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  • http://6cieta.org So Paulo, 8 a 12 de setembro de 2014.ISBN: 978-85-7506-232-6

    PANORAMA DAS UNIDADES DE CONSERVAONA FAIXA DE FRONTEIRA BRASILEIRA: UMA

    CARACTERIZAO

    Letcia Nascimento Vimeney

    Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ)

    [email protected]

    INTRODUO E OBJETIVOS

    A questo ambiental teve um crescimento tanto de importncia local quanto

    global especialmente a partir da segunda metade do sculo XX. Discusses que vo desde a

    extino de espcies at as mudanas climticas fizeram com que houvesse um aumento da

    preocupao ambiental nas agendas estatais e internacionais, na medida em que a proteo

    da natureza representa tambm a proteo de recursos naturais que garantem a

    continuidade do desenvolvimento econmico. A noo de biodiversidade emerge nesse

    contexto, sendo a preservao da diversidade de espcies a meta que se tornar recorrente

    nas polticas nacionais, apontando para o carter cientfico e geopoltico que passa a

    envolver a questo. Ao redor do mundo, se torna comum a definio de reas destinadas

    proteo da natureza: diversos pases passaram a contar com sistemas de reas protegidas,

    cada um com particularidades em sua legislao, objetivos e estratgias de manejo. No

    Brasil, apesar de o primeiro Parque ter sido criado em 1937, a sistematizao dessa poltica

    vem somente nos anos 2000, por meio da Lei do Sistema Nacional de Unidades de

    Conservao (SNUC). Constam na Lei n 9985 as doze categorias de Unidades de

    Conservao (UCs) e as principais diretrizes que devem reger o manejo e gesto dessas

    reas.

    Na regio da Faixa de Fronteira brasileira, em particular, esse processo de

    criao e implementao de reas protegidas envolvido por controvrsias entre os

    diversos atores da sociedade civil, dos governos, foras armadas e organizaes

    ambientalistas. Essa controvrsia baseada no fato de que a incidncia das Unidades de

    Conservao nessa regio continuamente apresentada como um fator de vulnerabilidade

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    mailto:[email protected]

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    para a soberania nacional entre os setores mais nacionalistas ou como uma interdio de

    acesso aos recursos naturais por atores locais e regionais. Alm disso, em muitos casos, a

    criao de Unidades de Conservao pelo governo nessa regio - que ainda representa uma

    fronteira de ocupao no Pas - seguiu a estratgia de criao de zonas-tampo para

    impedir a apropriao de terras.

    Sendo assim, para um maior embasamento das discusses em torno dessas

    controvrsias, necessrio que o conhecimento sobre esse conjunto de Unidades seja

    aprofundado. O objetivo geral desse trabalho vem a ser, portanto, realizar uma

    caracterizao da situao atual das Unidades de Conservao na Faixa de Fronteira

    brasileira (regio definida segundo a Lei 6.634 de 2/5/1979 como a faixa de 150 km de

    largura a partir do limite internacional do territrio) - especialmente no que se refere aos

    instrumentos de gesto e efetividade de seu manejo.

    Especificamente, esse panorama visa a abranger trs principais dimenses,

    realizando uma caracterizao: a) biogeogrfica, principalmente pelos biomas protegidas

    pelas Unidades, b) institucional, analisando tanto a distribuio das Unidades pelas

    categorias e grupos do SNUC quanto os instrumentos de gesto implementados - como

    Plano de Manejo, Conselho Gestor, situao fundiria-, e c) socioeconmica, explorando

    possveis conflitos a partir dos diferentes usos da terra.

    METODOLOGIA

    Conceitual

    O termo reas protegidas refere-se abordagem mais generalizante quando

    tratamos de pores do territrio delimitadas com objetivos de proteo e/ou conservao

    da natureza. Essa definio ganha destaque especialmente pela iniciativa desenvolvida pela

    Internacional Union for Conservation of Nature (IUCN) para elaborao de um sistema

    internacional que categorizasse esses espaos dedicados conservao. Assim, o conceito

    desenvolvido para reas protegidas define-se como reas do espao terrestre e/ou

    martimo especialmente dedicadas proteo e manuteno da diversidade biolgica e dos

    recursos naturais e culturais a ela associados, manejadas por meios oficiais ou outros meios

    efetivos (IUCN, 1994, p. 7).

    Diversos pases, entretanto, desenvolveram seus sistemas nacionais de reas

    protegidas utilizando terminologias distintas. No Brasil usa-se o termo Unidades de

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    Conservao, definidas a partir da Lei n 9985 do ano 2000 como espao territorial e seus

    recursos ambientais, incluindo as guas jurisdicionais, com caractersticas naturais

    relevantes, legalmente institudo pelo Poder Pblico, com objetivos de conservao e limites

    definidos, sob regime especial de administrao, ao qual se aplicam garantias adequadas de

    proteo. O Sistema Nacional de Unidades de Conservao divide essas reas em doze

    categorias, separadas em dois grupos (Proteo Integral e Uso Sustentvel), cujos objetivos

    de conservao e diretrizes de manejo se diferenciam entre cada uma delas.

    O recorte espacial definido por esse trabalho constitui-se na Faixa de Fronteira

    brasileira, regio definida segundo a Lei 6.634 de 2/5/1979 como a faixa de 150 quilmetros

    de largura a partir do limite internacional do territrio. Assim, foram consideradas as

    Unidades de Conservao (UCs) inseridas nos municpios que constituem essa regio.

    Operacionalizao

    Para a elaborao do panorama das Unidades de Conservao na Faixa de

    Fronteira foi necessria a construo de um banco de dados com informaes relativas s

    reas que constam no Cadastro Nacional de Unidades de Conservao (CNUC) nos

    municpios que constituem a Faixa. Uma das dificuldades metodolgicas desse processo a

    incompatibilidade dos dados disponibilizados pelas diferentes instituies, especialmente

    no que tange existncia ou no de determinadas Unidades. Algumas UCs so

    mencionadas tanto na bibliografia disponvel quanto em bases de dados de rgos locais,

    porm no se encontram no CNUC. Assim, diante da impossibilidade de confirmao do

    mbito de existncia dessas Unidades (como por exemplo por meio do seu Decreto de

    Criao), decidiu-se por considerar aquelas registradas no Cadastro Nacional.

    Essa base de dados conta com informaes relativas s trs dimenses

    abordadas, como exemplificado por meio do Quadro I. Os dados relativos a essas variveis

    foram preenchidos a partir da pesquisa em diversas fontes de dados, como o Cadastro

    Nacional de Unidades de Conservao (CNUC), os sites institucionais do Instituto Chico

    Mendes de Conservao da Biodiversidade (ICMBio), o banco de dados disponibilizado

    online pelo Instituto Socioambiental (ISA), as instituies estaduais e municipais

    responsveis pela gesto das unidades, alm de notcias publicadas pela mdia local e

    nacional.

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    Quadro 1: Exemplo do banco de dados

    Cabe destacar que o presente trabalho no abrange todas as variveis

    levantadas, j que a extenso da anlise possvel de ser realizada com algumas delas

    demandou a segmentao desse estudo. Esses casos sero aqui abordados dentro de cada

    dimenso a que a varivel pertence.

    Diante da divergncia que muitas vezes foi encontrada entre as informaes

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    disponibilizadas pelas diferentes fontes, somente incluram-se os dados que foram passveis

    de confirmao (no caso da divergncia, por exemplo, relativa ao Plano de Manejo somente

    considerou-se sua existncia quando foi encontrada a publicao oficial de sua criao).

    A partir das variveis disponveis no banco de dados, foram confeccionados

    grficos e quadros comparativos para visualizao e anlise das informaes encontradas.

    RESULTADOS

    A despeito da dificuldade de obteno de dados, os resultados preliminares

    apontam para a existncia de 204 unidades de conservao na Faixa de Fronteira, que

    representam cerca de 11% do universo de Unidades de Conservao no Brasil. Os dados

    foram trabalhados principalmente por meio de grficos, divididos pelas dimenses da

    matriz da pesquisa.

    Dimenso biogeogrficaA principal varivel que caracteriza essa dimenso o bioma abrangido pelas

    Unidades de Conservao. A Amaznia protegida por mais da metade dessas reas (57%

    das unidades), enquanto a outra metade abrange Unidades no Cerrado, Pantanal, Pampa e

    Mata Atlntica (Grfico 1). Esse dado vai se relacionar de maneira muito prxima

    distribuio das Unidades ao longo dos arcos da Faixa de Fronteira (Norte do Amap at

    Rondnia-, Central Mato Grosso e Mato Grosso do Sul- e Sul Paran, Santa Catarina e Rio

    Grande do Sul), distribuio essa que melhor analisada pelas variveis da dimenso

    Institucional, a seguir.

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    Grfico 1: UCs por bioma abrangido.

    Fonte: Cadastro Nacional de Unidades de Conservao

    Dimenso institucional

    Na dimenso institucional, a matriz foi dividida entre as variveis referentes

    legislao e implementao e gesto. No primeiro tema, as variveis incluem a

    categoria e o grupo do SNUC a que pertence a Unidade, alm da sua data de criao e se

    houve alterao de seus limites. Dentre as 204 reas, aparecem 11 categorias das 12

    propostas pelo SNUC (somente a Reserva de Fauna no figura na Faixa de Fronteira).

    Constitui-se um universo em que mais da metade das Unidades so do grupo de Uso

    Sustentvel (Grfico 2). Em relao s datas de criao, possvel que se analisem os

    perodos em que mais foram criadas Unidades no pas, porm esse estudo dimensiona-se

    alm dos objetivos especficos do presente trabalho. Da mesma forma, o processo de

    ampliao ou reduo dos limites de Unidades de Conservao gera anlises que se inserem

    em uma etapa posterior a essa primeira caracterizao panormica.

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    Grfico 2: Distribuio das UCs por Grupo.

    Fonte: Cadastro Nacional de Unidades de Conservao

    Dentro do tema de Implementao e Gesto, foi analisada primeiramente a

    distribuio espacial das Unidades pelos arcos da Faixa de Fronteira e dentro da prpria

    Faixa (Grfico 3). O Arco Sul o que conta com menos Unidades, respondendo por 19% do

    universo dessas reas na Faixa, enquanto que os Arcos Central e Norte tm 40 e 41%

    respectivamente. Essa distribuio reflete os padres de maior preservao na Regio

    Amaznica em relao ao resto do pas, rea que hoje representa ainda a fronteira de

    expanso econmica brasileira. Nesse sentido, cabe ressaltar o carter polmico da

    implementao dessas reas de proteo, j que envolvem uma srie de interesses distintos

    entre os agentes envolvidos. Por um lado, h uma preocupao da criao das Unidades de

    Conservao com o princpio primeiro da preservao desse ecossistema que vem sendo

    ameaado pelo avano do agronegcio do Centro-Oeste. Em escalas mais locais, porm, as

    Unidades se tornam um empecilho para os governos municipais e populaes que se

    beneficiam dos setores de extrao dos recursos da floresta. H, ainda, os interesses das

    populaes tradicionais e indgenas, que muitas das vezes no vo ao encontro da

    instituio dessas reas de proteo.

    A menor representao das Unidades no Arco Sul, por sua vez, se justifica pelos

    maiores ndices de urbanizao dessa regio, cujos ndices de desmatamento j suprimiram

    a maior parte da vegetao original.

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    Grfico 3: Distribuio das UCs por Arcos da Faixa de Fronteira.

    Fonte: Ministrio do Meio Ambiente

    Das 204 Unidades, somente 31 esto na linha fronteiria; nessas, h uma

    distribuio mais equilibrada entre as reas de cada grupo (nas demais Unidades h uma

    prevalncia das reas de Uso Sustentvel) (Grfico 4).

    Grfico 4: UCs por Grupos segundo posio na Faixa de Fronteira.

    Fonte: Ministrio do Meio Ambiente

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    J em relao distribuio espacial dos grupos de categorias pelos Arcos da

    Fronteira, podemos destacar que no Arco Norte h uma predominncia de Unidades de Uso

    Sustentvel (69% das 84 Unidades desse Arco), enquanto no Arco Sul o padro inverso

    (52% das 38 unidades so de Proteo Integral); o Arco Central repete o padro de

    distribuio do Arco Norte (67% so Unidades de Uso Sustentvel). Cabe ressaltar,

    entretanto, a relatividade desses dados, j que o nmero de Unidades de Conservao

    bem distinto em cada Arco.

    Quadro 2: Grupos das UCs por Arco da FF

    Fonte: Cadastro Nacional de Unidades de Conservao; Ministrio do Meio Ambiente.

    Sobre esse dado, importante perceber que a representao das Unidades de

    Uso Sustentvel no Arco Norte especialmente justificada pela predominncia das Reservas

    Extrativistas na regio. Essa categoria d conta das reas protegidas destinadas

    preservao das fontes de subsistncia de populaes tradicionais que vivem do

    extrativismo vegetal, o que explica que elas apaream basicamente na Regio Amaznica do

    Pas. Por outro lado, no Arco Central, as Reservas Particulares de Patrimnio Natural so

    responsveis pela quantidade de Unidades de Uso Sustentvel e espelha a expressividade

    da propriedade privada nessa regio do Pas.

    Em relao s esferas responsveis pela gesto dessas reas, somente 3% so

    geridas por rgos municipais e mais da metade so da esfera federal (Grfico 5). Sobre

    esse dado, ressaltamos que, ao longo do trabalho de pesquisa, diversas Unidades

    municipais que no figuram no CNUC foram levantadas a partir de bibliografia e de mdias

    locais (blogs, sites de instituies e dos rgos municipais, jornais). Assim, a pouca

    expressividade dessa esfera demonstrada por esse estudo justificada pelo fato de que

    muitas reas protegidas geridas pelo poder municipal no se enquadraram na legislao do

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    SNUC e, portanto, no fizeram seu registro no Cadastro Nacional.

    Grfico 5: UCs por esfera de gesto.

    Fonte: Ministrio do Meio Ambiente

    J em relao existncia de instrumentos de gesto, percebe-se que mais de

    70% das Unidades no contam com Plano de Manejo (Grfico 6). Esse dado torna-se

    bastante relevante quando lembramos que a Lei 9.985 estabelece a obrigatoriedade de um

    Plano de Manejo para todas as Unidades (Captulo IV, artigo 27). nesse Plano de Manejo

    que devem constar todas as normas referentes gesto, administrao e utilizao tanto

    dos limites internos da rea protegida quanto da sua zona de amortecimento. No Plano so

    estabelecidas tanto as aes de manejo referentes aos recursos naturais quanto

    necessidade de infraestrutura fsica (instalaes, nmero de funcionrios, acessos

    Unidade). Assim, conclui-se que a ausncia do Plano de Manejo dificulta ou mesmo impede

    uma sistematizao nas aes relativas gesto da Unidade.

    O Plano de Manejo, ao regulamentar todas as normas da Unidade de

    Conservao, deve contar com a participao da sociedade civil, visto que a sociedade que

    vai se beneficiar da visitao e/ou da utilizao da Unidade, bem como de seus servios

    ambientais. A Lei do SNUC, nesse sentido, prev que o Plano seja elaborado conjuntamente

    com os Conselhos Gestores da Unidade. Os Conselhos so presididos pelo chefe da Unidade

    e se constituem de representantes dos rgos pblicos e representantes da sociedade civil,

    visando garantir a dita participao na regulamentao da rea protegida.

    Para a Faixa de Fronteira, em relao s Unidades que devem contar com um

    Conselho Gestor (excetuam-se as Reservas de Patrimnio Privado Natural, cuja existncia de

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    Conselho facultativa), 39% ainda no o implementaram (Grfico 6). Isso significa que,

    nessas Unidades, a sociedade civil est excluda dos processos decisrios de

    regulamentao e gesto das reas, assim como indiretamente dos mecanismos de

    fiscalizao.

    Grfico 6: Existncia de Plano de Manejo e Conselho Gestor.

    Fonte: Cadastro Nacional de Unidades de Conservao; Instituto Socioambiental

    Os dados referentes situao fundiria das Unidades foram extrados

    exclusivamente do Cadastro Nacional de Unidades de Conservao. Alm da predominncia

    da situao de no-regularizao, pertinente que se destaque a ausncia de dados

    referentes essa varivel no Cadastro (Grfico 7).

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    Grfico 7: Situao fundiria.

    Fonte: Cadastro Nacional de Unidades de Conservao

    Em relao varivel recursos humanos, os dados relativos ao nmero de

    funcionrios das Unidades so referentes a anos distintos. A presena de funcionrios

    dentro de uma Unidade um dado importante para anlise da efetividade da gesto, visto

    que h Unidades sobre as quais podemos dizer que existem somente perante a Lei, posta a

    ausncia absoluta de funcionrios para conduzir sua gesto. So os denominados parques

    de papel. Porm, para desenvolver uma metodologia mais adequada de anlise desses

    dados, haveria necessidade da compatibilidade das datas.

    Diversos aspectos ligados infraestrutura, presentes no CNUC, poderiam

    complementar o estudo realizado nessa dimenso: no Cadastro esto presentes inmeros

    dados relativos estrutura de transportes, comunicao, energia, saneamento bsico e

    estruturas fsicas. Uma metodologia para cruzamento de todos esses aspectos poderia ser

    desenvolvida em um estudo posterior, porm na medida em que a maioria das Unidades

    no conta com esses dados, no haveria a preciso desejada na anlise.

    Dimenso socioeconmica

    Essa dimenso se desdobra no tema Conflitos de uso, que vai abranger

    variveis que apontam para conflitos gerados pelos diferentes usos da terra por diferentes

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    atores que se incluem no processo de criao e gesto de uma Unidade.

    A varivel populao indica a existncia ou no de moradores no interior das

    UCs, o que pode apontar uma potencialidade para a gerao de conflitos a partir do

    momento em que os objetivos de proteo buscados pela criao da Unidade vo de

    encontro ao uso da terra dado pela populao que habita aquela rea. importante

    destacar que em relao a esse aspecto (presena de moradores no interior da UC), as

    normas de cada categoria diferem em relao ao grau de interdio, quer se trate de

    moradia ou mesmo de visitao e pesquisa. Mesmo no grupo de Proteo Integral, a

    ocupao humana permitida nas categorias Monumento Natural e Refgio de Vida

    Silvestre. No grupo de Uso Sustentvel, todas as categorias permitem a ocupao, algumas

    delas restringindo essa ocupao s populaes tradicionais. Em tais UCs, os objetivos de

    conservao devem ser compatibilizados com os usos necessrios ocupao desses

    moradores. Quando tratamos da ocupao humana ilegal, entretanto, nos referimos

    quelas categorias que no permitem a presena de moradores. Em alguns casos, as UCs

    sofrem com a invaso de agentes interessados na extrao de recursos e na agropecuria;

    em outros, h conflitos entre populaes que tradicionalmente habitavam o local e passam

    a ter sua ocupao proibida pela implantao posterior da Unidade de Conservao.

    Assim, dentre as 12 categorias do SNUC, as Estaes Ecolgicas, os Parques e as

    Reservas Biolgicas so as 3 que no admitem presena de populao humana em seu

    interior. As Florestas, as Reservas Extrativistas e as Reservas de Desenvolvimento

    Sustentvel admitem a presena somente de populaes tradicionais. Assim, para a Faixa de

    Fronteira, no primeiro grupo mais restritivo observou-se que 15 Unidades ainda registram

    ocupao irregular em seu interior (Grfico 8).

    J dentre as Unidades que permitem a ocupao por populaes tradicionais, 28

    tm ocupao no interior, sendo que 5 delas tm ocupao por populaes no-tradicionais

    (irregular) (Grfico 9).

    Cabe destacar que em ambos os casos h uma ausncia significativa de dados

    no Cadastro Nacional, comprometendo uma anlise mais precisa sobre essa varivel.

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    Grfico 8: Ocorrncia de ocupao humana irregular no interior das UCs.

    Fonte: Cadastro Nacional de Unidades de Conservao

    Grfico 9: Ocupao humana em UCs restritas a populaes tradicionais.

    Fonte: Cadastro Nacional de Unidades de Conservao

    Em relao varivel Visitao alarmante o fato de que somente 16 Unidades

    contem com os dados registrados no CNUC. Assim, a indisponibilidade de dados de 92% das

    UCs impossibilita a anlise dessa varivel.

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    A varivel proprietrio se aplica s RPPNs, j que essa categoria de UC

    constitui-se em propriedades privadas. A anlise do registro do proprietrio no CNUC

    permite, muitas vezes, analisar se aquela UC est inserida em uma propriedade voltada

    agropecuria, minerao ou mesmo se foi criada com fins eminentemente tursticos. Essa

    varivel, assim como as variveis que tratam da sobreposio de uma UC com outras e/ou

    com Terras Indgenas e a varivel que destina-se ao levantamento de presses sofridas pela

    Unidade, resultou em estudos mais especficos que no se inseriram no escopo do presente

    trabalho.

    CONCLUSES

    At esse ponto, os resultados nos levaram s concluses preliminares de que

    uma maior efetividade no cumprimento dos objetivos de conservao nessas reas ainda

    exigir um grande esforo relativo aos instrumentos de gesto e manejo. Apesar de a Lei n

    9985 ter preenchido a lacuna que o Pas tinha referente regulamentao do processo de

    criao e gesto de reas protegidas, o que se observa que sua existncia no garantiu o

    cumprimento efetivo das diretrizes que ela prope. A partir da bibliografia existente,

    percebemos que, de maneira geral, esses problemas observados na Faixa de Fronteira

    repetem o padro das reas protegidas do resto do Pas. A criao de Unidades de

    Conservao sem uma real implementao das mesmas faz com que elas existam somente

    no papel, impedindo um real cumprimento das diretrizes de preservao dos ecossistemas

    e permitindo que ainda sejam frequentes as ocorrncias de ilcitos ambientais dentro de

    seus territrios.

    Apesar de as deficincias de gesto nessa regio repetirem o padro registrado

    no resto do Pas, infere-se que essas lacunas, quando associadas posio perifrica da

    Faixa de Fronteira no espao brasileiro, criam uma especificidade da problemtica nessa

    rea. Nesse sentido, a prxima etapa desse estudo configura-se no levantamento de

    presses e ameaas s Unidades na Faixa de Fronteira, objetivando analisar a existncia de

    padres entre a ocorrncia de ilcitos ambientais e a posio fronteiria dessas Unidades.

    REFERNCIAS

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  • http://6cieta.org So Paulo, 8 a 12 de setembro de 2014.ISBN: 978-85-7506-232-6

    PANORAMA DAS UNIDADES DE CONSERVAO NA FAIXA DE FRONTEIRA BRASILEIRA: UMA CARACTERIZAO

    EIXO 5 Meio ambiente, recursos e ordenamento territorial

    RESUMO

    A criao de reas protegidas dedicadas conservao da natureza intensificou-se medida que

    uma gama de questes ambientais cresceu em importncia nas pautas internacionais e na agenda

    nacional. Sua implantao na regio de fronteira brasileira em particular segue controversa para

    diversos atores da sociedade civil, dos governos, foras armadas e organizaes ambientalistas.

    Sua incidncia na faixa de fronteira brasileira continuamente apresentada como um fator de

    vulnerabilidade para a soberania nacional entre os setores mais nacionalistas ou como uma

    interdio de acesso aos recursos naturais por atores locais e regionais. Mas esse conjunto to

    diverso de unidades de conservao muito pouco conhecido de fato.

    Assim, o presente trabalho pretende preencher esta lacuna traando um panorama das Unidades

    de Conservao situadas na Faixa de Fronteira brasileira. Est em curso a construo de uma

    base de dados com informaes relativas sua localizao, extenso, criao, gesto e

    categorizao, bem como sobre a incidncia de presses e ameaas. Esto sendo pesquisadas

    diversas fontes de dados, como o Cadastro Nacional de Unidades de Conservao (CNUC), os

    sites institucionais do Instituto Chico Mendes de Conservao da Biodiversidade, o banco de

    dados disponibilizado online pelo Instituto Socioambiental, as instituies estaduais e municipais

    responsveis pela gesto das unidades, alm de notcias publicadas pela mdia local e nacional.

    A despeito da dificuldade de obteno de dados, os resultados preliminares apontam para a

    existncia de 204 unidades de conservao na Faixa de Fronteira, que representam cerca de 11%

    do universo de unidades de conservao no Brasil. Dessas unidades, 57% so de gesto federal,

    enquanto 40% so geridas por rgos estaduais e apenas 3% por rgos municipais. Em relao

    aos grupos classificados pelo SNUC, a maioria das UCs so de Uso Sustentvel (64%, enquanto

    36% so de Proteo Integral). A Amaznia protegida por mais da metade dessas reas (57%

    das unidades), enquanto a outra metade abrange unidades no Cerrado, Pantanal, Pampa e Mata

    Atlntica. Mais de 70% delas no contam com Plano de Manejo, o que aponta uma falha bastante

    significativa nas estratgias de gesto dessas reas. Em relao s presses levantadas, o

    desmatamento a mais recorrente: mais de 26% das Unidades apresentaram ocorrncias. Em

    sequncia ao desmatamento aparecem incidncias de incndios/queimadas, extrao ilegal de

    madeira, caa e pesca ilegais e ainda minerao/garimpo.

    Palavras-chave: Unidades de Conservao; Faixa de Fronteira; gesto ambiental.

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