o papel roxo da maçã

17
1 1. 1

Upload: lucas-pinheiro

Post on 28-Mar-2016

625 views

Category:

Documents


98 download

DESCRIPTION

isnspira a criatividade infantil

TRANSCRIPT

Page 1: o papel roxo da maçã

1

1.

1

Page 2: o papel roxo da maçã

2

2

Page 3: o papel roxo da maçã

3

Índice

SumárioCapitulo 1.......................................................................................................................3Capitulo 2.......................................................................................................................5Capitulo 3.......................................................................................................................8Capitulo 4.....................................................................................................................10

3

Page 4: o papel roxo da maçã

4

Capitulo 1

Rosa.É o nome dela: Rosa, rosa.Rosinha, rosal, roseira, rasácea, roseiral, roseta, rosário, rosicler, rosa-flor, rosa-choque, rosa-menina: Rosa.Era linda a Rosa menina de cinco anos.O cabelo preto-pretinho, liso, os olhos também, assim puxadinhos para o canto: afinal, seus avós eram índios da cor da canela e do coração risonho.Rosa, risonha também.

Onde é que ela morava, já não me lembro bem.Sei que era no fim-de-mundo de um mundo sem fim chamado Goiás.Agora, se era Goindira, Goiatuba, Goianesia, Goiatins, Goianorte, Goianás, Goianópolis...O certo é que não podia ser Goiânia.

Então, faz de conta que era na mesma e velha e linda Vila Boa de Goiás.Pronto, então.Rosa, a Rosa, a menina risonha, vivia lá, na Vila Boa de Goiás – e quem quiser que vá até o mapa, como eu fui. Mas vá devagarinho, porque Goiás é um mundo cheio de surpresas coloridas e mil-misteriosas: os segredos.O céu mais azul dessa terra toda, o céu mais lindo que haja. É como dizia o meu amigo Riobaldo Tatarana: O senhor vá ver, em Goiás, como no mundo cabe mundo.

Então, mais uma vez, agora a vez verdadeira.Era uma menina que se chamava Rosa, era linda e viva, morava e crescia em Goiás.É já um bom começo.Tinha mãe? Tinha pai? Tinha bicho?Calma! Por partes. Mãe, sim tinha, esse chamava Dona Marília, que é um nome muito curioso: faz a gente pensar em mar e ilha, duas coisas que lá no Goiás nem não tem.

Pai tinha também: o nome dele era Donizete, nome que no Goiás é mais comum do que Jão ou Zé. Em cada esquina, cada canto de rua, se a gente vê um menino, um homem-feio ou um velhinho e pergunta assim: é como o nome seu? – ele decerto vai responder: Donizete, sô, senão não é goiano dos de verdade.Mas o pai de Rosa, Rosinha risonha, para que a gente não fizesse a confusão com tantos outros, era chamado de Zezete, que é um nome bem engraçadinho. Aliás, foi a Rosa mesma, a filhinha linda, que deu aquele apelido.

Prosseguindo.Bichos, bicho, bichos, tinha, sim.E muitos.Galinhas aos montes.Uma cabritinha sem nome chamada Bé.Alguns porquinhos barulhentos, um papagaio chamado Opaco, e o mais querido, um gato bem vira-lata batizado de Gaiato.

4

Page 5: o papel roxo da maçã

5

Então, de novo.Era uma vez uma menina risonha e linda, tinha cinco anos e se chamava Rosa, filha de dona Marilia e Seu Donizete, todos eles vivendo em Goiás, antigamente chamada Vila Boa de Goiás e hoje para desgosto dos que vivem lá, Goiás Velho.

Será que agente não começa nunca essa história?

Mas é que a história só começa quando, um dia, um dia assim, sem mais sem menos, o pai da Rosa, seu Zezete, disse assim á mãe dela, Dona Marilia:

Vou viajar.

Rosa que nunca tinha saído dali, da Vila Boa, ouviu aquela palavra viajar,Remexeu nas gavetas de lembrança sua gavetinhas ainda pouco cheias, e descobriu nada.Mas deixou lá a palavrinha, viajar, bem acomodada, para um-dia-talvez-quem-sabe descobrir de novo de onde vinha a para onde levava.

Eu Seu Zezete foi.Foi.Durou alguns dias.Quantos?Criança de cinco anos ainda não sabe medir o tempo não existe e, por isso, não carece de medida.E volto.Agora, sim, é que vamos ver o que aconteceu coisa nova e muito estranha.Mas muito boa.

Seu Zezete voltou de viagem e trouxe coisinhas, presentinhos para a Rosa filhinha sua e Dona Marilia, mãe da Rosa.O presente da risonha Rosinha foi uma nunca vista antes fruta vermelha, da pele fina e lisa, que chegou embrulhadinha numa coisa simplesmente deslumbrante um papel de seda roxo, roxo assim como o céu do cerrado ao pôr do sol dos meios de agosto(tenho pena de quem nunca esteve lá para ver como é bonito!).

5

Page 6: o papel roxo da maçã

6

Capitulo 2

Então, Rosinha pegou aquela coisa redonda coberta de papel roxo e ficou olhando para ela durante muitos minutos, compridos.Dona Marília reparou naquilo e disse

-Rosinha, minha filha, ce sebe o que é isso?

De frutas Rosinha conhecia o araticum, o cajá-manga, a manga mesma, a goiaba e o pequi, mas aquela nova...

Aí, sem saber porquê, Rosinha encostou a orelhinha no papel roxo como se estivesse ouvindo alguma coisa lá dentro.E parece que ouviu mesmo, porque logo respondeu:

-Isso, mãe, é maçã...

Dona Marilia, admirada com a esperteza da menina-rosa, chamou o marido:

-Ô Zezete foi ocê que disse pra Rosinha o nome da maçã?

-Eu não, uai.

E os dois ficaram espiando, olhando com muita atenção a filhinha linda.Rosinha então, risonha, com toda a delicadeza, desembrulhou a maça, deixou a maça em cima da mesa e foi para o quintal, levando o papel roxo, gostoso, macio, friinho.Aí se repetiu o milagre.

Rosinha chegou novamente o papel perto do ouvido. E dessa vez ouviu muitas coisas estranhas, esquisitas, uma zoada nova, um ti-ti-ti de coisas, gente falando, portas batendo, campainhas tilintando, ruídos mil e mil.

De repente, do meio daquele bafafá, daquele rififi que vinha do papel roxo da maça, Rosa reconheceu a voz do próprio pai.

Ficou tão feliz tão contente que voltou para dentro de casa. Procurou pai e mãe e começou. Assim:

-Pai, lá onde ce comprou a maçã pra mim tinha uma mulher velha e chata, falando muito e com um cachorrinho preto no colo?

O pai, muitíssimo espantadíssimo demais da conta, falo:

-Tinha – e olhou para dona Marília como quem pergunta como-é-que-pode.

-Rosa, sem se dar conta do espanto que estava provocando, continuou:

6

Page 7: o papel roxo da maçã

7

- A maçã custou foi cinco contos, não foram?

-O pai, de olhar arregalado: Foi.

- E tava fazendo muito frio lá, onde ocê comprou a maçã, num tava?

-O pai, quase sem fala:

- Tava, é...

Dona Marília, percebendo o estado de choque do marido, pegou Rosinha, pôs ela no colo e perguntou como era que ela tinha sabido daquilo tudo, se o pai nem não tinha contado nada. -Ué, mãe, foi o papel roxo da maçã que me contou tudo!Dona Marília não quis acreditar: -Ah, é, foi? E cadê esse papel, menina?Rosa tirou azedinha do bolso da saia colorida que estava vestindo: -Ta aqui, ó! -Então, me conta mais alguma coisa do lugar lá onde seu pai comprou a maçã, vai – Dona Marília que pediu.

Rosinha, sem saber que aquilo era um teste, pôs de novo o papel junto da orelhinha e disse:

-A moça que vendeu a maçã se chama Rosa, e o pai ficou todo contente e falou pra ela que tinha uma filha chamada Rosa, e a moça também ficou feliz e riu.

Dona Marília olhou para Seu Zezete, buscando a confirmação. Seu Zezete só fez um sim com a cabeça.Dona Marília, então, muito religiosa que era, pensou assim: “Valei-me, minha Nó´Senhora dÁbadia! Será que tenho uma santinha aqui den´de casa?” Mas não disse nada, para não assustar a menina.

Lá conversar mais tarde com o Padre Donizete (mais um, ta vendo?) para ver o que se deveria fazer um caso feito aquele.Mandou Rosinha passear e ficou conversando com o marido, tentando acalmar o pobre, porque os homens se espantam mesmo assim, á-toa-toa.

7

Page 8: o papel roxo da maçã

8

Rosinha, feliz da vida, continuou a escutar as coisas que o papel roxo da maçã contava para ela.Depois, á noitinha, guardou a seda dentro de seu baú de brinquedos, foi jantar.

Conversou muito com o gato Gaiato, que nada dizia, mas por ser tão lindo, já era uma companhia ótima.

Voltou para o quarto, rezou para Santa Teresinha do Menino Jesus, que também é menina, e dormiu.

No dia seguinte, logo de manhãzinha, depois do café com bolo de milho, Rosa Rosinha, a risonha, passando pela sala, viu o pai arrumando umas coisas no móvel grande que se chama estante. Tinha um pacote bem grande no chão, e desse pacote o pai, ia tirando umas caixinhas engraçadas, com tamanhos e cores variados. Não quis perguntar ao pai. Mas, de novo, aconteceu a coisa...

Cada uma daquelas caixas, que o pai tirava do pacote fazia um barulho diferente: ora feliz, ora triste, ora medonho, ora suave, às músicas, ás vezes gritos, choro de criança, ou de mulher ou de homem, ruídos de animais.

O pai terminou de guardartudo, a estante ficou cheinha, cheia de barulhos, como uma banda de música, tocando no meio da sala a todo vapor.

Rosa não resistiu:

-Pai, que são essas coisas que ce pôs aí, no móvel?E o pai, tranqüilo:

- Livros, minha flor, que eu trouxe da viagem.“Livros, é? Que engraçado!” Perguntando novamente.

- Pai, a gente faz o que quer com eles?

- A gente lê, Rosinha, a gente lê livros.

- E é como, isso de “lê”?

8

Page 9: o papel roxo da maçã

9

Capitulo 3

O pai pegou um dos livros, abriu uma página qualquer e mostrou as letras para a filha.

- Ce ta vendo essas coisinha pretas aqui?

- Hum-hum, to.

- Pois então são letras, as letras juntas são palavras e, quando a gente vai para escola a gente aprende a ler .

Rosinha tomou o livro da mão do pai, na mesma página, fazia um barulho seco, meio que triste barulho que, afinal, só ela ouvia.Rosinha pôs o livro junto do ouvido e depois disse ao pai: _ Tadinha da cachorrinha, pai ele morreu, e morreu sonhando...o pai, então assutado leu o nome do livro na capa : Vidas Secas, era verdade, achou que sua filha era milagrosa , ouvia coisas, meu DEUS!

-Pai, eu acho que já sei ler.As formiguinhas-letrinhas me contam tudo, só que é muito barulho que ás vezes dói, dá dorzinha de cabeça...

O pai abraçou a meninazinha-flor, apertou ela gostosamente e disse bem assim:

-Rosinha, você é a coisa mais lindaque o pai tem, ouvido?Eu gosto d´ocê demais da conta!

E a Rosa,acostumada ao amor de pai e mãe, nem deu fé que aquela frase era mais sincera que as de sempre.

9

Page 10: o papel roxo da maçã

10

Rosa, a risonha, foi então brincar com sua amiga mais querida, chamada Adélia.Contou que escutava coisas no papel roxo da maçã e nos livros da estante do pai.Adélia nem ficou assim tão surpresa porque – vejam só! – ela também ouvia os barulhinhos, só que nos vidros de remédios da mãe, quando ficaram vazios, a na folhinha do calendário.Rosinha ficou contente:

-Adélia, vamos ver se é assim com todo mundo?

E foram ver.

E pois não era?Todas as meninas de por ali também ouviam ruidinhos e vozes e vacas e cães e locomotivas e choro e ranger de dentes e telefones e tempestades e apitos de navio.

Todas, todas.Clarice.Cecília.Teresa.Florbela.Ligia e Emilia.

Rosinha ficou alegre como água fresca, mas não disse nada nem ao pai nem á mãe.Assim combinaram todas as meninas.Ia ser um segredinho só delas.

Foi aí que a Rosa pensou-será que quando a mãe dela, Dona Marília, era menina também não ouviu essas coisas, aquelas? E agora, já grande, mulher, será que tinha esquecido, assim de vez? Ficou com esse pensamentozinho na àbeça muito tempo seguido.

10

Page 11: o papel roxo da maçã

11

Capitulo 4

Os mezes foram passamdo.Até que um belo dia de verão, apareceu Dona Marília com mais novidades:

-Rosinha, meu bem, hoje é um dia muito importante pra você.

-ah, é? E por causa de quê, hein, mãe?

-hoje ce vai pra escola.

Rosinha já tinha escutado aquela palavra escola, mas não sabia bem bem o que fosse.Suas primas Clementina e Maria Alice já iam para a escola e até gostavam.Se era bom, então, ela também gostava de ir.

-vamos, mãe, então, agora, já!

Iam, sim, só que antes Dona Marília quis dar um banho cheiroso na risonha Rosa, vestir nela a mais bonitinha roupa, entregar a ela um caderno colorido e um lápis preto.Então foram.

A escola, cá entre nós, no de verdade, não era bem uma escola, mas uma escolazinha.Era assim: a irmã de Dona Marília, tia Malena, morava numa casa muito grande.Então, como gostaria muito demais de criança, resolveu que ia ensinar a elas irem para a escola, a ESCOLONA, que ficava depois da ponte, depois da casa da vó Cora Coralina.

Tinha uma parede lisinha, pintada de verde.Nela Tia Malena escrevia com a pedrinha branca e comprida(que Rosinha aprendeu o nome:giz).Tinha também algumas mesinhas com cadeiras e um punhado de meninas, umas dez ou doze.

11

Page 12: o papel roxo da maçã

12

Tia Malena é um encanto, mas é seria e quer que as meninas todas repitam a-e-i-o-u, desenhem com muito cuidado as letrinhas, aprendam tudo.

Naquela dia, então, Rosihha aprendeu que, quando a gente passa mal, junta um a e um i quantas vezes quiser e diz: ai-ai-ai-ai-ai-ai-ai-ai...

Que, quando a gente fala da gente mesmo, pode juntar o peixinho com o cabelinho e dizer, sem mais complicação: eu

Que, quando a gente se espanta ou não acredita no que estão contando, pode comentar: uai.

Rosinha voltou aquele dia para casa apaixonada pelas letras mágicas.E descobriu, na sala, uma coisa nova: os livros na estante faziam menos barulho agora do que antes.Seria por que?

Pegou um deles e viu lá dentro o á-é-i-ó-u no meio de outras tantas letrinhas e formiguinhas que ainda não conhecia.

E um desejo novo, enorme, começou a crescer no coração da risonha Rosa menina-flor, Rosinha.Queria ler todos aqueles livros, todos, todinhos, sem deixar nem um só de fora.

12

Page 13: o papel roxo da maçã

13

Rosinha então pereceu preocupada.

-Sei não, Adélia, sei não

-sabe não o quê, Rosinha?

-Quando a gente termina de aprender tudo e ficar prontinha para escrever, a gente já cresceu, já não é mais criança, já esqueceu de tudo... fica assim, feito a minha mãe, a sua, que não acreditam que a gente escuta coisas no papel roxo da maçã, no vidro de xarope, no papel de pão...

-Ah, não! Pois isso mesmo, Rosinha...Eu vou ser diferente, eu vou me lembrar de tudo, tudo, tudo, todinho, Tim-Tim por Tim-Tim, ora se não vou...

13

Page 14: o papel roxo da maçã

14

E assim acontecendo foi.Quanto mais aprendia na escola da Tia Malena, menos barulho as coisas faziam em volta de Rosinha.

Até que, no fim do ano, Rosinha entrou em casa e...

E não ouviu nada.Era tudo um grande silêncio.Correu até o quarto e procurou o papel roxo da maçã

14