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Ano 4 - Nº 15 Setembro/2016 O combate à corrupção no México / Mercado de auditorias sob pressão Os riscos da profissão de compliance officer / O poder da comunicação Profissional da área de controles internos, o presidente da Volvo Cars no Brasil, Luis Rezende, sabe que o importante mesmo é criar uma cultura de transparência e integridade e Mais: Luis Rezende: presidente da Volvo Cars O PaPeL dO LídeR O PaPeL dO LídeR

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Ano 4 - Nº 15 Setembro/2016

O combate à corrupção no México / Mercado de auditorias sob pressãoOs riscos da profissão de compliance officer / O poder da comunicação

Profissional da área de controles internos, o presidente da Volvo Cars no Brasil, Luis Rezende, sabe que o importante mesmo é criar uma cultura de transparência e integridade

e Mais:

Luis Rezende: presidente da

Volvo Cars

O PaPeLdO LídeRO PaPeL dO LídeR

CURSO DE COMPLIANCE FINANCEIROÍNICIO DIA 01/10/2016 - SÃO PAULO / SP

MÓDU

LOS D

ISPO

NÍVE

IS

MÓDULO I - Data: 01/10/2016COMPLIANCE FINANCEIRO – OVERVIEW MÓDULO IV - Data: 19/11/2016PROGRAMA DE COMPLIANCE EM BANCOS MÚLTIPLOSMÓDULO VI - Data: 10/12/2016FATCA E RESPONSABILIDADE SOCIOAMBIENTALMÓDULO VIII – Data: 21/01/2016CRIMES FINANCEIROSMÓDULO X - Data: 11/02/2017GESTÃO DE TERCEIROS

MÓDULOS II E III - Data: 29/10/2016MERCADO DE CAPITAIS E MERCADO DE PAGAMENTOSMÓDULO V – Data: 19/11/2016PROGRAMA DE COMPLIANCE DAS CORRETORAS DE CÂMBIOMÓDULO VII - Data: 10/12/2016PROGRAMA DE COMPLIANCE DAS SEGURADORAS E CORRETORAS DE SEGUROSMÓDULO IX – Data: 21/01/2017PROGRAMA DE PREVENÇÃO AO TERRORISMO E CYBERCRIMESMÓDULO XI - Data: 11/02/2017DILEMAS E DESAFIOS DO COMPLIANCE OFFICER

LEGALETHICS COMPLIANCE

(11) 3259-2837www.lecnews.com

[email protected]

Curso desenvolvido especialmente para profissionais que atuam na indústria farmacêutica e saúde, buscando aprimorar conhecimentos e discutir as melhores práticas aplicáveis aos

setores farmacêutico, dispositivos e tecnologia médica, hospitalar, securitária e tecnologia em saúde. Sob a tutoria dos melhores profissionais do mercado, a metodologia do CCFS baseia-se

nas melhores práticas, nacionais e internacionais, de Compliance e conduta corporativa.

AGUARDE MAIS INFORMAÇÕES

CURSO DE COMPLIANCE NAINDÚSTRIA FARMACÊUTICA E SAÚDE

www.lecnews.com.br LEC - LEGAL, ETHICS, COMPLIANCE 3

A comunicação é uma das maiores aliadas dos profissionais de compliance para conquistar e engajar o público da empresa.

6. Especial

O ministro Torquato Jardim faz um balanço dos primeiros meses à frente da CGU.

12. Entrevista

A criação dos primeiros comitês da LEC: Compliance Digital, Compliance Farmacêutico e Comunicação e Gestão de Crises.

21. Papo de Compliance

A conta da corrupção na Embraer começou a chegar. E ela é bem salgada.

15. LEC News

Será que ser compliance officer virou profissão de risco?

18. Papo de Compliance

O governo chinês usa a corrupção como pretexto para intervir na economia das províncias que não seguem seus planos.

28. LEC News – Anticorrupção

A difícil relação entre a tecnologia e a Justiça do Trabalho.

31. Digital

A globalização dos sindicatos.49. LEC News – RH

As empresas de auditoria estão, de novo, sob pressão.

42. Mercado

O bom trabalho dos órgãos de controles internos dos estados.

24. Poder público

O presidente da Volvo Cars, Luis Rezende, estreia a nova seção da LEC.

32. Tone at the top

Os países com maior risco de lavagem de dinheiro do mundo.

40. LEC News – PLD

As mudanças no mercado europeu de auditorias.

46. Mercado

Quem disse que investir em compliance é caro?

50. Pilares do Compliance

A economia do México avançou muito nos últimos anos. O combate à corrupção, nem tanto.

36. Internacional

A primeira publicação de negócios com foco em compliance do Brasil

Idealizador: Daniel SibilleDiretora: Alessandra Gonsales

Gestor de Comunicação: Renato Paim – [email protected]

Editora LECRua Martin Afonso, 150 – Belenzinho 03057-050 – São Paulo – [email protected]

REDAÇÃO E EDIÇÃO

Fundador: José Luiz de Paula Jr.Editor e Publisher: Aûani Cusma de Paula

Colaboraram nesta edição: Bruna Soares (re-visão), Gabriel Oda e Rafael Amorim (Textos)

Cusman Editora Especializada LtdaRua Dom Duarte Leopoldo, 678 – Cambuci 01542-000 – São Paulo – SPFone: (11) 3392-2584 [email protected]

A revista LEC não se responsabiliza pelas informações emitidas por terceiros.

LEC • sumário

lec • editorial

| LEC - LEGAL, ETHICS, COMPLIANCE • ED 154

O universo de compliance é gigantesco e envolve diversas áreas de especialização que demandam conhecimentos específicos e aprofundados. As nuances podem variar de acordo com a área de

atuação econômica da empresa, as regiões atendidas por ela, ou também, especialidades que funcionam de maneira transversal, como as que envolvem questões trabalhistas e ambientais. Já falamos algumas vezes sobre esses temas nas páginas da LEC.

A verdade é que tudo isso ainda é novo por aqui e, de fato, muitos desses conhecimentos precisam ser aprimo-rados. E, esse é o tipo de conhecimento que é muito em-basado na experiência conquistada pelo profissional com a vivência do dia a dia. Só que esse conhecimento, que está nas mentes das mulheres e homens de compliance do Bra-sil, quando fica restrito apenas a eles mesmos, não agrega em nada para o desenvolvimento da área no Brasil. Fazer o conhecimento circular é o meio mais rápido que temos para aprofundar e acelerar a difusão e a qualidade do tra-balho dos compliance officers no Brasil e a LEC está 100% comprometida com isso desde a sua criação.

Em mais uma mostra desse nosso compromisso, abri-mos as portas da LEC Academy, nosso centro de conhe-cimento, para receber os primeiros comitês de complian-ce da LEC, dedicados ao estudo de três áreas específicas: Compliance Digital, Compliance Farmacêutico e Comu-nicação e Gestão de Crises. Cada comitê opera de forma independente, sob a supervisão de um coordenador com reconhecido conhecimento no tema e terá como missão principal aprofundar os estudos e as discussões acerca da-quele determinado assunto, produzindo conhecimento relevante para contribuir para a melhor compreensão e a evolução do trabalho dos profissionais naquela área. No decorrer dos próximos meses, você certamente terá muitas notícias sobre o trabalho desses comitês.

Mais especializaçãoEm um dos últimos editoriais, disse aqui que a atuação do compliance precisa avançar para além das questões ligadas

à corrupção. A LEC tem orgulho de ter formado mais de 500 profissionais no seu Curso de Compliance Anticor-rupção, o primeiro desenvolvido com uma visão prática do tema. O curso continua sendo um sucesso de público e crítica, mas não temos por hábito deitar em berço esplen-dido. Por isso, a partir de outubro, a LEC dá início a uma nova geração de cursos, com enfoque direcionado para im-portantes segmentos do mercado. O primeiro deles será o Curso de Compliance Financeiro.

Assim como tudo o que a LEC desenvolve, o Curso de Compliance Financeiro tem como pilar de sustentação um time de instrutores altamente especializados e experientes, que prepararam uma grade que representa o dia a dia de um profissional que atua nesse setor. O curso também ino-va ao oferecer módulos para segmentos específicos como corretoras de câmbio, meios de pagamento, bancos múl-tiplos, fundos de investimento preparando o profissional para atuar em qualquer área do segmento financeiro, ou, simplesmente, aprofundar o seu conhecimento em uma área especifica.

Em breve, será lançado também o lançamento do Curso de Compliance Farmacêutico, que certamente será a gran-de referência para os profissionais desse mercado. E, ainda, a 2ª turma do curso de Compliance anticorrupção online.

Você pode estar certo que, assim como o compliance no Brasil, estamos sempre nos aprimorando.

Boa Leitura,

oceano azulAssim como no famoso livro de gestão e emprendedorismo, a área de compliance oferece um mar de oportunidades

Alessandra GonsalesSócia-fundadora

[email protected]

LEGALETHICS COMPLIANCE

NOVAS TURMAS - INTENSIVO (PRESENCIAL)

• Curso pioneiro em compliance e integridade corporativa no Brasil.• Abordagem prática e professores atuantes no mercado.• Conteúdo abrangente e alinhado com as exigências da Certificação Profissional em Compliance Anticorrupção CPC-A, idealizada pelo Lec Certification Board e operada em parceria com a FGV Projetos.• Maior comunidade de compliance da América Latina.• Sede na Av Paulista em frente ao metrô Trianon-Masp.• Curso Online com evento ao vivo e mentoring (turmas limitadas a 100 pessoas).

CARACTERÍSTICAS DO CURSO

DIARIAMENTE, DE 21/11/2016 A 02/12/2016

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CURSO DE COMPLIANCE ANTICORRUPÇÃO

Dia 21/11/2016 – Compliance Overview – Suporte da Alta AdministraçãoDia 22/11/2016 – Legislações AnticorrupçãoDia 23/11/2016 – Compliance DigitalDia 24/11/2016 – Risk AssessmentDia 25/11/2016 – Due DiligenceDia 28/11/2016 – Auditoria e MonitoramentoDia 29/11/2016 – Comunicação e Treinamento

– Criminal ComplianceDia 30/11/2016 – Investigação e ReporteDia 01/12/2016 – Políticas e Controles InternosDia 02/12/2016 – Casos Práticos

especial • comunicação

| LEC - LEGAL, ETHICS, COMPLIANCE • ED 156

Vamos ser sinceros, o medo foi um fator fundamental para a introdução e a disseminação do compliance. Foi só quando

passaram a encarar o risco real de so-frerem sanções pesadíssimas dos re-guladores que as grandes empresas realmente correram atrás para instau-rar seus programas. A necessidade de implementá-los rapidamente – como algo praticamente mandatório – e a falta de conhecimento e de boas práti-cas sobre o assunto fez com que os pri-meiros profissionais da área se vales-sem muito dessa obrigatoriedade num primeiro momento. “Por que eu preci-so avisar sobre com qual cliente eu vou almoçar? ”, “Por que eu não posso dar mais um brinde legal? ”, “Porque esses caras de compliance não me deixam fazer o negócio do jeito que sempre foi feito? ”. No calor dos primeiros anos de implementação, parte substancial das respostas não avançou para mui-

Pilar básico da área: sem um bom plano de comunicação, fica difícil vender o compliance e conquistar o público da empresa

to além de um simples “porque não pode!”, no máximo um “porque a lei não permite!”. É claro que as leis e as políticas de uma empresa existem para serem seguidas. Mas as pessoas costu-mam ficar mais confortáveis quando sabem o motivo de precisarem fazer aquilo, principalmente em uma área como o compliance, que lida com re-gras e procedimentos, mas também com valores e, dependendo de como for colocado, com a própria honra das pessoas. Muitos profissionais de com-pliance, ao apresentarem os primeiros programas nas empresas, escutaram questionamentos do tipo: “Você está questionando a minha honestidade? ”, ou, “Se eu nunca fiz nada de errado porque a empresa está me questionan-do sobre corrupção? ”.

Sim, o compliance pode funcionar só pela dor, com base simplesmente em obrigar as pessoas a cumprir com as diferentes obrigações da área, só que, definitivamente, esse não é o modelo mais eficaz para fazer os funcionários o aceitarem. “A pessoa pode até te se-

guir pelo medo. Mas o resultado não é a mesma coisa do que ela comprar sua ideia”, acredita Marcelo Noguei-ra, compliance officer da Sandoz, uma subsidiária da farmacêutica Novartis. “Quando ela segue pelo medo, é o lance da punição, mas na hora em que achar que não está sendo vigiada, ela pode ir lá e fazer algo errado, porque a única coisa que segura ela é o medo”, emenda.

O executivo, que chegou a empresa no final de 2015, encontrou um pro-grama de compliance bem estrutura-do. Sua missão era torná-lo assimilado. Para isso, mudou o eixo de trabalho da área deixando a simples “martelação” sobre a obrigatoriedade de estar em compliance, para fazer um trabalho mais focado em explicar os riscos e mostrar como o trabalho da área im-pacta na vida das pessoas.

Quem não se comunica, se trumbica

7www.lecnews.com.br

Clareza é fundamentalAs ferramentas e possibilidades de co-municação com o público interno hoje são muitas e variadas: de formatos tra-dicionais, como os murais, jornais in-ternos e e-mails corporativos, até o uso de aplicativos para dispositivos mó-veis e redes sociais corporativas. Cada plataforma cumpre com um papel no mix de comunicação, mas antes de qualquer coisa, é preciso saber o que comunicar. “Independente do meio de comunicação utilizado, o complian-ce officer deve sempre prezar por uma mensagem atraente ao seu público-al-vo, levando em consideração as carac-terísticas e cultura organizacional da empresa”, pontua Giovana Valeriano, compliance officer da empresa de tec-nologia alemã SAP.

Ter clareza da mensagem que se quer passar é fundamental para o su-

Com o desafio de trazer as pesso-as mais para perto, o executivo tem envolvido profissionais de diferentes áreas para participar dos processos de melhoria da área. “Quando as pessoas se sentem parte do processo de criação, seguem isso muito mais fácil. Elas vão entender os riscos da empresa, o con-texto das regras e passam a segui-las como algo automático. E então, entra o trabalho de comunicação, investi-mos muito nisso”, conta Marcelo.

Trata-se de uma mudança cultural do compliance. Ao invés de querer se impor, trabalhar para conquistar men-tes e corações do público da empresa. Para isso, é preciso vender adequada-mente o compliance e seus benefícios. As diferentes ferramentas de comuni-cação representam a forma mais eficaz de transmitir essa mensagem aos seus “consumidores”.

cesso de qualquer campanha de comu-nicação, e no caso de um tema novo, delicado e complexo como o da área em questão, saber como traduzir a mensagem e todos os elementos fun-damentais do universo do compliance para o grande público da empresa é um desafio e tanto.

Mais importante do que ser bonita, a mensagem que se quer (ou precisa) ser passada tem de ser entendida. O mundo do compliance, como qual-quer outra área, tem as suas próprias gírias. Enforcements, DPA´s, FCPA, DoJ, tone at the top, check-in-the-box, due diligence... São termos tão naturais e usados de maneira tão espontânea que os profissionais de compliance se esquecem de que, quem está do outro lado, não faz a menor ideia do que eles estão falando. E, se a sua audiência não entendeu a mensagem direito, é por-que você – e não eles – está fazendo alguma coisa errada.

No início dos anos 2000, tradu-zir os jargões técnicos e regulatórios, a maior parte deles em inglês, para a linguagem dos negócios, que pudesse ser entendida claramente pela pessoa que está na ponta dos negócios foi um dos primeiros desafios encarados pela área de controles internos e complian-ce da Bradesco Seguros. ”Procuramos montar isso no decorrer do tempo. A página da intranet exclusiva para os te-mas da área foi nosso primeiro desafio, depois o jornalzinho e os cursos de e--learning”, lembra o gerente-executivo de controles internos e compliance da empresa, Valdinei Donizetti. A área foi desenvolvendo essa linguagem mais acessível na medida em que foi evoluindo com a geração de conteúdo sobre o tema e o uso de novas plata-formas. Atualmente, a área conta com duas pessoas dedicadas à geração e à publicação de conteúdos praticamente diários sobre controles internos e com-pliance nas diferentes plataformas de comunicação da qual faz uso.

ConheCendo Cada audiênCiaTodo mundo sabe que o treinamen-

O ÍCONE DA ALEGRIA E DA COMUNICAÇÃO CHACRINHA:

não é pelo medo que a area de compliance vai conseguir criar

uma cultura de integridade.

especial • comunicação

| LEC - LEGAL, ETHICS, COMPLIANCE • ED 158

to para o chão de fábrica tem que ter uma linguagem mais leve e baseada em exemplos do dia a dia, que os diretores e altos executivos precisam de informa-ções mais rápidas e dinâmicas sobre o assunto, e que as pessoas mais expostas precisam de conhecimentos específicos.

Pensar na comunicação do com-pliance já levando em conta esses di-ferentes perfis de público é de extrema importância e, entender a dinâmica do dia a dia do trabalho de cada um de-les é fundamental na hora de definir a plataforma de comunicação mais ade-quada para cada grupo. Pegue o caso do pessoal de vendas, que está quase sem-pre na rua e que em muitos casos não

vai mais do que uma vez por semana ao escritório. Ferramentas mais tradi-cionais de comunicação interna, como o jornal corporativo ou mesmo comu-nicados enviados por e-mail não cos-tumam ter grande aderência entre esse público. Por isso, formatos que permi-tam mandar mensagens curtas e pontu-ais, principalmente de lembretes sobre ações que ele precisa tomar, como ler a nova versão do código de conduta, são mais indicados para alcançar o sucesso na comunicação. Enquadram-se aí as mensagens de texto (quando a equipe de vendas conta com celular corporati-vo) e pop-ups na página de abertura da intranet da empresa.

Os principais executivos da empre-sa também têm pouco tempo disponí-vel em suas agendas para conhecer em maior profundidade o programa de compliance e todos os seus processos e mecanismos de prevenção e atua-ção. Ciente disso, a Bradesco Seguros, quando precisou comunicar a revisão das suas políticas de controles internos e compliance, decidiu criar algo sob medida para essa turma. A área desen-volveu um caderno, algo tão simples quanto ainda extremamente útil para qualquer profissional, e agregou no iní-cio dele algumas páginas com as princi-pais informações de controles internos e compliance, como o mapa estratégico e o portfólio de atividades da área. Já na parte final do caderno, os executivos podiam consultar a política na íntegra e esclarecimentos de temas como os di-ferentes tipos de risco e como eles são calculados.

No caso da seguradora, a própria comunicação com o time de complian-ce precisou de uma estratégia diferen-ciada. Como a equipe é grande – são cerca de 80 pessoas divididas entre a matriz em São Paulo, unidades de ne-gócios no Rio de Janeiro e também em outras filiais Brasil afora – as pessoas até se falam por telefone e e-mail, porém muitas delas pouco conheciam seus co-legas. Para melhorar essa integração, em 2014, ano da Copa do Mundo, foi lan-çado um álbum de figurinhas da equi-

pe de controles internos e compliance que trazia também informações sobre os gostos e hábitos de cada membro da equipe e também os principais marcos na história da área. Lançado durante o encontro anual da área e, para comple-tá-lo, as pessoas tinham que trocar suas figurinhas com outros funcionários. Os primeiros a preencherem o álbum foram premiados. De quebra, Valdinei aproveitou o momento para divulgar o Balanced Score Card da área para o time. Uma forma bem diferente de se comunicar.

Para falar com os estagiários da área de vendas – um público notadamente jovem e que tem, em relação ao com-pliance, muito medo – a Sandoz esta-beleceu uma abordagem especial. “Eles só sabem que não podem fazer, mas não entendem o porquê daquilo”, diz Mar-celo em relação às regras de compliance. É com esse público que a área está tes-tando uma nova ferramenta para se co-municar chamada Yammer, uma rede social corporativa. Por uma série de motivos, esse público é mais distante da companhia e fica muito mais no cam-po. Mas eles também são mais conec-tados e ansiosos, e o melhor, é que vem sem os vícios do passado, gerados por um modelo de funcionamento um tan-to torto do mercado, com festas e janta-res caríssimos oferecidos pelas empresas para os médicos, o que ajuda a explicar o fato extremo de proibir a distribuição de canetas. Marcelo lembra-se de uma visita de campo que ele realizou com um estagiário. “Depois de apresentar os lançamentos da empresa, no que estáva-mos saindo, vi que foram perguntar se ele não tinha uma caneta para dar. Ele explicou que a empresa não dava mais – porque a Sandoz aboliu qualquer prá-tica de brindes que podem influenciá--lo a dispensar um medicamento da empresa, que não fosse pela qualidade do produto. Isso foi exibido num dos nossos vídeos e isso me deixou muito feliz, porque a mensagem foi assimilada na ponta.”

As empresas mais avançadas no seu processo de comunicação de com-

MARCELO NOGUEIRA, DA sANDOz: missão de fazer um programa que era seguido ser assimilado.

9www.lecnews.com.br

pliance conseguem ir um ou dois pas-sos além, segmentar regionalmente e até por faixa etária. Claro que para isso é preciso contar com ferramentas que permitem gerar dados suficiente-mente confiáveis para direcionar esses esforços. Na Bradesco Seguros, uma Pesquisa de Avaliação do Ambiente de Controle ajuda a área a direcionar os seus esforços de comunicação e até a revisão do plano de trabalho. Da pes-quisa é possível extrair uma série de in-dicadores e analisar o nível de conheci-mento de acordo com o perfil de quem está respondendo, assim como o nível de adesão de profissionais de diferentes áreas, regiões e níveis hierárquicos. Em sua oitava edição, a pesquisa voluntária teve a adesão de 70% dos funcionários da seguradora, com mais de quatro mil funcionários respondendo a mais de 20 questões relacionadas aos controles internos e compliance. “Podemos ata-car regiões especificas quando identifi-camos uma baixa adesão. Até porque pode ser algo cultural da região, mas pode ser também um problema especí-fico daquela filial, como a falta de in-centivo do líder da região. Com essas informações, é possível fazer um pedi-do de mais apoio do líder para o tema, incorporando-o na sua abordagem do dia a dia”, explica Valdinei Donizetti.

múltiplas plataformasEm meio às inúmeras novas possibili-dades de comunicação, é importante que o compliance officer consiga fazer bom uso de todas elas, de acordo com o tipo de mensagem que se quer passar e com a audiência que se busca atingir. Planos multimídia de comunicação, que compreendem formatos online e físico, além de eventos e outras ações presenciais, ganham cada vez mais espa-ço nas empresas. Na SAP, o reforço dos temas da área é feito por meio de dife-rentes canais digitais como newsletters trimestrais, mensagens na intranet e site corporativo, que são ágeis, práticos e econômicos; impressos como as bro-churas e os cartazes que oferecem uma comunicação acessível e leitura dinâ-

mica; além dos meios eletrônicos, com uma programação na TV corporativa da empresa que, apesar do custo eleva-do, tem se mostrado um instrumento eficiente para informar e estreitar o relacionamento entre a empresa e seus colaboradores, de acordo com Giovana.

“Cada vez mais é necessário que o Departamento de Compliance seja criativo e invista na diversificação dos canais informativos para obter uma efe-tiva comunicação do seu programa”, lembra a compliance officer da SAP. Essa abordagem criativa pode ajudar a dar uma cara nova para canais de co-municação bastante tradicionais. É o que tem acontecido com uma das fer-ramentas mais utilizadas pela área de compliance das empresas, o tradicio-nal jornal interno corporativo. É bas-tante comum, hoje em dia, encontrar um espaço dedicado aos temas da área dentro deles. E ainda, o objetivo tem sido fugir do convencional, buscando uma forma mais humana e divertida de falar, desmistificando as coisas de compliance. “É mais sobre curiosi-

dades para despertar o interesse nas pessoas”, reforça Marcelo, da Sandoz. É lógico que quanto mais pontos de impacto a sua comunicação permitir, melhor. Mas ainda existe um ponto de impacto fundamental, e dos quais o compliance officer não deve se esquecer jamais, isto é, ele mesmo. É preciso es-tar acessível – na verdade é preciso estar e se fazer perceber acessível.

Não adianta só falar em ser parcei-ro do negócio, é preciso estar lá para apoiar, tirar dúvidas e ajudar sempre que alguém te chama. Caso contrário, a frustração pode acabar com qualquer confiança dos profissionais no tra-balho. É como comprar um produto por causa dos benefícios propostos no anúncio e, depois, na hora que você usa, descobrir que o produto não en-trega o que promete. É quase certeza que você não vai querer mais nem ou-vir falar daquela marca.

Apesar de já buscar maior proximi-dade no dia a dia com as outras áreas, é preciso reforçar a abertura que existe,

pRODUtOs DA NAtURA: comunicação intensa para o lançamento da nova área de compliance da empresa.

especial • comunicação

| LEC - LEGAL, ETHICS, COMPLIANCE • ED 1510

especialmente quando levamos em con-ta que a grande maioria dos funcioná-rios da empresa vê o compliance officer, quando muito, em um treinamento anual da área, ministrado para grupos de dezenas, até centenas de funcio-nários ao mesmo tempo. As empresas que têm programas de compliance cer-tamente contam com canais formais para receber denúncias de violações e práticas ilegais. Contudo, estabelecer também um canal de comunicação ofi-cial, porém mais informal com o profis-sional de compliance, pode ajudá-lo a aproximar o pessoal. Na Sandoz, no re-cém-implementado programa Fale com o Compliance, Marcelo Nogueira fica disponível uma hora por mês para re-ceber ligações diretas de qualquer pro-fissional da empresa, não importa onde ele esteja. Neste canal, o funcionário pode falar de temas que não cabem nos canais de denúncia tradicionais, como questões e dúvidas em relação à algu-

ma ação da concorrência, ou fazer per-guntas sobre o processo. Naturalmente os questionamentos podem ser feitos a qualquer momento, mas ter esse ca-nal com hora e data pré-determinadas estimula mais pessoas a interagir com o compliance. “As pessoas vêm falar comigo, dizendo que era essa comu-nicação que faltava para dar uma cara diferente à questão de compliance com uma posição de orientador, de parceiro. A gente não tinha essa visibilidade”, diz o executivo da Sandoz.

Grandes e estruturadas Nessa nova dinâmica empregada, a co-municação deixa de ser algo necessário (ela é um dos pilares do programa de compliance e, como tal, um elemento mandatório), mas corriqueiro, para ser

pensada de maneira bem mais estru-turada, por temas e públicos, além da diferenciação entre grandes campanhas de grande impacto para a comunicação de fatos altamente relevantes, comple-mentada com ações mais pontuais de reforço ou alertas sobre pontos de aten-ção e sustentação para a manutenção de temas recorrentes.

O plano de comunicação da Bra-desco Seguros, é anual e contempla, no mínimo, uma chamada para cada tema na área no ano. Alguns temas como prevenção à lavagem de dinheiro, são acionados várias vezes, mas sempre bus-cando abordagens mais lúdicas. Recen-temente, o time de Valdinei desenvol-veu um mini lanterna, fazendo relação com a investigação para que nenhum detalhe passe no escuro.

Na fabricante de cosméticos Na-tura, a área de compliance é nova, de 2014. “Sempre fomos uma em-presa que prezou por ser complian-

ce em tudo, mas não tínhamos uma estrutura formal de compliance”, explica a gerente jurídica e de com-pliance da Natura, Suyang Melo. Tão logo a diretora jurídica da com-panhia, Roberta Salvador, foi aponta-da pelo conselho também como com-pliance officer, teve início um grande movimento de comunicação interna para apresentar a nova estrutura a to-dos os funcionários da Natura no Bra-sil e nas filiais da empresa espalhadas pela América Latina. A primeira fase dessa comunicação foi feita utilizando as ferramentas de comunicação interna da empresa, como o mural, a Intranet e o e-mail corporativo Natura Infor-ma. “Era uma palavra nova no voca-bulário das pessoas da empresa, então tomamos cuidado para explicar que

era uma estrutura que estava sendo montada para dar um olhar processual sobre a questão de compliance, com tudo o que determina a legislação no sentido mais amplo e, também os nos-sos posicionamentos e políticas”, con-ta Suyang. Na sequência, a área passou a tratar da comunicação de temas mais pontuais, que estivessem mais quentes no momento. A última comunicação retomou o entendimento e o posi-cionamento da Natura em relação ao processo eleitoral, algo já arraigado na companhia, mas que não custava relembrar, de acordo com a gerente da empresa. Para falar disso, a área de compliance preparou pílulas de conhe-cimento e as divulgou via intranet e no e-mail interno.

No passado, sempre que lançava uma atualização do seu Código de Con-duta Ética, a área de controles internos e compliance da Bradesco Seguros sim-plesmente entregava o documento para os funcionários. Mas para apresentar a versão mais recente do documento, que foi reestilizado e teve seu conteúdo atualizado, aproveitou a sua Semana da Ética. “Durante esta semana fazemos uma série de ações de comunicação, incluindo comunicação visual no pré-dio da empresa. Damos foco num de-terminado tema durante um período, concentrando as ações de divulgação”, explica o executivo da Bradesco Segu-ros. Para engajar a equipe na leitura do documento, Valdinei conta que foram realizadas ações com perguntas sobre o código e o programa, com premiações e pontuação para alguns programas inter-nos da empresa, como a Maratona do Conhecimento.

Na Natura, o final de novembro é o período da grande campanha interna da empresa de compliance da empresa e, também o momento no qual os co-laboradores refazem seu exame sobre o código de conduta. “Aproveitamos esse momento para reforçar os canais de comunicação com compliance, os canais de denúncia e até para falar se temos alguma atualização de políti-cas”, revela Suyang.

Ao preparar o material de comunicação de compliance, se a sua audiência não entendeu a mensagem direito, é porque você – e não eles – está fazendo alguma coisa errada

11www.lecnews.com.br

usando as CelebridadesNo mundo dos produtos de consumo, uma das estratégias é o uso de celebri-dades como embaixadores ou porta-vozes de uma determinada marca ou empresa. O objetivo é muito simples: a celebridade empresta o seu “prestígio” para quem a contratou.

No ambiente interno da empresa, embora de maneira um pouco diferen-te, essa ferramenta também é importan-te e as celebridades, que podem avalizar com o seu prestígio, são os diretores de cada área e o executivo principal, es-pecialmente os executivos responsáveis pelas áreas de negócios.

Assim como as celebridades, altos executivos costumam ter uma agenda repleta de compromissos, por isso, na maior parte das vezes, a sua mensagem é transmitida por meio de um vídeo, podendo ser uma entrevista ou um re-cado. O tone at the top, que também é um pilar do programa de complian-ce, precisa chegar a toda a corpora-ção. Desta forma, as mesmas regras de clareza de mensagem e conhecimento do público alvo valem para a manei-ra como os principais executivos das empresas falam e, depois, quais as fer-ramentas de comunicação a área de compliance vai usar para massificá-la.

No passado não muito distante, o nível de atenção dado por presidentes e diretores aos temas de compliance era algo um tanto tímido. Como as circunstâncias mudaram e, em meio a tudo o que acontece no Brasil de hoje, o tema é a bola da vez. É preciso que o compliance officer saiba se aproveitar disso para trazer também os líderes para perto da área. “Temos tido ses-sões constantes com os conselheiros, até para que eles sejam embaixadores para falar do tema e reforça-lo junto aos colaboradores”, conta Suyang, ge-rente jurídica e de compliance da Na-tura. Esse grupo, do qual fazem parte os três acionistas controladores, Luiz Seabra, Guilherme Leal e Pedro Luiz Passos, tem acessado bastante a área de compliance de acordo com a executiva.

O processo de conscientização é

moroso e precisa ser sustentado por uma estratégia de comunicação con-sistente, que consiga vender e conti-nuar vendendo, de novas maneiras, a importância do trabalho. “Quando olhamos para trás sabemos que todo o esforço ao longo do tempo deu muitos resultados. A gente obriga pelo regu-latório, mas pela dor você usa ameaça e isso se sustenta durante um período e, nos temas nos quais não tem como fazer pressão, você não consegue cons-

cientizar. Fazendo esse trabalho de comunicação você traz o pessoal, os conscientiza e engaja. Sai da dor e en-tra no amor”, acredita Valdinei, que afirma ter recebido várias ligações de funcionários de filiais que estavam fa-zendo trabalhos de conclusão de curso e optaram por um tema de complian-ce. “Para nós é muito significativo que a comunicação do nosso trabalho está chamando a atenção”, conclui o exe-cutivo.

CRIANDO IDENTIDADEEm 2009, a área de controles internos e compliance da Bradesco Seguros

resolveu que estava na hora de ter uma identidade própria, uma marca que a identificasse dentro da própria empresa. “[Naquele momento] gerávamos muito conteúdo, mas as pessoas não entendiam do que e de quem era aqui-lo. Precisávamos de um elemento ao qual as pessoas batessem o olho fos-sem remetidas à área de controles internos e compliance”, lembra Valdinei. O executivo diz que o primeiro desafio foi convencer a área de marketing do porquê disso.

Depois de desenvolvido e homologado, teve início um grande esforço de divulgação da nova marca. Todo o material da área, dos e-mails até os selos utilizados para lacrar relatórios confidenciais, traziam a identidade visual de controles internos e compliance. Aos poucos o logotipo se tornou uma marca que as pessoas associam com a área. “Por si só ele representa a área em todos os temas”, comemora o executivo, que está sempre em busca de formas diferentes para impactar os funcionários da empresa.

MAtERIAIs DE COMUNICAÇÃO DE COMpLIANCE DA bRADEsCO sEGUROs: identidade da área construída de maneira consistente ao longo dos últimos anos.

entrevista • torquato jardim

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Um balanço dos primeiros meses de trabalho do ministro da Transparência, Fiscalização e Controle, Torquato Jardim

o ministro torquato jardim: investimentos em novas ferramentas tecnológicas no foco para 2017.

Por quase uma década a Controladoria-Geral União atuou de maneira discreta, praticamente sem ser inco-modada por questões rela-

cionadas ao mundo da política. Nesse período, conseguiu estruturar um cor-po técnico altamente especializado e desenvolver projetos que foram funda-mentais para aumentar a transparência da prestação de contas do governo à população e criar mecanismos de con-trole que contribuíram para, se não acabar, mitigar os riscos de corrupção e desvios de verba pública na máqui-na pública, principalmente na admi-nistração direta. A aprovação da Lei Anticorrupção, que tem a CGU como principal reguladora, foi uma espécie de cereja do bolo.

Mesmo quando a Lava Jato ex-plodiu, ainda que com uma ou outra polêmica sobre como a pasta iria con-duzir os acordos de leniência, a CGU continuou com o seu trabalho de ma-neira relativamente tranquila. Mas aí, veio o segundo mandato da presidente Dilma Rousseff e a estabilidade deu lu-gar à incerteza. Primeiro, a demora em

nomear um titular para a pasta com as operações da Lava Jato alcançando o topo do PIB nacional levantou ques-tionamentos sobre uma eventual inge-rência do lado político em relação ao trabalho da CGU. Depois, uma se-quência de troca de ministros inédita. Em pouco mais de um ano ocuparam a pasta Valdir Simão e Luiz Navarro, então conselheiro da Petrobras – o então secretário-executivo Carlos Hi-gino assumiu interinamente por três vezes no mesmo período. Já sob o co-mando de Michel Temer, e um novo nome – Ministério da Transparência, Fiscalização e Controle – mais um

ministro, Fabiano Silveira. Oriundo do legislativo, durou não mais do que algumas semanas, pego em conversas telefônicas, nas quais orientava sena-dores, entre eles o presidente da casa Renan Calheiros, sobre com se portar em eventuais audiências relacionadas à operação Lava Jato.

O atual ministro, Torquato Jar-dim, assumiu no início de junho. Sua indicação causou surpresa entre os profissionais que operam na área de compliance e acompanham mais de perto os movimentos do ministério. Especialista em Direito Constitucio-nal e amigo de décadas de Temer, não

De volta aos trilhos

13www.lecnews.com.br

cional permanente, tais como a regu-lamentação do lobby e a alteração da própria Lei Anticorrupção.

E a relação com o sindicato, ela está em patamares que o senhor conside-ra razoáveis? Existe alguma deman-da, ou algum conflito em particular?A questão das reivindicações sindicais é um tema anterior à minha chegada à pasta e assim deve permanecer, pois as questões colocadas pelo sindicato dependem de legislação afeta ao Con-gresso Nacional, o que extrapola as minhas funções. Já tive um bom di-álogo com representantes do sindicato logo que cheguei ao ministério, porém esse diálogo foi esquecido no calor das discussões que reivindicam o que está além da minha esfera de decisão.

Nesses últimos meses percebemos uma movimentação mais intensa do MTFC em duas frentes: maior diálo-go com outros órgãos de controle do Estado e mais ações que focam em ampliar a transparência do governo. É correta essa percepção? São eixos que vêm ganhando mais destaque no dia a dia da pasta?A sua percepção está correta. Não há como trabalharmos isoladamente, pois isso significa duplicidade de ações e pode ser traduzido em ineficiência. Meu intuito sempre foi o de integrar a colaboração no nível federal entre os vários entes que têm como objetivo o combate à corrupção, o controle e a fiscalização das contas públicas.

Já é possível fazer um balanço da atu-ação do departamento de compliance do MTFC? Já é possível ter uma ideia de calendário para que outros órgãos do poder executivo implementem o departamento internamente?Até o momento, 12 órgãos aderiram formalmente ao Programa de Fomento à Integridade Pública – PROFIP, entre ministérios e autarquias, além do pró-prio MTFC. A partir da adesão, o Mi-nistério inicia um trabalho que envolve a realização de reuniões, capacitação e

orientação, por meio de oficinas, ma-terial de suporte e atividades comple-mentares, com o intuito de melhorar a compreensão sobre o tema e auxiliar o órgão a iniciar seu processo de gestão da integridade. Por não ser desejável a criação de novos departamentos no setor público, a ideia é que os órgãos aproveitem as estruturas já existentes para definir a instância responsável pelo Programa de Integridade. A expectativa é de que até o final do ano alguns dos órgãos voluntários tenham seus planos de integridade elaborados ou em fase final de construção.

Desde o ano passado e, basicamente, até o senhor assumir, a prioridade número um do MTFC era resolver a questão dos acordos de leniência. De meados de junho para cá, aparente-mente esse tópico saiu do radar. Os acordos de leniência, ao menos os fechados no âmbito da Lei Anticor-rupção com o MTFC, estão travados?Há uma falsa percepção de que esses acordos estejam levando muito tempo. Na verdade, eles cumprem todos os re-quisitos legais para um ato jurídico per-feito, que não venha a ser questionado posteriormente. Os acordos são subme-tidos a várias instâncias e isso acarreta um prazo maior para o entendimento final. Temos cronogramas exatos de onde e em que fase está cada uma des-sas propostas de acordo, mas como se tratam de ações sigilosas não podemos torna-las públicas até o fechamento, o que reforça a impressão de ser um pro-cesso lento. Como disse, essa percepção não encontra respaldo na realidade da tramitação dos processos.

O governo planeja editar uma nova MP para “reformar” o modelo dos acordos de leniência? E nesse parti-cular, como estão as conversas com o TCU e o MP sobre o acordo de leni-ência? A falta de entendimento sobre a participação de cada parte no acor-do de leniência certamente contri-buiu para que os acordos não fossem fechados com as empresas.

era um nome que aparecia no radar do mercado. Nesta entrevista exclusiva, Torquato Jardim faz um balanço dos seus primeiros meses à frente da pasta e dos planos para 2017.

O senhor assumiu há poucos me-ses, em meio a uma situação bas-tante conturbada na pasta por mo-tivos como a mudança de nome, os acordos de leniência e um sindicato fazendo muito barulho. Tudo isso gerou temores de que a CGU per-deria prestígio e, ainda que super-ficialmente, abalou a sua reputação. Passados quase 90 dias da sua pos-se, é possível dizer que os ânimos e a rotina estão normalizados no Mi-nistério? Quais ações tomadas neste período curto o senhor destacaria?Boa parte desse ruído se deve a infor-mações desencontradas e às vezes en-viesadas, pois é importante destacar que todas as competências da CGU foram preservadas. A criação do minis-tério evidencia a ênfase à questão da transparência. Com isso, temas rela-cionados à ética e às boas práticas ga-nham amplitude de interesse nacional, alcançando outros entes federativos. Ao contrário do que foi propalado, a transformação em ministério busca o fortalecimento das estruturas do ór-gão para um melhor exercício de suas atribuições, além de deixar claro que o incentivo à transparência e o adequado controle dos gastos públicos é uma po-lítica permanente. A retirada do órgão de dentro da estrutura da Presidência da República traz uma sinalização cla-ra à sociedade, no sentido de afirmar a importância do apropriado desempe-nho destas tarefas e de independência.Não percebo qualquer ataque à minha reputação. São 40 anos como advo-gado, professor, ministro do TSE por duas gestões e uma carreira internacio-nal que já me levou a advogar em mais de 30 países.No momento estamos voltados para ações específicas: o ministério vem debatendo e oferecendo propostas le-gislativas sobre temas de interesse na-

entrevista • torquato jardim

| LEC - LEGAL, ETHICS, COMPLIANCE • ED 1514

Os acordos de leniência devem ser, na verdade, “Contratos de Conduta Con-trolada”. Ou seja, não basta à empresa assumir sua responsabilidade pela irre-gularidade e colaborar para sua apu-ração. A empresa ou pessoa jurídica envolvida deverá adotar as medidas ne-cessárias para que o ato ilícito não vol-te a ocorrer. Para isso, deve perseguir a efetiva implementação e aperfeiçoa-mento de mecanismos de integridade. Também é essencial que haja medidas que levem ao afastamento de dirigen-tes e sócios que compactuem com prá-ticas nocivas. A celebração dos acordos é sempre o primeiro passo para que a empresa altere sua forma de se re-lacionar com o poder público. Nossa proposta tem como objetivo fazer com que os acordos não se limitem à cola-boração para o esclarecimento de ilíci-tos, mas que venham a se tornar uma ferramenta de incentivo à mudança em estruturas corporativas que em dado momento foram contaminadas por práticas corruptas. Nesse sentido, a participação dos demais atores corro-bora para a eficiência do processo.

Uma última questão sobre os acor-dos de leniência. As empresas inves-tigadas pela lava jato e que fizeram a leniência com o MP, ainda podem ser multadas ou declaradas inidôneas pelo MTFC, com base na lei anticor-rupção. O MTFC vai acionar essas empresas? Os acordos relativos às pessoas jurí-dicas estão obrigatoriamente afetos ao Ministério da Transparência, Fis-calização e Controle e a conclusão desses processos de responsabilização de empresas e empregados públicos relacionados a irregularidades iden-tificadas na Operação Lava-Jato tem sido uma prioridade. Adicionalmen-te, o fomento à cultura de integrida-de corporativa nas empresas também tem tido destaque nas ações do órgão, juntamente com medidas que aperfei-çoam e viabilizam um mais adequado controle dos gastos públicos e que se voltam também para o recebimento e

tratamento das denúncias.

No mundo inteiro existe uma ten-dência dos órgãos de controle am-pliar o número de ações (os famosos enforcements) relacionados ao com-bate à corrupção de suas empresas no exterior. No Brasil, esse tipo de ação é uma prerrogativa do MTFC. A operação lava jato tem apontado que empresas brasileiras podem ter praticado corrupção no exterior para ganhar projetos públicos. Podemos esperar movimentações da pasta, no curto prazo, por conta dessa questão?O MTFC já atua em três frentes: prevenção, detecção e investigação e punição. A prevenção está ligada aos mecanismos de integridade privada e pode ser exemplificado no âmbito do Ministério pelo cadastro PRO--ÉTICA e pelas ações de sensibili-zação das PMEs junto ao SEBRAE. Sobre a detecção, fica ela relaciona-da à matriz de casos da OCDE. Isso significa que, sendo o Brasil parte do grupo anti-suborno dessa organização, o Ministério relata os casos internos, bem como desenvolve metodologia de avaliação de risco de ocorrência de su-borno transnacional em outros países, elaborando estratégias específicas para promoção da integridade em empresas que atuam em países detectados como potencialmente de alto risco da ocor-rência de corrupção. Por fim, referente à investigação e punição, o MTFC, em parceria com a AGU, o MJ e o MRE, também tem promovido gestões bila-terais e multilaterais para viabilizar a cooperação jurídica internacional, no intuito de instruir os procedimentos de investigação. Nesse aspecto, é re-levante compreender que por tratar de uma multiplicidade de jurisdições, é exigido um alto nível de coordena-ção entre as autoridades, o que tem se mostrado satisfatório.

Falando um pouco da estrutura do MTFC, desde a gestão do ministro Jorge Hage que existe um déficit de profissionais para completar os

quadros do órgão. Alguma chance dessas vagas serem preenchidas no curto prazo? Em maio de 2016, o Ministério da Transparência solicitou ao Ministério do Planejamento autorização para re-alização de concurso para provimento de 620 cargos de Analistas de Finanças e Controle – AFC (nível superior). A previsão é que o pedido seja contem-plado pela Lei Orçamentária Anual (LOA) 2017. Nós temos um desafio claramente co-locado este ano, que é o da restrição orçamentária e a necessidade de tra-balhar com um cenário de contingen-ciamento. Por isso, precisamos racio-nalizar ao máximo a força de trabalho disponível, ampliando o uso da tecno-logia da informação para potencializar nossos esforços. Fazer mais com me-nos. Isso não significa que não vamos trabalhar pelo reforço das condições de trabalho, sejam físicas ou de recursos humanos.

O senhor pode falar sobre os princi-pais focos de investimento da pasta em 2017? Estão previstos investimen-tos em novos sistemas de TI e ferra-mentas de controle e inteligência? E em treinamento dos servidores tanto do MTFC como de outras pastas, te-remos alguma novidade para 2017?Dentre os principais investimen-tos para 2017, é possível citar alguns exemplos: melhorias no sistema para gestão dos benefícios resultantes dos trabalhos de controle interno, incre-mento no uso de ferramentas de mi-neração open source e nas aquisições para big data analytics, destaque de recursos para melhorias nas sedes es-taduais do Ministério, expansão do e--ouv, distribuição de kits de atividades de corregedoria e o desenvolvimento da Plataforma Mapa Brasil Transpa-rente, entre outros. Na parte de capa-citação, é possível destacar a formação de um Núcleo de Especialização em Inteligência, bem como os cursos para gestores estaduais e municipais sobre a Lei Anticorrupção.

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LEC • NEWS

A fabricante brasileira de aviões Embraer divulgou, pela primeira vez, uma estimativa do que acredita que será o custo envolvido para encerrar as acusações de violação ao FCPA em um eventual acordo com o Departamento de Justiça dos Estados Unidos e a SEC, reguladora do mercado de capitais de lá. A companhia provisionou R$ 684,9 milhões no balanço do segundo trimestre, por conta da investigação. Devido a isso, a empresa repor-tou prejuízo de R$ 337,3 milhões no período.

De acordo com a empresa, as negociações junto aos órgãos dos Estados Unidos, que tiveram início em maio do ano passado, progrediram de maneira significativa nos últimos meses, o que levou a empresa a contingen-

ciar o valor, que é apenas uma estimativa. O acordo também deve obrigar a empresa a manter um monitor de compliance independente por três anos.

Em 2013, a Embraer divulgou ao mercado que era alvo de uma investigação por parte das autori-dades norte-americanas por pagamento de propinas no valor de US$ 3,5 milhões para um funcionário público na República Dominicana em troca de um contrato de US$ 92 milhões. A empresa foi intimada pela SEC a prestar contas sobre isso em setembro de 2010. Como resposta, a empresa contratou uma em-presa independente para conduzir uma investigação interna em três países.

A conta ficou salgada

Compliance é prevenção. Esse é um mantra ainda pouco difundido no ambiente corporativo brasileiro, muito pro-vavelmente pela dificuldade em conseguir quantificar os valores gerados pela ação direta da área. A antiga Contro-ladoria-Geral da União (atual Ministério da Transparência, Fiscalização e Controle) é um bom exemplo a ser seguido pelo mercado. No início de agosto, a pasta divulgou o ba-lanço sobre as ações de avaliação da execução dos pro-gramas de governo com recursos federais e da gestão dos administradores. E, o número impressiona. Em 2015, es-sas ações resultaram num total de R$ 2,38 bilhões econo-

O valor da prevenção mizados para os cofres públicos. O resultado é composto pela correção de falhas e pelo aprimoramento das políticas públicas federais no ano passado.

Apenas a suspensão de pagamentos continuados in-devidos gerou economia superior a R$ 1 bilhão. Outros R$ 428 milhões foram economizados com a redução nos va-lores licitados/contratados. O trabalho aponta também que R$ 14 milhões foram poupados com o cancelamento de licitação devido a objetos desnecessários e R$ 46 milhões com a recuperação de valores pagos indevidamente.

Os dados auxiliam a verificar o grau de cumprimento dos objetivos estabelecidos pelo ministério e contabilizam o resultado positivo no trabalho de controle interno desen-volvido pelo órgão.

LEC • NEWS

| LEC - LEGAL, ETHICS, COMPLIANCE • ED 1516

Em 2011, Melayna Lokosky, uma ex-vendedora da fabricante de dis-positivos médicos Acclarent, de-nunciou que a empresa estava se va-lendo de indicações não autorizadas pelo FDA, agência reguladora da indústria de saúde, para vender um dispositivo utilizado em cirurgias de sinusite chamado de Stratus.

Cinco anos depois, Melayna re-cebeu US$ 3,5 milhões, a sua parte no acordo de US$ 18 milhões fecha-do entre a Justiça dos Estados Uni-dos e a gigante Johnson & Johnson, que comprou a Acclareant em 2010, para encerrar as acusações.

A denúncia e a acusação foram feitas com base no False Claims Act, uma legislação norte-ameri-cana que pune severamente com-panhias do mercado de saúde que utilizem argumentos, usos e benefí-

cios não aprovados pelos regulado-res para vender seus produtos. A lei permite que cidadãos entrem com ações por violações a ela, em nome do Estado, e fiquem com parte do recurso restituído ao governo.

Em 2006, a Acclarent recebeu autorização do FDA para comer-cializar o Stratus como um espaça-dor para ser usado apenas com soro fisiológico para manter aberturas dos seios da face após a realiza-ção de cirurgia. Mas a companhia alegava que o seu dispositivo foi especificamente projetado e cons-truído para a dispensação de dro-gas prescritas à base de corticoides. Em 2007, o FDA reprovou o pe-dido da empresa para novos usos. No entanto, isso não impediu a empresa de continuar a comerciali-zar o Stratus para a dispensação de

drogas de prescrição – mesmo de-pois de a própria empresa adicionar uma etiqueta de advertência de que ele não deveria ser usado para essa finalidade em 2010. Inclusive, fun-cionários da Acclarent treinavam médicos usando um vídeo, na qual demonstravam o Stratus sendo usa-do com o corticoide.

A Johnson & Johnson parou de vender o dispositivo, mas a empre-sa não admitiu qualquer responsa-bilidade.

Em julho, o ex-CEO e o ex--VP de vendas da Acclarent foram condenados por um júri federal por dez acusações de delito pela introdução de dispositivos médi-cos adulterados e mal rotulados em comércio interestadual. Mas foram absolvidos de 14 acusações crimi-nais, incluindo conspiração.

Denúncia milionária

escritório da Johnson&Johnson: os problemas vieram com a empresa comprada.

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Ainda são raros pelo Brasil os ca-sos de empresas punidas com base na Lei Anticorrupção. Mas, se existe um ente da federação que está fazendo a lei acontecer é o es-tado do Mato Grosso. Desde abril deste ano, quando a lei foi sancio-nada no estado, a Controladoria Geral do Estado do Mato Grosso (CGE-MT) já instaurou proces-sos administrativos de responsa-bilização contra 33 empresas por supostas infrações previstas na Lei Anticorrupção.

No último dia 4 de agosto, a CGE, em conjunto com a Secre-taria de Estado de Gestão, abriu um processo administrativo de

responsabilização contra sete em-presas por supostas violações con-tra a Lei Anticorrupção. Cinco das empresas processadas são investi-gadas na Operação Sodoma pela Polícia Civil e denunciadas pelo Ministério Público Estadual à Jus-tiça. Entre elas está a companhia contratada para prestar serviços de administração de consignados no Poder Executivo do Mato Grosso.

As outras duas são empresas foram cotadas em Relatório de Auditoria da própria CGE por supostas irregularidades no pro-cesso licitatório e na execução do contrato para realização de prova prática de direção veicular no âm-

bito do Departamento Estadual de Trânsito.

O secretário-controlador ge-ral do Estado, Ciro Rodolpho Gonçalves, salienta que a CGE, em conjunto com as respectivas secretarias, também tem se dedi-cado a outros processos adminis-trativos contra fornecedores com base apenas na Lei de Licitações e Contratos.

Atualmente, o Cadastro de Empresas Inidôneas e Suspen-sas mantido pela CGE do Mato Grosso já conta com 123 empre-sas sancionadas por irregularida-des na execução contratual com a administração pública.

Mato Grosso manda ver

o governador pedro taques: 33 empresas punidas pela Lei Anticorrupção.

papo de compliance • carreira

| LEC - LEGAL, ETHICS, COMPLIANCE • ED 1518

Poucos assuntos têm gerado tanto burburinho entre os profissionais de complian-ce quanto o Memorando Yates. O documento as-sinado pela procuradora-

-adjunta do Departamento de Justiça dos Estados Unidos (DoJ), Sally Yates e divulgado em setembro do último ano trouxe à tona a nova visão do ór-gão no que diz respeito às punições por violações às regras de compliance. As multas milionárias contras as empre-sas continuarão sendo aplicadas. Mas, elas não são mais suficientes. O que o memorando deixa explicito – e isso, ao mesmo tempo, empolga e preocupa os profissionais da área – é que o DoJ quer além de dinheiro, cabeças graúdas para “coroar” suas caçadas.

Outro movimento recente, que tem gerado menos discussões, mas que de-veria preocupar ainda mais compliance officers, foi o julgamento, em janeiro deste ano, do executivo Thomas Hai-

Mudanças na postura dos órgãos norte-americanos não deixam dúvidas: os compliance officers terão muito mais responsabilidade sobre os programas em execução na empresa. Mas, essa realidade ainda não “casa” com a justiça trabalhista do Brasil

der, ex-chefe de Compliance da Mo-neyGram, uma companhia que faz transferências internacionais de dinhei-ro e que, em 2012 fechou um acordo de US$ 100 milhões com o governo EUA ao admitir crimes de fraude eletrônica e lavagem de dinheiro por conta da fa-lha nos controles internos da financeira. No julgamento, uma Corte Federal do Distrito de Minnesota nos Estados Uni-dos decidiu que profissionais da área de Compliance podem ser responsabiliza-dos como pessoa física e punidos indi-vidualmente por falhas na aplicação das políticas de prevenção à lavagem de di-nheiro. A ação contra Haider foi aberta pelo FinCEN (braço de investigação contra crimes de lavagem de dinheiro do Tesouro norte-americano) em de-zembro de 2014. O órgão de controle aplicou uma multa de US$ 1 milhão contra o executivo por ele não ter gara-tido que a empresa respeitasse as regras de prevenção à lavagem de dinheiro. Entre 2003 e 2008, o departamento de

Fraudes da MoneyGram, chefiado por Haider, recebeu milhares de reclama-ções de consumidores vítimas de esque-mas fraudulentos. Os departamentos de Compliance e de Prevenção à Lavagem de Dinheiro também eram de responsa-bilidade do executivo.

Juntando tudo, uma coisa fica clara: a pressão e a responsabilidade (indivi-dual inclusive) sobre os profissionais de compliance ao redor do mundo tende a crescer cada vez mais. Mas, isso traz à tona uma questão importantíssima para discussão: até onde o profissional de compliance pode ser responsabili-zado por falhar no exercício das suas funções? No caso dos jovens profissio-nais, a falta de preparo e experiência para assumir uma função de tamanha responsabilidade pode colocá-los em

Profissão de risco?

19www.lecnews.com.br

promissor. Com isso, centenas de pro-fissionais saíram em busca de cursos de formação (o Curso de Compliance Anticorrupção da LEC, por exemplo, atingiu o aluno número quinhentos) e, depois, em busca de uma posição (bem remunerada) na área. Mas, só ter fei-to um curso, por melhor que ele seja, não faz de ninguém um profissional de compliance. No entanto, vá dizer isso para um jovem, cheio de vontade e energia. São justamente esses profissio-nais mais jovens que, via de regra, estão mais expostos aos riscos da profissão. Para a executiva Patrícia Punder, expe-riente compliance officer, o profissional que está entrando no mercado deve fi-car atento à própria empresa que o está contratando. “Por ser um profissional ainda com pouca experiência, as inten-ções da empresa devem ser analisadas. Ele deve questionar se a empresa o está contratando de fato para exercer a fun-ção do compliace officer ou se o querem lá apenas para dar um check-in-the-box para os órgãos públicos, sem a autono-mia necessária para a implementação de programas efetivos”, explica a executiva o motivo de muitas empresas buscarem jovens profissionais de escritórios de ad-vocacia – que possuem certo conheci-mento no assunto, mas que não exigem um salário tão grande quanto aqueles que têm mais de sete, oito anos de ex-periência na área. “Poucos profissionais são experientes aqui no Brasil e as em-presas não querem pagar esses profissio-nais”, acredita Patrícia.

O peso dado ao compliance é uma questão cultural, mas também orça-mentária e, principalmente, merca-dológica de cada empresa, de acordo com a realidade dos países e segmentos econômicos nas quais opera. A contra-tação de um jovem profissional pode ter ocorrido por uma questão de fal-ta de orçamento mesmo, ou porque a empresa está realmente começando um programa e atua em mercados não tão expostos. Contudo, existem, sim, casos de executivos que buscam profissionais mais novos e inexperientes, justamente para continuar realizando atividades ilí-

maus lençóis? Eles podem ser punidos em casos de inoperância ou mesmo de negligência? E, a empresa que contrata um profissional sem as devidas qualifi-cações para o cargo, como ela fica quan-do o compliance officer falha?

São todas questões quentes e atuais e sobre as quais existem várias opiniões e realidades, inclusive de fronteiras, pois o que se aplica nos Estados Unidos nesses casos, dificilmente terá situação análoga por aqui.

Sobra energia, falta exPeriênciaNa esteira de casos como o Mensalão e a Lava Jato, o Brasil viveu um boom de compliance, o que fez com que mui-tos jovens enxergassem na área um ca-minho profissional de futuro seguro e

citas, só que com o verniz de uma em-presa que tem compliance. Nesse tipo de situação, a orientação de Patrícia é muito direta: “[Quando aplicável] Esse tipo de problema deve ser levado ao De-partamento de Justiça americano(DoJ). Dessa forma, há a isenção de culpa do compliance officer”. Ela dá como exem-plo o recente caso envolvendo a gigan-te japonesa Olympus Corporation, no qual o Chief Compliance Officer, depois de apresentar todos os problemas apon-tando corrupção ao Conselho, foi de-mitido e, então, denunciou o caso ao órgão de Justiça, trazendo o escândalo à tona. É claro que não é uma situação fá-cil, como reconhece a executiva, que diz que, em caso da denúncia por parte do compliance officer, ele também pode ser acionado e, aí, entram uma série de dilemas. “Se eu for ao DoJ e levantar o caso, nos EUA vai haver proteção, fora de lá, não. Será que depois disso eu vou conseguir emprego? Caso eu denuncie a empresa para o DoJ, vou receber mi-lhões de dólares?”.

Por outro lado, a executiva acredita que o profissional de compliance, em caso de negligência comprovada, pode e deve ser responsabilizado, assim como executivos, administradores e conselhei-ros que estão envolvidos no ato ilícito.

não quer ProblemaS? Pague o Salário adequadoÉ verdade que não estamos no melhor período para que os profissionais façam grandes pedidos em relação à sua re-muneração. Com a crise econômica e o desemprego nas alturas e subindo, as empresas voltaram a dar as cartas, após anos sob pressão, para aumentar os salá-rios dos seus melhores talentos.

No entanto, empresas que levam a sério o seu programa de compliance e, principalmente, as que estão em mer-cados mais expostos como o de Saúde, Óleo & Gás e Construtoras, devem es-tar dispostas a pagar o salário adequado para um profissional experiente e de qualidade. São negócios que operam em mercados complexos, altamente regula-mentados e com muita interação com

sally yates, a “pessoa” do

momento: ela quer cabeças tanto quanto

cifrões.

papo de compliance • carreira

| LEC - LEGAL, ETHICS, COMPLIANCE • ED 1520

o setor público. Se a empresa não tiver um profissional capacitado para isso, é ela quem estará sujeita aos erros relacio-nados à falta de experiência, preparo e até uma possível negligência do pro-fissional. “A empresa deve querer um profissional bom e dar a ele liberdade para agir. Deve analisar o profissional, investigando seu histórico de experiên-cias, os programas implementados e a efetividade alcançada por eles, além de possíveis investigações realizadas pelo profissional”, afirma Raul Cury Neto, sócio da Vittore Partners, empresa de recrutamento de profissionais especiali-zada no segmento de compliance.

divórcio entre duaS realidadeSExiste uma tendência global que pode ser observada prevendo punições para profissionais de controles internos e compliance por falta de observância às suas funções.

Foi o que aconteceu com Thomas Haider, da MoneyGram, que era, su-postamente, um profissional bastante experiente. “A linguagem clara do esta-tuto prevê que penalidades civis podem ser impostas a diretores de empresas e funcionários como Haider, que era res-ponsável pela concepção e supervisão do programa de prevenção à lavagem

de dinheiro da MoneyGram”, escreveu o Juiz Federal David Doty, responsável por negar o pedido dos advogados do Réu para a anulação da multa. A Procu-radoria Geral do Distrito Sul de Nova York também entrou com ação contra o executivo, para que ele seja proibido de atuar no mercado financeiro.

Do ponto de vista prático, essa decisão aponta claramente que o pro-fissional, ao aceitar uma posição de compliance officer sem certo grau de

conhecimento prático e maturidade, assume o risco e coloca-se sob a mira do DoJ, que pode, eventualmente, acusá--lo de negligencia ou conivência com atos ilícitos praticados “debaixo dos seus olhos”.

Mas, essa realidade não poderia es-tar mais distante do Brasil, ao menos no que diz respeito à Justiça do Trabalho. Há uma espécie de divórcio entre o pensamento dos órgãos norte-america-nos e como os órgãos brasileiros agem. Para a Justiça Brasileira, ainda que o programa de compliance possa ter de-sandado por negligência do profissional da área, quem responde pelo risco, pri-meiramente, são as empresas.

Em tese, para a justiça trabalhista, um compliance officer (exceto quando for também um diretor estatutário, o que é muito raro fora do mercado fi-nanceiro no Brasil), é um empregado assalariado como qualquer outro de ní-vel gerencial, que tem certas responsa-bilidades a partir do momento em que é autorizado pela empresa a assinar certos documentos e tomar algumas decisões, mas nada que o faça pagar diretamente por falhas no programa de compliance, ainda que as falhas possam ser atribu-ídas ao profissional da área. “A justiça trabalhista costuma decidir que, no caso de um erro, a culpa é transferida

para a empresa, pois foi ela que contra-tou um profissional inapto para a fun-ção”, diz Leonardo Mazzillo, advogado e sócio da área Trabalhista do escritório WFaria, que lembra que, no Brasil, os casos de responsabilização de funcio-nários em decorrência desse tipo de situação de falha individual (excluindo quando elas envolvem profissões regu-lamentadas por conselhos específicos, como médicos e engenheiros) são mui-to raros, e ainda assim, com punições

individuais muito mais leves. Esse choque de culturas deve ser-

vir como um alerta para comunidade de compliance no Brasil, que ainda é muito nova e segue diretamente cor-rentes do exterior, principalmente dos Estados Unidos, esquecendo que, inde-pendentemente de serem as melhores práticas globais de compliance, se elas não estiverem em acordo com a legis-lação brasileira, elas serão invalidadas pela Justiça sumariamente. Leonardo dá como exemplo o caso de uma em-presa que contratou uma grande firma internacional para investigar um dos seus funcionários por fraude. “A em-presa fez a investigação para coletar provas seguindo as melhores práticas de compliance reconhecida nos Estados Unidos, só que a justiça brasileira, que não segue as regras norte-americanas, anulou a investigação e a empresa ainda foi obrigada a pagar uma indenização para o funcionário investigado”, conta o advogado.

É público e notório que a Justiça do Trabalho no Brasil é, em geral, pa-ternalista e anacrônica e todos sabem que é preciso modernizar as leis que a regem hoje. Mas, isso é um papel que cabe aos congressistas. Às empresas que operam no Brasil fica a certeza de que contratar um profissional para a área de compliance vai ser uma tarefa com um grau de responsabilidade cada vez maior e que, literalmente, o barato pode sair caro. Para os profissionais me-nos experientes, mas cheios de vontade, também está cristalino que dar um salto bem maior do que a perna pode levá--los ao precipício e, por isso, é preciso muita análise e serenidade antes de en-carar um desafio de alto nível na área. Vale lembrar que em âmbito penal, a interpretação pode ser menos restritiva que a da Justiça Trabalhista do Brasil e visa penalizar o compliance officer em algumas situações especificas.

De um lado ou de outro, se existe uma certeza é a de que a profissão de compliance vai exigir muito mais – em todos os sentidos – de quem se dispuser a encará-la.

Para a Justiça Brasileira, ainda que o programa de compliance possa ter desandado por negligência

do profissional da área, quem responde pelo risco, primeiramente, são as empresas.

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papo de compliance • comitês lec

Ao passo que o com-pliance se difunde pelo ambiente corporativo brasileiro, começa a surgir a necessidade de se fatiar o tema e

abordá-lo sob diferentes perspectivas. Afinal, compliance não se resume a combater à corrupção, de longe ainda o tema dominante por aqui. A área oferece uma ampla gama de atividades de prevenção, investigação e correição relacionadas às questões regulatórias, interação com o poder público, relação com parceiros, funcionários, concor-rência, entre outros. E todos esses (e muitos outros) aspectos vão variar de acordo com a dinâmica e a realidade de cada mercado. Uma empresa que atue no setor farmacêutico está sujeita a re-gras bastante específicas, assim como uma empresa que atue no segmento financeiro, ou de tecnologia, também. Não significa dizer que uma área é mais difícil do que outra, embora existam aquelas mais expostas e com regulações mais pesadas. O que realmente importa é entender que existe uma base comum de compliance, que pode ser aplicada transversalmente, e conhecimentos que se aplicam de maneira mais objetiva a certos mercados.

Para criar um ambiente especiali-zado de estudos e discussões aprofun-dadas sobre o compliance em impor-tantes segmentos da economia, a LEC

Na medida em que o compliance avança no Brasil, é preciso ampliar o escopo de estudos para discussões e estudar de maneira mais profunda

cada uma de suas ramificações

tomou mais uma iniciativa que reforça o seu compromisso com o desenvolvi-mento do mercado da área em questão no Brasil, isto é, a criação dos seus pri-meiros comitês de compliance.

Neste primeiro momento, foram estabelecidos três comitês: Gerencia-mento de Crise e Comunicação, Mer-cado Farmacêutico e Compliance Di-gital. Cada comitê é único e segue uma dinâmica própria, com um coordena-dor e uma agenda regular e intensa de debates e discussões com o objetivo de estudar, trocar experiências e aprofun-dar o debate junto aos profissionais que participam de um determinado segmento da econômica e precisam enfrentar situações de compliance que são bastante específicas daquele merca-do e, sobre as quais, nem sempre existe literatura ou mesmo um conjunto de boas práticas já testadas e de conheci-mento público. “Esses comitês estão sendo feitos em um ambiente infor-mal, acadêmico, leve e aonde, natural-mente, discussões possam ser feitas”, conta Benny Spiewak, sócio da ZCBS Advogados, especialista no setor far-macêutico e coordenador do comitê que trata do assunto.

ComplianCe que protege a vidaO mercado de saúde é dos mais regu-lados e, por isso, também dos mais de-senvolvidos em termos de compliance

mundo afora. Contudo, mesmo inves-tindo pesadamente em suas estruturas, as empresas do setor continuam sendo pródigas na geração de violações de compliance, especialmente no que diz respeito à tentativa de interferir numa relação que precisa ser sagrada, ou seja, a do médico com o seu paciente. A maior parte do negócio das empresas do setor é gerada a partir da prescrição de um medicamento ou de um trata-mento de saúde por um médico. Des-ta forma, não raro indústrias do setor tentam cooptar esses profissionais para que eles prescrevam os seus produtos. Todavia, no afã de gerar mais negócios, essas indicações são feitas não no me-lhor interesse do paciente. Isto, além de onerar o sistema de saúde, pode, em última instância, acarretar em proble-mas para o próprio paciente. “A pessoa já está fragilizada e procura um médi-co na esperança de que ele lhe indique um tratamento que vá lhe curar do problema de saúde que ele enfrenta. O compliance da saúde busca garantir que o diálogo do profissional da saú-de e da indústria seja realizado dentro das regras e da ética e que o interesse do paciente esteja em primeiro lugar”, diz Spiewak. Para o coordenador do comitê de Compliance Farmacêutico, o compliance officer que atua na área da saúde não deve ignorar o interesse da indústria em vender seus produtos, mas que isso pode (e deve) ser feito sem

as especialidades dentro da especialidade

papo de compliance • comitês lec

| LEC - LEGAL, ETHICS, COMPLIANCE • ED 1522

entender isso. “As nossas discussões vi-sam contribuir para que a correta visão sobre o mercado farmacêutico permeie toda a indústria, garantindo ao pacien-te sempre o melhor atendimento, in-dependentemente de interesses comer-ciais”, pontua Spiewak.

para não fiCar desatualizado Numa indústria onde a inovação é a regra quando se trata de mudanças drásticas de modelo de negócios, com-portamento dos usuários e rupturas tecnológicas, o compliance precisa correr três vezes mais rápido do que o normal só para tentar se manter em li-nha com o que está sendo colocado no mercado. Essa é a realidade da indús-tria digital, que costuma se mover anos à frente das regulações governamentais e, por isso mesmo, joga muitas vezes os profissionais em uma grande zona cinzenta, que vai do próprio negócio das empresas de tecnologia até como clientes e funcionários de empresas de qualquer setor da economia interagem

interferir na independência do profis-sional de saúde de indicar o tratamento que ele considerar o mais adequado à realidade de cada paciente.

Os participantes deste comitê atu-am nas diferentes frentes que englo-bam o negócio farmacêutico, além da indústria farmacêutica e de dispositi-vos médicos e dos seus parceiros distri-buidores, também hospitais, clínicas, planos de saúde e varejistas. “Temos profissionais com pelo menos quinze anos de atuação em compliance farma-cêutico e outros que estão na área há pouquíssimo tempo”, conta o especia-lista. São profissionais que conhecem e atuam na área e que agora buscam entender melhor esse segmento espe-cífico, para que possam exercer suas funções da melhor forma nas empresas em que atuam. As pautas são decididas pelos próprios participantes durante a reunião e cabe ao coordenador agir como figura mediadora, preparando as discussões com o envio prévio de ma-teriais de estudo.

Para preservar o ambiente como um lugar de estudos e discussões apro-fundadas, o comitê permite um limite de quinze participantes por reunião, estimulando a conversa e deixando de lado a sensação de que ali se está em uma sala de aula. A expectativa de Benny Spiewak é a de que a experiência e os conhecimentos gerados no âmbito do comitê contribuam para aumentar a expertise e o nível de conhecimen-to dos profissionais que lidam com o compliance no setor farmacêutico no dia a dia. O mercado só tem a ganhar com isso. Quando se melhora e espe-cialização dos profissionais, o mercado como um todo sobe um ou até mais de um degrau. “Os grandes desafios do compliance officer da saúde, assim como em muitas áreas, envolvem a mudança de cultura da empresa, que é um as-sunto delicado. No caso da saúde, a cultura empresarial envolve a visão do médico sobre o mercado, do paciente, do farmacêutico, além da própria em-presa. Mudar tudo isso leva tempo e os compliance officers da área precisam

e atuam no am-biente virtual.

É nesse con-texto que se insere o comitê de Com-pliance Digital. “Quando a gente fala de Complian-ce Digital, a gente está falando so-bre conformidade com inúmeras leis e orientações ju-rídicas em relação ao uso da tecnolo-gia para os fins do negócio”, afirma

Camilla Jimene, sócia da banca espe-cializada em tecnologia Ópice Blum e professora do módulo especial sobre o assunto do Curso de Preparação de Compliance da LEC. “Cada vez mais, o profissional de compliance precisa ser multidisciplinar. Que ele entenda não só de corrupção e do negócio da empresa, mas de outros aspectos que possam impactar no negócio. O Com-pliance Digital é mais uma habilidade que está sendo exigida do profissional nessa área”. A especialista espera que o impacto da discussão desse comitê seja o aprofundamento e, uma melhora na habilidade dos profissionais em lidar com situações que, talvez ontem, se-quer existissem.

Este comitê é composto por cerca de trinta pessoas, cujo perfil compre-ende compliance officers, advogados de diferentes áreas, profissionais da tec-nologia da informação e de análise de riscos. “O grupo é intencionalmente bem multidisciplinar, para que o as-sunto seja abordado de ângulos bem

fábio risério: comitê de Gestão de Crise será uma ponte entre as áreas de comunicação, jurídica e compliance.

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a cultura organizacional. Quando o compliance officer desenha algum pro-grama, o setor de comunicação é cha-mado, no máximo, para validar o que já está feito. Mas essa interação precisa ser feita antes. O compliance tem de chamar a área de comunicação para discutir o conteúdo que será apresen-tado e a forma como ele será apresen-tado”, acredita. Sem dúvida, o diálogo multidisciplinar só tende a facilitar a implementação de um programa de compliance efetivo, que é o que todos buscam ou deveriam buscar.

Durante a gestão de crises, essa integração se faz ainda mais necessá-ria. Afinal, uma crise nunca acontece numa área só da empresa, e mesmo

quando acontece, é necessária uma ação coordenada de todas as áreas para poder tirar a empresa daquela situa-ção. Além disso, é nessa interação que os profissionais de compliance ainda têm um gap que precisa ser mais bem resolvido. “Gerir crises demanda um know-how específico e ele só é possível com o diálogo e o trabalho conjunto das áreas de compliance, jurídico e comunicação”, conclui.

variados, não se transformando numa discussão unilateral”, reforça Jimene.

Assim como acontece com o comitê de Compliance Farmacêutico, não existe uma subordinação entre o comitê e os cursos de formação da LEC que abor-dam o assunto. Mas em ambos os casos, é natural que contribuam com o aperfei-çoamento da grade e das próprias discus-sões colocadas em pauta com os alunos futuramente. O comitê de Compliance Digital se reúne sempre na última terça--feira do mês. Alguns dos temas que já foram decididos pelo grupo passam des-de o controle tecnológico no ambiente de trabalho, proteção à dados pessoais até a Lei Carolina Dieckmann.

ação e diálogo Contra CrisesA comunicação exerce papel funda-mental dentro da área de compliance e, em momentos de crise, ela se torna um elemento crucial. Por isso, o co-mitê criado para tratar sobre Gerencia-mento de Crises incorporou também o tema comunicação. Coordenado por Fábio Risério, gerente de Compliance e Responsabilidade Social do Grupo Promon, o formato deste comitê é um pouco diferente com um perfil ainda mais diversificado de profissionais. “Estamos trazendo profissionais da co-municação de empresas, escritórios e

agências de Relações Públicas e Comu-nicação”, lembra Risério. Isso faz com que este seja o comitê mais populoso dentre os três estabelecidos pela LEC, com cerca de 40 profissionais partici-pando do grupo, bem divididos entre compliance officers de formação e pro-fissionais da comunicação empresarial. O foco é discutir o papel de comunica-ção dentro do compliance e criar uma ponte entre os próprios profissionais do jurídico e da comunicação. “Uma vez estabelecida essa ponte, os dois lados só tendem a ganhar”, afirma o executivo.

Risério acredita que ainda existe um distanciamento nas relações en-tre compliance e comunicação dentro

das empresas. “O nosso foco é trazer pesquisas, estudos, ou mesmo com-partilhar casos práticos de destaque na área para a troca de experiências. Não é segredo para ninguém que para a empresa funcionar, os setores têm que conversar e trocar informação”, expli-ca o coordenador. Ele ressalta que o comitê pretende estabelecer uma pon-te e facilitar o trabalho de compliance. “Se ninguém conversa, ninguém muda

Com a criação dos comitês, a LEC reforça o seu compromisso com o desenvolvimento contínuo da

área de compliance no Brasil.

benny spiewak: estudos aprofundados sobre os temas de compliance do setor farmacêutico.

camilla jimene: grupo vai acompanhar o impacto das inovações tecnológicas no compliance.

poder público • estados

| LEC - LEGAL, ETHICS, COMPLIANCE • ED 1524

Em um país tão grande, diversificado e desigual como o Brasil, esperar que tudo se resolva, ou seja resolvido em Bra-sília, é no mínimo, um

contrassenso. Primeiro, porque o Bra-sil é uma federação e, como tal, deveria reservar aos entes federativos um papel mais relevante dotando-os de maior independência para atuar em aspectos legais, tributários e administrativos. Embora isso possa até constar nas leis e regulamentos do país, a verdade é que Brasília concentra um poder demasia-damente grande em todos esses aspec-tos, deixando os estados mais amarra-dos ao poder central do que seria de bom grado numa federação, de fato. Ao contrário dos nossos irmãos da América do Norte, que tem no federalismo uma questão central do desenvolvimento da nação, por aqui se fez o contrário, com uma centralização cada vez maior do poder. Sem independência financeira e com restrições gigantescas para legislar dentro das suas fronteiras em questões legais, os estados brasileiros acabam li-mitados em certas ações.

Menos badalados e reconhecidos que o seu equivalente federal, boa parte dos órgãos de controles internos dos estados vem

desempenhando um papel fundamental para ajudar os estados a serem mais eficientes e a criarem um ambiente de negócios mais

transparente no país

Com menos possibilidades de ge-rar receitas e atrair investimentos, e a pressão cada vez maior sobre o caixa – muitas das concessões fiscais feitas pelo executivo federal em governos anterio-res tiveram como base impostos que alimentavam diretamente os caixas es-taduais – a busca por eficiência passou a ser um tema dominante, especialmente nos estados mais estruturados. E, quan-do se fala do poder público no Brasil, não dá para falar de eficiência sem pas-sar pela questão dos controles internos, seja para aperfeiçoar processos e evitar desperdícios, seja para atuar de maneira corretiva, punindo quem tentou lesar os cofres públicos. “A qualidade no gas-to público será determinante para supe-rar os desafios. Os órgãos de controles internos têm sido instados a compor e até liderar comitês governamentais para propor medidas e garantir sua obser-vância. Não há espaço para desperdí-cios de recursos e evitá-los é nossa ex-pertise”, afirma Roberto Paulo Amoras, auditor-geral do Pará e presidente do CONACI. Vários estados já atentaram para esse ponto e têm turbinado as ope-rações dos seus órgãos de controles.

Necessário a qualquer tempo No atual momento do país, com res-trições orçamentárias nos seus estados, contar com o apoio de bons órgãos de controles internos é de extrema impor-tância para os estados atraírem investi-mentos privados. Com todas as discus-sões e reflexos da lava-jato, as grandes empreiteiras estão fazendo uma análise criteriosa dos estados para definir onde investir e de onde fugir, com base no grau de risco que cada ente oferece. “Par-ticipei de vários debates com o setor pri-vado e percebi essa preocupação com a segurança jurídica ou a falta dela, estados que não tomaram providência em rela-ção a essas leis importantes, que não te-nham um bom portal de transparência, são sintomas de uma possível fragilidade e desorganização do poder público, o que naturalmente afugenta investimen-tos”, diz Gustavo Ungaro, ouvidor-geral de São Paulo. É uma agenda necessária para todos os estados em favor das suas respectivas populações.

O trabalho das controladorias e ou-vidorias estaduais (CGE´s) não ganha o mesmo destaque e nem é acompanha-do tão de perto pelos profissionais de

Bom trabalho fora dos holofotes

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atividades clássicas dos órgãos de con-troles internos da administração públi-ca como corregedoria e auditoria. Estas continuam na controladoria-geral do estado das atividades de transparência e prevenção à corrupção, que passaram a estar lotados em um gabinete espe-cial. O gabinete tem um trabalho vol-tado para o setor privado, tanto no que diz respeito à prevenção com a inclu-são de cláusula nos contratos fechados com a administração pública e a reali-zação de due diligences nas empresas contratadas pelo estado, como no que concerne ao fomento da cultura de in-tegridade. “Temos chamado o empre-sariado, sindicatos e federações para discutirmos compliance”, diz Matheus Lourenço Rodrigues da Cunha, secre-tário-adjunto do gabinete. Na esfera pública, o gabinete de Transparência está responsável pela implantação do programa de integridade do estado, que vai funcionar como a área de com-pliance da administração pública, e também de instituir o processo de due diligence para os servidores que atuam no estado. Além disso, a pasta trabalha no desenvolvimento de um canal de

compliance, que acabam quase sempre limitando o seu olhar para a Controla-doria-Geral da União, que com a res-ponsabilidade sobre o executivo federal e regulador da Lei Anticorrupção (ao menos em tese), acaba tendo um im-pacto muito maior sobre a área. Mas, os negócios são realizados dentro dos estados, que tem os seus próprios ór-gãos de fiscalização e que por si só, já gera um envolvimento bastante grande com o poder público local. Além disso, estão entre os grandes contratantes de obras públicas, serviços e produtos do país, conduzido licitações gigantescas. Ou seja, seria bom que os profissionais passassem a dar mais atenção ao traba-lho dessa turma, porque muitos deles vêm realmente desenvolvendo um bom trabalho e merecem o reconhecimento por isso.

Um bom exemplo é o estado do Mato Grosso, o ente da federação que até aqui mais fez uso da Lei Anticor-rupção, punindo 33 empresas desde que a lei foi regulamentada no estado em abril deste ano. O estado do centro--oeste estabeleceu um modelo inédito no país responsável pela separação de

denúncias focado em casos de corrup-ção, separado da ouvidoria.

Implementar a cultura de integri-dade em um estado gigantesco que congrega mais de 100 mil servidores como o Mato Grosso, não é tarefa fácil. Ademais, a estrutura do poder público, quase sempre lenta, também não ajuda. Apesar disso, Matheus se mostra contente com a perspectiva do trabalho. “Além da prevenção, o nosso viés é de transformação social. Que-remos melhorar o meio ambiente de trabalho para o servidor, temos muitos bons funcionários que acabam ficando desmotivados, porque fica a sensação de que quem consegue dar um jeitinho é que se dá bem”, lamenta. O comitê de ética do estado também foi integra-do ao gabinete especial, colocando os processos administrativos contra servi-dores sob a proteção do gabinete, blin-dando o caso de qualquer interferência externa.

Dono do segundo maior orçamento do Brasil, o estado de São Paulo opera com um modelo na qual as atividades de controles internos estão organizadas em vários órgãos, formando um siste-

rodoanel em sp: em tempos de poucos recursos cuidar para que eles não se percam em desvios e ineficiências no meio do caminho é fundamental.

poder público • estados

| LEC - LEGAL, ETHICS, COMPLIANCE • ED 1526

ma estadual de controladoria. “Temos diversas unidades estaduais voltadas aos controles internos, cobrindo todas as macrofunções preconizadas para a atividade, mas elas não estão centrali-zadas em apenas um órgão. Temos a Ouvidoria, a área de Auditoria que fica na Secretaria da Fazenda, a responsa-bilidade punitiva fica na Procuradoria Geral do Estado”, explica Ungaro, que como chefe da Ouvidoria, fica respon-sável pelas ações de transparência do executivo estadual, como o Portal da Transparência e o Conselho de Trans-parência. Nessa seara, o ouvidor pau-lista destaca que o estado disponibiliza no seu portal, não apenas os salários dos servidores da administração públi-ca direta, como também da indireta, onde se enquadram empresas como a SABESP, concessionária de água e es-goto que tem o estado como controla-dor. “Se você quiser saber quanto ga-nha o presidente da SABESP, você vai encontrar lá. Acho que o governo fe-deral deveria adotar a mesma medida, abrindo os valores pagos aos servidores públicos que atuam nas grandes esta-tais federais. Acredito que o momen-to é propício e a população demanda isso”, pontua. A Ouvidoria também é responsável, em parceria com a Trans-

parência Internacional, pela operação do projeto experimental CAIAC – Centro de Apoio e Incidência Anti-corrupção – um local onde o cidadão poderá fazer sua denúncia sobre casos de corrupção em sigilo e amparado por uma equipe de especialistas.

apoio aos muNicípiosUm dos grandes desafios para os esta-dos mais desenvolvidos é apoiar o de-senvolvimento do controles internos nos municípios. Se as capitais dos es-tados, em sua grande maioria, não con-tam com áreas realmente estruturadas de controladoria, o que dizer dos mi-lhares de pequenas cidades espalhadas pelo interior dos estados? No caso de São Paulo, Ungaro diz que a Ouvidoria realiza uma série de atividades para au-xiliá-los nesse desenvolvimento, como o programa Transparência Paulista, que disponibilizou mais de 200 portais da transparência para as menores cidades do estado, que assim puderam cumprir com o que determina a lei sem que isso incorresse em custos adicionais. Mas esse auxílio também cumpre o papel de permitir um melhor acompanhamento pelo executivo estadual da aplicação dos recursos repassados aos municípios. No caso de Mato Grosso, Rodrigues da

Cunha, do gabinete da Transparência, diz que como o próprio estado ain-da está em fase de desenvolvimento e aprendizado do seu programa, não tem parâmetros estabelecidos que permitam ao estado replicar o programa nos mu-nícipios, embora deixe claro que tão logo tenha condições, o objetivo do programa será o de compartilhar todo o aprendizado.

Rumando na mesma direção Claro que a diferença na realidade enfrentada por cada um dos 27 entes federativos brasileiros é gritante, algo natural numa federação. No entanto, independentemente das disparidades, é importante destacar que no caso dos estados, a grande maioria das contro-ladorias têm feito um esforço consis-tente para evoluir, o que por si só já é uma conquista. Muitos estados têm tomado medidas importantes, como a regulamentação da Lei Anticorrupção em âmbito estadual e legislações locais para garantir maior robustez em seu sistema de controles internos. O Ce-ará, por exemplo, estabeleceu na sua constituição estadual, o modelo preco-nizado pela PEC 45, que o CONACI quer ver aprovada. Essa proposta de emenda constitucional prevê que a ati-vidade de controle interno necessaria-

gustavo ungaro, ouvidor-geral de sp: sistema de controles internos espalhado por várias áreas da administração pública estadual.

matheus cunha, da secretaria de transparÊncia do mt: estado campeão na aplicação da Lei Anticorrupçao.

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mente envolva quatro macrofunções: auditoria, correição, ouvidoria e cor-regedoria. E que tais áreas devam ser conduzidas por órgãos de estado per-manente, assim como por servidores públicos concursados.

Gustavo Ungaro lamenta o fato de existirem situações em alguns estados em que a área de controle ainda não conte com o reconhecimento necessá-rio e atue sem condições operacionais adequadas, sendo comandada por pes-soas de outras áreas, sem vínculo com a pasta. “Por isso a importância da PEC 45, um entendimento nacional de como deve ser a atividade de con-trole interno”, reforça o ouvidor de São Paulo.

O CONACI tem promovido a tro-ca de conhecimento e experiências en-tre as CGE´s. É bem comum hoje ver os servidores de um estado indo visitar seus colegas em outro estado, objetivan-do conhecer as boas práticas adotadas por lá. E vale notar que quem visita, tem ido para conhecer aspectos específi-cos de cada programa, o que demonstra que as bases de trabalho, em sua grande maioria, já estão estabelecidas.

Claro que muito mais pode ser feito para melhorar a integração entre os estados, como um melhor compar-tilhamento de informações e base de dados dos estados capazes de tornar os processos mais céleres, efetivos e eco-nômicos. Paulo Amora diz que há uma intensa interação institucional entre os membros do CONACI., “[Isso] nos habilita ao próximo passo, que seria viabilizar a estratégia de integração corporativa, não entendida, exclusi-vamente, como a integração entre os diversos sistemas corporativos utiliza-dos e, sim, como compartilhamento de base de dados e, principalmente, de informações gerenciais estratégicas para os objetivos do controle interno”, diz o presidente do órgão.

Outro ponto que estimula o aper-feiçoamento dos órgãos de controle e merece destaque são os convênios in-ternacionais. Um bom exemplo disso foi o acordo de cooperação para for-

talecer os órgãos estaduais de controle firmado pelo CONACI com o Banco Mundial em 2014, para implementar nos órgãos internos estaduais a meto-dologia Internal Audit Capability Mo-del (Modelo de Maturidade de Audi-toria Interna para o Setor Público, ou IA-CM, da sigla em inglês), desenvol-vida pela consultora canadense Elisa-beth MacRae, contratada pelo Banco Mundial para coordenar a sua imple-mentação em algumas controladorias estaduais. O IA-CM está baseado num quadro que identifica os fundamentos necessários para a auditoria interna eficaz no governo e no setor público. Mais recentemente, o CONACI e o Banco Mundial atuaram em conjunto para desenvolver um trabalho de quali-ficação das auditorias públicas.

Os próprios estados já estão tra-balhando diretamente com o Banco Mundial em busca de recursos para melhorar suas capacidades como é o caso de Goiás, que conseguiu aprovar junto ao Banco Mundial o seu Plano

de Ações apresentado pela Controladoria--Geral do Estado de Goiás em prol da mo-dernização de sua área de controles internos. O processo é parte do acordo de parceria fir-mada com a instituição multilateral que visa obter apoio técnico e financeiro para apri-morar as atividades de controle interno e, contou com a inter-mediação do Conselho Nacional de Controle Interno. Adauto Bar-bosa Júnior, responsá-vel pela CGE de Goiás, explica que o objetivo das medidas é moder-nizar as áreas de con-trole interno do estado

por meio da implementação de níveis elevados de auditoria interna, aperfei-çoamento da governança e gerencia-mento de riscos.

Viabilizar parcerias e fontes de fi-nanciamento é fundamental para que os órgãos de controles internos estadu-ais possam fazer maiores investimen-tos em ferramentas de Tecnologia de Informação. “É imprescindível, diante do amplo e complexo universo de atu-ação dos órgãos de controles internos, contar com um quadro funcional bem qualificado e capacitado, a fim de al-cançar a efetividade e excelência exi-gidas. O conhecimento inteligente do ‘negócio’ controle interno, indiscuti-velmente, encontra-se com os servido-res que nele atuam. Faz-se imperioso, entretanto, dar escala a esse know--how. Para tanto, os investimentos em TI são essenciais. Reconhecemos que muito há a avançar nesse aspecto”, diz o presidente do CONACI, que con-clui que o órgão vem fazendo esforços nesse sentido, no âmbito denominado “PROMOIN”, Programa para Mo-dernização e Fortalecimento do Con-trole Interno.

roberto amoras, do conaci: apoio aos estados com convênios internacionais e troca de experiências.

LEC NEWS • ANTICORRUPÇÃO

| LEC - LEGAL, ETHICS, COMPLIANCE • ED 1528

Pequim para eliminar parte da sua capacidade excedente de produção industrial. Como parte da sua estra-tégia econômica, o governo central quer eliminar o excesso de plantas industriais pesadas no país. Só que muitas delas são a base das economias nas províncias chinesas. Apenas na in-dústria de aço, essas medidas devem resultar em 1,1 milhão de demissões nos próximos anos, o que faz com que a medida enfrente resistências das populações e governos regionais. He-bei é um importante centro de indús-trias pesadas da China, especialmente na produção de aço, área em que ele concentra 23% da produção total do país. Só que Pequim planeja cortar a produção de aço de 150 milhões de toneladas métricas ao longo dos pró-ximos cinco anos, fazendo de Hebei um provável caldeirão de problemas e insatisfações. Trabalhadores fizeram protestos na região este ano e conti-nuam a sair com frequência. Assim, estão sendo afastados enquanto não há nenhum sinal de apoio do gover-no central com fundos do pacote de assistência bilionário anunciado por Pequim no início do ano. De acordo

Cortina de fumaçaQue o combate à corrupção na

China, uma missão prioritária impos-ta pelo atual presidente Xi Jinping, tem gerado ações e resultados con-cretos, não se discute. Vários figurões do Partido Comunista (ou ligados à figuras importantes do partido) caí-ram em desgraça e estão, em muitos casos, presos. Mas, em um país com forte histórico de corrupção, também é inegável que essa cruzada tem clara-mente servido aos interesses do atual mandatário e de seus aliados como pretexto para tirar de circulação ini-migos políticos ou aqueles que se vol-tem contra as demandas de Pequim.

Um recente artigo publicado pela consultoria especializada em assuntos geopolíticos, Strafor, joga mais luz so-bre esse aspecto sombrio do combate à corrupção na China.

Em abril deste ano, uma metalúr-gica foi fechada na província de He-bei, sob acusações de corrupção. Mas, na verdade, o movimento pode sinali-

zar uma artimanha dos burocratas na capital chinesa para diminuir o exces-so de capacidade na indústria pesada. Zhang Yue, chefe da Comissão Polí-tica e de Assuntos Jurídicos da pro-víncia de Hebei, foi investigado pela organização de combate à corrupção do Partido Comunista, que é quem comanda a nação asiática. O órgão não entrou em detalhes sobre as acu-sações contra Zhang, mas, de acordo com a Strafor, tendo como base notí-cias publicadas em jornais chineses, o Yue era ligado ao ex-vice-ministro do serviço de inteligência do país, que foi preso no ano passado.

A acusação diz que Yue usou sua posição e o aparelho judicial da pro-víncia para prender rivais de negócio da metalúrgica (uma prática que pa-rece comum na China). No entanto, a Strafor sugere que as circunstâncias da prisão de Yue estão mais ligadas à sua resistência e de sua província em obedecer à ordens enviadas por

cidade de dalian, na província de liaoning, na china: corrupção pode

servir de pretexto para intervenção econômica.

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Um caso de corrupção com um desfe-cho digno de filme.

Chinesa naturalizada norte-ameri-cana foi condenada no final de junho por um tribunal de Nova York, nos Es-tados Unidos, a 20 meses de prisão por subornar John Ashe, o ex-presi-dente da Assembleia Geral das Na-ções Unidas entre setembro de 2013 e setembro de 2014.

Sheri Yan, de 60 anos e também conhecida como Shiwei Yan, é co--fundadora e ex-chefe da Fundação Global de Sustentabilidade. Ela se de-clarou culpada por pagar a Ashe, que era um alto membro da missão perma-nente da ilha caribenha de Antiqua na ONU, mais de US$ 800 mil em subor-nos, para que o burocrata a ajudasse e a outros empresários chineses a negociar terras na ilha. As negociatas tiveram início em 2012 e Ashe repas-sou parte do suborno para outros fun-cionários públicos do seu país. Além dos US$ 800 mil, Sheri Yan pagou a Ashe uma “ajuda” de US$ 20 mil por mês, por conta do seu papel como “presidente honorário” da Fundação Global de Desenvolvimento Susten-

tável, que viria a se transformar na Fundação Global de Sustentabilidade. Ela foi criada com a suposta missão de promover metas de desenvolvimento sustentável da ONU. Além da prisão, Sheri foi condenada a pagar US$ 300 mil às autoridades norte-americanas.

O próprio John Ashe foi indiciado por um júri federal por esse e outros casos de suborno que teriam superado US$ 1 milhão, além de fraude fiscal e suposta conspiração envolvendo cinco outras pessoas, incluindo um bilionário homem de negócios chinês e o ex--embaixador adjunto da ONU na Re-pública Dominicana. De acordo com a promotoria dos Estados Unidos, Ashe teria usado o dinheiro para comprar relógios Rolex, ternos feitos sob enco-menda, um veículo BMW para férias com a família e, até mesmo sua pró-pria quadra de basquete.

Só que Ashe não chegou a ir a jul-gamento. Cinco dias antes da sua au-diência no tribunal, ele morreu após, supostamente, se acidentar enquanto fazia ginástica e com isso, teve o pesco-ço quebrado quando a barra com pesos que utilizava durante o exercício caiu.

Caso suspeito

john ashe (à esq.), na onu: acidente fatal uma semana antes de depor sobre corrupção.

com a Strafor, a evidência de que não existe vontade real do governo central de ajudar as províncias é que muitos trabalhadores nem sequer ouviram fa-lar do programa.

Nesse contexto, para os analistas da Strafor é implausível acreditar que Yue tenha sido removido simplesmente por ser incompetente ou corrupto. A cor-rupção esteve ao seu lado por toda sua carreira e suas sucessivas promoções sugerem que ele era um funcionário competente. Além disso, é improvável que os investigadores chineses não ti-vessem conhecimento das atividades regressas do dirigente. Ele inclusive passou sem maiores percalços por uma investigação em 2014, provavelmente trocando informações sobre suas co-nexões e patronos para garantir sua so-brevivência política, aponta a Strafor, que acredita que Yue pode até ter sido útil para os esforços anticorrupção do partido em 2014. Mas, que preocupa-ções legais são de importância secun-dária frente às preocupações políticas do presidente Xi Jinping em suprimir qualquer ameaça ao seu poder.

O mais importante nesse caso é que, embora as investigações tenham começado em 2015, Pequim pode estar acelerando as investigações, não por causa da corrupção, mas sim pelo papel central que a província de He-bei exerce na reforma estrutural dos excessos produtivos do setor indus-trial de base na China. Por isso, os afastamentos por conta de corrupção têm mais a ver com retirar do conse-lho provincial quaisquer nomes que se coloquem contra as mudanças pretendidas por Pequim e, ao mesmo tempo, colocar medo sobre os que lá ficaram, para que votem de acordo com os desejos da capital. A mesma estratégia poderá ser usada em outras províncias que não executem o plano econômico de Pequim. Uma investi-gação semelhante envolvendo o Co-mitê Político e de Assuntos Jurídicos da província de Liaoning, outra área com enorme excesso de capacidade industrial, já foi iniciada.

LEC NEWS • ANTICORRUPÇÃO

| LEC - LEGAL, ETHICS, COMPLIANCE • ED 1530

Prestando contas

No final de julho, David Green (foto), diretor do Serious Fraud Office – a agência britânica de combate às fraudes e à corrupção – foi ao parlamento britânico para apresentar o re-latório anual sobre as atividades da agência do período 2015-2016. O dirigente reforçou o papel da agência, que se dedica a examinar casos altamente suspeitos de fraude ou suborno que podem minar a confiança no ambiente de negócios e a reputação do Reino Unido e da City, o famoso centro finan-ceiro de Londres. “Nossos casos têm características comuns: são sempre complexos, demandam análise pesada de dados e são tecnicamente e legalmente desafiadores. As evidências têm de ser colhidas a partir de várias jurisdições e exigem co-ordenação com reguladores e agências estrangeiras”, disse.

Segundo Green, foram abertas 12 novas investigações criminais e três investigações de responsabilidade civil no período. Mas, esse número tende a ser maior, uma vez que as investigações só são anunciadas quando existe uma neces-sidade da empresa investigada de comunicar ao mercado ou quando o SFO vê alguma razão para tal. As investigações em curso incluem nomes como a varejista Tesco, a fabrican-te de peças aeronáuticas Rolls Royce, a farmacêutica Gla-xoSmithKline e o banco Barclays. Todos os casos progredi-ram significativamente neste ano, de acordo com o órgão. Green também destacou que o órgão está mais focado em utilizar ferramentas disponibilizadas recentemente, especial-mente os acordos de leniência, da sigla em inglês DPA. Em Novembro do ano passado, o SFO acertou o seu primeiro acordo com Standard Bank, assumindo a culpa por não ter evitado o pagamento de subornos em sua operação na Tan-zânia. O banco pagou US$ 7 milhões em compensação ao governo da Tanzânia (algo que diferencia os britânicos dos seus colegas norte-americanos, que ficam com todos os re-cursos oriundos desses acordos) além de multa e devoluções para o tesouro do Reino Unido de US$ 25.2 milhões.

Usando as ferramentas E para se valer das novas possibilidades de acordo permiti-das pelo SFO, a fabricante europeia de aviões, Airbus está

cooperando com o SFO, que comunicou oficialmente no início de agosto a abertura, em julho, de uma investigação contra a empresa por problemas envolvendo o uso de agen-tes terceirizados para vender aeronaves civis em mercados internacionais, especialmente da Ásia e do Oriente Médio. O fechamento de um DPA permite que a acusação seja sus-pensa em troca de promessas de melhorias em compliance, o pagamento de uma multa, além de ajudar os investigadores a estabelecer casos contra indivíduos. Foi a Airbus quem co-municou às autoridades, em abril, as suspeitas envolvendo o uso de terceiros em alguns mercados internacionais.

Para as empresas de aviação, estabelecer vendas nas regi-ões de rápido crescimento, como Oriente Médio e Ásia, nas quais muitas companhias relevantes têm os governos locais como acionistas, tornou-se um desafio. Para acelerar o cres-cimento nessas áreas, elas têm optado pelo uso de terceiros já estabelecidos nos mercados e que contam com acessos e conexões com pessoas de decisão já estabelecidas no merca-do, ao invés de montarem áreas de vendas próprias, o que poderia levar vários anos para gerar resultados. Em tempo, um dos focos da investigação SFO é a falha da Airbus em divulgar o uso de terceiros para o UK Export Finance, uma agência que fornece crédito para vendas no exterior e que a Airbus – que fabrica a maior parte de seus componentes na França, na Alemanha e na Inglaterra – usou para viabilizar algumas vendas internacionais.

Comentando o caso, Katherine Dixon, diretora do pro-grama de Defesa e Segurança da Transparência Internacional disse que Airbus é apenas um nome dentro uma longa linha de empresas que enfrentam problemas pelo uso de agentes, um dos maiores riscos de corrupção em todo o setor de defesa e aeroespacial. Para a executiva, o caso da Airbus destaca a fraqueza de cumprir com exigências de autocomunicação e demonstra que os governos podem e devem usar políticas de exportação para reduzir a influência de intermediários corrup-tos. “O caso Airbus demonstra a necessidade de requisitos de transparência mais consistentes nas políticas de exportação no uso e pagamento de agentes”, diz.

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Nos dias atuais, vivemos em um universo ampla-mente interconectado, fazendo com que a infor-mação se torne um dos

principais ativos das empresas. Assim, as questões relacionadas à Segurança da In-formação conquistaram lugar de destaque no universo corporativo, porquanto pro-teger e conservar as informações das inú-meras ameaças tornou-se essencial para garantir a continuidade do negócio e o retorno sobre os investimentos.

As empresas passaram então a adotar medidas tecnológicas de controle para proteger seu capital intelectual, visando garantir a confidencialidade das informa-ções a fim de se manterem competitivas perante o mercado. Monitoramento de e--mails, verificação da navegação na Inter-net, gravações das conversas telefônicas, acompanhamento por GPS, são alguns exemplos desse tipo de controle. Porém, tais controles acabaram por acarretar re-flexos em outras esferas de direitos, em especial à privacidade dos trabalhadores.

Tratando-se o Direito do Trabalho uma ciência eminentemente social, que lida com a justiça humana, seria esperado que se manifeste sobre a presença das no-vas tecnologias no ambiente laboral e os controles efetuados através das mesmas.

No entanto, embora seja uma forte tendência a incorporação de recursos tec-nológicos no cotidiano do trabalhador, tímidas são as iniciativas legislativas so-bre o tema. A Consolidação das Leis do Trabalho cuidou apenas de mencionar sucintamente a questão do trabalho re-moto (home office), prevendo a possibili-dade de utilização de meios telemáticos e informatizados para o comando, controle e supervisão do trabalhador.

O silêncio legislativo acabou por

Pode isso, Arnaldo?

estimular uma natural evolução do po-sicionamento jurisprudencial, passando o Poder Judiciário a estabelecer alguns parâmetros acerca dos controles imple-mentados pelas empresas.

As discussões nos vários precedentes jurisprudenciais orbitaram essencialmente ao redor dos seguintes fundamentos: di-reito ao sigilo das comunicações, direito à privacidade, direito à propriedade, poder de direção e responsabilidade objetiva. Se por um lado, o trabalhador tem direito à privacidade e inviolabilidade das suas co-municações pessoais, por outro, o empre-gador tem o direito de propriedade sobre as ferramentas de trabalho e a garantia de proteção aos segredos de seu negócio.

Após muita discussão, o Tribunal Superior do Trabalho consolidou o en-tendimento no sentido de que o empre-gador poderia monitorar os e-mails dos seus empregados, desde que atendesse aos seguintes requisitos: (i) existência de re-gra interna que informe ao trabalhador a existência do procedimento de monitora-mento de forma clara e transparente; (ii) o trabalhador deve ter ciência inequívoca de que o procedimento de monitoramento é realizado, a fim de afastar eventual expec-tativa de privacidade; (iii) o monitoramen-to somente pode ser realizado na conta de e-mail corporativa e demais ferramentas que sejam de propriedade do empregador, pois ostentam natureza de ferramenta de trabalho; (iv) é vedado o monitoramento de contas de e-mail particulares, ainda que acessadas a partir da rede do empregador, pois em relação a estas, os empregados go-zam de expectativa de privacidade.

Com isso, observa-se que a Justiça do Trabalho cuidou de harmonizar o siste-ma jurídico, levando em conta que ne-nhum direito pode ser considerado ab-soluto, sob pena de prejudicar a vigência

de outro, no mesmo patamar. O problema é que o universo da tec-

nologia é absolutamente dinâmico e está em constante evolução, nada é definiti-vo. Novas ferramentas surgem a cada dia e novos modelos de negócio se desenvol-vem a partir delas.

Com o barateamento dos dispositivos informáticos, a tecnologia de ponta está hoje nas mãos do usuário comum e não mais concentrada nas grandes empresas, como ocorria no século passado. Não raro, o trabalhador possui equipamentos mais modernos e mais potentes do que aqueles que a empresa poderia lhe dispo-nibilizar como ferramentas de trabalho.

Surgem então uma situação bastante peculiar, na qual os trabalhadores colo-cam em segundo plano as ferramentas de trabalho disponibilizadas pelo emprega-dor e passam a querer usar suas próprias ferramentas. Não bastasse isso, as gera-ções mais jovens que estão chegando ago-ra ao mercado de trabalho se recusam a trabalhar em empresas que não autorizem o uso de seus próprios dispositivos.

Porém, como controlar as informa-ções corporativas quando estas circulam em dispositivos e aplicações que não são propriedade da empresa, sem violar a privacidade do trabalhador? O emprega-dor poderá instalar ferramentas de segu-rança nesses equipamentos? Poderá ser realizado algum tipo de controle? Como disponibilizar ferramentas de mensagens online sem que caracterize sobreaviso ou realização de horas extras?

Sem dúvida, novas soluções jurídicas terão que ser construídas. É certo que as empresas não estarão libertas de limites para controlarem as suas informações, mormente quando tenderem a reduzir a esfera da privacidade de seus empregados, porém, o grande desafio que enfrentarão será o encontro de um ponto de equilí-brio entre o respeito individual e as res-ponsabilidades sociais e coletivas.

A privacidade do trabalhador versus os controles eletrônicos sob a perspectiva da relação trabalhista

Por Camilla do Vale Jimene

Camilla do Vale Jimene é Advogada do escritório Opice

Blum, Bruno, Abrusio e Vainzof Advogados, especializado em

Direito Digital.

legislação • digitAl

TONE AT THE TOP • LUIS REzENDE

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A Suécia é um país que habita o nosso imagi-nário. Índices eleva-díssimos de qualidade de vida, alto padrão de bem estar social e uma

sociedade organizada de modo mais igualitária. O país é um dos mais aber-tos do mundo e com mais facilidade para se fazer negócios, em compara-ção com a Alemanha ou na Suíça. Essa abertura para o mundo tem muito a ver com as necessidades do próprio país. Com apenas nove milhões de habitantes e parte substancial do seu território sob as severas condições do Ártico, as corporações do país preci-sam gerar negócios muito além de suas fronteiras. E assim eles têm feito ao longo de décadas, desbravando novos países, suas culturas e idiossincrasia. “Eles não falam quatro, cinco línguas diferentes porque têm desejo, mas porque têm necessidade. Na Suécia, se você quer se comunicar com o resto do mundo, você tem de se esforçar para isso”, explica Luis Rezende, o jovem presidente da operação brasileira da

Como Luis Rezende, presidente da Volvo Cars,ajudou a disseminar a cultura de ética e transparência na operação brasileira da empresa

Volvo Cars, a divisão de automóveis de luxo da gigante automotiva sueca.

O país nórdico é também uma re-ferência em transparência e conduta ética. E a Volvo trouxe recentemente para a sua comunicação essa origem, adotando o “Think Swedish” (algo como ‘o jeito sueco’, numa tradução livre). “Esse conjunto de valores suecos é o que nos diferencia. Somos a única marca de automóvel premium de lá e nossas maiores concorrentes são ale-mãs. Então, ser sueco é diferente”, diz o presidente da empresa.

“Por que não construir carros para pessoas que pensam em outras pes-soas?”, diz uma peça publicitária da marca. É uma abordagem diferente de tudo o que costuma ser feito na indús-tria automotiva, em especial no seg-mento de automóveis premium, onde a performance e o luxo das máquinas costumam direcionar todo o trabalho e a comunicação com o público. “Isso traduz como a gente enxerga nossos produtos e como eles devem ser”, ex-plica o presidente. Dentre as propostas que compõe a visão da empresa para

Ponto de referência

estilos que se casam: o modelo de liderança praticado por Luis Rezende encontra respaldo na cultura da Volvo.

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2020, uma das mais importantes é a de que a partir daquele ano, nenhuma pessoa venha a morrer por ter se en-volvido em um acidente com um au-tomóvel da Volvo. Na verdade trata-se de uma visão do governo sueco, que tem a Volvo como parceira. Só que a empresa, que opera em vários pa-íses ao redor do mundo, pensou que isso deveria ser expandido para todos os países. Afinal, estamos falando em salvar vidas humanas. “Por que excluir alguns países desse objetivo, seja por uma diferença social ou de educação, ou porque são muito populosos e isso gera mais acidentes? A nossa visão é zero mortes em qualquer lugar, e te-mos muito orgulho disso”, pontua. O mais recente lançamento da empresa é um carro que a uma velocidade de até 50 km/h não atropela nada e ninguém, garantindo isso sem a necessidade de intervenção do motorista.

A empresa é tão aficionada por se-gurança e pelas pessoas que a usam, que nos anos 1950 inventou o cinto de três pontos. Uma grande inovação, reconhecidamente um dos itens de se-gurança mais importantes já inventa-dos. Em boa parte das empresas, ou se a Volvo estivesse em outro país, esse avanço seria patenteado e utilizado como um grande diferencial competi-tivo. Mas, a Volvo entendeu que não poderia fazer isso com um item criado para essa função, e não patenteou a in-venção, deixando livre para que todas as outras montadoras a adotassem e transformassem o modelo inventado no padrão do mercado.

Essa visão mais humana – se é que podemos chamar assim – se reflete na maneira como as empresas com origem no país são geridas. Indepen-dentemente da hierarquia do cargo, costuma existir o respeito à opinião das pessoas que são estimuladas a com-partilhá-las em vez de simplesmente acatar um ponto de vista por ele vir de cima. Para Luis, isso tem a ver com algo extremamente precioso para o desenvolvimento dos projetos, isto é, o tempo. Contudo, é uma visão que

pode ser considerada unusual dentro do ambiente corporativo. Enquanto na imensa maioria das corporações globais, a questão do tempo está ligada diretamente a aumentar a velocidade para diminuir o tempo necessário para fazer de tudo – do planejamento até a execução –para os suecos da Volvo, a relação é oposta. Você tem de ter o tempo necessário para a tomada de uma decisão, mesmo que isso torne al-guns processos mais lentos do que po-deriam ser na visão do time no Brasil. “Se você tem tempo para pensar e para tomar uma decisão, você dorme tran-quilo, seus medos e angústias, suas in-seguranças [em relação ao assunto] irão aparecer e, se estiver num ambiente aberto, você vai falar sobre isso e todos chegarão juntos à uma conclusão mais plausível”, acredita o executivo. “Ago-ra, quando [as empresas] não te dão o tempo e ainda colocam muita pressão, neste momento é onde alguma coisa pode acontecer”, emenda Luis.

É uma cultura que vestiu, sob me-dida, o estilo de liderança e os valores do presidente da Volvo Cars no Brasil. “Aqui não pode haver o ‘gerenciamen-to pelo medo’. Há três anos, alguém imaginava que estaríamos vendo um impeachment? Não. Ou que o câmbio estaria nesta situação? Não. Agora, o importante é o quê você faz com todas essas informações. Os fatos são sempre colocados na mesa e você sempre tem um momento em que pode escolher qual caminho seguir. O que muito norteia é isso, que caminho escolher, pois em algum momento foram lhe dadas opções”, diz.

Economista de formação, Luis acu-mula bastante experiência em áreas relacionadas à controladoria e audito-ria. Depois de estagiar na montadora francesa Peugeot, atuar como analista financeiro numa distribuidoras e im-portadora de bebidas – intercalado com um período de estudos de sete meses em Londres, na Inglaterra – foi convidado para trabalhar na gigante holandesa Philips. Entrou na empresa como business controler, função na qual

TONE AT THE TOP • LUIS REzENDE

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além da controladoria, cuidava da in-trodução de novos produtos, precifica-ção e cálculos de margem para algumas linhas de consumo da empresa. Em 2004, o executivo foi para a área de auditoria interna corporativa com dois chapéus, a própria auditoria (financei-ra) e a investigação de fraudes. “[Nessa nova função] conheci todas as divisões de negócios da Philips. O compliance e a auditoria eram muito fortes na em-presa”. Ele recorda que trabalhava com uma agenda toda programada para re-alizar auditorias nas diversas unidades da empresa. Mas, quando aparecia uma denúncia de fraude, e elas po-diam aparecer a qualquer momento, parava-se tudo até que a investigação fosse concluída. “No máximo eu con-seguia fechar a auditoria que estava fa-zendo”, lembra. Para exercer essa fun-ção, o executivo foi treinado em Hong Kong. Ele participava de um centro de debates onde os cerca de 70 auditores da empresa holandesa trocavam infor-mações sobre o que acontecia em suas unidades, como proceder com certas fraudes, sempre balanceando o efeito cultural.

Luis mudou de vida quando rece-beu o convite da Volvo, que na épo-ca era uma marca pertencente a Ford e tocada aqui no Brasil pela própria montadora norte-americana. Já estava definido que a Volvo voltaria a operar no Brasil com uma marca indepen-dente, e com 28 anos, Luis assumiu a diretoria financeira com a responsabi-lidade de cuidar de todo o processo de separação da operação. “Toda a parte de back office, infraestrutura e logísti-ca, eu que cuidei”, recorda. O processo de mudança durou até 2011, quando a empresa finalizou a instalação do sis-tema de gestão SAP e se mudou para um novo escritório. Depois de cinco anos como diretor financeiro, há três ele está como o principal executivo da Volvo Cars no Brasil.

A exPeriênciA que vem do lAdo de láCom toda a vivência na áreas de con-

troles internos como auditor e inves-tigador, Luis sabe que não é na au-ditoria que as fraudes são realmente descobertas. Um número que nor-teia o executivo, de uma pesquisa da KPMG, é que apenas 3% das fraudes que se descobrem são encontradas pela auditoria. “O grande fator para descobrir uma fraude é a denúncia. A auditoria é importante, mas se você confiar 100% nela como sua maior garantia, não dá. Você tem de criar a cultura e o ambiente de transparên-cia”, garante o executivo. “Essa cultu-ra se reflete no jeito como você toca o negócio e toma decisões de acordo com as opções que lhe são dadas”, emenda. Um exemplo, bastante co-mum no Brasil, diz respeito ao paga-mento de impostos. Com novas leis fiscais todos os dias, é natural que al-gum tributo escape ou seja calculado errado. Mas a maneira de encarar isso é o que faz a diferença, explica Luis Rezende: “Uma coisa é você saber que algo está errado e esperar que o Fisco venha te cobrar; outra totalmente di-ferente é assim que descobrir que está fazendo errado, ir lá e pagar. Esse é a minha conduta e ela era estranha para alguns quando cheguei”.

Mais uma vez é a questão dos ca-minhos que o líder decide seguir e isso tem muito a ver com os valores e cons-ciência de cada um. O ambiente de negócios no Brasil faz com que muitos líderes, optem por deixar o problema para lá. Afinal, a cultura aqui ainda é a de acreditar que você dificilmente se-ria pego, o que com a complexidade e a ineficiência do poder público, pode realmente acontecer. Luis lembra de um professor na faculdade que dizia que se um projeto só parasse de pé por não pagar imposto (seja por benefício fiscal ou por artimanhas fiscais), você não teria um projeto. “Hoje, entendo bem que se você montar um projeto baseado em benefícios fiscais, não vai dar certo. Acho que isso norteia muito as minhas decisões e o bacana é a que a cultura da minha empresa me permite isso”, explica. “Vai da sua consciência

fazer ou não. E a minha não permi-tia”, diz Luis. Em situações quando lhe eram apresentadas hipóteses, ele simplesmente dizia que se era devido, que se pagasse, sem discussão. “Era uma atitude que gerava surpresa e, ao mesmo tempo, alegria nas pessoas, porque se estabelecia uma confiança. Hoje vejo que tenho discípulos aqui dentro, são meus diretores que sabem realmente o que é ser um diretor esta-tutário, assim como suas responsabili-dades e o quanto isso pesa nas tomadas de decisão.”

Os resultados dessa conduta trans-parente do executivo estão dissemi-nados por toda a operação local. Na mais recente pesquisa global com os funcionários da Volvo Cars, os índi-ces obtidos pela operação brasileira são excelentes. 100% dos funcionários co-nhecem os caminhos e tem confiança em reportar casos de assédio. E tam-

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bém o conhecimento da conduta e de compliance e ética, cujo índice de adesão foi de 98%. “Fiquei muito fe-liz. São indicadores que nos orgulham. As pessoas sabem o que devem fazer se verem algo saindo fora dos trilhos. É um ambiente de auto-proteção”.

mArco zeroAs referência das pessoas mudam ao longo da sua trajetória. Isso é bastan-te normal e não quer dizer que esteja errado. Afinal, os pontos de referência vão mudando ou ficam mais distan-te. Entretanto, para alguns temas, é preciso encontrar referências que não mudem nunca, que funcionem como marco zero. “Quando você está em um avião parado na pista com outro do lado, quando você olha pela janela e o avião começa a se movimentar, nunca se sabe se é o seu ou o outro que está andando, porque é uma referência”,

exemplifica Luiz. “Mas por exemplo para uma fraude ou algo assim, a sua referência tem de ser o marco zero, que te dá uma referência fixa para te fazer perceber que está se distanciando. É assim que nossos cérebros e nossas emoções funcionam. Entendendo isso, fica mais simples. Então a cultura sue-ca, com tudo o que tem por trás, me deixa muito tranquilo para manter o marco zero.”

Mas isso não faz a cultura sueca ser menos comprometida com o resulta-do. Alías, um país com apenas nove milhões de habitantes que conquistou tudo o que eles alcançaram só tendo resultados muito bons. “O segredo é que eles buscam formas de serem efi-cientes e de se reinventarem sem mu-dar suas crenças, o marco zero. Você também tem que entender que faz parte disso. A partir daí vem um en-sinamento. Se eu quero explicar Brasil

para eles, eu tenho de me esforçar para entender como eles pensam e, por fim, traduzir o que temos aqui para a forma deles pensar.”

Dois dos marcos zero na Volvo são a transparência e a segurança. A indústria automobilística vem mos-trando ter mais caixas pretas do que se imaginava. Omissão e alteração de dados ambientais ou uma série de recalls que deveriam, mas não fo-ram convocados no momento em que foram descobertos. Na Volvo não há discussão e nem abertura de portas para um debate sobre isso. “É até difícil de explicar. Não vou falar por outras marcas, pois não tenho autoridade e conhecimento para falar por nenhuma delas. Mas, pela nossa empresa, quando identificamos um problema, nós imediatamente con-vocamos um recall, porque, de novo, a segurança é a minha essência, é o meu marco zero. E o processo é um cheque em branco. Não vejo o recall como problema, vejo como solução. Problema é manter o carro rodando com defeito”, afirma Luis.

Com toda a vivência na área de controles internos, finanças e ago-ra, na liderança do negócio, Luis não tem dúvida de que a burocracia no Brasil é um dos pontos de maior dificuldade para fazer negócios. “De novo, se você tem pressão de tempo, de resultados, ela pode te levar a to-mar atitudes que podem trazer muito risco. E o problema é quando a bu-rocracia é criada para isso, aí a gente se complica”, diz ele, que apesar de tudo enxerga um movimento de mu-dança. “Aquela história do ‘faz assim [errado], porque todo mundo faz as-sim” não está mais bem. De maneira geral, vejo uma mudança muito po-sitiva de conduta no Brasil. Acho que estamos numa geração mais educada, de maior formação e de maior consci-ência. Temos de ter esperança, espero que mude. Peguei um país melhor do que o dos meus país e espero entregar também, até onde for capaz, melhor para as minhas filhas”, finaliza.

linha de produção da volvo: sempre que se descobre um problema, a Volvo imediatamente inicia um recall.

internacional • méxico

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Quando o atual pre-sidente do México, Enrique Peña Nie-to, assumiu o cargo político mais alto do país em dezembro

de 2012, parecia o prenúncio de um novo tempo. Apesar de ser membro de um clã de longa linhagem política e parte do Partido Revolucionário Insti-tucional (PRI) – o mais tradicional do país e que por sete décadas teve todos os presidentes mexicanos, até o ano 2000 – o novo mandatário trazia o fres-cor da juventude, com uma nova visão e disposição para reformar e dinamizar a economia mexicana, incluindo velhos vespeiros como os poderosos monopó-lios do país, caso do mercado de petró-leo, controlado pela estatal Pemex, e do de telefonia, dominado pela Telmex, do bilionário Carlos Slim, um dos ho-

O governo mexicano aprovou uma série de reformas econômicas importantes para dinamizar a economia do país. Mas, a corrupção entranhada no Estado e a lentidão para combatê-la de fato pode atrapalhar o avanço conquistado até aqui

mens mais ricos do mundo. A reforma do setor energético, realizada em 2013, que liberou o investimento estrangeiro, tem potencial de atrair US$ 1 bilhão por mês para a economia mexicana, segundo o banco JP Morgan. As mu-danças também atingiram outras áreas como a trabalhista e a financeira.

O jovem presidente mexicano tam-bém tinha um forte discurso de com-bate à corrupção. Um problema que é mais endêmico e perigoso no México (dado o forte desenvolvimento dos car-téis do crime organizado em algumas regiões do país) do que aqui no Brasil.

Peña Nieto caiu nas graças dos mercados internacionais de imedia-to. Ele conseguiu realmente realizar grandes mudanças na fechada estru-tura econômica do país, abriu merca-dos para novos competidores e captou mais investimentos estrangeiros. Entre

2013 e 2014, as agências de classifica-ção de risco Moody’s, Standard & Po-ors e a Fitch melhoraram a classifica-ção da dívida mexicana. “A aprovação de uma agenda ampla de reformas (...) reflete vontade política para enfrentar problemas estruturais de longo prazo”, disse a Moody’s em 2014. Num mo-mento em que boa parte das econo-mias emergentes começava a mostrar sinais de fraqueza, o México desponta-va como a bola da vez.

Historicamente mais apoiada no livre comércio – são mais de 40 países com os quais mantém acordos de livre comércio – do que no consumo inter-no dos seus 129 milhões de habitantes, a economia do México se beneficiou da recuperação econômica dos Estados Unidos, destino de 80% dos US$ 380 bilhões em bens exportados. Em para-lelo, no sul da América Latina, o Brasil,

Movimentos dúbios

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combate são questões mais preocupan-tes e tratadas de maneira menos clara e objetiva do que estamos vendo por aqui. Os movimentos das autoridades mexicanas têm sido bem mais lentos e, em certa medida, menos impetuosos do que os direcionados para as reformas econômicas. E, isso pode gerar reflexos para a economia do país.

ProbleMa crônicoA percepção de corrupção no México é pior do que no Brasil, de acordo com os dados da Transparência Internacional. Todavia, enquanto o Brasil, com 38 pontos, caiu várias posições no ranking em função de ter tido o problema ex-posto ao mundo, por conta da opera-ção Lava Jato (ironicamente é o mesmo motivo que tem feito o País avançar no combate à corrupção), o México não saiu do lugar. Tão pouco escancarou os seus problemas a ponto de não ter mais como fugir deles, como aconteceu com o poder público no Brasil.

Para o advogado norte-americano Johnatan Adams, que atua no escritório da banca Baker & McKenzie na Cidade do México, o maior desafio enfrentado no combate à corrupção na terra dos Astecas é a noção, cada vez mais ultra-passada, de que é preciso trapacear para chegar à frente. “À medida que mais e mais pessoas jovens entram em contato com as empresas de sucesso mexicanas e estrangeiras que atuam de forma ética, esse conceito está sendo desmascarado e perdendo apelo na cultura mexicana”, acredita o advogado.

Mas, o que muitos questionam é a falta de celeridade do governo para colocar em prática ações concretas de combate à corrupção. E, elas são im-portantíssimas, porque parte do sucesso esperado pelas reformas como a aber-tura do setor de petróleo para investi-dores privados, depende do combate à corrupção. “A corrupção é o maior obs-táculo à competitividade do México”, disse Juan Pardinas, diretor do Institu-to Mexicano para a Competitividade, em entrevista ao jornal The Wall Street Journal, em janeiro deste ano. Segundo

que é de certa forma o maior “rival” da economia mexicana na região, sofria com a desaceleração do apetite chinês por commodities, o principal driver do crescimento do país, ao lado do con-sumo interno, entre o final dos anos 2000 e o início desta década. Além dis-so, o viés desestatizante e pró-mercado do mexicano contrastava com a visão estatizante e intervencionista de sua então colega brasileira, Dilma Rousse-ff. Em uma capa dedicada a ele, a re-vista Time disse que Peña Nieto estava “salvando” o país. Em 2014 e 2015, o PIB mexicano avançou 2,3% e 2,5%, respectivamente.

Mas nem tudo são flores para os mexicanos.

Nós brasileiros estamos descobrin-do, de fato, a extensão dos desvios e dos danos que a corrupção gera para o país. Mas, no México, a corrupção e o seu

a entidade, a corrupção custa à econo-mia do México – entre desvios e inefi-ciências – US$ 48 bilhões ao ano, cerca de oito vezes o orçamento anual para programas de desenvolvimento social.

O governo e seus aliados no con-gresso também têm sido criticados por uma suposta falta de vontade em avan-çar com as reformas que permitiram o combate à corrupção. Em outros países da América Latina, por bem ou por mal, a corrupção está no topo das priorida-des nacionais. O Brasil é sem dúvida o maior exemplo da região com os desdo-bramentos da operação Lava Jato, mas outras nações como Colômbia e Chile têm avançado com a implementação de instrumentos adequados para combatê--la no setor público e responsabilizar as empresas que a tenham praticado.

“Essas mudanças exigem lideran-ça, não só discursos. Peña Nieto está pondo em risco seu legado. Ele precisa decidir se quer ser lembrado como um presidente que combateu a corrupção ou não”, disse o pesquisador Marco Fernández, do Instituto de Tecnologia e Ensino Superior de Monterrey, tam-bém ao The Wall Street Journal.

criando as basesEm abril do ano passado, mudanças constitucionais aprovadas no congres-so nacional abriram caminho para a criação do Sistema Nacional Anticor-rupção (SNA), um conjunto de leis e iniciativas que formam um arcabouço legal e de execução que compreende uma força-tarefa, tribunais especiali-zados para julgar as empresas na esfera administrativa e um promotor inde-pendente.

O projeto passou mais de um ano parado, até que em 18 de julho deste ano, o presidente sancionou a lei ins-tituindo de fato o Sistema Nacional Anticorrupção. A partir de agora, será possível punir as empresas em casos de corrupção, um avanço notável no ambiente regulatório local. De acordo com Banks, a responsabilidade crimi-nal para pessoas jurídicas foi estabele-cida no final de 2014 para a Cidade do

o presidente peña neto: avanços na economia, lentidão no combate à corrupção.

internacional • méxico

| LEC - LEGAL, ETHICS, COMPLIANCE • ED 1538

México, e em junho deste ano, entrou em vigor a nível federal. A legislação atual permite a aplicação de multas de até US$ 6 milhões para empresas envolvidas em corrupção, além de for-necer incentivo para a implementação de programas de compliance e de auto--relato nos casos em que a corrupção interna é identificada.

Apesar disso, ainda não existe clare-za sobre como as multas e sanções que serão aplicadas às empresas. “O México ainda precisa definir quais tipos de mul-tas e penalidades que seriam aplicadas”, disse Matterson Ellis, especialista em compliance na América Latina do escri-tório Miller & Chavallier, nos Estados Unidos. Ele ainda espera por avanços no conjunto de propostas que formam o SNA. “Se implementadas essas pro-postas fortalecerão a infraestrutura re-gulatória local”, diz ele, ressaltando que se trata de algo diferente, sem o mesmo grau de avanço visto no Brasil. Mas, a verdade é que os mexicanos não estão olhando muito para o nosso exemplo. Em uma pesquisa conduzida pelo escri-tório Miller & Chavallier sobre corrup-ção na América Latina, apenas 15% dos entrevistados no México ouviram falar da operação Lava jato.

Para o Fernando Cevallos, diretor de Compliance, Forense & Inteligência da consultoria Control Risks, o gover-no tem dificuldade para executar uma estratégia de combate à corrupção basi-camente por não ter ideia do que quer. “O México vai fazer a coisa certa, mas vai demorar muito, porque a situação politica não é favorável para direcionar aonde o pais quer chegar no combate a corrupção. Existe um custo político para levar esse projeto em frente que al-guém tem que assumir”, diz o executi-vo, que lembra que em dado momento, chegou-se a cogitar que o Sistema Na-cional Anticorrupção – uma plataforma complexa, que lida com mais de 20 leis em diferentes esferas – cobrisse todas as empresas do país, menos a Pemex e ou-tras estatais. “De nada serviria fazer isso e isso partiu do partido do governo”.

Por outro lado, Banks acredita que

muito foi feito pelo governo até aqui e em vários aspectos. “Mesmo antes de concluir com as reformas prioritárias do setor energético, o presidente Peña Nieto iniciou o fortalecimento do regi-me de transparência do México”, diz. Em 2014, uma emenda constitucional ampliou a cobertura do Instituto Na-cional de Acesso à Informação, de cerca de 230 entidades governamentais para mais de 500. No decorrer dos últimos dois anos, a legislação passou a abranger também estatais e órgãos federais como a Pemex e a Comissão Federal Elétrica.

Na medida em que o nível de trans-parência do governo aumenta, Banks acredita que empresas locais e estran-geiras que tinham medo de vender para o governo, estão se sentindo menos inibidas. E, num país com um grande aparato estatal que tem o poder público como maior comprador, como é o caso do México, não vender para o governo significa ficar de fora de uma parcela extremamente relevante dos negócios no país.

Transparência será algo importante para o governo demonstrar à sociedade como vai funcionar o Sistema Nacional Anticorrupção e qual a responsabili-dade de cada parte envolvida. “É pre-ciso explicar muito bem, com clareza e transparência como vai funcionar e como será a implementação disso, os impactos do novo sistema nos setores públicos e privados, explicar melhor o tema do combate à corrupção, quais as instâncias, órgãos reguladores e funções de cada um”, pontua Cevallos, que en-tende que as regras ainda estão numa zona um pouco cinzenta. “Esperamos que isso fique mais claro no nível fe-deral e, depois, no nível estadual e aí a máquina começará a andar”, emenda.

De acordo com Cevallos, o mercado acredita que o SNA comece a funcionar de fato após o final do mandato de Peña Nieto em 2018, quando o novo gover-no poderá ter a oportunidade de dizer o que fará e como direcionará a questão do combate à corrupção, já tendo uma boa base de partida.

cidade de juarez, na fronteira com os eua: a violência em certas regiões do país implica em uma análise de riscos mais específica, inclusive no que diz respeito à lavagem de dinheiro e suborno.

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de olho no futuroAinda que leve algum tempo, a nova realidade que se desenha para o México tem chamado a atenção das empresas, especialmente as multinacionais, que tem investido em mais pessoas e ferra-mentas de compliance. Banks enxerga isso como uma forte tendência e diz que as operações das multinacionais no México estão lidando com um nível de integração com a matriz e outras opera-ções internacionais que há 10 anos seria considerado algo extremo. “Operações mexicanas de empresas multinacionais comandadas por uma única pessoa que concentra o report com a matriz estão se convertendo em raridades. Agora, um grande número de profissionais em diferentes funções tem pelo menos uma linha pontilhada de report para o exte-rior. Isso abriu espaço para as áreas da empresa ao escrutínio externo e para a necessidade de um maior investimento em pessoas, ferramentas de prevenção e políticas”, explica o advogado do Baker & McKenzie.

As empresas mexicanas também têm começado a dar mais atenção aos

temas relacionados ao combate à cor-rupção e ao compliance. Na medida em que passam a se relacionar mais com companhias estrangeiras, Banks acre-dita que elas estão pesquisando e ado-tando as melhores práticas disponíveis. Outras estão sendo obrigadas a adotar tais políticas para continuar trabalhan-do como fornecedor ou cliente de em-presas estrangeiras.

não trava, Mas atraPalhaA corrupção ou até mesmo o crítico problema da segurança no México são uma realidade e uma preocupa-ção para investidores. Mas, nenhum desses pontos vai fazer com que o investimento estrangeiro deixe de ir para o México, porque o país oferece boas oportunidades de investimento e existe apetite para o risco. Mas, como deixa claro Cevallos, é preciso antes de começar, entender muito bem quais são esses riscos, que variam de acor-do com o segmento e mercado que a empresa vai atuar e, também, com a região onde a operação será instalada. A questão do crime organizado, em especial nas regiões mais próximas das fronteiras com os Estados Unidos, afe-ta as empresas que sofrem com o im-

pacto negativo das atividades ilícitas na região. “É diferente do Brasil, onde também tem crime organizado, assim como em todos os outros lugares. No México, você tem que entender (esse contexto de risco) antes de operar e adotar uma estratégia adequada, que pode envolver identificar as pessoas--chave no mercado em que vai atuar, tanto do setor privado como do setor público”, diz Cevallos, que explica que as empresas que vão investir no Méxi-co, seja de onde forem, precisam en-tender que a rentabilidade do projeto não deve ser pensada só pela operação e pelo mercado. “Onde você for, vai ser preciso definir qual o caminho a se-guir, porque talvez vão lhe pedir pro-pina no meio do caminho”, lamenta Fernando Cevallos.

“Acho que vai chegar um ponto em que os governantes de agora e os futu-ros vão entender que o setor privado está cansado de ter que pagar sempre algum tipo de propina para fazer ne-gócios no México. Mas, acredito que a consciência vai surgir. Somos um país muito rico e atraente para investidores, mas o governo tem que acordar para o fato de que os impactos da corrupção são muito ruins”, conclui Cevallos.

fernando cevallos, da controls risks: governo mexicano não tem ideia do que quer, por isso não consegue executar uma política anticorrupção.

johnatan banks, do baker & mckenzie: novas gerações começam a abandonar a velha cultura de que só cresce quem consegue alguma vantagem.

LEC NEWS • PLD

| LEC - LEGAL, ETHICS, COMPLIANCE • ED 1540

O ranking da lavagem

O Comitê de Basileia de Supervisão Bancária, organização internacional que estabelece os padrões bancá-rios globais, divulgou a nova edição do Basel AML Index (ou Índice de Prevenção à Lavagem de Dinheiro da Basiléia, em tradução livre). É a quinta edição do estudo que estabe-lece o ranking anual do risco dos pa-íses em relação à lavagem de dinhei-ro e ao financiamento do terrorismo. O índice cobre 149 países e faz a classificações de risco com base na qualidade da estrutura de prevenção à lavagem de dinheiro e aos esforços dos países contra o financiamento do terrorismo e fatores relacionados, como os níveis percebidos de cor-rupção, padrões do setor financeiro e transparência pública.

Os resultados do Índice PLD da Basileia são estabelecidos a par-tir de 14 indicadores que utilizam informações de fontes públicas dis-poníveis como o GAFI, Transparên-cia Internacional, Banco Mundial e

Fórum Econômico Mundial e fazem avaliações qualitativas.

O comitê diz que a pontuação representa uma avaliação holística abordando elementos estruturais e funcionais no âmbito da prevenção à lavagem de dinheiro. Como não trabalha com dados quantitativos, o índice é desenvolvido para indicar o nível de risco, isto é, as vulnera-bilidades de lavagem de dinheiro e financiamento do terrorismo dentro de um país.

Na edição deste ano, o núme-ro de 79 países que melhoraram a sua classificação foi superior a lista do ano passado. Por outro lado, 50 nações pioraram a sua classifica-ção. Além disso, a eficácia na luta contra a lavagem continua fraca. O relatório destaca que embora a maioria dos países tenha regras e legislações em conformidade com as normas globais de PLD, a implementação eficaz delas fica aquém do necessário.

A Finlândia é o país com o me-nor risco de lavagem de dinheiro, seguida por Lituânia e Estônia. Já a região da África Subsaariana tem a pontuação mais alta (com maior ris-co) em todo o mundo.

Na América Latina, Paraguai, Haiti, Bolívia, Panamá, Argenti-na, República Dominicana e Ve-nezuela são considerados os países de maior risco. Por outro lado, Equador, Costa Rica, Honduras e Paraguai foram os países que mais avançaram no ranking da região. O Brasil ocupa a 56º posição no ranking entre os países com maior risco de lavagem de dinheiro e com uma posição intermediária no ranking da região.

Os países-membros da OCDE, incluindo os grandes centros finan-ceiros como Luxemburgo, Japão, Suíça, Itália, Alemanha, Estados Unidos, França e Reino Unido não apresentaram muito progresso em suas classificações.

cidade do panamá: país é um dos que oferece maiores riscos de lavagem

na América Latina.

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Uma das mais críticas preocupações dos reguladores e das unidades nacionais de inteligência financeira que lidam diretamente com a prevenção à lavagem de di-nheiro é como lidar com as moedas virtuais, das quais os Bitcoins são as mais conhecidas..

No início de julho, a Comissão Europeia publi-cou o texto base para uma nova diretiva que propõe incluir os serviços de troca e guarda de moedas virtu-ais sob o guarda-chuva das regras de prevenção à lava-gem de dinheiro (PLD). Com isso, vários operadores de Bitcoins baseados no velho continente precisarão se adequar para atender à essas regras, incluindo aí a necessidade de realizar procedimentos de conheça o seu cliente (“Know Your Client”). O maior objetivo é restringir a utilização anônima de moedas como os Bitcoins, um negócio de natureza opaca, tecnologica-mente complexo e ainda sem qualquer regulamentação. “Estas entidades terão de aplicar controles de vigilância da clientela ao realizar a troca de moedas virtuais para moedas reais, encerrando o anonimato associado à essas trocas", diz o texto. A proposta vem num momento em que a Europa sofre com o aumento de ataques terroris-tas perpetrados por lobos solitários e as moedas virtuais representam uma fonte relativamente segura para mo-vimentar os baixos valores necessários para os planeja-mentos desses ataques.

Caso a diretiva seja aprovada, as empresas que ope-ram nesse mercado serão obrigadas a recolher docu-mentos de identidade dos seus clientes, algo que alguns operadores já fazem – até por exigência de parceiros financeiros, como instituições financeiras tradicionais – embora não seja algo obrigatório atualmente. As em-presas também terão de monitorar as transações sus-peitas realizadas em sua plataforma e comunicá-las às autoridades de inteligência financeira.

Segundo a Comissão Europeia, o objetivo não é pre-judicar a adoção das moedas virtuais e nem o avanço tecnológico que elas representam. A entidade ressalta

A carteira digital vai fechar

que a credibilidade das moedas virtuais tende a cair se ela for usada para fins criminosos e que o anonimato, nesse contexto, mais prejudica do que as ajuda a se disseminarem.

A proposta precisa ser aprovada pelo Parlamento Euro-peu e os Estados membros, o que pode acontecer ainda nes-te ano. Uma vez aprovada, os membros da União Europeia terão condições de implementar legislações locais com base da diretiva.

O novo texto não trata da fiscalização dos usuários indi-viduais de moedas virtuais, mas reconhece que isso precisa-rá ser resolvido em algum momento a curto prazo também. A Comissão Europeia reconhece que regular os prestadores de serviços do negócio de moedas digitais pode não ser su-ficiente para impedir o uso delas para fins criminosos, uma vez que os usuários podem negociá-las usando o seu próprio computador ou smartphone, sem a necessidade de qualquer intermediador.

bitcoins: os reguladores começam

a estabelecer os controles para as moedas virtuais;

mercado • auditorias

| LEC - LEGAL, ETHICS, COMPLIANCE • ED 1542

Londres, meados do Século 19, a Revolução Industrial estava a todo vapor na Grã--Bretanha. Sua capital era o centro financeiro do mun-do e via o alvorecer de um

sem número de novas empresas. Isso, somado ao avanço da produção de larga escala e a evolução da logística, que per-mitia que os produtos fabricados chegas-sem a lugares cada vez mais longínquos, alterou a expectativa que se tinha sobre o trabalho do auditor. Seria preciso contar com profissionais capazes de lidar com um mundo cada vez mais complexo, que passava a ver transações globais realiza-das em alta velocidade, além da neces-sidade de calcular informações como a depreciação dos ativos e avaliar os esto-ques. Ainda, novas legislações começa-vam a surgir, estabelecendo novas regras e procedimentos para serem adotados pelas companhias.

Com esse movimento, havia pro-cura por empresas de contabilidade in-dependentes que pudessem atestar para acionistas tais como o governo e outros interessados, a confiabilidade dos nú-meros divulgados ao mercado por uma determinada empresa por meio de sua avaliação técnica e isenta. Rapidamente a auditoria independente foi incorpo-rada como um pilar central do sistema financeiro e do mundo dos negócios.

Bem mais de um século depois, a es-sência do trabalho das auditorias segue a mesma: emprestar a credibilidade das

O universo de trabalho das auditorias evoluiu muito nos últimos anos. E, nos próximos deverá mudar ainda mais

informações prestadas nas demonstra-ções financeiras da companhia aos acio-nistas, reguladores e a quem mais possa interessar.

Mas, o ambiente de negócios global se tornou muito mais complexo com o passar das décadas. E, assim segue. As empresas e os seus modelos de gestão evoluíram, assim como os fraudadores e os reguladores, que vieram criando no-vas leis e processos para tentarem se ade-quar (ou reagir) às novas realidades que se impunham. Para navegar nesse ocea-no cheio de riscos, as auditorias também tiveram de avançar. Mas, assim como a essência do trabalho que não mudou, o pilar central de sustentação das empre-sas de auditoria – que hoje atua com um amplo leque de serviços empresariais, de consultoria a terceirização de processos – segue o mesmo de décadas atrás: a capa-cidade que o seu nome tem de empres-tar credibilidade e respeitabilidade para avalizar as informações e os resultados financeiros dos seus clientes empresa-riais. Por isso, quando acontece algo de errado com os números de uma empresa auditada, o estrago costuma ser grande.

Os mais recentes ciclos de crises norte-americanos, primeiro no início do milênio com os casos de fraudes corpo-rativas gigantescas como a da Enron, e depois em 2008 com os bancos de in-vestimento, impactaram fortemente a economia global. Nos dois casos, uma pressão muito forte culminou com mu-danças relevantes nas regras de gover-

nança, contabilidade e uma maior pres-são sobre os auditores independentes. “Como eles são contratados para emitir um parecer do relatório de que as infor-mações prestadas são razoáveis, sempre que o problema passa pelo auditor e ele não vê isso, logicamente ele é cobrado”, diz Idésio Coelho, presidente do Ibra-con, o instituto que congrega os audito-res independentes do país.

A pArte que me cAbeO senso comum entre a grande maioria das pessoas é a de que o papel da audi-toria é validar os números de uma em-presa, garantindo que eles são reais. E, todo mundo acha que a auditoria é a responsável por identificar fraudes e des-vios que acometam o caixa da empresa.

Sob pressão

pregão da bolsa de nova york: sem

o aval das auditorias independentes não se negocia ações por ali.

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padrões de contabilidade. Essa demons-tração financeira é de responsabilidade da administração da empresa e prepa-rada seguindo normas internacionais de contabilidade. As empresas têm a obri-gação de preparar suas demonstrações financeiras anualmente para fins fiscais, societários e regulatórios.

Todavia, em muitos casos, é exigido que essas demonstrações sejam auditadas por uma empresa independente por con-ta de questões societárias, ou por uma obrigação regulatória – caso das empre-sas de capital aberto, mas também das companhias com faturamento superior a R$ 300 milhões. “O auditor garante as-seguração razoável dando a informação de que a demonstração está preparada de forma adequada e aumenta a credibili-dade com um relatório independente, apontando que aquelas demonstrações contábeis estão alinhadas com o padrão contábil adotado no Brasil. O objetivo é somente esse”, explica Idésio, ao reforçar que dentro da responsabilidade do audi-tor de emitir o seu relatório, não consta a obrigação de identificar fraudes.

Só que a maioria das pessoas não sabe disso. E, muitas outras não concor-dam. “Acho que é o trabalho da audito-ria, sim. É claro que existem fraudes tão bem engendradas que fica difícil. Mas, eles têm de dizer que foram enganados e colocar isso no relatório”, afirma a professora de Direito Comercial da Fa-culdade Nacional de Direito da UFRJ, Kone Cesário.

Na verdade, esse é mais um dos im-portantes tópicos de governança corpo-rativa que ganharam destaque por conta da operação Lava Jato. Primeiro a PwC, uma das grandes firmas de auditoria do mundo, sinalizou que não iria assinar o balanço anual da enrolada Petrobras até que ela afastasse do comando da sua subsidiária Transpetro, o hoje notório Sérgio Machado. Depois, ela passou a exigir que a petroleira determinasse uma baixa fiscal no seu balanço por conta dos desvios e perdas frutos da corrupção e da reavaliação de seus ativos, dos quais muitos foram alvos de corrupção. Ter o balanço assinado por um auditor inde-

É uma percepção bastante razoável, para dizer o mínimo. Agora, transponha isso para o Brasil com eventos de fraude e corrupção em grandes empresas estatais de uma magnitude sem igual e farta-mente documentada de hoje. A chiadei-ra sobre os auditores foi geral.

Contudo, a crua realidade é a de que o auditor independente prepara o seu trabalho com um propósito específico. E, não faz parte necessariamente desse propósito principal da auditoria contábil e financeira, encontrar fraudes.

Vale esclarecer o fato de que muito embora seja um documento feito anual-mente, o balanço patrimonial é o resul-tado de transações feitas no dia a dia e registradas nos livros contábeis, que tam-bém seguem a mesma metodologia dos

pendente é uma necessidade crítica, com impactos de diferentes naturezas para a empresa, da queda do valor das ações, multas dos reguladores e até a possibili-dade de execuções de dívidas futuras.

Mais recentemente, outra estatal, a Eletrobrás, sofreu com a falta de en-trega do formulário 20 – F, documen-to exigido pelo regulador do mercado de capitais dos Estados Unidos e que contempla informações financeiras das empresas estrangeiras com papéis nego-ciados nas bolsas americanas. A KPMG, auditoria da estatal do setor elétrico se recusou a assinar o documento e acabou não fazendo a sua entrega dentro do pe-ríodo legal exigido. Como resultado, a negociação de suas ações foi suspensa na Bolsa de Nova York. Nos dois casos, o que gerou muitos questionamentos foi o fato de que as firmas de auditoria que se recusaram a assinar o balanço quando os casos vieram a público, os validaram por muitos anos antes disso. Indepen-dentemente do mérito da questão, é fato que a não aprovação do balanço gera grandes prejuízos para as empresas e, consequentemente, para seus acionistas. Nessa história, os acionistas minoritá-rios, pequenos investidores individuais, são os que mais sofrem. Desta forma, a professora de Direito Comercial acredita que as firmas de auditoria têm, sim, do ponto de vista da responsabilidade ci-vil e administrativa, que responder por omissão pelo prejuízo que a não assina-tura desse balanço gera para o acionista minoritário. “Hoje, meu entendimento é de que é uma posição muito cômoda [para as auditorias]. Depois que o caso sai na mídia e vai parar na mão do ju-diciário, elas simplesmente se recusam a assinar o balanço?”, questiona a profes-sora, dizendo que o auditor tem meca-nismos para apontar os tópicos que ele não conseguiu identificar ou o que acon-teceu de errado nos últimos cinco anos e que, por conta disso, ele assina aquele balanço com ressalvas. “Poderiam ter as-sinado os relatórios mesmo antes de ter um valor atribuído para a corrupção, já que as empresas demoram a chegar nesse número”, emenda.

mercado • auditorias

| LEC - LEGAL, ETHICS, COMPLIANCE • ED 1544

A demora é real e decorre tanto da complexidade quanto da extensão da investigação, que é feita em fases. En-tretanto, do ponto de vista do auditor independente, o maior problema não é necessariamente determinar uma baixa específica atribuída à corrupção, mas entender a amplitude da fraude, que, de-pendendo do caso, pode resultar na falta de necessidade de ajustes contábeis.

Quando se depara com um caso de fraude, o auditor vai ao conselho da em-presa para tratar do tema e a empresa tem a obrigação de contratar profissio-nais experientes, com isenção total, para fazer uma investigação independente e completa. Ao identificar pessoas envolvi-das, terá de avaliar o impacto que aquela pessoa pode ter causado nos processos já conduzidos pelo auditor. “Vamos ima-ginar que uma pessoa de compras estava envolvida em determinado ato ilegal, toda a documentação e as informações que aquela pessoa lhe forneceu durante a auditoria passa a ser questionável. En-tão, ele vai ter de revisar todos os proce-dimentos daquele funcionário, para ve-rificar se não existe fraude ali também”, justifica Idésio. Nesse processo, o audi-tor vai interagindo com a companhia para avaliar qual o escopo da investiga-ção forense, para que ele consiga chegar a uma conclusão se os ajustes apropria-dos foram feitos, se as pessoas envolvi-das nas fraudes não fazem mais parte do processo de auditoria e após isso, chegar à conclusão de que o impacto da frau-de está reconhecido na demonstração financeira. “Enquanto o auditor não es-tiver satisfeito de que a investigação está sendo realizada de forma abrangente por profissionais experientes e com escopo bem definido [ainda que ela não tenha chegado ao fim], ele não assina o seu re-latório”, reforça o presidente do Ibracon.

Não Acredite em NiNguémÉ claro que o auditor trabalha no calor dos acontecimentos, sem o benefício de analisar o fato sob a perspectiva de um passado um pouco mais longínquo, ana-lisando a documentação e as informa-ções na medida em que elas estão acon-

tecendo. Mas, sempre que um evento de relevância envolvendo atos de corrupção acontece, a sociedade e os analistas cos-tumam acreditar que era papel do audi-tor ter identificado esse evento de fraude ou ato ilegal.

Apesar disso, em empresas de au-ditoria, o trabalho de identificação e investigação de fraudes está a cargo de outra área, a de auditoria forense, que atua de maneira mais reativa em cima de um evento conhecido, uma suspeita de fraude em um departamento ou em uma concessão.

Isso não quer dizer que os auditores contábeis não estejam mais atentos à esse problema. As próprias normas de audito-ria preconizam que o profissional tem de ter sempre em mente a existência de um risco potencial de fraude. Temas relacio-

nados ao reconhecimento de receitas são sempre pro-pensos à manipulação de resultados por profissionais ansiosos para atingir suas metas. Por isso, quando desenvolve os procedimen-tos para validar essa linha da demonstração financei-ra, o auditor precisa usar de sua expertise profissio-nal e trabalhar com espíri-to questionador constante. “Ele não pode confiar ape-nas nas informações que são passadas, ele precisa pe-dir informações adicionais, fazer confirmações com terceiros que fizeram tran-sações com a companhia, deve trabalhar apenas com documentos originais, re-cusando cópias e, conver-sar sempre com mais de uma pessoa para analisar a consistência das informa-

ções coletadas”, conta Idésio Coelho. Esse conjunto de procedimentos forma uma base de evidências de auditoria, que são documentadas e dão um conforto ao auditor de que aquelas contas estão razo-avelmente apresentáveis.

O grande problema do auditor é que, em muitos casos de corrupção, exis-te uma situação de conluio que se torna especialmente difícil quando envolve a alta administração, e tem poder para manipular as provas e revesti-las com toda a formalidade. “A corrupção está por de trás dos documentos, feito em acordos fechados, combinados na calada da noite mesmo. Os contadores de gran-des companhias lançaram transações nos livros, assumindo que aquilo estava cor-reto. É muito difícil mesmo, pois tudo é construído para enganar o auditor e os

idésio coelho, do ibracon: modelo de auditoria deve mudar substancialmente nos próximos cinco anos.

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reguladores, que também acompanham e são enganados. Até os analistas do mer-cado financeiro, que sempre olharam para esses números, não viram nada de errado”, afirma Idésio.

mAiS trANSpArêNciA“O trabalho da auditoria de demonstra-ções financeiras deveria trazer dentro do seu escopo, elementos da área forense. Isso não deveria ser um serviço à par-te, mas, sim, integrado”, reforça Kone. E, muitas vezes alguém com um pouco mais de conhecimento de causa do ne-gócio, consegue identificar a existência de algo errado numa simples conferên-cia. “Uma funcionária de marketing, ao revisar documentos, descobriu que a empresa dela fraudava uma lei estadual de fomento à cultura. E, ela descobriu isso conferindo as tabelas para fazer o fechamento do evento. Quando ela questionou o chefe, ele admitiu, depois de gaguejar um pouco, que aquilo era normal. Como a auditoria não percebeu que isso é também um crime fiscal?”, questiona a professora, lembrando que as auditorias têm uma responsabilidade perante o mercado, principalmente nas companhias de capital aberto. Portanto, a presença dela é obrigatória para se ter transparência e isenção.

Apesar de não alterar a responsabili-dade do auditor sobre a averiguação de fraudes, que continua não sendo o seu papel principal, a tendência global pode ser interpretada como algo que vá mais nessa linha nos próximos anos.

Reguladores de todo o mundo têm feito mais pressão sobre os auditores, para que eles aumentem o que é chama-do no setor de “ceticismo profissional”, ou seja, a sua capacidade de questionar os diferentes processos da empresa, e de empresa para empresa. Ainda, também é exigido que esse ceticismo seja cada vez mais compartilhado, de forma mais transparente com acionistas, reguladores e outros stakeholders.

Já valendo para os relatórios de au-ditoria relativos ao exercício de 2016, os principais assuntos como o apontamen-to de áreas críticas de julgamento, riscos

de fraudes e a subjetividade da avaliação de determinados instrumentos, passam a ser comentados numa seção específica do relatório. São normas internacionais e que vão permitir entender melhor o trabalho do auditor.

E, essa não é a única mudança. O IESBA, órgão que estabelece normas sobre padrões éticos e de independên-cia dos profissionais de contabilidade, vinculado à Federação Internacional de Contadores, emitiu em julho, novas diretrizes sobre como o auditor deve comunicar atos ilegais e quebras de re-gulamentos de conformidade às autori-dades públicas locais competentes, sem infringir o seu dever de confidenciali-dade. “O novo padrão reforça a função de interesse público que os auditores profissionais desempenham para tornar as organizações mais confiáveis e respon-sáveis, e para ajudar a proteger as partes interessadas e o público em geral de da-nos substanciais resultados de violações de leis e regulamentos”, disse o presiden-te IESBA, Stavros Thomadakis. As novas disposições vêm justamente na linha de atender à uma demanda por maior aten-ção e vigilância dos auditores em situa-ção de crimes como fraudes, lavagem de dinheiro e corrupção, uma constante no mundo dos negócios embalada pela cria-tividade humana. “O padrão preenche uma lacuna em jurisdições onde a legis-lação ou a regulamentação não aborda as responsabilidades dos profissionais de contabilidade nestas situações”, disse o diretor Técnico do IESBA, Ken Siong.

A diretriz é fruto de um trabalho de seis anos e a expectativa é a de que o novo padrão seja adotado pelos órgãos reguladores locais e empresas de audito-ria mundo afora.

NovA reAlidAdeUm dos fatores de consideração para de-terminar o escopo de trabalho da audi-toria é o ambiente em que determinada companhia opera. Como a percepção de corrupção no Brasil hoje é maior, muito embora os atos ilegais tenham sido pra-ticados no passado, é preciso reconhecer que atos de desvios não são exceção, isto

é, é preciso que os auditores questionem mais e mais seus clientes. Além disso, a independência precisa ser reforçada e os auditores precisam ter a coragem de es-crever com todas as letras e de maneira clara sempre que encontram algo errado. Kone Cesário se lembra de um balanço da antiga OGX, a petroleira de Eike Ba-tista, na qual a auditoria até fazia ressal-vas e levantava questões, mas de um jeito que dava a entender que os auditores tinham medo de dizer o que queriam dizer. “Só que esse é o trabalho deles”, pontua.

Nesse novo contexto, ainda que não tenham responsabilidade direta sobre a identificação de fraudes, como reforça Idésio, do Ibracon, as auditorias con-tábeis têm incorporado às suas equipes profissionais com mais recursos para conseguir identificar fraudes e supor-tar o seu trabalho. Das fraudes organi-zacionais, 50% delas são identificadas por meio de delação, a auditoria interna identifica 8% das fraudes, já as audito-rias financeiras externas encontram ape-nas 3% dentro dos seus procedimentos regulares.

É possível que no futuro, o modelo de trabalho das auditorias seja comple-tamente diferente. Hoje, elas trabalham com base numa amostragem de docu-mentos. Uma das maiores apostas para o futuro é a utilização mais frequente do conceito de Big Data. Algumas au-ditorias já têm usado essa possibilidade para fazer análises mais aprofundadas na demonstração financeira dos clientes. As empresas vêm investindo pesadamen-te no desenvolvimento de ferramentas nessa área. O objetivo é que os audito-res possam acessar todo o ambiente de tecnologia do cliente e importar para um ambiente externo e seguro esse gran-de volume de informações, causando a menor ruptura possível no trabalho do cliente. “Ainda vai levar um tempo para acontecer, acredito que uns cinco anos entre normas e ferramentas, mas ele vai permitir um melhor uso dos dados no ambiente digital. E é uma demanda dos reguladores”, conclui Idésio Coelho, do Ibracon.

mercado • legislação

| LEC - LEGAL, ETHICS, COMPLIANCE • ED 1546

Uma nova diretiva da União Europeia vai mexer substancialmente no modo como as empresas de auditoria prestam serviços às companhias do velho continente

O norte-americano Arthur Andersen sempre foi tido como um defensor zeloso da adoção de padrões ele-vados para a indústria de

contabilidade. Para ele, a responsabilidade dos contadores e auditores era com os in-vestidores e não para com os clientes que os contratavam. Por anos, seu lema da foi “pense honestamente, fale honestamente”.

Mas, décadas se passaram e o lema e a rigidez de Arthur Andersen, que coman-dou a empresa com o seu nome da sua fundação, em 1913, até a sua morte, em 1947, acabaram sendo flexibilizados. Isso na mesma medida em que o mundo dos negócios e das finanças foi ficando mais e mais complexo com o passar dos anos. E, o papel das auditorias, de dar confiança aos investidores de que eles estavam inves-tindo com base em informações verdadei-ras, passou a ser mais questionado do que nunca quando, em 2001, explodiram os primeiros grandes casos de fraude contábil nos Estados Unidos, culminando com a implosão de grandes empresas e, conse-quentemente, das economias de milhares de pequenos investidores individuais que acreditaram no que lhes era dito. Além da Enron e da Worldcomm, até então duas das maiores e mais respeitadas empresas norte-americanas, um terceiro nome, ex-tremamente respeitado no mercado, su-cumbiu: justamente a Arthur Andersen.

Desde então, a vida das auditorias nunca mais foi a mesma. Em 2002, a aprovação da legislação Sarbanes-Oxley, virou de cabeça para baixo a vida das audi-torias, instituindo uma série de controles, exigindo mais transparência e impondo restrições para a prestação de serviços de não-auditoria, a fim de evitar conflitos de interesse entre as firmas de auditoria e os seus clientes.

Na Europa, onde muitos países tive-ram grandes casos de fraudes contábeis, vários países já contavam com leis versan-do sobre a atuação das auditorias. Mas, em junho deste ano, uma nova diretiva da União Europeia (UE) entrou em vigor, ampliando e muito as exigências, restrições e o controle na atuação das firmas de audi-toria da região. Apesar disso, a diretiva não é uma legislação, mas sim uma referência, para que os 27 países-membros da União Europeia (pós-Brexit) e outros países que seguem as regras do bloco aprovem as suas legislações locais sobre o tema, que podem ser inclusive mais rígidas do que a própria diretiva.

Além de estabelecer regras mais rígidas e claras sobre o que pode e o que não pode ser feito por uma firma responsável por auditar uma companhia europeia de inte-resse público – no qual se enquadram as companhias de capital aberto e outras que pelo seu porte, ou área de atuação, são con-sideradas como tal –, não será mais possí-

vel para a mesma firma auditar o balanço e prestar serviços fiscais para a mesma com-panhia, por exemplo.

Para entender melhor os impactos des-sa nova diretiva para as auditorias e para os seus clientes no Mundo e no Brasil, a LEC conversou com o diretor executivo da EY, Bruno Leão.

Como a nova diretiva e as respectivas le-gislações dos países-membros da União Europeia vão impactar firmas de audi-toria e empresas europeias?Desde que a diretiva foi aprovada no Par-lamento Europeu, em junho de 2014, os países membros da UE tiveram dois anos para estabelecer suas respectivas legislações sobre o tema. Obviamente cada país tem uma discricionariedade enorme em aplicar restrições ou medidas com relação ao que dispõe a diretiva. É esse o ponto que ainda gera um pouco de confusão, já que temos de lidar com um emaranhado de novas normas, que apesar de partirem de uma mesma base, não são iguais. A Espanha aprovou uma legislação com normas de rodízio mais restritivas do que as estabele-cidas na diretiva, por exemplo.

E, as empresas já estão sendo auditadas dentro dessas novas regras?Por uma questão de logística, isso só vai entrar em vigor efetivamente a partir do próximo exercício, em 2017. É o prazo que foi dado para que todos possam se fa-miliarizar com as peculiaridades da legisla-ção adotada em cada país. Se você conside-rar que nós temos mais de 30 países, é um tempo necessário para as empresas de au-ditoria tenham um aprendizado sobre cada uma delas. Também temos de fazer uma análise para identificar os impactos das no-vas regras na nossa carteira de clientes. Se eu tenho uma subsidiária brasileira de uma empresa de capital aberto na Polônia, eu vou ter de aplicar aqui também a regra da Polônia. Mas, o mais importante é que esse é o período que teremos para estabelecer novos controles internos que adequem a operação a essas novas exigências. Esse am-biente regulatório altamente complexo de-manda das firmas controles internos bem mais robustos.

Exigência de transparência

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É uma questão de proibição e permissão. Quando falamos do IESBA – órgão da federação internacional de contadores que estabelece os padrões éticos para a atuação dos profissionais da área –, que é o modelo adotado pelo Conselho Federal de Con-tabilidade para o Brasil, utiliza algo que chamamos de conceptual framework, ou seja, nós podemos analisar individualmen-te os serviços de não-auditoria e avaliar os impactos que aquele serviço poderá causar na independência do auditor. Realizamos uma análise de ameaça do risco da perda de independência e, a partir daí, quando é possível, estabelecemos salvaguardas para trazer tais riscos para um nível aceitável. A UE adotou um modelo mais parecido com o da SEC e, em muitos aspectos, ela foi ainda mais restritiva do que a SEC. É claro que há situações em que o risco é tão grande que ele não pode ser reduzido ao risco aceitável mesmo com salvaguardas. Mas, na maioria das vezes isso pode aconte-cer, o que é bom para as empresas, porque mantemos a independência do auditor e o trabalho. Dos profissionais europeus com quem conversei dois terços acreditam que as restrições são excessivas e que os servi-ços poderiam continuar a serem prestados com as devidas aplicações das salvaguardas.

Vocês podem ter clientes globais de auditoria e a operação brasileira des-se cliente ter um contrato de prestação de serviços fiscais com a operação lo-cal da firma de auditoria. Como vocês vão lidar com essas restrições do ponto de vista de operações transnacionais? Aí é onde entram os nossos controles inter-nos. Temos (na EY) um processo de acei-tação de clientes muito robusto que olha para todos os aspectos de independência e relacionamento de negócios. É esse o pon-to. Não vamos aceitar auditar um cliente sem antes fazer um levantamento de tudo e todos os serviços que estão sendo presta-dos – ou que foram prestados, porque em alguns casos existe uma exigência de in-dependência prévia, no caso da SEC dois anos antes de começar a prestar o serviço de auditoria e na Europa um ano. Vamos levantar todos esses aspectos e avaliar se algum dos serviços de não-auditoria que

estão sendo prestados são proibidos ou não pela nova diretiva. Se eles forem proibidos, aí a gente tem de analisar se vale a pena ces-sar o serviço ou se declinamos da auditoria. Isso tudo é feito logo no início do proces-so. Óbvio que podem existir mudanças no meio do caminho, daí a gente tem de re-fazer todo o processo para ver se tudo está em consonância com as regras.

Ainda é uma situação mal resolvida? O ponto de partida e a classificação dentro do território europeu e a identificação de empresas de interesse público que tem de se adequar às regras de cada país. As opera-ções das empresas fora da UE também têm de se adequar. Mas, a diretiva tem regras menos restritivas para as subsidiárias fora do território europeu. Teremos de levantar todas as restrições locais que forem mais restritivas do que aquelas estabelecidas na diretiva, para podermos fazer o levanta-mento nos nossos clientes e ver o que é que se adequa à legislação desses países e criar controles internos para que não se incorra em nenhuma violação regulatória. É aí que está o desafio das empresas de auditoria. É esse impacto, essa análise minuciosa que terá de ser feita acompanhada de novos controles internos e testes de eficácia dos mesmos.

As leis nacionais são claras?Na prática, são mais de 30 novas leis que temos de analisar e interpretar. Nunca é preto no branco, sempre tem uma zona cinzenta. E, provavelmente muitas dessas leis terão trechos com falta de clareza, o que vai exigir muita interpretação. Mas, isso é normal. A própria Sarbanes-Oxley, no início, tinha pontos pouco claros que geravam muitos questionamentos. Na medida em que a SEC foi esclarecendo os pontos, as regras foram ficando mais com-preensíveis para todos. Vai ser um exercício constante do profissional de auditoria e vai exigir muito contato com os reguladores e com as empresas lá fora para que possamos ter um sistema de controles internos bem estabelecidos.

Como vocês estão lidando com isso na EY? Tem um trabalho global sendo feito?

Quais os principais impactos dessa nova diretiva para as empresas?São vários. Como regras que limitam o pagamento de honorários que podem ser recebidos pelas firmas de auditoria dos seus clientes auditados por serviços de não--auditoria. O próprio rodízio – que já era praticado em alguns países da Europa – mas agora passa a ser obrigatório após um período de dez anos, prorrogáveis por mais dez. Mas, para as empresas de auditoria o mais importante, provavelmente, é a restri-ção na prestação de serviços de não-audi-toria para empresas que são auditadas pela firma. Essas restrições englobam a presta-ção de assessoria fiscal em alguns casos e em alguns países; serviços que envolvam apoio à tomada de decisão pela gestão da empresa auditada; desenho e implementa-ção de procedimentos de controles inter-nos e gestão de risco relacionados com o controle da informação financeira, entre outros. Recentemente fiz uma pesquisa com profissionais de vários países euro-peus, desde os grandes como Reino Unido e Alemanha até Romênia, Chipre e Malta, em sua maioria profissionais de Big 4. A metade deles acredita que essas restrições vão impactar de maneira substancial os negócios.

As empresas de auditoria vão pensar em qual serviço prestar para cada cliente? É uma questão de estratégia de negócios que já é analisada. Metade dos profissio-nais com quem conversei acreditam que essa restrição vai impactar os negócios de maneira substancial, uma vez que suas fir-mas prestam serviços que serão proibidos para os clientes da área de auditoria.

Sobre as restrições na prestação de ser-viços de não-auditoria, você acredita que elas tenham ido além da conta? Até aqui lidávamos basicamente com dois modelos. A SEC (o órgão que regula o mercado de capitais nos Estados Unidos) estabelece que determinados serviços de não-auditoria não podem ser prestados e que outros podem, desde que esse serviço não esteja subordinado à auditoria e não exista interferência da parte do auditor.

mercado • legislação

| LEC - LEGAL, ETHICS, COMPLIANCE • ED 1548

O time global tem feito apresentações sobre o tema. Por aqui estamos fazendo apresentações treinamentos sobre os im-pactos que sofreremos e da importância dos profissionais terem realmente cuidado quando estiverem lidando com empresas que estão sujeitas a essa diretiva da UE. Mas, é a partir do momento que tivermos o entendimento das regras de cada país que vai começar um trabalho árduo de estabe-lecimento de controles internos para nos certificamos de que teremos a segurança de que vamos poder identificar qualquer discrepância ou violação à regra.

Já é possível avaliar se isso vai impactar o custo dos serviços de auditoria?Isso é algo que ainda não está estabeleci-do. Trabalhos de auditoria relacionados à SEC, por conta dos procedimentos adicio-nais que são requeridos, de fato geram um acréscimo nos honorários. Isso ainda não foi discutido internamente, mas depen-dendo da complexidade talvez possa haver. Será avaliado caso a caso, de acordo com a legislação específica de cada país, do nosso custo interno de controles internos e ainda não temos um posicionamento claro sobre isso. No entanto, acredito que os custos se-guirão equivalentes.

A diretiva fala muito da qualidade do trabalho da auditoria. Isso me parece um tanto quanto subjetivo. O que po-demos esperar disso?A reforma do mercado de auditoria eu-ropeu tem como funções básicas esclare-cer e definir melhor o papel do auditor, reforçar a independência do profissional e tornar o mercado de auditoria mais dinâmico, aumentar a supervisão sobre os auditores, facilitar a prestação de ser-viços de auditoria além das fronteiras e reduzir encargos desnecessários paras as pequenas e médias empresas. Boa parte desses pontos já estava previsto em outra diretiva, de 2006, só que essa nova veio para esclarecer tudo. O objetivo maior é aumentar a qualidade do trabalho. Só que há vários questionamentos dos pro-fissionais que eu consultei se a reforma realmente tem condições de alcançar os objetivos propostos.

A versão revisada da ISA 700 (Interna-tional Standards on Auditing) também é explícita ao pedir que os relatórios de auditoria tragam informações mais rele-vantes sobre a empresa auditada para os investidores. Que tipo de informação a mais esse investidor pode esperar?As notas explicativas e também o relató-rio de auditoria são muito padronizados e existem críticas constantes sobre a essa pa-dronização. Várias pessoas se apegam ape-nas ao relatório do auditor independente, que são dois parágrafos de todo o relatório de auditoria. O que está sendo muito dis-cutido hoje é a necessidade do auditor não só expressar uma opinião, mas também ex-plicar as premissas que nortearam o seu jul-gamento e que resultou naquela opinião. Isso é uma exigência cada vez maior. Os Key Audit Matters (KAMs) dizem respeito a assuntos comunicados à governança que são, no julgamento no auditor, relevantes e demandaram atenção no trabalho e que devem ser divulgados no relatório como uma forma de comunicação entre o au-ditor e os usuários para expor como foi a execução da auditoria

Estamos falando dos processos e meto-dologias aplicados?Ele não vai entrar em detalhes dos proces-sos que foram feitos. Na realidade, é uma informação adicional que vai corroborar a linha de raciocínio que fez o profissional chegar naquele julgamento. Esse é um as-sunto muito novo que está sendo discuti-do em diversos fóruns. Ainda tem muita controvérsia sobre isso, mas o fato é que a sociedade está pedindo informações que lhes deem a possibilidade de tomar uma decisão de investimentos com maior co-nhecimento de causa, o que já foi regula-mentado pelas ISAs revisadas.

As novas regras da UE destacam e refor-çam o papel dos comitês de auditoria das empresas. O que esse maior empo-deramento para os comitês representa?Os comitês de auditoria têm papel funda-mental na estrutura de governança corpo-rativa de uma empresa, com um papel de supervisão nos trabalhos das empresas de auditoria. Sempre houve comitês de audi-

toria nas empresas consideradas como de interesse público na Europa. Só que a dire-tiva veio para reforçar o papel do comitê de auditoria. Toda e qualquer prestação de ser-viço de não-auditoria para clientes que são considerados de interesse público devem passar pela aprovação do comitê de audito-ria. Existe uma similaridade entre a diretiva europeia com a Sarbanes-Oxley – que obri-gou as empresas sob a égide da SEC a ins-tituírem comitês de auditoria – tanto que a estão chamando de SoX europeia. Não diria que ela vai empoderar os comitês, mas sim estabelecer um maior envolvimento do comitê de auditoria no que diz respeito ao trabalho do auditor independente.

E o relatório extra do comitê de audito-ria que passa a ser exigido dos auditores. O que ele vai conter?Ele vai trazer informações mais detalhadas sobre a metodologia utilizada e as eventu-ais deficiências identificadas nos controles internos. Com esse relatório, a auditoria pode fazer uma primeira comunicação para o comitê de auditoria sem ter de tor-nar isso público no seu relatório padrão. Só que essa comunicação tem de ser efetiva.

Outro ponto no qual a diretiva se apega é o desenvolvimento do mercado de au-ditoria na Europa, tentando diminuir a dependência das Big 4. Isso é legítimo e viável?No caso do rodízio obrigatório de empre-sas, a partir do momento que uma em-presa é obrigada a encerrar o seu contrato de auditoria, ela deixa de ter as restrições para prestação de serviços de não- audi-toria. A exemplo da EY, uma empresa de auditoria hoje presta todo e qualquer tipo de serviço que você possa imaginar. Muitos países já adotavam essa prática. No Brasil, onde já existem regras para o rodízio temos uma série de controvérsias, de que quanto menor o tempo que as fir-mas ficarem com um cliente a qualidade da auditoria poderia ser comprometida devido ao desconhecimento e falta de fa-miliaridade da nova firma com o clienteo que significa que a nova firmam teria que entender o contexto e a operação desse novo cliente.

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LEC NEWS • RH

A operação brasileira da montadora Nissan teve que enfrentar uma situa-ção inusitada, para dizer o mínimo, durante a passagem da tocha olímpica em São Paulo. Trabalhadores metalúrgicos e comerciários (que trabalham nas revendas de veículos da marca) protestaram contra o que conside-ram ser práticas abusivas cometidas pela Nissan. A montadora era uma das patrocinadoras oficiais das Olimpíadas Rio 2016. Até aí, tudo bem. O problema é que o motivo do protesto nada tem a ver com as condições de trabalho ou eventuais demandas dos trabalhadores da Nissan no Brasil. Na verdade, os protestos realizados na Avenida Paulista e em frente à loja da empresa na Avenida Brasil, duas importantes vias da capital paulista, protestavam contra “a agressiva campanha antissindical promovida pela Nissan North America dirigida aos trabalhadores da Nissan na cidade de Canton, no Mississippi, Estados Unidos”. O protesto é fruto de uma “par-ceria” entra a CUT, a Força Sindical e a União Geral dos Trabalhadores, em parceria com a United Auto Workers, a poderosa central sindical ame-ricana que representa os trabalhadores do setor automobilístico nos EUA, e uma das responsáveis por levar as três gigantes norte-americanas do setor (GM, Ford e Chrysler) quase que à bancarrota nos anos 2000, por conta da posição inflexível em relação às questões trabalhistas.

De acordo com as centrais sindicais brasileiras nos EUA, aproximada-mente metade dos trabalhadores da Nissan é terceirizada, ganhando me-nos de 1/3 do salário de um trabalhador sindicalizado, exercendo a mesma função. Mas, em tese, o que mais atormenta os dirigentes daqui é que os trabalhadores seriam “obrigados a comparecer à seções de doutrinação antissindical e assistir à vídeos do mesmo caráter nos refeitórios e nas salas de descanso, ameaçados de demissão e/ou penalizados em suas funções ao menor sinal de que pretendem votar pela instalação do sindi-cato, tendo havido inúmeros casos de demissão. A empresa também es-palha sistematicamente boatos de que a fábrica será fechada e transferida para o México, com a demissão de todos os seus funcionários, caso os trabalhadores consigam a sindicalização”, diz o comunicado emitido pelos sindicatos brasileiros. Nos Estados Unidos, ao contrário do que acontece no Brasil, o vínculo sindical não é uma imposição.

Globalização sindical

Um dos maiores problemas que os grandes grupos de varejo enfrentam é lidar com a sua capilaridade. Com milhares de lojas espalhadas por todo o Brasil, é realmente difícil controlar todos os aspectos da operação, especialmente os que estão, naturalmente, mais relacionados com a própria operação da loja. Nesse tipo de situação, é comum que a matriz conceda algum grau de autonomia para o time que comanda a região, ou mesmo para que o próprio gerente da loja resolva questões do dia a dia, incluindo vários aspectos relacionados aos funcionários. Então, a união entre as amarras trabalhistas e a nem sempre sensata burocracia brasileira, com a busca por melhores resultados para a opera-ção da loja, pode gerar situações desagradáveis para a matriz. Uma filial do Extra Supermer-cados, bandeira do Grupo Pão de Açúcar, o maior varejista do Brasil, está sendo acusada de tentar burlar as leis trabalhistas por meio da contratação irregular de terceiros para exerce-rem atividades-fim.

O Ministério Público do Trabalho de Ala-goas diz que a loja do Extra contratava, em regi-me de terceirização, pessoas com a intenção de selecionar novos empregados, utilizando-se do falso argumento que eles estariam substituin-do, ocasionalmente, empregados afastados por doença ou licença-maternidade. Dessa forma, o varejista poderia avaliar os funcionários sem a necessidade de firmar um contrato de experiên-cia, com prazo de até 90 dias, que implicaria no pagamento dos mesmos benefícios trabalhistas oferecidos aos funcionários regulares. “A preca-rização da relação do trabalho ficou evidente, pois a empresa reduzia os gastos da empresa ao não contratar os trabalhadores, além de privá--los do recebimento de benefícios concedidos aos outros empregados, como plano de saúde, concessão de licença-maternidade de seis meses e fornecimento de cesta básica”, disse a procu-radora do Trabalho Rosimeire Lobo.

A 5ª Vara do Trabalho em Maceió condenou o Extra Supermercados ao pagamento de uma indenização no valor de R$ 100 mil por tercei-rizar irregularmente trabalhadores para exercer atividade-fim. Os valores serão revertidos ao Fundo de Amparo ao Trabalhador. Ainda cabe recurso da decisão.

De novo, os terceiros

a passagem da tocha olímpica por são paulo:

alianças globais para fazer barulho.

PILARES DO COMPLIANCE • DANIEL SIBILLE

| LEC - LEGAL, ETHICS, COMPLIANCE • ED 1550

As opiniões neste texto dizem respeito aos entendimentos pessoais do autor e não de sua empregadora.

Por Daniel Sibille, diretor de Com-pliance da Oracle para a América Latina e coordenador acadêmico do Curso de Compliance Anticorrupção da LEC.

Anos atrás, não tenho a menor dúvida de que se perguntas-sem aos principais executivos de empresas nacionais sobre

a real necessidade de estabelecerem uma área de compliance em suas com-panhias, as principais respostas men-cionariam os seguintes termos: “buro-cracia”, “diminuição de vendas”, “dor de cabeça” e, principalmente, “custo”. Sim, são todos termos aplicados com um viés claramente pejorativo. Mas, será mesmo que a implementação de uma área de compliance teria este sig-nificado tão negativo?

De acordo com recente pesquisa desenvolvida pelo Searle Civil Justice Institute da George Mason Universi-ty, nos Estados Unidos, assim que o mercado toma conhecimento de uma investigação com potencial impacto de sanções por violações ao FCPA, o valor da empresa cai aproximadamente 2,7%. Agora, vamos aplicar esse im-pacto numa empresa. Se considerar-mos que o Walmart, maior varejista do mundo, possui um valor de merca-do aproximado à US$ 240 bilhões, o anúncio de uma investigação pelas au-toridades norte-americanas significaria uma perda imediata de US$ 7 bilhões

em valor para o acionista. Seria, literal-mente, um caso de destruição de valor para eles.

Além do valor de mercado, assim que uma investigação por possíveis violações ao FCPA, começa a rodar uma espécie de “taxímetro”, que só vai parar com o fechamento de algum acordo judicial, o que costuma levar meses ou anos em muitos casos. E a conta final desse “taxímetro” costuma ser bastante relevante. O Walmart gas-tou quase meio bilhão de dólares (mais de R$ 1,5 bilhões) ao longo de dois anos de investigação, de acordo com dados enviados à SEC, responsável pela regulamentação do mercado de capitais nos Estados Unidos. A fabri-cante de cosméticos Avon, por outro lado, provisionou mais de uma cente-na de milhões de dólares por conta da sua investigação relacionada ao paga-mento de propina em operações inter-nacionais, notadamente na China.

A magnitude do impacto de uma acusação de violação ao FCPA varia dramaticamente de acordo com o tipo de punição. Empresas que enfrentam acusações de suborno, por si só, têm uma redução média acumulada no va-lor de 2,7% do seu valor de mercado.

Contudo, empresas que enfrentam alegações de suborno e também de fraude, viram seu valor de mercado despencar até 55%. “Descobrimos que o mercado reage muito mais ne-gativamente aos anúncios de empresas que pretendem enganar os outros”, diz Jerry Martin, professor de finanças na George Mason University e principal pesquisador do estudo.

Para as empresas investigadas ape-nas pelo pagamento de suborno e não por fraude financeira, a reação do mer-cado pode ser explicada como um cál-culo racional do impacto do custo que as empresas incorrem para investigar possíveis violações e para cobrir even-tuais multas ou penalidades. Já quando o problema envolve uma fraude finan-ceira o abalo à reputação, acaba sendo muito mais relevante e empurrando as ações ladeira a baixo.

Os dados demonstram a importân-cia da implementação de um programa de compliance robusto, que certamen-te acarretará em custos infinitamente menores do que os envolvidos numa eventual investigação ou uma séria fraude financeira. E essa conta não precisa nem ser feita na ponta do lá-pis. O programa de compliance não irá evitar que problemas ocorram, mas garantirá que a empresa possa oferecer provas concretas às autoridades públi-cas de que tomou as medidas necessá-rias, no limite do razoável e esperado, diante do risco apresentado.

Será mesmo que compliance significa custo para as empresas?

O barato que sai caro

loja do walmart, no méxico: meio bilhão de dólares gastos em investigações de compliance.

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