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O TRABALHO DE CAMPO E O ENSINO DE GEOGRAFIA: experiências de uma prática pedagógica significativa Janãine Daniela Pimentel Lino Carneiro Introdução O trabalho de campo tem sido um importante recurso metodológico para o processo de ensino-aprendizagem em Geografia. Ao longo da história desta ciência o trabalho de campo ora teve menor relevância, ora teve maior destaque, tanto enquanto recurso metodológico para as pesquisas científicas, quanto enquanto recurso didático. Atualmente nota-se uma considerável retomada do trabalho de campo como metodologia de ensino e como instrumento de pesquisa, sobretudo a partir da influência da Geografia Crítica, da Geografia Humanística e da Pesquisa Qualitativa em Geografia. O trabalho de campo aliado à observação, ao diário de campo, à pesquisa participante, às fontes orais, dentre outros instrumentos, tem permitido a construção do conhecimento geográfico por parte dos estudantes de Geografia seja na Educação Básica, no Ensino Médio, no Ensino Superior ou mesmo na Pós-graduação, uma vez que, aliado à teoria que o embase, permite a compreensão da realidade complexa e contraditória que compõe o espaço geográfico e os sujeitos que nele atuam. Esses instrumentos metodológicos também constituem significativos instrumentos de pesquisa em Geografia, por permitirem que a teoria geográfica seja constantemente (re)construída a partir da dinâmica da realidade. O presente texto apresenta uma breve reflexão acerca da relevância do trabalho de campo como metodologia de ensino-aprendizagem em Geografia, bem como, a possibilidade de sua utilização em conformidade com a observação participante, o diário de campo e as fontes orais, ou seja, entrevistas e depoimentos dos sujeitos que atuam na (re)produção da realidade, significando uma rica oportunidade de articulação entre teoria e prática, ou seja, possibilitando “[...] uma interpretação geográfica do fenômeno [...]” (LIMA DOURADO, 2010, s/p). As reflexões aqui apresentadas advêm de um trabalho de campo proposto pela disciplina Organização do Espaço Agrário Brasileiro do Curso de Mestrado em Geografia da Universidade Federal de Goiás (UFG), Campus Catalão (CAC), o qual pode reconhecer a relevância desta metodologia como estratégia de ensino para a compreensão do espaço rural da Comunidade, bem como do modo de vida dos sujeitos que nela atuam. Foi possível compreender que nos estudos de Geografia Agrária, o trabalho de campo é uma ferramenta indispensável, que aliado à observação da paisagem, à observação participante, às entrevistas e aos depoimentos dos sujeitos que vivem no campo, é possível uma maior compreensão das tramas espaciais que configuram a realidade do campo brasileiro. Nesse sentido, considera-se de extrema relevância a utilização do trabalho de campo como metodologia de ensino em Geografia. O texto está dividido em quatro tópicos, sendo o primeiro, a Introdução, o segundo, As contribuições do trabalho de campo para o ensino de Geografia..., terceiro, ... E as contribuições dos recursos de apoio ao trabalho de campo, quarto, Relato de Experiência: visita ao Parque Estadual da Serra de Caldas (PESCAN), e por último, as Considerações.

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O TRABALHO DE CAMPO E O ENSINO DE GEOGRAFIA: experiências

de uma prática pedagógica significativa

Janãine Daniela Pimentel Lino Carneiro

Introdução

O trabalho de campo tem sido um importante recurso metodológico para o processo

de ensino-aprendizagem em Geografia. Ao longo da história desta ciência o trabalho de

campo ora teve menor relevância, ora teve maior destaque, tanto enquanto recurso

metodológico para as pesquisas científicas, quanto enquanto recurso didático. Atualmente

nota-se uma considerável retomada do trabalho de campo como metodologia de ensino e

como instrumento de pesquisa, sobretudo a partir da influência da Geografia Crítica, da

Geografia Humanística e da Pesquisa Qualitativa em Geografia. O trabalho de campo aliado à

observação, ao diário de campo, à pesquisa participante, às fontes orais, dentre outros

instrumentos, tem permitido a construção do conhecimento geográfico por parte dos

estudantes de Geografia seja na Educação Básica, no Ensino Médio, no Ensino Superior ou

mesmo na Pós-graduação, uma vez que, aliado à teoria que o embase, permite a compreensão

da realidade complexa e contraditória que compõe o espaço geográfico e os sujeitos que nele

atuam. Esses instrumentos metodológicos também constituem significativos instrumentos de

pesquisa em Geografia, por permitirem que a teoria geográfica seja constantemente

(re)construída a partir da dinâmica da realidade.

O presente texto apresenta uma breve reflexão acerca da relevância do trabalho de

campo como metodologia de ensino-aprendizagem em Geografia, bem como, a possibilidade

de sua utilização em conformidade com a observação participante, o diário de campo e as

fontes orais, ou seja, entrevistas e depoimentos dos sujeitos que atuam na (re)produção da

realidade, significando uma rica oportunidade de articulação entre teoria e prática, ou seja,

possibilitando “[...] uma interpretação geográfica do fenômeno [...]” (LIMA DOURADO,

2010, s/p).

As reflexões aqui apresentadas advêm de um trabalho de campo proposto pela

disciplina Organização do Espaço Agrário Brasileiro do Curso de Mestrado em Geografia da

Universidade Federal de Goiás (UFG), Campus Catalão (CAC), o qual pode reconhecer a

relevância desta metodologia como estratégia de ensino para a compreensão do espaço rural

da Comunidade, bem como do modo de vida dos sujeitos que nela atuam. Foi possível

compreender que nos estudos de Geografia Agrária, o trabalho de campo é uma ferramenta

indispensável, que aliado à observação da paisagem, à observação participante, às entrevistas

e aos depoimentos dos sujeitos que vivem no campo, é possível uma maior compreensão das

tramas espaciais que configuram a realidade do campo brasileiro. Nesse sentido, considera-se

de extrema relevância a utilização do trabalho de campo como metodologia de ensino em

Geografia.

O texto está dividido em quatro tópicos, sendo o primeiro, a Introdução, o segundo,

As contribuições do trabalho de campo para o ensino de Geografia..., terceiro, ... E as

contribuições dos recursos de apoio ao trabalho de campo, quarto, Relato de Experiência:

visita ao Parque Estadual da Serra de Caldas (PESCAN), e por último, as Considerações.

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As contribuições do trabalho de campo para o ensino de Geografia...

Sobre a relevância do trabalho de campo para o ensino de Geografia, Tomita (1999)

afirma que existe uma gama de variedades e formas de aprendizagem e que o professor deve

selecionar as atividades adequadas ao tema, aos objetivos propostos, ao tempo e a turma com

a qual trabalha. Ao propor um trabalho de campo é fundamental que o professor conheça as

técnicas de planejamento, condução, avaliação, e principalmente ter bom domínio do

conteúdo a ser trabalho. O planejamento faz parte da realização de trabalho de campo e

consiste num elemento fundamental para que os objetivos almejados com a atividade sejam

alcançados. Em contato com a realidade, o aluno será capaz de perceber os processos, a

dinâmica e as contradições das diferentes formas de apropriação da natureza, ou seja, de

produção do espaço e construção das paisagens.

Lima (s/d) afirma que o trabalho de campo também se fundamenta na observação,

permitindo ao aluno um olhar especial sobre os elementos da paisagem, a partir da

fundamentação prévia, despertando o senso crítico e investigador. Além disso, o trabalho de

campo vem sendo valorizado como um recurso metodológico de ensino-aprendizagem na

Geografia, despertando um maior interesse dos geógrafos e demais professores que se

dedicam ao ensino de Geografia.

Lima dourado (2010) faz uma ressalva em relação ao trabalho de campo como

metodologia de ensino. Segundo o autor [...] “é consenso entre os defensores do trabalho da

validade do trabalho de campo para o ensino de Geografia, a postura de que essa metodologia

não pode ser desvinculada de uma teoria que a sustente.” (LIMA DOURADO, 2010, s/p).

Essa preocupação ameniza os argumentos contrários à realização do trabalho de campo, pois

minimiza a possibilidade de reconhecimento dessa metodologia como um simples passeio, ou

reconhecimento de área e reforça a necessidade de fundamentação teórica em todas as suas

etapas de realização, ou melhor, desde o planejamento, durante a sua execução e

posteriormente, na avaliação.

Na realidade, o trabalho de campo significa um momento de contato com a realidade,

que se coloca como um desafio para o aluno na tentativa de compreender os fatos e

fenômenos a partir das teorias vistas em sala de aula, ou mesmo diante da falta de contato

com uma teoria que consiga explicar a grandeza desses fatos e fenômenos. A esse respeito

Lima Dourado (2010) assegura que: O trabalho de campo se constitui num instrumento extremamente

significativo e necessário ao processo de ensino-aprendizagem porque gera o

conflito que se coloca para o aluno como uma problemática a ser resolvida.

Quando o conflito se instala e desestabiliza a sua percepção a um dado

elemento, tem-se a oportunidade de romper com a abordagem simplista [...]

dada por muitos autores de livros a assuntos demasiadamente complexos.

(LIMA DOURADO, 2010, s/p)

Nesse sentido, a teoria possibilita que o estudante possa problematizar a realidade

que se coloca aos seus olhos, despertando o interesse em compreendê-la além das aparências e

em busca da sua essência. Para Silvestre; Lima; Moreira (s/d) o objetivo central da prática do

trabalho de campo é oportunizar aos alunos a aprendizagem de Geografia mediante a

observação direta e apreender a relação entre aspectos físicos, naturais e humanos,

constituindo-se um importante meio de unir prática e teoria.

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A Geografia trabalha com fenômenos sociais, em constante construção, por isso as

dificuldades em relação à escolha do método e da metodologia a serem utilizados nos

processos de ensino-aprendizagem. As questões sociais são provisórias, dinâmicas e com

consciência histórica por isso a demanda pela utilização de diferentes métodos e diversos

procedimentos metodológicos que sejam capazes de compreender, ao menos em partes, as

complexidades da realidade e dos fenômenos investigados. Dessa forma evidencia-se o papel

fundamental do trabalho de campo como recurso metodológico.

O trabalho de campo permite o contato entre o aluno, os fatos, fenômenos e os

sujeitos a serem compreendidos, ou seja, a realidade empírica. Este contato com a empiria

deve ser acompanhado pela revisão teórica, pois ela irá fornecer meios que possibilitem a

análise do empírico além da sua aparência. Além disso, o entendimento dos fatos e fenômenos

a serem compreendidos deve ser construído a partir da correlação com um contexto mais

amplo, ou seja, a partir de uma relação entre o particular e o geral, e entre o local e o global.

... E as contribuições dos recursos de apoio ao trabalho de campo

Reconhece-se que o trabalho de campo se constitui numa ferramenta indispensável

na construção do conhecimento geográfico. Vale destacar que este recurso metodológico

pode, e deve, ser praticado aliado à observação da paisagem, à observação participante, às

entrevistas e aos depoimentos dos sujeitos que constantemente (re)constroem o espaço

geográfico, por atuarem de forma complementar a esta metodologia de ensino e pesquisa.

Dessa forma, serão apresentados alguns aspectos que demonstram a necessidade e a

relevância de tais metodologias.

A observação pode ser o princípio da realização de um estudo de campo, pois

permite ao estudante/pesquisador, um contato com o espaço, com a paisagem e com os

sujeitos a serem investigados. A observação pode ser direta ou indireta, sendo

respectivamente, quando se dispõe a observar o objeto de estudo e os sujeitos da pesquisa, e

quando se dirige ao sujeito para obter a informação desejada. A observação direta e a

observação indireta podem ser utilizadas numa mesma pesquisa, também de forma

complementar. (MATOS; PESSÔA, 2009)

Outra forma de observação possível de ser desenvolvida durante a realização de um

trabalho de campo é a observação participante. Souza Júnior (2009) afirma que a observação

participante é a possibilidade de maior aproximação entre o pesquisador, os sujeitos da

pesquisa e a realidade socioespacial da qual fazem parte. Esta estratégia metodológica permite

uma maior percepção em relação ao mundo vivenciado pelos sujeitos, oportunizando uma

análise além do discurso que se instaura.

Para Barros; Lehfeld (2007) na observação participante: [...] o pesquisador participa da situação estudada, sem que os demais

elementos envolvidos percebam sua posição de participante. O observador se

incorpora natural ou artificialmente ao grupo ou comunidade pesquisados

[...] natural quando já é elemento desse grupo investigado. (BARROS;

LEHFELD, 2007, p. 75).

Outro instrumento que contribui para a realização de um trabalho de campo que

contemple as necessidades do ensino-aprendizagem é o diário de campo. Esse procedimento

metodológico, embora não seja utilizado com grande frequência, permite ao pesquisador

registrar as suas impressões, e intuições em relação à pesquisa que está sendo desenvolvida.

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Dessa forma o diário de campo permite registrar o convívio com os entrevistados, facilitando

a reconstrução da história nos seus aspectos econômicos, políticos e culturais, possibilita o

exercício de memória do pesquisador nas anotações posteriores ao campo, amplia a

capacidade de percepção da paisagem, e ajuda a aprofundar o olhar do pesquisador sobre o

espaço social, registrar as preocupações e inquietações que surgem no decorrer do trabalho de

campo. (VENÂNCIO; PESSÔA, 2009).

Quanto às fontes orais, ou entrevistas e depoimentos, deve-se reconhecer que “A

utilização de entrevistas como fonte vem de muito longe e é perfeitamente compatível com os

padrões acadêmicos.” (THOMPSON, 1992, p. 22). Esta fonte de dados adquire centralidade

nas pesquisas e estudos em Geografia, pois oferecem novas perspectivas e revelam novos

campos de estudo valorizando os diferentes saberes e a memória do homem, possibilitando

que os sujeitos forneçam dados e informações fundamentais para a compreensão da dinâmica

da realidade investigada.

A escolha dos sujeitos a serem entrevistados depende da trajetória e da postura

política do aluno/pesquisador, e é de extrema relevância para os resultados do estudo, pois

irão representar o direcionamento da abordagem a ser assumida durante a realização do

trabalho de campo. Nesse sentido, caberá ao professor, despertar a sensibilidade dos

estudantes para essas questões, pois a forma como irão compreender a realidade está

intimamente relacionada com essas abordagens.

Grande parte dos estudos que utilizam fontes orais se restringe às lideranças

políticas, às lideranças locais, personagens oficiais que reproduzem o discurso hegemônico.

Acredita-se que essas abordagens não incorporam os conflitos e desigualdades existentes no

espaço e no território. É preciso avançar nesse sentido, dando visibilidade a todos os sujeitos

que fazem parte, construindo e reconstruindo a realidade a ser investigada, e despertar desde o

início, o olhar crítico dos estudantes de Geografia.

Luna (1997) assegura que estudar um fenômeno por meio de relatos verbais implica

selecionar os indivíduos que detenham a informação, que sejam capazes de traduzi-los

verbalmente e que se disponham a fazê-lo. Essa seleção frequentemente considera apenas as

“autoridades oficiais” sobre o assunto, e não as diferentes vozes que compõem a realidade.

Dessa forma, esse quesito, segundo Luna (1997) precisa ser repensado.

Nesse sentido, recorre-se também ao pensamento de Souza Santos (2002) ao afirmar

que as abordagens devem promover as diferentes culturas e as diferentes formas de interação

com o conhecimento, e ainda entre o conhecimento científico e não científico para que a

riqueza social existente não continue a ser desperdiçada. É preciso constituir uma ciência que

supere a monocultura do saber, e construa uma ciência a partir da ecologia dos saberes,

identificando os diferentes contextos e as diferentes culturas. Assim, ao considerar os

diferentes sujeitos, é possível compreender de forma mais abrangente a complexidade da

realidade investigada, ou a ser conhecida.

No que se refere aos idosos, Bosi (1994) traz uma contribuição primordial para esta

reflexão que se propõe realizar a respeito da escolha dos sujeitos a serem entrevistados, no

que se refere à escolha dos velhos e das velhas como sujeitos a serem entrevistados. Estes

trabalhadores e trabalhadoras dedicaram suas vidas ao trabalho e são silenciados por formas

brutais ou sutis, mecanismos quase invisíveis ou mesmo científicos. Acredita-se que: “A

função social do velho é lembrar e aconselhar [...] unir o começo e o fim, ligando o que foi e o

porvir. Mas a sociedade capitalista impede a lembrança, usa o braço servil do velho e recusa

os seus conselhos”. (BOSI, 1994, p. 18).

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Quanto ao papel da invisibilidade social atribuído às mulheres, Hirata (2010) afirma

que a relação entre homens e mulheres em nossa sociedade oculta a hierarquia social já que os

homens são considerados superiores às mulheres. As relações de gênero estão pautadas em

relações de poder, de dominação dos homens e subordinação das mulheres. Embora estas

tenham ocupado o seu lugar no mercado de trabalho elas têm uma situação diferente e são

vistas de maneira diferente em relação aos homens nas diferentes situações reais. Assim,

existe uma divisão entre os sexos, tanto no terreno do trabalho quanto no do saber e do poder,

de forma indissociável. Ao selecionar apenas os homens como sujeitos a serem entrevistados,

a compreensão da realidade será feita pelo viés masculino e hegemônico.

Entende-se que no trabalho de campo, na escolha dos sujeitos a serem entrevistados,

e durante a própria realização das entrevistas o professor deva despertar o olhar dos

estudantes para uma nova percepção da realidade, para que esta se coloque aos seus olhos de

forma contraditória e conflituosa.

As entrevistas permitem que o entrevistador tenha uma compreensão melhor de

como a realidade é percebida e vivenciada pelos sujeitos, ao mesmo tempo em que possibilita

uma série de descobertas capazes de superar as expectativas. “Com as entrevistas se aprende

algo mais do que o simples conteúdo [...] demonstram como é rica a capacidade de expressão

de pessoas de todas as condições sociais.” (THOMPSON, 1992, p. 41). Muitas vezes

permitem que sujeitos, jamais ouvidos ou considerados nos registros históricos oficiais,

possam falar, possam expressar-se, possam ser ouvidos.

Relato de Experiência: visita ao Parque Estadual da Serra de Caldas (PESCAN)

A visita ao Parque Estadual da Serra de Caldas Novas (PESCAN) foi realizada no

dia 14 de agosto de 2015, com as turmas da segunda fase do Ensino Fundamental e as do

Ensino Médio do Colégio Municipal Santa Terezinha, localizado no Povoado do Areião,

Município de Corumbaíba (GO). A proposta de realização da atividade foi apresentada à

equipe gestora da escola e aos discentes, pelas professoras de Geografia, Ciências, Artes e

Língua Portuguesa, como uma atividade interdisciplinar. Dentre os objetivos destacados pelas

professoras estão:

Promover a interação entre teoria e prática;

Fortalecer as práticas interdisciplinares oportunizando a visão interdisciplinar da

realidade;

Reafirmar a contribuição do conhecimento científico nas diferentes áreas do

conhecimento para a apreensão da realidade e suas transformações;

Compreender a formação do relevo, da hidrografia, a fauna e a flora, bem como, as

questões socioambientais que envolvem o Bioma Cerrado;

Conhecer espécies de peixes, aves, répteis e mamíferos que compõe a Fauna do

Cerrado;

Reconhecer a relevância da responsabilidade socioambiental na atualidade,

fortalecendo a Educação Ambiental no Colégio;

Analisar a importância, o histórico e a contribuição das áreas de Conservação

existentes em nossa sociedade.

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Ampliar os momentos de socialização e interação entre discentes e docentes como

uma das formas de melhorar a qualidade da educação desenvolvida, ampliando o

cumprimento da função social da escola.

A programação foi bem acolhida pelo pelos discentes e pela equipe gestora que

auxiliou os docentes na logística da realização da atividade. Por sua vez, os discentes e

comunidade escolar também contribuíram para que a atividade acontecesse a alcançasse os

objetivos propostos. O envolvimento destes segmentos foi imprescindível para a realização do

trabalho de campo.

O cronograma da atividade foi elaborada da seguinte forma:

1) Planejamento (aulas preparatórias nas disciplinas envolvidas);

Apresentação de slides sobre os Biomas Brasileiro, o Cerrado e as

Unidades de Conservação;

Preparação para trabalho de campo (orientações sobre roteiro, atitudes,

vestimentas e alimentação adequados para a atividade).

2) Execução:

Saída do Colégio Municipal Santa Terezinha (7h30);

Chegada ao Parque e ao Museu (9h30);

Saída para o Areião: 14h

Chegada no Colégio Municipal Santa Terezinha (16h).

Durante a visita ao PESCAN os discentes tiveram a oportunidade de observar os

aspectos constitutivos do Cerrado e sua apropriação, bem como, reconheceram na prática

elementos já estudados durante as aulas de Geografia e Ciências. As trilhas, o piquenique, e o

estudo de campo foram registrados nos diários de campo por cada discente e também por

meio de fotografias. Nesse sentido, observe as Fotografias 1 e 2.

Fotografia 1 Estudantes do Colégio Municipal Santa

Terezinha na Trilha do Paredão no Parque Estadual da

Serra de Caldas (PESCAN).

Autora: CARNEIRO, Janãine D. P. L., maio de 2015.

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Fotografia 2 Estudantes do Colégio Municipal Santa

Terezinha no Parque Estadual da Serra de Caldas

(PESCAN). Ao fundo, árvore do Pequi.

Autora: CARNEIRO, Janãine D. P. L., maio de 2015.

A sistematização e avaliação também fizeram parte do planejamento das atividades,

sendo constituídas pelas seguintes tarefas:

1) Avaliação (qualitativa e quantitativa; individual e em grupo):

Apresentação de seminários;

Confecção de Cartazes;

Elaboração de relatório/produção de texto

Confecção de Painéis.

Considerações

Dessa forma, o trabalho de campo, a observação participante, e as fontes orais

constituem metodologias fundamentais para a realização das pesquisas em Geografia,

podendo ser revestidas de igual importância no processo de ensino-aprendizagem do

conhecimento geográfico. Tais procedimentos oportunizam a construção de um conhecimento

geográfico mais próximo da realidade percebida e vivenciada pelo estudante dando um

sentido para este conhecimento, muito além do sentido transmitido pelo livro didático e

demais teorias vistas em sala de aula. A escolha do trabalho de campo, assim como dos

procedimentos metodológicos que irão acompanhá-lo durante a sua realização, irá interferir

na qualidade do ensino desenvolvido pelo professor, bem como, irá interferir nos resultados

alcançados, a partir do estudo realizado. É importante destacar que a utilização do trabalho de

campo como metodologia de ensino na maioria das escolas, sobretudo na Educação Básica,

ainda não acontece com grande tranquilidade, pois a própria rigidez estrutural tende a

dificultar a sua realização.

Mesmo diante de dificuldades inerentes ao modelo estrutural tradicional da

organização da maior parte das escolas na atualidade, foi possível, realizar um trabalho de

campo com os estudantes do Colégio Municipal Santa Terezinha, cuja avaliação por parte da

equipe gestora, dos docentes e dos discentes foi positiva e satisfatória.

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Assim, as reflexões aqui apresentadas não tiveram como centralidade esgotar o

debate acerca da temática, mas sim, oferecer subsídios para as discussões acerca do tema e,

argumentar em favor da utilização desse recurso didático, contribuindo para a sua implantação

nos diferentes níveis do ensino de Geografia.

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geógrafos ou um instrumento banalizado? In: Boletim Paulista de Geografia: trabalho de campo. Associação

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