parasitologia - protozoários

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PARASITOLOGIA INTRODUÇÃO Parasitologia é uma ciência que se baseia no estudo dos parasitas e suas relações com o hospedeiro, englobando os filos Protozoa (protozoários), do reino Protista e Nematoda e Platyhelminthes (platelmintos) e Arthropoda (artrópodes), do reino Animal. Ao iniciar o estudo da parasitologia é conveniente que você se lembre de alguns dos conceitos básicos utilizados na Parasitologia. Portanto, vamos a eles: -> agente etiológico - é o agente causador ou o responsável pela origem da doença. Pode ser um vírus, bactéria, fungo, protozoário ou um helminto. -> endemia - quando o número esperado de casos de uma doença é o efetivamente observado em uma população em um determinado espaço de tempo. -> doença endêmica - aquela cuja incidência permanece constante por vários anos, dando uma ideia de equilíbrio entre a população e a doença. -> epidemia - é a ocorrência, numa região, de casos que ultrapassam a incidência normalmente esperada de uma doença. -> infecção - é a invasão do organismo por agentes patogênicos microscópicos. -> infestação - é a invasão do organismo por agentes patogênicos macroscópicos. -> vetor - organismo capaz de transmitir agentes infecciosos. O parasita pode ou não desenvolver-se enquanto encontra-se no vetor. -> hospedeiro - organismo que serve de habitat para outro que nele se instala encontrando as condições de sobrevivência. O hospedeiro pode ou não servir como fonte de alimento para a parasita. -> hospedeiro definitivo - é o que apresenta o parasito em fase de maturidade ou em fase de atividade sexual. -> hospedeiro intermediário - é o que apresenta o parasito em fase larvária ou em fase assexuada. -> profilaxia - é o conjunto de medidas que visam a prevenção, erradicação ou controle das doenças ou de fatos prejudiciais aos seres vivos. CONCEITOS GERAIS EM PARASITOLOGIA MÉDICA As primeiras conceituações de parasitismo o caracterizavam como uma relação desarmônica, portanto unilateral, onde o parasita obrigatoriamente trazia prejuízos ao seu hospedeiro. Como esta definição se mostrou falha, principalmente em razão de nem sempre se conseguir demonstrar danos determinantes de sinais e/ou sintomas, no hospedeiro, a mesma foi sendo abandonada pela maioria dos profissionais da área e substituída por outras mais coerentes com os conceitos mais modernos. Atualmente, parasitismo é principalmente conceituado como a “relação entre dois elementos de espécies (ou grupo e espécie, no caso dos vírus) diferentes onde um destes, apresenta uma deficiência metabólica (parasita) que faz com que se associe por período significativo a um hospedeiro (hospedador), visando suprir tal carência”.

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Page 1: Parasitologia - Protozoários

PARASITOLOGIA

INTRODUÇÃO

Parasitologia é uma ciência que se baseia no estudo dos parasitas e suas relações com

o hospedeiro, englobando os filos Protozoa (protozoários), do reino Protista e Nematoda

e Platyhelminthes (platelmintos) e Arthropoda (artrópodes), do reino Animal.

Ao iniciar o estudo da parasitologia é conveniente que você se lembre de alguns dos

conceitos básicos utilizados na Parasitologia. Portanto, vamos a eles:

-> agente etiológico - é o agente causador ou o responsável pela origem da doença.

Pode ser um vírus, bactéria, fungo, protozoário ou um helminto.

-> endemia - quando o número esperado de casos de uma doença é o efetivamente

observado em uma população em um determinado espaço de tempo.

-> doença endêmica - aquela cuja incidência permanece constante por vários anos,

dando uma ideia de equilíbrio entre a população e a doença.

-> epidemia - é a ocorrência, numa região, de casos que ultrapassam a incidência

normalmente esperada de uma doença.

-> infecção - é a invasão do organismo por agentes patogênicos microscópicos.

-> infestação - é a invasão do organismo por agentes patogênicos macroscópicos.

-> vetor - organismo capaz de transmitir agentes infecciosos. O parasita pode ou não

desenvolver-se enquanto encontra-se no vetor.

-> hospedeiro - organismo que serve de habitat para outro que nele se instala

encontrando as condições de sobrevivência. O hospedeiro pode ou não servir como

fonte de alimento para a parasita.

-> hospedeiro definitivo - é o que apresenta o parasito em fase de maturidade ou em

fase de atividade sexual.

-> hospedeiro intermediário - é o que apresenta o parasito em fase larvária ou em

fase assexuada.

-> profilaxia - é o conjunto de medidas que visam a prevenção, erradicação ou controle

das doenças ou de fatos prejudiciais aos seres vivos.

CONCEITOS GERAIS EM PARASITOLOGIA MÉDICA

As primeiras conceituações de parasitismo o caracterizavam como uma relação

desarmônica, portanto unilateral, onde o parasita obrigatoriamente trazia prejuízos ao

seu hospedeiro. Como esta definição se mostrou falha, principalmente em razão de nem

sempre se conseguir demonstrar danos determinantes de sinais e/ou sintomas, no

hospedeiro, a mesma foi sendo abandonada pela maioria dos profissionais da área e

substituída por outras mais coerentes com os conceitos mais modernos.

Atualmente, parasitismo é principalmente conceituado como a “relação entre dois

elementos de espécies (ou grupo e espécie, no caso dos vírus) diferentes onde um

destes, apresenta uma deficiência metabólica (parasita) que faz com que se associe por

período significativo a um hospedeiro (hospedador), visando suprir tal carência”.

Page 2: Parasitologia - Protozoários

PRINCIPAIS TIPOS DE PARASITISMO

1- Acidental - Quando o parasita é encontrado em hospedeiro anormal ao esperado.

Por exemplo, adulto de Dipylidium caninum parasitando humanos.

2- Errático - Se o parasita se encontra fora de seu habitat normal. Por exemplo, adulto

de Enterobius vermicularis em cavidade vaginal.

3- Obrigatório - É o tipo básico de parasitismo, onde o parasita é incapaz de sobreviver

sem seu hospedeiro. Por exemplo, a quase totalidade dos parasitas.

4- Proteliano - Expressa uma forma de parasitismo exclusiva de estágios larvares,

sendo o estágio adulto de vida livre. Por exemplo, larvas de moscas produtoras de

miíases.

5- Facultativo - É o caso de algumas espécies que podem ter um ciclo em sua integra

de vida livre e opcionalmente podem ser encontrados em estado parasitário. Por

exemplo, algumas espécies de moscas que normalmente se desenvolvem em materiais

orgânicos em decomposição no solo (cadáveres ou esterco), podem sob determinadas

condições, parasitar tecidos em necrose, determinando o estado de miíases

necrobiontófagas.

CICLO VITAL (ONTOGÊNICO, BIOLÓGICO OU DE VIDA) DOS PARASITAS

É a seqüência das fases que possibilitam o desenvolvimento e transmissão de

determinado parasita. Quanto ao número de hospedeiros necessários para que o

mesmo ocorra, podemos ter dois tipos básicos de ciclos:

Homoxeno (monoxeno): Onde é o bastante um hospedeiro para que o mesmo

se complete. Por exemplo, Ascaris lumbricoides e Trichomonas vaginalis.

Heteroxeno: Onde são necessários mais de um hospedeiro para que o ciclo se

complete, existindo pelo menos uma forma do parasita exclusivo de um tipo de

hospedeiro.

Quando existem dois hospedeiros, é denominado ciclo dixeno (Gên. Taenia e

Trypanosoma cruzi); entretanto, quando são necessários mais de dois hospedeiros,

de ciclo polixeno (Gên. Diphyllobothrium).

TIPOS DE HOSPEDEIRO

1- Ciclo heteroxeno:

*Definitivo: Quando o parasita se reproduz neste, de forma sexuada e/ou é encontrado

em estágio adulto.

*Intermediário: Se o parasita no hospedeiro só se reproduz de forma assexuada ou se

encontra exclusivamente sob forma larvar (helmintos).

Obs.: Se um protozoário não apresenta em seu ciclo reprodução sexuada em nenhum

dos hospedeiros, estes são conhecidos como hospedeiro vertebrado e invertebrado

respectivamente.

2- Paratênico ou de transporte - Quando no mesmo, não ocorre evolução parasitária,

porém, o hospedeiro não está apto a destruir o parasita rapidamente, podendo assim,

ocorrer posterior transmissão em caso de predação por espécie hospedeira natural.

Page 3: Parasitologia - Protozoários

Obs. Não é um verdadeiro caso de parasitismo.

3. Reservatório: É representado pelo (s) hospedeiro (s) vertebrado (s) natural (is) na

região em questão.

Obs.: O termo vetor é utilizado como sinônimo de transmissor, representado

principalmente por um artrópode ou molusco ou mesmo determinado veículo de

transmissão, como água ou alimentos, que possibilite a transmissão parasitária. Alguns

autores utilizam o termo vetor biológico quando ocorre no interior deste animal a

multiplicação e/ou o desenvolvimento de formas do parasita (se constituindo em

hospedeiro) e vetor mecânico nas situações onde não existem tais condições,

transmitindo assim o parasita com a mesma forma de desenvolvimento de ciclo que

chegou ao mesmo, não sendo portanto um hospedeiro.

MECANISMOS DE AGRESSÃO E RESPOSTA ÀS PARASITOSES

1- Patogenia e manifestações clínicas ao parasitismo

É o conjunto de mecanismos lesionais respectivos determinados no decorrer do

parasitismo ao organismo parasitado, incluindo-se também as agressões determinadas

pela reação do hospedeiro. Porém, é importante ser lembrado que não é obrigatória a

relação entre patogenia e manifestações clínicas (sinais e ou sintomas), que são os

paradigmas da doença propriamente dita. Para que ocorra doença, as lesões

determinadas devem ultrapassar a capacidade homeostática do hospedeiro. Os

seguintes fatores devem ser avaliados para que surja tal desequilíbrio:

A. Parasita: Virulência, carga parasitária infectiva e porta de entrada utilizada.

B. Hospedeiro: Mecanismos de resistência a este parasita.

2- Mecanismos gerais de agressão dos parasitas

Os danos determinados na dinâmica da relação Hospedeiro-Parasita podem de forma

genérica ser classificados em:

A. Diretos - Determinados pelo parasita e substancias por ele secretados.

B. Indiretos - Quando acarretados pela reação do hospedeiro ao parasitismo.

Mecanismos:

Espoliativo: É o determinado por perda de substâncias nutritivas pelo organismo do

hospedeiro, podendo o mesmo ser acarretado por perda direta de nutrientes (P.e. Gên.

Taenia), tecidos sólidos ou hematofagismo (Ancilostomídeos).

Enzimático: É determinado pela liberação de secreções enzimáticas produzidas por

parasitas, que determinam destruição tecidual de extensão variável. (Entamoeba

histolytica e larvas infectante de ancilostomídeos).

Inflamatório/hipersensibilizante: A maioria dos mecanismos acima leva a uma

resposta inflamatória de forma indireta ou diretamente por liberação de substâncias que

ativam esses mecanismos. Incluiremos aqui a hipersensiblidade que se constitui

também em elemento gerador de resposta inflamatória. (Larvas de helmintos que fazem

ciclos pulmonares).

Page 4: Parasitologia - Protozoários

Imunodepressor: É determinado por metabólitos liberados pelo parasita ou por outros

mecanismos que possam reduzir a capacidade de resposta defensiva do hospedeiro.

(Leishmania donovani).

Neoplásico: Algumas Parasitoses crônicas, através de liberação de metabólitos ou

reações inflamatórias crônicas ou de sua conseqüência, podem levar a gênese de

tumores malignos. (Schistosoma haematobium e neoplasia de bexiga).

Obs.: Quando temos uma resposta do organismo do hospedeiro ao parasitismo, sem

que ocorra consequente manutenção da homeostase, surge, em função desse

desequilíbrio, o que denominamos manifestações clínicas (sinais e/ou sintomas) da

parasitose em questão.

RELAÇÕES DEFENSIVAS DO HOSPEDEIRO HUMANO

Para tentar reduzir, em número, ou neutralizar, os agentes responsáveis pelas

infecções, ou infestações, o organismo humano lança mão de mecanismos que

caracterizam o que foi denominado em seu conjunto como resistência. A mesma pode

ser considerada como total, ou absoluta, quando o parasita não dispõe de condições

que permitam sua instalação, seja por eficiência dos mecanismos protetores do

hospedeiro, ou mesmo, por não existirem condições metabólicas básicas para o

desenvolvimento do parasita. Quando a resistência se apresenta reduzindo,

significativamente, o número de formas parasitárias, porém, permitindo manutenção do

parasitismo, é, então, denominada de relativa, ou parcial.

No aspecto concernente à forma de instalação da mesma, é considerado como

resistência natural, ou inespecífica, ou, ainda, inata; os mecanismos de resistência ao

parasitismo que se comportam da mesma forma, independente de contato anterior com

o agente parasitário, não determinando o que é denominado de memória. Se, ao

contrário, o sistema linfocitário participa dos eventos defensivos, determinando memória

imunológica e posterior alteração de resposta nos contatos com o parasita em situações

subsequentes, o evento é denominado de resistência adquirida.

Do ponto de vista operacional, a divisão entre os mecanismos inespecíficos e

específicos, não têm validade, pois, os mesmos, atuam de forma integrativa. Porém,

visando a uma melhor apresentação do tema, será utilizada essa divisão como recurso

didático. É importante lembrar que, apesar da importância das reações defensivas frente

ao parasitismo, em alguns casos, a mesma, causa tal magnitude lesional em nível local

ou sistêmico, que se torna altamente danosa para a própria homeostase, determinando

agressão indireta.

ATIVAÇÃO DA RESPOSTA IMUNE

Um antígeno pode ser apresentado ao sistema imune de duas maneiras: 1) interação

direta com a imunoglobulina específica presente na superfície do linfócito B; 2) pelas

APCs, que expressam em sua superfície os peptídeos do antígeno juntamente com as

moléculas de MHC I e MHC II. Para que uma célula seja ativada por um antígeno é

necessário que durante o processo de apresentação ocorra a interação TRC-peptídeo-

MHC e das moléculas co-estimulatórias (B7-CD28, CD40-CD40L).

Page 5: Parasitologia - Protozoários

O antígeno, ao entrar em contato com o organismo, será fagocitado por neutrófilos,

macrófagos ou células dendríticas (DCs). As APCs profissionais (DCs, macrófagos,

linfócitos B) apresentam antígenos para os linfócitos T CD4+ e CD8+, respectivamente

pelas moléculas de MHC II e MHC I, enquanto as demais células nucleadas só

expressam MHC I.

Os antígenos provenientes do ambiente extracelular são englobados dentro de

endossomos ou fagossomos, que se fundem com lisossomos, sendo então digeridos

pelas enzimas e degradados em peptídeos. No interior do núcleo, esses peptídeos (em

média dez aminoácidos) serão acoplados ao MHC I, sendo assim transportados para a

superfície da célula, onde apresentaram ao linfócitos T CD8+ por exemplo. =>

estimulação de IL-2, quimiocinas, e recrutamento de mais células para o local.

Os linfócitos B naive apresentam em sua superfície a IgM e IgD, além de moléculas

acessórias, conjuntamente formando o receptor de linfócitos B (BCR). O LB ativado se

transformará em plasmócitos e passará a produzir imunoglobulina da classe IgM. Como

o LB é também uma APC, este processará o antígeno protéico e apresentará os

peptídeos ao linfócito T específico.

INTERAÇÃO ENTRE OS PARASITOS E O SISTEMA IMUNE

Os principais mecanismos efetores são: lise por citotoxidade celular mediada por

anticorpo (ADCC), ou pelo sistema complemento, citocinas efetoras (interferon gama,

fator de necrose tumoral alfa) e apoptose.

MECANISMOS DE RESISTÊNCIA INESPECÍFICOS

A. Tegumento cutâneo A.1 Barreira mecânica: Impede, ou dificulta a penetração de agentes parasitários.

A.2 Barreira uímica: O pH da pele humana é ácido, o que dificulta a penetração, ou

instalação, em sua superfície, de patógenos. Esse pH é mantido principalmente pela

produção, por parte das glândulas sebáceas, de ácidos graxos de cadeia longa e pela

degradação, dos mesmos, pela microbiota local, que determina a produção de ácidos

graxos voláteis, que, além de auxiliarem a manutenção do pH, apresentam ação

principal em bactérias Gram As glândulas sudoríparas, ao produzirem lisozimas

(muramidase), apresentam ação lítica bacteriana (principalmente nas Gram +).

A.3 Pelos: Barreira mecânica que pode reduzi a penetração de patógenos no

organismo, como representado pelas vibrissas (pêlos na porção anterior das fossas

nasais).

A.4 Microbiana: Várias espécies de bactérias residem na pele normal, ou em glândulas

sebáceas. Os componentes mais numerosos são representados pelo Staphylococcus

epidermidis e pelo Propionibacterium acneae. A competição com patógenos é a forma

pela qual a microbiota participa das defesas do hospedeiro. As formas de reduzir, ou

eliminar o agente invasor, se baseia principalmente em:

Page 6: Parasitologia - Protozoários

1) Produção de substâncias microbicidas e redução do pH local, já explicados

anteriormente;

2) Ligação a receptores de superfície celular, também utilizado pelo patógeno;

3) Produção de outras substâncias microbicidas.

B. Cavidades revestidas por mucosas

B.1 Barreira Mecânica: Pelas características histológicas do revestimento mucoso,

esta condição se apresenta com pouca eficiência.

B.2 Barreira química: Existe uma grande variedade de produtos liberados nas

cavidades mucosas, entre os quais, HCl (estômago), enzimas digestiva, e outras como

a lisozima, sais biliares e suco pancreático que atuam na degradação ou inativação de

grande número de microrganismo.

B.3 Muco: A mucina, proteína de alta viscosidade, atua fundamentalmente: 1) facilita a

adesividade entre si de agentes biológicos e virais, bem como partículas inertes, visando

a posterior remoção; e 2) mantém úmida a superfície mucosa, formando camada

protetora frente a agentes físicos e químicos.

B.4 Cílios: A presença, e consequente movimentação celular em determinadas

mucosas, como a do trato respiratório, determina remoção de elementos inanimados

(poeira e vírus), ou biológicos (bactérias, larvas de helmintos e protozoários) aderidos

ao muco.

B.5 Microbiota: Tal como acontece no tegumento cutâneo, nos segmentos onde existe

microbiota (cavidade oral, vagina, intestino grosso), a mesma pode atuar competindo

com patógenos das seguintes formas: 1) Produzindo catabólitos, que determinam

redução do pH, como ocorre na cavidade vaginal, onde os bacilos de Doderlein utilizam

o glicogênio proveniente de células descamativas e produzem ácido lático que

determina faixa de pH entre 3.8 a 4.2; 2) Por competição por fonte nutricional; 3) Ligação

a receptores de superfície utilizados por patógeno; e 4) Por produção de substância(s)

que tenha(m) ação deletérica(s) sobre espécies patogênicas.

C. Fagócitos Profissionais

Grande número de tipos celulares tem a capacidade fagocitária, porém, em sua maioria,

o fazem de forma sistemática e não especializada. Quando a fagocitose é feita de forma

defensiva, tais células são denominadas fagócitos profissionais, sendo representadas

pelas seguintes células:

C.1 Neutrófilos: Existem, predominantemente, em nível de medula óssea e circulação

sangüínea. O potencial microbicida destas células é assegurado pela existência de

grande quantidade de enzimas lisossomiais e sua grande mobilidade, peróxidos e

aldeídos, que apresentam alto poder microbicida. Quando ocorre qualquer dano

tecidual, ou liberação de substâncias quimiotáticas, outras para neutrófilos, estas

células abandonam o pool circulante e migram por diapedese para o tecido lesado. Em

Page 7: Parasitologia - Protozoários

muitos casos, onde a atividade dos neutrófilos é requisitada, sua vida média, pela

grande atividade metabólica, se restringe a poucas horas após sua ativação.

C.2 Eosinófilos: Estas células apresentam potencial fagocitário bem inferior ao dos

neutrófilos, porém, em menor escala, apresentam-se com capacidade microbicida por

mecanismos análogos aos dos neutrófilos.

C.3 Macrófagos (Ms): Pelos conhecimentos atuais, os monócitos circulam e vão

progressivamente se localizar em vários sítios anatômicos, onde se diferenciam em

células especializadas, sendo, portanto, precursores de todos os outros macrófagos. Os

fagócitos mononucleares se distribuem no organismo constituindo o chamado Sistema

Fagocitário Mononuclear (SFM), que, no passado, era chamado de Sistema Retículo

Endotelial (SRE), que tem como elementos: Monócitos, células de Kupffer, Ms

gânglionares, Ms peritoniais, Ms endotélio dos sinusóides esplêmicos, Ms alveolares,

Ms lâmina própria intestinal, Ms de medula óssea, histiócitos, osteoclastos e micróglia.

O potencial microbicida dos Ms é determinado pela presença de enzimas e outras

substâncias como os peróxidos em seu citoplasma, porém, ao contrário dos neutrófilos,

depende, significativamente, para uma maior eficiência destrutiva, da ativação

determinada, principalmente, por linfócitos T. Outro fator de relevância, destas células,

é sua capacidade potencial de apresentação antigênica.

D. Resposta inflamatória

É definida como um complexo processo defensivo local, acionado por injúria

determinada por agentes biológicos e/ou físicos e/ou químicos, caracterizado por

sequência de fenômenos irritativos, vasculares, exsudativos, degenerativo-necróticos e

de reparo.

A fagocitose de patógenos é facilitada pela presença, na membrana, dos macrófagos,

de receptores para Fc, de IgG e para C3b. Quando o fenômeno se apresenta em

intensidade significante, ocorre exteriorização da inflamação por: dor, rubor, calor, tumor

(aumento do volume da área) e frequentemente por alteração da função local.

Do ponto de vista cronológico, existem dois tipos de inflamação:

D.1 Aguda: É a que ocorre na fase inicial de contato com o agente e existe um

predomínio de neutrófilos.

D.2 Crônica: Quando a causa injuriante não é eliminada em período inicial, ocorre uma

mudança no tipo celular predominante, onde agora se é encontrado em maior número

os mononucleares (linfócitos e Ms) e uma tendência, em várias situações, a formação

de granulomas e/ou células gigantes, bem como processos fibróticos em escala variada.

E. Células Matadoras Naturais (“Natural Killer Cell” - NK)

A ação das células NK parecem se dar a partir de alterações de permeabilidade da

membrana plasmática da célula alvo, determinando poros de membrana. Os principais

elementos de atuação são os microrganismo e células neoplásicas.

Page 8: Parasitologia - Protozoários

F. Sistemas de Amplificação Biológica

São encontrados como sistemas de relevância no campo da amplificação das respostas

defensivas, principalmente no que se refere a inflamação de sistemas de grande

relevância como: Complemento, Coagulação sanguínea, Cininas vasoativas e outros de

menor importância. Será destacado a seguir o sistema Complemento, pela sua

importância em processos de agressão/defesa determinados por parasitas.

F.1 Sistema Complemento: é um sistema enzimático sob forma de zimogênios (forma

inativa), até serem ativados em sistema de cascata. Existem duas vias para sua ativação

inicial:

1. Via clássica onde se destacam os Ac das classes IgM e IgG, e mais

raramente outros elementos como produtos bacterianos;

2. Via alterna (alternativa), para a qual são encontradas variedade de

substâncias químicas ativadoras de origem biológia e com menor intensidade a

própria via clássica. As principais ações biológicas do sistema estão

relacionadas ao fomento de fenômenos inflamatórios onde se destacam: a

degranulação de mastócitos e basófilos (C3a e C5a), a opsonização (C3b) e a

possível lise de membrana, ou parede bacteriana pelo complexo C7, C8 e C9.

MECANISMOS DE ESCAPE PARASITÁRIOS

Os parasitas utilizam o organismo de seus hospedeiros como meio ambiente vital, este

reage por vários mecanismo já descritos, a essa invasão. Para tentarem reduzir a sua

taxa de mortalidade, os parasitas se utilizam um ou vários dos mecanismos de escape

à resistência do hospedeiro, dos quais foram selecionados abaixo os mais importantes:

Localização estratégica: Se dá quando determinado agente se localiza em

local de difícil acesso quanto as respostas defensivas do hospedeiro. Em nível

intracelular (formas amastigotas de T. Cruzi e do gênero Leishmania) e em luz

intestinal (adultos de Ascaris lumbricoides).

Espessura de tegumento externo: Os helmintos adultos se utilizam de um

tegumento espesso para dificultar a ação de Ac e complemento e células de

defesa. (Schistosoma mansoni e Wuchereria bancrofti).

Rápida troca de membrana externa: A produção rápida e consequente perda

da membrana externa anterior facilitam a eliminação de Ac, fatores de

complemento e mesmo células de defesa. (S. mansoni).

Máscara imunológica: Consiste na preexistência, adsorção ou mais raramente

na produção pelo parasita de antígeno do hospedeiro, reduzindo inicialmente a

resposta aos mesmos. (S. mansoni (adsorção) e T. Cruzi (preexistência)).

Page 9: Parasitologia - Protozoários

Variação antigênica: Seria a alternância de produção de Ag parasitários, o que

reduziria a capacidade de resposta protetora do hospedeiro. (T. brucei).

Determinação de imunodeficiência ao hospedeiro por parte do parasita:

Consiste em produção de substâncias ou degradação direta parcial significativa

do sistema de resistência do hospedeiro. (L. chagasi e L. donovani (ativação

policlonal linfocitária)).

CONFIRMAÇÃO DIAGNÓSTICA

Os sinais e/ou sintomas apresentados pelos hospedeiros humanos infectados,

normalmente não fornecem, como ocorre na maioria das afecções de outra natureza,

condições para um diagnóstico definitivo. Pelo exposto acima, a confirmação da

hipótese diagnóstica deve ser feita através de testes laboratoriais ou mais raramente

por outras formas de exames complementares. Será citado a seguir, de forma geral, os

principais métodos de confirmação diagnóstica utilizados em Parasitologia Médica.

1- Detecção de formas parasitárias

A. Pesquisa visual:

A.1 Macroscópica: O parasitismo por artrópodes como exemplificado por piolhos e

pulgas e o encontro em matéria fecal de fragmentos de helmintos (proglotes de Taenia

sp, A. lumbricoides), ou mesmo íntegros (A. lumbricoides), possibilitam o diagnóstico

definitivo da Parasitose em questão.

A.2- Microscópica: Neste caso, o encontro de estruturas parasitárias de helmintos

(ovos e/ou larvas), protozoários (cistos, trofozoítas e outras formas) e mais raramente

provenientes de artrópodes, determina a condição de confirmação da hipótese clínica.

Essas estruturas podem ser encontradas em vários materiais clínicos:

- Sangue: Exame direto entre lâmina e lamínula: Trypanosoma cruzi e esfregaço

(distensão delgada) e Gênero Plasmodium; Métodos de concentração: gota espessa

(Gênero Plasmodium), Strout (T. cruzi); Knott (Wuchereria bancrofti e Mansonela

oozardi); Filtração em sistema Millipore (Wuchereria bancrofti e Mansonela oozardi).

- Fezes: Exame direto entre lâmina e lamímula: Encontro de ovos (Ancilostomídeos) e

larvas (Strongyloides stercoralis) pertencentes a helmintos e cistos e formas

trofozoíticas de protozoários (Giardia lamblia). Métodos de concentração (Faust e col;

Lutz; Ritchie): pesquisa de ovos e larvas de helmintos e cistos de protozoários e de

tamisação em: malha média (proglotes de Taenia sp) e malha fina (adultos de

Enterobius vermicularis).

- Raspado cutâneo: Exame direto entre lâmina e lamínula associado ao uso de

clarificadores: Estágios evolutivos de ácaros causadores da sarna humana (Sarcoptes

scabei) e fungos determinantes de lesões superficiais são as principais indicações

diagnósticas por esta técnica.

Page 10: Parasitologia - Protozoários

- Biópsia: Tegumentares (Gên. Leishmania), Medula óssea (Gên. Plasmodium) e retais

(válvulas de Houston) no caso de infecção pelo Schistosoma mansoni. Podem ser feitas

mais raramente biópsias de vários tecidos tais como: hepático, esplênico, ganglionar

entre outros.

- Recuperação de helmintos adultos ou ovos na superfície cutânea: A Técnica da

fita adesiva (papel celofane ou método de Grahan) detecta principalmente adultos e

ovos de Enterobius vermicularis e mais raramente ovos de Taenia sp.

- Inoculação de material suspeito de conter o parasita (sangue ou macerado

tecidual) em animais de laboratório (hamster, gerbilídeos e camundongos) como

exemplificado para Leishmania e mais raramente Toxoplasma gondii, ou

xenodiagnóstico (T. Cruzi). Essa forma diagnóstica raramente é empregada na rotina

diagnóstica, exceto em instituições de ensino e pesquisa. Outra forma é tentativa de

cultivo do parasita a partir de materiais biológicos (P.e. sangue, biópsias e liquor), porém

este método não é utilizado com frequência na rotina diagnóstica, em protozoologia e

helmintologia, como em ocorre em bacteriologia e micologia. O uso de culturas em

meios próprios, principalmente em instituições acadêmicas, pode determinar o

diagnóstico de algumas infecções por protozoários (T. vaginalis, T. cruzi).

2- Pesquisa de Antígenos parasitários

Atualmente através de técnicas como a imunofluorescência direta e enzimaimuno

ensaio (ELISA), poderemos detectar Ag de vários parasitas, como a Entamoeba

histolytica entre outros, não só em nível fecal como em vários tecidos e líquidos

corpóreos (liquor).

3- Pesquisa de Anticorpos anti-parasitários

A positividade por estes métodos, principalmente representados pelas reações de

hemaglutinação, imunofluorescencia indireta, enzimaimuno ensaio (ELISA), e em menor

escala a Reação de Fixação de Complemento, Contra-Imunoeletroforese e as provas

de Imunodifusão, detectam possível resposta imune aos antígenos testados, porém não

diagnosticam obrigatoriamente uma infecção presente, podendo ser inclusive resultado

de reação cruzada com antígenos encontrados em diferentes agentes infecciosos ou

estruturas químicas pertencentes a outros elementos que entraram previamente em

contato com o sistema imune do hospedeiro. Para debelar estes resultados

considerados como falso-positivos, o título de Ac e a classe(s) de Imunoglobulina

detectada(s) (IgG e/ou IgM) detectados nos métodos citados acima são de grande

ajuda, bem como a sorologia pareada (comparação com no mínimo de duas semanas

de intervalo, utilizando-se a mesma técnica, dos títulos encontrados). Estes testes são

usados principalmente nas infecções por T. gondii, T. cruzi e gênero Leishmania entre

outras.

4- Pesquisa de fragmentos específicos de ADN parasitário

Page 11: Parasitologia - Protozoários

Atualmente existem provas de biologia molecular utilizadas em Parasitologia Médica,

onde por sua automação, alta sensibilidade e reprodutibilidade, se destacam a Reação

em Cadeia da Polimerase (Polymerase Chain Reaction - PCR), que é utilizada

principalmente onde outras técnicas apresentam dificuldade diagnóstica para detecção

da real presença do parasita. Esta técnica é atualmente, uma opção diagnóstica para

várias infecções parasitárias, como nas determinadas por T. cruzi, Gênero Leishmania

e Cryptosporidium parvum.

5- Intradermorreação (IDR) para pesquisa de reatividade mediada por

linfócitos T

A base desta reação é a medição da área afetada pela inflamação mediada por LT,

observada após 48 a 72 h pós-introdução do Ag específico do parasita alvo, em nível

intradérmico. Esta reação não revela necessariamente parasitismo presente, mas sim

resposta ao Ag problema, podendo a mesma ser fruto de infecções passadas pelo

agente ou mesmo por reações cruzadas com o Ag introduzido. Por essas razões a IDR

é considerada um teste prognóstico. Utilizamos a IDR com maior frequência, em

leishmaniose tegumentar e em algumas micoses.

6- Imagens

A análise dos resultados obtidos por métodos que determinam imagens (diagnóstico por

imagem), representados por exames de radiologia convencional, tomografia

computatorizada, ressonância magnética, cintilografia e ultra-sonografia, podem em

algumas infecções por helmintos, tais como larvas dos gêneros Taenia (cisticerco) e

Echinococcus (cisto hidático) e em determinados casos de parasitismo por adultos A.

lumbricoides podem determinar o diagnóstico etiológico específico. É possível também,

com a análise das imagens obtidas nos exames, ajudar na avaliação das condições do

indivíduo parasitado (estagio da doença) ou mesmo sugerir diagnósticos em função das

alterações encontradas.

PROTOZOÁRIOS

INTRODUÇÃO

Protozoários são seres unicelulares, na maioria heterótrofos, mas com formas

autotróficas e com mobilidade especializada. Esta última serviu de critério para sua

taxonomia. A maioria deles é muito pequena, medindo de 0,01 mm a 0,05 mm

aproximadamente, sendo que algumas exceções podem medir até 0,5 mm como, por

exemplo, os foraminíferos. Sua forma de nutrição é muito diferenciada, pois podem ser

predadores ou filtradores, herbívoros ou carnívoros, parasitas ou mutualistas. A

digestão é intracelular, por meio de vacúolos digestivos, sendo que o alimento é ingerido

ou entra na célula por meio de uma "boca", o citóstoma.

A célula é muito especializada, e cada organela tem uma função vital. O sistema

locomotor é um dos mais especializados, com flagelos, cílios, membranas ondulantes,

cirros ou pseudópodes. Há um sistema hidrostático, constituído de vacúolos pulsáteis

Page 12: Parasitologia - Protozoários

que eliminam o excesso de água que entra na célula por osmose nos protozoários

dulcicolas, estabelecendo assim o equilíbrio osmótico. O citoesqueleto também é

especializado para manter a forma da célula, emissão de pseudópodes, locomoção,

movimentação de vacúolos digestivos, entre outras funções necessárias. Pode haver

exoesqueleto em algumas espécies.

Estes organismos estão presentes em todos os ambientes por causa de seu tamanho

reduzido e produção de cistos resistentes. Quanto à sistemática, podem ser divididos,

a grosso modo, em quatro grupos distintos: flagelados, amebóides, formadores de

esporos e ciliados.

Dependendo da sua atividade fisiológica, algumas espécies possuem fases bem

definidas:

-Trofozoíto: é a forma ativa do protozoário, na qual ele se alimenta e se reproduz.

-Cisto: é a forma de resistência ou inativa.

LEISHMANIOSES

As leishmanioses são causadas por diferentes espécies de protozoários do gênero

Leishmania, e transmitidas pela picada de um mosquito da sub-família Phlebotominae.

A leishmaniose apresenta três formas clínicas mais comuns:

- Leishmaniose cutânea: que causa feridas na pele.

- Leishmaniose muco-cutânea: cujas lesões podem levar a destruição parcial ou total

das mucosas.

- Leishmaniose visceral: também chamada calazar, caracterizada por surtos febris

irregulares, substancial perda de peso, espleno e hepatomegalia e anemia severa. Se

não tratada pode levar a morte em 100% dos casos.

LEISHMANIOSE CUTÂNEA – LEISHMANIOSE TEGUMENTAR

AMERICANA (LTA)

A LTA é uma doença tropical endêmica na América latina, África e Ásia. A incidência

mundial está aumentando e é uma das doenças consideradas pela OMS como

negligenciada.

A leishmaniose pode se apresentar na forma tegumentar ou na forma visceral. A forma

tegumentar é classicamente dividida em cutânea e mucosa. A forma cutânea é ainda

classificada em localizada, múltipla, disseminada e difusa. Na forma cutânea da

leishmaniose ocorre comprometimento da pele com lesões bastante características, de

fácil reconhecimento pelo clínico atento, embora o número de diagnósticos diferenciais

seja grande.

Etiologia e Morfologia

A LTA é causada por um protozoário parasito humano que possui características bem

peculiares, leishmania. Este é um parasito intracelular obrigatório que se multiplica nas

Page 13: Parasitologia - Protozoários

células do sistema fagocítico mononuclear dos mamíferos susceptíveis. Apresenta em

seu ciclo evolutivo, duas formas principais: amatigota e promastigota.

Em relação a uma das formas de Leishmania, a promastigota, ela tem uma vida

extracelular, é alongada, móvel e flagelada. É encontrada no vetor e também pode

crescer in vitro no meio de cultura. Multiplica-se por divisão binária e ocupa o segmento

anterior do tubo digestivo do inseto, sendo finalmente inoculado ao picar um novo

hospedeiro.

Paramastigotas: formas ovais ou arredondadas com flagelo livre. São encontradas

aderidas ao epitélio do trato digestivo do vetor através de hemidesmossomas.

Logo após entrarem na pele, as promastigotas aderem à sperfície dos macrófagos e

são fagocitadas. Dentro do vacúolo parasitóforo eles perdem o flagelo e transformam-

se em amastigotas que se multiplicam por divisão binária. A amastigota é outra forma

clássica de Leishmania, o qual é intracelular, tem formato arredondado e é encontrada

nos tecidos do hospedeiro.

Essas duas formas apresentam diferenças importantes nas proteínas de superfície,

conferindo diferença na resposta imune e na adaptaçãoao hospedeiro ou vetor.

Epidemiologia

A leishmaniose tende a ter um ciclo mais rural ou selvagem de transmissão, embora a

urbanização tenha se expandido. O grupo de risco para a infecção são os trabalhadores

rurais, assim como aqueles que habitam áreas próximas de matas, como garimpeiros,

construtores de rodovias, grupos militares em atividade na mata, desmatadores, turismo

ecológico, etc.

A L. amazonensis, L. braziliensis e L. guyanensis são as espécies mais importantes no

Brasil. A primeira tem um distribuição mais ao norte e nordeste da região brasileira e

apresenta os roedores como reservatórios naturais; Já a segunda tem uma distribuição

que vai da Bahia até o Paraná; finalmente, a terceira se concentra mais na região norte

apresentando um ciclo mais selvagem sendo comuns hospedeiros como tamanduá,

bicho-preguiça e rato do mato.

Transmissão

Page 14: Parasitologia - Protozoários

O mosquito hematófago responsável pela transmissão do parasito da LTA é as

subfamília Phlebotominae. O gênero Phlebotomus é responsável pela transmissão da

doença na Ásia, e o gênero Lutzomyia (fêmea), na América.

Patogenia

O desenvolvimento da doença é dependente da resposta do hospedeiro. Ocorrem

múltiplas interações hospedeiro-parasito que envolvem todos os componentes da

doença. No entanto, o parasito tem estratégias que são os mecanismos de evasão das

várias etapas da infecção.

Assim, tem-se a repsosta inflamatória inespecífica na ocasião em que o parasito entra

em contato com o hospedeiro. Logo em seguida, as amastigotas são fagocitadas pelos

macrófagos, nos quais acabam sobrevivendo, apesar de este ser o local de destruição

de agentes estranhos no organismo. As amastigotas, ao contrário das promastigotas,

mostram um alta atividade enzimática que degrada metabólitos exidativos tóxicos do

macrófago e também são altamente adaptadas ao pH ácido do fagolisossoma.

Na forma cutânea localizada (ferida aberta localizada – até 4 feridas é considerada

localizada) da LTA existe ua quantidade abundante de ambos os padrôes de citocinas

(Th1 e Th2), embora nos monócitos coletados de sangue periférico apresentem um

padrão de secreção de citocinas Th1. Todo o processo imune gera um infiltrado

inflamatório que promove a formação ulcerosa cutânea, explicando o aspecto da lesão.

Diferenças entre as espécies de Leishmania geram diferentes padrões inflamatórios e

diferentes graus de ativação celular, o que faz com que haja particularidades entre as

úlceras nas diversas partes do mundo.

Na forma cutânea difusa (várias lesões em forma de verrugas) existe uma

predominância de resposta Th2 durante toda a doença, o que leva ao processo crônico

não-ulceroso. A forma disseminada (várias lesões internas na pele semelhantes a

nódulos de acne) da doença ocorre em pacientes com deficiência imune celular, nos

quais existe uma resposta imune celular insuficiente, facilitando a disseminação do

parasito pela pele e podendo levar à visceralização. A diferença de forma difusa está na

quantidade do parasito no tecido, sendo pouco na disseminada e abundante na difusa.

Ciclo Biológico

No vetor: o inseto pica o vertebrado contaminado para fazer o seu repasto sanguíneo

e ingere macrófagos contendo as formas amastigotas do parasito. Ao chegarem ao

estômago do inseto, os macrófagos se rompem liberando as amastigotas. Estas sofrem

uma divisão binária e se transformam rapidamente em promastigotas, que se

multiplicam ainda no sangue ingerido, que é envolto pela membrana peritrófica. Esta

membrana se rompe no 3º ou no 4º dia e as formas promatigotas ficam livres. As formas

promastigotas permanecem se reproduzindo por divisão binária, podendo seguir dois

caminhos, de acordo com a espécie do parasito. As leishmanias do “complexo

brasiliensis” vão migrar para as regiões do piloro e do íleo (seção peripilária). Nestes

locais elas se transformam de promastigotas para paramastigotas, aderindo ao epitélio

do intestino do inseto. Nas leishmanias do “complexo mexicana” o mesmo fenômeno

Page 15: Parasitologia - Protozoários

ocorre, porém a fixação das paramastigotas se dá no estômago do inseto. Novamente

se transformam em promastigotas e migram para a região da faringe do inseto. Neste

local se transformam novamente em paramastigotas e à partir daí vão se transformando

em pequenas promastigotas infectantes, altamente móveis, que se deslocam para o

aparelho bucal do inseto.

Ciclo no vertebrado: O inseto, na sua tentativa de ingestão de sangue, injeta as formas

promastigotas no local da picada. Dentro de 4 a 8 horas estes flagelados são

interiorizados pelos macrófagos teciduais. Rapidamente as formas promastigotas se

transformam em amastigotas, que são encontradas no sangue 24 horas após a

fagocitose. As amastigotas resistem à ação destruidora dos macrófagos e se multiplicam

intensamente, até ocupar todo o citoplasma. O macrófago se rompe, liberando as

amastigotas, que vão penetrar em outros macrófagos, iniciando a reação inflamatória.

Diagnóstico

a) Diagnóstico Clínico

- Baseado na característica da lesão e em dados epidemiológicos.

b) Diagnóstico laboratorial

- Pesquisa do parasito:

Exame direto de esfregaços corados: após anestesia local, retira-se um

fragmento das bordas da lesão e faz-se um esfregaço em lâmina, corado com

derivados de Romanowsky, Giensa ou Leishman.

Cultura: pode ser feita a cultura de fragmentos de tecido ou de espirados da

borda da lesão. Inóculo em animais: o hamster é o animal mais utilizado para o

Page 16: Parasitologia - Protozoários

isolamento de Leishmania. Inocula-se, por via intradérmica, no focinho ou nas

patas, um triturado do fragmento com solução fisiológica.

- Métodos imunológicos:

Teste intradérmico de Montenegro: é o mais utilizado no país para

levantamentos epidemiológicos, avalia a hipersensibilidade retarda do paciente.

Inocula-se 0,1 ml de antígeno no braço do paciente, e no caso de reações

positivas, verifica-se o estabelecimento de uma reação inflamatória local que

regride depois de 72 horas.

Reação de Imunofluorescência indireta (IFI): teste bastante usado, com alta

sensibilidade, porém apresenta reação cruzada para outros tripanossomatídeos.

Além do IFI, tem-se o ELISA e a reação em cadeia da polimerase (PCR).

Tratamento

Forma cutânea localizada = forma cutânea difusa. O que diferencia são as doses dos

medicamentos.

- Meglumina

- Pentamidina

- Anfotericina B deoxicolato

LEISHMANIOSE CUTÂNEA – LEISHMANIOSE MUCOSA

A leishmaniose mucosa é uma das apresentações clínicas da LTA. Seu principal agente

é o L. (Viannia) braziliensis, embora outras espécies já tenhm sido implicadas como

causadoras da doença.

A leishmaniose mucosa é decorrente de metástase após lesão cutânea que

habitualmente não foi tratada, e o seu principal local de acometimento é o septo nasal

e a região orofaringe.

Patogenia

A leishmaniose mucosa é considerada o pólo hiper-responsivo da LTA, pois apresenta

uma maior resposta linfoproliferativa frente ao parasito, quando comparada com a forma

cutânea. Além de ocasionar uma resposta inflamatória exuberante, com extensa

destruição tecidual, habitualmente progressiva (presença de grande quantidade de

TNF-alfa, IFN-gama, IL-4 e infiltração maçiça de células inflamatórias).

Diagnóstico e Tratamento

São os mesmo da LTA.

Page 17: Parasitologia - Protozoários

LEISHMANIOSE VISCERAL (LV)

A LV ou calazar é uma doença sistêmica causada por protozoários do gênero

Leishmania, subgênero Leishmania, complexo donovani, que parasitam células do

sistema fagocítico mononuclear do hospedeiro. O complexo donovani engloba três

espécies: L.(L.) donovani, L. (L.) infantum e L (L.) chagasi. A transmissão ocorre através

da picada de flebotomíneos.

Etiologia e Morfologia

Os parasitos intracelulares obrigatórios são as leishmanias do complexo donovani

sendo sua morfologia semelhante a LTA.

Epidemiologia e Transmissão

Os padrões epidemiológicos da LV no mundo variam basicamente de acordo com a

espécie da leishmania e vetores envolvidos na sua transmissão. A LV pode ser dividida

por dois grandes grupos: a LV causada pela L. (L.) infantum e L. (L.) chagasi e a LV

causada pela L. (L.) donovani.

A LV causada pela L. (L.) chagasi é a única com ocorrência nas américas. As outras

duas são comuns na Europa, Ásia e África. A lutzomyia longipalpis é aparentemente a

única espécie vetora com importância epidemiológica envolvida na transmissão da

doença no novo mundo.

O ciclo biológico da L. chagasi é heteroxênico (alterna-se entre um hospedeiro

invertebrado e um vertebrado), envolvendo a fêmea da Lu. Longipalpis como vetora,

possuindo hábitos vespertinos e matutinos.

Patogenia

Com a penetração das formas promastigotas nas células fagocíticas, há a

transformação destas a forma amastigotas e a partir deste ponto, a maioria dos

indivíduos conseguem conte a infecção (infecção inaparente) e estabelecer uma

imunidade duradoura. Outros desenvolvem uma forma oligossintomática da infecção

que também pode se resolver espontaneamente ou evoluir para a doença clássica. O

que determina, em última análise, o curso que a infecção irá tomar é basicamente o tipo

de responta imune que o indivíduo irá tomar: Th1 ou Th2. Essa resposta inflamatória,

por outro lado, irá depender de aspectos ainda não totalmente conhecidos, como fatores

genéticos do hospedeiro, existência de genes promotores do TNF, resposta efetiva das

células NK, etc.

Nos indivíduos em que há progressão da doença (Th2), os macrófagos infectados se

rompem, liberando as formas amastigotas do parasito, que invadem novos macrófagos.

Os macrófagos infectados produzem quimiocinas que irão atrair novos macrófagos, os

quais serão parasitados, criando, dessa forma, um ciclo qu irá aumentar

exponencialmente o número de parasitos.

Page 18: Parasitologia - Protozoários

Outros órgãos ricos em células do sistema monofágico fagocítico que podem ser

parasitados são: linfonodos, mudela óssea, baço e fígado.

Sinais e Sintomas

A infecção causada por L. chagasi apresenta um espectro clínico amplo, que varia dese

formas completamentes assintomáticas, passando por formas clínicas com

sintomatologia discreta ou moderada, até aquelas de apresentação mais grave.

As infecções inaparentes ão sempre assintomáticase, portanto, sem evidência clínica

da doença.

As infecções aparentes variam desde formas clínicas discretas com pouca

sintomatologia, passando por formas clínicas moderadas, até aquelas de apresentação

mais grave que, se não tratadas, evoluem para óbito. Deve-se suspeitar clinicamente

de LV quando o paciente apresentar: febre a mais de duas semanas, espleno e

hepatomegalia, emagreciemento, diarréia, tosse e pancitopenia.

Co-infecção LV e HIV

A LV já foi descrita como infeção oportunista endiversas situações associadas à

alteração da resposta imune do hospedeiro, como, por exemplo, linfomas, LUPUS,

transplantes renais, e mais recentemente, a infecção pelo HIV. Nessas situações, os

sinais e sintomas clássicos da doença enm sempre estão presentes e ainda podem ser

mascarados ou confundidos pela sintomatologia da doença de base.

Diagnóstico:

a) Clínico:

Febre baixa recorrente, envolvimento linfático, esplenomegalia e caquexia, combinados

com histórico de residência em área endêmica.

b) Laboratorial

- Pesquisa do parasito: o parasito pode ser demonstrado com material obtido da punção

da medula óssea, fígado e baço, através de esfregaços corados pelo Giensa.

- Hematológico: anemia discreta (NN), trombocitopenia, leucopenia, VHS (>50mm).

- Métodos imunológicos:

IFI e ELISA

A intradermorreação de Montenegro não tem indicação de uso no diagnóstico

da LV!

Page 19: Parasitologia - Protozoários

TRIPANOSSOMÍASE AMERICANA – DOENÇA DE CHAGAS .

Em 1909, o médico e cientista brasileiro Carlos Ribeiro Justiniano das Chagas, então

pesquisador assistente do Instituto Oswaldo Cruz, mudou-se para a cidade de

Lassance, interior de Minas Gerais, com objetivo de combater a malária que acometia

os trabalhadores envolvidos na construção dos ramais da estrada de ferro central do

Brasil. Neste período, Carlos Chagas utilizou como moradia, laboratório e consultório o

vagão de um trem. Por sua genialidade e curiosidade científica, ele examinava animais

e pessoas, permanecendo em contato direto com as doenças e a fauna daquela região,

de modo que sua dedicação o levou a descobrir um flagelado de mico, o qual denominou

Trypanosoma minasense (exclusivo de micos). Após mais estudos, o pesquisador

identificou outro tripanossoma, diferente do anterior, de cinetoplasto extremamente

denso e movimentação intensa, no tubo digestivo de “chupões” ou “barbeiros”, um inseto

hematófago muito frequente em casas da região e causador de várias moléstias.

Em 1909, Carlos Chagas, diante da descoberta deste último flagelado, enviou amostras

de barbeiros infectados ao laboratório de Oswaldo Cruz, no Rio de Janeiro. Ao infectar

micos, comprovaram a suspeita de Chagas de que este tripanosoma deveria ser uma

espécie nova que circularia entre barbeiros, mamíferos e, talvez, humanos. A partir daí,

Carlos Chagas procurou incessantemente aquele protozoário no sangue de pessoas

residentes em casas infestadas por barbeiros. A esta nova espécie e em homenagem a

Oswaldo Cruz, Chagas a denominou de Trypanosoma cruzi e desta forma descobriu

uma nova doença humana, a tripanossomíase americana ou doença de Chagas.

Foi assim que no dia 14 de abril de 1909, ao examinar o sangue de uma criança febril,

de dois anos de idade, Berenice, que Carlos Chagas identificou o protozoário, antes

encontrado em barbeiros. A mãe de Berenice relatou a Chagas que sua filha havia sido

sugada por um barbeiro e quais sintomas haviam manifestado.

A partir de então, Chagas estudou o parasito, seu ciclo evolutivo no vertebrado e

invertebrado, insetos vetores e seus reservatórios, a clínica inerente a fase aguda da

doença, a patologia, a epidemiologia da doença e a sintomatologia inerente a fase

aguda da doença, o seu primeiro diagnóstico parasitológico (gota espessa) e as formas

de tratamento. Além disso, tornou notável às autoridades a importância médica e social

da doença.

Etiologia e Morfologia

A doença de Chagas, uma zoonose, tem como agente etiológico o protozoário

monoflagelado Trypanosoma cruzi. O parasito possui um ciclo biológico complexo do

tipo heteroxênico e passa por diferentes formas evolutivas no interior do hospedeiro

vertebrado (homem, quatis, mucuras, tatu, morcego, paca, porco-espinho, macacos,

gambá, cães, gato, entre outros) e no hospedeiro invertebrado (insetos vetores):

sendo os gêneros mais importantes o Panstrongylus, Triatoma, e Rhodnius. Na américa

latina, o Triatoma infestans foi o maior responsável pela endemia chagásica.

Page 20: Parasitologia - Protozoários

Esses vetores passam por cinco estágios de ninfas, necessitando de sangue para o seu

desenvolvimento (hematofagismo). O hematofagismo é exercido à noite ou em

ambiente escuro e realizado próximo de onde habitam.

O T. cruzi é um protozoário que no vertebrado encontra-se sob a forma tripomastigota

(circulação) e sob a forma amastigota (interior de células do tecido muscular, sistema

reticulo-endotelial, sistema linfático, entre outros). No transmissor, além dessas duas

formas, pode apresentar-se como epimastigota. A espécie T. cruzi é representada por

um conjunto de populações heterogêneas com diferenças marcantes entre si no tocante

ao seu comportamento biológico e às suas características intrínsecas. É possível que

essa heterogeneidade genética do parasito fosse fator importante, ao lado da resposta

imunológica do hospedeiro, no determinismo da evolução clínica da doença no homem,

semelhante ao que é discutido na leishmania.

Epidemiologia

Existem no Brasil os ciclos de circulação silvestre e doméstico do parasito. O ciclo

silvestre mantém-se através da uma extensa gama de reservatórios em diversos

ecótopos naturais (desertos, palmeirais, matas, caatinga, cerrado, pedregais, pampa,

chaco, pantanal, etc). Nesses ambientes o parasito mantém-se em diversos mamíferos

(reservatórios) e triatomíneos (vetores) harmonicamente, através de seus hábitos

alimentares. É também comum a infecção de reservatórios pelo T. cruzi por via oral,

através da ingestão de insetos ou outros mamíferos contaminados. Os principais

reservatórios nesse ciclo são os tatus, gambás, alguns roedores e morcegos.

O ciclo doméstico decorre da inserção do homem no ambiente silvestre, utilizando

habitações de condições precárias e favorecendo a domiciliação dos triatomíneos.

Neste ciclo, os reservatórios são os homens e pequenos mamíferos domésticos, como

gatos, cães e ratos. A taxa de infecção dos reservatórios neste ciclo diminuiu com as

medidas para redução da domiciliação dos triatomíneos.

A quase totalidade da transmissão ocorre por meio de vetores. No Brasil, os mais

importantes são o Triatoma infestans, Panstrongylus megistus, Triatoma brasiliensis,

Triatoma pseudomaculata e Triatoma sordida. No entanto diversas outras espécies

Page 21: Parasitologia - Protozoários

podem ser encontradas infectadas, mas com menor potencial transmissor para o

homem. A partir de 1980, com a redução da densidade de triatomíneos domiciliados,

através de ações de saúde pública, decresceu de forma importante a ocorrência de

Doença de Chagas, e especialmente da sua forma aguda aparente. A doença ainda é

endêmica em alguns estados onde há a persistência de focos residuais de T. infestans

domiciliado, em especial em regiões da Bahia, Minas Gerais e Rio Grande do Sul, com

ocorrência predominante em ambiente rural com habitações precárias.

Transmissão

A transmissão da doença de Chagas pela via vetorial é considerada o mecanismo de

transmissão de maior relevância epidemiológica, correspondendo a 80% dos casos da

doença.

Transmissão vetorial

No âmbito da via de transmissão vetorial é necessário que ocorra a interação vetor-

hospedeiro, sendo o vetor o principal elo na cadeia dessa modalidade de transmissão.

O T. cruzi desenvolve-se com sucesso nos insetos da família Reduviidae e subfamília

Triatominae. Os triatomíneos, como são conhecidos os insetos vetores, são

considerados os vetores mais importantes da doença. O parasito é transmitido a

mamíferos, incluindo o homem, pelo inseto vetor, que popularmente é conhecido como

“barbeiro” ou “chupão”. Este inseto possui hábitos noturnos e apresenta em sua saliva

propriedade anestésica e anticoagulante, tornando assim indolor sua picada. Durante

ou logo após o hematofagismo o vetor defeca. A importância do momento da evacuação

está no fato dos tripanossomos desenvolverem-se no intestino posterior do triatomíneo

e serem disseminados nos dejetos do inseto. Normalmente, ocorre uma leve ardência

ou coceira no local da picada, assim, quando a pessoa se coça, acaba por propiciar a

penetração do parasito contido nas excreções do barbeiro no organismo, causando a

infecção.

No Brasil a transmissão vetorial foi substancialmente reduzida frente aos avanços

tecnológicos utilizados no controle das atividades de vigilância epidemiológica,

juntamente com estratégias para a identificação da presença do vetor, desencadeando

assim ações de combate ao mesmo.

Transmissão congênita

Outro meio de transmissão da doença de Chagas consideravelmente relevante é a

transmissão congênita (ORGANIZACIÓN PANAMERICANA DE LA SALUD, 2007). A

transmissão vertical da doença de Chagas ocorre principalmente pela via

transplacentária, que pode ocorrer tanto na fase aguda quanto na fase crônica da

doença, podendo ocorrer em qualquer período da gestação, sendo mais provável no

último trimestre. Porém, a transmissão também pode ocorrer no canal do parto, através

do contato de mucosas do feto com o sangue da mãe contaminado por T. cruzi.

Havendo a contaminação, as crianças, normalmente apresentam baixo peso ao nascer.

Nestes casos, o número de natimortos é consideravelmente alto. Sendo considerada

Page 22: Parasitologia - Protozoários

inevitável, cabe então uma possível prevenção secundária, que é diagnosticar

precocemente a infecção nos recém-nascidos filhos de mães chagásicas. Conhecendo

o risco de transmissão em determinadas áreas, recomenda-se introduzir no pré-natal

sorologia própria ao diagnóstico da doença de Chagas. Dessa forma, pode-se iniciar

rapidamente o tratamento dos nascidos comprovadamente infetados.

Transmissão oral

Nos últimos anos casos por transmissão oral tem sido relatado em diversos estados

brasileiros. Por via oral a contaminação ocorre pela ingestão de alimentos contendo

tripanossomos provenientes de triatomíneos ou suas dejeções. A amamentação

também pode ser ressaltada como outro meio de contaminação por via oral. Estudos

comprovaram achados de T. cruzi no leite de mães com infecção chagásica nas fases

aguda e crônica da doença.

Transmissão acidental

Acidentalmente a transmissão pode ocorrer em diversas circunstâncias e na sua maioria

são despercebidos ou não diagnosticados. Um conjunto de elementos como

desconhecimento, desatenção, falta ou mal uso de equipamentos de proteção

individual, instalações e equipamentos inadequados e falta de capacitação, são

considerados fatores de risco para a contaminação pelo T. cruzi. Em laboratórios com

indivíduos que manipulam o parasito no sangue de animais, fezes de triatomíneos,

pessoas contaminadas, ou vetores infectados, a infecção pode ocorrer pelo contato do

parasito com alguma lesão na pele, mucosa oral ou auto-inoculação. Diante destas

situações, faz-se importante ressaltar a necessidade das medidas de biossegurança.

Transmissão transplantar

O transplante de órgãos também é uma maneira de transmissão citada na literatura

científica. Os primeiros relatos de contaminação por esse meio de transmissão datam

do início de 1980 através de um transplante de rim. No que se refere à via transplantar,

essa só ocorre quando não há triagem no processo de transplantes. Ocorrendo a

transmissão, o indivíduo pode desenvolver a fase aguda grave, já que o indivíduo

transplantado, contaminado, apresenta menor resistência à infecção, devido ao

tratamento com imunossupressores.

Transmissão transfusional

A transmissão transfusional da doença de Chagas foi confirmada pela primeira vez no

Brasil em 1952 por Pedreira de Freitas, em São Paulo, relatando dois casos de

pacientes infectados por esta via.

O processo migratório no sentido rural-urbano nas últimas décadas em função da

industrialização do Brasil promoveu o fenômeno de urbanização dos “chagásicos”. Esse

fato foi responsável pela alta prevalência de doadores chagásicos nos bancos de

sangue do país.

Page 23: Parasitologia - Protozoários

Na década de 70 as doações de sangue se concentravam nos grandes centros urbanos

e o aparato tecnológico para coleta de sangue era rudimentar. Nessa época os doadores

eram remunerados e em grande número e não havia controle do sangue transfundido.

Em 1976, o Ministério da Saúde definiu a necessidade de se implantar hemocentros

públicos, baseados na doação voluntária de sangue.

Foi somente na VIII Conferência Nacional de Saúde ocorrida em 1986, que se discutiu

a questão da transmissão da doença de Chagas através da transfusão sanguínea. Em

1988, a nova Constituição brasileira ampliava a cobertura química contra o vetor para

cerca de 2.450 municípios. Além disso, proibiu o doador remunerado, normatizou a

prática da hemoterapia, criou um sistema nacional de sangue e hemoderivados e

instituiu a obrigatoriedade da seleção sorológica dos candidatos à doação. Dessa forma,

essas medidas contribuíram para a diminuição da prevalência da doença em doadores

de sangue.

Mesmo diante destas ações, vários são os fatores que propiciam a persistência do risco

de transmissão transfusional da doença de Chagas. Os principais fatores envolvem:

falhas na triagem clínica e sorológica, a prevalência da doença na região, a forma e

quantidade de produto sanguíneo infectado transfundido, a situação imune do receptor,

o baixo nível de cobertura da sorologia para T. cruzi nos serviços de hemoterapia e o

grau de sensibilidade dos testes para diagnóstico sorológicos utilizados nos possíveis

doadores.

A resolução RDC 57 de 2010, determina a obrigatoriedade de apenas uma única

técnica de alta sensibilidade para a detecção de anticorpo anti-T. cruzi na triagem de

doadores de sangue.

HAI e IFI não são mais utilizados na triagem!!!

Patogenia

Clinicamente a doença de Chagas apresenta duas fases bastante distintas: fase aguda

e fase crônica. A fase aguda apresenta-se sintomática ou assintomática, sendo mais

frequente na primeira infância. Essa fase inicia-se quando o parasito penetra no

vertebrado. A manifestação sintomática inicia de oito a dez dia após a entrada do agente

etiológico na corrente sanguínea do hospedeiro vertebrado. Nesta fase, o indivíduo pode

apresentar sinais de porta de entrada da infecção, como sinal de Romaña e o Chagoma

de inoculação. No sinal de Romaña ocorre um edema indolor na pálpebra inferior e

superior de um dos olhos, simultaneamente ocorre uma coloração palpebral

eritematoso-violácea, congestão conjuntival e linfonodomegalia satélite. O Chagoma de

inoculação consiste em um pequeno nódulo eritematoso que pode surgir em qualquer

região do corpo, no entanto, é mais frequente nas regiões descobertas durante o sono.

As manifestações gerais são: febre, astenia, inapetência e cefaléia. Podem surgir outros

sintomas como linfonodomegalia generalizada e hepatoesplenomegalia, e até

manifestações neurológicas características de meningo-encefalite e manifestações

cardíacas. Os sintomas da fase aguda normalmente desaparecerem de quatro a oito

semanas na maioria dos indivíduos acometidos.

Page 24: Parasitologia - Protozoários

Após o término da fase aguda inicia-se a fase crônica. Esta fase é subdividida em

crônica assintomática (forma indeterminada ou latente) e crônica sintomática. A forma

indeterminada ou latente caracteriza-se por achados clínicos e laboratoriais como:

inexistência de manifestações clínicas (sinais e/ou sintomas da doença) significantes;

eletrocardiograma sem significativas alterações ou coração, esôfago e cólon

radiologicamente normal e sorologia reagente, normalmente, diagnosticado em bancos

de sangue. Aliás, a forma indeterminada ou latente é a mais frequente forma clínica da

tripanossomíase identificada na população das áreas endêmicas e entre doadores de

sangue. Trinta por cento dos pacientes chagásicos que apresentam a forma

indeterminada irão manifestar alguma das formas crônicas da tripanossomíase após um

período de 10 a 20 anos.

Na fase crônica sintomática, certa parcela dos chagásicos, após permanecerem

assintomáticos por vários anos, podem apresentar com o tempo, complicações

relacionadas ao sistema cardiovascular e digestivo. Isso se deve ao fato de mudanças

anatômicas ocorridas no miocárdio e no tubo digestivo. Nesta fase, observa-se

reativação intensa do processo inflamatório.

A forma crônica cardíaca da doença é a mais relevante pela elevada causa de

morbimortalidade pelos diversos danos ocorridos no sistema de condução e pela

falência cardíaca nos casos graves da Doença de Chagas. Há evidências que o

acometimento cardíaco evolui para quadros de miocardiopatia dilatada e insuficiência

cardíaca congestiva. A miocardite é silenciosa e leva a perda progressiva da massa

miocárdica, promovendo certa destruição e como consequência provoca dilatação

cardíaca e/ou disritmia potencialmente fatal. Na miocardiopatia encontra-se infiltrado

mononuclear com regiões de adensamento celular, fibrose, dissociação, fragmentação

e hialinização de fibras cardíacas. Essa forma ocorre em aproximadamente 30% dos

casos crônicos, sendo a principal responsável pela mortalidade dos pacientes

chagásicos.

No Brasil, a forma digestiva ocorre em cerca de 10% dos casos, variando dependendo

da região geográfica estudada. As manifestações digestivas são caracterizadas por

lesões dos plexos intramurais em virtude do parasitismo das células musculares

vizinhas, refletindo na função motora, especialmente do esôfago e do cólon, fazendo

com que a musculatura lisa desses órgãos responda com contrações desordenadas. No

cólon de pacientes chagásicos pode haver dilatações dos cólons (sigmóide e reto),

caracterizando megacolón.

Quando transmitida por transfusão, a doença de Chagas apresenta-se oligo ou

assintomaticamente na maioria dos casos manifestando a fase aguda de modo

excepcional em pacientes imunossuprimidos como portadores de AIDS, transplantados

e pacientes em tratamento com quimioterápicos. Similar à transmissão vetorial, em

indivíduos imunocompetentes a infecção chagásica adquirida pela via transfusional

raramente é desenvolvida e o período de incubação costuma ser mais extenso, podendo

ultrapassar os 100 dias. Quando ocorrem manifestações clínicas, essas são

caracterizadas por febre prolongada, linfadenopatia e hepatoesplenomegalia.

Page 25: Parasitologia - Protozoários

Ciclo Biológico

Diagnóstico

a) Diagnóstico Clínico

Origem do paciente, presença dos sinais de entrada, acompanhados de febre irregular

ou ausente, hepatoesplenomegalia, taquicardia, edema generalizado ou dos pés.

As alterações cardíacas (reveladas pelo eletrocardiograma), do esôfago e do cólon

(reveladas pelo raio X) fazem suspeitar da fase crônica da doença.

b) Diagnóstico Laboratorial

Durante a fase aguda, ocorre alta parasitemia (presença da forma tripomastigota

metacíclica no sangue) e presença de imunoglobulinas específicas anti- T. cruzi da

classe IgM. Neste período, recomenda-se exame parasitológico de sangue: lâmina

corada de gota espessa ou esfregaço, método enriquecido por concentração e a

pesquisa a fresco de tripanossomatídeos e exames sorológicos: hemaglutinação

indireta ou passiva (HAI), imunofluorescência indireta (IFI) e o método imunoenzimático

(ELISA).

Na fase crônica, observa-se baixa parasitemia e altos títulos de imunoglobulinas

específicas. Nesta fase, os exames sorológicos mais indicados são IFI, ELISA, HAI e

fixação do complemento (não utilizada mais pelos laboratórios da rede pública de

Page 26: Parasitologia - Protozoários

saúde). Também podem ser úteis métodos de exames parasitológicos indiretos, como

xenodiagnóstico (não utilizado na rotina laboratorial) e hemocultura.

O método de PCR já foi padronizado e parece constituir recurso laboratorial de grande

valia para o diagnóstico da fase crônica da doença de Chagas, especialmente nos casos

cujo resultado da sorologia tenha sido duvidoso.

Em pacientes ambulatoriais, a pesquisa de T. cruzi é feita através da realização de dois

testes podendo ser HAI, IFI e ELISA. O resultado só sairá como reagente se as duas

metodologias empregadas forem positivas.

Tratamento

A terapêutica da doença de Chagas prossegue parcialmente ineficaz, apesar do real

progresso alcançado nas últimas décadas. Diversas drogas vêm sendo estudadas,

porém, nenhuma consegue eliminar a infecção pelo T. cruzi e promover a cura definitiva

da tripanossomíase, permitem apenas efeitos supressivos. Algumas drogas foram

ensaiadas na terapêutica da doença de Chagas, mas até agora, somente dois

compostos ativos se revelaram favoráveis, sendo eles o nifurtimox (Lampit, também

conhecido como Bayer 2502) e benzonidazol (Rochagan).

O tratamento antitripanosomal da doença de Chagas com os fármacos benzonidazol e

nifurtimox são recomendados para todos os casos agudos. Estes atingem um índice de

cura superior a 80%, quando administrados nesta fase. Na fase crônica estes fármacos

apresentam apenas 8% a 30% de taxa de cura.

No Brasil, o benzonidazol é a única droga atualmente disponível para o tratamento da

tripanossomíase americana. O nifurtimox, existente na América Central, pode ser

utilizado como alternativa em casos não satisfatórios como a intolerância ao

benzonidazol.

MALÁRIA

Etiologia

A malária é uma doença infecciosa cujo agente etiológico é um parasito do gênero

Plasmodium. As espécies associadas à malária humana são: Plasmodium falciparum,

P. vivax P. malariae e P. ovale. No Brasil, nunca foi registrada transmissão autóctone

de P. ovale, que é restrita a determinadas regiões da África. A transmissão natural da

malária ocorre por meio da picada de fêmeas infectadas de mosquitos do gênero

Anopheles, sendo mais importante a espécie Anopheles darlingi, cujos criadouros

preferenciais são coleções de água limpa, quente, sombreada e de baixo fluxo, muito

frequentes na Amazônia brasileira.

Page 27: Parasitologia - Protozoários

Morfologia e Ciclo Biológico

A infecção inicia-se quando os parasitos (esporozoítos) são inoculados na pele pela

picada do vetor, os quais irão invadir as células do fígado, os hepatócitos. Nessas

células multiplicam-se e dão origem a milhares de novos parasitos (merozoítos), que

rompem os hepatócitos e, caindo na circulação sanguínea, vão invadir as hemácias,

dando início à segunda fase do ciclo, chamada de esquizogonia sanguínea. É nessa

fase sanguínea que aparecem os sintomas da malária.

O desenvolvimento do parasito nas células do fígado requer aproximadamente uma

semana para o P. falciparum e P. vivax e cerca de duas semanas para o P. malariae.

Nas infecções por P. vivax e P. ovale, alguns parasitos se desenvolvem rapidamente,

enquanto outros ficam em estado de latência no hepatócito. São, por isso, denominados

hipnozoítos (do grego hipnos, sono). Esses hipnozoítos são responsáveis pelas

recaídas da doença, que ocorrem após períodos variáveis de incubação (geralmente

dentro de seis meses).

Na fase sanguínea do ciclo, os merozoítos formados rompem a hemácia e invadem

outras, dando início a ciclos repetitivos de multiplicação eritrocitária. Os ciclos

eritrocitários repetem-se a cada 48 horas nas infecções por P. vivax e P. falciparum e a

cada 72 horas nas infecções por P. malariae. Depois de algumas gerações de

merozoítos nas hemácias, alguns se diferenciam em formas sexuadas: os

macrogametas (feminino) e microgametas (masculino). Esses gametas no interior das

hemácias (gametócitos) não se dividem e, quando ingeridos pelos insetos vetores, irão

fecundar-se para dar origem ao ciclo sexuado do parasito.

A reprodução sexuada (esporogônica) do parasito da malária ocorre no estômago do

mosquito, após a diferenciação dos gametócitos em gametas e a sua fusão, com

formação do ovo (zigoto). Este se transforma em uma forma móvel (oocineto) que migra

até a parede do intestino médio do inseto, formando o oocisto, no interior do qual se

desenvolverão os esporozoítos. O tempo requerido para que se complete o ciclo

esporogônico nos insetos varia com a espécie de Plasmodium e com a temperatura,

situando-se geralmente em torno de 10 a 12 dias. Os esporozoítos produzidos nos

oocistos são liberados na hemolinfa do inseto e migram até as glândulas salivares, de

onde são transferidos para o sangue do hospedeiro humano durante o repasto

sangüíneo.

Page 28: Parasitologia - Protozoários
Page 29: Parasitologia - Protozoários

Epidemiologia

No Brasil, a Amazônia comporta mais de 99% dos casos, embora existam focos

espalhados, denominados ilhas de transmissão, em geral localizados em pólos de

desenvolvimento ou de extração mineral. Entre meados das décadas de 1950 e 1970,

observou-se no Brasil uma drástica redução na incidência de malária e, particularmente,

na área do território brasileiro com transmissão ativa. Poucos mais de 50.000 casos de

malária foram notificados em 1970, contrastando com os milhões de casos anuais

registrados três décadas antes.

No entanto, a partir da década de 1970 a migração maciça de indivíduos atraídos pelos

projetos de colonização agrícola da Amazônia levou a um acentuado agravamento do

quadro epidemiológico. E meados da década de 1980, ainda que a transmissão da

malária no Brasil continuasse virtualmente restrita à Amazônia, registravam-se 500.000

casos anuais, com equilíbrio entre P. falciparum e P vivax. A situação continuou a se

agravar na virada do século: temos anualmente entre 400.000 e 600.000 casos anuais,

dos quais cerca de 75% devidos a P. vivax.

Transmissão

O período de transmissibilidade natural da malária está ligado à existência de portadores

de gametócitos (reservatórios humanos) e de vetores. Existem centenas de espécies de

anofelinos com potencial de transmitir a malária. No Brasil, cerca de cinco espécies são

importantes: Anopheles (N) darlingi, A. (N) aquasalis, A. (N) albitarsis, A. (K) cruzi e A.

(K) bellator. Costumeiramente, esses insetos evoluem em águas limpas e sombreadas

de remansos de rios, córregos, igarapés, lagoas, represas, açudes, valetas de irrigação,

alagados e pântanos. Por sua vez, a subespécie Kertesia desenvolvesse em águas

acumuladas pelas bromeliáceas, conhecidas no Sul pelo nome de gravatás.

A malária pode ser transmitida acidentalmente por transfusão de sangue (sangue

contaminado com plasmódio), pelo compartilhamento de seringas (em usuários de

drogas ilícitas) ou por acidente com agulhas e/ou lancetas contaminadas. Há, ainda, a

possibilidade de transmissão neonatal.

Patogenia

A gravidade da malária depende da relação entre hospedeiro (vulnerabilidade e estado

imunológico) e o Plasmodium spp (espécie infectante e densidade parasitária). Quanto

ao hospedeiro, os que se encontram mais vulneráveis às formas graves da doença são

os primoinfectados, as gestantes e as crianças pequenas.

A maioria dos casos de malária grave e de óbitos é causada pelo P. falciparum, apesar

de existirem relatos cada vez mais frequentes de infecções graves pelo Plasmodium

vivax. Devido à menor duração do seu ciclo tecidual (P. falciparum e P. vivax: 36 a 48

horas – febre terçã; P malariae: 72 horas – febre quartã), à maior produção de

merozoítas durante as esquizogonias tecidual e eritrocitária e a capacidade de infectar

hemácias de qualquer idade, o P. falciparum tem a potencialidade de produzir hiper-

parasitemias, intimamente relacionada à gravidade da infecção.

Page 30: Parasitologia - Protozoários

Além disso, o P. falciparum é a única espécie que claramente produz alterações na

microcirculação, concorrendo assim para o surgimento de uma doença mais grave. Após

a invasão das hemácias pelo protozoário acontecem, progressivamente, mudanças na

membrana celular, com alteração das propriedades de transporte, exposição de

antígenos de superfície e inserção de proteínas derivadas do microrganismo. As

hemácias infectadas pelo agente apresentam protrusões eletrodensas em sua

superfície, o que facilita a aderência dessas às células endoteliais de vênulas e pós-

capilares e capilares de diversos órgãos, como cérebro, pulmões e rins, além da

presença de adesinas do Plasmodium – como os knobs –, propiciando a maior

gravidade da doença, através do fenômeno conhecido por citoaderência.

Somando-se à citoaderência, existe também o processo de produção de “rosetas”, no

qual as células infectadas aderem a células não-infectadas, havendo, portanto, o efeito

sinérgico dos dois fenômenos na patogênese da malária grave, com formação de

agregados celulares que interferem na microcirculação. Ademais, na malária grave, as

hemácias infectadas e as não-infectadas tornam-se rígidas, o que promove um im-

pedimento adicional ao fluxo sanguíneo.

As altas parasitemias provocadas pelo P. falciparum (maiores ou iguais a 5% de

hemácias infectadas) são relacionadas com apresentações mais graves de malária,

tanto pelo maior acometimento da microcirculação, quanto pela presença de efeitos

metabólicos deletérios, como a hipoglicemia e a acidose lática. Por se tratar de uma

síndrome de resposta inflamatória sistêmica (SIRS) de origem infecciosa, pode-se

considerar a malária grave um quadro de sepse pelo Plasmodium, com possível

evolução para disfunção múltipla de órgãos e sistemas (DMOS), sendo uma das mais

importantes causas de morte em unidades de terapia intensiva em diversas regiões do

mundo.

A malária pelo P. vivax também pode se comportar como uma sepse grave com

evolução para DMOS. A importância clínica deste agente tem sido atribuída à

disseminação da resistência à cloroquina e ao sulfametoxazol-trimetoprima, o que

implica no aumento da morbidade e mortalidade da infecção.

Manifestações e complicações da malária graves: malária cerebral, convulsões

generalizadas, anemia grave, hipoglicemia, IRA, edema pulmonar, acidose metabólica,

alterações na hemostasia, hipertemia, disfunção hepática e ruptura esplênica.

Manifestações clínicas

Os sintomas da malária envolvem a clássica tríade febre, calafrio e dor de cabeça.

Sintomas gerais – como mal-estar, dor muscular, sudorese, náusea e tontura – podem

preceder ou acompanhar a tríade sintomática. Contudo, esse quadro clássico pode ser

alterado pelo uso de drogas profiláticas ou aquisição de imunidade, e muitos desses

sintomas podem ou não estar presentes e até mesmo todos podem estar ausentes. Nos

casos complicados, podem ainda ocorrer dor abdominal forte, sonolência e redução da

consciência – podendo levar ao coma nos casos de malária cerebral.

Page 31: Parasitologia - Protozoários

Diagnóstico

a) Diagnóstico Cínico

A atual estratégia preconizada pelo Ministério da Saúde consiste no diagnóstico precoce

e no tratamento oportuno e adequado dos casos. De fato, recentes estudos apontam o

atraso no diagnóstico como fator de agravamento dos casos de malária, principalmente

a causada por P. falciparum.

A possibilidade de malária deve ser cogitada em todo indivíduo que apresente quadro

febril a esclarecer e história de deslocamento para regiões endêmicas ou entrada em

região de Mata Atlântica. Além de pensar nas viagens em associação ao quadro de

malária por transmissão natural – ou seja, pela picada do mosquito Anopheles spp. –,

deve-se também suspeitar da possibilidade em casos de febre e hemotransfusão,

transplante de órgãos ou acidentes com material perfurocortante.

Deve-se destacar que o intensivista poderá ser chamado para avaliar um quadro febril

não esclarecido, devendo, por conseguinte, formular a hipótese de malária e investigá-

la, diferenciando-a de outras infecções, tais como meningite, febre tifóide, sepse,

influenza, dengue, hepatites, leptospirose e encefalite viral.

b) Diagnóstico Laboratorial

O diagnóstico da doença é realizado pela visualização microscópica do Plasmodium em

exame da gota espessa de sangue, corada pela técnica de Giemsa ou de Walker, e em

distensão sanguínea, que permite a identificação da espécie, mas apresenta menor

sensibilidade. Apesar da microscopia ser considerada o padrão-ouro para o diagnóstico

e o monitoramento do tratamento da malária, essa técnica exige pessoal treinado e

experiente no exame de distensões sanguíneas. Desta forma, os exames preconizados

pelo Ministério da Saúde são:

Gota espessa, considerado o exame padrão-ouro para diagnóstico da malária.

Permite a contagem da parasitemia – fator preditor de gravidade na infecção por

P. falciparum – além de permitir o acompanhamento da queda da mesma, após

o início da terapêutica.

Distensão sanguínea, a qual permite a identificação da morfologia do

protozoário, e consequente diferenciação da espécie infectante – que é

importante para a adequação do tratamento.

Tratamento

Cuidados gerais

A malária grave – ou seja, a malária por P. falciparum fora de área endêmica –, é uma

emergência médica, destacando-se que neste caso, pela gravidade da apresentação

Page 32: Parasitologia - Protozoários

clínica, os pacientes devem ser internados na UTI. Na admissão, a permeabilidade das

vias aéreas deve ser garantida e os parâmetros respiratórios e cardiovasculares avalia-

dos. O peso do paciente deve ser aferido para o cálculo das doses dos medicamentos.

Um acesso venoso adequado deve ser obtido, além da coleta de sangue para realização

de exames laboratoriais – como glicemia, hemograma, contagem da parasitemia,

gasometria arterial e parâmetros de função renal e hepática. Balanço hidroeletrolítico

rigoroso deve ser realizado. O exame neurológico deve ser minucioso, com especial

atenção para o estado de consciência avaliado através da escala de coma de Glasgow.

Terapêutica etiológica

Um aspecto essencial do tratamento da malária grave é o controle da parasitemia, já

que esta funciona como fator determinante da gravidade; desta feita, utilizam-se priori-

tariamente os esquizonticidas eritrocitários de ação rápida – p. ex., os derivados da

artemisinina –, lembrando-se que não devem ser administrados fármacos como a

mefloquina, a cloroquina e o halofantrine, disponíveis apenas por via oral, uma vez que

a terapia medicamentosa deve ser administrada por via intravenosa, para obtenção de

níveis séricos com maior rapidez.

TRICONOMOSE – Trichomonas vaginalis

O tricomonas é membro da família Trichomonadidae, da subfamília Trichomonadinae,

da ordem Trichomonadida, da classe Zoomastigophorea e do filo Sarcomastigophora.

As quatro espécies encontradas no homem são Trichomonas vaginalis, Trichomonas

tenax, Pentatrichomonas hominis e Trichomitus fecalis.

A espécie T. vaginalis foi descrita, pela primeira vez, em 1836, por Donné, que a isolou

de uma paciente com vaginite. Em 1894, observaram esse flagelado em uretrite

masculina. O T. tenax é um comensal, vive na cavidade bucal humana e também de

chipanzés e macacos. O P. hominis, também comensal, habita o trato intestinal humano.

O Trichomitus fecalis só foi encontrado em um único paciente e não existe certeza se o

homem seria o seu hospedeiro primário.

Etiologia e Morfologia

Das três espécies que parasitam o organismo humano, T. vaginalis destaca-se por ter

as maiores dimensões, variando de 10 a 30 μm de comprimento por 5 a 12 μm de

largura. É geralmente maior do que as células brancas do sangue, porém menor do que

uma célula epitelial. Os tricomonas menores aparecem nos cultivos e nas fases agudas

da inflamação, pois, nesses momentos, eles se multiplicam rapidamente (divisão binária

longitudinal).

T. vaginalis é uma célula tipicamente elipsóide, piriforme ou oval em preparações

fixadas e coradas. A forma tende a se tornar mais uniforme entre os flagelados que

Page 33: Parasitologia - Protozoários

crescem nos meios de cultura do que entre aqueles observados na secreção vaginal e

na urina. As condições físico-químicas (por exemplo: pH, temperatura, tensão de

oxigênio e força iônica) afetam o aspecto dos organismos, que não possuem a forma

cística, somente a trofozoíta.

Os tricomonas possuem quatro flagelos anteriores, desiguais em tamanho, e uma

membrana ondulante que se adere ao corpo pela costa. Sob condições de crescimento

não favoráveis, pode se arredondar e interiorizar os flagelos. Alguns acreditam que

essas formas sejam pseudocistos, mas é mais provável que sejam formas degeneradas

do parasita.

T. vaginalis é um organismo anaeróbio facultativo. Cresce perfeitamente bem na

ausência de oxigênio e em temperaturas entre 20ºC e 40ºC. Como fonte de energia, o

flagelado utiliza a glicose, a maltose e a galactose. Os hidrogenossomos são portadores

de uma enzima piruvato, a ferroxina oxidorredutase, capaz de transformar o piruvato em

acetato pela oxidação fermentativa e liberar adenosina 5’-trifosfato (ATP) e hidrogênio

molecular. O parasita é capaz de manter o glicogênio em reserva como forma de

energia. Isso é muito importante no ambiente vaginal, que é constantemente modificado

por variações de pH, hormônios, menstruação e fornecimento de nutrientes. Os

carboidratos são a principal fonte de nutrientes para o T. vaginalis.

Habitat

O parasita apresenta alta especifi cidade de localização, sendo capaz de produzir

infecção somente no sistema urogenital humano (do homem e da mulher), e não se

instala na cavidade bucal ou no intestino. É comumente encontrado em órgãos genitais

inferiores das mulheres e em próstata e uretra nos homens.

O canal vaginal normal é notavelmente resistente às infecções e, para alguns autores,

a implantação do T. vaginalis estaria associada a modificações do ambiente vaginal.

Dentre as alterações que favorecem o desenvolvimento do flagelado, estariam:

modificações da flora bacteriana normal, diminuição da acidez local e acentuada

descamação epitelial. O parasita pode ser encontrado em mulheres com pH vaginal

entre 4,0 e 8,0, porém incide com maior frequência em faixa de pH de 6,0 a 6,5.

Page 34: Parasitologia - Protozoários

Epidemiologia

A tricomonose é a DST não-viral mais comum no mundo, com 250 milhões de casos

novos ocorrendo a cada ano. A incidência da infecção depende de vários fatores,

incluindo idade, atividade sexual, número de parceiros, outras DSTs, fase do ciclo

menstrual, técnicas de diagnóstico e condições socioeconômicas.

O T. vaginalis, não tendo a forma cística, é susceptível à dessecação e às altas

temperaturas, mas pode viver, surpreendentemente, fora de seu habitat por algumas

horas sob altas condições de umidade. O T. vaginalis pode viver durante três horas na

urina coletada e seis horas no sêmen ejaculado.

A taxa de prevalência da infecção em homens é pouco conhecida, mas é provável que

seja 50% a 60% menor que em mulheres. Uma correlação positiva existe entre a

presença desse parasito no trato urogenital masculino e infertilidade; em torno de 10%

de homens estéreis são infectados por T. vaginalis.

Transmissão

T. vaginalis é transmitido por meio da relação sexual e pode sobreviver por mais de uma

semana sob o prepúcio do homem sadio após o coito com mulher infectada. O homem

é o vetor da doença, sendo que, com a ejaculação, os tricomonas presentes na mucosa

da uretra são levados à vagina pelo esperma. Apesar disso, transmissão não sexual

teoricamente pode ocorrer em casos de duchas contaminadas, espéculos ou assento

de vasos sanitários.

Na recém-nascida, a tricomoníase pode ocorrer durante a passagem pelo canal do

parto, em consequência da infecção materna, quando a mãe não tomou medidas

profiláticas contra a parasitose durante a gestação ou, quando ainda não iniciou o

tratamento por não apresentar sintomas. Aproximadamente 5,0% das neonatas podem

adquirir a infecção verticalmente de suas mães infectadas. Na ocasião do parto, o

epitélio escamoso da vagina da recém-nascida sofre ação de estrógenos maternos e

pode permitir a colonização do parasita. Entretanto esse efeito hormonal desaparece

em poucas semanas após o parto, tornando o trato genital relativamente resistente à

invasão do T. vaginalis. Dessa forma, bebês teriam condições de eliminar

espontaneamente o parasita.

Patogenia

As respostas imunes celular e humoral são evidentes em pacientes com tricomoníase.

Embora não seja encontrado em todos os pacientes, o aumento no número de

leucócitos resulta em formação de pseudópodes, em internalização e em degradação

das células imunes nos vacúolos fagocitários do parasita. A reinfecção pode ocorrer,

pois não há desenvolvimento de imunidade duradoura após a infestação aguda.

T. vaginalis pode ter um papel crítico na amplificação da transmissão do HIV, por ser

um importante co-fator na propagação do vírus, causando grande impacto sobre a

epidemia de HIV. O risco de transmissão de HIV aumenta na presença de doença

Page 35: Parasitologia - Protozoários

ulcerativa genital e de doença não-ulcerativa como a tricomoníase. Muitos pacientes

são assintomáticos e, mantendo-se sexualmente ativos, propagam ainda mais a

infecção.

Dois mecanismos que podem contribuir com associação epidemiológica entre

tricomoníase e transmissão sexual por HIV-1 foram identificados recentemente e são:

T. vaginalis rompe as monocamadas epiteliais urogenitais, podendo facilitar a passagem

do HIV-1 para camadas adjacentes; ativação das células imunes locais pelo parasita na

presença de infecções com HIV-1, podendo levar ao aumento da replicação viral. Essas

descobertas sugerem que o diagnóstico e o tratamento da tricomoníase podem reduzir

significativamente a transmissão do HIV.

Patogenicidade na mulher

A infestação feminina por T. vaginalis parece estar associada a uma diminuição da

acidez vaginal e dos lactobacilos produtores de ácido. Até a puberdade, o epitélio

vaginal (pluriestratificado escamoso não queratinizado) é fino, constituído apenas por

células escamosas parabasais, pois não existem níveis de estrógeno e progesterona

para a proliferação e maturação desse epitélio. Tais células não contém quantidades

apreciáveis de glicogênio, e a secreção vaginal é escassa e quase neutra, com flora

bacteriana variada. A partir da puberdade, elevam-se os níveis de estrógeno e

progesterona, que levam à proliferação e maturação celular respectivamente. O epitélio

escamoso passa a ser constituído de células escamosas superficiais e intermediárias

em casos normais, sendo que as intermediárias contêm grande quantidade de

glicogênio. Com isso, a flora bacteriana passa a ser constituída de lactobacilos, que se

nutrem do glicogênio das células escamosas intermediárias, produzindo quantidades

elevadas de ácido lático. Por essa razão, o pH vaginal e cervical passa a ser de 3,8 a

4,5. Esse pH ácido torna a vagina menos susceptível a infecções. O aumento do pH

vaginal e cervical logo, antes e durante o período menstrual favorece a infecção pelo

parasita. A flora bacteriana predominante em casos de tricomoníase é mista,

normalmente com ausência de lactobacilos, e a acidez vaginal é diminuída.

Mulheres com vaginite, aguda causada por T. Vaginalis, freqüentemente têm corrimento

devido à infiltração por leucócitos. A consistência do corrimento varia de acordo com a

paciente, de fino e escasso a espesso e abundante. O sintoma clássico de corrimento

amarelo, abundante, espumoso e mucopurulento ocorre em somente 20% dos casos.

Há também odor vaginal anormal e prurido vulvar. A vagina e a cérvice podem

apresentar-se edematosas e eritematosas, com erosão e pontos hemorrágicos na

parede cervical, conhecidos como colpitis macularis ou cérvice com aspecto de

morango. Embora essa aparência seja altamente específica para tricomoníase, é vista

somente em poucas mulheres. Dor abdominal tem sido relatada entre muitas mulheres

com tricomoníase e pode ser indicativa de infecção do trato urogenital superior. Na

infecção crônica, os sintomas são leves, com secreção vaginal escassa.

Essa forma é particularmente importante do ponto de vista epidemiológico, pois são a

maior fonte de transmissão do parasita.

Recentes publicações indicam que o impacto da tricomoníase não é limitado a vaginites,

uma vez que micoplasmas e Neisseria gonorrhoeae são fagocitados por T. vaginalis, e

Page 36: Parasitologia - Protozoários

também segmentos de RNA viral têm sido encontrados em certas linhagens do parasita.

É possível, então, que o protozoário possa atuar também como vetor para outros

patógenos.

O risco de infertilidade é quase duas vezes maior em mulheres com história de

tricomoníase, em comparação com as que nunca tiveram tal infecção. Mulheres com

mais de um episódio de infecção têm maior risco de infertilidade do que aquelas que

tiveram um único episódio. Para mulheres com o primeiro episódio antes dos 21 anos,

esse risco é duas vezes maior do que para aquelas com o primeiro episódio depois dos

21 anos.

Patogenicidade no homem

Diferentemente da mulher, homens infectados pelo contato com parceira sexual

infectada, por razão desconhecida, comumente têm somente infecção autolimitada. A

tricomoníase, em homens, pode ser classificada em três grupos: estado assintomático;

estado agudo, caracterizado por uretrite purulenta abundante; e doença assintomática

leve, clinicamente indistinguível de outras causas de uretrites. Os homens são mais

frequentemente considerados como carreadores assintomáticos, os quais se

apresentam como vetores e reservatórios, sendo os carreadores crônicos do T. vaginalis

em sua uretra.

As seguintes complicações são atribuídas a esse microrganismo: prostatite,

balanopostite, cistite e epididimite. Esse protozoário pode se localizar ainda na bexiga,

nas vesículas seminais e nos testículos. Pela manhã, antes da passagem da urina, pode

ser observado um corrimento claro, viscoso e pouco abundante, com desconforto ao

urinar (ardência miccional) e, por vezes, hiperemia do meato uretral. Durante o dia, a

secreção é escassa.

Diagnóstico

a) Diagnóstico Clínico: o diagnóstico diferencial da tricomoníase, tanto no homem

como na mulher é difícil, sendo essencial o diagnóstico parasitológico.

b) Diagnóstico Laboratorial

Parasitológico:

Coleta da amostra:

No homem: os pacientes devem comparecer no local pela manhã, sem terem urinado

no dia e sem terem tomado nenhum medicamento tricomonicida há mais de 15 dias. O

material uretral é colhido com uma alça de platina ou com swab de algodão não

absorvente ou de poliéster. O organismo é mais encontrado no sêmen que na urina ou

em esfregaços uretrais. Uma amostra fresca poderá ser obtida pela masturbação em

um recipiente limpo e estéril. Também pode deve ser observado o sedimento

centrifugado dos primeiros 20 ml de urina matinal.

Na mulher: a vagina é o local mais facilmente infectado, e os tricomonas são mais

abundantes durante os primeiros dias após a menstruação. O material é normalmente

Page 37: Parasitologia - Protozoários

coletado na vagina com um swab de algodão não absorvente ou de poliéster. O

diagnóstico é feito através da observação do material coletado a fresco no microscópio

ou em cultura de parasitos ou por esfregaço colpocitológico.

Características gerais do esfregaço colpocitológico

As cervicocolpites por tricomoníase apresentam variados graus de intensidade. Existem

pacientes com tricomoníase sem reação inflamatória e com respectivos esfregaços

citológicos sem alterações celulares, sem presença de infiltrado leucocitário e com fundo

limpo. Porém o exame de amostras vaginal e cervical pode revelar alterações

citomorfológicas induzidas pelos tricomonas. Nesse caso, o esfregaço é tipicamente rico

em elementos polimorfonucleares, e há grande número de células epiteliais

inflamatórias isoladas. O esfregaço apresenta-se sujo devido à abundância de

leucócitos, histiócitos e detritos celulares produzidos pela lise citoplasmática das células

escamosas. Observa-se marcante citólise, além de muco característico de aspecto

granuloso.

Alterações citoplasmáticas

Como sinais mais específicos, aparece quase constantemente uma falsa eosinofilia

(pseudoeosinofilia) e também anfofilia, que parecem ser produzidas por uma oxidação

dependente do metabolismo do parasita ou por esse provocar um fenômeno de

queratinização patológica da mucosa vaginal, que afeta também as células

intermediárias e parabasais. Observam-se halos perinucleares, sendo que esses são

decorrentes de alterações da membrana nuclear e citoplasmática em células mortas ou

maceradas por agressões mecânicas e são patognomônicos da tricomoníase. Ocorre

também vacuolização citoplasmática.

A reação inflamatória celular pronunciada, binucleações, falsa eosinofilia, halo

perinuclear, anfofilia, discreta cariomegalia e hipercromasia, às vezes, podem

assemelhar-se a uma lesão pré-cancerosa ou mesmo ao carcinoma “in situ” e

representam, em conjunto, os chamados sinais citológicos indiretos da tricomoníase.

Após cura clínica da tricomoníase, em várias oportunidades, observam-se verdadeiros

“desaparecimentos” de displasias e neoplasias “in situ”.

Flora bacteriana associada

T. vaginalis está frequentemente associado com flora bacteriana anaeróbia, sendo este

o motivo da positividade ao teste do KOH e do aspecto bolhoso do corrimento. Foi

descrita alta frequência de Gardnerella vaginalis e outros microrganismos anaeróbios

associados com tricomonas. Observa-se também coexistência de tricomonas com

Leptothrix vaginalis, que são microrganismos anaeróbios, filamentosos, não

ramificados, muito longos e gram negativo. Esses lembram lactobacilos bastante

longos, sendo classificados como Trichobactérias, e são saprófitas vaginais. A

infestação feminina pelo parasita está normalmente acompanhada de flora bacteriana

predominantemente mista, normalmente com diminuição ou ausência de lactobacilos

produtores de ácido. Porém o parasita pode também sobreviver em vaginas com flora

normal de lactobacilos e exsudatos ácidos.

Page 38: Parasitologia - Protozoários

Tratamento

Eficiente, realizado com nitrimidazóis, mais comumente com metronidazol.

GIARDÍASE

O gênero Giardia inclui parasitos do intestino delgado de mamíferos, aves, répteis e

anfíbios, tendo sido, possivelmente, o primeiro protozoário intestinal humano a ser

conhecido. Giardia e giardíase têm sido muito estudadas e, apesar dos esforços, várias

questões fundamentais ainda continuam sem respostas. A própria taxonomia ainda é

controversa, e a determinação das espécies de Giardia têm sido feita considerando-se

o hospedeiro de origem e características morfológicas. As denominações Giardia

lamblia, Giardia duodenalis e Giardia intestinalis, têm sido empregadas com sinonímia,

particularmente para isolados de origem humana.

A espécie G. lamblia tem sido muito estudada em cultivo axêmico e é reconhecida,

atualmente, como um dos principais parasitos humanos, principalmente, nos países em

desenvolvimento. Nessas áreas, a giardíase é uma das causas mais comuns de diarreia

em crianças, que em consequência da infecção, muitas vezes, apresentam problemas

de á nutrição e retardo no desenvolvimento.

Etiologia e Morfologia

A primeira descrição do trofozoíto tem sido atribuída a van Leeuwenhoek, porém foi

Lambl, em 1859, quem o descreveu com mais detalhes. O gênero Giardia foi criado por

Kunstler, em 1882, ao observar um flagelado presente no intestino de girinos de anfíbios

anuros.

A classificação proposta por Filice, em 1952, tem sido a mais aceita, e, de acorda com

esse sistema, o gênero Giardia é dividido em três espécies: 1- Giardia duodenalis o qual

infecta vários mamíferos, aves e répteis; 2- Giardia muris o qual infecta roedores, aves

e répteis e 3- Giardia agilis o qual infecta anfíbios. Além dessas, duas espécies

encontradas em aves foram propostas: Giardia psittaci e Giardia ardeae descritas em

periquitos e garças azuis, respectivamente.

Giardia apresenta duas formas evolutivas: o trofozoíto e o cisto. O trofozoíto tem

formato de pêra, com simetria bilateral e mede 20μm de comprimento por 10μm de

largura. A face dorsal é lisa e convexa, enquanto a face ventral é côncova, apresentando

uma estrutura semelhante a uma ventosa, que é conhecida por várias denominações:

disco ventral, adesivo ou suctorial. Esta estrutura tem sido considerada uma importante

estrutura para a adesão do parasito à mucosa. Abaixo do disco, ainda na parte ventral,

é observada a presença de uma ou duas formações paralelas, em forma de vírgula,

conhecidas como corpos medianos. No interior do trofozoíto, e localizados na sua parte

frontal, são encontrados dois núcleos. O trofozoíto possui ainda quatro pares de flagelos

Page 39: Parasitologia - Protozoários

que se originam de blefaroplastos ou corpos basais situados nos pólos anteriores dos

dois núcleos: um par de flagelos anteriores, um par de flagelos ventrais, um par de

flagelos posteriores e um par de flagelos caudais. O cisto é oval ou elipsóide, medindo

cerca de 12μm de comprimento por 8μm de largura. O cisto, quando corado, pode

mostrar uma delicada membrana destacada do citoplasma. No seu interior encontram-

se dois ou quatro núcleos, um número variável de fibrilas (axonemas de flagelos) e os

corpos escuros com forma de meia-lua e situados no pólo oposto aos núcleos. Estes

últimos, geralmente, são confundidos pelos autores com os corpos medianos. Várias

organelas estão presentes no trofozoíto da Giardia.

São elas microtúbulos e proteínas contráteis, vacúolos, retículo endoplasmático,

ribossomas, aparelho de Golgi e vacúolos de glicogênio. Não se observa, entretanto,

mitocôndria. No cisto, todas as estruturas descritas são vistas, embora de forma

desorganizada.

Epidemiologia

A giardíase é encontrada no mundo todo, principalmente entre crianças de oito meses

a 10-12 anos. Altas prevalências são encontradas em regiões tropicais e subtropicais e

entre pessoas de baixo nível econômico. No nosso país a prevalência é de 4% a 30%.

Alguns aspectos atuais devem ser considerados na epidemiologia dessa parasitose:

Esta infecção é frequentemente adquirida pela ingestão de cisto na água proveniente

de rede pública, com defeitos no sistema de tratamento; Giardia tem sido reconhecido

como um dos agentes etiológicos da "diarreia dos viajantes" que viajam para zonas

endêmicas; as crianças defecando no chão (dentro e fora das habitações), aí brincando

e levando a mão a boca se infectam com facilidade; a giardíase é uma infecção

frequentemente encontrada em ambientes coletivos: enfermarias, creches, internatos

etc., onde o contato direto de pessoa a pessoa é frequente e medidas de higiene difíceis

de serem implementados; babás e manipuladores de alimentos crus (saladas,

maioneses etc.) podem ser fonte de infecção.

Transmissão

Page 40: Parasitologia - Protozoários

A via oral de infecção do homem é a ingestão de cistos maduros, que podem ser

transmitidos por um dos seguintes mecanismos: ingestão de águas superficiais sem

tratamento ou deficientemente tratadas (apenas cloro); alimentos contaminados

(verduras cruas e frutas mal lavadas); esses alimentos também podem ser

contaminados por cistos veiculados por moscas e baratas; de pessoa a pessoa, por

meio de mãos contaminadas, em locais de aglomeração humana (creches, orfanatos);

através de contatos homossexuais e por contato com animais domésticos infectados

com Giardia de morfologia semelhante à humana.

Patogenia

Não se sabe exatamente os mecanismos pelos quais a Giardia causa diarreia e má

absorção intestinal. Quando se examinam biópsias intestinais de indivíduos infectados,

observa-se que podem ocorrer mudanças na arquitetura da mucosa. Ela pode se

apresentar normal ou com atrofia parcial ou total das vilosidades. Mesmo que a mucosa

se apresente morfologicamente normal, tem-se detectado lesões nas microvilosidades

das células intestinais. Observa-se que os trofozoítos de Giardia aderidos ao epitélio

intestinal podem romper ou distorcer as microvilosidades do lado que o disco adesivo

entra em contato com a membrana da célula. Além disso, o parasita contém várias

proteases capazes de romper a integridade da membrana. Entretanto, a explicação mais

plausível para a alteração morfológica e funcional do epitélio intestinal é dada pelos

processos inflamatórios aí desencadeados pelo parasito, devido à reação imune do

hospedeiro. Tal processo inflamatório leva a um aumento da motilidade do intestino, o

de células imaturas levando a problemas de má absorção e, consequentemente, à

diarreia.

Outros fatores também parecem estar associados ao aparecimento da diarreia e má

absorção em alguns indivíduos, como, por exemplo, o atapetamento da mucosa por um

grande que poderia explicar o aumento da renovação dos enterócitos. As vilosidades

ficam assim repletas número de trofozoítos impedindo a absorção de alimentos e a

produção de prostaglandinas pelos mastócitos, que agem diretamente sobre a

motilidade intestinal, provocando o aparecimento da diarreia.

Ciclo biológico

G. lamblia é um parasito monoxeno de ciclo biológico direto. A via normal de infecção

do homem é a ingestão de cistos. Em voluntários humanos, verificou-se que um

pequeno número de cistos (10 a 100) é suficiente para produzir a infecção. Após a

ingestão do cisto, o desencistamento é iniciado no meio ácido do estômago e

completado no duodeno e jejuno, onde ocorre a colonização do intestino delgado pelos

trofozoítos. Os trofozoítos se multiplicam por divisão binária longitudinal. O ciclo se

completa pelo encistamento do parasito e sua eliminação para o meio exterior. Tal

processo pode se iniciar no baixo íleo, mas o ceco é considerado o principal sítio de

encistamento. Provavelmente, o encistamento é estimulado pelo pH intestinal, o

estímulo de sais biliares e o destacamento do trofozoíto da mucosa. Acredita-se que tal

destacamento da mucosa seja estimulado pela resposta imune local, o que culminaria

com o encistamento do trofozoíto. Ao redor do trofozoíto é secretada pelo parasita uma

membrana cística resistente, que tem quitina na sua composição. Dentro do cisto ocorre

Page 41: Parasitologia - Protozoários

a nucleotomia, podendo ele apresentar-se então com quatro núcleos. Os cistos são

resistentes e, em condições favoráveis de temperatura e umidade, podem sobreviver,

pelo menos, dois meses no meio ambiente. Quando o trânsito intestinal está acelerado,

é possível encontrar trofozoítos nas fezes.

Imunidade

Apesar de uma imunidade protetora ainda não ter sido demonstrada de forma conclusiva

nas infecções humanas por Giardia, o desenvolvimento de resposta imune tem sido

sugerido a partir de evidências, como: a natureza autolimitante da infecção; a detecção

de anticorpos específicos anti-Giardia nos soros dos indivíduos infectados; a

participação de monócitos citotóxicos na modulação da resposta imune; a maior

suscetibilidade de indivíduos imunocomprometidos à infecção; a menor suscetibilidade

dos indivíduos de áreas endêmicas à infecção, quando comparados com os visitantes.

Anticorpos IgG, IgM e IgA anti-Giardia têm sido detectados no soro de indivíduos com

giardíase, em diferentes regiões do mundo. Estudos têm relacionado a participação de

IgA secretória na imunidade local a nível de mucosa intestinal. Evidências sugerem que

este anticorpo diminua a capacidade de adesão dos trofozoítos à superfície das células

do epitélio intestinal. O aumento da frequência de giardíase em indivíduos com

alterações na imunidade humoral, particularmente nas deficiências de IgA e IgG, sugere

que estas imunoglobulinas participem da eliminação de Giardia.

Page 42: Parasitologia - Protozoários

Algumas observações em experimentos com modelos animais sugerem a participação

de mecanismos T-dependentes. Além disso, tem-se observado a capacidade de

monócitos, macrófagos e granulócitos em participar da destruição de trofozoítos, em

reações de citotoxidade anticorpo-dependente.

Diagnóstico

a) Diagnóstico Clínico:

Baseia-se na observações dos sintomas característicos da doença. Em crianças de oito

meses a 10-12 anos, a sintomatologia mas indicativa de giardíase é diarreia com

esteatorréia, irritabilidade, insônia, náuseas e vômitos, perda de apetite (acompanhada

ou não de emagrecimento) e dor abdominal.

b) Diagnóstico Laboratorial

Parasitológico: Para confirmar as suspeitas clínicas, deve-se fazer o exame de

fezes nos pacientes para a identificação de cistos ou trofozoítos nas fezes. Os

cistos são encontrados nas fezes da maioria dos indivíduos com giardíase,

enquanto o encontro dos trofozoítos é menos freqüênte, e está, geralmente,

associado às infecções sintomáticas. Em fezes formadas, há o predomínio de

cistos, que podem ser detectados em preparações à fresco pelo método direto,

corados com Hematoxilina Férrica. Em fezes diarréicas, há o predomínio de

trofozoitos, e o recomendado é colher o material no laboratório e examiná-lo

imediatamente, ou diluir as fezes em conservador, uma vez que os trofozoitos

sobrevivem durante pouco tempo no meio externo (15 a 20 min). O exame pode

ser feito pelo método direto e, caso seja necessário, podem ser feitos esfregaços

corados pelo método da Hematoxilina Férrica.

Imunológico: os métodos mais empregados são a imunofluorescência e o

método ELISA. A detecção de antígenos nas fezes (copro-antígenos)

empregando a técnica ELISA tem demonstrado resultados satisfatórios.

Tratamento

Até recentemente, o tratamento da giardíase era feito com sucesso empregando-se a

furazolidona (Giarlam); entretanto, em vista da resistência ao medicamento, novos

produtos têm sido indicados. Entre esses, temos: metronidazol (Flagil), tinidazol

(Fasigyn), omidazol (Tiberal) e secnidazol (Secnidazol). Recentemente, alguns anti-

helmínticos, do grupo dos benzimidazóis (mebendazol e albendazol), têm sido

empregados no tratamento da giardíase. Quando o parasito apresenta resistência à

terapêutica, isto é, quando após o uso de determinado medicamento há remissão parcial

dos sintomas e apenas redução do número de cistos, recomenda-se dar um intervalo

de cinco a dez dias para eliminação do primeiro medicamento e completar a terapêutica

com outro princípio ativo.

Page 43: Parasitologia - Protozoários

AMEBÍASE

A amebíase é definida como infecção sintomática ou assintomática causada pelo

protozoário intestinal Entamoeba histolytica. Este parasito vive na luz do intestino grosso

do hospedeiro, mas ocasionalmente pode penetrar a submucosa e, pela circulação

portal, pode alcançar o fígado e outros órgãos.

Segundo estimativas da OMS, 50 milhões de novos casos e 100 mil óbitos são

registrados anualmente. Contudo, as maiores prevalências são observadas em áreas

onde as condições sanitárias e socioeconômicas da população são precárias. Entre as

infecções parasitárias causadas por protozoários, a amebíase é a segunda principal

causa de óbitos, perdendo apenas para a malária.

Podem ser encontradas em algumas cavidades do corpo humano, por exemplo,

intestino grosso (E. histolytica e E. coli) e cavidade oral (E. gingivalis), mas a única

espécie intestinal patogênica é a E. histolytica. Além dela, uma infinidade de outras

amebas comensais, não parasitas e não patogênicas, pode ser encontrada nestas

cavidades humanas e, no caso das amebas comensais intestinais, sua presença é

indicativa de maus hábitos de higiene. Entre as espécies de amebas comensais

intestinais existem sarcodinos muito semelhantes à E. histolytica e que podem gerar

diagnósticos falso positivos se o técnico que as observa não for bem treinado. Entre

elas temos: Entamoeba dispar, morfologicamente idêntica à E. histolytica

(diferenciando-se somente pela virulência), E. coli, Iodamoeba butschlii, Endolimax

nana, dentre outras.

O desenvolvimento de pesquisas genéticas e moleculares tem permitido avanços no

estudo de aspectos envolvidos nos mecanismos que tornam E. histolytica o único

protozoário intestinal deste gênero capaz de causar doença invasiva.

Etiologia e Morfologia

A ameba se alimenta por endocitose de partículas, preferencialmente ricas em amido,

mas pode endocitar bactérias da microbiota normal ou patogênica e até hemácias. São

protozoários muito simples, onde o endossomo logo após ser formado no processo de

fagocitose, se desfaz e o restante da digestão se dá no citossol. Não há outras organelas

membranosas no citoplasma, exceto o núcleo.

Existem dois estágios evolutivos para as amebas: trofozoíto e cisto. O estágio de

trofozoítos (trofos = alimento, zoo = animal, ou seja, estágio heterótrofo que se alimenta)

é a forma evolutiva que invade o hospedeiro, que se alimenta, se reproduz e troca

substâncias com o meio ambiente, portanto é a forma vegetativa do parasito. Apresenta

entre 20 e 40 µm de diâmetro médio, um único núcleo com formato de “roda de carroça”

devido à disposição dos grânulos abaixo da membrana nuclear e do carioplasma, além

do nucléolo, aqui chamado cariossomo, delicado e colocado centralmente no núcleo. O

citoplasma é rico em inclusões que incluem material fagocitado e constituintes celulares.

Page 44: Parasitologia - Protozoários

Os vacúolos são em sua maioria osmóticos e mantêm a volemia e osmolaridade celular

bombeando excesso de líquido e de sais para fora da célula.

Já os cistos, são ainda menores, em torno de 20 µm, são esféricos a levemente

ovalados e podem apresentar 1 a 4 núcleos além de uma ou duas estrutura fortemente

coradas pelos corantes usuais na microscopia (lugol e tricrômio, por exemplo),

chamados corpos cromatóides, em formato de bastões com extremidades

arredondadas. É uma forma evolutiva com metabolismo reduzido, sendo bastante

resistente a acidifcação, a cloração e a dissecação, bem como outros estresses

ambientais.

Além do cisto e do trofozoíta descritos acima, duas outras formas são também

observadas durante o ciclo: o trofozoíta-metacístico, uma forma multinucleada que

emerge do cisto no intestino delgado e posteriormente, dão origem aos trofozoítas. O

pré-cisto, fase intermediária entre o trofozoíta e o cisto, uninucleado, de aspecto oval ou

ligeiramente arredondado, contendo no citoplasma agregados ribossômicos formando

os corpos cromatóides com aspecto de bastão além da presença de vacúolos

alimentares.

Epidemiologia

A aceitação de E. dispar e E. histolytica como espécies distintas, porém fortemente

relacionadas, trouxe implicações na epidemiologia da amebíase. Diversos

parasitologistas têm relacionado a E. dispar aos casos assintomáticos da doença.

Page 45: Parasitologia - Protozoários

Esta parasitose apresenta ampla distribuição geográfica com alta prevalência em

regiões tropicais onde as condições de higiene e a educação sanitária são consideradas

deficientes. A África, Ásia, Europa e Américas do Norte e do Sul são consideradas as

regiões de maior prevalência da doença.

Esta parasitose apresenta ampla distribuição geográfica com alta prevalência em

regiões tropicais onde as condições de higiene e a educação sanitária são consideradas

deficientes. A África, Ásia, Europa e Américas do Norte e do Sul são consideradas as

regiões de maior prevalência da doença.

A amebíase hepática é a forma mais frequente da amebíase extra-intestinal, e segundo

estudos realizados na Índia, 11,8% dos pacientes com a doença chegam a óbito.

Transmissão

Constitui-se de uma transmissão fecal-oral, feita principalmente pela ingestão de cistos

tetranucleados presentes em água e alimentos. Vetores mecânicos podem transportar

cistos viáveis ou contaminar alimentos com seus perdigotos ou fezes.

Os cistos permanecem viáveis em ambiente úmido e temperado em média por 12 dias.

Podem durar de 9 a 30 dias em material fecal a uma temperatura de 25ºC, e em

alimentos até 15 dias. Os trofozoítas não são importantes na transmissão por não

resistirem ao pH ácido do estômago e resistirem apenas alguns minutos fora do

organismo.

Patogenia

A base molecular dos eventos que levam a E. histolytica a invadir o tecido do hospedeiro

e causar doença ainda é motivo de pesquisa. Sabe-se que a invasão tecidual requer um

complexo controle da expressão de várias proteínas do parasito como resposta a um

processo adaptativo as condições adversas do ambiente hospedeiro. Foram

identificados a expressão diferencial de 12 genes durante a formação do abscesso

hepático in vitro, a maioria associada a condições de estresse, regulação transcricional

e tráfego de vesículas.

A atividade citolítica da E. histolytica tem sido estudada sob condições in vitro e envolve

quatro etapas: adesão, citólise, fagocitose e degradação intracelular.

O contato inicial entre E. histolytica-célula hospedeira é mediado via lectina que se liga

a resíduos de carboidratos Gal/GalNAc presentes na membrana plasmática da célula

hospedeira.

Após adesão, a ameba lisa a célula alvo usando proteínas formadoras de poros,

conhecidas como amebaporos e, possivelmente fosfolipases. Os amebaporos se

inserem na camada de fosfolipídeos da célula hospedeira e são responsáveis por parte

do efeito citolítico da E. histolytica por promover mudanças no balanço osmótico das

células (formação de poros) e cuja atividade depende do pH do meio.

Page 46: Parasitologia - Protozoários

Enzimas proteolíticas (cisteína proteinases, fosfolipase A) atuam juntamente com os

amebaporos na atividade citolítica do parasito, e provavelmente são usadas na

penetração do tecido, na degradação de substratos exógenos e em processos

inflamatórios.

Após a morte da célula hospedeira (apoptose), o parasito segue com a fagocitose,

auxiliado pela lectina e outros receptores de membrana que estariam atuando na

aderência as células. A ingestão de células mortas parece limitar a resposta inflamatória

do hospedeiro fazendo com que o parasito estabeleça infecção persistente.

Ciclo Biológico

O homem se infecta ingerindo a forma cística madura contida em alimentos, água ou

por qualquer tipo de contato fecal-oral. Também são possíveis formas menos usuais de

transmissão, incluindo o sexo anal e oral e equipamentos de lavagem intestinal

contaminados.

O desencistamento ocorre no intestino delgado e os trofozoítos liberados migram para

o intestino grosso. Os trofozoítos multiplicam-se por divisão binária e estes sofrem o

processo de encistamento, originando novos cistos que são eliminados nas fezes. Por

causa da proteção conferida por sua parede, os cistos podem sobreviver dias e até

semanas no meio ambiente. Os trofozoítos podem ser eliminados em fezes diarreicas,

mas são rapidamente destruídos no meio externo e, se ingeridos, não sobrevivem às

enzimas digestivas.

Na forma não invasiva os trofozoítos permanecem confinados no lúmen intestinal dos

portadores assintomáticos, que eliminam os cistos em suas fezes. Na forma invasiva os

trofozoítos invadem a mucosa intestinal e através da corrente sanguínea atingem outros

órgãos como fígado, pulmão e encéfalo, causando doença extra-intestinal.

Para serem eliminados pelas fezes em forma de cistos (forma de resistência), os

trofozoítos se arredondam (pré-cisto), reduzem seu metabolismo e começam a sintetizar

a parede cística. Aparecem no citoplasma os corpos cromatóides e os vacúolos de

glicogênio. O núcleo sofre divisões múltiplas, podendo dar origem a até quatro novos

núcleos, que resultam de duas divisões sucessivas. Outros sinais de um cisto maduro

são percebidos também pela diminuição do número de corpos cromatóides e do

tamanho do vacúolo de glicogênio. O cisto eliminado é então capaz de resistir às

condições desfavoráveis do meio ambiente externo, podendo, desse modo, infectar

outro indivíduo que se torna um novo hospedeiro

Page 47: Parasitologia - Protozoários

Virulência

A virulência da E. histolytica é um evento multifatorial influenciado por fatores do

hospedeiro, fatores intrínsecos do parasito e fatores do microambiente. Com relação ao

microambiente, um dos aspectos de maior importância na virulência amebiana talvez

seja a interação das amebas com os diferentes tipos de bactérias que,

concomitantemente, habitam o intestino do hospedeiro. O papel das bactérias intestinais

no início e durante o curso da amebíase intestinal é pouco conhecido.

Os trofozoítos de E. histolytica, crescidos em associação com bactérias, alimentam-se

ativamente delas por fagocitose. Entretanto, pouco se sabe acerca dos mecanismos de

fagocitose e de digestão das bactérias e de quais os benefícios nutricionais este tipo de

alimentação traz para os trofozoítos. A natureza da relação trofozoíto-bactéria parece

ser um fenômeno altamente específico, no qual intervêm componentes da superfície

amebiana com atividade de lectina e resíduos de galactose e N-acetil-galactosamina,

presentes na superfície bacteriana.

Existem evidências de que trofozoítos deste protozoário são altamente seletivos com

respeito à sua interação com as diferentes espécies de bactérias. Assim sendo, somente

aquelas espécies que possuem um dos mecanismos de reconhecimento mencionados

anteriormente teriam a capacidade de se unir aos trofozoítos, sendo posteriormente

fagocitadas por estes. Nos casos em que ocorre um reconhecimento específico entre

trofozoítos e bactérias, tem sido observado um aumento na expressão da virulência

amebiana desde que as bactérias estejam intactas, pois lisados bacterianos e bactérias,

atenuadas pelo calor ou por irradiação, não sofrem nenhum efeito dos trofozoítos.

Entretanto, o reconhecimento específico não deve ser a única condição para o aumento

Page 48: Parasitologia - Protozoários

da virulência amebiana, já que existem relatos de que a associação bacteriana pode ou

não determinar uma diminuição na expressão da virulência dos trofozoítos.

Enzimas, como as cisteíno-proteases e as metalo-proteases, são reconhecidamente

capazes de destruir as células intestinais causando a invasão da mucosa intestinal. As

proteases são consideradas um importante fator de virulência na patogenicidade de E.

histolytica.

Até o momento, foram identificados oito genes que codificam as cisteíno-proteases,

mas, intrigantemente, apenas um pequeno grupo desses genes é expresso em

condições artificiais de cultivo, dificultando o estudo da ação dessas enzimas no tecido

intestinal.

Experimentos in vitro demonstraram que, quando os trofozoítos são associados com

bactérias, podem causar modificações na expressão fenotípica da virulência amebiana

e essas modificações dependem da cepa de E. histolytica e da espécie e cepa de

bactérias utilizadas nesta associação.

Diagnóstico

O diagnóstico da colite amebiana pode ser feito pela microscopia de amostras de fezes

(parasitológico) e da mucosa do cólon de pacientes com diarreia. Esse tipo de método

diagnóstico tem sido utilizado há muitos anos. Porém, os resultados dependem da

habilidade dos técnicos que fazem a análise, pois a diferenciação de trofozoítos com

leucócitos e outros protozoários intestinais pode ser um pouco difícil para um

especialista não treinado. Com a descoberta do complexo E. histolytica/E. dispar, esse

tipo de análise se tornou inapropriado e ineficiente, uma vez que ambas as espécies

não podem ser distinguidas por sua morfologia. Alguns pesquisadores, depois de várias

discussões, relataram que, dependendo da situação clínica do paciente (diarreia

sanguinolenta) e das características morfológicas do parasito encontrado nas fezes

(presença de eritrócitos fagocitados por E. histolytica), o diagnóstico pela microscopia é

aceitável. Entretanto, este diagnóstico pode estar errado quando se tem um paciente

com E. dispar associada com outro tipo de parasito, o que pode levar a um falso

diagnóstico de colite amebiana.

Atualmente, existem testes de ELISA disponíveis no mercado cuja metodologia é

baseada em anticorpos monoclonais específicos contra uma superfície do trofozoíto de

E. histolytica. Esses testes são bem mais sensíveis e específicos do que os exames de

microscopia e também capazes de distinguir as duas espécies de amebas do complexo.

Porém, não são usados com muita frequência em áreas endêmicas em razão de seu

custo elevado.

A PCR também apresenta boa sensibilidade e especificidade. Trata-se de uma técnica

que permite a amplificação de regiões específicas do DNA da E. histolytica e da E.

dispar, sendo assim um instrumento para a diferenciação das espécies. Assim como o

teste ELISA, também apresenta alto custo, sendo mais utilizado em pesquisa que no

diagnóstico de rotina laboratorial. Nos casos em que o parasito não é detectado nas

Page 49: Parasitologia - Protozoários

fezes e que o paciente vem apresentando quadros de colite aguda, podem ser usadas

técnicas como colonoscopia ou retosigmoidoscopia flexível.

O diagnóstico de abscessos hepáticos amebianos é feito por sorologia e por ultra-som.

A sorologia é altamente sensível (>94%) e específica (>95%). Resultados falso-

negativos podem ser obtidos quando se utiliza o teste sorológico em fases iniciais da

infecção (até os primeiros 10 dias). Testes posteriores a esse período relataram o

resultado correto do exame, já que o paciente passa a apresentar elevados títulos de

anticorpos. A HAI tem sido utilizada como teste sorológico padrão por apresentar uma

elevada sensibilidade e especificidade. Já o ultra-som não apresenta alta especificidade

para lesões hepáticas causadas pelos trofozoítos.

TOXOPLASMOSE

Toxoplasma gondii é um protozoário intracelular obrigatório descrito em dois

importantes laboratórios: no Instituto Biológico de São Paulo, por Splendore (1908) em

coelhos; no Instituto Pasteur de Tunis, por Nicolle & Manceux (1908) em roedores do

norte da África, Ctenodactylus gondii, aos quais se deve o nome da espécie; o nome do

gênero é derivado da palavra grega toxon, ou arco, em referência ao formato do

parasito. O protozoário apresenta organelas citoplasmáticas características do Filo

Apicomplexa, classe Sporozoa, subclasse coccídea, ordem Eucoccidiida, subordem

Eimeriina e família Sarcocystidae.

Diferentes cepas de T. gondii têm sido isoladas e são geralmente classificadas como

virulentas ou avirulentas tomando-se por base sua patogenicidade e/ou antigenicidade

para o modelo experimental. Após estudos da estrutura genética populacional do T.

gondii, foi demonstrada a existência de três linhagens clonais predominantes,

designadas como tipos I, II e III, que diferem quanto à virulência e à epidemiologia.

Cepas tipo I têm sido encontradas em pacientes com doenças congênitas; as cepas tipo

II têm sido isoladas de pacientes imunocomprometidos com reativação da infecção

crônica; as cepas do tipo III, em sua maioria, têm sido isoladas de animais. Segundo

alguns autores, a definição desses três tipos de cepas pode promover uma poderosa

combinação para o estudo dos genes que regulam a patogênese da toxoplasmose. O

uso de peptídeos específicos permite a genotipagem das cepas de T. gondii no soro dos

pacientes. Esta classificação também é importante para a caracterização

epidemiológica, pois permitirá a investigação da distribuição e da virulência de diferentes

cepas de parasitos isoladas de populações animais e humanas.

Etiologia e Morfologia

O T. gondii é um parasito intracelular estrito, tendo reservatório natural os felídeos

domésticos e selvagens, particularmente o gato. O homem e muitos outros mamíferos

(caprinos, ovinos, suínos, bovinos, coelhos, cães jovens, etc), assim como diversas

espécies de aves (galinhas, pombos, etc) são infectados acidentalmente. A prevalência

Page 50: Parasitologia - Protozoários

da infecção por T. gondii entre os mamíferos costuma diferir de país para país, sendo

variável, por isso, o grau de participação de cada espécie animal na transmissão indireta

da toxoplasmose para o homem, nas diferentes regiões do mundo onde foram

realizados estudos relativos a essa questão.

As formas infectantes que o parasito apresenta durante o ciclo biológico são:

taquizoítos, bradizoítos e esporozoítos (oocistos).

Taquizoíto: é a forma encontrada durante a fase aguda da infecção, sendo também

denominada forma proliferativa, forma livre ou trofozoíto. Foi a primeira forma descrita

e o seu aspecto morfológico, em forma de arco, deu o nome ao gênero. Apresenta-se

com a forma grosseira de banana ou meia-lua, com uma das extremidades mais afilada

e a outra arredondada, medindo cerca de 2 x 6 µm, com o núcleo em posição mais ou

menos central. É uma forma móvel, de multiplicação rápida (tachis = rápido), por um

processo denominado endodiogenia (forma especializada de divisão assexuada onde

duas células filhas são formadas dentro da célula-mãe). Pode ser encontrada dentro do

vacúolo citoplasmático (vacúolo parasitóforo) de várias células, como nos líquidos

orgânicos, como as excreções, as células do sistema mononuclear fagocitário (SMF),

as células hepáticas, as pulmonares, as nervosas, as submucosas, e as musculares.

Destaca-se que os taquizoítos são pouco resistentes à ação do suco gástrico no qual

são destruídos em pouco tempo.

Bradizoíto: é a forma encontrada em vários tecidos (musculares esqueléticos e

cardíacos, nervoso, retina), geralmente durante a fase crônica da infecção, sendo

também denominada cistozoíto. Os bradizoítos são encontrados dentro do vacúolo

parasitóforo de uma célula, cuja membrana forma a cápsula do cisto tecidual. Os

bradizoítos se multiplicam lentamente (brady = lento) dentro do cisto, por endopoligenia

(mesmo processo da endodiogenia, mas mais rápido e com formação de mais células

filhas). A parede do cisto é resistente e elástica, que isola os bradizoítos da ação dos

mecanismos imunológicos do hospedeiro. O tamanho do cisto é variável, dependendo

da célula parasitada e do número de esporozoítos no seu interior, podendo atingir até

200 µm. Os bradizoítos são muito mais resistentes à tripsina e à pepsina do que os

taquizoítos e podem permanecer viáveis nos tecidos por vários anos. Apesar de serem

mais frequentemente encontrados na fase crônica, em algumas cepas os bradizoítos

podem ser encontrados na fase aguda da infecção toxoplásmica.

Oocisto: é a forma de resistência que possui uma parede dupla bastante resistente às

condições do meio ambiente. Os oocistos são produzidos nas células intestinais de

felídeos não imunes e eliminados imaturos junto com as fezes. Os oocistos são

esféricos, medindo cerca de 12,5 x 11,0 µm e após a esporulação no meio ambiente

contém dois esporocistos, com quatro esporozoítos cada.

Page 51: Parasitologia - Protozoários

Epidemiologia

De acordo com Amato Neto e colaboradores (1982), a prevalência da infecção causada

pelo T. gondii é mais frequente em regiões quentes e úmidas. A prevalência da infecção

no homem aumenta com a idade, atinge todos os níveis sociais e é encontrado em

quase todos os países com porcentagem de positividade que varia entre 20% a 83% da

população. No Brasil, estima-se que 70% da população apresenta-se infectada, em

algum momento da vida.

As diferentes taxas de soroprevalência para toxoplasmose na população humana

mundial devem-se a diferentes fatores como: localização geográfica, condições

ambientais, tipos de fauna, hábitos culturais, grau de desenvolvimento do país,

infraestrutura hídrica e sanitária e metodologia utilizada nos levantamentos

epidemiológicos.

A prevalência de gatos domésticos expostos a T. gondii na Europa, América do Sul e

Estados Unidos da América varia de 9 a 46%, enquanto que na Ásia é de 6 a 9%, porém

estas taxas, dependem do tipo de alimentação e do hábito do animal de viver dentro ou

fora de casa.

Transmissão

A transmissão oral ocorre quando os oocistos ou cistos são ingeridos por hospedeiros

intermediários. Os esporozoítos ou bradizoítos infectam o epitélio intestinal produzindo

formas assexuadas (taquizoítos) que penetram em células nucleadas, desenvolvem

pseudocistos e se multiplicam rapidamente por endodiogenia, ocorrendo, assim, uma

infecção aguda, que dissemina o parasito por todo o organismo do hospedeiro

vertebrado. Após alguns dias da infecção sistêmica pelos taquizoítos, ocorre o

desenvolvimento de outro estágio do ciclo, a formação de cistos teciduais contendo

bradizoítos. Estes cistos podem se desenvolver em qualquer órgão visceral, incluindo

pulmões, fígado e baço, mas a maior prevalência tem sido verificada em tecidos neurais

e musculares, como cérebro, olhos e musculatura esquelética estriada ou cardíaca, nos

quais permanecem por toda a vida do indivíduo. Estes cistos teciduais também são

importantes fontes de infecção tanto para os animais carnívoros como para o homem,

quando ingeridos junto com carne crua ou mal cozida. Este mecanismo é o responsável

por vários surtos descritos na literatura como o que recentemente ocorreu em Anápolis-

Goiás. O T. gondii adaptou suas diferentes fases do ciclo biológico e pode infectar

hospedeiros com diferentes comportamentos alimentares: os herbívoros podem se

infectar pelo ciclo oral-oocistos e os carnívoros, pelo ciclo oral-tecidual.

O ser humano ainda pode adquirir a infecção de forma congênita ou transplacentária,

por transfusão sangüínea, transplante de órgãos e transmissão acidental por auto-

inoculação em laboratório.

As vias de infecção para o feto são: transplacentária – quando a gestante adquire a

toxoplasmose durante a gestação e, se apresentar a fase aguda da doença, poderá

transmitir T. gondii ao feto, tendo provavelmente os taquizoítos como formas

responsáveis; rompimento de cistos no endométrio – apesar de a gestante

Page 52: Parasitologia - Protozoários

apresentar a doença na fase crônica, alguns cistos localizados no endométrio podem

romper-se (distensão mecânica ou ação lítica das vilosidades coriônicas da placenta),

liberando os bradizoítos que penetram no feto; taquizoítos livres no líquido amniótico

– neste caso podem atingir o feto. A infecção materna nos primeiros meses da gestação

pode resultar em morte fetal ou aborto espontâneo.

Patogenia

Estima-se que 20 a 90% da população adulta mundial já teve contato com o T.gondii. A

baixa imunidade está intimamente relacionada com a cronicidade da infecção.

A infecção toxoplásmica nos seres humanos e muito comum, porem os sinais clínicos

geralmente estão ausentes, salvo em duas categorias, aqueles indivíduos com o

sistema imune deprimido (quimioterapia para o câncer, tratamento para transplantados

e indivíduos HIV positivos) e para mulheres que contraem primariamente a infecção

durante a gestação.

Nos imunocompetentes, a toxoplasmose, em geral, assume caráter benigno, já que o

rápido desenvolvimento humoral e celular restringe eficientemente a ação patogénica

do parasita. Os toxoplasmas são agregados em microcistos que caracterizam a forma

de latência do processo em sua forma crônica, permanente por toda a vida. Assim, e

comum que a fase aguda da infecção se mantenha em níveis subclínicos ou apenas

com sintomas semelhantes a uma mononucleose (febre, cefaleia, linfadenopatia, mal-

estar e apatia). Em casos raros pode ocorrer acometimento neurológico secundário a

esta infecção e, geralmente, se expressa por encefalite ou meningoengefalite, com

sintomas inespecíficos e sem manifestações neurológicas focais. O início pode ser

marcado por cefaleia, sonolência e mudança de comportamento, com duração variável

de dias ou semanas, seguido por coma, convulsões, síndromes piramidal ou cerebelar,

paralisias oculares e transtornos psíquicos. A encefalite geralmente e difusa e raramente

observam-se lesões focais levando a manifestações localizadas, como hemiparesias ou

hemiplegias. Dessa forma, tais manifestações em pacientes imunocompetentes

dificilmente levam a suspeita diagnostica de toxoplasmose do sistema nervoso central,

o que retarda o diagnóstico e o início do tratamento e, como consequência, piora o

prognostico.

Segundo LANGONI (2006), a toxoplasmose ocular se manifesta por retinocoroidite, em

mais de 80% dos casos, mas pode apresentar ainda estrabismo, nistagmo e

microoftalmia. Em recém-nascidos, a lesão ocular e frequente e quase sempre bilateral.

Nas lesões tardias, pode ser unilateral e a coriorretinite e, geralmente, sequela de uma

infecção congênita.

A infecção materna primaria com T. gondii adquirida durante a gestação, ainda e de

elevada importância em nosso meio pelo fato de poder resultar em infecção fetal com

graves sequelas para a criança. Durante o primeiro trimestre da gestação, a infecção

pode levar a morte fetal. No segundo trimestre, pode ocasionar a chamada Tetrade de

Sabin, em que o feto apresenta retinocoroidite, calcificações cerebrais, retardo mental

ou perturbações neurológicas e hidrocefalia, com macro ou microcefalia.

Page 53: Parasitologia - Protozoários

Quadros como a Tetrade de Sabin ocorrem pela reparação tecidual do feto a lesão

causada pelo T. gondii, que leva a obstrução dos sistemas de transporte do liquido

cefalorraquidiano e a uma grande destruição dos tecidos nervosos, como o cérebro e a

retina.

Já no terceiro trimestre de gestação, a criança pode nascer normal e apresentar

evidencias da doença como febre, manchas pelo corpo, cegueira, em alguns dias,

semanas ou meses após o parto.

Em crianças recém-nascidas, a forma clínica e encontrada, sendo grave e caracterizada

por encefalite, icterícia, urticaria e esplenomegalia, geralmente associada com

coriorretinite, hidrocefalia e microcefalia, com altas taxas de morbidade e mortalidade.

A criança pode ter o seu desenvolvimento normal e depois vir a apresentar sintomas da

infecção quando mais velhas.

A doença é menos grave na toxoplasmose adquirida após o nascimento com

manifestações que variam com a virulência e localização do parasita. A forma mais

comum é a ganglionar, com linfadenopata febril ou afebril, podendo ocorrer cura

espontânea em semanas ou meses. Ha casos assintomáticos. A infecção adquirida é

menos frequente e a pessoa apresenta febre, mal-estar, mialgia, artralgia, pneumonia,

miocardite, miosite, meningoencefalite e erupções cutâneas maculopapulares. Em

pacientes que sofrem imunodepressão medicamentosa, a doença e muito grave, assim

como nos portadores da AIDS, nos quais pode ser mortal, pelo desenvolvimento da

encefalite.

Estudos específicos sobre interações entre o parasita e diferentes tipos de células

neurais mostram que nem todos os indivíduos doentes apresentam encefalite. Uma

explicação e que os sinais clínicos da doença dependem do genótipo da cepa causadora

da doença. Segundo DABRITZ & CONRAD (2010), muitos estudos mostram que a

toxoplasmose latente, possui efeitos neurológicos e comportamentais em humanos.

Indivíduos infectados por toxoplasmose na sua forma latente são mais envolvidos em

acidentes automotivos, sofrem mais de esquizofrenia, epilepsia e possuem alteração

nas suas personalidades. SILVA & LANGONI (2006) afirmam que a esquizofrenia em

humanos vem sendo relacionada com a toxoplasmose há anos, já que o T. gondii pode

parasitar os astrócitos.

Ciclo Biológico

O ciclo de vida, envolve uma fase assexuada que ocorre nos tecidos e nos linfonodos

de vários hospedeiros e resulta na produção de taquizoítos e bradizoítos, e uma fase

sexuada que ocorre nas células do epitélio intestinal de gatos jovens e outros felídeos

não imunes e resulta na produção de oocistos.

Após a ingestão pelo hospedeiro intermediário de cistos teciduais, ou ocasionalmente

oocistos esporulados, o parasita penetra nas células do epitélio intestinal e se dissemina

por todo o corpo através do sangue e da linfa. Tanto o gato como os hospedeiros

intermediários, inclusive o homem, desenvolvem a fase tecidual da infecção, e os cistos

Page 54: Parasitologia - Protozoários

teciduais contendo bradizoítos persistem por anos após a infecção. O ciclo de vida de

T. gondii é completado quando os cistos teciduais são ingeridos por gatos.

Os esporozoítos, bradizoítos ou taquizoítos ao penetrarem no epitélio intestinal do gato,

se multiplicarão por endodiogenia e merogonia (esquizogonia), originando vários

merozoítos. A célula parasitada se romperá e liberará os merozoítos que penetrarão em

novas células epiteliais e se transformarão nas formas sexuadas masculinas ou

femininas: os gametócitos (ou gamontes) que após maturação formarão os gametas

masculinos móveis com dois flagelos (microgametas) e femininos imóveis

(macrogametas). O macrogameta permanecerá dentro de uma célula epitelial, enquanto

os microgametas móveis sairão de sua célula e irão fecundar o macrogameta, formando

o ovo ou o zigoto, que evoluirá dentro do epitélio, formando uma parede externa dupla,

originando o oocisto. Após alguns dias, o oocisto imaturo, após o rompimento da célula

epitelial, será liberado no meio externo juntamente com as fezes. A sua maturação no

meio externo ocorrerá por esporogonia após um período de um a cinco dias, e resultará

na formação de dois esporocistos contendo quatro esporozoítos cada. O oocisto

esporulado é infectante para muitos vertebrados, inclusive o homem. O oocisto pode

sobreviver por meses ou anos, e em condições favoráveis de umidade e temperatura

pode manter-se infectante por cerca de 12 a 18 meses.

O hospedeiro intermediário pode se infectar ao ingerir oocistos maduros contendo

esporozoítos, taquizoítos ou cistos contendo bradizoítos. Os taquizoítos que chegarem

ao estômago serão destruídos, enquanto aqueles penetrarem na mucosa oral poderão

evoluir do mesmo modo que as outras formas. Após a ingestão, as enzimas proteolíticas

degradarão a parede dos oocistos e dos cistos teciduais, havendo liberação de

bradizoítos e esporozoítos que invadirão as células do hospedeiro. Essas formas se

multiplicarão após rápida passagem pelo epitélio intestinal e penetrarão em vários tipos

de células do organismo, formando o vacúolo parasitóforo, onde sofrerão divisões por

endodiogenia, formando novos taquizoítos (fase proliferativa), que irão romper a célula

parasitada, liberando novos taquizoítos, que invadirão novas células. Essa fase inicial

da infecção, chamada de fase proliferativa, caracteriza a fase aguda da doença. Alguns

parasitos evoluem para a formação de cistos teciduais.

Page 55: Parasitologia - Protozoários

Diagnóstico

O diagnóstico clínico torna-se difícil, pois a infecção por T. gondii é um processo

sistêmico, com baixa parasitemia, com sintomas e sinais clínicos genéricos que levam

a confundir a toxoplasmose com outras afecções de etiologias diversas, necessitando

de técnicas laboratoriais para sua confirmação.

a) Diagnóstico Clínico

Na toxoplasmose adquirida, a manifestação clínica mais comum na criança e/ou adulto

imunocompetente é um quadro semelhante à mononucleose infecciosa, com

adenopatias, principalmente cervicais, frequentemente acompanhadas de febre baixa,

desâmino e anorexia. Esse quadro é de evolução benigna na maioria dos casos, com

resolução espontânea no final de duas a quatro semanas, podendo persistir por alguns

meses, mas os gânglios regridem até o final do segundo ou terceiro mês.

Os sintomas da toxoplasmose aguda em gestantes podem ser transitórios, inespecíficos

e subclínicos. A possibilidade de transmissão fetal é remota quando a toxoplasmose é

adquirida antes da concepção. Cerca de 50% dos recém-nascidos de mães que

soroconverteram durante a gravidez são infectados e só 10% apresentam

manifestações clínicas precoces. A infecção que se manifesta no período neonatal é

caracterizada pela clássica tétrade de Sabin, composta por alterações do volume

Page 56: Parasitologia - Protozoários

craniano (hidrocefalia ou microcefalia), coriorretinite (geralmente bilateral, macular ou

perimacular, simétrica), calcificações intracranianas e retardamento mental.

O diagnóstico de toxoplasmose congênita é, por vezes, impreciso, pois as

manifestações clínicas podem ser confundidas com as causadas por outros agentes

como Citomegalovírus, Herpes simples, Rubéola, HIV, Epstein Barr, Treponema

pallidum, Listeria monocytogenes, Borrelia burgdorferi e Trypanosoma cruzi. Outras

doenças também podem apresentar sinais clínicos semelhantes à toxoplasmose como

a eritroblastose fetal e determinadas doenças degenerativas. A toxoplasmose congênita

pode permanecer latente por vários anos e, não excepcionalmente, durante a

puberdade (talvez por influência hormonal) ou mais adiante, reativar. Os distúrbios

oculares e neurológicos são exemplos comuns observados neste tipo de reativação

clínica.

Em imunodeprimidos, essas manifestações clínicas são encontradas com frequência,

provavelmente pela reativação, nos diferentes órgãos, das formas latentes dos cistos

contendo bradizoítos. Tal processo revela ser o T. gondii um agente de caráter

oportunista. É importante salientar que, com a expansão da SIDA, ficou claro que a

toxoplasmose em pacientes infectados pelo HIV tem como órgão de agressão primária

o sistema nervoso central.

b) Diagnóstico Laboratorial

Inoculação em camundongo: A inoculação em camundongo utiliza o sangue

do paciente, de preferência a camada leucocitária, ou sedimento do centrifugado

de líquido cefalorraquiano, líquido amniótico, lavado brônquico-alveolar,

suspensões de triturados de biópsia ou de placenta, que são inoculados via

intraperitoneal em camundongos isogênicos. A positividade é indicada pela

soroconversão do animal e confirmada pelo achado de taquizoítos no líquido

peritoneal ou, mais frequentemente, de cistos no cérebro e outros órgãos,

evidenciados em cortes histológicos.

Isolamento em cultura de células

Imunohistoquímica

Reação em Cadeia da Polimerase (PCR)

Diagnóstico sorológico

A sorologia continua a ser a principal abordagem para estabelecer um diagnóstico de

toxoplasmose. Ela baseia-se na pesquisa de anticorpos de diferentes classes de

imunoglobulinas (IgG, IgM, IgA e IgE) anti-T. gondii. Além disso, a presença dos

anticorpos antitoxoplasma no curso da infecção permite a análise de perfis sorológicos,

seja de infecção recente, em fase aguda, ou de infecção antiga, em fase de latência ou

crônica. Em indivíduos imunocompetentes, os testes sorológicos com pesquisa de IgG

e IgM são suficientes para o diagnóstico, por serem sensíveis, específicos e de fácil

execução.

IFI, ELISA, MEIA

Page 57: Parasitologia - Protozoários

IgG Avidez (ELISA): Este método avalia a avidez de ligação ao antígeno dos

anticorpos IgG contra o T. gondii, separando os anticorpos de baixa avidez,

produzidos numa fase inicial da infecção (de 3 a 4 meses), dos anticorpos de

elevada avidez, indicativos de infecção crônica (após 4 meses).

IgG e IgM positivas fazer IgG de avidez!!

Baixa avidez de IgG – provável infecção aguda: tratamento e acompanhamento

durante a gravidez (alguns indivíduos permanecem muito tempo com avidez baixa,

assim, o valor preditivo da avidez baixa não é tão alto quanto o da avidez alta).

Alta avidez de IgG (no primeiro trimestre de gestação) – infecção passada.

Tratamento

O tratamento em imunocompetentes não é necessário, desde que a infecção seja

subclínica e o sistema imunológico do paciente não esteja debilitado. Em

imunocomprometidos, como aideticos, a recomendação e a associação de dois

fármacos: sulfonamida e pirimetamina. Esses são os fármacos mais usados no

tratamento da toxoplasmose no mundo.

As gestantes que apresentarem suspeita de infecção por T. gondii adquirida durante a

gestação devem ser imediatamente tratadas com espiramicina, que e ministrada para

prevenir a transmissão do T. gondii da mãe para o feto. A etapa seguinte deverá ser

investigar a infecção do feto pelo protozoário. Se a infecção toxoplásmica fetal for

confirmada, ou nas infecções adquiridas nas fases mais tardias da gestação, período

no qual a taxa de transmissão materno-fetal e mais alta, o tratamento especifico da mãe

e feito com pirimetamina, sulfadiazina e ácido fólico.

Em cães e gatos, a clindamicina constitui provavelmente o medicamento de escolha.

Pode-se também usar as sulfonamidas ou combinações sinérgicas de sulfonamida e

pirimetamina.

Utilidade do teste de avidez dos anticorpos IgG no diagnóstico de doenças

infecciosas

O diagnóstico sorológico das doenças infecciosas é realizado através da pesquisa e

dosagem dos anticorpos das classes IgM e IgG, produzidos pelo organismo em resposta

a um agente infeccioso. Classicamente, o primeiro anticorpo a ser produzido na infecção

primária é da classe IgM, sendo, então, acompanhado pela produção de anticorpos da

classe IgG. Os anticorpos IgM ficam presentes por um curto período de tempo,

normalmente desaparecendo de três a seis meses após a infecção, enquanto os

anticorpos IgG permanecem presentes por longo período, por vezes o resto da vida.

Portanto, a presença de anticorpos IgM é indicativa de infecção aguda ou recente, e a

presença somente de IgG, de infecção passada.

Page 58: Parasitologia - Protozoários

Entretanto, com o desenvolvimento, nos últimos anos, de novas metodologias que

apresentam maior sensibilidade para o diagnóstico dos processos infecciosos, esse

conceito tem-se alterado devido à possibilidade da detecção de IgM por um período

prolongado. Esses anticorpos IgM, denominados residuais, podem ser detectados,

geralmente, em valores baixos, até 18 a 24 meses após a infecção. A sua presença,

juntamente com anticorpos IgG, por vezes, dificulta a interpretação do tempo de

infecção. Além disso, os anticorpos IgM podem ser detectados na reinfecção ou

reativação de processos infecciosos, bem como em reações cruzadas.

Recentemente, foi desenvolvido um método de ensaio imunoenzimático capaz de

diferenciar infecção recente de infecção passada, com a presença de IgM residual,

através da avaliação da capacidade de ligação dos anticorpos IgG. Tal capacidade de

ligação, denominada avidez, é diretamente proporcional ao tempo de infecção.

Em quadros infecciosos com até três a quatro meses de evolução, a IgG apresenta uma

baixa avidez, enquanto que, em infecções com mais de quatro meses de evolução, os

anticorpos IgG apresentam alta avidez. Em algumas situações, os anticorpos IgG

podem apresentar uma avidez intermediária, o que impossibilita a definição segura do

tempo de infecção.

O teste de avidez para anticorpos IgG tem grande importância, principalmente em

pacientes grávidas que apresentam simultaneamente anticorpos das classes IgM e IgG

no exame pré-natal para as doenças infecciosas que podem acometer o feto. Nessa

situação, a determinação do tempo de infecção é de extrema importância, pois pode

definir a necessidade de tratamento caso a infecção tenha ocorrido durante a gravidez,

como no caso da toxoplasmose, ou tranquilizar a gestante e o médico, caso a infecção

tenha ocorrido antes da gravidez. Embora o teste de avidez já tenha sido utilizado no

diagnóstico de numerosas doenças infecciosas, hoje a sua maior aplicação é no

diagnóstico da toxoplasmose, rubéola e citomegalovirose, principalmente em pacientes

gestantes.