o que eles fazem e o que eles dizem: o mito das vacas felizes da nestlé

Upload: franze-matos

Post on 08-Jan-2016

233 views

Category:

Documents


1 download

DESCRIPTION

análise do tratamento e do discurso da Nestlé na criação de seus animais.

TRANSCRIPT

23

O QUE ELES FAZEM E O QUE ELES DIZEM: O MITO DAS VACAS FELIZES DA NESTL E O DITO DESCONEXO

Francisco Jos Sobreira de Matos Universidade Federal de Pernambuco (UFPE) e Faculdade Santa Helena (FSH). [email protected] Franca Barreto Universidade Federal de Pernambuco (UFPE) e Faculdade Santa Helena (FSH). [email protected] Figueira Bacelar, Universidade Federal de Pernambuco (UFPE). [email protected] Eduarda Nbrega Bastos Universidade Federal de Pernambuco (UFPE). [email protected]

ResumoMuitos gestores de organizaes no concordam, ou apreciam em parte, os princpios de tica animal: os animais merecem considerao moral ou direitos pois so seres sencientes - que sofrem e sentem dor, tem uma subjetividade, so conscientes de si. Por mais que distorcidas, insuficientes ou inoperantes, a simples necessidade da organizao em divulgar suas preocupaes com os animais demonstra uma considerao moral aos mesmos. Ou ser apenas uma tentativa de melhorar sua imagem junto ao consumidor? Hoje, por questes econmicas e/ou polticas, muitas organizaes que se dizem preocupadas com a temtica realizam aes de bem-estar animal. A Nestl uma das grandes organizaes que divulga suas prticas de bem-estar animal, a partir de vdeos e textos oficiais da organizao e outras informaes sobre o tratamento de vacas e bezerros na cadeia produtiva do leite. Desta forma, realizamos uma anlise para identificar se eles fazem o que dizem, ou apenas um dito desconexo (o que eles fazem no condiz com o que eles dizem). Conclumos que criar uma imagem, mas no ser efetivamente uma boa organizao para com os animais, dentro da perspectiva do dark side das organizaes implcito, ou seja, vendo os animais como seres que merecem considerao moral, incorre em falta dupla: causar dor, sofrimento e morte aos animais e fazer propaganda enganosa para seus consumidores.

Palavras-chave: tica organizacional, tica Animal, sencincia, dark side das organizaes, Nestl.

1. IntroduoCresce consideravelmente junto sociedade brasileira uma tendncia que segue outros pases do mundo ocidental: a preocupao tica para com os animais. Duas pesquisas recentes demonstram quantitativamente essa realidade. A primeira delas, um estudo global sobre responsabilidade social, demonstra que ate 45% dos consumidores consideram que proteger os animais e uma causa que deveria ser apoiada pelas corporacoes (INSTITUTO NIELSEN, 2012). A segunda mostrou que nao maltratar animais e o maior motivador de admirao ou preferncia na hora de consumir produtos (considerando o preco e qualidade dos mesmos). Do mesmo modo, a grande maioria (89%) acredita que o governo tambem deve comprar de empresas que nao maltratem animais (INSTITUTO AKATU, 2012).Desde 1988, com o aprovao da Constituio Federal do Brasil, pela primeira vez em nvel constitucional, encontramos na nossa histria uma normatividade voltada para os aspectos relativos proteo dos animais e contra a crueldade. Essa temtica pode ser encontrada mais especificamente, no seu artigo 225, pargrafo 1, inciso VII, que diz proteger a fauna e a flora, vedadas, na forma da lei, as prticas que coloquem em risco sua funo ecolgica, provoquem a extino de espcies ou submetam os animais a crueldade. Deste inciso constitucional, se segue a existncia de um dever, a ser cumprido pelo Estado e a coletividade, em proteger os animais contra prticas cruis, sendo possvel notar aqui, novamente, uma preocupao pelo seu bem-estar (FEIJ; SANTOS; CAMPOS GREY, 2010). Essa preocupao com o bem-estar animal pode ser includa dentro de uma pauta mais ampla, da tica Animal, Direitos Animais ou Libertao Animal (SINGER, 2008; FRANCIONE 2006; REGAN 2006). As implicaes para as organizaes podem ser muito vastas e expressivas, gerando necessidade de adaptaes a essa realidade ou a possibilidade de atender novos mercados. Exemplos disso so a elaborao de produtos sem ingredientes ou insumos de origem animal, a reduo dos testes em animais ou substituio por mtodos alternativos e a no utilizao de animais em espetculos de entretenimento. Tambm tem aumentado o controle estatal sobre o uso de animais pelas organizaes, em especial a partir de legislao (BARRETO et al, 2014). Entre as situaes recentes, com maior repercusso mundial, podemos citar a resoluo da Unio Europeia em proibir a comercializao de cosmticos testados em animais (j realizada anteriormente na ndia), a proibio da tourada em algumas regies (inclusive da Espanha) e a determinao do Governo da Costa Rica em fechar seus zoolgicos e no Brasil o encaminhamento da legislao similar europeia a partir da invaso do Instituto Royal, em So Roque, So Paulo (VISTA-SE, 2013).Mesmo com estas novas configuraes de mercado, e para um consumidor movido por questes ticas, podem surgir prticas organizacionais imorais, caracterizadas como o dark side das organizaes, que geram impactos nocivos ao consumidor, sociedade ou meio ambiente (MEDEIROS, 2015; LINSTEAD, MARCHAL e GRIFFIN, 2010, 2014). Linstead, Marchal e Griffin (2010) sugerem vrios temas relacionados aos estudos sobre o dark side das organizaes, em especial, dois deles esto mais associados temtica desse artigo: a) crimes corporativos (corrupo, crimes contra o consumidor, suborno, fraudes, crimes ambientais e crimes contra o trabalhador) e c) abuso de poder, agresso, extorso, violncia, suicdio, assassinato, perigo e risco nas organizaes. Diante do exposto, a ideia central deste artigo identificar se encontramos uma falta de conexo entre o que as grandes indstrias de explorao animal dizem e o que elas fazem, ou seja, se existe um dito desconexo (REGAN, 2006 p. 96). Se uma organizao afirma que trata seus animais levando em considerao seu bem-estar, mas o que eles fazem no condiz com o que eles dizem, ou seja, se eles no so tratados com o objetivo de promover sua sade, felicidade, conforto e satisfao, existe uma violncia contra suas vidas (REGAN, 2006). Ao mesmo tempo, nessas situaes, pode existir tambm um crime contra o consumidor, quando feita uma propaganda enganosa afirmando uma preocupao legtima com o bem-estar dos animais.Para anlise dessa problemtica, escolhemos um caso emblemtico: a Nestl - a maior empresa mundial de alimentos e bebidas, tambm consagrada como a maior autoridade do mundo em Nutrio, Sade e Bem-Estar (NESTL, 2015). Essa empresa atua na indstria de laticnios, que o segundo maior segmento de alimentos no Brasil, setor este que detm o terceiro maior rebanho mundial e tem uma movimentao de mais de R$ 20 bilhes por ano, correspondendo a 8% do ramo de alimentos no pas (FELIPE, 2012). Recentemente, a organizao realizou uma campanha chamada Histrias de Valor Nestl, na qual ela estimula seu consumidor a acreditar que as vacas de sua cadeia produtiva so felizes. Desta forma, buscaremos mostrar at que ponto a insero da temtica do respeito e cuidado aos animais, pela Nestl apresenta-se como uma caracterstica inerente do processo, ou somente uma adequao pr-forma e de discurso vazio s formas de cobrana dos mercados consumidores e legislao. Para tanto, feita uma anlise dos vdeos e textos disponveis no site da empresa e demais fontes de pesquisa que tratam sobre essa realidade.A partir da problemtica apresentada, a questo que norteia este artigo a seguinte: Como a Nestl utiliza suas ferramentas de comunicao com o consumidor para ocultar seu dark side no trato com as vacas leiteiras? Para responder a essa pergunta, o artigo foi dividido em 6 sees. Na prxima sero apresentados alguns conceitos do dark side das organizaes, fazendo aproximaes com a temtica dos animais no-humanos. Na seo seguinte, o conceito de bem-estar animal comparado com a tica animal e feito um questionamento se as prticas adotadas por algumas organizaes representam uma preocupao legtima com os animais ou com os seus clientes. A situao das vacas felizes da Nestl apresentada e em seguida a realidade da cadeia produtiva do leite relatada. Na seo seguinte feita uma anlise das duas situaes e procuramos responder pergunta: existem vacas felizes na indstria do leite? Por ltimo so tecidas concluses.

2. O dark side das organizaes e os animais no-humanosNa atualidade, as corporaes esto presentes em todos os lugares e em quase todos os aspectos de nossas vidas, mas, reproduzindo relaes de dominao, e em nome de seus interesses, elas podem ser perigosas para a sociedade, realizando aes com impactos negativos para consumidores, trabalhadores, meio ambiente e comunidades (MEDEIROS, 2015; 2013). Esse lado sombrio ou obscuro das organizaes, ou dark side, tem sido recentemente estudado por alguns autores nos estudos organizacionais (MORGAN, 1996; VAUGHAN, 1999; LINSTEAD, MARCHAL; GRIFFIN, 2010, 2014). A face repugnante das organizaes uma metfora utilizada por Morgan (1996) para enfatizar em especial o domnio ideolgico das corporaes que exploram trabalhadores e naes mais pobres, ameaam a sociedade e o meio ambiente, causam prejuzos aos consumidores e colocam a sociedade em risco. O autor afirma que a maneira que as empresas utilizam para ocultar esse lado sombrio um discurso ideolgico que mascara a realidade quando se apresentam como sistemas racionais que perseguem os objetivos dos seus stakeholders.Segundo Medeiros (2015), no centro das reflexes sobre o dark side, inserem-se os crimes corporativos. Para a autora (p. 206), nesse espao sombrio que as interseces entre o poder, a dominao e a ideologia potencializam as formas de explorao e dominao, no mbito do trabalho, consumo, meio ambiente, instituies ou governos. A autora define crime corporativo como:

uma ao ou omisso ilegal ou socialmente prejudicial e danosa contra o indivduo ou a sociedade, produzida na interao de atores envolvidos em estruturas organizacionais e interorganizacionais na busca de objetivos corporativos de uma ou mais corporao de negcios, resultando em prejuzos imateriais ou materiais aos seres vivos e s atividades humanas. Assim, o crime corporativo pode ser um ato voluntrio e consciente, bem como o agir negativo, a negligncia, o no fazer aquilo que devido, provocando prejuzos a indivduos e sociedade de forma mais ampla (MEDEIROS, 2013 p. 59-60).

O crime corporativo decorre de decises tomadas para alcanar os objetivos organizacionais, em nome da racionalidade que expressa os interesses dos grupos dominantes, no havendo um questionamento sobre seus efeitos e consequncias, seja por ilegalidade, negligncia, omisso ou m conduta (ALCADIPANI; MEDEIROS, 2014). Para os autores, que nesse texto analisam os crimes corporativos luz do conceito de Banalidade do Mal de Hannah Arendt, esses crimes no causam mais espanto: um fato banal, so cometidos como se fosse algo comum. Os crimes quando so resultados de decises tomadas para alcanar objetivos corporativos, procedimentos operacionais, padres e normas culturais da organizao, sendo intencionais, no podem ser explicados como uma fatalidade, ou incidente. A conduta dos indivduos incentivada pela estrutura e regras e planos que os tornam incapazes de criticar e prever as consequncias dos seus atos e se traduz na banalidade do mal (ALCADIPANI; MEDEIROS, 2014 p. 228).Os crimes corporativos podem ser classificados em diversas tipologias diferentes. Dentre elas, Grabosky e Braithwaite (1987 apud MEDEIROS, 2013) dimensionam os crimes conforme tipos de ofensa e suas vtimas. Uma delas um dos focos de nosso trabalho: crimes de consumo, que entre diferentes modalidades, inclui a propaganda enganosa que lesa os consumidores.Na detalhada reviso bibliogrfica que Medeiros (2013) realizou em sua tese, a autora identifica as vtimas dos crimes corporativos, e apesar de muitos utilizarem em sua abrangncia seres vivos ou vida, geralmente so includos apenas indivduos ou grupos humanos e o meio ambiente (vrias vezes como objeto que serve ao humano e no com valor inerente). Dessa maneira, podemos afirmar que na perspectiva terica do dark side das organizaes, existe uma aproximao com o discurso antropocntrico, ou seja, a viso de que apenas os humanos podem ser agentes e pacientes morais. O lado sombrio, os crimes e os efeitos negativos existem apenas quando prejudicam o ser humano, seja direta ou indiretamente, como no caso dos impactos ambientais que lhes so nocivos (BARRETO et al, 2014).Apesar disso, na prtica de muitas organizaes, se no so includos os animais como stakeholders, existe uma considerao instrumental com os mesmos, medida que se tornam fonte de preocupao para os seus consumidores. Assim, para alinhar a essa realidade e ampliar o debate para o horizonte das implicaes ticas no lidar das organizaes com os animais no-humanos, realizamos neste trabalho uma anlise das condies de manejo e publicidade das relaes entre a Nestl e suas fazendas ligadas cadeia produtiva do leite, tentando mostrar uma desconexo entre o discurso de cuidado e bem-estar animal, com as condies materiais de existncia e explorao destes animais. A seguir abordaremos alguns conceitos ligados ao bem-estar animal e tica animal.

3. Bem-estar animal: preocupao com os clientes ou com os animais?3.1 Corporaes, tica animal e o bem-estarismo: h de fato uma preocupao com modificaes estruturais? Hoje, com a rpida difuso de informaes via meios digitais de comunicao e as crescentes preocupaes eco ambientais com o destino do planeta, os consumidores amplificaram os seus desejos por um acesso, mesmo que incipiente, s informaes da produo e comercializao dos produtos consumidos (INSTITUTO NILSEN 2012; INSTITUTO AKATU, 2012). Nesta perspectiva, as preocupaes socioambientais se tornaram uma pauta, uma ordem do dia nas grandes corporaes, que buscaram e buscam uma adequao s novas demandas desse mercado consumidor. No ponto especfico de nosso artigo, o ano de 1975 aparece como um locus nevrlgico para as nossas discusses: as temticas ligadas ao consumo de derivados de animais e as questes e pensamentos ainda difusos sobre sofrimento, tica e libertao animal, confluem na importante publicao Libertao Animal (1975), de Peter Singer. Neste livro, Singer denuncia parte das atrocidades que se cometiam contra os animais no-humanos, especialmente em laboratrios e fazendas industriais, e, a partir disso, prope a inaugurao da temtica conceitual da tica Animal. A importncia dos estudos de Singer, com sua categorizao e divulgao das lutas histricas dos movimentos pelos animais e sua tentativa de construo filosfica utilitarista destas lutas, dissemina e abre um novo flanco nas reais implicaes das formas como os seres humanos tratam os que no fazem parte do crculo da sua espcie. O termo Especismo, criado pelo britnico Richard Ryder, passa, ento, a ser utilizado por Singer como mais uma das formas condenveis de discriminao e de opresso que os seres humanos infligem aos que consideram em algum momento como o diferente, o inferior e o divergente. Esse pensamento de Singer, e mais especificamente sua questo das implicaes ticas ligadas aos animais, parte de um princpio utilitarista elementar: o da igual considerao de interesses entre seres semelhantes, principalmente quando estes seres apresentam um aparato biolgico semelhante aos da espcie humana, apresentando-se como seres sencientes, capazes de padecer de dor e sofrimento. Ou seja, de forma resumida, a tica animal defendida pelo autor, que queles que a cincia nos mostra como portadores de um sistema nervoso central capaz de sentir e sofrer as consequncias da dor e sofrimento, assim como ns humanos sentimos, imputa-se uma necessidade tica de anlise, debate e considerao dos interesses ligados a estes seres, independente de sua espcie, estabelecendo o princpio da igual considerao de interesses como princpio moral bsico; [] este princpio se aplica aos membros das outras espcies, tal como nossa prpria (SINGER, 2008, p.19).Com a abertura, crtica e aprofundamento por diversos outros autores (ver REGAN 2001, 2004; FRANCIONE, 2003, 2010, 2013) desse flanco terico de anlises, a temtica da tica Animal, Direito Animal e Libertao Animal se difundem em uma rpida velocidade; as questes alimentares e o uso indiscriminado e intensivo dos derivados animais na fabricao de produtos ganham um novo olhar; e os indivduos e as empresas ligadas cotidianamente explorao desses seres so postas em cheque e cobradas a dar respostas e promover mudanas (transformadoras ou no) de hbitos nas suas prticas cotidianas. Neste horizonte, uma dessas transformaes, e que hoje se encontra bastante difundida como uma lgica de mercado, o foco da discusso sobre tica e direitos animais ligada s questes do bem-estar animal, ou bem-estarismo. Este fronte prtico terico tem como objeto a construo de leis, normas e polticas que regulamentem o uso de animais no-humanos, de forma a reduzir seu sofrimento, mas sem considerar a possibilidade de abolio da posse e uso sobre estes seres. O bem-estarismo, apresenta-se conceitualmente como uma soluo mais conservadora, e esse conservadorismo tantas vezes reacionrio do ponto vista conceitual da questo da tica e libertao animal, j que a problemtica da reduo de danos, ao invs da abolio das condies de opresso desenvolvem caminhos para a manuteno e, at mesmo, expanso dos contextos exploratrios dos animais no-humanos, j que apesar das condies de explorao que estes animais sencientes se encontram submetidos, a tica animal deve ser conseguida pela reforma e regulamentao passo a passo das condies de existncia destes. Ou seja,

Esta viso a de que no o uso, em si, mas somente o tratamento o fundamento da ideologia bem-estarista e difere da posio dos direitos animais por mim articulada. Eu afirmo que se os animais tiverem interesse na existncia continuada e eu argumento que todos os seres sencientes o tm, ento, o nosso uso deles como recursos (independentemente de quo humanitariamente os tratemos) no pode ser moralmente defensvel, e ns devemos procurar abolir, e no regulamentar, a explorao animal (FRANCIONE, 2011).Desta forma, o bem-estarismo aparece como uma degradao conceitual do tema central do objetivo mximo da tica Animal, que a total considerao dos direitos dos animais no-humanos. Nesta perspectiva, e no caso de nosso objeto de estudo, a teoria bem-estarista se enquadra muito bem aos propsitos e relaes de uma grande empresa multinacional como a Nestl, j que esta busca absorver parte do discurso de bem-estar animal, para manter e ampliar sua base consumidora, sem necessariamente abolir as condies de explorao em que estes animais se encontram.Logo, de certa maneira, estamos diante de uma dupla condio de maquiamento das condies: uma conceitual e outra pragmtica legal. Na primeira, na temtica da considerao dos pressupostos ticos dos animais no-humanos, adota-se a teoria bem-estarista, que como vimos, reduz, mas no resolve as condies de explorao, garantindo a continuidade, desde que minimamente transformada, do uso e explorao dos animais. Da segunda, temos que a explorao animal continua, e que as grandes empresas exploradoras de animais entenderam que devem vender e publicizar uma imagem ao consumidor de produtos que surgem a partir de preocupaes legais com a reduo de danos em relao explorao animal, tranquilizando o consumidor que deseja um produto de qualidade, mas com tratamento humanitrio para com os animais, vendendo a imagem de que, em suas instalaes, estes vivem da melhor maneira possvel at o seu momento derradeiro, oferecendo sempre um produto que leva em considerao os interesses dos animais no-humanos.

3.2 O dito desconexo e a separao elementar entre discurso e prtica.No subtpico anterior, analisamos uma espcie de sada parcial, uma resposta terica limitada s demandas da tica animal, o bem-estarismo. Neste espao analisaremos o conceito de dito desconexo, como uma resposta falaciosa s cobranas dos movimentos sociais em defesa animal.Como vimos, a temtica da tica e direitos animais vem ganhando uma fora cada vez maior de penetrao e difuso na nossa sociedade. Os movimentos de defesa animal se tornam cada vez mais corriqueiros e suas mensagens penetram em esferas que antes no conseguiam acessar (VISTA-SE, 2015). Obviamente, o discurso desses grupos e dos tericos dessas temticas entram em choque com partes importantes do nosso modo de viver e dos nossos hbitos de consumo, j que um sem fim de produtos de nosso dia a dia tem origem no uso e explorao dos animais. Empresas inteiras so aliceradas sobre esses ditames e cobradas a dar respostas sobre as formas de tratamento destes seres nas suas cadeias de produo, uma vez que o mercado consumidor minimante preocupado com as questes animais tm aumentado. Nem sempre as respostas oferecidas so da magnitude da necessidade, j que uma resposta verdadeira e completa desestruturaria o alicerce inteiro destas corporaes ligadas comercializao desses tipos de produto.Desta forma, as empresas tm rumado para trs polos mais classificveis: 1 - Ficam indiferentes temtica e arcam com as consequncias legais e comerciais;2 - Uma adoo dos conceitos de bem-estarismo, promovendo melhoras pontuais em suas cadeias produtivas, no tangente s condies de vida e existncia dos seus animais; 3 - Construo de um discurso e publicidade de bem-estar animal e tratamento humanitrio em suas dependncias, adequando-se necessidade legal e dando resposta demanda do pblico, entretanto sem promover verdadeiramente as mudanas prticas que seu discurso sustenta o dito desconexo.

Assim, como o polo 1 encontra-se num lugar de insustentabilidade e rpido declnio comercial, dadas as demandas crescentes de respostas legais e das cobranas dos mercados consumidores, e o polo 2 aparece como um momento, ainda que limitado, mas desejvel, ante as condies precrias de explorao animal, analisaremos especialmente o polo 3, e a ttica do dito desconexo, como um subterfgio para manter as condies de explorao e maus-tratos aos animais, adequando-se somente em discurso aos ditames legais e ao mercado consumidor. Apresentando-se como uma mentira sustentada de maneira estratgica para responder aos anseios da sociedade, dessa forma podendo se enquadrar como uma ferramenta do dark side das organizaes. O dito desconexo, proposto por Tom Regan em seu livro Jaulas Vazias (2006), apresenta-se como um mecanismo de evaso, uma retrica vazia, de desconexo entre prtica e discurso, dos interlocutores das grandes empresas, visando sanar e adequar, mas sem onerar ou modificar substancialmente sua cadeia produtiva e as condies de explorao animal, s demandas legais e dos mercados consumidores. Este conceito pode ser explicitado na frase: o que eles fazem no condiz com o que eles dizem (REGAN, 2006, p. 96). O autor aponta, ento, que porta-vozes da indstria ligada explorao animal desfrutam das benesses desse dito desconexo. Com discursos prontos e com dados formais muitas vezes vazios de realidade, expressam o que as pessoas gostariam de ouvir, ou seja, que o tratamento legado humanitrio e o bem-estar animal prezado. As corporaes e seus lobistas utilizam esse artifcio por duas razes essenciais: para se adequar legislao que regulamenta sobre as questes dos cuidados com os animais na cadeia produtiva e para transmitir a imagem ao consumidor de uma empresa que tem preocupao com os animais, garantindo o escopo de um produto obtido sem sofrimento animal (REGAN, 2006). Destarte, esta forma de posicionamento, apesar de suas implicaes morais, resolve, sem grandes modificaes reais ou alteraes nos custos de produo, as cobranas dos movimentos de defesa animal, o anseio dos mercados consumidores por produtos produzidos sem sofrimento animal e a necessidade de adequao normatividade legal. Nestas perspectivas, o dito desconexo aparece como conceito extremamente importante para expor as contradies do nosso objeto de estudo, o mito das vacas felizes e as reais condies de explorao da cadeia produtiva do leite da Nestl. Apresentando-se, tambm, como importante lastro terico para anlise da fissura entre as condies reais e as condies fictcias e publicizadas ao consumidor, na perspectiva dos aspectos da explorao animal em suas instalaes.

4. As vacas felizes da NestlConsiderada uma das maiores corporaes do mundo, a Nestl detm 57 marcas e centenas de produtos no mercado, sendo a grande maioria provinda da indstria de laticnios, dentre os quais o atual carro-chefe da empresa: o leite condensado Moa (NESTL, 2015a). Fundada em 1866, a empresa tornou-se uma potncia mundial na dcada de 1930 e passou por fuses, aquisies e expanses, duas guerras mundiais e foi protagonista de inmeras polmicas e alvo de boicotes e manifestaes em todo o mundo. O caso mais memorvel e persistente diz respeito sua influncia na alimentao e nutrio infantil, tendo inclusive firmado parcerias com organizaes da sociedade civil de notoriedade sobre o tema, tais como a Sociedade Brasileira de Pediatria (ALMEIDA, RIBAS, LEANDRO, 2009). Os consumidores so bombardeados com anncios em rdios e televiso de novos alimentos, bebidas e medicamentos, perante os quais geralmente se mantm uma atitude ingnua, que beira a religiosidade frente a essas ofertas (FELIPE, 2012). Segundo a autora, as pessoas se enganam quando consideram que os alimentos oferecidos no vo fazer mal nossa sade e que o poder pblico toma medidas para barrar esses produtos e nos proteger. Todavia, Marcelino e Gracioso (2008, p. 6) afirmam: o consumidor est mais informado (acesso tecnologia e regulao), protegido (Cdigo de Defesa do Consumidor), seletivo (pode escolher melhor) ativo (ganha voz por meio das organizaes da sociedade e est atento ao comportamento das empresas) e crtico (sente-se cada vez mais vontade para colocar seu ponto de vista s empresas). Atenta a esse novo consumidor e relevncia de uma imagem aceitvel e do bom relacionamento com esse ator, a Nestl vem adotando, desde sua origem, estratgias comerciais que oferecem exatamente aquilo que o pblico gostaria de ver, ler, ouvir e patrocinar. Aqui, sero descritas algumas destas estratgias de marketing utilizadas para a divulgao e comercializao dos produtos da Nestl relacionados indstria do leite e ao iderio das vacas felizes, construdo e alimentado na imaginao do pblico em geral. A primeira estratgia a propaganda, por meio de imagens, mensagens e/ou comerciais nos diferentes meios de comunicao, tais como televiso, revistas, web sites, redes sociais. As propagandas da empresa, em geral, falam sobre nutrio, sade e bem-estar da famlia e das crianas, vida em comunidade, sobre a beleza da maternidade, dentre outros temas interessantes ou comoventes para o pblico. Exemplo disso foi uma srie de vdeos publicitrios da marca Ninho, chamada Saber tudo que tem, faz bem[footnoteRef:2], lanada em 2014. Essa srie, formada por quatro episdios, traz histrias de mes que no conheciam toda a cadeia produtiva do leite Ninho, item apresentado como essencial da alimentao de suas crianas. Assim, um dos episdios mostra a realidade de um dos fornecedores do leite: uma fazenda idlica, pequena e familiar, na qual as vacas possuem nomes prprios, vivem livres num pasto vasto e verde e so ordenhadas por um calmo senhor num ambiente tranquilo, limpo e reservado. Alm disso, a fazenda tambm adota o programa Boas Prticas na Fazenda (ver adiante), dando a entender que realmente um modelo no que faz. Em alguns momentos, um bezerro solitrio mostrado no vdeo, sendo acarinhado pela consumidora e pela filha da proprietria. O comercial mostra imagens de todos interagindo e sorrindo. Por fim, a consumidora depe sobre sua agradvel surpresa e experincia de conhecer uma realidade que realmente atende sua expectativa inicial: encontrar vacas felizes. [2: Podem ser vistos no YouTube (https://www.youtube.com/watch?v=LjqA6ET0l6Q). ]

Outra estratgia utilizada para construir o iderio da vaca feliz" a rotulagem, utilizao de mascotes, figuras e outros smbolos atraentes associados aos seus produtos. Tais signos, junto s informaes contidas nas embalagens, representam uma das principais influncias nas decises de compra, at mesmo porque os consumidores tendem a acreditar no que est escrito ou exposto nos rtulos. De acordo com Grager (apud GRRAN, SERRALVO, 2012), a embalagem moderna uma ferramenta de marca, um vendedor e um educador muito importante. As empresas conhecem as necessidades emocionais e traam perfis psicolgicos de seus consumidores. Portanto, previsvel que ofeream exatamente o contedo que tocar tanto o aspecto racional quanto o emocional do seu pblico-alvo, por meio de diversas caractersticas, como fotos, linguagem adequada, tipografia (tipos, estilos, tamanhos e cores das letras), cores e estrutura (composio). A vaca simptica e feliz do chocolate Lollo e a vaquinha branca e lils dos campos alpinos do chocolate Milka so dois exemplos emblemticos (Figura 1). Utilizar cones que despertam emoes agradveis nos consumidores a despeito da realidade, que propositadamente ocultada e confortavelmente ignorada pela maioria da populao, vem sendo uma das tcnicas de marketing mais bem-sucedidas das grandes empresas para manter seu monoplio mercadolgico. De acordo com Silayoi e Speece (2004), os elementos visuais e informativos das embalagens exercem influncia nos sistemas afetivo e cognitivo do pblico. Estes, por sua vez, assumem papis diferentes: para compras de baixo envolvimento, ou seja, rotineiras e de baixo risco, o consumidor usa seu sistema afetivo para avaliar os elementos das embalagens, abrangendo caractersticas mais visuais e respostas mais emotivas. A marca Lollo, por exemplo, foi posteriormente substituda pela Milkybar, com logomarca e mascote diferentes. Foi uma estratgia de inovao que no deu certo e o produto foi relanado 20 anos depois. Segundo especialistas, o chocolate por si s uma comfort food, cujo consumo evoca um estado psicolgico prazeroso e confortvel (GABBAY, 2012). A marca Lollo criou uma memria afetiva residual no pblico, resultando na baixa aceitao da sua reformulao.

Figura 1. Acima e esquerda a embalagem do chocolate Lollo, lanado na dcada de 1980 e relanado 20 anos depois. Abaixo e esquerda, duas verses da vaca Milka. direita, um dos anncios comerciais do chocolate no exterior. Fonte: NESTL (2015a).

A terceira estratgia so as aes para fortalecer as relaes com os consumidores e fornecedores. A exemplo do programa Boas Prticas na Fazenda (PRODUTOR NESTL, 2015), que incentiva a adoo de procedimentos para reduzir as perdas em qualidade e produzir um leite mais seguro e saudvel. semelhante aos programas adotados na Nova Zelndia e Frana e envolve questes relacionadas sanidade animal, valorizao do produto, aumento da produtividade rentabilidade e, o ponto alto do programa, a sustentabilidade da produo. Citado no vdeo e vinculado imagem da Nestl, o programa visa aumentar sua credibilidade, alcanando o pblico, em aparente ascenso, que afirma se preocupar com a responsabilidade socioambiental das empresas. No Brasil, interessante verificar que a Nestl possui 8 fornecedores entre os 100 maiores produtores de leite, o que significa uma produo mdia de mais de 15 mil litros por dia (MILKPOINT, 2015). No entanto, as imagens que so mostradas no documento desse portal, que tem o papel de fortalecer essa indstria, divergem das vacas felizes apresentadas nos rtulos e nos comerciais (Figura 2).Nas imagens, as vacas dispem de pouqussimo espao para se movimentarem, e em trs delas esto confinadas, em ambientes fechados e sem acesso ao pasto. Mesmo que o vdeo da campanha da marca Ninho mostre uma fazenda real, que de fato fornea leite para a Nestl, ela representa uma pequena parcela dos seus fornecedores e dos demais concorrentes apenas 16% das 100 maiores fazendas brasileiras adotam o sistema de pasteio (MILKPOINT, 2015) e muitas questes sobre o processo de produo no so citadas no vdeo, como o destino dado aos filhotes das vacas leiteiras ou s prprias vacas quando param de produzir leite.Figura 2. Algumas imagens reais das fazendas e das vacas, no to felizes como nos anncios. Fonte: MILKPOINT (2015).

Um dos autores desse artigo entrou em contato com a Nestl informando sobre a realizao desse trabalho e fez perguntas para esclarecer algumas dvidas em relao a sua cadeia produtiva do leite. Aps vrios dias sem resposta, uma cobrana por retorno foi realizada e apenas nesse momento a empresa respondeu sugerindo outro setor de contato para solicitao da informao. A nova solicitao foi realizada de imediato, mas ainda sem resposta da empresa aps mais de um ms do contato inicial. As perguntas enviadas foram as seguintes:

1 - Em relao aos seus fornecedores de leite, vocs controlam as questes vinculadas ao bem-estar animal, tanto das vacas quanto bezerros? Caso afirmativo, vocs podem descrever quais so as prticas exigidas aos seus fornecedores?2 - Vocs tm conhecimento sobre a destinao dada aos bezerros (tanto s fmeas, mas em especial aos machos)?3 - O processo de gravidez feito atravs de inseminao artificial?4 - Quando no esto ordenhando, as vacas costumam ficar livres?5 - Existe alguma medicao ou tratamento (remdios, hormnios, etc) feito para que as vacas possam ter uma produo de leite maior?6 - comum que as vacas tenham mastite ou problemas decorrentes do processo de ordenha e ou medicao utilizada, provvel que o leite dessas vacas no seja misturado, correto? Mas independente disso, o que feito com elas?7 - Vocs tem ideia do tempo de vida mdio das vacas leiteiras de seus fornecedores?8 - Qual costuma ser a destinao dada s vacas mais velhas ou improdutivas?

Para uma empresa que busca ativamente construir uma imagem de que zela pelo bem-estar dos animais, seria de se esperar que respondesse prontamente s perguntas enviadas. Para entender melhor porque essas perguntas foram feitas, necessrio compreender as principais prticas da cadeia produtiva do leite, que sero tratadas no prximo tpico.

5. A cadeia produtiva do leite A vaca leiteira, outrora vista tranquilamente, mesmo idilicamente, a vaguear pelos montes, agora uma mquina de produo de leite cuidadosamente vigiada e afinada (SINGER, 2008 p. 129). O autor afirma que o quadro buclico da vaca brincando com a cria na pastagem no faz parte da produo comercial de leite, pois muitas dessas vacas so criadas em confinamento, ambientes fechados, e algumas mantidas em compartimentos individuais com espao apenas para que elas permaneam de p e se deitem. O ambiente totalmente controlado: quantidade de rao, temperatura e iluminao ajustados de forma a maximizar a produo (SINGER, 2008). A realidade brasileira se aproxima da americana e europeia. Dados da Milkpoint (2015a) informam que dos 100 maiores produtores brasileiros em 2014, apenas 16 utilizam o sistema de produo de pastejo (aquele apresentado pela Nestl em seu comercial). Entre os dez maiores, esse percentual se reduz a apenas 1 deles. 61 propriedades utilizam o sistema de confinamento, e o restante de semiconfinamento. Na situao mais comum dentro dessa indstria, aps ter sido retirada a primeira cria, d-se o incio do ciclo produtivo do animal, onde a vaca ordenhada duas a trs vezes ao dia, durante 10 meses, e aps o terceiro ms de novo emprenhada, ser ordenhada at pouco antes do nascimento do bezerro e voltar a s-lo logo que a cria lhe seja retirada (SINGER, 2008). Tais dados so corroborados pela EMBRAPA (2002). Vacas leiteiras saudveis, em um ambiente favorvel, podem viver at 25 anos. uma situao bem diferente da encontrada na indstria leiteira: as vacas ficam prenhes uma vez por ano durante trs a seis anos, depois disso, muitas delas so vendidas para serem transformadas em produtos de carne baratos (REGAN, 2006; SINGER, 2008; FELIPE, 2012). Regan (2006) informa que no contexto americano, o principal destino virar hambrguer - 40% do que vendido nos mercados e restaurantes vem da carne de vacas leiteiras descartadas. Felipe (2012) tambm confirma esse fim para as vacas brasileiras.A manipulao gentica e o cruzamento seletivo, atravs de inseminao artificial, chegam a aumentar em at 10 vezes a capacidade produtiva normal da vaca, que atingem at 44 litros de leite por dia (REGAN, 2006). Quando empresrios e zootcnicos concluem que a produtividade est baixa, seu prximo passo criar novas formas de alimentar as vacas para que suas glndulas mamrias sejam estimuladas ao mximo (FELIPE, 2012). Como resultado disso, existe um excesso de peso, que tenciona o bere e agrava os danos aos joelhos e ancas, de 20% a 40% desses animais sofrem de mastite, uma inflamao do bere (REGAN, 2006; SINGER, 2008), alm de claudicao, uma afeco do casco bovino bastante comum, mas pouco diagnosticada e controlada pelos produtores, que provoca dor e desequilbrio locomotor (BOND et al, 2012). Mastite, laminite, depresso ps-parto recorrentes, gases formando borbulhas no interior do abdmen todos os dias, so apenas algumas das consequncias para as vacas leiteiras (FELIPE, 2012). Conforme a autora (p. 246) toda vaca usada para a extrao do leite morta, depois de sofrer durante anos as intervenes humanas voltadas para arrancar dela o maior volume possvel desse lquido ao menor custo financeiro para o empresrio. Muitos autores tambm relatam que a seleo gentica para alta produo reduz a fertilidade e longevidade dos animais, alm de elevar os ndices de doenas (BOND et al, 2012).Alm de infligir sofrimento s vacas, a produo de leite tambm afeta os bezerros, que quando no podem ser utilizados pelo prprio produtor de leite, so vendidos para a indstria de carne de vitela ou criados para o abate, para a indstria do couro (ANDA, 2015). A carne de vitela, especialmente a rosada, de bezerros alimentados com leite famosa pela sua maciez - sem msculo e cartilagem, que possibilitam ser cortada com o garfo - e destaque entre os pratos que algumas pessoas consideram entre os mais refinados, preparados pelos melhores chefs, principalmente franceses e italianos (REGAN, 2006). Mas para que os bons apreciadores da comida tenham essa experincia especial existe toda uma implicao a vida desses bezerros. Para Singer (2008), de todas as formas de agricultura intensiva atualmente praticadas, a indstria de vitelas a mais repugnante em termos morais. Milhares de bezerros excedentes de rebanhos leiteiros so retirados das suas mes e vendidos horas ou poucos dias aps o nascimento - recomendado pela indstria menos de 7 dias (REGAN, 2006). A separao precoce da vaca e do bezerro um ponto crtico de bem-estar, devido ao alto nvel de estresse que provoca (GREGORY, 1998 apud BOND et al, 2012). Algumas informaes sobre a criao e abate de vitelos tambm so fornecidas pela Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuria (EMBRAPA, 2015):

Vitelos (veal ou veau de boucherie) podem ser obtidos de bezerros abatidos at as 20 semanas de idade. Geralmente, esses bezerros so de origem leiteira, a maioria deles holandeses, alimentados exclusivamente com leite e/ou sucedneos do leite. H diferentes tipos de vitelos, podendo-se classific-los de acordo com a idade de abate [menos de 4 semanas, entre 4 e 12 semanas, entre 12 e 20 semanas].

Fato curioso o que o documento no traz informaes detalhadas sobre as instalaes onde ficam os vitelos, apenas menciona exemplos de outras unidades produtivas que usam o confinamento total ou o manejo dos vitelos em grupos sociais. O documento, sem especificao de autoria, aponta que importante possuir mais de uma unidade de instalao, pois permite a limpeza, desinfeco e repouso da baa j utilizada. Por fim, coloca que o ambiente escuro mantm os bezerros quietos, aumentando a performance (EMBRAPA, 2015, p. 10). Para Bond et al (2012), essa escassez na literatura a respeito do bem-estar dos bezerros machos crtica e, ao mesmo tempo, confortvel, j que os animais so tratados como um subproduto do sistema, tendo como destino mais comum o abate precoce, a criao de vitelo (que no molde tradicional oferece restries severas) ou o consumo na prpria fazenda. A dinmica da indstria do leite tambm foi descrita por Irvnia Prada, mdica veterinria, professora e orientadora do curso de ps-graduao em Anatomia dos Animais Domsticos e Silvestres, da Faculdade de Medicina Veterinria e Zootecnia da USP, em entrevista rdio EBC (2014). Ela afirma que o setor no tem nenhum interesse legtimo pelo bem-estar dos animais e narra sobre situaes de estresse, desconforto e sofrimento que fazem parte do cotidiano da grande maioria dos estabelecimentos que compem a indstria leiteira no Brasil.

6. Existem realmente vacas felizes na indstria do leite?Historicamente, o bem-estar dos animais de produo foi ofuscado pela busca de melhores ndices zootcnicos. Desde a dcada de 1960, na Unio Europeia, por meio de iniciativas como o livro Animal Machines (HARRISON, 1964), e, principalmente, o livro Libertao Animal (SINGER, 1975) e suas reverberaes a sociedade passou a conhecer os sistemas de produo animal e a exigir a criao de animais de maneira humanitria. Atualmente, produtos oriundos de sistemas de mais alto grau de bem-estar apresentam valores agregados, de ordem econmica e tica, atendendo demanda de um nicho especfico de mercado. Adicionalmente, a demanda social levou elaborao de legislao especfica a respeito do bem-estar animal, a qual provavelmente originar o estabelecimento de barreiras comerciais entre pases. Dessa forma, parece interessante o desenvolvimento de pesquisas na rea de diagnstico de bem-estar, para que se possa subsidiar a elaborao de leis e o controle do bem-estar animal nos sistemas produtivos (BOND et al, 2012).Assim, para que esses avanos ocorressem, foi preciso uma gama enorme desses estudos e pesquisas em relao as questes fisiolgicas, conceituais, filosficas dos animais no-humanos, e das suas inseres no nosso cotidiano. Peter Singer (2008) aborda a temtica da dominao e explorao desmedida dos animais no-humanos pelos humanos como uma das formas mais latentes de tirania e opresso presentes na sociedade, sintetizadas pelo conceito de Especismo. Diferente do que o especismo aponta, a cincia tem mostrado que o desenvolvimento fisiolgico dos animais, em sua capacidade inerente de padecer de dor e sofrimento, de uma forma semelhante nossa a sencincia cobra uma reestruturao das nossas relaes com as outras espcies, na forma de um alargamento dos seres participantes da esfera moral. Isto porque, uma vez que h seres que sofrem, no nos facultado a opo de no considerar seus interesses no momento de nossas aes. A tica animal tem, pois, como princpio fundamental, a igual considerao de interesses entre seres semelhantes.Se uma empresa diz que suas vacas so felizes, est implcito que ela se preocupa com o bem-estar dos animais. Tendo a Nestl o interesse em no mudar a relao instrumental existente com os animais (em especial as vacas leiteiras), esta se utiliza das imagens, a publicidade e a produo terica com um vis argumentativo bem-estarista, que como visto uma degradao conceitual dos objetivos da tica animal. O bem-estarismo se apresenta num dos polos menos transformadores dos debates em relao tica animal, j que o objetivo ltimo da libertao animal, como apresentado por seu precursor Tom Regan (2006 p. 75) que temos de esvaziar as jaulas, no deix-las maiores. Na perspectiva bem-estarista, e da adoo deste conceito pelas grandes coorporaes, tem por intento, no melhorar vertiginosamente a condio da explorao e uso dos animais em sua cadeia produtiva, mas, emblematicamente, promover um sustento e at mesmo um aumento de suas vendas, apresentando-se pelo dito desconexo como empresa que se preocupa, no s com a qualidade de seus produtos, mas pela forma humanizada de utilizao dos animais no-humanos em sua cadeia produtiva de alto impacto. A propaganda enganosa sobre os benefcios e a omisso sobre os malefcios do leite para a sade humana cerceiam a mente dos consumidores, esta propaganda omite os ingredientes danosos sade humana, como hormnios, pesticidas, clcio em excesso sem equilbrio de magnsio, pus (FELIPE, 2012 p. 195). A autora, em seu livro Galactolatria (2012), ataca de maneira veemente a indstria do leite em seus aspectos morais, ambientais e sobre a sade humana. Ela enfatiza o poder das grandes marcas alimentcias no estabelecimento dos padres dietticos seguidos pela populao, seja pela grande verba utilizada em propagandas, ou pelo financiamento que pode gerar a no-iseno de cientistas e polticos. As cifras movimentadas pelo negcio laticnio so um poder suficiente para embotar a capacidade de ao de governantes e polticos de modo geral (FELIPE, 2012 p. 215). Ao consumidor individual, segundo a autora, a nica sada tica para no assinar sua coautoria na devastao ambiental, na dor e sofrimento das vacas escravizadas sexualmente, e dos males para o seu prprio corpo, uma dieta abolicionista (vegana). Neste ponto, do papel da linguagem e do discurso como ferramentas fundamentais para legitimao e manuteno dos contextos da explorao animal, temos que h ainda uma utilizao peculiar dos significados das palavras pelas empresas cobradas a dar respostas sobre a qualidade de vida dos animais em sua cadeia produtiva. Uma vez que a linguagem uma arma poderosa, tanto para o bem quanto para o mal, e a retrica dos exploradores de animais no nenhuma exceo (REGAN, 2013, p. 18), esta peculiaridade, apresenta-se na construo de discursos numa esfera apenas pr-forma, com palavras e conceitos bem quistos, mas que quando aplicados e analisados sob a tica da efetiva da explorao animal nas suas cadeias produtivas, mostram-se como contradies insolveis. Assim, dada esta cooptao das temticas da tica Animal pelo marketing empresarial ligado aos produtos de derivados animais da Nestl, em contraste com as reais materialidades de sua cadeia produtiva do leite, percebemos uma desconexo nevrlgica entre o discurso e o factual. Tal desconexo, pode ser entendida, como j mostramos, como o que Regan (2006) entende por dito desconexo. O dito desconexo aparece, pois, como a estratgia de ao adotada pelas organizaes para reagir quanto a demanda sobre os direitos animais, sendo a estratgia mais rentvel, j que promove mudanas apenas em discurso, no na prtica. Dado que os consumidores no tem acesso, nem interesse, nem o detalhamento da situao dos animais, esta estratgia consegue funcionar bem. Quando questionamos a Nestl sobre suas prticas de bem-estar animal, a mesma calou as perguntas, pois descrever a realidade de seus fornecedores, entrar em choque com uma preocupao real de bem-estar animal, ou seja, sade, felicidade, conforto, satisfao. Nessa perspectiva, nossa anlise do dito desconexo, presente no mito das vacas felizes da Nestl, aponta ainda, para uma importante problemtica, a legislao vigente, aquela que normatiza as atividades com explorao animal e que cobram adequao das empresas aos conceitos de bem-estar animal e tratamento humanitrio, apresenta-se ainda em um carter ou incipiente, dada a jovialidade da temtica, ou insuficiente, pelo motivo anterior e pelas foras econmicas e polticas contrrias ampliao dessas regras, ou sem efetividade de fiscalizao ou cumprimento das punies. Ou seja, um caso emblemtico em que legalidade e justia encontram-se em polos dissonantes, j que,

[] o tipo de proteo legal que os animais recebem parte do problema, no parte da soluo. O fato de existirem to poucas violaes da lei em vigor no mostra que os animais so bem tratados, mas que os padres legais de tratamento humanitrio esto abaixo do mnimo, e que o trabalho de assegurar que pelo menos esses padres sejam seguidos deplorvel (REGAN, 2006, p.99, grifos do autor)

Portanto, a criao no imaginrio do pblico consumidor de uma realidade onde a vaca feliz no s existe, mas a regra, tanto resultado de todas as tcnicas especializadas de marketing, quanto da prpria alienao inerente a nossa sociedade. Apesar do caso aqui ilustrado ser da gigante de alimentos Nestl, podemos tambm considerar que as demais organizaes que tem sua linha de produo industrializada ou seja, que utilizam o processo produtivo de confinamento ou que executam as demais atividades aqui relatadas, no mnimo, incorrem em maus-tratos e violncia para com esses animais, e so passveis de serem questionadas quanto a aes do dark side. Afinal, mesmo se muitos tericos no incluam os animais dentro da esfera de considerao moral, verificamos que parte dos consumidores e sociedade o fazem.

7. ConclusesA partir da perspectiva da tica animal, baseada na sencincia e de acordo com a reviso da literatura, podemos constatar que as vacas leiteiras sofrem com uma vida privada de liberdade, ausncia de sua cria, condies precrias de sobrevivncia, alimento inadequado, inflamaes e outras doenas, alm da antecipao do perodo de vida com uma morte prematura. Os vitelos, subprodutos da indstria leiteira, tem um destino igualmente sofrido, por menor tempo, mas muitas vezes em piores condies (SINGER, 2008, REGAN, 2006). O sistema industrial de extrao do leite trata as vacas como objetos destitudos de sensibilidade, mente e conscincia (FELIPE, 2012 p. 37). Quando uma grande indstria leiteira afirma que suas vacas so felizes, ela est claramente realizando uma propaganda enganosa e induzindo o consumidor a acreditar numa histria para boi dormir.Deste modo, quando a Nestl, maior captadora e processadora de leite fresco do pas (NESTL, 2015b), resolve fazer uma propaganda para mostrar vacas felizes, ela assume que isso deve ser importante para algum. Esse algum so seus consumidores, pois afinal, a propaganda direcionada a eles, e em nenhuma outra situao em seu site e informaes oficiais ela aprofunda ou cita essa preocupao interna. Nem mesmo no seu programa de Boas Prticas na Fazenda (BPF), que atravs da gesto tem como objetivo qualidade e segurana da produo com ganhos de produtividade e rentabilidade (NESTL, 2015) e no a considerao dos interesses dos animais, ou os aspectos de seu bem-estar. Eles no esto preocupados com a sade das vacas e vitelos, a no ser na medida em que suas doenas e sofrimento possam afetar os lucros de seus negcios (FELIPE, 2012). Alm disso, quando a empresa assume que deve ser dado um bom tratamento s vacas, e no o faz, seus gestores agem de maneira imoral, configurando-se no conceito do dito desconexo, o que eles dizem no correspondem ao que fazem (REGAN, 2006), uma espcie de resposta falaciosa s preocupaes externas com o bem-estar e tratamento humanitrio dos animais; uma pura estratgia de marketing para atender demanda dos consumidores e da legislao vigente. Agir contra o consumidor, atravs de propaganda enganosa, considerado um crime corporativo (MEDEIROS, 2013; LINSTEAD, MARCHAL e GRIFFIN, 2014) e atuar com violncia e reduzir o tempo de vida de outros indivduos (as vacas e bezerros) tambm pode se enquadrar no dark side das organizaes; com o agravante que estamos falando de milhares de indivduos, cujos sofrimentos e mortes se transformaram em um fato banal.Por conseguinte, a criao de uma imagem que no condiz com as prticas efetivas da organizao em relao ao bem-estar dos animais, e sem a real considerao dos seus interesses morais destes, enquanto indivduos dentro de uma esfera da moralidade ampliada pela crtica ao especismo incorre numa dupla contradio na perspectiva do dark side das organizaes: causar dor, sofrimento e morte aos animais e fazer propaganda enganosa.

RefernciasALMEIDA, L. N.; RIBAS, J. R.; LEANDRO, A. S. Os formadores de opinio na alimentao infantil.Rev. adm. contemp., Curitiba, v. 14,n. 4,p. 761-774,Aug. 2010. ALCADIPANI, R. S.; MEDEIROS, C. R. O. Viver e morrer pelo trabalho: uma anlise da banalidade do mal nos crimes corporativos. O&S - Salvador, v. 21 - n. 69, p. 217-234 - Abril/Junho 2014ANDA. Agncia de Notcia de Direitos Animais. Bezerro resgatado da indstria de laticnios e se recupera em santurio. Disponvel em: . Acesso em: 03 de ago. 2015.BARRETO, T. F., BACELAR, D. F., LIMA, M. H. C. C. A., LORETO, M. S. S. Soltando os cachorros: A invasao do Instituto Royal e o Dark Side das organizacoes a partir da perspectiva da Etica Animal In: II CBEO, 2014, Uberlandia. II Congresso Brasileiro de Estudos Organizacionais CBEO. , 2014.BOND, Guilherme Borges et al . Mtodos de diagnstico e pontos crticos de bem-estar de bovinos leiteiros.Cienc. Rural, Santa Maria, v. 42,n. 7,p. 1286-1293,jul 2012 . EBC. Programa Amaznia brasileira. Saiba como a separao de vacas e bezerros para produo de leite. Disponvel em: . Acesso em: 20 jul. 2015.EMBRAPA. Gado de leite. 2002. Disponvel em: . Acesso em 20 jul. 2015.______. CT 42 Vitelos. Disponvel em: . Acesso em 20 jul. 2015.FEIJ, A.; SANTOS, C.; CAMPOS GREY, N. 2010. O animal no-humano e seu status moral para a cincia e o Direito no cenrio brasileiro. Revista de Biotica y Derecho, v. 19, 2010.FELIPE, S. T. Galactolatria: mau deleite. implicaes ticas, ambientais e nutricionais do consumo de leite bovino. So Jos, SC: Ed. da autora, 2012.FRANCIONE, G. Abolition of Animal Exploitation: The Journey Will Not Begin While We Are Walking Backwards. 2011. Disponvel em: . Acesso em: 21 de Julho de 2015.___________. Animal Rights Theory and Utilitarianism: Relative Normative. in Guidance. Between the Species, 3, 2003.___________. The Animal Rights Debate: Abolition or Regulation. Columbia: Columbia University Press, 2010.___________. Eat Like You Care: An Examination of the Morality of Eating Animals. Exempla Press, 2013.GABBAY, L. A. Comportamento alimentar comfort food. Disponvel em: http://www.brpress.net/index.php?option=com_content&view=article&id=7198:comportamento-alimentar-comfort-food&catid=297:comportamento-alimentar&Itemid=153. Acesso em: 18 jul 2015.GRRAN, V. G.; SERRALVO, F. A. A influncia dos aspectos visuais das embalagens na formao das atitudes: um estudo no setor de alimentos. Revista Administrao em Dilogo, v. 14, n. 2, mai/jun/jul/ago 2012, p. 169-194.INSTITUTO AKATU. Pesquisa AKATU 2012: rumo a sociedade do bem-estar. Sao Paulo: Instituto Akatu, 2012.INSTITUTO NIELSEN. O consumidor com preocupacoes sociais ao redor do mundo. Relatorio da Nielsen Company. 2012.LINSTEAD, S. A.; MARECHAL, G.; GRIFFIN, R. W. (2014). Theorizing and Researching the Dark Side of Organization. Organization Studies, v. 35.__________, S. A.; ___________, G. ; ________, R. W. Special Issue on The Dark Side of Organization. Organization Studies, Call for Papers, v.31, p. 997-999, 2010.MARCELINO, R. M. A.; GRACIOSO, F.. O novo paternalismo de Ivan Zurita: exemplo de gesto orientada para liderana. Revista da ESPM, v. 14, ano 14, ed. 4, jul/ago 2008, p. 8-19. MEDEIROS, C. R. O. Crimes corporativos e estudos organizacionais: uma aproximao possvel e necessria.Revista de Administrao de Empresas, v. 55, n. 2, p. 202-208, 2015.__________, C. R. O. Inimigos Pblicos: Crimes Corporativos e Necrocorporaes. So Paulo: FGV, 2013. 314 f. Tese (Doutorado em Administrao) - Escola de Administrao de Empresas de So Paulo, Fundao Getlio Vargas, So Paulo, 2013.MILKPOINT. Levantamento Top 100 2015 Os 100 maiores produtores de leite do Brasil. Disponvel em: Acesso em: 19 jul 2015. ___________. Top 100 MilkPoint 2015: 100 Maiores produtores de leite do Brasil crescem 9,4% em 2014. Disponvel em:< http://www.milkpoint.com.br/cadeia-do-leite/giro-lacteo/top-100-milkpoint-2015-100-maiores-produtores-de-leite-do-brasil-crescem-94-em-2014-93643n.aspx>. Acesso em: 22 de julho de 2015. (2015a)MORGAN, G. Imagens da organizacao. Sao Paulo: Atlas, 1996.NESTL. A Nestl. Disponvel em Acesso em 20 de julho de 2015._______. Marcas. Disponvel em Acesso em: 18 jul 2015. (2015a)_______. Fornecedores e parceiros. Disponvel em . Acessi em: 23 de jul 2015. (2015b)PRODUTOR NESTL. Programas Nestl: Boas Prticas na Fazenda (BPF). Disponvel em: Acesso em 19 jul. 2015.SILAYOI, P.; SPEECE, M. Packaging and purchase decisions: a focus group study on the impact of involvement level and time pressure. British Food Journal, v. 106, n. 8, 2004, p. 607-628.SINGER, P. Libertao Animal. So Paulo: Martins Fontes, 2008.REGAN, T. Jaulas vazias: encarando o desafio dos direitos animais. Lugano. Porto Alegre, 2006.______. A causa dos direitos animais. In Revista Brasileira de Direito Animal,Vol. 8, No 12, 2013._______. T. Empty Cages: Facing the Challenge of Animal Rights. MARYLAND: Rowman and Littlefield, 2004._______. Defending Animal Rights. ILLINOIS: University of Illinois Press, 2001.VAUGHAN, D. The dark side of organizations: Mistake, misconduct, and disaster. Annual Review of Sociology, v. 25, p. 271305, 1999.VISTA-SE. O maior portal vegetariano do Brasil. Noticias. Disponivel em: . Acesso em: 06 ago. 2013.______. Interesse da populao brasileira pelo veganismo aumentou mais de 500% nos ltimos 5 anos. Disponvel em . Acesso em 01 ago. 2015