os planos de urbanização de teresina e a agenda 2015

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UNIVERSIDADE SÃO JUDAS TADEU Programa de Pós-Graduação em Arquitetura e Urbanismo SAMUEL CARVALHO RESENDE Os Planos de Urbanização de Teresina e a Agenda 2015 São Paulo 2013

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Estudo sobre a urbanização de Teresina e assuntos decorrentes desse tema.

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  • UNIVERSIDADE SO JUDAS TADEU Programa de Ps-Graduao em Arquitetura e Urbanismo

    SAMUEL CARVALHO RESENDE

    Os Planos de Urbanizao de Teresina e a Agenda 2015

    So Paulo 2013

  • SAMUEL CARVALHO RESENDE

    Os Planos de Urbanizao de Teresina e a Agenda 2015

    Dissertao apresentada para qualificao no Programa de Ps-Graduao em Arquitetura e Urbanismo da Universidade So Judas Tadeu, como requisito parcial para obteno do ttulo de Mestre em Arquitetura e Urbanismo.

    Orientador: Prof. Dr. Paulo de Assuno

    So Paulo 2013

  • SAMUEL CARVALHO RESENDE

    Os Planos de Urbanizao de Teresina e a Agenda 2015

    Dissertao apresentada para qualificao no Programa de Ps-Graduao em Arquitetura e Urbanismo da Universidade So Judas Tadeu, como requisito parcial para obteno do ttulo de Mestre em Arquitetura e Urbanismo.

    Aprovado: em _____________________ de 2013

    ORIENTADOR: Prof. Dr. PAULO DE ASSUNO

  • A minha me, pelo carinho e dedicao.

  • AGRADECIMENTOS

    A todos que contriburam pra realizao deste trabalho, fica expressa aqui a minha gratido:

    A minha me, em quem me espelho para buscar a realizao dos meus objetivos. A meu tio Paulo Henrique Carvalho Costa e minha prima Janete Oliveira, pelo apoio. A Diana Melo Barbosa, Tabata Michelle Magalhes, Mariane Cristina Mendes, Mirella

    Alves, minhas amigas a quem pude recorrer em todos os momentos que precisei durante o desenvolvimento deste trabalho.

    Aos meus irmos Flvia Resende e Thyago Resende, que me deram todo o apoio emocional que precisei durante esse perodo.

    Agradeo em especial ao meu orientador, prof. Dr. Paulo de Assuno, pela pacincia, orientao, aprendizado e apoio em todos os momentos necessrios.

    E a todos os outros que de uma maneira ou de outra, acabaram contribuindo para esta construo.

  • RESUMO

    Esta dissertao foi realizada atravs de um estudo exploratrio sobre a cidade de Teresina, capital do Estado do Piau. Uma cidade com uma origem bem peculiar, e que ao contrrio de todas as outras cidades nordestinas, a nica que se localiza em posio central no territrio do estado. Esta pesquisa contemplou a peculiaridade da formao desse adensamento levando em conta todo o histrico sobre a criao e escolha desse territrio para sediar uma nova capital provincial at as intervenes implementadas. Com o objetivo de, atravs da historiografia da construo da cidade e das polticas implantadas, verificar de que forma se desenvolveu o processo de urbanizao da cidade. Assim, foi realizado um estudo dos planos de desenvolvimento urbanos desenvolvidos para a cidade com foco no planejamento atual e na Agenda 2015, com base nos princpios definidos pelo Estatuto das Cidades, Lei Federal 10.257/2001. Visa tambm abordar o que os planejadores intencionam para o futuro da cidade atravs da Agenda e de como se deu a construo do seu sucessor o PRU. Os resultados mostram que a cidade se desenvolveu de uma maneira muito particular e apontam as perspectivas futuras de planejamento urbano para cidade.

    Palavras-chave: Plano diretor. Planejamento urbano. Polticas pblicas. Interveno Urbanstica.

  • ABSTRACT

    This dissertation was conducted through an exploratory study on the city of Teresina, capital of the State of Piau. A city with a peculiar origin, unlike all other Northeastern cities, Teresina is the one located in a central area of the States territory. This research approaches the peculiar formation of its densification, taking into account the entire history of its creation and a choice to host a new provincial capital until the implemented interventions. With the goal of verifying, through the citys historiography and the implemented policies, the way of the urbanization of the city was developed. It was performed a study on urban development plans developed for the city as a focus on current planning and the Agenda 2015, based on the principles set by the City Statute, Federal Law 10.257/2001. It also approaches what planners intend for the future of the city through the agenda and how its successor PRU was built. The results show that the city has developed in a very particular way and point out future perspectives of urban planning for the city.

    Keywords: Master planning. Urban planning. Public policies. Urban intervention.

  • LISTA DE FIGURAS

    Figura 1: Stio Urbano de Teresina - 1855 ............................................................................... 74

    Figura 2: Igreja do Amparo. Sem Data..................................................................................... 75 Figura 3: Miniatura do Plano de Therezina Plano Saraiva. .................................................. 77

    Figura 4: Praa da Constituio. ............................................................................................... 79

    Figura 5: Um trecho da Rua Senador Pacheco, Praa Marechal Deodoro. .............................. 80

    Figura 6: Casa do Baro de Gurguia, Mercado Pblico. ........................................................ 80

    Figura 7: Mapa do stio urbano de Teresina (1800 -1940) ....................................................... 81

    Figura 8: Construo do Seminrio. ......................................................................................... 82

    Figura 9: Usina Eltrica. Inaugurada em 1914. ........................................................................ 83

    Figura 10: Telgrafo PT, 1884. ................................................................................................ 84

    Figura 11: Mapa das alteraes no permetro urbano de Teresina. ........................................ 100

    Figura 12: A Zona Fisiogrfica do Mdio Parnaba no Estado do Piau. ............................... 109

    Figura 13: Municpio de Teresina no Mdio Parnaba. .......................................................... 110

    Figura 14: Morfologia do stio urbano e reas adjacentes de Teresina. ................................. 111 Figura 15: Carnaubal na PI-113.............................................................................................. 112

    Figura 16: Mapa da rede de energia eltrica........................................................................... 115

    Figura 17: Pirmide etria. ..................................................................................................... 145

    Figura 18: Grfico de Renda e Empregos de Teresina. .......................................................... 147

    Figura 19: Vista area Riverside Shopping e Pintos Shopping. ............................................. 157

    Figura 20: Parque Lagoas do Norte. ....................................................................................... 178

    Figura 21: rea Central de Teresina. ..................................................................................... 181 Figura 22: Bosque no Parque Linear Beira Rio Poti. ............................................................. 182

    Figura 23: Vista area da Av. Frei Serafim ............................................................................ 184

  • Figura 24: Santa Maria da Codipi Zona Norte de Teresina .................................................... 185

    Figura 25: Estao de Tratamento de Efluentes Domsticos - Zona Leste ............................ 186

    Figura 26: Legenda Mapa de Intervenes PRU .................................................................... 189

    Figura 27: Fotos da obra do Parque Lagoas do Norte. ........................................................... 191

    Figura 28: Projeto Lagoas do Norte ....................................................................................... 192 Figura 29: Plano de Habitao Vila da Paz ............................................................................ 193

    Figura 30: Groto Vila da Paz na poca do plano. ................................................................. 194

    Figura 31: Projeto Habitao Vila da Paz .............................................................................. 195 Figura 32: Fotos da visita a Vila da Paz em junho de 2013. .................................................. 196 Figura 33: Restaurao e Reabilitao do Mercado Central So Jos ................................... 198

    Figura 34: Fotos da visita ao Mercado em junho de 2013..................................................... 199 Figura 35: Parque Potycabana ................................................................................................ 201

    Figura 36: Situao diagnosticada pelo PRU Parque Potycabana ....................................... 202

    Figura 37: Fotos da visita Potycabana a em junho de 2013................................................ 203

  • LISTA DE MAPAS

    Mapa 1: Mapa Geogrfico da Capitania do Piau-1760 ........................................................... 65

    Mapa 2: Mapa do Piau, localizao com o permetro urbano atual das cidades envolvidas na mudana da capital. .................................................................................................................. 68

    Mapa 3: Mapa da cidade de Teresina 1922. ............................................................................. 71

    Mapa 4: Demarcao do permetro urbano de Teresina entre 1850-1900. .............................. 87

    Mapa 5: Demarcao do permetro urbano de Teresina entre 1901-1940. .............................. 91

    Mapa 6: Demarcao do permetro urbano de Teresina entre 1941-1950 ............................... 92

    Mapa 7: Demarcao do permetro urbano de Teresina entre 1951-1960 ............................... 93

    Mapa 8: Demarcao do permetro urbano de Teresina entre 1961-1970 ............................... 95

    Mapa 9: Demarcao do permetro urbano de Teresina entre 1971-1980 ............................... 96

    Mapa 10: Demarcao do permetro urbano de Teresina entre 1981-1990 ........................... 102

    Mapa 11: Demarcao do permetro urbano de Teresina entre 1981-1990 ........................... 103

    Mapa 12: Mapa cronolgico da expanso urbana de Teresina de 1800 a 1970. .................... 108

    Mapa 13: Mapa da Rede de abastecimento dgua. ............................................................... 113

    Mapa 14: Mapa de esgoto sanitrio Projeto em execuo em 1965 ....................................... 114 Mapa 15: Mapa da Rede telefnica. ....................................................................................... 116

    Mapa 16: Mapa da tipologia de pavimentao ....................................................................... 117

    Mapa 17: Mapa com o fluxo de Trfego. ............................................................................... 118

    Mapa 18: Zoneamento espontneo. ........................................................................................ 119

    Mapa 19: Mapa das Indstrias - localizao por Bairros. ...................................................... 120

    Mapa 20: Mapa de valores de terrenos urbanos ..................................................................... 121

    Mapa 21: Mapa de Intervenes PRU .................................................................................... 188

    Mapa 22: Mapa de localizao Projeto Lagoa do Norte ........................................................ 190

  • Mapa 23: Mapa PRODETUR Teresina. ................................................................................. 197

    Mapa 24: Corredores Ambientais Rios Poti/ Parnaba ........................................................... 200

  • LISTA DE TABELAS

    Tabela 1: Populao e concentrao urbana do Estado do Piau em suas principais cidades (1940-1970) .............................................................................................................................. 28

    Tabela 2: Crescimento demogrfico de Teresina 1872-1940 ................................................... 86

    Tabela 3: Taxas de crescimento geomtrico populacional entre 1950 1970 ......................... 89

    Tabela 4: Brasil, Piau: populao segundo domiclio, no perodo de 1940 a 1996. ............... 90

    Tabela 5: Leis de alteraes do permetro urbano .................................................................. 101

    Tabela 6: Taxas de crescimento geomtrico da populao entre 1970-2000 ......................... 103

    Tabela 7: Nmero de vilas, favelas e parques residenciais. ................................................... 105

    Tabela 8: Resumo dos trs primeiros planos diretores de Teresina ....................................... 130

    Tabela 9: Teresina: Crescimento da populao 1970-2000.................................................... 144

    Tabela 10: IDH de 1970-196 .................................................................................................. 145

    Tabela 11: Distribuio de empregos em 1999 ...................................................................... 148

    Tabela 12: Atendimento a pacientes de outros estados em Teresina de janeiro outubro de 2000 ................................................................................................................................................ 149

    Tabela 13: Possveis corredores de transporte interrompidos pelo Rio Poti .......................... 160

    Tabela 14: Equipamentos do Centro de Teresina. .................................................................. 162

    Tabela 15 - Cenrios construdos na Agenda 2015. ............................................................... 168

    Tabela 16: Quadro comparativo entre plano estratgico e plano diretor. ............................... 173

  • LISTA DE SIGLAS

    AGESPISA guas e Esgotos do Piau S.A.

    AGRIPISA Agroindstria do Piau

    AIDS Sndrome de Imunodeficincia Adquirida

    ANA Agncia Nacional de guas

    BEP Banco do Estado do Piau

    BID Banco Interamericano de Desenvolvimento

    BIRD Banco Mundial

    BNB Banco do Nordeste do Brasil

    BNH Banco Nacional da Habitao

    CAF Corporacion Andina de Fomento

    CDRU Concesso de Direito Real de Uso

    CEF Caixa Econmica Federal

    CEPAC Centro Piauiense de Ao Cultural

    CEPISA Companhia Energtica do Piau S.A.

    CIAM Congresso Internacional de Arquitetura Moderna

    COHAB Companhia Metropolitana de Habitao

    COHEBE Companhia Hidro Eltrica de Boa Esperana

    CREA Conselho Regional de Engenharia e Arquitetura e Agronomia

  • DENER Departamento Nacional de Estradas de Rodagem

    DER-PI Departamento de Estradas de Rodagem do Piau

    EIV Estudo de Impacto de Vizinhana

    FIPLAN Sistema Integrado de Planejamento, Contabilidade e Finanas

    FRIPISA Frigorficos do Piau

    FUNDAPE Fundao de Apoio e Desenvolvimento ao Ensino, Pesquisa e Extenso

    I PET Primeiro Plano Estrutural de Teresina

    IBAMA Instituto Brasileiro de Meio Ambiente e dos Recursos Naturais

    IBGE - Instituto Brasileiro de Geografia e Estatstica

    IDH ndice de Desenvolvimento Humano

    II PET Segundo Plano Estrutural de Teresina

    INAD Instituto Nacional de Administrao para o Desenvolvimento

    INAD Instituto Nacional de Administrao para o Desenvolvimento

    IPAM Instituto de Planejamento e Administrao Municipal

    IPAM Instituto de Planejamento e Administrao Municipal

    IPEA Instituto de Pesquisa Econmica Aplicada

    IPHAN - Instituto do Patrimnio Histrico e Artstico Nacional

    IPTU Imposto Predial e Territorial Urbano

    IQVU/BR ndice de Qualidade de Vida Urbana

    IUCN International Union For Conservation of Natureand Natural Resources

  • IUPN Unio Internacional para a Proteo da Natureza

    MMAD Comisso Mundial sobre o Meio Ambiente e Desenvolvimento

    MNRU Movimento Nacional pela Reforma Urbana

    MTUR Ministrio do Turismo

    ONG Organizao No Governamental

    ONU Organizao das Naes Unidas

    PAC Programa de Ao Concentrada

    PB Estado da Paraba

    PDDI Plano de Desenvolvimento Integrado do Municpio de So Paulo

    PDDU Plano de Desenvolvimento Urbano

    PDDU Plano Diretor de Desenvolvimento Urbano

    PDITS Plano de Desenvolvimento Integrado do Turismo de Teresina

    PDLI Plano de Desenvolvimento Integrado

    PDLI Plano Diretor Local Integrado

    PI Estado do Piau

    PLANASA Plano Nacional de Saneamento

    PLI Planejamento Local Integrado

    PMT Prefeitura Municipal de Teresina

    PMT Prefeitura Municipal de Teresina

    PND I Plano Nacional de Desenvolvimento I

  • PND II Plano Nacional de Desenvolvimento II

    PNUD Programa das Naes Unidas para o Desenvolvimento

    PNUMA Programa das Naes Unidas para o Meio Ambiente

    PSH Programa de Subsdio Habitao de Interesse Social

    PUB Plano Urbanstico Bsico

    SEMCOM Secretaria Municipal de Comunicao

    SEMDEC Secretaria Municipal de Desenvolvimento Econmico

    SEMDEC Secretaria Municipal de Desenvolvimento Econmico

    SEMPLAN - Secretaria Municipal de Planejamento

    SERFHAU Servio Federal de Habitao e Urbanismo

    SINDHOSPI Sindicato dos Hospitais do Piau

    SP Estado de So Paulo

    SUDENE Superintendncia do Desenvolvimento do Nordeste

    TELEPISA Telefones do Piau S.A.

    UESPI Universidade Estadual do Piau

    UFPI Universidade Federal do Piau

    UICN Unio Internacional para a Conservao da Natureza

    UIPN Unio Internacional para a Proteo da Natureza

    UnB Universidade de Braslia

    UNESCO Organizao Das Naes Unidas para a Educao, Cincias e Cultura

  • URSS Unio das Repblicas Socialistas Soviticas

    WCS World Conservation Strategy

    WSSD World Summiton Sustainble Development

    WWF Word Wilde Fund for Nature

    ZEIS Zonas Especiais de Interesse social

    ZP Zonas de Preservao Ambiental

  • SUMRIO

    INTRODUO ........................................................................................................................ 21

    CAPTULO 1 DISCUSSO SOBRE O URBANISMO E SUSTENTABILIDADE. .......... 32

    CAPTULO 2 A IMPLENTAO DE POLTICAS URBANAS NO BRASIL. ................ 46

    CAPTULO 3 TERESINA: O NASCIMENTO DE UMA NOVA CAPITAL ..................... 63

    3.1 De Oeiras a Teresina. ................................................................................................... 67

    3.2 - Teresina: da mudana ao povoamento ......................................................................... 73

    3.3 A expanso da malha urbana ....................................................................................... 85

    CAPTULO 4 TERESINA: PLANEJAMENTO URBANO NA CAPITAL ...................... 105

    4.1- Os Planos Diretores de 1969 a 1983 ........................................................................... 107

    4.2 -Um breve balano sobre os planos diretores de Teresina de 1969 a 1983 .................. 129

    4.3 - Planejamento Urbano em Teresina ps 1988. ............................................................ 131 4.4 - Plano de Desenvolvimento Sustentvel: formulao, implementao e reviso........ 138

    4.4.1 - O processo de elaborao e a participao popular ............................................. 139

    4.4.2 - Metodologia adotada ............................................................................................ 143

    4.4.2.1-Teresina que Temos ............................................................................................ 143

    4.4.2.2-Teresina que Teremos ......................................................................................... 163

    4.4.2.3-Teresina que Queremos....................................................................................... 169

    4.4.2.4-Teresina que Faremos. ........................................................................................ 169

    4.4.2.5 - Acompanhamento e implementao ................................................................. 171

    4.4.2.6 - Desdobramentos e crticas ................................................................................ 172

    4.4.2.7 - A reviso da Agenda 2015 ................................................................................ 173

    4.5 Perspectivas para Teresina e o PRU .......................................................................... 177

  • CAPTULO 5 CONSIDERAES FINAIS ...................................................................... 205

    REFERNCIAS BIBLIOGRFICAS ................................................................................... 209

  • 21

    INTRODUO

    Este trabalho tem como objetivo analisar a formao urbana da cidade de Teresina e a implementao do seu plano diretor atual, Agenda 2015, conhecida como Agenda Sustentvel de Teresina, sem desconsiderar a intrnseca relao da formao do estado do Piau e o nascimento de sua capital atual.

    No Brasil, a modernizao empreendida a partir dos anos 1950 se fez conservadora e, aps o golpe militar (1964), o Estado passa determinantemente a controlar tal situao. O projeto de construo nacional comea, ento, a valorizar a perspectiva do urbano-industrial, fruto da modernizao acelerada.

    Como consequncia de um pas que deixou de ser agrcola para tornar-se industrializado, houve a necessidade de planejamento para os servios urbanos e a poltica habitacional. Desta forma, a partir dos anos de 1960 diversos municpios brasileiros passam a ser alvos de planos urbanos, tendo em vista a organizao e o desenvolvimento do municpio de forma integrada.

    Este momento regido pelos paradigmas do urbanismo moderno, em que o planejamento urbano importante instrumento do Estado e oferece uma soluo formal ou figurativa organizao espacial da cidade, e no qual o Estado se afirma como o organizador e promotor do desenvolvimento urbano.

    Para tentar resolver estes problemas, o governo criou em 1964 o SERFHAU, um agente tcnico do sistema financeiro da habitao, que em 1966 passou a ser o rgo responsvel pela elaborao e coordenao da poltica nacional para o planejamento urbano integrado.

    O modelo de planejamento desenvolvido nesta poca era o fsico-territorial: partia de um diagnstico da cidade do ponto vista fsico, social e econmico, e de uma projeo estimada da populao at determinado ano ao qual se pretendia chegar, para ento elaborar um conjunto de propostas de como deveria apropriar-se da rea planejada. (ALVIM; KATO; BRUNA, 2007)

  • 22

    Assim, a concepo de planejamento urbano correspondia idealizao de um projeto de cidade do futuro, modelo de cidade desejada, onde seu ponto de partida era a definio de padres adequados ou aceitveis de organizao do espao condizente com o modelo adotado. (BRASIL, 2001). O zoneamento, principal instrumento utilizado, baseia-se na ideia da definio de um modelo de cidade ideal, traduzido em ndices como taxas de ocupao, coeficientes de aproveitamento, tamanhos mnimos de lotes, etc. (BRASIL, 2001, p.38)

    Isto significava tratar as cidades como um objeto puramente tcnico,

    [...] no qual a funo da lei seria apenas o de estabelecer os padres satisfatrios de qualidade para seu funcionamento. Ignora-se dessa forma qualquer dimenso que reconhea conflitos, e muito menos a realidade da desigualdade das condies de renda e sua influncia sobre funcionamento dos mercados imobilirios urbanos. (BRASIL, 2001, p.38)

    A responsabilidade do plano era do Estado, com investimentos em obras de infraestrutura (transportes, sistema virio, saneamento bsico, conjuntos habitacionais e equipamentos pblicos) associados a um controle dos investimentos privados por meio da implementao do zoneamento urbano que visa disciplinar o uso e a ocupao do solo.

    Nesse perodo, quase todas as capitais brasileiras e municpios de grande porte tiveram planos diretores calcados neste modelo. Os planos eram baseados em diagnsticos aprofundados e pretendiam dar conta de todos os aspectos do municpio, mas em geral no incorporavam as demandas sociais. O plano era entendido como dever do Estado e no incorporava a participao social, dispensando a considerao dos agentes e dos conflitos presentes na cidade. (ALVIM; KATO; BRUNA, 2007)

    Em Teresina, no foi diferente. Entre os anos de 1969 e 1983, foram elaborados trs planos diretores para este municpio, todos trazendo os mesmos princpios.

    A partir de meados dos anos 1980, iniciam-se as tentativas de democratizao das polticas pblicas e sua inscrio na Constituio de 1988 - a descentralizao e a participao da sociedade na gesto pblica. Neste momento, a sociedade brasileira passava por transformaes sociopolticas e econmicas com forte repercusso nos grandes centros urbanos.

    Um grande marco nos movimentos sociais foi o perodo da Constituinte de 1988, onde houve uma ampla participao popular atravs da elaborao de emendas populares. Na fase

  • 23

    anterior Constituinte, as aes dos movimentos foram predominantemente reivindicativas e de ao direta nas ruas. (CARVALHO, 2008, p.32)

    Um dos principais movimentos foi o MNRU, j citado anteriormente, que lutava por moradia e pressionava o Estado por reformas em vrias reas. As propostas de democracia que preconizavam a insero da populao em prticas de gesto pblicas como uma soluo frente aos problemas do cenrio poltico-administrativo ganhavam visibilidade.

    Esta bandeira de luta concorreu para a inscrio na Constituio Federal de 1988 de mecanismos de democratizao das relaes entre o Estado e a sociedade civil, e para a expanso de experincias inovadoras na rea de gesto de polticas pblicas.

    Como resultado dessa luta, foi includo na Constituio Federal de 1988 um captulo especfico destinado poltica urbana, artigos 182 e 183, que previam instrumentos de garantia no mbito municipal que garantiam o direito cidade, a defesa da funo social da cidade e da propriedade e a democratizao da gesto urbana. (CONSTITUIO FEDERAL, 1988)

    Assim, a partir de 1988, com a promulgao da Constituio Federal, consagra-se um novo perodo que para diversos autores, entre eles, Martins (2006), Villaa (2007), onde o planejamento urbano passa a ser parte de um processo democrtico e participativo que busca incorporar aspectos da realidade a ser transformada em prol de uma cidade justa e equitativa.

    Aps 13 anos de luta, em 2001 foi aprovada a Lei Federal n 10.257, o Estatuto da Cidade, que define as diretrizes para a poltica urbana no Brasil nos nveis federal, estadual e municipal, procurando promover o desenvolvimento urbano de forma equitativa, sustentvel e democrtica.

    O Estatuto da Cidade oferece as diretrizes e instrumentos para que os artigos constitucionais por ele regulamentados sejam aplicados a fim de atingir as finalidades desejadas. Desta forma, o Estatuto delega aos municpios a explicitao destas finalidades no Plano Diretor.

    Assim, o plano diretor ganha lugar de destaque no processo de planejamento urbano brasileiro, pois por meio deste instrumento os artigos constitucionais que tratam na poltica

  • 24

    urbana podem ser aplicados de forma eficaz, se ajustados s necessidades de cada cidade e utilizando os instrumentos oferecidos pelo Estatuto.

    No intervalo entre a instituio da Constituio Federal de 1988 e a aprovao do Estatuto da Cidade, em 2001, diversos municpios revisaram ou elaboraram novos planos em funo das obrigaes delineadas pela Carta Magna. Aps 2001, com a aprovao do Estatuto da Cidade, a elaborao do plano diretor tornou-se obrigatria para os municpios com mais de 20.000 habitantes; integrantes de regies metropolitanas ou aglomeraes urbanas; integrantes de reas de especial interesse turstico; inseridas na rea de influncia de empreendimentos ou atividades com significativo impacto ambiental de mbito regional ou nacional, e a sua aprovao no prazo de cinco anos. (ESTATUTO DA CIDADE, 2001)

    Em Teresina, dois planos diretores foram elaborados nesse perodo. Embora o primeiro tenha sido institudo trs meses antes da promulgao da Constituio Federal de 1988, o fato deste processo ter ocorrido no bojo das discusses da Constituinte no impediu que o plano incorporasse princpios da nova poltica urbana, tendo inclusive sido revisado em 1993.

    O segundo plano foi elaborado no mesmo ano da aprovao do Estatuto da Cidade, em 2001, e j incluiu os princpios da poltica urbana federal agora regulamentada. Em 2006, esse plano sofreu uma reviso e foi reinstitudo, ocasio em que os instrumentos definidos no Estatuto da Cidade foram incorporados ao seu contedo.

    Dessa forma, em primeiro lugar, pode-se destacar, em uma viso mais ampla, o processo de urbanizao e estruturao de Teresina, a partir do desenho de uma linha temporal, partindo do plano inicial e fundador da cidade, e passando pelos planos anteriores Constituio Federal de 1988: Plano de Desenvolvimento Integrado (PDLI, 1969), Plano Estrutural de Teresina (I PET, 1977), Plano de Desenvolvimento Urbano (PDDU,1983); pelo posterior, o Plano Estrutural de Teresina (II PET, 1987), e pelo seu primeiro plano ps Estatuto das Cidades, o Plano de Desenvolvimento Sustentvel de Teresina Teresina Agenda 2015.

    Tendo isso em vista, vale ressaltar a relevncia do relato sobre a fundao e escolha desta cidade como capital do estado. Esse histrico, alm de delimitar o objeto da pesquisa, demonstra a importncia do planejamento urbano na capital desde seu princpio.

  • 25

    O levantamento histrico da cidade em estudo permite compreender a fora de vontade dos habitantes da cidade que acabam se tornando fundamentais para implantao da primeira malha urbana.

    Em Memria e Identidade Social, Pollak fala sobre esse momento da identidade coletiva, que a sua origem e histria esto relacionadas com a formulao da identidade com o lugar onde elas habitam e, por consequncia, com a cidade:

    [] Alm desses acontecimentos, a memria constituda por pessoas, personagens. Aqui tambm podemos aplicar o mesmo esquema, falar de personagens realmente encontradas no decorrer da vida, de personagens freqentadas por tabela, indiretamente, mas que, por assim dizer, se transformaram quase que em conhecidas, e ainda de personagens que no pertenceram necessariamente ao espao-tempo da pessoa. [] Alm dos acontecimentos e das personagens, podemos finalmente arrolar os lugares. Existem lugares da memria, lugares particularmente ligados a uma lembrana, que pode ser uma lembrana pessoal, mas tambm pode no ter apoio no tempo cronolgico. (POLLAK, 1992, p.02)

    Com esse pensamento, a justificativa de se colocar temporalmente no momento de fundao da cidade cria uma perspectiva muito mais aprofundada da formulao do seu status atual. So esses personagens que esto na memria coletiva da populao teresinense, que ilustram a historiografia da cidade. E esse levantamento da fundao de Teresina e a sua ascenso capital trata de uma temtica que foi nos ltimos tempos um dos fatos mais importantes na hegemonia municipal.

    (...) situada em terras pouco frteis e distante do principal escoadouro natural do territrio piauiense o rio Parnaba no correspondia mais as necessidades exigidas para uma cidade capital, cuja administrao tinha expectativas diferentes com relao ao papel que um centro urbano de tal porte deveria desempenhar no contexto considerado. Com populao pobre, sem maiores perspectivas do que gravitar em torno do decadente comrcio do gado reflexo da situao em franco processo de estagnao, processo este que se reproduzia igualmente na maioria dos pequenos ncleos urbanos piauienses (ABREU, 1993, p.5).

    Dessa forma, observa-se que dada situao geogrfica de Oeiras, essa se constitua um obstculo para o progresso da ento provncia da Piau, inviabilizando no somente a comunicao com as demais provncias, como tambm o alavancamento do comrcio. Assim, buscava-se uma nova sede estrategicamente melhor situada para redefinir a economia e melhor administrar o territrio.

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    Foi ento que no ano de 1850, quando assumiu o governo da provncia, o jovem baiano Jos Antnio Saraiva, poltico liberal e de grande viso administrativa, esboou a ideia da mudana. Nascia a cidade de Teresina a quatro lguas da Vila do Poti, exatamente na poca em que toda provncia se comovia com as inundaes calamitosas que assolaram a vila, pois o local era baixo e sujeito a enchentes.

    A deciso obstinada de Saraiva foi lastreada pelo prestgio poltico que gozava na Assembleia da Provncia, a qual votou na lei da mudana. Resistindo a toda a sorte de presso contra a mudana, fundou a cidade e deu-lhe o nome de Teresina, homenageando a Imperatriz Teresa Cristina que, segundo a histria, apoiou, junto ao Imperador, a ideia da mudana da capital para a nova cidade. (CHAVES, 1994, p.19)

    A fundao de Teresina em 16 de agosto de 1852, a transferncia da freguesia e parquia de Nossa Senhora do Amparo do Poti para a nova cidade e a construo da matriz so os trs grandes jatos mais importantes na vida piauiense, sendo que este nascimento no de uma nova cidade e de nova capital, mas de vrios municpios piauienses que foram importantes para o fortalecimento do Estado. (CHAVES, 1994, p.20)

    As primeiras providncias so tomadas pelo Presidente, que planeja tudo, determinando ruas e praas, com o cuidado de estabelecer logradouros, em linhas paralelas, simetricamente dispostas, partindo do rio Parnaba ao rio Poti, que colocava a povoao em direo ao norte. Assim nasce Teresina, com uma planta primitiva elaborada sem rigor tcnico, com um centro no qual se edificariam como se edificaram os edifcios pblicos imprescindveis ao estabelecimento da administrao e do governo provincial. Em 1852, foi realizada a transferncia da capital da provncia do Piau. A vila elevada cidade recebeu o nome de Teresina. (ABREU, LIMA; 2000, p.7)

    No incio, desenvolveu-se rapidamente como centro administrativo e de comrcio varejista. Em 1858, foi fundada a companhia de navegao do rio Parnaba que originou um porto fluvial de intenso movimento e um centro comercial que atingia toda provncia.

    Teresina, no Piau, nica capital do Nordeste que se localiza no interior, foi planejada e construda especialmente com a funo de sede do Governo do Estado, j que apresentava melhores condies de comunicao com os outros centros e com o litoral do que a antiga

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    capital Oeiras. A cidade foi edificada sobre a Chapada do Corisco a uma altitude de 72 metros. (ABREU, LIMA; 2000, p.7)

    Como cidade planejada, apresenta um traado em xadrez, de ruas retilneas e largas, tendo ruas e praas arborizadas. Partindo desse plano em xadrez, construram suas ruas onde as larguras no ultrapassam sete metros e suas quadras no so superiores a 100 metros, tendo como centro a Praa da Constituio, atual Deodoro da Fonseca. A cidade at a dcada de 1900 expandiu-se obedecendo a essas diretrizes, tendo como eixo central a Avenida Frei Serafim, que a divide em Norte e Sul.

    Essa expanso, no incio mais acentuada na asa Norte, em 1868 foi favorecida no sentido sul aps a desobstruo de afloramentos rochosos, existentes no entroncamento da Rua da Glria (atual Lisandro Nogueira com Riachuelo). Com uma topografia suave, onde os acidentes naturais praticamente inexistem, as nicas barreiras encontradas foram no sentido leste oeste, os rios Parnaba e Poti e suas respectivas reas de inundaes.

    A transferncia da capital para Teresina significou uma urbanizao crescente do Piau, embora no existisse um relacionamento mais estreito entre as cidades, j que essas eram autossuficientes e, nesse perodo, tenha sido verificado fraco desenvolvimento das cidades quando se rompeu essa conjuntura no incio do sculo XX, mais precisamente de 1900 a 1940, com a economia extrativa para exportao. (BANDEIRA, 1983 apud FAANHA, 1998, p.55)

    Foi um perodo em que a atividade econmica foi intensamente marcada pelo ciclo da manioba, carnaba e babau. Para Faanha:

    Tal perodo, marcado pela atividade econmica extrativista, trouxe modificaes importantes para a organizao espacial do Piau. A explorao da manioba (1900-1915), da cera de carnaba e da amndoa do babau (1910-1950) consolidando no estado a rea centro-norte Teresina, Parnaba, Floriano, Amarante, Unio, todas situadas s margens do rio Parnaba como pulmo das atividades propulsoras do desenvolvimento (FAANHA, 1998, p.57).

    Embora tenha ocorrido o desenvolvimento de algumas cidades do Piau, Teresina, Parnaba e Floriano foram as principais cidades no final da dcada de 1940. Apesar de Teresina no ter apresentado um crescimento demogrfico satisfatrio nesse perodo, ainda assim se tornou o principal centro urbano piauiense graas ao seu carter eminentemente comercial. (FAANHA, 1998, p.57).

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    O crescimento de Teresina se deu nos sentidos norte e sul, sendo que o sentido norte tinha como condicionantes obstculos naturais, como seria ento o encontro dos rios. Dessa forma, havia espao somente no sentido sul o sentido leste opunha-se o rio Poti. Nas dcadas seguintes, a urbanizao piauiense ganha nova dinmica e consolida de vez Teresina como principal cidade do estado. (FAANHA, 1998, p.58).

    Tabela 1: Populao e concentrao urbana do Estado do Piau em suas principais cidades (1940-1970)

    CIDADE ANOS 1940 1950 1960 1970

    Teresina Urbana 34.695 5.418 98.320 181.022 Total 67.641 90.723 142.691 220.481

    Parnaba Urbana 22.641 30.174 39.145 57.030 Total 42.062 49.369 62.719 79.210

    Floriano Urbana 7.084 9.101 15.574 26.776 Total 25.705 33.786 23.556 35.850

    Campo Maior Urbana 3.789 6.992 13.849 18.400 Total 30.195 39.927 56,120 61.549

    Piripiri Urbana 4.520 4.357 9.409 18.481 Total ? 23.701 29.248 43.222

    Picos Urbana 2.943 4.357 8.080 18.107 Total 40.414 54.713 49.801 52.757

    Piau Urbana 130.816 170.584 292.233 538.197 Total 817.601 1.045.696 1.249.200 1.680.954

    Fonte: Faanha, 1998, p.69.

    Os nmeros indicam, na dcada de 1970, uma populao urbana igual a 181.022 habitantes e confirmam Teresina como principal centro piauiense, destacando-se na importncia em relao s outras cidades em nvel hierrquico no estado. Apresenta uma populao significativamente superior Parnaba, que se constitua a segunda cidade em populao, apresentando um total de 57.030 habitantes, um nmero trs vezes menor que a capital.

    Assim como o resto do Brasil, a capital do Piau acompanha o processo de urbanizao das outras cidades brasileiras que se intensificou a partir da segunda metade do sculo XX com

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    a industrializao do pas. Nos anos de 1950 a 1970, o milagre econmico impulsionou o movimento de xodo rural, incrementando o crescimento das cidades e a demanda de moradia nas mesmas. Nesse perodo, o modelo de planejamento adotado no pas era basicamente a interveno do estado no meio urbano de forma tecnocrtica.

    Teresina a partir disso passa por vrios planos que acompanham as caractersticas do contexto poltico brasileiro. Entre 1969 e 1980, na capital piauiense, so implementados planos essencialmente tecnocratas, voltados infraestrutura urbana. Aps a Constituio Federal de 1988, o municpio elabora dois novos planos diretores que acabam a focar em problemas de moradia e infraestrutura e ainda no h uma preocupao com o desenvolvimento equitativo e a justia social. (IPHAN, 2008, p.5)

    Seguinte Constituio em 2001, o Estatuto das Cidades incorporado s aes urbanas no Brasil. A partir destas leis, abrem-se novos canais de discusso com a sociedade, as polticas e os assuntos relacionados ao contexto urbano e geral1. Os principais tpicos so as mudanas dos panoramas municipais, relacionando o crescimento dos polos urbanos aos problemas sociais e ecolgicos que a expanso urbana provoca.

    Este trabalho pretende discorrer sobre as implantaes dos planos de urbanizao na cidade e como o plano atual est sendo implantado. Vale ressaltar que o principal material de estudo desta pesquisa proporcionado pelos planos diretores elaborados nesse perodo.

    Com isso o objetivo principal deste trabalho a discusso sobre o Plano de Desenvolvimento Sustentvel de Teresina, levando em considerao o histrico de desenvolvimento urbano voltado sustentabilidade, as suas repercusses no Brasil e os instrumentos de planejamento urbano que a Constituio Federal de 1988 e o Estatuto da Cidade de 2001 ditam para o desenvolvimento de polticas urbanas no Brasil.

    Os objetivos especficos deste trabalho so:

    1 O Estatuto da Cidade (EC), Lei Federal n 10.257/2001, a lei prevista no art.182 da Constituio

    Federal, que fixa as diretrizes e dispe a respeito das competncias da Unio sobre a poltica urbana, e estabelece tambm as atribuies aos outros nveis de poder, Estados, Distrito Federal e Municpios.

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    Compreender as bases tericas de planejamento urbano tanto no Brasil quanto no outros pases.

    Localizar na histria do Brasil a fundao da capital do Piau;

    Explanar os planos que foram criados para Teresina, mesmo os que no chegaram a ser implementados;

    Discutir o plano diretor atual, segundo as diretrizes do Estatuto da Cidade;

    Com isso se torna muito importante o conhecimento sobre o processo de planejamento urbano, mas essa pesquisa o toma apenas como referncia emprica, pois o foco principal da mesma a explanao dos planos diretores. Ou seja, um discurso baseado nos documentos dos planos diretores elaborados dentro dos diferentes contextos em que o Brasil se encontrava desde a fundao da cidade de Teresina at o ano de 2010.

    A metodologia aplicada na pesquisa parte de um processo investigativo, em um primeiro momento, a partir da reviso bibliogrfica em artigos, livros e revistas que falam sobre os processos e polticas de planejamento urbano e outros que tratavam dos histricos de formao da cidade em estudo. Em um segundo momento, a reviso documental dos planos diretores e legislao relevantes voltadas s novas polticas urbanas brasileiras.

    Trata-se ento de uma pesquisa qualitativa. E segundo GODOY (1995, apud NEVES, 1996, p.01) esse tipo de pesquisa caracterizada pelos seguintes itens:

    A no preocupao com estatsticas numricas;

    O enfoque indutivo;

    A descrio dos fenmenos e ambientes estudados;

    O ambiente natural a sua fonte de informaes;

    O significado que as pessoas do s coisas e sua vida como preocupao do investigado;

    A pesquisa qualitativa costuma ser direcionada, ao longo de seu desenvolvimento; alm disso, no busca enumerar ou medir eventos e, geralmente, no emprega instrumental estatstico para anlise dos dados; seu foco de interesse amplo e parte de uma perspectiva diferenciada da adotada pelos mtodos qualitativos. Dela faz parte a obteno de dados descritivos. (NEVES, 1996, p.01):

    A partir disto o trabalho se divide em cinco partes:

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    No primeiro captulo o objetivo abordar certos conceitos relacionados s polticas voltadas ao planejamento sustentvel no mundo. Essa parte da pesquisa fundamenta as aplicaes dos planos de desenvolvimento urbanos em vrios pases do mundo e no Brasil.

    No segundo momento, aborda os principais conceitos e definies relacionados ao tema desta pesquisa planejamento urbano em Teresina destacando a evoluo do processo de planejamento urbano no Brasil. Pretende-se entender os conceitos de planejamento urbano, plano diretor e de polticas pblicas, e a evoluo dos mesmos ao longo dos ltimos 50 anos, particularmente no perodo que sucede a Constituio Federal de 1988 e a aprovao do Estatuto da Cidade em 2001.

    Na terceira parte, pretende-se ilustrar a formao da capitania de So Jos do Piauhy e a formao dos seus primeiros adensamentos urbanos. A escolha da primeira capital, Oeiras, e as questes que geraram a discusso sobre a mudana da sede do poder provincial, passando pela tratativa da mudana da sede do poder pblico e a final escolha da nova capital, seguindo, com os planos que foram criados para o desenvolvimento. Essa exposio das diretrizes, que as ferramentas do governo municipal implementadas para tentar atuar de maneira mais coordenada dentro do territrio urbano, foram muito importantes para o entendimento dos problemas e principalmente na formulao do adensamento em que a cidade se encontrava quando recebeu o plano.

    No quarto captulo, ser tratada a Agenda 2015, buscando o entendimento da mesma e os paradigmas e mudanas que ela aponta na formao da cidade de objeto de estudo.

    E por fim, apresenta-se as consideraes finais sobre o desenvolvimento urbanstico, as influncias desses planos na formulao da cidade do presente, especialmente o de 2006, a Agenda 2015, verificando assim em que medida o processo de planejamento urbano, atravs do ltimo plano diretor, incorpora os princpios, diretrizes e instrumentos regulamentados pelo Estatuto da Cidade.

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    CAPTULO 1 DISCUSSO SOBRE O URBANISMO E SUSTENTABILIDADE.

    Os conceitos de urbanismo e planejamento urbano atual nascem da evoluo do pensamento sobre as cidades. O termo urbanismo um neologismo inventado h mais de um sculo. O planejamento urbano considerado um instrumento de interveno que depende fundamentalmente da relao entre Estado e classes sociais, no qual o Estado intervm para regularizar as contradies surgidas tanto no processo de reproduo de fora como de reproduo dos meios de produo. (NAMUR, 1992, p. 04)

    Com base na contribuio sociolgica, sugere sentidos diferenciados a palavra urbanizao. O primeiro diz respeito concentrao espacial de uma populao a partir de certos limites de dimenso e de densidade. E o outro, a difuso de sistemas de valores, atitudes e de comportamentos denominado de cultura urbana. (CASTELLS, 2002, p.16)

    Urbano designaria ento uma forma especial de ocupao do espao por uma populao, a saber, o aglomerado resultado de uma forte concentrao e de uma densidade relativamente alta, tendo como correlato previsvel uma diferenciao funcional e social maior. (CASTELLS, 2002, p.17)

    Mas, antes de ser um espao fsico, o urbano um espao social. O ambiente onde vivem seres humanos que tm suas necessidades, sonhos e projetos. Um ambiente modificado, alterado, construdo, que muitas vezes faz esquecer o ambiente natural.

    A cidade urbana moderna vem com caractersticas tcnicas e tambm com o sentimento de artificialidade. Com isso interessante conceituar essa cidade de maneira a se afastar um pouco dos conceitos de urbe como aglomerao e passar a considerar o aspecto material, ou seja, a partir do estabelecimento compacto de prdios prximos uns dos outros e do distanciamento da natureza. Assim, sob a tica econmica, Weber aponta que na cidade a maioria de seus habitantes vivem da indstria e do comrcio, e no da agricultura2. (WEBER, 1987, p. 4)

    2 No original: la mayor parte de sus habitantes viven de la industria y del comercio y no de la agricultura

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    A instituio do urbanismo como um campo de saber, nas primeiras dcadas do sculo XX, vincula-se ao de tcnicos, especialistas dos problemas das cidades, particularmente engenheiros e arquitetos. A recorrncia destes tcnicos ao urbanismo como disciplina, prtica e campo de atuao profissional se inscreve com a prpria ampliao da complexidade destes problemas. Congressos internacionais e nacionais, palestras, artigos de revistas e jornais, assim como a publicao de livros possibilitavam a circulao das ideias. O urbanismo prendia-se a uma cultura urbanstica que extrapolava o mbito desta disciplina, o que nos remete a um conjunto de prticas sociais que tm a cidade como forma de territorialidade dominante. (ANDRADE, 1992, p.38)

    O sculo XX pode ser considerado como aquele em que o Homem presenciou a urbanizao da sociedade, e tambm a consolidao de propostas urbansticas que tentavam vislumbrar uma nova configurao espacial para as cidades. Neste sentido, o maior desafio dos urbanistas ao lidar com a complexidade ps-industrial foi tentar estabelecer uma conexo entre as novas atividades, as relaes humanas nelas desenvolvidas e o espao urbano. (MENDONA, 2006, p.35)

    A urbanstica do sculo XX foi decorrente do amadurecimento de ideias lanadas no sculo XIX e da constante busca de se criarem modelos para as cidades desta nova era. Apesar de haver certas diferenciaes de propostas, Choay (2003) subdividiu o urbanismo em culturalista, progressista e naturalista. Pode-se dizer que elas convergiam em direo ao papel do arquiteto-urbanista como sintetizador das funes/tarefas presentes na cidade e organizador do espao urbano, de forma a tentar resolver os problemas do crescimento demogrfico e facilitar a vida nas cidades. Estava, ento, sendo formada a base terica e prtica do movimento modernista no sculo XX, que ganhou fora e tendncia ainda mais racionalista e funcionalista a partir das dcadas de 1920 e 1930, com o principal lder terico, Le Corbusier. (CHOAY, 2003, p. 7)

    Considera-se, ento, que o modernismo, apesar de ter sido criticado como parte de um cenrio das utopias sociais iniciadas na Unio das Repblicas Socialistas Sovitica (URSS) e Europa, das dcadas de 1920 e 1930, antes de tudo representou uma mudana significativa no modo de projetar obras arquitetnicas e cidades, possibilitado pela Revoluo Industrial e aliado vontade de se construir uma nova sociedade. Assim, os pioneiros da nova arquitetura,

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    os construtivistas russos (URSS) e os funcionalistas (estes liderados por Le Corbusier) aceitaram o risco de construir para o futuro, tentando encontrar formas arquitetnicas condizentes com os novos materiais. (MENDONA, 2006, p.35)

    Nesse intuito, segundo os primeiros ideais modernistas, necessitava-se de uma nova forma de habitao e de cidades para atender s novas relaes humanas e s formas tornadas possveis pelas tcnicas e materiais inovadores e, acima de tudo, para a reconstruo do "modo de vida" mais condizente com a sua proposta social.

    Na segunda fase, entre a Primeira e a Segunda Guerras Mundiais, o modernismo assume uma postura heroica de reconstruo das naes envolvidas na guerra e agrega a esta ao social a viso esttica que surgia. O modernismo foi tambm associado a movimentos polticos mesmo que antagnicos. Era difcil manter-se indiferente Revoluo Russa, ao crescente poder de movimentos socialistas e comunistas, ao colapso de economias e governos e ascenso do fascismo (HARVEY,1998, p40)

    Nesse universo catico aconteceu o IV Congresso Internacional de Arquitetura Moderna (CIAM), em 1933, que buscou decifrar a problemtica que acontecia no mundo na poca, com relao a caos urbano que a revoluo industrial causou nos principais centros que se industrializavam na poca. (CHOAY, 2003, p. 12)

    Peter Hall (1995) demonstra em sua obra Cidades do Amanh o cenrio que Londres, Paris, Berlim e Nova Iorque viviam entre os anos de 1880 e 1900. O autor ponta que essas cidades enfrentavam graves problemas de planejamento urbanstico e habitacionais decorrentes da transformao demogrfica do espao urbano.

    Londres, por exemplo, passou de 864.845 habitantes em 1801 para 1.841.676 em 1841, e 4.232.118 em 1891. Ou seja, em menos de um sculo, a populao do principal polo industrial ingls quintuplicou. Paralelamente, o nmero de cidades inglesas com mais de 100 mil habitantes passou de duas para 30, entre 1800 e 1895. (CHOAY, 2003, p. 03-04)

    O adensamento desses polos industriais acontecia de maneira descontrolada, as cidades encontravam-se com uma infraestrutura muito distante da necessria para atender nova demanda urbana.

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    Do ponto de vista estrutural, nas velhas cidades da Europa, a transformao dos meios de produo e transporte, assim com a emergncia de novas funes urbanas, contribuem para romper os velhos quadros, frequentemente justapostos, da cidade medieval e da cidade barroca. Uma nova ordem criada, segundo o processo tradicional da adaptao da cidade sociedade que habita nela. (CHOAY, 2003, p. 04)

    Como bem demonstra Choay, a urbe deve se adaptar de uma maneira ou de outra aos seus ocupantes e s carncias dos mesmos. nesse cenrio que IV CIAM acontece, e a partir da observao de que nova sociedade industrial gera uma nova cidade adaptada a novos comportamentos e necessidades das pessoas que nela habitam. O resultado disso um dos produtos mais importante para o desenvolvimento de polticas voltadas ao planejamento urbano at hoje, a Carta de Atenas de 1933. O documento traz um diagnstico do panorama de como se encontravam as cidades industriais no perodo:

    No interior do ncleo histrico das cidades, assim como em determinadas zonas de expanso industrial do sculo XIX, a populao muito densa (chega a mil e at mil e quinhentos habitantes por hectare).

    Nos setores urbanos congestionados, as condies de habitao so nefastas pela falta de espao suficiente destinado moradia, pela falta de superfcies verdes disponveis, pela falta, enfim, de conservao das construes (explorao baseada na especulao). Estado de coisas ainda agravado pela presena de populao com padro de vida muito baixo, incapaz de adotar, por si mesma, medidas defensivas.

    O crescimento da cidade devora progressivamente as superfcies verdes limtrofes, sobre as quais se debruavam as sucessivas muralhas. Esses afastamentos cada vez maiores dos elementos naturais aumentam proporcionalmente a desordem higinica.

    As construes destinadas habitao so distribudas pela superfcie da cidade em contradio com os requisitos da higiene.

    Os bairros mais densos se localizam nas zonas menos favorecidas. (CONGRESSO INTERNACIONAL DE ARQUITETURA MODERNA, 1933)

    Por fim, um panorama de como os participantes do IV CIAM viam a situao das novas cidades que nasciam da revoluo industrial:

    A base desse lamentvel estado de coisas est na preeminncia das iniciativas privadas inspiradas pelo interesse pessoal pelo atrativo do ganho. (...) A construo de habitao ou de fbricas, a organizao das rodovias, hidrovias ou ferrovias, tudo se multiplicou numa pressa e numa violncia individual, da qual estavam excludos qualquer plano preconcebido e qualquer reflexo previa. Hoje, o mal est feito. As cidades so desumanas, e da ferocidade de alguns interesses privados nasceu a infelicidade de inmeras pessoas. (CONGRESSO INTERNACIONAL DE ARQUITETURA MODERNA, 1933)

    Para esse diagnstico, 33 cidades foram analisadas, dentre elas, Amsterd, Frankfurt, Paris, Londres e Zurique. Todas apresentaram o mesmo tipo de problema: a desordem instituda

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    pelo maquinismo em situao que comportava at ento uma relativa harmonia; e tambm a ausncia de qualquer esforo srio de adaptao. (CONGRESSO INTERNACIONAL DE ARQUITETURA MODERNA, 1933)

    Com isso, foram criadas doutrinas para a produo urbana, colocando o homem e suas necessidades como base na construo deste novo pensamento. E assim as chaves do urbanismo foram fundamentadas em quatro funes: habitar, trabalhar, recrear-se e circular, que seriam regulamentadas pelo urbanismo dentro da mais rigorosa economia de tempo, sendo a habitao social considerada o centro das preocupaes urbansticas.

    Assegurar aos homens moradias saudveis, isto , locais onde o espao o ar puro e o sol, condies essenciais da natureza, lhe sejam largamente asseguradas;

    Organizar os locais de trabalho, de modo que, ao invs de serem uma sujeio penosa, eles retomem seu carter de atividade humana natural;

    Prever as instalaes necessrias boa utilizao das horas livres tornando-as benficas e fecundas;

    Estabelecer o contato entre essas diversas organizaes mediante uma rede circulatria que assegure as trocas, respeitando as prerrogativas de cada uma; (LE CORBUSIER, 1971, p.119)

    A carta tambm apresenta que os princpios do urbanismo foram produzidos pelo trabalho de inmeros tcnicos, tais como os da arte de construir, da sade e da organizao social. E que o urbanismo deve ser, portanto, um campo que envolve um conhecimento multidisciplinar. Alm disso, o pensamento urbanstico, de acordo com o documento, deve levar em considerao as transformaes dos aspectos da cidade, os elementos da natureza, como o clima, a topografia, a regio, fatores culturais, econmicos, necessidades sociolgicas, etc. E esclarece a funo do profissional de urbanismo dentro do planejamento de uma cidade, que : a administrao dos lugares e dos locais diversos que devem abrigar o desenvolvimento da vida material, sentimental e espiritual em todas as suas manifestaes individuais ou coletivas. (CONGRESSO INTERNACIONAL DE ARQUITETURA MODERNA, 1933)

    Aps esse momento chave do urbanismo mundial, a preocupao com as cidades e com a ocupao do territrio passou a ser foco de estudos e debates. Vrios eventos, congressos, fruns e reunies aconteceram em todo o mundo para discutir os problemas que as cidades viviam e tentar evit-los daqui em diante. (DIAS, 2009, p. 19)

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    a cidade de Le Corbusier, que responde as funes da vida: habitar, trabalhar, cultivar o corpo e o esprito, aos quais um objetivo elevado, conquanto acessvel, possa ser atribudo: a alegria de viver. (LE CORBUSIER, 1971, p. 53)

    Entretanto, aps as concretizaes das propostas racionalistas e funcionalistas do modernismo em vrias partes do mundo, a partir da dcada de 60 comearam as primeiras crticas a esse modo de pensar a arquitetura e as cidades. A descrena nasceu justamente da exacerbao do racionalismo universal que passou a ser interpretado no como soluo para os problemas da cidade, mas como um modelo rgido e opressor.

    A cidade ps-moderna contrape-se cidade moderna, assumindo formas exatamente opostas. Uma cidade em pedaos, onde as funes esto esparramadas na mancha urbana, agregando-se umas as outras em um aparente caos de estilos e atividades. A cidade volta a ser o que era no passado, no incio da era industrial.

    Assim, a crtica ps-moderna internacional colocou em um mesmo pacote as manifestaes do modernismo alto como uma aplicao rotineira e menos bem sucedida do perodo heroico:

    A vulgarizao da morfologia moderna vir a fazer-se sem o brilho dos grandes mestres e das qualidades do seu desenho, entregues a arquitetos menos talentosos ou a rotina burocrtica dos organismos de deciso. Nesta avalanche de planos e projectos acabar por se instalar a rotina e a monotonia, porque o prprio sistema facilita a tomada de decises freccionada por sistemas, remetendo as questes menos arquitetnicas para as mos da Administrao ou das engenharias (LAMAS, 1993, p.298)

    Apesar de margear o mesmo ponto crtico do modernismo, como aponta Colquhoun, o ps-modernismo tambm divergia em correntes progressistas e culturalistas, o que mostra que a ideia universalista e consensual do modernismo alto foi substituda por uma pluralidade de tendncias, novamente em um perodo de experimentaes.

    Para os progressistas, o ps-modernismo uma transfigurao do modernismo. Mantm muitas das idias associadas ao modernismo principalmente a noo de uma radical ruptura com a histria -, mas as transforma. Para os culturalistas, ao contrrio, o ps-modernismo implica uma completa dissociao do modernismo e uma reao contra ele e a favor da tradio. (COLQUHOUN, 2004, p.223)

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    Entretanto a proposta de reduzir drasticamente uma autoridade no planejamento urbano foi uma postura comum entre as duas correntes e acabou por relegar a outros setores, com interesses particulares, o poder de decidir sobre a cidade.

    A minimizao da autoridade do produtor cultural cria a oportunidade de participao popular e de determinaes democrticas de valores culturais, mas ao preo de certa incoerncia ou, o que mais problemtico, de certa vulnerabilidade manipulao do mercado de massa. (HARVEY, 1998, p.55)

    A evoluo desses pensamentos levou a sociedade a se preocupar com outras patologias que o aumento acelerado dos grandes centros mundiais provocavam. Questes voltadas durao dos recursos naturais, mudanas climticas, uso da tecnologias para um crescimento urbano menos agressivo. O meio ambiente passa a ser foco das discusses sobre as cidades e a influenciar nas doutrinas de planejamento das mesmas.

    Foi nesse novo momento formado por uma evoluo do pensamento do homem com relao qualidade de vida humana e a manuteno dos recursos naturais, que surgem as primeiras ideias voltadas ao planejamento sustentvel. Porm, observa-se no progresso das polticas urbanas que a partir do desenrolar do pensamento de autores como Charles Fourier, Robert Owen, John Ruskin, William Morris, e dos pensadores Friedrich Engels, Karl Max sobre novas cidades industriais e suas peculiaridades, que se comeou a desenvolver novos conceitos sobre as mesmas.

    As primeiras movimentaes voltadas a essa preocupao com a manuteno do meio ambiente aconteceram em conjunto com o crescimento urbano, iniciando-se logo aps ao IV CIAM. Vallejo traz uma cronologia dos primeiros fatos que precedem o desenvolvimento deste assunto:

    A Conveno para Preservao da Fauna e Flora em Estado Natural (Londres, 1933);

    A Conveno Pan-americana de Proteo da Natureza e Preservao da Vida Selvagem do Hemisfrio Oeste (Washington, 1940);

    O Congresso organizado pelo governo Francs e pela Organizao das Naes Unidas para a Educao, Cincia e Cultura (UNESCO) em 1948, quando foi fundada a Unio Internacional para a Proteo da Natureza (UIPN), posteriormente denominada de Unio Internacional para a Conservao da Natureza (UICN), englobando agncias governamentais e no-governamentais, e que passou a coordenar e iniciar trabalhos de cooperao internacional no campo da conservao da natureza

    As Assembleias Anuais da UICN, realizadas a partir de 1960; e

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    Os I, II, III e IV Congressos Internacionais de Parques Nacionais, respectivamente nos EUA (Seattle, 1962 e Yellowstone, 1972) Indonsia (Bali, 1982) e Venezuela (Caracas,1992). (VALLEJO, 2004, p. 04)

    Em 1961 criada a Organizao No-Governamental (ONG) World Wide Fund for Nature (WWF), que se consolidou como uma das mais respeitveis redes independentes de conservao da natureza. O livro Primavera Silenciosa (Silent Spring), lanado em 1962, escrito por Rachel Carson, relaciona a degradao ambiental com produo dos campos, chamando ateno para os perigos de uso de pesticidas. Em 1968, Garrett Hardin publica o artigo A Tragdia dos Bens Comuns (The Tragedy of the Commons), apresentado como conferncia no congresso da Sociedade Americana para o Progresso da Cincia, tratando da destruio de bens comuns por interesses privados. (DIAS, 2009, p. 33)

    Em 1968, constituiu-se o Clube de Roma, composto por cientistas, industriais e polticos, que tinha como objetivo discutir e analisar os limites do crescimento econmico levando em conta o uso crescente dos recursos naturais. Quatro anos depois, no ano de 1972, Donella H. Meadows e Dennis L. Meadows publicaram o estudo Os Limites do Crescimento (The Limits of Growth), conhecido como Relatrio do Clube de Roma, que relaciona a degradao ambiental, o esgotamento dos recursos naturais no renovveis e a difuso da fome e do crescimento populacional. (DIAS, 2009, p. 33).

    No mesmo ano, ocorreu a Conferncia das Naes Unidas sobre o Meio Ambiente, ocorrida em Estocolmo, na Sucia, reuniu uma delegao de 113 pases e produziu a Declarao da ONU com relao ao Ambiente Humano com vinte seis princpios voltados a preservao e a manuteno dos recursos naturais e proteo de espcies ameaadas. Alm disto, da conferncia foi produzido um Plano de Ao com cento e nove recomendaes e a criao de um rgo, o Programa das Naes Unidas para o Meio Ambiente (PNUMA), com a funo de coordenar as questes ambientais dentro do sistema das Naes Unidas. (DIAS, 2009, p. 33)

    Entre os dias de 14 a 26 de outubro de 1977 aconteceu em Tbilisi, Gergia, a Conferncia Intergovernamental sobre a Educao Ambiental, que produziu uma declarao sobre polticas voltadas Educao Ambiental, com base no que foi proclamado em Estocolmo.

    Como foi proclamada na Declarao da Conferncia das Naes Unidas sobre o Ambiente Humano, realizada em 1972 em Estocolmo, a defesa e a melhoria do ambiente para as geraes presentes e futuras constituem um objetivo urgente da

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    humanidade. Para atingir este objetivo necessrio que se adote com urgncia novas estratgias, incorporando-as ao desenvolvimento, o que representa, especialmente nos pases em desenvolvimento, o requisito prvio de todo avano nessa direo. (...). A Educao Ambiental deve atingir pessoas de todas as idades, todos os nveis e mbitos, tanto da educao formal, quanto da no-formal. Os meios de comunicao social tm a grande responsabilidade de colocar seus recursos a servio dessa misso educativa. Os especialistas em questes ambientais, assim como aqueles cujas aes e decises podem repercutir de maneira perceptvel no ambiente, devem adquirir, no decorrer de sua formao, os conhecimentos e as atitudes necessrios e perceber plenamente o sentido de suas responsabilidades a esse respeito. (CONFERNCIA INTERGOVERNAMENTAL SOBRE EDUCAO AMBIENTAL, 1977)

    No dia 5 de outubro de 1948, foi criada a Unio Internacional para a Conservao da Natureza (International Union for Conservation of Natureand Natural Resources IUCN) com sede em Gland, Sua. Fundada inicialmente como Unio Internacional para a Proteo da Natureza (IUPN) em Fontainebleau, Frana, em 1956 mudou o nome e tornou-se uma das principais organizaes ambientais do mundo. (ASSEMBLEIA DA REPBLICA, 2012)

    Em 1980, IUCN, PNUMA e a WWF laaram o documento Estratgias de Conservao Mundial (World Conservation Strategy WCS), que registra a necessidade da realizao de aes a longo prazo para soluo de problemas ambientais e de estratgias nacionais de conservao, voltadas para integrar os objetivos ambientais com os relacionados ao desenvolvimento. (DIAS, 2009, p. 33-34)

    (1) manter os processos ecolgicos essenciais e os sistemas naturais vitais necessrios sobrevivncia e ao desenvolvimento do Ser Humano; (2) preservar a diversidade gentica; e (3) assegurar o aproveitamento sustentvel das espcies e dos ecossistemas que constituem a base da vida humana. O objetivo da conservao, segundo esse documento, o de manter a capacidade do planeta para sustentar o desenvolvimento, e este deve, por sua vez, levar em considerao a capacidade dos ecossistemas e as necessidades das futuras geraes. (BARBIERI, 2005, apud DIAS, 2009)

    Seguindo na dcada de 80, em 1983, a Comisso Mundial sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento (MMAD - 1983), tambm chamada de Comisso Brundtland, uma vez que foi presidida pela Primeira-Ministra da Noruega, Gro Harlem Brundtland, tendo como relatrio final publicado em 1987, conhecido como Nosso Futuro Comum (Our Common Future), um documento de imensa importncia para a produo em urbanismo atualmente. Nele se encontra o conceito de desenvolvimento sustentvel: aquele que atende s necessidades do presente sem comprometer a possibilidade das geraes futuras atenderem a suas prprias necessidades. (COMISSO MUNDIAL SOBRE MEIO AMBIENTE E DESENVOLVIMENTO, 1988). E

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    tambm apresenta uma srie de medidas que devem ser tomadas pelos pases para promoverem o desenvolvimento sustentvel:

    (1) Limitao do crescimento populacional; (2) Garantia de recursos bsicos (gua, alimentos, energia) a longo prazo; (3) Preservao da biodiversidade e dos ecossistemas; (4) Diminuio do consumo de energia e desenvolvimento de tecnologias com

    uso de fontes energticas renovveis; (5) Aumento da produo industrial nos pases no-industrializados com base

    em tecnologias ecologicamente adaptadas; (6) Controle da urbanizao desordenada e integrao entre campo e cidades

    menores; (7) Atendimento das necessidades bsicas (sade, escola, moradia). (8) Em mbito internacional, as metas propostas so: (9) Adoo da estratgia de desenvolvimento sustentvel pelas organizaes

    de desenvolvimento (rgos e instituies internacionais de financiamento); (10) Proteo dos ecossistemas supranacionais como a Antrtica, oceanos, etc.,

    pela comunidade internacional; (11) Banimento das guerras; (12) Implantao de um programa de desenvolvimento sustentvel pela

    Organizao das Naes Unidas (ONU). (13) Algumas outras medidas para a implantao de um programa

    minimamente adequado de desenvolvimento sustentvel so: (14) Uso de novos materiais na construo; (15) Reestruturao da distribuio de zonas residenciais e industriais; (16) Aproveitamento e consumo de fontes alternativas de energia, como a

    solar, a elica e a geotrmica; (17) Reciclagem de materiais reaproveitveis; (18) Consumo racional de gua e de alimentos; (19) Reduo do uso de produtos qumicos prejudiciais sade na produo

    de alimentos. (RELATRIO BRUNDTLAND, 2012)

    O PNUMA, em 1984, organizou a Conferncia Mundial da Indstria sobre a Gesto do Meio Ambiente, com o objetivo de reduo do impacto ambiental da indstria. E tambm, em parceria com o IUCN e WWF publica, em 1991, o documento Caring for The Earth.

    (1) desenvolvimento sustentvel para indicar a melhoria da qualidade de vida, respeitando os limites da capacidade dos ecossistemas; (2) economia sustentvel para indicar a economia que resulta de um desenvolvimento sustentvel e que, portanto, conserva a sua base de recursos naturais; e (3) o uso sustentvel para indicar a utilizao de recursos renovveis de acordo com a sua capacidade de reproduo. (BARBIERI, 2005, apud DIAS, 2009, p. 36)

    Em 1992, a Conferncia das Naes Unidas para Meio Ambiente e Desenvolvimento, conhecida como a Cpula da Terra, Conferncia do Rio ou Rio-92, contou com a participao de 178 pases, 103 chefes de estado e 10 mil delegados e produziu:

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    (1) a Declarao do Rio sobre o Meio Ambiente e Desenvolvimento, contendo 27 princpios; (2) a Agenda 21, que um plano de ao para o meio ambiente e o desenvolvimento do sculo XXI; (3) duas grandes convenes internacionais: a Conveno Quadro das Naes Unidas sobre Mudana do Clima e a Conveno sobre Diversidade Biolgica; (4) a Comisso de Desenvolvimento Sustentvel; (5) um acordo para negociar uma conveno mundial sobre a desertificao; (6) a declarao de Princpios para o Manejo Sustentvel de Florestas. (DIAS, 2009, p.36)

    A Rio-92 tratou da problemtica ambiental, erradicao da pobreza e a melhoria das condies de vida e de trabalho no campo. Esses temas vm sendo tratados pela comunidade cientfica desde antes do IV CIAM, em 1933, como destacamos anteriormente. Trata-se de um intervalo de 59 anos e a principal diferena entre os eventos no apenas o envolvimento de mais pases e a preocupao com uma gama maior de problemticas, mas que neste novo evento se fala em um Princpio da Precauo includo no Princpio 15: Quando houver ameaa de danos graves ou irreversveis, a ausncia de certeza cientfica absoluta no ser utilizada como razo para o adiamento de medidas economicamente viveis para prevenir a degradao ambiental (CONFERNCIA DAS NAES UNIDAS SOBRE O MEIO AMBIENTE E DESENVOLVIMENTO apud DIAS, 2009, p.37)

    Alm disto, da Conferncia do Rio, foi gerada uma Comisso de Desenvolvimento Sustentvel, rgo internacional, encarregado de supervisionar e ajudar a comunidade internacional a atingir as estabelecidas no evento. Tambm, um programa de ao denominado Agenda 21, dividido em 40 captulos com enfoque em quatro reas principais:

    (1) dimenses sociais e econmicas, como a cooperao internacional para acelerar o desenvolvimento sustentvel, combater a pobreza, mudar os padres de consumo, as dinmicas demogrficas e a sustentabilidade e proteger e promover a sade humana; (2) conservao e manejo dos recursos para desenvolvimento, como a proteo da atmosfera, o combate ao desmatamento, o combate desertificao e seca, a promoo da agricultura sustentvel e do desenvolvimento rural, a conservao da diversidade biolgica a proteo dos recursos de gua doce e dos oceanos e o manejo racional de produtos qumicos txicos e de resduos perigosos; (3) fortalecimento do papel dos grupos principais, incluindo mulheres, crianas e jovens, povos indgenas e suas comunidades, ONGs, iniciativas de autoridades locais em apoio Agenda 21, trabalhadores e seus sindicatos , comercio e indstria, a comunidades cientifica e tecnolgica de agricultores; (4) meios de implementao do programa, incluindo mecanismos e recursos financeiros, transferncia de tecnologia ambientalmente saudveis, promoo da educao, conscientizao pblica e capacitao, arranjos de instituies internacionais, mecanismos e instrumentos legais internacionais e informaes para o processo de tomada de decises.(DIAS, 2009, p.37)

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    Em 1997, houve um encontro realizado em Nova Iorque para rever os compromisso assumidos na Rio 92, principalmente no que diz respeito repercusso da Agenda 21 e sua implantao nos pases participantes, chamada de Rio+5, chegando a concluso de que muitas metas estabelecidas no documento no haviam sido cumpridas. (DIAS, 2009, p.43)

    A Conferncia Mundial sobre Desenvolvimento Sustentvel (World Summit on Sustainable Development - WSSD) Rio+10 em Johanesburgo, frica do Sul, buscou entre o dia 26 de agosto a 4 setembro de 2002, a avaliao do cumprimento das metas da Agenda 21. Muito se falou, e se escreveu sobre a temtica da sustentabilidade durante os anos que precederam a Conferncia. (DIAS, 2009, p.43)

    Em decorrncia deste encontro foram produzidos dois documentos: uma declarao poltica sobre a busca do desenvolvimento sustentvel (Johannesburg Declaration) e um plano de ao para orientar a implementao dos compromissos assumidos entre os pases participantes, conhecido com Metas do Milnio, que visavam alm de garantir a sustentabilidade ambiental:

    Erradicar a fome e a pobreza extrema; alcanar uma mnima educao primria com iguais oportunidades para homens e mulheres; reduzir a mortalidade infantil com especial enfoque ao combate AIDS e malria; melhorar as condies de vida dos que moram em favelas e de outras populaes mais necessitadas, ampliar o acesso gua potvel; desenvolver uma parceria global para o desenvolvimento que inclusse sistemas internacionais de comercio e financiamento no discriminatrios e atendesse s necessidades especiais dos pases em desenvolvimento, aliviando suas dvidas externas, provendo trabalho aos jovens e acesso a remdios e novas tecnologias. (LUCON e COELHO, 2002, p.11)

    A comunidade mundial ainda no conseguiu fazer jus s promessas feitas na Eco-92, mesmo tento alcanado vrios pontos importantes no decorrer dos anos. Um novo encontro aconteceu entre os dias 13 a 22 de julho 2012, a Rio+20, um retorno ao Rio de Janeiro para avaliar o progresso do alcance das metas. Com a participao de 193 lderes de naes que fazem parte da ONU, a conferncia debateu cinco temas principais: (1) o balano do que foi feito nos ltimos 20 anos em relao ao meio ambiente; (2) a importncia e os processos da Economia Verde; (3) aes para garantir o desenvolvimento sustentvel do planeta; (4) maneiras de eliminar a pobreza; (5) a governana internacional no campo do desenvolvimento sustentvel.

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    Todo esse movimento da percepo das influncias do homem no meio ambiente e da necessidade de buscar poltica, que alm de melhorar a condio de vida dos que vivem no planeta atualmente e dos que ainda iro habit-lo no futuro, fundamentaram o tipo de viso que a sociedade possui sobre as cidades. A expectativa nesse momento sai da esfera dos congressos e conferncias e passa a fazer parte do cotidiano de toda a populao. Hoje, a palavra sustentabilidade est disseminada em vrias esferas do conhecimento:

    Sustentabilidade ambiental: refere-se manuteno da capacidade de sustentao dos ecossistemas, o que implica a capacidade de absoro e recomposio dos ecossistemas em face das interferncias antrpicas.

    Sustentabilidade social: tem como referncia o desenvolvimento e como objeto a melhoria da qualidade de vida da populao. Em pases com desigualdades, a adoo de polticas distributivas e/ou redistributivas e a universalizao do atendimento na rea social principalmente na sade, educao, habitao e seguridade social.

    Sustentabilidade poltica: refere-se ao processo de construo da cidadania, em seus vrios ngulos, e visa a garantir a plena incorporao dos indivduos ao processo de desenvolvimento.

    Sustentabilidade econmica: implica uma gesto eficiente dos recursos em geral e caracteriza-se pela regularidade de fluxos do investimento pblico e privado o que quer dizer que a eficincia pode e precisa ser avaliada por processos macrossociais.

    Sustentabilidade demogrfica: revela os limites da capacidade de suporte de determinado territrio e de sua base de recursos; implica cotejar os cenrios ou tendncias de crescimento econmico com as taxas demogrficas, sua composio etria e continente de populao economicamente ativa.

    Sustentabilidade cultural: relaciona-se com a capacidade de manter a diversidade de culturas, valores e prticas no planeta, no pas e/ou numa regio, que compem ao longo do tempo a identidade dos povos.

    Sustentabilidade espacial: norteada pela busca de maior equidade nas relaes inter-regionais. (DIAS, 2009, p. 45 a 47)

    O conceito de urbanismo atual est intrinsecamente relacionado sustentabilidade e todos os conceitos que a envolvem e se correlacionam entre si. A poltica urbana, segundo Dias, o conjunto de aes voltadas para se alcanar o pleno desenvolvimento das funes sociais da cidade e da propriedade urbana. E qualidade de vida urbana est diretamente ligada eficcia do planejamento urbano. (DIAS, 2009, p.48)

    Atualmente em Teresina, assim como na maioria das capitais brasileiras, a preocupao com o meio ambiente e sua preservao foi a principal questo que o plano atual almeja alcanar. A Agenda 2015 dividida em 19 livros, nos quais quatro deles, Teresina e seu espao, Teresina que faremos, Teresina que queremos e Teresina que Temos, sendo o ltimo um diagnstico da situao em que a cidade se encontra, envolvem uma tica com pretenso de

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    implantar o planejamento urbano sustentvel.3 Com isso, podemos concluir que o plano em estudo deve compreender as preocupaes levantadas pela historiografia do assunto.

    3 A agenda 2015 ser explorada de maneira aprofundada posteriormente nesta pesquisa.

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    CAPTULO 2 A IMPLENTAO DE POLTICAS URBANAS NO BRASIL.

    Influenciado pelos eventos histricos que modificavam o cenrio europeu, o Brasil produziu as definies dos programas urbanos de maneira muito semelhante s outras cidades do mundo. Os primeiros planos consistiam basicamente do alargamento de vias, erradicao de ocupao de baixa renda nas reas mais centrais, implementao de estrutura, especialmente de saneamento e ajardinamento de parques e praas.

    Abascal, Bruna, Alvim (2007), em Modernizao e modernidade fazem algumas consideraes sobre as influncias na arquitetura e no urbanismo de So Paulo no incio do sculo XX, apontam que a renovao das reas centrais e os novos sistemas de transporte pblico e virio substituram os antigos padres arquitetnicos coloniais por modelos que remetem queles estilsticos europeus, afirmando assim a inteno de transformao modernizadora.

    E assim como os outros pases do mundo, foi posteriormente a sua industrializao que o Brasil passou a apresentar polticas voltadas ao planejamento urbano fundamentos pelo j consolidado Urbanismo Moderno, o qual aparece como um instrumento que oferece soluo formal ou figurativa organizao espacial da cidade, incidindo em sua estruturao social, propondo formas de convivncia que tratam de evitar os males da sociedade industrial. (ALVIM; KATO; BRUNA, 2005, p. 4)

    Mas, partindo de um panorama histrico, Villaa em Uma Contribuio para histria do Planejamento urbano no Brasil constri uma historiografia do planejamento brasileiro.

    Uma sria dificuldade que se apresenta para a construo da histria do planejamento urbano no Brasil que nele, comumente, o discurso e prtica se mesclam de tal forma que difcil separ-los. comum entre ns, por exemplo, considerar como sendo poltica pblica urbana o discurso do Estado acerca de sua ao sobre o urbano. Assim, alguns se referem ao discurso do SERFHAU sobre o planejamento urbano como a poltica pblica do governo federal no campo do planejamento urbano. Mesmo nos casos do BNH ou do PLANASA, h que se considerar com cuidado a diferena entre o discurso e a ao real do Estado, cujos objetivos, alis, frequentemente so ocultos. (VILLAA, in DEAK, CSABA e SCHIFFER, SUELI R. (org.), 2010, p. 173)

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    Tendo isso em vista, para melhor esclarecimento do assunto, o entendimento da diferenciao do conceito de plano e projeto. Uma determinao prtica, ou discurso do Estado sobre o espao urbano, estar mais prxima do conceito de plano e, portanto, afastada do de projeto. Villaa desenvolve uma lista de critrios que conceitua os planos e ajuda a fazer essa diferenciao.

    (1) Abrangncia de todo o espao urbano e apenas desse espao e seus vrios elementos constitutivos no tocante aos objetivos (a organizao e equipamento desse espao), mas no necessariamente no tocante ao diagnstico feito para fundamentar a interveno.

    (2) Continuidade de execuo necessidade de revises e atualizaes. (3) Interferncia da ao sobre maioria ou grandes contingentes da populao. (4) Papel e importncia das decises polticas, especialmente dos organismos

    polticos formais, com maior participao dos organismos municipais e menor dos federais e estaduais. (VILLAA, in DEAK, CSABA e SCHIFFER, SUELI R. (org.), 2010, p. 174)

    Flvio Villaa, com isso, prope uma separao conceitual no planejamento urbano brasileiro. Ele os dividem em planejamento urbano lato sensu e stricto sensu. O primeiro trata do planejamento que inclui tanto os discursos como as prticas (PDDI de So Paulo, plano de Braslia, de transportes para Fortaleza e o Pereira Passos para Rio de Janeiro), e o segundo planos que tiveram como eixo atividades e discursos que vieram a desemborcar nos atuais planos diretores (zoneamento, planejamento de cidades novas, o chamado urbanismo sanitarista). A partir disto, o autor traz sua diviso da histria do urbanismo brasileiro. Segundo o autor, ela acontece do ano de 1875 e pode ser dividida em trs grandes perodos: um vai at 1930, outro desta data at a dcada de 1990, e um terceiro que se inicia de 1990 at a atualidade. (VILLAA, in DEAK, CSABA e SCHIFFER, SUELI R. (org.), 2010, p. 175)

    No artigo Urbanismo e planejamento urbano no Brasil 1875 a 1992, Renato Saboya (2008) relaciona a diviso de Villaa com a historiografia apresentada por Maria Leme em A formao do pensamento urbanstico no Brasil, 1865-1965, dividindo as etapas do desenvolvimento do planejamento urbano no Brasil at o ano de 1992 em quatro fases: (1) planos de embelezamento (1875 1930); (2) planos de conjunto (1930 1965); (3) planos de desenvolvimento integrado (1965 1971); (4) planos sem mapas (1971 1992).

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    O mesmo perodo representou a poca onde a classe dominante brasileira tinha uma proposta urbana, discutindo os planos antes de serem efetivamente implementados. Villaa descreve que fica claro que os planos no seriam elaborados para ser executados, nem para resolver os grandes problemas das massas populares urbanas. Sem dvida eram elaborados para atender aos interesses dominantes urbanos. (VILLAA, in DEAK, CSABA e SCHIFFER, SUELI R. (org.), 2010, p.203). E quanto aos planos de embelezamento, o autor discorre que:

    A Frana foi o principal referencial, com o seu planejamento de origem renascentista, que enfatizava a beleza monumental, ao mesmo tempo em que vinha impregnando de ideologia, visto que glorificava e ajudava a impor o estado e a Classe dominante capitalista populao. Tratava-se no apenas de discurso, mas de aes concretas do estado, que nem sempre tinham os mesmos objetivos pregados nesses discursos. (VILLAA, in DEAK, CSABA e SCHIFFER, SUELI R. (org.), 2010, p. 193)

    Por trs dos planos de embelezamento e de incremento da infraestrutura os quais interessavam classe dominante, estavam os interesses imobilirios, que eram acompanhados e financiados pelo setor. As obras de embelezamento eram anunciadas previamente e festejadas por todos, enquanto as de infraestrutura eram geralmente escondidas, pois beneficiavam apenas uma parte privilegiada da populao. Exemplos de planos desse perodo so o Plano de Avenidas de Prestes Maia (1930), em So Paulo, e o Plano Agache, no Rio de Janeiro, tambm em 1930.

    Abascal, Alvim, Bruna (2007) colocam que a renovao das reas centrais e os novos sistemas de transporte pblico e virio substituram os antigos padres arquitetnicos coloniais por modelos que remetem queles estilsticos europeus, afirmando assim a inteno de transformao modernizadora.

    Com o grande crescimento econmico que o pas passava, os planos de embelezamento no solucionam as patologias que assolavam as metrpoles brasileiras na poca. Villaa (op.cit., p.199) amplia este discurso afirmando que se passava da cidade bela para a cidade eficiente, da cidade do consumo para a cidade da produo, mas sempre com o interesse imobilirio fortemente presente. Com isso os planos de embelezamento foram substitudos pelos de infraestrutura, mudana incentivada pela necessidade que os industriais tinham de cidade equipadas para receber as indstrias.

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    As obras de embelezamento e melhoramento, antes consumidas por todos, eram anunciadas com antecedncia e festejadas; as de infraestrutura, que passaram a dominar a segunda metade do sculo XX, eram geralmente escondidas, pois beneficiavam uma parcela reduzida, e privilegiada, da populao. Os Planos Urbanos passam a ser desconsiderados, embora ainda reconhecido como necessrios pelo setor pblico. A eficincia das cidades mais valorizada que a questo da beleza.

    Entre os anos de 1920 e 1930, segundo Villaa, predomina ainda o urbanismo sanitarista, o qual est calcado na urbanizao das cidades para fins de higienizao. Um dos principais precursores deste modelo no Brasil foi o engenheiro Saturnino Brito, autor de planos em vrias cidades, entre elas Vitria (1896), Santos (1905-1910) e Recife (1909-1915). (VILLAA, in DEAK, CSABA e SCHIFFER, SUELI R. (org.), 2010, p. 177).

    No segundo perodo proposto, a maioria dos planos diretores elaborados era excessivamente genricos, compostos por diretrizes e objetivos gerais que, na prtica, pouco orientavam as aes do Poder Pblico. Os planos diretores deste perodo apresentam um forte carter tecnocrtico, uma vez que eram elaborados por tcnicos que estavam distantes dos problemas da populao. Estes tcnicos acabavam por ditar os rumos das cidades, assim como os meios necessrios para o desenvolvimento das mesmas. (VILLAA, in DEAK, CSABA e SCHIFFER, SUELI R. (org.), 2010, p.203.)

    Villaa cita tambm como caracterstica deste perodo o distanciamento entre os planos e suas propostas e as possibilidades de suas implementaes; o conflito de uma administrao cada vez mais setorizada e especializada com as propostas cada vez mais, abrangentes e a dificuldade de aprovao dos planos.

    O principal exemplo disso o Plano Doxiadis4 para o Rio de Janeiro, em 1965, elaborado pelo escritrio do urbanista Greco-internacional Constantin A. Doxiadis, escrito em ingls, que inaugura a fase dos superplanos tecnocratas. Estes planos eram elaborados em escritrios privados encomendados pelo governante, mas no eram assumido por ele.

    4 Intitulado Plan for UrbanDevelopment, o plano elaborado por um escritrio privado em Atenas foi entregue ao governo somente dias antes do fim do mandato demonstrando claramente que no seria usado.

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    Devido a essa falta de consistncia nos planos e tambm pela falta de disposio em segui-los, a viso tradicional de plano diretor fortemente associada de zoneamento. Junto da crescente urbanizao pela qual passava o Brasil no perodo ps-milagre econmico, comeavam a surgir os problemas urbanos, e precisava-se de uma resposta a esses problemas.

    Para a questo da falta de habitao, o governo criou em 1964 o SERFHAU (Servio Federal de Habitao e Urbanismo)5, que em 1966 foi regulamentado como um rgo responsvel pela elaborao e coordenao da poltica nacional no que se referia ao planejamento urbano integrado. Assim, o ano de 1964 marca o momento do planejamento urbano no qual se inicia a gesto de uma poltica nacional voltada para a questo urbana.

    O Planejamento Local Integrado (PLI) era entendido como a elaborao de planos e projetos que, eram compatibilizados entre si e onde era compreendido os aspectos econmicos, sociais, fsicos e institucionais, visavam ao desenvolvimento a nvel municipal. Propunha-se, portanto, um tratamento interdisciplinar para os problemas municipais, apesar de na prtica, ter-se verificado nfase excessiva nos problemas fsico-urbansticos. (TOLOSA,1977 in TOLEDO 1978, p.40)

    A concepo de planejamento urbano em vigor correspondia idealizao de um projeto de cidade do futuro por meio de um Plano Diretor de Desenvolvimento Integrado que seria executado ano