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Página 1 de 14 PARECER SOBRE O ESTUDO DE IMPACTE AMBIENTAL REFERENTE AO PROJECTO DE CONSTRUÇÃO DA BARRAGEM DO FRIDÃO António Luis Crespí, Herbário, Jardim Botânico da Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro, CITAB, Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro, Apdo. 1013, 5001-801 Vila Real, [email protected] O presente parecer é desenvolvido a partir do Resumo Não Técnico e da documentação que sobre a AIA está recolhida no site da empresa adjudicatária para a realização da obra em causa (http://www.edp.pt/pt/sustentabilidade/EDPDocuments/Estudos%20de%20impacte%20ambi ental/Fridão/RT%20-%20Volume%201/AP_Cap-IV.pdf ). Objectivos Através da análise dos documentos mencionados será efectuado um estudo crítico do Resumo Não Técnico, objecto da presente discussão pública. Esta análise determinará a validez científica deste documento, especialmente em relação à flora e vegetação, bem como nas implicações ecológicas deste nível trófico no ecossistema onde pretende ser construída a barragem. Introdução O empreendimento proposto constitui, em termos funcionais do ecossistema em causa, um tipo de alteração ambiental substancial, que implicará um claro empobrecimento na complexa organização dinâmica de estados de equilíbrio (Hanski, 2001; Rohde, 2005), bem como na diversidade genómica existente, na qualidade das águas e no ordenamento pasiagístico desta região. Em relação à funcionalidade do ecossistema, desde uma perspectiva dinâmico- estrutural, a construção da albufeira implicará uma clara redução dos estados de equilíbrio funcionais, tal como resulta apreciável na Figura 1, onde está representado, de modo muito esquemático, o possível efeito da aplicação do presente empreendimento.

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O presente parecer é desenvolvido a partir do Resumo Não Técnico e da documentação que sobre a AIA está recolhida no site da empresa adjudicatária para a realização da obra em causa (http://www.edp.pt/pt/sustentabilidade/EDPDocuments/Estudos%20de%20impacte%20ambiental/Fridão/RT%20-%20Volume%201/AP_Cap-IV.pdf).

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PARECER SOBRE O ESTUDO DE IMPACTE AMBIENTAL REFERENTE AO

PROJECTO DE CONSTRUÇÃO DA BARRAGEM DO FRIDÃO

António Luis Crespí,

Herbário, Jardim Botânico da Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro, CITAB,

Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro, Apdo. 1013, 5001-801 Vila Real,

[email protected]

O presente parecer é desenvolvido a partir do Resumo Não Técnico e da documentação que

sobre a AIA está recolhida no site da empresa adjudicatária para a realização da obra em causa

(http://www.edp.pt/pt/sustentabilidade/EDPDocuments/Estudos%20de%20impacte%20ambi

ental/Fridão/RT%20-%20Volume%201/AP_Cap-IV.pdf).

Objectivos

Através da análise dos documentos mencionados será efectuado um estudo crítico do Resumo

Não Técnico, objecto da presente discussão pública. Esta análise determinará a validez

científica deste documento, especialmente em relação à flora e vegetação, bem como nas

implicações ecológicas deste nível trófico no ecossistema onde pretende ser construída a

barragem.

Introdução

O empreendimento proposto constitui, em termos funcionais do ecossistema em causa, um

tipo de alteração ambiental substancial, que implicará um claro empobrecimento na complexa

organização dinâmica de estados de equilíbrio (Hanski, 2001; Rohde, 2005), bem como na

diversidade genómica existente, na qualidade das águas e no ordenamento pasiagístico desta

região. Em relação à funcionalidade do ecossistema, desde uma perspectiva dinâmico-

estrutural, a construção da albufeira implicará uma clara redução dos estados de equilíbrio

funcionais, tal como resulta apreciável na Figura 1, onde está representado, de modo muito

esquemático, o possível efeito da aplicação do presente empreendimento.

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Figura 1.- Diversidade das situações de equilíbrio dinâmico estrutural, ao longo da área abrangida pelo

empreendimento proposto (áreas adjacentes ao empreendimento; e zona de implantação da albufeira).

É visível a progressiva diminuição destas situações de equilíbrio dinâmico (representados por cada um

dos pequenos vales ao longo de um mesmo transepto), com a aplicação do empreendimento proposto

ou sem ele.

A área intervencionada sofrerá, inevitavelmente, uma diminuição drástica de estados de

equilíbrio (e, portanto, da sua complexidade dinâmico-estrutural), o que acabará por provocar

uma acentuada diminuição da biodiversidade e, consequentemente, das combinações

biológico-estruturais. Através do princípio da continuidade ecológica (Vandermeer, 1999), este

efeito obrigará a um esforço suplementar por parte das áreas adjacentes. Tal esforço traduzir-

se-á numa progressiva diminuição da complexidade biológico-estrutural, com uma perda

apreciável de caos estrutural (Souza & Buckeridge, 2004). Deste modo será patente a redução

de estados de equilíbrio dinâmicos (representados na Figura 1 pelos pequenos vales),

resultando num claro empobrecimento do ecossistema em relação a sua resistência e

resiliência, garantias estas da funcionalidade do sistema (Ives & Gross, 2000).

Ao longo de séculos, a diversidade funcional do ecossistema objecto do projecto foi

assegurada pela predominância da heterogeneidade ambiental, que distribuía as diferentes

variáveis ambientais de um modo mais complexo e disperso ao longo de toda a área (Turner &

Chapin, 2005) em matrizes ambientais e biológicas infinitesimais. Estas variáveis ambientais

acabavam assim por constituir um diversificado elenco de factores ecológicos, que incidiam

sobre os indivíduos aumentando o caos estrutural (Hastings et al. 1993; Prigogine, 1993) e,

consequentemente, a diversidade de comportamentos estruturais e taxonómicos (ver Figura

2) num ambiente evolutivo com uma importante percentagem de não linearidade (Gassmann

et al., 2005).

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Figura 2.- Representação da variação do caos estrutural das comunidades ao longo de um gradiente de

diversidade de variáveis ambientais e, ao mesmo tempo, de intensidade destas variáveis. A progressiva

diminuição do número de variáveis ambientais, bem como o aumento do protagonismo de umas poucas

em detrimento das restantes, provocará uma acentuada diminuição do caos estrutural e,

consequentemente, das situações de equilíbrio estrutural-dinâmico. Tal fenómeno incidirá numa

diminuição da resistência e resiliência das comunidades, as quais terão que recorrer a taxa exóticos que

consigam proporcionar uma resposta mais eficiente perante este desequilíbrio ambiental.

Tendo em consideração que a presença do elemento antrópico provoca variações importantes na matriz

ambiental e, consequentemente, biológica, o agroecossistema do Tâmega constitui um conjunto

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extremamente complexo de situações de equilíbrio em constante e continua mudança. Esta dinâmica de

variação dos estados de equilíbrio será a resposta dos indivíduos a essas variações ambientais que de

modo continuado intervêm no ecossistema.

A presença de uma albufeira como a aqui proposta provocará uma alteração intensa na matriz

ambiental e na biológica, de repercussões desconhecidas. Tal circunstância obrigará a um estudo prévio

muito pormenorizado do ecossistema objecto da alteração, pois só assim será possível ter uma ideia

aproximada da complexidade das matrizes ambiental e biológica. Por tal motivo, o estudo de impacte

ambiental aqui apresentado deverá, obrigatoriamente, salvaguardar este carácter abrangente,

pormenorizado e devidamente discutido com base no elevado volume de resultados que venham a ser

obtidos.

Discussão

A primeira alusão à flora e vegetação surge numa vaga e inadequada descrição referente à

“Caracterização da zona de implantação” (capítulo 5, página 14). De acordo com esta

descrição, a zona onde será instalada a obra “… é dominada pelo pinheiro bravo e eucaliptal,

ocorrendo as espécies de maior interesse em manchas dispersas de carvalhal e na galeria

ripícola do rio Tâmega, em particular a jusante da barragem principal,…”. Uma descrição

sumária como a solicitada neste capítulo introdutório está muito longe de responder ao texto

referido. Pela leitura desta descrição é notória a falta de visão paisagística por parte do

avaliador, além da aparente ignorância do mesmo em relação à importância do elenco

florístico existente nas formações vegetais não florestais (arbustivas, rupícolas, de leito de

cheia ou de pastagens). De facto este capítulo não está isento de contradições. Assim, por

exemplo, em relação ao uso do solo (capítulo 5, página 15) o avaliador incide na “… grande

intervenção humana com uma floresta intensiva por pinhal bravo e eucalipto, zonas de

pastoreio e agrícolas.” Com base nesta descrição estaríamos perante uma típica paisagem

ibero-atlântica ocidental, não fragmentada, atendendo à presença de explorações florestais e

ganadeiras. É preciso lembrar, neste sentido, que o Parque Nacional da Peneda-Gerês ou o

Parque Natural do Alvão estão caracterizados por uma paisagem deste tipo e, no entanto, são

áreas protegidas. Por tal motivo, não só esta descrição não resulta apropriada ao contexto da

área do projecto, como também não proporciona uma ideia real da ocupação do solo nesta

zona.

Esta deficiente descrição ecológica da área origina um dos aspectos mais deficientes de todo o

documento. Este encontra-se, precisamente, na análise dos Impactes do projecto (capítulo 6,

página 16), mais especificamente em relação aos impactes negativos. Segundo consta nas

páginas 18 e 19, os impactes em termos da flora e vegetação e da paisagem são pouco

consistentes. Aparentemente, segundo o avaliador, estes impactes irão a ocorrer de forma

mais significativa “… sobre as espécies típicas do leito do rio, como salgueiros, freixos e ameais

e algumas manchas dispersas de carvalhos.” De facto, o avaliador insiste neste aspecto pouco

significativo e, já em relação à paisagem, indica como impactes mais importantes os

resultantes da “… submersão de alguns elementos e/ou pequenos troços do rio com interesse

paisagístico e/ou lúdico recreativo, que são contudo impactes pontuais e passíveis de

minimização.” Este atrevimento resulta ser ainda mais persistente no fim deste parágrafo,

quando o avaliador considera oportuno opinar do seguinte modo: “… o nível do plano de água

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da albufeira do Escalão Principal permite uma utilização lúdica e recreativa da albufeira e uma

maior relação visual e funcional como o plano de água, não se perdendo, contudo, a imagem

de algum encaixe da zona de vale, aspectos que concorrem para uma valorização dos aspectos

cénicos e paisagísticos do vale do Tâmega”.

Alertado por estes comentários e discussões sem qualquer consistência científica, que

deixavam entrever não só erros básicos de funcionalidade dos ecossistemas, como também

uma falta de notória de informação em relação à flora e vegetação da área do projecto,

considerei oportuno consultar a documentação que sobre este assunto está disponível no site

da empresa EDP

(http://www.edp.pt/pt/sustentabilidade/EDPDocuments/Estudos%20de%20impacte%20ambi

ental/Fridão/RT%20-%20Volume%201/AP_Cap-IV.pdf). Neste sentido, na página 173 do

capítulo IV-Descrição do estado actual do ambiente- me foi possível confirmar as minhas

sospeitas. No subcapítulo 10.3.2, destinado a explicar a metodologia a aplicar para o estudo da

flora e vegetação, é recolhido um ambicioso programa de fases para esta análise, as quais

passam desde uma análise horizontal da vegetação (Fase 2, 3 e 5), até um estudo estrutural e

florístico (Fase 4), juntamente com uma desconcertante “Caracterização fitogeoclimática” que

protagoniza a Fase 1. Tendo em consideração esta estruturação faseada para o estudo da flora

e da vegetação, os resultados obtidos deveriam ser ricos e diversificados, permitindo uma

discussão dos mesmos igualmente enriquecedora. Porém, tal nunca chega a acontecer, pois de

forma surpreendente o avaliador oferece um conjunto extremamente pobre e frustrante de

resultados.

Estes resultados surgem no subcapítulo 10.3.3, ou de “Enquadramento Geral”. Em primeiro

lugar o avaliador atreve-se a afirmar que a zona de estudo “… constitui em termos ecológicos

um conjunto de biótopos de características xerotérmicas acentuadas relativamente à

envolvente.” De acordo com esta afirmação estaríamos perante um ecossistema com uma

matriz ambiental muito diversa, o que já está a enriquecer o mesmo. O principal problema

está no facto de que esse comentário, como tal, não quer dizer cientificamente nada, uma vez

que não são indicados os pisos bioclimáticos presentes, os valores dos índices de termicidade

aplicados ou algum parâmetro que funcione como descritor. Contudo, o mais desconcertante

ainda está por vir no parágrafo a seguir: “De acordo com os trabalhos de Pina Manique e

Alburquerque (1982)…” O avaliador só utiliza esta bibliografia fitoclimática?. Permitam-me

lembrar um pequeno conjunto de outras contribuições, que também abrangem a área de

estudo:

CAPELO, J., MESQUITA, S., COSTA, J. C., RIBEIRO, S., ARSÉNIO, P., NETO, C., MONTEIRO-HENRIQUES, T., AGUIAR, C., HONRADO, J., ESPÍRITO-SANTO, D., LOUSÃ, M. -2007- A mehodological approach to potential vegetation modeling using gis techniques and phytossociological expert-knowledge: application to mainland portugal. Phytocoenologia, 37 (3-4): 399-415. CORREIA, A. I. -1997- Essai de phytoclimatologie dynamique sur le nort du Portugal. Lasgacalia, 19(1-2): 413-422. CRESPÍ, A. L.; SILVA, L.; RIBEIRO, J. A.; COELHO, A.; AMICH, F. & BERNARDOS, S. 2001. Modelo de caracterização fitoclimatológica do Nordeste de Portugal. I. Análise metodológica e primeiros resultados. Silva Lusitana 9(1): 69-81.

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FREITAS, R., ROCHA, J., CRESPÍ, A. L., CASTRO, A., BENNET, R. N., ALVES, P., GARCÍA-BARRIUSO, B., AMICH, F. 2008. The occurrence of alien species for Northern of Portugal. Apparent bioclimatic indicators?. Studia Botanica (in press). FRANCO, J. DO A. 1994. Zonas fitogeográficas predominantes de Portugal Continental. Annais Instituto Superior de Agronomia 44: 39-56. LOUSÃ, M. F. -2004- Bioclimatologia e séries de vegetação de Portugal. Lazaroa 85: 83-86. MARTINS, A. R.; CRESPÍ, A. L.; BERNARDOS, S.; BRANCO, M. A.; CASTRO, A.; FERNANDES, C. P.; JANIAK, A.; SANTOS, C.; AFONSO, C.; CARVALHO, G.; LOBATO, A.; HOELZER, A.; AMICH, F. &

WOZIWODA, B. 2004. Sistema de caracterización fitoclimatológico de taxones en el Norte de Portugal. II. Grupos bioclimáticos. Bol. Real Soc Esp. Hist. Nat. (Ser. Biol.) 99(1-4):5-17. MARTINS. A., CRESPÍ, A. L., CASTRO, A., FERNANDES, C. P., ROCHA, J., BERNARDOS, S., AGUIR, C. & AMICH, F. -2006- Contribución para la caracterización florístico-ambiental del Norte de Portugal. Botanica Complutensis 31 ( in press). MOLINA, R. T., TELLEZ, T. R. & ALCARAZ, J. D. -1992- Aportación a la bioclimatologia de Portugal. Anales del Jardín Botánico de Madrid, 49(2): 245-264.

Como não poderia ser doutro modo, a caracterização biogeográfica apresentada não só

mostra uma clara e indiscutível desactualização, como também um total desajuste com a

realidade. Neste sentido volta a chamar a atenção um aspecto que permite ver a ignorância do

avaliador, agora quando trata o extremamente complexo caso do taxon Quercus pyrenaica. De

facto, o avaliador indica que este taxon consegue chegar até à foz do rio Tâmega (“… até à

confluência do Rio Douro…”) e desconhece que de facto esses indivíduos foram classificados

como endemismos extremamente raros, conhecidos como Quercus x henriquesii Franco &

Vasc. In Annais Inst. Super. Agron. 21: 25 (1954).

As análises biogeográficas efectuadas até à presente data pelo Herbário do Jardim Botânico da

Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro já detectaram a complexidade biogeográfica do

vale do rio Tâmega (ver referências bibliográficas acima citadas). Esta complexidade não

resulta só de uma evolução histórica glacial e inter-glacial, como também é o resultado da

intrincada orientação deste curso fluvial, que acaba por proporcionar um efeito de

refúgio/corredor muito dinâmico. A redução do problema a uma mera transição

eurosiberiana-mediterrânica mostra, novamente, um claro desinteresse por parte do

avaliador.

No capítulo 10.3.4 o EIA entra já na análise específica da Flora. A primeira abordagem diz

respeito ao comportamento corológico, facto este que a partida já causa muita surpresa, uma

vez que não existe qualquer referência à riqueza florística da região (análise do catálogo

florístico, comportamentos fisionómicos, fenológicos ou riqueza taxonómica por habitats,

análise sistemático-filogenética,…). O avaliador opta, sem causa justificada, por aplicar a

hierarquia de Rivas-Martínez (1985) e a caracterização biogeográfica de Costa et al. (1998). Em

relação a esta, novamente injustificada, tomada de decisão surgem duas questões

determinantes:

a) A riqueza florística em causa tem origens diversas (euroasiáticas de diversos tipos,

neotropicais, paleotropicais, mais recentes –atlánticas, mediterrânicas, subendémicas

ou endémicas- ou alóctones), aspectos estes que não são se quer mencionados.

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b) A caracterização de Costa et al. (1998) já está mais actualizada em Capelo et al. (2007).

Curiosamente, agora passou a ser mais complexa do que a versão aqui utilizada.

Deste modo, e seguindo os critérios muito discutíveis escolhidos pelo avaliador, a

caracterização biogeográfica é aborrecida e triste, uma vez que não reflecte a extrema riqueza

biogeográfica da região. Chamo a atenção aqui para o aspecto extremamente relevante das

glaciações neogénicas, os efeitos de corredor e refúgio florístico, a importante presença de

ilhas biogeográficas presentes nesta região, a importância do acesso exógeno recente

(resultante das alterações ambientais provocadas neste ecossistema), ou o acentuado efeito

geo-corológico de uma região como esta com importantes variações no perfil do vale.

Nenhuns destes aspectos são aqui mencionados.

O penúltimo parágrafo é, no mínimo, suspeito. De acordo com o avaliador, e tendo em

consideração o carácter ameno do clima desta região, tal facto faz com que “Esta situação

possibilita que a flora medioeuropeia domine neste território com formações arbóreas

caducifólias e apresentando uma diversidade florística elevada com frequentes habitats

hidrófilos”. Os interrogantes são óbvios: qual é a flora medioeuropeia?, onde está o dado

segundo o qual afirma que a diversidade florística é elevada?, se os habitats hidrófilos fossem

tão frequentes o presente projecto não violaria claramente convenções como a de Ramsar ou

a própria Estratégia Nacional de Conservação da Natureza?.

Já o último parágrafo desta mesma página (página 180) e o primeiro da seguinte (página 181)

não tem qualquer sentido, uma vez que levanta sérias dúvidas mencionar aqui espécies

características das dunas costeiras (Armeria pubigera, Coincya jonhstonii, Jasione lusitana,

Salix arenaria), juntamente com taxa de montanha de enquadramento taxonómico duvidoso

(Scilla merinoi, Dianthus laricifolius subsp. caespitisifolius, Ophioglosum lusitanicum) sem fazer

qualquer menção aos outros muitíssimos endemismos referenciados, catalogados e

herborizados nesta região (Dianthus pungens subsp. langeanus, Digitalis amandiana,

Paradisea lusitanica, Pterospartum tridentatum subsp. cantabricum, Luzula sylvatica subsp.

henriquesii, Anarrhinum duriminium, Carex elata subsp. reuteriana, Veronica micrantha, etc.

etc.).

Seguindo a mesma ordem imposta pelo trabalho de Costa et al. (1998), uma vez que o

avaliador retira todo este texto desta única obra, aparece outra afirmação extremamente vaga

e não representativa deste ecossistema. Citando o escrito pelo autor deste EIA, “… a vegetação

climácica é constituída pelos carvalhais mesotemperados e termotemperados do Rusco-

aculeati-Quercetum roboris,…”. A questão agora é lógica, … e o resto?. Onde aparecem aqui

contempladas as formações de bosques atlânticos hiperhúmidos colinos e montanos relíticos

de Fraxinus angustifolius e Alnus glutinosa?; e a dos sobreirais ibérico-ocidentais do Noroeste

peninsular? (que de modo quase insultante e absolutamente desencaixado

sintaxonomicamente refere mais abaixo como “… normalmente associado aos carvalhais de

Quercus robur, podendo no entanto surgir como elemento clímax nas estações xero-térmicas

mais acentuadas.”); e essas Isoeto-Nanojunceteas com as sempre filo-biogeograficamente

enigmáticas Alismátidas?; que foi das Potameteas que com as Ranunculion cobrem de branco

as margens do Tâmega?; e as reverdejantes Asplenieteas dos taludes ombrófilos que vão

caindo sobre o rio?; e novamente etc. etc. Mais uma vez não encontramos catálogo, neste

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caso sintaxonómico, análise corológica das formações climácicas, discriminação das espécies

características, ou qualquer análise florístico-comunitária neste sentido.

O último parágrafo desta mesma página 181 é mais um sinal do descuido reincidente e

característico por parte do avaliador. Isto é, uma relação muito geral e vaga de taxa florísticos,

sem qualquer tipo de correlação fito-ambiental.

Na seguinte página (página 182) o avaliador descobre uma nova referência bibliográfica

(Franco, J. 1973. Zonas fitogeográficas predominantes. Notícia explicativa III.6, Atlas do

Ambiente, Ministério do Ambiente e do Ordenamento do Território). Sem qualquer razão

quebra a organização do texto e volta novamente às questões biogeográficas, resume

brevemente o explicado pelo já falecido Sr. Professor João de Amaral Franco e não compara

com os comentários anteriores. A interrogante que invade ao leitor é a razão pela qual surge

aqui este parágrafo…

Mas a nossa dúvida em relação ao aparecimento desta última referência bibliográfica é

rapidamente esclarecida no capítulo 10.3.4.2. A avaliação do valor florístico da zona de estudo

será agora feita com base naquele trabalho. A razão de tal decisão centra-se na caracterização

corológica que o Prof. Amaral Franco faz na sua internacionalmente conhecida e reconhecida

Nova Flora de Portugal. Bom!..., a razão é fundamentada… pelo menos assim seria se o

avaliador opta-se por aplicá-la, facto este que não chega a ser concretizado. Nas páginas

seguintes não surge nenhuma referência à caracterização corológica de Franco (1973), ou

qualquer tipo de análise correlativo neste sentido. É pena, mas não é compreensível esta falta

grave por parte do avaliador.

De facto, o capítulo 10.3.4.2 (Valores Florísticos Referenciados na Zona Fitogeográfica do

Noroeste Ocidental) constitui mais um exemplo contra a boa prática na realização deste tipo

de estudos. Antes de nada, o avaliador deve compreender a relevância e o alcance do termo

“Valores Florísticos Referenciados”. Referenciados por quem?, com base em que?, de acordo

com quais critérios?.

Olhando para a legislação ambiental em vigor não consigo encontrar um fundamento ao

critério adoptado pelo avaliador. Aparentemente, e sem qualquer razão justificada, o autor

deste trabalho opta por utilizar unicamente a relação de habitats e taxa referenciados na

Directiva nº 92/43/CEE (Conselho da Europa, 21 de Maio de 1992). A aplicação deste método

de trabalho implica defeitos extremamente importantes no trabalho desenvolvido, de modo

que os resultados obtidos acabam por não ter qualquer representatividade. As listagens

publicadas nos Anexos da Directiva Habitats, constituem instrumentos de trabalho básicos e

muito gerais para todo o espaço europeu. Cada geossistema deve ser objecto de um estudo

cuidadoso e pormenorizado em relação a sua riqueza biológica, tendo em consideração as

funcionalidades dos ecossistemas em causa, bem como os comportamentos corológicos e

metapopulacionais de cada taxon. Deste modo, espécies que a priori poderiam não ser

consideradas como raras ou ameaçadas acabariam por adquirir esse estatuto na área de

trabalho; taxa funcionalmente generalistas poderiam adoptar funções especialistas neste

geossistema; ou, simplesmente, taxa com distribuições restringidas poderiam encontrar

óptimos ecológicos nesta região, o que implicaria uma protecção redobrada nesta zona do

país. Fenómenos como este são actualmente contemplados com análises RELAPE (espécies

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Raras, Endémicas, Localizadas, Ameaçadas ou em Perigo de Extinção), não contempladas na

presente proposta.

Como resultado desta errática opção, por parte do avaliador, a relação dos taxa e habitats

relacionados na página 183 não passa de um conjunto sem nexo com o projecto em causa.

Taxa tais como Narcissus asturiensis, Linaria coutinhoi, Scilla odorata ou Dorycnium

pentaphyllum subsp. transmontanum não apresentam qualquer ocorrência na área de estudo

(sendo que os dois últimos são taxa com integridade morfológica extremamente duvidosa). O

restante conjunto de espécies desta mesma relação são um conjunto não representativo da

riqueza florística rara ou ameaçada da região.

Finalmente, e relativamente ao capítulo 10.3.4.3 (Conclusões Relativas à Flora), é mencionado

um taxon muito frequente na área de estudo (a gilbardeira ou Ruscus aculeatus) e outro que

aparece pela primeira vez neste trabalho (o mirto ou Myrtus communis). Sem qualquer dúvida,

a análise florística resulta ter um grau de simplicidade, incoerência, desenquadramento e

fiabilidade tal que não resulta admirável obter um resultado tão triste e afastado da realidade

como este.

A análise do capítulo 10.3.5, referente à Vegetação e Habitats tem início com uma descrição

geral (ponto 10.3.5.1, página 184), dando passo a uma análise aparentemetne mais

pormenorizada das comunidades vegetais (ponto 10.3.5.2, da mesma página). É precisamente

no início onde o avaliador distorce escandalosamente a leitura da lei, provocando um engano

com repercussões muito graves. Neste ponto o avaliador escreve “… Actualmente e por

determinação legal aplica-se a classificação dos Habitats incluídos na Directiva nº 92/43/CEE

(aplicada para o direito nacional através do Decreto-Lei nº 140/99, corrigido pelo Decreto-Lei

nº 49/2005).” A leitura pormenorizada de ambos Decretos-Lei nunca obriga o uso da Directiva

nº 92, pois o avaliador parece ignorar o espírito desta directiva comunitária (transposta mais

tarde em lei nacional). Uma directiva, como o seu nome indica, é uma linha de orientação que

passa a ter âmbito legal aquando da sua transcrição na legislação nacional. Contudo, esta

normativa legal não deverá restringir a correcta realização das peritagens e estudos

necessários para avaliar, neste caso, o alcance de um impacte ambiental sobre os ecossistemas

em causa. Esta afirmação está claramente recolhida em ambos Decretos-Lei:

Decreto-Lei nº 140/99, de 24 de Abril de 1999

“…

Artigo 10

Avaliação de impacte ambiental e análise de incidências ambientais

6- A análise de incidências ambientais abrange:

a) A descrição da acção, plano ou projecto em apreciação, individualmente ou em

conjunto com outras acções, planos ou projectos;

b) A caracterização da situação de referência;

c) A identificação e avaliação conclusiva dos previsíveis impactes ambientais,

designadamente os susceptíveis de afectar a conservação de habitats e de espécies

da flora e da fauna;

d) O exame de soluções alternativas;

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e) Quando adequado, a proposta de medidas que evitem, minimizem ou compensem

os efeitos negativos identificados.

7- A análise de incidências ambientais deve constar da fundamentação da decisão sobre

as acções, planos ou projectos previstos no nº 1, sendo precedida, sempre que

necessário, de consulta pública.

…”

Com o objectivo de esclarecer mais dúvidas acrescento a esta referência a do próprio Decreto-

Lei nº 69/2000, sobre o Regime Jurídico da Avaliação de Impacte Ambiental. No Artigo 12º

(Elaboração e conteúdo do EIA) da Secção II (Procedimento de AIA) não há registada qualquer

cita ao Decreto-Lei nº 140/99. De facto, a alínea 3 não deixa espaço a qualquer dúvida:

“…

3- Sem prejuízo do disposto no nº 7 do artigo anterior, o EIA deve conter as informações

adequadas, consoante o caso, às características do estudo prévio, anteprojecto ou

projecto em causa, atendendo aos conhecimentos e métodos de avaliação existentes,

devendo abordar necessariamente os aspectos consoantes do anexo III do presente

diploma e que dele faz parte integrante.

…”

Neste sentido, o mencionado Anexo III do próprio Decreto-Lei nº 69/2000, explica quais devem

ser os conteúdos mínimos do EIA. A alínea 3 deste Anexo é conclusiva em relação aos

conteúdos sobre flora e fauna:

“…

3- Descrição do local e dos factores ambientais susceptíveis de serem

consideravelmente afectados pelo projecto, nomeadamente a população, a fauna, a

flora, o solo, a água, a atmosfera, a paisagem, os factores climáticos e os bens materiais,

incluindo o património arquitectónico e arqueológico, bem como a inter-relação entre

os factores mencionados.

…”

Portanto, fica assim devidamente esclarecido o facto da aparente obrigatoriedade do uso

exclusivo das espécies e habitats recolhidos na Directiva nº 92/43/CEE.

Contudo, o mais duvidoso, ambíguo, irreal e absolutamente desajustado está por vir, desde o

meu ponto de vista, entre as páginas 193 e 200. De facto, a descrição dos habitats é

apresentada com uma complexidade totalmente inusual até aqui. Se bem todo o estudo tinha

como característica mais relevante a sua extrema simplicidade, atendendo ao muito reduzido

de informação que proporcionava, já a relação de habitats faz com que cheguem a ser

diferenciados um total de 21 habitats!!. Porém, esta aparente vontade de tentar descrever a

complexidade do ecossistema objecto de estudo acaba, contrariamente ao desejado, por

desembocar numa insustentável consistência florístico-estrutural.

Em primeiro lugar, o avaliador refere os habitats de bosques. Independentemente do

explicado até aqui, referente à problemática do carácter de relíquia das formações com

Quercus suber e o seu enquadramento sintaxonómico, do problema em relação ao Quercus x

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henriquesii ou do princípio da continuidade entre formações vegetais (através do fundamento

caótico das combinações florístico-estruturais), o primeiro grave problema desta

caracterização surge na página 194: como consegue o avaliador diferenciar entre Carvalhais

caducifólios de Quercus robur (variante termófila) e Sobreirais?. A resposta que o avaliador

proporciona é, no mínimo, um atentado científico: “…na realidade a ocorrência de sobreiros

encontra-se relacionada com a acção dos incêndios que favorecem o desenvolvimento desta

espécie em detrimento das restantes quercíneas, ou seja as manchas de sobreiros ocorrentes

na área de estudo correspondem a povoamentos pioneiros pós-fogos frequentemente

protegidos por interesses económicos dos proprietários.” Até à presente data não encontrei

nenhuma referência bibliográfica que consiga afirmar tal aberração. No entanto, parece que o

avaliador também não possui esta informação de referência, uma vez que não refere dado

algum ou artigo científico que apoie esta teoria.

A seguir a este enigmático tipo de habitat surgem outros não menos duvidosos. Assim, por

exemplo, o avaliador mostra umas capacidades extraordinárias para distinguir choupais,

formações estas que não chegam a estar presentes como tais no rio Tâmega, pois aparecem

associadas como companheiras nas formações de Salicéteas. Tal fenómeno acaba por

confundir ao avaliador, especialmente nos raros e afastados afloramentos de Platanus hybrida,

que aproveitam as clareiras das próprias Salicéteas ou até nas formações herbáceas de Isoeto-

Nanojuncetea. Incluir também as formações de castinçais não deixa de ser dificilmente

aceitável, pelo menos desde uma perspectiva científica, uma vez que as formações silvestres

de Castanea spp. são caracteristicamente apenino-balcánicas. Outro erro centra-se na

dificuldade que o avaliador mostra para diferenciar formações de matagal ou sub-bosque com

pinheiros e/ou eucaliptos. Aconselharia, neste sentido, a aplicação generalizada que de modo

comum é implementada neste tipo de estudos: manchas de pinhal, atendendo à presença

contínua de pinheiro, e manchas de eucalipto ou de presença igualmente contínua de

eucalipto.

Não consigo aceitar de forma nenhuma o desdobramento das comunidades arbustivas, que

neste tipo de trabalhos são diferenciadas, na melhor das hipóteses, entre comunidades

arbustivas altas e comunidades arbustivas baixas. O avaliador deve ter em consideração a

extrema complexidade florístico-estrutural e dinâmica destas comunidades, o que faz com que

fitossociologicamente estejam num conjunto muito diferenciado de classes e alianças. Desde

Cytiseteas até Calluno-Uliceteas passando pelas etapas seriais do Arbutetum unedi.

Os habitats rupícolas constituem novamente um conjunto de formações intrincado e difícil,

embora bem distinguíveis por fotografia aérea. Contudo, a descrição que proporciona dos

mesmos resulta ser extremamente pobre e irreal. Já em relação aos habitats ripícolas a

distinção que faz é científica e cartograficamente impossível, pois estas três aparentes

formações constituem um continuo fito-estrutural que muito raramente é separável (como

consegue distinguir um amial de um freixal sem abandonar a mesma formação de Alnetea?).

Os restantes tipos de habitats, com excepção das áreas agrícolas, urbanas, exploração de

inertes, áreas urbanas e linhas torrenciais temporárias são uma pura ilusão de óptica: prados

húmidos, quais os semeados (vulgarmente designados por lameiros) ou os semi-naturais?;

arboretas ou formações mistas?, isso é uma formação extremamente frequente em áreas com

pinhal e/ou eucaliptal.

Em definitiva, esta caracterização de habitats resulta pela sua complexidade e ambiguidade,

excessivamente frágil. Ao mesmo tempo, e o que acaba por ser mais problemático, esta

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elevada fragilidade faz com que seja muito difícil de aplicar, muito discutível e, deste modo,

reflicta mal a paisagem vegetal real desta zona. Em consequência, todo o conjunto das

quantificações referentes aos impactes sobre a vegetação (capítulo V, sobre a Identificação e

avaliação de impactes) transforma-se numa combinação dificilmente legível. Um exemplo

deste efeito está no Quadro V.34, onde são quantificadas as áreas de biótopos afectadas na

fase de enchimento e de exploração. Esta tabela começa com as áreas agrícolas e florestais

(arboretum); passando a uma amalgama de floresta autóctone entre as quais surgem

combinações com Platanus hybrida e com Acacia dealbata; novamente volta às áreas de

produção florestal, com uma exploração deste tipo desconhecida nesta região, a de choupal

(Populus nigra) com ou sem plataneiros (o Platanus hybrida é normalmente utilizado como

paliçada na produção vinhateira); a seguir passa às galerias ripícolas, diferenciando aqui entre

manchas com carácter prioritário e classificado (o que não deixa de ser incompreensível e

desconhecido no próprio Decreto-Lei nº49/2005); finalmente acaba esta extensa e

insustentável relação com matagais e matos, conceitos estes não discernidos ao longo do

trabalho e recorrentes em relação a manchas já tipificadas (os matos serão bosques?). Isto é,

um verdadeiro exemplo de uma extensa informação que, contrariamente, não proporciona

informação alguma, mas sim confunde e baralha a leitura daqueles que pretendam aplicar esta

tiipificação.

Resulta especialmente importante chamar a atenção para as conclusões do capítulo 9.1.4,

relativo à Síntese de impactes sobre a flora e vegetação. Aqui será destacada a seguinte

afirmação:

“…

De um modo geral, os impactes na flora e vegetação na fase de construção classificam-

se de negativos, de magnitude elevada, permanentes, irreversíveis e significativos. A

maioria dos habitats afectados corresponde a estruturas vegetais alteradas pelo

homem, ou de abundância elevada no território português.

…”

Novamente o avaliador pretende dirigir o seu estudo de modo a suavizar aquilo que, a partida,

considera ser uma alteração muito significativa no ecossistema. Esta atitude já a revelou na

descrição da paisagem vegetal afectada pelo projecto. Neste caso chamámos a atenção para o

facto desta paisagem apresentar as mesmas características do Parque Nacional da Peneda-

Gerês ou do Parque Natural do Alvão, com base na descrição geral proporcionada pelo

avaliador. Agora o avaliador introduz um comentário muito mais vago e incoerente: “… A

maioria dos habitats afectados corresponde a estruturas vegetais alteradas pelo homem, ou

de abundância elevada no território português.” Lembro à equipa de avaliadores responsável

por este estudo, que a grande maioria dos ecossistemas existentes em Portugal são

caracteristicamente agroecossistemas e, por tal motivo, alterados pelo homem…

A conclusão resultante do capítulo 9.1.4 está em clara contradição com a exposta no capítulo

IX, referente às Conclusões deste estudo. Neste capítulo, e sem qualquer razão aparente, os

impactes passam a ser favoráveis na sua generalidade:

“…

Globalmente e tendo em conta as vantagens e desvantagens e os impactes positivos e

negativos identificados, a construção o empreendimento é claramente favorável

ambientalmente, não se identificando qualquer aspecto crítico relevante que não possa

ser minimizável para níveis aceitáveis e controláveis.

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…”

Tal afirmação é, portanto, diametralmente contrária à esgrimida no capítulo 9.1.4, invalidando

assim todo o estudo aqui apresentado relativo à flora, vegetação e paisagem. Os avaliadores

mostram uma falta clara de critérios, uma vez que conseguem contrariar as conclusões sem

justificação aparente.

Conclusões

O presente estudo de impacte ambiental deve ser, desde o meu ponto de vista, novamente

realizado. As razões desta afirmação podem ser sustentadas sobre as seguintes razões:

1- Este estudo não analisa de modo profundo e pormenorizado a riqueza florística do

ecossistema afectado pelo empreendimento.

2- Não existe qualquer análise sobre flora ameaçada, rara ou endémica.

3- A flora protegida não é devidamente enquadrada na vegetação ou na análise florística,

não existindo qualquer monitorização para a mesma.

4- O estudo da vegetação está sustentado sobre uma inventariação inconsistente, uma

vez que utilizando o método fitossociológico não consegue diferenciar

sintaxonomicamente o coberto vegetal.

5- A cartografia de habitats é extremamente ambígua, pouco clara e dificilmente

aplicável por qualquer outro perito, facto este que inviabiliza a mesma.

6- As conclusões são contraditórias e não têm em consideração os resultados obtidos

nem a discussão dos mesmos.

Este conjunto extenso e generalizado de erros acaba por fazer com que as medidas

minimizadoras propostas tenham uma duvidosa aplicabilidade. Ao mesmo tempo, o processo

de monitorização igualmente apresentado será igualmente inapropriado, pois este estudo não

revelou um verdadeiro conhecimento do nível trófico florístico vascular para o ecossistema

analisado.

Tendo em consideração a importância da obra pretendida, as implicações que a mesma terá

sobre a matriz ambiental e biológica do ecossistema, bem como sobre o desenvolvimento

económico e sócio-cultural desta região, aconselho vivamente uma nova análise sobre a flora,

vegetação e a paisagem do ecossistema no qual está projectada a barragem do Fridão.

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