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UNIVERSIDADE DO ESTADO DE SANTA CATARINA – UDESC
CENTRO DE EDUCAÇÃO FÍSICA, FISIOTERAPIA E DESPORTOS - CEFID
LÉLIA REGINA KREMER GAMBA
OOFFIICCIINNAASS DDOO JJOOGGOO:: EEDDUUCCAAÇÇÃÃOO DDOOSS SSEENNTTIIDDOOSS
DISSERTAÇÃO DE MESTRADO
FLORIANÓPOLIS
2007
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UNIVERSIDADE DO ESTADO DE SANTA CATARINA – UDESC
CENTRO DE EDUCAÇÃO FÍSICA, FISIOTERAPIA E DESPORTOS - CEFID
LÉLIA REGINA KREMER GAMBA
OOFFIICCIINNAASS DDOO JJOOGGOO:: EEDDUUCCAAÇÇÃÃOO DDOOSS SSEENNTTIIDDOOSS
Dissertação apresentada ao Programa de Pós-Graduação
em Ciências do Movimento Humano da Universidade do
Estado de Santa Catarina como requisito parcial para
obtenção do título de Mestre em Ciências do Movimento
Humano.
Orientador: Prof. Dr. João Batista Freire da Silva.
FLORIANÓPOLIS
2007
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UNIVERSIDADE DO ESTADO DE SANTA CATARINA – UDESC
CENTRO DE EDUCAÇÃO FÍSICA, FISIOTERAPIA E DESPORTOS - CEFID
LÉLIA REGINA KREMER GAMBA
OOFFIICCIINNAASS DDOO JJOOGGOO:: EEDDUUCCAAÇÇÃÃOO DDOOSS SSEENNTTIIDDOOSS
Esta Dissertação foi julgada e aprovada para a obtenção do grau de Mestre em
Ciências do Movimento Humano da Universidade do Estado de Santa Catarina.
Florianópolis, 13 de março de 2007.
Banca Examinadora:
_________________________________________
Prof. Dr. João Batista Freire da Silva Orientador
_________________________________________
Prof. Dr. Lino de Macedo
_________________________________________
Prof. Dr. Giovani De Lourenzi Pires
__________________________________________
Prof. Dr. Giovana Mazo
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É possível trabalhar infindáveis horas por dia, acreditando na possibilidade de
construir uma educação com múltiplas oportunidades de aprendizado e ser
abençoada por encontrar um orientador humilde em sua profunda sapiência que
oportunizou a mim e a muitos, novas reflexões, reforçando que a verdadeira
pesquisa é aquela viva, latente, percebida pela sutileza dos órgãos dos sentidos.
Professor Doutor João Batista Freire, o grupo envolvido na dinâmica da pesquisa
não pode deixar de registrar o mais profundo apreço, orgulho e admiração ao senhor
pelo convívio informal e doação generosa do seu profundo saber a cada um de nós.
É possível, encontrar amigos verdadeiros. Quem tem ao seu lado um Ciro, Ana Cristi
e Liene consegue perceber a essência da vida.
É possível, por meio do trabalho, empenho, dedicação e estudo transformar uma
escola em referência pedagógica, ainda que localizada em um bairro marcado pelos
estigmas e preconceitos.
É possível existir um grupo chamado Oficinas do Jogo, cujos integrantes pessoas
sensíveis e lutadoras, capazes de transformar a escola em um espaço lúdico e
verdadeiro.
É possível ter uma família e ser “apaixonada” por ela. Luiz, Luize e Laíza meus
amores.
É possível ter pais e irmãos unidos, cúmplices nos momentos de dificuldade.
É possível encontrar a professora Andréa, mais criança que as próprias crianças,
colaboradora, adorável e comprometida.
E, finalmente, é possível sentirmo-nos gente! Pois, cheiramos; amamos; ouvimos;
tocamos; sentimos...Sentir, assim, é não desistir jamais.
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RESUMO
GAMBA, Lélia Regina Kremer. Oficinas do jogo: educação dos sentidos. 2007. 122 f. Dissertação (Mestrado em Ciências do Movimento Humano) - Centro de Educação Física, Fisioterapia e Desportos, Universidade do Estado de Santa Catarina, Florianópolis.
Este estudo tem como fundamento, além das teorias aqui consideradas, nossa
vivência como educadores. Nasceu da inquietação dos pesquisadores ao
vivenciarem que a Educação dos Sentidos não contempla os currículos escolares. A
escola onde se realizou a pesquisa foi uma escola particular de Florianópolis que
congrega indivíduos de diferentes níveis sócio-econômicos. Optamos por analisar e
interpretar os dados de acordo com uma modalidade qualitativa de pesquisa,
chamada pesquisa-ação, a mais adequada para este caso. Foram selecionadas
intencionalmente vinte e duas crianças, sendo dez meninas e doze meninos do
Infantil III da Educação Infantil. Para a coleta de dados recorremos ao registro, em
diário de campo, por escrito, de todos os acontecimentos das aulas, filmagens,
fotografias e os relatos orais das crianças. A proposta desta pesquisa consistiu em
investigar a Educação dos Sentidos, mais especificamente, a audição, dentro dos
fundamentos intitulada Oficinas do Jogo. Educar a audição no sentido de fazê-las
prestar atenção no que ouvem, refletir e tomar consciência dos sons ao seu redor.
Desenvolvemos e aplicamos uma seqüência de atividades para o objetivo em
questão. Durante a pesquisa percebemos que as crianças participavam com muito
entusiasmo nas atividades desde que as mesmas fossem motivadoras e atrativas,
portanto conduzimos as aulas dentro de uma cultura lúdica.
Palavras-chave: Audição. Criança. Sentidos. Brincadeira.
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ABSTRACT
GAMBA, Lélia Regina Kremer. Game workshops: education of the senses [sensorial education]. 2007. 122.f. Master’s Thesis (Sciences of Human Movement Graduate Program) – Centro de Educação Física, Fisioterapia e Desportos, Universidade do Estado de Santa Catarina, Florianópolis.
This study is based on our lived-through experience as educators, besides the
theories herein considered. It was born of the researchers’ uneasiness in
experiencing that Sensorial Education is not incorporated to schools’ curricula. This
research was carried out at a private school in Florianópolis which congregates
individuals of different socio-economical backgrounds. We have chosen to analyze
and interpret the data according to a qualitative research mode called action
research, the most appropriate one in this case. Twenty-two children were
deliberately selected from [grade] “Infantil III” of Children’s Education [kindergarten],
ten of them being girls and twelve boys. To collect our data we wrote down in a field
log every occurrence observed in classes, filming, and photographs, and the oral
reports of the children. The proposed aim of this research consisted in investigating
Sensorial Education—more specifically, the education of hearing—within the
fundaments called Game Workshops: to educate the hearing in order to make the
children pay attention to what they hear, to make them reflect on it and become
aware of the sounds around them. We developed and undertook a sequence of
activities directed to the proposed goal. During the research we noticed that the
children took great enthusiasm in those activities, provided that these were
interesting and motivated them. Thus we have conducted the classes within a ludic
(playful) culture.
Keywords: Hearing. Child. Senses. Playing.
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SUMÁRIO
1 INTRODUÇÃO.................................................................................................10
2 O SISTEMA AUDITIVO ................................................................................14
3 O PROBLEMA DA ATENÇÃO....................................................................18
4 AUDIÇÃO COMO PROPOSTA DE INVESTIGAÇÃO ...........................23
4.1 O ouvir para o interior.....................................................................................23
5 OFICINAS DO JOGO: UMA PROPOSTA TRANSDISCIPLINAR......27
6 CAÇADORES DE SONS ..............................................................................34
7 CONSIDERAÇÕES METODOLÓGICAS..................................................36
7.1 O método adotado...........................................................................................36
7.2 Os instrumentos utilizados.............................................................................38
7.3 A escolha do grupo .........................................................................................40
7.4 Os procedimentos para a coleta dos dados..................................................40
7.5 O projeto piloto................................................................................................41
8 ANÁLISE DOS DADOS E DISCUSSÃO DOS RESULTADOS ..........42
8.1 Contribuição inicial da professora.................................................................42
8.2 Procedimentos Pedagógicos durante a coleta de dados.............................42
8.3 As aulas analisadas e interpretadas ..............................................................43
8.3.1 Contribuição final da professora .....................................................................72
9 CONSIDERAÇÕES FINAIS .........................................................................74
REFERÊNCIAS ..................................................................................................78
APÊNDICES ........................................................................................................82
ANEXOS..............................................................................................................121
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1 INTRODUÇÃO
Comecei minha vida profissional na educação assim que conclui o Ensino
Médio em magistério de Educação Física (em 1987 havia a formação em Educação
Física no Ensino Médio). Os questionamentos que fazia ao sistema de ensino
tradicional levaram-me a fundar, em 1991, uma instituição de ensino particular.
Queria garantir um espaço educacional onde o aluno pudesse construir novos
conhecimentos, socializando seus patrimônios pessoais, ampliando seus ângulos de
visão, e aprendendo a respeitar verdades e culturas diversas.
Sinto-me responsável, como profissional da área de educação e como
proprietária de uma Instituição de Ensino, por contribuir com outras dinâmicas e
intervenções dentro da escola, principalmente nas aulas de Educação Física,
defendendo propostas educacionais que não diminuam o valor educacional dessa
disciplina.
Tenho a clareza de que a escola é uma instituição social das mais
importantes e, como tal, mantém uma relação dialética com a sociedade. Sabemos
também que reproduzimos as estruturas de dominação existentes na sociedade,
mas a escola pode constituir um espaço de transformações sociais (GONÇALVES,
1994).
Faço uma pausa para analisar, de maneira especial, o que representou,
em minha vida, implantar uma instituição privada na cidade de Florianópolis, SC,
mais especificadamente no bairro da Coloninha, com seu histórico de pobreza e
discriminações diversas. Mesmo velado, há um manto de marginalização e
preconceitos sobre bairros como o da Coloninha, praticado por parte de uma
sociedade adepta de rótulos cruéis e eticamente duvidosos, que se referem ao
bairro como um local de “negros e pobres”, e, conseqüentemente, violento. Mas a
comunidade apesar do fardo de tantos estigmas é alegre e orgulhosa de seu modo
de viver. Trata-se de um povo humilde e laborioso que respeita a comunidade
educacional.
Ciente do compromisso enquanto instituição, não somente com a
comunidade da Coloninha, mas com todos que lá estudam, muitas são as
inquietações... Uma delas é observar a Educação Física Escolar, disciplina que
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requer reflexão e cuidados, principalmente quando a história da pesquisadora se faz
ali presente.
O forte compromisso que uma escola deve ter com a comunidade levou-
me a definir, na prática pedagógica, rumos coerentes com tal compromisso. A partir
disso, alguns rumos diferentes daqueles adotados pela escola tradicional, tiveram
que ser implantados. Um deles, que é o motivo principal deste trabalho, é o que
afirma ser possível educar o aluno como um todo, considerando outras dimensões
humanas que não só a intelectual. Por exemplo, a educação dos sentidos, já que os
sentidos constituem a via pela qual o aluno toma consciência das capacidades de
seu próprio corpo, de suas possibilidades e de seus limites (ARRIBAS, 2002).
Portanto, este estudo investigou a possibilidade de realizar uma educação
dos sentidos (visão, audição, olfato, tato e paladar), mais especificamente a
educação da audição, em alunos de Educação Infantil. Eventualmente, ocorrem
experiências isoladas sobre esse tema em escolas e aulas de Educação Física,
mas, não sistematicamente.
Este projeto faz parte de um programa denominado Oficinas do Jogo, que
é desenvolvido por profissionais comprometidos com a idéia de produzir práticas
pedagógicas e pesquisas diferentes das tradicionais. Dele participo desde sua
fundação, por acreditar em seus propósitos, entre eles, o de ser possível uma
pedagogia fundada na beleza, e num trabalho de pesquisa que dê voz a professores
e alunos.
A educação dos sentidos, sobretudo o sentido da audição, tem um
aspecto claro para mim: o aluno tem que ser educado para viver amplamente e com
qualidade, isto é, para ter uma vida melhor, e isso não pode ser conseguido
ignorando que há mais coisas para educar além do intelecto. Ver e ouvir, por
exemplo, são tão educáveis quanto o pensamento lógico-matemático, e não são
menos importantes. Trata-se, por isso, de integrar as várias dimensões educacionais
numa mesma prática pedagógica, dando igual relevância a todas.
Aqui chamo a atenção para um dado curioso: educar a audição da criança
significa também, para a escola, ser capaz de ouvir o aluno. Na educação
tradicional, de modo geral, os alunos apenas “ouvem” os professores falar;
raramente são ouvidos.
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Alves (2005 p. 29) afirma que: “Todo mundo quer ser escutado. (Como
não há quem os escute, os adultos procuram um psicanalista, profissional pago para
escutar). Toda criança também quer ser escutada”.
Sobre este questionamento Freire (1999 p.127) ressalta:
Se, na verdade, o sonho que nos anima é democrático e solidário, não é falando aos outros, de cima para baixo, sobretudo, como se fôssemos os portadores da verdade a ser transmitida aos demais, que aprendemos a escutar, mas é escutando que aprendemos a falar com eles. Somente quem escuta paciente e criticamente o outro, fala com ele [...].
A educação do sentido da audição, neste trabalho, insere-se numa
pedagogia que pretende ouvir e dar voz ao aluno. Por outro lado, entendo educar a
audição não apenas como uma maneira de lidar com o aparelho biológico para
aumentar a acuidade auditiva. É mais que isso: educar a audição é ensinar o aluno a
ouvir para dentro, isto é, ensiná-lo a prestar atenção ao que ouve, a refletir sobre o
que ouve, a tomar consciência do que ouve. Perceber-se como corpo é tomar
consciência dos sentidos e não somente fazer uso deles numa condição meramente
biológica; mas construir sensações dentro de nós mesmos através das nossas
experiências (FREIRE; SCAGLIA, 2003).
Segundo Ackerman (1992 p. 15), “Não existe maneira de compreender o
mundo sem antes detectá-lo por meio do sistema de radar de nossos sentidos”.
A partir de reflexões como as que foram expostas nas linhas anteriores,
podemos apontar os seguintes questionamentos: qual a importância de os alunos
serem educados para saber ver, ouvir, tocar, cheirar e saborear? Os sentidos podem
ser educados?
Ressaltam Freire e Scaglia (2003, p.126):
A escola trata os sentidos como se seu desenvolvimento fosse algo exclusivamente natural e como se o pensamento fosse uma questão cultural. O pensamento poderia ser ensinado, mas a sensibilidade ficaria por conta da natureza.
Propus-me como objetivo principal deste estudo, argumentar a favor da
possibilidade de educar os sentidos de alunos da Educação Infantil de acordo com
os fundamentos da proposta do projeto intitulada Oficinas do Jogo. Mais
especificamente, nesta pesquisa argumentei a favor da educação da audição, uma
vez que os limites temporais do trabalho não permitiriam estendê-lo aos demais
sentidos.
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Sobre o aparelho biológico – ouvido, fiz uma análise superficial, somente
para compreender o seu funcionamento. Preocupou-me destacar a audição interior,
refletindo sobre a importância de incluir nos currículos escolares um programa
desenvolvendo atividades que contribuam para uma audição mais refinada e
sensível.
Neste trabalho preferi utilizar a Pesquisa-Ação, a mais adequada para a
situação, pois durante a investigação, analisei as ações em função das reações que
ocorreram, ou seja, durante a aplicação das atividades repensei o processo
educativo com a finalidade de fazer com que os alunos prestassem atenção nos
sons propostos, produzindo um grau de consciência sobre o que ouviram e sobre o
ato de ouvir. As aulas tiveram que ser planejadas pensando no “novo”, ou seja,
sempre contendo algo que impelisse os alunos à reflexão. Desse modo, cada aula
foi planejada para que a partir de ações familiares já conhecidas pelos alunos, novos
elementos, fossem introduzidos. A relação entre os elementos novos e os já
conhecidos provoca uma atenção especial em particularidades da ação, no caso
deste trabalho, certos sons ouvidos. Entendemos por novo qualquer elemento ainda
desconhecido que chame a atenção do aluno. O ambiente pedagógico, nas aulas do
programa Oficinas do Jogo, é lúdico e decisivo para se alcançar o objetivo do
trabalho, pois no ambiente lúdico, as crianças se interessam mais pelas ações;
chamando a atenção para os elementos principais da aula, no caso, os sons. Além
disso, brincar é um direito da criança, tal como está mencionado na Declaração dos
Direitos da Criança, citada por Marcellino (1989, p. 64): “A criança deve desfrutar
plenamente de jogos e brincadeiras, os quais deverão estar dirigidos para a
educação; a sociedade e as autoridades públicas se esforçarão para promover o
exercício desse direito”.
Já nos primeiros encontros o grupo foi batizado pelos alunos de
“caçadores de sons”. Sempre que iniciávamos nossas atividades, ouvíamos uma
exclamação:
-Vamos caçar sons? !
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2 O SISTEMA AUDITIVO
Para entendermos a audição precisamos compreender, entre outras
coisas, o aparelho biológico - ouvido.
A audição é uma das capacidades mais sofisticadas do organismo
humano. Seu desenvolvimento foi um tanto tardio comparativamente ao olfato, por
exemplo (PELAEZ, 2000). Ela pode ser definida como uma estrutura sensorial de
captação do som, composta de três partes: o ouvido externo (nos seres humanos
atua como receptor das ondas sonoras), o ouvido médio e o ouvido interno.
O ouvido externo é composto por uma estrutura cartilaginosa chamada
orelha; por um conduto auditivo e pelo tímpano, uma membrana vibrátil capaz de
captar as ondas sonoras. Apesar de ser a parte mais exposta do sistema auditivo, é
provavelmente o que menos faz pela audição humana.
O ouvido médio é uma câmara oca ligada à faringe pela trompa de
Eustáquio, com a finalidade de eqüalizar a pressão interna com a pressão externa.
Ligados ao tímpano, existem três pequenos ossos (martelo, bigorna e estribo), que
conduzem mecanicamente as vibrações à janela oval. Desempenha uma importante
função para determinar as características quantitativas da discriminação auditiva.
E o ouvido interno, formado por duas partes: o vestíbulo que sustenta
três canais semicirculares relacionados ao equilíbrio, e a cóclea, que é responsável
pela transformação das vibrações em estímulos nervosos que serão levados pelo
nervo acústico para o cérebro.
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Fonte: ABC da saúde (2006).
Figura 1: Aparelho auditivo.
É importante após relatarmos sobre a constituição biológica do ouvido,
compreendermos o caminho do som.
Quando o som nos chega, ele foi produzido por ondas sonoras propagando-se através do ar exatamente da mesma forma que as ondas propagam-se na superfície da água. A orelha Humana é um órgão altamente sensível que nos capacita a perceber e interpretar ondas sonoras em uma gama ampla de freqüências. As ondas sonoras que se propagam no ar são recebidas pela orelha. O pavilhão auditivo capta e canaliza as ondas para o canal auditivo e para o tímpano (VILELA, 2006).
De acordo com Ackerman (1992, p. 217),
Durante um jantar festivo, um garçom serve um delicioso vinho Liebfraumilch, contemplamos sua cor de damasco, aspiramos seu bouquet, saboreamos seu sabor de frutas. Depois, desejando felicidades aos nossos companheiros de refeição, batemos nossas taças, porque faltava o som para estimular o último sentido e podermos, então, apreciar totalmente o vinho. O que chamamos de som é, na verdade, o avanço, o ondular e o recuo de uma onda de moléculas de ar, desencadeados pelo movimento de qualquer objeto, grande ou pequeno, e que se expande em todas as direções. Em primeiro lugar as coisas têm que se mover – um trator, as asas de um grilo – e agitam as moléculas de ar que as rodeiam; depois as moléculas mais próximas começam a mover-se também e assim
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sucessivamente. As ondas de som rolam como vagas até nossos ouvidos, fazendo vibrar o tímpano; por sua vez, essa vibração move três ossos de nomes pouco graciosos (o martelo, a bigorna e o estribo), que são os menores ossos do corpo humano. A cavidade onde esses ossos repousam tem menos de um centímetro de largura e pelo menos de meio centímetro de profundidade, mas o suficiente para que o ar que fica aprisionado no local, pelos tubos de Eustáquio bloqueados, provoque dor violenta nos mergulhadores e passageiros de viagens aéreas, quando muda a pressão atmosférica. Os três ossos pressionam o fluido do ouvido interno contra as membranas, que agitam os minúsculos pêlos, que atingem as células nervosas das cercanias, que, por sua vez, telegrafam a mensagem ao cérebro: ouvimos.
Os ouvidos nos permitem muito mais do que ouvir sons. Eles também são
órgãos do equilíbrio, fornecendo ao cérebro informações sobre o movimento e a
posição do nosso corpo (GEWANDSZNAJDER, 2002).
Ganong (1991, p.125) define como som, “uma sensação produzida
quando vibrações longitudinais das moléculas no meio externo – isto é, fases
alternadas de condensação e rarefação das moléculas – incidem sobre a membrana
timpânica”.
Percebemos no nosso cotidiano que os sons nos chegam de forma
simultânea com uma gama diversidade de sons dos quais selecionamos somente
aqueles que nos interessam. As ondas sonoras chegam até os nossos ouvidos
através das orelhas, cuja função principal é amplificar o som ao vertê-lo no canal
auditivo. No instante em que o som bate nas orelhas ele é modificado, pois devido
ao seu formato e tamanho, elas enfatizam certas escalas de freqüências, priorizando
nos seres humanos aquelas relativas à fala, correspondendo à faixa de 20 a
20.0000Hz (PELAEZ, 2000). Ao chegar ao tímpano o som viaja através do ar como
onda de pressão, que o faz vibrar. Essa vibração se transmite para os ossículos
martelo, bigorna e estribo. Esses ossículos, por sua vez, transmitem a vibração ao
ouvido interno, por meio da membrana da janela oval (BARROS, 2005).
Conforme Barros (2005, p.193):
As vibrações atingem a cóclea e são transmitidas a um líquido aí existente. A vibração desse líquido sensibiliza terminações nervosas presentes na cóclea. Então impulsos nervosos são gerados e conduzidos até o cérebro pelo nervo vestibulococlear, onde são interpretados, e a pessoa tem noção do que ouve.
Grande parte do aprendizado envolve escutar a fala dos outros. A audição
e a fala trabalham conjuntamente. Quem nasce com audição limitada, enfrentará
problemas para capturar os sons e conseqüentemente para desenvolver a
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linguagem. Qualquer que seja o distúrbio no processo de audição normal, seja qual
for sua causa, tipo ou severidade, constitui-se uma alteração auditiva
(GEWANDSZNAJDER, 2002). Constata-se que na nossa cultura,
predominantemente visual, atribui-se maior deficiência ao surdo do que ao cego,
pois este último pode dispor da faculdade da linguagem, e o primeiro não, privando-
lhe da comunicação através da língua e da música, traço distintivo de humanidade
(PELAEZ, 2000).
As pessoas com limitações auditivas poderão substituir o ouvir pelo sentir
das vibrações, ou por outras formas de comunicação.
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3 O PROBLEMA DA ATENÇÃO
Quando solicitamos a atenção de alguém para algo, dizemos: “preste
atenção!” Nesse caso queremos dizer prestar no sentido de conceder, de tornar
disponível, como se diz quando se homenageia alguém, prestando-lhe honras,
reverências, etc. Atenção, de sua parte, usa-se no sentido de ligar, atar, definido
pelo antepositivo at. Ou de fixar-se em algo, de concentrar nossa mente em alguma
coisa.
O termo, pouco explorado pelas ciências, gera confusão quando
consideramos que ter atenção é apenas concentrar-se especialmente em algo,
quando o estado de atenção pode ser um estado geral de irradiação das nossas
ligações com o mundo em qualquer direção. Não necessariamente precisamos estar
concentrados em algo particular. Em certos estados, podemos distribuir a atenção
para muitas coisas ao mesmo tempo, e não concentrá-lo em nada especialmente.
Neste último caso, isso não quer dizer que não somos atentos, mas apenas que não
há nada que, num dado momento, esteja chamando especialmente nossa atenção.
Portanto, não há porque prestar, nesse caso, atenção nisto ou naquilo.
Por outro lado, a questão da desatenção perturba mais, porque, no
ambiente pedagógico, mais particularmente o da escola, se os alunos não prestarem
atenção nas aulas, os professores não conseguem ensinar. Vive-se um drama
atualmente nas escolas, porque o estado de desatenção em relação às aulas é
generalizado. E de tal maneira isso conturba o ambiente escolar que a saída
encontrada é denominar como doença esse estado de desatenção, uma doença que
acometeria os alunos, livrando o sistema educacional de seus pecados crônicos.
Ora, o que não causa interesse não desperta a atenção, portanto, as aulas
escolares, desinteressantes, provocam um generalizado estado de desatenção,
atribuído como doença dos alunos. Quando a escola constata que os alunos estão
desatentos, isso não significa que eles não tenham atenção, mas apenas que não
prestam atenção nas aulas, do jeito como elas são ministradas. Porém, a atenção de
que eles, e todas as pessoas são portadoras, continua ali, distribuída para outras
coisas, quem sabe a própria imaginação, quem sabe conversas com colegas, etc.
Damásio (2000, p. 123) é de opinião que “A ausência de atenção
manifesta diante de um objeto externo não necessariamente nega a presença de
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consciência; pode, em vez disso, indicar que a atenção está voltada para um objeto
interno”. Se, num dado momento, o objeto interno for mais interessante que o
externo, chamará mais a atenção do aluno na sala de aula, que os conteúdos
apresentados pela escola. É bem possível que certos conteúdos escolares e o modo
de ensiná-los sejam bem menos atraentes que as fantasias que provocam a
imaginação das crianças.
De uma certa maneira, a atenção, uma espécie de foco dirigido para as
coisas internas ou externas ao sujeito, é seletiva. Sua presença dirigida para algo
especialmente é uma maneira de selecionar alguma coisa, assim como a ausência
de atenção para alguma coisa é uma forma de evitá-la, por não considerá-la
necessária. Cremos que a desatenção freqüente dos alunos durante as aulas, muito
antes de ser patológica, pode ser um modo de defender-se de coisas que, aos
ouvidos dos alunos, soam como desnecessárias. Nesse sentido, a escola tem
prestado atenção demais nos alunos e muito pouco em seus métodos, ou seja, olha
muito para fora, e muito pouco para dentro.
Resistente, conservadora, impermeável, a escola recusa rever seus
métodos. Quando muito, edita documentos autodenominados progressistas, mas, na
prática, continua aliada ao que há de mais tradicional, causando enorme
desinteresse entre os alunos. O que os professores assistem, durante as aulas, é
uma generalizada desatenção, fenômeno que desencadeou uma série de estudos
sobre a desatenção e um sem-número de sugestões sobre como tratá-la. O
renomado pesquisador indiano Ramachandran (2004, p. 156) tem uma interessante
passagem sobre esse tema:
Mas “atenção” é uma palavra carregada, rica, e até sabemos menos sobre ela do que sobre desatenção. Assim, a afirmação de que a desatenção surge da “falha em prestar atenção” realmente não nos diz muito, a não ser que tenhamos uma noção clara do que podem ser os mecanismos neurais subjacentes. (É mais ou menos como dizer que a doença resulta de uma falha na saúde.) Em especial, a gente gostaria de saber como uma pessoa normal – você ou eu – é capaz de atender seletivamente a uma única informação sensorial, que esteja tentando ouvir uma única voz em maio a uma algazarra de vozes num coquetel ou apenas tentando localizar um rosto conhecido num estádio de beisebol. Por que temos esta nítida sensação de ter um holofote interno, que podemos apontar para diferentes objetos e incidentes em torno de nós?
A escola tem os olhos excessivamente abertos para fora, para o que vê no
seu exterior, e é bastante cega para seu interior. Portanto, quando abre os olhos, o
que ela vê são alunos desatentos às aulas. Persiste na sua visão exterior e afirma
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que ali está o problema. De modo que a escola não consegue enxergar a questão
da atenção, pois só tem olhos para a desatenção. E seu discurso atual é, portanto,
sobre a desatenção, buscando soluções para esta, sem, contudo, buscar
compreender o que venha a ser atenção e que procedimentos pedagógicos devem
ser adotados para despertá-la nos alunos em relação às aulas.
De acordo com Merleau-Ponty (1999, p. 54),
A atenção é portanto um poder geral e incondicionado, no sentido de que a cada momento ela pode dirigir-se indiferentemente a todos os conteúdos de consciência. Estéril em todas as partes, ela não poderia ser em parte alguma interessada. Para reatá-la à vida da consciência, seria preciso mostrar como uma percepção desperta a atenção, depois como a atenção a desenvolve e a enriquece. Seria preciso descrever uma conexão interna, e o empirismo só dispõe de conexões externas [...].
Criticando o empirismo, tanto quanto o intelectualismo, Merleau-Ponty
aborda diretamente as pedagogias que decorrem dessas correntes filosóficas. Faz
uma localização perfeita de problemas como a atenção e seu reverso, a desatenção.
Em sua crítica ao empirismo, Merleau-Ponty afirma que a atenção interessada, uma
vez que, para ele, atenção é um estado geral de uma pessoa, exige uma conexão
de algo externo particular com alguma coisa interna que já está no sujeito.
Considerando que o empirismo ignora as construções internas, tal conexão não
poderia existir e a atenção não se explicaria, ou apenas se explicaria como projeção,
para dentro, de algo que existe fora do sujeito, ou apenas um reflexo de um
acontecimento externo. Explicação, pelo visto, muito pobre para explicar um
fenômeno tão importante como a atenção. Não aprender, nos últimos tempos,
tornou-se uma tradição escolar. Antigamente, aprendia-se mais, à custa de castigos.
O castigo mobilizava algo interno, uma consciência no aluno de que não aprender o
levaria à punição. Portanto, por mais que a escola ignorasse a consciência do aluno
e seus conhecimentos anteriores, ela, de uma certa forma, mobilizava essa estrutura
do medo, essa consciência do castigo, e os alunos se conectavam às aulas (pelo
menos parte deles). Com o advento dos direitos da criança, mais recentemente, a
escola não pode mais punir; os pais não podem mais surrar. Portanto, esse
mecanismo, a escola perdeu e não conseguiu, ainda, encontrar outro.
As críticas de Merleau-Ponty não se restringem ao empirismo. Também o
intelectualismo as recebe. Se o empirismo, para esse pensador, não pode explicar a
atenção, porque não considera algo interno ao sujeito para se conectar, o
21
intelectualismo já tem tudo, portanto, qualquer coisa fora do sujeito não poderia
afetá-lo. Não há novidades, nas palavras dele:
Mas em uma consciência que constitui tudo, ou, antes, que possui eternamente a
estrutura inteligível de todos os seus objetos, assim como na consciência empirista
que não constitui nada, a atenção permanece um poder abstrato, ineficaz, porque ali
ela não tem nada para fazer. A consciência não está menos intimamente ligada aos
objetos em relação aos quais ela se distrai do que àqueles aos quais ela se volta, e o
excedente de clareza do ato de atenção não inaugura nenhuma relação nova
(MERLEAU-PONTY, 1999, p. 55).
Ou seja, é preciso que haja alguma coisa, fora do sujeito, que seja
considerada por ele, por algo que é interno à sua consciência. O ato de prestar
atenção, portanto, não é uma mágica em que, de repente se coloca em mobilidade
um instrumento chamado atenção para focalizar algo que está pronto, ou para
focalizar algo que não é novo (portanto, que não chamaria a atenção). O ato de
atenção é a focalização de um atributo distribuído sem direção antecipada, para algo
que se conectou com o sujeito num dado momento. Trata-se de uma espécie de
construção. É preciso que haja familiaridade entre o objeto fora do sujeito e sua
consciência. Algo que chama a atenção é algo que guarda alguma familiaridade,
senão, não pode haver conexão. Ou seja, não é uma coisa que seja totalmente
nova, mas apenas parcialmente nova. Isso não quer dizer que não possamos
ignorar as coisas familiares externas, pois elas podem não chamar a atenção num
dado momento e permanecerem lá, ignoradas.
Segundo Merleau-Ponty (1999, p. 56),
O que faltava ao empirismo era a conexão interna entre o objeto e o ato que ele desencadeia. O que falta ao intelectualismo é a contingência das ocasiões de pensar. No primeiro caso, a consciência é muito pobre: no segundo, é rica demais para que algum fenômeno possa solicitá-la.
Mais adiante ele diz que “Ambos concordam no fato de que nem um nem
outro compreendem a consciência ocupada em aprender, não notam essa
ignorância circunscrita, essa intenção ainda “vazia”, mas já determinada, que é a
própria atenção” (MERLEAU-PONTY, 1999, p. 56),
A consciência, portanto, é esse atributo que precisa aprender porque
sempre lhe falta algo. Algo que ela não encontra em si, e que tem que ser buscado
em outros aspectos, ou internos ou externos. Quando encontra algo que pode
aprender, isto é, que pode preencher sua ignorância, ela focaliza esse algo, num ato
que chamamos de atenção. Não haveria qualquer motivo para dirigir a atenção para
22
algo que não falte à consciência. Pelo contrário, é necessário que exista algo para
preencher a falta, o vazio, algo para aprender. Ou seja, prestar atenção tem o
sentido de aprender. Prestar atenção é já aprender.
Para Merleau-Ponty (1999, p. 59),
É justamente subvertendo os dados que o ato de atenção se liga aos atos anteriores, e a unidade da consciência se constrói assim pouco a pouco por uma “síntese de transição”. O milagre da consciência é fazer aparecer pela atenção fenômenos que restabelecem a unidade do objeto em uma dimensão nova, no momento em que eles a destroem.
Os ouvidos sem atenção não ouvem. Os olhos com atenção, enxergam.
As ondas sonoras ou os raios luminosos chegam a todos os ouvidos e olhos, mas
sem atenção, não ouvem ou enxergam.
23
4 AUDIÇÃO COMO PROPOSTA DE INVESTIGAÇÃO
4.1 O ouvir para o interior
Quase todas as pessoas possuem as condições biológicas do ouvir; porém torna-
se necessário exercitar a consciência do ouvir, o ouvir para o interior. Não basta, portanto,
a audição biológica. Todos nós nascemos com esse dom, exceto nos casos patológicos,
embora a audição biológica do ser humano seja limitada, poderá ser melhor desenvolvida
ou não, dependendo dos recursos culturais (FREIRE; SCAGLIA, 2003).
Foi através das representações mentais que Beethoven conseguiu
escrever tantas sinfonias e obras musicais, mesmo depois de ter ficado surdo.
Intriga bastante pensar sobre o caso de Beethoven, um músico notável que, mesmo
depois de ficar surdo, construiu uma obra memorável. Podemos destacar que a
partir da sua deficiência auditiva o músico ficou mais contemplativo e livre das
convenções musicais, criando, então, suas expressivas obras musicais. Ele havia
perdido a audição dos sons do mundo externo, mas a música continuava soando na
sua mente (JUNG, 2006).
Os músicos, de uma forma geral, criam uma linguagem musical através do
som e do silêncio. Porém, notamos um seleto grupo desses profissionais que
parecem desenvolver uma audição mais refinada, uma sutileza rara entre as
pessoas (FREIRE, 1991).
Como educadores desejamos que os alunos tenham a oportunidade de
escutar boas músicas, assistir a belos espetáculos, saborear boas comidas, enfim,
tudo que possibilite novos conhecimentos e enriquecimento de sua cultura.
Desta forma, Freire e Scaglia (2003, p.126) afirmam:
Todas as pessoas deveriam ter o mesmo direito de ouvir Beethoven, Mozart ou Bach, ou de assistir a uma ópera, apreciar uma exposição de arte e até de degustar um bom vinho francês. No entanto, isso não ocorre: se formos às salas de concertos, aos museus ou aos bons restaurantes, verificaremos que apenas algumas pessoas possuem esse privilégio.
Expressando significados sobre o ouvir para o interior, citamos uma
história relatada por Pelaez (2000, p. 89). Decidimos transcrevê-la na íntegra,
apesar de extensa, pelo tanto que ilustra o que aqui queremos dizer sobre a
audição:
Num país distante, num tempo longínquo, havia um rei amado por seu povo e respeitado nos reinos vizinhos por sua coragem, inteligência e justiça, como por sua sabedoria, misericórdia e compreensão.
24
Vendo que seu filho já estava na idade de se preparar para sucedê-lo, resolveu levá-lo até um sábio que vivia naquele reino. O sábio ancião, que também havia lhe orientado, anos atrás, disse ao príncipe: - Quando seu pai aqui chegou, eu era mais jovem. Foi um aluno aplicado. Fazia diariamente as tarefas que eu preparava. Hoje estou velho e cansado, e os tempos são outros. Não posso lhe ensinar da mesma forma que ensinei seu pai. Por isso, ao invés de ficar ao meu lado, o que muito me agradaria, você vai partir para a floresta. A natureza será sua mestra. Melhor do que eu, ela vai lhe ensinar a ser um rei justo e respeitado, como o seu pai é. Durante um ano fique lá e perceba tudo o que puder perceber. Estarei aqui, à sua espera quando voltar. O jovem príncipe, no pleno vigor de sua mocidade, alegrou-se diante da perspectiva de aventura, sozinha naquela floresta. Dia após dia, ele percorria a mata, conhecendo seus segredos.Conheceu os tipos de plantas, suas cores, perfumes e propriedades. Catalogou diferentes espécies de animais, desde os minúsculos insetos, até os grandes e ferozes mamíferos. Ouviu seus sons, seus cantos e gritos. E assim, no final do tempo determinado ele se tornara um expert no conhecimento dos diferentes reinos que habitavam a floresta. “O velho ficará surpreso!”, pensava o rapaz. Afinal, ele aprendera coisas que jamais havia encontrado nos livros conhecidos. Na verdade, ele havia colhido material para escrever muitos livros. E nessa disposição se dirigiu à casa do sábio. Lá chegando, logo começou a relatar sua experiência. Falou durante horas, tentando não omitir nada do que havia descoberto. O sábio, após ouvir pacientemente o relato minucioso e acalorado do
jovem, disse:
Então foi só isso que você percebeu? Durante um ano lá e é só isso que tem a me dizer? O príncipe, chocado com a reação do ancião, disse:
- Mestre, com todo respeito devo dizer que o conhecimento que adquiri sequer consta dos livros conhecidos. Além disso... O velho interrompeu o que seria interminável discurso de argumentação, dizendo: - Você só viu as aparências. Só ouviu o audível, só captou as informações dos sentidos. E isso é muito pouco – é quase nada. Retorne à floresta e só volte aqui quando ver o invisível e ouvir o inaudível. Desapontado, o rapaz abaixou a cabeça. Como fora educado a respeitar, obedeceu. Mas no íntimo estava em conflito. Ver o invisível? Ouvir o inaudível? Se é invisível como posso ver? E se é inaudível, como posso ouvir? Loucura! Perda de tempo! Ainda mais agora que eu tinha planos de divulgar meu conhecimento, escrever os livros, ser respeitado entre os sábios do reino...ele refletia. Mas, no fundo, o jovem estava curioso em testar essa estranha experiência. À medida que o tempo passava, ia crescendo o sentimento de revolta com a tarefa que lhe fora atribuída. O que esses seres irracionais têm a me ensinar que eu não consigo entender? - Velho decrépito! Você pode ter sido bom, mas no tempo do meu pai. - O que é que eu estou fazendo aqui? Louco sou eu em me sujeitar a isso. - E a revolta aos poucos foi se transformando em frustração, por não saber como desempenhar a tarefa. Mas seu orgulho ferido o impedia de voltar antes de concluí-la. Já não tinha disposição de andar de lá para cá. Ficava sentado vendo o tempo passar, sem que nada acontecesse, por horas a fio, até adormecer, cansado de nada fazer.
25
Num certo dia, igual a tantos outros tediosos dias, ele foi despertado pelo canto de um pássaro conhecido. Mas ele não cantava da mesma maneira. Havia algo naquele canto que ele não percebera antes. Enquanto fixava sua atenção na escuta daquele som, aos poucos outros sons começaram a soar. Ainda estava escuro, o sol estava prestes a despontar. Era difícil ver de onde vinham esses sons. Então ele percebeu que cada som se organizava numa espécie de sinfonia de sons que antes não havia percebido. Havia uma indescritível alegria nas vozes daqueles animais celebrando a chegada do novo dia. Aqueles sons, antes inaudíveis, tinham formas dançantes que se desenhavam numa coreografia espacial. Era como se ao ouvir os sons, ele ouvisse a si mesmo. Extasiado com a beleza do que agora via e ouvia, ele se sentiu uno com a natureza que o cercava. Nesse estado de comunhão e silêncio, o mestre o encontrou. Na verdade, o mestre tinha estado sempre com ele, à distância, sem se fazer perceber, observando-o cuidadosa e pacientemente. Ao ver o mestre perto de si, fitou-lhe nos olhos, e de alma para alma, os dois comungaram aquele silêncio que só aqueles que sabem ouvir e só aqueles sabem ver podem compreender. Pouco se sabe do que aconteceu depois disso. Conta-se que, após a morte do pai, o príncipe tornou-se rei, e além das qualidades paternas que aprendeu a desenvolver, ele foi conhecido como o rei que sabia ouvir do seu povo o que ninguém jamais pudera ouvir, e dizer o que ninguém ousara pronunciar, pois ele via e ouvia com os olhos e ouvidos do coração.
Nascer com o aparelho auditivo saudável, do ponto de vista biológico,
ainda não garante a qualidade da audição humana. Caso fosse assim, todos
ouviriam o mesmo, e isso não é verdade. Muitos sons acontecem, que alguns
ouvem, outros não. Quantas pessoas são capazes de apreciar Beethoven? Quando
um som é produzido, as ondas sonoras, espalhando-se, chegam aos receptores dos
ouvidos humanos e a partir daí, uma imensa complexidade de elementos que
envolve o cérebro humano, a história de cada pessoa, a imaginação, a capacidade
de interpretação, entre tantos outros recursos, define a qualidade da audição. Um
processo educacional que considere, toda essa complexidade poderá educar, de
fato, a audição, desenvolvendo em cada aluno recursos para que ele produza uma
audição melhor a cada período da vida. Isso equivale, mais ou menos, a dizer que
nascemos com ouvidos, mas não nascemos com audição. Os ouvidos nos garantem
a possibilidade de receber as ondas sonoras, porém, a audição é uma lenta e longa
construção cultural, portanto, dependente do processo de educação.
Maran (1977, p. 73) considerou o silêncio como um exercício sensorial.
Como ela viveu algum tempo na Índia, o país da interioridade, aprendeu que o
silêncio ajudaria a criança no seu auto-aperfeiçoamento. Entre outras coisas,
destacou:
A prática do silêncio deve ser adequada à criança e depende muito do momento. O silêncio nunca pode ser imposto, é uma conquista,
26
descoberta. Ele deve ser um processo lento e gradativo de apaziguamento do ser. Deve ser uma emergência do ser; algo que brote do estofo da criança.
No sistema Montessori o ponto alto da prática do silêncio é aquele em que
a criança:
- não ouve nenhum barulho ou som;
- nenhuma voz ou ruído.
Maran (1977 p. 74) ainda destaca: “A conquista do silêncio depende de
um conjunto de elementos que se somam e se inter-relacionam. Como poderá o
indivíduo estar em silêncio, se ele não está no seu devido lugar? “. Em seus
estudos e análises a autora ainda ressalta que “A educação para o silêncio é um
processo de socialização que implica numa normalização dos: gestos, palavras,
atitudes”.
“É do silêncio que nasce o ouvir. Só posso ouvir a palavra se meus ruídos
interiores forem silenciados. Só posso ouvir a verdade do outro se eu parar de
tagarelar. Quem fala muito, não ouve” (ALVES, 2005, p. 26).
Podemos considerar o silêncio como ausência de som. Atualmente, tudo é
realizado para que haja a quebra desse silêncio. Sendo assim, torna-se difícil para
as pessoas conseguirem silenciar por muito tempo. O silêncio é como uma caixa de
possibilidades e tudo pode acontecer para quebrá-lo. O silêncio é valioso, pois ao
nosso redor há intensidade de ruídos predominando sobre o silêncio. Tememos a
ausência do som como tememos a ausência da vida, pois o último silêncio é a morte
(SCHAFER, 1991).
27
5 OFICINAS DO JOGO: UMA PROPOSTA TRANSDISCIPLINAR
Iniciamos em 2004 a primeira experiência prática das Oficinas do Jogo em
uma escola municipal no Morro do Horário, logo seguida por outra, ao pé do Morro
da Penitenciária. Ambas mostraram, desde o início, que tínhamos um campo fértil de
trabalho. As primeiras aulas foram tão animadoras que resolvemos estender a
experiência a outros professores e escolas. E foi assim que abrimos, no Centro de
Educação Física, Fisioterapia e Desporto (CEFID) da Universidade do Estado de
Santa Catarina (UDESC), um grupo de estudos. Diferente dos tradicionais grupos
acadêmicos, este seria integrado por qualquer pessoa que quisesse estudar, sem a
burocracia da Universidade. E os professores da rede de ensino aderiram de pronto
à idéia. Hoje somos mais de trinta participantes e o projeto passou a ser chamado
de Oficinas do Jogo. Todos aprendem e todos ensinam. Os professores chegam
com sua enorme bagagem de conhecimentos trazida do cotidiano escolar e a
Universidade entra com suas possibilidades de teorizar a respeito da pedagogia.
Dessa troca surgem as produções pedagógicas. Conseqüentemente, professores de
escolas melhoram suas possibilidades de teorizar e a Universidade ganha em
experiências práticas.
O projeto Oficinas do Jogo tornou-se um trabalho tanto de extensão
universitária quanto de ensino e pesquisa. Até dezembro de 2006, o projeto
permaneceu ao abrigo do Centro de Educação Física, Fisioterapia e Desporto
(CEFID), da UDESC, quando, por questões alheias à nossa vontade e ligadas à
burocracia da Universidade, fomos obrigados a nos desligar daquele centro. Hoje o
projeto Oficinas do Jogo funciona com independência, mantendo seus integrantes,
suas pesquisas, suas publicações, porém, não mais sob o abrigo do CEFID.
Todas as aulas realizadas pelos professores do projeto, a partir do
momento em que implantam as Oficinas do Jogo, são registradas e pesquisadas.
Praticamos uma modalidade de pesquisa chamada Pesquisa-Ação e os primeiros
resultados, já os temos, fruto das pesquisas feitas nas escolas do Morro do Horácio
e do Morro da Penitenciária. Os depoimentos colhidos entre alunos, professores e
coordenadores dessas duas escolas são semelhantes. As crianças mostraram
resultados maravilhosos, todas alfabetizadas.
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A educação tem compromissos com a sociedade, mas não apenas no
sentido de mantê-la como está. Em parte trabalha-se, em educação, para que as
coisas boas do nosso mundo sejam fortalecidas; em parte para que as coisas ruins
sejam eliminadas, corrigidas, substituídas. Há muita riqueza no mundo, mas ela é
mal distribuída. A natureza é pródiga, e nem sempre respeitada. Há muita gente
sofrendo por causa da acumulação de lucros e riquezas. A miséria se espalha pelas
chamadas periferias. E a natureza sofre sucessivos ataques, também por causa
dessa ambição desenfreada pelo lucro. A educação, com o progresso dos meios de
educação, ampliou-se, vem pela televisão, pelo rádio, pelas festas, pelos jornais,
pela música, enfim, por todos os meios de comunicação, que hoje são tantos e tão
eficazes. Mas nem por isso a escola deixou de ser forte. Continua exercendo
enorme influência entre os jovens, para o bem ou para o mal, basta ver o tempo que
a criança passa dentro da escola, pelo menos quatro horas por dia, isso representa
mais que a exposição a qualquer outro meio. No entanto, a escola não consegue dar
conta de educar para corrigir as desigualdades, para preservar o meio ambiente, etc.
De nossa parte, acreditamos que os currículos são insuficientes e
inadequados e não são feitos para os que mais padecem com as injustiças. Com o
que se aprende nas escolas e do modo como as escolas ensinam, as populações
injustiçadas não se emanciparão. Pena, porque é na escola que todos,
obrigatoriamente, têm que ir.
Foi a nossa opção por educar para fazer um outro tipo de currículo, que
supra as necessidades de uma educação para a autonomia, que gerou o projeto
Oficinas do Jogo. Logo percebemos que precisávamos de pontos fortes de
referência. Sabemos que ninguém ensina nada se o aluno não estiver prestando
atenção ao conteúdo que se quer ensinar. Esse é um ponto crucial: é preciso
mobilizar a atenção para algum ponto específico, evitando a dispersão. Nos
decidimos pela beleza; as coisas bonitas mobilizam a atenção. Uma aula bonita, um
cenário de aula bonito resolveriam esse ponto fundamental. Tantos séculos se
passaram e a escola não atentou para esse detalhe. No programa Oficinas do Jogo,
não precisamos mais que construir materiais bonitos, coloridos, chamativos e as
crianças passaram a não mais se dispersar, a quererem estar na aula. Optamos por
um segundo ponto de referência, algo que movesse os alunos a realizar as
atividades e aprenderem. Uma referência que estava o tempo todo à disposição: o
jogo. Vizinho da beleza, é de tal forma atraente, que a criança não se cansa de
29
repeti-lo. Portanto, as Oficinas do Jogo constituem um cenário lúdico de extrema
beleza para a criança e, dessa forma, conseguimos despertar em nossos alunos o
desejo de freqüentar e participar das aulas. Salvo algum caso patológico que possa
surgir, não nos incomodam os transtornos de desatenção e hiperatividade.
O jogo tem tudo a ver com a criança. Com as outras pessoas também,
mas parece que, do ponto de vista ambiental, a criança compõe mais fortemente um
ambiente favorável às manifestações do jogo. Crianças brincam, e não deveriam ser
impedidas de fazê-lo. É o caso de pensarmos se é possível educar crianças sem
respeitar sua condição de criança. Talvez esse seja um ponto crucial: a escola
insiste em não respeitar esse princípio. Encerra o aluno como prisioneiro em
estreitos espaços de carteira e mesa, impedindo as manifestações de riso, choro e
movimento que, no jogo, são típicos.
Há muito o que aprender no jogo. Jogo é descompromisso com as
necessidades. Ninguém joga quando come para matar a fome. Mas a gente joga
quando a comida não tem esse compromisso dramático com a fome. Talvez
ninguém aprenda direito quando tem que aprender português para preencher uma
obrigação com a escola. Mas talvez todos o aprendessem se fosse realizado
jogando, sem obrigações, mas apenas porque é uma brincadeira, porque, para a
criança, não soe como alguma coisa necessária. E isso se poderia dizer da
matemática ou de qualquer outra disciplina. Quem sabe aprender a pensar não seja
mais importante que aprender as técnicas dessas disciplinas? A matéria de
português que vai cair na prova valendo notas não gera autonomia. Mas o
pensamento que produz a compreensão da língua portuguesa, sim. E a adesão à
aprendizagem certamente seria mais benéfica que a obrigação de aprender.
Não há obrigação de aprender nas Oficinas do Jogo. Os alunos sequer
percebem que aprendem, eles apenas jogam. Os professores e professoras que
orientam as crianças sugerem temas de aula ou deixam que as crianças os sugiram
enquanto brincam. Por exemplo, o tema sugerido pode ser a construção, com o
material disponível de uma casa, de um bairro, da cidade ou partes dela, e assim por
diante. Nesse caso, trata-se de atividades que chamamos de jogos de construções e
jogos simbólicos. Antes de mais nada há uma conversa com as crianças, de modo
que, falando sobre o tema, elas produzam imagens, representem essa realidade
sugerida nos temas, falem sobre ela. Ou seja, antes mesmo da prática, há uma
representação, uma certa tomada de consciência, um distanciamento de uma
30
realidade que, no cotidiano, é vivida pelas crianças. Em seguida passa-se às
construções, quando as crianças escolhem o material, discutem o que fazer, entram
em conflitos sobre como será a casa, ou o bairro, até chegarem a acordos,
estabelecerem regras e, finalmente, concluir a atividade. Durante esse processo, a
imaginação funciona intensamente, os alunos realizam as representações
necessárias ao projeto da construção e vivem a oportunidade, pela segunda vez, de
tomar consciência desse cotidiano vivido por elas, graças ao distanciamento tomado
quando das representações. Feito isto, a professora conversa com eles sobre suas
construções, pede detalhes, faz perguntas, de modo a provocar novas
representações, novas tomadas de consciência. Mais tarde, findos os trabalhos
práticos, na escola ou em casa, os alunos ficam com a tarefa de escrever, às vezes
desenhar, a respeito de suas construções. Ou seja, mais um momento privilegiado
de representações.
É assim que se passa da ação prática à representação. E é por isso que
dissemos que as crianças sequer percebem que estão aprendendo. Claro que,
conscientemente, mesmo sem concluir isso, aprendem a fazer a tarefa que se
propuseram, tanto é que há um resultado final, isto é, uma construção pronta. Mas
essa prática não revela o que está por trás de tudo isso, qual seja, as aprendizagens
decorrentes dos conflitos para definir que tipo de casa se construirá, que são
aprendizagens de ordem social e moral, assim como não se vê o que ocorre no
plano afetivo, uma vez que as representações do cotidiano mobilizam uma gama
variada de emoções, elaboradas em função do objetivo do jogo, bem como a prática
não traduz com clareza a lógica do pensamento que conduz à solução dos
problemas decorrentes do jogo. A aparência do jogo revela, isso sim, os movimentos
corporais, os gestos que o jogo exige, geralmente muito sutis, pois se trata de
construções. Esses gestos são coordenados em função de objetivos e, essas
coordenações, visíveis nos movimentos corporais, são da mesma ordem que as
demais coordenações envolvidas no jogo e não reveladas, como as morais, as
sociais, as intelectuais e afetivas. São da mesma ordem, mas realizadas em planos
diferentes.
Durante uma atividade como essa, como se viu na descrição, as crianças
que realizam uma prática de jogos de construção e jogos simbólicos, precisam,
antes, durante e após a construção, representar intensamente essas práticas, ou
seja, os cotidianos traduzidos nesses jogos. Essas representações, produtoras de
31
tomadas de consciência, levam à compreensão daquilo que foi feito, não digo
compreensões plenas, mas pelo menos parciais. Compreensão não quer dizer,
exatamente, no caso de crianças tão novas, ter idéias claras sobre os significados
das casas, dos bairros, da cidade, das tramas da vida que cada um leva no seu
cotidiano. Ou ainda, uma percepção clara a respeito dos modos de fazer cada
detalhe das atividades, ou dos processos de elaboração das regras, e assim por
diante. O importante não é isso, mas sim, que as crianças refletem durante as
atividades, enfrentam desafios, superam os conflitos quando das dificuldades, têm
dúvidas, solucionam problemas. E isso as ensina a pensar, a cooperar, a resolver
conflitos com os colegas, a coordenar melhor os gestos, a lidar com as emoções, a
renunciar, e assim por diante. São esses saberes que, em outras ocasiões,
encontram oportunidades de se aplicar, e é por isso que há tanta repercussão
positiva em outras aprendizagens de outros momentos escolares.
As Oficinas do Jogo não vivem só de jogos de construção e jogos
simbólicos ou de faz-de-conta. As brincadeiras populares, de modo geral, são
praticadas pelas crianças durante as aulas. Sempre que possível, os materiais das
Oficinas são adaptados para todas elas. Por exemplo, num jogo tradicional como o
Caça ao Tesouro, as pistas podem ser fornecidas pelos materiais. Em uma das
estações, pode haver a indicação de que os alunos devem seguir até um ponto em
que haja uma caixa vermelha em forma de triângulo. Noutra estação, pode-se
indicar uma bola não amarela, pequena e pesada, etc. Usando apenas uma corda, a
aula pode ser de pular corda com todas as variações possíveis, desde que cada
variação ultrapasse a prática anterior em graus de complexidade.
A respeito dos materiais das Oficinas do Jogo Freire e Scaglia (2004,
p.63), em seu livro Educação como Prática Corporal, apresentam alguns objetos que
podem ser confeccionados nas Oficinas do Jogo pelos professores e também,
conforme o caso, com a ajuda dos alunos.
Nas Oficinas do Jogo os materiais são atraentes, bonitos e despertam nas
crianças a curiosidade pela apreciação estética; então, se o material de trabalho for
realmente belo, a criança estará sendo educada esteticamente, não só por conviver
em um ambiente de beleza, mas também porque suas construções perseguem essa
beleza. Utilizam-se nas aulas: caixas de papelão, cabos de vassoura, garrafas
vazias de plásticos, tampinhas de garrafas, arcos, bolas de meias e bolas com
alpiste. A ilustração desse material encontra-se no APÊNDICE A.
32
No caso mais específico desta dissertação de Mestrado, incluímos, nas
Oficinas do Jogo, a proposta de educar os sentidos. Valemo-nos, para tanto, dos
mesmos recursos de trabalhos feitos com outros objetivos específicos, isto é, o
ambiente, o jogo, a beleza, os materiais. Porém, neste caso, voltados para a
educação dos sentidos, mais especificamente, da audição. A cada novo trabalho de
pesquisa do programa Oficinas do Jogo, novos enfoques educacionais são
integrados.
O ambiente lúdico é extremamente favorável à aprendizagem, mas não à
aprendizagem em seus moldes mais tradicionais, quando, o que se espera dos
alunos é que apenas se conformem a um modelo burocrático de transmissão de
conteúdos, perguntas e respostas. Em hipótese alguma o ambiente lúdico está de
acordo com a mecânica da preparação para os vestibulares, uma espécie de
chantagem intelectual, na qual, se os alunos não se ajustarem ao modelo cruel de
responder exatamente o cai na prova, serão duramente castigados.
Quando a escola estrutura um ambiente lúdico para seus alunos, como
ocorre nas Oficinas do Jogo, é preciso ter clareza quanto ao que significa jogar. Até
onde é possível, é preciso ter liberdade para jogar. Porém, que se entenda que o
jogo ensina, não necessariamente para o bem. Ou seja, o jogo não é, nem para o
bem, nem para o mal (FREIRE, 2002). Deixado absolutamente livre, pode seguir por
caminhos imprevisíveis e indesejados. Mas o jogador não sabe disso. Envolvido pela
trama lúdica, vai, às vezes, até onde o terreno é perigoso, danoso e destrutivo.
Assim são muitos dos jogos adultos. Pessoas destroem a vida em volta de uma
roleta. Quem definirá rumos para o jogo, de modo a conduzi-lo para o bem (até onde
podemos saber sobre isso), é a conduta ética dos professores e professoras.
Costumamos entender que é um bem fazer coisas que estejam de acordo com o
viver bem, com o viver mais, com o viver amorosamente. Costumamos acreditar
que, se as crianças praticarem jogos coletivos e, para isso, tiverem que construir
relações cooperativas, isso é um bem. Costumamos acreditar que, se nossos alunos
forem levados, pelo jogo, a elaborar suas emoções a ponto de não serem violentos
com os colegas, isso é um bem. Costumamos acreditar que, se as crianças
construírem as regras de seus jogos, isso é um bem moral. Gostamos de ver os
gestos finos e desembaraçados quando os alunos praticam jogos bem orientados. E
nada mais realizador que perceber o modo inteligente como resolvem os problemas
surgidos no jogo, quando são propostos também de forma inteligente pelos
33
professores. Sabemos como se enchem de orgulho os bons professores, quando
ouvem a maneira desembaraçada e crítica de seus alunos que aprenderam a se
expressar bem sobre diversos assuntos.
Os resultados conclusivos que temos até o momento, naquelas turmas de
alunos que passaram períodos longos em atividades das Oficinas do Jogo, são
muito positivos, muito animadores. As referências de bom desenvolvimento são,
entre outras coisas, o modo como resolvem seus problemas e alcançam os objetivos
dos jogos, a maneira como falam sobre suas práticas, os registros dos professores
das Oficinas, os depoimentos dos professores de sala, das coordenadoras
pedagógicas e diretoras, etc. Esse conjunto de dados nos permite supor que, de
fato, houve um desenvolvimento significativo das crianças, em vários planos, quer
seja no plano motor, quanto no afetivo, no moral, no social ou no intelectual. Tudo
indica que, aquilo que nos propusemos fazer, realmente ocorreu, isto é, os alunos
que participaram das Oficinas do Jogo tiveram seus instrumentos para lidar, de
maneira bastante autônoma, com situações de sua vida, incluindo a escolar,
fortalecidos. No caso desta pesquisa, os alunos mostraram claramente esses
aspectos de desenvolvimento, especialmente quando falavam a respeito das coisas
ouvidas.
Quando brincam nas Oficinas do Jogo, aquilo que é tão funesto nas
rotinas escolares, qual seja, a obrigação, e apenas obrigação, é amenizado, tanto
quanto possível. Não somos partidários da idéia de que crianças, por serem
crianças, devem exclusivamente brincar, sem se submeter à obrigatoriedade de
certas tarefas. Achamos que deve haver uma mescla entre trabalho e jogo. Se as
pessoas apenas jogassem, apenas usufruiriam, isto é, retirariam coisas para si, sem
precisar repor, e, em algum tempo, os recursos se esgotariam. Por isso é preciso
trabalhar, é preciso submeter-se às tarefas para suprir necessidades. Mas isso pode
ser feito num ambiente lúdico, de maneira que as necessidades, por exemplo, de
aprender, sejam conduzidas pela motivação de jogar.
Nas Oficinas do Jogo as crianças são tratadas como crianças e essa
condição torna-se uma forte referência para o ensino/aprendizagem. Procuramos
criar um ambiente em que ser criança na escola é possível.
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6 CAÇADORES DE SONS
No decorrer do projeto piloto, projeto este que aconteceu no ano de 2005,
onde contei com a participação dos alunos do Infantil III da Educação Infantil, na
faixa etária entre cinco e seis anos, propus um passeio pela escola e seus
arredores, com o objetivo de exercitar o “ouvir”, dentro da perspectiva já abordada
em capítulos anteriores.
Foram vários e diferentes os tipos de sons vivenciados por essa turma.
Sendo assim, aquela experiência piloto nos encaminhou para algo inesperado:
surgiram ali “os caçadores de sons.” O nome, criado por um dos alunos integrante
da turma, espalhou-se rapidamente pelo grupo.
O nome “os caçadores de sons” surgiu a partir do momento em que
propus prestarmos atenção especialmente nos sons em volta. E, de uma certa
forma, indica que os alunos ficaram especialmente atentos àquela situação. Como
decorrência, esse nome orientou o tema da aula, que era educar a audição. Ou seja,
uma situação bastante favorável foi criada para as crianças se envolverem no tema
planejado. Nesse contexto, as crianças passaram a ter voz, a serem ouvidas.
Observa-se que as pessoas da área da educação costumam realizar suas
experiências preocupadas em fazer o melhor, embora muitas das vezes não
percebam o que é melhor para os seus alunos, e sequer lhes dão voz.
Em uma sociedade que muda tanto, os professores precisam estar atentos
às inovações e às possibilidades de realizar aulas desafiadoras, que permitam
romper com certas tradições esclerosadas. As aulas podem ser mais prazerosas e
atrativas quando penetramos na vivência e fantasia dos alunos.
A respeito dessa questão, destacam Freire e Venâncio (2005, p.104):
O jogo simbólico marca o apogeu do jogo infantil e através dele é que a criança vai desenvolver sua capacidade de representação, ou seja, utiliza significações para referir-se ao significado. Assim, desenvolve a capacidade de representar simbolicamente o que lhe é conhecido.
Percebemos a satisfação das crianças quando elas relacionam o
professor com alguém que lhes oferece um espaço lúdico. O brincar é fundamental
para o desenvolvimento humano; é a principal atividade das crianças quando não
estão dedicadas as suas necessidades básicas (repouso, alimentação, etc).
35
É da natureza das crianças brincarem se não estiverem cansadas,
doentes ou impedidas. Brincar é envolvente, interessante e informativo. Envolvente
porque coloca a criança em um contexto de interação em que suas atividades físicas
e fantasiosas, bem como os objetos de projeção ou suporte, fazem parte de um
mesmo contínuo topológico (MACEDO; PETTY; PASSOS, 2005).
Macedo, Petty e Passos (2005, p. 14) destacam que:
O brincar supõe também disponibilidade, já que as coisas mais importantes da vida da criança – o espaço, o tempo, seu corpo, seus conhecimentos, suas relações com pessoas, objetos e atividades – são oferecidas a uma situação na qual ela, quase sempre, é a única protagonista, a responsável pelas ações e fantasias que compõem esta atividade.
As crianças, nesse momento, não estarão apenas brincando, pois há um
objetivo didático em questão. Há tarefas para serem realizadas. Há, de uma certa
maneira, uma mistura entre obrigações e atividades lúdicas. Novos saberes são
construídos nesse ambiente onde predomina o lúdico. As tarefas, mesmo
acrescentando algo à situação, que não caracteriza o jogo, são realizadas e as
dificuldades superadas pela motivação lúdica.
Essa é a idéia dos procedimentos pedagógicos investigados nesta
pesquisa. No cotidiano das aulas, as crianças cumpriam objetivos educacionais,
claros para a professora pesquisadora. Precisavam ouvir os sons sugeridos em aula
e refletir sobre eles. A partir dessa reflexão, que se dava no prestar atenção, no
falar, imaginar ou desenhar a experiência sonora, conhecimentos eram construídos.
No entanto, aquilo que era claro para a professora (aprender a ouvir), não o era para
as crianças. Não importava saber desses objetivos, no caso delas. Importava, sim,
brincar de caçadores de sons.
36
7 CONSIDERAÇÕES METODOLÓGICAS
7.1 O método adotado
Pesquisas em pedagogia podem seguir procedimentos de coleta de
dados, tanto de ordem quantitativa, quanto de ordem qualitativa. No caso deste
estudo, os pesquisadores integram um projeto maior, denominado Oficinas do Jogo,
que tem, entre outros objetivos, harmonizar, na atividade acadêmica, ensino,
pesquisa e extensão. Como mencionamos no capítulo 5, nesse projeto há um grupo
de estudos que refere-se a professores da rede oficial de ensino que estudam,
debatem e produzem pedagogias que são levadas às escolas. Nessas escolas, o
produto dos estudos realizados é aplicado em aulas de Educação Infantil e Ensino
Fundamental. Essa aplicação é feita por integrantes do grupo de estudos e
analisada cientificamente. O professor da turma de alunos, sendo integrante do
grupo Oficinas do Jogo, ao investigar os efeitos da pedagogia aplicada, investiga
também sua própria ação de professor, ou seja, trata-se de uma pesquisa em que o
pesquisador investiga uma ação da qual ele participa ativamente.
A pesquisa qualitativa é a mais adequada, no caso, para analisar um
contexto dessa natureza, pois os dados são colhidos em forma de relatórios, diários
de campo, depoimentos, filmes, fotografias, etc. Dado o envolvimento do
pesquisador com o cenário da pesquisa, a modalidade mais indicada para proceder
às análises é a Pesquisa-Ação, isto é, a pesquisa em que a ação investigada
envolve o próprio pesquisador, que faz parte dela como interventor. O professor,
quando estava no momento da aula com seus alunos, não estava somente
pesquisando, estava dando aula, ensinando, e seus alunos aprendendo.
É importante destacar que a pressa é um pressuposto que não funciona
na pesquisa-ação e se estiver presente conduz, freqüentemente, a atropelamentos
no trato com o coletivo, passando a priorizar o produto, e tornando mais fácil a
utilização de procedimentos estratégicos que vão descaracterizar a pesquisa,
portanto foi disponibilizado para a pesquisa um tempo significativo para que o
trabalho fosse realizado com mais propriedade.
Toda a relação pedagógica existente foi alvo de investigação, o que
ocorreu a partir da recuperação dos acontecimentos através de registros em diário
37
de campo, vídeos, fotos, depoimentos, relatórios, etc. Franco (2006 p.6) confirma o
que foi dito nas linhas anteriores:
Quero com isso esclarecer que a pesquisa-ação, estruturada dentro de seus princípios geradores, é uma pesquisa eminentemente pedagógica, dentro da perspectiva de ser o exercício pedagógico, configurado como uma ação que cientificiza a prática educativa, a partir de princípios éticos que visualizam a contínua formação e emancipação de todos os sujeitos da prática.
Consideremos um dado fundamental: a pesquisadora fazia parte da vida
escolar das crianças envolvidas e antes de se tornar pesquisadora integrou o grupo
de estudos Oficinas do Jogo. Após meses de estudo, julgou conveniente aplicar os
conhecimentos desenvolvidos naquela turma. Pode-se dizer que os sujeitos da
pesquisa, entre eles a própria pesquisadora, participaram ativamente do processo
de elaboração das aulas, portanto, da pesquisa. A professora, por ser adulta, tinha
plena consciência de todo o processo e ajudava a decidi-lo. As crianças, por serem
crianças, tinham pouca consciência desse processo, mas praticavam um tipo de
aula em que a dinâmica era, em parte, decidida por elas. De certa forma, eram co-
autoras das aulas. Seus depoimentos durante as aulas indicavam certa consciência
do processo desenvolvido na pesquisa.
Uma das novidades no processo que estamos desenvolvendo no grupo
Oficinas do Jogo é que não se trata apenas de pesquisadores da universidade
querendo ajudar professores da rede de ensino a resolver seus problemas
pedagógicos. Trata-se sim, de professores da rede de ensino integrando o grupo
Oficinas do Jogo e tornando-se, eles mesmos, com a orientação de professores da
universidade, pesquisadores das ações pedagógicas de que participam em suas
escolas.
O objeto de investigação é ao vivo e real. O pesquisador está em
permanente construção científica, unindo teoria e prática, pois, conforme ressalta
Thiollent (2004 p.23), “A compreensão da situação, a seleção dos problemas, as
busca de soluções internas, a aprendizagem dos participantes, todas as
características qualitativas da pesquisa-ação não fogem ao espírito científico”.
Demo afirma (1997, p. 35) que, “Pesquisar é, lidimamente, saber pensar e
o aprender a aprender”.
38
A Pesquisa-Ação pode ser chamada de pesquisa prática, destinada a
intervir diretamente na realidade, a teorizar práticas, a produzir alternativas
concretas, a comprometer-se com soluções (DEMO, 1997).
Segundo Thiollent (2004, p 16), “Com a pesquisa-ação os pesquisadores
pretendem desempenhar um papel ativo na própria realidade dos fatos observados”.
O autor ainda destaca que:
Pesquisa-ação é um tipo de pesquisa social com base empírica que é
concebida e realizada em estreita associação com uma ação ou com a
resolução de um problema coletivo e no qual os pesquisadores e os
participantes representativos da situação ou problema estão envolvidos de
modo cooperativo ou participativo (THIOLLENT, 1986, p.14).
Neste estudo, a proposta foi de observar os fenômenos para descrevê-los
e interpretá-los.
Conforme Triviños (1999, p. 67), “A tarefa da observação requer que se
utilizem processos mentais superiores como: a atenção, a percepção, a memória e o
pensamento, para observar fatos e realidades sociais presentes”.
7.2 Os instrumentos utilizados
Para obter informações sobre o processo pedagógico em questão, foi
utilizado um diário de campo em que foram registrados, por escritos, os aspectos
relevantes do comportamento global e de reações promovidas pela atividade
proposta. A transcrição foi feita na integra a fim de evitar perda dos detalhes.
Registramos todos os eventos observados, levantando as hipóteses, verificando e
anotando as impressões acerca do contexto de eventos específicos, pessoas,
grupos, famílias, registrando também as falas, situações e modos. Esses registros
serviram para o planejamento das aulas, ou seja, para organizar a aula subseqüente
estudávamos a aula anterior, além de analisar os comentários dos alunos.
Para um registro fidedigno, não se dispensou alguns recursos visuais,
como o suporte tecnológico de uma câmera fotográfica digital e uma filmadora.
39
As fotografias serviram para ilustrar as aulas e como comprovação da
análise das atividades.
Quando ocorreram às filmagens, não houve o diário de campo, pois este
tipo de registro trouxe subsídios para essa coleta de dados.
Sempre que encerrávamos as atividades solicitávamos como registro dos
alunos através de um texto coletivo ou um desenho das atividades realizadas. Em
alguns momentos os desenhos eram individuais e em outros eram realizados
coletivamente. Este material servia para compreendermos os olhares e percepções
das crianças em relação às atividades.
Sendo a Pesquisa-Ação o modelo de pesquisa escolhida, consideramos a
voz dos alunos participantes, sua perspectiva, seu sentido, mas não apenas para
registro e posterior interpretação do pesquisador: a voz do sujeito fará parte da
tessitura da metodologia da investigação. Nesse caso, a metodologia não se faz por
meio das etapas de um método, mas se organiza pelas situações relevantes que
emergem do processo.
Além dos materiais das Oficinas do Jogo citado no capítulo 5, utilizamos
os seguintes materiais:
- caixas das oficinas do jogo transformado em material sonoro;
- caixas de fósforos;
- caixas de tamanhos variados;
- jornais;
- livros de histórias;
- palitos coloridos;
- CD com sons variados;
- elásticos.
Foi solicitado à professora colaboradora o registro inicial e final (por
escrito) dos alunos envolvidos, expressando sua percepção sobre a turma
participante do projeto.
Para efetuar o projeto, foi planejado e estabelecido com a escola uma aula
semanal de 90 minutos nas terças-feiras, sendo este período flexível, dependendo
da atuação e motivação do grupo.
40
No início da coleta de dados foram apresentados aos pais, através de uma
reunião pedagógica, todos os objetivos da pesquisa, bem como os procedimentos a
serem realizados.
7.3 A escolha do grupo
A escolha do local como cenário do estudo deu-se de forma intencional.
A instituição é uma escola particular na cidade de Florianópolis e foi
fundada no ano de 1991, segue as exigências e autorizações para funcionamento,
conforme a legislação em vigor. Localiza-se na parte continental da cidade, mais
especificamente no Bairro Coloninha, distrito de Florianópolis, SC. Fica próxima à
Escola de Samba Unidos da Coloninha, Figueirense Futebol Clube e Escola Básica
Professora Otília Cruz. Constatou-se pela fichas de matrículas dos alunos que,
atualmente, assim como nos primeiros anos da escola, grande parte dos pais/tutores
é composta de funcionários públicos (PROJETO PEDAGÓGICO, 2000). A
comunidade procura a instituição pelo diferencial na proposta pedagógica e o baixo
custo das mensalidades.
A estrutura física conta com duas unidades, uma atendendo aos alunos da
Educação Infantil e a outra atendendo aos alunos do Ensino Fundamental.
A unidade do Ensino Fundamental compõe-se de oito salas de aula, um
laboratório de tecnologia, um laboratório multidisciplinar (matemática, artes e
ciências), uma sala de leitura, uma biblioteca, uma sala de dança, um espaço
cultural, uma sala de coordenação, uma sala para professores, uma quadra
descoberta, uma cantina, um espaço coberto e descoberto para o lanche e ala dos
banheiros.
Os alunos que realizaram as aulas aqui estudadas eram todos
matriculados na Educação Infantil na faixa etária de 05 a 06 anos, período matutino,
totalizando 22 alunos, sendo 12 do sexo masculino e 10 do sexo feminino.
7.4 Os procedimentos para a coleta dos dados
41
Para iniciar a coleta de dados, fizemos contato com a professora da turma
para apresentar os objetivos da pesquisa e neste trabalho, ela será chamada de
professora colaboradora. Em seguida foi feito um roteiro de atividades, bastante
flexível, podendo ser alterado de acordo com o ritmo de desenvolvimento de cada
aula. O projeto também teve a aprovação do Comitê de Ética, que segue as Normas
e Diretrizes Regulamentadoras da pesquisa Envolvendo Seres Humanos –
Resolução CNS 196/96 da Universidade do Estado de Santa Catarina (UDESC)
(ANEXO A). Para facilitar a investigação do projeto Oficinas do Jogo – Educação
dos Sentidos, no ano de 2005 foi realizado um projeto piloto.
7.5 O projeto piloto
Para verificar a viabilidade do projeto Oficinas do Jogo: Educação dos
Sentidos e alguns ajustes fundamentais, no ano de 2005 foi iniciado o projeto piloto.
Este projeto compreendeu alunos da Educação Infantil cuja faixa etária
dos cinco e seis anos de idade com o total de 21 alunos envolvidos, sendo 10 do
sexo feminino e 11 do sexo masculino de uma Escola Particular de Florianópolis,
SC.
Utilizamos para coletar essas informações, um diário de campo, relato dos
alunos e fotografias. Apresentamos como registro a coleta de dados referentes a 03
aulas (APÊNDICE B).
A turma que fez parte desse projeto encontra-se, atualmente matriculada
na primeira série do Ensino Fundamental.
42
8 ANÁLISE DOS DADOS E DISCUSSÃO DOS RESULTADOS
8.1 Contribuição inicial da professora
No dia 13 de março de 2006, realizamos a primeira vivência com a turma
do Infantil III da Educação Infantil, que compreende a faixa etária entre 05 e 06 anos
de idade. A professora da turma mostrava-se mais ansiosa que os próprios alunos,
sentia-se feliz e com expectativa quanto ao projeto. Trabalhava na escola há poucos
meses, expressava receptividade e disposição em contribuir com as Oficinas do
Jogo.
Nos primeiros encontros com a professora, no início do projeto,
conversamos sobre o perfil do grupo. Ela fez a seguinte descrição da turma no início
de trabalho:
A turma do Infantil III, do período matutino iniciou o ano com animação. De 21 crianças, apenas 10 já se conhecia do ano anterior e o restante do grupo eram novos na escola ou estavam freqüentando a mesma pela primeira vez. A princípio tudo era novidade e foram se conhecendo aos poucos. Foi então que o grupo que já se conhecia começou a se afastar do restante. Foram momentos delicados, algumas crianças chorando pela falta de amizade de determinados colegas. As diferenças e rivalidades eram testadas a todo o momento. Quanto ao processo de alfabetização também percebemos muitas diferenças, enquanto algumas já estavam no nível pré-silábico, silábico-alfabético, outras não conheciam nenhuma letra e o respectivo som, não sabiam escrever o seu nome.
Constatamos que na turma do Infantil III, especificamente do período
matutino, havia uma grande quantidade de alunos que estavam ingressando na vida
escolar pela primeira vez. Entrevistando os pais, observamos que eles mantêm os
filhos em creches públicas ou em casa até à idade correspondente ao período do
Infantil III, quando procuram escolas particulares com mensalidades mais acessíveis,
pois acreditam que, nessa faixa etária, inicia-se realmente a vida escolar.
43
8.2 Procedimentos Pedagógicos durante a coleta de dados
A seguir vamos apresentar o relato e fazer as devidas discussões,
seguindo o percurso cronológico das atividades trabalhadas com o grupo de alunos
pesquisados. Selecionamos, entre as aulas realizadas durante o ano letivo, cinco
delas, entre as que consideramos mais significativas. As demais aulas podem ser
lidas no APÊNDICE C deste trabalho. O tempo escasso para realizar o trabalho de
coleta de dados e posteriores análises (tempo estipulado pelo programa de pós-
graduação), não nos permitiu analisar, em profundidade, um número grande de
aulas. Podemos adiantar que todas as aulas são importantes e se complementam.
As cinco aulas aqui analisadas, seguiram os mesmos procedimentos
pedagógicos de todas as demais. Sempre, ao planejar uma aula, as anteriores eram
consideradas de forma a se estabelecer um elo entre elas. Além disso, foi
necessário acrescentar, a cada nova aula, algum elemento que superasse as
anteriores em complexidade. Como já tivemos oportunidade de destacar
anteriormente, esses elementos novos eram de fundamental importância para
prender a atenção das crianças e provocar nelas certo nível de tomada de
consciência.
Esta pesquisa faz parte de um projeto maior que objetiva verificar os
efeitos educacionais dos procedimentos pedagógicos produzidos pelo projeto
Oficinas do Jogo.
8.3 As aulas analisadas e interpretadas
� Aula um – O reconhecimento
Um dos primeiros encontros com a turma aconteceu em sala de aula.
Quando entramos, rapidamente mencionaram:
- Hoje seremos caçadores de sons!
44
Percebemos, naquele instante, que a professora havia conversado com o
grupo sobre os nossos encontros, isto é, que eles fariam com a pesquisadora
atividades que se referiam a sons. Os alunos sabiam que nas aulas das Oficinas do
Jogo ocorreriam atividades diferentes da rotina escolar. Conforme destacamos
anteriormente, o termo caçadores de sons foi dado pela turma que participou do
projeto piloto, e esta menção acabou se espalhando pela escola.
No espaço da sala de aula os alunos estavam sentados nas respectivas
carteiras e dispostos em círculo. O grupo ouvia a música Rancho de Amor à Ilha do
poeta e escritor Zininho. Aproveitamos os acordes e a sintonia do momento para
iniciar um diálogo com o grupo. Perguntamos de que forma era possível ouvir aquele
som. Eles rapidamente responderam:
- Ora, com os ouvidos!
A pergunta que fizemos às crianças tinha o objetivo de fazê-las voltar a
atenção, não só para a música, mas para o ato de ouvir, ou seja, fizemos com que
elas focalizassem, com consciência, algo que se referia ao que estávamos
perguntando. Para conseguir que os alunos tenham atenção especial sobre alguma
coisa, entre outras medidas, deve-se fazer uma pergunta adequada, que provoque
nos alunos uma espécie de auto-pergunta. Quanto perguntamos: “de que forma era
possível ouvir aquele som?”, isso é o mesmo que fazer com que eles se perguntem
a respeito disso, de fazer com que resgatem a experiência já vivida, de conseguir
que eles vejam, dentro deles, na imaginação, o episódio ocorrido.
Todos os sons produzidos à nossa volta são sentidos por nossos ouvidos.
Isso diz respeito, num primeiro momento, ao aparelho biológico da audição, o qual,
nos seres humanos, é bastante limitado comparativamente a boa parte dos animais.
Portanto, para os seres humanos, ouvir não é apenas sentir com o aparelho
biológico, mas levar os sons ouvidos à imaginação, potencializando-o. Chegar a
isso, depende, basicamente, do foco da atenção. Se ela estiver distribuída
aleatoriamente, não necessariamente isso será percebido.
A respeito dessa questão, Barber e Legge afirmam (1976, p. 145 ):
Podemos descrever esta percepção como um processo, seleção, aquisição, transformação e organização das informações fornecidas através dos nossos sentidos, porém, se a atenção estiver focada num determinado ponto, a possibilidade de levar o som ouvido à imaginação é maior. Nosso cérebro é bombardeado por inúmeras informações e a mente parece ser favorável a que faça uma coisa de cada vez.
45
A audição de que tratamos aqui neste trabalho, isto é, a audição interna,
não significa desconsideração pelo sensível, uma vez que julgamos ser sensível
apenas aquela fina camada que nos recobre e traça as fronteiras com o mundo
exterior. Pelo contrário, em nossa compreensão de sensível, sentimos tanto as
coisas que nos chegam de fora, do mundo exterior, quanto as que nos vêm de
dentro, desse mundo interior. Para nós, esse mundo interior não é o mundo
espiritual, no sentido das coisas não materiais. Nosso mundo interior, a exemplo da
audição interna de que tratamos aqui, é o mesmo mundo corporal, é o mesmo corpo
que somos nós.
Quando os alunos responderam, de pronto, que ouviram a música com os ouvidos, para
eles, algo era óbvio; tratava-se de uma resposta fruto das primeiras reflexões, bastante
superficiais. Essa resposta nos deu a oportunidade de levá-los à biblioteca da escola e
mostrar-lhes ilustrações de livros a respeito do aparelho auditivo humano. Para as crianças,
ouve-se uma música com os ouvidos, e isso é um fato, uma verdade, tanto para elas, quanto
para nós. Nosso objetivo tratando-se de uma educação dos sentidos é conseguir, sobre o ato
de ouvir, uma tal atenção que produza neles um certo grau de consciência sobre o que
ouviram e sobre o ato de ouvir. Levar as crianças para a biblioteca e mostrar-lhes
ilustrações sobre o aparelho auditivo, significa criar mais um momento de redobrada
atenção sobre os elementos ouvidos. Lembramos, no entanto, que a música que haviam
ouvido já não estava acontecendo mais; situava-se apenas na lembrança das crianças.
Portanto, ao prestarem atenção nas ilustrações, a idéia é de que as crianças estabeleçam
relações entre o ato de ouvir com os ouvidos, como elas mesmas disseram, e o ouvido
desenhado nos livros. Ora, como dissemos no capítulo anterior, não basta a audição
biológica, pois todos nós nascemos com esse dom, uma vez que a audição biológica do ser
humano é limitada e poderá ser melhor trabalhada ou não, dependendo dos recursos
culturais para desenvolver uma audição mais apurada, ou seja, uma audição interna.
Voltemos à resposta tão direta das crianças, quando disseram que ouviram com os ouvidos.
Em seguida, quando olharam as ilustrações do aparelho auditivo nos livros, participaram
de um momento em que as coisas ouvidas foram refletidas, isto é, novamente ouvidas,
porém, dentro delas, e não mais no mundo exterior. Com as ilustrações puderam
estabelecer comparações entre o ouvido biológico e seu próprio ouvido, assim como com
as coisas ouvidas. Queremos dizer, neste ponto, que essa audição interna, não é menos
verdadeira que a audição externa. Se uma criança dissesse nesse momento (e para ela seria
difícil), que estava ouvindo dentro dela, isso não seria menos verdade que sua afirmação
anterior de que ouviu com os ouvidos. E isso é verdade porque, nos dois momentos, trata-
se de afirmar nosso ser sensível: no primeiro momento, o som chegou ao ouvido biológico,
vindo do mundo exterior, e a criança o sentiu; no segundo momento o som chegou ao ser
sensível, vindo do mundo interior, e a criança o sentiu também.
Continuando, saímos da biblioteca e, no caminho para a escola,
chamamos a atenção das crianças para os sons em torno delas, solicitando que
prestassem muita atenção àqueles sons. Para isso, procuramos despertar o
interesse do grupo, pois observa-se que as pessoas de um modo geral somente
46
dirigem a atenção para aquilo que lhes desperta o interesse, que as motiva e, no
caso das crianças desta pesquisa, que tenha significado para elas.
Ressaltam Boujon e Quaireau (2000, p. 8):
Entendemos a atenção como a disposição para selecionar e controlar objetos, informações, ações, de maneira voluntária ou não. A eficácia e a rapidez da atenção dependem do nível de vigilância ou de alerta no momento em que exercitamos, mas também de nossa capacidade de mantê-la.
Durante o percurso, passamos em frente às casas, atravessamos uma
rua, encontramos uma praça onde paramos. Fechamos os olhos para que as
crianças pudessem focar toda a atenção apenas nos estímulos sonoros. Durante
esse momento questionamos os sons capturados com a intenção de exigir dos
alunos um esforço mental para que aquele estímulo sonoro permanecesse maior
tempo no campo da consciência. Nosso objetivo era focalizar a concentração mais
para o que ouviram, do que para o que olharam.
Em uma experiência semelhante citado por Freire e Scaglia (2003 p. 129):
O primeiro passo, portanto, é conseguir que os alunos prestem atenção em suas próprias experiências. A professora Vera, por exemplo, sentou-se com seus alunos e começou a fazer-lhes perguntas. Essas perguntas, contudo, não podem ser aleatórias; devem ser pedagógicas, isto é, devem fazer com que o aluno questione a si mesmo.
Mesmo uma habilidade tão básica como a atenção exige a participação de
muitas regiões extensas do cérebro (RAMACHANDRAN, 2004).
O autor acima ainda destaca:
O sistema de ativação reticular – um emaranhado de neurônios no tronco cerebral que se projeta amplamente para vastas regiões do cérebro - ativa o córtex cerebral inteiro levando a excitação e vigília, ou – quando necessário – uma pequena porção do córtex, conduzindo a atenção seletiva. O sistema límbico está envolvido no comportamento emocional e na avaliação do significado emocional e do valor potencial de acontecimentos no mundo exterior. Os lobos frontais estão envolvidos em processos mais abstratos como julgamento, previsão e planejamento. Todas estas áreas são interconectadas num arco de feedback positivo – uma reverberação recorrente, como de um eco – que pega estímulo vindo do mundo exterior, extrai seus traços salientes e depois o faz saltar de região para região, antes de finalmente calcular o que é e como reagir a ele (RAMACHANDRAN, 2004, p. 156).
Ao retornar ao espaço da Educação Infantil, nos surpreendemos com os
protestos dos alunos que já com tão pouca idade escolar preferiam os passeios e
atividades livres, à sala de aula.
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Na sala de aula, tivemos o cuidado de garantir que todos os alunos
relatassem o que haviam escutado durante nossa saída. Fazer com que os alunos
prestem atenção especial nos sons, pedindo que relatem depois o que ouviram,
conversando com eles a esse respeito, é uma maneira de fazê-los ouvir diversas
vezes a mesma coisa, a primeira, efêmera, com o aparelho biológico; as demais,
ouvindo para dentro, com a imaginação, com auxílio de palavras, com consciência.
Muitas coisas não percebidas no primeiro nível de audição, são descobertas a
seguir, ouvindo para dentro. Trata-se de aprendizagem, de aprender a ouvir de uma
outra maneira que não superficial.
Os relatos foram diversos:
- cachorro latindo, homem falando com o cachorro, caminhão, carro,
nuvem, arco-íris, lagartixa, vento, joaninha voando, borboleta, balanço da árvore,
fogo, dálmatas, Gustavo queimando no sol e passarinhos.
Quando pedimos para os alunos relatarem o que ouviram, evidentemente,
esses acontecimentos sonoros já haviam terminado, era passado, estavam apenas
na imaginação, guardados nas lembranças. No momento de falarem, procuravam
recuperar os sons ouvidos, num processo que vamos chamar de ouvir para dentro,
ouvir com a imaginação. Ora, o que aconteceu é que misturaram lembranças do que
realmente aconteceu com outras lembranças, fato, para nós, absolutamente normal,
pois, no momento em que os sons são ouvidos com atenção, passam a fazer parte
de um acervo imenso e complexo de imaginação. Passam a fazer parte de uma teia
complexa de construções a que chamamos audição, muito mais ampla que o
simples ato de receber ondas sonoras no aparelho auditivo.
Em relação à menção dos alunos aos sons escutados, constata-se que
alguns sons externos que tiveram opinião da maioria do grupo, eram colocados
pelos alunos como sons visíveis (associado como algo material e real) para todos,
como por exemplo, um caminhão, pois durante o percurso, passou um caminhão
grande e barulhento. Ou um cachorro latindo, pois em muitos momentos da
caminhada fomos surpreendidos por cachorros latindo nas casas dos moradores
daquela rua.
Ao contrário dos sons visíveis, constatação do que realmente aconteceu
no passeio, alguns sons citados eram invisíveis e individuais (associado a
lembranças anteriores ou imaginação), como por exemplo, a nuvem: o aluno afirma
48
ter fechado os olhos e escutado o som da nuvem. No silêncio da praça um aluno
percebeu o som da joaninha voando.
Segundo Tevês (apud MARTINS, 2005, p. 99):
A realidade é construída por nossas representações e simbolizações. E, assim, como existe a realidade que nos é visível, formada por nossos hábitos, atitudes e condições de vida, existe uma outra faceta que tem como constituinte o nosso ser sensível, intuitivo e imaginário.
Para Venâncio et al (2005 p.98)
Há muitas formas, ou ainda, dimensões diferentes de o ser humano manifestar-se. Dimensões visíveis, concretas, percebidas a “olho nu” e outras, que também se revelam nas condutas humanas, que necessitarão de um olhar mais apurado por parte do observador para ser compreendidas.
As crianças citam coisas que não estavam mais acontecendo; porém elas
ainda ouviam, por isso podiam descrevê-las. Coisas que ainda permaneciam na sua
lembrança, na sua imaginação (FREIRE; SCAGLIA, 2003).
Desta forma podemos acrescentar dizendo que, quando oferecemos às
crianças essas experiências de prestar atenção nos sons à sua volta, estamos
fazendo com que elas penetrem também no mundo imaginário, capacitando-as para
tornar esses conhecimentos significativos durante a proposta de escutar os sons.
Exceto quando se trata de satisfazer necessidades básicas, a aprendizagem
humana é um processo contínuo de significação. Aquilo que pode ser significado é
incorporado, tem sentido para a pessoa; aquilo que não pode ser tornado signo é
rejeitado (PIAGET, 1990). Talvez por isso haja tanta rejeição quanto aos conteúdos
escolares, que são oferecidos às crianças como algo que não tem sentido para elas.
Logo após o relato de cada aluno solicitamos, tendo em vista que a
maioria dos alunos não era alfabetizada, que desenhassem o que ouviram. Os
alunos demonstraram um prazer imenso em desenhar e trocaram muitas
informações entre eles. Nesse momento o objetivo em questão não era avaliar ou
interpretar os desenhos dos alunos e sim fazer com que eles recorressem
novamente à imaginação, efetuando resgates da vivência sonora durante o passeio.
Assim como no momento em que pedimos que falassem sobre os acontecimentos
sonoros, também agora produz-se a oportunidade de que novamente tomem um
certo grau de consciência quanto a essas experiências. A experiência sonora, como
qualquer outra experiência empírica, pode ser vivida em vários planos, desde o mais
elementar, quando a sensação capta as ondas sonoras, passando depois pela
49
percepção, quando essa experiência é organizada de uma maneira particular pelo
sujeito, até a sua realização na imaginação, onde o acontecimento pode ser vivido
internamente. Neste último caso, o sujeito pode ouvir para dentro, isto é, ouvir dentro
dele o que tinha acontecido fora dele. É exatamente nesse ponto, quando se pode
ver para dentro, ouvir para dentro, que ocorre o processo de tomada de consciência.
As coisas ouvidas aparecem como audições construídas e sempre podem ser
ouvidas de novo e nada garante que serão ouvidas sempre da mesma forma, tanto
que, nos relatos verbais das crianças, surgiram coisas que elas não tinham ouvido
naquele momento.
A partir do momento em que ouve para dentro, a criança começa a ter
uma certa consciência da experiência sonora, vários níveis de consciência podem
ser produzidos, dependendo das oportunidades. Relatar verbalmente a experiência
é uma dessas oportunidades. Desenhar é outra. Reconhecemos pelos relatos dos
alunos e através dos desenhos que estabeleceram relações fortes entre o mundo
real e o imaginário.
Assim, os desenhos materializam as imagens mentais do que a criança
conhece e tem registrado na memória, com a contribuição da imaginação. Ou seja,
criança não faz desenho de observação, mas de memória e imaginação
(FERREIRA,1998).
Quando encerraram seus desenhos, solicitamos novamente que falassem
sobre aquele registro, pois através da linguagem eles expressavam os significados
dos seus trabalhos.
Freire (1997, p.37) defende a idéia, segundo a qual, “viajando pela
fantasia, a criança vai longe. Conhece coisas que nós, adultos, já vivemos e
esquecemos, e muitas vezes vai além de quase todos os adultos”.
Na etapa que constitui a Educação Infantil a fantasia é uma fase
importante e presente. Torna-se necessário descortiná-la e refletir sobre a
importância de que para aprender a pensar, é fundamental viver o mundo da
fantasia (FREIRE, 1997).
50
Fonte: Dados da pesquisa (2006).
Figura 2: Desenho de uma criança ao representar a experiência vivida circulando
pelas ruas vizinhas à escola ouvindo os sons.
51
Fazer da escola um espaço lúdico é tarefa criativa e trabalhosa que
somente acontece quando se almeja uma escola alegre e formadora. Precisamos
ousar nas instituições escolares, ousadamente, brincar na escola (VASCONCELOS
apud ARANTES, 2006).
� Aula dois – Explorando os sons do cotidiano
Iniciando as atividades sugerimos explorar os sons que estavam
presentes no nosso cotidiano. Dirigimo-nos para a quadra da escola. Ao chegar
naquele espaço observamos que os alunos gostavam do ambiente, corriam sem
parar. Reunimos então o grupo e fizemos a proposta para que os alunos
continuassem correndo, no entanto, deveriam tocar em tudo que produzisse sons.
Na quadra havia um diversificado material utilizado nas aulas de Educação Física
tais como: corda, bolas de diversos tamanhos, caixas, palitos, garrafas plásticas, etc.
Os alunos se deslocaram em uma algazarra coletiva e batiam nos objetos para
produzir sons. Percebemos que eles competiam entre si, tentando tocar muitos
objetos, sem a preocupação de explorar diversas possibilidades de sons.
Resolvemos questioná-los: procurem e toquem em objetos com sons
suaves, agora sons altos, sons baixos, sons barulhentos, etc. Com esta estratégia
constatamos que os alunos se preocuparam com a qualidade dos sons. Atentos
buscavam o som proposto.
Os alunos individualmente exploravam diversos objetos, entre os mais
manuseados foram: cordas, caixas, madeiras e bastões, bola, ferro, cone.
De repente, o grupo vibrou ao achar um balde com muitos palitos de
madeira coloridos. Resolvemos então brincar criando sons com o material
encontrado. Exploramos os palitos batendo nas diversas partes do corpo. Um
colega sugeriu:
_Vamos bater na barriga?
Aos poucos os alunos batiam os palitos na barriga e fomos sugerindo que
batessem em outras partes do corpo. Perguntamos:
- Tem diferença de som de uma parte do corpo ao bater o palito e outra?
Silenciosamente, tentavam escutar as diferenças dos sons.
52
_Ah, no cabelo não faz som! Uma colega manifestou.
Outra colega respondeu rapidamente:
_Faz sim, eu estou ouvindo!
Richmond (1981, p. 121), colocou que Piaget:
Considera a participação de grupo com outros iguais em idade e posição como poderosa influência na mudança das estruturas intuitivas para estruturas operacionais. Sugere que ser membro de um grupo encoraja comportamento cooperativo e proporciona um modelo concreto de ralações recíprocas. A criança precisa descentralizar seu ponto de vista a fim de explicar os pontos de vistas alheios. O intercâmbio de idéias realiza-se por meio de palavras e, para comunicar-se, a criança precisa aceitar a significação dessas palavras da maneira pela qual são conservadas pelo grupo como um todo.
Nesse momento de questionamento entre as crianças, elas são instigadas
a observar seus pensamentos experimentando-os socialmente e, assim, a resolver
as contradições que neles descobre. Todas essas facetas tomadas em conjunto
auxiliam o agrupamento de estruturas mentais em sistemas operacionais.
(RICHMOND, 1981).
Aproveitando a motivação do grupo com o material, sugerimos fazer uma
atividade com ritmo. Batíamos o palito no chão e o grupo repetia. Fomos dificultando
as batidas com tempos e ritmos diferentes. Começamos com uma batida simples e
fomos aumentando o grau de dificuldade. Por exemplo, para descrever nossa
atividade, representamos para os alunos, as batidas por notas musicais, sendo que
cada nota musical corresponde a uma batida e os espaços ao tempo entre as
batidas.
�- � - �
�- �� - ��
�- ��� - ��� - �
�- �� - ��� - ���
Nesta atividade observamos uma concentração significativa dos alunos,
até porque o barulho da batida no chão e o desafio de tentar reproduzi-las, chamou-
lhes a atenção.
53
Antes do encerramento da aula, solicitamos que os alunos descrevessem
o que lembravam explorando os sons com os materiais encontrados. Eles então
destacaram:
_Quando escutei o som da corda, lembrei de uma cobra. _Quando escutei o som do palito, lembrei de chupar picolé. _Ao usar as caixas dos jogos lembrei da bateria. _Quando bati o palito no meu cabelo, lembrei de tomar banho e pentear os cabelos. _Quando batemos os palitos no chão lembrei das aulas de música do professor Bruno. _No barulho da bola lembrei do jogo de futebol.
Quando as crianças ouvem um som qualquer produzido por algum
elemento ou objeto, elas transformam, pela atenção, esse som em consciência do
som. Elas realizam uma ação que consiste em ouvir para dentro o som que
aconteceu lá fora. Mas elas só ouvem, especialmente, um determinado som fora
delas, entre os inúmeros sons que poderiam ser ouvidos, porque algo as conecta
com ele, conforme lembrou, Merleau-Ponty (1999). E esse algo só pode ser a
existência parcial e insuficiente daquele mesmo som na sua consciência, criado ali,
anteriormente. Se for um som absolutamente conhecido, sem qualquer novidade, e
mesmo assim objeto de atenção especial, a novidade pode não estar no som
exterior, mas em qualquer outra coisa nova na situação vivida. Por exemplo, a
professora pede que as crianças prestem atenção nos sons agudos de um
ambiente. Uma criança descreve depois um som determinado que já é por ela
amplamente conhecido. Porém, a novidade estaria no fato de que a situação de
estar numa aula em que a professora lança o desafio de ouvir e descrever os sons
do ambiente, essa sim é nova. Novo não é o som, mas a situação.
Com isso queremos dizer que a atenção só se prende ao novo. O que é
discutível é o conceito de novo, porque, aparentemente, prestamos atenção em
coisas, na maior parte das vezes, conhecidas, por exemplo, as coisas da nossa
casa. O que há de novo ali? No entanto, volta e meia nos pegamos atentos
especialmente há algo amplamente conhecido. Mas, alguma lembrança ligada ao
objeto criou um sentimento novo, podemos vê-lo por um ângulo diferente, alguma
curiosidade por saber uma nova utilidade nele, etc.
54
Um bom exemplo quanto a essas coisas é o próprio corpo. Nós somos o
próprio corpo, portanto, o que há de mais conhecido, mais comum, mais familiar?
Nosso ouvido ficará no esquecimento por anos, até que nós tenhamos uma otite, ou
que nós queiramos colocar um brinco na orelha, ou até que um som estridente nos
perturbe, etc. E as vísceras? Nunca as percebemos, a não ser que algo novo chame
a atenção sobre elas, como uma doença, por exemplo. Mas a novidade pode ser
simplesmente a pergunta feita por alguém, ou por nós mesmo sobre as coisas
conhecidas. De repente nos pegamos perguntando, a respeito de nossa mesa tão
conhecida, que nunca nos chama a atenção: há quanto tempo a compramos?
Pronto, aí está a novidade, e é ela que nos faz novamente prestar atenção na mesa.
Ou, distraidamente colocamos a mão no peito, estamos sozinho, e sentimos as
batidas do coração, e começamos a pensar se o nosso coração está num ritmo
regular, se há alguma doença, etc, e isso nos faz ter a atenção voltada para o
coração, de onde decorre uma produção diferente, uma consciência sobre um órgão
que cumpria sua função sem que percebêssemos.
O problema, porém, de uma pedagogia, não é realizar uma explicação
científica, quer seja, psicológica, antropológica ou social da atenção, mas resolver o
problema de como manter o aluno atento em uma determinada situação, de modo
que ele aprenda, ou seja, que ele fortaleça seus instrumentos para viver melhor
nesta ou naquela situação. Trata-se, no caso presente, de tornar o aluno forte, no
sentido de fazê-lo aprender a ouvir para dentro, dado que seu contato com o mundo
exterior, feito pelo aparelho biológico da audição é frágil, comparativamente a outros
animais. Há um dado social, neste caso, de enorme relevância: diante das coisas do
mundo para ouvir, ver, saborear, tocar ou cheirar, todos os órgãos dos sentidos, no
sentido biológico, estão igualmente abertos. Isso não resulta em pessoas que
igualmente vêem ou ouvem muito bem, mas apresenta uma disparidade de
conhecimentos enorme sobre isso. Qual seria a razão? Provavelmente porque,
chegando a sensação aos órgãos dos sentidos, elas só se diferenciam quando
tornadas conscientes, que é o que aqui chamamos de ouvir para dentro, por
exemplo. Portanto, podemos ser fortes na audição interna, enquanto pouco
podemos alterar a audição externa. Então, esse é o problema da pedagogia:
entender o funcionamento da atenção para ensinar os alunos a ouvirem melhor.
Chegamos à consciência, portanto, pela atenção. Ouvimos e tornamos o
aluno atento ao que ouve. Se ele conseguir tornar-se atento, transformará, por sua
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ação, a sensação em consciência e essa consciência equivale ao ouvir para dentro.
Resta a questão estratégica de manter o aluno atento. A pedagogia deveria pensar,
para isso, em tornar as situações interessantes, e isso exige um capítulo à parte.
No final de cada intervenção a preocupação dos pesquisadores residia na
análise do grau de percepção e concentração em relação aos sons propostos.
Naquela proposta percebemos que os alunos começavam a explorar sons nunca
percebidos e estavam começando a entender a proposta da atividade.
� Aula três – Caçando sons
- É azedo , eu adoro!
- Eu odeio!
- O cheiro é gostoso!
- É doce!
- É amargo!
- É delicioso!
Foram essas as manifestações orais e espontâneas dos alunos, quando
provaram carambolas, uma fruta de forma exótica e plena de vitamina C. Para
muitos, carambola era apenas uma fruta observada em supermercados, sacolões ou
em árvores. Outros a desconheciam.
Nosso objetivo principal foi caçar sons (como os alunos mencionavam),
passeando pelas ruas circunvizinhas à escola. De repente paramos e avistamos
uma casa com um imenso quintal e, neste espaço justamente tinha um frondoso pé
de carambola.
Tanto os alunos como os professores ficaram atônitos com aquela visão
fantástica que se descortinava a poucos metros da rua barulhenta, repleta de
concreto e tijolos. Ali reinava majestosamente o pé de carambola, que mais parecia
uma árvore de natal, repleta de delicados enfeites amarelados, outros verdes,
muitas se espalhavam pelo chão. Que enfeites de formas estranhas, mais
parecendo estrelas alongadas que mantinham os olhares presos em uma única
direção. Chamamos o proprietário. De pronto ele nos atendeu e se apresentou,
dando um fraternal sorriso, abrindo os braços como se quisesse abraçar a todos
56
simultaneamente. Explicamos o objetivo da nossa presença naquele local:
estávamos investigando todos os sons ao nosso redor, quando avistamos naquele
terreno a frondosa árvore carregada de atrativas e suculentas carambolas.
Solicitamos ao morador se poderíamos explorar mais o quintal dele. O generoso
proprietário não só permitiu, como também nos ofereceu a oportunidade de saborear
algumas frutas. O quintal, bem cuidado, capinado não apresentava somente o pé de
carambola, mas inúmeras outras árvores e, para cuidar do zelo, deveríamos ser
vigiados pelo seu cão de guarda, que de tão avançado na idade preferiu ficar
dormindo, preguiçosamente, num canto da varanda, ignorando completamente os
numerosos visitantes.
Instalamo-nos debaixo daquela chamativa árvore e assim iniciamos a aula
C. Solicitamos que escolhessem uma carambola e cheirassem, sentindo o seu
perfume. Um aluno levantando a mão se expressou com veemência:
- Sabem que somos caçadores de sons e de cheiros, pois a professora
pediu para cheirarmos a carambola?
Depois de explorar as carambolas, através do seu cheiro e do seu sabor,
ficou impossível manter os alunos quietos debaixo daquela árvore. Os alunos
sentiam-se livres para correr entre as árvores. Constantemente vibravam, gritavam e
mencionavam que estavam em uma floresta, e as emoções contagiavam a todos.
Continuando nossa atividade, propusemos que descobrissem a maior
quantidade de cheiros possíveis. Para que isso acontecesse deveriam prestar
bastante atenção, pois havia muitas plantas diferentes. Sugerimos que, ao cheirá-la
ficassem de olhos fechados. É lógico que pela idade das crianças que estavam
participando dessa atividade, elas não conseguiam falar o nome das plantas e sim
somente destacar se gostavam ou não dos respectivos perfumes, se tinha cheiro
forte ou suave, e se os cheiros eram iguais ou diferentes.
Ficamos por ali um período de aproximadamente trinta minutos, deixando-
os livres até observarmos que estavam se dispersando do objetivo proposto. De
tempo em tempo chamávamos os alunos para socializar o que o colega estava
relatando ao descobrir um cheiro ou um som que lhe chamara a atenção.
Como o terreno era bastante amplo, os alunos se dispersaram,
focalizando sua atenção em outros objetos ou situações, o que consideramos
normal, principalmente se observarmos a faixa etária dos alunos. No entanto, para
socializarmos tantas informações, chamávamos os alunos, utilizando o som das
57
palmas o que significava que naquele momento o grupo estava se reunindo. Desta
forma envolvíamos novamente nossos alunos, excitando-lhes a curiosidade, fazendo
perguntas sobre as percepções sensoriais, ou seja, o que estavam escutando,
vendo e cheirando. Uma vez conseguida atenção, tentávamos mantê-la provocando
os alunos com perguntas para socializar o que mais chamara sua atenção naquele
espaço. Como era de se esperar, o tempo de atenção foi decrescendo e os alunos
finalizaram a aula correndo eufóricos e livres.
Conseguimos fixar a atenção dos nossos alunos por um período
considerável. Percebemos que isso somente seria possível se a nossa aula fosse
atraente, ou seja, aulas monótonas e cansativas não atraem os alunos e muito
menos prendem sua atenção. Não podemos afirmar que neste momento em que os
alunos estão prestando atenção, todos eles estão conectados naquele assunto
proposto. O que queremos afirmar é que, ao contrário do que se ressalta sobre a
falta de atenção, ou a desatenção, podemos manter a atenção dos alunos por um
tempo determinado se tivermos estratégias e motivação suficientes para o objetivo
em questão. Quando pesquisamos o tema da atenção, notamos a escassez de
literatura. Há muita coisa, ao contrário, sobre a falta de atenção. Para muitos a
atenção está ligada a desempenho intelectual. É lamentável que, embora a
garimpagem por literatura especializada tenha sido intensa, poucos estudos sobre a
atenção foram localizados, bem como o que motiva a atenção do indivíduo.
Nossas atividades não têm o propósito de manipular ou apresentar
técnicas que venham a condicionar o educando a manter a atenção e sim,
proporcionar aulas em que o novo, a curiosidade, estejam presentes atendendo às
necessidades do nosso aluno. Para nós educadores o aluno, quando excitado na
sua curiosidade e motivado, encontra motivos para participar de atividades que o
levem à realização dos objetivos educacionais. A criança, quando vai para a escola,
leva com ela grande expectativa, desejando estar em um ambiente diferente e
inovador. Enquanto essa criança estiver satisfazendo suas necessidades, ela se
sentirá motivada a buscar a escola, existindo, então, maiores possibilidades para o
desenvolvimento da aprendizagem.
Para nós, o conhecimento é uma construção, fruto da interação entre
aquilo que uma pessoa possui de acervo de conhecimentos num dado momento e
os elementos da situação nova que está vivendo. Nova porque, se não houver
novidades, que apareçam para a pessoa como novidade, não há porque aprender.
58
Ou seja, se o sujeito viver uma situação em que nada apareça como novidade, é
porque tudo aquilo já faz parte do seu conhecimento. Pois bem, suponhamos,
portanto, uma situação com novidades. E não só com novidades, mas que
apresente necessidades de aprendizagem. Como por exemplo, quando uma criança
quer ler alguma coisa, tem muito interesse nisso, mas ainda não sabe ler o suficiente
para compreender o que está escrito naquele texto. Nesse caso, por ser necessário
para ela, ela se esforçará para ler. Para tanto, usará o que tem de recursos e
construirá, com o texto a ser lido, um novo patamar de leitura. Portanto, o
conhecimento é um recurso disponível para compreender o mundo, o que inclui
nesse mundo a própria pessoa que conhece. E, como vimos, o conhecimento não
brota do nada, mas é fruto de trabalhosas construções. Há, nesse caso,
alimentadores do conhecimento. É preciso que coisas novas alimentem o
conhecimento. Neste trabalho, as novidades são as coisas a serem sentidas, mais
especialmente, a serem ouvidas. Os únicos alimentadores de conhecimento, que
provocam a mobilização dos recursos internos, isto é, dos conhecimentos anteriores,
são as coisas que chegam aos sentidos, vindas de fora, e as coisas internas do
próprio conhecimento, que funcionam também como sensibilizadores internos. Isso
justifica, neste trabalho, estarmos dizendo que a audição mais poderosa é a audição
interna, é aprender a ouvir para dentro. As coisas ouvidas pelas crianças, são coisas
que, devido à pedagogia utilizada, despertam muito a atenção delas. Com a atenção
especialmente focada no objeto de audição, a coisa ouvida é trazida para dentro, é
imaginada como som interno, e ouvida tantas vezes quantas sejam necessárias para
produzir muito além daquele som. O pequeno som de um pássaro cantando,
remoído internamente, isto é, ouvido internamente, pode se transformar em
lembranças de um episódio antigo, de conversas familiares, músicas, etc. Essa é a
extensão de um pequeno episódio de ouvir algo, quando a atenção é especialmente
despertada, e quando a pedagogia é extremamente solicitadora de reflexões, ou
seja, quando a pedagogia ensina a ouvir para dentro. E quando falamos de
extensão, sequer nos aproximamos do quanto ela pode ser profunda, jamais
saberemos até onde essa extensão do som do pássaro pode ir.
Quando anunciamos o retorno à sala de aula, houve um protesto de
indignação por parte das crianças, mediante vozes decididas e olhares fixos em nós.
Como dar continuidade a esse entusiasmo na sala de aula, fazendo algo que o
mantenha?
59
Para encerrar aquela visita, restava-nos agradecer ao proprietário.
Em coro, algumas com vozes gratas, outras em tom de protesto, mesmo
com a heterogeneidade de emoções, as crianças gritaram:
- Muito obrigado!
Na sala de aula, fizemos a nossa roda para a troca do precioso acervo de
informações, sobre as nossas vivências. Sobre a aula os alunos relataram:
- Eu escutei um cachorro e lembrei de um leão.
- Eu escutei um pauzinho sendo quebrado.
- Eu escutei uma pipa.
- Eu vi pitanga.
- Eu vi frutas e lembrei do sítio da minha vó.
- Eu lembrei de uma floresta perigosa.
- Eu escutei um passarinho.
- Eu também escutei um leão.
- Eu nunca tinha comida carambolas e gostei.
- Eu não gostei.
O trabalho educacional feito nessa aula envolveu outros sentidos. Como a
nossa é uma Pesquisa-Ação, onde os pesquisadores desempenham um papel ativo,
intervindo conscientemente durante todo o processo, sem separar o objeto
pesquisado do observador, desencadeando ações a partir das possíveis reações
que vierem a ocorrer, resolvemos explorar também outros sentidos.
Segundo Arckerman (1992, p.274). “Diferente se alguns animais que
vêem melhor com os ouvidos, nos humanos os olhos continuam sendo os grandes
monopolizadores de nossos sentidos”. No entanto nossa ida até aquele terreno com
seu belo pé de carambola não era somente com o objetivo de enxergar, mas de
levar os alunos a contemplar aquela cena. Era também fazê-los enxergar para
dentro, para o interior. O mesmo podemos dizer quando cheiramos as plantas e
provamos as frutas, quando várias atividades sensoriais foram realizadas,
potencializando os sentidos dos nossos alunos. As atividades realizadas fizeram os
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alunos percorrer um caminho que partiu da sensação, passou pela percepção, e
chegou à imaginação e à consciência (FREIRE, 2003).
Encerrando essa aula, entregamos para cada aluno um ramo de alecrim,
pedimos que fechassem os olhos e sentissem seu cheiro. Então perguntamos:
- Do que se lembram ao sentir esse cheiro?
Eles responderam:
- O alecrim tem cheiro de pizza, ou uma coisa que a gente coloca na pizza. - Eu lembrei do mato. - Tem cheiro de flor, algumas flores têm esse cheiro. - Eu lembrei da casa na minha avó. - Eu lembrei do remédio que às vezes eu tomo.
Em seguida entregamos o alecrim para cada aluno e propusemos um
desafio: enviamos um bilhete para casa comentando com os pais o que havíamos
realizado naquele dia.
Anexamos o pequeno ramo de alecrim em um papel e solicitamos que a
criança o cheirasse com a família e registrasse como fora o momento. “Do que se
lembravam ao cheirar o alecrim?”
No dia seguinte recebemos de volta bilhetes. Os registros dos familiares
foram os seguintes (APÊNDICE D):
- Papai lembra do cheirinho do campo! Mamãe lembra de comida gostosa temperada com o alecrim e também do remédio que fez o vovô que tinha dor nas costas. Meu filho lembrou da música Alecrim Dourado. Lá em casa todos concordaram que o cheirinho do alecrim é muito bom!
- Foi uma viagem ao passado, à infância. Cheirinho gostoso de mato;
lembrou-me a chácara de meu avô, onde vivi muitos momentos felizes. É mesmo incrível a nossa memória olfativa! Dizem ser a melhor de todas. Sim, gostamos da sensação (depoimento de um pai).
- Achamos que o alecrim possui um aroma muito peculiar, porém, lembrou-
nos muito do cheiro da pizza, como disse a Beatriz e nós, a família, concordamos com ela.
- Foi um momento prazeroso. Gostamos do aroma. Lembra um pouco as trilhas que fazemos na praia e o tempero do vovô.
- Lembra da natureza e dos passarinhos.
- Lembrei da minha sogra que sempre tomava chá e benzia com raminhos de alecrim, lembrei do pé de alecrim em frente a minha casa.
- Lembramos de carne assada na casa de minha vó, na infância. O Eduardo lembrou do sanduíche. O cheiro é muito bom, adoramos.
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- Lembramos do chá da avó.
- Lembramos das plantas, incenso, música e tempero.
- Com a correria do dia a dia é sempre bom parar para apreciar pequenas coisas. Passamos um maravilhoso final de semana no sítio, o Thiago pôde acordar e se deliciar com frutas colhidas do pé.
- Cheirar o alecrim nos faz lembrar estes bons momentos.
Foi recompensador para nós pesquisadores receber os retornos das
famílias dos alunos. Os pais compreendiam o projeto, pois, lhes foi apresentado no
início do ano em reunião com os pais. Sabemos que a família e a escola possuem
tarefas complementares, apesar de distinguirem seus campos de abrangência. Para
nós foi marcante conferir os registros, pois cada família tem os seus hábitos,
crenças, ideologias, etc. Não nos cabe analisar cada registro individualmente, pois
para isso também precisaríamos de um capítulo a parte. Podemos apenas destacar
que existem cheiros que são marcantes e ficam para sempre em nossa memória. De
todos os sentidos “O olfato é o sentido mudo que não tem palavras. Na ausência de
um vocabulário, ficamos de língua atada, buscando as palavras em um mar de
prazer e exaltação inarticuladas” (ACKERMAN, 1992, p.26).
Em nossa cultura estamos cercados por inúmeros odores. Cheiramos o
tempo todo. No entanto há cheiros que nos conduzem e despertam nossa
imaginação, nossa atenção. Segundo Ackerman (1992, p. 39) “Cada um de nós
possui suas próprias memórias aromáticas”. Podemos constatar esse fato pelos
relatos das famílias, pois as manifestações são diferentes, sempre ligados às
histórias de vida.
A proposta básica deste estudo é argumentar a favor de uma educação
dos sentidos, isto é, mostrar que os sentidos, mesmo limitados biologicamente,
possuem poderes inexplorados de desenvolvimento cultural; basta educar.
Especificamente lidamos com a audição mas, nessa aula, as circunstâncias
encaminharam para outra questão, a do paladar e do olfato. Foram descobertas dos
alunos e nós as seguimos. E tentamos mostrar que, aquilo que foi dito para a
audição, ocorreu também em relação ao paladar e ao olfato.
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� Aula quatro – Os sons da chuva
O dia amanheceu diferente, chuvoso. Quando entramos na sala
resolvemos propor uma atividade para escutar os sons da chuva. Andamos pela
escola, investigando a gama de sons proporcionados pela chuva. De repente, os
alunos perceberam o som provocado pela mesma ao cair do toldo.
Podemos caracterizar esta percepção como o processo ativo de seleção,
organização e interpretação da informação capturada pelo cérebro através dos
órgãos dos sentidos. Vários processos perceptivos também passam por vias não
conscientes. O que significa dizer que o limite entre percepção e a sensação, na
realidade, diz respeito à fase do processo. Na primeira (sensação) há a entrada de
estímulos através dos órgãos sensoriais e na segunda (percepção) há o
processamento desses estímulos transformando-os em informações (PENNA 1966).
Nesta cena educacional, as coisas percebidas estão ali, não sabemos se
suficientes ou não, mas estão de acordo com as previsões feitas pelo professor em
seu plano. Isso não quer dizer que os alunos e a própria dinâmica da cena não crie
novos fatores de aprendizagem.
Quanto às expectativas sobre o que deve ser educado, relacionadas à
audição, os sons estão ao nosso redor. Para que o aluno aprenda temos que dizer
algo que equivalha a dizer, “ouça, isto está aqui, está fazendo barulho”, e temos que
dizer isto de forma que a atenção do aluno se volte para o acontecimento. Estamos
dizendo, portanto, que ele vai ouvir com a atenção, mais que com o ouvido. E é
permitido dizer isto, pois agora mesmo, ao seu redor, muitos sons estão
acontecendo e você não está ouvindo. Porém, as ondas sonoras estão chegando ao
seu ouvido. Há, portanto, vários níveis de audição. O primeiro é esse, em que as
ondas chegam ao ouvido, mas a pessoa não as ouve. Depois há um nível mais
elevado em que, tendo a atenção chamada para o som, a pessoa efetivamente o
ouve. Em seguida, pode-se pedir um aprofundamento da atenção, quando o
acontecimento é enviado para regiões mais profundas da audição, o cérebro, por
exemplo, onde recebe um tratamento melhor. Dá para dizer que, num nível maior de
atenção, quando o aluno tem que desenhar, relatar, escrever sobre o que ouviu, a
consciência participa do processo e se amplia o conhecimento sobre o som ouvido.
63
Ou seja, ouve-se com a atenção, que é um ouvido de muitas camadas, cada uma
ouvindo melhor que a outra.
Em nossas aulas, não observamos os tão propalados problemas de falta
de atenção. As aulas são lúdicas, estão de acordo com os interesses das crianças,
portanto, elas não se dispersam, manifestam interesse e prestam atenção e por isso,
aprendem. Não precisamos falar a cada instante do problema da falta de atenção,
mas da questão da atenção, decisiva; a criança só aprende quando presta atenção.
Continuando nossas atividades, sugerimos que os alunos “limpassem
seus ouvidos”. A técnica consiste em solicitar que os alunos tapem com as mãos os
ouvidos contando até três, não escutando nenhum som, de preferência com os olhos
fechados. Após este procedimento devem retirar as mãos dos ouvidos abrir os olhos
e escutar os sons a sua volta. Percebemos, naquele instante, que ao retirar as mãos
dos ouvidos os alunos permaneceram em silêncio por alguns segundos, procurando
transformar seus ouvidos em filtros e captar o maior número de sons possíveis.
Após circular pela escola explorando todas as possibilidades de sons
causados pela chuva, retornamos à sala de aula para conversar. Na roda de
conversa, aproveitamos para confrontar vários pontos de vistas, seja na divergência
ou convergência de idéias. O importante é, através do diálogo, descentralizá-los
construindo um ambiente coletivo em favor de uma certa referência, neste caso, os
sons da chuva.
Antes de iniciar nossa discussão, um aluno comentou:
- Sempre quando chego em casa limpo os ouvidos e escuto sons.
Perguntamos.
- Você sempre faz isso?
- Não, somente depois dessas aulas. Agora eu presto atenção nos sons que não prestava antes.
Continuamos:
- Você acredita que as aulas o ajudaram a escutar sons diferentes?
Ele respondeu:
- Antes eu não escutava alguns sons.
Insistimos:
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- Quais sons você não escutava?
Respondeu:
- Som do passarinho e dos carros. Eu não prestava atenção, agora eu presto!
O aluno que fez o relato era um aluno participativo, mas nunca tinha se
manifestado dessa maneira. Expressou-se de forma espontânea, o que chamou a
atenção de todos os envolvidos naquela roda de discussão. Ele se manifestou antes
mesmo de iniciarmos nosso diálogo. Não ouve indução naquele depoimento.
Percebemos que foi desencadeado pela seqüência das atividades que vinham
sendo realizadas no decorrer dos nossos encontros, ou seja, a criança estava sendo
provocada, através dos nossos questionamentos, a verificar seus pensamentos,
experimentando-os socialmente e, assim, a resolver as contradições ou indagações
que neles descobre.
Concordamos com Richmond (1981, p.131): “quando destaca que o
objetivo do professor é encorajar a criança a aplicar seu conhecimento a situações
até então desconhecidas, e ao mesmo tempo, encorajá-la a usar ações conhecidas
em contextos desconhecidos”.
Entendemos que cada criança tem um tempo diferente para aprender e
não aprenderão da mesma forma. Nem todos os alunos naquele instante
conseguiram prestar atenção da mesma maneira, até porque podemos destacar que
há situações que chamam mais a atenção de uns e menos de outros, dependem do
significado que cada um estabelece para sua vida, e nas transformações que
realizam com aquele conhecimento aprendido.
Na seqüência da aula, conversamos com os alunos sobre suas
lembranças ao escutar o som da chuva. A pergunta é realizada em relação à
situação de aprendizagem, do ponto de vista da experiência passada; nossa
preocupação é acomodar a experiência passada à situação presente.
Os alunos precisavam fazer certo esforço para resgatar, através das suas
lembranças, o percurso e nossas indagações.
Relataram:
- Avião que voa na chuva. - Borboleta e da minha tia. - Do céu e do barulho dos passarinhos.
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- De ficar em casa com a mãe e com o pai. - A primavera. - Eu lembrei do shopping, quando eu fui estava chovendo e fazia barulho
no telhado. - Arco-íris, sapo, relâmpago, poça d’água. - Brincar de bola. - Eu na minha casa vendo a chuva.
Nesse espaço de troca entre os alunos, observamos que eles queriam
falar ao mesmo tempo; os professores procuraram organizar os relatos para que
pudessem escutar os colegas estabelecendo uma relação de troca.
Os alunos ao falarem dos sons que escutaram, referem-se à chuva;
indicaram prestar atenção em aspectos que, parece, não lhes chamava a atenção
antes. Eles disseram que, agora, prestando mais atenção, ouvem coisas que até
então não escutavam. Pedimos exemplos, e eles relacionaram, aos sons da chuva,
lembranças passadas.
É possível dizer que isso, de alguma maneira, está relacionado ao que
dizia Piaget (1979) sobre os processos de assimilação e acomodação. São
processos complexos, porque Piaget referia-se a eles como construções internas.
Ou seja, no caso da audição, não se tratava apenas de um ouvir e registrar o
acontecimento sem alterações, mas de construir alguma coisa internamente, a partir
das relações entre o som produzido externamente e todo o acervo de percepções,
conhecimentos, imaginações, etc, acumulado até então, e que pudesse se
relacionar com a experiência da chuva, no caso. Pode-se dizer que a criança ouve o
som da chuva e, nesse processo de adaptação (assimilação e acomodação),
constrói mentalmente um conhecimento que se refere a uma lembrança passada.
Não nos compete dizer porque ela relacionou chuva com jogo de bola ou com
primavera. Ela tem seus motivos, não necessariamente conscientes. Para nós, o
que importa é que a educação dos sentidos, não é simplesmente melhorar a
sensibilidade do aparelho auditivo biológico, mas sim, aumentar os poderes de
construção interna do aluno. Ao ser instigado a prestar mais atenção nas coisas, ao
ser questionado sobre o que ouviu, ele dá mostras de que aumenta seus poderes
mentais de elaborar as experiências sensíveis. A isso nós chamamos de ouvir para
66
dentro, e o mesmo seria dizer, ver ou cheirar para dentro, se as experiências
sensíveis fossem de outro tipo.
Quando a criança assimila a experiência auditiva dos sons da chuva, na
verdade ela está incorporando essa experiência à sua história de vida. Não coloca
algo mais na sua memória, mas sim, faz com que algo novo passe a fazer parte da
sua história, por isso ela, imediatamente, mostra as relações entre o som atual da
chuva e uma lembrança tão passada como o avião que voa na chuva. Portanto,
assimilação é isso, algo novo que passa a fazer parte do sujeito; e acomodação, por
outro, é esse esforço realizado pelo sujeito que faz com que aquilo que ele era, se
modifique.
Ressalta Macedo (1994 p.16):
A criança ao adquirir um novo conhecimento tem que reconstruí-lo, transformá-lo, tomar consciência de suas características e do quão bem ou mal ele cumpre suas funções. Conhecimento este subordinado ao que ele já tinha, mas que é re-significado e reconstruído.
� Aula cinco – Túnel dos sentidos
Durante o tempo em que aplicamos as atividades, compartilhamos com a
turma, um período dinâmico e expressivo. Constatamos que os alunos esperavam
ansiosos pelos encontros. Para eles nós éramos vistos como alguém que sempre
oferecia uma atividade nova, pois nossas aulas eram realizadas em espaços
internos e externos da escola. Sair da sala de aula e vivenciar uma novidade
significava fugir da rotina escolar, e era motivo de satisfação.
Uma atividade como essa que estávamos aplicando, poderia ser oferecida
através do jogo ou sem provocar o jogo, ou seja, poderíamos conduzir as atividades
por uma cultura lúdica, pelo prazer que causa tal brincadeira, que nesse caso
chamamos de jogo ou por atividades formais, na sala de aula. Tudo dependerá da
condução da aula.
Não vamos repetir conceitos e definições sobre o jogo e sim dispensar
nossos esforços procurando investigar como o jogo pode nos auxiliar nesta
atividade. Concordamos com Freire (2002, p. 87) quando ele destaca que: O jogo é,
como vemos, uma das mais educativas atividades humanas, se considerado por
67
esse prisma. Ele não educa para que saibamos mais matemática ou português ou
futebol; ele educa para sermos mais gente, o que não é pouco”.
A escolha de como desencadear o percurso das atividades dependerá da
visão ou da disposição de cada educador, pois os alunos, quando jogam, se
desprendem e se libertam, o que, muitas vezes, causa sobressalto nos professores.
Observamos que, de um modo geral, os professores preferem oferecer atividades
onde o controle e a dominação estejam garantidos.
Em todas as nossas atividades, não somente por preferência, mas por
convicção, preferimos encaminhar nossas aulas dentro de uma conduta lúdica.
Através da brincadeira estávamos chamando a atenção dos alunos.
Celante (apud VENÂNCIO; FREIRE, 2005. p. 101) destaca:
A infância é a idade do possível, em que tudo pode acontecer, na qual sempre se pode fazer de conta e a fantasia é então o grande recurso que a criança possui. Dessa forma, trabalhando com a mudança da realidade, no jogo do faz-de-conta, poderemos propiciar recursos para uma futura atuação no mundo objetivo.
Penetrar no mundo da fantasia, do desconhecido e do mistério, esse foi o
nosso objetivo ao construir o túnel dos sentidos. Como citamos no capítulo 6 onde
relatamos que fomos batizados de caçadores de sons pelos próprios alunos,
resolvemos finalizar nossas aulas construindo um túnel dos sentidos, mais
especificamente, trabalhando dentro das Oficinas do Jogo - audição. Não podemos
considerá-lo apenas como um túnel sonoro, e sim, um túnel sensível, um túnel dos
sentidos, onde os alunos, através do tato e outros sentidos, experimentavam
diversas sensações.
O túnel foi feito com uma armação de canos, revestida por um grande
plástico preto. Foi colocada uma cortina na entrada e outra na saída, feitas, do
mesmo material que revestia o túnel. Dessa maneira os alunos não observavam, de
fora, o que havia dentro dele. No espaço interno colocamos vários objetos sonoros:
no chão, nas paredes e no teto. Os objetos eram: chocalhos, pandeiros, rosa dos
ventos com diversos sons, caixas e brinquedos sonoros, latas com tampinhas e
pedras. No chão colocamos folhas secas, plásticos barulhentos, papéis amassados.
Os objetos eram colocados de maneira que provocassem contraste de sons, ou
seja, ao andar pelo túnel os alunos tocavam em um objeto que produzia um som
estridente, depois tocavam em um outro objeto que produzia um som baixo, e assim
sucessivamente. Um aparelho de som toca um CD com sons da natureza.
68
Para iniciar a atividade convidamos os alunos para que entrassem no
mundo da fantasia, vivendo uma aventura imaginária. Quando avistaram o túnel
seus olhos ficaram fixos nele, estavam atentos, pareciam imaginar o que havia
dentro daquele túnel. O aluno para se deslocar dentro do túnel, tinha que tirar os
calçados e ter seus olhos vendados. Ao entrar era orientado para tocar em tudo que
encontrasse, prestando muita atenção nos sons. Sem a visão, o aluno tinha que
redobrar a atenção, ou seja, ativar outros órgãos dos sentidos. Ao sair eram
questionados sobre os sons escutados e sobre o que lembravam.
“A brincadeira simbólica dá também à criança a maravilhosa possibilidade
de ir até a fantasia, vivê-la intensamente e poder voltar à realidade, sem se perder
pelo caminho ou fixar-se na situação imaginada” (MARTINS; VENANCIO apud
VENÂNCIO; FREIRE, 2005,p. 111).
Os alunos relataram:
- Primeiro a gente ficou curioso para entrar no túnel e ver o que tinha lá
dentro!
- Eu não fiquei com nenhum medo!
- Quando eu vi o túnel eu lembrei do túnel lá do centro que a gente passa
de carro!
- Eu senti um barulho no chão parecido com pipoca!
- Senti que tinha plástico para pisar e tambor!
- Eu mexi no chocalho, era som de chocalho!
- Tinha um som de cristal!
- Eu ouvi barulho de asas batendo, passarinhos voando!
- Eu toquei no sino, era bem alto!
69
- Tinha um som da natureza, bem baixinho!
- Eu achei uma guitarra que tocava umas músicas!
- Eu acho que tinha um grilo na caverna!
- Eu tenho medo do escuro, não gostei de fechar os olhos, podia cair!
- Eu gostei porque eu nunca tinha entrado numa caverna!
- Nós caçamos muitos sons dentro da caverna, ouvimos bastante!
- Eu ouvi som de bateria e um som parecido com skate!
- Eu gostei do túnel porque eu aprendi a ouvir mais!
- Adorei passar no túnel, queria ouvir de novo!
- Eu achei divertido, a gente não sabia o que ia ouvir!
- Eu ouvi um barulho que parecia um avião!
70
Fonte: Dados da pesquisa (2006).
Figura 3: Desenho de uma criança ao imaginar o que havia dentro do túnel.
“A brincadeira ou jogo que acabamos de descrever incluiu uma atividade
fantasiosa acompanhada de ação corporal” (FREIRE, 1997 p. 43). É lógico que as
crianças entendiam que aquele não era um túnel de verdade, ou seja, sabiam que
era um faz-de-conta, mas para a criança, naquele momento, o essencial era a
fantasia, a brincadeira e a diversão.
Para Goda (2005, p. 58):
Precisamos apreender essa capacidade de virar o mundo pelo avesso, ou aprender os segredos dos prestidigitadores e as virtudes do pó de pirlimpimpim e deixar o mundo imaginário fluir, fazer diferente do que é esperado, dar outro sentido às coisas, imaginar um outro sonho que não seja o convencional.
Para nós, adultos, que estávamos acompanhando o grupo, o importante
não era analisar o desenvolvimento dos alunos a partir das nossas realidades e sim,
proporcionar uma atividade que os ajudassem a construir, dentro deles mesmo,
71
novas experiências de aprendizagem e conhecimento, sem perder o clima de magia
instituído naquele momento.
Pudemos observar que as crianças participaram procurando prestar muita
atenção aos sons, e isso ficou visível, pois a grande maioria, quando entrava no
túnel, procurava explorar o maior número de sons possível, e, ao tocar em um
objeto, ficava silenciosa e concentrada tentando identificá-lo.
Segundo Freire (2002 p. 60):
Se num determinado contexto o jogo de um grupo de crianças mostra-as
extremamente concentradas, essa concentração é real, é existente naquele
contexto e, se eu puder identificar aquele conjunto como jogo, posso, se
não deixar escapar a idéia de totalidade, dedicar-me à tarefa de investigar
a concentração das crianças para compreender o jogo que ela faz parte.
No jogo ou na brincadeira, em alguns momentos podemos perder o
contato com a realidade, ou seja, a realidade (objetivo) cede espaço ao simbólico
(subjetivo). No entanto, a qualquer instante podemos voltar à realidade, pois o jogo
infantil guarda ligações concretas com o mundo real (MARTINS; VENANCIO apud
VENANCIO; FREIRE, 2005).
Pudemos constatar em todo o processo da aula, que, tendo encontrado
um ambiente propício, as crianças mergulharam no mundo da fantasia, criando um
clima especial que desafiava os participantes.
Analisando os relatos dos alunos percebe-se nas suas falas que os sons
escutados são entrelaçados com sentimentos de medo, alegria, reconhecimento,
curiosidade, etc. Seja qual for o som ele estará associado com outras experiências
vividas.
Alguns dias depois a professora da classe conversou novamente sobre a
atividade, relembrando os sons escutados naquela aula e propôs que fizessem uma
produção textual coletiva sobre o túnel.
Produção Textual Coletiva: Referente ao Túnel dos Sentidos
“UMA CAVERNA MISTERIOSA”
Era uma vez um menino chamado Pedro e sua irmã chamada Mariana. Um dia eles saíram para passear em uma floresta perto da casa deles. E aí eles encontraram uma caverna abandonada. Eles ficaram com medo do que poderia ter lá dentro, pois a caverna estava cheia de teias de aranhas
72
e com alguns ratos saindo de dentro. Também tinha sete morcegos em cima dela. Foi aí que eles ficaram de cabelos em pé, de tanto medo. Foram para casa procurar uma lanterna para entrar na caverna. Voltaram e devagar foram chegando cada vez mais perto. Tinha uma porta de pedras. Eles tiraram algumas pedras para poder espiar. Viram que não tinha ninguém dentro e ao entrar ouviram vários sons. Ficaram espantados! Um comentava com o outro: “Você ouviu os sons da natureza?” “Eu ouvi som de cobra!” “Também deve ter
grilos aqui dentro!” “Acho que tem uma guitarra!”
Eles saíram da caverna, animados com os sons que descobriram e assim resolveram ir morar dentro daquela caverna misteriosa para ouvir mais coisas e viveram felizes para sempre...
Turma da Lua Infantil III – Matutino
Essa atividade foi realizada após uma semana em que os alunos
vivenciaram a experiência do túnel dos sentidos. É claro que muitas informações
foram se modificando à medida que o tempo passou e os alunos foram construindo
outros conhecimentos. A partir do momento em que a criança interage com algo
novo, necessário para ela, portanto, uma relação construtora de conhecimentos, os
conhecimentos anteriormente produzidos não param de se modificar, a cada
instante. De tal maneira que, se pudéssemos avaliá-los anos depois, as
modificações seriam de tal ordem que já não reconheceríamos o conhecimento
original. Ou seja, isso aponta claramente um dos mais graves problemas da
avaliação: só conseguimos avaliar o imediato, quando o mediato estende-se, talvez,
à vida toda. Contudo esse ir e vir de representações e ações resulta em
construções de novos conhecimentos e tomadas de consciência. Não poderíamos
encerrar essa análise sem citar Paulo Freire (1999, p. 15).
As consciências não se encontram no vazio de si mesmas, pois a consciência é sempre, radicalmente, consciência do mundo. Seu lugar de encontro necessário é o mundo, que, se não for originariamente comum, não permitirá mais a comunicação. Cada um terá seus próprios caminhos de entrada nesse mundo comum, mas a convergência das intenções, que o significam, é a condição de possibilidade das divergências dos que, nele se comunicam. A não ser assim, os caminhos seriam paralelos e intransponíveis.
As manifestações das crianças, em cada aula, são muito parecidas.
Gostam muito de falar sobre as vivências. Quando manifestam o que ouviram, ou o
que cheiraram e provaram, os relatos vão muito além daquilo que o aparelho
biológico pode captar. Os relatos traduzem as representações mentais, traduzem as
conexões entre as experiências internas e um rico acervo de representações,
imagens, conhecimentos, etc, anteriores. Não se pode provar em termos absoluto, a
73
evolução na educação dos sentidos que procuramos praticar nas aulas que
resultaram nesta pesquisa. Porém, não se trata de provar o que quer que seja, mas
apenas demonstrar a possibilidade de praticar uma pedagogia que considere que os
cinco sentidos podem ser educados. Percebe-se, no entanto, que os discursos das
crianças evoluíram, tornaram-se mais desembaraçadas, falantes, tinham mais sobre
o que falar e notamos que, suas falas afastavam-se, cada vez mais, das coisas que
eram ouvidas.
8.3.1 Contribuição final da professora
Encerramos a coleta de dados no final do mês de outubro. Solicitamos à
professora um parecer final da turma e as suas considerações sobre a proposta
apresentada:
Em primeiro lugar gostaria de registrar os meus agradecimentos por tudo o que foi apresentado e vivenciado com a turma do Infantil III durante este ano. Foram momentos de muitas conquistas, descobertas e aprendizagens. Já estamos sentindo falta dos nossos encontros todas as terças-feiras. A “Educação dos Sentidos”, com certeza ficará presente no nosso grupo para aperfeiçoamento da sensibilidade das nossas vivências. O que antes não era explorado, agora já faz parte da rotina das nossas aulas. No início do projeto, na nossa primeira saída da escola como “Caçadores de Sons”, as crianças só conseguiam ouvir o barulho dos carros, cachorros latindo, buzinas, etc... Já na nossa saída de estudos ao Parque Ecológico do Córrego Grande, realizada no final do projeto, os sons foram bem diferentes, barulho da água com o movimento dos peixes, da gangorra batendo no pneu, do gatinho miando no mato, ... Hoje qualquer barulho que escutamos, já conseguimos parar, ouvir, verificar e relembrar tudo o que foi trabalhado com a nossa turma. Sabendo ouvir, temos uma audição muito mais apurada. Sons que anteriormente não eram percebidos, agora são comentados durante as aulas, como por exemplo: o som das folhas balançando na árvore do parque, o barulho da chuva, dos brinquedos do parque, dos pássaros, do vento, ... Esses comentários partiram das crianças quando questionadas sobre o que o projeto acrescentou para o grupo e uma delas respondeu: “É que antes a gente não ouvia tão bem assim! A gente não prestava atenção em alguns sons! Então agora, a gente escuta muito mais e melhor!” O estudo da sensibilidade dos órgãos dos sentidos fez com que as crianças percebessem ao seu redor o mundo que as envolve, traduzindo as suas emoções de forma natural e significativa, abordando um novo olhar no sentir e na percepção e concepção de mundo.
As palavras da professora confirmam o que observamos anteriormente. As
crianças mudaram, amadureceram, deixaram claro que ouvem melhor, embora,
nada a respeito disso se possa dizer quanto ao aparelho biológico. Além disso, foi
74
possível perceber o quanto essa proposta das Oficinas do Jogo influenciaram a
visão e, conseqüentemente, a ação da professora de sala. A atividade lúdica, as
ações fora de sala, entre outros recursos, tornaram-se, para ela, procedimentos
possíveis.
75
9 CONSIDERAÇÕES FINAIS
Por muito tempo a escola ficou centrada na convicção de que seu papel
consistia apenas em transmitir conhecimentos, e o aluno, sentado nos bancos
escolares, representava o fiel depositário desse canal de comunicação.
Muitos de nós, educadores, fomos vítimas dessa política estática do
saber, essa espécie de educação bancária, como tão bem a descreveu Paulo Freire
(1999). Com pesar constatamos que esse estigma não foi eliminado ou substituído
por uma prática pedagógica mais interativa e dinâmica, cujos danos encontram-se
espalhados por muitas escolas,. Nelas as crianças ainda são conduzidas por uma
pedagogia em que as imagens da escola e do professor representam autoridades
absolutas e nada pode ser contestado. Essa postura levou e leva as pessoas a
economizarem reflexões, argumentos, embates, questionamentos e posturas
ideológicas.
Acreditamos em uma escola onde exista um ambiente de interação entre
o aluno e a cena educacional, com tudo que ela contém. Ensinar e aprender requer
a sapiência de escutar o outro.
Como participante de um compromissado projeto denominado Oficinas do
Jogo, desenvolvi, especificamente neste trabalho, uma pedagogia para educar os
sentidos, isto é, um complexo de conteúdos que, de maneira geral, não integram os
currículos escolares e, quando aparecem, constituem casos eventuais.
Ao longo desta pesquisa, notamos que existe uma vasta gama de
possibilidades de exploração de uma educação dos sentidos. A literatura sobre o
assunto não é extensa, mas, antes de isso ser um empecilho, motivou-nos a
construir algo que represente, para os educadores, novas possibilidades
pedagógicas. Tivemos que construir, plano a plano, aula a aula, um conjunto
pedagógico específico, isto é, novas proposições educacionais. Educação não se
faz só em sala de aula, apenas com os conteúdos tradicionais. Vivemos numa
sociedade repleta de problemas, a questão ecológica se coloca mais forte que
nunca, há o problema da convivência, dos sentimentos pessoais, há os problemas
coletivos, o que justifica, mais que nunca, ao nosso ver, outras experiências
pedagógicas diferentes das tradicionais.
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Nossa cena educacional era lúdica. Nossos alunos eram crianças, e
bastante novas, o que justifica envolvê-las num ambiente lúdico. A escola tem que
ser sedutora, tem que atrair a atenção das crianças. Durante as aulas todas que
ministramos, não registramos casos sérios de desatenção ou de hiperatividade.
Parece-nos que, no ambiente lúdico, as crianças não padecem das doenças tão
típicas da escola tradicional de hoje, isto é, os famosos transtornos de desatenção e
hiperatividade. Nenhuma de nossas aulas deixou de produzir fantasias. O que as
crianças faziam era sempre um tipo de faz de conta. Ficavam extremamente atentas
ao que ocorria, ao que faziam e principalmente ao que ouviam, pois este era o
objetivo maior, fazê-las aprender a ouvir. Tornaram-se “caçadores de sons”. E as
aulas não eram só lúdicas, eram também bonitas. Parece que a beleza é própria do
ambiente lúdico. Bem ouvidos, a beleza dos sons aparece.
Fazer da escola um espaço lúdico é uma tarefa criativa e trabalhosa, que
somente acontece quando se almeja uma escola alegre e formadora. Precisamos
ousar nas instituições escolares, ser audaciosos e brincar (ARANTES ET AL 2006).
Por se tratar de uma escola com um perfil de integrar as famílias,
apresentamos o projeto para os pais nas reuniões, reafirmando o compromisso da
escola com a pesquisa, os estudos e a construção de um novo currículo,
contemplando outras atividades que não somente aquelas definidas pelos livros
didáticos, grades curriculares, etc.
Ao final do projeto recebemos uma carta espontânea de um pai de aluno, que diz o
seguinte:
Queria aproveitar e compartilhar com você uma situação bastante interessante e acredito, compensadora para você! Meu filho estava sentado na praça de alimentação do Shopping com dois carrinhos na mão e me surpreendeu com a seguinte colocação: - mãe, olha os sons que a Lélia faz a gente escutar! E empurrou um carrinho de cada vez sobre a mesa me chamando a atenção para os diferentes sons que fazia, detalhando os mesmos e completando: - O bom observador de sons não precisa de olhos e sim de ouvidos! Me pegou de surpresa, mas foi tão espontâneo da parte dele que não podia deixar de dividir com você este momento especial. (APÊNDICE E).
Observamos no decorrer desta pesquisa que, aos poucos, a integração da
pesquisadora com os alunos se efetivava, porque as atividades tinham significado
para os alunos, pois era prioritário ouvi-los, acatando suas opiniões e planejando
novas estratégias.
77
O que propomos neste projeto denominado Oficinas do Jogo, de onde emergiu
esta pesquisa, não é uma escola sem conflitos. Pelo conflito, eles são benvindos, desde que
administráveis. Durante o transcorrer das aulas constatamos inúmeros embates, mas foi
administrando-os que registramos também o crescimento, da pesquisadora e dos alunos.
Foi graças aos conflitos que as aulas puderam ser reestruturadas. A Pesquisa-Ação, forma
de investigação escolhida por nós, permitiu-nos a recriação das atividades e as reflexões
contínuas.
O envolvimento da pesquisadora com os alunos pesquisados alcançou
patamares inusitados e surpreendentes. Pesquisar, neste caso, significou estruturar
aulas, dialogar com os alunos, voltar atrás, criar. A Pesquisa-Ação é uma pesquisa
pedagógica. Rompendo com o tradicional, não havia em nossas aulas um saber
antigo, previamente confirmado, para ser transmitido aos alunos. Valorizamos os
saberes antigos, mas eles foram, a cada aula, reconstruídos, tornados novos, para a
pesquisadora e para os alunos, que demonstravam orgulho em aprender e
apresentavam seus conhecimentos com satisfação. Não queremos parecer
presunçosos ao afirmar que os participantes da pesquisa aprenderam, no entanto,
isso é um fato, está registrado. Aprenderam, principalmente, a ouvir, e a ouvir para
dentro, objetivo maior deste estudo. Para nós, o conhecimento é uma construção,
fruto de uma interação entre aquilo que uma pessoa possui de acervo de
conhecimentos e os elementos da situação nova que está vivendo, e isso se
confirmou nos relatos dos alunos, quando afirmaram prestar atenção em sons antes
não observados ao descrevê-los, indicaram a ligação deles a tantas lembranças de
suas vidas.
A parceria com a professora colaboradora foi decisiva para alcançar os
objetivos deste trabalho, o que confirma as teses da Pesquisa-Ação, isto é, que as
pessoas da cena educacional precisam integrar a pesquisa. Tivemos uma parceria
plena, pois a professora auxiliou na coleta de dados e principalmente nos registros.
Como as aulas de educação dos sentidos tinham um tempo limitado, após
aplicarmos as atividades a professora dava continuidade ao trabalho em sala,
sempre que possível, fazendo os questionamentos aos alunos sobre a atenção do
ouvir.
Nossos questionamentos durante todo o processo tinham por objetivo fazer com
que os alunos se indagassem, fenômeno que faz com que as experiências externas sejam
internalizadas, parte do processo de tomada de consciência, neste caso, das experiências de
ouvir.
As atividades oferecidas aos alunos objetivavam despertar uma
consciência sobre a importância de se ouvir com atenção, algo que foi muito além da
78
possibilidade auditiva de cada um. Escutar, no sentido aqui discutido, significou a
disponibilidade permanente por parte do sujeito que escuta para a abertura aos sons
do ambiente educacional, à fala do outro, ao gesto do outro, à diferença do outro
(FREIRE, 1999, p. 135).
Encerramos registrando a dificuldade em lidar com o tempo estipulado
para a pesquisa. O tema é muito fértil, demandaria um tempo de estudos muito
maior. Somos limitados pela burocracia dos cursos de pós-graduação, para os
quais, não interessa o tema e a extensão dos trabalhos. Estudos longitudinais
requerem tempo maior de pesquisa, por essa razão, nosso trabalho de aulas e
pesquisas a respeito dos sentidos terão continuidade após o encerramento desta
dissertação. Não pudemos estudar os outros sentidos: visão, paladar, tato e olfato,
porém já providenciamos para continuação dos estudos a construção na escola, de
uma cozinha experimental, ou seja, nossos alunos não aprenderão exclusivamente
em sala de aula, mas também em uma cozinha, no pátio, nas praias, nas árvores,
etc. O projeto empolgou de tal maneira outros profissionais da escola que diversos
deles estarão envolvidos no prosseguimento do projeto.
79
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85
APÊNDICE B – Projeto Piloto - Planos de aula.
� Aula 01 - Tema: Sons da rua
Através de uma conversa prévia sobre o projeto Educação dos Sentidos
com a professora, no Infantil III, obtive dela uma resposta positiva que se mostrou
interessada pelas atividades e pela participação no projeto.
Chegando à sala de aula fui bem recepcionada pelos alunos, no entanto,
quando me sentei no tapete para uma conversa preliminar, eles estranharam e seus
olhos pareciam indagar: o que você está fazendo aqui, ou melhor, o que faz no
nosso tapete?
Conversei com o grupo, composto de 20 alunos, e expliquei que em
alguns momentos eu também trabalharia com eles. Percebendo a empolgação das
crianças propus o primeiro desafio: fazer um passeio fora da escola, ir até uma
praça. Combinamos algumas regras e saímos com o compromisso de ouvir sons.
Ainda em frente à escola, perguntei o que ouviam e responderam ouvir crianças
brincando, Mais adiante afirmaram ouvir um serrote e, de fato, em frente havia um
homem serrando um telhado.
Chegando à praça, solicitei que fechassem os olhos por alguns segundos
e então disseram ouvir passarinhos, porém, no mesmo instante, o som foi
interrompido pelo barulho de uma furadeira. Saímos da praça e continuamos nossa
caminhada pela rua, quando surgiu o comentário de que éramos os “caçadores de
sons”. Um aluno acrescentou que nós éramos caçadores de sons e cheiros, porque
aqui tem cheiro ruim (estávamos passando por um terreno baldio). Continuando o
percurso os alunos ouviram vários latidos de cachorros, por isso, solicitei que
identificassem quantos latidos de cachorros diferentes havia. Alguns mencionaram
três latidos, outros mencionaram que eram dois.
Os alunos durante o percurso mostraram-se bastante ansiosos, pois
estavam saindo dos muros escolares. Em vários momentos eu interrompia e
instigava-os a ficarem atentos aos sons. Perguntava o que estavam escutando.
Retornamos para a escola e perguntei quais os sons escutados e de qual mais
gostaram?
86
O som do passarinho, o mais apreciado pelos alunos, foi o mais difícil de
ser escutado. Percebi que eles se surpreenderam ao ouvi-lo.
Após a conversa solicitei um desenho sobre o tema proposto.
Eu e a professora da sala conversamos com todos os alunos sobre seus
desenhos que registraram o que haviam escutado.
Os relatos foram surpreendentes e muitos foram os desenhos: bichinho no
chão, abelhas, cortador de grama, corrente, dinamite, vento, borboleta, cachorros,
pessoas falando, ônibus e avião. Sobre o som do passarinho uma das meninas
desenhou um ninho de pássaros e o aluno que desenhou um navio exclamou:
- Este navio somente eu escutei!
Encerrando a discussão percebeu-se que os alunos ficam ansiosos com a
saída da sala de aula, pois eles permanecem o maior tempo dentro das salas de
aulas, sentados em carteiras que controlam seus movimentos corporais. A sala é
organizada em fileira e os corredores são estreitos. Quando deixam o espaço
escolar, há algazarra e descontração.
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Fonte: Dados da pesquisa (2006).
� Aula 02 - Tema: Caçadores de sons
Quando entrei na sala, escutei comentários do tipo: Vamos passear
novamente ouvindo sons?
Sentei no tapete da sala e conversamos sobre o que havíamos feito na
aula anterior, todos lembravam com detalhes dos sons ouvidos. Perguntei se eles
gostariam de continuar ouvindo sons. Após ter a certeza da disponibilidade do
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grupo, propus um novo desafio: ser caçadores de sons pela escola, em todos os
ambientes, inclusive no banheiro, na sala da coordenação, na cozinha, enfim,
visitaríamos todos os espaços.
Organizamos o grupo. Eu e a professora Andréia saímos em busca de
sons que chamassem atenção e, em vários momentos, alertava-os da importância
de somente ouvir. Visitando lugares, parávamos e discutíamos o que estávamos
escutando.
Quando retornamos para a sala de aula dividimos o grupo em quatro. Pedi
que conversassem sobre os sons que haviam escutado. Após alguns minutos,
solicitei o relato. Instiguei-os, a eleger o som que mais chamara a atenção.
Relataram:
Grupo 1 – batida de espelho
Grupo 2 – árvore
Grupo 3 – passarinho e faca cortando banana
Grupo 4 – explosão, passarinho e crianças falando.
O grupo quatro teve dificuldade de chegar a um único som, não havia
acordo entre eles.
Os demais grupos tiveram facilidade nessa organização.
Como discutiram os sons em grupo, solicitei que desenhassem os sons
percebidos.
Através dos desenhos relataram terem escutado:
- Ônibus, oceano, moto, criança, carro, árvore, borboleta, boneca, flor,
coração batendo, explosão, pincel, faca cortando, choro de bebê, pum, batida de pé,
vento, foguete, batida no espelho, dinamite, nuvem.
Após encerrar os desenhos, conversei sobre o que haviam achado da aula
e a maioria respondeu que gostou. Um aluno manifestou que não gostou de
desenhar em grupo e que preferia que lhe dessem uma folha individual.
� Aula 03 - Tema: Ruídos do Corpo – Sons do Corpo
Iniciamos a aula trabalhando a sensibilidade corporal com os alunos
através do toque no seu próprio corpo, depois tocando o corpo do colega.
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Findo o toque, promovi um novo desafio: descobrir os sons produzidos
pelo nosso corpo.
Cada aluno teve que produzir um som, utilizando o seu corpo.
Surgiram palmas, estalos, batidas no peito, batidas no rosto, meia palma,
batidas com os pés, batidas nas coxas, assovios, estalos com a língua, entre outros.
Depois dessa descoberta, cada aluno mostrou o som produzido. Com
tantos sons mostrados resolvemos fazer uma banda, sendo a professora a
maestrina. Quando ela levantava os braços todos produziam sons e, assim, surgiu a
nossa banda. Após vários ritmos, solicitamos que dividissem o grande grupo em
quatro grupos menores e cada pequeno grupo era responsável por fazer a sua
banda, criando ritmos. Terminando a combinação, cada grupo fez sua apresentação.
Encerrei a aula agradecendo a participação de todos e solicitando um
relato em forma de desenho.
91
APÊNDICE C - Seqüência das aulas.
� Tema: Banda com sons do corpo
Fomos para a quadra e formamos um círculo. Conversamos sobre as
aulas anteriores. Como foi? “Caçamos ouvidos?” Será?
Nicoli – brincamos com as caixas.
Mateus A..- caçamos sons.
Amanda – caçamos o som do cachorro.
Nicoli – o som das árvores.
Beatriz – o som dos rios.
Eduardo M. – o som do vento.
Vinícios – o som da chuva.
Lucas – o som da água .
Willian – o som do monitor do computador
parece barulho de serrote
Lélia disse que eram duendes que cuidavam da nossa escola durante a
noite.
Mateus A. – “Duendes não existem!”
Lélia sugeriu que formássemos uma banda e o grupo ficou muito animado.
Vamos formar uma banda com os sons do nosso corpo.
Então, iniciamos correndo livremente pela quadra até ouvir as instruções
da Lélia: “Tocar a barriga do amigo!” “Tocar na cabeça do amigo!” “Tocar no pé!”
Beatriz não quis correr para tocar em um amigo. Perguntei o porquê e ela
explicou que não estava com vontade de tocar nos amigos; sorriu demonstrando
“vergonha”.
O grupo correu muito, demonstrando alegria.
Ao escutar um som diferente lá fora
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Depois de fazer todos esses movimentos, voltamos para o círculo e
formamos duplas para continuar explorando nosso corpo. “Tocar os ombros”, “Tocar
as costas”, “Tocar na barriga”, “Tocar na orelha”.
Danilo e Gustavo achavam muito engraçado e caíram no chão abraçados.
Eduardo M., Mateus A., Willian, Vitor e Tiago formaram um grupo e foram
tocando uns nos outros.
Lucas quis dar a mão para o amigo Mateus G. e ele não aceitou. Lélia
conversou com o grupo sobre amizade, conhecer o corpo... sem escolher o amigo,
todos os amigos vão participar.
Lélia veio buscar a Beatriz, que não participou da roda e os amigos foram
falando novamente as partes do corpo que foram tocadas e ela foi tocando no corpo
da Lélia.
Danilo e Gustavo caíram por cima da Nicoli.
Lélia comentou sobre a importância do corpo, que somos humanos e que
devemos cuidar bem dele.
Nicoli – a gente tem esqueleto.
Eduardo C. – quando eu cresço, dói minha perna.
Agora, vamos inventar sons:
Gustavo – bateu com a mão na boca, (som do índio).
Willian – bateu com os pés.
Vitor – palmas.
Mateus A.- barulho com a língua.
Tiago – tossiu.
Eduardo M. - bateu com os joelhos.
Mateus G.- pensou bastante, disse que não sabia.
Eduardo C. – estalou os dedos.
Jade – bateu os pés, som já realizado, então fez um barulho diferente com
a boca.
Isabella – pernas batendo no chão (esticadas).
Vitória – pediu para pensar.
Sarah – batendo os pés (um com o outro).
Letícia – não sabe.
Larissa – batendo com as mãos abertas nas bochechas.
Beatriz – não sabe.
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Lucas – fez dois gestos que já haviam sido produzidos, então disse que
não sabia.
Vinícios – disse que não queria.
Amanda – bateu com os pés, já havia acontecido, ficou pensando.
Polyana – bateu com as mãos abertas no chão.
Nicoli – ficou pensativa. Depois bateu com os joelhos.
Renata – som diferente com a boca ( mais ou menos um beijo).
Danilo – gritou (uhhhh...).
Lélia – bateu na barriga (3 vezes) e estalou os dedos (3 vezes).
Vamos repetir? Vitor e Tiago logo levantaram a camiseta.
Lélia apresentou a banda com um “microfone” e cada um fazia o seu som.
Separamos um grupo: Gustavo, Willian, Vitor, Mateus A., Tiago, Eduardo M., Mateus
G., Eduardo C., Eduardo C. dizia: “Senhoras e Senhores...”
Tiago logo começou a dizer: “A, a, a, auuuu...” e os outros integrantes
começaram a fazer os seus sons.
2o grupo: Jade, Isabella, Vitória, Letícia, Sara, Larissa, Beatriz, Nicoli,
Renata, Polyana, Amanda, Lucas, Vinícios e Danilo. Só Beatriz e Letícia ficaram
sentadas e não fizeram os seus sons.
Lélia sugeriu voltar para roda e levou uma figura do ouvido e um boneco
do corpo humano para mostrar que o som entra e conduz até o nosso cérebro.
Todo o grupo se aproximou para ver melhor o corpo humano. Danilo logo
pegou a parte que abria a cabeça do boneco.
Nicoli - “Onde está o coração? Quero ver!”
Eduardo C. – “Quero ver, quero ver!”
Agora todo mundo respirando. O ar foi para onde? “Pulmão” e o grupo viu
no boneco o lugar do pulmão.
Danilo – “Deixa eu ver!”
Ouviram explicações sobre os cuidados com o corpo e sobre uma
alimentação saudável com frutas e verduras.
Polyana e Vitória saíram do círculo para brincar de roda-cutia. Isabella e
Jade foram juntar-se as amigas.
O restante do grupo escutou atentamente as explicações.
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Formamos grupos pequenos com as letras iniciais do nosso nome. O 1o
grupo, o das crianças que começavam com as letras A,B,C... Como houve dúvida,
trocamos para números.
No papel pardo, cada grupo irá desenhar o barulho do nosso corpo, a
nossa banda.
Tiago – “eu vou desenhar, eu escutando!”
Mateus A. – “eu vou desenhar o cérebro escutando.”
Danilo – “eu desenhei eu com as mãos na boca, meu barulho foi
“AUUUU...”
Renata – “eu desenhei a minha boca, meu barulho foi a boca.”
Larissa – “eu fiz a bochecha.”
Eduardo C. – desenhou a boca, bateu com os dentes.
Beatriz – fez o desenho do coração. Ela respondeu batendo com a mão no
peito.
Vinícios – “como que tu fez barulho com o coração se ele está dentro do
nosso corpo?” (perguntou para Beatriz).
Finalizamos nossa aula brincando de estátua.
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Fonte: Dados da pesquisa (2006).
� Tema: Descobrindo objetos que produzam som
O grupo estava animado, aguardando a chegada da Lélia. Fomos para a
quadra e relembramos nossa aula anterior:
Lucas - nós caçamos um “monte” de sons.
Thiago - escutamos cachorro.
Lélia - Quem lembrou de mais algum som no final de semana?
Thiago – eu escutei o som da piscina.
Mateus A. – eu escutei da água (praia) (chuá, chuá, ...).
Nicoli – eu percebi o som do parque aquático.
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Danilo – Tia Lélia, eu não gosto de caçar som, só do jogo das caixas.
Agora, vocês podem usar tudo o que tem na quadra, qualquer objeto para
produzir som...
O grupo correu e logo encontrou objetos para produzir som.
Eduardo P. batia com uma cesta de basquete na parede.
Nicoli e Amanda pegaram um baldinho e um pauzinho (tambor).
Jade, Letícia, Vitória, Sarah e Isabella, pegaram os bastões e batiam um
no outro.
Foi um barulho enorme. Na verdade formamos uma grande banda.
Agora, somente sons baixos, barulhos bem suaves, bem baixinhos.
Em seguida, guardamos todos os objetos: tampinhas, bastões, cones,
caixas, bolas, garrafas, etc... e sentamos em círculo na quadra.
Com um balde cheio de palitos coloridos resolvemos explorar os sons
daquele material.
Nicoli – “Eu quero cores diferentes!”
O pote foi circulando entre eles e após a escolha ficaram brincando com o
amigo do lado batendo uns nos outros.
A Renata descobriu que faríamos sons com os palitos.
Nicoli – “Leeegaalll...”
Batiam uns nos outros e batiam no chão como bateria.
- Vamos bater na barriga?
Beatriz não queria bater com os palitos na barriga.
Fizemos diversos barulhos com os palitos e descobrimos sons novos com
o nosso corpo ao bater os palitos no braço, cabeça, cabelo e perceber os sons.
Nicoli – “Ah, no cabelo não faz som!”
Renata – Faz sim eu estou ouvindo!
Depois a turma se dividiu em quatro grupos – palitos vermelhos, palitos
verdes, palitos azuis e palitos amarelos. Cada grupo recebeu uma caixa dos jogos
de construção para produzir sons com os palitos e uma caixa.
- O grupo azul esfregava os palitos na caixa.
- O grupo amarelo batia com os palitos rapidamente.
- Os grupos vermelho e verde também batiam na caixa.
Na seqüência buscamos sons dos palitos na parede.
97
Parte do grupo os arrastavam, outros batiam lentamente e alguns tão
rápido até quebrarem os palitos.
Retornamos para nossa roda no centro da quadra e trabalhamos com os
ritmos. Lélia sugeriu bater duas vezes com os palitos, duas vezes no chão e três
vezes com os palitos. A maioria do grupo acompanhou o ritmo falando : 1,2, 1,2,
1,2,3.
- Lucas ficou brincando com as sandálias.
- Gustavo ficou mordendo os palitos.
- Eduardo C. ficava passando os palitos no cabelo da Sarah.
Willian e Letícia foram escolhidos para serem professores auxiliares.
Em roda, começamos a ver figuras em livros e imitamos os sons que
estávamos vendo nas imagens. Criança gritando, formigas, crianças andando de
bicicleta. Não podíamos falar, só reproduzir os sons. Vimos tubarões no livro e
imitamos. Em seguida, o leão (ARRR.. bem alto).
O grupo estava bem agitado.
Vimos gatos, muitas pessoas, pessoas jogando moedas.
Normalmente a Nicoli iniciava o som e todos copiavam.
Quando ela não mais o fez, eles reconheceram outros sons.
Finalizamos a nossa aula brincando de cobra cega. Fechamos os olhos do
Tiago e através do “bom dia” da Letícia, Tiago descobriu quem era. Letícia descobriu
que era o Mateus G. Mateus G. teve dificuldades para identificar a Larissa e a
Isabella, mas descobriu o Lucas.
O grupo aplaudiu a brincadeira.
� Tema: Sensibilização da importância do ouvir
Iniciamos nossa aula relembrando a aula anterior. O grupo estava
envolvido e interessado na moça que veio conhecer e conversar conosco.
Foi então que tivemos uma hora do conto: “Audição” de Mandy Suhr e
Mike Gordon. Percebemos a importância do “ouvir”. Na história conhecemos lugares
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tranqüilos e agitados e, em uma escola, havia uma menina surda que era a melhor
corredora da escola.
Foi aí que a nossa amiga deficiente auditiva se apresentou. A Juliana
nasceu ouvinte, mas com nove meses teve rubéola e ficou surda. Além da doença
ela também caiu e bateu com a cabeça.
As crianças começaram a fazer perguntas:
Beatriz – Como é a letra O?
Danilo – Como você ensina as outras crianças?
Lucas – Onde você trabalha?
Durante a nossa conversa a Beatriz e a Jade tentavam se comunicar
através dos sinais.
Danilo – Como você sabe se comunicar com ela? Ele perguntou para
Gladis que acompanhava Juliana.
Ela respondeu que trabalha há muito tempo com os surdos e aprendeu a
linguagem de sinais.
Juliana nos mostrou as letras do alfabeto manual e ensinou alguns nomes:
Danilo, Nicoli, Beatriz, Renata.
Danilo e Nicoli interagiam muito com a Juliana.
Nicoli perguntou se ela sente dor e quando ela vai voltar a ouvir?
Quando Juliana explicou que não vai ouvir mais, Nicoli disse: “Nem com
um médico?”
Sentimos que o grupo ficou chocado ao ouvir isto de Juliana, mas esse
impacto foi importante para todos. Beatriz perguntou quantos anos o filho dela tem e
como ele aprendeu a falar.
Ela disse que ele é ouvinte, chama-se Fabrício e tem 5 anos, que ele
aprendeu a linguagem dos sinais com a família, o pai também é surdo.
Agradecemos cantando o hino de Florianópolis para ela. Aplaudimos na
linguagem dos sinais e demos beijos nela agradecendo.
Todos agradeceram este momento importante.
Recebemos o alfabeto manual para colar no caderno.
� Tema: Jogo de memória com sons
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Hoje a nossa aula foi junto com o professor Toni da Educação Física.
Iniciamos em uma roda e relatamos para o professor Toni tudo o que escutamos ao
“caçar os sons”.
Em seguida, a Lélia distribuiu alguns potinhos com objetos dentro para
duas equipes.
Os grupos correram até os potinhos e começaram a sacudir cada um
deles. A proposta era encontrar o par, o som igual.
Renata sacudia no ouvido da outra amiga e dizia: “Escuta, é igual!”
Nicoli muito satisfeita falava bem alto: “Eu achei, é igual!”
Eduardo P. dizia e pulava: “Que legal, que legal!”
Mateus A. falava para Tiago: “Tu conseguiu escutar? É igual né?”
A alegria foi geral ao escutar os mesmos sons em potinhos diferentes.
Voltamos para o centro da roda e começamos a conferir os sons com todo
o grupo. Foi muito interessante a observação do grupo. Encontramos todos os
pares.
Depois, colocamos todos os potes no centro e cada dupla deveria
encontrar dois pares.
Letícia e Lucas iniciaram e escolheram dois potes cada um e acertaram os
sons. Foi mais ou menos como um jogo de memória.
Polyana e Tiago foram até o centro e escutaram atentamente cada som,
também encontraram os pares.
Nicoli e Gustavo foram os próximos, Nicoli encontrou rapidamente e
demonstrou muita alegria. Gustavo ficou pensativo procurando e logo encontrou o
par também.
Danilo e Vitória foram “caçar os sons” e Danilo ficou muito concentrado
para encontrar. E falava: “Eu achei, olha só!” E batia com os potinhos para o
professor Toni escutar.
Foi a vez de Matheus G. e Larissa escolherem dois potes para tentar
descobrir os sons. Os dois ficaram um tempo maior escutando e escolhendo.
Matheus G. conseguiu acertar e Larissa apresentou um pouco mais de dificuldades,
mas depois acertou. Lélia acrescentou mais potes quando o grupo começou a se
dispersar.
100
Renata, Mateus A. e Amanda foram escolher. Renata logo descobriu.
Amanda e Matheus A. demonstraram interesse e concentração para definir qual
seria o par.
Lélia gravou alguns momentos da atividade e em seguida colocou para o
grupo escutar. Fizeram uma roda bem apertadinha ao redor da Lélia para conseguir
escutar.
Chamamos a Jade e vendamos os seus olhos para que ela procurasse o
gravador ligado. O grupo fez silêncio total para colaborar com a amiga. Ela foi
caminhando até o gravador, de onde vinha o som e conseguiu encontrá-lo.
Em seguida, foi a vez do Eduardo Começamos a escutar um CD com os
sons da natureza e ele começou a caminhar pela quadra a procura do som. Iniciou
indo para o lado contrário e bateu na parede. Depois começou a dirigir-se para perto
do som.
Finalizamos a aula perguntando para o grupo o que mais gostaram na
aula.
- Renata – de vendar os olhos.
-Amanda – dos chocalhos.
Fechamos os ouvidos e em seguida escutamos os pássaros novamente.
- O que lembramos?
Tiago – ao ouvir os pássaros, lembrei da água que eles tomam.
Beatriz – lembrei do ar.
Eduardo P. – eu lembrei que eles comem.
Lucas – eu lembro do vento da árvore.
� Caçando sons
É azedo, eu adoro, eu odeio. Cheiro é gostoso, é doce, amargo, delicioso.
Vitor- a gente está em uma ilha?
Mateus A. – Nossa! Quantas árvores?
Visitamos uma casa aqui na rua da escola com um pé enorme de
carambola. Foi maravilhoso!
101
Saímos da escola e escutamos muitos sons, “caçamos sons”
Mateus A. – cachorro.
Thiago – escutamos quatro em uma casa e um na outra,
Mateus A. – eu escuto um cachorro e lembro de um leão, o rugido é
parecido. O grupo concordou.
Danilo – eu não concordo porque o leão faz “UARRHH...” e o cachorro faz
“AU AU AU...” Nicoli concordou com Danilo.
Eduardo P. – eu escutei um pauzinho sendo quebrado.
Lucas – eu escutei uma pipa.
Chegando lá o que vimos?
Tiago – carambolas verdes e amarelas e a gente comeu um monte.
Lucas – coquinhos. Lembrei de uma floresta perigosa.
Eduardo P. – bananas.
Mateus A. – eu vi pitanga.
Eduardo P. – a gente viu uma floresta.
Beatriz – eu vi frutas e lembrei do sítio da minha vó.
Thiago – eu lembrei do sítio do Maicon.
Nicoli – eu gostei de comer carambola doce.
O grupo gostou muito do passeio.
Ganhamos um pedacinho de alecrim para cheirar e levar para casa.
Beatriz – o alecrim tem cheiro de pizza, uma coisa que coloca na pizza.
Willian – tem cheiro de mato.
Nicoli – tem cheiro de flor, algumas flores tem esse cheiro.
Lucas – tem cheiro de mortadela, não sei porque.
Nicoli – que cheiro gostoso na mão!
Desafio: Levaremos um pedacinho de alecrim para os pais cheirarem e
relatarem o que eles lembram ao cheirar.
103
O encontro iniciou por volta das 10h20, com a apresentação da Lélia e da
proposta de brincarem como “Caçadores de som”.
Combinaram que iriam caçar os sons na rua “Vidal Gregório Pereira” (rua
da escola), mas que antes precisariam “limpar” os ouvidos (esta atividade consiste
em fazer silêncio para ouvir os sons, os ruídos...)
Saíram da escola como caçadores de sons:
1ª parada: “Eu estou ouvindo o barulho da bola”.
2ª parada: “Escutar os sons específicos”.
3ª parada: “Tem barulho de passarinho”.
4ª parada: Limpando os ouvidos 1,2,3... “Aí tem cachorro”
5ª parada: “Barulho de cachorro”
6ª parada: portão de uma casa “Estou ouvindo 1,2,3 passarinhos”. “Estou
ouvindo só um passarinho” “Aí tem cachorro”.
7ª parada: portão da casa do Lucas. “Só escutei cachorro”
Voltamos para o colégio e na sala a Lélia relembrou que eles eram
“Caçadores de som” e que receberiam duas madeirinhas para produzirem sons.
1° Desafio: Produzir sons com as madeiras e sem bater na mesa (bateram
as madeiras no ar e em diferentes ritmos) 2 batidas e mais 3...
2° Desafio: Produzir sons com as madeiras que sejam iguais ao do trajeto.
3° Desafio: Eduardo: O que você ouviu no seu trajeto? Ouvi som de cavalo
(reproduziu com as madeiras).
Polyana: Ouvi som do cachorro, de passarinho, as reproduziu com
diferentes ritmos.
Matheus Alves: som de passarinho: pii...
Nicoli: som de passarinho.
4° Desafio: A Lélia chamou Matheus, Vinícios, Polyana, Letícia, Jade e
Eduardo C.
Criar som com o corpo, imitando os sons de todo o trajeto:
Bateram palmas, os pés no chão, com a voz, com a voz e palmas.
5° Desafio: Socializar os sons com o grande grupo.
6° Desafio: A Lélia indagou o colega Matheus: “O que você lembrou
quando ouviu o passarinho?” Não soube responder.
� Aula: Interdisciplinaridade com o professor de música
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Iniciamos a aula com o professor Bruno de música e fomos ao auditório
relembrando o que somos. E o grupo gritou: “Caçadores de sons”. E a Lélia fez
expressão de espanto. Quando Bruno perguntou porque a Lélia estava espantada, a
Renata logo respondeu: “É porque a gente caça sons com ela também”.
O professor Bruno disse que a gente iria escutar muitos sons na sala e
identificar de onde eles vêm. No canto da sala o professor bateu palma de longe,
algumas crianças repetiram a palma.
Em seguida o Bruno colocou uma música orquestral em outra sala, perto
do auditório. As crianças começaram a ouvir e queriam dançar. O som foi chegando
mais perto. Gustavo levantou e queria chegar bem perto do som para ouvir melhor.
Bruno – Porque nós escutamos melhor agora?
Beatriz – “A minha avó escuta e dança”.
Mateus A. – “Eu escuto música bem paradinho, porque se eu ficar me
mexendo, não escuto muito bem.”
Nicoli – “eu danço quando escuto música”
Larissa – “eu danço porque a música tem ritmo. Eu sou funkeira”.
Sarah – “ eu danço samba”.
Lélia – Quem escuta essas músicas em casa?Que tipo de música é essa?
Mateus A. – “é música clássica, é bem tranqüila”.
Letícia – “ é uma música bem calma”.
Polyana – “ é música de ballet”.
Lélia – Porque essa música lembra ballet. As meninas estavam dançando.
Mateus A. – “Os bailarinos escolhem música assim”.
Lélia sugeriu que reproduzíssemos o que escutamos com os sons do
corpo. Bruno colocou a música clássica e nos sons mais graves eles imitavam
batendo palmas.
O professor finalizou a aula colocando a música para que todos
dançassem. As meninas imitavam o ballet.
No final o grupo ficou mais disperso.
� Tema: Explorando os sons do jornal
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No primeiro momento conversamos sobre as aulas anteriores: o que
vimos, ouvimos, aprendemos?
Beatriz – a gente ouviu música com o tio Bruno.
Hoje nós vamos trabalhar com o jornal. Cada criança recebeu uma folha
de jornal e caminhamos pela quadra lendo. Em seguida, nosso desafio era deixar o
jornal equilibrando na cabeça. A animação foi geral, muitas gargalhadas. Também
carregamos nas costas, como se fosse um casco de tartaruga. Depois colocamos
entre as pernas e começamos a pular como o saci pererê.
Amanda chegou atrasada e a Nicoli foi correndo ao seu encontro e disse:
“Vem, vem, pega um jornal, hoje a aula da tia Lélia está o máximo!”
Carregamos o jornal em cima dos pés e em todos os movimentos a alegria
foi geral.
Sentamos em roda e começamos a ler as notícias dos jornais.
- Letícia – o celular custa R$ 49,00
- Tiago – a televisão está R$ 1,00
- Mateus A. – vai chover em quase todos os lugares.
- Jade – a cidade está cheia de carros.
- Lucas – eu não sei ler.
- Eduardo C. – os dinossauros atacam a cidade.
- Eduardo P. – os bichos estão comendo a cidade.
A Lélia estava falando com eles de uma forma diferente, cantava um
pouco no final de cada frase e o grupo começou a imitá-la percebendo que podemos
conversar de várias maneiras.
Começamos a mexer os jornais para escutar o som.
Nicoli – parece a chuva gostosa. É gostosa porque é gelada.
Em seguida, Lélia sugeriu que o grupo fizesse silêncio para ouvir o barulho
ao rasgar o jornal perto dos ouvidos.
Amanda – o barulho parece folha de árvore.
Depois começamos a cheirar o jornal:
Nicoli – parece churrasco
Eduardo P. – cheiro de papel queimado.
Mateus A. – tem cheiro de queimada.
Beatriz – tem cheiro de gás.
106
Fechamos os olhos e cheiramos novamente. Jogamos fora todos os
pedaços de jornal e em roda começamos a receber outra folha.
Eduardo P. – E agora, o que vamos fazer?
Começamos a dobrar esta folha várias vezes e surgiu uma idéia:
Letícia – vamos fazer um instrumento musical?
Tiago – eu ainda não acabei.
Mateus A. – colocou o jornal na boca e cantava.
Willian – eu fiz um pandeiro.
Nicoli – dobrou o jornal como um leque, abria e fechava fazendo o som
com a boca. Depois fez só com o jornal e conseguimos escutar somente o som dele.
Beatriz – eu fiz uma flauta.
Gustavo – eu fiz um tambor.
Eduardo P. – uma flauta “canta tudo”
Eduardo C. – eu fiz uma gaita.
Fizemos uma grande banda com os sons dos jornais, primeiro usando a
boca e depois somente os jornais, sem ajudar com o som.
O que vocês lembraram com os sons dos jornais?
Nicoli – eu lembrei da festa das mães.
Vinícios – eu lembrei da aula de música.
Eduardo P. – eu lembrei da minha mãe.
Finalizamos a aula juntando tudo o que restou na quadra.
108
� Tema: Criando sons
Iniciamos nossa aula relembrando nossa aula anterior:
Willian – nós brincamos com jornal.
Tiago - fizemos um instrumento musical.
Mateus A. – Nós lemos o jornal, colocamos no pé, na cabeça.
Vinícius – a gente correu sem deixar cair o jornal.
Lélia – hoje eu trouxe outra novidade para vocês!
Cada criança recebeu uma caixa com um elástico ao redor. No momento
que receberam já descobriram um som, puxando o elástico e soltando para bater na
caixa.
Em seguida, Lélia sugeriu que abrissem as caixas para verificar o que
tinha dentro. Na maioria delas, encontraram sacos plásticos e deixaram elas vazias.
Os elásticos saíram das caixas e foram para o braço de cada um deles.
Agora vamos ver que barulhos podemos fazer com essas caixas?
Tiago – a minha caixa é de óleo de gasolina.
Willian – a minha é de caixa de som.
Lélia - Precisamos inventar um som bem diferente, quem consegue?
Willian – batia uma vez na mão e uma vez no chão.
Larissa – batia no chão.
Nicoli – rolava a caixa no chão.
Thiago – só levantava um pouquinho do chão e batia de volta, sem tirar a
caixa do chão.
Sarah – só arrastava a caixa no chão. Parece um reco-reco!
Polyana – batia com a mão na caixa suavemente.
Danilo – levantou a caixa bem no alto e soltou. O grupo repetiu.
Será que tem diferença de som, dependendo do jeito que a caixa cai?
Todos responderam que sim. Lélia demonstrou diferentes sons, deixando
a caixa cair de diversas formas.
Agora vamos colocar o elástico de volta ao redor da caixa.
Vinícius – A aula está tão divertida!
Vamos descobrir sons?
109
Cada criança fazia um som diferente, mexendo no elástico, ou arrastando
na caixa com ritmos diferentes. Eles se esforçavam para não repetir o som do amigo
anterior.
Foi sugerido descobrir sons altos com os elásticos e em seguida sons bem
baixinhos, próximos dos ouvidos. O grupo colaborou com o que foi solicitado e
conseguiu se concentrar.
Mais um desafio para vocês. Vamos trabalhar com dois elásticos.
Coloquem os dois na caixa para produzir um som diferente. O grupo começou a
imitar um violão, os elásticos eram as cordas. Cantavam uma música junto com o
instrumento musical – “O BOM” do dia das mães.
Em seguida, a Lélia sugeriu o ritmo e eles repetiram, uma corda de cada
vez 1,2,1. Danilo e Lucas não acompanharam.
O grupo recebeu mais um elástico para colocar na caixa e produzir o som
utilizando os três elásticos. Conseguiram um som bem mais forte.
Eles largaram um pouco as caixas e receberam folhas para registrar o
tamanho dos sons e suas ondas. Colocaram a caixa no ouvido e perceberam o som
para desenhar.
O som provoca barulho? Ele fica certo tempo no ar, não fica?
Lélia trouxe para roda um copo com água para demonstrar as ondas que
permaneciam ao provocar movimentos circulares. O som é assim também, ele
continua.
As crianças permaneceram concentradas para explorar e desenhar o som.
Sarah permaneceu um tempo longo observando o som atentamente e
fazendo o desenho.
Ao terminar os desenhos, devolvemos os elásticos e fizemos uma fila para
receber um objeto “surpresa” dentro de cada caixa. Eram vários objetos, tubos de
tintas pequenos, pedaços de madeiras e tubinhos de filme para máquina fotográfica
vazios.
Agora, vocês precisam descobrir o que tem dentro da caixa, qual o som?
Em roda começaram a balançar as caixas perto dos ouvidos.
Polyana e Amanda disseram logo: “O nosso é igual!”
Vamos ver os pares? Tem som igual?
Agora só a Isabella e a Vitória vão balançar. É igual? O grupo respondeu
que não.
110
Depois foi a vez da Polyana, Amanda e Nicoli, é igual?
O Danilo percebeu que uma era diferente. O da Nicoli era um pedaço de
madeira e as outras duas tinham caixinhas vazias.
Todos perceberam sons iguais e diferentes.
Guardamos as caixas que recebemos e sentamos em roda no centro da
quadra.
Finalizamos a aula elogiando o grupo e combinando que iremos continuar
trabalhando com as caixas.
Palmas para todos!
Fonte: A autora (2006).
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Fonte: Dados da pesquisa (2006).
� Tema: Banda de música utilizando sons
Iniciamos a aula relembrando a aula anterior. O que precisamos para
escutar? Beatriz respondeu: “Barulho!” Será? Ou a gente precisa ficar em silêncio
para conseguir ouvir? O grupo concordou e aceitou colaborar.
Em seguida, começamos a fazer um aquecimento: corremos, caminhamos
devagar, com passos largos, etc.
112
No centro da quadra as caixas já estavam posicionadas no chão e foi
sugerido que cada criança fosse até o centro para escolher uma caixa.
Nicoli – “Tem um fósforo!”
Logo após, teriam que formar dois grupos para explorar os sons e assim
formar uma banda.
O primeiro grupo disse que a sua banda iria se chamar: “Banda do Brasil”
– (Beatriz, Nicoli, Larissa, Renata, Polyana, Letícia, Sarah, Gustavo)
O segundo grupo escolheu o nome: “Banda sem nome!” (Mateus A.,
Amanda, Vitória, Lucas, Eduardo P., Vitor, Jade)
Começamos a apresentação das bandas. Primeiro à Banda do Brasil!
Algumas crianças puxaram o elástico, outras batiam na caixa ou sacudiam. A
segunda banda “Sem nome” também fez a sua apresentação com as caixas.
Sentamos em roda, começamos a explorar o som que cada um produziu,
criou. Iniciaram a apresentação e na maioria das vezes o som não se repetia. O
grupo tentava criar um som diferente do amigo anterior, mais rápido, mais lento...
Agora vamos criar ritmos, melodias?
Colocamos o elástico na ponta da caixa com o palito e ao mexer no palito
inventamos um outro som. O grupo estava bem concentrado e empenhado na
produção dos sons.
Em roda, escutamos a história do “Caranguejo surfista”. Ele queria chegar
até o fundo do mar, mas não conseguia porque a maré subia e ele encontrava
muitos obstáculos, Titanic, tubarão,e para voltar ele encontrou uma prancha, subiu e
retornou para a areia. Então, ele se tornou o primeiro “Caranguejo surfista”.
Foi sugerido para o grupo representar a estória com as caixas. E assim,
dividimos os personagens. Alguns eram caranguejos, outros mar, piaba, plantas,
algas, ostras, tesouros, Titanic, tubarão. Escutamos a história mais uma vez e ao
falar nos personagens, cada um representava o som dele com a sua caixa. Foi um
momento divertido.
Depois da hora do conto, brincamos de “escravos de jó” com as caixas.
Durante a música o grupo passava a sua caixa e pegava a caixa do amigo do lado.
Nas duas primeiras, as caixas paravam no Lucas que não conseguia passar para o
amigo. Em seguida, o grupo foi aperfeiçoando, mas as caixas se acumulavam em
um determinado lugar.
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Voltamos para o centro da quadra, sem as caixas, a fim de representar a
história do caranguejo surfista com o nosso corpo. E assim finalizamos a nossa aula
de hoje.
Fonte: Dados da pesquisa (2006).
� Tema: caça ao tesouro das flautas
Iniciamos a nossa aula de hoje dentro da sala com as explicações da Lélia
sobre a “caça ao tesouro”. Descobrimos que na quadra teríamos que procurar, ou
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melhor, caçar as flautas que estavam escondidas com o nome de cada um. A partir
do momento que encontrássemos as nossas flautas, não poderíamos mais falar,
nossa comunicação aconteceria somente através deste instrumento. E quando um
amigo quiser conversar com o outro, terá que parar para ouvir.
Foi alegria geral! A animação na procura das flautas foi contagiante, todos
procuravam com pressa seu nome. Ao achar o nome do amigo queriam logo
entregar para ele. E assim começaram a se comunicar.
Letícia e Beatriz tocavam as flautas e faziam sinal de “legal”, significando:
entendido. Sentamos em roda para conversar um pouco.
Lélia: - O que vocês lembraram?
Beatriz: “Eu lembrei do canto dos pássaros!”
Letícia: “Eu lembrei da aula de música!”
Vinícius: “Eu lembrei da aula de informática!”
Nicoli: “Eu lembrei da hora de ir dormir!”
Em seguida recebemos mais um desafio. O grupo foi dividido em duas
equipes (“Brasil” e “Figueira”) e as flautas ficaram na linha final da quadra.
Formamos duas filas bem longe das flautas e cada um corria até a linha das flautas
para procurar o seu nome. Ao achar, chegava no centro da quadra e assoprava três
vezes a flauta, batia na mão do amigo para que o mesmo iniciasse o percurso. O
grupo que terminasse primeiro seria o vencedor.
Foi então que fizemos pela primeira vez. Foi muito legal! Percebemos que
o grupo estava muito animado e concentrado.
Ao terminar descobrimos que era só um aquecimento, que a próxima vez
seria pra valer.
Nosso desafio foi aumentando. Agora iríamos procurar em duplas, de
mãos dadas, sem soltar, e assim fazer o mesmo trajeto.
Algumas duplas foram do começo ao fim sem soltar as mãos. Outras
largaram as mãos para procurar mais rápido. Os dois grupos terminaram
praticamente juntos e receberam “parabéns!”
A concentração do grupo foi impressionante!
Sentados em roda recebemos uma folha e caneta hidrocor para registrar
os sons e as ondas da música, como imaginavam.
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As crianças procuraram cantos na quadra para fazer o registro. Cada um
tocava a flauta, escutava o som e desenhava. Todos tocavam atenciosos e depois
registravam, prestando atenção no som que reproduziam.
Observamos desenhos bem interessantes. Se o som era mais agudo, o
desenho era mais alto. Se o som era grave, o desenho era pequeno.
� PARECER – LÉLIA
O dia amanheceu radiante, as pessoas estavam felizes e esperançosas
com o primeiro jogo do Brasil na Copa do Mundo de Futebol de 2006. Esta alegria
transbordava nas pessoas. Os alunos, na sua maioria, chegaram animados e
vestiam camisetas do Brasil.
Quando as crianças receberam as flautas demonstraram satisfação,
principalmente para com aquelas que estavam personalizadas e durante as
brincadeiras percebi que queriam manuseá-las, tocá-las, enfim, fazer barulho.
� Tema: Caçando sons com um gravador
Depois de várias semanas sem se ver, foi o momento de matar a saudade.
Devido as férias e a festa dos pais, tudo ficou mais corrido e os nossos encontros
atrasaram um pouco. Agora, teremos dois momentos durante a semana.
Começamos a conversar em uma roda no centro da quadra e a resgatar,
relembrar alguns dos nossos momentos passados nas aulas anteriores.
Eduardo P – Foi a aula do jornal
Thiago – Com caixas?
Nicoli – A gente procurou coisas dentro das caixas
Após relembrar nossas aulas, limpamos nossos ouvidos fazendo um
grande silêncio. Foi nesse momento que começamos a escutar o barulho dos
pássaros na rua. No início não conseguimos ouvir porque estava passando um carro
de som propaganda. Aguardamos a sua passagem e começamos a ouvir os
pássaros novamente e até que ele ficou na nossa janela. Com um gravador
tentamos gravar o canto dos pássaros e depois de várias tentativas enfim
conseguimos. Concluímos que existe muita poluição sonora em nosso meio o que
dificulta escutarmos alguns sons mais específicos.
116
Finalizamos a aula limpando novamente nossos ouvidos e procurando
escutar o barulho da nossa respiração e do nosso coração.
� Tema: Sons da chuva
Caçando sons – O dia amanheceu chuvoso. Resolvi propor uma atividade
para escutarmos o barulho da chuva. Saímos andando pela escola, dividimos a
turma em dois pequenos grupos. Investigamos todas as possibilidades de sons que
a chuva proporciona.
- Os alunos ficaram observando o som provocado pela chuva ao cair no
toldo.
- Neste dia fiquei feliz com a concentração do Lucas. A todo instante
fechava os olhos e procurava escutar o som da chuva.
- Na sala de aula fazendo o registro a Amanda comentou:
- Sempre quando chego em casa limpo os ouvidos e escuto sons.
Perguntei: - Você sempre fez isso?
– Não somente depois destas aulas, agora eu presto atenção em sons que
não prestava antes,
Continuei: -Vocês acham que o projeto ajudou a escutar sons diferentes.
Respondeu: -Antes nós não escutávamos alguns sons.
Insisti: -Que sons que vocês não escutavam?
Amanda: - Som do passarinho, dos carros.
Não prestava atenção, agora presto.
Terminei a aula perguntado o que lembravam ao escutar o som da chuva.
Solicitei que registrassem.
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Fonte: Dados da pesquisa (2006).
� Tema: Sem a visão, descobrindo os sons
No momento de roda, começamos a explicar para o Marcelo nosso novo
amigo, tudo o que nós aprendemos até agora com os caçadores de sons.
Beatriz – a gente aprendeu a escutar.
Nicoli – a gente já sabia escutar, só que agora a gente escuta melhor.
O grupo estava um pouco disperso devido a presença do nosso novo
amigo. Todos queriam ficar a sua volta.
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Em seguida escolhemos o Eduardo para vendar os olhos e através do
som descobrir quem estava dando bom dia para ele, trocamos várias vezes de
colegas. Todos adivinharam. Ressaltamos que eles eram os verdadeiros caçadores
de sons.
Fizemos uma nova brincadeira: um círculo e no centro muitos objetos
sonoros, dividimos o grupo em quatro equipes. Cada equipe escolheu seus objetos e
fez a sua banda. Teve ensaio e apresentação.
Os alunos se esforçaram na seqüência e ritmo.
No final das apresentações fizemos uma grande banda.
Após encerrar as apresentações, guardamos os instrumentos.
Convidamos um colega para ir ao centro da roda. Vendamos seus olhos. Tocamos
um instrumento, o aluno de olhos vendados teve que adivinhar onde estava aquele
som.
Os alunos estavam muito concentrados nesta atividade.
� Tema: Caçando os sons da rua e reproduzindo com jogos de
construção
Chegando na sala tentei justificar aos alunos que não trabalharia com eles
naquela manhã devido a falta de alguns alunos e escutei a lamentação deles, pois
estavam ansiosos por aquele momento; então, retomei e falei que teríamos aula.
Todos vibraram.
Sugeri aos alunos um novo desafio: a turma em duas e cada grupo
exploraria um espaço, o grupo da professora Andréia seria responsável por escutar
os sons do prédio do infantil, o grupo da Lélia exploraria o fundamental. Andamos
pelo prédio escutando todos os sons. De tempo em tempo parávamos e
chamávamos a atenção dos alunos para que escutassem o som.
No prédio do infantil os alunos andaram por todos os espaços, igualmente
aconteceu no prédio do fundamental.
O encontro dos dois grupos foi no espaço cultural e os relatos foram.
Grupo do fundamental – a gente escutou bola e o grito na quadra, crianças
brincando, na cozinha tinha barulho de panela no fogo – perguntei qual era o
119
barulho, um aluno falou: si,si,si. Na secretaria a Cris falava de comprar fotos, tinha
também um barulho de carro.
Grupo do infantil – a gente escutou a professora Michelle cantar a música
do trem, a professora Ana Lúcia estava escrevendo um relatório com os alunos
sobre o passeio que nós fizemos, no passeio tinha avião e helicóptero, a Dinha
cortava um pão schi, schi, schi, eu senti o cheiro do misto, ouvimos o barulho da
sanduicheira.
Após ouvir estes relatos propus que construíssemos o que escutamos
utilizando os jogos de construção e, passados alguns minutos, solicitei aos alunos
que relatassem as suas construções, surgiu:
- Helicópteros, trilho do trem, secretaria, computador, caixa para guardar o
dinheiro.
Solicitei aos alunos que produzissem os sons escutados utilizando as
caixas.
Os alunos colocaram o ouvido nas caixas para tentar ouvir o som.
E assim encerramos nossa aula.
Fonte: A autora (2006).
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