o uso do midi para a transcrição

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3º Nas Nuvens... Congresso de Música – de 01 a 08 de dezembro de 2017 – ANAIS Artigo Nas Nuvens...: <http://musicanasnuvens.weebly.com/> 353 O uso do MIDI para a transcrição Luciano Soares Virgilio 1 Mauro Rodrigues 2 Categoria: Comunicação Resumo: Acreditamos que o uso de ferramentas tecnológicas possa auxiliar na preparação de transcrições musicais e na performance musical. Neste artigo propomos o registro por meio de arquivos MIDI, visando a posterior edição de performance no formato de partitura. Palavras-chave: Tecnologia. Performance. Transcrição. The use of MIDI for transcription Abstract: We believe that the use of technological tools can help at preparation of musical transcriptions and musical performance. In this article we propose the recording through MIDI files with the goal of subsequent edition of performance in the score format. Keywords: Technology. Performance. Transcription. Introdução O MIDI 3 é um protocolo de comunicação, que foi apresentado durante a NAMM 4 de 1982 visando padronizar a troca de dados entre instrumentos digitais. Através deste protocolo não é transmitido áudio analógico ou digital, o MIDI transmite apenas mensagens de comando em forma de bytes. Podem passar por um cabo MIDI algo em torno 1500 mensagens por segundo. (Prado, 1994). “Ao se executar uma nota em um teclado, ele gera uma mensagem que possui 3 bytes: o primeiro avisa que uma nota foi acionada; o segundo, qual nota: o terceiro, com que intensidade [...]” (Alves 2006, p.59). 1 Mestrando em música pela Universidade Federal de Minas Gerais – UFMG, na linha de pesquisa performance musical sob financiamento da CAPES. E-mail: [email protected]. 2 Professor adjunto na Escola de Música da UFMG (flauta) – Departamento de música popular – Email: [email protected] . 3 Musical Instrument Digital Interface – Interface musical para instrumentos digitais. 4 National Association of Music Merchants, feira de música e tecnologia que acontece nos Estados Unidos.

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3º Nas Nuvens... Congresso de Música – de 01 a 08 de dezembro de 2017 – ANAIS Artigo

NasNuvens...:<http://musicanasnuvens.weebly.com/>353

OusodoMIDIparaatranscrição

LucianoSoaresVirgilio1

MauroRodrigues2

Categoria:Comunicação

Resumo: Acreditamos que o uso de ferramentas tecnológicas possa auxiliar napreparação de transcrições musicais e na performance musical. Neste artigopropomos o registro por meio de arquivos MIDI, visando a posterior edição deperformancenoformatodepartitura.Palavras-chave:Tecnologia.Performance.Transcrição.

TheuseofMIDIfortranscriptionAbstract:Webelieve that theuseof technological toolscanhelpatpreparationofmusical transcriptions and musical performance. In this article we propose therecordingthroughMIDIfileswiththegoalofsubsequenteditionofperformanceinthescoreformat.Keywords:Technology.Performance.Transcription.

Introdução

OMIDI3éumprotocolodecomunicação,quefoiapresentadoduranteaNAMM4

de1982visandopadronizaratrocadedadosentreinstrumentosdigitais.Atravésdeste

protocolo não é transmitido áudio analógico ou digital, o MIDI transmite apenas

mensagensdecomandoem formadebytes.PodempassarporumcaboMIDIalgoem

torno1500mensagenspor segundo. (Prado, 1994). “Ao se executarumanota emum

teclado,elegeraumamensagemquepossui3bytes:oprimeiroavisaqueumanotafoi

acionada;osegundo,qualnota:oterceiro,comqueintensidade[...]”(Alves2006,p.59).

1 Mestrando em música pela Universidade Federal de Minas Gerais – UFMG, na linha de pesquisaperformancemusicalsobfinanciamentodaCAPES.E-mail:[email protected] Professor adjuntonaEscola deMúsica daUFMG (flauta) –Departamentodemúsica popular – Email:[email protected]–Interfacemusicalparainstrumentosdigitais.4NationalAssociationofMusicMerchants,feirademúsicaetecnologiaqueacontecenosEstadosUnidos.

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1–AsmensagensMidi

Asmensagens transmitidas peloMIDI se dividem basicamente em dois tipos:

mensagens de canal (channel message) e mensagem de sistema (systemmessage). As

mensagens de canal carregam majoritariamente dados musicais, enquanto as

mensagensdesistemasãousadaspara informaçõesmais técnicas comosincronização

entreosdispositivosdigitais.

AsprincipaismensagensdecanalenviadaspeloMidisão:

ü Note on / Note off – comandos que controlam, qual nota é tocada e

comqueintensidadeeduração;

ü Afertouch–comandorelacionadoàpressãosobreateclaapósonote

on;

ü Control Change – Tem uma variedade de funções e comandos

relacionadosàperformanceemsi. Sãoaotodo127controles,alguns

predefinidos pelo fabricante e outros que podem ser editados pelo

usuário;

ü Program / Bank - Change (patch) – Comando relacionado ao timbre

(tone)queseráusado;

ü Pitch Wheel – Comando que permite a alteração em tempo real da

afinaçãodanotaparacimaouparabaixo.

Oscomandospodemservisualizadosnafigura1esãochamadosdeeventlist:

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Figura1-EventlistdoprogramaNuendo.

Detalhamentodoscomandosmostradosnafigura1:

• AcolunaTypemostraotipodecomandousado(note,programchange,

controller,pitchBendetc.);

• Starteendmostraomomentonocompassoemqueanotaéacionada

(start)equandoelaésolta(end)5;

• Lengthserefereàduraçãodanota;

• Data1refere-seadadosouvaloresquevariamdeacordocomotipo

de comando associado (event). Para notas, por exemplo, refere-se à

altura(B1=Si1);

• Data2 são valores que também dependem do tipo de comando, no

caso de notas (note) equivale à intensidade com que a nota foi

executada(velocity6).

5 OMIDIestabeleceumsistemade120divisõesporcadasemínima6Dinâmicaouintensidadenestecaso(velocity)relaciona-secomcadanotaenãocomovolumegeral.OsvaloresMIDIvariamde0a127,Sendo0paraomínimoe127paraomáximo.Podemosobservarnafigura1opedaldesustain,nestecasoovalor0serefereaopedalnãopressionadoe127aopedalpressionado.

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2.Aplicaçãonatranscrição.

Apartirdomomentoemqueosdispositivosdigitaistiveramumapadronização

doacessoaoutrossistemas,aconexãodostecladoseletrônicoscomoscomputadoresse

tornou mais fácil. Com isso as informações transmitidas entre teclados poderiam

também ser enviadas a um computador e ser salvas em forma de um arquivo com a

extensão(.mid).

Noanode1987aAppleapresentouumsoftwarenoqualeramdisponibilizados

vários recursosdeediçãoparaumarquivoMIDIcomo: copiar, colar, arrastaretc.Não

demoroumuitoatéqueestesistemaseconvertesseparaaediçãodepartituras.

UmarquivoMIDI registrauma sériede informaçõesnecessáriasparaqueum

dispositivodigitalconsigareproduzircomamaiorfidelidadeumaperformanceatravés

doscomandos,noentantomuitosdestescomandosnãosãoutilizadospelosprogramas

deediçãodepartitura7,poisnãosãocontempladasnaescritamusicaltradicional.

A maioria dos programas de edição de partitura dão opções sobre quais

parâmetrosserãoutilizadosnomomentodegerarumapartituraautomáticaapartirde

umarquivoMIDI.Afigura2detalhaateladeimportaçãodoSibelius.

A partitura será gerada de acordo comas opções de importação selecionadas

pelousuário.Porexemplo,seforescolhidacomoduraçãomínimaacolcheia,oprograma

nãoirámostrarnenhumasemicolcheianapartitura,mesmoque,noarquivoMIDIusado

naimportação,tenhamsidoexecutadasfigurascomestaduração8.

Figura2-TeladeimportaçãodearquivosMIDIdosoftwareSibelius.

7 Utilizamos neste trabalho o software sibelius. 8 O software poderá, neste caso, agrupar as semicolcheias como um acorde de dois sons como valor de uma colcheia, o que vai gerar um resultado gráfico diferente do que é ouvido na execução.

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3.OMIDIeaediçãodeperformance

Ediçãodeperformanceéumtermousadonamúsicaeruditaocidentalpara

se referir a reelaboração de uma partitura com as impressões de intérprete frente à

obra.SegundoDOMINGUES(2016)

Aediçãodeperformancediferentementedeumarevisãomusicológica,ediçãocriticaoumesmoumaanálise[...],temcomopontodepartidaaexperiênciaeavisãodo instrumentistaemdiferentesperspectivas [...]propondo muitas vezes soluções para realização de passagenstecnicamentecomplexas[...].

Acreditamospoderampliaresseconceitotambémparaatranscrição,poisno

momentoemquea fazemossão tomadasdecisõessobreamelhor formadese fazera

notação para que o performer tenha mais informações para tomar decisões

interpretativas.Geraríamosassimumanotaçãocommaisinformaçõestécnicas.

Segundo HARNONCOURT (1982 apud UNES, 1998, p.36) existem

basicamente dois tipos de notação: notação musical e a notação técnica. A notação

musicalseriaumapartituraguia(leadsheet),queteriasemelhançascomasnotaçõesdo

século XVIII, nas quais os compositores não se preocupavam em registrar todas suas

intenções,poissupunhamqueointérpretesaberiaoquefazer,“asnotasgrafadaseram

um mero guia [...]” que trariam informações básicas para a realização da obra. Já a

notaçãotécnicaéaquelaemque:

[...]sedáespecialatençãoaosmecanismosnecessáriosparaquesejamobtidosdeterminadosefeitosacústicos,musicais.Defato,saltaaosolhosa profusão de simbologia e indicações utilizadas por compositoresnossos contemporâneos, através dos quais tentam como que situar ointérprete numa determinada atmosfera estética. (HARNONCOURT,1982)

Teclados digitais são indiscutivelmente os instrumentos que mais se

beneficiaramequemelhorserelacionamcomoMIDI,porémcadavezmaisosbenefícios

se expandem para outros instrumentos, sendo possível encontrar sistemas que

convertemosinalsonoroeminformaçõesMIDIparaváriascategoriasdeinstrumentos

(cordas,sopros,percussãoetc.).

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RegistramosatravésdeumtecladocontroladorMIDI,aperformancedopianista

LeonardoMarotarecriandoaintroduçãodamúsicaLivingInsideMyselfdeGinoVanelli9

(1952). As informações geradas e arquivadas no formato MIDI com a performance

serviramdebaseparaumapropostadeediçãodeperformance.

Como ponto de partida para a transcrição utilizamos a gravação da canção

lançadaem1982ealeadsheet(figura3).

Figura3-LeadsheetdacançãoLivingInsideMyself.

Uma das primeiras observações é que a lead sheet está no tom de Dómaior,

enquantoacançãoéexecutadaporVanelliemSimaior.Outradecisãoquetomamosfoia

deexecutaramúsicanoandamentode =58BPMenão =120BPM,comosugerido

naleadsheet,poisaprópriamarcaçãofeitapelobateristaduranteaintroduçãooriginal

sugereoandamentode58BPM.

Comparandoaleadsheetcomoáudiooriginalfoifeitaatranscriçãodotrechoe

o posterior performance para registro no formato MIDI. O resultado em MIDI desta

execuçãogerouasinformaçõesquepodemservisualizadasnafigura4.

9 Cantor e compositor canadense iniciou sua carreira nos anos 1970 e fez muito sucesso na música pop nos anos 1980.

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Figura4-PianorollcomaexecuçãodaintroduçãodeLivingInsideMyself

A figura4destacaasnuancesnainterpretação,avariaçãodetamanhoecores

nasnotasnográficodevelocityreferem-seàsdiferentesdinâmicasexecutadas.Nopiano

rollpodemosobservartantoestavariaçãodedinâmicaquantoavariaçãodeduraçãodas

notas(length)alémdeinformaçõessobreomomentoexatoemqueanotafoiacionada.

Ográficodopedal sustain ressalta como foi ousodopedalnaperformance.O timbre

utilizadofoiumVST10simuladordeRhodes11.

Apenas quatro mensagens MIDI foram necessárias para o registro desta

performanceespecífica:NoteOn,Noteoff,VelocityePedalSustain.

PosteriormenteimportamosoarquivoMIDInosoftwaredeediçãoSibelius,para

gerar a partiturado trecho.Na figura5 temosduas versõesda execução: uma escrita

visando facilitar a leitura (notaçãomusical) e a outra da forma como foi tocada pelo

músico(notaçãotécnica).

10VirtualStudioTecnology -éumainterfacequeintegrasintetizadoreseefeitosdeáudiocomeditoresesoftwaresdegravação.RegistramosoarquivoMIDIdaperformancenosoftwaredaSteinberg,Nuendo.11PianoelétricoinventadoporHaroldRhodes.

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Figura5-PartiturageradaatravésdoarquivoMIDI-comesemediçãodenotaseduração.

As principais diferenças que aparecem nestas transcrições são relativas à

duração das notas, é possível ver que na performance o músico utiliza o pedal para

sustentaraduraçãodanotaenquantosepreparaparaexecutarapróximapassagemou

acorde.Taisdetalhessãomaisdifíceisdeanotarcomprecisãosomentecomaaudiçãoou

mesmoaoverapenasumvídeodaexecução.AperformanceregistradaviaMIDIémais

uma ferramenta que auxilia bastante o entendimento da forma como foi realmente

executadaumapassagemmusical.

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Luciana Hamond utilizou os procedimentos de registrar a performance em

formatoMIDIjuntoaalunosnafasedeaprendizadodeumanovapeça,auxiliandoassim

o interprete a visualizar além da sua performance os comentários feitos acerca da

performance.ParaHAMOND(2016)estetipodeferramenta“[...]temopotencialdedar

apoio à aprendizagem, pois o aluno pode realizar autoavaliações, tornar-se mais

consciente das próprias performances, e ser mais independente e autônomo em sua

aprendizagem”.

4.ConsideraçõesFinais

O uso do MIDI como ferramenta de registro de uma performance, gera

informaçõesricasparauminterpretequequeiraentendermelhorasua interpretação.

Muitasdasferramentasdeediçãosãousadasprincipalmentepara“consertar”pequenas

imperfeiçõesnaperformance,nocasodeimportaçãodearquivosMIDI,parageraruma

partituramaislimpaefácildeler.

Fazendo o uso do MIDI para auxiliar em uma edição de performance nossa

proposta é fazer exatamente o contrário, ou seja, deixar o resultado da performance

exatamente como foi registrada pelo MIDI para que possamos comparar e ver as

diferentesnuancesdadaspelointerprete.

DestacamosquealémdocaráterdidáticoressaltadoporHAMOND,acreditamos

quetalprocessoédegrandeutilidadenapreparaçãodeumaperformance,fornecendo

informações preciosas para o performer sobre detalhes que podem passar

despercebidos. Mesmo sendo um processo trabalhoso, pode trazer grandes

contribuições tanto no estudo da performance de outrosmúsicos, quanto no próprio

aperfeiçoamento da performance. Informações como velocity, podem mostrar, por

exemplo, a dinâmica na execução de cada nota de um acorde. Conforme destaca

HAMOND “Estudos relatam que a complexidade que a performance musical envolve

podeserverificadapelarepresentaçãográficadeperformancesmusicais.”(2016,p.1)

No caso especifico dos instrumentos de cordas com traste, a utilização de tal

tecnologia traz aindamais um benefício, pois os captadores pitch to midi no caso da

guitarra transmitem “informaçõesnomodoMIDImono,noqual cada cordaé enviada

por um canal MIDI separado” (ALVES, 2016 p.38); este recurso simplificariamuito o

entendimentodadigitaçãorealmenteusadapeloperformer.

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Referências

ALVES, Luciano. Fazendo música no computador. . 2ª edição Rio de Janeiro. Ed.Campos,2006.DOMINGUES, Ravi Shankar Magno Viana. Edição de Performance: reflexões dointérpreteparaumapropostainterpretativa.AnaisdoSefim,PortoAlegre,V.02.2016.p.340-342.HAMOND, Luciana Fernandes. Uso pedagógico de feedback adicional gerado portecnologiano ensino e aprendizagemdepianodenível avançado: umestudode caso.AnaisdoIVSIMPOM.RiodeJaneiro2016.p.460-468.MIDI Manufacturers Association. 2009. An introduction to MIDI (www.midi.org) –Acessado15demaiode2017PRADO,Fábio.TudoquevocêqueriasabersobreMIDI.1994.ROOS,Dave–HowMIDIworks.Disponívelemhttp://entertainment.howstuffworks.com/midi1.htmacessado15demaiode2017