os direitos humanos e a literatura: prÁticas para … · direitos humanos, à educação e o...

16
OS DIREITOS HUMANOS E A LITERATURA: PRÁTICAS PARA UMA EDUCAÇÃO EMANCIPADORA FONTES, Nathalia Soares 1 LIMA, Cláudia Araújo de 2 RESUMO: O artigo propõe evidenciar a pedagogia Histórico-Crítica como teoria e prática que viabilizem a disseminação dos direitos humanos voltados à educação emancipadora do indivíduo, uma vez que compreende a tomada de consciência, incorporação efetiva da historicidade social, e sua transformação em ferramentas de revoluções da sociedade para que, através da reflexão, possa modificá-la. Ressaltar-se-á a educação como direito garantido em âmbitos nacional e internacional e sua necessidade de concernência com a prática. O ensino da literatura e suas especificidades serão ressaltados em sua perspectiva formativa e compreensão da sociedade como disciplina viabilizadora da expansão do entendimento acerca dos direitos dos indivíduos críticos. Analisa-se os documentos que respaldam os direitos humanos a fim da disseminação dos conhecimentos acumulados socialmente de forma que possibilite a construção do indivíduo crítico e ativo. O texto propõe estabelecer, por meio de revisão bibliográfica, relações entre os direitos humanos, à educação e o direito à literatura com intuito de viabilizar a efetivação da apropriação e prática dos direitos humanos. Palavras-chave: Direitos humanos, Pedagogia Histórico-Crítica, Literatura. 1 INTRODUÇÃO A formação dos direitos se dá a partir das necessidades de se assegurar e respaldar a concreticidade das condições básicas de vida. Segundo Bobbio (2004), os direitos surgem a partir das necessidades existentes, assim é a circunstância que determina a existência de um direito. Além disso, sua formação é gradativa e muda a cada nova necessidade do homem. 1 Graduada em Letras Português/Espanhol, mestranda em Educação pela Universidade Federal de Mato Grosso do Sul Campus do Pantanal. 2 Doutora em Ciências na área de Saúde Pública pela Escola Nacional de Saúde Pública Sérgio Arouca da Fundação Oswaldo Cruz (2014). Graduada em Pedagogia pelo Centro Universitário de Brasília (1991), mestrado em Integração de Pessoas com Deficiência pela Universidade de Salamanca/Espanha (2000) e mestrado em Saúde Pública pela Escola Nacional de Saúde Pública Sérgio Arouca, Fundação Oswaldo Cruz (2004). Anais do XIV Congresso Internacional de Direitos Humanos. Disponível em http://cidh.sites.ufms.br/mais-sobre-nos/anais/

Upload: buidat

Post on 23-Nov-2018

221 views

Category:

Documents


0 download

TRANSCRIPT

Page 1: OS DIREITOS HUMANOS E A LITERATURA: PRÁTICAS PARA … · direitos humanos, à educação e o direito à literatura com intuito de viabilizar a efetivação da apropriação e prática

OS DIREITOS HUMANOS E A LITERATURA: PRÁTICAS PARA UMA

EDUCAÇÃO EMANCIPADORA

FONTES, Nathalia Soares 1

LIMA, Cláudia Araújo de 2

RESUMO:

O artigo propõe evidenciar a pedagogia Histórico-Crítica como teoria e prática que viabilizem

a disseminação dos direitos humanos voltados à educação emancipadora do indivíduo, uma vez

que compreende a tomada de consciência, incorporação efetiva da historicidade social, e sua

transformação em ferramentas de revoluções da sociedade para que, através da reflexão, possa

modificá-la. Ressaltar-se-á a educação como direito garantido em âmbitos nacional e

internacional e sua necessidade de concernência com a prática. O ensino da literatura e suas

especificidades serão ressaltados em sua perspectiva formativa e compreensão da sociedade

como disciplina viabilizadora da expansão do entendimento acerca dos direitos dos indivíduos

críticos. Analisa-se os documentos que respaldam os direitos humanos a fim da disseminação

dos conhecimentos acumulados socialmente de forma que possibilite a construção do indivíduo

crítico e ativo. O texto propõe estabelecer, por meio de revisão bibliográfica, relações entre os

direitos humanos, à educação e o direito à literatura com intuito de viabilizar a efetivação da

apropriação e prática dos direitos humanos.

Palavras-chave: Direitos humanos, Pedagogia Histórico-Crítica, Literatura.

1 INTRODUÇÃO

A formação dos direitos se dá a partir das necessidades de se assegurar e respaldar a

concreticidade das condições básicas de vida. Segundo Bobbio (2004), os direitos surgem a

partir das necessidades existentes, assim é a circunstância que determina a existência de um

direito. Além disso, sua formação é gradativa e muda a cada nova necessidade do homem.

1 Graduada em Letras – Português/Espanhol, mestranda em Educação pela Universidade Federal de Mato Grosso

do Sul – Campus do Pantanal.

2 Doutora em Ciências na área de Saúde Pública pela Escola Nacional de Saúde Pública Sérgio Arouca da Fundação

Oswaldo Cruz (2014). Graduada em Pedagogia pelo Centro Universitário de Brasília (1991), mestrado em

Integração de Pessoas com Deficiência pela Universidade de Salamanca/Espanha (2000) e mestrado em Saúde

Pública pela Escola Nacional de Saúde Pública Sérgio Arouca, Fundação Oswaldo Cruz (2004).

Anais do X

IV C

ongresso Internacional de Direitos H

umanos.

Disponível em

http://cidh.sites.ufms.br/m

ais-sobre-nos/anais/

Page 2: OS DIREITOS HUMANOS E A LITERATURA: PRÁTICAS PARA … · direitos humanos, à educação e o direito à literatura com intuito de viabilizar a efetivação da apropriação e prática

2

Nem a ciência, nem os seus diversos ramos, nem a arte, possuem uma história

autônoma, imanente, que resulte exclusivamente da sua dialética interior. A

evolução em todos esses campos é determinada pelo curso de toda a história

da produção social, no seu conjunto: e só com base neste curso é que podem

ser esclarecidos de maneira verdadeiramente científica os desenvolvimentos e

as transformações que ocorram em cada campo singularmente considerado.

(LUKÁCS, 1965, p. 12)

Portanto, numa concepção marxista, é negado o entendimento que seja possível

compreender o desenvolvimento do conhecimento humano com base exclusivamente em suas

conexões imanentes. Logo, a partir da historicidade da humanidade é que se constituem o

esclarecimento da ciência, da filosofia, da arte e também dos direitos.

A Declaração Universal dos Direitos Humanos (1948) expressa o desejo de garantir a

educação básica a fim de torná-la um direito inalienável do indivíduo. O artigo 26 prevê que

toda a pessoa possui direito ao ensino e que deve estar aberto a todos em plena igualdade. É

previsto no mesmo artigo que a educação deve favorecer o reforço dos direitos das liberdades

fundamentais. Logo, identifica-se a educação como essencial para a formação do ser humano.

Além de ser uma proposta do Plano Nacional de Educação em Direitos Humanos (2007), que

estimula a reflexão e o desenvolvimento de uma pedagogia participativa que inclua

conhecimentos, análises críticas e habilidades para a promoção dos direitos humanos.

Em âmbito nacional, a Constituição Federal (1988) prevê, no artigo 205, que a educação

é um direito de todo o indivíduo, sendo obrigação do Estado e da família, visando o pleno

desenvolvimento do cidadão. Endossando a importância da educação, Saviani (1999) entende

o ensino como parte do processo educativo, em que o professor é o produtor, tornando-se

responsável pela socialização do saber, uma vez que possui competências técnicas de atuação

e o aluno é o consumidor, cabendo-lhe aprender os conteúdos que ultrapassem o saber

espontâneo. Assim, a igualdade estaria no acesso ao saber sistematizado.

Segundo Dore (2006), para Gramsci, a educação pode ser em certa medida,

transformadora, sempre que possa proporcionar às classes subalternas os meios iniciais para

que, após uma longa trajetória de conscientização e luta, se organizem e se tornem capazes de

“governar” aqueles que as governam. Visava a quebra da hegemonia e da doutrinação do

homem a partir de uma mente emancipada. Assim, para ele, a escola tinha uma função social

importantíssima, pois os agentes principais das mudanças seriam os intelectuais e, um dos seus

instrumentos mais importantes para a conquista da cidadania, seria a escola. A escola, em sua

Anais do X

IV C

ongresso Internacional de Direitos H

umanos.

Disponível em

http://cidh.sites.ufms.br/m

ais-sobre-nos/anais/

Page 3: OS DIREITOS HUMANOS E A LITERATURA: PRÁTICAS PARA … · direitos humanos, à educação e o direito à literatura com intuito de viabilizar a efetivação da apropriação e prática

3

concepção, deveria ser socializada para o conhecimento da população em geral, dando-lhes a

aprendizagem científica, que cabia somente à elite.

Posto isso, a educação é de extrema importância para levar o indivíduo a níveis mais

altos de compreensão de sua existência e dar a ele ferramentas para transformação de seu meio,

enfatizando a escola como mediadora entre o saber popular e o saber erudito, no sentido de sua

superação. Somente através da igualdade é que os seres se posicionarão em um mesmo patamar

de poder, a fim de dominar sua espécie de maneira justa.

Nessa perspectiva, esse artigo ressaltará a importância do ensino literário, que, segundo

Candido (2011), é um direito e tem sua função ligada a construção da humanização no indivíduo

através da formação de significados, manifestação de concepções e emoções dos seres

individuais e coletivos, e, sem dúvida, uma forma de conhecimento.

Na Declaração dos Direitos Humanos, o artigo 27° declara que toda a pessoa tem o

direito de tomar parte livremente na vida cultural da comunidade, de fruir as artes e de participar

no progresso científico e nos benefícios que deste resultam. Assim, a arte literária é um direito

do indivíduo e tem sua validade reconhecida em níveis mundiais.

A literatura é definida como:

A arte, e, portanto, a literatura, é uma transposição do real para o ilusório por

meio de uma estilização formal da linguagem, que propõe um tipo arbitrário

de ordem para as coisas, os seres, os sentimentos. Nela se combinam um

elemento de vinculação à realidade natural ou social, e um elemento de

manipulação técnica, indispensável à sua configuração, e implicando em uma

atitude de gratuidade. (CANDIDO, 1972, p. 53).

Segundo Candido, a literatura é uma criação humana na tentativa de coisificar suas

emoções através de manipulação técnica. Desse modo, através dessa objetivação, o homem

entra em contato com seus próprios sentimentos, entretanto, exteriorizados. Além disso, a

literatura permite o homem a viver dramas da humanidade de todas as épocas, tanto no passado,

quanto a projeção do futuro.

A escolarização da literatura proporciona a aquisição de conhecimentos interiores e

exteriores pela mediação, proporcionando uma visão emancipada de si e do mundo, objetivando

a superação da alienação. Seu papel humanizador manifesta o que o indivíduo é, e molda o que

ele pode ser com o exercício da reflexão, o afinamento das emoções e a aquisição do saber.

Anais do X

IV C

ongresso Internacional de Direitos H

umanos.

Disponível em

http://cidh.sites.ufms.br/m

ais-sobre-nos/anais/

Page 4: OS DIREITOS HUMANOS E A LITERATURA: PRÁTICAS PARA … · direitos humanos, à educação e o direito à literatura com intuito de viabilizar a efetivação da apropriação e prática

4

Diante desse pressuposto, consideramos relevante reforçar o papel da literatura a partir

das concepções de Antonio Candido e da pedagogia Histórico-Crítica proposta por Saviani na

perspectiva de uma educação emancipadora, de modo a contribuir para a discussão da

importância de uma educação que propicie o pensamento crítico. O objetivo desse artigo é

salientar a educação através da literatura como prática de emancipação do indivíduo e

instrumentalizar a prática pedagógica, contextualizando com os direitos adquiridos pelo

homem.

A discussão se dará em dois momentos distintos: 1) O direito à educação; 2) O direito à

literatura. A partir da discussão desses dois tópicos, acreditamos ser possível estabelecer um

entendimento acerca da validação da literatura, sua prática na educação e ressaltar sua visão

emancipadora como meio transformador da sociedade.

2 O DIREITO À EDUCAÇÃO

O debate sobre o reconhecimento do direito é complexo, uma vez que tem a premissa

de se tornar obrigação e, além disso, necessita-se do reconhecimento das necessidades dos

indivíduos como sendo as mesmas de todos.

Por quê? Porque pensar em direitos humanos tem um pressuposto:

reconhecer que aquilo que consideramos indispensável para nós é

também indispensável para o próximo. Esta me parece a essência do

problema, inclusive no plano estritamente individual, pois é necessário

um grande esforço de educação e autoeducação a fim de reconhecermos

sinceramente este postulado. Na verdade, a tendência mais funda é achar

que os nossos direitos são mais urgentes que os do próximo. (CANDIDO,

2011, p. 174)

Embora a fundamentação e definição de direitos ainda seja um campo a ser esgotado, é

inegável o reconhecimento do homem em garantir que a necessidade de todos seja suprida de

forma igualitária. Essa consciência, mesmo positiva, ainda não é suficiente para garantir que os

direitos conquistados historicamente sejam executados na prática social. Bobbio (2004) afirma

que, mais do que debater sobre os fundamentos dos direitos, importa-nos debater e viabilizar

sua prática no exercício de atender as necessidades básicas de todos de forma justa. A partir do

reconhecimento de que todos têm as mesmas necessidades, empenha-se a um exercício árduo,

que é fazer coincidir os direitos teóricos com as práticas.

Anais do X

IV C

ongresso Internacional de Direitos H

umanos.

Disponível em

http://cidh.sites.ufms.br/m

ais-sobre-nos/anais/

Page 5: OS DIREITOS HUMANOS E A LITERATURA: PRÁTICAS PARA … · direitos humanos, à educação e o direito à literatura com intuito de viabilizar a efetivação da apropriação e prática

5

O Plano Nacional dos Direitos Humanos (2007) visa, na educação, a formação de

sujeitos de direito e fortalecimento do sentimento de convivência pacífica. Visando, nesse

contexto, a formação de uma mentalidade coletiva para o exercício da solidariedade, do respeito

e da tolerância. Seu objetivo é promover a adoção de valores que evidenciem a liberdade, a

justiça e a igualdade.

No novo documento para a educação, Base Nacional Comum Curricular, em

concernência com as Diretrizes Curriculares Nacionais, a educação integral do indivíduo é

assegurada, assim, a Educação Básica visa “[...] à formação humana integral, à construção de

uma sociedade mais justa, na qual todas as formas e discriminação, preconceito e exclusão

sejam combatidas” (2016, p. 33). A seguridade à educação é inquestionável. Todo indivíduo

socializado deve ter acesso a todo conhecimento adquirido pelas gerações anteriores.

Entretanto, como aponta Bobbio, os fundamentos filosóficos do direito “não terá

nenhuma importância histórica se não for acompanhada pelo estudo das condições, dos meios

e das situações nas quais este ou aquele direito pode ser realizado” (2004, p.16). Assim, aponta-

se aqui a necessidade de igualdade na educação, uma vez que, garantido em lei, todos os

indivíduos devem ter acesso a ela. Entretanto, mais do que ter direito a ir à escola, ressalta-se

que a educação deve propiciar a liberdade de pensamento no indivíduo.

Na Constituição Federal (1988), artigo 5º, é assegurado que todos são iguais perante a

lei, garantindo-se a inviolabilidade à liberdade. Nos parágrafos quatro e cinco desse artigo,

declara o direito à liberdade de pensamento e consciência, além de sua manifestação. Contudo,

como se formará indivíduos de consciência livre e de pensamento crítico se não a partir de uma

educação emancipadora? Segundo Ferrari (2011), baseado no pensamento marxista, a função

social da escola é combater a alienação e a desumanização que foram impostos pelo

capitalismo.

Baseada em Oliveira e Felismino (2010), Gramsci, por sua vez, afirmava que a educação

tem a função de tirar o homem do senso comum e levá-lo ao bom senso, no qual a escola

desenvolveria essa ascensão a partir do conjunto de valores históricos da sociedade, sendo

compartilhado para todos de maneira esclarecida por meio da consciência, promovendo a crítica

contra hegemônica. Dessa forma, a tomada de consciência contribuiria para a mudança do senso

comum social.

...têm um grande valor filosófico, já que a hegemonia do

proletariado representa a transformação, a construção de uma

nova sociedade, de uma nova estrutura econômica, de uma nova

Anais do X

IV C

ongresso Internacional de Direitos H

umanos.

Disponível em

http://cidh.sites.ufms.br/m

ais-sobre-nos/anais/

Page 6: OS DIREITOS HUMANOS E A LITERATURA: PRÁTICAS PARA … · direitos humanos, à educação e o direito à literatura com intuito de viabilizar a efetivação da apropriação e prática

6

organização política e também de uma nova orientação ideológica

e cultural. Como tal, ela não tem consequências apenas no nível

material da economia ou no nível da política, mas no nível da

moral, do conhecimento, da ‘filosofia’. Portanto, a revolução é

entendida por Gramsci – e ele continuamente o repete – como

reforma intelectual e moral. (GRUPPI, 1978, p. 2)

Nessa perspectiva, Demerval Saviani (1999) elaborou uma nova tendência educacional,

a Pedagogia Histórico-crítica, que entende a educação a partir do contexto social, podendo

interferir para sua transformação, além de valorizar a consciência e a percepção social,

incluindo o saber sistematizado e a valorização dos conteúdos. Além de se constituir como uma

pedagogia participativa e viabilizadora do senso crítico como requerido no Plano Nacional de

Educação em Direitos Humanos (2007), incluindo mecanismos que podem permear a

seguridade dos direitos a partir da aquisição dos conhecimentos. Em sua concepção, seria

possível transformar a realidade social a partir de um ensino emancipador, em que formaria

indivíduos críticos e reflexivos, capazes de analisar e intervir na realidade a que pertencem.

Assim, a educação, por meio de sua pedagogia, se mostraria como uma ferramenta importante

para a propiciação do pensamento e suas manifestações.

Pedagogia Histórico-Crítica é o empenho em compreender a questão

educacional a partir do desenvolvimento histórico objetivo. Portanto, a

concepção pressuposta nesta visão da Pedagogia Histórico-Crítica é o

materialismo histórico, ou seja, a compreensão da história a partir do

desenvolvimento material, da determinação das condições materiais da

existência humana. (SAVIANI, 2008: p. 102).

A pedagogia Histórico-crítica tem como partida a realidade social. Isso se dá porque

"[...] os conteúdos reúnem dimensões conceituais, científicas, históricas, econômicas,

ideológicas, políticas, culturais, educacionais que devem ser explicitadas e apreendidas no

processo ensino-aprendizagem" (SAVIANI, 2008, p.15). Nesse sentido, os conteúdos se

originam nos conhecimentos históricos acumulados socialmente, não em práticas inertes, mas

nas relações de trabalho e de produção.

Saviani compreende que, mesmo precário, os indivíduos têm conhecimentos prévios, e

seria a partir dele que a prática social e seus problemas seriam explicados, seguindo para a

instrumentalização por práticas pedagógicas que, a partir da catarse – momento de elevação da

compreensão social – o indivíduo concretize esse percurso em sua nova prática social, adquirida

pelo conteúdo assimilado. Assim, nessa formulação, Saviani desenvolve seu método em cinco

Anais do X

IV C

ongresso Internacional de Direitos H

umanos.

Disponível em

http://cidh.sites.ufms.br/m

ais-sobre-nos/anais/

Page 7: OS DIREITOS HUMANOS E A LITERATURA: PRÁTICAS PARA … · direitos humanos, à educação e o direito à literatura com intuito de viabilizar a efetivação da apropriação e prática

7

etapas. Nelas, os alunos e professores igualmente, porém em posições distintas, partem da

prática social em uma relação que visa a solução dos problemas sociais suscitados. São elas:

Prática Social, momento de conscientização do que ocorre na sociedade de forma que

o assunto desenvolvido seja evidenciado como já presenta na sociedade. Problematização,

tentativa de compreensão real das questões a fim de viabilizar soluções possíveis. Seguida da

Instrumentalização, em que os estudantes se apropriam dos instrumentos teóricos e práticos

necessários para a resolução dos problemas. Nessa etapa, Saviani (1999) reflete “trata-se da

apropriação pelas camadas populares das ferramentas culturais necessárias à luta social que

travam diuturnamente para se libertar das condições de exploração em que vivem”. (p. 81)

A partir da tomada de consciência, produzida na Catarse, o estudante sai do senso

comum para entrar no plano científico, com base em uma visão consistente e estruturada, sendo

assim, de fato, a incorporação dos instrumentos culturais. Enfim, é na Prática Social Final que

o estudante consegue realizar suas atividades de modo autônomo e emancipado, manifestando

seus conceitos alcançados através da mudança intelectual.

É preciso, no entanto, ressalvar que a alteração objetiva da prática só

pode se dar a partir da nossa condição de agentes sociais ativos, reais.

A educação, portanto, não transforma de modo direto e imediato e sim

de modo indireto e mediato, isto é, agindo sobre-os sujeitos da prática.

Como diz Vázquez (1968: 206-7): "A teoria em si (...) não transforma

o mundo. Pode contribuir para a sua transformação, mas para isso tem

que sair de si mesma, e, em primeiro lugar tem que ser assimilada pelos

que vão ocasionar, com seus atos reais, efetivos, tal transformação.

Entre a teoria e a atividade prática transformadora se insere um trabalho

de educação das consciências, de organização dos meios materiais e

planos concretos de ação; tudo isso como passagem indispensável para

desenvolver ações reais, efetivas. Nesse sentido, uma teoria é prática na

medida em que materializa, através de uma série de mediações, o que

antes só existia idealmente, como conhecimento da realidade ou

antecipação ideal de sua transformação". (SAVIANI, 1999, pág. 81-82)

Em sua concepção, a escola deveria ser um lugar de estimulação e interação para que os

alunos desenvolvessem suas atividades de forma que obtivessem resultados satisfatórios. Nesse

sentido, limita-se o sentido da existência da escola em transmitir o conhecimento científico

(SAVIANI, 2008, pág. 15). Através dessa prática, evidencia-se que o papel da escola é

transmitir o ensino sistematizado de conteúdo e, portanto, pode ser o principal meio de

transformação do ser humano, pois é mediante a educação que o indivíduo se alicerça para uma

vida em sociedade sabendo discernir, optar, analisar e criticar o meio em que vive, modificando-

o.

Anais do X

IV C

ongresso Internacional de Direitos H

umanos.

Disponível em

http://cidh.sites.ufms.br/m

ais-sobre-nos/anais/

Page 8: OS DIREITOS HUMANOS E A LITERATURA: PRÁTICAS PARA … · direitos humanos, à educação e o direito à literatura com intuito de viabilizar a efetivação da apropriação e prática

8

Contudo, Bobbio (2004) ressalta que, embora haja a concessão dos direitos humanos, é

inegável que a prática desse ainda é pouco executada. Considera-se, portanto, os apontamentos

de Saviani e seu método relevantes para a formação crítica do ser humano a fim de exercer sua

liberdade e fazer com que o direito à educação esteja em concernência com a prática no intuito

de emancipação e pensamento crítico. Trata-se de viabilizar a educação que levará os indivíduos

a níveis altos de compreensão do mundo e instrumentalizá-lo por meio dos conhecimentos

científicos a fim de que teoria e prática dos direitos humanos convirjam.

3 O DIREITO À LITERATURA

O reconhecimento de um direito tem grande representação na sociedade. Admitir que

todos os indivíduos têm direito a ter suas necessidades básicas supridas não é considerar

privilégios aos seres, pois trata-se de sua existência. Contudo, reconhecer que os menos

abastados tenham direito ao conhecimento clássico e erudito, normalmente, não é debatido.

Menos ainda compreender que todo conhecimento histórico da sociedade é direito de todo

homem.

Segundo Antonio Candido (2011), a literatura é um direito do indivíduo. Em sua

concepção, os bens coletivos deveriam ser partilhados entre todos de forma igualitária. Assim,

tanto os bens que asseguram a vida física, quanto os que asseguram a vida espiritual deveriam

ser palpáveis a todos.

Elas afirmam que o próximo tem direito, sem dúvida, a certos bens

fundamentais, como casa, comida, instrução, saúde, coisas que

ninguém bem formado admite hoje em dia que sejam privilégio de

minorias, como são no Brasil. Mas será que pensam que o seu

semelhante pobre teria direito a ler Dostoievski ou ouvir os quartetos

de Beethoven? Apesar das boas intenções no outro setor, talvez isto não

lhes passe pela cabeça. E não por mal, mas somente porque quando

arrolam os seus direitos não estendem todos eles ao semelhante. Ora, o

esforço para incluir o semelhante no mesmo elenco de bens que

reivindicamos está na base da reflexão sobre os direitos humanos.

(CANDIDO, 2011, p.174)

Na análise de Candido, segundo o sociólogo Lebret, os bens sociais têm seu valor

atrelado à necessidade que temos de algo, assim, eles podem ser considerados incompressível

ou compressível. Nessa perspectiva, os bens que asseguram a sobrevivência física e a

integridade espiritual não podem ser suprimidos, sendo eles: a moradia, a alimentação, a

Anais do X

IV C

ongresso Internacional de Direitos H

umanos.

Disponível em

http://cidh.sites.ufms.br/m

ais-sobre-nos/anais/

Page 9: OS DIREITOS HUMANOS E A LITERATURA: PRÁTICAS PARA … · direitos humanos, à educação e o direito à literatura com intuito de viabilizar a efetivação da apropriação e prática

9

instrução, a liberdade, a saúde e também os direitos à crença, à opinião, ao lazer. Portanto,

partindo dessa premissa, por que não o direito à literatura?

Vista deste modo a literatura aparece claramente como manifestação

universal de todos os homens em todos os tempos. Não há povo e não há

homem que possa viver sem ela. Isto é, sem a possibilidade de entrar em

contato com alguma espécie de fabulação. (CANDIDO, p.174)

Não obstante, a arte supre as necessidades do homem pela representação do mundo

como objeto de sua criação, tornando-se indispensável como a necessidade do homem em

respirar. Ter conhecimento da arte é apropriar-se dos bens culturais produzidos pela

humanidade, de modo que, a partir da exposição a esse conhecimento, o indivíduo lapida sua

personalidade e afina seu olhar para questões sociais.

A literatura corresponde a uma necessidade universal que deve ser

satisfeita sob pena de mutilar a personalidade, porque pelo fato de dar

forma aos sentimentos e à visão do mundo ele nos organiza, nos liberta

do caos e, portanto, nos humaniza. Negar a fruição da literatura é

mutilar nossa humanidade (CANDIDO, 1995, pág. 186).

A literatura é a arte da palavra e possui grande importância para a sociedade. Seu valor

está na possibilidade de reflexão e identificação, resultado da vivência de dramas históricos por

meio das narrativas. Assim, o indivíduo não precisa passar fome para sentir a dor dessa mazela,

porque no exercício da leitura literária ele incorpora o drama vivido de forma reflexiva e crítica,

modificando-o e contribuindo para sua mudança de prática social.

Evidencia-se também que, por meio da arte literária é possível proporcionar o

desenvolvimento do senso crítico do ser humano, enriquecendo-o intelectualmente e

culturalmente através do aguçamento da percepção dos fatos narrados, fazendo com que o leitor

valide ou não o comportamento e ações vividas. Não são as histórias que determinam a

positividade ou negatividade dos fatos, mas, por meio das ações, o leitor se coloca favorável ou

crítico aos acontecimentos.

Nesta perspectiva, a leitura literária contribui para o enriquecimento intelectual e

cultural do leitor, desenvolvendo seu senso crítico e despertando-o para novas experiências.

Humaniza porque nos faz vivenciar diferentes realidades e situações. Ela atua em nós como

uma espécie de conhecimento porque resulta de um aprendizado sistematizado.

Anais do X

IV C

ongresso Internacional de Direitos H

umanos.

Disponível em

http://cidh.sites.ufms.br/m

ais-sobre-nos/anais/

Page 10: OS DIREITOS HUMANOS E A LITERATURA: PRÁTICAS PARA … · direitos humanos, à educação e o direito à literatura com intuito de viabilizar a efetivação da apropriação e prática

10

[…] a literatura tem sido um instrumento poderoso de instrução e

educação, entrando nos currículos, sendo proposta a cada um como

equipamento intelectual e afetivo. Os valores que a sociedade

preconiza, ou os que considera prejudicais, estão presentes nas diversas

manifestações da ficção, da poesia e da ação dramática. A literatura

confirma e nega, propõe e denuncia, apoia e combate, fornecendo a

possibilidade de vivermos dialeticamente os problemas. (CANDIDO,

2011, pág. 177)

Por meio da vivência dialética dos problemas, a literatura transforma os seres a partir

do confronto com a realidade, uma vez que permite possibilidades múltiplas e, muitas vezes,

incoerente. Desse modo, proporciona ao indivíduo a inserção nos problemas sociais de forma

crítica e com suas próprias concepções do meio em que está inserido.

A partir de todo exposto, é evidente que a literatura é uma necessidade e, portanto, um

direito. Além disso, Candido ressalta que é “um instrumento consciente de desmascaramento,

pelo fato de focalizar as situações de restrição dos direitos, ou de negação deles, como a miséria,

a servidão, a mutilação espiritual” (2011, p. 122). Nesse contexto, a literatura está relacionada

a luta pelos direitos humanos. Posto isso, necessita ter seu lugar assegurado nas instituições

educacionais e garantido para todas as classes sociais de forma igualitária.

[...] por possuir essa função maior de tornar o mundo compreensível

transformando sua materialidade em palavras de cores, odores, sabores

e formas intensamente humanas que a literatura tem e precisa manter

um lugar especial nas escolas. (COSSON, 2014, pág. 17)

Evidencia-se, desse modo, o ensino literário como ferramenta de emancipação dos

indivíduos, que os permitem pensarem por si, refletindo sobre as injustiças sociais a fim de

igualar suas realidades. Só a partir da igualdade é que a sociedade pode ser considerada justa.

3.1 LITERATURA E A DISSEMINAÇÃO DOS DIREITOS HUMANOS

Uma vez estabelecido o direito e a seguridade prática à educação e à literatura é

importante ressaltar nessa última seus aspectos formativos do ser humano de direito. Cabe-nos

questionar os acontecimentos da sociedade de forma crítica e ativa, entretanto, empenha-se

evidenciar como a literatura pode se tornar esclarecedora na prática escolar, contribuindo para

tornar a teoria uma realidade.

Anais do X

IV C

ongresso Internacional de Direitos H

umanos.

Disponível em

http://cidh.sites.ufms.br/m

ais-sobre-nos/anais/

Page 11: OS DIREITOS HUMANOS E A LITERATURA: PRÁTICAS PARA … · direitos humanos, à educação e o direito à literatura com intuito de viabilizar a efetivação da apropriação e prática

11

Tanto no caso da literatura messiânica e da idealista dos românticos,

quanto no caso da literatura realista, na qual a crítica assume o cunho

de verdadeira investigação orientada da sociedade, estamos em fase de

exemplo de literatura empenhada numa tarefa ligada aos direitos

humanos. (CANDIDO, 2011, p. 187)

Em O direito à literatura, Candido aborda sob dois ângulos diferentes a relação da

literatura com os direitos humanos. Num primeiro momento, ele ressalta a necessidade do

indivíduo, caracterizando a literatura como algo que deve ser suprido. “A literatura corresponde

a uma necessidade universal que deve ser satisfeita sob pena de mutilar a personalidade, porque

pelo fato de dar forma aos sentimentos e à visão do mundo ela nos organiza, nos liberta do caos

e portanto nos humaniza”. (p. 188)

Não obstante, a literatura é abordada em seu caráter instrumentalizador, em que se torna

um meio de desmascaramento social, pelo fato de focalizar as situações de restrição dos direitos,

ou de negação deles, como a miséria, a servidão, e mutilação espiritual.

O estudo apaixonado da natureza humana do homem – faz parte da

essência de toda literatura e de toda arte autêntica; daí que toda boa arte

e toda boa literatura sejam humanistas, não só ao estudarem

apaixonadamente o homem e a verdadeira essência de sua natureza

humana, mas, também, por defenderem apaixonadamente a integridade

humana do homem contra todas as tendências que a atacam, a

envilecem e a adulteram. (LUKÁCS, 1965, p. 21)

Nessa concepção, por meio da leitura literária, o homem poderia visualizar as mazelas

sociais de forma objetiva, assim, fomentar meios de superação do caos. Entretanto, necessita-

se esclarecer que, em uma sociedade de desigualdades sociais, o conhecimento clássico é

suprimido das classes menos favorecidas, encontrando-se, muitas vezes,

respaldo/“justificativa” na impossibilidade de entendimento por parte dessas classes.

Sem dúvida, o sistema da produção capitalista representa o grau

econômico mais elevado no quadro do processo evolutivo das

sociedades divididas em classes. Mas também não há dúvida de que,

para Marx, tal sistema de produção é essencialmente desfavorável ao

desenvolvimento da literatura e da arte. (LUKÁCS, 1965, p. 19)

Contudo, não se pode subestimar a capacidade do indivíduo, tampouco negá-lo alcance

aos conhecimentos se baseando em sua condição social. Logo, os bens culturais precisam

Anais do X

IV C

ongresso Internacional de Direitos H

umanos.

Disponível em

http://cidh.sites.ufms.br/m

ais-sobre-nos/anais/

Page 12: OS DIREITOS HUMANOS E A LITERATURA: PRÁTICAS PARA … · direitos humanos, à educação e o direito à literatura com intuito de viabilizar a efetivação da apropriação e prática

12

perpassar todas as camadas da sociedade. Assim, os clássicos da literatura nacional e universal

precisam ser ensinados a todos os estudantes de forma igualitária. Nesse interim, é válido

ressaltar que, embora o sujeito não tenha conhecimento da cultura clássica por questões de sua

situação social, ele tem direito a adquiri-lo. Não deve ser do interesse escolar manter, aos menos

afortunados, o ensino raso e popular, uma vez que esse já será adquirido em sua vida cotidiana,

mas é na escola que o indivíduo deve ter acesso ao erudito e rebuscado, elevando-o a níveis

altos de complexidade e explorando suas potencialidades.

Em nossa sociedade há fruição segundo as classes na medida em que

um homem do povo está praticamente privado da possibilidade de

conhecer e aproveitar a literatura de Machado de Assis ou Mário de

Andrade.... Para que a literatura chamada erudita deixe de ser privilégio

de pequenos grupos, é preciso que a organização da sociedade seja feita

de maneira a garantir uma distribuição equitativa dos bens.

(CANDIDO, 2011, p. 188 – 189)

A escola, como instituição que sistematiza o conhecimento, deve ser uma agente da

socialização do saber, transformando-se em um viabilizador da transposição de níveis

intelectuais, no qual propicie o mais alto nível de conhecimento alcançado pela humanidade.

Assim, mediante o acesso ao universo literário é possível estabelecermos as relações de poder

e caos, para, com uma visão objetiva, questionar as possibilidades da desconstrução da

concepção de meritocracia disseminada culturalmente.

Nesse contexto, o pobre nunca alcançará níveis altos de intelectualidade porque a ele

cabe a cultura popular que lhe é conferida, subestimando sua capacitada e impossibilitando sua

ascensão cultural e intelectual. Essa realidade e sua mudança já é assegurada em documentos

como a Declaração Universal dos Direitos Humanos e a própria Constituição Federal, contudo,

a prática desse direito precisa ser difundida por meio de todos os veículos. Vê-se a literatura

como um agente disseminador dos conhecimentos universais, portanto, os direitos humanos.

Nas sociedades que procuram estabelecer regimes igualitários, o

pressuposto é que todos devem ter a possibilidade de passar dos níveis

populares para os níveis eruditos como consequência normal da

transformação de estrutura, prevendo-se a elevação sensível da

capacidade de cada um graças à aquisição cada vez maior de

conhecimentos e experiências. (CANDIDO, 2011, p. 190)

Na perspectiva de Candido, à medida que a igualdade é estabelecida, os indivíduos

podem ultrapassar as barreiras sociais e chegarem a níveis intelectuais elevados. Assim, a partir

Anais do X

IV C

ongresso Internacional de Direitos H

umanos.

Disponível em

http://cidh.sites.ufms.br/m

ais-sobre-nos/anais/

Page 13: OS DIREITOS HUMANOS E A LITERATURA: PRÁTICAS PARA … · direitos humanos, à educação e o direito à literatura com intuito de viabilizar a efetivação da apropriação e prática

13

desse exercício dialético, as camadas menos privilegiadas podem compreender sua posição na

sociedade a ponto de se perceberem portadores de direitos, consequentemente, reivindicarem

melhores condições de vida e a quebra da hegemonia.

Considera-se que, por meio do prazer estético, é possível humanizar. Segundo Vigotski

(1998), a arte possibilita dar aos sentimentos uma realidade social, em que viabiliza a relação

dos indivíduos com seus sentimentos por meio da catarse. Nesse interim, o ser humanizado

entende sua existência e os fatos que perpassam na sociedade. Portanto, a ascensão do homem

para seu estado humanizado está diretamente ligada as concepções de luta e de direito que

devam embater.

É certo que quanto mais igualitária for a sociedade, e quanto mais lazer

proporcionar, maior deverá ser a difusão humanizadora das obras

literárias, e, portanto, a possibilidade de contribuírem para o

amadurecimento de cada um. (CANDIDO, 2011, p. 189)

Evidencia-se que, ao contrário do senso comum em que se acredita que os clássicos não

interessam a todos, Candido ressalta que é por meio deles que as desigualdades são estreitadas

e todo indivíduo se interessa pelos assuntos universais em certa medida. Portanto, validar o

acesso de todos aos diferentes níveis de cultura está inserido na luta pelos direitos humanos,

evidenciando a tomada de consciência por meio dessa alteração de entendimento.

No poder universal dos grandes clássicos, que ultrapassam a barreira da

estratificação social e de certo modo podem redefinir as distâncias

impostas pela desigualdade econômica, pois têm a capacidade de

interessar a todos e portanto devem ser levados ao maior número.

(CANDIDO, 2011, p. 192)

Por fim, os direitos do homem são inalienáveis. Quanto a isso não há questionamentos.

Necessita-se de meios para viabilizá-lo. Em uma sociedade justa essa necessidade precisa ser

suprida em todos os níveis, desde as que asseguram a sobrevivência física, até as que

emancipam o indivíduo.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Diante de todo exposto, buscou-se evidenciar a necessidade da promoção de um ensino

emancipador em que se aponta a proposta da Pedagogia Histórica-Crítica como uma corrente

Anais do X

IV C

ongresso Internacional de Direitos H

umanos.

Disponível em

http://cidh.sites.ufms.br/m

ais-sobre-nos/anais/

Page 14: OS DIREITOS HUMANOS E A LITERATURA: PRÁTICAS PARA … · direitos humanos, à educação e o direito à literatura com intuito de viabilizar a efetivação da apropriação e prática

14

pedagógica de ensino que viabilize a prática dos direitos ligados a educação. A literatura, como

posto, é uma ferramenta bastante eficaz no âmbito educacional que, ao libertar a fantasia e as

emoções, muda a maneira de ver a realidade, fazendo-nos enxergar os conflitos externos e

internos em que vivemos. Dessa forma, emancipados poderemos transformar a nós mesmos e

a nossa realidade social.

Compreende-se que, através da literatura nas instituições escolares, é possível

vislumbrar a formação de indivíduos de direitos e emancipados para transformarem a si e seu

meio social. Nessa perspectiva, as contribuições marxistas favoreceram esse ensino

emancipador na medida em que busca compreender as raízes da estrutura social, pois para que

haja mudança efetiva na sociedade é necessário conhecer profundamente os problemas sociais,

de modo que as soluções sejam eficazes e não medidas emergenciais.

O professor possui uma grande responsabilidade. A de instrumentalizar os indivíduos

de conhecimentos científicos, filosóficos e artísticos em que intentem a desalienação através de

uma educação que propicie uma mudança de mente e visão, que emancipe o indivíduo a fim de

transformar a sociedade em um lugar de igualdades.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

ACANDA, Jorge Luis. Sociedade civil e hegemonia. Rio de Janeiro, Editora UFRJ, 2006.

BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília, DF:

Senado Federal: Centro Gráfico, 1988.

BOBBIO, Norberto. A era dos direitos. tradução Carlos Nelson Coutinho; apresentação de

Celso Lafer. — Nova ed. — Rio de Janeiro: Elsevier, 2004. — 7ª reimpressão.

CANDIDO, Antonio. A Literatura e a formação do homem. In: Ciências e Cultura. São Paulo,

USP, 1972.

CANDIDO, Antônio. O direito à Literatura. In: Vários escritos. Rio de Janeiro: Ouro Sobre

Azul, 2011.

COSSON, Rildo. Letramento literário: teoria e prática. 2ª ed. São Paulo: Contexto, 2014.

DORE, Rosemary. Gramsci e o debate sobre a escola pública no Brasil. Cad. Cedes, Campinas,

vol 26, n. 70, pág. 329 – 352, 2006. Disponível em: <

http://www.scielo.br/pdf/ccedes/v26n70/a04v2670.pdf > Acesso em 28 dez. 2016.

FERRARI, Márcio. Pedagogia: Karl Marx. Disponível em:

<http://educarparacrescer.abril.com.br/aprendizagem/karlmarx> Acesso em 20 dez. 2016.

Anais do X

IV C

ongresso Internacional de Direitos H

umanos.

Disponível em

http://cidh.sites.ufms.br/m

ais-sobre-nos/anais/

Page 15: OS DIREITOS HUMANOS E A LITERATURA: PRÁTICAS PARA … · direitos humanos, à educação e o direito à literatura com intuito de viabilizar a efetivação da apropriação e prática

15

LUKÁCS, Georg. Ensaios sobre literatura. Editora Civilização Brasileira S.A. Rio de Janeiro,

vol. 58, 1965

LOJOLO, Marisa. O que é literatura. 10 ed.: São Paulo – Brasiliense, 1989.

GRUPPI, Luciano. Conceito de hegemonia em Gramsci. Rio de Janeiro, Edições Graal, 1978

MASHIBA, Glaciane Cristina Xavier; MENEZES, Maria Christine Berdusco. O processo

histórico da Pedagogia Histórico-Crítica: gênese, desenvolvimento e organização didático-

metodológica. IX Seminário Nacional de Estudos e Pesquisas “História, Sociedade e Educação

no Brasil. Disponível em:

http://www.histedbr.fe.unicamp.br/acer_histedbr/seminario/seminario9/PDFs/7.32.pdf Acesso

em: 10 dez de 2016.

MOCHCOVITCH, Luna Galano. Gramsci e a escola. SP, Ed. Ática, 1990.

Ministério da Educação. Base Nacional Comum Curricular. Proposta Preliminar – Segunda

Versão. 2016.

OLIVEIRA, Thiago Chagas; FELISMINO, Sandra Cordeiro. Gramsci e a concepção marxista

da escola. Revista Digital Filosofia e Educação. Volume 2, 2010. Disponível em:

file:///C:/Users/Nathalia/Downloads/8635537-4858-1-PB.pdf Acesso em 15 dez. 2016.

Plano Nacional de Educação em Direitos Humanos / Comitê Nacional de Educação em Direitos

Humanos. – Brasília: Secretaria Especial dos Direitos Humanos, Ministério da Educação,

Ministério da Justiça, UNESCO, 2007

RODRIGUES, Adriana Aparecida; FAVARO, Neide de Almeida Lança Galvão. A

contribuição do pensamento de Karl Marx para a compreensão da estruturação do sistema

educacional. Disponível em: http://www.estudosdotrabalho.org/anais-vii-7-seminario-

trabalho-ret-

2010/Adriana_Rodrigues_contribuicao_do_pensamento_Marx_sistema_educacional.pdfAcess

o em: 15 dez. 2016.

ROSA, Aline Azevedo; DELGADO, Valéria; MARTINS. A Sociologia da Educação na Visão

de Karl Marx. Pitágoras. v. 3, n. 3, 2012. Disponível em: http://docplayer.com.br/7846017-A-

sociologia-da-educacao-na-visao-de-karl-marx.html Acesso em: 15 dez. 2016.

SAVIANI, Demerval. Escola e Democracia. São Paulo: Cortez Autores e Associados, 1999.

SAVIANI, Demerval. Pedagogia Histórico-Crítica: primeiras aproximações. 7 ed. Campinas,

SP: Autores Associados, 2008.

SEVERINO, Antônio Joaquim. Metodologia do trabalho científico. 22.ed. rev. e ampl. de

acordo com a ABNT. São Paulo: Cortez, 2002.

SOUZA JUNIOR, Justino de. Marx: e a crítica da educação. Aparecida/ SP: Ideias e Letras,

2010.

Anais do X

IV C

ongresso Internacional de Direitos H

umanos.

Disponível em

http://cidh.sites.ufms.br/m

ais-sobre-nos/anais/

Page 16: OS DIREITOS HUMANOS E A LITERATURA: PRÁTICAS PARA … · direitos humanos, à educação e o direito à literatura com intuito de viabilizar a efetivação da apropriação e prática

16

TEODORO, Cristiane Aparecida Zambolin; LARA, Natália Bianca Bruni de. A profissão

docente numa perspectiva marxista. Web artigos: http://www.webartigos.com/artigos/a-

profissao-docente-numa-perspectiva-marxista/134377/. Acesso em 11/12/2016.

ZILBERMAN, Regina. Que literatura para a escola? Que escola para a literatura? Revista

do Programa de Pós-Graduação em Letras da Universidade de Passo Fundo - v. 5 - n. 1 - 9-20

- jan./jun. 2009.

Anais do X

IV C

ongresso Internacional de Direitos H

umanos.

Disponível em

http://cidh.sites.ufms.br/m

ais-sobre-nos/anais/