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EDITORIAL SUMáRIO SMD: os desafios para a medicina Em novembro de 2011, realizou-se, em São Paulo, um encontro com cer- ca de 120 médicos hematologistas de várias partes do país com o objetivo de discutir sobre as condutas clínicas em síndrome mielodisplásica. Dr. David Steensma, investigador clínico do Dana-Farber/Harvard Cancer Institute e professor da universidade de Harvard, em Boston, Massachusetts, e Dra. Silvia Magalhães, médica hemato- logista, professora titular da Universi- dade Federal do Ceará, conduziram o encontro. Esse simpósio apresenta grande rele- vância para os médicos hematologistas, já que o conteúdo tem alto valor e im- portância para o entendimento da utili- zação dos agentes hipometilantes, com exemplos reais de sua aplicabilidade na prática clínica. Durante este evento, após uma pa- lestra breve sobre o uso de agentes hi- pometilantes na prática clínica, foram discutidos cinco casos clínicos, que res- ponderam a questões importantes sobre o manejo desses pacientes. A seguir, os leitores conferem a palestra do Dr. Steensma e os casos clínicos apre- sentados pela Dra. Silvia. Boa leitura. Os editores AGENTES HIPOMETILANTES EM SÍNDROMES MIELODISPLÁSICAS NA PRÁTICA CLÍNICA Um dos maiores especialistas no tratamento da síndrome mielodisplásica (SMD) faz palestra sobre os agentes hipometilantes ........................... 2 CASO 1 Os pacientes de IPSS de grau intermediário 1 devem ser tratados precocemente? ................................................................................. 3 CASO 2 Profilaxia antimicrobiana é indicada durante a terapia com agentes hipometilantes? Como devem ser conduzidas as citopenias? ............... 4 CASO 3 Por quanto tempo a terapia com decitabina pode ser mantida? ........... 5 CASO 4 Decitabina pode ser usada como uma ponte para o transplante de medula óssea? ................................................................................. 5 CASO 5 A opção pela decitabina é correta para os casos que necessitam de efeitos mais rápidos? ........................................................................ 6 HIGHLIGHTS Síndrome Mielodisplásica: Discussão de Casos Clínicos com decitabina - SP 13066_Janssen.indd 1 15/02/12 14:06

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editorial

sumário

SMD: os desafios para a medicinaEm novembro de 2011, realizou-se,

em São Paulo, um encontro com cer-ca de 120 médicos hematologistas de várias partes do país com o objetivo de discutir sobre as condutas clínicas em síndrome mielodisplásica.

Dr. David Steensma, investigador clínico do Dana-Farber/Harvard Cancer Institute e professor da universidade de Harvard, em Boston, Massachusetts, e

Dra. Silvia Magalhães, médica hemato-logista, professora titular da Universi-dade Federal do Ceará, conduziram o encontro.

Esse simpósio apresenta grande rele-vância para os médicos hematologistas, já que o conteúdo tem alto valor e im-portância para o entendimento da utili-zação dos agentes hipometilantes, com exemplos reais de sua aplicabilidade na prática clínica.

Durante este evento, após uma pa-lestra breve sobre o uso de agentes hi-pometilantes na prática clínica, foram discutidos cinco casos clínicos, que res-ponderam a questões importantes sobre o manejo desses pacientes.

A seguir, os leitores conferem a palestra do Dr. Steensma e os casos clínicos apre-sentados pela Dra. Silvia. Boa leitura.

Os editores

Agentes hipometilAntes em síndromes mielodisplásicAs nA práticA clínicAUm dos maiores especialistas no tratamento da síndrome mielodisplásica

(SMD) faz palestra sobre os agentes hipometilantes ........................... 2

cAso 1Os pacientes de IPSS de grau intermediário 1 devem ser tratados

precocemente? ................................................................................. 3

cAso 2Profilaxia antimicrobiana é indicada durante a terapia com agentes

hipometilantes? Como devem ser conduzidas as citopenias? ............... 4

cAso 3

Por quanto tempo a terapia com decitabina pode ser mantida? ........... 5

cAso 4

Decitabina pode ser usada como uma ponte para o transplante de

medula óssea? ................................................................................. 5

cAso 5

A opção pela decitabina é correta para os casos que necessitam de

efeitos mais rápidos? ........................................................................ 6

HigHligHtssíndrome

mielodisplásica:discussão de Casos Clínicos

com decitabina - sP

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síndrome mielodisplásica:discussão de Casos Clínicos com decitabina - sP

Prof. dr. david P. steensma, md, faCPAdult Leukemia Program, Department of Medical Oncology, Dana-Farber Cancer Institute Attending Physician, Hematological Oncology Service, and Brigham & Women’s Hospital Associate Professor of Medicine, Harvard Medical School

Um dos maiores especialistas no tratamento da síndrome mielodisplásica (smd) faz palestra sobre os agentes hipometilantes

Quando surge um medicamento, espe-cialmente em enfermidades em que o arsenal terapêutico é pequeno, há um grande otimismo. Entretanto, com o tempo, surgem pacientes que não res-pondem ou apresentam efeitos colate-rais, então os médicos têm que encarar que, na realidade, todos os medicamen-tos apresentam pontos positivos e ne-gativos e funcionam muito bem para alguns pacientes, mas para outros não.

Dr. David Steensma, investigador clí-nico do Dana-Farber/Harvard Cancer Institute, e professor da Universidade de Harvard, tratou seu primeiro paciente com agentes hipometilantes há mais de dez anos.

Em tratamento compassivo autoriza-do pelo National Cancer Institute, esse paciente apresentou infecção grave após dois ciclos, sendo necessária terapia in-tensiva. Após esse episódio, Dr. David comentou que ficou com receio de uti-lizar esses agentes, até que um paciente em desespero, com pancitopenia, depen-dência de transfusão para hemácias e pla-quetas e infecções repetidas, o consultou. “Havíamos iniciado um estudo clínico

no instituto e esse paciente foi tratado com decitabina”, contou Dr. Steensma. Algumas semanas depois, ele voltou para a primeira consulta, e sua contagem de plaquetas subiu de 8.000 para 200.000/mm3, logo após o primeiro ciclo. “Fiquei tão chocado, não acreditava, então o en-viei novamente para o laboratório para checar esse resultado, mas era real”, de-clarou o médico. Durante dezoito me-ses, esse paciente não precisou de outra transfusão e apresentava boa qualidade de vida, quando faleceu em razão de um acidente. Segundo o pesquisador do Dana-Farber, “algumas vezes temos pa-cientes com respostas maravilhosas, em que o medicamento realmente faz a dife-rença, mas também há pacientes para os quais o medicamento não funciona bem, e precisamos de um pouco mais de ha-bilidade para conduzir as complicações”.

Há cerca de um ano, em razão do gran-de volume de questões de colegas sobre o manejo de pacientes que estão rece-bendo tratamento com decitabina, Dr. David e seu colega Dr. Richard Stone, especialista em leucemia mieloide aguda e também professor de Harvard, escreve-ram um artigo sobre essas considerações práticas1. Segundo os pesquisadores de Harvard, muitas questões e dificuldades nessa conduta não estão bem explicadas nos artigos científicos, e são necessárias decisões sobre aspectos essenciais ao tratamento. São questões sobre quan-do iniciar e interromper o tratamento, profilaxia com antibióticos, fatores de crescimento, entre outras. Como não há muita evidência sobre muitas dessas questões, realizar tais escolhas pode ser um desafio. Dessa forma, Dr. Steensma dividiu alguns pontos abordados em sua publicação recente no Hematology/Oncology Clinics of North America.

Seleção dos pacientes – O primei-ro ponto abordado é qual paciente deve ser considerado para tratamento com

agentes hipometilantes. Com base em dados de sobrevida, deve-se considerar os pacientes com síndrome mielodisplá-sica (SMD) de alto risco e os pacientes de risco intermediário 1 com citopenias preocupantes (dependentes de transfu-são, neutropenia/trombocitopenias gra-ves), em que os fatores de crescimento não funcionaram bem. Além disso, tais medicamentos são muito utilizados antes da realização de transplante, pois mui-tas vezes a espera por uma doação pode ser longa. Outro aspecto apontado por Dr. Rafael Bejar, outro pesquisador de Harvard, em um artigo publicado em New England Journal of Medicine, em junho de 2011, é que alguns pacientes apontados como de baixo risco não são realmente de risco baixo. Algumas muta-ções, como do gene EZH2, são predito-res de menor sobrevida em pacientes com SMD, independentemente dos fatores de risco estabelecidos2. Entretanto, os testes para detecção dessas mutações genéticas ainda não estão amplamente disponíveis, mas devem ficar mais acessíveis nos pró-ximos anos. Além disso, em vários estu-dos, incluindo The Alternative Dosing for Outpatient Treatment (ADOPT) Trial, publicado no Journal of Clinical Oncology, demonstrou-se que pacientes diagnostica-dos a menos de um ano apresentam taxa de resposta aos agentes hipometilantes maior do que em pacientes que apresen-tam a doença há mais tempo3.

Escolha do agente hipometilante – Assim como no Brasil, nos Estados Uni-dos estão disponíveis dois agentes hipo-metilantes: a decitabina e a azacitidina.

O esquema terapêutico da decitabina utilizado atualmente, de 20 mg/m2 por cinco dias, é o esquema terapêutico mais comum nos Estados Unidos para SMD. A intensidade terapêutica desse esquema é maior do que o esquema usual por sete dias com azacitidina. Dessa forma, os

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os pacientes de ipss de grau intermediário 1 devem ser tratados precocemente?

Profa. dra. silvia m. m. magalhães, universidade federal do Ceará - Crm-Ce 3852hematologista, Professora titular da universidade federal do Ceará. membro da diretoria da associação Brasileira de hematologia e hemoterapia (aBhh). membro da diretoria da Myelodysplastic Syndrome Foundation. membro do International Working Group for Prognosis in MDS (iWg-Pm), que trabalha na revisão do iPss.

cAso 1

pacientes respondem mais rapidamente ao esquema terapêutico com decitabina. Dr. Steensma observa que “no estudo ADOPT, após dois ciclos, 75% dos pa-cientes que responderiam já haviam apre-sentado essa resposta, considerando-se que o tratamento completo eram quatro ciclos de cinco dias. Então, há diferença em re-lação à intensidade, e esse é um fator que nunca foi estudado adequadamente3”.

“Eu uso decitabina em muitos pa-cientes para obter uma resposta um pouco mais rápida, mas explico os da-dos de sobrevida. As taxas de resposta completa foram de 37% em um estudo do MD Anderson6 e de 15% no estudo ADOPT3”, afirmou Dr. David.

Profilaxia com antibióticos – “No iní-cio do uso dos agentes hipometilantes, as infecções eram o que mais me preocupa-va. Hoje, não fico tão preocupado com a neutropenia, pois muitas dessas células são clonais e disfuncionais, e é possível perce-ber que o paciente com neutropenia apre-senta maior taxa de resposta. Talvez seja necessário ter citopenias transitórias para eliminar esses clones e é fundamental dar suporte ao paciente durante esse perío- do de neutropenia. O paciente que não tem citopenia provavelmente apresentará resistência primária”, disse Dr. Steensma.

A profilaxia adotada pelo pesquisador é com levofloxacina, utilizada em um es-tudo do MD Anderson6, nos moldes do que se utiliza em protocolos para trata-mento das leucemias agudas. Não há da-dos em SMD sobre essa profilaxia, mas, segundo sua experiência, está associada a um menor índice de infecções bacteria-nas. Já em relação às infecções fúngicas, são muito raras com esses agentes, mas alguns médicos preferem realizar profila-xia com antifúngicos. Além disso, devem ser consideradas as úlceras orais, presen-tes em cerca de 10% dos pacientes. Se o paciente já apresentou histórico de úlce-ras em mucosas, é necessária a profilaxia com valaciclovir ou aciclovir.

Quanto à intolerância, os transtornos gastrointestinais podem ser contornados com antieméticos e medicamentos anti-motilidade. A fadiga é o sintoma mais comum em pacientes com SMD e tam-bém o mais difícil, mas, segundo o pro-fessor, alguns pacientes podem respon-der ao metilfenidato ou ao modafinil.

Interrupção do tratamento – O tra-tamento é interrompido quando o pa-ciente apresenta intolerância aos medica-mentos, progressão da doença ou falta de resposta por um determinado período. “Sempre faço manutenção do tratamen-

to, pois o paciente apresenta recorrência da doença seis meses após a interrupção da medicação e, algumas vezes, não con-sigo fazer com que responda novamente. Portanto, continuo com o tratamento, talvez com aumento do intervalo entre os ciclos, a cada cinco ou seis semanas, mas sempre indico a terapia de manu-tenção”, concluiu Dr. Steensma.

REfERêncIaS1. Steensma DP, Stone RM. Practical recommendations

for hypomethylating agent therapy of patients with myelodysplastic syndromes. Hematol Oncol Clin North Am. 2010 Apr;24(2):389-406.

2. Bejar R, Stevenson K, Abdel-Wahab O, Galili N, Nilsson B, Garcia-Manero G, et al. Clinical effect of point mutations in myelodysplastic syndromes. N Engl J Med. 2011;364:2496-506.

3. Steensma DP, Baer MR, Slack JL, Buckstein R, Godley LA, Garcia-Manero G, et al. Multicenter study of decitabine administered daily for 5 days every 4 weeks to adults with myelodysplastic syndromes: the alternative dosing for outpatient treatment (ADOPT) trial. J Clin Oncol. 2009;10;27(23):3842-8.

4. Fenaux P, Mufti GJ, Hellstrom-Lindberg E, Santini V, Finelli C, Giagounidis A, et al. Efficacy of azacitidine compared with that of conventional care regimens in the treatment of higher-risk myelodysplastic syndromes: a randomised, open-label, phase III study. Lancet Oncology. 2009;10(3):223-32

5. Wijermans P, Suciu S, Baila L, Rüter BH, Platzbecker U, Giagounidis A, et al. Low dose decitabine versus best supportive care in elderly patients with intermediate or high risk MDS not eligible for intensive chemotherapy: final results of the randomized phase III study (06011) of the EORTC Leukemia and German MDS Study Groups [abstract 226]. Blood. 2009;114(22).

6. Kantarjian H, Oki Y, Garcia-Manero G, Huang X, O’Brien S, Cortes J, et al. Results of a randomized study of 3 schedules of low-dose decitabine in higher-risk myelodysplastic syndrome and chronic myelomonocytic leukemia. Blood. 2007 Jan 1;109(1):52-7.

A professora Dra. Silvia Magalhães relatou o caso de uma paciente de 69 anos, encaminhada para avaliação de pancitopenia, sem transfusão ante-rior ou comorbidade. A avaliação da medula óssea mostrou alterações dis-plásticas nas três linhagens. A doença foi classificada como de grau inter-mediário 1, de acordo com o IPSS (Tabela 1). Não houve resposta à ad-ministração de eritropoetina.

“Houve piora de todas as citopenias e a paciente tornou-se dependente de transfusão de dois concentrados de hemácias por mês”, observou.

hb: 7,3 g/dl (vCm 92,4 fl)glóbulos brancos: 2.900/mm3

neutrófilos: 870/mm3

Plaquetas: 91.000/mm3

ferritina sérica: 647 ng/ml (16,4 - 293,9)eritropoetina sérica: 114 mu/ml(2,4 - 33,0)todas as causas não clonais foram excluídas.

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