o programa bolsa familia-seus efeitos sociais na região do nordeste
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TTULO DO TRABALHO:
O Programa Bolsa-Famlia: seus efeitos econmicos e sociais na regio Nordeste do Brasil
RESUMO:
Este trabalho se prope a realizar uma anlise sobre a atuao do Programa Bolsa-Famlia
no Nordeste brasileiro. A escolha desse tema justifica-se medida que o padro de
desenvolvimento adotado pela economia capitalista, fruto da reestruturao produtiva
liderada pela hegemonia do capital financeiro, contrasta com a pobreza nordestina
constituda no s mais pelos idosos e deficientes fsicos, mas tambm por trabalhadoresativos, pelas vtimas do desemprego estrutural, pelos jovens sem qualificao profissional,
entre outras razes. neste contexto, que o debate ressurge frente s crescentes
demandas sociais. Como procedimento metodolgico realizou-se uma reviso bibliogrfica
abrangendo distintas interpretaes para trajetria histrica da poltica social. Assim,
constata-se que as polticas sociais vm contribuindo para reduzir os elevados ndices de
pobreza, melhorando o perfil das desigualdades sociais. O Bolsa-Famlia tem expandido
gerando efeitos relevantes, mas ainda insuficiente para gerar mudanas estruturais. O
ideal seria a poltica social estar articulada com a econmica criando mecanismos capazes
de viabilizar projetos de desenvolvimento auto-sustentado.
Palavras-Chave: Crescimento e Desenvolvimento Regional; Regio Nordeste; Poltica
Social; Programa Bolsa-Famlia.
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1 INTRODUO
As recentes transformaes que ocorreram no interior da economia mundial, frutos
da reestruturao produtiva capitalista, liderada pela hegemonia do capital financeiro,repercutiram diretamente na estrutura social dos pases, alterando sua tradicional
capacidade e forma de interveno social. Neste contexto, a atual pobreza constituda no
s mais pelos idosos e deficientes fsicos, mas tambm por trabalhadores ativos que
possuem salrios deteriorados, pelas vtimas do desemprego estrutural, pelos jovens sem
qualificao profissional que no conseguem se inserir no mercado de trabalho, entre outras
razes, fez ressurgir o debate sobre as possibilidades e os limites dos tradicionais
programas sociais frente s crescentes demandas sociais.
No Brasil, a situao no diferente. Tendo em vista que, nas dcadas de 1980 e1990, o pas apresentou um baixo dinamismo econmico, com taxas de crescimento inferior
mdia das economias emergentes, bem como dos pases latino-americanos, no seguindo
a expanso mundial, somado, ainda, aos efeitos do processo de financeirizao da
economia e da desregulamentao das relaes capital-trabalho, a sociedade brasileira
passou a conviver com altos ndices de desemprego e, conseqentemente, com o
crescimento da taxa de pobreza, incorporando novos processos de excluso social. Com
isso, a poltica social teve que ser progressivamente redimensionada, procurando se
adequar ao quadro de possibilidades oferecidas pela ordem econmica neoliberal.Esse padro de crescimento econmico adotado pelo Brasil contribuiu para
aprofundar o processo acelerado de concentrao de riquezas, cujo resultado culminou na
existncia de uma pequena parcela da populao que acumulou bens e capital, enquanto
um conjunto significativo da populao permaneceu destituda da riqueza produzida no pas.
No entanto, essa realidade social frente ao legado de assimetrias histricas e estruturais,
incompatvel com o potencial de crescimento econmico socialmente construdo vem
mostrando sinais de melhoria na condio de vida dos pobres, que alm da elevao da
renda tambm tem tido um maior acesso aos bens durveis e de servios.
Neste novo cenrio, as polticas pblicas estimuladoras do desenvolvimento social
realizaram um papel estratgico. Com efeito, as mudanas que vem ocorrendo alteraram o
bem-estar dos indivduos, gerando um considervel interesse entre os policy-makers,
gestores pblicos, polticos, pesquisadores, acadmicos, entre outros, em ampliarem seus
estudos, a fim de encontrar novas alternativas para os processos sociais. De modo geral, na
literatura econmica parece consensual a discusso de que a principal causa da pobreza
brasileira reside no grau de desigualdade na apropriao da riqueza, conformada
historicamente. Por fora disso, o encaminhamento da questo social no Brasil requer uma
transformao das estruturas econmica e poltica, ao mesmo tempo.
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diante deste contexto, que os programas de transferncia direta de renda, mais
especificamente o Programa Bolsa-Famlia (PBF), tm buscado compensar a populao de
baixa renda dos efeitos do parco dinamismo econmico brasileiro, que predominou nos anos
80, 90 e incio do sculo XXI, dando origem s novas propostas de gesto e operao dasprticas de proteo social. Para tanto, algumas questes surgem: possvel combater a
pobreza apenas com transferncia monetria? Qual tm sido os alcances e os limites
desses programas no enfrentamento da pobreza? A ampliao e a integrao das polticas
de transferncia direta de renda, em particular do PBF, vm contribuindo para reduzir os
problemas de pobreza e de desigualdade, ou, ao contrrio, so formas compensatrias que
apenas aliviam esses problemas deixando intacta a velha questo social brasileira?
Estas indagaes motivaram a realizao deste trabalho, partindo da constatao da
importncia de aprofundar os estudos sobre os programas de transferncia direta de renda,em particular do PBF. Essa opo teve origem no conjunto de observaes empricas e
questionamentos tericos e polticos por parte de vrios estudiosos e pesquisadores que
vem mostrando a preocupao em dimensionar a existncia e a magnitude dos fenmenos
sociais no Brasil. Uma vez que, o acesso a um bem ou servio deixou de ser um indicativo
suficiente para a compreenso da condio de superao de pobreza, o desafio de se
estudar e analisar esse tema elevou-se, deixando-o mais amplo e complexo.
Nesta perspectiva, este trabalho se prope a realizar uma anlise de cunho
econmico e social sobre a atuao do PBF na regio Nordeste do Brasil. Para tanto, como
procedimento metodolgico, realizou-se um breve levantamento da literatura econmica,
abrangendo distintas interpretaes para a trajetria histrica da poltica social brasileira.
Alm disso, foi feito um tratamento estatstico para os dados coletados pela internet atravs
dos sitesoficiais como IBGE, IPEA, MDS, PNUD, entre outros.
A fim de cumprir o objetivo proposto acima, o presente texto, alm desta breve
introduo, est assim organizado: na segunda parte uma sucinta trajetria histrica da
Poltica Social Brasileira traada a partir da Constituio Federal de 1988 (CF/1988); na
terceira parte examina-se, de forma simplificada, a temtica sobre os programas de
transferncia direta de renda, tomando como ponto de partida as diferentes posies
ideolgicas que vo desde a tica liberal at as que defendem uma viso mais redistributiva
de cunho mais progressista; na quarta parte, destaca-se o PBF orientado pela perspectiva
de contribuir para a incluso social de famlias pobres e extremamente pobres, para tanto
uma discusso mais geral sobre a sua formulao e implantao realizada a partir da
problematizao de alguns aspectos do desenho do programa; na quinta parte procura-se
enfocar a atuao do PBF na regio Nordeste. Por fim, finaliza-se este trabalho tecendo
algumas consideraes finais sobre as possibilidades e limites que o PBF apresenta para o
crescimento e desenvolvimento da regio Nordeste do Brasil.
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2 A TRAJETRIA HISTRICA DA POLTICA SOCIAL: O SISTEMA BRASILEIRO DEPROTEO SOCIAL (SBPS)
As transformaes econmicas, polticas, sociais e culturais que ocorreram ao longo
dos ltimos anos nas quais se deram o processo de industrializao e de urbanizao dasociedade brasileira resultaram na expanso das cidades, no aumento demogrfico e no
aprofundamento da situao social. Assim, elevaes das taxas de pobreza, do
desemprego, da falta de moradia, entre outras, colocaram em evidncia a questo social e o
papel do Estado. Nas palavras de POCHMANN (2005, p. 23) [...] construiu-se um pas para
poucos, em que a maior parte das transformaes ocorridas aconteceu sem mudanas de
natureza estrutural, bloqueando a incluso social plena.
O esforo estatal, reconhecido pela construo do SBPS, de estruturar um conjunto
de polticas e programas, especificamente os das reas sociais previdncia, assistncia
social, trabalho, alimentao, sade, educao, alm de habitao e saneamento,
destinados prestao de bens e servios, bem como transferncia de renda teve como
objetivo garantir direitos sociais; equalizar as oportunidades; reduzir os riscos sociais; e,
enfrentar as condies de pobreza. Os amplos estudos desenvolvidos desde meados da
dcada de 1980 vm caracterizando o SBPS como insuficiente para o progresso de uma
sociedade mais justa e menos desigual (CARDOSO JNIOR; JACCOUD, 2005).
Mesmo assim, o amplo SBPS concebido pelo Estado, dotado de instituies,
recursos humanos e fontes de financiamento que garantem a implementao das polticas
sociais, contribuiu para os crescentes avanos das condies de vida, inclusive da regio
Nordeste do Brasil, expressos na melhoria de alguns indicadores sociais como a taxa de
analfabetismo, a expectativa de vida e a mortalidade infantil (vide Tabela 7, p. 29). No
obstante, a sua heterogeneidade e ineficincia so apenas algumas das dificuldades, no
desprezveis, para a anlise acadmica, reafirmando sua importncia para um estudo mais
detalhado do processo de reorganizao do sistema social.
Neste contexto, a CF/1988 tentou superar o antigo sistema de proteo social
marcado pelo autofinanciamento excludente e no-distibutivo, procurando instituir as bases
para a organizao de um sistema universal e garantidor de direitos. Deste modo, ao
mesmo tempo em que se exigiram esforos de reorganizao das polticas j existentes, a
criao de novas garantias de proteo social levou criao de um novo conjunto de
intervenes por parte do Estado brasileiro. Neste sentido, os autores CARDOSO JNIOR e
JACCOUD (2005, p. 195) vo alm da anlise dos espaos abertos ao estatal, ao
refletirem: [...] em que medida o campo da proteo social aberto pela nova Constituio
provoca a construo ou reconstruo de eixos diferenciados de polticas sociais, em tornodos quais passam a se desenvolver polticas articuladas e tenses especficas? O
redesenho da poltica social brasileira o tema do prximo subitem.
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2.1 O REDESENHO DA POLTICA SOCIAL BRASILEIRA NA CF/1988
A federao brasileira, ao longo de sua trajetria histrica, viveu ciclos alternados de
centralizao e descentralizao, nos quais os governos subnacionais dispunham de maiorou menor autonomia poltica e oramentria. Com a redemocratizao poltica a partir de
1984 deu-se incio a mais uma fase descentralizadora, culminando na promulgao da
CF/1988. Neste processo, a redemocratizao, o reconhecimento dos direitos sociais e o
reordenamento das polticas sociais marcaram os novos princpios de reestruturao do
SBPS.
Sem pretender esgotar o assunto, alguns pontos merecem ser analisados, por
caracterizarem um campo de divergncias tericas, tendo na CF/1988 o elemento-chave
para a luta pela redefinio da poltica social brasileira. O primeiro ponto diz respeito criao do Sistema de Seguridade Social, que engloba a Previdncia, a Sade e a
Assistncia Social, incorporando cidadania uma maioria que vivia margem do mercado
de trabalho formal e sempre esteve fora de qualquer mecanismo pblico de proteo social.
O segundo ponto tem por referncia as possibilidades de uma cidadania ativa, dada pela
CF/1988, uma vez que os programas sociais foram colocados sob a gide de polticas
pblicas, pautadas pelos critrios universais da cidadania, dando maior visibilidade aos
direitos sociais.
Pode-se ento afirmar que, a sociedade brasileira decidiu, atravs de seusrepresentantes na CF/1988, por um novo pacto social, por novas formas de financiamento
das polticas pblicas, nas quais os oramentos pblicos passaram a incorporar parcelas
crescentes de recursos para o financiamento da seguridade social e das polticas sociais
direcionadas para o combate pobreza e fome. Tal pacto esteve, desde o seu incio, em
consonncia com as propostas dos organismos internacionais, entre os quais as
recomendaes emanadas da Organizao Internacional do Trabalho (OIT), que tem
concentrado seus esforos na defesa de condies bsicas de trabalho e no
estabelecimento de determinados padres mnimos sociais. Essa instituio, assim como o
Banco Mundial favorvel s polticas de combate pobreza com o objetivo de garantir o
exerccio da cidadania frente ao avano da desregulamentao econmica.
Foi nesse contexto, que o governo brasileiro passou a desenvolver iniciativas de
integrao das polticas sociais, iniciadas pela agregao das trs polticas, com o intuito de
garantir o acesso e os recursos a toda populao, de acordo com os princpios que orientam
todo o sistema: a universalidade da cobertura e do atendimento; a uniformidade e
equivalncia dos benefcios rurais e urbanos; a seletividade e distributividade na prestao
de servios; a irredutibilidade no valor dos benefcios; a diversidade da base de
financiamento estruturada no Oramento da Seguridade Social; a eqidade na forma de
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participao no custeio; e o carter democrtico dos subsistemas da seguridade social, ou
seja, a Previdncia, a Sade e Assistncia (IPEA, 2007; CF/1988, Ttulo VIII, Cap. II, Seo
I, art. 194, pargrafo nico).
Entre os estudiosos da ao pblica, no existe consenso quanto integrao dastrs polticas acima referidas. Ao contrrio, as iniciativas de integrao das polticas sociais
suscitaram diferentes reaes, argumentos e manobras polticas, desde o seu incio. A
literatura de cunho mais ortodoxa deixa claro que a juno da Previdncia, Sade e
Assistncia Social no um arranjo adequado. Nesta defesa argumenta que essas polticas
so constitudas por programas distintos, com diferentes fontes de financiamentos e
objetivos diversos. Na verdade, mesmo reconhecendo a importncia e os avanos no s
na rea de sade, mas tambm nas reas da previdncia e assistncia social, no se pode
negar que a Seguridade Social da forma como foi pensada nunca foi efetivamenteimplantada no Brasil.
J os defensores da integrao argumentam que foi um mecanismo indispensvel
para a concretizao dos direitos sociais, guiados pelos princpios da universalizao.
Entretanto, tais inovaes coincidiram com o perodo da ascenso neoliberal, que imps
uma srie de limites e desafios efetivao de um padro de cidadania social-democrata. O
conjunto de direitos, arduamente conquistados, ao ser submetido aos princpios neoliberais
apresentou um descompasso entre o que constava formalmente na CF/1988 e a sua
operacionalizao.
Na verdade, com a CF/1988, o direito social tornou-se o fundamento do redesenho
da poltica social. O comprometimento do Estado com o sistema, projetando um acentuado
grau de proviso estatal pblica e o papel complementar do setor privado tambm foi
garantido. A concepo da seguridade socialcomo forma mais abrangente de proteo e,
no plano organizacional, a descentralizao das polticas sociais e a participao social
como diretrizes do reordenamento institucional do sistema, foram estabelecidos e
normatizados. As polticas sociais passaram a ter como objetivo fundamental o atendimento
de necessidades e direitos sociais que afetavam vrios dos elementos que compem as
condies bsicas de vida da populao, principalmente, aqueles que diziam respeito
pobreza e desigualdade social.
Em sentido mais amplo, pode-se dizer que a poltica social passou a garantir
segurana ao indivduo em determinadas situaes de dependncia, entre as quais se
podem citar: incapacidade de ganhar a vida por conta prpria em decorrncia de fatores
externos, que independem da vontade individual; posio vulnervel no ciclo vital do ser
humano (crianas e idosos, por exemplo); ou situaes de risco, como em caso de
acidentes (invalidez por acidente). Alm disso, buscou-se atender s demandas por maior
igualdade, seja de oportunidade ou de resultados entre os indivduos.
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Os avanos legais concedidos pela CF/1988 projetavam a conformao de um novo
padro social para o Brasil, partindo da garantia de um conjunto de direitos universais e de
polticas pblicas de proteo social. As novas formas de expresso da questo social
brasileira, materializada no aumento da pobreza, na precarizao do trabalho, nodesemprego estrutural, entre outras, finalmente tinham sido alcanadas pela ampla agenda
de reformas democrticas que o pas vivenciou no final dos anos 80. Todavia, partes desses
anseios no se concretizaram. Apesar de uma agenda social progressiva, o pas vivia numa
economia semi-estagnada, com altas inflaes e na busca pela retomada do crescimento
econmico.
Dessa forma, o conjunto dessas polticas sociais viveu sob forte embate terico entre
duas correntes de pensamento distintas: de um lado, reconheceu-se a ampliao legal da
cobertura e do perfil redistributivo que a CF/1988 promoveu a poltica social, e de outro, asmesmas foram condicionadas pela combinao dos fatores macroeconmicos, que
resultaram nas reformas liberalizantes ocorridas na dcada de 1990, como a privatizao da
oferta de servios pblicos, a focalizao das polticas resultando no corte do gasto social, o
aumento da participao no-governamental e o desvio de recursos para o processo de
financeirizao da riqueza, onde o Estado foi o espao de intermediao dos interesses das
elites econmicas e polticas do pas, intensificando o conflito distributivo, como ser visto, a
seguir (SALAMA; VALIER, 1997; IPEA, 2007).
2.2 O PERFIL DA POLTICA SOCIAL BRASILEIRA NA DCADA DE 1990
Na dcada de 1990, o Brasil aderiu ordem neoliberal que prometia uma soluo
para a retomada do crescimento econmico, uma ampla modernizao e avanos no que se
refere tambm questo social. Essas mudanas se dariam mediante a integrao do pas
ao movimento geral da globalizao e da implementao de um conjunto de reformas
estruturais, como a reforma gerencial do Estado, a abertura comercial e financeira, a
privatizao, e, uma ampla reforma social. Todavia, passados mais de uma dcada, essesintentos reformistas ainda no se concretizaram, a ponto de poder visualizar transformaes
geradas pelo modelo em curso de desenvolvimento. De forma geral, a questo social em
meio a movimentos regressivos foi sendo redimensionada e se adequando s possibilidades
oferecidas pela ordem econmica.
Apesar disso, pode-se dizer que, no campo social, foi decisiva a regulamentao da
legislao complementar a CF/1988, fator fundamental para a consolidao dos direitos
sociais conquistados na dcada anterior. Na realidade, como bem indica FAGNANI (2005), o
que se viu foi uma contra-reforma truncada. Atravs de um movimento liberal e conservador,promoveu-se um novo ciclo de reformas na trajetria histrica da poltica social brasileira,
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com a finalidade de desestruturar as bases institucionais e financeiras que tinham sido
formalmente esboadas na CF/1988. Neste sentido, a estratgia governamental caminhou
simultaneamente em duas direes, como descreve Fagnani:
De um lado, ela foi marcada pela formulao de uma nova agenda de reformas,visando reviso constitucional, prevista para ocorrer em 1993. De outro lado,enquanto as elites engendravam essa reviso que acabou no ocorrendo aestratgia do governo visava a obstruir ou desfigurar os direitos sociais no processode regulamentao da legislao constitucional complementar. (FAGNANI, 2005, p.396).
Assim, sob a lgica desse projeto neoliberal hegemnico, as transformaes de
ordem econmica mundial mudaram completamente a agenda social governamental. O
debate sobre a forma de como retomar o crescimento, ser competitivo, combater a pobreza
e reduzir as desigualdades passou a ser prioritrio, na reestruturao dos programas
sociais. A recomendao neoliberal era descentralizar parte das atribuies fiscais da Uniopara os estados e municpios, focalizar as polticas, os programas e os gastos sociais sobre
a parcela considerada mais pobre da populao, alm de aumentar a participao social
organizada, atravs da criao de inmeras Organizaes No-Governamentais (ONGs)
sem fins lucrativos, para prestao de servios de cunho social e de defesa dos direitos
humanos. O tradicional universo da filantropia foi dando lugar a vrios fruns com a
representao e participao popular.
A descentralizao das polticas sociais ocorreu de forma desordenada e acelerada o
que provocou vazios institucionais e superposies em alguns setores. Em termos gerais, a
descentralizao acabou se transformando em parte da estratgia social do governo federal
ao transferir responsabilidades e gastos aos governos subnacionais. Na contramo dos
preceitos universalizantes impressos na CF/1988 surgiu um novo princpio ideolgico, a
focalizao das polticas sociais que objetivava o combate direto pobreza, supostamente
tido como sendo mais eficiente para a aplicao dos recursos pblicos. Na verdade, o
objetivo era criar direitos flexveis, de natureza precria e que fossem facilmente
modificveis. O aumento da participao social ligado idia de maior envolvimento da
sociedade civil na formulao, implementao, controle e avaliao das polticas sociais
tambm trouxe uma nova forma de contribuio em relao democratizao da gesto e
da execuo das polticas pblicas.
Foi neste contexto que uma ampla reestruturao dos programas sociais para
enfrentamento da pobreza ocorreu seguindo o paradigma neoliberal defendido pelas
instituies internacionais de fomento. As bases do Estado social pontilhado pela CF/1988
foram progressivamente sendo deslocadas em direo aos programas baseados na
transferncia monetria aos mais pobres. Os chamados programas sociais de transferncia
direta de renda ganharam espao focalizando suas aes em grupos diferenciados, de
acordo com as polticas pblicas adotadas e direcionados para a reduo da pobreza.
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3 OS PROGRAMAS DE TRANSFERNCIA DIRETA DE RENDA
Desde a dcada de 1990 que os programas de transferncia direta de renda vm
ganhando crescente importncia como instrumento de distribuio de renda e de reduo dapobreza, e, tambm, como objeto de estudo em centros de pesquisas universitrios
pblicos e privados , e, em outros tipos de organizaes do Estado e da sociedade civil,
nacionais e internacionais. A lista dessas organizaes imensa. Apenas a ttulo de
exemplo, podem ser citados os estudos financiados ou produzidos pelo Banco Mundial e
pelo Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID), ou ento, as pesquisas realizadas
por grupos institucionalmente consolidados, como o caso do Ncleo de Estudos em
Polticas Pblicas (NEPP), da Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP); do Instituto
de Pesquisa Econmicas Aplicadas (IPEA); e da Fundao Getlio Vargas (FGV), querealizam pesquisas nessa rea.
Esses estudos produzidos por essas organizaes possuem uma grande amplitude
ideolgica, que vai desde a tica liberal, caracterizada pelas chamadas polticas
compensatrias e focalizadas, at as que defendem uma viso mais redistributiva, de cunho
mais progressista, que se caracteriza pelo repasse de um valor monetrio s famlias
pobres, com base em critrios de universalidade e de integrao com outras polticas de
gerao de ocupao e renda. Na realidade, tal amplitude ideolgica reflete o contexto
internacional, no qual a formulao e a implementao de um variado conjunto dessesprogramas foram influenciados por diferentes perspectivas tericas.
No Brasil, a efetiva concretizao desses programas deu-se ao longo da dcada de
1990, num momento de fortes contradies tericas no campo das polticas sociais. De um
lado, vivia-se um processo de mudana, representado pela implantao do Sistema de
Seguridade Social, norteado pelos princpios da descentralizao das polticas sociais e pela
maior participao social, conforme previam a CF/1988. De outro lado, tinha-se uma postura
restritiva do aparelho governamental que impunha limites expanso dos programas
sociais, acompanhadas de aes de desmonte dos direitos sociais universais.
Deste modo, verificou-se que um novo formato foi institudo no Sistema de Proteo
Social Brasileiro. O debate nacional sobre a transferncia de uma renda se ampliou,
direcionando-o para o enfrentamento da questo social. Assim, passaram a ser
considerados como programas de transferncia direta de renda, todos aqueles destinados a
efetuar uma transferncia monetria, independentemente de prvia contribuio, a famlias
pobres, consideradas a partir de um determinado corte de renda per capita,
predominantemente, no caso dos programas federais brasileiro, de meio salrio mnimo
(SILVA, YAZBEK; GIOVANNI, 2007).
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neste contexto que os programas de transferncia direta de renda tornaram-se um
elemento importante no debate nacional, passando a fazer parte da agenda pblica
brasileira com a aprovao no Senado Federal do Projeto de Lei n 80/1991, de autoria do
Senador Eduardo Suplicy. Essa proposta, apresentada ao Legislativo, institua um Programade Garantia de Renda Mnima (PGRM), de abrangncia nacional, destinado a todos os
brasileiros residentes no pas, maiores de 25 anos, que auferissem rendimentos brutos
mensais inferiores a Cr$ 45.000,00, o correspondente a R$ 498,00, em valores corrigidos
pelo IGP-DI com a mdia do ano de 2007.
Deste modo, as primeiras iniciativas concretas de implantao dos programas de
transferncia direta de renda datam de 1995, originadas pela perspectiva de redistribuio
da riqueza, em nvel municipal. Entre elas, as cidades de Campinas, Ribeiro Preto, Santos
e Braslia. Na sua maioria, esses programas tomaram a famlia como unidade beneficiria econdicionaram a transferncia monetria s polticas de educao e sade, embora em
graus diferenciados. A partir de ento, esses programas ganharam destaque em nvel
nacional, servindo de modelo para a implantao dos programas federais.
Inaugurou-se, ento, um novo momento histrico no campo das polticas sociais
brasileiras, onde as polticas de transferncia direta de renda se ampliaram nos anos
subseqentes, com a implantao de uma srie de programas no contributivos, entre os
quais se destacaram os Programas Bolsa-Escola, Bolsa-Alimentao, Auxlio-Gs e o
Carto-Alimentao. A forma descentralizada de implementao desses programas
possibilitou o alcance das populaes pobres na maioria dos municpios brasileiros,
resultando numa abrangncia geogrfica significativa, o que contribuiu para a construo da
Poltica Nacional de Transferncia de Renda. Em 2003, com a criao do PBF, esses
programas acima relacionados foram unificados, dando origem a um novo desenho
institucional das polticas de transferncia direta de renda no Brasil, no qual a integrao, a
transparncia e a descentralizao institucional foram as suas marcas fundamentais.
Vale dizer que a natureza desses programas tambm teve orientaes poltico-
ideolgicas diferenciadas, que vo desde o apoio funcionalidade do mercado com carter
compensatrio e residual, cujos fundamentos se encontram nos pressupostos neoliberais,
tendo como objetivo a focalizao das aes na extrema pobreza, at a perspectiva de que
a riqueza socialmente produzida deve de alguma forma, ser redistribuda, orientada pelo
critrio de Cidadania Universal, conforme ser visto no subitem, a seguir.
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3.1 AS CONTRAPOSIES ENTRE OS PRINCPIOS DA UNIVERSALIZAO VERSUSFOCALIZAO
De acordo com os recentes estudos do IPEA (2007), o embate entre essas duas
correntes envolvem orientaes terico-metodolgicas e ideolgicas distintas. Deste modo,ainda, que de modo sucinto, busca-se distinguir as polticas sociais universais das polticas
focalizadas de combate pobreza. A universalizao das polticas sociais foi erguida sobre
o princpio moral da equidade e defende a repartio dos recursos de forma a garantir,
igualmente, a cada pessoa, os bens e servios necessrios a satisfao de suas
necessidades bsicas e, portanto, o respeito aos direitos sociais. Deste modo, as polticas
sociais universais esto diretamente ligadas noo de cidadania e requer uma maior
atuao do Estado para garantir nveis aceitveis de sade, educao, renda, moradia,
entre outras necessidades, independentemente do poder de barganha.
J a concepo de focalizao aplicada s polticas sociais rene diferentes
interpretaes. Em sentido geral, a perspectiva neoliberal de privilegiar o mercado atribui
focalizao objetivos meramente econmicos. Os organismos financeiros internacionais
(BIRD, BID, FMI, FED) tm difundido a focalizao como forma de maior eficincia para os
gastos pblicos, direcionando os programas sociais para os mais desfavorecidos. Neste
sentido, as estratgias de reduo do Estado, de um no investimento nas polticas sociais
universais e de reduo destas ao atendimento da populao mais pobre, so explcitas no
pacote de ajuste fiscal promovido aos pases em desenvolvimento, entre eles o Brasil.
Na tica progressista, a focalizao no significa totalmente o desmonte de direitos
j conquistados. Ao contrrio, vista como um instrumento que direciona recursos e
programas para determinados grupos populacionais, considerados vulnerveis no conjunto
da sociedade, tornando esse mecanismo, aparentemente, de acordo com os princpios da
justia social. Segundo esses os mais desfavorecidos deveriam ser priorizados, por
entenderem de se tratar de um nivelamento social que contribui para a reduo da
desigualdade. Sob esse ponto de vista, defende-se a adoo da focalizao para os pases
com renda per capitamediana e com elevada desigualdade de renda, como o Brasil. Isso
porque apenas uma pequena parcela da populao dispe de recursos prprios para
satisfazer as suas necessidades bsicas, e, portanto, pode auto-garantir os seus direitos
sociais, enquanto, a outra parcela da populao, formada pela maioria, precisa do Estado
para ter seus direitos respeitados.
Nesta perspectiva, a focalizao torna-se um componente da racionalidade do
sistema. SALAMA e VALIER (1997), ao argumentarem sobre o assunto concordaram com
essa concepo, mesmo seguindo uma linha de argumentao crtica s idiasliberalizantes. Em seus estudos, os autores reconheceram que diante da insuficincia das
receitas fiscais e tributrias, bem como da quantidade excessiva de excludos do sistema de
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proteo social, a universalizao efetiva dos direitos sociais e da proteo social no
poderia ser um objetivo de curto prazo. Assim, propuseram a adoo de polticas pblicas
focalizadas, porm de natureza muito distinta das propostas idealizadas pelos neoliberais.
importante enfatizar que a operacionalidade dos programas focalizados no seexplica simplesmente pela adequao ou no dos instrumentos utilizados para a focalizao
da pobreza. Na defesa pela focalizao das aes, um elemento fundamental que entra no
debate a correta identificao e seleo dos beneficirios. Um fator a ser considerado
como limitante nas polticas focalizadas a utilizao da renda como mecanismo exclusivo
de identificao e caracterizao da populao pobre de um pas.
Vale lembrar que, no Brasil, os programas nacionais de transferncia direta de renda
utilizaram a renda familiar per capita, em termos de salrios mnimos, para selecionar os
beneficirios. No entanto, em se tratando de pobreza essencial que se compreenda o seucarter multidimensional. Alm da renda, outros aspectos determinantes de pobreza como
as condies de moradia, saneamento bsico, acesso aos servios pblicos bsicos,
agravado pela situao atual do mercado de trabalho marcado pela informalidade,
instabilidade e rotatividade, podem deixar de fora dos programas inmeras famlias que
estejam acima da renda considerada, mas que vivem em situaes de precariedade.
neste sentido, que o debate se torna mais controverso, pois alm de ser insuficiente para
atender a todos, tambm requer dos beneficirios o cumprimento de condicionalidades,
como ser visto, a seguir.
3.2 O PAPEL DAS CONDICIONALIDADES NOS PROGRAMAS DE TRANSFERNCIADIRETA DE RENDA
Desde 2001, que os programas de transferncia direta de renda implantados no
Brasil tm mantido como caracterstica marcante um conjunto de condicionalidades, tambm
chamadas de contrapartidas ou co-responsabilidades das famlias beneficiadas. Essa
questo geradora de polmicas vista pelos seus defensores como uma inovao e tem
como objetivo incentivar o ncleo familiar a demandar servios essenciais associadas s
polticas de carter universal como educao e sade, j garantidas constitucionalmente
como um direito social. Em geral, para que as condicionalidades sejam cumpridas, os
argumentos apresentados s famlias so no sentido de tornar possvel a esses o acesso s
demais polticas sociais, como sendo uma oportunidade de incluso social, oferecida pelo
Estado como forma de suprir as deficincias estruturais, procurando, assim, atender a um
conjunto de carncias da populao mais empobrecida.
J presente nos antigos programas como o Bolsa-Escola e o Bolsa-Alimentao, as
exigncias davam-se de forma distinta. No Programa Bolsa-Escola a condicionalidade
atribuda s famlias carentes era a de freqncia escolar das crianas a pelo menos 85%
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das aulas. Em relao ao Programa Bolsa-Alimentao, a famlia beneficiada se
comprometia a duas condicionalidades: a primeira era atualizar o carto de vacinao das
crianas que estivessem na faixa etria de 0 a 6 anos e a segunda era fazer visitas
regulares ao posto de sade para o pr-natal e enquanto estivesse no perodo deamamentao, alm de participar das atividades educativas oferecidas pelas equipes de
sade a comunidade.
Do ponto de vista dos resultados, da necessidade e dos impactos, o tema das
condicionalidades bastante controverso na literatura contempornea. Estudos publicados
pelo IPEA (2007) ressaltam que no se sabe ao certo quo necessrio so as
condicionalidades, nem quanto se gasta para control-las, e, qual seria o seu custo-
benefcio. Deste modo, levantam como hiptese que talvez a existncia das
condicionalidades nos programas de transferncia direta de renda deva servir como pano defundo para as questes polticas e ticas.
Assim, em parte, as condicionalidades atenderiam s demandas daqueles que
julgam que para se receber algum benefcio necessrio que exista uma contrapartida por
parte do beneficirio. Neste caso, as condicionalidades seriam algo equivalente ao suor do
trabalho, sem essa simbologia, o programa correria o risco de perder apoio na sociedade.
(MEDEIROS; BRITTO; SOARES, 2007, p.18) Assim, a existncia das condicionalidades
ligadas s reas de educao, sade e, em alguns casos, de contrapartidas de trabalho, nos
programas de transferncia direta de renda brasileiro se assemelham com vrios outros
programas implementados em outros pases, como os existentes nos Estados Unidos que
adotam a idia do workfare1 para os programas do campo da Assistncia Social.
No esforo de possibilitar uma viso mais completa sobre a concepo e
funcionamento dos programas de transferncia direta de renda, implantados no Brasil e
criados numa conjuntura scio-econmica marcada pelo crescimento do desemprego,
acompanhado do incremento de formas de ocupaes precrias, crescimento da violncia,
entre outros, o prximo item tomar como exemplo o Programa Bolsa-Famlia como
expresso atual do desenvolvimento desses programas, tendo como princpio orientador a
focalizao do pblico-alvo, as condicionalidades e o seu financiamento.
1 O workfareprope que todos os beneficirios de algum auxlio social aptos ao trabalho para no carem napassividade tenham a obrigao de se qualificar para trabalhar, ou a procurar ativamente um emprego, ou aindaa aceitar uma funo que lhes sejam propostas. (AZNAR, 1996 apudLAVINAS; VARSANO, 1997)
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4 O PROGRAMA BOLSA-FAMLIA (PBF)
Como visto, o Brasil chega ao sculo XXI, com um modelo de proteo social
complexo que conta com diversos programas sociais em desenvolvimento nas esferasmunicipais, estaduais e federais. Segundo o diagnstico realizado pela equipe de transio
do Governo Lula, as experincias em torno dos programas de transferncia direta de renda
representaram um avano no campo das polticas pblicas. No entanto, a pluralidade
desses programas tornou a operacionalidade dispersa e ineficiente, no sendo possvel
superar caractersticas marcantes das polticas sociais tradicionais, tais como: elevado custo
administrativo, fragmentao, superposies de pblicos-alvo, sistema de cotas de
atendimento, competio entre as instituies, entre outras, o que levou a equipe do
governo de Lula a propor a unificao de alguns programas mediante a criao doPrograma Bolsa-Famlia (PBF).
Deste modo, no final de 2003, o governo federal instituiu o PBF, integrando quatro
programas federais (Bolsa-Escola, Bolsa-Alimentao, Auxlio-Gs e o Carto-Alimentao),
no mbito do Programa Fome Zero, como parte do eixo articulador n1, denominado acesso
aos alimentos, sob a justificativa de combater fome e a pobreza. Para tanto, pela tica do
governo federal, o PBF possui dois objetivos bsicos: o primeiro combater a misria e a
excluso social, por meio da transferncia do benefcio financeiro associado garantia do
acesso aos direitos sociais bsicos como a sade, educao, assistncia social e seguranaalimentar; e o segundo promover a incluso social contribuindo para a emancipao das
famlias pobres e extremamente pobres.
Embora, no primeiro ano de governo do Presidente Lula, o Programa Fome Zero
tenha obtido maior repercusso na mdia e at mesmo no prprio discurso do governo, o
PBF acabou tornando-se o carro-chefe da poltica social implementada pelo governo federal.
Este programa caracterizado como sendo de transferncia condicionada de renda, voltado
para um pblico especfico, notadamente a parcela da populao mais desassistida,
inaugurou uma nova agenda social tendo como princpios gerais a integrao dos
programas, a racionalizao dos recursos financeiros e a ampliao de cobertura. Ao
contrrio da corrente de pensamento de polticas de renda bsica universal, onde o
benefcio monetrio transferido deveria ser direcionado para cada cidado, independente da
sua situao socioeconmica.
Dessa forma, existem vrios argumentos levantados a favor e contra ao PBF, que
vo desde a fragilidade poltica de um programa seletivo segundo a renda menor
capacidade de reduzir desigualdades atravs de um programa focalizado. Assim, o
programa vem sendo abordado por instituies de pesquisas como o Centro Internacional
de Pobreza, o Centro de Polticas Sociais da FGV e pelo Instituto de Pesquisa Econmica
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Aplicada (IPEA), alm das prprias avaliaes contratadas pelo MDS para o programa,
objetivando potencializar suas aes.
Em termos legais, o PBF foi institudo por meio de uma medida provisria,
transformada em lei e regulamentada atravs de decretos e normas do Executivo 2. Por nopossuir uma definio na CF/1988, a legislao criada para o PBF condiciona a seleo de
beneficirios, a alocao oramentria e os convnios entre os entes federados. Dessa
forma, caracteriza-se por ser um programa de governo cuja exigibilidade judicial por uma
famlia pobre ainda no claramente assegurada. Vale lembrar que, os direitos sociais
estabelecidos pela Constituio Federal tm carter mais permanente e no so associados
a nenhum governo especfico.
Inicialmente, a operacionalizao do PBF ficou vinculada a uma Secretaria Executiva
ligada diretamente Presidncia da Repblica. Somente em 2004, aps a criao doMinistrio do Desenvolvimento Social e Combate Fome (MDS) que o PBF passou a ser
gerenciado por esse Ministrio, sob a coordenao da Secretaria Nacional de Renda de
Cidadania (SENARC). Desde ento, o programa vem tendo o empenho governamental para
a disseminao e expanso, sendo revertido em crditos polticos para o Governo Lula.
Neste sentido, o prximo subitem busca abordar o pblico-alvo do PBF, mostrando
os critrios de elegibilidade, bem como a sua expanso, tomando como base os anos de
2004 a 2007.
4.1 O PBLICO-ALVO DO PROGRAMA BOLSA-FAMLIA
Considerando as recentes transformaes na configurao das famlias, o PBF
seguindo os demais programas de transferncia de renda e polticas que tomam a famlia
como sujeito importante no processo de proteo social incorporou um conceito de famlia
mais amplo. Neste sentido, conforme consta no art. 2, 1 da Lei de criao do PBF,
aceito como famlia a unidade nuclear, eventualmente ampliada por outros indivduos que
com ela possuam laos de parentesco ou de afinidade, que forme um grupo domstico,vivendo sob um mesmo teto e que se mantm pela contribuio de seus membros.
Dessa forma, o PBF ao priorizar o ncleo familiar como unidade de interveno
social, volta-se para as famlias que se encontram em situao de pobreza ou de extrema
pobreza. Para tanto, o programa estabelece duas linhas de corte para a entrada de
beneficirios delimitando tambm o valor do benefcio a ser concedido. Assim, a realizao
do clculo adota como critrio seletivo a renda familiar mensal per capitae a composio
familiar, conforme mostra a Tabela 1.
2 O PBF foi lanado mediante a publicao da Medida Provisria n 132, de 20 de outubro de 2003 e,posteriormente, convertida na Lei n 10.836, de 09 de janeiro de 2004, sendo regulamentado pelo Decreto n5.209, de 17 de setembro de 2004.
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Tabela 1 PBF: critrios de elegibilidade do pblico-alvo e o valor do benefcio
Situao dasFamlias
Renda Familiar Mensal(per capita) Benefcio Mensal do PBF
Valor Mnimo(R$)
Valor Mximo(R$)
2004 20063 2004 20074 2004 2007 2004 2007
ExtremamentePobres
At R$50,00
At R$60,00
Sem filhosPiso Bsico:
R$ 50,00Piso Bsico:
R$ 58,00 50,00 58,00 50,00 58,00
Com filhos(at 3 filhos)
Piso Bsico:R$ 50,00 +Varivel:R$ 15,00
Piso Bsico:R$ 58,00 +Varivel:R$ 18,00
65,00 76,00 95,00 112,00
Pobres
Superior aR$ 50,00 einferior a R$
100,00
Superior aR$ 60,00 e
inferior a R$120,00
Com filhos(at 3 filhos)
Varivel:R$ 15,00
Varivel:R$ 18,00
15,00 18,00 45,00 54,00
Fonte: MDS, SAGI Matriz de Informao Social, 2007. (Elaborao prpria)
Diferentemente dos programas de transferncia direta de renda anteriores, em seu
desenho, o PBF tem como pblico-alvo dois grupos distintos. No primeiro, desde 2006, o
programa direciona-se para as famlias que auferem uma renda familiar mensal per capita
de at R$ 60,00 independentemente de sua composio. Para essas famlias,
considerando-se o ano de 2007, o benefcio monetrio mensal fixo transferido correspondia
a R$ 58,00. Neste caso, pode-se dizer que o PBF amplia, at certo ponto, o seu pblico-alvo
ao permitir o acesso de famlias sem filhos ao programa. No entanto, se na composio
dessas famlias existem crianas e/ou adolescentes com at 15 anos de idade, a esse valor
fixo transferido podia se acrescido R$ 18,00, por cada filho, at o limite de trs filhos,
totalizando um valor mensal mximo de R$ 112,00 por famlia.
O segundo grupo mais restrito, pois considera inelegveis as famlias sem filhos. O
acesso permitido apenas para as famlias que se encontram em situao de pobreza, ou
seja, a renda familiar mensal per capita considerada desde 2006 deve ser superior a R$
60,00 e inferior a R$ 120,00 e devem ter em sua composio familiar crianas e/ou
adolescentes (at com 15 anos de idade). Neste caso, o valor da transferncia monetria
varivel e podia chegar at R$ 54,00 por famlia, sendo R$ 18,00 por cada filho, no limite de
trs, tomando como base de anlise o ano de 2007.
Vale salientar o baixo valor do corte de renda, principalmente para a definio de
extrema pobreza, o que na realidade representa um grande risco de excluir muitas famlias
pobres, j que acima desse corte as famlias que no possuem filhos no tm o direito ao
3 Em abril de 2006, de acordo com o Decreto n 5.749 foi ampliado de R$ 50,00 para R$ 60,00 o teto da rendafamiliar mensal per capitaque d direito de acesso ao benefcio do PBF s famlias consideradas extremamentepobres. E para as famlias em situao de pobreza o valor mximo da renda familiar mensal per capitapassoude R$ 100,00 para R$ 120,00. Entretanto, vale ressaltar que no h nenhuma forma automtica de indexao
para esses valores.4 Em julho de 2007, foi assinado o Decreto n 6.157 determinando o reajuste do valor mensal do benefcio doPBF. Assim, o benefcio bsico passou de R$ 50,00 para R$ 58,00, um reajuste de 16%, enquanto o valorvarivel passou de R$ 15,00 para R$ 18,00, o equivalente a um aumento de 20%.
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benefcio bsico. A aplicao do dinheiro pelas famlias livre podendo permanecer no
programa enquanto houver a manuteno dos critrios de elegibilidade, desde que
cumpram as condicionalidades impostas pelo programa, conforme ser visto mais adiante.
Em 2007, alm da recomposio dos valores dos benefcios (videnota de rodap n4, pg. 16), o governo tambm ampliou a faixa etria dos adolescentes de 15 anos para 17
anos, como forma de estimul-los a permanecer na escola, concedendo um benefcio
mensal varivel no valor de R$ 30,00, at o limite de dois adolescentes por cada famlia.
Deste modo, com essa variao o valor mximo a ser recebido por uma famlia em situao
de pobreza passou de R$ 54,00 para R$ 114,00, desde que em sua composio existam
trs crianas na faixa etria de 0 a 14 anos e dois adolescentes com idade entre 15 a 17
anos. Com esta mesma composio familiar, o valor mximo a ser recebido pelas famlias
consideradas extremamente pobres passa de R$ 112,00 para R$ 172,00, o que significa umacrscimo de 53,6% na renda familiar.
Na configurao atual do desenho do PBF, o governo federal com o objetivo de
garantir o poder de compra das famlias beneficirias do programa, defasado em virtude do
aumento dos preos dos alimentos, concedeu mais um reajuste mdio de 8% ao valor do
benefcio mensal transferido. Deste modo, o valor do piso bsico passou de R$ 58,00 para
R$ 62,00 e o valor varivel de R$ 18,00 para R$ 20,00. O valor destinado aos adolescentes
correspondente a R$ 30,00 permaneceu inalterado. Com esses novos valores, dependendo
da composio, uma famlia extremamente pobre poder receber at o mximo de R$
182,00 por ms. Enquanto, os valores pagos pelo programa para uma famlia pobre podero
variar de R$ 20,00 at o mximo de R$ 120,00. Essa recomposio dos valores teve como
base a variao do ndice Nacional de Preo ao Consumidor (INPC), calculado pelo IBGE,
ocorrida entre junho de 2007 e maio de 2008.
O ingresso das famlias no PBF ocorre por meio do Cadastramento nico do governo
federal institudo em 2001, ainda, no governo de FHC. O objetivo desse cadastro
uniformizar as informaes socioeconmicas da populao de baixa renda, a fim de mapear
e identificar possveis beneficirios do PBF e dos demais programas sociais, propondo-se
tambm a subsidiar o planejamento de polticas pblicas dos diferentes nveis de governo.
Para tanto, cabe aos municpios o papel de executar o processo de coleta, incluso,
atualizao e excluso sistemtica dos dados referentes ao Cadastro nico. As principais
informaes que constam neste cadastro dizem respeito s caractersticas do domiclio, a
composio familiar, qualificao escolar e profissional, grau de parentesco e rendimentos e
despesas familiares.
Vale ressaltar que, o enfrentamento dos problemas sociais brasileiros no pode
prescindir do Estado como agente central na coordenao e na execuo da poltica. Para
exercer essas funes e, ao mesmo tempo, assegurar a sustentabilidade das aes
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necessrio redesenhar a relao que se estabelece entre Estado, em suas trs esferas e a
sociedade civil, na perspectiva de consolidao da prpria democracia brasileira.
A expanso do PBF retratado pelos dados de cobertura apresentados no Grfico 1
merece ser destacado pelo seu rpido avano. Em 2004, o nmero de famlias atendidastotalizava 6,5 milhes, o que representava uma cobertura de 59,2%, considerando a
existncia de 11,1 milhes de famlias pobres, de acordo com os dados estimados pelo
IPEA. No ano seguinte, o PBF alcanava um total de 8,7 milhes de famlias, o que
representava um crescimento de 32,4% e uma cobertura de 78,4%. Em 2006, o PBF j
atingia quase a meta prevista de 11,1 milhes de famlias atendidas, com uma cobertura de
98,8%. Em 2007, o PBF estava presente em todos os municpios brasileiros, atendendo
pouco mais de 11 milhes de famlias, o que mostra que entre 2004 a 2007, o PBF
apresentou um crescimento mdio geomtrico anual de 13,9% a.a..
Fonte: MDS, SAGI Matriz de Informao Social, 2007. (Elaborao Prpria)
Grfico 1 Brasil: evoluo da taxa de cobertura do PBF (2004-2007)
Vale lembrar que, as famlias oriundas dos programas de transferncia direta de
renda (Bolsa-Escola, Bolsa-Alimentao, Auxlio-Gs e Carto-Alimentao) tm prioridadessobre as famlias novas para ingressarem no PBF, de modo a cumprir com o objetivo de
integrao. Alm disso, desde 2007, o governo federal incluiu tambm as famlias indgenas
e quilombolas dando-lhes acesso prioritrio.
A distribuio espacial dos beneficirios do PBF pelas grandes Regies do Brasil
apresentada na Tabela 2. possvel observar que a regio Nordeste, como era de se
esperar, concentra metade das famlias beneficiadas pelo PBF. Em 2004, a regio totalizava
3,3 milhes de famlias, o equivalente a 50,5% do total das famlias beneficiadas pelo PBF.
Em 2007, o nmero de famlias atendidas pelo PBF j era de 5,6 milhes, representando50,47% do total de famlias atendidas, um crescimento de 67,9% em relao ao ano de
2004. Em seguida, a regio Sudeste apresenta a segunda maior participao. Em mdia,
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considerando os anos de 2004 a 2007, a regio teve uma participao de 26,3%, enquanto
as demais regies (Sul, Norte e Centro-Oeste) apresentaram uma distribuio espacial
mdia de 10,0%, 8,8% e 5,1%, respectivamente.
Tabela 2 Brasil/Grandes Regies: nmero de famlias atendidas pelo PBF (2004-2007)
Brasil/GrandesRegies
Total de Famlias BeneficiadasPrograma Bolsa-Famlia
2004(%)
partic. 2005(%)
partic. 2006(%)
partic. 2007(%)
partic.Centro-Oeste 292.405 4,45 444.786 5,11 596.620 5,44 583.672 5,29Nordeste 3.320.446 50,53 4.245.574 48,80 5.442.567 49,63 5.573.605 50,47Norte 527.652 8,03 697.644 8,02 1.023.507 9,33 1.081.636 9,79Sudeste 1.730.675 26,33 2.325.379 26,73 2.875.677 26,22 2.848.034 25,79Sul 700.661 10,66 987.062 11,34 1.027.439 9,37 956.129 8,66BRASIL 6.571.839 100,00 8.700.445 100,00 10.965.810 100,00 11.043.076 100,00
Fonte: MDS, SAGI Matriz de Informao Social, 2007. (Elaborao prpria)
Esse resultado reflete, evidentemente, a desigualdade regional existente no pas que
entre outras manifestaes se expressa na enorme diferena de renda entre as famlias das
diferentes regies, especialmente, entre o Nordeste e o Centro-Sul do pas. O Grfico 2, a
seguir, mostra a distribuio espacial mdia das famlias beneficiadas pelo PBF entre as
regies geogrficas brasileiras, tomando como base de comparao os anos de 2004 a
2007.
Fonte: MDS, SAGI Matriz de Informao Social, 2007. (Elaborao prpria)
Grfico 2 Brasil: distribuio espacial por regio geogrfica das famlias beneficiadas peloPBF a mdia entre os anos de 2004-2007
A focalizao do PBF nas famlias pobres tomando como critrio nico de seleo a
renda levanta uma srie de crticas pelo seu carter restritivo. Se considerado o conceito de
pobreza multidimensional, j mencionado, somente a renda no suficiente para qualificar a
pobreza. Desse ponto de vista, a vulnerabilidade social engloba outras dimenses como
sade, esperana de vida, educao, saneamento e acesso a bens e servios pblicos, indo
alm da privao de bens materiais. Neste caso, o PBF tende a impossibilitar a incluso de
famlias que apesar de estarem situadas em uma faixa de renda um pouco acima do valordefinido encontram-se tambm em situao de pobreza.
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Ademais, outro aspecto preocupante refere-se desvinculao da renda familiar
mensal per capitaadotada como referncia para definio da linha de pobreza do salrio
mnimo. Vale ressaltar que, nos programas de transferncia direta de renda, vistos no item
3, o corte de renda para acesso aos programas estavam vinculados a fraes do salriomnimo vigente. Desta forma, para as famlias consideradas pobres era considerada uma
renda familiar mensal per capita de salrio mnimo, enquanto para as famlias
extremamente pobres o corte equivalia a uma renda familiar mensal per capita de do
salrio mnimo. Se tomarmos como base o salrio mnimo vigente em 2008, as famlias
pobres corresponderiam quelas que totalizariam uma renda familiar mensal per capitaigual
a R$ 207,50 e as famlias extremamente pobres teriam como renda familiar mensal per
capitao valor de at R$ 103,75, cerca de 72,9% a mais do valor atualmente considerado
(R$60,00), o que tornaria a focalizao mais abrangente.Segundo ROCHA (2006), em um pas de dimenses continental e de diferenas
regionais de desenvolvimento to marcantes como o Brasil, nem a simples utilizao do
salrio mnimo como parmetro para definir a linha de pobreza retrata a realidade brasileira,
porque acaba sendo ignoradas as diferenas regionais e urbano-rural de custo de vida para
os pobres. Portanto, na sua concepo a definio de uma linha de pobreza para o Brasil
exige-se a adoo de parmetros que levem em conta as especificidades de cada regio.
Desta forma, a estrutura de consumo das famlias seria a forma mais adequada para
estabelecer a linha de pobreza.
Como se v a construo de critrios e mecanismos de seleo uma das tarefas
mais difceis na formulao de programas focalizados. Em um pas, como o Brasil, marcado
pela heterogeneidade e por uma cultura poltica muito influenciada pelo clientelismo,
focalizar o pblico de um programa sempre muito difcil.
4.2 AS CONDICIONALIDADES DO PROGRAMA BOLSA-FAMLIA
O PBF ao unificar os programas de transferncia direta de renda seguiu a mesmatrajetria de definir o cumprimento de condicionalidades associadas a polticas de carter
universal educao e sade j garantida constitucionalmente populao como um
direito. Deste modo, o PBF vincula o pagamento do benefcio ao cumprimento de
contrapartidas comportamentais por parte das famlias beneficiadas. Na tica do governo
federal essa uma forma de possibilitar o acesso e a insero da populao pobre nos
servios sociais bsicos, contribuindo para a interrupo do ciclo de reproduo da pobreza.
Assim, em relao educao, o objetivo da condicionalidade associar o
complemento de renda ao acesso das crianas e adolescentes a educao bsica, bemcomo a permanncia na escola. Para tanto, o PBF exige 85% de freqncia escolar das
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crianas e dos adolescentes na faixa etria de 6 a 15 anos. A partir de 2007, com a incluso
dos adolescentes de 16 e 17 anos no PBF, a freqncia escolar exigida pela
condicionalidade para essa faixa etria de 75%.
No que tange aos servios de sade, o PBF determina que gestantes, nutrizes ecrianas menores de sete anos de idade sejam acompanhadas do ponto de vista nutricional
mantendo a caderneta de vacinao atualizada. Alm disso, as gestantes devem participar
das consultas de pr e ps-natal e, assim como as mes de crianas de 0 a 7 anos
incompletos devem tambm fazer parte das atividades socioeducativas sobre sade e
nutrio.
O PBF tambm condiciona aes na rea da assistncia social. Assim, os
beneficirios do PBF devem participar das aes socioeducativas destinadas para as
crianas em situao de trabalho infantil. Alm disso, o PBF recomenda a adoo deprogramas complementares voltados gerao de emprego e renda, tais como: cursos
profissionalizantes, programas de microcrdito, compras de produo agrcola familiar, entre
outros. No entanto, essas aes no fazem parte do conjunto de condicionalidades impostas
pelo programa.
Portanto, verifica-se que a exigncia de contrapartidas comportamentais por parte
dos beneficirios um ponto central do desenho do PBF e vem se tornando numa questo
bastante polmica. O debate em torno desse tema abarca diferentes posies. Para os
formuladores do PBF, a condicionalidade apresentada como sinnimo de incluso social e
emancipao. A exigncia favorece a ampliao do exerccio do direito a servios sociais de
carter universais como a educao e a sade. Todavia, uma vez exigida essas
condicionalidades, faz-se necessrio criar mecanismos consistentes de acompanhamento
social das famlias beneficirias, tendo em vista ser uma oportunidade de insero social.
Sob essa perspectiva, as aes de controle e acompanhamento exigem um esforo
conjunto dos trs ministrios (MDS, MEC e Sade).
4.3 O FINANCIAMENTO DO PROGRAMA BOLSA-FAMLIA
Entre os desafios enfrentados pelo PBF est o seu financiamento. Em termos
oramentrios, o MDS executa duas unidades que possuem fins distintos: o seu prprio
oramento, onde fica alocada a maior parte dos recursos financeiros destinados ao PBF, e o
do Fundo Nacional da Assistncia Social (FNAS). A dotao oramentria prpria do MDS
destina-se a atender, alm do PBF, as aes e programas relacionados com a Segurana
Alimentar e de combate fome, bem como a gesto do Sistema nico da Assistncia Social
(SUAS). J os recursos do FNAS financiam os benefcios previstos e regulamentados pela
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Lei Orgnica da Assistncia Social (LOAS), os servios, programas e projetos de assistncia
social, tais como o PETI, o Agente Jovem, o Sentinela, o BPC, entre outros.
Em relao aos recursos destinados para o financiamento do PBF, a anlise dos
dados mostra que h um predomnio crescente na participao dos recursos nosoramentos da Seguridade Social, do MDS e da unidade oramentria prpria do MDS. Em
2004, os recursos do PBF representavam 1,3% do OSS, trs anos depois o peso relativo
havia mais que dobrado (2,7%), um crescimento equivalente a 107,7%. Comparando os
recursos do PBF com o oramento total do MDS, verifica-se que em 2004, os mesmos
representavam 21,9%, j em 2007, essa representatividade foi de 36,6%, um crescimento
no perodo de 67,1%. Por fim, tomando como base os recursos prprios da unidade
oramentria do MDS, a proporo dos recursos do PBF cresceu 63,8%, ou seja, passou de
55,5%, em 2004, para 90,9%, em 2007, conforme destaca os dados da Tabela 3.
Tabela 3 Participao do PBF nos Oramentos da Seguridade Social, do MDS e daunidade oramentria prpria do MDS (2004-2007)
R$ mil
ANOS OSS(1)
(A)MDS (2)
(B)
Unid. Or. Prpriado MDS (2)
(C)
PBF (3)(D) % (D/A)
%(D/B)
%(D/C)
2004 258.651.659 15.483.779 6.095.734 3.385.356 1,3 21,9 55,52005 279.719.372 16.712.441 5.510.998 3.893.634 1,4 23,3 70,72006 311.105.571 22.235.642 9.182.573 7.860.261 2,5 35,3 85,62007 328.651.284 24.503.304 9.866.194 8.965.500 2,7 36,6 90,9
Fonte:(1)
Cmara dos Deputados. Consultoria de Oramento e Fiscalizao Financeira e PRODASEN. Banco de Dados do
SIAFI/STN;(2)
Senado Federal. SIGA Brasil SIAFI/SIDOR/SELOR. Acompanhamento da Execuo Oramentria da Unio(LOA) 2004-2007. Valor pago no ano de referncia;
(3)MDS, SAGI Matriz de Informao Social, 2007. Valores
deflacionados pelo IPCA com base mdia do ano 2007. (Elaborao prpria)
Vale ressaltar que nos anos de 2004 e 2005, o PBF tambm teve recursos alocados
no Ministrio da Sade, mais especificamente no Fundo Nacional de Sade (FNS), num
montante correspondente a R$ 932,4 milhes e R$ 2.238,6 milhes destinados para as
despesas relacionadas com o cumprimento das condicionalidades na rea de sade.
Considerando a dimenso dos recursos financeiros referentes ao PBF, no perodo de
2004 a 2007, verifica-se que houve um significativo crescimento. Em 2004, o valor investido
para o programa somou R$ 4,3 bilhes (corrigidos pelo IPCA, considerando como ano-base
o ano de 2007). Em 2007, o gasto anual registrado foi de R$ 8,9 bilhes, mais que o dobro
do valor repassado em 2004, o que representa um crescimento mdio anual de 20,0% a.a..
Na Tabela 4, ao examinar a distribuio espacial mdia dos recursos do PBF entre
as grandes Regies do Brasil, durante os anos de 2004 a 2007, constata-se que a regio
Nordeste foi detentora de mais da metade dos recursos (53,8%). Em seguida, vm as
regies Sudeste (23,9%), Norte (9,4%), Sul (8,9%) e por ltimo, o Centro-Oeste (4,3%). No
entanto, a proporcionalidade dos recursos direcionados para o Nordeste no total dos
recursos do PBF, ao longo desses quatro anos, reduziu-se. Em 2004, os recursos da regio
Nordeste representavam 57,3% do total dos recursos do PBF. J em 2007, a proporo era
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de 52,8%, o que mostra uma reduo de 7,9% da participao na totalidade dos recursos.
Por sua vez, as regies Centro-Oeste e Norte foram as que apresentaram o maior
crescimento em relao participao das grandes Regies brasileiras no total dos
recursos do PBF. Neste sentido, em 2004, o Centro-Oeste participava com 3,5% do totaldos recursos e passou a 4,8%, em 2007, revelando um crescimento de 38,5%. A regio
Norte, por sua vez, era detentora de 8,6% do total dos recursos do PBF em 2004 e trs anos
depois essa participao era de 9,4%, o que representou um aumento de 23,5%.
Tabela 4 Brasil e as Grandes Regies: evoluo e distribuio regional dos recursos doPBF (2004-2007)
R$ milBrasil/Grandes
RegiesRecursos do Programa Bolsa-Famlia
2004 (%) 2005 (%) 2006 (%) 2007 (%) Mdia
Centro-Oeste 149.287 3,5 258.271 4,2 367.628 4,7 429.386 4,8 4,3Nordeste 2.474.946 57,3 3.214.537 52,4 4.123.945 52,5 4.735.067 52,8 53,8Norte 369.989 8,6 529.466 8,6 766.551 9,8 948.452 10,6 9,4Sudeste 939.145 21,8 1.530.056 25,0 1.899.111 24,2 2.123.533 23,7 23,6Sul 384.355 8,9 599.874 9,8 703.026 8,9 729.062 8,1 8,9BRASIL 4.317.723 100,0 6.132.205 100,0 7.860.261 100,0 8.965.500 100,0 100,0
Fonte: MDS, SAGI Matriz de Informao Social, 2007. Valores deflacionados pelo IPCA com o ano-base de 2007.(Elaborao prpria)
No que se refere ao valor mdio do benefcio do PBF, a Tabela 5 apresenta a sua
evoluo, tomando como referncia o perodo analisado neste trabalho. Ao longo desses
quatro anos, constata-se um crescimento real anual contnuo do valor mdio da
transferncia monetria recebida pelas famlias. Em 2004, verifica-se que o valor mdionacional alcanado foi de R$ 54,75. Somente as regies Nordeste e Norte tiveram um valor
mdio maior que a mdia nacional, sendo R$ 62,11 e R$ 58,43, respectivamente. Em 2007,
o valor mdio nacional foi de R$ 67,66, o que significa dizer que, entre os anos de 2004 a
2007, a taxa mdia anual de crescimento foi de 23,6%.
Tabela 5 Brasil e as Grandes Regies: valor mdio e taxa de crescimento anual dobenefcio do PBF (2004-2007)
R$ 1,00
Brasil/GrandesRegies
Programa Bolsa-Famlia
2004 2005 2006 2007 MdiaTaxa Anual de
Crescimento Real2007/2004 (%)
Centro-Oeste 42,55 48,39 51,35 61,31 50,90 44,1Nordeste 62,11 63,10 63,14 70,80 64,79 14,0Norte 58,43 63,24 62,41 73,07 64,29 25,1Sudeste 45,22 54,83 55,03 62,13 54,31 37,4Sul 45,71 50,64 57,02 63,54 54,23 39,0BRASIL 54,75 58,73 59,73 67,66 60,22 23,6Fonte: MDS, SAGI Matriz de Informao Social, 2007. Valores deflacionados pelo IPCA com o ano-base de 2007.(Elaborao prpria)
Ressalta-se, ainda, que o benefcio do PBF pode ser cancelado mediante as
seguintes ocorrncias: a) caso o benefcio no seja sacado pelo beneficirio no prazo de 90
dias, sendo o valor restitudo ao programa; b) comprove-se o trabalho infantil na famlia; c)
existncia de fraudes e informaes incorretas no ato do cadastramento; d) descumprimento
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das condicionalidades; e) desligamento do ato voluntrio do beneficiado ou por
determinao judicial; f) alterao cadastral da famlia que a exclua dos critrios
estabelecidos pelo programa para incluso; e g) a ocorrncia de regras excludentes
existentes nos programas de transferncia de renda anteriores ao PBF.No entanto, importante dizer que o desligamento de uma famlia um processo
longo, sendo adotada uma abordagem mais educativa e de orientao do que punitiva. A
seguir, este trabalho apresenta a atuao do PBF na regio Nordeste do pas.
5 O PROGRAMA BOLSA-FAMLIA NO NORDESTE BRASILEIRO
Espacialmente, segundo os dados do IBGE, a regio Nordeste com uma extenso
territorial de 1.554.257,0 km2 representa 18,3% do total da rea do Brasil. Em 2007, com
uma populao de 51,5 milhes de habitantes, totalizando 28% da populao total do pas,
cerca de 42,2% dos seus habitantes viviam em condies de pobreza,conforme estimativa
do IPEA. Como se observa no Grfico 3, todos os estados do Nordeste possuam um
percentual de pobreza acima da mdia brasileira (27,8%). Dessa forma, verifica-se que a
regio concentra um imenso bolso de pobreza, constituindo-se de fato num espao com
enormes carncias, se comparada com as demais regies brasileiras.
Fonte: MDS, SAGI Matriz de Informao Social, 2007. (Elaborao prpria)
Grfico 3 Percentual de pobreza: estimativa de pobres (IPEA, 2004) em relao populao (IBGE, contagem de 2007) dos estados do Nordeste, da regioNordeste e do Brasil
Todavia, nos ltimos anos, o espao nordestino sofreu importantes mudanas,
resultando numa grande diversidade e crescente heterogeneidade em sua estrutura
econmica. De tal modo que, reas com elevado grau de modernizao passaram a
conviver com reas de intensa pobreza, diferenciando o seu crescimento e o seu
desenvolvimento. A tradicional viso assistencialista, marcada fortemente pelas secas,
agora contrasta com a formao de novas reas modernas e dinmicas que foram se
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desenvolvendo, ao longo do processo de desconcentrao espacial da atividade econmica,
denotando um crescimento desigual e seletivo da regio. Desta forma, a riqueza local
tornou-se cada vez mais concentrada, uma caracterstica marcante da prpria regio,
criando profundos contrastes sociais. Desse ponto de vista, pode-se dizer que a presenado grande capital na regio contribuiu para o crescimento econmico e em menor
intensidade para reduzir os dficits sociais.
Nesta realidade, a importncia do PBF evidenciada atravs dos dados mostrados
no Grfico 4. Apesar das inmeras crticas ao programa, tomando como base os dados para
o ano de 2007, o percentual das famlias atendidas sobre o total das famlias residentes nos
estados nordestinos bastante elevado variando entre 35,8% a 51,8%. Em termos
proporcionais, o estado de Sergipe correspondia ao estado com o menor nmero de famlias
atendidas pelo PBF (35,8%), em relao ao total de famlias existentes. Ao contrrio doMaranho, onde mais da metade das famlias residentes, o equivalente a 51,8% do total das
famlias, recebiam o benefcio. Nos demais estados, o percentual mdio das famlias
atendidas pelo PBF correspondia a 42,8%, considerando a estimativa das famlias para o
ano de 2007, realizada pela contagem do IBGE. Esses dados mostram a importncia do
programa na promoo da distribuio da renda e da atividade econmica, nas reas mais
pobres do Nordeste.
Fonte: Ministrio do Desenvolvimento Social e Combate Fome (MDS), SAGI Matriz de Informao Social, Ano de2007. (Elaborao Prpria)
Grfico 4 Regio Nordeste: total de famlias residentes x total de famlias atendidas peloPBF Ano de 2007
Apesar de se circunscreverem a mudanas incrementais e de estarem longe de
mudanas estruturais relacionadas com a distribuio da renda e da riqueza, as avaliaes
realizadas pelo MDS mostram que o PBF tambm contribuiu para a movimentao das
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economias locais das regies mais pobres do pas, o que sugere a realizao de estudos
mais aprofundados que simulem os efeitos combinados das polticas sociais, com os
repasses das transferncias constitucionais, por exemplo.
Neste sentido, do ponto de vista dos recursos destinados ao PBF, verifica-se que osdispndios realizados no Nordeste em 2007, no foram desprezveis. Ao contrrio,
representaram 52,8% do total investido pelo programa. O Grfico 5 apresenta a relao
percentual entre o valor anual despendido do PBF, no ano de 2007, comparativamente ao
Fundo de Participao dos Estados (FPE) transferido pelo governo federal a cada estado da
Regio Nordeste. A Bahia foi o estado que teve a maior proporo relativa (40,0%),
enquanto Sergipe a menor, com 12,3%. No Rio Grande do Norte, os valores transferidos
pelo Programa Bolsa-Famlia representaram 18,2% do valor repassado pelo FPE para o
estado. Enquanto, em Pernambuco e no Maranho, essa proporo foi de 33,7% e 28,8%,respectivamente.
Fonte: Ministrio do Desenvolvimento Social e Combate Fome (MDS), SAGI Matriz de Informao Social, Ano de2007. (Elaborao Prpria)
Grfico 5 Regio Nordeste: FPE x dispndio anual do PBF Ano de 2007
Esses dados revelam que o programa vem assumindo um peso significativo na
composio da renda de alguns estados. Em relao ao valor monetrio transferido
diretamente s famlias, nota-se que extremamente baixo e insuficiente para atender s
necessidades bsicas. No entanto, este limite resulta da concepo neoliberal sobre os
programas de transferncia direta de renda, segundo a qual uma transferncia monetria
no deve contribuir para desestimular os indivduos para o trabalho. Dessa forma, o impacto
que o programa tem na reduo da pobreza ainda nfimo, mas necessrio.
Teoricamente, MARQUES (2005) chama ateno para o efeito multiplicador de
inspirao keynesiana, admitindo que o gasto governamental, assim como o privado, gere
uma renda de valor maior do que o do gasto realizado no conjunto global da economia. Isso
acontece porque as compras que o governo efetua resultam em novas demandas para as
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empresas que, ao aumentarem sua produo, elevam os pedidos junto a seus fornecedores,
aumentando o nvel de contratao de trabalhadores. Esse processo tem continuidade na
cadeia produtiva, tanto das empresas inicialmente beneficirias da maior demanda estatal,
como daquelas vinculadas ao consumo dos trabalhadores e dos demais segmentos dapopulao que aumentaram sua renda.
Neste sentido, as transferncias de renda s famlias proporcionam um impacto
econmico tanto maior quanto maior for a propenso marginal a consumir, isto , quanto
maior for a parcela destinada ao consumo quando a renda aumentada em uma unidade.
Neste caso, a populao alvo do PBF, principalmente, as famlias definidas como
extremamente pobres, possui uma propenso marginal a consumir das mais elevadas,
quando no igual a um. O aumento da renda dessa populao, resultante da poltica
pblica, retorna, em parte, aos cofres pblicos, sob a forma de incremento na arrecadaode tributos. (MARQUES, 2005)
Tomando-se como referncia o perodo de 1990 a 2006, os indicadores de renda
apresentados na Tabela 6 mostram que na regio Nordeste a intensidade de indigncia
reduziu mais da metade (54,3%), ou seja, passou de 41,8% para 19,1%. Nesse mesmo
perodo, a intensidade de pobreza da regio caiu de 69,6% para 46,3%, uma reduo de
33,5%. Esses resultados tm registrado uma melhoria nas condies de vida da populao
mais pobre, representada pela reduo das desigualdades sociais, calculada atravs do
ndice de Gini, que apresentou uma reduo de 8,5%. Vale salientar que no existe um
consenso entre os pesquisadores que atribui esse fato aos programas sociais, entre eles o
PBF. BARROS, CARVALHO, FRANCO e MENDONA (2006), assim como HOFFMANN
(2006) consideraram em suas anlises os efeitos positivos desses programas
especificamente para a regio Nordeste. Na viso de DELGADO (2006) a melhora na
distribuio de renda, vai alm da contribuio do PBF, deve-se ser levada em conta,
principalmente, a contribuio dos benefcios da seguridade social pagos pelo INSS, cujo
perfil fortemente concentrado no salrio mnimo.
Entretanto, deve ser enfatizado que o PBF promove o acesso renda para uma
grande parcela da populao no assistida pela Previdncia Social, por estar margem do
mercado de trabalho. Nesse sentido, verifica-se que o PBF est pautado em combater a
extrema pobreza que impe a populao a situaes de riscos. Embora os resultados,
preliminarmente observados, ainda sejam modestos para superar essa pobreza, os
repasses do benefcio contribuem para melhorar a renda das famlias beneficiadas, visto
que se encontram num nvel econmico de mera subsistncia. A sua importncia eleva-se
ao tentar articular o programa aos servios de sade e educao. Essa proposta
intersetorial vista como um aspecto inovador que incentiva o rompimento da
fragmentao, ao buscar estabelecer um vnculo mais efetivo da Assistncia Social com as
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Polticas Sociais de carter estrutural. Alm disso, favorece ao exerccio da cidadania, que
segundo os formuladores do PBF sinnimo de incluso social.
Tabela 6 Estados do Nordeste e Brasil: indicadores de renda PIB per capita (2005),ndice de Gini, intensidade de pobreza e de indigncia (1990/2006)
Estados doNordeste e Brasil
PIB*per capita(R$ 1,00)
ndice de Gini Intensidade de Pobrezapessoas pobres** (%)Intensidade de Indignciapessoas indigentes*** (%)
2005*IBGE
1990IPEA
2006IPEA
TaxaCresc.
(%)
1990IPEA
2006IPEA
TaxaCresc.
(%)
1990IPEA
2006IPEA
TaxaCresc.
(%)Alagoas 4.687 0,574 0,627 9,2 72,0 55,0 -23,6 37,0 24,0 -35,1Bahia 6.583 0,647 0,556 -14,1 68,0 44,0 -35,3 39,0 17,0 -56,4Cear 5.054 0,627 0,548 -12,6 73,0 45,0 -38,4 46,0 19,0 -58,7Maranho 4.150 0,563 0,595 5,7 71,0 53,0 -25,4 46,0 25,0 -45,7Paraba 4.690 0,655 0,565 -13,7 69,0 42,0 -39,1 46,0 15,0 -67,4Pernambuco 5.931 0,602 0,583 -3,2 65,0 48,0 -26,2 36,0 20,0 -44,4Piau 3.700 0,666 0,599 -10,1 80,0 50,0 -37,5 59,0 23,0 -61,0
Rio Grande do Norte 5.948 0,609 0,561 -7,9 66,0 39,0 -40,9 39,0 14,0 -64,1Sergipe 6.821 0,567 0,560 -1,2 62,0 41,0 -33,9 28,0 15,0 -46,4Nordeste 5.498 0,626 0,573 -8,5 69,6 46,3 -33,5 41,8 19,1 -54,3Brasil 11.658 0,614 0,563 -8,3 40,4 25,2 -37,6 18,2 8,4 -53,8
Fonte: IBGE, PIB per capita Contas Regionais do Brasil 2002-2005, n21, 2007. * PIB per capita (Ano de 2005) atualizado conformea nova metodologia do IBGE para apurao do PIB, divulgada em maro de 2007. IPEA Ipeadata. ** Percentual de pessoas comrenda familiar per capita inferior a linha de pobreza, estimada pelo IPEA, como sendo duas vezes o valor da linha de extrema pobreza.*** Percentual de pessoas com renda familiar per capita inferior a linha de extrema pobreza, estimada pelo IPEA, tomando-se comobase o valor da cesta bsica de alimentos que satisfaa os requisitos nutricionais em cada regio brasileira. (Elaborao prpria)
Analisando a evoluo de alguns indicadores sociais expostos na Tabela 7, entre os
anos de 1991 a 2006, verifica-se que importantes avanos tambm foram registrados na
regio Nordeste. Na educao, a taxa de analfabetismo para as pessoas de 15 anos ou
mais caiu de 36,6% para 20,7%, o equivalente a uma reduo de 43,3%. Nesse perodo, o
estado do Piau apresentou o pior resultado da regio, conseguindo reduzir apenas 35,2%,
ficando abaixo da mdia regional (43,3%). Quanto esperana de vida ao nascer, a regio
elevou de 63 anos para 69 anos. Mesmo assim, continua abaixo da mdia nacional, que em
2006 era de 72 anos. O estado de Pernambuco foi quem obteve a maior taxa de
crescimento, em 1991 a esperana de vida era de 61 anos e passou a 68 anos, em 2006. A
mortalidade infantil tambm apresentou uma significativa reduo na regio Nordeste. Em
1991, a taxa de mortalidade infantil era de 69,6% e passou para 36,9%, em 2006, uma
reduo de 46,9%. O melhor desempenho foi do estado do Piau, que conseguiu reduzir
54,7% o ndice referente mortalidade infantil. Por ltimo, o trabalho infantil tambm
apresentou uma queda significativa na regio. Considerando a faixa etria entre 10 a 14
anos, em 1992 cerca de 8,4% desempenhavam algum tipo de trabalho na regio. Em 2006,
esse ndice caiu para 3,4%, o que significa uma reduo de 59,5%. A Paraba foi o estado
que teve a maior reduo nesse perodo, cerca de 68%.
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Tabela 7 Estados do Nordeste e Brasil: indicadores sociais taxa de analfabetismo,expectativa de vida, mortalidade infantil (1991/2006) e trabalho infantil(1992/2006)
Estados doNordeste e
Brasil
Taxa de Analfabetismo
(15 anos ou mais) (%)
Esperana de vida
ao nascer (anos)
Mortalidade Infantil
(at 1 ano de idade) (%)
Trabalho Infantil
(10 a 14 anos) (%)1991IBGE
2006IBGE
TaxaCresc.
(%)
1991IBGE
2006IBGE
TaxaCresc.
(%)
1991PNUD
2006IBGE
TaxaCresc.
(%)
1992IBGEPNAD
2006IBGEPNAD
TaxaCresc.
(%)
Alagoas 44,0 26,4 -39,9 59,7 66,4 11,2 74,5 51,9 -30,3 6,8 3,9 -42,6Bahia 34,5 18,6 -46,2 65,3 71,7 9,8 70,9 34,5 -51,3 8,0 2,9 -63,8Cear 36,1 20,6 -42,9 64,0 69,9 9,2 63,1 30,8 -51,2 8,1 3,8 -53,1Maranho 40,7 22,8 -44,0 62,1 67,2 8,2 82,0 40,7 -50,3 11,0 4,9 -55,5Paraba 40,6 22,7 -44,0 61,7 68,6 11,2 74,5 39,4 -47,1 9,1 2,9 -68,1Pernambuco 32,9 18,5 -43,8 60,7 67,9 11,9 62,6 39,8 -36,4 8,1 3,5 -56,8Piau 40,5 26,2 -35,2 62,5 68,6 9,8 64,7 29,3 -54,7 9,9 3,5 -64,6Rio Grandedo Norte 34,9 21,8 -37,5 63,3 70,1 10,7 67,9 36,1 -46,9 6,5 2,3 -64,6
Sergipe 35,0 18,2 -47,9 63,4 70,6 11,4 65,8 35,0 -46,8 5,4 2,8 -48,1Nordeste 36,6 20,7 -43,3 62,8 69,4 10,5 69,6 36,9 -46,9 8,4 3,4 -59,5BRASIL 19,4 10,4 -46,5 66,9 72,4 8,2 48,7 25,1 -48,5 5,3 1,9 -64,2Fonte: IBGE Sntese de Indicadores Sociais 2007, n 21, 2007. IBGE PNAD 2006, v.27, 2007. PNUD Atlas dedesenvolvimento humano no Brasil. (Elaborao prpria)
6 CONSIDERAES FINAIS
Os desafios da atual conjuntura brasileira levaram o Estado a adotar polticas
pblicas de promoo do desenvolvimento econmico. Dessa forma, um conjunto de
programas vem marcando a atuao do governo federal na rea social, caracterizando-se
pela predominncia das polticas focalizadas de cunho neoliberal. Mesmo assim, muito
pouco tem sido realizado para combater as causas estruturais da pobreza. A reduo do
dficit habitacional, a eliminao do analfabetismo, do desemprego, da fome, do trabalho
infantil, alm da garantia do acesso educao gratuita, aos servios bsicos de sade e o
bem-estar social continuam precisando de aes eficientes e eficazes.
Como se viu, desde os anos 90, que os programas de transferncia direta de renda
transformaram-se num instrumento valioso, com implicaes econmicas e sociais, para o
enfrentamento da pobreza massificada no Brasil. Neste sentido, o principal programa dessa
natureza, o PBF tem se expandido e gerado efeitos relevantes, mas ainda insuficientes
sobre os ndices sociais, no estando isento de crticas e problemas. Na verdade, os
estudos realizados tm apontado que, apesar dos limites, o PBF tornou-se um indicador do
quanto possvel fazer com polticas pblicas.
Como esse processo ainda est em curso h um debate em aberto sobre esse tema.
Preliminarmente, uma anlise do PBF aponta alguns aspectos problemticos que
necessitam de estudos aprofundados. Os autores SILVA, YAZBEK e GIOVANNI (2007), ao
elencarem algumas questes levantaram alguns pontos que podem ser destacados como: a
obrigatoriedade de freqncia escola, no basta criana estar matriculada e
freqentando a escola, o ensino precisa ser de boa qualidade; a condicionalidade queassocia transferncia monetria a participao das famlias s questes de sade, o que
implica numa ampliao e democratizao dos servios de atendimento sade; o
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monitoramento e avaliao do programa necessitam de uma maior abrangncia para o seu
dimensionamento dos impactos de mdio e longo prazo; por fim, a sustentabilidade
expressa pela continuidade do programa evidencia a fragilidade da organizao popular
enquanto fora de presso reduzindo as possibilidades de impactos estruturantes.Embora se reconhea o mrito e o efeito distributivo do PBF, a focalizao das suas
aes no combate pobreza, sem integrao com outras polticas que atendam as
necessidades bsicas da populao e que forneam bens e servios pblicos de qualidade,
pode gerar o enfraquecimento da consolidao da cidadania. Portanto, para o
enfrentamento da pobreza brasileira primordial que os programas venham acompanhados
de uma ativa e permanente poltica de gerao de emprego e renda e de um ambiente
macroeconmica favorvel s polticas sociais, o que requer que se faa um mnimo de
incurso sobre o comportamento recente e as perspectivas que se abrem para a economiabrasileira e para as polticas sociais (CARDOSO JUNIOR; JACCOUD, 2005).
Portanto, do que foi exposto, conclui-se que sintetizar os avanos e os retrocessos
da poltica social brasileira constitui uma tarefa complexa e difcil. Cabe destacar que,
apesar de todos os esforos do governo federal na rea social, a poltica macroeconmica
deveria est articulada com as variveis estruturais, produtivas e financeiras, como bem
alertou Carneiro (2006, p.7): a dinmica da economia brasileira no pode ser compreendida
apenas como o resultado da interao entre as polticas econmicas. O ideal seria construir
polticas de estabilizao conjuntamente com as polticas de crescimento e
desenvolvimento, partindo-se de negociaes entre governo, empresrios, trabalhadores e
sociedade civil organizada. Para isso, preciso trabalhar arduamente para a criao de
mecanismos capazes de viabilizar um projeto de crescimento auto-sustentado. E assim,
chegar mais perto das solues para a pobreza, pois o futuro do pas depende do modelo
de desenvolvimento adotado no presente.
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