o virtual e o desenho de moda

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o Virtual e o Desenho de Moda

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FICHA TÉCNICA

Organização: Prof. Dra. Mara Rúbia Sant’Anna

**Impressão: a confirmar

Supervisão de Impressão: Lucas da Rosa e Monike Meurer

Projeto Gráfico: Déborah Salves [[email protected]]

Editoração: Ana Carolina Dall’Agnoll [[email protected]] e

Maurício Tussi [[email protected]]

Capa: Leonardo Silva Alves [[email protected]]

Coordenação de Editoração: Célia Penteado [[email protected]]

Editado pelo Núcleo de Comunicação CEART/UDESC

Este livro foi financiado pelo Fundo de Apoio à Extensão da Universidade do Estado de Santa Catarina e patrocinado pelo Departamento de Moda, do Centro de Artes da mesma Universidade.

SANT’ANNA, Mara Rúbia (Org.). Moda em Santa Catarina: história,

crítica e perspectivas. Série Modapalavra. Vol. 5. Florianópolis/Barueri/

SP: UDESC/Estação das Letras, 2008. xxx p.

ISBN: XXXXXXXXXX

1. Moda. 2. Vestuário indústria. 3. Moda Aspectos sociais. 4. Moda história.

I. Sant’Anna, Mara Rúbia II. Universidade do Estado de Santa Catarina –

Departamento de Moda

CDD 391

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2008

Todos os direitos de edição reservados àEstação das Letras Editora LTDA

Calçada das Acácias, 89Centro Comercial Alphaville

06453-054 – Barueri – SPwww.estacaoletras.com.br

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Aos consumidores de moda que através de seus desejos alimentam nossos ímpetos de

pesquisadores e profissionais de moda

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Sumário

Apresentação

História

Capítulo I

ALFAIATARIA NO VALE DO ITAJAÍ-MIRIM – estudo histórico

Renato Riffel e Mara Rúbia Sant’Anna

Capítulo II

Modateca Digital – Um Sistema de Informação

José Alfredo Beirão Filho

Capítulo III

Personagens e Inovação no Cenário do Curso de Moda da Universidade

do Estado de Santa Catarina

Flávia Z. Tronca

PÁG.

11

17

57

73

Sumário

ModaPalavra - Volume 5 - 2008

7

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Crítica

Capítulo IV

Programa ecomoda: desenvolvimento sócio-ambiental

Neide Kölher Schulte e Lucas da Rosa

Capítulo V

Relações de aparência e construção de novas identidades através do

consumo de cópias: bolsas Louis Vuitton na Grande Florianópolis

Taísa Vieira Sena

Capítulo VI

A importância do conhecimento do aplicativo coreldraw nas empresas

têxteis catarinenses para o desenvolvimento de desenhos técnicos dos

produtos do vestuário

Fabiana Ludwig

Capítulo VII

O virtual e o Desenho de Moda

Lourdes Maria Puls

Perspectivas

Capítulo VIII

Bases conceituais para a confecção de Uniformes Hospitalares para

enfermagem

Dulce Maria Hollanda Maciel

Sumário

História, Crítica e Perspectivas

8

PÁG.

93

115

141

165

175

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Capítulo IX

Futuro do presente: porque e como pesquisar tendências

Sandra Regina Rech e Amanda Queiroz Campos

Capítulo X

Moda, museu e história – novos horizontes para o profissional de

moda

Mara Rúbia Sant’Anna-Muller; Liliane E. F. Carvalho; Luciana D. Lopes

e Paula Consoni

Palavras Finais

Sumário

ModaPalavra - Volume 5 - 2008

9

PÁG.

201

215

271

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Mara Rúbia Sant’Anna (org.)

Apresentação

A organização de um projeto editorial fundamenta-se na carência ou fervor com que alguns temas são discutidos na área na qual a nova publicação irá se inserir. E tendo em vista as condições atuais da economia catarinense, nada mais profícuo do que uma dis-cussão acadêmica sobre a Moda.

Segundo dados recentes, o crescimento da atividade in-dustrial em junho de 2008, o maior registrado desde 2003 segundo a Confederação Nacional da Indústria (CNI), ficou muito além das melhores expectativas. O faturamento real da indústria nacional cresceu 3,8% no mês e 8,4% no primeiro semestre de 2008, enquanto o desempenho de Santa Catarina superou o do país, com crescimen-to nas vendas de 10,28% de janeiro a junho deste ano na comparação com igual período de 2007. (Cf. ACIB, 2008). Estes dados represen-tam um crescimento industrial geral e não apenas do setor do ves-tuário ou da Moda, sendo o setor de veículos automotores (13,4%), bastante influenciado pela expansão na fabricação de carrocerias para caminhões e ônibus, seguido por borracha e plástico (10,1%),

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Apresentação

História, Crítica e Perspectivas

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onde os destaques são os itens tubos, canos e mangueiras de plás-tico, e peças e acessórios de plástico para a indústria automobilística os mais de maior importância e impacto para o alcance destes bons resultados. Cabe ainda citar os resultados positivos de minerais não-metálicos (5,9%) e de celulose e papel (3,6%) (Cf. IBGE, 2008).

O setor do vestuário, ao contrário dos acima citados, reali-zou contribuições negativas (-18,5%) ao lado do setor madeireiro (-24,7%). Estes setores foram pressionados em grande parte pela queda na fabricação de conjuntos de malha (feminino e masculi-no) e madeira serrada. Na evolução por trimestres, os dados são mais confortadores, pois a atividade fabril catarinense avançou 0,4% no segundo trimestre de 2008, contudo, num estudo de maior abrangência o índice de 0,4% + confirma a redução no ritmo de crescimento frente aos resultados do primeiro trimestre deste ano (2,2%) e do último do ano passado (6,5%). Este movimento é expli-cado, segundo a análise do IBGE (2008) principalmente pelo setor do vestuário, que passou de uma expansão de 7,5% no primeiro trimestre para uma queda de 9,4% no período abril-junho, vindo a seguir máquinas e equipamentos (de –2,4% para –6,2%) e celulose e papel (de 7,0% para 0,5%).

Portanto, mesmo que haja oscilações que comprometem a prosperidade de algumas indústrias têxteis e ameacem o setor de confecção no Estado, o crescimento nos demais setores ainda indica algo que se relaciona diretamente com a Moda, qual seja, a expansão da oferta de empregos e, logo, a garantia da circulação de dinheiro e de manutenção e até mesmo aumento do poder aquisitivo em alguns agrupamentos sociais.

Pois como apresentado no site da FIESC (Federação das In-dústrias do Estado de Santa Catarina) e redito de diferentes formas, mas sempre com o mesmo teor em diferentes meios de comunicação

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Mara Rúbia Sant’Anna (org.)

e de formação de opinião Santa Catarina é um lugar de Moda. Nos termos apresentados no site:

Em Santa Catarina encontra-se o segundo pólo têxtil e do vestuário do Brasil, estando situada aqui a segunda maior fabricante de camisas de malha do mundo. Somos também o maior produ-tor de linhas para crochê e fitas elásticas da América Latina. Destaca-se ainda a produção de artigos de cama, mesa e banho. Somos o maior exportador do Brasil de roupas de touca-dor/cozinha, de tecidos atoalhados de algodão e camisetas T-Shirts de malha. (FIESC, 2008)

Feita estas observações fica justificado a importância e ocasião deste livro, pois a globalização mundial da economia e os planejamen-tos estratégicos do mercado têxtil e da confecção catarinense encon-tram-se num patamar que fomenta um debate severo das condições atuais deste mercado e setor produtivo, como das possibilidades econômicas e tecnológicas e, ainda, sobre os impactos sociais, históri-cos e culturais que tais transformações poderão provocar ou que de-vem ser prevenidos. Este debate não está totalmente contemplado neste livro, porém, aponta algumas reflexões e sugere outros trabalhos que devem completar as discussões propostas nos capítulos.

Sem nenhum vínculo com interesses empresariais que se propõem a produzir conhecimento para se servir deste numa futura implantação de políticas econômicas estaduais, o projeto deste livro não prevê nada de concludente para os próximos anos, não ajeita dados e opiniões de alguns para reforçar argumentos que venham priorizar apenas um ou alguns grupos empresariais que buscam in-centivos para avançar sobre o mercado internacional da moda. Ao contrário, ocupando-se de questões muito próprias do ensinar, fazer, pesquisar e produzir Moda em Santa Catarina, o objetivo deste livro

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Apresentação

História, Crítica e Perspectivas

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é ampliar e fomentar as discussões que já estão postas e que carecem apenas de maiores dados e possibilidades de abordagem.

Logo, o tema do volume 5 da série Modapalavra: “Moda em Santa Catarina: história, crítica e perspectivas” fornece, pela varie-dade de aspectos abordados como da profundidade de suas aná-lises, discussões proveitosas e fecundas para o futuro da economia catarinense e da sua sociedade, a qual deve mostrar-se sustentável e de qualidade. Lembrando sempre que uma sociedade de moda e o sistema que a gesta não se desenvolvem somente com o superávit de alguns grupos empresarias, mas, sobretudo, com a implantação e difusão do ethos Moda, o que implica na ampliação das condições socioeconômicas de todos os grupos sociais que habitam o solo catarinense, com distribuição de renda mais igualitária, com oferta de serviços e políticas culturais mais consistentes, incluindo-se aqui um projeto político-pedagógico de base que forneça condições de estudo e formação profissional de densa qualidade, como ainda, com perspectivas de crescimento humano e tecnológico que transforme o desejo do novo e da modernidade numa possibilidade real para todos e não apenas para alguns poucos, a dita elite.

Como lembra Umberto Eco (1995), todo trabalho acadêmico deve ser digno pela originalidade e seriedade com que é produzido e servir ao seu mundo, seja como proposta de crítica ou de projeção e execução do futuro.

Referências Bibliográficas:

ECO, H. Como se faz uma tese. 14a ed. São Paulo: Perspectiva, 1995.

IBGE, 2008. http://www.ibge.gov.br/home/presidencia/noticias/noticia_visualiza.php?id_noticia=1201&id_pagina=1. Acesso em 08 de agosto de 2008.

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Mara Rúbia Sant’Anna (org.)

ACIB, 2008. http://www.acib.net/hpn/noticias/det_noticia.php?nt_chave=651fc7ca7b5deb0cac73. Acesso em 08 de agosto de 2008.

FIESC, 2008. http://www.fiescnet.com.br/. Acesso em 08 de agosto de 2008.

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Renato Riffel e Mara Rúbia Sant’Anna-Muller

Capítulo I

ALFAIATARIA NO VALE DO ITAJAÍ-MIRIM - estudo histórico

Renato Riffel1

Mara Rúbia Sant’Anna-Muller2

O presente estudo resultou da monografia de conclusão da Especialização em Moda, realizada em 2003 pelo convênio SENAC/UDESC e que teve como objetivo geral a análise de como as atividades dos alfaiates no Vale do Itajaí-Mirim se adequaram perante o surgimento do pronto para vestir na década de 1970. Dentre os diversos aspectos levantados destacou-se o histórico, no qual se analisou a partir de diversas fontes a constituição e o desenvolvimento das atividades de alfaiataria no Vale do Itajaí-Mirim, ficando evidente a importância da urbanização e industrialização sofrida na região para as transformações localizadas no exercício deste ofício tão inerente ao desenvolvimento do produto

HISTÓRIA

1 Especialista em Moda – SENAC/UDESC e professor da [email protected] Doutora em História – UFRGS/EHESS e professora efetiva do Departamento de Moda – UDESC. [email protected].

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de moda. Desta forma, o presente estudo revisto e atualizado pelo autor original e sua orientadora, atual co-autora, tem como objetivo analisar historicamente a emergência e difusão da profissão de alfaiate numa região de migração alemã até a inserção do produto pronto para vestir no mercado local.

Metodologicamente importa destacar que o trabalho foi delimitado espacialmente à região do Vale do Itajaí-Mirim composta dos municípios de Brusque, Guabiruba, Botuverá e Vidal Ramos, porém as atividades de alfaiataria que porventura tenham sido desenvolvidas neste último município não foram pesquisadas devido ao fato dele não estar ligado historicamente à colonização da região (SEYFERTH , 1974, p.9). Temporalmente a delimitação do presente estudo é bastante abrangente, iniciando-se no século XIX, na ocasião da colonização de origem alemã da região, até o século XX, na sua década de 1970, quando ficou evidente a transformação dos hábitos de consumo do trabalho de alfaiate.

A pesquisa foi desenvolvida a partir de documentação indireta, abrangendo a pesquisa bibliográfica e a busca em fontes primárias. A pesquisa documental teve como fonte: periódicos, publicações e registros oficiais. A Casa de Brusque, instituição mantida pela Associação Amigos de Brusque, guarda um grande acervo de documentos referentes à imigração, bem como dos primeiros jornais veiculados na colônia, livros, fotografias e revistas de diversas épocas, os quais foram explorados oportunamente. Completando o quadro documental foram utilizados os recursos das fontes orais.

A técnica empregada foi a da entrevista aberta pautada na história de vida (MEIHY, 1998). Foi elaborado um roteiro previamente, que serviu de base para o trabalho de coleta de dados, tendo como entrevistados os alfaiates que residem nas cidades de

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Renato Riffel e Mara Rúbia Sant’Anna-Muller

Brusque, Guabiruba e Botuverá, contemplando tanto os que ainda atuam como aqueles que não mais exercem a profissão. O roteiro, porém, não foi necessariamente seguido de forma rígida, permitindo aos entrevistados propor respostas de maneira espontânea, o que deu margem a interpretação seletiva dos gestos e entonações, dos silêncios e seleções narrativas desenvolvidas (ROUCHOU, 2000).

Portanto, o presente capítulo contribui para uma abordagem histórica da moda em Santa Catarina porque tem como tema de estudo uma relevante região industrial do Estado e discute um aspecto do sistema de moda que sucinta ainda muitos debates, pois como é evidente, os novos profissionais da moda muito devem às técnicas e história que os alfaiates legaram.

1.1 Alfaiates entre as águas do Itajaí-Mirim

A fim de contextualizar o tema que desenvolvemos é preciso pontuar alguns aspectos sobre os modelos sociais vigentes na Alemanha no século XIX, contemplando assim o local, a época e a situação econômica e social em que se encontravam artesões e camponeses, formadores do contingente de imigrantes que iniciaram o povoamento do Vale do Itajaí-Mirim e de onde vieram as concepções e técnicas que caracterizam o trabalho de alfaiata na região.

A Revolução Francesa e a Revolução Industrial, ocorridas na França e na Inglaterra, respectivamente, no final do Século XVIII, produziram mudanças sem precedentes nas estruturas sociais e econômicas da época. A primeira, com seus ideais de liberdade, igualdade e fraternidade, levou ao poder a burguesia, pondo fim ao regime monárquico e a todo um sistema de valores que centrava no privilégio de nascimento e casta a organização dos poderes e do próprio mundo social. A segunda promoveu a mecanização do

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trabalho, deslocou os sujeitos dos seus habitats, os desapropriou das raízes familiares e aldeãs mais profundas e os condicionou a um sistema de trabalho desconhecido e pautado pelo quantidade e rapidez em detrimento da qualidade e do savoir-faire. Entre outras coisas fez surgir uma massa trabalhadora assalariada e marginalizada dos direitos ditos universais do Homem.

Podemos dizer, em linhas gerais, que os acontecimentos acima expostos, combinados com o aumento populacional na Europa, desencadearam o processo migratório a partir do século XIX, quando 60 milhões de pessoas deixaram o continente europeu em busca de outras perspectivas de vida. Entre os alemães, 80% a 90% se destinaram aos Estados Unidos e 1,5% a 3% vieram ao Brasil (RENAUX, 1995, p. 17).

Segundo SEYFERTH (1974, 21) o movimento migratório do campo em direção às grandes cidades alemães, na primeira metade do século XIX, foi tão expressivo que a cidade de Berlim duplicou sua população, no período de 1815 a 1850.

Com a expansão da revolução industrial a situação dos artífices e artesões das aldeias e das cidades só tendeu a piorar porque, sem condições de concorrer com os produtos saídos das fábricas, viam-se forçados a proletarização. Nesse momento, surge uma intensa propaganda referindo-se às concessões de terras no Novo Mundo, efetuada pelas companhias de colonização, dos agentes de imigração e de alguns países interessados em atrair imigrantes, incluindo-se aí o Brasil. Os colonos e artesões mergulhados na crise européia viram na emigração a chance de tentar melhor sorte no outro lado do atlântico. A propaganda não revelou, entretanto, as dificuldades que os futuros proprietários teriam que enfrentar.

Ao analisarmos a relação dos primeiros imigrantes que chegaram à Colônia de Itajahy-Brusque em 1860, podemos verificar que o contingente de colonizadores correspondia exatamente a camponeses e artesões, conforme já havia observado SEYFERTH:

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Renato Riffel e Mara Rúbia Sant’Anna-Muller

De qualquer forma, a maioria dos imigrantes alemães que entraram no Itajaí-Mirim entre 1860 e o final do século XIX eram camponeses e artesões, o que foi possível deduzir tanto de algumas entrevistas como também das listas de colonos que o primeiro Diretor da Colônia, Barão M. von Schneeburg, anexou a seus relatórios. Esses imigrantes estabeleceram na região uma sociedade camponesa que manteve alguns traços característicos da sociedade de origem, combinados com outros que surgiram no novo ambiente. (1974, p. 28)

Conforme as informações obtidas em Osvaldo Cabral (1958) o processo de colonização do Vale do Itajaí-Mirim ocorreu seguindo o modelo já implantado em outras regiões. Embora já existissem tentativas anteriores de povoamento da região, a colônia Itajaí, foi fundada pelo Aviso Imperial em 18 de junho de 1860, ficando seu território a 30 quilômetros da foz do Rio Itajaí-Mirim, ocupando uma área de quatro léguas quadradas na margem esquerda do rio, sendo estas terras desmembradas da Freguesia do Santíssimo Sacramento do Itajaí.

Os primeiros imigrantes chegaram em 4 de agosto de 1860, acompanhados pelo Barão von Schnéeburg, nomeado diretor da colônia.

Os dados apresentados em algumas obras quando confrontados com os documentos oficiais apresentam sempre divergências. Tomando como a listagem oficial do Barão de Schnéeburg, em 1862, havia 4 alfaiates. Mas entraram até aquela data, segundo os registros de entrada de imigrantes, 6 alfaiates: João José Scharfenberg, José Waeschenfelder, Damiano Dei3, João Kormann

3Em alguns livros encontra-se escrito Damiano Day.

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e Nicolau Schmidt, Carlos Sacht. Provavelmente, o fato se deve às dificuldades encontradas pelas autoridades, e até mesmo pelos colonos, em discernir as atividades exercidas pelos mesmos, já que o artesanato era uma atividade suplementar dos colonos. Esses dados nos mostram que a atividade principal dos imigrantes consistia em explorar o seu lote colonial a fim da garantir sua subsistência, ficando a atividade artesanal como trabalho secundário, conforme considerações de Seyferth (1974, p. 117)

Tomamos como base, portanto, os estudos efetuados por Oswaldo R. Cabral em seu livro “Subsídios para a História de uma Colônia nos Tempos do Império”, que apresenta dados mais concisos, e que já havia detectado as divergências nos relatórios fornecidos pelo dirigente da colônia.

Traçando um panorama geral da colônia no ano de 1862, dois anos após a sua fundação, temos segundo Cabral (1958, p.54) os seguintes números: uma população de 833 habitantes vivendo em 116 casas. Desse total, 83 pessoas viviam na sede da colônia em 17 casas, sendo 44 não colonos. Havia também na colônia 3 marceneiros, 5 carpinteiros, 2 carpinteiros dedicados à construção de carros, 3 pedreiros, 1 canteiro, 2 oleiros, 6 alfaiates, 8 sapateiros, 4 ferreiros, 1 armeiro (espingardeiro), 1 funileiro, 3 tecelões, 1 relojoeiro, 1 ourives, 2 mineiros, 5 padeiros, 4 músicos, 1 curtidor e 2 jardineiros. As atividades exercidas pelos imigrantes nos primórdios da colonização estavam ligadas à exploração do solo: a derrubada de matas nas áreas destinadas à agricultura e a abertura de caminhos que pudessem facilitar a circulação de bens. Visava-se assim produzir o que fosse imprescindível ao sustento dos moradores, tornando-os auto-suficientes e independentes dos auxílios do governo.

Em setembro de 1863 chegaram à colônia 2 famílias transferidas de Teresópolis. Numa delas, o chefe de família era alfaiate: Henrique Wenning, 48 anos, natural da Prússia, católico,

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Renato Riffel e Mara Rúbia Sant’Anna-Muller

casado com Maria e tendo como filhos Henriqueta e Liseta. A relação de setembro de 1863 é a última que apresenta dados relativos à profissão dos imigrantes e que, segundo o relatório oficial do Barão de Schnéeburg, datado de 1863, havia 8 alfaiates na região. (CABRAL, 1958, p. 317). A partir desta data, os registros de entrada suprimem a informação relativa à profissão, inviabilizando assim a apresentação dos nomes dos alfaiates que chegavam à colônia, ficando os relatos resumidos a números extraídos dos mapas estatísticos de cada ano.

Alguns destes alfaiates das primeiras levas de imigrantes desapareceram nas listagens posteriores, como é o caso de João José Scharfenberg, o primeiro citado. Também em nenhum outro documento constam os fatos que o fizeram deixar a colônia nem a localidade de destino. Mas, certamente alguns imigrantes deixaram a colônia frente às dificuldades encontradas, tomando como destino cidades já mais desenvolvidas, ou ainda regressando para a sua terra de origem.

Existiam também algumas indústrias, muito rudimentares e restritas ao uso familiar, relacionadas às atividades agrícolas: como engenhos de fubá e de farinha de mandioca, bem como algumas pequenas serrarias que aproveitavam a matéria prima advinda da derrubada das matas e uma cervejaria.

A sede da colônia, localizada inicialmente à margem direita do rio Itajaí-Mirim, passando posteriormente para a margem esquerda, tornou-se mais tarde o centro da cidade de Brusque. As construções foram feitas próximas à margem do rio, onde havia também um ancoradouro, já que a única forma de comunicação existente com a vila de Itajaí era feita através do rio. (SEYFERTH, 1974, p. 88)

Duas padarias foram abertas para atender aos habitantes da sede, já que no interior as próprias donas-de-casa faziam seu próprio

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pão. Havia também um armazém “mais sortido e suprido” montado pelo “velho e itajaiense Joaquim Pereira Liberato” para atender aos colonos (CABRAL, 1958, p. 64).

Quantos dos registrados alfaiates se dedicavam às suas atividades em detrimento das atividades agrícolas necessárias à subsistência é difícil precisar. Podemos mencionar, no entanto, um fato ocorrido na colônia em 1861. Em junho daquele ano, quase 10 meses após a chegada dos primeiros imigrantes, o Pe. Alberto F. Gattone, vigário de Gaspar, em visita à colônia, celebrou ali os primeiros nove casamentos (In: Revista de Cultura Histórica do Vale do Itajaí-Mirim, p. 251). Talvez tenham os alfaiates, na ocasião, além de suas roças e outros trabalhos, costurados os primeiros ternos e trajes necessários á ocasião, dando início a história do ofício de alfaiate na nova colônia.

1.2 Precisa-se de clientes – alfaiataria e consumo antes da urbanização

Como fundamentado em outros trabalhos (Ver SANT’ANNA, 2007), a preocupação com a aparência e a vitalização da busca do novo como uma ferramenta de inserção social só é possível na medida em que alguns fatores se coadunam, como poder aquisitivo que ultrapasse o financiamento das necessidades básicas, a disponibilidade de produtos e serviços aptos a atender a demanda do produto de moda e a existência de ocasiões nas quais os sujeitos sociais podem se exibir, expondo uma aparência que evidencie moda, e que são incentivados para tal por instrumentos de difusão de padrões idealizados de modernidade. Tais fatores jamais se coadunam quando a vida rural predomina, pois eles são resultantes, em primeira instância, da vida urbana e carecem da lógica moderna para serem justificados.

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Renato Riffel e Mara Rúbia Sant’Anna-Muller

Desta feita, apesar das ocasiões festivas como a comemoração dos nove casamentos celebrados em 1861, não se pode considerar que os alfaiates presentes entre os primeiros colonos puderam prosperar com seu ofício antes que a Colônia de Brusque se constituísse num centro urbano.

Resumindo a forma de organização da Colônia de Brusque, podemos afirmar, segundo a ótica de Seyferth (1974), que se constituía de propriedades rurais, a colônia propriamente dita, e a vila até 1881. As propriedades rurais caracterizavam-se por um povoamento disperso em fileiras de maneira regular, demarcadas a partir das picadas abertas pelos colonos. Essas picadas, que constituíam as vias de acesso, acabaram por transformar-se em estradas. Nos cruzamentos dessas estradas começaram a aparecer os pequenos povoados que reuniam algumas residências, uma pequena capela, uma ou mais casas comerciais, alguns engenhos e um ou dois artesões.

Já a vila de Brusque era, basicamente, “um aglomerado com características semi-urbanas, inserido na área colonial” (SEYFERTH, 1974, p. 67) Como se situava junto ao ancoradouro e sendo a sede administrativa da colônia, a vila tornou-se o lugar para onde os colonos se deslocavam esporadicamente, indo:

(...) vender ou trocar suas mercadorias,

buscar sua correspondência, assistir aos

ofícios religiosos, obter assistência médica,

pagar suas dívidas, enterrar seus mortos com

assistência religiosa, participar das festas da

comunidade a fim de encontrar os amigos e

manter as tradições. (SEYFERTH, 1974, p. 68)

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Foi na vila de Brusque que surgiu a primeira Sociedade de Atiradores, a Schützenverein, tradição já existente na Alemanha no século XIX, que visava manter as tradições e reunir grande parte dos colonos de origem alemã numa grande festa, a Shützenfest. As Sociedades de Atiradores tinha por finalidade, na Alemanha da Idade Média, a defesa dos castelos feudais e das cidades medievais, perdendo com o tempo a sua finalidade, restando somente as competições de tiro e os folguedos.

Através desta Sociedade e de outras festividades de cunho religioso a colônia foi adquirindo ares de cidade, apesar de sua população reduzida. Somente em 23 de março de l88l (pela Lei Provincial nº 920), a Colônia Itajahy tornou-se município com a denominação de São Luiz Gonzaga. Em 17 de fevereiro de 1890 (pelo Decreto nº 77), passou a denominar-se definitivamente Brusque, em homenagem a Francisco Carlos de Araújo Brusque, presidente da Província de Santa Catarina na época da fundação da colônia

Observando o quadro da evolução populacional e do número de alfaiates existentes desde 1864 até 1876, data marcada pelo grande aumento demográfico da população da colônia em virtude da entrada dos imigrantes italianos, pode-se tecer algumas considerações a respeito do desenvolvimento da colônia.

Quadro da evolução populacional e do número de alfaiates existentes desde 1864 até 1876

ANO POPULAÇÃO N° DE ALFAIATES

1864 1121 5

1865 1259 61866 13331867 14481868 1517 10

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Renato Riffel e Mara Rúbia Sant’Anna-Muller

1869 1673 111870 172818711872 2166

1873 25051874 35001875 4568 141876 8110

Fonte: CABRAL, 1958, p. 310

Os dados acima apontam um desenvolvimento bastante lento da colônia, verificando-se um aumento acentuado no número de habitantes a partir de 1875 com a chegada de inúmeros colonos italianos.

O fluxo imigratório foi incrementado com outras origens a partir de 1866, o que dinamizou ainda mais a urbanização da região. Além dos italianos, entraram em Brusque imigrantes vindos da Inglaterra, Irlanda, França, Estados Unidos e Polônia. Entre estes últimos chegaram 2 famílias procedentes da região de Lodz que dominavam o ofício da tecelagem, tornando-se figuras fundamentais na instalação das primeiras indústrias têxteis na região.

Esse aumento da população em virtude da entrada ininterrupta de imigrantes e a concentração de algumas famílias na vila de Brusque fizeram com que alguns artesões, que antes se dedicavam a agricultura, passassem a exercer exclusivamente sua profissão. Essas atividades artesanais, no entanto, eram quase sempre exercidas por um indivíduo, geralmente auxiliados por um ou mais filhos. Mesmo assim as atividades na lavoura não cessavam, só decresciam em comparação as dos outros colonos. A atividade artesanal tornou-se assim, uma especialidade com possibilidades de

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bons rendimentos, impulsionada pelo aumento do mercado interno da colônia. Tal conclusão torna-se evidente quando se compara a duplicação do número de alfaiates entre 1865 e 1876.

Segundo o levantamento de Seyferth (1974, p. 121) em 1865 havia na colônia 4 carpinteiros, 2 marceneiros, 1 curtidor, 8 sapateiros, 3 moleiros, 1 padeiro, 3 pedreiros, 3 ferreiros, 4 charuteiros e 5 alfaiates. Em 1876, esse número aumentou para 16 carpinteiros, 11 pedreiros, 8 oleiros, 21 serradores, 2 serralheiros, 14 alfaiates, 1 seleiro, 18 sapateiros, 1 tanoeiro, 10 ferreiros, 11 marceneiros, 2 carpinteiros de carros, 5 padeiros e 1 funileiro.

Todavia o aumento populacional e apesar de existir um bom número de alfaiates na colônia, nada garante que a confecção das roupas dos habitantes locais fosse atividade exclusiva deles. Primeiro porque seu universo de consumidores restringia-se ao público masculino, e segundo por terem como concorrentes as costureiras.

A figura da costureira fazia parte do cenário doméstico local e sua origem remonta à tradição alemã do artesanato. Como as corporações de ofícios, e, por conseguinte, as corporações de alfaiates não permitiam que o trabalho feminino de costura fosse executado em oficinas próprias, o trabalho de costureira ficou restrito às residências. “A máquina de costura da mãe como peça da sala de visitas situada perto da claridade da janela, era uma paisagem comum”, assim narra Ingeborg Weber-Kellermann (In: RENAUX, 1995, p. 144), confirmando que muitas das mulheres dedicaram-se à costura, quando lhes sobrava um tempo entre os outros afazeres, a fim de contribuir para o sustento da família. Também o relato de Alma Imhof (In: RENAUX, 1995, p. 144), de Brusque, contando que recebia um vestido novo somente uma vez por ano, costurado pela sua mãe à noite, à mão, sob a luz de um lampião de querosene, antes de receber sua primeira máquina de costura, confirma que o feitio das roupas concentrava sua origem na costura doméstica.

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A costura doméstica além de ser uma tradição cultivada para o papel feminino também assevera a escassez de recursos financeiros dos colonos para contratar este serviço com terceiros, bem como, a raridade com que recorriam à manufatura de novas roupas. Enquanto a sofisticação dos costumes na Europa e em alguns centros mais desenvolvidos do Brasil, como o Rio de Janeiro, ditavam um traje para cada ocasião, de preferência novo e feito por uma modista, para as mulheres, ou por um alfaiate, para os homens, entre os colonos do Vale do Itajaí-Mirim a vida simples, o trabalho no campo e a escassez de recursos financeiros apontavam uma outra realidade. Pois este guarda-roupa requintado era sinal de luxo, visto como “a expressão da vaidade subjetiva” sendo o consumo associado “à existência de uma classe abastada”, segundo Renato Ortiz (1991, p. 27).

Ao contrário das toilettes requintadas do século XIX europeu, os colonos vestiam com praticidade e simplicidade, como seus afazeres exigiam. Segundo Maria Luiza Renaux: os homens usavam geralmente calças de linho, uma camisa colorida de algodão e um chapéu de abas largas, os pés descalços ou enfiados em tamancos de couro. “Um paletó em casa raramente é usado” (In: RENAUX, 1995, p. 144). As mulheres usavam saia, avental e blusa. As crianças, até os 6 anos de idade, vestiam uma única camisa que descia até os joelhos. A autora lembra que na Europa, a vida das diferentes camadas sociais era orientada por símbolos exteriores que sinalizavam o status, sendo este hábito abandonado inteiramente na colônia.

Destarte a lida diária, as ocasiões festivas exigiam algum sacrifício das economias e a encomenda de um traje mais apurado. Conforme constatamos nos relatos feitos pelos alfaiates nas entrevistas, as roupas simples do dia-a-dia eram substituídos por trajes especiais em dias de comemoração, como casamentos, batizados, crismas; ou mesmo aos domingos para se ir à missa. As festas de Natal, Ano Novo e Páscoa também ocasionavam a procura por trajes novos, visto que nestas datas também aconteciam grandes bailes que reuniam toda a comunidade.

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Os primeiros casamentos ocorreram de forma simples. Os noivos desciam à vila a cavalo, acompanhados de seus pais e testemunhas, para celebrar a união sob a égide da Igreja. Após o ato religioso, reuniam-se em algum local público, celebrando o acontecimento com café e “kuchen”, a tradicional cuca alemã (In: Revista de Cultura Histórica do Vale do Itajaí-Mirim, p. 726). Segundo Zedar Silva, referindo-se aos trajes usados nas zonas de origem alemã e italiana para estas ocasiões, até o começo do século XX, os noivos e noivas vestiam-se de preto, diferenciando-se pelo que usavam como cobertura da cabeça. “Os descendentes de italianos usavam chale (sic) preto, e os alemães um gorro verde com umas flores de mirta.” (SILVA, 1954, p. 4).

Algumas festividades também eram preparadas quando ocorriam batizados, 1ª Comunhão e Crisma entre os católicos, e a Confirmação entre os protestantes. O historiador Walter Piazza descreve assim os trajes usados na 1ª Comunhão: “as meninas são trajadas com longos vestidos brancos e véus, os meninos, com ternos azul-escuro (geralmente azul-marinho), de calças compridas” (PIAZZA, 1960, p. 18).

As festividades de final de ano também mereciam preparativos especiais. No Natal enfeitava-se o pinheiro, faziam-se doces cobertos com glacê e açúcar cristal colorido e entoavam-se cânticos natalinos, além de roupas novas para comparecer as missas especiais da data. A chegada do ano novo era festejada com salvas de tiros de espingardas e foguetes e as sociedades recreativas organizavam bailes onde comparecia grande parte da população. Nessas ocasiões e cenários a atividade dos alfaiates se fazia indispensável, pois “Naquela época todo mundo usava terno. Até criança.”, relata o alfaiate Harry Laube. (Entrevista, 2003)

Portanto, antes que a urbanização se concretizasse na região o consumo do trabalho de alfaiates, mesmo que já fossem em maior número e capazes de viver apenas de seu ofício, era muito reduzido,

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pois carecia de um hábito de consumo ainda não firmado, qual seja, o da aparência idealizada como moderna que a cidade enseja e a disputa entre os estranhos fomenta (Ver SENNET, 1989).

Foi apenas após com o início da implantação das indústrias e o incremento urbano da região que o uso de ternos e trajes mais elaborados, feitos sob medida e por mão-de-obra especializada se constituiu num traço de distinção entre alguns grupos que circulavam na cidade e que fizeram a profissão de alfaiate se firmar na região.

1.3 – A industrialização e urbanização da colônia

As primeiras indústrias têxteis do vale do Itajaí-Mirim surgiram nos fins do século XIX por iniciativa de João Bauer (1890), Carlos Renaux (1892) e Edgar von Buettner (1898), “antes portanto da existência de uma verdadeira cidade”, conforme artigo escrito por Mamigoniam (1960, p. 382), para o Álbum do Centenário da cidade de Brusque em 1958. Já no século XX, mais precisamente em 1911, Gustavo Schlösser e seus filhos, tecelões vindos de Lodz e que trabalharam na fábrica de Renaux, fundaram também uma tecelagem. Estas empresas, excetuando-se a de Bauer, vendida em 1896 a Rodolfo Tietzman vindo de Blumenau, dominaram por muito tempo o cenário industrial da cidade.

Desde sua fundação, em 1860, até 1918 a economia da colônia foi dominada pelo sistema “colônia-venda”, ou seja, a existência de dois elementos essências: a colônia, tendo como fonte de exploração agrícola os lotes recebidos pelos imigrantes; e a venda: onde os colonos trocavam os excessos da produção agrícola por mercadorias essenciais à sua subsistência e que não podia produzir, como sal, azeite, ferramentas, armarinhos e tecidos.

Mamigonian (1960) e Seyferth (1974) concluíram que a figura do vendeiro teve importância fundamental na constituição

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das indústrias de tecelagem na região por serem os únicos capazes de acumular reservas de capital suficientemente necessária aos seus empreendimentos, segundo a lógica do materialismo histórico que justifica o fato da industrialização pela acumulação primitiva do capital.

Segundo Seyferth (1974) os vendeiros mais importantes situavam-se na vila de Brusque, em número bastante reduzido – cerca de cinco – e monopolizavam as atividades comerciais mais importantes, fixando os preços das mercadorias e controlando ainda os meios de transporte. Transformando-se no elo entre a colônia com o mundo exterior, principalmente com o porto de Itajaí, a colônia de Blumenau e Desterro, capital da província na época, exerciam também o domínio cultural e político, já que em seus estabelecimentos eram distribuídos os jornais, realizavam-se reuniões políticas e serviam como destinatários das cartas remetidas aos colonos. Além disso, também atuavam como uma espécie de banco, guardando as economias dos colonos e recebendo pagamento por este serviço. Os lucros obtidos em suas transações comerciais eram investidos em pequenos empreendimentos ligados à exploração de terras e de florestas, gerando mais acúmulo de capital, possibilitando futuramente o investimento na indústria têxtil.

A presença destes vendeiros, que organizavam a economia local e mesmo da própria vida cultural, alimentou o surgimento na colônia de um potencial mercado consumidor e que, combinado outros dois fatores, determinou os investimentos no setor têxtil: a saturação da exploração agrícola através do esgotamento das propriedades mais antigas, levando ao decréscimo da produção agrícola; e a existência de now how entre os imigrantes, como é o caso das famílias de tecelões procedentes de Lodz, na Polônia, que chegaram à colônia em 1889.

Podemos considerar a progressiva urbanização da vila de Brusque como a conseqüência mais importante ocorrida com o

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desenvolvimento da indústria têxtil. Quando surgiram as primeiras indústrias têxteis, em 1889, a vila de Brusque apresentava pequena infra-estrutura urbana, apesar de servir como ponto principal das atividades econômicas e sociais da colônia. Moravam ali cerca de 500 pessoas: alguns comerciantes e artesões e os prestadores de serviços públicos.

Enfim, a história da industrialização de Santa Catarina se relaciona diretamente a estes aspectos citados acima e que diversas bibliográficas já exploraram convenientemente. Porém, cabe ressaltar o incremento da atividade artesanal dos alfaiates nestes novos tempos de urbanização e industrialização do Vale do Itajaí-Mirim.

Entre os vendeiros, Gustavo Krieger4, diferentemente dos outros proprietários de vendas, resolveu abrir uma alfaiataria em 1898: a Alfaiataria Elegante. Órfão da mãe aos 5 anos e do pai aos 14, ele aprendeu o ofício de alfaiate em Desterro, mudando-se para Brusque ao terminar o aprendizado. Todos os seus filhos4 aprenderam também o ofício, hábito muito comum na época, inclusive suas filhas mulheres e ainda a esposa. Aos poucos seus filhos foram seguindo outras profissões, ficando com Axel e Nilo a continuidade dos negócios. Assim, a “Alfaiataria Elegante” foi crescendo, transformando-se na empresa “Irmãos Krieger S.A”., chegando a empregar, em 1978 cerca de 200 funcionários. (KRIEGER, 1978)

Foi a partir do século XX que Brusque teve seu impulso industrial e urbano consolidado e além da “Alfaiataria Elegante” muitos outros negócios, espaços sociais e meios de difusão do valor do novo e do moderno tomaram corpo e mudaram o panorama socioeconômico e cultural da região.

4 Em 1902 Gustavo Krieger casa-se com a imigrante italiana Adelaide Diegoli, nascida na Bolonha. Desse casamento nascem 17 filhos, sendo que 4 faleceram ainda crianças.

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Em 1916, segundo Seyferth (1974, p. 137), Brusque ainda não apresentava características urbanas: havia cerca de 150 casas a população não ultrapassava o número de 1.000 pessoas. Mamigonian (1960, p. 383), por sua vez, apresenta alguns dados referentes ao panorama do aglomerado urbano de Brusque em 1917, quando a população do município era de 11.736 habitantes: existiam na sede 2 igrejas (católica e evangélica), 6 escolas primárias, a Sociedade de Atiradores e Ginástica, Intendência e Coletoria Municipal, Comissariado de Terras e Colonização, Coletoria Estadual, Correio, Telégrafo, Coletoria Federal, Delegacia de Polícia e Cadeia. Havia 15 casas comerciais, sendo 2 atacadistas (G. Krieger e J. Bauer), além de outras importantes, como Buettner e Renaux. Krieger e Bauer importavam da Alemanha ferragens, máquinas de costura, moendas de cana, relógios, brinquedos e enfeites de Natal. Krieger, Bauer e Buettner vendiam tecidos, ferragens e armarinhos.

As principais indústrias eram as mesmas citadas acima, empregando entre 70 e 100 operários. Os artesões existentes na sede eram 6 ferreiros, 4 a 5 marceneiros, 1 tanoeiro, 44 alfaiates, 4 padeiros, 4 pedreiros, 1 açougueiro, 1 barbeiro. Uma rede de energia elétrica existia desde 1913 por iniciativa de João Bauer. Destes dados fornecidos por Mamogonian é surpreendente o número de alfaiates em relação aos outros ofícios existentes.

Também por volta da década de 1920, apesar de não constituir um centro urbano, Brusque já possuía algumas publicações como a Gazeta Brusquense e o jornal O Rebate, o que através de suas colunas, notícias e anúncios aproximava as possibilidades de consumo dos serviços de alfaiate e do produto de moda do seu público leitor.

Todavia, a expansão da industrialização da cidade de Brusque deu-se de forma lenta, refletindo assim no traçado da cidade, e conseqüentemente no seu processo de urbanização. Até meados

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da década de 1930, o trabalho agrícola sobrepunha-se ao trabalho nas indústrias. Mesmo os colonos que trabalhavam nas fábricas não abandonaram a exploração de suas propriedades, tendo em vista o número de vagas oferecidas e os salários pagos, deslocando-se diariamente até as fábricas, percorrendo distâncias de até 10 quilômetros. Era comum também, uma ou mais pessoas da família trabalhar nas fábricas, enquanto o restante da família continuava os trabalhos na agricultura. Surge assim o colono-operário que, mesmo trabalhando na fábrica oito ou nove horas por dia, mantinha as atividades agrícolas juntamente com outros membros da família, não se transferindo para o núcleo urbano. A partir da Segunda Guerra, com o crescimento das indústrias têxteis e a segurança encontrada no trabalho assalariado e, também, motivados pela fragmentação constante dos lotes coloniais, muitos colonos deixaram o trabalho agrícola, dedicando-se somente ao trabalho nas fábricas (Ver NIEBUHR, 1999).

A partir da década de 1940, nota-se um adensamento da população, não somente na região central de Brusque, mas também nas áreas suburbanas. Essa população não é somente formada por ex-colonos, mas também de pessoas vindas de outras cidades do estado de Santa Catarina, atraídas pelo trabalho nas fábricas. Mesmo assim, a região central de Brusque não apresenta uma grande concentração de habitantes, como podemos ver no censo de 1940 onde, num total de 23.428 habitantes somente 2.641 viviam na cidade, e 3.327 viviam nos subúrbios mais próximos (IBGE, 1950). Dessa forma, a população, vivendo de forma dispersa em subúrbios, longe de um centro urbano propriamente dito, conservou por muitos anos hábitos e costumes trazidos desde os primeiros tempos da imigração e, conseqüentemente, o consumo do produto de moda manteve-se pouco alterado, sendo restrito às camadas sociais mais abastadas e que gozavam de oportunidades de informação e exibição de forma mais acentuada.

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A despeito dessa constatação, que é válida até a década de 1970, o número de alfaiates pareceu significativo em levantamentos como o feito por Mamogonian para 1917. Isso se dá, conforme o depoimento de Valmir Pruner, porque na época, certamente, foram contabilizados os mestres alfaiates das casas de alfaiataria juntamente com seus aprendizes e empregados:

É, mas isso eles contavam tudo... quando sabia fazer paletó, era oficial de paletó. E depois tinha o calceiro, que só fazia calça, não fazia paletó. (...) Talvez era considerado como alfaiate, mas não era, era calceiro. Quem fazia paletó também não cortava, quem cortava antigamente era só o patrão. (ENTREVISTA, 2003)

O trabalho da memória sempre é perspicaz e diante da informação dada e a realidade vivida há sempre lacunas que não tem como serem preenchidas. No entanto, pode-se concluir que 44 artífices, em 1917, tinham como forma de sustento, alguma atividade ligada à alfaiataria.

Nos anos posteriores, foi através dos periódicos, como a Gazeta Brusquense e O Rebate, que se pode constatar a presença dos ateliês de alfaiates inseridos na realidade da cidade.

Na Gazeta Brusquense, em 20 de outubro de 1926, talvez se encontra o primeiro anúncio veiculado em jornal, na região de Brusque, de uma casa de alfaiataria:

ALFAIATARIA UNIÃO de Leopoldo Matheus. Quem quizer (sic) trajar a última moda procure esta alfaiataria que executa qualquer trabalho com bons aviamentos e por preços módicos.

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No mesmo jornal, aparece em 24 de setembro de 1927, um anúncio da alfaiataria de Ervino Siegel. Anúncios como estes se tornaram mais comuns a partir da década seguinte, principalmente no jornal O Rebate, o periódico de maior circulação no município, mas restringem-se a três ou quatro casas de alfaiataria.

Os anúncios encontrados nos periódicos brusquenses mais que indicar a existência e o exercício da profissão de alfaiate, também indicam como funcionavam estas atividades naquele período.

Em 1936, temos num anúncio da Alfaiataria Teixeira que diz: “Comunico ao povo de Brusque e aos meus amigos que abri uma oficina (sic) de Alfaiate em minha residência perto do Grupo Escolar, onde espero receber o apoio de todos”. Essa é uma característica bastante comum em grande parte desses estabelecimentos: a alfaiataria funcionava junto à casa dos proprietários, trazendo ainda na sua forma de constituição e organização os preceitos herdados das antigas corporações de ofícios.

Também em 1936, encontra-se outro anúncio, que fala:

Este bem montado estabelecimento que acaba de abrir-se nesta cidade em frente ao “Hotel Schaefer” acha-se habilitado a bem servir os mais exigentes freguezes, de accordo com os últimos figurinos e a preços convidativos. Nesta alfaiataria precisa-se de um aprendiz. (Alfaiataria Central de Jason Zimbro Santos. In: GAZETA BRUSQUENSE, 09 ago 1924)

A figura do aprendiz de alfaiate remonta também às tradições das corporações de ofícios da Idade Média. Geralmente sem receber nenhuma forma de remuneração, os aprendizes dedicavam anos de trabalho para aprender a profissão. Harry Laube, que aprendeu o ofício em Jaraguá do Sul, em 1938, faz um relato da rigidez do aprendizado e da situação dos aprendizes na época:

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Quando tinha 15 anos prá 16 fui aprender. (...)

mas o homem era rígido, era pontual (...) nós

fazia tudo à mão [gesticula, exemplificando]

nós trabalhando aqui na máquina, tinha um

relógio lá, na parede [silencia, para representar

a jornada] hoje nós chuleamos em tanto tempo

[pausa] levou uma hora, uma meia hora [pausa]

amanhã tinha que diminuir, tinha que ser mais

rápido [pausa] e ai de nós se nós não fizesse um

serviço bem feito. (LAUBE, Entrevista, 2003)

O relato prosseguiu, contando que o tempo para o aprendizado completo do ofício chegava a 3 anos, quando o aprendiz era então chamado de oficial: “Trabalhei 3 anos quase de graça. (...) É, era duro. Olha, ficar ali das 5 horas até às 7 horas da tarde...depois das 7 horas fazia sobre-hora pra ganhar uns trocados. Ganhava 400 réis uma calça...400 réis...nunca me esqueço.” (LAUBE, Entrevista, 2003).

A forma de aprendizado do ofício mudou pouco com o passar dos anos. Porém, com o uso da máquina de costura elétrica, a modernização do vestuário e dos materiais usados, o processo de aprendizado tornou-se mais rápido.

Alguns anos mais tarde, na edição bi-anual (1937/1938) do Livro Azul da Cidade de Curityba, 3ª Edição, na seção de Informes das Casas de Indústria e Comércio das Cidades de Itajahy, Blumenau, Florianópolis, Joinville e Brusque, encontram-se registrados os alfaiates existentes em Brusque na época: Braz Tolledo dos Santos, Ernesto Wancka, Erwino Siewert, Germano Westphal, Gustavo Krieger, José Tencini, Manoel Flor, Sezefredo Pieper, Rolando Heil na localidade de Cedro Grande, Leão V. Kormann em Guabiruba do Norte e Luiz Vicentini em Porto Franco.

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1.4 – A modernidade se estabelece e a alfaiataria se reformula

Antes dos anos 50, não apenas no Vale do Itajaí-Mirim, o consumo do produto de moda era restrito às camadas sociais mais abastadas, sendo que a maior parte da população continuava, como outrora, a buscar um vestuário mais requintado apenas para ocasiões muito especiais. Soma-se a este aspecto o fato que Gilda de Mello e Souza destaca em sua obra (1987) – o fenômeno de oposição entre o estilo de vida do campo e da cidade. Esta oposição à moda por parte das camadas rurais manteve-se até época recente, pois as famílias rurais permaneciam vinculadas às tradições firmadas no nome de família, na posse da terra e nos laços de parentesco e compadrio que estabeleciam um lugar para os sujeitos no mundo, independente de seu parecer.

Até meados da década de 1930, a economia brasileira estava baseada na produção agrícola, onde se destacavam o café, o algodão o cacau e a borracha. A partir da revolução de 1930, essa economia modifica-se com o surgimento do processo de industrialização, adotando-se um modelo desenvolvimentista, onde o processo de substituição das importações, principalmente no que diz respeito aos bens de consumo leve, torna o país auto-suficiente. (DIAS, 1987, p. 129). Sendo, então, a partir dos anos 50 que o Vale do Itajaí-Mirim vai expressar uma mudança maior em relação ao consumo do produto de moda e, logo, do trabalho dos alfaiates.

A população mais jovem da cidade, a partir da década de 50, começa a absorver e aceitar as modificações impostas pelo vestuário, motivados principalmente pelos meios de comunicação, pela cultura do consumo vinda dos EUA, e pelo distanciamento, mesmo que periódico, do meio rural no momento em que ingressavam no trabalho fabril. O contato com o modo de vida urbano, mesmo que restrito, induzia a novos hábitos, onde a roupa ganhava “um papel mais importante, e era escolhida por critérios distintos daqueles usados no meio rural” (RUFFAT, 2002, p. 128).

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Essa reestruturação no modo de vida pode ser visto nos relatos de NIEBUHR (1999, pp. 104 -119) em seu trabalho sobre a memória operária de Brusque na década de 1950: nas atividades sociais, tanto no meio rural como no urbano, os jovens operários preocupam-se com o vestir, procurando seguir os padrões ditados pela moda, mesmo que distantes dos grandes centros urbanos. Nesta época o centro da cidade já contava com iluminação, arborização, cinemas, hotéis, restaurantes e cafés, compondo um cenário bastante distinto das décadas anteriores.

Nesse contexto, os serviços dos alfaiates já dividiam espaço com o mercado de roupas prontas, conforme podemos verificar numa publicação editada em 1947, pela passagem do 87º aniversário do município (In: Revista Brusquense, ago 1947). Nesta encontra-se anúncios de 4 casas comerciais que vendiam roupas prontas, uma delas específica para o público feminino, aparecendo na mesma publicação anúncios de 6 casas de alfaiataria: Alfaiataria Siegel, Alfaiataria Avenida de Izidoro Schaefer, Alfaiataria Vasselai de José Vasselai, Alfaiataria Voitina, de João Voitina, Alfaiataria Krieger de Irmãos Krieger Ltda. e Alfaiataria Moderna de Manoel Flores. Duas destas funcionando também como casas comerciais – Krieger e Moderna_, vendendo tecidos, aviamentos e acessórios, ocupando ainda lugar de destaque na publicação com um breve histórico das atividades (In: Revista Brusquense, ago 1947).

O relato do histórico da Alfaiataria Moderna, de Manoel Flores, exemplifica a trajetória de transformações sofridas nestas atividades:

Em 1946, recentemente, portanto, Helmo Flores, filho do dirigente da Alfaiataria Moderna, foi a São Paulo, onde se aperfeiçoou na arte da tesoura. De lá, voltou em Setembro daquele ano, como Alfaiate Técnico Cortador, tendo a custo de seus

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intensos estudos, formado o curso na Premiada e Laureada Escola de Corte Imperial, daquela capital paulista. (In: Revista Brusquense, ago 1947).

A formação profissional do alfaiate, restrita por séculos ao aprendizado familiar, começou a sofrer adaptações impostas pelos novos hábitos. Já não bastava somente aprender o ofício com o pai, o mercado começava a exigir um profissional atualizado e eficiente, em sintonia com os novos tempos, portador dos conhecimentos racionais instituídos pelo surgimento da mecanização do trabalho e do processo industrial. Os conhecimentos adquiridos num mundo exterior ao da cidade transformavam-se em sinônimo de competência, trazendo uma concepção de modernidade e estabelecendo afinidades com os consumidores que privilegiavam estas condições.

Quem não tinha condições de freqüentar cursos em escolas especializadas, procurava soluções alternativas para melhorar o aprendizado e adequar-se às novas solicitações do mercado. Um exemplo da busca de aprimoramento profissional pode ser encontrado no depoimento de José Batistotti, que viu na infra-estrutura de uma grande empresa os recursos para melhoria da sua profissão. No início da década de 1970, o mesmo deixou seu negócio próprio e foi trabalhar na empresa Irmãos Krieger:

Eu queria dar uma mudada também porque naquela época o tipo de trabalhar da gente era cem por cento diferente dos Krieger. O modo de trabalhar era todo diferente. Hoje em dia eu trabalho no mesmo estilo dos Krieger. (BATISTOTTI, Entrevista, 2003)

Contudo, não era apenas a inovação nas condições do aprendizado da profissão que alterou o fazer alfaiate. As inovações tecnológicas introduzidas na indústria do vestuário nas décadas que se seguiram à segunda guerra trouxeram agilidade ao processo

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de produção das roupas, mesmo para as formas mais artesanais de confecção. Essas inovações, tanto nos processos de produção como no surgimento de novos materiais usados, causou uma distinção entre os profissionais. Podemos apontar assim, o surgimento de duas gerações de profissionais: a primeira que trabalhava sob os antigos preceitos, e a nova, que buscava agilidade e facilidade dos novos padrões de produção.

A geração de alfaiates que aprenderam o ofício depois da segunda guerra acostumou-se rapidamente às novas tecnologias, incorporando-as em seu trabalho, conseguindo melhorias consideráveis em produtividade e a própria sobrevivência num sistema de moda que se tornou insípido para o artesanal.

Essa diferença de “gerações” ainda é possível de ser identificada e se torna nítida ao visitar as casas de alfaiatarias ainda existentes: nas mais antigas existem máquinas movidas a pedal e a grande parte do trabalho ainda é feito à mão, quase sempre instalada num ateliê de proporções modestas, um tanto quanto de feições domésticas e contando com poucos ajudantes; nas mais modernas, máquinas elétricas de costura e acabamento dividem espaço com a antiga régua e tesoura, heranças do trabalho artesanal que dão o seu charme, tendo, porém, ao seu lado um serviço de recepção mais personalizado e a oferta de materiais têxteis mais requintados, além de revistas e informações que já indicam o tipo de cliente que quer ser cativado.

O depoimento de Valmir Pruner, que aprendeu o ofício de alfaiate no final da década de 50, evidencia algumas das mudanças ocorridas tanto no processo de produção como no surgimento de novos materiais usados:

Hoje em dia mudou muito o sistema de trabalho, o paletó era muito feito à mão, hoje em dia é mais à máquina. Uma calça se tu pegas uma calça

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dentro de 40 minutos tu tiras ela da máquina. Antigamente num dia se fazia 2 calças. Quando eu comecei a aprender, fazia esse acabamento aqui tudo à mão [mostra a costura interna da calça feito em máquina overlock]. Depois veio a máquina zig-zag. (...) Naquela época era muito diferente. Se cortava uma tirinha que se chamava trinca, fora a fora no paletó, feito dois pontos à mão, um ponto corrido e um ponto simples, fora a fora no paletó. Se fazia o mosqueado do bolso tudo à mão [arremate com costuras nas extremidades do caseado]. Hoje em dia ninguém mais faz mosqueado. (...) botava ombreira, botava uma entretela de crina de cavalo. Agora não, agora é tudo sintético. (PRUNER, Entrevista, 2003)

Pedro Severino lembra, também, das mudanças pelas quais a profissão passou: “Antigamente eles faziam tudo à mão. Era tão demorado (...) meu irmão foi muito inovador nisso daí, ele começou a trabalhar com entretela colante e fazia o paletó rápido” (SEVERINO, Entrevista, 2003).

A agilidade na confecção de calças e paletós era requisito necessário a todo bom profissional de alfaiataria. Nos decorrer dos depoimentos, essa qualidade é ressaltada várias vezes, como foi o caso de um tal Cartucho, lembrado por Pedro Severino por costurar 5 a 6 calças por dia numa máquina tocada a pedal. Harry Laube também lembra dos seus tempos de aprendiz em Jaraguá do Sul, quando um certo alfaiate apelidado de Lingüiça conseguia fazer um paletó por dia.

O trabalho ágil era também, premissa para ordenados mais elevados, já que a remuneração, passado o tempo de aprendizado, era feita por peças concluídas. A máquina de costura elétrica e os novos materiais trouxeram aos alfaiates a agilidade necessária para

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atender a demanda dos serviços solicitados, embora a manufatura das roupas mantivesse o aspecto artesanal. Com o tempo, os mais bem sucedidos foram abrindo mão deste aspecto distinto para valorizar o lucro e a produção em série.

Adaptando-se às novas perspectivas do mercado consumidor, a empresa Irmãos Krieger incorporou os conceitos de produção em série, tornando-se a primeira indústria de roupas pré-fabricadas do Vale do Itajaí-Mirim, chegando a empregar diretamente, em 1978, cerca de 200 funcionários (KRIEGER, 1978).

A trajetória da Alfaiataria Krieger indica que a inovação desde cedo foi posta como prioridade. A partir de 1934, a alfaiataria tornou-se representante exclusiva para a região “(...) de uma das mais importantes organizações industriais e comerciais do país, a A. J. Renner S.A., de Porto Alegre (...)” (In: Revista Brusquense, 4 ago. 1947). Em 1947 o estabelecimento oferecia, além dos ternos de fabricação própria, uma gama de produtos bastante diversificada: casemiras e linhos nacionais e importados; chapéus de feltro e calçados para homens; camisas, camisetas, meias, guarnições de cintos e suspensórios; capas para montaria e trajes de puro linho e tropical da marca Renner para pronta entrega; capacetes para homens e crianças; artigos de jersey para senhoras e máquinas de costura da marca Renner. Em 1950, por fabricar produtos semelhantes aos vendidos pela Renner, a empresa perdeu a concessão de venda dos produtos daquela empresa, sem perder a importância comercial que já gozava na região.

O alfaiate José Batistotti, que trabalhou na empresa Krieger na década de 1970, descreve a forma de divisão do trabalho na fabricação dos ternos, onde executavam os serviços em cinco pessoas: “Cada um tinha uma parte do paletó. Eu, por exemplo, só colocava o bolso do paletó. O Lauro só colocava as mangas e o Nelson Visconti

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só colocava a gola do paletó. Os outros faziam serviço de mão, coisa simples”. No depoimento, ainda, o alfaiate conta porque deixou a empresa no final daquela década: “Saí do Krieger porque eles terminaram a sessão de paletó, aí eles queriam me botar na sessão de calça. Aí eu não aceitei” (BATISTOTTI, Entrevista, 2003)

O sistema de trabalho e a oferta dos serviços evidenciam a agilidade que a empresa primava e que, com o seu sucesso, servia de exemplo para que outras alfaiatarias fizessem o mesmo.

Além da produção em série, a Krieger fazia uso do sistema de terceirização para cobrir a demanda das encomendas, como os relatos de José Battistotti atestam. Ele relatou que além de cumprir seu horário de trabalho na empresa Irmão Krieger, trazia para casa os paletós encomendados, confeccionando a metade dos mesmos: “Eu fazia até a metade e o Nelson Visconti terminava.” Harry Laube, que também trabalhou como alfaiate na Krieger, na década de 1960, afirmou que depois de desligar-se da empresa continuou a confeccionar ternos para a mesma em seu domicílio (Entrevistas, 2003).

Este sistema de terceirização passou a ser utilizado também por outras alfaiatarias, surgindo como alternativa para a falta de aprendizes que se dispusessem a trabalhar no ofício, a partir da década de 1970. Não se pode afirmar as causas que motivavam a falta de interesse para aprender o ofício, mas certamente o trabalho nas fábricas apresentou-se como uma alternativa mais segura de garantia de salários para os jovens que mais sonhavam com uma profissão atribuída por um diploma universitário do que com a manutenção de uma tradição familiar.

Ainda há de se considerar que a regulamentação das leis trabalhistas, a partir do governo Vargas, estabeleceu limites mínimos

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para o pagamento dos salários, o que onerou os custos da produção, pois os aprendizes já não se dispunham a trabalhar gratuitamente nas oficinas em troca de perspectivas futuras. Preferiam o trabalho remunerado, com todas as vantagens trabalhistas que o acompanhava e não viam nenhuma vantagem profissionalizante na condição de aprendiz já que, neste momento, a utilização do maquinário diminuía consideravelmente a importância da habilidade artesanal.

Outro elemento primordial nas transformações do trabalho de alfaiataria está ligado ainda à terceirização dos serviços na forma de subcontratação do trabalho feminino. Se esta variante da produção era alternativa eficaz tanto para suprir a necessidade de mão-de-obra nas alfaiatarias bem como para a redução dos custos, incorporando assim alguns conceitos de produção e administração utilizados por grande parte das indústrias de confecção nas décadas posteriores, ela se tornou ainda mais vantajosa quando começou a contar com a mão-de-obra feminina que ajustava a vida doméstica à absorção de uma nova fonte de renda. (RUAS, In: GOULARTI, 1997). Nessas circunstâncias, segundo Abreu (In: GOULARTI, 1997), apareceu a predileção pelo trabalho feminino, cuja posição no contexto social, reflexo de uma ideologia patriarcal e de nítida diferenciação nos papéis sexuais, somada à informalidade do trabalho possibilitava um menor valor a ser pago pela mão-de-obra.

Ivo Fischer, proprietário de uma alfaiataria em Guabiruba na década de 1950 até meados da década de 1970, relatou que buscava os serviços de duas costureiras, Ana Erthal e Catarina Kohler, para confeccionar calças para sua alfaiataria. O alfaiate José Batistotti também fez uso da mão-de-obra feminina para terceirizar a produção: “Tinha uma moça que trabalhava pra mim, numa máquina tocada à pé, ela conseguia tirar 6 calças por dia. Era uma loucura, nunca vi daquilo.” (BATISTOTTI, Entrevista, 2003).

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Venda de produtos de moda complementares, divisão de trabalho por processos de confecção e terceirização da produção são algumas das características que marcam a renovação significativa na alfaiataria na década de 1970.

Nesta mesma década, no Brasil, a participação da indústria do vestuário e calçados representava 7,2% do total dos estabelecimentos industriais, representando também 9,2% no número de empregos existentes no país (IBGE. Censo Econômico de 1970). Esses números cresceram na década seguinte, principalmente pela facilidade de operação das novas máquinas de costura, pelo emprego intensivo de mão-de-obra e pelo conhecimento facilitado das técnicas de produção (GOULARTI, 1997, p. 105), o que encharcou o mercado de produtos com melhor acabamento, com apelo estético vinculado à moda e a preços acessíveis, vendidos em lojas que também renovaram sua forma de atendimento e condições de venda. (SANT’ANNA, 2005, Cap. 6)

A partir dos anos 60 e 70 ocorre também a difusão do uso do jeans e das camisetas de malha, apontando a mudança de hábitos dos consumidores. Os jovens, que já gozavam de certa autonomia financeira, formavam uma categoria de peso, e reclamavam o reconhecimento para seus hábitos, “entre os quais, antes de qualquer coisa, estavam sua música e sua moda” (RUFFAT, 2002, p. 128), rejeitando os gostos das gerações precedentes.

Quando o comércio de roupas prontas apareceu no Vale do Itajaí-Mirim através da empresa Irmãos Krieger e de seu sistema de revenda das confecções Renner, a aceitação das mesmas sofria resistência por parte dos compradores, muitas vezes pela falta de qualidade que apresentavam em detrimento ao acabamento perfeito encontrado nas roupas feitas sob medida5. Apesar da resistência inicial dos consumidores frente às roupas confeccionadas industrialmente, a qualidade das mesmas passou a melhorar de forma significativa no decorrer dos anos 70.

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A cidade de Brusque, por sua vez, acompanhava esta tendência mundial. No início da década de 19706 apresentava uma população aproximada de 35.000 pessoas, contando com um parque industrial de 80 fábricas, 245 casas comerciais, ocupando na época o 4º lugar na arrecadação estadual. Havia na cidade 1 biblioteca pública, 42 escolas de curso primário, 6 escolas de nível médio, 2 de curso secundário e 1 curso superior, ministrado em Brusque em convênio com a Fundação Universitária de Blumenau. Aparelhos de televisão e rádio já eram comuns na época, podendo os brusquenses assistir à 3 canais de TV e ouvir, entre outras, a rádio Araguaia, única existente na cidade.

Dentre outras inovações que incrementaram a economia local, foi criada a festa do tecido para aproveitar o movimento de turistas na região, principalmente os que vinham passar suas férias em Balneário de Camboriú. Esta festa consistia numa feira ocorrida durante a última semana de janeiro e primeira de fevereiro num pavilhão especialmente construído para o evento, onde podia-se comprar produtos têxteis a preços de fábrica. O município caracterizava-se pela forte presença da indústria têxtil, mas apontava excelentes perspectivas de crescimento para as indústrias de metalurgia, confecção e móveis, segundo as palavras do prospecto da Comissão Municipal de Turismo, editado em 1970.

As indústrias de confecções começaram a ganhar expressão na região a partir de 1975 já eram 15 empresas deste tipo, oferecendo uma grande diversidade de produtos: trajes, calças, blazers, jaquetas,

5 Ivo Fischer nos conta um desses casos: alguns ternos pré- fabricados vinham com uma forração de entretela sem pré-encolhimento. Assim que eram lavados, a entretela encolhia, e os paletós vol-tavam para os alfaiates para serem reformados. “Naquele tempo, sabe como é o povo, comprava uma vez e depois não comprava mais.” (FISCHER, Entrevista, 2003)6 Para obtenção dos dados foram usados tanto de documentos oficiais emitidos pelos órgãos públi-cos, como também algumas publicações, de cunho menos formal impressos pela prefeitura mu-nicipal juntamente com a secretaria de turismo.

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camisas sociais e esporte, camisetas; bermudas e shorts para homens e mulheres; calças de malha, algodão e tergal para meninas e mulheres; macacões e mini-blusas; malhas em acrílico para homens, mulheres e crianças; pijamas, cuecas, camisolas anáguas, combinações, pegnoir, baby-dolls, corpetes e conjuntos; roupas infantis. (COMISSÃO MUNICIPAL DE TURISMO, 1975).

Diante destes dados é evidente que, desde o início dos anos 1970, a elite local optou por um o plano de desenvolvimento da cidade centrado na confecção de roupas para um público de renda média, sendo que a alfaiataria e outros aspectos produtivos ligados ao artesanal e a tradição dos imigrantes ficaram secundarizados, senão totalmente esquecidos.

Também se deve considerar que a partir desta diversidade de produtos oferecidos, muito deles com preços bastante acessíveis, o movimento das alfaiatarias entrou num processo de declínio.

Nas épocas de vendas baixas, alguns alfaiates saíam em busca de clientes em outras cidades, utilizando-se às vezes de formas inusitadas para vender seus produtos. Mediam e cortavam os ternos na casa dos clientes, geralmente nas regiões menos urbanizadas, fazendo do atendimento domiciliar uma alternativa para garantir o sustento da família. Harry Laube relata que numa dessas épocas foi a Jaraguá do Sul, cidade onde nasceu e onde tinha um bom número de conhecidos, a fim de vender seus ternos. Carregou um caminhão com 4.500 abacaxis e partiu para a cidade levando consigo um ajudante. Consegui vender os abacaxis, e ainda vendeu, cortou e provou 10 ternos, recebendo o pagamento no mesmo dia. Davino Ferreira de Mello, funcionário da empresa Irmãos Krieger e genro de Gustavo Krieger, também teve seus dias de vendedor ambulante: foi a Tijucas de bicicleta, conseguindo vender na cidade 7 ternos da empresa (LAUBE; MELLO, Entrevistas, 2003). Alternativas que alteravam o status do ofício, mas que permitiam a sobrevivência

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e manutenção da profissão quando o sistema de moda na sua fase “aberta” (LIPOVETSKY, 1989, Cap. 3) havia renovado a noção de elegância, ampliado as possibilidades de consumo a distintos poderes aquisitivos e transformado a função social da moda, que não servindo mais para marcar as distinções entre os grupos sociais, servia à constituição da personalidade dos sujeitos modernos, ávidos por serem diferentes, jovens e conectados com o mundo a sua volta.

1.5 Últimos pontos

Nos depoimentos colhidos durante para este estudo, os alfaiates que continuam trabalhando em seu ofício não expõem as dificuldades encontradas a partir do surgimento da roupa produzida industrialmente. Todavia, um olhar mais atento apontou dois aspectos imprescindíveis para que as atividades continuassem de forma lucrativa para os mesmos.

O primeiro aspecto, mais evidente, refere-se a quantidade de alfaiates existentes no mercado. O decréscimo do número destes profissionais, a partir da década de 1970, favorece os que permaneceram trabalhando, já que a procura por trajes sob medida ainda continua com o passar dos anos, principalmente entre os grupos sociais de maior poder aquisitivo. Tal fato pode ser comprovado nos depoimentos quando os entrevistados citam os clientes que ainda procuram seus serviços: médicos, advogados, políticos e membros de famílias mais abastadas.

O segundo aspecto aponta a diversificação dos serviços prestados como forma de garantir a sobrevivência do negócio. Os exemplos a seguir indicam estas diversificações.

A empresa Irmão Krieger foi precursora na diversificação das atividades. Além da alfaiataria, possuía também uma camisaria e produzia pijamas masculinos. Mais tarde, já no final da década de

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1970, abandonou aos poucos as primeiras atividades, passando a produzir calças jeans, percebendo que as tradicionais calças de tergal foram perdendo espaço entre os jovens e que o uso do jeans tinha uma grande aceitação entre os mesmos pela sua facilidade de uso, conforto e praticidade. Desta forma, sempre atento as demandas do mercado, a Krieger pode manter a sessão de alfaiataria enquanto outras sustentavam os negócios e mantinham a marca no mercado.

Harry Laube, após trabalhar na empresa Irmão Krieger, passa a ter sua própria alfaiataria em 1960, montando junto à mesma uma loja que vendia, além de produtos de confecção, os mais diversos tipos de acessórios: chapéus, meias e roupas íntimas. Além disso, Harry produzia em sua alfaiataria os mais variados tipos de uniformes de trabalho: roupas para vigias, guarda-pós, uniformes para hotéis e restaurantes, uniformes para funcionários da prefeitura de Brusque e do Banco do Brasil, o que também mantinha as contas em dia e garantia a possibilidade de sustentação de uma equipe ocupada com a confecção típica dos trajes de alfaiate.

Pedro Severino, proprietário da Alfaiataria Santa Luzia, conta que desde o começo de suas atividades sempre trabalhou para o público feminino, além de atender a clientela masculina. Relata ainda que, atualmente, a metade da produção de sua alfaiataria destina-se ao público feminino, chegando por vezes a produzir mais para estas do que para os fregueses masculinos, fazendo, portanto, que o savoir-faire dominado pudesse atender uma clientela que o alimentaria através de seus pedidos de vestidos de festas e para ocasiões especiais.

Valmir Pruner, proprietário da Alfaiataria Pruner desde final da década de 1960, também viu na diversificação dos serviços uma forma de garantir a continuidade dos negócios. Ele oferecia diversos serviços de reformas, setor gerenciado pelo filho Marcelo,

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executando trabalhos tanto em roupas sociais como em peças de jeans. Confeccionou também calças em jeans e sarja, geralmente para clientes que não encontram numeração disponíveis nas lojas, ou seja, investiu numa clientela que carecia de seus conhecimentos e que, fielmente, mantinha seu trabalho e ateliê em dia.

Carlito Wippel, único alfaiate que continua trabalhando em Guabiruba, ensinou o ofício à esposa que costurava para as confecções de Brusque. Atualmente a mesma trabalha com costura sob medida para mulheres, enquanto o marido continua com os serviços na alfaiataria, fazendo com que haja o atendimento das necessidades de toda a família, a preços compatíveis com esta clientela e serviços adequados aos seus gostos e usos.

Estes exemplos colhidos nos depoimentos destes profissionais demonstram que a diversificação das atividades na alfaiataria e a incorporação de algumas técnicas de produção, oriundas da industrialização, tornaram o ofício ainda viável comercialmente nos dias atuais.

Todavia, a difusão e a melhoria da qualidade das roupas produzidas industrialmente, aliada ao surgimento da cultura juvenil, ao poder de compras dos grupos urbanos após a segunda guerra mundial e à cultura do consumo consagrada no mundo contemporâneo, modificaram totalmente os padrões de produção e consumo de moda. Assim surgiu a partir das últimas décadas do século XX, uma nova cultura, mais preocupada com a originalidade, a espontaneidade criativa e o impacto imediato do que com a perfeição (LIPOVETSKY, 1989, p. 115). Os alfaiates atrelados à forma artesanal de trabalho precisaram compreender e assimilar não só as novas técnicas de manufatura, mas compreender as mudanças e os novos gostos do mercado consumidor para sobreviver nesta nova dinâmica do sistema de moda.

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Neste contexto, podemos citar a frase dita por Yves Saint Laurent ao inaugurar a primeira boutique de prêt-à-porter em Paris, em 1966: “Não fui eu quem mudou, foi o mundo. E este mudará sempre, e nós estamos eternamente condenados a adaptar nossas maneiras de vestir, sentir e julgar” (In: VINCENT-RICARD, 1989, p. 70)

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Entrevistas:

BATISTOTTI, José. Entrevista concedida a Renato Riffel. Brusque, 2003.

FISCHER, Ivo. Entrevista concedida a Renato Riffel.. Guabiruba, 2003.

LAUBE, Harry. Entrevista cedida a Renato Riffel. Brusque, 2003.

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Renato Riffel e Mara Rúbia Sant’Anna-Muller

PRUNER, Valmir. Entrevista concedida a Renato Riffel.. Brusque, 2003.

MELLO, Davino Ferreira de. Entrevista concedida a Renato Riffel.. Brusque, 2003.

SEVERINO, Pedro. Entrevista concedida a Renato Riffel.. Brusque, 2003.

WIPPEL, Carlito. Entrevista concedida a Renato Riffel.. Guabiruba, 2003.

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José Alfredo Beirão Filho

Capítulo II

Modateca Digital – Um Sistema de Informação

José Alfredo Beirão Filho1

2.1 Introdução

Na atual sociedade da informação, onde as pessoas aproveitam as vantagens das tecnologias em todos os aspectos de suas vidas, a busca de novas alternativas de ensino que transformem os ambientes educacionais em espaços que contribuam para formar pessoas, ao invés de simplesmente instruí-las, tem sido o desafio de educadores sintonizados com os contextos modernos de educação, em especial os que contemplam o acesso ao conhecimento, com base na transmissão de conteúdos acadêmicos associados às experiências e práticas sociais e culturais do aluno.

Nesta perspectiva de ensino e aprendizagem insere-se também a tecnologia computacional, uma vez que se propõe a aumentar a capacidade de criar, de produzir e de reproduzir o conhecimento humano.

HISTÓRIA

1 Doutorando em Engenharia da Produção – UFSC. Professor efetivo do Departamento de Moda – UDESC. [email protected]

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Esses pressupostos embasam a implantação de um sistema digital de informação, como subsídio às áreas de comunicação, cultura e artes, a partir do acervo de moda e vestuário existente no Centro de Artes, da Universidade do Estado de Santa Catarina. Atualmente estruturado como um sistema manual de informações, este acervo, decorrente de projetos de pesquisa e incorporado ao Programa de Extensão Modateca, possui mais de cinco mil peças, o que torna o espaço físico, onde está abrigado, inviável para pesquisa presencial, além de que os objetos, por estarem acondicionados e armazenados na reserva técnica, não podem ser visualizados, fato que restringe e limita o seu acesso por parte de usuários.

2.2. Modateca: sistema manual de informações

A falta de uma memória cultural têxtil nas instituições museológicas – aliada à formação de acervos que privilegiavam apenas os valores sociais da roupa, em detrimento de suas características técnicas e estéticas – tem interferido diretamente na forma como hoje a história do vestuário de moda é estudada e, até mesmo como um artefato têxtil é tratado, pois esses fatores têm sido limitantes à produção de conhecimento novo e à construção do futuro.

Com vistas a equacionar essas carências o Curso de Bacharelado em Moda, do Centro de Artes, da Universidade do Estado de Santa Catarina, com apoio do corpo docente, discente e comunidade, deu início à implantação de um espaço de memória que teve sua origem, a partir do projeto de pesquisa “Modateca: espaço para preservação de moda e de vestuário”, deste pesquisador.

Integrada ao Departamento de Moda, a Modateca tem por objetivo contribuir para a formação de uma memória cultural têxtil em Santa Catarina, bem como disponibilizar à comunidade interna

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José Alfredo Beirão Filho

e externa do Centro de Artes, um espaço para pesquisa de moda e do vestuário, através das ações de reunir acervo da cultura material relativa à moda e ao vestuário; organizar a legislação pertinente à área têxtil e do vestuário; subsidiar as atividades de ensino, pesquisa e extensão; criar um Banco de dados com a produção científica do Curso de Moda; desenvolver ações necessárias à realização do processamento técnico do acervo; aplicar as técnicas e tratamentos de conservação visando à integridade física e funcional dos objetos, além de expor, propor e mostrar o acervo.

Após a instalação da Modateca no Centro de Artes, em uma sala de aproximadamente 40 metros quadrados, com piso em madeira, no espaço central do piso superior do prédio - com uma única parede externa, onde estão localizadas duas janelas - as primeiras providências tomadas foram de adequação do mobiliário ao espaço físico e à preservação do acervo. O mobiliário e equipamento constituem-se de: araras de chão, araras de parede, estantes metálicas, estantes revestidas com fórmica embutidas na parede, módulos em acrílico para exposição, mesas com tampo em madeira e pés de ferro, cadeiras giratórias, cadeiras comuns, armários, ar condicionado, ventiladores de teto, máquina de costura tipo doméstica, biombo, manequins femininos meio corpo para modelagem, manequins masculinos e femininos para exposição, manequins femininos em escala um por dois, câmera fotográfica digital, computadores ligados em rede com os demais setores da universidade e acesso à internet, impressora e scanner.

2.2.1 Formação do acervo

O acervo da Modateca se constitui de trajes de antigas modistas, costureiras, chapeleiras, bordadeiras, como Maria Neves, Galdino Lenzi, Nilma Vieira, Érica Wiese Thiensen, Cotinha, Gesony

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Pawlick, Ninita Muniz (catarinenses), mas também peças de Mary Steigleder, Rui Spohr, João Goldman, Denner, Reinaldo Lourenço, Valentino Garavani, Hubert de Givenchy, Christian Dior, que pertenceram na maioria, a pessoas que moram em Santa Catarina. Compõe ainda o acervo: resultado de pesquisas, livros, revistas, anais, periódicos, catálogos, fotografias, fitas de vídeos e CDs, acessórios de moda como chapéus, luvas, jóias, calçados, bolsas, bijuterias de diferentes épocas e estilos, bem como o material produzido pelo Curso de Moda. A pesquisa referente ao acervo vem sendo feita, pelos alunos e professores na disciplina de História da Moda e a coleta dos elementos da cultura material, através de campanhas de doação, custódia e reprodução, no caso de não conseguir a doação do original.

Considerando que os objetos estavam depositados na Modateca sem nenhum critério de organização, as ações subseqüentes à adequação do espaço foram a separação dos materiais por tipificação – roupas, calçados, bolsas, chapéus, objetos de adorno - e a realização de um diagnóstico, para apurar seu estado de conservação. Os objetos suspeitos de comprometimento de sua integridade física e/ou infestados foram isolados e os demais acondicionados em cabides e organizados nas araras para facilitar o processo de identificação.

2.2.2 Tratamentos aplicados ao acervo

Identificado com o maior número possível de informações transcritas diretamente na ficha de entrada – contendo data de entrada, lugar de origem, época, estilo, dimensões, proprietário, doador, técnica, material, histórico, forma de aquisição, - o objeto recebeu um número e foi registrado no livro tombo, onde consta apenas a data de entrada, o modo de aquisição, o estado de conservação e uma descrição sucinta. Em paralelo foi preenchida e

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afixada imediatamente no objeto, a ficha de identificação contendo o número de registro, data de entrada e descrição. No caso de um traje com duas ou mais peças, cada peça foi considerada um objeto e recebeu um número de registro. No caso de objetos pares, sapatos, brincos ou outros objetos que não podem ser usados em separado como, por exemplo, um vestido cujo cinto é do mesmo tecido, ambos receberam o mesmo número, sendo o segundo, acrescido da letra “a” e assim sucessivamente. A partir dessa identificação inicial, o objeto foi fotografado nas posições frente e costas. No caso de traje que contém mais de uma peça, primeiramente foi fotografado o conjunto todo, frente e costas e após, as peças uma a uma.

Fotografado o objeto, a etapa seguinte foi a elaboração da Ficha de Registro que contém todas as informações obtidas na identificação, o número de registro, número da página do livro tombo e a fotografia. Após o registro foi afixada a etiqueta definitiva de numeração no objeto e tratou-se de elaborar os seguintes documentos: Termo de Doação e Recibo de Doação ou Termo de Custódia, no caso dos objetos que permanecerão por um determinado tempo na Modateca e depois serão devolvidos a seu dono.

A catalogação – cuja ficha foi elaborada em três vias para compor os catálogos que permitirão a busca do objeto de três formas: por categoria, por número de registro e pela localização espacial - foi feita com base no Thesaurus para Acervos Museológicos, cujo sistema classificatório consiste em três níveis básicos de terminologia, hierarquicamente relacionados: classe, subclasse e uma lista aberta de termos, ou nomes de objetos. As classes consideram o universo dos objetos; as subclasses são subdivisões das classes principais, onde os objetos estão reunidos de acordo com sua função e, os termos designam objetos específicos. (FERREZ, 1987).

Com os objetos registrados pôde-se fazer um novo diagnóstico do seu estado de conservação e os que apresentavam

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comprometimento de sua integridade física e/ou funcional foram encaminhados para receber os tratamentos de conservação. Constatou-se que nenhuma das peças requeria o tratamento de desinfestação, uma vez que os maiores comprometimentos exigiam apenas a aplicação dos tratamentos de higienização - eliminação de sujidades generalizadas, extrínsecas ao objeto, a ser realizada por meio de limpeza a seco ou aquosa; reestruturação, consiste em repor partes faltantes, por meio de costuras, consolidações e tecimento; e, acondicionamento que se refere à confecção de embalagens adequadas para guarda, transporte e exposição dos objetos .

2.2.3 Comunicação do acervo

Devidamente tratado e armazenado, o acervo foi disponibilizado à comunidade através de: consulta direta; empréstimo para composição de catálogos, banners; empréstimo para aulas de fotografia e de preservação têxtil; exposições temáticas no próprio espaço da Modateca; nos espaços internos do Centro de Artes e em eventos dos quais participou o Curso de Moda.

Nesse contexto, a Modateca se constitui num sistema manual de informações, por abrigar fontes primárias de pesquisa; recursos didático-pedagógicos utilizados pelas disciplinas do curso de Moda - para: verificar os tipos de costura e acabamentos utilizados nas roupas; aviamentos; modelagem e interpretação de modelos; desenho de observação de sapatos, bolsas, bijuterias; desenho artístico e técnico de moda; aplicabilidade dos tecidos mais adequados aos modelos propostos; comprovar as tendências e informações de moda; ilustrar e comprovar fatos históricos, comportamentos, diversidades culturais e desenvolver práticas de conservação têxtil.

Com o crescimento do acervo – atualmente com mais de cinco mil peças - o espaço físico comporta apenas a documentação, o

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armazenamento e a consulta presencial de um número bem restrito de usuários, sendo as demais atividades executadas em espaços como: Laboratório Têxtil, higienização e hidratação; Laboratório Experimental de Confecções, reestruturação; Laboratório de Modelagem e Oficina de Madeira, embalagens para acondicionamento. Isso leva a busca de alternativas para salvaguardar e comunicar o acervo.

2.3 Arquitetura da Informação, Card Sorting e Mapas Conceituais

Na sociedade contemporânea, as informações se propagam com tanta velocidade e agilidade que o ser humano, na maioria das vezes, sequer consegue assimilá-las. Mistura-se a quantidade à ausência de qualidade, sem proveito concreto para o usuário, em termos de conhecimento construído, porque o excesso o deixa vulnerável aos erros de sua percepção. Atualmente, é através da Arquitetura da Informação - desenho de uma interface, incluindo todos seus fluxos de navegação e estruturação de conteúdo - que serão satisfeitas as necessidades dos usuários, isso porque a organização visual das informações, permite o seu entendimento com facilidade. Algumas técnicas facilitam a organização da informação para fins didáticos, como é o caso do método Card Sorting e dos Mapas Conceituais que têm esse perfil, ou seja, possuem a particularidade de organizar bem a informação

2.3.1 Arquitetura da Informação

Richard Saul Wurman, arquiteto e especialista em design gráfico, criou o termo Arquitetura da Informação, em meados dos anos de 1960, para designar a profissão emergente do século XXI

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que envolve a análise, o design e a implementação de espaços informacionais, como sites, bancos de dados, bibliotecas.

No final dos anos de 1990, Lou Rosenfeld e Peter Morville autores do livro Information Achitecture for the World Wide Web, introduziram a Arquitetura da Informação no design de websites, mantendo o mesmo princípio de Wurman: criar as estruturas de organização da informação de um website, para que o usuário consiga compreendê-lo com facilidade.

Segundo West (2001), apud Guillermo Reis (2006) “[...] Arquitetura de Informação é a prática de projetar a infra-estrutura de um website, especialmente a sua navegação”. Neste sentido, Shiple (2001), apud Guillermo reis (2006) afirma que “[...] Arquitetura de Informação é a fundação para um ótimo web design [...]”, porque é a estrutura que vai atender as necessidades de informação dos usuários de um website, sobre o qual vários aspectos serão construídos como forma, função, interface, design visual, entre outros.

Assim, a Arquitetura da Informação tem como meta a organização do conteúdo e a estruturação da navegação de um sistema proposto, com a definição e a classificação da informação, para que o usuário possa encontrá-la e utilizá-la com maior facilidade. Quanto mais fácil o acesso à informação, mais útil o website se torna ao usuário. Para o arquiteto da informação cabem as seguintes tarefas: organizar as tendências inerentes aos dados, tornando o complexo claro; criar a estrutura ou mapa de informações que permite às outras pessoas encontrarem seus próprios caminhos para o conhecimento e dedicarem-se às necessidades exigidas pelo momento. Para isso, precisa focar a clareza, o entendimento humano e a ciência da organização de informação.

A realização de um bom trabalho está condicionada ao conhecimento do perfil dos usuários, ao entendimento dos objetivos,

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às restrições da empresa para a qual o profissional presta serviço, bem como ao conhecimento do conteúdo que será apresentado (volume, formato, estrutura, etc.). Esta tríade - usuário, empresa e conteúdo - e suas interdependências são únicas para cada website, e segundo Rosenfeld e Morville (2002), o papel do arquiteto é justamente balanceá-las, para que a informação certa seja acessada pela pessoa certa na hora certa.

Rosenfeld e Morville (2002) dividem a Arquitetura da Informação de um website em quatro sistemas, cada um composto de regras e aplicações: sistema de organização que define a classificação de todo o conteúdo; sistema de labelling que estabelece a forma de apresentação e representação da informação, definindo rótulos para cada elemento informativo; sistema de navegação, pertinente a cada maneira de navegar, de se mover pelo espaço informacional e, sistema de busca que determina as perguntas que o usuário pode fazer e o conjunto de respostas que pode obter.

2.3.2 Card Sorting

O Card Sorting é um método hábil para identificar a estrutura ou arquitetura de informação de uma lista não ordenada de idéias ou itens. Neste método, cada idéia ou item é escrito em um cartão e, posteriormente, o conjunto de cartões é submetido a usuários, para que os ordenem por grupo. No caso de o grupo representar a população alvo, os resultados do Card Sorting podem ser usados para definir a estrutura de navegação do website, porque é essa estrutura que os usuários esperam encontrar, quando tais idéias ou itens lhes forem apresentados.

Para Ulbricht (2004) este é o método mais adequado para pesquisar o modelo mental dos usuários - verificar como eles vêem a informação e onde cada item deve ser colocado – por ser de baixo

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custo financeiro, fácil de usar, rapidamente aplicável, envolver os participantes no processo de projeto e demonstrar que o novo sistema será criado de acordo com as necessidades dos usuários.

Nesse sentido, como método de usabilidade rápido e eficaz, o Card Sorting permite: descobrir como o usuário organiza e classifica as informações em sua mente, possibilitando que sejam criadas estruturas de organização de informação otimizadas e mais adequadas ao seu modelo mental; avaliar a qualidade da atual arquitetura de informação e de suas categorias; perceber como usuários novos e experientes podem acessar um dado conteúdo e, como diferentes populações-alvo nomeiam as categorias de primeiro nível; identificar os itens que são difíceis de categorizar, os que possam pertencer a mais de um grupo e as terminologias mal interpretadas.

Quanto às etapas de análise, o Card Sorting pode ser aplicado no início da fase da Arquitetura de Informação do projeto, para identificar como os usuários agrupam as informações e levantar novas sugestões de conteúdo, quanto no final, com o objetivo de validar uma arquitetura proposta. Em ambos os casos podem ser abertos ou fechados, ou seja, permitir ou não que os usuário proponham novos conteúdos.

2.3.3 Mapas Conceituais

Entende-se por Mapas Conceituais, as representações gráficas semelhantes a diagramas que indicam relações entre conceitos ligados por palavras, para organizar e representar o conhecimento e servem como instrumento para facilitar o aprendizado do conteúdo sistematizado em conteúdo significativo para o aprendiz. Esta abordagem está embasada em uma teoria construtivista, na qual o indivíduo constrói seu conhecimento

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e significados a partir da sua predisposição para realizar esta construção (AUSUBEL, 2003).

Desenvolvidas por Joseph Novak em 1977, estas representações gráficas assemelham-se a diagramas em um domínio específico de conhecimento, usados para esclarecer ou descrever as idéias que as pessoas têm sobre um determinado assunto. O mapa conceitual foi originalmente baseado na teoria da aprendizagem significativa de David Ausubel, para quem a aprendizagem só é significativa quando uma nova informação adquire significado para o aprendiz, através de uma espécie de ‘ancoragem’ em aspectos relevantes da estrutura cognitiva, preexistente do indivíduo. Na aprendizagem significativa há uma interação entre o novo conhecimento e o já existente, na qual ambos se modificam. À medida que o conhecimento prévio serve de base para a atribuição de significados à nova informação, ele também se modifica. A estrutura cognitiva está constantemente se reestruturando durante a aprendizagem significativa. Por isso, o processo é dinâmico; o conhecimento vai sendo construído. Por ser uma técnica muito flexível, o mapeamento conceitual, pode ser usado em diversas situações, para diferentes finalidades: instrumento de análise do currículo, técnica didática, recurso de aprendizagem, meio de avaliação (MOREIRA; BUCHWEITZ, 1993).

Assim, Mapas Conceituais representam conceitos e suas ligações (relacionamentos) em forma de mapa, onde os nós são os conceitos e os links entre dois nós, os relacionamentos entre os conceitos. Podem seguir um modelo hierárquico no qual conceitos mais inclusivos estão no topo da hierarquia (parte superior do mapa) e conceitos específicos, pouco abrangentes, estão na base (parte inferior). Mas esse é apenas um modelo, porque mapas conceituais não precisam necessariamente ter este tipo de hierarquia. Por outro lado, sempre deve ficar claro no mapa quais os conceitos contextualmente mais importantes e quais os secundários ou específicos. Embora

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normalmente tenham uma organização hierárquica e, muitas vezes, incluam setas, tais diagramas não devem ser confundidos com organogramas ou diagramas de fluxo, pois não implicam seqüência, temporalidade ou direcionalidade, nem hierarquias organizacionais ou de poder (MOREIRA; BUCHWEITZ, 1993).

2.4. Modateca Virtual

Implantada a partir das necessidades didático-pedagógicas do Curso de Moda, por iniciativa de professores, técnicos e alunos, e com recursos alocados em projetos de extensão da Universidade que é mantida pelo Governo do Estado de Santa Catarina, a Modateca , como sistema manual de informações já não atende as necessidades da sua comunidade usuária. Com vistas a ampliar as possibilidades de acesso ao acervo, a um número ilimitado de usuários, há que se estruturar sistemas computacionais para organização visual destas informações de forma lógica, incluindo todos seus fluxos de navegação.

Figura 1: Modelo de Mapa Conceitual para criação da Modateca Virtual

Fonte do autor.

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Em vista disso, para atender essa demanda, propõe-se criação de uma Modateca Virtual, baseada numa estrutura organizacional definida através de um Mapa Conceitual, onde células constituirão a formatação do espaço virtual, com informações obtidas através da técnica do card sorting, conforme ilustra a figura 1.

Os procedimentos metodológicos para implantar a Modateca digital, como subsídios às atividades, nas áreas de comunicação, cultura e artes serão:

a) Construção do sistema digital de informação será embasado na Arquitetura de Informação, incluindo todos seus fluxos de navegação e estruturação de conteúdo;

b) Produção de imagens será feita com câmara digital e as peças de roupas serão vestidas em manequins de exposição e os acessórios, em displays apropriados;

c) Digitalização de imagens, todas as peças do acervo fotografadas serão digitalizadas, para compor o acervo digital;

d) Digitação das fichas de registro, com todas as informações pertinentes a cada objeto, como: data de entrada, lugar de origem, época, estilo, dimensões, proprietário, doador e outros antecedentes será feita junto da imagem, compondo uma ficha de registro digital;

e) Inserção das informações no sistema de pesquisa através das fichas de registro digital;

f) Criação de circuitos expositivos temáticos virtuais, tendo em vista que este espaço não tem o seu correspondente no mundo real, porém as imagens que comporão o discurso expositivo serão digitais, extraídas do banco de dados da Modateca, ou de outras instituições ou pessoas interessadas.

Como sistema digital de informações, a Modateca Virtual permitirá que usuários de locais diversos acessem as informações do acervo, através de um microcomputador. Isso soluciona o problema de espaço físico, uma vez que requer apenas uma área de reserva

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técnica para manutenção e guarda do acervo e uma sala de pesquisa; otimiza a busca do objeto real nas instalações da Modateca, dispensa um espaço físico para exposições permanentes, além de oferecer a possibilidade de a rede de conhecimento ser ampliada a todo momento, na medida em que alunos e professores passem a conhecer mais o acervo.

2.5 Considerações finais

A proposta de implantar um sistema digital de informações, para comunicar o acervo da Modateca do Centro de Artes, adquire sentido, ao proporcionar modernização na área de ensino técnico-artístico e de divulgação e exposição de bens culturais, na forma de produtos manufaturados, ligados ao uso pessoal e à vida privada. Ampliar as oportunidades de pesquisa, para as áreas de comunicação, cultura e artes, permitindo o acesso a um número ilimitado de usuários, independente de sua localização espacial. Provocar reflexão crítica sobre objetos e linguagens gerados por meios tecnológicos e artísticos, além de compreender a materialidade e a visualidade em seus aspectos semióticos e estéticos, educacionais, históricos, sociológicos, morfológicos e no campo da subjetividade, onde se insere a moda que tem como objeto de estudo a aparência, materializada através do vestuário.

Referências bibliográficas

AGNER, L.; SILVA, F. Uma introdução à disciplina de Arquitetura de Informação: conceitos e discussões. In: Anais do 2º Congresso Internacional de Pesquisa em Design. Rio de Janeiro: ANPED, out. 2003.

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AUSUBEL, D.P. Aquisição e retenção de conhecimentos: uma perspectiva cognitiva. Lisboa: Kluwer Academic Publishers, 2003.

FERREZ, Helena Dodd. Thesaurus para acervos museológicos. Rio de Janeiro: Fundação Nacional Pró-Memória, 1987, 2 v.

MOREIRA, M.A.; BUCHWEITZ, B. Novas estratégias de ensino e aprendizagem: os mapas conceituais e o Vê epistemológico. Lisboa: Edições Técnicas. 1993.

NOVAK, J. D. A Theory of education. Ithaca, N.Y., Cornell: University Press, 1977.

ULBRICHT, V.R. Conceitos, Definições e Metodologia para Desenvolvimento de Ambientes Hipermidiáticos. Fpolis, 2004.

REIS, Guillermo. O que é arquitetura de informação em websites. 2006. Disponível em: http://www.fiec.org.br/jforum/posts/list/137.page Acesso em jun/08.

ROSENFELD, L. & MORVILLE, P. Information Architecture for the Word Wide Web. 2ed. Sebastopol: O’Reilly, 2002.

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Capítulo III

Personagens e Inovação no Cenário do Curso de Moda da Universidade do Estado de Santa Catarina

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3. A História

Trabalhar com Moda é participar, hoje, de um universo de ampla repercussão cultural, social, tecnológica e econômica, onde as oportunidades profissionais não só existem como crescem a cada dia, num mercado em expansão, com um processo diversificado e complexo que necessita diversos tipos de profissionais.

O contexto da moda não se restringe mais aos domínios locais ou nacionais. A moda precisa ser vista como um empreendimento global, numa linguagem internacional, que supera as fronteiras étnicas e de classes. Hoje, as confecções não têm mais linhas de produção extremamente centralizadas, podendo estar espalhadas por diversas localidades onde os custos operacionais, técnicos e de estocagem são menores.

HISTÓRIA

1 Mestre em Educação Estética pela Pontifica Universidade Católica do Rio Grande do Sul – PUC/RS. [email protected]

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Os anos 80 foram de muito desenvolvimento para as indústrias têxteis da Grande Florianópolis (...), porém, as pessoas que trabalhavam nas empresas não possuíam qualificação na área de moda e as indústrias do vestuário da região tinham dificuldade em encontrar profissionais qualificados para trabalhar com criação, modelagem e gerenciamento de produto; as empresas produziam de acordo com a intuição e o gosto pessoal do empresário, sem pesquisas específicas na área de moda. (OVERRATH: 2002, p. 29).

Até pouco tempo atrás, as empresas de Santa Catarina buscavam em São Paulo conhecimento, técnicas inovadoras e produtos para suprir as necessidades de produção de suas indústrias, não levando em consideração as características regionais dos consumidores. Contratavam designers de moda do vestuário de outros estados e até mesmo do exterior, que tinham pouco ou nenhum conhecimento do consumidor da região.

Foi com a necessidade de profissionalismo num mercado latente, com possibilidades futuras e imediatas que, em 1991, foi idealizado o Bacharelado em Moda da Universidade do Estado de Santa Catarina - UDESC. Nessa data, a moda já representava índices consideráveis quanto à geração de empregos, arrecadação de tributos e exportação de produtos, mas o mercado editorial brasileiro ainda não acreditava que este filão pudesse realmente despontar: o preconceito ainda cercava os que se aventuravam a se matricular em um Curso de Moda.

À época, os cursos em nível superior na área de moda estavam localizados: 3 em São Paulo, 1 no Rio Grande do Sul, 1 no Ceará e 1 no Rio de Janeiro. A UDESC considerou pouco viável, em termos de custos, trazer professores de outras

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localidades para lecionar em Florianópolis. A alternativa foi oferecer um curso de pós-graduação, em nível de especialização (lato-sensu), voltado para as áreas de desenho industrial e moda. (CLASEN: 2005, p. 45).

Com um setor em pleno desenvolvimento era necessário, urgentemente, formar profissionais qualificados para o mercado. A ex-presidente da Assinvest, Ninita Daura Muniz, com o aval da sua diretoria, idealizou o Curso de Graduação em Moda e interferiu junto ao Governo do Estado para estudar a proposta de implantação na Universidade do Estado de Santa Catarina – UDESC. Rogério Brás era o reitor na época e deu início aos trâmites burocráticos, encaminhando a proposta ao Centro de Artes da instituição. Coube às professoras Vera Collaço (diretora geral) e Sandra Makowieky, (diretora de ensino) darem os primeiros traços para a Criação do Curso de Bacharelado em Moda – Habilitação em Estilismo.

Iniciativas de tal porte, levadas por uma necessidade de institucionalização do setor, foram acompanhadas por um considerável crescimento do número de empresas nos primeiros anos. Estudo do Instituto de Planejamento Urbano de Florianópolis, realizado no final da década de 80, apontou que em apenas três anos 510 empresas de vestuário instalaram-se na região, gerando 7.260 novos empregos.

A implantação do pólo confeccionista da Grande Florianópolis ensejava a necessidade de profissionais para desenvolverem tarefas no processo produtivo, especialmente nas etapas de criação e modelagem. (CLASEN: 2005, p. 45).

Para que o Curso de Moda fosse colocado em prática, eram necessários professores pós-graduados para a docência imediata e o caminho possível foi vincular o Curso de Especialização em Desenho

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Industrial: Estilismo e Modelagem à graduação em Desenho. As aulas, em nível de Especialização, aconteceram no período entre 3 de setembro de 1991 a 24 de setembro de 2002. Foi o primeiro Curso de Pós-Graduação em Moda do Brasil, sendo que a turma era formada por alguns associados da Assinvest. Foram contratados consultores externos de São Paulo para organizar as disciplinas específicas do currículo do Curso, tendo como modelo as Universidades de São Paulo.

As atividades do Curso de Bacharelado em Moda – Habilitação em Estilismo iniciaram em 1996, enfrentando inúmeras resistências. Atualmente, com 10 anos de muito trabalho e conquistas, o Curso está entre os melhores do país.

No início das atividades, as salas de aula ficavam dispostas no prédio cedido pela Prefeitura Municipal de São José, em Campinas, e as aulas aconteciam à noite. O local foi escolhido em São José pelo fato do município concentrar grande número de confecções, e imaginando-se, na época, que a maioria dos alunos pudessem ser empregados nas empresas do setor.

A primeira turma foi formada por alunos que provinham do segundo grau de ensino. Já a partir do segundo ano, o vestibular vocacionado atraiu profissionais dos setores interessados em aperfeiçoar seus conhecimentos:

Várias alunas, que ingressaram por meio dos três primeiros vestibulares, associavam as disciplinas do curso à carreira de modelo ou ao frisson da moda. A partir da adoção da prova prática no vestibular vocacionado foi possível promover o fortalecimento do ingresso de alunos, mais direcionado à temática do curso. (MARTENDAL: 2005, p.30)

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O Curso de Bacharelado em Moda – Habilitação em Estilismo, da Universidade do Estado de Santa Catarina, foi concebido com a intenção de inovar o conhecimento e a desenvolver competências nas áreas de criação do produto de moda, abrangendo também a cadeia têxtil.

A moda, interagindo com diversas áreas de conhecimento em seus diferentes contextos, ampliou as possibilidades de articulação com a pesquisa científica e a extensão universitária, proporcionando aos alunos e aos professores da UDESC oportunidades de vivenciarem experiências de produção científica.

A prática pedagógica do Curso firma-se na utilização de métodos, técnicas e processos para estimular a criatividade através da sensibilização e de articulação das funções psicológicas superiores, como a percepção da realidade, a memória, as diversas linguagens, a criatividade e ainda as diversas técnicas de confecção e pesquisa, compondo o processo intelectual inovador. Para esta aprendizagem concorrem disciplinas de Desenho, Laboratório de Criatividade, Oficina de Estilo, Desenho Têxtil, Pesquisa e Criação de Moda e Expressão Visual da Moda, na estimulação da criatividade e sensibilidade expressiva.

O currículo abrange também campos essenciais das Ciências Humanas para a formação do indivíduo com o suporte teórico das disciplinas, como a Iniciação ao Sistema de Moda, Sociologia da Moda, História da Moda, Psicologia da Moda, Antropologia da Indumentária, Folclore Brasileiro e Indumentária Brasileira.

A abrangência da Moda tem exigências específicas nesta profissão e as demais disciplinas do Curso promovem a constituição de suas competências através das disciplinas de Tecnologia Têxtil, Modelagem do Vestuário, Atelier Experimental de Confecção, Aviamentos, Acessórios e Complementos de Moda e

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Operacionalização da Produção. As disciplinas específicas habilitam o aluno à identificação de matérias-primas, conhecimento teórico e prático das etapas dos processos produtivos e tecnológicos, nas áreas têxteis e de confecção.

As disciplinas de Modelagem e Atelier Experimental de Confecção proporcionam prática da montagem das peças do vestuário e visão do setor produtivo, sendo possível projetar produtos viáveis na produção e comercialização das peças de vestuário.

Abrangendo também conhecimentos na prospecção do mercado da moda, setor que exige profissionais com habilidade, agilidade e rapidez na tomada de decisões2, o Curso apresenta as disciplinas de Marketing Têxtil e de Confecção, Pesquisa e Criação de Moda e Introdução à Administração.

A interdisciplinaridade3 e a transdisciplinaridade4 tecem a articulação do conhecimento, possibilitando o envolvimento dos discentes e docentes, em estudos integrados, através da Metodologia da Pesquisa de Moda e Projeto de Coleção, Comunicação de Moda e Produção de Moda, envolvendo a definição de objetivos, técnicas de coleta de dados, materiais e acessórios, comunicação visual, conteúdo editorial e apresentação da coleção final em desfile, com a produção dos acadêmicos.

O trânsito das disciplinas perpassa as teorias e práticas diversas e chegam à gestão, na condução do aluno através de um processo de pesquisa, criação e elaboração do projeto de planejamento da coleção do vestuário de moda numa visão sistêmica, combinando materiais, processos de fabricação, aspectos ergonômicos,

2 Por ser uma área inteiramente dinâmica na atualização das tendências.3 A Interdisciplinaridade propicia a aproximação entre disciplinas de áreas diferentes.4 A Transdisciplinaridade promove pontes de conhecimentos que permitem o trânsito entre as disciplinas, formando mapas cognitivos inusitados no processo criativo.

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psicológicos, sociológicos e culturais do produto, chegando ao Trabalho de Conclusão de Curso, com tema proposto pelo aluno.

Esta proposição de ensino e da aprendizagem provoca a formação de profissionais que se apropriam das habilidades e competências necessárias para a sua formação intelectual e profissional. O Curso de Moda da UDESC propõe orientação constante e diversa ao aluno, estimulando a imaginação e a criatividade em bases sólidas de técnicas e execução na profissão.

Muitos são os eventos e concursos que os alunos, professores e coordenação participam, inclusive com premiações importantes que confirmam o excelente trabalho desenvolvido no Curso.

3.1 A Modateca

No primeiro semestre de 2003, o Curso de Moda da Universidade do Estado de Santa Catarina – UDESC deu vida a um desafiador Projeto de Pesquisa que propunha a preservação de moda e de vestuário em um espaço chamado Modateca. Tal desafio, iniciado pelos professores José Alfredo Beirão Filho e Marlene Torrinelli, tinha por objetivo contribuir para a formação da memória têxtil em Santa Catarina, disponibilizando um espaço precioso de pesquisa de moda e do vestuário à comunidade interna da UDESC e externa. Auxiliados por alunos do Curso de Moda, foram desenvolvidas técnicas de restauração e conservação do acervo composto por doações.

No início, contavam com apenas uma sala de aproximadamente 20 metros quadrados, no prédio da administração do Centro de Artes. Alguns objetos faziam parte deste cenário, como duas araras, um armário, uma mesa, duas cadeiras e poucas peças de roupas que tinham sido doadas pela comunidade. Na mesma época, o registro de depoimentos, catalogação de materiais fotográficos

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e recuperação do acervo de estilistas permitiram a homenagem feita à Galdino Lenzi: o projeto de extensão “Integrando Passado e Presente da Moda em Santa Catarina”, que homenageava os 50 anos de atividades do estilista catarinense, no Centro Integrado de Cultura. O evento proporcionou à Modateca da UDESC a ampliação considerável de seu acervo, obrigando a transferência da sua sede para um espaço maior.

Já no piso superior do Departamento de Artes Cênicas, a Modateca continuou a receber diversas peças de moda e vestuário, como trajes de diversas décadas, coleções de antigas modistas, costureiras, plissadeiras, chapeleiras, bordadeiras, materiais de pesquisa, catálogos, revistas, periódicos, livros, fotografias, fitas de vídeo e CDs, cadernos de tendências e acessórios de moda variados de diferentes épocas e de diversas comunidades do Estado de Santa Catarina.

Além dos belíssimos trajes de Galdino Lenzi, a Modateca recebeu trajes importantes dos anos de 1960, confeccionados pela modista Maria Neves, do Sul do Estado. Peças de outros estilistas também marcam presença como: Olga Mafra (1950 – Florianópolis), Dorotéia Couto, Ninita Muniz, José Gomes, Érica Wise Thiesen, Gesony Pawlick e Nilma Vieira.

Profissionais de destaque como Christian Dior, Hubert Givanchy, Valentino, Paco Rabanne, Jean Paul Gaultier, Denner Pamplona de Abreu, Rui Spohr, Mary Staeglaeder, João Goldmann e Reinaldo Loureiro também marcam presença no acervo.

Materiais de moda foram catalogados e, juntando-se aos já existentes, ano após ano, agregaram-se mais objetos produzidos pelos alunos do Curso de Moda da UDESC, que desde o início formou diversas turmas, participou de inúmeros eventos de moda e fez parcerias com empresas de tecidos, de calçados, de aviamentos e

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de diversos complementos de moda. Tais parcerias proporcionaram constantes doações de materiais para que os alunos do Curso pudessem desenvolver novas coleções e participar de eventos, produzindo novamente acervo para o núcleo de pesquisa.

Desde a sua idealização, a Modateca contribuiu com a preservação da memória cultural têxtil de modo inovador, privilegiando a experiência e aproximação dos alunos e professores com a indústria do setor e vice-versa. Incentivando o trabalho genuíno de pesquisa científica, promoveu a divulgação de culturas e técnicas, além de proporcionar, incessantemente, a interdisciplinaridade (entre disciplinas) e a transdisciplinaridade (pontes de conhecimentos que transitam entre disciplinas formando mapas cognitivos inusitados e promovendo a criação) com a história, a antropologia, a sociologia, o folclore, a tecnologia têxtil, a própria moda em seu aspecto mais criativo, a tecnologia da confecção e modelagem, o desenho têxtil e de moda, entre outros.

Segundo Torrinelli (2004), a Modateca atende usuários através de visitas e tem por objetivos reunir acervo da cultura material relativa à moda e ao vestuário em Santa Catarina; organizar a legislação pertinente à área têxtil e do vestuário; estimular a pesquisa e a extensão na área de moda e do vestuário; criar e alimentar banco de dados com a produção Científica do Departamento de Moda; identificar, registrar, executar o processamento técnico; aplicar tratamentos de conservação nos materiais e, ainda, disponibilizar o acesso ao acervo.

A valorização da memória cultural através da Modateca gerou a necessidade de preservação do acervo, composto de suportes frágeis e vulneráveis às condições climáticas, às agressões dos seus usuários e aos diversos processos que aceleram a deterioração, ocasionando perda irreparável de informações.

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A conservação de acervos surgiu recentemente, no século XX, como um campo de trabalho junto à restauração, com áreas de atuação que envolvem a arquitetura, as instalações, o mobiliário, entre outros, tendo a intenção de prolongar a vida dos materiais pesquisados, através de um tratamento clínico, com técnicas apropriadas e observação permanente das condições ambientais, de guarda e de manuseio. Torrinelli e Vandresen (2004, p. 85) argumentam que:

Uma das grandes dificuldades encontradas na conservação de Têxteis tem sido a falta de pesquisa e produção científica nas áreas de história da indústria têxtil e da indumentária no Brasil. Isso faz com que os objetos históricos em suporte têxtil sejam sempre abordados como arqueológicos e não como testemunhos de relações e contextos de produção.

A preservação de acervos como o da Modateca da UDESC é muito recente, se comparada ao do mobiliário, da cerâmica ou de outros objetos de arte. Até há pouco tempo, as roupas, acessórios e complementos de uso diário eram considerados comuns e cotidianos para serem destacados em uma coleção ou até mesmo estudados. Isso ocasionou a formação de acervos somente com roupas consideradas nobres, como as do clero ou as dos militares. Só a partir da década de 70 a preservação do patrimônio têxtil foi ampliada e houve interesse pelo seu estudo além das fontes bibliográficas usuais:

A análise sistemática das ações de documentar, conservar e disponibilizar o acervo, com base no referencial teórico, permite considerar a Modateca inserida nos pressupostos básicos da museologia – salvaguarda e comunicação – portanto, espaço de preservação da memória

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e do vestuário catarinense, fonte primária de pesquisa para a produção de conhecimento novo e construção do futuro.” (TORRINELLI, p. 50, 2004).

Segundo Torrinelli e Vandresen (2004), a mecânica da documentação, da conservação e da disponibilização do acesso ao acervo perpassa pela identificação, registro e catalogação do material, que é feito da seguinte forma:

3.1.1 Identificação

Busca de todas as informações possíveis sobre o objeto estudado: data de entrada, lugar de origem, época, estilo, dimensões, proprietário, doador e outros antecedentes que permitam análise estética, histórica e material.

3.1.2 Registro

Após a identificação é feito o registro fotográfico do objeto, recebendo um número que irá acompanha-lo por todo o processo. É feito o registro no livro de tombo, constando a data de entrada, modo de aquisição, estado de conservação e sinopse da descrição do objeto.

3.1.3 Ficha de Registro

Contém todas as informações obtidas durante a identificação do objeto, número de registro, página do livro tombo e fotografia.

3.1.4 Catalogação

Ato de classificar os objetos de forma científica, inserindo-os em uma ou mais categorias de um sistema de classificação de modo organizado.

As técnicas e tratamentos de conservação utilizados nos objetos recebidos no acervo da UDESC são os seguintes:

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3.1.5 Higienização

Eliminação de sujidades, externas ao objeto, como poeira, excrementos de insetos, partículas sólidas, suor e demais elementos estranhos a sua estrutura, feita através de limpeza a seco ou aquosa.

3.1.6 Desinfestação

Eliminação de macro e/ou microorganismos existentes nos materiais, requerendo o uso de câmaras de baixa temperatura ou de inseticidas.

3.1.7 Hidratação

Tratamento a úmido utilizado em materiais que apresentam vincos e amassamentos que, normalmente, são resultado de mal acondicionamento.

3.1.8 Reestruturação

Reposição das partes faltantes dos objetos.

3.1.9 Acondicionamento

Utilização de embalagens adequadas para guardar, transportar ou, ainda, expor em vitrines.

O espaço da Modateca da UDESC comporta a documentação, o armazenamento e a consulta do acervo. As demais etapas são realizadas em outros espaços:

3.1.10 Higienização e Hidratação

Laboratório Têxtil

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3.1.11 Reestruturação

Laboratório Experimental de Confecções

3.1.12 Embalagens

(Cabides, caixas, sacos em algodão cru, caixas com reforço para peças pesadas)

Oficina de Madeira

Laboratório de Modelagem

Laboratório Experimental de Confecções

3.1.13 Tratamento Gráfico de Materiais

3.1.14 Composição de Imagem

3.1.15 Gravação de CDs e Reprodução

Laboratório de Informática

Atualmente, a área física da Modateca da UDESC comporta apenas os materiais têxteis, não oferecendo condições de excelência para pesquisa no local aos usuários, devido ao seu espaço restrito. Está sendo implantado, já em fase avançada, o Projeto de Extensão Modateca Virtual, com o objetivo de ampliar as possibilidades de acesso ao acervo e à pesquisa a um número irrestrito de usuários.

O acervo da Modateca da Universidade do Estado de Santa Catarina vem sendo organizado cientificamente, partindo de campanhas de doação junto à comunidade, professores, alunos

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e interessados no assunto. Os materiais passaram a ser estudados, documentados, conservados, armazenados e expostos de forma permanente e também itinerante.

A Coordenação do Curso de Moda da UDESC enfatiza a Importância da Modateca para o sucesso do Curso de Moda e para a preservação da memória do vestuário da comunidade Catarina. Tem como base a museologia, salvaguarda e comunicação de objetos do vestuário; um espaço de preservação da memória de moda e do vestuário catarinense, fonte rara e primária de pesquisa para a produção de conhecimento e construção do futuro.

3.2 A Teciteca

A Teciteca do Centro de Artes – CEART da Universidade do Estado de Santa Catarina – UDESC representa a cristalização efetiva de um Programa de Extensão que oferece suporte aos alunos e professores do Curso de Bacharelado em Moda e também à comunidade catarinense.

Os trabalhos tiveram início em agosto de 1996, de modo pioneiro no Estado de Santa Catarina, oferecendo suporte técnico-científico às empresas, comunidade acadêmica e diversos profissionais da área, tendo como objetivo o estímulo e a orientação no que diz respeito à pesquisa teórica e prática do substrato têxtil, oferecendo atualização permanente aos pesquisadores que à Teciteca procuram, de acordo com as tendências tecnológicas do setor.

Com admirável espírito de gestão e visão de futuro, a Teciteca da UDESC é coordenada pela Professora Maria Izabel Costa, com a participação da Professora Aparecida Maria Batisti de Abreu e demais professores colaboradores do Departamento. Bolsistas também fazem parte da equipe que organiza e mantém o acervo.

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Para um bom desempenho do profissional ligado à moda e ao estilismo é fundamental que tenha amplo conhecimento dos tipos de tecidos disponíveis no mercado e características técnicas. Com tais informações e com ampla pesquisa de materiais, o estilista poderá resolver problemas de caimento e elasticidade que sempre definem o trabalho de qualidade. Com o conhecimento apurado do tecido empregado poderá, também, calcular com precisão o rendimento esperado do tecido. Madeleine Vionnet, Coco Chanel, Jacques Fath e Mme. Grés eram mestres neste conhecimento e a execução dos seus trabalhos era resultado da aplicação inusitada e precisa do tecido, diretamente sobre o corpo do manequim, analisando o caimento e aplicações.

A Teciteca da UDESC destaca-se pelo envolvimento com a pesquisa em criação e transformação têxtil e por ser um espaço organizado apresentando amostras têxteis, periódicos e catálogos. O acervo tem atualização permanente, através de diversos colaboradores. Neste espaço de pesquisas estão incluídas ações relacionadas ao estudo e catalogação de novas bandeiras e cartelas têxteis, cadastramento de catálogos, periódicos e aviamentos. Desenvolvem-se trabalhos de reposições de bandeiras danificadas e complementação de dados técnicos. Também é realizado controle dos empréstimos de bandeiras e de diversos materiais do acervo.

Atualmente, o acervo está composto por mais de 2.000 amostras têxteis; 718 cartelas; 190 periódicos; 97 criações têxteis exclusivas; glossários de diversos tecidos comerciais; books de tendência têxtil; bandeiras com técnicas de estamparia industrial, bandeiras confeccionadas em teares manuais e cartelas têxteis.

Diversos serviços são prestados à comunidade como: consulta local assessorada, informações técnicas, científicas e de tendências, divulgação de informações junto aos veículos de comunicação,

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empréstimo interno de materiais, cursos, palestras, oficinas e apresentação e atualização do site próprio com informações e notícias da área têxtil. A equipe envolvida também desenvolve projetos considerando as novas tendências têxteis, trata da manutenção e atualização constantes do acervo, implementação da Teciteca Virtual, desenvolvimento da criação e transformação têxtil, organização de cursos de extensão e planejamento de coleções.

A Teciteca também disponibiliza aos alunos, professores e profissionais na área a “Pesquisa de Tendências Têxteis” nacionais e internacionais. Através do portal textila net5 o interessado tem disponível dois níveis de informações: o acesso público (informações atualizadas diariamente, tanto da área têxtil quanto das áreas de confecção e moda) e o acesso restrito (acervo de matérias dirigidas e organizadas por assunto, artigos técnicos e banco de dados).

O projeto “Teciteca Virtual” dispõe informações técnico/científicas e de tendência têxtil via on-line. O trabalho partiu da necessidade de oferecer as informações da área têxtil de forma mais rápida e eficiente ao seu público-alvo que estava crescendo e não tinha acesso fácil ao programa. O aumento dos Cursos de Moda no Estado de Santa Catarina fez com que o número de solicitantes se ampliasse consideravelmente. Outro propósito do projeto foi a conscientização das micro e pequenas empresas do pólo do vestuário local sobre a importância da obtenção do conhecimento das características e propriedades do substrato têxtil na correta aplicação dos materiais em suas coleções. A Teciteca estruturou o seu site com as seguintes janelas: acervo, glossário, criações, parceiros, notícias etc. Além disso, o site representa um instrumento de comunicação e troca de informações entre os usuários e o referido programa.

5 Maior e mais completo meio de comunicação e interação do universo têxtil.

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Através da Teciteca Virtual é possível acessar um prático glossário com informações sobre diversos tecidos, tornando imediata e eficaz a pesquisa de alunos e professores sobre a composição dos materiais de produção. Cada tecido selecionado traz no registro informações técnicas e detalhes fotográficos. Através desta via de comunicação, a Teciteca tem se correspondido com outras instituições e empresas de todo o território nacional, bem como com centros de pesquisa de outros países.

Com tantos serviços disponíveis, a Teciteca já tem conquistada a credibilidade junto às empresas no que se refere à solicitação de informações e matérias. A comunicação acontece em tempo real, tornando-se conhecida pela maioria das escolas de ensino de moda e contribuindo para a divulgação das pesquisas têxteis.

A Teciteca do Curso de Moda da UDESC é um excelente e inovador espaço de pesquisa. Seu acervo é utilizado por alunos e professores de diversas universidades, mas também por profissionais e empresas que acreditam em tecnologia e inovação como proposta eficaz de boas vendas. Lá encontram materiais e informações e também levam propostas de trabalho que se cristalizam em conjunto com a produção. Uma troca necessária e eficiente.

A Teciteca do UDESC tem sede no Campus do CEART, que fica na Avenida Madre Benvenuta, 1.907 - Florianópolis, junto à Biblioteca Central. Também pode ser acessada através do site: www.udesc.br/teciteca ou do e-mail: [email protected]

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Neide Köhler Schulte e Lucas da Rosa

Capítulo IV

Programa EcoModa: Desenvolvimento Sócio-ambientalNeide Köhler Schulte1

Lucas da Rosa2

4.1 Introdução

Este artigo apresenta inicialmente a origem do Programa de Extensão EcoModa e as principais atividades desenvolvidas na comunidade da Grande Florianópolis, na seqüência apresenta os resultados da pesquisa Eco Fashion: consolidação de uma tendência ecológica na moda, no período de 2005 à 2008, e finaliza com as considerações sobre as atividades desenvolvidas na extensão articulada com a pesquisa. A extensão universitária é um desafio e a sua institucionalização na integração com as demandas da sociedade, implantando desta forma, o compromisso da Universidade. Considerando este processo, a extensão tem

CRÍTICA

1 Doutoranda Design – PUC-RJ e Professora efetiva do Departamento de Moda – UDESC. nei [email protected] Doutorando Design – PUC-RJ e Professor efetiva do Departamento de Moda – UDESC. [email protected]

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sido objeto de intensas discussões, por entender-se que através dela as atividades de ensino e de pesquisa podem assumir uma Universidade, consiste fundamentalmente num processo de luta e conquista3.

O Programa de Extensão EcoModa/UDESC teve início em agosto de 2005, sob a coordenação dos professores Neide Köhler Schulte e Lucas da Rosa. Surgiu a partir do projeto de extensão ‘Desenvolvimento de coleção para o 1° Veg Fashion’, que aconteceu em 2004, para atender a um convite feito por Marly Winckler, presidente da SVB - Sociedade Vegetariana Brasileira - organizadora 36° Congresso Mundial de Vegetarianismo4, para participar do evento com um desfile. O evento foi realizado em Florianópolis no Hotel Resort Costão do Santinho, no período de 08 a 12 de novembro de 2004. O tema proposto para o desfile foi ‘moda sem crueldade’, todas as peças confeccionadas não tinham nenhuma matéria prima de origem animal. Foram desenvolvidos dois desfiles pela UDESC. O primeiro desfile foi produzido pelo projeto de extensão, com a participação de uma equipe de alunos e professores da UDESC e pessoas da comunidade. Todas as peças foram confeccionadas com reaproveitamento de materiais. A partir de uma campanha no CEART – Centro de Artes da UDESC – foram arrecadados roupas usadas, tecidos, calçados e demais objetos do vestuário que não eram mais utilizados. Após triagem das doações recebidas, algumas peças foram totalmente desmontadas para criação de novos modelos, e outras receberam tingimentos, aplicações, customização, ou outras técnicas. A coleção foi chamada ‘Chic é ser consciente’5. O segundo desfile foi produzido pelos alunos formandos da oitava fase do

3 Missão da Coordenadoria de extensão. www.udesc.br acesso em 10/07/2008.4 Congresso Mundial de Vegetarianismo acontece a cada dois anos em um país diferente, em 2004 no Brasil, em 2006 na Índia e em 2008 na Alemanha.

5 Proposta pela jornalista Danieli Ferraz, organizadora do 1° Veg Fashion.

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curso de moda. Utilizaram tecidos novos, mas buscaram propostas ecológicas para tecidos como o aproveitamento do pet, o couro vegetal, as fibras orgânicas, entre outros. A coleção foi chamada ‘Sementes’.

O evento teve projeção internacional, pois o Congresso Mundial de Vegetarianismo reúne pessoas de diversos países para discutir questões relativas ao vegetarianismo: alimentação, consumo consciente, preservação ambiental, filosofia, entre outros.

A participação no evento estimulou o estudo e aprofundamento da temática Moda & Meio Ambiente. O tema que norteou o 1° Veg Fashion’ também deu origem a uma pesquisa que iniciou em agosto de 2005 ‘Eco fashion: consolidação de uma tendência ecológica para a moda’.

A idealização do Programa EcoModa também teve origem em motivações pessoais. Verificou-se que a universidade pública gratuita não atinge as comunidades mais desfavorecidas socialmente. Os jovens destas comunidades não conseguem ingressar em cursos superiores gratuitos, entre eles o curso de moda, que tem alto índice de candidatos por vaga a cada vestibular6. O que pode ser feito diante deste fato?

Outra constatação é relativa à questão ambiental. O sistema da moda, com a renovação constante dos produtos, ditadas pelas tendências de moda, estimula o consumo excessivo, gerando um ciclo de vida muito curto dos produtos. A produção aumenta para atender a demanda, com isso aumenta o consumo de energia, de água, de matérias primas, gera efluentes, lixo, redução de recursos naturais, entre outros impactos negativos no meio ambiente. Como pode se pensar a moda, junto com os alunos e a comunidade, num contexto

6 Dados apresentados pela coordenação do curso de Moda/UDESC.

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de menor impacto ambiental? Neste sentido, será apresentado a seguir a proposta do programa EcoModa para atender parte de tal questionamento.

4.2 Programa de extensão EcoModa

Partindo da problemática identificada que envolve uma questão sócio-ambiental, se criou o Programa de Extensão EcoModa. O objetivo é disseminar o conceito de sustentabilidade ambiental promovendo a interação entre os acadêmicos e a comunidade na busca por soluções em relação à questão sócio-ambiental e a adequação dos produtos ligados ao universo da moda para um contexto de menor impacto ambiental. Pois, em relação à difusão dessa proposta no ambiente externo da universidade, observou-se que a extensão universitária seria o meio mais ágil de alcançar resultados relevantes.

O Programa EcoModa é constituído por projetos, eventos, cursos e outras atividades como palestras, exposições, participação em programas de televisão, rádio, entre outros. A maioria das ações acontece em Florianópolis, mas participa-se de desfiles e palestras em outros estados e outros países.

No primeiro ano de atividade, em 2005, o Programa EcoModa teve as seguintes ações:

1.Projeto ‘Coleção EcoModa vestindo uma nova era’ - foram desenvolvidas mini-coleções por cinco professores do curso de Moda/UDESC (Alzira Martins, Eliana Gonçalves, Lucas da Rosa, Luciana Dornbush Lopez e Neide Schulte). Nas coleções não foi utilizado nenhum material de origem animal, trabalhou-se com reciclagem de tecidos, aproveitamento de retalhos de confecções e com tecidos doados por empresas da região.

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2.Desfile ‘EcoModa vestindo uma nova era’ - as cinco coleções foram apresentadas no maior evento de moda de Santa Catarina, o Floripa Fashion DonnaDC7 em agosto de 2005.

3.Exposição ‘Semana do meio ambiente SESC’ - evento promovido pelo SESC em setembro de 2005, onde foram expostas algumas roupas apresentadas no desfile Floripa Fashion e peças desenvolvidas durante curso com a comunidade.

4.Curso ‘Utilizando o velho para fazer o novo’ - curso aberto para comunidade, gratuito, desenvolvido no segundo semestre de 2005 e primeiro semestre de 2006. A partir de roupas usadas, retalhos e outros materiais reciclados, aplicando técnicas como patchwork, customização, tingimentos, aplicações, bordados, entre outros, foram desenvolvidos novos produtos de moda para o vestuário.

Figura 1 – Desfile da coleção ‘É o Bicho’ - EcoModa vestindo uma nova era - programa EcoModa, no Floripa Fashion em agosto de 2005.

Fotos: Acervo pessoal

7 Floripa Fashion é o maior evento de moda de Santa Catarina realizado duas vezes por ano.

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A coleção infantil ‘É o bicho’ teve como tema os bichos: gato, tartaruga, cavalo, boi, galinha, entre outros, representados em aplicações, bordados e bonecos de tecido. Roupas confortáveis, desenvolvidas em malha e jeans, para que as crianças aprendam brincando que devem respeitar os bichos e toda natureza desde a infância para que sejam adultos com valores que incluem a preservação ambiental.

No segundo ano de atividade, em 2006, o Programa EcoModa teve as seguintes ações:

1.Projeto ‘O FPS8 no vestuário: desenvolvimento de coleção’ - foram desenvolvidas duas mini-coleções, uma infantil e outra com roupas para trabalhadores que ficam sob o sol como carteiros, agentes de saúde, zona azul e construção civil, com tecidos que protegem contra os raios ultravioletas causadores de câncer de pele. Este projeto foi desenvolvido em parceria com a Dra. Senen Dyba Hauff, médica oncologista do CEPON de Florianópolis. As duas mini-coleções foram apresentadas em palestra e desfile técnico no IV Encontro de Moda da UDESC.

2.Projeto ‘EcoModa: desenvolvimento de coleção para o II Veg Fashion’ - coleção chamada ‘modaCOMpaixão’ desenvolvida a partir de roupas doadas, retalhos e outros materiais reciclados, com aplicação de técnicas como patchwork, customização, tingimentos, aplicações, bordados, fuxicos, entre outros.

3.Evento ‘Desfile EcoModa: II Veg Fashion em São Paulo’ - coleção ‘modaCOMpaixão’ foi apresentada em São Paulo, dia 7 de agosto de 2006 em desfile no Memorial da América Latina, durante o 1° Congresso Vegetariano Brasileiro e Latino Americano. No dia

8 Fator de Proteção Solar, produto aplicado nos tecidos para bloquear a passagem dos raios UV que causam câncer de pele.

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Neide Köhler Schulte e Lucas da Rosa

do desfile a GNT gravou entrevista e apresentou diversas vezes no programa Alternativa Saúde.

4. Curso ‘Desenvolvimento sustentável de produtos de moda – curso aberto para comunidade, gratuito, desenvolvido no segundo semestre de 2006 e primeiro semestre de 2007. A partir da apresentação dos conceitos de sustentabilidade ambiental foram idealizados e executados produtos de moda. Oficinas de tingimento, de customização e de bijuterias foram desenvolvidas para capacitar os alunos participantes. Entre eles jovens do Projeto Aroeira9 e do IGK10.

Além das atividades ligadas aos projetos, também houve participação em eventos com palestras, entre elas a palestra ‘Sustentabilidade Ambiental: um desafio para Moda’, em Indaial11, entrevistas na rádio UDESC e na CBN com Luis Carlos Prates, sobre o uso de tecido com FPS para proteção contra o câncer.

Figura 2 – Peças desenvolvidas pelos projetos do programa EcoModa em 2006.

Fotos: Acervo pessoal

9 Projeto Aroeira atende jovens da comunidade da Grande Florianópolis em risco social, com cur-sos de capacitação profissional e formação de cooperativas. Projeto ligado ao CCEA - Centro Cul-tural Escrava Anastácia.10 Instituto Guga Kuerten desenvolve atividades esportivas com crianças e de capacitação profis-sional com jovens de comunidades da Grande Florianópolis em risco social.11 9º Semana de Moda, de 07 a 09 de novembro de 2006, na UNIASSELVI, em Indaial SC.

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Em 2007, o curso de ‘Desenvolvimento sustentável de produtos de moda’ foi estendido até o final do ano, e as peças desenvolvidas pelos jovens do Projeto Aroeira, a partir de tecidos e retalhos de malhas doados pela Malharia LC de Brusque, resultaram num desfile chamado ‘Solto’. As peças foram apresentadas em forma de desfile durante o encerramento das atividades do ano de 2007 pelo CCEA12, na Assembléia Legislativa de Florianópolis.

Em junho de 2007, foram apresentadas três palestras na escola Menino Jesus de Florianópolis, sobre utilização de FPS nas roupas e sobre a necessidade de preservação o meio ambiente. As palestras fizeram parte da programação da escola para desenvolver a consciência ecológica nos estudantes.

Figura 3 – Desfile em Bogotá EcoModa/UDESC em 2006.

Fotos: Acervo pessoal

12 Centro Cultural Escrava Anastácia.

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Neide Köhler Schulte e Lucas da Rosa

As atividades e propostas do Programa de Extensão EcoModa também foram apresentadas no exterior durante o “I Encuentro Internacional de Diseño, Marketing Y Moda”que foi realizado nos dias 20 e 21 de setembro de 2007 em Bogotá, Colômbia. No primeiro dia foi apresentada a palestra ‘Desenvolvimento sustentável: um desafio para a moda’, e no segundo dia foi apresentado um desfile com vinte modelos desenvolvidos nos projetos do Programa EcoModa, que encerrou o evento.

Em 2008, estão em andamento os seguintes projetos:

1.Desenvolvimento de Produtos e Coleções13 - o projeto compreende pesquisa e desenvolvimento de produtos de moda, que envolvam conceitos ecológicos e ambientalmente sustentáveis, a partir de um tema; com intenção de sensibilizar a comunidade e o consumidor em geral quanto ao reaproveitamento de materiais – reciclagem, aplicados ao vestuário e/ou acessórios de moda.

2.Coleção do vestuário para o Floripa Fashion e exposições14

- Este projeto possui como principal foco a elaboração de uma coleção do vestuário para ser apresentada na forma de desfile no Floripa Fashion em agosto de 2008 e, ainda, expor os modelos com o intuito de divulgar a possibilidade de fabricá-los em escala industrial. As ações envolverão a união de conceitos e tendências de moda com base nas produções artísticas do artista plástico e Professor Dr. Antônio Vargas Sant’Anna, do Departamento de Artes Plásticas da UDESC. Os produtos da coleção serão desenvolvidos sem a utilização de materiais de origem animal. Os tecidos utilizados serão oriundos de tecelagens que trabalham com fibras e processos que contribuem para a preservação da biodiversidade, conseqüentemente, promovem o desenvolvimento sustentável.

13 Coordenado pela professora Luciana Dornbusch Lopez.14 Coordenado pelo professor Lucas da Rosa.

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Desta forma, a coleção do vestuário terá como finalidade o despertar das pessoas para uma consciência ecológica voltada para a preservação do meio ambiente.

3.Desenvolvimento de coleção de acessórios e complementos de Moda15 - Este projeto tem como objetivo criar uma coleção de acessórios e complementos de Moda. Esta coleção será apresentada em exposições e eventos que são realizados ao longo do ano. É importante lembrar que os produtos da coleção serão desenvolvidos sem a utilização de materiais de origem animal, também serão utilizados tecidos ecológicos, reciclagem, customização e outras técnicas para reaproveitamento de materiais.

4. Projeto EcoModa na comunidade: ações sociais e ambientais – tem como objetivo desenvolver atividades que ofereçam para a comunidade cursos de capacitação, oficinas e palestras com foco no desenvolvimento sustentável, promovendo a inclusão social e a preservação do meio ambiente. No projeto se pretende desenvolver produtos como: brinquedos, peças de vestuário e objetos de decoração, a partir de resíduos domésticos e de resíduos de empresas de confecção do vestuário. Estes produtos serão desenvolvidos pelos participantes dos cursos e oficinas que serão oferecidas durante pelo o projeto. Durante as atividades com a comunidade, serão trabalhados conceitos como: desenvolvimento sustentável, sistema da moda e consumo consciente.

Além dos projetos em andamento em 2008, foi realizada a palestra ‘Sustentabilidade Ambiental e Consumo Consciente: um desafio aos designers e às empresas’ em Maravilha, oeste de Santa Catarina16.

15 Coordenado pela professora Eliana Gonçalves.

16 I Semana da Moda, 16 a 19 de junho de 2008, na UNOESC, Maravilha, SC.

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Todas as atividades apresentadas até o momento, resumem as ações desenvolvidas no Programa de Extensão EcoModa/UDESC, realizado de 2005 a 2008. Concomitantemente foi realizada a pesquisa Eco Fashion: consolidação de uma tendência ecológica na moda para dar suporte teórico às ações do programa de extensão.

4.3 Pesquisa Eco Fashion

Com as atividades desenvolvidas no Programa EcoModa, surge a necessidade de um embasamento teórico sobre sustentabilidade ambiental e um levantamento sobre as iniciativas na área da moda para se adequar a necessidade de preservação do meio ambiente.

O conceito de sustentabilidade foi inventado a mais de trinta anos para sugerir que era possível conseguir o crescimento econômico e a industrialização sem destruir o meio ambiente17.

O desenvolvimento sustentável é aquele que atende às necessidades do presente, sem comprometer a possibilidade das gerações futuras de atenderem às suas próprias necessidades18

(LEMOS e BARROS, 2007, P.9). Esta definição trata de dois pontos fundamentais: o problema da degradação ambiental, que geralmente acompanha o crescimento econômico, e a necessidade que esse crescimento contribua para reduzir a pobreza.

O desenvolvimento sustentável implica em três grandes desafios para a humanidade. Primeiro: garantir a disponibilidade de recursos naturais transformados em bens e serviços necessários

17 Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente, em Estocolmo, em 1972. LEMOS e BAR-ROS 2007, pg 19.18 Definição da Comissão Mundial de Meio Ambiente e Desenvolvimento das Nações Unidas, publicado em 1987.

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no cotidiano. Segundo: não lançar sobre a biosfera do planeta substâncias tóxicas, resíduos e poluição, decorrentes da produção e uso de bens e serviços em quantidades e velocidades superiores á capacidade de auto-depuração da natureza. Terceiro: reduzir a pobreza mundialmente (LEMOS e BARROS, 2007, P.9-11)

Apesar de mais de três décadas de preocupação com a sustentabilidade, continua a redução dos recursos naturais em quase todo planeta, assim como os problemas da pobreza. Ou seja, os desafios da humanidade para atingir um desenvolvimento sustentável ainda parecem distantes da superação.

Qual seria a razão para um processo tão lento da assimilação de uma mudança da relação do homem com o meio ambiente, de respeito e de valorização, tão necessária para o futuro da humanidade, seria a visão antropocêntrica?

A definição de sustentabilidade ambiental é antropocentrista: futuras gerações de pessoas possuem tanto direito a viver fisicamente seguras e saudáveis como as pessoas das presentes gerações. Cada ser humano está sob uma obrigação de não permitir que o meio-ambiente natural se deteriore a ponto que seja comprometida a sobrevivência e bem-estar dos futuros habitantes humanos da terra. Também possui um dever de conservar os recursos naturais para que as futuras gerações possam usufruir dos muitos benefícios derivados desses recursos. A responsabilidade presente de proteger espécies selvagens ameaçadas está ligada aos valores humanos. Além do mais, algumas vezes é argumentado que a variedade de espécies de plantas e animais é necessária para desenvolver novas maneiras de proteger os humanos de doenças, a se livrar de bactérias perigosas, de aprender como controlar certos insetos e outras ‘pestes’ e produzir novas fontes de comida por meio da engenharia genética. Os humanos também possuem uma obrigação de preservar a beleza da natureza

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selvagem para que as futuras gerações possam ter tanta oportunidade de experimentar e apreciar essa beleza, como presente. Seria injusto destruir as maravilhas naturais do mundo e que deixar apenas lixo para que os outros contemplem. Além do mais, um sistema inteiro de padrões e regras governando a conduta no presente em relação ao ambiente natural da terra pode ser formada apenas a partir dos interesses e necessidades humanos .(TAYLOR, 1987).

A partir do ponto de vista da teoria biocêntrica da ética ambiental, por outro lado, as obrigações para a natureza não se sustentam pelas obrigações com os humanos. A ética ambiental não é uma subdivisão da ética humana. Embora muitas das ações estejam corretas de acordo com uma teoria biocêntrica, há o que torna essas ações corretas no caso de um jogo completamente diferente de considerações. Os princípios morais envolvidos são fundamentalmente separados e distintos. Os dois pontos de vista, um sistema ético antropocêntrico ou biocêntrico, nem sempre possuem os mesmos resultados. Isso implica numa diferença prática na forma como os humanos tratam o ambiente natural. Quando um ponto de vista biocêntrico é tomado, as obrigações e responsabilidades a respeito dos animais selvagens e plantas da Terra são vistos para levantar certas relações morais entre os humanos e o mundo natural. O mundo natural não é simples como um objeto a ser explorado pelos humanos, assim como também não são criaturas que podem ser utilizadas como nada mais que recursos de uso e consumo (TAYLOR, 1987).

É comum a crença de que a existência do ser humano é mais valiosa do que a existência de um animal ou planta. Humanos vivem em um plano superior, possuem uma dignidade e um valor que estão ausentes em outras formas de vida, algo mais importante, algo de maior valor é perdido para o mundo quando morre um ser humano que não é perdido para o mundo quando um leão, uma serpente,

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ou uma árvore morre. Esta idéia é tão profundamente enraizada em várias culturas, que é difícil pensar de forma clara e crítica sobre o assunto. Para muitas pessoas, parece perfeitamente evidente que o bem-estar dos seres humanos tem maior valor e, conseqüentemente, deve ser dada maior peso nas suas deliberações morais, além do bem-estar dos animais e plantas. No entanto, quando se busca descobrir razões objetivas que justifiquem esta crença, freqüentemente, se confronta com uma metafísica obscura e acrítica.

A admiração e o respeito pelos humanos ao que é inerentemente valioso na natureza dá origem a princípio da preservação. O princípio da preservação se refere à não destruição e não interferência no ambiente natural. O princípio da preservação é a base para uma ética ambiental.

Para que seja possível uma sustentabilidade ambiental genuína, é necessária uma visão biocêntrica da natureza. Enquanto se tratar a natureza apenas como um valor utilitário para os humanos, sem considerar seu valor inerente, não haverá sustentabilidade ambiental. Se os princípios da sustentabilidade ambiental devem estar incorporados ao desenvolvimento humano, é preciso estabelecer um conceito mais sólido quanto ao que é ambientalmente sustentável de fato.

A visão antropocêntrica não parece adequada no século XXI, e nunca foi. Os estudos sobre uma ética ambiental biocêntrica indicam que esta visão de mundo, centrada na superioridade humana, é responsável pela degradação do ambiente natural do planeta terra, ou seja, pela grave crise ambiental que poderá limitar a existência humana, nesta e nas próximas gerações.

Diante deste contexto, do desafio de adequar o desenvolvimento econômico a preservação do meio ambiente e minimização da pobreza, da visão antropocêntrica que dirige as

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ações humanas e dificulta o respeito e a consideração pelas demais formas de vida no planeta, o que poderá impulsionar as mudanças necessárias para o desenvolvimento sustentável?

Para Kazazian, a natureza não tem dogma. Entender as relações dinâmicas que nela se produzem é a primeira etapa a superar para obter respostas à complexidade das dificuldades encontradas. Nesse campo de reflexão, quatro grandes dimensões interligadas podem ser consideradas. A primeira é a noção de ‘interdependência’. Cada elemento – ou cada sistema – existe pela soma de suas relações com os outros, e em uma geometria temporal – ou uma duração – que lhe é própria: ‘o tempo’, a segunda dimensão. Dela aparece a idéia de ‘ciclo’. Aparecer, desaparecer, mudar de estado para alimentar outros ciclos, é assim que a vida se compõe e se recompõe, infinitamente. Por fim, os elementos em conjunto – ou os sistemas – se desenvolvem na medida em que recebem energia, em um perpétuo fenômeno de ‘auto-regulação”. (KAZAZIAN, 2005, pg 28)

Além de entender a dinâmica da natureza é preciso desejar o desenvolvimento sustentável, a partir disso, com a criatividade humana é possível idealizar e conceber novos produtos ou serviços mais adequados, diante da crise ambiental.

Se o desejo é o motor do desenvolvimento sustentável, a criatividade é seu combustível: é a criatividade que dará o impulso ao empreendedor para imaginar um produto ou serviço mais (satisfação às necessidades) com menos (recursos e trabalho). É a criatividade que vai inspirar o político ou o legislador a conceber as mais adequadas e flexíveis estruturas. É a criatividade que vai permitir ao pesquisador encontrar soluções elegantes para problemas cada vez mais complexos. E finalmente, é a criatividade

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que vai dar vontade ao consumidor, ao eleitor, ao investidor de escolher um desenvolvimento que tenha mais sentido (KAZAZIAN, 2005, pg 8).

Uma vez desejado o desenvolvimento sustentável é preciso entender que praticar a sustentabilidade ambiental significa cuidar de todas as coisas, das menores até o planeta inteiro e vice-versa.

Portanto, para a transição à sustentabilidade, são apontados dois caminhos:

Por caminhos traumáticos, uma transição forçada por efeitos catastróficos, que de fato obrigam a uma reorganização do sistema, a mais indolores, uma transição por escolha, isto é, como efeitos de mudanças culturais, econômicas e políticas voluntárias que reorientem as atividades de produção e consumo.

(MANZINI, E; VEZZOLI, C, 2005, pg. 45).

O segundo caminho indicado, a transição por escolha, é o que está se tentando a mais de trinta anos, desde a Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente, em Estocolmo, em 1972. Ao que parece, o que tem acelerado a transição tem sido alguns efeitos catastróficos decorrentes das mudanças climáticas que tem ocasionado grandes enchentes, secas, tornados, entre outros. Segundo Roberts, estes efeitos também vêm comprometendo a produção de alimentos e de outras matérias primas naturais utilizados pelas indústrias.

As mudanças climáticas vão dificultar o aumento na produção de comida e acentuar a escassez de água. A alteração do clima também será um desafio para que grandes exportadores, como os Estados Unidos e o Canadá, consigam elevar sua produção. Os desafios são complexos e as

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respostas para eles também. Será preciso reduzir o uso de energia e de água na agricultura, ao mesmo tempo que se elevam a eficiência e a produtividade. Porém, isso não será o bastante. Seremos obrigados a comer menos19.

A redução de consumo tem sido indicada por diversos pesquisadores e teóricos, inclusive de comida. Depois de um século de consumo numa escala crescente, em que várias gerações passaram a associar o aumento de consumo ao aumento do bem-estar, o processo inverso parece mais difícil.

E quando entra em questão a moda20, a dificuldade parece se acentuar. Isto porque a moda se relaciona com o novo, com o efêmero, com mudanças cada vez mais rápidas. Com isso, há a busca frenética pela novidade e o aumento de consumo. Este sistema da moda tem grandes conseqüências ambientais que foram ignoradas durante muito tempo.

Estamos em Paris, na Belle Époque. Para enfeitar o chapéu que completa o adereço das elegantes e as protege dos raios de sol, nenhum enfeite é bonito ou colorido demais. Para seguir a moda, os chapeleiros se entusiasmam com as penas púrpuras de reflexos ondulados da íbis, uma ave pernalta do vale do Nilo. Naturalmente ignoram que o pássaro pertence a uma cadeia alimentar que existe há muito tempo: a íbis se alimenta de pequenos répteis, cuja alimentação é composta por batráquios que, por sua vez, comem gafanhotos. Certamente, eles não imaginavam

19 ROBERTS, Paul. The End of Food. Entrevista para revista Época em 16/06/2008, disponível em: http://www.linearclipping.com.br/

20 O termo Moda neste texto se refere ao produto de vestuário.

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que, querendo satisfazer uma mania fugaz da capital francesa por essas penas vermelhas, vão provocar fome no Egito. E de fato. Com a perseguição da íbis, cresce a população de répteis. Os répteis devoram as rãs, deixando os gafanhotos sem predador: os insetos vão destruir as culturas de cereais e espalhar a miséria entre os camponeses. (KAZAZIAN, 2005, pg 10)

Este exemplo de Kazazian ilustra a complexidade das interações entre o homem, os objetos e a natureza. É o que Capra define como uma teia interconexa de relações (CAPRA, 1996) quando se refere ao modo como deve der vista a natureza. Tudo está interligado. Se as tendências de moda, por sua vez, indicarem o uso de materiais orgânicos, reciclados, reaproveitados, menos poluentes, o não uso de peles de animais, entre outros, haverá uma contribuição significativa para reorientar a produção, os serviços e o consumo de moda.

Está tendência ecológica para a moda não é apenas uma suposição. Ela já lançada e pode ser observada nas coleções de grandes estilistas internacionais.

Roupas feitas com fibras naturais e materiais reciclados ganham terreno na Itália. Gigantes da moda, como Giorgio Armani, se somam à tendência.

O respeito pelo meio ambiente, a utilização de fibras e tintas naturais e a reciclagem de roupas e objetos usados são a base da moda ecológica, que pouco a pouco ganha terreno entre os consumidores e estilistas na Itália. A também chamada ecomoda confecciona roupa orgânica. Isto é, elaboradas com tecidos em cuja produção não são usados produtos químicos,

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nem fertilizantes, nem pesticidas. Com 72 mil empresas e 700 mil empregados, a indústria italiana do vestuário é uma das principais do mundo: fatura quase US$ 90 milhões ao ano. E, embora a moda de baixo impacto ambiental esteja mais desenvolvida em mercados como o inglês e o alemão, até gigantes do ramo, como Giorgio Armani, estão dispostos a aderir à tendência21.

A estilista inglesa Vivienne Westwood, considerada a mãe do punk e uma das designers mais influentes do século 20, fez um apelo para que as pessoas consumam menos e façam melhor suas escolhas de compra. A estilista de 66 anos, que lançou em São Paulo, em janeiro de 2008 durante a SPFW22, duas sandálias de plástico em parceria com uma empresa brasileira, rebate as críticas de quem a chama de ‘hipócrita’ por seu discurso anticonsumista, já que ela mesma produz coleções veneradas pelo mundo fashion. Segundo Westwood, hipócritas são as pessoas que têm dinheiro e se vestem como pobres. Eles deveriam comprar roupas bacanas, mas não muitas. Para ela, as pessoas devem discriminar mais, não ser engolidas por tudo o que se propõe. São privilegiadas porque podem escolher as roupas, mas devem escolhê-las melhor. Ela afirmou ainda que gostaria de produzir menos. “Eu realmente estou cansada de fazer tanto. Prefiro muito, muito fazer menos e fazê-lo muito bem. Só preciso descobrir como23.”

Descobrir como fazer uma moda ‘melhor’, mais adequada ao contexto do desenvolvimento sustentável, tem sido o grande desafio da moda nos dois últimos anos. É uma tendência recente, ou melhor, já pode ser considerado um paradigma, se é que se pode aplicar este

21 http://tierramerica.net Acesso em: 07/08/200722 São Paulo Fashion Week, janeiro de 200823 http://oglobo.globo.com/cultura/mat/ Acesso em: 17/01/2008

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termo para a moda. Antes disso, a natureza aparecia nas tendências de moda apenas como tema para as cores, texturas, ou materiais.

4.4 Considerações Finais

Desde o início das atividades do Programa EcoModa e da pesquisa Eco Fashion, os desafios identificados têm profunda relação com os desafios para a sustentabilidade ambiental. As questões ambientais estão interligadas com as questões sociais, e ambas, durante muito tempo, foram pouco consideradas diante da importância dada ao crescimento econômico. O cerne do pensamento da sustentabilidade transformou-se em três dimensões: a ambiental, a social e a econômica. Sendo que não pode haver hierarquia entre estas dimensões na busca pela sustentabilidade ambiental.

O objetivo de disseminar o conceito de sustentabilidade ambiental através da moda tem sido atingido a partir das ações realizadas pelo Programa EcoModa. A interação entre os acadêmicos e a comunidade aconteceu durante os cursos, palestras e demais atividades. Foram indicadas algumas soluções para a questão sócio-ambiental como a capacitação de jovens de comunidades em risco social, através de cursos e oficinas com atividades ligadas a moda e, a adequação de produtos de moda para um contexto de menor impacto ambiental, desenvolvidos a partir da reciclagem de materiais, customização, recuperação de roupas, entre outros. Em relação à difusão da proposta do Programa EcoModa no ambiente externo da universidade, observou-se que a extensão universitária é um ótimo meio para alcançar resultados relevantes para a questão sócio-ambiental.

Considera-se que, diante do que foi exposto, o desenvolvimento sustentável somente poderá acontecer se houverem mudanças de valores, se a visão antropocêntrica for substituída por

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uma visão biocêntrica em relação à natureza, considerando-se o valor de todas as vidas imparcialmente, sem especismo, ou qualquer escala de valor.

A partir do Programa EcoModa e da pesquisa Eco Fashion, a temática moda e sustentabilidade ambiental, tornou-se objeto de pesquisa para uma tese de doutorado que está em andamento.

Referências Bibliográficas

CAPRA, Fritjof. A teia da vida: uma nova compreensão científica dos sistemas vivos. São Paulo: Coltrix, 1996.

LEMOS, Haroldo M. e BARROS, Ricardo L.P. O desenvolvimento sustentável na prática. Rio de Janeiro: Comitê Brasileiro das Nações Unidas para o Meio Ambiente, 2007.

KAZAZIAN, Thierry. Haverá a idade das coisas leves: design e desenvolvimento sustentável. São Paulo: Ed. SENAC, 2005.P. 194

MANZINI, E; VEZZOLI, C. O desenvolvimento de produtos sustentáveis. Os requisitos ambientais dos produtos industriais. São Paulo: Editora da Universidade de São Paulo, 2005.

ROBERTS, Paul. The End of Food. 2008. Entrevista para revista Época, disponível em: http://www.linearclipping.com.br/ , acesso em 16/06/2008.

TAYLOR, Paul W. Respect for Nature: a theory of environmental ethics. 2. impress with corrections. New Jersey, Princeton: Princeton University Press, 1987

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Taísa Vieira Sena

Capítulo V

Relações de aparência e construção de novas identidades através do consumo de cópias: bolsas

Louis Vuitton na Grande FlorianópolisTaísa Vieira Siena1

A moda, mais do que indicar os gostos que mudam de tempo em tempo, com a finalidade de atender a vontade de distinção social, se caracteriza como um sistema que constitui a sociedade em que funciona, traduzindo-se na própria dinâmica que produziu a modernidade.

As sociedades modernas são essencialmente sociedades de mudança constante e rápida, a revolução tecnológica e a globalização causaram um impacto sobre a identidade cultural. Hall (2001, p.7) afirma que a crise de identidade “é vista como parte de um processo mais amplo de mudança, que esta deslocando as estruturas e

CRÍTICA

1 Pós-graduada em Marketing e Gestão Empresarial – UFSC/ Graduada em Moda – Habilitação Estilismo –UDESC / Professora efetiva da Uniasselvi Indaial/professora colaboradora UDESC. [email protected]

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processos centrais das sociedades modernas e abalando os quadros de referência que davam aos indivíduos uma ancoragem estável do mundo social.” Observamos também uma fragmentação dos sujeitos em diversas identidades criadas a partir de objetos e elementos simbólicos.

Conforme (Silva & Serafim, 2006) até há pouco tempo, o termo globalização era vinculado apenas a questões econômicas, porém, atualmente ela é gerada pela conexão de fatores políticos, sociais, culturais e econômicos, estimulados, sobretudo, pelo desenvolvimento de tecnologias da informação e de meios de comunicação que permitem intensificar as relações entre pessoas de diferentes partes do mundo.

Num mundo globalizado, o fluxo de informações, as possibilidades de acesso a reconfigurações do espaço e do tempo marcam a vida de grupos sociais, e a mídia apresenta-se como um forte papel no comportamento das pessoas em todas suas manifestações veiculadas pelos diferentes meios de comunicação. Na era digital, a internet e outras mídias, disseminam a informação encurtando distâncias e criando sensação ilusória de poder e alcance sobre qualquer tempo, lugar e produto. Modificando assim, as relações sociais e de consumo.

Em relação às transformações tecnológicas, Sevcenko (2001) afirma que elas se tornaram um fator cada vez mais decisivo na definição das mudanças históricas. E que a tecnologia trás mudanças de mecanismos e processos técnicos, que por sua vez, ampliam os potenciais produtivos de dado sistema econômico e com isso alteraram a própria estrutura da sociedade, seu quadro de valores e o comportamento das pessoas.

Assim, sofremos mutações e nos transformamos na sociedade moderna da “supervalorização do olhar” para Sevcenko (2001) da

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pós-modernidade de Hall (2001), das “relações pela aparência” para Sant’Anna (2007) e da “liquefação e fluidez” para Baumam (2001), onde o que vemos são os sujeitos se relacionando a partir de símbolos exteriores, das qualidades de mercadorias ou objetos que ele ostenta e agrega a si.

Na sociedade moderna a aparência é elemento fundamental da relação dos sujeitos e constituição dos mesmos. Funcionando como mediadora das relações sociais, ela faz surgir um homo estheticus, que desloca suas emoções para objetos e símbolos, consumidos muito mais pelo que representam, do que por sua utilidade. Desta forma, a superfície, a aparência, o externo, reconstroem imagens do ser a partir de elementos externos, carregados de signos, que são atribuídos a ele, funcionando como agente social e construindo sujeitos aptos à modernidade.

Na configuração social em que o sujeito moderno está constituído como tal, para sua integração na sociedade é importante a adequada manipulação das fichas simbólicas e disto decorre que a possessão dos objetos, materiais e imateriais, torna-se mais do que simples aquisição feita aqui ou acolá. (SANT’ANNA, 2007, p.51)

A medida que consome, o indivíduo agrega a si valores atribuídos a produtos ou marcas, constituindo a atualização do eu a partir de algo novo, buscando criar uma identidade. “Numa sociedade de consumo, compartilhar a dependência de consumidor – dependência universal das compras - é a condição sine qua non de toda liberdade individual; acima de tudo da liberdade de ser diferente, de ter identidade.” (BAUMAN, 2001, p. 98)

As mudanças provocadas pela contemporaneidade ocorrem no interior dos discursos, que são práticas sociais construídas na

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interação realizada nos diversos contextos sociais, históricos e culturais. Ao interagirmos com o outro nesses contextos construímos o outro e a nós mesmos a partir de um discurso.

Assim, Santa Catarina tenta construir uma imagem de estado criador de moda, já que os olhos do “mundo fashion” estão se abrindo para o Brasil. Até então, o Estado era conhecido como confeccionista. Conforme Quirino (2005) “Algumas empresas catarinenses chegaram até mesmo a ter destaque nacional, como a Naylotex, porém Santa Catarina irá ganhar sua fatia de mercado através do setor de cama, mesa, e banho, ainda hoje de grande importância para economia catarinense.” A Cia. Hering já ocupou o lugar de segunda maior malharia da América Latina, sendo a única autorizada no mundo a produzir os licenciados Disney (HERING TÊXTIL,1980) contudo, com a abertura de mercado e a entrada dos produtos chineses, a empresa encontrou dificuldades financeiras, forçando-a a uma reestruturação.

Na busca de articular uma identidade criadora, um grupo de grandes indústrias de Santa Cantarina, reuniu-se em um projeto audacioso que congrega empresas, instituições de ensino e os acadêmicos com objetivos de fomentar o Design de Moda em Santa Catarina (transformar a imagem do estado); integrar a comunidade acadêmica (futuros profissionais) com o mercado (através do contato com as empresas); e incentivar a troca de experiências para o fortalecimento do setor através do trabalho coletivo2.

O SCMC (Santa Catarina Moda Contemporânea) é um programa que tem por objetivo transformar o Estado de Santa Catarina, que tem reconhecimento nacional como industrial e corporativo, em referência no design de moda. As ações compreendem desde um exercício de autoconhecimento das empresas em relação

2 Dados do site oficial do projeto Santa Catarina Moda Contemporânea. http://www.scmc.com.br

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aos seus pontos fortes e fracos, até a efetivação destas ações que tornem Santa Catarina um estado que vá além do potencial já existente. Ações que serão realizadas através de diversas iniciativas que trarão fortalecimento do setor. Ações que se baseiam no trabalho coletivo que solidificará ainda mais este setor no âmbito nacional e internacional.

Seguindo esta mesma linha, grandes empresas do Estado vem formando conglomerados corporativos, comprando marcas de sucesso, com destaque para o grupo AMC Têxtil e a gigante Marisol. De acordo com Rogar (2007) os jovens empresários sonham alto, ambicioso: guardadas as devidas proporções, querem consolidar, nas próximas décadas, conglomerados brasileiros a exemplo do gigante francês LVMH, que controla a Louis Vuitton e a Dior entre outras.

E na contramão destas iniciativas, vemos o número de confecções que produzem cópias ilegais de diversas marcas, as quais, são facilmente encontradas nos centros comerciais de Brusque, como camisetas ou calça Diesel, Carmim, Dolce & Gabana entre outros.

Estas duas posições antagônicas mostram que a pós-modernidade ou modernidade líquida não resiste às exclusões, a ponto de incorporar a diversidade, embora se saiba que o espaço da diferença só é legitimado quando cada diferença reconhece a outra como requisito para a sua própria manutenção. E que os sujeitos agem no mundo através da linguagem (seja ela visual ou verbal), a qual sempre carrega marcas dos valores, crenças e interesses pessoais. E que as relações de poder estão envolvidas nas interações, onde o consumo é elemento responsável no processo de construção de identidades.

Para Sant’Anna (2007) na sociedade contemporânea, o poder se estabelece por meio da competência de apropriação do novo e do encontro no outro, onde o novo conquista seu espaço de manifestação e positivação pela dialética do reconhecimento da diferença.

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Esta relação do poder da aparência traduzida na competência em lidar com o novo e a tecnologia, dentro da temática da renovação sempre crescente da sociedade moderna, também foi levantada por Sevcenko (2001), que indica que o controle tecnológico tem por conseqüência a alteração do comportamento das pessoas, no mundo novo da aceleração constante, onde o grande ganho adaptativo em termos sensoriais e culturais, consiste em estabelecer nexos imediatos com os fluxos dinâmicos, criando assim, sujeitos aptos à modernidade.

Neste contexto, onde as mudanças são constantes e rápidas e que os indivíduos buscam se relacionar e se identificar pela aparência, observamos o crescente consumo de cópias ilegais. As marcas de luxo são o foco de tipo de consumo, sendo as bolsas da Louis Vuitton as mais copiadas3. Para não sofrer impactos econômicos e de imagem institucional da marca, a empresa modificou processos e estratégias comerciais, que serão abordadas no decorrer do artigo.

5.1 Luxo

Elizabeth Wilson (1985) diz que a moda não nega as emoções, apenas as desloca para o reino da estética, em um mundo onde vivemos adornados de sonhos, movimentados pelos desejos.

E o maior destes desejos são os artigos de luxo. “O luxo é o sonho, o que embeleza o cenário da vida, a perfeição tornada coisa pelo gênio humano.” (LIPOVETSKY & ROUX, 2005, p.19).

Neste cenário, o luxo aparece como fator importante na diferenciação social no decorrer da história (principalmente a partir do final da Idade Média), segundo Burke (2002, p. 97), “Outro meio de ascensão social na Europa dos primórdios da Idade Moderna

3 Dados do III Relatório de Atividades do Conselho Nacional de Combate à Pirataria de 2006.

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era imitar o estilo de vida de um grupo mais alto na escala social e engajar-se em um “consumo conspícuo”.”

O luxo não se traduz apenas em acúmulo de bens, ele muda de tempos em tempos, de acordo com Ortiz (1991) em meados do século XIX o luxo era traduzido também na forma de lazer, e dentre eles o mais apreciado era o turismo. Criando assim uma outra necessidade de consumo, os bens relativos à viagem, dentre eles as malas tinham destaque, pois eram os invólucro de suas posses e deveriam demonstrar o poder aquisitivo de seus donos.

Foi nesta época que, de acordo com Pasols (2005), Louis Vuitton se tornou pioneiro em fazer malas luxuosas, criando uma marca que mais vende atualmente no mercado de luxo. No decorrer de seus cento e cinqüenta e três anos de história a Louis Vuitton acompanhou os acontecimentos e mudanças sociais mantendo-se no mercado como maior vendedor no segmento do luxo.

Até poucos anos, poderíamos definir o luxo como um sonho exclusivo para poucos privilegiados, mas o luxo se fragmentou em vários luxos. Seguindo as tendências de mercado, as marcas agora fazem parte de grandes conglomerados, onde o luxo artístico cedeu ao financeiro, onde criação e a alta rentabilidade tornaram-se inseparáveis.

Conforme (Lipovetsky & Roux, 2005) subjetivação, democratização da relação com o luxo: transformações que deveriam ser vinculadas à era do consumo e da comunicação de massa. A ligação do luxo com o princípio de exagero e de excesso não foi desfeita, porém, não é mais a teatralidade da riqueza que importa, mas os frissons subjetivos da aventura. Onde a própria publicidade e comunicação das marcas de luxo dedicam-se a recuperar a dimensão do desafio, explorando a veia da transgressão. Esta subjetivação e democratização da relação com o luxo são

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transformações que devem ser vinculadas à era do consumo e da comunicação de massa.

5.2 Pirataria no Brasil e em Santa Catarina

A medida que buscamos nos tornar aptos à modernidade, o consumo modificou-se. Observamos que a compra de cópias tornou-se algo normal e corriqueiro, seja ele de bolsas ou tênis, cd’s e dvd’s, remédios e alimentos ou até de peças de automóveis ou aeronaves. Mais uma vez, a tecnologia interferiu nos meios de produção e no comportamento da sociedade.

De acordo com Pinheiro-Machado (2008), “Na natureza nada se cria, tudo se copia”. No mercado também. Atualmente, na China, a produção das chamadas cópias, imitações, réplicas e falsificações é um fenômeno social que produz efeitos em todo o mundo e se impôs de forma incontrolável devido aos mecanismos através dos quais ele se expande e reinventa a si próprio. Ao passo que existem inúmeras esferas governamentais e empresariais que procuram combater tal faceta comercial, a realidade é que essa força encontra forte eco nas sociedades em que se manifesta, principalmente em países em desenvolvimento.

O III Relatório de Atividades do Conselho Nacional de Combate à Pirataria de 2006, que consta de 210 páginas de informações levantadas pelo Mistério da Justiça, Polícia Federal e Receita Federal, mostra o Brasil como o 4º colocado no ranking mundial de países consumidores de produtos piratas, atrás apenas de China, Rússia e Índia. O relatório apresenta ainda dados da International Criminal Police Organization (Interpol) citando que o comércio de produtos pirateados chega a 519 bilhões de dólares por ano, equivalentes a cerca de 5,2% do comércio mundial de mercadorias em 2006, interferindo diretamente na arrecadação de impostos e na geração de empregos.

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O problema da pirataria tornou-se tão sério que foi necessário criar uma comissão de combate a Pirataria dentro da Receita Federal, acarretando inclusive mudanças na legislação. Conforme Busarello (2007) o Brasil segue desde 8 abril de 1975, por meio do Decreto n◦. 75.572, as regras da Convenção da União de Paris (CUP), criada em 1880 visando combater a concorrência desleal e os crimes contra propriedade industrial e intelectual (mostrando que os países europeus já tinham preocupação sobre o crime da imitação há mais tempo). Mas apesar do rigor das regras internacionais e de seu tempo de existência, os tribunais brasileiros não conseguiram sua aplicabilidade em todo o território, tornando necessária a criação de uma legislação própria para este problema. A legislação sobre direitos autorais no Brasil está consolidada na lei 9.610, de 1998. Em 2003, o Presidente da República sancionou a Lei 10.695, que prevê penas de três meses a quatro anos de reclusão, sem direito a habeas copus, para crimes de violação de direitos de autor feitos com a intenção de obter lucro.

No Brasil, de cada dez CDs e DVDs vendidos, quatro são falsificados. Somente em 2006, Receita apreendeu em todo o país mais de R$ 870 milhões em produtos piratas e fechou diversas empresas de fachada, usadas na importação ilegal de produtos.Essas ações, no entanto, não afugentam os consumidores, alguns dos quais viajam para fazer compras. A informalidade é, ao mesmo tempo, causa e conseqüência do baixo crescimento do país e principalmente da grande carga tributária brasileira. É, portanto, um círculo vicioso com vários aspectos. Cada um deles requer um conjunto de ações específicas, o que torna ainda mais complexa a repressão do problema.

Na sociedade moderna ou sociedade da aparência, onde os sujeitos se relacionam a partir de fichas simbólicas. O consumo de cópias ilegais é uma realidade do tempo presente e a forma como ele se articula a partir do discurso da moda, com sua constante renovação, promovem movimentos de hierarquização e construção

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do eu. Onde as imitações desempenham um papel social decisivo, tanto no que diz respeito ao sistema de produção e distribuição de bens (na geração vasta e rápida de renda e empregos formais e informais), quanto no consumo dos mesmos.

“A partir de pesquisas etnográficas realizadas no sul da China e no sul do Brasil sobre o consumo desses produtos, percebe-se claramente que o mercado de cópias – também conhecido como pirataria – preenche lacunas abertas em diversas esferas sociais” (PINHEIRO-MACHADO (2008)

Conforme, Jung Mo Sung (2007), um outro grupo de produtos piratas é constituído por mercadorias com “griffes” falsificados. Por exemplo, uma bolsa Louis Vuitton original que custa R$ 5.000, 00 pode ser comprada na R. 25 de Março (centro de comércio popular em São Paulo) por R$ 150,00.

No Brasil e em Santa Catarina, as bolsas da marca parisiense Louis Vuitton são os produtos mais cobiçados do mercado de luxo, tendo principais consumidores, as classes médias.

No dia 12 de abril de 2006, a unidade local da Secretaria da Receita Federal (SRF), em Florianópolis realizou auditoria em um escritório comercial localizado no centro da cidade, que foi usado como um armazém de mercadorias estrangeiras em situação irregular e de abastecimento do comércio local. Entre os estrangeiros, as mercadorias falsificadas, apreendidas foram relógios, perfumes, roupas de marcas diferentes, bebidas e principalmente carteiras e bolsas da marca Louis Vuitton. O valor total da apreensão foi estimado em US $ 20.000. A operação teve a participação do Ministério Público Estado de Santa Catarina e da Polícia Civil, e foi precedida por uma investigação conjunta4.

4 Dados do III Relatório de Atividades do Conselho Nacional de Combate à Pirataria de 2006.

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No momento em que pessoas das camadas médias adquirem tais cópias, existe um jogo social para que essa bolsa se passe por legítima. Trata-se de um consumo inconfesso. Confirmando os dados de Pinheiro-Machado, a estilista Nilma Vieira-Cassol5 (2008), observa que existem casos, em que os consumidores da Grande Florianópolis (assim como nos lugares estudados por Pinheiro-Machado), esforçam-se para dizer que a bolsa foi comprada em alguma viagem, haja vista que em Santa Catarina não há loja da Louis Vuitton, ou que foi um presente ganho, ou ainda adquirido através de um grande esforço de poupança (demonstrando o valor ou status de obra de arte) . O público observador acredita na medida em que o convencimento é eficiente, há uma ascensão.

No Brasil, a Louis Vuitton possui lojas apenas em nas cidades de São Paulo e Rio de Janeiro6, e está avaliando uma boa localização em Brasília para implantação de mais uma LV no país. Vale salientar que, apesar de não ser o primeiro país da América do Sul a ter uma loja, o Brasil possui o maior número de pontos de venda da marca.

Conforme Vieira & Silva Júnior (2008), o vice-presidente mundial da Louis Vuitton, Philippe Schaus, meio ao Brasil no início de maio para inaugurar a quinta loja da marca no país e a quarta em São Paulo, no shopping Cidade Jardim em São Paulo. Além de ir à Brasília para decidir onde será o endereço Louis Vuitton na capital federal. Para ele, grau de investimento que o Brasil acaba de receber mostra que o país está no caminho certo, e reforça as decisões de investimento da LV por aqui. Contudo, espera que as altas taxas de importação de produtos sejam revistas para tornar mais fácil e barata a comercialização. Em visibilidade e vendas o Brasil é o país da América Latina tem o maior crescimento, hoje

5 Proprietária da grife Nínevi, produzindo linha festa na Grande Florianópolis por aproximada-mente 28 anos. 6 Dados do site oficial da marca. http://www.louisvuitton.com

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mais do que o dobro do México, que possui 8 lojas distribuídas em 4 cidades.

A estilista afirma ainda que antes da abertura das lojas Louis Vuitton no Brasil, o local mais próximo para compra era Buenos Aires (Argentina). Assim a aceitação da cópia como original, denotava ainda o ato de viajar, no caso, uma viagem internacional. Porém, observa que tais cópias (chamadas de primeira linha), tratam-se de produtos com bom acabamento e cuidado aos detalhes, vendidas por um valor alto (para uma cópia), sendo muitas vezes difícil de diferenciar, pois a costura, o zíper, os ilhoses da bolsa, e a própria tonalidade aproximam muito das originais.

As bolsas LV originais com monograma possuem alças em couro cru e que vão escurecendo com o tempo, o forro interno é em tecido diferenciado e na cor vinho. Em qualquer dos modelos, podem ser de couro EPI (um couro riscadinho), lona ou jeans, além de outros materiais menos comuns, as letras LV aparecem cortadas ou separadas nas peças originas. Têm fechos dourados e banhados a ouro. Todas as bolsas e carteiras sem exceção possuem número de série composto por 2 letras e 4 números gravado no couro da própria bolsa, este lugar varia de acordo com o modelo.

Há somente seis cores na bolsa Louis Vuitton falsificada, enquanto a legítima tem 31. A tinta utilizada descasca com facilidade. Mais rosado, o couro da alça é pintado, ao passo que na original escurece com o tempo. As costuras são tortas e malfeitas. Nem o zíper escapa: “É de péssima qualidade e apresenta sinais de oxidação mesmo sem uso”, diz Marcelo Noschese, presidente da Louis Vuitton no Brasil. Internamente, a falsa é forrada com um pano sintético de cor bege, que em nada se parece com o tecido vinho usado pela marca francesa. Em alguns camelôs, ela

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vem em uma simples sacolinha de pano, onde está escrito “Malletiera Paris” (o correto é “Malletier a Paris”). (DUARTE &SALLUM, 2003)

Em conversa informal com lojistas7 do Centro Comercial Varejista Camelão8, nos últimos três anos tem crescido a busca por cópias de “bolsas de marca”, também por pessoas de menor poder aquisitivo. Dizem que aquelas que não têm muito conhecimento sobre a marca Louis Vuitton, ou não possuem condições de pagar por uma, acabam comprando uma Fendi9, que das bolsas ditas de marca, é a de menor valor. Contudo, há casos “em que a compradora vê a LV da “patroa” tem e quer uma também, nem que para isto, tenha que parcelar em diversas parcelas”. O cartão de crédito popular facilitou o acesso à compra para pessoas de menor poder aquisitivo.

E ainda há, o que as lojistas chamam de “cópia da cópia”, peças produzidas geralmente por confecções da região, nas quais o modelo e a logomarca são semelhantes aos da Louis Vuitton, que de acordo com as mesmas, enganam à primeira vista. Sendo estes, os modelos mais vendidos para pessoas de menor renda, e que não estão envolvidas emocionalmente com a marca. Compram porque acreditam que está na moda.

Observam também, que as clientes que compram cópias da bolsas da LV desde quando começaram a vender, buscam comprar os lançamentos, sendo importante o destaque para logomarca.

Dados da Receita federal apontam as regiões sudeste e sul como maiores consumidores dos produtos pirateados, talvez

7 Loja 3 e 4, Din Don Bolsas e Acessórios, Pimenta Doce Festas e Jan Bolsas.8 Inaugurado no dia 1° de Março de 1996, em Campinas/São José, o Centro Comercial Varejista Camelão conta com uma estrutura de 182 lojas divididas entre 82 lojistas formando o maior Centro de Compras da sua Região. Dados do site oficial do Camelão. http://www.camelao.com.br

9 Marca Italiana.

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por maior interesse e busca por informações de moda ou por sua tradição no ramo. Porém, para Hobsbawan (1998, p. 49-50) “toda a previsão sobre o mundo real repousa em grande parte em algum tipo de interferência sobre o futuro a partir daquilo que aconteceu no passado [...] Não obstante, passado, presente e futuro constituem um continuum.” Seguindo esta linha de pensamento, observamos que as relações que se dão pela aparência a partir da perfeita manipulação das fichas simbólicas seguem um continuum. E dialogando com Consini & Sant’Anna (2006) verificamos que a partir de 1855 ocorre uma verdadeira revolução na moda feminina das catarinenses, voltando seus olhares e consumo para produtos vindos França, contudo, sem perder o vínculo com Portugal. Mas sobretudo, mais do que ligações com Portugal ou França, as mulheres de Desterro e do país seguem este círculo, buscando um fator de integração que aos membros dessa camada igualar-se á aristocracia portuguesa e a burguesia européia.

Cada vez mais, chegam bens falsificados chineses ao Brasil. Embora esses produtos sejam de comercialização proibida sob o ponto de vista legal, enquanto o consumidor está consciente do que compra e de suas escolhas, há uma gradação moral que pode ser socialmente aceitável. Para Rover (2008) na realidade o problema que existe hoje não é de falta de leis, no máximo é preciso flexibilizar as regras face à dinamicidade do mundo de hoje. Existe de fato uma impossibilidade de tornar eficazes as leis atuais, na medida em que as pessoas se adaptem para fugir da lei, quando a consideram ilegítima. Bolsas Louis Vuitton ainda são inofensivas. O problema é que ela se estende a outros produtos como remédios e alimentos.

Complementando, Jung Mo Sung (2007), destaca que A pirataria das grifes mostra que o capitalismo global logrou conquistar os desejos mais profundos não só dos bem integrados no mercado, mas também dos pobres e da “classe média remediada”. Estamos

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vivendo uma “colonização da subjetividade” da população mundial (ou de uma grande parte dela) pela cultura capitalista global. O que move todo esse comércio em torno das mercadorias piratas é o desejo das pessoas, que não podem pagar o preço dos originais, de participar desse mundo, onde as grifes como Louis Vuitton, conquistaram a mente e o coração das pessoas.

Questão importante a ser ressaltada é que o consumo destes produtos tomam o lugar religião e outras estruturas que “davam aos indivíduos uma ancoragem estável no mundo social.” (HALL, 2001). Nesta sociedade pós-moderna, onde as certezas estão desfeitas na fragmentação das identidades, o ato de comprar preenche um vazio, dando a oportunidade de agregar a si elementos dos objetos e construir um novo eu . Capaz de fazer com que se sintam participando do algo inacessível, que é fonte de sentido e força para as suas vidas. Características que o mundo religioso tradicional chamava de “sagrado”.

5.3 Louis Vuitton

Em 1836, aos 14 anos, Vuitton deixou o pequeno vilarejo francês de Anchay e mudou-se para Paris. Como era carpinteiro, ofício que aprendeu, ainda criança, com seu pai, conseguiu emprego como aprendiz de um grande artesão de malas, Monsieur Marechal. Aos 43 anos, abriu sua própria loja, batizada de Louis Vuitton Malletier. Vendia baús, que logo se tornaram reversíveis em guarda-roupa com gavetas e cabides, escritório e cama. Tudo para agradar aos viajantes do século XIX.

A expansão da Louis Vuitton começou um ano após a sua morte, em 1893, quando seu filho Georges levou os produtos para a Feira Mundial de Chicago. Por conta da alta qualidade e inovação (eram quadradas e tinham compartimentos), o material era sempre

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o mesmo: madeira, zinco, cobre e lonas impermeáveis. A ferramenta era o apuro artesanal, que conquistou ricos e nobres.

Para minimizar as cópias, os baús se tornaram o primeiro produto manufaturado a levar uma assinatura do lado de fora: “marque L.Vuitton”. Foi em vão, surgiu então, em 1896 um novo desenho: a tela de monograma bege e marrom que atravessou os tempos. O maior sucesso da Louis Vuitton através dos tempos, a bolsa Keepall, a primeira com tecido impermeável flexível (as LV anteriores eram todas rígidas), foi inventada em 1924, sendo vendida até hoje em todo o mundo.

A marca faz parte do grupo LVMH, “primeiro grupo mundial de marcas de luxo, que realizou um montante de negócios de 12,2 bilhões de euros em 2001” (LIPOVETSKY & ROUX, 2005, p.14) dos quais sessenta por cento, movimentados pela marca Louis Vuitton.

Ainda de acordo com (LIPOVETSKY & ROUX, 2005, p.165) “O que diferencia uma marca de luxo de uma marca de moda é a sua inscrição no na longa duração, para além dos ciclos efêmeros da moda, a relação com o tempo está no próprio princípio da gestão da identidade estilística da marca.” Para Louis Vuitton este modelo de gestão seguiu a linha da continuidade, onde houve uma transição criativa, porém o novo criador soube projetar a ética da marca em uma nova época, sendo ao mesmo tempo fiel aos valores e a identidade da marca.

Seguindo as tendências de mercado a Louis Vuitton, em 1998 contratou Marc Jacobs como diretor artístico e ingressou no mundo do prêt-à-porter, modificando sua filosofia, antes baseada na arte de viajar e em produtos tradicionais, feitos à mão, com status de obras de arte. A visibilidade social das marcas de luxo cresceu fortemente pela intensificação do investimento publicitário e pela midiatização das marcas de luxo.

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Atualmente a marca vende roupas, acessórios e todos tipos de malas e bolsas, em mais de 350 lojas no mundo, expandindo seu mercado para América Latina, África e principalmente Ásia. Overmeer (2005) diz que a diretora de comunicação e expansão da marca, Mimnna Viglégio, observa que os asiáticos se identificam muito com a atual filosofia da Louis Vuitton, que combina tradição e inovação, sendo este, seu mais importante canal de comunicação com eles.

Neste processo de comercialização em maior escala e entrada no mercado do prêt-à-porter, a Louis Vuitton precisou modificar seus meios de produção, utilizando-se da terceirização, o que proporcionou um maior acesso aos produtos e facilitou a pirataria.

O italiano Marcello Bottoli, primeiro presidente não-francês da companhia, diz no programa Mundo S/A do dia 14 de abril de 2008, exibido pelo canal Globo News, que ficará preocupado no dia em que as cópias não existirem mais. As falsificações são um termômetro da popularidade da marca. Só uma parte ínfima dos clientes adquire uma cópia, porque sabe que a qualidade é muito inferior. “Nossa perda financeira não é importante. O problema é de imagem. A gente fica vendo essas sacolas malfeitas com o logo LV.” Afirma ainda “não estamos interessados em criar para a massa. O luxo é, por definição, um sonho exclusivo para poucos privilegiados.” Com este problema de imagem criado pela pirataria, hoje o maior desafio da marca resgatar os clientes mais tradicionais, isto é levado tão a sério que a LV é a única marca de luxo que não faz liquidação.

Quanto às bolsas a Louis Vuitton seguiu uma estratégia de segmentação. Mantém a produção de peças exclusivas, sob encomenda e feitas à mão. Tem uma linha de bolsas produzidas em pequena quantidade, também confeccionadas por processo manual, como a bolsa Tribute, “uma bizarra colagem de pedaços de quinze bolsas tradicionais da qual foram produzidos 24 exemplares, a 42.000

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dólares (80.000 reais!) cada um.” (VILLAVERDE, 2007, p.108) Tais peças têm status de obra de arte e fazem parte do Museu da LV, localizado na antiga casa da família e com entrada restrita apenas a poucos convidados.

“A fascinação pelo objeto artesanal vem do fato deste ter passado pela mão de alguém cujo trabalho ainda se acha nele inscrito: é a fascinação por aquilo que foi criado (e que por isso é único, já que o momento da criação é irreversível).” (BAUDRILLARD, 2000, 85)

E por fim, a Louis Vuitton lança a cada estação uma nova coleção de bolsas diferenciadas, como forma de minimizar a cópia, pois, até que as peças sejam reproduzidas em larga escala (de forma ilegal), os modelos originais já estarão sendo substituídos por outros. Destas peças de coleção, apenas as que fazem muito sucesso são incluídas no chamado “hall da fama” da LV, como o caso das bolsas criadas por Takashi Murakami em 2003, nas quais ele trabalhou a tradicional logomarca brincando com cores e formas. “O estilo de Murakami é um dos mais individualistas da arte contemporânea japonesa [...] se distingui por combinar as tradições visuais japonesas e sua cultura popular com a pop art americana.” (OVERMEER, 2005, p.32)

Outra alternativa contra a pirataria, tem sido a formação de grupos de proteção criados pelas empresas, dentre eles ganha destaque o Brand Group Protection (BPG), formado em 200210, do qual fazem parte empresas como Louis Vuitton, Oakley, Chanel, Philip Morris, Souza Cruz, Nike, Henkel e BIC. O grupo trabalha em colaboração com órgãos oficiais, como o Conselho Nacional de Combate à Pirataria. A principal ação do BPG é o treinamento dos agentes aduaneiros para reconhecer a entrada de produtos falsificados ou contrabandeados no país.

10 Dados do III Relatório de Atividades do Conselho Nacional de Combate à Pirataria de 2006.

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5.4 Conclusões

Na dinâmica da moda o sujeito moderno adquiriu a legitimidade de viver na aparência, de abandonar a religião, os ideais revolucionários e políticos, de buscar mais o prazer de viver do que sua compreensão. As palavras de Sant’Anna (2007)são um convite à reflexão sobre as relações entre aparência e poder, onde este segundo remodela-se a partir da primeira. Na sociedade contemporânea, o poder se estabelece por meio da competência de apropriação do novo e do encontro no outro, onde o novo conquista seu espaço de manifestação e positivação pela dialética do reconhecimento da diferença.

O tema central deste estudo circula as relações que se fazem e se mantêm pela aparência e correta manipulação das fichas simbólicas, e como isto articula a para construção de novas identidades. Os dados abordados acima demonstram o crescente consumo de cópias piratas, para a partir de uma resignificação pela posse do objeto. Mas até onde esta relação é permeável, ela transpõe todas as camadas?

Conforme Walter Longo11 (2007) “se minha esposa comprar uma bolsa Louis Vuitton falsificada, ela passará por verdadeira, já se minha empregada comprar um verdadeira, esta passará por falsa”. E continua, abordando que quando se tratam de objetos de luxo o processo de significação não se dá no produto e sim na pessoa. Mostrando o outro lado do sistema classificatório discriminador da sociedade brasileira, que pouco conferirá legitimidade a uma Louis Vuitton usada por indivíduos de camadas populares. É por isso que o mercado de réplicas no Brasil terá apelo principalmente

11 Walter longo, 57 anos, é mentor de estratégia e inovação do Grupo Newcomm – holding for-mada pela associação de Roberto Justus e Grupo WPP. Dados do site http://walterlongo.com.br

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entre pessoas da classe média, os quais sentem que, através do uso da marca, conseguem burlar momentaneamente sua condição social numa direção ascendente.

E se pensarmos em Bourdieu, lembraremos que as distinções sociais estão atreladas ao consumo e às possibilidades de ser ou não um consumidor, ou ainda de ser associado à aparência mais in ou de estar distante dela.

Desta forma podemos analisar o fenômeno do consumo de cópias de produtos do segmento de luxo, a partir da ótica da modificação da aura dos mesmos. Na medida em que a tecnologia e a reprodução modificam sistemas de consumo e encurtam distância entre o luxo e o popular, transformando os valores estéticos e simbólicos dentro de um sistema de hierarquização social e construção do eu.

Walter Benjamim (1975) descreve a aura da obra de arte (comparando os produtos originais da Louis Vuitton com obras de arte, devido a seus status dentro do segmento de mercado de luxo) como fator decisivo em sua função ritualística e de como a tecnologia e a reprodução modificam esta aura. Para ele a reprodução não implica necessariamente em perda da aura, mas sim em uma transformação da mudança de seu valor como objeto de culto para seu valor como realidade exibível.

Sob este ponto de vista, Longo discorre que ser copiada é a maior confirmação do sucesso de uma marca, chegando ao “limite máximo de sua possibilidade de projeção”, mesmo que isto implique em despertar o desejo também nas classes populares.

Frente a esta realidade, a saída para as empresas que dependem da imagem do luxo foi criar linhas de produtos de grande impacto e altos preços, o segmento do hiperluxo, buscando preservar

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o prestígio dos clientes mais importantes e diferenciá-los dos outros compradores.

Concluí-se que no caso da Louis Vuitton, o processo passou por uma gestão de transição criativa, onde o novo criador soube projetar a ética da marca em uma nova época, sendo ao mesmo tempo fiel aos valores e a identidade da marca, combinando tradição e inovação.

Para reposicionar a marca, a Louis Vuitton optou por uma divisão clara entre suas linha de produtos, uma seguindo a supervalorização do luxo para resgatar os clientes mais tradicionais; e outra apostando na velocidade do sistema de moda como forma de minimizar o processo de produção de cópias ilegais.

Por este viés, pode-se fazer um paralelo com o atual momento com a indústria catarinense, que percebeu que a partir da união em conglomerados e buscando uma identidade criativa, pode também segmentar e diferenciar seu mercado em espaços bem demarcados. Porém, isto deve partir de um movimento em diversas direções. Alexandre Megegotti em entrevista a Rogar (2007), diz “que esta preocupação com o design e a nova ênfase no estilo também teve seus reflexos nas universidades: Santa Catarina é hoje o segundo estado em cursos de moda do país, perdendo apenas para São Paulo”.

Nesta segmentação vê-se a possibilidade de Santa Catarina deslanchar como estado criador e gerador de moda, buscando mercados que se aproximam ao luxo, ou caminham em direção a ele. Porém, ainda assim vão se manter as pequenas confecções ou os mercados de cópias, pois há espaço e consumidores para todos. A questão é quais serão as relações que marcarão os momentos em que eles se permeiam.

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Fabiana Ludwig

Capítulo VI

A importância do aplicativo CorelDRAW nas empresas têxteis catarinenses para o

desenvolvimento de desenhos técnicos dos produtos do vestuário

Fabiana Ludwig1

“Se uma imagem vale por mil palavras, será que

mil palavras conseguem explicar uma imagem?”

Michael Stephan, A Transformational Theory of Aesthetics.

6.1 O Avanço Tecnológico

Cada vez mais profissionais de diversas áreas vêm percebendo a necessidade de aperfeiçoar suas técnicas de trabalho devido o desenvolvimento tecnológico. Podemos citar como exemplo, o telefone celular que deixa de ser um simples meio móvel de comunicação para funcionar como câmera digital fotográfica

CRÍTICA

1 Mestranda em Educação - Educação, Comunicação e Tecnologia – UDESC e professora nos Cur-sos de Design de Moda da UDESC e UNIASSELVI. [email protected]

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e cinematográfica, televisão, rádio, MP3, MP4, bússola, internet, podendo receber e enviar e-mails e até mesmo servir como um rastreador. Essas mudanças se dão de um mês para outro. Um telefone móvel, adquirido hoje com a maior tecnologia do momento, pode, em menos de dois meses, tornar-se ultrapassado.

A rapidez com que os fatos acontecem é percebida por toda a sociedade, pois a busca pelo novo, o atual e o moderno são feitos a qualquer custo. O filósofo Gilles Lipovetski ressalta esse desejo contínuo das pessoas por novidade em seu estudo deste fenômeno efêmero e quem lida com moda deve estar atento a essa necessidade do público para qual trabalham:

Com a moda, aparece uma primeira manifestação de uma relação social que encarna um novo tempo legítimo e uma nova paixão própria do ocidente, a do “moderno”. A novidade tornou-se fonte de valor mundano, marca de excelência social; é preciso seguir “o que se faz” de novo e adotar as últimas mudanças do momento: o presente se impôs como o eixo temporal que reage uma face superficial mas prestigiosa da vida das elites. (LIPOVETSK, 1989)

Devido a esta busca frenética pelo novo, surgiram computadores com softwares e internet que nos permitem, dentre outros, assistir grandes eventos simultaneamente em todas as partes do mundo. Questiona-se como o homem viveria sem essa máquina que propaga informações de forma instantânea pois vivemos em um momento que a ausência destas facilidades nos tornaria totalmente limitados. Sem dúvida, a tecnologia dinamizou nossas vidas, em contrapartida, tornamo-nos escravos da nossa própria criação, pois sem ela voltaríamos praticamente ao tempo das cavernas.

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2 CAD/CAM - COMPUTER AIDED DESIGN E COMPUTER AIDED MANUFACTURING (De-senho assistido por computador e Manufatura Assistida por computador).

Na cadeia têxtil o processo não é diferente e exige o mesmo dinamismo. A tecnologia traz a agilidade e a praticidade tanto para os maquinários, que auxiliam a produção, quanto aos inúmeros softwares criados a todo instante para facilitar o setor de criação, como ressalta Sue Jones:

As novas tecnologias permitem por exemplo que um traje de tamanho padrão seja cortado e alinhavado em aproximadamente noventa minutos [...]. Roupas também podem ser feitas em medidas individuais e cortadas a laser, usando a tecnologia de design assistido por computador (CAD-computer-aided design). Alguns equipamentos de CAD criam tingimentos por pistola hidráulica para peças como o jeans, que são reproduzidos aos milhares. De modo similar, as inovações desenvolvidas por engenheiros japoneses na malharia assistida por computador permitem a confecção de peças inteiras em malha, com golas e bolsos, em 45 minutos. (JONES, 2006. p. 58)

Feghali acredita que “o principal avanço neste setor foi a utilização da tecnologia CAD/CAM2, tanto nas fases de concepção e desenho como na preparação e execução do corte de tecidos” reduzindo quase à metade o tempo gasto antes, ao passo que os desenhos executados pelo computador tornam a produção muito mais flexível. (FEGHALI, 2001.p.64).

Qualquer setor que envolva desenho admite a utilização do sistema CAD. Os dois sistemas são responsáveis por agilizar e organizar os processos de um desenho, bem como podem operar máquinas de corte a laser. No mesmo sentido, Jones diz que “a aceleração de uma série de pequenos processos permitiu à indústria

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responder com rapidez às demandas do mercado (confecção just in time)”(Ibidem. JONES, 2006). A presença do computador no ramo têxtil é, portanto, uma ferramenta de fundamental importância, em função de suas peculiaridades já abordadas.

No que toca ao meio acadêmico, observa-se a necessidade de conhecer determinados aplicativos para o desenvolvimento das coleções de moda. Painéis e desenhos compõem esse processo de criação na medida em que são empregados em projetos e dossiês, como acontece nas empresas. Em conseqüência disso, o conhecimento de softwares voltados ao desenvolvimento de desenhos técnicos se torna de grande relevância, constituindo, na maioria das vezes, uma verdadeira condição para admissão no atual mercado de trabalho catarinense.

Estes fatores desencadearam a necessidade de investigar o aplicativo CorelDRAW por ser um software que realiza desenhos vetoriais. Este aplicativo é conhecido há bastante tempo no mercado e seu uso está associado a imprescindibilidade de se otimizar a produção nas empresas, bem como agregar valor estético e funcional aos desenhos. A exigência das empresas pela manipulação do aplicativo CorelDRAW se dá já em função de ele possibilitar o desenvolvimento de croquis de moda bem como os desenhos técnicos dos produtos do vestuário. Por meio destas representações o(a) modelista interpretará os desenhos para desenvolver a modelagem, permitindo desta forma a continuidade à produção.

6.1.1 O desenho realizado no computador

As vantagens de se realizar um desenho pelo computador são inúmeras. O aplicativo CorelDRAW como já mencionado anteriormente pode realizar os desenhos técnicos que são as representações gráficas corretas para leitura das principais peças do vestuário feminino,

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masculino e infantil. Por ele desenvolvem-se com grande rapidez e precisão localização de aviamentos, recortes, costuras, pespontos, filetes, frisos e até o preenchimento de desenhos com cores e texturas. 3

A camisa masculina pode ganhar inúmeras variações. Com poucos “clicks” criam-se diferentes modelos apenas mudando um decote redondo por um decote em “V”, uma camisa pólo pode se transformar em uma com gola dupla ou modelo raglan. Blusas femininas se transformam em segundos de em decote transpassado para uma blusa com gola alta. Essas mudanças podem ser feitas em um curto espaço de tempo quando o designer cria em seu computador, uma biblioteca virtual. Ao armazenar seus desenhos, basta abrir as bases de desenhos já antes feitas e arrumar detalhes sobre um desenho semelhante, pois para o desenhista tanto de uma empresa como o freelancer essa economia de tempo, papel e outros materiais é bastante significativa.

Faz tempo que os desenhistas têxteis, designers gráficos e ilustradores usam o computador como ferramenta de desenho. Até recentemente o desenhista de moda preferia criar desenhos e fichas técnicas à mão. As grandes melhorias na qualidade, facilidade de uso e preço dos computadores e programas para o setor de moda, têm mudado a relação entre os desenhistas e os computadores. (SHULTER, 2003).

Uma vantagem muito grande no desenho feito pelo computador é sua facilidade de uso e a agilidade. Muda-se a cor da roupa, o comprimento da saia, a largura da perna da calça de

3 Desenhos técnicos não são preenchidos com cor ou textura por dificultar a visualização de seus pormenores. Mas representações planificadas com tais preenchimentos podem complementar a do desenho que está em preto e branco para uma maior compreensão do modelista. Este método é bastante usado em empresas têxteis nos casos em que um mesmo produto possui moldes que devem ser cortados em diferentes tecidos.

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acordo com o gosto do cliente em apenas alguns “clicks”. Em relação ao desenho feito a mão livre no papel, o desenho no computador está bem a frente em relação a isto, pois do modo manual, tais mudanças começariam da “estaca zero”.

As possibilidades de variações e experimentações de cores e outras técnicas ilustrativas dão uma devida qualificação ao trabalho do profissional, como destaca Schulte:

Os alunos destacam o computador pela agilidade, rapidez. ‘a escolha de cores e formas já prontas agiliza o desenho, entrega para o cliente com maior rapidez, por ex., um trabalho feito aqui pode ser entregue via e-mail no Japão, corrige de forma mais fácil e rápida os erros’; pela Facilidade ‘facilita a representação da criação, o estudo das padronagens, as repetições’; pelas possibilidades de criação ‘permite criar mais variações sobre o tema, desenvolver mais as estampas, os efeitos fazem o diferencial’. (SHULTER, 2003, p.96)

Para acrescentar, Ostrower reforça um pouco mais as vantagens de se usar o computador para desenhar:

As técnicas de computação introduzem formas e efeitos visuais inteiramente novos. Pelo ‘pincel eletrônico’, qualquer imagem no televisor pode ser inteiramente alterada; as linhas, as cores, os contrastes, as proporções, a imagem positiva virando negativa, ou vice-versa, maior, menor, os vermelhos virando azuis ou verdes ou outra cor qualquer. Ao mesmo tempo, os enquadramentos podem ser ampliados ou reduzidos, ou combinados das maneiras mais diversas, isolando-se trechos ou detalhes, acrescentando-se outros ou reagrupando-os. Seqüências inteiras podem avançar ou recuar no campo visual, podem ser

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aceleradas, espaçadas, repetidas ou invertidas para passar de trás para frente. A precisão do foco pode ser enturvada, ou como por um passe de mágica, os diversos planos da imagem podem surgir ou sumir de vista. As imagens podem ser misturadas, fundidas ou então desmanchadas, como que ‘liquefeitas’, escorrendo em borrões e formando outras imagens. Utilizando-se a memória do computador, pode-se justapor seqüências arquivadas e outras mais recentes, ou então superpor desenhos diretamente

projetados [...]. (OSTROWER, 1977, p. 69)

As ferramentas virtuais executam tudo o que pode ser feito no papel: pintam, recortam, colam, alteram cores e linhas, transformam texturas e possuem a vantagem de refazer qualquer dessas tarefas, sem a necessidade de iniciar um novo trabalho. Diante destas peculiaridades do aplicativo e a agilidade que ele trás ao setor de criação, universidades adotam esse novo método de se desenhar em sua grade curricular e empresas executam seus desenhos por meio de softwares como este.

6.1.2 Os desenhos técnicos no computador e nos cursos de Design de Moda

Os cursos de graduação ou tecnólogos direcionados à área de criação têxtil em moda cresceram nos últimos vinte anos de maneira exorbitante. De acordo com Caldas, essa mudança iniciou no final dos anos de 1980 em São Paulo com a instalação de três cursos superiores. Abaixo vemos um levantamento feito em 2004:

Para contrastar com a atualidade, uma consulta ao site da Secretaria de Ensino Superior do Ministério da Educação (MEC) será tomada como evidência da rápida evolução do

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segmento. Apenas no Estado de São Paulo, são 12 cursos superiores de moda com autorização de funcionamento, oito na capital e quatro no interior do estado. Na Região Sudeste, esse número sobe para 25. No país inteiro, são 46 cursos de moda, em sua grande maioria formando bacharéis (raras exceções oferecem o diploma de tecnólogo superior) e oferecendo um número de vagas anuais que ultrapassa a casa dos quatro mil e quinhentos. (CALDAS, 2004, p.174)

Segundo a coordenadora do curso de Design de Moda da Universidade do Estado de Santa Catarina – UDESC, MSc. Icléia Silveira e Silva, só no estado de Santa Catarina, que é um dos maiores pólos têxteis do Brasil, existem hoje mais de 30 cursos capacitando novos profissionais em design de moda.4 No final do ano de 2006 esse número era de 15 cursos, ou seja, os cursos dobraram em menos de dois anos.

Através destes dados, podemos perceber que tanto as instituições de ensino como as pessoas que optam por um curso de moda para se especializar, compreenderam que moda não é futilidade, e sim uma grande área que gera recursos para o país que é o quarto mercado mundial do setor. Conforme a revista Isto é, no ano de 2004 a indústria têxtil já respondia por 13% do PIB nacional, arrecadando por ano US$ 24 bilhões.(ISTO É, 2006. p.20)

No decorrer destes cursos de graduação em design de moda ou demais cursos direcionados à área de criação têxtil, diversos conteúdos são ministrados com a finalidade de elucidar aos alunos, todo o processo de desenvolvimento de um produto voltado ao segmento de moda. Podemos destacar algumas disciplinas que abordam tal assunto como as de pesquisa de moda, laboratório de

4 Cursos de Graduação e Tecnólogos.

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criatividade, tecnologia têxtil, história da moda e da indumentária, modelagem, moulagem5, ateliê de confecção, administração, marketing, psicologia da moda, projeto de produto etc. Além destas matérias que auxiliarão o desenvolvimento de uma coleção, os cursos oferecem disciplinas como as de Desenho e de Computação gráfica, ambas aplicadas ao design de moda, onde mostram meios para o designer transpor para o papel suas idéias.

O conhecimento de determinados aplicativos para o desenvolvimento de croquis fashion e seus respectivos desenhos planificados (desenhos técnicos) é de fundamental importância para estilistas, acadêmicos e designers de moda. Algumas universidades catarinenses como a Universidade do Estado de Santa Catarina - UDESC e o Centro Universitário Leonardo da Vinci - UNIASSELVI, situadas respectivamente em Florianópolis e em Indaial, possuem em sua grade curricular, disciplinas ministradas com o objetivo de ensinar aos seus acadêmicos de design de moda, meios para a realização destes trabalhos no computador por meio de aplicativos como o CorelDRAW. Desta maneira os acadêmicos não precisam realizar cursos extracurriculares para aprenderem o que as empresas exigem e esperam de um profissional e empresários encontram com maior facilidade profissionais qualificados para trabalhar no setor de desenvolvimento.

6.2 Desenho Técnico

Quem trabalha com criação considera o desenho técnico obrigatório ao desenho de moda. Os desenhos fashion, assim também conhecidos, são mais agradáveis aos olhos, pois são o fruto da criatividade e das idéias representados de maneira artística através

5 Palavra de origem francesa. Técnica de modelagem, onde os moldes são executados no próprio manequim (busto de moda em escala 1:1 ou 1:2) com tecido americano.

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de um croqui. Mas por mais legíveis que possam parecer e estando representados de maneira mais humanizada que estilizada, mesmo assim vão estar privados de detalhes e vão dificultar a imediata compreensão do modelo.

Diante disso, sabemos que os croquis por mais belos que forem e concebidos com fidelidade à idéia do designer de moda, são pouco usados nas empresas têxteis. A produção requer agilidade cabendo muitas vezes ao desenho técnico representar as duas funções que é a de representar a criação do estilista substituindo assim o croqui, e a de desenho planificado com todas as particularidades que este desenho requer.

Quando executados os croquis, como forma de representação das idéias do designer, percebemos que cada vez mais estes desenhos exigem o complemento através dos desenhos detalhados. Os desenhos técnicos são atualmente uma exigência nas indústrias e são necessários para a linha de montagem de produção.

Com o advento do projeto organiza-se a estrutura que permitirá a divisão de trabalho. O profissional responsável pelo projeto não precisa necessariamente se ocupar da confecção dos produtos. O operário responsável pela produção do produto conseguirá, através das indicações que oferecem o projeto, concretizar as idéias do projetista, esboçadas somente no papel. (MEYER, 2006, p.64).

Estas indicações existentes nos desenhos técnicos são essenciais para a compreensão exata das idéias do projetista. Nele consta o tipo de tecido que será usado, o local onde serão aplicados os aviamentos, bolsos, zíperes, ilhós; a posição exata das costuras e pespontos e demais detalhes na ficha técnica que indicarão subsídios

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para que este desenho bidimensional possa ser reproduzido em modelos tridimensionais idênticos.

O croqui é um desenho artístico que não lhe cabe a função de indicar medidas ou demais detalhes que darão suporte a produção. Ele é um facilitador representado de forma legível e que permite uma rápida compreensão por quem o visualiza.

O corpo humano é o suporte para a criação da vestimenta e o desenho técnico nada mais é do que a representação de uma determinada roupa vestindo essa figura humana em suas proporções reais visto de frente, de costas e a lateral quando necessário. Os desenhos técnicos geralmente não reportam àqueles que o desenho de moda já visualiza, isto é, o tecido, a cor, brilhos etc. Entre outras formas, o profissional de moda pode se comunicar por meio de desenhos técnicos de maneira que possa orientar a produção de peças do vestuário registrando graficamente de maneira clara e objetiva dimensões, formas, medidas, materiais a serem utilizados e acabamento desejado.

Sobre os desenhos planificados, Treptow afirma que o corpo do manequim é abstraído e que distorções e alongamentos que são característicos do desenho de moda, devem ser evitados. As informações contidas nele devem ser precisas para a confecção da peça, como a riqueza em detalhes de costuras ou acabamentos. (TREPTOW, 2003.p 148). Leite e Velloso nos apontam o desenho técnico como uma espécie de código genético da roupa. Logo após o produto estar totalmente pronto para ser reproduzido e aprovado em sua forma final, dá-se a ele o nome de peça piloto. A partir desta peça se fará o desenho detalhado, com todas as especificações de construção e produção. A principal função destes desenhos é fornecer os esclarecimentos técnicos para a confecção da roupa, mas eles podem também ser usados para outros fins, como catálogos e manuais de venda. (LEITE, 2004).

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Enquanto não existirem normas da ABNT6 para os desenhos técnicos do vestuário, sugere-se que cada empresa do ramo têxtil, use a representação que melhor lhe aprouver, onde os desenhos não percam sua verdadeira função que é a de ser o elo de comunicação entre projetista e produção.

6.2.1 Normas usadas para o desenho técnico do vestuário

Diante da falta de regulamentação para executar de maneira correta os desenhos técnicos para o vestuário até o presente momento, é nítido perceber em muitas bibliografias nesta área, algumas contradições decorrentes do assunto. Os materiais encontrados acabam por divulgar métodos em que os autores usam em sala de aula ou em empresas onde trabalham. Conforme Abreu, essas diversas abordagens vêem contribuir para a urgente necessidade de se estabelecer regras para esse campo, onde as representações corretas seriam executadas de uma só maneira. (ABREU, 2005, p. 92)

Sugere-se neste artigo o método usado pela autora em sala de aula que consiste nas seguintes etapas de desenho:

FIGURA 1 - SEQÜÊNCIA DE DESENHOS

FONTE: Desenvolvido pela autora

A partir do momento que temos a idéia do produto que será desenvolvido, desenhamos sobre a base humana7 seu desenho técnico com medidas, recortes, costuras e demais detalhes que esta

6 Associação Brasileira de Normas Técnicas.

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peça possui para que ela possa ser produzida. Utiliza-se este “apoio”, pois ele já foi previamente desenhado em escala e o desenho ficará com o tamanho e medidas proporcionais ao produto real. Através deste desenho se desenvolverá a peça piloto visto que a partir deste produto já finalizado e aprovado em suas provas e acabamentos se fará o desenho técnico definitivo em escala8 sem ter mais a base humana como apoio. A importância de este desenho estar em escala se dá ao fato de excluir possíveis erros em seu produto final, pois se o desenho estiver fiel à idéia do designer, basta produzí-lo de acordo com as informações técnicas apontadas.

Segundo Ferreira, “escala é uma linha graduada, dividida em partes iguais, que indica a relação das dimensões ou distâncias marcadas sobre um plano com as dimensões ou distâncias reais”.(FERREIRA, 1993, p. 218). Usa-se esse método de se trabalhar em escala, pois para muitos casos dificultaria executar desenhos em medidas reais do seu produto. Engenheiros, arquitetos e projetistas, por exemplo, usufruem a técnica do desenho em escala, ao fato de ser impossível, na maioria das vezes, a representação de objetos9 em tamanho natural (escala 1:1), pois seria inviável manusear e armazenar tais desenhos ou projetos, devido ao seu imenso tamanho. Isto até mesmo nos impossibilita de imaginarmos a representação de uma construção civil, um desenho de uma casa ou um prédio em tamanho real, por exemplo.

7 A UDESC desenvolveu no ano de 2006 este estudo da base com as medidas reais do corpo hu-mano (feminina, masculina e infantil), pesquisado pela professora MSc.Lourdes Maria Puls e o professor MSc. Lucas da Rosa. Os resultados deste estudo são igualmente usados por eles em sala de aula e foram gentilmente cedidos para a pesquisa da Monografia de Especialização da autora: “O Desenvolvimento de croquis, desenhos técnicos e Painéis de Moda por meio dos aplicativos CorelDRAW e Photoshop”.UDESC, 2006.8 Escala é uma lei de relacionamento que deve existir entre um desenho representativo de um obje-to e o objeto, para que haja autenticidade na representação [...] Ela é definida como a relação entre os comprimentos em um desenho e seus correspondentes ao natural. (RANGEL, 1979, p.18) 9 De modo geral, chama-se objeto tudo que admite representação, seja um ponto, uma linha, uma superfície etc. Um objeto também é chamado Figura objetiva.

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Estudantes de designer em moda usam réguas de escala desde o inicio do curso, ao iniciarem as disciplinas de modelagem têxtil, como nos explica em entrevista o professor de modelagem Ricardo Madeira:

O sistema de ensino de modelagem industrial utilizando a escala de redução é eficaz devido ao fato de agilizar melhor a aula. O processo de realizar modelagem em escala de redução ou em tamanho real (escala 1:1) é o mesmo. São utilizados réguas, curvas e esquadros apropriados para a obtenção do molde nos dois sistemas (redução e medida real). Uma outra vantagem de se trabalhar em escala de redução é sobre uma futura consulta no material didático. Em tamanho reduzido o aluno não precisa abrir pilhas e pilhas de papéis para procurar ‘aquela aula sobre determinado molde’, está tudo dentro de uma pasta de tamanho A4 com todas as anotações que fez durante o aprendizado.

Como podemos perceber, o processo que será realizado no computador não é diferente e o desenho pode estar em escala facilitando desta forma a visualização e seu manuseio caso seja impresso. O desenho que é realizado em escala representa com exatidão toda a sua proporção dando o equilíbrio ideal de tamanho entre as partes que compõem um todo. Designers de moda geralmente usam escalas que variam de 1:2 a 1:8 para representarem seus produtos

Outra regra adotada dos desenhos técnicos da engenharia civil e arquitetura é o método idealizado pelo francês Fellipe Büache em 1737 para as projeções cotadas. Esta prática tem como objetivo a representação da figura por meio de sua projeção em um plano, escrevendo-se ao lado da projeção de cada ponto considerando a distância do plano ao respectivo ponto. “Essa distância é

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representada apenas por um número abstrato, visto que todas elas devem ser referidas à mesma unidade, e assim a unidade adotada deve constar na folha do desenho, bem como a respectiva escala”.(RANGEL, 1979, p.29).

Imaginemos que o desenho de um peça piloto, regata desenhada na figura abaixo, fosse distribuído para cinco pessoas que teriam como tarefa desenvolver sua modelagem para poderem dar continuidade à produção.

FIGURA 02 - DESENHO REGATA

FONTE: Desenvolvido pela autora

Por mais que o desenho esteja em escala e visivelmente proporcional, bem sabemos que as chances das cinco modelagens saírem com medidas iguais as do desenho é praticamente impossível. As mangas podem ser interpretadas com diferenças de 5 centímetros, o comprimento da peça de uma pode ser mais curta que a interpretação da outra, e também não podemos descartar a chance de uma pessoa fazer uma modelagem bastante pequena, imaginando se tratar de um desenho técnico do vestuário infantil. As cinco modelagens, por mais diferentes que estejam umas das outras, não estão erradas se não tomarmos como parâmetro a peça piloto, pois em nenhum

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momento estão especificadas as medidas que foram usadas para o desenho. A intenção desta regra é que façamos um desenho a partir da pilotagem para que se desenvolvam modelos idênticos e é por isso que devem estar indicadas todas as medidas necessárias para que se tenha tal resultado.

Estes desenhos técnicos em escala, com cotas e com demais indicações de materiais e costuras, vêm acompanhados de uma ficha técnica que contem todo o memorial descritivo do produto bem como informações sobre matéria-prima, beneficiamento, etiquetas e sua operacionalização da produção10. Todo tipo de informação que tem o objetivo de informar como e com o que este produto vai ser desenvolvido deve estar descrito nesta ficha técnica.

Diante destas regras, vê-se nas indústrias têxteis catarinenses, que cada empresa desenvolve e usa uma ficha que melhor se adapta ao produto que confecciona. Percebe-se também que uma mesma marca desenvolve diversos tipos de artigos e possui desta forma diferentes modelos de ficha técnica. Como esses desenhos são a comunicação entre o designer e o setor de produção recomenda-se que eles sejam executados da maneira mais clara e objetiva possível para que haja êxito em sua compreensão. Por isso indica-se neste artigo a necessidade da efetuação dos desenhos técnicos em escala por meio do aplicativo CorelDRAW.

6.3 O aplicativo CorelDRAW

Os sistemas CAD/CAM (COMPUTER AIDED DESIGN E COMPUTER AIDED MANUFACTURING - Desenho assistido por computador e Manufatura Assistida por computador)

10 Entende-se como Operacionalização da produção, todas as informações sobre a seqüência ope-racional para a confecção do produto, inclusive a ordem de montagem e o tempo gasto de cada ferramenta ou maquinário em determinada operação.

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são responsáveis por agilizar e organizar os processos de um desenho, bem como, podem também operar máquinas no setor de produção.

O aplicativo CorelDRAW faz parte deste sistema. Ele é um programa que possui ferramentas virtuais como o lápis, a borracha, os pincéis, esfuminho, canetinhas, tesouras, carimbos, cola, dentre outros. Sabendo manipulá-lo, cria-se quase tudo o que se fazia no papel, porém de maneira muito mais rápida. De acordo com Andrade, podemos criar dois tipos de imagens pelo computador: a imagem vetorial e a imagem de varredura.

A imagem vetorial é utilizada na criação de desenhos e ilustrações. A imagem é gerada por softwares para desenho gráfico como CorelDRAW, que é o foco desta pesquisa, ou Adobe illustrator. Segundo Andrade, “este tipo de imagem é criado com equações matemáticas; para desenhar uma reta, por exemplo, são necessários dois pontos e suas coordenadas. Retas e curvas são denominados vetores”(ANDRADE, 2003, p.22). Referindo-se à Imagem de Varredura, o autor escreve que podemos chamar também de mapa de bits, que é uma imagem formada por milhões de pontos agrupados, de diversas tonalidades de cor e sombra, na qual chamamos de pixels. O aplicativo Photoshop, tão conhecido quanto o CorelDRAW, funciona desta maneira, permitindo criar e editar imagens.

O aplicativo CorelDRAW lançou sua última versão, correspondendo a de número 14, em janeiro de 2008 com o nome de CorelDRAW X4. Esta versão sucede o CorelDRAW X3 e o CorelDRAW 12. A primeira versão surgiu em 1989 apenas na língua inglesa e hoje é difundido em inúmeros idiomas e é usado em diversos países. A figura abaixo ilustra as últimas três versões.

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FIGURA 03: AS MAIS RECENTES VERSÕES DO APLICATIVO CORELDRAWFONTE: Recorte Virtual das imagens dos aplicativos (Autora, 2008)

O aplicativo CorelDRAW oferece ferramentas para desenvolver fichas e desenhos técnicos em diversas escalas de maneira bastante simples. Basta se ater às medidas da peça piloto e transpô-las para a tela, resultando desta forma em um desenho que ao ser confeccionado conforme suas orientações se produzirão centenas ou até milhares de produtos idênticos a idealização do designer.

Todo desenho técnico deve ser desenvolvido mostrando a parte frontal e traseira do produto e quando possuir detalhes em suas laterais, estas também devem ser visualizadas. A parte das costas na maioria das vezes se assemelha a parte da frente e quando isto acontecer aconselha-se aproveitar o mesmo desenho para agilizar a tarefa e modificá-lo conforme a necessidade por meio de suas ferramentas virtuais.

De fato, os desenhos técnicos possuem diversos detalhes que na maioria das vezes deveriam ser destacados para uma maior compreensão em sua interpretação. Por meio do efeito “Power Clip”, do aplicativo, detalhes da roupa referentes às costuras, bolsos ou

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Fabiana Ludwig

algum tipo de fechamento ou acabamento que se queira dar alguma ênfase podem ser copiados do desenho e colocados em forma de lupa ao lado, aumentando-os para um melhor entendimento, como o exemplo na figura abaixo:

FIGURA 03 - DETALHE EM LUPAFONTE: Desenvolvido pela autora

As ferramentas do aplicativo desenvolvem também com rapidez e precisão as representações cotadas que são tão importantes em um desenho planificado como visto no tópico anterior. Em minutos colocam-se todas as medidas de largura e altura que um

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A importância do aplicativo CorelDRAW nas empresas têxteis...

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produto exige (medida de cintura, quadril, cavas, decotes, fendas, comprimento das mangas etc) com a precisão e fácil compreensão tal qual a “planta baixa” de uma casa.

São regras como estas e pequenos destes detalhes que estão comentados no decorrer destes tópicos que fazem com que os desenhos planos das roupas fiquem representados com medidas técnicas e a localização exata de todos os seus pormenores impedindo possíveis interpretações erradas. Diante disto, o CorelDRAW é visto nesta pesquisa como um excelente aliado no setor têxtil por desenvolver com rapidez e precisão os desenhos técnicos dos produtos do vestuário.

6.4 Considerações Finais

Quando surgiram softwares para desenho, alguns designers e ilustradores de moda hesitavam usar o computador para representar suas criações assim como os respectivos desenhos técnicos. Hoje a realidade nos mostra uma crescente procura pelo conhecimento na área de computação gráfica, tanto através de aulas particulares como cursos oferecidos por diversas instituições. Como já mencionado anteriormente, este conhecimento prévio dos aplicativos é fator decisivo para a contratação de novos profissionais.

Cada vez mais usado, o computador é a ferramenta que possibilita a agilidade e a rapidez no trabalho do designer de moda. Este profissional se apropria de softwares especializados para desenvolver croquis e desenhos técnicos dos mesmos. Pelas informações contidas nestes desenhos técnicos é que se desenvolve a modelagem de um produto para por meio destas, produzir centenas e até milhares de peças idênticas a piloto. Podemos perceber a importância da coerência deste item técnico com o primeiro processo (criativo), pois é imprescindível que o produto final coincida com idéia inicial do designer.

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Fabiana Ludwig

De fato, o aplicativo CorelDRAW é o mais usado por acadêmicos e designers catarinenses para o desenvolvimento de seus produtos. Este uso demasiado faz com que diferentes versões do aplicativo sejam criadas a cada ano para facilitar o uso de suas ferramentas virtuais e desta forma, aperfeiçoar a representação dos desenhos que são produzidos por meio dele. Diante disso, o ilustrador e designer de moda, com tantas softwares e ferramentas e a seu dispor, passa a determinar com mais autonomia suas próprias regras de trabalho otimizando seu processo de criação. Assim, este profissional, ao tornar-se mais capacitado, adquire reconhecimento no mercado de trabalho e contribui para a constante evolução da história da moda.

Referências Bibliográficas

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Fabiana Ludwig

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Lourdes Maria Puls

Capítulo VII

O virtual e o Desenho de ModaLourdes Maria Puls1

“O virtual possui uma plena

realidade enquanto virtual.”

Gilles Deleuze

7. Introdução

Começa-se por falar brevemente sobre os objetos do estudo, o virtual e imagem representada graficamente pelo desenho. Compreendê-los significa conhecer suas possibilidades dentro do processo da virtualização e da área do ensino do desenho de moda, do Curso de Moda da Universidade Estadual de Santa Catarina – UDESC.

Assim, no desenho moda, apropriando-se das referências artísticas imprimi-se expressividade na transformação da imagem

CRÍTICA

1 Doutoranda em Design – PUC-RJ e professora efetiva do Departamento de Moda – UDESC. [email protected].

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gráfica da figura humana, para a imagem da figura de moda, onde se modificam suas formas, com técnicas diferenciadas, para atender a lógica da moda.

Ao trabalhar com as distorções da imagem, próprias da figura de moda, é o aluno aprende a desenvolver seu estilo próprio de desenhar. Adapta a figura com medidas específica, mais longilínea, com menos massa corpórea, para cumprir com exigências mercadológicas.

Mesmo sendo imagens representadas graficamente, pelo desenho, devem passar a idéia de modelos em desfile de passarela. Assim, desenho deve acentuar as funções que lhe são inerentes. Portanto, deve haver a preocupação com a estética, com sua função informativa, ou seja, mostrar como vai ficar o produto final, bem como, caracterizar um personagem hipotético que se adeqüe ao conceito da coleção. Neste contexto, constrói-se um repertório de imagens com características peculiares do desenho de moda e, que encerra em si o poder de potencializar-se.

7.1 Imagem, como representação gráfica, pelo desenho

O desenho revela o segredo das linhas tranqüilas, linhas silenciosas, serenas, linhas quentes, frias, linhas irrequietas, instigantes, guardando as particularidades do pensar de seu autor. Um desenho precisa saber flutuar. As formas têm direito de se expandir.

Lizárraga.

Sob este ponto de vista, pode-se considerar o desenho como o início de um processo criativo que envolve o perceber, o pensar. Dessa forma, os traços e linhas vão construindo formas, transformando-se em linguagens expressivas. Representar, pelo

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Lourdes Maria Puls

desenho, passa a ser, então, uma seleção e organização de formas constituídas de diferentes elementos, materiais e técnicas, com o fim de cumprir um propósito determinado: de oportunizar a visualização de um de produto, ou seja, é a transformação de uma imagem visual mental em uma imagem representada graficamente, de maneira que se tenha um efeito de real, de presentificação.

Assim, o ato de desenhar uma imagem está efetivamente concretizado, “está presente” mediante sua representação. Nesse sentido, o ato de desenhar é um processo singular, é uma linguagem extensiva aos pensamentos e pelas quais o aluno, futuro designer, pode materializar suas idéias, trazer ao visível o que é imaginação.

7.2 Virtualização e suas conexões com o desenho de moda

Virtualidade é um termo da modernidade, usualmente associada à tecnologia e a informatização. Vivemos num mundo onde tudo circula. De acordo com Parente (1996) tudo circula o mais rapidamente possível: os veículos, os enunciados, as imagens, as informações, os homens. Nesse sentido Levy afirma que embora vivamos hoje sua aceleração, a virtualização não é um fenômeno recente. A espécie humana se construiu na e pela virtualização.

No seu livro Levy explica a origem do termo “Virtual” que, vem do latim medieval virtualis, derivado por sua vez de virtus que significa força, potência. Na filosofia escolástica, é o que existe em potência e não em ato. O virtual tende a atualizar-se, sem ter passado, no entanto, à concretização efetiva ou formal. Exemplificando-se este processo, pode-se dizer que a árvore está virtualmente presente na semente. Pode assumir também outras definições como virtude, poder, força. O que é suscetível de se realizar, possibilidade, potencial. O que está premeditado e contém todas as condições de se realizar. O que existe como faculdade, porém, sem exercício ou efeito.

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Se direcionarmos para a linguagem do desenho de moda, tem-se que o desenho ilustrativo, ou figura de moda, é a imagem resultante de dois momentos do processo de construção do desenho de moda. No primeiro momento, é a possibilidade de escolha entre as variações de exercícios, ou esboços, que se constituem no virtual, e, conseqüentemente, o atual é uma dessas opções. No segundo momento, tem-se o desenho da figura de moda em si, é o desenho que mostra como vai ficar o produto final, portanto como algo que existe potencialmente. As imagens das figuras de moda, abaixo representadas pela designer, e professora da UDESC, Fabiana Ludwig, mostram estes momentos. É a simulação, portanto é o virtual. Significa a ausência de presença. São, ainda, apenas imagens. Ou seja, a roupa ainda não foi produzida.

Como a figura de moda funciona como suporte da roupa, visualiza-se a imagem de suas formas, com texturas e tipos de tecidos, ou seja, ainda não possui uma forma concreta, palpável. É apenas

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o modelo pré-definido, com inúmeras possibilidades intrínsecas a ele e, que serão definidas quando a imagem for utilizada como, por exemplo, para ilustração de modelos para venda de tecidos, ilustração de textos, artigos ou livros, ou ainda para venda do modelo das peças de roupas das coleções, que poderão ser fabricadas em pequena ou em grande escala. Tendendo-se a atualizar-se. E, dependendo de sua utilização, produzirá diferentes significados.

O virtual não se opõe ao real, mas sim ao atual. Contrariamente ao possível, estático e, já constituído, o virtual é como o complexo problemático, o nó de tendências ou de forças que acompanha uma situação, um acontecimento, um objeto ou uma entidade qualquer, e que chama um processo de resolução - a atualização. A atualização aparece, então, como a solução de um problema, uma solução que não estava contida previamente no enunciado. A atualização é criação, é a invenção de uma forma a partir de uma configuração dinâmica, de forças e finalidades.

Ainda, relacionando-se com o desenho de moda, tem-se o desenho técnico planificado, que obrigatoriamente acompanha a imagem ilustrada da figura de moda. É sua atualização. O desenho técnico também se encontra incluso na ficha técnica mostrando o desenho com medidas, cores, formas, tamanhos, tecidos e materiais que serão utilizados para sua produção. Deve, portanto, ser coerente com as medidas do corpo humano real. É a etapa que soluciona vários problemas.

Compreendendo-se dessa forma, como a atualização, que não está contida previamente no modelo da figura de moda ou no seu enunciado. A virtualização é a própria ação, é sua dinâmica, é a transposição de um estágio para outro. Não é necessariamente acompanhada por um desaparecimento, mas é um o processo de materialização, do modelo da figura de moda, em peças de roupa.

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O ferramental, do desenho técnico e da ficha técnica de moda, participa do fenômeno de desterritorialização e de mundialização. Assim, o surgimento da ferramenta não responde a um estímulo particular, mas materializa parcialmente uma função e, cria um ponto de apoio para a resolução de uma classe de problemas. A padronização (virtualização) permite a compatibilidade entre sistemas de informações, sistemas econômicos, sistemas de transportes distintos, desta forma, facilitam a produção industrial, de peças de roupa, em qualquer parte do mundo.

Denota-se aí um “significado” de não mais precisar-se ir à costureira, ou tirar medidas e escolher tecidos. A industrialização, o prêt-à-porter (roupa pronta para usar) substitui este processo. Tem-se, então, uma resposta - essas possibilidades decorrentes do uso de padrões do desenho técnico de moda, de novas tecnologias, dos softwares, das redes digitais interativas - economiza matéria prima, mão de obra, otimiza o tempo e conseqüentemente geram lucro. Tornando o virtual no atual.

A grande contribuição, para que se possa utilizar essa tecnologia de passagem da imagem, só se tornou possível, devido a estudos iniciado nos séculos passados da história da humanidade, a evolução das técnicas da figuração indica desde o Quattrocento a constância de uma pesquisa quase obsessiva que visa automatizar cada vez mais os processos de criação e reprodução de imagens. Essa preocupação começou primeiro entre os pintores e artistas que eram também, de fato, na época experimentados engenheiros, tais como Brunelleschi, Alberti ou da Vinci. Os efeitos da automatização da imagem, obtidos com o aperfeiçoamento da perspectiva de projeção central, foram alem dos limites do campo

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pictórico e se estenderam a outros domínios, tais como as matemáticas, a física e a mecânica, e mesmo a indústria. (COUCHOT in Parente 1996).

Assim, esses efeitos, de alguma forma, também são utilizados nos domínios da área da moda. O real assemelha-se ao possível; em troca, o atual em nada se assemelha ao virtual - responde-lhe.

Esta resposta é o modelo pronto, o real, a atualização do virtual, nesse caso tem materialidade, formas, cores, têm existência. Na moda o designer cria coisas que se entendem para além de sua pessoa, que só terão vida própria quando acolhida por outras, identificando-se com suas escolhas, não só pela sua funcionalidade e estética, mas principalmente por construírem significados.

Aqui se pode fazer uma analogia entre o possível e o virtual. O possível, é o modelo da roupa pronto para ser usado, é o desejo de tê-lo. O modelo já existe, mas está lá; numa vitrine, numa loja, ou ainda, nas imagens da internet. Nesse caso, portanto, ainda virtual. Para o consumidor, o possível, é exatamente como o real, só lhe falta à existência do objeto pelos sentidos perceptíveis, visuais e táteis, conferindo-lhe a posse do produto.

Além da desterritorialização, outro caráter é freqüentemente associado à virtualização: a passagem do interior ao exterior e do exterior ao interior. Esse “efeito Moebius” declina-se em vários registros: o das relações entre privado e público, próprio e comum, subjetivo e objetivo, mapa e território, autor e leitor, entre outros.

Este caso pode ser perfeitamente ilustrado pelos desfiles de moda. Atualmente, interage cada vez mais com o público, obrigando os manequins a incorporarem personagens hipotéticos. Os manequins realmente vivenciam a roupa, ela passa a significar. Transmitem o desejo da posse e da realização de um sonho. Tem-se,

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então, uma situação que passa da subjetividade para a objetividade. Significa a possibilidade da venda, ou o poder da compra, de uma imagem. Essa situação é enriquecida pela linguagem do desfile, por sua capacidade de englobar diferentes métodos, reunindo a alta tecnologia moderna com o profissionalismo. Esse ferramental fornece condições para qualquer pessoa acompanhar todas as imagens, nos mínimos detalhes, das roupas, do modelo conceitual ao modelo industrial, em qualquer parte do mundo. É a passagem do interior para o exterior.

Do exposto, conclui- se poder entender a efemeridade da moda. Do virtual ao real. Dentro dos critérios que regem a cadeia da moda esta passagem é muito próxima. Quando a roupa está pronta, é real, tem materialidade. Neste momento o modelo da roupa já está ultrapassado, já significou. O tempo e espaço estão muito próximos. O aluno, futuro designer, Inicia todo o processo novamente . É uma busca, constante, por novas imagens e novas possibilidades. É um movimento cíclico. O aluno precisa entender que o mundo da moda pede sempre por novas imagens, novos objetos, novos significados para continuar sua trajetória.

Finalizo, então, com as palavras de Pierre Lévy:

(...)gosto do que é frágil, evanescente, único e carnal. Aprecio os seres, os lugares singulares, insubstituíveis, as atmosferas ligadas para sempre a situações e a momentos. Creio que o sofrimento à virtualização sem compreendê-la é uma das principais causas da loucura e da violência de nosso tempo(LEVY, 1996).

O autor quis mostrar neste livro, que a virtualização é o movimento pelo qual se constitui e continua a se criar nossa espécie. Ainda, conforme o autor, a virtualidade não tem nada absolutamente

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nada a ver com aquilo que a televisão mostra sobre ela. Não se trata de modo algum de um mundo falso ou imaginário. Ao contrário, a virtualização é a dinâmica mesma do mundo, é aquilo através da qual compartilhamos uma realidade. Longe de circunscrever o reino da mentira, o virtual é precisamente o modo de existência de que surgem tanto a verdade como a mentira.

Referências Bibliográficas

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LÈVY, Pierre. O que é virtual? São Paulo: Ed 34, 1996.

TEXTO: O Tempo do Virtual - Fabiana Ferreira de Alcantara e Helena Cavalcanti de Albuquerque (turma 2001.1).

PARENTE, André (org). Imagem máquina. A era das tecnologias do vir-tual. Rio de Janeiro: Editora 34/Nova Fronteira, 1996.

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Capítulo VIII

Bases conceituais para a confecção de Uniformes Hospitalares para enfermagem

Dulce Maria Holanda Maciel1

8. Introdução

O uniforme é a forma extrema de roupa convencional que é totalmente determinado pelo outro, ou seja, vestir um uniforme é abdicar o direito de agir individualmente. Além disso, ao contrário de um traje civil, um uniforme é consciente e deliberadamente simbólico, identificando aquele que o veste como pertencente a um grupo e muitas vezes o situa em uma hierarquia, fornecendo informações sobre suas realizações. Lurie (1997) afirma que se pensarmos no vestuário em termos de discurso falado, o uso do uniforme2 significa estar parcialmente ou totalmente sob censura, acarretando assim uma maneira de agir mecanicista, ficando difícil para a pessoa que usa uniforme constantemente agir normalmente.

PERSPECTIVAS

1 Doutora em Engenharia de Produção – UFSC e professora colaboradora do Departamento de Moda – UDESC. [email protected] Traje - vestuário habitual, vestuário próprio de uma profissão, vetes, roupa, fato. Uniforme – que tem uma só forma, que não varia, farda ou vestuário confeccionado segundo modelo oficial e co-mum, para uma corporação, classe, grupo de funcionários, etc” Novo Dicionário Aurélio

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Bases conceituais para a confecção de Uniformes Hospitalares para enfermagem

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A autora ainda disserta sobre as vantagens e desvantagens de usar um uniforme, destacando que um uniforme pode ocultar uma desvantagem física ou psicológica. “... a toga de um juiz ou a bata de um cirurgião pode esconder muito bem um físico esquelético ou receios de incompetência, concedendo-lhe dignidade e confiança.” (LURIE, 1997).

Um traje oficial tende a congelar o estilo da época que foi criado e muitas vezes alguns uniformes nos pareçam hoje antiquados.

Historicamente, as roupas utilizadas pelas pessoas de profissões letradas divergiam das roupas correntes e na maioria das vezes eram estagnadas no tempo.

Wilson (1985) cita, por exemplo, os trajes utilizados pelo clero, médicos e cirurgiões no século XVI que continuavam com a mesma aparência dos usados na Idade Média – vestidos compridos, diferentemente dos elegantes da época que preferiam casacos curtos e gibões. Roupas ligadas às profissões datam de épocas remotas, e muitas vezes surgiram de necessidades especificas. Pode-se citar o exemplo dos padeiros e cozinheiros no século XVIII: vestiam-se de branco, pois eram suscetíveis a ficarem cobertos de farinha. Mas, ainda segundo Wilson (1985) nem sempre as roupas eram usadas por razões práticas, por vezes eram usadas para distinguirem uns vendedores de outros.

Quanto aos uniformes hospitalares – especificamente uniformes do corpo de enfermagem, é escassa a bibliografia disponível sobre o assunto. Um texto clássico sobre enfermagem é apresentado por Florence Nightingale (1989, p. 55)3:

3 Florence Nightingale. Disponivel: Enfermeira inglesa nascida na cidade italiana de Florença, fundadora da profissão de enfermeira. Após se formar por uma instituição protestante de Kaiser-swerth, Alemanha, transferiu-se para Londres, onde passou a trabalhar como superintendente de um hospital de caridade. Sempre interessada pela enfermagem, durante a guerra da Criméia (1854 -1856), integrou o corpo de enfermagem britânico como enfermeira-chefe do exército, em Scutari, Turquia.Durante a guerra constatou que a falta de higiene e as doenças matavam grande numero de soldados hospitalizados por ferimentos. Assim desenvolveu um trabalho de assistência aos enfermos e de organização da infra-estrutura hospitalar que a tornou conhecida em toda a frente

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Dulce Maria Holanda Maciel

Uma enfermeira cuja vestimenta farfalha (falo de enfermeiras profissionais ou não profissionais) torna-se um pavor para o paciente, ainda que ele não saiba por quê. O agitar da seda ou da crinolina, o chocalhar das chaves, o rangido das barbatanas e sapatos, fazem mais mal ao doente do que o bem que todos os remédios do mundo poderiam fazer-lhe.

Neste texto, Nightingale(1989) cita também que as mulheres deveriam ser silenciosas e alguns tecidos eram impróprios tanto pelo barulho que faziam quanto a imagem que evocavam. Também era proibido o uso de adornos, como flores no cabelo e fitas nas capas. Segundo Azevedo (2005, pg 33):

O novo paradigma nightingaliano procura dar um novo perfil ao trabalho de enfermagem, agora calçado numa abordagem holística na inter-relação corpo-mente-meio-ambiente; levando em consideração os pensamentos, sentimentos e emoções no processo de recuperação do doente.

8.1 Uniformes - Design e ergonomia

De acordo com Gomes Filho (2003), o design existe para possibilitar a concepção, a inovação, o desenvolvimento tecnológico e elaboração de projetos na melhoria do padrão da qualidade dos objetos em geral.

de batalha, consagrando a assistência aos enfermos em hospitais de campanha. Depois da guerra publicou Notes on Matters Affecting the Health,Efficiency and Hospital Administration of the British Army (1858) e fundou uma escola de enfermagem no Hospital de St. Thomas, em Londres, a primeira escola de enfermagem do mundo (1860).Como era solteira, trabalhava fora de casa e agia de acordo com as suas idéias, serviu de exemplo a outras mulheres e contribuiu para impor respeito pelo papel da mulher na sociedade, e só parou de trabalhar quando ficou completamente cega (1901), morrendo em Londres, aos noventa anos de idade. Fonte: http://www.dec.ufcg.edu.br/biografias/FlorNigh.html 29/1/2008 17:22:50

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Bases conceituais para a confecção de Uniformes Hospitalares para enfermagem

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Para a configuração de objetos trabalha-se com três conceitos fundamentais que são a função, a estrutura e a forma. A correta harmonia entre estes 3 itens na fase de concepção de projeto, juntamente com a fase seguinte que é a de elaboração, confecção ou fabricação do objeto (depende basicamente dos recursos técnicos, financeiros e de pessoal), vai garantir a otimização da qualidade final do produto.

Conforme Martins (2005) para o desenvolvimento de um produto é necessária a articulação de um conjunto de atividades no processo metodológico do design. Por conseqüência, a escolha da matéria-prima, e a inclusão de tópicos relevantes como ergonomia, e sustentabilidade acrescentam alto valor agregado aos produtos concebidos a partir destes novos parâmetros.

8.2 Materiais adequados ao uniforme

Entre as principais atribuições do corpo de enfermagem da Clínica Médica 1 do Hospital Universitário Ernani Polydoro São Thiago de Santa Catarina o contato com os pacientes nas mais diversas situações incluindo atividades como banho, aplicação de injeções, contato com vômito, fezes, etc. representam um risco de contaminação iminente caso não sejam tomadas as devidas precauções e utilizados os uniformes como EPIs4.

Ramos (2003) cita que o uso de tecidos de algodão, por exemplo, apresentam “um razoável efeito barreira bacteriológica quando secos, mas perderem essa propriedade quando molhados... Além disso, libertam partículas, sendo relatado um número significativo de infecções provocadas durante as operações.”

4 EPI – Equipamento de proteção individual - A LEI Nº 6.514 - de 22 de dezembro de 1977 - DOU de 23/12/77 trata em seu artigo 166 sobre EPI – Equipamentos de proteção individual.

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Este é o caso da maioria dos uniformes que são atualmente utilizados no Hospital Universitário Ernani Polydoro São Thiago, em Florianópolis, SC.

A autora mostra ainda que os materiais têxteis utilizados na medicina são classificados dependendo das áreas de aplicação e dividem-se no grupo dos Têxteis cirúrgicos – têxteis que são utilizados em cirurgias – neste grupo têm-se os têxteis implantáveis: suturas, artérias vasculares, válvulas para o coração, ligamentos artificiais, tecidos para tratamento de hérnias, redes de reforço cirúrgico, etc; os têxteis não-implantáveis: ligaduras, emplastros, etc.; os têxteis de proteção: batas cirúrgicas, gorros, máscaras, campo operatório e no grupo dos têxteis para sistemas extra-corporais: rins artificiais, fígados e pulmões, etc. e por último, no grupo de produtos de higiene e saúde: vestuário de proteção (excluindo as batas cirúrgicas), roupas de cama, material de limpeza, etc.

No QUADRO 1 a seguir são citados os principais produtos têxteis utilizados na área da saúde, o tipo de fibra e a aplicação.

Aplicações Tipo de fibra Estruturas têxteis

Artigos de cama

Cobertores/mantas

Algodão, poliéster Tecido, malha

Lencóis Algodão TecidoAlmofadas Algodão Tecido

Vestuário

Uniformes Algodão, poliéster TecidoVestuário de

protecçãoPoliéster, polipropileno Não-tecido

Fraldas para incontinencia

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Bases conceituais para a confecção de Uniformes Hospitalares para enfermagem

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Camada absorvente

Lã, superabsorventes, pasta de celulose

Não-tecido

Camada exterior

Polietileno Não-tecido

Artigos de Limpeza

Viscose Não-tecido

Meias cirúr-gicas

Poliamida, poliéster, fios elastoméricos,

algodão

Malha

QUADRO 1: TÊXTEIS UTILIZADOS NA HIGIENE E SAÚDE:

Fonte: RAMOS (2003)

Conforme apresentado, os materiais mais utilizados em uniformes de enfermagem são os materiais naturais – algodão, as fibras de celulose regenerada (viscose) e os não-naturais incluindo o poliéster. O vestuário de proteção citado no QUADRO 1 anterior refere-se às batas cirúrgicas.

Ressalta-se que os materiais escolhidos também devem oferecer propriedades anti-microbiais e resistência a lavagens, ou seja, que mantenham suas qualidades ao longo de seu ciclo de vida. A escolha também deve levar em consideração a manutenção da temperatura corporal e a flexibilidade quanto à modelagem no sentido de adequação às posturas requeridas durante o turno de trabalho.

Inserir também a componente ambiental desde o inicio de projeto de produto significa a necessidade da utilização de materiais não nocivos ao meio ambiente. Neste requisito, é imprescindível avaliarmos o processo de obtenção do tecido desde o ponto que seja possível rastrear, pois para realizarmos uma avaliação de ciclo de vida de produto deve-se levar em consideração os

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recursos financeiros, informacionais e de tempo disponíveis para o levantamento destes dados.

Um estudo prévio dos materiais que possivelmente poderiam adequar-se aos critérios requeridos para uma proposta de uniformes hospitalares tendo como base o Corpo de Enfermagem Feminino da Clínica Médica 1 levou em consideração algumas características como conforto, resistência a lavagens, propriedades anti-microbiais, e facilidade de manutenção além de ser um produto têxtil ecológico.

[...] produtos têxteis ecológicos podem ser definidos como aqueles que empregam pelo menos uma destas iniciativas de redução de impacto ambiental, seja na produção agrícola, seja na etapa de acabamento, com o uso de corantes naturais ou de fibras naturalmente coloridas. Entretanto, foi apenas no final desta década que a visão integrada dos diferentes segmentos da indústria têxtil deu origem aos têxteis orgânicos, que são produzidos considerando o impacto ambiental tanto da produção da matéria-prima como do processamento industrial. (SOUZA apud ALVES 2007)

Aqui vale ressaltar a seguinte questão: todas as fibras são potencialmente poluentes em seu processo de fabricação, desde as mais naturais até as químicas artificiais ou sintéticas. Transformações no processo como o uso de amaciantes à base de óleos naturais e de tingimentos à base de pigmentos naturais como sementes, ou mesmo o uso de tecidos sem tingimento podem ser sugeridos no processo para amenizar os impactos.

Levando-se em consideração as características de conforto, facilidade de obtenção da matéria-prima, propriedade anti-microbial,

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custos, além da questão de responsabilidade ambiental, estas opções restringem-se a apenas algumas possibilidades.

Assim sendo, o estudo apresentado limitou-se às fibras de algodão – devido a sua freqüente utilização nos setores de saúde, às fibras de bambu devido à sua característica naturalmente anti-microbial, às fibras PET – devido a sua componente de responsabilidade ambiental e social conseguida através de sua característica de reuso. E finalmente aos tecidos inteligentes, notadamente no que diz respeito aos formados por fibras anti-microbiais.

8.3 Fibras de algodão

A fibra de algodão é uma fibra natural de origem vegetal, podendo ser produzida em praticamente todos os continentes. É uma cultura delicada e sujeita a pragas sendo assim consumidora de herbicidas e fungicida. Segundo Oliveira (1995) apud Alves(2007), o algodão corresponde a 80% do total de fibras utilizadas nas fiações brasileiras e na tecelagem 65% dos tecidos são produzidos dos fios de algodão,enquanto que na Europa é de 50%. Face ao aumento das fibras artificiais estes números tendem a cair. O algodão possui algumas vantagens em relação às fibras artificiais e sintéticas, entre elas pode-se destacar: o conforto ao toque, a alta capacidade de absorção de água, a resistência ao uso e a biodegradabilidade.

Em relação à adequação da fibra de algodão nos uniformes para utilização na área da saúde, cita-se o estudo de Ramos (2003) que chama atenção para um estudo desenvolvido por Dk-Teknik Energy & Environment (Dinamarca) a pedido da E.T.S.A (European Textile Services Association) demonstrando que “A lavagem industrial é melhor para o ambiente do que a utilização de batas cirúrgicas descartáveis” neste estudo foram testados 5 tipos de batas cirúrgicas (Reutilizáveis: 50/50 Algodão/Poliéster com acabamento

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fluorocarbonado, 100% Poliéster (microfibra) com acabamento fluorocarbonado, Laminado de Poliéster com membrana Gore-Tex5 e com membrana de poliuretano e as Descartáveis: Polpa de papel/Poliéster com acabamento fluorocarbonado, e Laminado de Polpa de papel/Poliéster e Polietileno).

As conclusões deste estudo demonstram que:

1. Nos melhores casos (com uma única exceção), as batas reutilizáveis tem menor impacto ambiental que as batas descartáveis;

2. Nos piores casos (com uma única exceção), as batas reutilizáveis apresentam uma melhor performance ambiental do que as descartáveis;

3. Quando comparados os melhores resultados para as batas descartáveis com os piores resultados para as batas reutilizáveis, estas apresentam na maioria das categorias um menor impacto ambiental;

4. De uma forma geral as vantagens da utilização de batas cirúrgicas reutilizáveis são claras;

5. Outro argumento a favor das batas reutilizáveis é o impacto negativo dos materiais descartáveis em termos de consumo de recursos naturais, pois a sua obtenção leva ao desmatamento.

“As perspectivas para as batas cirúrgicas reutilizáveis de nova geração são por isso bastante animadoras.” Ramos (2003, p41).

8.4 Fibras de bambu

As fibras de bambu enquadram-se na classificação das fibras químicas- artificiais. Erhardt (1976) cita que as fibras químicas foram produzidas inicialmente em 1913, posteriormente a patente da fabricação de fibras a com cloreto de polivinilo foi requerida por Fritz Klatte.

5 Tecido desenvolvido pela empresa Gore. Disponível em http://www.gore.com/en_xx/ acesso em 30/1/2008 19:16:01. É um dos primeiros tecidos impermeáveis transpiráveis lançados no mercado.

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O bambu é uma espécie de gramínea flexível e de crescimento rápido, tem plantio e manutenção fáceis, além de ser uma alternativa relativamente barata servindo para diversos usos – desde construção civil até tecidos.

Segundo Alves (2007) o bambu é uma fibra regenerada de celulose de polpa de bambu, e tem uma função antibacteriana mesmo após inúmeras lavagens.

Entre as propriedades do bambu estão o aspecto bactericida natural, é inibidor de odores, é 100% biodegradável, super absorvente, de fácil secagem e ainda hipoalergênico além de ser macia e muito confortável.

Atualmente no Brasil são confeccionados tecidos planos e malhas com 100% fibras de bambu. A catarinense Têxtil RenauxView colocou no mercado este ano o primeiro tecido plano de fio tinto de bambu do Brasil6. E a malharia Marles obteve o certificado internacional Oeko-Tex7.

O fio de bambu era importado da Indonésia e da China até que em setembro de 2005, a malharia Marles resolveu trazer a matéria-prima para o Brasil, formando um fio com 84% bambu, 14% poliamida, 2% elastano. A fibra de bambu tem uma capacidade de absorção da transpiração quatro vezes superior à do algodão, tem função anti-bactéria, oferece proteção contra os raios UV, possui

6 Reportagem veiculada no site da Associação Brasileira da Indústria Têxtil e de Confecção disponível em http://www.abit.org.br/content/noticia/noticia.asp?nCodNoticia=2493, 11/11/2007 21:12:207 O selo surgiu no norte da Europa, em 1990, com o objetivo de unificar as características químicas exigidas em várias normas aplicadas mundialmente. Assim, foi possível normatizar um artigo têxtil que, independente da sua origem, deve conter ou apresentar determinados resíduos quími-cos nas quantidades determinadas, para garantir padrões exigentes de segurança aos consumi-dores finais. http://www.santistatextil.com.br/site/content/qualidade/certificacoes_premios.asp 11/11/2007 10:08:05 PM

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capacidade termodinâmica, que a deixa geladinha no verão e quente no inverno e não forma as indesejáveis bolinhas.

8.5 Tecidos inteligentes

Atualmente o grande desafio da indústria é incorporar aos tecidos sintéticos características desejadas dos fios naturais. A evolução do uso de fibras sintéticas permite hoje construir qualquer textura ou toque e vai ao encontro de vários desejos dos consumidores indo desde tecidos térmicos a produtos ecologicamente corretos.

Tecidos inteligentes também são chamados de tecidos de performance, técnicos8 ou diferenciados9:

São tecidos feitos de fios que agregam no interior

da fibra tecnologia e ciência. Em razão disso

são capazes de oferecer propriedades funcionais

de desempenho e bem-estar, suprindo na sua

aplicação uma gama de exigências alem das

convencionais. (José conceição Padeiro – gerente

de marketing da Rhodia apud Costa, 2006).

Também podem ser caracterizados como tecidos funcionais, pois apresentam propriedades que agregam segurança, saúde,

8 Existem diversas definições de tecidos técnicos. Frankfurt (2005) cita que o uso/área de aplicação determina se o produto é um confeccionado têxtil, um têxtil-lar ou um têxtil técnico. Assim, alguns autores determinam que “tecidos técnicos são aqueles usados para confecções ou para o lar, tecid-os para mobiliário, lonas para caminhões de carga, air bags, roupas de proteção contra fogo, pecas moldadas aeronáuticas ou navais ou mesmo concreto com reforço têxtil.” Frankfurt (2005) Já Eral-do Maluf - Pesquisador do IPT, responsável pelo Laboratório de Produtos Têxteis (LPTex), cita que não existe diferença entre tecidos técnicos e inteligentes. “Ambos possuem características especí-ficas definidas, como por exemplo, proteção ao calor, impermeabilidade, transporte de líquidos, etc.” disponível em http://www.ipt.br/atividades/servicos/chat/?ARQ=113 16/5/2007 19:42:34

9 Neste trabalho usaremos os termos técnicos, diferenciados, inteligentes ou de performance como sinônimos.

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conforto, ou proteção ambiental entre outras funções indo alem das encontradas nos tecidos convencionais.

Na realidade, conforme cita Fraga (2005) os tecidos inteligentes já existem a algum tempo, fundamentais para uma “série infindável de utilizações, e que vem tendo uma participação crescente no mercado em geral, e no universo dos têxteis.”

Deve-se ressaltar que os usos mais tradicionais dos chamados tecidos técnicos ainda respondem pelo maior consumo agregando cada vez mais exigências dos consumidores.

8.5.1 Tecidos de PET – Poli (Tereftalato de Etileno)

O PET é uma fibra obtida através da reciclagem de embalagens10 de materiais sintéticos. A fibra pode ser misturada a outros materiais como algodão, linho ou viscose. Na forma de fibras, sob marcas Tergal ® (ICI) ou Dracon ® (Du Pont), apresentam excelente resistência mecânica e ao amassamento, bem como lavagem e secagem rápida.

A fibra Alya Eco, por exemplo, desenvolvida pela Rhodia-Ster e utilizada pela Santista têxtil em alguns de seus tecidos11, é composta por PET e algodão reciclados (no qual são recuperados

10 Depois de usadas, estas embalagens tomam parte na formação de montanhas de lixo, por serem em sua maioria descartáveis e não-degradáveis. A reciclagem é a alternativa para reduzir o im-pacto da matéria plástica descartada. Agora, a aplicação nobre e que está crescendo, é a utilização desta fibra na confecção de tecidos e malhas em poliéster. A garrafa PET, na Indústria têxtil passa pelo processo de reciclagem primária, que consiste em selecionar, separar, limpar, triturar em pedaços uniformes, retornando à produção de resina na própria unidade. Desta forma, o material triturado (flake) é extrudado (derretido) formando uma fibra. O processo de fiação condiciona o material para o processo de tecelagem ou malharia, e, em seguida, vai para a confecção e artigos de vestuário. Tudo isso graças à resina plástica PET ter o maior nível de aproveitamento quando reciclada. O resultado final é um produto de qualidade tão boa quanto aquele que foi confec-cionado com matéria-prima não reciclada, mas com uma diferença fundamental: tem um valor social e ecológico agregado sem precedentes. Disponível em http://www.tramaecologica.com.br/Sobre_Reciclagem.htm. Acesso em 4/11/2007 00:00:19

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tecidos usados, fios de algodão e retalhos de confecção, transformados novamente em matéria-prima). Esta fibra é 20% mais fina que a de algodão a partir daí a Santista desenvolveu um tecido índigo composto por 35% Alya Eco e 65% fibra de algodão reciclado. Salienta-se que existem inúmeras empresas12 que trabalham com fibras PET recicladas no Brasil. Segundo o fabricante para a produção de uma tonelada de fibra Alya Eco são necessárias cerca de 20 mil garrafas, uma camiseta branca básica, numa mistura 50% Alya Eco e 50% de algodão, consome duas garrafas PET de 2 litros13.

A principal aplicação da fibra Alya Eco são os produtos têxteis, em misturas com várias matérias-primas, como algodão, viscose, linho e liocel.

As garrafas PET também fornecem matéria-prima para a produção de flocos que confeccionam a fibra de poliéster destinada principalmente às indústrias de tapetes, carpetes e enchimentos.

8.5.2 Tecidos com ação anti-microbiana

Vieira (2006) cita que os materiais têxteis são um excelente meio para a proliferação de microrganismos (particularmente bactérias e fungos), pois servem como fonte de nutrientes para estes seres vivos. A autora continua descrevendo que a proliferação microbiana provoca nos materiais têxteis inúmeros problemas entre eles, a perda de resistência e de alongamento das fibras, a descoloração

11 Ver em: http://www.santistatextil.com.br/site/content/workwear/noticias_texto.asp?campo =1251&noticia_mes=9&noticia_ano=2003&secao_id=657&home=sim. Acesso em 10/30/2007 5:49:45 PM12 Exemplo de empresas que trabalham exclusivamente com reciclagem de PET: A Reciclean, re-cicladora de Diadema-SP, A Repet, recicladora com unidades em Mauá-SP e João Pessoa-PB, Da mesma forma pode-se citar empresas que trabalham com tecidos feitos a partir de PET para aplica-ções diversas como a ECOFABRIL e a CICLOAMBIENTAL– processo industrial de reciclagem do PET. Disponível em: http://www.gorni.eng.br/pet.html. Acesso em: 3/11/2007 23:59:0013 Disponível em http://www.santistatextil.com.br/ acesso em 2/11/2007

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e alterações no aspecto ou degradação do material. Esta ação se deve ao fato dos microrganismos que entram em contato com o material têxtil e metabolizam o suor e a urina, por exemplo, provocando a formação de substâncias que causam mau odor, irritações e mesmo infecções ao consumidor.

Assim sendo, o acabamento antimicrobiano nos materiais têxteis é relevante no combate à proliferação microbiana e imprescindível no setor hospitalar· como medida preventiva da transferência e desenvolvimento dos microrganismos patogênicos e conseqüentes infecções. Algumas fibras naturais como o algodão, o linho e a lã são mais susceptíveis ao ataque microbiano, pois tem condições inerentes de retenção de água e oxigênio– fonte alimentar destes microorganismos, já que sua estrutura permite.

Vale ressaltar que apesar das fibras celulósicas não constituírem uma fonte alimentar direta dos microrganismos, determinados fungos e bactérias segregam enzimas que convertem por hidrólise a celulose em glicose, neste caso, os tecidos produzidos a partir da celulose podem então ser mais suscetíveis a este ataque.

Assim, os tratamentos desenvolvidos têm sido no sentido de realizar modificações permanentes nas superfícies das fibras através de vários tipos de procedimentos como reações químicas, fotoquímicas, enzimáticas, aplicação de plasma, etc. Algumas destas técnicas, cita a autora, têm encontrado dificuldade de inserção no mercado, pois alguns métodos são incompatíveis com os processos têxteis industriais estabelecidos. E ainda salienta que as espécies presentes nos materiais têxteis são essencialmente bactérias e fungos.

O ataque microbiano consiste basicamente em liberar a glicose – usada como fonte de carbono para o desenvolvimento dos

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microrganismos a partir da destruição da celulose, mas esta quebra depende da destruição da cutícula, só posteriormente à degradação dessa camada14 é que ocorre a destruição da celulose.

Por sua vez, os compostos antimicrobianos devem ser eficientes na eliminação ou controle de microrganismos indesejáveis e devem ser inofensivos para o produtor e consumidor. Também devem apresentar reduzido impacto ambiental, além de serem resistentes às condições atmosféricas (luz solar, umidade) e um dos itens mais importantes no foco deste estudo – devem ser duráveis às lavagens. Dependendo do material têxtil e do espectro da atividade do agente microbiano que se quer dar, podem-se usar diferentes tipos de agente s antimicrobianos – a maioria, conforme cita Vieira (2006) tem que entrar no interior da célula, atuando assim de forma intracelular, e outros atuam no exterior da célula, permitindo uma imobilização na superfície celular. Define Vieira (2006. p37):

O grau de actividade é diferenciado pelo termo “cida”, que indica destruição significativa dos micróbios e o termo “estático” que representa a inibição do crescimento microbiano, sem no entanto, existir destruição dos microrganismos. Assim sendo, acabamentos antimicrobianos que inibem o crescimento e desenvolvimento dos micróbios são geralmente denominados como biostáticos, bacteriostáticos e fungistáticos, ao invés, os produtos antimicrobianos que destroem os microrganismos, são designados como, biocidas, bactericidas e fungicidas. (Ramachandran et al., 2004; Schindler et al., 2005)

14 Ressalta-se que muitos fatores são relevantes para determinar o quanto suscetível uma fibra é de ataque microbiano Vieira (2006) cita, por exemplo: a estrutura e morfologia da fibra, as diferenças no comprimento da cadeia e na variação de hemiceluloses, ceras, pectinas e outras substâncias não celulósicas, fatores como grau de orientação e o ângulo segundo o qual as fibrilas estão posiciona-das em relação ao eixo da fibra, etc.

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No estudo citado a autora explica que os compostos antimicrobianos podem ser classificados em dois grandes grupos de acordo com o modo de atuação.

No primeiro grupo a substância antimicrobiana é lentamente libertada na superfície da fibra ou no seu interior, sendo assim eficiente na superfície da fibra e no ambiente circundante15. Este primeiro grupo apresenta uma diminuição da eficácia durante a vida útil do produto. Na maioria dos casos este composto antimicrobiano é aplicado durante a fase de acabamento dos tecidos ou fibras.

O segundo grupo consiste nos compostos que utilizam produtos ligados quimicamente às superfícies das fibras16, sem possibilidade de libertação ou migração para o ambiente circundante, neste caso o acabamento é permanente, não perdendo sua eficácia durante a vida útil do produto, sendo inclusive potencialmente inócuos para o usuário. Neste caso a introdução do composto microbiano se dá de forma a se obter fibras intrinsecamente antimicrobianas, ou seja, ainda no processo de obtenção da fibra.

Podem ainda ser distintos pela sua característica de atividade, nos materiais com característica passiva, este produz um efeito negativo para o desenvolvimento dos microorganismos. Nos materiais com característica ativa, estes atuam no interior da parede celular do microorganismo, eliminando-o.

15 Incluem-se compostos como, triclosano, sais quaternário de amónio, fenóis, poliaminas e iões de prata.Vieira(2006).16 Quando o composto antimicrobiano é ligado quimicamente às fibras têxteis há a sua total imo-bilização e portanto, o processo de inibição ocorre quando existe contacto do microrganismo com a superfície tratada do material têxtil. Esta metodologia permite, obter uma durabilidade da ac-tividade elevada em fibras celulósicas, lã e ainda fibras sintéticas. .. são os derivados de siloxano, que permanecem imobilizados na superfície do substrato têxtil e destroem os microrganismos por contacto, não ocorrendo migração.Vieira(2006)

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Dentre os vários agentes antimicrobianos utilizados nos materiais têxteis incluem-se antibióticos, formaldeído, metais pesados (prata, cobre, sais metálicos), compostos organometálicos, fenóis, cloro- amina, peróxido de hidrogénio, iodeto, ozono, compostos quaternários de amónio, e organosiloxanos, conforme descreve Vieira (2006)

Além dos cuidados com as condições físicas que os profissionais atuantes em hospitais devem ter, às vezes, continua Vieira (2006), os processos de lavagem freqüentes não conseguem o controle total de infestação microbiana. As lavagens com fervura são freqüentemente desaconselháveis à maioria dos têxteis e neste panorama o tratamento antimicrobiano surge então como uma possibilidade de diminuir ou até mesmo eliminar riscos de infecções provocadas por microorganismos.

Existem inúmeros fabricantes de tecidos com propriedades anti-microbianas, pode-se citar a empresa Cedro, por exemplo, que lançou no mercado a linha de tecidos técnicos Cedrotech, entre os produtos desta linha tem-se o AM antimicrobial. Segundo o fabricante os tecidos da linha Cedrotech se destacam pela utilização da aplicação de nanotecnologia no desenvolvimento dos produtos. O fabricante informa ainda que:

[...] esse tecido inibe a proliferação de microorganismos e é uma excelente proteção contra um amplo espectro de bactérias. O efeito antimicrobiano, além de proteger os tecidos da degradação, proporciona efeitos adicionais, tais como frescor duradouro e conforto no uso. Sua eficácia é testada por normas internacionais. Indicado para: Ind. farmacêutica, alimentícia e hospitalar, esportes e resgate.17

17 Disponível em: http://www.cedro.com.br/br/tecnicos/tecnicos.asp?tipo=AM#inicio. Acesso em 30/10/2007 18:05:11

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Ainda nesta linha – dos tecidos anti-microbiaisl pode-se citar a Santista Têxtil que possui, de acordo com informações do fabricante, 13 produtos18 com acabamento anti-microbial destinados aos mais diversos setores.

Segundo informações do fabricante das fibras - M&G - empresa do Grupo Mossi & Ghisolfi (M&G) podem-se realizar o tratamento antimicrobial de 2 formas – através do coating – uma espécie de banho aplicado ao tecido já acabado. Neste caso a vida útil é estimada em 20 a 30 lavagens. E a outra forma na qual se introduz ainda no processo de fabricação da fibra o bactericida – é o caso do Alya health – uma cerâmica com íons de prata em seu interior. Neste caso o poder bactericida é permanente, e resiste a todo tipo de lavagens, além de eliminar 99,99% das bactérias que entram em contato com a fibra. Pode ser misturada a artigos 100% poliéster, algodão ou viscose, impedindo o desenvolvimento de bactérias e fungos.

Já existem alguns fabricantes que usam tecidos direcionados especificamente para área hospitalar usando este aditivo, é o caso da Empresa Sabie19 de enxovais corporativos que utiliza na sua linha tecidos 100% algodão com tratamento antimicrobial da Milliken (com o aditivo “Alaphasan”, mesmo utilizado na fibra alya health20).

8.6 Fibras/tecidos indicados para a confecção de um uniforme hospitalar

Em um primeiro momento constata-se que existem no mercado inúmeras fibras apropriadas para a confecção de uniformes hospitalares para enfermagem.

18 Disponível em: http://www.santistatextil.com.br/site/content/workwear/resultado_busca.asp. Acesso em 30/10/2007 18:17:1119 Disponível em: http://www.sabie.com.br/html/hospital.htm. Acesso em: 1/11/2007 10:13:0120 Disponível em: http://www.alya.com.br/prod_fibras/alya_health.htm#. Acesso em: 1/11/2007 11:28:33

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No que diz respeito às fibras requeridas neste estudo, algumas qualidades como as que incorporam funções antimicrobiais para a função de barreira aos riscos biológicos, importante para a fabricação de uniformes hospitalares, já são comercializadas conforme citado e apresentam-se como uma das opções de uso para a confecção dos uniformes. As fibras fabricadas a partir de PET, por exemplo, também podem ser avaliadas, visto que estas apresentam o perfil sustentável requerido nos produtos atuais.

Verifica-se que é enorme a possibilidade de soluções que podem ser implementadas com o objetivo de adquirir características desejadas em materiais têxteis, incluindo o setor hospitalar, foco deste trabalho.

Salienta-se ainda que a partir de contato com fabricantes21 foi possível verificar fibras/tecidos disponíveis no mercado e ainda, propor algumas combinações - passiveis de realização.

O tecido composto pelo conjunto das seguintes fibras: Pet+ alya Health+ algodão orgânico ou fibra de bambu mostrou-se viável economicamente, passível de produção e adequado às necessidades de um uniforme hospitalar.

No quadro a seguir apresenta-se um resumo das características requeridas e o comportamento de cada uma das fibras apresentadas neste estudo.

Características requeridas

Algodão Algodão orgânico

Bambu PET Fibra alya

health

Tecido feito de fibra PET + alya health

+ algodão orgânico (ou

bambu)

Conforto X X X X X X

21LC Malhas – disponível em http://www.lcmalhas.com.br/. Acesso em:25/11/2007 12:02:10; RenauxView Tecidos – disponível em: http://www.renauxview.com/. Acesso em: 25/11/2007 12:03:41; e Gruppo Mossi & Ghisolfi,- M&G Fibras e Resinas Ltda.- fabricante de fibras.

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Anti-microbial X X XFacilidade de manejo

X X X X X X

Facilidade de ma-nutenção

X X X X X

Fibra ecológica - uso de materiais de baixo impacto ambiental no processoou uso de materi-ais recicláveis

X X X

QUADRO 2: CARACTERISTICAS REQUERIDAS x COMPORTAMENTO DAS FIBRAS TEXTEIS

Fonte: Maciel (2007)

8.7 Conclusão

A partir de um estudo realizado sobre uniformes profissionais, a seleção de materiais têxteis é um dos itens relevantes para a confecção de um produto de vestuário, especialmente tratando-se de um uniforme profissional para área da saúde.

A possibilidade de avaliar condicionantes diferentes das usuais como escolha de materiais com características de baixo impacto ambiental e barreira microbial é uma inovação e demonstra o comprometimento com a produção de produtos com foco em sustentabilidade ambiental e segurança para o usuário.

Com esta compreensão abre-se caminho para a percepção de que é possível integrar a questão ambiental em projetos de produto de vestuário sem reduzir a qualidade, conforto ou beleza estética do produto.

A fim de também verificar as condicionantes ambientais que a população em estudo estava submetida, foi realizado um mapa de

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riscos (físicos, químicos, biológicos e ergonômicos) e a avaliação de usabilidade dos uniformes usados atualmente. A conclusão destes itens é a inadequação dos uniformes para a rotina do serviço de enfermagem juntamente com uma clara visão dos tipos de riscos que esta população enfrenta. Esta foi a base utilizada para a escolha dos materiais têxteis, tendo em mente o viés da sustentabilidade presente neste estudo.

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Bases conceituais para a confecção de Uniformes Hospitalares para enfermagem

História, Crítica e Perspectivas

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Sandra Regina Rech e Amanda Queiróz Campos

Capítulo IX

FUTURO DO PRESENTE: PORQUE E COMO PESQUISAR TENDÊNCIAS

Profa. Dra. Sandra Regina Rech1

Amanda Queiróz Campos2

9.1. Introdução

A utilização de artifícios como as tendências de Moda, que reverberam o espírito de seu tempo, aparece como estratégia utilizada por empresas, que buscam interpretar e prever aspirações dos consumidores e as qualidades do mercado comercial num futuro determinado. “As atividades de monitoramento de Moda, ou a pesquisa de Moda, analisam a informação de áreas distintas como economia, política, sociologia, ciência e tecnologia, até chegar à formulação de prognósticos na forma de tendências” (FEGHALI, 2001, p.13).

PERSPECTIVAS

1 Doutora em Engenharia de Produção – UFSC e professora efetiva do Departamento de Moda – UDESC. [email protected] Graduanda em Estilismo – UDESC e bolsista PIVIC do Projeto de pesquisa “Futuro do Presente: espaço para observação, análise e interpretação de sinais”. [email protected]

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Cada vez mais as empresas na área do Design e da Moda, através da pesquisa de sinais emergentes, em suas diversas faces, garantem o conhecimento de informações relevantes para os departamentos de marketing e de desenvolvimento de produto, investindo lucros numa espécie de seguro contra o fracasso. A captação e interpretação de pulsos no espírito do tempo devem ser entendidas como a tradução de uma linguagem cultural em um momento específico, um relatório do investigador sobre os tempos ainda por vir.

9.2. Objetivos

O seguinte texto constitui-se como um artigo de iniciação científica e objetiva apresentar uma discussão teórica a respeito do projeto de pesquisa Futuro do Presente: espaço para observação, análise e interpretação de sinais. Portanto, a pesquisa de tendências é abordada através da sua relação com o Sistema de Moda, e faz entender a importância das mudanças freqüentes das tendências para a economia, através do emprego do método de prospecção e análise de sinais emergentes elaborado por Back (2008).

9.3. Entendendo a complexidade do sistema de Moda

O sistema de Moda bombardeia todos os dias informações, imagens, idéias, tendências; e, segundo Guillaume Erner (2005) torna-se parte integrante do nosso processo de construção das identidades e modo de comunicação. A lógica de consumo, que está ancorada nos pilares estruturais do ethos Moda, a efemeridade e o culto à novidade, é cada vez mais bem aceita, sendo que, de acordo com Lipovestky (1997), a dominação do indivíduo pela sociedade é infinitamente maior do que nunca e as novidades são cada vez mais bem aceitas.

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As necessidades e desejos dos seres humanos dentro da cultura capitalista são aguçados através do inconstante apelo da mídia e da indústria cultural. Segundo Bliss (1916) apud Lynch (2007), um dos motivos primordiais do uso de peças de roupa é o de endereçar um sentimento fundamental de incompletude e insatisfação. A partir dessa idéia, nota-se a procura por satisfação, e, assim através do resultado de pesquisas prospectivas, as indústrias buscam prever aspirações de mudanças dos consumidores e englobar anseios, e, até mesmo movimentos de contracultura para o sistema de Moda, visando sempre sua hegemonia.

Eco (1989, p.19) aponta:

Há dez anos, usar barba podia significar: ou ser artista ao velho estilo, ou um fascista nostálgico (mas neste caso seria uma barba de tipo especial, à Ítalo Balbo). Depois da contestação estudantil a barba tornou-se uma opção ‘de esquerda’. Hoje, vai-se tornando gradualmente uma opção cada vez mais ‘à moda’ e esvazia-se de significado.

As idéias de sedução e inovação tomaram fronte da sociedade moderna, o “parecer” tornou-se mais importante do que o “ser”, a Moda conecta os prazeres de ver e ser visto, virando palco para a reprodução perfeita do narcisismo. “A moda estetizou e individualizou a vaidade humana, conseguiu fazer do superficial um instrumento de salvação, uma finalidade da existência” (LIPOVETSKY, 1997. p.39).

A partir das idéias de Kawamura (2005) entende-se então que a Moda não é apenas uma peça de roupa, mas trata-se de elementos invisíveis por ela representados e que os seres humanos agregaram naquele pedaço de tecido ou material específico. Conseqüentemente, o Sistema de Moda, que compõe-se de engrenagens complexas que

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interligam lógicas sociais, antropológicas, sociológicas, históricas e econômicas, passa longe de ser um campo de estudo fútil, superficial, ou leviano.

9.3.1. A importância das tendências como forças motoras para o Sistema de Moda

Partindo de uma explicação econômica para o fenômeno das mudanças de Moda, há quem crê que a moda é o resultado de uma conspiração apenas dos criadores com as empresas do setor, fazendo assim com que os consumidores sejam sempre atingidos com novos desejos buscando então saciar tais faltas através do consumo.

Porém, notamos, hoje, que a rua é perigosamente criadora, e que as principais tendências de moda atualmente seguidas foram exploradas a partir de uma primeira observação da sociedade e mundo ao nosso redor. Popcorn e Marigold (1997) apud Oliveira (2006, p.63) assinalam que:

As sementes estão em toda parte – basta abrir os olhos e olhar: nos restaurantes, bares e clubes; nas ruas; na música que ouvimos; nas revistas que lemos; nos programas de televisão que vemos. Observe o que o governo nos diz e o que o comércio nos vende.

As influências observadas e analisadas pelos pesquisadores de tendências funcionam como espécie de espelho da modernidade, sendo assim expressões do espírito do tempo anunciando traços póstumos.

... porque se pode ler um ritual ou uma cidade, da mesma maneira como se pode ler um conto popular ou um texto filosófico. O método de exegese pode variar, mas em cada caso a leitura é feita em busca do significado – o significado inscrito

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pelos contemporâneos no que quer sobreviva de uma noção de mundo (DANTON, 2006).

Através do estudo e análise de fenômenos sociais provenientes das ruas e disseminados por meios de comunicação em geral, torna-se possível a prospecção de tendências sociais, as quais, posteriormente, serão traduzidas em tendências de Moda para a indústria.

9.3.2. A incessante antecipação do futuro

Estudar o futuro como modo de minimizar os riscos em relação ao tempo desconhecido não é novidade em nossa sociedade. É válido ressaltar que apesar da prospecção de sinais emergentes apontarem geralmente direções definidas, nada pode assegurar que tais direcionamentos serão atingidos. A idéia de incerteza com relação a tais prospecções exemplifica muito bem as inseguranças e incertezas com que o mercado de criação e o pesquisador de tendências lidam.

Back (2008) assevera que pesquisar tendências é perceber influências exercidas sobre um contexto e ler sua evolução buscando compreender suas futuras conseqüências. Nos dias atuais, a internet aparece como um meio eficaz de auxílio nas leituras de tendências sócio-econômicas, uma vez que surge como modo potencializador da velocidade e democratizador das tendências e informações do mundo da Moda. Com surgimento da blogsfera, cada vez mais a moda que emerge das ruas e é divulgada via internet serve como potente energia inspiradora para pesquisadores, criadores a até mesmo os próprios consumidores.

9.3.3. Modelo referência para a prospecção de sinais emergentes

Vê-se que a observação, análise e interpretação de signos é o que orienta os grandes setores sobre os desejos e anseios da

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população consumidora. Entretanto, para analisá-los é necessário criar certo distanciamento, a fim de ver tais práticas de modo como elas realmente se apresentam. Para isso, faz-se imperativo o uso de um método estruturado visando organização, validade e suposta imparcialidade das informações coletadas.

Aponta-se a internet como meio auxiliar de prospecção de tendências. Desde os populares sites especializados em moda até as páginas das distintas marcas e criadores, existe muito material que possibilita analisar tendências. Tanto em sites específicos do setor como em blogs, páginas pessoais ou noticiários, na internet as informações fluem com mais rapidez e tornam a pesquisa de tendências mais veloz, consistente, democrática e globalizada.

Seguindo o método proposto por Back (2008), efetua-se o uso da identificação das influências para a prospecção de tendências de curto prazo (até dois anos) para o segmento Moda, realizando pesquisas através da internet. No projeto de pesquisa Futuro do presente: espaço para observação, análise e interpretação de sinais considera-se relevante, então, a realização de análises específicas dentro dos seguintes segmentos de influência: macro-tendências, comportamento, tecnologias e setores de referência (figura 1).

9.3.4. Pesquisando tendências através dos Setores de Referência

Os setores de referência enquadram para sua categoria, principalmente, empresas e meios de comunicação e informação com características inovadoras e de formação de opinião pública. Dentro do segmento Moda, têxtil e de confecção, delimitado pelo projeto de pesquisa, as pesquisas de sinais emergentes dão-se através da busca na internet, bem como idéias e atitudes de vanguarda em relação a produtos, estratégias de mercado e também na relação entre consumidor e empresa.

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Figura 1: Método de pesquisa de sinais para tendências de curto prazo

Fonte: Adaptado de Back (2008).

Outras fontes de materiais a serem coletados para o trabalho através dos Setores de Referência são análises de formas e conteúdos

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em publicidade e marketing, do mesmo modo em outros diversos meios. Segundo Vicent-Ricard (1989) apud Rech (2002), a pessoa que é um bom radar tem instinto, é receptiva a tudo que a cerca, sente no ar o espírito da época e dá asas ao próprio faro mesmo sem estabelecer qualquer ligação com o produto a ser fabricado.

Após a coleta dos dados, as informações prospectivas são arquivadas em um caderno de idéias denominado sketch-book. Consoante Gomes (2001, p.48-49), o caderno de idéias serve também como álbum de recortes, reportagens, textos, gráficos, diagramas, esquemas e ilustrações, que mais tarde irão servir como ‘vocábulos da forma’, ou seja, servirá como uma biblioteca de sinais organizada cronologicamente, e, através da qual será possível determinar e analisar o espírito do tempo em relação à influência em questão (comportamento, setores de referência, tecnologia, macro-tendências).

Após o acúmulo de informações, é realizada a filtragem de sinais relevantes através da crítica genética, fazendo uso da sensibilidade do pesquisador de tendências, tendo como objetivo apresentar um conteúdo mais organizado e claro para os demais integrantes do grupo de pesquisadores. Ao final de cada mês, um texto (figura 2) é elaborado com fim de comunicar as idéias mais relevantes captadas e traduzidas, enfim, em tendências.

Como fonte comunicativa auxiliar ao texto, são elaborados painéis imagéticos a fim de ilustrar conceitos e tendências captados, filtrados, analisados e interpretados (figura 3).

O material é apresentado, primeiramente, para os outros integrantes do grupo de pesquisa (o que inclui acadêmicas, professores participantes e coordenadora), sofrerá modificações, se necessário, e será posteriormente divulgado através do website http://www.ceart.udesc.br/futurodopresente/.

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Figura 2: Texto desenvolvido para comunicação das principais influências apontadas pelos setores de referência no mês de junho de 2008.

Fonte: Amanda Queiróz Campos

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Figura 3: Painel imagético criado para a comunicação das principais influências apontadas pelos setores de referência no mês de maio de 2008.

Fonte: Amanda Queiróz Campos

Figura 4: Website

Fonte: http://www.ceart.udesc.br/futurodopresente/

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O website Futuro do Presente foi colocado na rede no mês de dezembro no ano de 2007, e, no início do ano acadêmico de 2008, sofreu modificações que permitiram maior conforto visual (através da utilização da escala de cores acromática e disposição mais ergonômica do menu de navegação), além da organização do material disponibilizado. O site conta com uma breve apresentação do projeto, lista de blogs interessantes a serem visitados, um glossário ricos em termos dos segmentos Moda e marketing (útil para estudantes assim como para profissionais), bem como divulga as principais tendências destacadas pelo grupo de pesquisa dentro de cada categoria de influência, especificamente escolhidas para a observação, análise e interpretação de sinais emergentes

9.3.5. Resultados

A pesquisa é realizada através da observação e análise semiológica durante todo o período de estudo através do processo composto pelo acesso diário aos blogs e outras formas de comunicação e expressão pessoal e empresarial, da elaboração do sketch-book, da montagem do quadro de sinais (pranchas iconográficas) e divulgação das prospectivas via meio digital.

Além disso, a busca e análise de sinais emergentes estimulam criações e propostas inovadoras das empresas a fim de alcançar as expectativas do consumidor. Permite ainda que os profissionais da área de criação e marketing atualizem-se no mercado e foquem em seu público-alvo identificando seus desejos e anseios, satisfazendo-os assim ao longo do tempo através da oferta de produtos materiais ou de experiência.

9.4. Considerações finais

O projeto de pesquisa em sua continuidade, busca comunicar a um público cada vez maior as tendências de Moda,

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focando seu alvo nas micro e pequenas empresas buscando semear a idéia de como a presença de um profissional de pesquisa de tendências é relevante para a empresa, que por sua vez mostrar-se-á mais competitiva em relação às empresas de mesmo ou maior porte.

Logo, exibe-se a importância de profissionais com formação acadêmica voltada para o segmento Moda no setor de desenvolvimento de produtos, mirando não apenas a abertura de mercado local para os futuros bacharéis em Moda, mas igualmente o crescimento do mercado têxtil regional como um todo em relação à qualidade de criação e processo criativo dirigido.

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Mara R. Sant’Anna-Muller, Liliane E. Carvalho, Luciana D. Lopes e Paula Consoni

Capítulo X

Moda, museu e história – novos horizontes para o profissional da ModaMara Rúbia Sant’Anna-Muller1

Liliane E. Carvalho2

Luciana D. Lopes3

Paula Consoni4

O mundo está em alerta pelo futuro que o aguarda. Aquecimento global, destruição da Amazônia, crise dos alimentos, escassez d’água tudo atemoriza e leva a sociedade a debater o futuro e por ressonância a pensar no passado, a buscar sua preservação e a constituir reservas técnicas de todas as ordens para os dias de incertezas que são anunciados5.

O que a Moda tem a ver com isso? Tudo e profundamente. Talvez dessas discussões comece uma revisão consistente do próprio ethos Moda e a reformulação dos sistemas produtivos e comerciais

PERSPECTIVAS

1 Doutora em História – UFRGS/EHESS e professora efetiva do Departamento de Moda – UDESC. [email protected]. 2 Mestre em História Cultural pela Universidade Federal de Santa Catarina. Especialista em Moda: criação e produção, pela Universidade do Estado de Santa Catarina. [email protected]

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associados à Moda e, conseqüentemente, uma alteração do papel do profissional do setor. Todavia isso não é para amanhã nem para a próxima geração. Têm-se séculos pela frente para observar onde isto vai parar. Por outro lado, desde já, como a Moda sempre o faz, a questão suscita a abertura de novos desafios e sintonizando na macro-tendência vinculada à preservação, nunca se debateu tanto e nem se produziu com tamanha vivacidade discussões relativas à conservação e constituição de espaços museológicos, dando aos objetos uma dimensão mais científica do que até então havia sido dada.

Esta discussão é bastante ampla e por si só produziria um livro. A proposta deste capítulo é mais modesta e se restringe as possibilidades de aplicação desta discussão a alguns acervos catarinenses. Portanto, nosso objetivo é indicar as fronteiras teórico-metodológicas da pesquisa em acervos museológicos e propor algumas possibilidades de associação entre estes espaços e a ação criativa do profissional de moda.

Como método de abordagem foi utilizado o método indutivo e como método de procedimento foi trabalhado o desenvolvimento monográfico, articulando com pertinência e perspicácia argumentação e dados coletados em diferentes fontes escritas relativas ao debate. O capítulo foi construído a partir de referências

3 Especialista em Moda - Criação e Produção pela Universidade do Estado de Santa Catarina - UDESC. Professora no curso de moda, disciplina Modelagem Industrial, na Universidade do Es-tado de Santa Catarina - UDESC. [email protected] Graduada em Moda pela Universidade do Estado de Santa Catarina - UDESC. [email protected] São exemplos: Projeto Embraport, realizado na cidade de Santos/SP, que criou uma reserva com mudas provenientes da Mata Atlântica, bastante devastada na região, com 180 metros quadra-dos. Ver http://www.jornaldaorla.com.br/noticias. Internacionalmente, a maior iniciativa foi a criação do Banco Internacional de Sementes de Svalbard, na Noruega e coordenado pelo Global Crop Diversity Trust, organização criada pela FAO. Neste banco de sementes serão armazenadas 4,5 milhões de amostras de sementes e 2 bilhões de sementes de todas as espécies cultivadas pelo ser humano com o objetivo de preservar as principais cultivares para permitir que a agricultura seja retomada caso ocorra alguma catástrofe global. Ver http://www.noruega.org.br/policy/en-vironment/cooperation/frolageret_sp.htm.

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Mara R. Sant’Anna-Muller, Liliane E. Carvalho, Luciana D. Lopes e Paula Consoni

bibliográficas consagradas dos temas afeitos a este estudo, associado à observação in loco dos acervos documentais e museológicos, os quais ocorreram como atividade obrigatória da disciplina “História e Moda”, ministradas pelas professoras Liliane e Mara Rúbia. Além disso, também como procedimento metodológico foi desenvolvido, pela estilista Paula com o apoio da professora Luciana, a pesquisa detalhada sobre três peças do acervo do Museu da Família Colonial, considerando todas as suas características materiais e imateriais e sua relação com a sociedade que as produziu, conforme procedimentos discutidos abaixo a partir das considerações de Rita Andrade. Como já indicado, muito da intuição e experiência profissional foi levado em conta para o desenvolvimento da argumentação e exemplificações que sustentam este trabalho composto, realmente, a quatro mentes.

10.1. Fontes de pesquisa – um passeio pela teoria

Os objetos antigos ou novos enquadram-se, sob o ponto de vista científico e acadêmico, numa grande categoria analítica chamada “cultura material”. Segundo Susan Pearce (1992) esta se define como um “termo [...] usado significando artefatos construídos por seres humanos através de uma combinação entre matérias brutas e tecnologia, e que, para fins práticos, podem ser distinguidos das estruturas fixas por sua mobilidade”. Portanto não é apenas o objeto em si que conta, mas toda a história de sua fabricação, uso, representação social e valor simbólico, o que leva o estudo para outra esfera de abordagem que contempla a cultura e a sociedade numa relação intensa e que produz patrimônios culturais intangíveis, mas passíveis de estudo e análise a partir das materialidades constituídas.

Segundo Pessez, destacando a relevância deste estudo:

em anos recentes [...] a interpretação da cultura material tem se tornado uma preocupação

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acadêmica. Uma razão para isto é o fato de que as coleções museológicas representam a cultura material armazenada desde o passado, enquanto as exposições museológicas são o principal meio através do qual o passado é publicamente apresentado [...] (1989)

Por sua vez, José Bittencourt esclarece que o estudo da cultura material se produz em três dimensões:

uma espacial (a topologia das transformações naturais e seus resultados visíveis), uma cronológica (que se manifesta em termos de processos evolutivos) e uma terceira, social, que produz diferenças no interior de um mesmo conjunto humano, sendo possível observar níveis de cultura material que separam os grupos sociais. Esses níveis manifestam-se tecnicamente, economicamente, mas também (pensamos nós) simbolicamente. (1998)

Do estudo no silêncio das salas de reservas técnicas dos mais diferentes museus ou acervos, boa parte dos objetos um dia compõe exposições permanentes ou temporárias, temáticas ou não, e assim fixados em conjuntos formados por critérios dos curadores e apresentados por pequenas legendas ou textos que poucos lêem, aquilo que um dia foi objeto de uso pessoal ou coletivo se constituí num documento. Este tipo de documento vira um atestado histórico da existência de uma sociedade, das relações humanas vividas numa determinada época e local e por assimilações inconscientes, torna-se, na mente de cada observador, a síntese de todo um tempo e sociedade. Essas análises desembocam numa questão valiosa para a historiografia, qual seja, a produção do conhecimento do passado, a constituição de memórias coletivas e seus usos e até abusos ideológicos.

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Desta forma, cada objeto, independente de seu tamanho, condições de fabricação ou uso, se constituí num documento histórico, sob o ponto de vista da cultura material, e como todo documento diante de um historiador, o objeto deve ser investigado no seu contexto, situado em seu tempo e tratado como algo que propôs relações e impôs tratamentos. Tal como diante de um documento escrito o historiador deve indagar quem? para quem? quando? onde? e por quê? tais palavras e argumentos ou formas, cores e texturas ou, ainda, enquadramentos, posses e falas foram construídos. Das respostas obtidas diante de suas fontes devidamente contextualizadas o profissional deve ser capaz de analisar não a verdade exposta, mas as intenções de verdade que o documento se propôs expressar. Ou seja, um objeto como uma carta possui um discurso e este deve ser analisado como uma possibilidade de interpretação dos sujeitos que o compartilharam, assim como um vestido, uma fotografia ou mesmo um depoimento.

Todavia Bittencourt alerta, reforçando a argumentação acima, que:

Com uma armadilha adicional: ao contrário dos documentos escritos, os objetos parecem imediatamente acessíveis, já que podemos dizer que, ao contrário, daqueles esses ‘ensinam’ diretamente, bastando, para tanto, olhá-los. E pode-se também pensar que os objetos têm seu conteúdo mais diretamente aprendido porque são materialização de processos sociais. (BITTENCOURT, 1998)

Por sua vez, o conjunto dos objetos que se constituíram em documentos sob a égide de uma instituição como o Museu, faz com que este também se torne um grande objeto histórico e, logo, um documento também. Neste caso, conforme Jacques Le Goff (2003) considera, um documento desta proporção se transforma em

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monumento e torna-se passível das mais diversas comemorações, cuja existência tem como função a formação e manutenção de memórias sociais. O documento/monumento é visto como um legado das gerações anteriores que deve ser preservado, especialmente porque ele de alguma forma representa e torna-se testemunho de uma época. Nem todos os objetos se constituem, como já se destacou acima, em documentos, assim como, nem todas as casas e prédios tornam-se monumentos. Entre eles sempre há aqueles que são considerados irrelevantes e são destruídos ou desprezados intencionalmente. Portanto, a partir da argumentação de Le Goff (2003), o que se constitui como monumento são aqueles objetos julgados como portadores de conteúdo “superior” e por isso preservados com a intenção de serem peças num projeto político de institucionalização de uma memória social.

Nas palavras de Susan Pearce a questão ainda se apresenta mais complexa e nos faz pensar o quanto nos é necessário de atenção e perspicácia para pesquisar objetos:

Um modo de frisar sua [dos objetos] centralidade social é dizer que eles são inscrições intencionais no mundo físico que corporificam significações sociais: pode-se também dizer que se as idéias sociais não existem sem um conteúdo físico, os objetos carecem de significação sem um conteúdo social: idéia e expressão não são duas partes separadas, mas a mesma construção social. Uma das implicações desta formulação é revelar o papel dos objetos na reprodução social, ou seja, no processo contínuo que capacita uma sociedade a seguir sendo o que é. (PEARCE, 1990, p.36)

Ciente disto o historiador de moda tem maiores possibilidades de analisar os trajes e outros artefatos têxteis que

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chegam as suas mãos. Ele é capaz de percebê-los como seleções ocorridas por critérios diversos, mas que de uma forma ou de outra passaram a fazer parte de uma coleção na medida em que atestaram um tipo de discurso, tido como fundamental, na formação e preservação de uma memória social.

Somente o método vigia o trabalho do historiador, como afirma Marc Ferro (1989), pois sem ele o profissional da história fica a mercê das seduções que suas fontes podem realizar sob sua sensibilidade, ofuscando sua crítica e impondo deduções muitos circunscritas e que, sob o julgo de belas argumentações e muitas citações de outros autores, passam como possíveis de serem coerentes. Contudo, o método para o trabalho com a cultura material é muito incipiente, especialmente dentre os historiadores de Moda.

O ensino da história da moda e algumas poucas publicações neste campo no Brasil atestam a carência citada acima. Como fonte primordial das disciplinas ministradas nos mais diferentes cursos de Estilismo, Moda ou Design de Moda estão livros publicados há muitas décadas fora do Brasil e que se utilizam de uma metodologia predominantemente cronológica e linear para abordar a questão. Numa série de páginas ilustradas por dezenas de imagens são sintetizadas décadas inteiras de costumes vestimentares, quase sempre partindo apenas daquilo que a elite usava ou as tendências de moda ditavam, sem que haja um mínimo questionamento das fontes utilizadas ou relativização daqueles trajes que ilustram as décadas por grupos sociais, regiões do planeta e mesmo por diferenças culturais. Tudo é padronizado.

E o que os profissionais destes cursos fazem posteriormente? Pouquíssimos têm aguçado o interesse pela história como fonte de pesquisa, utilizando dela apenas como uma forma, de algumas vezes,

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ilustrar seus trabalhos e releases, reforçando assim a síntese standard da vida em sociedade.

Os museus, as coleções e os acervos são espaços a conquistar tanto por aqueles que se propõem a escrever sobre a história da moda como por aqueles que trabalham com a criação do produto de moda. É um desafio ao historiador da moda abrir seu leque de fontes e ir além do documento escrito, jornalístico ou bibliográfico.

Rita Andrade (2006), alerta que as fontes escritas e apenas visuais, como as imagens reproduzidas nos livros tradicionais ou nas revistas especializadas, não são suficientes para servirem de ponte à investigação das condições tecnológicas de sua fabricação, da disponibilidade de matérias-primas, do estágio de aperfeiçoamento da modelagem ou mesmo das condições de acabamento e uso de técnicas relativas à confecção da roupa.

Claro que investigar um traje como qualquer outro objeto exige o método rigoroso que se falava acima, pois só vendo-o como um documento pode-se tratá-lo academicamente. Nas palavras da autora:

Ao passo que num método tradicional a roupa é ilustrativa, representativa de uma série de aspectos da moda, como estilo, design, forma e cor, recentemente, a roupa tem sido usada como um documento histórico, evidência cultural e material da sociedade. Nessa nova perspectiva, o que é analisado e estudado é a roupa e não a foto da roupa. Neste sentido, o estudo da moda fica menos semiológico e mais multidisciplinar. Áreas como a história, a etnologia, a etnografia, a arqueologia e a sociologia passam a coexistir e não mais a se excluir. (ANDRADE, 2008)

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Dentre os estudiosos que já propuseram métodos para o trabalho com os objetos destacam-se, segundo Andrade (2006): Barretos; Durbin, Morris, Wilkinson; Prown; Horta, Grunberg, Monteiro; e Taylor. Entre eles, Jules Prown (1994) propõe três estágios de análise de um objeto: “descrição, dedução e especulação”, nos quais a interferência do pesquisador sobre o objeto é de fundamental importância para o alcance dos resultados que são majoritariamente de caráter analítico e logo qualitativo e não quantitativo, pois o que mais conta é o contexto no qual o objeto se inseria e não propriamente suas condições sistemáticas de produção.

Inicia-se pela descrição, na qual será dado conta das condições técnicas e materiais da confecção do objeto, cuja riqueza e detalhamento estão numa proporção direta do universo de conhecimento do pesquisador sobre as possibilidades tecnológicas implícitas na confecção de um determinado objeto num dado momento. Num segundo passo, quando ocorre o processo dedutivo, mais uma vez esta especialidade do pesquisador o fará capaz de identificar as “ausências” e arrolar hipóteses explicativas para as mesmas. Já no terceiro passo, a especulação será o exercício das evidências históricas associada às deduções, fazendo com que a partir de um conhecimento maior do contexto do uso, das possibilidades simbólicas contidas no objeto e das condições de sua preservação, ou seja, se ele pertence a uma coleção, o tipo de acervo, como foi adquirido, em que sistema maior de produção ele se inseria e para quais objetivos ele serve hoje.

A par da metodologia proposta por Prown, Andrade (2006, p. 74), sintetizando os diversos autores, diz que “cinco questões devem ser abordadas quando estudamos um artefato têxtil”, são elas:

1. Observação das características físicas; 2. Descrição ou registro; 3. A identificação; 4. Exploração ou especulação do

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problema; e por último, 5. Pesquisa em outras fontes e programa de pesquisa.

Para a execução de cada uma destas etapas é fundamental que o pesquisador esteja sensibilizado com o objeto de seu estudo de uma forma sensorial, dando valor a tudo que o objeto transmite a partir de seu contato com o humano; de forma tátil e visual de forma que cada detalhe, por menor que seja, torne-se ponderado. Para tal deve-se utilizar de instrumentos como desenhos técnicos, fita métricas, máquinas fotográficas, como também de técnicas próprias como a contagem dos fios das tramas e dos urdimes, testes químicos para identificação da composição dos fios dos tecidos etc. Ainda é de relevância pensar na articulação das diferentes partes que compõem a peça, seu volume, brilho e apliques. Porém neste momento não podem ser desconsiderados elementos relevantes para a especulação do objeto como as alterações que as roupas podem ter sofrido, como remendos, manchas, puídos, adaptações diversas, o que são considerados indícios fortes das interferências sociais e culturais e da “biografia cultural específicas das coisas” (TAYLOR 2002 Apud ANDRADE, 2006, 74).

Ainda dentro das etapas propostas a identificação é de grande valor para poder chegar às etapas seguintes, nas quais o objeto ultrapassa sua unicidade para ser inserido numa coletividade específica. Por isso identificar a data, o local de produção, para quem e por quem foi produzido, as possibilidades tecnológicas da época para tal realização são meios de datar, num sentido amplo, o objeto e dar-lhe historicidade. Colocado o objeto em seu tempo e sociedade é possível alcançar a etapa da especulação, onde as hipóteses apresentadas darão plausibilidade para que em alguns enredos o objeto se constitua em personagem. Andrade (2006, p. 75) destaca a importância da “criatividade, a livre associação de idéias e percepções” para que a 4ª. etapa tenha êxito. E por fim é chegado

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o momento de extrapolar o objeto, compreendendo-o como um documento datado, ir além dele, mas não o abandonando e sim o vitalizando na medida em que por meio de outras fontes documentais possa pressenti-lo como parte de um todo. É fundamental que nesta etapa o historiador não seja traído pela “veracidade” de outras fontes que falam e não faça do objeto estudado uma mera ilustração de algo que constatou alhures. O objeto precisa manter-se no centro, ser o vetor de análise e discussão das demais fontes e propor, por meio destas outras vozes, um discurso para si e é assim que o historiador fará com que o objeto fale.

Portanto é preciso arregaçar as mangas e ir a busca do objeto “roupa”, levando em mãos um método que assegure seu tratamento como fonte histórica e não apenas como ilustração de concepções pré-estabelecidas e que em nada contribuem para a compreensão da moda como ethos de uma sociedade centrada em sua aparência.

Se o objeto roupa é instigante como fonte de pesquisa e criação para o profissional de moda, também, como destacado acima, outras fontes devem ser por ele utilizadas para que no cruzamento de suas informações se possa explorar todo o potencial que este métier exige.

Dentre as fontes usuais da pesquisa histórica as imagens, fotográficas ou não, são de especial relevância. Peter Burke destaca que “imagens são especialmente valiosas na reconstrução da cultura cotidiana de pessoas comuns, suas formas de habitação, por exemplo, algumas vezes construídas com materiais que não eram destinados a durar” (BURKE, 2004, p. 99). E nada mais frágil do que um têxtil que, em raras condições, consegue sobreviver ao desgaste do tempo e das intempéries.

Também o historiador inglês lembra que as obras artísticas de pintura além de descrever, em alguns estilos, minuciosamente as

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vestimentas de suas épocas, colocam as mesmas num contexto de uso, permitindo assim que sejam pensados seus significados e funções. Um trabalho exemplar neste aspecto é o estudo de Maria José Palla (1999), que consistiu no estudo das mensagens contidas nas pinturas de Grão Vasco para o Retábulo da Sé de Viseu, identificando que o uso das cores, dos tecidos e desenhos dos personagens, entre outras coisas, não foram apenas uma escolha aleatória ditada pelo gosto do artista, mas uma codificação muita precisa da teologia católica.

Porém, como já argumentado anteriormente, as imagens também devem ser questionadas e contextualizadas, pois muitas daquelas que se apresentam ilustrando um texto são por vezes convenções estabelecidas para determinadas descrições, épocas e sociedades e que se reproduzem ao infinito reafirmando uma versão muito parcial de algo. Portanto, como diz Burke:

É seguramente perigoso tratar ilustrações desse tipo [que retratam um processo tecnológico] como uma reflexão não problemática do estado da tecnologia num determinado lugar e numa determinada época sem empreender uma crítica das fontes, identificando os artistas e, ainda mais importante, as fontes nas quais os artistas se basearam (...). Como sempre, é necessária a crítica das fontes (...). (BURKE, 2004, p. 102)

Desta forma o pesquisador que se debruça sobre um acervo de fotografias, documentos iconográficos diversos e mesmo vídeos nos seus mais distintos formatos contemporâneos depara-se com narrativas visuais e como tais podem ser tomadas como evidência histórica. Deve-se levar em conta que a arte da representação mais distorce a realidade do que a divulga com correção, sabendo sempre ser a imagem um duplo, uma natureza segunda do objeto representado e, logo, não é o próprio objeto e nem substitui sua

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realidade apesar de se impor como real e agir sobre as percepções humanas, constituindo possibilidades de ação no mundo tanto quanto um objeto material. Este enfoque também é um interessante objeto de pesquisa, qual seja, como a imagem de um objeto acionou valores e ações sociais. A mídia televisiva é testemunha diária dessa realidade.

Como a imagem é representação visual ela sempre se constrói de forma heterogênea porque coordena diferentes categorias de signos (icônicos, plásticos, lingüísticos) e da interação entre os diferentes signos resulta sua produção de sentido, cuja função central está em evocar a coisa ausente representada e dar-lhe a força da presença.

Ainda é adequado salientar as peculiaridades de outras duas fontes imagéticas: cenas e retratos pintados e o cinema. Nos quadros, especialmente aqueles mais clássicos que retratam cenas, pessoas e ocasiões com uma riqueza de detalhes fabulosa há um arcabouço de representações que foram sintetizadas pela imaginação artística mais do que vista pelos pintores. Diante da opção de seu tema, mesmo que houvesse a presença de modelos, o que mais entrava na composição eram as escolhas realizadas visando o atendimento de um objetivo central vinculado a mensagem que se desejava transmitir. Disto se deduz que mais que a verdade nas imagens, compostas de gestos, fisionomias, paisagens, vestuário, objetos etc, as cores, os movimentos e as permanências corporais, os materiais implícitos, sugeridos ou revelados falam de uma época e da mentalidade que o artista, como sujeito daquelas, era capaz de compor.

O cinema, por sua vez, se constituí como um iconotexto, ou seja, ele é capaz de produzir a sensação de testemunhar eventos ao seu telespectador, isso porque possui espaço e superfícies; personagens que são incorporados por atores e interpretações que dão veracidade

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as cenas. Todo filme, seja ele um documentário, Cult ou comercial, se constituem como um discurso, um espaço de construção teórica e abordagem ideológica. Todo diretor e sua equipe realiza o filme fazendo uma seleção de diversos níveis para dar conta dos enredos que explora. Para Peter Burke, os filmes (imagem em movimento) passam por um duplo filtro: o literário e o cinematógrafo. “O poder do filme é que ele proporciona ao espectador uma sensação de testemunhar o evento” (2004, p. 199). Um dos perigos é causar uma sensação ilusória de testemunho, além de fazer o passado parecer estar presente.

Ainda Burke salienta sobre os filmes que trabalham com um passado relativamente recente têm maior facilidade de não cometer anacronismo, do que os que trabalham com um período anterior ao século XVIII – pois estes geralmente pecam pelo excesso em gestos, falas, idéias e cenas. Pode-se considerar que “o ponto essencial é que uma história filmada, como uma história pintada ou escrita, é um ato de interpretação” (Burke, 2004, p.200). Todavia, mesmo havendo anacronismos e apropriações equivocadas, todos os filmes contribuem para uma consciência histórica dos sujeitos sociais, nas palavras de Burke: “se existe uma única lição que todos os filmes ensinam, é que existem diferenças entre as formas pelas quais indivíduos ou grupos diversos vêem os mesmos acontecimentos” (2004, p.209).

Assim sendo, diante de uma fonte visual como o cinema, mais do que acatar as escolhas de um renomado figurinista ou as sugestões do enredo como sendo a expressão verdadeira de uma época, o profissional de moda, como o historiador, deve se propor a contextualizar a produção cinematográfica, estudando o diretor e localizando suas propostas conceituais ao longo dos trabalhos realizados; ligar o passado escolhido pelo filme ao presente de seus realizadores, cujas relações são mais evidentes do que se imagina e que dão a chave para compreensão de certos discursos, escolhas

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e propostas ideológicas defendidas; ainda, discutir a historiografia criada pelo cinema, começando pela leitura obrigatória dos trabalhos de Marc Ferro e de outros especialistas em cinema; apto pelo criterioso olhar desenvolvido sobre o enredo, não mais encantado pela performance de autores, figurinos e direção de arte, o profissional deve observar os anacronismos, especial em enredos dos séculos anteriores ao XIX e, por fim, admitir a construção consciente de uma interpretação desejada do passado, que sempre tem, mesmo que implícita, uma função didática.

Como destaca Burke “O que molda o presente e o futuro não é tanto o passado, mas sim as imagens do passado incorporado na linguagem. Imagens incorporadas em filmes são ainda mais poderosas” (2004, p.210).

Para finalizar esta parte ainda é relevante pensar que os periódicos, especialmente os jornais diários são fontes e objetos de pesquisa riquíssimos. Segundo Tânia Regina de Luca (2005), ao tratar metodologicamente da possibilidade da imprensa como fonte e objeto de pesquisa, o pesquisador deve inicialmente observar a materialidade do impresso (suporte), atentando que sua apresentação está ligada aos diversos métodos de impressão de determinado momento e lugar social ocupado pelo periódico em estudo e que estes podem se colocar como empecilhos para uma expressão mais trabalhada. Também a autora salienta que a circulação, ou seja, de que forma determinado impresso chegou às mãos de seus leitores, a proposta gráfica (formato, tipo de papel, qualidade de impressão, capa, presença/ausência de ilustrações); a estruturação e a divisão do conteúdo; assim como, as relações mantidas com o mercado, a publicidade feita de si e a que divulgava através de suas páginas, o público visado e os objetivos propostos são algumas das chaves de compreensão e abordagem de um periódico que todos devem considerar prioritariamente.

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Situado graficamente o periódico, o segundo passo está em contextualizar a fonte, ou seja, analisar as condições técnicas de produção vigentes e averiguar o que foi escolhido e porque, como também os fatos históricos do momento (funções sociais dos impressos), além de atentar para contextos sócio-culturais que devem permitir localizar a fonte escolhida numa série ou coleção. Como dificilmente se aborda o periódico como um todo, mas quase sempre, a partir de uma de suas sessões ou matérias é preciso, num terceiro momento, analisar a relação entre a parte e o todo, ou seja, em que espaço do periódico se deu a publicação, layout das páginas, ilustrações adicionadas, tipografia utilizada, resolução das imagens. Além disso, deve-se ponderar a ênfase dada a certos temas, linguagens e natureza dos conteúdos ligados aos interesses do público.

Acima do próprio periódico é preciso pesquisar o que o circunda, como identificar o grupo responsável pela linha editorial (colaboradores mais assíduos, escolha do título, representações passado/futuro, intenções e expectativas); perceber as ligações cotidianas com diferentes poderes e interesses financeiros (incluídos os de caráter publicitário), considerar após a análise da materialidade e do conteúdo, os aspectos nem sempre evidentes nas páginas dos impressos e lembrar sempre que o sumário resulta de uma intensa atividade de bastidores, buscando outras fontes de informações para dar conta do processo que envolveu a organização, o lançamento e a manutenção do periódico.

Por fim, lembrar que a imagem possível de ser encontrada nas páginas dos jornais possui sua especificidade, tanto de produção, captação como de difusão e sem contextualizar este trabalho particular se poderá incorrer num grave erro de pensar que a câmera do jornalista está isenta de escolhas artísticas, pessoais e mesmo ideológicas nem sempre evidentes.

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Apesar de todos os “senões” salientados é preciso e torna-se fundamental nos tempos atuais tomar os objetos materiais, as imagens e os jornais como fontes e objetos históricos e de criação, pois eles são tão válidos como todos os demais testemunhos orais e escritos e desde que se compreenda que estes documentos são testemunhos construídos, possuem seus autores e usuários e remetem ao seu próprio passado; utilizam da iconicidade, da tradição escrita e oral, da memória social para constituir, em outros presentes e futuros, também mais memória social, mais imagens, mais lições de como viver e criar.

O que importa sempre é contextualizar, saber quando, como, por quem, para quem e porque tais objetos foram construídos; ter em mente os processos de construção de cada um deles, com seus limites e vantagens; analisar as possibilidades de recepção e intervenção que os sujeitos – autores ou expectadores – realizaram sobre eles e, nunca esquecer que todo documento, seja qual for sua natureza, conscientiza e congela o passado a partir de escolhas que nem sempre são evidentes, mas sempre estão intrínsecas as suas construções.

10.2. Espaços de memória - sensibilizando o olhar para criação

A cultura material, produzida em diferentes épocas e sociedades, é dotada de infinitas possibilidades de pesquisa para a criação de produtos de moda. Cabe aos designers o desejo de, em suas pesquisas para a criação, extrapolar o óbvio dado por livros e revistas, e buscar, partindo de diferentes espaços de memória, novos olhares e interpretações sobre o ser e o estar no mundo hoje. Assim, busca-se aqui apontar alguns espaços e seus acervos que possibilitam novas pesquisas e criações de conceitos a serem aplicados no desenvolvimento de novos produtos de moda. Limitou-se este trabalho ao Estado de Santa Catarina, mais precisamente acervos das cidades de Florianópolis, Blumenau e Joinville. Não se

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tem como objetivo abarcar todas as possibilidades de leitura, mas suscitar o desejo da pesquisa e criação partindo de um olhar inovador sobre objetos da cultura material presentes nos acervos de museus, bibliotecas e casas de memória.

A Modateca6 é um espaço de preservação da cultura material ligada à memória da produção de vestuário em Santa Catarina. Localizada no Centro de Artes da Universidade do Estado de Santa Catarina, disponibiliza à comunidade um espaço para pesquisa de vestuário e acessórios produzidos por criadores catarinenses, nacionais e mesmo internacionais. Os materiais coletados, por doação, empréstimo ou compra são documentados, conservados, armazenados e expostos de forma permanente ou temporária.

Contando com materiais das mais variadas décadas, a Modateca permite o contato com peças produzidas por conhecidos criadores catarinenses, dos mais antigos aos mais modernos, de Lenzi e Maria Neves até os recém formados profissionais de moda do Estado. A partir do acervo, pode-se observar as modificações na produção do vestuário ao longo da história Ocidental. Modificações estas que retratam, à sua maneira, as variações sociais, tecnológicas e econômicas que marcam as épocas e as sociedades. Estas podem ser percebidas nas peças de forma material e imaterial. Materialmente por seus tecidos e nisto variam a composição e a trama, suas modelagens, aviamentos utilizados, acabamentos etc. De forma imaterial na relação que esta materialidade estabelece ou estabeleceu com o espaço e a sociedade que a concebeu.

Dividindo espaço com a Modateca, encontra-se a Teciteca, conjunto organizado e catalogado de amostras têxteis, periódicos e catálogos de moda para pesquisa. O acervo é formado por 1734

6 Localizada junto da Biblioteca Universitária da Udesc, na Avenida Madre Benvenuta, número 1907, Itacorubi, Florianópolis, Santa Catarina.

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bandeiras, 785 periódicos, 192 catálogos, 407 criações têxteis exclusivas e 259 periódicos, crescendo em números a cada semestre. Oferece informações técnicas e atualizadas à comunidade empresarial, acadêmicos e profissionais de moda. No acervo de memória têxtil, conta com bandeiras de tecidos produzidos comercialmente e artesanalmente, em grande escala ou exclusivos. Entre os artesanais, encontram-se amostras feitas por alunos dos cursos de graduação e pós-graduação para a disciplina de Tecnologia Têxtil, ministrada na própria UDESC. Neste caso, um projeto de inovação têxtil é posto em prática com objetivo de criar novos fios, tramas e tecidos. Já as bandeiras de tecidos comerciais, produzidos em grande escala, são doadas pelas indústrias têxteis e contam com as informações técnicas de suas composições. Os tecidos comerciais exclusivos, são os de produção limitada para coleções de designers específicos, como algumas bandeiras têxteis doadas por Ronaldo Fraga, Mário Queiroz e Jum Nakao.

Modateca e Teciteca são espaços onde a memória é mantida e atualizada. Seus acervos permitem experiências sensoriais que jamais seriam possíveis apenas pesquisando em revistas ou livros de história. É destas experiências que o profissional de moda pode se alimentar para encontrar fundamentos para a criação de novos produtos. A percepção da materialidade das formas, tecidos e cores, a rigidez ou a leveza das peças, a relação imaterial com a época e os corpos que as vestiram, o passado presente no cheiro, no amarelado e no puído, abrem um conjunto de nuances passíveis de interpretação e criação. Luvas antigas feitas de delicadas linhas; chapéus grandes, pequenos, austeros ou fantasiosos; bolsas ornadas de bolinhas de baquelite coloridas ou com as clássicas pérolas, de tecidos práticos ou elegantes; sapatos grandes e pequenos, nas mais variadas formas, cores e materiais; roupas íntimas que, de fato, cobriram os corpos a que pertenceram ou os apertaram para melhor exibi-los; estojos dos

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mais variados tamanhos e utilidades, de manicures a secadores de cabelo; vestidos, capas, casacos, camisas, tudo o que se mostra ou mesmo esconde, que participou dos espaços públicos ou apenas dos privados, trazem ao nosso olhar, viciado pelo próprio cotidiano, novas possibilidades de ler e interpretar outras épocas, figuras e experiências, indiretamente refletindo na leitura do nosso próprio tempo.

Assim, é possível desenvolver pesquisas que partam dos próprios objetos, época em que foram elaborados, modelagens, materiais de que são feitos os tecidos ou detalhes que os compõe, como bordados, pedrarias, acabamentos e aviamentos; ou então do universo simbólico em torno do nome de seu criador, sua história de vida, experiências, criações, seus gostos e desgostos. As possibilidades de pesquisa e criação, a partir de acervos, são infinitas, limitadas somente pela criatividade e ousadia do pesquisador.

Um outro espaço de memória interessante para pesquisa é a Biblioteca Pública do Estado de Santa Catarina7. Inaugurada em 1855, na antiga Nossa Senhora do Desterro, atual Florianópolis, a biblioteca tem como missão manter, conservar e desenvolver a memória cultural do Estado. No setor de Obras Raras é possível um maior contato com livros de difícil acesso, visto serem de produção limitada ou mesmo únicos pela idade avançada, datando do século XVII até a atualidade. Muito rico em materiais, este setor conta não só com livros raros, mas com encadernações dos principais jornais e revistas nacionais, estaduais e regionais produzidos antes mesmo da criação da biblioteca. Assim, encontram-se no acervo desde revistas agrícolas até as que tratam de cultura, moda e sociedade, permitindo uma gama de possibilidades de pesquisa e leitura.

Apesar de ser uma instituição antiga, o prédio que a abriga é de arquitetura moderna. Suas linhas frias e racionais, cercadas de

7 Localizada na Rua Tenente Silveira, número 343, Centro, Florianópolis, Santa Catarina.

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concreto e janelas de metal e vidro, sugerem estruturas em linhas retas, limpas de excessos, muito condizentes com o que se espera de um lugar que se propõe a salvaguardar o conhecimento. No contraponto, o interior carregado de livros, jornais e revistas novos e antigos, permite um constante mergulho no passado, com suas múltiplas facetas e diferentes percepções do presente, interagindo com valores, gostos, idéias, modismos e sentimentos de épocas distintas. Assim, o Tempo é o melhor elemento a ser pensado num espaço como este. Pensar o tempo é pensar na fragilidade do que se diz humano; na mutabilidade que se tenta cristalizar através de nossas muitas instituições. Bibliotecas contêm nosso esforço em sermos atemporais, de sobrevivermos, como espécie ou indivíduo, às nossas próprias limitações biológicas. É, portanto, espaço prolífico para se pensar a falibilidade disso tudo.

No setor de obras raras, livros antigos com suas lombadas gastas e páginas amareladas trazem ao olhar uma materialização do tempo que passa e, ironicamente, destrói tudo que de alguma forma tenta contê-lo. As prateleiras, com suas obras enfileiradas e devidamente organizadas de forma normativa, lembram do processo de racionalização que participa da nossa tentativa de organizar o mundo, tornando-o suportável na direta medida do controle que exercemos sobre ele. Externando ordem, prateleiras abrigam o caos. Quando abertos, os livros nos invadem de imagens, idéias e universos que não conseguem ser contidos apenas por suas capas mofadas: são então reinterpretados a cada vez que lidos, reformulados segundo cada novo leitor. Para além das considerações pseudo-filosóficas, desde a capa até a diagramação, a maneira como estão expostos ou o que contêm em suas linhas, seu corpo material e sua imaterialidade enfim. Livros, revistas e os espaços onde são abrigados, permitem variadas possibilidades de olhar, pensar e fazer o mundo, bases de interpretação e criação para um profissional de moda.

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A Casa da Memória8 localiza-se no centro histórico de Florianópolis, num prédio dos Anos 1920 construído para abrigar a sede do Partido Republicano Catarinense. Com arquitetura de características ecléticas, a casa já é, em si, patrimônio da cultura material. Não bastasse ser por si mesma objeto histórico, serve de centro de documentação onde são recuperados, preservados, organizados e acessados registros visuais, sonoros, bibliográficos e documentais da história, memória e produção cultural da cidade. Do amplo acervo, o que se foca aqui são seus bancos de imagem e som. Conta com 2,7 mil fotografias de épocas e temas variados. Vê-se surgir, nestas fotografias, imagens de ruas, panorâmicas aéreas, eventos públicos e particulares, principalmente da capital catarinense, além de personalidades locais e ilustres desconhecidos imortalizados pela câmera.

Apresentadas em ordem cronológica, essas imagens permitem a experiência de conhecer uma cidade em seus diferentes ritmos ao longo da história. As ruas, os casarios, as igrejas, os diferentes meios de transporte e o número reduzido deles, em comparação com a atualidade; os morros ocupados pela mata nativa que, ao longo dos anos, foi se perdendo em meio as construções que proliferaram; o acesso à Ilha por uma ponte, duas pontes e três pontes, discursos de prosperidade e crescimento; os tipos humanos que circulam nas ruas ou posam para as fotografias, tudo leva a um paradoxo entre o estranhamento dessa outra época e uma certa familiaridade, posto ser aquela Florianópolis conhecida de ouvido, imaginada de tão falada que foi, de forma saudosa, pelos mais velhos. De muitas ruas, casas e pessoas que um dia existiram ficou a imagem. Esta é fonte de leituras sobre texturas, materiais, práticas diferenciadas; relações onde o corpo no espaço urbano, ao longo das décadas, variou a própria postura frente a percepção do registro da

8 Localizada na Rua Padre Miguelinho, número 58, Centro, Florianópolis.

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imagem. Para a pesquisa e criação, o acervo de fotografias permite olhar por uma janela do tempo, vendo estruturas arquitetônicas e corporais que se perderam no tempo, texturas e formas que trazem lampejos de sabor à monotonia monocromática das fotos mais antigas. São narrativas com ritmos e movimentos, que podem ser lidas e analisadas e, portanto, passíveis de interpretação e reflexão, que servirão de inspiração para histórias que se realizam nas passarelas, com texturas e formas que permitem “sentir” o tempo e o movimento.

Além do acervo fotográfico, a Casa da Memória possui 10 mil vinis e 200 fitas cassetes que remontam a história do rádio em Santa Catarina. Este acervo pode ser abordado de diferentes formas: separar as produções musicais por anos, décadas, compositores, cantores, temáticas. Focar as letras, os estilos musicais ou o público a quem a música é destinada: para homens ou mulheres; jovens ou velhos; falando de amor, ódio, rancor, paixão, morte, vida, saudade ou incompreensão; sendo samba, MPB, chorinho, rock ou romântica, enfim muitas são as possibilidades de mapeamento para a pesquisa. O entrecruzar destas informações associado ao contexto da produção e divulgação, permitem leituras sobre como uma época ou sociedade pensou em si e em sua relação com o mundo em que vivia. A fluidez ou rigidez que disso decorrem podem ser materializados em cores, linhas e formas.

Com relação aos museus, o espaço que abriga o Victor Meirelles9 foi a casa onde nasceu este artista brasileiro e que pertenceu a sua família. Estabelecido desde 1952, o museu engloba além da coleção e casa do artista – patrimônio histórico – um espaço cultural de exposição temporária de arte contemporânea. Victor Meirelles nasceu em 1832 e se destacou desenhando desde jovem. Patrocinado

9 Localizado na Rua Victor Meirelles, número 59, Centro, Florianópolis.

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pelo Estado, foi estudar na Faculdade de Belas Artes do Rio de Janeiro onde ganhou uma bolsa para aprofundar seus conhecimentos de pintura na Europa. Lá ficou por nove anos, estudando e pintando obras encomendadas inclusive pelo Imperador Dom Pedro II. Aos 30 anos pintou seu quadro mais famoso “A primeira missa no Brasil”. Suas obras mais conhecidas estão no acervo do Museu Nacional de Belas Artes, no Rio de Janeiro.

Se a própria história do artista já desperta a curiosidade e o desejo de aprofundamento sobre esta personalidade e seu destino, ótimo tema para pesquisa e criação, pode-se partir para a análise da casa: um sobrado luso-brasileiro de estilo oitocentista com características comerciais comuns ao período. O andar superior destinava-se à moradia da família e o térreo ao comércio. Neste caso, o térreo abrigava o armazém do pai de Victor Meirelles, o senhor Antônio Meirelles de Lima. Construída em diferentes níveis, seguindo o alinhamento da rua, a casa possui ambientes pequenos e grossas paredes feitas de alvenaria de pedra, tijolo e estuque. É coberta com telhas capa e canal. Possui beirais do tipo beira-seveira (beira sob beira) - camadas de telhas embutidas na alvenaria das paredes – e piso feito de canela. Sua porta de madeira em folhas duplas é fechada com a chave original feita de ferro e medindo perto de 30 cm de comprimento, algo simplesmente descomunal e impensável para a época atual, mas fantasiosa e encantadora em suas formas que combinam linhas retas e alongadas com a base arredondada.

Assim, possibilidade de pesquisa é o que não falta aos olhos e mentes atentos: da estrutura da casa, seus materiais, os elementos característicos da arquitetura portuguesa oitecentista tão estranhos a nós, pode-se tirar formas e texturas. Linhas retas estruturam a silhueta pesada do edifício direcionando nosso olhar para então fazê-lo se perder nas curvas das telhas no alto. A própria espessura das paredes e a porta pesada fechada pela chave curvilínea descomunal,

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remetem a um jogo de dicotomias: aberto e fechado, leve e pesado, curvas e retas. Elementos estes conhecidos dos profissionais de moda em seus ofícios.

Dos acervos em exposição, os temas das obras, as técnicas e materiais usados e as molduras que as envolvem servem de amparo para a criação. As obras de Meirelles mostram a antiga Desterro com seus casarios, pessoas vivas e mortas, estudos para obras complexas, momentos religiosos e históricos. Alguns esboços da mostra “Estudos de Trajes Italianos”, apresentado sobre papel com técnica de aquarela e que foram realizados pelo artista em sua fase de aprendizado na Itália entre 1853 e 1856, permitem visualizar diferentes composições de formas, estruturas, texturas e cores, panejamentos e jogos de luz e sombra. As obras são, enfim, os olhares de um homem sobre a cultura e a vida que o cercavam em meados do século XIX até o início do século XX e é inadmissível sequer pensar que profissionais de moda hoje possam olhar indiferentes e infecundos para tudo isso.

Já o Museu Cruz e Souza10, em Florianópolis, teve seu início como “Casa de Governo”. Foi em meados do século XVIII, época em que foi criada a Capitania da Ilha de Santa Catarina e nomeado o primeiro governador, o Brigadeiro José da Silva Paes, que este edifício foi construído, sendo constantemente modificado ao longo dos séculos até que, no governo de Hercílio Luz, em fins do século XIX, sofreu uma grande reforma que o caracterizou com a opulência e o ecletismo de estilos que o definem na atualidade. Em 1979, após novas reformas, deixou de ser o Palácio do Governo, passando a chamar-se Palácio Cruz e Souza em homenagem ao mais conhecido poeta catarinense. Foi tombado pelo patrimônio em 1984 e, em 1986, passou a sediar o Museu Histórico de Santa Catarina.

10 Localizado na Praça XV de Novembro, número 227, Centro, Florianópolis.

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Como foi sede do governo do Estado por grande parte de sua existência, seus ambientes ostentam decoração, ambiências e mobiliário de diferentes épocas. Assim caracteriza-se, por sua própria estrutura, como riquíssima fonte de pesquisa. Da miscelânea decorativa, que vai do neoclássico e barroco de esculturas, pinturas nas paredes e decorações rebuscadas ao art nouveau dos vitrais internos, percebe-se infinitas possibilidades de imersão criativa. Chama especial atenção o assoalho com sua marchetaria diferenciada conforme variam os ambientes. Os diferentes recortes e composições, em que madeiras claras e escuras são trabalhadas interagindo de maneira que o chão parece ter vida própria, permitem inúmeras associações com misturas de materiais e recortes inovadores. As salas, seus domos, a maneira como os ambientes são divididos no palácio que, se abrindo uns para os outros, permitem visualizar uma época na qual ainda não se criava espaços exclusivamente privados. Na escadaria em mármore de Carrara, que domina o vão central, percebe-se a importância centralizadora da relação que se estabelece entre este espaço de exercício do governo e as regiões governadas representadas no teto, onde elementos barrocos, em laçarotes e volteios, complementam os nomes das cidades mais importantes do Estado à época da criação destes ornamentos.

Como fonte de pesquisa para a criação, pode-se partir de elementos instigantes como seus assoalhos diferenciados, as pinturas nas paredes parecendo papel decorativo, a imponente escadaria em mármore finalizada por estátuas em bronze, o vitral em art nouveau, a temática decorativa de cada ambiente combinando com o uso a que lhe foi atribuído; pequenos detalhes em ornamentos delicados numa porta ou maçaneta, os objetos que compõe o acervo, como os instrumentos da sala de música, suas formas, cores, entalhes e desgastes. O próprio poeta, que dá o nome ao museu, pode servir de base para pesquisa: desde sua obra até seus restos mortais,

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trazidos do Rio de Janeiro e depositados numa urna funerária, acompanhada de seu busto, numa das salas do museu, podem servir de inspiração na medida em que suscitam questionamentos. Desta forma, há inúmeras possibilidades de pesquisa partindo de seus habitantes e freqüentadores ao longo dos séculos, vivos e mortos: quem morou ali e em que época; que eventos o espaço sediou; que lendas circulam sobre ele, atiçando o imaginário e mantendo vivas histórias como a da noiva fantasma, que são levadas, geração após geração, ao patamar da esperança: espera-se vê-la circulando imponente pelos corredores, quando a tarde finda e coloca sombras nas ondulantes linhas desenhadas nas paredes ou no rico chão de marchetaria. Uma pergunta possível é: porque uma noiva? Quais elementos são trabalhados em sociedade na composição do discurso do “ser noiva”? Um vestido que significa um universo simbólico? A percepção de algo que findou antes de se concretizar, como neste caso, um final feliz que não aconteceu? Que mulheres viveram ou foram veladas ali? Casadas ou solteiras? Talvez não fosse uma noiva e, simplesmente, velavam-se jovens vestidas de noiva quando não eram casadas. Velórios e brindes de casamento, orquestrados ao longo dos anos neste espaço que hoje abriga o museu, suscitam a imaginação. Assim, mesmo histórias de fantasmas podem auxiliar na percepção de um acervo estudado, na leitura e aprofundamento das práticas de diferentes épocas e na observação da riqueza de opções para a inspiração e criação.

Diferente do Museu Cruz e Souza, que sempre foi espaço público que abrigou espaços privados, o Museu da Família Colonial11, de Blumenau, é composto de três casas que foram moradas de pessoas da cidade. As casas, duas em estilo enxaimel e uma em germânico, trazem no acervo objetos pessoais, mobiliário, trajes, roupas de cama e apetrechos de cozinha usadas na região

11 Localizado na Alameda Duque de Caxias, número 78, Centro, Blumenau, Santa Catarina.

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em diferentes épocas. A casa mais antiga data de 1858 e pertenceu ao senhor Hermann Wendeburg, guarda-livros e secretário do Doutor Hermann Blumenau, fundador da cidade. A segunda casa mais antiga data de 1864 e pertenceu a família Gaertner, sendo que a última moradora, Edith Gaertner, foi sobrinha-neta do Doutor Blumenau. Por fim, a construção de 1920 pertenceu a um dos irmãos de Dona Edith, o senhor Arnold Gaertner. Percebe-se, então, pelos moradores, que este museu da “família colonial” fala da realidade de famílias abastadas da colônia, levando a pensar sobre a realidade material de outras famílias.

Em exposição no museu encontram-se muitos objetos que são doações de famílias da cidade e várias peças de Hermann Blumenau, como sofás, jogo de jantar de porcelana, camas e baús, objetos decorativos, roupas de cama e peças do vestuário pertencentes a Edith Gaertner. Peças como escarradeiras, batedeiras, máquina de escrever, batedores de manteiga, instrumentos musicais, celas para cavalos masculinas e femininas, centrais telefônicas, ferros para passar roupas a carvão, máquinas fotográficas ou para moer café, permitem a visualização de diferentes estágios de evolução técnica nos equipamentos usados nos ambientes domésticos deste o século XIX. Como a cidade de Blumenau se constituiu com rica produção têxtil, o museu abriga ainda maquinário da indústria nascente, como as rocas, teares de pedal manual e máquinas de costura nas versões manual ou pedal. Como a região foi habitada por índios Kaingang e Xokleng, o museu expõe peças como arcos, flechas, cestos, cocares e túnicas feitos com fibra de urtiga. Só rapidamente exposta aqui, a riqueza de objetos do museu torna impossível a indiferença. O design do mobiliário, a decoração das porcelanas, a estrutura das casas por dentro e por fora, os materiais usados na construção das casas, as camas idênticas separadas do quarto de casal, os entalhes nas madeiras de guarda-roupas e baús, as roupas de casa ou de uso

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pessoal, com seus materiais, bordados, modelagens e aplicações, os quadros com frases em alemão bordados em ponto cruz que pediam proteção ou traziam orações, a geladeira pequena e de metal pesado em tom de cinza, onde se colocava gelo, comprado todos os dias, para resfriar os alimentos, tudo que está visível, enfim, aguça a imaginação e permite a reflexão sobre novas leituras e impressões para antigos discursos visuais.

Na mesma linha, mas muito mais amplo em espaço e acervo, segue o Museu Nacional da Imigração e Colonização12, numa edificação denominada Palácio dos Príncipes, construída em 1870 para sede da administração da Colônia Dona Francisca, atual Joinville. Parte da mobília, como a sala de jantar em carvalho e a sala de visitas em jacarandá, é original do Palácio, mas o acervo é constituído de mais de 5 mil peças, distribuídas em 13 coleções, muitas das quais doações de famílias da região. Estas coleções foram montadas em ambientes que buscam representar os espaços cotidianos dos imigrantes abastados, como quartos, sala de jantar, de estar, escritório, sala para o lazer das crianças ou para a higiene pessoal.

Há chapéus, bengalas, roupas, numa profusão de objetos da cultura material que lembram muito, guardando-se as devidas proporções, o Museu da Família Colonial de Blumenau. Um dos diferenciais do Museu Nacional está no espaço do fundo do terreno, que abriga o Galpão de Tecnologia Patrimonial e uma casa em enxaimel, esta sim muito mais próxima da realidade da maioria dos imigrantes, mas ainda assim somente dos já bem assentados. Construído na década de 1960, para abrigar os acervos de tecnologia, o galpão seguiu os moldes de construção dos galpões coloniais típicos da antiga Colônia Dona Francisca. Equipamentos rústicos feitos em

12 Localizado na Rua Rio Branco, número 229, Centro, Joinville, Santa Catarina.

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madeira, movidos por tração animal ou moinhos de água, mostram atividades praticadas na região, como a produção de mandioca, erva-mate e açúcar. Aqui, o contato dos imigrantes com os indígenas pode ser medido pela maneira como a mandioca foi introduzida como base da sua alimentação. Este alimento tradicional dos grupos indígenas da região é trabalhado em grandes prensas, dentro de cestos trançados pelo imigrante, antes de ser torrada sua pasta. Neste mesmo espaço vêem-se diferentes modelos de carroças e carruagens, puxadas por animais, que mostram carros de particulares ou de transporte de passageiros em épocas mais ricas da colônia. Chama especial atenção o carro fúnebre: amplo, ornamentado e iluminado com lampiões laterais, provoca admiração inicial e logo depois repulsa, quando se toma claro o papel a que se destina. Atiçando o imaginário mórbido, é uma das peças mais fotografadas do galpão, posto que, além da beleza evidente de suas madeiras trabalhadas e dos ornamentos, o universo simbólico que o envolve torna-o ainda mais irresistível.

A casa em enxaimel busca representar uma autêntica moradia de colonos, com peças e espaços mais rústicos, mas não menos preocupados com o aconchego dados por cortinas, objetos de decoração produzidos manualmente, panos de cozinha, roupas de cama e mesa. O que torna esta casa única como objeto dado ao olhar criativo são os tijolos que a formam: em todos eles, feitos um a um manualmente e depois queimados, as marcas dos dedos daqueles que os produziram são visíveis, texturizando com impressões de dedos cada tijolo da construção. Essas marcas de dedos humanizam a casa para além dos objetos que a ocupam, na medida em que falam dos homens e mulheres que a construíram e deixaram ali suas marcas, tijolo por tijolo, subindo paredes que falam de história: suas próprias ou da comunidade que habitaram. Essa “personalização” dos tijolos comunga com os discursos de personalização e individualização que

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permeiam a produção de moda na atualidade. Coleções que têm histórias pra contar e cujas marcas dessas histórias são visíveis nas formas, cores e texturas, agregam novos sentidos de individualidade que significam o sujeito hoje.

Por fim buscou-se, no pincelar de alguns espaços de memória possíveis de apreciação, sensibilizar o olhar do profissional de moda para estes espaços, seus objetos e suas histórias, como bases possíveis para a pesquisa e criação. Este olhar pode ser trabalhado em formas que variam do histórico apurado ao fantasioso e poético. Nesses museus, tudo que está visível são seleções que sugerem perguntas sobre o que se escondeu: no próprio museu ou na história. Perguntas estas que podem gerar tanto outras indagações como divagações, ambas extremamente frutíferas no campo da criação. Assim, percebe-se que a cultura material não precisa apenas suscitar o conhecimento histórico, papel tradicional comumente atribuído às peças em exposição nos museus, mas pode sim servir de inspiração para novas idéias onde a própria sensibilidade de ver poesia no cotidiano seja privilegiada para tornar a criação única e autoral.

10.3. Acervo têxtil - considerações sobre o produto de moda

Os profissionais de moda são verdadeiros agentes culturais, e no exercício da atividade de estilo contribuem na ampliação da cultura material, na medida em que cooperam com sua criatividade. Para tanto, precisam se tornar hábeis na associação entre suas idéias e as que já foram materializadas há muito tempo, capacidade que proporciona resposta criativa e original, produz percepção e competência para a criação de produtos úteis, funcionais, porém de apelo esteticamente sensibilizadores – e por isto, emocionais.

A pesquisa em objetos de museus, considerando-se as bases têxteis, o vestuário e seus complementos, com objetivo de criação

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e desenvolvimento de produtos de moda é uma dinâmica mais do que multidisciplinar, como apontado nos fundamentos da cultura material, uma prática interdisciplinar.

As principais disciplinas acadêmicas envolvidas diretamente na atividade de criação de produto de moda de vestuário são: história da moda, pesquisa de moda; desenho - artístico, conceitual ou técnico; modelagem e ateliê. Para fins de pesquisa e análise em vestuário museológico, estas mesmas disciplinas interagem constantemente na busca e exercício para resolução de problemas estéticos, funcionais, técnicos, bem como para as questões relacionadas às sociabilidades que o contextualiza.

Os conhecimentos das áreas apontadas permitem melhor entendimento sobre as peças eletivas e os contextos dos quais fizeram parte. A partir dos métodos empíricos do sistema de criação e produção de roupas atuais várias são as evidências observáveis que contribuem para a aplicação do método proposto por Jules Prown: descrição, dedução e especulação.

O primeiro aspecto pode ser com relação à forma, que é o resultado do arranjo de linhas estruturais do modelo, como posição da costura entre linhas dos ombros, contorno das cavas, linhas das laterais, decotes e barras – que por sua vez delineiam e definem a silhueta, ou seja, o todo. Perceber a estrutura visual da forma levará o pesquisador a ler criticamente seu objeto de estudo, bem como perceber as oscilações das mesmas no decorrer dos períodos históricos. Esta tem sido a mais corriqueira das investigações em história da moda. Contudo, pensa-se que:

(...) a tarefa do designer, do artista ou de qualquer outro profissional é a de conceber e desenvolver objetos que satisfaçam as necessidades de adequar estrutura formal, obviamente,

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respeitando-se os padrões culturais, estilos ou partidos formais relativos e intrínsecos aos diversificados objetos concebidos, desenvolvidos e construídos pelo homem. (GOMES, 2003, p.17).

O olhar mais atento e insistente, pautado em método apropriado, poderá constatar ainda outros aspectos importantes além da visualização da forma. Esta não deve ser o fim para o profissional de moda, mas um meio pelo qual o mesmo conheça o que já foi produzido por determinada sociedade e endosse seu repertório para solução de questões, a exemplo – como um objeto poderá servir em dias atuais? E, ainda, pensar qual novo arranjo poderia ter razão de ser elaborado para a sociedade atual, tanto com relação a elementos estruturais - as partes - quanto em relação ao todo – a forma.

Outro aspecto importante, que a leitura e análise de tais objetos pode nos propor, diz respeito aos aspectos das proporções anatômicas de uma sociedade.

As proporções anatômicas atuais são semelhantes para alguns períodos históricos, porém, em se tratando da cultura do corpo, pode-se apontar períodos e momentos em que os valores, hábitos e desenvolvimentos tecnológicos influenciaram as sociedades quanto às suas atividades e relações com o corpo, alterando mesmo as formas dos corpos humanos. A pesquisadora Denise Sant’Anna salienta estas questões em seus trabalhos, alertando que:

(...) não se trata de realizar uma listagem das maneiras supostamente exóticas de se lidar com o corpo em outras épocas, mas sim de tornar questionáveis os gestos e as atitudes que ontem e hoje nos parecem familiares ou não. Pois o corpo é, ele próprio, um processo. Resultado provisório das convergências entre técnica e sociedade,

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sentimentos e objetos, ele pertence menos à natureza do que à história (SANT’ANNA, 1995, p.13).

Pela análise da forma e modelagem de diferentes peças do vestuário é possível se verificar a proximidade ou distanciamento das proporções corporais atuais, considerando que os corpos podem ser esculpidos ou remodelados pelas práticas esportivas, tratamentos cosmetológicos, estéticos, e também cirúrgicos. Algumas práticas vestimentares – por exemplo, em fins do século XIX, como o uso dos corselets – provocaram, pelo uso prolongado, o afinamento das cinturas e, por vezes, dependendo de sua modelagem e estruturação, a projeção da parte superior do corpo para frente.

Também é um exemplo do século XIX, desta intervenção do vestuário sobre a idealização do corpo, a adoção da anquinha, uma armação de ferro colocada por baixo das saias na altura dos quadris na parte anterior que, sem alterar o corpo, projetava e dava volume artificial na região dos glúteos. O uso deste recurso exigiu que os trajes tivessem modelagens especiais.

Portanto, o primeiro requisito para a ideal visualização da silhueta e efeitos de volume de um traje e/ou peça de vestuário é que o mesmo seja apoiado sobre um manequim que reproduza a conformidade anatômica e postural do momento em que o traje ou peça foi construído.

A partir dos relatos sobre a formação do acervo e implantação do Museu do Traje e do Têxtil em Salvador – Bahia, Peixoto (2003) esclarece que foi contratada uma escultora para fazer os manequins para cada roupa exposta, os quais foram refeitos várias vezes até que chegassem à forma ideal, pois os corpos que elas vestiram um dia também foram únicos13.

13Para demais informações sobre o museu acessar - http://www.institutofeminino.org.br/.

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Um traje de qualquer período somente comunicará fielmente a forma original desde que apoiado em suporte que reproduza a anatomia e postura corporal do momento de sua construção, com todas suas intencionalidades de forma.

Quanto às peças de vestuário e complementos do trajar, várias ainda são as leituras que se pode realizar. Em se tratando da modelagem da peça, além da compreensão de como a mesma foi projetada e confeccionada, percebe-se o tipo de gestualidade que o tal traje permitia. A manga alfaiate – com dois recortes longitudinais e traçado levemente curvo, típica nos paletós masculinos e femininos, naturalmente prende um pouco o movimento dos braços e do tronco; principalmente para levantá-los e mantê-los erguidos acima da linha do tórax, o que implica numa concepção de mobilidade que certamente hoje nos é estranha, mas que pode ser analisada a partir destas estruturas.

O nível de qualidade de confecção, como os acabamentos, a estruturação e almofadar dos trajes e a manipulação têxtil – pregas, plissados, efeitos de casas de abelhas, relevos e desenhos formados por meio de costura - são identificáveis desde que o conhecimento tácito, a percepção tátil e o conhecimento das técnicas para tal levantamento sejam intrínsecos ao pesquisador ou dos membros da equipe de trabalho.

A modelagem leva-nos também a reconhecer alguns detalhes de construção e confecção que não são soluções atuais. Por exemplo, as braguilhas que formam o acabamento de aberturas com zíperes, geralmente em calças, são recursos utilizados antes mesmo do século XX. Também ao se investigar os materiais de catalogação ou as fichas técnicas que acompanham as peças de acervo, desde que devidamente elaborados, permite que conheçamos expressões, termos e conceitos ignorados na atualidade, além de se ter registro

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de informações com as quais já temos familiaridade confirmando, assim, sua propriedade.

Dependendo do tipo de roupa e o fim inicialmente para o qual a mesma foi construída é possível, por vezes, perceber alterações realizadas no modelo, como o acréscimo de um babado ou barra aplicada, a troca de um forro puído ou mesmo o retingimento.

Os materiais, tanto têxteis quanto os dos aviamentos e acessórios indicam, a partir de análise e técnicas apropriadas, sua composição ou ao menos sua origem – animal, vegetal, química - e o tipo de construção do tecido. Estas características permitem a datação das peças ou, inversamente, que conheçamos que tipo de tecido era produzido em um determinado tempo e sociedade, ainda, o que a mesma tinha disponível de materiais para a elaboração de artefatos, objetos, vestimentas e suas tecnologias. Por meio da contextualização das peças e suas técnicas pode-se objetivar informações sobre os níveis tecnológicos vigentes, bem como as atividades para as quais o traje foi destinado inicialmente.

Também ao se trabalhar sobre um acervo têxtil é necessário ponderar os efeitos de degradação que os materiais sofrem, tanto ao longo do uso quanto ao longo do período em que se encontram sob guarda em acervos sistematizados. Supõe-se que nestes a ação sofrida seja menor, ainda que não seja possível impedi-la, por meio da aplicação dos tratamentos de preservação, conservação, acondicionamento e restauração. As razões pelas quais estes danos ocorrem dependem de vários fatores: o uso, a maneira como eram guardados, como eram lavados e passados, como eram e são manuseados. Um dos efeitos mais comuns é o desbotar das cores e tons, em especial nos materiais de composição natural e artificial. Como os tecidos de uso possuem “memória”, aplicando-se luz específica sobre um lençol, por exemplo, visualizam-se todas as

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manchas impossíveis de serem vistas sem a interferência deste recurso. Todavia, o que mais se deve salientar neste aspecto é que as formas de acondicionamento das peças precisam ser ponderadas para avaliação de suas relações tempo, sociedade e uso a fim de não chegar a conclusões equivocadas que não se aplicam às condições tecnológicas de sua produção, mas sim as suas condições de preservação.

Muitos exemplos adequados de preservação e convite ao trabalho aqui proposto ao profissional de moda são as peças do acervo do Museu do Traje da Bahia. Dentre tantos que podiam ser citados escolhe-se um vestido de fim de tarde confeccionado à mão, na Bahia, em 1915, em renda Renascença com aplicações em renda de almofada, arranjo este que formou o tecido – arabescos florais estilizados, sobre o qual o modelo foi executado (In: Peixoto, 2003). A partir da análise deste traje nota-se que um aviamento simples como um fio de sutache14ou uma linha para bordar, entrelaçados por mãos habilidosas, ganham uma nova conotação estética, transformando os tecidos e aviamentos em arte.

Uma peça como esta suscita diversos questionamentos, desde aqueles relativos às técnicas de construção desta base têxtil – como foi aprendida, sob quais condições o trabalho aconteceu, foram uma ou mais pessoas que a elaboraram, quanto tempo levou até que tenha se transformado num vestido? – até aquelas de ordem social como o entendimento do porque foi designado como um vestido para o fim de tarde. Porque o fim de tarde em tal momento necessitava veste tão elaborada, que pessoa era esta, com quais pessoas se reunia, qual atividade se desenrolava nestes momentos de sociabilidades e exibição. Ou seja, que tipo e estilo de vida tinham

14 Sutache – Galão estreito formado de pequena trança feita de algodão, lã, seda ou material sinté-tico. Utilizado para debruar golas, bordas em geral ou delimitar uma parte do vestuário, criando um efeito decorativo. Fonte: CATELLANI, 2003. p. 475.

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nessa sociedade para que fosse necessária a construção de um traje com tamanha destreza manual?

Os bordados e aplicações de determinados trajes podem ser um estudo a parte. Encontra-se nos acervos as mais variadas técnicas decorativas em boa porção de trabalho manual, ainda que no avançar da industrialização alguns destes motivos aplicados tenham sido produzidos mecanicamente por equipamentos nas empresas de confecção.

Roupas e acessórios como luvas, chapéus, bolsas e sapatos receberam cuidado meticuloso em várias épocas, sendo também dado igual cuidado para as peças que compunham os objetos de espaço privado – a casa. Colchas, lençóis, toalhas para banho, para rosto, para mãos, lenços, panos decorativos apresentam monogramas delicadamente bordados, por vezes têm os acabamentos das barras trabalhados com aplicações manuais ou a sua própria trama alterada o que resulta em desenhos decorativos, indicando em suas entrelinhas, literalmente, que mundo social distinto se compunha por meio destes cuidados.

Portanto, repassando por estas indicações breves de como os trajes em sua materialidade nos indicam questões a serem pensadas, pode-se afirmar que todo e qualquer objeto ou elemento em um acervo é fonte de leitura e pesquisa para criação e desenvolvimento de produtos de moda.

Desde os mobiliários, a arquitetura, paredes, telhados, vidros, assoalhos, pisos, azulejos, detalhes de janelas e portas, jardins, pátios às louças, bases têxteis de cama, mesa e banho, trajes e seus complementos, enfim, toda ordem de objetos, além das demais fontes citadas anteriormente neste capítulo, são elementos visuais merecedores de investigação. Pois, um museu já é ele próprio, um documento.

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A moda freqüentemente vê as formas e os materiais do passado como fonte de inspiração para novos estilos. As roupas antigas são admiradas não só pelo tratamento artesanal e o cuidado com detalhes quase impossíveis de se obter hoje em dia, mas também porque despertam um sentimento de nostalgia por estilos de vida que já se foram. O aspecto “emocional” das roupas é um elemento importante do design. Contudo, por mais que se queira reintroduzir o visual do corselete ou da crinolina, é aconselhável considerar as condições políticas e sociais que conferiram eficácia a esses itens em sua época, e aplicar análises semelhantes em relação aos estilos contemporâneos” (JONES, 2005, p24).

Misturar as informações e idéias pesquisadas de maneira a propor um produto de moda – sem que pareça um produto “antigo”, mas um produto novo, atual e desejável passível de proporcionar alusão a uma época e seus detalhes – é um verdadeiro desafio aos criadores. Contudo, é necessário que a primeira iniciativa seja a de estudar detalhadamente os objetos selecionados a partir de um método de trabalho coerente com os objetivos definidos pelo profissional de moda no projeto de criação.

10.4. Objetos museológicos - método de abordagem

O reposicionamento das roupas dos acervos museológicos como documentos históricos e a metodologia de análise nas pesquisas em cultura material, as quais iniciam com uma sensibilização do olhar sobre estes acervos, já foram amplamente discutidos. Resta, portanto, a exemplificação do uso dessa abordagem em três peças constantes no acervo do Museu da Família Colonial: uma pelerine e um conjunto de corpete e saia, ambos, originais da segunda metade

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do século XIX, propondo um método de trabalho. Sendo que, esta investigação histórica deve ser entendida como um ponto inicial possível na criação e desenvolvimento de produtos de moda, assim como, proposto anteriormente.

Primeiramente revelam-se os três objetos de estudo em sua materialidade considerando-os individualmente em três quesitos distintos: modelagem, materiais usados e construção. A análise dos significados dá-se na busca de vestígios históricos de assimilação ao sistema de moda europeu considerando-se o uso de outras fontes de pesquisa refletindo e cruzando com as informações trazidas pelas roupas.

10.4.1 Pelerine

Doada no dia 6 de Setembro de 2000 pela Senhora Vitória Sievert, que reside na cidade e é conhecida no Museu da Família Colonial e no Arquivo Histórico José Ferreira da Silva pelo apoio à revista científica local “Blumenau em Cadernos”.

No museu, a pelerine encontra-se no sótão de uma das casas acomodada em uma caixa expositora de madeira com o tampo superior de vidro e o fundo interno forrado com feltro vermelho na posição horizontal envolvida por folhas de papel de seda.

Confeccionada com tecido de sarja de algodão, atualmente em tom verde escuro, tendo as costas mais curtas com duas pregas e mangas amplas. Adornada por tira de renda franzida na barra do corpo e das mangas e por aplicações de fitas de sutache e rolotês15 acetinados acrescidos de bordado de pedras em tule igualmente preto.

15 Pedaço de tecido cortado em viés e transformado num tubo fino que funciona como cinto ou debrum em chapéu e casacos. Também conhecido como rabo-de-rato. (O’HARA, 1992, p. 236)

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A pelerine é composta por 5 partes: frente, costas, gola, manga e recorte interno da manga. A modelagem da peça é bastante elaborada demonstrando conhecimento técnico de quem a executou. Nota-se a expertise do executante pela costura lateral que é deslocada para as costas fazendo com que o corpo pareça menor, pela elaboração das mangas que com o recorte inferior ganham ainda mais amplitude e pelo detalhe de terminarem nas costas acima das duas pregas duplas ? característica igualmente interessante.

Apresenta ligamento com o nome igual ao do tecido, neste cada fio de urdume16 ou de trama tem a mesma evolução, porém deslocado de um fio em relação aos adjacentes, resultando na trama em diagonal. A armação sarja tem menos pontos de entrelaçamento que a tela ou seus derivados, o que permite a utilização de maior densidade de urdume, possibilitando que os tecidos obtidos sejam bastante compactos, mais resistentes aos rasgos, mais pesados, firmes e mais duráveis (RIBEIRO, 1984).

16 “Fios do tear que se estendem no sentido longitudinal e são entretecidos com os fios da trama” (O’HARA, 1992, p. 275)

Figura 1 – Pelerine frente e costas.Fotos: Paula Consoni.

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As características do entrelaçamento em diagonal conferem a peça, portanto, naturalmente uma melhor conservação. Percebem-se, contudo, as seguintes alterações do tempo: ação dos agentes de degradação biológicos nas pequenas corrosões ocasionadas por insetos (por ser uma fibra natural) e agentes físicos no desbotamento da cor original, nas manchas amareladas e no puído de certas partes devido a tensão do uso e do local onde a peça ficou armazenada. Quanto à alteração social, percebeu-se um ajuste na cabeça das mangas, pois há marcas de costura à máquina com o intuito de deixá-las mais curtas.

Na parte interna da pelerine, mais especificamente na gola e nas costas, encontram-se tecidos de algodão com ligamento tela usados como entretela e forro. No caso da gola, uma tira retangular de 37 centímetros de comprimento por 3 de altura, confere à gola maior sustentação, em tonalidade original, possivelmente, de algodão cru costurada com pontos aleatórios em linhas de cores diversas. Encontra-se amarronzada e com alguns rasgos – ocasionados pelo desgaste do uso e por agentes biológicos.

Já nas costas, costurado manualmente, há um retângulo de tecido de algodão com 15 centímetros de altura por, aproximadamente, 10 de comprimento, usado para conter as pregas da parte externa, tonalidade atual esverdeada, apresenta pontos de corrosão por insetos e manchas amareladas, indicando desbotamento.

A pelerine é adornada com fitas formando desenhos florais diversos e bordado de pedras pretas de vidro17 no tule. O maior destes motivos encontra-se nas costas, em cima do início das pregas, são aplicações de fita sutache, rolotê acetinado e fita aveludada

17 Mesmo que nenhuma análise microscópica tenha sido realizada para se chegar nesta conclusão, o brilho que as pedras preservam e o conhecimento de quais eram os materiais usados no período levam a esta avaliação.

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(usada somente neste motivo) rebordadas com pedras formando dois desenhos simétricos lembrando flores. Algumas pedras caíram, inclusive, em um dos lados não há mais o pendente de pedras que há no outro.

Usando os mesmos materiais e técnica, encontram-se aplicações na abertura frontal da peça, dos dois lados em simetria e seguindo os 66 centímetros de comprimento. Em um total de sete unidades em cada lado, tendo entre estas uma distância de aproximadamente 10 centímetros. Costuradas manualmente na pelerine, sendo que algumas estão parcialmente soltas da peça.

Ao longo da barra das mangas e na gola há uma faixa estreita de tule rebordado com as mesmas pedras das outras aplicações formando pequenos desenhos triangulares, lembrando flores que se repetem um ao lado do outro. Algumas pedras se soltaram e a tira de tule também.

Além das aplicações de sutache e pedras a pelerine é decorada com uma tira de renda preta de material sintético franzida na barra do corpo e das mangas. Aplicada à máquina está em algumas partes solta da peça e desbotada (tonalidade amarronzada). Sabe-se que no século XIX as fibras sintéticas não eram ainda produzidas, fato é que a renda mesmo tendo um desenho muito semelhante ao observado nas revistas de moda datadas dos fins do século XIX a sua aspereza leva a crer que não é de material 100% algodão. Caso a peça de fato seja original deste período, como o presente estudo demonstra ser, a renda teria sido aplicada após sua confecção, numa outra ocasião.

No que diz respeito aos aviamentos, há sete ganchos todos oxidados e de modelos diversos na abertura frontal da peça, assim que alguns estão faltando e ainda um elástico (sem a elasticidade original) verde de 20 centímetros de comprimento por 1 de altura costurado na parte interna das costas na altura da cintura, usado

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para segurar a peça na cintura da usuária deixando a pelerine bem justa e levantando as pregas.

As linhas estruturais do modelo são costuradas à máquina usando o ponto reto, seguindo de todos os acabamentos com pontos manuais, sendo eles: pontos de construção aleatórios para aplicar os bordados e na parte interna da gola, que tem ainda o ponto cruz e o ponto luva inclinado; Ponto de alinhavo corrente usado nas barras para marcá-las antes da costura à máquina; Usado como ponto de construção, substituindo o ponto atrás, o ponto de alinhavo corrente é aplicado na parte interna das costas e no viés na manga (Cf. Reader’s Digest, 1980).

10.4.2 Conjunto

O conjunto de corpete e saia foi doado ao museu nos primeiros cinco anos de sua inauguração. Segundo catálogo das peças existentes no museu, publicado em 1976, o conjunto pertenceu a Sra. Rosa Steiff avó da doadora, Sra. Erica Stingelin, falecida no ano de 2007 com 90 anos. Contudo, Senhora Y, que trabalhava na casa da família Stingelin, fora contatada por Senhora X e revelou que o grau de parentesco entre a Sra. Rosa Steiff e a Sra. Erica Stingelin era de tia e sobrinha, mas considerou corretas as informações do museu de que a peça foi enviada da Suíça como presente no ano de 1884.

O conjunto localizava-se pendurado em um único cabide forrado de tecido de algodão pendurado em um armário de madeira, estando este encostado em uma parede de meio na sala de exposições de uma das casas do museu.

10.4.2.1 Corpete

Corpete de tafetá bordô acinturado com pences até a altura do busto. Na frente, encontram-se três pregas que saem do meio do

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pescoço (costas) até a base do busto terminando drapeada e com acabamento de viés do mesmo tecido. Gola em pé pregueada na frente, restante liso. Fechada até o pescoço com ganchos e com recorte no peito de veludo bordô. Manga modelo alfaiate com babados nos punhos. Costas terminada em triângulo.

Figura 2 – Corpete frente e costas.

Fotos: Paula Consoni.

O corpete é composto por oito partes: centro da frente, lateral da frente, gola, peitilho, centro das costas, lateral das costas, manga parte superior e parte inferior. A modelagem da peça exige noção da técnica de moulage18 ou algum método semelhante devido à necessidade de conhecer com precisão a curvatura do corpo, o que com a modelagem plana demandaria diversos testes.

Na lateral da frente encontram-se duas pences, sendo uma ao lado da outra terminando na altura do início da cava com 24 e 27 centímetros de comprimento cada, que além de acinturar a peça deixam certa folga de tecido caso viesse a ser ajustada. O modelo da manga usado é o de alfaiate, tendo em sua estrutura uma pence embebida na costura na altura do cotovelo (recurso de modelagem

18 Técnica de modelagem tridimensional onde a construção dos moldes de uma roupa é feita dire-tamente sobre um modelo vivo ou um busto de costura, permitindo a sua visualização espacial, bem como seu caimento e volume, antes da peça ser confeccionada (JONES, 2005).

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usado para acomodar o movimento do cotovelo) e por ter a cabeça da manga alta ela fica franzida na altura do ombro. A execução da modelagem do peitilho e do centro da frente demanda igualmente conhecimento técnico que vão além da cópia de moldes de revistas (prática comum na época). Merece destaque também os detalhes dos babados, pregas e tomas que seguem o mesmo tamanho e padrão em toda a peça.

O tecido externo usado na confecção do corpete é o tafetá de seda, um dos tecidos mais antigos conhecidos pelo homem. O tafetá tem como características ser lustroso e armado de trama fina, superfície lisa, textura regular e leve nervura no sentido da trama. O fio de seda é considerado o mais nobre dos fios, possui qualidades incomparáveis como a elasticidade, solidez, finura, leveza e flexibilidade, além disso, tem poder elevado de absorção o que lhe confere qualidade de higiene e de conforto única (PEZZOLO, 2007).

O tecido interno usado como forro é composto por fio de algodão originalmente “branco”. Apresenta nas costas, no peitilho e nas mangas estampas lembrando margaridas e folhas feitas com tinta preta, o que não tinha o objetivo de ser um adorno para a peça, mas aproveitar de forma máxima o tecido.

Ambos os tecidos externo e interno apresentam ligamento conhecido como tela ou tafetá, a mais simples das armações, “caracteriza-se pela disposição inversa de fios pares e ímpares. Cada fio da trama passa alternadamente por cima e por baixo de cada fio do urdume, resultando numa trama que lembra um tabuleiro” (PEZZOLO, 2007, p.153). Esse ligamento apresenta menor tendência ao esgarçamento, porém menor resistência a rasgos. Além de maior facilidade para enrugar e amarrotar (RIBEIRO, 1984).

Assim como a pelerine, o corpete sofreu alterações do tempo na ação de agentes de degradação físicos e biológicos. Em especial

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contraste está o fato de ter sido mantida por muitos anos, desde sua aquisição em 1967 até o ano atual, pendurada em um cabide o que ocasionou grande desgaste às fibras e certo esgarçamento, aliado a perda do brilho natural da seda e a manchas escuras e brancas.

O tecido interno encontra-se amarelado e com manchas mais escuras na parte inferior da cava (em baixo do braço), já que é o local de maior transpiração. Os pontos amarelados são ocasionados por uma degradação interna do próprio tecido que se enferrujam, uma vez que pequenas partículas de ferro constantes nas esteiras e nos teares ficam na trama e oxidam com o tempo e o contato com o gás oxigênio, seguindo as considerações de Marlene Torrinelli (2004).

Percebeu-se, por haver marcas de costura à máquina, que houve alteração social no tafetá ao ajustar as mangas próximo aos punhos. As pences no forro apresentam mais de uma costura, o que pode indicar algum ajuste após a confecção inicial. A aplicação de tecido de sarja preto na parte interna da gola é a alteração mais evidente na estrutura original da peça, pois este não apresenta a mesma degradação natural do restante do corpete e também não foi usado em outras partes do modelo, nota-se ainda que atrás deste há o mesmo tecido usado no revel interno da saia (faz conjunto com o corpete ).

O peitilho do corpete é confeccionado com tecido de veludo originalmente bordô, contudo, a parte exposta está desbotada (amarelada) e com os pêlos visivelmente danificados e opacos.

Quanto aos aviamentos, há um total de quatro ganchos metálicos no peitilho de veludo e outros seis no restante do corpo todos oxidados e de modelos diversos, assim que alguns estão faltando, dois deles com uma linha vermelha mais grossa substituindo-os, o que denota uma atenção diversa da inicial em relação aos acabamentos e, logo, não realizada por um profissional. Na cintura têm quatro casas

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de botões feitas, aparentemente, à maquina e dois botões forrados de veludo bordô (o mesmo tecido do peitilho) encontram-se costurados ao lado das casas. Notam-se pequenos furos de agulha do outro lado da peça, coincidindo com o local inverso das casas, possivelmente ocasionados pelos botões que um dia lá foram costurados.

Costurada na parte interna das costas na altura da cintura, assim como o elástico na pelerine, uma fita de sarja de 66 centímetros de comprimento por 3 de altura originalmente “branca”, encontrando-se manchada em tom amarronzado. Nas extremidades apresentam furos arredondados e manchas de oxidação, indicando que, provavelmente, algum aviamentos metálicos era utilizado nas pontas para uni-las com o objetivo de segurar a peça na cintura, deixando-a bem justa no corpo.

Na parte inferior da cava das mangas (embaixo do braço) costurou-se manualmente e dobrando-a ao meio (ficando uma parte dentro da manga e outra fora) uma espécie de ombreira em formato ovalado de malha de algodão com viés no mesmo tecido. Possivelmente não é original do período de confecção do corpete e pode ter sido costurada depois pra aumentar a vida útil da peça, já que é um local de fácil desgaste. Tem-se tal noção, pelo desgaste que não acompanha o do tecido do forro, mesmo que tecidos de malha de algodão já fossem produzidos em Blumenau a partir de 1880.

Na montagem e confecção da peça o forro e tecido do direito foram costurados ao mesmo tempo, por conseqüência as margens de costuras de ambas as partes ficam aparentes no lado avesso da peça. Aparecem no forro os acabamentos do tecido externo, o que igualmente não é comum na confecção da atualidade. Especialmente na virada das mangas (na parte interna dos punhos) não há preocupação em deixar o tamanho do acabamento de tecido externo igual em toda a peça.

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Assim sendo, as linhas estruturais do modelo são costuradas à máquina usando o ponto reto, seguindo de todos os acabamentos com pontos manuais. Usaram-se pontos de construção aleatórios, o ponto de luva inclinado para chulear todos os acabamentos da costura à máquina e o ponto cruz para unir a tira de sarja na parte interna das costas.

Pontos em linha vermelha mais grossa, localizados nas costas do corpete, são um recurso usado para que o forro e o tecido externo fiquem bem próximos e a peça justa na cintura. Em um primeiro olhar parecem pontos soltos, mas com uma leitura mais técnica entende-se que não foram costurados por acaso.

Na parte externa da peça há vários remendos no mesmo tecido evidenciando a necessidade de um máximo aproveitamento do tafetá para a construção do corpete, já que os remendos nem mesmo seguem o fio do tecido.

10.4.2.2 Saia

Saia godê de tafetá de seda bordô, sendo nas costas mais comprida formando uma cauda. Circunferência da saia de 3 m e 30cm com viés de veludo bordô em toda a barra. O corpo da saia é franzido no revel das costas, onde há uma abertura vertical de 26 cm. Cintura decorada na frente com tomas formando um triângulo e adornada por franzidos na vertical.

A saia é composta por 8 partes, sendo que seis formam o corpo da saia e as outras duas referem-se ao revel. As alturas da saia, sem contar o revel, são de 1,7 metros e 1,16 metros na cauda. A cintura tem o perímetro de 63 centímetros, considerando-se a distância entre cada gancho; medida que coincide com o perímetro da cintura do corpete que é de 64 centímetros. A modelagem da peça exige igualmente noção da curvatura do corpo para que o revel se

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ajuste adequadamente na cintura. Os franzidos da saia embebidos no revel não estão na mesma proporção em cada parte do modelo, inclusive a abertura vertical não está no centro das costas, fato que não indica, necessariamente, um erro de modelagem.

Quanto ao tafetá alterações do tempo na opacidade, nas manchas escuras e brancas e pontos de corrosão, alguns remendados manualmente, já o tecido interno encontra-se amarelado e com pontos de oxidação, bem como diversos rasgos e corrosões. Importante ressaltar que a saia ficou por muito tempo, assim como o corpete, pendurada em um cabide, motivo para os rasgos no tecido interno e para o fato dos franzidos que decoram o revel estarem pendendo para baixo.

Há um total de cinco ganchos metálicos de modelos diversos e oxidados costurados no revel, sendo quatro ganchos macho e apenas um dos ganchos fêmea faltantes foi substituído por uma linha vermelha mais grossa. Também no revel, foram costuradas manualmente duas fitas de sarja usadas para pendurar a saia no cabide, possivelmente, colocada pelo museu. Em toda a circunferência da saia foi costurado à mão, com ponto de luva inclinado, viés de veludo bordô usado no peitilho e para forrar os botões do corpete; este igualmente desbotado em tonalidade ainda mais amarelada.

Figura 3 – Frente e costas da saia.Fotos: Paula Consoni.

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Usando a mesma técnica da montagem e construção do corpete, o forro de gaze de algodão (conhecido também como fraldinha) e o tafetá foram costurados ao mesmo tempo, deixando as margens de costura de ambas às partes aparentes no lado avesso da peça.

Ainda foi costurado manualmente na barra da saia, exatamente, na cauda (local de maior contato com o chão) um reforço de tecido mais firme de algodão cru. Na parte interna do revel há também um reforço de tecido de algodão mais firme, porém como se encontra bastante danificada e parecendo já ter sido ajustada fica difícil precisar o material original usado.

10.4.3 Análises dos Significados

O método aqui proposto consiste, portanto, em:

1. Descrever as características gerais da peça;

2. Averiguar onde e como a peça em estudo chegou ao acervo e lá é conservada;

3. Estudar a modelagem da peça, analisando as partes do modelo e as técnicas, possivelmente, adotadas;

4. Apontar os materiais empregados na confecção da peça. Indicando, inicialmente, a composição têxtil do exterior para o interior, partindo para a indicação do restante de materiais, como bordados e aviamentos;

5. Resaltar as alterações, tanto temporais quanto sociais, sofridas por cada um dos materiais observados, partindo-se para um apontamento dos aspectos gerais da peça. Para tanto, deve-se considerar as informações anteriormente registradas, ou seja, o histórico da peça, a forma de salvaguarda pelo museu e as condições materiais da mesma;

6. Analisar os recursos e condições da confecção, indicando os pontos empregados e as técnicas, possivelmente, adotadas;

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Contudo, seguido da análise material das três peças apresentadas o trabalho não está terminado e torna-se necessário ir além dos seus aspectos materiais, o que, no trabalho efetivamente realizado junto ao Museu da Família Colonial se deu, assim como proposto pela metodologia da cultura material, com a busca de outras fontes de pesquisa que possibilitaram a compreensão dos vestígios históricos de assimilação por parte de Blumenau ao sistema de moda da época.

Inicialmente, partiu-se para a intersecção de dados a respeito do comércio em Blumenau, além das características geográficas da região para se pensar em um dos primeiros momentos da cadeia cíclica do sistema de moda: a matéria-prima.

Observou-se os modelos desenhados nas revistas de moda de Berlim (“Die Modenwelt”, “Victoria – Illustrierte Muster und Modezeitung” e “Bazar”) das décadas de 1860 e 1870 com a finalidade de compreender as tendências de moda do período. Analisaram-se fotografias da mesma época das mulheres moradoras de Blumenau para entender de que forma as tendências das revistas alemãs eram, efetivamente, consumidas.

Esclareceu-se a respeito das técnicas de modelagem e confecção, possivelmente, utilizadas sempre refletindo com dados historiográficos e cartas dos imigrantes aos parentes na Alemanha, além das memórias escritas pelos imigrantes. Finalizando, com as sociabilidades que proporcionavam a exibição dos trajes estudados.

Ao extrapolar a técnica e a estética dessas roupas, o universo das imigrantes alemãs da Blumenau de 1850 a 1890 foi inserido no estudo, cujo teor consistiu na contextualização histórica do período e na investigação do sistema de moda (matéria-prima, tendências de moda, estágio tecnológico disponível, locais de comercialização e exibição, entre outros) da Colônia em comparação com a realidade

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européia e nacional, especialmente com enfoque no Rio de Janeiro e em Desterro.

O conjunto de corpete e saia em tafetá de seda bordô e a pelerine em sarja de algodão verde são objetos capazes de transcender o tempo e o espaço, imortais, permanentes, mas não imóveis. E foi essa a intenção do trabalho realizado: retirá-los da inércia do cabide e da caixa expositora para analisá-los minuciosamente, como documentos históricos do seu tempo e construtores de conhecimento para o tempo presente ou produtos novos para o ávido mercado contemporâneo.

Guardando as caixas e arrumando a mesa

Luiz Vidal (2001) alerta que “ao ingressar no ensino superior, estudantes já deveriam estar habilitados para efetuar observação consciente, experimentação sistemática e representação instrumentada” (p.87). Tais requisitos são necessários para que eles possam adquirir condições para intervir ou propor adequadamente, como profissionais criativos e competentes, na e para a cultura material do futuro.

Concordando com este autor e corroborado pela experiência profissional das autoras, este capítulo atendeu aos seus objetivos, oferecendo condições para que estudantes e profissionais já graduados venham a ter olhar consciente frente as mais variadas fontes de pesquisa. Foi indicada a importância de contextualizar as fontes de pesquisa, associando-as a teorias já consagradas, para que se compreenda que por meio destes objetos está congelado o passado e são eles contidos de escolhas históricas e ideológicas. Como objetos documentos elas não expressam a verdade, não estão prontos para o consumo de uma história simplificada em datas e fatos, mas sugerem interpretações, apropriações e desmanches.

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Da mesma forma, foram apontados acervos catarinenses e suas características, sensibilizando para as possibilidades de pesquisa e criação a partir de acervos, sempre infinitas e limitadas somente pela criatividade e ousadia do pesquisador. O olhar sobre estes objetos pode ser trabalhado em formas que variam do histórico apurado ao fantasioso e poético. Levantou-se ainda, as possibilidades de percepção e aprendizado além do estudo geral das formas pelos séculos, seguindo a apresentação de um método de trabalho que auxilia na leitura dos objetos para pesquisa e também criação e desenvolvimento de produtos de moda.

Assim, se propôs novos horizontes para o profissional de moda, suplantando a indicação empírica que o convida para a simples visitação de museus, de galeria de artes, cinemas, concertos, leituras de revistas, acessos a sites, entre outros, mas que raramente indica o que fazer diante destas fontes e como associá-las e desconstruí-las pensando-as como objeto de pesquisa. Se o futuro da humanidade parece depender do passado, a partir de ações do presente, como indicado nas primeiras linhas deste capítulo, façamos nossa parte sendo profissionais de moda que antecipam as eras e as fazem frutificar com mais rapidez.

Rerências Bibliográficas:

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ModaPalavra - Volume 5 - 2008

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D

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ModaPalavra - Volume 5 - 2008

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Mara Rúbia Sant’Anna (org.)

Palavras Finais

Como os caros leitores observaram, este livro foi composto em três partes, tal como seu subtítulo recorta a abordagem da Moda em Santa Catarina. Com termos tão abrangentes como história, críti-ca e perspectivas este livro poderia se desdobrar em muitos volumes e mesmo apresentar capítulos que divergissem entre si, pois todo conhecimento é passível de discussão e controvérsias. Todavia, esta foi a possibilidade encontrada, dentre os talentos dispostos a compor esta obra, para apresentar o volume 5 da série Modapalavra, que num novo formato buscou congregar autores e pesquisas que se rel-acionavam entre si pela temática da Moda em Santa Catarina.

Talvez outros volumes virão ainda com este propósito ou com objetivos mais específicos, abordando apenas um aspecto da Moda Catarinense: sua indústria, a formação de seus profissionais ou ainda suas redes de distribuição, sua capacidade de comunicação ou administrativa, seus aspectos históricos..., enfim as opções são muitas e caberá ao corpo de pesquisadores instalados no Estado e debruçados sobre sua realidade o futuro desta proposta, como do próprio setor no Estado.

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Palavras Finais

História, Crítica e Perspectivas

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Fica aí o desafio, com parceiros mais generosos e compro-metidos o Modapalavra só tenderá a crescer, a gerar frutos e marcar um tempo de pensares e fazeres em Santa Catarina no âmbito da Moda.

Muito obrigada por sua leitura, este foi mais uma realização do Departamento de Moda da UDESC.

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Diagramação Editorial

CEART / UDESC

Este projeto editorial foi criado eletronicamente utilizando o software Adobe In Design CS3.

As famílias tipográficas Book Antiqua e FunctionTwosão utilizadas em todo o livro.