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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE CENTRO DE CIÊNCIAS HUMANAS LETRAS E ARTES DEPARTAMENTO DE HISTÓRIA KLEBSON AUGUSTO RUFINO PARA TODOS AQUELES QUE FALAM SOBRE O VIETNÃ, O ROCK SAÚDA A VOCÊ: DEBATE E PROTESTO SOBRE O VIETNÃ NO ROCK (1960/1970). NATAL MAIO DE 2016

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Page 1: PARA TODOS AQUELES QUE FALAM SOBRE O VIETNÃ, O … · cronológico da historia dos Estados Unidos, desde a época da colônia, até o século XXI, ... livro História dos Estados

UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE

CENTRO DE CIÊNCIAS HUMANAS LETRAS E ARTES

DEPARTAMENTO DE HISTÓRIA

KLEBSON AUGUSTO RUFINO

PARA TODOS AQUELES QUE FALAM SOBRE O VIETNÃ, O ROCK SAÚDA

A VOCÊ: DEBATE E PROTESTO SOBRE O VIETNÃ NO ROCK (1960/1970).

NATAL MAIO

DE 2016

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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE

CENTRO DE CIÊNCIAS HUMANAS LETRAS E ARTES

DEPARTAMENTO DE HISTÓRIA

KLEBSON AUGUSTO RUFINO

PARA TODOS AQUELES QUE FALAM SOBRE O VIETNÃ, O ROCK SAÚDA

A VOCÊ: DEBATE E PROTESTO SOBRE O VIETNÃ NO ROCK (1960/1970)

Monografia apresentada ao

Departamento de História da

Universidade Federal do Rio Grande

Do Norte, Natal, orientada pelo prof.

Dr. Francisco das C. F. Santiago

Júnior, como pré-requisito para

conclusão do Bacharelado em História

NATAL MAIO

DE 2016

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RESUMO

A Guerra do Vietnã foi uma batalha militar e simbólica sem precedentes para a história

do século XX, principalmente Estados Unidos da América. O Rock n Roll, que na

década de 1960 estava se consolidando na cultura juvenil, ajudou a mobilizar vozes em

retaliação à Guerra, trabalhando em conjunto com outros movimentos civis que

agitaram a sociedade americana desde os anos 1950. A cultura musical, cantada com

letras carregadas de protesto, ajudou a mobilizar toda uma geração em plena mudança

de comportamento de jovens. O objetivo deste trabalho é entendermos como as canções

do Rock N Roll participaram da construção simbólica da Guerra do Vietnã na cultura

juvenil nos anos de 1960/1970? Através de análises de canções específicas, que

explicam diferentes visões sobre a Guerra, cada canção num total de três torna isso

possível.

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO......................................................................................... 1

1- ERUPÇÃO: Os Estados Unidos nos anos de 1960/1970.........................9

1.1- Guerra Fria e Aspectos Gerais..............................................................9

1.2- Direitos Civis e uma nova forma de pensar........................................12

1.3- O efeito “Quente” da Guerra “Fria”- a Guerra do Vietnã.......................16

2- Muito mais que um IÊ IÊ IÊ”.................................................................18

2.1 O nascente Rock N Roll...........................................................................18

2.2- O Rock N Roll: Agitação e Constetação.................................................22

2.3- As Vozes, o Rock e o Vietnã...................................................................32

3- Muito Rock e um pouco mais de Vietnã.................................................30

3.1- O Conflito...............................................................................................30

3.2 Letras de canções: Análise........................................................................33

Considerações finais:.....................................................................................43

Referências Bibliográficas e fontes.................................................................45

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INTRODUÇÃO

“Políticos se escondem; eles apenas

iniciaram a guerra. Por que eles deveriam

sair para lutar? este papel eles deixam

para os pobres, sim!”1

Ouvir a voz, elemento importante para que clamores sejam ouvidos pelas

autoridades, os jovens acabaram descobrindo que poderiam ter voz realmente ativa por

meio de um estilo musical que, na década de 1960 começava a ganhar um “corpo” e um

vigor inéditos, o Rock n Roll. Neste trabalho, analisaremos algumas canções específicas

do Rock n Roll nas décadas de 1960 e 1970 buscando entender como tais canções foram

escritas para construir certa visão sobre o conflito do Vietnã. Por meio dessa análise

poderemos reconstruir a cultura jovem daquelas décadas e a maneira como relacionou

com o conflito e produziu representações nos e para os jovens daquele momento.

Essas músicas estavam ligadas a um discurso de crítica contra a Guerra do

Vietnã. Elas tinham um objetivo em comum, que era mostrar o quanto de trágico o

conflito tinha, pois a ida de jovens militares Norte-americano para o país asiático tinha

uma série de contradições, as quais foram debatidas e analisadas pelas letras que serão

analisadas nos próximos capítulos, como a ida de pobres e negros para a batalha, a

maneira como a mídia modificava informações e de quanto o maquinário de guerra

estava algo bastante presente, só para citar alguns aspectos presentes. As canções são

consideradas neste trabalho como discursos sobre a guerra, empregando o conceito de

discurso de Michel Foucault tal como explicitado em sua aula inaugural do Collége de

France, em 1970. Para o filósofo francês um discurso pode ser importante, não apenas

por “aquilo que manifesta(ou oculta) o desejo; é, também, aquilo que é o objeto do

desejo”. (Foucault, 2013, pg. 10). Neste ponto de vista, observaremos nas letras o desejo

de manifestar inquietação face aos acontecimentos que a guerra gerava, fazendo questão

de deixar claro nessas músicas sua insatisfação.

1 IOMMI,Tony. BUTLER,Geezer. War pigs. Londres,Vertigo, c1968. 1CD

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Música e História nem sempre têm uma relação próxima e este trabalho

pretende fazer com que esses dois campos de conhecimento possam ter mais contato,

no sentido de que a canção pode ser uma fonte a mais para o historiador analisar,

debater e construir o conhecimento histórico. As letras dessas canções, como este

trabalho deixará claro, oferecem um rico campo de ideias, interpretações sobre os

mais diferentes assuntos cotidianos, tanto de questões sociais, filosóficas, quanto de

questões de conhecimento e de sentimentos pessoais. Autores como, Ugo Monte e

Mick Wall, procuram resgatar o contexto pelo qual o Rock surgiu, dimensionando

aspectos sociais e focando nos elementos em que o estilo se tornou importante na

década de 1960/1970, não apenas citando apenas componentes musicais, mas

evidenciando que já existem trabalhos historiográficos importantes e que merecem

destaque.

Na discussão de Música e História existem os trabalhos de Leonardo Felipe e

Neliane Maria Felipe. O primeiro relaciona o contexto social dos anos de 1960 com o

sentido da Arte, tentando compreender como artistas musicais como Elvis Presley, e

os Beatles deram origem a um novo movimento artístico musical (Felipe, 2012,

pg. 177- 191)

Neliane Maria Ferreira analisa os movimentos que deram origem a Contracultura nos

anos de 1960/1970, abordando autores de viés marxistas e estudos freudianos,

encontrando alternativas mais ‘duras’ em relação a sociedade da época (Ferreira,

2006, p. 68-74). Autores como Marcos Napolitano sugerem que o estudo da relação

entre historia e música vem crescendo muito desde a década de 1990 e que os estudos

sobre música popular têm uma natureza interdisciplinar desde sua origem

(Napolitano,2007). Outro autor que procura trabalhar sobre esta relação

interdisciplinar é José Geraldo Vinci de Moraes, o qual mostra como a relação entre

história e musica dá-se num contexto cultural, sustentando que a música é uma fonte

documental importante para o historiador desvendar zonas obscuras da história

(Moraes, 2000).

Assim como estes citados a pouco, também trabalharemos com autores que

ajudaram a dar suporte aos temas discutidos nesse trabalho, não somente na relação

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entre história e música, mas sobre questões que estão diretamente relacionados ao

período estudado, que certamente seria impossível não analisarmos no trabalho.

No livro Cultura de massa no século XX: Necrose, de Edgar Morin, vai tratar

sobre a mudança de comportamento juvenil das décadas de 1960/1970. Discutindo

sobre a crise vivida por essa juventude, a contestação de valores e a mudança de

comportamentos desses jovens nesse período. Apesar de o livro ter um viés mais

teórico sobre questões de cultura, o autor mostra questões práticas, cotidianas de como

tais rupturas aconteceram. Não somente voltada a juventude, mas também o autor se

detém a discutir outras “crises” além da juvenil, como a crise feminina e a crise

ecológica.

Outro livro que nos ajudará neste trabalho é o de Voltaire Schilling, intitulado

América: A história e as contradições do império. O autor trabalha com um viés

cronológico da historia dos Estados Unidos, desde a época da colônia, até o século

XXI, passando por todos os momentos importantes na trajetória deste país, tanto na

esfera nacional, suas politicas e suas manifestações, como na esfera internacional,

passando pelos conflitos que os Estados Unidos passaram. No entanto, o autor faz um

“resgate” de personagens que talvez, não tenham sido muito explorados pela

historiografia tradicional, resgate esse de pensadores, cientistas sociais e personagens

característicos, específicos de certas temáticas, como John Dewey, chamado pelo

autor de Dewey, filósofo da democracia, que muito batalhou pela educação nos

Estados Unidos no século XIX.

Também discutindo e analisando sobre a história dos Estados Unidos, temos o

livro História dos Estados Unidos: das origens ao século XXI. O livro, que foi editado

por Leandro Karnal, contem a contribuição de vários autores sobre diferentes períodos

da história norte-americana, também analisando desde a colônia, até o século XXI.

Não somente dando sentido as atitudes dos Estados Unidos como nação, mas

questionando essas atitudes, e suas consequências, como bem mostra um dos autores

do livro, Sean Purdy, ao analisar a Guerra do Vietnã.

Falando na famigerada batalha do Vietnã, outro livro fundamental para este

trabalho é o de Noam Chosmky, que têm o titulo de Banhos de Sangue. O autor,

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através de varias fontes de jornais, revistas e de relatos interessantes de pessoas

envolvidas diretamente com a Guerra do Vietnã, traz uma visão alternativa sobre o

conflito. Chomsky não apenas se detêm aos motivos que levaram os Estados Unidos a

o que este chama de “assalto” ao Vietnã, como denuncia outros “assaltos” a outras

nações que os norte-americanos fizeram em outras nações. O autor sempre questiona e

analisa essas atitudes, sobre os métodos “pacíficos” de ocupação e sobre a forma

“tranquila” em que os Estados Unidos tratavam os civis desses países.

Como já citamos anteriormente, as canções analisadas neste trabalho partem de um

discurso sobre a guerra, palavras escritas e direcionadas para um proposito. Então,

sobre o poder do discurso e o que ele pode proporcionar, utilizaremos o livro de

Michel Foucault, chamado A ordem do discurso. O autor analisa sobre o que o

discurso pode ser, bem como o seu poder perante a sociedade, em que este tem poder

para além de ser direcionado a algo, pode também servir como uma exclusão.

A música destas décadas, de 1960 e 1970 mostra como aqueles

momentos foram tempos agitados socialmente. As bandas não refletiam esse “agito”

cultural e político simplesmente, mas eram agentes que deixavam a sociedade

inquieta. Como este trabalho deixará claro, a música (principalmente o Rock) não

passou com “olhos vendados” sobre acontecimentos como a Guerra do Vietnã, mas

participou do conflito de forma simbólica, em que músicas de protesto contra o

conflito foram criadas, não só pelo Rock N Roll, mas por estilos como o Folk e Jazz.

Ao contrário dos jovens recrutas que iam para o outro lado do mundo, na Ásia para a

Guerra, os músicos usaram de sua voz e seus instrumentos como ‘armas’ para

protestar e refletir. Por meio da expressão musical, ocorria uma participação indireta

dos artistas, os quais, mesmo não estando presentes no Vietnã, podiam expressar

opiniões e ansiedades no seu meio social em relação ao contexto beligerante,

escrevendo letras de repúdio e não deixando essa crítica a Guerra passar despercebido.

Tratava-se, portanto, de uma participação simbólica de jovens em meio a uma cultura

juvenil internacional em consolidação.

Neste sentido, definimos cultura juvenil como um dos aspectos fundamentais

das sociedades ocidentais nos anos de 1960/1970. Esta cultura juvenil, segundo Edgar

Morin, teria surgido dos jovens marginais dos anos 1950, que podiam ser ou não

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serem identificados como “deliquentes” 1 e vistos (Morin, 2006, pg. 138).

Com seu desenvolvimento, essa cultura teria, sobretudo dois lados, um deles

inserido na cultura de massa e o outro procurando se destacar dela. Por um lado,

os jovens, inseridos dentro de todo o sistema capitalista, procuram o consumo de

produtos criados para ele. Ao mesmo tempo, procuravam também se destacar do

sistema, não entrando em alguns dos antigos “padrões” de consumo do capitalismo.

Parte da “nova juventude” acreditava que a vida podia ser “levada” sem se prender a

todo esse consumismo. Os bairros de boemia, por exemplo, segundo Morin, eram

vistos como “utopias concretas em que a vida é vivida diferente, com outra moral”

(Morin, 2006, pg. 139).

A união dessas duas posturas criou algo misto, que usava a criatividade dos

artistas e que ao mesmo tempo, se submetia às tendências e censuras do sistema de

produção. Mas isso só é possível graças a “autonomia dos adolescentes no seio da

família e da sociedade” (Morin, 2006, pg. 140). A cultura juvenil era algo que se

utilizava do capitalismo presente na sociedade, mas que ao mesmo tempo encontrava

formas para contestá-lo.

Após o fim da Segunda Guerra Mundial os diversos líderes em 1944, em

especial os Estados Unidos e a Grã Bretanha reuniram-se para tratar sobre questões

econômicas, delimitando o rumo das nações que perderam a Guerra. Um novo sistema

econômico de relações era discutido no qual as nações fossem ligadas entre si, a fim

de evitar que uma nova e catastrófica guerra surgisse novamente e levasse o planeta

a um novo colapso. Surgiu o FMI (Fundo Monetário Internacional). O fim do

Conflito de 1945,deixou notório que além daquelas duas grandes potências, a

União Soviética havia adquirido um grau de influência gigantesco, ainda que o

destaque dos Estados Unidos fosse evidente, afinal era único que saiu sem danos

materiais no próprio território por causa da guerra ou sofreram as perdas econômicas

por causa da mesma. Não demorou muito para que URSS e EUA olhassem um ao

outro com desconfiança, sempre achando que um estaria tramando algo contra. Sem

condições de travarem uma guerra bélica direta e sustentando ideologias opostas, um

com a ideia de que o comunismo não podia ter influência perante a comunidade

internacional, e o outro pensando que o capitalismo não era possível de instaurar

1 Esses jovens, segundo Morin, se constituíam em “clãns”, que se identificava em personagens do cinema.

Personagens que apresentavam um comportamento “diferente” eram apreciados, como o encrenqueiro

Jim Stark, papel vivido por James Dean, no filme Juventude Transviada, de 1955

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uma paz mundial, ambos tiveram suas respectivas zonas de influência no mundo.

Desencadeou-se uma corrida armamentista junto a uma guerra simbólica e apoio a

conflitos regionais em escala global. Os historiadores chamaram isso de Guerra fria.

Paralelo a isso, porém, surgiram outros movimentos políticos alternativos em relação a

essa polarização capitalismo Vs. Comunismo. Na década de 1950, nos EUA e na

Europa emergiram os movimentos dos direitos civis com reivindicações por igualdade

e exercício de direitos em sociedades onde ocorria discriminação racial, por gênero e,

mais tarde, por orientação sexual. Nas décadas seguintes as perspectivas abertas pelos

movimentos raciais, femininos e gays, além da contestação dos costumes já em ação

nas manifestações da Contracultura teriam força transformadora na cultura do mundo

ocidental.

O mundo dos anos 1960 e 1970 estiveram marcados pela ameaça da guerra

e parecia não ser nada animador. Os Estados Unidos fora à potência que mais se

beneficiara da Guerra de 1945, a única que tinha condições de se manter

economicamente e militarmente forte. Com todo este poderio, os EUA teve uma

forma peculiar de exercer essa influência perante o mundo, seja por influência

política ou bélica direta. Ao mesmo tempo, na América da década de 1960 começara

“germinar” uma nova forma de pensar e uma nova forma de agir dos jovens. Estes,

que nas décadas anteriores, viviam de forma mais ‘reprimida’ de suas vontades,

começaram a tentar se expressar de forma livre. Dentre outras coisas caraterísticas,

surgiu á chamada “Contra Cultura”, conjunto de práticas culturais que incluíam novas

formas de pensar e agir e se tornou um campo para que os jovens tivessem seus

clamores sociais ouvidos. Como dito acima, a “Contracultura” fora contemporânea

dos movimentos dos direitos civis, das lutas por uma maior liberdade sexual e também

de um conflito que teve profundo impacto na cultura juvenil, que foi a guerra do

Vietnã.

Os movimentos civis tiveram significativa importância e contaram com

vários episódios icônicos, destacando-se o vivido por Rosa Parks, no estado Norte-

Americano do Alabama, que voltando de ônibus num dia de trabalho, recusou-se a

sair de uma cadeira que era reservada somente para os brancos, resistência essa que

resultou em um boicote em massas aos ônibus daquele estado. Era o inicio da

tentativa para que acabassem as leis segregacionistas nos Estados Unidos. As

passeatas eram constantes contra temas como a discriminação ou contra o conflito do

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Vietnã. Um evento em especial conseguiu reunir música e protesto contra o conflito e

tornou lendário desde então; Woodstock. Este festival, bem como outros ocorridos

no decorrer da década de 1960,foi importante de várias maneiras. Além da

“reunião” de sujeitos e práticas sociais no sentido de mudança de comportamento,

no próprio festival não era difícil observar vários jovens fazendo sexo ao ar livre,

regados a muito álcool e drogas, deixando evidente que a partir daquele momento

seu modo de viver e pensar seriam diferente dos tempos anteriores. Claro que a

sociedade conservadora da época não via esta atitude com bons olhos, mas teve como

forte impacto simbólico evidenciar a todos que daquele período em diante seriam

diferentes os jovens eram sujeitos históricos, tinham voz e seriam ouvidos.

Também, embora não seja o objeto central neste estudo, devemos atentar que

não somete musicas serviram com inspiração como mudança de atitudes dos jovens,

nem como a musica foi a única forma de protesto em relação a Guerra do Vietnã.

Literatura, fotografia e o cinema, foram importantes para que o tema fosse visto e

discutido na sociedade norte-americana. Estes dois últimos, alias sobretudo no livro O

cinema vai a guerra mostra o retrato que o cinema fez sobre grandes conflitos, e a

importância que a fotografia teve , sobretudo relacionado ao Vietnã .Seja no apoio a

invasão norte-americana teve, seja na divulgação de repulsa, o cinema foi

preponderante para o enfoque sobre a Guerra.

Esta monografia esta dividida em 3 capítulos: no primeiro, intitulado

Erupção: os Estados Unidos nos anos 1960 e 1970, levantaremos aspectos gerais da

situação política do pós-Segunda Guerra, uma vez que neste período estão as bases da

dinâmica social e cultural que aconteceria nas décadas seguintes influenciando nas

letras das canções escritas sobre. Todos os movimentos sociais, bem como a uma

nova forma dos jovens verem e encararem o mundo não surgiu da noite para o dia.

Houve fatores importantes para que estas ideias vissem a luz do dia.

O segundo capítulo, Muito mais que um Iê Iê Iê discorrerá um pouco sobre

o Rock N Roll, um dos estilos mais atuantes nas contestações sociais e políticas,

até os dias de hoje. Embora seja difícil precisar sobre uma real origem deste

estilo, mostraremos um pouco de como ele ganhou consistência sonora e mostrar e

como se desenvolveu nos anos de 1960 e 1970. Vamos também mostrar os grupos

musicais com os quais trabalhamos na pesquisa, os quais surgiram na mesma época

em que grupos como The Beatles, The Kinks, e Beach Boys faziam músicas com as

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letras um pouco mais diferentes em relação a críticas sociais. Nosso foco está nas

bandas de Rock mais pesados, bandas como Black Sabbath, The Doors e o Creedence

Clearwater Revival .

A Escolha de bandas especificas para este trabalho, foi devido ao fato de que cada

uma delas, através de canções igualmente especificas, apresentam tanto uma

sonoridade diferente, relacionados ao Rock N Roll, como que as letras apresentam

significados sobre um mesmo conflito. Atitudes do governo em relação a Guerra,

consequências dessas ações sobre os combatentes e a sociedade são alguns dos

temas recorrentes nesses grupos, bem como em suas letras. Ainda que o Black

Sabbath seja uma banda originaria de Birmingham, Inglaterra, as letras abordadas ao

apresentar uma ‘visão’ norte-americana sobre o conflito. Essas bandas, fizeram

músicas muitos mais atuantes e presente no contexto dos anos de 1960 e 1970, no

sentido que escreveram mais canções de protestos e de mais atuação contra A Guerra

do Vietnã, em relação a grupos musicais contemporâneos Vamos também analisar

como a cultura juvenil se relacionou com o Rock e foi fundamental para que toda essa

agitação social fosse possível.

No terceiro e último capítulo, o Muito rock e um pouco mais de Vietnã

falaremos sobre o conflito e sua apropriação nas letras das canções de Rock. Será

necessário uma reconstrução do quadro histórico, mostrando as formas como o

governo norte-americano atuou no conflito e suas principais atitudes na Guerra do

Vietnã. As letras das canções que tematizaram e foram contra a guerra serão

analisadas, bem como falaremos um pouco das bandas que as escreveram e o por quê

de as terem escrito. Houve outros estilos os quais se fizeram presente na batalha

simbólica pelo do fim da guerra do Vietnã, bem como vários artistas que escreveram

sobre o assunto, porém acreditamos que as canções selecionadas mostram aspectos

peculiares das principais atitudes que os Estados Unidos tomaram em relação ao

Vietnã, seja na conduta da batalha, seja no tratamento que estes davam aos nativos

do país asiático. Foram elas: War Pigs, do Black Sabbath, The unknown soldier, do

The Doors e Fortunate son, do Creedence Cleawater Revival. Tais letras serão nosso

principal material de trabalho. Tanto as canções como as Bandas musicais que vamos

analisar foram escolhidas pelo fato de que cada uma delas trazer um aspecto diferente

do mesmo conflito, nos dando norteamento sobre o que ocorreu no conflito através

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dos “olhos” de cada música: um mesmo conflito, mas com aspectos diversos e

peculiares sobre o que estava ocorrendo.

Além do critério de gosto pessoal pela escolha de cada dessas canções e das

bandas, procuraremos mostrar também que cada uma dessas bandas escolhidas tem

uma sonoridade diferente. O Black Sabbath, com um estilo de Blues mais grave, muito

através da deficiência do Guitarrista Tony Iommi, que falaremos mais adiante, tem um

estilo considerado mais “pesado” em relação as outras bandas aqui trabalhadas.

Embora o Sabbath seja uma banda de Birmingham, Inglaterra, ela nos ajuda a dar uma

visão americana sobre o conflito, uma critica vista através das atitudes norte-

americanas na Guerra do Vietnã.

Já a banda The Doors, com um estilo calcado no tecladista Ray Manzarek, e

nos vocais e letras importantes de Jim Morrison, trazia uma sonoridade mais leve, com

mais linhas melódicas e com muitos solos do já citado tecladista. A letra, trata dentre

outras questões, da manipulação que a mídia americana fazia, das noticias que viam

do país asiático.

O Creedence Cleawater revival, tinha um Rock N Roll mais calcado no

country, e sua suas letras e vocais quase que totalmente feitas pelo

vocalista/guitarrista, John Fogerty. A letra de Fortunate son, analisado terceiro

capítulo, nos dirá vários aspectos sobre o conflito, uma letra maior do que as outras

que serão analisadas, e que trás algumas observações importantes.

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1. ERUPÇÃO: OS ESTADOS UNIDOS NOS ANOS DE 1960/1970 :

1.1 Guerra Fria e aspectos gerais

Na trajetória humana as ações dos indivíduos não se concretizam por questões

aleatórias. Os homens são construídos num dado contexto no qual vivem pelas

questões que os rodeiam e os fazem tomar certas atitudes, as quais, sendo

prudentes ou não, marcaram a história da humanidade.

A Segunda Grande Guerra deixou marcas profundas em todos os aspectos

imagináveis tanto socialmente, como militarmente e economicamente, influenciando

as condições existentes em diversos países. Os Estados Unidos, a URSS e a Grã-

Bretanha foram às nações que saíram fortes do conflito, já que com o decorrer

da Guerra, conseguiram vencer as forças do Eixo. Apesar da Grã Bretanha e da URSS

terem tido baixas consideráveis tanto em termos de militares quanto em termos

econômicos (SCHILLING,2004, pg 198), os Estados Unidos foram, segundo Voltaire

Schilling os “únicos em que suas cidades industriais como Chicago e Detroit que não

sofreram uma bomba sequer”(Ibid, pg 202) . Isso significa que Norte-Americanos

saíram mais poderosos do que nunca do Conflito.

Enumerar todas as razões para esse sucesso do Pós-guerra norte-americano

nos parece demasiado longo para nos debruçarmos. No entanto, suas consequências

tiveram bastante impacto nas décadas seguintes. A mais poderosa nação mundial logo

daria as “cartas do jogo”, mostrando a diversos países como a economia deveria

proceder. Durante a guerra, os Norte-Americanos não pouparam esforços, nem em

termos de militares, nem em termos econômicos. Após o fim do conflito, as três

grandes campeãs se reuniram diversas vezes para entrarem em acordo sobre os

novos rumos do mundo, em termos econômicos e em zonas de influência. A mais

famosa dessas reuniões aconteceu em Yalta, na Criméia(KARNAL,2010, pg 208).

Além de aqui, dividirem os países perdedores entre os campeões, de acordo com

zonas que achassem mais importantes para seus interesses. No entanto, não foi

somente a partilha das nações ditas “campeãs” sobre os países que saíram derrotados.

Embora ali estivesse reunidos os líderes da Grã-Bretanha, Estados Unidos e União

Soviética, e as decisões ali tomadas fossem de significativa importância para os anos

seguinte de varias nações do mundo, antecedentes importantes dessa reunião merecem

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destaque. Pois ainda em 1944 foi criada uma Nova Ordem Econômica Mundial, um

fundo que seria capaz de reconstruir e apoiar nações que sfrem perdas durante o

conflito, bem como ajudar na economia destes países. Este aspecto é muito importante

para percebemos, pois está diretamente lidada a ordem do mundo nos anos seguintes:

a divisão entre a União Soviética e os Estados Unidos. Embora inicialmente tanto do

lado dos Norte- Americanos, quanto do lado Soviético pregar-se um discurso de

coexistência sem retaliações, não demorou muito para que as primeiras divisões

começassem aaparecer. A ideia estadunidense era, desde o fim da guerra, estabelecer

uma nova ordem mundial calcado no dólar, á única moeda naquele momento que era

“segura”, pois era toda centrada no ouro, o que os Estados Unidos tinham em grandes

reservas. O ponto em que essa rachadura ficou notória fora a partilha da Polônia.

A partir de então começaram pequenos fatos que anos depois levaram à

Guerra fria. Apesar de não existir uma data precisa sobre o inicio deste conflito

ideológico, que por algumas vezes, quase se tornou um confronto militar direto

entre elas no decorrer das décadas seguintes, ambos as superpotências (EUA e URSS)

usariam suas zonas de influências espalhadas pelo mundo para se “atacarem”. Se

Franklin Delano Roosevelt, presidente americano durante a Segunda Guerra Mundial,

acreditara que era possível ambas as potências terem zonas de influencias de uma

maneira pacífica, após a morte deste, em maio de 1945, esse quadro mudaria. Seu

sucessor, Harry Truman acreditava que se deveria conter o “comunismo” na defesa

dos “povos livres. Stalin, por sua vez, depois de até ter considerado uma “coexistência

pacifica”, que era difícil viver em harmonia com um sistema de governo totalmente

diferente do seu (SCHILLING,2004, pg.196).

Ainda na perspectiva de manter suas zonas de influências, ambas as

superpotências gastaram vastos recursos financeiros na tentativa de mostrarem cada

vez mais sofisticados equipamentos militares. Ocorreu uma corrida armamentista

entre Estados Unidos rivalizando com a URSS sobre quem teria um maior aparato

militar e influência do mundo pós-guerra. De fato, houve enorme gastos militares.

Truman não poupou esforços para exercer seu poderio e tentativa de superioridade

sobre a URSS. A doutrina Truman para “libertar os povos livres” e o Plano Marshall

para “ajudar as nações a se desenvolver” foram medidas de fortalecimento do bloco

capitalista contra o “comunismo”.

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A obsessão anticomunista nos Estados Unidos trouxe muitas consequências.

A liberdade, tão cultuada pelos americanos e garantida pela sua constituição estava

ameaçava, pois como Voltarie Schilling diz “uma única pergunta: você é ou alguma

vez foi membro do partido comunista?”(Schilling,2004,pg 208) era capaz de tirar

aquilo que os estadunidenses mais prezavam, sua liberdade Os EUA financiaram

vários golpes de estado em varias nações do mundo no combate ao comunismo,

criando inúmeros conflitos dentro da própria nação. Pois se alguém afirmasse que

“sim”, era membro de algum partido comunista, eram presos, por não colaborarem

com as intenções saudáveis de conter o “Comunismo”.

Socialmente, os Estados Unidos nas décadas de 1950 estavam estabilizados e

em franco desenvolvimento no pós-Segunda Guerra. Todos os meios de

comunicação, como rádio e a televisão que se tornaria o grande veiculo

comunicador traziam a consolidação do modelo familiar o pai trabalhador, a mãe do

lar e o modelo cristão de família temente a Deus o qual, porém, seria contestado

décadas depois. Mas como já citamos, apesar do crescimento econômico formidável

nem todos compartilhavam desta riqueza do Pós-Guerra. Como nos mostra Sean

Purdy, 45% de toda a renda produzida nos EUA ficavam concentrados nas mãos de

20% da população, enquanto que os 20% mais pobres controlavam apenas

5%.(Purdy,2004, pg 231) .

Apesar do modelo familiar estabilizado entre os jovens, mulheres e

todos aqueles que eram tratados como subalternos começou a emergir práticas e ideias

comprometidos com mudanças em busca de visibilidade, igualdade e oportunidade.

Paralela a “sangrenta” rivalidade dos EUA com a URSS, as contradições da sociedade

norte-americana, apesar das condições econômicas, demandavam cada vez mais

solução. As desigualdades sociais se refletiam nos problemas para os mais pobres e

oprimidos e trariam consequências fundamentais, mas que mudaria para sempre a

juventude e suas dimensões políticas nos anos seguintes com os movimentos

dos direitos civis e um “despertar” da juventude nas décadas seguintes. Estes

“novos” sujeitos, cada vez mais descontentes com uma cultura que os “ensinava” de

dada forma, literalmente descobririam uma “voz”, de um jeito único, que analisaremos

mais adiante.

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1.2 Direitos civis e uma nova forma de pensar

Direitos civis: essas duas palavras sugerem bem mais do que uma simples luta

por reconhecimentos dos direitos dos afrodescendentes nos Estados Unidos. Como se

já não bastasse à agitada década anterior, por tudo que está relacionado ao fim da

Segunda Grande Guerra e a reconstrução parcial (muitas vezes total) das nações

envolvidas, a década de 1960 foi igualmente conturbada, pois além dos direitos já

citados, ocorreu a conscientização juvenil e a quebra de valores sociais e familiares

estabelecidos, uma vez que aqueles jovens sofriam represálias com os pais, se

envolvendo num conflito de gerações, e com as classes conservadoras da sociedade

americana.

Os Estados Unidos tinham leis segregacionistas em vários estados,

principalmente no Sul, como no Tenessee, por exemplo, onde bares, restaurantes e até

banheiros tinham que ser separados racialmente. Não era nada estranho entrar nesses

lugares e se deparar com placas “Only White” e “Only Blacks” Os Negros eram

párias de uma sociedade multiétnica que se imaginava “branca”, sendo convocados

para o exército, mas sem exercerem um simples papel e que em tese seria inerente a

todo cidadão, o direito do voto. Ainda havia a violência policial, discriminação no

emprego e nas Colleges.

Como Voltaire Schilling deixa claro, os movimentos dos direitos civis, além

de combaterem as condições desumanas nas quais os negros eram tratados,

tiveram também forte ligação “com os povos de cor da Ásia e da África iniciando a

luta pela descolozinação”(Schilling, 2000, pg. 231). Na década de 1950/1960 dois

nomes em especial tiveram amplo destaque: Martin Luther King e a já citada Rosa

Parks, os quais seriam fundamentais no processo dos movimentos dos direitos

civis, já na década de 1960.

Parks vivia no Alabama, vindo de um dia de trabalho, simplesmente se

sentou no banco do ônibus numa atitude aparentemente normal. A não ser pelo fato

dela ter se sentado num lugar reservado somente para brancos. Negando-se a ceder

seu lugar a um branco, ela foi presa, acusada de não cumprir a lei. Esta simples atitude

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tornou-se simbólica, gerou um boicote geral no Alabama exigindo que aquela lei fosse

revogada e vários ativistas exigiam das autoridades do governo que esta lei fosse

banida. Depois do apoio de vários intelectuais, muitos deles brancos, a Lei caiu e

Rosa se tornou anos depois um símbolo mundial na luta contra a segregação, tendo

recebido inclusive, nos anos de 1990 um Nobel da Paz.

Luther King era pastor evangélico e admirador de Ghandi que participou

ativamente da “desobediência civil” 2 (KARNAL, 2010, pg 243) à Lei de

segregação com o caso de Rosa Parks. A situação se tornou tão conhecida que a

Suprema Corte Americana revogou a lei. King percorreu vários estados para que suas

ideias, inspiradas na Bíblia fossem ouvidas e ajudassem no combate as leis de

segregação. Os notáveis esforços, no entanto, não passaram despercebidos. Vários

foram os modos usados pelos conservadores para barrar as ações de King, que sofreu

inclusive ameaças de morte. As ações, que acabaram ganhando discurso na mídia

tiveram diferentes impactos para aqueles que assistiam (KARNAL, 2009, pg. 245).

Se por um lado, acionavam ações de resistência a mudanças, também fazia com que

brancos atuassem em favor das leis que acabariam com a segregação.

O seu famoso discurso com a conhecida introdução “eu tenho um

sonho”(SCHILLING,2004, pg 241) em Washington-DC foi o ápice dos movimentos

do direitos civis. Segundo estatísticas, em 1963 existia mais de 200 mil pessoas

ouvindo o pastor King, numa intensidade de protestos que se intensificaram desde o

inicio da década de 1960. Lyndon Johnson, presidente americano que substituiu

Kennedy depois do seu assassinato, ocorrido em 1963 no Texas, finalmente assinou a

Lei que proibia as leis segregacionistas. Mas isso não significou exatamente um

avanço. Embora os negros estivessem ganhando status social sendo chamado para

altos cargos, inclusive no próprio governo federal, sua condição financeira ainda era

degradante. Outra forma de protestar além das manifestações nas ruas, como

cartazes e faixas, ganhou literalmente uma voz, a música. O blues, nascido dos

guetos de varias regiões dos Estados Unidos era um estilo recorrente de protestos e de

lutas por melhores condições de vida por partes dos negros, e temas como pobreza

eram bastante recorrentes nessas canções. Gente como Solomon Burke, Bo Diddley

2 Martin Luther King organizou uma luta pelos direitos civis, mas de uma forma pacífica. Protesto não

só pelas “bandeiras” já existentes, como na luta por melhores empregos e o fim da discriminação. Mas

aqui em especial, pelo fim da segregação nos serviços públicos no estado do Alabama, em 1955

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usavam de suas guitarras e vozes para dizer a todos não só a poesia e as ruas estavam

protestando, a música também era um elemento importantíssimo para que a sociedade

os ouvisse e uma forma ativa de crítica.

Verificamos que toda a década de 1960 foi um período das mais

variadas manifestações sociais. Feministas, latinos e índios também encararam uma

sociedade que os discriminava e não davam condições de serem simplesmente

cidadãos. Apesar do movimento dos direitos civis serem normalmente considerados

como os mais importantes movimentos sociais deste período, não é correto afirmar

que apenas estes lutassem por melhores condições sociais e visibilidade de

grupos sociais. Também contemporâneo na década de 1960 e que foi uma peça

chave para entendermos o nosso trabalho foi a chamada “Contra Cultura”.

O termo “Contra Cultura” sugere muitos mais do que uma simples

contestação de valores sociais. Como Edgar Morin deixa claro, o termo “Contra

cultura” remete à oposição contra “pressões organizacionais profundas sejam

batizadas de capitalistas, repressão” (Morin,1999, pg 131). E não era uma simples

negação de valores, mas uma revolução cultural, que afirmava valores positivos, já

existentes na sociedade (Morin,1999). A música, por exemplo, bem como outras

artes, não era mais encarada como algo de divertimento, mas uma atitude de não

pertencimento a sociedade consumista. Em especial, a música voltada para certa

juventude iria se impor não apenas negando valores, mas agora como uma revolução

cultural (Morin,1999, pg. 131).

O modelo da família tipicamente cristã, centrado no pai provedor e na mãe

doméstica que cuidava dos filhos, e como Sean Purdy afirma com as casas com

“indefectíveis cercas brancas” entrava em crise (Karnal, 2010, pg 231) Rebelando-

se contra essa padronização de comportamentos sociais e afetivos, a juventude se

sentiu encorajada para mudar parâmetros, inclusive apoiando os negros na luta do

movimento dos direitos civis e mulheres nas reivindicações por condições de

igualdade na sociedade.

Indo contra ao consumismo desenfreado proporcionado pela sociedade

americana, a juventude estimulou novas formas de se viver nessa sociedade. Não era

simplesmente negar aquilo já estabelecido, mas eram novas formas de se viver,

de pensar e de agir. Não à toa, a “Contracultura” sofreu represálias das autoridades e

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dos conservadores norte-americanos, que se negavam a aceitar esse “mundo novo”

que a juventude americana anunciava. Notava-se que se tratava de uma crítica a todo

um sistema de crenças e valores. Um aspecto em especifico mexeu com a sociedade

americana: as críticas ao envolvimento dos Estados Unidos na Guerra do Vietnã,

sobre o qual vamos nos debruçar nos capítulos seguintes.

O que temos de fato é um grande conflito de gerações, uma nova geração de

jovens que se caracteriza por ser diferente da geração anterior a 1950. Um exemplo

citado por Morin, sobre essa “quebra” de paradigma, era o jovem que queria se livrar

do “assalariado e do proletário” (Morin, 1999, pg. 136). Tudo isso em busca de uma

identidade, uma busca em ser diferente.

Música, poesia, pinturas foram usadas para as mais variadas expressões

de sentimento do individuo, seja estas remetendo a uma tranquilidade ou não. Na

década de 1960 e na década de 1970, principalmente a música foi uma arte bastante

utilizada para expor as ideias contrárias sobre o conflito do Vietnã. A Guerra do

Vietnã e o envolvimento dos Estados Unidos não passaram despercebidos pelos

músicos do ainda “jovem” Rock N Roll. Os músicos não faziam apenas canções com

letras cujo conteúdo era sobre meninas e curtição, embora a chamada geração do “iê iê

ie” possa sugerir.

Neste período, diversos festivais de música tinham como “mensagem” a

crítica a Guerra do Vietnã e a toda mudança social que os jovens queriam. O festival

de Woodstock, feito em na região de Bethel, Nova York, em 1969, foi o ápice de toda

essa manifestação juvenil. Sexo ao ar livre, consumo de música e uso drogas eram

vistos como formas de expandir a mente, numa experimentação do presente como se

não existissem o amanhã. No entanto, além do caráter crítico que este e outros

festivais, como o de Monterrey (1967), exerceram outro caráter foi fundamentalmente

importante para que o impacto causado fosse visto em larga escala. Nesta época, a

mídia era um poderoso método de divulgação de ideias. A televisão nos anos de 1960

teve um papel importante, bem como o rádio era em anos anteriores. Ainda que a

televisão tenha expressado esses valores mesmo que de maneira não intencional

(KARNAL, 2010, pg 233) foi importante para a divulgação de novos ideais e na

inspiração de festivais semelhantes nos anos seguintes.

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1.3 O efeito “quente” da guerra “fria” a Guerra do Vietnã

Como explicamos anteriormente, Estados Unidos e a URSS exerceram

hegemonia sobre grande parte das disputas ideológicas e políticas no mundo Pós

Segunda Guerra Mundial. Embora o termo “Guerra Fria” leve a pensar que não houve

um embate direto entre as duas superpotências, ambas, em locais estratégicos

espalhados pelo mundo, usaram de sua influência para promover embates “quentes”.

Ao longo das décadas de 1960 e 1970, não foram raros os momentos sobre a

participação direta dos Estados Unidos, sempre em nome da sua política de

contensão ao “comunismo”. Segundo Sean Purdy existiam nesses locais muitos

“consultores militares”(Purdy,2010, pg 238) que passavam informações a respeito

dessas regiões consideradas “comunistas” pelo governo Norte-Americano. Embora os

Estados Unidos tivessem largo poder e influência, duas nações, embora fossem

geograficamente pequenas, demonstraram que o Gigante também tinham seus pontos

“fracos”: Cuba e Vietnã. Sobre a batalha ocorrida neste último, daremos mais

ênfase no capítulo seguinte.

O episódio dos Mísseis em Cuba foi o momento mais próximo no qual os

Estados Unidos estiveram prestes a declarar guerra contra a União soviética. Fidel

Castro, após a Revolução Cubana de 1959, se aproximou dos soviéticos deixando os

Estados Unidos em total alerta, afinal, a ilha Cubana fica muito próxima ao estado

americano da Flórida. Depois que os Estados Unidos colocaram embargos comerciais

a pequena Ilha, o então Presidente Americano John Kennedy rompeu

relações diplomáticas com Cuba. Kennedy também treinou refugiados cubanos para

tentar tirar Castro do poder. Mas a operação foi um fracasso, justamente por

desconhecer a Politica Cubana. As políticas sociais do Ditador eram populares e bem

vistas pelo povo Castro então concordou com a instalação de mísseis soviéticos no

território da Ilha. Os americanos enfrentaram os soviéticos e por muito pouco, não

ocorreu uma catastrófica guerra nuclear.

No Vietnã não foi muito diferente. Duas forças antagônicas do mesmo país,

apoiadas por forças Soviética e Norte-americana disputavam o poder local. De um

lado, o ditador Ho Chin Min, do lado norte do país asiático, de influência soviética, e

Ngo Diem Dieh que tinha por intenção instaurar um governo satélite dos EUA.

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Devido a sua política de contensão ao “comunismo”, os Estados Unidos com todo

o seu poderio militar passaria a intervir cada vez mais diretamente no Vietnã para

“varrer” adeptos a politica soviética. Conforme o conflito cresceu e a quantidade de

jovens norte- americanos enviados ao sudeste asiático aumentou, a música e mais

notadamente o Rock, empenhou-se nas críticas ao conflito. Vamos analisar mais a

fundo sobre as circunstâncias que fizeram os Estados Unidos entrar na Guerra do

Vietnã, bem como procurar entender como estas situações aconteceram e como ela

foram recebidas posteriormente pelo povo Norte-americano no terceiro capítulo.

Neste capítulo analisamos um pouco o contexto da sociedade americana

nos anos de 1960 e como esta tentou sair das dificuldades que a cercavam. No

capítulo a seguir analisaremos um pouco sobre o Rock e si e tudo que este

significou para esta nova geração, ávida por ter sua voz escutada e atendida. As

nascentes Bandas, com suas formas únicas de se expressar liricamente e musicalmente

garantiam ao mundo que as contestações sociais teriam mais um aliado na luta por

mudança. Embora outros estilos como o jazz, blues e o Folk também tivessem suas

canções de críticas a Guerra do Vietnã, o Rock N Roll, se tornou significativo por

ter impactado mais os jovens nessa década de 1960. Não apenas passeatas faziam

contestação: agora por meio de músicas e festivais ajudaram a “agitar” os anos de

1960.

Assim, trataremos da origem do Rock N Roll e a maneira como cada vez foi

incorporado como um traço fundamental de uma cultura juvenil em formação. O Rock

nesta época, assim como o Punk nos anos de 1970, teve papel crucial em temas

relevantes na época, um estilo que pode parecer inofensivo, mas que suas

“raízes” sociais de contestação e agitação, foram fundamentais nas décadas seguintes.

2. MUITO MAIS QUE UM “IÊIÊIÊ”

2.1- O nascente Rock N Roll

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Notamos que o Rock N Roll foi um “pano de fundo” vivencial e simbólico

para os jovens dos anos de 1960 e 1970, embora naqueles anos existissem outros

estilos como o jazz e o blues, por exemplo. O Rock foi o estilo musical com o qual a

juventude se identificou, por ser um gênero que discursou sobre as mudanças sociais

que ocorriam naquele momento. Não somente questões ligadas ao amor livre, por

exemplo, mas todo um ‘sistema’ de contestações, que iam desde contra as ações do

governo norte- americano e em favor das minorias raciais e o anticonsumismo, sendo

assim um marco desde o seu nascimento, em meados dos anos de 1950. Embora ao

longo desses anos, ele tenha originado continuadores como o rock progressivo, o

punk rock, o rock alternativo, só para citar alguns, o seu “tronco” principal

praticamente permaneceu intacto.

Mas esse estilo não surgiu do nada, bem como também não há apenas um

fundador. É preciso levar em conta o contexto no qual ele estava inserido e entender

como esteve ligado a uma geração que, por tudo que acontecia a sua volta,

ousava pensar diferente, agir diferente. Dizer com precisão um início exato de como

este estilo surgiu parece difícil de descrever em poucas palavras, mas podemos

destacar elementos importantes, tanto de imagem quanto de questão musical

propriamente dito, que o fizeram ser um gênero musical difundido em boa parte do

mundo. O rádio e a TV, com a forte influência que já exercia nos lares Norte-

Americanos nos anos de 1950, fez com que o estilo fosse largamente divulgado,

ainda que tenham sofrido muitas intervenções de outros gêneros musicais. Neste

quadro todo, foi decisiva a importância que os Negros tiveram nesse gênero

musical.

É praticamente impossível não citar a influência que o Rock teve da Música

Negra. O Jazz, com sua forma cheia de improvisação e muita técnica, foi bastante

difundida pelos negros, mesmo quando estes ainda sofriam as imposições racistas ao

longo do século XX nos Estados Unidos. O espaço destinado a eles era bastante

reduzido, devido a imagem de um negro em uma mídia destinada a de “brancos” mas

afro americanos tocavam tão bem, que muitos brancos passavam a imitá- los. Os

ouvintes brancos queriam mesmo era ouvir as canções originais,bem como com as

letras originais, geralmente com conteúdo mais sarcástico como bem assinalou o

historiador musical, Ugo Monte (Monte, 2013,pg.24). O jazz com seus compassos

complexos deu aos futuros músicos de Rock uma teoria de harmonia e de composição

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bastante importantes. Bateristas famosos, como Keith Moon, Charlie Watts, E Ringo

Starr citam o Jazz como influência primordial no seu estilo de tocar.

Não apenas o Jazz foi de suma importância para o nascente Rock N Roll. Um

estilo chamado Rhythm N Blues foi de igual importância. Surgido na época de 1920,

tendo o nome escrito pela primeira vez pela popular revista musical, Billboard, vindo

do Ragtime,43 um estilo que deu origem também ao Jazz e também uma mistura de

gospel e Soul music.54 Artistas como Glenn Miller e Muddy Waters(sendo influências

para vários roqueiros posteriores) foram populares cantores desse gênero musical.

Ainda segundo Ugo Monte, o “Rock N Roll” era uma expressão “usada por

jovens negros nos anos de 1940, expressão que significava sair e se divertir”

(MONTE, 2013, pg. 23). Alan Freed, um famoso DJ65 Norte-Americano, foi o

pioneiro para divulgar o estilo em rádio de brancos. Ainda que anos depois ele tenha

sido colocado no ostracismo, por estar ajudando na divulgação de um estilo que era

“comunista”, foi importante para que os brancos tivessem contato com o novo estilo.

Nesta época, quando o estilo ainda estava em seus primeiros passos, suas

letras já expressavam atitudes de rebeldia e de contestação, algo que ficaria latente

com o seu “amadurecimento” anos depois. Letras com conteúdo “imoral”, que não

confrontavam com o comportamento conservador até então vigente eram vistas como

uma espécie de “delinquência”, e encontrou considerável resistência como bem

assinalou o famoso cantor/ator Frank Sinatra. Sinatra, assim como a cantora de jazz

Ella Fritzgerald, achavam que o estilo era uma moda passageira e iria acabar logo.

Artistas Negros que começavam a fazer essa fusão de estilos como

Chuck Berry, Bo Diddley e Little Richard, pioneiros ao unir o Rhythm n Blues ao

Rock, escreviam canções que muitas pessoas entendiam que eram canções

imorais. No entanto, havia brancos que preferiam ouvir essas letras simpatizaram

com elas. O que seria, porém, do Rock sem um dos seus instrumentos mais

identificáveis, como a

Guitarra? Que deu melodia e riffs tão importantes que ajudaram ele a ser o que é?

3 Ragtime é um estilo afro americano bastante popular no sul dos Estados Unidos que provavelmente se

originou no final do século XIX. 4 Um gênero musical que inspirou o rock n roll na década de 1950, também originada da música afro

americana 5 Expressão usada naquele contexto para se referia ao locutor de rádio, que colocava discos no gramofone,

e não a expressão Dj que se tornou anos depois, comum em boates

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Fora um sujeito chamado Lester William Polsfuss, ou simplesmente Les Paul,

nascido em 1915, no Wisconsin, o pioneiro de técnicas musicas e instrumentos

elétricos, o qual fez da Guitarra ser conhecida da forma que é hoje. Seu famoso

modelo de Guitarra, a Les Paul, se tornou referência desde a década de 1950/1960

aos dias atuais. Além da introdução de técnicas musicais ajudou a desenvolver

pedais de Guitarra, bem como seu modo único de tocar ajudou os músicos nas

décadas seguintes a se desenvolverem, sejam eles ligados ao Rock n Roll ou não.

Igualmente importante para o desenvolvimento de futuros guitarristas foi Django

Reinhardt, guitarrista de jazz belga com influências do flamenco em suas músicas. A

trágica perda de dois dos cinco dedos de sua mão direita não o impediram de tocar e

não o impediram de desenvolver o estilo próprio, que o faz ser reconhecido, sempre

com muita técnica e elegância. Django foi primordial para diversos guitarristas das

décadas seguintes, em especial Tony Iommi, guitarrista do Black Sabbath.

Embora o nascente Rock N Roll já tivesse músicos importantes e que faziam

canções que se tornariam clássicas nos anos seguintes, ainda nesta época existia a

barreira de que muitos deles eram músicos negros, embora houvesse músicos brancos

que tocavam o estilo, tais como Bill Haley, que junto com o seu grupo, o Hit Comets,

fizeram bastante sucesso, principalmente com a canção intitulada “Rock Around The

Clock”. No entanto, numa época em que a imagem era importante para a divulgação,

Haley já passava dos trinta anos em meados dos anos de 1950 e rapidamente

desapareceu do cenário. O rock, tanto em termos de imagem quanto de voz, ‘ganharia’

ainda nesta década de 1950 um importante interprete que ajudou a popularizar o

gênero, um jovem chamado Elvis Presley.

Elvis Aaron Presley, nascido na cidade de Tupelo, no dia 8 de janeiro de

1935, vindo de família humilde e cristã, originalmente entrou em um estúdio pela

primeira vez apenas para agradar sua mãe cantando músicas gospel para ela. No

entanto, Sam Phillips, gerente da gravadora Sun Records, notou no jovem cantor um

timbre e um alcance vocal diferente dos cantores populares da época, ainda que fosse

um instrumentista e um compositor sofrível, já que suas principais canções eram

escritas ou por outros compositores, ou eram regravações de outros

artistas.(MONTE,2013, pg 31)

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Na sociedade racista norte-americana um artista de Rock N Roll negro dificilmente

estaria nas paradas de sucesso pretendido por Phillips, o qual viu em Elvis alguém que

realmente poderia fazer muito sucesso. Como o próprio Phillips assinalou em uma

citação famosa “se eu encontrasse um branco com a voz de um negro, eu ganharia um

milhão de dólares”.(MONTE, 2013, pg. 30)

Neste período, outros nomes também já se destacavam como aqueles futuros

candidatos a estrelas do Rock como o jovem Buddy Holly, que com sua Banda The

Crickets, faziam um som diferente de outros grupos. A dupla de guitarristas de sua

banda, que faziam um som mais leve, menos “cru” que os demais, os distinguia junto

com suas letras. Buddy fora inspiração fundamental para um também jovem Paul

Mccartney, que junto com seu amigo John Lennon, mudaria toda a história do

Rock com os Beatles, sobre o qual falaremos mais adiante. Mas apesar de Buddy ter

feito relativo sucesso, os seus óculos de grau e o seu tipo físico magro não caiam bem

numa proposta de alcance massivo. Neste quesito, Elvis correspondia a um tipo

branco, com uma voz forte, bonito capaz de emplacar uma persona musical de massa.

Isso a despeito de suas danças nas apresentações, as quais foram vistas pelos

conservadores como algo que ferisse a moral e os bons costumes.

Algo importante para ser mencionado é a apresentação dos artistas, algo que

neste período se consolida. Muito do sucesso de Elvis Presley também se deve a sua

imagem e sua maneira de se apresentar nos palcos. Suas roupas brilhantes e

extravagantes, a aproximação do palco junto com a plateia, e sua maneira

performática, de dançar e “chamar” o publico para dançar junto com ele, foram

aspectos importantes para o seu sucesso, bem como as canções que interpretava, com

variações de ritmos, ora com canções mais cadenciadas, ora com canções mais

dançantes. Essa importância da imagem e das apresentações é algo não apenas

marcantes em boa parte das bandas de rock surgidas neste período de 1960, mas algo

fundamental nas décadas posteriores. O rock dos anos de 1970 por exemplo, seria

muito caracterizado pela seus palcos enormes e suas produções impactantes, quando

se teve uma maior importância a este aspecto “teatral” da música , junto com as

inovações tecnológicas que ajudariam na “revolução” desses palcos e dessas

apresentações. A titulo de curiosidade, temos exemplos de bandas do Rock como Pink

Floyd e Emerson Lake e ´Palmer, que tinham enormes produções sobre suas

apresentações.

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No inicio da década de 1960, quase que o estilo poderia ter sido deixado de

lado devido a diversos acontecimentos, tanto com os principais artistas quanto com a

“explosão” de outros estilos: Chuck Berry, que fazia sucesso, acabou sendo preso sob

a acusação de ter feito sexo com uma menor de idade; Elvis Presley migrou sua

carreira um pouco mais voltado para o Pop, deixando um pouco da “rebeldia” de lado;

Buddy Holly junto com outros promissores músicos de Rock, como Ritchie Valens,

morreram tragicamente num acidente de avião, em 3 de fevereiro de 1959. Soma-se

tudo isso também com a emergência das novas estrelas femininas, como o grupo The

Ronettes, estrelas da música Pop como Marvin Gaye e os Jackson Five, ambos com

sucessos nas paradas musicais, os quais ofereciam competição no mercado

fonográfico ao rock em formação.

No entanto, o rock deu origem a novas e inovadoras bandas, as quais

investiram na inovação musical e lírica, superando a concepção de que era apenas um

estilo feito para os jovens dançarem. Os artistas tinham opiniões e muito bem

formadas sobre os mais variados assuntos. Jimi Hendrix, Janis Joplin The Doors,

Black Sabbath dentre tantos outros mostrariam que a música pode ser um importante

aliado na luta por ideais. Mesmo os Beatles e Stones, pioneiros na “Invasão

Britânica”, que normalmente são taxados como grupos musicais que não possuíam

conteúdo crítico em suas letras, foram na verdade, importantíssimos para o

engajamento juvenil, superando a ideia de que o “iêiêiê” não foi apenas de jovens que

eram totalmente apaixonadas pelos seus ídolos juvenis.

Procuramos neste início do segundo capítulo explicar em breves palavras o

surgimento do Rock. Ainda que seja difícil precisar uma origem, procuramos

exemplificar suas principais características do estilo, bem como seus precursores. O

gênero musical que se tornou tão difundido em todo o mundo, mostraria a partir da

década de 1960, que seria uma fora de contestação e transformação do modo de viver

e enxergar a sociedade. No próximo tópico, mostraremos como essas bandas, assim

como outros estilos fora do Rock, utilizaram suas vozes para criar todo um

movimento contra a Guerra do Vietnã. Bem como mostraremos como a juventude

participou ativamente dessa manifestação com música.

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2.2 O Rock N Roll: Agitação e Contestação

O Rock N Roll se estabilizou no decorrer da década de 1960 como um estilo

musical propriamente dito e um nicho de mercado definido. Inicialmente tendo um

viés mais dançante, não demorou muito para que recebesse outras influências

musicais que o tornariam um pouco diferente de sua forma original. Em 1963, ápice

dos movimentos dos direitos civis americanos, e momento do assassinato do

presidente John Kennedy, houve a grande “explosão” de um artista que, inicialmente

tocando apenas canções de Folk, anos depois iria se eletrificar e fundir com o Rock, e

que foi um dos mais importantes artistas desta geração contra a Guerra Do Vietnã,

bem como outras canções de protesto. Robert Zimmerman era o seu nome de batismo,

Bob Dylan seu nome de “Guerra”.

Bob Dylan, pseudônimo tirado do seu poeta favorito, Dylan Thomas, entendeu

como o sistema funcionava e como a massa populacional agia. Não demorou muito

para que suas letras, carregadas de críticas contra esse sistema racista e contra a

guerra que ganhava as notícias (no Vietnã) viessem à luz do dia, tais como Blowin in

the Wind uma espécie de hino dos direitos civis. Segundo Ugo Monte, Dylan queria

ter liberdade para escrever e compor sem nenhum tipo de patrulhamento

ideológico(Monte,2013, pg 75), mas no seu segundo disco, ainda composta

basicamente de músicas Folk, Dylan escreveu talvez a sua maior canção

antibélica: Masters Of War. Quase uma declamação e mostrando sua famosa

dicção já aqui, a letra era uma feroz declaração contra aqueles que tinham o poder e

utilizam dessa ferramenta para fazerem guerras e promoveram a destruição.

Embora nos seus discos sejam de canções com temas e sonoridade mais leves

e pouco ‘eletrificadas’ com características mais acústicas, assim como nos discos

seguintes, que continham canções de análise da sociedade e críticas ao sistema

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americano, foi em seu quinto disco, Bring it all comes, de 1965 que as canções de

Dylan voltaram-se ao Rock N Roll. O rock passaria ainda por algumas

transformações, ainda que suas identificáveis guitarras sofressem aqui e ali, alguma

diferença proposta de contestar, falar e ate em algumas vezes, gritar, não ia mudar.

Mas não devemos esquecer que nesta época surgiriam bandas que mudariam para

sempre o Rock.

Cada vez mais os costumes norte-americanos como roupas, novas formas de

consumo atravessavam as águas do Atlântico a música norte-americana fazia parte do

“pacote. Ainda que a Grã Bretanha, como aquela nação que mais revelou para o

mundo bandas excepcionais do estilo que vinha da antiga colônia, o modo de vida

inglesa parecia tradicional demais, “muito contidos e certinhos” (MONTE, 2013, pg.

58).

Foram muitas as bandas de rock inglesas desta década que “beberam”

da “fonte” norte-americana. Membros de bandas de Londres, Birmingham e de

Liverpool citam músicos daquele país como influência primordial. O Black Sabbath,

por exemplo, banda da qual analisaremos uma de suas canções no próximo capítulo

deste trabalho, era de Birmingham e tinha o blues americano e o prolífico cantor e

multi-instrumentista Frank Zappa como fonte de inspiração, pois inspirou muito as

bandas de rock a se reinventar, a não ficar “acomodado”, sempre buscando novos

som, novas formas de tocar.. Artistas como Bill Halley, que parecia não ter mais

espaço em sua nação, fizeram muito sucesso na Inglaterra.

Foi pela admiração á Buddy Holly, que um jovem músico chamado Paul

McCartney, junto a outro Jovem de Liverpool, John Lennon, fundaram a banda

“The Quarrymen”. Foi o início da dupla de compositores mais influente do todo o

século XX, base do grupo que não muito tempo depois mudou o nome para ‘Beatles’,

com o ‘a’, derivado de ’Beetle’, que significa “besouro”. Há duas versões para a

origem do nome, sendo que uma delas é uma alusão a banda que acompanhava Buddy

Holly, chamada de “Crickets” (que no português significa ‘grilos’) e outra que

foi uma sugestão do primeiro baixista da banda, Stuart “Stu” Stucliffe. Ian

‘Lemmy’ Kilmister, famoso Líder da banda Motorhead, afirmou que na Inglaterra

“existia o antes e o depois dos Beatles”, devido a sua inovação e o nível de suas

composições. Foi o início, mesmo sem querer, da chamada “invasão britânica7” e

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provavelmente sem estas bandas não teríamos o rock n roll de protesto. Boa parte das

canções de protesto tiveram forte influência da música norte- americana e dos

Besouros de Liverpool. Além da inovação musical, de terem praticamente 2 vocalistas

principais, os outros membros contribuíam com os vocais ao vivo, fazendo vocais de

apoio, bem como ajudando no estúdio com algumas composições.

Muito mais do que analisar a importância dessas bandas para o Rock And Roll, é

preciso chamar atenção ao contexto na qual essas bandas se inserem, levando em

consideração o mundo da época. Já existia um consumo musical intenso e com

as bandas produzindo cada vez mais ‘singles’ 8 e os jovens já eram o maior

mercado consumidor do ramo musical ,não se resumindo apenas, o numero de copias

vendidas de discos, mas no impacto que estas bandas causavam no jovens.. A música

vai ou a um grupo coletivo ou para o individuo em si. Segundo Jeder Janotti Jr, esse

consumo parte da:

Apropriação de produtos midiáticos seguem padrões de

conhecimento que ultrapassam ideia de passividade, pois o

consumo enriquece o processo de recepção, isto é, o

processo de leitura desses objetos.(Janotti Junior, 2003,pg.

11).

O consumo dessa mídia esta ligada a um processo de construção da

identidade a partir de um modo de ser, pela transmissão de valores do seu sentido

diante do mundo além das expressões do indivíduo. Por isso, como destaca Edgar

Morin, a cultura do tão difundido “iê iê iê” e do Rock N roll não era apenas um gosto

juvenil motivado pela música e pela dança intensa, mas “uma maneira de ser,

uma atitude face da vida”(Morin,2006,pg139)

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7 “Invasão Britânica” foi a forma como ficou conhecida a ,entrada, na década de 1960, de

algumas bandas inglesas em busca de fazer sucesso nos Estados Unidos. Muitas bandas inglesas tiveram

músicos norte-americanos como inspiração, e utilizando o contexto histórico como justificativa para o

termo “invasão”. Sob determinado sentido, a Inglaterra “re-conquistou” a ex-colônia. Em meados do

século XX, a história se repetiu, em termos culturais.. 8 Um disco com apenas uma música de promoção de um certo artista ou grupo musical.

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Essa cultura juvenil de consumo envolvia uma mudança de atitude, frente a

uma época que passava igualmente por profundas mudanças. A música, ligada a todo

um contexto social, não passou alheia ou sem ser influenciada pelos debates

cotidianos, principalmente frente a vários acontecimentos que chamavam a atenção.

Os Beatles, com seu visual definido pelo produtor Brian Epstein,

chamado “mop top” mudaram a maneira de escutar música por uma serie de

inovações, unindo os riffs estridentes de Chuck Berry com a presença de palco de

Little Richard e o carisma de Elvis Presley (vale destacar, todos músicos norte-

americanos) se destacaram das demais bandas da época. Passado o importante

período em que estiveram em Hamburgo, Alemanha, fazendo shows e

aperfeiçoando suas técnicas musicais, suas letras e melodias fizeram os jovens da

Inglaterra, e posteriormente os Estados Unidos, em 1964, expressarem seus

sentimentos e dançarem como nunca, dando inicio a chamada “Invasão

Britânica”. A sua imagem aqui foi importante também. A maneira de se vestirem

iguais ao se apresentar o já mencionado corte de cabelo, bem como a originalidade de

suas canções , os pioneiros em fazerem clipes para as suas musicas, e estas serem

chamativas devido ao seu conteúdo foram fundamentais para a sua popularização,

bem como sua ida aos Estados Unidos, em 1964, num mercado musical cada vez mais

em revolução e necessitando de artistas que transmitissem uma imagem identificável

com o publico juvenil.

Toda essa mudança juvenil também foi seguida por outros grupos musicais

que acompanharam essas mudanças. Numa época que bandas de Rock faziam suas

letras de amor, e de como era bom estar com a pessoa amada, como os Beatles se

destacaram inicialmente, outros grupos, como os Rolling Stones, tiveram a ousadia de

fazer letras diferentes. O grupo de Mick Jagger e Keith Richards teve ampla

influência, e já faziam letras que chocavam a opinião pública, como a famosa letra de

Sympathy for the devil,.

Outra banda que, apesar de pouco conhecida do grande público, foi

igualmente importante, no sentido de escrever letras que retratavam o contexto social

da época foi fundada em 1967 em Nova York: The Velvet Underground. Tendo

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sido apadrinhada pelo icônico artista plástico Andy Warhol, o Velvet escrevia sobre

tudo aquilo que parecia ser impossível de dizer, no seu primeiro álbum, intitulado

The Velvet Underground And Nico. Juntando o consumo de drogas,

sadomasoquismo, niilismo, dores no coração nos minutos finais da vida como temas

de letras mais uma sonoridade “arranhada”, com instrumentos desafinados e uma

atitude de apenas expressar aquilo que estava sentindo. A produção deste primeiro

disco, ainda que não fosse algo programado para acontecer, escancara que a sua fraca

produção, bem como o conteúdo de suas musicas , fizeram a banda não se “adequar”

aquilo que o mercado musical exigia, numa época em que a produção de discos

passava por transformações tecnológicas, em que cada musica era bem trabalhada

para que o resultado final do disco ficasse a “altura” do mercado. Não foi o que

aconteceu com o Velvet,que inclusive, este disco teve um numero de vendagens bem

abaixo, mas inspirados nas décadas seguintes. Apesar disso, o Velvet indiretamente

influenciaram bandas como Black Sabbath, The Doors e Creedence Cleawater

Revival a expressaram seus sentimentos de repulsa, face a guerra do Vietnã, os

quais vamos analisar mais especificamente no capítulo 3 deste presente trabalho.

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Neste segundo tópico procuramos explicar um pouco mais sobre o Rock And

Roll e a influencia que recebeu de outros estilos no decorrer da década de 1960.

Mostramos também o impacto que grandes bandas deste período tiveram nos jovens e

como foram importantes para a construção de bandas de protesto nas décadas seguintes.

O Velvet, com o conteúdo de suas letras inovadoras para a época, bem como o estilo

alternativo 9 presente em seus álbuns, serviu como um exemplo de pensar e agir

diferente por meio da expressão musical. Mostramos que esta mudança acompanhada de

tantas outras foram importante para que assim como essa juventude já se expressava nas

ruas com passeatas e cartazes, ela também se expressaria na música. A seguir,

mostraremos mais especificamente sobre as bandas de protestos, os festivais que foram

referência para estas manifestações de repúdio ao conflito do Vietnã.

2.3- As Vozes, O Rock e o Vietnã

Meados dos anos de 1960 e já caminhando para a década de 1970, foram anos

importantes para o Rock. Não apenas por este abrir para a fusão com novas sonoridades

e a permissão para novos experimentos em técnicas de instrumentos, mas toda a

indústria musical também caminhava para uma mudança significativa. Neste período, já

ocorrera ampla reivindicações de direitos, mudanças nos valores estruturais de

comportamento tais como questões de educação, de família, amor, sexo. Na música tais

elementos se mostraram de maneira plena. O jovem agora, diferente de épocas

anteriores, tinha voz.

Foi neste sentido que ‘explodiram’ festivais musicais em vários pontos dos

Estados Unidos. Nestes eventos, geralmente celebrados no meio do “nada”, toda uma

‘febre’ de luta por ideais e constatação de mudanças de comportamento se mostrou de

uma forma efetiva. Os primeiros festivais possivelmente ocorreram no norte da

9 Alternativo aqui não significa o derivado Rock alternativo, surgido na década de 1980, mas

apenas um sentido de fugir dos padrões do rock convencional e característico da década de 1960,

marcado por guitarras afinadas e vocais que acompanhavam a melodia das canções. Uma forma mais

experimental de se fazer música.

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Califórnia, o chamado Fantasy Fair & Magic Montain entre os dias 10 e 11 de junho de

1967(MONTE, 2013, pg 115). Não muitos dias depois deste, o famoso Monterrey

International pop festival tomou proporções maiores muito, pelo fato de grandes bandas

de Rock que já faziam sucesso estarem presentes tais como Jimi Hendrix, The Who,

Janis Joplin e nomes Folk como Simon And Garfunkel.

Parte das transformações musicais pelas quais a sociedade passava nesta

década, como já salientamos há pouco, deriva do fato destes festivais renderem às

bandas que se apresentavam uma divulgação ampla e importante Num movimento que

até os dias atuais verificamos claro com as devidas proporções, bandas que queriam ter

o seu lugar ao Sol procuravam participar destes eventos a fim de aumentar suas

vendagens, popularidade e consequentemente, o sucesso.

Woodstock é uma cidade do Estado Americano da Virginia no condado de

Shenandoah. Alguns jovens gostaram da ideia sobre ter um festival nesta cidade, mas a

população local vetou a ideia. Sem se contentarem, eles acharam uma fazenda em

Bethel, já no Estado de Nova York, o lugar para fazerem de lá “3 dias de paz e música”.

O festival, ajudou na ‘expansão’ dessa nova formas de viver dos jovens, as drogas, o

sexo livre mostravam que as tradições familiares, já estabilizada, estava sendo

contestada.

O “Woodstock Music & Art Fair” foi muito mais que estes pontos citados. Para

o Sociólogo Emiliano Rivello, Woodstock representou:

Um marco cultural e simbólico para as gerações posteriores. Não

somente na forma de artista cantar e compor, suas performances de

palco, mas também os hábitos culturais da sociedade Norte-

Americana (Rivello Apud Mariuzzo, 2009, p. 60-61)

O rock adquiriu uma mensagem, um fazer frente a uma Guerra que como veremos no

capitulo 3 foi rejeitada por grande parte da população norte-americana e muitos dos seus

jovens que iam para ela desertavam.

Ocorrido nos dias 15 e 18 de agosto de 1969, sua previsão de aproximadamente

200.000 pessoas foi superada pelos 500.000 participantes que foram para a fazenda em

Bethel. Não faltou no festival paz, amor e muito Rock and roll, regados a drogas. Sem

muitos incidentes graves, o festival no geral acabou sendo um extremo sucesso.

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Muitos artistas que já ganhavam destaque no cenário musical norte-americano

estiveram presentes. Artistas Folk como Joan Baez foi a grande estrela do estilo

musical, já que Bob Dylan não esteve presente, se recusando a participar. Artistas como

Jefferson Airplane, Janis Joplin, The Who, Santana e Creedence Cleawater Revival e

que para esse trabalho merecem atenção especial, não somente pela notoriedade de suas

canções e a notável habilidade para com seus instrumentos, mas pela representatividade

que teriam em virtude da critica a Guerra do Vietnã.

Jimi Hendrix já presente no Festival de Monterrey fez o seu grande nome

provavelmente aqui. Conhecido na Inglaterra, Hendrix, nascido em Seattle em 1942.,

fez de sua guitarra sua verdadeira ‘voz’. Ainda que suas letras mereçam destaque,

devido a simplicidade e sua objetividade foi durante a sua apresentação no dia 17 que

ele mostrou o que ‘pensava’ do conflito. Durante a execução de sua versão para o hino

nacional dos Estados Unidos, o The Star- Spangled Banner, Hendrix utilizou de efeitos

de distorção na guitarra para simular sons de bombas, canhões e metralhadoras. Atitudes

descritas como um símbolo da inquietude e manifestação contra a Guerra do Vietnã. É

importante mencionar aqui não apenas os “gritos” de repudio que não só Hendrix, mas

algumas bandas do festival fizeram a Guerra do Vietnã. O próprio distorcer da guitarra

de Hendrix é um símbolo do quanto á música em si, não somente as letras é um fator

interessante para ser analisado. As distorções de guitarra, os solos durante as músicas e

as improvisações em pleno palco faziam parte de inovações no sentido de “provocar”, do

fazer diferente, uma maneira de incomodar os ouvintes, de musicalmente dizer que esses

protestos eram ativos e fazendo parte de todo um contexto de protestos, não apenas em

termos de letras, mas em termos de melodias, da música em si.

Outra banda presente no festival, sobre a qual no próximo capítulo daremos

mais ênfase a sua historia, foi a banda Creedence Cleawater Revival. Já famoso na

época do Woodstock, o grupo liderado pelo Guitarrista/Vocalista John Foghety compôs

uma das canções de maior sucesso da banda, a Fortunate son, uma declaração afiada sob

uma das várias críticas que se fazia sobre a guerra.

Black Sabbath, The Doors e o Creedence Cleawater Revival, bandas que

analisaremos mais adiante, participaram de diferentes festivais de música. Todas elas

escreveram suas canções de protesto em repúdio ao conflito reagindo a cada aspecto de

uma catastrófica batalha, inclusive aqueles que as autoridades demoraram

demasiadamente e se recusavam a divulgar sobre o que realmente acontecia no campo

de batalha asiático. No entanto, essas e tantas outras bandas não só de Rock and Roll

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tentaram contestar, denunciar, alertar. Neste tópico procuramos mostrar os caminhos

que o Rock tomou em meados da década de 1960 e inicio de 1970. Mostrando um

pouco dos festivais de música e sua influência na divulgação de novos valores sociais,

que já vinham se instituindo desde o inicio da década de 1960, bem como exemplificar

a atitude da juventude diante de todos esses acontecimentos e sua reação para com eles.

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3. MUITO ROCK E UM POUCO MAIS DE VIETNÃ

3.1-O conflito

Neste analisaremos as bandas Black Sabbath, The Doors e o Creedence

Cleawater Revival, analisando algumas de suas canções específicas sobre a Guerra do

Vietnã. Destacaremos também a atuação norte-americana na Guerra e como o conflito

se originou. Embora ao longo do trabalho mencionamos aspectos da Guerra, achamos

mais adequado analisar o conflito e as canções em separado, para que o leitor tenha uma

compreensão mais uniforme sobre o que será analisado. Alguns aspectos merecem uma

menção especial a cada uma das letras analisadas, pois cada uma delas contém um

detalhe, uma parte do que o conflito foi capaz de causar tanta na população

vietnamita/norte-americana, como na opinião pública dos Estados Unidos.

Ressaltamos aqui também o engajamento dessas bandas e de suas letras em

denunciar o conflito e de todas as consequências que este trouxe a população jovem.

Cada aspecto de cada letra selecionada será de suma importância para compreendermos

o quanto ela foi desastrosa. Estas canções deixaram claras que foram direcionadas a

temas específicos, a um objetivo certo, nem sobre a execução da canção pelos artistas

mencionados.

O termo “Guerra do Vietnã” sugere uma batalha como várias outras, ou seja, em

que dois ‘países’10 se enfrentam e um deles saí vitorioso. O fato de um majoritariamente

ter mais recursos militares e econômicos maiores do que o outro sugere que este saiu

‘campeão’ do conflito, se é que em batalhas existem campões, sobretudo esta. Mas não

é simplesmente o fato do “maior” país ter perdido para o “menor” que está a

peculiaridade desta guerra. Alguns fatos presentes neste sangrento conflito nos ajudará a

perceber que muito maior que as perdas de recursos financeiros foram as perdas

humanas, sobretudo de civis.

10 Ressaltamos que havia aqui dois Vietnãs, o do norte e o do sul. Embora sejam separados por

distintas formas administrativas, ambas sofreram drásticas consequências civis, e ambas estiveram

envolvidas em diversos conflitos armados, tanto de dentro desses países como de invasores

estrangeiros, mais notadamente foi os Estados Unidos.

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Claro que toda essa movimentação intensa em direção a mais uma guerra

sangrenta estava inserida dentro da famigerada Guerra Fria. A contenção ao comunismo

e a ideia de que este era uma “podridão” (CHOMSKY, 1976, pg. 65) levaram os norte-

americanos a enviarem ao Vietnã “consultores militares” para averiguarem a situação

no país, embora existam provas de que estes consultores militares auxiliavam Diem em

suas matanças, inclusive revelando detalhes e relatando o que viram nessas ocasiões. O

fato é que no Governo Truman já havia relatórios de que os Estados Unidos temiam a

expansão do comunismo na China que poderia se espalhar para as outras nações. Os

governos seguintes, como o de Kennedy, Lyndon B Johnson e o de Richard Nixon,

empreenderam esforços para conter a “ameaça vermelha”. Como “argumento” para a

invasão do Vietnã do Sul, os norte-americanos alegavam que certos países da Ásia

estariam tendo reais avanços econômicos e sociais, tendo estes como modelo de

governo o comunista (Ibid,66). A invasão norte-americana no Sul do Vietnã, neste caso,

seria para conter a unificação dos dois Vietnã sob governo comunista, e mais do que

isso, garantir que esse “progresso” econômico não corresse fora do quadro de controle

norte-americano e impedir a inspiração de outros movimentos locais, de outras nações a

levante de intenções “comunistas”.

Só que isso levou a sérias consequências. Antes da Guerra do Vietnã, com o

envolvimento diretamente norte-americano, o país asiático já sofria consequências de

outros conflitos. Parte da antiga colônia francesa da Indochina, o Vietnã havia sido

dividido depois da guerra da Coréia em dois, norte e sul. Os franceses bombardearam a

cidade de Haiphong, no norte, onde estima-se que mais de 6.000 civis morreram.

Segundo Noam Chomsky, a administração no Vietnã do Sul, liderada pelo ditador Ngo

Dihn Diem teria promovido massacres ainda mais drásticos.(Chomsky,1976, pg 59)

Este governo, que era apadrinhado pelos Estados Unidos, cometeu uma série de

atrocidades, como a criação de campos de concentração contra prisioneiros políticos. As

matanças sem freio apenas por serem suspeitas começaram a serem “mal vistas” pelo

seu ‘pai11’ norte-americano. Os Estados Unidos deram apoio a Diem ate 1963, quando

aos norte-americanos viram que as ações descontrolados do ditador asiático se tornaram

uma ameaça para os seus interesses.

11 ‘pai’ aqui no sentido metafórico, em que o ‘filho’ seria o governo de Diem. Onde este fornecia

recursos financeiros, armamentos e outras necessidades, tudo para conter a o avanço “comunista”.

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Os Estados Unidos, ciente de que seu poderio militar poderia rapidamente

derrotar o inimigo, fizeram este lançar diversas bombas contra o país asiático. Segundo

Chomsky, no fim do ano de 1971, mais de 3,9 milhões de toneladas de bombas foram

lançadas no Vietnã, apenas dos aviões (Chomsky, 1976, pg. 70) muito em algumas

zonas habitadas. Esses bombardeamentos, bem como outras formas de ataques fizeram

desta guerra uma batalha sangrenta sem precedentes. Estima-se que mais de 400.000

mortos e mais de 900.000 feridos sofreram as trágicas consequências, sendo que quase

nunca a preocupação era com os civis, mas em conter um ‘expansionismo’ de uma

forma de governo.

Dentre as varias atrocidades que podemos listar aqui cometidas não só pelo

governo norte-americano, a mais conhecida e trágica delas seja My Lai, quando em

retaliação a morte de um militar importante, o tenente americano William Calley

mandou matar todos os civis da aldeia, inclusive mulheres, crianças e idosos. O fato é

que há evidencias de que houve diversos outros massacres semelhantes ou piores que

este. Este e outros relatórios que chegavam, feitos por soldados comuns, chocaram a

opinião pública norte-americana, que passou a fazer o possível para protestar, sobretudo

na música e mais ainda, do Rock N Roll.

Em solo norte-americano, passeatas, cartazes, dizeres, festivais de músicas e

manifestações artísticas em geral não se ‘calaram’. O rock foi um dos estilos largamente

utilizado para estes fins, embora diversos estilos musicais, como o Folk também tenha

sido engajados. Não só pelo número de material gravado com canções de conteúdo

explícito e não explícito sobre a Guerra, mas por grupos musicais de Rock que

ganhariam destaque na década de 1970 nos Estados Unidos, sendo estas canções de

protestos cada vez mais presentes nos Set-list, fazendo muito sucesso entre o público.

Embora como já mencionamos diversas canções de rock foram produzidas,

gravadas e executadas em repúdio à Guerra Do Vietnã, neste capítulo é realizada a

análise de 3 canções de três diferentes bandas de rock. O critério de escolha contempla a

qualidade musical, o impacto de cada uma destas bandas no cenário musical e pelo

aspecto singular que cada uma dessas letras trouxe de referência sobre a guerra. Vamos

apresentar a letra de cada canção, tratar um pouco o histórico da banda e sua biografia.

A título de reforço, as canções aqui analisadas são: War Pigs do Black Sabbath, The

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Unknown Soldier do The Doors e Fortunate Son da banda Creedence Cleawater

Revival.

3.2 - Letras das canções: análise

A Guerra do Vietnã foi um conflito sem precedentes, tanto para o ‘lado’ Norte-

Americano, quanto para o lado Vietnamita. Baixas, torturas, violência de vários tipos

eram cenas comuns de um ‘filme’ que em nada eram de ficção. Nas letras das canções a

seguir, todas escritas no fim da década e 1960 e início de 1970, mencionaremos

aspectos que não estiveram presente até agora no trabalho sobre o conflito do Vietnã.

Neste tipo de abordagem, favoreceremos o significado das canções e como cada uma

das letras realçava um aspecto da guerra que durante alguns anos esteve ‘escondido’ da

opinião publica norte-americana. Além do mais, realça-se a singularidade que a música

teve com questões sociais. Existiram bandas altamente atuantes com questões voltadas

para o social.

O Black Sabbath é uma banda de Rock N Roll que influenciou diversas

gerações seguintes do rock, sendo a principal influência para um estilo musical que faria

sucesso anos depois, o Heavy Metal. Fundada em 1968 na cidade de Birmingham,

Inglaterra, ainda quando esta cidade se recuperava da devastação das bombas recebidas

pelos aviões alemães na Segunda Guerra Mundial. Formada por Tony Iommi (guitarras)

Ozzy Osbourne (Vocais) Terence’Geezer’ Butler ( Baixo, letras) e Bill Ward (bateria)

sua especificidade eram o som calcado no Blues Americano e a deficiência de Iommi,

que perdeu parte de seus dedos médios em um acidente em uma fábrica. Rapidamente

tornou-se conhecido na Inglaterra inicialmente, depois nos Estados Unidos. O grupo fez

sucesso no fim da década de 1960 e na década seguinte, mais precisamente até 1975, a

partir de quando a qualidade dos álbuns caiu e o público deixou de comparecer nos

shows ao vivo. Dentre algumas consequências deste momento conturbado, ocorreu a

saída de Ozzy, em 1978, após a gravação do disco Never say die, do mesmo ano. O

grupo se revitalizou após a perda de seu vocalista original, chamando para o lugar de

Ozzy o cantor ex-Rainbow Ronnie James Dio, lançando álbuns clássicos do Rock, como

o Heaven and Hell, de 1980. No entanto, foi Ozzy Osbourne quem deu voz à canção

War pigs. O seu primeiro disco de estúdio da banda, Black Sabbath lançado em

fevereiro de 1970, já se caracterizava por letras em que aspectos sombrios permeavam

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por todo o disco o próprio nome da banda fora tirada de um filme do cineasta Mario

Bava intitulado Black Sabbath de 1963. Mas foi no segundo disco, de novembro de

1970, que a banda fez um sucesso ainda maior e onde está contida a nossa canção de

análise War Pigs. Disco nomeado, Paranoid ,fez um grande sucesso pelo estilo calcado

no blues, fundindo com o Rock já firmado e com as letras do disco. A letra de War Pigs

segue abaixo, junto a sua tradução:

Generais reunindo seus seguidores

Como bruxas numa missa negra

Mentes diabólicas que tramam destruição

Criação de feiticeiros da morte

Nos campos há corpos queimando

Enquanto a máquina de guerra continua agindo

Morte e ódio à humanidade

Envenenando suas mentes esvaziadas,

Oh Deus!

Políticos se escondem

Eles apenas iniciam a guerra

Por que eles deveriam sair para lutar?

Eles deixam esse papel para os pobres

O tempo vai mostrar a força de suas mentes

Fazendo guerra só por diversão

Tratando as pessoas como peões num jogo

de xadrez

Esperando até que o dia de seu julgamento chegue,

yeah!

Agora na escuridão o mundo parece parar de girar

Cinzas onde os corpos deles estão queimando

Os porcos de guerra não têm mais o poder

A mão de Deus marcou a hora

Dia do julgamento, Deus está chamando

Os porcos de guerra estão de joelhos, rastejando

Implorando perdão por seus pecados

Satã está rindo e espalhando suas asas

Oh Senhor, yeah.

Generals gathered in their masses

Just like witches at black masses

Evil minds that plot destruction

Sorcerers of death's construction

In the fields the bodies burning

As the war machine keeps turning

Death and hatred to mankind Poi-

soning their brainwashed minds, Oh

Lord yeah!

Politicians hide themselves away They only started the war Why should they go out to fight? They leave that role to the poor Time will tell on their power minds Making war just for fun Treating people just like pawns in chess Wait 'till their judgement day comes, yeah!

Now in darkness, world stops turning

Ashes where their bodies burning

No more war pigs of the power

Hand of god has struck the hour

Day of judgement, god is calling On their knees, the war pigs crawling Begging mercy for their sins Satan, laughing, spreads his wings Oh lord, yeah!

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A letra, segundo o baixista Geezer Butler, é em crítica sobre a guerra do Vietnã

(WALL,2014. pg 67) ,que contém versos que se baseava em como os políticos ricos e

pessoas ricas começam as guerras apenas para seu beneficio próprio mandando os mais

pobres para morrer por eles. Fato este presente na letra, quando o baixista escreve “Eles

apenas iniciam a Guerra, por que eles deveriam sair para lutar? Eles deixam o papel

para os mais pobres”.

War Pigs também evidencia outros aspectos que a Guerra do Vietnã trouxe de

malefícios para aquele país. Na primeira estrofe, quando cita “nos campos a corpos

queimando, enquanto a máquina de guerra continua girando” faz-se uma citação a toda

matança empreendida pelos norte-americanos. Como o livro de Noam Chomsky deixa

claro, as autoridades norte-americanas não estavam isentas das responsabilidades de

certas “violações do espírito, se não da letra do Direito Internacional” (Chomsky, 1976,

p. 21). O Slogan “a morte é um negocio e o negocio corre bem”, segundo Chomsky ,

estava presente nas bases norte-americanas no Vietnã, atestando o quanto existia

matança desenfreada, principalmente em relação aos civis. Uma operação de cunho

“pacifista” batizada de Speedy Express12 trouxe números de destaque sobre como era

desproporcional o número de armas encontradas (748) e o número de pessoas mortas

(cerca de 11.000). Os Vietcongs armados eram facilmente reconhecidos pelo simples

fato de estarem com armas, mas os civis desarmados eram mortos de maneira

desproporcional. Como Chomsky coloca “muitas vítimas eram civis inocentes e

desarmados” (Chomsky, 1973, pg. 43)

Também, é preciso notar na letra a denúncia pelos “corpos queimando”, pois o número

de Napalm jogado no Vietnã do Sul foi absurdo, sem nenhum fundamento militar, e

embora justificado como para atingir os Vietcongs, era lançado em locais habitado por

civis nas regiões classificadas como zonas “suspeitas”, evidenciando ainda mais a morte

de inocentes. A letra também atesta a falta de preocupação com aqueles que eram

enviados para os campos de batalha por parte dos governantes norte-americanos,

mostrados aqui de forma irônica quando afirma que “o tempo vai mostrar a força de sua

mente, fazendo guerra só por diversão”. Como foi mostrado nas linhas anteriores, o

12 A operação Speedy Express foi mais uma das missões de “pacificação” existente, de parte

Norte-americana no Vietnã. Os Números presentes de mortos, segundo um relatório do correspondente de

guerra Kevin Buckley, eram de 5,000 mortos, pelopoder do tiro, para “pacificar”. Essas missões de

“pacificação” nada mais eram do que uma matança desenfreada de civis, em zonas agrícolas, sem ser

necessariamente em zonas de alvo militar.

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governo dos Estados Unidos concebia o “comunismo” como uma ameaça política e

econômica, não importando a forma como iriam combater esse modelo de governo.

Outra letra que evidencia aspectos da Guerra do Vietnã é a canção The

Unknown Soldier do Grupo Norte-Americano, The Doors. O grupo foi formada em

1965, Los Angeles, California. Formado por 4 jovens músicos que deram a banda uma

sonoridade mais leve, mas ainda assim cheio de vigor e energia, seja pelas atuações de

destaque dos teclados, seja pelos vocais ora “feroz”, ora “leve” do seu vocalista, Jim

Morrison. Sua formação incluía também Ray Manzarek (teclados, vocais) Robby

Krieger (Guitarra) e John Densmore (bateria). Após a morte de Morrison, em 1970, a

banda com os seus membros originais tentaram seguir carreira, tendo Manzarek a frente

dos vocais, dividindo-os também com Krieger. Os discos após a morte de Morrison, o

Other voices (1971) e o Full circle (1972) não tiveram muito destaque, embora ainda

esteja presente a conhecida sonoridade da banda. Notou-se que seria difícil seguir sem

Jim a frente da banda e o grupo acabou logo após o Full circle, tendo seus membros

seguido em suas respectivas carreiras-solo.

A melodia da banda é um aspecto que desde cedo chamou atenção e isso

evidencia o sucesso dos seus álbuns no decorrer da década de 1960 e no inicio da

década de 1970. As poesias e fortes letras de Morrison, unidos com as importantíssimas

bases de teclado de Manzarek, faziam um som totalmente caraterísticos. O teclado

tomava a ‘frente’ na sonoridade, sempre estavam em evidência sob os outros

instrumentos. A guitarra de Krieger, em sua maioria suave, e a bateria de Densmore,

embora em segundo plano, completavam a sonoridade da banda, como uma espécie de

‘camada’ no qual os teclados fincavam suas bases.

The Unknown soldier presente no álbum Waiting for the Sun o terceiro da

banda, de 1968, apresenta essas características. Com direitos a gritos e solos tanto de

teclados quanto um tímido e brilhante solo de Krieger, essa música especial está em um

nível importante dentro de sua discografia. Além da sonoridade, a letra é um aspecto

especial que completa a canção, como se pode observar a seguir.

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Wait until the war is over And we're both a little older. The unknown soldier.

Breakfast where the news is read.

Television children fed. Unborn living, Living dead. Bullet strikes the helmet's head

And it's all over For the unknown soldier. It's all over For the unknown soldier.

*army marching sounds*

*gun firing*

Make a grave for the unknown soldier Nestled in your hollow shoulder. The unknown soldier.

Breakfast where the news is read.

Television children fed. Unborn living, Living dead. Bullet strikes the helmet's head

And, it's all over.

The war is over.

It's all over. The war is over. Well, all over, baby. All over, baby. Oh, over, yeah. All over, baby.

Espere até a guerra terminar E estaremos os dois um pouco mais velhos O soldado desconhecido

Café da manhã, onde os notícias são lidas

Televisão alimenta crianças Não-nascidos vivos, mortos vivos Bala atinge a cabeça sob o capacete

E está tudo acabado

Para o soldado desconhecido E está tudo acabado Para o soldado desconhecido

Faça uma cova para o soldado desconhecido Aninhado no seu ombro vazio O soldado desconhecido

Café da manhã, onde os notícias são lidas

Televisão alimenta crianças Não-nascidos vivos, mortos vivos Bala atinge a cabeça sob o capacete

E está tudo acabado

A guerra acabou

Está tudo acabado A guerra acabou Tudo acabado, baby

Tudo acabado, baby

Tudo acabado

Tudo acabado

A letra da canção apresenta uma feroz crítica a Guerra do Vietnã, bem como

uma canção também antiguerra .Embora a canção possa dar a entender que não se trata

diretamente a uma critica a Guerra do Vietnã13, vemos elementos nela que apontam o

contrário14. O pai de Jim se envolveu no conflito já que este era da Marinha norte-

americana. A letra trata da manipulação que a mídia daquele país fazia, não divulgando

os reais fatos e as reais atrocidades que aconteciam no Vietnã. Morrison, conhecido de

13 O site “songfacts.com” afirma que ela é apenas uma canção apenas anti guerra. 14 O site http://wordsinthebucket.com/the-doors-unknownsoldier-1968 apresenta mais argumentos de comprovação, bem como a nossa análise.

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outros tempos por fazer letras que escancaravam o que acontecia no social, analisou tais

ideias.

A segunda e na quinta estrofe, nas quais se repete “Café da manhã, onde as

noticias são lidas, televisão alimenta crianças” evidenciam que as notícias que

chegavam não correspondiam ao que ocorria no país asiático. A ideia passada pela

mídia americana sobre o conflito era de que as tropas estavam lá por questões

dignamente “humanitárias”, para combater a violência e a ‘expansão’ de ideais

‘comunistas’. O textos de “Televisão alimenta crianças” evidencia que apenas notícias

de “pacificação” eram vinculadas, e que devido a outros acontecimentos em países

como Camboja e Burundi, onde aconteceram tantas atrocidades como esta, muitos fatos

foram ocultados para que a opinião pública ficasse sempre ao lado do governo.

Interessante notar que essa música, devido a sua polêmica letra, foi proibida em varias

rádios dos Estados Unidos, mas era uma canção que frequentemente estava nos Setlist

nas apresentações ao vivo. A letra da canção também alerta que com o “andar” dos

acontecimentos, pela forma como as notícias vindas do Vietnã eram passadas, a situação

ficou cada vez mais difícil: “está tudo acabado, tudo acabado para o soldado

desconhecido”.

Chomsky evidencia que havia uma espécie de “gestão de atrocidades” por parte

das autoridades, com o intuito de controle e o uso seletivo de relatórios sobre as ações

de guerra. Segundo Chomsky, essa ideia e essa forma de manipulação da mídia norte-

americana não é algo que surgiu voltada somente para esconder os atos de Guerra, mas

é uma prática recorrente dos governos. A canção se insurge contra este controle,

embora ela mesma tenha sido censurada em veículos de comunicação. Mas proibida de

ser veiculada nos rádios, a canção aparecia em shows. Interessante notar que nas

apresentações desta música ao vivo 15 acontecia de Krieger apontar a guitarra para

Morrison, e o guitarrista simular atirar no vocalista, que caia no chão e continuava

cantando.

A Banda Creedence Cleawater Revival, foi uma banda que assim como o The

Doors teve pouca duração. Iniciou suas atividades em 1967 na Califórnia e terminou em

15 Nos vídeos disponíveis no youtube, site que serviu de pesquisa sobre essa música ao vivo, pode-

se observar que nos shows de 1968, nas cidades de Copenhague, Londres e no show do intervalo do

Hollywood Bown, essa performance era comum..

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1972 devido as diferenças musicais entre seus integrantes. Mesmo com pouco tempo de

vida seus discos foram bastante marcantes, vendendo milhares de cópias em todo o

mundo. Sua formação era composta por John Fogerty (Vocais, Guitarra, letras) o seu

irmão Tom Fogerty (Guitarra), Stu Cook (Baixo) e Doug Clifford(Bateria).

A sonoridade do grupo era uma interessante mistura entre Country e Blues

Rock, no qual predominava as letras e os vocais do Fogerty mais novo, John. Embora

sejam conhecidos pelo ‘hino’ Have you ever seen the rain? que os alçou em fama

mundial, outras canções como Proud Mary e Green River também os fizeram bastante

conhecidos. O grupo foi convidado a participar do festival de Woodstock, fazendo uma

apresentação bastante elogiável e memorável.

Igualmente importante foi a canção Fortunate son, música objeto de análise a

seguir. A canção, suave e cantada pelos vocais roucos e característicos de John,

apresenta muitos mais elementos voltados para o Country, com harmonias mais

rítmicas, sem muitas variações. Isso é algo que perpetua em praticamente todas as

outras canções do grupo. Fortunate Son está presente no álbum Willy and the Poor Boys

de 1970, o quarto disco e um dos mais vendidos da banda, que ganhou dois discos de

platina nos Estados Unidos.

Some folks are born made to wave the flag, ooh, they're red, white and blue. And when the band plays "Hail To The Chi ef", oh, they point the cannon at you, Lord,

It ain't me, it ain't me, I ain't no senator's son, It ain't me, it ain't me, I ain't no fortunate one, no.

Some folks are born silver spoon in hand, Lord, don't they help themselves, oh. But when the taxman come to the door, Lord, the house look a like a rummage sale, yes.

It ain't me, it ain't me, I ain't no millionaire's son. It ain't me, it ain't me, I ain't no fortunate one, no.

Algumas pessoas nascem para balançar a bandeir a, Ooh, elas são vermelhas, brancas e azuis, E quando a banda toca "Saúde o Chefe" Ooh, eles miram o canhão para você, Senhor.

Não sou eu, não sou eu, Eu não sou filho do senador, Não sou eu, não sou eu, Eu não sou o afortunado, não. Algumas pessoas nascem em berço de ouro,

Senhor, eles não se ajudam, oh. Mas quando o coletor de impostos chega à porta, Senhor, a casa parece um bazar de caridade, sim. Não sou eu, não sou eu

Eu não sou filho de milionário Não sou eu, não sou eu, Eu não sou o afortunado. Sim, algumas pessoas herdam olhos com brilho d

asestrelas, Ooh, Eles te enviam para a guerra, Senhor, E quando você os questiona, o quanto devemos d

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Yeh, some folks inherit star spangled eyes, ooh, they send you down to war, Lord, And when you ask them, how much should we give, oh, they only answer, more, more, more, yo h,

It ain't me, it ain't me,

I ain't no military son,

It ain't me, it ain't me, I ain't no fortunate one.

It ain't me, it ain't me,

I ain't no fortunate one, no no no, It ain't me, it ain't me, I ain't no fortunate son, no no no,

ar, Ooh, eles apenas respondem, mais, mais, mais, si m. Não sou eu, não sou eu

Eu não sou filho do militar Não sou eu, não sou eu, Eu não sou o afortunado Não sou eu, não sou eu

Eu não sou o afortunado, não não não Não sou eu, não sou eu, Eu não sou o filho afortunado, não não não

A letra ressalta para uma questão que não era muito discutida quando o assunto

era Conflito no Vietnã: a pobreza. Apesar de este aspecto estar presente na letra de War

Pigs do Black Sabbath, aqui temos quase um alerta inteiro para esta questão,

mencionando aspectos relativos aos soldados combatentes na Guerra.

Isso fica evidente na segunda estrofe, em que diz “eu não sou filho de

milionário, não sou eu, não sou eu. Eu não sou o afortunado”. Pesquisas confirmam que

milhares de jovens majoritariamente de baixa renda, latinos, negros eram recrutados

desproporcionalmente pelas forças armadas para o conflito do Vietnã. Outros fatores

aparecem na letra além da denuncia do quanto que essa prática de recrutamento de

classe era recorrente. Em certa parte, a letra cita “e quando você os questiona, o quanto

devemos dar. Ooh, eles apenas responde, mais, mais, mais, sim” mostrando que se devia

seguir as ordens dos chefes do exército, mesmo que as ordens fossem completamente

contrárias àquilo que os soldados acreditassem. Além do que, a letra claramente

chamava atenção à proteção aos filhos dos ricos por parte das autoridades, quando é

citada que “algumas pessoas nascem em berços de ouro”

Derivado desses protestos também cresceu o número de deserções e

desobediência por parte dos militares recrutados. De quarenta e sete mil em 1967 para

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noventa mil em 1971. O Pentágono informou que duzentos e nove oficiais foram mortos

pelos próprios colegas de farda além de inúmeras desobediências. O próprio John

Fogerty foi um desses que nos anos de 1960 conseguiu baixa do exército, por não

concordar com o conflito, situação que gerou inspiração para compor a letra, além de

escrever uma canção de repúdio sobre. Fortunate son nos traz alguns aspectos sobre um

mesmo conflito, os anseios e preocupações sobre uma questão que muitas vezes,

passava despercebido do grande público. A preocupação de John Fogerty para mostrar o

quanto era desproporcional recrutar aqueles de baixa renda bem como a proteção aos

ricos e a falta de preocupação por parte dos poderosos em relação a essa classe da

sociedade, torna a letra uma das mais completas críticas a Guerra do Vietnã

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CONSIDERAÇÕES FINAIS

Desde o início da graduação procurava compreender como o Rock N Roll, que

já nasceu dentro de um espírito de ‘rebeldia’, conseguiu ser uma voz ativa sobre

questões sociais. Após notar que um conflito de proporções gigantescas como a Guerra

do Vietnã fora contemporâneo de um estilo musical que já era, e se tonaria ainda mais,

muito popular entre os jovens, procurei analisar como esta música foi mobilizada

diante deste fato. Embora seja importante ressaltar que não só o Rock N Roll tenha

‘cantado’ sobre a Guerra, entendemos que o Rock, como um estilo popular construiu

representações musicais que simbolizaram toda uma era de mudanças sociais

principalmente em relação a juventude.

A música nunca esteve fora do contexto social ao qual esta ligado,

principalmente o Rock N Roll, estilo ‘abraçado’ pela juventude e que se tornou uma

referência para contestar experiências de vida e concepções normativas de sua época.

Além das passeatas, protestos e manifestações dos jovens nos anos de 1960 e 1970, toda

palavra que saia das bocas das bandas que se recusavam a se calar diante das

atrocidades cometidas em conflitos bélicos, que defendiam a necessidade de ampliar os

direitos civis em favor de minorias raciais e das mulheres, por uma maior liberdade

sexual além de outros fatores. Houve a mobilização de vários jovens contra a política

de um Governo que aparentemente ‘cego’ pela paranóia comunista, mandava jovens

para o massacre em um País asiático.

A Guerra do Vietnã trouxe não só consequências aos soldados norte-americanos

que lá foram, mas à população civil daquele país dizimada aos milhares. A derrota da

maior nação bélica do planeta neste conflito escancara o quanto que todo este poder

pode trazer graves consequências para as populações civis, tanto do lado norte-

americano, no sentido de contestações para estas atitudes, como para o lado na nação

invadida, que sofre com a baixa populacional que como este trabalho procurou deixar

claro, muitas vezes nada tinha a ver com a Guerra. Nas nossas pesquisas constatamos

que bandas de Rock N Roll escreveram músicas para protestar contra o Vietnã. Ainda

que metodologicamente seja impossível escrever sobre todas elas, ressaltarmos aquelas

que de alguma forma permitem um olhar sobre aspectos diferentes da guerra como uma

experiência de geração ainda que trágica, quando jovens viam uma guerra como

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barbárie e se mobilizaram contra. Como já dito acima, embora os músicos não fossem à

Guerra, e não tenham pego em armas e atirarado em algum vietnamita, suas ações em

repúdio ao conflito foram significativas. Participaram da guerra, mas de uma forma

simbólica, “combatendo” escrevendo canções, “atirando” ao tocar melodias e dizer sua

ansiedade contra o que viviam, como esperamos que as três canções analisadas tenham

deixado claro. Esta geração, mobilizada pelas notícias de barbárie e pelas fotos que

chegavam dos campos de batalha asiáticos, teve um papel importante na mobilização

antiguerra, como mostra Francisco Carlos Teixeira da Silva (2015). A fotografia e o

impacto da imagem foram importantes para que os jovens, principalmente, para uma

mobilização contrária ao conflito.

Os jovens da década de 1960/1970 teve amplo impacto nas mudanças de

comportamento na década de 1960, utilizando de seus recursos sociais para fazer

mobilizações não só diante dos costumes, como maior liberdade sexual e contestação do

modelo patriarcal, mas também contra a Guerra do Vietnã. Os festivais de música, como

o notável Woodstock, contribuíram para as massas entenderem o que estava se

passando.

Por meio das letras notamos que aspectos diferentes da Guerra eram vistos pelos

músicos e foram transformados em músicas e afetos para seu público. Eram jovens

escrevendo letras para jovens sobre temas atuais. Enquanto que jovem norte-americano

pegava em armas em direção a um país Asiático para batalharem, outros jovens

pegavam em baixos, guitarras, baterias e vocais para dizerem, falarem e não se calarem.

Infelizmente, nossas pesquisas comprovaram que a análise de músicas

relacionada com a História ainda não é satisfatória. Entendemos que esta análise

enriquece a interdisciplinaridade e permite ao historiador desenvolver uma nova

interpretação de fontes. Nós, como o nosso olhar treinado, podemos ter mais contato

com o que as letras musicais podem nos dizer. Esperamos que este trabalho possa

estimular outros historiadores a buscarem músicas dos mais variados estilos e analisá-

las. A música é e sempre será um ‘balcão’ enorme de informações, na qual sempre

podemos consultá-las.

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REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS E FONTES

1. Livros:

CHOMSKY, Noam. Banhos de Sangue. 6. ed. São Paulo: Difel, 1976. 151 p.

FOUCAULT, Michel. A Ordem Do Discurso: aula inaugural no Collége de France

pronunciada em 2 de dezembro de 1970. 23. ed. São Paulo: Loyola, 2013. 74 p.

KARNAL, Leandro et al. História dos Estados Unidos: das origens ao século XXI. 2.

ed. São Paulo: Contexto, 2010. 286 p.

JANOTTI JUNIOR, Jeder. Aumenta ai que isso é Rock and Roll: mídia, gênero

musical e identidade. Rio de Janeiro: E-Papers Serviços Editoriais, 2003.

MORIN, Edgar. Culturas de massas no século XX: o espirito do tempo necrose. 3. ed.

Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2006. 206 p.

MONTE, Ugo. Rock N Roll: Uma breve história da música que mudou a maneira de

ver o mundo. Natal: Sarau das Letras, 2013. 348 p.

SILVA, Francisco Carlos Teixeira da; LEÃO, Karl Schurster Sousa; LAPSKY, Igor

(Org.). O cinema vai à guerra. Rio de Janeiro: Elsevier, 2015. 271 p.

SCHILLING, Voltaire. América: A História e as contradições do Império. Porto

Alegre: L&PM, 2004.

WALL, Mick. Black Sabbath: a biografia. Rio de Janeiro: Globo Livros, 2014.

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2-Artigos:

FERREIRA, Neliane Maria. Paz e Amor na era do aquário: a Contra Cultura nos

Estados Unidos. Caderno de Pesquisa do CHIS, Uberlândia, v. 1, n. 33, 2007.

Disponível em: <http://www.seer.ufu.br/index.php/cdhis/article/view/102/97>. Acesso

em: 24 mar. 2016.

FELIPE, Leonardo. Arte contemporânea e rock: algumas relações. Visualidades,

Goiânia, v. 9, n. 2, 2011, pp. 177-191. Disponível em:

<https://revistas.ufg.emnuvens.com.br/VISUAL/article/view/19860>. Acesso em: 23

mar. 2016.

MORAES, José Geraldo Vinci de. História e música: canção popular e conhecimento

histórico. Revista Brasileira de História, São Paulo, v. 20, n. 39, 2000. Disponível em:

<http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0102-01882000000100009>.

Acesso em: 25 mar. 2016.

NAPOLITANO, Marcos. História e música popular: um mapa de leituras e questões.

Revista de História, São Paulo, n. 157, 2007, pp. 153-171. Disponível em:

<http://www.redalyc.org/pdf/2850/285022050008.pdf>. Acesso em: 22 mar. 2016.

3. Fontes sonoras

3.1 Discos analisados

FORGETY, John. Willy and the poor boys. Califórnia: Fantasy1969. 1 disco (34.31

min)

MORRISON, Jim. Waiting For The Sun. Califórnia: Elektra1968. 1 disco(32.49 min)

OSBOURNE, Ozzy. Paranoid. Londres: Vertigo, 1970. 1 disco(42.02 min)

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3.2-letras analisadas e fontes

BUTLER, Geezer; IOMMY,Tony. War Pigs. In: Paranoid. Londres: Vertigo, 1968.

Disponível em: http://www.vagalume.com.br/black-sabbath/war-pigs-traducao.html.

Acesso em: 03 mar.2016.

FOGERTY, John. Fortunate son. In: Willy and the poor boys. Califórnia: Fantasy,

1969. Disponível em: http://www.vagalume.com.br/creedence-clearwater-

revival/fortunate-son.html. Acesso em: 03 mar.2016.

MORRISON, Jim. The Unknown Soldier. In: Waiting for the sun. Califórnia: Elektra,

1968. Disponível em: http://www.vagalume.com.br/the-doors/the-unknown-soldier-

traducao.html. Acesso em: 01 mar.2016.

3.3 Fontes específicas de análise da letra de The unknown soldier:

VIGLIAR, Virginia. The Doors: The Unknown Soldier. 2015. Disponível em:

<http://wordsinthebucket.com/the-doors-unknownsoldier-1968>. Acesso em: 05 abr.

2016.

3.4 Biografias consultadas:

Wikipédia, The Doors. Dísponível em:.< https://en.wikipedia.org/wiki/The_Doors>.

Acesso em: 28 abr. 2016.

Wikipédia, Creedence Cleawater Revival. Disponível em:.

<https://en.wikipedia.org/wiki/Creedence_Clearwater_Revival>. Acesso em: 28 abr.

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