pareceres, volume 1, fallencias - josé xavier carvalho de mendonça

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Pareceres, volume 1, Fallencias - José Xavier Carvalho de Mendonça

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  • P f l R E C E R E S

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  • J . X. CARVALHO DE MENDON A

    IPS h

    V

    PRECERES

    FALLENCIAS

    COM UM PREFACIO DO DR. WALDEMAR FERREIRA

    CO LLIG1DOS

    por

    ACHILLES BEVILQUA e

    O CARVALHO DE MENDONA

    S. . F. P A T R I M N I O

    H.*0U

    1 9 3 3

    L I V R A R I A E D I T O R A F R E I T A S B A S T O S Ruas : Bethencourt da Silva, 21 - A e 13 de Maio, 74 e 76

    .1 I !

    RIO DE JANEIRO

  • P R E F A C I O

    Jurisconsulto de larga envergadura, autoridade maior nos domnios do direito comercial, sempre acatado em todos os ramos da cincia jurdica, em que era, notavel-mente, exmio, foi J. X. CARVALHO DE MEN-DONA ouvido sobre os mais considerveis pleitos de-batidos no foro e sobre as questes mais difceis da praa mercantil brasileira. Quem desejou sentir-se seguro do seu direito, antes de o pr em ao, ou para defende-lo barra dos tribunais, bateu porta do grande comercialista. Re-cebeu ele considervel numero de consultas, provindas de vrios pontos do Brasil. Emitiu, por isso, parecer es sem conta, dos mais variados contedos, recebidos como ver-dadeiras sentenas de ordem privada, tamanho era o in-confundvel prestigio do seu apuradissimo senso jurdico.

    Espirito aberto a todas as cogitaes em torno da vida brasileira, que conheceu a fundo, em todas as suas manifestaes, habituou-se a examina-las na sua realidade. Viu. Observou. Sentiu. Magistrado, nos primeiros tem-pos de sua mocidade, depois de rpida passagem pelo mi-nistrio publico, adextrou-se na /arte difcil de pesar os prs e os contras, na balana dos interesses individuais, afim de dar a cada um o seu. Afeito ao mister de tirar os disfarces dos pretensos direitos, no {esmoreceu no de in-terpretar a lei imutvel na mutablidade dos casos ocur-rentes. aphcando-a com acerto aos submetidos ao seu exame.

  • VI

    Predicado de relevncia do juiz . por via de regra, o-da serenidade quasi impassvel, a abafar-lhe as paixes, ainda as mais nobres, sobrepondo-se contingncia hu-mana, de molde a poder executar friamente as normas le-gais. No tinha J. X. CARVALHO MENDONA tem-peramento para isso. Trabalhador incansvel e vibrante, facilmente apreendia os termos das questes, no seu con-torno e no seu mago. Estudadas em todas as suas mo-dalidades e aspectos e formado o seu juizo luz dos prin-cpios jurdicos, exprimia-o sem rebuos e defendta-o como se se tratasse da sua propria individualidade. Con-vencido da verdade no havia como impedir-lhe a sua proclamao. Homem de boa f. nunca foi. entretanto, um obstinado. Se. mesmo depois de expressas as conclu-ses do seu raciocnio, outros e novos argumentos se lhe antolhavam e lhe indicavam outro resultado, no se de-tinha. De um desprendimento invulgar. tinha a coragem nobilissima de penitenciar-se e reconhecer, em publico e razo. o engano de seu pensamento.

    Empolgou-o a luta forense, impelindo-o da judica-tura para a advocacia. Advogado veiu a ser. em toda a extenso da palavra. Inteligentssimo e dotado de um pe-netrante espirito de jurista, dedicadissimo no estudo a apresentao das causas, independente, vivacisstmo, e, principalmente, de uma tinha moral retilinea e inteiria, deixou, no pretorio. a impresso profunda de advogado modelar. E ele. efetivamente, o foi. Disso lhe adveiu no-meada extensa e de grande intensidade, justssima.

    No lhe diminuram as lides forenses os pendores para a investigao cientifica. Aprofundou-se no conhe-cimento do fenmeno jurdico. Investigou os seus princ-pios gerais e os efeitos de sua aplicao quotidiana por juizes e tribunais. Os seus trabalhos forenses, redigidos em linguagem lmpida e cristalina, de um brilho fora do comum, e com um fundo jurdico impressionante, deram-lhe a primazia nos auditrios. Minutas e arrazoados, ela-borados com alta preciso tcnica e imensa segurana de conceitos, denunciaram o pulso do jurista: eram monogra-fias completas sobre os assuntos versados.

  • VII

    Consultor jurdico de empresas e de particulates, viu-se. dia a dia, envolvido pela multiplicidade sempre crescente de controvrsias sobre matrias complexas de di-reito. Pouco a pouco, e merc das circunstancias, o juris-consulte foi suplantando o advogado. Preocupado, como sempre esteve, com os trabalhos doutrinrios e de sistema-tizao, culminados com a publicao do monumental Tratado de Direito Comercial Brasileiro, se no deixou de advogar e as ultimas causas, em que defendeu os interesses do Bando do Brasil, alm de outras, demons-traram no haver sofrido alterao a tempera de ao das armaduras do lidador muito mais se dedicou aos la-bores de gabinete, num mourejar continuo e cheio de res-ponsabilidades. No cessou a sua faina gloriosa seno quando a vida se lhe extinguiu.

    No lhe sobrou ensejo para cuidar da coordenao e da publicidade dos seus inmeros pareceres. resolvendo as mais intrincadas perlengas de direito. Muitos, em ver-dade, apareceram nas colunas dos jornais e nas paginas das revistas de doutrina e de jurisprudncia. Reproduzi-ram-se em arrazoados, dissertaes e sentenas, em apoio de orientaes tericas. As teses, neles defendidas e assim postas em circulao, adquiriram o quilate de ouro de lei. Mas o jurisconsulte no contribuiu para essa divulgao, de iniciativa dos interessados, em prol do seu prprio di-reito e em defesa dos seus interesses. Os deixados em si-lencio pelos consulentes ele em silencio conservou. Con-vidado, mais de uma vez, por editores e por admiradores, a da-los impresso em volumes, sempre se recusou a atende-los. Por julga-la inteiramente desnecessria, em vista de haver, mais amplamente, desenvolvido nos vrios tomos do seu tratado sistemtico de direito mercantil bra-sileiro as teorias neles apenas esboadas? Por entender obri ga-lo o segredo profissional a manter no olvido as expo-sies, que se lhe fizeram, e as concluses a que chegou? Por somente pertencer aos solicitantes de pareceres o di-reito de divulga-los se e quando unicamente conveniente ao seu interesse?

    No o disse nunca.

  • VIII

    Deixou ele. entretanto, massa formidvel de traba-lho pela quantidade e. especialmente, pela qualidade Posto se no encontre assunto ao menos delineado nos v-rios tomos de sua obra. muitas diretrizes novas se lhe desvendaram, por via das objees e observaes formu-ladas por quantos meditaram sobre os seus prprios en-sinamentos. Por outro lado. proporo que os seus vo-lumes se foram imprimindo, novas leis se promulgaram, novas doutrinas se lanaram e novas veredas se abriram para a jurisprudncia. Questionrios inteiramente origi-nais se lhe apresentaram, ampliando os seus estudos, mas aumentando a sua imensa cultura jurdica. Nos seus pa-receres ela se foi refletindo e se desdobrando, a variar com a diversidade dos casos ao seu exame sujeitos.

    No era possvel permanecessem inditas paginas das mais brilhantes sobre captulos do direito brasileiro. Se o tempo decorrido amorteceu o interesse individual dos casos concretos, no desapareceu o interesse geral pela sua divulgao.

    No logrou a excelsa Senhora, que lhe deu um lar felicssimo e foi. de resto, a sua mais inteligente e eficaz colaboradora. resistir s solicitaes inmeras no sentido de coordenar e fazer imprimir os pareceres ministrados pelo grande comercialista no decurso de uma clinica jur-dica intensissima. Levada pelo intuito nobissimo de au-mentar o patrimnio cultural do seu paiz. que ele tanto serviu e amou. decidiu-se a lanar este volume de parece-res. a que outros se seguiro.

    Aparecem no momento oportuno e serviro, sem du-vida no para acrescer a aureola que envolve o nome do glorioso jurisconsulte e tem um brilho de primeira gran-deza, mas para enriquecer ainda mais a literatura jurdica brasileira.

    Lisboa. 30 de Abril de 1933.

    WALDEMAR FERREIRA

  • Concordata extra-judicial

    Embora unanime no vincula os credores entre si.

    C O N S U L T A

    F. S Cia. embaraados em seus negcios idearam uma concordata de pagamento de 20% e levaram-na a effeito sem interveno judicial, obtendo de forfos os seus credores recibos de 20% sobre os seus crditos e plena quitao.

    Aos credores O. S Cia., que relutaram na acceitao dos 20 "",. somente, F. & Cia. deram essa porcentagem em dinheiro e pelo restante uma letra por elles acceita, mas com as datas do acceite e do saque em branco.

    Posteriormente. O. Cia. dataram o saque e cederam a letra com a data do acceite ainda em branco a C. que as-sim a protestou por no paga no vencimento.

    O , com a letra protestada, requereu a fallencia dos acceitantes que, para evital-a, depositaram em juzo o va-lor delia e procuraram demonstrar com os depoimentos de O . dos membros da firma O. 8 Cia. e outros, que a letra

  • 10 J. X. CARVALHO DE MENDONA

    era obrigao sem causa porque O. 8 Cia. tinham dado plena e geral quitao com o recebimento de 20 % por saldo de seu credito e que a cesso da letra a C. era si-mulada.

    O juiz, no dando pela allegada nullidade da letr; e tendo-a como um titulo lquido e certo e passado em data posterior ao recibo de 20% por saldo, mandou que se entregasse ao portador a quantia depositada, o que se ef-fectivou.

    Isto posto, pergunta-se:

    1."

    F. 8 Cia. podem impugnar o valor da letra com fundamento no recibo de 20 % por saldo de seu debito para com O. 8 Cia. considerando a obrigao sem causa?

    2.

    Podem demandar por aco ordinria C. e O. 8 Cia. para lhes restituirem o valor da letra j recebido pelo pri-meiro e as despesas que fizeram com a defesa para preve-nir a fallenca requerida por C. ?

    Pede-se nas respostas esclarecimentos oportunos.

    R E S P O S T A

    Obrigao sem causa no a que se prope a um fim juridicamente possvel, licito e verdadeiro.

    F. li Cia. deviam a O. 8 Cia. O pagamento de 20% em dinheiro e a entrega da letra, a que se refere a exposi-o preambular da consulta, tinham fundamento em um facto certo, existente, real. Os devedores pagaram parte do

  • PARECERES FALLENCIAS 11

    seu debito em dinheiro e adiaram o pagamento do saldo. A conveno fora solvendi causa.

    Os accordos amigveis entre o devedor e seus cre-dores em unanimidade, sem homologao ou interveno judicial, so contractos de direito commum; no vincu-lam os credores entre si, no os subordinam quelia disci-plina de egualdade que na fallencia constitue o seu emba-samento e a sua maior fora. Nesses accordos. um credor pode ficar mais beneficiado que outro; o princpio que nelles domina o do interesse individual prprio, de cada credor.

    Dahi a conseqncia: a conveno entre F. & Cia. e O. & Cia. era juridicamente possivel e licita.

    A quitao dada por O. & Cia., no passar o recibo dos 20%, foi um acto simulado para manter apparente-mente entre todos os credores uma egualdade alis dispen-svel. A quitao foi passada ad ostentationem do de-vedor. Verdadeiramente O. 6 Cia. no faziam abatimen-to na divida de F. & Cia.

    A simulao relativa ou innocente nenhum prejuizo traz s partes. Deve-se integrar a vontade dos contractan-tes com aquillo que verdadeiramente ella representa. Pias valet quod agitur quam quod simulate concipitur,

    O acto apparente deve ser substituido pelo acto ver-dadeiro, afim de regular os direitos e obrigaes decor-rentes.

    A letra, entregue por F. & Cia. a O. & Cia. e cedida por estes a O , que se apresentou como portador, embora tambm participasse da simulao do contracte de que provinha, representava uma obrigao verdadeira do seu aceitante e era juridicamente exgivel.

  • J. X. CARVALHO DE MENDONA

    Nestes termos, nosuo parecer:

    1."

    F. 0 Cia. no podem impugnar a ietra. sob o fun-damento de representar uma obrigao sem causa.

    2."

    No sendo caso da conditio indebili nenhuma aco cabe a F. Cia.

  • I

    Concordata Preventiva

    No pde a maioria conceder prorogao.

    C O N S U L T A

    O commerciante que fez concordata preventiva com seus credores e no a cumpriu dentro do prazo concedido, tem direito de pedir prorogao do respectivo prazo, evi-tando assim a fallencia?

    E no caso affirmativo, bastar ao devedor obter o assentimento da maioria que lhe concedeu a primeira con-cordata, para que a prorogao lhe seja concedida? De-ver o pedido da prorogao ser processado satisfazendo o devedor todas as formalidades de uma nova concordata preventiva, isto .mostrando pelos livros e balano que obrigado a exhibir o estado actual de seus negcios, para que os credores possam com conhecimento de causa dar ou negar a prorogao pedida?

    R E S P O S T A

    A concordata preventiva uma vez no cumprida pelo devedor resolve-se em fallencia, desde que um dos credores requeira esta medida.

  • 14 J. X. CARVALHO DE MENDONA

    E' o que decorre dos termos do art. 121 da Lei nu-mero 859, de 1902, e dos princpios adoptados em nosso -direito ( 1 ) .

    Nos contractes bilateraes (a concordata um dlies) subentende-se a clausula resolutiva (LOUREIRO, Direito 'Civil, 650), e, especialmente nos de natureza commer-cial, a parte morosa no pde obter dilao para cumprir aquillo a que se obrigou.

    A prorogao do prazo concedido para o cumpri-mento da concordata, com a interveno judiciaria afim de forar a minoria, seria uma offensa aos direitos desta e somente tolervel em virtude de lei expressa, como se dava anteriormente com a prorogao do prazo das mo-ratrias, e assim mesmo com restrices (Decr. 917, ar tigo 119).

    A minoria tem direitos respeitveis e no deve ficar discreo absoluta da maioria, muitas vezes condescen-dente ou formada por conluio do devedor. Em nosso sys-tema legal os pagamentos aos credores concordatarios no so feitos mediante rateios, e, em taes condies, fcil ao devedor manter uma maioria de credores para o auxiliar na negligencia, seno fraude.

    Prejudicadas esto as demais perguntas.

    (1) Art. 157 da vigente lei n. 5746 de 9 de Dezembro de 1929

  • I l l

    Credito de aluguel, na f allencia

    Aluguel. Classificao na failencia. A retroactividade da failencia somente apre-

    civel para effeito de invalidade de certos actos.

    C O N S U L T A

    A., commerciante. requereu e conseguiu de seus cre-dores accordo ou moratria por 2 annos. No perodo da moratria, mudou-se para um prdio de B. No tendo cumprido a moratria foi declarada a failencia que retroa-giu 40 dias antes do protesto de um titulo feito nas ves peras da moratria.

    B, no recebeu os alugueis. Pergunta-se: B. credor da massa pelos alugueis vencidos no pe-

    rodo da moratria? Tem algum outro privilegio a no ser sobre o pro-

    ducto dos moveis?

    R E S P O S T A

    A retroactividade da failencia somente aprecivel para os effeitos da invalidade de certos actos, praticados

  • 16 J. X. CARVALHO DE MENDONA

    pelo fallido, at art. 35 da Lei n. 859, de 1902 (2 ) , De-clarada a fallencia do devedor que no cumpriu a con-cordata preventiva, a situao dos credores fixada no dia da fallencia.

    Isto posto, respondemos: B. no credor da massa. Quando elle locou o seu

    prdio a A. no havia massa e nem A. era representante dos credores. B. credor da fallencia, no tendo outro pri-vilegio alm do declarado no art. 78 n III a da Lei nume-ro 859, (3 ) , isto , privilegio sobre os moveis de uso pes-soal, que se acharem dentro da casa de residncia do faldo.

    Convm observar que, se se trata de armazm, depo-sito ou estabelecimento reservado ao commercio do fa-ldo, no existe privilegio algum (vide o nosso livro Das Fallencias, vol. 2, n 817 in fine); B. credor chirogra-phario.

    (2) Corresponde ao art. 55 da !ei n. 5746 de 9 de Dezembro de 1924.

    (3) Corresponde ao art. 92, VI letra d da lei vigente.

  • I V

    Verificao de conta para effeito de fallencia

    A conta mercantilmente extrahda dos livros dos commerciantes, nos termos da lei de fallencias, serve apenas para abertura desta.

    A prova feita com a verificao nos livros do credor dispensa a que possa ser colhida nos vro do devedor.

    Expede-se precatria, quando credor e deve-dor residem em lo-gares diffrentes.

    O juiz competente para a verificao aquel-le perante o qual vae ser requerida a fallencia.

    Em regra nomeam-se dous peritos e o iuiz deve estar presente ao exame.

    C O N S U L T A

    1.

    A conta mercantil, extrahda com as formalidades de que trata a lei das fallencias, de 1902, e seu regula-mento, de 1903, prova literal da divida, para o effeito de requerer-se arresto ou embargo em bens do devedor ?

  • IS J, X. CARVALHO DE MENDONA

    i:

    Para ser julgado o titulo de divida liquida e certa, basta o exame nos livros do devedor ou a recusa do mesmo em os apresentar? ou, alm disso, preciso ainda o exame nos livros do credor?

    3."

    No caso de o devedor ser domiciliado no interior do Estado e o credor domiciliado na Capital, qual o processo para o exame nos livros do credor? Depreca-se do juzo do domicilio do devedor para o do domicilio do credor? ou requer-se o exame directamente perante o juizo do do-micilio do credor? Servem os mesmos peritos que fizeram o exame nos livros do devedor, ou nomeam-se outros no juizo do domicilio do credor?

    4."

    Quantos peritos o juiz nomeia para procederem ao exame?

    5."

    O exame, que fazem os peritos em os livros do de-vedor, com assistncia ou sem assistncia do juiz e do escrivo?

    R E S P O S T A

    Ao 1."

    No. A conta mercantilmente extrahida dos livros dos commerciantes e verificada nos termos do art. 2, le-tra h da lei n 859, de 16 de Agosto de 1902 (4 ) , serve somente para a abertura de fallenca do devedor. '

    (4) Corresponde ao art. 1., unico, n. 8, da lei vigente.

  • PABECERES FALLEN'CIAS 19

    Parece-nos ser tal a verdadeira doutrina, attendendo a que se trata de uma medida excepcional. A jurisprudn-cia do Tribunal de Justia de So Paulo tem sido essa (Revista Mensal, vol. 3. pag. 45 e vol. 6. pag. 28) .

    No nos referimos ao Dec. n. 4.855. de 1903. que teve a preteno de regular a lei de fallencias, por ser acto arbitrrio do governo federal, acto inconstitucional e reve-lador da decadncia da nossa legislao (veja-se S. Paulo Judicirio, vol. 2, pag. 424) .

    Ao 2."

    Todo o commerciante obrigado a ter os dois livros mencionados no art. 11 do cdigo. Esta obrigao fun-dada no interesse publico do commercio. Se o commer-ciante recusa apresentar os seus livros, seja qual fr o mo-tivo, para a verificao judicial da conta, tido como con-fesso (art. 2.'. letra h S 1" da Lei n" 859) . A confisso proclamada pelos doutores regina probationum. e consti-tue prova plena (Regul. n. 73 7. art. 157).

    O credor tem o direito de optar pela verificao da conta em seus livros ou nos do devedor. A prova feita nos livros do credor dispensa a que possa ser colhida em os livros do devedor. A disjunctiva ou. que se v no art. 2 letra h 1." da Lei n. 859. solve qualquer duvida que a esse respeito se levante.

    Ao 3.

    O juiz perante o qual a fallencia vae ser requerida parece-nos o competente para a verificao da conta, pois se trata de uma diligencia in preparatrio judicio. Nessas condies, o credor deve requerer a verificao da conta perante o juiz. em cuja jurisdico tem o devedor o s'u principal estabelecimento (art. 4." da Lei n. 859) pc dindo que se expea precatria para o exame dos livros ao juiz do seu domicilio (art. 19, 2.* parte do cod. com.L O devedor tem de ser citado para vr expedir a precatria.t Os peritos podem ser nomeados pelo juiz deprecante ou

  • 20 J. X. CARVALHO DE MENDONA

    mesmo pelo deprecado, e no ha incompatibilidade em servirem nos exames dos livros do credor e do devedor os mesmos peritos. O exame julgado pelo juiz deprecante.

    O protesto da conta (art. 3. da Lei n. 859) deve ser feito no domicilio do devedor ( arg. do art. 3 74. 1. do Regul. n. 737).

    Ao 4."

    Em regra, dois. Se ha divergncia, facto raro attenta misso desses peritos, nomea um terceiro. E' essa a praxe.

    Ao 5."

    A verificao da conta mercantil para os fins da Lei n. 859 idntica ao exame parcial dos livros, de que trata o art. 19 do cod. com. O Regul. n.737 considera vistoria o exame judicial dos livros (art. 211) , e dever do juiz estar presente ao acto com o seu escrivo. E' costume se dar prazo aos peritos para apresentarem em cartrio as suas respostas.

  • V

    Custas. Remunerao do syndico e do commissario

    As custas da concordata preventiva correm por conta de quem as promove.

    Credor recorrente. Si a falencia ficou sem effeito em virtude de

    provimento de aggrave, no houve liquidao e no ha commlsses que pagar.

    C O N S U L T A

    A. requereu uma concordata prevent iva que lhe foi negada. Aggravando para o T r i b u n a l de Jut ia est? deu provimento , porm condemnou a massa de A nas custas.

    Ora no ha mais massa. Pergunta-se : quem deve pagar as custas, inclusive

    commisses aos syndicos e aos fiscaes: A. que venceu o"

  • 22 J. X. CARVALHO DE MENDONA

    aggravo ou o Banco Z., nico credor dissidente que foi,. afinal, vencido ?

    O Banco Z. credor de A. e de B. Acceitou uma pro-posta de pagamento integral e prazo de um anno feita por B.. porm, com resalva de seus direitos contra A. accei-tante dos ttulos saccados por B.

    Pergunta-se: A. ficou exonerado de responsabilidade para com o Banco?

    P A R E C E R

    I

    As custas do processo do accordo ou concordata pre-ventiva correm por conta de quem o promove; so custas ex-causa.

    A reclamao dos credores, autorizada pelo art. 116 da Lei n. 859 (5) com as conseqentes diligencias jud-caes constitue parte daquelle processo e no um incidente no sentido processual. Se a reclamao do credor no attendida, este no se pde dizer vencido, no sentido da. Ord. 3, tit. 67, pr., obrigado ao pagamento das custas. Se a fallencia aberta, elle tambm no se poder dizer vencedor.

    Entretanto, se um credor age fora deste processo, col-locando-se na posi>o ostensiva de adversrio, deve pagar as despesas se fr vencido. Assim: no caso da resciso (6) do accordo nos termos do art. 120 da Lei n. 859, e mesmo se do despacho de homologao elle aggrava e dece no recurso. No caso da consulta, o Banco Z. acompanhou o aggravo, collocando-se na posio de parte; -deve pagar as custas-

    (5) Art. 150, 2., n. lr da lei vigente.

    (6) Art. 158 combinado com o art. 115. da lei vigente.

  • PAEECERES FALLENCIAS 23

    deste recurso, mas no as do processo da concordata, em-bora figurasse neste como credor dissidente.

    Devemos dizer que na hypothse exposta na consulta, o syndico provisrio e a commisso fiscal no tm direito a remunerao ou salrio.

    A lei determina que os salrios (gratificao ou com-misso) do syndico provisrio e da commisso fiscal ,se-jam apurados sobre o valor da liquidao (art. 66 2. da Lei n. 859) (7 ) . e sempre tiradas do liquido EFFE-_TIVA e REALMENTE apurado afinal, deduzidas as importncias dos crditos privilegiados e as despesas da li-quidao (art. 138 da cit. Lei). ( 8 ) .

    evidente, pois. que as porcentagens do syndico provisrio e da commisso fiscal devem ser deduzidas, como bem frisou o accordam do Tribunal de Justia de 11 de Junho de 1903. das quantias distribudas em divi-dendos pelos credores chirographarios.

    Sendo assim, estas porcentagens somente podem ser verificadas na segunda phase da fallencia. durante o re-gimen unionista. Como conseqncia: somente depois de finda a liquidao da massa poder ser paga a gratificao que o juiz arbitrar ao syndico e commisso fiscal.

    Ora. se a fallencia foi sustada em seus primeiros pas-sos, se ella ficou sem effeito em virtude do provimento do aggravo. no houve liquidao, no ha commisses a pagar.

    I I

    A concordata preventiva no proSuz novao e, con-segumtemente, no exonera os co-obrigados com a reque-rente. Veja-se o que extensamente desenvolvemos nas Fallencias. vol. 2. n. 969. e vol. 1.* ns. 560 e 561.

    (7) Art. 73 da lei vigente.

    (8) Art. 73, 2.' alina.

  • /

    V I

    Sociedade em commandita

    No existem, no direito brasileiro, sociedades zm commandita irregulares ou de facto.

    Findo o prazo do contractu de sociedade em commandita, si esta continua, sem as formalidades de novo contracto e registro, os commanditarios se tor-nam solidrios e incorrem na fallenda. quando de-cretada a da sociedade.

    C O N S U L T A

    O syndico provisrio da massa fallida de V. &> Cia. requereu ao juiz autorisao para proceder arrecadao dos bens do socio commanditario da mesma firma T . A. C para garantia de sua responsabilidade, por ter-se tor-nado solidrio, continuando a firma suas transaces sem que houvesse de novo registrado seu contracto. O peticio-nario invoca os arts. 301 ult. alina do C. Com., 80 2 da Lei e 91 1." do Regul. das Fallencias e Julgados. Junta-se :opia da petio e pergunta-se:

  • 26 J. X. CARVALHO DE MENDONA

    1."

    Tendo a firma commanditaria V. S Cia. continuado as suas operaes depois de expirado o prazo do contracto social, alterou-se a situao jurdica do socio commandi-tario, por este facto, e sem que este socio tenha praticado qualquer acto de gesto, conforme o preceito do art. 314 do Cdigo Commercial?

    2."

    Tendo o juiz decretado a fallencia do socio solid-rio, que foi seguida da arrecadao dos bens socaes e dos particulares deste, pde ainda decretar a arrecadao dos bens do socio commanditario. que no foi declarado fal-lido?

    3.

    Qual o recurso contra tal medida?

    R E S P O S T A

    Expirado o prazo fixado para a durao da socie-dade commercial, esta:

    a) DISSOLVE-SE pleno jure (Cod. Comm. ar-tigo. 335). ou

    ) CONTINUA, devendo, neste caso. ser passado novo contracto com todas as formalidades internas e ex-ternas do contracto institucional (Cod. Com. art. 306) .

    As sociedades em commandita, que. para a sua vali-dade e effeitos jurdicos, tm de ser regularmente Institu-das e mantidas (Cod. Com. arts. 301 in fine. 306 e 312) esto estrictamente sujeitas aos princpios acima estabe-lecidos. Findo o prazo ajustado para a sua existncia ellas, ou continuam com vida legal, no regimen da mais absoluta publicidade, ou desaparecem. Sociedades em commandita irregulares ou de facto no existem aos olhos da lei.

  • PARECERES FALLENCIAS 2T

    No caso exposto na consulta, findo o prazo existen-cial da sociedade em commandita sob a firma V. S Cia., os scios no estipularam a sua continuao na forma im-perativamente determinada pelo art. 306 do Cod. Com.. isto . no passaram novo instrumento legalisado. como fizeram por occasio de instituil-a.

    Temos, pois. uma sociedade sem contracto registrado, uma sociedade irregular ou de facto, em continuao da-quella que fora instituda legalmente: temos tambm, urrr socio ostensivo, representante da sociedade, gerindo e con-tractando em nome desta e outro socio occulto, no inter-vindo na gesto social, no apparecendo nas relaes ex-teriores desta sociedade.

    Ora, os scios occultos so pessoal e solidariamente responsveis como os ostensivos ( Cod. Com. art. 305 in fine).

    E'. consegumtementc. fora de duvida que o socio commanditario se tornou solidrio na sociedade de facto-que succedeu sociedade legalmente constituda.

    Precisamos dizer que o nosso Direito, que parece po-sitivo sobre esse ponto, tem sido ensombrado pelas dou-trinas do Direito francez. mal e indevidamente applicadas.

    Em Frana, commina-sc a pena de nulltdade falta de publicidade (registro e publicao pela imprensa) dos actos pelos quaes se estipula a continuao da sociedade alm do prazo fixado para a sua durao (Lei de 24 de Julho de 1867. art. 61). Quanto aos effeitos dessa nul-lidade diverge a jurisprudncia: uma parte se manifesta no sentido da solidariedade do commanditario. por se achar elle em uma sociedade de facto, cuja conseqncia a res-ponsabilidade de todos os scios pelas obrigaes sociaes (doutrina do Direito brasileiro) : outra parte, a que alis tem prevalecido, sendo actualmente aceita por escriptores de nota. entende que os terceiros tm a opo de conside-rar nulla a sociedade, no podendo, neste caso. exigir a solidariedade dos commanditarios com quem no trataram, que no conheceram por se terem conservado occultos e em cuja f no confiaram. ou admittir a validade da sociedade, reconhecendo nos scios a obrigao jurdica

  • 28 J. X. CARVALHO DE MENDONA

    resultante da conveno social, e ento os commandita-rios no respondem alm da quota com que entraram ou se obrigaram a entrar para o fundo social (PANDECTES FRANAISES, verb. Socits, n. 4.305: ROUSSEAU, Soci-ts, d. 1902. vol. 1, ns. 419 e 420: LYON C A E N ET R E ' -NAULT. Traire de Droit Com., vol. 2. n. 527; THALLER. Trait Elem.. 2.' d. n. 373) .

    Bm nosso Direito, entretanto, os princpios legal-mente estabelecidos so outros.

    A falta de registro em que se estipulou a pro-rogao no traz a naldade da sociedade porque no foi imposta expressamente esta pena (Regi. n. 737. ar-tigo 693). A sanco especial para o caso a mudana da situao jurdica dos scios commanditarios: estes tor-nam-se solidrios com a sociedade nas obrigaes sociaes.

    A ultima alina do art. 301 do Cod. Com. decisiva Respondemos, pois:

    1."

    Sim. Expirado o prazo do contracta social e no tendo sido redigido e registrado novo contracta sobre a prorogao. a sociedade, continuando, tornou-se irregu-lar, de facto: a situao jurdica de todos os scios nive-lou-se quanto responsabilidade pelas obrigaes sociaes. O socio commanditario. no exigindo, em tempo, a li-quidao da sociedade, permanecendo na sociedade irre-gular com a affectio soaetatis, quando mesmo se conser-vasse occulto (isto . quando mesmo no praticasse os actos declarados no art. 3 14 do Cod.). tornou-se solidrio.

    2."

    O juiz. por provocao da parte interessada, deve, por sentena, declarar includo na fallencia da sociedade o socio que se conservava occulto e se dizia e se reputava commanditario. facultando-lhe a mais ampla defesa e o

  • PAEECEEES FALLENCIAS 29

    uso dos recursos legaes. O caso est previsto no n. 845 (2. vol.) do nosso estudo sobre Fallencas.

    Da sentena do juiz que declarar includo na fallen-cia da sociedade o socio occulto, com fundamento no ar-tigo 12 da Lei n. 859 de 1902, podendo tambm ser em-bargada essa sentena (9 ) .

    Do despacho do juiz, que ordenar a arrecadao dos bens. sem essa prvia declarao da responsabilidade do socio occulto cabe aggravo com fundamento no art. 669 15 do Regul. 737 ou ento podero ser utilmente em-pregados os embargos de terceiro, logo depois da effe-ctiva arrecadao dos bens (Regul. 737. arts. 329 e 597)..

    (0) Corresponde ao art. 19, 1. da lei n. 5.746 de 1929.

  • V I

    Sociedade em commandita

    O socio commanditario no credor da socie-dade pelo capital com que contribuiu. No caso de concordata feita por outro socio, no pde esse ca-pital ser exigido do concordatario. na forma dos outros crditos

    P R O P O S T A

    A. e B. ajustaram entre si uma sociedade commer-cial, sob a forma de commandita, entrando o socio B. como simples prestador do capital, que foi integralmente realisado.

    Decretada a fallencia da sociedade, A. socio solid-rio, apresentou uma proposta de concordata, aceita em reunio de credores, compromettendo-se a pagar uma porcentagem sobre o passivo social.

    Pergunta-se : O socio commanditario B., que no teve interven-

    o na concordata, apresentada em nome individual do socio solidrio (o commanditario nem esteve presente

  • 32 J. X. CARVALHO DE MENDONA

    reunio), deve ser contemplado como credor da massa para os effeitos de receber a porcentagem constante da mesma concordata, ou deve ser considerado como pessoa estranha, um direito a ser havido como credor do devedor concordatario ?

    P A R E C E R

    Fallida sociedade, o socio commanditario fica despojado da quota com que entrou para a constituio do capital social. Este acha-se captivo das obrigaes que a sociedade contrahiu. Finda a liquidao do active e pas-sivo da fallencia social e havendo sobras, so estas dis-tribudas pelos scios em proporo aos quinhes que tenham no fundo social (Lei n. 859, de 1902, art. 70 6; Cod. Com., arg. arts. 329 e 330) .

    O commanditario no mutuante, mas socio; o quinho ou quota com que contribue para o capital social representa um elemento do activa da sociedade, incorpo-ra-se massa dos bens sociaes, ao patrimnio social.

    Ao socio concordatario so entregues os bens so-ciaes (Lei n. 859, art. 83 2.) ; a sociedade desapparece de todo.

    A concordata, meio de liquidao na fallencia, quando celebrada entre um socio solidrio e os credores sociaes no altera a situao ou condio jurdica do socio commanditario; no transforma este em mutuante-habilitando-o a figurar no passivo da fallencia, e muito menos lhe confere o privilegio de gosar vantagens na-quelle contracte, como titular de um credito que nunca tivera, ou de um direito que se extinguira com a runa econmica da sociedade.

    Pouco importa, como diz a consulta, que o socio commanditario no intervesse na formao da concor-data proposta pelo socio solidrio, nem que reunio em que ella fora aceita elle no estivesse presente.

    Cada socio tem o direito de apresentar proposta de concordata, independente de accordo ou consentimento

  • PARECERES FALLENCIAS 33

    dos outros scios; tem ainda o direito de discutir a pro-posta apresentada pelo consocio e offerecer substituto (Lei n. 859, art. 83) (10) . Se o commandtaro no compareceu reunio de credo'res, s de si deve se queixar.

    Nestes termos, respondemos : O socio commandtaro B. no tem direito de figu-

    rar entre os credores da fallencia para receber a porcenta-gem estipulada na concordata para pagamento dos cre-dores sociaes, e muito menos se pode considerar credot particular do socio concordatario.

    Somente em um caso o commandtaro B. deveria ser tido como credor do socio concordatario nos termos da concordata : se houvesse feito emprstimo sociedade (Cod. Com., arg. do art. 349, 2." parte).

    E' esse o nosso parecer.

    (10) Corresponde ao a r t 103, 1." da lei n. 5.746 de 1929.

  • V I I I

    Concordata na fallencia

    E X P O S I O

    Os bens particulares dos scios, arrecadados na fallencia. no passam para o patrimnio do socio con-cordatario.

    Entre partes, como outorgante vendedor e por sua vez outorgado credor A. e outorgados compradores c por sua vez outrgantes devedores B. e sua mulher e H. e sua mulher, fez-se por escriptura publica um contracte de compra e venda e outro de divida com hy-potheca. Por elles. A. vendeu dois terrenos a B. e sua mu-lher e a H. e sua mulher, e estes se confessaram devedores a A. do valor dos mesmos terrenos, garantindo o paga-mento com hypotheca destes.

    B, e H 9 mezes depois, formaram entre si uma so-ciedade commercial, sob a firma B. 8 H. para explorar a preparao, compra e venda de couros. No contracto social, archivado na Junta Commercial, foi includa a seguinte clausula : "A sociedade tem por fim construir

  • 36 J. X. CARVALHO DE MENDONA

    um cortume em terreno de propriedade commum dos dois scios e explorar a preparao, compra e venda de couros". Nada mais se encontra no contracte, relativo aos terrenos referidos, que continuaram hypothecados a A. e no foram objecto de qualquer outro contracte.

    J., credor da sociedade, requereu a declarao da fal-lencia da mesma, que foi aberta, sendo nomeados syn-dicos que. como bens sociaes arrecadaram os terrenos hy-pothecados, considerando como fazendo parte do passivo da massa a divida hypothecara de A.

    Na reunio de credores, B. apresentou a seguinte proposta de concordata : "O abaixo assignado, socio so-lidrio da firma B. 8 H. prope aos credores desta firma pagar-lhes 5 c,c de seus respectivos crditos, por saldo de contas, ficando pertencendo ao proponente todo o active da referida firma de B. 8 H.".

    A proposta foi acceita. sendo a concordata homo-logada pelo juiz.

    Pagos os 5 % a alguns credores e depositada judi-cialmente a importncia das quotas dos que no se apre-sentaram. B. requereu ao juiz da fallenca que lhe fosse entregue a massa pelos syndicos e que. "consistindo parte do activo em bens que foram adquiridos individualmente por cada um dos scios e com os quaes entraram elles para a sociedade, sendo taes bens de raiz, cuja transfe-rencia s pde ser operada por escriptura publica", se ex-pedisse alvar de autorisao para que os syndicos ou-torgassem ao supplicante escriptura de entrega da massa e transferencia dos immoveis para o nome individual do supplicante e autorisando a fazer no registro geral a de-vida baixa e transcripo, com a clausula expressa de ser o supplicante o nico responsvel pelo pagamento da divida hypothecara que onera os ditos immoveis e cujo pagamento ainda no foi feito, porque o respectivo cre-dor concorda em conceder novo prazo".

    Ouvido o curador fiscal das massas fallidas. con-cordou com o requerido, proferindo o juiz este despa-cho : "Passe-se alvar, salvo direitos de terceiros". O al-var foi passado e autorisou os syndicos a "fazer ao dito

  • PARECERES FALLENCIAS 87

    concordatario entrega da massa, outorgando e assignando a competente escriptura. visto que a concordata proposta pelo referido concordatario, aceita pelos credores em nu-mero legal e homologada por sentena, que passou em julgado, j est cumprida", segundo os seus termos tex-tuaes. Os syndicos. por escriptura publica, fizeram a en-trega da massa a B.. em nome da massa fallida B. 8 H., "transferindo ao mesmo toda a posse, domnio e aces que pertenciam ao ex-socio referido que por fora da decretao da fallencia, ficaram a pertencer a ella outor-gante. autorisando o outorgado a dar no registro geral a competente baixa na transcripo feita em nome do socio H. e transcrevendo metade dos referidos immoveis no nome delle outorgado, com a clausula expressa de ficar o mesmo outorgado o nico responsvel e obrigado a pagar a quantia de cinco contos de ris, devida por ambos a A., conforme a referida escriptura de divida e hypo-theca". Agora, B. quer outorgar nova escriptura de divida e hypotheca a A., como nico devedor da quantia indi-cada e mais da de 5 contos de ris que deseja que este lhe empreste, hypothecando como de sua propriedade ex-clusiva o mesmo immovel que elle e H. e as respectivas mulheres adquiriram.

    E' bom notar que o contracte social no foi junto aos autos da fallencia e que ao juzo desta nunca com-pareceu H., sendo pessoalmente intimado da senten3 que homologou a concordata, nc interpondo recurso algum.

    Consulta-se :

    1."

    B. legitimo proprietrio dos terrenos que foram adquiridos por elle e sua mulher e por H. e sua mulher, em conseqncia da fallencia da sociedade B. 8 H., em virtude da concordata aceita e cumprida e ex-vi da escri-ptura outorgada pela massa, representada pelos syndicos autorisados pelo alvar, cujos termos foram transcriptos?

  • 38 J. X. CARVALHO DE MENDONA

    2."

    A. pde valdamente receber de B. nova escriptura da hypotheca. garantindo o seu credito anterior e o em-prstimo que fizer ao mesmo B. ?

    Si receber essa escriptura. 3 garantia hypothecaria fica extreme de duvidas ?

    3.

    No caso de respostas negativas aos dous quesitos, precedentes, qual o meio de fazer-se o contracta, com in-teira segurana para A. ?

    P A R E C E R

    Da exposio preambular da consulta, deduzimos os assertos seguintes :

    1." B. 8 H. adquiriram collectivamente, por com-pra, os immoveis, surgindo a figura jurdica da copro-pnedade ou condomnio.

    Na qualidade de condminos, elles offereceram esses immoveis para garantir hypothecaramente o preo da compra, que ficaram a dever a A.

    2." Os immoveis no foram transferidos socie-dade commercial, constituda entre B. e H., nove mezes depois da acqusio, como quota ou parte da quota com que os scios deviam contribuir para a formao do ca-pital social, porque : a) Essa crcumstancia no consta expressamente do contracta de sociedade, como era indis-pensvel (Cod. Com. arts. 287 e 302 n. IV) .

    b) A transcripo, no registro geral da comarca da situao dos immoveis essencial para realisar a trans-misso do domnio que o socio faz sociedade como contingente para fundo social (Decr. n. 370 de 1890. art. 236 4. ' ) , e a falta desta formalidade, no caso da consulta, salienta que a inteno dos scios foi manter em

  • PARECERES FALLENCIAS 39

    seus respectivos patrimnios mdividuaes os immoveis em questo.

    c) A clausula contractual "A sociedade tem por fim construir um cortume em terreno de propriedade commum..." exclue a ida da transferencia do terreno para o patrimnio social.

    Nem obsta que o socio B.. aps o cumprimento da concordata, que propuzera e obtivera dos credores so-ciaes, declarasse, em petio ao juiz da fallencia. que com os immoves adquiridos- individualmente entraram os s-cios para a sociedade. Essa declarao unilateral, por parte do interessado, com o fim de obter o consentimento ju-dicial para uma situao que desejava criar em seu bene-ficio, no tem valor jurdico, no obriga o ex-consocio. nem os credores particulares deste e do prprio dclarante.

    Note-se ainda a grande contradico : na petio que ao juiz dirigiu. B. affirmou que os immoveis entra-ram para a sociedade; na escriptura, que com os syndicos assignou. disse que. por fora da declarao da fallencia, a posse, o dominio e aces que pertenciam ao socio H. ficaram pertencendo massa dos credores !

    Alm de divergentes as duas proposies, a primeira no tem apoio nos factos. a segunda no tem sentido em Direito.

    Declarada a fallencia da sociedade B. 8 H . , informa a alludida exposio, os immoveis foram arrecadados e inventariados no activo social, o credito hypothecario de A. arrolado no passivo social, e. mais tarde, aceita e ho-mologada a concordata proposta pelo socio B.. a este foram transferidos os immoveis pelos syndicos. autori-sados pelo juiz da fallencia.

    Tudo isso reputamos illegal, por ser contra a lei e a verdade dos factos, e. por esse motivo, sem a virtude de produzir effeitos validos.

    Com effeito : a) A parte ideal que na co-propriedade dos im-

    moveis tinham B. e H. permaneceu incorporada aos seus

  • 40 J. X. CARVALHO DE MENDONA

    respectivos patrimnios individuaes. No fora deslocada por occasio. ou. mesmo, depois da organisao da socie-dade commercial. No inventario dos bens da sociedade. pessoa jurdica distincta da dos scios, no podiam fi-gurar aquees immoveis. bens particulares, sujeitos a outra ordem de relaes (Decr. n. 917. art. 73 1. 2 e 3 ) .

    b) Ao socio concordatario so entregues somente os bens sociaes para liquidar como entender (Decr. n. 917. art. 76 2."). A massa entregue e no transferida ao concordatario. Os credores no assumem a propriedade dos bens do devedor fallido.

    O conceito da acquisio por titulo de fallencia. ad-mittido no Direito nglez (title by banckruptcy) no teve entrada no Direito Ptrio. Os fallidos conservam a propriedade de seus bens. sendo privados, apenas, da ad-ministrao: os syndicos, representantes dos credores, so simples administradores do alheio. No podem elles trans-ferir direitos que no tm.

    c) Injustificvel foi. pois. a exigncia de uma transferencia impossvel, vasada em escriptura tabella e transcripta no registro geral, em cuja escriptura. os syn-dicos se arvoraram em curadores de H., alheio concor-data e j livre definitivamente dos effeitos commerciaes da fallencia (Decr. 917. art. 76). transferindo a B. a posse, domnio e aces que ao ex consocio pertenciam. e onde. tambm, declarou B.. que se tornava nico res-ponsvel pelo pagamento da divida hypothecaria de A.

    No a forma com que se reveste o acto que lhe imprime a fora jurdica. Esta promana da natureza in-tima do acto. qualquer que seja a mascara que o disfarce

    A concordata homologada um acto judicial, e. nessas condies, tem fora de escriptura publica. (PE-REIRA E SOUZA e TEIXEIRA DE FREITAS, Pri-meiras linhas nota 484) , e. quando ella operasse a alle-gata transferencia dos bens da massa para o concordata-rio. dispensaria a transcripo no registro geral (Decreto n. 917. art. 237) .

  • PAEECEEES PALLENCIAS

    d) O juiz no pde tornar firmes e valiosos, com a interposio de sua auctoridade. actos que repugnam aos textos e espirito da lei.

    Auctorisaes judiciaes para a pratica de actos dessa natureza so excessos de poder, e nullos de pleno direito. O juiz applica a lei, no tem a faculdade de a modificar a aprazimento dos interessados.

    e) O facto de H. no recorrer da sentena homo-logatona da concordata, da qual fora intimado, no sana os defeitos do processo da fallencia. as irregularidades da concordata e muito menos torna efficaz a transferencia operada depois dessa sentena, pois, alm de a referida sentena no ter auctoridade de cousa julgada (LACOS-TE, La chose juge, n. 131), foi proferida contra direito expresse c nulla ipso jure (Reg. n. 737 art. 680 2. : ord. 3. 75 Pr . ) .

    Isto posto, respondemos:

    Ao 1."

    A. e B. continuam a ser condminos dos immoveis em questo, no obstante a fallencia da sociedade com-mercial, da qual faziam parte. Desta fallencia. solvida pela concordata proposta por B., no podia este sahir aquinhoado em bens particulares do socio H.

    A escriptura de transferencia e o alvar de autorisa-o judicial so actos despidos de valor jurdico, como j dissemos.

    Ao 2.e 3."

    A hypothecs constituda a favor de A., por oceasio da compra dos immoveis que fizeram B. e H. c respecti-vas esposas, mantem-se em inteira efficacia.

    A. credor por titulo civil, credor dos dois compra-dores, individualmente.

  • 42 J. X. CARVALHO DE MENDONA

    Si A. quer. alm do credito que j tem, proveniente do preo da venda dos immoveis. emprestar dinheiro a B., poder obter para garantia do mutuo nova hypo-theca sobre a parte que este tem individualmente nos ter-renos (Dec, n. 3 70. art. 219) .

    O que B. no pde fazer garantir o emprstimo com aquelles immoveis em sua integridade, sem consen-timento expresso do co-proprietario. pois a fallenca social e a conseqente concordata no opc-raram a extin-co do condomnio.

  • IX

    Aces contra o socio de sociedade em nome collectivo f allida

    C O N S U L T A

    E' nulla a aco proposta por credor individual de um socio de sociedade em nome collectivo, no es-tado de fallencia, sem audincia do syndico.

    C, B., socio da firma C. B. 0 Cia., que veio a fallr em 1893, foi accionado durante o perodo da fal-lencia por P., seu credor particular, sem audincia dos syndcos e da commsso fiscal. Correndo a aco os trami-tes legaes unicamente com citao do fallido que deixou o feito correr a revelia, veio o juizo da 1." vara da Capital a proferir sentena final condemnando o fallido ao pa-gamento do pedido e custas. Em 1899. a firma C. B. Cia. fez com seus credores concordata por abandono, re-querendo em seguida o fallido C. B. a sua rehabilitao, que foi concedida. C. B., que tem seus bens particulares arrecadados pela fallencia, foi victima de uma penhora

  • 44 J. X. CARVALHO DE MENDONA

    do seu credor, depois da rehabilitao. Isto posto, per-gunta-se :

    E' nulla a aco proposta contra o fallido sem ci-tao dos syndicos e da commisso fiscal ?

    R E S P O S T A

    Decretada a fallencia da sociedade em nome colle-ctivo. incidem tambm em fallencia os scios solidrios (art. 72. Dec. n. 91 7) (11) . Estes so privados da admi-nistrao plena de seus bens particulares: soffrem absoluta restrico no exercicio da capacidade jurdica quanto a direitos, obrigaes e interesses que possam affectar esses bens.

    A defesa dos direitos patrimoniaes do fallido con-fiada aos syndicos. e a estes, assistidos pelo curador-fiscal na primeira phase da fallencia ou auctorisados pela com-misso fiscal na segunda, exclusivamente incumbe inten-tar, seguir ou defender qualquer aco relativa quelles direitos e interesses (art. 25. Dec. n. 917. verbis "... s po-dero.. .").

    Falta, portanto, ao fallido a qualidade jurdica para estar em juizo. como autor ou como ro. em taes aces. A lei admitte. apenas, a sua interveno como assistente (art. 25 1.". Dec. 917). E' a massa dos credores, pelos seus orgams legtimos, que representa o fallido. substi-tuindo-o. Esta massa na hvpothese. um representante in omnibus et per omnia.

    Ora. se o fallido no podia ser ro. por lhe faltar a qualidade jurdica a que acima alludimos. no podia ter sido citado para s com elle correr a aco (PEREI-RA e SOUZA 8 TEIXEIRA DE FREITAS. Primeiras Linhas. XCVII ) .

    O Processo da aco. a que se refere a consulta, nullo porque lhe faltou a base fundamental, a citao

    (*) Corresponde ao art. 6. da lei n. 5.746, de 1929,

  • PAEECEEES PALLENCIAS 46-

    inicial legitima, a citao da parte competente, contra a qual devia correr a acco (Regul. 737. art. 672 1 c 2: art. 673, 2 ) .

    No importa que o socio fallido mais tarde se re-habilitasse em virtude da concordata social, acceita pelos credores sociaes.

    A aco foi proposta durante a fallencia, e nesse pe-rodo aos representantes da massa, a cujo cargo estava a administrao dos bens particulares dos scios, cumpria defender os direitos patrimoniaes destes scios. Os syn-dicos da fallencia no foram citados; pereceu a defesa. A aco foi proposta indevidamente contra o fallido e correu eivada da mais substancial nullidade.

    Em materia de capacidade prevalece a regra cato-niana: quod initio vitiosum est, non potest tracta tempons convalescere (L. 24 Dig. de regul. juris).

    Accresce que: emquanto a fallencia no se encerra, os credores, presos sorte commum da liquidao, no podem exercer aces individuaes ou singulares contra o devedor. No era licito ao credor desligar-se voluntaria-mente da fallencia para accionar singularmente o devedor, privado da administrao de seus bens. Deu-se mais essa infraco gravssima, que attenta contra uma regra fun-damental do instituto da fallencia: concursus sustit pro-cessus.

    E' esse o nosso parecer.

  • X

    Revogao da fallencia em grau de recurso

    C O N S U L T A

    As pessoas prohibidas de commerciar incorrem em fallencia, quando transgridem o preceito legal.

    Como se entende a reposio ao estado an-terior por ef feito da revogao da fallencia.

    O P. A., parocho da cidade de B.. exercia, a pro-fisso de commerciante. e nessa qualidade foi declarado fallido.

    O processo de fallencia seguiu seus termos regulares, sendo liquidado todo o activo. cujo producto se distribuiu em rateio entre os credores, os quaes receberam 4 5 % dos seus crditos. O P. A. era fallecido, quando foi aberta a sua fallencia: seus herdeiros, indo a juizo. recorreram. por via de carta testemunhai para o Superior Tribunal, da sentena declaratora da fallencia e o Superior Tribunal, dando provimento ao recurso, mandou que o juiz "recon-siderasse a sua deciso, no sentido de annullar a fallencia do P. A., visto como, sendo os clrigos prohibidas de commerciar, no pde ser acceito em juizo, como com-

  • 48 J. X, CARVALHO DE MENDONA

    merciante e declarado fallido o referido P., que era tambm parocho da cidade de >., quando commerciava." (As pala-vras em grypho so textuaes no accordam).

    Quando, porm, esse accordam foi levado ao conhe-cimento do juiz, estavam liquidados todos os bens da massa, e pagos os credores em rateio, na proporo de 45 % dos seus respectivos crditos.

    Tudo isso se passou na vigncia das leis commerciaes anteriores ao Dec. n. 917, de 24 de Outubro de 1890, que reformou o Cod, do Commercio na parte III.

    Pergunta-se:

    I

    Diante da liquidao consumada, qual a conseqn-cia da annulao da fallencia do P. A.?

    A soluo pde ser a das disposies geraes do Cod, do Commercio, tit. VIII, arts. 908 a 910?

    Il

    So nullos os actos de Commercio praticados pelos prohibidos de commercar, ou, pelo contrario, so validos, e apenas os sujeitam a sances diversas, conforme a classe que pertence o prohibdo?

    P A R E C E R

    Revogada, por sentena do Tribunal Superior, a fal-lencia do P. A., decretada posf mortem pelo juiz da cidade de B., a conseqncia seria a reposio de tudo ao antigo estado (arg. art. 808 do Cod. Com.), isto , a restituio dos papeis, livros, bens e effeitos arrecadados aos her-deiros do P. A., seus legtimos representantes em todas as relaes da vida civil.

    Informa, porm, a exposio preambular da consulta que quando aquella sentena foi levada ao conheci-mento do juiz inferior, os bens arrecadados se achavam

  • PAEECEEBS FALLENCIAS

    liquidados e o producto distribudo aos credores, amor-tizando 4 5 % do passivo.

    O accordam revogatorio da fallencia do P. A. limi-tou-se a decidir uma questo de direito: resolveu que os clrigos, transgredindo a disposio do art. 2 n. III do Cod. Com., no podiam incidir em fallencia. ou por outra, que esse meio de execuo commercial no cabia aos cre-dores dos prohibidos de commerciar para realisarem pra-ticamente os seus direitos. deciso alis errnea, con-forme diremos na resposta ao 2." quesito.

    Quanto s questes de facto o referido accordam: a) reconheceu expressamente que o P. A. exerceu

    o commercio (Vide as palavras " . . . quando commer-ciava) " :

    b) implicitamente deu como certo que o P. A., em vida .houvera cessado os seus pagamentos (art. 807, in fine, do Cod. Com.). No foram motivos ou funda-mentos do accordam o facto do P. A. no ter credores e, muito menos, a particularidade de no se ter caracterisado a fallencia (Art. 797 do Cod. Com.).

    E' muito importante esse subsidio que fornece o accordam para auxiliar a soluo pedida na consulta.

    Quando se diz que a conseqncia da fallencia revo-gada a reposio de tudo ao antigo estado, deve-se entender tanto quanto seja humanamente possvel e conciliavel com outros princpios de direito e com as razes de convenincia que surgem da lucta de interesses das partes e de terceiros.

    Se os herdeiros do devedor tinham o direito de exigir a reposio de tudo in statum priorem. aos credores assis-tia tambm idntico direito.

    Invalidados os actos praticados durante a vida ephe-mera da fallencia do P. A. e restituidos os bens j ven-didos posse dos herdeiros deste, taes bens ficariam sem-pre sujeitos a responder pelo cumprimento das obrigaes do seu titular, pois constituam o penhor commum dos credores (Cod. Civil Francez. art. 2093) . No thema das restituies cada uma das partes deve voltar integridade de seus direitos: a lico da Lei 24 4 Dig. de Mnorbr

    i

  • 0 J. X. CARVALHO DE MENDONA

    "restitutio autetn ita facienda est, at unusquisque inte-grum jus suum reapiat".

    Reposto tudo ao antigo estado, desapparecendo todas as relaes criadas pela fallencia, dous caminhos se abriam aos credores para fazerem effectivos os seus direitos. Podiam: 1.") Promover o inventario do devedor (ME-NEZES, JUZOS Div. Cap. II 1.). Como ah seriam descriptas as dividas passivas (RIBAS, Proc. Civil. art. 829) , facilmente se reconheceria a tnsolvencia do inven-tariado (a certeza desse facto d-nos a liquidao ope-rada na fallencia), e hasta publica teriam de ir os bens arrolados (os mesmos que haviam formado o activo da fallencia revogada), sendo o producto distribudo em rateio proporcional aos credores chrographarios, se a estes no fossem adjudicados os prprios bens. 2.") Accionar singularmente a herana. Como os bens deixados pelo P. A. eram insufficientes para pagamento de suas dividas, entre os credores chrographarios se estabeleceria o rateio, aberto o concurso na execuo (Ord. L. 3 Tit. 91 pr. verbis: "e o devedor no tiver outros bens"; Lei de 20 de Junho de 1774. 42, 43 e 44) ,

    Fallencia. inventario ou concurso, qualquer destes meios levaria as cousas ao mesmo termo. Em cada um dlies apresentar-se-ia, em sua realidade, pela fora das crcumstancias, o mesmo facto com o mesmo resultado: a insufficiencia dos bens do P. A. para pagamento dos credores, e, portanto, a necessidade da sua liquidao, e a verificao do dividendo a distribuir equivalente a 4 5 % .

    Que vantagens, pois, haveria em repor as cousas no estado anterior declarao da fallencia, se o estado a que se havia chegado com a fallencia era o nico possvel e o nico que harmonsava e respeitava o direito de todos os interessados, isto , herdeiros e credores?

    Que interesse de ordem material, mesmo moral, podia mover os herdeiros de P. A. a inutilisarem o que se fez na fallencia para afinal colherem o mesmo resultado no inventario ou concurso?

    Que damno experimentaram elles mantendo o statu quo?

    Para os credores, que estavam pagos eai moeda de

  • PARECEBES FALLENCIAS 51

    fallencia. qual a utilidade, a convenincia de espontanea-mente restituirem aos herdeiros do devedor o prorata com uma mo para o embolsarem no dia seguinte com a outra?

    Absurdo seria se os credores agissem nesse sentido, quando os seus direitos de credito estavam extinctos (MACKELDEY. Droit Romain. 194. n. 3) . e, como conseqncia, extincto se achava tambm o seu direito de aco (SAVIGNY. Droit Romain, 230. no quadro geral da extinco do direito de aco, n. 2 ) .

    A fallencia manifestou-se sempre cercada por uma athmospbera humilhante: foi. em todos os tempos, con-siderada, ainda que injustamente nos tempos modernos, uma offensa honra e ao credito.

    A lei, conferindo aos herdeiros do devedor o direito de represental-o no processo da fallencia. no cogitou somente da necessidade que. por ventura, tivessem de de-fender os seus interesses pecunirios: attendeu tambm, a um ponto altamente presado no intimo das famlias, qual a defesa e rehabilitao da memria do morto (RE-NOUARD.Traif des Faillites, vol. 1. pag. 491) .

    Declarado fallido o P. A., que havia sido parocho da cidade de B.. os seus herdeiros, guiados e fortalecidos pelo nobre sentimento, a que acabo de me referir, procuraram cassar a fallencia. de cuja subsistncia e effeitos no po-deria sahir illesa a memria do devedor, pois ficaria reco-nhecida judicial e solemnemente a infraco, por parte daquelle parocho. das leis divinas (Act. dos Apost. Cap. 18 v. 33 e Cap. 20 v. 33) . das leis canonicas (Can. 6. Aie clerici vel Monachi etc.) e das leis seculares (Cod. Com. art. 2." n. III. e Cod. Crim. de 1830, art. 148)

    Attribundo intenes puras aos herdeiros do P. A.. outro no podia ser o movei que os levou a reclamar pela invalidade da fallencia.

    A contra-prova disso offerece-nos o facto bastante significativo de no se terem lembrado os herdeiros de, ao tempo do accordam revogatorio. exigir a restituio dos bens que figuraram no activo da fallencia e nem iniciado o inventario do P. A.

  • 52 J. X. CARVALHO DE MENDONA

    Essa absteno por tanto tempo poderoso indicio da vontade de renunciar tacitamente a successo (RA-MALHO, Inst. Orph. 5."). muito especialmente quando se considera:

    a) que reposto tudo in statarn priorem perderiam aquelles herdeiros tempo, trabalho e dinheiro, pois ond ha dividas no ha herana, e

    b) que no inventario os credores seriam collocados na mesma situao que haviam conquistado com a fallen-cia mallograda.

    Os sentimentos que actuaram no espirito dos her-deiros do P. A. so justificveis emquanto assim com prehenddos. Fora desses limites no podem ser apadri-nhados pelo Direito: pretender a restituio de tudo ao antigo estado, esquecendo o direito correlativo dos cre-dores e de terceiros, j no originalidade: tomaremos a liberdade de qualificar de temeridade.

    A' hypothse em estudo no pde ter applicao o conhecido aphorismo resoluto jure dantis revolvitur et jus acapientis.

    1.) Porque os credores quando se constituram em massa, em virtude da fallencia. elegeram os adminis-tradores e estes, liquidando o activo e passivo, obraram como representantes do devedor. Revogada a fallencia, sob o fundamento do accordam, c muito contestvel a nullidade dos actos promovidos por quem. tendo sido investido de um mandato, pde-se dizer, publico ou legal, fez ba administrao no s no interesse dos credores como do prprio devedor. A feliz expresso de SCOE-VOLA na Lei 9 Dig. de negot. gest. (3.5) qaod utiliter gestum est. necesse est apud judicem pro rato haberi" talvez resolvesse de vez a questo. Os textos das Leis 2, 10 1." e 45 Dig. eod ministram ainda muito subsidio para essa soluo.

    Em todo o caso. porm, fora de duvida que com a annullao da fallencia, no ficou resolvido o direita dos credores.

    Este direito em nada perdeu a sua efficacia. Se no podia ser realisado em processo de fallencia, meio extraor-

  • PARECEBES FALLENCIAS 53

    dmario de execuo commercial, cabia sl-o pelos meios ordinrios de direito.

    2.') Porque aquelle aphorismo no pde ser cega-mente applicado todas as vezes que se torne fonte de damnos e injustias, que ao Direito incumbi orevenir e obstar (GIORG Obblig. vol. 8 n. 182).

    Isto posto respondemos:

    I

    No caso da consulta, em virtude das circumstancias acima ponderadas e que lhe do um colorido especial, con-sumada, como se achava, a liquidao do activo e passivo da fallencia do P. A., quando foi esta revogada, seria tra-balho inutil e baldado repor todas as cousas ao estado antigo, pois em seguimento. voltaria tudo situao apre-sentada no momento do accordam revogatono.

    A revogao da fallencia produziu o seu nico objec-t ive poupando memria do P. A. os effeitos dessa medida. O seu alcance foi de naturesa moral.

    Os bens do devedor foram vendidos em leilo, o pro-dueto foi recebido por qaem tinha qualidade de receber por credores incontestveis, legitimos.

    Est tudo terminado. Nada ha a restituir. Poderiam alis os credores ter o direito de reclamar pelo pagamento integral de seus crditos se os herdeiros do P. A. hou-vessem acceito pura e simplesmente a herana.

    Tornou-se impossvel para estes herdeiros exigirem hoje os bens que na fallencia foram arrecadados e vendidos e o produeto partilhado entre os credores.

    1.) Porque taes bens deviam ter sido postos em leilo judicial (art. 862 do Cod. Com.) e as cousas ven-didas em leilo ou hasta publica no so reivindicaveis (COELHO DA ROCHA, Dir. Civ. 408) . Nas proprias execues eiveis o executado tem somente trinta dias para repetir os bens vendidos, quando a sentena exequenda for revogada pelo provimento dos recursos que pendiam (TEIXEIRA DE FREITAS. Consol. das Leis Civis, arts. 570 e 860: CARLOS DE CARVALHO. Direito Civil, art. 1060 2.).

  • 54 J. X. CARVALHO DE MENDONA

    2.) Porque seria emprestar ao accordam revoga-torio da fallencia do P. A. a inteno absurda de enri-quecer os herdeiros do devedor nsolvavel custa dos cre-dores. Jure naturae equum est nenimen cum alterius detrimento et injurice fieri locupletiorem.

    Os factos consummados. em casos como o da con-sulta, criam relaes e interesses novos e tm per isso as suas prprias leis.

    H

    Profisses ha que so incompatveis com o exerccio do commerco.

    As pessoas a que se refere o art. 2 do Cod. Com. no so attngidas por uma incapacidade, mas por uma prohibico. Se transgridem o preceito legal, os seus actos so validos e produzem todos os effeitos jurdicos; so-mente ficam os taes infractores sujeitos s penai que a lei penal comma. (Cod. Crim. de 1 830, art. 148; Cod. Penal vigente, att. 223) .

    Quanto aos correctores e agentes de leilo, o Cod. Com. tornando mais severa a interdico, prohibu-lhes at o exerccio de actos de commercio isolados e fulminou taes actos com a nullidade (vide arts. 59 n. I e 68, 2." alin. do Cod.).

    Esta excepo. expressa na lei. confirma a regra acima estabelecida.

    Ora, se os correctores e agentes de leilo, para os quaes foi mais rigorosa a prohbio de commercar, e que pelo Cod., foram considerados agentes auxiliares do com-mercio (art. 35) , esto sujeitos fallencia (art. 804 do Cod. Com. Dec. n. 917, art. 97 c n. x ) . como se duvidar que os outros incompatveis ou prohibidos de commercar transgredindo o preceito legal, estejam sujeitos fallen-cia. quando esta se caractrisa?

    A deciso do Tribunal, constante da exposio preambular da consulta, foi, pois. a nosso vr, proferida contra a lei commercial.

    Para outros detalhes nesse assumpto pedimos con-sultar o nosso livro Das Fallencias, vol. 1, n. 56.

    Eis o nosso parecer.

  • X 1

    Cesso de arrendamento

    Cesso de arrendamento por parte do arrenda-dor no importa novao subjectiva nem exige con-sentimento do arrendatrio.

    P A R E C E R

    Ao 1."

    A venda do immovei arrendado no resolve o arren-damento quando no contracto de compra e venda o com-prador se obriga a respetal-o (Ord. Liv. 4.", tt. 9, p r . ) .

    Nesse caso d-se alm da transferencia da propriedade do immovel arrendado, a cedencia ou cesso de direitos que o vendedor tinha em virtude do contracto de arrenda-mento.

    A cesso do contracto de arrendamento por parte do arrendador (credor) no importa novao subjectiva, pois se substitue simplesmente a pessoa do credor perdu-rando a obrigao em todos os seus termos fveja-se deci-so n 'O Direito, vol. 3. pag. 314) , e para tanto no

  • 56 J . X. CARVALHO DE MENDONA

    necessrio o consentimento do arrendatrio (devedor). Vejam-se AUBRY E RAU. Droit Civil Franc, vol. 4, 324. pag. 219: LOMONACO. Divino Cw. It. vol. 5. pag. 291 : Leis 1 e 3 Cod. de Novato.

    A cesso da obrigao comprehende todos os acces-sories desta, como hypothecas. fianas (Cod. Civil Franc art. 1692).

    E'. portanto, fora de duvida que a fiana prestada por A. e C. no ficou extineta com a venda do immcvel arrendado. As garantias do cessionrio do contractu de arrendamento e simultaneamente adquirente do immove! arrendado, melhor se tornaram, pois alm da fiana j existente, que perdura, o vendedor V. constituiu-se por sua vez fiador. Em vez de dois ficou o contracte de arren-damento com trs fiadores.

    Aos 2." e 3.

    Optando pela resoluo do contracte de arrenda-mento, a massa fallida de J. & Cia., est obrigada a pagar ao arrendador perdas e damnos pela no execuo do contracte. (Dec. n. 917. art. 22 2 ) .

    Consta da exposio preambular da consulta que se estabeleceu no contracte de arrendamento a pena conven-cional de 5:O0OSOOO para o caso de resciso. Essa pena convencional representa o valor previamente ajustado das perdas e damnos pela no execuo do contractu.

    Assim. pois. preferindo a massa a resciso do con-tracte sua inteira e fiel execuo ( o que lhe facultado pelo art. 22 pr. do Dec. n. 917) tem de pagar ao arren-dador a pena convencional.

    E como a resoluo do contracte de arrendamento por parte da massa, no liberta os fiadores da responsabi-lidade que assumiram, pois a resoluo um direito exce-pcional de que gosa a massa podendo exercital-o contra a vontade do arrendador. segue-se que: se a massa no paga integralmente ao arrendador o credito deste por alu-gueis at o dia da resciso e pela importncia da pena convencional, que fr devida, elle arrendador. pde exigir

  • PARECERES FALLENCIAS 57

    clos fiadores que completem o pagamento a que esto )brigados.

    Assumindo os fiadores a obrigao de principaes pagadores, o arrendador tem o dreito de exigir dlies tudo quanto lhe deve o fallido: nesse caso, os fiadores sero contemplados na failencia do arrendatrio como credores chirographarios por tudo quanto tenham pago em descarga do fallido. (Dec. n. 917, art. 70 n. IV ! . ) .

    E' esse o nosso parecer.

  • X I I

    Contracto celebrado plo fallido

    Pde o fallido contractai- para obter recurso* para a concordata.

    P A R E C E R

    O escripto particular assignado por F. 8 Filho re-presenta um contracto bilateral ou synalagmatico passado entre elles e M.. pois. ahi se estipulou uma promessa de venda ou transferencia de cousa futura mediante quantia certa.

    F. S3 Filho, apezar de falldos, podiam fazer esse contracto. E' erro gravssimo considerar tal acto como nullo de pleno direito com fundamento no art. 28, letra a do Dec. n. 917.

    Esse contracto no tinha relao directa com a massa nem se referia a bens que deviam ser arrecadados (hypo-theses do art. 28. a, cit.) : a incapacidade do fallido, por sua vez, restringe-se aos actos que se referem directa ou in-directa/nente a direitos, interesses e obrigaes da massa (art. 17, 3. do Dec. n. 917), isto . aos actos que a lei conferiu aos syndicos.

  • 60 J. X. CARVALHO DE MENDONA

    Os failidos contractando com terceiro- para obter recursos para a formao de uma concordata em nada offenderam direitos e interesses da massa e nem praticaram actos que com esta tivesse directa relao.

    E boje ponto liquido na doutrina e na jurispru-dncia que o fallido pde livremente contractar para obter recursos para a concordata, tendo essa faculdade seus nicos limites na raia onde comeam a m f e o dlo.

    So de uso constante taes contractos: elles, repetimos, em nada affectam aos direitos e interesses da massa: no prejudicam aos credores, antes os beneficiam; no signi-ficam fraude, ao contrario salientam a boa f do devedor e desejo ardente deste de evitar maior prejuzo aos cre-dores, proporcionando-lhes um meio fcil, econmico e vantajoso de liquidao, como a concordata.

    A lei faculta ao fallido comprar a massa activa fart. JjjJ 60. c. Dec. n. 917) . Ora. se esse contracte de compra e

    venda celebrado pelo fallido com os prprios credores em massa, um acto legal, que dizer do contracte que o fal-lido celebrar com terceiro para obter recursos afim de

    cumprir ou propor uma concordata? Trata-se. no caso da consulta, de um contracto syna-

    lagmatico. que gerou obrigaes reciprocas. Se uma das partes infringiu a lei da conveno, s

    por meio de aco ordinria pde a outra parte obter a resoluo do contracto e Javer a quantia que foi dada como adeantamento do preo. A parte que se suppe ser mfractora podia ter suas razes, e razes relevantes de direito, para no cumprir as obrigaes que a seu cargo ficaram no contracto bilateral.

    No se trata, portanto, de uma obrigao mercantil liquida e cena: ao contrario, vemos no escripto em questo uma obrigao perfeitamente illiquida, incerta e duvidosa.

    Admira como se declarou uma fallencia fundada em tal titulo!

    Accresce que o escripto assignado por F. S Filho no encerrava prazo para vencimento, e nem era exigive! dez dias depois de sua data. sendo inapplkavel o art. 137 do Cod. Com.

  • PARECERES FALLENCIAS 61

    Esse escripto (simples promessa de venda de cousa futura) no podia ter sido levado a protesto. Nullo, im-prestvel e destitudo de effeitos o protesto a que elle foi sujeito contra as regras de direito e at do bom senso.

    Sobreleva notar que o escripto em questo resente-se de faltas gravssimas:

    a) no foi feito pela propria letra dos represen-tantes dos signatrios (art. 2. da Lei n. 79 de 23 de Agosto de 1892).

    b) no pagou o sello legal. Tal documento, destitudo de formalidades impor

    tantes, devia ser recebido com muita cautella em juizo e nunca incondicionalmente, como foi, servindo para basear uma medida violenta e odiosa, como a fallencia, meio extraordinrio de execuo, estabelecida como uma pro-teco ao commercio e ba f.

    Em summa: No pde subsistir a fallencia de F. 8 Filho declarada contra disposio de lei e com in-fraco dos mais rudimentares princpios de direito.

    Convm seguir o recurso para o Tribunal de Jus-tia, onde a parte aggravante pde contar com justia.

  • X I I I

    Desistncia da fallencia

    A desistncia do credor que requereu a fallencia no determina encerramento desta, quando j houver sido declarada.

    Perguntase: I

    Em virtude do Acc. do Tribunal, (annexo n. 2) devem se considerar como no existentes os actos j praticados na fallencia, ou esta deve novamente dar logar a taes actos, a comear pela nomeao de syndicos provisrios, arrecadao, etc?

    II

    Quer num, quer noutro caso, pode a companhia S. desistir da fallencia requerida, e promover a execuo, fazendo pcnhora nos bens de M. ?

    m

    Affirmatvamente, vindo J. com embargos, como credor hypothecario, pde a Companhia S. discutir nesses embargos a origem dolosa da hypotheca?

  • 64 J. X. CARVALHO DE MENDONA

    IV

    Caso a fallencia no possa ser trancada pela Com-panhia, podem os segundos credores hypothecarios iniciar o seu executivo, e, em discusso de preferencia, allegar contra o 1." credor hypothecario a m f que vicia o seu titulo?

    V

    A discusso de preferencia baseada na m t. pde ser travada dentro da fallencia, em relao ao producto alcanado em praa pelos bens hypothecados?

    VI

    Negativamente, qual o meio que assite Companhia S. e aos segundos credores hypothecarios para annullarem a hypotheca constituda a favor de J.?

    P A R E C E R

    1."

    O aggravo interposto pelo credor J. no suspendeu nem devia suspender o andamento do processo da fal-lencia de M., pois o recurso versava to somente sobre a parte que na sentena declaratoria daquella fallencia fixara o termo legal.

    Essa sentena passou em julgado quanto ao seu dis-positivo principal, isto , quanto declarao da fallencia Logo, todos os actos relativos a arrecadao de bens, veri-ficao provisria de crditos, reunio de credores, con tracto de unio, etc, foram bem praticados e, sobre elles, nenhuma influencia pode exercer o acc. de 25 de No-vembro de 1899.

  • PARECERES FALLENCIAS 65

    J. interpondo aquelle aggravo, procurou evitar a nul-ldade de pleno direito com que a sentena declaratoria da fallencia implicitamente fulminava a hypotheca que elle havia contrahido (Dec. n. 917 de 1890. art. 29 letra c) ; mas, fixado o termo legal da fallencia em uma outra data, os bens hypothecados tinham sempre de ser arrecadados (Dec. n. 917, art. 36 pr. e arg. do art. 60 a verbis, todos e quaesqaer bens ) .

    O estado em que se acha o processo da fallencia nada soffre, portanto, com a situao creada pelo Acc. de 25 de Novembro; esta deciso somente produz o effeito de aparar o golpe da nullidade de pleno direito com que haviam sido feridas as hypothecas feitas pelo fallido em 3 de Setembro de 1898 e em datas posteriores.

    2.

    Assim como o devedor pde retirar do juizo a sua declarao de fallencia at antes da sentena judicial (Fal-lencias. n. 116). do mesmo modo o credor antes da sen-tena declaratoria da fallencia pde desistir do seu pedido.

    Quando, porm, a sentena declaratoria da fallencia se acha j proferida, e muito especialmente quando ha passado em julgado, nada obsta a que o credor requerente desista de todos os seus direitos, mas o processo de fallencia segue o seu curso normal, no se encerra:

    1.") porque daquella sentena decorrem effeitos no s de ordem privada ou civil como de ordem publica ou penal;

    2.) porque a falncia no interessa simplesmente o credor que a promoveu; uma vez declarada estabelece um estado excepcional de direito, e faz desapparecer a aco individual do credor requerente, formando-se a massa dos credores, onde existem no s credores com-merciaes como credores civis:

    3.) porque fora dos casos estabelecidos em lei no podem ser suspensos os effeitos legaes da declarao da fallencia, e entre estes no est comprehendida a desistncia dos credores requerentes.

    5

  • es J. X. CARVALHO DE MENDONA

    3.

    Prejudicado

    4.

    A hypotheca liquida-se na fallencia, vendendo-se os immoveis onerados. Se, porm, os syndicos no se apres-sam em cumprir este dever e se a obrigao est conven-cionalmente vencida, o credor pde promover a execuo hypotbecaria (Fallencias, ns. 822 a 824). mas como. no caso relatado na exposio preambular da consulta, existem credores preferentes sobre o producto dos immo-veis, este producto tem de entrar para a massa, para que os syndicos faam a distribuio na conformidade da lei. No possvel discutir-se preferencia na execuo hypo-thecara assim promovida e muito menos, discutir a m f do devedor hypothecario pois a fallencia tem o seu pro-cesso especial, onde se encontram a classificao e gra-duao de crditos e o remdio da aco revocatoria para accudirem a necessidades taes.

    5. e 6."

    Com fundamento no art. 30. letra b, do Dec. n. 917, pde ser invalidada a hypotheca celebrada pelo devedor com os credores a que se refere a consulta.

    O Acc. de 25 de Nov. de 1899 evitou implicitamentt que estas hypothecas incorressem em nullidade de pleno direito, mas no prohibiu nem vedou o remdio da aco revocatoria. que:

    a) deve ser proposta pelos syndicos (veja-se Fal-lencias. ns. 384 a 388);

    b) deve ter como base a prova da fraude das partes contractantes, (cit. art. 30. b. Dec. n. 917). a fraude pauliana cujo conceito pde-se 1er nas Fallencias, ns. 358 bis e 359:

    c) tem processo summario, estabelecido no art. 35 do Dec 1 7.

    m

  • XIV

    Socio, ainda que solidrio, no commerciante

    No pde o socio ser declarado fallido, por ina-dimplemento de obrigaes individuaes.

    A solidariedade no imprime ao socio a qua-lidade de commerciante.

    C O N S U L T A

    J. M. organisou. com outro, uma sociedade com-mercial que ha muitos annos gyra na praa sob a firma J. S3 A. Ultimamente B. de R. requereu se declarasse aberta a fallencia de J, M,, visto que, sendo no juizo do eivei, executado por divida civil, e no tendo pago nem tendo feito o deposito, dentro de 24 horas est fallido, ex vi do art. 2 n. 1 da Lei n. 2024 de 1908.

    Pergunta-se: A expresso commerciante, empregada na citada lei

    n. 2024, entende-se nos termos da doutrina (MEN-DONA, Dos Commentantes, n'O Direito, vols. 92, ns. 7 e 10; e 94, pags. 15 e 22, n, 141, e pags. 25, ns. 143 a 148; Das Firmas ou Razes Commerciaes, ns.

    i

  • eg J. X. CARVALHO DE MENDONA

    5 e 6, do Dec. n. 916, de 1890, e Cdigo Commercial. Cap. II, do Tit . I) como comprehensva somente da pessoa singular que exerce o commercio em seu prprio nome sob firma individual, e da pessoa jurdica que o exerce sob firma social; ou pde tornar-se extensiva a J. M. so-mente porque, com outro, constituiu a sociedade com-mercial que gyra na praa sob a razo de J. 8 A?

    A fallencia foi requerida sob o fundamento de que em execuo contra J. M., no juizo cvel, este, dentro de 24 horas, no pagou nem depositou a quantia exequenda. Informa-se que o executado, intimado como particular para pagar divida civil, ou nomear bens a penhora usou deste direito, nomeando prdio nesta cidade; e nem se pre-tendeu na execuo que elle fosse commerciante, sujeito fallencia, seno pagasse na mesma execuo.

    No caso de decretar-se a fallencia de J. M., como po-deriam ser cumpridas as disposies da Lei de Fallencias relativas "arrecadao da Massa fallda, livros do fal-lido, afixao de edital no estabelecimento commercial do fallido. quando na verdade J. M. no tem livros com-merciaes, nem fundo commercial, e tem domicilio diff-rente do da firma J. 8 A.?

    Devia-se ou no condemnar o mesmo J. M. na frma dos arts. 167 n. 7 e 168 n. 5 e por falta do registro de que tracta o art. 170 n. 3?

    P A R E C E R

    A fallencia uma frma de execuo, execuo col-lectiva, promovida contra o devedor commerciante (su-jeito passivo), responsvel por obrigao mercantil (base do processo inicial).

    A cada um desses princpios fundamentaes, devedor commerciante e obrigao mercantil, abriu a Lei n. 2024. de 17 de Dezembro de 1908. duas excepes.

    Assim: 1. Ampliou a fallencia s seguintes pessoas no

    commerciantes:

  • PAEECERES FALLENCIAS 69

    a) s sociedades anonymas, com objeto civil (art.

    b) aos scios de responsabilidade illimitada. no caso de fallencia da sociedade (art. 6.).

    2. Permittiu que a obrigao civil servisse de base ao processo inicial da fallencia:

    a) Quando reconhecida por sentena passada em julgado e em via de execuo (art. 2.. n. 1) , caso unico em que o credor por obrigao civil pde iniciar, com titulo prprio, a declarao da fallencia do seu devedor commerciante. (art. 9.. n. 3 2.) ; ou

    b) quando o sujeito passivo da fallencia fosse a sociedade anonyma (art. 3.).

    Desta breve exposio do systema legal, conclue-se: 1." Que os scios de responsabilidade illimitada no

    so commerciantes. 2." Que estes scios, como particulares ou na qua-

    lidade de scios solidrios, no podem ser directamente declarados fallidos por obrigaes pessoaes ou por obri-gaes da sociedade de que fazem parte.

    A fallencia destes scios surge produzida, occasio-nada. acarretada (expresso legal) pela fallencia da so-ciedade.

    Que os scios de responsabilidade illimitada no so commerciantes questo hoje completamente solvida em nosso direito.

    Se nos ativessemos letra do Cod. Com. e s idas dominantes na poca em que fora promulgado, a these poderia ser de duvidosa resposta. Os arts. 315 e 318 do Cdigo exigem que nas sociedades de responsabilidade illi-mitada figurem commerciantes como scios, no podendo fazer parte da firma nome de quem o no seja.

    Estas disposies acharam echo no 1 do art. 3 do Dec. n. 916, de 24 de Outubro de 1890.

    Os princpios que disciplinam actualmente as socie-dades commerciaes so. porm, muito diffrentes dos de 1850.

    As sociedades commerciaes, pessoas jurdicas distin-ctas das pessoas dos scios, so commerciantes: tm patri-

  • 70 J. X. CARVALHO DE MENDONA

    monio prprio e independente dos patrimnios de cada um dos scios (Lei n. 2024. arts 75 e 132).

    E' a sociedade quem exerce o commercio em nome prprio, quem se assigna nos actos a estes referentes (Dec. n. 916, de 1890, art. 2 ) .

    O socio ou scios gerentes no so mais do que rgos exteriores da pessoa juridica, usam ou empregam a firma social, nica que inscripta no Registro Publico do Commercio.

    Isso quer dizer em outras palavras que a sociedade, formada com escopo mercantil, quem exerce a profisso de commerciante, quem est no dever de cumprir todas as obrigaes que a lei impe aos commerciantes em geral (art. 10 do Cod. Com.).

    O socio no tem firma commercial a inscrever no Registro Publico do Commercio, no obrigado a ter livros de commercio e a levantar balano annual do seu patrimnio.

    Tudo porque elle no commerciante. Dois so os argumentos invocados pelos que ainda

    entendem que os scios de responsabilidade illimtada so commerciantes.

    O primeiro que estes scios respondem solidacia-mente para com terceiros, credores da sociedade.

    Essa responsabilidade , porm, uma garantia pelas operaes da sociedade, e, certamente, no basta isso para caracterizar em algum a qualidade de commerciante.

    O fiador de um commerciante pde no ser com-merciante.

    O segundo que esses scios so declarados failidos conjunctamente com a sociedade (Lei n. 2024. arts. 6 e 16 a ) .

    Attenda-se. porm, a que nem a impontuahdade do socio nem a sua qualidade de commerciante so presup-postos da fallencia da sociedade, sim a impontaalidade da sociedade e o seu caracter mercantil.

    O credor da sociedade mercantil nos casos dos artigos 1 e 2 da Lei n. 2.024 no pde pr margem a devedora

  • PARECEEES - FALLENCIAS 71

    sociedade para requerer a falkncia do socio aa s-cios solidrios.

    Porque ? Pelo simples facto de no serem commerciantes os

    scios de responsabilidade illimitada. A fallencia do socio de responsabilidade illimitada

    somente poder ser acarretada pela fallencia da sociedade. A fallencia dopcio dictada pela lei. nessa emergn-

    cia, para facilitar a execuo collectiva dos credores sobre os bens que lhes servem de garantia, alm do fundo social. E' uma providencia que tambm visa. indirectamente em-bora, manter o credito das sociedades commerciaes. duran-te a sua vida normal, proporcionando-lhes vantagens no mundo dos negcios.

    O eximio TEIXEIRA DE FREITAS, desde 1878. dizia que ser socio em sociedades commerciaes no era ser commerciante (Additamentos ao Cod. de Com., pagina 318), e tal a doutrina racional e jurdica, hoje trium-phante.

    O Trib. de Justia de S. Paulo adoptou-a recente-mente no aggravo da Capital, aggravante J. P.. socio soli-drio de L. 8 Cia.

    A disposio do art. 2. n. 1 da Lei n. 2.024, de 17 de Dez. de 1908. com o seu complemento no art. 9. n. 3 2. tem por fim evitar que os credores por titulo civil, com carta de sentena apparelhada. conquistem melhor situao do que os credores por obrigaes com-merciaes.

    Com effeito. habilitado o credor por titulo civil com a carta de sentena, a penhora deve ser procedida con-forme a gradao do art. 512, do Reg. n. 737. de 1850. A nomeao de bens penhora no vale contravindo essa gradao (art. 508 1 do Reg. 737).

    Teramos assim o credor por titulo civil iniciando a penhora sobre mercadorias do estabelecimento commer-cial do executado (bens moveis). e impossibilitando este de continuar o seu commercio. vindo mais cedo ou mais tarde a incidir em fallencia. quando a verdade que, desde o mo-mento em que elle no poude pagar aquelle credor, munido

  • 72 J. X. CARVALHO DE MENDONA

    de carta de sentena, portador de um titulo liquido e certo. revelou a sua impontualdade.

    Por outro lado. no seria justo deixar o credor por titulo civil sujeito ao perigo de ver declarada, no curso da execuo, a fallencia do seu devedor, perdendo tempo e sacrificando despesas (art. 25 princ. e 1 da Lei numero 2.024).

    Ora. attendendose ao primeiro fundamento aqui acima exposto, no ha razo que justifique a fallencia do socio de responsabilidade illimtada. porque se a dvida por titulo civil da pessoa jurdica sociedade esta a principal responsvel, esta a unca que teria os seus bens penborados.

    Isto posto, respondemos consulta nos seguintes termos:

    J. M. no pde ser declarado fallido porque no commercante.

    O simples facto de ser socio solidrio da sociedade J. 8 A. no imprime ao socio J. M. a qualidade de commercante.

    A disposio do art. 2 n. 1 da Lei n. 2.024, de 1908 referese a commerciante, a dizer, quelle que faz da mercancia profisso habitual (Cod. Co.. art. 4; Reg. n. 737 art. 19).

    Commerciante a sociedade e no o socio. A fallencia de J. M. somente pde ser produzida

    pela fallencia da sociedade J. i A. Mas, esta sociedade no devedora de B. de R.

    O socio J. M. tem o direito de contestar a fallencia com fundamento no art. 4 n. 7 da Lei n. 2.024, de 1908.

  • X V

    Failencia do devedor executado por sentena

    No d logar a faencia a sentena condemna-toria que pende de recursos, ainda que autorize exe-cuo provisria.

    C O N S U L T A

    P. propoz contra N. S3 Cia. uma aco decendiaria, baseado em uma letra do acceite dessa firma, que no de-cendio oppoz embargos de falsidade, no os provando, apesar de procurar fazel-o.

    Conclusos os autos, o juiz recebeu ditos embargos sem condemnao e a Cmara de Aggravos deu provimento ao que foi interposto pelo credor, para reformar aquella de-ciso no sentido de receber os ditos embargos com con-demnao.

    Extrahida a competente carta de sentena foram os condemnados citados para, em 24 horas, pagarem a im-portncia da condemnao ou darem bens penhora.

    Dentro desse prazo os executados foram a cartrio e offereceram penhora o seu estabelecimento commercial e sem audincia do exequente, nem mesmo despacho do

  • 74 J. X. CARVALHO DE MENDONA

    juiz. fizeram lavrar um auto de deposito desses bens e as-signal-o por um parente proximo dos scios da firma exe-cutada.

    O credor fez passar pelo respectivo escrivo certi-do de que os executados no haviam pago nem deposita-do a importncia da condemnao no prazo de 24 horas, que j estavam findas.

    Baseado no 2." do art. 9, combinado com o art. 2 n. 1 da Lei n. 2.024. de 17 de Dezembro de 1908. (*) re-quereu ento o credor a fallencia dos devedores, que fo-ram citados regularmente para se defenderem no prazo de 24 horas.

    Dentro desse prazo os devedores offereceram embar-gos fallencia, allegando que a condemnao no tinha passado soberanamente em julgado, visto que os seus em-bargos oppostos na aco decendiaria tinham sido recebi-dos, posto que com condemnao. e tambm que a letra que serviu de base sentena exequenda era falsa, por ser falso o acceite attribuido a elles devedores, como j haviam allegado nos embargos aco decendiaria protestando por exame nesse titulo e por prova testemunhai a respeito.

    Recebidos os embargos e marcada a dilao proba-tria de cinco dias. na frma do art. 12 da Lei n. 2.024, um dos scios da firma devedora requereu em seu nome individual a nomeao de perito, dia e hora para o exame e a citao do cre