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O USO DA MODELAGEM MATEMÁTICA NO CURSO DE ELEMENTOS DE CÁLCULO PARA ENGENHARIA FLORESTAL Resumo: Neste apresento o relato de uma experiência desenvolvida com o uso da modelagem matemática em disciplinas matemáticas para não matemáticos. A mesma foi desenvolvida na Disciplina Elementos de Cálculo II, ocorrida no período de março a junho de 2006, no Curso de Engenharia Florestal, na Universidade Estadual o Sudoeste da Bahia – Campus de Vitória da Conquista. Inicio fazendo uma discussão acerca do papel das disciplinas em serviço 1 , o uso da modelagem matemática e como estas disciplinas têm sido tratadas com interesse por diversos pesquisadores em Educação Matemática. Em seguida, descrevo como a experiência foi conduzida em sala de aula e, finalizo, discutindo as dificuldades encontradas para realizá-la e fazendo um comentário de como experiências com o uso da modelagem matemática podem desempenhar papel relevante na redefinição de valores atribuídos a essas disciplinas. PALAVRAS-CHAVE: Modelagem Matemática; Ensino-aprendizagem da Matemática; Ensino Superior. 1- INTRODUÇÃO: CONSIDERAÇÕES SOBRE O ESTUDO As disciplinas de matemática para não matemáticos, as denominadas disciplinas em serviço, em cursos superiores têm sido tema de interesse de vários educadores matemáticos, uma vez que na maioria das vezes “elas não dizem a que vieram”. Segundo BARBOSA (2004, p. 64), essas disciplinas se tornam “ilhas no currículo”, não mantendo qualquer relação com o restante das disciplinas do curso, gerando insatisfação nos alunos, sendo, muitas vezes, o “tendão de Aquiles” deles. Muitos questionam se de fato são necessárias ou em que podem contribuir para sua formação. Nesse momento surge a pergunta costumeira: onde vou utilizar isso? Essa pergunta muitas vezes fica sem uma resposta convincente, uma vez que boa parte dos próprios professores que ministram tais disciplinas não estão 1 É o nome que normalmente se dá as Disciplinas Matemáticas em cursos superiores para não matemáticos.

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O USO DA MODELAGEM MATEMÁTICA NO CURSO DE ELEMENTOS DE CÁLCULO PARA ENGENHARIA FLORESTAL

Resumo: Neste apresento o relato de uma experiência desenvolvida com o uso da

modelagem matemática em disciplinas matemáticas para não matemáticos. A mesma foi

desenvolvida na Disciplina Elementos de Cálculo II, ocorrida no período de março a junho

de 2006, no Curso de Engenharia Florestal, na Universidade Estadual o Sudoeste da Bahia

– Campus de Vitória da Conquista. Inicio fazendo uma discussão acerca do papel das

disciplinas em serviço1, o uso da modelagem matemática e como estas disciplinas têm sido

tratadas com interesse por diversos pesquisadores em Educação Matemática. Em seguida,

descrevo como a experiência foi conduzida em sala de aula e, finalizo, discutindo as

dificuldades encontradas para realizá-la e fazendo um comentário de como experiências

com o uso da modelagem matemática podem desempenhar papel relevante na redefinição

de valores atribuídos a essas disciplinas.

PALAVRAS-CHAVE: Modelagem Matemática; Ensino-aprendizagem da Matemática;

Ensino Superior.

1- INTRODUÇÃO: CONSIDERAÇÕES SOBRE O ESTUDO

As disciplinas de matemática para não matemáticos, as denominadas disciplinas em

serviço, em cursos superiores têm sido tema de interesse de vários educadores matemáticos,

uma vez que na maioria das vezes “elas não dizem a que vieram”. Segundo BARBOSA

(2004, p. 64), essas disciplinas se tornam “ilhas no currículo”, não mantendo qualquer

relação com o restante das disciplinas do curso, gerando insatisfação nos alunos, sendo,

muitas vezes, o “tendão de Aquiles” deles. Muitos questionam se de fato são necessárias ou

em que podem contribuir para sua formação. Nesse momento surge a pergunta costumeira:

onde vou utilizar isso? Essa pergunta muitas vezes fica sem uma resposta convincente, uma

vez que boa parte dos próprios professores que ministram tais disciplinas não estão

1 É o nome que normalmente se dá as Disciplinas Matemáticas em cursos superiores para não matemáticos.

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preocupados em dar um caráter aplicativo a elas, apenas preocupam-se em cumprir a

ementa proposta.

É justamente por provocar discussões dessa natureza que tais disciplinas têm

despertado o interesse de educadores matemáticos, os quais vêm abrindo caminhos para um

trabalho mais proveitoso e crítico e, sobretudo, envolvendo os alunos em situações nas

quais possam eles próprios refletir sobre a importância dessas disciplinas.

ARAÚJO (2004) relata sua experiência desenvolvida na disciplina Matemática I,

para o curso de Geografia na UFMG. Para o desenvolvimento das atividades da disciplina

inicialmente a pesquisadora propôs aos alunos que juntos elaborassem “o programa a ser

cumprido na disciplina” (p. 87) o qual ela denominou de “programa prático”. Para tanto, os

alunos realizaram uma pesquisa em diversas fontes de informação, coletando artigos nos

quais estivesse aparente o uso conjunto da Geografia e da Matemática. Assim, com base

nos dados obtidos, eles elaboraram o “programa prático” da disciplina. Segundo a autora,

essa forma de conduzir a disciplina levou os alunos a não mais questioná-la sobre a

necessidade da Matemática, mas a si mesmos.

Sem dúvida a experiência mostra algo bastante inovador, uma vez que não partiu de

uma ementa previa a ser cumprida, mas nasceu do trabalho compartilhado da professora e

dos alunos na construção de uma proposta conjunta. Ainda segundo a autora alguns alunos

continuaram questionando a necessidade da disciplina no curso, entretanto tais

questionamentos foram mais no âmbito da crítica em relação ao “poder da matemática”

para explicar fenômenos sociais.

Encontramos ainda na literatura outras experiências (AZAMBUJA ET ALI, 2004;

FORTES E PORTANOVA, 2004). Nesses estudos, o foco a metodologia adotada em sala

de aula, como forma de envolver os alunos no trabalho sem que eles questionassem os

conteúdos propostos, ou seja, apresentavam propostas metodológicas alternativas, como por

exemplo, a leitura de textos matemáticos.

BARBOSA (2001, 2004), por exemplo, aponta para que também se discuta as

“condições oferecidas aos alunos para desenvolverem atividades específicas dentro do

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contexto geral da disciplina”, o que ele denominou de “ambientes de aprendizagem” (p.65).

Nestes ambientes de aprendizagem “os alunos são convidados a indagar e/ou investigar, por

meio da modelagem, situações oriundas de outras áreas da realidade” (p. 6). Acredito que

nestes ambientes de aprendizagem esteja incluído também o uso das novas tecnologias,

com laboratórios de informática para que os alunos possam utilizar quando necessário.

Além disso, que disponham de tempo necessário para desenvolverem atividades fora da

sala de aula. Assim, para ampliar o debate sobre esses temas, proponho que também

discutirmos também a carga horária de cada disciplina, pois para que os alunos envolvam-

se em atividades extraclasse eles precisam dispor de tempo.

2- A MODELAGEM MATEMÁTICA E AS DISCIPLINAS EM SERVIÇO

Com vistas a promover em sala de aula situações de ensino-aprendizagem

matemática e, de certo modo, situações de aplicação da matemática, o uso da modelagem

matemática tem sido proposto BARBOSA (2004, 2005), com base nas discussões que

alunos fazem quando envolvidos em projetos de modelagem, comenta como este ambiente

torna-se propício à discussão sobre as aplicações da matemática, além de incitar os alunos a

discussões em grupo. Ainda, ao permitir que os próprios alunos escolham temas que lhes

interessem propicia uma maior participação deles no processo de ensino-aprendizagem da

matemática e promove uma maior interação entre eles e o professor. Na experiência que

relato mais adiante, fiz uso da modelagem matemática como uma forma de levar os alunos

a perceberem e/ou questionarem a importância da Disciplina Elementos de Cálculo II para

o futuro Engenheiro Florestal.

BASSANEZI (2002, p.16) define a Modelagem Matemática – “como uma arte de

transformar problemas da realidade em problemas matemáticos e resolvê-los interpretando

suas soluções na linguagem do mundo real”. Com isso, espera-se que ao se traduzir a

linguagem natural em linguagem matemática, esta se revele deixando de ser algo pronto e

estático para tornar-se uma re-descoberta ou mesmo uma construção. O pesquisador foi o

pioneiro a utilizar a modelagem matemática nas disciplinas em serviço. As experiências

desenvolvidas nas Disciplinas de Cálculo para os cursos de Engenharias da UNICAMP,

ainda na década de oitenta, estão entre as experiências pioneiras BASSANEZI (2002);

BIEMBENGUT (2000).

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Desde as propostas iniciadas com Bassanezi, a discussão sobre o papel da

modelagem no ensino-aprendizagem da matemática tem sido intensa e fecunda, tomando

diferentes concepções e vertentes no cenário educacional nacional. BARBOSA (2001)

discutiu como futuros professores de matemática ao tomarem contato com a modelagem

concebem-na com base nas suas experiências e concepções sobre o ensino da matemática.

O pesquisador destaca a importância de incorporar a modelagem matemática nos currículos

de licenciatura em matemática, mas considera mais importante que ela esteja presente nas

diferentes disciplinas de matemática e faça parte da atividade matemática de alunos e

professores.

BORBA, MENEGHETTI e HERMINI (1997a, 1997b); ARAÚJO e BORBA (2004)

apresentam a modelagem matemática como um enfoque didático-pedagógico para a sala de

aula de Matemática. A experiência foi conduzida na disciplina Matemática Aplicada ä

Biologia, tendo o primeiro dos autores como docente. Nesse enfoque, os alunos escolhem

os temas a serem matematizados, podendo contar com a ajuda do professor nessa escolha.

Além disso, no processo de modelagem fazem uso de ferramentas tecnológicas, tais como

calculadoras gráficas. Uma sugestão na escolha dos temas é que estejam relacionados com

os conteúdos propostos na disciplina.

SCHEFFER (1998, 1999) utilizou a Modelagem Matemática como ferramenta de

ensino-aprendizagem da matemática, tomando como base alunos do ensino fundamental

que viviam no meio rural, na tentativa de aproximar a sala de aula do ambiente em a

maioria dos alunos estavam envolvidos. Centrou sua pesquisa nas formas geométricas dos

silos (depósitos) para armazenagem de grãos. Desse modo os alunos davam-se conta de

como a matemática estava presente em muitas situações que os cercavam.

Em outros estudos ARAÚJO (2002) e BARBOSA (2004 e 2006 ) trabalharam sobre

as discussões que alunos fazem quando envolvidos em projetos de modelagem. Também

abordaram o papel do professor nessas discussões, considerando que as interações alunos-

alunos e alunos-professor são muito importantes para o refinamento das soluções

inicialmente apresentadas pelos grupos tornando os projetos desenvolvidos fonte de

informação e contribuição para o ensino da matemática e para a educação matemática.

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As discussões e experiências acima apresentadas mostram a importância que a

Modelagem Matemática para o Ensino-Aprendizagem da matemática, em particular nas

disciplinas em serviço e a proporção e o nível de discussão que tem tomado na pesquisa em

Educação Matemática. Assim, a Modelagem Matemática, como uma das tendências em

Educação Matemática, é apresentada como uma proposta metodológica de forte caráter

interdisciplinar, um instrumento valioso para resgatar nos alunos, de todos os níveis, o

gosto e o prazer em aprender Matemática e, sobretudo, vista como uma ferramenta para

acessar e compreender o mundo.

Portanto, foi, com base no aqui exposto, que a modelagem matemática2 inseriu-se

como uma das propostas por mim desenvolvida na disciplina citada. Esperava também que

nessa disciplina meus alunos tivessem a oportunidade de discutir o papel da matemática na

formação de futuros engenheiros florestais.

3. RELATO DA EXPERIÊNCIA E DESTAQUE PARA UM DOS PROJETOS

Ao tomar conhecimento que ficaria responsável pela disciplina Elementos de

Cálculo II, oferecida no período de março a junho de 2006, no Curso de Engenharia

Florestal, incluí como uma das propostas de trabalho da disciplina a modelagem. A idéia,

baseada nos estudos acima apresentados, era envolver os alunos em um trabalho

experimental no qual pudessem perceber a importância da matemática para o futuro

Engenheiro Florestal. A disciplina com uma carga horária de 45 horas teve as aulas

concentradas em um único dia, com 3h/a semanais.

Embora já estivesse previsto no plano de curso da disciplina desenvolver projetos de

modelagem, não visei impor aos alunos tais projetos, pois gostaria que nascessem a partir

do interesse deles e como parte de uma negociação. Assim, no primeiro dia de aula fiz uma

breve explanação sobre os objetivos da disciplina, argumentei como esta poderia estar

relaciona a uma situação próxima da realidade, que poderiam interessar ao futuro

Engenheiro Florestal, questionei-os sobre as disciplinas que vinham cursando, sobre como

2 A partir de agora usaremos apenas modelagem para indicar modelagem matemática.

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viam a Matemática e qual a relação que tinham com a disciplina e, fiz uma breve

explanação sobre a natureza da modelagem e como esta tem estado presente em disciplinas

matemáticas para não matemáticos.

Foi a partir desse diálogo inicial, que visou conhecer a turma, compreender seus

interesses e expectativas em relação á disciplina e avaliar o interesse deles pela

Modelagem, que os convidei a desenvolverem um projeto experimental envolvendo

situações referentes à Engenharia Florestal e a matemática, em especial os conteúdos

previstos na ementa da disciplina. Combinei com eles que os projetos constituiriam uma

das avaliações e que a escolha dos temas seria livre. Apesar de se sentirem atraídos pela

idéia dos projetos ficaram apreensivos, uma vez que se viram envoltos por muitas dúvidas e

se em tão pouco tempo conseguiriam realizá-la. Visando atenuar as dúvidas destinei um dos

nossos encontros semanais, logo no início do semestre, para explicar-lhes detalhadamente a

proposta dos projetos bem como o que era a modelagem. Também disponibilizei artigos,

dentre os acima citados, para que consultassem e tirassem suas dúvidas sobre modelagem.

Ainda, solicitei aos grupos que até o final da primeira unidade deveriam me

apresentar um pré-projeto, explicitando o tema que abordariam e como realizariam o

experimento. Combinamos também que poderíamos marcar encontros fora do horário da

disciplina para tirar dúvidas e delinear os encaminhamentos que deveriam empreender na

realização dos experimentos. Para os que não podiam me encontrar fora do horário da

disciplina, destinava alguns minutos no início e no final de cada encontro semanal. Foi

bastante significativo perceber o empenho de alguns grupos em definir seu tema e iniciar o

experimento.

Combinamos também que no final do semestre deveriam apresentar um relatório

final, explicitando o experimento com resultados, discussão e conclusões prévias sobre o

trabalho desenvolvido. Também ficou prevista uma apresentação oral para toda a classe de

cada um dos projetos desenvolvidos. Infelizmente, em função do tempo não foi possível a

apresentação oral. Assim, de acordo com o empenho de cada grupo os projetos foram

desenvolvidos dentro do prazo previsto, com todas as ressalvas para esse tipo de trabalho.

Os cinco projetos desenvolvidos foram:

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1. Taxa de Germinação de Sementes de Leucema em Relação ao Substrato emque

foram semeados;

2. Modelagem Matemática com Eucaliptos Citriodora;

3. Aplicação da Modelagem Matemática em Crescimento de Fungo P.

Scletigenum;

4. Modelagem matemática: germinação e desenvolvimento do pepino Aodai;

5. Aplicação da Modelagem matemática ao crescimento do milho.

É possível perceber pelos títulos dos projetos que todos, de certa forma, têm relação

com o curso que fazem e com algumas das disciplinas. Assim, segundo ficou explicitado

em alguns pré-projetos eles iriam aproveitar experimentos que vinham realizando em outras

disciplinas, especialmente de Biologia, para coletar os dados para o projeto. Talvez por isso

explique os projetos seguirem basicamente a mesma tendência, com exceção do trabalho

sobre fungos. Todos envolveram o plantio, medições sobre crescimento, taxa de

germinação de acordo com o ambientes onde foram plantadas, etc. Neste relato destacamos

o projeto: Taxa de Germinação de Sementes de Leucema em relação ao substrato onde

foram semeados.

Este projeto foi desenvolvido pelos alunos Cátia, Evandro e Karine. A escolha

recaiu sobre as sementes de Leucema por tratar-se de uma espécie, segundo os proponentes,

de grande importância econômica e ambiental, algo que interessa muito ao futuro

engenheiro florestal e vai de encontro às preocupações atuais com aquecimento global e a

necessidade de diminuir a emissão de gás carbônico na atmosfera com o plantio de árvores.

Conforme está na justificativa da escolha pela Leucema, Eles dizem:

A Leucema é uma leguminosa arbórea, originária da América Central, de emprego bastante

diversificado que na fase adulta produz uma grande quantidade de sementes, o que facilita a

propagação em larga escala da espécie. O grande destaque da espécie recai sobre sua

multiplicidade de usos: como madeireira, forrageira e como planta melhoradora de solos,

especialmente quando consorciada com outras culturas”. (extraído do relatório final)

No projeto eles queriam observar a taxa de germinação em três substratos

diferentes: substrato agrícola – adubo extraído de vegetais; terra vegetal – solo com alto

teor de matéria orgânica e terra arenosa – material rico sílica (SiO2). As sementes foram

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plantadas em pequenos sacos pretos, pois segundo informações constantes do projeto, o

local onde as sementes são plantadas influencia na germinação. Depois de feita a

semeadura em cada substrato as sementes foram ao mesmo tratamento: irrigação, exposição

solar e ar. As observações foram feitas entre os dias 16 de junho a 27 de julho de 2006.

Conforme apresentado abaixo:

Quadro 1. Tabela de germinação das sementes.

Após a semeadura e as medições eles montaram uma tabela com os valores

encontrados.

Montaram também tabelas com as medidas do comprimento das folhas em cada

substrato e montaram gráficos, apresentaram as equações e calcularam taxas de

crescimento. Utilizaram o Excel como ferramenta computacional, conforme vemos abaixo:

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Quadro 2 – Medidas obtidas em cada substrato.

Quadro 3 – Gráfico do crescimento no substrato vegetal

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Quadro 4 – Crescimento das mudas na terra preta e cálculos de previsões de crescimento.

Quadro 5 - Gráfico de crescimento no Substrato Arenoso

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Quadro 6 – Cálculo com previsão de crescimento

Eles também montaram gráfico comparativo do número de folhas em cada

substrato:

Quadro 7 – gráfico do número de folhas no tempo

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4- COMENTÁRIOS SOBRE A EXPERIÊNCIA E CONSIDERACÕES FINAIS

Conforme podemos observar do anteriormente exposto, as atividades foram

desenvolvidas usando procedimentos semelhantes aos usados em muitos dos trabalhos

descritos na literatura, ou seja: a construção de tabelas, gráficos e expressões algébricas

para explicar os dados. Enfim, sempre uma busca de explicar por meio de um modelo

“ideal” que retrate fielmente os dados. Infelizmente, não foi possível retomar alguns

questionamentos que poderiam enriquecer as conclusões iniciais e ampliar a compreensão

do processo tanto em relação à matemática quanto em relação à de modelagem, não deu

“tempo”.

Por exemplo, no tocante à matemática (ou aos conteúdos matemáticos) é perceptível

que os alunos só “construíram” situações que envolveram funções de 1º grau, ou seja, não

conseguiram ampliar as discussões para os conteúdos desenvolvidos na disciplina, a qual

envolveu funções, taxas de variação, derivadas e noções de integral. Conforme exposto

anteriormente era nosso objetivo levar os alunos a utilizarem esses conteúdos em seus

experimentos, no entanto isso não se concretizou. Poderiam ter utilizado funções diferentes

das de 1º grau para expressar os dados das tabelas ou mesmo observado como se deram as

taxas de crescimento das sementes em cada substrato. Tal constatação nos leva a pensar se

tais conteúdos foram compreendidos e se, de fato, são necessários para o curso em questão.

É importante também ressaltar que o tempo destinado à disciplina e às condições de

funcionamento do curso3 não permitiu que ampliássemos a discussão, que chamo de

feedback. Com o feedback, poderíamos “melhorar” os resultados apresentados nos

relatórios, levantar novos questionamentos, refletir sobre o conhecimento matemático

produzido, ou seja, uma série de questões que são levantadas quando nos embrenhamos no

trabalho com modelagem. Ainda estamos muito presos ao modelo tradicional de ensino no

qual, uma vez concluída a carga horária da disciplina e feitas as avaliações, perdemos o

contato com os alunos e, para eles, foi apenas mais uma disciplina cumprida. Assim, o

projeto dura enquanto a disciplina está em curso, lançada a nota acaba o interesse dos

3 - O Curso de Engenharia Florestal, acima citado, funciona no turno da manhã e, conforme relatado pelos alunos, eles cursam de 7 a 9 disciplinas por semestre, o que não deixa espaços livres. Alguns dos alunos trabalham no turno oposto, outros viajam diariamente de cidades vizinhas até a sede do campus. Assim, o tempo que dispõem para estudos fora da sala é muito pouco para darem conta de tantas disciplinas.

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alunos pelo mesmo. Neste caso, por exemplo, tentei obter deles um relato escrito sobre o

que significou para eles desenvolver aquele projeto, mas infelizmente não obtive resposta.

Segundo Barbosa (2001, p. 4), “as atividades de modelagem são consideradas como

oportunidades para explorar os papeis que a matemática desenvolve na sociedade

contemporânea”. Assim, modelagem e matemática não são fins, mas meios para

questionarmos a realidade vivida. Nesse sentido, percebo a importância do feedback entre a

produção dos alunos, as discussões acerca do que produziram, sua percepção da realidade

frente aos dados obtidos, sua percepção dos conteúdos matemáticos abordados e até onde

eles poderiam avançar para compreender a realidade, abstraindo-a dos dados matemáticos.

Ainda segundo Barbosa, é nesse momento que poderiam surgir questionamentos tais

como: “Este resultado é válido?”, “Por quê?”, “Como podemos garantir?”, “Ao traduzirmos

a situação em termos matemáticos, o que perdemos?” “O que ganhamos?”, etc. Tais

questionamentos, para o pesquisador, se situam no campo do conhecimento reflexivo e

podem levar a uma reflexão sobre o próprio conhecimento matemático, sobre a modelagem

e seu significado social. Nessa experiência faltou este momento, pois fomos submetidos aos

prazos, ao tempo de duração da disciplina, à conclusão da avaliação, ao currículo. Enfim,

ao modelo tradicional de ensino.

Entretanto, acredito que a experiência foi significativa, uma vez que, como já

antecipei, para o desenvolvimento dos projetos alguns grupos se valeram de experimentos

que vinham desenvolvendo em outras disciplinas e, desde a primeira aula, na qual a

proposta foi lançada, empenharam-se no desenvolvimento dos projetos. Assim, nesses

pontos, penso que conseguiram (ou conseguimos) implementar a interdisciplinaridade e a

capacidade de tornar os alunos participantes ativos no processo de construção do

conhecimento, propósitos requeridos com o trabalho de modelagem.

Finalizo apontando que as dificuldades acima descritas, no desenvolvimento da

experiência, na ampliação e discussão dos resultados obtidos, servem para percebermos que

ainda temos muitos desafios a vencer quando queremos romper com um modelo

tradicional, ainda tão enraizado nos cursos de graduação. Acredito que encarar essas

dificuldades e apontar novos rumos, como é o caso da proposta de trabalho com

modelagem, é tarefa requerida ao educador matemático que visa dar um novo sentido à

matemática na sala de aula, em qualquer curso em que ela esteja presente.

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8. BORBA, M. C; MENEGHETTI, R. C.; HERMINI, H. A Modelagem, Calculadora Gráfica, Interdiciplinaridade na sala de aula de um curso de Ciências Biológicas. Educação Matemática em Revista, Ano 5, n. 3, p.63-70, 1997. 9. BORBA, M. C.; MENEGHETTI, R. C. G. & HERMINI, H. A., Estabelecendo Critérios para Avaliação do Uso de Modelagem em Sala de Aula: estudo de um caso em um curso de Ciências Biológicas. In: E. K. Fainguelernt, F. C. Gottlieb (Org.) Calculadoras Gráficas e

Educação Matemática, Rio de Janeiro: Art Bureau, p.95-113. 10. BORBA, M. C.; BOVO, A. A. Modelagem em sala de aula de matemática: interdisciplinaridade e pesquisa em biologia. Revista de Educação Matemática, ano 8, n. 6 e 7, p. 27-33, 2002. 11. FORTES, M. H. M. & PORTANOVA, R. O Cálculo no Curso de Arquitetura. In: Cury, H. N. (org.) Disciplinas Matemáticas em Cursos Superiores. Reflexões, Relatos, Propostas. Porto Alegre: EDIPUCRS, 2004.

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12. SCHEFFER, N. F. Modelagem Matemática: Uma abordagem para o Ensino-

Aprendizagem da Matemática. Educação Matemática em Revista - RS, Nº 1, p. 11-16 1999. 13. ______________ Modelagem Matemática uma alternativa para o ensino-

aprendizagem da Matemática no meio Rural. Zetetiké, CEPEM-UNICAMP, Nº 10, VOL 6, p. 35-56,1998.