os poderes perdidos

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um

Ganho um

relógio barato

do meu irmão

SABE, quando você tem doze anos, você espera que sua vida siga um ritmo como ir à escola, sair com a família, jogar videogames, ler livros, jogar bola... essas coisas. Mas acredite, nem todo mundo vive assim. Meu nome é Erick, Erick Griffin. Sou de uma família normal e não muito rica do Rio Grande do Sul. Moro em Porto Alegre em um apartamento pequeno com minha mãe. Pai? Assunto complicado, minha mãe sempre diz que ele nos abandonou quando eu era pequeno o que me faz sentir muita, muita raiva dele. Tios? Avós? Amigos? Bem meus tios (por parte de mãe, nunca conheci os parentes do meu pai, minha mãe disse que ele era filho único e que seus pais haviam morrido) não gostam de mim. Eu e minha mãe somos o lado pobre da família. Minha avó é legal comigo (a única) e com minha mãe, ela está sempre querendo ajudar, mas minha mãe nunca aceita, ela sempre diz que é melhor assim como vivemos. Como vivemos? Bem, levamos uma vida normal. Minha mãe trabalha em uma pastelaria como garçonete, o salário não é bom, mas é o suficiente para nos sustentar e pagar as contas da casa. Levamos a vida numa rotina. Levantamos juntos, ela vai para o trabalho e eu para escola, chegando na escola eu estudo e depois almoço e então volto para casa. Enquanto minha mãe não chega eu dou uma arrumada na casa (o que não demora muito já que só tem quatro peças: meu quarto, quarto da minha mãe, banheiro e a cozinha e a sala são juntas) depois olho TV, ou leio um pouco os livros que ganho da vovó (livros de historias antigas, a maioria sobre mitos).

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Minha vida “mais ou menos” começou a mudar naquela noite de terça-feira. O dia seguinte ia ser o ultimo dia de aula na A.P.P.A (quer dizer Escola Preparatória Para Adolescentes), que eu chamo de A.P.P.D (Escola Preparatória Para Delinquentes), por que é só isso que você encontra lá. Estava lendo um livro que vovó me deu antes de dormir, o livro se chamava contos antigos e eu estava na parte de mitologia grega. Nessa parte explicava um pouco sobre os deuses que dominavam o Olimpo e tal. Já tinha decorado isso, mas continuava lendo porque achava interessante. – Erick – minha mãe me disse entrando no meu quarto. Seus cabelos loiros escuros na altura do ombro um pouco emaranhados, olhos azuis, com sua camiseta da pastelaria (compre o de frango e ganhe o de carne, escrito ao centro e com pasteis por toda ela), calça jeans e de chinelo de dedos. – Está na hora de ir dormir. Amanhã temos um longo dia em. O que eu mais gostava em minha mãe é que mesmo com as coisas indo mal, ela nunca desanimava, sempre com um sorriso no rosto e me animando. Esse mês ela teve dificuldade com as contas da casa, então eu fui fazer um “bico” no mercadinho da esquina. O dono é legal, conhece a gente, então às vezes quando precisamos, ele me deixa ficar de empacotador e me dá uns trocados. Não é muita coisa, mas já ajuda. – Não estou com sono mãe. – Deite, você vai ver, vai ficar com sono logo. Não contrariei. Escovei os dentes, abracei minha mãe e fui dormir. Demorei um pouco para pegar no sono, mas quando dormi tive um sonho estranho. Estava de pé em uma sala com muitas armaduras antigas (gregas ou romanas, tem figuras assim nos livros da vovó), espadas, escudos de diferentes tamanhos. Alguns escudos eram quadrados de madeira com desenhos de águias, espadas cruzadas e fogo. Outros eram redondos de bronze ou couro com desenhos abstratos. No fim da sala estava um homem sentado em uma cadeira. Cabelos curtos, como os de um militar, pretos, olhos castanhos claros, pele clara, e uma leve barba mal aparada. Usava roupas semelhantes às de acampar, uma camiseta preta, calça jeans e botas. Ele sorria com o canto da boca para mim. – Olá irmão? Como vai? – ele perguntou. Apenas depois que ele falou que percebi a lança enorme em suas mãos. Sua voz era um tanto rouca e suave – Desculpe, acho que você se enganou, eu sou filho único. Depois que eu disse isso fui perceber o quão estúpido e ignorante isso soava. – Até onde eu sei – me corrigi, afinal meu pai não me mandou noticias, mas acho que aquele cara tinha idade para ser meu pai, aparentava ter seus o que? Vinte e sete, vinte e oito anos? Teria que ter sido pai bem cedo, admito. Ele riu, seus dentes eram brancos como a neve e seu sorriso tranquilizador. – Você tem mais irmãos do que pensa. – Serio? Tipo, quantos? – Não sei ao certo, mas mais de cinco. Seu pai tem muitos filhos.

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Comecei a pensar quantos anos meu pai tinha. Eu sempre o imaginava como minha mãe o descrevia, bem parecido comigo (cabelos loiros, olhos azuis cor do céu lá com seus vinte e sete anos quando me abandonou, mas pelo jeito havia algum engano nessa historia...) – Eu sou Erick. – disse estendendo a mão para o homem, ele apertou respondendo: – Me chamo Marte. Sabe por que eu te trouxe aqui Erick? Estava tão ocupado pensando na idade de meu pai que não havia percebido que estava longe de casa sozinho com um cara esquisito. Por mais que eu quisesse, eu não conseguia sentir medo dele. – Não. Por que me trouxe aqui? – Você vai encarar muitos desafios criança. Você tem um futuro nebuloso e com muitos perigos. Seu futuro porem é importante, muito importante, para ser sincero, queria que um de meus filhos ocupasse seu lugar. Fala serio, o cara estava pirado. Futuro nebuloso, futuro importante (filhos? caramba era tio e nem sabia). – Como é que é? – Você enfrentará muitos monstros garoto. E temo que a força do nosso pai não sege o suficiente para te proteger até os dezesseis anos. – O que quer dizer, eu vou morrer? – Espero que não herói, você é importante. Você ainda não sabe do que é capaz. Enfim, eu te trouxe aqui para te ensinar a lutar. – Ensinar a lutar? Ele assentiu. – Você precisará de toda a ajuda que conseguir, pois seus inimigos são muito poderosos. Venha, pegue uma espada, vamos treinar um pouco. Ele saiu e eu o acompanhei. Ele me deu uma espada, pesada para burro, e depois procurava o escudo certo em meio a vários na mesa. Ela analisava cada um cuidadosamente, como se estivesse procurando o perfeito na grande mesa no meio da sala. Ele pegou um escudo na mão. Era redondo de bronze e liso, apenas com um grande Alfa circulado no meio.

– Um presente – ele anunciou – as imagens de suas aventuras ficarão gravadas conforme elas forem acontecendo. – Minhas... aventuras? – Sim, você vivenciará muitas. E precisará estar pronto para elas, por isso vim treinar você. – Como posso confiar em você? – Vai ter que confiar maninho. Se não tiver minha ajuda, dificilmente vai conseguir outro deu... outra pessoa para te ajudar. – Quando... hã, vai começar minhas aventuras? – Temo que esta semana rapaz. Ele se virou para mim e pude ver sua lança com clareza. Sua lança era feita de couro no cabo e tinha uma faixa vermelha enrolada em espiral por todo o

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comprimento que resultava em cerca de um metro e largura de vinte e cinco cm. A ponta era sombria. Tinha forma de um bico de um de foguete porem um tanto afiada. Ali, perto da ponta, havia o desenho de um javali de olhos vermelhos. De repente sua lança começou a se transformar até virar uma espada parecida com a minha. Ele me atacou, e eu levei um corte no braço.

Ele sorriu. – Viu porque precisa de minha ajuda? – Escute – eu disse tocando o ferimento – eu queria saber mais sobre o nosso pai. O sorriso desapareceu de seu rosto. Ele ficou com a expressão fria e seria. Ele acariciou a lamina da espada e desviou o olhar para o chão. Ele pareceu pensar um pouco sobre assunto. – Vamos fazer um acordo, se você colaborar e se sair bem hoje, eu te conto alguma coisa sobre nosso pai, tudo bem? – Está bem, mas, se eu sobreviver a você, posso saber tudo sobre ele? – Ainda é cedo garoto, cedo demais, mas te concederei uma pergunta. Fiquei pensando em qual pergunta eu faria. Quem ele é? Não, muito estranho, e ele podia me responder comé uma pessoa. Onde ele mora? Não iria visitar ele mesmo. O que ele faz? É... podia ser, eu nunca soube nada sobre a profissão do meu pai. – Pronto para começar? – ele disse com a espada em mãos. Os aspectos eram idênticos aos da lança só que menores (o desenho do javali continuava na lamina da espada, o cabo de couro, e a faixa vermelha enrolada no cabo) – Temos muito trabalho. Eu assenti. Ele veio para cima de mim, eu desviei (para o lado errado) e ele me acertou no ombro direito. – Você precisa olhar alem do que vê em uma luta. – Como assim? – estava espantado, eu estava com dois cortes, mas eles sequer doíam. Eles não sangravam, não ardiam, era como se eu não estivesse ferido. Olhei para meu braço e dei um pulo para traz, pois o machucado estava cicatrizando, só havia um leve resquício do ferimento que já estava sumindo. – Eu não... me machuquei. – Você não se machuca a menos que eu queira. Mas como eu dizia, você tem que ver alem da luta. Você nasceu com um dom para lutar, mas não é o suficiente sem treinamento. Você já se sentiu como se às vezes não conseguisse ficar parado alguma vez? Ou como se tudo estivesse passando mais devagar e você não estivesse no mesmo ritmo que todos? Eu assenti. Senti isso muitas vezes. Parecia que tudo era devagar e que isso me angustiava, o tempo não se alterava, mas eu parecia a mil por hora. – Então, esses são seus instintos. Você tem isso por que é um modo de se manter vivo em uma guerra. Se você conseguir usar esse seu “poder” você pode lutar melhor. Tente. – Como faço isso?

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– Concentre-se, defenda-se. Você é capaz de se defender. Ele veio me atacar, tentei me concentrar e consegui. Por uma fração de segundo eu consegui ver o seu próximo movimento. Quero dizer, não ver claramente, mas o seu movimento para a direita. Coloquei o escudo na frente, ele trocou de lado e eu bloqueei novamente e o golpeei tão rapidamente em seu braço que ele não pôde desviar. O mais estranho é que minha espada sequer o feriu. Foi como se eu batesse com ferro em ferro. Me afastei de olhos arregalados e boquiaberto. Ele parecia normal (tirando o fato de ser completamente misterioso, vim me visitar do nada dizendo que é meu irmão e saber lutar como um profissional falando das minhas aventuras futuras) não de ferro. – Eu não machuco você e você não me machuca, justo? Assenti, mas anda assim achei estranho. – Tudo bem, mas – tentei procurar a palavra certa – você é de ferro? – Fico vulnerável quando quero. Vamos continuar o treinamento irmão, daqui a pouco você vai acordar e... Caramba, me distraí tanto com os assuntos, lutas e tal que nem percebi que estava sonhando. Agora tudo fazia sentido, um louco que lutava, falava coisas sem sentido, de certo eu estava misturando com os livros que li antes de dormir. – Isso é real ou é um sonho? – perguntei – Você está sonhando, mas é real. – Ah, claro – murmurei – ótimo, entendi tudo agora. Ele atacou de novo, mais rápido desta vez, mas me concentrei e desviei novamente, e o ataquei, ele desviou facilmente dizendo: – Não está com a espada certa garoto, quando estiver vai ser melhor. Ele continuou me ensinando táticas de guerra por horas, como onde posicionar o escudo no inicio da luta, ataques novos, como desarmar oponentes, os pontos em que se deve golpear quando estiver lutando para desmaiar, paralisar instantaneamente e até matar.

*** Ele se sentou, não parecia cansado ao contrario de mim que estava encharcado de suor, exausto, com as pernas bambas, as mãos tremulas, e a cabeça girando. Ele me mostrou outra cadeira ao seu lado e eu sentei largando o escudo e a espada no chão e me avançando na garrafa da água que ele me deu.

Houve uns minutos de silencio enquanto apreciava o campo e as armas e olhava minha perna arranhada que ainda não havia cicatrizado. – Então, – eu disse enfim – como me saí? – Para um primeiro dia bem, muito bem. Vou treina-lo todas as noites que eu puder. Aquilo não foi uma pergunta, mas respondi assim mesmo. – Por mim tudo bem, até que foi legal. Bem, já que você disse que eu fui bem...

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– Estava esquecendo de uma coisa – ele disse rapidamente com intenção clara de me interromper – esse escudo, seja lá como você vai chama-lo, ele é seu. – Meu? Mas tipo, como eu vou andar pela casa ou pela rua com um negocio deste tamanho? – Deseje, deseje que ele encolha. – Como assim? Ele vai encolher? – Erick me diga, você tem relógio? – Não, mas... – Gostaria de ter? Um modelo barato não muito chamativo. – É... ta – Então, pegue o escudo – eu obedeci – Você está vendo este símbolo no centro dele? Assenti – O Alfa? A primeira letra do alfabeto grego. – Sim, muito bem, encoste sua mão nela e imagine um relógio, simples. Fiz o que ele me falou, imaginei um relógio normal que vi na vitrine de uma loja não devia custar mais de vinte reais e o escudo magicamente se transformou nele. Fiquei surpreso, mas não muito (afinal era sonho mesmo). – E como faço para ele virar escudo de novo? – Coloque os dedos sobre os botões de Alfa e deseje que ele vire. – Simples assim? – Simples assim. Que horas são? – Seis horas da manhã. – Está na minha hora irmão. Tchau Erick, nos veremos amanhã à noite em seus sonhos. Vê se dorme cedo para podermos ter mais tempo. – Tchau Marte. – Treine e ganhe a guerra! Um trovão rugiu nos céus, um raio caiu perto de nós, a imagem de Marte desapareceu de vez e eu acordei assustado na minha cama. Foi um sonho, pensei, então olhei minha perna e ela ainda estava cicatrizando. Quase caí da cama, o ferimento ia se fechando lentamente até cicatrizar por completo. Foi um sonho, comecei a repetir para mim mesmo tentando me convencer. Olhei minha mão, nela estava um relógio barato igual ao que vi no sonho. Não, isso não foi sonho, foi real.

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Dois

Uso uma espada

mágica

DEPOIS DA noite estranha, acho que meu dia não podia ser mais anormal. E eu estava certo. Fui para aula e foi tudo normal, nada de estranho (a mesma galera apanhando no recreio, os mesmos valentões batendo e os mesmos professores fingindo que não veem nada). Meu dia, então, foi completamente normal tirando pela noite. Fui ler os livros da vovó um pouco, mas fui dormir cedo, queria ver Marte de novo e perguntar sobre meu pai. Não demorou muito para que eu dormisse, pois andei com sono o dia inteiro porque me cansei em meu sonho anterior. Estava no mesmo lugar de sempre, o campo, as armaduras, tudo menos o Marte. – Oi Marte – eu chamei procurando por ele – você está aí? Sou eu Erick. Silencio, não havia ninguém. Comecei a sentir uma presença atrás de mim, apertei os botões do meu relógio e quis que ele se transformasse e ele se transformou em Alfa ligeiramente em minha mão (sim, estava tentando achar um nome para o escudo e acho que Alfa foi o melhor que pude pensar). Virei para trás a tempo de bloquear o ataque de alguém, primeiro achei que era Marte, depois vi que não. O cara era super estranho. Tinha uns dois metros de altura e usava um sobretudo preto, coturno, luvas, óculos escuros, chapéu e tinha a pele marrom madeira. Em suas mãos estava um porrete de espinhos. Corri desesperadamente pelo campo procurando uma espada e peguei a primeira que encontrei, esta era mais pesada ainda que a peguei na noite anterior mas não podia me dar o luxo de escolher. Estava escuro exceto pela luz da lua e por algumas lâmpadas que haviam no local. As “prateleiras” com armaduras faziam circulo me deixando sem escolha a não ser lutar, que para mim era sinônimo de morrer.

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O bicho veio para cima de mim, me lembrei do que Marte dissera ontem sobre me concentrar e desviar. Fiz isso, desviei para o lado e desferi um golpe contra seu calcanhar e dele começou a sair fumaça. Eu posso feri-lo e ele pode me ferir, que ótimo! Ele me deu um tapa e eu caí. Ele levantou o porrete e eu pude ver exatamente para onde tinha que sair. Rolei para o lado e levantei a tempo de cortar seu braço estranho do punho ao cotovelo de onde começou a sair mais fumaças que se dissipavam logo a cima, de modo que não formava uma “nuvem” como se fosse uma fogueira. Ele urrou de dor, acho, e tentou me acertar. Eu desviei de novo como se já soubesse lutar a anos, me sentia bem, me sentia como se tivesse sido feito para lutar até levar um soco na barriga e cair de cara no chão. Deixei minha espada cair quando apanhei e o “esquisito” a chutou para longe me deixando apenas com Alfa. Foi aí que o momento mais esquisito da noite aconteceu, estiquei a mão para a espada desejando que ela viesse para a minha mão e ela veio. Não havia tempo para pensar em como fiz aquilo, apenas corri em direção ao oponente e o feri no peito, desviei de seu golpe, passei por baixo do seu braço e feri suas costas. Ele estava sentado no chão com uma das mãos no peito e a outra tentando pegar o porrete. – Melhor não – eu disse confiante com a espada em seu pescoço. Esperava que ele fosse me bater enquanto eu fazia cena, mas ele apenas ficou me olhando e rosnando. Do fundo do campo, atrás de uma prateleira saiu um homem batendo palmas. Marte. – Isso foi incrível irmão! Eu achei que ia ter que me meter, mandar ele parar ou coisa do tipo, mas pelo que vejo você aprendeu rápido! Isso é ótimo! Nunca tinha visto ninguém alem de mim derrotar um ogro da caverna com tanta facilidade. – Ogro o que? – É um ogro que eu criei em uma caverna para treinar. Esse aí é filhote, mas os maiores são bem mais fortes, embora acho que não sege problema para você. – Ah, obrigado Marte. – eu disse enquanto transformava Alfa de volta em um relógio e largava a espada na prateleira de onde tirei – Eu, bem – começou a me dar um mal estar – eu vou sentar um pouco. Sentei em uma cadeira próximo a Marte e tomei um pouco de água. – Não se preocupe Erick – ele disse ainda orgulhoso – é assim mesmo, até seu corpo se acostumar. – A levar socos na barriga? – Não, a lutar usando os poderes. – Ah, aquela espada é... mágica? – Não irmão. Você é, você pode fazer isso. Você herdou os poderes do papai. – Que poderes? – Harg maninho, sabendo lutar desse jeito como ensinei, quem precisa de poderes?! – Sobre o nosso pai, o que ele faz?

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– Cuida do mundo. Ah, meu pai cuida do mundo, que legal! Vou levar ele na escola no dia da profissão. Que idiota, como ele ia cuidar do mundo? – Você vai conhecê-lo quando chegar a hora certa. Só ele pode te dizer quando é. Vamos treinar? – Vamos, mas como eu faço aquilo com a espada? Ele tentou me explicar dizendo que era só eu querer, mas disse que meu corpo não estava preparado ainda e muitas coisas sem sentido que não consegui entender. Eu e ele lutamos um pouco e depois a imagem dele começou a tremeluzir. – Está na minha hora irmão. Você começará a colocar a prova seu treinamento daqui a alguns dias. Eu não entendia bem o que ele queria dizer com colocar o treinamento a prova, mas acho que deve ser mais um ogro da caverna ou coisa assim que ele vai me dar para treinar.

*** Sexta feira chegou, eu todos os dias treinando a noite com Marte e aprendendo coisas de guerra. Na noite passada ele me ensinou aonde deve atingir um ogro adulto para desarma-lo (é na parte de baixo de seu punho, porque lá ficavam as correntes e a pele estava machucada), ensinou táticas como se sua espada for menor que a do oponente tente sempre ficar mais perto, essas coisas. Era noite, minha mãe e eu estávamos jantando (pastéis que ela ganha da pastelaria quando sobra no dia). Eu comentei com ela que estava com sono e logo iria dormir. Ela estava me achando estranho nos últimos dias. Eu não gostava de ir dormir cedo, mas andava indo cada dia mais cedo pra cama. – É que eu ando cansado – eu disse – e gosto de dormir. – Você está de férias Erick, não precisa ir se não quiser. Não tem mais aula, pode dormir até que hora que quiser. – Eu sei, mas estou realmente com sono. Fiquei tentado a contar tudo a ela. Sempre contei tudo para minha mãe, mas aquilo era loucura e a deixaria preocupada então achei melhor mentir, dizer que era cansaço mesmo. Ultimamente à tarde eu andava brincando com Alfa e uma espátula da minha mãe (a espátula era a espada) refazendo os golpes que Marte me ensinara. – Vamos conversar um pouco – ela disse – Eu estava pensando, podíamos ir na sua avó este final de semana, o que você acha? Eu adoro ir na minha avó, quando ela vai para o sitio é mais legal ainda. Gosto de brincar com os animais, andar a cavalo, e lá eu podia brincar com meu primo David a vontade sem o pai dele se implicar. Nossa ia ser tão legal, ia poder mostrar ao David o Alfa, os golpes, a gente podia brincar de corrida com cavalos, jogar juntos... – Eu ia adorar, ela está no sitio? – Está, o David está junto com ela. Eu andei pensando se você não quer passar a semana lá com eles.

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Ia ser muito legal, mas deixar minha mãe sozinha não era bom. Ela não gosta de ficar sozinha e estava me propondo para ir. Fiquei pensando um pouco. – Mas e você? Vai ficar sozinha? – Sou grande Erick, sei me cuidar. – Não tem problema então, se eu quiser ficar lá? – Não. Prepare suas malas, vamos amanhã pela manhã. Fui para meu quarto preparar as malas, ia ser super legal, minha vó, eu e David, ela sempre dava livros para nós dois. Nunca entendi porque só pra a gente, no natal os outros ganhavam roupas, brinquedos, nós dois sempre ganhamos livros e jogos como mytomania e outros do tipo. Alfa ficou em meu braço, afinal precisava dele a noite para treinar com Marte. Coloquei meus assessórios de toalete, roupas de banho (no sitio da minha vó tem piscina, embora eu não goste muito de água. Quase sempre quase me afogo ou coisa assim). Coloquei uns livros que vovó me deu para ler na viagem ou coisa assim. Deitei, querendo dormir o mais rápido possível para falar com Marte. Dormi e apareci no mesmo lugar de sempre, ele me esperava com um sorriso no rosto. – Pronto para mais um dia de treinamento? – Sim, acho que sim. E aí vamos aprender o que hoje? – Primeiro uma pergunta, Erick. Se eu me rebelasse e lutasse contra você. Vamos dizer, eu seria poderoso, poderia te reduzir a pó se quisesse, o que você faria? Não entendi o motivo da pergunta. Ele estava pensando em se rebelar? Ele ia me reduzir a pó? Dei de ombros. – Eu te enfrentaria. – seria a única opção já que correr eu não poderia cogitar se não ia virar pó instantaneamente. Ele riu como se aquilo o animasse. – Ótimo, você é corajoso e ousado e é isso que mais gosto em você irmão. Vamos lá. Treinamos táticas de guerra e lutamos um contra o outro algumas vezes. Uma delas eu ganhei, então ele disse que ia aumentar o nível de dificuldade e eu perdi as outras duas seguidas. – Você tem um gênero forte. – ele disse enquanto bebíamos água – É um grande líder, difícil de dobrar e autoritário. – E isso é bom? – Oh céus, Erick, claro que é! Você é um líder nato, espero ver você liderando exércitos um dia. Bem, tenho que ir – ele parou como se sentisse um pressentimento ruim – na ida, quando você estiver indo para a sua vó, ele vai... ele vai te achar. A imagem tremeluzia, eu não o enxergava direito. – O que? Do que você está falando? – Aceite a minha benção. Aceite e você lutará melhor. Aceita? Fiquei confuso, por um momento não sabia o que responder. Quer dizer eu não sabia de nada, nada fazia sentido, mas senti que tinha que ser rápido e resolvi aceitar.

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– Eu, Marte, deus da guerra dou minha benção a Erick Griffin, em sua consciência. Eu Marte divido parte de meu poder com esse mortal. Que a guerra viva em Griffin como vive em mim! – ele gritou e desapareceu Um trovão rugiu nos céus, um raio deve ter caído perto de mim, mas nem senti. Eu estava me sentindo ótimo. Por um momento pude ver uma fraca luz dourada entrando em mim. Comecei a me sentir forte, como se sentisse que a luta estava em mim. Olhei para meu punho. Lá estava uma marca que eu nunca tive. Uma marca de duas espadas cruzadas na parte de baixo do meu punho estava lá, como se eu tivesse feito uma tatuagem. Acordei em minha cama. Sentei e olhei as horas eram cinco horas da manhã. Marte foi mais cedo hoje. Olhei meu punho, a marca estava lá. Resolvi levantar. O que mais me intrigava era a frase que ele disse: “na ida, quando você estiver indo para a sua vó, ele vai... ele vai te achar”. Conferi minha mala, estava tudo lá. Conferi Alfa, em meu pulso. Conferi as horas: seis horas, minha mãe levantou, entramos no carro e saímos. Comecei a pensar no que ia acontecer. Ele vai te achar, quem? Quem será poderia estar interessado em mim assim. Só sei que isso não parecia nada bom.

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Três

Viro biscoito

canino

O QUE EU mais gosto na minha cidade é o transito. Sempre engarrafado, ou com acidentes, ou com greves e coisas do tipo. Eu estava nervoso afinal alguém ia me achar nesse caminho hoje, e ainda tentava assimilar aquilo que aconteceu na noite passada com Marte. Tenho que parar de pensar nisso, isso só me deixa pior. Comecei então a brincar com Alfa. Olhar os botões, e trocar ele de forma escondido da minha mãe. Comecei a ficar com frio, estava só com a camiseta preta da escola, calça jeans e tênis porque era verão e no sitio geralmente é mais quente do que na cidade. Revirei a mochila procurando um casaco mas não achei, talvez eu tivesse esquecido de colocar roupas de inverno. – Seu irmão andou te visitando, não foi? – minha mãe indagou como se tivesse certeza disso. Fiquei sem palavras, ela não sabia dele, eu acho. Quer dizer, ela conhecia o deus da guerra (como Marte se intitulou naquela noite). – Eu imaginei que ele viria ver você um dia. Mas isso me deixa com medo Erick. Ele sempre te protegeu e disse que ia ajudar, mas estamos bem. – Você conhece Marte? Vi o rosto de minha mãe pelo espelho retrovisor do carro e a expressão era de quem é Marte?. Ela pensou um pouco, talvez lembrando da historia, ou lembrando do nome, não sei. – Marte... – sua voz falhou – Ele sempre te protegeu Erick. Você sabe porque tem uma vida tranquila? Eu lembro quando você comentou sobre aquele senhor de um olho só que te seguiu até parada quando vinha da escola... – Um ciclope – eu interrompi – ... Ele poderia ter seguido você para dentro do bairro, ou invadido nossa casa, mas ele não pode porque Marte nos protege. Ele não deixa que os maus entrem para dentro de nosso bairro para proteger você. – Por isso não visitamos muito a vovó? Porque é arriscado sair. – Sim, exatamente.

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– Mas como Marte pode ter esse poder de proteger o bairro? – É seu pai. Ele era diferente de todos, Erick. Ele era simpático, formal, ele parecia... poderoso. – minha mãe virou-se ligeiramente para mim e sorriu – Ele era como você... Eu olhei para frente e tinha um cachorro na frente do carro, o cão era enorme e negro. Seus olhos eram vermelho sangue e ele tinha... três cabeças? Sim. – Mãe! – eu gritei. Ela freou o carro o máximo que pôde, mas o carro bateu no cão. A estrada estava deserta, só o nosso carro e o cachorro estranho. Ele vai te achar, Marte dissera. Será que ele estava falando desses cachorros monstros? Desci do carro olhando Alfa em meu punho. O cachorro estava bem, mas o carro estava amassado na frente. O cachorro de três cabeças é de ferro! Ele olhou para mim e rosnou, voltei correndo para dentro do carro. – Aqui dentro somos alvos fáceis filho – minha mãe disse. – temos que correr! Já estávamos perto de uma floresta, perto do sitio da vovó. Olhei pela janela. O cão começou a crescer até ficar com uns quatro metros de altura. Joguei minha mochila nas costas, minha mãe e eu saímos correndo na hora certa, demos dois passos e o Cérbero pegou parte do nosso carro com a boca. Nos enfiamos no meio das arvores, quis que Marte tivesse me dado uma espada também, assim seria mais fácil de enfrentar um cão gigante de três cabeças. Comecei a seguir uma trilha que dava perto do sitio da minha vó, esperando que o cão não nos achasse. – Erick, temos que chegar no sitio da sua avó, lá é seguro, temos... Uma sombra abaixo dos meus pés me fez olhar para cima, um pedaço do nosso carro (grande o suficiente para matar a mim e a minha mãe) estava vindo na nossa direção por cima de nossas cabeças. Gritei para minha mãe se abaixar e ela abaixou, o carro passou por cima da gente e caiu em frente a nossos pés. Corremos para a direita, mas o Cérbero estava na nossa frente. Ativei Alfa e minha mãe ficou surpresa. O cão deu uma patada no meu escudo fazendo três arranhões que logo sumiram. – Aí do meio – eu gritei – a da direita te chamou de feia. Por um momento eu acho que as duas cabeças iam brigar, mas a da esquerda puxou a orelha delas e trouxe-as para a realidade. Uma delas me jogou para cima, enquanto eu caía pude ver outra pegando minha mãe pela blusa. Encostei em Alfa, caí no chão e desmaiei. Geralmente eu não tenho pesadelos, coisa que começou a mudar depois daquele dia... Eu estava em um lugar escuro, rodeado de fogo escuro. Era um belo lugar, admito. Feito de mármore preto no chão com desenhos de morte (é, esses desenhos não eram bonitos) e de tortura que acho melhor eu não descrever, as paredes pareciam ser feitas da mesma coisa mas pareciam se mexer conforme o vento frio escoava na sala. Quatro estatuas de um homem, um homem de cabelos curtos e escuros com barba até um pouco abaixo do queixo, ele usava uma

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armadura de guerra escura com detalhes de fogo por toda ela, segurava em sua mão uma espada comprida com uma caveira grande no cabo, e em sua outra mão um elmo. O elmo era diferente, não era um elmo comum como os que vi nos treinos com Marte, ele era como uma coroa, só que preto, e parecia mais poderoso do que um simples elmo, mesmo sendo estatua. Ouvi vozes e resolvi segui-las, passei por uma porta e dei direto a uma sala de trono. Um trono alto, muito alto como se alguém de uns três metros de altura sentasse ali estava no fundo da sala. Um homem igual a estatua estava de pé. Usava uma túnica vermelho sangue (o mais bizarro é que parecia sangue mesmo, a roupa meio que se mexia involuntariamente), sandálias, tinha a pele pálida, era meio magro, cabelos pretos curtos e ondulados, barba escura até pouco abaixo do queixo e os olhos que expressavam medo e terror, não que ele estivesse com medo, mas que me deixou com medo e terror. Seus olhos eram negros (todo negro, sem parte branca) como as sombras, não consegui olhar nos olhos dele por muito tempo, aquilo me torturava. – Você sabe o que está me pedindo? – o homem gritou para a outra pessoa. A outra pessoa era baixa, porte atlético, de um jovem talvez, usava uma capa preta e um capuz e estava de costas para mim então não pude ver seu rosto. – Já tentamos isso muitas vezes e fracassamos... – Eu sei pai, mas dessa vez tenho uma coisa que não tínhamos antes – disse a outra pessoa. A voz mudava o tom varias vezes me impedindo de identificar ou ouvir claramente. – Uma nova peça no jogo. A pessoa se moveu até a mesa. Havia uma mesa no centro da sala, uma mesa de concreto alta com umas peças no centro. Eram estatuetas de deuses gregos, monstros e pessoas. O estranho colocou uma nova peça na mesa, uma estatueta mal feita de um menino com um raio na mão. – Acha que o filho de Zeus pode nos ajudar? – indagou o homem – Acha que ele vai concordar em nos ajudar? – Se ele não souber para quem estiver lutando, não vai questionar. E temos seu motivo para continuar, pegamos a mãe dele, ele vai lutar. – Talvez tenha razão, talvez ele colabore conosco. Não é fácil encontrar um mestiço treinado por um deus por aí. Quanto ao elmo, tenho que pensar... – Pai, – o garoto insistiu – eu tenho que ir, tenho que estar de espião e confrontar os guardiões, mas sem o elmo fica difícil escapar. O homem bufou, ele pareceu me perceber na sala, encarou o lugar onde eu estava. Não me mexi, talvez fosse pior se me mexesse. E mesmo que eu quisesse parecia que ele tinha me petrificado. – Vou empresta-lo a você, mas terei que omitir a legião, sabe como eles são ignorantes. Terei que agilizar dessa vez, os deuses estão desconfiando, temo que Poseidon tenha desconfiado depois da ultima vez que seu filho escapou do forte. – ele fitou o filho(a) com raiva e terror – Você não pode deixar que o filho de Zeus escape, se ele chegar ao Olimpo, isso vai ser terrível! Eles podem anular o juramento!

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– Ele não fugirá, enquanto sua mãe estiver presa ele vai permanecer conosco. Um frio se apossou de mim, e tive a sensação de que “o garoto” de quem falavam era eu. – Você deve ir, leve o elmo e tome cuidado, espero que tenhamos êxito desta vez. – o homem disse e a outra pessoa desapareceu em sombras. Trimmmmmmmmmmmmmmm. Um sinal, como um sinal de escola tocou e eu acordei, estava deitado em uma sala escura e pequena. Dois beliches haviam nela, eu estava na parte de cima do da direita com uma dor de cabeça horrível. Por um momento pensei que acordaria na escola, talvez eu estivesse dormindo na aula e tudo fosse um pesadelo, mas infelizmente não estava. No beliche ao lado, na cama de baixo estava um garoto, de uns treze, quatorze anos talvez. Cabelo curto e castanho claro cortados em forma de cogumelo, olhos verdes amarelados, vestia um casaco azul por cima de uma blusa branca, calça jeans e parecia estar tão perdido quanto eu. – Sabe onde estamos – eu e ele falamos juntos em uníssono – não. – respondemos juntos de novo. Uma pessoa levantou, estava abaixo de mim no mesmo beliche. Uma garota que devia ter entre doze e treze anos de cabelos castanhos claros ondulados, olhos verdes, pele clara. Usava uma blusa rosa, calça jeans e tênis e estava com cara de quem se perdeu. – Vocês dois sabem...? – ela começou a perguntar – Não, nenhum de nós sabe que lugar é esse. – respondi Alguém bateu na porta, na verdade era mais como se estivesse esmurrando a porta. A pessoa nem esperou nós abrirmos e já foi entrando com cara de raiva pura. Um cara moreno e forte com uma barbicha e cabelos curtos militares, pretos. Ele estava com uma couraça e segurava um pedaço de madeira como se quisesse nos espancar. A sua parte de baixo porem era meio perturbadora, em sua cintura começava a ter pelos e seus pés eram de... bode. Pernas peludas e cascos sujos de lama. – Uou! – eu disse, e vi na expressão dele que perdi um bom momento de ficar calado. – O que foi? Nunca viu um fauno antes? – ele rosnou – Para ser sincero não. Olhei para os outros, eles estavam tão assustados, surpresos e espantados quanto eu. – Novatos! – ele resmungou – Sempre incrédulos e céticos! – ele respirou fundo, tomando fôlego como se dissesse tenho que se gentil, então vou me apresentar – Eu sou Aron, o treinador histórico, o que treinou grandes heróis... – Esse aí não é Quíron? – a menina disse – Não, menininha simpática – o fauno falou entre dentes – Quíron treinou os heróis mais famosos, mas eu treinei muitos também. Conhecem aquele garoto que matou um cão infernal?

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Fizemos que não com a cabeça e ele resmungou algo sobre jovens chatos que não conhecem nada. – Vou parar de explicar isso, vocês não vão entender – o entender soou mais como um conhecer – venham para fora, tenho que mostra-los porque estão aqui, o que tem que fazer e blá, blá, blá. Saímos do quarto minúsculo e lá nos esperava um campo. Um campo bonito com flores, arvores, um riacho correndo firme a direita. O dia estava lindo, o sol brilhava por trás das arvores, poucas nuvens no céu extremamente azul e um vento agradável que passava pelo local aliviando o calor. Era um belo lugar, admito. Em circunstancias diferentes eu teria adorado fazer um piquenique ali, ou brincar com meu primo, mas agora estava realmente preocupado com o que havia acontecido com minha mãe, ou onde eu estava e o que teria que fazer. Comecei a notar outras pessoas, a maioria crianças, saindo de outros quartos, que vistos de fora eram cabanas pequenas. Havia duas fileiras delas, mas apenas quatro estavam inteiras, as outras estavam destruídas. O Aron nos levou até o centro do campo e se virou para um outro cara. Esse outro cara tinha cabelos marrons na altura do ombro , barba comprida e a parte de baixo era de cavalo. Achei que estava ficando louco. Sátiros e centauros, estava maluco, mas só achei isso porque não sabia o que estava por vir. – Bem, crianças, – começou Aron – vocês agora são prisioneiros. – todos nós começamos a murmurar – É, isso aí, prisioneiros, vão fazer o que eu mandar, não tem saída, não tem escolha e não tem reclamação. Agora vocês vão trabalhar... – Calma Aron – disse o centauro se aproximando. Sua voz era muito suave e tranquila – ele está nervoso, estamos aqui a muito tempo. Vocês serão treinados para... ajudar eu e Aron a pegar uma coisa. Aron largou o pedaço de pau e pegou uma flauta resmungando, como sempre. Quíron se posicionou no meio do circulo formado pelos jovens que saíram dessas cabanas. Deviam ser umas quinze pessoas fora Aron e Quíron. A musica que Aron tocava na flauta era calma e me deixou com sono, lutei para ficar de pé. – Uma vez – Quíron começou – três irmãos passeavam em uma praia escura. – sua voz calma começou a me tontear, e eu comecei a ver... ver o que ele contava – Eles tiveram uma infância difícil e haviam fugido de casa naquela noite. Vi três jovens andando em uma praia escura. Não podia ver seus rostos claramente. Era como uma escadinha, um mais alto, outro mais ou menos e outro mais baixo. Eles andavam um ao lado do outro, o mais alto parecia mais preocupado, mas o menor que dava as ordens. – Eles estavam dividindo as coisas quando acharam algo mágico – Quíron continuou, sua voz estava mais baixa dentro da historia, mas ainda sim conseguia ouvir – eles acharam algo que mudariam suas vidas. Um dos meninos (o do meio) pegou uma caixa no chão, ele a abriu e dentro havia quatro cristais brilhantes em forma de losango. Um era azul marinho e estava no canto, o outro era marrom madeira, o outro era vermelho alaranjado e o ultimo era azul claro da cor dos céus mas pude notar relâmpagos dentro dele.

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– Os jovens sabiam – Quíron continuou – que o que encontraram tinha os maiores poderes do mundo. Eles decidiram então que o mais velho ficaria com o fogo, o do meio com as águas e o mais novo com o céu. Cada um pegou um, como Quíron citou, mas o marrom ainda estava lá e nenhum deles se apossou. Minhas pernas estavam tremulas, a cabeça ainda doía e o sono aumentava por causa da musica que estava cada vez mais alta e clara na minha mente. Claro, já havia lido muitas vezes sobre a musica hipnotizadora dos faunos/sátiros. – A terra sobrou, eles eram três e o quarto elemento sobrou. Eles decidiram então dividir o poder do ultimo. A terra estava em parte para os três. Eles eram poderosos, mas precisavam proteger os cristais, os poderes eram cobiçados, eles precisavam de seres fortes o suficientes para proteger os cristais daquele que com intenções impuras que desejasse aquele poder. Cada um deles convocou um guardião para proteger seu poder, e é por isso que vocês estão aqui. Saí do transe que eu havia entrado, ainda com sono, as pernas moles, a cabeça doendo, quase desmaiei, mas me apoiei em um menino que estava ao meu lado. Olhei em volta, não foram todos que sofreram igual a mim, na verdade acho que só eu, a garota do beliche e mais um que ficamos abalados (embora eu tenha sido o único que perdeu o equilibre), não sei se os outros tinham visto o que eu vi, mas sei que isso foi cansativo. Todos começaram a reclamar sobre o assunto. – Você quer que a gente proteja esses poderes? – um reclamou – Por que a gente terá que fazer isso? – indagou o outro – Nós... – a menina do beliche disse, sua falhou, ela tomou fôlego e continuou – nós teremos que busca-los não é? Fez-se silencio, todos a olhavam e pensavam. Se existissem esses poderes como a historia relatou, fazia sentido que alguém quisesse pegá-lo, mas não fazia sentido porque essa pessoa raptou crianças. E ainda sim, como a menina do beliche podia saber disso? – Sim – Aron disse ainda com a flauta na mão – vocês estão aqui porque o chefe quer os cristais. Ele deseja os poderes e vocês talvez possam pegá-los. – Por que ele mesmo não pega? – o meu companheiro de quarto falou – Por que ele não pode – disse Quíron, com calma – a lenda diz que aquele de coração impuro não pode pegar o poder. Por isso temos vocês. – E por que faríamos isso? – um outro menino perguntou Me lembrei do sonho que tive, a minha mãe estava presa, talvez não só a minha, talvez a de todos que estavam ali. Esse era o motivo, eles iam nos fazer pegar os poderes em troca de nossas famílias. – Nossas famílias – eu e a garota do beliche murmuramos juntos. Nós nos olhamos, por um momento tive a sensação que ela também havia tido sonhos sobre o assunto. Fiquei feliz por não ser o único anormal e esquisito do mundo. Aron preparou a flauta e eu vi minha mãe, ela estava meio transparente o que me causou uma dor no peito. Ela não podia estar morta, se estivesse eu não teria

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por que lutar aqui. Mas ela também não estava completamente bem. Parecia uma aura espectral presa, estava adormecida em um lugar escuro cujo eu não pude identificar, mas se parecia muito com o lugar dos meus sonhos.

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Quatro

Apanho para uma

garotinha

EU ESTAVA abalado e não parecia o único, acho que todos viram o que eu vi desta vez. Estávamos todos espantados e pálidos e nós não sabíamos o que dizer até Quíron começar. – Eu estou aqui a muito tempo, treino jovens e mais jovens para a captura dos poderes e sempre tenho que fazer isso de novo... – Sabem por que? – interrompeu Aron – Porque todos eles morrem! Eles nunca voltam vivos! E vocês não vão ter um destino diferente, adolescentes fracos! – E o que acontece com a família de quem morreu? – eu perguntei – Morrem junto! – disse Aron impaciente como se isso fosse obvio – Eu não aguento mais treinar crianças! – Aron, acalme-se. – disse Quíron Eles já estão aí? Ah sim, vejo que estão. Disse uma voz na minha cabeça, uma voz conhecida... a voz do homem do meu sonho, o que conversava com o filho. Vocês serão classificados em equipes conforme a cabana em que estavam, as da direita são um e dois, as da esquerda três e quatro. Falta alguma coisa? Ah sim, Aron cuida da um e dois e Quíron da três e quatro. Que maravilha ia ter que aguentar Aron. Minha cabana era a dois então ia ter que aguenta-lo. Quíron fez um sinal para nos dividirmos e vi que não era só eu que tinha ouvido isso, todo mundo tinha escutado. Nos separamos, cada qual para o lado correspondente do instrutor. Que comece o treinamento. Vocês vão sair amanhã, vão trazer o cristal da terra a mim e veremos como vão se sair. Aron olhou para nós com desprezo, depois disse: – Alguém ai sabe lutar? Eu e a menina do beliche (preciso aprender o nome dela, “menina do beliche” fica estranho) levantamos a mão. – Sabem manusear uma espada? Assentimos e ele pareceu surpreso. Ele nos levou até um canto da floresta onde havia uns escudos e umas espadas. Na hora me lembrei de Alfa, olhei meu pulso e estava sem relógio. Havia perdido ele talvez, ou tivessem me confiscado. Apalpei o bolso da calça e tinha um volume lá, peguei e era Alfa, ainda bem.

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Coloquei ele no pulso sem Aron e a garota ver e depois os segui até a mesa com os escudos e espadas. – Mostrem – disse Aron. – O que? – eu perguntei, por um momento achei que ele estava falando de Alfa, mas como falou no plural... – Falaram que sabiam lutar, mostrem. Provem, lutem. – ele murmurou alguma coisa como crianças burras. Eu e ela trocamos olhares que diziam ele é louco. A menina se dirigiu até a mesa com as espadas e notou uma diferente das outras. A espada era de aço ou prata não sei, era brilhosa, tinha alguma coisa escrita mas não consegui ler. Entre seu cabo e sua lamina tinha três laminas pequenas, ao final da terceira um desenho de uma águia se formava (a primeira e a segunda eram as asas e a terceira formava a cauda). Seu cabo era de couro com tiras de prata e na ponta do cabo havia dois raios desenhados como pequenas estatuetas. – Se eu fosse você não tentaria essa aí menina. – Aron advertiu – Muitos já tentaram e todos sempre se decepcionaram. – Como assim? – ela perguntou – Tente levantá-la e verá. Ninguém conseguiu em cinco anos... – Você está aqui a cinco anos? – indaguei surpreso. Quando Quíron disse que estavam ali a muito tempo, achei que era uns dois ou três meses mas não cinco anos. – Sim, e ninguém nunca conseguiu levantá-la ou usá-la. Acho que ela pode estar aqui a espera de alguém em especial. Tente, pode ser você. – ele disse descrente Ela encostou na espada e recuou ligeiramente segurando a mão que havia tocado o objeto. – Me queimou! – Isso sempre acontece. – disse Aron decepcionado – Você menino, tente pegar. Me aproximei com cuidado e encostei na espada, nada me aconteceu. Levantei ela e era perfeita! Nem leve demais e nem pesada demais como as que tinha no acampamento do Marte. Senti como se ela se conectasse comigo, uma carga elétrica passou de mim para ela e vice e versa. – Você... conseguiu – ele soltou um rosnado meio parecido com um sorriso o que me deixou surpreso –Isso é um sinal. Bem, vamos lá, pegue uma espada e um escudo, garota. E você, rapaz, trate de arranjar um escudo. Ah, qual os nomes de vocês? – Erick – Selina – Tudo bem, Erick e Selina. Arranjem armas, eu já volto. Vou chamar Quíron.

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Ele saiu saltitando em seus cascos imundos floresta afora nos deixando sozinhos. Selina me encarava com o canto do olho enquanto olhava as espadas e parecia esconder alguma coisa. – Então – eu disse – nenhum desses escudos parecem bons, não acha? – Os escudos são bons, não gostei das espadas. – ela tirou uma corujinha de prata do bolso – Sei que você tem uma arma, vamos fazer um trato: não conto sobre a sua e você não fala sobre a minha, ok? – Trato feito. Transformei Alfa e ela abriu a asa direita da corujinha que se transformou em uma espada de tamanho médio em suas mãos. A espada tinha uma coruja no cabo, na verdade era como se houvesse uma coruja espelhada e era um tanto aterrorizante. Devia ser feita da mesma coisa que a minha, talvez, aço ou prata quem sabe. – Titânio primordial – ela disse como se estivesse lendo minha mente – é a única lamina mortal para monstros, dizem que pode ferir até mesmo imortais. – Você já passou por isso antes? – Não exatamente, já lutei pela minha vida antes, Erick. Mas não temos tempo para isso agora. Aron saiu da floresta com Quíron. Eles olharam e fizeram sinal para começarmos a lutar. Selina havia dito que já havia lutado por sua vida antes, isso não soava como que ela ia ser um adversário fácil. Ela pegou um escudo da mesa e perguntou se eu estava pronto, assenti e ela me atacou. Com os poderes que recebi de Marte eu parecia saber tudo, onde ela ia golpear, como bloquear, tudo. Bloqueei seu golpe que teria me atingido no ombro e contrataquei no mesmo lugar. Ela defendeu, sorriu de modo travesso, me atacou e eu defendi de novo, mas não era isso que ela estava fazendo, enquanto defendi o golpe ela me deu uma escudada na barriga e eu caí. Aron e Quíron observavam sem piscar a luta. Eu me levantei e ataquei, ela defendeu mas eu fui mais rápido desferindo um golpe contra seu braço direito. Ela me chutou e depois me cortou o braço direito também. Começamos a lutar empatados, defendendo todos os golpes até que eu consegui desarma-la e coloquei a espada em seu pescoço. Achei que havia vencido até ela bater em minha espada com o escudo com tanta força que tirou-a de mim e me bateu com o escudo na cabeça. Ela se virou e correu atrás de sua espada e eu atrás da minha. Quando estava alcançando a minha uma lamina passou de raspão em meu braço e prendeu minha blusa na arvore (ela havia jogado uma espada comum em meu braço). Selina veio caminhando com sua espada em mãos e antes que eu pudesse levantar Alfa para bater ela colocou a espada em meu peito e segurou meu braço. – Você luta bem Erick, – ela disse – mas é impulsivo e previsível, se tivesse um plano ganharia com certeza. Aron veio batendo palmas com um enorme sorriso no rosto como se aquilo tivesse salvado seu dia.

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– Muito bom! – ele exclamou – Acho que vocês dois tem chance de sobreviver. – Chance? – eu disse enquanto tirava a espada da blusa – Ah, obrigado, melhorou o dia. – O que vamos enfrentar? – Selina perguntou – Não tenho permissão para dizer, mas vocês dois são incríveis! Quem treinou vocês? Nós dois fizemos silencio, ele pareceu notar algo estranho, então insistiu. – Quem treinou vocês? Falem. – Meu irmão – eu disse – Minha prima – respondeu Selina. – Vocês não precisam de treinamento. Estão prontos para a batalha, no treinamento a gente ensina muito menos do que vocês sabem. Vocês podem nos ajudar a treinar, ou ajudar a encontrar os cristais ou guardiões. – Fico com a segunda opção – Selina disse – Prefiro a primeira – eu disse – Tudo bem, podem fazer cada um o que quiser. Ou podem fazer os dois as duas coisas. Ele nos conduziu até a salinha dos beliches e nos entregou papeis, um bolo deles, folhas antigas ou pergaminhos. Aron disse que devíamos organizar e descobrir os guardiões conforme aqueles papeis. Eu odiei, gosto de estar em ação não de ficar parado. – Fogo, quem pode estar para o fogo? – eu disse – Um dragão talvez – Selina disse – Não há muitos animais, são só dragão, fênix... acho que é isso. – Olha aqui, tem uma coisa sobre... línguas de fogo, acho que é isso. – Deixa eu ver – ela disse pegando o papel – ta escrito, ilhas de fogo. Olhando de longe parecia que estava escrito em outra língua, as línguas de

fogo pareciam mais com Νησιά της φωτιάς. Pisquei e olhei de novo e as letras estranhas ainda estavam lá. – Que língua é essa? – perguntei espantado – Isso é... latim? – Grego antigo, – ela respondeu – ilhas de fogo. Separa ali naquele canto o que tiver a ver com fogo. Alguém bateu na porta. Falamos para entrar e ele entrou. Um menino de cabelos pretos, olhos negros, uma pinta na bochecha, devia ter seus quinze, dezesseis anos mas era de porte atlético. Usava armadura de couro e a espada na bainha. – Licença – ele disse entrando – é aqui que as pessoas descobrem sobre os guardiões? – Bem vindo ao clube. – eu disse – Estamos tentando desvendar o fogo primeiro. – Na verdade não – Selina disse – estamos lendo os pergaminhos e organizando qual é qual. Testamos o fogo por que as opções são poucas.

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– Ah, tudo bem, vamos ver se eu sei alguma coisa. Não sou muito inteligente, mas não custa tentar. – Já sabe lutar? – eu perguntei a ele – Já, minha família é meio que “bem de vida” – ele fez aspas com os dedos – então eu fazia aulas de esgrima no tempo livre. Talvez por isso que raptaram, talvez queiram resgate. E vocês, também são ricos? Eu e Selina fizemos que não com a cabeça. – Eu sou de uma família pobre do sul. Não tenho muito a oferecer – eu disse – o resgate seria baixo. – a não ser que minha avó pagasse, mas não quis entrar em detalhes. – Eu não tenho muito dinheiro, nada a oferecer a eles. Afinal, nem sei o que querem comigo. – Selina disse – Bom, temos que continuar, temos muito trabalho. – Tem razão – o rapaz disse – ah, ia me esquecendo, sou Bruno. – Erick – Selina Ele se sentou ao meu lado e começou a analisar os papeis. Ele fez uma cara como se aquilo fosse fácil, muito fácil. – Aqui, os olhos de pedra, górgonas! – Selina exclamou como se fosse obvio, já havia lido essa muitas vezes mas não associei uma coisa com outra – Como não vi isso antes, pedras, terra, claro! – Você é bem inteligente – Bruno disse a ela – para a sua idade, muito inteligente. Talvez por isso tenham escolhido você. Não achei aquilo nada de mais, afinal ela já tinha lutado pela vida, devia saber de algumas coisas. – Obrigada, ah, olhe aqui o repouso da... – ela pareceu ter dificuldade de ler – coruja? –É, coruja – eu confirmei – alguma floresta ou coisa assim? Tipo, é lá que as corujas repousam não? – É – Bruno concordou – mas não deve ser tão assim. A gorgona não estava escrito, tipo, gorgona. Quero dizer a coruja pode ter um sentido figurado, símbolo, código, marca... – Parthenon! – eu exclamei – A primeira coisa não é gorgona? A Medusa e Atena tiveram um desentendimento e... – me interrompi, Selina me encarava e comecei a pensar que podia ter dito algo errado. – Você não é tão burro quanto eu pensava Erick. – ela disse – Tem razão, faz sentido. – Muito obrigado pela parte que me toca. – Ei, isso foi um elogio! – Ah claro, você é muito gentil. – Ah, fala menos e trabalha mais. – ela disse – Estou trabalhando se você não percebeu. – resmunguei – Não, eu não percebi

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– Ei – Bruno disse – vocês já se conhecem não é? – eu e Selina fizemos que não com a cabeça – Serio, eu achei que se conheciam, vocês parecem que se conhecem e que não são bons amigos... – Graças aos deuses eu não conheço ele – ela bufou – Ah, cala a boca. – Você é tão idiota. – Você é tão chata. – Insuportável – Ah, eu...? – Chega – disse Bruno calmamente pondo a mão no meu ombro – acalmem-se, não briguem. Temos a Medusa no Parthenon as ilhas de fogo, precisamos de mais dois, os guardiões do ar e água. Começamos a trabalhar de novo. O motivo da briga era meio besta, mas de algum modo estava com raiva como se a conhecesse e não gostasse. Alguma coisa assim. Aron abriu a porta com cara de decepção de novo. Ele nos encarou com cara brava e depois tentou aliviar a rispidez na face, mas não funcionou. – Venham, vamos começar um jogo. Um jogo comum no acampamento... – Aron se interrompeu como se aquela palavra o trouxesse lembranças ruins, ou boas – Ah, acharam alguma coisa? Nós assentimos. – Ah, ótimo, anotem e me entreguem a noite no jantar. – Aron – Bruno disse – Não tem como trocar de equipe? É que eu me familiarizei com eles e minha equipe não é tão...

– Me desculpe garoto, mas não posso desfalcar uma equipe, essa equipe já está espetacular – ele encarou a mim e a Selina – se eu tirar você de sua equipe todos eles vão morrer! Eles não aguentarão sem um líder bom de espada ou inteligente, eles vão fracassar e morrer. Sinto muito amigo, mas não posso desfalcar uma equipe. – Então vamos salvar vidas – Selina disse se levantando – me troque de equipe, coloque-me em outra, me deixe trocar para as outras. – Não, trocar duas pessoas é demais, não posso fazer isso, ia dar muita bagunça. – Eu disse para me trocar, sou uma pessoa, como assim duas? – O que? Nem pensar, eu preciso de vocês dois trabalhando juntos – ele apontou para mim e eu me levantei – O que? Não vou trabalhar com ela. – Isso não é uma opção, é uma ordem! – Aron disse com autoridade – Se eu separar vocês dois não teremos chance, vocês precisam ficar juntos. Venham, vamos jogar a coroa de louros.

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Cinco

Vencemos um jogo

SAÍMOS para o campo e todos estavam lá, o menino da nossa cabana veio

correndo na nossa direção sorrindo com armadura de couro, arco e aljava pendurado nas costas.

– Gente olha só, vocês tem que ver, eu sempre fui bom de mira mas nunca tinha usado um arco-e-flecha antes. Eu acertei todos, achei alguma coisa em que sou bom de verdade.

– Que bom cara – eu disse – hã, qual é o seu nome? – Pedro, você é Erick não é? E você Selina? – Sim, mas como sabe? – Selina perguntou – Ah o Aron falou de vocês, que vocês lutavam bem e que você era... como

ele falou? Estratégica e lutava mais ou menos e o Erick era... um ótimo gladiador mas burro, sem ofensas cara, Aron que disse.

– Olha, eu e Aron concordamos em alguma coisa. – Selina disse Pedro e Bruno tentaram não sorrir, mas riram igual. Estava pensando em

alguma coisa boa para dizer, mas não achava nada, não era bom com palavras. – Eu sou o forte, bom gladiador – comecei – poderoso, consegui a espada e

você é inteligente e o que mesmo? Eles riram novamente, parecia aqueles colegas de escola que ficam falando briga, briga, briga antes de uma discussão. Aquele argumento parecia ter me dado a vitoria, mas ela sempre tinha uma resposta na ponta da língua. – Inteligente e experiente, mas não importa, foi o suficiente para te vencer não foi? Depois de dizer isso ela saiu. Bruno colocou a mão no meu ombro. – Um dia você consegue. – Depois saiu rindo. Pedro estava rindo ao meu lado, ele me olhou, me estudou e depois disse: – Vocês se conhecem não é? Você e Selina. – Não, você é a segunda pessoa a me dizer isso. Conheci ela agora. – Para mim parece que vocês dois se conhecem e que não são amigos. – Silencio – Aron pediu, ou melhor, ordenou – Vamos jogar um jogo comum. Vocês tem que capturar a bandeira do inimigo e levar até a sua cabana. Quem conseguir mais bandeiras ganha um premio, não é uma coroa de louros, mas é algo que vai ajudar vocês nas batalhas.

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– O que é? – Bruno perguntou – Qual é o premio? – Surpresa, mas é um bom premio. Acreditem vale a pena ganhar. Eu não sei quem vai ganhar – ele encarou a mim, Pedro e Selina que estávamos juntos em um canto – mas boa sorte a todos. Ah, uma coisa, vocês vão ser separados por cores, a um é azul, dois vermelho, três verde e quatro amarelo. Tem camisetas para vocês ali, coloquem vai ficar melhor de identificar os parceiros e os inimigos. Lembrem-se: cada cabana é uma equipe e as equipes devem ser unidas – ele deu uma ultima encarada em nós e se virou para pegar as bandeiras – Aqui, cada uma com a cor correspondente, peguem e escondam. Vão! Eu, Selina e Pedro colocamos as camisetas vermelhas, as armaduras de couro, pegamos as espadas (arcos), escudos (aljava) e a bandeira e fomos floresta adentro como as outras equipes fizeram. – Então sabe-tudo, – eu disse – qual o plano? – Pedro: vá para alto da arvore e deixe a bandeira aqui no chão. Tomadinha: fica aqui e cuida da nossa bandeira e eu vou pegar as outras bandeiras. – O que? – eu reclamei – Você acha que eu vou ficar aqui parado? – Eu sei onde estão as outras bandeiras, Tomadinha! – Ah é? Como você sabe onde elas estão? Não entendi a reação dela, ela encostou em uma arvore e segurou minha mão. Tive uma visão como aquelas que tive quando Aron tocava a flauta, só que mais lenta e com cor amarela por causa do sol. Vi Bruno correndo com a bandeira verde no meio da mata e colocando ela no centro de um riacho, ele deu ordens para seus amigos protegerem ela. Selina soltou minha mão e quase desmaiei. Não estava acostumado com isso e como ela conseguia fazer isso? Pedro me segurou e a encarou com cara de o que você fez com ele? – Como você... – eu disse tomando fôlego e tentando me endireitar, tentei ficar de pé mas ia cair de novo se ela não tivesse me segurado – faz isso? – O que as arvores veem, viram, escutam ou escutaram eu consigo saber. – Por que? – Ai, uma longa historia. Você se acostuma com o tempo, eu ficava assim no inicio mas agora já acostumei. Só não sei como achar o rio. O vento soprando na minha direção, comecei a melhorar instantaneamente e me situei completamente. Sabia para onde era o rio, as cabanas, os campos de flores.... – O rio é ali, para o leste – eu disse – não sei como sei, mas só sei que sei Depois de dizer isso vi que era muito idiota, mas era tarde demais. – Você tem certeza? – ela perguntou, o que me surpreendeu pois achei que ela ia zombar da quantidade de sei que eu disse – Sim, eu tenho certeza. Não sei porque mas eu sei que é para lá. Ela olhou para Pedro, ele sorriu e assentiu. – Tudo bem Pedro? – ela perguntou – Não tem problema se formos nós dois?

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– Não tem problema, quero um presente então... – ele deu de ombros – Vou tentar defender a bandeira. Boa sorte e não morram. – Não vou dar esse gostinho para ela – eu disse e eles riram. Deu um barulho de um berrante e a gente soube que era para começar. Eu e Selina resolvemos ir atrás da bandeira do time três, já que foi a que vimos antes e não sabíamos se teríamos tempo para ter outra visão. Eu a levei até o rio, ela bolou uma coisa de ela distrair o guarda enquanto eu pegava a bandeira que funcionou. Levamos a bandeira verde até a nossa cabana com facilidade e Selina teve uma ideia que era melhor do que eu achava. – Ei Tomadinha, eu tive ideia. – ela disse – Vou te mostrar mais uma bandeira, você vai atrás enquanto eu fico aqui e tomo a de quem passar, está bem? – Ah, ta, eu acho que consigo achar mais uma. Ela encostou em outra arvore e segurou minha mão novamente. Vi umas pessoas tentando pegar a nossa bandeira, mas Pedro se saiu muito bem. Ele atirava flechas nos braços das pessoas prendendo-as nas arvores e protegendo a bandeira. Depois a visão mudou e vi uma bandeira azul pendurada em uma arvore grande que eu sabia que ficava ao centro da floresta. Selina tirou a mão da arvore e me segurou. Quase desmaiei umas duas vezes enquanto ela me segurava e reclamava que eu era pesado com armadura. Depois que me recuperei fui atrás da bandeira na arvore. Estava fácil para falar a verdade, nenhuma pessoa guardando a bandeira apenas um oponente. Um garoto alto de uns dezesseis anos, seu rosto estava encoberto por um elmo, sua camiseta verde por baixo da armadura de couro, calça jeans e botas. – E aí Erick, infelizmente teremos que nos enfrentar. Era Bruno, ele saiu correndo e eu também até a arvore. Ele começou a escalar e eu também, ele estava na frente até eu puxar seu pé e ele quase cair, então eu peguei a bandeira. Pulei da arvore e rolei pro lado a tempo de não ser atingido por Bruno que pulou atrás de mim. Corri desesperadamente com ele atrás em direção as cabanas, quando estava passando por uma poça de lama Bruno pulou em cima de mim e eu caí na lama. Ele desembainhou a espada. Era uma espada semelhante a de esgrima, cabo redondo e ponta fina, mas mesmo assim não parecia nem um pouco agradável ser atingido por uma daquelas em qualquer parte do corpo que seja. Ele veio pra cima de mim, eu estava sem escudo porque segurava na mão direita a espada e na esquerda a bandeira. – Ei, não pode deixar essa passar? – eu disse enquanto defendia seu golpe com minha espada. – Desculpe Erick, mas quero esse presente. Ele lutava muito bem, diria que era profissional. Consegui defender muitos dos seus golpes mas levei um corte na bochecha. Corri de novo e estava vendo a minha cabana quando fui atingido por um escudo voador nas costas. – Foi mal Erick – ele disse pegando a bandeira – não leve para o lado pessoal. Ele se virou e a bandeira voou longe. Selina estava com duas espadas nas mãos, idênticas.

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– Estamos empatados, Erick pega a bandeira, se pegarmos ganhamos. Ela atacou Bruno, os dois lutavam bem, mas acho que Selina perdia essa, ia ser legal assistir, mas não tinha tempo. Me levantei e fui em direção a bandeira mas estava longe, Bruno empurrou Selina e correu na direção do objeto que definiria a equipe vencedora. Estiquei a mão e a bandeira veio até mim, corri em direção a cabana, mas lá me esperavam alguns guerreiros amarelos e verdes. Todos vieram para cima de mim, não tinha como proteger a bandeira de todos eles, nem como abrir caminho. Alguém atrás de mim gritou joga pra cá e eu joguei, Selina vinha correndo empurrando a maioria das pessoas. Ela pegou a bandeira e o foco da metade das pessoas foram nela. Eu lutava contra a outra metade que ainda me atormentava. – Pega – Selina gritou e agarrei a bandeira ainda no ar. Estávamos a uns dois metros da entrada da nossa cabana, ficávamos jogando a bandeira de um para o outro para despistar os outros quando a coisa apertava e lutávamos em sinfonia como se lutássemos juntos a anos. Talvez estivesse entendendo o que Aron queria dizer que não podia nos separar, eu sabia quando ela ia precisar de ajuda, quando me abaixar para ela golpear alguém que tentava me bater pelas costas. Eu estava com a bandeira a uns trinta centímetros da entrada da cabana, a trinta centímetros da vitoria, quando alguém me derrubou, era um dos azuis, a pessoa estava pegando a bandeira quando uma flecha passou de raspão no braço dela e ela soltou a espada. Pedro havia chegado sujo de lama e estava com o arco em mãos. Passei a bandeira para Selina, mas Bruno ficou entre ela e a porta. Ela me olhou com o canto do olho e murmurou desculpe. De primeira não entendi, até ela me puxar e me empurrar por cima Bruno, ele caiu, mas eu consegui ficar de pé tempo suficiente para ser puxado para dentro da cabana. Os outros guerreiros fizeram cara de raiva, decepção, frustração, menos Bruno. Ele sorria para nós, eu e Selina atirados no chão da cabana, ela com a bandeira nas mãos.

– Me deixem passar. – Aron dizia – Olha, o que temos aqui? Uma equipe vencedora? Quantas bandeiras?

– Duas – eu disse – verde e azul. Me levantei e estendi a mão para Selina levantar. Ela levantou com

dificuldade e então percebi um grande corte em seu braço direito. O pior é que estava roxo na volta.

– O que houve com seu braço? – eu perguntei – Não sei. Está doendo. Alguém me acertou pelas costas quando estávamos

perto de ganhar, senti isso. – Deixa eu ver – Quíron disse se aproximando – espada envenenada, alguém

aqui está com espada envenenada. É proibido usar veneno na espada aqui, quem usou errou o corte, ninguém usa espada envenenada para acertar o braço de alguém. Quem usou estava em busca de morte.

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Seis

Marte perde o

controle

O ASSUNTO assustou a todos, tiveram sussurros e alvoroços, alguns acharam que era eu quando estávamos perto da porta ou entrando. Quíron trouxe algumas plantas medicinais e colocou no braço dela, a ferida ainda estava bem exposta e “feia”. Estava escurecendo, Pedro e eu estávamos na cabana esperando a inspeção. Aron ia passar de cabana em cabana a procura da espada envenenada enquanto Selina ficava em uma sala ao oeste que eles disseram que era uma ala hospitalar. – Nossa – Pedro disse quebrando o silencio – alguém aqui quer matar a Selina, por que será? – Eu não sei, ela é chatinha, mas não chega a esse ponto de matar. Bom, podemos descartar eu, você e Bruno. – Eu não gosto dele. – Por que? – Ah, não sei dizer. Ele é meio exibido e não me parece boa gente. Ele queria tomar meu lugar na equipe – Como sabe? – Ele me falou. Quero dizer não com essas palavras, ele disse eu queria ficar na sua equipe – Pedro disse imitando a voz de Bruno de um jeito engraçado que me fez rir – eles são legais, brigam bastante mas são legais. – Ele me pareceu um cara legal. Acho que ele pode ser nosso amigo, nosso aliado. – É, talvez sege implicância minha mesmo. – Com licença – Aron disse abrindo a porta – vou pegar as espadas e flechas de vocês e levar para analisar. É hora do jantar venham, vou levar vocês.

Ele nos conduziu até um tipo de templo. O lugar estava meio destruído, mas ainda dava para ficar debaixo dele. Devia ter sido um lugar bonito, piso brilhoso, paredes bem arquitetadas (as que sobraram) e colunas bem elaboradas. Havia umas quatro mesas ali, o suficiente para nós, cada uma com comidas diferentes.

Tinha carne, refrigerante, arroz, feijão, batata, alface... estava no paraíso pois estava com muita fome. Peguei um prato e me servi, provavelmente uma serra de comida mas já que estava com fome e a pessoa que me prendia estava com a minha mãe, acho que falir o cara não era uma má opção. Foi anunciado que cada cabana

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devia se posicionar em uma mesa, sem trocas, mas é claro que houve trocas. Bruno veio para nossa mesa, alguns azuis para a amarela e assim foi...

Pouco antes de eu começar a comer Selina veio com o braço enfaixado do ombro ao cotovelo. Ela se serviu e sentou com a gente.

– Como está? – eu perguntei – Ainda dói? – Não, Quíron é bom com plantas medicinais. E aí, perdi alguma coisa? – Não – Bruno respondeu – Quíron apenas recolheu as armas de todo o

mundo para analisar. Olha se isso não era apavorante o bastante agora ficou. – Se está para você, – Pedro disse – imagina para ela que foi o alvo. Selina pensou um pouco enquanto mexia na comida. Ela parecia pensar se

me dizia algo ou não porque as vezes ela olhava com o canto do olho para mim. – Algum palpite – eu disse a Selina – sobre quem fez isso? – Não tem que ter palpite – Pedro disse – agora que eles vão olhar as

laminas vão descobrir na hora. – É mais complexo do que isso, – Selina disse me olhando com o canto do

olho – a pessoa que fez isso é esperta, muito esperta, ela não faria nada assim tão fácil de descobrir e se descobrirem alguém logo aposto que é truque. A pessoa que está fazendo isso é um traidor – ele olhou diretamente para mim – ele pode se esconder de nós.

De alguma maneira ela tinha tido o mesmo sonho que eu e sabia que eu tive. Com esse comentário tudo começou a se encaixar, o traidor era o filho daquele homem que estava comandando tudo, ele tinha um elmo que podia fazer ele ficar invisível. Ele tinha o elmo da escuridão, a terceira arma mais poderosa da mitologia grega, ele tinha o elmo de Hades.

Eu ia dizer alguma coisa inteligente como não deve ser tão difícil achar um filho de Hades por aí, mas Selina me lançou um olhar “cala a boca” e eu não falei nada.

– O que foi? – Bruno disse – Vocês sabem de alguma coisa não é? – É – Pedro disse – vocês estão se olhando... estranho – É que... bem, nós – eu comecei, eles eram meus amigos eu devia contar a eles – Nós temos um palpite – Selina interrompeu – um azul, ele vem me observando a um tempo e acho que possa ser ele. Ele estava atrás de nós dois na luta. Qualquer que sege a coisa que eu ia falar antes, tenho certeza que isso saiu mais convincente. Não devia contar a eles sobre o sonho, isso eu entendi, mas não sabia por que. Nós comemos em silencio. Ninguém falou mais nada sobre o assunto, Bruno e Pedro olhavam constantemente para mim e para Selina como se tentassem descobrir o que escondíamos. Aron nos mandou ir dormir porque amanhã teríamos que acordar muito cedo para buscar o cristal da terra. Eu e Selina ficamos na mesa por ultimo para falar com Aron, cobrar ele do presente que nos devia. Pedro estava tão cansado que foi dormir, disse para a gente contar para ele amanhã.

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– Então Aron – eu disse – e o nosso presente? – Ah claro – ele disse – eu estava me esquecendo. São cavalos. – Como cavalos vão ajudar contra a gorgona? – Selina disse – Eles vão virar pedras! – Ah sim, vocês erraram, quero dizer, ela se despediu dhsbfhs – ele arranjou uma enrolada no final – Não é gorgona amanhã é um outro monstro que não tenho permissão para dizer. Agora vão dormir, amanhã terão muito trabalho. Obedecemos. Perto da porta da cabana Selina me segurou antes que eu entrasse. – Preciso falar com você. – Ah ta, lá dentro você fala, to com frio. – Você não entendeu, é só com você. Fomos para perto de uma outra cabana, uma destruída, aos pedaços. – É sobre aquele assunto da espada envenenada. – ela disse – Eu sei tudo sobre isso, e porque Pedro não pode saber?

– Alguém tentou te matar hoje, sabia? – Não diga! Quer a lista em ordem alfabética ou cronológica? – Ah cala a boca, eu estou falando serio! Quando eu levei a espadada no braço foi quando estávamos a uns dois metros da entrada. Você estava com a bandeira e eu vim atrás de você... foi aí que fui apunhalada. – E...? – Pelos céus Erick você é muito burro! Eu entrei na frente sem querer. Quíron falou que quem envenenou a espada estava atrás de morte. Alguém ia te apunhalar pelas costas! – E você me salvou sem querer? – Claro! – Quem pode ser? – Qualquer um, por isso não queria falar na frente do Pedro. Ele é legal mas não pode confiar em ninguém. – Tem razão, ainda mais que ele não estava lá na hora. Ele apareceu apenas depois com o arco. Você sonhou também não é? Na noite passada, você viu o que eu vi não foi? – Acho que sim, eu vi um filho de Hades pedindo o elmo emprestado. Você viu isso também? Assenti. Por que será que só nós dois sonhamos? Por que os outros não sonham também? Ela pegou meu braço e olhou a marca que Marte me deu. – Ah, por isso você é tão ignorante. – O que? – Tem a benção de Ares, por isso não nos damos bem. – Você tem a benção de quem? Ela esticou o braço para mim deixando a vista uma marca também. Uma coruja. A marca de Atena. – Ah, sabe-tudo.

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– Não comente isso para ninguém, ninguém deve saber. Você é a segunda pessoa que sabe. – Espera, você não mostra isso aí para ninguém, mas mostra para mim? – Eu não sei porque, mas confio em você cabeça de vento. Vamos dormir, amanhã o dia promete. Deitei sem sono. Não sei o que viria dessa vez, não sei se viria Marte ou o traidor, mas com certeza viria alguma coisa. Dormi em fim e apareci em lugar diferente. O lugar era magnífico. Feito de pedras brancas e colunas de mármore e, é claro, o lugar era enorme. Havia doze tronos espalhados formando um U. Os tronos eram feito cada um de uma coisa. O primeiro da ponta da direita era feito de um metal acinzentado, tinha um desenho de um urso na ponta do encosto e dava direto para a lua. O próximo era feito de um metal avermelhado e brilhoso. Havia desenhos de guerra, uma lança sangrenta e um javali no encosto e nos braços do trono. O outro parecia ser feito da mesma coisa que o local (pedras brancas e mármore) com uma coruja no topo do encosto. O quarto era feito de um metal brilhoso, muito brilhoso e dourado, talvez fosse ouro, com um arco-e-flecha no topo do encosto. O quinto era feito de pedras com videiras e uvas crescendo por ele. No topo havia um tigre e uma garrafa de vinho. O sexto era feito de ouro, era o maior e o mais majestoso de todos. Tinha desenhos de grifos, raios, e águias por todo ele. Em seu encosto (no topo) havia o desenho de uma águia envolvida por dois raios cruzados. O sétimo era majestoso também, nem tanto quanto o sexto, mas era majestoso, feito de prata com uma romã no topo. O oitavo era feito de ferro e tinha umas ferramentas no topo. O nono tinha um caduceu no topo. O décimo era feito de conchas marinhas e tinha um enorme tridente no topo do encosto. O décimo primeiro era rosa e tinha uma pomba no encosto. O décimo segundo e ultimo era feito tipo de arvores e tinha no encosto uma cevada. O local estava vazio, mas ficou assim por pouco tempo. Logo chegaram as doze pessoas e sentaram cada um em seu trono. A maioria estava usando túnicas, mas havia uns que usavam armadura de guerra e um deles eu reconheci: era o Marte. – A grande reunião chegou! – anunciou o homem do trono majestoso com autoridade. Seus cabelos eram curtos e brancos e sua barba igual. Seus olhos eram azuis da cor do céu, usava uma túnica branca e sandálias – Teremos que decidir o futuro do mundo. – Irmão, – o homem do trono de conchas disse. Usava uma armadura que parecia ter sido feita do mar, sandálias, cabelos castanhos e grisalhos e olhos azuis da cor da água – creio que somos capazes de evitar uma guerra. Apenas devemos nos manter atentos a qualquer rebelião e impedi-la.

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– Poseidon – o homem de cabelos brancos, que pelo que percebi liderava, disse – se não formos capazes de evitar uma rebelião ou mesmo não percebê-la, as consequências serão graves, muito graves. – Com sua permissão Zeus. – uma mulher disse. Sua aparência era de uns 24 anos, cabelos castanhos avermelhados, usava armadura grega e levantava de seu trono como todos que falaram fizeram – Acredito que uma guerra deve ser evitada. O poder do senhor é muito cobiçado por todos. Levanto a questão aqui de uma hipótese de um traidor entre nós, talvez um amante da guerra que queira promove-la. Marte levantou de seu trono com javalis e lanças tão rapidamente que cheguei a me assustar. Por baixo do elmo pude ver seus olhos ardendo em chamas. – Como ousa me acusar de traição? – ele perguntou aos berros para a mulher – Acalme-se Ares! – Zeus rugiu – Eu não lhe acusei irmão, mas se a carapuça serviu... Marte pegou sua lança e foi enfurecido para cima da mulher, tiveram que segurá-lo. Eu também fiquei com raiva dela, ela estava acusando meu irmão de traição! – Ares mantenha a calma! – Zeus rugiu novamente – Se perder o controle mais uma vez vou expulsá-lo da reunião. – ele se virou para a mulher que falava antes – Atena, continue, qual a sua sugestão? – Um juramento. Sabemos que se a guerra acontecer será provocada por um dos três grandes... – As profecias nem sempre são claras – interrompeu Poseidon – A batalha épica por um dos três grandes será travada – Atena continuou –, parece bem claro para mim. – As palavras da profecia geralmente são mistérios – disse um homem levantando. Seus cabelos castanhos arrepiados, olhos amarelados, dentes brancos que chagavam a brilhar. Usava roupas da atualidade: calças jeans, tênis e uma blusa branca escrito eu amo o Apolo em amarelo. Estava com arco e aljava nas costas; parecia um galã de filmes americanos. – Mas desta vez pareceu bem claro. Sabemos quem são os três grandes e suspeitamos de quem pode se rebelar. – Por isso sugiro que os três grandes façam um juramento – Atena continuou – um juramento que evite a guerra e a volta dos titãs. Sugiro que os irmãos se desfaçam temporariamente de seus poderes até termos certeza que não há chances de Olimpo ser destruído. – Protesto! – Poseidon gritou – Se os deuses se desfizerem de seus poderes como vamos combater os inimigos em uma guerra? – Se vocês se desfizerem de seus poderes então não haverá guerra. – Você não pode decidir o futuro do Olimpo! Você não pode obrigar os deuses a fazerem o que você quiser! – Poseidon estava descontrolado e gritava – Silencio! – Zeus berrou – Temos que considerar a proposta de Atena. – ela deu um sorriso maldoso para Poseidon e ele só olhava com raiva – Faremos uma votação, amanhã a meia noite todos tragam respostas sobre o assunto. Amanhã à

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meia noite teremos a resposta se o juramento será feito ou não. Mais algum assunto a tratar? – Irmão, – Poseidon disse – uma linha da profecia ainda me atormenta. O príncipe mestiço é a decisão pelo Olimpo tomará, e o deus dos mares vai destronar. Um de seus filhos irá me destronar, não podemos fazer nada para evitar? Como eliminar as crias semideusas. – Como você mesmo disse Poseidon, – Atena disse – o príncipe mestiço é o único que salvará. Não podemos exterminar nossas chances de sobreviver a uma guerra. – Atena tem razão, – Zeus concordou – se um de meus filhos pode nos salvar futuramente não posso mata-lo. Não deixarei ele te destronar irmão. Mais algum assunto? Houve silencio, ninguém falou nada. Atena olhava com o canto do olho para Marte e ele bufava de raiva enquanto tomava um calmante medeia (no vidro dizia: acalma até cães infernais famintos!). – Reunião encerrada. – anunciou Zeus – Hermes, leve a mensagem a Hades da proposta de Atena, quero que ele venha votar aqui amanhã. A visão começou a enfraquecer e o sonho mudou. Apareci novamente naquele lugar escuro, na sala do trono. O homem e o traidor conversavam. O traidor usava a mesma capa preta e estava de costas me impedindo novamente de ver seu rosto. – E então – o homem disse – acha que ele sabe de alguma coisa? – Acho que não, – a voz da pessoa estava equalizada – ele conseguiu levantar a espada hoje. – Omega? – Sim. Estou próximo a ele, ele é um bom lutador. Vai nos ajudar a pegar os cristais e depois o matamos, assim conseguimos a confiança de Poseidon. – Claro, se Poseidon estiver do nosso lado teremos as chances dobradas. Quanto ao garoto, quanto antes conseguir mata-lo melhor. – Conto com a ajuda de Poseidon. No cristal da água ele pode nos ajudar fazendo seu monstro perseguir o garoto... – Senhor Hades – um espírito entrou pela porta. – O barqueiro anunciou que o senhor tem visita, seu irmão veio vê-lo. – Mande-o entrar. Vá filho e tome cuidado. – Não se preocupe pai. Ele nunca desconfiará de mim, o que me preocupa são seus amigos. Eles podem desconfiar de mim se já não desconfiam. – Livre-se deles, mate todos se for necessário, mas o menino não pode sobreviver. A imagem se desfez em sombras e eu acordei com Selina me sacudindo e Pedro de olhos arregalados ao meu lado.

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Sete

Ganho um belo

par de chifres

ESTAVA com a cabeça parecendo que ia explodir e sentia meu rosto queimar. A visão tinha me atormentado. Estava próximo a mim, eu nunca ia desconfiar. Quando acordei a primeira pessoa que vi foi Selina, ela estava me sacudindo e gritando acorda e me deu um frio na barriga. Ela estava próxima a mim, ganhando minha confiança e se não fosse o sonho nunca iria desconfiar dela. – Ah, graças aos deuses você acordou – ela disse me soltando. – Cara você nos assustou – Pedro disse, ele estava com expressão de assustado. – O que foi? – eu perguntei assustado – O que houve comigo? – Você começou a falar um monte de coisas – Pedro disse – em sei lá que língua. – Você começou a falar em grego antigo, a gritar na verdade. – Selina explicou – Depois eu tentei te acordar, estamos tentando te acordar há mais de cinco minutos. – Ela te sacudia, eu te bati – isso explica meu rosto queimando –, mas você não acordava. Teve um pesadelo? – Mais ou menos – eu respondi, ainda pensava na possibilidade de Selina ser traidora o que me incomodava. Se ela fosse, talvez Aron também fosse, afinal ele não deixou a gente trocar de equipe. Mas porque Aron trairia? Ele queria ser libertado, sair dali; talvez ele não soubesse que Selina era traidora e achasse que ela fosse uma pessoa de bem que podia me ajudar – na verdade foi um sonho revelador, acho que foi bom, me abriu os olhos. Eu a encarava e ela franziu as sobrancelhas. – Eu não acredito que você... – ela se interrompeu, Pedro a olhou – Eu o que? – ele disse Ela bufou. – Não é você, é o cabeça de vento. Ele está desconfiando de mim agora. – O que? Como você...? – eu comecei – Ah, fala serio! Você me encarou e disse: acho que me abriu os olhos. – ele tentou me imitar de forma ridícula, fez voz de retardada!

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– É, talvez seja você, pode ser qualquer um não é mesmo? – Uau! – Pedro exclamou – Calma. Me expliquem primeiro, o que está acontecendo? – Sabemos que há um traidor. – eu disse – Eu tive uns sonhos que me revelaram algumas coisas... – Ah é? – Selina interrompeu – O que por exemplo? O que você alucinou que me viu como traidora? – Não é da sua conta – Claro que é! Você me acusa de traição sem provas e diz que não é da minha conta! – Sei o suficiente para te acusar – Ta bom. – Pedro berrou – Os dois vão me explicar agora o que está acontecendo. Erick, explica para nós o que você viu. Contei parte do sonho do mundo inferior para eles, omiti a parte que falava no irmão de Hades e a parte que falava nos amigos mortos e a confiança de Poseidon. – Espera aí – Selina começou – ta me dizendo que só porque você ouviu que o traidor está próximo a você sou eu? É isso? – Sim, eu não ia desconfiar de você se não tivesse sonhado, e foi isso que ele disse. – Como pode ter certeza que sou eu? – Como posso ter certeza de que não é você? – Se fosse eu você nunca ia desconfiar! – É um motivo convincente – Pedro disse ainda meio perdido – e Erick, se desconfiar de alguém não o encare. – Não sei mais em quem confiar – eu disse triste. Não sabia com quem contar, a única pessoa com quem eu podia falar era com Selina e Marte mas agora já não sabia mais. – Pode ser qualquer um, pode ser você – eu apontei para Pedro – ou até mesmo você – apontei para Selina –, mas de qualquer forma, ainda são meus amigos. – Se você ficar junto do traidor – Selina disse mais calma – vai ser perigoso, mas se você se isolar vai ser pior ainda. – Eu tive uma ideia, você pode fazer aquelas coisas que você faz com as arvores e tentar ver se elas viram quem estava com a espada envenenada. – Como você faz aquilo? – Pedro perguntou a Selina – Eu não sei, – ela disse, mas me pareceu que ela sabia ou pelo menos tinha um palpite – já tentei fazer isso Erick, a visão delas foram bloqueadas pelas pessoas, elas estavam na frente. Mas eu vi uma coisa que quero te mostrar... O sinal bateu, como um sino escolar. Aron bateu na nossa porta e mandou nós irmos pegar as armaduras, espadas, escudos e tudo mais para lutar. Peguei minha espada e consegui ler o nome escrito em grego na sua lamina: Omega. Fiquei com Alfa em forma de relógio porque pesava menos. Tomamos café da manhã (um

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sanduiche e sucos de caixinha), colocamos a armadura e fomos até os estábulos, para onde Aron nos levou. – Aqui, os presentes – ele apontou para três cavalos, dois brancos e um malhado de branco com marrom. Eles eram lindos, pelos brilhosos, crina penteada e já estavam selados. O malhado deu três passos para frente na minha direção e abaixou a cabeça perto da minha mão. Eu o acariciei e ele se afastou novamente, as vezes a sua imagem ficava turva e eu não conseguia vê-lo claramente – Vejo que o rebelde escolheu você. Bom dia parceiro, uma voz falou na minha cabeça e não era a voz do Hades, era uma voz mais fina e engraçada, tentei não demonstrar que a ouvi mas acho que era impossível. Aqui, sou eu, na sua frente, parceiro. Eu olhei para frente e só estava o cavalo malhado me olhando fixamente. É sou eu mesmo, nunca viu um cavalo falar não? – Para ser sincero não – murmurei – O que? – Selina perguntou – Ah, nada, eu estava falando, que lindo esse garanhão. Se o cavalo podia falar comigo pela mente, talvez eu também pudesse falar com ele. Ei, ta me ouvindo cavalo? Claro, eu não sou surdo! Que maravilha, agora eu estava falando com cavalos, estava ficando completamente louco. – Aí estão, – Aron disse – montem neles, e venham para cá para o campo principal, temos uma longa jornada pela frente crianças idiotas – ele não podia terminar a frase sem um insulto. Eu montei no cavalo, ele tinha uma mancha marrom no focinho que envolvia seus olhos, seu pelo era brilhoso e ele estava limpo e escovado. Meus amigos fizeram a mesma coisa, Selina parecia nervosa. – O que foi? – eu perguntei a ela – Você tem medo de cavalos? – Não, é que – ela titubeou – bem, cavalos não gostam de mim, sabe, eles são meio que crias de Poseidon e eles... me perseguem de vez enquanto. – Porque Poseidon e Atena não se dão. – É, isso. Aí as vezes ele me segue. – Cadê o Pedro e o Aron? – Já saíram. Nós fomos atrás deles. O campo estava cheio de pessoas armadas com espadas, escudos, arcos, aljavas, facas, adagas e outras armas. Quíron estava conduzindo todos e Aron me chamou em um canto. – Ei, garoto. Tome cuidado, a espada que você possui é muito valiosa, só você pode pegá-la, mas não mostre ela para ninguém entendeu? – Por que? – Ela está aqui a muito tempo, a mais tempo que eu, e tem uma grande historia. Ela apareceu aqui em um relâmpago, o símbolo do senhor do Olimpo quer dizer que só um descendente dele pode levanta-la. O traidor não pode descobrir que você a pegou. – Ele já sabe, ele sabe que estou aqui, ele está próximo a mim.

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– Andou sonhando, não é? É importante que sonhe, muito importante, você tem que saber da verdade, tem que saber que tudo isso é uma farsa e que tudo isso é... – Aron – Pedro veio correndo – Quíron mandou te chamar, ele disse que não tem mais tempo, se não vamos perder o sei lá o que. – Ah, claro, vamos Erick. Temos muito trabalho. Chegando no meio do campo tinha um grande circulo em espiral azul escuro. Eu olhei em volta e todos pareciam estar tão confusos quanto eu sobre o assunto. – Vocês estão diante de um portal. – anunciou Quíron – O cristal da terra foi escondido em um lugar mágico que não tem como encontrar se não for por um portal. Vocês passarão por ele e sairão em terras mágicas. – Ele olhou o relógio em meu braço e olhou as horas. – Temos cinco minutos. Vão, passem. Todos nós ficamos com medo mas acabamos passando pelo portal. Assim que passei saí em um deserto, um deserto quente e não havia ninguém lá alem de nós. Quíron começou a nos guiar areia adentro e o seguimos, Pedro estava ao meu lado e começamos a conversar. – Como era sua vida antes daqui? – eu perguntei a ele – Ah, normal. Vivia em uma casa mais ou menos em São Paulo, minha mãe trabalhava em uma empresa de eletrônicos. Eu e meu irmão estudávamos em uma escola que dava aula de manhã e de tarde, assim não ficávamos sozinhos. E você? – Normal também, eu e minha mãe moramos em um apartamento pequeno no Rio Grande do Sul. Ela trabalha em uma pastelaria e eu estudava de manhã e ficava sozinho em casa a tarde. Estão com sua mãe e seu irmão? – É, eles pegaram eles. Sabe Erick, eu fico com medo. A vida deles está em minhas mãos, mas e se... e se eu morrer? Eu nunca lutei bem nem nada do tipo, eu não tenho chances. Eu acho que vou ter que dar adeus a minha família. – Não fale assim. Eu também não sou lá essas coisas, tem que pensar positivo, você não vai morrer. Nenhum de nós vai. – Para você falar é fácil. Você sabe lutar, tem uma espada boa, tem os instrutores, e eu? Eu não tenho nada a meu favor, estou sozinho. Parei para tentar me colocar no lugar dele. Realmente era difícil, ele não teve Marte para treina-lo e nem tinha uma espada significativa ou sonhos com o que estava acontecendo. – Ei, vamos fazer um trato. Vamos cuidar um do outro, não pode deixar o outro morrer, ok? – Ok. – ele riu – Nessa eu levo vantagem. Mas fala aí, qual é a de você e Selina? Vocês dois sabem de alguma coisa a mais, não sabem? Titubeei um pouco. Pensei, ela havia dito para eu não contar nada a ninguém e Aron me advertiu sobre isso também, ma Pedro era um cara legal. – Eu não sei porque – eu disse enfim – mas nós sonhamos com algumas coisas. – contei a ele sobre meu primeiro sonho com o traidor e recontei o segundo – Você não tem esse tipo de sonho também?

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Ele fez que não com a cabeça – Olha, isso é estranho, por que será que vocês veem essas coisas? Porque eles são especiais, meu cavalo disse. Perguntei para ele como assim mentalmente, mas ele disse que não sabia, ele disse que só sabia disso. – Para mim – Pedro disse – Selina esconde alguma coisa. Não sei o que, mas ela sabe alguma coisa alem do que nós sabemos. – Será? – Eu acho que sim. – Mas porque ela não contaria? – Não sei, pergunte isso a ela não a mim. Todos pararam em frente a três portais que estavam posicionados um ao lado do outro. Quíron se virou para nós. – Vocês deram azar. O monstro que enfrentarão estava banido nas profundezas do tártaro até pouco tempo após ser morto, mas ele já cumpriu sua pena e foi liberado para proteger o cristal da terra. Como comentei antes esta ilha é mágica, ela não possui saída a não ser pelos portais e como esse monstro é bom em lugares fechados, creio que vocês tenham mais chances se tiverem saídas. O monstro é uma mistura bem elaborada de humano, já tem alguma ideia de que monstro é? – O Minotauro – disse Bruno – fruto da raiva dos deuses e da ignorância dos mortais. – Aprisionado pelo rei no labirinto de Creta – continuou Selina – E morto por Teseu. – eu disse – Espera, ele era para estar morto! – Os monstros não morrem completamente. Eles ficam no tártaro até se recuperarem. Por isso ele está de volta, e enfrentará vocês para proteger os poderes da terra. Há portais espalhados pelo mundo todo nesse momento. Eles mudam de curso de cinco em cinco segundos para que vocês tenham chances de correr por lugares diferentes. Ao final, quando o guardião for morto, o portal vai os enviar para o acampamento em que ficamos. Os portais tendem a ir ao mesmo lugar mas em pontos diferentes para impedir que vocês se separem ou fujam. Não se esqueçam que o Minotauro, por ter origens humanas, é inteligente e pensa, e com o tempo foi aprimorando sua inteligência. Houve um barulho embaixo da terra e o local inteiro tremeu, todos nós entramos em pânico. Aron e Quíron sairão correndo em direção ao quarto portal que os levaram ao acampamento onde a gente fica e depois sumiu. Mais um estranho barulho surgiu por debaixo da terra, parecia um rugido ou coisa parecida, mas era completamente apavorante. Do nada uma mão gigante de couro rompeu a areia saindo da terra e todos nós começamos a correr desesperadamente em direção aos portais. Eu sou muito curioso, quis ver o monstro emergir da areia então fiquei parado na frente do portal do meio olhando. Metade do corpo do monstro já estava para fora e poucos segundos depois seu corpo inteiro. Tinha uns cinco metros de altura, todo de couro de animal e pelo, seu corpo tinha formato humano

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só que era coberto de pelo e couro cinza chumbo, sua cabeça era de touro, com dois enormes chifres. Ele terminou de levantar e só aí fui perceber o risco que corria. Passei correndo pelo portal que estava na frente e rezando para que o monstro fosse devagar e passasse pelo portal depois dos cinco segundos. Apareci em cima de um prédio em uma cidade dando tudo de mim no cavalo para que ele corresse bastante. Por uma fração de segundo fiquei aliviado até o braço do guardião aparecer atrás de um dos prédios do condomínio em que eu estava. Ele apareceu por inteiro destruindo todos os prédios que ele passava rapidamente com socos e cabeçadas atrás de mim e meu prédio era o próximo, estava chegando ao fim dele quando ele começou a desmoronar atrás de mim. Olhei para frente e dava direto para a rua, meu prédio era o ultimo do condomínio. Eu tinha duas opções de morrer: ou me atirando em uma queda de uns dez metros de altura ou sendo engolido por um monstro de cinco metros de altura e, é claro, que eu escolhi a primeira opção. Eu e meu cavalo pulamos em direção a morte, fechei os olhos para não ver o chão e comecei a ouvir barulho de trotes equinos. Abri os olhos novamente e meu cavalo e eu estávamos em uma floresta, olhei para trás e vi um portal. Graças aos deuses! Ia comaçar a me animar quando o Minotauro surgiu novamente atrás de mim e três cavalos ao meu lado, em cima deles estavam Pedro, Selina e Bruno. – Santa Atena – Selina murmurou observando o monstro que nos seguia – Ele está me seguindo, se não tivermos como matá-lo temos que atrasa-lo – eu disse. – Acho que posso atrasa-lo, mas não por muito tempo. – É perigoso chegar perto dele. – Eu não vou chegar perto dele. Mas não sei se tenho força o suficiente. – O que vai fazer? – Bruno perguntou – Fale que eu faço, eu acho que posso me aproximar e sou maior. – Vocês não entendem, tem que ser eu. O monstro estava cada vez mais perto de nós, mais uns três minutos até ele nos alcançar e seria nosso fim. Estávamos no meio das arvores, Pedro atirava flechas nele sempre que podia, mas as que acertava pareciam não fazer nem cócegas no monstro gingante. O gigante estava muito perto, ele esticou a mão para pegar um de nós mas os galhos de uma arvore o seguraram, as raízes de outra se enrolou em seus pés e outras tentaram imobilizar o tronco, mas o monstro lutava contra as arvores com muita força. Olhei para Selina, ela parecia se concentrar, mas estava fraca. Correndo a velocidade máxima dos cavalos demos de cara com um monte de arvores fechando o caminho, eu podia ver o portal do outro lado, mas não tinha como passar. Olhei para trás e vi o Minotauro se soltando das plantas, as plantas lutavam para prende-lo mas não o segurariam por muito tempo. Selina esticou a mão para frente e as arvores abriram caminho e depois o fecharam de novo. Passamos pelo portal e aparecemos em uma praia. Tinha poucas pessoas na beira do mar, o vento e a brisa do mar soando pelo local. – Um, dois, três, quatro e cinco. Estamos salvos! – Eu desabafei

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Desci do meu cavalo e os outros fizeram o mesmo. Fui até Selina. Ela estava pálida, fraca, tremula e não conseguia se equilibrar direito. Ela se apoiou em mim. – Caramba aquilo foi incrível! – Bruno disse – Eu ousei demais – ela disse – eu nunca tinha tentado fazer tantas coisas, controlar tantas de uma vez. – ela foi cair mas eu segurei. – Aquilo foi muito legal – Bruno disse sorrindo – Como você consegue...? Ele não terminou de falar porque ouvimos um rugido vindo a nossa frente. – Os portais tendem a sair no mesmo lugar só que em pontos diferentes – lembrou Pedro – ele vai sair aqui. Temos que ir. – Consegue ir? – perguntei a Selina Ela assentiu, montamos nos cavalos e antes que pudéssemos virar meia volta e ir o monstro apareceu na nossa frente. Os cavalos levantaram relinchando e só depois correram. Olhei em volta, algumas dunas, uns morros de areia, grandes placas de ferro enterradas no chão dizendo: mar bravo e centenas de banhistas. As pessoas pareceram nem se abalar. – Tive uma ideia, mas preciso da ajuda de vocês. – eu disse – Ele está perto, quando ele se aproximar mais vocês freiam os cavalos está bem? Eles assentiram, quando o monstro estava chegando perto nós freamos os cavalos e passamos por baixo das pernas dele. Corri em direção a um morro de areia. Não sei o que eles estavam fazendo, mas acho que Selina entendeu porque ela falou algo para Pedro e ele começou a disparar flechas no monstro chamando a atenção, ela e Bruno saíram cavalgando por baixo das pernas do monstro e deram um corte em cada um dos calcanhares do bicho fazendo ele se ajoelhar. Do alto do morro eu pulei em direção ao monstro, caí em seu ombro desferindo golpes em seu braço, ele tentou me pegar mas eu escorreguei pelo seu braço o cortando por todo o braço de onde começou a sair fumaça. Levei um tapa que me jogou para cima e quando estava caindo desejei que o vento me colocasse de pé e isso aconteceu. Assobiei para ele e ele se virou, ele tentou me acertar mas eu desviei para o lado, mas caí, o soco foi forte demais. Ele levantou a mão para me esmagar, fechei os olhos quando ouvi: – Ei bicho feio – Bruno gritou – Vem aqui se você tem coragem. O monstro se virou. Ele urrou e depois foi contra Bruno, não vi o que aconteceu pois estava muito ocupado recuperando os sentidos e levantando. Só ouvi Selina gritar e uma flecha passar por cima do ombro do Minotauro. Corri por baixo das pernas dele cravando a espada no ferimento feito pelos dois. Quando saí do outro lado vi Bruno atirado num canto, Pedro em cima do cavalo atirando flechas, mas Selina não estava lá. Olhei para o monstro e ele estava com ela em uma das mãos. – Solte ela! – eu gritei O monstro soltou um berro que eu pude jurar que foi um como quiser. Ele a soltou, Bruno saiu correndo, talvez na intenção de segurá-la, mas não chegou a tempo, ela caiu nas pedras. Não queria sequer olhar para aquele lado, ela quase

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morreu antes para nos salvar e agora eu tinha deixado ela morrer. Que grande amigo eu sou! Fiquei triste e com raiva. O sangue ferveu em minhas veias, hoje foi ela, amanhã era eu. Bruno correu até as pedras, Pedro ficou paralisado, não se mexia, não fazia nada. Era só eu, só eu e o Minotauro e eu iria vingar Selina. Transformei Alfa e desejei que os ventos ficassem a meu favor e eles ficaram, não entendi porque mas estava poderoso, me sentia capaz de derrotar um monstro de cinco metros mais que nunca na vida. Avancei para cima dele. Ele estava com expressão que eu acho que era de riso, ele tentou me pegar mas eu desviei e cortei seu braço, ele tentou me pegar de novo e eu pulei para cima da mão dele, subi até o ombro e cravei a espada. Ele veio com a outra mão para me apanhar mas eu cortei ela e cortei seu rosto perto do nariz. Fui aí que cometi o erro, ele se enfureceu e me jogou no chão novamente, ele veio me apunhalar com um poste e eu lembrei do que fiz com a bandeira naquele dia. Marte me disse que era só eu querer, olhei para uma grande placa de ferro, estiquei a mão e desejei que ela viesse. Em cheio, ela veio direto na cabeça do monstro me dando chances de levantar novamente e pegar Omega. – Você acha que é assim? – Bruno berrou – Você não vai mais levar nenhum amigo meu! Ele escalou as pernas do monstro ajoelhado até suas costas e fincou sua espada. O monstro urrou e começou a se balançar até derrubar Bruno de suas costas, ele arrancou a espada dele e jogou para trás, a espada passou zunindo no meu ouvido. Foi aqui que fiquei com mais raiva, uma pessoa morta é uma coisa, agora duas? Não, não podia deixar isso acontecer. Taquei Alfa na cabeça do Minotauro, ele se virou e veio para cima de mim. Estava esperando o momento certo, o momento certo para mata-lo, apertei minha espada com toda minha força, o guardião veio me atacar, e eu com toda a força correndo em seu encontro, cravei a espada em seu peito. A espada se enterrou toda. O Minotauro foi caindo para trás e a espada foi saindo de seu peito com um tipo de liquido preto nela. O bicho ainda tentou me pegar, eu não tinha mais forças, não tinha mais energia. Para me salvar uma flecha atravessou o braço dele, caí de joelho na areia e desmaiei.

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Oito

Conheço meu pai

EU ANDAVA acostumado com pesadelos ou visões ultimamente, então nada do que vi quando estava desmaiado me abalou muito. Apareci em um campo, estava de noite, a lua cheia brilhando no céu escuro com poucas estrelas, o vento frio passava como navalha pelas minhas costas. Estava em frente a uma floresta com poucas arvores e um homem escorado em um muro afiando a lamina da espada contra a parede. Sua imagem estava tremula e eu não o via com clareza por causa da escuridão. – Ah, Erick! Que bom que você veio! – a voz era conhecida, era a voz de Marte. – Marte! – eu me afastei, o que andei vendo sobre ele ultimamente era perturbador. – Eu... eu não sei como vim, na verdade você veio. – Cara, quem está com você é muito poderoso – ele dizia atropelando as palavras, ele parecia descontrolado, fiquei com medo de ele perder o controle como fez no Olimpo e me matar –, foi muito difícil para mim quebrar as barreiras para falar com você. – Ei, mas você é Ares, o deus da guerra, como pode ser difícil? – Quem está com você é mais poderoso até que eu, irmão. – Se você é Ares e é meu irmão, então quer dizer que eu sou filho... – Sim – a imagem dele desapareceu por uns dois segundos e depois reapareceu atrás de mim – Você é um semideus. Por isso está aí, por isso todos estão. Eu não tenho muito tempo, escute, tome cuidado com o traidor. – Você sabe quem é? Pode me dizer? – Eu não sei, essa barreira de poderes me impede de ver, mas mesmo que eu soubesse não poderia dizer, estou proibido de interferir em seu futuro irmão. Uma coisa, não confie na cria de Atena, ela pode querer me prejudicar através de você. Ele desapareceu como uma imagem holográfica, o comentário final dele me lembrou do dia terrível que eu passei. A morte de uma amiga, o ferimento de outros. Em quem eu poderia confiar agora? Marte, ou Ares, não poderia mais me ver, Selina havia morrido, Pedro... não sei, mas ele não parece um cara bom para dar conselhos. Quanto ao fato de eu ser semideus, acho que no fundo eu já sabia, quero dizer, isso explicava o que eu fiz com a bandeira, com a espada e com a placa de metal, explicava o fato de minha mãe dizer que meu pai nos abandonou, explicava o fato de Marte dizer que nosso pai cuidava do mundo e explicava o fato da minha

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família não me querer por perto, afinal eu devia ser um ima de monstros ambulante quando não estava sob a proteção de Marte. Fiquei por mais uns dois minutos escorado na arvore pensando em tudo, depois apareci no Olimpo novamente. O lugar magnífico era aconchegante, o vento passava levemente por mim, o ar da noite estava bom e o céu minado de estrelas com uma meia-lua no canto. Todos os deuses estavam reunidos cada um em seu trono, e haviam colocado uma cadeira de madeira preta e velha no canto da direita. Zeus, meu pai (pai de Ares na mitologia então é meu pai também. Como é deus do ar, explica como movi a bandeira, a espada e a placa de metal apenas com a mente), se levantou. Ele vestia a mesma túnica branca, uma coroa de louros na cabeça e um raio majestoso nas mãos. – Que comece a votação! – ele berrou. Eu senti raiva, muita raiva. Minha opinião sobre ele não havia mudado porque ele é um deus, para mim ele continua sendo um canalha, sem compromisso e cafajeste. Só que agora ele é um deus canalha, sem compromisso e cafajeste. – Todos sabem que estamos aqui para votar sobre a proposta de Atena. Ela sugere que, para evitar a profecia, os três grandes se desfaçam temporariamente de seus poderes. Vamos começar a votação, deve ser dito se vota contra ou a favor e porque. Aquilo me lembrou um paredão do big brother, vota em quem e porque. – Hades, o trouxemos aqui porque o assunto se trata principalmente de mim você e Poseidon. Diga seu voto. Hades se levantou. Usava roupas vermelho sangue, sandálias, uma coroa negra como a escuridão e um cinto de caveira. – Zeus, meu irmão, meu voto é contra. Acho que esta não é a melhor maneira de evitar uma guerra. Se a interpretação da profecia estiver errada e a guerra acontecer de outros meios, como poderemos nos defender dos ataques inimigos? O Olimpo ficou em silencio, todos pareciam pensar a respeito. A voz de Hades saiu tão suave e convincente que todos os deuses e deusas pensaram na ideia. – Poseidon – Zeus disse enfim –, vote – Concordo com o nosso irmão, creio que a profecia pode estar sendo interpretada errada. Os votos foram seguindo, alguns contra e outros a favor. Marte votou contra, acho que para contrariar Atena, porque ele parecia sem opinião sobre o assunto. Estava empatado quando chegou na vez de meu pai. Ele franziu as sobrancelhas, mordeu o lábio e pensou por alguns instantes, ele encarou o mundo lá fora como se o imaginasse sendo um cenário de guerra. – Eu voto a favor da proposta. – ele disse enfim, houve revoltas, alguns deuses quiseram se levantar mas ele bateu com o raio no chão e todos ficaram quietos – A profecia é muito perigosa, estamos falando de uma segunda titanomaquia, lamento que a prevenção seja por medidas drásticas, mas é uma situação de emergência. – Como vamos nos desfazer dos poderes? – indagou Poseidon – Não podemos joga-los fora.

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– Pensei em uma forma – Atena disse – de aprisionar os poderes, em uma forma simples e deixa-los no mundo mortal, em algum lugar que eles não os encontrem. – Se deixarmos no mundo mortal eles vão ser roubados. – Esconda eles em algum lugar mágico ou os proteja de algum modo. Coloque um guardião, um monstro que nenhum mortal seja capaz de derrotar. – É, de fato, – meu pai disse – uma boa ideia, esconder em ilhas mágicas e colocar guardiões para ninguém jamais possa pegá-lo. Vamos aprisionar nossos poderes em pedras e guarda-los bem, onde ninguém possa pegá-los. O juramento. – Repitam – Atena disse – Eu juro pelo rio Estige – os três falaram juntos (o rio Estige é poderoso, se você faz um juramento em nome dele, não pode quebra-lo) – Aprisionar meus poderes – Atena dizia e eles repetiam – em formas simples, juro que só o resgatarei depois de 100 anos, juro que nunca ousarei pegar os poderes de meus irmãos. Um relâmpago rugiu nos céus. Uma luz começou a sair dos três irmãos, uma luz azul de Poseidon, uma luz vermelha de Hades e uma luz azul céu de Zeus. Em frente aos deuses os quatro cristais flutuavam, idênticos aos que vi no dia que cheguei ao estranho acampamento. – A partir de agora – Zeus anunciou – os poderes estarão escondidos e aprisionados, a profecia deve ser evitada por estes cem anos. Houve uns sorrisos, uns protestos, mas Zeus bateu seu raio mais uma vez no chão, pediu silencio e dispensou os outros deuses. Acordei com dor de cabeça na ala hospitalar do acampamento que andava ficando nos últimos dias. Bruno estava ao meu lado me olhando firme com os olhos cinzas chumbo. Quando acordei me peguei gemendo comida. – Aí, Erick! – ele bufou como se fosse um alivio me ver acordado – Cara, eu achei que você não fosse mais acordar. – Por quanto tempo eu...? – A dois dias. Você estava meio que vegetativo, comia pouco, mas não acordava nem nada do tipo. – E o Minotauro? Ele morreu? E o cristal? – Ele está morto, o cristal estava em um de seus... cascos de touro. Você o matou! – ele me deu alguma coisa enrolada em um pano, desenrolei e era a ponta do chifre do monstro – A ponta do chifre, difícil de cortar. Deve ficar com você, você lutou muito bem naquele dia. – Bem, eu o acertei no peito. – No coração Erick. O coração é o lugar mais difícil de se acertar em uma luta, ele está sempre protegido. Depois que você apagou, ele se dissolveu em fumaça. – E... – eu titubeei, era difícil para mim falar em morte – E Selina, ela...?

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– Com o tempo temos que aprender a superar a perda de alguns amigos. – ele disse colocando a mão em meu ombro. Eu estava confuso, triste, culpado, mas não sabia direito o que fazer. – Mas felizmente não perdemos alguns amigos. Ele puxou a cortina que dividia a minha cama a da do lado e lá estava Selina com o braço enfaixado, camiseta vermelha, calças jeans, cabelos presos em uma trança, sentada, olhando os remédios. – Não vou te dar esse gostinho tão cedo, cabeça de vento! – ela disse sorrindo. – Mas como você...? Ah, você... você está viva! – Pois é, eu meio que nasci de novo a dois dias. Caí nas pedras que estavam cobertas de areia, talvez por isso não tenha morrido. Mas eu é que não vou reclamar! – Puxa eu achei que você tinha morrido. – Eu vou chamar o Aron e dizer para ele que você acordou – Bruno disse – Selina, da o remédio para ele. Ela assentiu, pegou um vidro escrito: revigorante Medeia, anima até morto-vivo! – Eu já disse que odeio esses negócios da Medeia? Ei, eu não preciso tomar isso, preciso? – Na verdade sim, mas não parece bom. – ela serviu um copo da água e me deu o comprimido verde que cheirava a hortelã com melancia podre – É melhor você beber. Relutantemente eu bebi, o gosto era de mais ou menos de melancia podre. Aquilo desceu queimando na minha garganta, quis vomitar mas não consegui. – Tem gosto de que? – Selina perguntou com uma careta – Melancia podre – Já comeu melancia podre? – Não, mas é esse o gosto. Selina olhou para o chifre do Minotauro em cima da minha cama, pegou ele na mão com cuidado e depois o largou de novo em cima da cama. – Fiquei sabendo que você matou o monstro. – É, mais ou menos. – Solte ela, quando eu estava a 4 metros do chão foi o máximo que você pôde pensar? – Ah, você poderia ter dito obrigado por me salvar. – E então – ela olhou em volta para ter certeza de que estávamos sozinhos – você sonhou mais alguma coisa? Quero dizer, deve ter sido bastante, afinal dois dias dormindo. Fiquei meio com medo. O traidor não havia se revelado e eu sequer tinha algum palpite sobre ele. Não confie na cria de Atena, Marte dissera, mas Selina era minha única amiga naquele lugar, se alguém ali pudesse escapar ou liberar todo o mundo, esse alguém era ela. Quando ia começar a contar Aron entrou na sala com

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cara de preocupação. Os cabelos pretos emaranhados e a barbicha para o lado, os olhos escuros estavam apreensivos e ele olhava para mim fixamente. – Garoto, achei que você não ia mais acordar. Que bom que está vivo, vamos jantar. A comida está servida, adolescentes chatos! Saímos e fomos para o templo meio-destruído. A comida estava boa, eu não estava com muita fome e ainda pensava em meus sonhos. Se aquilo realmente fosse real, talvez os cristais não fossem apenas poderes dos elementos, talvez possa ser os poderes dos deuses. E Marte, o jeito como ele agiu no Olimpo, parecia sanguinário e violento, talvez aquele fosse o jeito normal dele e ele fingia para mim. E ainda tinha o traidor, eu não o vi nestes dias que passei desmaiado, mas creio que ele continue agindo e eu precisava desmascará-lo rápido antes que fosse tarde demais e eu estivesse morto. Pensei em Selina, como ela podia ter sobrevivido? Talvez ela fosse a traidora, talvez ela tenha usado o elmo da escuridão para escapar, ou pelo fato de ser filha de Hades ela não morresse. Mas Hades é o deus dos mortos, não explica o fato de ela controlar as arvores. Pedro, arqueiro, não estava na hora da bandeira, eu contei a ele sobre os sonhos, parecia o mais apavorado de todos, talvez fosse esta a jogada dele, parecer o bobo, o por fora, tentou incriminar Selina... Era dia nosso de lavar a louça, mas Aron dispensou a mim e a Selina porque ela estava com o braço quebrado e eu estava com tonturas e estava realmente fraco, então Pedro e os azuis foram lavar a louça e nós e os outros fomos dispensados para fazermos o que quiséssemos. Era umas nove horas da noite, a noite estava refrescante, a lua crescente no centro do céu, as estrelas brilhando intensamente na escuridão da floresta. Selina estava ao meu lado, estávamos indo para a cabana, não havíamos conversado durante o jantar, apenas ficamos conversando com Pedro e Bruno que ficaram falando de que Aron tropeçou no próprio casco enquanto nós estávamos desmaiados. Chegamos na cabana, estava mais frio lá dentro. Eu sentei no beliche, a parte de baixo do de Pedro onde eu andava dormindo nos últimos dias. Ficamos em silencio, Selina olhava inquietamente para sua miniatura de coruja como se tentasse decifrar algum código no objeto. – Presente de Atena? – eu perguntei quebrando o silencio – A coruja, é presente de Atena? Ela me fitou como se eu fosse mais um enigma que ela quisesse desvendar mas não conseguisse, depois assentiu devagar e voltou a olhar para a coruja. – Presente de Ares? O escudo. Aquilo soou mais como um afirmação, como se ela soubesse a muito tempo. Ela parecia estar mudada, diferente, fisicamente não, mas alguma coisa a incomodava profundamente. – O que foi? – eu perguntei – No que está pensando? – Eu... eu não entendo, não entendo o que estou fazendo aqui. – Você é filha de Atena... – Filha não! Atena não tem filhos, ela caracterizada por ter se comprometido a nunca se casar.

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– Ta e essa marca em seu braço? – Ela fez comigo o que Ares fez com você. Eu sou inteligente sim, mas não entendo porque me querem aqui, eles tem os planos, eu não tenho função específica aqui, e minhas visões foram bloqueadas. – Você quer dizer que você não sonha mais? Ela fez que não com a cabeça. Ela me disse isso em um tom confiante, mas me pareceu que não era só isso que a incomodava, havia mais alguma coisa. – Estão com a sua mãe? – perguntei um pouco sem graça, quer dizer, eu não gosto muito de falar em família. – Não, minha mãe... estão com meu pai, ele está preso e eu.... eu não sei se vou conseguir salvá-lo. Há alguns anos antes quando... – ela se interrompeu como se aquilo fosse uma má lembrança – Você continua sonhando? Assenti, contei os meus últimos sonhos tirando a visita de Ma... de Ares. Ela me olhava apreensivamente enquanto eu contava sobre a proposta de Atena. Ela disse para eu pular os detalhes do Olimpo, talvez ela já soubesse? Talvez ela já tivesse sonhado com isso, não sei. Terminei de contar, ela pensou um pouco, como se pensasse se falava alguma coisa ou não. – Você sabe, não é? - ela perguntou – Sim, por isso estou aqui. – Você é raro, na verdade nós dois somos. – Por que? – Bem, é difícil de se achar algum mestiço que tenha a benção de um deus, nós dois temos. E ainda, você é filho de Zeus, por isso está aqui... – ela arregalou os olhos e abriu a boca – Oh céus! Como pude ser tão burra! – O que foi? Ela se levantou e começou a andar na cabana de um lado para o outro. Falava algumas coisas em grego que entendi como: como não percebi isso antes? ou o pacto de edifício. – O que é o pacto de edifício? – Sacrifício, pacto de sacrifício. O que me contou, o pacto que fizeram sobre os poderes. – Eu ainda não entendi – Os deuses não podem pegar os poderes uns dos outros, é um juramento antigo para prevenir rebeliões entre eles... – E Hades quer estes poderes... - continuei – Mas não consegue pegar – Então ele raptou treinadores e semideuses para enfrentar os guardiões e pegar os poderes - comecei a entender – Porque se a gente pegar os cristais eles vão passar a ser nossos... – E de nós ele pode roubar os cristais! – Mas ele teme a gente de algum modo. - ela franziu a sobrancelha – Ele teme que a gente consiga fugir, que a gente avise ao Olimpo sobre a rebelião.

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– Se Hades conseguir os poderes dos quatro elementos... – Ele será invencível e dominará o Olimpo. - conclui – Se ele destruir o Olimpo, os deuses cairão. O Olimpo é a fonte de poderes dos deuses. – Agora tudo se encaixou! – Mas o traidor ainda me intriga, eu tenho meus palpites, pelo que vi ultimamente. - ela disse – O que você viu? – Venha, tem uma arvore que viu algumas coisas aqui, não sei a quanto tempo atrás, mas está ligado ao traidor. Nós saímos e fomos até perto de uma arvore que dava para o campo de batalha. Era apenas nós ali, não havia mais ninguém fora da cabana, estava um tanto escuro tirando a iluminação da fogueira que ficava no meio do acampamento. Selina respirou fundo, segurou minha mão e encostou na arvore. Apareci em um tipo de acampamento de verão acho. Muitas crianças brincando de pega-pega, esconde-esconde, jogando basquete, futebol, vôlei. Ninguém parecia me notar, eu falava mas ninguém escutava. Caminhei até perto de dois meninos que lutavam com espadinhas de madeira, lembrei de mim e de meu primo brincando no sitio, mas eles pareciam profissionais. Estavam com elmos então eu não podia ver seus rostos. Um dos garotos desarmou o outro. – Ei irmão, você piorou um pouco nos últimos dias – o que desarmou o outro disse, sua voz saiu equalizada embora fosse uma criança, como se tivessem tentado esconder as lembranças. – Acho que você que melhorou. – a voz do outro era clara, de uma criança de uns treze anos por aí A visão ficou turva. Não conseguia ver claramente como se uma nevoa me impedisse de enxergar. A imagem começou a se afastar mas voltou de novo mais claramente. Tive a impressão que o tempo passou na visão, o mesmo garoto estava lá, mas mais velho um pouco. Eu não pude ouvir com clareza o que dizia, mas era algo como: você só pode estar brincando. A imagem avançou novamente. O lugar estava em chamas, cabanas sendo destruídas por ogros, ciclopes perseguindo jovens em armaduras gregas, um lindo templo sendo esmagado por touros de bronze gigantes. Os jovens tentavam lutar, gritavam desesperadamente mas continuavam se machucando, o menino que vi de cabelos pretos estava em uma luta contra outro garoto, o mesmo de antes, mas desta vez parecia ser real. As espadas eram reais, de titânio primordial, e eles tentavam se atingir em locais mortais como pescoço, barriga, no coração e tal. A imagem começou a escurecer novamente, a se dissolver, mas voltou de novo com mais força. Os garotos brigavam para valer, estavam quase se matando de verdade. – Como você pode ter nos traído deste jeito? – berrou o garoto de olhos verdes

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– Você não entende? Você se contenta com migalhas! Você se contenta com eles te maltratando e te humilhando! Como você pode aguentar isso? - retrucou o outro que estava com elmo e de costas. A voz do segundo garoto ainda era equalizada. A visão começou a ficar mais fraca bem na hora que o traidor ia tirar o elmo. Senti que a visão estava tentando voltar, mas se dissolveu e eu voltei ao mundo real. Selina soltou da arvore e ficou completamente mole. Eu continuava tonto, mas não havia ficado tão mal quanto ela por ter essa visão, ela caiu por cima de mim e consegui me manter de pé e segurá-la. – As lembranças... – ela resmungou tentando levantar a cabeça, mas não conseguiu – Elas foram apagadas, tentaram apaga-las, é difícil quebrar as barreiras, é difícil forçar as arvores a me mostrarem. Quem bloqueou as lembranças é muito poderoso e muito forte. Ela se equilibrou em mim e fomos novamente para a cabana. Uma coisa eu consegui saber: o traidor esteve aqui antes, aqui era um acampamento feliz, mas o traidor o devastou e o destruiu. E, de alguma maneira, ele sabia que tentaríamos descobrir.

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Nove

Tenho uma visão

comprometedora

Dias se passaram, eu ainda me recuperava e ficamos treinando enquanto, não

tinha nada para fazer a não ser dar 5 voltas no acampamento todos os dias, 2 vezes ao dia, treinar a defesa, o ataque, a mira, tudo isso com Aron e Quíron nos guiando. Imaginei como tudo estaria agora se o demônio Junior não tivesse estragado tudo. O campo devia continuar lindo como estava na visão antes do ataque dos monstros, as cabanas deviam estar construídas e com muitos semideuses felizes passando as férias de verão. Os campos deviam estar intactos com cheiro das arvores e da plantação de uvas, hortelãs, e abacaxis que ainda haviam resquícios que eu identifiquei agora. Eu não tive a oportunidade de explorar mais os local porque Aron deixou as regras claras, seus limites são os bosques, temos guardas por todo o perímetro! Não sabia quais eram os guardas mas também não quis arriscar. O Aron era chato, não deixava a gente fazer muito coisa, não deixava visitar os rios ou os campos do local, não deixava a gente se misturar muito com as outras equipes, no fundo eu acho que ele e Quíron fazem meio que uma competição, quero dizer, minha turma é melhor que a sua. Mas por mais que o sátiro fosse chato eu gostava dele, ele cuidava da gente as vezes, vinha ver como eu estava enquanto fiquei doente. Para falar a verdade ele estava sendo o mais perto de um pai que eu já tive. Pelas minhas contas fazia uma semana que eu estava preso. Uma semana sem minha mãe. Pensei nela, será que ela estava bem? Será que estava morta? Não, disse a mim mesmo, pense positivo, você vai sair vivo dessa. Pensei em minha avó e meu primo, o que será que eles estavam pensando? Quero dizer, a uma semana atrás eu e minha mãe devíamos ter chegado lá e agora desaparecemos. Havia alguma coisa perto da casa da minha avó, minha mãe me mandou ir para lá quando fomos atacados pelo Cérbero. Agora fazia sentido minha avó me dar livros sobre mitologia de presente, ela estava me preparando. Mas se só eu e David ganhávamos livros, quer dizer que ele também... de qual deus será que ele é filho? Será que ele já sabe? Será que ele já veio para cá? Minha avó sempre disse que éramos especiais, mas eu não pensava que fosse deste jeito.

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Comecei a pensar quem protegia ele, Mar... Ares me protegia, era meu irmão (e as historias dele geralmente não são muito boas), mas quem protegia David? Qual dos meus tios é o parente verdadeiro? Já que ele é um semideus um dos pais dele tem que ser... “falso”. Mas por mais que David fosse meu amigo, ele sempre foi meio bobo. Um garoto gordinho, um ano mais velho que eu, cabelos loiros meio ruivos, muitas acnes no rosto, altura media. Ele não parecia o tipo de gente que você vê com armas em punho e desafiando monstros. Ele é bem medroso para falar a verdade, tem medo de tudo. Quanto a Ares, bem os mitos o retratam diferente de como ele apareceu para mim, bem diferente. Nos mitos o Ares é um deus sanguinário, impaciente, egocêntrico, estressado e raivoso, por isso ele sempre perde para Atena (que também é uma deusa da guerra, mas ela é da guerra estratégica e Ares é da devastação sanguinária, para resumir), mas o que me assustou foi que Ares me pareceu exatamente assim no Olimpo quando perdeu o controle e quis brigar com Atena.

*** Nesses últimos dias eu andava livre dos pesadelos, mas não sei se isso era bom ou ruim, afinal eu não via mais o traidor e não tinha mais pistas. Desejei ver Marte antes de dormir, talvez se eu falasse a ele que o culpado fosse Hades e ele e os outros deuses conseguissem detê-lo e salvar a mim, minha mãe e meus amigos. Mas quando dormi apareci em lugar diferente, uma caverna. Estava completamente escuro, eu não enxergava nada além do fogo, das tochas e dos olhos de quem eu via. Do nada, umas 10 tochas se ascenderam a minha volta e vi uma cena que... bem, me atormentou um pouco e me deixou com vergonha até mesmo sendo visão: estava eu, Pedro, David e Selina na caverna, mas o constrangedor é que... bem, eu e ela estávamos de mãos dadas, mas aposto que deve ter tido um bom motivo, como... sei lá, um bom motivo! Bom continuando, um enorme monstro apareceu as nossas costas e depois abriu seus olhos extremamente laranjas. Eu me vendo, me viro rapidamente, empurro eles para trás e transformo Alfa rapidamente, bem a tempo de me defender de uma rajada de fogo. Logo depois os outros chegam, Bruno e os verdes, os amarelos e o resto dos azuis (um dos azuis era David que já estava conosco). Todos eles são cercados de fogo e, quando estou prestes a ver eles morrerem o cenário muda e apareço no mundo inferior. O submundo não mudou nada desde a minha ultima visão. Hades e seu filho conversavam, como sempre em meus sonhos. – Pai – disse o traidor – o garoto não desconfia de mim. Se desconfiava antes, agora tenho certeza que conquistei a confiança dele. – Quanto a seus outros amigos? O traidor ajeita o capuz negro em sua cabeça, depois estrala os dedos e tenho que certeza que se pudesse ver seu rosto ele estaria sádico e sorrindo com maldade.

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– Eles estão me ajudando sem saber, estão confundindo o príncipe. Ele deve morrer amanhã, quando sairmos a procura do cristal da água.

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Dez

Quase sou

esfaqueado

FUI ATÉ O campo principal. Meus amigos e todos os outros estavam lá pegando as armas. Não falaram nada, mas eu sabia que era o cristal da água que iríamos atrás, porque a alguns dias atrás eu ouvi o traidor dizer, em sonho, que contava com a ajuda de Poseidon para me matar, e ontem ele disse que hoje era minha morte. Então tudo se encaixou. Aron nos advertiu de que não seria bom colocar as armaduras agora, talvez nós fossemos cair na água, e a armadura pesaria muito e talvez pudéssemos nos afogar. Principalmente eu que sempre me afogo, e só agora sabia o motivo. Poseidon comentou sobre uma profecia no Olimpo. Comentou algo sobre um príncipe mestiço, um filho de Zeus, e o traidor disse isso ontem, me chamou de príncipe. Na profecia citada por Poseidon, o príncipe mestiço o destronaria, então ele queria me matar. – Eu odeio água – Selina murmurou. É verdade, Poseidon também não gosta de Atena, ele deve ter perseguido ela também. – Eu também não – murmurei de volta Ela sorriu, não sei porque, mas ela sorriu. Aron estava de mal humor (como sempre) e não explicou nada, apenas mandou nós passarmos por um portal. Na verdade ele nos empurrou porque empacamos na frente do portal olhando a cena. Era um oceano, nada alem de água cercava um pequeno barco. O mar estava agitado e chovia muito, raios fracos e trovoes extremamente barulhentos dava para ouvir apenas de ficar na frente do portal. Aron me deu um chute (o que foi estranho já que ele tem cascos) e eu caí para dentro do barco. O barco estava imundo. Garrafas quebradas, barris de rum espalhados pelo meio do navio, os mastros estavam apoiados a duas caixas de ferro para não caírem. O volante do navio estava metade comido por cupins, o convés estava cheio de musgos e algas marinhas. O cheiro mar encobria um pouco o cheiro de peixe podre, mas o barco parecia que havia sido retirado de baixo da água a pouco tempo e alguém tentasse remenda-lo. Corri para dentro da parte de baixo do barco. Lá conseguia ser pior, imundo, pratos com comidas podres cheio de mosquitos e moscas, teias de aranha enormes nas entradas das portas, mesas comidas de cupins, peixes pequenos e mortos no

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chão. Havia uns quartos com beliches espalhados lá em baixo, a maioria das pessoas foram se deitar, afinal tínhamos acabado de levantar. Não quis arriscar dormir em um navio. Desde que pisei no barco comecei a me sentir mal, estava sob o domínio de um inimigo, não queria arriscar dormir e ficar indefeso. Selina pareceu querer a mesma coisa, ela se recusou a dormir embora ficasse bocejando o tempo todo. Aron ficou na chuva conduzindo o barco, outros mestiços que não quiseram dormir (acho que um ou dois no máximo) foram ficar no beliche, estavam cansados. Na verdade eles andavam meio que com medo da gente, não se misturavam muito, ficavam sempre afastados. Selina sentou á mesa, antes ela olhou para ver se não havia nenhuma aranha na mesa ou na cadeira. Ela disse que ela tinha fobia de aranhas desde pequena. Eu comecei a analisar as coisas que ficavam em cima das prateleiras com lampiões. Haviam alguns pergaminhos que estavam tão velhos que não deu para ler, outros estavam molhados, havia também uma caixa molhada, eu abri e tinha umas cartas. Um baralho antigo mas seco. – Sabe jogar pife? – perguntei a Selina – Sim, por que? – ela respondeu enquanto bocejava – Eu achei cartas, um baralho. Eu peguei as cartas e sentei á mesa. Começamos a jogar pife e conversar. Estava frio, estávamos de armaduras e espadas embainhadas, de frente um pro outro e bocejando de cinco em cinco minutos jogávamos sem prestar muita atenção. – O que você quer ser quando crescer? – perguntei para puxar assunto – Eu? Viva – ela disse e sorriu, sorri também. A possibilidade de ficar viva até crescer e cursar uma faculdade não parecia possível – Eu também, mas se você conseguir sobreviver, que profissão quer seguir? – Ah, sei lá. Quero trabalhar em alguma coisa que eu entenda, bióloga talvez. Não marinha, claro. – É, interessante, assim você poderia ficar perto das arvores e plantas. – E você? – Ah... acho que quero ser... na verdade eu não sei. Primeiro tenho que pensar em sair daqui... acho que talvez vamos ser liberados daqui a alguns dias, eu sonhei... – Bati! Ah, desculpa, continue. Contei o sonho para ela enquanto dava as cartas. Enquanto contava, confesso que fiquei com ciúmes, Atena foi até um acampamento e pediu ajuda a um filho de um de seus maiores inimigos para resgatar a gente (claro que a preocupação dela não era eu, era Selina) e Ares sequer comunicou um filho dele para me ajudar. – Temos que nos manter o máximo de tempo no acampamento porque... – Bati! – ... se nós sairmos de lá, Dean e os outros não vão nos achar. – Espera, conhece ele?

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– É, bem... mais ou menos. É que antes de eu vir para cá, eu e minha irmã conhecemos algumas pessoas, mas isso foi a muito tempo, antes de Atena, antes de tudo. O barco quase virou, nós dois caímos com as cadeiras um por cima do outro enquanto o barco tombava e eu senti que havíamos chegado ao nosso destino. Mas estava errado porque Aron gritou lá de fora: – Sem pânico, foi só um... iceberg. – Só porque eu estava quase batendo – resmunguei – Mas eu estava com o seu nove de ouro – Mas eu tinha comprado o nove de paus. Ah, eu não quero mais jogar. O que aconteceu com você e sua irmã afinal? – Bem, – levantamos as cadeiras e sentamos de novo um de frente para o outro – o meu pai era mortal... – Você e sua irmã são mestiças? – Claro que não! Ela e mortal, olho de vidro, mas mortal. – Olho de que? – Olho de vidro Erick, são as pessoas que podem ver alem do que vemos. São mortais que enxergam mais que mestiços, eles enxergam a verdadeira forma de qualquer um, sendo deus, monstro disfarçado pela visão mortal, qualquer um. – E sua irmã é assim. É raro achar pessoas assim? – Não sei, talvez, no inicio que nos perseguiam por causa dela até Atena me escolher. – ela sussurrou a parte de Atena, ainda era um segredo, só eu e outras poucas pessoas sabiam disso – Nosso pai e minha madrasta, mãe da Clara, morreram em um acidente de carro e... os parentes da minha madrasta eles... ficaram com clara, mas não quiseram ficar comigo. – ela tentou disfarçar a tristeza no rosto, mas não conseguiu. Eu conseguia entende-la, sabia como era duro você ser rejeitado pela própria família. – Então eu tive que fugir, achar um lugar para mim, e conheci alguns mestiços no caminho, Dean foi um deles. – Nossa, que... que tristeza, meus pêsames. – Ah, tudo bem, já faz quatro anos. E você, como era sua vida antes de vir pra cá? Contei sobre minha vida, contei sobre a proteção de Marte e sobre meu primo. Descrevi ele a ela e perguntei se ela tinha algum palpite de quem ele poderia ser filho. – Talvez se eu o visse pessoalmente – ela respondeu ainda triste, acho que lembrar do passado era ruim para ela – A aparência indica um pouco Apolo, mas não acho que seja. Pedro entrou na sala que estávamos e olhou para as cartas no chão, ele parecia confuso e perdido. Usava a camiseta vermelha da equipe e armadura por cima, mas parecia diferente. – Vocês não estão com sono? – Não – respondi e bocejei – Ah, é que eu não quero dormir. Eu to falando alto demais?

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– Não, é que eu... estou me sentindo estranho. – Pedro – Selina disse calmamente – deixa eu ver seu braço. – O que? Por que? – Só deixe-me ver. Ele ia esticar o braço, mas parou instantaneamente. Seus olhos se amarelaram completamente e ele puxou sua faca e veio devagar na direção minha e de Selina. Nós dois levantamos correndo e fomos nos afastando conforme ele vinha. – Pedro – eu gaguejei – cara, nós somos amigos lembra. Selina levou a mão no bolso e pegou a coruja, mas Pedro com uma velocidade incrível tomou a coruja dela e jogou minha espada longe, ele queimou a mão a tocar na Omega mas não pareceu ligar para o ferimento. Continuamos recuando até encostar na parede. Ele levantou a vaca de caça de trinta centímetros. Selina segurou minha mão. Em circunstancias diferentes eu teria ficado envergonhado, mas segurou na minha mão como se pedisse ajuda. Eu queria ajudar, mas não sabia o que fazer. Pensei gritar, mas Pedro me olhava com os olhos extremamente amarelos que diziam: se gritar eu mato os dois. Ele baixou a faca rapidamente, mas conseguimos pular para o lado. Achei que ele fosse nos perseguir ou nos esfaquear enquanto levantávamos, mas o que ele fez realmente me surpreendeu. Ele estava completamente em transe escrevendo com a faca em uma prateleira de madeira. Eu e Selina nos entreolhamos. Eu peguei minha espada e ela resgatou a coruja. Paramos ao lado da porta olhando ele escrever. Apenas seu braço se mexia, o resto do corpo estava imóvel, completamente imóvel. De repente Pedro largou a faca no chão e caiu no chão. Fui correndo ver o que havia acontecido com ele, ele já havia acordado, como... como se alguma coisa o tivesse possuído e o largado naquele instante. – Cara, – ele disse – que dor de cabeça! Por que você está tão pálido? – E-Erick – Selina gaguejou – Olhe isso. Me aproximei da mesa, havia muitas palavras, palavras em grego antigo que começaram a se transformar em palavras em português. – As quatro relíquias juntas estarão, caso contrario dez dos treze cairão. Os quatro únicos juntos os poderes devem resgatar e no prazo da morte as relíquias tende aos donos se juntar. – repeti – Isso é...? – Sim – Selina respondeu tremula –, isso é uma profecia.

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Onze

Vejo um amigo

morrer

EU ESTAVA ASSUSTADO. Ultimamente eu andava vendo coisas bem estranhas, mas ver um amigo ser possuído e escrever em uma profecia em uma prateleira de madeira semipodre era novo para mim. Enfaixamos a mão queimada de Pedro, depois que ele “voltou ao normal” ele sentiu o ferimento que Omega causara. – O que eu... – ele franziu a testa – O que eu fiz? – Você escreveu na mesa. – eu disse inutilmente – Você escreveu uma profecia na mesa. Você se lembra de alguma coisa? Porque parecia que não era você. – Eu lembro que... eu lembro de ver vocês dois de mãos dadas com medo – ele disse meio sem graça – Você veio nos esfaquear, estava com medo, queria ajuda – Selina se adiantou dizendo rapidamente. Provavelmente eu estava corado, mas diante da situação acho que tínhamos problemas maiores. – É, você ia nos matar – eu concordei – Ok – Pedro disse –, mas por que eu ia esfaquear vocês? – Não sei – eu disse –, você meio que se possuiu ou coisa do tipo. Pegou uma faca para nós. – Pedro – Selina disse – você foi possuído por um espírito do oráculo. Isso acontece as vezes com os... com os filhos de Apolo. – É, eu... – ele olhou para o chão – eu acho que já sabia. Mas porque esse espírito me possuiu? – Apolo é o deus das profecias, certo? – eu disse – Deve ser por isso. – Mas para isso ter acontecido ele tem que já ter sido assumido, – Selina disse – para que os poderes dele tenham sido liberados, para que ele possa ter sido usado pelo oráculo. – O oráculo? – Pedro perguntou – Oráculo não é aquele negocio que os caras consultavam para saber o futuro?

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– Mais ou menos, geralmente o espírito habitava o corpo de uma jovem moça, mas ele deve estar solto, ele foi enviado para nos dar o recado, ele veio nos dar a profecia através de você. – As quatro relíquias – eu disse – são os cristais não são? – Eu acho que sim – Selina respondeu –, mas os quatro únicos, você deve saber que um deles é o traidor não é? – Sei. E o prazo da morte? Aron invadiu a sala, Selina sentou na prateleira discretamente em cima da profecia para esconde-la. Eu tentei agir normalmente, mas não sou muito bom ator. – Estamos chegando – ele disse friamente e só aí fui notar um corte perto do olho, ou o corte não estava lá ontem – Preparem-se, vai ser difícil, principalmente para vocês dois – ele apontou para mim e para Selina. Ajeitamos as armaduras de bronze. Braceletes pesados, couraças um tanto ilustradas com desenhos de espadas, botas de couro com um espaço para guardar uma faca e sua sola tinha um tipo de dentes para caminhar na lama (imaginei se alguém pisasse no meu pé com aquilo, não seria nem um pouco bom), o cinto com a bainha de couro para carregar a espada e o elmo com a viseira em forma T (os olhos, nariz e boca). Nosso elmo tinha uma pena vermelha no topo, para identificar quem é de nossa equipe se estivéssemos vendo de cima. Transformei Alfa. Pensei se ele seria útil contra serpentes, mas aí lembrei do arranhão que ele levou do Cérbero e em seguida se recuperou, talvez ele fosse indestrutível, rezei para que fosse. Pensei no que aconteceria se ele caísse na água em uma luta, ele voltou no dia que fui capturado, ou não retiraram ele de mim, então não tinha certeza se ele voltaria magicamente para mim ou se perderia nas profundezas do oceano. Reparei no meu escudo com mais atenção, e havia um desenho alem do Alfa grande e circulado no centro. Era uma imagem pequena nas linhas da ponta. O desenho retratava um menino, um menino enfiando uma espada no peito de um monstro, o Minotauro. As imagens de suas aventuras ficarão gravadas nele, Marte disse uma vez e era real, literalmente, as imagens iam se formando conforme eu ia passando pelas coisas. Imaginei quantas imagens ficariam gravadas no escudo, quantas aventuras eu ia conseguir sobreviver. – Aí, – Pedro disse se aproximando de mim. Ele estava com a armadura completa exceto pelo elmo que carregava nas mãos. – aquela coisa de... ser assumido, você sabe exatamente o que aquilo quer dizer? – Não – admiti –, não exatamente, acho que pode ser uma marca, alguma marca tipo sol, arco e flecha. Recebeu alguma coisa assim? – É, mais ou menos – ele esticou o braço e havia uma marca no pulso. Um arco e flecha e um rato desenhados em preto levemente – Recebi isso ontem a noite. Antes de dormir, uma imagem apareceu para mim. Um homem, disse que estava não hora, que... – ele se interrompeu, pareceu triste. Não quis força-lo, seu pai havia falado com ele apenas ontem a noite. Ele passou quatorze anos sem se manifestar e de repente aparece em uma visão não

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falando muita coisa. Apenas assenti relutante, coloquei o elmo e saí para o convés do navio sujo. Não havíamos passado muito tempo no navio, uma hora, duas talvez, mas o sol estava se pondo. Não sabia em que lugar eu estava, mas devia ser em algum lugar que devia ser umas seis horas da tarde. O vento estava ainda mais frio e agressivo jogando gotículas de água em meus braços desprotegidos, a água passava como navalha em minha pele. Comecei a olhar para o mar, ondas violentas pareciam ter piorado por causa da tempestade, ondas de três metros de altura levantavam a nossa frente. Em uma das ondas pude ver um rosto, o rosto de um homem. – Você é meu, garoto – uma voz profunda e grave disse – Você ousa entrar em meus domínios e ainda quer sair vivo? – depois dessa frase percebi que era só eu que estava ouvindo. A “pessoa” gargalhou maleficamente – Você está abusando da sorte, mestiço! A onda quebrou e o rosto se desfez. Empalideci. Poseidon estava presente, e mais do que nunca queria minha morte. Um rugido muito forte surgiu de baixo d’água, tão forte que fez o barco tremer. Me aproximei da ponta do convés e vi uma sombra preta gigante passando por baixo do navio. Umas dez pessoas se aproximaram da ponta do navio para olhar, quando viram a sombra se afastaram rapidamente. – Fiquem longe das bordas! – Aron gritou – Não cheguem na beira do barco! Corri para o meio do navio, mas era tarde demais. Alguma coisa bateu com tanta força por baixo na parte esquerda que ela levantou, fazendo o navio inteiro tombar quase que completamente. Enquanto caía consegui me agarrar com uma das mãos a uma placa de metal que calçava um dos mastros do convés. Pessoas iam caindo ao meu lado, a maioria conseguia se segurar em placas de ferro, pedaços de madeira, nas bordas do navio, mas um garoto passou por mim e se segurou em uma rede fina presa a um pedaço de madeira do chão do navio que estava levantado. Era um azul. Ele estava completamente apavorado e desesperado, chorando e com as mãos presas firmemente na redinha que começava a se rasgar. – Segura na minha mão – gritei para ele sobre o barulho da chuva e do mar O garoto esticou a mão tremula e seus dedos quase encostaram nos meus. Estava a uns cinco centímetros de conseguir segurá-lo quando o barco tombou mais ainda para o lado. A rede do menino rasgou e ele começou a cair gritando na água, mas aí o mais chocante do dia aconteceu: pouco antes de atingir a água, uma serpente enorme subiu engolindo o garoto inteiramente enquanto ele caía. Eu não sabia o que fazer. Consegui ouvir uma risada vindo dos mares como se aquilo divertisse Poseidon, como se ele estivesse adorando aquele massacre. O sangue ferveu nas minhas veias. Quanto custou a vida daquele garoto? Uma risada maligna e o divertimento de um velho sanguinário? Não, isso não ia ficar assim, eu ia fazer Poseidon pagar... Ei, a parte que ainda tinha consciência do meu cérebro disse, ele é um deus. Mesmo assim, pelo menos a morte daquela serpente, a vingança, eu fazia questão de realizar.

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O monstro endireitou o barco o empurrando para a esquerda, me levantei e pude observar melhor a fera. A parte que estava visível acima do mar devia ter uns cinco metros, era da altura dos mastros podres do navio. O corpo todo escamado em um verde azulado escuro e espinhos em suas costas, sua cabeça era do mesmo jeito com dois enormes olhos cinzentos um de cada lado da cabeça. Tinha pequenas narinas (que deviam ser quase do meu tamanho, mas em relação ao monstro eram pequenas), uma enorme boca com uns cento e poucos dentes brilhantes e uma língua de um metro e meio para fora. A parte da frente da fera era branca e na lateral havia umas vinte guelras abrindo e fechando de cinco em cinco segundos. Todos correram para a parte de baixo do navio, Aron na frente. Ele entrou correndo e fechou a porta, não deixou ninguém entrar para fugir. Muito corajoso da parte dele se trancar em um lugar mais ou menos seguro. Estávamos sem saída, água cercava todo o perimeto, tínhamos apenas espadas e escudos que contra aquelas feras gigantes não eram muita coisa... sim, feras gigantes, apareceram mais duas nos cantos do barco. Todos entraram em pânico, começaram a correr e gritar por todo o navio. Minha vontade era de fazer o mesmo, mas dentro de mim eu sabia que era matar ou morrer. Corri para trás de uma das placas de ferro, achei que tinha tido a ideia brilhante mas já tinha três pessoas lá. Selina, Pedro e Bruno estavam encolhidos embaixo das armaduras apertando as armas e conversando rapidamente. – Escuta, – Bruno disse – temos que ir rápido, atacar no corpo. Estudei em uma escola na Europa, estudei sobre isso, não isso exatamente, mas sobre cobras. – Bruno, não é a mesma coisa. – Selina dizia exasperada – As escolas podem te ensinar coisas, mas isso aqui é real, r-e-a-l, as escamas não são tão fáceis de acertar. – Eu só sei que não temos tempo para testar – eu disse, e só aí que eles me viram – Acho que temos que atingir na cabeça, tipo, na cabeça é sempre certo de que machuque, não é? – Sim – Selina respondeu virando para mim – é isto que estou tentando dizer. – Mas como vamos acertar a cabeça dessa coisa? – Pedro indagou – Não temos tempo para... Uma sombra se formou acima de nós, olhamos juntos para o alto e a serpente maior, a que havia engolido o menino minutos antes, ela estava pronta para dar o bote e só tivemos tempo para saltar para o lado antes que ela abocanhasse onde estávamos em poucos segundos. Como eu já esperava, a cobra me perseguiu. Ela tentou abocanhar onde eu estava mas pulei para o lado e levantei a tempo de golpea-la no pescoço o que pareceu não surtir efeito. Meu golpe sequer fez um arranhão nas duras escamas da serpente. Corri para o mastro da ponta do convés, de lá podia enxergar a devastação. As três serpentes causavam o caos, jovens gritando e correndo, alguns usavam escudos na intenção de se defender de algumas mordidas, outros estavam escondidos atrás das placas enormes de metal que sustentavam os mastros.

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Enquanto as serpentes estavam ocupadas com meus amigos eu tive uma ideia. No alto do mastro, para segurar a bandeira, havia uma ponta grande de metal onde a bandeira estava amarrada para não correr o risco de a madeira apodrecer e tudo cair por completo. A ideia era louca e arriscada, mas era a única que eu tinha, e eu precisava de meus amigos para isso. Conto com a ajuda de Poseidon para derrota-lo, dissera o traidor em meu sonho, era um deles com certeza, mas no momento eu tinha problemas maiores. Saltei do mastro e saí correndo em direção a eles gritando as ordens. – Quando eu der o sinal, eu quero que empurrem as placas de metal. Eu demorei demais para falar, a serpente me achou. Ela tentou me abocanhar algumas vezes mas eu consegui desviar até ela me dar uma cabeçada. Levantei com dificuldade, a fera me fitou com seus olhos acinzentados e depois sibilou com sua língua de um metro e meio e esse foi o seu erro, mais rápido do que ela desferi um golpe com Omega em sua língua e arranquei uma boa parte dela fora. Aquilo foi sem duvida muito nojento e só serviu para deixar o monstro mais zangado. Sei que não estava em condições de ficar fazendo piadinhas, mas era mais forte que eu. – Está vendo tio? – eu disse mentalmente – O senhor fala demais para o meu gosto. O mar começou a se agitar com mais força e cambalear o barco de um lado para o outro sem parar. Ele devia estar se esforçando para isso, afinal ele ainda havia seus poderes, mas era pouco, porque a maioria ainda estava preso no cristal. Então por mais que eu corresse perigo com o mar, não era tanto quanto se ele tivesse os poderes completos. A cobra sibilou (o que foi estranho já que ela estava sem mais da metade da língua), seus olhos expressavam a raiva que sentia. Ela abocanhou as madeiras próximas a mim e coloquei meu plano em ação. Corri o mais rápido que pude em direção ao mastro do convés e comecei a escala-lo. Sei que devia ter ficado com medo, a madeira estava em condições precárias, mas a altura me revigorava, me deixava melhor e mais forte. Estava quase no topo do mastro quando a sibilante me achou. Ela veio na minha direção me perseguindo, mas eu já sabia e já esperava e contava com isso para o plano dar certo. Ela veio me atacar mas eu pulei para a parte de cima do mastro ficando completamente na ponta (a ponta na verdade era um tipo de lança, mas estava na ponta da parte de madeira que dava seguimento ao outro, como uma tabua colocada pala passagem). A serpente me olhou e sem titubear veio me atacar, pulei para o lado naquela tabua de passagem e me equilibrei transformando alfa em um relógio novamente, afinal estava no alto, o que eu não precisava era de mais peso. A cobra mordeu parte da madeira do mastro que, para minha surpresa, não se desfez ou desmoronou. Outra fera surgiu na minha frente abocanhando a madeira em frente a minha, mas por sorte ainda estava perto do mastro do convés e consegui pular de volta. A cobra sem língua havia saído dali, mas a outra ainda me perseguia.

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Ela se afastou e se preparou para dar o bote. Arreganhou a boca com mais de cem dentes e a língua de um metro meio e ainda cuspiu em mim. – Agora! – gritei sobre o barulho da tempestade aos meus amigos, pulando do mastro. Caí e machuquei o braço na madeira molhada, mas pude ver a serpente cair. Pedro e Bruno deram encontroes fortes e precisos na placa de metal que se arrastou pela madeira molhada até a beira desestabilizando o mastro e o fazendo cair. Por sorte o plano deu certo, o mastro começou a tombar tão rápido na direção da serpente que ainda dava o bote no nada e a lança gigante cravou em sua boca de baixo para cima imobilizando o monstro completamente. Ela tentou se livrar da lança lançando um urro de dor mas logo depois se desmanchou em fumaça e o mastro tombou completamente na água. A ideia tinha funcionado perfeitamente, Selina me olhou impressionada com aquela cara de como não pensei nisso antes?. Mas ainda havia um problema. Só havia mais um mastro, porem duas serpentes e minha fase de ideias brilhantes havia passado, então procurei alguém que talvez soubesse de alguma coisa do tipo. – Ei, como vamos matar as duas? – perguntei a Selina que se escondia atrás de uma placa de metal – O único ponto fraco delas parece ser na boca ou na cabeça. Uma delas nós vamos ter que matar na mão, se é que você me entende. Assenti, íamos ter que matar uma delas no mano a mano, sem a ajuda das pilastras gigantes. – E o cristal – perguntei –, se conseguimos acha-lo, fica mais fácil de derrotar a terceira. – Oh céus Erick, o que deu em você hoje?! – O que? – É brilhante, temos que encontrar antes de... abaixa! Me abaixei bem na hora que o bicho se lançou de boca aberta na altura de nossas cabeças. Corremos cada um para um lado, não vi mais os outros, talvez tivessem arrombado a porta, ou ido ao outro lado pelas tabuas lá em cima, só sei que não estavam lá. Apenas eu, Selina, Pedro, Bruno e mais uma menina que eu não reconheci. Tinha um novo plano: achar o cristal que estava, provavelmente, com uma das cobras e destruir a outra com os poderes marinhos. Comecei a analisar as cobras enquanto elas abocanhavam a esmo o navio inteiro que começava a querer afundar. O rosto do deus dos mares reapareceu em uma onda, gargalhando com sua voz má em minha mente. – O que me diz agora, príncipe? – ele disse a ultima palavra com desdém – Vai cair em meus domínios. – ele gargalhou novamente – Como vai querer morrer? Me enfrentando? Porque seria ótimo acabar com você em uma batalha! – Não – disse mentalmente –, minha mãe me ensinou a não bater nos mais velhos.

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O mar embraveceu de novo, mas eu não estava nem aí, tinha problemas maiores como derrotar duas serpentes marinhas e manter o barco sobre a água. Corri ao mastro que havia sobrado e comecei a escala-lo, o que não foi fácil com a serpente sem língua me perseguindo. Algumas vezes ela largou do meu pé e foi atrás de Pedro que disparava flechas de sua aljava encostado na placa de metal, esperando o sinal. Bruno estava com ele, mas só observava as duas lutas. Selina estava contra a outra fera, corria, se abaixava e na maioria das vezes analisava o monstro quando tinha tempo. Voltei a atenção para minha luta, estava perto da ponta e notei que ainda havia parte da tabua de ligação (o resto havia caído com a outro mastro), mas nada me ocorreu alem do natural. O que acabou com o meu plano foi a serpente ser mais esperta do que eu esperava, enquanto eu me preocupava com o cristal e o procurava ela arrancou a ponta de metal do mastro e a jogou na água acabando com as minhas esperanças. Pude ouvir a risada de Poseidon nas águas novamente, mas se ele achou que eu ia desistir ou morrer, ele estava muito enganado.

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Doze

O traidor se

revela

EU NÃO TINHA mais nenhum plano. Estava surpreso comigo mesmo, havia tido duas ideias que nem Selina não tinha pensado, mas acho que meu momento Einstein havia acabado. Ainda havia as duas serpentes e o cristal para achar. Eu achava que os poderes estavam na maior, a mais forte, a sem língua. Não havia nada a recorrer alem da minha espada, Omega, então resolvi usa-la (já que era minha única opção). Ainda equilibrado em cima da mastro ao lado das redes desejei ter alguma coisa, alguma arma a mais, mas estava na água, era tudo de Poseidon, a chuva, o mar o trovão... opa, espera, o trovão não, o trovão é do meu pa... é de Zeus, e talvez eu pudesse controla-lo. Tentei me concentrar no raio, mas era impossível com uma cobra de seis metros tentando me morder de dez em dez segundos. Bem, eu disse mentalmente (caramba eu estava falando com um raio?), seria muito bom se você me ajudasse sabe, tipo acabando com uma das serpentes. Os céus se nublaram mais um pouco e um raio caiu em minha espada. Não sei se o raio havia ouvido ou se eu falasse com ele, mas caiu na minha espada. O choque foi passando por Omega até mim, senti a eletricidade passar pelo meu corpo, meus cabelos molhados se eriçaram, e eu me senti instantaneamente ótimo. Poderoso, bem, capaz. Agi como um profissional treinado por uns dez anos para matar serpentes marinhas gigantes e ferozes. Encarei o monstro, ela rosnou e me atacou, pulei e cai em cima de sua cabeça cravando Omega na parte acima da narina entre os olhos. A fera gritou de forma estranha e começou a se balançar de um lado para o outro sem parar, tive que me segurar firme em Omega para não cair. Tirei a espada de seu rosto e caí em suas costas (quase fui cortado por um dos espinhos, só não fui fatiado porque os “dentes” da minha bota se grudaram neles antes de eu cair), e vi alguma coisa diferente em meio aos espinhos enormes, uma coisa azul brilhante. O cristal. Tentei me aproximar mas o monstro mergulhou na água e só tive tempo de cravar Omega em meio a suas escamas e me segurar novamente. Abri os olhos embaixo da água o que não fui muito inteligente de minha parte já que estava no mar e a água é salgada. Por um momento tive medo que o bicho não retornasse a superfície, que eu morresse ali afogado, mas aí alguma coisa o fez voltar, uma

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pessoa com uma lança cutucando o bicho nas escamas. Assim que a fera subiu, tomei fôlego e corri por meio de suas costas atrás do cristal, mas foi mais difícil do que pensei. Ela começou a se mover e quase caí. – Erick! – Selina gritou Me virei e vi a outra serpente se lançando na minha direção com a enorme boca aberta. E então outra coisa estranha aconteceu, desejei ter uma arma maior, uma lança e Omega se transformou quase que imediatamente em uma lança. Os detalhes eram idênticos aos da espada (as mesmas laminas formando a águia, só que o cabo era de couro com tiras de prata), tentei acertar o monstro na parte de baixo da boca, mas não deu certo (não totalmente) e fui lançado para o mar. Comecei afundando, o mar fazia força para me engolir e eu força para voltar a superfície. Não sabia nadar muito bem, então mais me batia o que me fazia subir mas não o suficiente. Comecei a soltar bolhas pelo nariz e a não conseguir mais respirar quando alguém me puxou para fora a tempo. Respirei com dificuldade, cuspi a água e sentei no barco olhando para Pedro todo molhado. – Valeu – eu disse – Eu tava me afogando. – Eu vi, mas olha só, como você fez aquilo? Hoje é o dia das esquisitices. Procurei a bainha vazia. Omega havia ficado na serpente, pendurada. Bruno tentava pegar o cristal, estava em cima do mastro e tentando loucamente pular na cobra que, na maioria das vezes, não deixava abocanhando o local onde ele estava. – Precisamos de um plano. – Pedro afirmou. Ele tinha razão, precisávamos de algum plano certeiro para pegar o poder. – Mas primeiro precisa da sua... lança. Terminando a frase ele puxou uma flecha, encaixou no arco, mirou e soltou. A flecha foi certeiramente na ponta da lança, deu um estrondo e Omega caiu em cima da placa de metal. Olhei para Pedro assustado, como ele havia feito aquilo? – Flechas explosivas – ele disse – Agora precisamos de um plano. – O barco está afundando, temos que ser rápidos, muito rápidos. – Pedro assentiu analisando o navio que começava a afundar. – Tive uma ideia, me da cobertura. Corri em direção ao mastro que já estava quase podre, peguei Omega no caminho, escalei a madeira, e cheguei ao topo sem ser incomodado. Meu plano era um tanto perigoso, não, um tanto não, era completamente perigoso, consistia basicamente em eu ter 10% de sorte e matar o bicho no mano a mano. Olhei para baixo, só via Selina brigando com a cobra menor, Pedro atirando flechas-bombas na sem língua e Bruno esperando meu sinal ao lado da placa de metal. Eu ainda estava no topo do mastro esperando a sem língua vir, mas na real quem veio foi a outra. Ela tentou me abocanhar umas 10 vezes mas eu consegui desviar no mastro podre. Olhei para baixo para dar o sinal a Bruno mas ele havia saído de lá, estava tirando Pedro da água, acho que ele machucou a perna porque mancava e fazia cara de muita dor. Mas a serpente ainda me importunava, ainda tentava me abocanhar e eu ainda tinha que matá-la, uma outra ideia me ocorreu, mas eu ainda tinha que me arriscar, tinha acabar com isso antes que Poseidon

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conseguisse me derrubar na água de novo porque não sabia se ia conseguir lutar contra ele de novo. – Ei sua coisa feia! – provoquei – Garanto que consegue ser mais feia do que... sua irmã muda! Ela veio atrás de mim e eu me esquivei para cima, chegando completamente na ponta do mastro que estava quase se rompendo e tombando. Provoquei a cobra mais uma vez e ela atacou, mas ficou presa com os dentes na ponta do mastro e esta foi minha deixa. Pulei agarrado no pedaço de madeira podre e fiz um giro completo bem na hora que ela conseguiu se soltar e o mastro começou a tombar, mas desta vez estava preparado. Quando cheguei ao lado do mastro que estava quando pulei girando ela abriu a boca para dar o bote, mas, em uma velocidade incrível, me agarrei a madeira com o braço esquerdo, fiz um raio cair em cima de Omega e, juntamente com a cobra, me aproximei dela cravando minha lança com tudo na pare superior de sua boca. Graças aos deuses meu plano funcionou. A corrente elétrica da minha lança começou a passar para o corpo escamoso e imobilizou o monstro completamente até os raios atingirem a água. Continuei com minha lança fincada e esperando o bicho se desfazer em fumaça o que não demorou muito. Soltei do mastro, fraco, e caí de cara na madeira, na verdade com o rosto na água. Levantei a cabeça ligeiro e a metade do convés já afundava. Eu tinha que agir rápido, muito rápido. Reuni meus amigos atrás da placa de metal. – Selina, você distrai o bicho. Pedro, atira flechas explosivas nela se ela se aproximar demais de Selina – ordenei – E Bruno, você vai me ajudar a subir naquela coisa. Todos obedeceram. Bruno saiu comigo em direção a placa de ferro e me ajudou a vira-la e a subir nela, era o ponto mais alto que tinha para chamar a atenção. – Qual o plano Erick? – ele perguntou – Improvisar! Preciso subir naquela coisa. O que eu não contava era com a inteligencia do animal. Enquanto eu falava ela passou muito rápido por baixo do barco e o virou completamente pra baixo d'água. Aquilo me irritou, Poseidon usava aquele monstro como seu instrumento de morte. – Não, Griffin, não adianta lutar – Poseidon disse – Você é meu agora, você vai morrer como muitos morreram, vai sofrer como poucos sofreram, porque ninguém desafia o Lord dos Mares! Muahahahahaha! Abri os olhos em baixo d'água porque achei que seria o melhor, e foi, porque bem na hora em que a cobra ia me matar com uma mordida certeira, me debati para cima e me agarrei a seu couro com Omega fincada entre suas escamas. Ela subiu para a superfície e minha mão chegou a encostar no cristal, mas ela mergulhou de novo e só tive tempo de tomar fôlego. Não vou negar que não fiquei com medo, estava louco de medo, morrendo de medo, mas se sou bom em uma coisa é em não demonstrar isso, então permaneci sério. Ela subiu de novo, com

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toda a força para uns 3 metros acima quando consegui agarrar o cristal em suas costas. Caí na água, caí nos domínios do meu inimigo. Não, caí nos meus domínios. Eu não vou negar que o poder é bom. Eu me sentia bem, eu comecei a respirar abaixo do mar, a me sentir melhor do que qualquer um que pisasse nessas águas, eu me sentia mais poderoso até mesmo que o Lord dos mares, eu podia sentir qualquer alga que passasse em onda por mim. Eu me sentia como um deus. Virei o barco de volta a superfície, juntei meus amigos nos cantos e os calcei no barco, e eu mesmo subi apenas com uma onda que me colocou de pé na madeira molhada. Bem tio, eu acho que você está em meus domínios agora. – Não, Griffin, você pode ter pego os poderes agora, mas nunca, nunca vai chegar aos meus pés – Poseidon fez seu rosto na água – Nunca vai chegar aos pés do Lord dos ma... Com um aceno desfiz seu rosto marinho e pude ouvir seus gritos ecoarem pelas rochas: Griffin! Olhei em volta no navio. Selina estava apoiada na madeira tossindo, Pedro se pôs de pé com dificuldade e Bruno o ajudava enquanto tossia também. Estávamos todos encharcados, todos molhados, mas isso não era mais problema. Desejei que a água das roupas deles saíssem por completo e ela saiu (a minha eu acho que não era só água do mar). Fui até Selina que parecia ser a pior. – Você está bem? – Ele não... – ela tossiu novamente – ele não me deixou sair, sair da água. Eu a ofereci a mão e ela pegou e se levantou com dificuldade, muita dificuldade. Me aproximei dos outros – Cara, deixa eu experimentar isso – Pedro disse – Pode curar minha perna, me deixa experimentar isso. Dá o cristal, na boa. – Hum, não... leva a mal, é que... bem eu... não posso – Me deixa usar, só para curar a perna, é rápido príncipe, é rápido! Me dá o cristal agora! Eu e Selina trocamos olhares nervosos. Ele queria o cristal, desesperadamente, estava ficando nervoso, estava ficando bravo e... me chamou de príncipe exatamente o mesmo apelido que o traidor me chamou na noite passada. Paralisei, agora tinha certeza de quem era o traidor.

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Treze

Meu amado tio

mata mais um

MEU SANGUE fervia ao descobrir a verdade. Meu sangue fervia ao saber que era ele o tempo todo, sempre o quieto, sempre o bobo, o por fora, sempre o que menos parecia ser. Fizemos até um trato, de um proteger o outro e agora, o que ele mais queria era a minha morte. Eu poderia enfiar a espada nele ali mesmo, na mesma hora, acabar com isso, acabar com tudo. Mas e se minha mãe morresse lá com Hades? Era um grande risco. E, eu havia esquecido da serpente que ainda não estava morta, mas esse era o menor dos problemas. Senti o monstro nadar no mar abaixo de mim e a forcei a sair para fora. Estiquei a mão para frente e ordenei que o mar fizesse uma mão gigante de água, e, é claro, ele obedeceu agarrando a serpente em uma mão marinha gigante. O bicho se debatia e tentava se soltar, mas eu era mais forte, então fiz um tridente de água fria, quase gelo, em minhas mãos, e fiz um raio eletricuta-lo (o que não foi muito inteligente porque quase matei meus amigos e o x9). – Isso é o que acontece com quem trai o mais novo deus dos mares – Gritei e joguei o tridente na cobra que, antes mesmo de cair na água, explodiu em uma nuvem de fumaça e raios. Pedro ainda me olhava, Bruno parecia perdido mas ainda dava apoio ao x9, Selina praticamente se escondia atrás mim, mas tentava manter a postura de coragem o que não estava funcionando. Pedro alegou que queria o cristal pela perna, não por isso, eu posso curá-lo. – Eu posso curar sua perna – eu disse a Pedro – e não preciso do cristal. – Não, não pode – Selina disse – Ele foi mordido, arranhado, é veneno, não está quebrada. Quiron pode cura-lo. Mas como vamos voltar pra lá? Como vamos voltar? Bem na hora Quiron abriu um portal pra dentro do barco e veio direto em minha direção. Ele coçou a sobrancelha e me encarou firme enquanto Aron e um outro menino ajudavam Pedro a passar. Bruno foi pelo portal mas Selina hesitou, ela parou umas duas vezes em frente a foto do acampamento pelo portal. Ela resolve não ir. – O cristal, Erick – disse Quíron – você o pegou e agora deve alcançá-lo a mim.

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– Quíron, o traidor foi revelado, eu sei quem ele é, podemos pegar ele de refém agora e... – comecei mas fui interrompido – O cristal Erick, me dá o cristal. O chefe o quer Erick, você tem que entregá-lo a ele ou todos nós morremos – ele disse e aí notei nele um corte, uma cicatriz, igual a de Aron mas que também não estava no dia anterior. Hades havia batido neles, deve ter dado uma surra neles e um sermão dizendo pra não deixar eu pegar os poderes, mas agora era tarde, eu já estava com eles. Ainda não sabia o que fazer, olhei de relance para Selina que estava atrás de Quiron e ela balançou a cabeça em concordância e tristeza. Entreguei o cristal para Quíron em relutância, mas continuei desconfiando dele. Por que ele não prendia Pedro agora e forçava Hades a soltar todos ou seu filho morreria? Talvez ele não morresse, mas assim, como eu poderia matá-lo? Quíron praticamente me jogou para o acampamento, bem, eu sempre soube que ele não gostava muito de mim, mas o modo como ele agiu, ou ele estava morrendo de medo, ou ele é traidor também. Fui direto para a ala hospitalar para me examinarem, Bruno e Selina fizeram o mesmo e alguns azuis também. Para meu desagrado Pedro estava lá, mas para meu alívio ele estava desacordado. Depois de me examinarem Aron e Quiron me liberaram para minha cabana, e, assim que eu e Selina colocamos os pés nela eles a trancaram e trancaram também a ala hospitalar assim que saímos. – O que vamos fazer? – perguntei a ela – Vamos matá-lo, vamos prendê-lo, vamos sequestrá-lo, vamos torturá-lo? – Não! Não podemos fazer isso! Temos que tramar alguma coisa, temos que fingir que não sabemos de nada – Como assim fingir que não sabemos de nada? É bem mais fácil eu enfiar minha espada no peito dele! – E depois? Hades te mata, ou Poseidon, ou os monstros dos dois! Sem contar nas nossas famílias, se você quer se matar e matar sua família vai em frente, mas não me mete nessa. – Eu tive uma ideia! – eu exclamei em um grito – Vai chover! – ela murmurou – Ah, cala a boca e escuta. Eu vou montar guarda a noite, em frente a ala hospitalar e daí vamos ver ele sair! – Fala um pouco mais alto Erick, meu irmão não está ouvindo direito lá do submundo. – Ah, que sege, eu vou fazer isso, e pegar ele no pulo! – É, talvez dê certo porque como Quíron não acha que é ele, ele provavelmente não vai montar guarda. – Como sabe que Quíron não acha que é Pedro? – perguntei, bem mais baixo agora – Ele não se manifestou, não disse nada. Ele ia falar se soubesse.

***

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O tempo passou, era noite, eu e Selina ficamos brigan... conversando o tempo todo sobre os treinadores. Ela dizia que Quíron era mais legal e eu dizia que Aron era mais legal. Essa discussão durou bastante, até o Hades equalizado chamar a gente para fora. Eu e Selina saímos até o campo, e lá estavam nós, Pedro de muletas e perna enfaixada, Bruno, e alguns azuis. Os únicos sobreviventes do massacre das serpentes. – Como vocês devem ter notado, as equipes se reduziram drasticamente e em números muito, muito pequenos. Ficamos com apenas 1 na equipe verde, 2 na azul, nenhum na amarela e.. olha que notícia espantosa! Os três queridos guerreiros vermelhos! Parece que vocês são duros de matar não é mesmo? Bem, continuando, eu tomei providências de arranjar mais jovens, mais guerreiros. Acho que vai ser bom vocês conhecerem seus novos colegas de cabana. Assim que meu querido e amado tio terminou de falar, vários jovens com camisetas de identificação (por cor, 1 azul, 3 amarelos e 2 verdes) vinham correndo desesperados como se fugissem de alguma coisa na floresta. Assim que nos viram eles pararam, descansaram e nos olharam algumas vezes. Havia entre eles um desajeitado, um gordinho ruivo que estava praticamente de língua de fora e camiseta azul. Só tem 1 desajeitado e burro o suficiente para ficar desse jeito: meu primo, David. Depois vi um rosto que me pareceu familiar. Um garoto de cabelos bem pretos, olhos azuis escuros e brilhos. Ele estava com a camiseta amarela, cabelos para cima e uma cicatriz longa na bochecha. Eu não conseguia me recordar de onde eu o conhecia o rapaz de quinze, dezesseis anos, mas eu só sabia que eu o conhecia. – Aí estão os novos integrantes de suas equipes, os novos servos da escuridão! Agora vocês... Minha atenção se desviou completamente ao rapaz de olhos azuis. Ele arregalou os olhos, seu olhos começaram a expressar raiva e seu rosto ficou vermelho. Ele começou a correr em nossa direção gritando: – Seu desgraçado! Você vai pagar! Você acabou com a minha vida e com a de todos os outros, seu traidor! Ele estava a 1 metro de nós (eu, Selina, Pedro e Bruno que estávamos um ao lado do outro). O garoto pegou a espada de Selina da bainha e pulou girando como se fosse golpear-nos e matar-nos, mas antes que pudéssemos fazer qualquer coisa, um buraco negro se abriu no chão e uma mão de sombra raquítica e esquelética agarrou o pé do menino e o puxou com uma força descomunal para dentro do buraco que se fechou rapidamente sobrando apenas a espada de Selina em cima da terra fissurada.

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Quatorze

Viro presidiário

TUDO O QUE aconteceu foi muito rápido, em questão de segundos o

menino estava morto embaixo daquela terra. Em questão e segundos eu quase perdi

a vida. Mas agora pelo menos eu sabia quem era o garoto. Ele era o da visão, o da

árvore que Selina me mostrou. Aquele do acampamento que lutava com o amigo e

depois com o inimigo, ele lutava contra o traidor, e, agora que ficou frente a frente

com ele, tentou matá-lo. Eu comecei a sentir raiva de Hades, afinal, se ele não

estivesse se metido o traidor estaria morto e eu estaria com a consciência limpa, eu

não iria ter feito nada! Mas é claro, Hades tinha que proteger o filhinho dele.

– Tivemos um pequeno probleminha, mas isso é só... um pequeno problema,

nada a mais, todos... vão para suas cabanas, vão conversar! – disse Hades um pouco

confuso

Eu estava confuso. Nada fazia sentido, seu só pensava em como matar o

traidor sem matar, quero dizer, provocar a morte talvez, sem que ninguém

descobrisse. Uma coisa eu descobri: o traidor pode morrer, porque se não, porque

Hades teria que salvá-lo?

– Ra, Erick – David disse de olhos arregalados e ainda tomava fôlego –,

você está aí! Ainda bem que eu te achei!

– Espera, você sabia que eu estava aqui?

– É... mais ou menos, quer dizer, tipo, sim.

– Como? Por que não me soltou? Por que não avisou sobre tudo? Por que

você não fez nada? – eu comecei a despejar indignado. Ele sabia de tudo, e ainda

veio pra cá atrás de mim? Porque ele não avisou o Olimpo?

– Cala a boca tomadinha! – Selina interrompeu rápido – Quer que seu tio

mate a gente?

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– Tomadinha? – questionei

– É, cabeça de vento não estava te insultando o suficiente. Ah, oi menino do

acampamento.

– Menino do acampamento?

– É, o acampamento para mestiços, o A.M.G, vai dizer que você conhece?

Eu me virei para David. Ele ia a um acampamento para mestiços, um lugar

seguro, um lugar legal, um lugar que, pelo que vi na visão, era livre de monstros e de

perigos, e ele sequer havia me falado!

– Acampamento? Nossa que grande primo você é.

Selina tentou segurar o riso.

– Espera, vocês são primos? Você é primo do olho de vidro?

– Olho de que?

–Ah, Erick, ele é olho de vidro, ele pode ver mais que nós, ele não é

confundido pela visão mortal.

– Olho de vidro, David! – eu disse virado pra ele – Acampamento, olho de

vidro, mais algum segredinho que queira me contar?

– Hm, não, é, eu... acho que você sabe né, tipo, você já sabe quem é seu pai,

né?

– Sim

– Ei, menino do acampamento, você viu o jeito que o Dean morreu? Ele foi

atacar o traidor daqui, espera... tinha um tabu no acampamento, ninguém podia

falar no que aconteceu anterior a 1 ano.

– Só pode ter sido a guerra, a luta que vimos na arvore naquele dia – eu disse

– Espera, conheciam ele?

– Ele quem? – Indagou Pedro as nossas costas. Eu levei um susto com ele,

ele sempre foi magrinho, alto, nada assustador mas agora depois que eu fiquei

sabendo que ele era filho de Hades, tudo havia mudado, ele parecia sempre

sombrio.

Page 77: Os poderes perdidos

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– O David – Selina disse calmamente, sinceramente eu não sei como ela

consegue fingir tão bem –, o paspalho do Griffin ta surpreso porque eu e o primo

dele estudamos juntos.

– Ah, legal. Mas vocês viram aquele garoto, viram tudo o que aconteceu?

– Vimos, mas ainda não sabemos pra quem ele puxou a espada. Ah, eu estou

com frio, vocês não estão meninos?

Quando ia dizer não o olhar de concorda Erick de David e Selina me

atingiram e aí entendi o plano.

– É, está ficando frio mesmo. Vamos pra cabana é mais quente.

– Hm, eu não posso ir – Pedro disse triste – Quíron me mandou ficar na ala

hospitalar até amanhã, mas vão me visitar lá qualquer hora.

– Pode deixar – concordamos e saímos correndo pra dentro da cabana. Eu e

David nos sentamos na parte de baixo do meu beliche e Selina na parte de baixo do

dela.

– Então, como conheciam esse garoto? – perguntei curioso

– Ele era do acampamento, líder na verdade – David explicou

– Ele foi líder algumas vezes, muitas vezes e fazia isso bem, mas ele não fala

muito com as pessoas, só com a namorada dele, uma menina de Afrodite, e estava

sempre de mal humor. – Selina continuou

– Agora sabemos porque, ele foi traído, e pelo jeito pelo melhor amigo dele,

que é Pedro, ou melhor, era.

– É estranho, eu não vejo nada no filho de Apolo, eu deveria sentir, deveria

ver alguma coisa, não sei.

– Ele ainda não foi assumido, isso poderia dificultar pra você ver alguma

coisa

– É, talvez.

– Bem, eu vou continuar com meu plano, vou ficar escondido perto da ala

hospitalar, quando ele sair eu vou atrás dele e vou dar um jeito nele.

– Ãã, Erick, só uma coisa – Selina disse um pouco preocupada – Dean

sempre foi o melhor lutador do A.M.G, de todos os tempos...

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– Nunca ninguém jamais conseguiu vencê-lo – David continuou

– A não ser o traidor – ela finalizou – ele luta muito bem, ele luta melhor

que você.

– Eu vou conseguir ganhar dele! – eu levantei – O meu futuro depende

disso!

– Eu acho que não é uma boa ideia, ele é muito forte, muito esperto, e muito

estratégico – ela retrucou e se levantou

Não sei como a briga começou, mas a raiva entre a gente era natural, não

conseguíamos controlar então...

– Você ta me subestimando! Acha que não sou capaz de derrubá-lo?

– Nossa, quando eu começo a querer te ajudar, olha como você me trata?

– Ajudar? Você ta me chamando de fraco, isso é ajudar?

– Quer saber, eu não queria dizer, mas você é fraco sim! – ela disse com

raiva

– Se eu fosse fraco eu não tinha derrotado aquelas cobras, e muito menos

salvo sua vida quando estava morrendo nas mãos do Minotauro!

– Salvo minha vida? Eu caí de cabeça nas pedras! E só aconteceu isso porque

estava fraca, porque tive que dominar umas 500 arvores pra você correr, porque,

não se esqueça, quando eu estava em boas condições, te dei a maior surra.

– Você fica se vangloriando porque me venceu numa batalha, na minha

primeira, quero ver agora com experiência – provoquei –, aposto como perderia nos

primeiros 5 minutos!

– Se você quer apanhar de novo... – ela abriu as asas da corujinha que se

transformou em 2 espadas médias idênticas – Então vamos.

Desembainhei Omega e transformei alfa.

– Vamos ver quem é o fraco agora.

– Ei! – Aron gritou e só ai notamos ele abrindo a porta e David atrás dele.

Só podia ter sido ele mesmo, só podia ter sido ele a nos entregar – Parem com isso,

vocês são uma equipe!

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– Não mais! – Selina exclamou e transformou sua coruja de novo – Eu vou

substituir o menino que morreu na amarela.

– Não, eu quero vocês dois na verde! – Aron exclamou

– Escuta, então ela fica e eu vou para amarela. – eu disse

– Não! – Ele berrou com autoridade – Vocês vão ficar juntos, por bem ou

por mal.

– Ei, calma Aron – eu disse – podemos lutar juntos nas batalhas, mas não

precisamos ficar na mesma equipe.

– É, me deixa ir – Selina suplicou

– Vocês vão ficar juntos aqui? – o treinador perguntou

– Não – eu e ela dissemos juntos

– Então vai ser por mal – rapidamente ele pegou alguma coisa da mão de

David, prendeu na minha mão e depois na de Selina. Depois de alguns segundos fui

notar que era uma algema. Eu e Selina nos olhamos, nenhum de nós pensou que o

por mal, seria tão por mal assim. Não tínhamos como nos soltar.

– Aron espera. Volta aqui, espera! – gritamos mas ele apenas balançou a

chave e a guardou em meio a seus pelos emaranhados de bode.

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Quinze

Sou nocauteado

COMO SE NÃO bastasse estar preso com uma pessoa chata que acabou de

brigar comigo, ainda fiquei sem ter como utilizar meu escudo...

– Eu tive uma ideia – disse a Selina que parecia estar bem mais nervosa e

com raiva do que eu. – Eu posso transformar meu escudo, ele pode quebrar a

algema.

– Ou minha mão! – ela exclamou – Você está louco, vem comigo.

Ela me puxou pela mão e saiu rápido andando duro cabana afora. Eu saí

tropicando atrás e só depois de uns 3 passos consegui me equilibrar.

– Calma! – eu disse – Eu posso tirar isso. É só cortar com a espada.

– Como? Ta brincando, né tomadinha? – ela disse

– Não, olha só. – Eu peguei Omega e pedi que ela esticasse o braço, ela

esticou mas me encarava com os olhos arregalados e espantados como se eu fosse

matá-la a qualquer momento. Eu medi, medi, medi de novo e quando estava prestes

a descer a espada quando Selina me interrompeu

– Não! Para com isso!

– Você prefere ficar acorrentada comigo?

– Não! Mas você vai tirar meu braço fora! Vamos procurar alguém de

confiança!

– Confiança? – eu disse – Eu to acorrentado junto e não sou de confiança?

– Cala a boca e me segue! – ela disse e saiu andando

– Não, não, eu vou ir pro outro lado

Ela deixou escapar um leve riso. Me segue?

Page 81: Os poderes perdidos

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– Onde você está indo? – perguntei

– Em qualquer lugar que tenha um bom espadachim. Vamos atrás de Bruno.

Não demorou muito até ele abrir a porta e rir 5 minutos da nossa cara

enquanto a gente mandava ele calar a boca e dizia que foi culpa de Aron e que não

fizemos nada. Pedimos a ele que quebrasse a corrente. Ele tentou espada de esgrima,

espada de lamina dourada, espada de titânio primordial, mas nada quebrou aquilo.

– Pega a minha espada – eu disse

– Está louco, eu não quero me eletrecutar! – ele afirmou – Mas aí, vocês

ficam tão bonitinhos juntos – ele disse e riu histericamente com seus amigos verdes

e David que estava junto.

– Cala a boca! Aron me prendeu aqui, eu preferia estar morta! – Selina

afirmou

– Queria ver se fosse você que estivesse preso com ela e eu tivesse fazendo

piada.

– Foi engraçado – David disse

– Ah, cale a boca – eu e Selina dissemos juntinhos

Saímos dali entupidos de raiva e fomos atrás de algum arqueiro cabanas a

fora, mas quando estávamos quase chegando nos azuis (a primeira em que íamos

procurar) Selina parou de repente como se tivesse visto um fantasma.

– O que foi? – David perguntou

– Nada, eu só... me ocorreu que... deixa pra lá.

***

Pelos meus cálculos nós procuramos um arqueiro até lá pelas 10h da noite e

em toda cabana que passávamos eram zombados e havia as piadinhas quando

contávamos a história. Mas nossa busca não durou muito tempo porque quando

começamos já era isso aí de horário. Tentamos também a cozinha, passamos olho,

manteiga, mas nada deslizou nossa mão o suficiente. Então fomos falar com Aron.

– Escuta Aron, nos arrependemos, não vamos mais querer trocar de equipe,

por favor solte a gente – implora Selina

Page 82: Os poderes perdidos

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– Vamos fazer assim – ele começou – vocês vão ficar o dobro do que eu

disser, ok? 1 dia assim

– Então são 2 – eu disse

– Agora são 4 – disse Aron

– Que é... – antes de eu terminar Selina tampou rapidamente minha boca

com a mão e parecia que ia explodir, seu rosto estava completamente vermelho.

– Tudo bem Aron, entendemos. Vem, tomadinha

Ela me puxou arrastado para nossa cabana onde sentou e me empurrou pra

o beliche ao lado.

– Tudo culpa sua! – ela afirmou

– Minha? – indaguei, até parece que eu tinha brigado sozinho

– 1 dia assim – ela disse – agora são 2, blablabla – ela fez uma imitação

ridícula da minha voz – E só paramos em 4 porque calei sua boca!

– Ok, ok – eu disse, afinal estava mesmo sem argumentos sobre o assunto –

Espera, eu tenho que ir no banheiro.

– E agora? – ela disse e caminhamos até a porta do banheiro

– Sei lá, fica de costas.

– Erick, tem um espelho – ela disse devagar e ironicamente apontando para

o enorme espelho que ficava de frente pra porta. – Tenta ir, eu puxo o braço o

máximo que posso e você faz o mesmo.

– O que?

– Só obedece

Fomos puxando um pra cada lado e o metal foi se esticando como uma

borracha até dentro do banheiro. Fechei a porta e usei o banheiro, quando abri a

algema nos puxou tão rápido que quase quebrei a mão. Selina fez o mesmo

enquanto eu esperava lá fora. Depois ficamos parados lá dentro, procurando meu

primo, mas ele já tinha saído. Bum, houve um barulho alto na porta e corremos

para abrir mas estava trancada. Bum, lá se foram as janelas.

– O que está acontecendo? – perguntei

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– Eu não sei. Arromba!

Forcei a porta varias vezes, mas nada adiantava

– Não da, estão segurando. As janelas

Antes mesmo que pudéssemos correr até as janelas uma nuvem de fumaça

começou a surgir do fundo da cabana, uma fumaça verde, que só me fez ficar tonto.

– Tranca a respiração – Selina disse rápido

Eu obedeci, mas em questão de minutos, antes de chegar a janela, caí

desmaiado.

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Dezesseis

Atena reúne uma

equipe de resgate

ÓTIMO, AGORA estava desmaiado, por uma fumaça! Covardia da parte

de Hades, eu não tinha como lutar contra aquilo, e era exatamente a intenção dele

com isso. E, desse jeito, não podia esperar coisa diferente. Sonhos.

A minha antiga prisão, sob a luz do luar. Cerca de quatro meninos e 6

meninas estavam sentados, escorados nas cabanas e suados. Mas uma das garotas

parecia inquieta, ela andava de um lado para o outro praguejando entre os dentes.

– Não está errado! Eu tenho certeza de que era aqui! – ela para embaixo da

luz de um dos postes inteiros e consigo ver seu rosto. Cabelos extremamente pretos

e lisos desciam até o meio de suas costas onde paravam em cima de um desenho em

sua armadura de couro. Olhos róseos e orientais e boca da mesma cor que

expressavam extremo pavor e desespero. Ela é bonita e encantadora, chego a

entristecer com sua frustração como se aquilo me atingisse. – O endereço está certo!

Eu tenho certeza!

– Calma, Nak. Você deve ter se enganado – diz um menino alto e forte de

cabelos militares – Ele está bem, está vivo.

– Não, Jake, ela disse que era aqui! – pondera ela e lagrimas escorrem de seus

olhos.

– Ela pode ter se enganado. Ou eles fugiram.

– Ei, maninha, está tudo bem – disse um garoto que estava completamente

no escuro, impedindo–me de ver seu rosto.

Page 85: Os poderes perdidos

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– E se... Argh! Eu não quero nem pensar. Onde eles estão? – grita a menina

aos céus – Você me disse que estariam aqui! Você mentiu.

– Eles estavam aqui – a voz calma de Atena assusta a todos que não haviam

notado sua presença atrás deles, ou ela simplesmente não estava lá. – Trocaram o

acampamento de lugar, saíram daqui. Não sei como, mas eles descobriram que

estávamos a caminho.

– Pra onde eles foram? – interroga Nak – Por favor.

– Desculpe querida, mas, como sabe, a lei feita por Lord. Zeus designa que

os deuses não devem interferir na vida dos demais habitantes do mundo. Já fiz

demais lhes dizendo o local que estamos agora, mas não posso ajudar.

Ela cobre o rosto com o capuz preto e caminha sumindo na noite deixando

apenas o eco de seus passos na escuridão.

– O que faremos agora? Para onde vamos? – disse Jake

– Eu não sei – respondi Nak – Não tenho nenhum palpite. Quando

conseguimos, quando finalmente conseguimos reconstruir o acampamento, quando

íamos ter paz ele desaparece, e agora, tem mais de 70% chances de estar morto!

– Vamos ficar aqui – decide Jake – Vamos esperar qualquer coisa.

A visão se desfaz e acordo com Selina me puxando pela algema, tentando me

arrastar piso a fora. Ela está virada para porta. Cabelos presos em uma trança para a

direita e a mesma camiseta vermelha com os jeans azuis claros de ontem. Minha

cabeça dói, meus olhos ardem e meu corpo está dividido igualmente entre:

músculos rígidos e músculos moles.

– Wow, dá pra parar com isso – disse a ela. Ela para e se senta ao meu lado

dizendo que chegou a pensar que eu estava morto, porque tentou me acordar de

todas as maneiras possíveis e eu continuei desacordado.

Levantei. Me sentei no chão mesmo já que não tinha nada lá dentro. Olhei

em volta, não se parecia com uma cabana, muito menos com uma casa, está aberto

em cima, de modo que sei que ninguém deve, de fato, dormir ali.

– Onde estamos? – perguntei

– Não sei, você não me deixou ver.

– Eu tava ocupado demais tendo umas visões – disse

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– Que tipo de visões?

– Não quero falar sobre isso agora. Onde está Pedro?

– Não sei, ele não amanheceu aqui. O que é melhor para nós. – ela fez uma

breve pausa – Talvez ainda esteja mantendo o disfarce da perna machucada.

– É, talvez.

Depois recuperar metade do meu animo e disposição usual, levantei e

caminhei até a porta. O que vejo me assusta. Não sei o que eu esperava. Um

gramado verde e brilhante, talvez. Ou um campo florido, bosques. Eu esperava de

tudo menos a entrada de uma caverna. Olhei para trás, o local onde eu acordei não

passava de um tipo de ruína. A caverna é simplesmente enorme, alta excessivamente

e larga da mesma maneira. Cheguei a me perguntar o porque de tanto espaço, já que

parecia completamente abandonado e vazio.

– Onde acha que os outros estão? – perguntei

– Entraram? – sugeriu ela. Resolvemos primeiro olhar em volta. Caminhei

em volta da ruína onde estávamos, mas nada me chamou a atenção. Andamos até

dar de cara com uma montanha, nenhuma saída, nada alem da caverna. Logo que

pus os pés dentro do local já me percorre um calafrio da cabeça aos pés. As paredes

úmidas e extremamente escuras. Griffin ecoa uma voz suave e rígida por toda a

imensidão do local. Parei de imediato e olhei em volta, procurando a fonte da voz,

mas, como imaginei nada aconteceu. Era apenas a morte clamando meu nome. – O

que foi?

– Nada, eu só... deixa pra lá.

Conforme adentramos na caverna esta se tornava mais escura o que nos fez

ter a necessidade de algum tipo de luz. Eu tirei Omega da bainha, ela brilhou em

meio a escuridão e pesou mais do que o normal em meu braço ainda rígido e quase

imóvel. Selina e eu nos assustamos frequentemente com insetos ou até mesmos

alguns morcegos que abato facilmente com minha lamina. Tudo está indo bem até

nos depararmos com 2 pessoas correndo, sangue saindo de ferimentos e uma delas

chega a mancar. Selina as avista primeiro, o que é bom, já que me impede de

esfaqueá-los. Nos aproximamos dizendo que está tudo bem, mas eles hesitam em

parar. O primeiro jovem para e puxa o segundo – que descubro ser A segunda –

dizendo que está tudo bem.

Page 87: Os poderes perdidos

87

– Oh, puxa – Selina exclamou olhando o braço da garota azul que iluminei

com Omega. – O que te fez isso?

– Não sabemos – David tentou explicar – Apenas caminhávamos pela

caverna, a única saída que tivemos do canto em que acordamos.

– Está me dizendo que estamos sendo atacados pela escuridão? – perguntei

agradecendo mentalmente por ter Omega comigo.

– Não tínhamos nenhuma luz – resmungou a garota – Corremos no escuro

e fomos atacados.

– Quanto ao outro azul? – Selina perguntou e David balançou a cabeça em

discordância levemente. – Precisamos limpar os ferimentos – ela puxou a manga da

garota até a brecha da ombreira de couro. O ferimento era feio, como se tivessem

arrancado um pedaço de carne dela. David forneceu um pedaço do tecido azul de

sua camiseta para estancar o sangue. Selina amarrou o tecido com força em volta do

braço e aconselhou a menina a não mover o braço bruscamente. Ela realizou um

tipo de primeiro socorro, mas parecia desconfortável, como sempre, ela tentou

manter a postura de corajosa, sem demonstrar fraquezas. Os outros pareceram até

acreditar mas para mim, ela estava muito nervosa. – Precisamos de mais luz, sua

espada não vai ser o suficiente para quatro pessoas.

– Tente a sua – disse a ela, afinal, a coruja dela também é mágica, de forma

que acredito que possa “brilhar como a minha”, mas a luz produzida pela espada

dela não é o suficiente, mas mesmo assim, passamos ela a David que vai ficar com a

retaguarda. Eu assumiria esse posto, mas Selina vai ficar na dianteira e não posso me

afastar dela. Literalmente.

Seguimos viagem, em alguns momentos Selina parava de repente e me

perguntei se ela estava escutando a mesma voz que ouvi mais cedo, mas preferi

acreditar que estava apenas analisando o lugar. O fato de ter David na retaguarda

não foi uma boa ideia, já que ele é o mais medroso do grupo que não tira os olhos

de nós, e o trabalho dele seria cuidar de qualquer coisa que fosse nos atingir pelas

costas. Me aproximei de Selina levemente e quase a matei de susto quando

sussurrei:

– Preciso ir para a retaguarda.

Ela me olhou e depois olhou para a algema. A ideia de ficar sozinho na

retaguarda não me agradou, mas a ideia de ficar desprotegido com o primo

Page 88: Os poderes perdidos

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medroso – mais uma pessoa da família que deveria proteger – na retaguarda não é

nada melhor.

– Não é uma boa ideia, Erick. Não sabemos o que tem por vir ainda.

– Se formos para a retaguarda, te conto minha visão.

– Azuis tomem a dianteira. Sigam em frente até o fim da linha.

Caminhamos, eu e Selina, um de costas para o outro, revezando nas olhadas

para trás. Vou contando pra ela a visão, tudo. Detalhe por detalhe. Quando cheguei

na aparição de Atena, senti uma ponta de inveja. Atena reuniu uma equipe de

resgate, por mim é que não era. Era por Selina. Ares com sua penca de filhos não

mexeu um pauzinho sequer para me salvar.

– Isso é estranho – ela diz – A menina que você viu provavelmente era

Nakamura. Isso se encaixa. Lembra do Dean? O menino da arvore. Ele era

namorado dela, ela é filha de Afrodite. Ele era filho de Poseidon. Ela estava

procurando por ele. Coitada!

– E quanto aos outros?

– Eu não sei, provavelmente eles foram escolhidos por ela para sair pra

missão. Geralmente são só 3, no máximo 5 pessoas. mas uma missão importante

como essa, que consiste em salvar o Príncipe Mestiço das garras de Hades, ditada

pela própria deusa da sabedoria abriria com certeza uma exceção.

Nos viramos, agora eu estou de costas para os outros enquanto Selina cuida

da frente, afastada, mas melhor que David com certeza.

– É, mas você sabe que Atena não entrou nessa por mim. Ela sequer aparece

para mim ou algo assim.

– Nossa, Príncipe, que egoísmo! Você já tem Lord. Zeus e o deus da guerra,

podia deixar Atena pra mim!

Eu me permiti rir, o que fez David e a Azul virarem para nós com olhares

perdidos. Logo depois de não falarmos nada, eles retomaram a posição e seguiram

caminho.

– Isso me incomoda – digo

– O que? – questionou Selina. Nós viramos ficando ela de costas e eu de

frente – A piada?

Page 89: Os poderes perdidos

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– Não, é bom rir um pouco. – umedeci os lábios. Eu não falei sobre isso

com ninguém desde que fiquei sabendo. Sequer me permiti pensar sobre o assunto,

mas não poderia adiar muito mais que isso. E Selina é uma pessoa que posso

confiar. – O negocio de eu ser o príncipe.

– Por que?

– Por que? Eu sou perseguido por isso!

– Todos os mestiços são perseguidos, Griffin. Uns mais outros menos – nós

viramos de novo – A vida normal não é uma opção.

– Mas e depois. Quando isso acabar, posso voltar a ser normal.

– Você nunca vai voltar a ser normal. Depois que você é um semideus, nada

pode trazer sua vida de volta.

Aquilo me silenciou. Por um momento eu comparei nossas vidas. Meu pai

não está nem aí pra mim, a mãe dela também não. Minha mãe junto comigo

sempre. O pai dela não. Eu nunca tive um padrasto, ela teve e a mulher morreu por

sua causa. Eu vivi a vida inteira no apartamento, ela fugindo de monstros. A ultima

frase dela ainda ficou na minha cabeça. Ela é um exemplo vivo. Depois de ser

semideusa ela nunca terá de volta sua madrasta, que morreu em função disso.

No inicio, eu estava gostando disso. De ser um mestiço. De poder ter

mesmo as aventuras que lia nos livros de mitologia. Mas agora, sei que não é assim.

Que é muito pior do que eu pensava.

– Olhem isso – disse David com a voz tremula. – Para onde vamos?

Três caminhos. Três tuneis. Grandes. Olhei para cima por acaso e vi as

escritas, em grego antigo. Levantei Omega para ver melhor, e até mesmo ler.

– Aquele que ousa o senhor dos mortos desafiar... – estreito os olhos, mas

continua difícil de ler – A morte espera você nos ombros dos aspar... – me

interrompo porque ia dizer aspargos.

– Aquele que o senhor dos mortos desafia, perde a vida aos poucos e a

alegria. O ultimo a morrer e o primeiro a gritar, na lava de perda dos amigos sofrerá

– Selina fala, como se fosse tudo muito fácil.

Griffin ecoa em minha cabeça de novo, seguido de uma risada.

A visão. O aviso. O sussurro. A risada.

Page 90: Os poderes perdidos

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Tudo significa uma coisa: se Hades não me matar hoje, ele vai acabar com

todos os outros.

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Dezessete

MINHA ESPADA CAI

NO ABISMO

MEDO. Simplesmente medo. A arma mais poderosa de Hades. Nunca

escrita ou relatada em qualquer livro, mas que eu tive de descobrir sozinho. Medo.

O que eu estava sentindo naquele momento. Olhei para Selina, mas ela apenas me

olhou de volta, sem nenhuma fala, nada. Eu queria poder falar com meu primo

agora. Queria que ele me explicasse algumas coisas ou me aconselhasse, porque ele é

medroso, sim, mas sabe dar conselhos. Só que agora não era o momento, e ainda

que fosse, queria falar com ele sozinho, não algemado a outra pessoa...

– Então? – a Azul perguntou – Para onde vamos?

– Provavelmente só 1 deles é certo, os outros vai nos matar. – disse David.

– Um sorteio? – sugeri

– Vamos decidir nossa vida em um sorteio? – Selina reclamou – Vamos

analisar, ver os pros e os contras de cada um. Primeiro, estamos atrás dos poderes

Hades, certo?

– A não ser que vocês conheçam outro deus dos mortos sedento pelo meu

sangue – disse

– Espera... – a Azul disse – Você é o príncipe?

Ela disse isso meio com desdém. Provavelmente esperava alguém mais

experiente, mais velho.

– Infelizmente, sim. – eu disse e ela me encarou surpresa. – Prazer. – falei

tentando amenizar a situação, mas não funcionou.

Page 92: Os poderes perdidos

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– Estou perdida! – ela disse – Você sequer pode usar as 2 mãos!

Fiquei envergonhado, de certa forma. Eu devia ser uma figura de guerra.

Um... Ares da vida, sei lá. Por um momento desejei não ser tão novo e nem tão...

fraco? Desabilidoso? Não, não é essa a palavra. A palavra é vulnerável. O clima

ficou tenso, eu desviava o olhar para baixo enquanto a menina praticamente

despedia-se da vida.

– Hã... vamos continuar? – Selina sugeriu. Me deu vontade de abraçá-la por

mudar de assunto – Bem, analisando os tuneis. Um é mais largo, então tende a ser

mais curto. O dois é mais estreito e ao julgar pelas paredes áridas e feitas por uma

proporção ligeiramente contraria ao da estrutura original, eu diria que ele é,

basicamente, a metade de um ligeiro retângulo de dez metros cúbicos.

Selina nos olha e analisa nossos rostos. Todos os 3 ainda tentando absorver

as palavras super inteligentes e completamente sem sentido pra nós.

– Traduz – eu disse

– Vai acabar na metade em uma brecha estreita que vai nos impedir de

continuar ou até mesmo de voltar.

– Ahhh – todos nós dizemos. – E o terceiro? – perguntei

– Tem uma luz no final. Provavelmente vai chegar a algum lugar lá fora.

– Então? – a Azul perguntou

– Acho que o 3 – David votou e nós concordamos.

– Mas, provavelmente você está certo, David. 1 deles é certo, então se

formos todos para 3 e ele for errado, ninguém terá chances. É melhor nos

separarmos.

– Ok, eu e Selina vamos para o 1 e... – David começou a falar – Eu tinha

esquecido. Eu e a azul para o um, então.

– Vocês vão precisar de luz – eu disse e joguei meu relógio pra ele – Fica

com ele.

Ele concorda e depois que Selina e eu ficamos esperando os dois entrarem

(já que David reluta em ir na frente e resmunga algumas coisas). Entramos no 3º

túnel. Andando um ao lado outro, tendo como foco a luz no final dele. A cada

passo que damos, Selina praticamente se esconde atrás de mim.

Page 93: Os poderes perdidos

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– Você tem... medo do escuro? – perguntei, quebrando o silencio.

– Não. Mas você viu as frases. Eu devo estar na lista dele agora.

– De Hades? – perguntei e uma nuvem de sombras nos atingiu. Selina

agarrou meu braço.

– Quer fazer o favor de não falar nomes? – ela brigou – É como se você

estivesse o evocando.

– Desculpe.

Continuamos, em silencio, atentos a qualquer coisa que se movesse ou não

na escuridão. Caminhamos 1, 2 metros a frente, muito devagar e muito

cautelosamente. Eu avisto a luz mais forte, mas não a frente, ao lado, nos lados.

Cutuco Selina com o cotovelo e me aproximo da luz azul. Um círculo com algumas

pontas ao redor, azul claro, brilhante, enterrado na caverna. Um diamante.

– Não toque nisso! – Selina avisa segurando minha mão a dois centímetros

do objeto. – Pode ser uma armadilha. Na mitologia romana, o equivalente romano

do deus dos mortos comanda as pedras preciosas porque elas ficam abaixo da terra.

E tudo que fica abaixo da terra é de seu domínio.

Continuamos, eu com a cabeça voltada para trás ainda pensando se voltava

para pegar o diamante ou não. Provavelmente eu poderia arrastar Selina até lá, pegar

a pedra e por dentro do bracelete, mas se fosse mesmo uma arm... interrompo meu

pensamento quando dou de cara com um estalactite gigante. Tipo, do topo do teto

quase o final do piso.

– Ai – gemi e coloquei a mão na testa, mas assim que me movimentei o chão

tremeu.

– O que é isso? – eu e Selina falamos juntinhos. Só que eu apontando para a

pedra e para o chão, e ela pra luz forte que vinha de fundo do túnel. Em um

movimento rápido ela ilumina do seu lado, vê uma abertura mínima (talvez um

corredor). Ela olha de novo para o estalactite, para luz, para o túnel e só tem tempo

de dizer corre!

Tudo foi em menos de 5 segundos. Me joguei para dentro do corredor junto

com Selina antes do fogo atingir o túnel inteiro. Cheguei a queimar a camiseta

porque não deu tempo de puxar toda para o corredor. Estou olhando para as

chamas incessantes quando algo puxa meu braço com força.

Page 94: Os poderes perdidos

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– Corre Erick! Corre! – Selina estava gritando

De inicio eu não entendi o porque, até meus olhos conseguirem ver o

estalactite através das chamas. Solto, cravado no chão que era frágil o suficiente

para se romper inteiro com o peso da pedra. Começo a correr tarde demais, estou

apenas 1 passo a frente do desabamento do chão. O corredor não parece muito

curto e minha velocidade não parece muito boa, tanto que Selina está alguns passos

na minha frente. Olhei para trás, meus pés ainda pisam em um pedaço falso de

chão. É aí que o pânico me atinge. Começo a correr e a empurrar Selina na minha

frente, logo depois já estou alguns passos na frente dela. Mas o desabamento

consegue ser ainda mais veloz. O corredor começa a se estreitar de forma que deixo

Omega cair no buraco, mas ela parece estar caindo bem devagar (ou é fundo

demais). Um pequeno buraquinho ainda está aberto – o suficiente para passar uma

pessoa – no final do túnel, então empurrei Selina para frente e fiz ela passar. Antes

de passar estiquei a mão para o buraco e Omega veio até mim. Então passo pelo

buraco e já sou puxado túnel adentro.

Achei que tinha acabado, mas o chão começa a cair novamente. Corro de

novo, mas dessa vez tenho bastante vantagem. Mais ao longe, meus olhos avistaram

duas pessoas andando devagarzinho com uma luz dourada e redonda iluminando a

frente enquanto andavam.

– Corre! – eu gritei – David corre!

Ele se virou para mim com a sobrancelha ruiva franzida e meio boquiaberto.

– Erick?

– Corre!

Eu e Selina estamos a alguns passos deles e começamos a empurrá-los túnel a

fora. Com força, com velocidade e, principalmente, com medo, corremos até o fim

da linha. O túnel simplesmente acabou e nossos pés flutuaram por um segundo

antes de começarmos a cair. Para nossa sorte, a altura era mediana de forma que

caímos sem nos machucar muito.

Levanto a cabeça, esfrego os olhos e o galo na cabeça. Não enxergo nada.

Tudo escuro. Nenhuma luz. Apenas Omega que está bem longe de mim. Alguém

segura minha mão como apoio. Tento enxergar, mas continuo “cego”.

Page 95: Os poderes perdidos

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Uma. Duas. Duas luzes vermelhas fortes estão atrás de mim. Me viro a

tempo de evitar a terceira. Com o braço direito abraço algum corpo ao meu lado e

me jogo no chão com ele antes das chamas atingirem nossas cabeças.

Page 96: Os poderes perdidos

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Dezoito

Ganho um novo

amigo

A MAIORIA do seus amigos não te agradeceriam por quase quebrar o nariz

deles mas quando você salvou eles de serem cremados vivos eles acabam

demonstrando um tipo de gratidão. O corpo que joguei no chão era o de Selina –

era meio obvio já que estava com o braço direito algemado ao dela –, e machuquei

seu rosto. Causei cortes, sangue saiu de seu nariz, mas ela me agradeceu assim

mesmo. Conseguimos correr para trás de uma pedra antes da cobra que cospe fogo

atacar de novo.

– Ah, cara, o que eles veem nas cobras? – eu reclamei.

– Eu não sei – ela disse, limpando o sangue do nariz com a camiseta.

– Você ta legal?

– Já passei por coisas piores – ela disse sem convicção.

– Ótimo, e agora? Aprendeu alguma coisa sobre cobras alucinógenas que

cospem fogo?

– Não, eu desconheço essa criatura. Pode ter sido criada pelo próprio

Hades. De qualquer maneira, aqui não vai ser seguro por muito tempo.

Desnecessário falar, o fogo ainda se espalhou pelos lados da pedra que não

era muito grande. Então nós quase viramos uma pessoa só de tanta distancia que

tentamos tomar do fogo de ambos os lados. Tento olhar em volta procurar alguma

saída, mas nada me ocorre. No topo avisto uma luz, que não sei se é uma saída ou

um diamante. Rezo para ser uma saída. Mas mesmo que fosse, era alto demais, e

esta parte da caverna é em forma de funil. No topo, tem uma saída, mas é estreita.

Grande o suficiente para passar umas 5 pessoas mas nada comparado ao enorme

solo.

Page 97: Os poderes perdidos

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A cobra estava posicionada no centro, e pela luz que vinha do meio, onde o

corpo se alongava, eu diria que havia chamas. Hades não é o deus do fogo, mas

usou o elemento para seu aliado, e, de certa forma, esse é o elemento mais

pertencente a ele nas histórias. Bom, isso não importava pra mim naquele momento.

– Precisamos desatar isso – eu disse olhando a algema.

Outro disparo de fogo, nós nos encolhemos e vemos a pedra se esfarelar

pouco a pouco. A pedra estava diminuindo, eu morrendo de medo, e Selina mais

preocupada com o nariz do que o resto. Tento olhar em volta. não tenho muito o

que fazer aqui. Meu plano era o seguinte, sair daqui, bloquear o fogo com Alfa e

correr até a ponta, de lá eu dava um jeito. Toco o pulso vazio e me lembro que Alfa

não está mais lá. Bom, pelo menos ele estava sendo útil, vislumbro meu primo atrás

de outra pedra, segurando o escudo com força enquanto... rezava? Provavelmente.

– É o seguinte, a mordida desse bicho deve soltar a gente. – eu disse

– O que?

– Se ele morder a algema a gente se solta.

– Não, eu não vou... – outra rajada de fogo passou pelos lados da pedra. –

Escuta, pode ser que dê certo. Se conseguirmos esticar a corrente o suficiente para

atravessar a pedra dos dois lados e se conseguirmos fazer esse bicho morder... pode

dar certo.

– Ta, mas precisamos de uma distração – outra rajada de fogo, agora tirou

mais farelos da pedra. – Rápido.

Pensei em gritar para David, mas ele estava muito longe e nunca ia escutar e

mesmo que escutasse, nunca ia aceitar servir de isca. Os outros eu não vi, mas

provavelmente estavam escondidos. Combino com Selina de sair da pedra.

Corremos, corremos e os outros também (o que revela uma coisa: todas as pedras

estavam se desfazendo). O fogo começa a nos cercar, mas sem nos acertar, passa por

nosso lado, forma um circulo mantendo todo mundo dentro. A visão. A visão que

eu tive em sonho.

Quanto tempo eu tinha de vida? Uns 30 segundos, talvez? Mais? Menos?

Isso era meu tempo máximo. Uma sombra passa pelos meus olhos a esquerda, mas

não sei o que é. Provavelmente é a sombra da serpente. Olho em volta, a maioria

fechou os olhos, meu primo continua murmurando alguma coisa. Pelos deuses, era

a primeira vez que... deuses... Deuses! Eu nunca havia pedido nada aos deuses, mas,

Page 98: Os poderes perdidos

98

de certa forma, eu estava “fazendo um favor a eles”, então eles também podiam me

fazer um favor.

– Ã... pessoal do Olimpo... – eu disse mentalmente – Não seria mal uma

mãozinha agora.

– Assovie – uma voz grossa disse leve em minha mente e não era a voz de

Hades.

Não entendi no que um assovio podia me ajudar, mas eu não ia contrariar.

Assoviei. O monstro se preparava para dar o bote. Fechei os olhos esperando a

morte quando ouvi um barulho, um relincho. Abri os olhos e lá estava ele. Crina

branca ao vento, o pelo escovado e em boas condições, perto de suas patas mais

uma parte de pelo se abria cobrindo o casco, a característica mancha marrom no

focinho, e, a grande surpresa, as duas enormes asas brancas.

Agora estava explicado o por que de eu poder conversar com ele. Um

pegaso. Um ser... ã... alado. E isso podia fazer eu falar com ele por causa do meu

estranho parentesco. Eu acho.

– Chamou, parceiro? – ele disse pousando em cima da cabeça da cobra

– Preciso de uma ajudinha.

Desnecessário falar, todos correram. Eu e Selina fomos até a pedra, mas ela

estava longe. Olhei meu querido pegaso correndo pelas paredes redondas da caverna

enquanto o fogo quase alcançava suas patas. Corri mais um pouco e olhei de novo.

A cobra havia o deixado de mão e já tinha voltado pro seu principal alvo: eu.

Meu primeiro reflexo foi entrar pelo lado mais longe da pedra, já Selina se

atirou para o mais próximo dela e se escondeu, o que fez a corrente se esticar e dar a

volta na pedra. Não foi proposital, mas conseguimos. A cobra-infernal abocanhou a

pedra e levou muitos fragmentos, com eles a corrente. Sinto mais leve o braço

direito, vejo que se rompeu completamente a corrente que me prendia em uma luz

dourada.

– É incrível como a morte persegue as pessoas, não é mesmo? – Hades fala e

depois riu levemente

Agora, naquele momento eu estava mais do que nunca determinado a matar

aquela serpente enorme. Esperei ela se distrair com alguma coisa e comecei a correr

até o meu... parceiro, mas o caminho era longo e a distração pouco suficiente. Me

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99

atiro no chão e desvio da primeira rajada. Meu pé prende em uma pedra. Tento

puxar a perna, mas está grudada mesmo. Uma luz forte e alaranjada atinge meus

olhos e eu sei que é o fogo prestes a sair da boca do bichinho infernal. Tão

involuntário quanto inútil, levei a mão a frente dos olhos por causa da luz.

Uns 5 ou 10 segundos se passaram. Eu com os olhos fechados e imaginando

onde estaria quando os abrisse. No mundo inferior? Campos de Asfódelos?

Campos de punição? Tomo coragem e abro os olhos. Tudo o que vejo são as

chamas, a pouca distancia de mim e forçando pra me queimar. Foi como se...

existisse um campo de força que impedisse o fogo de chegar em mim.

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Dezenove

Mergulho para a

morte

FOI A PRIMEIRA vantagem em ser filho de Zeus que notei desde que me

descobri semideus. A cobra não havia parado de cuspir fogo e eu, exausto e tonto.

Rastejei até meu mais novo parceiro e o montei. Eu ainda estava tonto, como se

tivesse quase desmaiando, mas me mantive firme.

Voando conseguimos nos aproximar do animal, e eu estava certo. Havia um

circulo de fogo embaixo, onde o corpo do animal deveria estar, então eu só via a

parte de cima: O enorme pescoço e a cabeça gigante com olhos vermelhos e dentes

afiados.

– Hey bicho feio – eu chamei

O monstro se virou cuspindo fogo, mas meu pegaso era mais rápido e

conseguiu desviar. A cobra tentou atacar de novo, mas ainda sou mais rápido, e

dessa vez consegui desferir um golpe com Omega, ceifando o pescoço da aberração.

– Wow, era só isso? – disse

Algo chama me atenção. Selina. Ela está gritando algo pra mim, com certeza

deve ser algum estimulo ou um agradecimento por eu ter matado a fera então

apenas sorrio de volta.

– Segura! – disse meu pegaso na minha cabeça e mergulhou em direção ao

fogo.

Não entendi nada até ver as duas cobras enormes lá. Elas cuspiram fogo

juntas e só me salvei porque meu pegaso mergulhou em direção ao fogo... Ai

caramba ele mergulhou em direção ao fogo!

– Sobe, sobe, sobe! – eu dizia

Page 101: Os poderes perdidos

101

Pã! Ele subiu no ultimo momento me livrando de ser cremado vivo. Segurei

Omega com força. Se matei uma, mato duas, não é mesmo? Não, não é. Mas eu ia

me esforçar. Subi com o pegaso, agarrado em sua crina. Agora seria mais fácil,

porque os arqueiros disparavam flechas, o que me dava medo de eles acertarem em

mim alguma, ainda mais as de fogo, ou as explosivas (principalmente as explosivas).

Me aproximo de uma cobra que está distraída e ceifo sua cabeça, a outra vem

pra atacar, mas meu pegaso desvia e corto seu pescoço. Achei que havia acabado

quando mais 2 apareceram na minha frente, corto suas cabeças. Outras duas atrás.

Decepei-as também, mais 4 na frente e mais 4 atrás.

Olho para baixo, Selina pôs as mãos na cabeça ainda gritava pra mim, de

forma que talvez fosse melhor escutá-la. Digo ao pegaso para descer e ele tenta,

driblando aquele monte de cabeças, mas uma consegue nos acertar, não com os

dentes mas com uma cabeçada que me faz voar do pegaso em direção as pedras.

Pedras. Melhor elas do que o fogo.

A queda era de uns 10 metros. 9. 8. 7. 6. 5. 5, o numero que me fez rever o

pavor. A 5 metros do chão, pude ver que não era nas pedras que eu ia cair, e sim no

fogo. Pânico. Eu não tinha o que fazer a não ser me irritar com Hades rindo em

minha mente. Não, eu não podia morrer. Mas senti que estava. Eu não ouvia mais

nada, nem a risada, nem os gritos, nem o barulho das pedras. Eu só ouvia a batida

do meu coração... talvez a ultima batida.

Começo a gritar apavorado. Não, eu não ia desistir. Omega virou uma lança

em minha mão, estiquei-a pra frente e ela raspou em uma pedra. Até cravou, mas

logo se soltou. 3 metros. 2. 1. Fecho os olhos e não faço mais força, jogo as mãos

para cima e... sinto alguém agarrá-las. Abro os olhos. Meu anjo da guarda! Bruno.

– Segura firme. Segura firme. – ele disse, segurando minha mão com suas

duas.

Jogo os pés pra frente tentando alcançar as pedras e escalar, mas estou longe.

Não ouso olhar para baixo, só iria me dar mais pânico, se é que é possível. Mas

ouso olhar para o corpo dos animais... não, do animal, só tem um corpo. Um

corpo, 8 cabeças... Oh, céus! Eu cortei a cabeça de uma hidra! Eu só piorei as coisas.

Mas ainda tinha problemas maiores. Uma cabeça, uma cabeça vindo na direção de

Bruno. Era o fim. Ele a olhou e mesmo assim não me soltou, não correu. Ela está

perto, com a boca aberta pronta pra nos engolir quando de repente bum! Um

escudo dourado a luz do fogo atinge bem em seus olhos. O animal rosna e se vira.

Page 102: Os poderes perdidos

102

– Rápido. Vem. – David disse pegando meu outro braço. Juntos, ele e

Bruno me içaram.

– Onde está...?

– Ali – Bruno apontou. Selina contra uma cabeça, luta boa de se ver, mas ela

não duraria muito tempo. O bicho tentou abocanhá-la mas não conseguiu porque

ela rolou para o lado e desferiu um golpe certeiro no olho do animal. Ele urrou e

tentou golpeá-la de novo, mas ela conseguiu esquivar. Oh oh. Outra cabeça vindo

na direção dela, pelas costas, com a boca aberta e fogo pronto. Disparo em corrida,

mas sei que não vou chegar a tempo. Então descubro que não sou só eu que tenho

amigos. A azul vem... voando e da um belo chute no nariz da cabeça. Sim, ela estava

voando com um... sapato voador? Era o que parecia.

Puxei Selina para o meu lado, Bruno pegou a azul e a trouxe também. Pensei

que a hidra viria em nossa direção, mas na verdade ela tinha outras distrações, como

os outros. Eu queria salvá-los, mas sei que não conseguiria, então simplesmente

evito olhar. Selina me olha fixamente com ódio puro.

– Ta, como Hercules matou essa coisa? – perguntei

– Ele colocou fogo logo depois de cortar as cabeças, para que elas não

crescessem mais. Mas é inútil, eu já tentei – Selina afirmou.

– Então o que vamos fazer? – David perguntou

– Matar 8 vai ser difícil – Bruno afirmou

– Impossível – corrigiu a azul

– Se fosse só 1, era bem mais fácil – Selina me disse brava

– Eu não sabia, ok?

– Você acha que é só empunhar uma espada e vai resolver o problema!

– Você poderia ter avisado! – eu disse bravo

– Cala a boca você já estragou demais as coisas por aqui.

– Eu? Então porque não resolve isso, senhorita perfeição!

– Eu resolveria se você não tivesse chamado 300 cabeças da aberração. Seu

burro!

Page 103: Os poderes perdidos

103

– Eu sou burro? Você é... A rainha da idiotice!

– Rainha da idiotice? Quantos anos você tem, 5?

– 3, eu tenho 3!

– Parem! – Bruno gritou – Eu vou ter que jogar uma coisa na cabeça de

vocês para entenderem que tem que trabalhar juntos? E sem brigas?

– Jogar na cabeça... – Selina disse e seus olhos se iluminaram... ela me olhou

– Acha que tem no teto? – perguntei

– É claro que tem! Olha a estrutura disso! – ela afirmou

– O que tem no teto? – David perguntou

– Qual é o plano? – Bruno perguntou

– Precisamos de uma saída primeiro. – Selina disse – Precisamos de uma

arqueiro, rápido.

Olho em volta, as 8 cabeças estão tentando matar os outros 7 que se

escondiam. Um deles tinha que ser arqueiro... E sim, era! Avistei um arco, segui a

mão da pessoa, o braço e... Não! Ele não! Pedro segurava o arco com força, e tinha

apenas mais 2 flechas em sua aljava.

– Precisamos do Pedro. – eu disse

– David e Bruno, peguem ele. Digam a ele para abrir uma saída. Onde tiver

mais água nas paredes. Erick eu e Lívia vamos matar o monstro.

– Mas vai... – David começou

– Custe o que custar. Abram a saída. – Selina disse firme

Os dois saem correndo. Olho para Selina.

– Pedro tem 2 flechas explosivas na aljava, uma abre a saída, a outra quebra

as pedras. – eu disse

– Ele vai precisar das 2 para a saída. As pedras é com a gente. – Selina

respondeu

– Que olhos de águia. – Lívia afirmou – Literalmente

Page 104: Os poderes perdidos

104

– Onde está seu escudo? – Selina perguntou

– Ali – apontei para o chão. Peguei-o na mão. E peguei Omega também, em

forma de lança.

– Vamos precisar atirá-los. – Selina disse

Bum. Um enorme estouro vindo da direita me fez olhar. Rochas caíram,

pedras cederam, mas ainda não conseguiram fazer uma saída. Pedro encaixa a outra

flecha no arco. Tinha que ser rápido. Peguei o escudo e o joguei para cima com

toda a força. Ele sumiu na escuridão. Cract, o barulho do impacto. Seguro Omega

com força e a jogo também. Mais um barulho, mas não o suficiente.

Selina pragueja em grego antigo. Eu praguejo em grego antigo. Lívia nos

olha como se ainda não compreendesse. Olho para cima, estreito os olhos.

Estalactites balançam. Eles balançam rápido, bem rápido. Olho para onde joguei

Omega, um estalactite enorme balançando. Balançando.

– Corre! – gritei.

Peguei Selina pela mão e saí correndo igual a um louco para onde Pedro e os

outros estavam. Bum! A flecha explosiva de Pedro atinge a parede e abre um buraco

nela. Bum! O estalactite cai com o impacto. Não ouso olhar para trás, mas sei que

as cabeças da hidra estão sendo fincadas com pontas gigantes. E também sei que

alguns estalactites estão caindo no fogo, e que o fogo vai vim para cima de nós

como uma onda.

Tumulto, um tumulto correndo para a saída. Mesmo sendo apenas 12

pessoas, o volume era grande. Consigo chegar a saída puxando Selina para fora,

saímos pro lado e um pouco de magma ainda sai da caverna. Caímos no chão.

Exaustos, cansados. Confusos e chamuscados. Mas vitoriosos.

Page 105: Os poderes perdidos

105

Vinte

Me comunico com

uma filha de

Afrodite

TODOS FICARAM felizes quando viram a nuvem de fumaça enorme que

saiu da caverna. Alguns vieram agradecer a gente, outros vieram cantando felizes,

alguns olhavam em volta pensando em fugir.

– Terra, fogo e água. – eu disse pra mim mesmo – Falta apenas 1 para eu

poder ir pra casa

– Nós irmos pra casa – David disse

– Eles pegaram a vovó?

Ele assentiu triste

– Sim. Mais uma pessoa pra você ter que salvar.

– Nós termos que salvar – eu disse dei um soco de leve em seu ombro.

Embora ele fosse mais velho, era mais baixo, e sempre inseguro. Mas mesmo assim,

ainda era meu melhor amigo. – Você fez um ótimo trabalho hoje.

– Não, eu só joguei o escudo – ele disse, mas é claro que estava feliz com o

elogio. – Eu nem sei o que querem comigo aqui.

Page 106: Os poderes perdidos

106

– Iam dar falta da gente. Você, a vovó. Seus pais ainda vão dar falta de

vocês.

– Não vão, não. Eles acham que estou com a vovó, nem vão ligar. Ainda

bem que ninguém se feriu.

– Ah, não.

– O que foi?

– Meu parceiro... Hey, você está bem?

– O que? – David perguntou

– Qual é, parceiro, ninguém derruba o alazão aqui tão fácil. – o pegaso disse

em minha mente

– Ainda não sei seu nome... – disse

– O mandachuva, pegaso rei cara. Hercules.

– Belo nome – observei – Até mais.

– Com quem estava falando? – David perguntou – Você está bem?

– Estou, eu só estava falando... com um amigo alado. O nome é Hercules,

estou em dívida com ele.

– Onde vamos agora? – David perguntou

– Eu não sei... talvez devêssemos esperar. Mas, enquanto isso, me fale desse

acampamento que você frequentava.

***

Ficamos lá por mais ou menos uma hora. O suficiente para David me contar

bastante dobre o tal acampamento. Ele me falou que lá é o lugar ideal para mestiços

e Olhos-de-Vidro. Ele disse que lá tem um lugar para cada deus, uma casa pequena.

A mais populosa nesse ano foi a de Hermes... Hermes gosta muito das pessoas a

quem ele entrega as mensagens, suponho. O acampamento também tinha tarefas

diárias de treinamento, como arco e flecha, escalada, equilíbrio e a coroa de louros.

Pela descrição dele era o paraíso, lá se tinha paz, amigos e tudo de bom... pelo

Page 107: Os poderes perdidos

107

menos tinha, agora com esse lance de guerra que está pra acontecer, provavelmente

deve ter abalado toda essa estrutura.

Quando Aron e Quíron foram nos buscar, nos levaram para outro lugar. Um

prédio. Sim, como apartamentos. Mais espaçosos e tudo mais, mas quando

olhávamos pela janela só víamos escuridão e vultos. Ninguém nunca ia conseguir

escapar. A boa noticia era que tinha um chuveiro e a má era que Pedro voltou a

ficar com a gente. Era difícil pra mim olhar pra ele sem querer matá-lo

repentinamente, mas eu havia recebido bons conselhos quanto a isso. Já era noite

quando parei de andar de um lado pro outro no apartamento, uma coisa me

incomodava: a profecia ainda não resolvida.

As 4 relíquias juntas estarão, caso contrario 10 dos 13 cairão... Não fazia

sentido, não a segunda parte. As 4 relíquias, os cristais tem que estar juntos, caso

contrario 10 dos 13... os deuses, 13 deuses contando com Hades. Agora porque

10? Isso não fazia sentido... Depois de me cansar, me deitei e adormeci e o que eu

esperava dessa noite? Visões, pesadelos, coisas horríveis, mas apenas caí no sono.

***

Acordei com o barulho da porta batendo. De um sobressalto eu pulei da

cama. Havia esquecido que estava ali, provavelmente eu sonhei que estava em casa,

mas pena que eu não me lembrava do sonho. Olhei em volta, ninguém nas camas, as

camas estavam desarrumadas e limpas, diferente de mim. Me levantei e me olhei no

espelho.

– Santo deus da guerra. – murmurei

Eu estava... horrível. Sujo, mais magro, os cabelos pareciam eletrocutados.

Em meu rosto tinha manchas de sujeira, manchas de sangue e manchas de coisas

que sequer sabia o que era. Minhas roupas estavam chamuscadas, meus olhos com

enormes olheiras e o corpo então... pura fuligem. Eu não havia me olhado no

espelho desde que cheguei aqui.

– Acho que um banho te faria bem – Selina disse pelas minhas costas, quase

caí de susto. Me virei. Ela estava... diferente. Os cabelos estavam molhados e soltos,

ela estava limpa, roupas limpas também. Uma blusa branca com rosa, calça jeans e

um tênis rosa. Ela estava... ah deixa pra lá.

– Pra você fez – eu disse meio sem pensar

Page 108: Os poderes perdidos

108

– Com certeza, pra todo mundo deve fazer. Tem roupas limpas nos

armários. Deve ter o seu tamanho.

– Que horas são? – perguntei

– Agora? 12:30. Você dormiu ein? Quem dera eu pudesse ter tanta paz no

sono.

– E Pedro?

– Saiu. Disse que a perna estava doendo e saiu. Melhor pra nós – ela deu de

ombros – Ah, tem comida na geladeira.

– Que comida? – perguntei

– E importa? – ela riu

Eu fui até o armário, guarda-roupas. Tinha algumas roupas lá, uns casacos,

ternos, vestidos. Passei a mão em uma camiseta azul marinho, calça jeans, tênis

brancos e meias pretas. Me perguntei se as roupas já estavam ali ou se foram

colocadas por algum servo de Hades. Me dirigi ao banheiro e comecei o banho.

Esfreguei o rosto e tirei o sangue seco. Tirei as fuligens do cabelo e gastei quase

todo o xampu até tirar o fedor de peixe. Eu me sentia melhor. Renovado. Bem. Me

vesti e ainda achei pasta de dentes, a qual eu usei para escovar os dentes com o dedo

(é meio anti-higiênico, eu sei, mas é melhor do que usar escovas dentais de quem

você nem conhece). Me olhei no espelho novamente depois de sair do banho.

Agora sim. Os cabelos loiros estavam penteados, as roupas limpas, o rosto limpo e

os olhos... bem, melhores.

Fui até a geladeira. Tinha um hambúrguer e uma latinha de pepsi lá. Era

melhor que nos outros dias que eram só cereal e suquinho. Fui até a mesa e Selina

estava lá, lendo alguma coisa. Um livro, provavelmente achou na casa.

– Patético – ela reclamou – Ridículo.

– O que foi?

– Esse livro. É ridículo. – ela fechou o livro, e se arrumou na cadeira – Eu

vou sair

– Pra onde?

– Tanto faz, estou cansada de ficar aqui – ela disse

Page 109: Os poderes perdidos

109

Eu queria pedir para ela me esperar, mas fiquei um pouco com vergonha e

estava muito faminto para parar de comer. Terminei a refeição em silencio. Fiquei

um tempo lá ainda, olhando pela janela, olhando a escuridão profunda. Eu não

aguentaria ficar mais um minuto ali. Eu não sabia aonde eu ia ir, aí me lembrei que

precisava alertar alguém.

Desci as escadas até onde me informei com Lívia era o lugar dos verdes. Bati

na porta e quem me atendeu foi a pessoa certa: Bruno. Só que atrás dele Pedro

vinha vindo.

– Eu já estava saindo – ele disse. Também estava limpo e arrumado, mas

ainda caminhava com dificuldade. Depois que ele subiu as escadas Bruno se virou

pra mim.

– E então? Você está bem diferente, em? – ele disse – Quer entrar?

– Ã... sim – eu passei pela porta. O apartamento deles não era tão bonito,

era bem mais simples, mas ainda assim era aconchegante. Ele me mostra um sofá,

nós nos sentamos um de frente para o outro. – Você está sozinho?

– Tem uma no banheiro, mas ela está tomando banho, não se preocupe – ele

se ajeitou na poltrona. Seus cabelos pretos estavam arrepiados e os olhos castanhos

estavam brilhantes, ele usava uma camiseta branca polo e calças jeans. – Olha, eu

acho que sei do que você quer falar...

– É, eu acho que você sabe. – eu disse – Mas antes de tudo, eu quero

agradecer a você por ontem, você me salvou. De verdade, eu ia estar morto agora.

– É isso que os amigos fazem, não é? – Ele disse e forçou um sorriso.

– É. Bem eu estou aqui para alertar você. Já tem um tempo que eu... descobri

sobre Pedro. Ele... – baixei o to de voz – é filho de Hades.

– Eu sei – ele disse triste – Mas não posso simplesmente mandar ele embora,

ele pode me matar!

– Eu sei... mas toma cuidado, ok? – eu disse e me dirigi até a saída. Ele

apertou minha mão e notei algo estranho. Uma marca. – O que é isso? Você é filho

de quem?

Aquilo soou idiota e impulsivo. Eu sei o quanto é delicado falar da família,

mas simplesmente saiu. Involuntariamente. É sério.

Page 110: Os poderes perdidos

110

– Ah – ele puxou o braço – Eu sou filho de Hefesto. Estranho, não é? Eu

achava que... ah sei lá, achava que não era Hefesto.

– Ah, certo. Eu também, não achava que você era filho de Hefesto.

– Você é filho de Ares? – ele perguntou

– É... – toda a longa a história sobre Marte me veio em mente, e eu estava

com preguiça demais para contar. – Sim.

– Legal. – ele disse e eu fui embora.

Logo depois de subir as escadas do apartamento, eu sentei no sofá e minha

cabeça começou a doer muito. Latejar de verdade. Levei a mão nela e de repente eu

estava vendo fog, fogo para todos os lados. Sacudo a cabeça, fecho e abro os olhos

varias vezes. Durou uns 5 minutos até passar. Quando volto a mim Selina e David

estão abrindo a porta.

– Como está Tomadinha? – Selina pergunta, de um modo frio.

– Ótimo – meti – E vocês?

– Bem – Selina respondeu ainda fria

– Eu to legal – David disse feliz e então começou a andar na direção de uma

parede. – A quanto tempo estão capturados.

– Sei lá, uns 15 dias?

– 17 dias, 12 horas e 30 minutos – Selina disse

– Como você sabe disso? – perguntei

– Eu sei das coisas, ta? Por que, David?

– Então... hoje é dia 24 de dezembro. – David disse – Véspera de natal.

– E daí? – perguntei

– Daí – Selina disse –, que amanhã fecha os exatos 100 anos do Pacto de

Sacrifício.

***

Estava anoitecendo e não me importava que horas eram, eu só queria

dormir. Pedro chegou no apartamento minutos depois de David sair. Ele apenas se

Page 111: Os poderes perdidos

111

deitou e riu pra mim. Aquilo me enojava, eu poderia ter morrido diversas vezes por

causa dele, mas aquilo sequer o incomodava. Tive uma noite tranquila de sono,

certo? Errado!

O meu sonho não foi bem um pesadelo, mas também não foi agradável. Vi

nosso antigo acampamento, o antigo mais recente. Nak estava ajoelhada envolta de

um menino moreno de olhos róseos. Ela chorou e colocou uma bandagem em cima

da testa do garoto. Este estava desacordado, mas mesmo assim se contorceu um

pouco. Olhei em volta. Os outros estavam dormindo, em seus sacos de dormir na

rua. Aquilo me comoveu, Nak e o garoto. Eu me aproximei deles e olhei o menino

com calma. Eu iria dizer alguma coisa, mas sei que seria inútil, ninguém me ouviria

mesmo.

– Ele vai ficar bem – eu disse alguns minutos depois.

Nak se virou a procura do som.

– Alguém está aqui?

Ela me ouviu... Ela me ouviu! Senti meu corpo saindo do sonho, me senti

voltando a cama, deitado.

– Socorro! Apartamentos, escuridão, cidade! – gritei e acordei sentado na

cama suando frio.

Page 112: Os poderes perdidos

112

Vinte e um

Vou para o

templo nas

nuvens

MINHA CHANCE, minha única chance de informar onde estava, de dizer

onde Nak e os outros deveriam ir, onde eles poderiam me libertar! Eu ponderei, me

alto puni com xingamentos diversos e perdi o sono. Já era umas 9:30 da manhã e eu

estava inquieto. Limpei a geladeira. Deixei apenas um pouco de queijo e presunto

para meus amigos e desci todos os andares até o térreo. Ninguém me parou nos

corredores, nem mesmo na saída. Andei um pouco por onde a escuridão não

abrangia e dei de cara com Aron.

– O que faz aí, adolescente impertinente? – ele perguntou para mim.

– Nada, eu só...

– Nem fale nada! Vá se vestir, ali a direita. E se arme também. – Era a

primeira vez que ele não xingava – Jovem insolente – ele murmurou. É, talvez eu

estivesse errado.

Segui a direita. Armaduras de couro, bronze e pele estavam ali. Optei pelas

de couro. Eram mais leves e senti que esta manhã eu precisaria correr muito. Eu

tinha um plano. Arriscado, muito arriscado, mas era um bom plano.

Depois de por a couraça de couro, os braceletes, as botas – essas também

tinham uns espinhos – e pegar o elmo – que por sinal era bem melhor e se encaixo

direitinho em minha cabeça – eu fui até a prateleira com as espadas. Olho elas. São

muitas. Me encanto em uma espada de ouro com a haste do cabo curvada para

baixo, mas esta é muito grande e para concluir meu plano eu precisaria de

velocidade, precisaria correr. Pego uma outra dourada, tem um brilho forte, e é bem

Page 113: Os poderes perdidos

113

clara. Não diria que ela era de ouro, era um dourado da luz do sol. Ela se encaixa

bem em minha bainha.

Eu havia perdido Alfa e Omega, mas foi por uma boa causa. Pensei em pegar

outro escudo, mas lembrei que esse não se transformaria em um relógio, como Alfa

fazia magicamente. Peguei algumas facas. Coloquei uma em cada bota, uma em cada

bracelete e ainda enfiei uma no cinto de munição. Coloquei nele também outras

coisas como um punhado de corda. Não sei pra que precisaria, mas precisaria.

Coloquei também um arco nas costas – nunca fui bom em arquearia, mas talvez

precisasse.

Eu estava preparado. Meu plano era simples. Pegar os poderes do meu pai e

fugir para o Olimpo. Como eu chegaria no Olimpo? Onde fica o Olimpo? Esperava

apenas que Hercules soubesse me responder. Consequências? Morte, perda da mãe,

do primo, da avó e dos amigos. Agora e se eu não fizer isso? Hades vai provocar

uma guerra do cão que provavelmente vai matar todo mundo. O trecho da profecia

vem a minha mente: As 4 relíquias juntas estarão. As 4... eu só vou levar uma... deve

servir para alguma coisa. Deve não, tem que servir.

***

Não demorou até todos se arrumarem. Eu, armado até os dentes e inquieto.

O vento estava gélido, cogelando meus ossos, mesmo a camiseta sendo de manga

comprida e a armadura e os braceletes esquentando bastante, ainda estava frio.

Quíron passa por mim, enquanto respiro fundo.

– Deixe-me ver – ele pega a espada de minha bainha e a analisa. A sensação

de ter que olhar para cima cada vez que ele esta perto de mim não é boa. Ele deve

ter uns dois metros mais ou menos. – Titânio primordial revestido com os metais

da ilha do sol... Boa escolha – ele disse e sorriu pra mim.

Forço um sorriso. Não foi minha primeira escolha, nem a segunda. Tenho

uma tendência forte para armaduras pesadas, mas hoje consegui manter o foco.

Aron da a ordem de nos agruparmos com nossos parceiros. Selina e Pedro estão ao

meu lado. Olho para ela. Vestiu a armadura de pele e trançou os cabelos para o

lado. Sorrio para ela.

– Pronta para o fim? – perguntei baixinho.

– Você nem imagina o quanto – ela respondeu com um sorriso maligno no

rosto.

Page 114: Os poderes perdidos

114

Aron abre uma frasco com um conteúdo sólido azul dentro e o joga no ar.

Vejo em câmera lenta a areia azul se agrupando em forma circular e girando

formando o portal. Antes de passar, peço a meu parceiro, Hercules, para ficar

preparado ao meu chamado, depois volto minha visão para o portal. O lugar onde

sairei é lindo. Ruínas. Pedras brancas de formas arredondadas contornavam

montanhas que faziam desenhos a paisagem. Eu não via nenhum campo, apenas

rochas. O sol brilhava e o céu azul estava com algumas nuvens estrategicamente

espalhadas para o dia ficar perfeito. “Bom, não é um lugar ruim para morrer”,

pensei.

Atravessei o portal. O local era ainda mais bonito de perto, estava quente e

aconchegante. E só tinha um fator paranormal na paisagem: as nuvens abaixo de

meus pés. A pedra por onde eu andava era praticamente uma ponte, só que natural.

Ela estava íngreme de forma que continuávamos subindo. Selina olhava

constantemente fixo para frente e dava os passos com muito medo. Eu a ofereci

ajuda, mas ela apenas resmungou algumas coisas. Eu estava ótimo, estava em casa.

Provavelmente ninguém sobreviveria a tantos pés de altura, mas somos semideuses e

o lugar pode ser mágico também. Depois de mais ou menos meia hora de subida

pude avistar um templo. Enorme. Esbelto. Dourado a luz do sol e em forma

retangular. Não era nada parecido com o Parthenon. Talvez até mais belo.

Não demorou muito até entrarmos no templo. E este era incrível. Havia uma

estatua de meu pai com um raio majestoso na mão e na outra o famoso escudo

Aégis – aquele que contem a “imagem” da cabeça da Medusa –, mais adiante havia

escombros, poeiras e outra forma incrível. Era como um grifo das historias antigos,

mas diferentes. Tinha todo o corpo de um enorme leão branco, com os dentes

afiados e os olhos fechados, e as enormes asas albinas de uma águia.

– Uau – eu disse e fui com a mão na pata da estatua. Tirei um pouco de

poeira e a pata enrijeceu. Levantei a cabeça. O animal abrira os olhos azuis tanto

quanto os meus. A grossa camada de poeira e areia que cobriam o bicho começou a

se quebrar e tive menos de dois segundos para me atirar no chão antes que o

enorme grifo desce o bote.

Page 115: Os poderes perdidos

115

Vinte e um

Meu amigo sai de

férias adiantadas

O SUSTO que eu levei foi grande. O servo de Zeus passou por cima de

minha cabeça e partiu direto pra cima dos outros. Ele abocanhava um, arranhava

outro, e muitas vezes até empurrava eles para fora do templo. Uma das meninas –

uma verde eu acho – caiu para fora. Eu corri até ela, tentei segurar sua mão, mas

não consegui... de novo. A segunda pessoa que deixei escapar, que não consegui

salvar desde que vim pra cá. Volto para dentro com raiva. O animal é um servo do

meu pai, mas achei estranha a possibilidade de eu poder falar com ele. Não custava

tentar, afinal, não sei que chances teria e também quanto tempo eu teria. Até o fim

do dia talvez.

– Ei, cara... quer dizer senhor – eu comecei – Vamos conversar em paz...

De repente ele pulou em cima de mim e cerrou os dentes perto da minha

cabeça. Por acaso você sabe como é ficar um cavalo enorme e gordo em cima de

você? Não? Que ótimo, não é nada bom. Por um momento eu achei que ele fosse

me matar. Desviar o olhar seria rendição e encarar seria desafio. Eu o encaro, vejo o

meu reflexo em seus olhos. O elmo voou de minha cabeça, mas creio que ele não

fosse útil agora.

– Só não o mato em nome de MeLord – rosna ele e voa em direção aos

outros. Ele pega uma garota pela perna, eu não a conheço, mas mesmo assim.

– Espere! – eu gritei – Acalme-se.

– Você está me fazendo perder tempo, garoto – ele rosnou ainda

encurralando os meninos – Estou trabalhando. Vá embora antes que eu o mate

também.

Só aí eu vi os esqueletos no meio do templo. Estavam todos caveiras, apenas

com as armaduras e algumas espadas e escudos jogadas de lado.

Page 116: Os poderes perdidos

116

– Eu tenho uma mensagem. De Ze... De LordZeus. – Menti. Espero que ele

não tenha um senso que diferencie a mentira da verdade. Ele parou de rosnar e se

virou para mim. – Eu venho como mensageiro. Esses são meus amigos – digo essa

parte em alto e bom som – Eles vão largar as armas e nós vamos conversar. – largo

a espada dourada no chão. Os outros seguem meu exemplo.

– Por que Hermes não vieste trazer esta mensagem? – O Grifo disse

– Meu pai não confia no deus – disse sem pensar – Ele não tem sido

profissional com as entregas. E além do mais, é melhor um filho dele falar com

você.

– Prossiga – ele disse

– Meu pai... – eu comecei – Acha que você têm feito um ótimo trabalho, no

entanto, há muitos anos que você está aqui. E já está na hora de descansar. Um

outro... guardião está para vir e ele deve assumir o seu lugar aqui, mas não se

assuste. Encare como... Ã... férias.

– Férias? Hoje? – ele disse incrédulo. Meu estomago se revirou, e se ele não

acreditasse? Meu argumento era idiota, mas era o único que tinha.

– Sim, sim. O contrato de trabalho dos 100 anos espira hoje. Entende?

– Talvez eu goste dessas férias.

– Ah, claro. Você vai adorar, vai ser bom. Pode ver os amigos... – eu disse –

A família.

– Ótimo. Mande cumprimentos ao Lord por mim.

– Só mais uma coisa – eu disse – O cristal. Tenho de devolvê-lo a ele.

O animal me deixa se aproximar e retirar o cristal de seu pelos na cabeça. Se

eu achei que os poderes de Pedro fossem bons, é porque eu nunca tinha tido

contato com os do meu pai. Relâmpagos surgiram nos céus. No mármore antigo

vejo meu reflexo: os cabelos se arrepiaram novamente, os olhos passaram a ser um

azul brilhante e pareciam sempre eletrificados. Senti como se o mundo estivesse a

meu alcance. Senti como se eu pudesse fazer qualquer coisa. Eu me senti como um

verdadeiro rei do Pedro.

Me lembro de meu plano. O grifo já voou, peguei a espada dourada no chão

e coloquei a na bainha. Olhei para Pedro, depois para Selina. Os dois se entre

Page 117: Os poderes perdidos

117

olharam logo depois de mim. Em um movimento rápido eles cataram as espadas e

dispararam em minha direção. Eu corri pelas ruínas do outro lado do templo.

Page 118: Os poderes perdidos

118

Vinte e dois

Sou acusado de

traição

COMO FILHO DE ZEUS, eu saí saltando perante as pedras e correndo a

toda velocidade, enquanto Selina e Pedro corriam com cuidado, um tentando

ultrapassar o outro. Corri mais um pouco e olhei para trás. Selina estava a frente de

Pedro que corria desesperadamente. Volto a visão para frente e consigo pular no

ultimo segundo; o chão acabou. Pulei e consegui cair em um gramado que estava

bem distante das pedras. Selina se apavorou, arregalou os olhos e logo os fechou

antes de pular. Ela quase caiu, mas eu a puxei para o gramado a ajudando a subir.

– Vamos sa... – Não completei a frase. Ela puxou uma das asas da sua coruja

de prata e esta se transformou em uma de suas laminas fascinantes. Ela cortou meu

braço. Me afastei surpreso e então tive que desviar de seus golpes contra a minha

cabeça. – O que está fazendo?

– Ah, não me venha com essas conversas, traidor! – Ela disse com raiva.

Ficamos nos encarando por um tempo. Poucos segundos, mas se percebe

muito em um olhar. Ela me olhava com ódio, decepção, tristeza e até mesmo um

pouco de... duvida.

– Erick! – Pedro gritou e uma de suas flechas quase atingiu o corpo de

Selina e quase atingiu a minha mão. Não entendi direito. Selina me atacou e me

chamou de traidor. Pedro atirou uma flecha em direção a nós. Quem ele queria

acertar? A mim, ou a Selina? Bem, eu não que ia ficar para descobrir. Depois de ver

Pedro pular para o gramado e encarar Selina com os mesmos olhos que ela me

encarou, eu corro para a floresta.

As arvores arranharam meu rosto e o chão de terra um tanto molhado e

desnivelado me fez tropeçar e cair. Não senti a queda, talvez por causa dos poderes.

Talvez eu não sentisse mais dores por eles. Rezei para estar certo quando uma

Page 119: Os poderes perdidos

119

flecha caiu fincada na terra ao lado do meu rosto e em seguida escutei os passos de

Pedro e Selina correndo até mim; com raiva e querendo me matar.

– Ela é traidora, acabe com ela – Pedro gritava

Me levantei e logo escorreguei novamente em um barranco de terra. Rolei

algum metros e machuquei o braço em um galho, mas antes mesmo de eu me por

de pé ele já havia curado. Assoviei um coro para chamar meu pegaso. Seria um tã dã

dã tã dã em assovio. Ele não respondeu. Eu praguejei. Onde diabos ele estaria

agora que eu mais precisava? Virei para correr quando as raízes de uma arvore se

enrolaram em meus braços e depois em minhas pernas e começaram a ir em direção

ao meu pescoço.

– Muito obrigada – Selina disse pegando o cristal e saindo de perto

correndo pela direita. Uma flecha cortou uma das raízes. Não foi proposital pela

cara que Pedro me olhou.

– Eu vou atrás dela – ele disse como uma explicação.

Com a mão livre eu me livrei do resto das raízes e saí em disparada atrás

deles. Não demorou muito para eu alcançá-los. Pedro atirava flechas

constantemente contra Selina que corria e desviava delas. Uma das flechas passou

de raspão em seu pé. Ela caiu no chão e se virou com os olhos... extremamente azuis

e elétricos. Ela esticou a mão para Pedro e eu fechei os olhos. Ele não foi atingido

(e nesse momento nem sei mais se isso é bom ou ruim), mas a arvore ao lado dele

quase caiu com o impacto e o estrondo foi horrível. Selina voltou a correr, sem

olhar para trás.

Eu e Pedro a perseguimos até ela se encurralar entre pedras. Nós lutamos.

Nós dois. Ela desferiu golpes contra meu corpo. Eu desviei e investi contra seus

braços e acertei um golpe. Certeiro! Bem no compartimento do cristal! Os poderes

caíram no chão, nós dois o olhamos, mas Pedro nos impediu chegando e pisando

em cima do cristal.

– Já chega – ele disse. Estava com um corte feio na testa e me perguntei se

não foi Selina que o machucou. Pedro pôs a sua... espada? Sim, era a primeira vez

que o via com uma, no peito de Selina, que pôs uma de suas laminas de coruja em

meu pescoço. Eu ponho a espada dourada contra o peito de Pedro. – O que? Você

está louco? Ela é a traidora, não percebe?

Page 120: Os poderes perdidos

120

– Cale a boca, idiota – Selina protestou – O principezinho é que nos

enganou!

– Eu? – disse assustado – Eu sou o principal alvo do demoniozinho aqui –

pressionei mais minha espada contra o peito de Pedro e ele fez o mesmo que eu em

Selina. – Como eu posso ser o traidor, vocês sabem que tenho a marca de Ares e já

provei que sou filho de Zeus. Como eu poderia?

– Não venha com essa. – Selina disse com raiva – Eu confiei em você, sabia?

E eu não posso ser a traidora, em todas as visões sempre foi um homem! E ainda

tenho as duas marcas para comprovar isso!

– Tem a de Atena, pode ser falsa – disse Pedro pra ela. Nos estávamos como

um triangulo. Um com a espada no outro.

– Você por acaso está duvidando da minha inteligência? – Selina disse com

os olhos raivosos que apenas agora estão voltando ao verde musgo de sempre.

– Eu sou filho de Apolo, eu fui possuído pelo tal espírito e ainda sei muito

bem usar um arco! – Pedro justificou

– Você me chamou de príncipe! Você tentou dar uma de coitadinho sempre,

mas na verdade era você que estava nos traindo o tempo todo – Eu gritei

– Você até que finge bem, tomadinha – Selina disse e baixou a lamina até o

ponto onde senti meu coração parar de bater. – Eu teria acreditado em você se não

tivessem me aberto os olhos.

– Cale a boca traidora – Pedro gritou

– Quem te abriu os olhos? – disse tremulo.

– Ora, o único amigo que tive pelo jeito! Mas não te interessa!

– Espera... – Pedro começou – Também me abriram os olhos.

– Eu... – eu disse – Quem disse a vocês?

– Bruno – Selina disse – Ele disse que Erick era o traidor, ele me convenceu

disso.

– Bruno disse que você era traidora – Pedro falou confuso – Ele disse que já

desconfiava de você.

Page 121: Os poderes perdidos

121

– Ele também me disse que você era traidor, Pedro. – abaixo a espada. Meu

sangue ferve. Flashs e lembranças me vem a mente fazendo com que tudo faça

sentido – E isso só quer dizer uma coisa: Bruno é filho de Hades.

Page 122: Os poderes perdidos

122

Vinte e três

Faço um home

run no rio de

janeiro

O MEU REFLEXO foi tão rápido quanto a lamina negra da espada de

Bruno. Ele saiu da floresta com a espada sombria empunhada com força em direção

a nossas cabeças. Meu sangue ferveu. Eu nunca havia desconfiado dele! Ele me

enganou! Ele enganou a todos! Ele colocou um contra o outro, e se não fosse por

sorte teríamos nos matado, por nada.

Me virei novamente e me levantei. Meus olhos percorreram o perímetro

automaticamente atrás do cristal. Ele estava bem na ponta de uma arvore. Mas a

visão que me chamou mais a atenção foi a espada negra e sombria de Bruno

apertada contra o pescoço de Pedro. O meu amigo largou o arco no chão e pôs as

mãos para cima. Seus olhos estavam arregalados e ele estava completamente

petrificado. Levei a mão em direção a minha bainha, mas Bruno apenas balançou a

cabeça em negativa sadicamente com os olhos bem abertos e a boca levemente

aberta.

– Vá e frente, e eu corto a garganta dele! – ele disse. Ele estava diferente.

Parecia mais forte, sua postura estava completamente diferente... de fraco e

oprimido a líder e intimidador. Seu rosto estava normal, tirando pela fisionomia

sádica e os olhos. Os olhos estavam castanhos, como sempre mas alguma outra

coisa brilhava por trás deles. Os olhos. Minha avó sempre diz que vemos quem

somos pelos olhos. Olho para Selina, ela está agachada com as mãos para cima se

levantando devagar. Sigo seu exemplo. – Bem quietinhos. Argh, eu não aguentava

mais isso aqui – Bruno reclamou. Com uma mão apenas ele retirou dois vidros de

seus olhos. Lentes. Ele é tão... esperto (a palavra dói em minha mente, mas é a

verdade) que colocou lentes para não ser denunciado pelos olhos. Os olhos. Negros

Page 123: Os poderes perdidos

123

como a noite que causam a mesma impressão dos de Hades, seu pai: se você olhar

por muito tempo, vai se perder na escuridão sem fim para sempre.

De pé, eu tento pensar em alguma coisa, mas nada me vem em mente. O

único plano que eu tinha era pegar o cristal do Céus e combater Bruno, ou levar ao

Olimpo. Mas eu não havia como ter acesso a estes poderes, a não ser que...

– Por que está fazendo isso? Por que está se revoltando? – eu disse. Olhei

com o canto do olho para o cristal e tentei me concentrar. Eu não poderia fechar os

olhos, ou sequer manter os olhos fixos nele, mas eu tinha que tentar me concentrar,

e em algum momento, eu teria de conseguir – Não vale a pena.

– É claro que vale a pena, Griffin. – ele disse. O mais incrível nele era que

mesmo tendo a atenção voltada a mim, sua espada continuava do mesmo jeito,

como se o braço e a mão não fizesse parte do corpo e tivesse vida própria, cortando

a garganta de Pedro se ele se movesse – Se eu não fosse matá-lo, eu não perderia

meu tempo. Mas um verdadeiro Rei tem que treinar o seu discurso não é mesmo? –

ele riu e, sem olhar para o lado, fez um corte na camiseta de Pedro, do inicio do

tórax ao meio do peito, perfurando um pouco de sua pele. Olhei para o lado, Selina

engoliu em seco e levantou as mãos novamente.

– Os deuses já estão a tempo demais. O mundo precisa de melhoras!

Modelar tudo a nossa imagem. O plano já está feito. Meu pai vai subir no trono, e

eu vou ficar com todo o reino dos mortos. Por que eu não trocaria a vida idiota

onde tenho que servir a esses hipócritas inúteis por uma vida de rei em um império

onde eu vou comandar tudo? Só se eu fosse um verdadeiro idiota. E ainda, os

deuses nunca se importaram conosco.

– Claro que se importaram! Ares se importou comigo, assim como Atena

com Selina e Hefesto com você! – eu disse

Ele riu debochadamente.

– Você acha mesmo que eles se importaram? Isso não passa de um jogo pra

eles, Griffin! Nós somos apenas mais uma peça! E eles são os caras que fazem as

apostas. Pena que Ares e Atena apostaram no time perdedor. – ele disse em um tom

tristemente debochado – Agora, seus pupilozinhos vão morrer indefesos,

coitadinhos.

– Eu não teria tanta certeza disso – disse. Gritei rápido e consegui puxar o

cristal para minha mão. Estiquei a mão para frente e uma corrente de vento se jogou

Page 124: Os poderes perdidos

124

contra Bruno. Ela foi tão forte que ele voou até bater com as costas em uma arvore.

O caule da arvore rachou de leve. Peguei minha espada e olhei para Bruno. Deitado

no chão. Me aproximei dele. Ele riu histericamente e foi se levantando devagar até

está todo de pé. Eu fiquei perplexo, ele deveria estar morto!

– Vamos ver quem pode mais – ele abriu um sorriso. Seu olho direito ficou

extremamente azul-marinho enquanto o esquerdo ficou extremamente vermelho,

ardendo em chamas. Ele sacode as mãos e uma pequena chama se forma em seus

dedos indicadores. Ele põe uma mão a frente da outra. Eu quase ri. O que uma

chama menor que a de um fósforo poderia fazer contra mim? Ele assoprou e só tive

tempo de cruzar os braços a frente do fogo para segurar o fogo enorme vindo de

suas mãos. O fogo força contra mim. Provavelmente agora ele nem precisa assoprar

para vim direto em minha cabeça.

Depois que as chamas se cessam eu tento o empurrar com o vento

novamente mas uma parede de terra se ergue sempre a sua frente, como um escudo

gigante. Tento umas três vezes sem sucesso. Um nó se forma em minha garganta.

Quais as minha chances? Eu tenho um poder e ele três. Plano B: correr para o

Olimpo. Tentei contato com meu parceiro e ele me disse que estava avistando o

templo. Pedi para ele descer no templo, afinal não tinha tempo de explicar aonde

ficava o campo onde estávamos.

– Vamos – Bruno me disse, agora seu olho esquerdo estava marrom e seu

olho direito ardendo em chamas. – Me entregue o cristal e poupe tempo.

– Não, obrigado. Eu prefiro morrer mais tarde.

– Sabe, você daria um bom soldado. Talvez até mesmo um bom líder.

Poderia ficar com um dos reinos que sobrarem, Ásia, quem sabe... Ainda tem tempo

de trocar de lado, Griffin. Pense em você, dominando um continente inteiro.

Fazendo o que quiser sempre que quiser – Eu sabia que era errado, eu sabia, mas...

não pude parar de pensar. O que os deuses fizeram por mim na verdade? Quando

foi que recebi alguma ajuda útil? E se Bruno estiver certo, e se não passa de uma

aposta, um jogo? Bruno olha no relógio. Ele faz uma cara amarrada e diz: – Tempo

acabou, Griffin. Uma pena você morrer tão jovem. Vocês também – ele se dirige a

Pedro e Selina que ficaram paralisados. Não os culpei, eles poderiam correr e serem

mortos ou ajudar e serem mortos – Que desperdício de soldados. Eu o mataria

agora mesmo, Griffin. Mas aí perderia a graça de ver sua cara de choro quando tudo

desmoronar.

Page 125: Os poderes perdidos

125

Ele se vira e sai voando com sapatos voadores como os de Lívia. Penso em

me atirar atrás dele, mas o que faria? Provavelmente morreria na queda do

penhasco. Também não podia ir ao Olimpo. Hey pai, o filho de Hades vai matar

todo mundo, isso não é ótimo? Eu tinha que recuperar os poderes perdidos.

– Erick – disse Lívia e os outros correndo até mim – Toma.

Ela jogou um par de tênis de skate para mim, quase os deixei cair, mas

consegui segurar. Coloquei-os no pé e o cadarço deles começou a se amarrar

sozinho e, logo, suas asas cresceram. Olhei para Selina.

– Vá para o Olimpo. Avise-os sobre uma possível guerra eminente. – Ela

abriu a boca para perguntar mas eu interrompi – Hercules, o pegaso está no templo,

ele vai te levar até lá.

– São os Alados mais velozes que eu conheço – ela disse rindo – Mas você

precisa de treinamento e...

Eu tomo distancia, vou até quase a outra ponta do penhasco. Olho para

David. Ele está um tanto nervoso. Uma mão tremula segura meu ombro.

– Não morre, o.k? – Selina disse

– Você também – concordei com a cabeça e comecei a correr. Correr.

Correr. Até não haver mais chão no abismo.

Poucos minutos antes, eu havia pensado que ia cair aqui e morrer. Mas agora

eu me lembrei bem de onde estou. Eu estou no meu lugar preferido: o céu. Eu estou

no meu reino. E dessa vez, Bruno é que é o intruso.

Lívia tinha razão. Os tênis eram bem rápidos, bem rápidos mesmo. Uma

nevoa começou a se formar em minha frente, densa. Olhei para cima e vi que o céu

estava se preparando. Se preparando para uma chuva das grossas. Eu diria que um

furacão estava indo ao sul, mas não sabia ao certo e meu foco mudou quando o

avistei com seu tênis Nike preto com asas. Olho para frente, ele estava indo para

um lugar estranho, uma caverna. Tentei alcançá-lo. Meus tênis são mais rápidos, é

verdade, mas mesmo assim, ele entrou na caverna e eu o segui. Lá dentro era escuro

e eu apenas continuei voando até sair do outro lado... Wow. Do outro lado saímos

em uma cidade. Era grande, cheia de prédios comerciais enormes. Mantenha o foco

Griffin, disse a mim mesmo. O procurei em meio as nuvens. Lá estava ele,

sobrevoando um prédio... Ótimo, espero que ele não tenha problemas com os

vidros...

Page 126: Os poderes perdidos

126

Me lancei sobre seu corpo com a espada em punho, nós rolamos no ar

caindo em direção a janela direita de um prédio comercial. Bruno consegue me

imobilizar. Ele põe a espada em meu pescoço e me empurra forte no ar contra a

parede. Bum! Invadimos o escritório onde tinha uma apresentação. Todos se

chocaram, obvio. Bum! Bruno arrebenta a parede do mesmo prédio comigo. Dessa

vez é uma sala de computadores, mas passamos tão rapidamente que não consigo

reparar em nada. Me virei, colocando Bruno contra parede com toda a força e

aumentando ainda mais a velocidade do vento contra ele. Arrebentei a ultima

parede com Bruno e o joguei no asfalto. Chegou a fazer um buraco, uma cratera

pequena.

– Você não desiste, garoto? – Bruno disse se levantando, com um pouco de

dificuldade – Olhe só para você. Você não tem nada de um lutador. – ele tira a

espada da bainha. Posso vê-la claramente. Ela tem uns 90 cm a 1metro mais ou

menos, sua lamina é escura e brilhosa e o cabo tem uma caveira prateada que, com a

luz do sol, ficou um tanto vermelho. – Eu não preciso desses poderes para ganhar,

Griffin. Acabou. E você não pode evitar, não pode evitar um apocalipse eminente,

garoto.

– Uma luta – desembainho a espada dourada – Uma ultima luta. Sem

poderes. Limpa. Se eu ganhar, você devolve as famílias de todos que estavam presos

com seu pai. Se você ganhar, eu te dou o cristal e caio fora daqui. O que você acha,

ein?

– Você vai morrer – ele diz de sobrancelhas franzidas – Vamos, sem

poderes, agora jure.

– Eu? Não, não, você primeiro – eu disse. Ele estava falando de um

juramento pelo rio Estige. Um juramento pelo rio Estige não pode ser quebrado,

caso contrario recebe punição... bom, ninguém sabe, ninguém nunca foi louco o

bastante para quebrar um. – Eu não tenho a nada perder se morrer. E alem do mais,

se você vencer, vai atacar o Olimpo assim mesmo.

– Tudo bem. Eu juro pelo Estige devolver as família de todas as pessoas que

trabalharam para meu pai no ano de 2012...

Atiro uma rajada de vento que o joga contra um carro que chega a amassar a

lataria. Ele demora a se levantar, mas quando se levanta me manda direto para a

parede com a água que tirou de um hidrante. Eu me aproximo, com a espada em

punho. Ele pega a dele e nós lutamos. Eu começo com o ataque e ele desvia

sorrindo, como se fosse a coisa mais fácil do mundo e como se eu fosse o pior

Page 127: Os poderes perdidos

127

espadachim que ele já viu. Ele me corta em vários lugares em poucos segundos.

Perna esquerda, joelho direito, bochecha, braços, mãos e o pior: testa. Este corte foi

profundo. Eu poderia estar lutando melhor se estivesse com Alfa e Omega, mas eles

se foram no fogo. Eu estava quase lançando o vento nele de novo pois estava me

cansando de apanhar. Era difícil de acertá-lo. Quando Selina comentou sobre ele ser

um bom espadachim, eu acreditei, serio, mas achava que ia conseguir pelo menos

bater nele sem os poderes. Me lembrei de meu treinamento com Marte, ele sempre

e ensinou táticas de guerra... táticas de guerra...

Me esquivei do próximo golpe que Bruno tentou acertar e fui atrás dele, bati

como cabo da espada em um ângulo correto em seu pescoço e o lado direito de seu

corpo parou instantaneamente. Ele é destro, de forma que a espada ficou parada,

mas não era ela que eu queria. Abri o compartimento no seu bracelete e lá estava

ele: o cristal do fogo. Peguei-o na mão e me preparei para sair voando quando um

bloco gigante de pedra me atingiu em cheio.

– Belo truque, Griffin – Bruno disse e veio com toda a força voando em

minha direção. Em pouco tempo, amasso um poste de metal e o puxo para mim.

Seguro firme e espero o momento. Bum! Eu o atiro longe (tenho certeza que seria

um belo home run em um estádio) e voo. Não sei em que direção voar. Não faço a

mínima ideia de pra onde fica o Olimpo então simplesmente voo e acabo na praia,

na areia. A areia se enrola em meus pés, e a água começa a subir até praticamente

metade do oceano estar vindo sobre mim. Não conseguiria segurar aquilo, não

assim, o ar seria insuficiente e não penetraria na onda tão facilmente, mas eu havia

esquecido do fogo. Faço com as mãos duas bolas enormes de fogo e começo a jogar

o fogo contra a água. Com certeza seria insuficiente, mas acho que Bruno não tinha

mais todas as forças.

Jogo uma corrente de ar para ele e ele bloqueia com um escudo de pedras.

Ele grita para ter forças e faz uma cara de dor em meio ao grito, talvez estivesse

fraco com a tacada. Junto forças e vou para cima dele com a espada, dessa vez

consigo acertá-lo. Acerto-o com a lamina em um braço e puxo o cristal da água, em

troca, perco o do fogo novamente. Olhei o oceano e concentrei minhas forças em

uma onda gigantesca. Bruno está respirando com dificuldades. Acertei-o mais um

corte, dessa vez no rosto. Joguei a água contra ele, ele tentou bloquear mas não

conseguiu. Ele se debateu e o cristal da terra caiu sobre a areia, caminhei devagar até

ele e o peguei, me sentindo mais poderoso ainda. Bruno rompe a barreira d’água

com fogo e cai no chão respirando com dificuldade. Olhei em volta. Tinha prédios,

favelas, carros porem a praia estava deserta.

Page 128: Os poderes perdidos

128

Avistei um morro enorme, grande mesmo. Depois, uma estátua realmente

grande... Cristo Redentor, eu estava no Rio de Janeiro. Bruno me encara, eu

caminho devagar até ele, com a espada em punho. Ele me olha e sorri, tentando

esconder careta.

– Acha mesmo que acabou? – ele disse e pondo de pé e segurando o cristal

do fogo com tanta força que as suas juntas ficaram brancas – Um cristal já será o

bastante depois que seu pai já estiver caído.

– Você acha que Hades consegue mesmo derrubar meu pai, assim tão fácil?

– eu menti. Até mesmo eu gostaria de ver Zeus tomando uma surra, então... ele ri

debochadamente com os dentes serrados e põe a mão na barriga. Eu o chutei de

leve.

– Hades? Não, não, ele ainda não está pronto. Mas ainda é esperto... olhe

você mesmo, Erick, e descubra. – ele apontou para o mar. Eu me virei. Um tipo de

furacão estava se formando e as águas tremiam em forma desgovernada.

– Poseidon... – murmurei e fui atingido por um chute na canela e logo

depois o cristal do ar me é tirado da mão. Caído no chão levo dois chutes ao lado

do corpo e em seguida, Bruno parte voando. Sinto a dor agora, aguda e forte,

provavelmente porque um dos poderes me foi tirado. O mais forte.

Disparei atrás dele, uma das asas de meus tênis alados começou a parar de

bater, pode ter sido por causa do vento, embora eu duvide disso, ela começa a pegar

fogo e se desfaz. Consigo alcançar terra firme. Bruno parou no topo do pão-de-

açúcar, olhando para os céus e com as mãos na cintura. Parei atrás dele e preparei

um bom ataque com terra quando um raio caiu ao meu lado. Pulei para o lado com

o susto e outros começaram a cair perto de mim. Puxei a espada e comecei a desviar

a maioria das cargas elétricas com a lamina dourada. Com o canto do olho, ainda vi

Bruno se virar para mim com os olhos azuis. Ele falou alguma, algo que não

consegui ouvir, mas li em seus lábios:

– Esse é bom, não acha? – Disse ele com o cristal do ar esticado pra mim.

Ele carrega as forças para um raio enorme e forte, mas eu estou preparado e quando

ele lança o relâmpago faço ricochetear na espada e ir com tudo em seu peito. O

estrondo me jogou para trás, mas também fez com que o cristal voasse da mão de

Bruno. Eu corro e o pego e logo em seguida. Bruno ainda tenta levantar, com a mão

no peito. Ele não chegou a cair do pão de açúcar, mas ficou um tanto na beirada.

Ele estava tremulo (porque estava molhado e o choque foi o dobro). Eu chego

Page 129: Os poderes perdidos

129

perto dele e o chuto no lado do corpo, ele deixa o cristal do fogo cair de sua mão.

Eu o peguei com a mão e o guardei no compartimento.

Estava me sentindo simplesmente incrível. Estava com todos os poderes dos

deuses. Eu poderia fazer qualquer coisa. Eu poderia derrubar o Olimpo, derrubar

Hades, eu poderia ser um rei. Não vou negar que a imagem de mim sentado em um

trono de ouro com armaduras e roupas elegantes não tenha me agradado. Eu

poderia fazer melhor que os deuses, poderia impedir os assaltos, mortes,

assassinatos e todos os outros crimes mais. Encaro o por do sol, a sombra chegando

ao ponta do morro. Não, Griffin, disse a mim mesmo, não é esse o seu objetivo.

– Então esse é o plano? – perguntei a ele – Uma luta entre Zeus e Poseidon

onde Poseidon ganharia? E depois? Hades ia matar Poseidon e todos os outros?

Bruno engatinhou um pouco para longe de mim. Ele se esforçou para se por

de pé e me olhou com os olhos negros, mas dessa vez eu não desviei o olhar. O

encarei com raiva.

– Hades não vai cair, Griffin. E ele não será o único.

Ele se atirou no abismo, sumindo assim que as sombras atingiram seu corpo.

Page 130: Os poderes perdidos

130

Vinte e quatro

Visito a casa do

meu pai

EU DEVERIA ir para o Olimpo, mas sem as asas do meu tênis, não sei

como chegaria lá. Pensei isso até avistar o pegaso branco com a crina marrom. Ele

pousa no chão do pão de açúcar e Selina desse xingando todos os xingamentos

possíveis.

– Idiota, porque você fez isso? Você queria me matar? – ela pragueja mais

em grego – Cavalo inútil.

– Aí, não se critica o trabalho de um profissional, garota enxerida! Aí

parceiro, porque você mandou essa carga... chata?

– O que está acontecendo? – perguntei a Pedro que descia da sela com os

olhos semisserrados

– Ah, Erick! – Selina disse em tom de animação. Ela se movimentou

devagar, talvez pensando se me abraçava ou não, então apenas parou na minha

frente – Você esta vivo!

– É, eu estou – disse, tolamente – O que aconteceu, por que estão brigando?

– Seu pegaso louco! – Selina disse brava – Ele começou a mergulhar do nada

e subir e eu quase caía toda a vez que fazia isso!

– Imagine eu que estava na ponta – Pedro disse calmo

– Mas você não morre de medo de altura! – Selina bufou

Levanto a sobrancelha pra ela. Ela nunca admitiu pra mim que tinha medo

de altura, mas agora falou. Pela cara dela acho que saiu sem querer, não era a

intenção dela expor os medos. Me voltei para Hercules.

Page 131: Os poderes perdidos

131

– Por que você estava fazendo aquilo? – perguntei a ele mentalmente

– Eu não gosto dela. E foi divertido. – ele respondeu como se fosse obvio

– Por causa do negocio de Atena? Você não deve ficar matando os

passageiros, parceiro, isso não é legal, nem um pouco.

Ele relinchou e reclamou um pouco, mas depois ficou quieto logo em

seguida. Selina me encarou por um momento, depois ela veio com a manga da

camiseta e a apertou contra minha testa fazendo uma careta.

– Bela surra, você tomou ein?

– Digamos que Bruno é bom com uma espada. Mas... eu não entendo. Os

outros ferimentos curaram, porque este ainda está doendo?

– Como filho de Hades é possível que ele use uma espada... indestrutível –

ela disse e continuou dando tapinhas de leve em minha testa cortada – Banhada no

rio Estige, para ser mais exata.

– Indestrutível? Tipo Aquiles e o calcanhar de Aquiles? Ai!

– É. Isso ta muito feio, Tomadinha.

– Ã... – Pedro começou – Acho que não temos muito tempo. – ele apontou

para os céus. O furacão ficou pior e o mar também estava agitado, bem agitado.

Formulei a palavra vamos na boca quando um raio caiu perto de nós. Quase caí por

cima Selina. – Vamos logo.

– Vocês querem acabar com a minha coluna? – Hercules reclamou – 3? Eu

sou um pegaso não um burro de carga.

– Ah qual é? – eu disse a ele – O Pegaso Rei não consegue carregar três

pessoas? Duvido.

Ele reclama novamente e nos deixa montar. Eu vou na frente, Selina logo

atrás e Pedro na outra ponta. Hercules é grande até mesmo para um cavalo, o que

não nos deixa muito desconfortável. Ordenei Hercules para ir para o Olimpo e ele

partiu me dizendo que estávamos perto. Começamos a ir em direção ao furacão que

estava bem acima do Cristo Redentor. Olhei para cima e pude ver um raio

cruzando de cima pra baixo, bem de cima da estátua. Lá está o Olimpo.

Page 132: Os poderes perdidos

132

O caminho é curto, já que estamos voando, mas na metade dele já estou com

dor na barriga de tanto Selina a apertar cada vez que Hercules sobia um pouco

mais. Me virei para trás.

– Que horas foi feito o pacto de sacrifício? – gritei para ser ouvido através

do vento. O céu está bem preto embora seja umas 2 horas e 30 da tarde mais ou

menos

– Não sei, lá por umas 3 horas, eu acho. – Selina disse de olhos fechados –

Afinal, 3 é um numero sagrado.

Depois disso levamos uns 5 ou 7 minutos até chegar ao Olimpo. A entrada

dele é incrível. Um enorme portão de uns 10 metros de altura e largura. O portão é

todo dourado com um cadeado enorme de ouro preso no centro. Há também duas

estatuas, uma de cada lado do portão. Não olhei bem, mas acho que era Hermes.

Me concentrei no cadeado, o olhando e firme e bum! Ele explode e o portão abre

com a força. É, talvez eu estivesse mesmo gostando dos poderes do meu pai. Uma

grande corrente de ar concentrada nos lugares certos pode fazer qualquer coisa e...

Wow. Interrompi meu pensamento quando avistei as escadarias, mármore dourada,

branco e de todas as cores conforme a luz (do próprio Olimpo) refletia no chão.

Os degraus eram enormes como para gigantes e tinha muitos deles. Ao redor das

escadas, em cada andar via-se uma coisa diferente de cada lado. Plantação de uvas

com milhares de sátiros comendo e festejando (imaginar Aron feliz foi confuso em

minha mente), ninfas correndo e se transformando em tudo (arvores, rios e etc...),

mulheres aparentemente normais andando de um lado para o outro enquanto

festejavam felizes. Esse povo aqui em baixo parecia nem perceber o que estava

prestes a acontecer lá em cima...

Quando Hercules esgotou suas forças, já estamos a alguns passos da entrada

gigante. Um arco com flores enormes está na volta da entrada com as flores

formando a palavra PAZ no topo. Selina bufou com raiva.

– Até parece que ela iria influenciar em alguma coisa.

Pensei em perguntar a ela porque ela odiava tanto a sua mãe assim, mas achei

que esse não era o lugar certo e nem a hora certa. Estávamos prestes a entrar no

Olimpo e eu não sabia bem o que esperar.

– Caramba, isso aqui é um espetáculo! – Pedro disse – É lindo, perfeito não

acham? Eu daria um dedo pra morar aqui.

Page 133: Os poderes perdidos

133

– É, é lindo, mas temos que entrar, rápido – eu disse.

Andamos alguns metros e percebi que estava a recém em um degrau, mas

ainda bem era o ultimo. Ouço alguns ruídos e depois uns gritos. Gritos raivosos

terríveis.

– Você está me acusando de traição? – uma voz familiar berrou. Ela era

grave e um tanto ameaçadora, um calafrio percorreu meu corpo quando a escutei.

Poseidon. – Eu não acredito que me acusa de traição, irmão, sendo que você mesmo

pode ter muito bem passado a perna em nós.

– Ora, Poseidon, não seja tolo! – essa voz era de meu pai – Por que eu faria

isso?

– Por que você sempre teve inveja dos meus poderes!

– Eu nunca precisaria desses poderes inúteis e fracos – berrou meu pai.

Eu apressei o passo. Corri de verdade com Selina e Pedro atrás de mim

correndo a mesma velocidade. Passamos pelo marco correndo a toda velocidade e

paramos logo que entramos. Cheguei a soltar um suspiro. O mármore branco

cobria toda a sala com os tronos depositados estrategicamente em todos os lugares.

Mas algo me chamou mais a atenção. Nenhum dos deuses notaram nossa presença,

todos estavam prestando atenção em Zeus e Poseidon, mas meus olhos encontraram

os dele. Do meu pior inimigo, o cara que quer me matar. Hades. Ele ri com o canto

da boca pra mim e me encara. Poseidon está com os seus cabelos pretos, jovem e

com um corpo de um guerreiro. Meu pai também está diferente. Jovem, com os

cabelos loiros e os olhos azuis. A única coisa, quase sem importância era que eles

tinham uns 5 ou 7 metros de altura. Uma armadura começa a crescer no corpo de

Poseidon. Azul, como feita de conchas, com as ombreiras sobressaltadas e o elmo

como uma grande alga brilhante. Em meu pai começou a crescer uma dourada e

eletrificada e seu elmo era grande como uma cabeça de leão. Eu gritei para pararem,

mas nem ouviram. Meu pai puxou a espada em forma de raio da bainha e um

escudo estranho surgiu em sua mão esquerda. Poseidon fez crescer um tridente de

água em sua mão, um de uns dois metros. Gritei novamente mas nada aconteceu.

Eu precisava chamar a atenção. Concentro os poderes nas tochas espalhadas e estas

explodem em chamas causando um barulho estrondoso por todo o mármore que

chegou a vibrar com o eco.

Page 134: Os poderes perdidos

134

– Quem ousa interromper uma reunião... – Zeus começou e para ao olhar

para mim. Eu o encarei de volta. – O que quer... semideus? – Ele falou semideus

com cuidado.

– Que parem com a guerra – respondi

– Devíamos atira-lo do Olimpo agora mesmo! – Poseidon disse – Ele

interrompeu a reunião nos dando ordens.

– Eu vim aqui para reestabelecer a paz – eu disse. Todos os deuses voltaram

a atenção para mim. Eu ia dizer que Hades pegou os poderes, que tudo era plano

dele, mas eu só tinha uma chance. Uma chance de falar. Se eles não acreditassem de

primeira, eu seria morto e não acreditariam. Eu já havia visto o quanto Hades é

influente e no fundo eu sabia que ele iria convencê-los. Ele devia estar se

preparando pra invadir o Olimpo, preparando um exercito, mas estava ali. Eu não

podia convencê-los de que ele era traidor. – Bruno, filho de Hades, roubou os

poderes perdidos. – Todos os deuses se entreolharam e murmuraram alguma coisa.

Hades fez cara de surpresa e decepção profundo. Aquele filho da P... – Eu lutei

contra ele e os recuperei – Abri as mãos e mostrei os 4 cristais nelas. Zeus abriu um

sorriso. – Não precisam mais de guerra.

– E então – Zeus disse, sentando-se em seu trono – Você o matou?

– Não. Ele escapou.

Zeus estica as mãos, e eu jogo o cristal do ar e da terra a ele. Não confio que

Poseidon e Hades vão dividir igualmente de novo. Jogo os do mar para as mãos de

Poseidon e os do fogo para a mão de Hades. Trovões, terremotos e barulhos

estranhos rugiram fora do Olimpo. Zeus me encarou.

– Muito bem, semideus – ele disse, sentado no trono com satisfação – Os

deuses reconhecem seu feito.

– Eu não fiz sozinho – disse e olhei para Selina e Pedro. Selina estava com o

rosto vermelho de raiva e tinha uma fúria nos olhos que não havia visto nos olhos

de ninguém ainda. Nem mesmo nos de Poseidon ao olhar para meu pai, ou Hades

quando olhava para mim ou até mesmo eu quando olhava para Bruno. Segui seu

olhar e ele dava direto no trono de Demeter, sua mãe. – Eu tive ajuda.

– Quais suas graças semideuses? – meu pai perguntou, se acomodando no

trono e desfez sua armadura, transformando-a em uma túnica branca com uma faixa

vermelha

Page 135: Os poderes perdidos

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– Erick – disse primeiro – filho de Zeus.

Os deuses se entreolham quando eu pronuncio a palavra Zeus. Há

murmúrios, mas logo se calaram. Demeter sorri e aproxima a boca de um deus que

eu acho ser Hermes. Ela fala algo (e aponta pra Selina) que consigo entender em

seus lábios: minha filha.

– Pedro – disse – filho de Apolo.

– Selina – disse com raiva, quase engasgando-se com as próprias palavras –

cria de Atena.

Os deuses se entreolharam de novo e murmúrios mais altos surgiram. O

sorriso no rosto de Demeter desapareceu enquanto Atena fez um leve movimento

consentindo com a sua cabeça. Segurei a vontade de olhar pra Selina e ver o que

estava acontecendo, mas deduzi que não é muito comum se apresentar sem dizer o

seu pai/mãe olimpiano.

– Muito bem – disse meu pai – Os deuses reconhecem o que fizeram por

nós e lhe daremos o nosso agradecimento. E, claro, um modo de se locomoverem.

Para onde vão? – eu não sei aonde Bruno vai largar as famílias, mas tenho certeza de

que ele não vai demorar. Encarei Hades nos olhos, confiante, ele teria de e dizer.

– Talvez devêssemos voltar a agradecê-los como era antes. – ele disse –

Apenas com um aceno de cabeça.

É o suficiente para eu saber aonde Bruno vai largar as famílias. E é o

suficiente para eu saber que Hades pensa que eu talvez possa entregá-lo a eles, e que

eles acreditem, mas não o faço. Ainda é perigoso.

– Para o antigo acampamento grego. Ah, alguns amigos meus ficaram em seu

esconderijo, talvez possa levá-los para lá também.

Zeus franze a sobrancelha e me olha por um longo segundo. Depois se vira

para Hermes.

– Creio que saiba onde fica. Pode lhes conceder uma maneira rápida de

viajar?

Hermes faz que sim com a cabeça e coloca um frasco no chão.

Os deuses não dizem obrigado, e eu não espero isso deles. Meu pai estala os

dedos e uma mulher nos traz comidas em bandejas. De primeiro, eu hesitei em

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aceitar, mas logo depois peguei um pedaço. A porção era extremamente pequena,

do tamanho de meia laranja na verdade e possuía uma tonalidade amarronzada

estranha. Eu a pus na boca; o gosto era agradável e senti como se os ferimentos

estivessem se curando, mas eles não estavam. Não, nesse momento. A cara de pau

deles me irritou. Eu quase morri pra pegar a droga dos cristais umas 4 ou 5 vezes

(no mínimo) e eles me dão... comida? Que falta de consideração! No momento eu

estava arrependido de não ter pego aqueles cristais e posto a correr um por um de lá

de dentro.

Marte me encarou, com um sorriso no rosto. Ele está diferente, está mais...

feio. Os cabelos emaranhados e sujos igual ao rosto e com um nariz

desproporcionalmente grande mas reconheço o seu sorriso, em qualquer rosto.

Minha vó me disse uma vez que os deuses podem mudar a sua forma, mas não

usam muito isso, só os mais vaidosos.

– Bom trabalho garoto – Marte disse em minha mente – Que bom que está

vivo.

Eu me virei, sem dizer nada e comecei a andar até o final do Olimpo, até o

marco na porta. Agora eu estou com raiva. Eu não sei o que eu esperava, eu não sei

o que queria. Um obrigado não seria ruim, ou um que bom te conhecer em quase

13 anos meu filho! Engulo com dificuldade as poucas e boas palavras que quero

falar a meu pa... não, não vou chamá-lo de pai, se eu não mereço ser chamado de

filho então ele não merece ser chamado de pai.

Os ventos estão fortes contra minha armadura, que agora que a adrenalina

passou, parece pesar mais de 10 kg em meu corpo. Eu a arranco do corpo e jogo

pelo lado do Olimpo, e continuo andando, um pouco rápido demais. Selina pega

meu braço.

– Ei, mais devagar. O que você esperava deles? Que eles se ajoelhassem, eles

não são assim.

– Você tem razão. E não vale a pena se sentir mal por causa deles.

Ela sorri e continua andando, dessa vez a minha frente. Paro e olho para trás,

o marco na porta ainda é o mesmo, mas as flores estão um tanto murchas agora.

Bem, pelo menos Selina conseguiu irritar alguém.

– É bom saber que você se importa com o Olimpo, príncipe. – disse meu pai

na minha mente – Que se importa comigo.

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– Nunca foi por você.

Me virei novamente para as escadas. Sinto que o sangue do meu machucado

na testa parou de escorrer, talvez até cicatrizar. Alcanço Pedro e Selina no caminho,

as descendo. A raiva de Selina parece ter diminuído ao julgar pela nova cor em seu

rosto. Ela está rindo de alguma coisa que Pedro falou.

– É serio, ele piscou pra mim – ele disse rindo ainda mais

– Quem piscou? – eu comecei a rir também.

– Apolo piscou pra ele – ela ri – Tinha que ser Apolo mesmo...

Nós três rimos por um instante. Me lembro de todas as dicas para que

Bruno era o traidor, e só agora elas fazem sentido. O fogo, logo que vi que ele era

“filho de Hefesto”. Hefesto é simbolizado pelo fogo, por isso tive essa visão. A

visão no fogo, quando estava sendo atacado pela hidra. Puxei-a da memória e acho

que consegui ver a sombra melhor. Me pareceu alguém entrando na roda de fogo.

O objetivo da hidra nunca foi matá-lo, e ele precisa se encarregar de que isso não

fosse transparecido a nós. Franzo as sobrancelhas

– Você desconfiou dele

– O que? – Selina disse

– Você desconfiou de Bruno, quando ficamos algemados.

– Ah – ela faz uma cara não muito boa – A sua espada nunca eletrocutou

ninguém, ela sempre causou queimaduras, mas Bruno tinha a benção de Hefesto, o

fogo não o machucaria e a espada provavelmente ia dar choque nele. Mas como ele

poderia saber disse se nunca a tocou?

– Nossa, eu nunca ia pensar nisso – disse Pedro

– De que importa? Eu não segui em frente com esse pensamento. Se estivesse

seguido, talvez seria melhor agora.

– Ele enganou a todos nós. – dou um sorriso travesso – Mas eu também

enganei ele.

– O que você fez? – Selina disse, quase rindo

– Nada de mais, só fiz ele jurar pelo Estige que ia devolver nossas famílias.

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Ela cai na risada de satisfação (acho) e Pedro a segue. Ele se põe no meio e

abraça nós dois, descendo as enormes escadas de mármore branco. Estamos rindo,

felizes, a salvo. Dessa vez, tenho certeza que estou entre amigos.

***

Depois de contar toda a historia da luta enquanto descíamos mais uns

degraus, nós usamos o frasco dado por Hermes. O pó se formou no ar e passamos

pelo portal azul que estava mais parecido com roxo hoje. Do outro lado

encontramos nada mais, nada a menos que o campo do antigo acampamento grego

e o resto da nossa equipe de caça aos poderes. David vem correndo falando um

monte de coisas as quais eu nem sei o que quer dizer. Ele me abraça e depois me

solta e continua falando.

– ... Aí a gente apareceu aqui do nada, foi muito sinistro, muito estranho

mesmo, cara, eu fiquei apavorado, porque eu pensei e se aconteceu alguma coisa

com o Erick? Aí eu fu...

– Calma, David, está tudo bem – Selina disse calmamente.

– Haha, você também está viva, que ótimo, é bom ver... pessoas vivas.

– Com certeza é – Pedro disse

– Vocês conseguiram? Eles conseguiram? – Lívia vinha dizendo – Eu sabia

que iam conseguir!

– Sinto muito ter... estragado os seus tênis voadores – eu disse

– Você acha que eu ia querê-los de volta? – ela ri – Estou brincando, estou

brincando.

A maioria das pessoas, até mesmo as que eu nunca havia falado antes, vem

me cumprimentar, me dar os parabéns ou falar coisas sem sentido como o jeito que

apareceram ali. Eu estou feliz, todos estão. Bem, pensei isso até ver Selina sentada

no gramado passando os dedos contra a grama. Eu me sentei ao seu lado.

– Qual é o problema? Acabou, podemos ir pra casa.

– Esse é o problema, Tomadinha, eu não sei se eu estou... preparada para vê-

lo de novo. – ela me olha com os olhos tristes – E se ele me rejeitar, ele se ele não

me quiser mais?

– Não se preocupe com isso, seu pai vai aceitar você de volta.

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Ela suspira

– Espero que esteja certo.

Ouço gritos, mas os ignoro. As pessoas estão eufóricas e os gritos são de

euforia. Continuei ali parado ao lado de Selina olhando o campo a minha frente.

Um lugar tão bonito me causou tanto desespero e alegria. Não sei se vou gostar

dele ou não. Alguém grita meu nome varias vezes, é David, e me forço a olhar para

trás e lá está ela. Com a mesma roupa que eu a vi da ultima vez: uma camiseta

vermelha, uma legue preta e o casaco marrom escuro por cima da blusa. Minha mãe.

Eu coro e a abraço com força. Ela chora em mim, mas eu não derramo uma lagrima.

Minha mãe diz que nunca fui muito de chorar, e vejo que isso é verdade agora. Nós

ficamos abraçados por mais de um minuto e então ela me solta e me abraça de novo

e beija o rosto.

– Pensei que não ia mais ver você! – ela disse

– Eu também. Mas estamos aqui, não estamos?

Nós rimos. David me empurra rindo e logo atrás dele está vovó. Corro e a

abraço também, ela ri. Ela sempre me protegeu de uma forma ou outra, com os

livros, os ensinamentos e com os presentes de aniversário. Depois damos um abraço

em família, os 4.

– Foi muito louco, eu fui raptado por Hades e aí ele nos obrigou a ir atrás

de uns poderes que... – comecei

– Calma, filho. Vamos ter muito tempo para conversar. Em casa.

Por trás do ombro de minha mãe me assusto ao ver uma águia voando baixo.

De primeira, achei que ela ia nos atacar mas então vejo que ela deixou uma caixinha

pequena, de madeira, no chão.

– Eu... já volto – disse e fui até a caixinha. Eu não tinha certeza de que era

para mim, mas no fundo eu pressentia que era. Peguei-a na mão e analisei. Havia

um bilhete em cima, com letras miúdas e gregas:

Foi um desafio refazer essa lamina. E sinto dizer-lhe que ela pode não voltar a ser a

mesma de antes devido ao material que tive de usar.

Faça bom uso Príncipe.

Ass: Hefesto

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Ao abrir a caixa, avistei metais brilhantes que quase me segaram a luz do sol

forte. Caminhei até a sombra. Dentro da caixa havia, naqueles moldes de espuma,

um relógio levemente dourado com dois Alfas nos cantos, e um anel, em forma de

águia, metade prata e metade dourado. Sorrio. Talvez os deuses não sejam tão pães-

duros assim. Coloco o anel no dedo da mão direita e ponho o relógio no pulso

esquerdo. É apenas um anel e um relógio, mas já me sinto armado.

Uma visão me chama a atenção a minha esquerda. Uma menina, de cabelos

castanhos claro e olhos extremamente verdes que estão piscando para segurar as

lagrimas. É inútil piscar, lagrimas já escorrem em seu rosto. Ela está abraçada em

um homem de uns 38, 40 anos. Os dois choram e se abraçam com força. Eu tinha

certeza que o pai de Selina não ia afastá-la. Mais ao longe, vejo Pedro abraçado em

sua mãe e seu irmão. E quanto mais eu olhar, mais vou ver famílias felizes juntas,

abraçadas.

Depois de alguns minutos, vou até Pedro para me desculpar e me despedir

dele. Eu o devo muitas desculpas, acreditei que ele o traidor e o tratei mal todas

essas semanas. Ele diz que não foi nada, que ele entende e que ia fazer o mesmo

com Selina, que já estava vindo ao nosso encontro.

– E então – perguntei – para onde vão agora que ficaram sabendo desse tal

acampamento?

– Eu... – Selina sorriu ainda mais – Acho que já fiquei tempo demais longe

de casa.

Pedro fica na duvida, mas acabamos todos nos decidindo ficar com as

famílias. Pedro pedi desculpas a Selina e ela o abraça. Geralmente acho que não é

do costume das pessoas abraçarem as outras que conheceram a pouco tempo, mas

quando você passa uma experiência de vida ou morte com essa pessoa, isso se torna

compreensível. Pedro saiu falando umas coisas as quais nem prestei a atenção. Logo

ele voltou com um saquinho – na verdade era mais um pedaço de tecido –

apontado pra nós. Ele desenrolou o tecido e lá havia... diamantes! Grandes, do

tamanho de meias laranjas. Havia uns 10 lá dentro.

– Toma – ele me deu um – E esse pra você – ele colocou outro nas mãos de

Selina.

– Onde conseguiu isso? – perguntei

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– Na caverna de Hades. Acho que da um pra cada um. – ele sai rindo com o

saquinho

– Acho que alguém deve desculpas a alguém – eu disse a Selina

– Claro, estou ouvindo. – ela disse e nós dois rimos – Me desculpe,

Tomadinha. Achei mesmo que você era x9.

– É... mas... bem não vamos ter um meio de manter contato?

– Você tem rede social? – ela perguntou e eu acenei com a cabeça – Então,

eu te acho lá.

– Internet não é perigosa para semideuses? – perguntei

– Erick, você é um filho de Zeus com a benção de Ares que acabou de irritar

Hades e Poseidon, acha que é o facebook que vai te matar?

Nós caímos na risada outra vez. Fazia sentido, na verdade. Eu a olhei por

uns segundos e dessa vez sou eu que hesito em abraçá-la. Então apertamos as mãos

meio sem jeito.

– A gente se vê? – ela perguntou

– A gente se vê.

E nos viramos, cada um para um lado. Caminhei até minha mãe, minha avó e

David. Eles estavam sorrindo e me olhando o que me fez corar, não sei se estavam

me olhando ou apenas olhando a paisagem mas corei de qualquer jeito. Vovó e

David saíram na frente. Minha mãe passa o braço em volta da minha cintura. Ela é

uma mulher alta, e ainda é uns 3 centímetros mais alta que eu.

– Quem era aquela garota? – perguntou ela

– O nome dela é Selina – respondi – Ela é uma amiga.

– Ela é bonitinha – concordo com a cabeça sem perceber o que estou

fazendo. Coro ainda mais.

– Mãe!

Ela cai na gargalhada e me aperta contra seu corpo

– Vamos para casa.

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fim