Órgãos do período colonial

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Órgãos do Período Colonial (1500-1822) Lançado em 2011, o dicionário é uma ferramenta em constante atualização, em que novos verbetes vão sendo adicionados rotineiramente. No total, serão cerca de 120 órgãos e cargos contemplados, elaborados a partir dos projetos Poder e Administração: a corte joanina no Brasil e Administração colonial: Fiscais e Meirinhos na base Mapa. FORÇAS MILITARES NO BRASIL COLONIAL Tropas de Primeira Linha As tropas de primeira linha, também chamadas de tropas regulares ou pagas, foram criadas em 1641, no contexto da restauração do trono português, após o período de unificação com a Espanha, que vigorou entre 1580 e 1640. Elas integravam a estrutura militar do reino e seus domínios, junto com as Companhias de Ordenanças, criadas em 1570, e as tropas auxiliares, em 1645. No entanto, diferentemente dessas duas, as tropas de primeira linha na colônia eram compostas por oficiais pagos, vindos em sua maioria de Portugal (SALGADO, 1985, p. 87). Com a promulgação da lei das armas em 1549, iniciou-se um processo de militarização geral da sociedade portuguesa e de seus domínios. Em 1569, uma nova lei reafirmou as disposições anteriores obrigando todos os vassalos a terem armas e usá-las quando fosse preciso. Um ano depois foi promulgado o Regimento dos Capitães-mores, e mais Capitães, e Oficiais das Companhias da gente de Cavalo, e de pé; que criou as Companhias de Ordenanças, forças militares convocadas em caso de necessidade, formadas por todos os homens entre 18 e 60 anos de idade, exceto os eclesiásticos e fidalgos. Outras grandes mudanças na organização militar decorreram das guerras da restauração, que buscaram acabar com o domínio espanhol e impuseram grandes necessidades de modernização. Uma delas foi o estabelecimento do Conselho de Guerra, em 1640, com o fim de tratar de questões referentes à organização de tropas e armadas e à nomeação de oficiais de patente, atuando ainda como um tribunal superior nas causas militares. Também foi instituído o cargo de tenente-geral da artilharia do Reino, com jurisdição sobre o material de guerra, armas, pólvora, fundições. Criaram-se, ainda, os cargos de

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Page 1: Órgãos Do Período Colonial

Órgãos do Período Colonial (1500-1822)Lançado em 2011, o dicionário é uma ferramenta em constante atualização, em que novos verbetes vão

sendo adicionados rotineiramente. No total, serão cerca de 120 órgãos e cargos contemplados,

elaborados a partir dos projetos Poder e Administração: a corte joanina no Brasil e Administração colonial:

Fiscais e Meirinhos na base Mapa.

FORÇAS MILITARES NO BRASIL COLONIAL

Tropas de Primeira Linha

As tropas de primeira linha, também chamadas de tropas regulares ou pagas, foram criadas em 1641, no contexto da restauração do trono português, após o período de unificação com a Espanha, que vigorou entre 1580 e 1640. Elas integravam a estrutura militar do reino e seus domínios, junto com as Companhias de Ordenanças, criadas em 1570, e as tropas auxiliares, em 1645. No entanto, diferentemente dessas duas, as tropas de primeira linha na colônia eram compostas por oficiais pagos, vindos em sua maioria de Portugal (SALGADO, 1985, p. 87).

Com a promulgação da lei das armas em 1549, iniciou-se um processo de militarização geral da sociedade portuguesa e de seus domínios. Em 1569, uma nova lei reafirmou as disposições anteriores obrigando todos os vassalos a terem armas e usá-las quando fosse preciso. Um ano depois foi promulgado o Regimento dos Capitães-mores, e mais Capitães, e Oficiais das Companhias da gente de Cavalo, e de pé; que criou as Companhias de Ordenanças, forças militares convocadas em caso de necessidade, formadas por todos os homens entre 18 e 60 anos de idade, exceto os eclesiásticos e fidalgos.

Outras grandes mudanças na organização militar decorreram das guerras da restauração, que buscaram acabar com o domínio espanhol e impuseram grandes necessidades de modernização. Uma delas foi o estabelecimento do Conselho de Guerra, em 1640, com o fim de tratar de questões referentes à organização de tropas e armadas e à nomeação de oficiais de patente, atuando ainda como um tribunal superior nas causas militares. Também foi instituído o cargo de tenente-geral da artilharia do Reino, com jurisdição sobre o material de guerra, armas, pólvora, fundições. Criaram-se, ainda, os cargos de governadores das Armas, destinados a assegurar o recrutamento, instrução e disciplina das tropas em cada província (SELVAGEM, 1931, p. 384).

Em 1641 foi votado um imposto extraordinário para as despesas de guerra e manutenção de um exército, que deu origem às tropas de primeira linha, o primeiro exército permanente de Portugal. O exército de linha se destinava especialmente à guerra de manobra nas fronteiras e seus oficiais eram integrantes da nobreza, nomeados pelo rei, enquanto os soldados eram recrutados entre os filhos segundos de todas as classes, com exceção dos filhos de viúvas e lavradores. Além de cavalaria e artilharia, as tropas dispunham de infantaria, que era composta por terços e comandados por mestres-de-campo, sendo divididas em companhias. (SELVAGEM, 1931, p. 384-387).

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O Regimento das Fronteiras de 29 de agosto de 1645, adotado no Brasil em 1653, regulou sua organização, definindo as normas, pagamento de soldos, formas de concessões de licenças, castigos, entre outras disposições. Este ato também estabeleceu o cargo de vedor-geral, destinado a controlar o pagamento dos oficiais e soldados. Subordinados ao vedor ficariam os comissários de mostra e oficiais de pena responsáveis por fazer as revistas, inscrever as tropas e elaborar lista com registro de informações sobre os soldados (SILVA, 1994, p. 600; SALGADO, 1985, p. 103).

No século XVIII, novas mudanças na organização militar ocorreram no contexto de um processo de racionalização do aparelho de Estado, incluindo, em 1736, a criação da Secretaria de Estado dos Negócios Estrangeiros e da Guerra. Houve, ainda, a reforma do exército português pelo conde de Lippe, a criação de auditorias de guerra, a redefinição do papel das tropas auxiliares e das ordenanças, a substituição dos terços pelos regimentos, de inspiração francesa, e a adoção de princípios estratégicos oriundos do modelo prussiano de Frederico II, que valorizava a ofensiva (WEHILING; WEHLING, 2008, p. 27).

Com a chegada da família real no Brasil em 1808, além da transladação da Secretaria de Estado dos Negócios Estrangeiros e da Guerra para Rio de Janeiro, foram criados outros órgãos e cargos como o Conselho Supremo Militar e de Justiça, a Academia Real Militar, o inspetor-geral de Artilharia da Corte e Capitania do Rio de Janeiro, fábricas de ferro e pólvora, além de promovidas reformas nas oficinas e arsenais de Guerra.

Além disso, as ações militares empreendidas na Guiana, Montevidéu e a repressão da revolta ocorrida em Pernambuco em 1817 demandaram uma maior atenção à organização do exército profissional (WEHILING; WEHLING, 2008, p. 13). Em 1816, o alvará de 21 de fevereiro regulamentou a organização do exército de Portugal, tratando das divisões dos regimentos, soldos, guarnições, concessões de licenças, armamento, provisão de postos, montepio, entre outras questões.

Após a Independência em 1822 não houve alterações na organização militar e a Constituição de 1824 tratou brevemente do assunto, determinando que todos os brasileiros fossem obrigados a pegar em armas para sustentar a independência e a integridade do Império.

Angélica Ricci Camargo

BibliografiaMAGALHÃES, Joaquim Romero. A guerra: os homens e as armas. In: MATTOSO, José (dir.). História de Portugal. No alvorecer da modernidade (1480-1620). v. 3. Lisboa: Estampa, 1993, p. 105-118.

MELLO, Christiane Figueiredo Pagano de. Os corpos de auxiliares e de ordenanças na segunda metade do século XVII: as capitanias do Rio de Janeiro, São Paulo, Minas Gerais e a manutenção do Império português no centro-sul da América. 2002. Tese (Doutorado em História). Niterói-RJ. Universidade Federal Fluminense, 2002.

SALGADO, Graça (coord.). Fiscais e meirinhos: a administração no Brasil colonial. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1985.

SELVAGEM, Carlos. Portugal militar: compêndio de história militar e naval de Portugal desde as origens do estado portucalense até o fim da dinastia de Bragança. Lisboa: Imprensa Nacional, 1931.

SILVA, Maria Beatriz Nizza da. Organização Militar.In: ______ (coord.). Dicionário da história da colonização portuguesa no Brasil. Lisboa: Verbo, 1994, p. 598-602.

SODRÉ, Nelson Werneck. História militar do Brasil. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1965.

WEHILING, Arno; WEHLING, Maria José. Exército, milícias e ordenanças na Corte Joanina: permanências e modificações. DaCultura. Ano VIII, n. 14, jun. 2008, p. 26-32. Disponível em: http://www.funceb.org.br/images/revista/5_2q0t.pdf Acesso: 15 janeiro 2010.

Referência da imagem

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São Cristóvão. RUGENDAS, Johann Moritz. Voyage pittoresque dans le Brésil. GOLBERY, M. de (Tradutor). Paris: Engelmann & Cie., 1835. 3ª div., pl. 14.Arquivo Nacional, OR2119.

Tropas Auxiliares

As tropas auxiliares, posteriormente denominadas milícias, foram criadas em 7 de janeiro de 1645 no contexto da restauração do trono português após o período unificação com a Espanha, entre 1580 a 1640. Tinham como atribuições a manutenção da posse territorial, da ordem e da lei (LEONZO, 1986, p. 324-325). Formavam, junto com as  tropas de primeira linha instituídas em 1641 e com as companhias de ordenanças estabelecidas em 1570, as forças militares de Portugal e seus domínios.

A restauração se constituiu como um marco importante para organização militar portuguesa. Ainda em 1640 foi criado o Conselho de Guerra, tribunal superior nas causas militares encarregado de tratar de questões relativas à nomeação de oficiais de patente e à organização de tropas e armadas, entre outros assuntos. Além do Conselho, foram instituídos os cargos de governadores das Armas, destinados a garantir o recrutamento, instrução e disciplina das tropas, e o de tenente-geral da artilharia do Reino, com jurisdição sobre o material de guerra, armas, pólvora e fundições (SELVAGEM, 1931, p. 384).

As tropas auxiliares eram obrigadas a atuar nas fronteiras quando fosse necessário, ajudando as tropas de primeira linha. Eram compostas por filhos de viúvas e lavradores, e por homens casados em idade militar. A princípio foram instituídas em algumas comarcas, mas a partir de 1646 se generalizaram em Portugal e suas colônias (SELVAGEM, 1931, p. 384).

Sua organização, tal como a das tropas de primeira linha, era baseada no sistema militar da Espanha, e dividia-se em terços, com cerca de 600 homens subdivididos em 10 companhias. Cada terço era comandado por um mestre-de-campo e os homens eram disciplinados e instruídos por oficiais hábeis e experimentados dastropas de primeira linha, nomeados pelos governadores das províncias. Mas, diferente das tropas de primeira linha, as auxiliares, como também as ordenanças, não eram remuneradas. Dessa forma, muitas vezes o rei concedia regalias, honras, liberdades e isenções aos oficiais dos terços como uma das maneiras de atrair o interesse no serviço real (MELLO, 2009, p. 46-49).

A partir da segunda metade do século XVIII, foram empreendidas novas mudanças na organização militar, decorrentes de um processo de centralização político-administrativa. Um pouco antes, em 1736, foi criada aSecretaria de Estado dos Negócios Estrangeiros e da Guerra. A isso seguiram a reforma do Exército português pelo conde de Lippe, a criação de auditorias de guerra, a substituição dos terços pelos regimentos, de inspiração francesa, e a adoção de princípios estratégicos oriundos do modelo prussiano de Frederico II, que valorizava a ofensiva (WEHILING; WEHLING, 2008, p. 27).

No caso das tropas auxiliares, a maior transformação ocorreu por meio do decreto de 7 de agosto de 1796, que mudou sua denominação para milícias, elevando-a à categoria de tropa de segunda linha. O decreto também transformou os cargos de mestres-de-campo, que passaram a ser chamados de coronéis de milícias.

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No Brasil, durante o período colonial, foram reproduzidas as mesmas determinações estabelecidas no reino em relação às tropas militares, que se depararam, muitas vezes, com dificuldades relacionadas ao alistamento. Também houve disposições específicas, como a expressa pela carta régia de 22 de março de 1766, que determinou o alistamento “sem exceção” de nobres, brancos, mestiços, pretos, ingênuos e libertos, e todos os homens válidos para o serviço militar.

Com a transferência da corte e da família real portuguesa para o Brasil em 1808, importantes modificações foram empreendidas na nova sede do reino, incluindo a instalação da Secretaria de Estado dos Negócios Estrangeiros e da Guerra. Também foram reorganizadas a administração dos arsenais de Guerra, criada umaReal Academia Militar, fábricas de ferro e pólvora e o cargo de inspetor-geral de Artilharia da Corte e Capitania do Rio de Janeiro. Também foi instituído o Conselho Supremo Militar e de Justiça, um tribunal ao qual competiam todas as matérias militares que, em Lisboa, se expediam pelos Conselhos de Guerra, do Almirantado e do Ultramar.

Em relação às tropas, foram mantidas as três linhas: do Exército, Milícias e Ordenanças. Houve, contudo, um predomínio do exército profissional sobre as demais, devido às ações militares empreendidas na Guiana, Montevidéu e a repressão da revolta ocorrida em Pernambuco em 1817 (WEHLING; WEHLING, 2008, p. 13).

O decreto de 24 de junho de 1808 criou o cargo de inspetor-geral de milícias, encarregado de inspecionar os regimentos de milícias da corte e capitania do Rio de Janeiro. A decisão n. 1 de 3 de janeiro de 1809 deu novas instruções para o cargo, que também existia nas capitanias de Pernambuco, Bahia e São Paulo.

Com a independência política de Portugal em 1822, não houve grandes mudanças na administração das milícias. Em 1831, a lei de 18 de agosto criou a Guarda Nacional, extinguindo as milícias e as ordenanças.

Angélica Ricci Camargo

BibliografiaGOMES, José Eudes Arrais Barroso. As milícias d’El Rei: Tropas militares poder no Ceará setecentista. 2009. Dissertação (Mestrado em História). Niterói-RJ. Universidade Federal Fluminense, 2009.

LEONZO, Nanci. As instituições. In: SILVA, Maria Beatriz Nizza da. (coord.). O Império Luso-Brasileiro, 1750-1822. Lisboa: Estampa, 1986. (Nova História da Expansão Portuguesa, v. 8), p. 301-331.MELLO, Christiane Figueiredo Pagano de. Forças militares no Brasil colonial: Corpos Auxiliares e de Ordenanças na segunda metade do século XVIII. Rio de Janeiro: E-Papers, 2009.

SALGADO, Graça (coord.). Fiscais e meirinhos: a administração no Brasil colonial. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1985.

SELVAGEM, Carlos. Portugal militar: compêndio de história militar e naval de Portugal desde as origens do estado portucalense até o fim da dinastia de Bragança. Lisboa: Imprensa Nacional, 1931.WEHILING, Arno; WEHLING, Maria José. Exército, milícias e ordenanças na Corte Joanina: permanências e modificações. DaCultura. Ano VIII, n. 14, jun. 2008, p. 26-32. Disponível em: http://www.funceb.org.br/images/revista/5_2q0t.pdf Acesso: 15 janeiro 2010.

Documentos sobre o órgão podem ser encontrados nos seguintes fundos do Arquivo Nacional:BR AN,BSB Z6 Ministério da Fazenda – Delegacia de Mato GrossoBR AN,RIO 9U Série Guerra – Pagadoria das Tropas (IG9)

Referência da imagemEmbarque das tropas em Praia Grande para expedição contra Montevidéu. DEBRET, Jean Baptiste. Voyage pittoresque et historique au Brésil, ou Séjour d’un Artiste Français au Brésil, depuis 1816 jusqu’en 1831 inclusivement, epoques de l ‘avénement et de I ‘abdication de S.M. D. Pedro 1er. Paris: Firmind Didot Frères, 1834 – 1839, v. 3, pl. 23. Arquivo Nacional, OR1909.

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Sargento-mor da Comarca

O cargo de sargento-mor foi criado no contexto da reformulação da estrutura militar de Portugal e de seus domínios, com o fim de organizar as atividades dos corpos de Ordenanças. A primeira referência encontrada sobre ele consta na provisão de 10 de maio de 1574, mas a regulamentação ocorreu mais tarde, com regimento de 28 de novembro de 1598, que definiu suas atribuições.

As companhias de Ordenanças foram criadas em 10 de dezembro de 1570 pelo Regimento dos Capitães-mores, e mais Capitães, e Oficiais das Companhias da gente de Cavalo, e de pé; e da ordem que terão em se exercitarem. Constituíam-se como forças militares não remuneradas formadas por todos os homens válidos entre 18 e 60 anos e convocadas em ocasiões de necessidade. Junto com as Milícias e com as tropas de primeira linha formavam as estrutura de defesa da colônia.

Segundo o regimento de 1570, as Companhias de Ordenançasdeveriam ser formadas por 250 homens, divididos em dez esquadras, nas cidades, vilas e concelhos. Seriam comandadas por capitães e contariam também com alferes, sargento, meirinho, escrivão, tambor, recebedor, e dez cabos.

As companhias existentes em cada cidade eram subordinadas ao capitão-mor, que tinha o dever de engajar toda a população no serviço militar, contando com o auxílio do sargento-mor. Os postos mais importantes deveriam ser escolhidos pelos oficias das câmaras, incluindo o de capitão-mor, caso este não fosse assumido por um senhor de terras ou pelo alcaide-mor. Dessa maneira, as câmaras detinham um grande poder de ingerência na organização da força armada colonial.

Segundo o Regimento dos Sargentos-mores das Comarcas, o ocupante do cargo deveria residir na cabeça de cada comarca, cabendo-lhe visitar e adestrar toda a gente das companhias existentes em sua jurisdição pelo menos duas vezes ao ano, com especial cuidado para com as áreas onde houvesse maior necessidade de sua atuação. O sargento-mor da comarca também seria acompanhado por um tambor, destinado a ensinar os tambores das companhias dos lugares conforme a ordem de guerra (PORTUGAL, 1789a, p. 217-219).

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As visitas deveriam ser realizadas durante o verão, quando, segundo o regimento, os exercícios poderiam ser executados com menos trabalho e opressão. Ao chegar, o sargento-mor da comarca deveria falar com o capitão-mor e ordenar que este convocasse as companhias para realizarem os exercícios determinados. Os exercícios seriam assistidos por ele, acompanhado do capitão-mor e do sargento-mor do lugar (PORTUGAL, p. 218-219). Além disso, o sargento-mor da comarca deveria ter um livro onde registraria o número das companhias existentes em cada lugar e das pessoas que compunham cada uma, que, anualmente, seria enviado para o rei (PORTUGAL, p. 218).

Todos os oficiais das Ordenanças ficavam obrigados a cumprir suas determinações e, não o fazendo, incorreriam em penas de dez cruzados nas vilas principais e de mil réis nos lugares menores. A execução das penas seria feita pelo corregedor, provedor da comarca ou pelo juiz de fora (PORTUGAL, p. 218-219).

Apenas no século XVIII foram introduzidas novas mudanças na organização das Ordenanças. A primeira foi determinada pelo alvará de 18 de outubro de 1709 e tinha como finalidade impedir as crescentes irregularidades praticadas nas câmaras durante o processo de eleição dos postos, além de promover uma maior interferência da Coroa na escolha dos ocupantes dos cargos (MELLO, 2002, p. 69). No que se refere às atribuições do sargento-mor, este ficou encarregado de participar do processo eleitoral para a escolha dos postos de sargento-mor e capitão de companhia, na ausência do capitão-mor, donatário ou do alcaide-mor. Assim, auxiliaria os oficiais das câmaras que, juntos com o ouvidor e provedor da comarca, escolheriam três nomes que seriam enviados para o general ou cabo que comandasse que as Armas na capitania, e propostos ao rei através do Conselho de Guerra (PORTUGAL, 1789b, p. 203).

Outros atos legislaram e modificaram disposições acerca da organização das Ordenanças, alguns deles voltados exclusivamente para o Brasil, acentuando a interferência da Coroa na organização das forças militares locais. No entanto, não houve mais menção ao cargo de sargento-mor da comarca.

As Companhias das Ordenanças ainda vigoraram até 1831, quando foram extintas pela lei de 18 de agosto e substituídas pela Guarda Nacional.

 

Angélica Ricci Camargo

 

BibliografiaMELLO, Christiane Figueiredo Pagano de. Os corpos de auxiliares e de ordenanças na segunda metade do século XVII: as capitanias do Rio de Janeiro, São Paulo, Minas Gerais e a manutenção do Império português no centro-sul da América. 2002. Tese (Doutorado em História). Niterói-RJ. Universidade Federal Fluminense, 2002.

PORTUGAL. Regimento dos sargentos-mores das comarcas, de 28 de novembro de 1598. Sistema, ou Coleção de Regimentos Reais compilados por José Roberto Monteiro de Campos Coelho e Sousa. Tomo V. Lisboa, p. 217-219, 1789. Disponível em: www.iuslusitaniae.fcsh.unl.pt . Acesso em: 1º de abril de 2008.

_________. Lei, de 18 de outubro de 1709. Em que se declara a forma em como daqui por diante se hão-de-fazer as eleições para capitães-mores e dos mais oficiais da Ordenança. Sistema, ou Coleção dos Regimentos Reais, compilados por José Roberto Monteiro de Campos Coelho e Sousa. Tomo V. Lisboa, p. 202-205, 1789. Disponível em: www.iuslusitaniae.fcsh.unl.pt . Acesso em: 5 de agosto de 2008.

SALGADO, Graça (coord.). Fiscais e meirinhos: a administração no Brasil colonial. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1985.

 

Referência da imagemArte Militar. Encyclopedie, ou, Dictionnaire raisonne des sciences, des arts et metiers, par une Societe de Gens de lettres. Paris: Briasson, 1751-1780, v.1, pr. I .Arquivo Nacional. OR1896

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Capitão e Governador de Capitania

O cargo de capitão e governador foi instituído para a administração das capitanias hereditárias a partir do processo da divisão e distribuição de extensas faixas de terra da colônia. A doação mais antiga conhecida se refere à capitania de Pernambuco, dada a Duarte Coelho em 10 de março de 1534, considerada portanto como data de criação do cargo.

Logo depois da descoberta das terras no continente americano em 1500, os portugueses iniciaram o envio de várias expedições para o reconhecimento e patrulha do litoral, com o objetivo principal de evitar as investidas de estrangeiros, sobretudo dos franceses. Em 1501, a Coroa promoveu o arrendamento do território a um consórcio de comerciantes de Lisboa para desenvolver o comércio dos produtos encontrados, principalmente o pau-brasil, e iniciou o estabelecimento de feitorias para guardar os gêneros de resgate e facilitar seus carregamentos para Portugal.

A continuidade dos ataques estrangeiros e o fracasso das feitorias fizeram com que os portugueses iniciassem a colonização efetiva da terra, seguindo o exemplo já empreendido nas ilhas do Atlântico, realizado quase sem ônus para a Coroa. Assim, foi enviada a expedição liderada por Martim Afonso, que partiu de Lisboa em março de 1530, tendo como finalidades fiscalizar a costa, estabelecer uma colônia por meio de concessões de terras e explorar a foz dos rios Amazonas e Prata para determinar sua proximidade com a linha de Tordesilhas (Johnson, 1998, p. 253).

A carta de grandes poderes ao capitão-mor Martim Afonso de Sousa, e a quem ficasse em seu lugar, de 20 de novembro de 1530, dotava-o de diversas prerrogativas, que incluíam jurisdição criminal e cível. Também determinava, como suas atribuições, a demarcação de todas as terras conquistadas, as quais devia tomar posse em nome do rei, e a incumbência de ocupar o cargo de capitão-mor e governador nas novas terras.

O sucesso da expedição de Martim Afonso, contudo, mostrou-se insuficiente para pôr fim às ameaças das outras nações contra os interesses portugueses. Essa situação motivou o rei d. João III a repartir e distribuir o território a algumas pessoas, entre os anos de 1534 e 1536. Foram criadas assim as chamadas capitanias, que foram doadas às diferentes donatários. Apesar de não existir um consenso

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entre a historiografia, as primeiras capitanias criadas teriam sido a de Pernambuco, São Tomé, Bahia, Porto Seguro, Espírito Santo, Rio de Janeiro e São Vicente, Itamaracá, Santo Amaro, Santana, Pará, Ilhéus, Piauí, Ceará e Rio Grande (Instituto dos Arquivos Nacionais / Torre do Tombo, 1999; Wehling, 1994, p. 68-69).

Os donatários eram, em quase sua totalidade, fidalgos da Casa Real. Alguns deles tinham se distinguido no desempenho de funções militares e navegações, como Duarte Coelho, Francisco Pereira Coutinho, Vasco Fernandes Coutinho, Antônio Cardoso de Barros, Martim Afonso de Sousa e Pero Lopes de Sousa, enquanto outros eram ligados à Coroa por terem ocupado importantes cargos na burocracia estatal, como João de Barros e Jorge de Figueiredo Correia. A doação das capitanias se constituiu, dessa maneira, como uma forma de o monarca recompensar aqueles que o tinham bem servido (Abreu, 2000, p. 66; Carvalho, 1992, p.116-121; Silva, 2005, p. 43).

A instituição das capitanias também se manteve nas duas outras repartições que vigoraram, durante o período colonial, separadamente do Estado do Brasil, a “Repartição do Sul”, que abrangia as capitanias de São Vicente, Espírito Santo e Rio de Janeiro, e durou de 1608 a 1612, e o Estado do Maranhão, que permaneceu separado de 1621 a 1774.

A carta de doação da capitania era o documento pelo qual o rei fazia a concessão da terra aos capitães, que gozariam do título de governadores de sua donataria, enquanto o foral fixava os direitos, foros e tributos que cabiam ao rei e a parte relativa ao capitão (Tapajós, 1966, p. 47). A carta de doação da capitania de Pernambuco a Duarte Coelho continha não somente suas atribuições relativas à administração da terra, mas incluía seus direitos e privilégios. Seu conteúdo se assemelhava ao das doações praticadas desde longa data em Portugal, mas era marcado por uma maior flexibilidade, justificada pelo caráter de exceção das faculdades concedidas aos governadores e capitães em razão da distância de Portugal e da extensão do território (Saldanha, 1991, p. 73).

A justificativa para a repartição das terras presente no documento radicava-se na necessidade de povoar e propagar a fé católica. O fato de ser uma doação de juro e herdade significava que seus sucessores herdariam os territórios, cuja concessão deveria ser confirmada por meio de uma nova doação (Hespanha, 1994, p. 411). Dentre as atribuições do capitão e governador estava a de escolher uma pessoa para servir como ouvidor, com quem praticaria suas funções judiciais. Possuía jurisdição no cível e no crime, e podia conhecer, junto com oouvidor, as ações novas a dez léguas de onde estivesse e as apelações e agravos de todos juízes e oficiais – área maior do que aquela geralmente fixada nas doações em Portugal, cujo limite era de cinco léguas.

Nos casos crimes, o governador e ouvidor tinham jurisdição e alçada de morte natural em escravos, índios, peões, cristãos, homens livres, sem apelação e agravo. Em relação às pessoas de “maior qualidade” ou de origem fidalga, tinham alçada de dez anos de degredo e até cem cruzados de pena, sem apelação e agravo. Porém, em casos de heresia, traição, sodomia e moeda falsa, sua alçada alcançava a todas as pessoas, de qualquer qualidade, para a condenação à morte, sem apelação nem agravo (Carta…, 1966, p. 193-202).

Cabia ainda ao capitão e governador a “dada das justiças”, ou seja, o provimento dos cargos que não eram eleitos para atuarem nas câmaras, e de outro ouvidor, caso fosse necessário. Além disso, devia presenciar a eleição de juízes e oficiais das câmaras; limpar e apurar as pautas e passar cartas de confirmação aos juízes e oficiais; e entregar as alcaidarias-mores. O capitão ficava encarregado também de criar vilas e povoações, que teriam termo, jurisdição, liberdades e insígnias segundo foro e costume do Reino (Carta…, 1966, p. 193-202).

A extensão de seus poderes pode também ser medida a partir da isenção da correição, ou seja, a proibição da entrada de corregedor na capitania, o que tornava seu governo imune à fiscalização da Coroa. Todavia, a carta de doação proibia o capitão e governador de promover mudanças nos itens dispostos, sob pena de perder a governança e a capitania; e também dispunha que o ocupante do cargo podia ser suspenso ou sentenciado, mas não sem antes ser ouvido pelo rei (Carta…, 1966, p. 193-202).

Em relação a seus privilégios, a carta determinava que o capitão devia possuir todas as moendas de água, marinhas de sal e outros engenhos, e dar licença para quem quisesse construí-los, cobrando os tributos ou foros acertados. Podia ainda tomar a posse de terras em qualquer parte que quisesse e, não tomando, estas deviam ser repartidas em quatro ou cinco partes, as quais podiam ser arrendadas ou aforadas. No entanto, havia um limite para a quantidade de terra que o capitão devia possuir, a partir da proibição de tomar sesmarias para si ou sua família, e da obrigação de reparti-las a quaisquer pessoas sem cobrança de foro e direito, somente do dízimo à Ordem de Cristo (Carta…, 1966, p. 193-202).

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A carta de doação também tratava da questão da sucessão do cargo de capitão e governador, permitindo que mulheres e até filhos bastardos assumissem a governança, revogando assim as disposições da Lei Mental, que estabelecia os princípios de sucessão em Portugal desde 1434. (Carta…, 1966, p. 193-202).

No que diz respeito aos foros, tributos e direitos reais, era direito do capitão receber a metade da dízima do pescado da capitania (diminuída pela metade, de acordo do foral), receber a redízima de todas as rendas e direitos pertencentes ao rei, receber a vigésima parte dos rendimentos provenientes do pau-brasil, o qual deveria guardar e conservar, e ter os escravos resgatados na terra, devendo mandar vinte e quatro deles para o Reino (Carta…, 1966, p. 193-202).

As disposições referentes a esses assuntos foram bem especificadas no foral de 24 de setembro de 1534. De acordo com este, o capitão e governador ficava encarregado de cuidar do recebimento do quinto, taxado sobre metais e pedras preciosas que fossem descobertos, do qual receberia a dízima, além de receber os direitos dos tabeliães, de receber a redízima do pagamento dos direitos da entrada e de saída de mercadorias, de dar licença para saída de navios com mercadorias e estabelecer os direitos e tributos taxados pelas câmaras nas passagens dos rios (Foral…, 1966, p. 202-208).

O foral também determinava que o capitão, junto a moradores e povoadores, ficariam liberados para vender quaisquer mercadorias pagando apenas a sisa, e autorizava a compra e o trato com capitães de outras capitanias, ficando porém o trato com os índios sob inteira responsabilidade do capitão. Em relação à defesa da capitania, ficava o capitão incumbido de convocar os moradores para servir no tempo de guerra (Foral…, 1966, p. 202-208).

O empreendimento colonizador teve êxito em apenas duas capitanias, São Vicente e Pernambuco. Muitas não foram sequer colonizadas e em outras as tentativas feitas resultaram em uma colonização precária ou redundaram em fracasso, que teve causas diversas, envolvendo principalmente conflitos com índios e dissensões entre colonos ou destes com os donatários (Wehling, 1994, p. 68-69).

Em 1548, com a instalação de um governo-geral, a Coroa empreendeu uma tentativa de se impor de maneira mais efetiva na colônia, centralizando as atividades administrativas, judiciárias e fazendárias. O regimento dado ao primeiro governador-geral, Tomé de Sousa, em 17 de dezembro, continha algumas determinações destinadas aos capitães e governadores, ordenando que estes enviassem ajuda ao governador-geral e que tratassem, em conjunto com outras autoridades, sobre questões de governança e segurança, além de deliberar sobre a forma de construção dos navios. Os capitães e governadores também ficavam encarregados de dar licença aos colonos para tratarem com índios nos dias não estipulados pela lei e para aqueles que quisessem se deslocar para outras capitanias, além de licença para se fazer guerra aos índios, assentar os preços das mercadorias e favorecer a fé católica. O regimento também reforçava a obrigação dos capitães e governadores de terem armas para a defesa das capitanias, e mandava que eles informassem ao governador-geral sobre a proximidade de corsários (REGIMENTO…, 1966, p. 253-269).

Durante o governo de Tomé de Sousa iniciou-se um processo de diminuição da jurisdição dos capitães, através da revogação dos itens antes presentes nas doações, mas que agora iam contra os regimentos e provisões fornecidos para o governador-geral. Posteriormente, o alvará de 5 de março de 1557 determinou que a condenação de morte natural em peão tivesse apelação para maior alçada, como também os crimes de heresia, traição, sodomia e moeda falsa. Outra mudança foi a permissão da entrada de corregedor. A partir também de 1557, a nomeação dos ouvidores das capitanias pertencentes à Coroa passou a ser feita pelo rei (COMENTÁRIO…, 1970, p. 353; Saldanha, 1991, p. 311).

No regimento do governador-geral Francisco Giraldes, de 5 de março de 1588, foram acrescidas às competências dos capitães e governadores a concessão de licença para o desembarque de navios estrangeiros, exceto quando mostrassem provisão do rei de Portugal. O regimento de Gaspar de Sousa, de 6 de outubro de 1612, evidenciando uma preocupação em limitar os poderes dos donatários, ordenava que ogovernador-geral não deixasse que estes tomassem mais jurisdição da que lhes pertencia segundo suas doações. Previa, ainda, a suspensão de capitão e governador e sua substituição durante o julgamento dos seus crimes (REGIMENTO… 1972, p. 413-436).

Esse processo de limitação de poderes dos capitães e governadores foi contínuo, como se observa no regimento do ouvidor-geral do Brasil, de 14 de abril de 1628, que diminuía o valor da quantia máxima para o conhecimento das causas cíveis sem apelação e agravo de cem para vinte mil réis. Este regimento determinava também que quando estivesse em determinada capitania, o ouvidor-geral podia conhecer, por apelação e agravo, todos os casos crimes tratados perante o capitão ou seu ouvidor, permitindo que estes tivessem alçada somente nos feitos crimes em que alguns escravos ou índios fossem acusados e sentenciados a penas de açoites ou corte de orelhas; nos casos em que aos peões cristãos livres fosse

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posta pena de açoites e degredo até três anos; e nos casos de pessoas de “mais qualidade”, teriam alçada somente até um ano de degredo e das penas pecuniárias até vinte cruzados. O regimento de 1628 também determinava que o ouvidor-geralvisitasse as capitanias, usando da jurisdição dos corregedores das comarcas do Reino (Portugal, 1855, p. 124-127, 1855).

Em 1663, foi dado um regimento específico para os governadores, o Regimento que se mandou aos Capitães-mores das Capitanias deste Estado, de 1º de outubro de 1663, no qual se destacam as questões relacionadas à defesa. Assim, o regimento mandava que os capitães e governadores visitassem as fortalezas e armazéns existentes nas capitanias, verificando a artilharia e as munições e avisando sobre sua situação ao governo-geral, além de passar em revista os habitantes da capitania, obrigando aqueles que fossem aptos a servir militarmente, promover anualmente o treinamento dos moradores e notificar ao rei se vagasse uma companhia de infantaria paga, Ordenança ou de tropas Auxiliares (REGIMENTO…,1928, p. 374-380).

O documento reforçava a ideia de que os governadores deviam se subordinar ao governador-geral e mandava-os avisar ao rei sobre vacância dos ofícios de Justiça e Fazenda, ficando contudo proibidos de se intrometer nos negócios dessas esferas e nas câmaras. Também ficavam proibidos de dar sesmarias nas capitanias reais (REGIMENTO…,1928, p. 374-380). De acordo com o regimento do governador-geral Roque da Costa Barreto, de 23 de janeiro de 1677, esta subordinação valia também para as capitanias de Pernambuco e Rio de Janeiro, que tinham regimentos específicos dotando seus governadores de poderes para o provimento dos ofícios de Justiça, Fazenda e Guerra por um período provisório (REGIMENTO…,1972, p. 745-846).

A relativa autonomia dessas duas capitanias foi conquistada em momentos anteriores. No caso de Pernambuco, o governador foi investido de poderes especiais desde o período da guerra contra os holandeses, em meados do século XVII. Um pouco antes do regimento de Roque da Costa Barreto, foi dado um regimento especial que garantia autonomia a capitania, que deveria subordinar-se diretamente ao Conselho Ultramarino. O Rio de Janeiro, por sua vez, após o curto período de separação do governo da Bahia, também passou a ter um estatuto diferenciado (Salgado, 1985, p. 68; Lobo, 1962, p. 376).

Em todo o período colonial foram dadas algumas determinações específicas para governadores de certas capitanias, que os dotava de atribuições diferenciadas, como no caso de Minas Gerais, como pode se observar no Regimento para a nova forma de cobrança do direito senhorial dos quintos dos moradores das Minas Gerais, de 3 de dezembro de 1750, ou na legislação referente à inspeção do algodão em Pernambuco, que pode ser observado na decisão n. 17, de 17 de março de 1820.

O processo de diminuição da jurisdição e dos privilégios dos capitães e governadores foi acompanhado pela compra gradativa das capitanias particulares pela Coroa. A primeira capitania adquirida foi a da Bahia, no momento de instalação do governo-geral, em 1548. Depois, seguiu-se a incorporação das capitanias do Rio de Janeiro (1567), Paraíba (1585). Rio Grande (1598), Ceará (1611), Pernambuco (1640), Santos e São Vicente (1709), Rio Grande do São Pedro (1760) (Salgado, 1985, p. 415-433).

Essa tendência se acentuou no século XVIII, especialmente com a política de centralização empreendida por d. João V (1707-1750) e pelo marquês de Pombal(1750-1777), que levaria à extinção definitiva das capitanias. Segundo o vice-rei d. Fernando José de Portugal, no início do século XIX havia apenas um único donatário, Fernando Dias Paes Leme da Câmara, que recebeu, em 1786, a mercê de um senhorio de uma vila próxima ao rio Paraíba do Sul (COMENTÁRIO…, 1970, 354).

Tal fato, no entanto, não significou o fim da divisão da colônia em capitanias, que continuaram a serem geridas pelos capitães e governadores. Suas atribuições administrativas aumentaram, visto que os governadores passaram também nas Juntas de Justiças, que começaram a serem instaladas nas capitanias em 1758, e nasJuntas de Fazenda, criadas a partir de 1760 . Em relação à administração militar, especificamente à organização das Ordenanças, a provisão de 30 de abril de 1758, determinou que os governadores das capitanias passassem os regimentos para os capitães-mores, regulando os exercícios das companhias.

Com a chegada da família real ao Brasil, em 1808, toda a administração colonial sofreu reformulações, tanto no âmbito da Corte, como nos das capitanias e cidades. Em relação à esfera de atuação do capitão e governador, o decreto de 22 de junho de 1808 determinou que este continuasse a distribuir sesmarias, cuja confirmação caberia à Mesa do Desembargo instalada no Rio de Janeiro. No dia seguinte, a decisão n. 16, mandou que os capitães e governadores executassem as ordens expedidas pelo Intendente-geral da Polícia, outro cargo criado na colônia em decorrência da transferência da Corte, cujas atribuições estavam ligadas à manutenção da ordem pública.

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Em 24 de novembro de 1808 a decisão n. 54 mandou cessar a autoridade dos governadores das capitanias sobre as patentes militares, de Linha ou de Milícias, que passariam para a esfera de atuação do Conselho Supremo Militar e de Justiça. Assim, ficaram os governadores encarregados de enviar ao rei apenas as propostas dos postos vagos e as solicitações de concessão de licenças para fora da capitania e de demissões do real serviço ou passagem de uns Corpos para outros.

Em relação à autoridade militar, cabe ainda observar que em alguns atos dos governadores de determinadas capitanias aparecem como capitães-mores ou capitães-generais. De acordo com a bibliografia, a patente implicava a ampliação dos poderes militares, que, no entanto, não ficam esclarecidos pela leitura da legislação (Puntoni, 2004, p. 47).

Os capitães e governadores foram extintos em decorrência dos acontecimentos iniciados com a Revolução do Porto em 1820, quando, após a instituição das Cortes Gerais e Extraordinárias da Nação Portuguesa, uma série de medidas foi tomada no sentido de limitar a autonomia adquirida pela colônia a partir de 1808. Além do regresso do rei e a determinação de extinção de vários tribunais instalados no Brasil, as Cortes ordenaram que se constituíssem juntas provisórias de governo e governadores das armas, subordinados diretamente a Portugal com o fim de controlar o governo das capitanias, que, naquele momento passaram a ser chamadas de províncias. A primeira junta instituída no lugar do capitão e governador foi a de Pernambuco, em 1º de setembro de 1821. Um mês depois, o decreto de 1º de outubro determinou a constituição de juntas em todas as outras províncias.

 

Angélica Ricci Camargo

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BIBLIOTECA NACIONAL. Regimento que se mandou aos Capitães-mores das Capitanias deste Estado, de 1 de outubro de 1663. In: Documentos Históricos. Rio de Janeiro, 1928, v. 5, p. 374-380, 1928.

CARTA de Doação da capitania de Pernambuco a Duarte Coelho, de 10 de março de 1534. In: TAPAJÓS, Vicente. A Política Administrativa de D. João III. 2ª ed. Rio de Janeiro: DASP – Serviço de Documentação, p. 193-202, 1966. (História Administrativa do Brasil; 2)

CARVALHO, Filipe Nunes de. Do Descobrimento à União Ibérica. In: JOHNSON, Harold; SILVA, Maria Beatriz Nizza da (coord.). O Império Luso-Brasileiro (1500-1620). Lisboa: Editorial Estampa, p. 19-204, 1992 (Nova História da Expansão Portuguesa, v. 6).

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HESPANHA, António Manuel. As vésperas do Leviathan: instituições e poder político, Portugal (século XVII). Coimbra: Almedina, 1994.

INSTITUTO DOS ARQUIVOS NACIONAIS/TORRE DO TOMBO (Portugal). Doações e forais das capitanias do Brasil: 1534-1536. CHORÃO, Maria José Mexia Bigotte. Lisboa: Instituto dos Arquivos Nacionais/Torre do Tombo, 1999.

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PUNTONI, Pedro. A arte da guerra no Brasil: tecnologia e estratégia militares na expansão da fronteira da América portuguesa (1550-1700). In: CASTRO, Celso; IZECKSOHN, KRAAY, Hendrik. Nova história militar brasileira. Rio de Janeiro: Editora FGV, 2004, p. 43-66.

REGIMENTO de Tomé de Sousa, de 17 de dezembro de 1548. In: TAPAJÓS, Vicente. A Política Administrativa de D. João III. 2ª ed. Rio de Janeiro: DASP – Serviço de Documentação, p. 253-269, 1966. (História Administrativa do Brasil; 2)

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REGIMENTO de Gaspar de Souza, de 6 de outubro de 1612. In: MENDONÇA, Marcos Carneiro de. Raízes da Formação Administrativa do Brasil. Rio de Janeiro: Conselho Federal de Cultura, 1972, v. 1, p. 413 – 436.

REGIMENTO de Roque da Costa Barreto dos governadores-gerais, de 16 de janeiro de 1677. In: MENDONÇA, Marcos Carneiro de. Raízes da formação administrativa do Brasil. Rio de Janeiro: Conselho Federal de Cultura, 1972, v. 2, p. 745-846.

SALDANHA, Antônio Vasconcelos de. As capitanias: o regime senhorial na expansão ultramarina portuguesa. Funchal: Centro de Estudo de História do Atlântico, 1991.(Coleção Memórias, 6)

SALGADO, Graça (coord.). Fiscais e meirinhos: a administração no Brasil colonial. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1985.

SILVA, Maria Beatriz Nizza da. Ser nobre na Colônia. São Paulo: Editora UNESP, 2005.

TAPAJÓS, Vicente. A Política Administrativa de D. João III. 2ª ed. Rio de Janeiro: DASP – Serviço de Documentação, 1966. (História Administrativa do Brasil; 2)

 Documentos sobre o órgão podem ser encontrados nos seguintes fundos do Arquivo Nacional:BR AN,RIO 86 -Secretaria do Estado do BrasilBR AN,RIO 89 – Secretaria do Governo da Capitania do ParáBR AN,RIO 8B – Secretaria do Governo da Capitania do Rio Grande do NorteBR AN,RIO 8C – Secretaria do Governo da Capitania do Rio Grande do SulBR AN,RIO 8D – Secretaria do Governo da Nova Colônia de SacramentoBR AN,RIO 87 – Secretaria do Governo da Província de Mato GrossoBR AN,RIO 8E – Secretaria do Governo da Província de São PauloBR AN,RIO 88 – Secretaria do Governo da Província do CearáBR AN,RIO D9 – Vice-ReinadoBR AN,RIO NP – Diversos SDH – CódicesBR AN,RIO 2H – Diversos SDH – CaixasBR AN,RIO C1 – Tesouraria da Fazenda da Província do CearáBR AN,RIO 4A – Junta da Real Fazenda da Capitania do ParáBR AN,RIO 8K – Câmara de São LuísBR AN,RIO 53 – Ministério do ImpérioBR AN,RIO 7T – Provedoria da Fazenda Real de SantosBR AN,RIO EG – Junta da Fazenda da Província de São PauloBR AN,RIO 59 – Negócios de PortugalBR AN,RIO 4K – Mesa do Desembargo do PaçoBR AN,RIO 03 – Alfândega da BahiaBR AN,RIO BX – Tesouraria da Fazenda da Província da BahiaBR AN,RIO RD – Marquês do Lavradio

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BR AN,RIO 0O – Casa Real e Imperial – Mordomia-MorBR AN,RIO AA – Série Interior – Negócios de Províncias e Estados (IJJ9)

 

Referência da imagemOfício ao governador da capitania do Rio de Janeiro. ARQUIVO Nacional, 150 anos: visão histórica. Rio de Janeiro: Index, 1988. p.33

Capitão-mor

A criação do cargo de capitão-mor, concedido a Martim Afonso de Sousa, chefe da expedição enviada para a América em 1530, representou a primeira iniciativa da Coroa portuguesa de colonização efetiva do território descoberto em 1500.

Nos primeiros trinta anos após o descobrimento, a presença portuguesa na América foi marcada pelo envio de expedições de reconhecimento do litoral e de patrulha, destinadas a evitar investidas de estrangeiros no território recém-descoberto, especialmente dos franceses. Além disso, a Coroa promoveu o arrendamento das terras a um consórcio de comerciantes de Lisboa, pelo período de cinco anos, para desenvolver o comércio dos produtos encontrados, principalmente o pau-brasil, e estabeleceu feitorias, para guardar os gêneros de resgate e facilitar os carregamentos.

Com o passar do tempo, diante da precária situação das feitorias e da continuidade dos ataques piratas, o rei d. João III e seus conselheiros chegaram à conclusão de que deveria se iniciar a colonização permanente, prática anteriormente adotada pelos portugueses em outros territórios. Assim, foi enviada a expedição liderada por Martim Afonso, um fidalgo de alta linhagem.

Composta por cinco navios e transportando cerca de 400 colonos, sua frota partiu de Lisboa em março de 1530, tendo como finalidades patrulhar a costa, estabelecer uma colônia efetiva por meio de concessões de terras, e explorar a foz dos rios Amazonas e Prata, para determinar sua proximidade com a linha de Tordesilhas. Também ficava encarregada de levar para o Brasil ferramentas, sementes, mudas de plantas e animais domésticos que deveriam ser empregados nos estabelecimentos das primeiras vilas, expressando uma preocupação que envolvia, além do povoamento, a organização de uma produção voltada ao mercado e de uma base administrativa para garantir o empreendimento (VARNHAGEN, 1962, p. 122; JOHNSON, 1998, p.253).

A carta de grandes poderes ao capitão-mor Martim Afonso de Sousa, a quem ficasse em seu lugar, de 20 de novembro de 1530, mandava que todas pessoas da frota e as moradoras da terra obedecessem a Martim Afonso, cumprindo e guardando todas as suas ordens como se fossem dadas pelo próprio rei. Além disso, dotava-o de todo poder e alçada, no crime e no cível, incluindo pena de morte natural, sem dar apelação nem agravo, exceto para o caso de fidalgos, cujos autos deveriam ser enviados para o rei. Dava ainda poder para demarcar todas as terras conquistadas, e tomar posse delas em nome do rei, bem como determinava que provesse governador para ocupar o cargo de capitão-mor e governador nas terras encontradas.

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Outros documentos da mesma data completaram suas atribuições. Na carta de poderes para capitão-mor criar tabeliães e mais oficiais de Justiça, o rei concedia-lhe o poder de criar e investir alguns oficiais, tabeliães e outros funcionários que se fizessem necessários. Já a carta para o capitão-mor dar terras e sesmarias, dispunha que Martim Afonso poderia dar terras às pessoas interessadas em povoar o novo território, mas essa doação não teria caráter hereditário.

A expedição, que durou três anos, foi responsável por percorrer o litoral de onde atualmente se localiza Pernambuco até o Uruguai, e explorar a costa nordestina. Essas viagens possibilitaram a aquisição de conhecimentos sobre a costa e a informação sobre ouro e prata existentes no interior. Além disso, Martim Afonso fundou a vila de São Vicente, a primeira na colônia portuguesa edificada na América, que, posteriormente, se tornaria uma das capitanias prósperas com o cultivo de cana-de-açúcar (NEVES, 2007, p. 44-48).

Depois do curto período de serviços prestados na América, Martim Afonso regressou para Portugal e foi recompensado com o cargo de capitão-mor da Índia. Sua experiência contribuiu para a decisão do rei d. João III de dividir o território em capitanias e distribuí-las para capitães e governadores, que ficariam encarregados de empreender de maneira mais eficaz a tarefa da colonização. Na ocasião, Martim Afonso foi contemplado com a capitania de São Vicente e do Rio de Janeiro.

Angélica Ricci Camargo

Bibliografia:JOHNSON, H. B. A colonização portuguesa no Brasil, 1500-1580. In: BETHELL, Leslie (org.). América Latina Colonial, 2. ed, v.1. Trad. Maria Clara Cescato. São Paulo: Editora da Universidade de São Paulo; Brasília-DF: Fundação Alexandre de Gusmão, 1998, p. 241-281.

NEVES, Cylaine Maria das. A vila de São Paulo de Piratininga. São Paulo: Annablume, FAPESP, 2007.

SALGADO, Graça (coord.). Fiscais e meirinhos: a administração no Brasil colonial. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1985.

VARNHAGEN, Francisco Adolfo. História Geral do Brasil. Antes da sua separação e independência de Portugal, tomo I. 7 ed. São Paulo: Melhoramentos, 1962

SILVA, Maria Beatriz Nizza da. Sociedade, Instituições e Cultura. In: JOHNSON, Harold; SILVA, Maria Beatriz Nizza da (coord.). O Império Luso-Brasileiro (1500-1620). Lisboa: Editorial Estampa, 1992 (Nova História da Expansão Portuguesa, v. 6), p. 303-551.

Referência da imagemDetalhe de “Rosa dos ventos”. PIMENTEL, Manoel. Arte de navegar: em que se ensinam as regras práticas, e os modos de cartear e de graduar a Balestilha por via de números, e muitos problemas úteis a navegação, e roteiro das viagens, e costas marítimas de Guiné,Lisboa: Officina de Miguel Manescal da Costa, Impressor do Santo Officio, 1762, p. 11. Arquivo Nacional. OR 1966.

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Governadores/Comandantes das Armas

Os cargos de governadores, ou comandantes, das Armas foram instituídos nas províncias da colônia a partir de 1821, com a incumbência de administrar e organizar as forças militares. Sua criação é fruto das transformações feitas pelas Cortes Gerais e Extraordinárias da Nação Portuguesa, instaladas em Portugal após o movimento liberal iniciado em agosto de 1820 na cidade do Porto, visando recuperar a posição portuguesa no cenário europeu e reconquistar a hegemonia política do Reino no império luso-brasileiro. Uma das principais medidas tomadas pelas Cortes foi a alteração das formas de governo das capitanias, com a criação das juntas provisórias e dos governadores/comandantes das armas subordinados diretamente a Portugal.

A primeira referência ao cargo encontrada na legislação é o decreto de 1º de setembro de 1821, que reorganizou administrativamente a província de Pernambuco, criou o cargo de governador das Armas e mandou instalar uma Junta Provisória do Governo, que tinha como competência toda a autoridade e jurisdição no âmbito civil, econômico, administrativo e de polícia.

Em outubro do mesmo ano, o decreto do dia 1º, expedido pelas Cortes, ordenou a criação destas juntas de governo em todas as províncias onde elas ainda não existissem e ordenou também que o comando militar nestas localidades passasse a ser exercido pelo governador das armas, que seria um militar com a patente de general. No caso das províncias administradas apenas por governadores sem a patente de capitão ou capitão-general, seria nomeado um comandante das Armas, escolhido entre militares com patente até o grau de coronel.

A instituição desses novos cargos promoveu a separação das atribuições administrativas e militares, que antes estavam compreendidas entre as competências dos capitães e governadores das províncias, que muitas vezes eram a mesma pessoa. De acordo com o citado decreto de 1º de outubro, os governadores e comandantes de armas se constituiriam como uma instância independente das juntas provisórias de governo e suas atribuições seriam reguladas pelo regimento de 1º de junho de 1678 e por outros atos posteriores. Segundo este regimento, cabia aos governadores e comandantes o julgamento dos crimes cometidos por militares, o envio de informações sobre o estado das fortificações, trens e apetrechos de guerra para o rei, entre outras atribuições.

Após a independência do país em 1822, a Constituição outorgada em 1824 manteve a divisão do território brasileiro em províncias, possuindo cada uma delas uma estrutura administrativa envolvendo um presidente, indicado pelo imperador, e um Conselho Geral, com representantes locais eleitos indiretamente. Neste sentido, a provisão do Conselho Supremo Militar de 11 de maio de 1829 esclareceu os limites da atuação dos presidentes das províncias e dos governadores ou comandantes das armas em relação à administração militar, definindo que os presidentes eram responsáveis pela inspeção das fortalezas e fortificações, por assistir os exercícios das tropas, aprovar ou desaprovar as nomeações feitas pelos comandantes das Armas para os empregos de comandantes de fortalezas e outros postos militares. Aos governadores ou comandantes cabia regular, dirigir e inspecionar a economia, disciplina e instrução de toda a tropa, bem como a instrução das tropas de primeira e segunda linha, além de nomear,

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dependendo da aprovação do presidente, os comandantes das fortalezas e outros postos militares, remeter aos presidentes todos os requerimentos e representações de militares, propostas e ofícios, e cuidar do provisionamento da tropa em todos os objetos que lhes são relativos.

Em 1830, o decreto de 28 de junho unificou a denominação dos cargos, determinando que os governadores das Armas existentes também passassem a ser chamados de comandantes.

Em 1831, o decreto de 5 dezembro mandou suprimir os comandos das Armas das províncias de São Paulo, Goiás, Minas Gerais, Espírito Santo, Sergipe, Alagoas, Paraíba, Rio Grande do Norte, Ceará e Piauí, mas os cargos de outras províncias vigoraram até o final do Império, recebendo uma grande regulamentação pelo decreto n. 293, de 8 de maio de 1843.

Sua extinção se deu pelo decreto n. 431 de 2 de julho de 1891, já após a Proclamação da República, quando o território brasileiro foi dividido militarmente em sete distritos, cada um deles com um comando próprio.

Angélica Ricci Camargo

 

BibliografiaCOSTA, Emília Viotti da. Da monarquia à República: momentos decisivos. 3ª ed. São Paulo: Editora Brasiliense, 1985.

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SLEMIAN, Andréa. “Delegados do chefe da nação”: a função dos presidentes de província na formação do Império do Brasil (1823-1834). Almanack brasiliense, São Paulo, n. 6, nov. 2007, p. 20-38.

SOUZA, Iara Lis Franco S. Carvalho. A Pátria Coroada: o Brasil como corpo político autônomo (1780-1831). Tese (Doutorado em História) – Instituto de Filosofia e Ciências Humanas, Universidade Estadual de Campinas, Campinas – SP, 1997.

 

Documentos sobre o órgão podem ser encontrados nos seguintes fundos do Arquivo Nacional:BR AN,RIO EG – Junta da Fazenda da Província de São Paulo

Referência da imagemCarta da Costa Leste do Brasil, Rio Grande do Norte e Paraíba, entre o Rio Piquitinga e o Rio Mogoam Guape.Livro que da razão do estado do Brasil. Rio de Janeiro: Instituto Nacional do Livro, 1968. 85p.:il.;38cm Arquivo Nacional. ACG02522

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Companhia de Ordenanças

As Companhias de Ordenanças foram criadas pelo regimento de 10 de dezembro de 1570 e constituíam-se como forças militares do Reino e colônias portuguesas, compostas por moradores locais e encarregadas da manutenção da ordem interna (SALGADO, 1985, p. 97).

Logo após a descoberta das terras do continente americano, em 1500, a Coroa portuguesa empreendeu algumas iniciativas de caráter militar, como a construção de feitorias e a promoção de diversas expedições, destinadas a garantir a defesa do território contra investidas de estrangeiros. Com a distribuição de terras na forma de capitanias hereditárias a partir de 1534, outras medidas visando à defesa da colônia foram implementadas. Nesse sentido, o foral de Duarte Coelho determinou que o donatário possuísse o título de capitão e tivesse o comando das armas de sua jurisdição, ficando também incumbido de convocar os moradores para servir no tempo de guerra (FORAL…, 1966, p. 202-208).

Com a instalação de uma estrutura administrativa mais complexa, a partir da criação dos cargos do governador-geral, ouvidor-geral e provedor-mor, a questão da defesa assumiu um destaque maior. Tomé de Sousa, primeiro governador-geral nomeado em 1548, recebeu o título de capitão-mor da armada que trouxe os oficiais régios para a colônia, e uma de suas primeiras tarefas foi a de construir, em Salvador, uma fortaleza. Na sua expedição trouxe também cerca de quatrocentos soldados regulares para assegurar o exercício de sua autoridade. (SODRÉ, 1965, p. 19).

Em relação à administração militar, no regimento de Tomé de Sousa havia, entre outros pontos, as disposições de proibir que se dessem armas para os índios e a de obrigar que capitães e governadores, senhores de engenho e outros moradores tivessem as armas necessárias para a defesa da terra – cuja inspeção ficaria a cargo do provedor-mor (REGIMENTO…, 1966, p. 253-269). Segundo parte da bibliografia consultada, ainda nesse período inicial foi criado o cargo de capitão-mor da costa, destinado a guardar a costa colonial, para o qual, no entanto, não foi dado um regimento específico (SALGADO, 1985, p. 99).

A partir da segunda metade do século XVI a necessidade de reorganização militar da colônia e do próprio Reino provocou um aumento das atividades relacionadas à proteção do tráfego comercial português e de seus domínios ultramarinos. Nesse sentido, d. Sebastião promulgou a Lei das Armas, definindo as obrigações militares e prescrevendo as armas obrigatórias a todos os vassalos entre 20 e 60 anos na direta proporção dos bens e rendimentos que possuíssem (MELLO, 2002, p. 19-21).

Um ano após o estabelecimento da Lei de Armas, foi promulgado o Regimento dos Capitães-mores, e mais Capitães, e Oficiais das Companhias da gente de Cavalo, e de pé; e da ordem que terão em se exercitarem, com o fim de regular com maior eficiência a estrutura militar de Portugal e suas colônias. Este regimento criou as Companhias de Ordenanças, forças militares convocadas em caso de necessidade, formadas por todos os homens entre 18 e 60 anos de idade, exceto os eclesiásticos e fidalgos.

Junto com as Milícias, as Ordenanças formavam as tropas de segunda linha, ambas não-remuneradas, e prestavam o serviço de apoio às tropas de primeira linha. As Milícias eram compostas por filhos de viúvas

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e lavradores, além de homens casados em idade militar. As Ordenanças, por sua vez, eram formadas por todo o restante de homens válidos. Os soldados recrutados para as tropas de primeira linha, por sua vez, eram geralmente, os filhos segundos das famílias, excetuando-se os de viúvas e lavradores (MELLO, 2002, p. 38).

De acordo com o regimento de 1570, as Companhias de Ordenanças seriam formadas, nas cidades, vilas e concelhos, por 250 homens, divididos em dez esquadras. As companhias deveriam ser comandadas por capitães, e contariam também com alferes, sargento, meirinho, escrivão, tambor, recebedor, e dez cabos, sob os quais ficava a responsabilidade por cada esquadra. As companhias existentes em cada cidade ficavam subordinadas ao capitão-mor, que tinha como competência arregimentar toda a população no serviço militar, além de visitar e determinar a formação de companhias, tarefas para quais contaria com o auxílio do sargento-mor.

O cargo de capitão-mor seria naturalmente ocupado por algum senhor do lugar ou pelo alcaide-mor. Na ausência destes, se realizaria uma eleição na câmara com a presença do corregedor (ouvidor) ou do provedor da comarca. Para os postos de sargento-mor, capitães de companhia, alferes, sargento e de outros oficiais se realizariam, igualmente, eleições nas câmaras. Todos os oficiais eleitos deveriam prestar seus juramentos, nos quais se comprometiam a defender os lugares, favorecer a justiça e ajudar em todos os casos em que fossem solicitados. Além disso, esses receberiam o privilégio de cavaleiro, que foi a forma encontrada pela Coroa para a retribuição dos serviços sem dispêndio da Fazenda Real (PORTUGAL, 1789a, p. 183-184).

A realização das eleições nas câmaras estabelecia um vínculo estreito entre estas e as Ordenanças, que acabaram por assumir o caráter de braço auxiliar na execução da política administrativa metropolitana. Ao mesmo tempo, estas fortaleciam o poder dos senhores de terras locais, que passavam, desse modo, a dispor de uma força armada para impor sua própria ordem e resguardar seus interesses (SALGADO, 1985, p. 110-111).

As cidades, vilas, e concelhos onde havia portos mereceriam disposições especiais. Além das Companhias de Ordenanças, nestas existiriam vigias para guardar os portos durante o dia e a noite, e sobre-roldas, eleitos pelo capitão-mor, com a finalidade de fiscalizar os trabalhos desses vigias. O regimento também previa a organização de companhias para os casos excepcionais, quando faltassem os 250 homens destinados à formação destas, e, ainda, determinava quais oficiais ficavam encarregados de substituir os postos mais importantes, quando estes estivessem ausentes ou impedidos.

Definidas atribuições particulares de cada oficial em relação à organização das companhias, ficavam os soldados, de maneira geral, incumbidos de zelar por suas armas, de comparecer aos exercícios realizados a cada oito dias e aos dois alardos anuais para os quais seriam convocados. Além disso, eram obrigados a se reunirem com suas armas e atuarem para a defesa do lugar, quando fosse necessário.

Em caso de não comparecimento aos exercícios e alardos, os moradores seriam punidos com penas pecuniárias e, a partir da terceira reincidência, presos, podendo até mesmo ser degredados. As apelações e agravos deveriam ser encaminhados para o capitão-mor. As despesas com pólvora e chumbo utilizadas nos exercícios seriam pagas com as rendas dos concelhos, e, onde não houvesse o dinheiro suficiente, o rei ordenaria a imposição de impostos sobre os vinhos e carnes.

A provisão de 10 de maio de 1574 determinou algumas mudanças na organização das Ordenanças, com a justificativa de que as medidas implantadas anteriormente causavam a “opressão do povo”. Dentre elas, estiveram a extinção do posto de capitão-mor na vila, cidade ou concelho onde só houvesse uma companhia e a redução do número de alardos anuais de dois para um, além de medidas que visavam ao favorecimento da obtenção de armas (PORTUGAL, 1879b, p. 195).

Em 1598, o cargo de sargento-mor da comarca, mencionado na provisão de 1574, foi regulamentado pelo regimento de 28 de novembro. Cabia-lhe a autoridade sobre os capitães-mores e as companhias de Ordenanças existentes nas comarcas. Também ficava incumbido de assistir aos exercícios e de fazer um livro de registro de todas as companhias.

O regimento do governador-geral Gaspar de Sousa, dado no período da dominação espanhola, em 1612, foi o primeiro a fazer referência à organização das Ordenanças no Estado do Brasil, encomendando a repartição dos moradores da Bahia e das outras capitanias em Companhias e garantindo que todos os moradores tivessem armas e se exercitassem aos domingos e dias santos, conforme ao Regimento de 1570.

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As guerras da restauração do trono do português, visando libertar o país do domínio espanhol que se estabeleceu entre 1580 e 1640, criaram urgentes necessidades de modernização e reorganização militar. Uma das primeiras medidas foi o estabelecimento do Conselho de Guerra, em 1640, com o fim de tratar de questões referentes à organização de tropas e armadas, nomeação de oficiais de patente, atuando, ainda, como um tribunal superior nas causas militares (SALGADO, 1985, p. 43). No caso do Estado do Brasil e demais domínios portugueses, os assuntos relacionados à defesa ficaram a cargo do Conselho Ultramarino, instituído em 1642, que centralizava todos os assuntos referentes às colônias, com exceção dos eclesiásticos e das rendas régias.

Outra medida visando à reorganização militar foi a promulgação, em 1645, do Regimento de Fronteiras, destinado às tropas regulares, que também seria adotado no Brasil, segundo informa o regimento do governador-geral Roque da Costa Barreto, de 1677. Este regimento também expressou a mesma tendência, observadas nos regimentos anteriores dos governadores-gerais, em reforçar as atribuições relacionadas à defesa, à organização e ao pagamento de tropas militares.

Novas mudanças na organização das Ordenanças foram introduzidas durante todo o século XVIII. Em 1709, o alvará de 18 de outubro, tendo como objetivo impedir as crescentes irregularidades praticadas nas câmaras no processo de eleição dos postos, efetuou transformações com a finalidade de promover uma maior interferência da Coroa na escolha dos ocupantes dos cargos (MELLO, 2002, p. 69). Assim, para ocupar o cargo do capitão-mor seriam escolhidas, pelos oficiais da câmara junto com o ouvidor ou provedor da comarca, três pessoas “da melhor nobreza, cristandade e desinteresse”, cujos nomes seriam enviados para o general ou cabo que comandasse as Armas na capitania, e propostos ao rei através do Conselho de Guerra. Para a escolha dos postos de sargento-mor e capitão de companhia seriam seguidos os mesmos procedimentos, mas a eleição contaria com a participação do capitão-mor, donatário ou do alcaide-mor, e, na falta destes, com o sargento-mor da comarca (PORTUGAL, 1789d, p. 203). Este alvará também se referia aos ajudantes de Ordenanças, que antes eram providos através de eleição, e que passavam, a partir daquele momento, a serem nomeados pelo capitão-mor.

Em 1739, com a provisão de 21 de abril, a primeira direcionada particularmente ao Estado do Brasil e ao Estado do Maranhão, algumas determinações do alvará de 1709 foram reforçadas e novas mudanças autorizadas, dentre elas a de que cada companhia fosse composta por um capitão, um alferes, um sargento do número, outro do supra, e os cabos de esquadra necessários, devendo ser extintos os demais cargos (PORTUGAL, 1785a, p. 528-529).

Em 1749, a ordem de 12 de dezembro reiterou uma determinação, promulgada anteriormente, de que os capitães-mores das Ordenanças fossem vitalícios, e não mais escolhidos a cada três anos. Além disso, mandava que a escolha dos nomes propostos pelas câmaras para ocupar os postos ficasse por conta dos governadores do Brasil, que também lhes passariam as patentes (PORTUGAL, 1785b, p. 537-538).

Com a transformação do procedimento de escolha dos postos, verificou-se uma restrição gradual do poder de ingerência das câmaras nas Ordenanças, processo que atingiu seu ápice no reinado de d. José I (1750-1777). Nesse sentido, a provisão de 30 de abril de 1758 transcreveu o regimento das Ordenanças e as provisões concedidas nos séculos seguintes, com a finalidade de reunir a legislação para que esta fosse interpretada e aplicada no Brasil de forma correta (MELLO, 2002, p. 68; SALGADO, 1985, p. 108). A provisão também determinou algumas mudanças, como a do juramento obrigatório que passava a ser prestado ao governador-geral e a patente confirmada pelo rei. Modificava ainda a forma de adestramento militar, deixando de existir os exercícios semanais e o alardo anual, ficando o governador de capitania encarregado de baixar as normas a esse respeito, a fim de que os exercícios fossem feitos no lugar e tempo mais conveniente. A provisão também definiu que as atribuições dos extintos cargos de meirinhos e escrivães passariam aos sargentos das companhias, e mudou o procedimento judicial, determinando que as apelações e agravos fossem interpostas não mais pelos ouvidores do Estado do Brasil, mas pelo governador da capitania, o qual, com o auditor-geral e o cabo de maior patente sentenciariam em junta as apelações e agravos (PORTUGAL, 1785b, p. 538-539).

As disposições efetivadas por d. José tinham dois objetivos. O primeiro era o de ordenar a maior participação de habitantes da América portuguesa na defesa colonial, em decorrência das tensões entre as Cortes de Madri e Lisboa, provenientes das dificuldades na demarcação dos limites estabelecidos pelo Tratado de 1750. O segundo era reforçar a presença régia no processo seletivo para postos de oficiais, corrigindo os excessos e desvios (MELLO, 2002, p. 76).

Seguindo esta mesma tendência, a carta régia de 22 de março de 1766, dirigida especialmente para o Brasil, ordenou que os governadores mandassem alistar todos os moradores das suas respectivas jurisdições, incluindo “nobres, plebeus, brancos, mestiços, pretos ingênuos e libertos…” para servirem nos terços de Auxiliares e Ordenanças, de cavalaria ou de infantaria, para os quais seriam nomeados oficiais

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competentes, dentre eles um sargento-mor escolhido entre os oficiais das tropas pagas (idem, p.144; SALGADO, 1985, p. 109).

Com a chegada da família real em 1808, a estrutura da administração militar passou por uma remodelação que incluiu a instalação da Secretaria de Estado dos Negócios Estrangeiros e da Guerra, da Academia Real Militar, fábricas de ferro e pólvora, além de reformas nas oficinas e arsenais existentes desde o século XVIII. Neste contexto, também foi instituído o Conselho Supremo Militar e de Justiça, um tribunal composto por dois conselhos relativamente independentes, o Militar e o de Justiça, ao qual competiam todas as matérias militares que, em Lisboa, se expediam pelos Conselhos de Guerra, do Almirantado e do Ultramar.

Em relação às tropas, foram mantidas as três linhas: do Exército, Milícias e Ordenanças. No entanto, houve um nítido predomínio do exército profissional sobre as demais, devido às ações militares empreendidas na Guiana, Montevidéu e a repressão da revolta ocorrida em Pernambuco em 1817 (WEHLING; WEHLING, 2008, p. 13).

No caso da organização dos corpos de Ordenanças, algumas questões relativas às nomeações dos postos foram esclarecidas por meio de várias decisões ao longo do período joanino. A decisão n. 54, de 24 de novembro de 1808, mandou cessar a autoridade dos governadores das capitanias sobre patentes e outros atos do serviço militar. Entretanto, a decisão n. 5 do ano seguinte determinou que, com exceção da Corte e capitania do Rio de Janeiro, os governadores continuariam a passar as nomeações e patentes dos oficiais.

No período joanino também foram criadas novas companhias: no distrito de Cantagalo, em 1811, na Vila de Magé, em 1813, na freguesia de Nossa Senhora da Glória, na Corte, em 1817, no distrito de Macaé, em 1818, na vila de Valença, na Bahia, em 1821, entre outras.

A partir de 1822, com a Independência, novas questões relacionadas ao provimento de postos foram temas da legislação, como exemplifica a decisão n. 8, de 15 de janeiro de 1823, que dispôs que as patentes dos oficiais de Milícias e de Ordenanças fossem lavradas em nome do Governo Provisório das Províncias, determinação que foi confirmada pela decisão n. 126 do mesmo ano. Posteriormente, a Constituição de 1824 previu a elaboração de uma regulamentação específica sobre o assunto e determinou ainda que todos os brasileiros fossem obrigados a pegar em armas para sustentar a independência e a integridade do Império.

Uma nova mudança na organização das Ordenanças ocorreu em 1830, com a decisão n. 9, que determinou quecâmaras perdessem a atribuição de propor os nomes para os postos das Ordenanças, limitando, desse modo, o poder de ingerência dos municípios na administração militar.

Em 1831, a lei de 18 de agosto extinguiu os corpos de Milícias, Guardas Municipais e Ordenanças, criando, em seu lugar as Guardas Nacionais.

 

Angélica Ricci Camargo

BibiligrafiaFORAL de Duarte Coelho, de 24 de setembro. In: TAPAJÓS, Vicente. A Política Administrativa de D. João III. 2ª ed. Rio de Janeiro: DASP – Serviço de Documentação, p. 202-208, 1966. (História Administrativa do Brasil; 2)

LEONZO, Nanci. As instituições. In: SILVA, Maria Beatriz Nizza da. (coord.). O Império Luso-Brasileiro, 1750-1822. Lisboa: Estampa, 1986. (Nova História da Expansão Portuguesa, v. 8), p. 301-331.

MELLO, Christiane Figueiredo Pagano de. Os corpos de auxiliares e de ordenanças na segunda metade do século XVII: as capitanias do Rio de Janeiro, São Paulo, Minas Gerais e a manutenção do Império português no centro-sul da América. 2002. Tese (Doutorado em História). Niterói-RJ. Universidade Federal Fluminense, 2002.

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PORTUGAL. Regimento dos capitães-mores, e mais capitães, e oficiais das companhias da gente do cavalo, e de pé; e da ordem que terão em se exercitarem de 10 de dezembro de 1570. Sistema, ou Coleção dos Regimentos Reais compilado por José Roberto de Campos Coelho e Sousa, Tomo V. Lisboa, p. 183-194, 1789. Disponível em: http:// www.iuslusitaniae.fcsh.unl.pt. .Acesso em: 4 de agosto de 2008.

_________. Provisão de 15 de maio de 1574. Sobre as Ordenanças, com algumas declarações, que não estavam nos regimentos. Sistema, ou Coleção dos Regimentos Reais compilado por José Roberto Monteiro de Campos Coelho e Sousa, Tomo V. Lisboa, p. 195-202, 1789. Disponível em: http:// www.iuslusitaniae.fcsh.unl.pt . Acesso em: 4 de agosto de 2008.

_________. Regimento dos sargentos-mores das comarcas de 28 de novembro de 1598. Sistema, ou Coleção dos Regimentos Reais, compilados por José Roberto Monteiro de Campos Coelho e Sousa, Tomo V. Lisboa, p. 217-219, 1789. Disponível em: http:// www.iuslusitaniae.fcsh.unl.pt .Acesso em: 4 de agosto de 2008.

_________. Lei de 18 de outubro de 1709. Em que se declara a forma em como daqui por diante se hão-de-fazer as eleições para capitães-mores e dos mais oficiais da Ordenança. Sistema, ou Coleção de Regimentos Reais compilados por José Roberto Monteiro de Campos Coelho e Sousa, Tomo V, Lisboa, p. 202-205, 1789. Disponível em: http:// www.iuslusitaniae.fcsh.unl.pt . Acesso em: 4 de agosto de 2008.

_________. Regimento das Ordenanças do Brasil de 21 de abril de 1739. Sistema, ou Coleção dos Regimentos Reais, compilados por José Roberto de Campos Coelho e Sousa, Tomo IV, Lisboa, p. 516-527, 1785. Disponível em: http:// www.iuslusitaniae.fcsh.unl.pt. Acesso em: 4 de agosto de 2008.

_________. Provisão sobre o mesmo regimento passado pelo Conselho Ultramarino em 30 de abril de 1758. Sistema, ou Coleção dos Regimentos Reais compilados por José Roberto Monteiro de Campos Coelho e Sousa, Tomo IV. Lisboa, p. 537-539, 1785. Disponível em: http:// www.iuslusitaniae.fcsh.unl.pt. Acesso em: 4 de agosto de 2008.

SALGADO, Graça (coord.). Fiscais e meirinhos: a administração no Brasil colonial. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1985.

SODRE, Nelson Werneck. História militar do Brasil. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1965.

WEHILING, Arno; WEHLING, Maria José. Exército, milícias e ordenanças na Corte Joanina: permanências e modificações. DaCultura. Ano VIII, n. 14, jun. 2008, p. 26-32. Disponível em: http://www.funceb.org.br/images/revista/5_2q0t.pdf Acesso: 15 janeiro 2010.

 

Referência da imagemArte Militar, Evoluções. Encyclopedie, ou, Dictionnaire raisonne des sciences, des arts et metiers, par une Societe de Gens de lettres. Paris: Briasson, 1751-1780, v.1, pr. XIV. Arquivo Nacional OR1896

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Capitão e Governador de Capitania

O cargo de capitão e governador foi instituído para a administração das capitanias hereditárias a partir do processo da divisão e distribuição de extensas faixas de terra da colônia. A doação mais antiga conhecida se refere à capitania de Pernambuco, dada a Duarte Coelho em 10 de março de 1534, considerada portanto como data de criação do cargo.

Logo depois da descoberta das terras no continente americano em 1500, os portugueses iniciaram o envio de várias expedições para o reconhecimento e patrulha do litoral, com o objetivo principal de evitar as investidas de estrangeiros, sobretudo dos franceses. Em 1501, a Coroa promoveu o arrendamento do território a um consórcio de comerciantes de Lisboa para desenvolver o comércio dos produtos encontrados, principalmente o pau-brasil, e iniciou o estabelecimento de feitorias para guardar os gêneros de resgate e facilitar seus carregamentos para Portugal.

A continuidade dos ataques estrangeiros e o fracasso das feitorias fizeram com que os portugueses iniciassem a colonização efetiva da terra, seguindo o exemplo já empreendido nas ilhas do Atlântico, realizado quase sem ônus para a Coroa. Assim, foi enviada a expedição liderada por Martim Afonso, que partiu de Lisboa em março de 1530, tendo como finalidades fiscalizar a costa, estabelecer uma colônia por meio de concessões de terras e explorar a foz dos rios Amazonas e Prata para determinar sua proximidade com a linha de Tordesilhas (Johnson, 1998, p. 253).

A carta de grandes poderes ao capitão-mor Martim Afonso de Sousa, e a quem ficasse em seu lugar, de 20 de novembro de 1530, dotava-o de diversas prerrogativas, que incluíam jurisdição criminal e cível. Também determinava, como suas atribuições, a demarcação de todas as terras conquistadas, as quais devia tomar posse em nome do rei, e a incumbência de ocupar o cargo de capitão-mor e governador nas novas terras.

O sucesso da expedição de Martim Afonso, contudo, mostrou-se insuficiente para pôr fim às ameaças das outras nações contra os interesses portugueses. Essa situação motivou o rei d. João III a repartir e distribuir o território a algumas pessoas, entre os anos de 1534 e 1536. Foram criadas assim as chamadas capitanias, que foram doadas às diferentes donatários. Apesar de não existir um consenso entre a historiografia, as primeiras capitanias criadas teriam sido a de Pernambuco, São Tomé, Bahia, Porto Seguro, Espírito Santo, Rio de Janeiro e São Vicente, Itamaracá, Santo Amaro, Santana, Pará, Ilhéus, Piauí, Ceará e Rio Grande (Instituto dos Arquivos Nacionais / Torre do Tombo, 1999; Wehling, 1994, p. 68-69).

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Os donatários eram, em quase sua totalidade, fidalgos da Casa Real. Alguns deles tinham se distinguido no desempenho de funções militares e navegações, como Duarte Coelho, Francisco Pereira Coutinho, Vasco Fernandes Coutinho, Antônio Cardoso de Barros, Martim Afonso de Sousa e Pero Lopes de Sousa, enquanto outros eram ligados à Coroa por terem ocupado importantes cargos na burocracia estatal, como João de Barros e Jorge de Figueiredo Correia. A doação das capitanias se constituiu, dessa maneira, como uma forma de o monarca recompensar aqueles que o tinham bem servido (Abreu, 2000, p. 66; Carvalho, 1992, p.116-121; Silva, 2005, p. 43).

A instituição das capitanias também se manteve nas duas outras repartições que vigoraram, durante o período colonial, separadamente do Estado do Brasil, a “Repartição do Sul”, que abrangia as capitanias de São Vicente, Espírito Santo e Rio de Janeiro, e durou de 1608 a 1612, e o Estado do Maranhão, que permaneceu separado de 1621 a 1774.

A carta de doação da capitania era o documento pelo qual o rei fazia a concessão da terra aos capitães, que gozariam do título de governadores de sua donataria, enquanto o foral fixava os direitos, foros e tributos que cabiam ao rei e a parte relativa ao capitão (Tapajós, 1966, p. 47). A carta de doação da capitania de Pernambuco a Duarte Coelho continha não somente suas atribuições relativas à administração da terra, mas incluía seus direitos e privilégios. Seu conteúdo se assemelhava ao das doações praticadas desde longa data em Portugal, mas era marcado por uma maior flexibilidade, justificada pelo caráter de exceção das faculdades concedidas aos governadores e capitães em razão da distância de Portugal e da extensão do território (Saldanha, 1991, p. 73).

A justificativa para a repartição das terras presente no documento radicava-se na necessidade de povoar e propagar a fé católica. O fato de ser uma doação de juro e herdade significava que seus sucessores herdariam os territórios, cuja concessão deveria ser confirmada por meio de uma nova doação (Hespanha, 1994, p. 411). Dentre as atribuições do capitão e governador estava a de escolher uma pessoa para servir como ouvidor, com quem praticaria suas funções judiciais. Possuía jurisdição no cível e no crime, e podia conhecer, junto com oouvidor, as ações novas a dez léguas de onde estivesse e as apelações e agravos de todos juízes e oficiais – área maior do que aquela geralmente fixada nas doações em Portugal, cujo limite era de cinco léguas.

Nos casos crimes, o governador e ouvidor tinham jurisdição e alçada de morte natural em escravos, índios, peões, cristãos, homens livres, sem apelação e agravo. Em relação às pessoas de “maior qualidade” ou de origem fidalga, tinham alçada de dez anos de degredo e até cem cruzados de pena, sem apelação e agravo. Porém, em casos de heresia, traição, sodomia e moeda falsa, sua alçada alcançava a todas as pessoas, de qualquer qualidade, para a condenação à morte, sem apelação nem agravo (Carta…, 1966, p. 193-202).

Cabia ainda ao capitão e governador a “dada das justiças”, ou seja, o provimento dos cargos que não eram eleitos para atuarem nas câmaras, e de outro ouvidor, caso fosse necessário. Além disso, devia presenciar a eleição de juízes e oficiais das câmaras; limpar e apurar as pautas e passar cartas de confirmação aos juízes e oficiais; e entregar as alcaidarias-mores. O capitão ficava encarregado também de criar vilas e povoações, que teriam termo, jurisdição, liberdades e insígnias segundo foro e costume do Reino (Carta…, 1966, p. 193-202).

A extensão de seus poderes pode também ser medida a partir da isenção da correição, ou seja, a proibição da entrada de corregedor na capitania, o que tornava seu governo imune à fiscalização da Coroa. Todavia, a carta de doação proibia o capitão e governador de promover mudanças nos itens dispostos, sob pena de perder a governança e a capitania; e também dispunha que o ocupante do cargo podia ser suspenso ou sentenciado, mas não sem antes ser ouvido pelo rei (Carta…, 1966, p. 193-202).

Em relação a seus privilégios, a carta determinava que o capitão devia possuir todas as moendas de água, marinhas de sal e outros engenhos, e dar licença para quem quisesse construí-los, cobrando os tributos ou foros acertados. Podia ainda tomar a posse de terras em qualquer parte que quisesse e, não tomando, estas deviam ser repartidas em quatro ou cinco partes, as quais podiam ser arrendadas ou aforadas. No entanto, havia um limite para a quantidade de terra que o capitão devia possuir, a partir da proibição de tomar sesmarias para si ou sua família, e da obrigação de reparti-las a quaisquer pessoas sem cobrança de foro e direito, somente do dízimo à Ordem de Cristo (Carta…, 1966, p. 193-202).

A carta de doação também tratava da questão da sucessão do cargo de capitão e governador, permitindo que mulheres e até filhos bastardos assumissem a governança, revogando assim as disposições da Lei Mental, que estabelecia os princípios de sucessão em Portugal desde 1434. (Carta…, 1966, p. 193-202).

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No que diz respeito aos foros, tributos e direitos reais, era direito do capitão receber a metade da dízima do pescado da capitania (diminuída pela metade, de acordo do foral), receber a redízima de todas as rendas e direitos pertencentes ao rei, receber a vigésima parte dos rendimentos provenientes do pau-brasil, o qual deveria guardar e conservar, e ter os escravos resgatados na terra, devendo mandar vinte e quatro deles para o Reino (Carta…, 1966, p. 193-202).

As disposições referentes a esses assuntos foram bem especificadas no foral de 24 de setembro de 1534. De acordo com este, o capitão e governador ficava encarregado de cuidar do recebimento do quinto, taxado sobre metais e pedras preciosas que fossem descobertos, do qual receberia a dízima, além de receber os direitos dos tabeliães, de receber a redízima do pagamento dos direitos da entrada e de saída de mercadorias, de dar licença para saída de navios com mercadorias e estabelecer os direitos e tributos taxados pelas câmaras nas passagens dos rios (Foral…, 1966, p. 202-208).

O foral também determinava que o capitão, junto a moradores e povoadores, ficariam liberados para vender quaisquer mercadorias pagando apenas a sisa, e autorizava a compra e o trato com capitães de outras capitanias, ficando porém o trato com os índios sob inteira responsabilidade do capitão. Em relação à defesa da capitania, ficava o capitão incumbido de convocar os moradores para servir no tempo de guerra (Foral…, 1966, p. 202-208).

O empreendimento colonizador teve êxito em apenas duas capitanias, São Vicente e Pernambuco. Muitas não foram sequer colonizadas e em outras as tentativas feitas resultaram em uma colonização precária ou redundaram em fracasso, que teve causas diversas, envolvendo principalmente conflitos com índios e dissensões entre colonos ou destes com os donatários (Wehling, 1994, p. 68-69).

Em 1548, com a instalação de um governo-geral, a Coroa empreendeu uma tentativa de se impor de maneira mais efetiva na colônia, centralizando as atividades administrativas, judiciárias e fazendárias. O regimento dado ao primeiro governador-geral, Tomé de Sousa, em 17 de dezembro, continha algumas determinações destinadas aos capitães e governadores, ordenando que estes enviassem ajuda ao governador-geral e que tratassem, em conjunto com outras autoridades, sobre questões de governança e segurança, além de deliberar sobre a forma de construção dos navios. Os capitães e governadores também ficavam encarregados de dar licença aos colonos para tratarem com índios nos dias não estipulados pela lei e para aqueles que quisessem se deslocar para outras capitanias, além de licença para se fazer guerra aos índios, assentar os preços das mercadorias e favorecer a fé católica. O regimento também reforçava a obrigação dos capitães e governadores de terem armas para a defesa das capitanias, e mandava que eles informassem ao governador-geral sobre a proximidade de corsários (REGIMENTO…, 1966, p. 253-269).

Durante o governo de Tomé de Sousa iniciou-se um processo de diminuição da jurisdição dos capitães, através da revogação dos itens antes presentes nas doações, mas que agora iam contra os regimentos e provisões fornecidos para o governador-geral. Posteriormente, o alvará de 5 de março de 1557 determinou que a condenação de morte natural em peão tivesse apelação para maior alçada, como também os crimes de heresia, traição, sodomia e moeda falsa. Outra mudança foi a permissão da entrada de corregedor. A partir também de 1557, a nomeação dos ouvidores das capitanias pertencentes à Coroa passou a ser feita pelo rei (COMENTÁRIO…, 1970, p. 353; Saldanha, 1991, p. 311).

No regimento do governador-geral Francisco Giraldes, de 5 de março de 1588, foram acrescidas às competências dos capitães e governadores a concessão de licença para o desembarque de navios estrangeiros, exceto quando mostrassem provisão do rei de Portugal. O regimento de Gaspar de Sousa, de 6 de outubro de 1612, evidenciando uma preocupação em limitar os poderes dos donatários, ordenava que ogovernador-geral não deixasse que estes tomassem mais jurisdição da que lhes pertencia segundo suas doações. Previa, ainda, a suspensão de capitão e governador e sua substituição durante o julgamento dos seus crimes (REGIMENTO… 1972, p. 413-436).

Esse processo de limitação de poderes dos capitães e governadores foi contínuo, como se observa no regimento do ouvidor-geral do Brasil, de 14 de abril de 1628, que diminuía o valor da quantia máxima para o conhecimento das causas cíveis sem apelação e agravo de cem para vinte mil réis. Este regimento determinava também que quando estivesse em determinada capitania, o ouvidor-geral podia conhecer, por apelação e agravo, todos os casos crimes tratados perante o capitão ou seu ouvidor, permitindo que estes tivessem alçada somente nos feitos crimes em que alguns escravos ou índios fossem acusados e sentenciados a penas de açoites ou corte de orelhas; nos casos em que aos peões cristãos livres fosse posta pena de açoites e degredo até três anos; e nos casos de pessoas de “mais qualidade”, teriam alçada somente até um ano de degredo e das penas pecuniárias até vinte cruzados. O regimento de 1628 também determinava que o ouvidor-geralvisitasse as capitanias, usando da jurisdição dos corregedores das comarcas do Reino (Portugal, 1855, p. 124-127, 1855).

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Em 1663, foi dado um regimento específico para os governadores, o Regimento que se mandou aos Capitães-mores das Capitanias deste Estado, de 1º de outubro de 1663, no qual se destacam as questões relacionadas à defesa. Assim, o regimento mandava que os capitães e governadores visitassem as fortalezas e armazéns existentes nas capitanias, verificando a artilharia e as munições e avisando sobre sua situação ao governo-geral, além de passar em revista os habitantes da capitania, obrigando aqueles que fossem aptos a servir militarmente, promover anualmente o treinamento dos moradores e notificar ao rei se vagasse uma companhia de infantaria paga, Ordenança ou de tropas Auxiliares (REGIMENTO…,1928, p. 374-380).

O documento reforçava a ideia de que os governadores deviam se subordinar ao governador-geral e mandava-os avisar ao rei sobre vacância dos ofícios de Justiça e Fazenda, ficando contudo proibidos de se intrometer nos negócios dessas esferas e nas câmaras. Também ficavam proibidos de dar sesmarias nas capitanias reais (REGIMENTO…,1928, p. 374-380). De acordo com o regimento do governador-geral Roque da Costa Barreto, de 23 de janeiro de 1677, esta subordinação valia também para as capitanias de Pernambuco e Rio de Janeiro, que tinham regimentos específicos dotando seus governadores de poderes para o provimento dos ofícios de Justiça, Fazenda e Guerra por um período provisório (REGIMENTO…,1972, p. 745-846).

A relativa autonomia dessas duas capitanias foi conquistada em momentos anteriores. No caso de Pernambuco, o governador foi investido de poderes especiais desde o período da guerra contra os holandeses, em meados do século XVII. Um pouco antes do regimento de Roque da Costa Barreto, foi dado um regimento especial que garantia autonomia a capitania, que deveria subordinar-se diretamente ao Conselho Ultramarino. O Rio de Janeiro, por sua vez, após o curto período de separação do governo da Bahia, também passou a ter um estatuto diferenciado (Salgado, 1985, p. 68; Lobo, 1962, p. 376).

Em todo o período colonial foram dadas algumas determinações específicas para governadores de certas capitanias, que os dotava de atribuições diferenciadas, como no caso de Minas Gerais, como pode se observar no Regimento para a nova forma de cobrança do direito senhorial dos quintos dos moradores das Minas Gerais, de 3 de dezembro de 1750, ou na legislação referente à inspeção do algodão em Pernambuco, que pode ser observado na decisão n. 17, de 17 de março de 1820.

O processo de diminuição da jurisdição e dos privilégios dos capitães e governadores foi acompanhado pela compra gradativa das capitanias particulares pela Coroa. A primeira capitania adquirida foi a da Bahia, no momento de instalação do governo-geral, em 1548. Depois, seguiu-se a incorporação das capitanias do Rio de Janeiro (1567), Paraíba (1585). Rio Grande (1598), Ceará (1611), Pernambuco (1640), Santos e São Vicente (1709), Rio Grande do São Pedro (1760) (Salgado, 1985, p. 415-433).

Essa tendência se acentuou no século XVIII, especialmente com a política de centralização empreendida por d. João V (1707-1750) e pelo marquês de Pombal(1750-1777), que levaria à extinção definitiva das capitanias. Segundo o vice-rei d. Fernando José de Portugal, no início do século XIX havia apenas um único donatário, Fernando Dias Paes Leme da Câmara, que recebeu, em 1786, a mercê de um senhorio de uma vila próxima ao rio Paraíba do Sul (COMENTÁRIO…, 1970, 354).

Tal fato, no entanto, não significou o fim da divisão da colônia em capitanias, que continuaram a serem geridas pelos capitães e governadores. Suas atribuições administrativas aumentaram, visto que os governadores passaram também nas Juntas de Justiças, que começaram a serem instaladas nas capitanias em 1758, e nasJuntas de Fazenda, criadas a partir de 1760 . Em relação à administração militar, especificamente à organização das Ordenanças, a provisão de 30 de abril de 1758, determinou que os governadores das capitanias passassem os regimentos para os capitães-mores, regulando os exercícios das companhias.

Com a chegada da família real ao Brasil, em 1808, toda a administração colonial sofreu reformulações, tanto no âmbito da Corte, como nos das capitanias e cidades. Em relação à esfera de atuação do capitão e governador, o decreto de 22 de junho de 1808 determinou que este continuasse a distribuir sesmarias, cuja confirmação caberia à Mesa do Desembargo instalada no Rio de Janeiro. No dia seguinte, a decisão n. 16, mandou que os capitães e governadores executassem as ordens expedidas pelo Intendente-geral da Polícia, outro cargo criado na colônia em decorrência da transferência da Corte, cujas atribuições estavam ligadas à manutenção da ordem pública.

Em 24 de novembro de 1808 a decisão n. 54 mandou cessar a autoridade dos governadores das capitanias sobre as patentes militares, de Linha ou de Milícias, que passariam para a esfera de atuação do Conselho Supremo Militar e de Justiça. Assim, ficaram os governadores encarregados de enviar ao rei apenas as propostas dos postos vagos e as solicitações de concessão de licenças para fora da capitania e de demissões do real serviço ou passagem de uns Corpos para outros.

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Em relação à autoridade militar, cabe ainda observar que em alguns atos dos governadores de determinadas capitanias aparecem como capitães-mores ou capitães-generais. De acordo com a bibliografia, a patente implicava a ampliação dos poderes militares, que, no entanto, não ficam esclarecidos pela leitura da legislação (Puntoni, 2004, p. 47).

Os capitães e governadores foram extintos em decorrência dos acontecimentos iniciados com a Revolução do Porto em 1820, quando, após a instituição das Cortes Gerais e Extraordinárias da Nação Portuguesa, uma série de medidas foi tomada no sentido de limitar a autonomia adquirida pela colônia a partir de 1808. Além do regresso do rei e a determinação de extinção de vários tribunais instalados no Brasil, as Cortes ordenaram que se constituíssem juntas provisórias de governo e governadores das armas, subordinados diretamente a Portugal com o fim de controlar o governo das capitanias, que, naquele momento passaram a ser chamadas de províncias. A primeira junta instituída no lugar do capitão e governador foi a de Pernambuco, em 1º de setembro de 1821. Um mês depois, o decreto de 1º de outubro determinou a constituição de juntas em todas as outras províncias.

 

Angélica Ricci Camargo

BibliografiaABREU, Capistrano. Capítulos da História Colonial (1500-1800). 7. ed. Belo Horizonte: Itatiaia; São Paulo: Publifolha, 2000.

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CARTA de Doação da capitania de Pernambuco a Duarte Coelho, de 10 de março de 1534. In: TAPAJÓS, Vicente. A Política Administrativa de D. João III. 2ª ed. Rio de Janeiro: DASP – Serviço de Documentação, p. 193-202, 1966. (História Administrativa do Brasil; 2)

CARVALHO, Filipe Nunes de. Do Descobrimento à União Ibérica. In: JOHNSON, Harold; SILVA, Maria Beatriz Nizza da (coord.). O Império Luso-Brasileiro (1500-1620). Lisboa: Editorial Estampa, p. 19-204, 1992 (Nova História da Expansão Portuguesa, v. 6).

COMENTÁRIO do vice-rei d. Fernando José de Portugal ao Regimento de Roque da Costa Barreto. In: AVELLAR, Hélio de Alcântara. A administração pombalina. Rio de Janeiro: DASP – Serviço de Documentação, p. 337-396, 1970 (História Administrativa do Brasil; 5)

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HESPANHA, António Manuel. As vésperas do Leviathan: instituições e poder político, Portugal (século XVII). Coimbra: Almedina, 1994.

INSTITUTO DOS ARQUIVOS NACIONAIS/TORRE DO TOMBO (Portugal). Doações e forais das capitanias do Brasil: 1534-1536. CHORÃO, Maria José Mexia Bigotte. Lisboa: Instituto dos Arquivos Nacionais/Torre do Tombo, 1999.

JOHNSON, H. B. A colonização portuguesa no Brasil, 1500-1580. In: BETHELL, Leslie (org.). América Latina Colonial, 2. ed, v.1. Trad. Maria Clara Cescato. São Paulo: Editora da Universidade de São Paulo; Brasília-DF: Fundação Alexandre de Gusmão, 1998, p. 241-281.

LOBO, Eulália Maria Lahmeyer. Processo Administrativo Ibero-Americano: aspectos sócio-econômicos – período colonial. São Paulo: Biblioteca do Exército, 1962.

PORTUGAL. Regimento do Ouvidor-Geral do Brasil de 14 de abril de 1628. Coleção Cronológica da Legislação Portuguesa compilada e anotada por José Justino de Andrade e Silva. Legislação de 1627 a

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1633. Lisboa, p. 124-127, 1855. Disponível em: http://www.iuslusitaniae.ufsh.unl.pt . Acesso em: 10 de setembro de 2006.

PUNTONI, Pedro. A arte da guerra no Brasil: tecnologia e estratégia militares na expansão da fronteira da América portuguesa (1550-1700). In: CASTRO, Celso; IZECKSOHN, KRAAY, Hendrik. Nova história militar brasileira. Rio de Janeiro: Editora FGV, 2004, p. 43-66.

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REGIMENTO de Francisco Giraldes, de 30 de março de 1588. In: MENDONÇA, Marcos Carneiro de. Raízes da Formação Administrativa do Brasil. Rio de Janeiro: Conselho Federal de Cultura, 1972, v. 1, p. 253-277.

REGIMENTO de Gaspar de Souza, de 6 de outubro de 1612. In: MENDONÇA, Marcos Carneiro de. Raízes da Formação Administrativa do Brasil. Rio de Janeiro: Conselho Federal de Cultura, 1972, v. 1, p. 413 – 436.

REGIMENTO de Roque da Costa Barreto dos governadores-gerais, de 16 de janeiro de 1677. In: MENDONÇA, Marcos Carneiro de. Raízes da formação administrativa do Brasil. Rio de Janeiro: Conselho Federal de Cultura, 1972, v. 2, p. 745-846.

SALDANHA, Antônio Vasconcelos de. As capitanias: o regime senhorial na expansão ultramarina portuguesa. Funchal: Centro de Estudo de História do Atlântico, 1991.(Coleção Memórias, 6)

SALGADO, Graça (coord.). Fiscais e meirinhos: a administração no Brasil colonial. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1985.

SILVA, Maria Beatriz Nizza da. Ser nobre na Colônia. São Paulo: Editora UNESP, 2005.

TAPAJÓS, Vicente. A Política Administrativa de D. João III. 2ª ed. Rio de Janeiro: DASP – Serviço de Documentação, 1966. (História Administrativa do Brasil; 2)

Documentos sobre o órgão podem ser encontrados nos seguintes fundos do Arquivo Nacional:BR AN,RIO 86 -Secretaria do Estado do BrasilBR AN,RIO 89 – Secretaria do Governo da Capitania do ParáBR AN,RIO 8B – Secretaria do Governo da Capitania do Rio Grande do NorteBR AN,RIO 8C – Secretaria do Governo da Capitania do Rio Grande do SulBR AN,RIO 8D – Secretaria do Governo da Nova Colônia de SacramentoBR AN,RIO 87 – Secretaria do Governo da Província de Mato GrossoBR AN,RIO 8E – Secretaria do Governo da Província de São PauloBR AN,RIO 88 – Secretaria do Governo da Província do CearáBR AN,RIO D9 – Vice-ReinadoBR AN,RIO NP – Diversos SDH – CódicesBR AN,RIO 2H – Diversos SDH – CaixasBR AN,RIO C1 – Tesouraria da Fazenda da Província do CearáBR AN,RIO 4A – Junta da Real Fazenda da Capitania do ParáBR AN,RIO 8K – Câmara de São LuísBR AN,RIO 53 – Ministério do ImpérioBR AN,RIO 7T – Provedoria da Fazenda Real de SantosBR AN,RIO EG – Junta da Fazenda da Província de São PauloBR AN,RIO 59 – Negócios de PortugalBR AN,RIO 4K – Mesa do Desembargo do PaçoBR AN,RIO 03 – Alfândega da BahiaBR AN,RIO BX – Tesouraria da Fazenda da Província da BahiaBR AN,RIO RD – Marquês do LavradioBR AN,RIO 0O – Casa Real e Imperial – Mordomia-MorBR AN,RIO AA – Série Interior – Negócios de Províncias e Estados (IJJ9)

 

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Referência da imagemOfício ao governador da capitania do Rio de Janeiro. ARQUIVO Nacional, 150 anos: visão histórica. Rio de Janeiro: Index, 1988. p.33

Tropas Auxiliares

As tropas auxiliares, posteriormente denominadas milícias, foram criadas em 7 de janeiro de 1645 no contexto da restauração do trono português após o período unificação com a Espanha, entre 1580 a 1640. Tinham como atribuições a manutenção da posse territorial, da ordem e da lei (LEONZO, 1986, p. 324-325). Formavam, junto com as  tropas de primeira linha instituídas em 1641 e com as companhias de ordenanças estabelecidas em 1570, as forças militares de Portugal e seus domínios.

A restauração se constituiu como um marco importante para organização militar portuguesa. Ainda em 1640 foi criado o Conselho de Guerra, tribunal superior nas causas militares encarregado de tratar de questões relativas à nomeação de oficiais de patente e à organização de tropas e armadas, entre outros assuntos. Além do Conselho, foram instituídos os cargos de governadores das Armas, destinados a garantir o recrutamento, instrução e disciplina das tropas, e o de tenente-geral da artilharia do Reino, com jurisdição sobre o material de guerra, armas, pólvora e fundições (SELVAGEM, 1931, p. 384).

As tropas auxiliares eram obrigadas a atuar nas fronteiras quando fosse necessário, ajudando as tropas de primeira linha. Eram compostas por filhos de viúvas e lavradores, e por homens casados em idade militar. A princípio foram instituídas em algumas comarcas, mas a partir de 1646 se generalizaram em Portugal e suas colônias (SELVAGEM, 1931, p. 384).

Sua organização, tal como a das tropas de primeira linha, era baseada no sistema militar da Espanha, e dividia-se em terços, com cerca de 600 homens subdivididos em 10 companhias. Cada terço era comandado por um mestre-de-campo e os homens eram disciplinados e instruídos por oficiais hábeis e experimentados dastropas de primeira linha, nomeados pelos governadores das províncias. Mas, diferente das tropas de primeira linha, as auxiliares, como também as ordenanças, não eram remuneradas. Dessa forma, muitas vezes o rei concedia regalias, honras, liberdades e isenções aos oficiais dos terços como uma das maneiras de atrair o interesse no serviço real (MELLO, 2009, p. 46-49).

A partir da segunda metade do século XVIII, foram empreendidas novas mudanças na organização militar, decorrentes de um processo de centralização político-administrativa. Um pouco antes, em 1736, foi criada aSecretaria de Estado dos Negócios Estrangeiros e da Guerra. A isso seguiram a reforma do Exército português pelo conde de Lippe, a criação de auditorias de guerra, a substituição dos terços pelos regimentos, de inspiração francesa, e a adoção de princípios estratégicos oriundos do modelo prussiano de Frederico II, que valorizava a ofensiva (WEHILING; WEHLING, 2008, p. 27).

No caso das tropas auxiliares, a maior transformação ocorreu por meio do decreto de 7 de agosto de 1796, que mudou sua denominação para milícias, elevando-a à categoria de tropa de segunda linha. O decreto também transformou os cargos de mestres-de-campo, que passaram a ser chamados de coronéis de milícias.

No Brasil, durante o período colonial, foram reproduzidas as mesmas determinações estabelecidas no reino em relação às tropas militares, que se depararam, muitas vezes, com dificuldades relacionadas ao alistamento. Também houve disposições específicas, como a expressa pela carta régia de 22 de março de 1766, que determinou o alistamento “sem exceção” de nobres, brancos, mestiços, pretos, ingênuos e libertos, e todos os homens válidos para o serviço militar.

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Com a transferência da corte e da família real portuguesa para o Brasil em 1808, importantes modificações foram empreendidas na nova sede do reino, incluindo a instalação da Secretaria de Estado dos Negócios Estrangeiros e da Guerra. Também foram reorganizadas a administração dos arsenais de Guerra, criada umaReal Academia Militar, fábricas de ferro e pólvora e o cargo de inspetor-geral de Artilharia da Corte e Capitania do Rio de Janeiro. Também foi instituído o Conselho Supremo Militar e de Justiça, um tribunal ao qual competiam todas as matérias militares que, em Lisboa, se expediam pelos Conselhos de Guerra, do Almirantado e do Ultramar.

Em relação às tropas, foram mantidas as três linhas: do Exército, Milícias e Ordenanças. Houve, contudo, um predomínio do exército profissional sobre as demais, devido às ações militares empreendidas na Guiana, Montevidéu e a repressão da revolta ocorrida em Pernambuco em 1817 (WEHLING; WEHLING, 2008, p. 13).

O decreto de 24 de junho de 1808 criou o cargo de inspetor-geral de milícias, encarregado de inspecionar os regimentos de milícias da corte e capitania do Rio de Janeiro. A decisão n. 1 de 3 de janeiro de 1809 deu novas instruções para o cargo, que também existia nas capitanias de Pernambuco, Bahia e São Paulo.

Com a independência política de Portugal em 1822, não houve grandes mudanças na administração das milícias. Em 1831, a lei de 18 de agosto criou a Guarda Nacional, extinguindo as milícias e as ordenanças.

Angélica Ricci Camargo

BibliografiaGOMES, José Eudes Arrais Barroso. As milícias d’El Rei: Tropas militares poder no Ceará setecentista. 2009. Dissertação (Mestrado em História). Niterói-RJ. Universidade Federal Fluminense, 2009.

LEONZO, Nanci. As instituições. In: SILVA, Maria Beatriz Nizza da. (coord.). O Império Luso-Brasileiro, 1750-1822. Lisboa: Estampa, 1986. (Nova História da Expansão Portuguesa, v. 8), p. 301-331.MELLO, Christiane Figueiredo Pagano de. Forças militares no Brasil colonial: Corpos Auxiliares e de Ordenanças na segunda metade do século XVIII. Rio de Janeiro: E-Papers, 2009.

SALGADO, Graça (coord.). Fiscais e meirinhos: a administração no Brasil colonial. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1985.

SELVAGEM, Carlos. Portugal militar: compêndio de história militar e naval de Portugal desde as origens do estado portucalense até o fim da dinastia de Bragança. Lisboa: Imprensa Nacional, 1931.WEHILING, Arno; WEHLING, Maria José. Exército, milícias e ordenanças na Corte Joanina: permanências e modificações. DaCultura. Ano VIII, n. 14, jun. 2008, p. 26-32. Disponível em: http://www.funceb.org.br/images/revista/5_2q0t.pdf Acesso: 15 janeiro 2010.

Documentos sobre o órgão podem ser encontrados nos seguintes fundos do Arquivo Nacional:BR AN,BSB Z6 Ministério da Fazenda – Delegacia de Mato GrossoBR AN,RIO 9U Série Guerra – Pagadoria das Tropas (IG9)

Referência da imagemEmbarque das tropas em Praia Grande para expedição contra Montevidéu. DEBRET, Jean Baptiste. Voyage pittoresque et historique au Brésil, ou Séjour d’un Artiste Français au Brésil, depuis 1816 jusqu’en 1831 inclusivement, epoques de l ‘avénement et de I ‘abdication de S.M. D. Pedro 1er. Paris: Firmind Didot Frères, 1834 – 1839, v. 3, pl. 23. Arquivo Nacional, OR1909.

Câmaras Municipais

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As câmaras municipais começaram a ser criadas na colônia a partir de 1532, no contexto da primeira expedição colonizadora portuguesa na América, comandada por Martim Afonso de Souza, constituindo-se, ao longo do período colonial, como base local da administração portuguesa e reunindo competências das esferas administrativa, judiciária, fazendária e policial. A primeira câmara instalada foi a da vila de São Vicente.

As câmaras eram instituídas nos locais com estatuto de vila e podiam ser criadas por um decreto real ou por meio de uma petição dos moradores locais ao rei.(RUSSEL-WOOD, 1977, p. 29). Em Portugal, a municipalização do espaço político data dos séculos XII e XIII, com a penetração do modelo islâmico de organização dos quadros administrativos municipais. Nos séculos seguintes, após a reconquista cristã do território, a Coroa passou a supervisionar a justiça exercida pelos poderes locais, em uma tentativa de impor leis gerais sobre os costumes e padronizar o modelo de unidade administrativa e judicial de primeira instância. Assim, uma série de oficiais periféricos da administração real, ligada ao centro por relações hierárquicas, foi criada para exercer o controle sobre a administração local (PIRES, 2006, p. 70).

Segundo as Ordenações Filipinas, de 1603, as câmaras seriam formadas através de eleições realizadas a cada três anos, das quais somente os considerados “homens bons” poderiam ser eleitores e elegíveis. Sua composição era formada por juízes ordinários, vereadores, procurador e almotacé, que se constituíam em ofícios honorários, geralmente eleitos e, em princípio, não remunerados. Além destes, havia o escrivão da Câmara, o escrivão da almotaçaria, o tesoureiro, os tabeliães das notas, os tabeliães judiciais, os inquiridores, os distribuidores, o alcaide-pequeno, o porteiro, os contadores de feitos e custas, os solicitadores, o escrivão das sisas, os quadrilheiros, o carcereiro, o meirinho, o juiz dos órfãos e o escrivão dos órfãos. Em algumas câmaras existiam também outros oficiais eleitos, como um juiz para cada ofício, também chamado de juiz do povo, e o afilador, encarregado da fiscalização dos pesos e medidas (HESPANHA, 1994, p. 164; LOBO, 1962, p. 353).

O cargo de juiz ordinário acumulava a função de presidente da Câmara. Cabia-lhe a aplicação da lei em primeira instância e a fiscalização dos outros funcionários. Também deveria exercer a função de juiz dos órfãos onde não houvesse esse ofício. De acordo com as Ordenações, os juízes ordinários teriam que realizar audiências em dois dias na semana nos concelhos, vilas e lugares com sessenta vizinhos, e em um dia nos lugares com menor número de moradores (SALGADO, 1985, p. 70, PORTUGAL, 1870, p. 135).

Em algumas localidades, a presidência da Câmara ficava com o juiz de fora, letrado e nomeado pelo rei. Tal configuração representava uma tentativa de controlar as práticas municipais e também possibilitar a circulação do direito letrado no nível local. Nas paróquias distantes havia um representante do poder municipal, o juiz pedâneo ou de vintena, que julgava os casos cíveis menores, além de fazer testamentos, cobrar multas e prender criminosos (BICALHO, 2003, p. 346; RUSSEL-WOOD, 1977, p. 62). Em algumas câmaras havia ainda um juiz específico voltado para as causas dos órfãos, o juiz dos órfãos, ao qual cabia o cuidado com o cadastro, fiscalização da administração de seus bens pelos tutores, organização de inventários e o julgamento dos feitos cíveis em que órfãos tomassem parte (HESPANHA, 1994, p. 180).

O papel administrativo era assumido pelos vereadores, que tinham, entre outras, as funções de determinar os impostos, fiscalizar os oficiais da municipalidade e a aplicação da lei pelos juízes ordinários, zelar pelas obras e pelos bens do lugar, fiscalizar as contas do procurador e do tesoureiro, determinar os preços de alguns produtos, os ordenados dos oficiais mecânicos, jornaleiros e moças de soldada, lançar fintas, além de despachar com os juízes os feitos provenientes dos almotacés (SALGADO, 1985, p. 132-133).

Outro oficial ligado às atividades administrativas era o procurador, que tinha atribuições ligadas à administração das rendas e das demandas da municipalidade, cuidando dos reparos e consertos de casas, fontes, pontes, chafarizes, poços, calçadas, caminhos e outros bens, além de servir como tesoureiro onde não houvesse esse ofício (SALGADO, 1985,p. 133-134).

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Encarregado de fiscalizar o abastecimento e o respeito às posturas e vereações, o almotacé também tinha a competência de despachar os feitos relacionados à sua área de atuação, além de ter o cuidado com a limpeza de cidade e a atribuição de fiscalizar a realização de qualquer obra de edifício (PORTUGAL, 1870, p. 157-162).

Além desses cargos, havia: o escrivão da câmara, encarregado de reduzir por escrito todo o expediente da vereação; o tesoureiro, que tinha a função de arrecadar as receitas e de efetuar as despesas; os tabeliães das notas, cujas atribuições eram redigir instrumentos jurídicos que carecessem de fé pública (testamentos, inventários, contratos, procurações, etc); os tabeliães judiciais, encarregados da redação dos atos judiciais praticados pelos juízes locais; os contadores, incumbidos de contarem o custo dos processos; os inquiridores, destinados a inquirirem testemunhas; os distribuidores, que tinham a competência de distribuir as escrituras ou feitos entre os tabeliães; os solicitadores, que tinham a função de cuidar da arrecadação dos bens dos resíduos; e o porteiro, que fazia as penhoras e apregoava as deliberações da câmara. Encarregados do policiamento, havia ainda o alcaide-pequeno e os quadrilheiros, que cuidavam de efetuar as prisões (HESPANHA, 1994, p. 168-177; SALGADO, 1985, p. 138-142).

Além das atribuições distribuídas entre seus diversos cargos, as câmaras também tinham participação decisiva no processo de escolha dos postos das companhias de ordenanças, criadas em 1570, que constituíam as forças militares locais, convocadas em momentos de necessidade e não remuneradas. A realização das eleições nas câmaras estabelecia um vínculo estreito entre estas e as Ordenanças, que, na colônia, acabaram por assumir o caráter de braço auxiliar na execução da política administrativa metropolitana. Ao mesmo tempo, as Ordenanças fortaleciam o poder dos senhores de terras locais, que passavam, desse modo, a dispor de uma força armada para impor sua própria ordem e resguardar seus interesses. (SALGADO, 1985, p. 110-111).

As principais fontes de rendimentos das câmaras provinham das condenações, dos impostos municipais e dos foros procedentes dos aforamentos de terrenos baldios. Sua própria manutenção consumia cerca de dois terços dos rendimentos, sendo o restante destinado à defesa e segurança. As taxas aplicadas sobre as atividades podiam ser cobradas diretamente pelas câmaras ou ser concedidas mediante contrato. As câmaras também eram responsáveis por tabelar os gêneros alimentares, como a carne, e os artefatos produzidos por oficiais mecânicos, além de taxar os salários dos jornaleiros (MONTEIRO, 1992, p. 319-323; SILVA, 1994, p. 27; SALGADO, 1985, p. 71).

Dotadas de prédio, termo e rocio, as câmaras tinham suas insígnias. O símbolo máximo da dignidade municipal era uma coluna de pedra ou um poste de madeira levantado na praça principal, o pelourinho. Algumas câmaras receberam o título honorífico de “Senado da Câmara”, que, no entanto, não acarretava diferenças em relação às suas competências (ZENHA, 1948, p. 50; SALGADO, 1985, p. 70).

No Brasil colonial, as câmaras tiveram uma prática diferente da determinada pelas Ordenações. Um exemplo era o do cargo de procurador que, na colônia, funcionava como uma espécie de advogado e defensor. A própria qualificação de “homem bom” era diferente, e muitos comerciantes e pequenos proprietários acabaram por ocupar cargos importantes nas câmaras. O grau de poder e da autonomia do governo municipal também variava, de acordo com os distintos interesses da Coroa (SALGADO, 1985, p. 71-72; Lobo, 1962, p. 355).

A questão da qualidade dos ocupantes dos cargos foi motivo de vários conflitos, que em algumas ocasiões resultaram em legislação específica, como o alvará de 29 de julho de 1643, que, em reposta a uma petição dos oficiais da câmara do Rio de Janeiro, ordenou que não se elegesse oficiais mecânicos e judeus. Outro alvará relativo ao Rio de Janeiro, de 26 de setembro de 1644, expressava o relativo poder da câmara desta cidade, determinando que esta elegesse pessoa idônea para servir ao cargo de capitão e governador da capitania, sucedendo o falecimento do ocupante do cargo, enquanto o rei ou o governador-geral não provesse.

Ainda no século XVII, após a restauração do trono português, que esteve unido à Coroa espanhola entre 1580 a 1640, verificou-se uma tendência à ampliação do controle sobre a administração colonial, decorrida das urgências financeiras e de organização da defesa da guerra da Restauração (BICALHO, 2003, p. 351). Neste contexto, a atitude mais expressiva foi a criação de juízes de fora em algumas câmaras, com a finalidade de controlar mais diretamente a administração colonial e cercear o exacerbado poder econômico e político de algumas câmaras. Com isso, à medida que as populações se desenvolviam economicamente e que os interesses políticos, comerciais e fiscais da Coroa ganhavam maior importância, as magistraturas não letradas eram substituídas por juízes nomeados pelo rei. O primeiro juiz de fora nomeado no Brasil foi o da Bahia, em 1696, seguido do de Pernambuco em 1700, do Rio de Janeiro, em 1701 ou 1703. Logo depois, foram criados mais juízes de fora em municípios

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menores, mas estratégicos do ponto do vista do ouro e diamantes: em Santos, em 1713, em Itu, em 1726 e em Ribeirão do Carmo, em 1731 (BICALHO, 2001, p. 199; CAMARINHAS, 2009, p. 87).

A composição das câmaras municipais na colônia variava de acordo com a importância da vila ou cidade. Em 1689, o Senado da Bahia era composto por juízes ordinários; juiz do povo; mister; síndico; procurador; almotacé; tesoureiro-geral; tesoureiro dos efeitos aplicados ao sustento da infantaria; tesoureiro dos donativos, dote e paz de Holanda; tesoureiro dos donativos do vinho; tesoureiro da nova imposição; tesoureiro das rendas do concelho; escrivão da câmara, que também servia de escrivão do juízo dos órfãos; oficiais da secretaria; escrivão da almotaçaria, que também servia de contador, inquiridor, distribuidor; inquiridor; tabeliães do judicial e notas; meirinho da cidade; escrivão de meirinho; meirinho do campo; avaliadores e partidores do concelho; medidores de terras; medidores das obras; arrecadador da cidade; afilador dos pesos da cidade; afilador das medidas quadradas e de pau; contraste de ouro; contraste da prata; repisador das carnes; jurado de rendeiro; oficiais dos pedâneos; capitães do mato; piloto do concelho; porteiros do concelho; porteiro da câmara, que também servia de afilador das medidas redondas; selador das pipas de vinho (ARQUIVO NACIONAL, códice 539, f. 9). Em 1792, o Senado da Câmara do Rio de Janeiro era formado pelo juiz de fora, vereadores, procurador, escrivão, tesoureiro, porteiro e guarda-livros, síndico, almotacés, escrivão da almotaçaria, tabeliães, inquiridor, contador, distribuidor (ALMANAQUES…, 1937, p. 261- 263). No alvará de regimento dos salários dos ministros e oficiais de justiça da América, na Beira-mar e sertão, exceto Minas, de 10 de outubro de 1754, havia disposições sobre os salários referentes aos cargos de juiz de fora, juiz dos órfãos, escrivães, tabeliães do judicial, tabeliães das notas, escrivães dos órfãos, distribuidores, inquiridores, contadores, meirinhos, alcaides, escrivães da vara, porteiros, partidores dos órfãos, escrivães da câmara, escrivães da almotaçaria, advogados, requerente e carcereiros.

No caso de Minas Gerais no século XVIII, existiram também vários outros delegados da autoridade municipal, instituídos mediante o estabelecimento de contratos, encarregados de cuidar de questões como pesos e medidas, de inspeção, das meias patacas e das taxas da cadeia. Os contratos, prática muito comum da administração portuguesa, tinham uma finalidade dupla: por um lado, aliviava a câmara da responsabilidade e despesa com funcionários assalariados para desempenhar essas funções e, por outro, acreditava-se que o compromisso resultaria em um maior rigor na cobrança (RUSSEL-WOOD, 1977, p. 53).

As competências das câmaras também variavam de acordo com o lugar. Segundo a lei de 3 de dezembro de 1750, que definiu a arrecadação dos quinto sobre o ouro, as câmaras existentes nas regiões mineradoras tinham a função de eleger, a cada três meses, um fiscal para a Casa de Fundição, escolhido entre os principais da terra.(PORTUGAL, 1830, p. 24). Outro exemplo, contido no alvará de 15 de julho de 1775, determinava que as câmaras existentes nos territórios onde havia plantação de tabaco teriam que fazer os livros nos quais seriam registrados os nomes dos lavradores, que seriam remetidos anualmente para a Mesa de Inspeção de sua área de atuação (PORTUGAL, 1828, p. 52). Desse modo, observa-se que cada câmara tinha uma configuração própria, determinada historicamente, de acordo com as diferentes conjunturas econômicas, sociais e políticas existentes no espaço colonial (BICALHO, 2001, p. 193).

Com a transferência da corte portuguesa para o Brasil, em 1808, algumas competências foram acrescidas às câmaras ou a funcionários específicos. Pelo alvará de 27 de junho de 1808, que criou o imposto da décima para os prédios urbanos, foram estabelecidas juntas destinadas à sua arrecadação, nas quais, em algumas localidades, os juízes de fora tomariam parte. O alvará de 25 de janeiro de 1809 determinou que as câmaras propusessem nomes para serem escolhidos para ocuparem o cargo de juiz de sesmarias. As câmaras também ficavam incumbidas de propor nomes para servirem de recebedor ou tesoureiro do imposto da sisa e outro para o imposto do selo sobre heranças e legados, criados, respectivamente pelos alvarás de 3 e de 17 de junho de 1809.

Em 1809, o decreto de 28 de julho criou o cargo de Provedor-mor de Saúde da Corte, cujas atribuições envolviam a regulação das quarentenas feitas nos navios provenientes de portos estrangeiros, as averiguações feitas sobre os mantimentos e gêneros alimentícios, entre outras. No entanto, conforme estabelecido pelo regulamento de 22 de janeiro de 1810, fora da Corte tais atividades cabiam às câmaras, através do juiz de fora ou do juiz ordinário. Em relação à defesa, ainda nesse ano, a decisão n. 18 mandou que as câmaras formassem companhias de capitães do mato para efetuarem a prisão dos escravos fugidos e assalto dos quilombos.

Em todo o período joanino verificou-se a ereção de novas vilas, com suas respectivas câmaras, como a de Caxias das Aldeias Altas, da comarca do Maranhão (1811), a de São Pedro de Cantagalo (1814), a de Santa Maria de Maricá (1814), a de Brejo de Areia, da comarca da Paraíba do Norte (1815), a de Vila Real da Praia Grande, na capitania do Rio de Janeiro (1819), a de Campo Largo, na capitania de

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Pernambuco (1820), entre outras. O número de juízes de fora também cresceu, sendo criados novos cargos na vila de Angra dos Reis na Ilha Grande e Parati (1808), na vila de Goiânia, da capitania de Pernambuco (1808), na Vila Boa de Goiás (1809), na vila de Santo Amaro da Purificação de São Francisco, na capitania da Bahia (1810), na vila do Bom Sucesso das Minas Novas de Arassuí, na capitania de Minas Gerais (1810), na cidade de São Paulo (1810), na vila de Fortaleza (1810), na vila do Desterro na Ilha de Santa Catarina (1811), na vila do Rio Grande, da capitania de São Pedro (1816) na cidade de Oeiras, no Piauí (1819). Em alguns atos, o cargo criado aparecia com a denominação de juiz de fora do cível e do crime, ou juiz de fora do cível, crime e órfão, que implicava maiores atribuições à sua atuação.

Outra atividade importante das câmaras nesse período foram as petições à Mesa do Desembargo do Paço para a instalação de aulas régias, criadas no Reino e na colônia desde de 1759. Em resposta a esses pedidos foram instaladas aulas de primeiras letras e gramática latina em várias localidades, como na vila do Desterro da Ilha de Santa Catarina (1809), na vila de São Carlos, da capitania de São Paulo (1813), na vila de Inhambupe de Cima, da capitania da Bahia (1816), na vila de Macaé (1817), na vila do Espírito Santo (1818), na vila de Mogi das Cruzes (1818), na Vila da Atalaya da comarca de Alagoas (1819).

No Rio de Janeiro, a criação da Intendência-geral de Polícia, em 1808, órgão responsável por uma série de medidas relacionadas à segurança e manutenção da ordem pública, provocou conflitos de jurisdição com o Senado da Câmara da cidade, pois ambos compartilhavam a mesma esfera de atuação governativa (GOUVÊA, 2005, p. 745). A decisão n. 15, de 1808 determinou que a Intendência tivesse o cuidado das ruas, asseio, calçadas, estradas, pontes, fontes, exercendo atividade cumulativa a da Câmara, que ficava obrigada a passar a terça parte de seus rendimentos para a Intendência.

Após a Independência, foram estabelecidas algumas reformas na estrutura e administração das câmaras. AConstituição de 1824 determinou que as câmaras municipais fossem compostas por vereadores, competindo-lhes o governo econômico e municipal de vilas e cidades, excluindo portanto a função judicial de sua esfera de atuação. Mudanças mais profundas foram determinadas pela lei de 1º de outubro de 1828, que modificou a forma das eleições, e reiterou o caráter estritamente administrativo desses órgãos, característica que mantêm até a atualidade.

Angélica Ricci Camargo

BibliografiaALMANAQUES da cidade do Rio de Janeiro para os anos de 1792 e 1794. Anais da Biblioteca Nacional, Rio de Janeiro, v. 59(1), p. 188-356, 1937. Disponível em: http://objdigital.bn.br/acervo_digital/anais/anais_059_1937.pdf . Acesso: 2 julho 2009.

ARQUIVO NACIONAL. Avaliação dos ofícios do distrito da capitania da Bahia feitas no ano de 1689, aprovadas pela Junta dos Três Estados em 1695; e outrossim uma relação das atuais avaliações pelas quais se regulam as meias-anatas, e donativos extraídas da Secretaria do Estado (1695). Fundo: Relação da Bahia, Códice 539, v. 3, f. 9.

BICALHO, Maria Fernanda B. As Câmaras Ultramarinas e o Governo do Império. In: João Fragoso; Maria Fernanda Baptista Bicalho; Maria de Fátima SilvaGouvêa. (Org.). O Antigo Regime nos Trópicos. A dinâmica imperial portuguesa. Séc. XVI-XVIII. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2001 , p. 189-221._________________________. A cidade e o império: o Rio de Janeiro no século XVIII. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2003.

CAMARINHAS, Nuno. O aparelho judicial ultramarino. O caso do Brasil (1620-1800). Almanack Braziliense, n. 9, maio de 2009. São Paulo: Instituto de Estudos Brasileiros da Universidade de São Paulo. Disponível em: http://www.almanack.usp.br/PDFS/9/almanack.pdf Acesso em: 26 agosto 2009.

CARTA de doação da capitania de Pernambuco a Duarte Coelho, de 10 de março de 1534. In: TAPAJÓS, Vicente. A Política Administrativa de D. João III. 2ª ed. Rio de Janeiro: DASP – Serviço de Documentação, p. 193-202, 1966. (História Administrativa do Brasil; 2)

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GOUVÊA, Maria de Fátima Silva. As bases institucionais da construção da unidade. Dos poderes do Rio de Janeiro joanino: administração e governabilidade no império luso-brasileiro. In: JANCSÓ, István (org.). Independência: história e historiografia. São Paulo: Hucitec; Fapesp, 2005. p. 707-752.

HESPANHA, António Manuel. As vésperas do Leviathan: instituições e poder político, Portugal (século XVII). Coimbra: Almedina, 1994.

LOBO, Eulália Maria Lahmeyer. Processo Administrativo Ibero-Americano: aspectos sócio-econômicos – período colonial. São Paulo: Biblioteca do Exército, 1962.

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PORTUGAL. Alvará de 26 de setembro de 1644. Em caso de morte do governador do Rio de Janeiro, eleja a Câmara quem sirva enquanto não for nomeado outro. Coleção Cronológica da Legislação Portuguesa compilada e anotada por José Justino de Andrade e Silva. Legislação de 1640-1647. Lisboa, p. 447, 1856. Disponível em: http://www.iuslusitaniae.fcsh.unl.pt. Acesso em: 12 de fevereiro de 2010.

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PORTUGAL. Código filipino, ou, Ordenações e leis do Reino de Portugal recopiladas por mandado d’el-Rei D. Filipe I… / por Candido Mendes de Almeida, segundo a primeira de 1603, e a nona de Coimbra de 1824, v. 1, 14. ed. Rio de Janeiro: Tip. do Instituto Philomatico, p. 134-153, 1870.MONTEIRO, Nuno Gonçalo. Os concelhos e as comunidades. In: MATTOSO, José (dir.). História de Portugal, v. 4 (O Antigo Regime). Lisboa: Editorial Estampa, 1992, p. 303-331.

REGIMENTO de Tomé de Sousa, de 17 de dezembro de 1548. In: TAPAJÓS, Vicente. A Política Administrativa de D. João III. 2ª ed. Rio de Janeiro: DASP – Serviço de Documentação, 1966, p. 253-269, 1966. (História Administrativa do Brasil; 2)

RUSSEL-WOOD. A. J. R. O governo local na América Portuguesa: um estudo de divergência cultural. Revista de História, ano XXVIII, v. LV, p. 25-79, 1977.

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SALGADO, Graça (Coordenador). Fiscais e meirinhos: a administração no Brasil colonial. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1985.

SILVA, Maria Beatriz Nizza da. Administração municipal. In: SILVA, Maria Beatriz Nizza. (coord.). Dicionário da história da colonização portuguesa no Brasil. Lisboa: Verbo, 1994. p. 25-28.

ZENHA, Edmundo. Município no Brasil: 1532-1700. São Paulo: Instituto Progresso Editorial, 1948.

Documentos sobre o órgão podem ser encontrados nos seguintes fundos do Arquivo Nacional:BR AN,RIO 2H – Diversos SDH – Caixas: ‘Câmaras Municipais’BR AN,RIO ØO – Casa Real e Imperial – Mordomia-Mor: ‘Câmara Municipal da Corte’ códices 868, 914, 915BR AN,RIO 86 – Secretaria do Estado do Brasil: ‘Santa Catarina – Câmaras’ códice 110BR AN,RIO 8K – Câmara de São Luís: ‘Câmara do Maranhão’ códice 96BR AN,RIO 8I – Câmara de Fortaleza: ‘Câmara de Fortaleza-Ceará’ códice 1116BR AN,RIO NP – Diversos Códices da Antiga SDH: ‘Câmaras Municipais’ códice 792BR AN, RIO 7T – Provedoria da Fazenda Real de Santos: ‘Certidões da Câmara’ códice 453BR AN,RIO A2 – Série Interior – Corte – Distrito Federal – Territórios – Comarcas (IJJ10) ‘Câmara Municipal da Corte’BR AN,RIO A4 – Série Interior – Eleições (IJJ5) ‘eleições para câmaras municipais’BR AN,RIO AA – Série Interior – Negócios de Províncias e Estados (IJJ9) ‘Câmaras municipais’BR AN,RIO 8J – Câmara de MecejanaBR AN,RIO 8G – Câmara de SalvadorBR AN,RIO 8H – Câmara de AquirásBR AN,RIO OE – Câmara de Macaé: ‘câmara municipal’ códice 42BR AN,RIO 4K – Mesa do Desembargo do PaçoBR AN,RIO 53 – Ministério do ImpérioBR AN,RIO EG – Junta da Fazenda da Província de São Paulo

Referência da imagemO Bando (Proclamação Municipal). DEBRET, Jean Baptiste. Voyage pittoresque et historique au Brésil, ou Séjour d’un Artiste Français au Brésil, depuis 1816 jusqu’en 1831 inclusivement, epoques de l ‘avénement et de I ‘abdication de S.M. D. Pedro 1er. Paris: Firmind Didot Frères, 1834 – 1839. v. 3, pl. 14. Arquivo Nacional, OR1909

Ouvidor de Capitania/Comarca

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O cargo de ouvidor de capitania foi criado no início do processo de colonização portuguesa na América, em 10 de março de 1534, com a finalidade de administrar a Justiça em conjunto com o capitão e governador.

A determinação para se criar os primeiros oficiais de Justiça foi dada em 1530, durante a primeira expedição colonizadora, comandada por Martim Afonso de Souza. A Carta de Grandes Poderes ao Capitão-mor Martim Afonso de Sousa, a quem ficasse em seu lugar e a Carta de poderes para Capitão-mor criar tabeliães e mais oficiais de Justiça discriminava, entre outras, as atribuições do capitão-mor relativas à aplicação da Justiça. A este cabia alçada no crime como no cível sobre todas as pessoas da armada e das terras, exceto em casos de fidalgos, os quais mandaria prender ou emprazar, enviando-os juntos com os autos das culpas para o rei.

Com a distribuição de extensas faixas de terra, denominadas capitanias hereditárias, o capitão e governador ficou encarregado de escolher um ouvidor, com quem compartilhava a administração de Justiça. A Justiça no âmbito das capitanias ficava, portanto, nesse período inicial, concentrada nas mãos de particulares, diferentemente da administração fazendária, que era fiscalizada, desde pelo menos 1501, por oficiais providos pelo rei, o almoxarife e o feitor.

De acordo com a Carta de Doação da capitania de Pernambuco a Duarte Coelho, de 10 de março de 1534, o ouvidor tinha que presidir, pelo capitão e governador, a eleição dos juízes ordinários e oficiais de Justiça, e conhecer as ações novas a dez léguas de onde estivesse, e as apelações e agravos de causas cíveis e crimes dos juízes da capitania. No caso das causas cíveis, o ouvidor poderia conhecer as ações, sem apelação e agravo, até a quantia de cem mil réis. Nos casos de crimes, atuaria junto com o capitão e governador, tendo jurisdição e alçada até morte natural em escravos, índios, peões cristãos, homens livres, sem apelação e agravo. No caso de pessoas de “maior qualidade”, os fidalgos, o ouvidor, junto com o capitão, teria alçada até dez anos de degredo e cem cruzados de pena, sem apelação e agravo. Para os casos de heresia, traição, sodomia e moeda falsa, teriam alçada até morte natural sobre qualquer pessoa. Para auxiliá-lo em suas atividades, o ouvidor contaria com um meirinho (CARTA…, 1966, p. 193-202).

O documento também determinava que o governador e seus sucessores fossem obrigados a colocar outros ouvidores, conforme o crescimento da população e da área de ocupação das terras. Assim, os donatários foram dotados de uma grande extensão de poder relacionada à administração da justiça, podendo inclusive impedir a entrada de qualquer autoridade judicial nas capitanias, o que tornava sua atuação imune à fiscalização da Coroa. (SALGADO, 1985, p. 74; SCHWARTZ, 1979, p. 22).

O processo de centralização da administração da Justiça na colônia iniciou-se com a instalação do governo-geral, em 1548, cuja sede ficava em Salvador. Compunham a nova estrutura administrativa o governador-geral, o provedor-mor da Fazenda e o ouvidor-geral. A bibliografia sobre o assunto aponta que a criação deste último cargo foi uma forma encontrada pela Coroa para controlar o exercício dos poderes judiciais que estavam nas mãos de particulares (SCHWARTZ, 1979, p. 24). Assim, a justiça portuguesa na colônia ficava dividida entre a justiça real, diretamente exercida pelos representantes do rei, e a justiça concedida aos donatários, praticada por delegação (WEHLING, WEHLING, 2004, p. 37).

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Segundo o regimento do governador-geral Tomé de Souza, de 17 de dezembro de 1548, o ouvidor de cada capitania deveria participar na tomada de decisões relacionadas ao governo e segurança da capitania, junto com o governador-geral, o provedor-mor, o capitão da capitania, mais os oficiais da Fazenda e alguns homens principais da terra.

Durante o governo de Tomé de Souza iniciou-se o processo de diminuição da jurisdição dos donatários, derrogando as doações em tudo o que fosse contrário aos regimentos e provisões que trouxe. Posteriormente, o alvará de 5 de março de 1557, determinou que a condenação de morte natural em peão tivesse apelação para maior alçada, como também os crimes de heresia, traição, sodomia e moeda falsa – modificações que figuraram na carta de confirmação da doação da capitania de Ilhéus a Jerônimo de Alarcão Figueiredo, de 16 de julho de 1560. A partir de 1557, a nomeação dos ouvidores de capitania passou também a ser feita pelo rei nas capitanias que pertenciam à Coroa (SALGADO, 1985, p. 148-149).

Contudo, foi no período da União Ibérica (1580-1640), no qual Portugal ficou sob o domínio espanhol, que ocorreu uma acentuação nesse processo de centralização das atividades de Justiça da colônia, que foi acompanhado pela revisão e promulgação das Ordenações Filipinas, em 1603. Nessa época foram criadas mais duas ouvidorias-gerais, uma para as três capitanias do Rio de Janeiro, Espírito Santo e São Vicente, em 1608, e a outra para o Maranhão, em 1619 – regiões que se encontravam separadas do Estado do Brasil –, além de um tribunal superior de apelação, a Relação, instalada na Bahia, em 1609. Mas, se em um primeiro momento a opção foi criar ouvidorias-gerais, que abrangeriam um território mais vasto, a maior ocupação e povoamento das áreas coloniais e, principalmente, a descoberta do ouro e diamantes, provocaram a nomeação de outros oficiais régios a nível mais local, como os ouvidores e os juízes de fora.

No caso dos ouvidores, estes eram apenas seis até a descoberta do ouro, e ficavam nas capitanias do Rio de Janeiro, Maranhão, Bahia, Pernambuco, Pará e Paraíba (CAMARINHAS, 2009, p. 87). A partir do final do século XVII, mais ouvidores foram criados, em substituição àqueles providos pelos donatários – acompanhando o processo de incorporação das capitanias pela Coroa – e também no âmbito das comarcas. Assim, com a expansão do processo colonizador estabeleceram-se novos ouvidores em São Paulo (1681), Bahia (1695), Sergipe (1695), Vila Rica (1709), Rio das Mortes (1711), Serro Frio (1717), Paranaguá (1723), Ceará (1723), Cuiabá (1726), Jacobina (1734), Porto Seguro (1737), Santa Catarina (1749), Porto Seguro (1766), Ilhéus (1766), entre outras (NEQUETE, 2000, p. 99-222).

As comarcas eram as divisões territoriais que compunham as capitanias. Em geral, em Portugal, o que definia uma comarca era a jurisdição de um corregedor (BLUTEAU, p. 386). No Brasil, a figura que correspondia ao corregedor era o ouvidor.

De acordo com as Ordenações Filipinas, entre as competências do corregedor de comarca estavam funções judiciais e administrativas, tais como: a de receber as culpas enviadas pelos tabeliães; conhecer as inquirições e devassas proferidas pelos tabeliães e juízes; saber se os oficiais de justiça cumpriam seus ofícios; promover ação contra o acoitamento de criminosos e clientela de poderosos; informar ao rei das demandas dos concelhos; informar-se sobre o estado das cadeias, sobre o valor das rendas dos concelhos e sobre posturas prejudiciais ao povo e ao bem comum; existentes nas câmaras; notificar aos prelados sobre os clérigos revoltosos; informar-se sobre os médicos, cirurgiões e sangradores e verificar se possuíam cartas de exercício de medicina; passar cartas de seguro; promover a povoação dos lugares despovoados; mandar fazer benfeitorias públicas; mandar plantar árvores frutíferas segundo a qualidade das terras, entre outras atribuições (WEHLING, WEHLING, 2004, p. 77; PORTUGAL, 1870, p. 103-112).

Nesse mesmo sentido, todas as referências ao corregedor contidas no regimento da Companhia de Ordenanças de 10 de dezembro de 1570, na lei de 18 de outubro de 1709 e na provisão de 30 de abril de 1758, seriam interpretados como funções do ouvidor. Em 1570, elas compreendiam: estar presente na eleição dos oficiais das ordenanças, enviando ao rei os nomes eleitos para o posto de capitão-mor; informar ao rei sobre os impedimentos e ausências dos capitães-mores, para que fossem escolhidas outras pessoas; participar com ogovernador, provedor-mor, capitão e governador de capitania, oficiais de fazenda e os principais homens da terra, na tomada de decisões sobre o governo e segurança das capitanias. Em 1709, suas atribuições incluíam a de indicar, juntamente com os oficiais da câmara, três pessoas a serem escolhidas pelo rei para o posto de capitão-mor das ordenanças e informar, também com os oficiais da câmara, ao general ou cabo que governasse as armas da província, que proporiam ao rei, por meio do Conselho de Guerra, o melhor nome para ocupar o posto. Já em 1758, deveriam proceder contra os capitães-mores e demais oficiais das ordenançasculpados de alguma transgressão, dando apelação ao governador-geral. (SALGADO, 1985, p.147; 260; 358).

O regimento de ouvidor-geral do Estado do Brasil, de 14 de abril de 1628, modificou algumas das atribuições dos ouvidores de capitanias. Uma delas limitava a jurisdição do cargo em relação às causas

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cíveis, diminuindo de cem para vinte mil réis a quantia máxima fixada. No caso de apelação e agravo, estas deveriam ser remetidas para o ouvidor-geral. O regimento também determinava que o ouvidor, junto com o capitão e governador das capitanias, tivesse alçada nos feitos crimes de alguns escravos ou índios, nos casos de pena de açoites ou cortamento de orelhas e nos casos em que peões cristãos livres fossem sentenciados a penas de açoites e degredo até três anos. Nos casos de pessoas de mais qualidade, teriam alçada somente até um ano de degredo e nas penas pecuniárias, até vinte cruzados, diminuindo o estabelecido pela Carta de Doação da capitania de Pernambuco a Duarte Coelho. O regimento também determinava que o ouvidor-geral poderia avocar qualquer causa tratada perante o ouvidor, capitão e governador ou qualquer juiz.

O alvará de regimento do Auditor da gente de guerra do Presídio do Brasil, de 2 de abril de 1630, ordenava que oouvidor-geral tirasse residências dos capitães e ouvidores de capitania. Também determinava que, em caso doouvidor-geral ser posto em suspeição, seria juiz da dita suspeição o provedor dos defuntos, o provedor-mor da Fazenda ou o ouvidor da capitania onde estivesse o ouvidor-geral.

No período pombalino (1750-1777), verificou-se, no âmbito da Justiça, a constituição de uma outra Relação em 1751, no Rio de Janeiro, cidade que, a partir de 1763, se tornaria a sede do governo da colônia. Além disso, estabeleceram-se gradualmente, nas capitanias, Juntas de Justiça e de Fazenda, nas quais os ouvidores tomavam parte.

Data dessa época a finalização do processo de substituição dos ouvidores providos pelos donatários pelos nomeados pelo rei, que, segundo uma parte da bibliografia, só ocorreria de fato com a lei que extinguiu todas as donatarias do reino, em 1790 (SALGADO, 1985, p. 69; WEHLING, WEHLING, 1994, p. 304; WEHLING, WEHLING, 2004, p. 77). Também se realizou nesse período a fixação dos estipêndios dos magistrados e oficiais de justiça das comarcas e dos magistrados da Relação, aliviando a pressão que sofriam os prisioneiros e queixosos. Outra inovação foi o abandono do direito romano pelo direito natural e internacional. Desse modo, nas questões temporais deviam seguir apenas as leis do país e subsidiárias, juntamente com os costumes e práticas estabelecidas (SILVA, 1998, p. 491-492).

Também no período pombalino foi promulgado o Alvará de regimento dos salários dos ministros e oficiais de justiça da América, na Beira-mar e sertão, exceto Minas, de 10 de outubro de 1754, que, ao determinar a quantia recebida pelo ouvidor para cada tipo de procedimento realizado, informava sobre algumas atribuições que não constavam na legislação anterior. Assim, aparecem como competências do ouvidor de comarca: ter alçada nos bens de raiz até a quantia de dezesseis mil réis, nos móveis até vinte mil e nas penas pecuniárias até seis mil; receber ações da alma; mandados de preceito; dar cartas precatórias, citatórias, executórias, de inquirição e posse; dar cartas de seguro; passar instrumentos de justificações para embargo ou segurança; ter o selo da Chancelaria em seu poder; realizar a inquirição de testemunhas; vistoriar as cidades, vilas, termos ou comarcas; realizar diligências; proceder às devassas; realizar as correições; participar na eleição de oficiais de justiça, e; revistar as balanças, pesos e medidas nas comarcas onde houvesse rendeiros da Chancelaria (PORTUGAL, 1830, p. 315-318).

Esse alvará ainda mencionava que os ouvidores eram também provedores em suas comarcas, e tinham a obrigação de examinar as contas dos concelhos e de prover os inventários dos órfãos, tomando as contas de seus rendimentos ou revendo-as, se fossem anteriormente tomadas pelos juízes dos órfãos. Cabiam-lhe, também, as matérias pertinentes às confrarias, capelas, hospitais, e ao domínio dos resíduos, ou seja, os ouvidores deveriam controlar o cumprimento das deixas testamentárias no que respeitava a legados pios. (idem; HESPANHA, 1982, p. 228).

Em algumas regiões os ouvidores tinham funções específicas, como no caso da capitania de Minas Gerais no contexto da mineração, onde cabia ao mesmo pronunciar e julgar as denúncias encaminhadas pelos fiscais no impedimento dos intendentes, tirar devassas e proceder judicialmente em tudo o que fosse necessário na ausência do intendente e aprovar as pessoas nomeadas pela câmara para ocupar o cargo de fiscal daIntendência do Ouro, como indicam os alvarás de 3 de dezembro de 1750 e o de 4 de março de 1751 (SALGADO, 1985, p. 357-358).

A partir de 1758, os ouvidores das capitanias passaram a compor a estrutura das Juntas de Justiça, criadas gradualmente, e que tinham amplas atribuições, como o julgamento de processos, incluindo os crimes cometidos por militares, a observância das leis e a conservação da paz. O alvará de 18 de janeiro de 1765, que determinou a formação de Juntas de Justiça em todas as partes do Brasil onde houvesse ouvidor, ordenou que este assumisse a sua presidência. A partir de 1760, os ouvidores passaram a integrar as Juntas de Fazenda, constituídas nas capitanias.

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Com a chegada da família real ao Brasil, em 1808, a administração da justiça na colônia passou por grande reformulação, especialmente com a criação de tribunais como o do Desembargo do Paço e Mesa da Consciência e Ordens, a Casa de Suplicação, a Junta da Bula da Cruzada, a Real Junta de Agricultura, Comércio, Fábricas e Navegação, diversos juízos privativos, o Conselho Supremo Militar e de Justiça e asRelações do Maranhão e do Recife.

Na jurisdição dos ouvidores das comarcas algumas atribuições foram acrescidas, tais como a de receber as apelações e agravos dos juízes de sesmarias, rubricar o livro dos recebedores do imposto de carnes verdes onde não houvesse uma Junta de Fazenda, e exercer a jurisdição do provedor-mor de Saúde, criado na Corte em 1809.

Os ouvidores somente seriam extintos no período regencial, em 1832, com a lei de 29 de novembro de 1832, que promulgou o Código do Processo Criminal de primeira instância.

 

Angélica Ricci Camargo

BibliografiaBLUTEAU, Raphael. Vocabulario portuguez e latino, v.1. Coimbra: Collegio das Artes da Companhia de Jesus, 1712-1728, p. 386-387. Disponível em: http://www.ieb.usp.br/online/dicionarios/Bluteau/buscaDicionarioPlChave.asp Acesso em 7 outubro 2009.

CAMARINHAS, Nuno. O aparelho judicial ultramarino. O caso do Brasil (1620-1800). Almanack Braziliense, n. 9, maio de 2009. São Paulo: Instituto de Estudos Brasileiros da Universidade de São Paulo. Disponível em: http://www.almanack.usp.br/PDFS/9/almanack.pdf Acesso em: 26 agosto 2009.

CARTA de Doação da capitania de Pernambuco a Duarte Coelho, de 10 de março de 1534. In: TAPAJÓS, Vicente. A Política Administrativa de D. João III. 2ª ed. Rio de Janeiro: DASP – Serviço de Documentação, 1966, p. 193 – 202, 1966. (História Administrativa do Brasil; 2)

HESPANHA, António Manuel. As vésperas do Leviathan: instituições e poder político, Portugal (século XVII). Coimbra: Almedina, 1994.

NEQUETE, Lenine. NEQUETE, Lenine. O Poder Judiciário no Brasil: crônica dos tempos coloniais, v. 2. Brasília: Supremo Tribunal Federal, 2000.

PORTUGAL. Código filipino, ou, Ordenações e leis do Reino de Portugal recopiladas por mandado d’el-Rey D. Phillippe I… / por Candido Mendes de Almeida. segundo a primeira de 1603, e a nona de Coimbra de 1824. ALMEIDA, Cândido Mendes de (Compilador). 14ªed. Rio de Janeiro: Tip. do Instituto Philomatico, p. 103-112, 1870.

PORTUGAL. Alvará de Regimento dos salários dos ministros e oficiais de justiça da América, na Beira-mar e sertão, exceto Minas, de 10 de outubro de 1754. Coleção da Legislação Portuguesa desde a última compilação das Ordenações redigida pelo desembargador Antônio Delgado da Silva. Legislação de 1750 a 1762. Lisboa, p. 315-327, 1830. Disponível em: http://inslusitaniae.fcsh.unl.pt .Acesso: 4 agosto 2008.

SALGADO, Graça (coord.). Fiscais e meirinhos: a administração no Brasil colonial. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1985.

SCHWARTZ, Stuart B. Burocracia e sociedade no Brasil colonial: a suprema corte da Bahia e seus juízes: 1609-1751. Tradução de Maria Helena Pires Martins. São Paulo: Perspectiva, 1979. (Estudos, v. 50).

SILVA, Andrée Mansuy-Diniz. Portugal e o Brasil: a reorganização do Império, 1750-1808. In: BETHELL, Leslie (org.). História da América Latina, v. 1. A América Latina colonial. (trad. Maria Clara Cescato). 2.ed. São Paulo: Editora da Universidade de São Paulo; Brasília, DF: Fundação Alexandre de Gusmão, 1998, p. 477-518.

Page 40: Órgãos Do Período Colonial

WEHLING, Arno; WEHLING, Maria José Mesquita Cavaleiro de Macedo. Formação do Brasil Colonial. Rio de Janeiro: Editora Nova Fronteira, 1994.

WEHLING, Arno; WEHLING, Maria José. Direito e justiça no Brasil colonial: o Tribunal da Relação do Rio de Janeiro (1751-1808). Rio de Janeiro: Renovar, 2004.

Documentos sobre o órgão podem ser encontrados nos seguintes fundos do Arquivo Nacional:BR AN,RIO 6B – Ouvidoria-Geral da Comarca da Capitania de ParanaguáBR AN, RIO 7T – Provedoria da Fazenda Real de SantosBR AN, RIO 4K – Mesa do Desembargo do PaçoBR AN,RIO 83 – Relação da BahiaBR AN,RIO 6D – Título:  Ouvidoria-Geral do Rio de JaneiroBR AN,RIO 86 – Título:  Secretaria do Estado do Brasil

Referência da imagemSentença proferida contra os réus do levante e conjuração de Minas Gerais em 18 de abril de 1792. ARQUIVO Nacional, 150 anos: visão histórica. Rio de Janeiro: Index, 1988. p.35

Provedor/Provedoria dos Defuntos e Ausentes

A Provedoria dos Defuntos e Ausentes foi criada em 13 de dezembro de 1613, com a função de arrecadar, administrar e conhecer todas as causas tocantes aos bens dos defuntos e ausentes que não deixassem procuradores nomeados em seus testamentos.

O cargo de provedor dos ausentes integrava uma categoria da administração lusa, a dos provedores, que fazia parte de uma estrutura bastante especializada, mas periférica, da administração real. Os provedores, como um todo, acumulavam uma variada gama de atribuições, abrangendo duas grandes áreas de competência:. a primeira era a da tutela dos interesses dos titulares que não estivessem em condições de os administrar, como os defuntos, ausentes, órfãos, cativos, ou de pessoas coletivas, como confrarias, capelas, hospitais, concelhos; a segunda era constituída pelas matérias de finanças, tendo que verificar livros, cuidar de arrendamentos reais, tomar contas de almoxarifes e recebedores, etc. (HESPANHA, 1994, p. 206-209)

Em relação aos ausentes, cabia ao provedor administrar seus bens e entregá-los a quem os reclamasse, dando apelação e agravo para a justiça ordinária. No caso dos órfãos, o cargo superintendia a administração da sua fazenda e das atividades dos juízes dos órfãos, em relação ao qual tinha jurisdição cumulativa e de quem recebia os agravos, dando apelação para a Relação da área. No que tocava às capelas, hospitais, albergarias e gafarias, supervisionava a administração dos que não fossem de fundação ou administração eclesiástica ou dos que não estivessem sob proteção imediata do rei (HESPANHA, 1982, p. 228).

Em Portugal, a Provedoria dos Defuntos e Ausentes foi regulada em 1588, e o regimento de 1613 continha disposições específicas para o funcionamento dos órgãos no Brasil, São Tomé, Cabo Verde, Açores e outras partes ultramarinas. Nesses lugares, essas repartições deveriam contar com provedor, tesoureiro e um escrivão. Em Lisboa, existia o cargo de tesoureiro-geral que deveria tomar as contas das provedorias de todo Reino e Domínios, ficando a Mesa da Consciência e Ordens encarregada da tutela desses órgãos.

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De acordo com o regimento de 1613, ao provedor competia ir à casa da pessoa falecida sem herdeiros na terra e fazer, junto com o tesoureiro e o escrivão, o inventário dos bens móveis e de raiz, escrituras e papéis. Nesse inventário constariam informações sobre o defunto e nele se trasladariam os testamentos, se os houvesse.

Toda fazenda móvel lançada no inventário seria enviada para leilão em praça pública, cabendo ao provedor vendê-las a seu justo preço. No caso dos imóveis, o leilão somente ocorreria com o consentimento dos herdeiros. Se o defunto fosse credor, os oficiais da Provedoria cobrariam as dívidas, sendo o dinheiro arrecadado colocado em um cofre. Se ele tivesse dívidas, estas seriam pagas com sua própria fazenda.

O regimento também regulava os procedimentos em caso de morte em navios, detalhando as atribuições dos capitães, mestres, pilotos e escrivães na realização dos inventários, e abrangia os casos de defuntos e ausentes ligados às ordens religiosas.

Os inventários e toda a informação sobre receita e despesa deveriam ser copiados nos livros pertencentes ao tesoureiro, que seriam remetidos para a Mesa de Consciência e Ordens. O dinheiro também iria para Lisboa, depois de descontadas as despesas, para que o tesoureiro-geral o distribuísse aos herdeiros. As certidões das justificações assim como as ações dos credores que ultrapassassem a quantia de 10 mil réis seriam enviadas ao Juiz das Justificações de Guiné, Índia e Mina, onde corriam os processos dos que se queriam habilitar aos bens dos falecidos no Ultramar e que haviam estado a serviço do rei (PORTUGAL, 1998, p.139).

Os sepultamentos dos defuntos deveriam ser providenciados pelos oficiais da Provedoria, bem como seus testamentos, caso houvesse legados por sua alma ou para obras pias. Geralmente, a encomenda da alma ocupava um espaço grande nos testamentos, segundo a tradição católica, junto com os pedidos de missas e da doação de esmolas a pobres e legados a igrejas, irmandades e hospitais (FARIA, 2001, p. 411).

O provedor também funcionaria com instância judicial, competindo conhecer todas as causas dos defuntos, tocantes à sua fazenda e arrecadação, tendo a mesma alçada, no julgamento, dos corregedores e os ouvidores das capitanias, dando apelação e agravo, nos casos que não lhe coubesse, para a Casa da Suplicação. Poderia, ainda, convocar qualquer um dos oficiais nomeados para comparecerem à Mesa de Consciência e Ordens em Portugal.

Em relação à administração da provedoria, o regimento determinava que todos os funcionários fossem nomeados pelo rei. Ao provedor cabia tomar as contas aos tesoureiros a cada seis meses e nomear os oficiais quando se fizessem necessários, com o parecer do bispo, provisor ou vigário-geral. O regimento também informava sobre os ordenados dos oficiais das provedorias e previa punições para os descumprimentos legais.

A legislação portuguesa da época indica que algumas provedorias funcionavam no âmbito das capitanias, mas o mais comum era que se limitassem às comarcas, e menciona que algumas Provedorias dos Defuntos e Ausentes atuavam na administração dos bens das capelas e resíduos.

A vinda da Corte para o Brasil, em 1808, e a montagem do aparato administrativo na nova sede do Reino, não promoveu alterações na administração das Provedorias dos Defuntos e Ausentes. Na estrutura do Tribunal daMesa do Desembargo do Paço e da Consciência e Ordens, foi criado o cargo de promotor fiscal dos defuntos e ausentes a quem competia fiscalizar a arrecadação das fazendas. Em 1817, a decisão n. 33 mandou que as contas dos oficiais dos Defuntos e Ausentes fossem tomadas pelo  Erário Régio, conforme ocorria em Portugal desde 1774.

A lei de 22 de setembro de 1828, que extinguiu a Mesa do Desembargo do Paço e da Consciência e Ordens, encarregou os juízes dos órfãos de entregar os bens dos defuntos e ausentes aos parentes mais próximos e de administrar as habilitações dos herdeiros, atribuição que antes pertencia ao Juízo da Índia e Mina, com recurso ex-officio para a Mesa da Consciência e Ordens. Em 1830, a lei de 3 de novembro extinguiu a Provedoria dos Defuntos e Ausentes, confirmando a passagem da administração dos bens dos defuntos e ausentes para a esfera de atuação dos juízes de órfãos.

Angélica Ricci Camargo

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BibliografiaFARIA, Sheila Castro. Herança. In: VAINFAS, Ronaldo. (org.). Dicionário do Brasil colonial (1500-1808). Rio de Janeiro: Editora Objetiva, 2001, p. 280-281.

______. Morte. In: VAINFAS, Ronaldo. (org.). Dicionário do Brasil colonial (1500-1808). Rio de Janeiro: Editora Objetiva, 2001, p. 410-412

HESPANHA, António Manuel. História das instituições: épocas medieval e moderna. Coimbra: Livraria Almedina, 1982.

_________. As vésperas do Leviathan: instituições e poder político, Portugal (século XVII). Coimbra: Almedina, 1994.

PORTUGAL. Juízo da Índia e Mina. In: Guia Geral dos Fundos da Torre do Tombo: instituições do Antigo Regime, Administração Central (1). Coord. José Mattoso et al. Elab. Ana Maria Rodrigues et al. Fot. José António Silva. Lisboa: Instituto dos Arquivos Nacionais/Torre do Tombo, 1998. p. 138-139.

_________. Juízo das Justificações Ultramarinas. In: Guia Geral dos Fundos da Torre do Tombo: instituições do Antigo Regime, Administração Central (1).Coord. José Mattoso et al. Elab. Ana Maria Rodrigues et al. Fot. José António Silva. Lisboa: Instituto dos Arquivos Nacionais/Torre do Tombo, 1998. p. 139.

_________. Regimento dos oficiais da Fazenda dos Defuntos e Ausentes. Coleção Cronológica da Legislação Portuguesa compilada e anotada por José Justino de Andrade e Silva. Legislação de 1613-1619. Lisboa, p.69-78, 1855. Disponível em: http://www.iuslusitaniae.fcsh.unl.pt. Acesso em: 10 de novembro de 2008.

SALGADO, Graça (coord.). Fiscais e meirinhos: a administração no Brasil colonial. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1985.

Documentos sobre o órgão podem ser encontrados nos seguintes fundos do Arquivo Nacional:BR AN, RIO 4J – Mesa da Consciência e OrdensBR AN, RIO 7X – Junta do Comércio, Agricultura, Fábricas e NavegaçãoBR AN,RIO 4K – Mesa do Desembargo do Paço

Referência da imagemCortejo fúnebre de um membro da Confraria da N. Srª da Conceição. DEBRET, Jean Baptiste. Voyage pittoresque et historique au Brésil, ou Séjour d’un Artiste Français au Brésil, depuis 1816 jusqu’en 1831 inclusivement, epoques de l ‘avénement et de I ‘abdication de S.M. D. Pedro 1er. Paris: Firmind Didot Frères, 1834 – 1839. Arquivo Nacional, OR1909. v. 3, pl. 26.

Relação da Bahia

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A Relação da Bahia foi criada em 7 de março de 1609 como um tribunal de apelação na colônia, à semelhança da Relação de Goa, estabelecida em 1554. Na verdade, a criação da Relação da Bahia data de 1588, mas o tribunal não foi implantado nesta ocasião. O regimento elaborado nessa data serviu, com pequenas alterações, para estabelecer sua estrutura, atribuições e procedimentos em 1609, tendo a Casa de Suplicação de Lisboa como modelo de organização (SCHWARTZ, 1979 p. 41-45).

No reinado de Filipe II, durante a União Ibérica, a estrutura judicial e administrativa portuguesa sofreu uma revisão; a Casa do Cível foi abolida, e a Casa de Suplicação, estabelecida em caráter permanente, recebeu um novo regulamento, além de ser criado um novo tribunal superior, a Relação do Porto (idem, p. 41). A Casa de Suplicação era o tribunal encarregado do julgamento final dos pleitos judiciais da Corte portuguesa, exercendo jurisdição também sobre as comarcas de Estremadura, Alentejo, Algarve, Castelo Branco e Ultramar. Em última instância, a Casa de Suplicação encarregava-se de receber os agravos e apelações da Relação do Porto e, naquilo que excedia sua alçada, das ilhas atlânticas e do ultramar, além dos juízos privativos e comissões cíveis e criminais (HESPANHA, 1994, p. 228-229). Em 1554, foi criada a Relação de Goa, primeiro tribunal de apelação estabelecido fora dos limites de Portugal, numa tentativa de reduzir o volume dos processos e agilizar a aplicação da justiça nas possessões ultramarinas (SCHWARTZ, 1979, p. 17).

Segundo o regimento de 1609, a Relação da Bahia era presidida pelo governador-geral do Estado do Brasil, e sua estrutura era composta de dez desembargadores, que desempenhavam as seguintes funções: um chanceler, que serviria também de juiz da Chancelaria e das Três Ordens Militares; três desembargadores de agravos e apelações; um ouvidor-geral das causas cíveis e do crime; um juiz dos feitos da Coroa, Fazenda e Fisco; um procurador da Coroa, Fazenda e Fisco, que serviria igualmente de promotor de justiça; um provedor dos defuntos e resíduos; e dois desembargadores extravagantes, além de outros oficiais. Nos casos estabelecidos pelo regimento, caberia a interposição de agravos e apelações somente à Casa de Suplicação de Lisboa.

A invasão holandesa e os altos custos decorrentes da manutenção de tropas e fortificações entre os anos de 1624 e 1625, as constantes críticas da elite colonial ao controle e interferência da Relação em seus negócios, o conflito de interesses com outros órgãos da administração colonial e a preocupação com o aumento da burocracia acabaram por contribuir para a suspensão do funcionamento do tribunal de apelação no Brasil (idem, p. 173-187). A partir de então, a estrutura judicial da colônia manteve-se sob a alçada do ouvidor-geral até 1652, quando a Relação da Bahia foi restabelecida (RELAÇÃO da Bahia, 1994, p. 694). Contribuíram para sua retomada uma série de fatores, como o crescimento e a diversificação da economia, que criava novas demandas para o sistema administrativo e judicial e teriam corroborado as sucessivas petições encaminhadas pela Câmara de Salvador ao Conselho Ultramarino, em Lisboa, com queixas sobre as despesas necessárias para interposição de recursos nos tribunais da Corte (SCHWARTZ, 1979, p. 192-193).

Restabelecida a Relação da Bahia, o regimento aprovado em 12 de setembro de 1652 definiu sua estrutura, sendo ela composta de oito desembargadores, que desempenhavam as seguintes funções: um chanceler, que serviria também de juiz da Chancelaria; dois desembargadores de agravos e apelações; um ouvidor-geral dos feitos e causas crimes, que serviria também de auditor da gente de guerra; um

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ouvidor-geral dos feitos e causas cíveis, que serviria também de auditor das causas cíveis entre privilegiados e soldados; um juiz dos feitos da Coroa, Fazenda e Fisco; um procurador dos feitos da Coroa, Fazenda e Fisco, e promotor de justiça; um provedor da Fazenda dos defuntos e resíduos; e oficiais diversos. A estrutura da Relação foi alterada apenas em 10 de novembro de 1698, quando, em resposta a uma consulta ao Conselho Ultramarino, foi elevado para dez o número de desembargadores do órgão (idem, p. 200; BIBLIOTECA NACIONAL, 1950, p. 35-36). A função de juiz dos cavaleiros das Três Ordens Militares, prevista no regimento de 1609 e ausente em 1652, foi incluída entre as atribuições de seus desembargadores em 11 de outubro de 1724 (SCHWARTZ, 1979, p. 1999; BIBLIOTECA NACIONAL, 1950, p. 54).

A Relação da Bahia manteve-se como o único tribunal superior da colônia até 1751, quando foi criada a Relação do Rio de Janeiro. Passariam as duas relações a dividir a jurisdição do Estado do Brasil, cabendo ao Rio de Janeiro todo o território ao sul da Bahia, compreendendo as comarcas do Rio de Janeiro, São Paulo, Ouro Preto, Rio das Mortes, Sabará, Rio das Velhas, Serro do Frio, Cuiabá, Goiás, Itacazes (Campos dos Goitacases), Ilha de Santa Catarina, Paranaguá e Espírito Santo. Transformada a Relação do Rio de Janeiro em Casa de Suplicação, pelo alvará de 10 de maio de 1808, sua jurisdição passou a incluir também os agravos ordinários e as apelações do Pará, Maranhão, ilhas de Açores e Madeira, bem como os da Relação da Bahia, que até então eram remetidos para a Casa de Suplicação de Lisboa.

Havia ainda, na estrutura das relações da Bahia e do Rio de Janeiro, uma Mesa do Desembargo do Paço, para despacho das matérias privativas da jurisdição deste órgão. O alvará de 22 de abril de 1808, que criou na Corte o Tribunal da Mesa do Desembargo do Paço e da Consciência e Ordens, extinguiu a Mesa do Desembargo que existia na Relação do Rio de Janeiro, mas manteve-a funcionando na Relação da Bahia, devido aos inconvenientes para os vassalos sob sua jurisdição, que tinham de recorrer ao novo tribunal na Corte. Além disso, as longas distâncias e a dificuldade de comunicação a que estavam submetidos os colonos para terem acesso ao sistema judicial, somados ao aumento demográfico e à maior importância econômica que a colônia adquiriu no século XVIII, levaram à criação de juntas de Justiça, dada a dificuldade de as regiões mais afastadas serem atendidas pelas relações (WEHLING, 1986, p. 154).

Novas mudanças na jurisdição da Relação da Bahia se deram com a instalação da Relação do Maranhão, em 1811, regulamentada pelo alvará de 13 de maio de 1812. Seu estabelecimento foi resultado de um parecer daMesa do Desembargo do Paço, feito em razão da representação dos moradores da cidade de São Luís e do ofício e requerimento do procurador da Coroa sobre as constantes reclamações acerca da morosidade e parcialidade que envolvia a administração da justiça na capitania. Com a mesma graduação que tinha a Relação da Bahia, o tribunal do Maranhão exerceu jurisdição sobre as comarcas do Maranhão, Pará e Rio Negro, desmembradas da Relação de Lisboa, além de Piauí e Ceará Grande, separadas do distrito da Relação da Bahia. Posteriormente, em 1821, foi criado ainda o Tribunal da Relação da vila do Recife, na capitania de Pernambuco, tendo sido esta a última relação estabelecida antes da Independência.

A revolução constitucionalista do Porto, em 1820, e o retorno de d. João VI a Portugal acentuaram a crise política, que desembocou no processo de independência política do Brasil em 1822. As Cortes Gerais Extraordinárias e Constituintes de Lisboa, encarregadas de elaborar a Constituição, adotaram medidas que visavam a reforçar a condição colonial do Brasil, em um claro retrocesso político-administrativo após o país ter sido alçado à condição de Reino Unido de Portugal e Algarves em 1815. Uma das medidas adotadas pelas Cortes Gerais foi a lei de 13 de janeiro de 1822, que extinguiu os tribunais criados no Rio de Janeiro após a vinda da Corte em 1808. A Casa de Suplicação seria reduzida à posição de relação provincial, como as da Bahia, Recife eMaranhão, e os recursos e apelações de suas comarcas deveriam ser interpostos para Lisboa.

Com a Independência, a Constituição outorgada em 1824 promoveu novas mudanças no sistema judiciário brasileiro. Segundo o texto constitucional, as relações deveriam ser constituídas nas províncias em que fossem necessárias, devendo julgar as causas em segunda e última instância, estando sujeitas a um novo tribunal, o Supremo Tribunal de Justiça, criado em 1828.

Dilma Cabral

BibliografiaBIBLIOTECA NACIONAL. Documentos Históricos, v. 90, p. 35-36, 1950.

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HESPANHA, António Manuel. As vésperas do Leviathan: instituições e poder político, Portugal (século XVII). Coimbra: Almedina, 1994.

RELAÇÃO da Bahia. In: SILVA, Maria Beatriz Nizza da (coord.) Dicionário da história da colonização portuguesa no Brasil. Lisboa: Verbo, 1994. p. 693-695.

SCHWARTZ, Stuart B. Burocracia e sociedade no Brasil colonial. São Paulo: Perspectiva, 1979.

SUBTIL, José. Governo e administração. In: MATTOSO, J. História de Portugal. Lisboa: Círculo de Leitores, 1993, v. 4. p. 180-181.

WEHLING, Arno. Administração portuguesa no Brasil de Pombal a d. João (1777-1808). Coord. Vicente Tapajós. Brasília: Centro de Documentação, Informação e Difusão Graciliano Ramos; Rio de Janeiro: Biblioteca do Exército, 1986. (História Administrativa do Brasil, v. 6).

Documentos sobre este órgão podem ser encontrados nos seguintes fundos do Arquivo Nacional: BR AN, RIO 83 – Relação da BahiaBR AN, RIO 2H – Diversos SDH – CaixasBR AN,RIO 22 – Decretos do Executivo – Período ImperialBR AN,RIO NP – Diversos – SDH – Códices

Referência da imagemAvaliação dos Ofícios do Distrito da Capitania da Bahia feitas no ano de 1689, aprovadas pela Junta dos Três Estados em 1695; e outrossim uma relação das atuais avaliações pelas quais se regulam as meias-anatas, e donativos extraídas da Secretaria do Estado (1695). Fundo: Relação da Bahia, Códice 539, v. 3, f. 6 v. (código do fundo: 83).

Governador-geral do Estado do Brasil

O cargo de governador-geral foi criado em 17 de dezembro de 1548 com o objetivo de centralizar as atividades administrativas na colônia. Neste mesmo contexto foram estabelecidos os cargos deprovedor-mor, destinado à administração fazendária, e o de ouvidor-geral, como autoridade máxima da justiça.

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As experiências de colonização das terras encontradas pelos portugueses nas Américas em 1500 foram iniciadas na década de 1530, com a divisão do território em extensas faixas de terras, as capitanias hereditárias, distribuídas a fidalgos da Casa Real. Com a instalação do governo-geral, em 1548, a Coroa empreendeu uma tentativa de se impor de maneira mais efetiva na colônia, buscando, por um lado, retomar parte dos amplos poderes concedidos aos particulares que detinham e administravam as terras recebidas, e, por outro, criar um centro administrativo que fosse um prolongamento da ordem jurídico-administrativa metropolitana, tornando o controle régio mais eficaz (SALGADO, 1985, p. 51). Além disso, a presença de uma estrutura administrativa mais complexa representava uma forma encontrada para combater de forma mais eficiente os ataques dos estrangeiros e contornar os problemas enfrentados com os indígenas.

O governador-geral se caracterizava como um servidor da monarquia portuguesa, provido de poderes que lhe davam, com certos limites, uma dignidade real, pois exercia nas terras coloniais, por delegação real, poderes que eram próprios do ofício régio. O nome do ocupante era geralmente sugerido pelo Conselho de Estado português e proveniente da indicação do Conselho de Portugal. Até o período da dominação espanhola (1580-1640), os fidalgos escolhidos para ocupar o cargo tinham como requisitos ter prestado serviços na África e Ásia. Depois de 1640, a participação na guerra contra a Espanha passou a ocupar um espaço mais importante entre os critérios de seleção (COSENTINO, 2005 p. 62; 81; 257). Com o tempo, o cargo acabou por se constituir como um dos postos mais elevados do Império ultramarino português.

O governador-geral acumulava amplas atribuições, que incluíam todas as matérias da administração, tendo que prestar contas de seus atos a Portugal. O primeiro regimento dado ao cargo foi o de Tomé de Souza, de 17 de dezembro de 1548. De acordo com este, as principais tarefas a serem desempenhadas eram a de promover o povoamento das terras e a propagação da fé católica. O regimento também determinava que Tomé de Souza avisasse sobre sua chegada aos capitães e governadores, pedindo toda a ajuda necessária para a instalação de um governo central em Salvador, e localizasse um lugar adequado para construir uma fortaleza.

Em relação à colonização, o governador-geral ficava obrigado a distribuir sesmarias a quem pedisse, isentando o pagamento de qualquer foro, exceto o dízimo destinado à Ordem de Cristo. Esta preocupação reiterava o cuidado da Coroa com o desenvolvimento de uma produção econômica lucrativa, notadamente o cultivo da cana-de-açúcar, que se expressava também na determinação de dar terras destinadas à edificação de engenhos para pessoas que tivessem condições financeiras suficientes para a realização do empreendimento (REGIMENTO…, 1966, p. 253-269; SALGADO, 1985, p. 144-145).

Outro tema contido no regimento de 1548 e que permaneceu como constante preocupação da Coroa nos regimentos seguintes, era o do relacionamento com os índios. Datam dessa época várias revoltas indígenas ocorridas nas capitanias da Bahia, São Tomé, Espírito Santo e Porto Seguro (CONSENTINO, 2005, p. 116). Nesse sentido, o regimento do governador-geral determinava que se conservasse a paz e punisse os índios que causassem conflitos ou promovessem guerras. Proibia também que cristãos fossem tratar com os índios em suas aldeias sem licença especial do governador-geral, além de estipular um dia específico para a realização de feiras para que se pudesse comprar e vender mercadorias com nativos e impedir que fossem dadas armas a estes. Para facilitar a conversão ao catolicismo, o regimento mandava que o governador-geral zelasse para que os índios morassem próximos às vilas e povoações (REGIMENTO…, 1966, p. 253-269; SALGADO, 1985, p. 144-145).

No que se refere à defesa e administração militar, da qual o governador-geral era autoridade máxima, o regimento determinava a construção de navios e proibia que qualquer outra pessoa exercesse tal atividade sem a licença do governador ou a do provedor da capitania. Cabia ainda ao cargo ordenar que os capitães e governadores, senhores de engenho e outros moradores tivessem as armas para a defesa da terra e que oscapitães e governadores o informassem sobre a proximidade de corsários ao redor das capitanias (REGIMENTO…, 1966, p. 253-269; SALGADO, 1985, p. 144-145).

Apesar de conduzir mais diretamente o governo da capitania da Bahia, o governador-geral ficava encarregado de visitar todas as demais, junto com o provedor-mor, e realizar atividades que envolviam: discutir com cada capitão e governador, ouvidor, oficiais e pessoas “principais” da terra sobre assuntos relativos à governança e à defesa; taxar, com os governadores e oficiais, os preços das mercadorias; prover os oficiais de Fazenda necessários; informar ao rei sobre as rendas e direitos reais existentes e a maneira como eram arrecadados em cada capitania, e; conceder licença de permissão para as pessoas irem de uma capitania a outra (REGIMENTO…, 1966, p. 253-269; SALGADO, 1985, p. 144-145).

O governador-geral também poderia prover com ofícios os degredados que prestassem bons serviços na colônia e agraciar com o grau de cavaleiro das Ordens Militares aqueles que se destacassem no serviço

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durante períodos de guerra. Tal prática era muito utilizada pela Coroa, com o fim de incentivar a busca do ouro ou recompensar aqueles que se destacavam nas guerras ou que a ajudavam financeiramente. Além disso, era uma forma encontrada pelos reis de obter os resultados pretendidos sem grande dispêndio da Fazenda Real, pois os vassalos acabavam se contentando com as honras e privilégios inerentes à condição de nobre (SILVA, 2005, p. 7).

Por último, o regimento previa que o governador-geral poderia realizar outras atribuições não relacionadas em seu regimento, recorrendo a oficiais ou pessoas que lhe pudessem ajudá-lo. Essa disposição conferia ao cargo uma grande autonomia, já que permitia até desobedecer às instruções régias, sempre que uma avaliação pontual do serviço real o justificasse, o que era inerente ao caráter instável dos empreendimentos coloniais (HESPANHA, 2007, p. 11).

A partir de 1580, com a unificação das Coroas ibéricas sob o reinado de d. Filipe II, ocorreram algumas alterações na estrutura administrativa e na legislação destinada à colônia. Em termos institucionais, em Portugal, as criações mais importantes foram a do Conselho de Portugal, em 1582, a do Conselho da Fazenda, em 1591, e do Conselho da Índia, em 1604, encarregado da supervisão política-administrativa do Brasil, África e Índia portuguesa (WEHLING, 2005, p. 24).

Na colônia, a mudança mais expressiva se deu em 1609 com a instalação da Relação da Bahia, prevista no regimento do governador-geral Francisco Giraldes de 1588. Em relação à atividade legisladora do período, além da revisão e promulgação das Ordenações Filipinas em 1603, observou-se o estabelecimento de normas exclusivas para atividades produtivas coloniais, como os regimentos das terras minerais de 1603, 1613 e 1618, e do pau-brasil, de 1605. Além destas, outras transformações ocorreram na organização territorial quando a colônia foi dividida em mais duas repartições com governos próprios, primeiro com a “Repartição do Sul”, abrangendo as capitanias de São Vicente, Espírito Santo e Rio de Janeiro, entre 1608 e 1612, e depois, com a criação do Estado do Maranhão, que duraria de 1621 a 1774.

O primeiro regimento do governador-geral dessa época foi o de Francisco Giraldes, de 1588, que manteve a maior parte das competências presentes no regimento de Tomé de Souza. Em relação aos índios, esse ato determinava que o governador-geral cuidasse da sua conversão, guardasse as provisões reais que garantiam sua liberdade e não consentisse que lhes fizessem vexações e agravos. Para os índios convertidos, o regimento determinava que o governador-geral concedesse um pedaço de terra para cultivarem uma roça e a isenção, por quinze anos, do pagamento do dízimo. Além disso, mandava que se favorecessem os religiosos encarregados da conversão, especialmente os padres da Companhia de Jesus. No caso de índios e africanos rebelados, a ordem era de aprisioná-los (REGIMENTO…, 1972, p. 253-277; SALGADO, 1985, p. 170-172).

A questão da defesa também recebeu destaque a partir da ordem de zelar pela boa manutenção dos armamentos existentes nas capitanias, de realizar as obras nas fortificações e de ordenar que os donos de engenho de açúcar contribuíssem com armamentos necessários. Havia ainda a determinação ao governador-geral de presenciar o exercício dos bombardeiros, passando as cartas de exame para aqueles que estivessem aptos (REGIMENTO…, 1972, p. 253-277; SALGADO, 1985, p. 170-172).

Em relação à administração da justiça, o regimento ordenava que o governador-geral construísse ou comprasse uma casa onde funcionaria o tribunal da Relação, que somente seria instalado em 1609, e procedesse contra os desembargadores que cometessem algum delito, suspendendo seus ordenados e enviando os autos do processo para o Reino. Disposição semelhante caberia no caso dos oficiais que não cumprissem seus ofícios, os quais deveriam ser repreendidos. O regimento mandava ainda que o governador-geral zelasse para que cristãos-novos não desembarcassem na colônia sem licença régia, vigiasse o cumprimento das penas dos degredados e não se intrometesse na jurisdição eclesiástica – (REGIMENTO…, 1972, p. 253-277; SALGADO, 1985, p. 170-172).

O governador-geral também ficava encarregado de se informar sobre a existência de minas de salitre, de ferro e de outros metais, além de reforçar a fiscalização dos portos, proibindo os navios estrangeiros e do Reino de aportarem sem mostrar provisão régia (REGIMENTO…, 1972, p. 253-277; SALGADO, 1985, p. 170-172).

O regimento seguinte, dado a Gaspar de Sousa, em 1612, trazia como novas atribuições do cargo a necessidade de visitar as capitanias de Rio Grande, Paraíba, Itamaracá e Pernambuco, antes de se estabelecer em Salvador. Também caberia prover o governo da capitania do Rio Grande, e estabelecer os limites entre as capitanias do Rio Grande e da Paraíba (REGIMENTO…, 1972b, p. 413-436; SALGADO, 1985, p. 172-176). A questão indígena também esteve presente, com a determinação de executar a lei sobre a liberdade dos índios e de mandar fazer e imprimir um vocabulário da língua

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indígena a fim de facilitar sua compreensão e a domesticação (REGIMENTO…, 1972b, p. 413-436; SALGADO, 1985, p. 172-176).

A defesa foi mais uma vez um tema recorrente, e, nesse regimento, o governador também aparecia com a patente de capitão-geral do Brasil. Entre suas atribuições estavam a de ter a vigilância na guarda e defesa dos portos e das fortificações, com especial cuidado com Salvador e Recife, a de organizar os moradores emOrdenanças, conforme o Regimento Geral das Ordenanças, e a de realizar o pagamento das pessoas que estivessem no serviço militar (REGIMENTO…, 1972b, p. 413-436; SALGADO, 1985, p. 172-176).

Em relação a aspectos gerais da administração, o governador-geral ficava responsável por diversas tarefas, como: cuidar da manutenção das casas de Misericórdia e hospitais; ordenar o pagamento da gente de guerra, ministros eclesiásticos, oficiais de Justiça e despesas ordinárias por conta do rendimento dos dízimos; mandar fazer e aprovar a folha de receita e despesa, com o parecer do provedor-mor; mandar arrematar o contrato da cobrança dos dízimos, guardando as partes pertencentes à Fazenda Real; tomar providências contra oscapitães e governadores de capitanias que cometessem alguma força, violência ou extorsão pública, substituindo-os enquanto estivessem sob suspeição; impedir que os donatários tomassem mais jurisdição do que as que lhes pertenciam de acordo com sua doação, e; organizar, anualmente, a relação dos oficiais civis, militares e eclesiásticos, e de praças, fortalezas e capitanias, enviando uma cópia dela ao rei. O governador ficava, no entanto, proibido de criar ofícios novos, e de aumentar ordenados, exceto em caso da guerra (REGIMENTO…, 1972b, p. 413-436; SALGADO, 1985, p. 172-176).

No que se refere à administração da Fazenda, o governador-geral ficava encarregado de estimular as culturas e povoamento das terras, a construção de engenhos, a conservação das matas próximas aos engenhos, para que não faltassem madeira e lenha, favorecer a pesca de baleias e a plantação de palmeiras destinadas à fabricação de azeite, bem como fiscalizar o cumprimento dos regimentos do pau-brasil e das minas, especialmente naquilo que tocava aos direitos da Coroa (REGIMENTO…, 1972b, p. 413-436; SALGADO, 1985, p. 172-176).

Além dos regimentos que possuíam as instruções mais gerais, contendo todas as disposições e poderes pertencentes ao governador-geral, como os mencionados, houve outros que trataram de questões conjunturais e de problemas e dificuldades enfrentados em determinados momentos (CONSENTINO, 2005, p. 103). Um desses atos foi dado ao governador-geral e capitão-general d. Fernando Mascarenhas, conde da Torre, em 13 de agosto de 1638, no contexto da guerra contra os holandeses. Com o domínio da Espanha sobre Portugal, as colônias portuguesas passaram a ser alvos dos ataques holandeses, como decorrência dos conflitos entre a Espanha e os Países Baixos. Salvador foi ocupada em 1624, mas a maior conquista foi a capitania de Pernambuco, onde os holandeses permaneceram entre 1630 e 1654 (FAUSTO, 2002, p. 44-45).

Após inúmeras batalhas, em 1638 foi preparada uma forte armada restauradora, composta por trinta e três navios, comandada pelo conde da Torre, que partiu de Lisboa no dia 7 de setembro. O regimento trazido por ele regulamentava o provimento das tropas e o pagamento dos soldados, estabelecendo que o governador-geral ficava encarregado de cuidados especiais, como o de mandar fiscalizar todos os oficiais e soldados embarcados no Reino vindos para o Brasil, convocar o provedor-mor, o tesoureiro, pagador-geral e escrivão da Fazenda para que estivessem presentes ao pagamento das tropas, e conceder licença para que os soldados viajassem para o Reino (ABREU, 2000, p. 117; REGISTO…, 1955, p. 187-209; SALGADO, 1985, p.177-178).

Com a restauração portuguesa, em 1640, houve uma mudança significativa nas instituições centrais do Reino, dando continuidade à criação de órgãos consultivos, imposta pela necessidade de se atender à complexidade crescente dos assuntos de governo (LANGHANS, s.d., p. 214). Vários conselhos foram criados nesse período, como o da Guerra, em 1640, e o Conselho Ultramarino, em 1642, considerado um sucessor do Conselho da Índia e dotado de amplas competências nos domínios ultramarinos, exceto as ligadas aos negócios eclesiásticos. Além disso, várias medidas implantadas buscaram intensificar as bases da administração metropolitana nos seus domínios ultramarinos. Neste contexto, o Brasil adquiriu posição central nos negócios da Coroa portuguesa, como se pode observar com a própria nomeação de Jorge de Mascarenhas, em 1640, que foi o primeiro governador-geral que recebeu o título de vice-rei. Soma-se a isso a elevação da colônia à condição de Principado em 1645, representando o reconhecimento enquanto área privilegiada, que foi seguido do reconhecimento do direito de representação nas Cortes portuguesas, ocorrido em 1653 (GOUVÊA, 2001, p. 293-296).

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Data dessa época o último regimento conhecido dado a um governador-geral, o de Roque da Costa Barreto, de 23 de janeiro de 1677, que manteve grande parte das atribuições dos regimentos anteriores, incorporando e preservando as orientações definidas durante o período da dominação espanhola.

No regimento de Roque da Costa Barreto observava-se a mesma tendência em reforçar as atribuições relacionadas à defesa do território e à organização e pagamento de tropas militares. Além disso, aparece como competência do governador-geral o provimento dos postos milicianos nas capitanias, exceto na de Pernambuco e Rio de Janeiro – pois essa disposição existia nos regimentos de seus próprios governadores. Em relação à gestão fazendária, os novos itens que apareceram foram o de zelar para que os contratos se fizessem por triênios, de ordenar que as despesas feitas em embarcações que se dirigissem à Índia ou de lá viessem fossem cobertas pelo Donativo da Inglaterra e Paz da Holanda, e de cuidar do cumprimento do tratado de comércio entre Portugal e Espanha (REGIMENTO…, 1972c, p.745-846; SALGADO, 1985, p. 233-238). Além disso, determinava a subordinação do governo das capitanias ao governador-geral, que também foi ordenado no regimento dos governadores de capitanias de 1663. Essa disposição incluía as capitanias de Pernambuco e Rio de Janeiro, que segundo a bibliografia sobre o assunto, um pouco antes tinham adquirido certa autonomia, chegando a de Pernambuco a receber um regimento especial que a subordinava diretamente ao Conselho Ultramarino (SALGADO, 1985, p. 68).

Já no século XVIII, tem início um processo de racionalização do aparelho de Estado em Portugal, reforçando o caráter centralizador na administração lusa na metrópole e na colônia. Uma das principais transformações foi a criação, pelo alvará de 28 de julho de 1736, de três secretarias de Estado, a dos Negócios do Reino, a dos Estrangeiros e da Guerra, e a dos Negócios da Marinha e Domínios Ultramarinos. Esta última ficou encarregada pelo controle sobre os órgãos metropolitanos que partilhavam a responsabilidade pelas questões coloniais, incluindo as nomeações de oficiais régios, os provimentos de postos militares, dos ofícios de Justiça e Fazenda, os negócios das missões, e todos os mais pertencentes à administração da Justiça, Fazenda, comércio e governo dos domínios (ARQUIVO NACIONAL, códice 796, fls. 19-21). Sua estruturação absorveu atribuições que antes eram do âmbito de atuação do Conselho Ultramarino, gerando alguns conflitos de jurisdição entre essas duas instâncias.

Essas secretarias foram mantidas após as reformas administrativas empreendidas pelo marquês de Pombal, ministro do rei d. José I, que criou, em 1761, uma nova instância destinada ao controle da administração fazendária, o Erário Régio, elevado à categoria de secretaria de Estado no reinado de d. Maria, em 1788.

No Brasil, essa política refletiu-se na criação de órgãos especializados para o incentivo agrícola e o controle do comércio de vários gêneros, como as Mesas de Inspeção, e na reformulação da administração do ouro e diamantes e da administração geral da Fazenda (WEHLING, 1986, p. 115). Além dessas mudanças, a partir de 1720 todos os governadores-gerais passaram a deter o título de vice-rei. A distinção entre os títulos não era de âmbito jurisdicional, mas situava-se no nível da representação do poder, observado especialmente no cerimonial da posse (MONTEIRO, 2001, p. 259).

Em 1763, em decorrência à descoberta de ouro no território onde atualmente situa-se Minas Gerais, ocorreu a mudança da capital da colônia, que passou para cidade do Rio de Janeiro, onde um pouco antes foi instalada uma Relação. Em 1774, o Estado do Maranhão foi extinto, passando a integrar o do Brasil, mudando, novamente, a estrutura territorial e administrativa da colônia. Ainda no século XVIII os governadores das capitanias mais importantes, chamadas de capitanias-gerais, passaram a assumir um papel de destaque como forças dominantes na frente administrativa colonial, processo que foi acompanhado de uma perda da autoridade do governador-geral. Assim, os governadores das capitanias-gerais, como São Paulo, Minas Gerais, Goiás, Mato Grosso, Pernambuco, Bahia, e, depois de 1774, do Grão-Pará e Maranhão, correspondiam-se diretamente com o rei e com o Conselho Ultramarino (RUSSELL-WOOD, 1998, p. 178).

Em 1808, com a vinda do príncipe regente d. João e a família real ao Brasil o cargo de governador-geral deixou de existir. A partir desse momento foi instituída uma nova estrutura da administração portuguesa no Brasil com a transferência de vários órgãos centrais para o Rio de Janeiro, que foram adaptados à nova conjuntura política e ao aparato institucional existente na colônia.

Angélica Ricci Camargo

 

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Governadores-gerais / vice-reis do Estado do Brasil – 1549-1808Fonte: Campo Belo, 2010

1549-1553 – Tomé de Sousa1553-1557 – D. Duarte da Costa1557-1572- Mem de Sá1573-1578 – Luiz de Brito de Almeida1578-1581 – Lourenço da Veiga1583-1587 – Manuel Teles Barreto1591-1602 – D. Francisco de Sousa1602-1607 – Diogo Botelho1608-1612 – D. Diogo de Meneses1613-1617 – Gaspar de Sousa1618-1621 – D. Luiz de Sousa (2º conde do Prado)1621-1624 – Diogo de Mendonça Furtado1625-1626 – D. Francisco de Moura Rolim1626-1635 – Diogo Luiz de Oliveira1635-1638 – Pedro da Silva (1º conde de São Lourenço)1639-1640 – D. Fernando de Mascarenhas (1º conde da Torre)1640-1641 – D. Jorge de Mascarenhas (1º marquês de Montalvão) – 1º vice-rei do Estado do Brasil1642-1647 – Antônio Teles da Silva1647-1649 – Antônio Teles de Meneses (1º conde de Vila Pouca)1649-1653 – João Rodrigues de Vasconcelos e Sousa (2º conde de Castelo Melhor)1654-1657 – D. Jerônimo de Ataíde (6º conde de Atouguia)1657-1663 – Francisco Barreto de Meneses1663-1667 – D. Vasco de Mascarenhas (1º conde de Óbidos) – 2º vice-rei do Estado do Brasil1667-1671 – Alexandre de Sousa Freire1671-1675 – Afonso Furtado de Mendonça Castro do Rio e Meneses (1º visconde de Barbacena)1678-1682 – Roque da Costa Barreto1682-1684 – Antônio de Sousa Meneses1684-1687 – D. Antônio Luiz de Sousa Telo de Meneses (2º marquês das Minas)1687-1688 – Matias da Cunha1690-1694 – Antônio Luiz Gonçalves da Câmara Coutinho1694-1702 – D. João de Lencastre1702-1705 – D. Rodrigo da Costa1705-1709 – Luiz César de Meneses1710-1711 – D. Lourenço de Almada1711-1714 – Pedro de Vasconcelos e Sousa1714-1718 – D. Pedro Antônio de Noronha (1º marquês de Angeja) – 3º vice-rei do Estado do Brasil1718-1719 – D. Sancho de Faro e Sousa (2º conde de Vimeiro)1720-1735 – Vasco Fernandes César de Meneses (1º conde de Sabugosa) – 4º vice-rei do Estado do Brasil1735-1749 – André de Melo e Castro (2º conde das Galveias) – 5º vice-rei do Estado do Brasil1749-1755 – D. Luiz Peregrino de Ataíde (10º conde de Atouguia) – 6º vice-rei do Estado do Brasil1755-1760 – D Marcos de Noronha (6º conde dos Arcos) – 7º vice-rei do Estado do Brasil1760-1760 – D. Antônio de Almeida Soares Portugal (1º marquês de Lavradio) – 8º vice-rei do Estado do Brasil1763-1767 – D. Antônio Álvares da Cunha (1º conde da Cunha) – 9º vice-rei do Estado do Brasil1767-1769 – D. Antônio Rolim de Moura (1º conde de Azambuja) – 10º vice-rei do Estado do Brasil1769-1779 – D. Luiz de Almeida Portugal Soares Mascarenhas (2º marquês de Lavradio) – 11º vice-rei do Estado do Brasil1779-1790 – Luiz de Vasconcelos e Sousa (conde de Figueiró) – 12º vice-rei do Estado do Brasil1790-1801 – D. Luiz de Castro (2º conde de Rezende) – 13º vice-rei do Estado do Brasil1804-1806 – D. Fernando José de Portugal (2º marquês de Aguiar) – 14º vice-rei do Estado do Brasil1806-1808 – D. Marcos de Noronha e Brito (8º conde dos Arcos) – 15º vice-rei do Estado do Brasil

 

BibliografiaABREU, Capistrano de. Capítulos de história colonial (1500-1800). 7. ed. Belo Horizonte: Itatiaia; São Paulo: Publifolha, 2000.

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CAMPO BELLO, Henrique Leite Pereira de Paiva de Faria Tavora. Governadores gerais e vice-reis do Brasil. Porto: Delegação Executiva do Brasil às Comemorações centenária de Portugal, 1940.

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COSENTINO, Francisco Carlos Cardoso. Governadores-gerais do Estado do Brasil (séculos XVI e XVII): ofício, regimentos, governação e trajetórias. Tese (Doutorado em História) – Universidade Federal Fluminense, Niterói, 2005.

GOUVÊA, Maria de Fátima Silva. “Poder político e administração na formação do complexo atlântico português (1645-1808)”. In: FRAGOSO, João; BICALHO, Maria Fernanda Baptista; GOUVÊA, Maria de Fátima Silva (orgs.). O antigo regime nos trópicos: a dinâmica imperial portuguesa (séculos XVI – XVIII). Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, p. 285- 315, 2001.

HESPANHA, António Manuel. A constituição do Império Português. Revisão de alguns enviesamentos correntes. Disponível em: http://www.hespanha.net. Acesso em: 31 janeiro 2007.

LANGHANS, Franz Paul de Almeida. Organização administrativa central. In: SERRÃO, Joel (dir.). Dicionário da história de Portugal. Lisboa: Iniciativas Editoriais, 1964-1971. v. III.

MONTEIRO, Nuno Gonçalo. Trajetórias sociais e governo das conquistas: Notas preliminares sobre os vice-reis e governadores-gerais do Brasil e da Índia nos século XVII e XVIII. In: FRAGOSO, João; BICALHO, Maria Fernanda Baptista; GOUVÊA, Maria de Fátima Silva (orgs.). O antigo regime nos trópicos: a dinâmica imperial portuguesa (séculos XVI – XVIII). Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, p. 249-283, 2001.

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REGIMENTO de Francisco Giraldes, de 30 de março de 1588. In: MENDONÇA, Marcos Carneiro de. Raízes da Formação Administrativa do Brasil. Rio de Janeiro: Conselho Federal de Cultura, 1972, v. 1, p. 253-277.

REGIMENTO de Gaspar de Souza, de 6 de outubro de 1612. In: MENDONÇA, Marcos Carneiro de. Raízes da Formação Administrativa do Brasil. Rio de Janeiro: Conselho Federal de Cultura, 1972, v. 1, p. 413 – 436.

REGIMENTO de Roque da Costa Barreto dos governadores-gerais, de 16 de janeiro de 1677. In: MENDONÇA, Marcos Carneiro de. Raízes da formação administrativa do Brasil. Rio de Janeiro: Conselho Federal de Cultura, 1972, v. 2, p. 745-846.

REGISTRO de um traslado do regimento que a este Estado trouxe o conde da Torre dom Fernando Mascarenhas, tirado do próprio escrivão da Fazenda Real, que foi deste Estado Miguel Pinto de Freitas, de 13 de agosto de 1638. In: BIBLIOTECA NACIONAL. Documentos Históricos. Rio de Janeiro, 1955, v. 79, p. 187-209.

RUSSELL-WOOD, A. J. R. Governantes e agentes. In: BETHENCOURT, Francisco; CHAUDHURI, Kirti (org.). História da expansão portuguesa. v. 3: O Brasil na balança do Império (1697-1808). Lisboa: Círculo de Leitores, 1999.

SALGADO, Graça (coord.). Fiscais e meirinhos: a administração no Brasil colonial. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1985.

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Documentos sobre o órgão podem ser encontrados nos seguintes fundos do Arquivo Nacional:BR AN,RIO D9 – Vice-ReinadoBR AN,RIO 2H – Diversos SDH – CaixasBR AN,RIO 86 – Secretaria do Estado do BrasilBR AN,RIO 53 – Ministério do ImpérioBR AN,RIO 59 – Negócios de PortugalBR AN,RIO 03 – Alfândega da BahiaBR AN,RIO 4B – Junta da Real Fazenda da Capitania do Rio de JaneiroBR AN,RIO 7T – Provedoria da Fazenda Real de SantosBR AN, RIO NP – Diversos SDH – CódicesBR AN,RIO 8D- Secretaria do Governo da Nova Colônia de SacramentoBR AN,RIO BI – SesmariasBR AN,RIO 4K – Mesa do Desembargo do PaçoBR AN,RIO 0Q – Chancelaria-MorBR AN,RIO RD – Marquês do Lavradio

Referência da imagemCarta da Costa Oriental da América do Sul , do “Cabo do Norte” (Cabo do Norte, lat. 01º 40′ N) à “I: de d.º Ramires, ilhas situadas ao norte da passagem de Drake . Livro que da razão do estado do Brasil. Rio de Janeiro: Instituto Nacional do Livro, 1968. 85p.:il.;38cm. Arquivo Nacional ACG02522