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EM REVISTA SOCIAL ISSN 1678 -152 x s Mutilações Assédio moral LER e invalidez Distúrbios mentais s s s Os riscos do trabalho

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ISSN 1678 -152 x

CONSELHO DIRETOR

Presidente - Kjeld A. JakobsenCUT - João Vaccari NetoCUT - Rosane da SilvaCUT -CUT -CUT -CUT -CUT - Artur Henrique da Silva SantosDieese - João Vicente Silva CayresDieese -Unitrabalho - Francisco MazzeuUnitrabalho - Silvia AraújoCedec - Maria Inês BarretoCedec - Tullo Vigevani

DIRETORIA EXECUTIVAKjeld A. Jakobsen - PresidenteArthur Henrique da Siva SantosAri Aloraldo do Nascimento - TesoureiroCarlos Roberto HortaClemente Ganz LúcioMaria Ednalva B. de LimaMaria Inês Barreto

SUPERVISÃO TÉCNICAAmarildo Dudu Bolito Supervisor Institucional

Supervisor TécnicoMarques Casara Supervisor de ComunicaçãoMônica Corrêa Alves - Supervisora Administrativo-FinanceiraRonaldo Baltar - Supervisor do Sistema de informação

SEDE NACIONALRua São Bento, 365 - 18º andarCentro - São Paulo SPFone: (11) 3105-0884 Fax: (11) [email protected]

Maria Ednalva B. de LimaJosé Celestino LourençoAntonio Carlos SpisGilda Almeida

Mara Luzia Feltes

-João Paulo Veiga -

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Saúde e Segurança no Trabalho:Dever do Empregador.Direito do Trabalhador.

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P 4: A SAÚDE E A SEGURANÇA NO TRABALHOBrasil tem meio milhão de vítimas fatais por ano

P 12: ESTADO E LEIS DE PROTEÇÃOArtigo da historiadora Ana Iervolino

P 16: MADEIRA E SANGUEMutilações na indústria moveleira de SantaCatarina

P 29: A VIOLÊNCIA CAMUFLADAAs humilhações e a tortura no cotidiano laboral

P 35: TRANSTORNOS MENTAISOs efeitos da exposição a perigo, pressões etóxicos

P 41: O CIRCO DE HORRORES DA CARGILLLesões por esforços repetitivos levam à invalidez

P 45: UM CENÁRIO SOMBRIOA difícil construção de uma política eficaz de SST

P 49: O ELEFANTE E A RSEArtigo da pesquisadora Regina Queiroz

P 51: TERMO DE REFERÊNCIAComo o IOS avalia saúde e segurança no trabalho

P 53: PESQUISA IOS NO 9º CONCUTO que pensam os dirigentes sindicais

P 54: PROJETO AMAMultinacionais e meio ambiente na AméricaLatina

P 56: CONEXÃO SINDICALVeja como participar da comunidade virtual

P 57: PAPEL E CELULOSEPesquisa da Veracel é apresentada na Finlândia

P 61: TRABALHO INFANTILObservatório recebe prêmio de direitos humanos

P 62: ALUMÍNIOEstudo inédito sobre cadeia produtiva

P 64: PONTO DE CONTATOSeminário sobre aplicação das Diretrizes daOCDE

P 65: REDLATPublicação trilíngüe apresenta metodologiaconjunta

P 66: TRABALHO PRECÁRIOC&A vai monitorar sua cadeia produtiva no Brasil

P 67: DIÁLOGO SOCIALAvanços na relação de sindicalistas com AkzoNobel

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O preâmbulo da Constituição da OMS (Organização Mundial de Saúde) define saúde como “um estadocompleto de bem-estar físico, mental e social, e não apenas ausência de doença”. Esse conceito passou poruma revisão crítica importante nas últimas duas décadas, em que o mundo do trabalho sofreu profundastransformações tecnológicas e organizacionais. Ao contrário do que se imaginava, as máquinas não livraramos humanos de seus fardos. A transição da era industrial para a era de serviços trouxe mais pressão porcompetitividade e produtividade, com impactos nocivos para os trabalhadores, que muitas vezes são obriga-dos a alcançar novos patamares de produção usando as mesmas máquinas do passado. Surgiram novasformas de adoecer e morrer.

Por outro lado, os trabalhadores conquistaram espaço de manifestação e participação nos assuntosrelacionados a saúde e segurança. Aumentou a consciência de que saúde no trabalho passa, sobretudo,pelo grau de liberdade que as pessoas têm em se organizar para desenvolver suas habilidades com plenitu-de. Uma nova definição foi proposta por Christophe Dejours (1986): “A saúde para cada homem, mulher oucriança é ter meios de traçar um caminho pessoal e original em direção ao bem-estar físico, psíquico esocial”.

A CUT (Central Única dos Trabalhadores) é parte ativa da transformação pela qual passaram a saúdeocupacional e a saúde pública no Brasil. Entre os valores e princípios do movimento sindical cutista, geradospelo movimento sindical italiano dos anos 1960, estão o da Não-Delegação – um profundo convencimentodos trabalhadores de não poder mais entregar a ninguém o controle sobre as suas condições de trabalho; eo da Validação Consensual – o julgamento sobre o nível de bem-estar ou de intolerabilidade de determinadasituação de trabalho é expresso pelos trabalhadores.

Exigências legais crescentes, mais a pressão sindical e da opinião pública, levaram muitas empresasa adotar compromissos voluntários com saúde e segurança. Um marco regulatório significativo foi desenvol-vido sobre este tema. Assim, criaram-se condições mais favoráveis para que os trabalhadores organizadosconquistem direitos. Ainda há muito a avançar. As reportagens desta edição ilustram a magnitude dessedesafio. Mutilações na indústria, assédio moral, transtornos psíquicos, lesões por esforços repetitivos... Éextensa a lista de mazelas, mas também existem propostas viáveis para preveni-las.

Nossa expectativa é contribuir para que o assunto ganhe a devida prioridade na agenda de empresá-rios, formuladores de políticas públicas, juízes, profissionais de saúde e segurança e, naturalmente, dospróprios trabalhadores. Todo esforço nessa direção representa avanço na construção de uma sociedadesaudável e segura. A luta por melhores condições de saúde e segurança se insere na campanha pelo “traba-lho decente” preconizada pela OIT (Organização Internacional do Trabalho) e que baliza as atividades doObservatório Social. Isto é, um trabalho adequadamente remunerado, exercido em condições de liberdade,eqüidade e segurança, e capaz de garantir uma vida digna.

Conselho Editorial

CAPA

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Quase 500 milpessoas morremanualmente no

Brasil por causa deacidentes e doenças

relacionadas aotrabalho. No mundo

o número chega acinco mil mortes por

dia. Indústria,serviços e

agricultura são ossetores mais

perigosos.

Adriana Franco

e a segurançatrabalhadorbrasileiro

e a segurançatrabalhadorbrasileiro

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As principaisdoenças do trabalho

Asma Ocupacional – Adquirida por meio dainalação de poeira de materiais como algodão,borracha, couro, sílica, madeira vermelha etc.Os trabalhadores de fábricas, madeireiras,plantações de algodão e tecelagensapresentam sintomas como falta de ar, tosse,aperto e chiado no peito e tosse noturna.

Dermatoses ocupacionais – Causadas por contatocom agentes biológicos, físicos e químicos,principalmente. Os sintomas são alteração dapele e mucosas. Os trabalhadores em fábricasquímicas são os mais prejudicados com ela.

LER/DORT – Decorrentes de problemas com olocal de trabalho e com os movimentosrepetitivos. Os empregados dos setoresindustrial e comercial podem ser prejudicadoscom estas doenças.

De acordo com relatório ela-borado pela Organização Internacio-nal do Trabalho (OIT), cerca de cin-co mil trabalhadores morrem nomundo todos os dias por causa deacidentes e doenças relacionadas aotrabalho. O documento, denomina-do Trabalho Decente – Trabalho Se-guro, alerta que a maioria da forçatrabalhista mundial não possui segu-rança preventiva, serviços médicosnem mesmo compensação para aci-dentes ou doenças.

No Brasil, cerca de 500 milpessoas se acidentaram e 2.708morreram em 2005, segundo o Mi-nistério da Previdência Social. En-quanto os óbitos tiveram uma redu-ção de 4,6%, os acidentes aumen-taram 5,6% em relação ao ano an-

terior. As doenças decorrentes dotrabalho chegaram a 30.334.

Para o coordenador de pes-quisas do Centro de Estudos da Saú-de do Trabalhador e Ecologia Hu-mana (CESTEH), William Waiss-mann, os números podem ser aindamais assustadores. “Os acidentesgraves, por exemplo, não há comoesconder, o que já não acontece comas doenças”.

Caracterizar e registrar as do-enças do trabalho, no Brasil, aindatem sido uma tarefa muito difícil. Istoacontece, segundo Waissmann, de-vido às dificuldades em notificá-lase pelo fato de os mecanismos de pro-teção ao trabalhador não serem mui-to bem definidos. O acidente é mui-to mais fácil de se notificar porque

se vê, o que não acontece com asdoenças, que surgem lentamente enem sempre são diretamente relacio-nadas ao trabalho.

Os acidentes mais freqüen-tes em 2005 – 33% do total – re-lacionam-se com os ferimentos elesões ligados ao punho e à mão.Nas estatísticas, as doenças repre-sentam apenas 6,1% do número deacidentes registrados – porcenta-gem quase inalterada de um anopara o outro. Entre as principaisestão: asma ocupacional, Lesãopor Esforço Repetitivo / DistúrbiosOsteomusculares Relacionados aoTrabalho, as LER/DORT, perdaauditiva induzida pelo ruído(PAIR), pneumoconiose e distúr-bios mentais

Perda auditiva induzida pelo ruído (PAIR) –Diminui gradativamente a audição dostrabalhadores por exposição continuada aníveis muito elevados de ruído. Metalúrgicossofrem com este problema.

Pneumoconioses – Doenças pulmonaresocasionadas pela inalação de poeirasquímicas como da sílica e dos asbestos, quecausam silicose e asbestose. Químicos,trabalhadores da construção civil emineradores estão entre as principais vítimas.

Distúrbios mentais – Mais difíceis de detectar eprincipalmente relacionar ao trabalho, podemter ligação com diversas circunstâncias.Sofrem com isso operadores detelemarketing, bancários e outrosprofissionais submetidos a estresse oucontaminação.

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Indústria, serviços e agriculturatêm maior número de acidentes

Setores mais atingidosSetores mais atingidosSetores mais atingidosSetores mais atingidosSetores mais atingidosO setor industrial brasileiro é

o que mais tem número de aciden-tes. Foram 229,1 mil em 2005 de acor-do com o Ministério da Previdência.Em segundo lugar está o setor de ser-viços, com quase 220 mil acidentes.Em terceiro está a agricultura, commais de 35 mil acidentados.

Na comparação com 2004, osnúmeros aumentaram na indústria(17,5 mil novos casos) e nos servi-ços (mais 17,2 mil). Na agriculturahouve leve redução: 1,7 mil aciden-tes a menos.

Segundo o secretário da Con-federação Nacional dos Metalúrgicos(CNM/CUT), Valter Sanches, mui-tas vezes os acidentes acontecemporque a linha de produção não con-segue acompanhar o crescimento dosetor industrial e acaba sobrecarre-gada.

LER/DORTMãos, cotovelos e braços são

alvos das LER/DORT na indústria eno comércio. Sanches explica que aperda de rendimento é a principal for-ma de se identificar a doença. A mai-oria dos tipos de lesões e, principal-mente, a LER/DORT, são irreversí-veis. A forma de atenuá-las é comfisioterapia e tratamentos.

“A gente tem brigado para queas pessoas não trabalhem acidenta-das e para que a Comunicação de Aci-dente de Trabalho (CAT) seja o iní-cio do processo de reconhecimentode qualquer doença ou de algum aci-dente” afirma.

Para ele, o papel dos sindica-tos evoluiu muito nos últimos anos.Antigamente a atenção dos sindica-tos era voltada à ergonomia dos equi-pamentos de segurança. ”Hoje tudoparece ter evoluído”, diz. “Mas não

adianta ter o design do produto se oposto de trabalho tem excesso dehoras ou ritmo acelerado”.

Baixa prioridadeO presidente da Federação dos

Empregados Rurais Assalariados noEstado de São Paulo (Feraesp), ÉlioNeves, avalia que a situação brasilei-ra quanto a saúde e segurança no tra-balho é muito falha e o tema é colo-cado em prioridade inferior. Para ele,o lucro tem sido a tônica.

O sindicalista ressalta queessa questão deveria ser primordialno âmbito da responsabilidade so-cial. “A cada ano que passa, asempresas encontram mecanismosilegais para reduzir custos de pro-dução, o que inclui cortes na pre-venção de saúde e segurança”, in-digna-se.

Segundo Neves, o alto núme-ro de acidentes é preocupante, poistem deixado trabalhadores com se-qüelas para o resto da vida. Ele lem-bra que também há muitos aciden-tes de percurso na colheita de cana,que ocorrem durante o transportedo trabalhador até a lavoura. “Pou-cas são as empresas que utilizamônibus e mesmo as que os têm nãoos oferecem em condições adequa-das de segurança”.

Os problemas do setor agrí-cola, segundo opresidente daFeraesp, inclu-em o descasocom as terceiri-zações da co-lheita e do cortee a falta da apli-cação do Planode AssistênciaSocial (PAS).

Fotos: Banco de Imagens Observatório Social

ValterSanches, daCMN/CUT:“Sobrecargade trabalho”

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A Medida Provisória (MP) 316,assinada em 11 de agosto pelo presi-dente Luiz Inácio Lula da Silva, podealterar o processo em que são caracte-rizados os acidentes e doenças do tra-balho. A partir de agora, não é mais otrabalhador quem deve provar o nexocausal. Acidentes e incapacidades se-rão diretamente ligados a ramos de ati-

vidades, por-tanto é a em-presa quemdeverá mos-

O ônus da provaO ônus da provaO ônus da provaO ônus da provaO ônus da provatrar que os acidentes não são decor-rentes da atividade desenvolvida peloempregado no ambiente de trabalho.

A MP também adotará um novomecanismo para o pagamento do se-guro de acidentes de trabalho (SAT),que será proporcional à quantidade realde trabalhadores acidentados. Comisto, a medida visa incentivar que ogasto das empresas com seus pen-sionistas seja investido em saúde esegurança.

A MP cria um banco de dados

que relaciona as atividades empresa-riais com as funções dos trabalhado-res, doenças e acidentes decorren-tes em cada caso e um banco espe-cífico que contabiliza os acidentes porempresa. Os empregados devem secomprometer a utilizar os equipamen-tos de segurança e os sindicatos, prin-cipalmente nos setores em que onúmero de acidentes é alto, a ofere-cer capacitação, treinamento e cons-cientização sobre a importância douso correto de equipamentos.

situação da saúde do trabalhador.

AcompanhamentoQuem trabalha no comércio

tem a seu dispor a equipe multidisci-plinar da área de saúde e segurança.O Sindicato auxilia o trabalhador noencaminhamento do benefício juntoao Instituto Nacional de Seguro Soci-al (INSS) e também o acompanha comum médico do trabalho até que sejapossível ele retornar à atividade.

“Durante o atendimento, aempresa é cadastrada em nosso ban-co de dados para a solicitação de fis-calização conjunta entre Sindicato eum dos órgãos públicos que atuamem saúde do trabalhador, como a De-legacia Regional do Trabalho ou osCentros de Referência em Saúde doTrabalhador”, esclarece ela.

A Feraesp atua de forma pa-recida: “O Sindicato procede ao re-gistro desses acidentes às estatísti-cas e aos dados sobre a sua incidên-cia, os quais servem de base para aformulação de reivindicações à polí-

Jovens doentesA diretora da área de Saúde e

Segurança do Sindicato dos Comer-ciários, Cleonice Caetano Souza, vêo alto número de acidentes com gran-de preocupação. O setor gera empre-gos principalmente entre os jovens.“Isso significa mãos mutiladas ou pes-soas adoecendo mais cedo, muitasainda no primeiro emprego”, assina-la.

Só uma pequena parcela dosempregadores do setor tem destina-do recursos financeiros, humanos emateriais para proporcionar uma me-lhora na condição de trabalho. “Cons-cientizar os empregadores de que in-vestir na saúde e segurança é lucro enão prejuízo tem sido uma tarefa ár-dua”, diz.

Cleonice conta que as doençasmentais e lombalgias também apare-cem com freqüência. Ela enumera ocrescimento e diversificação do comér-cio, carga excessiva, ameaça de per-der o emprego e pressão para atingirmetas como os responsáveis pela atual

tica de prevenção de acidentes, estu-dos para a melhoria de ferramentas,equipamentos de proteção individuale como argumento para o oferecimen-to de denúncia aos órgãos competen-tes”, explica Élio Neves.

Nos casos mais graves, queresultam em morte, o Sindicato acom-panha o processo de rescisão de tra-balho, verifica em que condições issoocorreu e ainda acompanha de pertose a família recebeu o seguro.

A preocupação com a linha demontagem é, para Waissmann daCESTEH, a alternativa para diminuiro número de acidentes de trabalho.Ele defende a criação – em um pri-meiro momento – de uma lógica ade-quada e, posteriormente, um sistemade proteção coletivo.

“Caso todos os outros sistemasfalhem ainda haveria o equipamentoindividual para garantir a proteção”,diz. “A proteção coletivizada é o ca-minho para proteger o ambiente, aspessoas de uma forma geral e tam-bém o trabalhador”.

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A questão dos equipamentosde proteção individual é polêmica nomundo do trabalho. Conhecidoscomo EPI, esses dispositivos são re-gulamentados através da norma nº 6do Ministério do Trabalho e Empre-go, que os avalia e aprova antes deserem colocados no mercado. Estanorma considera EPI todo dispositi-vo ou produto de uso individual notrabalho que tenha como função pro-teger o empregado de riscos possí-veis de ameaçar a saúde e a segu-rança no trabalho.

Os equipamentosde segurança

do implantadas e para atender situ-ações de emergência. No entanto,muitos EPI são ineficientes, atrapa-lham e até machucam o trabalhador.

Ruído excessivoNa metalurgia o ruído é o

grande vilão e, por isso, existe a ne-cessidade do uso do protetor auri-cular para atenuar o barulho. Po-rém, o problema não é resolvido, jáque não é apenas o ruído que podetrazer problemas à saúde do traba-lhador. A vibração afeta o sistemanervoso e suas conseqüências sãoainda mais difíceis de provar. Wais-smann, do CESTEH, alerta para osequipamentos que dificultam os mo-vimentos dos trabalhadores, preju-dicando o desempenho em algumastarefas.

O setor agrícola também en-frenta muitas dificuldades quantoa isso. O presidente da Fe-raesp, Élio Neves, contaque alguns equipamen-tos precisam deadaptações. O maisgrave é que a mai-oria dos tra-balhadoressequer temacesso aeles, devidoà precariza-ção das con-

dições de trabalho no setor. “Ócu-los, mangotes, aventais, perneiras,botas e chapéus deveriam ser usa-dos diariamente por esses trabalha-dores”, diz.

No setor de serviços os equi-pamentos são mais raros. A dirigen-te sindical Cleonice Caetano Souzaafirma que os empregados da cate-goria dependem mais das relaçõesinterpessoais para se precaver dasdoenças laborais. Entre os aparelhosde proteção mais usados estão pro-tetores faciais, óculos de segurança,luvas, mangas de proteção, cremesprotetores, calçados impermeáveis ede proteção, aventais, capas, vesti-mentas especiais, respiradores emáscaras de filtro químico.

Toda empresa é obrigada afornecer gratuitamente aos seus em-pregados esses produtos que garan-tem a segurança do trabalhador emperfeito estado de conservação e fun-cionamento – principalmente quan-do o sistema de trabalho não ofere-cer proteção completa, as medidasde proteção coletivas estiverem sen-

Élio Neves, da Feraesp:descaso das empresas

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Saiba para que servem osequipamentos de proteção.

Como se protegerComo se protegerComo se protegerComo se protegerComo se proteger

Máscaras e respiradores– Servem contra poeiras,agentes químicosprejudiciais e para locaisonde o teor de oxigênio sejainferior a 18%.

Protetores faciais– Protegem olhos e facecontra lesões resultantesdo contato compartículas, respingos,vapores de produtosquímicos e radiaçõesluminosas intensas.

Óculos de segurança– Combatemferimentos nos olhosprovenientes do contatocom partículas, líquidosagressivos, poeiras eoutras radiaçõesperigosas.

Luvas– Protegem de materiaisou objetos escoriantes,abrasivos, cortantes eperfurantes, químicos,corrosivos, tóxicos,alergênicos, oleosos,solventes etc.

Mangas de proteção– Evitam o contato de braçose antebraços com agentesbiológicos, materiais quentes,cortantes, perfurantes ouabrasivos, entre outros.

Calçados impermeáveise de proteção– Evitam o contato dotrabalhador com locaisúmidos, agentes químicose biológicos agressivos oucontra riscos de origemelétrica.

Vestimentas especiais– São usadas contra osriscos de lesõesprovocadas por produtosradioativos, biológicos ouquímicos.

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POR MOTIVO E ANO (mil)Ano Total Típico Trajeto Doença do Óbitos

Trabalho2004 465,7 375,1 60,3 30,2 2,82005 491,7 393,9 67,5 30,3 2,7

Para cada real gasto pela Pre-vidência com acidentes ou doençasprofissionais, o país gasta mais R$ 3.

Longos períodos de afasta-mento e aposentadorias especiaisdevido aos tratamentos geram con-seqüências drásticas para setores emque ocorrem os acidentes e para todaa sociedade brasileira. Os custos paraa Previdência Social, apenas em2003, chegaram a R$ 8,2 bilhões embenefícios acidentários. Desse valor,R$ 3,4 bilhões são referentes a apo-sentadorias, pensões por morte, au-xílio doença, acidente e suplementare R$ 4,8 bilhões, a aposentadoriasespeciais. Os gastos da Previdênciasão apenas uma parte do custo dosacidentes de trabalho.

Segundo a reportagem “Con-ta Elevada” (Revista Proteção, se-tembro de 2005), estudos apontamque, para cada real gasto pela Previ-dência Social com benefícios por in-capacidades motivadas por aciden-tes ou doenças profissionais, mais R$3 são gerados pelo custo social comoa falta de trabalho e redução de pro-dutividade. Dessa forma, conclui apublicação, o custo seria elevado paramais de R$ 32,8 bilhões. A Previdên-cia atua apenas entre os trabalhado-

A sociedade paga a contaA sociedade paga a contaA sociedade paga a contaA sociedade paga a contaA sociedade paga a contares registrados em carteira, poucomais de um terço do total.

Afastamento e invalidezNo comércio o tratamento das

LER/DORT e das doenças mentaisrequer um longo período de afasta-mento, que dura entre dois e cincoanos. No entanto, explica Cleonice

Caetano Souza, do Sindicato dos Co-merciários, por questões diversas daPrevidência Social, como o mau aten-dimento de vários médicos peritos, ostrabalhadores sequer registram seubenefício como Acidente de Traba-lho.

“Conseguem apenas um Auxí-lio Doença Previdenciário, retornan-do ao trabalho em cerca de seis me-ses e ainda doentes”, diz. Ela vai além:“As conseqüências não são somentepara o setor, e sim para toda a socie-dade, que vai arcar com o custo soci-al ao receber um cidadão excluído domercado por conta das seqüelas dei-xadas por precárias condições de tra-balho”.

Os afastamentos na agricultu-ra são constantes para a recupera-ção de cortes ou lesões causadas pelaenxada ou facão. Vários atingidospelas LER/DORT podem nunca maisvoltar ao trabalho devido à invalidez.Nos últimos anos, diversas mortesocorridas no setor sucroalcooleiro têmsido atribuídas à fadiga por excessode trabalho. No ramo metalúrgico, aCNM/CUT deve aumentar a negoci-ação com as empresas e cobrar asonze horas de descanso entre umajornada e outra, estabelecidas por lei.

Cleonice Souza:muitas vítimas jovens

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AAAAAcidentes de trabalho no Brasilcidentes de trabalho no Brasilcidentes de trabalho no Brasilcidentes de trabalho no Brasilcidentes de trabalho no Brasil

POR SETOR DE ATIVIDADE (mil)Setor de Atividade 2004 2005Indústria 211,6 229,1Serviços 202,6 219,8Agricultura 37,2 35,5

Fonte: Ministério da Previdência Social.

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Em diferentes partes do mun-do, os debates sobre a criação de leispara a proteção dos trabalhadoresocorreram tão logo se fizeram sentiros problemas sociais do processo deindustrialização. Isso porque a profis-são do operário já surgiu junto com do-enças provocadas pela lógica da pro-dução, com acidentes de trabalho queamputariam, invalidariam e levariam àmorte, com lesões por falta de prote-ção ou preparo, com jornadas exausti-vas e baixa remuneração.

A interferência do Estado nes-tas questões significava uma afrontaaos princípios liberais, que pregavama auto-regulação do mercado, inclusi-ve no que se refere à “mercadoria”força de trabalho. Embora o processotenha se desenvolvido de acordo comas particularidades históricas de cadapaís ou região, pode-se dizer que namaior parte dos casos o operariado foio grande desencadeador das discus-sões, enfrentando as reações da bur-guesia industrial e comercial.

O Brasil não foi exceção. Sãofamosas as greves ocorridas já em1907 em prol de melhores salários elimitação do tempo diário de trabalho.Nessa época, as negociações eram

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O Estado e a proteçãodos trabalhadores

A legislação social emvigor é uma conquista

resultante de mobilizaçõeshistóricas do movimentooperário, que enfrentou

dura repressão dopatronato.

Ana Iervolino- Historiadora,integra a equipe doObservatório Social.

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feitas diretamente com o patronato.Pouca coisa era feita pelo Estado, que– baseado na Constituição de 1891,alheia a questões de trabalho – se li-mitava à criação de medidas para aproteção de crianças e para a garan-tia de benefícios a funcionários públi-cos.

Industrialização e grevesA industrialização foi intensifi-

cada no país, principalmente em SãoPaulo e Rio de Janeiro, durante a Pri-meira Guerra Mundial (1914-1918) –sendo favorecida pela crise nas impor-tações, o aumento do mercado inter-no, a inflação e os baixos custos commão-de-obra. Ao mesmo tempo, amobilização de trabalhadores para aintervenção do Estado como mediadornas relações de trabalho crescia e setornou bastante expressiva no períodode 1917 a 1919, marcado por fervoro-sas greves.

O pa-tronato tam-bém se orga-nizava. Paracontrolar asm o b i l i z a -ções, amea-çava demitire fechar fá-bricas, con-tando com oapoio de autoridades policiais nas situ-ações mais críticas. A burguesia indus-trial não poderia ser totalmente con-trária a qualquer intervenção estatal,já que precisava de protecionismo al-fandegário. E quanto à atuação do Es-tado como árbitro nos conflitos soci-ais, procurava limitar a legislação so-cial, já que não podia impedir a sua cri-ação.

Após o término do conflito mun-dial, o Brasil assumia – através do Tra-tado de Versalhes e outros acordos –compromissos internacionais sobre a

questão so-cial. A Re-v o l u ç ã oRussa tevegrande re-percussãonas discus-sões. NaCâmara, sedebatia acriação deum Códigode Traba-lho, reunin-do questões

como a jornada de oito horas e a pro-teção à mulher e ao trabalhador comidade até 14 anos. As primeiras con-quistas referentes à legislação prote-tora dos trabalhadores no Brasil pas-saram a ser concretizadas, começan-do pela Lei de Acidentes de Trabalho,sancionada em janeiro de 1919.

Repressão aos operáriosA organização do movimento

operário era cada vez maior. Se asgreves significavam perdas nos lucrospara as indústrias, o aumento da difu-são de convicções anarquistas e co-munistas passou a ser visto pelos go-vernos como uma ameaça. Não poracaso, os avanços nas discussões re-ferentes à legislação social da décadade 20 – que na prática pouca coisamudavam devido à falta de fiscaliza-ção – foram acompanhados da repres-são de idéias vistas como perigosas.Um novo projeto de Código de Traba-lho foi elaborado na Câmara (1923),que originaria a regulamentação dodireito de férias (1925) e a criação doCódigo de Menores (1927). Por outro

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lado, a Lei de Deportação de Estran-geiros (1921) oficializava a expulsãodaqueles considerados elementos di-fusores de idéias indesejáveis.

Foi uma época de abrandamen-to das mobilizações do movimentooperário. Se o contexto internacionalhavia trazido idéias favoráveis ao in-tervencionismo estatal, no Brasil, o le-vante tenentista de 1922 forneceumais argumentos para uma atuaçãoefetiva contra o que era consideradoperigo à segurança nacional, legitiman-do as sucessivas vezes que o gover-no recorreu ao estado de sítio. Den-tre o que era considerado ameaça,estava o movimento operário, dura-mente reprimido.

Com a crise de 1929 e o au-mento do desemprego, as agitaçõesdo movimento operário ganharam im-pulso. Novas organizações de traba-lhadores foram criadas, participandodo processo eleitoral por meio doapoio a candidatos. Ao mesmo tem-po, a crise fazia com que as atençõesdo poder público ficassem voltadas aassuntos econômicos e não à ques-

tão proteção do trabalhador, que eraencarada, até o momento, como decaráter sanitário e moral.

O marco da CLTO governo de Getúlio Vargas

daria ao assunto um outro significa-do: o problema social passou a servisto como parte do progresso, estebaseado no desenvolvimento industri-al. Novos avanços foram feitos naproteção do trabalhador, a começarpela criação do Ministério do Traba-lho, em 1930. Mas não se pode es-quecer que este tipo de preocupaçãofazia parte do discurso com base noapoio da classe trabalhadora. Se noinício dos anos 30 havia um operaria-do fortemente organizado, as novasmedidas procuravam demonstrar queo uso da força não seria necessário.

A Consolidação das Leis doTrabalho (CLT), de 1943, foi um mar-co para a questão trabalhista, masseriam as muitas greves e movimen-tos feitos pelos trabalhadores duran-te décadas que fariam valer esta le-

Referências:

CAPELATO, Maria Helena R.Multidões em cena: Propagandapolítica no Varguismo e noPeronismo. Campinas, SP: Papirus,1998.

GOMES, Ângela Maria de Castro.Burguesia e trabalho. Política elegislação social no Brasil 1917 -1937. Rio de Janeiro: EditoraCampus, 1979.

TOLEDO, Edilene. Anarquismo esindicalismo revolucionário:Trabalhadores e militantes em SãoPaulo na Primeira República. SãoPaulo: Editora Fundação PerseuAbramo, 2004.

Centro de Pesquisa e Documentaçãode História Contemporânea doBrasil/Fundação Getúlio Vargas(CPDOC/FGV) www.cpdoc.fgv.br.

gislação. Além disso, os sindicatos –em negociação com as empresas –aos poucos conquistavam a inclusãode cláusulas de proteção nos acordoscoletivos.

Assim, as discussões quanto àcriação de uma legislação social noBrasil começaram por iniciativa dasfortes pressões do operariado duran-te a primeira metade do século XX,sob as reações do empresariado que,vendo a produção ameaçada, fez asconcessões mínimas necessárias.Enquanto isso, o Estado – nos dife-rentes momentos – lidava com os in-teresses envolvidos e utilizava as es-tratégias de controle social que lhepareciam mais eficazes para garantira manutenção da ordem vigente.Embasados por novos conceitos eparâmetros, os debates tratando dacriação de novas leis e de sua aplica-ção efetiva não cessariam.

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A empresa é obrigada afornecer aos empregados,

gratuitamente,equipamento de proteçãoindividual adequado aorisco e em perfeito estado

de conservação efuncionamento, sempre

que as medidas de ordemgeral não ofereçam

completa proteção contraos riscos de acidentes e

danos à saúde dosempregados.

”Consolidação das Leis do

Trabalho (CLT): Artigo 166S

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Madeira

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MadeiraA indústria de móveis,somada à de madeira,

é a campeã em acidentesde trabalho que provocamincapacidade permanente

em Santa Catarina,estado líder no setormoveleiro. Ações deprevenção têm sido

adiadas.

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e sangueDauro Veras

O Alto Vale do Rio Negro, no PlanaltoNorte de Santa Catarina, é o maior pólo expor-tador de móveis do Brasil. Essa história de lan-ces épicos começou em 1873, quando 70 famí-lias alemãs, polonesas, austríacas, tchecas e bra-sileiras subiram a Serra do Mar em mulas e pas-saram a trabalhar a madeira.

São Bento do Sul (75 mil habitantes), RioNegrinho (45 mil) e Campo Alegre (13 mil) abri-gam 650 empresas da cadeia produtiva de ma-deira e móveis, das quais 450 moveleiras. Jun-tas, movimentam metade da economia local eempregam 15 mil pessoas. São Bento do Sul

e sangue

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está entre os cem municípios bra-sileiros com maior Índice de De-senvolvimento Humano (IDH-M).

Por trás desse êxito oculta-se o alto custo humano cobradopela atividade. A indústria de mó-veis, somada à de madeira, é acampeã em acidentes de trabalhoque provocam incapacidade per-manente em Santa Catarina. A si-

tuação, bem pior nos anos 90, ain-da preocupa, mas a crise econô-mica deixou o tema da segurançano trabalho em segundo plano.

As movelarias enfrentam for-tes prejuízos com a valorização docâmbio, pois exportam 80% da pro-dução. Em 2005, dois mil postos detrabalho desapareceram e váriasempresas fecharam as portas. Em

conseqüência, as ações integradas deprevenção têm sido adiadas.

Nesta reportagem, trabalha-dores, empresários e representantesdo governo opinam sobre as causasde tantos acidentes e propõem solu-ções. Mutilados em movelarias con-tam suas tragédias pessoais, na es-perança de que sirvam de alerta aoscolegas e evitem outras.

ACIDENTES DE TRABALHOGRAVES E FATAIS EM SC

Acidentes incapacitantes Mortes

2004 775 147

2002 696 150

ACIDENTES DE TRABALHOGRAVES E FATAIS NA MADEIRA

Acidentes incapacitantes Mortes

2004 68 11

2002 67 03

ACIDENTES DE TRABALHOGRAVES E FATAIS NA CONSTRUÇÃO CIVIL

Acidentes incapacitantes Mortes

2004 41 07

2002 32 09

ACIDENTES DE TRABALHO GRAVESE FATAIS NA INDÚSTRIA MOVELEIRA

Acidentes incapacitantes Mortes

2004 37 01

2002 25 02

ACIDENTES DE TRABALHO GRAVES E FATAISNO TRANSPORTE RODOVIÁRIO DE CARGAS

Acidentes incapacitantes Mortes

2004 24 19

2002 24 22Anuário Estatístico de Acidentes de Trabalho 2004 - MTE/MPS, 2005Elaboração: DRT/SC e Observatório Social

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As quatro atividades mais pe-rigosas no estado de Santa Catarina,considerando morte e incapacidadepermanente, são: 1ª. Desdobramentoda madeira; 2ª. Indústria da constru-ção; 3ª. Indústria moveleira e 4ª.Transporte rodoviário de cargas. Aindústria de móveis, somada à demadeira, é a campeã em acidentes detrabalho que provocam incapacidadepermanente no estado.

Os dados mais recentes, de2004, mostram que, dos 775 aciden-tes com incapacidade permanente,105 (13,6%) ocorreram nas indústriasde madeira e de móveis. Doze das 147mortes (8%) foram de trabalhadoresdesses setores. Somente a indústriamoveleira apresentou 37 acidentesincapacitantes em 2004.

É o que informa o Anuário Es-tatístico de Acidentes de Trabalho,publicado pelo Ministério do Trabalhoe Emprego e pela Previdência Social.

Os campeões emacidentes do

trabalho em SCPara a DRT/SC,o setor não está

fazendo osinvestimentosnecessários

São Bento do Sul, com 75 mil, habitantes,é o centro do pólo moveleiro catarinense

Sér

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Estudo da Fundacentro (Fundação JorgeDuprat Figueiredo de Segurança e Medi-cina do Trabalho) realizado em São Ben-to do Sul estima que os números oficiaisrepresentam somente um quinto das ocor-rências de fato.

No caso da construção civil, o mai-or risco é a queda de altura, que pode serevitado com equipamentos de proteçãocoletiva e individual adequados. Os ris-cos no transporte rodoviário de cargasenvolvem fatores como o excesso de jor-nada dos motoristas e estradas mal con-servadas.

Vinte fiscais para5 mil empresas

“Temos só 20 auditores para fisca-lizar 5 mil empresas por ano e precisaría-mos de pelo menos 75”, diz o chefe dafiscalização da DRT/SC, Roberto Cláu-dio Lodetti. “Fiscalização deveria ter ca-ráter não só punitivo, como também edu-cativo”. Atualmente o auditor leva até umano para voltar à mesma empresa, em vezde três a quatro meses como seria ideal.Um concurso abrirá 200 vagas no paíspara 2006 e 2007. Santa Catarina devereceber 12 vagas.

O grande problema das indústriasmoveleira e madeireira é a falta de inves-timentos na proteção adequada de máqui-nas. Segundo Lodetti, a legislação queproíbe a venda de máquinas sem equipa-mentos de proteção vem sendo descum-prida como forma de baratear os custos.Para ele, não se justifica o argumento dadificuldade de importação, pois já existemmáquinas nacionais seguras.

Qualificação é outro ponto crítico.A maior parte dos funcionários é treinadapor profissionais mais antigos. Muitosacidentes ocorrem quando o trabalhadoré inexperiente, mas também quando éextremamente experiente – por excessode confiança. “A quantidade de profissio-nais formados é insuficiente para atendero mercado e poucas empresas investemem qualificação”, constata.

PressãoTrês dos 24 dirigentes do Sindicato

tiveram dedos mutilados no trabalho

Mutilações são um tema recor-rente no Sindicato dos Trabalhadoresna Indústria da Construção e do Mo-biliário de São Bento do Sul (Siticom,filiado à CUT). Dos 24 diretores, trêsperderam dedos fabricando móveis.Na categoria é difícil encontrar quemnão conheça alguém mutilado. Paraos trabalhadores a prevenção de aci-dentes continua em segundo plano naagenda patronal, mais focada em va-lorização do câmbio, carga tributáriae competição externa.

“A pressão por produtividade éuma das principais causas dos aciden-tes”, diz o presidente do Sindicato,Airton Edson Martins de Anhaia. “Osempresários citam a concorrência

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desleal da China como argumentopara pressionar por mais produção,por aumento de jornada e terceiriza-ções, e isso leva à fadiga”. Ele contaque todas as Comunicações por Aci-dentes de Trabalho (CAT) registra-das no hospital da cidade atestam “atoinseguro” e nenhuma diz “condiçãoinsegura”.

ReivindicaçõesAté 1994, predominava uma

situação precária. Naquele ano o Si-ticom entrou com ação coletiva naJustiça, exigindo melhores condiçõesde trabalho. Desde então, conta Air-ton, reduziram-se as ocorrências gra-ves, mas o número de acidentes con-tinua elevado.

O Sindicato quer que as em-presas combatam a subnotificação,adotem máquinas seguras e revisemo papel das Comissões Internas dePrevenção de Acidentes (Cipas).“Somos abertos ao diálogo, mas es-tamos perdendo a paciência com afalta de ação”, diz o sindicalista.

Sem indenizaçãoOutra reclamação é a falta de

apoio psicológico para a reintegraçãodos acidentados. “Quando ocorre umacidente, as empresas costumam pa-gar o seguro coletivo convencionado,mas a indenização por perdas e da-

nos só é obtida com ações na Justi-ça, que se arrastam por anos”, con-ta. “Muitos trabalhadores desistem dereclamar seus direitos por medo deperder o emprego”.

As Lesões por Esforços Re-petitivos e os Distúrbios Osteomus-culares Relacionados ao Trabalho

(LER/DORT) também são um pro-blema sério na atividade. “A maioriados responsáveis por Recursos Hu-manos nas empresas levam na brin-cadeira, dizem que é LERdeza” co-menta o sindicalista Ingo Petersen. “Ea maioria dos moveleiros prefere tra-balhar com dor a reclamar”.

As mutilações de dedossão um drama que afeta

muitos trabalhadores daindústria moveleira

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por produtividade

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De cada cinco acidentes de tra-balho ocorridos em São Bento do Sul,apenas um é registrado oficialmentepelo governo. É o que mostra um es-tudo realizado pela Fundação JorgeDuprat Figueiredo de Segurança eMedicina do Trabalho (Fundacentro),vinculada ao governo federal.

Sete em cada dez acidentados no pólo moveleiro do Planalto Norte catarinense ganham até doissalários mínimos; dois terços das ocorrências são ferimentos nos dedos e mãos.

Estatísticas ignoramSete em cada dezvítimas ganhammenos de dois

salários mínimospor mês

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A constatação, semelhante àverificada em outros municípios doBrasil, revela a necessidade de repen-sar a estratégia de coleta de dadospelo INSS, hoje descolada da reali-dade. Também reforça a reivindica-ção dos trabalhadores por mais parti-cipação no controle das condições de

dados foram comparados com os daPrevidência Social. Só 19,1% dosacidentes haviam sido informados aogoverno.

Em muitas Comunicações deAcidente de Trabalho (CAT) o tra-balhador é indicado como culpado pordescuido ou negligência, observa aeconomista Fabiana Carvalho da Sil-va, que realizou o estudo com ArturCarlos da Silva Moreira. Ela acreditaque vários profissionais de seguran-ça do trabalho, por serem atreladosàs empresas, não têm liberdade paraexpor sua convicção.

Perfil das vítimasO estudo indica que a idade

média dos acidentados é 27,6 anos.Os homens representam 87% do to-tal. Operadores de máquina (45%) eajudantes de produção (31%) são amaioria. Um quarto dos acidentesocorreu em junho e julho, meses fri-os. Cerca de 72% vitimaram traba-lhadores que ganham de um a doissalários mínimos – o piso é de R$457,20 e a média salarial, R$ 600,00.

Dedos são 47% das ocorrên-cias, mãos, 18% e pés, em torno de8%. Ferimentos de tronco e colunatambém são comuns, indicando jorna-da excessiva. O período da manhãconcentra a maioria dos acidentes.Em 20 empresas consultadas, nenhumfuncionário novo passou por treina-mento.

A Fundacentro quer realizar umseminário na região para mostrar aosempresários que segurança não é cus-to, é investimento. Está em andamentoum novo estudo em São Bento do Sulpara investigar a qualidade de vida notrabalho e a visão patronal sobre Res-ponsabilidade Social das Empresas.

segurança.O estudo analisou 2.598 aci-

dentes de trabalho registrados entrejaneiro de 2000 e julho de 2003 peloHospital Sagrada Família, o único dacidade. Do total, 1.115 (42%) acon-teceram no ramo de móveis. Esses

No BrasilAs estatísticas ofici-

ais de acidentes de traba-lho no Brasil começarama ser publicadas pela Pre-vidência Social a partir de1970. Os primeiros núme-ros eram muito altos, o quelevou o governo a publicarnormas específicas e a cri-ar legislações sobre a for-mação de profissionais es-pecializados, como enge-nheiro, médico e técnicode segurança do trabalho.

Os números cresce-ram até 1975, quando hou-ve 1,9 milhão de aciden-tes registrados. A partir de1976, foram caindo até ospatamares atuais que, des-de 1999, indicam em tor-no de 400 mil acidentesanuais. Mas o número demortes aumentou, possi-velmente porque não hácomo deixar de informá-las.

Vários especialistasquestionam os númerosoficiais. Apontam proble-mas como mudanças nalegislação que desestimu-laram a coleta de infor-mações, subnotificação,aumento da informalidadee estrutura precária daPrevidência Social paracontrolar a CAT.

80% dos casos

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O presidente do Sin-dusmobil, Udo Weihermann,atribui parte do problema dosacidentes à rápida moderni-zação da indústria moveleira.Em dez anos o foco mudoude móveis coloniais com ma-deira nativa vendidos ao mer-cado interno para móveis empínus reflorestado visando omercado internacional.

“Essas mudançasatraíram muitos trabalhadores não-qualifi-cados para a região, onde antes havia ple-no emprego”, diz. Ele admite que, além deatos inseguros, existem também condiçõesinseguras. “É um clima horrível quando umaempresa tem um acidente; ninguém quer terum”.

Weihermann destaca os progressosjá obtidos, em especial nas empresas degrande porte, e acredita que o setor cami-nha para uma grande redução no númerode acidentes: “Um dia a cobrança por se-gurança vai chegar ao mesmo nível de prio-ridade que a cobrança por qualidade”.

Ação conjuntaEle defende uma atuação conjunta

de empresas, trabalhadores e governo parapadronizar os procedimentos de controlede segurança e aumentar o monitoramentosobre a cadeia de fornecedores. Sua expec-tativa é que as ações da Comissão Triparti-te de Prevenção comecem em breve.

O empresário acredita que facilitar oprocesso de importação de máquinas repre-sentaria um avanço importante, principal-mente para as pequenas e médias empre-sas, que utilizam equipamentos ultrapassa-dos ou obsoletos.

Um ponto essencial para transfor-mar a realidade, na sua avaliação, é o inves-timento em educação com perspectiva delongo prazo: “Queremos que a próxima ge-ração esteja preparada para trabalhar comsegurança”.

Falta de qualificação éparte do problema

Crise adia açõesde prevenção

Em outubro de 2005 foimontada uma comissão paraestudar os acidentes de traba-lho nas movelarias do Alto Valedo Rio Negro e adotar ações deprevenção. Formada pelos sin-dicatos patronal e de trabalha-dores, pela Universidade de Jo-inville (Univille), Sesi, Senai eFundacentro, a comissão adiouseus trabalhos a pedido da ban-cada patronal.

O atraso é atribuído peloempresariado ao momento eco-nômico desfavorável, que levoua indústria moveleira a colocara sobrevivência como priorida-de. Os dirigentes moveleiros sequeixam do fortalecimento doreal frente ao dólar, golpe duropara um setor que exporta 80%da produção.

Entre janeiro de 2005 ejaneiro de 2006 houve mais de2 mil demissões e queda de16,5% nas horas trabalhadas,segundo o Sindicato das Indús-trias da Construção e do Mobi-liário de São Bento do Sul (Sin-dusmobil). Em um ano o núme-ro de empregos formais no pólomoveleiro do município caiu de9 mil para 7 mil.

Estudo setorialUm estudo realizado pelo

pesquisador Adelino Denk paraos sindicatos patronais quanti-fica o momento difícil pelo qualpassa o setor. A pesquisaabrange 67% das empresas doAlto Vale do Rio Negro, maiorpólo exportador de móveis doBrasil e terceiro exportador deSanta Catarina.

Os dados indicam prejuí-

zo acumulado de R$ 51,7 mi-lhões, 4,6% sobre o faturamen-to em 2005. O prejuízo contabi-lizado é de R$ 32,1 milhões,equivalentes a 2,9% do fatura-mento do setor, quando descon-tados os lucros de R$ 19,5 mi-lhões. Os créditos tributáriosacumulados somam R$ 102milhões, 9,1% do faturamento.

Entre 2001 e 2006, pros-segue o estudo, a inflação acu-mulada foi de 71%, enquanto ocusto da mão-de-obra subiu63% e o preço da madeira su-perou os 120%. No mesmo pe-ríodo o dólar caiu 8%. Energiaelétrica e diesel também fica-ram muito acima da inflação doperíodo.

ReivindicaçõesNo dia 11 de maio os di-

rigentes moveleiros pediram aoministro da Fazenda, GuidoMantega, alívio no impacto ne-gativo do câmbio. O setor acre-dita que o dólar entre R$ 2,40 eR$ 2,60 seria adequado.

A resposta do governofoi a mesma dada aos seto-res automotivo e calçadista: apolítica cambial será mantida.Mantega prevê que a queda dataxa Selic no Brasil – associ-ada à elevação dos juros nosEstados Unidos – fará comque o câmbio se torne maiscompetitivo.

Os empresários tambémpediram agilidade na compen-sação de créditos tributáriosaos quais as empresas têm di-reito. Ele prometeu pedir à Re-ceita Federal que agilize a aná-lise dos pedidos.

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Trabalhadores falam sobreo trauma de suas vidas

Quando o assunto é acidente em movela-rias, a família Osovsky tem muito a contar. Val-dir, o pai, perdeu três dedos e parte dos movi-mentos da mão esquerda. Seu filho Vilmar, diri-gente sindical, teve o nervo do polegar esquer-do lesado por um corte na lixadeira. O outrofilho, Vilson, perdeu os movimentos do polegardireito na multisserra. Um tio perdeu dois dedos.

Seis de outubro de 1999, 11h10. Valdirtrabalhava em uma indústria de móveis havia21 anos como operador de máquinas. Tentouabrir um pedaço de madeira com a mão na serra

OS MUTILADOS

OSOV

SKY circular. A peça trancou e a lâmina decepou

seu polegar. Outros dois dedos foram esmaga-dos. Ele sangrou duas horas até receber socor-ro médico.

“Foi excesso de confiança, falha minhae da firma”, reconhece. “Trabalhei tantos anossem proteção e um dia aconteceu. Depois dissofizeram um levantamento dos problemas e me-lhoraram a segurança”. A empresa não o inde-nizou. Um dos donos era seu primo e, como Val-dir admite parte da responsabilidade, decidiunão buscar seus direitos.

Antônio Alves Martins, 45 anos, também lembra com precisão o momento em que sua vidamudou: às 20h15 de 13 de fevereiro de 2001, ele perdeu quatro dedos da mão esquerda enquantofazia a moldura de um espelho numa fresa da empresa Intercontinental, maior exportadora demóveis do Brasil:

“Senti o sangue jorrando, vi nervos e pele. Então desliguei a máquina, levantei a mão e pediajuda. Os colegas enrolaram a mão numa toalha e me levaram ao hospital. Fiquei brabo comigomesmo, me lamentava preocupado com o sustento da minha família. Depois de três dias internado,tive uma recuperação rápida. Pensei comigo: ‘Aconteceu, paciência, tenho que levantar a cabeçae tocar pra frente’. Recebi a indenização e agora sou dono de um mercadinho”.

Ele conta que a Cipa atribuiu as causas em parte a um erro humano, em parte a um erro deferramentaria – as lâminas foram montadas e encaixadas de maneira indevida. Antônio acha queo acidente poderia ter sido evitado se não houvesse tanta pressão por produtividade: “Os patrõesestavam na fábrica naquela noite e foi uma correria, eles queriam aqueles móveis prontos...”.

MARTINSWACTAVSKI

No dia 27 de maio de 2005, Almir Wacta-vski, então com 28 anos, trabalhava na Inter-continental. Às 16h30 a máquina apresentou umproblema e ele foi verificar, mas não desligou oequipamento porque “o pessoal estava com pres-sa”. Um segundo de distração bastou: “O auxi-liar me chamou, virei para falar com ele e a má-quina puxou minha mão”. Almir perdeu quatrodedos da mão direita.

“Se a máquina tivesse proteção isso nãotinha acontecido”, diz. “Fazia três meses que eupedia isso, mas eles diziam que não podiam pa-rar o serviço. Na mesma noite do meu acidentecolocaram proteção em todas as máquinas”. Al-mir passou três meses em desespero, depois su-perou o trauma com apoio da família e do sindi-

cato. Hoje vive com uma pensão do INSS equi-valente a 70% do salário que recebia, de R$580,00. Entrou com ação na Justiça pedindoindenização.

Três meses antes – 19 de fevereiro de2005 às 17h20 – seu irmão Marcelo Wacta-vski, hoje com 23 anos, trabalhava como pro-totipista na Embramóvel quando perdeudois dedos da mão esquerda. Deprimido,pensou em se matar, mas foi dissuadido peloirmão. “Eu estava no hospital dando conse-lhos a ele e pouco tempo depois fiquei inter-nado no mesmo quarto”, lembra Almir. “Re-cebi R$ 2 mil pelos dois dedos”, recordaMarcelo, que atribui o acidente à falta deproteção na máquina.

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VERSÃO DAS EMPRESAS

EMBRAMÓVELO gerente de produção da Embramóvel,

João Luís Grossl, diz que o acidente sofrido porMarcelo Wactavski foi provocado por desatençãodo trabalhador: “Até hoje não consigo entendercomo aconteceu – ele era um funcionário bastan-te cuidadoso, mas foi negligente. A esquadreja-deira é uma máquina com duas serras usada parafabricar protótipos; não há como cobrir as lâmi-nas. Lamentei muito. Fui eu que o acompanhei aohospital. A gente procurou ajudar, mas ele pediupara sair”.

Grossl não soube informar quanto foi pagode indenização ao acidentado: “Nossa política éfazer o que é justo e certo”. Para ele, a principalcausa dos acidentes de trabalho nas movelarias éa cabeça dos funcionários: “O salário é pequenoe isso desmotiva os mais jovens, que são um pou-co inconseqüentes. As empresas até buscam pes-soas qualificadas, mas 70% da mão-de-obra é ma-landra, não tem amor pelo trabalho”.

Em março a Embramóvel desativou sua li-nha de produção e demitiu 70 funcionários.

INTERCONTINENTALCom relação aos

acidentes de trabalho men-cionados, a Intercontinen-tal gostaria de esclarecer:

a) Sr. Almir Wacta-wski: foi apurado pela CIPAque o funcionário ao fazeruma tarefa de rotina, corre-ção da altura do cabeçote

nr. 05, não desligou o cabeçote nr. 04 como deve-ria ser feito, acabando por ter sua mão direita atin-gida pelas facas deste cabeçote que se encontra-va em funcionamento, provocando desta forma oacidente. Apuraram, ainda, que a Ordem de Servi-ço de treinamento assinada pelo acidentado pre-vê no item “m” que as máquinas devem ser desli-gadas para efetuar regulagens, e no item “ n” es-tabelece que o funcionário deve sempre desligar amáquina para qualquer reparo. A causa do aci-dente, segundo a apuração e decisão unânime daCIPA, foi o ato inseguro praticado pelo emprega-do/acidentado, que não desligou o equipamentoquando pretendia efetuar um trabalho de rotina deajuste de altura do cabeçote do equipamento.

b) O sr. Antônio Alves Martins exercia a fun-ção de prototipista. No relatório de investigação eanálise de acidente ficou constatado que ao fazera usinagem em uma peça de montante de quadroespelho, o acidentado, apesar de experiência devários anos na função, decidiu usinar uma peçasem o gabarito, contrariando orientações do su-pervisor da área e as normas internas da compa-nhia. O acidentado tentou duas vezes e não con-seguiu realizar a operação. Na terceira tentativa,

A Intercontinentalenviou por correio

eletrônico aseguinte nota,

que publicamosna íntegra:

a peça voltou para trás porque estava sem o calçode apoio e gabarito que estavam disponíveis e de-veriam ser utilizados. Numa nova tentativa, levousua mão esquerda junto, quando aconteceu o aci-dente.

A Intercontinental Indústria de Móveis Ltdaé uma empresa que sempre esteve preocupadacom o bem-estar de seus funcionários e de toda acomunidade. Realiza altos investimentos para asquestões de segurança no trabalho. Entre as di-versas ações, podemos destacar que todos os seusfuncionários, antes de iniciarem suas atividades,recebem vários treinamentos relacionados à áreade segurança e na função que irão exercer. Alémdo treinamento, existe um constante acompanha-mento, verificando se as normas estão sendo cum-pridas ou não. Também incentiva a participaçãoativa de seus funcionários nas questões de segu-rança através da CIPA.

Dentro da política de segurança desenvolvi-da pela empresa visando a total segurança de seusfuncionários durante suas atribuições diárias, aempresa desenvolveu um manual de segurança,que todos os funcionários recebem ao entraremna empresa, onde estão estabelecidas todas asnormas básicas e procedimentos de segurança notrabalho.

Além disso, a empresa age com rigor parafazer cumprir o uso de EPIs por todos seus funci-onários, prevendo, inclusive, penas de suspensãopara os casos de descumprimento das normas.Contudo, a questão da segurança no trabalho éuma responsabilidade conjunta da empresa e dofuncionário.

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A Móveis James, de São Ben-to do Sul, empresa de porte médiocom 150 funcionários e R$ 13,5 mi-lhões de faturamento em 2005, é apon-tada pelo próprio Sindicato dos Tra-balhadores como um exemplo na pre-venção de acidentes. A começar pe-los equipamentos. Seu parque fabrilpossui máquinas importadas que re-

O médico cirurgião Eduardo Moraes, especializa-do em mãos, atende quase todos os casos de acidentesgraves em São Bento do Sul. De cada dez pacientes seus,quatro se feriram em atividades profissionais. Amputa-ções, lesões de tendão e tentativas de reimplante de mãose dedos – em alguns casos, bem sucedidas – fazem partede seu cotidiano. Para ele, se a lei fosse aplicada comrigor, 50% das empresas do município teriam de fecharas portas por falta de segurança.

“Quando eu cheguei aqui há 16 anos, a situaçãoera indecente, era uma batalha campal”, recorda. Mora-es atendia de 40 a 50 pacientes graves por dia; hoje sãoseis a sete, o que ele considera um número ainda elevadopara uma população de 75 mil habitantes. “Havia muitafabriqueta de fundo de quintal e menores de 18 anos semvínculo empregatício”, conta. “Depois a pressão dos com-pradores europeus por maior qualidade de vida para ostrabalhadores melhorou a situação”.

O médico ressalta que, embora os acidentes te-

“É preciso ensinar a prevenção na escola”Médico defende mais

fiscalização e mais orientaçãonham sido reduzidos nasgrandes empresas, aindaocorrem por causa da pres-são por produtividade e pelomau preparo dos trabalha-dores. Ele defende não só oaumento na fiscalização,como também na orienta-ção, como parte de uma po-lítica nacional: “Precisamosensinar a prevenção de aci-dentes domésticos, de trân-sito e de trabalho já na es-cola, com exemplos práticos,junto com a prevenção aoalcoolismo e às drogas”.

Moraes diz esperarcom ansiedade a implantação do Projeto de Saúde doTrabalhador em São Bento do Sul. Outras duas propos-tas do médico: que os acidentes de trabalho sejam trata-dos em separado dos demais, para facilitar o exame dascausas e planejar melhor as ações; e a criação de umaestrutura independente, privada, para atacar o problema.

Produtividade com éticaEmpresa aposta em segurança como vantagem competitiva

duzem ao mínimo o contato com fer-ramentas perigosas.

“Prefiro que a empresa seja vis-ta não como ‘bom exemplo’, e simcomo uma que faz o dever de casa”,diz o diretor presidente, James Pfut-zenreuter. O histórico de acidentesgraves é mínimo, mas o empresáriodeixa claro que o risco faz parte daatividade: “É preciso conscientizar osfuncionários disso”. Ele destaca se-gurança como vantagem competitivaque fortalece a confiança do cliente.E lembra que o funcionário parado re-presenta prejuízo tanto para a Uniãocomo para a empresa.

O valor do ritmoUma das reclamações mais fre-

qüentes dos trabalhadores moveleirosde São Bento do Sul, a pressão ex-cessiva para produzir, não parece serponto de conflito na Móveis James.

“Eu cobro produtividade, mas com éti-ca”, afirma. “Não se pode apressaruma atividade onde existe risco. O rit-mo do trabalho é mais importante queos picos”.

Há dez anos uma empresa daárea de segurança no trabalho dá as-sessoria três vezes ao mês e cobra adiretoria sobre o que precisa ser mu-dado. A Cipa faz uma ata mensal e adiretoria implementa as mudançaspropostas. O equipamento de prote-ção individual é obrigatório de fato:“Sou um cara chão de fábrica, façoquestão que usem”, diz.

Entre as medidas que ele de-fende para aumentar a segurança estáo incentivo do governo à compra deequipamentos importados – mais pra-zo e mais carência nos financiamen-tos –, pois as máquinas alemãs e ita-lianas não têm, na sua avaliação, si-milar nacional.

Eduardo Moraes:orientação comopolítica nacional

James Pfutzenreuter:“Minha empresa faz o dever de casa”

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Bastante dependente das oscilações domercado externo, o setor teve um ótimo desem-penho entre 2003 e 2004, com aumento de 42%nas exportações. A variação entre 2004 e 2005foi de apenas 5,4% em função da valorizaçãocambial. Em 2005 o Brasil exportou US$ 1,018bilhão em móveis.

Nove em cada dez móveis exportados sãodos estados do Sul mais São Paulo. Santa Ca-tarina lidera com 42% das exportações, segui-da de Rio Grande do Sul (26%), São Paulo (12%)e Paraná (9%). Os maiores compradores sãoEstados Unidos, França, Reino Unido, Argenti-na e Alemanha.

O Alto Vale do Rio Negro, no PlanaltoNorte de Santa Catarina, é o maior pólo expor-tador de móveis do Brasil – US$ 368 milhõesem 2005. Abrange os municípios de Rio Negri-nho, Campo Alegre e São Bento do Sul – esteresponde por dois terços das exportações dopólo.

Fortalezas e debilidadesEntre as características positivas do pólo

moveleiro do Alto Vale do Rio Negro, segundoestudo do consultor Adelino Denk, estão a dis-ponibilidade e proximidade de matérias-primas;a qualidade reconhecida do produto no mercadomundial; a proximidade dos portos; a presençade empresas especializadas na prestação deserviços e a atualização tecnológica.

Os pontos fracos são, entre outros, o ele-vado grau de verticalização; o fraco entrelaça-mento com fornecedores; a dependência do de-sign externo; a falta de estratégias cooperativasde longo prazo e a integração passiva e depen-dente no mercado internacional. Há muitas ini-ciativas em curso para modernização de ges-tão, mas encontram dificuldades pela forte pre-sença de empresas familiares.

Uma das principais ameaças externas éo crescimento da China. A competitividade dopaís asiático é tão expressiva que um númerocrescente de empresas moveleiras dos EstadosUnidos está transferindo suas estruturas produ-tivas para lá para aproveitar os baixos custos deprodução.

Perfil da indústria moveleiraA indústria de madeira e mobiliário é o terceiromaior empregador de mão-de-obra do Brasil,com 852 mil trabalhadores, que representam6,8% da ocupação do setor industrial. Entre2001 e 2004 o crescimento médio do setor foide 1,79%, abaixo da média de crescimento dopaís (2,2%).

Crescimento da IndústriaCrescimento da IndústriaCrescimento da IndústriaCrescimento da IndústriaCrescimento da IndústriaMoveleira do Brasil - 2000-2005Moveleira do Brasil - 2000-2005Moveleira do Brasil - 2000-2005Moveleira do Brasil - 2000-2005Moveleira do Brasil - 2000-2005

Evolução do Emprego formal em SC noEvolução do Emprego formal em SC noEvolução do Emprego formal em SC noEvolução do Emprego formal em SC noEvolução do Emprego formal em SC nosegmento madeira/móveis - 2002-2005segmento madeira/móveis - 2002-2005segmento madeira/móveis - 2002-2005segmento madeira/móveis - 2002-2005segmento madeira/móveis - 2002-2005

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ASSÉDIO MORAL

A violência camufladaHumilhação e tortura

fazem parte do dia-a-diade muitos trabalhadoresbrasileiros, em flagranteviolação de direitos e com

efeitos devastadoresna saúde.

Século 21. 2006. Brasil. Umaoperária do setor fabril da região Sulé acorrentada a uma máquina têxtil.Ela só será libertada depois de cum-prir sua meta de produção. Assimcomo todas as outras trabalhadorasque apresentaram baixa produtivida-de.

Outra trabalhadora, de umaempresa do Nordeste do país, parausar o banheiro durante o serviço éobrigada a fazer a limpeza dos sani-tários, pias e chão. Ela decide levarum urinol para o trabalho e fazer suasnecessidades fisiológicas diante dascolegas.

Numa terceira empresa, naBahia, vários trabalhadores são colo-cados num auditório. Os homens quenão atingiram as metas de vendas sãoobrigados a desfilar vestidos de mu-lher, ornamentados com um pênis deplástico preto – os negros têm queusar o artifício de plástico branco. Eas mulheres são oferecidas de brindepara programas sexuais com os cole-gas que atingiram as metas. As quenão aceitam são queimadas com ci-garros nas nádegas.

Humilhação, tortura, violência.Perpetrada de forma sistemática con-tra trabalhadores, com o objetivo detorná-los mais produtivos, ou descar-tá-los por baixa produtividade. Todos,vítimas do assédio moral.

São apenas três casos pinça-dos entre os encontrados e publica-dos pela pesquisadora Margarida Bar-reto, uma das maiores autoridades noBrasil sobre assédio moral.

Sylvia Palma

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atrasos, os castigos para o não cum-primento de metas, a intolerância paraqualquer tipo de doença ou queixa;são atos de violência, que agridem ooutro, e, dependendo de quanto agri-dem, podem se constituir até em danomoral. Têm uma intenção e uma di-reção. Normalmente é para fazer apessoa desistir do emprego. A pessoaacaba, muitas vezes, pedindo a demis-são e ainda carrega com ela seqüelasgraves, como transtornos mentais.

Durante cinco anos a médica,que se especializou na área da psico-logia social, entrevistou mais de doismil trabalhadores. Defendeu tese demestrado e doutorado sobre o tema.E ainda, com base em consultas aoutros 42 mil trabalhadores de todo opaís, de empresas privadas e públi-cas, de organizações não governa-mentais e sindicatos, traçou a primei-ra grande pesquisa nacional sobre otema. O resultado impressiona: dototal dos entrevistados, 10 mil reve-laram ter sido vítimas de humilhaçãoe constrangimento, repetidamente, noambiente de trabalho, na maior partedos casos, por ação dos chefes. Sóno sindicato dos químicos, onde sedeu o início da pesquisa, 42% dos tra-balhadores sofriam assédio moral.

Os sintomasA classe trabalhadora está ado-

ecendo muito por causa do assédiomoral. E os sintomas são nítidos, ex-plica a médica:

– Às vezes, a pessoa nem sabeque está sofrendo o assédio, mas pe-los sintomas é possível detectar o pro-blema. Pode começar com choros fre-qüentes, tristeza, falta de concentra-ção, de vontade de ir trabalhar, quepode se caracterizar por estresse.Mas assédio moral não é estresse. Noassédio há um processo de esmaga-mento que – muitos autores acredi-tam – pode levar a um suicídio psí-quico. É uma desvalia tão grande que

a pessoa não se considera mais útil epode acabar se matando. Muitos têmtranstornos como perda de memória,insônia, sonhos e pesadelos com o ti-rano ou agressor. Desenvolvem achamada Síndrome de Burnout, quese caracteriza por exaustão emocio-nal, avaliação negativa de si mesmo,depressão e insensibilidade com re-lação a quase tudo e todos. Quandochegam à empresa sentem palpita-ções, pânico, calafrios, suores. Aí vema depressão, a angústia, muito comumhoje. Fora isso, você tem outras tan-tas patologias que podem ser agra-vadas por fatores emocionais, comodiabetes e hipertensão.

Bancários,vítimas freqüentesRegivaldo Farias, 30 anos, fun-

cionário do Banco do Brasil em Per-nambuco, é vítima de assédio moral.Ele conta que começou a sofrer as-sédio de seu chefe no primeiro mêsde trabalho:

– O meu gerente não pedia ascoisas, ele ordenava. Eu ficava sem-pre depois do horário. Ele não tinhadiálogo, só monólogo, era ouvir e nãopoder nunca colocar minha opinião.Aquilo foi me afetando, fui seguran-do. Ele só chegava pra criticar, diziaque meu trabalho não prestava, issojá nos primeiros três meses de ban-co. Fui ficando doente, meu sistemaimunológico baixou e eu procurei umapneumologista. Ela me examinou eme encaminhou para um psiquiatra.

Margar idaBarreto,médica:

“Assédiomoral é um

risco nãovisível depotência

devastadorana saúde”

Div

ulga

ção

Violação de direitos– O assédio moral é um risco

não visível de uma potência devasta-dora na saúde do outro e uma viola-ção de direitos dos trabalhadores. Éuma humilhação sistemática ao lon-go do tempo. Os berros, os gritos, osmurros na mesa; os operários revis-tados como ladrões na saída das fá-bricas, os limites de tempo para o usodo banheiro, as penitências para os

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O psiquiatra me disse que realmenteeu precisava de um acompanhamen-to e que tinha que sair do ambienteda agência. Cheguei a ser internado.E até lá no hospital, o gerente ligavapara saber quando eu ia sair. Ele eratão opressor que me fez desmarcaruma audiência judicial por causa dotrabalho. Proibiu-me de usar a tesoura-ria do banco, ordenou que os funcioná-rios não me atendessem. Era humilha-ção atrás de humilhação. Só fui ter pazquando ele foi transferido. Mas foi umaluta que durou um ano e dois meses.

A paz que Regivaldo conquis-tou foi graças ao Sindicato dos Ban-cários, que publicou uma cartilha so-bre assédio moral. Por meio dela,Regivaldo teve consciência de quesua saúde não tinha sido afetada poruma fragilidade pessoal, mas de umsistema perverso de controle de pro-dução. Segundo Regivaldo, algunscolegas já tinham passado por aquilo,mas entendiam que “esse era o jogoa ser jogado”. Criticar era perder ojogo ou se arriscar a ficar fora dele.

Só com a intervenção do Sin-dicato e com laudos de quatro psiqui-atras, Regivaldo conseguiu provar queo problema não era só dele, mas dosistema. Um dos psiquiatras chegoua ir à agência e fazer entrevistas comoutros funcionários. Comprovou que10% deles estavam com problemaspsíquicos. Era uma agência doente.Depois disso, o gerente perseguidorfoi transferido.

A adminis-tradora

legislativaCristina de

Almeida foitransferida

para alimpeza

depois defazer

denúnciasC

hico

Ter

ra

– A gente sabe que o gerentetambém sofria pressão. Falam tantoem responsabilidade social, mas sóvejo isso da porta pra fora da institui-ção. Para dentro são metas e metas.Claro que temos que atingir as me-tas, eu sempre atingi as minhas, maspor que a gente tem que ser humilha-do para isso? Eles falam que é umproblema interpessoal, mas não é não,em todos os bancos existe a mesmacoisa – completa.

E o sindicato comprova. Segun-da a Secretária Geral do Sindicato dosBancários, Suzineide Medeiros, coor-denadora do projeto “Assédio Moralna Categoria Bancária, Uma Experi-ência No Brasil”, que deu origem àcartilha, pelo menos 39% dos bancá-rios sofrem assédio moral.

– Fizemos uma pesquisa com-parativa e, na média, poderíamos di-zer que 32 mil bancários, nos últimosseis meses, passaram por isso.

A pesquisa foi feita com ban-cários de 25 estados, de todas as re-giões do Brasil. No caso dessa cate-goria, o maior constrangimento é comrelação a metas abusivas.

– Éramos 800 mil, hoje somos400 mil, houve uma redução drásticados trabalhadores. A categoria devetrabalhar seis horas. Mas se sair nessehorário, outros acusam o que saiu dedeixar trabalho acumulado. A com-pensação por banco de horas tambémé aleatória. As folgas não são plane-jadas junto ao trabalhador. E ainda sãocobradas dele as metas. Aqueles quenão conseguem atingi-las são subme-tidos ao assédio. O funcionário é vis-to como descartável, diz Suzineide.

A médica e pesquisadora Mar-garida Barreto explica por que essaprática é cada vez mais comum en-tre as empresas:

– A gente vive numa socieda-de ainda marcada pelo coronelismo,na qual as atitudes autoritárias sãobastante banalizadas. Por outro lado,

há uma nova reorganização interna-cional do trabalho. A política de ges-tão das empresas visa ao resultadoem curto prazo. Nela o trabalhadornão é importante, e sim a sua produ-tividade. É o neoliberalismo. E o tra-balhador, para não perder o empre-go, compromete sua saúde física emental. O resultado disso é perda dedireitos. É trabalho precarizado, bai-xos salários, ameaça de desempre-go. Adoeceu, eliminam-se os adoe-cidos, coloca-se gente mais nova.

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O bodeUm patrão obriga-

va o funcionário que nãoatingia as metas da em-presa a conviver em seuambiente de trabalho comum bode. O empregadoconsiderado fracassadotinha que cuidar do animalpor um determinado tem-po. Se bode perdessepeso, ele era obrigado apagar 200 reais para opatrão. Se morresse, a dí-vida dobrava. O trabalha-dor tinha que levar o ani-mal para casa, expondo-se à zombaria pública.

OUTROS CASOS DE ASSÉDIO MORALOUTROS CASOS DE ASSÉDIO MORALOUTROS CASOS DE ASSÉDIO MORALOUTROS CASOS DE ASSÉDIO MORALOUTROS CASOS DE ASSÉDIO MORAL

Indenização roubada

Gravidez indesejadaUma trabalhadora de empresa

pública era perseguida e humilhadapela chefe. Como necessitava do tra-balho, tentava contornar a situação.Um dia se descobriu grávida e, que-rendo compartilhar a felicidade com ascolegas, anunciou emocionada a notí-cia. Ao ouvir, a chefe destacou: “Eu

odeio mulher grávida!” Quanto mais agravidez ia avançando, mais a chefeperseguia a funcionária, que passou ater pânico de ir ao trabalho. O descan-so só chegou no momento de dar à luzao filho. Mesmo assim, depois teve quepedir transferência do local de traba-lho.

A cada fim de contrato, a empre-sa propunha ao funcionário terceirizadocontinuar naquele trabalho, com outraempresa que estava entrando para onovo período de contrato. Para isso, aprincípio ele receberia todos os direitostrabalhistas, as multas rescisórias, etc,

mas no momento em que fosse descon-tar o cheque no banco, deveria devolverparte desse pagamento à empresa. O Mi-nistério Público conseguiu flagrar o mo-mento em que o trabalhador devolvia par-te de sua indenização ao representanteda empresa.

Assédio moralna política

Cristina de Almeida, candidatapelo PSB ao Senado pelo Amapá nasúltimas eleições, acreditava só fazero seu trabalho quando denunciou, noperíodo em que foi superintendente doIncra, que mais de 25 mil hectares deterra da União foram ocupadas irre-gularmente por pessoas influentes doestado – entre elas, um deputado es-tadual, um juiz, um deputado federal,um promotor, funcionários públicosfederais e agricultores. Até o presi-dente da Assembléia Legislativa, de-putado Jorge Amanajás, estava envol-vido, disse ela. A denúncia ecooucomo uma bomba na região. Negra,39 anos, um metro e oitenta de altu-ra, ela foi afastada do cargo no In-cra, ameaçada de morte e sofreu todotipo de difamação.

Mas o pior ainda estava por vir.Na Assembléia Legislativa ela haviaentrado através de concurso públicopara ocupar o cargo de administra-

dora legislativa e exercer a função deauditora. De lá fora cedida ao Incra.Chamada a se reapresentar, Cristinafoi obrigada, por determinação do pró-prio presidente da Assembléia, depu-tado Jorge Amanajás, a ocupar umcargo na área de serviços gerais. Aretaliação, com fortes tons de precon-ceito racial e assédio moral, não rece-beu protesto de nenhum parlamentar.

– Eu pensei em cercá-lo naAssembléia para tirar satisfação, mastive orientação do partido para acei-tar a situação. Os jornais publicarama história. As pessoas iam lá ver seera verdade. Fiquei então trabalhan-do na limpeza. Nenhuma das quatromulheres parlamentares, duas delasinclusive integrantes da mesa direto-ra, teve a coragem de anunciar no ple-nário a minha situação. Mas muitosmovimentos reagiram: o Conselho Es-tadual de Mulheres, o Instituto deMulheres Negras, o Partido Socialis-ta Brasileiro, todos fizeram uma car-ta para ele, sem nenhum resultado.

Cristina teve que passar os diaslimpando o chão e as cadeiras da As-

sembléia, para o constrangimento daspróprias serventes, que sabiam da in-tenção do deputado de humilhar a mu-lher que o tinha denunciado. Ela fica-va também na cozinha, onde era vigi-ada diretamente pelo chefe imediatode Amanajás. Teve o ponto cortadodurante o período de transição do In-cra para a Assembléia. Quando re-solveu ir à televisão denunciar sua si-tuação, foi obrigada a tirar férias paraque o caso fosse abafado. Agora queela perdeu a eleição para o Senado,terá que retornar ao cargo na Assem-bléia nas mesmas condições.

– Eu dei queixa de assédio mo-ral no Ministério Público e me deramumas fichas para preencher. Informeique me retiraram da folha, recorri comtodos os advogados possíveis e ne-nhum teve uma resposta pra mim. Osprocuradores abriram processo, masnão foi pra frente, está lá parado!

Mico na mesaO Ministério Público, que no

Amapá não fez muito por Cristina, no

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Diego GomesJorge foiexcluído doprograma“Jovens pelaPaz” por serecusar a sercaboeleitoral

Div

ulga

ção

Rio de Janeiro tem sido mais atuan-te. Não existe ainda lei federal quecombata o assédio moral, mas algunsestados aprovaram uma lei que pro-tege o trabalhador dessa situação. ORio de Janeiro é um deles. Segundoo juiz do trabalho da 48ª Vara do RJ,Cláudio Olimpio Lemos de Carvalho,o assédio moral, pela lei, é uma espé-cie de dano moral, esse sim, previstono Código Civil.

– Todos nós temos valoresimateriais como honra, boa fama, ima-gem etc. O assédio moral é uma es-pécie de “dano moral”, porque a vio-lência ao patrimônio de uma pessoaé causada de forma contínua e per-manente. É como se fosse um danomoral homeopático, são pequenasdoses diárias que acabam aniquilan-do a auto-estima.

O juiz afirma que têm aumen-

tado as ações por assédio moral noestado. Num dos casos julgados porele, a trabalhadora reclamava que sesentia humilhada porque, quando nãoatingia a meta de vendas, era obriga-da a trabalhar com um mico de pelú-cia em cima da mesa de trabalho.Toda vez que ela se levantava damesa para vender, tinha que levar omico com ela. E durante toda a se-mana tinha que ficar com o mico emcima da mesa.

– Para uma criança de dez anosnão teria problema talvez! Mas paraum trabalhador, sim, é uma ofensa,embora seja apenas um boneco depelúcia. Não é um xingamento, algoque efetivamente viole o patrimôniode alguém, é um dano sutil. O curio-so é como as coisas se disseminamno ambiente de trabalho. Não é só ohumilhado a vítima. Quem receberáo “troféu” no próximo mês? Todospassam a viver sob pressão, medo, an-gústia, o terror psicológico de ter quepassar por aquela situação.

Para o juiz, há pouca consci-ência do problema do assédio moralnas empresas. Os empregadoresmuitas vezes têm dificuldade de en-tender e aceitar que estão cometen-do um ato danoso. Dizem que estãosurpresos, que era só uma brincadei-ra, um jogo, e que isso sempre existiuno ambiente de trabalho.

O gerente regional da CaseConsult – empresa de recrutamentoe seleção de executivos – André Bo-cater Szeneszi concorda que o assé-dio moral é velho conhecido dos tra-balhadores. Ele tem uma opinião di-ferente sobre o assunto e acredita quea novidade hoje esteja apenas nonome.

– Isso sempre existiu, a pres-são, a questão de puxar tapete, essacoisa toda. O nome é que é novo. Oque mais tem hoje são empresas tra-balhando em esquema de curtíssimoprazo, em que existe esse ambiente.As pessoas que trabalham nessasempresas reclamam, mas não procu-ram outro trabalho, mais adaptado aoseu perfil. Elas acabam ficando ali por-que já estão empregadas. Por outrolado, essas empresas também achamque é preferível trabalhar assim.Acham que investir no pessoal não énegócio. Seu produto já está com amargem tão alta que preferem sugaro máximo desse profissional, até eleexplodir. Depois é só trocar, porquetem muita mão-de-obra no mercado.

Ele acrescenta que a maioriadas empresas com as quais tem con-tato no mercado estão preocupadascom a qualidade de vida e com ambi-ente saudável no trabalho Mas nãoaconselha as pessoas que estejam vi-vendo esse problema a processarsuas empresas:

– Muito trabalhador acha quese entrar na justiça vai perder a em-pregabilidade pra sempre. Dependeda forma que isso vai se dar e qual ocusto-benefício disso aí. Tenho medoque vire um mercantilismo. Advoga-dos se aproveitando disso para ganhardinheiro, banalizando as relações detrabalho e até acabando com as em-presas. Você pode ter um chefe mui-to ruim e às vezes não ser culpa daempresa. Melhor é sair e procuraroutro emprego.

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É o oposto do que pensam ojuiz Cláudio Olimpio e o promotor daJustiça do Trabalho, João Bertier.Para eles, a atitude mais adequadaquando se vive um assédio moral édenunciar ao sindicato ou ao Minis-tério Público.

– São práticas que tendem aaumentar se não forem combatidas.Elas crescem cada vez mais. Geral-mente estão ligadas às empresas queestabelecem metas de venda. Recen-temente, uma empresa de telefoniaestabeleceu que os funcionários sópoderiam ir ao banheiro uma vez aodia, num determinado horário. “A em-presa foi julgada e condenada a pa-gar a um funcionário, por assédiomoral, dez mil reais, mas não reco-nheceu o erro, o que é lamentável”,diz o juiz Cláudio Olimpio.

A importânciada denúncia

Para procurador João Bertier,o único método de combater o assé-dio é a transparência, porque ele nãose dá diante da sociedade, mas den-tro das empresas.

– Ao denunciar, isso tende adiminuir. O sindicato da categoriapode ajudar nisso, seu papel é funda-mental. Ele deve ser atuante, forte,estar constantemente dialogando como trabalhador. Ele é que pode fazeressa ponte. E o trabalhador não pre-cisa aparecer. Pode fazer a denúnciaanonimamente ao sindicato ou ao Mi-nistério Público. Existem meios paraque ele não fique com o ônus da de-núncia. Pode entrar com uma açãocoletiva, por exemplo. A empresa ja-mais vai saber quem deu início à re-clamação.

O músico Diego Gomes Jorge,ex-monitor do projeto Jovens pelaPaz, do governo do estado do Rio deJaneiro, foi vítima de assédio moral.

Ele preferiu entrar com uma ação co-letiva na procuradoria da Justiça deNova Iguaçu, contra o governo. Masnão se esquivou de liderar seus cole-gas nem de aparecer como mentorintelectual da ação.

O caso é de assédio moral po-lítico partidário. Diego e outros jovensdenunciam que o programa Jovenspela Paz, cujo objetivo declarado éinserir jovens na sociedade por meiode atividades culturais e artísticas, temobrigado os participantes a trabalharem campanhas políticas do PMDB,partido do governo, e em repartiçõespúblicas.

Ele conta que começou comovoluntário do programa em 2004, de-pois se tornou bolsista. Em um mêsfoi colocado no cargo de monitor, dan-do aulas de canto e de teoria musicale instrumental para os jovens. Era res-ponsável por cem jovens e recebia 800reais por mês. A seguir passou a su-pervisor, com a missão de orientar osmonitores, e ficou no cargo por umano. O coordenador geral do progra-ma, Gilson Pinheiro Sombra, é namo-rado da Clarice Matheus, filha dagovernadora Rosinha Matheus. Du-rante esse período na supervisão, Di-ego percebeu uma enorme engrena-gem com objetivos políticos.

– A maioria dos bolsistas eramindicações políticas. Quando eu era

bolsista, já achava estranho ter quedar 10 reais de colaboração do auxí-lio-bolsa para o supervisor. Diziam queera uma caixinha para custear even-tos. Depois que comecei a conhecera supervisão, vi que havia vários gru-pos políticos dentro do programa, li-gados ao PMDB, para os quais deví-amos trabalhar. Quando era lançadaalguma campanha importante do go-verno, a gente tinha que ir lá fazer“claque”. Quem não ia era sumaria-mente demitido. Como muitos neces-sitavam da bolsa – mães solteiras, porexemplo – iam obrigados. Era cons-trangedor. Eu fui excluído quando nãoquis trabalhar para a campanha doprefeito de Nova Iguaçu, Mario Mar-ques. Eu tinha que botar os bolsistascomo cabos eleitorais dele. Só naBaixada Fluminense são 900 bolsis-tas, mais ou menos 7 mil em todo es-

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ONDE DENUNCIAR

Ministério Público ou Procuradoria Pública do Município Sindicato de sua categoria

Importante: a denúncia pode ser anônima

O coordenador do programa Jovens pela Paz, do Governodo Estado do Rio de Janeiro, Wilson Sombra, afirma que DiegoGomes Jorge foi desligado do programa por não ter apresentado osrelatórios solicitados pela coordenadoria do projeto, que atestam odesenvolvimento das atividades sócio-culturais junto aos jovens. Dizainda que as alegações de Diego só foram feitas depois de ele tersido afastado do programa justamente por causa do não cumpri-mento de suas atribuições.

Sobre a alegação de Diego de que o motivo do afastamentoteria sido a recusa em participar como cabo eleitoral das eleiçõespara prefeito na baixada fluminense, Wilson Sombra contesta e ga-rante que Diego só foi afastado meses depois das eleições citadas.Sobre a participação de bolsistas do programa em campanhas dogoverno, informa que nenhum jovem era obrigado a participar de-las.

Questionado sobre as motivações de Diego para entrar comuma ação contra o Estado, disse as que desconhece. Alega que oprograma envolve 15 mil jovens e somente Diego tomou essa inici-ativa, configurando um ato isolado. Sobre o uso do trabalho dos emrepartições públicas, Sombra explica que o programa Jovens pelaPaz faz convênios com a Defensoria Pública, que desenvolve ativi-dades de capacitação para o trabalho. Diz que os jovens são convi-dados e não obrigados a ocupar essas vagas. Ele assegura que osparticipantes são escolhidos pelos monitores na comunidade.

AmapáO presidente da Assembléia Legislativa da Amapá, deputado

Jorge Amanajás, foi procurado pela reportagem via e-mail e portelefone, insistentemente, por vários dias. Foi oferecido a ele o mes-mo espaço ocupado por Cristina Almeida para que pudesse se de-fender das acusações de assédio moral e grilagem. No entanto, ape-sar das promessas por parte da secretária do deputado, Maria deJesus, e de seu chefe de Gabinete, Claudomiro Borges da Silva, deque receberíamos uma resposta para as acusações e documentosimportantes atestando os acontecimentos, nada foi enviado até ofechamento desta edição. Num último telefonema, a secretária in-formou que todos estavam cientes de que a reportagem seria publi-cada sem a resposta do deputado.

NA INTERNET

www.assediomoral.org

tado. Imagina esse pessoal todo fa-zendo campanha. Comigo saíram 50a 60 bolsistas. Nós entramos comuma ação coletiva por assédio moralna Procuradoria de Nova Iguaçu. Aação é por racismo também, porquemuitas vezes nós éramos chamadospor termos que evidenciavam o ra-cismo.

O procurador da justiça do tra-balho de Nova Iguaçu, João Bertier,aceitou a denúncia. Foi aberta umaação do Ministério do Trabalho como Ministério Público em conjunto.

- Não havia inclusão social al-guma. Primeiro houve o desvio doprograma. Segundo, eles foram obri-gados a trabalhar para o Estado semconcurso público. E por último, tive-ram de aderir ao movimento políticoda juventude do PMDB. É assédiomoral, coação, porque a rigor essesjovens deveriam ser inseridos em pro-gramas sociais. O processo está emandamento, confirma o promotor.

Por que têm crescido tanto oscasos de assédio moral no país? Oprocurador procura a resposta:

– Isso é herança do trabalhoescravo. O trabalhador não é vistocomo um cidadão, mas como coisa.Muito assédio moral no Brasil tem aver com perversidade, mas outrostêm a ver com a questão da cidada-nia. Como aquelas empresas que re-vistam os empregados na hora de irembora. O empregador acha que otrabalhador é sua propriedade. Issocontribui muito para o assédio. O Bra-sil tem que se reeducar nas relaçõesde trabalho e a denúncia é o primeiropasso para isso.

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TTTTTrabalho erabalho erabalho erabalho erabalho etranstornos mentaistranstornos mentaistranstornos mentaistranstornos mentaistranstornos mentais

O trabalho em condições perigosas,humilhantes ou de extrema pressão porprodutividade pode levar a sérios danos

psíquicos. A exposição a substânciastóxicas também provoca alterações de

comportamento, linguagem, memória eaprendizado.

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U– Um piloto de metrô em SãoPaulo vê alguém pular na frente dotrem. Na época em que eu pesquisei,há alguns anos, a média dessas ocor-rências era de uma por semana. Eleteve que voltar a trabalhar no dia se-

a um caso de estresse pós-traumáti-co, um dos diversos transtornos psí-quicos que o trabalhador pode vir asofrer. O caso fez parte de uma pes-quisa sobre a saúde mental dos me-troviários encomendada para o Die-sat – Departamento Intersindical deEstudos da Saúde dos Ambientes de

Trabalho.– Quando a pes-

soa tem estressepós-traumático,

passa a quererevitar o localde trabalho”,explica am é d i c a .“Precisa terapoio psico-lógico parasuperar aqui-lo”. Ela relata

que o pilototambém passou

a sonhar com asvisões. Começou

a ficar nervoso emuito deprimido, em

conseqüência da falta de tratamentoadequado a tempo.

Depois que veio a depressãoele ficou quase um ano sem traba-lhar. Ao voltar, não foi encaminhadoa tratamento psicológico e ficou tra-balhando à base de calmantes. Edithconta que na entrevista ele dizia: “Ah,se pelo menos me dessem outra li-nha, a norte-sul, para eu não ter quepassar pela estação Bresser, porquequando eu passo por lá já começo ame sentir mal...”

O estresse pós-traumático serelaciona tanto à violência no traba-

lho quanto à violência social. Porexemplo: o caixa de uma agência ban-cária que é assaltada pode presenci-ar cenas de grande violência. Comoconseqüência, passa a vivenciar aque-la situação no dia-a-dia. “Esse pro-fissional não deve ser submetido amais agressão, que é encarar o tra-balho como se nada tivesse aconte-cido”, esclarece a médica.

Outro exemplo de estresse pós-traumático decorrente do ambiente detrabalho é o dos fotógrafos policiais,que freqüentemente têm de fotogra-far pessoas assassinadas. Os sinto-mas são semelhantes: flashback –lembrança das imagens que choca-ram o trabalhador –, sonhos, hesita-ção em relação ao ambiente que lem-bre aquela situação.

A leiAté 1999 as doenças mentais

ligadas ao trabalho não eram citadasna classificação geral das doençasque afetam os trabalhadores. O es-tudo de um grupo de pesquisadoresda Faculdade de Medicina de MinasGerais forneceu uma lista de trans-tornos mentais relacionados ao tra-balho. Isso deu base para a portarianº 1.339/1999, adotada pelo Ministé-rio da Previdência Social e pelo Mi-nistério da Saúde.

Em 2001, a lista Transtornosmentais e do comportamento relaci-onados ao trabalho se transformounum manual de serviços para orien-tar profissionais da área de saúdepública em seus diagnósticos. Tornou-se um instrumento importante para ostrabalhadores, que puderam ter am-

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guinte. Quando passou na estaçãoonde havia ocorrido o suicídio, teveuma visão da cena. Ficou paralisado,suando frio, não conseguia fazer maisnada. Aí tiveram que tirá-lo dos tri-lhos naquele dia. Mas ele continuoutrabalhando no outro e no outro, ten-do que passar por aquele trauma co-tidianamente.

Este relato da médica Edith Se-ligmann, que há mais de 20 anos pes-quisa doenças do trabalho, se refere

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paro da previdência no caso de afas-tamento do trabalho motivado pelasdoenças listadas.

O manual também vem servin-do aos pesquisadores interessados nolevantamento de estatísticas para de-tectar quais setores da economia têmmaior incidência de casos. Edith Se-ligmann considera fundamental esselevantamento, para que os trabalha-dores possam cuidar dos seus direi-tos junto às empresas e conseguir aresponsabilização delas.

Crescem a cada dia os proces-sos de adoecimento por causa da re-estruturação produtiva, que deixa aspessoas inseguras no ambiente de tra-balho. Apesar das novas tecnologias,os trabalhadores estão mais sobrecar-

regados. Um dos resultados dessenovo arranjo é o aumento da depres-são e do alcoolismo – que estão tam-bém na lista dos transtornos mentaise do comportamento.

Alcoolismo crônico“O alcoolismo muitas vezes

surge como uma tentativa de agüen-tar a carga insuportável da depres-são”, diz a doutora Seligmann. Ela fazuma lista dos trabalhos em que o al-coolismo está mais presente:

Os muito perigosos, em que fal-tam meios adequados para se prote-ger.

Os que demandam muita comu-nicação, como em vendas. Usa-se abebida para estar alegre, disponível efalante.

Os que envolvem muita pres-são e cobranças injustificadas, comobancário ou jornalista.

Os considerados socialmente re-pugnantes, como lixeiro, coveiro ouem matadouros de animais.

Na opinião da médica, essas sãoprofissões em que as pessoas precisa-riam ser muitas bem tratadas e ter pos-sibilidades de progredir na carreira paraocupar outras atividades.

Neurastenia e burn outEsse transtorno, que inclui a

síndrome de fadiga ou fadiga pato-lógica, está muito relacionado a ope-rários que fazem trabalhos repetiti-vos com esforço físico intenso e nãotêm tempo de se recuperar do can-saço. Eles se sentem desanimadose sem forças.

As LER/DORT – lesões poresforços repetitivos, distúrbios os-teomusculares relacionados ao tra-balho – são doenças físicas que po-dem ter origem psíquica. Sua ocor-rência é favorecida pela tensãoemocional. Às vezes levam à sín-drome de fadiga crônica.

Burn Out também é conheci-da como síndrome do esgotamentoprofissional. É uma espécie de es-tresse agudo. Acontece muito comprofissionais de saúde e educado-res que não recebem reconheci-mento e enfrentam muitas adversi-dades.

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Um caso específicoUm caso específicoUm caso específicoUm caso específicoUm caso específicoO alcoolismo e as drogas tam-

bém afetam grande número de tra-balhadores das plataformas de petró-leo da Bacia de Campos. Confinadospor duas semanas em alto mar, essesprofissionais trabalham 12 horas pordia, sem sábado ou domingo, em tur-nos alternados – uma semana de dia,outra semana de noite. Os trabalha-dores diretamente contratados folgam21 dias em terra. Os terceirizados –a grande maioria – folgam apenas 14dias. Quando estão em terra, muitoscompensam o estresse em compor-tamentos compulsivos como a buscapor álcool, drogas, jogos etc.

A assistente social Maria dasGraças Alcântara da Costa Rocha, doSindicato dos Petroleiros, o Sindipe-tro, trabalha desde 1998 com esseperfil de trabalhadores:

– A maioria dos que me procu-

ram não vem por problemas psíqui-cos, mas conversando com eles nóspercebemos a depressão, a drogadi-ção e o alcoolismo. Eles vivem numcontexto conturbado. A rotina juntoà família é afetada. Os filhos têm di-ficuldade de aprendizagem e de acei-tar a autoridade paterna, as esposasreclamam da falta de cooperação.Eles também têm um patamar de to-lerância baixo e muitos são agressi-vos.

Graça, como é conhecida pe-los trabalhadores, acredita que essestranstornos psíquicos estão relacio-nados ao contexto do trabalho nas pla-taformas. Apesar da falta de estatís-ticas, diz que o problema é sério emuito pouco falado:

– A distância da casa, o confi-namento, o preconceito com o homemque está no mar e deixa a mulher so-zinha em terra, a questão dos baixossalários, principalmente dos terceiri-zados, tudo isso é muito estressante.

Aldir de Souza Viera, 34 anos,14 anos no setor petroleiro, é um des-ses terceirizados. Há quatro anos emeio na plataforma P10 como ope-rador de guindaste, ele passa de umafirma para outra, sempre no mesmosetor. Fica 14 dias embarcado e 14dias em terra para ganhar 2.600 re-

ais por mês. Seu tempo máximode almoço é de 20 minutos.

Ele trabalha das 7 damanhã às 7 da noite. Depois

do horário, a rotina é tomarbanho, comer e assistir

tevê. Cada trabalhadorna plataforma tem direi-to a ficar apenas 30 mi-nutos por dia conecta-do à internet. Como sãomais de 100 profissio-nais, é quase impossívela comunicação freqüen-

te com a família e os amigos.– Até uns anos atrás, o pesso-

al terceirizado era humilhado, faziacoisas difíceis de um ser humano acei-tar. Hoje está melhor, mas essa roti-na leva a muita depressão. Um cole-ga nosso se matou. Eu não senti de-pressão, mas angústia sim. Vontadede ir embora, sumir, mas tenho famí-lia para criar, não posso largar – , con-ta.

Carlos Antonio da Silva, 40,também vive a mesma rotina estres-sante na plataforma P9. Diz que mes-mo com a pressão, não mudaria detrabalho, pela segurança que a em-presa lhe dá. Mas, reclama do regi-me de turnos alterados:

– Quando você vai para a pla-taforma, na primeira semana traba-lha de dia e na segunda de noite. Éuma adaptação difícil de rotina, eu par-ticularmente não durmo nessas vira-das. Você quer uma coisa e seu or-ganismo outra. Mas se pudesse tra-balhar em terra, eu não gostaria. Issoaqui é uma cachaça, a gente se vicia.

Mergulhadores guerreirosTranstorno de sono foi uma das

queixas mais ouvidas pelo engenhei-ro Marcelo Figueiredo, especializadoem organização do trabalho, quandofez estudo de doutorado sobre a saú-de dos mergulhadores de águas pro-fundas na Bacia de Campos. É tam-bém uma das doenças listadas pelomanual do Ministério da Saúde.

Os mergulhadores da indústriapetrolífera costumam ser profissionaisterceirizados – estão sujeitos a con-dições de trabalho mais estressantese podem ser demitidos a qualquermomento. Eles estão expostos a umacarga de trabalho intensa, que temefeitos ao longo dos anos. Doenças

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gastro-intestinais, diabetes e hiperten-são podem ter origem psicológica, masnão são diagnosticadas assim.

O risco de acidente com subs-tâncias inflamáveis gera ansiedadepermanente. Vários mergulhadoresusam mecanismos de defesa indivi-duais e coletivos para se manter noregistro de normalidade. Alguns có-digos de virilidade entre eles têm afunção de sustentação psíquica, ex-plica o pesquisador:

– Trabalhador que embarcanão pode manifestar cansaço ou es-tresse. Para suportar as condiçõestem que ser guerreiro. Quando vocêfaz uma manobra às duas da manhã,em condições ruins do mar, pareceque está numa frente de batalha: alança do guindaste passa sobre suacabeça, um cabo de aço pode arre-bentar e matar quem estiver pela fren-te, a pistola de hidrojateamento poderomper seu intestino... São riscos le-vados ao extremo. Nesta situação nãobasta ser guerreiro, tem que ser HighLander –, diz, referindo-se ao filmede ficção científica em que o herói sóperde a imortalidade se cortarem acabeça dele. – O melhor guerreiro éaquele que passa por tudo e não morre.

O Sindipetro propõe um Pro-grama de Saúde Mental para os tra-balhadores do setor:

– Hoje os agentes de saúdepensam a doença mental do trabalha-dor como uma questão individual, vin-da de uma predisposição da pessoa,e não como conseqüência das rela-ções do trabalho. Propomos que es-sas questões sejam também pensa-das pelo serviço público – diz a assis-tente social Maria das Graças.

Substâncias tóxicasNo manual adotado pe-

los Ministérios da Saúde e daPrevidência são mencionadostambém vários distúrbios men-tais no ambiente de trabalho li-gados à intoxicação por ele-mentos químicos ou a traumacrânio-encefálico. Por exem-plo, a demência, o transtornoorgânico de personalidade e otranstorno cognitivo leve – estepode ser causado por níveiselevados de ruídos.

A principal causa é a ex-posição a substâncias tóxicascomo monóxido de carbono,sulfeto de carbono, metais pe-sados como chumbo, mercú-rio, manganês ou, ainda, sol-ventes e outras substâncias.Entre as conseqüências estãoalterações no comportamento,na memória, na linguagem, noaprendizado e nas áreas cog-nitivas.

O manual orienta quenesses casos, identificadas asdoenças, é preciso neutralizarimediatamente os fatores derisco, realizar o diagnósticopreciso do paciente e afastá-lodo trabalho para tratamento.Também é importante dar su-porte aos familiares para con-viverem com a doença e emi-tir a CAT – Comunicação deAcidente do Trabalho, para queo trabalhador possa ser asse-gurado pela previdência.

Uma reflexãoUm caminho para prevenir e

resolver problemas de adoecimentomental é perceber como é feita a or-ganização do trabalho. Segundo osespecialistas, a gestão empresarialpode causar muitos sofrimentos ao tra-balhador. É importante transformar oesforço em algo que dê satisfação epossibilite exercer a criatividade.

O trabalho realizado em ambi-ente saudável tem dois lados: o daresponsabilidade e do prazer. Respon-sabilidade de levar até o fim aquelajornada e o prazer da construção edifusão daquele bem por toda socie-dade.

Os especialistas defendem asensibilização dos trabalhadores paraque eles conquistem esse ambientenovamente. Para que possam pressi-onar por uma legislação que impeçaas empresas de exigir tanta produti-vidade e competitividade. E pressio-nar por um sistema de saúde com-prometido com a prevenção e trata-mento das doenças do trabalho.

Um dos primeiros passos paraisso seria a reestruturação do tempoe dos laços afetivos no trabalho. Épreciso dividir melhor as tarefas e ostempos, para que todos se sintam me-lhor. Dinâmicas micro-sociais sãoações preventivas para a manutençãoda saúde mental.

Os especialistas também sãounânimes em afirmar que, sem essasações, a conta de tanto adoecimentovai bater no sistema público de saú-de. Isso não é mais um problema sóda classe trabalhadora, mas de todaa sociedade brasileira.

S.P.

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Leonardo Wexell SeveroAgência de Notícias CUT

O circo dehorroresda Cargill

Ritmo intenso de trabalho nosfrigoríficos agrícolas damultinacional causa a

multiplicação de lesões poresforço repetitivo.

Sindicalistas defendemaprovação da MP 316 para

combater a subnotificação dosacidentes de trabalho e

garantir direitos.

De repente, a correnteque transportava os frangos atéa linha de produção, a nórea, co-meçou a girar mais rápido, di-tando a intensidade do ritmo detrabalho no frigorífico avícola.Sem tacógrafo para disciplinarsua velocidade, tornou-se incon-trolável. Como se a nórea tives-se vida própria, implacável, trans-formando os funcionários em ser-vos da produtividade, obrigados aacelerar o movimento dos cortes,cada vez mais complexos, paraatender aos crescentes pedidosdos exportadores. Assim, na ân-

sia de garantir os seus empregos,os trabalhadores do setor come-çaram a adoecer para cumprir ameta e o Brasil transformou-se nomaior exportador mundial de fran-go - mas também subiu alto nopódio das lesões por esforço re-petitivo (LER).

“Filhas bastardas da re-lação promíscua entre a intensi-dade desumana e a falta de ri-gor na fiscalização nos locais detrabalho, as enfermidades vãobrotando como aleijões nestegordo e lucrativo mercado, mul-tiplicando lesões, invalidez e mu-tilações”, denuncia Siderlei deOliveira, presidente da Confede-ração Nacional dos Trabalhado-res nas Indústrias da Alimenta-ção (Contac/CUT). Entre tan-tos abusos, ressalta, “a Cargilldeveria entrar para o guiness dabandidagem, por seu histórico deilegalidades e agressões contraos trabalhadores e à própria re-presentação sindical”.

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TruculênciaPara quem acha que o termo

soa forte, Siderlei lembra que já ocor-reram dois encontros internacionaisde trabalhadores da Cargill – o últi-mo realizado em São Paulo, no mêsde agosto – no qual as denúncias vêmcrescendo, sendo fartamente compro-vadas por testemunhos em vídeos epublicações. Um dos mais obscurosexpedientes utilizados pela multinaci-onal – prontamente rechaçado pelaJustiça – ocorreu em Jaraguá do Sul-SC, onde, para conseguir manter oabate de 120 mil frangos por dia, abu-sou da truculência.

“Colocou lonas pretas em vol-ta da empresa, um som potente paraimpedir os informes do Sindicato du-rante a greve, policiais dentro dosônibus e seguranças para impedir olivre trânsito dos trabalhadores, numaprática terrorista”, lembra Sérgio Ec-cel, presidente do Sindicato da cida-de. Vários trabalhadores registraramBoletim de Ocorrência denunciandoterem sido vítimas de cárcere privado.

Com o apoio da União Inter-nacional dos Trabalhadores na Ali-mentação (UITA), o último evento,que reuniu delegações da Argentinae do Uruguai, definiu ações para se-rem encaminhadas “junto aos gover-nos, à direção da empresa, nos EUA,à Organização dos Países Industria-lizados (OPI) e aos países consumi-dores, que devem tomar ciência dosabusos e absurdos que são parte dodia-a-dia da Cargill – e agir”.

Questionada pela primeira vezno final de setembro, a assessoria deimprensa da empresa comunicou que"estranhava" as denúncias e que, por

fugirem da sua alçada, seriam res-pondidas oportunamente pela direçãode Recursos Humanos. Os dias sepassaram sem resposta e voltamos àcarga, solicitando um pronunciamentooficial. Negativo. "O RH definiu queem primeiro lugar vão resolver osproblemas para, depois disso, se ma-nifestar. Acredito que estão conver-sando com as entidades [CUT eContac]. A resposta que eu obtive éessa", reiterou a assessora de im-prensa três semanas após nosso pri-meiro contato. Até o fechamentodesta edição, a Cargill não havia res-pondido nem uma única denúnciaapresentada por dirigentes da Con-tac ao coordenador de RH, HaroldoVieira, durante reunião em Florianó-polis no dia 28 de junho, quando foidado prazo de 10 dias para que osproblemas fossem resolvidos. Umnovo encontro com os sindicalistasocorreu no dia 7 de julho, na sede daempresa em Itajaí. Novo silêncio.

Projeto de LeiAlém de audiências públicas

no Senado e na Câmara Federal, aContac realizou recentemente encon-tro na Assembléia Legislativa de San-ta Catarina (Alesc), com a presençada direção regional do INSS, do Mi-nistério Público do Trabalho, da DRTe parlamentares, em que a multina-cional norte-americana foi a princi-pal acusada pelo agravamento dascondições de trabalho no setor. Naspalavras do deputado Dionei Walterda Silva (PT), autor do Projeto de Leique dispõe sobre normas de prote-ção à saúde do trabalhador em em-presas de abate e industrialização de

carnes, “houve um aumento brutal dacarga de trabalho, um flagelo que semanifesta pelo crescente número detrabalhadores precocemente inutiliza-dos ou que passam longos meses emtratamento médico”.

O PL 300/2006 propõe a im-plementação de uma rotina de inter-valos a cada período trabalhado paraa realização de alongamentos; a ins-talação de delimitadores da velocida-de, em limites suportáveis, em todosos mecanismos como esteiras e cor-reias que compõem as linhas de pro-dução e a colocação de mecanismosfísicos (tacógrafos) para a fiscaliza-ção da velocidade de funcionamentoimposta aos trabalhadores.

Conforme o engenheiro e pe-rito em segurança do Trabalho, JoséDuarte de Araújo, “é urgente a colo-cação desses limitadores, pois o gran-de número de funcionários incapaci-tados por doença profissional nas aví-colas demonstra que a categoria évista como insumo descartável”. En-tre outras medidas, frisa o perito, énecessário que as plantas dos frigorí-ficos nas áreas frias, onde haja pos-tos de trabalho, sejam dotadas deáreas de equalização para atender odisposto no artigo 253 da CLT, objeti-vando o conforto térmico e a preven-ção das doenças provocadas pelo frio.

O caso dos lesionados da Cargillé debatido em audiência públicana Assembléia Legislativa de SC

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DesnacionalizaçãoSegundo a Contac, os estran-

geiros entraram em campo imanta-dos pelo lucro fácil no setor, “des-nacionalizando a galinha dos ovosde ouro”. Só para citar a evoluçãodo capital transnacional na indústriade frango, lembra a entidade, emapenas um ano a norte-americanaCargill pulou no ranking da 14ª paraa 11ª colocação entre as maioresempresas em atuação no Brasil.Com 353.269 toneladas, e 12,41%de participação no mercado, a Sea-ra/Cargill é a terceira maior expor-tadora de produtos de frango do país,seguida pela Doux Frangosul, com286.805 toneladas e 10,08% domercado.

Uma olhada nos números ex-plica a atenção também dispensadapela Doux francesa e a norte-ameri-cana Osi Group. As exportações dosetor avícola cresceram vertiginosa-mente: saltaram de US$ 870 milhõesde dólares, em 2000, para mais deUS$ 3,5 bilhões em 2005, um recor-de histórico que consolida a posiçãode segundo lugar no ranking do agro-negócio, superado apenas pelo com-plexo soja.

Conforme a Associação Bra-sileira dos Produtores e Exportado-res de Frango (ABEF), no ano pas-sado, os embarques somaram 2.845milhões de toneladas, com crescimen-to de 15% em relação a 2004, en-quanto a receita cambial aumentou35%. “Ao final de 2005 o Brasil che-gou a um total de 142 mercados com-pradores e uma participação de 41%no comércio internacional de frango”,comemora a entidade.

Globalização perversaPara o secretário da UITA,

Gerardo Iglesias, é preciso estreitara relação entre as entidades que têma Cargill na base, para potencializara ação sindical. “Complexo agroindus-trial, alimentar e financeiro, com 142mil funcionários em 1.100 fábricasespalhadas por 61 países, as vendasda Cargill já ultrapassam a casa dosU$ 70 bilhões. Tamanha produçãosocializada é apropriada por duas úni-cas famílias: a própria Cargill e a MacMillan, exemplificando o que é a glo-balização capitalista”, denuncia.

Informações divulgadas pelosite da Seara – encampada pela Car-gill – e que atua na área de carnes deaves e suínos, apontam que a empre-sa conta com 15.675 trabalhadores nosetor, distribuídos em nove unidades:Mato Grosso do Sul (Sidrolândia eDourados), São Paulo (Nuporanga),Paraná (Jacarezinho) e Santa Cata-rina (Itapiranga, Seara, Jaraguá doSul e Forquilha). Ao todo, os funcio-nários da Seara/Cargill abateram 277milhões, 320 mil e 934 aves no anopassado. “Sem novas contratações eo crescimento no abate de mais de14 milhões de cabeças em relação a2004, o que temos é uma sobrecargade trabalho, com mais lesões e muti-lações pelo esforço repetitivo”, escla-rece a Contac.

Embalados pela lógica banal deum ritmo selvagem, com a produçãoaumentando sem qualquer correspon-dência com a geração de empregos,os bônus tilintam nos cofres da em-presa, enquanto os ônus, como pesa-do fardo, se acumulam sobre as cos-tas, braços, mãos e colunas dos tra-

balhadores. De acordo com a legis-lação, a LER é acidente de trabalho,o que teoricamente obriga as empre-sas a emitirem o Comunicação porAcidente de Trabalho (CAT). Mas ofato, facilmente constatado, é quepara não pagar a mais o FGTS, amulta pela grande incidência de lesõese ter de garantir a estabilidade do tra-balhador no emprego, se mascara aemissão da CAT, potencializando o lu-cro.

Absurdo“Se em vez do auxílio-doença,

a empresa tiver de pagar pelo auxí-lio-acidente que causou, terá de de-positar o FGTS todo mês e ainda ga-rantir um ano de estabilidade após avolta do trabalhador. Além disso, pelanossa Convenção Coletiva, terá depagar todo tratamento médico, inclu-indo consultas, medicamentos e atécirurgia”, explicou Célio Elias, secre-tário-geral do Sindicato dos Trabalha-dores na Alimentação de Criciúma eRegião.

Presente à audiência pública naAssembléia Legislativa de Santa Ca-tarina, a dirigente regional do INSS,Eliane Luiz Schmidt, condenou o cir-co de horrores que é a subnotifica-ção dos acidentes de trabalho e des-tacou a importância da Medida Pro-visória 316, publicada pelo presidenteLula no dia 11 de agosto, que estabe-lece o Nexo Técnico Epidemiológico(NTE) e o Fator Acidentário Previ-denciário (FAP) para a saúde e se-gurança dos trabalhadores.

“Com o NTE há uma inversãodo ônus da prova no caso das doen-ças ocupacionais. A partir de agora,

Trabalhadores em audiênciapública no Congresso Nacional

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caberá à empresa comprovar que nocaso de determinadas lesões não foi aresponsável. No setor da alimentação,é grande o número de trabalhadores quetem adoecido barbaramente”, acrescen-tou. Conforme Eliane, casos como o dasdoenças osteomusculares de membrossuperiores vão se enquadrar automati-camente como seguro acidente e nãomais como auxílio-doença.

AlíquotasA dirigente do INSS frisou que

também é muito importante o FAP, paraque haja uma modificação nas alíquo-tas: “Assim as empresas que adoecemmais trabalhadores não ficarão apenaspagando alíquotas variáveis de 1% a 3%.Temos de penalizar aqueles que maisoneram a sociedade, pois este é um custonão apenas econômico, mas social: ostrabalhadores acabam ficando sem con-dições de continuar no mercado”.

Uma das explicações para os al-tos índices de LER/DORT no setor decortes de frango é a complexidade dosmovimentos das mãos que, associadosa um ritmo intenso, causa graves seqüe-las aos trabalhadores. Diante disso, mui-tos países trocam a produção local porimportações. Assim, no Brasil, os em-barques de cortes de frango somaram1,7 milhão de toneladas no ano passado,18,5% acima de 2004, enquanto a recei-ta foi 32% maior, alcançando US$ 2,236bilhões.

Manifesto conjunto em defesa daMP 316, assinado pela CUT, CGTB,CGT, Força e SDS, ressalta que “ao cri-ar medidas que trarão melhorias signifi-cativas no quadro caótico que se apre-senta na grande maioria dos ambientesde trabalho”, o governo contribui parapôr fim “à perda de direitos e à trajetóriade humilhações que os trabalhadores so-frem para obter o reconhecimento dosacidentes e principalmente doenças dotrabalho”. Ao mesmo tempo, as inova-ções “permitirão identificar de modo maispreciso o quanto cada empresa é res-ponsável pelos altos índices de aciden-tes e doenças do trabalho existentes noBrasil, e cobrar delas uma alíquota maisjusta”.

Valdirene João Gonçalves da Silva, funcioná-ria da Seara Cargill em Forquilhinha-SC, foi recom-pensada após 11 anos de serviços com a invalidezaos 35 anos de idade. Ela conta das inúmeras ve-zes que trabalhou deixando os filhos doentes, sobrecomo se esmerava para não deixar passar uma úni-ca coxa ou peito. “Eram sete coxas desossadaspor minuto, 420 por hora e sabe-se lá quantas milpor dia, dependendo dos pedidos de exportação”.

Foram anos seguidos de presença constan-te, sempre disposta a cumprir a meta e ir além. Atémesmo quando os colegas prepararam a greve, quesoava como palavrão em seus ouvidos, ela traba-lhou para a empresa. Em meio às lágrimas, descul-pa-se, frisando que havia adquirido a consciência daluta em meio à adversidade, à tentativa da Cargill desuborná-la com um cargo quando queria apenas vol-tar a ter condições de trabalho.

Nas palavras do médico, que expôs o trágicodiagnóstico de Valdirene munido do exame de ul-trassom, “o braço está podre”. Agora, a dor é cons-tante, aplacada apenas com morfina...

“Inferno”Ivani Alves de Meira, 41 anos, cinco de em-

presa, foi sumariamente demitida da Cargill em Ja-raguá do Sul-SC no dia anterior à cirurgia de retiradado útero, após ter comunicado a empresa sobre acomplexidade da operação. Na mesma cidade, V.B.de 24 anos, três de empresa, foi posta na rua comAids: “Quando souberam da doença, começou o in-ferno”.

Em São Miguel do Oeste, o dirigente sindicalNeomar Capelesso foi demitido por justa causa pordefender os direitos dos companheiros e reintegra-do por decisão da Justiça. Sebastiana Alves de Je-sus, com 36 anos, um ano e dois meses de empre-sa, foi demitida por justa causa em Sidrolândia-MS,ao trazer o exame de ultrassom comprovando a exis-tência de nódulos nos seios.

Na mesma cidade, Juliane dos Santos Silvei-ra, de 22 anos, quatro de empresa, foi dispensadano ato quando mostrou a ressonância magnéticaapontando a necessidade de intervenção cirúrgicapara fazer frente à lesão obtida na desossa do fran-go. Em Ilhéus-BA, a multinacional ingressou na Jus-tiça querendo cassar a estabilidade dos dirigentessindicais que reivindicavam Participação nos Lucrose/ou Resultados para a categoria. E a lista de abu-sos se estende.

As vítimas

Valdirene daSilva: invalidezaos 35 anos

Juliane Silveirafoi demitida aoadoecer

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As reuniões de profissionais daárea de saúde e segurança no Brasil,em geral, começam com as mesmasreflexões: não temos uma cultura desegurança, não temos políticas públi-cas organizadas para o tema, não te-mos dados confiáveis para baseá-las,mas sabemos que o número de aci-dentes de trabalho, de agravos à saú-de relacionados ao trabalho, de tra-gédias individuais e sociais causadospelo e no trabalho são inaceitáveis.

Tudo isso é verdade e as ra-zões deste panorama não são difíceisde perceber. Em primeiro lugar apassagem do modo de produção pre-dominantemente agrícola e familiarpara o modelo industrial, baseado nadivisão e controle do trabalho, se deumuito rapidamente. Hoje, esse modode produção é amplamente predomi-

Umcenário

sombrioVelhos problemas não

resolvidos e novosdesafios da

transformaçãotecnológica são

obstáculos para aconstrução de umapolítica eficaz de

saúde e segurançano trabalho

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Consuelo GenerosoCoelho de Lima- Médica do trabalho eauditora fiscal do trabalho.

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nante, inclusive no campo. As con-seqüências dessa mudança rápida,em termos históricos, se refletem tan-to nos ambientes de trabalho quantonos próprios trabalhadores.

Ambientes de trabalho escu-ros, com máquinas e equipamentosperigosos, sem um mínimo de organi-zação ou sistema de proteção mes-mo que visando a preservação do pró-prio maquinário, ainda são comuns enão chocam ninguém. Por sua vez,trabalhadores que não têm uma tra-dição de reivindicação e de auto-or-ganização para defesa de seus inte-resses coletivos e, por outro lado, comampla experiência de relações soci-ais e de trabalho extremamente au-toritárias, acabam por criar estraté-gias defensivas baseadas na negaçãodo risco, aumentando a resistênciaem aceitar proteções individuais oucoletivas, ainda mais se essas impli-

cam diminuição de sua performanceno trabalho.

Em segundo lugar, em paísesde capitalismo periférico, como é onosso caso, a valorização do trabalhosó é comparável ao desvalor atribuí-do ao trabalhador, principalmente du-rante os sucessivos períodos de cri-ses econômicas que aumentam o jáenorme exército de reserva, consti-tuído por milhares de desempregadose subempregados, dispostos a acei-tar quaisquer condições para manterum trabalho remunerado regular.Mais recentemente, o grau de degra-dação e violência nas periferias dascidades (não só as grandes) contribuide maneira significativa para a cons-trução de uma percepção de banali-dade da vida, cujo reflexo no mundodo trabalho é a consideração de quesistemas de proteção são caros e umexagero de zelo.

Subnotificação einformalidade

Nesse contexto, torna-se difí-cil delimitar o que são os principaisproblemas de segurança e saúde dotrabalhador brasileiro. Quase sempre,só são registrados os acidentes gra-ves que levam a afastamento do tra-balho por mais de 15 dias. No casodas doenças profissionais e do traba-lho a subnotificação é a regra, já quena maioria das vezes, sequer são di-agnosticadas. Os dados dão contaapenas de uma parte dos trabalhado-res, aqueles que se encontram nomercado formal de trabalho, consti-tuindo o universo de segurados do Ins-tituto Nacional da Seguridade Social.

“As organizações einstituições doEstado envolvidasno tema debatem-seentre um discurso euma práticadesvinculados euma eterna disputade competências”.

Contudo, parte expressiva dostrabalhadores está no mundo do tra-balho informal. À margem dos be-nefícios previdenciários e, portanto,sem análise de seu perfil de morbi-mortalidade a partir do trabalho. Nes-se mundo, muitas vezes, trabalho in-formal é também trabalho ilegal e vaiempregar uma mão-de-obra não acei-ta na formalidade, como jovens e cri-anças que acabam por ter o pior tipo

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“São raras asexceções de

construção de umapolítica de segurançacapaz de envolver otrabalhador ao invés

de simplesmenteobrigá-lo a seguir

regras sem reflexão”.

de iniciação, consolidando uma visãodistorcida do trabalho, na qual ganhara vida implica aceitar o risco de per-dê-la.

Na minha opinião, portanto, oprincipal problema de segurança esaúde no trabalho (SST) no Brasil éa absoluta falta de consciência quan-to ao que venha ser trabalho seguroe saudável e o conseqüente descasocom a questão. De qualquer ânguloque se aborde o tema, seja do pontode vista do trabalhador, do emprega-dor ou do próprio Estado, o investi-mento em SST é considerado secun-dário.

Com o fenômeno da globaliza-ção econômica, instituindo concorrên-cia entre trabalhadores dos diversoscantos do mundo e enfraquecimentodo movimento sindical (que andameio perdido diante da ameaça detransferência de empresas para regi-ões onde o trabalho é ainda mais ba-rato), as reivindicações referentes àsquestões de SST, se não desapare-ceram dos Acordos Coletivos, perma-necem como figuração. Negociam-se questões já resolvidas na legisla-ção ou pequenas variações em tornodo mesmo tema, nada que possa im-plicar tomadas de posição no sentidoda construção de políticas de segu-rança, com a participação de traba-lhadores.

Falta políticade segurança

Para os empregadores, é umaquestão de custo operacional. Em-presas maiores, geralmente, incluemem seus orçamentos gastos com pro-teções de máquinas, equipamentos de

proteção individual (EPI), elaboraçãoe manutenção de programas obriga-tórios pela legislação, como PCMSO- Programa de Controle Médico deSaúde Ocupacional e PPRA - Pro-grama de Prevenção aos Riscos Am-bientais.

Mas são raras as exceções deconstrução de uma política de segu-rança própria, pró-ativa e capaz deenvolver o trabalhador ao invés desimplesmente obrigá-lo a seguir regrassem muita reflexão sobre o assunto. Emgeral, trata-se de cumprir a lei.

Nas pequenas e médias em-presas o conflito é bem maior. Nes-sas, segurança e saúde do trabalha-dor costuma se resumir à compra deequipamentos de proteção individualde péssima qualidade e, muitas vezes,inadequados e realização de examesmédicos malfeitos e descontextuali-zados. Longe de aumentar o controlesobre a saúde dos empregados e dosriscos nos ambientes em que traba-lham, esses exames costumam servirapenas para efeitos burocráticos,atender às exigências da fiscalização,comprovação de cumprimento legalperante a justiça etc.

Já as organizações e institui-ções do Estado envolvidas no temadebatem-se entre um discurso e umaprática desvinculados e uma eternadisputa de competências. No Minis-tério do Trabalho e Emprego, respon-sável pela regulamentação e fiscali-zação dos ambientes e condições detrabalho, o principal problema aindaé um conflito de identidade. Há mui-to já superamos o entendimento deque nosso papel se resume à resolu-ção de problemas pontuais em fisca-lizações pontuais. Há muito é hege-

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mônica, entre os auditores fiscais dotrabalho especializados em saúde esegurança no trabalho, uma visão deque nosso papel pode ser muito maistransformador se praticarmos a fis-calização do trabalho de maneira pla-nejada, com objetivos definidos pre-viamente e com a participação dos di-versos atores sociais envolvidos.

Essa passagem do fiscal soli-tário para um agente de transforma-ção social que usa suas ferramentasde trabalho, inclusive os recursos le-gais da multa, da notificação, da me-diação e outras típicas da função, emações envolvendo organizações detrabalhadores e empregadores ou gru-pos de empregadores e empregadosde um mesmo ramo ou atividade ouainda com o mesmo tipo de proble-ma; reflete-se na organização de gru-pos e programas especiais de traba-lho e nas comissões tripartites paraintroduzir mudanças na legislação,entre outras ações. No entanto, o de-senvolvimento dessas práticas é to-lhido pelo modelo de controle e avali-ação do trabalho do auditor fiscal, ain-da baseado na produtividade indivi-dual e quantidade de fiscalizações re-alizadas.

Diálogo insuficienteOutro grave problema que apa-

rece como entrave à construção depolíticas públicas de saúde e seguran-ça no trabalho é falta de diálogo emesmo o conflito de interesses entreas diversas instituições e níveis go-vernamentais ligados à questão. A fis-calização não tem nenhum mecanis-mo formal de diálogo com a Previ-dência Social que, por sua vez, focasua ação na questão da concessão ou

negação de benefícios ao segurado in-dividual, não analisando a relação en-tre o problema de saúde apresentado(seja doença ou acidente) e os ambi-entes de trabalho. Sem menosprezara necessidade do atendimento indivi-dual, é preciso ter em mente que aparticularização do problema podegerar e gera enganos tanto na con-cessão quanto na negação desses be-nefícios e, principalmente, na carac-terização da relação de causalidadeentre os problemas apresentados pelotrabalhador/segurado e o trabalho.

E temos também o SistemaÚnico de Saúde (SUS), a quem cabe,conforme a legislação, a atenção àsaúde do trabalhador desde a prote-ção e recuperação da saúde, com arealização integrada das ações assis-tenciais e das atividades preventivas.Com tantas questões mais imediatase prementes a resolver, o SUS aindanão tem organizado sua ação em SST.Alguns municípios até chegaram acriar Centros de Referência em Saú-de do Trabalhador que resistem bra-vamente graças, principalmente, ao

“Qual é o resultado daterceirização?

Que repercussões trazem osnovos produtos e processosno ambiente trabalho? Essas

e outras questõespermanecem sem resposta”.

engajamento de seus profissionais,mas ainda isolados do restante da rede,pouco equipados e sem grande ex-pressão no mundo do trabalho.

É neste cenário sombrio queenfrentamos não só o quadro de aci-dentes de trabalho e doenças profis-sionais já conhecido como outro, ape-nas suspeitado, advindo da rápidatransformação de tecnologias de pro-dução e organização do trabalho.Qual é o resultado do processo de ter-ceirização do trabalho na preserva-ção da saúde e vida do trabalhador?A agroindústria canavieira está le-vando os colhedores de cana-de-açúcar à morte por exaustão? E to-dos esses novos produtos e proces-sos químicos e físicos introduzidosnos ambientes de trabalho, que re-percussão têm trazido? Essas e ou-tras questões semelhantes perma-necem sem resposta. E se não te-mos conseguido sequer responderde maneira coerente e integrada aosvelhos problemas, dificilmente con-seguiremos compreender e atuarsobre os novos.

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amos tomar a velha brincadei-ra “Descubra o que é” para ilustrar oestado da arte do movimento de Res-ponsabilidade Social Empresarial. Abrincadeira é vendar os olhos de al-guns participantes e desafiá-los aadivinhar, pelo tato, qual objeto estãotocando. O “objeto” não revelado é umelefante. Posiciona-se a pessoa jun-to a uma pequena área do corpo doenorme animal, o participante a tocae diz uma sorte de possibilidades; osegundo, da mesma forma, é coloca-do pegando o rabo, e provavelmentedirá que é um burro ou outro animalde rabo semelhante; o terceiro teránas mãos parte da tromba e logo tam-bém dará as mais variadas sugestões.

O elefante e aResponsabilidade

Social Empresarial“Desenvolvimento humano é o processode alargamento das escolhas dosindivíduos, proporcionando a cada um aoportunidade de tirar o melhor partidodas suas capacidades: viver uma vidalonga e saudável, adquirir conhecimentose aceder aos recursos necessários paraum nível de vida decente.”

Sergio Vieira de Melo

Tiradas as vendas logo fica óbvio paraos três participantes que aquilo sópoderia ser mesmo um elefante!

Assim é, mais ou menos, oque tem acontecido nos inúmeros se-minários, conferências, debates e di-vulgação sobre Responsabilidade So-cial Empresarial. Por se tratar de ummovimento das empresas de adesãovoluntária cujas políticas são definidasunilateralmente de acordo com as pos-sibilidades, interesses e nível de com-prometimento das empresas, encon-tramos um sem número de aborda-gens e programas colocados dentroda “cesta” RSE. Desta forma, fica di-fícil para o observador que não acom-panha o tema discernir entre os avan-ços, as oportunidades e os oportunis-mos criados por este movimento.

Entretanto, como toda idéia eação que amadurece ao longo de suaprática e enfrenta suas contradições,a RSE no Brasil tem proporcionadoevidentes exemplos de avanço tanto

no que diz respeito à atitude de algu-mas empresas quanto no envolvimen-to dos stakeholders (partes interes-sadas) que, mesmo de maneira tími-da, começam a compreender a suadinâmica. Parte destes avanços estápor conta de entender – as empresase uma parcela da sociedade que seinteressa pelo assunto – que filantro-pia não é RSE em seu conceito mai-or, e que fazer publicidade de açõesinócuas e mentirosas resulta em efei-to contrário sobre sua imagem commuita rapidez.

Sustentabilidade eTransparência

Sustentabilidade e Transparên-cia são dois elementos especialmen-te importantes ao tratarmos de RSE.Ambos também constituem o aspec-to mais utópico e, por que não dizer,contraditório deste movimento empre-

V

Regina Queiroz- Coordenadora da área de Responsabilidade Social do Observatório Social

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sarial que emerge justamente quando começam a apare-cer para a sociedade os rápidos resultados negativos doprocesso de globalização. A pergunta feita em meadosdos anos 90 era simples: onde vai dar tudo isso em ter-mos econômicos, sociais e ambientais? O esgotamentodos recursos naturais, a deterioração social e, portanto, ocaos, estavam e estão em processo acelerado. Obvia-mente estamos sentados sobre uma bomba. Há estudio-sos que dizem termos entre 30 e 70 anos para “consertaro estrago”, principalmente ambiental. Isso significa que omundo deve tomar uma atitude urgente pautada pela bus-ca da sustentabilidade. Preservar a possibilidade econô-mica no sentido de viabilizar a produção e o consumo,garantir a sustentação social baseada no trabalho e nasrelações entre os povos e grupos sociais, assegurar queas gerações futuras tenham os recursos naturais disponi-bilizados são tarefas impostas para toda a sociedade nesteséculo. E, portanto e principalmente, para as empresasque realizam, em altíssima escala, o seu poder de deter-minar a economia, as relações sociais e o uso dos recur-sos naturais.

A Transparência é aprimeira regra do comprome-timento. Impulsionadas pelaimperiosa necessidade deter atitudes conseqüentes eembaladas pelo velho ditado“perder os anéis para nãoperder os dedos”, as empre-sas, inicialmente as multina-cionais, criaram o movimen-to de Responsabilidade So-cial Empresarial. A propostaé que as companhias secomprometam em organizarseus negócios levando emconsideração os impactos esua responsabilidade sobre os aspectos econômicos, so-ciais e ambientais – também identificado como os triplebottom lines: people, planet, profit. Para que este com-promisso ultrapasse a idéia de intenção ou total superfici-alidade está instituído que a Transparência de sua políti-ca é primeira atitude daqueles que aderem ao movimentoe querem dar publicidade aos seus processos de Res-ponsabilidade Social Empresarial. Antes de esta Trans-parência ser para com a “sociedade em geral”, ela deveser direcionada para aqueles que têm imediato interessenos negócios e operações das empresas: seus trabalha-dores, as comunidades do entorno onde está operando, omeio ambiente interno e externo, os governos, os consu-midores e os fornecedores.

MonitoramentoDiferentes organismos internacionais procuram

nortear e propor diretrizes para a implementação de políti-

cas de RSE, como é o caso da ONU e da OCDE – Orga-nização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico.Várias iniciativas internacionais e nacionais estão empe-nhadas em organizar normas e diretrizes dando as condi-ções para que as empresas iniciem o processo de formaalcançar resultados para si próprias e suas partes inte-ressadas, como por exemplo o GRI – Global ReportingInitiative, a SAI – Social Accountability International (AS8000), ISO 26000, Instituto Ethos, Balanço Social do Iba-se, entre outros. Em todas essas orientações a base co-mum inicial é o estabelecimento de relações com as par-tes interessadas e, como conteúdo, o respeito e cumpri-mento dos artigos que compõem a Declaração dos Direi-tos Humanos e as convenções da OIT – Organização In-ternacional do Trabalho.

O processo é um grande desafio. Muito tempolevará, se acontecer, para que um razoável número de em-presas empenhe o tão esperado adjetivo “socialmente res-ponsável” e, muito mais importante do que isso, poder-mos constatar verdadeiras mudanças no curso das rela-

ções de produção e consu-mo, nas relações sociais etrabalhistas e no uso dosrecursos naturais. De nadaadiantará desenvolver certi-ficações, auditorias, selos,prêmios se não houver omonitoramento dessasações, programas e políti-cas de RSE por parte da so-ciedade.

Os trabalhadoresOs trabalhado-

res de uma empresa e seussindicatos organizados são

os elementos com maior possibilidade para desenvolver omonitoramento das políticas de RSE estabelecidas. Tudoaquilo que foi transparentemente declarado pelas empre-sas em suas publicações, relatórios, propaganda e ou-tros meios pode ser acompanhado por aqueles que vivemo dia-a-dia. Se o resultado deste monitoramento será umaatitude de denúncia ou de cobrança para que uma açãoseja efetiva e verdadeira, cabe aos trabalhadores e seussindicatos discutirem.

Os sindicatos da CUT tomaram a frente neste de-bate. No seu 9º Congresso, em junho deste ano, aprovaramuma resolução em que identificam a existência deste movi-mento empresarial e, com bastante cautela, se colocamcomo observadores das ações que estejam sendo criadaspelas empresas. Para os sindicatos, esta observação maisatenta está submetida, em primeiro lugar, a que as empre-sas cumpram seus compromissos de respeito à liberdadesindical. Sem este ponto de partida não há como se imagi-nar em um processo de responsabilidade social.

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O Observatório Social se propõe a avaliar as condi-ções de saúde e segurança nas empresas em queaplica suas pesquisas. Para tanto, conta com umtermo de referência desenvolvido para interpretar econtextualizar as normas internacionais à luz darealidade brasileira, bem como complementá-lascom as normas e padrões nacionais de condutaempresarial.

Segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS),saúde é “um estado de completo bem estar físico,mental e social, e não somente a ausência de afec-ções ou enfermidades”. Por isso, influências físicas,químicas e biológicas das condições de trabalhoafetam a saúde do trabalhador tanto física quantomentalmente.

As ações em favor da saúde do trabalhador devemter a participação dos mesmos para contribuir nacompreensão do impacto do trabalho sobre o pro-cesso saúde-doença e intervir efetivamente paratransformar a realidade.

Os marcos regulatórios dessa ação social são, en-tre outros, a ratificação da Convenção 148 da OITsobre contaminação, ruído e vibração; a alteraçãona NR-1, que determina ao empregador que infor-me aos trabalhadores sobre a existência de riscosno local de trabalho, de medidas de proteção, doresultado dos exames médicos e do direito de par-ticipar das decisões relativas a sua saúde; a Cons-tituição da República de 1988, que atribui ao Siste-ma Único de Saúde (SUS) a execução de ações devigilância sanitária e epidemiológica; a criação daRede Nacional de Atenção à Saúde do Trabalhador(Renast) integrada ao SUS etc.

O Observatório Social ainda considera os efeitosda abertura econômica do mercado brasileiro aomercado internacional. Por isso, busca constatarse uma empresa é signatária do Pacto Global e seela aplica tais compromissos no Brasil.

Leia a íntegra dos termos de referência em

Observatório Social avaliasaúde e segurança no trabalho

http://www.os.org.br/download/TRSconsolidados_maio2004port.pdf

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O uso indiscriminado de agrotóxicos é um dos principaisproblemas de saúde do trabalhador brasileiro. Proteja-se!

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Uma pesquisa do ObservatórioSocial com os delegados presentesao 9º Congresso Nacional da CUT(CONCUT), realizado de 5 a 9 de ju-nho em São Paulo, registrou a per-cepção dos dirigentes sindicais emrelação aos temas Trabalho Decente,Meio Ambiente e ResponsabilidadeSocial Empresarial. Também foramincluídas duas questões sobre o graude informatização dos sindicatos. Osresultados estão sendo analisados eserão divulgados em breve, em edi-ção especial.

O 9º. CONCUT recebeu 2.491delegados, representando 1.633 enti-dades. Quatrocentos delegados foramentrevistados de forma aleatória pelaequipe do IOS com um questionáriopadrão.

PPPPPesquisa IOS no 9º CONCUTesquisa IOS no 9º CONCUTesquisa IOS no 9º CONCUTesquisa IOS no 9º CONCUTesquisa IOS no 9º CONCUTA amostra cobriu os

17 ramos sindicais presen-tes no Congresso. Mais de70% dos dirigentes entrevis-tados corresponderam aosramos da AdministraçãoPública, Rurais, Financeiro,Comércio e Serviços e Me-talúrgicos. Quase 70%eram do sexo masculino e80% tinham entre 30 e 49de idade.

O tema geral do Con-gresso foi “Trabalho e demo-cracia: emprego, renda e direitos paratodos os trabalhadores e trabalhado-ras”. No caderno das Resoluçõesaprovadas no 9º. CONCUT, os temasabordados na pesquisa do IOS estãotodos presentes: Trabalho Decente,

Meio Ambiente (no Eixo 3 - Democra-tização do Estado, políticas públicase universalização de direitos”) e Res-ponsabilidade Social Empresarial (noEixo 4 – Fortalecimento da estruturasindical e organização da CUT).

Mesa de abertura do 9o Congresso da CUT

Delegados sindicais de 17 ramos participaram do 9o CONCUT, realizado em junho, em São Paulo

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Parceriaslatino-americanas

em construçãoProjeto de

cooperaçãointernacional vai

estudar ocomportamentosócio-ambiental

de quatromultinacionais

do setor dealimentos na

América Latina

Adriana Franco e Dauro Veras

O encontro de Bogotá serviu paracompartilhar o andamento do projeto edas informações a respeito das empre-sas pesquisadas. Participaram represen-tantes da ENS, da Central Única dosTrabalhadores da Colômbia (CUT) e desindicatos de trabalhadores, entre ou-tras organizações sindicais e de pes-quisa.

O método da pesquisa exploradois eixos principais: meio ambiente erelações de trabalho. A questão da sus-tentabilidade será estudada por meio deum instrumento de pesquisa com baseem convenções e protocolos multilate-rais. Um questionário desenvolvido pelaRede Latino-Americana de Pesquisa emEmpresas Multinacionais (RedLat) vaiestudar as relações trabalhistas e ocomportamento social. Todos os parcei-ros devem cumprir metas e prazos, quevão até o encerramento do projeto emagosto de 2007. As pesquisas devemser finalizadas até junho de 2007.

Lilian Arruda, do IOS, eEduardo Menajovsky, doCEFS, em Buenos Aires

o final de agosto, o ObservatórioSocial firmou contrato de cooperaçãocom o Centro de Estudos e FormaçãoSindical (CEFS), ligado à Central de Tra-balhadores Argentinos (CTA). A iniciati-va dá prosseguimento ao Projeto AMA -Multinacionais e Meio Ambiente, quevisa acompanhar o comportamento só-cio-ambiental de quatro multinacionaisdo setor de alimentos.

Para estudar as empresas Unile-ver, Nestlé, AmBev e Coca-Cola na Amé-rica Latina, o Observatório Social contacom o apoio de parceiros nos seguin-tes países: Argentina, Brasil, Chile, Co-lômbia, Equador e Peru. Os parceirossão o Observatório Laboral da CUT Chi-le, o Programa Laboral de Desenvolvi-mento (Plades), do Peru, a central sin-dical CTA e o CEFS, da Argentina, e aEscola Nacional Sindical (ENS), daColômbia. O parceiro do Equador será

definido em breve.Em julho, o Observatório So-

cial participou de uma atividade pro-movida pelo Plades no Peru e deum encontro promovido pela ENSna Colômbia. Estiveram presentesna reunião de Lima delegados sin-dicais da AmBev, Coca-Cola e Nes-tlé, um delegado da Central Geralde Trabalhadores do Peru (CGTP)e um representante do sindicato daTelefônica. Foram apresentados osproblemas ambientais locais, os ob-jetivos do projeto e os pontos devista das organizações.

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Encontro organizadopelo Plades em Lima

PROJETO AMA - MULTINACIONAIS E MEIO AMBIENTE

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a utilizaçãode substân-cias químicaspoluentes de-nominadasPOPs, subs-tâncias es-tas que semantêm in-tactas nomeio ambi-ente por lon-gos períodose se acumu-lam nos te-cidos adipo-sos dos se-res vivos, esão tóxicaspara a vidahumana e sel-vagem.

5- Convenção deMudança do Clima (1994) – Oobjetivo é estabilizar as concentra-ções de gases de efeito estufa naatmosfera. Ao emitirem menos car-bonos na atmosfera, as empresasreceberão “créditos de carbono”,que poderão ser comercializados

As ConvençõesAs ConvençõesAs ConvençõesAs ConvençõesAs Convençõesambientaisambientaisambientaisambientaisambientais

Leia mais sobre o Projeto AMA: http://www.os.org.br/portal/content/view/1036/127/

Conheça as Convenções e o Proto-colo que são objeto de Pesquisa:

1- Protocolo de Montreal sobre assubstâncias que destroem a Ca-mada de Ozônio (1987) – Restrin-ge a produção, o consumo e a ex-portação de aerossóis que conte-nham clorofluorcarbonetos até1999.

2- Convenção da Basiléia sobreControle dos Movimentos Trans-fronteiriços de Resíduos Perigo-sos e o seu Depósito (1989) – Re-gula a movimentação e a organiza-ção dos resíduos sólidos e líquidosperigosos, prevê a concessão pré-via de importação e exportação deresíduos autorizados a fim de evi-tar a existência de tráfico ilícito des-tas substâncias e os danos à saú-de humana e ao meio ambiente,causados pela geração e elimina-ção destes resíduos perigosos.

3- Convenção de Roterdã sobreProcedimento para o Consenti-mento Prévio para o ComércioInternacional de Certos Quími-cos e Pesticidas Perigosos (1998)– Controla o comércio de certos pro-dutos químicos perigosos, e prote-ger a saúde e o meio ambiente dospossíveis danos causados por es-tas substâncias.

4- Convenção de Estocolmo sobrePoluentes Orgânicos Persisten-tes (1990) – Controla a produção e

no mercado com ou-tras empresas.

6- Convenção de biodiver-sidade ECO 92 - O objetivo da

Convenção é conservar a diversi-dade biológica por meio da utiliza-ção sustentável de seus componen-tes e da repartição justa e eqüitati-va dos benefícios derivados da uti-lização dos recursos genéticos.Cada integrante tem direito a ex-plorar seus próprios recursos e seresponsabiliza pelas atividades exe-cutadas dentro de seu território demodo que não causem dano aomeio ambiente dos outros integran-tes. Também cooperam entre sipara a conservação e utilização sus-tentável da diversidade para desen-volver estratégias e integrá-las emplanos setoriais ou intersetoriais,entre outros.

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O projeto Conexão Sindical,neste terceiro ano de aplicação, fir-ma-se como uma ferramenta de ex-trema utilidade aos dirigentes sindi-cais cutistas, tanto os que têm pou-ca experiência no uso do computadore internet quanto os que já dominamas tecnologias.

As oficinas do projeto, realiza-das com sindicatos em diversos es-tados, têm como conteúdo a inclusãodigital (informática e internet básica),o Sistema de Informações ConexãoSindical e outros meios de obtençãode informações fidedignas para açãosindical.

Já foram realizadas 18 oficinas,contemplando o sistema ConexãoSindical e também o banco de dadosde denúncias de práticas anti-sindi-cais, desenvolvido pelo ObservatórioSocial e pela CUT Nacional.

Participação crescenteO sistema conta com 751 usu-

ários cadastrados, que já inseriram1.450 informes sobre o movimento sin-dical. Tem uma média de mais de 30mil visitas mensais, o que o consoli-da como um meio de comunicaçãoefetivo para o sindicalismo.

No segundo semestre de 2006estão sendo realizadas mais quatrooficinas de formação, bem como uma

Conexão Sindical:veja como participar

atualização do sistema, buscandocriar uma interface que vise uma co-municação ainda maior entre seusmembros.

Os usuários cadastrados po-dem ler os informes de outras pesso-as e publicar novos informes, compar-tilhando o que vem acontecendo nosseus sindicatos e outras informações

PASSOA PASSO

Participe você também doProjeto Conexão Sindical!Veja como é fácil:

1. Acesse www.os.org.br/conex

2. Na coluna da esquerda, abaixo do espaço para aidentificação dos usuários já cadastrados, clique no linkregistre-se.

3. Preencha no formulário os campos solicitados e clique emnovo usuário. Ao confirmar os dados, o sistema enviará parao seu e-mail a senha para acesso.

4. Com login e senha, é só fazer a identificação na coluna daesquerda.

Comunidade virtualde dirigentes

sindicais já temmais de 30 mil

acessos por mês

importantes para o meio sindical.Com as diferentes ferramentas

– como a janela de bate-papo (queaparece à direita), os fóruns, a trocade mensagens e os próprios informes– você estará interagindo com sindi-calistas e trabalhadores das mais va-riadas categorias e regiões, propon-do discussões e ampliando debates.

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Oficinas com o Sindicato dos Químicos do ABC emmaio e em agosto de 2006

Walter André Pires

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PAPEL E CELULOSE

A pesquisa na VeracelAna Yara Paulino*

O estudo realizado peloIOS na Bahia faz parte deum projeto de cooperação

entre sindicatos depapeleiros do Brasil,

Finlândia e Suécia. Suasconstatações foram

apresentadas na capitalfinlandesa, Helsinque.

Leia o relato de umaparticipante da delegação

brasileira.

que antecedeu a Veracel começou aplantar eucaliptos na região. Em me-ados de 2005, a Veracel colocou emoperação sua fábrica que tem a mai-or linha contínua de produção de ce-lulose de fibra curta no mundo.

Com apoio financeiro do Cen-tro de Solidariedade dos Sindicatos daFinlândia (Sask), o estudo do Obser-vatório Social fez parte de um proje-to de cooperação entre os sindicatosde trabalhadores na indústria do pa-pel e celulose do Brasil (Sinap), daFinlândia (Paperiliitto) e da Suécia(Pappers). A autoria é de Clóvis Sche-rer (na época supervisor técnico doIOS), Ana Margaret Simões, GiulianoSaneh e Luciana Souza.

Fábrica da Stora Ensona Finlândia

O estudo do IOS – Respon-sabilidade Social na Veracel Ce-lulose – abordou as políticas e práti-cas da empresa voltadas para as áreassocial, trabalhista e ambiental, tendopor objeto as concepções da própriaempresa e das partes interessadas(ou stakeholders). A Veracel é umdos maiores empreendimentos flores-tais e industriais do país na atualida-de. Controlada por uma sociedadeformada pela brasileira Aracruz epela sueco-finlandesa Stora Enso, aempresa está implantada no municí-pio de Eunápolis, no Extremo Sul daBahia.

O início do empreendimentodeu-se em 1992, quando a empresa

*Cientista social, pesquisadora doDepartamento Intersindical deEstatística e Estudos Socioeconômicos(Dieese), desenvolve atividades sobremetodologias de pesquisa social noIOS. E-mail: [email protected]

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Yara

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O projeto nasceu em seminário conjunto, realizadoem março de 2004 no Brasil, com a finalidade de discutirações conjuntas para o acompanhamento da conduta daempresa ao longo dos anos.

Um grupo de acompanhamento do estudo foi for-mado por representantes das entidades sindicais dos paí-ses, além da Confederação Nacional dos Químicos (CNQ-CUT), da Federação Internacional da Química e da Ener-gia (Icem) e do Sindicato dos Trabalhadores na Indústriade Celulose e Papel da Bahia (Sindicelpa). Foi previstoque, após este primeiro relatório, seriam monitoradas ascondições de contratação, emprego, trabalho e organiza-ção dos trabalhadores empregados na planta industrial daVeracel.

A pesquisa de campo utilizou a técnica da entre-vista semi-estruturada, seguindo roteiros de perguntas

abertas. Entre outubro de 2004 e março de 2005, em trêsvisitas, foram realizadas 32 entrevistas na região de atu-ação da Veracel, com diferentes atores sociais – repre-sentantes da empresa, dos sindicatos de trabalhadores,governamentais, das ongs e das comunidades locais, in-clusive lideranças indígenas. Também foram analisadosdocumentos fornecidos pela Veracel, que permitiu visitasàs suas instalações.

Ao avaliar os Códigos de Conduta/Ética da Vera-cel e suas controladoras, percebeu-se que a existênciade espaço para que os sindicatos pressionem a empresaa explicitar publicamente suas intenções relativas aos in-teresses dos trabalhadores, à sua relação com os sindica-tos e ao acompanhamento pelas partes interessadas(stakeholders) de suas políticas de Responsabilidade So-cial Empresarial (RSE).

De 6 a 11 de junho de 2006,uma delegação brasileira, compostapor mim, Ana Yara Paulino (repre-

sentandoo IOS), epelos sin-dicalistasCarlos Ri-b e i r oMonteiro(secreta-rio de re-lações in-ternacio-nais do Si-nap) eAmaziasSouza Sil-va (dele-gado doSindicelpa

na Veracel), visitou a Finlândia a con-vite do SASK e Paperiliitto.

A Finlândia (ou Suomi, em fin-

Monitoramento conjunto

Apresentação na Finlândialandês) tem uma população de 5,2milhões de habitantes –equivalente àmetade da população do município deSão Paulo. Em Helsinque, a capitaldo país, vivem 560 mil pessoas. A ati-vidade principal foi a apresentação ediscussão do relatório “Responsabili-dade Social na Veracel Celulose”pela delegação brasileira, em umaconferência de imprensa convocadapelo SASK e Paperiliitto, no dia 7 dejunho.

A sessão foi presidida porJukka Riksmann, representando Saske Paperiliitto. Na platéia encontra-vam-se Kjeld Jakobsen (presidente doIOS), Esa Mäisti (diretor de pesquisae assuntos internacionais do Paperi-liitto), Mikael Sterbäck (secretário deprojetos internacionais do Pappers -sueco), Liisa Mery (coordenadora deprojetos do Sask) e os coordenado-res regionais do Sask na América,Ásia e África.

Delegação brasileira com representantes do Paperiliitto

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Obras do porto da Veracel no sul da Bahia

Dois temas concentraram amaior parte das intervenções: a ques-tão da sustentabilidade econômico-so-cial-ambiental de um projeto do porteVeracel em países emergentes e ascondições de trabalho naquela indús-tria e em seu entorno. Os represen-tantes do Sinap informaram que aempresa paga salários compatíveiscom os do setor de papel e papelãono Brasil – nem maiores, nem meno-res – e que haviam acabado de fecharuma negociação coletiva (em abril/2006). Disseram ainda que o saláriovariava entre 500 e 800 euros. A coleti-va de imprensa recebeu ampla divulga-ção nos meios de comunicação do país.

À tarde a delegação participou,na sede do Paperiliitto, de uma expo-sição técnica sobre a estrutura sindi-cal finlandesa e as mudanças em cur-so em saúde e segurança do traba-lho. A reunião foi marcada pela curi-osidade em torno dos direitos labo-rais vigentes em países de tradiçõestão distintas. Uma vez unidos na pro-dução daquela mercadoria tão sofis-ticada, abriam-se as possibilidades decooperação e solidariedade entre asorganizações de trabalhadores.

O Paperiliitto foi criado em1906, na onda de transformações deuma reforma parlamentarista que en-corajava a formação de associaçõese sindicatos. Como em 2006 está co-memorando seu centenário, há umasérie de atividades programadas emtodo o país, entre elas bailes, circuitode motos e passeios a pé. Atualmen-te todos os trabalhadores da opera-ção na indústria de papel e celulose(exceto os florestais) estão organiza-dos no Paperiliitto que engloba 70 sin-dicatos locais. Em 2005, firmou doisacordos coletivos: um para a indús-tria pesada e outro para a indústriade papel e embalagem.

Ainda em Helsinque, compa-recemos ao 17º. Congresso da Cen-tral de Sindicatos da Finlândia (SAK),fundada em 1907 e que conta hojecom 21 federações sindicais, entre asquais, o Paperiliitto. No Congresso, adelegação brasileira foi mencionadae saudada pelo seu presidente, LauriIhalainen, reeleito na ocasião, commandato até 2011.

Outro ponto alto da viagem fo-ram as visitas à seção regional doPaperiliitto e às instalações da fábri-

ca mais moderna da Stora Enso, emOulu. Com cerca de 127 mil habitan-tes, essa é a maior cidade setentrio-nal da região nórdica, próxima ao Cír-culo Polar Ártico. A visita à fábricafoi marcada pela cordialidade dos re-presentantes empresariais que, inclu-sive, permitiram que a equipe regis-trasse a atividade com fotos.

No dia 8 de junho, a comissãobrasileira participou de uma reuniãono Sindicato local do Paperiliito emOulu. Fomos recebidos por Arto An-geria (presidente do Sindicato dosPapeleiros de Oulu), Lauri Santanie-mi (delegado de saúde ocupacional esegurança) e outros três delegados.Todos expuseram em detalhe como édesenvolvido o seu trabalho, inclusi-ve a interdependência entre empre-sas químicas vizinhas e a Stora Enso.

As particularidades das condi-ções do mercado de trabalho e lutasdo movimento sindical no Brasil des-pertaram muito interesse por parte dosdelegados finlandeses e o diálogo seestendeu até muito tarde da noite –embora esta não se fizesse nada es-cura! Muito pelo contrário, a claridadedo dia de quase verão permanecia.

Sustentabilidade e condições de trabalho

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Alguns problemas

Depois que a Veracel Celulose entrou em operação, vá-rios problemas passaram a preocupar os sindicalistas: o grandenúmero de trabalhadores terceirizados (inclusive nas ativida-des-fim), as condições de saúde e segurança da planta industri-al e do das áreas florestais, a qualidade do transporte coletivode trabalhadores –alguns acidentes de percurso têm aconteci-do entre Eunápolis e Porto Seguro – e a negociação coletiva,que envolve sindicatos de várias categorias, entre outros.

A terceirização e suas conseqüências – precarização dascondições de trabalho, menor remuneração, enfraquecimentodas negociações coletivas – constitui um ponto em aberto, pro-blema e desafio de uma nova agenda internacional pelo Traba-lho Decente da OIT. Isso envolve não só a Veracel e a StoraEnso, mas diz respeito a práticas de todas as empresas multina-cionais.

O diálogo com a empresa está aberto, mas ainda há mui-ta coisa para ser discutida e melhorada. O estudo do IOS acom-panhou a instalação até a operação da fábrica. Talvez fosseoportuna uma nova pesquisa sobre as condições de trabalho dacadeia produtiva da Veracel, agora em pleno funcionamento. Eum futuro acompanhamento das negociações coletivas, agora,no âmbito da globalização de direitos dos funcionários da multi-nacional Stora Enso, movimento em construção entre os repre-sentantes sindicais do Sinap, Paperiliitto e Pappers.

Em breve o relatório completo da pesquisa estará disponível em www.os.org.br.

Fábrica da Veracel em Eunápolis, no sul da Bahia

Coleta mecanizada de eucalipto

Toras à espera do carregamento

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TRABALHO INFANTIL

Reportagem premiadaO Observatório Social está entre os vencedores doPrêmio Jornalístico Vladimir Herzog de Anistia eDireitos Humanos. A reportagem que denunciou o

trabalho infantil na cadeia produtiva de multinacionaisreceberá menção honrosa na categoria revista

A reportagem A Idade da Pe-dra, publicada em fevereiro de 2006pelo Observatório Social, foi agracia-da com a Menção Honrosa do Prê-mio Jornalístico Vladimir Herzog deAnistia e Direitos Humanos – catego-ria revista. A cerimônia aconteceu nodia 25 de outubro no Parlamento Lati-no-Americano, em São Paulo.

O Herzog é a principal premia-ção do jornalismo brasileiro na áreade direitos humanos. Foi criado trêsanos após o assassinato do jornalis-ta Vladimir Herzog por agentes da re-pressão política, em 1975. O objetivoé reconhecer e premiar os jornalistasque, por meio de seu trabalho, cola-boraram com a promoção da cidada-nia e dos direitos humanos e sociais.E também reverenciar a memória deHerzog, preso, torturado e morto peladitadura militar.

A reportagem premiada é deautoria do jornalista Marques Casara,com as fotos de Sérgio Vignes e edi-ção de Dauro Veras.

Esta edição do prêmio foi a quemais teve inscrições em seus 28 anosde existência. Concorreram 412 tra-balhos em 10 categorias. O Herzog épromovido pelo Sindicato dos Jorna-listas Profissionais no Estado de SãoPaulo, em parceria com a FederaçãoNacional dos Jornalistas, AssociaçãoBrasileira de Imprensa, Comissão deDireitos Humanos da Ordem dos Ad-vogados do Brasil (seção SP) e Co-missão de Justiça e Paz da Arquidio-cese de São Paulo.

MultinacionaisA reportagem, cuja apuração

durou quatro meses, revela como

empresas multinacionais se benefici-avam da exploração de trabalho infantilna cadeia produtiva do talco. Em jazi-das localizadas em Ouro Preto (MG),crianças eram recrutadas para catare empilhar o minério para a empresaMinas Talco, que revendia o produtopara as empresas Basf (Tintas Suvi-nil), Faber Castell e ICI Paints (TintasCoral).

Após a denúncia, Faber Cas-tell e ICI suspenderam imediatamen-te a compra do minério, enquanto aBasf nega a ocorrência de trabalhoinfantil nas áreas de mineração. Devi-do à repercussão do caso, o Ministé-rio do Desenvolvimento Social aumen-tou, em Ouro Preto, de 60 para 280 onúmero de bolsas do Programa deErradicação do Trabalho Infantil. A pre-feitura do município se comprometeurealizar um programa de desenvolvi-mento social e econômico nas áreasafetadas pelo trabalho infantil.

CensuraEm agosto, os exemplares ain-

da não distribuídos da edição 9 darevista foram apreendidos por ordemda juíza Lúcia de Fátima MagalhãesAlbuquerque Silva, da Comarca deOuro Preto, que acatou ação civil pú-blica do Ministério Público do Estadode Minas Gerais. A juíza concordoucom a versão da promotora Luiza He-lena Trócilo Fonseca de que a revista"publicou matéria forjada expondo in-devidamente menores". Também de-terminou que fossem retirados, do sitede internet do Observatório Social,todas as imagens que mostrassemcrianças trabalhando nas áreas deextração de talco de Ouro Preto.

O Observatório Social, que con-sidera a medida um ato de censura,entrou com uma ação de suspeiçãocontra a juíza. A juíza também é alvode uma representação ajuizada pelaComissão de Direitos Humanos da As-sembléia Legislativa de Minas Gerais.

Após o ato de censura, o Ob-servatório Social recebeu apoio daFederação Nacional dos Jornalistas(Fenaj), da Associação Brasileira deJornalismo Investigativo (Abraji), doInstituto Prensa y Sociedad (IPYS) eda organização Repórteres Sem Fron-teira.

Para o presidente da Fenaj,Sérgio Murillo de Andrade, "além doabsurdo de determinar a apreensão darevista, a decisão da juíza mineira fazum questionamento inaceitável sobrea seriedade da publicação do Obser-vatório Social e a integridade ética dedois respeitados e conceituados jor-nalistas".

No âmbito federal, a procura-dora do Ministério Público do Traba-lho Adriana Augusta de Moura Souzainstaurou um procedimento investiga-tório para apurar a responsabilidadedas empresas. A procuradora prome-teu um relatório preliminar para breve.A íntegra da reportagem e as reper-cussões no Brasil e no exterior estãodisponíveis em www.os.org.br.

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A primeira etapadeste estudo

inédito do IOStem participação

de cincoempresas

privadas, umaestatal e cinco

sindicatos detrabalhadores

A cadeia do alumínioA cadeia do alumínioA cadeia do alumínioA cadeia do alumínioA cadeia do alumínioAmarildo Dudu Bolito*

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Terminal de carregamento de bauxita daMineração Rio do Norte, no Pará

O Observatório Social está desenvolvendo o mai-or projeto de pesquisa em toda a sua história. Trata-sedo estudo na Cadeia Produtiva do Alumínio, a princípiono Norte do país e posteriormente também em outrasregiões onde a produção do alumínio está presente. Cin-co empresas privadas, uma estatal e cinco sindicatos detrabalhadores participarão desta primeira fase do estu-do.

Na região Norte, a história do alumínio começaàs margens do Rio Trombetas, num lugar denominadoPorto Trombetas, município de Oriximiná, extremo oestedo Pará. Há aproximadamente 30 anos foi construída aMRN, Mineração Rio do Norte, conhecida na regiãosimplesmente por Mineração. A MRN extrai a bauxita,minério que é o insumo básico da produção da alumina.As operações consistem na extração do minério, bene-ficiamento, transporte ferroviário, secagem e embarqueem navios.

A bauxita é transportada até a Alunorte, instaladano complexo portuário de Vila do Conde, na cidade deBarcarena, a 40 km de Belém. Lá é transformada emalumina e imediatamente transferida para a Albrás, lo-calizada no mesmo complexo às margens do rio Pará,de frente à ilha de Marajó. A Albrás transforma a alumi-na em alumínio primário. Outra empresa que recebenavios carregados do minério de Porto Trombetas é aAlumar, em São Luís, Maranhão. Além de produzir aalumina, a Alumar produz também o alumínio primário.O Brasil é um dos maiores produtores de alumina e alu-mínio primário do mundo.

Mais bauxitaUma nova mina de bauxita foi recentemente des-

coberta no Pará. Localiza-se no município de Juruti, tam-bém no oeste do estado. Segundo pesquisas desenvol-vidas pela Alcoa, grupo que explora o empreendimen-to, as reservas do minério são superiores às de PortoTrombetas. Ainda não está em operação, mas fará par-te do estudo do IOS.

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Nesta importante cadeia produtiva, uma empresaé comum a todas – aliás, todas são clientes dela: a Ele-tronorte, que fornece energia para todo o Norte do país.A energia elétrica é o insumo mais dispendioso no pro-cesso produtivo do alumínio. Além da Eletronorte, acadeia do alumínio no Norte do país está composta pe-las seguintes empresas: MRN, Alunorte, Albrás, Alumare Projeto Juruti.

São mais de sete mil trabalhadores contratadosdiretamente e possivelmente o mesmo número de ter-ceirizados. Cinco sindicatos importantes representameste exército de operários, com exceção dos terceiros,com representação ainda não identificada. O Sindicatodos Mineiros de Oriximiná representa os trabalhadoresde Porto Trombetas e Projeto Juruti. Na cidade de Bar-carena, os sindicatos dos Químicos e Metalúrgicos re-presentam os trabalhadores da Alunorte e Albrás res-pectivamente. Em São Luís os metalúrgicos do Mara-nhão negociam pelos trabalhadores da Alumar. O tra-balhador da Eletronorte tem uma representação por es-tado, portanto dois sindicatos de urbanitários estão en-volvidos, no Pará e Maranhão, além de uma intersindi-cal, denominada Sindnorte, que negocia em bloco coma empresa.

DiálogoA novidade neste estudo é o envolvimento de di-

versas categorias, organizadas em vários ramos de ati-vidade. Mineiros, químicos, metalúrgicos e eletricitários(urbanitários), que resolveram dialogar sobre a cadeiaprodutiva. Uma decisão sábia e necessária, pois as em-presas já se articulam há muito tempo. Esta maturidadedo movimento sindical é fundamental para o equilíbriodas forças, principalmente no setor siderúrgico, no qualas relações ultrapassam as fronteiras. Muito importantetambém é a participação da DGB, central sindical alemãque, da mesma forma que os sindicatos brasileiros, estánum processo de debate sobre o setor do alumínio.

A equipe responsável pelo estudo está preparan-do o material para iniciarmos a pesquisa de campo. Pormeio de questionários construídos a partir de informa-ções secundárias e oficiais disponibilizadas pelas em-presas, a equipe do IOS, coordenada pela pesquisado-ra Maria Lúcia Vilmar, ouvirá os trabalhadores, cipei-ros, gerentes e diretores das empresas. A pesquisa serádesenvolvida no próprio local de trabalho, sem nenhumconstrangimento para os trabalhadores, conforme Ter-mo de Compromisso assinado entre as partes.

Em novembro acontecerá um intercâmbio entreos trabalhadores brasileiros e alemães que estarão cum-prindo uma agenda nesta região do estudo do alumínio.Será uma visita de 12 dias nas principais empresas esindicatos envolvidos. Finalizando o intercâmbio, reali-zaremos uma conferência relativa ao tema nos dias 22 e23 de novembro na cidade de Barcarena (PA). Traba-lhadores brasileiros e alemães, empresas, governo e so-ciedade contribuirão com o debate apresentando suasposições sobre vários temas que envolvem a cadeia pro-dutiva do alumínio no Brasil e no mundo.

Dudu Bolito, do IOS, com dirigentes sindicais

Reunião com o Sindicato dos Químicos de Barcarena (PA)

*Supervisor institucional doObservatório Social

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fortalecimento doPCN – Ponto de Contato Na-cional – foi tema de seminá-rio sobre esse instrumentoque monitora as práticas deempresas multinacionais.

Nos dias 29 e 30 deagosto, em São Paulo, rea-

lizou-se o Seminário “O Ponto de Con-tato Nacional e a aplicação das Dire-trizes da OCDE para as EmpresasMultinacionais: atualidades e pers-pectivas”. O objetivo foi promover umdiálogo com várias organizações dasociedade civil, em especial o movi-mento sindical cutista, para fortaleceresse instrumento de ação em relaçãoàs empresas multinacionais.

A terceira edição do seminário(os anteriores foram em 2001 e 2003)contou com a parceria da CUT, do Ob-servatório Social, da Fundação Frie-drich Ebert e do OCDEWatch-Ibase.Participaram dirigentes sindicais devários ramos da economia, represen-tantes de ongs ambientalistas, de con-sumidores, de empresas multinacio-nais e nacionais.

No evento foram apresentadoscasos de denúncias contra práticas ina-ceitáveis de empresas multinacionaise que foram alvo de monitoramento pe-los PCNs do Brasil, México e Chile. Orelatório completo do seminário encon-tra-se em www.os.org.br/download/pcn.pdf.

A apresentação do coordena-dor do PCN-Brasil, Pedro Florêncio,foi pautada por informações relevan-tes sobre o estado da arte deste ór-gão. O PCN é um órgão interministe-rial responsável pela implantação e di-vulgação das Diretrizes da OCDE paraas Empresas Multinacionais, que sãoum conjunto de recomendações semforça normativa.

As Diretrizes da OCDEAs Diretrizes para as Em-

presas Multinacionais da OCDE –Organização para Cooperação eDesenvolvimento Econômico – sãoum ponto de apoio a ser utilizadopara a promoção de práticas em-presariais condizentes com princí-pios democráticos e de respeitoaos direitos dos trabalhadores.

Isto se revela de grande im-portância na medida em que hou-ve forte expansão da presença demultinacionais no Brasil ao longodos últimos anos. Para o movimen-to sindical, os movimentos sociaise as ongs, essa importância cres-ce na medida em que ações depressão e diálogo com empresasdeste tipo se tornaram ainda maisfreqüentes.

Em 2000, com o final da re-visão do documento Diretrizes, os30 governos membros da OCDE,mais a Argentina, Brasil e Chile,adotaram o novo conjunto de Dire-trizes de maneira conjunta, comprocedimentos de implementaçãoaprimorados.

Assim, o governo que ade-re às Diretrizes deve estabelecerPonto de Contato Nacional em suaestrutura administrativa, cujas res-ponsabilidades serão de empreen-der atividades promocionais, escla-recer dúvidas e questionamentose contribuir para a solução de pro-blemas que possam surgir. O PCNno Brasil está localizado na Secre-taria de Assuntos Internacionais doMinistério da Fazenda.

PPPPPonto de Contatoonto de Contatoonto de Contatoonto de Contatoonto de ContatoExposição da imagem

Sua efetividade se dá por meioda exposição da imagem da empre-sa. As recomendações possuem dis-positivos que envolvem áreas de meioambiente, defesa do consumidor, de-fesa da concorrência, tributação, cor-rupção e área trabalhista. Florêncioinformou que a maior parte dos casosrecebidos no PCN referem-se a rela-ções trabalhistas e ambientais. Situ-ação semelhante é encontrada nosPCNs de outros países.

Os desafios a serem enfrenta-dos para maior efetividade do PCN con-centram-se em duas áreas: falta deformalização institucional e falta de vi-sibilidade. Para enfrentar o primeiro,passos estão sendo dados para dotá-lo de maior transparência externa, ela-borar relatórios de todos os casos (ini-cial e final), organizar o órgão interna-mente e criar um arcabouço normati-vo – regulamentação dos procedimen-tos em relação às denúncias recebi-das.

Quanto ao desafio de dar visi-bilidade, devem ser desenvolvidasações de divulgação do órgão e suacompetência no âmbito externo – sin-dicatos, ongs, empresas multinacio-nais, entidades patronais – e interno– perante o governo e demais minis-térios. Um PCN atuante e efetivo inci-ta as empresas a negociar conflitos esua atuação tem grande potencial dedivulgação para sindicatos e ONGs.(RQ)

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Público do Seminário

Seminário debate aplicaçãodas diretrizes da OCDE

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Para saber mais sobre o PCN:

http://www.fazenda.gov.br/sain/pcnmulti/novo.asp

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A Rede Latino-Americana dePesquisas emEmpresasMultinacionais (RedLat)já deu grandes passosdesde sua criação emoutubro de 2005.

De 7 a 9 desetembro foi realizadano Peru a quartareunião da RedLat,durante o seminário“Estratégias e açõesfrente às empresastransnacionais naAmérica Latina”. No

encontro comemoraram-se os 15 anos de existênciado Plades (Programa Laboral de Desenvolvimento), ongque assessora o movimento sindical peruano e éparceira do IOS há vários anos.

Na ocasião a rede definiu uma metodologiaconjunta, que já estava sendo discutida havia cincomeses. A partir do aval de todos os participantes daRedLat, está no prelo um guia com os termos dereferência da metodologia em três idiomas: português,espanhol e inglês.

Estudos em sete paísesMesmo antes da formalização deste documento,

os estudos na Unilever, no BBVA e na Telefónica jáestão em andamento nos sete países que compõem arede. Até novembro devem estar prontos os relatóriosde cada país para que um panorama regional possaser construído. A previsão é de que em fevereiro jáserão públicos os informes regionais sobre a presençae o comportamento social e trabalhista destas trêsmultinacionais na América Latina.

A fim de que esses relatórios tenham o alcancedesejado, um trabalho de consolidação dos sistemasde informação das instituições que formam a RedLatdeverá ser feito. Um site oficial deve ser construído em

breve como parte da estratégia de divulgaçãodesenhada por todos os componentes da rede.

Uma reunião dos assessores de imprensa dossete países será realizada em dezembro durante oprincipal evento organizado pelo IOS, a ConferênciaInternacional Pesquisa e Ação Sindical. Na ocasiãotambém haverá um encontro dos grupos de trabalhoresponsáveis pelos estudos em curso nas trêsempresas mencionadas.

Responsabilidade SocialEm sua 6ª edição, nosso evento discutirá as

questões ligadas ao movimento de ResponsabilidadeSocial Empresarial, tendo como motivação aconferência do Banco Interamericano deDesenvolvimento sobre este mesmo tema, “Um BomNegócio para Todos”, que acontecerá em Salvador entreos dias 10 e 12 de dezembro.

Responsabilidade Social Empresarial é um dostemas da metodologia desenvolvida para a RedLat quedevem trazer insumos interessantes para a açãosindical no continente americano. A metodologiatambém traçará o perfil e a estratégia de cadaempresa, um perfil e estratégia sindical, um panoramadas relações e condições de trabalho e incluirá aanálise da questão ambiental.

Quem faz a RedLatAs instituições que até agora compõem a Rede

são Cilas (Centro de Investigaciones Laborales ySindicales) do México, ENS (Escuela NacionalSindical) e CUT (Central Unitaria de Trabajadores) daColômbia, Plades (Programa Latinoamericano deDesarrollo), do Peru, Icudu (Instituto Cuesta Duarte) ePIT-CNT do Uruguai, Observatorio Laboral da CUT doChile, CTA (Central de Trabajadores Argentinos) daArgentina, IOS (Instituto Observatório Social) e CUT(Central Única dos Trabalhadores) do Brasil, eCIOSL/ORIT (Confederação Internacional deOrganizações Sindicais Livres/ Organização RegionalInteramericana de Trabalhadores).

Ana Luiza CernovAnalista de projetos do InstitutoObservatório Social

Metodologia conjuntaPublicação trilíngüe da Rede

Latino-Americana de Pesquisa emEmpresas Multinacionais terá

termos de referência para estudoda presença de três corporações no

continente

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Após reportagem veicula-da na edição número 10 de Ob-servatório Social Em Revista,que mostrava a utilização de ma-lharias clandestinas para costuraras roupas das Lojas C&A, a em-presa anunciou que adotará no-vas medidas de controle da ca-deia produtiva.

Segundo investigação doMinistério Público do Trabalho, asmalharias clandestinas são usadas por fornecedores daC&A, que subcontratam o serviço de costura feito porimigrantes bolivianos em situação irregular no país. Asmalharias são montadas em locais insalubres e sem con-dições de segurança e higiene. Também servem de moradiapara os bolivianos, que chegam a trabalhar 16 horas por dia.

Boa parte das oficinas continua em operação. Oque a C&A está tentando fazer é evitar que seus forne-cedores utilizem essa mão-de-obra para costurar as rou-pas vendidas em sua rede de 130 lojas no Brasil. Após aconclusão do inquérito, a C&A será convidada pelo Mi-nistério Público a assinar um Termo de Ajustamento deConduta (TAC). Com a assinatura, a empresa se com-promete a não se relacionar com empresas que se en-contram em situação ilegal ou que possuam empregadossem registro profissional.

FornecedoresDepois da reportagem veiculada pelo Observató-

rio Social, a multinacional afirmou que iria tomar provi-dências junto aos 700 fornecedores e às empresas queprestam serviços para eles. Cada fornecedor chega a ter20 subcontratadas. O presidente da C&A no Brasil, LuizFazzio, informou que vai instalar no país um sistema de

TRABALHO PRECÁRIO

C&A vai monitorar cadeia produtivaC&A vai monitorar cadeia produtivaC&A vai monitorar cadeia produtivaC&A vai monitorar cadeia produtivaC&A vai monitorar cadeia produtivaauditoria para monitoramento dacadeia produtiva, chamado Socam,usado pelo grupo em outros paí-ses. Enquanto isso, contratou a em-presa SGS para fazer o serviço.

A C&A também pretendeparticipar de um movimento jun-to ao setor têxtil, de confecçõese de varejo para que sejam feitasações em conjunto que coíbam otrabalho precário nas cadeias pro-

dutivas. Durante a investigação o Ministério Público tam-bém encontrou, em uma malharia clandestina, etiquetasda empresa Lojas Riachuelo, que descredenciou o forne-cedor e também se comprometeu a melhorar o controlede sua cadeia produtiva. A Associação Brasileira de In-dústria Têxtil e o Instituto Ethos de Empresas e Respon-sabilidade Social anunciaram apoio ao movimento.

Pela relevância da C&A no mercado mundial devestuário e pela sua presença no Brasil, o Instituto Ob-servatório Social iniciou uma pesquisa sobre a empresa,cujo objetivo é acompanhar seu comportamento social etrabalhista no país. A pesquisa está sendo conduzida emparceria com a Confederação Nacional dos Trabalhado-res do Comércio e Serviços (Contracs) e o Sindicato dosEmpregados no Comércio, filiados à Central Única dosTrabalhadores (CUT).

É consenso no movimento sindical que a C&A temgrande importância no setor de varejo de modas, seja pelonúmero de empregados, seja pela estratégia agressiva comque a empresa opera no Brasil. Por essa razão se faznecessário o mapeamento da conduta social, trabalhista eambiental da empresa. No dia 16 de outubro, a C&A in-formou ao Observatório Social que está disposta a parti-cipar da pesquisa.

(MC)

Denúncias de exploração deimigrantes levaram a

multinacional a secomprometer com fiscalização

rigorosa de seus 700fornecedores e das empresas

subcontratadas

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Fachada deloja da C&A em

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No final do primeiro semestre de2006, em São Paulo, aconteceu maisum encontro do Comitê Sindical de Tra-balhadores da Akzo Nobel. A reuniãocontou com a presença de dois geren-tes de recursos humanos e um mem-bro da holding brasileira da empresa,em clara demonstração de que o diálo-go social com os trabalhadores estáavançando.

A Akzo Nobel, de origem holan-desa, atua desde 1940 nos segmen-tos químico de tintas e farmacêutico. Osdirigentes da empresa apresentaramalgumas novidades, entre elas, a inten-ção de concentrar esforços nos seg-mentos de tintas e químicos. Isso acar-retará na venda mundial das ações dosegmento farmacêutico do grupo.

Ao contrário do que ocorreu emeventos anteriores, nesta oportunidadea empresa manifestou a intenção departicipar periodicamente das próximasreuniões do comitê. Esse fato é inéditodesde que se iniciou a aproximaçãoentre os sindicatos e a direção da em-presa no Brasil.

No mesmo evento, o Observató-rio Social apresentou os resultados da

A pesquisaA pesquisaA pesquisaA pesquisaA pesquisaAs duas fases da pes-

quisa do IOS sobre o compor-tamento sócio-trabalhista daAkzo Nobel, em 2004 e 2005,se relacionam com o desen-volvimento da organização dostrabalhadores. Seu objetivo écontribuir para a promoção e

o aprofundamento do diálogo entre a empresa e os re-presentantes dos trabalhadores.

A partir do levantamento e análise de diversosindicadores, a pesquisa propiciou aos sindicatos uminstrumento para a troca de informações. Assim, trou-xe para os dirigentes sindicais muitos subsídios pararefletir sobre a empresa, seus respectivos segmentosde negócios e sobre como as políticas corporativasforam efetivamente aplicadas em cada uma das unida-des produtivas.

No segundo semestre de 2006 a pesquisa en-trou na sua terceira fase, dando continuidade ao acom-panhamento dos temas e questões já levantados.

Diálogo social na Akzo NobelEmpresa demonstra intenção de construir uma relação mais efetiva com os trabalhadores

última pesquisa realizada no decorrerde 2005 sobre o comportamento sociale trabalhista do grupo no Brasil. Essapesquisa faz parte da segunda fase doprojeto Monitor de Empresas, com apoioda central sindical holandesa FNV.

O engajamento da Akzo Nobel nodiálogo com o comitê sindical foi consi-derado um avanço pelos seus mem-bros que, desde 2003, procuram umaaproximação com os dirigentes da cor-poração. Para os representantes sindi-cais, a participação da multinacional noencontro e sua declaração de apoio aodiálogo social têm grande significado,representando um verdadeiro esforçopara a construção de uma relação maisefetiva entre empresa e a rede de tra-balhadores.

Ao final do encontro, foram defi-nidos os próximos passos do comitê,entre eles, o lançamento de um bole-tim sobre a rede, a definição de umanova pauta para o próximo encontro –que ocorrerá em novembro – e, princi-palmente, um esforço efetivo dos repre-sentantes dos trabalhadores para tra-zer mais sindicatos e trabalhadores aocomitê. Dessa forma será possível for-

talecê-lo e torná-lo um instrumento efi-caz de diálogo social amplo.

Comitê SindicalO Comitê Sindical é uma rede

nacional de trabalhadores que procuraconstituir um fluxo constante de infor-mações entre os sindicatos que repre-sentam os trabalhadores da Akzo No-bel no Brasil, discutir o desenvolvimen-to de ações conjuntas e apoiar as ativi-dades sindicais locais.

Também busca ampliar o diálo-go com a Akzo Nobel sobre temas deinteresse que aproximam os trabalha-dores de todas as plantas, sobretudoaqueles que envolvem políticas corpo-rativas e outros assuntos de interessede cada unidade operacional.

A rede é uma iniciativa dos sin-dicatos de trabalhadores da Akzo No-bel, que representa a grande maioriadas plantas produtivas nacionais dogrupo. Conta com o apoio do ProjetoCUT-Multi, da Confederação Nacionaldos Químicos, do Instituto Observató-rio Social e da Federação Holandesade Sindicatos, a FNV.

Daniela Sampaio de Carvalho*

* Pesquisadora do Observatório Social

PERFIL DA EMPRESAPERFIL DA EMPRESAPERFIL DA EMPRESAPERFIL DA EMPRESAPERFIL DA EMPRESATrabalhadores no Brasil: 2,4 mil.Segmentos *: Químico, Tintas e Farmacêutico.Existem 10 unidades operacionais no Brasil:

Segmento Químico - Eka Chemical, DivisãoQuímicaSegmento de Tintas - Tintas em Pó, TintasMarítimas, Tintas Repintura Automotiva,Tintas Imobiliárias, Tintas Industriais.Segmento Farmacêutico - Organon, Intervet,Diosynth.

Fábricas no Brasil: 15 ** (11 no estado de São Paulo,2 no Rio de Janeiro, 1 na Bahia e 1 no Ceará)

Receita líquida anual(média dos últimos 4 anos):€ 300 milhões

Algumas marcas: Tintas Sikkens, Wanda, Miluz,Ypiranga, Sparlack, International.* Com a reestruturação global o segmento farmacêuticodeverá ser vendido.** Com a reestruturação restarão 11.

Pesquisa foi apresentada no III EncontroNacional do Comitê da Akzo Nobel

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“A saúde para cada homem, mulher ou criança é ter meios de traçar umcaminho pessoal e original em direção ao bem-estar físico,

psíquico e social”.

”Christophe Dejours

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