para falar de sotaque

Upload: arinaldo-martins

Post on 06-Apr-2018

237 views

Category:

Documents


0 download

TRANSCRIPT

  • 8/3/2019 Para Falar de Sotaque

    1/5

    \ dO-,j

    DEZEMBRO 2001 ISSN: 1516-1781.I IOLET IM 21./'

    Edit()rial.........iji;.~ 0 1 . . , " iI , ' '02o Terreiro de V6 SeveraRosario Santos ,., : 02Folclore no Terceiro Mih~nioRoberto Benjamim ,., , : 04"Com Defeito de Fabricacao": Tom Ze e a esteticado plaginHelen de Sousa ..,: , : > . : : .e ~ ............................. ; : ,: : : : ,' y .t .. 06Festa de Sao Gon.;a.lo 'Jacyara de Me/o , , , 08oBumba-meu-boi e seu SimulacroAdriano Sousa J JIemanja nao era a rainha do mar: 0culto a Iemanja no MaranhaoMundicarmo Ferretti 12Para falar desotaque de Bumba-meu-boiArinaldo de Sousa 16Mesa Branca eTambor de MinaMarilande Abreu. .. : 20_\'"ticias '"'~.,.. ' ' " ,. !II 22Perfil Popular - Francisco Naiva.\fdrcia Mendes ; : 24

    MARANHENSE DE FOlCLORE - eM.F~ CONSEl.HO EDITORIAL~91"F~~d" ~ffitU

    ..~....................~ 5 ef go . ' . . o:!.~.~.. e:~a ~:~~~~~~~~od~eA~::dO Nunes. ' .. ' .. , I 'Z2IaI!ira Uariade Azeveclo Nunes Maria Michol Pinho de CarvalhoMundicarmo Maria Rocha Ferretti. -r . .....1iIktJd Pinho de Casvalho Zelinda de Cast ro de Lima

    ".t! RozaSantos

    EOICAo: lzaurina Maria de Azevedo NunesIL.USTRACOES: Claudio Vasconcelos

    VERSAO PARA A INTERNET: I ranilton Araujo AVelarENDERECO EL.ETRONICO: http://sites.uol.com.br/cmtolclore

    As opini6eS publicadas .emartigos.~sao de inIeira_ _ . . . . . . . . . . . . . . ' . . . . . 1 _ . t . : . "

    http://sites.uol.com.br/cmtolclorehttp://sites.uol.com.br/cmtolclore
  • 8/3/2019 Para Falar de Sotaque

    2/5

    Boletim 21 I dezembro 2001

    P a ra fa la r d e so taqueAcho que isso e urn dos motivos que

    a brincadeira do Boi de Zabumba, tdvendo/Entiio, ui se apagando. Par quehoje a brincadeira e do hoi de matracaque te m 20 pe ssoa pronto e te m 50(), 600a paisano, s6 tocando matraca, td ven-do? Eo boi de sotaque de Guimariies eum hoi qu e [e m de spe sa , () grup o de Gui-mariies ' e urn boi que te rn m uita despe-sa. Voce ve que e t ud o n o c an ut il ho : des-de 0 h oi, v aq ue iro , p an de ire iro , tu do e110 brilho, e s o no canutilho puro.

    PIWPR lETARIO DE BUMB:hHEU- {j () [ SOTAQUE

    fJ8 GUIMARAES (17/05101)

    guns como um derivado do sotaque de Gui-maraes.o ponto concordante entre todos e aexistencia dessa classificacao dos diferen-res Bumbas em sotaques, A malaria dosestudos (nao digo todos para nao ser gene-rico) a rcspeito do Bumba-meu-boi assimo classificam, Nao hiconcordancia a res-peito. Alguns distinguem tres sotaques ori-ginarios (matraca, zabumba, orquestra) sen-do os outros derivacoes; outros preferem

    a conhecer determinada situacao. Nessesentido, somos frequentemente tentados aclassificar os fen omen os e enquadra-los emconceitos para melhor entende-los. 0 so-ciologo Max Weber, no corneco do SeculoXX, ja apontava que os soci61ogos devemcriar conceitos, mas, devem sempre levarem consideracao que sao eles frutos de umaescolha do pesquisador, cscolha que me-lhor se adequa aos propositos de seu estu-do. Tais escolhas levam em consideracao

    apenas uma fracao limitada dasituacao em questao e se ligama urn contexto historico especi-fico, nao a generalidade. Trata-se de conceitos ideais, criadospeIo pesquisador como um ar-quetipo, um artiffcio para melhorentender 0mundo social. Assim

    Eu sou 0 dono doBoi Costa de M iio ciaVila Conceiciio. sota-qu e de Cururupu. Nossomo, todos somo ar-tistas, que gosta dabrincadeira, gosta de[azer 0 bumba-meu-boi, mas eu ... , sou ar-tis ta p o rq ue [ ac o 0hoi, -v- _" __ q.~_.---7'-M~~eu gosto e ... , mas nane nessa empresa que emeu hoi, meu sotaque,meu sotaque Ii diferen-teo N() . I' s om as m is to deGuimariies COlli Curu-rupu, mas 0 sotaque ~de id e dife re nte do Boide Zabumba. e 0 Cos-ta de Miio, ta aquicomo Costa de Mao.

    PRUP8JET.WO DE B[;U-R4-, \4HU-BOI SOT,IQUE DEO./RUIwpu(1710SI01)

    Pe90 licenca aos ex-=erts para falar de urn as-'unto que tern sido alvo deimimeros debates entre os estudiosos que~;; prcocupam com 0 Bumba-meu-boi, 0conceito de sotaque e a divergencia sota-c~es originarios/sotaques derivados versus-;otaques realidades per si. E lugar comum.uvir-se, seja em debates de estudiosos, sejaern publicacoes, a questao de se dever clas-sificar 0 sotaque de Pindare como um so-.aque distinto ou como um sotaque deriva-':::')do sotaque da Ilha. 0 mesmo ocorre~',)m0 sotaque de Cururupu, tido por al-

    entender cada sotaque como uma realida-de per si, nao distinguindo se foi ou naoderivado de outro. Sou propenso a aceitara segunda proposicao, pois, cla prova sermenos evolucionista e parece pressupor quecada sotaque e fruto de uma escolha soci-al, portanto, urn artefato cultural. No en-tanto, pretendo esbocar algumas de minhasinquietacoes a respeito do assunto.

    Sabemos que 0 desejo de classificar einerente a qualquer trabalho que se propoe

    foram criados, por exemplo, ostipos ideais weberianos do es-pirito do capitalismo e dos tiposde dorninacao.

    Tal perspectiva, interessan-te para 0 entendimento de queos fenornenos fogem do desejovaidoso de classificar, apontaque nem scmprc se conseguevisualizar toda; s as nuancas doobjeto em questao, mas apenasurna limitada fra~ao do mesmo,Assirn aeontece com 0 coneei-to de sotaque, e pretcndo dizercomo, comentando uma dasmais famosas classificacoes,

    "".TI' que pressupoe a existencia dematrizes culturais a partir dasquais diversos grupos de bum-

    ba-meu-boi surgirarn,De acordo com AZEVEDO NETO

    (1983), na primeira edicao de urn de seusmais importantes trabalhos, temos, no Bum-ba-meu-hoi do Maranhao, tres vertentes ori-ginarias, frutos da miscigenacao que noBrasil se deu. Sao as vertentes indigcna,negra e branca. Segundo ele, a vertenteindfgena foi a responsive] pela producaode urn tipo de Bumba-boi que abusa do usode penas e tern como instrumento prepon-

    ~5:Z; 2r~ ce Cienc ias Sociais no CCPDVF e foi membra da Comissao Especial que elaborou, coordenou e avaliou as Rodas de Conversa par Sotaques com os Grupos de Bumba-meu-:0 : c-r"~" .aas peta eMF em parceria com 0 Centro de Cultura Popular, E o tambsm colaborador do Museu Nacional do Folclore e Cul tura Popular no lnventar io Nacional de ReferenCias:,...,~S :-~oeIo&gao.

  • 8/3/2019 Para Falar de Sotaque

    3/5

    80Ietim 211 dezembro 2001 __jd e bumba -m e u -bo iderante as rnatracas-, Esse tipo de Bum-ba-boi foi c1assificado pelo autor como gru-po indigena, compreendendo os subgru-pos da Ilha, da Baixada e de Penal va. Alemdos grupos e dos subgrupos, tem-se tam-bern os sotaques, que, no dizer do autor,representa cada um dos Bumbas que com-poem um subgrupo. Neste sentido, cadaBumba representa um sotaque e, sen doassim, 0 autor nao afirma que em urn sota-que existam varios grupos, como preferemoutros,

    Dentro desta perspectiva, Bois como 0dc Maracana e 0 da Maioba constituem 80-taques distintos, mas estao classificadosdentro do subgrupo de matraca ou da Ilha,pois, para 0 autor, cada Bumba possui umjeito diferente de dancar, de tocar rna-traca, indumentarla e ritrno.

    Embora nao estabeleca claramentequais as diferencas entre urn e outro, eleafirma:

    "0 surgimento de urn novo hoi podedeterminar 0 aparecimento de 110VOsotaque, comofoi 0caso do Sotaque dePin dare, surgido do Sotaque de Viana.No entanto, na maioria dos casos, osconjuntos recem-formados copiam urnconjunto jd existente, conceituado e[amoso, assimilando, tambem. as carac-teristicas de seu sotaque. As alte raciies,se alteraciies houvet; aconteceriio comopassar do tempo." (op. cit., p. 39).

    Pelo que se pede inferir, um novo sota-que surge quando, por ocorrencia de de-sentendimentos, causando cisoes, ou por ou-tros motivos, urn novo Bumba surge de den-tro de outro, OU mesmo quando alguem re-solve criar um tornando elementos de outroque ja existia. Nesse caso, podenarnos di-zer, baseado nessa proposicao, que um novosotaque surgiu na Madre Deus quando osmembros do Bumba que representava aque-ia comunidade desentenderarn-se entre si eresolveram fundar 0"Boi de cima", passan-Jo, entao, a existir naquela localidade, 0"Boi.ie Cima" eo "Boi de Baixo".

    Em outra ocasiao ele comenta que, por.ezes, pode haver confusao entre subgru-

    po e sotaque, mas, a sua perspectiva e deque a cada novo Bumba corresponde urnnovo sotaque. Essa classificacao comple-xa parece bastante interessante, na medi-da em que hi sinais de grupos no interiordo Estad03 que nao se enquadram nos cha-mados sotaques, No entanto, pareee queessa perspectiva nao foi aeeita e se ternpreferido classificar diferentes grupos emdeterminados sotaques, nao se fazcndo re-ferencia a grupos e a subgrupos. Alem dis-so, ela carece de inforrnacoes que com-provem as afirrnacoes feitas pelo autor.Grosso modo, os gestores das polnicas, es-tudiosos do assunto e a populacao de urnmodo geral aceitarn a existencia de pelomenos 5 sotaques: matraca ou ilha, orques-tra, pandeiroes ou Baixada, zabumba ouGuimaraes, costa de mao ou Cururupu.

    ASSUN

  • 8/3/2019 Para Falar de Sotaque

    4/5

    Boletim 21 I dezembro 2001

    CONTINUAl;AOino, preferindo o natalino, tambem noerior do Estado do Maranhao). Possuirno personagens: a Burrinha, 0 Cavalo-

    0Jaragua, Caipora, Catirina, Rosacomo figuras centrais, 0Boi, os vaquei-Mateus e Birico, Damas e Galantes

    lELO, 1977). No Piauf e muito forte,ate a classificacao em sotaques,

    como aqui OCOITe.L a temos a p re se nc aCatirina e Chico Vaqueiro. enredo doconta a estoria de Catirina que, gra-

    da, desejou comer a lfngua do Boi maiserido da fazenda. Tambern en valve 0odo de ser de um povo e r ef le te as condi -es socio-economicas da colonizacao

    (OLIVEIRA , 1995).Nesse sentido, os diferentes estilos de

    existcntes em Sao Luis esificaclos em sotaques nao poderiam se rh o r e nte nd id o s como var iacoes regio-do Bumba-meu-boi, a forma como

    da cornunidade realizou 0 jogo de apro-al,{aodos elementos'? l~born atcntar quen muitosmunicfpios maranhenses exis-diversas comunidades, muitas delas

    rritorios de pertenca etnica, remanescen-S de quilombos e t er ra s de santo e de pre-H ha quase meio seculo que se aban-

    0 entendimento de cultura popularmo mera colecao de curiosidades e seocurou adotar uma forma que enfocasseuito mais 0 aspecto etnico e social des sa

    E urn tanto tcmeroso constatar queMaranhao a in da e xistam in te le ctu ais q ue

    0 caduco usa do conceito deltura popular como colecao de curiosi-des, recorrendo a fatores cxternos (ins-um ento s m usic ais, indum cnta ria e ritm o)

    classificar os diferentes Sumba-boisno Maranhao em sotaques.

    Como estudante de Ciencias Socials.inda nao tcnho os anos de pesquisa e tam-

    0 reconhecimento que muitos pes-possuern, inclusive autorcs de

    sobre 0 tema. Talvez por esse 1110ti-~ 0 leitor se pergunte que autoridade te-para falar sobre um ass unto ja bastan-

    discutido e que recebe 0 endosso da po-de um modo geral. No entanto, sete artigo servir para suscitar 0 debate ele\antar a poeira" das certezas estabele-das. pelo menos urn passo consegui dar.

    Vivemos urn tempo em que se fala em pa-trim o nio irn ateria l (U NE SCO ; MEC .: 1 99 7),justamente 0 patrimonio que esta ligado auma pertenca etnica, a urn engajamentosocial, onde os estilos ou sotaques de Bum-ba-meu-boi sao entendidos como frutos deprocesso de escolhas sociais, estao ligadosa s comunidades que os geraram". Nessesenti do, nao irnporta 0 fato do tamanho dopandeiro do Boi de Pindare ser igual aopandeiro do Boi da Maioba, por exemplo,ou se todos os instrumentos que des usamsao iguais. importante e que os dais gru-pos foram criados por duas comunidadesdistintas, por pessoas com pertenca socialem comunidades separadas geograficamen-te e que puderam sc encontrar aqui em SaoLuis e fazer parte de urn mesmo fenOmeno.Pode ser que urn tenha copiado os instru-mentos do outre, m as, isso nao auto riz a di-zer que 0Bumba-meu-boi de influencia so-cial da baixada e uma derivacao do Bumba-meu-boi de inlluenci social da 111m.

    Se perguntarmos a um brincante de Boiquando foi que (1 Burnba-meu-boi entrouna sua vida. ele vai dizer que desde criancala na sua cidade natal scu pai the ensinouassim, ou um brine ante mais velho do Boida localidade sernpre the incentivava e, comisso. ele foi aprcndendo. Isto revela a ori-gem social do grupo, OU , como se quiserdizer, do sotaque.

    Eli SOli de sue nieses e, depois desetc anos, atr agora ainda niio teve unoijllC Leonardo ndo brinca boi. Agora,1l1mCa sell tei C/I1 bunco de colegio,aprcndi com 0A. E, J, 0, U, [oi 0 queaprendi, J1UIIUI sentei em banco de co-legio, JiU/S, podefatcr qualqucr pergutt-fa que ... pm mini que Leonardo res-poude. VOli [alar do meu proceduncn-(0: nunca [umei. nunca fu ! no [utebol,/lUlICO [ui numa praia, niio como cria-r;lio, niio tomo cafe: tres esport es. boi,tambor de crioula e cacando, s6 isso.Agora, ell era pequeno, mas, com 7anos, a ge nie e ra grande , Jl(1[Jide to-manho, agora, s o tem uma coisa, queandava nuzinho. Ii serio, e serio, Ii s e -rio. Andava nuzinho. fa pta quitanda,qualquer lugar. Entiio ele me levava,

    ele me levava porque des cantavam,perdiam a toada. 'tar Seu Joiio Brancoainda aqui, que nos ia nos do i s. Che-gava lti na hom, ele dizia .." chegavana quitanda ell pegava a cantar, "masrapaz; que preto danado!", Com seteano, sete ano. Depois, eu passei pratocar zabumba.(Leonardo: 17//05/07).

    No Maranhao. existe um enredo parao Auto tido como o autentico, e existemvariacoes, talvez de regiao para regiao, oude Bumba para Bumba. Tal enredo envol-ve a captura do negro Chico e a ressurrei-c ; a o do hoi com 0auxflio da pajelanca que,na minha opiniao, reflete a estrutura escra-vocrata vigente no perfodo da colonizacao.A dicotomia entre senhor e escravo, pre-sente na relacao entre 0 amo e Chico, lem-bra 0 regime de castas etnicas que, segun-do Roger Bastide, vigorou no Brasi I sobre-tudo na escravidao do iipo rural. RogerBastide faz urna diferenciacao entre a es-cravidao urbana e a rural (BASTIDE:1985), e o interessante c que, segundo de-poimentos orais (Marciano Veira Passos inMARANHAo , 1997), ate aproximadamen-te a dec ada de 20 do seculo XX, os locaisem que existiam bois em Sao LUIS eram,ou em zonas de pescadores ou em zonarural (Maracana, Maioba, Apicurn, MadreDeus, etc.). A populacao urbana scqucrsuportava os Bois e muito menos os seusencont ros . Somente depois e que comeca-ram a entrar outras pessoas. opertirios, etc.,no Burnba-mcu-bo i c este pZlSSOU por umprocesso de mclhor apreciacao.

    A lguns diz em que 0B um ha -bo i [em en-redo branco, indumentaria indtgcna c ritmonegro. En nao fic aria ta o seguro para afir-mar isso. 0 recurso a esse cnredo c aospersonagcns fidalgos pede SCI' uma carica-lura da sociedade cscravocrata, uma sub-versao dos valores vigentes, Adernais , sa-bernos que no seculo XIX os batalhocs deBumba-meu-bo i eram intoleraveis justamen-te pelo seu carater enrico e sattrico da 80-ciedade e estas reunioes de negros eramentendidas como uma turba de negros (ouindios) desordeiros, arrnados de pedacos depan que procuravam atacar a elite com pa-

    -c.r.=. :,,~-.,.a:).por parte de tolc ionstas, ent re danca e folguedo. A primeira nao possui ent recho oramanco, enquanto 0 out ro possui (FONTES. 1982: p. 166),~ - n n ~I 1 1 I. I I I

  • 8/3/2019 Para Falar de Sotaque

    5/5

    21 / dezembro 2001 _ : _ ;

    '.ras de ordem ou em tom jocoso, assu-0 carater de urn violento Bumba-meu-

    Para obter inforrnacoes sobre isto bas-ier ASSUNC;Ao (op. cit.), que ele citans rccortcs de jomais daquele seculo.Toda esta discussao e para tentar mos-ue 0que p od eriamo s c ha rn ar de a a pa -

    ncia externa de uma rnanifestacao cultu-nao e mais do que a fruto de um pro-

    sso de escolhas socialmente determina-is. escolhas que, no caso do nosso Bum-.-meu-boi, podern se dar diferentementeum Bumba para outro. A esse respeito}osao poucos os fo1cloristas a concordar,como DUARTE (1974), que afirma:

    H E oportuno referir; (. . . ). as carac-teristicas, os aspectos, as cores, as IlU-an~as. que os fatos folcloricos tomamem cada regiiio. De uma regiiio paraoutra, de u ma a re a ou zo na p ar a o utr a,assumem inegavclmente osfutosfolclo-ricos posiciies diferentes, diga-se mes-mo sem rebucos, aspectos regionais,se niio lo co is. "(p. 19).

    Mais adiante acrcscenta:

    "Os exemplos se sucedem. inequi-vocamente. mostrando que, dentro daregido nordestina brasileira, ofatofol-clorico Sf modi/lea e se transforma deum para outro Estado. Eis porque 0pes-quisador atento 011 0 observador per-cuciente do 1l0SS0 Folclore apreendedepressa os aspectos dispares que ummesmo [ato oferece dentro dessa gran-de area. Por exemplo: - 0 'Coco' ala-goano niio se apresenta com a tnesmavivacidade e a mesma impetuosidadeaqui 011 no Ceara, (.); 0 'Bumba-meu-boi' do Nordeste tuio e ( }mestno do SuI;au do extrema Norte do pe ds - de Be-lem do Pard; ( ... )." (p.19-20).

    Os sotaques, ja que se quer classificar,Jriam muito bern entendidos se fossemgaladas as regioes em que eles surgi-Adotando essa perspectiva, fica facil-crender como e par que os grupos mu-sao frutos de irueracoes sociais, por-perfeitamente mutaveis: 0 ser huma-

    pelo menos ate 0 presente memento,permanece estatico. Acredito que tal

    pode colocar novas luzes no que

    "sotaques" derivacoes de outros ou nao.Se se aceita os "sotaques" como frutos deinteracoes sociais, entao nao importa se urnveio de outro ou nao, importa apenas queaquela comunidade escolheu assim, consti-tuindo-se aquela forma, que, segundo alguns,seria "derivada", um "sotaque" ou urn Bum-ba-rneu-boi distinto do anterior. Ademais, aselementos a que se reivindica geralmentepara suscitar esta discussao sao sernpre asinstrumentos musicais, indurnentaria etc.,que, no caso do Bumba-rneu-boi sotaque daBaixada e 0Bumba-rneu-boi sotaque dallha,usam matracas e pandeiroes, com a dife-renca no ritmo, na indumentaria, nos perso-nagens e na forma de tocar as instrumen-los. Isso, fora 0 faro conhecido par todos datrupiada do Burnba-meu-boi da Ilha ser maispesada que 0acompanhamenlo musical dosbumbas do sotaque de Pindare.

    lnstrumentos musicais sao fi.tores ex-ternos, podendo ser usados par qualquerum. Nao constituem, portanto, razao parase acredirar na pcrspcctiva de derivacao,difusao cultural, modificacao, ou matrizcultural comum. Todos possuern, e ccrto.uma matriz comum, que scria 0proprio fatode screm Bumba-bois, mas, isso nao quer

    dizer que havia um original do qual derivououtros. As coisas, simples mente, foramacontecendo de forma diferente de lugarpara lugar. A cultura I S uma teia de signifi-cados tecida pelos homcns e sua interpre-tacao (GEERTZ: 1978). Cada cultura e umateia diferente, pois, nenhum homem teceexatamente igual a outro. 0 que mais nosidentifica como iguais (sercs humanos) e anossa eapacidade de sennos diferentes.

    Mas, 0 debate esta na mesa, C cadaqual pode dizer 0 que quiser, Afinal, tam-bern somes produtores da cultura popular.o que dizemos e 0 que fazernos influi deforma direta no que os Bumbas fazern, evi-denciando 0 que CANCl.INT (1998) frisa:o popular e o produto multi-determinado deamplos setores da sociedade, constituindo-se numa criacao tanto subaltema quantohegernonica, tanto da soeiedade civil quan-L O do Estado, 0 nosso Bumba-meu-boi,alern de ser criacao dos brincantes, e tam-bern da imprensa, dos orgaos gestores depoliticas piiblicas e da socicdade maranhen-se e ate mundial (me refire aos turistas)como urn todo, cada um dan do a sua par-cela de contribuicao na construcao do fe-nomcno,

    BIBLIOGRAFIAASSUNC;:AO, Matthias Rohrig. A Formacao da Cultura Popular Maranhense: algumas refle-

    xoes prelirninares in COMISsAo MARANHENSE DE FOLCLORE. Sao LUIS:Boletim14, Agosto de 1999.

    AZEVEDO NETO, Americo. Bumba-meu-boi no Maranhao. Sao LUIS:Ed. Alcantara. 1983.BASTIDE, Roger. Os Novas Quadros Sociais das religioes Afro -brasileiras. In As Religi-

    oes Africanas no Brasil: uma contribuicao a Lima sociologia das interpenetracoes decivilizacbes. Sao Paulo: Pioneira Editora, 1985.

    CANCLlN], Nestor Garcia. CuIturas Hihridas: estraregias para entrar e sair da modernida-de. Sao Paulo. Edusp, 1998.

    DUARTE, Ahelardo. lntroducao in Folclore Negro das Alagoas: pesquisa e interprctacao.Maceio: Departamento de Assuntos Culturais, 1974.

    FONTES, Dalvanira de Franca Gadclha. Dancas c Folgucdos Folcloricos da Parafba in PE-LLEGRINI FILHO, America (org.). Antologia de Folclore Brasileiro, Sao Paulo:EDART,1982.

    GEERTZ, Clifford. A Interpretacao das Culturas. Rio de Janeiro. Zahar Editora, 1978.MARANHAO. SECRETARIA DE ESTADO DA CULTURA. CENTRO DE CULTURA PO-

    PULAR DOMINGOS VIEIRA FILHO. Memoria de Velhos. Depoimentos: uma contri-buicao a memoria oral da cultura popular maranhense. Sao Luis: LITHOGRAF, 1997.V.3: u . , 22cm.MELO, Vertssimo de. Folclore BrasiIeiro: Rio Grande do Norte. Rio de Janeiro: MEC/DAC/FUNARTE/Campanha de Defesa do Folclore Brasileiro, 1977.

    OLIVEIRA, Noe Mendes de. Folclore Brasileiro: Piauf. Teresina: EDUFPL 2" Ed, 1995.UNESCO; MEC. Nossa Diversidade Criadora: Relatorio da Comissao Mundial de Cultura

    e Desenvolvimento, Org.: Javier Perez de.Cuellar, Campinas, SP: Papirus, Brasilia: UNES-CO, 1997.