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O RESGATE DE JOGOS E BRINCADEIRAS TRADICIONAIS EM UMA
TURMA DE 6º ANO NO COLÉGIO ESTADUAL PAPA JOÃO PAULO I
Rita de Cassia Sartore de Souza1
Carlos Eduardo da Costa Schneider2
Resumo:
Este artigo tem como finalidade apresentar uma reflexão sobre a aplicação de uma proposta pedagógica sobre resgatar a experiência fascinante de Jogos e Brincadeiras Tradicionais, criando e recriando o encantamento do lúdico, do convívio, da troca com o outro na constituição de grupos nas aulas de Educação Física. O trabalho foi desenvolvido com alunos de 11 à 14 anos matriculados no 6º ano do Ensino Fundamental. Investigamos as atividades, jogos e brincadeiras praticadas pelos pais e avós e compartilhamos com os colegas da turma nas aulas de Educação Física. Transformar o cotidiano escolar através dessa prática, fazer com que o gosto pelos Jogos e Brincadeiras Tradicionais, façam parte do dia a dia; sabendo que os mesmos fizeram parte da infância dos seus pais e avós, resgatando assim valores históricos e culturais. A pesquisa tem caráter qualitativo na modalidade de pesquisa-ação, com objetivo de desenvolver competências que permitam orientar, produzir, resgatar, vivenciar os jogos e brincadeiras. Podemos então observar ao final do trabalho que os pais contribuíram muito para o enriquecimento de nossas aulas através do conhecimento transmitido para seus filhos, e eles perceberam quão prazeroso e divertido esse aprendizado adquirido. Palavras-chave: Jogos Tradicionais; Brincadeiras; Resgate; Educação Física
1 Introdução
No tempo de nossos pais ou avós, a vida das crianças era nas calçadas, nas
praças, nos muitos terrenos da cidade, nos sítios e nas fazendas do interior. As
brincadeiras eram simples, porém, muito divertidas. Existiam brincadeiras de meninos
e brincadeiras de meninas. Tinham também as brincadeiras para ambos os sexos. As
brincadeiras de meninos estimulavam competições e atividades físicas, enquanto as
brincadeiras das meninas eram geralmente relacionadas à vida doméstica e às
relações afetivas. Essas mesmas brincadeiras fazem parte do patrimônio lúdico-
cultural, traduzindo valores, costumes, forma de pensamentos e aprendizagem. E,
assim, os jogos e as brincadeiras podem ser capazes de fornecer à criança, a
possibilidade de ser um sujeito ativo, construtor do seu próprio conhecimento,
alcançando progressivos graus de autonomia diante das estimulações do seu
ambiente.
1 Graduada em Educação Física pela Universidade Norte do Paraná, Pós-graduada em Educação
Especial DM – Deficiência Mental pela Unifil e Educação Física Escolar pela Universidade Gama Filho,
Professora pela Secretaria de Educação do Estado do Paraná.
2 Mestre em Recreação e Lazer pela Universidade do Porto – Portugal, Especialista em Magistério
Superior pela Universidade Tuiuti do Paraná, Graduado em Educação Física pela Universidade Católica
do Paraná, Professor de Educação Física e Orientador da Universidade Tecnológica Federal do Paraná.
A relação da criança não é mais com outra criança, mas com a imagem virtual.
Com isso, as emoções se perdem nesses circuitos eletrônicos, e a criança passa a ter
como melhor companhia a máquina e as imagens virtuais. Os sentimentos e as
relações interpessoais se tornaram frios nos dias atuais. Basta observarmos com mais
carinho os sites de relacionamentos, onde os cumprimentos de parabéns para um
amigo que esteja aniversariando são feitos por este veículo tecnológico, e nem um
simples telefonema é realizado. Diante disto, escola e família precisam se dar conta
que, por meio do lúdico, as crianças têm chances de crescerem e se adaptarem ao
mundo coletivo (MACHADO & NUNES, 2011).
A tecnologia é o centro das atenções de nossas crianças, observamos que a
importância das brincadeiras tradicionais é muito grande, o que, no entanto, muitas
pessoas na sociedade desconhecem. Sendo assim, as aulas de educação física
poderiam influenciar no resgate dos valores culturais e o melhor desenvolvimento das
crianças da sociedade. Porém, hoje, ao se entender a criança como sujeito imerso na
cultura, não se pode deixar de pensar no tempo e no espaço da brincadeira como a
própria forma de a criança conhecer e transformar o mundo em que vive.
Pois, é lamentável o fato de que estas brincadeiras tradicionais não se tenham
sido incorporadas ao conteúdo pedagógico das aulas de Educação Física. Pois,
aprender a trabalhar com essas brincadeiras poderia garantir um bom
desenvolvimento das habilidades motoras sem precisar impor as crianças uma
linguagem corporal que lhes é estranha (FREIRE, 2003).
Nos dias de hoje para muitas crianças a escola é o único espaço para brincar, o
que torna a Educação Física Escolar um pouco diferente do que se vias em épocas
anteriores. Hoje em dia o brincar está muito mais presente dentro das aulas, mas um
brincar com objetivo e não puramente largar a criança no meio da quadra com um
amontoado de brinquedos. O resgate de alguns jogos e brincadeiras tradicionais tais
como: jogos de pegar, cantigas de roda, amarelinha, barra manteiga, mãe da rua,
pedrinhas entre outras, estão presentes nas aulas.
Na educação física escolar há a hegemonia do esporte como principal conteúdo
(FARIA, 2004; BRACHT, 2005). Fora da educação física, nos momentos de lazer das
crianças, geralmente são jogos e brinquedos industrializados que fazem parte de sua
diversão, sendo esta uma forma paga de lazer (ALMEIDA, 2005).
2 Fundamentação Teórica
Brincar com crianças não é perder tempo, é ganhá-lo; se é triste ver meninos sem escola, mais triste ainda é vê-los sentados enfileirados em salas sem ar, com exercícios estéreis, sem valor para a formação do homem.
(Carlos Drummond de Andrade)
2.1 A importância do brincar
Brincar é, para a criança, fonte de prazer e lazer, aliado à fonte de
conhecimento. É esta dupla natureza que nos leva a considerar o brincar como parte
integrante da atividade educativa.
Ao utilizar os jogos, os brinquedos e as brincadeiras com o intuito pedagógico, é
preciso levar em consideração as divergências existentes entre as características que
são inerentes aos jogos, aos brinquedos e às brincadeiras, e os objetos educacionais.
A atividade lúdica possui um fim em si mesmo, isto é, ela é diferente de uma
atividade didática e não se destina à realização de um objeto pré-estabelecido. Na
educação infantil, as atividades realizadas têm um objetivo específico, algo a ser
aprendido (TEIXEIRA, 2010, p. 44)
Na literatura, muitos são os estudiosos da infância que destacam a relevância
do brincar para o desenvolvimento e socialização da criança. Seus estudos
contribuíram para que o brincar passasse a ser relacionado à Educação Infantil
(PIAGET, 1976; VYGOTSKY, 2007; OLIVEIRA, 2000; KISHIMITO, 1999; KLEIN 1985;
ABERASTURY, 1972).
Para Piaget (1976) o brincar constitui-se expressão e condição para o
desenvolvimento infantil, já que as crianças quando jogam assimilam, acomodam e
podem interferir na realidade. Outro estudioso do brincar é Vygotsky, que trata de um
brincar específico: o de “faz-de-conta”. Para ele os desejos não realizáveis podem ser
alcançados pelo mundo imaginário, por meio do brinquedo. Além disso, a brincadeira
tem a função de transmitir conhecimentos sobre a estrutura social e os tipos de
relações valorizadas por uma cultura específica.
Oliveira (2000) também faz menção à importância do brincar como condição
necessária para o desenvolvimento saudável da criança. Expressa o modo como ela
organiza sua realidade além de introduzi-la no universo sócio-histórico-cultural.
Kishimoto (2005) ressalta que o jogo desempenha um papel fundamental na
constituição das representações mentais infantis e como isto está vinculado ao
desenvolvimento da criança, já que o brincar é um elemento essencial para o equilíbrio
emocional.
Pode-se afirmar que o Brincar; “é de fundamental importância para a
aprendizagem da criança por que é através dela que a criança aprende, gradualmente
desenvolve conceitos de relacionamento casuais ou sociais, o poder de descriminar,
de fazer julgamentos, de analisar e sintetizar, de imaginar e formular e inventar ou
recriar suas próprias brincadeiras” (SANTIN, 2001, p.523), ou ainda simplificada nas
seguintes palavras de Ferreiro (1988), Brincar “é divertir-se e entreter-se infinitamente
em jogos de criança” Lúdico - “que tem caráter de jogos, de aprender brinquedo e
divertimento; é uma necessidade básica da personalidade, do corpo e da mente, faz
parte das atividades essenciais da dinâmica humana” (FERREIRO, 1988, p.139).
Atualmente as crianças entendem por brincadeira os jogos eletrônicos, fazendo
com que as mesmas não se movimentem e as deixando estáticas e com isso vão
ficando sedentárias e obesas. Com as brincadeiras tradicionais, como, por exemplo,
pular no pula-pular corda, elástico, pique alto, etc., fazem com que as crianças se
movimentem a todo tempo, gastando energia e dando liberdade para criar
proporcionando alegria e prazer.
2.2 Definição e um pouco de história
Segundo Huizinga (l980, p. 33) o jogo é uma atividade ou ocupação voluntária,
exercida dentro de certos e determinados limites de tempo e de espaço, segundo
regras livremente consentidas, mas absolutamente obrigatórias, com fim em si mesmo,
acompanhado de um sentimento de tensão e de alegria e de uma consciência de ser
diferente da “vida cotidiana”. Abrange jogos de força e de destreza, jogos de sorte, de
adivinhação, exibições de todo gênero.
Por definição do Atlas do Esporte no Brasil (Alexandre Marcos de Mello, 2005,
p. 35-36), jogos e esportes tradicionais constituem atividades lúdicas, competitivas
e/ou cooperativas que refletem a identidade cultural de um determinado grupo étnico,
distinguindo-se dos esportes de apelo internacional sujeito aos padrões
organizacionais e regras universais. Já os jogos e brincadeiras tradicionais infantis são
atividades passadas de geração a geração, em geral aprendidas pelas crianças mais
novas com as de mais idade, durante o ato de brincar.
Os jogos tradicionais infantis são provenientes dos romances, rituais religiosos,
contos e místicos abandonados pelo mundo adulto. Anonimato, oralidade, tradição,
conservação, mudança e universalidade são características desses jogos. Canções de
roda, advinhas, parlendas, histórias de fadas, bruxas, lobisomens, e jogos de bolinhas
de gude, pião, amarelinha, pedrinhas (saquinhos), a pipa, entre outros, foram
divulgadas pelos colonizadores portugueses quando vieram para o Brasil
(BERNARDES, 2006).
Na sociedade contemporânea, grande parte dos jogos tradicionais infantis -
ciranda cirandinha, cabra-cega, entre outros - que encantam e fazem parte do
cotidiano de várias gerações de crianças, estão desaparecendo devido à influência da
televisão, dos jogos eletrônicos e das transformações do ambiente urbano, ou seja, as
ruas e as calçadas deixaram de ser os espaços para a criança brincar, comenta
Bernardes (2006).
A descoberta do sentimento de infância ocorreu entre os séculos XV e XVIII,
quando reconheceram que a criança precisava de uma atenção antes de ingressar no
mundo dos adultos. No século XVI as brincadeiras infantis eram restritas às crianças
pequeninas, entre 3 a 6 anos. Após tal idade, as crianças imitavam e participavam
igualmente com os adultos nos jogos. (BERNARDES, 2005).
A introdução dos jogos e brincadeiras na vida das crianças trouxe a
possibilidade de interação entre as mesmas, comunicando-se pela expressão verbal e
não-verbal.
Os brinquedos, brincadeiras e jogos eram tratados, antigamente, como
atividades para ambos os gêneros, não restringindo a participação num ambiente
coletivo ou individual. As atividades eram passadas dos adultos às crianças através da
oralidade, mantendo as tradições daquele jogo transmitido, podendo ser modificado ou
alterado quando introduzido em diferentes culturas e realidade.
Para Bruhns (1993) citado por Souza (2001) a concepção dos jogos tradicionais tem
ligação com alguns aspectos mágico-religiosos. Alguns brinquedos tradicionais muito
antigos foram introduzidos inicialmente em forma de cultos, tais como a bola, o arco e
o papagaio, porém, com a capacidade de criação e imaginação as crianças foram
transformando em objetos das suas brincadeiras.
A origem dos brinquedos e brincadeiras se perde no tempo, se lembramos que
qualquer pauzinho ou pedrinha é transformado em atividade lúdica, sendo Entre as
brincadeiras e jogos, estão as chamadas tradicionais, sendo atividades lúdicas
transmitidas ao longo do tempo às novas gerações através da oralidade.
Segundo Carvalho e Pontes (2003) citado por Pontes et all (2008) as
brincadeiras tradicionais infantis são transmitidas de geração a geração de criança e
fazem parte do patrimônio cultural infantil. O jogo tradicional infantil possui
características de anonimato, tradicionalidade, transmissão oral, conservação,
mudança e universalidade, complementa Kishimoto (1993).
Como os jogos tradicionais são transmitidos pela oralidade, cria-se uma
dificuldade em rastrear a origem de muitos deles. Seus conteúdos provêm dos tempos
passados, de mitos, práticas religiosas e culturais (KISHIMOTO, 1993).
Para Nogueira (2002), o jogo tradicional é um tipo de brincadeira relacionada ao
folclore, isto é, está filiada ao campo da cultura popular. E tem como características a
transmissão oral e o anonimato da autoria. Passando de geração em geração, vai
sofrendo adaptações, reforçando o caráter dinâmico da cultura.
Para Cavali-Sforza et al (1982) citado por Pontes e Magalhães (2003) a
transmissão cultural é o processo de aquisição de comportamentos, atitudes ou
tecnologias. A transmissão pode ser vertical, quando, por exemplo, acontece de pai
para filho, Horizontal, adulto para adulto, ou Oblíqua, quando acontece entre não
parentes de gerações diferentes.
Durante a vivência de jogos tradicionais é percebido a marca da cultura. O avô
brincou, o pai aprendeu e ensinou ao filho. Nessa transmissão, algumas coisas vão
sendo modificadas, tais como o nome e o sentido da brincadeira ou suas regras,
precisando ser compreendida, resgatada e ressignificada aos dias atuais (TEIXEIRA,
2006).
Para Kocian (2006) as brincadeiras populares são um fenômeno histórico social
de irrefutável significação cultural de massa, independentemente de gênero, ideologia,
etnia, credo, raça e condições socioeconômicas.
Já para Souza (2001) os jogos tradicionais infantis são as atividades lúdicas
desenvolvidas em ruas, quintais, terrenos baldios, produtos da cultura popular
transmitidos de geração em geração.
O elo entre cultura e criança é claramente percebido nos jogos e brincadeiras
tradicionais e populares, especialmente aquelas desenvolvidas nas ruas, para Pontes
e Magalhães, (2003).
Definimos então os jogos tradicionais como atividades transmitidas de geração
em geração, através do discurso informal, em bate-papo e rodas de conversa, com
difícil precisão em suas origens, pois têm relação com o anonimato e provém de
muitas alterações no decorrer do tempo, sendo patrimônio da cultura infantil
possibilitando o desenvolvimento integral de quem pratica.
2.3 Jogos e brincadeiras tradicionais como conteúdo da educação física escolar
Para entender este conteúdo nas aulas de Educação Física Escolar, faz-se
necessário buscar um entendimento de escola. Considerando a escola como um
espaço de socialização de conhecimentos, um lugar em que são oferecidos aos alunos
outros ou novos saberes ampliando seus horizontes.
Segundo PICCOLO (1995) “o principal papel do professor, através de suas
propostas, é o de criar condições aos alunos para tornarem-se independentes,
participativos e com autonomia de pensamento e ação”. Para que a Educação Física
faça parte deste cotidiano escolar ela não pode ter uma ação pedagógica
mecanizada.... Ela deve considerar o aluno como um ser social e visar seu
desenvolvimento global.
A desconsideração da escola em relação aos conhecimentos adquiridos pela criança e
sua vivência antes do ingresso na instituição constitui um dos males educacionais.
Esquece-se que as crianças não deixaram de ter seu mundo particular (sua rua, sua
casa) ao ir à escola, cujos símbolos precedem os universais, através de imagens
criadas por elas como forma de representação do real. Portanto, "negar a cultura
infantil, é no mínimo, mais uma cegueira do sistema escolar".
Alerta Marcellino (1996, p. 37), "o mundo do brinquedo, em essência, não se prende à
preparação sistemática para o futuro, mas à vivência do presente, do agora". Assim,
torna-se necessário entender a criança como produtora de cultura, oportunizando a ela
tempo e espaço necessários para essa produção, assegurando-lhe o direito de brincar,
possibilitando diversificadas vivências e contribuindo para sua formação como ser
humano participante da sociedade em que vive. Embora se fale em entender a criança
como "criança" e não como "adulto em potencial", o que se observa é que a
instrumentalização da infância vem acontecendo frequentemente, desrespeitando a
faixa etária da criança e afastando cada vez mais o brincar e a ludicidade de sua
prática diária, sendo a escola um dos contribuintes dessa instrumentalização.
A atividade lúdica se torna "uma das formas pelas quais a criança se apropria
do mundo, e pela qual o mundo humano penetra em seu processo de constituição
enquanto sujeito histórico" (ROCHA, 2000, p. 66). É geralmente por meio do brincar
que crianças compartilham suas memórias, constituindo não somente um tipo de
educação informal como, também, uma espécie de produção cultural comum. Neste
sentido, é possível presumir que uma mudança na forma de compreender a criança
impulsiona mudanças educacionais no trato pedagógico com os conteúdos. O desafio
dado à educação formal (nas escolas) é como tratar metodologicamente dessa
manifestação, considerando suas possibilidades e suas contradições. Para tanto, é
importante atentar para as feições assumidas pelas brincadeiras na transmissão de
saberes (em particular da cultura corporal) no âmbito informal (rua, casa, igreja,
trabalho) e formal (escola).
Costa (2000) pergunta e, na sequência, posiciona-se: "De onde vêm as
brincadeiras? Ninguém responde com certeza. Elas são universais e fazem parte da
cultura popular - como a literatura oral, a música, a culinária". Entende ser impossível
dar a palavra final sobre o surgimento de uma brincadeira, pois ela agrega variante e
se transforma ao longo do tempo. Faz menção aos jogos infantis presentes na
Odisseia de Homero, às bonecas colocadas nos túmulos de crianças gregas (Séc. IV
A.C.), aos piões, bonecas, soldadinhos, histórias de monstros e canções de ninar
trazidas pelas famílias europeias que chegavam ao Brasil, às danças africanas e suas
criaturas assustadoras (tutu-marambá, nironga), às danças, brincadeiras com corda,
músicas e lendas indígenas que vão ocorrendo frente o processo de construção
cultural.
2.4 As brincadeiras tradicionais praticados na escola
É evidente e conhecida a influência portuguesa nas brincadeiras e jogos
tradicionais através de versos, adivinhas e parlendas, principalmente nas estórias de
bruxas, fadas, assombrações, príncipes, entre outras. Para exemplificar temos a Mula-
sem-Cabeça e do bicho papão, que são folguedos da península ibérica trazidos pelos
portugueses e espanhóis ao Brasil. A presença dos personagens nas estórias virou
participação essencial em jogos como o Jogo do Papão que consiste em fazer três
buracos no chão, formando um triângulo no chão, e quem conseguir dar três voltas
será o papão, que terá imunidade e será responsável em matar seus adversários.
O folclore é transferido para os jogos tradicionais em forma do Jogo de bolinhas
de gude (KISHIMOTO, 1993). Os jogos tradicionais como bolinhas de gude, pião, jogo
de botão, amarelinha e cinco marias (ossinhos) tem origem portuguesa. A chegada da
Corte Portuguesa no Brasil trouxe, possivelmente, a presença de negros em suas
embarcações para o serviço escravo.
A chegada dos negros no Brasil não tem data comprovada, por falta de
comprovação em documentos, mas o Brasil possui atualmente, profunda influência dos
negros em todos os setores da vida econômica. O folclore africano, cheio de estórias
de bichos, repletos de animismo. As crianças negras nos engenhos de açúcar na
época da escravidão brincavam de faz-de-conta destacando as atividades do
cotidiano, o patriarcalismo e o rude sistema de transporte. A cultura infantil preserva as
brincadeiras com tais influências: chicotinho, quente e frio, batata quente e jogo do
belisco (KISHIMOTO, 1993).
Para Herrero et al (2006) o brincar indígena não é só coisa de criança, mas é
próprio da vida adulta. Há brincadeiras comuns, em que meninos e meninas participam
juntos e outras específicas, só de meninos, ou de homens, como são as danças e os
jogos de lutas, nos quais o mérito está na participação e na apresentação, tão
somente. Um jogo tradicionalmente indígena é o esconde-esconde e a peteca, feita
com palha de milho e o miolo, proveniente de tribos tupis do Brasil.
3 Metodologia
O desenvolvimento deste estudo se deu por meio do Programa de
Desenvolvimento Educacional – PDE, oferecido pela Secretaria de Estado da
Educação aos professores do Estado do Paraná. No primeiro ano do programa, foi
produzido um Projeto de Intervenção Pedagógica a fim de solucionar uma
problemática levantada na realidade escolar onde questionamos o porquê que os
Jogos e Brincadeiras Tradicionais não eram utilizados como conteúdo pedagógico nas
aulas de educação física. Para auxiliar na aplicação deste projeto, foi construída uma
Produção Didático-Pedagógica, onde optamos pelo formato de um caderno
pedagógico. As aulas ofertadas na universidade neste período, no caso a Universidade
Tecnológica Federal do Paraná – UTFPR, foram de grande importância para
analisarmos nossas práticas pedagógicas e auxiliar na elaboração destes materiais.
Voltar às cadeiras acadêmicas com uma bagagem de vivências em sala de aula e ter a
oportunidade de compartilhar experiências com colegas que atuam em diferentes
realidades foi muito construtivo.
Após muitas pesquisas para embasar teoricamente a importância dos Jogos e
Brincadeiras Tradicionais no ambiente escolar, optamos por seguir em nosso trabalho
uma abordagem qualitativa do tipo pesquisa-ação:
A pesquisa ação possibilita a participação dos membros da comunidade estudada, ao longo da pesquisa, na análise e interpretação dos dados, de modo que os resultados possam influenciar a comunidade e cause resultados como propostas de soluções para os problemas detectados (CORDEIRO, 1999 apud MOTTA-ROTH; HENDGES, 2010, p. 114).
No primeiro semestre do segundo ano do programa, após a apresentação do
Projeto de Intervenção Pedagógica na Escola para o Conselho Escolar e equipe
diretiva para apreciação da relevância do estudo, ocorreu a implementação do projeto,
no período de fevereiro a agosto de 2017. Em consonância a esta ação aconteceu o
Grupo de Trabalho em Rede – GTR, onde as produções foram apresentadas e
discutidas com professores da rede no formato de um curso à distância.
Participaram do estudo 28 alunos do 6º ano A e 19 do 6º B, , na faixa etária
entre 11 e 14 anos, do ensino fundamental do Colégio Estadual Papa João Paulo I,
localizado no município de Almirante Tamandaré, região metropolitana de Curitiba.
A referida instituição atende uma clientela bastante diversificada, com diferentes
realidades sociais, econômicas e culturais.
A apresentação do projeto para os alunos aconteceu já no primeiro contato no
início do ano letivo, o que de imediato causou uma mistura de curiosidade e euforia. A
participação e as contribuições do público-alvo foram de grande valia para o sucesso
dos resultados.
3.1 Instrumentos metodológicos
O instrumento metodológico utilizado para coletar informações foi o questionário
desenvolvido pelo autor deste projeto de pesquisa, com perguntas fechadas e abertas,
ferramenta de observação onde coletou informações das atitudes e processos dentro
do ambiente trabalhado, orientado dentro do contexto pesquisado.
Thiollent (2011) salienta que a pesquisa-ação permite a coleta de informação
original de situações, a concretização de conhecimentos teóricos por meio da relação
pesquisador e problema investigado e ensinamentos positivos ou negativos quanto às
condições de êxito.
Segundo Gil (2014), a observação participante consiste na participação real do
conhecimento na vida do grupo a ser pesquisado, assumindo o observador o papel de
um membro.
3.2 Descrição Metodológica e Análise dos Resultados
As informações foram coletadas em um período de aproximadamente três
meses, nas aulas de educação física, durante a implementação da produção
didático-pedagógica desenvolvida pela autora. Esta foi trabalhada em 04 ações sendo:
Ação 01: Investigar com pais e familiares a respeito dos jogos e brincadeiras de sua
infância e explicação sobre jogos, brincadeiras e esportes (suas características).
Ação 02: Reconhecimento de todos os jogos e brincadeiras descobertos com as
pesquisas, escolha de materiais a serem utilizados em cada aula, transformando o
cotidiano escolar através desta prática.
Ação 03: Explicação (individual) de cada brincadeira descoberta e execução da
mesma por toda turma, instigando assim os alunos a vivenciar os jogos e brincadeiras
que fizeram parte da infância de seus pais.
Ação 04: Gincana Educacional com provas variadas para as duas turmas, sendo
divididas em 4 equipes.
Obs: Após todas as aulas, conversamos sobre a importância do brincar para o
desenvolvimento de cada um, as características das brincadeiras realizadas naquela
aula, sobre os valores históricos e social dessas atividades. Durante essa
Implementação, podemos perceber que despertou a curiosidade e a vontade de outros
alunos da escola em participar das atividades realizadas na quadra, por serem
também conhecidas de alguns deles mas não mais praticadas na escola.
Para execução das atividades foram utilizados diversos recursos, tais como:
1-Recursos humanos: Alunos (as) e a professor;
2-Recursos Físicos: Quadra poliesportiva, pátio da escola e sala de aula;
3-Recursos Materiais: Arcos, bolas, balões, cordas, elásticos, sacos, garrafas
plásticas, tacos, dentre outros.
4 Resultados Finais
Através da pesquisa para elaboração do Projeto e a Implementação, foi possível
compreender e confirmar que jogos e brincadeiras tem papel fundamental na formação
dos alunos e seu desenvolvimento, pois as mesmas são parte do desenvolvimento
integral das crianças, além de propiciar á criança o conhecimento de sua cultura
O Caderno Pedagógico nos auxilia corretamente nessa aplicação, a divisão das
Unidades já torna todo trabalho planejado e organizado. A participação dos alunos foi
muito positiva, a descoberta das brincadeiras, as mudanças de regras nos jogos já
conhecidos, tornaram a aula mais atrativa. Despertou novamente nos alunos a vontade
de brincar e entreter-se. No encerramento da Implementação realizamos a Gincana
Acadêmica do 6º ano, atividade em que organizamos várias ações de competição e
cooperação em grupo, onde todos puderam participar e se divertir.
Após a implementação do Projeto foram realizadas algumas perguntas para os alunos
participantes.
1)Qual a brincadeira que você descobriu com seus pais ou familiares que fizeram parte
da infância deles?
2)Você gostou de participar do Projeto de Resgate de Jogos e Brincadeiras
Tradicionais?
3)Você gostou das atividades realizadas em nossas aulas de Educação Física? Por
quê?
4)Em relação a nossa Gincana Acadêmica do 6º ano, qual a atividade que mais
gostou?
De acordo com as questões realizadas com os alunos participantes, obtivemos os
seguintes resultados:
Questão 1
Brincadeiras descobertas com seus pais:
Mãe Pega, Mãe Cola 8 vezes
Bet’s 5 vezes
Caçador ou Queimada 5 vezes
Amarelinha 5 vezes
Cabra Cega 4 vezes
Pular Elástico 3 vezes
Cinco Marias 3 vezes
Peteca 3 vezes
Corrida do Saco 3 vezes
Outras citadas apenas 1 vez 8 vezes
Questão 2
Gostou de Participar do projeto? Quantidade
Sim 45
Não 2
Por que?
Vergonha - Não gosto de brincar 2
Muito legal 8
Foi muito divertido, temos que brincar mais vezes 7
Descobrimos como nossos pais brincavam 6
Aprendemos várias brincadeiras 6
É divertido e importante resgatar essas brincadeiras 3
Brincar é importante para nosso desenvolvimento 3
Deixamos de lado o celular 3
Muito bom brincar toda a turma 2
Diversas, menos citadas 7
Questão 3
Gostou das atividades realizadas no Trimestre?
Sim 45
Não 2
Por que?
Não gosto de brincar - Vergonha 2
Aulas divertidas 8
Muito legal brincar 8
A professora fez muitas brincadeiras 6
Gostei de falar da brincadeira de meus pais 5
Não precisamos de muitos materiais para se divertir 4
Outras respostas 6
Questão 4
Qual brincadeira da Gincana que você mais gostou?
Boliche dos vendados 9
Estoura-Bexigas 8
Corrida do Saco 6
Toca 5
Corrida do Ovo 5
Corrida 3 pernas 4
Arremesso de arcos (Bambolês) 3
Outras 7
5 Considerações finais
Compreender a criança como um sujeito histórico e culturalmente localizado
significa dizer que a ação educativa com ela caminha no sentido de ampliar seu
repertório vivencial, trabalhando com suas práticas sociais e culturais. Estas oferecem
a possibilidade, através das mais diferentes propostas, de elaborar e ampliar os
conhecimentos, como também, de construir tanto a identidade pessoal de cada criança
como a de cada grupo.
A ação educacional pedagógica evidencia-se no momento em que são
propiciados instrumentos para que o aluno amplie suas ações e modifique sua
atuação, sua forma de ver e sentir o mundo.
Durante esse estudo, com base nos autores pesquisados e na experiência
vivida dentro do espaço escolar, foi possível descobrir quão importante são os jogos e
brincadeiras na infância de nossos alunos para seu desenvolvimento motor, cognitivo e
afetivo, além do resgate de valores históricos e culturais e ressalto a oportunidade de
aproximação com seus pais para o conhecimento de sua própria história!
É de grande importância o resgate das brincadeiras tradicionais para que
nossos alunos as conheçam e se desenvolvam através dessa prática, fazendo com
que as tecnologias não sejam mais sua única distração e diversão, que possam se
relacionar e interagir com o mundo real.
As aulas de Educação Física podem se tornar muito mais atrativas e possibilitar
inúmeras combinações de jogos e brincadeiras, para que a aprendizagem motora e
cultural de nossos seja significativa. Podemos traçar um elo de aprendizagem, escola-
família-escola, ou família-escola-família, que facilita as nossas vidas de professores de
Educação Física, e melhora em muito os aspectos motores de nossos alunos, tendo
em vista que os pais também conhecem algumas das atividades que trabalhamos
durante nossas aulas, contribuíram com sugestões e trouxeram novas formas de
brincar.
Sabemos também que hoje a escola é um dos poucos espaços em que as
crianças podem brincar, por não terem mais a segurança nas praças e nas ruas. Cabe
a nós educadores fazermos com esse conhecimento chegue até nossos alunos e não
as deixem cair no esquecimento ou só uma mera lembrança!
6 Referências
ALMEIDA, M. A. B; GUTIERREZ, G. L. O lazer no brasil: do nacional
desenvolvimentismo à globalização. Conexões: Campinas, Unicamp,v.3,n.1,p.
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