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Organização social e produtiva de farinheiras comunitárias na APA de Guaraqueçaba - PR: uma estratégia de desenvolvimento local Nathalia de Jesus Sibuya¹ Bruno Mathias Paifer² Valdir Frigo Denardin³ Luiz Fernando de Carli Lauter Guilherme Lim 1 Bacharel em Gestão Ambiental/Universidade Federal do Paraná Setor Litoral, [email protected] 2 Bacharel em Gestão Ambiental/Universidade Federal do Paraná Setor Litoral, [email protected] 3 Doutor em Desenvolvimento, Agricultura e Sociedade/Universidade Federal do Paraná Setor Litoral/Coordenador da Ação, [email protected] 4 Doutor em Geografia/Universidade Federal do Paraná Setor Litoral/ Coordenador do Programa, [email protected] 5 Bacharel em Gestão e Empreendedorismo/Universidade Federal do Paraná Setor Litoral/ Estagiário do Programa, [email protected] Resumo O Litoral do Paraná está inserido no mais preservado espaço contínuo de Mata Atlântica do Brasil, rico em sociobiodiversidade e pluralidade cultural. O cultivo de mandioca na região atua como atividade estratégica para o desenvolvimento local, visto que contribui para a segurança alimentar e é um potencial de geração de renda para as famílias rurais. A produção de farinha de mandioca é uma tradição, sendo repassada de geração em geração, é popularmente conhecida como “Farinha da Boa” ou “Farinha da Terra”, devido seu modo artesanal de processamento. No entanto, os agricultores familiares, encontram alguns limitantes para o exercício desta atividade, como a disponibilidade de área de plantio, a dificuldade de transporte das mercadorias, falta de licença da vigilância sanitária e alvará de funcionamento para agroindústrias, falta de um rótulo de identificação adequado, além da concorrência de farinhas vindas de outras localidades. Neste contexto, o objetivo do presente artigo é relatar as ações realizadas e estratégias utilizadas pelo Programa de Extensão Farinheiras no Litoral do Paraná, da Universidade Federal do Paraná Setor Litoral, por intermédio da metodologia participativa, para auxiliar na organização social e produtiva de farinheiras comunitárias, localizadas nas comunidades de Açungui e Potinga, na APA de Guaraqueçaba. O Programa desenvolve desde o ano de 2008, ações de ensino, pesquisa e extensão no âmbito ambiental, cultural, social e econômico, possibilitando algumas conquistas como a licença da vigilância sanitária e o alvará de funcionamento da prefeitura, a elaboração do rótulo da farinha de mandioca com identidade cultural/territorial, a construção do termo de uso

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Organização social e produtiva de farinheiras comunitárias na APA de

Guaraqueçaba - PR: uma estratégia de desenvolvimento local

Nathalia de Jesus Sibuya¹

Bruno Mathias Paifer²

Valdir Frigo Denardin³

Luiz Fernando de Carli Lauter

Guilherme Lim

1 Bacharel em Gestão Ambiental/Universidade Federal do Paraná – Setor Litoral,

[email protected]

2 Bacharel em Gestão Ambiental/Universidade Federal do Paraná – Setor Litoral,

[email protected]

3 Doutor em Desenvolvimento, Agricultura e Sociedade/Universidade Federal do

Paraná – Setor Litoral/Coordenador da Ação, [email protected] 4 Doutor em Geografia/Universidade Federal do Paraná – Setor Litoral/ Coordenador

do Programa, [email protected]

5 Bacharel em Gestão e Empreendedorismo/Universidade Federal do Paraná – Setor

Litoral/ Estagiário do Programa, [email protected]

Resumo

O Litoral do Paraná está inserido no mais preservado espaço contínuo de Mata Atlântica

do Brasil, rico em sociobiodiversidade e pluralidade cultural. O cultivo de mandioca na

região atua como atividade estratégica para o desenvolvimento local, visto que contribui

para a segurança alimentar e é um potencial de geração de renda para as famílias rurais.

A produção de farinha de mandioca é uma tradição, sendo repassada de geração em

geração, é popularmente conhecida como “Farinha da Boa” ou “Farinha da Terra”,

devido seu modo artesanal de processamento. No entanto, os agricultores familiares,

encontram alguns limitantes para o exercício desta atividade, como a disponibilidade de

área de plantio, a dificuldade de transporte das mercadorias, falta de licença da

vigilância sanitária e alvará de funcionamento para agroindústrias, falta de um rótulo de

identificação adequado, além da concorrência de farinhas vindas de outras localidades.

Neste contexto, o objetivo do presente artigo é relatar as ações realizadas e estratégias

utilizadas pelo Programa de Extensão Farinheiras no Litoral do Paraná, da Universidade

Federal do Paraná – Setor Litoral, por intermédio da metodologia participativa, para

auxiliar na organização social e produtiva de farinheiras comunitárias, localizadas nas

comunidades de Açungui e Potinga, na APA de Guaraqueçaba. O Programa desenvolve

desde o ano de 2008, ações de ensino, pesquisa e extensão no âmbito ambiental,

cultural, social e econômico, possibilitando algumas conquistas como a licença da

vigilância sanitária e o alvará de funcionamento da prefeitura, a elaboração do rótulo da

farinha de mandioca com identidade cultural/territorial, a construção do termo de uso

dos equipamentos das unidades produtivas, o fortalecimento das associações

comunitárias, bem como o estabelecimento da autogestão das unidades produtivas.

Palavras chaves: Litoral do Paraná, Farinheiras Comunitárias, Programa de

Extensão, Organização Social e Produtiva.

Introdução

O litoral do Paraná apresenta sete municípios, podendo ser dividido de acordo

com suas características sociais e atividades econômicas, sendo os portuários,

Paranaguá e Antonina, sendo o primeiro o maior exportador de grãos da América Latina

e o segundo com movimentação de diversas, os praiano-turísticos, Matinhos, Pontal do

Paraná e Guaratuba, que dependem economicamente do turismo de veraneio e por

último os rurais, Morretes e Guaraqueçaba (ESTADES, 2003).

O município de Guaraqueçaba se destaca entre os demais por apresentar o

espaço mais bem preservado da Mata Atlântica, tendo 98% de sua área coberta por

Unidades de Conservação (UCs), dentre as categorias presentes estão APA (Área de

Proteção Ambiental), a ESEC (Estação Ecológica), o PARNA (Parque Nacional), a

REBIO (Reserva Biológica) e a RPPN (Reserva Particular do Patrimônio Natural). A

criação das áreas protegidas e a implementação de seu marco regulatório, desencadeou

na região, uma série de conflitos socioambientais inerentes ao uso e ocupação do solo e

ao acesso aos recursos naturais (DENARDIN et al., 2008).

Figura 1 – Localização do Município de Guaraqueçaba, Litoral do Paraná.

Fonte: SIBUYA et al., 2013

É um município com característica predominantemente rural, possui forte

potencial agrícola, onde se evidencia o cultivo da banana e mandioca, realizada por

famílias de pequenos agricultores.

A produção de mandioca é de grande importância para estas famílias, pois,

além de contribuir para a segurança alimentar, é uma atividade estratégica na geração de

renda e no desenvolvimento local. A prática do ato de fazer farinha de mandioca é uma

tradição na região, a farinha é popularmente conhecida pelos consumidores como

“Farinha da Boa” ou “Farinha da Terra”, sendo repassada de geração em geração,

mantendo o modo artesanal de processamento de acordo com a cultura material de cada

família. As etapas sequenciais da produção, após a colheita da raiz, são basicamente as

mesmas para cada família: a lavagem da raiz; descascamento; ralação; prensagem;

peneiração; torragem e embalagem do produto final (SIBUYA et al 2013).

A distinção no modo de fazer farinha de cada família está ligada a variedade de

rama utilizada no plantio, na forma de divisão do trabalho entre homens e mulheres no

momento do processamento, na velocidade de rotação em que se encontra a pá para a

torração da farinha e no tempo de torração.

No que diz respeito à valorização das famílias no meio rural e das diversidades

produtivas desenvolvidas por estas, está vinculado com a introdução da produção

agropecuária no mercado. No entanto, a proximidade de pequenos produtores com o

mercado externo nem sempre é favorecida, visto que a realidade de competição com

outras fontes de mercado é maior e ainda se destaca a dificuldade de acesso ou o

mantimento deles nesse processo de construção social.

Sendo assim, os fatores que agregam valores para um produto, que trazem

consigo a identidade regional e cultura local são estratégias importantes para o

desenvolvimento social e também na construção de canais de comercialização, sendo

fonte de geração de renda e ponte do agricultor até o mercado consumidor.

Neste contexto, destaca-se a comunidade de Açungui, que está localizada as

margens do rio Açungui e da rodovia PR-405, próxima às coordenadas UTM 22J 758905

721269, entre Tagaçaba e Serra Negra, a cerca de 40 km da sede do município de

Guaraqueçaba, tem aproximadamente 150 habitantes, distribuídos em 37 famílias.

Quanto à descendência a maioria relata ter parentesco de origem indígena e portuguesa; e

deve-se citar também a comunidade de Potinga, que fica entre as comunidades de Rio do

Cedro e Tagaçaba, próxima às coordenadas geográficas 25° 14’S e 48° 30’W, sua população

reside basicamente às margens da PR 405 e uma pequena parcela habita o entorno próximo

de alguns rios que permeiam a região. A comunidade possui cerca de 200 habitantes

(KASSEBOEHMER, 2007).

No ano de 2003, o Programa Paraná Doze Meses, através da EMATER (Instituto

Paranaense de Assistência Técnica e Extensão Rural), contemplou Açungui com uma

farinheira comunitária e um micro trator, e Potinga apenas com a farinheira comunitária.

Porém este processo de implantação das unidades produtivas não ocorreu com consulta

pública nas comunidades, o que fez com que grande parte dos equipamentos não

pudessem ser utilizados ou demonstrassem ser inadequados ao uso das comunidades,

tornando-se locais inativos.

O primeiro contato do Programa de Extensão com as farinheiras comunitárias

ocorreu através do Projeto “Estudo da cadeia produtiva da mandioca como estratégia

para o desenvolvimento da agroindústria familiar no litoral do paranaense”

(DENARDIN et al., 2009) que identificou um total de 118 farinheiras nos sete

municípios do litoral do Paraná. Destas, oito são farinheiras comunitárias e as demais

são farinheiras individuais que produzem para o auto-consumo e para o mercado. Foi

identificado também que nenhuma farinheira possuía a autorização da vigilância

sanitária, seja municipal ou estadual, para operar. Entretanto, as farinheiras comunitárias

do Açungui e Potinga, encontravam-se em condições favoráveis para a adequação as

normas da vigilância sanitária, então o Projeto acima mencionado passou a ser

denominado Reestruturação Produtiva de Farinheiras Comunitárias no Litoral do Paraná

e optou-se por trabalhar inicialmente com a comunidade de Açungui e posteriormente

houve a inclusão da comunidade de Potinga. O objetivo foi à organização social e

produtiva das farinheiras comunitárias, bem como, possibilitar a geração de renda e

permanência no campo dos pequenos agricultores. No ano de 2009 se tornou um

Programa de Extensão e conquistou o Prêmio Santander Universidade Solidária. O

Programa trabalhava numa espécie de guarda chuva sendo dividido em quatro metas,

compreendendo Processos Agroecológicos, Mercado, Gestão, Organização e Resgate

Cultural. No entanto, devido ao tempo de atuação e a forte interdisciplinaridade, houve

a necessidade de incorporar as metas umas as outras, e atualmente é desenvolvido com

duas metas principais.

O artigo tem por objetivo relatar as ações realizadas e estratégias utilizadas pelo

Programa de Extensão para auxiliar na organização social e produtiva das farinheiras

comunitárias, visando à geração de renda e a permanência dos agricultores familiares no

campo.

Além desta introdução, apresenta-se a metodologia utilizada, os resultados a

partir de um conjunto de metas estabelecidas em parceria com as comunidades, e por

fim as conclusões ou considerações.

Metodologia

A principal metodologia do Programa de Extensão, que norteia todas as ações

nas comunidades, é a participativa. De acordo com Kummer (2007), o método

participativo é um processo no qual a troca de informações ocorre entre todos os

envolvidos, internaliza-se os problemas e potencialidades principais de forma coletiva, o

que gera uma participação dos envolvidos, provocando e apoiando o processo de

mudança comportamental de cada um e do grupo como um todo. Também são

utilizadas algumas ferramentas, que auxiliam nas oficinas de capacitação e no processo

de diálogo com as comunidades, como o Diagnóstico Rural Participativo, o Mapa da

Cadeia Produtiva de Mandioca, o Geoprocessamento, o Grupo Focal, o Brainstorming

ou Tempestade de Ideias, e a História Oral.

O Programa atualmente é subdividido em duas metas, Meta 1 – Gestão,

Organização e Estratégias de Mercado, e a Meta 2 - Gestão Ambiental e Processos

Agroecológicos. Cada meta possui certa autonomia para realizar as ações propostas,

contudo os resultados, positivos e negativos, são socializados em reuniões semanais aos

demais membros do Programa. Este procedimento permite que a equipe toda tome

conhecimento de como cada meta esta avançando, suas dificuldades, erros e acertos.

A equipe de trabalho é interdisciplinar, com o intuito de proporcionar maior

diversidade e aporte de informações à comunidade, é composta por: professores

economistas, geógrafos, agrônomos e gestores ambientais; estudantes dos cursos de

gestão ambiental, gestão e empreendedorismo, gestão pública e agroecologia. Além de

se tornar um instrumento de transformação e impacto no desenvolvimento local, a

intenção do Programa é a troca de saberes, entre o científico e o popula;r, incentivando

o protagonismo e a autogestão das comunidades, a universidade atuando como meros

orientadores.

Resultados e Discussões

Os resultados e discussões serão apresentados a partir de duas metas, que

corespondem a Projetos no Programa de extensão.

Meta 1 – Gestão, Organização e Estratégias de Comercialização

Durante os Projetos anteriores foi possível constatar que ambas as comunidades

detinham uma organização comunitária formalizada, no formato de Associação, porém

nem sempre seu funcionamento era efetivo, havia uma necessidade de um agente

motivador. Na comunidade de Açungui, a gestão da Associação estava praticamente

abandonada por conta de conflitos nas relações interpessoais dentro da comunidade, o

que influenciava diretamente na conclusão da reforma da farinheira comunitária para a

ativação da mesma. A Associação da comunidade de Potinga abrange a comunidade

vizinha, Rio do Cedro, conta com um número razoável de membros, sua organização é

fortalecida e articulada, mas em relação à farinheira comunitária a associação só

avançou nas reformas quando foi orientada pela vigilância sanitária quanto à

necessidade da rotulagem da farinha de mandioca.

Desta forma, a equipe do Programa juntamente com os agricultores familiares

definiram como a reestruturação física das unidades produtivas e a adequação as normas

da vigilância sanitária, para obtenção da licença e alvará de funcionamento para

agroindústrias. E posteriormente realizaram ações para o fortalecimento da imagem do

produto, farinha de mandioca, e a construção de estratégias para a comercialização do

produto em mercados mais organizados, por intermédio de ferramentas.

A ideia foi promover nas comunidades um espaço de reflexão e discussão da

realidade local, buscando o fortalecimento dos laços comunitários, a autogestão e

desenvolvimentos das relações institucionais. A meta teve várias etapas:

Etapa 1 – Visitas técnicas: parecer de técnicos especializados da Vigilância

Sanitária para promover a melhoria continua da unidade produtiva;

Etapa 2 - Inovações tecnológicas: foram feitos os ajustes necessários e

introduzidos novos maquinários que aprimorem a qualidade dos produtos, respeitando a

experiência e o “saber local”;

Etapa 3 – Oficinas para autogestão: repassar/relembrar conhecimentos sobre

gestão e organização da produção de farinha de mandioca.

Etapa 4 – Apoio a organização e fortalecimento do grupo: reforçar

potencialidades e corrigir dificuldades em relação à gestão interna do grupo;

Etapa 5 – Promover intercâmbios entre as comunidades e instituições.

Etapa 6 – Capacitar os agricultores sobre boas práticas de higiene durante o

processo produtivo;

Etapa 7 – Promover encontros entre os grupos comunitários produtores de

farinha para troca de experiências no que tange as práticas de higiene e acesso a

mercado;

Etapa 8 - Rotulagem dos produtos: elaborar a rotulagem da farinha de

mandioca produzida na farinheira. Estimulando a identidade territorial/cultural.

Etapa 9 – Propor novos canais de comercialização para a farinha e demais

derivados da mandioca no mercado local e regional;

Etapa 10 – Incremento na geração de renda: acompanhar sistematicamente a

produção de farinha pelas famílias.

No decurso dessas etapas, que atualmente continuam em andamento, é notável

os avanços das comunidades, e podem-se citar resultados concretos conquistados.

O primeiro resultado a relatar é a reestruturação completa das unidades

produtivas, a conquista da licença da vigilância sanitária e do alvará de funcionamento

da prefeitura, por intermédio de muito diálogo com as famílias, mutirões de reforma,

articulação de parcerias institucionais e visitas de avaliação da vigilância sanitária.

Figura 2 – Reforma da Farinheira (Açungui) Figura 3 – Visita da Vigilância Sanitária

Fonte: Banco de Dados do Programa (Açungui)

Fonte: Banco de Dados do Programa

Figura 4 – Visita Vigilância Sanitária

(Potinga)

Fonte: Banco de Dados do Programa Figura 5 – Farinheira Comunitária após Reforma

(Potinga)

Fonte: Banco de Dados do Programa

As oficinas de boas práticas de higiene e segurança do trabalho foram

fundamentais na obtenção da licença, mas mesmo após a conquista, houve continuidade

buscando atender as demandas das comunidades com assessoria e treinamentos dos

membros associados. As oficinas ministradas tinham como intuito a demonstração

correta da lavagem de mãos, como produzir a farinha com segurança e cuidado, como

adaptar os equipamentos as normas de segurança do trabalho.

Na aplicação das oficinas, surgiu o desejo por parte dos participantes, de se

planejar a elaboração de uma cartilha de bolso, sobre as boas práticas de higiene, para

os associados da farinheira comunitária.

Figura 6 – Oficina de Segurança do Trabalho

Fonte: Banco de Dados do Programa

O rótulo da farinha de mandioca é uma exigência estabelecida pela ANVISA

(Agência Nacional de Vigilância Sanitária), sem o mesmo não é possível à

comercialização do produto. A primeira experiência de elaboração do rótulo foi

realizada na comunidade de Açungui. O processo de desenvolvimento teve a duração de

aproximadamente quatro meses. A equipe do Programa realizou um total de vinte

reuniões internas na universidade e seis reuniões com a comunidade: quatro oficinas

participativas e dois encontros para conversas individuais na casa de cada associado.

A equipe do Programa teve a possibilidade de rever as oficinas realizadas na

comunidade de Açungui, corrigir os erros cometidos e fazer um planejamento mais

refinado, para a elaboração do rótulo em Potinga. A comunidade de Potinga possui uma

associação mais fortalecida e organizada, o que fez com que o processo de elaboração

do rótulo fosse desenvolvido de modo mais objetivo e rápido. No total foram realizadas

três oficinas para construção do rótulo, a data das reuniões era de preferência no mesmo

dia da Assembleia Geral da Associação de Moradores e Pequenos Produtores de

Potinga e Rio do Cedro. Após as oficinas os agricultores se reuniam para discutir e

propor, pensar o rótulo. Os resultados das conversas eram repassados a equipe do

Programa.

Ambas as comunidades optaram por enfatizar no rótulo a identidade

territorial/cultural, acrescentando uma marca e imagem local.

Figura 7 – Rótulo do Açungui Figura 8 – Rótulo da Potinga

Fonte: Banco de Dados do Programa Fonte: Banco de Dados do Programa

Outra mudança de destaque foi à adoção do livro controle da produção de

farinha, nas unidades produtivas, facilitando o planejamento da produção e auxiliando

na quantificação do produto.

Figura 9 – Livro Controle da Produção

Fonte: Banco de Dados do Programa

Na comunidade do Açungui a equipe do Programa sentiu a necessidade de

utilizar a metodologia do mapa de propriedade que é uma das ferramentas do DRP –

diagnóstico rural participativo. O mapa de propriedade mostra todos os detalhes

produtivos e de infraestrutura social de uma propriedade. Serve para o planejamento, a

discussão e a análise da informação visualizada. Os dados foram coletados em duas

fases:

Fase 1 – Aplicação de questionário socioeconômico na comunidade de Açungui.

Fase 2 – Mapas de propriedade

Resultando em 19 mapas de propriedade de 17 agricultores da comunidade com

todas as informações de interesse. Os mapas permitiram quantificar o potencial

produtivo de matéria prima da comunidade auxiliando, assim, a organização no uso da

farinheira.

Figura 10 – Mapa de Propriedade desenhado Figura 11 – Mapa de Propriedade

Fonte: Banco de Dados do Programa Fonte: Banco de Dados do Programa

Meta 2 – Gestão Ambiental e Processos Agroecológicos

Os locais de produção localizam-se dentro das Unidades de Conservação,

especialmente na categoria APA (Área de Proteção Ambiental) o que obriga os

produtores a adotarem novas práticas de cultivo para compensar as restrições da

Legislação Ambiental. Inseridos neste contexto, os produtores estão limitados em

produzir nas mesmas áreas, contribuindo na diminuição da fertilidade do solo, o que

determina a adoção de novas práticas para a sua melhoria.

No caso da produção da farinha, são gerados resíduos sólidos como a casca da

mandioca, e dois tipos de efluentes: o da fase de lavagem (água de lavagem) e o da

prensagem (mandiquera). Tendo esses problemas visíveis, a meta tem como objetivo

estimular a produção dos pequenos produtores através de atividades desenvolvidas com

parcerias externas, intervindo para mitigar os gargalos e desenvolver as potencialidades,

evitando, assim, o desaparecimento desta atividade de grande importância econômica e

cultural e adotando práticas sustentáveis de manejo. A meta teve as seguintes etapas:

Etapa 1 - Qualidade do solo: realizar estudos com o intuito de identificar

técnicas agroecológicas que possibilitem o aumento na produção e produtividade da

mandioca;

Etapa 2 - Consolidar práticas relacionadas à gestão de resíduos sólidos e líquidos

na unidade produtiva: utilizando como base a ABNT NBR 10004 (dispõe sobre a

classificação de resíduos sólidos), a Lei 12305 que institui a Política Nacional de

Resíduos Sólidos (PNRS) de 2 de agosto de 2010;

Etapa 3 - Incremento na área cultivada: realizar ações que propiciem o

incremento da área cultivada na comunidade;

Etapa 4 – Certificação orgânica: análise da potencialidade da certificação e

busca de parcerias.

As etapas acima mencionadas ainda estão em andamento, mas já é possível

observar o progresso e avanço neste âmbito.

Foram realizados estudos para a implantação de novas variedades de mandioca,

selecionando entre elas as mais adaptadas às particularidades da região. Também houve

a necessidade de aplicação de questionários visando verificar a quantidade plantada,

área utilizada, espécie de mandioca plantada, principais dificuldades e o interesse de

plantio para o corrente ano, em paralelo a essas questões, foram propostos à

possibilidade de um experimento com essas novas variedades de mandioca, e com o

interesse dos agricultores, iniciou-se uma conversa com o IAPAR (Instituto

Agronômico do Paraná) para obtenção dessas mudas. Devido a grande busca do

mercado nacional e internacional por busca de alimentos ecológicos, livres de

agrotóxico, outra linha de trabalho foi um levantamento das certificadoras de produtos

orgânicos que atuam no Paraná, e contato com os mesmos para verificar custos, forma

de auditoria, burocracias e a possibilidade de parcerias para obtenção da certificação

orgânica, em conjunto com reuniões internas a fim de verificar qual a melhor opção

para a comunidade de Açungui já que todos os agricultores desta comunidade produzem

os alimentos somente com práticas agroecológicas.

No decorrer buscaram-se novas práticas agroecológicas que respeitem o meio

ambiente, aumentem a produção e a qualidade da mandioca, a partir dessa busca foi

realizado um experimento de adubação orgânica. No experimento foram utilizados

materiais de fácil acesso aos agricultores, com o intuito de desmistificar a adubação

orgânica, e mostrar tanto visivelmente quanto na questão de produção por m² as

vantagens dessa técnica. No experimento foram utilizadas diferentes concentrações de

esterco de gado, esterco de frango e calcário dolomítico em 3 áreas das comunidades.

Com o melhoramento da produção, e o desenvolvimento de práticas

agroecológicas através da adubação orgânica, tem se trabalhado a viabilidade da

obtenção do rótulo de produtos orgânicos contribuindo dessa maneira na viabilização

dos canais de comercialização e contribuindo no aumento da renda dos produtores.

Figura 12 – Área com adubação verde Figura 13 – Área sem adubação verde

Fonte: Banco de Dados do Programa Fonte: Banco de Dados do Programa

Na questão da geração de resíduos da produção, está sendo desenvolvido um estudo em

torno da água de lavagem, para averiguar qual é a destinação adequada que causa menos

impacto ao ambiente. No caso da mandiquera ou manipueira, o líquido tem sido

utilizado pelos pequenos agricultores no combate de pequenas pragas nas roças.

Considerações Finais

A produção de farinha de mandioca no Litoral do Paraná é uma tradição cultural

que faz parte do cotidiano dos pequenos agricultores familiares, serve de alimento

diário, traz consigo um pouco da história dos ancestrais, sendo uma alternativa de

geração de renda que auxilia no desenvolvimento local.

Por intermédio do Programa de Extensão, foi possível concluir que a

universidade tem um papel importante no impacto e transformação da realidade dessas

comunidades invisíveis ao Estado. A reestruturação dessas unidades produtivas e

adequação aos padrões de higiene estabelecidos pelas normas da ANVISA (Agência

Nacional de Vigilância Sanitária) colaboraram de modo significativo para o aumento na

produção de farinha. A estrutura produtiva com seus equipamentos propicia a

diminuição no tempo e força de trabalho em todas as fases do processo produtivo, além

de evitar problemas de saúde por esforços repetitivos.

Nota-se que os novos padrões impostos pela modernização da sociedade ainda

não suprimiu a qualidade do produto ou levou a uma padronização. Cada família tem o

seu modo peculiar de produzir a farinha, de acordo com sua cultura material e o anseio é

de que a atividade continue e alcance novos mercados.

O fato das comunidades estarem inseridas dentro de áreas protegidas faz com

que haja uma preocupação constante em relação à adoção de práticas sustentáveis de

manejo e a destinação dos resíduos sólidos no processo de produção, os esforços

coletivos, Programa e agricultores, são para que em breve as comunidades possam obter

a certificação orgânica, que já é uma realidade em comunidades vizinhas.

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