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III Semana de Ciência Política Universidade Federal de São Carlos 27 a 29 de abril de 2015 OS TUCANOS SE REPRODUZEM NA TERRA DA GAROA: UM ESTUDO ELEITORAL SOBRE A REELEIÇÃO DO PSDB EM SÃO PAULO Jayane Maia 1 RESUMO Todo partido político visa chegar ao poder e permanecer nele, almejando vantagens como prestígio e renda. Desde 1994 candidatos do PSDB ocupam o governo de São Paulo. O trabalho tem como objeto de pesquisa o eleitorado paulista. Sendo o município a unidade de análise, buscou-se verificar a existência ou não de um padrão sócio geográfico ligado à reeleição do PSDB em SP. A porcentagem de votos válidos no município para o governador eleito foi associada com o Índice Paulista de Responsabilidade Social, com as transferências estaduais para o município e com o partido do prefeito. Os resultados preliminares mostram que a cada eleição o PSDB tem maior apoio do eleitorado. Não há diferença sócio geográfica significativa entre os votantes nem baixa votação nos municípios nos quais a prefeitura pertence ao PT. A imagem dos candidatos tucanos e a dificuldade de inserção no estado dos partidos da oposição são hipóteses alternativas para a reeleição do governo em SP. PALAVRAS-CHAVE: Reeleição, São Paulo, PSDB, Eleitorado. INTRODUÇÃO A eleição de candidatos para cargos públicos é uma das marcas de países democráticos como o Brasil. O período eleitoral se coloca, então, como a essência da 1 Bacharela em Ciência Política pela Universidade de Brasília (UnB) e mestranda em Sociologia pela mesma universidade. E-mail: [email protected].

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III Semana de Ciência Política

Universidade Federal de São Carlos

27 a 29 de abril de 2015

OS TUCANOS SE REPRODUZEM NA TERRA DA GAROA: UM

ESTUDO ELEITORAL SOBRE A REELEIÇÃO DO PSDB EM SÃO

PAULO

Jayane Maia1

RESUMO

Todo partido político visa chegar ao poder e permanecer nele, almejando vantagens como

prestígio e renda. Desde 1994 candidatos do PSDB ocupam o governo de São Paulo. O

trabalho tem como objeto de pesquisa o eleitorado paulista. Sendo o município a unidade

de análise, buscou-se verificar a existência ou não de um padrão sócio geográfico ligado

à reeleição do PSDB em SP. A porcentagem de votos válidos no município para o

governador eleito foi associada com o Índice Paulista de Responsabilidade Social, com

as transferências estaduais para o município e com o partido do prefeito. Os resultados

preliminares mostram que a cada eleição o PSDB tem maior apoio do eleitorado. Não há

diferença sócio geográfica significativa entre os votantes nem baixa votação nos

municípios nos quais a prefeitura pertence ao PT. A imagem dos candidatos tucanos e a

dificuldade de inserção no estado dos partidos da oposição são hipóteses alternativas para

a reeleição do governo em SP.

PALAVRAS-CHAVE: Reeleição, São Paulo, PSDB, Eleitorado.

INTRODUÇÃO

A eleição de candidatos para cargos públicos é uma das marcas de países

democráticos como o Brasil. O período eleitoral se coloca, então, como a essência da

1 Bacharela em Ciência Política pela Universidade de Brasília (UnB) e mestranda em Sociologia pela

mesma universidade. E-mail: [email protected].

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história política nesses contextos, tempo em que se afirmam as forças políticas que

chegam ao poder ou se consolidam aquelas que nele permanecem mediante a reeleição.

As vantagens alcançadas pelo grupo político que consegue se eleger são várias – como

status e renda – e incentivam o desejo de manutenção do poder por quem governa,

conforme aponta Anthony Downs (1992)2.

Nesse sentido, Max Weber tinha razão quando apontou que a empresa política

se coloca como empresa de interesses em praticamente todos os lugares3. Segundo ele,

estar no poder é um interesse e um desejo de um grupo restrito de pessoas (“politicamente

ativas”4), as quais para fazerem parte da vida política do país reúnem as condições

financeiras necessárias para se apresentarem como candidatos e correrem atrás de votos

dos que são “politicamente passivos”5. A existência desses dois grupos (ativos e passivos)

é indispensável para a criação de um partido político, de acordo com Weber6.

Com efeito, os partidos políticos nas democracias constituem os grupos em

torno dos quais os indivíduos interessados por política se reúnem para concorrerem a um

cargo eletivo ou se engajarem em prol de uma candidatura. Essa pode ser considerada

uma definição operacional do que vem a ser um partido político. No entanto, os efeitos

causados por um partido transcendem a sua função eleitoral, de modo que sua existência

implica na criação de grupos e, portanto, na divisão da sociedade. Essa divisão pode ter

um fundo didático, ou seja, direcionado para uma melhor organização e entendimento do

mundo e da realidade e, particularmente, das preferências daqueles que têm direito ao

voto. Todavia, o combate e a oposição que são intrínsecos a esses agrupamentos

culminam em uma sociedade organizada por meio da luta, colocando-a como “a forma

essencial da convivência entre homens7”.

2 DOWNS, Anthony. Uma teoria econômica da democracia. São Paulo: Edusp, 1992. 3 WEBER, Max. Ciência e Política: duas vocações. “A política como vocação”. Dunker & Humblot,

Berlim, 1968. 4 Idem. 5 Idem. 6 Idem. 7 ORTEGA Y GASSET, José. Os intelectuais e a política. “Não ser homem de partido”. Ed. Presença, Lisboa, 1964.

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A luta entre os partidos políticos e seus respectivos candidatos se mostra,

portanto, como um elemento essencial do período eleitoral. E é por intermédio dessa luta

partidária que a cada eleição novas forças políticas se criam e as que já existem se

rearranjam ou morrem. No caso de uma reeleição, o partido e seu candidato se tornam

duplamente vitoriosos: permanecem no poder e se mantém ativos na concorrência

instaurada pela luta partidária.

A vitória contínua de um partido e/ou de um candidato pode ter dois

direcionamentos. Um deles é a possibilidade de continuidade das políticas que já vinham

sendo realizadas. Por outro lado, não há como negar que a continuidade pode disfarçar o

desejo de usufruir dos benefícios de quem detém o poder e culminar na formação de uma

dinastia política legítima.

O que entra em questão, portanto, são as vantagens e as desvantagens da

reeleição. A pergunta que se faz é: até que ponto a permanência de um grupo político a

frente de um governo é benéfica para a população?

Alguns preferem a rotatividade de poder, pois acreditam que ela minimiza a

criação de vícios políticos que ocorrem em detrimento da sociedade, como a corrupção e

o uso da máquina pública para fins privados. Todavia, a continuidade pode significar algo

benéfico quando aplicada às políticas públicas e ao seu aprimoramento ao longo dos

mandatos, tendo em vista que a rivalidade entre os grupos políticos muitas vezes resulta

na quebra das políticas e no “começar de novo”, quando um ou outro alternam o poder.

Em termos de continuidade de mandatos, o estado de São Paulo é um caso

brasileiro curioso. Desde 1994, com a vitória de Mário Covas, candidatos do Partido da

Social Democracia Brasileira (PSDB) ocupam o Palácio dos Bandeirantes. Em 2018, o

PSDB completará 24 anos à frente do governo do estado, considerando a vitória em

primeiro turno do tucano Geraldo Alckmin nas eleições de 2014. A grande permanência

do PSDB no poder executivo paulista levou o estado a ser chamado de “Tucanistão”

(termo criado pelo filósofo Vladimir Safatle para se referir a SP nas suas colunas na Folha

de S. Paulo).

Os tucanos dominam SP desde 1994 independente das circunstâncias, sejam

sociais, políticas ou econômicas. Exemplo disso foi a vitória de Geraldo Alckmin em

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2014, que venceu apesar da chamada “crise da água”, e de Mário Covas em 1998, que

conseguiu a reeleição de forma apertada após ter feito um choque de gestão tendo em

vista a situação calamitosa deixada pelos seus antecessores do Partido do Movimento

Democrático Brasileiro (PMDB). Em suma, a história política recente de São Paulo

mostra que os governos do PSDB, embora tenham atitudes políticas impopulares ou

sejam alvo de denúncias de corrupção, são reeleitos.

Nesse sentido, o trabalho aqui realizado tratará de compreender as eleições

para governador no estado de São Paulo. O problema que se propõe analisar pode ser

definido na seguinte questão: a reeleição do PSDB em São Paulo ao longo de 20 anos se

associa a diferenciações políticas e socioeconômicas municipais que influenciam na

votação?

Objetiva-se com a pesquisa realizar um apanhado histórico – que abarque o

período em que o PSDB está no poder executivo de SP (1994-2014) – do perfil do

eleitorado paulista, por meio da associação entre características políticas e

socioeconômicas municipais e proporção de votos recebida pelos candidatos tucanos

vitoriosos.

Com efeito, não se pode compreender uma eleição sem levar em consideração

o eleitorado que é por elas responsável. Por isso, entender o eleitor paulista constituiu o

primeiro pilar da pesquisa. O segundo pilar foi o contexto socioeconômico e político do

período em análise, considerando que as circunstâncias do momento em muito

influenciam – ou deveriam influenciar – a mentalidade do eleitor bem como a política

que se tem nos bastidores.

CONTEXTUALIZAÇÃO DO TEMA E ABORDAGEM TEÓRICA

As eleições para governador em São Paulo nos anos de 1994, 1998, 2002,

2006, 2010 e 2014, nas quais o PSDB foi eleito, foram envoltas de circunstâncias

socioeconômicas e políticas que formaram o contexto no qual as eleições ocorreram. A

identificação e o entendimento dessas circunstâncias em muito contribui para a

compreensão dos dados eleitorais.

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O período eleitoral não pode ser entendido somente por meio dos dados

contidos nas estatísticas do Tribunal Superior Eleitoral (TSE). Se faz necessário entendê-

lo também a partir dos fatos que permeiam o contexto político do período, de modo que

o resultado das urnas e, por sua vez, o divulgado pelo TSE, é consequência daquilo que

ocorre durante o processo eleitoral.

A pesquisa qualitativa é, portanto, necessária para se melhorar a qualidade de

leitura dos dados estatísticos, de forma que os números revelam algumas coisas e

mascaram outras, não informando com exatidão a complexidade da situação. Conforme

aponta Carlos Estevam Martins, “a partir da distribuição dos votos não se infere o que foi

o processo eleitoral. Para conhecê-lo, temos que voltar atrás e analisá-lo em si mesmo, tal

qual se desenvolveu8”.

As notícias veiculadas pelos meios de comunicação permitem que qualquer

um tenha uma visão do contexto e das circunstâncias que rodeiam o período eleitoral. Os

jornalistas são importantes nesse sentido na medida em que têm acesso a informações que

não são divulgadas pelos canais oficiais de informação, por exemplo. Além disso, as

pessoas que participam ativamente da política de determinada região, seja em cargos

públicos ou em campanhas eleitorais, também são fontes valiosas de informação, tendo

em vista que, assim como os jornalistas, veem de perto o que ocorre no âmbito político e

possuem mais elementos que tornam sua interpretação da realidade mais robusta.

Caso o resultado das urnas contradiga o contexto sócio político, faz-se

necessário se apoiar em outras bases, como na história política da região e nas questões

circunstanciais, a fim de encontrar outras explicações para o comportamento político dos

eleitores, que, nesse caso, não teriam sido afetados pelos fatos ocorridos ou os

minimizaram, não dando a eles a importância que os pesquisadores achariam que teria.

Em meados de 1994, Mário Covas, candidato psdebista ao governo de São

Paulo, estava com 55% das intenções de votos, segundo pesquisa do Datafolha. A

campanha eleitoral do PSDB nesse ano foi concentrada em cinco cidades do Vale do

8 MARTINS, Carlos E. “O Balanço da Campanha”. In: CARDOSO, Fernando Henrique, comp. Partidos políticos e eleições no Brasil. Rio de Janeiro, Paz e Terra, 2ª ed. 1978, 262 p.

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Paraíba – São José dos Campos, Taubaté, Lorena, Cruzeiro e São Sebastião – que foram

escolhidas segundo critérios geográficos e importância política, segundo o então

coordenador da campanha de Covas9. Realmente o PSDB tinha fortes razões para definir

a região como prioritária. São José dos Campos possuía o maior colégio eleitoral do Vale

e as cidades de Taubaté, Cruzeiro e Lorena tinham prefeitos psdebistas. Além disso, a

região do Vale do Paraíba era a principal base eleitoral do vice de Mário Covas, Geraldo

Alckmin10.

Graças à aliança entre PSDB e PFL, Covas foi beneficiado com o segundo

maior tempo no horário eleitoral tanto na televisão quanto no rádio. Se não fosse isso, ele

teria ficado apenas com o quinto tempo11, o que certamente teria dificultado sua

campanha política, sabendo que “o HGPE [Horário Gratuito de Propaganda Eleitoral] é

assim a única maneira pela qual os partidos políticos têm acesso à mídia não-escrita”12.

O partido que tentava a reeleição à época – o PMDB – com Barros Munhoz, tinha o maior

tempo no horário eleitoral e possuía 50% das intenções de voto. O assessor de imprensa

de Munhoz, Carlos Brickmann, reconhecia que “o horário eleitoral [seria] a chave que

pode definir o vencedor”13.

Em 11 de julho de 1994, a Folha de S. Paulo divulgou dados de pesquisa do

Datafolha que mostravam uma queda de 11 pontos nas intenções de voto para Mário

Covas de junho para julho. Esse índice direcionava para o que tinha ocorrido com o

mesmo candidato em 1990, ano eleitoral em que Covas, disputando o governo de SP,

iniciou sua campanha com ótimos percentuais, mas acabou sendo derrotado. No entanto,

a opinião disseminada nas eleições de 1994 era de que Covas não tinha adversários a sua

altura14.

9 Folha de S. Paulo, Folha Vale, 6 de Junho de 1994. 10 Idem. 11 Folha de S. Paulo de 6 de junho de 1994, Primeiro Caderno. 12 SCHMITT, Rogério; CARNEIRO, Leandro Piquet; KUSCHNIR, Karina. Estratégias de campanha no horário gratuito de propaganda eleitoral em eleições proporcionais. In: Dados, Rio de Janeiro, v. 42, n. 2, 1999. Disponível em <http: http://www.scielo.br/scielo.php?pid=S0011-52581999000200003&script=sci_arttext&tlng=es#back>. Acessado em 10/04/2015. 13 Idem. 14 Folha de S. Paulo de 11 de julho de 1994, Primeiro Caderno.

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A reeleição do PMDB em São Paulo estava bastante prejudicada pelas

circunstâncias que tinham nascido no último governo. A imagem do partido estava frágil

perante o eleitorado, principalmente pelas denúncias de corrupção envolvendo o ex-

governador Orestes Quércia15, o que, por sua vez, dificultava o sucesso da candidatura de

Barros Munhoz.

Na época o Superior Tribunal de Justiça (STJ) rejeitou a denúncia contra

Quércia por estelionato, fato que ele próprio considerou como “atestado de idoneidade”.

No entanto, o fato ainda gerou muita badalação e acusações por parte dos adversários

políticos. Mário Covas, acreditando que a decisão judicial não reverteria a imagem do

peemedebista, chegou a afirmar que “decisão da justiça não se discute, mas aquilo em

que o povo acredita também não se discute”16.

A difícil situação do PT em São Paulo também beneficiava o PSDB. A

situação era tal que, José Dirceu, candidato do PT, mostrava-se otimista ao ter pouco mais

de 10% das intenções de voto nas pesquisas realizadas, o que era um feito inédito para o

partido nas eleições para o governo de SP. A campanha petista no estado em 1994 não

gozou de muitos recursos financeiros e nem de espaço na mídia, segundo Dirceu17.

Com uma campanha eleitoral que se valia de objetos para identificar as

prioridades do PSDB no governo de São Paulo – ferramenta (emprego), ovo (agricultura),

lápis (educação), compasso (administração) e estetoscópio (saúde)18 – Covas venceu em

1994.

Em julho de 1998, Mário Covas anunciou que deixaria o governo de SP para

concorrer à reeleição, tendo em vista que, segundo ele, não conseguiria conciliar as

atividades do cargo com a campanha eleitoral19. “Ao anunciar a licença, o governador

acabou sinalizando que acredita na realização de segundo turno na eleição paulista. O

15 Folha de S. Paulo de 8 de agosto de 1994, Primeiro Caderno. 16 Idem. 17 Folha de S. Paulo de 4 de outubro de 1994, Caderno Especial. 18 Idem. 19 Folha de S. Paulo de 29 de junho de 1998, Primeiro Caderno.

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primeiro turno é no dia 4 de outubro, mas Covas pedirá afastamento até o dia 30 de

outubro20”.

Segundo pesquisa do Datafolha feita nos dias 27 e 28 de agosto de 1998,

Mário Covas (PSDB) estaria em terceiro lugar com 14% das intenções de voto. A sua

frente estariam Paulo Maluf (PPB), que agora estava coligado com o PFL, e Francisco

Rossi (PDT), ambos com 27%. No entanto, de um mês para o outro, os números

mudaram.

No final de setembro, Maluf mantinha a liderança, com 30%, enquanto Rossi

e Covas empatavam com 19%. Para Covas o pulo do gato estava na conquista dos votos

do interior do estado: “comparando-se o desempenho dos dois candidatos que disputam

a segundo vaga no 2º turno paulista na pesquisa atual e na anterior, percebe-se que Rossi

tem seu melhor desempenho na Grande São Paulo, enquanto Covas vai melhor no

interior21”.

A campanha de 1998 foi difícil para Covas, tendo em vista medidas

impopulares que ele tinha tomado durante seu primeiro mandato. O choque de gestão por

ele instaurado a fim de colocar as finanças públicas em ordem, quase o custa a reeleição.

A despeito disso, o PSDB e seu candidato vencem mais uma vez, em segundo turno, com

uma média percentual de 51,17%.

Com a morte de Mário Covas, Alckmin assume o governo de São Paulo em

março de 2001 e concorre à eleição em 2002. Em pesquisa realizada pelo Datafolha em

meados de agosto desse ano, Alckmin aparece com 24% das intenções de voto, 16 pontos

percentuais atrás do adversário Paulo Maluf (PPB)22.

Nesse mesmo período, o então governador atingiu o pior índice de aprovação,

32%, sendo que a maioria dos eleitores considerava o seu governo regular. Segundo a

pesquisa, sua melhor avaliação estava no eleitorado do interior paulista23. Percebe-se,

20 Idem. 21 Folha de S. Paulo de 26 de setembro de 1998, Caderno Eleições. 22 Folha de S. Paulo de 19 de agosto de 2002, Folha Eleições 2002. 23 Idem.

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portanto, que tanto nas eleições de 1998 quanto nas de 2002, os municípios interioranos

tiveram uma importância significativa nas eleições do PSDB.

Novamente a dinâmica dos números surpreende. Alckmin consegue uma

vantagem significativa sobre os demais candidatos, o que coincide com a melhora da

aprovação do seu governo: em outubro, sua administração foi considerada boa/ótima por

56% dos entrevistados na pesquisa Datafolha24. Ele é, então, reeleito, ocupando pela

terceira vez um cargo executivo no Palácio dos Bandeirantes.

Nas eleições de 2006, o PSDB tenta novamente a reeleição para o governo de

São Paulo, lançando José Serra como candidato, enquanto seu antecessor concorre à

Presidência da República. Segundo pesquisa do Datafolha, se as eleições fossem em 20

de julho de 2006, Serra seria vitorioso no primeiro turno, com 61% dos votos válidos25.

Seus principais adversários, Aloizio Mercadante (PT) e Orestes Quércia (PMDB) – que

possuía o maior índice de rejeição dos três candidatos – com, respectivamente, 15% e

11% das intenções de voto não tinham fôlego para alcançar o tucano. Vale observar que

nas eleições de 2006, houve a saída de Paulo Maluf da disputa ao cargo de governador

em São Paulo, sendo outros os adversários políticos, esses já citados.

O PSDB aparecia como vencedor nas pesquisas eleitorais em SP, a despeito

do sucessor de Geraldo Alckmin, Cláudio Lembo (PFL), com menos de quatro meses à

frente do governo, ser alvo de vaias em eventos públicos e enfrentar o crescimento da

porcentagem dos eleitores que consideravam sua administração ruim ou péssima26. No

período, Lembo governou em meio a uma crise de segurança no estado, devido aos

ataques violentos do PCC (Primeiro Comando da Capital). Na época, alguns nomes do

PSDB tentaram vincular o PT ao PCC, a fim de prejudicar as campanhas nacional e

estadual dos candidatos petistas em benefício dos tucanos.

Em 2006, o PT também foi acusado – e teve pessoas ligadas ao partido presas

por isso – de ter comprado um dossiê que envolvia o candidato tucano José Serra, quando

24 Folha de S. Paulo de 21 de outubro de 2002, Folha Eleições 2002. 25 Folha de S. Paulo de 20 de julho de 2006, Primeiro Caderno. 26 Idem.

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ministro da Saúde em 2001, na venda de ambulâncias a municípios, episódio mais

conhecido como o esquema dos sanguessugas. Serra apareceu em fotos que registravam

o momento da entrega das ambulâncias ao lado de deputados que foram acusados de

integrar a máfia27.

Embora o presidente do PT à época, Ricardo Berzoini, que depois deixou a

presidência do partido por conta do escândalo, tenha negado envolvimento com as

denúncias contra Serra, aproveitou o contexto para pedir investigações sobre ele28. Já

Mercadante (PT), que supostamente seria beneficiado com as acusações contra seu

adversário, deu declarações de que a compra de dossiês não condizia com a vida

democrática, mas pediu que Serra esclarecesse de forma consistente as acusações29.

O contexto político conturbado no qual Serra foi envolvido não impediu sua

eleição. Recém saído do cargo de prefeito da cidade de São Paulo, ele foi eleito

governador do estado em primeiro turno, algo que até o momento não havia ocorrido no

estado com nenhum candidato. Após eleito, disse que o povo tinha dito “não às tramoias”.

O ex-prefeito José Serra (PSDB) foi eleito governador de São Paulo em

uma vitória sem precedentes: é a primeira vez que um candidato vence

no primeiro turno. Ele obteve uma votação recorde – eram 12.372.929

votos (57,94% do total) à 1h de hoje, com 99,92%das urnas apuradas.

É a quarta vitória consecutiva do PSDB no principal estado do país.

Filho único de um imigrante italiano, José Serra Chirico, 64, já passou

pela maioria dos cargos públicos – foi deputado, senador, ministro e

prefeito30.

Em 2010, o PSDB traça a estratégia de priorizar as eleições para governador

em quatro estados – incluindo São Paulo com a candidatura já bastante conhecida de

Geraldo Alckmin – a fim de fazer a oposição sobreviver caso houvesse uma derrota do

27 Folha de S. Paulo de 17 de Setembro de 2006, Primeiro Caderno. 28 Idem. 29 Idem. 30 Folha de S. Paulo de 2 de Outubro de 2006, Eleições 2006 estados.

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partido na eleição nacional para Presidente31. A possibilidade da derrota já era cogitada,

então, pelos tucanos e, conforme bem apontou um eleitor paulista, o PSDB havia

descoberto, tarde demais, que o discurso pragmático só fazia sentido em SP32.

Para viabilizar sua candidatura, Alckmin teve que disputar internamente com

Aloysio Nunes, que era o preferido do ex-governador José Serra. Fortalecendo-se

politicamente, Alckmin conseguiu unificar o PSDB, o que não tinha conseguido em 2006,

e obteve o apoio de todos os diretórios no estado. No dia da eleição, em 3 de outubro de

2010, o Datafolha apontava que ele venceria no primeiro turno com 55% dos votos

válidos33.

O possível segundo colocado, Aloizio Mercadante (PT), que, mesmo

derrotado em 2006, aceitou o pedido de Lula para ser candidato no estado, ficaria em

segundo lugar com 28%. O pedido de Lula, agora cabo eleitoral da candidata do PT,

Dilma Rousseff, para a Presidência da República em 2010, evidencia a fragilidade do

partido no estado de São Paulo, que, por não conseguir emplacar nenhum nome de peso

no estado, tem que optar pelo perdedor da eleição anterior. Obviamente, deve-se

considerar que era outra eleição e o candidato adversário não era o mesmo, portanto, o

contexto era outro.

Atrás do tucano, Mercadante tinha nas mãos uma provável reeleição

para o Senado. Partiu para o “sacrifício”, em nome de pedido de Lula,

que queria consolidar um palanque para Dilma no maior colégio

eleitoral. Mercadante aceitou a missão, pensando não apenas no projeto

político de Lula, mas vislumbrando uma chance para ele próprio34.

A pesquisa do Datafolha também apontou que o candidato tucano teria

votação mais expressiva entre os mais ricos, os mais velhos e os mais escolarizados.

31 Folha de S. Paulo de 24 de Agosto de 2010, Primeiro Caderno. 32 Folha de S. Paulo de 24 de Agosto de 2010, Primeiro Caderno, Painel do Leitor, p. 3. 33 Folha de S. Paulo de 3 de Outubro de 2010, Ed. Especial Extra 34 Idem.

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Geraldo Alckmin venceu, como assinalavam as pesquisas, e a característica da população

paulista foi apontada como um dos fatores que beneficiariam o PSDB no estado.

O elemento demográfico traz outras pistas para a hegemonia tucana.

Mais adultos e menos crianças equivalem a mais renda e menos

despesas, o que contribui para um “fell good factor” que vem

beneficiando o PSDB. (...) o próprio envelhecimento da população

resulta num voto mais conservador. Em geral, são os jovens e os que

sentem não estar avançando que arriscam votos heterodoxos35.

Nas eleições de 2014, novamente Geraldo Alckmin é candidato à reeleição

pelo PSDB, tendo o apoio de partidos importantes no estado e nacionalmente, sendo eles

o Democratas (DEM) e o Partido do Movimento Democrático Brasileiro (PMDB).

Alguns fatos que rondavam a realidade paulista à época da eleição eram vistos e tratados

com cuidado pela cúpula interessada em se manter no poder.

Em primeiro lugar, as manifestações ocorridas em junho de 2013, as quais

tiveram em São Paulo um reduto importante e significativo, demonstravam a insatisfação

da população (pelo menos de uma parte) com as atitudes políticas dos governantes, não

só a nível municipal ou federal, mas também estadual. Segundo dados da Pesquisa CNI

– IBOPE: retratos da sociedade brasileira: qualidade dos serviços públicos e

tributação36 publicada em julho de 2013, 81% da população de São Paulo considerava

que o governador e seus secretários utilizavam os recursos públicos mal ou muito mal.

Em segundo lugar, a chamada “crise da água” em São Paulo, iniciada antes

das eleições, também resultou em protestos no estado diante da falta de água e do

racionamento severo imposto à população. Tudo indicava a falta de planejamento do

35 Schwartsman, Hélio. Articulista da Folha. Em Folha de S. Paulo, 4/10/2010, Especial eleições 2, pg. 2. 36 Pesquisa CNI – IBOPE: retratos da sociedade brasileira: qualidade dos serviços públicos e tributação. Brasília: CNI, julho de 2013, 29p.

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governo estadual como o motivo principal da crise37. Somado a isso, houveram denúncias

de que a Sabesp, operadora do sistema produtor de água em SP, teria optado por fazer

repasses milionários para seus acionistas em detrimento dos investimentos necessários ao

fornecimento de água38. Em resumo, a crise de abastecimento em São Paulo foi posta em

debate no contexto eleitoral e surgia como um fator que poderia prejudicar a reeleição do

PSDB.

Em terceiro lugar, escândalos de corrupção também assombravam o governo

paulista, como a denúncia de cartel do metrô. Políticos ligados à Geraldo Alckmin foram

acusados de terem recebido suborno da multinacional francesa Casol Alston, que com

isso pretendia ganhar o contrato de expansão do metrô de SP. Ademais, houve o “caso

Simiens”, no qual a empresa assumiu ter formado cartel com outras para fraudar as

licitações do metrô bem como afirmou, mediante comprovação documental, que o

governo estadual de São Paulo tinha conhecimento do esquema39.

O contexto político delineado em São Paulo nas eleições de 2014 não

desfavoreceu a hegemonia do PSDB no governo do estado. Geraldo Alckmin teve uma

ampla vitória, no primeiro turno, recebendo 57,31% dos votos válidos. Venceu em 644

dos 645 municípios paulistas.

Com efeito, os diferentes contextos que foram brevemente expostos das

eleições para o governo de SP de 1994 a 2014 trazem à tona três pontos que podem ajudar

na compreensão da hegemonia do PSDB no estado.

Ressalta-se que não se deseja nesse trabalho encontrar explicações gerais para

a manutenção do poder pelo PSDB em São Paulo ao longo de 20 anos. O objetivo aqui é

encontrar elementos nos diferentes períodos eleitorais que somados possam convergir

37 Carta Capital, “Perguntas e respostas sobre a crise da falta de água em São Paulo”, por Redação, 2014. Disponível em: http://www.cartacapital.com.br/politica/perguntas-e-respostas-sobre-a-crise-de-falta-de-agua-em-sao-paulo-2358.html. Acessado em: 15/12/2014. 38 Carta Capital, “Do Cantareira para a Bolsa de Nova York”, por Fabio Serapião, 2014. Disponível em: http://www.cartacapital.com.br/blogs/blog-do-serapiao/do-cantareira-para-a-bolsa-de-nova-york-976.html. Acessado em: 15/12/2014. 39 Carta Maior, “14 escândalos de corrupção envolvendo Aécio, o PSDB e aliados, por Najla Passos, 2014. Disponível em: http://www.cartamaior.com.br/?/Editoria/Politica/14-escandalos-de-corrupcao-envolvendo-Aecio-o-PSDB-e-aliados/4/32017. Acessado em: 15/12/2014.

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para uma melhor compreensão da permanência de um mesmo partido no poder executivo

estadual. Em suma, não se procura aqui descobrir o motivo das reeleições, mas sim

identificar e compreender, ainda que minimamente, os fatores e aspectos que convergiram

para a hegemonia atual do PSDB em SP.

O primeiro aspecto identificado foram as alianças realizadas entre os atores

políticos que permeavam o contexto eleitoral. Observa-se que o PFL, que hoje é

denominado DEM, um partido de força nacional, é um constante aliado do PSDB nas

eleições estaduais, com exceção do pleito de 1998, ano no qual apoiou o principal

adversário de Mário Covas na época, Paulo Maluf (PPB).

Já nas eleições de 2014, embora o PMDB tivesse um candidato próprio

concorrendo à reeleição, ocorreu o que se pode chamar de “levante pró-Alckmin” dos

prefeitos paulistas pmdebistas, os quais, após reunião com o candidato tucano, decidiram

apoiá-lo em detrimento do candidato do PMDB ao governo, Paulo Skaf, que, por sua vez,

acusou Alckmin de intimidar prefeitos de cidades pequenas40.

A competição eleitoral, principalmente em um sistema multipartidário, requer

a existência de apoio político entre os atores para que eles se auxiliem mutuamente e

aumentem suas chances de chegar ao poder. Conforme aponta estudo de Carreirão e

Nascimento (2010) que analisa a dinâmica das coligações entre as eleições de 1986 a

2006, “a taxa de sucesso eleitoral de candidaturas lançadas por coligações [é no conjunto

do período] quase cinco vezes maior do que a taxa de sucesso eleitoral de candidaturas

isoladas” (CARREIRÃO & NASCIMENTO, 2010, 97)41. Muitas vezes, troca-se apoio

(entende-se votos) por espaço nas alianças pós-eleitorais e participação no governo. Vê-

se, portanto, a importância da “construção de uniões efêmeras [entre partidos] decorrentes

apenas de um momento eleitoral específico” (MACHADO & MIGUEL, 2011, 37)42.

40 Ver em < http://www1.folha.uol.com.br/cotidiano/ribeiraopreto/2014/10/1525612-pmdb-analisa-

levante-pro-alckmin-liderado-pelo-prefeito-de-araraquara.shtml> 41 CARREIRÃO, Yan de S. & NASCIMENTO, Fernanda Paula do. “As coligações nas eleições para os

cargos de governador, senador, deputado federal e deputado estadual no Brasil (1986/2006)”. Revista

Brasileira de Ciência Política, Brasília, n. 4, p. 75-104, julho-dezembro, 2010.

42 MACHADO, Carlos M. & MIGUEL, Luis Felipe. “Padrões de coesão e dispersão: Uma proposta de

tipologia para coligações”. Teoria & Pesquisa, vol. 20, nº 2. São Carlos, pp. 37-58, 2011.

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Um segundo aspecto que chama a atenção na construção feita anteriormente,

ainda que superficial, do contexto político das eleições paulistas é a fragilidade que os

partidos oposicionistas manifestam na arena eleitoral paulista. Dessa forma, um aspecto

que beneficiaria o PSDB no estado seria o fato de que os demais partidos não conseguem

consolidar uma oposição no estado.

Ainda são incertos os motivos pelos quais o PT e também os demais partidos

nas últimas duas décadas não conseguiram se consolidar como uma alternativa possível

ao governo do estado. No caso do PT, que é apontado como o principal adversário político

dos tucanos em SP, em três das seis eleições ocorridas para o governo estadual desde

1994 (pleitos de 1994, 1998 e 2014), o PT foi apenas o terceiro colocado no 1º turno e

em outras duas (pleitos de 2006 e 2010) mesmo ficando em segundo lugar não conseguiu

ir para o segundo turno, conforme evidenciam os dados a seguir.

Em terceiro lugar, observa-se a possibilidade da força do PSDB em São Paulo

se concentrar em uma região específica do estado, mais especificamente, no seu interior.

Conforme mencionado anteriormente, nas eleições de 1994 os tucanos decidiram

concentrar a campanha na região interiorana do Vale do Paraíba. Em 1998 e 2002, as

pesquisas de intenção de voto divulgadas pela mídia informavam que os votos

conquistados no interior do estado seriam a chave para a vitória do PSDB.

Nesse sentido, impõe-se verificar se as reeleições do PSDB em São Paulo

possuem algum padrão sócio geográfico. Se faz importante, portanto, verificar a priori

quem são e onde estão os eleitores que decidem por reeleger que está no poder, atentando

para a possibilidade de que o perfil dos eleitores que votaram na última eleição no PSDB

no estado de São Paulo não seja o mesmo daqueles que votaram nas eleições de 1994, por

exemplo.

Visando iniciar uma parte do trabalho que é entender as reeleições para

governador em SP, a presente pesquisa tem como objeto de estudo o eleitorado do estado

de São Paulo, almejando compreender seu perfil socioeconômico e geográfico no

decorrer dos períodos eleitorais, buscando constatar semelhanças e/ou diferenças entre as

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eleições. As características sócio políticas municipais serão associadas à porcentagem de

votos por município dos vitoriosos para o cargo de governador. A unidade de análise será,

portanto, o município, de modo que, para os fins aqui propostos, os eleitores não serão

avaliados em suas características individuais, mas sim agrupados no nível municipal.

Acredita-se que a compreensão primeira do eleitorado paulista em termos

socioeconômicos e geográficos certamente ajudará na análise acerca do comportamento

dos eleitores bem como na compreensão dos demais aspectos que podem estar associados

ao resultado das urnas, alguns já citados nos parágrafos anteriores.

Deve-se ter em mente que as classes sociais ou os estratos socioeconômicos

não constituem em abstrações43. Com efeito, eles constituem como corretamente observa

Lamounier em “agrupamentos espaciais que se distribuem diferencialmente entre os

bairros de uma cidade em função das possibilidades de acesso a habitações de certo

padrão, a serviços de infraestrutura, etc.44”.

Em que pese o voto ser um ato individual, para o entendimento da

concentração da votação em determinado lugar é necessário abordar a teoria do

contextualismo geográfico, segundo a qual o comportamento dos eleitores é influenciado

pelo ambiente sócio geográfico, seja pelas redes de interação social existentes ou pela

semelhança de experiências às quais os habitantes de uma região estão submetidos45.

Segundo essa linha de pensamento, a política não pode ser compreendida

desconsiderando-se o contexto no qual ocorre e as condições em que se encontram os

indivíduos46. Com efeito, o contexto político e as opções de candidaturas disponíveis

também são fatores potenciais que podem interferir na decisão do eleitor.

43 LAMOUNIER, Bolívar. “Comportamento Eleitoral em São Paulo: passado e presente”. In: CARDOSO, Fernando Henrique, comp. Partidos políticos e eleições no Brasil. Rio de Janeiro, Paz e Terra, 2ª ed. 1978, 262 p. 44 Idem. 45 SOARES, Gláucio A. D. & TERRON, Sonia. “Dois Lulas: a geografia eleitoral da reeleição (explorando conceitos, métodos e técnicas de análise geoespacial)”. Opinião Pública, Campinas, v. 14, n. 2, Nov. 2008. 46 Ver LAZARSFELD, Paul; BERELSON, Bernard & GAUDET, Hazel. “The nature of personal influence”. New York: Columbia University Press, 1970, p. 150-158.

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Entende-se que os indivíduos são mais afetados por questões próximas à sua

realidade, seja geográfica, social ou contextual, do que por questões gerais como a

ideologia47, de modo que pessoas com realidades semelhantes estão predispostas, no

cenário eleitoral, a votar também de modo semelhante e a partilharem interesses.

A ideia de base eleitoral delimita uma unidade geográfica ou administrativa

na qual o candidato obteve alguma votação e para a qual se espera que o político retorne

e dirija sua atividade de representante48. Logo, a quantidade de votos obtida em cada

município é um critério que os pode distinguir e hierarquizá-los quanto à atenção que é

dada pelo político49. A literatura aponta que as regiões do estado onde o governante

recebeu maior votação são visitadas com mais frequência e recebem maior quantidade de

recursos50, o que pode contribuir com a manutenção e ampliação desses redutos eleitorais

em benefício do governante.

METODOLOGIA

Considerando o objetivo da pesquisa, o trabalho a ser realizado ambiciona

mesclar pesquisa quantitativa e pesquisa qualitativa. Almeja-se que a proporção de votos

do candidato vitorioso em São Paulo (de 1994 até 2014) seja associada com variáveis

socioeconômicas e políticas dos 645 municípios. Conforme explicitado anteriormente, o

objetivo é verificar a existência ou não de um padrão sócio geográfico associado à

reeleição do PSDB. Como já mencionado, será realizado um estudo histórico acerca das

reeleições do PSDB em SP, o que, a posteriori, permitirá comparações e possíveis

identificações de diferenças e padrões relevantes.

47 CONVERSE, Philip E. “The Nature of Belief Systems in Mass Publics”. In: APTER, D. E. Ideology and Discontent. New York: Free Press of Glencoe, p. 206-261, 1964. 48 BEZERRA, Marcos O. Em nome das “bases”: política, favor e dependência pessoal. Rio de Janeiro: Relume-Dumará – NUAP, 1999. 49 Idem. 50 Idem.

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A variável ‘votação’ será associada, com o auxílio do software estatístico R,

com as seguintes variáveis: transferências de recursos do estado para o município51;

partido do prefeito52, agrupando os partidos da base governista e da oposição, tendo em

vista a coligação formada no ano da eleição estadual; e, Índice Paulista de

Responsabilidade Social (IPRS)53, que mede o desenvolvimento humano nos municípios

paulistas, isto é, suas condições de vida, separando-os por grupos que possuem escala de

1 a 5. Nos grupos 1 e 2 do IPRS estão os municípios com nível elevado de riqueza, que

possuem bons níveis nos indicadores sociais e aqueles não exibem bons indicadores,

respectivamente. Já nos grupos 3 e 4 se encontram os municípios com nível de riqueza

baixo, mas que possuem bons indicadores nas demais dimensões e nível intermediário de

longevidade e/ou escolaridade, respectivamente. Por fim, o grupo 5 é composto pelos

municípios mais desfavorecidos, tanto em riqueza como nos indicadores sociais.

As bases de dados foram montadas no Excel com o auxílio do Access no

agrupamento de diferentes bases. Após a organização dos dados foram realizadas análises

descritivas, o que acarretou nos gráficos a seguir.

A identificação de bases socioeconômicas vinculadas à eleição do poder

executivo estadual direciona para a existência de um perfil de eleitor que decide votar em

tal candidato. A partir delas será construído um mapa eleitoral do estado, que certamente

poderá auxiliar na compreensão objetiva das eleições.

Além disso, pretende-se confrontar, por município, a diferença entre a

votação do candidato eleito e a votação do candidato que ficou em segundo lugar.

Pretende-se identificar onde estão as regiões de maior e menor diferença bem como qual

o perfil socioeconômico desses regiões/municípios.

51 Fonte SEADE (Fundação Sistema Estadual de Análise de Dados): Portal de Estatísticas do Estado de São Paulo < http://www.seade.gov.br> 52 Fonte Tribunal Superior Eleitoral (TSE) < http://www.tse.jus.br> 53 Fonte SEADE (Fundação Sistema Estadual de Análise de Dados): Portal de Estatísticas do Estado de São Paulo < http://www.seade.gov.br>

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O prefeito do município também será uma variável nesse estudo, pois deseja-

se verificar se o seu partido direciona para algum padrão de vitória ou não dos tucanos

em determinados municípios.

Deve-se ressaltar que as diferenciações socioeconômicas ou geográficas

relacionadas à decisão do voto, se verificadas no estado de São Paulo, não invalidam a

história eleitoral do estado54. Isto é, como já apontado anteriormente, as reportagens

acerca do contexto político vinculadas pela imprensa, mesmo que não sejam estudos

quantitativos em sua essência, apresentam questões contextuais que ajudam a compor a

história das eleições, podendo ser identificados como dados qualitativos.

RESULTADOS PRELIMINARES E CONCLUSÃO

A fim de apresentar alguns dados relativos à primeira hipótese referente ao

padrão sócio geográfico das eleições do PSDB no estado de São Paulo de 1994 a 2014,

seguem abaixo alguns gráficos descritivos dos dados até então levantados. Conforme

citado na seção de metodologia, a proporção da votação do candidato tucano eleito no

respectivo período eleitoral, foi associada ao volume de transferências de recursos

estaduais para o município, ao partido do prefeito, considerando quando esse compunha

a base governista ou a oposição, e ao IPRS (Índice Paulista de Responsabilidade Social).

A fim de descrever a proporção de votos do candidato eleito para o governo

de São Paulo em função das variáveis ‘partido do prefeito’ e ‘IPRS’, foram feitos boxplots

no software de análise R. Em resumo, o diagrama de caixa (ou boxplot) foi a ferramenta

utilizada para localizar e analisar a variação da variável ‘proporção de votos’ em função

das variáveis citadas acima.

54 LAMOUNIER, Bolívar. “Comportamento Eleitoral em São Paulo: passado e presente”. In: CARDOSO, Fernando Henrique, comp. Partidos políticos e eleições no Brasil. Rio de Janeiro, Paz e Terra, 2ª ed. 1978, 262 p.

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Já a descrição da ‘proporção de votos’ por meio da variável ‘transferência do

estado para o município’ foi realizada por meio de diagrama cartesiano (simple

scatterplot) no qual foram plotadas os valores das duas variáveis.

Os dados que serão vistos correspondem às eleições de 1998, 2002, 2006 e

2010, faltando, ainda, os dados de 1994 e 2014. Os resultados eleitorais por município

não estão disponibilizados no site do Tribunal Superior Eleitoral (TSE). Sendo assim, far-

se-á a solicitação dos dados de 1994, existentes em arquivo impresso, em momento

posterior. Os dados eleitorais de 2014 estão disponibilizados online. No entanto, os dados

socioeconômicos ainda não foram atualizados para o ano em questão, por isso a análise

será feita também a posteriori. Além disso, ainda não há para o ano de 1998 a descrição

da proporção de votos por indicador socioeconômico municipal, tendo em vista que o

IPRS é inexistente nesse ano específico.

As análises iniciais feitas a partir dos gráficos que se seguem direcionam para

a inexistência de um padrão relativo à votação nos períodos eleitorais, tendo em vista as

variáveis ‘transferência estadual para o município’ e ‘partido do prefeito’. Ou seja, essas

variáveis não interferem em menor ou maior proporção de votos para o candidato eleito.

O mesmo ocorre com a variável IPRS.

A inferência parcial que se tem é que o voto no PSDB em São Paulo

independe do volume de transferências estaduais para o município, do partido do prefeito

e do IPRS municipal.

Descrição estatística da proporção de votos do candidato a governador eleito (SP)

pelo volume das transferências estaduais para o município - eleições de 1998, 2002,

2006 e 2010

Tabela 1. Associação entre proporção de votos do governador eleito e transferências estaduais para

o município – 1998.

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Tabela 2. Associação entre proporção de votos do governador eleito e transferências estaduais para

o município – 2002.

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Tabela 3. Associação entre proporção de votos do governador eleito e transferências estaduais para

o município – 2006.

Tabela 4. Associação entre proporção de votos do governador eleito e transferências estaduais para

o município – 1998.

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Descrição estatística da proporção de votos do candidato a governador eleito (SP)

pelo partido do prefeito (partidos da base = 0 e partidos da oposição = 1) - eleições

de 1998, 2002, 2006 e 2010.

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Tabela 5. Associação entre proporção de votos para o governador eleito e partido do prefeito –

1998.

Tabela 6. Associação entre proporção de votos para o governador eleito e partido do prefeito –

2002.

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Tabela 7. Associação entre proporção de votos para o governador eleito e partido do prefeito –

2006.

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Tabela 8. Associação entre proporção de votos para o governador eleito e partido do prefeito –

2010.

Descrição estatística da proporção de votos do candidato a governador eleito (SP)

pelo Índice Paulista de Responsabilidade Social (IPRS)- eleições de 2002, 2006 e

2010.

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Tabela 9. Associação entre proporção de votos para o governador eleito e IPRS – 2002.

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Tabela 10. Associação entre proporção de votos para o governador eleito e IPRS – 2006.

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Tabela 11. Associação entre proporção de votos para o governador eleito e IPRS – 2010.

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Tabela 12. Associação entre proporção de votos para o governador eleito e rendimento mensal total

domiciliar per capita nominal em reais – 2010.

Bibliografia

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