p-423 - comando especial atlan - clark darlton

98
COMANDO ESPECIAL ATLAN Autor CLARK DARLTON Tradução AYRES CARLOS DE SOUZA Revisão ARLINDO_SAN (P- 423)

Upload: annttonny

Post on 03-Jan-2016

15 views

Category:

Documents


0 download

TRANSCRIPT

Page 1: P-423 - Comando Especial Atlan - Clark Darlton

COMANDOESPECIAL ATLAN

AutorCLARK DARLTON

TraduçãoAYRES CARLOS DE SOUZA

RevisãoARLINDO_SAN

(De acordo, dentro do possível, com o Acordo Ortográfico válido desde 01/01/2009)

(P-423)

Page 2: P-423 - Comando Especial Atlan - Clark Darlton

No Sistema Solar os calendários registram o final de junho do ano de 3.433. Deste modo passaram-se mais de dois anos e meio desde “Laurin”, o dia em que o Sol e todos os seus satélites foram trasladados em cinco minutos para o futuro, tornando-se invisíveis para o Universo restante. Neste espaço de tempo relativamente curto, a Humanidade Solar e os descendentes terranos vivendo fora do Sistema Solar, já passaram por severas crises, as quais, entretanto, puderam ser apaziguadas sem que surgissem maiores conflitos armados ou problemas políticos.

Um problema, entretanto, não pôde ainda ser dominado — e este problema, a cada dia que passa, assume importância maior para Perry Rhodan e seus terranos! É o Satélite da Morte, recentemente descoberto, que os misteriosos “Pendulares do Tempo” transformaram em sua base.

A invasão dos cappins, como os estranhos são chamados, entretanto, tem também suas vantagens!

Rechaçados de volta, para dentro do Satélite Solar, os cappins viram-se forçados a desligarem o mecanismo que teria levado, em pouco tempo, o Sol a uma explosão — se quisessem, eles mesmos, sobreviver. E deste modo a Humanidade ganhou uma moratória, para tomar contramedidas eficientes.

Mas o que acontecerá se os cappins se evadirem novamente?

O Lorde-Almirante Atlan toma providências. Ele não confia na paz do momento, e cria o “Comando Especial Atlan”!

= = = = = = = Personagens Principais: = = = = = = =

Perry Rhodan — O Administrador-Geral quase sofre um atentado.

Atlan — O Lorde-Almirante sai à caça dos cappins.

Alaska Saedelaere, Fellmer Lloyd, Ras Tschubai, Gucky e Lorde Zwiebus — Membros do Comando Secreto Especial de Atlan.

Tenente Habas Beruda — Um homem possuído, que se rebela contra o seu destino.

Galbraith Deighton — Marechal-Solar e Chefe da Contra- -Espionagem Solar.

Raymond Brandner — Um cultivador de tomates, rebelde.

Page 3: P-423 - Comando Especial Atlan - Clark Darlton

1

Quarta-feira.Quarta-feira, dia 19 de junho do ano 3.433, tempo-normal terrano.Há exatamente 1.462 anos Perry Rhodan tinha pousado na Lua terrana, onde

descobriu arcônidas naufragados ali. Com isto teve início uma nova era, ou seja, a Era Cósmica da Humanidade.

Em todos os âmbitos das bases vitais humanas, houve uma modificação das escalas de medidas. E se modificaram em dimensões que o homem do Século Vinte nunca teria pensado serem possíveis. Do mesmo modo como ele achara o voo para a Lua um aborto de uma mente maluca, ele também devia achar uma história ridícula de uma imaginação louca, ao saber dos pousos que seus contemporâneos mais evoluídos tinham efetuado, e suas consequências.

Porém todas as utopias se transformaram em realidades. Realidades lindas, maravilhosas e frequentemente assustadoras.

Povos e raças fundiram-se, necessariamente, com os terranos, que colonizaram o Sistema Solar, avançando para as estrelas longínquas. Foi criado o Império Solar. O encontro com inteligências estranhas levou a conflitos, decididos com armas e engenhos de guerra, que até então tinham sido vistos como impossíveis. Mas também a estrutura social do Estado Solar era progressista no sentido positivo e ideal. Muito mais ideal, de qualquer modo, do que aquele estado imaginado pelos pioneiros do Socialismo no Século Vinte — simplesmente porque estes tinham partido de pressupostos errados, deixando o desenvolvimento futuro fora dos seus cálculos.

1.462 anos de desenvolvimento cósmico! E antes do início deste desenvolvimento, levara 25 anos completos para transformar um ridículo foguete de combustível líquido num foguete lunar capaz de funcionar para levar os primeiros homens à Lua Terrestre.

1462:25!Esta era a escala da medida!

* * *

A nave-capitânia da frota, a Intersolar, estava parada no espaço entre o planeta Mercúrio e o Sol. Por razões táticas, Perry Rhodan preferira não passar o grande dia na Terra. Junto com seus amigos e colaboradores mais íntimos, ele dirigira-se para bordo da Intersolar. Daqui ele pretendia fazer o seu discurso, já tradicional, a vinte e cinco bilhões de terranos.

E ele pretendia comunicar-lhes a verdade.A verdade sobre os cappins.A central de rádio recebeu, pouco a pouco, as confirmações das centrais televisivas

de todos os planetas. Diante de bilhões de aparelhos de televisão os homens esperavam. Só muito raramente eles tinham oportunidade de ver e ouvir Rhodan. O feriado nacional era uma dessas oportunidades.

Também o Dr. Sigenberg e o Dr. Gruppe, funcionários de chefia de uma grande fábrica de computadores do centro europeu, tinham se acomodado no jardim da casa de dois apartamentos, esperando pelo sinal de abertura da estação de TV. Um filtro solar cuidava para que a tela de vídeo se encontrasse totalmente sombreado, tornando clara e

Page 4: P-423 - Comando Especial Atlan - Clark Darlton

nítida a imagem colorida em 3-D. No momento, entretanto, apenas o sinal da Solarvisão podia ser visto na tela.

— É de admirar que Rhodan consiga encontrar tempo para fazer um discurso — achou Helena Sigenberg, que trazia o café. — Realmente seria de imaginar-se que ele tem outras preocupações.

Sigenberg sacudiu a cabeça.— Quando é que as mulheres finalmente vão aprender a raciocinar com lógica? —

criticou ele a intervenção de sua mulher. — É claro que Rhodan tem pouco tempo, mas já que ele fala através de todas as transmissoras do Sistema Solar, provavelmente vai aproveitar a oportunidade para nos esclarecer sobre a situação atual. E se não me engano muito, esta situação parece estar muito séria.

— Tem toda razão — concordou o Dr. Gruppe, olhando com os olhos apertados para o Sol no alto. — O bom velho Sol está nos preocupando. E nos preocupa até muito. Há essa coisa orbitando o Sol, e não podemos modificar em nada, que esta coisa algum dia talvez venha a transformar o Sol numa nova.

— Pior ainda são os cappins — disse Sigenberg, amargo. Gruppe anuiu.— São mesmo, e além do mais foram eles que construíram o Satélite da Morte há

mais de duzentos mil anos atrás. — Na tela de vídeo mudou o sinal transmitido. — Olhe, parece que vai começar — ele suspirou. — Eu estou contente por não precisar estar participando da festa oficial na fábrica. Aquilo sempre é uma coisa muito chata.

— Sou totalmente de sua opinião — concordou Sigenberg, não tirando os olhos da tela. — Olhe, a Intersolar. Realmente, é uma tomada formidável, no espaço. Qual será a distância?

— É difícil calcular, Sigenberg. Se eles usam o “zoom”, a câmera de tomadas poderá estar no mínimo a cem metros de distância. Acho que logo vão começar — sim, aí já está a central de comando. O sujeito corpulento ao lado de Atlan deve ser nosso Marechal-de-Estado, o bom Reginald Bell. Nunca o tinha visto pessoalmente.

— Claro, aquilo é o Bell. Eu o conheço. Infelizmente, neste últimos tempos, ele não gosta mais de contar piadas. Provavelmente os cappins também são culpados por isso.

— Esse neandertalense, Lorde Zwiebus, é mesmo uma figura engraçada, o senhor também não acha, Sigenberg? Aquela história com Saedelaere, fez aumentar poderosamente o seu quociente de inteligência. Ele agora sabe até pilotar naves espaciais, pelo que ouvi falar.

Sigenberg anuiu para sua mulher.— Sente-se de uma vez, Helena. A todo momento você passa na frente da tela,

roubando-nos a visão.Gruppe disse:— Olhe, Rhodan está entrando na central, junto com o chefe da Contra-Espionagem

Solar, Galbraith Deighton. Com isso, provavelmente todos estarão reunidos, e se alguém tivesse a ideia de mandar a Intersolar pelos ares, ele teria eliminado todas as pessoas importantes de um só golpe.

Sigenberg sacudiu a cabeça.— O senhor às vezes tem cada ideia, Gruppe, quase não dá para acreditar. Quem é

que poderia ter interesse em fazer uma coisa dessas?Gruppe retrucou curto e sucinto:— Os cappins, quem mais?

Page 5: P-423 - Comando Especial Atlan - Clark Darlton

A imagem era tão nítida, que tinha-se a sensação de estar-se pessoalmente na central de comando da Intersolar. Julian Tifflor e o Professor Waringer conversavam em voz baixa. Não era possível entender-se uma só palavra do que os dois se diziam. Deighton falava com Atlan, muito solto e sem dar atenção às câmeras da televisão. Rhodan aproximou-se da tribuna de oradores, provisória.

— Esse tal rato-castor naturalmente não poderia faltar! — achou Gruppe, acrescentando como numa explicação: — Minha mulher está verdadeiramente apaixonada por ele.

— Que mulher não é apaixonada por ele? — Sigenberg sorriu. — Mas não há nenhuma razão para ciúmes, me parece. Além disso, não devíamos esquecer-nos de que temos muito que agradecer a Gucky.

— Rhodan agora vai falar. É melhor ouvirmos o que ele tem para nos dizer.Maria Gruppe empurrou a xícara para o seu marido e também sentou-se.Tal como eles, neste momento, muitos bilhões de pessoas estavam olhando as telas

de vídeo.Rhodan fez um discurso alusivo ao feriado nacional.Ou seria melhor chamar este discurso de um relato de informações?— Meus amigos, terranos!A voz de Rhodan revelava uma parte daquelas emoções contidas que, neste dia,

toda a Humanidade sentia. Ele não tinha motivo para envergonhar-se dos seus sentimentos. Afinal de contas fora ele quem, com o seu amigo Bill, naqueles tempos dera início ao desenvolvimento cósmico.

— Há quase mil e quinhentos anos a Terra não é mais nossa pátria exclusiva. Nós pegamos o céu também, e hoje sabemos que a Terra é apenas uma parte microscópica nestes quinze séculos — todos conhecem esta história muito bem. Queremos viver este dia em alegrias e na consciência de que dominamos todas as dificuldades, e que também vamos dominar as que vierem no futuro.

Ele fez uma pausa e lançou um olhar nas suas anotações, que segurava negligentemente na mão direita. Em cores resplandescentes, Whisper estava envolvendo os seus ombros como uma cortina — esse ser telepático com seus dons admiráveis, que já salvara a vida de Rhodan, por várias vezes.

— Na taça da alegria, entretanto, caiu uma gota amarga, e é meu dever esclarecer- -lhes sobre o perigo em que todos nós nos encontramos. Não preciso falar a respeito do Satélite da Morte. Todos o conhecem. É impossível destruí-lo. Parece que ele devia transformar o nosso Sol em uma nova, para destruir o nosso sistema. E então surgiram os cappins e se aninharam dentro do Satélite da Morte.

“Eu não sei muito bem, como deverei explicar-lhes a natureza dos cappins, sem que surjam incompreensões. Ainda sabemos muito pouco sobre eles, pouco demais. Mas eu vou tentá-lo, no que me apoiarei nos resultados das investigações de nossos cosmobiólogos.

“Já por duas vezes em nossa História nos encontramos com inteligências, que desta ou daquela forma podiam tomar posse de outros seres viventes. Também os cappins são capazes disso, se bem que o seu método ainda nos continue desconhecido. Deve tratar-se de um método muito complicado, mas extremamente eficaz.”

Gruppe anuiu para Sigenberg e murmurou:— Como em outros tempos os Deformadores Individuais, suponho. Ou as bestas-

-feras na M-87. Tudo se repete, é uma velha sabedoria.Rhodan entrementes continuou:

Page 6: P-423 - Comando Especial Atlan - Clark Darlton

— Não é possível diferenciar-se entre um cappin e um ser humano, portanto eles não precisariam assumir ninguém. Se eles o fazem mesmo assim, devem ter suas razões para isso. De conformidade com nossa avaliação, devem estar dentro do Satélite da Morte diversos milhares de cappins. Um perigo inimaginável para a nossa Terra e para os outros planetas. Depois da primeira tentativa de evasão, devemos contar com outras. Conforme todos sabem, nós modificamos o campo do tempo, que mantinha o nosso Sistema Solar constantemente em cinco minutos no futuro. Com isso, bloqueamos a retirada aos cappins no seu próprio espaço de tempo. Eles estão praticamente aprisionados.

“O Satélite Solar propriamente dito é inatacável. Pelo que pudemos descobrir até agora, ele é seguro por um campo energético dentro da atmosfera solar interior. A estrutura deste campo naturalmente pode ser calculada matematicamente, mas não pode ser imitada por nós. Deste modo falta-nos a possibilidade técnica de neutralizar o campo. Como nossos cientistas também descobriram, trata-se de um campo energético hexadimensional. Nesta esfera faltam-nos experiências, e temos que admitir, mal ou bem, que os cappins nos são muito superiores no domínio do tempo e do espaço. Melhor testemunho disto já é o método do seu transporte através de Universos.

“De qualquer modo conseguimos impedir a fuga dos cappins reunidos no Satélite Solar, ao mesmo tempo que bloqueamos o seu caminho para o nosso sistema. Dez mil unidades da frota da base natal foram colocadas no chamado Setor-Cappin.

“Este Setor-Cappin é o atalho que os invasores são obrigados a usar para o seu voo de entrada e saída. Eles somente podem abandonar o interior do Sol, se podemos falar desse modo, através desse atalho, por nós calculado. Eu vou tentar explicar-lhes isto mais detalhadamente, para que possam entender melhor a nossa tática.

“Mesmo os cappins, por mais inteligentes e progressistas que sejam, são obrigados a respeitar as leis da Natureza, tendo que ajustar-se às mesmas. Eles orbitam o Sol, numa distância que para nós é praticamente inacessível, mas nós temos todos os dados da órbita do satélite. Deste modo, o atalho do voo de entrada se desloca constantemente, mas as nossas unidades seguem a mesma. Uma órbita em torno do Sol, é só isso. Para os cappins não há possibilidade de fuga. Para eles é impossível avançarem ao espaço interplanetário, porque a nossa frota bloqueia o único caminho de escape, e o traço temporal também lhes fica ocultado. E deste modo nós os mantemos cercados.”

Rhodan mais uma vez olhou suas anotações. Por um instante ele as estudou, depois olhou novamente para a câmera, e através da mesma nos rostos de mais de vinte bilhões de criaturas humanas.

— Conforme já acentuei, o método usado por um cappin para assumir um ser humano ainda nos é desconhecido. Sabemos, em primeira linha, que ele precisa sobretudo de tempo e de muita calma para isso. Nossos especialistas chamam ao método de preparação de “pedogoniometria”. Se esta goniometria tem sucesso, o cappin pode passar a “pedotransferência”, caso não seja impedido de fazê-lo. Portanto temos o adversário perigoso, montado diretamente às nossas costas, apesar de sua situação difícil, e não sabemos quando ele vai golpear. E sobretudo, não sabemos quais são as suas intenções.

“Existe ainda outro problema: Não temos a menor ideia se um cappin tem possibilidade de executar uma pedogoniometria, nas circunstâncias dadas. Nossos cientistas duvidam disso, e eu gostaria de concordar com eles. O enorme campo energético hexadimensional que protege o satélite do Sol cria formidáveis frentes de interferências, cuja natureza propriamente dita nos é desconhecida. Com muito custo conseguimos abrir para nós o espaço pentadimensional, mas a dimensão hexadimensional

Page 7: P-423 - Comando Especial Atlan - Clark Darlton

nem sequer conseguimos imaginar. Não menos perturbadores nos parecem ser os campos de sobreposição de vibrações do próprio Sol. Estamos convencidos de que os cappins precisam de um espaço sem interferências para a sua goniometria, livres de influências de digressões e sobretudo livres de campos energéticos deste ou daquele tipo. Todas estas coisas, entretanto, estão presentes. Com isto deverá ficar suprimida a possibilidade dos cappins poderem colocar sob seu controle pessoas que lhes pareçam importantes, a partir do seu esconderijo seguro.”

O Dr. Sigenberg murmurou ao seu colega:— Um pensamento terrível, não acha? Nós estamos sendo espionados por

estranhos, que esperam apenas por uma oportunidade para assumirem o nosso corpo e nossa consciência.

— O senhor acabou de ouvir, Sigenberg — isso dificilmente lhes será possível.Sigenberg sacudiu a cabeça.— Rhodan apenas mencionou poucas possibilidades. Eu estou convencido de que

ele oculta as mais prováveis, para não nos inquietar. Mas vamos ficar quietos, ele continua falando...

Eles olharam novamente para a tela de vídeo. Entrementes escurecera. O Sol há muito tempo sumira. Em silêncio Helena Sigenberg retirou os filtros solares do vídeo.

Rhodan continuou o seu discurso.

* * *

O Tenente Habas Beruda era tido como um oficial extremamente confiável e gozava de toda a confiança dos oficiais do alto-comando. Dentro da Intersolar ele funcionava como mensageiro entre a central de rádio e o comandante, quando o intercomunicador estava desligado ou sendo usado para outros fins. Este agora era o caso.

Beruda acompanhara a manobra de abordagem, quando alguns cappins tinham conseguido abandonar o Satélite da Morte, com uma nave menor, para avançar dentro do Sistema Solar. A luta contra os descendentes de insetos ainda estava bem gravada na sua memória, os cappins, entretanto, tinham conseguido fugir. Parecera ter sido uma espécie de teleportação, se bem que no plano hexadimensional. Era de se supor que eles tivessem regressado ao seu satélite.

Habas Beruda conseguia lembrar-se muito bem daqueles acontecimentos, mas havia ainda outra coisa, da qual ele não conseguia lembrar-se nem com a melhor boa vontade. Aquilo estava ali, ancorado profundamente no seu subconsciente, inconcebível e incompreensível. Estava ali, mas não existia.

O oficial de plantão da central de rádio o chamou.— Uma mensagem de Terrânia, tenente. O intercomunicador está ocupado. Leve o

texto para o Coronel Korom-Khan, mas evite qualquer perturbação da transmissão de vídeo corrente.

— Em ordem, Sir. — O Tenente Beruda pegou a mensagem e fez continência. — O senhor pode confiar em mim.

— O Major anuiu.— Eu sei disso, obrigado.O caminho até a central de comando não era longo. No corredor, o jovem tenente

aproveitou a oportunidade para ouvir o discurso de Rhodan, nas telas do intercomunicador, instaladas em distâncias regulares. Não havia nenhuma interrupção de natureza acústica, pois quando a voz do Administrador-Geral atrás dele ficava mais baixa, ele podia ouvi-la mais alta na instalação à sua frente. Por um momento aquilo

Page 8: P-423 - Comando Especial Atlan - Clark Darlton

lembrou-lhe os campos magnéticos de tração de um campo energético, mas ele teve que sorrir. Pois aquela comparação era simplesmente ridícula.

Primeiramente ele ficaria diante de Rhodan, e ele hesitou um pouco, quando chegou à central de comando, parando diante da porta. Depois, entretanto, apertou o botão de sinalização dando o seu código. O Coronel Korom-Khan, comandante da Intersolar, abriu, livrando, desde a sua poltrona, o bloqueio positrônico.

Beruda entrou na gigantesca central de comando e parou. Jamais antes ele vira tanta gente reunida ao mesmo tempo no recinto mais importante da Intersolar. Ele reconheceu Rhodan, porém sua atenção era para o comandante, a quem ele devia entregar a mensagem, de maneira a mais discreta possível.

Bem perto do Coronel Korom-Khan, Beruda notou três homens, que ele reconheceu à primeira vista. Tratava-se do neandertalense Lorde Zwiebus, do misterioso Alaska Saedelaere e do chefe da Contra-Espionagem Galbraith Deighton. Especialmente Alaska Saedelaere fascinou o jovem tenente.

Todo mundo sabia que Alaska usava uma máscara, porque nenhum ser humano era capaz de suportar a visão do seu rosto chamejante, cintilando em todas as cores, sem perder o juízo. Alaska ainda era apenas noventa por cento ele mesmo. O restante pertencia a um cappin, que se perdera no seu corpo, sem jamais conseguir o predomínio. De qualquer modo Alaska tinha a possibilidade de dominar-se a si mesmo, e fazer com que o seu consciente dominasse sobre as ordens inócuas do cappin. Apesar de todas as desvantagens, o terrível destino de Alaska tinha demonstrado ser de grande utilidade em muitas situações difíceis. Ele dispunha de dons que nenhum homem antes dele possuíra.

O Tenente Beruda parou a poucos passos diante da poltrona do comandante, menos de cinco metros distante de Rhodan, onde repentinamente estacou. Olhou para a máscara dura de Alaska, depois para o rosto levemente intrigado de Lorde Zwiebus.

Ninguém deu-se conta, rapidamente, do curioso acaso, de que justamente o Tenente Beruda, que tinha sentido no próprio corpo a luta com os cappins, estacasse tão repentinamente, e exatamente perto de dois homens que também tinham vivenciado encontros com os cappins, ainda que de modo diferente. Este encontro, com Lorde Zwiebus, fora a duzentos mil anos atrás, mas que importância tinha isto, com seres que aparentemente sabiam viajar sem esforço através do tempo?

O comandante estendeu a mão para Beruda, impaciente.— Então, o que há? Mensagem de quem?O Tenente Beruda repentinamente sofreu uma estranha modificação. Ele continuava

parado no mesmo lugar, como se não tivesse mais a capacidade de mexer-se dali. Os seus olhos se mantinham fixos em Alaska, como se com os mesmos quisesse penetrar a máscara de plástico, para encontrar no rosto do inconcebível uma resposta. A mensagem escorregou dos seus dedos trêmulos.

E então, abruptamente, aquela expressão estarrecida dos seus olhos, tinha desaparecido. Os mesmos estavam vendo claro novamente — claro demais. De um segundo para outro eles tinham se tornado sabedores.

Rhodan nada notara do que estava acontecendo. Como antes, ele continuava diante da câmera, falando aos terranos. Os acontecimentos na central de comando não podiam desviar sua atenção, pois do efeito de suas palavras na Humanidade dependia o êxito da luta contra os cappins.

Os músculos de Lorde Zwiebus se retesaram. O seu instinto infalível o preveniu, e o seu espírito estava pronto a dar ordens ao seu corpo com uma velocidade inacreditável.

Page 9: P-423 - Comando Especial Atlan - Clark Darlton

A mensagem que o Tenente Beruda trouxera ainda não chegara até o chão, quando os dedos aparentemente trêmulos do jovem oficial se retesaram novamente. Com uma decisão rápida como o raio, ele arrancou a sua arma do cinturão, apontando-a diretamente para Rhodan, que ainda não notara nada do que estava acontecendo.

Milhões de pessoas nos planetas do Sistema Solar e dezenas de milhares de naves espaciais tornaram-se testemunhas do atentado contra Perry Rhodan.

Somente um deles reagiu: Lorde Zwiebus, o neandertalense.Os seus reflexos incrivelmente rápidos o tinham tornado automaticamente guarda-

-costas de Rhodan, e mesmo que ele não tivesse dons telepáticos, ele agia frequentemente mais depressa que Gucky ou Fellmer Lloyd. Também desta vez os dois telepatas pareciam não ter notado nada sobre as intenções do atacante, pois não reagiram.

Lorde Zwiebus, entretanto, saltou aqueles cinco metros, em cima do jovem tenente, arrancando-lhe a arma térmica das mãos com um pontapé, que a mandou através da central de comando, indo bater contra uma mesa de controles. Como estava com o gatilho puxado, ela descarregou o seu feixe energético, que queimou a cobertura plástica de um soquete.

Ainda antes que Alaska pudesse vir em socorro de Lorde Zwiebus, Galbraith Deighton agiu. O chefe da Contra-Espionagem Solar sempre trazia consigo a sua arma de impulsos energéticos de efeito mortal. Num instante ele arrancara do bolso, abrindo fogo em cima de Beruda, que continuava ali, imóvel, de pé. O fino raio energético atravessou o peito do tenente, ainda antes que Lorde Zwiebus pudesse evitá-lo.

Mortalmente ferido, Habas Beruda foi ao chão.

* * *

Atônitos, Sigenberg e Gruppe olhavam o espetáculo que se oferecia aos seus olhos. Tudo aconteceu tão rápido, que mal se conseguia seguir os movimentos das pessoas envolvidas. Quando Beruda foi ao chão, Rhodan parou de discursar. Ele virou-se e depois acenou para o Coronel Korom-Khan. Um segundo depois a imagem nas telas apagou-se.

— Um atentado! — gritou Sigenberg. O seu rosto estava pálido.— Os cappins! — disse Gruppe e anuiu. — Já está começando.— O senhor acha que o jovem oficial foi assumido por um cappin, e recebeu a

tarefa de assassinar o Administrador-Geral?— O senhor tem alguma explicação mais lógica? Sigenberg sacudiu a cabeça. Ele não tinha nenhuma. Segundos mais tarde, a tela de

vídeo acendeu-se novamente. O rosto de Reginald Bell apareceu. Ele disse:— Os senhores foram testemunhas de um atentado contra Rhodan, mas puderam ver

também que o mesmo fracassou. O autor do atentado está gravemente ferido, e pedimos a sua compreensão, por termos que interromper a transmissão. Sobre os resultados de nossas investigações, sobre os motivos do atentado e os seus mandantes, os senhores serão informados através dos serviços de noticiários normais. Com isto, terminamos aqui a transmissão da Solarvisão.

Mais uma vez a telinha escureceu.Sigenberg curvou-se para frente e desligou o aparelho.— Eu daria tudo para agora poder estar na Intersolar — disse ele para o Dr. Gruppe.

* * *

Page 10: P-423 - Comando Especial Atlan - Clark Darlton

Galbraith Deighton continuava com arma na mão parado a poucos metros de distância de Beruda caído ao chão, parecendo esperar. Somente quando Atlan colocou a mão no seu ombro, anuindo-lhe tranquilizadoramente, o chefe da Contra-Espionagem colocou a arma de volta no bolso, depois de tê-la travado.

Lorde Zwiebus não parecia satisfeito, apesar de provavelmente ter salvado a vida de Rhodan, com a sua incrível rapidez. Ras Tschubai estava ajoelhado ao lado de Beruda, tentando examinar o ferimento. O tenente gemia e apesar de suas dores terríveis sorria com esforço, como se tivesse conseguido exatamente o que queria atingir.

Atlan também se ajoelhou e viu aquela expressão de felicidade no rosto do autor do atentado. Sem demonstrar nada no seu rosto, ele registrou este fato incomum e absolutamente ilógico, e resolveu pensar nisto mais tarde. Agora não havia tempo disponível para isso.

O rapaz mortalmente ferido disse, em voz sumida:— Rhodan... por favor...Atlan fez lugar, para que também Rhodan se ajoelhasse.— Espere, Tenente. Não fale. O médico, Dr. Kaspon, já está a caminho daqui. Ele

fará tudo para...— Não há tempo... — mal se conseguia ouvir as palavras. O Tenente Beruda devia

estar sentindo dores terríveis, mas aquilo que tinha para dizer devia ter uma importância enorme. Ele estaria querendo fazer uma confissão, denunciando o seu mandante? — Desculpe a minha agressão à sua pessoa, mas eu nunca teria atirado. Eu queria apenas confundir o cappin, para livrar-me dele.

Rhodan curvou-se ainda mais.— O cappin? O que quer dizer com isso?O ferido respirava com dificuldade, estertorando. Era evidente que não sobreviveria

ao ferimento a tiro. Nem mesmo o Dr. Kaspon poderia fazer alguma coisa para isso.— Eu estive presente, quando abordamos a nave dos cappins, Sir. Nesta

oportunidade fui assumido por um cappin, que voltou, dentro de mim, para uma unidade da frota. Eu não sabia disso, não podia sabê-lo. — As palavras de Beruda eram interrompidas com cada vez mais frequência. Ele recebeu uma injeção, para acalmar as dores, que o aliviou. Os seus olhos estavam mais claros agora, e suas palavras mais nítidas. — Eu não o sabia, até poucos minutos atrás. Somente depois que vi Alaska e Lorde Zwiebus, sentindo a sua proximidade, aquilo caiu dos meus olhos como um véu. De repente eu dei-me conta de tudo, lembrei-me de tudo, e o meu cappin não pôde evitá- -lo.

— Ele deu-lhe a ordem para que me atacasse?O Tenente Beruda sacudiu a cabeça, com algum esforço.— Não, eu fiz isso por minha conta — eu tinha que fazê-lo. Deixe-me explicar,

Sir...Rhodan já notara que o microgravador de Atlan estava ligado. Mais tarde seria

possível ouvir mais uma vez aquela conversa importante, com toda a calma.— Poupe suas forças, Tenente.— Não há tempo, Sir. Eu tive que atacá-lo para forçar o cappin morando dentro de

mim à fuga. Pois ele tinha que abandonar o meu corpo, se não quisesse morrer junto comigo. Quando morre o corpo do hospedeiro, morre também o cappin que mora dentro dele. Somente através de um choque eu poderia ficar livre novamente. Eu não sabia que atirariam em mim tão depressa, depois que deixei que Lorde Zwiebus me tirasse a arma da mão com um pontapé.

Page 11: P-423 - Comando Especial Atlan - Clark Darlton

O olhar de Atlan pousou rapidamente no Chefe da Contra-Espionagem.O rosto de Deighton estava duro e frio. Ele sabia quais eram os seus direitos e os

seus deveres. Ela agira corretamente.— E por que não me procurou antes? Nós teríamos encontrado um caminho...— Somente na proximidade de Lorde Zwiebus e Alaska Saedelaere as ordens

dominantes do cappin foram reprimidas, libertando-me. Tudo aconteceu rápido demais para que eu pudesse entender alguma coisa, e tudo que pude fazer foi agir. Agora o cappin fugiu. Ele não pode assumir nenhum de nós, não agora. Mas ainda há alguma coisa que eu preciso comunicar-lhe, Sir...

Rhodan anuiu.— Não tão alto. Fale mais baixo, pois isso não o cansará tanto.— Não vai demorar mais muito. Eu sei que um segundo cappin conseguiu assumir

um de nossos homens. Já naquele tempo em que penetramos na nave deles. Mas só agora eu sei disso, e conheço o nome do homem. É o Sargento Rudulus Kampatschin. Ele é inocente e não sabe de nada, de absolutamente nada. Somente aqui, provavelmente acontecerá com ele o que houve comigo...

Rhodan fez um sinal para Atlan. O arcônida levantou-se e desapareceu sem fazer perguntas. Ele se ocuparia do sargento.

— Continue, Tenente. Mais alguma coisa?— Só generalidades, Sir... e depois eu gostaria de dormir, dormir longa e

profundamente. Eu estou cansado.— Vamos fazer tudo, Tenente, para ajudá-lo. Mas as suas informações são de vital

importância para nós e para a Terra. Se ainda puder, fale.— Os cappins não podem efetuar pedo-goniometrias de dentro do Satélite Solar.

Para isso precisam deixar o Satélite Solar. Eles têm que ajustar-se à individualidade de sua vítima, e isto não é possível, com as interferências na proximidade do Sol. Portanto, tenha cuidado, Sir. Um homem dominado pelos cappins ainda se encontra aqui a bordo.

— O que aconteceu com aquele que fugiu de dentro do senhor?O Tenente Beruda sorriu, num esgar.— Ele voltou para o Satélite Solar — ele tinha que fazê-lo. Pois não lhe restava

tempo para escolher uma nova vítima. Com este, o senhor não precisa se preocupar, Sir. E mais uma vez: Por favor, perdoe-me...

Atlan voltou. Ele anuiu, quase imperceptivelmente, para Rhodan.— Agora durma, Tenente — disse Rhodan, para Beruda, olhando para ele no chão.Depois não disse mais nada. O Tenente Beruda estava morto.

* * *

Dois oficiais trouxeram o sargento para a central de comando. O homem parecia sinceramente perplexo, e como Gucky e Fellmer Lloyd, os dois telepatas, puderam constatar, não tinha a menor ideia do que queriam com ele. Nem mesmo a pouca distância de Alaska Saedelaere trouxe qualquer resultado nesta direção.

Rhodan parecia muito sério, ao voltar-se para Deighton:— O senhor sabe o que isso significa, Galbraith. O cappin já abandonou a sua

vítima, há muito tempo, porque a mesma lhe parecia insignificante demais. E ele teve tranquilidade para fazê-lo. Mas ainda, ele teve até tranquilidade para escolher para si a vítima certa. Poderá ser qualquer um de nós, sem que o saibamos. O Tenente Beruda também não o sabia.

Page 12: P-423 - Comando Especial Atlan - Clark Darlton

— Nós vamos encontrá-lo, pode confiar nisso. Os dons de Alaska nos ajudarão a...— Não tenha tanta certeza, Galbraith, nós sabemos pouco demais sobre os cappins e

as possibilidades com as quais eles atingem as suas metas. Pelo que sei até agora, o sargento não se lembra absolutamente de quando foi assumido, nem de quando o seu cappin o deixou novamente, com toda a tranquilidade. E isso, parece evidentemente ter sido o caso. Portanto não vamos ficar sabendo de nada, através dele. Com isto teríamos dois fatos, que vamos ter que levar em consideração durante nossas investigações: Um homem que é abandonado por um cappin, com toda a tranquilidade, não consegue lembrar-se de mais nada. Se, entretanto, ele é abandonado em pânico e precipitadamente por um cappin, este não tem mais chance nem tempo para apagar a sua memória — ele sempre se lembrará, de todos os detalhes. Eu acho que com isto nós temos uma chance.

— Uma chance muito pequena — objetou Atlan. Ele olhou para Fellmer Lloyd. — Infelizmente, desta vez, nossos telepatas não estarão a nossa disposição.

Fellmer sacudiu a cabeça, lastimando, mas silenciou. Gucky opinou:— Sentimos muito, Atlan. Mas os impulsos da mente de Beruda eram totalmente

normais, quando pôs os pés na central de comando. Ele não teve qualquer pensamento de atacar Rhodan. E quando o fez, foi quase tarde demais. Isso deve ter acontecido no segundo em que o cappin o abandonou.

Rhodan ficou olhando enquanto o pessoal médico levava Beruda morto para fora. O seu rosto parecia de pedra, quando disse para Deighton:

— Isso não foi necessário, Deighton. Por que atirou em um homem, a quem Zwiebus já tinha tirado a arma? Ele estava indefeso.

Deighton retrucou, um pouco asperamente.— Sir, esta era minha tarefa, como chefe da Contra-Espionagem. Eu sou

responsável pela sua segurança, e pela segurança de todos reunidos neste recinto.— Mas por que teve que matá-lo?— Quem poderia garantir-me que o autor do atentado — e logicamente tive que

vê--lo assim — não trazia outras armas consigo, que automaticamente entrariam em ação, se a sua arma térmica falhasse? Eu sei que minha rápida intervenção foi dura e nada humana, mas não tinha outra escolha. Eu não seria digno de meu posto, se tivesse agido de outro modo. De deter o tenente dependia a vida de todos nós. Portanto só podia haver esta única decisão.

Rhodan olhou-o na cara, por alguns segundos, em silêncio, depois anuiu.— Talvez tenha razão, Galbraith. Sinto muito.— Eu também, pode acreditar.Rhodan observou o sargento Kampatschin, que continuava parado entre os dois

guardas, sem nada entender.— Infelizmente vamos ter que colocá-lo em quarentena, sargento. Não podemos

correr qualquer risco, mesmo se achamos saber que o senhor não tem mais nada a ver com um cappin. Investigações intensas provavelmente vão confirmar isso. Não se preocupe.

— Está bem, Sir. Eu me dou conta disso. Feras malditas! Com isso ele evidentemente queria designar os cappins.Eles o levaram.Atlan olhou atrás dele até a porta.— Não é ele — murmurou ele. — Ele não tem mais nenhum cappin dentro de si,

isso eu posso sentir.

Page 13: P-423 - Comando Especial Atlan - Clark Darlton

— Ninguém pode sentir isso — retrucou Galbraith Deighton, enérgico. — Eu estou convencido de que o cappin ainda está metido nele. O que, afinal, nós sabemos a respeito deles? Nada, simplesmente nada, Atlan.

— Por que não raciocinamos logicamente? — interveio Rhodan, lançando um olhar de aviso para Atlan. — O sargento é muito pouco importante. Ele serviu ao cappin apenas para que este pudesse chegar a Intersolar. Aqui ele teve tempo e tranquilidade de escolher para si uma vítima melhor, e eu acho que foi exatamente isso que ele fez.

— E por que o cappin dentro do Tenente Beruda não fez isso? — quis saber Deighton, áspero. — Será que este era tão tremendamente importante?

Rhodan encolheu os ombros. A intervenção de Deighton pareceu impressioná-lo. Ela estava correta. Também o Tenente Beruda, neste caso, e visto relativamente, não fora tão importante.

Mas na realidade ninguém sabia exatamente o que os cappins planejavam.— Eu acho melhor reforçarmos o bloqueio ainda mais — sugeriu Atlan. — De

modo algum devemos permitir que outros cappins penetrem no sistema. Já nos basta um, e este está metido aqui na Intersolar.

— Não necessariamente — aventou Rhodan. — Ele tem a possibilidade de, partindo daqui, conseguir chegar a qualquer parte no Sistema Solar. O bloqueio energético do Satélite Solar falta, e ele se encontra em nosso plano de tempo. Portanto ele pode muito bem, da Intersolar, assumir um homem na Terra, sempre que sua pedo- -goniometria for executada com êxito. A distância não vem ao caso.

Galbraith Deighton anuiu, concordando.— É assim mesmo, receio. Portanto vamos ter que encontrar um ser humano que é

um cappin. Eu vou pôr em movimento todo o aparelho da Contra-Espionagem Solar, Sir. Acho que com isso teremos êxito.

Rhodan olhou-o, pensativo.— Talvez, Galbraith, talvez... Entretanto, não se esqueça que não conhecemos

nenhum método seguro de desmascarar um cappin. Portanto, na prática, o senhor vai ter que procurar por alguém que na realidade não existe.

— Mas é justamente este que eu vou encontrar — prometeu Deighton, decidido.

* * *

Mais tarde, estavam sentados na cabine de Rhodan. Atlan, Ras Tschubai, Fellmer Lloyd e Gucky. Julian Timor e Abel Waringer deviam vir mais tarde.

— Mais uma vez eu gostaria de fazer a pergunta, por que um dos cappins se deu satisfeito com o Tenente Beruda, sem trocar de pessoa, apesar de Beruda certamente não estar entre as personalidades mais importantes, e o outro cappin abandonou o sargento Kampatschin logo que teve uma oportunidade para isso. — Rhodan olhou interrogativamente para os seus amigos, antes de acrescentar: — Se encontrarmos uma resposta mais ou menos sensata e lógica para esta pergunta, teremos avançado um pouco mais. Portanto, dêem tratos à bola. Sim, você também, Gucky.

Gucky parecia extremamente indignado. Atlan acariciou-lhe o pelo e disse:— Na pessoa de um oficial pouco importante, mas absolutamente digno de

confiança, o cappin via a oportunidade de se manter por muito tempo junto de nós, sem despertar atenção. Ele não despertava suspeitas e tinha a possibilidade de entrar em contato, a qualquer momento, com o Estado-Maior. Eu pessoalmente acho que ele estava interessado em você, Perry — em outras palavras: Ele esperava pela melhor oportunidade para assumir você. Entretanto, nós não sabemos se isto é possível dentro da nave, sem

Page 14: P-423 - Comando Especial Atlan - Clark Darlton

primeiro estabelecer um contato direto. Portanto é provável que o cappin na pessoa de Beruda apenas esperava por uma oportunidade propícia para efetuar a pedo-goniometria e trocar de hospedeiro. Não se esqueça, Perry, que na semana passada você mudou constantemente o seu local de estada. Com isso, o cappin não teve oportunidade de goniometrar você com calma. Esta oportunidade apenas aconteceu no momento em que você fez o seu discurso festivo. Você tinha que concentrar-se em suas palavras, e não podia dar atenção a outras coisas. O Tenente Beruda entrou na central de comando com a firme intenção de entregar a mensagem correspondente. O cappin o dominava inteiramente. E então aconteceu o imprevisto com Alaska e Zwiebus. Os dois já tinham tido problemas com os cappins antes, e alguma coisa que nem com a melhor boa vontade podia ser definida, ficou para trás. Entretanto, isso é suficiente, conforme vimos, para fazer um homem dominado pelos cappins a pensar claramente. Uma prova, aliás, para a inocência de Kampatschin. O Tenente Beruda, portanto, repentinamente viu claro, e em segundos procurou por uma saída para nos prevenir, sem dar oportunidade ao cappin de nos goniometrar. Ele fingiu o atentado. O cappin, com medo de que o seu corpo- -hospedeiro poderia ser morto, teve que fugir, se não quisesse morrer também. O seu medo, infelizmente, foi legítimo. Beruda realmente morreu. Deighton atirou um pouco depressa demais, para o meu entendimento.

Rhodan lançou um olhar rápido e interrogativo para Atlan. Na sua testa apareceram algumas rugas.

— O que é que você quer dizer com isso, Atlan? Você acredita que Galbraith não agiu corretamente?

— Corretamente demais, Perry, corretamente demais. Naturalmente ele é quem deve julgar quando deve atirar no autor de um atentado, ou deixá-lo fora de combate de algum outro modo. Neste caso, entretanto, o tiro mortal foi supérfluo, pois Zwiebus já tinha desarmado o tenente. Por que, então, Galbraith atirou?

Rhodan sacudiu a cabeça.— Você está julgando esta coisa facilmente demais, Atlan. Tente colocar-se na

situação dele. Ele é chefe da Contra-Espionagem. Se alguma coisa tivesse acontecido comigo — o que aconteceria então? Ele seria responsabilizado por tudo, e não sem razão. Portanto ele agiu rapidamente e com decisão. Ele não incorreu em riscos, é só isso.

Atlan anuiu lentamente.— Talvez você tenha razão, Perry. Talvez. Mas você não deve esquecer que cada

um de nós pode ser um cappin. Cada, um inclusive você ou eu.— Mas neste caso nós o saberíamos, ou não? Rhodan silenciou. A campainha tocou e depois Julian Tifflor e Abel Waringer

entraram. Eles se sentaram.— Eu acho — disse Waringer, cauteloso como sempre — que nós não devíamos

nos preocupar mais do que o absolutamente necessário. Um cappin está entre nós, muito bem e bonito. O que é que ele pode fazer, sem imediatamente ser desmascarado? Sejamos honestos: Se algum de nós se comportar de modo a chamar atenção, imediatamente toda a suspeita recairá sobre ele. E o que é que o cappin teria conseguido com isso? Nada, absolutamente nada. Por que, então, todo o nervosismo?

Rhodan sacudiu a cabeça.— Você acha tudo muito fácil, Abel. Você se esquece que nós nem sequer sabemos

o que os cappins querem de nós. Se nós soubéssemos, poderíamos agir de acordo.— Se nós soubermos disso ou não, Perry, importante é apenas o fato de que eles

nada poderão fazer sem se desmascarar. E Deighton deveria agir exatamente neste

Page 15: P-423 - Comando Especial Atlan - Clark Darlton

princípio, se quiser alcançar alguma coisa. Eu acho que é uma perda de tempo nos preocuparmos. Um cappin! O que é que é isso? Os restantes estão trancados no seu satélite sem poder empreender nada.

Mas Rhodan não se deixou acalmar tão facilmente.— Talvez você tenha razão, Abel. Você pode ser um cientista excepcional —

desculpe, você é um cientista fora do comum, naturalmente. Mas eu não sei se também em outras áreas você é um gênio. Eu também não sou nenhum, mas tenho minhas experiências. E eu aposto que cometemos um grave erro, se subestimamos os cappins.

— Vamos ver — disse Waringer. Rhodan dirigiu-se a Julian Tifflor.— E então, Julian, o que acha disso?Tifflor colocou suas mãos espalmadas sobre a mesa.— Se me pergunta tão diretamente, Perry — nada. Que opinião devo dar sobre

coisas de que não entendo — e o senhor também não, se for honesto. Certo, os cappins podem assumir outras inteligências e dirigir a sua consciência, dirigindo-as de acordo com suas vontades. Mas nós não conhecemos o objetivo desse exercício. Eles querem conquistar o nosso Sistema Solar? Isto eu acho uma ideia insensata, pois eles já poderiam tê-lo feito há duzentos mil anos atrás. Por que somente hoje?

— Para isso poderá haver diversas razões, Julian. Se Lorde Zwiebus informa a verdade e não se engana, então naqueles tempos realmente foram os cappins que vieram ao nosso sistema, fazendo aqui seus experimentos biológicos. Há cerca de duzentos mil anos atrás. Isto encheria muitas lacunas na História da Humanidade, e responderia a muitas perguntas sem respostas. Nem sempre para satisfação de exploradores sérios, mas de qualquer modo a serviço da nem sempre agradável verdade.

“Não se esqueçam dos misteriosos resultados das explorações do Século Vinte. Sob as camadas de terra, nas quais tinham sido conservados indubitavelmente os restos da Idade da Pedra, situavam-se outras camadas, camadas mais antigas. E elas continham as provas de uma civilização mais adiantada, que tinha desaparecido de modo inexplicável. Os cappins, Julian! Nossos antepassados encontraram as pegadas dos cappins, e naturalmente não souberam o que fazer delas. E como poderiam? Tanto os seus princípios científicos como também sua autoconsciência teriam sido duramente golpeados, sem levar-se em conta a tradição religiosa. E foram, aliás, as mais diversas associações religiosas que se levantaram contra alguns cientistas corajosos, para calar- -lhes a boca, com todos os meios de que dispunham. Não, Julian, eu conheço a psique humana bem demais, para não poder interpretar as suas marcas. Os cappins, naqueles tempos, há duzentos mil anos atrás, apenas queriam executar um experimento. Não se esqueça de que eles se parecem conosco, exteriormente. Nós éramos os objetos adequados para as suas tentativas. E se eu estiver interpretando corretamente, temos que agradecer aos cappins, devido aos seus conhecimentos biológicos, um salto demais de cem mil anos para a frente. Em outras palavras: Se os cappins, naquela ocasião, não tivessem agido de maneira tão inescrupulosa, nós hoje ainda estaríamos sentados em nossas cavernas.”

Atlan quis dizer alguma coisa, mas depois se calou. Parecia que não estava inteiramente de acordo com a exposição de Rhodan. Julian, a quem fora dirigido o discurso, anuiu.

— Talvez tenha razão, Perry, mas isso não pode nos fazer esquecer que os cappins, depois de duzentos mil anos, voltaram para dar uma olhada nos resultados dos seus experimentos. Nós temos o direito de impedir-lhes isso?

Page 16: P-423 - Comando Especial Atlan - Clark Darlton

— Naturalmente que temos, Julian. Nós nos desenvolvemos mais, e se os cappins nos deram o primeiro empurrão, isso não significa que tenhamos que ser seus escravos para sempre. Temos que convencê-los disso. E se não conseguimos fazê-lo, teremos que encontrar outro caminho, para tornar o acontecido, dentro de certos limites, não- -acontecido.

Julian olhou para Rhodan, assustado.— Correção de tempo? — perguntou ele, quase num murmúrio.Rhodan sacudiu a cabeça.— Não. O tempo não se deixa corrigir, mas sim, aquilo que aconteceu dentro dele.

A tentativa falhou já muitas vezes, mas algum dia teremos sorte. Eu acho que agora já conheço a falha. Não é possível executar uma correção sem que antes possamos produzir um paradoxo — ele suspirou. — Este não é um assunto para hoje. Nós precisamos encontrar o cappin que se esgueirou para dentro de nós, e nisto vamos ajudar Galbraith.

— Eu acho — disse Atlan, sem mexer um músculo na cara — que isso vai ser muito necessário.

Page 17: P-423 - Comando Especial Atlan - Clark Darlton

2

Gucky estava lá exatamente dois dias em Terrânia City, contente pelo tempo livre que a estada na Terra lhe oferecia. Sem preocupar-se com os outros, ele deixou-se levar ao seu bangalô no Lago Goshun, trancou a porta da casa, e avisou que não estava para ninguém. Uma vez ligou rapidamente a televisão, não ouviu, no verdadeiro sentido das palavras, as últimas notícias, desligou novamente, e deu uma olhada no bar de sua casa.

Sucos de frutas, em grandes quantidades.— Se vier visita, é azar o dela — disse ele, satisfeito com o resultado e abriu um

pequeno escaninho secreto que continha a sua última mania: aguardente de cereais.Ninguém devia saber nada a este respeito. Imaginem: Gucky, o vegetariano e anti-

-alcoólico, bebia cachaça, e ainda por cima do tipo que nas camadas melhores era designado como “aguardente ordinária”. O rato-castor sentia um grande alívio, porque ninguém sabia de sua paixão secreta. Além disso, ele nunca bebia demais. No máximo um copinho — ou dois.

Naturalmente copos de água.E isto apenas quando ele estava sozinho.Neste dia, Gucky começou a sentir a chateação, e sabia que com isso começavam

realmente os dias de férias. Somente o tédio levava a regeneração do corpo e do espírito. Nisto nem mesmo a cachaça tomada entrementes podia mudar alguma coisa. Bem, um homem adulto, depois da ração diária do rato-castor, teria pedido no máximo um segundo “duplo”, mas para Gucky o progresso era enorme.

Além do mais, os seus copos para água não davam para um “duplo”.Depois do almoço, ele dirigiu-se ao jardim, olhou um pouco chateado a superfície

calma das águas do lago e lamentou que não houvesse ninguém por perto, a quem pudesse pedir para preparar o seu barco a vela. Bell aparentemente tinha preferido ficar em Terrânia. Claro. O gordo não queria ser visto, e na metrópole gigante havia muitos hotéis.

— Sujeito cheio de segredinhos — achou Gucky, furioso, e resolveu abandonar o barco a vela. — Vou simplesmente me deitar ao sol.

E foi exatamente isso que ele fez. Justamente quando ia adormecendo, ouviu passos no saibro.

No saibro!Somente no seu jardim havia cascalho! Indignado ele ergueu-se e virou-se para

dizer poucas e boas ao invasor do seu domicílio. Infelizmente com isto ele perdeu o equilíbrio e virou com sua cadeira de praia. Ele parecia uma tartaruga colorida que queria se desfazer de sua carapaça. Atlan, o visitante não-anunciado, sorriu condescendente.

— Ora, baixinho, o que é que você tem? Eu não falei a ninguém que queríamos brincar de esconde-esconde. Como estão suas férias?

Gucky saiu de baixo da cadeira de praia, dando um pontapé na armação inocente.— Olá, Atlan, velho arcônida. Coisa mais complicada, essas modernas cadeiras de

praia. Parecem tão simples, mas põem essa coisa de pé! Pode considerar-se feliz se não fica embrulhado e sufocado dentro da mesma. O que é que você quer por aqui?

Atlan tomou lugar numa das poltronas que se encontravam junto da cadeira de praia desastrada, no terraço.

Page 18: P-423 - Comando Especial Atlan - Clark Darlton

— Você é um cappin? — perguntou ele, enquanto fazia uma cara tão séria, que Gucky instintivamente deixou-se cair na segunda poltrona, esquecendo totalmente sua cadeira de praia. — Diga-me a verdade: Você é um cappin?

Gucky respirou fundo, furioso.— Ficou doido mesmo, não? Eu, um cappin! Como é que um cappin pode me

assumir? Jamais um mutante como eu!— Justamente! — disse Atlan, olhando em volta, como que procurando alguma

coisa. — Você não tem nada para beber?— Suco de frutas — respondeu Gucky, arrotando discretamente.— Por mim, pode ser suco de frutas — Atlan deu-se por satisfeito.Quando os copos estavam sobre a mesa, Gucky perguntou:— O que significa isso — “justamente”?— Justamente! Eu estou convencido que os cappins não conseguem assumir um

mutante. Portanto, nem você, nem Ras nem Fellmer. E acho que também não são capazes de se meterem dentro nem de Zwiebus nem de Alaska. Foi por esta razão que eu criei o “Comando Especial Atlan”.

— Criou o quê?— O Comando Especial Atlan — disse Atlan. — E suponho que você vai

participar?— Perry sabe disso? Atlan sorriu.— Por que deveria? Quanto menos iniciados nós temos, melhor poderemos

trabalhar. Nosso objetivo é encontrarmos o cappin que se mantém escondido dentro de um de nós. Nós, do Comando Especial, com grande probabilidade somos eliminados dessa suspeita. Sem preconceitos, nós vamos partir na busca dele, não apenas na Terra. O cappin pode estar em qualquer parte. Apenas não sabemos como ele poderia se revelar, se trair. Não temos nenhum ponto de apoio. Mas vamos ter que encontrá-lo. Precisamos encontrá-lo, Gucky, você entende isso?

— É claro que entendo, Atlan. Só me pergunto como você pretende conseguir o que todos os outros não conseguiram.

— Bem, nós temos três mutantes e dois homens que já têm alguma experiência no trato com os cappins. Lorde Zwiebus certa vez foi transformado experimentalmente por eles e Alaska encontrou-se com um cappin durante um salto de transmissor pela quinta dimensão. O que foi um azar para os dois. Talvez logo isso será uma sorte.

Gucky sacudiu a cabeça e olhou de esguelha na direção do bar.— Eu não sei, assim, por trás das costas de Perry...— Não fale bobagens, baixinho. Você sabe muito bem que eu não faria nada que

pudesse prejudicá-lo. Mas ele é preconceituoso. Eu não. Eu desconfiaria até mesmo do meu melhor amigo e do homem mais confiável. E é justamente isso que eu tenho que fazer, infelizmente, até termos desmascarado o cappin.

Gucky levantou-se e saiu bamboleando através da porta aberta para o bar. Sem levar em consideração o seu visitante, ele tirou a garrafa misteriosa do escaninho, enchendo um copo. Quando viu o olhar curioso de Atlan, ele resignou-se, e com um suspiro profundo, tirou um segundo copo do armário.

— Boa bebida — elogiou Atlan, para imediatamente voltar ao outro assunto. — Os outros já estão informados. Você é o último a ser iniciado por mim. Logo que você concordar, vamos nos reunir pela primeira vez para discutirmos a missão. Aqui na sua casa. Posso usar o seu videofone?

Page 19: P-423 - Comando Especial Atlan - Clark Darlton

— Puxa, você trabalha mesmo depressa! — achou o rato-castor, surpreso. — E aqui na minha casa?

— Naturalmente! — Atlan levantou-se e ficou parado na porta do terraço. — Você não acha que os outros vão ficar muito satisfeitos se puderem provar também da sua cachacinha? Eu gostei muito dela.

— Eu também — disse Gucky, sorrindo bem ordinário. — Mas não creio que os outros vão ficar muito contentes.

— E por que não?— Porque você acaba de tomar o último copo — retrucou Gucky, com uma mistura

de pesar e malícia.

* * *

A segunda reunião para discussão da missão do Comando Secreto aconteceu na casa de Atlan, em Terrânia City. Como ninguém, nem mesmo Rhodan, devia ficar sabendo a respeito do complô, não foi muito simples para os participantes chegarem até a casa de Atlan, sem chamarem atenção. Por sorte, a Intersolar tinha partido, com Rhodan a bordo, para um rápido voo de exploração. Estavam esperando a sua volta, somente esta noite.

Atlan esperou até que todos estivessem sentados, depois disse:— Sobre os assuntos básicos, nós todos já concordamos, conforme verificamos

ontem. Mas eu gostaria de repetir os pontos mais importantes, mais uma vez:“Primeiro: Devemos ter como certo que uma personalidade importante do Império

Solar foi assumida por um cappin, e não há qualquer possibilidade de desmascará-lo. No máximo, a proximidade de Alaska Saedelaere, mas nem disso temos certeza.

“Segundo: Nós estamos convencidos de que nenhum cappin é capaz de assumir qualquer um de nós. Todas as experiências, até aqui, nos mostram isso. Esta é a razão por que justamente nós formamos o Comando Especial.

“Terceiro: Ninguém deve ficar sabendo alguma coisa sobre nosso Comando, pois neste caso o cappin escondido ficaria sabendo disso, sendo prevenido.

“Quarto: Para nós qualquer um é suspeito. Notoriedade e posto nada querem dizer. Até mesmo Rhodan é suspeito, ou mesmo Galbraith Deighton. Qualquer um!

“Estes seriam os pontos principais. Ainda há perguntas?”Ras Tschubai disse:— Como vamos proceder, Atlan? Sobre isso não falamos ontem.— É para isso que estamos aqui. Teria pouco sentido se agíssemos como grupo

fechado. Muito rapidamente chamaríamos atenção, e o cappin ficaria prevenido. Nós não possuímos qualquer ponto de apoio, com o qual pudéssemos interferir. Estamos limitados a descobrir o menor momento de suspeita em tempo hábil, e utilizá-lo, correr atrás dele. Por toda parte neste mundo, no Sistema Solar. O cappin pode mudar-se novamente, e nós não saberemos disso.

— Gostaria de saber como ele faz isso — disse Gucky, insatisfeito consigo mesmo e com o mundo. Ele não gostava desse caso. — Eles, afinal de contas, se parecem com criaturas humanas e têm um corpo, mas se transferem e assumem outras criaturas humanas. Certamente deve haver alguma coisa dobrada em tudo isso.

— Também isso vamos descobrir — prometeu Atlan, pacientemente.Gucky encolheu os ombros. Era evidente que não estava satisfeito com aquela

resposta.Fellmer Lloyd disse, de repente:

Page 20: P-423 - Comando Especial Atlan - Clark Darlton

— Atlan, o senhor tem uma suspeita bem determinada. Por que não nos fala sobre a mesma?

Atlan sorriu.— Naturalmente, o senhor, como telepata, certamente tinha que me surpreender,

mais cedo ou mais tarde. Está bem, eu tenho uma suspeita que, entretanto, se apóia em indícios muito improváveis e diminutos, sendo portanto, impraticável de ser mantida. De qualquer modo, temos que correr atrás de quaisquer indícios, por menores que sejam. Eu acho que devíamos prestar muita atenção em Galbraith Deighton.

— Deighton? — Ras Tschubai sacudiu a cabeça. — Como é que chegou a isso? Justamente Deighton, o chefe da Contra-Espionagem Solar!

— Ele atirou depressa demais — declarou Atlan, decidido. — Ele atirou depressa demais no Tenente Beruda, quando este já estava desarmado e dominado pelo nosso Lorde Zwiebus. A sua morte foi inútil. Caso um cappin esteja metido dentro de Deighton, nós teríamos uma explicação lógica para o comportamento apressado do Chefe da Contra-Espionagem. Existe algum argumento contra isso?

Em princípio não havia. Atlan prosseguiu:— É apenas uma suspeita de minha parte, só isso. Somente o desenvolvimento

futuro vai demonstrar se tenho razão ou não. Até lá, entretanto, não devemos demonstrar nada. Eu mesmo assumirei a tarefa de vigiar Galbraith, controlando todos os seus atos. Caso minhas suspeitas se confirmarem, existe apenas um meio de acabar com o cappin. Sabemos que ele precisa de tempo para a troca. Portanto nós não lhe deixaremos tempo nenhum.

— Como com Beruda — confirmou Atlan, tranquilo. — Vamos surpreender Galbraith, e colocar-lhe uma arma de efeito mortal no peito. Ele precisa ter a impressão de que vai morrer nos próximos segundos. Somente então o cappin vai fugir, em pânico, para não morrer ele também. Ele terá que voltar ao Satélite Solar, o qual não mais poderá abandonar.

— Tudo isso me parece muito doido — confessou Gucky, resignado. — Nenhum ponto de apoio, nenhum método legítimo de trabalho, um tatear no escuro, caça a alguma coisa que nós não conhecemos — não, isso não é para mim. Mas naturalmente não vou desembarcar dessa, Atlan, não se preocupe.

— Ninguém pensou nisso, baixinho. Nós acabaremos encontrando um caminho adequado. Mantenham-se prontos. Eu estou na central, vigiando Galbraith. Nessa ocasião eu fico escutando constantemente as notícias. Onde quer que, neste mundo ou no Sistema Solar, acontecer alguma coisa suspeita, nós vamos correr atrás. Um de nós partirá em viagem. Ras Tschubai e Gucky servirão como meios de transporte, teleportação. Isso é rápido, e não demanda tempo. Eu posso ser encontrado, a qualquer momento, no quartel- -general. Ali se reúnem os nossos fios. E nossos encontros serão no bangalô de Gucky, pois isso não chamaria atenção. Mais alguma pergunta?

Gucky ergueu timidamente a mão direita.— Sim?— No meu bangalô... tudo bem. Mas eu gostaria de sugerir que, na próxima visita

de vocês, cada um traga uma garrafinha. Afinal de contas, eu não tenho autorização para um bar...

Atlan e os outros riram.— Não se preocupe, nós levamos as bebidas — prometeu ele, encerrando a reunião.

* * *

Page 21: P-423 - Comando Especial Atlan - Clark Darlton

Rhodan voltou do seu voo de inspeção com a Intersolar e ficou sabendo, espantado, que Atlan nem pensava em tirar férias, e que permanecia no seu birô, vigiando as estações de noticiários. Ele resolveu fazer uma visita ao seu velho amigo.

— Lá fora está tudo em ordem. Eu mandei reforçar o bloqueio em volta do Sol, ordenando que abrissem fogo, se algum corpo espacial abandonasse a corona. Não podemos permitir, de modo algum, que outros cappins penetrem no nosso sistema. Eu receio que um deles já venha a nos causar muito trabalho e inquietação.

— Eu concordo com o bloqueio, Perry. Aqui na Terra vamos precisar de tranquilidade e a sensação de segurança para encontrarmos o cappin. Durante o voo você notou alguma coisa suspeita?

Rhodan sacudiu a cabeça.— Nada, Atlan, absolutamente nada. E o que há com você?Atlan apontou para a fila de telas de vídeo.— Você está vendo. Eu me informo sobre as coisas que acontecem lá fora. É difícil

acreditar que o cappin se mantenha passivo eternamente. Talvez ele conte com reforços, ou talvez não. De qualquer modo, ele acabará se traindo, ao forçar alguma criatura humana a agir contra seus costumes até então. E é justamente por isso que eu estou esperando.

— E você acredita que vai ficar sabendo disso, através das notícias de vídeo? Bem, eu acho que isso só mesmo por um acaso, muito improvável.

Atlan encolheu os ombros.— Talvez, mas não podemos deixar de tentar qualquer coisa. O que é que você

pretende fazer?— Nada, além de esperar. Galbraith colocou toda a Contra-Espionagem de

prontidão. O Departamento Científico, sob a direção de Abel, está estudando os métodos dos cappins, para desenvolver, talvez, um método seguro para a sua descoberta. Eu informarei você, em tempo hábil, dos resultados.

— Obrigado. Aliás, eu encerro o expediente, por hoje. Amanhã é outro dia.— Certo. Ainda nos veremos? Atlan sacudiu a cabeça.— Não. Eu estou cansado e gostaria de me meter cedo na cama. Não me leve a mal,

mas essa história com os cappins me deixou exausto. Se eu, pelo menos, soubesse o que eles querem de nós...!

— Logo vamos sabê-lo — prometeu Rhodan, despedindo-se de Atlan com um aperto de mão. — Até amanhã, então...

Atlan olhou atrás dele, até que a porta se fechou.— Talvez você mesmo seja o cappin, sem sabê-lo — murmurou ele, inseguro.

Page 22: P-423 - Comando Especial Atlan - Clark Darlton

3

Raymond Brandner definitivamente estava de saco cheio.Durante toda a sua vida ele já participara de muita coisa, mas isso agora ia longe

demais. Ele não tinha nada contra a regulagem artificial do tempo atmosférico, pois a mesma estava em ordem — quando funcionava bem. Geralmente ela fazia isso, e o que o automático programado podia fazer, se os cientistas preferiam chuvas, mesmo quando a Srta. Muller ou Mr. Smith queriam justamente tomar banho na praia?

Portanto ele não tinha nada contra o tempo. Pelo menos para os tomates, o tempo fazia bem.

Pelo menos até alguns meses atrás.Os antepassados de Brandner tinham feito uso desta circunstância começando com

o cultivo, pois tomates continham muita vitamina e eram saudáveis. Além disso, era fácil trabalhar com eles, e de forma concentrada podiam ser guardados em tubos e latas, assim podendo ser estocados até mesmo nas menores espaçonaves. Era uma comida fresca ideal, com alto teor em preciosos elementos alimentícios.

Deste modo os Brandner tinham enriquecido.Raymond, agora com a idade de cento e vinte anos, já várias vezes tivera a sensação

de ter que entregar toda essa tralha ao seu neto, para poder finalmente descansar. Ele já tinha o Vale da Morte pelo pescoço. Tinha saudades da sua grande casa de férias, junto ao Atlântico, na qual costumava passar seu tempo livre. Ele queria mudar-se para lá, para sempre.

Infelizmente então aquela coisa com o Sol se intrometeu.Como todo habitante da Terra ele fora informado de que tinham descoberto o

satélite dos cappins, numa órbita do Sol, e que havia a possibilidade de uma catástrofe solar. Saber disso naturalmente também estimulou a imaginação de Brandner. Apesar do controle do tempo atmosférico ele poderia ter jurado que as temperaturas, neste ano, eram bem mais elevadas que normalmente. Além disso, não chovia o suficiente. Mas a coisa tinha degringolado completamente com o tipo de radiação solar. Ela devia conter novos tipos de partículas, que antes não tinham existido. Brandner tinha falado com alguns cientistas particulares sobre isso, que naturalmente concordaram totalmente com ele, em vista da sua enorme riqueza. O campo de tempo devia ter a ver alguma coisa com isso.

O campo do tempo!Raymond Brandner ficou pensando por muito tempo no campo do tempo. Ele sabia

que o mesmo existia. Qualquer um o sabia. E desde que havia o campo do tempo, que mantinha a Terra e também todo o Sistema Solar em poucos minutos constantes no futuro, os tomates tinham piorado. Não tinham mais tanto suco, nem rendiam tanto quanto antes.

A culpa disso era de Rhodan, o Administrador-GeralNeste dia, Raymond Brandner mandou chamar o seu neto.Michael Brandner era único filho da filha de Raymond, e com isto o único herdeiro

da gigantesca empresa de tomates e seus produtos. Com seus trinta anos, ele chegara muito longe, e isto não somente devido à proteção secreta que recebia do seu avô.

Muito pelo contrário: Aquela riqueza ameaçadora lhe era sinistra.

Page 23: P-423 - Comando Especial Atlan - Clark Darlton

Ele saudou Raymond amistosamente e sentou-se no terraço cheio de Sol. Daqui tinha-se uma vista indescritivelmente bonita do verde Vale da Morte, que mantivera o seu nome original.

— Meu garoto, eu preciso falar com você — o velho Brandner abriu a conversa. — Eu sei que frequentemente temos diferenças de opinião e que só muito raramente coincidimos em questão de bom senso, mas neste caso eu espero que você concorde comigo e me dê o seu apoio.

— Com muito gosto, Grandy, você sabe disso. Você está preocupado com alguma coisa?

— E como! Olhe só para isso. — De um prato de cristal em cima da mesa, ele tirou um tomate maduro demais, estendendo-o ao seu neto na mão espalmada. — Não é uma beleza? Lindo de morder, não é? Maduro e suculento, como todo mundo está acostumado, com os tomates de Brandner. Dá para quase um tubo de massa de tomate, acho eu. Mas espere um pouco, Michael, logo você vai mudar de opinião. Preste atenção...

Apertando o tomate com as duas mãos, Raymond Brandner esmagou o mesmo entre os dedos. Ele o fez com uma pena visível e com uma cara como se estivesse rasgando uma nota de solares de bastante valor. Mas por mais que ele apertasse, e por mais que o tomate diminuísse, apenas algumas gotas de sumo passaram por entre os dedos do velho, pingando sobre a mesa.

Quando Raymond Brandner abriu as mãos, também os caroços e a pele caíram em cima da mesa.

— Isso é tudo, meu rapaz. Caroços e pele, mas nenhum miolo sumarento. Os tomates se tornaram sem valor. Para o que antigamente precisávamos de cinquenta quilos, hoje precisamos de quinhentos. Isso quer dizer que ainda ganhamos apenas dez por cento do que ganhávamos antes.

Michael anuiu, pouco impressionado.— Nós já temos que chega, Grandy. A riqueza é um fardo...— Você está louco, rapaz, totalmente doido. Você acha que eu vou deixar Rhodan

destruir a tradição de minha família? Afinal de contas ele é o culpado porque meus tomates se transformaram em bolas de pingue-pongue ressecadas.

— Rhodan? O que é que ele tem que ver com isso?— Tudo! O campo do tempo... não foi ideia dele?— Naturalmente. Ele nos protegeu de todos os outros, tirando-nos do espaço, assim

garantindo a paz. O que é que você tem contra isso?— Ele influenciou a radiação solar, Michael.— Grandy, agora é você que perdeu a cabeça!Raymond fez que não ouviu a censura de seu neto. O tempo de brigar ainda não

chegara. Primeiramente ele precisava salvar os tomates.— Eu pedi a opinião e o conselho de experts, e ele confirmaram minhas suspeitas.

O Sol ultimamente está emitindo uma radiação dura, que acaba ressecando os tomates.Michael anuiu e disse, irônico:— Ah, e isso somente aqui no Vale da Morte, não é mesmo?— Quase só aqui — concedeu Raymond. — Naturalmente eu também fiz essa

pergunta, porque é lógica. Você sabe do motivo? É muito simples: Nós nos encontramos metidos entre altas serras, que antes diminuíam a queda das chuvas. A neve nos cumes opera como linhas de frenagem. A radiação solar é reunida e nos chega ao vale de modo fortemente concentrado. É muito simples, não é mesmo?

Page 24: P-423 - Comando Especial Atlan - Clark Darlton

Michael não se mostrou absolutamente impressionado.— Quem foi que lhe contou essa besteira? Certamente outra vez um desses

cientistas de meia tigela, com altos honorários, não é mesmo? Grandy, você certamente não vai acreditar em coisa semelhante?

— O resultado dos meus esforços vai demonstrar se minha suposição está correta ou não. Eu exijo que a partir desse momento você me ajude.

— Muito bem, o que quer que eu faça?Raymond Brandner limpou os restos de tomate do tampo da mesa, com um

movimento de mão.— Eu vou destruir esta máquina maldita, em Mercúrio, o transformador de tempo.

Nós não precisamos nos esconder constantemente no futuro, para deste modo destruir as vitais colheitas de tomates. Eu vou destruir essa máquina, e então nós veremos...

— Você está doido, Grandy! Você está realmente maluco! E nisto eu não vou ajudá-lo de modo algum, jamais!

Raymond levantou-se, ameaçadoramente. Quando ele ficava de pé, passava, em uma cabeça, a altura do seu neto.

— Você vai fazer o que eu mandar, ou então você não será incluído entre os meus herdeiros.

Michael continuou sentado, nada impressionado e muito calmo.— Por mim, você pode meter os seus tomates idiotas dentro do seu chapéu, Grandy,

que eu não preciso deles. Eu tenho um emprego ótimo, uma mulher bonitinha e duas crianças, além de tudo que preciso. Eu não preciso do seu dinheiro. Muito bem, era isso que eu queria lhe dizer, há muito tempo, aliás.

Raymond Brandner parecia estar com falta de ar. O seu rosto parecia em cores, um dos seus tomates, como normalmente cresciam no Vale da Morte — grande, inchado, e cor de sangue.

— Seja sensato, Michael! Eu peço de você apenas que pilote uma pequena nave espacial, não, você nem precisa pilotá-la, apenas comandá-la. Eu estou velho demais para abandonar a Terra. Tudo que você precisa fazer é prestar atenção para que o piloto atire a bomba no momento certo. Isso é tudo. E com isso você ganha uma fortuna.

Michael sacudiu a cabeça.— Sinto muito — nunca! Você não consegue me comprar. O rosto do velho de repente tornou-se duro e distante.— Está bem, então esta é a sua decisão. Você pode me achar maluco, mas eu sei

que muita gente espera que alguém finalmente tenha a ideia de mandar aquela coisa em Mercúrio pelos ares. Nós perdemos qualquer contato direto com o cosmo. Correio, isso é tudo que consegue passar. Ninguém sabe o que realmente está se passando com seus parentes e amigos, na Frota Espacial. Há muito tempo que isso me chateia. Mas agora que meus tomates estão ameaçados, eu estou de saco cheio. A minha paciência esgotou- -se...

— E a minha também — interrompeu-o Michael, levantando-se. — Ou você raciocina sensatamente, agindo como uma pessoa normal, ou então esta é a última vez que você me verá por aqui. Você pode tranquilamente me deserdar, isso não me assusta. Deixe que seus milhões explodam por cima de Mercúrio, se você quiser. Os seus tomates, com isso, também não vão melhorar.

Sem esperar por uma contestação, ele foi embora, jovem e muito confiante em si mesmo.

Na realidade faltava-lhe o tutano para um plantador de tomates de sucesso.

Page 25: P-423 - Comando Especial Atlan - Clark Darlton

Raymond Brandner olhou atrás dele, com uma expressão dura e decidida no rosto. Para ele não havia mais como recuar, pois já metera a maior parte de sua fortuna líquida, nos preparativos, que deviam terminar com a destruição do transformador de tempo em Mercúrio.

Ele mostraria a esse Rhodan. Certo, o plebiscito há algum tempo atrás fora absolutamente democrático, mas ele, Raymond Brandner, tinha votado contra a sugestão de Rhodan. Infelizmente sem êxito, pois a maioria dos habitantes da Terra pronunciara-se a favor do erguimento de um campo de tempo.

— E agora eles têm o que merecem — raciocinou Raymond Brandner, e quase a sua satisfação maliciosa superava o seu desgosto. — Os bons tomates Brandner não existem mais...

* * *

Jeff Dengelmann ficara muito admirado, ao receber a oferta inesperada, através de um intermediário. Desde que ele deixara a frota de carga espacial, há alguns anos, ele não estava passando muito bem. E nisto nem o fato dele naquela ocasião ter comprado um pequeno iate cósmico, com seu dinheiro poupado, modificara alguma coisa, pois só muito raramente fazia uso de sua nave. De vez em quando uma excursão até os planetóides, e isso era tudo.

Ele alugava o iate para milionários, e a si mesmo como piloto.O seu anúncio aparecia regularmente nos jornais especializados correspondentes,

mas o negócio ia mal, em primeira linha porque os milionários, entrementes, quase todos possuíam suas naves espaciais próprias, e a gente com menos dinheiro naturalmente não tinha como comprar um iate e nem mesmo alugar um.

Por isso Jeff ficou muito contente, quando a oferta muito favorável apareceu-lhe inesperadamente. Um voo em direção a Mercúrio ida e volta. O honorário oferecido pelo desconhecido (ou seu intermediário) não era nada desprezível. Por isso Jeff teria voado duas vezes através do Sistema Solar, apesar de sua nave apenas alcançar metade da velocidade da luz.

Neste dia, ele deslocou-se até o estaleiro particular, para mais uma vez inspecionar detidamente a Glory of Mother Earth. Ele não era somente o proprietário da nave, não apenas o seu piloto, mas também o mecânico de bordo, técnico especial e o grupo de manutenção, tudo numa só pessoa.

Mostrou o seu passe, e pôde entrar no estaleiro. No caminho ele encontrou o chefe do mesmo.

— Olá, Mr. Dengelmann, faz tempo que o senhor não aparece. Para onde vai desta vez?

— Não é nada excitante — afirmou-lhe Jeff, de um modo como se pelo menos duas vezes por semana voasse para a Alfa Centauri e de volta. — Para Mercúrio, suponho. É uma incumbência especial.

— Bom para o senhor, Mr. Dengelmann. Depois disso certamente o senhor vai poder pagar o aluguel que já está em atraso, não é mesmo?

— Ó, eu quase tinha esquecido isso — desculpou-se Jeff, com presença de espírito. — O dinheiro naturalmente já está no meu banco. Logo que tiver este voo atrás de mim, eu mandarei passar-lhe a ordem de pagamento.

— Muito simpático de sua parte, Mr. Dengelmann. Aliás, seria uma pena, por sua bela nave.

— O que quer dizer com isso?

Page 26: P-423 - Comando Especial Atlan - Clark Darlton

O chefe do estaleiro encolheu os ombros.— Santo Deus, quando uma coisa dessas vai a leilão, a gente nunca sabe nas mãos

de quem vai parar. E ela será leiloada, caso o senhor não pague.Jeff parecia um pouco ofendido.— Ora, por favor! Eu alguma vez fiquei lhes devendo alguma coisa? Quero dizer,

por mais tempo, do que foi absolutamente necessário?— Naturalmente que não, meu caro. Mas eu certamente ficaria muito satisfeito se

no futuro os negócios andassem um pouco melhor para o senhor. Até então, Mr. Dengelmann.

— Até logo — retrucou Jeff e olhou atrás dele com sentimentos confusos.A nave estava em ordem, até onde ele pôde determinar. No fundo, estes iates

praticamente não exigiam manutenção. A propulsão nuclear ainda colocaria alguns milhares de horas-luz atrás de si, sem sequer exigir atenção. Depois, ela teria que ser recondicionada pela firma fornecedora, e novamente enchida. Isso custaria um bom dinheiro, mas Jeff tinha certeza que até lá ele o teria.

Ele examinou as provisões de víveres, pois a alimentação estava incluída no preço de voo. Também a aparelhagem de renovação de ar trabalhava sem problemas, conforme ele pôde ver pelos indicadores de controles. A Glory estava desarmada e tinha uma autorização especial da Administração Solar para voos dentro do Sistema Solar. Ela não precisava de qualquer autorização adicional e poderia partir a qualquer momento.

Depois de ter-se convencido de que a Glory estava pronta para partir, ele voltou à sua residência, onde o esperava ainda outra notícia. O seu cliente anunciava para amanhã um fornecimento, que deveria ser levado junto para Mercúrio. Tratava-se de três caixas de metal, de cem quilogramas cada uma. Quanto ao conteúdo das caixas a notícia nada informava.

— Por mim, ele pode levar o que quiser — resmungou Jeff, um pouco espantando. — Uma vez que ele me pague decentemente.

Ele passou a noite de muito bom humor e em companhia agradável. Na manhã seguinte levantou-se mais cedo que de costume, ligou o automático de serviço da casa para “Férias”, e dirigiu-se ao estaleiro, onde esperou pela carga anunciada. A carga veio num helicóptero, que recebera permissão de pouso da chefia do estaleiro. Ele pousou bem perto da Glory. Dois homens silenciosos carregaram as três caixas compridas do interior do helicóptero, depositando-as diante do iate espacial.

— Assine aqui — exigiu um deles a Jeff, de modo quase descortês.Jeff assinou.— Que tal os senhores me ajudarem a levar estas coisas para o meu porão de

cargas? Sozinho eu nunca vou dar conta disso.— Nós não fomos pagos para isso — recusou um dos homens.Jeff fez das tripas coração, e acabou tirando uma nota do bolso. Os dois homens

olharam para ela durante algum tempo, como se quisessem adivinhar o seu valor, e depois anuíram.

— Muito bem, abra essa joça.Um pouco mais tarde o helicóptero subiu novamente sumindo para o oeste.Jeff ficou olhando atrás dele, até que ele desapareceu. Depois desceu novamente

para o porão de carga e ficou olhando as três caixas com uma mistura de curiosidade e admiração. Pelo que ele podia determinar, elas estavam fechadas com uma fechadura positrônica. Era impossível que alguém não-autorizado pudesse abri-las. E se fossem abertas a força — pelo que Jeff sabia — significaria uma destruição das caixas.

Page 27: P-423 - Comando Especial Atlan - Clark Darlton

Bem, ele não tinha nada com o que um passageiro levava consigo.Ele sabia que teria que esperar por um longo tempo, e aproveitou a oportunidade

para examinar a Glory mais uma vez. A pequena cabine de passageiros estava pronta para receber o passageiro. A cama-basculante estava dobrada, as instalações sanitárias na melhor ordem. Uma mesa, duas poltronas fundas, um sofá pequeno, uma escotilha e um aparelho de vídeo proporcionavam uma atmosfera quase confortável.

Das provisões, Jeff preparou para si uma refeição, experimentando ao mesmo tempo a cozinha automática. Ela funcionou sem problemas.

Depois pousou novamente um helicóptero.O piloto ficou sentado na nacele, e somente um homem saiu da parte traseira do

aparelho. Para seu grande espanto, Jeff teve que verificar que o homem devia ter cem anos pelo menos. Entretanto, ele dava a impressão de robusto e cheio de espírito de iniciativa. Depois de ter acenado mais uma vez ao piloto do helicóptero, ele dirigiu-se, certo do seu objetivo, na direção de Jeff, que estava de pé, diante da sua Glory. O desconhecido, que agora já não parecia mais tão desconhecido a Jeff, saudou-o, agitando a bengala na qual se apoiava para caminhar.

— O senhor é Jeff Dengelmann, ou estou enganado?— Correto, Sir, piloto e proprietário da Glory of Mother Earth. E o senhor

certamente é o meu cliente, que preferiu não dizer o seu nome?— Correto. O senhor ainda ficará sabendo do meu nome em tempo, Dengelmann.

Quando podemos partir? As caixas já chegaram?— Já estão no porão de carga. Nós podemos partir quando o senhor quiser. Tudo

está pronto.O velho apontou com a bengala para a escada que ia dar na sala de controles.— Tenho que subir isso aí? Não há um embarcadouro mais seguro?— Somente pela escotilha de carga, Sir. Mas pela escada é melhor.— Hum — o velho Raymond Brandner começou a subida. Ele achou a sua cabine

um pouco apertada, mas se deu por satisfeito, especialmente porque Jeff garantiu-lhe que na cabine de comando ainda era mais apertado e menos confortável.

— Só resta ainda o recinto de carga, onde se encontram as caixas, Sir. Mas eu também não aconselharia este. A cabine de hóspedes tem os campos de gravidade artificiais, conforme disposições de transporte de passageiros no espaço cósmico. Nada poderá acontecer-lhe na mesma.

Antes de Jeff poder abandonar a cabine, Brandner ainda o reteve mais uma vez. Ele pôs a mão no bolso, tirando de lá um cheque preenchido.

— A soma combinada e mais um pouco. Eu prefiro pagar já agora. Está tudo em ordem?

Jeff pegou o cheque, examinou a assinatura, depois o seu rosto mostrou o reconhecimento.

— Brandner, o Rei do Tomate...! E eu que não o reconheci logo, quando o senhor saiu do helicóptero. Então é o senhor? O senhor pretende instalar um novo campo de tomates em Mercúrio? Dizem que o sol por lá é bem quente, justamente o que os tomates querem...

— Meu jovem, se quiser que continuemos amigos, não diga isso mais uma vez! — Raymond Brandner deixou-se cair numa poltrona. — E agora dê partida, pois não temos mais tempo a perder. Ah, sim, mais uma coisa: Não voe depressa demais! Eu sou alérgico a altas velocidades.

Page 28: P-423 - Comando Especial Atlan - Clark Darlton

Jeff fechou a porta e dirigiu-se à sala de controles, que ficava na proa da nave. Ele forçou passagem pela entrada bastante apertada e ligou o automático dos controles. A luz acendeu-se, a instalação de refrigeração e renovação de ar começou a trabalhar, na parte da popa os pré-aquecedores começaram a zunir, as bombas gemiam, e a vida em geral despertou na nave. De repente sentia-se que aquilo não era uma peça de metal morta.

Jeff entrou em contato com o controle de solo do estaleiro.— Tudo pronto para a partida.— Permissão de partida. Bom voo, Jeff.Isso foi tudo. Curto e simples. Sem dificuldades.A Glory deu partida cinco minutos mais tarde e desapareceu no céu noturno, sem

nuvens.Cinco minutos mais tarde um rapaz ainda jovem precipitou-se para dentro do

edifício de controles e perguntou pela aparência do passageiro que um certo Dengelmann levara consigo. Depois de ser informado que ninguém vira o passageiro, já que ele pousara de helicóptero, imediatamente passando para a Glory, o visitante despediu-se rapidamente, depois de ter recebido o endereço do piloto do helicóptero.

— Esse Dengelmann se relaciona com cada tipo de gente — disse o radioperador da torre de controle, sacudindo a cabeça, muito admirado.

* * *

Raymond Brandner tinha perdido o juízo. O seu propósito beirava a loucura e estava condenado à derrota, ainda antes de ter começado.

Mas talvez Brandner teria conseguido realizar o seu plano, se não fosse por Jeff Dengelmann e Michael Brandner.

Jeff quase não se importou com o seu passageiro. Ele tinha muitas outras coisas com que se ocupar, pois a sua Glory não era propriamente automatizada. Ele se ocupava com a navegação, com o rastreamento por rádio e naturalmente com os fortes de defesa do Governo Solar, que ainda vinham dos tempos em que o Sistema Solar podia ser alcançado por qualquer nave espacial vinda de fora. Eles trabalhavam totalmente automatizados, e era preciso transmitir pelo rádio o sinal de reconhecimento, quem não quisesse ser destruído pelas suas armas robotizadas.

E Jeff não queria isso de modo algum.Marte não podia ser avistado, mas logo a seguir Vênus surgiu. Pelo

intercomunicador Jeff entrou em conexão com Raymond Brandner chamando sua atenção para a belíssima vista. O plantador de tomates resmungou alguma coisa incompreensível e quis saber quando finalmente se chegaria em Mercúrio.

— Focinho planetário! — disse Jeff, ofendido, depois de ter desligado o intercomunicador. — Não tem sentido para as belezas do cosmo, só para seus tomates podres. Bem, por mim...

Ele ligou novamente a recepção de rádio para o caso de alguém querer contato com ele, o que agora quase lhe era desejável. Era terrivelmente chato quando se viajava com um passageiro chato.

Quando o sinal de chamada da Glory pôde ser ouvido no alto-falante, Jeff não quis acreditar nos seus ouvidos. Realmente havia alguém que queria entrar em ligação com ele! Mas que acaso!

Era o seu estaleiro, que neste caso tomava a si a tarefa do intermediário.— Um certo Michael Brandner gostaria de falar com o senhor, Jeff. Este nome lhe

diz alguma coisa?

Page 29: P-423 - Comando Especial Atlan - Clark Darlton

— Michael Brandner? O meu passageiro também se chama Brandner, Raymond Brandner. Engraçado.

— Não tem nada de engraçado, este é o avô de Michael. Mas ele quer falar com o senhor, e não com o avozinho dele. Eu agora faço a conexão. Por favor fale, Jeff.

Depois da chamada de Jeff, levou alguns minutos até que a conexão fosse estabelecida. Exatamente como nos tempos pré-históricos, achou Jeff, quando ainda não existiam ondas de rádio de velocidade ultra-luz.

— Aqui fala Michael Brandner, Mr. Dengelmann. Eu sou neto de Raymond Brandner. Como está o meu avô?

— Muito bem, Mr. Brandner. Ele sente-se bem, mas está com pressa de chegar a Mercúrio. Ainda vamos precisar de seis horas...

— Neste caso está na hora do senhor pensar em alguma coisa, ou então vai se meter em dificuldades, em dificuldades muito grandes, Mr. Dengelmann.

— Quem sabe o senhor se expressa com mais clareza? — sugeriu Jeff.— Com prazer. O meu vovozinho está completamente doido, é bom que o senhor

saiba. Eu sei o que ele quer em Mercúrio, pois foi ele mesmo quem me revelou tudo. O senhor terá que fazer malograr o seu projeto. Caso contrário eu não garanto mais nada.

— Mais claramente, por favor — pediu Jeff, que não entendia uma só palavra.Por milhões de quilômetros ouviu-se um suspiro.— Vovô quer destruir o transformador do tempo em Mercúrio — disse Michael

Brandner.Jeff Dengelmann respirou fundo, e então lembrou-se das três caixas metálicas no

porão de carga. O formato alongado, o peso enorme, as circunstâncias curiosas, sob as quais ele as recebera.

— Com bombas, quer dizer? — perguntou ele.— Sim, com três bombas. Não me pergunte como ele conseguiu as bombas, mas

com dinheiro consegue-se tudo. Eu pude seguir o seu rastro, depois que entendi o quanto eram sérias as suas ameaças malucas. Infelizmente cheguei tarde demais. O senhor já tinha partido, e naquela pressa não consegui encontrar um outro iate. O que o senhor vai fazer? Voltar?

— Talvez esta fosse a melhor solução, Mr. Brandner. Mas neste caso o senhor providencia para que tenhamos um comitê de recepção, caso contrário o velho acaba comigo depois do pouso. Além disso, eu não gostaria que ele me bloqueasse o cheque, que já me entregou.

— Não se preocupe com o dinheiro. Eu lhe restituo tudo. O meu interesse é que vovô não cometa nenhum crime. — Ele suspirou novamente. — E tudo isso por causa de uns tomates idiotas!

— Não compreendo.— Ele acredita que Rhodan tem culpa que seus tomates ficam ressecados. O campo

de tempo, sabe? Luz solar mais forte — ora, eu também não entendo disso. De qualquer modo meu avô quer destruir o transformador de tempo, para que caiamos de volta ao presente relativo e assim os seus tomates cresçam novamente como antes. Volte, antes que seja tarde. Dentro de cinco minutos eu volto a entrar em contato com o senhor.

— Acho melhor o senhor comunicar tudo à Contra-Espionagem Solar.— Não, eu não farei isso. Ainda não aconteceu nada, e vai depender do senhor, se

alguma coisa acontecer ou não. Pode ser que nossa conversa seja interceptada por acaso, neste caso nada posso mudar. Dentro de cinco minutos, portanto. Eu espero que então o senhor esteja pronto para iniciar o seu voo de volta para a Terra.

Page 30: P-423 - Comando Especial Atlan - Clark Darlton

— Está bem — disse Jeff, e ouviu que a ligação foi interrompida.Da pequena porta Raymond Brandner disse:— Ora vejam só, o meu querido neto! Quer que voemos de volta, o garoto. Calma,

Dengelmann, fique onde está. Eu estou com uma pistola de agulha apontada para o senhor, e lastimaria ter que disparar na sua direção. Eu não o mataria, pois como é que eu alcançaria o meu destino, mas o paralisaria um pouquinho, de modo que ainda pudesse seguir minhas instruções. Portanto fique bem quietinho, e nada lhe acontecerá. — Ele apontou para a tela de vídeo. — Aquilo lá é Mercúrio?

Jeff anuiu, furioso.— Sim, é ele, justamente na linha de voo. Dentro de seis horas estaremos lá.— Ótimo. E dentro de cinco horas eu direi poucas e boas ao meu neto. Então ele

poderá, por mim, avisar a Contra-espionagem. Pois já será tarde demais...

* * *

Quatro horas depois desse incidente Jeff começou a suar seriamente. O velho Brandner não afastava os olhos dele nem por um segundo, prestando ainda atenção para que Mercúrio ficasse sempre no centro da tela de vídeo. Por diversas vezes Jeff teve que atender e responder mensagens de rádio, mas parecia mesmo que ninguém tinha escutado a conversa entre ele e Michael Brandner. Pelo menos, nenhuma pergunta fazia referência a isso.

— Logo vamos abrir as caixas e aprontar as bombas para serem jogadas, Dengelmann. — Ele riu para si mesmo, irônico. — Foi um trabalho conseguir essas coisinhas. Afinal de contas, não é possível comprá-las em qualquer lojinha. Mas com as minhas relações a coisa finalmente funcionou. Essa gente é mesmo muito irresponsável. Por dinheiro são capazes de venderem a si mesmos.

— Eu não sou assim, o senhor sabe disso muito bem — protestou Jeff energicamente contra esse juízo global. — Ainda que o senhor me oferecesse muito mais, eu jamais participaria disso, de livre e espontânea vontade.

— Neste caso poderá explicar isso, mais tarde, aos homens da Contra-Espionagem — gritou Raymond Brandner, cortante.

Jeff perguntou:— O senhor queria apenas salvar os seus tomates, não é? O senhor acha que depois

desse atentado — se ele tiver êxito — o senhor ainda chegará a cultivar tomates? No máximo numa das luas de Júpiter, num campo de prisioneiros. Isso não lhe está bem claro?

Raymond Brandner parecia não ter escutado a pergunta. Ele acenou com sua pistola.

— Venha logo, temos que abrir as caixas. Eu espero que a sua presença aqui não seja urgentemente necessária.

— Se vier uma mensagem de rádio e não for respondida, isso poderia provocar suspeitas.

— E isso o senhor diz para mim, que sei que não está absolutamente interessado no êxito de minha missão? Eu não caio nessa, meu caro. Venha! Ande logo!

Eles se esgueiraram através do corredor estreito para dentro do porão de carga, Jeff na frente e o velho Brandner, com a pistola apontada, atrás dele. Não havia qualquer possibilidade de Jeff tirar a pistola do maluco.

Page 31: P-423 - Comando Especial Atlan - Clark Darlton

— Momento, onde é que eu tenho a combinação positrônica? — Brandner procurou nos seus bolsos, até que surgiu um bilhete. — Aqui está ela. Muito bem, vamos à primeira caixa...

A fechadura abriu prontamente. Acomodada em plástico isopor, a bomba se encontrava na caixa como num ataúde. Elegante e cintilando mortalmente, um pouco oleosa e perigosa, uma mistura indescritível de perigo, morte e beleza metálica.

Jeff olhou fixamente para ela como se ela pudesse explodir a qualquer momento.— Uma bomba atômica? Raymond Brandner anuiu.— Naturalmente, o que mais? O senhor acha mesmo que iria jogar pólvora seca

neles? Vamos, a próxima caixa. Saia da frente da luz.Pouco mais tarde, as três bombas estavam prontas para serem atiradas, perto da

escotilha de desembarque. Bastava apenas dar-lhes ignição e rolá-las alguns centímetros. Para isso, o velho seria capaz sozinho, se ninguém o ajudasse.

E dentro de uma hora, Michael chamaria novamente.Eles estavam, os dois, na central de comando, quando chegou o chamado. O próprio

Michael Brandner chamou. Parece que desta vez conseguira uma ligação direta.— Alô, Mr. Dengelmann, posso falar com o meu avô?— Ele está sentado do meu lado, segurando-me uma arma diante do nariz. Sinto

muito, mas não consegui impedi-lo...— Merda!Isso foi tudo que Michael conseguiu dizer, mas ele não soou nem especialmente

perturbado nem desesperado.— Merda ou não, meu caro rapaz, agora você vai me escutar. — Raymond

Brandner tinha empurrado Jeff para o lado, para ficar mais próximo do microfone. — Por mim, agora você pode alertar a Contra-Espionagem, pois será tarde demais. Logo teremos chegado, e então as bombas cairão.

— Você nunca vai consegui-lo! Mercúrio está rodeado por um anel cerrado de fortes de defesa, que ninguém consegue penetrar. Desista, vovô, antes que seja tarde demais.

— Imbecil! — O velho Brandner acenou para Jeff com sua pistola, para preveni-lo contra algum ato impensado. — O meu piloto vai irradiar o sinal de identificação, e ele poderá passar. Ou, entrementes, você já tomou alguma providência contra mim?

— Você logo vai ver. E agora desligo, pois não tenho mais tempo.A ligação foi interrompida, antes que Raymond Brandner pudesse responder.Ao mesmo tempo ouviu-se, em algum lugar na nave, um ruído. Parecia que uma

poltrona, ou uma cadeira, tivesse sido derrubada. Depois tudo ficou quieto novamente.Brandner olhou Jeff, interrogativamente.— O que será que foi isso?Jeff encolheu os ombros. Ele não o sabia. Na nave não havia peças soltas que

pudessem cair sozinhas. Talvez na cabine de passageiros, mas ali o neutralizador de gravidade controlava o seu interior, e não era afetado pelos movimentos da nave. E a Glory não modificara a sua rota.

Por um momento Jeff encontrou apenas uma explicação lógica: Além deles dois, devia haver ainda uma terceira pessoa a bordo. Mas depois ele sacudiu a cabeça. Não, isso era impossível. A nave era pequena demais para receber um passageiro clandestino, sem que o mesmo fosse descoberto na primeira ronda.

Mas, ainda assim...

Page 32: P-423 - Comando Especial Atlan - Clark Darlton

O ruído repetiu-se, só que desta vez nada caiu. Mas alguém tentava chegar à central de comando, através do corredor estreito.

E então este alguém bateu na porta.Jeff parecia como alguém que algum mágico tivesse transformado em mármore. Ele

não se mexeu e apenas olhava fixamente para a porta. A mesma não estava trancada. Quem quer que fosse que se tinha esgueirado para bordo, poderia entrar sem problemas. Jeff já não considerava mais onde o estranho tinha se escondido, para não ter sido descoberto. Para ele era decisivo apenas o pensamento de que se aproximava uma ajuda. Ajuda contra um louco.

Mas tão louco o velho Brandner realmente não era.— Vamos, venha até aqui, Brandner. Eu preciso manter o senhor e também a porta

sob minha vista. Quem é que pode ser isso?Jeff encolheu os ombros e não disse nada, colocando-se do lado de Brandner.— Espero que o estranho saiba que Brandner tem uma pistola...

* * *

Naturalmente Gucky sabia disso.Ele recebera a incumbência há poucos minutos, e depois de rápidas instruções de

Atlan, chegara até Vênus, através do transmissor, onde recebeu as coordenadas exatas da Glory. Depois de dois saltos teleportadores na direção de Mercúrio, ele avistou o iate e saltou para bordo. Nisto, materializou na cabine do passageiro, derrubando uma cadeira. Era este o ruído que Jeff e Brandner tinha ouvido.

Para Atlan estava claro que o cappin tinha assumido o velho Brandner, pois somente os cappins podiam ter um legítimo interesse em destruir o campo de tempo. Então eles poderiam escapar.

Gucky sabia exatamente o que precisava fazer para expulsar o cappin metido no velho Brandner, e isso tão depressa, que o mesmo não tinha mais tempo para goniometrar-se novamente e mudar.

A cadeira derrubada meteu-se entre os seus planos.Gucky concentrou-se e não foi-lhe difícil captar os pensamentos dos dois homens

na central de comando da Glory. Eles o informaram sobre o que acontecia ali.De modo algum ele devia pôr o piloto em perigo.De qualquer modo os dois estavam prevenidos e sabiam que, além deles, ainda

havia mais alguém a bordo do iate espacial. E agora o problema era de surpreender o velho Brandner, apesar do que ele sabia. Isto, entretanto, somente era possível, vigiando- -se atentamente os seus pensamentos, para estar constantemente informado de suas intenções.

E foi assim que Gucky acabou batendo na porta da central de comando.Ele esperou até que ficou sabendo, pelos pensamentos dos dois homens, como

Brandner pretendia defender-se contra inesperado invasor. Depois abriu a porta e entrou na central de comando. A arma de impulsos, uma arma absolutamente mortal, estava enfiada, solta, no seu cinturão, bem a mão. Destravada e pronta.

— Bom dia — disse Gucky quase cordialmente, colocando o capacete espacial do seu traje para trás. — O seu neto Michael, meu caro senhor Brandner, pediu-me para que desse um jeito nas coisas por aqui.

Brandner olhou para Gucky como se este fosse um fantasma. E então lembranças começaram a surgir na sua cabeça, e finalmente a certeza. Mas no todo ele não conseguia mesmo entender como é que tudo podia ter acontecido tão depressa.

Page 33: P-423 - Comando Especial Atlan - Clark Darlton

— De onde é que você... ah... de onde é que o senhor veio?— Teleportação — explicou-lhe Gucky, de boa vontade, e refletiu se não seria

aconselhável tirar a pistola do velho Brandner telecineticamente. Seria muito simples que o cappin que morava dentro dele apertasse o gatilho, ferindo alguém. Armas de agulha costumavam detonar ao impacto. — O seu neto Michael informou a Contra-Espionagem Solar, relatando-lhes sobre o seu plano maluco. O senhor jamais teria conseguido passar através do bloqueio, pois eles teriam destruído o senhor e a nave. Eu estou aqui para impedir isso.

— Então foi mesmo Michael! — murmurou Brandner, rouco. — Eu vou deserdá-lo.— Receio que para isso seja tarde demais — disse Gucky, sem pestanejar. — Pelas

suas ações o senhor provou que é irresponsável, Mr. Brandner. Com isso, qualquer advogado tem material suficiente nas mãos, para interditá-lo. Automaticamente também a sua fortuna passaria para o seu único herdeiro. Em outras palavras: Aconteça o que acontecer — se eu matá-lo, ou se o senhor se entregar de livre e espontânea vontade, o seu neto Michael mais tarde terá que cultivar os seus miseráveis tomates.

A cara de Brandner ficou muito vermelha.— Os tomates Brandner são os melhores do mundo, sim, de todo o Sistema Solar!

Pelo menos eram, até que este maldito campo de tempo começou a agir, modificando as radiações do Sol...

— Não diga besteiras — interrompeu-o Gucky, rigoroso. — O campo de tempo não tem absolutamente nada a ver com isso. Talvez o satélite dos cappins. E este nós queremos eliminar do mesmo jeito que o senhor o campo de tempo. Por que, portanto, devemos brigar? Vamos, dê-me a sua arma, depois voltamos para a Terra. E eu lhe prometo intervir a seu favor.

Brandner segurava a sua pistola de agulha de tal modo que com ela ameaçava ao mesmo tempo Jeff Dengelmann e Gucky.

— Mas nem em sonho penso nisso. O senhor é esse tal rato-castor, Gucky, não é mesmo? Neste caso também pode ler pensamentos, ou...?

Gucky sabia que agora não devia esperar mais. Brandner, com o tempo, também se lembraria de que teleportação e telepatia não eram os únicos dons do rato-castor.

— Jeff, fique onde está! — gritou ele, dando início à telecinese.Brandner não sabia o que estava lhe acontecendo, quando repentinamente a pistola

de agulha saiu de suas mãos, como se tivesse adquirido vida própria. Ela escapou dos seus dedos e saiu pairando, na direção de Gucky, que a pegou, com a mão esquerda, literalmente no ar, girando-a. A boca da arma agora apontava diretamente para o coração de Brandner.

— E agora reze, Brandner, eu vou atirar em exatamente cinco segundos!Jeff ficou parado. Não se mexeu. Ele não entendia mais absolutamente nada, mas

confiava no rato-castor, de quem sabia ser um dos melhores amigos de Rhodan.Brandner por sua vez foi tomado pelo pânico. Ele na realidade tinha que acreditar

que Gucky simplesmente mataria um homem indefeso.Ainda enquanto ele olhava atrás de sua pistola pairando pelo ar, ele agiu. Com um

salto, que ninguém imaginaria que ele fosse capaz, ele atirou-se sobre Gucky, que reagiu com velocidade do raio. Ele teleportou para o teto e apontou para Brandner...

...e atirou.Jeff deixou-se cair ao solo, pois não tinha intenção de ser morto por um acaso. O

projétil-agulha passou sibilando bem perto da cabeça de Brandner e detonou junto da tela de vídeo, sem causar danos visíveis. Brandner, entretanto, não conseguiu chegar ao seu

Page 34: P-423 - Comando Especial Atlan - Clark Darlton

objetivo, caindo ao chão. Antes de poder levantar-se, ele olhou mais uma vez na boca mortífera de sua própria arma e viu como o dedo indicador do rato-castor se curvava no disparador.

O tiro mortal podia ser disparado a qualquer momento.

O medo de morrer tomou conta dele — um medo de morrer genuíno e real.

Ele não conseguia mais se mexer. Estava caído no chão da central de comando e sabia que o seu fim chegara. Gucky o mataria, isso ele podia ver pela cara do rato-castor. Nos seus traços sempre tão alegres, não podia ver-se nenhuma compaixão, nenhuma consideração, nada.

Só a vontade de matar.E então Brandner desistiu. Sua cabeça

caiu-lhe sobre o peito e ele fechou os olhos.Ele tinha dado adeus à sua vida.Gucky abaixou a arma.Se alguma vez tivesse havido um cappin

dentro de Brandner, ele teria, neste momento, deixado o corpo hospedeiro, fugindo em pânico, e Brandner saberia o que acontecera. Isso a experiência com o Tenente Beruda tinha demonstrado nitidamente.

Gucky empurrou a arma-agulha no seu cinturão e abaixou-se para ajudar Brandner a por-se de pé.

— Levante-se, Mr. Brandner. Agora tudo acabou. Mas o senhor precisa ser sensato e me ajudar. Eu lhe garanto que o senhor vai conservar suas plantações de tomates, podendo fazer com elas o que quiser. O senhor pretendia cometer um crime, mas não chegou a executá-lo. Em outras palavras: o senhor apenas fez uma excursão no Sistema Solar. Isso é tudo. Mas agora fale! O que é que o senhor sabe? O senhor se lembra do cappin, que tomou posse do seu corpo?

Jeff, que não entendia mais nada, a um aceno de Gucky voltou-se para os seus controles, e programou uma nova rota no seu computador de navegação. O iate descreveu um arco de cento e oitenta graus e tomou a direção de volta para a Terra.

— E então, Brandner? — Gucky lembrou ao seu prisioneiro.Raymond Brandner olhou-o sem entender. Ele estava sentado em cima da pequena

mesa junto aos controles.— Eu não sei o que está querendo dizer. Cappins? O que é que eu tenho a ver com

os cappins?Atentamente Gucky leu nos pensamentos dele, e logo sabia que Brandner falava a

verdade. Isso levava a apenas duas conclusões: ou o cappin ainda tivera tempo para apagar a memória e a capacidade de lembrança do seu corpo hospedeiro, antes de abandoná-lo, ou então nunca tinha havido nenhum cappin. Neste caso, Brandner tinha agido autonomamente e era responsável por isso. Ele seria interditado. Nisto nem Gucky poderia mudar alguma coisa.

Page 35: P-423 - Comando Especial Atlan - Clark Darlton

— Está bem, Brandner. Mais tarde falaremos sobre isso. Agora vou levá-lo à sua cabine e trancarei a porta. Depois vou me ocupar com as suas bombas. Todo o resto acontecerá depois de nosso pouso na Terra.

Ele levou Brandner para a cabine dele, trancou a porta e voltou para a central de comando. Ele achou correto esclarecer tudo a Jeff Dengelmann, pois o piloto se mantivera leal. Rhodan cuidaria para que ele recebesse o seu dinheiro.

— E esta é toda a história — concluiu Gucky. — É claro que tínhamos que supor que um cappin tinha assumido Brandner, mas eu acabei constatando que o cultivador de tomates realmente ficou maluco. Bem, minha missão, de qualquer modo, não foi totalmente inútil. Talvez ele realmente conseguisse atirar aquelas bombas. Ah, sim, as bombas. Eu vou dar uma olhada nelas, e desativá-las. O senhor permanece em rota para a Terra e me chama caso alguém desejar contato pelo rádio.

No porão de carga, Gucky examinou as três bombas.Quando voltou para a central de comando, Jeff anunciou-lhe que tudo continuava

em ordem. No seu rosto, entretanto, lia-se uma pergunta receosa. Parecia não estar muito confortável, sabendo que tinha bombas atômicas ativadas a bordo.

Gucky pôde tranquilizá-lo.— Passaram a perna em Brandner, Jeff. As bombas na realidade não são bombas,

mas imitações muito bem-feitas. Elas poderiam tranquilamente serem jogadas sobre Mercúrio, que nada teria acontecido, a não ser que caíssem justamente na cabeça de alguém. Elas, afinal, eram bem pesadas, mas isso é tudo — ele gemeu. — E por isso, toda essa agitação...!

Jeff achou a agitação perfeitamente suportável, pelo menos agora.— Tivemos sorte — disse ele, apontando para a tela de vídeo. — Vênus está diante

de nós. Em poucas horas estaremos na Terra. Agora posso tirar tudo que a nave dá. Para Brandner a velocidade agora já não será mais desagradável...

— Para ele agora tanto faz... — garantiu Gucky. Ele lastimava não ter agarrado nenhum cappin.Apenas um maluco.

Page 36: P-423 - Comando Especial Atlan - Clark Darlton

4

No dia 29 de junho de 3.433, Rhodan reconheceu que não levaria a nada se ele se esforçasse demais. Há dias que ele se mantinha de pé, e poderia considerar-se feliz quando conseguia dormir umas duas horas por noite. Independentemente de Galbraith Deighton e de Atlan, ele peneirava os noticiários de todo o mundo, e quando Raymond Brandner quis destruir as instalações em Mercúrio, todos os participantes acreditaram finalmente terem encontrado um indício concreto. Entretanto, não fora assim.

Gucky relatou que Brandner era apenas um pobre louco, que agora poderia ficar tranquilamente no seu palácio no Atlântico, para refletir com calma, porque também os tomates eram submetidos a determinadas modificações. Michael tinha assumido o negócio, mas pelas revistas ilustradas e pelas notícias da televisão — “Hora de Atualidades” — a Humanidade ficou sabendo que o novo dono das plantações de tomates do Vale da Morte jamais comia um tomate.

Gucky agira por incumbência oficial da Contra-Espionagem Solar, de modo que pôde apresentar seu relatório tanto para Rhodan como também para Deighton. Só mais tarde ele repetiu o relato de suas aventuras no círculo estreito do “Comando Especial Atlan”.

Eles tinham se reunido novamente no bangalô de Gucky.Quando Rhodan finalmente decidiu tomar para si um fim de semana livre, ele

sentiu-se repentinamente muito solitário e sozinho. Enquanto estivera ocupado com o seu trabalho e seus deveres, nunca se dera conta disso. Agora, entretanto, enquanto refletia sobre o que fazer com o seu tempo livre, não achou a resposta.

Bell?O seu amigo Bell muitas vezes seguia seus próprios caminhos, dos quais ninguém

sabia ou imaginava. Naturalmente Rhodan ficara sabendo, através de fontes as mais diversas, que Bell se comportava de modo perfeitamente normal quando estava em Terrânia, e tinha tempo livre. Ele era conhecido em praticamente todo bar noturno, e era tido como visitante assíduo de shows de varieté interplanetários. Ele parecia também gostar de cabarés, mais pelo menos que dos cinemas em terceira dimensão com os filmes de monstros da mais moderna produção.

Rhodan não sentiu vontade de ir procurar Bell num dos inúmeros bares. Inclusive porque ele poderia chegar num momento pouco adequado. Bell não era tido absolutamente por um santo.

Ainda havia amigos suficientes que Rhodan poderia visitar. Entretanto, não sentiu vontade de ir procurar qualquer um deles. A sua casa, lá fora, no Lago Goshun, oferecia- -lhe tudo que ele poderia desejar, mas não aquilo que ele mais queria. Muitas vezes ele lembrava-se de Thora, sua primeira mulher. Isso já fora há uma eternidade, mas nas suas lembranças ela continuava tão viva quanto antes. Ou Mory, sua segunda mulher. Ambas viviam, em igualdade de direitos, uma ao lado da outra, na sua memória, já que na realidade parecia não haver lugar para uma terceira mulher.

Mas ainda assim devia haver um lugar.Pelo menos para sentimentalismos.

Page 37: P-423 - Comando Especial Atlan - Clark Darlton

Rhodan teve que rir muito, quando repentinamente pensou em Gucky. O rato-castor provavelmente teria sacudido a cabeça, muito admirado, se neste instante pudesse ler os pensamentos de Rhodan. Ele, como substituto para companhia humana!

De qualquer modo, Rhodan nesta noite resolveu fazer uma visita ao seu amigo Gucky. Provavelmente, pensou Rhodan, o último dos ratos-castores estava sentado, muito chateado, diante do seu aparelho de vídeo, esperando ansiosamente por novas ordens para entrar em ação. Por melhor que o ilt estivesse no seu bangalô, ele realmente só ficava muito contente quando acontecia alguma coisa. E na Terra realmente não acontecia muita coisa, ultimamente.

Rhodan tomou o seu próprio taxi-aéreo e estacionou, a menos de cem metros do bangalô de Gucky, no pequeno estacionamento existente para isto. O resto do trecho ele fez a pé.

Era uma noite quente de verão. A proximidade do lago diminuía o calor, que provavelmente reinava lá do outro lado, no deserto que o limitava. Mas na realidade aquilo não era mais um deserto, como há um milênio e meio atrás. O controle do tempo atmosférico tinha transformado o deserto num paraíso, mas aquela área desabitada continuava sendo chamada de “o deserto”, apesar de mais parecer um parque agora.

Rhodan ficou um pouco admirado ao constatar que no caso de Gucky todas as luzes estavam acesas. Isto era incomum, pois Gucky gostava de solidão e calma. Desde que não havia mais ilts, entretanto, o rato-castor não oferecia mais festas.

Hoje a coisa parecia diferente.Rhodan hesitou um pouco, mas logo resolveu não desistir de sua planejada visita de

surpresa. Quem quer que fosse hóspede na casa de Gucky, Rhodan certamente não deixaria de ser recebido.

Tudo estava quieto. Nenhum ruído saía do bangalô, e Rhodan lembrou-se das descrições indignadas de Bell dos festins de suco de fruta do rato-castor. Aquilo sempre fora um barulhão que perturbava os vizinhos. E Bell tinha o seu domicílio diretamente ao lado do bangalô de Gucky.

“Tudo escuro na casa de Bell”. — constatou Rhodan. — “Talvez ele estivesse na casa de Gucky...”?

Ele entrou no jardim e depois apertou o botão do intercomunicador. A porta estava trancada.

Demorou algum tempo, depois a voz do rato-castor piou:— Se quiser entrar, pelo menos se coloque diante da câmera. A minha tela de vídeo

está escura.Rhodan deu um passo para o lado. E olhou diretamente para a lente de uma câmera

de televisão. Ele ouviu um bufar perplexo.— Ó meu santo, é você?— Correto, sou eu apenas. Você não vai me deixar entrar? Pausa.— Eu tenho visitas, Perry. Só sujeitos chatos, se você quer saber. Nós estamos

conversando sobre a filosofia de composições quadridimensionais em estado de absoluta euforia.

Rhodan esperou até que a porta se abriu.— Ó, isso me interessa muito. Posso entrar?Gucky sentiu-se totalmente atropelado. De boa vontade deu um passo para o lado,

Rhodan passou por ele e entrou na sala de estar, que ele já conhecia de visitas anteriores.

Page 38: P-423 - Comando Especial Atlan - Clark Darlton

Divertido, ele olhou o pessoal que estava reunido ali. Se estava surpreso, o seu rosto nada demonstrou.

— Boa noite, meus amigos. É mesmo muita coincidência que esta noite todo mundo se reúne na casa de Gucky. Poderiam ter-me falado disso antes. E então, o que me dizem da filosofia de composições quadridimensionais? Aliás, eu acho essa designação pouco adequada. Por que não se pode tratar de inteligências? Por formações podemos entender tudo. Mesmo formações geométricas. E a que filosofia estas deveriam entregar-se?

Gucky estava parado do lado de Rhodan, fazendo caretas, totalmente sem saber o que fazer.

Atlan levantou-se e veio ao encontro de Rhodan.— Bem-vindo, Perry. Você naturalmente está admirado, porque todos nós estamos

reunidos na casa de Gucky, não é mesmo? Bem, a explicação é simples: Nós estávamos conversando sobre a possibilidade de desmascarar um cappin. Infelizmente, até este momento, não chegamos a nenhuma conclusão — ele sorriu. — Em certo sentido, isso naturalmente tem alguma coisa que ver com inteligências quadridimensionais, na realidade até mesmo com hexagonais. Portanto Gucky não estava mentindo.

— Isso, aliás, eu não imaginei, nem por um segundo — Rhodan olhou aquela roda, que o fitava com um silêncio embaraçado. — Será que estou incomodando?

Gucky trouxe um copo, que colocou sobre a mesa.— Ainda há um lugarzinho vago, Perry. Só tenho suco de fruta. Esses caras foram

avarentos demais, e não trouxeram nenhuma bebida com eles — ele olhou Rhodan, de forma penetrante. — Você naturalmente também nem pensou nisso?

Rhodan deu uma gargalhada e sentou-se.— Eu naturalmente não sabia que você estava dando uma festa de garrafa, caso

contrário teria trazido uma garrafa de leite comigo.Atlan e Gucky sentaram-se novamente. A conversa parecia não querer engrenar

bem, pois em nenhuma circunstância Rhodan podia saber que tinha chegado bem no meio de uma reunião do Comando Especial. Ninguém podia saber se Rhodan hospedava um cappin ou não.

— Deighton mandou prender Julian Tifflor — disse Rhodan de repente, sem transição. — Em sua opinião, Tifflor se portou de modo suspeito, ao mandar preparar a sua nave para partida.

— E só por isso Deighton mandou logo prendê-lo? — Atlan estava sinceramente espantado. — Eu acho isso bastante exagerado.

— Eu também — disse Rhodan, com convicção. — Infelizmente ainda não tive oportunidade de falar sobre isso com Galbraith, mas mandei avisar Tifflor, de que estou me interessando pelo caso. Se realmente houver um cappin dentro de Tifflor, este não ficará mais muito tempo. Com um corpo-hospedeiro, suspeito, e até já detido, um cappin não pode mais fazer muita coisa. Ele procederá a uma nova pedo-goniometria, procurando por uma nova vítima.

Atlan perguntou:— Onde está Galbraith Deighton neste momento? Rhodan lançou-lhe um olhar espantado.— Deighton? Não tenho a menor ideia, provavelmente em casa, se não estiver fora,

a serviço.— Isso seria fácil de verificar, não?— Certamente! Gucky tem de tudo nesta casa.

Page 39: P-423 - Comando Especial Atlan - Clark Darlton

— Correto, só não tenho mais cachaça de cereais — disse o rato-castor, apontando para a aparelhagem de intercomunicação ao lado do bar. — Sirva-se, Perry.

— Por que eu? Era Atlan quem queria saber se...— Está bem, já estou a caminho.Dez minutos mais tarde, o rosto do Chefe da Contra-Espionagem apareceu na tela

do telecomunicador. Chateado, ele queria saber quem o incomodava a uma hora tão tardia, no seu fim de semana. Quando Atlan deu-se a reconhecer, ligando a própria câmera, ele imediatamente mostrou-se mais cordial.

— Ah, é o senhor, Atlan? De onde está chamando? Eu acabei de chamá-lo em sua casa, mas ninguém respondeu.

— Eu estou na casa de Gucky. Perry também está aqui. Nós ouvimos dizer que o senhor deteve Tifflor. Por quê?

— Eu já imaginava que esta pergunta seria feita, Atlan. O senhor precisa entender que tenho que proceder com muito cuidado. Cada um que se torna suspeito, pode ter um cappin dentro de si. Tifflor também. Ele mandou preparar a sua nave para partir, sem comunicá-lo nem a mim nem a Rhodan. Isso é incomum, no mínimo.

— Tifflor tem o direito de partir quando quiser — lembrou-lhe Atlan. — Por isso não vejo motivo para suspeitar dele. Ou ainda há outras razões, sobre as quais não fomos informados?

— As coordenadas do destino, Atlan. Eu naturalmente fiz minhas investigações, como pode imaginar. Afinal de contas, não posso mandar prender um Marechal-Solar assim, sem mais nem menos. Mas o oficial navegador tinha recebido ordens de Tifflor de programar a rota para Mercúrio. Mercúrio, Atlan! O senhor lembra-se do caso Brandner. Esse também queria ir para Mercúrio. Talvez houvesse realmente um cappin dentro dele, mas ainda teve tempo suficiente para trocar de corpo, encontrando Tifflor para isso.

— É possível, mas pouco provável. Apesar disso, tenho que conceder que o seu argumento soa lógico. Portanto conserve Tifflor detido, até sabermos mais a respeito. Obrigado, e desculpe o incômodo.

— Amanhã estarei no meu birô. O senhor pode me alcançar ali a qualquer hora.— Até então — disse Atlan, e interrompeu a ligação.— Hum — fez Rhodan, provando o suco de fruta de Gucky. — Quem sabe quem

vai ser detido amanhã. O cappin, se realmente estiver metido dentro de Tifflor, já terá tido tempo suficiente para escolher uma nova vítima para si.

— Que pode ser qualquer um de nós — verificou Atlan sobriamente, olhando Rhodan de frente. — Qualquer um! — repetiu ele.

Rhodan levantou-se, depois de ter esvaziado o seu copo.— Eu não gostaria de incomodar este honorável círculo, por mais tempo. Afinal de

contas, cheguei de forma inesperada, sem me fazer anunciar antes. Alguém sabe onde Bell se meteu? Gucky, você também não? Dê uma espiada.

Gucky concentrou-se por alguns segundos, enquanto os outros ficaram olhando, muito tensos. Depois o rato-castor sacudiu a cabeça, fazendo uma cara embaraçada.

— Sinto muito, Perry, mas eu realmente não aconselho que você procure Bell agora. Você não vai me acreditar, mas ele está mesmo no seu bangalô, aqui do lado. Você não viu nenhuma luz, quando veio para cá?

— Não, tudo estava escuro. Gucky deu sua risadinha irônica.— Esse velho gozador. Mas ele está mesmo em casa.— Sem luz nenhuma? — Rhodan balançou a cabeça.

Page 40: P-423 - Comando Especial Atlan - Clark Darlton

Gucky continuava rindo, maroto. Ele não conseguia parar de rir.— Santo Deus, luz para quê? Bell sempre foi um homem muito poupador. Para que

um cego vai precisar de luz?Rhodan não entendeu imediatamente, apesar de ser famoso por comutar

rapidamente.— Cego? Como é que devo entender isso?Gucky riu, até que lágrimas lhe brotaram dos olhos. Somente mais uma pessoa

naquele círculo sabia por que ele estava rindo — e também ria muito — Fellmer Lloyd, o telepata.

— Você nunca ouviu dizer, Perry, que o amor é cego? Rhodan foi até a porta e virou-se mais uma vez.— Discrição nunca foi exatamente uma de suas forças, Gucky — verificou ele,

tentando esconder o riso. — Nós nos veremos amanhã, no quartel-general. Não podemos deixar Tifflor na prisão.

Somente quando os passos de Rhodan foram ouvidos no caminho de saibro, a conversa engrenou novamente.

Gucky disse:— Será que ele notou alguma coisa? Atlan sacudiu a cabeça.— Como poderia? Naturalmente que a reunião lhe pareceu suspeita, mas ninguém

poderia proibir-nos de nos reunirmos aqui no bangalô de Gucky, para uma festinha.— Uma festinha com suco de frutas, sempre será suspeita — verificou Ras

Tschubai. — Nós devíamos ter vinho, cachaça e algumas garotas. Isso teria parecido bem normal a Rhodan. Mas assim...

Gucky pigarreou.— Eu vou cuidar de ambas as coisas, para camuflagem. Mas não hoje — ele olhou

em volta, interrogativamente. — Alguém ainda quer um pouco de suco de amora?Todos sacudiram a cabeça, horrorizados.

* * *

No outro dia, Atlan e Gucky visitaram Julian Tifflor. Naturalmente não conseguiram verificar nada de suspeito, mas fizeram algumas perguntas. No decorrer da conversa cristalizou-se então que Deighton tinha agido de maneira absolutamente lógica, na sua qualidade de chefe da Contra-Espionagem. Qualquer outro teria que suspeitar de Tifflor também.

— Sim, meu caro Julian, neste caso nada se pode fazer. Fique aqui mesmo, pois assim estará em segurança. Ninguém poderá fazer-lhe alguma coisa, mas se realmente um cappin estiver metido no seu corpo, ele logo ficará chateado com a prisão, caindo fora. Infelizmente não temos meios de verificar se ele está dentro do senhor. É preciso ter paciência.

Tifflor se dominou.— Deighton é um estúpido! — constatou ele, simplesmente. — Ele não tem culpa,

tudo bem, mas afinal de contas eu deveria saber se fui assumido por um cappin ou não.— Isto simplesmente não é possível — corrigiu-o Atlan. — O senhor não pode

provar a sua inocência de modo algum. Por outro lado, o cappin procurado pode estar metido, do mesmo jeito, em mim ou em Rhodan. — Ele fez uma curta pausa, e acrescentou: — Ou em Deighton.

Tifflor lançou-lhe um rápido olhar, mas não disse nada.

Page 41: P-423 - Comando Especial Atlan - Clark Darlton

— Então até mais tarde, Julian — disse Gucky, dando a mão ao seu amigo. — No momento, infelizmente, não podemos fazer nada por você. Rhodan também ainda vai-lhe fazer uma visita.

— Prazer em saber disso — respondeu Tifflor, de mau humor.Lá fora, no pátio interno do edifício principal, de repente Gucky ficou parado. Ele

olhou para cima, para o céu brilhante, azul.— Você suspeita até de Deighton, não é mesmo? Atlan também parou.— O que quer dizer suspeitar, Gucky? Todos somos suspeitos. Até mesmo

Deighton, isso eu já repeti várias vezes.— Por que não o visitamos? — sugeriu o rato-castor. — Desse jeito, a coisa não vai

adiante. Em todo o mundo, nos planetas, em toda parte, pessoas são detidas porque supostamente se tornaram suspeitas. A julgar por isso, certamente não devia tratar-se de um cappin isolado, que se mantém escondido entre nós, e sim de milhares. Eu acho que Deighton é radical demais, mais que o necessário.

— Este é o seu dever — Atlan defendeu o chefe da Contra-Espionagem.Gucky olhou-o de esguelha.— O seu dever, é claro. Mas isso o cappin também sabe. Atlan continuou andando.— Vamos visitar Deighton, ou vamos desistir disso? Eu acho que não devíamos

preveni-lo desnecessariamente, ou até mesmo ao cappin, que talvez habite dentro dele. Com isso ele apenas ficaria mais cuidadoso, e aí mesmo não se revelaria. Eu sugiro que você vigie os seus pensamentos, apesar de não ter certeza, se isso vai adiantar alguma coisa. Afinal, ele não sabe que há um cappin dentro dele — se um cappin estiver dentro dele.

Gucky olhou para o seu relógio.— Quer saber de uma coisa, Atlan? Hoje é domingo, e além do mais o tempo está

lindo, cappin ou não cappin, para mim vou encerrar o expediente. Se você precisar de mim estou em casa. Para acalmá-lo posso garantir-lhe que irei escutar o noticiário no canal especial da Contra-Espionagem. Talvez eu tope com alguma coisa que nos leve adiante.

— Ótimo, baixinho, não tenho nada contra. Amanhã nos encontramos, conforme o combinado, em casa de Fellmer. Comparamos as notícias que nos pareceram suspeitas, e as coordenamos. Até então.

Eles deram-se as mãos, depois se afastaram em direções contrárias.Quando Atlan se virou mais uma vez, Gucky já tinha desaparecido.

Page 42: P-423 - Comando Especial Atlan - Clark Darlton

5

No dia 5 de junho Atlan e seus aliados não tinham avançado um passo sequer. Especialmente Gucky e Ras Tschubai suportavam a carga principal do trabalho, pois tinham a possibilidade de chegar de um ponto a outro da Terra, sem despertarem atenção. E Atlan fazia muito uso dessa possibilidade.

Onde quer que um homem se comportasse de forma incomum, desviando-se dos seus hábitos conhecidos, ele intervinha com os mutantes. Mas sempre havia uma explicação bem natural para o comportamento destas pessoas suspeitas. Nenhuma delas estava sob as ordens de um cappin.

Naturalmente — mesmo isto, somente poderia continuar uma suposição.Tifflor entrementes foi solto por ordem de Perry Rhodan, quando se chegou a uma

cena quase fantasmagórica, pois Deighton acusou Perry de ser o cappin escondido.Isto sem dúvida era o seu direito, pois qualquer um podia ser o cappin procurado,

até mesmo Rhodan. Atlan não sentiu-se especialmente confortável, quando pediu que Alaska Saedelaere se colocasse do lado de Rhodan. Os acontecimentos na Intersolar afinal tinham comprovado sem sombra de dúvida que a presença de Alaska revelava um cappin.

Rhodan não reagiu.E Atlan verificou, com alguma decepção, de que também Deighton não reagiu.Pelo menos não do modo como ele esperara.Deighton desculpou-se com o seu dever, que ele tinha que cumprir em qualquer

situação, e liberou Rhodan. Muito para o alívio dos homens da Contra-Espionagem Solar, que tinham sido encarregados da detenção.

Rhodan não fez nenhum comentário. Mudo, ele deixou o quartel-general, acompanhado de Tifflor e de Atlan. No estacionamento dos táxis aéreos eles se separaram.

— Deighton leva a sua tarefa muito a sério. Isso foi tudo que Rhodan tinha para dizer. Atlan anuiu.— Sim, muito. Eu estou curioso em saber quando ele vai prender a si mesmo.Rhodan olhou para Atlan.— Quer dizer que você ainda suspeita dele? Por que ele me deteve?— Não por isso, Perry. Ele teve que fazê-lo, pois você se comportou de modo

suspeito. Você tirou Tifflor da prisão.— E isso é motivo? Se o cappin estivesse dentro de Tifflor, eu não teria motivo de

libertá-lo, e com toda certeza um cappin não poderia habitar dois corpos a um só tempo. Se o cappin, entretanto, estivesse dentro de mim, que motivo eu teria então para tirar Tifflor da prisão? Nenhum, Atlan, absolutamente nenhum. Muito pelo contrário. O cappin ficaria contente por ter desviado a atenção dele. Que motivo, portanto, havia para Deighton me prender?

— Justamente! — disse Atlan e programou o seu táxi aéreo para o voo para casa. — Justamente!

Rhodan colocou o braço nos ombros de Tifflor.— Boa noite, Atlan. Vamos nos ver amanhã? Eu estarei no birô.

Page 43: P-423 - Comando Especial Atlan - Clark Darlton

— Talvez eu apareça — prometeu Atlan e embarcou. Quando pairava alto por cima de Terrânia, ele refletiu sobre a sua suspeita, que não

podia comprovar com nada firme.Ele não tinha quaisquer provas, nem mesmo indícios. Atlan teve que confessar a si

mesmo que sua suspeita somente se apoiava numa sensação desagradável, com a qual naturalmente não se podia fazer absolutamente nada. Ele sabia que Galbraith Deighton sempre fora um homem comedido, que não se deixava apressar para nada, que não se deixava incitar a praticar uma ação apressada. Ele era tido, inclusive, como um sujeito pacífico. E mesmo assim ele matara a tiros um homem, de forma totalmente desnecessária — um homem que já estava desarmado, um homem, portanto, inofensivo.

Para isso não havia explicação.Somente uma única:Deighton tinha sido assumido por um cappin, e isto já há semanas, ao mesmo

tempo, ou mais tarde, que o Tenente Beruda. Provavelmente o cappin dentro do sargento Kampatschin tinha trocado para Deighton, quando se ofereceu uma oportunidade apropriada para isso.

Atlan bateu com a mão espalmada na testa.— Naturalmente, é isso! — ele sacudiu a cabeça. — Geralmente a gente pensa nas

coisas mais simples por último. Eu deveria mandar comprovar isso. Kampatschin, essa é a solução.

E nisso tudo ainda havia um ponto, no qual era preciso refletir. Atlan tentou colocar-se na situação de um cappin. Quais das personalidades dirigentes do Império Solar ele assumiria, se tivesse escolha?

A resposta era muito clara:Galbraith Deighton, chefe da Contra-Espionagem Solar.De modo algum, entretanto, Rhodan, pois deste se suspeitaria em primeiro lugar.Deighton, sempre Deighton.Ele reprogramou o táxi e cinco minutos mais tarde pousou no estacionamento diante

do bangalô de Gucky.

* * *

No outro dia Rhodan chamou, de surpresa, todas as pessoas importantes da Administração, para uma reunião. Atlan, Bell, Deighton, Tifflor e Abel Waringer apareceram pontualmente. Um pouco mais tarde apareceram também os três mutantes, Lorde Zwiebus e Alaska.

Rhodan não se deteve com longos preâmbulos.— Nós achamos que a situação ficou insustentável, mesmo quando aparentemente

nada acontece e os cappins se mantêm calmos dentro do seu satélite, não empreendendo nada. Nós sabemos que nunca poderemos destruir este satélite, do mesmo modo como uma sombra bidimensional numa folha de papel não pode derrubar um dado tridimensional. O satélite é protegido por campos energéticos da sexta dimensão. Os cappins, portanto ficarão, porque não podem ser atacados. Mas eles também não podem fugir. Nosso Sistema Solar oscila praticamente no tempo, de um lado para o outro, como um pêndulo. Eu agora quero explicar-lhes a sugestão de Deighton, para a qual peço a sua opinião:

“Deighton sugere que desliguemos o campo de tempo, pela duração de uma hora, para assim darmos oportunidade aos cappins para baterem em retirada, honrosamente.

Page 44: P-423 - Comando Especial Atlan - Clark Darlton

Nós lhes possibilitamos a fuga através do Corredor do Presente. Para isto eu passo a palavra para Galbraith Deighton. Ele gostaria de fundamentar a sua tese.”

Atlan quase ficou sem voz. Ele imaginou que agora chegara a hora da decisão. Ele ainda não conseguira falar com Fellmer Lloyd, a quem encarregara de fazer investigações referentes ao sargento Kampatschin.

Deighton levantou-se.— Nós todos concordamos com o Administrador-Geral. A situação está

insustentável. Nós temos que nos livrar dos cappins, e disto não pode mais haver qualquer dúvida. Se eles ficarem onde estão agora, eles significarão uma ameaça permanente, contra a qual nada podemos empreender. Portanto vamos dar-lhes a possibilidade de fuga. Naturalmente isto somente pode acontecer, dando-se atenção a todas as medidas de segurança, para que nenhum cappin consiga penetrar em nosso campo de tempo, quero dizer, no presente relativo, onde poderia penetrar num ser humano, assumindo-o. Eles devem fugir, todos. Só deste modo podemos ter certeza de escapar dessa ameaça eterna. Infelizmente eu não vejo outra oportunidade de enfrentar o perigo. Eu lhes peço que reflitam no meu plano, e que me comuniquem suas opiniões a respeito.

Atlan foi até a porta, sem dar sua opinião. Rhodan perguntou-lhe:— Você está querendo nos abandonar? Atlan parou por um momento.— Eu logo estarei de volta, Perry. Entrementes, discutam vocês. Eu preciso liquidar

um assunto, e logo lhes comunicarei o resultado dos meus esforços. Até então.A porta fechou-se atrás dele.Como primeiro, Abel Waringer protestou contra a sugestão de Deighton. Ele baseou

seus protestos, dizendo que seria totalmente insensato deixar os cappins fugirem, pois eles voltariam, em todas as circunstâncias, e desta vez sob melhores pressupostos, para transformar em realidade suas intenções desconhecidas. Somente uma coisa seria possível: Isolamento absoluto do Satélite da Morte e manutenção do campo de tempo. Justamente o campo de tempo seria a única garantia para a segurança do Sistema Solar contra invasões de qualquer tipo.

Outras pessoas concordaram com Waringer, e o rosto de Deighton ficava cada vez mais duro. Gucky tentou ler nos seus pensamentos, mas não conseguiu passar totalmente. Ali havia a firme intenção de desligar o campo de tempo, para dar oportunidade aos cappins de uma fuga. E adiante ainda havia o pensamento de que, com isso, estaria servindo à Terra.

Atlan voltou. Ele caminhou até Fellmer Lloyd e trocou algumas palavras com ele. Depois ele viu os rostos apreensivos dos reunidos voltados para ele. E ele entendeu a pergunta muda.

— Eu tomei a liberdade — disse ele, ao chegar novamente ao seu lugar — de fazer perguntas ao computador Natã na Lua. Dei-lhe todos os dados conseguidos e pedi-lhe uma rápida conclusão. Esta levou apenas um minuto. O resultado deveria ser muito claro. Infelizmente a favor de sua sugestão, Galbraith Deighton.

— Ora, o que é que sabe um computador? — deixou escapar o chefe da Contra- -Espionagem.

Atlan sorriu.— Tudo, Deighton, quase tudo. Natã diz que os cappins apenas estão interessados

em fazer com que o Sistema Solar caia de volta ao presente, para poderem fugir sem

Page 45: P-423 - Comando Especial Atlan - Clark Darlton

serem molestados. Somente no plano do presente, trabalham os seus pedo-goniometradores, com cuja ajuda eles fazem uma pedo-transferência. Todos nós sabemos que, com isso, eles podem deixar para trás distâncias gigantescas em tempo-zero. Uma ideia que para nós ainda soa utópica, tal como em outros tempos foi utópico, para os seres humanos, imaginarem o domínio de distâncias de uma estrela para a outra. Quando Deighton recomenda o desligamento do campo de tempo, ele está agindo no interesse dos cappins. Mas ele também age em nosso interesse. Pois deste ou daquele modo, temos que resolver nosso problema com os cappins, somente eu não posso concordar com o pensamento de que uma fuga dos cappins seja a solução definitiva. Isso seria tudo que eu tenho a dizer sobre este assunto.

Ele sentou-se.Rhodan olhou para o chefe da Contra-Espionagem.— O que acha disso, meu caro Galbraith? — quis ele saber, sem qualquer ironia.Deighton sacudiu a cabeça.— Fuga para os cappins, naturalmente deve ser apenas uma solução de emergência.

Eu pessoalmente opinaria por uma solução mais radical, como pode imaginar. Destruição do Satélite da Morte. Eu sei que nós já o tentamos algumas vezes, mas talvez então tenhamos nos esquecido de uma coisa. Certo, Mr. Waringer, eu sei que não podemos usar uma bomba de Árcon. Ela também arrancaria consigo a matéria solar para o hiperespaço, e com isso apenas apressaria nossa destruição. Todos os outros meios, entretanto, parecem ser fracos demais. Mas porque não pegamos uma Brander, uma das novas naves especiais, para um voo até a corona solar, carregada com dez mil bombas de fusão, de quatro mil gigatoneladas de poder explosivo cada uma, fazendo com que ela se precipite depois sobre o satélite? A tripulação pode abandonar a Brander, em tempo útil, em naves auxiliares. Eu acredito que o satélite e os seus escudos energéticos protetores dificilmente poderiam aguentar toda esta carga. Isso apenas para adiantar-me a perguntas desnecessárias.

Ele sentou-se.Desta vez Atlan manteve-se passivo. Ele estava sentado no seu lugar, entre Gucky e

Waringer. Deighton estava sentado à sua frente. O chefe da Contra-Espionagem estava convencido da excelência de sua sugestão, isto era possível ver-se nele. E se ele estava falando sério, não havia nada a objetar contra a mesma, a não ser, talvez, que os cappins até então não tinham feito nada que pudesse justificar a sua radical destruição.

— Há perguntas que queiram fazer a Deighton? — quis saber Rhodan.Waringer levantou-se.— Eu duvido que vamos dar um jeito neles, com dez mil bombas de fusão, mas de

qualquer modo eu acho esta segunda sugestão de Deighton melhor que a primeira. O campo de tempo precisa ficar mantido. Mas eu não tenho nada contra o satélite ser destruído. Eu estou convencido que com isso nós não destruiremos os cappins. No momento de grande perigo, eles vão encontrar uma saída, que nós não conhecemos. Entretanto, existe a possibilidade de que eles falhem no seu objetivo, não podendo regressar até nós, de modo algum. Por isso, eu concordo com a sugestão de Deighton.

Com isto, o plano fora aceito, pois ninguém mais fez objeções.Atlan captou um olhar inquiridor de Rhodan, mas não reagiu. Até a realização do

plano, ainda se passariam alguns dias, tempo suficiente de qualquer modo para uma preparação correspondente.

— A reunião está encerrada — disse Rhodan, no murmúrio de vozes. — Eu lhes desejo ainda um fim de semana muito bom...

Page 46: P-423 - Comando Especial Atlan - Clark Darlton

* * *

Gucky contou as garrafas no seu bar.— Se isso continuar assim, eu estou abastecido até o ano que vem — disse ele,

satisfeito. — Realmente nada melhor do que uma festa onde cada um traz bebida. Foi gente esperta que inventou isso — ele olhou o relógio. — Estou curioso para ver quando eles vêm hoje — ele suspirou. — E a isso chamam de domingo. Dia de descanso. Lazer. Férias.

Ele programou o robô de cozinha, informando-lhe o número de pessoas que eram esperadas. Hoje eles teriam um panelão só de legumes, nada de carne. Para que eles aprendessem a não perturbar o seu descanso de domingo.

Atlan apareceu bem antes dos demais.— Por que exatamente hoje, esta reunião? — quis saber Gucky. — Isso não poderia

ter esperado até amanhã?— Amanhã temos que resolver outras coisas, e chamaria a atenção se nos

reuníssemos aqui. Ontem não tivemos mais oportunidade de discutir a sugestão de Deighton. Ela parece ser boa. Mas quando os outros estiverem aqui, eu ainda tenho alguma coisa para dizer a respeito. Você compreende que eu não queira relatar tudo dupla ou triplamente.

— É claro. Ah, aí vem o seguinte...Vinte minutos depois todos estavam reunidos. Atlan disse, depois de um rápido

prólogo:— Eu conheço Deighton há meio milênio, e acho que o conheço muito bem.

Sempre foi do jeito dele, apresentar sugestões, e depois fundamentá-las logicamente. Se fosse preciso, ele conseguia também fazê-las aceitas, com decisão. Mas a teimosia com que ele perseguiu a sua ideia de desligar o campo de tempo é pelo menos incomum. Na reunião ele pareceu dar para trás rapidamente, quando Waringer objetou. E logo colocou na mesa o seu novo plano, de destruir o satélite com a Brander. O que, entretanto, não é conhecido de todos, é o fato de que, depois da reunião, ele procurou Rhodan, querendo convencê-lo de que o desligamento do campo de tempo era realmente a única solução. Rhodan ainda me falou ontem de noite, a respeito da conversa. Ele estava mais assustado do que admirado da teimosia de Deighton. Naturalmente ele recusou, afirmando que o ataque ao satélite já tinha sido resolvido na reunião. Até mesmo ele, Rhodan, não podia simplesmente ignorar esta decisão. Depois disso Deighton saiu furioso da casa de Rhodan, e desde então ninguém mais o viu.

— Ele se comporta de modo muito suspeito — achou Ras Tschubai. — Ou então, ele simplesmente está convencido sinceramente de estar agindo certo.

— Ambas as coisas não são suficientes para supormos um cappin dentro dele, ou mesmo termos certeza disso — Atlan esperou até que Gucky trouxe bebidas. Depois continuou: — Mas ainda há uma outra coisa que entrementes fiquei sabendo, através de Fellmer Lloyd. Os senhores lembram-se do sargento Kampatschin, que foi abandonado em tempo pelo cappin que estamos procurando, numa hora que nos é desconhecida. Ele trocou de corpo, conforme suspeitamos, escolhendo uma personalidade mais importante, que naquela hora estava nas proximidades de Kampatschin. Como a nossa suspeita se concentra cada vez mais em Deighton, eu mandei investigar isto, e Fellmer pôde verificar que Rudulus Kampatschin, depois do encontro com os cappins, no qual ele foi levemente ferido, passou uma licença de saúde na Terra. Nesta ocasião ele foi saudado, com outros

Page 47: P-423 - Comando Especial Atlan - Clark Darlton

feridos no combate, por altos oficiais da frota e pelo chefe da Contra-Espionagem Solar, Galbraith Deighton. E foi saudado com um aperto de mão.

Quando Atlan calou, ninguém disse nada. Apenas o olharam mudos, cada um ocupado com seus próprios pensamentos e suposições.

— Portanto o cappin dentro de Kampatschin tinha tempo suficiente para goniometrar-se sobre Deighton, e abandonar o sargento. Ele sabia que Deighton era a personalidade mais importante para os seus planos. Eu receio que agora não precisamos mais de outras provas. Golpear, naturalmente ainda não podemos. Apenas podemos esperar e vigiar. Especialmente neste empreendimento iminente, que sem dúvida trará uma decisão. Em parte nós também participaremos dele.

— De que jeito? — perguntou Alaska. — Isso certamente daria na vista.— Não necessariamente, meu amigo. Nós temos dois teleportadores, que no

momento adequado nos levarão para bordo da Brander. Por enquanto não fazemos nada. Os preparativos já estão sendo feitos e não queremos interrompê-los. O empreendimento de Deighton, para nós é a única chance de desmascarar o cappin.

— E se não for Deighton?— Neste caso será um outro, que, entretanto, estará na Brander, em qualquer

circunstância. O cappin certamente não deixará escapar uma chance como essa.Eles ainda falaram sobre detalhes, depois se separaram.Quando todos tinham saído, Gucky verificou com satisfação que aquela reunião lhe

deixara um saldo de mais duas garrafas de bebida.Só que ele não teve muito tempo para alegrar-se com o seu triunfo.Naquela tarde Bell o visitou.

* * *

A nave espacial especial Brander tinha formato globular e um diâmetro de oitocentos metros. Pertencia à classe Dragon, e deste modo tinha a capacidade de penetrar profundamente na atmosfera solar, sem ser danificada pelo calor inimaginável que reinava ali.

Originalmente a Brander tinha sido pensada como nave de exploração, porém o surgimento dos cappins e, antes disso, o descobrimento do Satélite da Morte, a tinham desviado um pouco de sua finalidade.

Deighton insistiu para que na expedição iminente somente cinquenta homens constituíssem a tripulação, para que o risco de perda de vidas humanas não fosse muito elevada. As naves auxiliares de salvamento que se encontravam a bordo eram suficientes para colocar todos os homens em segurança, logo que a Brander chegasse ao seu destino, e fosse lançada contra o satélite.

O próprio Deighton vigiava os últimos preparativos. Ele escolhera pessoalmente os cinquenta homens que o acompanhariam. Tratava-se exclusivamente de voluntários, quase todos pertencentes diretos à Contra-Espionagem Solar.

Abel Waringer insistiu em também participar do voo decisivo, mas Deighton recusou decisivamente. Era muito perigoso, acentuou ele, colocar a vida de um cientista tão eminente em jogo.

Atlan achou que chegara a hora de falar abertamente com Rhodan. Ele agora tinha certeza absoluta de ter encontrado o cappin procurado. Poucos dias antes da partida da Brander, ele o procurou no seu birô.

Quando a porta fechou-se atrás dele, e ele estava sentado diante de Rhodan, perguntou:

Page 48: P-423 - Comando Especial Atlan - Clark Darlton

— Todas as ligações da intercomunicação estão desligadas? Podemos ter certeza de não sermos escutados?

Rhodan escondeu sua surpresa atrás de um sorriso.— Naturalmente podemos ter certeza. Por que, de repente, você está tão

desconfiado? Eu nunca vi você desse jeito.— Porque é vital que ninguém fique sabendo do que estamos conversando. Eu

preciso fazer-lhe algumas comunicações. Há coisas das quais você ainda não sabe nada.— Disto eu estou até firmemente convencido, Atlan. Quem é que pode saber tudo?— Sem que você o soubesse, eu criei um Comando Especial Secreto, para fazer

investigações a respeito do cappin, e fazer investigações de tal modo que o cappin em referência nunca pudesse saber nada a respeito. Eu escolhi pessoas, que com toda a probabilidade não podem ser assumidas por um cappin. Os mutantes Ras, Fellmer e Gucky fazem parte. Além de Alaska e Lorde Zwiebus. Ambos também não são apropriados para receberem um cappin. E eu mesmo também acho que sou imune.

— Não me diga, um comando especial, e eu não sabia nada a respeito — de repente Rhodan riu. — Ah, sim, agora também compreendo o embaraço de Gucky, quando naquela ocasião o visitei e vocês todos estavam reunidos na sua casa. Ele estava visivelmente constrangido, o nosso baixinho.

— Você não tinha trazido nenhuma garrafa de bebida — explicou-lhe Atlan.— Então foi isso! — Rhodan parecia visivelmente tranquilizado que não houvesse

qualquer outro motivo para aquela sua recepção não exatamente cordial. — E o que foi que o seu comando alcançou, se posso perguntar?

— Não muito — concedeu Atlan diretamente. — Não muita coisa. Mas de qualquer modo pudemos impedir que um certo Raymond Brandner jogasse bombas em Mercúrio — imitações de bombas, naturalmente, mas mesmo estas teriam causado muita inquietação. Alguns outros casos também puderam ser esclarecidos por nós. Deighton certamente teria precisado de semanas para fazê-lo. O seu cappin devia ter interesse em criar um número bastante grande de suspeitos. Deste modo, ele poderia estar mais seguro dentro de Deighton.

No rosto de Rhodan apareceu um sinal de dúvida.— Você fala como se tivesse certeza de que o cappin está dentro de Deighton. Nós

ainda não temos provas disso.— Ele também pode estar dentro de você — retrucou Atlan, secamente.Rhodan apoiou os cotovelos em cima da mesa.— Muito bem, então ele está dentro de mim. E agora? Atlan fez um gesto depreciativo.— Ele não está dentro de você, caso contrário eu não estaria sentado aqui,

contando-lhe tudo. Ele está a bordo da Brander, e com a maior probabilidade dentro de Deighton. Por questões de segurança, entretanto, eu ainda não vou iniciar em nosso plano, pois ainda existe a possibilidade de que o cappin troque de pessoa no último instante. E então tudo estaria perdido. Entretanto, você pode confiar em que o voo até o Sol será decisivo.

— Você acha que o plano de Deighton terá êxito? Quero dizer, você está convencido de que as dez mil bombas serão suficientes para destruir o satélite?

— Não, eu não acredito nisso, porque provavelmente nem chegará a ser feita essa tentativa.

Interessado, Rhodan curvou-se para a frente.— Não me diga...? Você não poderia me dizer nada mais exatamente?

Page 49: P-423 - Comando Especial Atlan - Clark Darlton

Atlan sorriu, friamente.— Não, infelizmente não posso. É que, na realidade, eu mesmo não sei nada

exatamente. Aliás, o que é que você pretende fazer, nestes próximos dias?Rhodan fingiu que deixava desviar o seu interesse.— Provavelmente estarei em Mercúrio, suponho. Vou dar uma olhada através da

eclusa do tempo, talvez uma inspeção das instalações dali. Enquanto Deighton voa para o Sol, eu estarei com certeza em Mercúrio.

— E Deighton sabe disso?— É claro que ele sabe disso.Atlan recostou-se na sua poltrona. O seu rosto mostrava satisfação.— Eu bem que o imaginava. Receio que, com isso, se fechou o círculo, Perry — ele

levantou-se. — Desculpe-me por ter tomado muito do seu precioso tempo. Eu também ainda tenho o que fazer. Nós nos veremos antes da partida.

— Espero que sim. A Intersolar e a Brander partem ao mesmo tempo. Combinei isso com Deighton. Naturalmente em rotas diferentes.

Atlan ficara parado junto à porta.— Rotas diferentes? Como é que devo entender isso?— Nós vamos voar com a Intersolar diretamente para Mercúrio, enquanto o destino

de Deighton é o Sol.Atlan anuiu e saiu.Rhodan ainda olhou por algum tempo para a porta fechada, depois pôs-se a liquidar

o seu serviço diário. O trabalho hoje não o agradava absolutamente.

Page 50: P-423 - Comando Especial Atlan - Clark Darlton

6

Os preparativos para a “Expedição Queda do Sol” estavam sendo feitos a toque de caixa. Até mesmo Bell insistiu em fazer a sua parte para que o Plano Deighton, como era chamado, tivesse êxito. Ele não saía do espaçoporto, vigiava as necessidades burocráticas na Administração, conversava com os membros da tripulação da Brander, e fez muitas outras coisas para se tornar suspeito.

Pelo menos era isto que o Tenente Halpers, um oficial tido como excepcionalmente capaz, tinha que supor. Ele observava Bell já há dois dias, chegando à clara conclusão de que o Marechal-de-Estado devia ser exatamente a personalidade adequada para servir de esconderijo para um cappin. Reginald Bell era lugar-tenente de Rhodan, e como tal era influente o bastante para ter acesso aos lugares de comando mais importantes.

O Tenente Halpers decidiu comunicar a sua suspeita ao seu superior, pois para ele, agir de modo pessoal seria bastante perigoso.

Galbraith Deighton ouviu o seu relato com bastante atenção e ficou refletindo muito, durante bastante tempo. Depois ergueu os olhos para o tenente.

— O senhor agiu corretamente, tenente, vindo me procurar. Teria pouco sentido, se neste andar da carruagem nós prendêssemos o Marechal-de-Estado agora. Com isso não ganharíamos nada, e no máximo estaríamos prevenindo o cappin. O senhor vai receber mais dois oficiais, e não terá outra tarefa a não ser ficar de olho em Bell, dia e noite. Quero ser informado imediatamente se ele se comportar de modo suspeito. Procure verificar com quem ele costuma tratar. E tenha cuidado com a vigilância. Ninguém deve notar alguma coisa. Entendeu?

— Sim, Sir. O senhor pode confiar em mim.— É o que eu tenho que fazer, tenente. Depois de amanhã a Brandner partirá.

* * *

No dia 9 de julho, um dia antes da partida, depois de uma manhã de trabalho árduo e um almoço excelente, Bell entrou no restaurante “Ao Centauro” e pediu um café gelado.

Há algumas horas ele tinha uma sensação desagradável. Ele estava praticamente seguro de que era vigiado. Certa vez fora um jovem oficial que se mantivera constantemente nas suas proximidades. Depois um estranho em trajes civis o seguira. E agora, mal ele entrara no restaurante, o civil entrou no mesmo, olhou em volta como se procurasse alguém e depois sentou-se na mesa ao lado.

Isso já não podia mais ser um acaso!Neste instante, Bell descobriu o seu velho amigo Fellmer Lloyd, numa mesa mais

afastada, realmente um acaso inacreditável. Mas neste caso Bell não deu atenção ao acaso. Fellmer era telepata e podia ajudá-lo.

Ele esvaziou sua xícara de café gelado e colocou uma moeda sobre a mesa. Depois levantou-se e caminhou lentamente através do salão, fez de conta que só agora viu Fellmer, cumprimentou-o entusiasmado e perguntou se podia sentar-se. O civil quis levantar-se, quando Bell se ergueu, mas depois ficou sentado quando notou que a sua vítima não tinha intenção de sair do restaurante.

Page 51: P-423 - Comando Especial Atlan - Clark Darlton

Bell, entretanto, teve a sensação, na mesa de Fellmer, de que não era exatamente bem-vindo. E isso naturalmente era uma coisa para a qual ele não tinha explicação.

— Está esperando mais alguém? — quis ele saber, cordialmente. — Eu não gostaria de incomodar.

— Não. O senhor não incomoda, Bell. Eu estou sozinho.Teria sido imaginação sua, ou o olhar de Fellmer caíra sobre o homem em trajes

civis? Bell não tinha certeza. Mesmo assim ele disse:— O senhor poderia fazer-me um favor, Fellmer? Está vendo aquele homem, lá do

outro lado — sim, o senhor está olhando diretamente para ele. Esse sujeito está atrás de mim, já há horas. O senhor é telepata. O que é que ele quer de mim?

Fellmer olhou atentamente para o homem, depois sacudiu a cabeça.— O senhor deve estar enganado, Bell. O homem não quer nada do senhor. É puro

acaso, se ele já o encontrou várias vezes.— Mas eu não sofro de alucinações, Fellmer! — Bell sacudiu a cabeça. — Ele

substituiu outro, quando eu ainda estava no espaçoporto. Desde então ele me vigia. Se o senhor não pode verificar nada, eu mesmo terei que bancar o detetive.

— Eu realmente não posso verificar nada.— Muito bem — disse Bell e anuiu. — Então, divirta-se com o seu café.Sem se despedir, Bell levantou-se e saiu, muito irritado. Pelos cantos dos olhos ele

pôde ver que o estranho pagou e o seguiu.Isso nunca poderia ser por acaso, mas Bell queria ter certeza absoluta, para não

cometer um erro. Ele pegou um táxi aéreo, programou-o e apertou no botão de partida. No retrovisor ele viu o perseguidor embarcar em outro táxi.

Bell recostou-se e deixou todo o resto a cargo do automático. Ele o levaria para sua casa com segurança, colocando-o diante do seu bangalô. O perseguidor devia ter ligado o controle manual, uma vez que não conhecia o destino. Ele mantinha uma grande distância, e por várias vezes mudou de rota. Somente quando Bell instruiu o táxi para o pouso, ele acelerou novamente.

Bell enfiou uma moeda no autômato de pagamento e programou o auto-piloto para o voo de volta. Depois desembarcou e ficou olhando enquanto o táxi partia, voltando para Terrânia. Calmamente ele então caminhou diante do seu bangalô, entrando no jardim da casa vizinha. Pela porta aberta do terraço, ele viu que Gucky estava em casa.

O estranho tinha pousado, mas ficou sentado dentro do seu veículo.Bell não se importou mais com ele.Ele encontrou Gucky no jardim. O rato-castor já tinha notado a sua chegada e veio

ao seu encontro.— Seu velho sumido, o que é que o traz à minha casa? — De repente ele olhou por

cima do ombro de Bell, na direção do táxi aéreo estacionado. — Ah, então é isso? E você gostaria de saber o que esse cara quer de você, não?

Bell ficou contente por ter-se poupado uma grande explicação. Ele anuiu.— Claro, eu sabia que você me ajudaria. Esse sujeito é da Contra-Espionagem?— Sim, e ele está firmemente convencido de que você é um cappin.Bell olhou para o rato-castor, muito perturbado.— Um cappin? Eu, um cappin? Ele deve estar maluco.— Por quê? Hoje em dia todo mundo é suspeito, meu caro. Vai ver que você se

interessou demais pelos assuntos de Deighton, não?

Page 52: P-423 - Comando Especial Atlan - Clark Darlton

— E o que é que isso tem a ver com este caso? — Bell apontou para a casa. — Não podemos entrar? Aqui está muito quente para mim, e além do mais estou com uma bruta sede.

— Você pode tomar limonada — ofereceu Gucky e saiu bamboleando na frente.Bell o seguiu. Ele ainda não conseguia entender por que justamente ele devia ser

suspeito de ter um cappin escondido.— Quer dizer então que Deighton mandou me campanar, ora vejam só! Que

finalidade terá isso?— Nestes últimos tempos, milhares de pessoas se tornaram suspeitas, até mesmo

Tifflor, conforme você sabe. E agora chegou a sua vez.— Mas eu não quero estar na vez — disse Bell furioso. — O que é que esse sujeito

está pensando?Gucky espionou por algum tempo, depois sorriu, maroto.— Ele está pensando que dentro de meia hora poderá ser rendido, podendo então ir

para casa. Mas ainda há outra pessoa, pensando diferente, bem nas proximidades. Logo vai entrar pela porta e fazer cara de bobo, ao ver você aqui — aí está ele.

Atlan ficou parado, ao ver Bell.— Você aqui? A gente vê você tão raramente. Teve muito trabalho?Gucky manteve-se quieto. Ele estava de consciência suja, por ter sido tão franco

com Bell. E ele também informou Atlan do que acontecera. Atlan lançou um olhar de censura para Gucky, depois disse:

— Bem, Rhodan também está iniciado, e assim não importa se nós também falarmos claro com Bell. — Em poucas palavras ele contou para Bell como ele criara o Comando Especial, e que depois toda a suspeita recaíra em Deighton. — Se ele agora está mandando vigiar você, isso não passa de uma hábil manobra de mistificação. Depois de amanhã será a partida. Até lá, ele terá que desviar todas as suspeitas de si mesmo. Eu não ficaria nada admirado se antes ele ainda manda prender todos nós — com exceção naturalmente daqueles que voam com a Intersolar para Mercúrio.

Bell olhou para Atlan, interrogativamente.— Isto tem alguma coisa a ver com tudo?— Receio que tenha muito que ver. O cappin quer prestar um serviço completo e

matar dois coelhos com uma só cajadada — ele ainda estava parado ao lado de Bell e colocou-lhe a mão no ombro. — Eu gostaria de fazer-lhe um pedido.

— Um pedido?— Não saia desta casa, antes das duas naves terem partido. Ou Perry disse que você

devia participar do voo da Intersolar?— Ele disse que eu ficasse aqui, para representá-lo.— Ótimo, neste caso você fica em casa de Gucky. Eu mesmo teleportarei daqui,

com os meus homens, para dentro da Intersolar, depois de sua partida. Ninguém saberá disso, muito menos Deighton.

— O que devo fazer aqui? Atlan sorriu, divertido.— Desviar a suspeita para nós, o que mais?

* * *

11 de julho de 3.433.Depois de uma última reunião para discutir a situação, Deighton tinha subido a

bordo, ordenando a partida. Atlan e alguns outros, que talvez pudessem atrapalhá-lo

Page 53: P-423 - Comando Especial Atlan - Clark Darlton

ainda, estavam reunidos tranquilamente no Lago Goshun, vigiados por homens capazes da Contra-Espionagem.

Deighton estava firmemente convencido de que um deles era o cappin.Ele achou que devia ser Bell.Depois de uma última tomada de contato antes da partida a Brander ergueu-se e

segundos depois desaparecia no céu azul de Terrânia.O Coronel Korom-Khan, comandante da Intersolar, apontou para a tela de vídeo e

disse para Rhodan:— Nós não vamos perder a nave com nosso rastreamento, Sir, de modo algum.

Vamos partir?— Vamos partir, coronel!Com os propulsores rugindo, a Intersolar seguiu a nave de Deighton tomando a rota

de Mercúrio, que se encontrava lateralmente ao Sol, exigindo uma rota ligeiramente diferente. As duas naves se afastariam entre si, lentamente.

* * *

Atlan desligou o aparelho de vídeo de Gucky.— Eles partiram e estão a caminho. Agora logo vamos ficar sabendo se nossas

suspeitas estão corretas. Você não recebeu nenhuma indicação correspondente, Fellmer?— Nenhuma, Atlan — garantiu o telepata. — E Gucky também não. Se o cappin

dentro de Deighton pensa, ele deve saber como escutar os seus impulsos totalmente. Eles não penetram de modo algum, aqui para fora, o que torna o seu descobrimento praticamente impossível. De acordo com os seus pensamentos, Deighton não tem outra finalidade que não a de destruir o Satélite da Morte, mais nada. Ele até está convencido de que o cappin e Bell estão muito bem guardados aqui conosco. No total, são sete oficiais da Contra-Espionagem que nos vigiam constantemente. Eles estão distribuídos pelo terreno aí fora.

— Eles que vigiem — disse Atlan. — Bell e Fellmer ficarão para trás aqui, e de vez em quando terão que mostrar-se no jardim. Isso convencerá os homens que todos ainda estamos reunidos aqui. Ontem à noite eu iniciei Rhodan em nosso Plano. Eu sei que foi um risco, mas não tínhamos outra escolha. Depois do pouso em Mercúrio, ele não deverá sair da Intersolar, de modo algum, mas terá que manter a nave sempre pronta para partir. Logo que, por alguma razão, nós falharmos, e logo que a Brander se dirigir para Mercúrio, Rhodan terá que destruir a nave de exploração. Esta, infelizmente, é nossa última possibilidade.

Gucky perguntou:— Já está certo, se primeiramente teleportamos para a Intersolar ou logo para dentro

da Brander?— Você tem contato com as duas?— Naturalmente.— Para dentro da Intersolar, para que de lá possamos intervir no momento decisivo.Eles ainda discutiram os últimos detalhes. Gucky transportaria Atlan e Alaska,

enquanto Ras Tschubai cuidaria do pesado Lorde Zwiebus. Bell e Fellmer ficariam para trás.

— Mais uma coisa — disse Gucky de repente, olhando para Bell de forma penetrante. — Tirem as mãos do meu barzinho! Por mim vocês podem dependurar-se o dia inteiro no encanamento de água, mas tirem as mãos de minha caixinha de medicamentos.

Page 54: P-423 - Comando Especial Atlan - Clark Darlton

— Velho pão-duro — gritou Bell, sorrindo.Atlan disse que estava na hora de partir. As duas naves não voavam em velocidade

máxima, mas Mercúrio e o Sol somente podiam ser um assunto de poucas horas.E por enquanto ninguém podia saber o que o cappin realmente planejava.Eles se deram as mãos, e segundos depois, Bell e Fellmer Lloyd estavam sozinhos

na sala de estar de Gucky.Bell suspirou, aliviado.— Vamos dar uma olhadinha — disse ele, passando para trás do bar — o que o

baixinho reuniu por aqui...

* * *

Eles materializaram na central de comando da Intersolar, onde já estavam sendo ansiosamente esperados por Rhodan. Atlan assegurou-se de que a Brander, a somente poucos milhões de quilômetros de distância, e numa rota quase paralela, ainda se dirigia para o Sol. Isso naturalmente podia se modificar de um momento para o outro. Mas se o cappin agisse do modo como Atlan esperava, ainda não havia razão para uma modificação de rota.

Não antes da Intersolar ter pousado em Mercúrio.Na central de rastreamento trabalhava-se sob alta tensão. Em muitas telas de vídeo

via-se a Brander, e por baixo cambiavam mudanças de rota e de velocidades. A nave expedicionária tornou-se um pouco mais lenta. Isso era exatamente o que Atlan esperara. Se o cappin agisse conforme o esperado, a Brander agora teria que ficar mais lenta.

Vênus estava colocada lateralmente, em alguns milhões de quilômetros, e Mercúrio escorregou da direita, no alto, para a tela panorâmica. A Brander continuou voando ainda mais para a direita, com a rota para o Sol.

— Vamos alcançar Mercúrio dentro de cinquenta minutos — anunciou o Coronel Korom-Khan.

Mais uma vez os cálculos correram no computador e o resultado correspondia às expectativas de Atlan.

— A Brander vai passar por Mercúrio, numa rota sempre igual, a uma distância de quinze milhões de quilômetros, e alcançar as camadas exteriores da atmosfera solar dentro de setenta minutos — deu a conhecer o chefe de rastreamento.

Atlan anuiu para Rhodan.— Até agora tudo está certo. Deighton ainda está agindo por iniciativa própria. Eu

acredito que o cappin vai assumir o comando logo que a Intersolar pousar em Mercúrio. Então nós agiremos, não antes.

Os cinquenta minutos se passaram numa lentidão torturante.Mercúrio ficava cada vez maior, e o Coronel Korom-Khan teve que irradiar os

primeiros sinais de reconhecimento, para não ficar exposto aos tiros dos fortes automáticos de defesa. Gucky mantinha contato permanente com Galbraith Deighton, para poder teleportar a qualquer momento. Ele tomaria a mão de Ras Tschubai, para que eles não se perdessem durante o salto.

Lorde Zwiebus ficou olhando os seus punhos enormes. Ele, desta vez, desistia da clava. As suas patas seriam suficientes para dar um susto mortal em Deighton.

E justamente o susto mortal, neste caso, era de importância vital.— Ainda mais trinta minutos — disse o Coronel Korom-Khan, dentro do silêncio.

— Ainda nada de mudança de rota da Brander.

Page 55: P-423 - Comando Especial Atlan - Clark Darlton

Por baixo da máscara estarrecida de plástico de Alaska o fragmento do cappin estremeceu. Ele tinha que usar permanentemente esta máscara, pois homem nenhum era capaz de suportar a visão do seu rosto cintilante, sem perder o juízo.

— Espero que você não esteja enganado — disse Rhodan, e sua voz traía insegurança. — O que vai acontecer, se este for o caso?

— Nada — respondeu Atlan. — Absolutamente nada— E Bell? Se for Bell?— Mesmo então nada pode acontecer. Bell é mantido permanentemente sob

controle, por Fellmer e pelos homens da Contra-Espionagem Solar. Neste caso, Deighton nos fez um favor, sem dúvida alguma — de um jeito ou de outro.

Rhodan não disse nada. Ele ficou olhando para as telas de vídeo.Mais vinte minutos ainda até o pouso.Mercúrio ficara maior. A Intersolar passou pelas primeiras formações de naves de

vigilância. Não se viam estrelas, mas no seu lugar o vermelho cintilante do hiperespaço, no qual o Sistema Solar estava acamado dentro do campo de tempo.

E então a Intersolar começou o pouso, um pouco ao sul do polo norte, bem próximo das gigantescas instalações do transformador de tempo principal, que mantinha o Sistema Solar no futuro.

Ainda antes da nave pousar, o Coronel Korom-Khan programou a partida de emergência, no computador e no automático de voo.

Atlan olhou para Gucky.— E então? — quis ele saber, muito tenso.

Page 56: P-423 - Comando Especial Atlan - Clark Darlton

7

Galbraith Deighton estava sentado perto do comandante da Brander.O Major Kees Hollander era um oficial respeitado da Contra-Espionagem Solar, de

sangue-frio e consciente. A Brander não era a primeira nave que ele comandava, e certamente não seria a última. Ele tinha toda a confiança do chefe da Contra-Espionagem.

— Dentro de quarenta minutos chegaremos ao ponto crítico e teremos que mudar de rumo, Sir. Caso contrário, os aparelhos de climatização não aguentarão o tranco.

— O senhor mandou examinar os botes salva-vidas? Deles dependerão as nossas vidas.

— Está tudo em ordem, Sir. — O Major Hollander de repente tinha um par de rugas verticais, na testa. — Posso fazer uma pergunta?

— Sem dúvida, major.— Os barcos salva-vidas, Sir... Eles não dispõem de capas de climatização

eficientes. Se abandonarmos a Brander dentro da atmosfera solar, nós arderemos. Eu receio que teremos que começar a ação antes do planejado, abandonando a nave antes.

No rosto de Deighton alguma coisa tremeu.— O senhor executa as minhas ordens, major, mais não precisará fazer. Eu recebi o

conselho dos cientistas especializados. E absolutamente possível permanecer com os barcos salva-vidas por curto tempo no maior calor. Não há qualquer perigo para nós, ou o senhor acha que eu estou cansado de viver?

— É claro que não, Sir. Eu apenas fiz uma pergunta. Deighton não respondeu. Ele chamou a central de rastreamento, e enquanto o fazia, a expressão do seu rosto modificou-se repentinamente. Ele perdeu a sua certeza e consciência objetiva, que até então mantinha na aparência. Por um segundo ele demonstrou insegurança, dúvida. Mas logo os seus olhos brilharam novamente claros e acostumados a dar ordens.

Aquela modificação durara apenas frações de segundos.O cappin assumira, sem compromissos e totalmente.— Central de rastreamento? Dê-me os dados da Intersolar.— Um momento, Sir — uma pausa de dois segundos. — A Intersolar acaba de fazer

a manobra de pouso no polo norte de Mercúrio, Sir. As coordenadas do pouso são...— Muito obrigado, isso basta. — Deighton voltou-se novamente para o Major Kees

Hollander: — Programe a nova rota, major. Eu modifiquei o meu objetivo. Primeiramente vamos voar para Mercúrio.

O Major Hollander apertou os olhos.— Para Mercúrio? Mas isto contraria tudo que ficou ajustado e...— Mercúrio, major! Ou quer que eu o mande prender por motim?Os olhos de Kees Hollander de repente ficaram frios como gelo. Nenhum músculo

tremeu no seu rosto, quando ele deu os novos dados para o computador, e já vinte segundos mais tarde a Brander saía de sua rota, tomando a direção de Mercúrio.

— Chegaremos a Mercúrio dentro de quinze minutos — disse o Major Hollander, de cara fechada.

* * *

Gucky hesitou, quando Atlan lhe perguntou, depois disse:

Page 57: P-423 - Comando Especial Atlan - Clark Darlton

— Os pensamentos de Deighton podem ser reconhecidos claramente. O cappin desistiu de sua camuflagem, parece que ele se sente absolutamente seguro. Ele assumiu a consciência de Deighton, e Deighton é obrigado a obedecer, sem que o saiba. A rota da Brander foi modificada. A nave tomou a rota de Mercúrio.

— Ela poderá estar aqui dentro de dez minutos — anunciou a central de rastreamentos.

Rhodan colocou a mão no ombro de Atlan.— Parece que você estava com a razão, Atlan.— Gucky já o confirmou. Eu acho que vamos ter que agir. Deighton tem a intenção

de deixar a Brander e toda a sua carga cair sobre o polo norte de Mercúrio. A detonação destruiria totalmente o principal transformador de tempo. O Sistema Solar cairia de volta ao presente, e os cappins poderiam fugir sem serem interceptados. Também o cappin dentro de Deighton, pois ele o abandonaria um pouco antes da detonação.

Gucky pegou a mão de Ras Tschubai, depois a de Atlan e Alaska.— Segurem-se em mim e em Ras, também você, Zwiebus. Não percam o contato,

caso contrário velejarão solitários através do hiperespaço e isso seria desagradável. Logo que puderem ver novamente, comportem-se como selvagens, o que não deveria ser muito difícil para Lorde Zwiebus. Bem, vocês já sabem de tudo.

Atlan esperou até que eles formaram um anel firmemente atado, depois ele anuiu mais uma vez para Rhodan.

— Partam, por precaução. Era propósito de Deighton logo destruir vocês também. Por isso aquela manobra de engano. A Intersolar deveria pousar no local previsto para a explosão — ele olhou para Ras e para Gucky. — Vamos, de uma vez...

Eles desmaterializaram.

* * *

— Mande preparar os barcos salva-vidas, major! — ordenou Deighton ao comandante da Brander. — Quanto tempo falta ainda até Mercúrio?

— Com a velocidade atual, três minutos. Nós teremos que desacelerar se temos a intenção de pousar nas proximidades da Intersolar.

Deighton fez que não ouviu a observação. Também não parecia interessado em saber se os barcos salva-vidas estavam prontos para partir ou não. Tenso, ele olhava a galeria panorâmica, que agora era praticamente preenchida pela imagem de Mercúrio.

E a Brander corria velozmente na sua direção.Diversos oficiais da Contra-Espionagem que estavam de serviço, na central de

comando, se aproximaram. Havia estupefação nos seus rostos, pois aquilo que Deighton fazia era contrário a toda razão. A nave teria que ou frear ou então imediatamente tomar um outro rumo.

Caso contrário tombaria sobre Mercúrio, um pouco abaixo do polo.E o que isso significaria, com a carga de bombas que trazia, qualquer um podia

calcular facilmente.— Sir...?Deighton não reagiu. Ele olhava fixamente a galeria panorâmica, mas ao mesmo

tempo não tirava os olhos do Major Hollander, sentado diante dos controles. A sua mão direita repousava no punho de sua arma de impulsos energéticos.

Exatamente neste momento as cinco criaturas materializaram, vindas do Nada.Ainda restavam dois minutos, antes da queda violenta.

Page 58: P-423 - Comando Especial Atlan - Clark Darlton

* * *

Eles agiram com a velocidade do raio e de acordo com o plano.Com um berreiro horrível, Lorde Zwiebus precipitou-se sobre Galbraith Deighton,

que estava de pé, junto do Major Kees Hollander, voltando-lhe as costas. Com um gesto rápido, ele lhe tirara a arma de impulsos do cinturão, destravando-a. Apontou a arma para Deighton, ainda enquanto este se virava, espantado.

Ele olhou para a arma de impulsos de Atlan.— O que quer dizer isso...?Ras tinha pulado até Kees Hollander.— Mudança de rota, imediatamente! Diminuir a velocidade! Procure entrar em

contato com a Intersolar. Rhodan entrementes partiu. Vamos, mexa-se logo!Kees Hollander obedeceu. Ele sabia que as ordens correspondiam à lógica e à razão.

Aquilo que Deighton pretendia fazer não podia ter mais nada a ver nem com a lógica nem com a razão. Ele queria destruir tanto a Brander como a Intersolar.

A Brander deu uma guinada, entrando no novo rumo.Choramingando, Galbraith Deighton foi ao chão, mas Gucky não deu tempo para

que o cappin se restabelecesse. Telecineticamente ele colocou Deighton novamente de pé.

E Atlan apontou exatamente para a sua testa.Mas esperou ainda alguns segundos, antes de começar a apertar o gatilho de fogo,

lentamente, com uma lentidão terrível.Os olhos de Deighton praticamente saíram de suas órbitas, enquanto olhava

fixamente o polegar de Atlan. Ele sabia que este tiro seria mortal, e somente levaria ainda segundos, até que...

Com um gemido indefeso ele novamente foi ao chão, e Atlan abaixou a sua arma.— Então é isso — disse ele, roucamente, e sem qualquer satisfação.Ele colocou a sua arma de volta no cinturão, anuiu para Alaska e abaixou-se para

cuidar de Deighton, que repentinamente perdera a consciência. Mas só por pouco tempo, e logo o chefe da Contra-Espionagem abriu os olhos novamente, olhando para Atlan, sem compreender.

— Onde é que eu estou? — perguntou ele, baixinho. — O que aconteceu? — Ele tocou a sua cabeça. — Dores... quem é que atirou em mim?

Atlan transmitiu o comando para Kees Hollander e ordenou-lhe que tomasse a rota de volta para a Terra. A ligação com a Intersolar, pouco mais tarde, foi conseguida. Rhodan veio pelo transmissor para bordo da Brander.

Entrementes Deighton lembrava-se de alguma coisa. Acontecia exatamente o que acontecera com o Tenente Beruda. Ele sabia o que acontecera. O cappin tivera que deixá--lo apressadamente demais.

Eles o levaram para o ambulatório, para que ele pudesse se recuperar. Rhodan insistia em querer interrogá-lo, mas Atlan aconselhou o contrário.

— Ele está exausto, mas nós podemos ter certeza de que o cappin fugiu, atropeladamente. Provavelmente de volta ao Satélite Solar, no qual ele agora se encontra com os outros cappins. O bloqueio continuará, até termos encontrado uma outra solução. Deighton terá muita coisa para nos contar, e logo saberemos o que devemos fazer.

— Os cappins são um perigo do passado, Atlan, e nós somente podemos afastar este perigo no passado.

Page 59: P-423 - Comando Especial Atlan - Clark Darlton

— Sim, isso está certo. A duzentos mil anos no passado! Os oficiais presentes na central de comando da Brander, quando da intervenção de Atlan e sua gente, tinham se mantido passivos, e na expectativa. Um deles tinha levado a mão à sua arma, mas Gucky simplesmente a tinha tirado dele. Agora ele a entregava de volta.

— Desculpe-me, tenente. Infelizmente não podíamos iniciá-lo antes.O tenente colocou a arma no cinturão, sem nada dizer. O seu rosto ainda

demonstrava todo o seu espanto.Ainda durante o voo de volta para a Terra, Deighton sentiu-se suficientemente

recuperado para fazer um primeiro relatório. Rhodan, Atlan e os membros do Comando Especial reuniram-se em volta do seu leito. Deighton dava uma boa impressão, bastante consciente de si mesmo.

— Eu me comportei como um maluco — concedeu ele, um pouco embaraçado, quando viu aqueles rostos curiosos à sua volta. — Isso foi o cappin. Eu agora lembro-me exatamente como tudo aconteceu. Ele deve ter-me deixado de maneira totalmente inesperada, pois ele não tocou na minha memória. Eu sei de tudo, e também sei agora como eles fazem isso.

Rhodan não interrompeu Deighton, mas anuiu bastante tenso.— Uma pedo-transferência ocorre em base individual de semitraço, na sexta-

-dimensão.Atlan curvou-se para a frente.— No que, por favor?— É um novo fator, com o qual nós jamais tivemos alguma coisa a ver. Eu não

consigo explicar-lhes isto, apesar de ter fluentes as expressões e designações. É a memória do cappin, que ficou para trás em mim. A sua sabedoria, ele levou consigo.

“O organismo humano, criado e cultivado nas suas funções orgânicas e psíquicas, possui uma radiação chamada radiação modular hipersexta. Trata-se de uma frequência de sexta-referência sobreposta. Uma constante energética hexadimensional, que cada homem e cada criatura altamente inteligente deve possuir, porque sem ela não poderá existir. O homem desenvolveu esta constante durante a sua longa evolução. Sem ela, ele não teria nem um intelecto nem aquilo que nós chamamos de sua alma.

“A constante EHD, como também a podemos designar mais sucintamente, é aquela unidade energética própria e não mensurável, que no final das contas é a responsável para que houvesse uma aglomeração da massa dos grupos atômicos no cérebro, e com isto a criação de um intelecto. E esta constante EHD é o pedo-ponto de referência para os cappins.

“Quando um cappin assume uma criatura humana, depois de uma pedo-goniometria de êxito, ele somente pode fazer isso sem o seu corpo orgânico. Portanto ele deixa para trás o seu corpo orgânico propriamente dito, que sem o fator hexadimensional simplesmente se esboroa. Uma massa cheia de bolhas e que rapidamente congela — isso é tudo que fica para trás, de um cappin que se transferiu.”

— Como pode saber de tudo isso, Galbraith? — perguntou Rhodan.— Por natureza sou um excelente observador, além disso disponho, como senso-

-mecânico, de um cérebro mutado. Portanto não esqueci de nada que o cappin tenha pensado, nem que fosse por só uma vez.

“Porém ouçam o resto: Quando um cappin deixa novamente um corpo assumido, este não é danificado. Ele simplesmente se separa do seu habitat energético hexadimensional, da alma de sua vítima. Caso isso aconteça com calma e em paz, o cappin apaga a memória da vítima, e esta nem sequer sabe que tinha sido assumida. O

Page 60: P-423 - Comando Especial Atlan - Clark Darlton

melhor exemplo disto provavelmente é o sargento Kampatschin, cujo cappin se transferiu para mim com toda tranquilidade.

“Se tudo isto acontece num mesmo plano de tempo, não existem mais distâncias entre pedo-goniômetro e pedo-goniômetro. Em tempo-zero os cappins podem chegar de galáxia a galáxia, até mesmo de um Universo para outro. A pedo-transferência hexadimensional venceu de modo ideal o espaço e o tempo. Eu acho que com isto muita coisa fica esclarecida, das que até agora quebrávamos a cabeça inutilmente para desvendar.”

Rhodan voltou para a Intersolar, acompanhado de Atlan.Os outros ficaram na Brander.Na cabine de Rhodan estavam apenas os dois amigos.— Agora sabemos de muita coisa, Perry. Talvez agora consigamos acabar com eles.

Ou você acha que podemos criar um contato direto com eles?— Talvez mais tarde. Criaturas viventes que descobriram o segredo da alma, cuja

existência nós naturalmente imaginávamos, mas que desconhecíamos totalmente, nos são superiores psiquicamente, sob todos os pontos de vista. Mesmo assim, eu acho que devíamos tentar o contato. Mas teremos que voltar ao passado, no tempo de duzentos mil anos atrás. Deve ter sido neste tempo que os cappins visitaram a Terra pela primeira vez e ergueram o Satélite Solar. Como estação de pedo-goniometria, como agora sabemos. Alguma coisa, entretanto, acabou dando errado. Este satélite transformou-se numa bomba solar. Um perigo que precisa ser afastado. E isto, conforme eu já disse, no passado.

— O deformador de tempo-zero logo terá sido completado. Ele espera por nós.— Uma máquina do tempo...? — perguntou Rhodan, olhando interrogativamente

para Atlan. — Ele é uma máquina do tempo, ou não?— Sim, mas com ele você jamais pode avançar no futuro legítimo, isso é

impossível. De nosso presente para o passado e de volta novamente. Isso é tudo.Rhodan silenciou, depois disse com um traço de insegurança:— Eu não sei. Eu realmente não sei. Mas vamos tentá-lo, Atlan. Precisamos tentá-

-lo. Não temos outra escolha.— Tem razão, não temos outra escolha, Perry. Talvez então tenhamos resposta para

muitas perguntas.— Isso eu também espero. Algum dia eu gostaria de obter respostas para as

perguntas maiores. Para a pergunta, por exemplo — quem somos nós?O rosto de Atlan estava totalmente inexpressivo, quando ele preveniu:— Às vezes é melhor deixar a cortina diante das últimas coisas. Com os cappins,

ventilamos o segredo da alma, de cuja existência já sabíamos. O fator hexadimensional dentro de nós, que nos liga com o Universo. Você ainda não sabe o que é a alma, e já você está querendo saber ainda mais. Você quer saber demais, Perry.

— Eu tenho que querer saber demais, Atlan, para finalmente saber de alguma coisa. Você quer me ajudar?

Atlan levantou-se e colocou a mão no ombro de Rhodan.— Eu sempre ajudarei você — prometeu ele, muito sério.— Espero que o saber, algum dia, não nos dará um susto mortal — murmurou

Rhodan, depois que Atlan saíra.Ele continuava sentado na sua cabine, quando a Intersolar pousou no espaçoporto de

Terrânia...

Page 61: P-423 - Comando Especial Atlan - Clark Darlton

* * ** **

O Lorde-Almirante Atlan tivera o faro certo, quando reuniu o Comando Especial para a caça aos cappins. De qualquer modo, através de sua intervenção, pôde ser impedido o pior.

Entrementes, prosseguiu-se com a construção do deformador de tempo-zero. O aparelho, que deverá possibilitar uma expedição ao passado terrano, ao tempo da criação do Satélite da Morte, está pronto e funcionando — e 23 criaturas iniciam uma viagem fantástica...

Esta viagem é contada no próximo número da série Perry Rhodan, intitulado: “Perdidos no Tempo.”

Visite o Site Oficial Perry Rhodan:www.perry-rhodan.com.br

O Projeto Tradução Perry Rhodan está aberto a novos colaboradores. Não perca a chance de conhecê-lo e/ou se associar:

http://www.orkut.com.br/Main#Community.aspx?rl=cpp&cmm=66731http://www.orkut.com.br/Main#CommMsgs.aspx?cmm=66731&tid=52O1628621546184O28&start=1