju : UNIT, 2010.

    160 p. : il.

    Inclui bibliografia

    1. Patrimnio cultural. I. Universidade Tiradentes (UNIT). Ncleo de Educao Distncia - NEAD. II. Ttulo.

    CDU: 351.853

  • Prezado(a) estudante, A modernidade anda cada vez mais atrelada ao tempo, e a

    educao no pode ficar para trs. Prova disso so as nossas disci-plinas on-line, que possibilitam a voc estudar com o maior confor-to e comodidade possveis, sem perder a qualidade do contedo.

    Por meio do nosso programa de disciplinas on-line voc pode

    ter acesso ao conhecimento de forma rpida, prtica e eficiente, como deve ser a sua forma de comunicao e interao com o mundo na modernidade. Fruns on-line, chats, podcasts, livespace, vdeos, MSN, tudo vlido para o seu aprendizado.

    Mesmo com tantas opes, a Universidade Tira-

    dentes optou por criar a coleo de livros Srie Biblio-grfica Unit como mais uma opo de acesso ao conhe-cimento. Escrita por nossos professores, a obra contm todo o contedo da disciplina que voc est cursando na modalidade EAD e representa, sobretudo, a nossa preocupao em garantir o seu acesso ao conhecimento, onde quer que voc esteja.

    Desejo a voc bom aprendizado e muito sucesso!

    Professor Jouberto Ucha de MendonaReitor da Universidade Tiradentes

    Apresentao

    iblio-onhe-ntm ando

  • SumrioParte I: Histria E Patrimnio Cultural: Uma Relao

    Necessria ......................................................................11

    Tema 1: Patrimnio Cultural: Conceitos e Trajetria ..........131.1 Conceitos de cultura e de identidade cultural na

    sociedade contempornea .......................................... 14

    1.2 Patrimnio cultural: da origem ao patrimnio global . 21

    1.3 Patrimnio cultural material ........................................ 32

    1.4 Patrimnio cultural imaterial ........................................ 40

    Resumo do Tema I .............................................................. 48

    Tema 2: Preservao do Patrimnio Cultural .......................492.1 IPHAN: fomentador da proteo do patrimnio

    cultural brasileiro ......................................................... 492.2 Aes preservacionistas: A legislao brasileira e

    as cartas patrimoniais .................................................. 572.3 A preservao do patrimnio material ........................ 632.4 A preservao do patrimnio imaterial ....................... 71Resumo do Tema II ............................................................. 81

    Parte II: Educao Patrimonial E O Patrimnio Mundial: A Preservao Como Ao Contnua ..........................83

    Tema: 3 Educao Patrimonial: Mtodos e Tcnicas ..........853.1 Educao patrimonial: conceitos, objetivos e

    metodologia.................................................................. 863.2 O ensino de histria, a histria local e o patrimnio .....923.3 Educao patrimonial, interdisciplinaridade e as

    possveis leituras dos objetos culturais ..................... 993.4 Exemplos de Educao Patrimonial no Brasil .......... 105

    Resumo do Tema III .......................................................... 111

  • Tema: 4 O Patrimnio Mundial: Bens da Humanidade .....1134.1 A Conveno da UNESCO: De 1972 at o presente 114

    4.2 Os bens do patrimnio natural no Brasil ................... 122

    4.3 Os bens do patrimnio cultural no Brasil .................. 132

    4.4 Requisitos e limitaes para incluso na lista da

    UNESCO ..................................................................... 145

    Resumo do Tema IV ......................................................... 151

    Referncias ............................................................................152

  • Concepo da Disciplina

    Ementa

    Compreender e analisar o papel da Histria e do Patrimnio Cultural na construo das identidades na contemporaneidade. Demonstrar a importncia do conceito de cultura, patrimnio e identidade cultural para a compreenso da sociedade contempo-rnea. Conceituar e classificar as modalidades dos patrimnios material e imaterial. Observar de que maneira a Educao pode contribuir para a preservao do Patrimnio Mundial. Destacar a importncia da Educao Patrimonial como instrumento da preservao do Patrimnio Histrico-Cultural.

    Objetivos

    Geral Estudar o patrimnio cultural nas suas mais diversas esferas

    e classificaes atravs da observao do contexto da sociedade contempornea enfocando a importncia da educao patrimonial e do ensino de Histria para a preservao do patrimnio em suas derivaes.

    Especficos

    Entender os conceitos de patrimnio, cultura e identidade

    cultural no contexto da sociedade contempornea;

    Observar as divergncias entre patrimnio material e

    imaterial, observando as peculiaridades de cada um deles;

  • Demonstrar o papel do patrimnio na construo das

    identidades culturais;

    Explicar os mecanismos de proteo ao patrimnio cul-

    tural atravs dos processos de tombamento, inventrio e

    registro;

    Expor a trajetria e a metodologia da educao patri-

    monial, bem como explicitar algumas propostas desse

    mtodo aplicadas em mbito nacional.

    Discutir o papel do ensino de Histria (histria local) como

    processo integrante dos contextos patrimoniais;

    Conhecer os exemplares do patrimnio mundial no Brasil,

    bem como a Conveno da Unesco (1972) que os ratifica;

    Orientao para Estudo

    A disciplina prope orient-lo em seus procedimentos de estudo e na produo de trabalhos cientficos, possibilitando que voc desenvolva em seus trabalhos pesquisas, o rigor metodo-lgico e esprito crtico necessrios ao estudo.

    Tendo em vista que a experincia de estudar a distncia algo novo, importante que voc observe algumas orientaes:

    Cuide do seu tempo de estudo! Defina um horrio regular para acessar todo o contedo da sua disciplina disponvel neste material impresso e no Ambiente Virtual de Apren-dizagem (AVA). Organize-se de tal forma para que voc possa dedicar tempo suficiente para leitura e reflexo;

  • Esforce-se para alcanar os objetivos propostos na disciplina;

    Utilize-se dos recursos tcnicos e humanos que esto ao seu dispor para buscar esclarecimentos e para aprofundar as suas reflexes. Estamos nos referindo ao contato perma-nente com o professor e com os colegas a partir dos fruns, chats e encontros presencias. Alm dos recursos disponveis no Ambiente Virtual de Aprendizagem AVA.

    Para que sua trajetria no curso ocorra de forma tranquila, voc deve realizar as atividades propostas e estar sempre em contato com o professor, alm de acessar o AVA.

    Para se estudar num curso a distncia deve-se ter a clareza que a rea da Educao a Distncia pauta-se na autonomia, responsabilidade, cooperao e colaborao por parte dos envolvidos, o que requer uma nova postura do aluno e uma nova forma de concepo de educao.

    Por isso, voc contar com o apoio das equipes pedaggica e tcnica envolvidas na operacionalizao do curso, alm dos recursos tecnolgicos que contribuiro na mediao entre voc e o professor.

  • Parte I

    HISTRIA E PATRIMNIO CULTURAL: UMA RELAO NECESSRIA

  • 1 Patrimnio Cultural: Conceitos e TrajetriaPatrimnio, cultura, identidade. O que estas trs palavras

    tm a ver com a histria? De que maneira estes trs conceitos

    contribuem para a construo da sociedade contempornea?

    Estas respostas sero observadas ao longo desta unidade, pois a

    mesma ir trabalhar com conceitos fundamentais do patrimnio

    cultural. Nesse sentido, faz-se necessria uma aproximao com

    estas palavrinhas to presentes no nosso cotidiano. Ao estudar

    estes conceitos logo a seguir voc ver que patrimnio, cultura e

    identidade esto mais presentes em sua vida do que voc supunha

    imaginar, fazendo parte do seu contexto enquanto cidado que

    interage com o passado, vive o tempo presente e se preocupa

    com o mundo e as suas futuras geraes.

  • 14 Patrimnio Cultural

    1.1 CONCEITOS DE CULTURA E DE IDENTIDADE CULTURAL NA SOCIEDADE CONTEMPORNEA

    O homem est rodeado pela cultura1. Para tentarmos entender de que maneira a cultura interfere no modo de pensar e de agir de dife-rentes povos basta pegarmos como exemplo a alimentao. Ns, oci-dentais, somos acostumados a to-mar leite de vaca. Isto seria inconce-bvel para os indianos, que possuem como sistema religioso majoritrio em seu pas o hindusmo, que consi-dera a vaca um animal sagrado.

    Outro exemplo refere-se aos diversos significados que as cores adquirem a partir dos diferentes sistemas culturais em que esto imersas. Para ns brasileiros e ocidentais, vestir preto quando algum parente morre algo comum e significa respeito, conside-rao pela pessoa que ser enterrada. J em outros pases que possuem um sistema cultural diverso do nosso vestir preto seria inconcebvel. Mais adiante, no final desta seo voc ver em texto complementar o significado das cores para cada cultura e poder refletir depois sobre isto.

    As teorias modernas sobre a culturaAs teorias modernas sobre a cultura2, abordam este con-

    ceito a partir de diferentes ticas: a primeira reconhece a cultura como um sistema adaptativo (essa adaptao pode ser o meio, a tecnologia, a organizao social) e as teorias idealistas de cultura (sistema cognitivo, sistemas estruturais ou sistemas simblicos). A cultura como sistema adaptativo est assentada, principalmente,

    1 Para Ruth Benedict a cultura

    uma lente atravs da qual o

    homem v o mundo, nasce,

    cresce e age num ambiente

    culturalmente construdo.

    2 Sobre o assunto leia

    mais nas pginas 59 a 62,

    em LARAIA, Roque Barros

    de. Cultura: um conceito

    antropolgico. 22 ed. Rio de

    Janeiro: Jorge Zahar ed., 2008.

  • Tema I | Patrimnio Cultural: Conceitos e trajetria 15

    no determinismo biolgico3. J as teorias idealistas esto embasadas no comportamento das comunida-des como fator determinante das culturas.

    As teorias modernas que en-xergam a cultura como um sistema adaptativo so defendidas por neo-evolucionistas como Leslie White e reinterpretadas por expoentes como Sahlins, Harris, Carneiro, Vayda e Rappaport, dentre outros. Em linhas gerais, Laraia (2008) resume os principais pensamentos que compem esta linha terica (teoria adaptativa da cultura):

    1) As culturas compem-se de sistemas que servem para adaptar as comunidades humanas aos seus embasa-mentos biolgicos;

    2) A mudana cultural pode ser comparada ao processo de adaptao da seleo natural;

    3) Os elementos da organizao social, a economia de subsistncia e a tecnologia que esto ligados produo compem o domnio mais adaptativo da cultura;

    4) Os componentes ideolgicos dos sistemas culturais podem ter como conseqncias adaptativas a manipulao da populao, da economia e influenciar a preservao ou no de bens naturais;

    3 Determinismo biolgico

    uma teoria que teve incio

    no sculo XIX, inspirada

    na teoria da evoluo das

    espcies (evolucionismo) de

    Charles Darwin que determina

    que algumas caractersticas

    genticas podem influenciar

    no comportamento das

    pessoas.

  • 16 Patrimnio Cultural

    J as teorias idealistas da cultura possuem trs linhas majo-ritrias e possuem como representantes W. Goodenough, Claude Lvi-Strauss e Clifford Geertz/David Schneider, respectivamente:

    1) A cultura como sistema cognitivo, ou seja, a anlise da cultura realizada pelos prprios membros da comunidade a respeito do seu modo de vida;

    2) A cultura como sistemas estruturais, ou seja, um sistema simblico formulado a partir da criao acumulativa da mente humana;

    3) A cultura como sistemas simblicos, na qual a cultura seria um conjunto de mecanismos de controle para governar os comportamentos;

    A identidade culturalMas de que maneira a cultura pode influenciar o nosso co-

    tidiano? Desde pequenos somos acostumados a ver o mundo a partir da tica dos nossos pais ou do nosso direcionamento reli-gioso, por exemplo. Quando crescemos, passamos a questionar e discutir o mundo a partir da viso dos nossos amigos, colegas de faculdade e da nossa prpria viso. Pois , estas maneiras de ver o mundo que chamamos de identidade cultural.

    Em seu livro A identidade cultural na ps-modernidade, Stuart Hall4 discute o papel das identidades culturais no mundo contemporneo. Para Hall (2006), a identidade cultural uma celebrao mvel, ou seja, no fixa. Alm disso, formada e transformada continuamente atravs da relao que mantemos com os sistemas culturais que nos rodeiam. Assim, a identi-dade cultural definida historicamente e no biologicamente. O sujeito pode assumir diversas identidades em diferentes momentos, a partir dos contextos de representao cultural em

  • Tema I | Patrimnio Cultural: Conceitos e trajetria 17

    que est inserido. Em ns habita uma multiplicidade inconstante de identidades.

    Stuart Hall (nascido em 3 de fevereiro de 1932 em Kingston, Jamaica) um terico cultural que trabalha no Reino Unido. Ele contribuiu com obras chave para os estudos da cultura e dos meios de comunicao, assim como para o debate poltico.Fonte: http://www.wikipedia.org

    Foto: http://www.psychoanalysis.cz

    No mundo contemporneo, o sujeito encontra-se descen-trado, ou seja, sem um centro condutor de seu comportamento que possa lhe dar segurana. Isto ocorre porque estamos imer-sos num ambiente cultural em constante mudana, a internet, a velocidade das informaes nos meios de comunicao, os avanos tecnolgicos esto revolucionando os nossos modos de vida e de nos relacionar com as outras pessoas e com o meio ambiente. Assim, uma nica pessoa pode ter vrias identidades culturais ao mesmo tempo.

    Tomemos como exemplo uma professora, negra e me de famlia. Esta pessoa poder se identificar com vrias identidades culturais. A primeira pertenceria ao sindicato dos professores, a segunda s causas relacionadas identificao tnica, a quarta s causas feministas e a quinta educao dos filhos. Essa mu-lher pode optar por participar de cada um desses segmentos, ou vrios ao mesmo tempo ou apenas se identificar com os mesmos. Observem que a identidade cultural pode ser desper-tada em diferentes ocasies e nos exige uma postura diante do mundo, como um exerccio de cidadania.

  • 18 Patrimnio Cultural

    Histria, cidadania, identidade cultural e patrimnio: Em prol da preservao

    A histria a cincia que estuda o passado atravs dos vestgios humanos. Esses vestgios podem ser tangveis ou intangveis. Mas, o que certo que no h histria sem homens. Ao longo dos sculos o homem, em contato com o meio ambiente, produziu artefatos nos quais se abrigou, inven-tou signos para a sua comunicao, templos para a sua f. Tanto os artefatos, como o modo de projet-los e faz-los, assim como os materiais utilizados para a confeco dos mesmos pode ser considerado patrimnio cultural.

    A forma de ser e de viver mudou muito nos ltimos anos, pois vivemos na Sociedade da Informao. Internet, blogs, twitter, Orkut, MSN, fazem parte do nosso cotidiano na atualidade. O novo se coloca todos os dias como o melhor, os avanos tec-nolgicos fazem as coisas descartveis muito rapidamente. Por exemplo, seu celular de ltima gerao?

    Como viver num mundo de rpidas mudanas sem se sen-tir solto? Apesar das novidades vivemos e compartilhamos um mundo em que as tradies so valorizadas como conjuntos de conhecimentos que nos agrega sociedade. A tradio, re-conhecida como algo peculiar a cada lugar seria uma res-posta ao mundo globalizado que nos quer todos iguais.

    O papel da Histria muito importante como mediadora de todas essas questes do presente. Segundo Eric Hobsbawm5

    (2009), um dos maiores historiadores do mundo, o historiador tem um papel muito importante na sociedade, na medida que identifica os elementos relevantes do passado, as tendncias e os problemas. a histria que vai esclarecer a importncia das coisas, na medida em que esclarece o mundo, traa as tra-jetrias de tudo que existe. a histria que vai confirmar ou no o tombamento de uma cidade, por exemplo, por que a mesma

  • Tema I | Patrimnio Cultural: Conceitos e trajetria 19

    importante, de que maneira ela seria testemunho de um passado relevante.

    Eric John Earnest Hobsbawm (Alexandria, 9 de Junho de 1917) um historiador marxista reconhecido internacionalmente.Um de seus interesses o desenvolvimen-to das tradies. Seu trabalho um estudo da construo destas no contexto do Estado-nao. Ele argumenta que muitas vezes as tradies so inventadas por elites nacionais

    para justificar a existncia e importncia de suas respectivas naes.Fonte: http://www.wikipedia.org

    Foto: http://3.bp.blogspot.com

    A preservao da memria, dos lugares da memria e dos objetos da memria nos conecta com todos os tempos, o passa-do, o presente e o futuro. A preservao do patrimnio cultural , tambm, uma questo de cidadania temos o dever de preservar o que os homens de outros tempos nos deixou, cuidar de tudo o que criamos e tudo que poderemos deixar para as geraes futu-ras. Isto deve acontecer tanto no nvel material, imaterial quanto em mbito ecolgico.

    Nesse sentido, a preservao da memria pode ser consi-derada uma identidade cultural, e fazendo parte desse contexto enquanto objeto da memria est o patrimnio cultural, que ser explicado com mais detalhes no prximo tpico.

    Para que voc possa entender o papel da cultura na viso de mundo das pessoas, leia atentamente o texto a seguir:

  • 20 Patrimnio Cultural

    Texto Complementar

    As cores e o luto nos diversos sistemas culturaisAs cores despertam em ns sentimentos e sensaes dife-

    rentes: alegria, tristeza, irritao, tranquilidade, melancolia, pai-xo, amor, calma, saudade, ateno, entre outras. O senso co-mum e estudos cientficos comprovam que o vermelho agua a fome, desperta a violncia e nos chama ateno (por isso o farol de pare no semforo dessa cor).

    Outras cores nos causam outras sensaes o azul reme-te tranquilidade, o verde associado natureza e sade, o amarelo desperta a energia, e assim por diante. Alm disso, as cores esto associadas aos sistemas culturais em que vivemos. Para explicar melhor, detalharemos um exemplo utilizado no in-cio desta seo, as cores e o luto.

    Aqui no Ocidente a morte associada cor preta. Vestir-se de negro para acompanhar um cortejo fnebre, velrio ou ir a um enterro demonstra o sentimento de perda, de tristeza e de melan-colia que ficamos com a perda de um amigo ou ente querido.

    Apesar disto, no Oriente outras cores simbolizam a morte, como o branco na China e no Japo, o amarelo no Egito, na fri-ca do Sul o vermelho, no Ir o azul. O branco que vestimos no ltimo dia do ano representando paz, na India possui outra cono-tao. Vestir-se de branco est convidando o marido infelicidade. Portanto, os significados das cores so interpretados de acordo com a cultura em que cada indivduo est inserido. Do mesmo modo ocorre com a identificao de objetos culturais, o que importante para uns no tem valor para os outros.

    Fonte: Adaptado do Blog de Liliana Silva: http://lilianasilvadcv.blogspot.com

  • Tema I | Patrimnio Cultural: Conceitos e trajetria 21

    Para Refletir

    Aps a leitura deste texto, voc pode perceber como algo simples como a interpretao das cores pode influenciar na nossa viso de mundo. Faa uma enquete (pesquisa) com seus familiares, vizinhos e amigos. Pergunte a eles se voc fosse a um enterro de vermelho, qual seria a reao deles? Depois disso, pergunte se acham necessrio preservar o artesanato local e a Igreja Matriz da cidade? Voc observar que as respostas iro variar.

    1.2 PATRIMNIO CULTURAL: DA ORIGEM AO PATRIMNIO GLOBAL

    Quando ouvimos a palavra Patrimnio geralmente a associamos a bens materiais. Por exemplo, uma herana, o conjunto de bens de uma pessoa, ou mesmo de uma cidade. Essa palavra tambm remete-nos s coisas antigas. Mas, ser que o patrimnio constitui-se apenas nas coisas concretas e antigas? Obser-vemos abaixo a etimologia4 da palavra patrimnio e, em seguida, a evoluo do seu conceito, bem como sua classificao em patrimnio cultural material e imaterial.

    O termo patrimnio vem do latim patrimonium que, em sentido original, na Roma antiga, referia-se totalidade do que pertencia ao pai, pater famlias, pai de famlia. Portanto, patrimonium significava tudo que poderia ser legado em herana, excetuando-se a famlia.

    4 o estudo da histria ou

    origem das palavras e da

    explicao do significado de

    palavras atravs da anlise dos

    elementos que as constituem.

    Veja em: http://pt.wikipedia.

    org/wiki/Etimologia

  • 22 Patrimnio Cultural

    Funari e Pelegrini (2006), em seu livro Patrimnio Histrico

    e Cultural, descrevem a trajetria do conceito de patrimnio at

    os nossos dias. Como foi dito anteriormente, a palavra patrim-

    nio surgiu na Roma antiga e possua como caractersticas ser

    patriarcal, individual e privado. Na Idade Mdia, o patrimnio

    passou a ser coletivo e simblico, pois passou a ser associado

    Igreja Catlica. O exemplo mximo do patrimnio coletivo nesta

    poca era a catedral. Apesar de coletiva, a catedral ainda era um

    bem aristocrtico.

    Com o surgimento da Renascena5 o humanismo influenciou

    uma mudana de perspectiva com relao ao patrimnio. A partir

    do humanismo, Deus deixou de ser

    o centro do universo e a religio en-

    quanto dogma passou a ser questio-

    nada. Assim, o homem passou a in-

    terpretar a natureza sem as lentes da

    religio. Para, proceder nessa quebra

    de pensamento (paradigma), os inte-

    lectuais da poca recorreram ao es-

    tudo da antiguidade clssica greco-

    romana. Dessa maneira, passou-se a reeditar obras clssicas em

    lngua original ou traduzidas, principalmente aps a inveno da

    imprensa. Alm disso, os humanistas passaram a colecionar e

    catalogar objetos antigos. Foi nessa poca que surgiram os anti-

    qurios, que so repositrios de objetos antigos.

    Portanto, durante a Renascena muitos artistas passaram a

    pesquisar objetos e monumentos da antiguidade clssica como

    fonte de inspirao de suas obras. Assim, a partir dessa poca a

    noo de patrimnio foi ampliada para objetos que j no faziam

    mais parte do contexto da poca.

    5 A Renascena foi um

    movimento artstico-filsfico

    que ocorreu na Itlia entre

    os sculos XIII e XVII. Seus

    principais expoentes foram

    Leonardo Da Vinci e Leon

    Battista Alberti.

  • Tema I | Patrimnio Cultural: Conceitos e trajetria 23

    No entanto, foi com o surgimento dos Estados Nacionais

    europeus que o patrimnio passou a representar a nacionalida-

    de desses pases. Para legitimar a sua autonomia, alguns pases recorreram na eleio de smbolos e na homogeneizao atravs de uma nica lngua para incutir em suas populaes uma iden-tidade nacional.

    Ranger e Eric Hobsbawn (2005) afirmam que a maioria das tradies que legitimam a ideia do nacional foram inventadas. O hbito de vestir o Kilt (saia xadrez usada por homens), na Esccia, por exemplo, algo bastante recente, mas forjado como algo mais remoto, para dar a impresso de legitimidade. Assim, os smbolos imateriais, como a lngua e a tradio passaram a fazer parte do patrimnio comum dos pases atravs do pertencimento que a coletividade dos pases possua.

    Assim, o conceito de patrimnio foi ampliado para a cole-tividade, como instrumento de memria fortificando o naciona-lismo em diversos pases europeus atravs da preservao de valores, costumes e tradies.

    O conceito de Patrimnio cultural da humanidade tal como conhecemos nos dias correntes foi formulado a partir da Con-veno da Unesco para Proteo do Patrimnio Mundial, Cul-tural e Natural, em 1972. Os prin-cipais objetivos desta Conveno identificar e proteger stios cultu-rais e naturais em todo o globo ter-restre, UNESCO6. No por acaso, a conferncia para a instalao dessa Conveno da Unesco para a proteo do patrimnio em mbito mundial ocorreu no mesmo ano da Conferncia da Organizao das Naes Unidas (ONU) sobre Ambiente Humano, tambm co-nhecida como a Conferncia de Estocolmo, que reuniu ambien-talistas de todo o mundo para a discusso da crise ambiental da

    atualidade.

    6 Para saber mais visite o site

    da UNESCO:

    http://www.unesco.org/pt/

    brasilia/

  • 24 Patrimnio Cultural

    Em fins da dcada de 1960, eclodiram principalmente nos pases considerados desenvolvidos nos dias de hoje, como os europeus e da Amrica do Norte, os Novos Movimentos Sociais7. Antes desses movimentos, havia apenas a reinvindicao no campo traba-lhista atravs de sindicatos. Entre as dcadas de 60 e 70 do sculo XX, surgiram os movimentos estudantil, hippie, feminista, gay, ambientalista, etc. O que havia em comum em todos estes movimentos era a reivindicao pela melhoria da qualidade de vida.

    A partir de ento, todas as questes passaram a ser discutidas pela sociedade civil em mbito pbli-co e privado. Para esclarecer melhor o campo de atuao da sociedade ci-vil convem esclarecer o que significa esfera pblica e esfera privada. Esfera Pblica8 seria o mundo comum que nos rene na companhia uns dos ou-tros, mas impede que nos choquemos. J a Esfera Privada refere-se ao m-bito privado, propriedade privada e ao particular.

    Assim, podemos observar que no mundo contemporneo as preocupaes vo alm das questes econmicas ou traba-lhistas. O acesso cultura, educao, a proteo ao meio am-biente, bem como a luta pela igualdade entre os sexos so ques-tes que se legitimam cada dia mais. Nesse sentido, o prprio conceito de patrimnio foi ampliado, como foi dito anteriormente, a partir da Conveno da UNESCO de 1972. Este alargamento con-siste em evidenciar que so comuns e so de direito pertencentes

    7 Sobre os quadros tericos e

    os tipos de Novos Movimen-

    tos Sociais, consulte: GOHN,

    Maria da Glria. Teoria dos

    Movimentos Sociais: Paradig-

    mas clssicos e contempor-

    neos. 3ed. So Paulo: Edies

    Loyola, 2002. pp-121-123.

    Dentre os principais Novos

    Movimentos Sociais desta-

    cam-se os movimentos: estu-

    dantil, feminista, negro, hippie,

    ambientalista, dentre outros.

    8 Para saber mais consulte.

    ARENDT, Hannah . A condio

    humana, 2006. pginas. 59 e 62.

    Para Arendt, na contempora-

    neidade difcil estabelecer os

    limites entre a esfera pblica e

    a privada.

  • Tema I | Patrimnio Cultural: Conceitos e trajetria 25

    a toda humanidade todos os bens culturais ou naturais que po-dem e devem ser preservados.

    Como voc pode observar, o conceito de patrimnio cultural est bastante ampliado, sendo defendido por alguns autores como patrimnio global ou total. Isto poderia gerar dvidas, como saber o que patrimnio natural, ou mesmo patrimnio cultural material e imaterial? Na verdade, todos esses bens se confundem e so produzidos atravs da lente da cultura.

    No entanto, para maiores esclarecimentos, o assessor internacional da UNESCO, Hugues de Varine-Boham, afirma que o patrimnio cultural possui como base trs categorias de elementos (LEMOS, 2006):

    Hugues de Varine-Boham ex-director do Conselho Internacional dos Museus (ICOM). Viveu e trabalhou vrios anos em Portugal, ligado ao cultural da Embaixada francesa. Atualmente dirige uma associao de desenvolvimento local e consultor inter-nacional nesta mesma rea, tendo efetuado frequentes misses sobre o assunto da nova museologia, o ecomuseu.

    Fonte: http://pt.wikipedia.org

    Foto:http://photos.unyk.com

    1) Elementos pertencentes natureza, meio ambiente;

    2) Conhecimento, as tcnicas, o saber e o saber fazer;

    3) Objetos, artefatos e construes obtidas a partir do meio ambiente e do saber fazer;

  • 26 Patrimnio Cultural

    A primeira categoria refere-se aos recursos naturais como um todo: os mares, os rios, os peixes, as espinhas dos peixes, as guas, as pedras, o calor e as areias das praias, as plantaes. Ou seja, tudo o que nos cerca, que nos envolve, ou seja, nosso meio ambiente. J a segunda categoria diz respeito aos elementos no tangveis do patrimnio cultural, quer dizer o patrimnio cultural imaterial, este abstrato, impalpvel, no podemos toc-lo, pois o mesmo est no plano das ideias. Como exemplo, temos desde uma receita de nossa av at clculos avanadssimos e bastante abstratos da fsica quntica. Veja que nesta categoria at mesmo o valor emocional que nos foi deixado por um ente querido pode ser patrimnio, pois nos traz a ideia de pertencimento.

    01 - Fonte: http://2.bp.blogspot.com

    02 - Fonte: http://es.i.uol.com.br

    01

    02

    Por fim, a terceira categoria a fuso entre as catego-rias anteriores, culminando no patrimnio material. Assim, os artefatos seriam a materialidade do patrimnio cultural. Esses artefatos poderiam variar desde um simples arco e flecha a um prdio de 828 metros de altura em Dubai, nos Emirados rabes. O artefato pode variar de tamanho e de durao. Tanto pode ser uma casa como a cidade que a cerca ou durar muito ou pouco tem-po, como a comida (pouco) ou a vasilha que a acondiciona (muito).

    Tutu Mineiro

  • Tema I | Patrimnio Cultural: Conceitos e trajetria 27

    A UNESCO diferencia dois tipos de patrimnio, em sua conveno sobre o Patrimnio Mundial da Humanidade (1972):

    Patrimnio Cultural significa monumentos, grupos de edifcios e stios que tm valor histrico, esttico, arque-olgico, cientfico, etnolgico ou antropolgico.

    Patrimnio Natural significa formaes fsicas, biol-gicas e geolgicas excepcionais, habitats de espcies animais e vegetais ameaadas e zonas que tenham valor cientfico de conservao ou esttico.

    Fonte: http://pt.wikipedia.org

    Prdio mais alto do mundo em Dubai

  • 28 Patrimnio Cultural

    A museloga Maria Clia dos Santos (2008) sugere o termo Patrimnio Global, que seria constitudo de alguns elementos: O homem, o meio ambiente, o saber e o artefato, bem como o real na sua totalidade cultural, natural, material e imaterial, acresci-dos do tempo e do espao. Todos esses elementos esto vin-culados uns aos outros compondo um patrimnio que engloba os outros j explicitados anteriormente, os patrimnios cultural, material e imaterial, como tambm o patrimnio natural.

    Desenvolvimento e cultura no sculo XXI

    Diante desse alargamento do conceito de patrimnio agora entendido como patrimnio global, seria interessante estudar-mos um pouco mais a interseo entre dois conceitos atuais que atuam na construo do patrimnio global: o desenvolvimento e a cultura.

    O termo desenvolvimento nos reporta ao desenvolvimento econmico. Apesar disso, o desenvolvimento na contempora-neidade empregado com um adjetivo: sustentvel. Assim, a todo o momento ouvimos falar em desenvolvimento sustent-vel. Mas, o surgimento deste termo remonta Conferncia da ONU de Estocolmo de 1972, porm sua disseminao ocorreu na ECO-92 que ocorreu no Rio de Janeiro. Mas, antes disso, em 1987, a ONU reuniu diversos cientistas que produziram o Rela-trio de Brundtland, que teve suas ideias sintetizadas no docu-mento chamado Nosso Futuro Comum. Este documento define o desenvolvimento sustentvel como:

    o desenvolvimento que satisfaz as necessidades pre-sentes, sem comprometer a capacidade das geraes futuras de suprir suas prprias necessidades.

  • Tema I | Patrimnio Cultural: Conceitos e trajetria 29

    Apesar do conceito de desenvolvimento sustentvel des-crito acima e do mesmo ser largamente difundido, h uma in-finidade de conceitos circulando no meio acadmico. Mas, de forma bastante resumida, podemos afirmar que o desenvolvi-mento sustentvel est assentado no trip: economia, sociedade e meio ambiente. O desenvolvimento econmico de uma regio inconcebvel se a populao no possui condies dignas de sobrevivncia e os recursos naturais esto sendo dilapidados. Assim, o desenvolvimento para ser sustentvel necessita ser so-cialmente justo e ambientalmente correto.

    Nesse sentido, a cultura tem um papel fundamental para que as comunidades possam reconhecer qual tipo de desenvol-vimento elas optam por viver, reconhecendo seu territrio, seu patrimnio cultural, seus recursos naturais. No que diz respeito s populaes tradicionais, observa-se que o fortalecimento da autonomia e da identidade cultural possui um papel fundamental no desenvolvimento sustentvel da comunidade.

    Uma proposta bastante atual e que foi exposta pela coor-denadora de cultura da UNESCO no Brasil, Jurema Machado, em palestra do XXXV Encontro Cultural de Laranjeiras (2010), um quadro correlacionando o desenvolvimento e a cultura de acor-do com o contexto histrico de cada poca.

    Tabela adaptada de Conferncia de Jurema Machado (2010):

    Desenvolvimento(Abstrao/valor imaterial)

    Cultura(realidade/valor material)

    FeudalismoIncio da supremacia europeia

    - assimilao

    MercantilismoColonialismo

    RenascimentoIluminismo

  • 30 Patrimnio Cultural

    Revoluo Industrial(Progresso material/eficincia)

    Protestantismo Cultura Fruio

    Desenvolvimento = Desenvolvimento econmico

    soluo para todos os problemas

    Hegemonia de valores ocidentais

    Guerra FriaModernizao

    Globalizao

    Avano tecnolgicoDomnio do meio ambiente

    Problemas ambientaisGlobalizao

    Descolonizaondia/frica/Caribe

    Os fatores culturais impedem a implantao do

    desenvolvimento econmico como modelo

    Fonte: Conferncia Patrimnio Cultural: pilar do desenvolvimento, proferida

    por Jurema Machado coordenadora de Cultura da UNESCO no Simpsio do

    XXXV Encontro Cultural de Laranjeiras, em 07 de janeiro de 2010. Laranjeiras-

    SE/Brasil.

    Para esclarecer melhor o papel da cultura na sociedade, segue abaixo alguns trechos da Declarao do Mxico Conferncia Mundial sobre Polticas Culturais (1985):

    A identidade cultural uma riqueza que dinamiza as possibilidades de realizao da espcie humana ao mo-bilizar cada povo e cada grupo a nutrir-se de seu passa-do e a colher as contribuies externas compatveis com a sua especificidade e continuar, assim, o processo de sua criao. (CURY, 2004, p.272)

  • Tema I | Patrimnio Cultural: Conceitos e trajetria 31

    A cultura constitui uma dimenso fundamental do pro-cesso de desenvolvimento e contribui para fortalecer a indepedncia, a soberania e a identidade das naes. O crescimento tem sido concebido frequentemente em termos quantitativos, sem levar em conta a sua necessria dimenso qualitativa, ou seja, a satisfao das aspiraes espirituais e culturais do homem. O desenvolvimento autntico persegue o bem-estar e a satisfao constantes de cada um e de todos. (CURY, 2004, p. 273).

    Qualquer povo tem o direito e o dever de defender e preservar o patrimnio cultural, j que as sociedades se reconhecem a si mesmas atravs dos valores em que encontram fontes de inspirao criadoras. (CURY, 2004, p.275).

    Observe que a cultura e o desenvolvimento so elementos fundamentais para o crescimento das populaes. Do mesmo modo, esses dois conceitos podem interferir na preservao ou no dos bens patrimoniais, pois so dinmicos, esto em cons-tante mudana.

    Para Refletir

    Faa uma comparao com o conceito de Identidade Cultural. Segundo Stuart Hall, exposto no tpico - 1.1 Conceitos de cultura e de identidade cultural na sociedade contempornea - com a identidade cultural sugerida pela Declarao do Mxico. Aps isto, coloque no frum do AVA e discuta com seus colegas.

  • 32 Patrimnio Cultural

    1.3 PATRIMNIO CULTURAL MATERIAL

    Quando se fala em patrimnio material a imagem que vem nossa mente a das runas de uma igreja. No toa que os especialistas tratam este conceito por o patrimnio de pedra e cal. Em verdade, o patrimnio material refere-se ao bem cultural concreto, que pode ser visto e tocado. Esta noo de patrimnio referindo-se pedra e cal ocorre porque, no Brasil, os primei-ros bens culturais a serem restaurados foram as Igrejas barrocas de Minas Gerais por iniciativa dos modernistas, entre as dcadas de 1920 e 1930.

    Como j vimos no tpico 1.2, o patrimnio material no apenas a igreja, pode ser uma floresta, uma rvore centenria, ou mesmo a oca de um ndio. O Patrimnio Mundial est classifica-do em Patrimnio Natural e Patrimnio Cultural que foi explicado anteriormente.

    O Artigo 216 da Constituio Federal Brasileira define o que constitui o Patrimnio Cultural brasileiro, dividindo-o em bens materiais e imateriais. Observe a redao abaixo:

    Constituem patrimnio cultural brasileiro os bens de natu-reza material e imaterial, tomados individualmente ou em con-junto, portadores de referncia identidade, ao, memria dos diferentes grupos formadores da sociedade brasileira, nas quais se incluem:

    I As formas de expresso;

    II Os modos de criar, fazer e viver;

    III As criaes cientficas, artsticas e tecnolgicas;

    IV As obras, objetos, documentos, edificaes e demais espaos destinados s manifestaes artstico-culturais;

  • Tema I | Patrimnio Cultural: Conceitos e trajetria 33

    V Os conjuntos urbanos e stios de valor histrico, paisa-gstico, artstico, arqueolgico, paleontolgico, ecolgico e cientfico;

    A partir da redao do artigo 16 da Carta Magna, observa-se que o patrimnio cultural pode ser observado por diversos n-gulos, variam de formas de expresso, obras, objetos, documen-tos, at conjuntos urbanos ou mesmo paisagsticos. Em linhas gerais, todos os bens culturais descritos na Constituio Federal podem ser agrupados em dois tipos de patrimnio cultural, o material e o imaterial.

    O patrimnio material refere-se a todo bem cultural9, que pode ser tocado, palpvel, con-creto, e portanto, material. Esses bens culturais tambm so conhe-cidos como artefatos, aqueles que estudamos anteriormente. Esses po-dem variar de objetos, como a pente-adeira da sua tia av at mesmo uma cidade inteira. Ento, voc poderia pensar tudo que h de concreto no mundo e que feito por seres huma-nos seria um patrimnio material? A resposta no. No bem assim, apesar se sabermos que tudo que produzido pelo homem um objeto cultural, h uma grande diferena para ele tornar-se patrimnio cultu-ral material. Para tanto, necessrio o tombamento do bem cultural para que ele possa se transformar num bem do patrimnio material.

    A seletividade um princpio do direito que impede que toda a realizao humana seja alvo da tutela protetiva do Estado.

    9 So considerados bens cul-

    turais os bens mveis e im-

    veis de grande importncia

    para o patrimnio cultural de

    cada pas, tais como as obras

    de arte e de arquitetura, os

    manuscritos, os livros e outros

    bens de interesse artstico,

    histrico ou arqueolgico, os

    documentos etnolgicos,os

    espcimens-tipo da flora e da

    fauna, as colees cientficas,

    e as colees importantes de

    livros, e arquivos, incluindo os

    arquivos musicais.

    (UNESCO,1995)

  • 34 Patrimnio Cultural

    Para tanto, os bens culturais materiais, geralmente, so os produ-tos mais representativos da cultura brasileira, o que no implica-ria no abandono ou esquecimento dos demais bens.

    O jurista Carlos Frederico Mars de Souza Filho (1991) destaca que a proteo de um bem cultural brasileiro comea a partir da sua individuao. Atravs desse procedimento o bem alcanaria o status de cultural. Essa individuao do objeto cul-tural se daria atravs de procedimentos administrativos, legais ou jurdicos. Os procedimentos administrativos so o inventrio, o tombamento ou registro. J os procedimentos de ordem legal so constitudos por leis de zoneamento, tombamento legislativo. E, por fim, os procedimentos de ordem judicial so, por exemplo, a ao civil pblica declaratria de valor cultural.

    Os bens culturais materiais podem ser protegidos atravs de alguns instrumentos tais como: inventrio, desapropriao, tombamento, sentena judicial, lei de zoneamento, etc. Esses instrumentos visam identificao dos bens, individuao, bem como os procedimentos legais para que o bem possa se tornar um exemplo do patrimnio cultural. Por exemplo, uma casa do sculo XIX pode ser inventariada, tombada e depois desapro-priada. Esses procedimentos garantiriam a cesso da casa para todos, transformando-a num bem difuso, comum a todos.

    O tombamento um procedimento de ordem administrativa e provm da palavra tombar que uma herana do vocabulrio portugus tombar que significa demarcar. O tombo, portanto, se refere ao registro dos bens. O tombamento pode ser solicitado por qualquer cidado a partir da observao da legislao perti-nente ao bem que se quer tombar, ou seja, registrar como bem cultural. O cidado pode incitar o tombamento, mas a efeti-vao desse instituto jurdico fica a cargo do poder administrativo nas suas instncias municipal, estadual ou federal. No caso de bens propostos como Patrimnio da Humanidade, a chancela de responsabilidade da UNESCO.

  • Tema I | Patrimnio Cultural: Conceitos e trajetria 35

    Existem oito tipos de tombamento onde os trs primeiros esto esclarecidos pelo decreto n25 de novembro de 1937.

    O primeiro seria o tombamento de ofcio, que realizado em bens pertencentes Unio, aos Estados e Municpios. O se-gundo tipo seria o tombamento voluntrio, que corresponde a propriedades particulares em que so solicitados/aceitos pelos proprietrios. J o tombamento compulsrio difere do volunt-rio, pois nesse ltimo no h concordncia do proprietrio.

    O tombamento provisrio aquele em que o propriet-rio notificado para tomar cincia do processo de tombamento e se manifestar a respeito. Este tipo de tombamento impede a destruio ou deteriorao de um bem, se isto ocorrer a pessoa estar sujeita s sanes do art. 62 da Lei 9.605/98.

    J o tombamento definitivo ocorre quando o processo fi-nalizado e o bem tombado inscrito no livro do tombo. O tomba-mento geral, por sua vez, refere-se ao tombamento de bens que esto dispostos em conjunto: tais como o acervo de um museu, de uma biblioteca ou um conjunto urbano, como uma cidade.

    Por fim, o tombamento individual que se d, como o nome j diz, em bens individuais, um livro, uma cadeira, um castial, por exemplo. E, o tombamento indireto que , na verdade, a de-sapropriao de bem de valor cultural que ocorre de acordo com o interesse do Poder Pblico com base no Decreto-Lei 3.365/41.

    Uma informao importante que voc deve saber que o tombamento pode ser a nvel municipal, estadual, federal e at mesmo mundial. O que ir definir qual esfera pblica ir prote-ger um bem e a seu grau de representatividade. A competncia para tombar um bem est descrita na Constituio Federal nos arts. 23, III e IV, 30, IX e 216 pargrafo 1. De acordo com estes artigos, a competncia trplice, pois compete ao Poder Pblico o tombamento de bens. Apesar disso, no raro o tombamento cumulativo em que municpio, Estado e Governo Federal atravs do IPHAN protegem um bem.

  • 36 Patrimnio Cultural

    Para saber mais o os bens tombados a nvel federal sugerimos que faa uma consulta sobre os bens tombados no seu Estado atravs do link abaixo:http://portal.iphan.gov.br

    H, ainda, outros instrumentos que so utilizados para pro-teger os bens culturais materiais. O inventrio de bens culturais consiste no levantamento dos bens que potencialmente podem se tornar bens culturais. Esse inventrio geralmente realizado a partir do envolvimento da comunidade na identificao des-ses bens. Como pressupostos do inventrio, h algumas etapas como a seleo, identificao e caracterizao dos elementos do patrimnio cultural com a devida superviso do IPHAN.

    Outros procedimentos so utilizados para a preservao dos bens culturais materiais. A restaurao consiste na reno-vao de algo que sofreu o desgaste com o tempo. Para que a restaurao seja implementada necessrio um conhecimento prvio da substncia do bem, ou seja, do aspecto do bem em seu sentido original. Num prdio antigo, por exemplo, qual a pintura original da fachada? Esta descoberta se daria atravs da pesquisa histrica. Para que a restaurao tenha sucesso, necessria a atuao de profissionais de vrias reas agindo de forma inter-disciplinar. Trabalham com restaurao: historiadores, engenhei-ros, arquitetos, arquelogos e restauradores.

    A reconstruo ocorre quando h um grande risco do bem cultural material desaparecer. Uma runa, por exemplo, que ameaa cair. Isso ocorre devido a intempries do tempo (chuva, sol, neve, umidade), desgaste ou alteraes profundas. Recons-truir consiste em colocar elementos que completam aquilo que j foi deteriorado, respeitando as caractersticas originais.

  • Tema I | Patrimnio Cultural: Conceitos e trajetria 37

    Atualmente, no Brasil, O IPHAN (Instituto do Patrimnio Histrico e Artstico Nacional) atravs do Programa Monumenta realiza a restaurao e recuperao de bens tombados. O Mo-numenta um programa estratgico do Ministrio da Cultura (MinC) e atua atravs de emprstimos do BID (Banco Interame-ricano de Desenvolvimento). Entre 1995 e 2000 foram realizadas pesquisas e definiram-se as reas prioritrias para a interveno do programa: Salvador, Recife, Olinda, So Paulo, Rio de Janeiro e Ouro Preto.

    As atividades do Programa Monumenta iniciaram-se mesmo a partir de 2000. Dentre os objetivos do programa destacam-se:

    Preservar reas prioritrias do patrimnio histrico e artstico urbano;

    Estimular aes que aumentam a conscincia da populao sobre a importncia de se preservar o acervo existente;

    Promover critrios de conservao e o estmulo a proje-tos que viabilizem as utilizaes econmicas, culturais e sociais das reas em recuperao;

    Estimular a autonomia dos stios histricos para que os mesmos no fiquem dependendo de novas divisas governamentais para a sua conservao. (IPHAN)

    Observe que os objetivos do Monumenta esto de acordo com a noo de patrimnio ampliada, voltada para o fortaleci-mento da identidade cultural, a partir de uma gesto comparti-lhada entre o poder pblico e a comunidade a ser beneficiada. Assim, entre as aes que aumentam a conscincia da populao sobre a importncia de se preservar o acervo existente destaca-se a educao patrimonial implementada em vrias cidades beneficiadas, promovida pelo IPHAN.

  • 38 Patrimnio Cultural

    Com relao aos outros dois objetivos, veja que h um es-tmulo a projetos que viabilizem as utilizaes econmicas, cultu-rais e sociais das reas em recuperao, bem como a autonomia financeira dos stios histricos. Um exemplo prtico do emprego desses objetivos foi a transformao de prdios histricos res-taurados em campus de Universidades Federais como so os ca-sos de edifcios em Cachoeira-BA (UFRB) e Laranjeiras-SE (UFS).

    O programa Monumenta atua atravs de convnios fir-mados entre os mbitos fede-ral, estadual e municipal (pre-feituras). Assim, so estabele-cidas as contribuies finan-ceiras de cada uma das esferas responsveis pela restaurao do bem tombado.

    No momento, 26 cidades so beneficiadas pelo Progra-ma Monumenta, todas elas foram escolhidas por sua re-presentatividade histrica e pela urgncia das obras, por causa do avanado estgio de deteriorao dos bens tomba-dos. As cidades atendidas so: Alcntara(MA), Belm (PA), Ca-choeira (BA), Congonhas (MG),

    Corumb (MS), Diamantina (MG), Goias (GO), Ic (CE), Laranjei-ras (SE), Lenis (BA), Manaus (AM), Mariana (MG), Natividade (TO), Oeiras (PI), Olinda (PE), Ouro Preto (MG), Pelotas (RS), Pe-nedo (AL), Porto Alegre (RS), Recife (PE), Rio de Janeiro (RJ), Salvador (BA), So Cristovo (SE), So Francisco do Sul (SC), So Paulo (SP), Serro (MG).

    Laranjeiras/SE/UFS: Quarteiro dos

    Trapiches

    Fonte: http://www.monumenta.gov.br

    Cachoeira-BA/UFRB: Fonte: http://2.bp.blogspot.com

  • Tema I | Patrimnio Cultural: Conceitos e trajetria 39

    Estas cidades possuem vrios bens materiais a serem res-taurados: igrejas, conventos, casas da cmara e cadeia, palace-tes, praas, ruas, fortificaes e edifcios pblicos e privados a serem tombados a nvel federal.

    Pelotas-RS Grande Hotel Fachada

    Fonte: http://www.monumenta.gov.br

    Praa das Runas da Igreja de N. S. do

    Rosrio, dia e noite

    Fonte: http://www.monumenta.gov.br

    Mariana(MG) praa Minas GeraisFonte: http://www.monumenta.gov.br

  • 40 Patrimnio Cultural

    Mas, mesmo antes da atuao do Programa Monumenta, o governo brasileiro j realizava aes10 para proteger o seu pa-trimnio histrico. A primeira ao remonta ainda ao sculo XVIII, em 1742, quando o Conde D. Andr de Castro Melo escreveu ao Conde de Galveas destacando a complexida-de que envolve a proteo de mo-numentos histricos.

    Para Refletir

    Aps conhecer o significado de patrimnio material, observe alguns exemplos de bens culturais da sua cidade que atravs de tombamento poderiam ser transformados em objetos do pa-trimnio cultural material. Agora discuta com seus colegas no frum do AVA.

    1.4 PATRIMNIO CULTURAL IMATERIAL

    O patrimnio cultural constitudo de bens culturais notveis, excepcionais que compem a histria e a identidade. Mas, estes bens so apenas objetos concretos? A resposta no. Mas, nem sempre foi assim, para o imaterial alcanar o patamar de patri-mnio cultural, muitos intelectuais lutaram para que festas, cele-braes, manifestaes folclricas, canes fossem para sempre resguardados do esquecimento.

    Antes, o patrimnio cultural era apenas a pedra e a cal, esta expresso largamente usada na bibliografia especializada nos bens imateriais para se referir s Igrejas Barrocas, que foram os primeiros bens materiais a serem tombados.

    10 Acesse o link abaixo e veja

    a Linha do tempo da Defesa ao

    Patrimnio Histrico Brasileiro:

    http://www.monumenta.gov.

    br/site/?page_id=165

  • Tema I | Patrimnio Cultural: Conceitos e trajetria 41

    A legislao brasileira de proteo ao patrimnio cultural data da dcada de 1930. O principal foco de proteo na poca foi o patrimnio material representado pela arquitetura de elite, ou seja, pela arquitetura das igrejas e prdios pblicos. No ano de 1936, Mrio de Andrade, literato e um dos intelectuais respon-sveis pela Semana de Arte Moderna de 1922 no Brasil, props um projeto de lei que inclusse como patrimnio cultural, os fa-lares, os cantos, as magias, as lendas, a culinria e a medicina indgena. Somente com a Constituio Federal de 1988 e mais recentemente com o Decreto 3.551, de 4 de agosto de 2000, os bens culturais imateriais ganharam relevo na discusso acerca do patrimnio. Essa legislao ser esclarecida a seguir.

    O patrimnio cultural imaterial corresponde ao conjunto de bens que no podem ser tocados, so inapreensveis, e tam-bm so conhecidos como intangveis. Uma cano folclrica, por exemplo, no podemos toc-la, mas ela est cheia de senti-dos culturais e identitrios, remetem ao passado e ao presente ao mesmo tempo, e o tombamento desse objeto poderia preserv-lo para as geraes futuras. Dessa forma, os bens culturais intang-veis remetem identidade, maneira e ao dos grupos sociais.

    O artigo 216 da Constituio Federal de 1988, em seus in-cisos I e II referem-se s formas de expresso e aos modos de criar, fazer e viver, respectivamente. Anos mais tarde, em 2000, o Decreto n 3.551 institui o Registro de Bens Culturais de Nature-za Imaterial, que constituem patrimnio cultural brasileiro, cria o Programa Nacional de Patrimnio Imaterial e d outras providn-cias. Esse decreto determina que o Registro de Bens Culturais de Natureza Imaterial seja composto de quatro livros:

    I Livro de registro de saberes;II Livro de registro das celebraes;III Livro de registro das formas de expresso;IV Livro de registro dos lugares.

  • 42 Patrimnio Cultural

    Cada livro de registro do Registro de Bens Culturais de Na-tureza Imaterial rene grupos maiores de manifestaes que po-dem ser enquadradas como patrimnio cultural imaterial.

    Vejamos alguns exemplos dessa classificao:

    Os Saberes conhecimentos e modos de fazer arraigados na rotina das comunidades;

    As Celebraes festejos e rituais que marcam a vivncia coletiva da religiosidade, do trabalho, do entretenimento e de outras prticas da vida social;

    As Formas de expresso manifestaes musicais, cnicas, literrias, plsticas e ldicas;

    Os Lugares feiras, mercados, bibliotecas, cinemas, praas, santurios e demais espaos onde se concentram e se reproduzem prticas culturais coletivas.

    Vejamos a definio do patrimnio cultural imaterial ou in-tangvel de acordo com a UNESCO (1993):

    O conjunto das manifestaes culturais, tradicionais e populares, ou seja, as criaes coletivas, emanadas de uma comunidade, fundadas sobre a tradio. Elas so transmiti-das oral e gestualmente, e modificadas atravs do tempo por um processo de recriao coletiva. Integram esta modalidade de patrimnio as lnguas, as tradies orais, os costumes, a msica, a dana, os ritos, os festivais, a medicina tradicional, as artes da mesa e o saber-fazer dos artesanatos e das ar-quiteturas tradicionais.

  • Tema I | Patrimnio Cultural: Conceitos e trajetria 43

    Nos dias atuais, o conceito de patrimnio imaterial tornou-se de difcil definio. A primeira reflexo que se faz a seguinte: ao registrar um som de tambor num mp3, ou transcrever uma cantiga de roda, o bem cultural imaterial se tornaria material. At onde poderia ir a fronteira entre o material e o imaterial? Uma outra questo que se coloca o fato da palavra congelar o ima-terial. Por exemplo, uma receita de um quitute, como a acaraj que um patrimnio imaterial da Bahia, ao transcrever a receita, a mesma no poderia ser modificada posteriormente. E se as baianas de acaraj de Salvador descobrissem como executar a receita de forma mais light? O que se chama ateno nessa discusso para a dinmica cultural que envolve cada bem cul-tural imaterial tombado.

    Vive-se numa poca em que a maioria das coisas esto disponveis na internet, isto fato incontestvel. Da, da rede mundial de computadores surge uma nova modalidade de pa-trimnio imaterial, o patrimnio digital. Patrimnio digital? Isso mesmo. Ele emerge na medida em que esto disponveis nos sites referentes preservao da cultura as transcries e at mesmo fotografias de objetos e monumentos tombados, documentos digitalizados, imagens antigas digitalizadas. Alm dos bens culturais materiais e imateriais digitalizados, surge uma nova dimenso: a do prprio material produzido virtualmente, que mais tarde poder ser tombado.

    Agora detalharemos um pouco mais os dois dos quatro livros de Registro de Bens Culturais de Natureza Imaterial. De forma didtica, trataremos os Saberes e as Celebraes. Sero feitos comentrios e, logo aps, sero colocados exemplos e limitaes para a preservao de cada bem. Apesar disso, esta separao apenas didtica, visto que todas estas expresses do patrimnio imaterial esto entrelaadas umas s outras. Retomaremos este ponto no final desta seo.

  • 44 Patrimnio Cultural

    Os saberesObservando-se a amplido do conceito do patrimnio cul-

    tural imaterial, a UNESCO decidiu dedicar suas aes de preser-vao a curto e a mdio prazos sobre a dana, as lnguas, as msicas, as tradies orais e o saber fazer do artesanato. Esse ltimo exemplo de bem cultural imaterial foi detalhado na reco-mendao da UNESCO (1993):

    prefervel assegurar que os detentores do patri-mnio imaterial continuem a adquirir conhecimen-to e saber-fazer e os transmitam s geraes seguintes. Levando em conta estes objetivos, preciso inicialmente identificar estes detentores de saber-fazer e os reconhecer oficialmente.

    Nesse sentido surge uma discusso bastante recente que se refere preservao dos Tesouros humanos vivos. Estes so pessoas consideradas preciosas para a transmisso da cultura, do saber-fazer (savoir-faire) para as prximas geraes. Este pro-grama da UNESCO tem como base a experincia do governo japons na dcada de 1950. Nesse pas, alm das pessoas, os grupos tambm so reconhecidos como patrimnio imaterial, compreendendo um total de 52 indivduos e 23 grupos.

    Em outros pases como Tailndia, Coreia, Filipinas, Frana, Romnia e mesmo no Brasil o programa da UNESCO Tesouros Humanos Vivos colocado em prtica, cada um com suas pe-culiaridades. Em 1995, a Repblica da Coreia estava com 95 ex-presses do patrimnio cultural imaterial, sendo composta por

    50 organizaes e 167 pessoas. Nas Filipinas, desde a dcada de

    1970 alguns detentores do saber-fazer j eram premiados com

    honrarias e privilgios. Na dcada de 1990, trs pessoas de co-

    munidades culturais autctones receberam a titulao Tesouros

    Humanos Vivos. Na dcada de 1990, houve premiao na Tailndia

    (oito pessoas), Frana (vinte mestres da arte) (ABREU, 2008).

  • Tema I | Patrimnio Cultural: Conceitos e trajetria 45

    No Brasil, o Projeto Tesouros humanos vivos no tem ob-

    tido muito sucesso. De acordo com Jurema Machado, a Coor-denadora de Cultura da UNESCO no Brasil, em entrevista que pode ser conferida no podcast, a aplicao deste projeto encon-

    tra algumas dificuldades. O primeiro dele refere-se ao fato de no

    Brasil no haver um consenso de quem sejam os grandes mes-

    tres da cultura material, dificuldade piorada ainda mais quando

    se trata do difcil acesso a esses mestres.

    Outra questo que se impe como dificuldade, tambm,

    a inexistncia de um programa que possa acompanhar a dis-

    seminao do conhecimento desses mestres. Segundo Jurema

    Machado, no h funo social alguma oferecer prmios aos

    mestres se os mesmos no repassarem o conhecimento para

    outras pessoas.

    Apesar disto, Estados brasileiros possuem projetos que

    tentam resguardar a cultura imaterial atravs dos seus mestres.

    No Cear, em 2003, foi sancionado um projeto de lei para pro-

    teger os Mestres da Cultura Tradicional Popular no Estado do

    Cear. Aps receberem o auxlio financeiro do Estado os mestres

    continuaram com as suas atividades normais. Coube, no entan-

    to, ao Estado, estimular jovens das comunidades para aprende-

    rem com os mestres.

    J no Esprito Santo, 10 mestres foram contemplados pelo

    prmio Mestre Armojo do Folclore Capixaba com valor mone-

    trio, mas sem aes para a perpetuao do seu conhecimento

    em suas comunidades. Alm disso, alguns estudiosos da UFPA

    pesquisaram sobre os mestres da cultura de Icoaraci, atravs das

    manifestaes culturais e da memria dos mesmos.

    Desde 2005 vem sendo realizado o Encontro Mestres do

    Mundo, que tem como objetivo disseminar conhecimentos

    atravs do intercmbio entre os mestres do Brasil e da Amrica

  • 46 Patrimnio Cultural

    Latina. Estes Encontros vm sendo promovidos com o apoio do

    Ministrio da Cultura e das Secretarias de Estado. Os Encontros so realizados, geralmente, no interior dos Estados, local onde se encontram a maioria dos mestres da cultura popular brasileira.

    CelebraesAs celebraes so a expresso da memria coletiva de um

    determinado local. Atravs de geraes, as msicas, os passos de uma dana, ou a indumentria so componentes de rituais que atravs da dinmica cultural so reinterpretados, modificados e alguns elementos so conservados. As celebraes contam tambm alguma histria que faz parte do lugar, atravs da religio ou de elementos profanos, ou da mistura dos dois.

    Moura (2007), classifica os tipos de festas populares brasileiras de acordo com seus elementos estruturais:

    Religiosos realizados por sacerdotes ou pessoas auto-rizadas pela Igreja. Exs.: reza, missa, beno, novena e procisso;

    Profanos Possuem o carter de entretenimento. Tm o intuito de fazer com que os participantes se prolonguem mais na festa. Exs.: danas, leiles, comidas, folguedos como pau-de-sebo, cavalhada, bumba-meu-boi;

    Profano-religiosos realizados por leigos com o aval do sacerdote, atravs de homenagem a figuras sacras. Exs.: Congados, Folia de reis, Imprio do Divino, Pastorinhas, Imprio do Divino e Reinado do Rosrio.

  • Tema I | Patrimnio Cultural: Conceitos e trajetria 47

    Como voc pode perceber os quatro grandes temas sobre o patrimnio imaterial esto entrelaados. Vamos a um exemplo prtico: o reisado11. Veja que h elementos dos quatro temas: os saberes atravs dos mestres que passam o conhecimento h geraes; as celebraes, pois uma dana festiva; as formas de expresso atravs das msicas e passos ensaia-dos previamente; lugares, no caso as ruas da cidade.

    Crio de Nazar em Belm do ParFonte: http://www.cella.com.br

    Bumba-meu-boi do MaranhoFonte: http://dastenras.files.wordpress.com

    Reisado de Idosos em LaranjeirasFonte: http://iaracaju.infonet.com.br

    11 Reisado uma dana

    popular profano-religiosa, de

    origem portuguesa, com que

    se festeja a vspera e o Dia de

    Reis. O Reisado instalou-se em

    Sergipe no perodo colonial.

    Fonte http://pt.wikipedia.org/

  • 48 Patrimnio Cultural

    Para Refletir

    Aps estudar este tema voc pode perceber que as mani-festaes culturais imateriais esto mais presentes em sua vida do que voc imaginava. Faa uma lista com cinco exemplos da cultura imaterial da sua cidade e depois divida-a com seus colegas no frum do AVA.

    RESUMO DO TEMA I

    Nesse tema voc viu o quanto importante conhecer o mundo em que est vivendo, atravs da sua cultura, das identidades culturais e do patrimnio cultural. Aprendeu que o patrimnio cultural pode ser material ou imaterial, mundial e at global.

    No tema 2 voc ver quais celebraes brasileiras so tombadas como bens imateriais pelo IPHAN.

  • Preservao do Patrimnio

    Cultural2A etimologia da palavra preservar vem do latim preservare

    e significa observar previamente. Ou seja, para preservar neces-srio conhecer e conhecer demanda algumas aes como inven-tariar, listar detalhes e componentes, pesquisar minuciosamente o objeto a ser preservado. Nesse tema voc vai descobrir que a preservao dos bens culturais muito importante, mas deman-da alguns instrumentos como projetos e legislaes pertinentes para proteger cada tipo de patrimnio cultural, quer seja material ou imaterial.

    2.1 IPHAN: FOMENTADOR DA PROTEO DO PATRIMNIO CULTURAL BRASILEIRO

    O IPHAN o rgo mximo da proteo do Patrimnio Cul-

    tural em nvel federal no Brasil. Acima do IPHAN, na hierarquia, somente a UNESCO atua em mbito mundial salvaguardando os bens do Patrimnio Mundial. A seguir, um histrico da instituio

  • 50 Patrimnio Cultural

    que acaba se confundindo com a prpria trajetria da cultura no pas. Depois sero demonstrados os objetivos e as princi-pais linhas de atuao.

    HistricoNo dia 13 de janeiro de 1937 foi criado pela lei n 378 o

    Servio de Patrimnio Histrico e Artstico Nacional (SPHAN), na poca, durante o governo de Getlio Vargas. Antes disto, j havia um movimento de intelectuais preocupados com a salvaguarda dos bens culturais brasileiros.

    A historiadora Letcia Julio (2005) traa o histrico do IPHAN, desde as discusses para a sua criao ainda na dcada de 1920 at o presente. A criao do SPHAN na dcada de 1930 foi o reflexo das discusses para a construo de uma identida-de e cultura nacionais, elaboradas na dcada anterior pelos inte-lectuais do movimento modernista. Antes desse movimento, o atraso brasileiro tinha como meta de superao a inspirao em tendncias europeias.

    A partir da Semana de Arte Moderna de 1922, artistas e in-telectuais propuseram um rompimento com a dependncia cul-tural atravs da descoberta das singularidades nacionais. Assim, o passado seria valorizado atravs das tradies nacionais num esforo de reconciliar o novo com o antigo. Em 1924, os moder-nistas realizaram viagens ao interior do Brasil e constataram a necessidade de preservao dos bens culturais, sobretudo das cidades mineiras que agregam a esttica barroca e o passado colonial.

    Conforme Julio (2006), ainda nos anos vinte, algumas ini-ciativas de poltica de preservao foram tomadas pelo governo federal. Essas iniciativas foram os antecedentes da criao do SPHAN, em que se destacam as criaes da Inspetoria dos Monu-mentos em 1923 e do Servio de Proteo dos Monumentos Histricos e Obras de Arte em 1934.

  • Tema II | Preservao do patrimnio cultural 51

    O contexto histrico em que o SPHAN foi criado tem como

    base a poltica autoritria e nacionalista do Estado Novo12. Houve

    ento um embate ideolgico entre os intelectuais brasileiros no

    que diz respeito concepo de pa-

    trimnio. Eram duas as vises sobre o

    patrimnio na poca, uma passadista

    e romntica e a outra modernista. A vi-

    so passadista e romntica enxergava

    o patrimnio como uma tradio a ser venerada e copiada pelo

    presente. J a viso modernista propunha a preservao do

    patrimnio atravs de uma releitura associando-a construo

    da nacionalidade.

    Houve uma divergncia, tambm, entre os criadores do

    SPHAN. Mrio de Andrade elaborou um anteprojeto a pedido

    do Ministro da Educao e Sade Pblica, Gustavo Capanema.

    Dentre os intelectuais que participaram da criao do rgo des-

    tacam-se: Rodrigo Melo Franco de Andrade que contou com a

    colaborao de outros brasileiros ilustres como Oswald de An-

    drade, Manuel Bandeira, Afonso Arinos, Lcio Costa e Carlos

    Drummond de Andrade.

    A proposta de Mrio de Andrade tinha como objetivo incor-

    porar as mais diversificadas manifestaes da cultura brasileira.

    Ele considerado um precursor da valorizao da cultura imaterial

    no Brasil. Assim, o literato props a criao de quatro grandes

    museus: arqueolgico e etnogrfico; histrico; das belas artes e das artes aplicadas; e tecnologia industrial. No entanto, a pro-posta que foi colocada em prtica quando da oficializao do orgo era bem diferente da proposta por Andrade, pois estava respaldada numa viso de patrimnio restritivo que reproduzia o universo simblico das elites e a ideia hierrquica da cultura.

    12 Regime poltico autoritrio

    implementado por Getlio

    Vargas entre 1937 e 1945.

  • 52 Patrimnio Cultural

    Mrio Raul de Morais Andra-de foi um poeta, romancista, crtico de arte, musiclogo, professor uni-versitrio e ensasta, considerado unanimidade nacional e reconheci-do por crticos como o mais impor-tante intelectual brasileiro do scu-lo XX.[1] Notvel polmata, Mrio de Andrade liderou o movimento modernista Maylsonanico no Bra-sil e produziu um grande impacto na renovao literria e artstica do pas, participando ativamente da Semana de Arte Moderna de 22, alm de se envolver (de 1934 a 37) com a cultura nacional trabalhando como diretor do Depar-tamento Municipal de Cultura de So Paulo.Fonte: http://pt.wikipedia.org

    A cultura popular foi contemplada somente em 1968, com a criao do Museu do Folclore. A criao deste museu repre-sentou o reflexo do movimento folclorista das dcadas de 1940 e 1950. Em 1979, sob a direo de Alosio Magalhes o SPHAN passou a ser chamado de IPHAN, alargando mais sua proposta quanto ao discurso do patrimnio brasileiro. Assim, essa nova proposta teve como objetivos democratizar o acesso ao patrim-nio cultural, bem como reconhecer a diversidade cultural do pas e os produtos do fazer popular.

    Aes e objetivos do IPHANAtualmente o IPHAN est vincu-

    lado ao Ministrio da Cultura e com-posto de 27 Superintendncias13 e 25 Escritrios Tcnicos. O funcionamento

    Fonte: http://bravonline.abril.com.br

    13 Acesse o link para conhe-

    cer as superintendncias do

    IPHAN:http://portal.iphan.gov.br

  • Tema II | Preservao do patrimnio cultural 53

    deste Instituto est de acordo com o artigo 216 da Constituio da Repblica Federativa do Brasil que j foi mencionado ante-riormente. A Carta Magna tambm institui que cabe ao poder pblico, com o apoio da comunidade, a proteo, preservao e gesto do patrimnio artstico e histrico do pas. A Administra-o Central funciona na Capital Federal, Braslia-DF e no Palcio Gustavo Capanema, no Rio de Janeiro-RJ. Alm disto, o IPHAN administra quatro Centros Culturais.

    Na cidade do Rio de Janeiro est situado o Arquivo Central do IPHAN. Este o setor responsvel pela abertura, guarda e acesso aos processos de tombamento, de entrada e de sada de obras de artes do pas. Alm disso, cabe ao Arquivo Central a emisso de certido para efeito de prova e inscrio dos bens nos Livros do Tombo e nos Livros de Registro do Patrimnio Ima-terial. No Brasil, 41 museus fazem parte da estrutura administrati-va do IPHAN e cerca de 250 mil bens em museus so protegidos pela Instituio.

    O IPHAN possui uma base de dados disponveis na internet composta de seis sistemas. O primeiro deles a Consulta dos Bens Culturais Procurados, e tem sido utilizado como instrumento de apoio, num esforo conjunto entre PHAN, ICOM e Interpol, na luta contra o trfico ilcito de bens culturais. Os outros cinco, desen-volvidos com o apoio do Ministrio da Cultura, so: o Sistema de Gerenciamento de Patrimnio Arqueolgico, o Inventrio Nacional de Bens Imveis em Stios Urbanos Tombados, o Guia dos Bens Tombados, o Acervo Iconogrfico e a Rede Informatizada de Bibliotecas do PHAN. Todas essas bases de dados esto acessveis para pesquisa podendo ser consultadas a partir do nome do bem, de seu estado de origem, de palavras chaves como: categorias dos bens, nomes populares, etc.

    Os objetivos do IPHAN so fiscalizar, proteger, identificar, restaurar, preservar e revitalizar monumentos, stios e bens mveis do pas. A atuao do IPHAN pode ser verificada em

  • 54 Patrimnio Cultural

    aproximadamente 21 mil edifcios tombados, 9.930 stios arque-olgicos, 79 centros e conjuntos urbanos, mais de um milho de objetos, incluindo o acervo museolgico, cerca de 834 mil volumes bibliogrficos, documentao arquivstica e registros fotogrficos, cinematogrficos e videogrficos. Alm disso, h o cuidado na preservao e manuteno do ttulo dos bens do Patrimnio Mundial.

    O IPHAN atua tambm em alguns projetos atravs da parce-ria com organismos Internacionais, nacionais, Estados, Prefeitu-ras e Iniciativa privada. Todos esses projetos tm como objetivo maior a preservao do patrimnio cultural em suas instncias material e imaterial. possvel observar as li-nhas de atuao do IPHAN dentre as quais se destacam:

    Programa Descrio

    Programa Nacional do Patrimnio Imaterial

    O Programa Nacional do Patrimnio Imaterial/PNPI, institudo pelo Decreto n 3.551, de 4 de agosto de 2000, via-biliza projetos de identificao, reco-nhecimento, salvaguarda e promoo da dimenso imaterial do patrimnio cultural.

    Programa Nacional de Incentivo Cultura

    O Programa Nacional de Incentivo Cultura apoia, desenvolve e incentiva projetos culturais por intermdio de recursos oriundos do Fundo Nacio-nal de Cultura - FNC, Fundo de Inves-timento Cultural e Artstico Ficart e o incentivo projetos culturais - Me-cenato. O investimento privado em cultura contribui no desenvolvimento econmico e social do pas.

    14 Para saber mais sobre as li-

    nhas de atuao do IPHAN acesse:

    http://portal.iphan.gov.br/

  • Tema II | Preservao do patrimnio cultural 55

    Programa MonumentaO Monumenta um programa de recuperao sustentvel do patrim-nio histrico urbano brasileiro tom-bado pelo Iphan e sob tutela federal.

    Programa de Reabilitao Urbana de Stios Histricos - Urbis

    Programa de Reabilitao Urbana de Stios Histricos, estratgico para a soluo de problemas afetos ao patri-mnio cultural nas cidades, na medi-da em que se volta para o desenvolvi-mento de uma cultura urbanstica do patrimnio.

    Programa de Revitalizao de S-tios Urbanos, atravs da Recupe-rao do Patrimnio Cultural

    O programa visa estabelecer um pro-cesso de revitalizao dos stios urba-nos que d sustentabilidade ao patri-mnio e contribua para elevao da qualidade de vida das comunidades envolvidas. Este programa est direta-mente ligado s aes desenvolvidas pelo Programa Monumenta.

    Programa de Especializao em Patrimnio Iphan/Unesco

    Em parceria com a Unesco, o Iphan oferece bolsas institucionais a recm-formados, num processo seletivo en-tre profissionais recm-formados que desejam especializar-se nos diversos campos da preservao do patrim-nio cultural.

    Programa de Inventrio de Bens Mveis e Integrados

    Em parceria com a Fundao Vitae, o Iphan implementou no estado de Mi-nas Gerais o Programa de Inventrio de Bens Mveis e Integrados.

    Fonte: Adaptado do site do IPHAN: http://portal.iphan.gov.br

    Os objetos de proteo vo desde stios urbanos at a prpria cultura em seus mais diversos nveis. Note que h tambm um programa de Especializao em Patrimnio, em convnio do IPHAN com a UNESCO.

  • 56 Patrimnio Cultural

    O IPHAN e os MuseusO museu um estabelecimento permanente, aberto ao p-

    blico, sem fins lucrativos, a servio da sociedade e de seu de-senvolvimento. Para tanto, adquire, conserva, pesquisa, expe e divulga o patrimnio cultural com o intuito de estimular o conhecimento, o lazer e a educao.

    Atualmente, no Brasil, existem aproximadamente 2.000 instituies museolgicas, dos mais diversos ti-pos: nacional, regional, ecomuseus15, comunitrios, pblicos ou privados, histricos, artsticos, antropolgicos e etnogrficos, tecnolgicos, cientfi-cos, dentre outros.

    H, no Brasil, 41 museus sob a tutela do IPHAN. Nestes existem, em conjunto, um acervo de aproximadamente 250 mil bens protegi-dos pelo Instituto.

    Para Refletir

    Aps conhecer a trajetria histrica, os objetivos e os prin-cipais projetos do IPHAN, faa uma pesquisa de quais bens do seu Estado so tombados pelo Instituto. Compartilhe os resulta-dos com seus colegas no frum do AVA.

    15 Os ecomuseus so institui-

    es que abordam a territo-

    rialidade, a identidade cultural

    e os problemas comunitrios

    . Nestas instituies primor-

    dial a participao das popula-

    es como agentes e utilizado-

    res das programaes museo-

    lgicas com vistas ao desen-

    volvimento social do meio que

    lhes d vida.

  • Tema II | Preservao do patrimnio cultural 57

    2.2 AES PRESERVACIONISTAS: A LEGISLAO BRASILEIRA E AS CARTAS PATRIMONIAIS

    Os principais instrumentos de preservao do patrimnio cultural no Brasil so a Legislao brasileira e as cartas patrimo-niais. A seguir comentaremos cada um desses elementos.

    A legislao brasileira e a preservao do patrimnio cultural

    A legislao brasileira referente ao patrimnio cultural

    bastante abrangente e aborda os mais variados assuntos. Esse

    conjunto de leis regulamenta desde o processo de tombamento

    at a instituio da educao ambiental. Marcos Miranda (2006)

    comenta a compilao que fez reunindo as leis que tratam e re-

    gulamentam os bens culturais brasileiros.

    As principais leis que abordam o patrimnio cultural em

    mbito federal so: acessibilidade aos bens culturais; apoio

    cultura, arquivos pblicos e privados; comrcio e exportao

    de bens culturais; educao ambiental; museus; patrimnio ar-

    queolgico; patrimnio bibliogrfico; patrimnio espeleolgico;

    patrimnio imaterial; patrimnio turstico; remanescentes de

    quilombos e tombamento.

    Remanescentes quilombolas

    Fonte: http://bibliotecadepiracicaba.files.wordpress.com

    Fonte: http://www.muhm.org.br

  • 58 Patrimnio Cultural

    No que diz respeito acessibilidade aos bens culturais a Instruo Normativa IPHAN 01/2003 dispe sobre o acesso aos bens culturais imveis acautelados em nvel federal. H tambm a bastante comentada lei de apoio cultura 8.313/91 que institui o Programa nacional de Apoio Cultura (PRONAC). A legislao referente aos arquivos pblicos e privados dispe da lei 8.159/91 e do decreto 2.942/99 que determinam sobre a poltica nacional de arquivos pblicos e privados e o decreto 2.134/97 que regula-menta a categoria dos documentos pblicos sigilosos e o acesso a eles.

    Com relao exportao de bens culturais, a Lei 4845/65 probe a sada de Obras de arte e Ofcios produzidos no pas at o fim do perodo monrquico. Nesse mesmo assunto, o decreto 3.166/99 promulga a Conveno da UNIDROIT sobre bens cultu-rais furtados ou ilicitamente exportados. A poltica nacional de educao ambiental regulamentada pela lei 9.795/99 e pelo decreto 4.281/2002.

    No que se refere s Instituies museolgicas, o decreto 5.264 institui o Sistema Brasileiro de Museus. Ainda tratando dos diversos tipos de patrimnio cultural, o patrimnio arqueolgico (lei n 3.924/61 e Lei 7.542/86), o patrimnio bibliogrfico (decre-to 520/92 e lei 10.994/2004), o patrimnio espeleolgico (porta-ria IBAMA 887/90 e o decreto 99.556/90), o patrimnio paleonto-lgico (decreto-lei 4.146/42), o patrimnio turstico (lei 6.513/77) e o patrimnio imaterial (decreto 3.551/2000). Merece especial ateno o fato desse ltimo tipo de patrimnio ter sido alvo de proteo apenas recentemente.

    H a legislao que regulamenta o processo de tombamento e que protege os remanescentes quilombolas. Tanto o decreto n 4.887/2003 quanto a Instruo Normativa INCRA n 16 de 24 de maro de 2004 abordam o procedimento de identificao, reco-nhecimento, delimitao, demarcao e titulao das terras demar-cadas por descendentes quilombolas. Quanto ao tombamento, o

  • Tema II | Preservao do patrimnio cultural 59

    decreto-lei 25/37 organiza a Proteo do Patrimnio Histrico e Artstico Nacional. J o decreto-lei 3.866 dispe sobre o cance-lamento do tombamento. Por fim, as leis 6.292/75 e 10.413/2002 determinam sobre o tombamento de bens no IPHAN e do tom-bamento dos bens culturais das empresas includas no Programa Nacional de Desestatizao.

    Em 2003, A UNESCO realizou a Conveno para a Salvaguar-da do Patrimnio Imaterial e a sua implementao uma das prio-ridades no campo da cultura. Cabe salientar que est disponvel na internet o trabalho Patrimnio imaterial: legislao e polticas es-taduais16. Esta pesquisa um levantamento e anlise da legislao de patrimnio imaterial adotada pelos governos estaduais brasilei-ros e as medidas para a implementao de cada legislao.

    As cartas patrimoniaisAs Cartas Patrimoniais so a

    reunio dos principais documentos, cartas e recomendaes que pos-suem como enfoque a proteo do patrimnio cultural em mbito nacional e internacional. O IPHAN disponibiliza a relao atualizada das cartas patrimoniais17.

    Algumas cartas, como a referente Reunio da ONU em Estocolmo em 1972, no possuem como objetivo maior o pa-trimnio cultural, mas aes para a proteo do meio ambiente em mbito mundial. No entanto, este instrumento considerado uma carta patrimonial, pois na atualidade a noo de patrimnio cultural tambm engloba as preocupaes ambientais. A compi-lao destas cartas um instrumento essencial para todos aqueles que se relacionam com o tema patrimnio cultural: professores, advogados, moradores de bens tombados, estudantes, organizaes governamentais ou no, afins ao IPHAN ou qualquer cidado brasileiro.

    16 Para saber mais acesse o link:

    http://unesdoc.unesco.orgorg

    17 Veja na ntegra as cartas

    patrimoniais, acessando:

    http://portal.iphan.gov.br

  • 60 Patrimnio Cultural

    No comeo, as cartas patrimoniais tratavam de assuntos como a noo de monumento e seu entorno. Depois, a noo de preservao do patrimnio cultural ampliou-se para a arquitetu-ra, restauro e os stios urbanos. Logo em seguida, as questes de arqueologia e comrcio de bens ganharam relevo.

    Vale ressaltar que algumas cartas no foram concebidas como carta patrimonial. Na verdade, esta classificao veio de-pois. A carta de Pero Vaz de Caminha, por exemplo, em 1500, no foi elaborada com a inteno de preservar o patrimnio cul-tural. O que h na carta de relevante e que a qualifica como carta patrimonial o fato da mesma ser a primeira descrio detalhada do patrimnio natural brasileiro.

    A seguir temos uma tabela com a relao de algumas das cartas de algumas patrimoniais, contendo o local, a data, entida-de promotora e o assunto referente a cada uma delas.

    Relao das Cartas Patrimoniais

    Carta PatrimonialLocal/ Entidade promotora/

    DataAssunto

    1- Carta de AtenasAtenas/ Sociedade das

    Naes / outubro de 1931Proteo a

    monumentos

    11- Carta do RestauroItlia/ Ministrio da Instruo Pblica do Governo/ 06 de

    abril de 1972. Restauro

    12- Declarao de Estocolmo

    Estocolmo( Sucia)/ ONU/ 05 a 16 de junho de 1972.

    Meio Ambiente

    13- Recomendao Paris 1972 (Conveno sobre

    a Proteo do Patrimnio Mundial, Cultural e

    Natural)

    Paris/UNESCO/ 16 de novembro de 1972.

    Patrimnio Mundial

  • Tema II | Preservao do patrimnio cultural 61

    15- Declarao de Amsterd

    Amsterd/Congresso do Patrimnio Arquitetnico

    Europeu/ outubro de 1975. Patrimnio

    Arquitetnico

    17- Carta do Turismo Cultural

    Bruxelas (Blgica)/ICOMOS/ 8 e 9 de novembro de 1976. Turismo cultural

    19- Carta de Machu Picchu

    Machu Picchu/CIAM/ dezembro de 1977.

    Preservao urbana

    21- Carta de FlorenaFlorena (Itilia) Conselho

    Internacional de Monumentos e Stios, em maio de 1981.

    Monumentos e stios

    arqueolgicos

    24- Declarao do Mxico (Conferncia

    Muncial sobre as Polticas Culturais)

    Mxico/UNESCO/1982. Polticas culturais

    25- Carta de Washington 1986 Washington/ ICOMOS/1986. Cidade Histricas

    26- Carta Petrpolis

    Petrpolis/1 Seminrio Brasileiro para Preservao e

    Revitalizao de Centros Histricos/ 1987.

    Centros Histricos

    30- Recomendao Paris 1989

    Paris/UNESCO/ 15 de novembro de 1989.

    Cultura Tradicional e

    Popular31- Carta de Lausanne Lausanne/ ICOMOS/

    ICAHM/1990.Patrimnio

    Arqueolgico32- Carta do Rio

    (ECO-92)Rio de Janeiro/ONU/ junho

    de 1992.Meio Ambiente e Desenvolvimento

  • 62 Patrimnio Cultural

    33- Conferncia de Nara

    (Conferncia sobre a autenticidade em

    relao Conveno do Patrimnio Mundial)

    Nara (Japo)/UNESCO/ICCROM/ICOMOS/ 06 de

    novembro de 1994.

    Patrimnio Mundial

    41 - Recomendao Paris 2003 Paris/ONU/outubro de 2003

    Patrimnio Imaterial

    42 - Carta de Pero Vaz de Caminha

    Brasil-Portugal/1500.

    Primeira obra litetria brasileira.

    Relata o descobrimento e descreve os

    primeiros contatos com a terra e

    seus habitantes.

    Fonte: Adaptado do site do IPHAN: http://portal.iphan.gov.br

    Nos dois prximos tpicos voc ver detalhadamente de que maneira os patrimnios material e imaterial esto sendo protegidos. E o que voc, enquanto cidado, poder fazer para proteg-los.

    Para Refletir

    Aps estudar a legislao brasileira e as cartas patrimoniais relacione-as. Por exemplo, qual legislao protege o patrimnio imaterial em mbito nacional e mundial, do mesmo modo com relao ao patrimnio natural e mundial. Compartilhe as informa-es no frum do AVA.

  • Tema II | Preservao do patrimnio cultural 63

    2.3 A PRESERVAO DO PATRIMNIO MATERIAL

    Na seo anterior, voc viu os instrumentos de proteo ao patrimnio cultural como um todo. Nesta seo voc ver como possvel preservar os bens materiais no Brasil a partir das aes do IPHAN e de algumas cartas patrimoniais. A seguir, detalharemos a partir da legislao pertinente cada tipo de patri-mnio material.

    Como voc viu anteriormente, o IPHAN a principal institui-o de proteo aos bens culturais no Brasil. Nesse sentido, para salvaguardar esses bens, h no IPHAN quatro livros do Tombo: arqueolgico, paisagstico e etnogrfico; histrico; belas artes; e das artes aplicadas. Estes esto divididos em bens imveis, como stios arqueolgicos, paisagsticos e bens individuais; e mveis como acervos museolgicos, bibliogrficos, documen-tais, colees arqueolgicas, dentre outros.

    Para saber quais bens so tombados a nvel federal pelo IPHAN, voc pode acessar o Arquivo Central do IPHAN, o link est na seo anterior. Dentre os bens materiais que so alvo de proteo pelo IPHAN destacam-se: Os stios urbanos; o patri-mnio arqueolgico; e jardins histricos, parques e paisagens.

    Os stios urbanosOs conjuntos urbanos so unidades do espao urbano que

    compem um conjunto homogneo no que se refere s suas caractersticas arquitetnicas. O reconhecimento dos conjuntos urbanos recente. Antes, apenas edifcios isolados eram o foco de preservao. Apesar disso, h cidades que possuem uma es-trutura nica, que caracterizada pela homogeneidade arquite-tnica de um mesmo perodo histrico. Foi somente a partir da Carta de Washington (carta patrimonial) de 1986, que diz:

  • 64 Patrimnio Cultural

    Os valores a preservar so o carter histrico da cidade e o conjunto de elementos materiais e espirituais que expres-sam sua imagem em particular:

    A forma urbana definida pelo traado e pelo parce-lamento;

    As relaes entre os vrios espaos urbanos, espaos construdos, espaos abertos e espaos verdes;

    A forma e o aspecto das edificaes (interior e exterior) tais como so definidos por sua estrutura, volume, estilo, escala, materiais, cor e decorao;

    As relaes da cidade com seu entorno natural ou criado pelo homem;

    As diversas vocaes da cidade adquiridas ao longo de sua histria.

    Qualquer ameaa a esses valores comprometeria a au-tenticidade da cidade histrica. (CARTA DE WASHINGTON, 1986, p. 2)

    At o momento, aqui no Brasil, h 63 stios urbanos tombados pelo IPHAN. Esses stios fazem parte do Inventrio Nacional de Bens Imovis (INBI). Veja abaixo o mapa da distribuio desses stios e, em seguida, uma tabela com a distribuio por regio.

  • Tema II | Preservao do patrimnio cultural 65

    Norte Nordeste Sul Sudeste Centro-Oeste

    ParBelm

    AlagoasPenedoPiranhas

    Paran- Lapa

    Rio de Janeiro- Angra dos Reis- Cabo Frio- Nova Friburgo-Niteri- Paraty- Petrpolis- Rio de Janeiro- Vassouras

    Distrito Federal(Braslia)

    Natividade (TO)

    Bahia- Andara - Cachoeira- Ilha de Itaparica- Lenis- Monte Santo- Mucug- Porto Seguro- Rio de Contas- Salvador- Santa Cruz de Cabrlia (BA)

    Rio Grande do Sul- Antnio-Prado- Porto - Alegre

    So Paulo- Carapicuiba- Jundia- So Paulo

    Mato Grosso

    -Cuiab

    Cear- Aracati- Ic- Sobral- Viosa

    SantaCatarina-Laguna-SoFranc i sco do Sul

    Minas Gerais- Belo Horizonte- Caet- Cataguazes- Itaverava- Mariana- Nova Era- Piranga- So Joo del Rey- Congonhas- Diamantina-Ouro Preto-Serro-Tiradentes

    Mato Grosso do SulCorumb

  • 66 Patrimnio Cultural

    Maranho- Alcntara- So Lus

    Gois- Goinia- Gois- Pilar de Gois- Pirenpolis

    Pernambuco- Igarassu- Olinda- RecifeSergipe- Laranjeiras- So Cristovo

    Fonte: adaptado do site:

    http://portal.iphan.gov.br

    O Patrimnio ArqueolgicoA proteo dos stios arqueolgicos no Brasil data da dca-

    da de 1960. A Lei n 3.924/61 define os stios arqueolgicos a se-rem protegidos. J na dcada de 1980, a Lei n 7.542/86 disps sobre a pesquisa, explorao,