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1 OS PROJETOS DE MICROBACIAS HIDROGRÁFICAS NO MUNICÍPIO DE PRESIDENTE VENCESLAU – SP Vania Cristina dos Santos Pedro Universidade Estadual Paulista-UNESP/Presidente Prudente [email protected] Antonio Nivaldo Hespanhol Universidade Estadual Paulista-UNESP/Presidente Prudente [email protected] Resumo O trabalho tem como objetivo analisar as ações dos projetos de microbacias hidrográficas implementados no município de Presidente Venceslau. Foram selecionadas duas microbacias no referido município: a microbacia do Córrego do Veado e a microbacia do Córrego Água da Colônia. A partir dos dados coletados em campo, averiguamos que, embora se localizem parte no mesmo município, as micorbacias em questão apresentaram diferenças quantitativas nas práticas implementadas, especialmente no que concerne as ações coletivas.A participação dos produtores rurais das duas microbacias nas suas respectivas associações também se dá de maneira bastante diferenciada. Palavras-chave: Programa de Microbacia Hidrográficas. Desenvolvimento Rural. Políticas Públicas. Introdução Neste texto são apresentados os resultados parciais obtidos a partir do plano de trabalho de iniciação científica intitulado que tem como objetivo analisar as ações dos projetos: de microbacias hidrográficas no município de Presidente Venceslau - SP. Com base nos parâmetros sociais, econômicos e ambientais, as microbacias selecionadas pelo Conselho Municipal de Desenvolvimento Rural foram a do Córrego do Veado e do Córrego Água da Colônia. Nesse sentido, a Microbacia Hidrográfica do Córrego Água da Colônia, cujo plano de ação foi aprovado no ano de 2002, abrange uma área de 2.459 hectares, perfazendo 41 unidades produtivas, enquanto que a Microbacia Hidrográfica do Córrego Água do Veado teve o plano de ação aprovado no ano de 2006, abrange uma área de 2.773 hectares e perfaz 49 unidades produtivas.

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OS PROJETOS DE MICROBACIAS HIDROGRÁFICAS NO MUNICÍPIO DE PRESIDENTE VENCESLAU – SP

Vania Cristina dos Santos Pedro

Universidade Estadual Paulista-UNESP/Presidente Prudente [email protected]

Antonio Nivaldo Hespanhol

Universidade Estadual Paulista-UNESP/Presidente Prudente [email protected]

Resumo O trabalho tem como objetivo analisar as ações dos projetos de microbacias hidrográficas implementados no município de Presidente Venceslau. Foram selecionadas duas microbacias no referido município: a microbacia do Córrego do Veado e a microbacia do Córrego Água da Colônia. A partir dos dados coletados em campo, averiguamos que, embora se localizem parte no mesmo município, as micorbacias em questão apresentaram diferenças quantitativas nas práticas implementadas, especialmente no que concerne as ações coletivas.A participação dos produtores rurais das duas microbacias nas suas respectivas associações também se dá de maneira bastante diferenciada.

Palavras-chave: Programa de Microbacia Hidrográficas. Desenvolvimento Rural. Políticas

Públicas.

Introdução

Neste texto são apresentados os resultados parciais obtidos a partir do plano de trabalho

de iniciação científica intitulado que tem como objetivo analisar as ações dos projetos:

de microbacias hidrográficas no município de Presidente Venceslau - SP.

Com base nos parâmetros sociais, econômicos e ambientais, as microbacias

selecionadas pelo Conselho Municipal de Desenvolvimento Rural foram a do Córrego

do Veado e do Córrego Água da Colônia.

Nesse sentido, a Microbacia Hidrográfica do Córrego Água da Colônia, cujo plano de

ação foi aprovado no ano de 2002, abrange uma área de 2.459 hectares, perfazendo 41

unidades produtivas, enquanto que a Microbacia Hidrográfica do Córrego Água do

Veado teve o plano de ação aprovado no ano de 2006, abrange uma área de 2.773

hectares e perfaz 49 unidades produtivas.

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Desenvolvimento

A questão principal do desenvolvimento de áreas rurais na perspectiva de Kayser (1990)

apud Favareto (2007) está centrada no fator populacional, como também no

enriquecimento da sociedade como um todo.

Para Gehlen (2004, p 98) o desenvolvimento local: (...) se fortalece na presença de políticas públicas, de organizações locais e informais onde o desenvolvimento local resulta da mobilização de recursos, da potencialização, da participação dos beneficiários na presença de parceiras com o Estado e com empresas privadas.

Autores como Basile; Cecchi (1997) afirmam que: A questão está na diferenciação produtiva, na mudança da composição setorial da economia das áreas rurais até a emergência das atividades não agrícolas: diferenciação traz novos atores, novas formas de uso dos recursos naturais, novas relações entre atores e entre setores, além de novos modos de integração do rural ao sistema econômico (FAVARETO, 2007, p. 124).

Apesar da importante contribuição desses estudos para o debate sobre o

desenvolvimento das áreas rurais, tais reflexões não respondem o porque não há

homogeneidade desses efeitos nas diversas localidades.

Após a Segunda Guerra Mundial o Brasil recebeu capital externo, o que propiciou o

desenvolvimento interno e a ascensão econômica até meados da década de 1970. Nesse

período, um grande contingente de indústrias químicas que anteriormente supria a

indústria bélica passa a produzir agrotóxicos, dentre eles herbicidas, fungicidas e

inseticidas utilizados na produção agrícola, com o objetivo de eliminar fungos, insetos e

ervas daninha, de acordo com Rosa (1998) apud Andrades e Ganimi (2007). Também

passaram a ser utilizadas máquinas tais como tratores, colheitadeiras, plantadeiras

empregadas em diversas etapas da produção, inovações estas promovidas pela

denominada “Revolução Verde”.

Assim, eram lançadas as bases para o pacote tecnológico da “Revolução Verde” que foi

disseminado em diversas partes do mundo, inclusive em alguns países periféricos. De

acordo com Hespanhol (2008) “a modernização da agricultura ocorrida em vários países

derivou deste movimento expansionista caracterizado pelo expressivo crescimento

econômico e pelo grande avanço tecnológico”. No caso do Brasil, foi incentivada pelos

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governos militares nas décadas de 1960 e 1970, quando foi instituído o Sistema

Nacional de Crédito Rural (SNCR).

Para que os produtores rurais dos países subdesenvolvidos tivessem acesso a esses

“pacotes tecnológicos”, foi necessária a ampliação do crédito através de convênios

intergovernamentais com a finalidade de financiar a importação de insumos e máquinas

agrícolas (ROSA, 1998 apud ANDRADES; GANIMI, 2007).

De acordo com Hespanhol (2008, p. 372): Graças à modernização da agricultura e ao estabelecimento da Política Agrícola Comum (PAC), alguns países europeus que apresentavam forte dependência da importação de alimentos, não somente se tornaram auto-suficientes, como se converteram em exportadores líquidos de produtos agrícolas a partir dos anos 1980. Os EUA, o Canadá, a Austrália, o Brasil, a Argentina, o México e muitos outros países, expandiram significativamente a produção agropecuária em decorrência da adoção do pacote tecnológico da “Revolução Verde”

Contudo, é válido destacar que embora um grande número de produtores rurais passou a

incorporar na produção os pacotes tecnológicos, esse número não é maior do que

aqueles que não puderam usufruir dessa tecnologia.

Apesar do sucesso alcançado pela modernização da agricultura, a degradação ambiental

causada por ela é significativa. Conforme Hespanhol (2008), a expansão de

monoculturas aliada ao acentuado uso de máquinas e insumos químicos afetaram a

qualidade ambiental de diversas áreas em países desenvolvidos e subdesenvolvidos. Em

decorrência desse fato houve a valorização de alimentos orgânicos.

Nessa perspectiva, se passou a reconhecer que a modernização da agricultura

consubstanciada no modelo produtivista, não foi eficaz na redução da pobreza das zonas

rurais, tampouco proporcionou melhora na qualidade de vida das suas populações.

Também não superou a mazela causada pela fome no mundo, embora houvesse

acréscimo na oferta de alimentos, os problemas relativos à sua distribuição persistiram e

até se agravaram (HESPANHOL, 2008).

Para Neves Neto (2009, p. 34): O crédito agrícola subsidiado, carro-chefe da modernização da agricultura, privilegiou os grandes proprietários de terras, em detrimento dos pequenos. Além dos juros negativos concedidos aos latifundiários monocultores, principalmente os plantadores de soja, trigo, milho e cana-de-açúcar, outras medidas adotadas durante o período militar contribuíram para a transformação de algumas grandes glebas em empresas rurais integradas à jusante e à montante das indústrias.

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Dessa forma, Araujo, (2003, p. 1-2) salienta que:

O Estado era o promotor do desenvolvimento e não transformador das relações da sociedade. Um Estado conservador que logrou promover transformações fantásticas sem alterar a estrutura da sociedade. Visto que, o essencial das políticas públicas desse período estava voltado para promover o crescimento econômico, acelerando o processo de industrialização, o que era pretendido pelo Estado brasileiro, sem a transformação nas relações de propriedade na sociedade brasileira.

Diante de tal quadro, podemos concluir que as políticas não eram elaboradas para

promover a equidade social no campo, mas sim dotadas de um hibridismo que

privilegiava a agricultura patronal sem “excluir” completamente os produtores não

capitalizados ou trabalhadores rurais.

Um bom exemplo desse hibridismo foi a instituição do Estatuto do Trabalhador Rural,

(lei n° 4.914) que concedeu direitos trabalhistas - férias, 13° salário, jornada de 8 horas -

ao trabalhador rural (NEVES NETO, 2009).

Nessa política híbrida o Estado acabou adaptando as leis relativas ao trabalhador urbano

para o trabalhador rural, numa clara tentativa de abrandar a população rural, por não ter

realizado uma reforma de base (agrária).

Corrobora com este fato a assertiva de Prado Junior (2000, p. 134): O legislador se limitou em regra, e com poucas exceções, a transpor para o trabalhador rural as disposições legais que já fazem parte de nossa legislação trabalhista e foram traçadas com vistas ao trabalhador urbano, o que tornará difícil a aplicação delas a muitas situações correntes no campo, e abre perspectivas para a fraude e não aplicação da Lei (NEVES NETO, 2009, p. 32).

Buscando uma adequação ao Estatuto, os grandes latifundiários passaram a contratar

mão de obra temporária, como é o caso dos “bóias frias” que vivem nas periferias das

cidades devido aos baixos salários que recebem, aliado a condições de trabalho

extenuantes.

Constatamos então que o Estado enquanto instituição que deveria zelar pelo

planejamento e elaboração de políticas públicas para as regiões e populações como um

todo, renuncia em prol do grande capital. No final dos anos de 1980 e início 1990,

devido a forte crise econômica que o país passou, ocorreu o processo de reorganização

do território nacional, fomentado pelo desenvolvimento de políticas públicas, pautadas

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na reestruturação territorial, que foi baseada na lógica de produção/e desenvolvimento

espacial.

O processo de descentralização administrativa surge como solução para os problemas

sociais deixados pela crise econômica do final dos anos de 1970, que adentram a década

de 1980, que provocaram o descontentamento da população e a eclosão de vários

movimentos sociais. Esse processo ocasionou o desmanche de toda a estrutura de

planejamento e o esgotamento do padrão de financiamento tradicional, que beneficiava

os grandes latifundiários durante o desenvolvimento da agricultura e da indústria

nacional.

Sobre a Constituição de 1988, Buarque (1999, p. 20) ressalta que: Este ciclo de desconcentração econômica e centralização política parece se inverter, a partir da segunda metade da década de oitenta, como resultado combinado da estagnação econômica e da crise do Estado no Brasil. Com a promulgação da Constituição de 1988, inicia-se um processo desorganizado de descentralização político-administrativa, com distribuição de responsabilidades e poder decisório para os Estados e municípios, reduzindo o peso da União.

Estados e Municípios, entes federativos, passam a ter maior autonomia nas decisões

internas a partir da promulgação da Constituição Federal de 1988, que estabeleceu a

redemocratização do país.

Houve a articulação de uma série de novos canais de participação envolvendo o Estado

e a sociedade, a fim de buscar alternativas cabíveis para sanar os problemas das

políticas públicas conservadoras implementadas no país, haja vista que, os dispositivos

da Constituição promulgada em 1988 eram considerados inovadores do ponto de vista

político, pois dava autonomia aos novos sujeitos sociais de reivindicar os seus direitos

perante a sociedade, tornando-os sujeitos ativos.

Assim, a ideia do desenvolvimento local se fortalece por meio de políticas públicas,

com a formação de organizações locais formais e informais. Sua dinâmica é

fundamentada na indução do desenvolvimento econômico e sustentável (GEHLEN,

2004).

Segundo Pereira e Silva (2009, p. 2) “políticas públicas são diretrizes, princípios

norteadores da ação do poder público; regras e procedimentos para as relações entre

poder público e sociedade, mediações entre atores e sociedade e o Estado”.

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Formular e participar da gestão de políticas públicas direcionadas para os municípios é

um desafio para a sociedade civil, que só será possível através da distribuição e

alocação de recursos públicos junto ao poder público (PEREIRA; SILVA, 2009).

Nessa perspectiva, o Programa Estadual de Microbacias Hidrográficas é considerado

um marco em prol do desenvolvimento do pequeno produtor rural, pois suas diretrizes e

ações estão direcionadas para o desenvolvimento destes novos agentes sociais, que

durante décadas foram excluídos socialmente e economicamente das ações da União.

Este programa tem sido executado desde o ano de 2000, com o objetivo de promover o

uso sustentável dos recursos naturais, utilizando como unidade de planejamento as

Microbacias Hidrográficas.

Em todo o Estado de São Paulo a CATI estabeleceu metas a serem atingidas. O objetivo

era atender 90 mil produtores rurais do Estado, atendendo mais de 1500 projetos, numa

área de abrangência de mais de 4,6 milhões de hectares (CATI, 2001).

A pesquisa realizou-se no município de Presidente Venceslau, cuja localização está

destacada na figura 1.

Figura 1: Localização do município de Presidente Venceslau na 10° Região

Administrativa do Estado de São Paulo

Fonte: Ministério das Cidades, 2012.

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Atualmente, o município possui uma população de 37.910 habitantes, destes 3.738

residem na zona rural, conforme os dados do Censo Demográfico do IBGE referente ao

ano de 2010.

O município possui 640 unidades produtivas, das quais 472 são classificadas como

agricultura familiar, ou seja, em 73,8% são as famílias que conduzem a exploração da

unidade produtiva, de acordo com o Censo Agropecuário do IBGE de 2006.

Com relação a agropecuária, tem destaque a produção de cana-de-açúcar, milho e

eucalipto, como também a criação de bovinos, uma vez que as pastagens ocupam uma

área de 56.309,4 hectares, o que representa 82,98 % da área total das unidades de

produção agrícola (UPAs) do município, conforme se verifica na Tabela 1.

Tabela 1: Principais produtos cultivados no município de Presidente Venceslau CULTURA ÁREA CULTIVADA Bráquiaria 56.309,4

Cana de Açúcar 9.574,5 Eucalipto 533,3

Fonte: LUPA, 2007/2008

O PEMH implementado no território paulista visou combater os problemas decorrentes

do processo de modernização da agricultura. No entanto, as ações do referido programa

se centralizaram no combate à erosão e aos ravinamentos, cercamento das áreas

proteção permanentes (APPs), reconstituição de matas ciliares, estímulo ao manejo

adequado dos recursos naturais nas pequenas propriedades rurais e a organização dos

agricultores em associações. Para o melhor desempenho das ações o Banco

Internacional para Reconstrução e Desenvolvimento (BIRD – Banco Mundial)

financiou parcialmente o programa, coube a CATI em parceria com os municípios, a

execução das ações em todo o território paulista.

A escolha das microbacias hidrográficas foi realizada com base em critérios técnicos e

socioeconômicos instituídos pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA).

Para a escolha, levaram-se em consideração a susceptibilidade a erosão e os elevados

índices de pobreza rural, conforme ressalta Hespanhol (2005).

O Conselho Municipal de Desenvolvimento Rural juntamente com o Engenheiro

Agrônomo da Casa da Agricultura foram os responsáveis pelo levantamento dos

principais problemas das microbacias selecionadas.

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Os projetos de Microbacias Hidrográficas implementados no município de Presidente

Venceslau, que se enquadrava na zona de prioridade 1, receberam incentivos individuais

e coletivos.

Dentre as práticas individuais podemos citar a adubação verde, cercas de proteção de

mananciais, controle de erosão, calcário, fossa séptica biogestora, entre outras. Dentre

as práticas comunitárias, destacaram-se a implantação de abastecedouros, distribuidores

de calcário, roçadeiras, semeadoras de plantio direto (tração animal) e roçadeira costal.

Os equipamentos comunitários foram concedidos por intermédio da associação de

produtores rurais. No entanto, era preciso que os produtores rurais formassem grupos

de, no mínimo, cinco beneficiários, devidamente inseridos na microbacia, para terem

acesso aos equipamentos e estarem vinculados a uma associação de produtores rurais

dentro da microbacia.

Para o recebimento dos benefícios, elaboraram-se os Projetos Individuais das

Propriedades (PIP´s) nas microbacias, por meio dos quais foram diagnosticados os

problemas de cada unidade produtiva. Os gastos para a aquisição dos kits de

infraestruturas poderiam ter os custos subvencionados em até 90% pelo Estado/BIRD,

conforme ressalta Neves Neto (2009).

Com base nos parâmetros e na pontuação foram selecionadas duas Microbacias

Hidrográficas no município de Presidente Venceslau: Córrego Água da Colônia, cujo

plano de ação foi aprovado no ano de 2002, abrange uma área de 2.459 hectares,

perfazendo 41 unidades produtivas e a Microbacia Hidrográfica do Córrego do Veado

que teve o plano de ação aprovado no ano de 2006, abrange uma área de 2.773 hectares,

perfazendo 49 unidades produtivas.

Dentre as práticas desenvolvidas pelo programa na microbacia do Córrego Água da

Colônia destacam-se: controle de erosão, cerca para proteção de mananciais, calcário

agrícola aplicado, doação de mudas de espécies florestais nativas e doação para a

Associação de Produtores Rurais de kits de informática e de equipamentos utilizados

para efetuar o plantio direto. Na microbacia do Córrego do Veado podemos destacar:

cerca de proteção de mananciais, controle de erosão, e voçorocas, aquisição de

roçadeira costal e doação de mudas de espécies florestais nativas.

Os dados levantados por meio do trabalho de campo, bem como de entrevistas com os

técnicos, o presidente da associação de produtores rurais, e com membros do conselho

de desenvolvimento rural nos permitiu identificar que apesar de ser um projeto de

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implantação de nível estadual, ele possui relação com outras escalas de poder. Sendo

assim, na escala global segue os pressupostos do BIRD, tendo em vista que, parte dos

recursos financeiros é oriundo daquele organismo internacional.

Na escala local, os técnicos responsáveis pela execução do programa agem em conjunto

com o CMDR, as associações de produtores rurais e a secretaria municipal de

agricultura e meio ambiente.

Notou-se, assim, a partir das entrevistas realizadas, que há conflitos de interesse entre as

diferentes instâncias envolvidas na execução dos projetos, além disso, a troca constante

de técnicos executores gera desconfiança dos produtores rurais e descontinuidade das

ações.

Apesar desses conflitos de interesse entre as diferentes instancias notamos também que

o PEMH incentivou os produtores a se organizarem coletivamente em busca de

soluções para os problemas decorrentes das atividades agropecuárias.

Pode-se afirmar também que ocorreram mudanças consideráveis nos aspectos

ambientais, na maneira dos técnicos atuarem nas propriedades, como também dos

produtores rurais se relacionarem com o meio ambiente. Estes passaram a se preocupar

com as questões ambientais, uma vez que se passou a adotar métodos de proteção das

nascentes, a reconstituição da vegetação nativa nas Áreas de Preservação Permanente,

como salienta Neves Neto (2009).

As Ações do Programa Estadual de PEMH não se restringiram somente aos pequenos

produtores rurais, pois o programa procurou ajudar os grandes e médios produtores

rurais através da concessão de mudas de espécies florestais (sem custo para os

produtores) para o reflorestamento das áreas degradadas pelo processo de modernização

agrícola, “O programa subsidiou a aquisição de mudas durante cinco anos com limite de

2.600 mudas por beneficiário. O técnico executor ficou responsável pela fiscalização e

manutenção das mudas plantadas” (NEVES NETO, 2009, p. 104) além de fornecer

material para o cercamento das Áreas de Preservação Permanentes (APP´s) e fossas

sépticas.

No que diz respeito às estradas rurais em todo o Estado de São Paulo, “o PEMH, por

meio desse componente, teve como meta recuperar 6.000 km da malha rodoviária rural

nas 1500 microbacias atendidas (NEVES NETO, 2009, p. 105)”, com a utilização de

técnicas inovadoras como a terraplanagem e a drenagem com o intuito de reverter

processos erosivos encontrados em boa parte da malha rodoviária rural paulista.

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Nesse sentido, por meio do trabalho de campo realizado nas duas microbacias

de Presidente Venceslau, notamos que muitas ações foram implementadas no

município. Deste modo, podemos destacar que a maio parte dessas ações se

concentraram em pequenas propriedades, conforme a tabela 2, tendo em vista que o

programa tem como prioridades as pequenas e médias propriedades.

Tabela 2: Distribuição das propriedades pesquisadas por estratos de área

TAMANHO DAS PROPRIEDADES (ha)

MICROBACIA CÓRREGO DO VEADO

MICROBACIA DO CÓRREGO ÁGUA DA

COLÔNIA N° produtores (%) N° produtores (%)

1 – 10 1 10 1 12,5 11 – 20 6 60 2 25 21 – 30 0 0 2 25 31 – 40 1 10 1 12,5 41 – 50 0 0 0 0 51 e mais 2 20 2 25 TOTAL 10 100 8 100

Fonte: Trabalho de campo Org: Vania C. S. Pedro

Nos dados analisados foi possível perceber que a microbacia Córrego do Veado possui

uma concentração de pequenas propriedades entre 1 e 20 hectares, ou seja, 70% dos

produtores entrevistados. Apenas 10% possuem propriedades entre 31 e 40 hectares e

20% possuem propriedades acima de 51 hectares. Notamos a importância da pequena

propriedade nessa microbacia.

A microbacia Água da Colônia possui grande diversificação no que tange a questão do

tamanho das propriedades 12,50% possui propriedades entre 1 e 10 hectares, 50%

possui propriedades entre 11 e 30 hectares e 37,5% possui propriedades acima de 40

hectares. Nota-se a importância da pequena e média propriedade como também a

evidente diversificação do tamanho das propriedades.

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Tabela 3: Avaliação do Programa de Microbacias Hidrograficas pelos produtores rurais pesquisados

AVALIAÇÃO DO PEMH MICROBACIA CÓRREGO DO VEADO

MICROBACIA DO CÓRREGO ÁGUA DA

COLÔNIA N° produtores (%) N° produtores (%)

Ótimo 0 0 3 37,5 Bom 8 88,88 5 62,5 Regular 1 11,12 0 0 Ruim 0 0 0 0 Péssimo 0 0 0 0 TOTAL 9 100 8 100

Fonte: Trabalho de Campo, 2012. Org. Vania C. S. Pedro

A partir da tabela 3 podemos verificar o número expressivo de produtores em ambas as

microbacias que avaliam como bom o PEMH, sendo 88,88% no Córrego do Veado e

62,5% no Córrego Água da Colônia. Em decorrência do viés ambiental que o programa

adquiriu 37,5% dos produtores avaliaram como ótimo, visto que nessa microbacia

notamos um número maior de benefícios. No que diz respeito aos 11,12% da

microbacia Córrego do Veado avaliar como regular deve-se a não continuidade das

ações do programa.

Tabela 4: Número de produtores pesquisados que receberam benefícios do PEMH

RECEBEU BENEFÍCIOS

MICROBACIA CÓRREGO DO VEADO

MICROBACIA DO CÓRREGO ÁGUA DA

COLÔNIA N° produtores (%) N° produtores (%)

Sim 7 70 8 100 Não 3 30 0 0 TOTAL 10 100 8 100

Fonte: Trabalho de Campo, 2012. Org. Vania C. S. Pedro

Diante dos dados empíricos, foi possível notar que os benefícios do PEMH alcançaram

com grande parte dos produtores. No caso da microbacia córrego do Veado, notamos

que 70% dos produtores receberam algum tipo de beneficio, e somente 30% não

receberam. Já na microbacia Córrego Água da Colônia 100% dos produtores

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entrevistados receberam benefícios do programa. Apreendemos dessa maneira que o

programa teve bons resultados no município de Presidente Venceslau.

Tabela 5: Tipo de benefício recebido pelos produtores rurais pesquisados

BENEFÍCIOS MICROBACIA CÓRREGO DO VEADO

MICROBACIA DO CÓRREGO ÁGUA DA

COLÔNIA N° produtores (%) N° produtores (%)

Individuais 6 66,66 4 40 Coletivos 3 33,34 6 60 TOTAL 9 100 10 100

Fonte: Trabalho de Campo, 2012. Org. Vania C. S. Pedro

Conforme os dados empíricos dos 70% dos produtores rurais que receberam benefícios

do programa, na microbacia Córrego do Veado 66,66% deles receberam benefícios

individuais e 33,34% receberam benefícios coletivos. No entanto, podemos notar uma

grande diferença na microbacia Água da Colônia, na medida em que 40% dos

produtores receberam benefícios individuais e 60% deles receberam benefícios

coletivos. Fato este que está relacionada ao número produtores associados.

Tabela 6: Existência da associação nas microbacias pesquisadas

MICROBACIA POSSUI ASSOCIAÇÃO

MICROBACIA CÓRREGO DO VEADO

MICROBACIA DO CÓRREGO ÁGUA DA

COLÔNIA N° produtores (%) N° produtores (%)

Sim 8 80 8 100 Não 2 20 0 0 TOTAL 10 100 8 100

Fonte: Trabalho de Campo, 2012. Org. Vania C. S. Pedro

Com relação ao grau de conhecimento da associação, verifica-se que 100% dos

produtores pesquisados na microbacia do Córrego Água da Colônia têm conhecimento

sobre a existência da associação. Já na microbacia do Córrego do Veado 80%

reconhecem a existência da associação e 20% afirma não ter conhecimento da

associação, devido ao fato de não receberem os benefícios do programa.

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Tabela 07: Número de produtores pesquisados que participam da associação

PARTICIPA DA ASSOCIAÇÃO

MICROBACIA CÓRREGO DO VEADO

MICROBACIA DO CÓRREGO ÁGUA DA

COLÔNIA N° produtores (%) N° produtores (%)

Sim 3 37,5 8 100 Não 5 62,5 0 0 TOTAL 8 100 8 100 Com relação à participação em organizações coletivas, no caso associação, verifica-se

que na microbacia do Córrego Água da Colônia 100% dos produtores participam da

associação, fato que pode ser explicado pelos benefícios coletivos conseguidos no

programa, uma vez que os mesmos devem se organizar em grupos formais ou informais.

Já na microbacia do Córrego do Veado o número de participantes é menor, isto é, 62,5%

não participam efetivamente da associação, refletindo no grau de benefícios

conseguidos.

Tabela 8: Principais ações individuais realizadas nas microbacias pesquisadas

PRINCIPAIS BENEFÍCIOS INDIVIDUAIS

MICROBACIA CÓRREGO DO VEADO

MICROBACIA DO CÓRREGO ÁGUA DA

COLÔNIA N° produtores (%) N° produtores (%)

Curva de nível 5 55,56 2 28,57 Cercamento 2 22,22 2 28,57 Calcário 0 0 2 28,57 Roçadeira 0 0 1 14,29 Irrigação 1 11,11 0 0 Sistema de divisão de pastagem

1 11,11 0 0

Fonte: Trabalho de Campo, 2012. Org. Vania C. S. Pedro

Com relação aos benefícios individuais, notamos que na microbacia Córrego do Veado

55,55% dos produtores realizaram em sua propriedade curva de nível, 22,22% o

cercamento, 11,11% irrigação e 11,11% fizeram os piquetes.

Na microbacia Água da Colônia houve uma diversificação nos benefícios recebidos, ou

seja, 28,57% realizaram curvas de nível, 28,57% cercaram a área de APP, 28,57%

aplicaram calcário e 14,29% utilizaram a roçadeira na propriedade.

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Tabela 9: Principais ações coletivas realizadas nas microbacias pesquisadas

PRINCIPAIS BENEFÍCIOS COLETIVOS

MICROBACIA CÓRREGO DO

VEADO

MICROBACIA DO CÓRREGO ÁGUA DA

COLÔNIA N° produtores (%) N° produtores (%)

Calagem 0 0 1 5,55 Trator 0 0 1 5,55 Roçadeira 1 33,33 3 16,69 Forrageira 0 0 1 5,55 Vincão 0 0 1 5,55 Maquinário 0 0 1 5,55 Plantadeira 0 0 2 11,13 Estradas 0 0 1 5,55 Curvas 0 0 1 5,55 Terraceamento 0 0 1 5,55 Distribuidor de calcário 1 33,33 1 5,55 Manejo de pastagem 0 0 1 5,55 Cerca de APPs/ madeira 0 0 2 11,13 Poço 1 33,33 0 0 Bacia 0 0 1 5,55

Fonte: Trabalho de Campo, 2012. Org. Vania C. S. Pedro

Conforme já evidenciado na tabela 8, notamos também nos benefícios coletivos uma

maior diversificação na microbacia Água da Colônia. Nesse sentido, os principais

benefícios foram roçadeira com 16,69%, utilização da plantadeira com 11,23%. Outros

benefícios como bacia de contenção, manejo de pastagem, utilização do distribuidor de

calcário, terraceamento, adequação das estradas rurais, utilização de maquinário e

calagem com 5,55% cada.

Na microbacia Córrego do Veado evidenciamos apenas três tipos de benefícios, como a

construção do poço, a utilização do distribuidor de calcário e da roçadeira.

Alguns dos benefícios, apesar de terem sido apontados como coletivos pelos produtores,

como, por exemplo, a calagem, são individuais de acordo com o manual do programa.

Conclusões

As políticas em prol do desenvolvimento rural no Brasil, sempre estiveram aliadas a

elite brasileira, pois grande parte das políticas públicas foi direcionada a este segmento

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da sociedade. O desenvolvimento dessas políticas foi alicerçada na entrada do capital

externo no país, bem como, o próprio financiamento promovido pelo Estado brasileiro.

Tem-se assim, o início do processo de modernização da agricultura, que excluiu ainda

mais os pequenos produtores rurais desse processo, uma vez que estes não tinham

condições de acesso ao crédito, como também o Estado privilegiava a produção para a

exportação, ou seja, aquela que gerava superávits na balança comercial brasileira.

Essa linha de política pública foi baseada nos pacotes tecnológicos da revolução verde,

que priorizavam a modernização da agricultura, com base no uso de implementos e

máquinas, uso de defensivos agrícolas, sem uma preocupação prévia com o meio

ambiente.

Diante da crise da década de 1980, o Estado brasileiro não conseguiu manter esse

padrão de financiamento, concomitantemente a sociedade começou a pressionar o

Governo para que houvesse a abertura política no país, com eleições diretas para

presidente. Diante de tal fato tem inicio uma modificação das políticas públicas

direcionadas ao meio rural, que passam a considerar o pequeno produtor rural como ator

social.

Nessa perspectiva, o PEMH implementado no Estado de São Paulo em parceria com o

BIRD, objetivou sanar os problemas decorrentes do processo de modernização da

agricultura. Entretanto, as ações do referido programa centralizaram suas ações na

questão ambiental, como pôde ser verificado nas ações de combate à erosão e aos

ravinamentos, ao cercamento de APPs, no estímulo ao manejo adequado dos recursos

naturais nas pequenas propriedades rurais e a organização dos agricultores em

associações, dentre outros.

Os projetos de Microbacias Hidrográficas implementados no município de Presidente

Venceslau tinham como metas atender os produtores rurais instalados nas duas

microbacias, a fim de diminuir o processo de degradação ambiental, os focos erosivos e

melhorar a capacidade produtiva dos pequenos produtores rurais.

Apesar da desconfiança dos produtores em relação ao programa, se ele iria ou não ter

continuidade, como também algumas ações realizadas, como as curvas de níveis, que

não recebem a manutenção. Foram desenvolvidas ações positivas nas duas microbacias.

A partir da sistematização dos dados de fonte secundária é possível inferir que nas duas

microbacias predominam pequenos estabelecimentos rurais, não ultrapassando os 50

hectares.

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Com relação ao alcance do programa, grande parte dos produtores foi beneficiada.

Dentre as principais práticas individuais destacadas pelos produtores, podemos citar as

curvas de nível, o cercamento de APPs e distribuição de calcário. Dentre as práticas

coletivas destaca-se a aquisição de equipamentos, como roçadeira e o distribuidor de

calcário.

Contudo, o número de benefícios executados nas microbacias apresentaram diferenças

quantitativas, principalmente os de ordem comunitária, que requeriam organização

formal por parte dos agricultores. Números estes que refletiram no grau de

conhecimento e engajamento dos produtores em suas respectivas associações.

Referências

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