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OS DONOS DO MUNDO

Todos os segredos da luta pelo domínio mundial

Pedro Baños

TraduçãoPedro Vidal

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Reservados todos os direitos de acordo com a legislação em vigor.Reprodução proibida por todos e quaisquer meios.

A presente edição segue a grafia do novo Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa.

© 2017, Pedro BañosDireitos para esta edição:© 2018, Clube do Autor, S. A.Avenida António Augusto de Aguiar, 108 – 6.º1050-019 Lisboa, PortugalTel. 21 414 93 00 / Fax: 21 414 17 [email protected]

Título original: Así se domina el MundoAutor: Pedro BañosTradução: Pedro Vidal (Lufada de Letras)Revisão: Rui AugustoPaginação: Gráfica 99em caracteres PalatinoImpressão e acabamento: Cafilesa – Soluções Gráficas, Lda. (Portugal)

ISBN: 978-989-724-431-5Depósito legal: 441 825/181.ª edição: Junho, 2018

www.clubedoautor.pt

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Este livro é dedicado a todas as pessoas que todos os dias se esforçam por conseguir um mundo mais justo, livre e seguro.

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ÍNDICE

Introdução .............................................................................................. 11

1. Como é o nosso mundo ................................................................. 13Tensões entre países • Hipocrisia e jogos de influências • Rivalidade, ambição e violência

2. Princípios geopolíticos imutáveis ............................................ 27Espaço vital • Influência da economia • Peso da História • Instabilidade das alianças

3. 27 geoestratégias imortais ......................................................... 85Políticas pacíficas e bélicas • Táticas diretas e indiretas • Manipulação da opinião pública

4. Grandes erros das decisões políticas ..................................... 321Ignorar a idiossincrasia dos povos • Excesso de confiança • Não contar com o inesperado

5. Os verdadeiros motivos por trás dos grandes conflitos .... 377As paixões e as fragilidades humanas • Ânsia de poder

Epílogo .................................................................................................... 391

Lista das 27 geoestratégias mais recorrentes ..................................... 397

Nota do autor ......................................................................................... 399

Agradecimentos ................................................................................... 401

Bibliografia ............................................................................................. 403

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INTRODUÇÃO

«A  essência do poder é influenciar o comporta-mento do adversário.»

Robert D. Kaplan, The Revenge of Geography

Desde tempos imemoriais, os poderosos tentam impor a sua vontade e deixar a sua marca em toda a parte onde chegam os seus tentá-

culos e a sua influência. Até ao século xvi, a expansão deste poder abar-cava uma zona geográfica limitada, que se foi ampliando a partir do descobrimento da América. A Revolução Industrial forneceu o último empurrão para levar esse predomínio a regiões até então desconheci-das, chegando a alcançar recônditos cantos do planeta.

Com o passar do tempo, o poder foi mudando de titularidade, mas as ambições mantiveram -se as mesmas. Para além da sua intenção de subjugar todos os grupos humanos que encontrasse pelo caminho, ten-tava impedir o acesso ou a chegada de outros poderes que pudessem rivalizar com o seu, fossem de índole militar, económica ou religiosa. Esta constante histórica prossegue na atualidade e perdurará, indepen-dentemente do tempo que passe. Mudarão a tecnologia e o modo de realizar as aspirações humanas, mas a ambição de dominação e submis-são do próximo continuará a ser imortal, como tem sido até agora. A geopolítica transformou -se num instrumento de «geopoder» (que também se poderia denominar «geocontrolo» ou «geodomínio»), pre-tendendo tanto controlar o mundo – ou, pelo menos, o maior número

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de regiões do mundo – como evitar ser subjugado por outro, ou pelo menos em demasia.

Para isso é necessário conhecer como os poderosos têm manipulado, e continuam a manipular, o mundo à sua volta. Certas estratégias têm sido aplicadas desde há séculos; outras são mais recentes, mas nada faz pensar que se venham a deixar de aplicar no futuro, embora com algu-mas variações. Dentro desta perspetiva, as 27 estratégias aqui tratadas não são mais do que a aplicação prática desse geopoder, a materializa-ção e a concretização de como se decidiu atuar e influenciar na esfera internacional.

Este conhecimento permitir -nos -á estar alerta para, na medida do possível, não acabarmos manipulados como meros fantoches nas mãos dos grandes artífices do mundo. Ainda assim, teremos de ter consciên-cia da enorme influência externa que pesa sobre as nossas vidas e da dificuldade de nos libertarmos dela.

Pensamos que somos livres, que podemos escolher de forma autó-noma o nosso destino, os nossos gostos, a maneira de vestir ou de nos comportarmos, o que comemos ou a que dedicamos o nosso tempo livre, mas somos permanentemente induzidos a adotar ações, decisões e atitudes. Com crescente subtileza, os que decidem em nosso nome impõem -nos formas de vida, modelos sociais e ideologias, de modo a ficarmos submetidos aos seus desígnios. Isto é o que acontece, mais do que nunca, nos dias de hoje, quando entrou na moda a palavra «pós--verdade» para definir o contexto global de desinformação, ainda que na realidade fosse mais correto denominá -lo «pré -mentira», «multimen-tira», ou «plurimentira», já que o que chega sobretudo ao público não é mais do que uma grande falsidade disfarçada de verdade.

Só conhecendo estas realidades geopolíticas chegaremos à certeza de que há muito caminho para percorrer até se conseguir um mundo em que verdadeiramente prevaleça o que é mais importante: a segu-rança humana.

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COMO É O NOSSO MUNDO

Tensões entre países • Hipocrisia e jogos de influências • Rivalidade,

ambição e violência

«O drama dos países ocidentais é que as democra-cias liberais carecem de uma estratégia constante e confundem estratégia com tática.»

Alexandre de Marenches

Para compreender o significado atual da palavra «geopolítica» não basta recorrer às suas aceções tradicionais. Sem contudo as ignorar,

é preciso ir mais além e inseri -la corretamente no contexto mundial vigente.

Segundo a visão clássica, os acontecimentos políticos podiam com-preender -se, interpretar -se e até justificar -se pela sua vinculação a posi-ções geográficas e antecedentes históricos. Nesta perspetiva, aceita -se a existência de uma série de constantes geopolíticas que moldam, de uma maneira quase imutável e perene, a estrutura do desenrolar dos aconte-cimentos que se repetem desde os tempos passados até ao presente.

Sem menosprezar estas abordagens, a geopolítica atual exige uma perspetiva mais ampla e profunda. A inegável globalização e a crescente interdependência dos países fazem com que a geopolítica tenha deixado de estar exclusivamente limitada à terra – o prefixo geo limitava -a a um dado território, a um espaço físico muito concreto – para passar a referir--se à Terra, a todo o globo terrestre. Em consequência disso, até os países mais pequenos são obrigados, hoje em dia, a estabelecer a sua geopolí-tica, pois pouco haverá que se passe no resto do mundo que não os afete

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de uma ou de outra forma. E afeta mesmo o espaço exterior ao planeta, pois a necessidade de procurar novas fontes de recursos e energia, ou simplesmente lugares onde albergar uma população crescente numa superfície terrestre cada vez mais exaurida, faz com que a moderna geopolítica se interesse também por dimensões extraterrestres.

Por outro lado, a expressão «geopolítica» ganhou um enorme dina-mismo, sendo obrigatório aprofundar não apenas o estudo do passado e do presente, como também esquadrinhar o futuro. Se conseguirmos elucidar como se desenvolverão os acontecimentos nos próximos anos, poderemos adiantar ações benéficas para os interesses próprios, que deverão ser os de toda a humanidade.

No Diccionario de la Real Academia Española, as duas primeiras aceções da palavra política proporcionam uma valiosa informação para este estudo. A primeira define -a como a «arte, doutrina ou opinião referente ao governo dos Estados», ao passo que a segunda diz que é a «atividade dos que governam ou aspiram a governar os assuntos públicos», o que se poderia perfeitamente traduzir como a aspiração a governar os des-tinos dos congéneres.

Assim, a geopolítica atual poderia definir -se como a atividade que se desenvolve com a finalidade de influenciar os assuntos da esfera internacional, entendido este exercício como a aspiração de influência à escala global, evitando, ao mesmo tempo, ser influenciado. Poderia mesmo concretizar -se como a atividade realizada por aqueles que pre-tendem governar os desígnios mundiais (ou, pelo menos, de uma ampla região do mundo), tentando simultaneamente impedir que outros ato-res internacionais dirijam os seus, aspirando a que ninguém tenha a capacidade de se intrometer nas suas decisões.

Apesar desta novidade na terminologia, a geopolítica continua a estar estreitamente ligada às circunstâncias geográficas (as que menos mudam), desde os meros acidentes, como cadeias montanhosas ou estreitos, até à população aí instalada, passando pelos diferentes recur-sos naturais (energéticos, minerais, hídricos, agrícolas, piscatórios, etc.). Não poderemos também esquecer que a geopolítica atua igualmente sobre outros fatores menos tangíveis, como a economia e as finanças.

Precisamente por abarcar um espectro tão alargado, esta geopolítica emergente é, ao mesmo tempo, geradora das demais políticas nacionais,

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COMO é O NOSSO MUNDO

as quais aglutina. Pouco, ou mesmo nada, do que acontece num país pode ser desligado completamente da situação internacional, das ten-dências mundiais dominantes e dos riscos comuns. Neste panorama de escala planetária, onde a complexidade e a confusão não deixam de aumentar, torna -se cada vez mais imprescindível para os decisores geo-políticos disporem de informação secreta precisa que possibilite vislum-brar os acontecimentos futuros.

Dentro do processo de estabelecimento das diretrizes geopolíticas (o «quê»), em primeiro lugar deverão ser determinadas as necessidades e os interesses do Estado (os «para quê»). Daí surgirão as estratégias pertinentes, convertidas em geoestratégias, ou seja, nos procedimentos, ações e meios requeridos para satisfazer as finalidades geopolíticas (o «como» e o «com quê»). Dito de outro modo, a geoestratégia é a conceção e a concretização de linhas de ação para alcançar os objetivos designados pela geopolítica.

O mundO é cOmO O pátiO da escOla

Em todas as escolas do mundo há meninos e meninas que controlam o seu pequeno círculo de companheiros. São os dominadores de uma turma ou de um curso inteiro, conhecidos, respeitados e temidos em toda a escola. Esta ordem do poder escolar percebe -se especialmente nos pátios dos centros de ensino, durante os intervalos do recreio, quando os alunos se mostram tal como são, descontraídos da tensão das aulas. Aí pode observar -se com nitidez quem tem essa capacidade para influenciar os outros, poder que advirá de uma ou de várias cir-cunstâncias diferentes: força física, faculdade inata de liderança, habi-lidade para a prática desportiva, pertença a uma família poderosa, eloquência aguda e viperina, cair nas graças dos professores… ou mera maldade unida à astúcia.

Estas crianças com especial ascendente sobre os outros podem atuar de modo benéfico sobre o grupo, levando -o a realizar atos nobres. Mas, com frequência, são os incitadores do vandalismo, os responsáveis pela organização de atividades ignoradas pelos professores e que infrin-gem as normas escolares ou, o que é ainda mais perverso, pela agressão

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psicológica, e mesmo física, dos companheiros mais vulneráveis, ou menos dotados ou graciosos.

As crianças que se comportam assim costumam rodear -se daqueles que procuram na sua proximidade proteção e reconhecimento, uma força de que carecem ou que não possuem em tão alto grau como os líderes aos quais se subordinam. São estes que se riem das piadas dos poderosos, que os exaltam quando agem perfidamente contra os frágeis objetos de enganos e troças, os que aplaudem as suas demonstrações de potência e habilidade física. Definitivamente, pertencem ao clube dos que preferem perder uma parte da sua personalidade em troca da sua integração numa corte de aduladores, ou que lhes concede um certo estatuto e consideração.

Claro que, para que o líder e o seu séquito possam agir enquanto tal, terão de conviver com os outros alunos, os quais consideram infe-riores, de modo que nunca lhes falte justificação. Alguns serão simples-mente ignorados por não pertencerem ao seu nível social, ou meramente por não jogarem tão bem como eles nos desportos mais populares da escola. Outros, lamentavelmente, converter -se -ão nos alvos a que lan-çarão os seus dardos de malícia, o que lhes permite sentirem -se supe-riores. Se estes desgraçados forem também estudantes destacados, a ira do grupo poderoso exercer -se -á sobre eles para evitar que lhes pos-sam fazer sombra e questionar a sua superioridade. Algumas destas vítimas, se não possuírem a resistência mental suficiente, ou o apoio familiar, poderão sofrer um dano terrível, irreparável e indelével. Entre elas poderá haver pessoas que aspirem a integrar -se no grupo dos comparsas, com a finalidade de deixarem de ser vítimas quotidianas. Tristemente, estes reconvertidos poderão transformar -se nos mais cruéis em relação aos outros.

Mas também se encontrarão outros que resistem a ser influenciados pelo líder ou pela pressão de todo o grupo, com um resultado mais ou menos positivo. Haverá quem, também dotado de algum poder, sim-plesmente não deseje formar qualquer grupo nem exercer a menor influência, contentando -se em prosseguir a sua própria vida, ser respei-tado e manter -se à margem de atuações impróprias contra os seus companheiros. Em certas situações, talvez lhes interesse uma aliança temporária com o poderoso de serviço, mas, em geral, poderão gozar

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de independência. Finalmente, existirão os que decidem afastar -se do conjunto dos alunos e não participar em qualquer atividade, nem posi-tiva nem negativa, mantendo uma atitude decidida, ou reagindo com excesso na primeira ocasião em que alguém pretenda abusar deles.

O mesmo se poderia dizer de qualquer atividade cujos participantes tenham de passar muitas horas juntos, como poderá acontecer num quartel, numa prisão ou num local de trabalho. E, de modo semelhante, é o que acontece na esfera internacional, onde existem potências com graus distintos de capacidade de influência nas decisões mundiais.

HipOcrisia e jOgOs de influências

Não há nada mais hipócrita e cruel do que a política internacional, pois tudo o que nela se gera e realiza é exclusivamente baseado nos interes-ses de cada país, os quais são sempre efémeros e mutáveis e muito pouco ou nada têm que ver com os outros Estados. A política nacional também é desapiedada e vingativa, sem nenhuma consideração pelo adversário político, pois qualquer medida contra ele adotada é consi-derada legítima, desde que sirva para o debilitar e expulsar do poder, com a única intenção de se ocupar o seu lugar. Ainda assim, é de supor que todos os grupos políticos – mesmo os mais díspares – persigam o mesmo fim e interesse – o bem dos seus cidadãos e da sua nação – ainda que cada um deles o interprete com uma abordagem diferente, segundo as suas afinidades ideológicas.

Mas, no âmbito internacional em que se move a geopolítica, não há nenhum fim comum, pelo menos permanente, que sirva para refrear os mais baixos instintos, nem sequer um resquício que se mantenha vivo e possa servir de fator de coesão. Os interesses comuns são tão perecí-veis que rapidamente se decompõem e passam a ser substituídos por outros, razão pela qual alianças, amizades e inimizades fluem com uma paradoxal e surpreendente rapidez. Vive -se num permanente estado de rivalidade, no qual todas as partes se acotovelam para conseguir o seu espaço e fazer valer os seus interesses próprios.

Nem sequer os perigos ou ameaças que se poderiam considerar comuns, como os derivados das alterações climáticas, exercem uma

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influência real. Pois, neste singular ambiente, cada país olha exclusiva-mente para o seu próprio interesse. Poderia dizer -se ainda: quanto mais poderoso é um país, menos se preocupa realmente com as necessidades das outras nações. Embora possa parecer uma frivolidade, para que todos os países adotassem decisões comuns que beneficiassem o conjunto da humanidade teria de acontecer uma ameaça extraterrestre sob forma de invasão, ou algo parecido. Entretanto, o que acontece, e acontecerá, é que cada país apenas olha para o seu próprio umbigo, mesmo que tenha plena consciência do mal, direto ou indireto, que possa causar aos restantes.

O historiador militar Michael Howard resume o altíssimo grau de hipocrisia em que se baseiam as relações internacionais, sempre dirigi-das, orientadas e legisladas pelos poderosos, com esta frase: «Com fre-quência, os Estados que mostram maior interesse pela conservação da paz são os que acumulam mais armamento.»

Na esfera internacional coexistem potências com diferentes graus de capacidade de influência nas decisões mundiais. Poderemos considerar que existem dois tipos básicos de países: os dominadores e os domina-dos. Os primeiros exercem o seu controlo à escala regional ou global. Os outros poderão estar submetidos de forma mais ou menos direta, sob diversos aspetos (militar, económico, cultural, tecnológico, etc.) e aceitar com mais ou menos boa vontade a sua condição, inclusivamente com resignada passividade. Se for necessário, poderão chegar a subor dinar -se aos mais poderosos, para poderem ser respeitados e mesmo temidos.

Os países que, por qualquer motivo, não se sintam poderosos – dispor ou não de armamento atómico é um ponto claro de inflexão – procuram abrigar -se sob o capote de uma potência superior que, pelo menos teoricamente, lhes garanta tanto a sua segurança como a sua imuni-dade. é o que oferecem as potências nucleares, em relação a meios puramente estratégicos, tal como o fazem os membros permanentes do Conselho de Segurança das Nações Unidas (CSNU) em relação às hipotéticas sanções internacionais. Foi o que fez a China com o Sudão e o seu presidente, Omar al -Bashir, que se mantém no cargo apesar de o Tribunal Penal Internacional ter emitido, em março de 2009, uma ordem internacional de prisão por crimes contra a humanidade e cri-mes de guerra, como consequência da violência ocorrida no Darfur.

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O presidente Al -Bashir sabe que, enquanto estiver à sombra da China, é intocável. Pequim oferece também este «serviço» a outros países durante os processos de negociação, nos quais emprega a política do win ‑win, uma negociação aparentemente transparente em que ambas as partes ganham. Por exemplo, na sua relação com o Sudão, Pequim obtém acesso ao crude e às terras cultiváveis do país. A China tem a vantagem de não ter sido potência colonizadora, razão pela qual não gera os mes-mos receios que outras potências rivais, especialmente em África.

A Síria é um exemplo de como um Estado débil, atacado por outro mais belicoso, se vê obrigado a apoiar -se num terceiro, mais fortalecido. O seu presidente, Bashar al -Assad, teve de aceitar a ajuda da Rússia – que evidentemente perseguia os seus próprios interesses – para evitar perder o poder, num momento em que as suas forças titubeavam frente ao ímpeto dos rebeldes, apoiados pelos Estados Unidos e por alguns dos seus aliados regionais e mundiais.

Por outro lado, quando um país considera que não tem peso sufi-ciente, ou ascendente regional ou mundial, alia -se a outros países para ganhar peso geopolítico. Alguns escudam -se numa premissa exposta por Otto von Bismarck, primeiro -ministro da Prússia (1862 -1873) e chanceler da Alemanha (1871 -1890): «Os povos que se isolam por com-pleto, acreditando que se bastarão a si próprios na defesa da sua pátria e dos seus interesses, acabarão por desaparecer, esmagados sob o peso das outras nações.» Quando isto acontece, a subordinação poderá alcan-çar um tal grau que alguns países, incluindo aqueles considerados potências médias, se deixam arrastar pelas superpotências do momento e participam em aventuras bélicas completamente estranhas aos seus interesses. Haverá assim governos que enviam as suas tropas para luga-res remotos, onde não têm qualquer interesse próprio a defender, embora logo se apresentem teóricos – que existem sempre e extrema-mente dispostos a agradar aos governantes da altura – que o justifiquem com teorias como as da «defesa adiantada», os riscos globais que não podem ser abordados solitariamente, a proteção dos direitos humanos (como se apenas nesse lugar estivessem a ser violados), ou a promoção dos valores democráticos. Em não poucas ocasiões, a única coisa que estes «países mariachis» conseguem é obter novos inimigos, de que não tinham qualquer necessidade. E isto pode implicar desde atentados no

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seu próprio território – algo habitual, no caso de na remota área de operações tiverem tido de enfrentar, ou simplesmente prejudicado de algum modo, um grupo que inclua o terrorismo nas suas táticas –, até uma convulsão social, devido à falta de apoio entre os seus cidadãos a uma indefinida expedição militar que acabe com a derrocada do governo responsável pelo envio das forças.

Alguns Estados, muito poucos, não encaixam em nenhum dos gru-pos anteriores, por não disporem de capacidade suficiente para ser dominadores, mas também não desejando ser dominados de nenhum modo. São os que se mantêm afastados do sistema internacional e se convertem em «rebeldes». Na última Estratégia de Segurança Nacional dos Estados Unidos, de 9 de fevereiro de 2015, este adjetivo foi substi-tuído por «irresponsáveis», categoria na qual hoje se incluem países como a Coreia do Norte. Mas tal como acontece com os meninos que tentam viver à margem dos grupos que dominam, na escola, os Estados que se negam a participar nos jogos de poder e tentam aplicar os seus próprios sistemas políticos e sociais correm um indubitável risco, pois têm de defender sozinhos a sua sobrevivência.

Certos países – como a Arábia Saudita, a Turquia, o Egito e o Irão – formam outro grupo reduzido, o daqueles que, sendo já líderes regio-nais, aspiram a continuar a crescer e a influenciar, mas renunciam a um poder mais global para não ofender as superpotências, com as quais mantêm uma relação ambígua. Além disso, também não aceitam ser relegados para o grupo dos vassalos geopolíticos.

Uma distinção semelhante foi oferecida pelo politólogo Zbigniew Brzezinski, para quem existiam «jogadores estratégicos» e «pivôs geopo-líticos». Entre os primeiros encontram -se os Estados com capacidade e vontade nacional para exercer poder ou influência para além das suas fronteiras e alterar a situação atual das questões geopolíticas. Estes «joga-dores estratégicos» são sempre países importantes e poderosos, embora nem todos os que reúnem estas características tenham de o ser, pois dependerá igualmente da vontade dos seus governantes para entrarem no jogo do poder. Por outro lado, os «pivôs geopolíticos» são aqueles Estados, como a Ucrânia, o Azerbaijão, a Coreia do Sul, a Turquia e o Irão, que devem a sua relevância a uma situação geográfica que lhes permite condicionar o acesso de outros países a certos recursos e lugares.