para efetiva proteÇÃo do meio ambiente no plano ...€¦ · la proteción del medio ambiente ha...
TRANSCRIPT
PARA EFETIVA PROTEÇÃO DO MEIO AMBIENTE NO PLANO
INTERNACIONAL: A CRIAÇÃO DO TRIBUNAL INTERNACIONAL DO MEIO
AMBIENTE
PARA LA PROTECCIÓN EFICAZ DEL MEDIO AMBIENTE EN PLAN
INTERNACIONAL: LA CREACIÓN DE LA CORTE INTERNACIONAL DE MEDIO
AMBIENTE
Sidney Guerra
Resumo
A proteção ao meio ambiente ganhou amplitude mundial e passou a ser
devidamente reconhecida a partir do momento em que a degradação ambiental atingiu
índices alarmantes e tomou-se consciência de que a preservação de um ambiente sadio está
intimamente ligada à preservação da própria espécie humana.
Infelizmente, apesar da mobilização de vários atores internacionais, os
resultados ainda não podem ser comemorados na medida em que ficam evidentes sérios
prejuízos relacionados à destruição da natureza, do patrimônio ambiental, dos bens
paisagísticos etc.
Problemas relacionados ao problema da água (qualidade e quantidade),
mortandade de espécies da fauna e da flora, aquecimento global, chuva ácida, perda de
solos férteis e desertificação, efeito estufa, além de outros que afetam a vida e a qualidade
de vida dos indivíduos fazem parte da realidade atual.
Indubitavelmente que os problemas ambientais ultrapassam os limites dos
Estados nacionais, portanto ações a serem desenvolvidas no campo das relações
internacionais são imperiosas.
Assim, o direito internacional público que se encontra em processo
expansionista deve dedicar especial atenção aos problemas que se apresentam no plano
global, propondo as soluções devidas e necessárias.
* Trabalho publicado nos Anais do XIX Encontro Nacional do CONPEDI realizado em Fortaleza - CE nos dias 09, 10, 11 e 12 de Junho de 2010 1605
Ademais, além da necessidade do desenvolvimento de políticas ambientais
no plano das relações internacionais a serem desenvolvidas de maneira articulada é de vital
importância que sejam concebidas estruturas para dirimir controvérsias e aplicar sanções
aos atores que sejam capazes de produzir danos ambientais e, por conseqüência, afetar o
meio ambiente no plano global.
A não existência de uma estrutura contemplada no plano internacional que
possa combater irregularidades praticadas contra o meio ambiente acaba por favorecer,
muitas vezes, a adoção de medidas eficazes contra os autores de danos ambientais.
Com efeito, as fronteiras dos Estados não podem servir para encobrir danos
ambientais que podem por em risco o ecossistema em escala planetária. Assim, a proposta
do presente estudo é de traçar considerações sobre a necessidade de se conceber, no campo
das relações internacionais, um tribunal que possa dirimir controvérsias na seara do direito
ambiental.
Palavras-chave: Meio ambiente. Tribunal Internacional. Proteção.
Resumen
La proteción del medio ambiente ha adquirido importancia en escala
mundial y empenzo a ser reconocido desde el momento en que la degradación ambiental
alcanzo niveles alarmantes y que se gana conocimiento que la preservación de un medio
ambiente está estrechamente vinculada a la preservación de la raza humana.
Lamentablemente a pesar de la mobilización de diversos actores
internacionales, los resultados aún no pueden ser comemorados ya que son evidentes los
daños graves en relación al medio ambiente. Sin duda, los problemas ambientales van más
allá de los límites de los estados nacionales, por lo que las acciones a ser desarrollada en el
ámbito de las relaciones internacionales son imprescindibles.
Así, el derecho internacional público que se encuentra en el proceso de
expansión debe atentar para los problemas que se plantean en el plan general, proponiendo
soluciones adecuadas y necesarias.
* Trabalho publicado nos Anais do XIX Encontro Nacional do CONPEDI realizado em Fortaleza - CE nos dias 09, 10, 11 e 12 de Junho de 2010 1606
Por otra parte, además de la necesidad de desarrollar políticas ambientales
en las relaciones internacionales la coordinación es vital para que las estructuras están
dibujadas para resolver los conflictos y aplicar las sanciones para los jugadores que son
capaces de producir daños al medio ambiente y, por tanto, afectan el medio ambiente a
nivel mundial.
La ausencia de una estructura prevista en el ámbito internacional que pueda
combater las irregularidades contrarias al medio ambiente proporcionan perjuicio en la
adopción de medidas eficaces contra los responsables de los daños ambientales.
Las fronteras nacionales no se pueden utilizar para cubrir los daños
ambientales que podrían poner en peligro el ecosistema a escala mundial. Así, el objetivo
de este estudio es hacer algunas consideraciones sobre la necesidad de concebir, en el
ámbito de las relaciones internacionales, un tribunal que pueda resolver los conflictos en las
cuestiones ambientales.
Palabras-claves: Medio Ambiente. Tribunal Internacional. Protección
1. Introdução
A proteção ao meio ambiente ganhou amplitude mundial e passou a ser
devidamente reconhecida a partir do momento em que a degradação ambiental atingiu
índices alarmantes e tomou-se consciência de que a preservação de um ambiente sadio está
intimamente ligada à preservação da própria espécie humana.
Infelizmente, apesar da mobilização de vários atores internacionais, os
resultados ainda não podem ser comemorados na medida em que ficam evidentes sérios
prejuízos relacionados à destruição da natureza, do patrimônio ambiental, dos bens
paisagísticos etc.
Problemas relacionados ao problema da água (qualidade e quantidade),
mortandade de espécies da fauna e da flora, aquecimento global, chuva ácida, perda de
* Trabalho publicado nos Anais do XIX Encontro Nacional do CONPEDI realizado em Fortaleza - CE nos dias 09, 10, 11 e 12 de Junho de 2010 1607
solos férteis e desertificação, efeito estufa, além de outros que afetam a vida e a qualidade
de vida dos indivíduos fazem parte da realidade atual.
Indubitavelmente que os problemas ambientais ultrapassam os limites dos
Estados nacionais, portanto ações a serem desenvolvidas no campo das relações
internacionais são imperiosas.
Assim, o direito internacional público que se encontra em processo
expansionista deve dedicar especial atenção aos problemas que se apresentam no plano
global, propondo as soluções devidas e necessárias.
Ademais, além da necessidade do desenvolvimento de políticas ambientais
no plano das relações internacionais a serem desenvolvidas de maneira articulada é de vital
importância que sejam concebidas estruturas para dirimir controvérsias e aplicar sanções
aos atores que sejam capazes de produzir danos ambientais e, por conseqüência, afetar o
meio ambiente no plano global.
A não existência de uma estrutura contemplada no plano internacional que
possa combater irregularidades praticadas contra o meio ambiente acaba por favorecer,
muitas vezes, a adoção de medidas eficazes contra os autores de danos ambientais.
Com efeito, as fronteiras dos Estados não podem servir para encobrir danos
ambientais que podem por em risco o ecossistema em escala planetária. Assim, a proposta
do presente estudo é de traçar considerações sobre a necessidade de se conceber, no campo
das relações internacionais, um tribunal que possa dirimir controvérsias na seara do direito
ambiental.
2. O direito internacional ambiental: breve notícia1
O Direito Internacional, diferentemente do que acontecia no passado, ocupa
papel de relevo na formação do jurista. Alguns anos atrás a matéria era concebida de
maneira indevida em muitos cursos jurídicos e hodiernamente, em razão das
transformações espetaculares ocorridas no campo das relações internacionais, a disciplina
1 Para melhor compreensão da matéria vide GUERRA, Sidney. Direito internacional ambiental. Rio de
Janeiro: Freitas Bastos, 2006
* Trabalho publicado nos Anais do XIX Encontro Nacional do CONPEDI realizado em Fortaleza - CE nos dias 09, 10, 11 e 12 de Junho de 2010 1608
assume posição de destaque em vários segmentos fazendo com que, inclusive, sejam
criadas novas áreas de atuação para o profissional do direito.
Esse é o caso do Direito Internacional Ambiental, ramo muitíssimo
especializado do Direito Internacional. O estudo do direito internacional ambiental é
recente e acontece praticamente a partir do momento que alguns segmentos da sociedade
internacional percebem a necessidade de promover um sistema de proteção ao meio
ambiente por entender que a degradação do mesmo, em muitos casos, ultrapassa os limites
do Estado nacional. Assim, valendo-se do magistério de Guido Soares, podem ser
apontados alguns marcos teóricos importantes para a compreensão da matéria2:
a) a abertura das discussões dos foros diplomáticos internacionais à opinião
pública internacional, por força da expansão dos meios de comunicação de massa e a
conseqüente valorização das teses científicas sobre os fatos relativos ao meio ambiente;
b) a democratização das relações internacionais, com a exigência correlata
da efetiva participação da opinião pública na feitura e nos controles de aplicação dos
grandes tratados internacionais, por força da atuação dos parlamentos nacionais na
diplomacia dos Estados;
c) a situação catastrófica em que o mundo se encontrava, pela possibilidade
de uma destruição maciça de grandes partes do universo, representada pela ameaça da
utilização dos engenhos bélicos fabricados por meio da utilização militar da energia
nuclear;
d) a ocorrência de catástrofes ambientais, como os acidentes de vazamentos
de grandes nuvens tóxicas ou grandes derramamentos de petróleo cru no mar, fenômenos
que fizeram recrudescer as letais experiências da poluição indiscriminada e não localizada
em um ponto geográfico, que poderia eventualmente ser controlada por uma única
autoridade estatal.
Com efeito, a partir dos fatores acima indicados e com os elementos
necessários para tal começava a se desenhar um cenário propício para a emergência do
direito internacional ambiental que levava em conta a necessidade social (em razão dos
problemas ambientais que eclodiram de maneira significativa) e a vontade determinante
para a produção da norma jurídica internacional.
2 SOARES, Guido Fernando Silva. Direito internacional do meio ambiente: emergência, obrigações e
responsabilidades. 2. ed. São Paulo: Atlas, 2003, p. 45
* Trabalho publicado nos Anais do XIX Encontro Nacional do CONPEDI realizado em Fortaleza - CE nos dias 09, 10, 11 e 12 de Junho de 2010 1609
É bem verdade que vários outros fatores foram decisivos para o surgimento
do Direito Internacional Ambiental, sendo que Soares3 acentua que essas circunstâncias
fazem com que esse se manifeste com tamanha velocidade jamais vista em outros ramos do
direito e ressalta alguns pontos interessantes:
a) a questão da poluição transfronteiriça, que tomou uma dupla forma, a de
águas doces dos rios e lagos internacionais e a poluição atmosférica trazida pelas correntes
de ar, fenômenos esses que, por sua natureza, não conhecem fronteiras físicas e políticas
entre Estados; e
b) a questão da poluição crescente e desenfreada dos mares e oceanos, por
meio das três formas detectadas:
- alijamentos deliberados de refugos, em geral na forma de óleos usados
provenientes de navios (lavagens de navios e/ou seu deslatreamento), ou de indústrias (o
alijamento direto de resíduos tóxicos não recicláveis ou dos rejeitos provenientes da
mineração submarina programada, ou das plataformas de exploração petrolífera), em níveis
sem precedência na história;
- deposição em suas águas, de cinzas provenientes de queima em alto-mar de
rejeitos industriais;
- a denominada “poluição telúrica”, aquela carregada pelas águas doces, que
servem de desaguadouro dos rejeitos altamente tóxicos industriais não recicláveis (como as
ligações de emissários submarinos ou de interceptores oceânicos para esgotos sanitários ou
industriais).
Frise-se, por oportuno, que em relação à poluição transfronteiriça havia uma
necessidade premente de se criar uma regulamentação no plano internacional em razão das
lesões ao meio ambiente ultrapassarem os limites do Estado-nação, bem como no que
concerne à poluição dos mares que alcançou índices alarmantes.
Sem embargo, a emergência do Direito Internacional Ambiental está
intimamente ligada aos vários problemas que se manifestam no planeta e que podem
comprometer a existência da vida humana: desaparecimento de espécies da fauna e da
flora; perda de solos férteis pela erosão; desertificação; aquecimento da atmosfera;
mudanças climáticas; diminuição da camada de ozônio; chuva ácida; acúmulo crescente de
3 Idem, p. 46
* Trabalho publicado nos Anais do XIX Encontro Nacional do CONPEDI realizado em Fortaleza - CE nos dias 09, 10, 11 e 12 de Junho de 2010 1610
lixo e resíduos industriais; colapso na quantidade e na qualidade da água; aumento
excessivo da população mundial; esgotamento dos recursos naturais; acidentes nucleares;
tornados, furacões, maremotos, que ocorrem com maior freqüência em razão da ação
antrópica.
Não se pode olvidar do emblemático naufrágio do petroleiro Torrey
Canyon4, que teve como resposta a este grande acidente ambiental, as Convenções de
Bruxelas, de 1969, sobre a intervenção no alto mar contra navios estrangeiros em caso de
acidente de poluição de hidrocarbonetos e outra sobre a responsabilidade civil pelos
prejuízos causados por hidrocarbonetos, complementada a posteriori pela Convenção de 18
de dezembro de 1971 que criou o fundo de indenização pelos prejuízos devidos à poluição
de hidrocarbonetos.
Além do acidente acima mencionado vale registrar as catástrofes ecológicas
que despertam grande interesse e clamor público para as questões ambientais, podendo ser
identificados alguns grandes deles, a saber:
a) Seveso na Itália, em 1976, com a contaminação de solos e rios por
toxinas;
b) Bhopal na Índia, em 1984, ocasionando a morte de 3400 pessoas pelo
lançamento de gases tóxicos na atmosfera;
c) Chernobyl na antiga União Soviética, em 1986, cujo acidente nuclear
ocasionou mais de 500 mortes e produz vários efeitos até os dias atuais;
d) Sandoz e Exxon Valdez nos Estados Unidos, em 1988, com o vazamento
de petróleo num volume equivalente a 260 mil tambores;
e) Rio de Janeiro, no ano de 2000, 1.290 mil toneladas de óleo vazaram na
baía de Guanabara.
4 O navio tanque Torrey Canyon encalhou e terminou por naufragar na costa inglesa da Cornualha, que poluiu
com 119.000 toneladas de óleo, ocasionando poluição das praias e acarretando a morte de peixes e aves.
Inúmeros problemas jurídicos surgiram neste caso: o proprietário era norte-americano; o afretador era inglês;
o navio tinha bandeira da Libéria; a tripulação era italiana etc. Qual seria o responsável pelos danos causados?
A própria Convenção de Londres não abrange este caso de naufrágio, porque ela visa unicamente à interdição
de desgaseificação ao largo das costas.
* Trabalho publicado nos Anais do XIX Encontro Nacional do CONPEDI realizado em Fortaleza - CE nos dias 09, 10, 11 e 12 de Junho de 2010 1611
A história recente da humanidade apresenta, infelizmente, vários episódios
que comprometem o meio ambiente em termos planetários. Desse modo, com a eclosão de
tantos problemas ocorridos versando sobre meio ambiente no plano global, a Assembléia
Geral das Nações Unidas, no ano de 1968, convocou o encontro que seria considerado o
“grande divisor de águas” na formação do direito internacional ambiental5: a Conferência
de Estocolmo, na Suécia, no ano de 19726.
A Conferência de Estocolmo constituiu etapa histórica para a evolução do
tratamento das questões ligadas ao ambiente no plano internacional e também no plano
interno de grande número de países. O tema passou a ser discutido, cada vez menos do
ponto de vista científico e cada vez mais no contexto político e econômico.7 Diante desse
cenário é que emerge uma nova ordem jurídica internacional ambiental que rege as relações
dos Estados na proteção do meio ambiente.8
O direito internacional ambiental consiste num conjunto de normas
complexas que merecem ser tratadas de forma global e organizadas, de modo a permitir a
participação democrática de todos os países, o que é, em grande parte, feito no âmbito da
Organização das Nações Unidas. 9
Nesse ramo do direito o objeto a ser tutelado é o ambiente, devendo, todavia,
levar em consideração a sua ampla conceituação e classificação, haja vista que a vida e a
qualidade de vida são as grandes razões de existência do direito ambiental, tanto no plano
doméstico, como no plano internacional.
O direito internacional ambiental pode ser apresentado como um conjunto de
normas que criam direitos e deveres para os vários atores internacionais e que atribui
papéis e responsabilidades que devem ser observados por todos visando a melhoria da vida
5 Vide GUERRA, Sidney; GUERRA, Sérgio. Curso de direito ambiental. Belo Horizonte: Del Rey, 2009, p.
49. 6 Para se ter a idéia da proliferação de documentos internacionais em matéria ambiental após 1972,
VARELLA, Marcelo Dias. Direito internacional econômico ambiental. Belo Horizonte: Del Rey, 2004, p. 53,
alerta que até os anos 60, existiam apenas alguns dispositivos para a proteção dos pássaros úteis à agricultura, a proteção das peles de focas e sobre a proteção das águas. De 1960 até 1992, foram criados mais de 30000
dispositivos jurídicos sobre o meio ambiente, entre os quais 300 tratados multilaterais e 900 acordos
bilaterais, tratando da conservação e mais de 200 textos oriundos das organizações internacionais. 7 LAGO, André Aranha Corrêa do. Estocolmo, Rio, Joanesburgo. O Brasil e as três conferências ambientais
das Nações Unidas. Brasília: Fundação Alexandre de Gusmão, 2007, p. 32 8 Vale observar o estudo de KISS, Alexandre. Direito internacional do ambiente. Lisboa: Centro de Estudos
Jurídicos, 1996. 9 VARELLA, Marcelo Dias, op.cit., p. 54
* Trabalho publicado nos Anais do XIX Encontro Nacional do CONPEDI realizado em Fortaleza - CE nos dias 09, 10, 11 e 12 de Junho de 2010 1612
e qualidade de vida, para as presentes e futuras gerações. Ele regula os aspectos
relacionados ao meio ambiente que dependem da ação livre da pessoa humana e cuja
regulamentação ultrapassa o interesse de um único Estado.
Sem embargo, Guido Soares10
alerta que pela sua própria natureza certos
fenômenos biológicos ou físicos localizados dentro de um espaço geográfico submetido à
soberania de um Estado exigem regulamentação internacional, seja porque, em sua
unicidade, estendem-se sobre a geografia política de vários países, seja porque os
fenômenos a serem regulados somente poderão sê-lo com a intervenção de normas
internacionais.
Na verdade, em sua caracterização moderna, o meio ambiente é um
fenômeno que desconhece fronteiras, pois os ecossistemas ou os elementos protegidos
situam-se em espaços locais, portanto, dentro de um país (por exemplo: as espécies animais
e vegetais em perigo de extinção, que vivem em determinado país, ou os recursos da
biodiversidade, cuja preservação é do interesse de toda humanidade), em espaços sub-
regionais (por exemplo: os rios transfronteiriços e lagos internacionais, cuja preservação
não pode ser deixada aos cuidados de um único país), em espaços regionais (como os mares
que banham vários países e nos quais realiza a pesca internacional, que não se encontra
restrita só aos países ribeirinhos) e, enfim, mesmo no espaço global de toda a Terra (como a
preservação da camada do ozônio ou a regulamentação das mudanças do clima da Terra
causadas por fatores humanos, mediante a emissão dos gases de efeito estufa.
Os problemas ambientais trazem prejuízos enormes para o desenvolvimento
da humanidade e o que é pior, colocam em sério risco a própria existência da pessoa
humana e de outros seres vivos.
Renovam-se aqui as perspectivas da evolução da matéria haja vista que se
encontra como recurso à humanidade, na luta por condições de vida digna e pela própria
sobrevivência do gênero humano na sociedade global.
3. Alguns Temas Contemplados pelo Direito Internacional Ambiental
10 SOARES, Guido Fernando Silva. Curso de direito internacional público. São Paulo: Atlas, 2002, p. 408
* Trabalho publicado nos Anais do XIX Encontro Nacional do CONPEDI realizado em Fortaleza - CE nos dias 09, 10, 11 e 12 de Junho de 2010 1613
Uma das principais características do Direito Internacional Ambiental
consiste numa enorme proliferação de tratados, convenções e protocolos internacionais,
multilaterais e bilaterais voltados para a proteção do meio ambiente. Outra característica
marcante corresponde à segmentação dos temas, na medida em que é muito mais simples se
alcançar consensos internacionais sobre temas predeterminados do que sobre temas muito
genéricos, tais como proteção da vida marinha, proteção da vida silvestre etc.11
Com efeito, vários documentos internacionais têm sido desenvolvidos no
sentido de proteger o meio ambiente, ora no plano global ora no plano regional. Esse
sistema de proteção, concebido no âmbito do direito internacional ambiental, procura con-
templar algumas áreas específicas do planeta, como, por exemplo, a Antártica, ou temas -
gerais, tais como: o ar, a fauna e a flora, os mares, lagos etc.
Assim sendo, abaixo serão apresentados alguns temas (áreas) em que o
direito internacional ambiental tem incidência, e, portanto, a existência de normas para
tentar minimizar os problemas que são concebidos no plano global.
3.1. Atmosfera e Clima
O artigo 1º da Convenção sobre a poluição atmosférica a longa distância,
adotada em Genova, em 13 de novembro de 1979, define a poluição atmosférica como
“introdução na atmosfera pelo homem, de forma direta ou indireta, de substâncias ou de
energia com ação nociva capaz de por em perigo a saúde humana, danificar os recursos bio-
lógicos e os ecossistemas, deteriorar os bens materiais e ameaçar ou prejudicar as ativida-
des de lazer do homem e outras utilizações legítimas do ambiente”.
A expressão “poluição atmosférica transfronteiriça a longa distância”
designa a poluição atmosférica cuja origem física está total ou parcialmente compreendida
numa zona submetida à jurisdição nacional de um Estado e que exerce os seus efeitos noci-
vos numa zona submetida à jurisdição de um outro Estado, mas a uma distância tal que não
é geralmente possível distinguir as contribuições de fontes emissoras individuais ou de gru-
pos de fontes.
11 ANTUNES, Paulo de Bessa. Direito ambiental. 7. ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2004, p. 393.
* Trabalho publicado nos Anais do XIX Encontro Nacional do CONPEDI realizado em Fortaleza - CE nos dias 09, 10, 11 e 12 de Junho de 2010 1614
Kiss12
afirma que é na atmosfera que os poluentes se propagam mais depres-
sa e percorrem distâncias particularmente importantes e que a proporção de poluentes vin-
dos do estrangeiro para a atmosfera é considerável, podendo atingir mais de 90% em certos
países, como a Noruega.
Em muitos casos, as poluições à longa distância produzem resultados signi-
ficativos, como por exemplo, o desaparecimento das florestas; e é na passagem de certas
substâncias na atmosfera que está a origem da rarefação da camada de ozônio e da alteração
do clima global.
Sem dúvida que um caso emblemático nesta matéria (no campo do direito
internacional ambiental) corresponde à realização de uma arbitragem entre os Estados
Unidos e o Canadá, em razão de poluição atmosférica que foi gerada por uma empresa
canadense, cujos efeitos nocivos traziam repercussões para o primeiro.
Esse caso ficou conhecido como o Caso da Fundição Trail, demanda
resolvida em 1941, em que os Estados Unidos litigaram em nome próprio contra o Canadá
acerca das medidas que deveriam ser tomadas para cessar as atividades poluidoras.
Com efeito, as normas de combate à poluição atmosférica foram desenvolvi-
das inicialmente através de regulações bilaterais e/ou regionais13
, entretanto em razão das
mudanças climáticas e das chuvas ácidas, tem-se desenvolvido normas cuja incidência se
manifesta no plano global.
Foi assim que o princípio número 2 da Declaração realizada em Estocolmo,
estabeleceu a previsão acerca desta matéria, no que se refere à responsabilidade de
assegurar que atividades sob sua jurisdição ou controle não causem danos ao meio
ambiente de outros Estados ou de áreas além dos limites da jurisdição nacional.
Posteriormente foi concebida no ano de 1985, a Convenção para a Proteção
da Camada de Ozônio, que estabelece que as partes devem tomar medidas necessárias e
apropriadas para proteger a saúde humana e o meio ambiente, contra os efeitos adversos,
resultantes das atividades humanas suscetíveis de modificar a camada de ozônio.
12 KISS, Alexandre, op. cit., p. 38. 13 SOARES, Guido, op. cit., p. 426: “São inúmeras as convenções multilaterais existentes em nível regional
europeu, às quais se devem juntar as igualmente inúmeras decisões da Comunidade Europeia, em particular,
após o acidente havido na cidade italiana de Seveso, onde, em 10/07/1976, ocorreria o maior acidente indus-
trial da Europa, com o maior lançamento de uma nuvem de dioxinas tóxicas que se espalhou pelas partes mais
povoadas da Europa Ocidental, em 1976, causado por operação negligente de uma fábrica Suíça.”
* Trabalho publicado nos Anais do XIX Encontro Nacional do CONPEDI realizado em Fortaleza - CE nos dias 09, 10, 11 e 12 de Junho de 2010 1615
Impende registrar outros documentos internacionais multilaterais
importantes sobre esta matéria:
i) Protocolo de Montreal sobre Substâncias que destroem a
Camada de Ozônio, assinado em Montreal, em 1987;
ii) Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudança do
Clima, assinada no Rio de Janeiro, em 1992;
iii) Protocolo de Quioto à Convenção-Quadro das Nações Unidas
sobre Mudança do Clima, assinado em Quioto, em 1997.
3.2. Rios transfronteiriços, lagos e bacias
A tutela internacional dos rios transfronteiriços, lagos e bacias é
fundamental em razão da importância da água doce no planeta para existência da vida e em
especial da pessoa humana.
Entretanto, a maioria dos instrumentos internacionais relativos ao tema
refere-se a uma zona determinada onde são celebrados tratados bilaterais entre os Estados
envolvidos.
Brownlie assevera que pode ser atribuído a um rio um estatuto inteiramente
distinto do da soberania territorial e jurisdição de qualquer Estado, com base num tratado
ou costume, geral ou regional. Contudo, na prática, os rios que separam ou atravessam os
territórios de dois ou mais Estados estão sujeitos à jurisdição territorial dos Estados ribeiri-
nhos até o canal mais profundo das águas navegáveis.14
A Convenção sobre a Proteção e Utilização dos Cursos de Água
Transfronteiriças e dos Lagos Internacionais, adotada em Helsinque no ano de 1992,
enuncia os princípios que devem ser aplicados em tratados que devem ser elaborados entre
países ribeirinhos de um mesmo curso de água ou de um lago. Figuram entre esses princí-
pios:
i) a obrigação de prevenir, combater e reduzir a poluição das águas sus-
cetível de produzir efeitos nefastos noutros países;
14 BROWNLIE, Ian. Princípios de direito internacional público. Lisboa: fundação Calouste Gulbenkian,
1997, p. 290.
* Trabalho publicado nos Anais do XIX Encontro Nacional do CONPEDI realizado em Fortaleza - CE nos dias 09, 10, 11 e 12 de Junho de 2010 1616
ii) de gerir as águas transfronteiriças de maneira racional, ecologicamen-
te sã e equitativa; e
iii) assegurar a conservação e, se necessário, a restauração dos ecossiste-
mas aquáticos.
Em razão da diversidade de interesses dos Estados e das peculiaridades que
suscitam nos temas indicados, evidencia-se que não há uma regulamentação internacional,
no plano global, que possa contemplar a proteção dos rios transfronteiriços, lagos e
bacias.15
Para tentar sanar o problema, a Comissão de Direito Internacional da
Organização das Nações Unidas elaborou um estudo que possa contemplar a proteção
internacional dos rios transfronteiriços, lagos e bacias e apresentou à Assembleia Geral, em
1999.
A ideia é que os Estados encaminhem colaborações para as Nações Unidas,
no sentido de aprimorar o estudo realizado pela Comissão, e posteriormente, que seja ado-
tada a Convenção Internacional sobre o Direito das Utilizações dos Rios Internacionais para
fins distintos da Navegação.
3.3. Os mares e oceanos
A preocupação em se proteger os mares e oceanos é relativamente recente e
acontece a partir do momento em que foram demonstrados os perigos provenientes da
exploração predatória dos recursos marinhos e pela ação dos grandes navios de petróleo
responsáveis pela contaminação, em larga escala, do meio ambiente.
Um caso importante foi o acidente com o petroleiro Torrey Canyon,16
que
possibilitou a necessidade de serem discutidos mecanismos para combater a poluição
ambiental dos mares e oceanos.17
15 No mesmo sentido SOARES, Guido, op. cit., p. 421: “A regulamentação dos rios internacionais é um capí-
tulo bastante complexo no Direito Internacional do Meio Ambiente em razão de corresponder a recursos
hídricos regionais, quando não sub-regionais, e que se submetem a regimes jurídicos particulares, elaborados
tendo em vista a necessidades dos Estados envolvidos, e ainda hoje, submetidos a regras casuísticas. Assim,
inexiste uma Convenção Internacional de nível global, que regule as águas doces, que são as mais importantes
para a biosfera, em especial, a vida humana.” 16 MELLO, Celso Albuquerque. Curso de direito internacional público. 11. ed. Rio de Janeiro: Renovar,
1997, p. 1346, apresenta os problemas causados neste episódio: “O navio tanque Torrey Canyon encalhou e
* Trabalho publicado nos Anais do XIX Encontro Nacional do CONPEDI realizado em Fortaleza - CE nos dias 09, 10, 11 e 12 de Junho de 2010 1617
No mesmo diapasão, Guido18
sinaliza que as catástrofes dos derramamentos
de óleo e suas sequelas sobre importantes setores da sociedade já tinham deixado os
Estados alertados sobre uma necessidade urgente de regulamentar as águas marinhas.
Assim, podem ser apresentados alguns documentos internacionais importan-
tes no regramento desta matéria:
i) Convenção sobre Prevenção de Poluição Marinha por
Alijamento de Resíduos Sólidos e outras matérias, em 1972;19
ii) Convenção Internacional para a prevenção da Poluição por
Navios, assinada em Londres, em 1973;
iii) Convenção Internacional sobre Responsabilidade Civil por
Danos Causados por Poluição por Óleo, assinada em Bruxelas, em 1977;
iv) Convenção das Nações Unidas sobre o Direito do Mar, assi-
nada em Montego Bay, em 1982;
v) Convenção Internacional sobre o Preparo, Resposta e
Cooperação em Caso de Poluição por Óleo, assinada em Londres, em 1990.
3.4. A fauna e a flora
As normas protetivas da fauna e da flora no campo internacional, com o viés
eminentemente ambiental, também são relativamente recentes haja vista que as normas
existentes no passado apresentavam interesse predominantemente econômico.
terminou por naufragar na costa inglesa da Cornualha, que poluiu com 118.000 toneladas de óleo, ocasionan-
do poluição das praias e acarretando a morte de peixes e aves. Inúmeros problemas jurídicos surgiram neste
caso: o proprietário era norte-americano; o afretador era inglês; o navio tinha bandeira da Libéria; a tripulação era italiana etc. Qual seria o responsável pelos danos causados? A própria Convenção de Londres não abrange
este caso de naufrágio, porque ela visa unicamente à interdição de desgaseificação ao largo das costas.” 17 SOARES, Guido, op. cit., p. 418 afirma: “Os espaços marítimos e oceânicos são o meio ambiente que mais
tem sofrido danos de natureza catastrófica, nos últimos anos, a partir da entrada em cena de superpetroleiros,
superdimensionados em tamanho e em sua capacidade de destruição do meio ambiente marinho e das ativida-
des litorâneas dos países ribeirinhos, que se relacionam aos mares e oceanos.” 18 Idem, p. 121. 19 Essa Convenção foi adotada de forma conjunta em Washington, Londres, Cidade do México e Moscou.
* Trabalho publicado nos Anais do XIX Encontro Nacional do CONPEDI realizado em Fortaleza - CE nos dias 09, 10, 11 e 12 de Junho de 2010 1618
No fim do século XIX/início do século XX, foram desenvolvidos alguns
mecanismos de proteção da fauna e da flora no campo internacional. Nesse sentido, podem
ser apresentados o contencioso arbitral (sentença arbitral de 15 de agosto de 1893, no caso
das Focas, para extração das peles no mar de Berhing) ou a conclusão de acordos, como,
por exemplo, a Convenção de Paris, de 19 de março de 1902, sobre a proteção das aves
úteis à agricultura.
Embora os marcos acima indicados não possam ser compreendidos como
pertencentes ao direito internacional ambiental, na medida em que esta idéia floresce a
partir da década de 60/70 do século passado, não se pode negar que serviram como bases de
construção do mesmo. Tanto é que da Convenção de Paris de 1902 houve o desdobramento,
já no ano de 1950, também em Paris, da Convenção Internacional para a Proteção dos
Pássaros.
Ainda assim, é fato que a consciência em matéria ambiental correspondente
à fauna e à flora começam a se manifestar no plano internacional também a partir da
Conferência de Estocolmo, de 1972, que consagra em seu princípio de número 4 que:
“O homem tem a responsabilidade especial de preservar e administrar judi-
ciosamente o patrimônio da flora e da fauna silvestres e seu habitat, que se encontram atual-
mente, em grave perigo, devido a uma combinação de fatores adversos. Conseqüentemente,
ao planificar o desenvolvimento econômico deve-se atribuir importância à conservação da
natureza, incluídas a fauna e flora silvestres.”
Da leitura do referido princípio evidencia-se que a preocupação concebida
no plano internacional corresponde não apenas a proteger este ou aquele animal ou vegetal,
mas principalmente o habitat que se encontram, em razão das muitas espécies que desapa-
receram ou estão em vias de desaparecimento.20
20 Atente-se para os dados espantosos fornecidos por CARNEIRO, Ricardo. Direito ambiental: uma
abordagem econômica. Rio de Janeiro: Forense, 2003, pp. 24-25: Apesar de ainda desconhecer a maior parte
das formas de vida do planeta, a pessoa humana tem provocado a extinção de várias espécies em um ritmo
assustador, sobretudo em função do desmatamento para a expansão da fronteira agrícola, para a produção de
carvão e para exploração de madeira, aliado à prática das queimadas, ao comércio ilegal de animais e de pro-
dutos de origem faunística, como peles, marfins etc., além da contaminação de rios, lagos e oceanos. As esti-
mativas são espantosas: entre 1500 e 1850 uma espécie era elimi- nada a cada dez anos; entre 1850 e 1950
uma espécie por ano foi extinta; em 1990, possivelmente desapareceram dez espécies por dia e por volta do
* Trabalho publicado nos Anais do XIX Encontro Nacional do CONPEDI realizado em Fortaleza - CE nos dias 09, 10, 11 e 12 de Junho de 2010 1619
Não se pode olvidar, neste ponto, de alguns documentos importantes que
foram concebidos no plano internacional:
i) Convenção Internacional para proteção dos Vegetais, assinada em
Roma, em 1951;
ii) Convenção Internacional para a Conservação do Atum e Afins, assi-
nada no Rio de Janeiro, em 1966;
iii) Convenção relativa a Zonas Úmidas de importância Internacional,
assinada em Ramsar – Irã, em 1971;
iv) Convenção relativa à proteção do patrimônio mundial, cultural e
natural, assinada em Paris, em 1972;
v) Convenção sobre Comércio Internacional das Espécies da Flora e da
Fauna Selvagens em perigo de extinção, assinada em Washington, em 1973;
vi) Convenção sobre a conservação de espécies migratórias pertencentes
à fauna silvestre, assinada em Bonn, em 1979.
Os documentos acima indicados não esgotam o plano normativo interna-
cional nesta matéria, ao contrário, existem vários outros textos pertinentes à proteção da
fauna e da flora; relativos à pesca internacional; de combate a determinadas pragas; e à
diversidade biológica.
Em relação a este último, ganha destaque a Convenção sobre a Diversidade
Biológica, concebida no Rio de Janeiro, em 1992. Logo no preâmbulo da referida
Convenção identifica-se a importância da diversidade biológica para a evolução e para a
manutenção dos sistemas necessários à vida da biosfera e que a conservação da diversidade
biológica é uma preocupação comum da humanidade.
ano 2000 uma espécie deverá desaparecer a cada hora; de 1975 a 2000 foram eliminadas da face da Terra
cerca de 20% de todas as espécies vivas; desde 1950 foi perdido 1/5 das florestas tropicais do mundo; a cada
ano são desertificados cerca de 20 milhões de hectares de áreas florestadas. Atualmente, mais de 14% das
espécies vegetais conhecidas estão em processo de extinção; 2/3 das 9600 espécies de aves que habitam o pla-
neta estão em declínio e 11% estão ameaçadas de extinção; 11% das 4400 espécies de mamíferos encontram-
se em perigo iminente de desaparecimento e 1/3 de todas as espécies de peixes que ocupam os oceanos, lagos
e rios está sob ameaça direta.”
* Trabalho publicado nos Anais do XIX Encontro Nacional do CONPEDI realizado em Fortaleza - CE nos dias 09, 10, 11 e 12 de Junho de 2010 1620
A Convenção procura reafirmar orientações do Direito Internacional do
Desenvolvimento e propugna que os Estados venham a elaborar estratégias para assegurar a
conservação e a utilização durável da diversidade biológica e adotar medidas de conserva-
ção in situ (art. 8º) e ex situ (art. 9º).
Outro ponto importante discutido na Conferência do Rio foi o corresponden-
te à Desertificação, sendo concebida a Convenção das Nações Unidas para o combate à
desertificação.
A desertificação torna o solo improdutivo e estéril e resulta de diversos fato-
res, tais como: mudanças climáticas, utilização inadequada do solo (queimadas, desmata-
mento etc).
4. Para a criação de um Tribunal Internacional do Meio Ambiente?
Indubitavelmente que os problemas ambientais crescem e colocam em risco
a existência das espécies (inclusive a humana). Muitos dos problemas que se manifestam na
sociedade hodierna decorrem de comportamentos inadequados que foram desenvolvidos
pelo ser humano (ação antrópica) ao longo dos anos em nome de um crescimento
desenfreado.
O “progresso” não levava em consideração as limitações do ambiente e para
atender aos interesses e anseios de pessoas cada vez mais ávidas pelo consumo é que se
desenvolveu uma sociedade global de risco em termos ambientais.21
O desabrochar do movimento ambiental no plano global decorre das grandes
Conferências Internacionais de Meio Ambiente que foram realizadas sob os auspícios da
Organização das Nações Unidas. Certamente que o grande desafio da humanidade é o de
encontrar respostas para que o desenvolvimento dos Estados não aconteça de maneira
predatória, comprometendo os recursos para as futuras gerações.
Os problemas ambientais trazem prejuízos enormes para o desenvolvimento
da pessoa humana, e subjacente às perspectivas da evolução da matéria encontra-se o
recurso último à humanidade na luta por condições de vida digna e pela própria
sobrevivência do gênero humano na sociedade global.
21 Para leitura completa vide GUERRA, Sidney; GUERRA, Sérgio. Curso de direito ambiental. Belo
Horizonte: Del Rey, 2009, p. 31-37
* Trabalho publicado nos Anais do XIX Encontro Nacional do CONPEDI realizado em Fortaleza - CE nos dias 09, 10, 11 e 12 de Junho de 2010 1621
Há de se envidar esforços em prol da criação de uma verdadeira cultura da
preservação do meio ambiente com participação mais efetiva dos múltiplos atores
internacionais.
A proteção internacional do meio ambiente se apresenta hoje como um dos
grandes temas da globalidade, ensejando uma grande transformação no âmbito das relações
internacionais e a consequente emergência de uma nova ordem internacional ambiental
calcada num desenvolvimento que leve em consideração seu principal elemento: o indiví-
duo.
Com efeito, na busca incessante do reconhecimento, desenvolvimento e
realização dos maiores objetivos por parte da pessoa humana e contra as violações que são
perpetradas pelos Estados e pelos particulares, o Direito Internacional tem-se mostrado uma
importante ferramenta para o fortalecimento e implementação dos direitos humanos e vem
ganhando terreno nesta seara, pois a proteção desses direitos passou a constituir lídimo
interesse da sociedade internacional.
A multiplicidade de instrumentos internacionais no pós-Segunda Guerra
levou a uma nova evolução da proteção internacional dos direitos humanos e por isso
hodiernamente busca-se uma “justiça globalizada” a ser institucionalizada em um tribunal
supranacional.
O direito internacional precisa se adequar às novas realidades sociais e
desenvolver normas adaptadas a todas as situações.
Em se tratando de meio ambiente, foi demonstrado que por várias vezes os
Estados não podem isoladamente resolver os problemas ambientais. Em muitos casos, as
lesões ao meio ambiente são transnacionais impossibilitando as ações dos Estados numa
possível intervenção, como por exemplo, na emissão de gases poluentes que produzem
efeitos nefastos na atmosfera, nos rios, lagos, mares; na produção de energia nuclear e
produção do lixo atômico; na devastação das florestas e preservação da biodiversidade.
Sendo o meio ambiente um direito humano e levando em consideração a
preservação das espécies, fundamentalmente a humana, há de se criar mecanismos para a
proteção ambiental no plano internacional.
* Trabalho publicado nos Anais do XIX Encontro Nacional do CONPEDI realizado em Fortaleza - CE nos dias 09, 10, 11 e 12 de Junho de 2010 1622
Castro22
assinala que a consolidação do Direito Internacional Ambiental e o
precedente das Cortes Internacionais de Direitos Humanos geraram a aspiração de se
instituir um Tribunal Internacional do Meio Ambiente ao qual se reservaria a competência
de fiscalizar a aplicação das normas de proteção ecológica, especialmente o julgamento das
questões resultantes da transgressão dessas normas e as que envolvessem responsabilidades
por danos ambientais que extrapolassem as fronteiras nacionais. A ideia de criação de uma
instância supranacional com autoridade judicante face aos litígios de fundo ambientalista
tem em mira diversas situações que já não comportam solução satisfatória perante a juris-
dição interna dos Estados.
A existência de um sistema jurídico supranacional com órgãos jurisdicionais
supranacionais dotados de competência ambiental exibe propriedades que os sistemas
jurídicos não possuem.
À luz das dificuldades pelas quais atravessam os sistemas jurídicos internos
para resolver os problemas derivados da degradação ambiental, o sistema jurídico
supranacional se apresenta como uma opção válida e oportuna, tendo em vista a nova
ordem mundial emergente.
Desta forma, a Assembleia Geral das Nações Unidas, em 22 de dezembro de
1989, bem como as reuniões celebradas em Haia, Paris, Roma, Washington, Limoges e
Florença, foram unânimes em ressaltar a necessidade de se rever os instrumentos
internacionais em matéria ambiental, como também de se criar um organismo internacional
junto à Organização das Nações Unidas, de caráter permanente, acessível a Estados,
pessoas físicas e jurídicas, organizações, com competência para dirimir conflitos de
natureza ambiental.
Com efeito, partindo das felizes experiências que já se manifestam no plano
das relações internacionais no que tange aos direitos humanos é que temos defendido a
necessidade de se constituir um Tribunal Internacional do Meio Ambiente em várias
ocasiões.23
Essa ideia tem-se propalado em vários lugares alcançando diversas
personalidades24
e defensores mundo afora.25
22
CASTRO, Carlos Roberto Siqueira. A constituição aberta e os direitos fundamentais: ensaios sobre o
constitucionalismo pós-moderno e comunitário. Rio de Janeiro: Forense, 2003, p. 710. 23 Nesse sentido, vide GUERRA, Sidney. Direito internacional ambiental. Rio de Janeiro: Freitas Bastos,
2006. GUERRA, Sidney. Direitos humanos: uma abordagem interdisciplinar. Vol. III. Rio de Janeiro:
* Trabalho publicado nos Anais do XIX Encontro Nacional do CONPEDI realizado em Fortaleza - CE nos dias 09, 10, 11 e 12 de Junho de 2010 1623
O referido Tribunal poderia apreciar as demandas que envolvessem, por
exemplo, derramamento de óleo em alto-mar, devastação de florestas para a extração de
madeira de forma predatória, a matança desenfreada dos animais ameaçados de extinção, o
transporte internacional de substâncias químicas nocivas à pessoa humana etc.
Embora os estudos para a implantação do Tribunal Internacional do Meio
Ambiente tenham sido realizados infelizmente ainda não foram efetivados. Nesse sentido,
vala ressaltar os estudos propostos por uma Organização Não Governamental chamada
Comitê Promotor do Tribunal Internacional do Meio Ambiente, que além de estabelecer os
princípios relativos à proteção ao meio ambiente, preconiza a criação e atuação junto à
ONU, em caráter permanente, de dois organismos internacionais de garantia: a Agência
Internacional do Meio Ambiente e um Tribunal Internacional do Meio Ambiente.
Freitas Bastos, 2007. GUERRA, Sidney. Tratado de direito internacional. Rio de Janeiro: Freitas Bastos,
2008. GUERRA, Sidney. Curso de direito internacional público. Rio de Janeiro: Lúmen Júris, 2009.
GUERRA, Sidney; GUERRA, Sérgio. Curso de direito ambiental. Belo Horizonte: Del Rey, 2009 etc. 24 http://www.mwglobal.org/ipsbrasil.net/nota.php?idnews=3262 “Enquanto a Organização das Nações Unidas assume um papel cada vez mais predominante no debate sobre a mudança climática, surge um
renovado interesse em uma proposta de longa data para criar um tribunal internacional que julgue crimes
ambientais. Porém, alguns diplomatas e ambientalistas duvidam que um tribunal desse tipo conte com o apoio
político da maioria dos 192 Estados-membros da ONU. “Levaram anos para criar um tribunal internacional
contra crimes de guerra, e a formação de um para crimes ambientais pode demorar gerações”, disse um
diplomata do Sul em desenvolvimento. Satish Kumar, editor da revista ambientalista Ressurgence, com sede
em Londres, é um forte defensor da criação desse tribunal. “Não temos direito algum de contaminar. E se eu
jogo meu lixo em sua casa, é um crime. Pode me levar ao tribunal”, disse. “Mas, se jogamos nosso lixo na
natureza, esta não pode nos levar ao tribunal. A natureza deveria ter o direito de nos julgar e, portanto, a ONU
deveria criar um tribunal para a natureza”, disse à IPS. Kumar destacou que os crimes ambientais – desde
jogar lixo tóxico até destruição de recursos naturais em operações militares – devem ser considerados “crimes contra a natureza”. 25 Em recente evento patrocinado pela International Academy of Environmental Sciences, na Conferência
Internacional datada de 02 e 03 de outubro em Veneza, houve mais um chamamento para que os Estados
apóiem a iniciativa de se criar um Tribunal Internacional de Meio Ambiente. Disponível em
http://www.iaes.info
* Trabalho publicado nos Anais do XIX Encontro Nacional do CONPEDI realizado em Fortaleza - CE nos dias 09, 10, 11 e 12 de Junho de 2010 1624
À Agência Internacional do Meio Ambiente compete o controle e monitora-
mento da situação do meio ambiente em todo o planeta, bem como a promoção de toda e
qualquer iniciativa (investigações, estudos, pesquisas, congressos, publicações etc.) destina-
da à preservação ambiental. Segundo o projeto, a Agência é composta por quinze membros,
nomeados pela Assembleia Geral das Nações Unidas e escolhidos dentre cem pessoas indi-
cadas pelo Secretário Geral da ONU em razão de notório nível técnico e independência.Ao
Tribunal Internacional do Meio Ambiente é conferida atribuição de dirimir conflitos envol-
vendo danos ambientais imputáveis à ação ou omissão dos Estados, como também à apura-
ção de responsabilidades e aplicação de sanções por danos ambientais causados por pessoas
físicas ou jurídicas privadas, cujas características e proporções atinjam os interesses funda-
mentais da preservação do meio ambiente humano sobre a Terra, competindo-lhe, ainda,
em caráter consultivo, emitir opiniões jurídicas relacionadas com questões ecológicas que
se revistam de importância em escala mundial. Integram o Tribunal quinze juízes indepen-
dentes, também escolhidos pela Assembleia Geral das Nações Unidas dentre um grupo de
cem pessoas indicadas pelo Secretário Geral da ONU, todos com mandato de sete anos e
reelegíveis uma única vez.26
5. Considerações finais
Em decorrência dos múltiplos problemas que atingem o meio ambiente no
plano global os Estados foram levados a conceber uma série de normas que pudessem
garantir sua proteção na arena internacional.
Apesar do direito internacional ambiental se apresentar hodiernamente como
uma realidade, com a existência de vários tratados e convenções internacionais, a sociedade
internacional se ressente da existência de um tribunal que possa dirimir controvérsias que
contemple essa matéria.
26 Vide CASTRO, Carlos Roberto Siqueira, op. cit., p. 711.
* Trabalho publicado nos Anais do XIX Encontro Nacional do CONPEDI realizado em Fortaleza - CE nos dias 09, 10, 11 e 12 de Junho de 2010 1625
Assim sendo, para que se viabilize a proposta de criação do Tribunal
Internacional do Meio Ambiente, parte-se da experiência existente acerca de Tribunais
Internacionais que estão em funcionamento, como por exemplo, a Corte Internacional de
Justiça (funciona para dirimir controvérsias entre Estados) e o Tribunal Penal Internacional
(tem competência de julgar os crimes que são tipificados no tratado de Roma de 1998).
Embora a criação do Tribunal Internacional do Meio Ambiente seja extre-
mamente importante para toda a humanidade deparamos com o problema antigo no proces-
so de elaboração das normas internacionais, in casu na criação de um tribunal que possa
atribuir responsabilidades aos Estados que produzam lesões ao ambiente: a falta de vontade
política (por motivos óbvios) na consecução deste projeto. 27
De toda sorte, as manifestações da sociedade civil, as organizações não
governamentais e, em especial, dos estudiosos do direito internacional ambiental são
valiosas para que, ao final (mas não no final) seja constituído o Tribunal Internacional do
Meio Ambiente.
6. Referências bibliográficas
ANTUNES, Paulo de Bessa. Direito ambiental. 7. ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2004.
BROWNLIE, Ian. Princípios de direito internacional público. Lisboa: fundação Calouste
Gulbenkian, 1997.
CARNEIRO, Ricardo. Direito ambiental: uma abordagem econômica. Rio de Janeiro:
Forense, 2003.
CASTRO, Carlos Roberto Siqueira. A constituição aberta e os direitos fundamentais:
ensaios sobre o constitucionalismo pós-moderno e comunitário. Rio de Janeiro: Forense,
2003. 27 “Há tempos diversos cientistas e especialistas em temas legais chamam a atenção pública sobre a quase
impunidade existente no mundo para os que provocam danos ecológicos irreversíveis. Embora os códigos
penais de muitos países contemplem a possibilidade de punição a estes infratores, não existem instrumentos
internacionais que possam pôr fim a grandes contaminações e muitos governos não se animam a enfrentar as
grandes empresas por temerem perder estes investimentos. Em entrevista à Rádio Holanda Internacional, o
prêmio Nobel da Paz, Adolfo Pérez Esquivel, declarou que para introduzir o delito contra o ambiente é
necessário modificar os Estatutos de Roma do Tribunal Penal Internacional, com sede em Haia, e para isso é
necessária a aprovação de dois terços dos países signatários.” Disponível em http://www.rnw.nl/pt-
pt/portugu%C3%AAs/article/tribunal-internacional-para-o-meio-ambiente capturado em 24 de fevereiro de
2010
* Trabalho publicado nos Anais do XIX Encontro Nacional do CONPEDI realizado em Fortaleza - CE nos dias 09, 10, 11 e 12 de Junho de 2010 1626
GUERRA, Sidney. Direito internacional ambiental. Rio de Janeiro: Freitas Bastos, 2006.
GUERRA, Sidney. Direitos humanos: uma abordagem interdisciplinar. Vol. III. Rio de
Janeiro: Freitas Bastos, 2007.
GUERRA, Sidney. Tratado de direito internacional. Rio de Janeiro: Freitas Bastos, 2008.
GUERRA, Sidney. Curso de direito internacional público. Rio de Janeiro: Lúmen Júris,
2009.
GUERRA, Sidney; GUERRA, Sérgio. Curso de direito ambiental. Belo Horizonte: Del
Rey, 2009.
KISS, Alexandre. Direito internacional do ambiente. Lisboa: Centro de Estudos Jurídicos,
1996.
LAGO, André Aranha Corrêa do. Estocolmo, Rio, Joanesburgo. O Brasil e as três
conferências ambientais das Nações Unidas. Brasília: Fundação Alexandre de Gusmão,
2007.
MELLO, Celso Albuquerque. Curso de direito internacional público. 11. ed. Rio de
Janeiro: Renovar, 1997.
SOARES, Guido Fernando Silva. Curso de direito internacional público. São Paulo: Atlas,
2002.
SOARES, Guido Fernando Silva. Direito internacional do meio ambiente: emergência,
obrigações e responsabilidades. 2. ed. São Paulo: Atlas, 2003.
VARELLA, Marcelo Dias. Direito internacional econômico ambiental. Belo Horizonte:
Del Rey, 2004.
* Trabalho publicado nos Anais do XIX Encontro Nacional do CONPEDI realizado em Fortaleza - CE nos dias 09, 10, 11 e 12 de Junho de 2010 1627