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PALESTRA: ASPECTOS JURÍDICOS DA DESAPROPRIAÇÃO AMIGÁVEL Henrique Varejão de Andrade Coordenador Nacional de Matéria Finalística PFE/ICMBio

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PALESTRA: ASPECTOS JURÍDICOS DA DESAPROPRIAÇÃO AMIGÁVEL

Henrique Varejão de AndradeCoordenador Nacional de Matéria Finalística

PFE/ICMBio

Aspectos gerais da Desapropriação amigável:

• relativiza o poder de império do expropriante, sem retirar o caráter de desapropriação (não há acordo sobre o direito de expropriar);

• o expropriado não tem autonomia de vontade em relação à venda do bem, mas apenas quanto à concordância em relação ao preço ofertado;

• costuma ser mais econômica e célere para o Poder Público;

• como ato jurídico voluntário, a realização do acordo deve obedecer a todas as condições previstas para a contração de direitos e obrigações de ordem civil, como: capacidade do agente; licitude do objeto; forma prescrita em lei;

• uma das formas prescritas em lei para a consolidação territorial de unidades de conservação de domínio público;

• no âmbito do ICMBio, procedimento é regido pela Instrução Normativa ICM nº. 02/2009.

DA INSTRUÇÃO DOCUMENTAL DE PROCESSOS DE DESAPROPRIAÇÃO AMIGÁVEL E SUAS REPERCUSSÕES JURÍDICAS

1) Âmbito de aplicabilidade

•) Desapropriação de imóveis rurais inseridos em UCs de domínio público;

•) Indenização de benfeitorias erigidas de boa-fé;

•) Qual o marco legal para áreas urbanas situadas em Ucs de domínio público ? Aplicação analógica (art. 4º LICC) do procedimento da IN 2/2009;

•) Instrução documental da IN deve servir, no que for compatível, com as exigências documentais contidas em editais de desoneração de reserva legal.

2) Da instrução documental propriamente dita e suas repercussões jurídicas:

a) Apresentação de documentos autenticados: minimiza riscos de fraude no processo de aquisição dominial;

c) Cópia do RG e do CPF:•)O ato de alienação imobiliária pressupõe que o proprietário seja identificado e seja plenamente capaz de praticar atos da vida civil ou esteja devidamente representado, caso seja parcial ou totalmente incapaz; OBS.: não seria o caso de obter certidão negativa de distribuição cível para confirmar que o proprietário não responde a processo de interdição?

•) É exigência da escritura pública de compra e venda e do registro imobiliário;

•) São absolutamente incapazes: menores de 16 anos, portadores de enfermidade mental grave, etc.

•) São relativamente incapazes: maiores de 16 e menores de 18 anos; ébrios habituais, pródigos e portadores de enfermidade mental leve.

•) O grau de incapacidade reflete na forma de prática de atos de disposiçãopatrimonial.

•Imóveis matriculados em nome de total ou absolutamente incapazes:

-Se o negócio jurídico for firmado apenas por totalmente incapaz, é nulo; se apenas por relativamente incapaz, é anulável.

OBS.: O art. 1.691 do CC impede que os pais alienem os bens dos filhos menores salvo se por necessidade ou interesse evidente da prole, mediante prévia autorização do juiz. Pergunta: nessa situação, é possível que os pais (ou tutores) firmem proposta de aceite em nome dos filhos (ou tutelados) em desapropriação amigável?

- Nos demais casos de incapacidade civil, cabe ao curador firmar o termo de aceite da proposta de desapropriação amigável, prestando contas ao juiz .

• Além do poder familiar, a tutela e a curatela serem hipóteses legais de representação, é possível que o proprietário também se faça representar por mandatário, em representação voluntária. Em todas essas situações, é necessário instruir também o processo com a documentação do representante.ATENÇÃO: o art. 657 do CC exige que o instrumento de mandato sejaconferido com a mesma forma exigida para a prática do ato delegado.Procuração para transferência imobiliária tem que ser pública!!!

• Documentação do cônjuge e assinatura em conjunto da proposta de aceite e do título de transmissão do imóvel:

- Regimes de comunhão parcial e comunhão total de bens exigem autorização do cônjuge para a prática de atos de alienação imobiliária (art. 1.647 do CC);

- No regime de comunhão total, a outorga marital é necessária inclusive para a alienação de imóveis recebidos por herança ou doação;

- Ausência de outorga marital torna negócio anulável;

- Regime de separação total de bens dispensa autorização marital;

- As exigências para a alienação de bens imóveis em caso de união estável são as mesmas existentes para o regime de comunhão parcial de bens.

• Documentação necessária para desapropriação amigável no curso de processo de inventário

- Com a morte, cessa a personalidade jurídica, e os bens são automaticamente transferidos aos herdeiros;

- Enquanto não dividida a herança por meio de inventário, os bens constituem co-propriedade de todos os herdeiros;

- A administração da herança cabe ao inventariante, após prestado o compromisso;

- A prática de atos de alienação imobiliária pelo inventariante pressupõe formalização do compromisso e autorização judicial;

- Enquanto não compromissado o inventariante, a administração da herança cabe ao cônjuge sobrevivente ou ao herdeiro que já estivesse na posse do bem.

c) Ato constitutivo, estatuto ou contrato social, devidamente registrados e atualizados, e comprovação da existência de poderes de representação, em se tratando de pessoa jurídica de direito privado:

-As pessoas jurídicas são ficções jurídicas, e seus atos constitutivos são suas "certidões de nascimento". A essência da teoria da personalidade jurídica é a distinção entre o patrimônio da sociedade e de seus sócios.

- A exigência de juntada dos atos constitutivos atualizados visam a conferir a atual conformação jurídica da sociedade, a forma prescrita para a prática de atos de alienação imobiliária e quem detenha o poder de representação sobre a mesma (sócio-gerente ou terceiro devidamente habilitado).

- É imprescindível a juntada da documentação pessoal do representante legal da empresa.

- Não é necessário autorização marital para o empresário alienar bens da sociedade.

d) Certidão de inteiro teor que comprove a existência de cadeia dominial trintenária ininterrupta ou com prazo inferior, quando iniciada por título expedido pelo Poder Público ou oriundo de decisão judicial, transitada em julgado, relativa à titularidade do domínio:

-Visa comprovar a regularidade dominial de imóvel privado pelo prazo necessário para a aquisição da propriedade por usucapião (20 anos pelo CC/16 e 15 anos pelo CC/2002), mais um prazo adicional para dar maior segurança ao ato sem exigir, em regra, cadeia dominial desde a origem.- Deve ser exigida, também, a cópia do título aquisitivo originário ou certidão deste, com cadeia válida desde a origem, quando: (i) Existir ação judicial ou requerimento administrativo que objetive a anulação da

matrícula do imóvel;(ii) O Cartório de Registro de Imóveis estiver sob intervenção;(iii) Forem constatados fortes indícios de nulidade na matrícula;(iv) Houver disputa judicial entre um ou mais interessados sobre o imóvel.(-)Se a documentação indicar dúvida de natureza dominial, deve o procedimento ser concluído na via judicial por meio de ação de desapropriação; (-)Se identificada manifesta fraude do registro, a PFE diligenciará o cancelamento da matrícula, preferencialmente pela via administrativa ,na forma prevista na Lei nº. 10.267/01 e alterações.

ATENÇÃO:

• A Lei nº. 6.739/79 estabelece um procedimento para cancelamento administrativo de matrículas imobiliárias nulas de pleno direito a requerimento de pessoa jurídica de direito público, por ato do Corregedor-Geral de Justiça do respectivo Estado.

• O exemplo clássico é de registros de propriedade com área muito superior à permitida pelas sucessivas Constituições Federais:

• (i) CF/34 (art. 130) e CF/37 (art. 155) previam autorização, respectivamente, do Senado e do Conselho Federal para concessão de terras com área superior da 10.000 ha

• (ii) CF/67 (art. 164, par. ún.) previa que a alienação ou concessão de terras públicas acima de 3.000 ha dependia de aprovação do Senado, e a CF/88 (art. 49, XVII) a exige para terras públicas com área superior a 2,5 mil hectares.

•Esse fundamento levou o CNJ a cancelar mais de 5.000 matrículas de imóveis no Estado do Pará, e pode vir a ser estendido aos demais Estados da Federação que possuem histórico de grilagem de terras, especialmente na Amazônia Legal.

e) Certificado de Cadastro de Imóvel Rural – CCIR atualizado:

- Registro no cadastro de imóveis rurais perante o INCRA, como condição legal para a alienação de imóveis rurais e constituição de ônus reais;

- Dados são puramente cadastrais, não legitimando posse ou propriedade;

- O CCIR deve ser renovado periodicamente, e é preciso juntar o documento atualizado, com a comprovação de sua quitação perante o INCRA.

f) Planta georreferenciada do imóvel e memorial descritivo, obedecidos os níveis de precisão adotados pelo INCRA, assinados por profissional técnico habilitado, com a devida Anotação de Responsabilidade Técnica

- Ideia central é evitar sobreposições entre imóveis rurais, considerando a imprecisão da descrição de limites de propriedades exigidas para o registro pela legislação anterior.

-Por força do art. 176, § 4º, da Lei de Registros Públicos, o registro de imóveis rurais é condicionado ao georreferenciamento e memorial descritivo da área desde os seguintes prazos:(i) 20 de fevereiro de 2004, para imóveis acima de 5.000 ha;(ii) 20 de novembro de 2004, para imóveis entre 1.000 e 5.000 ha;(iii) 20 de novembro de 2008, para imóveis entre 500 e 1.000 ha;(iv) 20 de novembro de 2011, para imóveis com menos de 500ha.

(-)Mesmo nas hipóteses em que a lei ainda não exige esta documentação, a IN nº 02/2009 a exige, podendo o ICMBio arcar com os custos se o proprietário não puder fazê-lo. (-) Nas hipóteses em que a exigência já está em vigor, pode o Diretor da DIUSP decidir pelo custeio dos trabalhos, deduzindo-os do valorda indenização a que faz jus o proprietário.

(-)Registro no cadastro de imóveis rurais perante o INCRA, como condição legal para a alienação de imóveis rurais e constituição de ônus reais;

(-) Dados são puramente cadastrais, não legitimando posse ou propriedade;

(-) O CCIR deve ser renovado periodicamente, e é preciso juntar o documento atualizado, com a comprovação de sua quitação perante o INCRA.

(-)

-Exigência de anotação de responsabilidade técnica (ART):

- Lei 6.496/77 cria ART para individualizar o responsável técnico de obras ou prestação de serviços de engenharia, arquitetura e agronomia;

- Configura taxa pelo exercício do poder de polícia pelo CREA;

- A não-apresentação de ART sujeita o profissional a uma multa pecuniária, mas não desqualifica tecnicamente o trabalho, cabendo ao CREA a apuração e cobrança;

- OBS.: Os processos administrativos de desapropriação cujas plantas e memoriais descritivos não estejam munidos de ART não ensejam óbice à conclusão se a área técnica do ICMBio, no laudo de vistoria, corroborar em campo os pontos dos vértices;

-

g) Certidões comprobatórias da inexistência de ônus, gravames e ações reais e pessoais reipersecutórias sobre o imóvel:

- Busca dar conhecimento ao adquirente de gravames incidentes sobre o bem que possam influir em seu preço ou na própria identificação do proprietário;

- Exs.: títulos de domínio sujeitos a condição futura (propriedade resolúvel); usufruto; hipoteca incidente sobre o bem; penhora; ações de usucapião ou reivindicatória da propriedade;

- Por expressa previsão legal (art. 167 da Lei de Registros Públicos), todos esses eventos que possam gravar o bem de ônus ou tornar controvertida a titularidade de seu domínio devem ser registrados e seu cancelamento, averbados;

-Não há previsão para sub-rogação dos credores do expropriado no preço pago pelo imóvel em desapropriação indireta – arts. 27 e ss. do Decreto-Lei 3.365 aplicam-se ao procedimento judicial;

- Para evitar dispêndio indevido de recursos públicos, só é possível concluir a desapropriação no âmbito administrativo se o bem estiver livre de ônus e com titularidade inequívoca; caso contrário, deverá a desapropriação correr navia judicial, com o depósito do preço e discussão entre credores/proprietários em ação autônoma.

(cont.)- As dívidas oriundas de direitos reais de garantia consideram-se vencidas na data da realização da desapropriação, subrogando-se os credores no respectivo preço.

-Literalidade da legislação não socorre o locatário/arrendatário na subrogação do preço; Construção pretoriana admite indenização por meio de ação direta;

- Em caso de compromisso de compra e venda, deve haver prévio acordo entre o promitente-comprador e o promitente-vendedor para a conclusão amigável, ou a citação de ambos para compor o pólo passivo da ação expropriatória;

h) Certidão negativa de Débitos de Imóvel Rural emitida pela RFB:

- certidão negativa de débitos é prova de quitação de tributos incidentes sobre o imóvel;

- certidão positiva com efeito de negativa tem o mesmo valor legal;

- Exigência se justifica em razão da responsabilidade pessoal do adquirente nos tributos incidentes sobre a coisa adquirida (art. 131, I, do CTN);

- O tributo incide até a imissão prévia na posse ou o pagamento da indenização por parte do ente público;

-Cada imóvel rural deve ter uma inscrição própria perante a Receita Federal, bem como apresentar a Declaração do ITR, na qual realiza o cômputo do valor devido a título da exação;

- Se o imóvel a ser desapropriado estiver situado em área urbana, as exigências de prova de regularidade fiscal deverão ser prestadas por CND referente ao IPTU apurado pelo município da inscrição do imóvel.

h) Comprovação da inexistência de débitos perante o ICMBio, sendo aceita declaração emitida pelo IBAMA até que o ICMBio possua sistema próprio de controle

- certidão negativa de débitos em aberto (multas) perante o IBAMA, já que o ICMBio ainda não tem certidão própria;

- exigível apenas na desapropriação amigável, já que existe uma forma específica de cobrança da dívida ativa de Autarquias e Fundações (execução fiscal);

- é preciso relativizar a exigência, para evitar a judicialização de uma ação de desapropriação, com dispêndio de tempo e recursos, com base em um fato que não guarda relação com a aquisição da propriedade imobiliária.

2) DA DESAPROPRIAÇÃO DE IMÓVEIS SITUADOS EM FAIXA DE FRONTEIRA

- faixa de fronteira definida pela Lei n. 6.634/79 como a faixa interna de 150Km de largura, paralela à linha divisória do território nacional;

-alienação e concessão de terras públicas, bem como aquisição, por estrangeiros, de domínio, posse ou quaisquer direitos reais sobre imóveis fica a depender de assentimento prévio do Conselho de Segurança Nacional;

- Por força do Decreto-Lei n. 1.414/75, cabe ao INCRA a ratificação das alienações ocorridas pelos Estados na faixa de fronteira, bem como a discriminação de terras devolutas situadas nessas áreas.

- São dispensados da ratificação as pequenas e médias propriedades situadas na faixa de fronteira das regiões Norte, Centro-Oeste e Sul se registrados até 26 de fevereiro de 1999 (art. 4º da Lei 9.871/1999).

- Em relação às demais propriedades com títulos não-ratificados até 1º de janeiro de 2001, deve o INCRA declarar sua nulidade, cancelar o respectivo registro e requerer o registro do imóvel em nome da União.

- Não ratificada o registro, não é possível pagar indenização pela terra nua.

3) DA CERTIFICAÇÃO DOMINIAL REALIZADA PELO INCRA

- em razão do alto grau de inconsistências em relação à origem e seqüência dos títulos de propriedade e a dimensão de imóveis rurais cadastrados perante o INCRA, promoveu-se, a partir de 1999, o cancelamento de ofício de todos os imóveis rurais com área acima de 5.000 ha em municípios situados nos Estados do AC, AP, AM, BA, GO, MA, MT, MS, MG, PA, PR, RO, SP e TO até que os proprietários comprovassem a veracidade das informações;

- exigência para recadastramento no Sistema Nacional de Cadastro Rural – SNCR foi estendida pela Portaria INCRA 835/2004 às propriedades, relacionadas pelo MTE, que submetem seus trabalhadores a formas degradantes de trabalho ou em condições análogas às de escravos;

-o rigor da documentação apresentada pelo proprietário e da análise realizada pelo INCRA justificam que a certificação da Autarquia seja considerada prova de domínio;

- nessas situações, a análise documental realizada no âmbito do ICMBio é mais simplificada.

4) ASPECTOS JURÍDICOS GERAIS DA INDENIZAÇÃO DE BENFEITORIAS EM OCUPAÇÕES DE BOA-FÉ EM TERRAS PÚBLICAS

- os precedentes do STJ: se a ocupação do bem público for irregular, não induz posse, mas mera detenção, afastando o direito a indenização por benfeitorias;

- o precedente não deve ser lido no sentido de afastar qualquer indenização de ocupantes de terra pública sem formalização da posse não possui direito à indenização por benfeitoria;

- o INCRA incentivou, por anos, a ocupação de terras públicas com posterior legitimação das posses: art. 11 do Estatuto da Terra, ainda em vigor, falar em reconhecimento de posses legítimas manifestadas através de cultura efetiva e moradia habitual, bem como em destinação de terras devolutas buscando o alto interesse do desbravamento através da colonização racional;

- Lei 6.969/81 previu usucapião rural de terras devolutas para quem a houver tornado produtiva com seu trabalho e nela tiver sua moradia;

- art. 71 do Decreto-Lei 9.760 assegura ao ocupante de área da União sem o assentimento indenização por benfeitorias quando ocupante de boa fé, com cultura efetiva e moradia habitual;

-as populações tradicionais têm previsão expressa de indenização por benfeitorias no art. 42 do SNUC caso o seu reassentamento seja necessário.

-

(cont.)

- a IN 02/2009 assegura o direito à indenização de benfeitorias, quando a ocupação for mansa, pacífica e de boa-fé, e anterior à criação da unidade de conservação;

- Em caso de ocupações de terras públicas, a indenização paga ao particular jamais incluirá o valor da terra nua;

- se, após a avaliação das benfeitorias indenizáveis, o ocupante não firmar a proposta de aceite, deverá a PFE/ICMBio ajuizar ação de desocupação da área, depositando em juízo o preço ofertado pelas benfeitorias.

Muito obrigado!!!

Contatos: [email protected]

[email protected](61)3341-9112 (PFE/ICMBio-Sede)