os noivos

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(Notário espera sentado o filho chegar enquanto fuma seu cigarro. Salviano entra) Notário - Senta meu filho, senta. Vamos bater um papo. Salviano – Pronto pai. Notário - Quero saber de ti o seguinte: esse teu namoro é coisa séria? Pra casar? Salviano — Minhas intenções são boas. (Notário diz esfregando as mãos) Notário — Ótimo! Edila é uma moça direita, moça de família. E o que eu não quero para minha filha, não desejo para a filha dos outros. Agora, meu filho, vou te dar um conselho. (Salviano escuta atento cada palavra do pai) Notário - O grande golpe de um namorado, sabe qual é? No duro? (baixa a voz) É não tocar na pequena, não tomar certas liberdades, percebeu? (Salviano se assombra) Salviano - Mas, como? Liberdades, como?. Notário — Por exemplo: o beijo! Se você beija sua namorada a torto e a direito, o que é que acontece? Você enjoa, meu filho. Batata: enjoa! E quando chega o casamento, nem a mulher oferece novidades para o homem, nem o homem para a mulher. A lua-de-mel vai-se por água abaixo. Compreende? (Salviano abismado de tanta sabedoria responde) Salviano — Compreendi. A SOMBRA PATERNA (Logo após salviano dizer “compreendi”, Edila entra na sala) Edila – Boa tarde. (Salviano entra e beija a mão de Edila) Salviano – Boa tarde. Notário – Vou deixa-los a sós (Sai). (Entusiasmado e orgulhoso do pai, salviano responde)

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(Notário espera sentado o filho chegar enquanto fuma seu cigarro. Salviano entra)

Notário - Senta meu filho, senta. Vamos bater um papo.

Salviano – Pronto pai.

Notário - Quero saber de ti o seguinte: esse teu namoro é coisa séria? Pra casar?

Salviano — Minhas intenções são boas.

(Notário diz esfregando as mãos)

Notário — Ótimo! Edila é uma moça direita, moça de família. E o que eu não quero

para minha filha, não desejo para a filha dos outros. Agora, meu filho, vou te dar

um conselho.

(Salviano escuta atento cada palavra do pai)

Notário - O grande golpe de um namorado, sabe qual é? No duro? (baixa a voz) É

não tocar na pequena, não tomar certas liberdades, percebeu?

(Salviano se assombra)

Salviano - Mas, como? Liberdades, como?.

Notário — Por exemplo: o beijo! Se você beija sua namorada a torto e a direito, o

que é que acontece? Você enjoa, meu filho. Batata: enjoa! E quando chega o

casamento, nem a mulher oferece novidades para o homem, nem o homem para a

mulher. A lua-de-mel vai-se por água abaixo. Compreende?

(Salviano abismado de tanta sabedoria responde)

Salviano — Compreendi.

A SOMBRA PATERNA

(Logo após salviano dizer “compreendi”, Edila entra na sala)

Edila – Boa tarde.

(Salviano entra e beija a mão de Edila)

Salviano – Boa tarde.

Notário – Vou deixa-los a sós (Sai).

(Entusiasmado e orgulhoso do pai, salviano responde)

Salviano — Muito bacana, o meu pai! Tu não achas?

Edila - Acho.

Salviano — Concordas?

Edila — Concordo.

Salviano — Dizem que ninguém é infalível. Pois eu vou te dizer um negócio: meu pai é infalível, percebeu? Infalível, no duro.

Edila – Hum... Minha mãe também é infalível. Outro dia mesmo ela me disse “Cuidado

com o beijo na boca! O perigo é o beijo na boca!”

(Curioso Salviano pergunta)

Salviano – O que mais ela te disse?

Edila – Ela disse que Sem beijo não há nada, que está tudo muito bem, e com beijo

pode acontecer o diabo. Falou que eu ainda sou muito menina e talvez não perceba

certas coisas e que tudo que acontece de ruim, entre um homem e uma mulher,

começa num beijo!

Salviano – Calma Edila. Nosso namoro será tranquilo. Eu não toco em ti até o dia

do casamento.

Edila — E nem me beija?

(Com um olhar tímido Salviano responde)

Salviano — Nem te beijo. OK?

Edila — OK.

Salviano — Ou será que você vai sentir falta?

Edila — De quê?

(Se aproximando e passando as mãos no rosto de Edila, Salviano responde)

Salviano — Digo falta de beijos e, enfim, de carinho.

(Edila sorri e responde serena)

Edila — Não. Estou cem por cento com teu pai. Acho que teu pai está com a razão.

(Salviano fica sem saber o que dizer)

Edila — Sabe que essas coisas não me interessam muito? Eu acho que não sou

como as outras. Sou diferente. Vejo minhas amigas dizerem que beijo é isso, aquilo

e aquilo outro. Fico boba! E te digo mais: eu tenho, até, uma certa repugnância.

Olha como eu estou arrepiada, olha, só de falar nesse assunto!

Salviano – Está bem (Sorri um pouco sem jeito). Já está um pouco tarde, acho

melhor eu te levar para casa, sua mãe deve estar preocupada.

Edila – Está bem. Vamos. (Saem de mãos dadas)

O VELHO

(Notário entra em cena e Salviano entra sorrindo)

Notário – Por que está tão contente Salviano?

Salviao – Estava com Edila pai.

Notário — Já vi que essa menina tem o temperamento de uma esposa cem por

cento. A esposa deve ser, mal comparando, e sob certos aspectos, um

paralelepípedo. Essas mulheres que dão muita importância à matéria não devem

casar. A esposa, quanto mais fria, mais acomodada, melhor! Vamos jogar poker e eu falo melhor sobre isso.

(Dr. Borborema, um velho conhecido da família bate na porta)

Salviano – Com licença, vou atender.

Notário – Está bem.

CATÁSTROFE

(Salviano sorri ao abrir a porta e ver o velho conhecido)

Salviano – Boa tarde. Há quanto tempo... (Apertam as mãos)

Borborema – Boa tarde Notário. Desculpe a grosseria, mas o senhor poderia me deixar a sós com o seu filho?

Notário – Está bem.

Borborema - Sua noiva acaba de sair do meu consultório. Para encurtar conversa:

ela vai ser mãe!(Salviano recua sem entender)

Salviano — Mãe?!...

Borborema - Por que é que vocês não esperaram, carambolas? Custava esperar?

Salviano - De quantos meses?

Borborema - Três. O negócio, agora, já sabe: é apressar o casamento. Casar antes

que dê na vista. (Salviano fica petrificado enquanto o doutor se despede e sai de

cena)

Salviano – (Diz enfurecido) Não... Isso não pode ser verdade! Não é possível! Não

pode ser! (Notário entra após escutar os gritos)

Notário – O que foi isso? Que barulheira é essa?

Salviano — Edila está grávida, meu pai! (E tomado por acesso de fúria acrescenta)

E não fui eu! Juro que não fui eu! Cínica... Cínica. Nunca teve um beijo meu, que sou seu noivo, e vai ter o filho do outro! O que eu Devo fazer pai?

Notário - Perdoar. Perdoa meu filho, perdoa!

Salviano - Ela merece um tiro!

Notário — Ela, não, nunca! Ele, sim! Ele merece!

Salviano — Quem?

Notário - O pai da criança! Esse filho não caiu do céu, de pára-quedas! Há um

culpado. (Notário segura Salviano pelos dois braços e olha firme para os olhos de

Salviano) Antes de ti, Edila teve um namorado. Deve ter sido ele. Se fosse comigo,

eu matava o cara.

Salviano – (Levanta-se e responde quase eufórico) O senhor tem razão, meu pai! O senhor sempre tem razão!

(Salviano entra enfurecido pela porta que estava aberta na casa de Edila)

Salviano – Foi o pimenta não foi? Foi ele não foi sua vagabunda?

Edila – Não sei, não sei!

Salviano – Foi ele né sua vadia?

Edila - Não digo! Tudo, menos isso!

Salviano – Pois eu vou matar ele!

Edila – Não! Você vai acabar com a sua vida!

Salviano – É isso mesmo que eu vou fazer. Depois de matar ele eu tiro minha vida

e você vai carregar esse fardo pra sempre! (Sai furioso enquanto Edila tenta

impedir)

Edila – Sai de perto de mim sua vadia!

(Mais tarde no velório, Notário dá um beijo na bochecha de Edila)

- Daqui ninguém pode nos ver... (Olha para os lados) Foi melhor assim. Ninguém

desconfia de nada. (Sai com estilo. Rsrs).