o novo cpc e o direito civil - - flavio tartuce

2431

Upload: mirian-damasceno

Post on 11-Dec-2015

96 views

Category:

Documents


10 download

DESCRIPTION

Novo CPC

TRANSCRIPT

Page 1: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce
Page 2: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

DADOS DECOPYRIGHT

Sobre a obra:

A presente obra é disponibilizadapela equipe Le Livros e seusdiversos parceiros, com oobjetivo de oferecer conteúdopara uso parcial em pesquisas eestudos acadêmicos, bem como osimples teste da qualidade daobra, com o fim exclusivo de

Page 3: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

compra futura.

É expressamente proibida etotalmente repudiável a venda,aluguel, ou quaisquer usocomercial do presente conteúdo

Sobre nós:

O Le Livros e seus parceirosdisponibilizam conteúdo dedominio publico e propriedadeintelectual de forma totalmentegratuita, por acreditar que oconhecimento e a educaçãodevem ser acessíveis e livres atoda e qualquer pessoa. Você

Page 4: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

pode encontrar mais obras emnosso site: LeLivros.link ou emqualquer um dos sites parceirosapresentados neste link.

"Quando o mundo estiver unidona busca do conhecimento, e

não mais lutando por dinheiro epoder, então nossa sociedade

poderá enfim evoluir a um novonível."

Page 5: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce
Page 6: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce
Page 7: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce
Page 8: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

■ A EDITORA MÉTODO seresponsabiliza pelos vícios do produtono que concerne à sua edição(impressão e apresentação a fim depossibilitar ao consumidor bemmanuseá-lo e lê-lo). Nem a editoranem o autor assumem qualquerresponsabilidade por eventuais danosou perdas a pessoa ou bens,decorrentes do uso da presente obra.Todos os direitos reservados. Nostermos da Lei que resguarda osdireitos autorais, é proibida areprodução total ou parcial de qualquerforma ou por qualquer meio, eletrônicoou mecânico, inclusive através deprocessos xerográficos, fotocópia egravação, sem permissão por escritodo autor e do editor.Impresso no Brasil – Printed in Brazil

■ Direitos exclusivos para o Brasil na

Page 9: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

língua portuguesaCopyright © 2015 byEDITORA MÉTODO LTDA.Uma editora integrante do GEN |Grupo Editorial NacionalRua Dona Brígida, 701, Vila Mariana –04111-081 – São Paulo – SPTel.: (11) 5080-0770 / (21) 3543-0770 –Fax: (11) [email protected] |www.editorametodo.com.br

■ O titular cuja obra sejafraudulentamente reproduzida,divulgada ou de qualquer formautilizada poderá requerer a apreensãodos exemplares reproduzidos ou asuspensão da divulgação, sem prejuízoda indenização cabível (art. 102 da Lei

Page 10: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

n. 9.610, de 19.02.1998).Quem vender, expuser à venda,ocultar, adquirir, distribuir, tiver emdepósito ou utilizar obra ou fonogramareproduzidos com fraude, com afinalidade de vender, obter ganho,vantagem, proveito, lucro direto ouindireto, para si ou para outrem, serásolidariamente responsável com ocontrafator, nos termos dos artigosprecedentes, respondendo comocontrafatores o importador e odistribuidor em caso de reprodução noexterior (art. 104 da Lei n. 9.610/98).

■ Capa: Danilo OliveiraProdução digital: Geethik

Page 11: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

■ CIP – Brasil. Catalogação-na-fonte.Sindicato Nacional dos Editores deLivros, RJ.

T198i

Tartuce, Flávio

Impactos do novo CPC no DireitoCivil / Flávio Tartuce. – Rio de Janeiro:Forense; São Paulo: MÉTODO, 2015.

Inclui bibliografiaISBN 978-85-309-6369-9

1. Direito civil - Brasil 2.Responsabilidade (Direito) 3.Responsabilidade social. I.

15-20999

CDU: 342.71

Page 12: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

Dedico esta obra a todos os amigosprocessualistas,

personificados nos meus irmãos DanielAmorim Assumpção

Neves e Fernanda Tartuce, padrinhos domeu filho Enzo.

Page 13: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

PREFÁCIO

Há momentos na Históriaque servem para definir otamanho de um doutrinador.

Estamos vivendo um deles.Temos um novo CPC. Pela

primeira vez na história, um CPCpublicado em regimedemocrático.

Dentre inúmeras novidades,o CPC traz consigo a marca deser um Código de Processopreocupado com a harmonizaçãocom o Código Civil de 2002, que

Page 14: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

veio quase 30 anos depois doCPC de 1973.

A influência do CC no CPCé evidente, e a recíproca éverdadeira. Basta ver o inciso IIdo art. 1.072 do CPC, queprocede à revogação expressa demais de dez artigos do CódigoCivil. Ainda há a alteração daredação de dois artigos doCódigo Civil pelo art. 1.068 doCPC: o art. 274 e o art. 2.027.

Afora essas mudançasexpressas, o impacto doCPC/2015 no Direito Civil é umdos principais temas a seremexplorados pela doutrina pelos

Page 15: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

próximos anos.Convocado pela História,

Tartuce chega antes e nosapresenta, com a sua aguçada eatualizada visão, as suasprimeiras impressões, abordandoinúmeros aspectos, da evicção àpartilha, da posse aos alimentos.Com isso, Tartuce ratifica a suaposição de proeminência na atualgeração de civilistas brasileiros.É uma obra de seu tempo.

É obra indispensável. Umadaquelas que todos haverão deler.

Parabéns ao Autor e à

Page 16: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

Editora.Salvador, março de 2015.

Fredie Didier Jr.Professor-associado da

Universidade Federal da Bahia.

Page 17: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

APRESENTAÇÃO

O Tartuce (assim o chamo)me convidou para fazer aapresentação da presente obra.Aceitei com prazer, porque, alémde sermos amigos há tempos, aobra certamente despertará ointeresse dos estudiosos doDireito.

Conheci o Tartuce nafaculdade e desde então temosseguido em paralelo nossoscaminhos. Ele, no Direito Civil, eeu, no Direito Processual. Ochamo de irmão porque para mim

Page 18: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

ele é exatamente isso. Meus paisme deram um irmão que amo, oCarlinhos, e a vida me deu outroirmão que amo, o Tartuce.Amizade essa definitivamenteconsagrada com o chamado queme fez para ser padrinho de seufilho Enzo, mesmo sabendo queeu seria um padrinho um tantoquanto relapso em razão dadesgastante correria do dia a dia.

No plano acadêmico, obrilho do Tartuce é manifesto,fruto de trabalho sério epersistente. É “chover nomolhado” dizer que ele é um dosexpoentes da nova geração do

Page 19: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

Direito Civil em nosso País.Como provas disso, tem váriasobras escritas e o reconhecimentocomo professor.

Poderia falar muito, e bem,do Autor. Contudo, minha missãonão é propriamente apresentá-lo,e sim sua presente obra. É o quepasso a fazer.

No Capítulo 1, é abordada aconstitucionalização do DireitoProcessual Civil, consagradapelo Novo CPC por meio daprevisão expressa de váriosprincípios constitucionais já emsuas regras inaugurais. O Autorfaz interessante paralelo com o

Page 20: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

mesmo fenômeno ocorrido noDireito Material com o adventodo CC/2002. Comenta, ainda, arespeito da consagração dospoderes do juiz no preenchimentodos conceitos jurídicosindeterminados e das cláusulaslegais abertas, dando especialênfase à boa-fé processual.

O Capítulo 2 é destinado àanálise do incidente dedesconsideração dapersonalidade jurídica,consagrado de forma inovadorapelo Novo CPC. Como bemapontado pelo autor, os aspectosmateriais da desconsideração da

Page 21: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

personalidade estão previstostanto no CC (art. 50) como noCDC (art. 28), mas oordenamento jurídico não tinharegramento exauriente doprocedimento do fenômeno doDireito Material. O Novo CPCveio para suprimir esse vácuo.

Os negócios jurídicosprocessuais são tratados noCapítulo 3, em que traz umsubstrato relevante e completodos negócios jurídicos no planodo Direito Material e faz a devidacorrelação com a cláusula geraldos negócios jurídicosprocessuais consagrada no art.

Page 22: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

191 do Novo CPC. NesseCapítulo, é feita uma homenagemimplícita ao Fórum Permanentedos Processualistas Civis, aocomentar, nem sempre de formaelogiosa, os seus Enunciados arespeito do tema.

Os reflexos do Novo CPC naprescrição e decadência sãoanalisados no Capítulo 4. NesseCapítulo, o Autor enfrenta ainovadora inclusão da prescriçãointercorrente na execução, oreconhecimento de ofício daprescrição e o momento dainterrupção da prescrição.

O Capítulo 5 trata de tema

Page 23: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

versado tanto pelo Código Civilcomo pelo Código de ProcessoCivil: a prova. O Autor trata dorol dos meios de prova, da provaatípica e de todas as novidades arespeito do procedimento dasprovas em espécie que afetam asprevisões contidas no CódigoCivil. Indica, ainda, osdispositivos do Código Civil queforam expressamente revogadospelo Novo Código de ProcessoCivil.

As consequências do NovoCódigo de Processo Civil para ateoria geral das obrigaçõesocupam o Capítulo 6 da presente

Page 24: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

obra. Nesse Capítulo, é realizadoum estudo sobre as novidades,ainda que não substanciais, naefetivação das decisões judiciaisque tenham como objeto asobrigações de fazer, não fazer ede entregar coisa.

No Capítulo 7, o Autorenfrenta as novidades do NovoCódigo de Processo Civil arespeito da responsabilidadepatrimonial, tais como as novashipóteses de responsabilidadepatrimonial secundária, ashipóteses ampliadas de fraude àexecução, a consagração dafraude contra credores como ato

Page 25: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

anulável e a mitigação doEnunciado da Súmula 375 doSTJ.

O Autor, no Capítulo 8, fazuma análise da evicção no planodo Direito Material e como oNovo CPC trata da matéria, emespecial no tocante à denunciaçãoda lide em razão da evicção.Ressalta que, apesar de certapacificação a respeito dapossibilidade de denunciação dalide per saltum, como o NovoCPC impede tal forma deintervenção. Primeiro porqueexpressamente prevê que adenunciação seja do alienante

Page 26: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

imediato, e em segundo, porquerevogou o art. 456 do CC.

As ações possessórias sãotratadas no Capítulo 9, emespecial as novidades criadaspelos parágrafos do art. 551 doNovo CPC a respeito de conflitosfundiários: forma de citação dosréus; publicidade da citação;intimação do Ministério Públicoe em casos que envolverempessoas em situação dehipossuficiência econômica daDefensoria Pública; e realizaçãode audiência especial.

É bem observado noCapítulo 10 que o Novo CPC

Page 27: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

retirou do rol de procedimentosespeciais o procedimento deusucapião, mas que as regrasdiferenciadas referentes à citaçãonesse tipo de ação forammantidas. Lembra que nasespécies de usucapiãoconstitucionais continua a existirprocedimento especial previstoem legislação extravagante.

Tendo sido os arts. 1.482 e1.483 do CC expressamenterevogados pelo art. 1.069, II, doNovo CPC, o qual o Autor chamade “aniquilador de normasmateriais”, no Capítulo 11enfrentam-se as consequências

Page 28: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

dessas revogações no tratamentoda remição da hipoteca.

Em interessante inovação doNovo CPC, é criado umprocedimento especial destinadoàs ações de família. O âmbito desua aplicação, bem como aspeculiaridades procedimentais detal procedimento são analisadosno Capítulo 12, no qual o Autortambém expõe suas opiniões arespeito do tratamento processualda ação de alteração de regime debens.

Depois de acaloradasdiscussões sobre o tema, foimantida no Novo CPC a previsão

Page 29: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

do procedimento da separação edo divórcio. O Autor, no Capítulo13, defende não existir mais oinstituto da separação em nossoordenamento jurídico, critica aopção legislativa, mas não deixade enfrentar o procedimento daseparação e divórcio, bem comoos dispositivos legais quepreveem a separação paradeterminação de competência, desegredo de justiça e de aplicaçãodo procedimento especial dasações de família.

O Capítulo 14 é destinadoao enfrentamento das regrasprocessuais do Novo CPC

Page 30: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

relativas à união estável e suasconsequências para o DireitoMaterial. Chama especial atençãopara a nova exigência de outorgaconvivencial para as ações reaisimobiliárias.

O Capítulo 15 é destinado àanálise de diferentes espécies dealimentos e de seu tratamentoprocedimental. O Autor se dedicaa enfrentar as normasprocedimentais previstas noNovo CPC que, de alguma forma,estejam associadas aos alimentos,dando especial ênfase ao meioexecutivo indireto exclusivo daexecução de alimentos: a prisão

Page 31: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

civil.A preocupação do Autor no

Capítulo 16 é analisar trêsfenômenos do Direito Material ea influência do Novo CPC sobreeles: a tutela, a curatela e ainterdição.

No derradeiro e maisextenso Capítulo, são analisadasas novidades procedimentais doprocedimento especial doinventário e partilha, sempreassociando as novidades ao planodo Direito Material e expondocomo esse plano será afetadopelas novidades processuais.

Page 32: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

Daniel Assumpção

Page 33: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

NOTA DO AUTOR

Após cerca de cinco anos detrâmite legislativo – devidamenteacompanhado com atenção poreste autor –, o Brasil tem agoraum Novo Código de ProcessoCivil. Uma nova codificaçãosempre traz consigo a felizesperança e a oportunidade derevisão das categorias jurídicas,para uma melhor aplicação dasleis em nosso País. Traz tambéma grande responsabilidade paraque os juristas construam umanova doutrina sobre os temas que

Page 34: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

emergem. Essa tarefa écompletada pela jurisprudência,por meio da apreciação concretados casos práticos, o que seráfeito a partir da entrada em vigorda Lei 13.105/2015, em março de2016.

A presente obra visa aanalisar as principaisrepercussões do Novo Código deProcesso Civil para o DireitoCivil, e vice-versa. Como énotório, além de revogar e alterardispositivos da codificaçãomaterial, o CPC/2015 continua atratar de assuntos de cunhosubstantivo, como sempre foi a

Page 35: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

nossa tradição. Cito, porexemplo, a regulamentaçãorelativa às provas e àresponsabilidade patrimonial.Contudo, o Novo CPC foi além,regulando também matérias comoos negócios jurídicosprocessuais, a desconsideraçãoda personalidade jurídica e asações de Direito de Família,todas aqui analisadas em umaprimordial interação entre omaterial e o instrumental.

Ademais, destaque-se osistema aberto e principiológicoadotado pelo CPC/2015, queconsagrou, especialmente em seus

Page 36: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

dispositivos inaugurais, umainterpretação processual a partirda Constituição Federal e dosprincípios constitucionais,seguindo os passos da escola deconstitucionalização do DireitoCivil. Em complemento, a técnicade ponderação, hoje tão cara aoscivilistas que seguem esse viés,foi positivada pelo Novo Códigode Processo Civil, passando a sersolução expressamenteconsagrada pela lei brasileira,com grande incidência para osconstantes conflitos entre osdireitos fundamentais. Por fim,ainda no contexto de um sistema

Page 37: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

aberto, a boa-fé objetiva passou aser princípio expresso do DireitoProcessual Brasileiro, o quetrará, sem dúvidas, a emergênciade novas teses para o campoprático-processual, assim comoocorreu com o Direito Material.

Sem dúvidas, tais aspectosdemonstram uma mudança deespírito do Código de ProcessoCivil, em confronto com o seuantecessor, a gerar muitosembates e debates nos anosvindouros. Apesar da reproduçãode muitos dos preceitos que jáestavam no CPC/1973 –especialmente diante das

Page 38: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

reformas processuaisengendradas nos últimos anos –,podemos dizer que temos umNovo Código!

Todos esses assuntos estãoestudados neste livro, quetambém aborda as consequênciaspara a prescrição e a decadência;as repercussões para a teoriageral das obrigações; os impactospara o instituto da evicção; aequiparação do companheiro aocônjuge para todos os finsprocessuais e suas decorrênciaspara o Código Civil; a interdição,a tutela e a curatela; a infelizmanutenção da separação de

Page 39: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

direito na norma instrumental; oinventário e a partilha.

Acredito que a adoção deum modelo aberto eprincipiológico pelo Novo CPCintensificará ainda mais asinterações entre essa norma e oCódigo Civil no futuro, em umnecessário e sempre sadiodiálogo entre as fontes. Dessaforma, como afirma FernandaTartuce, o diálogo entre civilistase processualistas é como umdiálogo entre irmãos, muitasvezes complicado e difícil, masprimordial para odesenvolvimento científico do

Page 40: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

Direito Brasileiro. Aceitemos,então, esses debates, para quetoda a sociedade brasileira sejadeles beneficiada.

Boa leitura a todos. Bonsestudos. Pois não serão poucos.

São Paulo, março de 2015.

Page 41: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

SUMÁRIO

1. Das NormasFundamentais do NovoCódigo de Processo Civil –Constitucionalização doDireito Processual Civil,Técnica de Ponderação,Princípio da Boa-FéObjetiva e Diálogos com oDireito Material

2. Do Incidente deDesconsideração daPersonalidade Jurídica

Page 42: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

3. Dos Negócios JurídicosProcessuais

4. Da Prescrição e daDecadência – Impactos doNovo Código de ProcessoCivil

5. O Tratamento dasProvas no Código Civil e oImpacto do Novo CPC

6. Das Consequências doNovo Código de ProcessoCivil para a Teoria Geraldas Obrigações

7. Das Regras Gerais de

Page 43: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

ResponsabilidadePatrimonial no NovoCódigo de Processo Civil esua Interação com oDireito Civil

8. Das Repercussões doNovo Código de ProcessoCivil para o Instituto daEvicção

9. Das Ações PossessóriasDiretas no Novo Código deProcesso Civil e suasConsequências para oTratamento Constante doCódigo Civil de 2002

Page 44: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

10. Do Tratamento daUsucapião Imobiliária noNovo CPC – Da UsucapiãoAdministrativa

11. Alterações noTratamento da Remição daHipoteca pelo Novo CPC

12. As Regras Gerais dasAções de Direito deFamília e o TratamentoProcessual da Ação deAlteração de Regime deBens

13. Do Tratamento da

Page 45: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

Separação e do Divórcio noNovo Código de ProcessoCivil

14. Das Regras Relativas àUnião Estável no NovoCPC e as Consequênciaspara o Direito Material

15. Dos AlimentosFamiliares no Novo Códigode Processo Civil – O NovoTratamento da Prisão Civil

16. A Tutela e Curatela e oTratamento da Interdiçãono Novo Código de

Page 46: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

Processo Civil

17. Do Inventário e daPartilha no Novo Código deProcesso Civil

18. Bibliografia

Page 47: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

DAS NORMASFUNDAMENTAIS DO

NOVO CÓDIGO DEPROCESSO CIVIL

Constitucionalização doDireito Processual Civil,Técnica de Ponderação,

Page 48: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

Princípio da Boa-FéObjetiva e Diálogos com

o Direito Material

O Novo Código de ProcessoCivil inova substancialmente aotrazer regras inaugurais efundamentais a respeito dosinstrumentos para a aplicação doDireito Privado. Como é notório,o Código de Processo Civilanterior iniciava-se com normasrelativas à jurisdição, que foramdeslocadas para depois desse

Page 49: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

tratamento inaugural. Muitosdesses novos preceitosconsubstanciam verdadeirosprincípios do direito processual,que agora passaram a serexpressos em lei, com interaçãonão só com o Direito Civil, mastambém com o DireitoConstitucional.

Como se extrai daEnciclopédia Saraiva de Direito,obra clássica do século XX, emverbete elaborado pelo juristaalagoano Sílvio de Macedo, “apalavra princípio vem deprincipium, que significa início,começo, ponto de partida, origem.

Page 50: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

Em linguagem científica princípioquer dizer fundamento, causa,estrutura. O termo foi introduzidona filosofia por Anaximandro deMileto, filósofo pré-socrático,que viveu entre 610 a 547 a.C.”.1Para Miguel Reale,sistematizador do Código CivilBrasileiro de 2002, “osprincípios são ‘verdadesfundantes’ de um sistema deconhecimento, como taisadmitidas, por serem evidentes oupor terem sido comprovadas, mastambém por motivos de ordemprática de caráter operacional,isto é, como pressupostos

Page 51: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

exigidos pelas necessidades dapesquisa e da praxis”.2

Em sentido muito próximo,leciona José de OliveiraAscensão que “os princípios sãoas grandes orientações formais daordem jurídica brasileira, quefundam e unificam normas esoluções singulares”.3 ParaFrancisco Amaral, “os princípiosjurídicos são pensamentosdiretores de uma regulamentaçãojurídica. São critérios para a açãoe para a constituição de normas emodelos jurídicos. Comodiretrizes gerais e básicas,fundamentam e dão unidade a um

Page 52: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

sistema ou a uma instituição. Odireito, como sistema, seria assimum conjunto ordenado segundoprincípios”.4

Maria Helena Diniz afirmaque os princípios são “cânonesque não foram ditados,explicitamente, pelo elaboradorda norma, mas que estão contidosde forma imanente noordenamento jurídico. ObservaJeanneau que os princípios nãotêm existência própria, estãoínsitos no sistema, mas é o juizque, ao descobri-los, lhes dáforça e vida. Esses princípios queservem de base para preencher

Page 53: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

lacunas não podem opor-se àsdisposições do ordenamentojurídico, pois devem fundar-se nanatureza do sistema jurídico, quedeve apresentar-se como um‘organismo’ lógico, capaz deconter uma solução segura para ocaso duvidoso”.5 Na esteira daslições, de Nelson Nery Jr. e RosaMaria de Andrade Nery, osprincípios gerais de direito “sãoregras de conduta que norteiam ojuiz na interpretação da norma, doato ou negócio jurídico. Osprincípios gerais de direito nãose encontram positivados nosistema normativo. São regras

Page 54: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

estáticas que carecem deconcreção. Têm como funçãoprincipal auxiliar o juiz nopreenchimento das lacunas”.6

Este autor segue uma ideiade princípio a partir daconjugação dos autores citados,todos com influência direta naconstrução do nosso pensamentojurídico. Assim, os princípiospodem ser definidos comoregramentos básicos aplicáveis auma determinada categoriajurídica, abstraídos das normas,da doutrina, da jurisprudência ede aspectos políticos,econômicos e sociais.

Page 55: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

Vislumbradas taisdefinições, constata-se que,confrontados com as normasjurídicas, os princípios são maisamplos, abstratos, muitas vezescom posição delimitada naConstituição Federal. São essespontos que os diferenciam dasnormas, dotadas de concretismo –denota-se um alto grau deconcretude –, de uma posição defirmeza, em oposição ao nexodeôntico relativo que acompanhaos princípios.

Ambos os conceitos – deprincípios e normas – apontam asdecisões particulares a serem

Page 56: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

tomadas no caso prático peloaplicador do direito, existindodiferença somente em relação aocaráter da informação quefornecem. As normas deverão sersempre aplicadas sob pena desuportar consequências jurídicasdeterminadas previamente. Osprincípios, não necessariamente.

Historicamente, não se podeesquecer que os princípiosestavam previstos como forma deintegração da norma no DireitoRomano, de acordo com as regrascriadas pelo imperador, as leges,entre 284 a 568 d.C. Nessesentido, não se pode perder de

Page 57: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

vista os princípios jurídicosconsagrados pelo direito romanoou mandamentos do direitoromano: honeste vivere, alterumnon laedere, suum cuiquetribuere (viver honestamente,não lesar a ninguém, dar a cadaum o que é seu, respectivamente).Tais regramentos ainda sãoinvocados tanto pela doutrinaquanto pela jurisprudência, sendoartifícios de argumentação muitointeressantes.

Como destacam Nelson NeryJr. e Rosa Maria de AndradeNery, os princípios jurídicos nãoprecisam estar expressos na

Page 58: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

norma.7 A conclusão é perfeita,devendo ser tida comomajoritária. A título deexemplificação, o princípio dafunção social do contrato éexpresso no Código Civil de2002 (arts. 421 e 2.035,parágrafo único), mas implícitono Código de Defesa doConsumidor e mesmo na CLT, quetrazem uma lógica de proteção dovulnerável, do consumidor e dotrabalhador, consagrando oregramento em questão, diante doseu sentido coletivo, dediminuição da injustiça social.

Com a entrada em vigor do

Page 59: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

Código Civil de 2002, ganhouforça a corrente doutrináriaclássica nacional que apontoupara o fato de não se poderdesassociar dos princípios o seuvalor coercitivo, tese defendidapor Rubens Limongi França emsua festejada e clássica obrasobre o tema.8 Os princípiosgerais devem assim guiar oaplicador do direito na busca dajustiça, estando sempre baseadosna estrutura da sociedade. ONovo Código de Processo Civil,com o seu tópico inaugural queora se estuda, confirma essatendência.

Page 60: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

Como é notório, o CódigoCivil de 2002 consagra trêsprincípios fundamentais,conforme se extrai da suaexposição de motivos, elaboradapor Miguel Reale. Advirta-se,contudo, que não houve, noCódigo Civil, um capítuloinaugural principiológico, aexemplo do que ocorre com oCódigo de Processo Civil de2015. Entretanto, os citadosregramentos são retirados devários de seus artigos e daprópria sistemática dacodificação.

O primeiro deles é o

Page 61: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

princípio da eticidade,representado pela valorização daética e da boa-fé, principalmentedaquela que existe no plano daconduta de lealdade das partes.Pelo Código Civil de 2002, aboa-fé objetiva tem função deinterpretação dos negóciosjurídicos em geral (art. 113 doCC). Serve ainda como controledas condutas humanas, eis que asua violação pode gerar o abusode direito, nova modalidade deilícito (art. 187 do CC). Por fim,a boa-fé objetiva tem a função deintegrar todas as fases pelasquais passa o contrato (art. 422

Page 62: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

do CC). Como se verá, a boa-féobjetiva tornou-se princípioexpresso do processo civilbrasileiro, o que é um notávelavanço, com muitas repercussõespráticas.

O segundo baluarte doCódigo Civil de 2002 é oprincípio da socialidade.Conforme apontava o próprioMiguel Reale, um dos escopos danova codificação foi o de superaro caráter individualista e egoístada codificação anterior. Nessecontexto, a palavra eu ésubstituída por nós. Todas ascategorias civis têm função

Page 63: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

social, o contrato, a empresa, apropriedade, a posse, a família, aresponsabilidade civil.

Por fim, como terceiroregramento, cabe destacar oprincípio da operabilidade, quetem dois sentidos. Primeiro, o desimplicidade ou facilitação dascategorias privadas, o que podeser percebido, por exemplo, pelotratamento diferenciado daprescrição e da decadência,exposto também neste livro, pelasinterações dessas categorias como processo civil. Segundo, o deefetividade ou concretude, o quefoi buscado pelo sistema aberto

Page 64: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

de cláusulas gerais adotado pelaatual codificação material. Essaadoção merece ser aprofundada,pois acreditamos que o Código deProcesso Civil, em muitos deseus preceitos, sobretudo osinaugurais, também acabou porseguir esse mesmo caminho.

Além disso, o Novo Códigode Processo Civil reconhece aplena possibilidade dejulgamento com base nascláusulas gerais e conceitoslegais indeterminados, exigindo adevida fundamentação pelojulgador em casos tais. Nessecontexto, o art. 11 do CPC/2015

Page 65: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

preconiza que todos osjulgamentos dos órgãos do PoderJudiciário serão públicos efundamentadas todas asdecisões, sob pena de nulidade.Em complemento, nos casos desegredo de justiça, pode serautorizada a presença somentedas partes, de seus advogados, dedefensores públicos ou doMinistério Público.

Mais à frente, ao tratar doselementos essenciais da sentença,o § 1º do art. 489 do EstatutoProcessual emergente estabeleceque não se considerafundamentada qualquer decisão

Page 66: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

judicial, seja ela interlocutória,sentença ou acórdão, que: a) selimitar à indicação, à reproduçãoou à paráfrase de ato normativo,sem explicar sua relação com acausa ou a questão decidida; b)empregar conceitos jurídicosindeterminados, sem explicar omotivo concreto de sua incidênciano caso; c) invocar motivos quese prestariam a justificar qualqueroutra decisão; d) não enfrentartodos os argumentos deduzidos noprocesso capazes de, em tese,infirmar a conclusão adotada pelojulgador; e) se limitar a invocarprecedente ou enunciado de

Page 67: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

súmula, sem identificar seusfundamentos determinantes nemdemonstrar que o caso sobjulgamento se ajusta àquelesfundamentos; f) deixar de seguirenunciado de súmula,jurisprudência ou precedenteinvocado pela parte, semdemonstrar a existência dedistinção no caso em julgamentoou a superação do entendimento.Nota-se que a norma menciona osconceitos legais indeterminados,mas é certo que muitos deles sãotambém cláusulas gerais, comoainda será exposto neste livro.

O último dispositivo visa a

Page 68: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

afastar o livre convencimento dojuiz, sem o devido fundamento.Acreditamos que esse comandopoderá revolucionar as decisõesjudiciais no País, trazendo-lhesbalizas mais certas e seguras,inclusive motivadas na doutrina.No entanto, o preceito tambémpoderá ser totalmente desprezadopelos julgadores, inclusive pelaausência de sanção imediata.

Aprofundando o estudo dascláusulas gerais e dos conceitoslegais indeterminados, naspalavras de Judith Martins-Costa,grande intérprete da filosofiarealeana, percebe-se na atual

Page 69: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

codificação um sistema aberto oude janelas abertas, em virtude dalinguagem que emprega,permitindo a constanteincorporação e solução de novosproblemas, seja pelajurisprudência, seja por umaatividade de complementaçãolegislativa. Vejamos as suaslições a respeito das cláusulasgerais:

“Estas janelas, bem denominadas por Irti de‘concetti di collegamento’, com a realidadesocial são constituídas pelas cláusulas gerais,técnica legislativa que conforma o meio hábilpara permitir o ingresso, no ordenamentojurídico codificado, de princípios valorativosainda não expressos legislativamente, de

Page 70: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

‘standards’, arquétipos exemplares decomportamento, de deveres de conduta nãoprevistos legislativamente (e, por vezes, noscasos concretos, também não advindos daautonomia privada), de direitos e deveresconfigurados segundo os usos do tráfegojurídico, de diretivas econômicas, sociais epolíticas, de normas, enfim, constantes deuniversos metajurídicos, viabilizando a suasistematização e permanenteressistematização no ordenamento positivo.Nas cláusulas gerais a formulação dahipótese legal é procedida mediante oemprego de conceitos cujos termos têmsignificado intencionalmente vago e aberto, oschamados ‘conceitos jurídicosindeterminados’. Por vezes – e aíencontraremos as cláusulas geraispropriamente ditas –, o seu enunciado, aoinvés de traçar punctualmente a hipótese e asconsequências, é desenhado como uma vagamoldura, permitindo, pela vagueza semânticaque caracteriza os seus termos, a

Page 71: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

incorporação de princípios e máximas deconduta originalmente estrangeiros ao corpuscodificado, do que resulta, mediante aatividade de concreção destes princípios,diretrizes e máximas de conduta, a constanteformulação de novas normas”.9

A partir dos ensinamentos dadoutrinadora citada, as cláusulasgerais podem ser conceituadascomo janelas abertas deixadaspelo legislador parapreenchimento pelo aplicador doDireito, caso a caso. Sãoexemplos de cláusulas geraisconstantes do Código Civil de2002: a) a função social docontrato (art. 421 do CC); b) a

Page 72: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

função social da propriedade (art.1.228, § 1º, do CC); c) a boa-fé(arts. 113, 187 e 422 do CC); d)os bons costumes (arts. 13 e 187do CC); e e) a expressãoatividade de risco, a gerar aresponsabilidade sem culpa ouobjetiva (art. 927, parágrafoúnico, do CC).

As cláusulas gerais têm umsentido dinâmico, o que asdiferencia dos conceitos legaisindeterminados, construçõesestáticas que constam da lei semdefinição. Desse modo, pode-seafirmar que, quando o aplicadordo direito cumpre a tarefa de dar

Page 73: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

sentido a um conceito legalindeterminado, passará ele aconstituir uma cláusula geral.Segue-se com tal premissa oposicionamento de Karl Engisch,para quem a cláusula geral não seconfunde com a ideia de conceitolegal indeterminado, eis que aprimeira “contrapõe a umaelaboração ‘casuística’ dashipóteses legais. ‘Casuística’ éaquela configuração da hipóteselegal (enquanto somatório dospressupostos que condicionam aestatuição) que circunscreveparticulares grupos de casos nasua especificidade própria”.10

Page 74: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

Consigne-se que muitas dascláusulas gerais são princípios,mas não necessariamente.Ilustrando, a função social docontrato é princípio contratual, aocontrário da cláusula geral deatividade de risco, que não éprincípio da responsabilidadecivil.

A adoção do sistema decláusulas gerais pelo CódigoCivil de 2002 tem relação diretacom a linha filosófica adotadapor Miguel Reale na vastidão desua obra. É notório que o juristacriou a sua própria teoria doconhecimento e da essência

Page 75: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

jurídica, a ontognoseologiajurídica, em que se busca o papeldo direito nos enfoques subjetivoe objetivo, baseando-se em duassubteorias: o culturalismojurídico e a teoriatridimensional do direito.11

De acordo com oculturalismo jurídico, existenteno plano subjetivo e inspirado notrabalho de Carlos Cossio, Realebusca o enfoque jurídico noaspecto subjetivo, do aplicadordo direito. Três palavrasorientarão a aplicação e asdecisões a serem tomadas:cultura, experiência e história,

Page 76: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

que devem ser entendidas tantodo ponto de vista do julgadorcomo do da sociedade, ou seja,do meio em que a decisão seráprolatada.

Pela teoria tridimensionaldo direito, presente no planoobjetivo e segundo Miguel Reale,direito é fato, valor e norma.Ensina o Mestre que a sua teoriatridimensional do direito e doEstado vem sendo concebidadesde 1940, distinguindo-se dasdemais teorias por ser “concretae dinâmica”, eis que “fato, valore norma estão sempre presentes ecorrelacionados em qualquer

Page 77: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

expressão da vida jurídica, sejaela estudada pelo filósofo ou pelosociólogo do direito, ou pelojurista como tal, ao passo que, natridimensionalidade genérica ouabstrata, caberia ao filósofoapenas o estudo do valor, aosociólogo de fato e ao jurista, anorma (tridimensionalidade comorequisito essencial do direito)”.12

Pela conjugação das duasconstruções, na análise dosinstitutos jurídicos presentes noCódigo Civil de 2002, muitosdeles abertos, genéricos eindeterminados, o jurista e omagistrado deverão fazer um

Page 78: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

mergulho profundo nos fatos quemargeiam a situação, para então,de acordo com os seus valores eos da sociedade – construídosapós anos de educação e deexperiências –, aplicar a normade acordo com os seus limites,procurando sempre interpretarsistematicamente a legislaçãoprivada. Fato, valor e normaserão imprescindíveis a apontar ocaminho seguido para a aplicaçãodo Direito. Dessa forma, dar-se-áo preenchimento das cláusulasgerais, das janelas abertas. Poresse processo, os conceitos legaisindeterminados ganham

Page 79: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

determinação jurídica, diante daatuação do magistrado, sempreguiado pela equidade.

Primeiro, o magistradojulgará de acordo com a suacultura, bem como do meiosocial. Isso porque os elementosculturais e valorativos domagistrado serão fundamentaispara o preenchimento dadiscricionariedade deixada pelanorma privada. Ganha destaque ovalor como elemento formador dodireito.

Segundo, tudo dependerá dahistória do processo e dosinstitutos jurídicos a ele

Page 80: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

relacionados, das partes queintegram a lide e também ahistória do próprio aplicador.Aqui, ganha relevo o fato, outroelemento do direito, segundo aconstrução de Reale.

Por fim, a experiência doaplicador do direito, que reúnefato e valor simbioticamente,visando à aplicação da norma.Esta, sim, elemento centraldaquilo que se denominaontognoseologia, a teoria doconhecimento, da essênciajurídica, criada por MiguelReale. Encaixa-se perfeitamente aproposta de Reale para que

Page 81: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

sejamos juristas – no ponto devista das normas –, sociólogos –diante da análise dos fatos – efilósofos – sob o prisma dosvalores.

Nunca é demais frisar que ascláusulas gerais que constam daatual codificação, seja elamaterial ou processual, a seremdelineadas pela jurisprudência epela comunidade jurídica, devemser baseadas nas experiênciaspessoais dos aplicadores e dosjulgadores, que também devemestar atualizados de acordo comos aspectos temporais, locais esubjetivos que envolvem a

Page 82: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

questão jurídica que lhes é levadapara apreciação. Ilustrando, oaplicador do direito deve estaratento à evolução tecnológica,para não tomar decisõestotalmente descabidas, como a dedeterminar o bloqueio de todos àInternet, visando proteger aimagem individual dedeterminada pessoa. A formaçãointerdisciplinar é primordial parao jurista do século XXI.

Certo é que essa linhafilosófica foi inserida no CódigoCivil, principalmente no capítuloque trata do Direito dasObrigações. Os desenhos a seguir

Page 83: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

demonstram muito bem aconfrontação entre o Código Civilde 1916, concebido à luz dateoria positivista de Hans Kelsen,e o Código Civil de 2002, sob ateoria tridimensional de MiguelReale:

Page 84: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

Como se nota, a visãokelseniana é de uma pirâmide denormas, um sistema fechado eestático. Assim era o civilista dageração anterior, moderno.Privilegiava-se o apego à

Page 85: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

literalidade fechada da normajurídica, prevalecendo a ideia deque a norma seria suficiente. Afrase-símbolo dessa concepçãolegalista era: o juiz é a boca dalei.

A visão realeana é de trêssubsistemas: dos fatos, dosvalores e das normas. O sistema éaberto e dinâmico, em constantesdiálogos. Assim é o civilista daatual geração, pós-moderno.Privilegia-se a ideia de interação,de visão unitária do sistema,prevalecendo a constatação deque, muitas vezes, a norma não ésuficiente. As cláusulas gerais

Page 86: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

são abertas e devem seranalisadas caso a caso. Frase-símbolo: direito é fato, valor enorma.

Acreditamos que o capítuloinaugural do Novo Código deProcesso Civil, recheado decláusulas gerais e conceitoslegais indeterminados, possibilitea mesma comparação, em que oCódigo de Processo Civil de1973 está para o Código Civil de1916, assim com o Código deProcesso Civil de 2015 está parao Código Civil de 2002,guardadas as devidas proporções.

Isso já pode ser percebido

Page 87: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

pelo artigo inaugural do NovoCódigo de Processo Civil, umdos mais debatidos preceitos nanovel norma instrumental, com aseguinte redação:

“Art. 1º O processo civil será ordenado,disciplinado e interpretado conforme osvalores e as normas fundamentaisestabelecidos na Constituição da RepúblicaFederativa do Brasil, observando-se asdisposições deste Código”.

Por esse preceito, todos osinstitutos processuais devem seranalisados de acordo com aConstituição Federal de 1988 eos direitos fundamentais nelasconsagrados. O comando segue a

Page 88: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

linha de constitucionalização dosramos jurídicos, como ocorreucom o Direito CivilConstitucional. Emerge, agoratextualmente, o DireitoProcessual Civil Constitucional.

A existência das grandesdicotomias em direito semprepermitiu uma sistematização doponto de vista da análise dopróprio âmbito jurídico,concebido, de forma analítica,como um conjunto de normas.Contudo, diante dasuperabundância dessas normas,uma organização teórica dodireito que assegure uma

Page 89: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

definição genérica e lógica dosassuntos jurídicos fica bastanteprejudicada, para não dizerinviabilizada. O “Big BangLegislativo” (explosão de leis),conforme simbologia criada porRicardo Lorenzetti, dificultou otrabalho do aplicador do direitona busca de uma sistematização.

Sabe-se que a diferenciaçãoentre Direito Público e DireitoPrivado não é apenas um métodode classificação, de ordenaçãodos critérios de distinção dostipos normativos, mas sim umpoderoso instrumento desistematização. Tal divisão

Page 90: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

remonta ao Digesto, 1.1.1.2, noCorpus Juris Civilis de Ulpiano,que dividiu o direito em juspublicum e jus privatum. Oscritérios utilizados nessadiferenciação se baseavam nautilidade da lei: se fosse deutilidade pública, tratar-se-ia deuma lei de Direito Público; sefosse de utilidade particular, seriauma lei de Direito Privado.

Esse critério de utilidadeestrita desde logo foi contestado,e chegou-se à conclusão de que,em verdade, o elemento paraclassificação da lei erafundamentado na utilidade

Page 91: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

preponderante da lei, uma vezque as utilidades de uma normanão ficam circunscritas a umúnico interesse, do Estado ou doparticular, mas acabam seentrelaçando, de modo que anorma de uma natureza exerceinfluência em outra de naturezadiversa.

Em princípio, o DireitoPúblico tem como finalidade aordem e a segurança geral, e oDireito Privado reger-se-ia pelaliberdade e pela igualdade.Enquanto no Direito Públicosomente seria válido aquilo queestá autorizado pela norma, no

Page 92: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

Direito Privado tudo aquilo quenão está proibido por ela seriaválido. No entanto, essadicotomia não é um obstáculointransponível e a divisão não éabsoluta.

A superação dessadicotomia, pelo menos em parte,é que fez surgirem as interaçõesentre o Direito Civil e o DireitoConstitucional, emergindo o quepara alguns representa uma novadisciplina ou o caminhometodológico, denominadoDireito Civil Constitucional, daqual este autor é adepto eentusiasta.13 A utilização da

Page 93: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

expressão Direito CivilConstitucional encontra raízes nadoutrina italiana de PietroPerlingieri.14 No início de suaobra, Perlingieri aponta que aConstituição funda o ordenamentojurídico, pois “O conjunto devalores, de bens, de interessesque o ordenamento jurídicoconsidera e privilegia, e mesmo asua hierarquia traduzem o tipo deordenamento com o qual se opera.Não existe, em abstrato, oordenamento jurídico, masexistem ordenamentos jurídicos,cada um dos quais caracterizadopor uma filosofia de vida, isto é,

Page 94: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

por valores e por princípiosfundamentais que constituem a suaestrutura qualificadora”.15

No Brasil, essa visão ganhouforça na escola carioca,capitaneada pelos professores daUniversidade do Estado do Riode Janeiro Gustavo Tepedino,Maria Celina Bodin de Moraes eHeloísa Helena Barboza. NoParaná, Luiz Edson Fachintambém faz escola com o ensinodo Direito Civil Constitucional,na Universidade Federal doParaná. No Nordeste é demencionar o trabalho de PauloLuiz Netto Lôbo, também adepto

Page 95: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

dessa visão de sistema. Em SãoPaulo, destacam-se os trabalhosde Renan Lotufo, na PUC/SP, e daprofessora Giselda MariaFernandes Novaes Hironaka,titular na USP. Na FaculdadeAutônoma de Direito (FADISP),onde lecionamos, uma das linhasde pesquisa do programa dedoutorado é aConstitucionalização dosInstitutos de Direito Privado. EmBrasília, na UNB, o professorFrederico Viegas de Limaigualmente se dedica aos estudosdas interações entre o DireitoCivil e a Constituição Federal de

Page 96: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

1988.Como antes exposto, o art.

1º do CPC/2015 parece inaugurarna lei instrumental o mesmocaminho, concebendo o DireitoProcessual Civil Constitucional.Como objeto do direito material,acreditamos que muitas premissasdo Direito Civil Constitucionalservem perfeitamente a essa novavisão do processo, na opiniãodeste autor.

O conceito de Direito CivilConstitucional, à primeira vista,poderia parecer um paradoxo.Mas não é. O direito é um sistemalógico de normas, valores e

Page 97: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

princípios que regem a vidasocial, que interagem entre si detal sorte que propicia segurança –em sentido lato – para os homense mulheres que compõem umasociedade.

O Direito CivilConstitucional, portanto, estábaseado em uma visão unitáriado ordenamento jurídico.16 Aotratar dos direitos fundamentais,José Joaquim Gomes Canotilhotambém fala em unidade da ordemjurídica, sustentando aviabilidade de uma interaçãoentre o Direito Privado e aConstituição, mesmo que em tom

Page 98: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

cético.17 Para Gustavo Tepedino,um dos principais idealizadoresdesse novo caminhometodológico no Brasil, é“imprescindível e urgente umareleitura do Código Civil e dasleis especiais à luz daConstituição”.18 Desse modo,“reconhecendo a existência dosmencionados universoslegislativos setoriais, é de sebuscar a unidade do sistema,deslocando para a tábuaaxiológica da Constituição daRepública o ponto de referênciaantes localizado no CódigoCivil”.19

Page 99: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

O Direito CivilConstitucional, como umamudança de postura, representauma atitude bem pensada, quetem contribuído para a evoluçãodo pensamento privado, para aevolução dos civilistascontemporâneos e para um sadiodiálogo entre os juristas das maisdiversas áreas. Essa inovaçãoreside no fato de que há umainversão da forma de interaçãodos dois ramos do direito – opúblico e o privado –,interpretando o Código Civilsegundo a Constituição Federalem substituição do que se

Page 100: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

costumava fazer, isto é,exatamente o inverso. Na mesmalinha, pelo mandamento constantedo art. 1º do Novo CPC, é sempreforçoso interpretar o Código deProcesso Civil também segundo oTexto Maior de 1988.

Os própriosconstitucionalistas reconhecem ofenômeno de interação entre oDireito Civil e o DireitoConstitucional como realidade doque se convém denominarneoconstitucionalismo, ou dainvasão da Constituição. E, porcerto, o movimento brasileiro éúnico, é autêntico. Ressalta

Page 101: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

Eduardo Ribeiro Moreira que“As outras inovações do direitocivil-constitucional têm de seresse ponto de encontro, osdireitos fundamentais nasrelações entre particulares,interação vital com atransposição e redução entre oespaço privado e o espaçopúblico, garantizador. Doispontos basilares do direito civil-constitucional que funcionam emprol da dignidade humana. Outroponto a ser destacado é que,apesar de partir do direito civilitaliano, o direito civil-constitucional brasileiro é uma

Page 102: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

expansão e produção autêntica”.20

O também constitucionalistaMinistro Luís Roberto Barrosoigualmente demonstrou todo o seuentusiasmo em relação à visãocivil-constitucional, tecendocomentários elogiosos.21

Deve ser feita a ressalva deque, por tal interação, o DireitoCivil não deixou de ser DireitoCivil; e o Direito Constitucionalainda é Direito Constitucional; oque também deve ocorrer com oprocesso civil brasileiro. Paranós, civilistas, especialmentepara a geração mais recente, oDireito Civil Constitucional nada

Page 103: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

mais é do que um novo caminhometodológico, que procuraanalisar os institutos privados apartir da Constituição Federal, e,eventualmente, os mecanismosconstitucionais a partir do CódigoCivil e da legislaçãoinfraconstitucional, em umaanálise em mão dupla. Éexatamente esse o sentido do art.1º do Novo Código de ProcessoCivil, agora para os institutosinstrumentais.

Pois bem, três são osprincípios básicos do DireitoCivil Constitucional, conformeas lições de Gustavo Tepedino, o

Page 104: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

que é fundamental para acompreensão da essência dessemarco teórico importante para acivilística contemporânea.22

Esses três princípios, na nossaopinião, igualmente podem edevem ser adaptados ao DireitoProcessual Civil Constitucional.

O primeiro deles, aquele quepretende a proteção da dignidadeda pessoa humana, estáestampado no art. 1º, inciso III,do Texto Maior, sendo avalorização da pessoa um dosobjetivos da RepúblicaFederativa do Brasil. Trata-se dosuperprincípio ou princípio dos

Page 105: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

princípios, como se afirma emsentido geral. A proteção dadignidade humana, a partir domodelo de Kant, constitui oprincipal fundamento dapersonalização do Direito Civil,da valorização da pessoa humanaem detrimento do patrimônio.Pontue-se, por oportuno, que adignidade humana passa a comporexpressamente outro dispositivodo Código de Processo Civil, oseu art. 8º, segundo o qual, aoaplicar o ordenamento jurídico, ojuiz atenderá aos fins sociais e àsexigências do bem comum,resguardando e promovendo a

Page 106: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

dignidade da pessoa humana eobservando a proporcionalidade,a razoabilidade, a legalidade, apublicidade e a eficiência.

O segundo princípio visa àsolidariedade social, outroobjetivo fundamental daRepública, conforme o art. 3º,inciso I, da CF/1988. Outrospreceitos da própria ConstituiçãoFederal trazem esse alcance,como no caso do seu art. 170,pelo qual: “a ordem econômica,fundada na valorização dotrabalho humano e na livre-iniciativa, tem por fim assegurar atodos existência digna, conforme

Page 107: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

os ditames da justiça social”.Aqui também reside o objetivosocial de erradicação da pobreza,do mesmo modo prevista naConstituição Federal de 1988(art. 3.º, III).

Por fim, o princípio daisonomia ou igualdade lato sensu,traduzido no art. 5º, caput, da LeiMaior, eis que “todos são iguaisperante a lei, sem distinção dequalquer natureza, garantindo-seaos brasileiros e aos estrangeirosresidentes no País ainviolabilidade do direito à vida,à liberdade, à igualdade, àsegurança e à propriedade”.

Page 108: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

Quanto a essa igualdade,princípio maior, pode ser amesma concebida pela seguinteexpressão, atribuída a Aristótelese Ruy Barbosa: A lei deve tratarde maneira igual os iguais, e demaneira desigual os desiguais.Do texto, nota-se na sua primeiraparte a consolidação do princípioda igualdade stricto sensu (a leideve tratar de maneira igual osiguais), enquanto a segunda traz oprincípio da especialidade (... ede maneira desigual osdesiguais). Essa é a essência daigualdade substancial.

No Código de Processo

Page 109: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

Civil de 2015, a paridade dearmas entre as partes acabaconcretizando essa isonomia,estabelecendo o seu novo art. 9ºque não se proferirá decisãocontra uma das partes sem que elaseja previamente ouvida, comoregra. Ademais, é assegurada àspartes paridade de tratamento emrelação ao exercício de direitos efaculdades processuais, aosmeios de defesa, aos ônus, aosdeveres e à aplicação de sançõesprocessuais, competindo ao juizzelar pelo efetivo contraditório(art. 7º do CPC/2015). Eis umaclara valorização do

Page 110: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

contraditório constitucional,igualmente especializando aigualdade substancial entre oscomponentes da demanda.

A propósito de tudo o quefoi exposto, em obra lançada em2014, Luiz Edson Fachindemonstra os grandes desafios doDireito Privado ContemporâneoBrasileiro, em constante interaçãocom a Constituição Federal.Apresenta que são tendênciasatuais do nosso Direito: “aincidência franca da Constituiçãonos diversos âmbitos dasrelações entre particulares,mormente nos contratos, nas

Page 111: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

propriedades e nas famílias, à luzde comandos inafastáveis deproteção à pessoa; há, nadaobstante, criativas tensões entre aaplicação de regras (e princípios)constitucionais e o ordenamentoprivado codificado; como há, sobo sistema constitucional,concepções filosóficas, o Estadoliberal patrocinou o agasalhoprivilegiado da racionalidadecodificadora das relaçõesinterprivadas; a ordem públicapode limitar a autonomia ou oautorregulamento dos interessesprivados, sob a vigilância dasgarantias fundamentais; os Código

Page 112: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

Civis são reinterpretados pelasConstituições do Estado Socialde Direito”.23 Além do direitomaterial, essa ingerênciaconstitucional passa a atingirtambém o Direito ProcessualCivil.

Um dos mecanismos paraefetivação dessaconstitucionalização dos institutoscivis, sejam materiais ouprocessuais, é eficáciahorizontal dos direitosfundamentais. Essahorizontalização nada mais é doque o reconhecimento daexistência e aplicação dos

Page 113: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

direitos que protegem a pessoahumana nas relações entreparticulares. Nesse sentido, pode-se dizer que as normasconstitucionais que asseguramtais direitos têm aplicaçãoimediata (eficácia horizontalimediata). Essa aplicaçãoimediata está justificada pelo teordo art. 5º, § 1º, da ConstituiçãoFederal de 1988, pelo qual: “Asnormas definidoras dos direitos egarantias fundamentais têmaplicação imediata”. Para DanielSarmento, grande entusiasta daeficácia horizontal dos direitosfundamentais, a referida

Page 114: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

aplicação “é indispensável nocontexto de uma sociedadedesigual, na qual a opressão podeprovir não apenas do Estado, masde uma multiplicidade de atoresprivados, presentes em esferascomo o mercado, a família, asociedade civil e a empresa”.24

Por certo é que essa eficáciahorizontal traz uma visualizaçãodiversificada da matéria, eis queas normas de proteção da pessoaprevistas na Constituição Federalsempre foram tidas comodirigidas ao legislador e aoEstado (normas programáticas).Essa concepção anterior não mais

Page 115: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

prevalece, o que faz com que aeficácia horizontal sejainteressante à prática, a tornarmais evidente e concreta aproteção da dignidade da pessoahumana e de outros valoresconstitucionais.

Do ponto de vista daterminologia, não mais sejustifica denominar a ConstituiçãoFederal de 1988 como uma CartaPolítica, fazendo crer que ela émais dirigida ao legislador, tendouma eficácia vertical. Melhordenominá-la, portanto, como umaCarta Fundamental, pelaprevalência de sua

Page 116: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

horizontalidade, ou seja, pela suasubsunção direta às relaçõesinterprivadas. Ilustre-se que adignidade humana é conceito quepode ser aplicado diretamente emuma relação entre empregador eempregado, entre marido emulher, entre companheiros, entrepais e filhos, entre contratantes eassim sucessivamente. Isso, sem anecessidade de qualquer ponteinfraconstitucional. A mesmaafirmação cabe para as açõesjudiciais com tais conteúdos,especialmente pelo que consta doart. 1º do Novo Código deProcesso Civil.

Page 117: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

Como exemplo de aplicaçãoda tese, pode ser citado acórdãodo Supremo Tribunal Federal emque foi adotada, no sentido deassegurar direito à ampla defesa aassociado excluído do quadro deuma pessoa jurídica (Informativon. 405 do STF). Não há a menordúvida de que o aresto traduzexemplo de constitucionalizaçãodo Processo Civil, pois foramvalores instrumentais e de cunhofundamental os reconhecidos pelojulgamento. Vejamos a suapublicação:

“A Turma, concluindo julgamento, negouprovimento a recurso extraordinário interposto

Page 118: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

contra acórdão do Tribunal de Justiça doEstado do Rio de Janeiro que mantiveradecisão que reintegrara associado excluído doquadro da sociedade civil União Brasileira deCompositores – UBC, sob o entendimento deque fora violado o seu direito de defesa, emvirtude de o mesmo não ter tido aoportunidade de refutar o ato que resultara nasua punição – v. Informativos ns. 351, 370e 385. Entendeu-se ser, na espécie, hipótesede aplicação direta dos direitos fundamentaisàs relações privadas. Ressaltou-se que, emrazão de a UBC integrar a estrutura doECAD – Escritório Central de Arrecadação eDistribuição, entidade de relevante papel noâmbito do sistema brasileiro de proteção aosdireitos autorais, seria incontroverso que, nocaso, ao restringir as possibilidades de defesado recorrido, a recorrente assumira posiçãoprivilegiada para determinar,preponderantemente, a extensão do gozo e dafruição dos direitos autorais de seu associado.

Page 119: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

Concluiu-se que as penalidades impostas pelarecorrente ao recorrido extrapolaram aliberdade do direito de associação e, emespecial, o de defesa, sendo imperiosa aobservância, em face das peculiaridades docaso, das garantias constitucionais do devidoprocesso legal, do contraditório e da ampladefesa. Vencidos a Min. Ellen Gracie,relatora, e o Min. Carlos Velloso, que davamprovimento ao recurso, por entender que aretirada de um sócio de entidade privada ésolucionada a partir das regras do estatutosocial e da legislação civil em vigor, sendoincabível a invocação do princípioconstitucional da ampla defesa” (STF, RE201.819/RJ, Rel. Min. Ellen Gracie, Rel. p/ oacórdão Min. Gilmar Mendes, j. 11.10.2005).

Interessante verificar que, dojulgado referido, relatado peloMinistro Gilmar Mendes, pode

Page 120: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

ser retirada outra grande lição, ade que “Um meio de irradiaçãodos direitos fundamentais para asrelações privadas seriam ascláusulas gerais (Generalklausel)que serviriam de ‘porta deentrada’ (Einbruchstelle) dosdireitos fundamentais no âmbitodo Direito Privado”. Trata-sedaquilo que se denomina eficáciahorizontal mediata, pois há umaponte infraconstitucional para asnormas constitucionais: ascláusulas gerais.

Trazendo outra aplicaçãodessa eficácia horizontal, valelembrar que a Emenda

Page 121: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

Constitucional 45 introduziu,entre os direitos fundamentais, arazoável duração do processo(art. 5º, inciso LXXVIII). Fez omesmo o Novo Código deProcesso Civil, por força do seuart. 4º, que tem a seguinteredação: “As partes têm o direitode obter em prazo razoável asolução integral do mérito,incluída a atividade satisfativa”.Muitas ementas do SuperiorTribunal de Justiça debatem esseimportante direito processual,especialmente os seus limites, oque deve ser aprofundado com aemergência do Novo Código de

Page 122: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

Processo Civil.Assim, por exemplo,

reconheceu o Tribunal daCidadania que “a ConstituiçãoFederal assegura, em seu art. 5º,inciso LXXVII, como direitofundamental, a razoável duraçãodo processo. Contudo, a alegaçãode excesso de prazo não podebasear-se em simples critérioaritmético, devendo a demora seranalisada em cotejo com asparticularidades e complexidadesde cada caso concreto, pautando-se sempre pelo critério darazoabilidade” (STJ, HC263.148/SP, Quinta Turma, Rel.

Page 123: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

Min. Marilza Maynard(desembargadora convocada doTJSE), j. 04.06.2013, DJe07.06.2013). Ou, ainda: “Aduração razoável dos processosfoi erigida como cláusula pétrea edireito fundamental pela EmendaConstitucional 45, de 2004, queacresceu ao art. 5º, o incisoLXXVIII, in verbis: ‘a todos, noâmbito judicial e administrativo,são assegurados a razoávelduração do processo e os meiosque garantam a celeridade de suatramitação’. A conclusão deprocesso administrativo em prazorazoável é corolário dos

Page 124: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

princípios da eficiência, damoralidade e da razoabilidade(Precedentes: MS 13.584/DF,Rel. Min. Jorge Mussi, TerceiraSeção, j. 13.05.2009, DJe26.06.2009; REsp 1091042/SC,Rel. Min. Eliana Calmon,Segunda Turma, j. 06.08.2009,DJe 21.08.2009; MS 13.545/DF,Rel. Min. Maria Thereza de AssisMoura, Terceira Seção, j.29.10.2008, DJe 07.11.2008;REsp 690.819/RS, Rel. Min. JoséDelgado, Primeira Turma, j.22.02.2005, DJ 19.12.2005)”(STJ, EDcl no AgRg no REsp1090242/SC, Primeira Turma,

Page 125: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

Rel. Min. Luiz Fux, j. 28.09.2010,DJe 08.10.2010).

Seguindo no estudo dessaconstitucionalização do processocivil brasileiro, outro mecanismoimportante para efetivá-la é aponderação de princípios,valores e normas, mecanismo quefoi adotado expressamente poroutro comando do Novo CPC. Aotratar dos elementos da sentença,estabelece o § 2º do art. 489 doEstatuto Processual emergente:“no caso de colisão entre normas,o juiz deve justificar o objeto e oscritérios gerais da ponderaçãoefetuada, enunciando as razões

Page 126: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

que autorizam a interferência nanorma afastada e as premissasfáticas que fundamentam aconclusão”.

Na opinião deste autor, erespeitando a posição emcontrário, a ponderação é ummecanismo argumentativo degrande relevo para a solução dasproblemáticas atuais maiscomplexas. Não restam dúvidasde que esse relevante artifício delógica jurídica é associado àvisão civil-constitucional dosistema, pois é a partir daConstituição Federal que sãoresolvidos problemas

Page 127: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

essencialmente privados.A sistematização da ideia de

pesagem remonta ao estudo deRobert Alexy, professor daUniversidade de Kiel, Alemanha,traduzido no Brasil por VirgílioAfonso da Silva, professor titularda Faculdade de Direito daUniversidade de São Paulo.25

Para o presente autor, parece queforam as lições do jurista tedescoque influenciaram a elaboraçãodo dispositivo inserido noCódigo de Processo Civil de2015.

Ao demonstrar a importância

Page 128: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

da construção da ponderação,Luís Roberto Barroso compara asubsunção – incidência direta danorma – a um quadro geométricocom três cores distintas e bemnítidas. A ponderação, nessamesma simbologia, será umapintura moderna, “com inúmerascores sobrepostas, algumas sedestacando mais do que as outras,mas formando uma unidadeestética”.26 Entretanto, o juristafaz um alerta: “Ah, sim: aponderação malfeita pode ser tãoruim quanto algumas peças dearte moderna”.27

Em sua obra, visando à

Page 129: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

ponderação, Alexy parte dealgumas premissas tidas comobásicas para que a pesagem ou osopesamento entre os princípiosseja possível, e que, repise-se,parecem ter sido adotadas pelaNova Norma InstrumentalBrasileira.

Como primeira premissa, odoutrinador alemão traz oentendimento de que os direitosfundamentais têm, na maioria dasvezes, a estrutura de princípios,sendo mandamentos deotimização “caracterizados porpoderem ser satisfeitos em grausvariados e pelo fato de que a

Page 130: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

medida devida de sua satisfaçãonão depende somente daspossibilidades fáticas, mastambém das possibilidadesjurídicas”.28

Em seguida, como segundapremissa, é reconhecido que, emum sistema em que há ocomprometimento com valoresconstitucionais, pode serfrequente a ocorrência decolisões entre os princípios, oque, invariavelmente, acarretarárestrições recíprocas entre osvalores tutelados. Consigne-seque, de acordo com o juristagermânico, a colisão entre regras

Page 131: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

e princípios é distinta, uma vezque, no primeiro caso, uma dasregras deve ser retiradaobrigatoriamente do sistema, oque não ocorre no segundo.29 Porisso, nas últimas hipóteses pode-se falar em relativização deprincípios ou mesmo em direitosfundamentais, uma vez queprincípios com peso maiordevem prevalecer sobreprincípios com peso menor.

Presente o conflito entreprincípios, sem que qualquer umdeles seja retirado do sistema,como terceira premissa, oaplicador do Direito deve fazer

Page 132: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

uso da técnica de ponderação.Em tal sopesamento, na presençada lei de colisão, os princípiossão numerados por P1 e P2; Csão as condições de procedênciade um princípio sobre o outro,enquanto T1, T2, T3 são osfatores fáticos que influenciam acolisão e a conclusão.30 Aaplicação da ponderação nadamais é do que a solução do casoconcreto de acordo com amáxima da proporcionalidade.31

Encerrando, a quarta eúltima premissa é a de que apesagem deve ser fundamentada,calcada em uma argumentação

Page 133: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

jurídica com solidez eobjetividade, para não serarbitrária e irracional. Para tanto,deve ser bem clara e definida afundamentação de enunciados depreferências em relação adeterminado valorconstitucional.32

Para explicar a ponderação,Alexy relata o caso Lebach. Aemissora alemã ZDF tinha aintenção de exibir documentáriointitulado O assassinato desoldados em Lebach, que contavaa história do assassinato dequatro soldados alemães quefaziam sentinela em um depósito,

Page 134: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

o que culminou com o roubo demunição do exército alemão,incidente ocorrido em 1969. Umdos condenados pelo crimeestava prestes a ser solto àsvésperas da veiculação doprograma televisivo, no qual eracitado nominalmente. Então, eleingressou com medida cautelarpara que o programa não fosseexibido, pois haveria uma claraafronta ao seu direito fundamentalà imagem. O Tribunal Estadual naAlemanha rejeitou o pedido doautor da demanda para a nãoexibição do documentário, o quefoi confirmado pelo Tribunal

Page 135: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

Superior Estadual, diante daliberdade de informar e dointeresse coletivo quanto aoconteúdo do documentário.33

A questão chegou até aSuprema Corte alemã, que aresolveu a partir da ponderaçãode princípios constitucionais. Aargumentação do julgamento foidividida em três etapas, as quaissão dispostas a seguir.

Na primeira delas, foidemonstrada a colisão entre odireito à imagem ou àpersonalidade (P1) e a liberdadede informar (P2), dois valores

Page 136: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

constitucionalmente tutelados e demesmo nível. A prevalência deP1 levaria à proibição doprograma, enquanto a prevalênciade P2, à sua exibição. Na segundaetapa, o julgamento concluiinicialmente pela prevalência deP2 sobre P1, em uma relação deprocedência, diante dosinteresses coletivos à solução decrimes. Contudo, na terceiraetapa, há a conclusão pelaprevalência de P1, no sentido deque o documentário não deveriaser exibido. Dois fatores fáticossubstanciais acabaram porinfluenciar o sopesamento: a) não

Page 137: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

haveria mais um interesse atualpela notícia do crime; b) haveriaum risco para a ressocializaçãodo autor da demanda.34

No Brasil, ponderaçãosimilar como a descrita no casoLebach foi realizada peloTribunal de Justiça de São Paulo,em caso que envolvia aapresentadora de televisãoDaniella Cicarelli, que foiflagrada em relações íntimas como namorado em uma praia daEspanha, tendo as imagensreproduzidas no YouTube, siteespecializado em vídeos mantidopela Google. O Tribunal, em

Page 138: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

demanda inibitória de tutela dapersonalidade proposta porambos, acabou concluindo pelanão exibição das imagens, deforma definitiva. Vejamos aementa desse paradigmáticojulgamento:

“Ação inibitória fundada em violação dodireito à imagem, privacidade e intimidade depessoas fotografadas e filmadas em posiçõesamorosas em areia e mar espanhóis – Esferaíntima que goza de proteção absoluta, aindaque um dos personagens tenha algumanotoriedade, por não se tolerar invasão deintimidades [cenas de sexo] de artista ouapresentadora de TV – Inexistência deinteresse público para se manter a ofensa aosdireitos individuais fundamentais (arts. 1º, IIIe 5º, V e X, da CF) – Manutenção da tutela

Page 139: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

antecipada expedida no Agravo deInstrumento 472.738-4 e confirmada nojulgamento do Agravo de Instrumento488.184-4/3 – Provimento para fazer cessar adivulgação dos filmes e fotografias emwebsites, por não ter ocorrido consentimentopara a publicação – Interpretação dos arts.461 do CPC e 12 e 21 do CC, preservada amulta diária de R$ 250.000,00, para inibirtransgressão ao comando de abstenção”(TJSP, Apelação Cível 556.090.4/4-00/SP,Quarta Câmara de Direito Privado, Rel. EnioZuliani, j. 12.06.2008, Data de Registro:17.07.2008).

Obviamente, outrasquestões, inclusive aquelasrelacionadas às reparações dosdanos, ainda estão sendodiscutidas judicialmente. Asituação fática do caso coloca em

Page 140: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

xeque o tão criticado art. 20 doCódigo Civil, dispositivo esteque não pode deixar de lado osvalores constitucionais, caso dodireito à informação e à liberdadede imprensa.35 A redação dessepolêmico dispositivo material é aseguinte: “Salvo se autorizadas,ou se necessárias à administraçãoda justiça ou à manutenção daordem pública, a divulgação deescritos, a transmissão dapalavra, ou a publicação, aexposição ou a utilização daimagem de uma pessoa poderãoser proibidas, a seu requerimentoe sem prejuízo da indenização

Page 141: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

que couber, se lhe atingirem ahonra, a boa fama ou arespeitabilidade, ou se sedestinarem a fins comerciais.Parágrafo único. Em se tratandode morto ou de ausente, sãopartes legítimas para requereressa proteção o cônjuge, osascendentes ou os descendentes”.

Como se percebe, o art. 20do CC/2002 traz apenas duasexceções expressas para autilização da imagem alheia, semautorização: a) quando a pessoaou o fato interessar àadministração da justiça, como nocaso de solução de crimes; b)

Page 142: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

quando a pessoa ou o fatointeressar à ordem pública,expressão genérica e aberta quemerece preenchimento casuístico.

Ora, como salienta a atentadoutrina, deve-se fazer a devidaponderação dos valores em jogo,não se olvidando da função socialdo uso de imagem, ou seja, o fatode que a informação pode ter umafinalidade coletiva. A propósito,tentando iluminar as trevasrelativas à tutela da imagem, naIV Jornada de Direito Civil doConselho da Justiça Federal e doSuperior Tribunal de Justiça foiaprovado o Enunciado n. 279,

Page 143: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

com a seguinte redação: “Art. 20.A proteção à imagem deve serponderada com outros interessesconstitucionalmente tutelados,especialmente em face do direitode amplo acesso à informação eda liberdade de imprensa. Emcaso de colisão, levar-se-á emconta a notoriedade do retratado edos fatos abordados, bem como averacidade destes e, ainda, ascaracterísticas de sua utilização(comercial, informativa,biográfica), privilegiando-semedidas que não restrinjam adivulgação de informações”. Valelembrar que os enunciados

Page 144: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

aprovados nas Jornadas deDireito Civil constituem hoje aprincipal ponte de diálogo entre adoutrina e a jurisprudência, noâmbito do direito material.

A ponderação não é simplese demanda a análise de várioscritérios, dependendo dascircunstâncias fáticas e dosdireitos e normas envolvidos,como realmente deve ser. Váriosjulgados superiores enfrentamesse problema de ponderar atutela da imagem e daintimidade x o direito àliberdade de imprensa e àinformação. Ao presente autor

Page 145: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

parece não existir um caminhopara encontrar a solução melhorem tais dilemas, que não seja aponderação.

Para ilustrar, em umprimeiro aresto, concluiu oSuperior Tribunal de Justiça, emdecisão publicada no seuInformativo n. 396, que “há, naquestão, um conflito de direitosconstitucionalmente assegurados.A Constituição Federal assegura atodos a liberdade de pensamento(art. 5º, IV), bem como a livremanifestação desse pensamento(art. 5º, IX) e o acesso àinformação (art. 5º, XIV). Esses

Page 146: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

direitos salvaguardam a atividadeda recorrente. No entanto, sãoinvocados pelo recorrido osdireitos à reputação, à honra e àimagem, assim como o direito àindenização pelos danos morais emateriais que lhe sejam causados(art. 5º, X). Para a solução doconflito, cabe ao legislador e aoaplicador da lei buscar o pontode equilíbrio no qual os doisprincípios mencionados possamconviver, exercendo verdadeirafunção harmonizadora. (...) Nahipótese, constata-se que areportagem da recorrente, parasustentar essa sua afirmação,

Page 147: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

trouxe ao ar elementosimportantes, como o depoimentode fontes fidedignas, a saber: aprova testemunhal de quem foi àautoridade policial formalizarnotícia-crime e a opinião de umprocurador da República.Ademais, os autos revelam que opróprio repórter fez-se passar poragente interessado nos benefíciosda atividade ilícita, obtendogravações que efetivamentedemonstravam a existência deengenho fraudatório. Não setratava, portanto, de um mexerico,fofoca ou boato que,negligentemente, divulgava-se em

Page 148: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

cadeia nacional. Acresça-se aisso que o próprio recorridorevela que uma de suas empresasfoi objeto de busca e apreensão.Ao público, foram dadas as duasversões do fato: a do acusador e ado suspeito. Os elementos quecercaram a reportagem tambémmostravam que havia fatos aserem investigados. O processode divulgação de informaçõessatisfaz o verdadeiro interessepúblico, devendo ser célere eeficaz, razão pela qual não secoaduna com rigorismos própriosde um procedimento judicial.Desse modo, vê-se claramente

Page 149: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

que a recorrente atuou com adiligência devida, nãoextrapolando os limites impostosà liberdade de informação. Asuspeita que recaía sobre orecorrido, por mais dolorosa quelhe seja, de fato, existia e era, àépoca, fidedigna. Se hoje já nãopesam sobre o recorrido essassuspeitas, isso não faz com que opassado altere-se. Pensar demodo contrário seria imporindenização a todo veículo deimprensa que divulgueinvestigação ou ação penal que,ao final, mostre-se improcedente.Por esses motivos, deve-se

Page 150: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

concluir que a conduta darecorrente foi lícita, havendoviolação dos arts. 186 e 927 doCC/2002. (...)” (STJ, REsp984.803/ES, Rel. Min. NancyAndrighi, j. 26.05.2009).

Mais recentemente, e combase na doutrina de AndersonSchreiber,36 o mesmo SuperiorTribunal de Justiça aduziu oscritérios que devem ser levadosem conta para a corretaponderação nos casos envolvendoa imprensa e a divulgação deinformações: “O Min. Relator,com base na doutrina, consignouque, para verificação da

Page 151: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

gravidade do dano sofrido pelapessoa cuja imagem é utilizadasem autorização prévia, devemser analisados: (i) o grau deconsciência do retratado emrelação à possibilidade decaptação da sua imagem nocontexto da imagem do qual foiextraída; (ii) o grau deidentificação do retratado naimagem veiculada; (iii) aamplitude da exposição doretratado; e (iv) a natureza e ograu de repercussão do meio peloqual se dá a divulgação. De outraparte, o direito de informar deveser garantido, observando os

Page 152: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

seguintes parâmetros: (i) o graude utilidade para o público dofato informado por meio daimagem; (ii) o grau de atualidadeda imagem; (iii) o grau denecessidade da veiculação daimagem para informar o fato; e(iv) o grau de preservação docontexto originário do qual aimagem foi colhida” (REsp794.586/RJ, Rel. Min. RaulAraújo, j. 15.03.2012,Informativo n. 493 do STJ).

A propósito desse problemae de outros que podem surgir,tem-se colocado em xeque aincidência do art. 20 do Código

Page 153: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

Civil, pois o conteúdo da normatem implicado verdadeiracensura, notadamente de obrasbiográficas de figuras históricas eque despertam o interessecoletivo.

Nessa realidade, foiproposta uma ação direta deinconstitucionalidade perante oSupremo Tribunal Federal contrao referido dispositivo, pelaAssociação Nacional dosEditores de Livros (ADIn 4.815,intentada em julho de 2012). Opedido da ação é no sentido deser reconhecida ainconstitucionalidade parcial dos

Page 154: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

arts. 20 e 21 do CC/2002, semredução de texto, “para que,mediante interpretação conformea Constituição, seja afastada doordenamento jurídico brasileiro anecessidade do consentimento dapessoa biografada e, a fortiori,das pessoas retratadas comocoadjuvantes (ou de seusfamiliares, em caso de pessoasfalecidas) para a publicação ouveiculação de obras biográficas,literárias ou audiovisuais,elaboradas a respeito de pessoaspúblicas ou envolvidas emacontecimentos de interessecoletivo”. A petição inicial é

Page 155: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

acompanhada de parecer muitobem construído pelo professorGustavo Tepedino.

Em sentido próximo, aComissão de Constituição eJustiça da Câmara dos Deputadosaprovou, em maio de 2013, otexto do Projeto de Lei 393/2011.A proposição tende a acrescentaroutro parágrafo ao art. 20 doCC/2002, dispondo que “a meraausência de autorização nãoimpede a divulgação de imagens,escritos e informações comfinalidade biográfica de pessoacuja trajetória pessoal, artísticaou profissional tenha dimensão

Page 156: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

pública ou esteja inserida emacontecimentos de interesse dacoletividade”. Filia-se em parte àtranscrita proposta, para que acensura de biografias sejadefinitivamente afastada darealidade nacional.

No tocante àresponsabilidade civil, aponderação também serve parasolucionar a hipótese fáticaenvolvendo o paciente médicobaleado e que se nega àintervenção cirúrgica porconvicções religiosas. A questãocoloca em jogo, de um lado, odireito à vida (art. 1º, inciso III,

Page 157: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

da CF/1988) e, de outro, o direitoàs convicções religiosas, dianteda proteção da liberdade decrença prevista no Texto Maior(art. 5º, inciso VI). Conformealguns julgados, de corretaponderação, deve prevalecer oprimeiro sobre o segundo, com arejeição da demandaindenizatória proposta pelopaciente que sobreviveu graçasao médico que o salvou e aohospital. Concluindo por essecaminho, no sentido de queproteção da vida prevalece sobreas convicções religiosas:

Page 158: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

“Indenizatória. Reparação de danos.Testemunha de Jeová. Recebimento detransfusão de sangue quando de suainternação. Convicções religiosas que nãopodem prevalecer perante o bem maiortutelado pela Constituição Federal que é avida. Conduta dos médicos, por outro lado,que se pautou dentro da Lei e éticaprofissional, posto que somente efetuaram astransfusões sanguíneas após esgotados todosos tratamentos alternativos. Inexistência,ademais, de recusa expressa a recebertransfusão de sangue quando da internaçãoda autora. Ressarcimento, por outro lado, dedespesas efetuadas com exames médicos,entre outras, que não merece acolhido, postonão terem sido os valores despendidos pelaapelante. Recurso não provido” (TJSP,Acórdão 123.430-4/Sorocaba, TerceiraCâmara de Direito Privado, Rel. Des. FlavioPinheiro, j. 07.05.2002).

Page 159: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

De qualquer maneira, aquestão não é pacífica, eis quealguns doutrinadores concluem demaneira diversa pela prevalênciadas convicções religiosas. Nessalinha, entende AndersonSchreiber que é “intolerável,portanto, que uma Testemunha deJeová seja compelida, contra asua livre manifestação devontade, a receber transfusão desangue, com base na pretensasuperioridade do direito à vidasobre a liberdade de crença.Note-se que a priorização da vidarepresenta, ela própria, uma‘crença’, apenas que da parte do

Page 160: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

médico, guiado, em sua conduta,por um entendimento que nãoderiva das normas jurídicas, masdas suas próprias convicçõescientíficas e filosóficas. (...). Avontade do paciente deve serrespeitada, porque assimdetermina a tutela da dignidadehumana, valor fundamental doordenamento jurídicobrasileiro”.37

Também adotando oentendimento pela prevalência davontade do paciente porconvicções religiosas, na VJornada de Direito Civil foiaprovado o seguinte enunciado

Page 161: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

doutrinário (Enunciado n. 403):“O direito à inviolabilidade deconsciência e de crença, previstono art. 5º, VI da ConstituiçãoFederal, aplica-se também àpessoa que se nega a tratamentomédico, inclusive transfusão desangue, com ou sem risco demorte, em razão do tratamento ouda falta dele, desde queobservados os seguintes critérios:a) capacidade civil plena,excluído o suprimento pelorepresentante ou assistente; b)manifestação de vontade livre,consciente e informada; e c)oposição que diga respeito

Page 162: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

exclusivamente à própria pessoado declarante”.

Com o devido respeito, nãose filia ao entendimento doenunciado doutrinário, pois asconvicções religiosasmanifestadas pela autonomiaprivada não podem prevalecersobre a vida e a integridadefísica.

Em síntese, no que concerneao tema, a ideia de ponderação,pesagem ou sopesamento érelevante para questões queenvolvem direitos no âmbitoprivado. Anote-se que algumascodificações materiais privadas

Page 163: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

optaram por preverexpressamente a possibilidade decolisão de direitos, como o fez oCódigo Civil Português, em seuart. 335º. De acordo com essecomando legal, havendo colisãoentre direitos iguais ou da mesmaespécie, devem os titulares ceder,na medida do necessário, paraque todos os direitos produzam,igualmente, os seus efeitos, semmaior detrimento para qualqueruma das partes. Caso sejam osdireitos desiguais ou de espéciediferente, deve prevalecer oconsiderado hierarquicamentesuperior. Seguiu o mesmo

Page 164: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

caminho o Novo Código deProcesso Civil Brasil, o que farácom que o artifício sejaincrementado nos próximos anos.

Alerte-se, contudo, que atécnica da ponderação é criticadapor alguns juristas, caso de LênioLuiz Streck, conforme suascolunas publicadas noinformativo Consultor Jurídico.Em um de seus mais destacadostextos, argumenta o respeitadojurista: “surpreende, portanto, queo novo CPC incorpore algo quenão deu certo. Pior: não satisfeitoem falar da ponderação, foi maislonge na tropelia epistêmica: fala

Page 165: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

em colisão entre normas (seriaum abalroamento hermenêutico?)o que vai trazer maioresproblemas ainda, pela simplesrazão de que, na linguagemjurídica, regras e princípios são...normas. E são. Já ninguém duvidadisso. Logo, o que vai haver de‘ponderação de regras’ não temlimite. Ou seja, sem exageros,penso que o legislador cometeuum equívoco. Ou as tais ‘normas-que-entram-em-colisão’ seriam ostais ‘postulados’, ‘metanormas’pelas quais se faz qualquer coisacom o direito? Isso tem nome:risco de estado de natureza

Page 166: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

hermenêutico, eis o espectro queronda, no mau sentido, o direitobrasileiro”.38 E arremata,propondo o veto ao comando pelaPresidente da República, o quenão ocorreu: “quem disse que aponderação (seja lá o que olegislador quis dizer com essaexpressão) é necessária? Porexemplo, é possível demonstrarque essa história de colisão nãopassa de um álibi retórico paraexercer a escolha arbitrária.Posso demonstrar que onde se dizexistir uma ‘tal’ colisão, naverdade o que existe é apenas umartifício para exercitar uma ‘livre

Page 167: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

escolha’. Jusfilósofos como JuanGarcia Amado ironizam essa‘manobra pseudoargumentativa’que é lançar mão da ponderação.O caso Elwanger é um bomexemplo, em que nada havia a‘ponderar’ (o melhor texto sobreisso é de Marcelo Cattoni):bastava aplicar a lei que diziaque racismo é crime hediondo.Na verdade, posso demonstrarque o argumento da ‘colisão’sempre chega atrasado.Sempre”.39

Na opinião do presenteautor, a crítica não se sustenta.Começando pelo final do texto de

Page 168: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

Lênio Streck, a ponderação é simnecessária para resolver os casosde difícil solução, como os queaqui foram mencionados. Comosolucionar o dilema entre aliberdade de imprensa e aimagem? Aplicando pura esimplesmente o art. 20 do CódigoCivil? Ora, isso conduziria àcensura, a uma soluçãoinconstitucional.

Em reforço, não acreditamosque a ponderação é um ato delivre escolha. Essa é a máponderação, conforme o alerta doMinistro Luís Roberto Barroso,aqui antes exposto. Nos termos do

Page 169: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

que consta do Novo CPC,seguindo as lições de Alexy, aboa ponderação sempre deve serfundamentada e utilizada emcasos excepcionais, quando a leinão traz a correta solução.

Por fim, o aumento de poderde julgador nos parece saudável.Isso tem sido incrementado pelaslegislações contemporâneas nãosó no Brasil, como na Europa,baseado em conceitos abertos,conceitos legais indeterminados ecláusulas gerais. O próprioCódigo de Processo Civil de2015 confirma essa tendência. Olegislador reconhece que não

Page 170: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

pode prever tudo, resolver tudo, eatribui um pouco de seu poder aojulgador. Qual sistema jurídicoseria melhor do que esse? Aquelepautado na estrita legalidade?Ora, o legalismo não vingou, estásuperado. É o momento abrir ossistemas jurídicos. Por que nãoconfiar nos julgadores, deixandoa fé somente no legislador?

Feitas tais consideraçõessobre a constitucionalização doDireito Processual Civil,interessante pontuar que o NovoCodex valoriza sobremaneira aboa-fé, aliás, outra cláusula gerala ser preenchida de acordo com

Page 171: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

as circunstâncias do casoconcreto, na linha do sistemaaberto outrora adotado peloCódigo Civil Brasileiro de 2002.

Conforme o art. 5º do NovoCPC, aquele que de qualquerforma participa do processo devecomportar-se segundo a boa-fé.Além disso, todos os sujeitos doprocesso devem cooperar entre sipara que se obtenha, em temporazoável, decisão de mérito justae efetiva (art. 6º do CPC/2015).O pedido formulado pela parte nademanda deve ser certo einterpretado conforme o conjuntoda postulação e a boa-fé (art. 322

Page 172: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

do CPC/2015). Comoconsequência, a decisão judicialtambém passa a ser interpretadapartir da conjugação de todos osseus elementos e emconformidade com o princípio daboa-fé (art. 489, § 3º, doCPC/2015). Esses preceitosampliaram um tratamento que eratímido no CPC anterior, limitadosomente à exigência da boa-fé daspartes no seu art. 14.

Como é notório, uma dasmais festejadas mudançasintroduzidas pelo Código Civil de2002 referiu-se justamente àprevisão expressa do princípio da

Page 173: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

boa-fé contratual, que nãoconstava da codificação materialde 1916. Como se sabe, a boa-fé,anteriormente, somente erarelacionada com a intenção dosujeito de direito, estudadaquando da análise dos institutospossessórios, por exemplo. Nesseponto era conceituada como boa-fé subjetiva, eis que mantinharelação direta com aquele queignorava um vício relacionadocom uma pessoa, bem ou negócio.

No entanto, desde osprimórdios do Direito Romano, jáse cogitava outra boa-fé, aqueladirecionada à conduta das partes,

Page 174: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

principalmente nas relaçõesnegociais e contratuais. Com osurgimento do jusnaturalismo, aboa-fé ganhou, no DireitoComparado, uma nova faceta,ligada à conduta dos negociantese denominada boa-fé objetiva. Dasubjetivação saltou-se para aobjetivação, o que é consolidadopelas codificações privadaseuropeias. Com essa evolução,alguns códigos da era modernafazem menção a esse traço daboa-fé, caso do Código CivilPortuguês de 1966, do CódigoCivil Italiano de 1942 e do BGBAlemão, normas que serviram

Page 175: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

como marco teórico para oCódigo Civil Brasileiro de 2002.

Nosso atual Código Civil,ao seguir essa tendência, adotou adimensão concreta da boa-fé,como havia feito o Código deDefesa do Consumidor em seuart. 4º, III, dentre outroscomandos, segundo o qual “aPolítica Nacional das Relaçõesde Consumo tem por objetivo oatendimento das necessidades dosconsumidores, o respeito à suadignidade, saúde e segurança, aproteção de seus interesseseconômicos, a melhoria da suaqualidade de vida, bem como a

Page 176: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

transparência e harmonia dasrelações de consumo, atendidosos seguintes princípios: (...) III –harmonização dos interesses dosparticipantes das relações deconsumo e compatibilização daproteção do consumidor com anecessidade de desenvolvimentoeconômico e tecnológico, demodo a viabilizar os princípiosnos quais se funda a ordemeconômica (art. 170, daConstituição Federal), semprecom base na boa-fé e equilíbrionas relações entre consumidorese fornecedores” (destacado).Quanto a essa confrontação

Page 177: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

necessária entre o Código Civil eo Código do Consumidor, prevê oEnunciado n. 27 CJF/STJ que:“Na interpretação da cláusulageral da boa-fé, deve-se levar emconta o sistema do Código Civil eas conexões sistemáticas comoutros estatutos normativos efatores metajurídicos”. Um dessesestatutos normativos é justamentea Lei 8.078/1990, ou seja, deveser preservado o tratamento dadoà boa-fé objetiva pelo CDC.

Outro estatuto normativo aser considerado passa a ser oNovo CPC, com a menção à boa-fé em vários de seus comandos.

Page 178: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

Como bem expõe Fredie DidierJr. a respeito da boa-féprocessual, ainda em comentáriosao Código de Processo Civil de1973:

“Trata-se de uma cláusula geral processual. Aopção por uma cláusula geral de boa-fé é amais correta. É que a infinidade de situaçõesque podem surgir ao longo do processo tornapouco eficaz qualquer enumeração legalexaustiva das hipóteses de comportamentodesleal. Daí ser correta a opção da legislaçãobrasileira por uma norma geral que impõe ocomportamento de acordo com a boa-fé. Emverdade, não seria necessária qualquerenumeração das condutas desleais: o inciso IIdo art. 14 do CPC é bastante, exatamente portratar-se de uma cláusula geral. Não se podeconfundir o princípio (norma) da boa-fé com aexigência de boa-fé (elemento subjetivo) para

Page 179: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

a configuração de alguns atos ilícitosprocessuais, como o manifesto propósitoprotelatório, apto a permitir a antecipação dosefeitos da tutela prevista no inciso II do art.273 do CPC. A boa-fé subjetiva é elementodo suporte fático de alguns fatos jurídicos; éfato, portanto. A boa-fé objetiva é uma normade conduta: impõe e proíbe condutas, além decriar situações jurídicas ativas e passivas.Não existe princípio da boa-fé subjetiva. Oinciso II do art. 14 do CPC brasileiro não estárelacionado à boa-fé subjetiva, à intenção dosujeito do processo: trata-se de norma queimpõe condutas em conformidade com a boa-fé objetivamente considerada,independentemente da existência de boas oumás intenções. Uma das situações jurídicascriadas a partir do princípio da boa-fé objetivaé o dever de cooperação entre os sujeitos doprocesso. A importância deste dever é,atualmente, tão grande, que convém separar oseu estudo, dando-lhe um item próprio, que é

Page 180: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

o seguinte: o princípio da cooperação. Aconsagração do princípio da boa-féprocessual foi resultado de uma expansão daexigência de boa-fé do direito privado aodireito público. A jurisprudência alemãentendeu aplicável o § 242 do Código Civilalemão (cláusula geral de boa-fé) também aodireito processual civil e penal. De um modogeral, a doutrina seguiu o mesmo caminho.Na verdade, a boa-fé objetiva expandiu-separa todos os ramos do Direito, mesmo osnão civis”.40

Na mesma linha, merecemespecial destaque as palavras deOvídio Baptista, igualmente emcomentários ao Código deProcesso Civil de 1973, nosseguintes dizeres: “O preceitocontido no art. 14 do CPC é uma

Page 181: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

manifestação do princípio geralda boa-fé objetiva, de que já sedisse constituir, mais do que umprincípio, o verdadeiro oxigêniosem o qual a vida do Direitoseria impossível” (destacamos).41

De fato, sem a boa-fé o Direitocomo um todo – e isso inclui oprocessual – não poderia sequerrespirar, devendo as partes agircom máxima probidade, dentrodas esperáveis regras do jogo.

Tornou-se comum afirmarque a boa-fé objetiva,conceituada como exigência deconduta leal dos participantes darelação jurídica, está relacionada

Page 182: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

com os deveres anexos oulaterais de conduta, que sãoínsitos a qualquer negóciojurídico, não havendo sequer anecessidade de previsão noinstrumento negocial.42 Sãoconsiderados deveres anexos,entre outros: a) dever de cuidadoem relação à outra parte negocial;b) dever de respeito; c) dever deinformar a outra parte sobre oconteúdo do negócio; d) dever deagir conforme a confiançadepositada; e) dever de lealdadee probidade; f) dever decolaboração ou cooperação, quepassa a estar expresso no âmbito

Page 183: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

do processo, pela cooperaçãoprocessual prevista no art. 6º doNovo CPC; g) dever de agir comhonestidade; h) dever de agirconforme a razoabilidade, aequidade e a boa razão.

A quebra desses deveresanexos gera a violação positivado contrato, comresponsabilização civil objetivadaquele que desrespeita a boa-féobjetiva, conforme expressa oEnunciado n. 24 do CJF/STJ,aprovado na I Jornada de DireitoCivil. Essa responsabilização,independentemente de culpa, estáamparada igualmente pelo teor do

Page 184: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

Enunciado n. 363 do CJF/STJ, daIV Jornada de Direito Civil,segundo o qual: “Os princípios daprobidade e da confiança são deordem pública, sendo obrigaçãoda parte lesada apenasdemonstrar a existência daviolação”. O grande mérito doúltimo enunciado, de autoria doprofessor Wanderlei de PaulaBarreto, é a previsão de que aboa-fé objetiva é preceito deordem pública, o que pode trazerclaras consequências para oprocesso civil, como o seuconhecimento de ofício e aintervenção do Ministério

Page 185: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

Público.Em complemento, para o

âmbito do processo civil, aviolação dos deveres anexosprocessuais passa a gerar, alémda imposição das penalidades porlitigância de má-fé, umaresponsabilização objetiva ousem culpa pelos danosprocessuais ou materiaiscausados. Essa é uma tese quesurge com a previsão expressa daboa-fé no Estatuto Processual eque será debatida profundamentenos próximos anos.

Além da relação com essesdeveres anexos, decorrentes de

Page 186: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

construção doutrinária, valerelembrar que o Código Civil de2002, em três dos seusdispositivos, apresenta trêsfunções importantes da boa-féobjetiva. Vejamos a confrontaçãodessas funções com o que estáprevisto no Código de ProcessoCivil de 2015.

A primeira função da boa-féé a de interpretação, retirada doart. 113 do CC/2002, eis que osnegócios jurídicos devem serinterpretados conforme a boa-fé eos usos do lugar da suacelebração. Nesse dispositivo, aboa-fé é consagrada como meio

Page 187: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

auxiliador do aplicador do direitopara a interpretação dosnegócios, da maneira maisfavorável a quem esteja de boa-fé. No Código de Processo Civil,a boa-fé passa a ser norteinterpretativo, do pedido (art.322) e da sentença (art. 489).Ademais, conforme está expostono próximo capítulo deste livro, aboa-fé objetiva servirá comoleme para os negócios jurídicosprocessuais, pela incidência dateoria geral do negócio jurídicopara esses atos.

A segunda função da boa-féobjetiva é a de controle,

Page 188: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

constante do art. 187 do CódigoCivil, uma vez que aquele quecontraria a boa-fé objetivacomete abuso de direito. Nostermos desse preceito material,“Também comete ato ilícito otitular de um direito que, aoexercê-lo, excede manifestamenteos limites impostos pelo seu fimeconômico ou social, pela boa-féou pelos bons costumes”. Ospróprios civilistas sempreapontavam que o abuso noprocesso seria um de seusexemplos típicos. Conforme seextrai da obra de Sílvio de SalvoVenosa, “no direito processual, o

Page 189: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

abuso de direito caracteriza-sepela lide temerária, trazendo oCPC, nos arts. 14 e 16, descriçãopormenorizada da faltaprocessual”.43 No mesmo sentido,as lições de Maria Helena Diniz:“Se o litigante ou exequente(CPC, art. 598), em processo deconhecimento ou de execução,formular pretensões, oferecerdefesas ciente de que sãodestituídas de fundamento,praticar atos probatóriosdesnecessários à defesa dodireito, alterar intencionalmente averdade dos fatos, omitir fatosessenciais ao julgamento da

Page 190: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

causa, enfim, se se apresentaremtodas as situações de má-féarroladas no Código de ProcessoCivil, art. 17, estará agindoabusivamente e deverá responderpor perdas e danos, indenizando aparte contrária dos prejuízosadvindos do processo e de suaconduta dolosa”.44

Ainda para ilustrar comooutra hipótese de abuso noprocesso, pode ser citado orecente tema do assédio judicial,presente quando alguém queexerce alguma forma de liderançainstiga os liderados apromoverem demandas

Page 191: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

descabidas contra determinadapessoa. O caso, sem dúvidas, éde abuso de direito processual,devendo ser resolvido pelaresponsabilidade civil, com aimputação do dever de indenizar.Como se concluiu na V Jornadade Direito Civil, o abuso dedireito tem fundamentoconstitucional nos princípios dasolidariedade, devido processolegal e proteção da confiança,aplicando-se a todos os ramos dodireito (Enunciado n. 414 doConselho da Justiça Federal e doSuperior Tribunal de Justiça).

Como complemento a essas

Page 192: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

concretizações da jurisprudênciasuperior, concluiu o SuperiorTribunal de Justiça que “oadvogado que ajuizou ação deexecução de honorários desucumbência não só contra asociedade limitada queexclusivamente constava comosucumbente no título judicial, mastambém, sem qualquerjustificativa, contra seus sóciosdirigentes, os quais tiveramvalores de sua conta bancáriabloqueados sem aplicação dateoria da desconsideração dapersonalidade jurídica, deve aossócios indenização pelos danos

Page 193: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

materiais e morais que sofreram.Com efeito, a lei não faculta aoexequente escolher quem sesujeitará à ação executiva,independentemente de quem sejao devedor vinculado ao títuloexecutivo” (STJ, REsp1.245.712/MT, Rel. Min. JoãoOtávio de Noronha, j.11.03.2014, Informativo n. 539).

Acrescente-se, na linha deoutro caminho exposto parachegar à mesma conclusão, que,segundo o Enunciado n. 37 doCJF/STJ, aprovado na I Jornadade Direito Civil, aresponsabilidade civil que

Page 194: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

decorre do abuso de direito éobjetiva, isto é, não depende deculpa, uma vez que o art. 187 doCódigo Civil adotou o critérioobjetivo-finalístico. Essa é aposição majoritária, em largaescala, da doutrina nacional,contando com o apoio desteautor.45

Desse modo, percebe-se quea quebra ou desrespeito à boa-féobjetiva conduz ao caminho semvolta da responsabilidadeindependentemente de culpa, sejapelo Enunciado n. 24 ou peloEnunciado n. 37, ambos da IJornada de Direito Civil. A

Page 195: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

premissa vale, reafirme-se, parao campo do direito processualcivil, pela inclusão da boa-féobjetiva nos artigos antes citados.

A terceira e última funçãoda boa-fé objetiva é a deintegração, extraída do art. 422do Código Civil, segundo o qual:“Os contratantes são obrigados aguardar, assim na conclusão docontrato, como em sua execução,os princípios de probidade e boa-fé”. Relativamente à aplicação daboa-fé em todas as fasesnegociais, foram aprovados doisenunciados doutrinários peloConselho da Justiça Federal e

Page 196: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

pelo Superior Tribunal de Justiça.De acordo com o Enunciado n. 25do CJF/STJ, da I Jornada, “o art.422 do Código Civil nãoinviabiliza a aplicação pelojulgador do princípio da boa-fénas fases pré-contratual e pós-contratual”. Nos termos doEnunciado n. 170 da III Jornada,“A boa-fé objetiva deve serobservada pelas partes na fase denegociações preliminares e apósa execução do contrato, quandotal exigência decorrer da naturezado contrato”. Apesar deparecidos, os enunciados têmconteúdos diversos, pois o

Page 197: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

primeiro é dirigido ao juiz, aoaplicador da norma no casoconcreto, e o segundo, às partesdo negócio jurídico.

Adaptando essa últimafunção ao direito processual,podemos afirmar que a boa-féobjetiva deve ser observadapelas partes e pelo juiz em todasas fases do processo, desde a fasede conhecimento e chegando àfase de cumprimento de sentença.Também deve incidir nas fasesprévias ao processo, como ocorreno caso dos procedimentosadministrativos e de negociaçãoprévias quanto à instauração de

Page 198: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

uma arbitragem. Ainda, a boa-féobjetiva é corolário da condutadas partes após o processojudicial. Desse modo, não poderáuma parte de uma demandaimpugnar os procedimentos dosquais participou ativamente e semqualquer insurgência. No queconcerne aos chamados negóciosjurídicos processuais, estudadosno próximo capítulo, igualmente aboa-fé objetiva deve permeartodas as suas fases, inclusive asua fase de negociaçõespreliminares.

Quanto a essa funçãointegrativa da boa-fé, é preciso

Page 199: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

estudar os conceitos parcelaresda boa-fé objetiva, advindos doDireito Comparado e retirados daobra do jurista lusitano AntonioManuel da Rocha e MenezesCordeiro, quais sejam asupressio, a surrectio, a máximatu quoque, a exceptio doli, e ovenire contra factum propriumnon potest.46 Há ainda o duty tomitigate the loss, extraídadoutrinariamente do Enunciado n.169 CJF/STJ, aprovado na IIIJornada de Direito Civil.Vejamos a aplicação dessesconceitos para o campoprocessual, o que concretiza a

Page 200: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

boa-fé prevista no Novo Códigode Processo Civil.

A supressio, no alemãoVerwirkung, significa asupressão, por renúncia tácita, deum direito ou de uma posiçãojurídica, pelo seu não exercíciocom o passar dos tempos. Nodireito material, o seu sentidopode ser notado pela leitura doart. 330 do Código Civil queadota o conceito, eis que “opagamento reiteradamente feitoem outro local faz presumirrenúncia do credor relativamenteao previsto no contrato”.Ilustrando, caso tenha sido

Page 201: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

previsto no instrumentoobrigacional o benefício daobrigação portável ou portable –cujo pagamento deve ser efetuadono domicílio do credor –, e tendoo devedor o costume de pagar noseu próprio domicílio e de formareiterada, sem qualquermanifestação do credor, aobrigação passará a serconsiderada quesível ou quérable– aquela cujo pagamento deveocorrer no domicílio do devedor.

Ao mesmo tempo em que ocredor perde um direito por essasupressão, surge um direito afavor do devedor, por meio da

Page 202: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

surrectio (Erwirkung), direitoeste que não existia juridicamenteaté então, mas que decorre daefetividade social, de acordo comos costumes. Em outras palavras,enquanto a supressio constitui aperda de um direito ou de umaposição jurídica pelo seu nãoexercício no tempo, a surrectio éo surgimento de um direito diantede práticas, usos e costumes.Ambos os conceitos podem serretirados do art. 330 do CC/2002,constituindo duas faces damesma moeda, conforme afirmaJosé Fernando Simão.47

Partindo para as

Page 203: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

concretizações, a jurisprudênciado Tribunal de Justiça de MinasGerais por bem aplicou os doisconceitos à questão locatícia, oque gerou a alteração no valor doaluguel:

“Direito civil. Locação residencial. Situaçãojurídica continuada ao arrepio do contrato.Aluguel. Cláusula de preço. Fenômeno dasurrectio a garantir seja mantido a ajustetacitamente convencionado. A situação criadaao arrepio de cláusula contratual livrementeconvencionada pela qual a locadora aceita,por certo lapso de tempo, aluguel a preçoinferior àquele expressamente ajustado, cria,à luz do Direito Civil moderno, novo direitosubjetivo, a estabilizar a situação de fato jáconsolidada, em prestígio ao Princípio da Boa-Fé contratual” (TJMG, Acórdão

Page 204: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

1.0024.03.163299-5/001, Belo Horizonte-MG,Décima Sexta Câmara Cível, Rel. Des.Mauro Soares de Freitas, j. 07.03.2007, v.u.).

O julgado é paradigmático,representando forte mitigação daforça obrigatória do contrato, emprol da boa-fé objetiva, daatuação concreta das partes.

Ainda exemplificando, oSuperior Tribunal de Justiça fezincidir ambas as construções emcontrato de locação de veículos,valorizando as condutas daspartes envolvidas. A ementa édidática e explicativa:

“Direito civil. Contrato de locação de veículos

Page 205: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

por prazo determinado. Notificação, pelalocatária, de que não terá interesse narenovação do contrato, meses antes dotérmino do prazo contratual. Devoluçãoapenas parcial dos veículos após o final doprazo, sem oposição expressa da locadora.Continuidade da emissão de faturas, pelacredora, no preço contratualmenteestabelecido. Pretensão da locadora dereceber as diferenças entre a tarifacontratada e a tarifa de balcão para a locaçãodos automóveis que permaneceram na posseda locatária. Impossibilidade. Aplicação doprincípio da boa-fé objetiva. (...). Anotificação a que se refere o art. 1.196 doCC/2002 (art. 575 do CC/2002) não tem afunção de constituir o locatário em mora,tendo em vista o que dispõe o art. 1.194 doCC/1916 (art. 573 do CC/2002). Ela objetiva,em vez disso, a: (I) que não há a intenção dolocador de permitir a prorrogação tácita docontrato por prazo indeterminado (art. 1.195do CC/1916 – art. 574 do CC/2002); (II) fixar

Page 206: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

a sanção patrimonial decorrente da retençãodo bem locado. Na hipótese em que o própriolocatário notifica o locador de que não serárenovado o contrato, a primeira função já seencontra preenchida: não é necessário aolocador repetir sua intenção de não prorrogaro contrato se o próprio locatário já o fez. Asegunda função, por sua vez, pode seconsiderar também preenchida pelo fato deque é presumível a ciência, por parte dolocatário, do valor das diárias dos automóveispela tarifa de balcão. Haveria, portanto, emprincípio, direito em favor da locadora àcobrança de tarifa adicional. – Se o acórdãorecorrido estabelece, contudo, que não houvequalquer manifestação do credor no sentidoda sua intenção de exercer tal direito e, maisque isso, o credor comporta-se de maneiracontraditória, emitindo faturas no valororiginal, cria-se, para o devedor, a expectativada manutenção do preço contratualmenteestabelecido. – O princípio da boa-fé objetivaexerce três funções: (I) a de regra de

Page 207: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

interpretação; (II) a de fonte de direitos e dedeveres jurídicos; e (III) a de limite aoexercício de direitos subjetivos. Pertencem aeste terceiro grupo a teoria do adimplementosubstancial das obrigações e a teoria dos atospróprios (‘tu quoque’; vedação aocomportamento contraditório; ‘surrectio’;‘supressio’). – O instituto da ‘supressio’indica a possibilidade de se considerarsuprimida uma obrigação contratual, nahipótese em que o não exercício do direitocorrespondente, pelo credor, gere no devedora justa expectativa de que esse não exercíciose prorrogará no tempo. (...)” (STJ, REsp953.389/SP, Terceira Turma, Rel. Min. FátimaNancy Andrighi, j. 23.02.2010, DJE11.05.2010).

Seguindo quanto àsilustrações, o Superior Tribunalde Justiça aplicou a supressio

Page 208: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

para hipótese de cobrança decorreção monetária em contratode mandato judicial, concluindoque o seu não exercício emmomento oportuno gerariarenúncia tácita em relação aosvalores. Vejamos a publicação noInformativo n. 478 daquela CorteSuperior:

“Correção monetária. Renúncia. O recorrentefirmou com a recorrida o contrato deprestação de serviços jurídicos com aprevisão de correção monetária anual.Sucede que, durante os seis anos de validadedo contrato, o recorrente não buscou reajustaros valores, o que só foi perseguido medianteação de cobrança após a rescisão contratual.Contudo, emerge dos autos não se tratar desimples renúncia ao direito à correção

Page 209: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

monetária (que tem natureza disponível), pois,ao final, o recorrente, movido por algo alémda liberalidade, visou à própria manutenção docontrato. Dessarte, o princípio da boa-féobjetiva torna inviável a pretensão de exigirretroativamente a correção monetária dosvalores que era regularmente dispensada,pleito que, se acolhido, frustraria umaexpectativa legítima construída e mantida aolongo de toda a relação processual, daí sereconhecer presente o instituto da supressio”(STJ, REsp 1.202.514/RS, Rel. Min. NancyAndrighi, j. 21.06.2011).

Nesse aresto já pode serpercebida a boa-fé objetivaincidindo no campo processual,pois houve limitação no direitode demandar, diante de umarenúncia tácita do credor,

Page 210: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

derivada de seu comportamento.O mesmo pode ser dito

quanto aos vários acórdãos queaplicam o dueto supressio esurrectio para ações dealimentos, o que demonstra que aboa-fé objetiva é princípio não sódo Direito Contratual, mastambém do Direito de Família.48

De início, do Tribunal deJustiça de São Paulo, concluiu-sepelo afastamento da pretensão dealimentos de esposa separada defato, diante de “inércia da autorapor aproximadamente seis anos,no exercício do direito de

Page 211: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

pretender alimentos, o queacarretou verdadeira supressio.Autora, ademais, que admitehaver sido auxiliada, nesteperíodo, por sua filha. Ausênciade demonstração do binômionecessidade/possibilidade”(TJSP, Apelação 0004121-24.2008.8.26.0024, Acórdão6030240, Andradina, SétimaCâmara de Direito Privado, Rel.Des. Ramon Mateo Júnior, j.04.07.2012, DJESP 30.07.2012).

Do Tribunal Gaúcho, semprepioneiro, podem ser extraídas asseguintes ementas, com granderelevância prática, e que, na

Page 212: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

opinião deste autor, igualmenteconcretizam a supressio nocampo processual:

“Agravo de instrumento. Execução dealimentos. Prisão. Rito. Art. 733. Ausência derelação obrigacional pelo comportamentocontinuado no tempo. Criação de direitosubjetivo que contraria frontalmente a regrada boa-fé objetiva. Supressio. Em atenção àboa-fé objetiva, o credor de alimentos que nãorecebeu nada do devedor por mais de 12 anospermitiu com sua conduta a criação de umalegítima expectativa no devedor e naefetividade social de que não haveria maispagamento e cobrança. A inércia do credorem exercer seu direito subjetivo de créditopor tão longo tempo, e a consequenteexpectativa que esse comportamento gera nodevedor, em interpretação conforme a boa-féobjetiva, leva ao desaparecimento do direito,

Page 213: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

com base no instituto da supressio.Precedentes doutrinários e jurisprudenciais.No caso, o filho deixou de exercer seu direitoa alimentos, por mais de 12 anos, admitindosua representante legal que a paternidade eauxílio econômico ao filho eram exercidospelo seu novo esposo. Caso em que se mostrailegal o Decreto prisional com base naquelevetusto título alimentar. Deram provimento.Unânime” (TJRS, Agravo de Instrumento156211-74.2011.8.21.7000, Canoas, OitavaCâmara Cível, Rel. Des. Rui Portanova, j.18.08.2011, DJERS 24.08.2011).

“Apelação cível. Embargos à execução dealimentos. Ausência de relação obrigacionalpelo comportamento continuado no tempo.Criação de direito subjetivo que contrariafrontalmente a regra da boa-fé objetiva.Supressio. Extinção material do vínculo demútua assistência. Os atos e negóciosjurídicos devem ser efetivados e interpretados

Page 214: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

conforme a boa-fé objetiva, e tambémencontram limitação nela, se a contrariarem.Inteligência dos artigos 113, 187 e 422 doCódigo Civil. Em atenção à boa-fé objetiva, ocredor de alimentos que não recebeu nada dodevedor por mais de 20 anos permitiu comsua conduta a criação de uma legítimaexpectativa – no devedor e na efetividadesocial – de que não haveria mais pagamento ecobrança. A inércia do credor em exercer seudireito subjetivo de crédito por tão longotempo, e a consequente expectativa que essecomportamento gera no devedor, eminterpretação conforme a boa-fé objetiva, levaao desaparecimento do direito, com base noinstituto da supressio. Precedentesdoutrinários e jurisprudenciais. No caso, aexequente/embargada – por longos 24 anos –não recebeu alimentos do seu falecido pai esequer buscou cobrar o débito. Caso em quedeve ser mantida a sentença que extinguiu aexecução, em razão da perda da eficácia do

Page 215: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

título de alimentos executado. Negaramprovimento” (TJRS, Apelação Cível70033073628, São Leopoldo, Oitava CâmaraCível, Rel. Des. Rui Portanova, j. 03.12.2009,DJERS 11.12.2009, p. 85).

O último julgado tem omérito de demonstrar as trêsfunções da boa-fé objetiva,relacionando-as aos institutosfamiliares e aos processuais. Detoda sorte, pode surgir oargumento de que os alimentosenvolvem ordem pública,devendo prevalecer sobre a boa-fé objetiva. Em verdade,conforme outrora demonstrado, aboa-fé objetiva também é

Page 216: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

princípio de ordem pública(Enunciado n. 363 da IV Jornadade Direito Civil), concluindo osjulgadores por sua prevalêncianos casos expostos.

O segundo conceito parcelara ser exposto é a máxima tuquoque, significando que umaparte que violou uma normajurídica não poderá, sem acaracterização do abuso dedireito, aproveitar-se dessasituação anteriormente criadapelo desrespeito. Conformelembra Ronnie Preuss Duarte, “alocução designa a situação deabuso que se verifica quando um

Page 217: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

sujeito viola uma norma jurídicae, posteriormente, tenta tirarproveito da situação em benefíciopróprio”.49

Desse modo, está vedadoque alguém faça contra o outro oque não faria contra si mesmo(regra de ouro), conforme ensinaCláudio Luiz Bueno de Godoy.50

Relata o professor daUniversidade de São Paulo que“Pelo ‘tu quoque’, expressão cujaorigem, como lembra FernandoNoronha, está no grito de dor deJúlio César, ao perceber que seufilho adotivo Bruto estava entreos que atentavam contra sua vida

Page 218: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

(‘Tu quoque, filli’? Ou ‘Tuquoque, Brute, fili mi’?), evita-seque uma pessoa que viole umanorma jurídica possa exercerdireito dessa mesma normainferido ou, especialmente, quepossa recorrer, em defesa, anormas que ela própria violou.Trata-se da regra de tradiçãoética que, verdadeiramente, obstaque se faça com outrem o que nãose quer seja feito consigomesmo”.51

A título de exemplo, darecente jurisprudência paulista,pode ser extraída interessanteementa, aplicando a máxima para

Page 219: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

negócio jurídico de transmissãode cotas sociais:

“Embargos à execução. Título executivoextrajudicial. Cheque oriundo de negóciojurídico de cessão de cotas sociais. Alegaçãode vício no negócio. Impossibilidade da parteinvocar proteção por regra contratual quehavia infringido ou, ao menos, colaboradopara infringir (tu quoque). Nãodemonstração de induzimento em erro acercada estimativa de faturamento. Embargosjulgados improcedentes. Sentença mantida.Apelação não provida” (TJSP, Apelação7161983-5, Acórdão 3583050, Osasco,Décima Terceira Câmara de Direito Privado,Rel. Des. Luís Eduardo Scarabelli, j.27.03.2009, DJESP 12.05.2009).

Ainda como hipótese deconcretude do conceito parcelar,

Page 220: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

a jurisprudência de Minas Gerais,em situação envolvendocompromisso de compra e vendade imóvel, entendeu que “ocontratante não pode deixar decumprir o contrato, com base naexceção do contrato nãocumprido (exceptio nonadimpleti contractus), se dácausa ao inadimplemento da partecontrária. Inteligência doprincípio da boa-fé objetiva, nadimensão do tu quoque” (TJMG,Agravo de Instrumento1.0024.09.732895-9/0011, BeloHorizonte, Décima SegundaCâmara Cível, Rel. Des. José

Page 221: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

Flávio de Almeida, j. 07.04.2010,DJEMG 03.05.2010).

Podem ser encontradosjulgados estaduais querelacionam a máxima em estudo àboa-fé processual. Nessecaminho, inicialmente, do mesmoTribunal Mineiro: “atrasoprocessual por falha da serventiajudicial configura meroaborrecimento, verificado nosdias atuais, no mais das vezes,devido ao assoberbamento doPoder Judiciário. Ausente danomoral quando deste atraso não severificam maioresdesdobramentos capazes de

Page 222: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

causar constrangimento,sofrimento e abalo à paz íntimado indivíduo. Pelo princípio daboa-fé processual, ao qual devemestar atentos os litigantes, évedado ao autor beneficiar-se daprópria torpeza (tu quoque)”(TJMG, Apelação Cível1.0056.09.213159-0/001, Rel.Des. Marcelo Rodrigues, j.05.11.2014, DJEMG21.11.2014). Em complemento,do Tribunal de Justiça Alagoasdeduziu-se que:

“Alegação de omissão em acórdão. Falta demanifestação acerca da necessidade deintervenção do Ministério Público no feito.

Page 223: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

Matéria de ordem pública. Possibilidade deconhecimento de ofício. Omissãoreconhecida. Nulidade alegada por quem lhedeu causa. CPC, arts. 243 e 84 do CPC.Violação da boa-fé processual: tu quoque evenire contra factum propium. Ausência dedemonstração de prejuízo para o incapaz”(TJAL, Embargos de Declaração 0701772-40.2011.8.02.0001, Primeira Câmara Cível,Rel. Des. Tutmés Airan de AlbuquerqueMelo, DJAL 15.01.2015, p. 135).

A tendência é que julgadoscomo esses surjam com maisintensidade no futuro, pelainserção da boa-fé objetiva noNovo Código de Processo Civil.

Ainda sobre a tu quoque, épossível estabelecer uma relação

Page 224: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

com os comportamentos delitigância de má-fé que sãovedados pelo Estatuto Processual,causadores de dano processual.Não houve uma ampliação dascondutas proibidas, mas sim dassanções impostas, como se podeperceber do seguinte estudoconfrontado das duas normasprocessuais, com alteraçõesdestacadas:

Novo Códigode Processo

Civil

Código deProcesso

Civil Antigo

Page 225: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

“Art. 79.Responde porperdas e danosaquele quelitigar de má-fécomo autor, réuouinterveniente.”

“Art. 16.Responde porperdas e danosaquele quepleitear de má-fé como autor,réu ouinterveniente.”

“Art. 80.Considera-selitigante de má-fé aquele que:

“Art. 17.Reputa-selitigante de má-fé aquele que:(Redação dadapela Lei nº6.771, de27.3.1980)

Page 226: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

I – deduzirpretensão oudefesa contratexto expressode lei ou fatoincontroverso;

I – deduzirpretensão oudefesa contratexto expressode lei ou fatoincontroverso;(Redação dadapela Lei nº6.771, de27.3.1980)

II – alterar averdade dosfatos;

II – alterar averdade dosfatos;(Redação dadapela Lei nº6.771, de27.3.1980)

Page 227: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

III – usar doprocesso paraconseguirobjetivo ilegal;

III – usar doprocesso paraconseguirobjetivo ilegal;(Redação dadapela Lei nº6.771, de27.3.1980)

IV – opuserresistênciainjustificada aoandamento doprocesso;

IV – opuserresistênciainjustificada aoandamento doprocesso;(Redação dadapela Lei nº6.771, de27.3.1980)

Page 228: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

V – procederde modotemerário emqualquerincidente ou atodo processo;

V – procederde modotemerário emqualquerincidente ou atodo processo;(Redação dadapela Lei nº6.771, de27.3.1980)

VI – provocarincidentemanifestamenteinfundado;

VI – provocarincidentesmanifestamenteinfundados.(Redação dadapela Lei nº6.771, de

Page 229: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

27.3.1980)

VII –interpuserrecurso comintuitomanifestamenteprotelatório.”

VII –interpuserrecurso comintuitomanifestamenteprotelatório.(Incluído pelaLei nº 9.668, de23.6.1998)”.

“Art. 81. Deofício ou arequerimento, ojuiz condenaráo litigante demá-fé a pagar

“Art. 18. O juizou tribunal, deofício ou arequerimento,condenará olitigante de má-fé a pagar

Page 230: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

multa, quedeverá sersuperior a umpor cento einferior a dezpor cento dovalor corrigidoda causa, aindenizar aparte contráriapelos prejuízosque esta sofreue a arcar comos honoráriosadvocatícios ecom todas asdespesas queefetuou.

multa nãoexcedente a umpor cento sobreo valor dacausa e aindenizar aparte contráriados prejuízosque esta sofreu,mais oshonoráriosadvocatícios etodas asdespesas queefetuou.(Redação dadapela Lei nº9.668, de23.6.1998)

§ 1º Quando

§ 1º Quando

Page 231: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

forem 2 (dois)ou mais oslitigantes demá-fé, o juizcondenará cadaum naproporção deseu respectivointeresse nacausa ousolidariamenteaqueles que secoligaram paralesar a partecontrária.

forem dois oumais oslitigantes demá-fé, o juizcondenará cadaum naproporção doseu respectivointeresse nacausa, ousolidariamenteaqueles que secoligaram paralesar a partecontrária.

§ 2º Quandoo valor dacausa forirrisório ouinestimável, a

Page 232: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

multa poderáser fixada ematé 10 (dez)vezes o valordo saláriomínimo.

§ 3º O valordaindenizaçãoserá fixadopelo juiz ou,caso não sejapossívelmensurá-lo,liquidado porarbitramentoou peloprocedimentocomum, nospróprios

§ 2º O valor daindenizaçãoserá desde logofixado pelo juiz,em quantia nãosuperior a 20%(vinte porcento) sobre ovalor da causa,ou liquidado porarbitramento.(Redação dadapela Lei nº8.952, de

Page 233: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

autos.” 13.12.1994).”

Como se pode perceber, aprincipal mudança foi a retiradade um limite para a pena delitigância de má-fé, adotando-seum modelo aberto, a serpreenchido pelo juiz caso a caso,na linha filosófica aqui antesexposta.

Seguindo no estudo dosconceitos parcelares, a exceptiodoli é definida como a defesa doréu contra ações dolosas,contrárias à boa-fé. Aqui a boa-féobjetiva é utilizada como defesa,

Page 234: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

tendo uma importante funçãoreativa, conforme ensina JoséFernando Simão.52

A exceção mais conhecidano Direito Civil Brasileiro éaquela constante no art. 476 doCódigo Civil, a exceptio nonadimpleti contractus, pela qualninguém pode exigir que umaparte cumpra com a suaobrigação, se primeiro nãocumprir com a própria. A essaconclusão chega Cristiano deSouza Zanetti.53 O jovem juristada Universidade de São Pauloaponta que a exceptio doli podeser considerada presente em

Page 235: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

outros dispositivos do atualCódigo Civil brasileiro, comonos arts. 175, 190, 273, 274, 281,294, 302, 837, 906, 915 e 916.Em relação ao art. 274 doCC/2002, como se verá em tópicopróprio, foi ele alterado peloNovo Código de Processo Civil,com a finalidade de lhe dar umsentido correto.

Para ilustrar, aplicando aexceptio, extrai-se de interessantejulgado assim publicado noInformativo n. 430 do SuperiorTribunal de Justiça:

“Exceção. Contrato não cumprido. Tratou-se

Page 236: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

de ação ajuizada pelos recorridos quebuscavam a rescisão do contrato de compra evenda de uma sociedade empresária e dosdireitos referentes à marca e patente de umsistema de localização, bloqueio ecomunicação veicular mediante uso deaparelho celular, diante de defeitos no projetodo referido sistema que se estenderam aofuncionamento do produto. Nessa hipótese,conforme precedentes, a falta da préviainterpelação (arts. 397, parágrafo único, e473, ambos do CC/2002) impõe oreconhecimento da impossibilidade jurídica dopedido, pois não há como considerá-la supridapela citação para a ação resolutória. Contudo,consta da sentença que os recorrentes jáestavam cientes de sua inadimplência mesmoantes do ajuizamento da ação e, por suainércia, não restou aos recorridos outraalternativa senão a via judicial. Alegam osrecorrentes que não poderiam os recorridosexigir o implemento das obrigaçõescontratuais se eles mesmos não cumpriram

Page 237: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

com as suas (pagar determinadas dívidas dasociedade). Porém, segundo a doutrina, aexceção de contrato não cumprido somentepode ser oposta quando a lei ou o contratonão especificar a quem primeiro cabe cumprira obrigação. Assim, estabelecido em queordem deve dar-se o adimplemento, ocontratante que primeiro deve cumprir suasobrigações não pode recusar-se aofundamento de que o outro não satisfará aque lhe cabe, mas o que detém a prerrogativade por último realizar a obrigação pode simpostergá-la, enquanto não vir cumprida aobrigação imposta ao outro, tal como se deuno caso. Anote-se que se deve guardar certaproporcionalidade entre a recusa de cumprir aobrigação de um e a inadimplência do outro,pois não se fala em exceção de contrato nãocumprido quando o descumprimento é mínimoe parcial. Os recorrentes também aduzemque, diante do amplo objeto do contrato, queenvolveria outros produtos além do sistema delocalização, não haveria como rescindi-lo

Page 238: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

totalmente (art. 184 do CC/2002). Porém,constatado que o negócio tem caráter unitário,que as partes só o celebrariam se ele fosseválido em seu conjunto, sem possibilidade dedivisão ou fracionamento, a invalidade é total,não se cogitando de redução. O princípio daconservação dos negócios jurídicos não podeinterferir na vontade das partes quanto àprópria existência da transação. Já quanto àalegação de violação da cláusula geral daboa-fé contratual, arquétipo social que impõeo poder-dever de cada um ajustar suaconduta a esse modelo, ao agir tal qual umapessoa honesta, escorreita e leal, vê-se que osrecorridos assim agiram, tanto que buscaram,por várias vezes, solução que possibilitasse apreservação do negócio, o que esbarroumesmo na intransigência dos recorrentes dese recusar a rever o projeto com o fim desanar as falhas; isso obrigou os recorridos asuspender o cumprimento das obrigaçõescontratuais e a buscar a rescisão doinstrumento. Precedentes citados: REsp

Page 239: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

159.661/MS, DJ 14.02.2000; REsp176.435/SP, DJ 09.08.1999; REsp734.520/MG, DJ 15.10.2007; REsp68.476/RS, DJ 11.11.1996; REsp 35.898/RJ,DJ 22.11.1993; REsp 130.012/DF, DJ1.º.02.1999, e REsp 783.404/GO, DJ13.08.2007” (STJ, REsp 981.750/MG, Rel.Min. Nancy Andrighi, j. 13.04.2010).

No âmbito processual, umaexceção sempre utilizada naprática é a de pré-executividade,criação doutrinária ejurisprudencial que acabou pornão ser tratada pelo Novo Códigode Processo Civil. Todavia,mesmo diante desse silêncio, a

Page 240: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

este autor parece ser a medidaainda cabível, quando o títuloexecutivo atinja matéria de ordempública, que não necessita deprova para afastar a suaexigibilidade.

Podem ser encontradosmuitos arestos estaduais queanalisam essa exceção a partir daboa-fé processual. A ilustrar:“Não configura litigância de má-fé (art. 18 do CPC) ou atoatentatório à dignidade da justiça(arts. 600 e 601 do CPC) exceçãode pré-executividade que, emboraimprocedente, é manejada dentroda boa-fé processual, sem

Page 241: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

intenção de maliciosamentefrustrar a satisfação do crédito”(TJPE, Agravo de Instrumento0000492-56.2014.8.17.0000,Quinta Câmara Cível, Rel. Des.José Fernandes de Lemos, j.10.09.2014, DJEPE 22.09.2014).Entretanto, seguindo outrocaminho, aplicando outroconceito parcelar que ainda seráabordado: “se a parte reconheceuexpressamente a existência dadívida e, inclusive, manifestousua vontade de pôr fim àdemanda, não pode, em exceçãode pré-executividade, alegar afalta de certeza e liquidez do

Page 242: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

título, por ser atitude incoerentecom sua própria conduta, poraplicação da teoria do ‘venirecontra factum proprium’, queprivilegia a boa-fé processual,devendo ser considerado litigantede má-fé” (TJMG, Agravo deInstrumento 1.0421.11.001305-7/001, Rel. Des. EstevãoLucchesi, j. 24.07.2014, DJEMG01.08.2014).

Do Tribunal de Justiça deSão Paulo merece destaquejulgamento que analisou essaexceptio ou defesa a partir do quese denominou supressioprocessual, na linha de aplicação

Page 243: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

desse último conceito parcelarantes exposta. Vejamos essainstigante decisium:

“Exceção de pré-executividade. Alegação deque a agravante não assinou o contrato dehonorários juntamente com seu cônjuge.Alegação descabida venire contra factumproprium e supressio processual. Omissãode alegar essa tese de defesa na primeiraoportunidade e contradição com o afirmadoanteriormente. Afronta à boa-fé processual, oque impede que a matéria seja considerada.Ainda assim, tese destoante da realidade dosautos, a qual revela a outorga de procuraçãoda agravante ao escritório exequente, o queevidencia a relação contratual entre as partes.Litigância de má-fé configurada. Negadoprovimento” (TJSP, Agravo de Instrumento2019891-85.2014.8.26.0000/50001, Acórdão7434685, São Paulo, Vigésima Quinta Câmara

Page 244: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

de Direito Privado, Rel. Des. Hugo Crepaldi,j. 10.04.2014, DJESP 05.06.2014).

Como se pode notar dealgumas decisões transcritas, avedação do comportamentocontraditório, a máxima venirecontra factum proprium nonpotest talvez seja o conceitoparcelar de maior incidência nãosó no campo material, comotambém no processual. Em certosmomentos, percebe-se umaaproximação desse conceito coma preclusão, pela simbologia,geralmente utilizada por DanielAmorim Assumpção Neves em

Page 245: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

suas aulas e palestras, do andarpelo processo e das portas quevão se fechando no caminho queficou para trás.

Por essa máxima em estudo,determinada pessoa não podeexercer um direito própriocontrariando um comportamentoanterior, devendo ser mantidos aconfiança e o dever de lealdade,decorrentes da boa-fé objetiva. Oconceito tem relação com a tesedos atos próprios, muito bemexplorada no Direito Espanholpor Luís Díez-Picazo.54

Para Anderson Schreiber,

Page 246: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

que desenvolveu excelentetrabalho monográfico sobre otema no Brasil, podem serapontados quatro pressupostospara aplicação da proibição docomportamento contraditório: 1º)um fato próprio, uma condutainicial; 2º) a legítima confiançade outrem na conservação dosentido objetivo dessa conduta;3º) um comportamentocontraditório com este sentidoobjetivo; 4º) um dano ou umpotencial de dano decorrente dacontradição.55 A relação com orespeito à confiança depositada,um dos deveres anexos à boa-fé

Page 247: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

objetiva, é muito clara, conformeconsta do Enunciado n. 362 da IVJornada de Direito Civil: “Avedação do comportamentocontraditório (venire contrafactum proprium) funda-se naproteção da confiança, tal comose extrai dos arts. 187 e 422 doCódigo Civil”. Mais à frente, ojurista fluminense traz à tona doisinteressantes exemplos deaplicação do venire na searaprocessual.

No primeiro deles foiproferida uma sentençahomologatória de apuração dehaveres de uma sociedade em

Page 248: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

relação a um sócio falecido. Nocurso do processo, em primeirainstância, o espólio do falecidoelogiou o trabalho do perito.Posteriormente, em sede deapelação, o espólio resolveuimpugnar o mesmo laudo, deforma contraditória. Diante damáxima que decorre do venire, oTribunal de Justiça do Rio deJaneiro confirmou a sentença,negando seguimento ao recurso(TJRJ, Apelação Cível 2.699/97,de 3 de março de 1998, Rel. Des.Wilson Marques).56

A segunda concretizaçãoexposta por Schreiber diz

Page 249: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

respeito a caso português, em queuma empregadora, condenada emprimeira instância por revelia,alegou falta de citação válida noprocesso para fundamentar a suaapelação, o que geraria nulidadeprocessual. “Alegou a sociedadeque o endereço a que seencaminhou a citação eraequivocada, mas, diante dasprovas apresentadas peloempregado, admitiu que lárecebesse outras espécies decorrespondências”.57 O Tribunalde Relação de Évora confirmou asentença, ficando clara aexistência de comportamentos

Page 250: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

contraditórios no processo. Adecisão faz menção expressa aovenire contra factum proprium.58

Aprofundando a prática deincidência do venire, a maisconhecida decisão envolvendo oconceito parcelar, proferida peloSuperior Tribunal de Justiça, dizrespeito a um caso de contrato decompromisso de compra e venda.O marido celebrou o referidonegócio sem a outorga uxória, ouseja, sem a anuência de suaesposa, o que, na vigência doCódigo Civil de 1916, era motivode sua nulidade absoluta docontrato. A esposa, entretanto,

Page 251: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

informou em uma ação queconcordou tacitamente com avenda. Dezessete anos após a suacelebração, pretendeu a nulidade,o que foi afastado justamente pelapresença de comportamentoscontraditórios entre si. Para opresente autor esse exemploclássico representa aplicação dovenire ao âmbito do processo, eisque as duas condutas forampraticadas no âmbito dedemandas. A primeira, comotestemunha, a segunda comoautora. Vejamos a ementa extraídadesse importante julgamento:

Page 252: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

“Promessa de compra e venda.Consentimento da mulher. Atos posteriores.Venire contra factum proprium. Boa-fé. Amulher que deixa de assinar o contrato depromessa de compra e venda juntamente como marido, mas depois disso, em juízo,expressamente admite a existência e validadedo contrato, fundamento para a denunciaçãode outra lide, e nada impugna contra aexecução do contrato durante mais de 17anos, tempo em que os promissárioscompradores exerceram pacificamente aposse sobre o imóvel, não pode depois se oporao pedido de fornecimento de escrituradefinitiva. Doutrina dos atos próprios. Art.132 do CC. 3. Recurso conhecido e provido”(STJ, REsp 95.539/SP, Quarta Turma, Rel.Min. Ruy Rosado de Aguiar, DJ 14.10.1996,p. 39.015, Data da decisão 03.09.1996).

Do mesmo Tribunal daCidadania aplicou-se o conceito

Page 253: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

para afastar a negativa dolocatário em pagar o alugueldevido, alegando que opromitente comprador não serialegítimo locador:

“Locação. Promitente comprador. Partelegítima para figurar no polo ativo da ação dedespejo. Prova da propriedade ou docompromisso registrado. Desnecessidade.Dissídio jurisprudencial superado. Agravoregimental improvido. 1. A priori, ainexistência de prova da propriedade doimóvel ou do compromisso registrado nãoenseja a ilegitimidade do promitentecomprador em propor o despejo da locatáriaque não adimpliu os aluguéis. 2. Comprovada,na espécie, a condição de locador através dorespectivo contrato de locação, assinado pelaora agravante, compete à locatária o ônus decomprovar a existência de fato impeditivo,

Page 254: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

modificativo ou extintivo do direito do autor,nos termos do art. 333, II, do CPC, o que nãoocorreu. 3. Fere a boa-fé objetiva a condutada locatária que, após exercer a posse diretado imóvel por mais de duas décadas, alega ailegitimidade do locador em ajuizar a ação dedespejo por falta de pagamento. 4. Embora aora agravante tenha demonstrado a existênciada divergência jurisprudencial, verifica-se queeste Superior Tribunal de Justiçarecentemente asseverou que o ajuizamento daação de despejo pelo promitente compradorprescinde de prova da propriedade do imóvellocado, a evidenciar a superação do dissídio.5. Agravo regimental improvido” (STJ, AgRgnos EDcl nos EDcl no Ag 704.933/SP, SextaTurma, Rel. Min. Maria Thereza de AssisMoura, j. 24.08.2009, DJe 14.09.2009).

Como se nota, mais uma vez,o conceito foi aplicado à

Page 255: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

categoria processual, pois houvea alegação de ilegitimidade doautor da ação de cobrança dealuguéis, que acabou por nãoprosperar na prática.

Sem prejuízo das ementasaqui antes colacionadas, podemser encontradas muitas outras, quecorrelacionam a boa-fé objetivaprocessual com a vedação decondutas contraditórias. Ainda noâmbito do Superior Tribunal deJustiça, destaque-se a seguinteconclusão, incidente no campoprocessual penal: “considerandoque a relação processual épautada pelo princípio da boa-fé

Page 256: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

objetiva, da qual deriva osubprincípio da vedação dovenire contra factum proprium(proibição de comportamentoscontraditórios), não é dadoreconhecer-se a nulidade, diantedo comportamento sinuoso daprópria Defensoria Pública queatuou no feito, ao não semanifestar pela nomeação deoutro causídico na instruçãocriminal ou mesmo no apelodefensivo, ajuizando, inclusive, amesma defensora a presenteimpetração em prol dos três réus”(STJ, HC 229.868/RJ, SextaTurma, Rel. Min. Maria Thereza

Page 257: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

de Assis Moura, j. 01.04.2014,DJe 14.04.2014). Emcomplemento, do mesmo Tribunalda Cidadania: “somente nestafase processual é que a agravante,de forma maliciosa e desleal,rotula como confiscatório opercentual de 20% (vinte porcento), que ela própria pleiteia, atítulo de multa moratória, emflagrante desrespeito à boa-féprocessual e ao princípioinsculpido na máxima nemopotest venire contra factumproprium” (STJ, AgRg no AREsp34.846/DF, Primeira Turma, Rel.Min. Arnaldo Esteves Lima, j.

Page 258: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

04.09.2012, DJe 11.09.2012).Partindo para os tribunais

estaduais, em pesquisa realizadano início de 2015, o presenteautor encontrou cerca de 50decisões de Tribunais com osverbetes venire e boa-féprocessual. Serão expostosapenas três para não se prolongarainda mais a presente exposição.

Ab initio, do TribunalPaulista, extrai-se, com precisão,que “constitui verdadeiro ‘venirecontra factum proprium’pretender, agora, a agravanteobstar olevantamento/transferência de

Page 259: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

valores da parte que outrorapedira a exclusão do polopassivo. Alerta quanto à violaçãoda lealdade e boa-fé processualconsubstanciada em condutacontraditória; artigo 14, inciso II,do Código de Processo Civil.Regimental não provido” (TJSP,Agravo de Instrumento 2123629-89.2014.8.26.0000/50000,Acórdão 7797526, Osasco,Décima Quarta Câmara deDireito Privado, Rel. Des. LigiaAraujo Bisogni, j. 25.08.2014,DJESP 28.08.2014). No mesmotrilhar, no Tribunal Gaúchoentendeu-se: “hipótese em que a

Page 260: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

parte autora requereu ojulgamento antecipado da lidediante da revelia do réu, nãopodendo vir agora alegarcerceamento de defesa, o que vaide encontro ao princípio da boa-fé processual e à regra que proíbeo comportamento contraditório(nemo potest venire contrafactum proprium). Liçõesdoutrinárias e precedentesjurisprudenciais. Preliminarrejeitada. Revelia. Não aplicaçãodos efeitos” (TJRS, Acórdão195443-25.2013.8.21.7000,Palmeira das Missões, DécimaCâmara Cível, Rel. Des. Paulo

Page 261: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

Roberto Lessa Franz, j.01.08.2013, DJERS 03.09.2013).Por fim, da Corte Catarinense:“Requerente que sustenta que ocálculo pericial não apresentafundamentação quanto ao cômputodos dividendos, das bonificaçõese dos juros sobre o capitalpróprio. Comportamentocontraditório. Suplicante que naorigem concordou expressamentecom os valores atingidos naperícia. Incidência do princípioda boa-fé processual e,notadamente, da regra do nemopotest venire contra factumproprium. Alegação que não tem

Page 262: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

o condão de modificar o rumo dainterlocutória. Recursoparcialmente conhecido eimprovido” (TJSC, Agravo deInstrumento 2013.032505-0,Ibirama, Quarta Câmara deDireito Comercial, Rel. Des. JoséCarlos Carstens Kohler, j.26.07.2013, DJSC 29.07.2013, p.177).

A finalizar o estudo dovenire para o Direito ProcessualCivil, é interessante trazerconcreções envolvendo aarbitragem, objeto de atuação dopresente autor nos últimos anos.Com precisão, Anderson

Page 263: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

Schreiber cita o caso em que aspartes de um contrato elegem aarbitragem e depois alegamnulidade da cláusulacompromissória, o que não seriacabível pela boa-fé objetiva.59

Realmente, a conclusão nãopoderia ser outra, existindointeressante julgado aplicando aideia em caso relacionado a umatransação entre as partes, queposteriormente foi impugnada poralegação de anulabilidade (TJSP,Apelação 1131069-5, São Carlos,Décima Primeira Câmara deDireito Privado, Rel. GilbertoPinto dos Santos, j. 12.04.06, v.u.,

Page 264: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

Voto 7.341). Acrescente-se com asituação que se tornou bemcomum, de partes que seguemtodo o procedimento arbitral e,após a sentença deimprocedência, insurgem-sejudicialmente contra a conclusãodo painel. A máxima que veda ocomportamento contraditóriodeve entrar em cena para rejeiçãodesse pedido.

Expostos os conceitosestudados por Menezes Cordeiro,cabe ainda analisar o duty tomitigate the loss, o deverimposto ao credor de mitigar suasperdas, ou seja, o próprio

Page 265: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

prejuízo. Sobre essa premissa foiaprovado o Enunciado n. 169CJF/STJ na III Jornada deDireito Civil, pelo qual “Oprincípio da boa-fé objetiva develevar o credor a evitar oagravamento do próprioprejuízo”.

A proposta, elaborada porVera Maria Jacob de Fradera,professora da UniversidadeFederal do Rio Grande do Sul,representa muito bem a naturezado dever de colaboração,presente em todas as fasescontratuais e que decorre doprincípio da boa-fé objetiva e

Page 266: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

daquilo que consta do art. 422 doCC.60 Anote-se que o Enunciadon. 169 CJF/STJ está inspirado noart. 77 da Convenção de Viena de1980, sobre a venda internacionalde mercadorias, no sentido de que“A parte que invoca a quebra docontrato deve tomar as medidasrazoáveis, levando emconsideração as circunstâncias,para limitar a perda, nelacompreendido o prejuízoresultante da quebra. Se elanegligencia em tomar taismedidas, a parte faltosa podepedir a redução das perdas edanos, em proporção igual ao

Page 267: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

montante da perda que poderia tersido diminuída”. Para a autora daproposta, há uma relação diretacom o princípio da boa-féobjetiva, uma vez que a mitigaçãodo próprio prejuízo constituiriaum dever de natureza acessória,um dever anexo, derivado da boaconduta que deve existir entre osnegociantes. Acreditamos queesse conceito pode ser inseridoperfeitamente no campoprocessual.

A ilustrar a aplicação doduty to mitigate the loss,concretize-se com o caso de umcontrato de locação de imóvel

Page 268: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

urbano em que houveinadimplemento. Ora, nessenegócio, há um dever por parte dolocador de ingressar, tão logo lheseja possível, com a competenteação de despejo, não permitindoque a dívida assuma valoresexcessivos.

O mesmo argumento valepara os contratos bancários efinanceiros em que hádescumprimento. Segundo ainterpretação deste autor, jáaplicada pela jurisprudência, nãopode a instituição financeirapermanecer inerte, aguardandoque, diante da alta taxa de juros

Page 269: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

prevista no instrumentocontratual, a dívida atinjamontantes astronômicos. Se assimagir, como consequência daviolação da boa-fé, os jurosdevem ser reduzidos (nessesentido, ver: TJMS, Acórdão2009.022658-4/0000-00, CampoGrande, Terceira Turma Cível,Rel. Des. Rubens BergonziBossay, DJEMS 24.09.2009, p.12; e TJRJ, Apelação Cível0010623-64.2009.8.19.0209,Nona Câmara Cível, Apelante:Paulo Roberto de Oliveira,Apelado: Banco de Lage LandenBrasil S.A, Rel. Des. Roberto de

Page 270: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

Abreu e Silva, j. junho de 2011).Seguindo no estudo de casos

concretos, o duty to mitigate theloss foi aplicado em acórdãopublicado no Informativo n. 439do STJ. Vejamos a ementa dojulgado que melhor elucida aincidência do instigante conceito:

“Direito civil. Contratos. Boa-fé objetiva.Standard ético-jurídico. Observância pelaspartes contratantes. Deveres anexos. Duty tomitigate the loss. Dever de mitigar o próprioprejuízo. Inércia do credor. Agravamento dodano. Inadimplemento contratual. Recursoimprovido. 1. Boa-fé objetiva. Standardético-jurídico. Observância pelos contratantesem todas as fases. Condutas pautadas pelaprobidade, cooperação e lealdade. 2.

Page 271: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

Relações obrigacionais. Atuação das partes.Preservação dos direitos dos contratantes naconsecução dos fins. Impossibilidade deviolação aos preceitos éticos insertos noordenamento jurídico. 3. Preceito decorrenteda boa-fé objetiva. Duty to mitigate the loss:o dever de mitigar o próprio prejuízo. Oscontratantes devem tomar as medidasnecessárias e possíveis para que o dano nãoseja agravado. A parte a que a perdaaproveita não pode permanecerdeliberadamente inerte diante do dano.Agravamento do prejuízo, em razão da inérciado credor. Infringência aos deveres decooperação e lealdade. 4. Lição dadoutrinadora Vera Maria Jacob de Fradera.Descuido com o dever de mitigar o prejuízosofrido. O fato de ter deixado o devedor naposse do imóvel por quase 7 (sete) anos, semque este cumprisse com o seu devercontratual (pagamento das prestaçõesrelativas ao contrato de compra e venda),

Page 272: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

evidencia a ausência de zelo com opatrimônio do credor, com o consequenteagravamento significativo das perdas, umavez que a realização mais célere dos atos dedefesa possessória diminuiria a extensão dodano. 5. Violação ao princípio da boa-féobjetiva. Caracterização de inadimplementocontratual a justificar a penalidade impostapela Corte originária (exclusão de um ano deressarcimento). 6. Recurso improvido” (STJ,REsp 758.518/PR, Terceira Turma, Rel. Des.Conv. Vasco Della Giustina, j. 17.06.2010,DJE 1.º.07.2010).

Ora, o último acórdãoreconhece, em seu corpo, que oduty to mitigate the loss deve seraplicado no campo processual.Conforme a sua precisa relatoria,“Impende destacar, ainda, que a

Page 273: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

aplicabilidade do referidoprincípio é vislumbrada noâmbito do processo civil porFredie Didier Jr.: ‘Remanesce adúvida: toda essa construçãoteórica, criada para o universo dodireito privado, pode seraplicada por extensão ao direitoprocessual? Certamente que sim.É lícito conceber a existência deum dever da parte de mitigar opróprio prejuízo, impedindo ocrescimento exorbitante da multa,como corolário do princípio daboa-fé processual, cláusula geralprevista no art. 14, II, do CPC.Como já se disse, o princípio da

Page 274: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

boa-fé processual é decorrênciada expansão do princípio da boa-fé inicialmente pensado no direitoprivado. Esse princípio implica aproibição do abuso do direito e apossibilidade de ocorrência dasupressio, figura, aliás, que écorolário da vedação ao abuso.Se o fundamento do duty tomitigate the loss é o princípio daboa-fé, que rege o direitoprocessual como decorrência dodevido processo legal, pode-seperfeitamente admitir a suaexistência, a partir de umaconduta processual abusiva, nodireito processual brasileiro. Ao

Page 275: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

não exercer a pretensãopecuniária em lapso de temporazoável, deixando que o valor damulta aumente consideravelmente,o autor comporta-seabusivamente, violando oprincípio da boa-fé. Esse ilícitoprocessual implica a perda dodireito ao valor da multa(supressio), respectivamente aoperíodo de tempo consideradopelo órgão jurisdicional comodeterminante para a configuraçãodo abuso de direito. Trata-se,pois, de mais um ilícitoprocessual caducificante’(DIDIER JR., Fredie. Multa

Page 276: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

coercitiva, boa-fé processual esupressio: aplicação do duty tomitigate the loss no processocivil. Revista de Processo, ano34, 1. 171, maio 2009, p. 48). Daanálise do contexto da lide, nãose divisa qualquer ilegalidade aser reparada, porquanto a Corteoriginária considerouinadimplido o dever de mitigar opróprio prejuízo, oriundo doprincípio da boa-fé objetiva”.

Como se nota, a aplicaçãodos conceitos parcelares acabapor concretizar a boa-fé objetivano âmbito processual em muitosaspectos. Sendo assim, cai por

Page 277: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

terra o argumento de algunscéticos no sentido de que acooperação processual em nadaalterará o sistema jurídicoprocessual brasileiro.

Para encerrar o presentecapítulo, é forçoso reconhecerque o Novo Código de ProcessoCivil, pela adoção de um sistemaaberto e principiológico,intensificará o diálogo não sócom a Constituição Federal, mastambém com o Código Civil. Apropósito, este é um livro dediálogo das fontes, substantivas eadjetivas.

A tese do diálogo das fontes

Page 278: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

foi desenvolvida na Alemanhapor Erik Jayme, professor daUniversidade de Helderberg,trazida ao Brasil por ClaudiaLima Marques, da UniversidadeFederal do Rio Grande do Sul. Aessência da teoria é que asnormas jurídicas não se excluem– supostamente porquepertencentes a ramos jurídicosdistintos –, mas secomplementam. Como se podeperceber, há nesse marco teórico,do mesmo modo, a premissa deuma visão unitária doordenamento jurídico.

A primeira justificativa que

Page 279: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

pode surgir para a sua aplicaçãorefere-se à sua funcionalidade. Écediço que vivemos um momentode explosão de leis, um “BigBang Legislativo”, comosimbolizou Ricardo Lorenzetti. Omundo pós-moderno eglobalizado, complexo eabundante por natureza, convivecom uma quantidade enorme denormas jurídicas, a deixar oaplicador do Direito atédesnorteado. Convive-se com aera da desordem, conforme expõeo mesmo Lorenzetti.61 O diálogodas fontes serve como leme nessatempestade de complexidade.

Page 280: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

Relativamente às razõesfilosóficas e sociais da aplicaçãoda tese, Claudia Lima Marquesensina que:

“Segundo Erik Jayme, as características dacultura pós-moderna no direito seriam opluralismo, a comunicação, a narração, o queJayme denomina de ‘le retour dessentiments’, sendo o Leitmotiv da pós-modernidade a valorização dos direitoshumanos. Para Jayme, o direito como parteda cultura dos povos muda com a crise dapós-modernidade. O pluralismo manifesta-sena multiplicidade de fontes legislativas aregular o mesmo fato, com a descodificaçãoou a implosão dos sistemas genéricosnormativos (‘Zersplieterung’), manifesta-seno pluralismo de sujeitos a proteger, por vezesdifusos, como o grupo de consumidores ou osque se beneficiam da proteção do meio

Page 281: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

ambiente, na pluralidade de agentes ativos deuma mesma relação, como os fornecedoresque se organizam em cadeia e em relaçõesextremamente despersonalizadas. Pluralismotambém na filosofia aceita atualmente, onde odiálogo é que legitima o consenso, onde osvalores e princípios têm sempre uma duplafunção, o ‘double coding’, e onde os valoressão muitas vezes antinômicos. Pluralismo nosdireitos assegurados, nos direitos à diferençae ao tratamento diferenciado aos privilégiosdos ‘espaços de excelência’ (JAYME, Erik.Identité culturelle et intégration: le droitinternational privé postmoderne. Recueil desCours de l’Académie de DroitInternational de la Haye, 1995, II, Kluwer,Haia, p. 36 e ss.)”.62

A primeira tentativa deaplicação da tese do diálogo dasfontes se dá com a possibilidade

Page 282: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

de subsunção concomitante tantodo Código de Defesa doConsumidor quanto do CódigoCivil a determinadas relaçõesobrigacionais, sobretudo aoscontratos. Isso diante da jáconhecida aproximaçãoprincipiológica entre os doissistemas, consolidada pelosprincípios sociais contratuais,sobretudo pela boa-fé objetiva epela função social dos contratos.Supera-se a ideia de que oCódigo Consumerista seria ummicrossistema jurídico,totalmente isolado do CódigoCivil de 2002.

Page 283: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

Claudia Lima Marquesdemonstra três diálogos possíveisa partir da teoria exposta.63 Comoprimeira interação, havendoaplicação simultânea das duasleis, se uma lei servir de baseconceitual para a outra, estarápresente o diálogo sistemático decoerência. A título de exemplo,os conceitos dos contratos deespécie podem ser retirados doCódigo Civil, mesmo sendo ocontrato de consumo, exemplo deuma compra e venda (art. 481 doCC).

Se o caso for de aplicaçãocoordenada de duas leis, uma

Page 284: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

norma pode completar a outra, deforma direta (diálogo decomplementaridade) ou indireta(diálogo de subsidiariedade). Oexemplo típico ocorre com oscontratos de consumo que tambémsão de adesão. Em relação àscláusulas abusivas, pode serinvocada a proteção dosconsumidores constante do art. 51do CDC e ainda a proteção dosaderentes constante do art. 424 doCC.

Por fim, os diálogos deinfluências recíprocassistemáticas estão presentesquando os conceitos estruturais

Page 285: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

de uma determinada lei sofreminfluências da outra. Portanto, oconceito de consumidor podesofrer influências do próprioCódigo Civil. Como afirma aprópria Claudia Lima Marques,“é a influência do sistemaespecial no geral e do geral noespecial, um diálogo de doublésens (diálogo de coordenação eadaptação sistemática)”.

Os principais julgados queaplicam a teoria do diálogo dasfontes dizem respeito à interaçãoproposta por Claudia LimasMarques, entre o Código Civil de2002 e o Código de Defesa do

Page 286: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

Consumidor, o que ocorresubstancialmente no campocontratual, pois houve umaaproximação principiológicaentre as duas leis. Adotando essecaminho, por todos os numerososacórdãos, cabe destacar oseguinte do Tribunal daCidadania: “o CDC não exclui aprincipiologia dos contratos dedireito civil. Entre as normasconsumeristas e as regras geraisdos contratos, insertas no CódigoCivil e legislação extravagante,deve haver complementação enão exclusão. É o que a doutrinachama de Diálogo das Fontes”

Page 287: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

(STJ, REsp 1.060.515/DF, QuartaTurma, Rel. Min. Honildo Amaralde Mello Castro (desembargadorconvocado do TJAP), j.04.05.2010, DJe 24.05.2010).

Todavia, podem serencontrados arestos que trazeminterações entre a legislaçãomaterial e a processual. Deinício, tratando do processotributário, concluiu o SuperiorTribunal de Justiça que, “ematenção ao princípio daespecialidade da LEF, mantidocom a reforma do CPC/1973, anova redação do art. 736 do CPCdada pela Lei 11.382/2006 –

Page 288: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

artigo que dispensa a garantiacomo condicionante dosembargos – não se aplica àsexecuções fiscais diante dapresença de dispositivoespecífico, qual seja o art. 16, §1.º, da Lei 6.830/1980, que exigeexpressamente a garantia para aapresentação dos embargos àexecução fiscal. Muito emborapor fundamentos variados – orafazendo uso da interpretaçãosistemática da LEF e doCPC/1973, ora trilhando oinovador caminho da teoria do‘Diálogo das Fontes’, orautilizando-se de interpretação

Page 289: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

histórica dos dispositivos (o quese faz agora) – essa conclusãotem sido a alcançada pelajurisprudência predominante,conforme ressoam os seguintesprecedentes de ambas as Turmasdeste Superior Tribunal deJustiça. Pela Primeira Turma:AgRg no Ag 1381229/PR,Primeira Turma, Rel. Min.Arnaldo Esteves Lima, j.15.12.2011; AgRg no REsp1.225.406/PR, Primeira Turma,Rel. Min. Hamilton Carvalhido, j.15.02.2011; AgRg no REsp1.150.534/MG, Primeira Turma,Rel. Min. Benedito Gonçalves, j.

Page 290: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

16.11.2010; AgRg no Ag1.337.891/SC, Primeira Turma,Rel. Min. Luiz Fux, j. 16.11.2010;AgRg no REsp 1.103.465/RS,Primeira Turma, Rel. Min.Francisco Falcão, j. 07.05.2009.Pela Segunda Turma: AgRg nosEDcl no Ag 1.389.866/PR,Segunda Turma, Rel. Min.Humberto Martins, DJe21.09.2011; REsp 1.195.977/RS,Segunda Turma, Rel. Min. MauroCampbell Marques, j.17.08.2010; AgRg no Ag1.180.395/AL, Segunda Turma,Rel. Min. Castro Meira, DJe26.2.2010; REsp, 1.127.353/SC,

Page 291: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

Segunda Turma, Rel. Min. ElianaCalmon, DJe 20.11.2009; REsp1.024.128/PR, Segunda Turma,Rel. Min. Herman Benjamin, DJe19.12.2008” (STJ, REsp1.272.827/PE, Primeira Seção,Rel. Min. Mauro CampbellMarques, j. 22.05.2013, DJe31.05.2013).

Também dessa seara merecedestaque: “A antinomia aparenteentre o art. 185-A do CTN (quecuida da decretação deindisponibilidade de bens edireitos do devedor executado) eos arts. 655 e 655-A do CPC(penhora de dinheiro em depósito

Page 292: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

ou aplicação financeira) ésuperada com a aplicação daTeoria pós-moderna do Dialógodas Fontes, idealizada peloalemão Erik Jayme e aplicada, noBrasil, pela primeira vez, porClaudia Lima Marques, a fim depreservar a coexistência entre oCódigo de Defesa do Consumidore o novo Código Civil. Comefeito, consoante a Teoria doDiálogo das Fontes, as normasgerais mais benéficassupervenientes preferem à normaespecial (concebida para conferirtratamento privilegiado adeterminada categoria), a fim de

Page 293: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

preservar a coerência do sistemanormativo. Deveras, a ratioessendi do art. 185-A do CTN éerigir hipótese de privilégio docrédito tributário, não serevelando coerente ‘colocar ocredor privado em situaçãomelhor que o credor público,principalmente no que dizrespeito à cobrança do créditotributário, que deriva do deverfundamental de pagar tributos(arts. 145 e seguintes daConstituição Federal de 1988)’(REsp 1.074.228/MG, Rel. Min.Mauro Campbell Marques,Segunda Turma, j. 07.10.2008,

Page 294: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

DJe 05.11.2008). Assim, ainterpretação sistemática do art.185-A do CTN com os arts. 11 daLei 6.830/80 e 655 e 655-A doCPC autoriza a penhoraeletrônica de depósitos ouaplicações financeirasindependentemente doexaurimento de diligênciasextrajudiciais por parte doexeqüente” (STJ, AgRg no REsp1.196.537/MG, Rel. Min. LuizFux, Primeira Turma, j.03.02.2011, DJe 22.02.2011).

Como já escrevemos emcoautoria com Fernanda Tartuce,especialmente no tocante ao

Page 295: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

Direito Civil e ao DireitoProcessual Civil, é de se pontuarque a relação entre ambos deveser considerada sob dois aspectosfundamentais: ainstrumentalidade e aefetividade.64 Com base nainstrumentalidade, deve-seconceber o processo como uminstrumento de atuação dosvalores consagrados no plano dodireito material. Em termos deefetividade, deve-se considerar,como bem expôs Liebman, que,sem o processo, o direito(material) estaria abandonadoapenas à boa vontade dos

Page 296: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

homens, correndo o risco de nãoser atuado; já o processo sem odireito (material) seria ummecanismo fadado a cair novazio, privado de conteúdo eobjetivo.65 Como atesta Rodolfode Camargo Mancuso, com talcontribuição o mestre italiano“logrou encontrar o ponto deequilíbrio entre direito eprocesso, como dois polos que,sem se sobreporem, antes seimplicam e se complementam”.66

Reafirme-se que interaçõescomo essas irão se intensificarnos próximos anos, pelaaproximação principiológica

Page 297: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

entre o Código Civil de 2002 e oNovo CPC, exposta, nestecapítulo, pelo estudo daconstitucionalização do processocivil e pela incidência da boa-féobjetiva e da cooperaçãoprocessual. Nos capítulosseguintes deste livro, outrasinterações e diálogos serãoapresentados.

Page 298: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

__________1 FRANÇA, Rubens Limongi.Enciclopédia Saraiva de Direito.São Paulo: Saraiva, 1977. v. 60, p. 505.2 REALE, Miguel. LiçõesPreliminares de Direito. 21. ed. SãoPaulo: Saraiva, 1994. p. 299.3 ASCENSÃO, José de Oliveira.Introdução à Ciência do Direito. 3.ed. Rio de Janeiro: Renovar, 2005. p.445.4 AMARAL, Francisco. Direito Civil.Introdução. 5. ed. Rio de Janeiro:Renovar, 2003. p. 92.5 DINIZ, Maria Helena. Lei deIntrodução ao Código CivilInterpretada. 8. ed. São Paulo:Saraiva, 2001. p. 123.

Page 299: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

6 NERY JR., Nelson; NERY, RosaMaria de Andrade. Código CivilAnotado. 2. ed. São Paulo: RT, 2003.p. 141.7 NERY JR., Nelson; NERY, RosaMaria de Andrade. Código CivilAnotado. 2. ed. São Paulo: RT, 2003.p. 141.8 FRANÇA, Rubens Limongi.Princípios Gerais do Direito. 2. ed.São Paulo: RT, 1971.9 MARTINS-COSTA, Judith. O NovoCódigo Civil Brasileiro: Em Busca da“Ética da Situação”. In: BRANCO,Gerson Luiz Carlos; MARTINS-COSTA, Judith. Diretrizes Teóricasdo Novo Código Civil brasileiro. SãoPaulo: Saraiva, 2002. p. 118.10 ENGISCH, Karl. Introdução do

Page 300: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

Pensamento Jurídico. 2. ed. Lisboa:Fundação Calouste Gulbenkian, 1964.p. 188.11 Sobre o tema, ver, por todos:REALE, Miguel. TeoriaTridimensional do Direito. Situaçãoatual. 5. ed. 5. tir. São Paulo: Saraiva,2003.12 REALE, Miguel. TeoriaTridimensional do Direito. Situaçãoatual. 5. ed. 5. tir. São Paulo: Saraiva,2003. p. 57.13 Ver: HIRONAKA, Giselda MariaFernandes Novaes; TARTUCE,Flávio; SIMÃO, José Fernando. OCódigo Civil de 2002 e a ConstituiçãoFederal: 5 Anos e 20 Anos. Os 20Anos da Constituição da RepúblicaFederativa do Brasil. Alexandre deMoraes (Coord.). São Paulo: Atlas,

Page 301: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

2009. p. 463-519.14 PERLINGIERI, Pietro. Perfis doDireito Civil. Introdução ao DireitoCivil Constitucional. Trad. MariaCristina De Cicco. 2. ed. Rio deJaneiro: Renovar, 2002.15 PERLINGIERI, Pietro. Perfis doDireito Civil. Introdução ao DireitoCivil Constitucional. Trad. MariaCristina De Cicco. 2. ed. Rio deJaneiro: Renovar, 2002. p. 5.16 TEPEDINO, Gustavo. NormasConstitucionais e Relações de DireitoCivil na Experiência Brasileira. Temasde Direito Civil. Rio de Janeiro:Renovar, 2005. t. II.17 CANOTILHO, José JoaquimGomes. Estudos sobre DireitosFundamentais. Coimbra: Coimbra,

Page 302: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

2004. p. 95.18 TEPEDINO, Gustavo. PremissasMetodológicas para aConstitucionalização do Direito Civil.Temas de Direito Civil. Rio deJaneiro: Renovar, 2004. p. 1.19 TEPEDINO, Gustavo. PremissasMetodológicas para aConstitucionalização do Direito Civil.Temas de Direito Civil. Rio deJaneiro: Renovar, 2004. p. 13.20 MOREIRA, Eduardo Ribeiro.Neoconstitucionalismo – A Invasãoda Constituição. São Paulo: Método,2008. v. 7 – Coleção Professor GilmarMendes, p. 114.21 BARROSO, Luís Roberto. Cursode Direito ConstitucionalContemporâneo. Os ConceitosFundamentais e a Construção do Novo

Page 303: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

Modelo. São Paulo: Saraiva, 2009. p.366-372.22 TEPEDINO, Gustavo. PremissasMetodológicas para aConstitucionalização do Direito Civil.Temas de Direito Civil. 3. ed. Rio deJaneiro: Renovar, 2004. p. 1-22.23 FACHIN, Luiz Edson. DireitoCivil. Sentidos, Transformações e Fim.Rio de Janeiro: Renovar, 2014. p. 10-11.24 SARMENTO, Daniel. DireitosFundamentais e Relações Privadas.Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2004. p.223.25 ALEXY, Robert. Teoria dosDireitos Fundamentais. Tradução deVirgílio Afonso da Silva. São Paulo:Malheiros, 2008.

Page 304: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

26 BARROSO, Luís Roberto. Cursode Direito ConstitucionalContemporâneo. Os ConceitosFundamentais e a construção do novomodelo. Rio de Janeiro: Renovar, 2009.p. 334.27 BARROSO, Luís Roberto. Cursode Direito ConstitucionalContemporâneo. Os ConceitosFundamentais e a Construção do NovoModelo. Rio de Janeiro: Renovar,2009. p. 334.28 ALEXY, Robert. Teoria dosDireitos Fundamentais. Tradução deVirgílio Afonso da Silva. São Paulo:Malheiros, 2008. p. 91.29 ALEXY, Robert. Teoria dosDireitos Fundamentais. Tradução deVirgílio Afonso da Silva. São Paulo:Malheiros, 2008. p. 92-93.

Page 305: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

30 ALEXY, Robert. Teoria dosDireitos Fundamentais. Tradução deVirgílio Afonso da Silva. São Paulo:Malheiros, 2008. p. 94-99.31 ALEXY, Robert. Teoria dosDireitos Fundamentais. Tradução deVirgílio Afonso da Silva. São Paulo:Malheiros, 2008. p. 117.32 ALEXY, Robert. Teoria dosDireitos Fundamentais. Tradução deVirgílio Afonso da Silva. São Paulo:Malheiros, 2008. p. 166-176.33 ALEXY, Robert. Teoria dosDireitos Fundamentais. Tradução deVirgílio Afonso da Silva. São Paulo:Malheiros, 2008. p. 100.34 ALEXY, Robert. Teoria dosDireitos Fundamentais. Tradução deVirgílio Afonso da Silva. São Paulo:Malheiros, 2008. p. 101-102.

Page 306: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

35 Críticas contundentes quanto aocomando legal podem ser observadasem: TEPEDINO, Gustavo;BARBOZA, Heloísa Helena;MORAES, Maria Celina Bodin de.Código Civil Interpretado. Rio deJaneiro: Renovar, 2004. v. I, p. 49-58.36 SCHREIBER, Anderson. Direitosda Personalidade. São Paulo: Atlas,2011. p. 103.37 SCHREIBER, Anderson. Direitosda Personalidade. São Paulo: Atlas,2011. p. 52.38 STRECK, Lênio Luiz. Ponderaçãode Normas no Novo CPC? É o Caos.Presidente Dilma, Por Favor, Veta!.Coluna Senso Incomum. ConsultorJurídico. Publicada em 8 de janeiro de2015. Disponível em:<http://www.conjur.com.br/2015-jan-

Page 307: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

08/senso-incomum-ponderacao-normas-cpc-caos-dilma-favor-veta>.Acesso em: 24 jan. 2015.39 STRECK, Lênio Luiz. Ponderaçãode Normas no Novo CPC? É o Caos.Presidente Dilma, Por Favor, veta!.Coluna Senso Incomum. ConsultorJurídico. Publicada em 8 de janeiro de2015. Disponível em:<http://www.conjur.com.br/2015-jan-08/senso-incomum-ponderacao-normas-cpc-caos-dilma-favor-veta>.Acesso em 24 de jan. 2015.40 DIDIER JR., Fredie. Editorial 45.Disponível em:<http://www.frediedidier.com.br/editorial/editorial-45/>. Acesso em: 24 jan. 2015.41 SILVA, Ovídio Baptista A da.Comentários ao Código de ProcessoCivil. 2. ed. São Paulo: RT, 2005. v. 1,

Page 308: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

p. 105.42 Esgotando o tema, como obradefinitiva no Brasil e servindo comoreferência: MARTINS-COSTA,Judith. A Boa-Fé no Direito Privado.São Paulo: RT, 1999.43 VENOSA, Sílvio de Salvo. CódigoCivil Interpretado. São Paulo: Atlas,2010. p. 208.44 DINIZ, Maria Helena. CódigoCivil Anotado. 15. ed. São Paulo:Saraiva, 2010. p. 210-211.45 Na doutrina nacional, sãopartidários da tese de que aresponsabilidade decorrente do abusode direito é objetiva, entre outros:TEPEDINO, Gustavo; BARBOZA,Heloísa Helena; MORAES, MariaCelina Bodin de. Código Civil

Page 309: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

Interpretado. Rio de Janeiro: Renovar,2004. p. 342; NORONHA, Fernando.Direito das Obrigações. São Paulo:Saraiva, 2003. v. 1, p. 371-372; DINIZ,Maria Helena. Código Civil Anotado.15. ed. São Paulo: Saraiva, 2010. p.209; DUARTE, Nestor. Código CivilComentado. Coord. Ministro CezarPeluso. São Paulo: Manole, 2007. p.124; GAGLIANO, Pablo Stolze;PAMPLONA FILHO, Rodolfo. NovoCurso de Direito Civil. 9. ed. SãoPaulo: Saraiva, 2007. v. 1, p. 448;FARIAS, Cristiano Chaves;ROSENVALD, Nelson. Direito Civil.Teoria Geral. 4. ed. Rio de Janeiro:Lumen Juris, 2006. p. 479;CAVALIERI FILHO, Sérgio.Programa de ResponsabilidadeCivil. 7. ed. São Paulo: Atlas, 2007. p.143; BOULOS, Daniel M. Abuso do

Page 310: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

Direito no Novo Código Civil. SãoPaulo: Método, 2006. p. 135-143. Esteautor já se filiou a essa corrente, emum dos seus primeiros trabalhos:TARTUCE, Flávio. Consideraçõessobre o Abuso de Direito ou AtoEmulativo Civil. In: DELGADO, MárioLuiz; ALVES, Jones Figueirêdo.Questões Controvertidas no NovoCódigo Civil. São Paulo: Método,2004. v. 2, p. 92.46 MENEZES CORDEIRO, AntónioManuel da Rocha e. Da Boa-Fé noDireito Civil. Coimbra: Almedina,2001.47 SIMÃO, José Fernando. DireitoCivil. Contratos (Série LeiturasJurídicas). 3. ed. São Paulo: Atlas,2008. p. 38.48 Tanto isso é verdade que inserimos

Page 311: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

a boa-fé objetiva como princípio geraldo Direito de Família em nosso manualque trata do assunto, a partir de suaedição 2014 (TARTUCE, Flávio.Direito Civil. Direito de Família 9. ed.São Paulo: Método, 2014. v. 5,Capítulo 1).49 DUARTE, Ronnie Preuss. ACláusula Geral da Boa-Fé no novoCódigo Civil Brasileiro. In:DELGADO, Mário Luiz; ALVES,Jones Figueirêdo. QuestõesControvertidas no Novo CódigoCivil. São Paulo: Método, 2004. v. 2, p.399.50 GODOY, Cláudio Luiz Bueno de.Função Social do Contrato. DeAcordo com o Novo Código Civil(Coleção Prof. Agostinho Alvim). SãoPaulo: Saraiva, 2004. p. 87-94.

Page 312: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

51 GODOY, Cláudio Luiz Bueno de.Função Social do Contrato. DeAcordo com o novo Código Civil(Coleção Prof. Agostinho Alvim). SãoPaulo: Saraiva, 2004. p. 88.52 SIMÃO, José Fernando. DireitoCivil. Contratos (Série LeiturasJurídicas). 3. ed. São Paulo: Atlas,2008.53 ZANETTI, Cristiano de Souza.Responsabilidade pela Ruptura dasNegociações. São Paulo: Juarez deOliveira, 2005. p. 112-114.54 DÍEZ-PICAZO, Luís; DE LEÓN,Ponce. La Doctrina de los PropiosActos. Barcelona: Bosch, 1963.55 SCHREIBER, Anderson. AProibição do ComportamentoContraditório. Tutela de Confiança e

Page 313: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

Venire Contra Factum Proprium. Riode Janeiro: Renovar, 2005. p. 124.56 SCHREIBER, Anderson. AProibição de ComportamentoContraditório. Tutela da Confiança eVenire Contra Factum Proprium. 2.ed. Rio de Janeiro: Renovar, 2007. p.227.57 SCHREIBER, Anderson. AProibição de ComportamentoContraditório. Tutela da confiança eVenire Contra Factum Proprium. 2.ed. Rio de Janeiro: Renovar, 2007. p.240.58 SCHREIBER, Anderson. AProibição de ComportamentoContraditório. Tutela da confiança eVenire Contra Factum Proprium. 2.ed. Rio de Janeiro: Renovar, 2007. p.241.

Page 314: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

59 SCHREIBER, Anderson. AProibição de ComportamentoContraditório. Tutela da Confiança eVenire Contra Factum Proprium. 2.ed. Rio de Janeiro: Renovar, 2007, p.252.60 FRADERA, Vera Jacob. Pode oCredor ser Instado a Diminuir oPróprio Prejuízo? Revista Trimestralde Direito Civil, Rio de Janeiro:Padma, v. 19, 2004.61 Todos os referenciais teóricos dojurista argentino constam em:LORENZETTI, Ricardo Luís. Teoriada Decisão Judicial. Trad. BrunoMiragem. Com notas e revisão deClaudia Lima Marques. São Paulo: RT,2009.62 MARQUES, Claudia Lima.Comentários ao Código de Defesa

Page 315: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

do Consumidor. São Paulo: RT, 2003.p. 24. Trata-se de introdução da obracoletiva escrita em coautoria comAntonio Herman de V. e Benjamin eBruno Miragem e que praticamenteapresentou o diálogo das fontes para acomunidade jurídica nacional.63 MARQUES, Claudia Lima.Manual de Direito do Consumidor.Antonio Herman V. Benjamim, ClaudiaLima Marques e Leonardo RoscoeBessa. São Paulo: RT, 2007. p. 91.64 TARTUCE, Fernanda; TARTUCE,Flávio. Lei nº 11.441/2007. JusNavigandi, Teresina, ano 12, n. 1478,19 jul. 2007. Disponível em:<http://jus.com.br/artigos/10168>.Acesso em: 26 jan. 2015.65 Tradução livre do trecho: “Senza ilprocesso, il diritto sarebbe abbandonato

Page 316: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

alla sola buona volontà degli uomini erischierebbe troppo spesso di rimanereinattuato; e il processo sensa il dirittosarebbe un meccanismo costretto agirare a vuoto, privo de contenuto e discopo” (Manuale di DirittoProcessuale Civile, p. 117 e 126,citado por Rodolfo Camargo Mancuso,em A Coisa Julgada e sua Recepçãono Código Civil. O Código Civil e suaInterdisciplinaridade: Os Reflexosdo Código Civil nos Demais Ramos doDireito. Belo Horizonte: Del Rey, 2004,p. 286).66 MANCUSO, Rodolfo Camargo. ACoisa Julgada e sua Recepção noCódigo Civil. O Código Civil e suaInterdisciplinaridade: os Reflexos doCódigo Civil nos Demais Ramos doDireito. Belo Horizonte: Del Rey, 2004.p. 288.

Page 317: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

DO INCIDENTE DEDESCONSIDERAÇÃODA PERSONALIDADE

JURÍDICA

Atendendo ao clamordoutrinário, o Novo Código deProcesso Civil passa a tratar deum incidente de desconsideração

Page 318: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

da personalidade jurídica,regulamentando, no planoinstrumental, as regras materiaisexistentes em vários diplomas derelevo, o que vem em boa hora.

Diante de sua concepçãocomo realidade técnica eorgânica, a pessoa jurídica écapaz de direitos e deveres naordem civil, independentementedos membros que a compõem,com os quais não tem vínculo. Talrealidade pode ser retirada doart. 45 do Código Civil de 2002,ao dispor que começa aexistência legal das pessoasjurídicas de Direito Privado com

Page 319: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

a inscrição do ato constitutivo norespectivo registro. Fala-se emautonomia da pessoa jurídicaquanto aos seus membros, o queconstava expressamente no art. 20do Código Civil de 1916,dispositivo que não foireproduzido pela atualcodificação, sem que isso tragaqualquer conclusão diferente.

Como decorrência lógicadesse enquadramento, em regra,os componentes da pessoajurídica somente responderão pordébitos dentro dos limites docapital social, ficando a salvo opatrimônio individual,

Page 320: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

dependendo do tipo societárioadotado (responsabilidade intravires). A regra é a de que aresponsabilidade dos sócios emrelação às dívidas sociais sejasempre subsidiária, isto é,primeiro exaure-se o patrimônioda pessoa jurídica, para depois seexecutar os bens particulares dossócios ou componentes da pessoajurídica.

Devido a essa possibilidadede exclusão da responsabilidadedos sócios ou administradores, apessoa jurídica, por vezes,desviou-se de seus princípios efins, cometendo fraudes e lesando

Page 321: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

a sociedade ou terceiros,provocando reações na doutrina ena jurisprudência. Visando acoibir tais abusos, surgiu noDireito Comparado a figura dateoria da desconsideração dapersonalidade jurídica ou teoriada penetração (disregard of thelegal entity ou disregarddoctrine). Com isso, sãoalcançados pessoas e bens que seescondem dentro de uma pessoajurídica para fins ilícitos ouabusivos, além dos limites docapital social (responsabilidadeultra vires).

No plano doutrinário, Fábio

Page 322: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

Ulhoa Coelho assim demonstra asorigens da teoria: “A teoria é umaelaboração doutrinária recente.Pode-se considerar Rolf Serick oseu principal sistematizador, natese de doutorado defendidaperante a Universidade deTübigen, em 1953. É certo que,antes dele, alguns autores jáhaviam se dedicado ao tema,como, por exemplo, MauriceWormser, nos anos 1910 e 1920.Mas não se encontra claramentenos estudos precursores amotivação central de Serick debuscar definir, em especial apartir da jurisprudência norte-

Page 323: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

americana, os critérios gerais queautorizam o afastamento daautonomia das pessoas jurídicas(1950)”.1

Como se extrai de obra dojurista citado, são apontadosalguns julgamentos históricoscomo pioneiros da tese: casoSalomon vs. Salomon & Co.,julgado na Inglaterra em 1897, ecaso State vs. Standard Oil Co.,julgado pela Corte Suprema doEstado de Ohio, nos EstadosUnidos, em 1892.2 A verdade éque, a partir das teses e dosjulgamentos, as premissas depenetração na pessoa jurídica

Page 324: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

passaram a influenciar aelaboração de normas jurídicasvisando a sua regulamentação.Trata-se de mais uma festejadaincidência da teoria da aparênciae da vedação do abuso de direito,agora em sede do Direito deEmpresa, ramo do Direito Civil.

O instituto em análisepermite ao juiz não maisconsiderar os efeitos dapersonificação da sociedade paraatingir e vincularresponsabilidades dos sócios eadministradores, com intuito deimpedir a consumação de fraudese abusos por eles cometidos,

Page 325: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

desde que causem prejuízos edanos a terceiros, principalmentea credores da empresa. Dessaforma, os bens particulares dossócios podem responder pelosdanos causados a terceiros. Emsuma, o escudo, no caso dapessoa jurídica, é retirado paraatingir quem está atrás dele, osócio ou administrador. Bens daempresa também poderãoresponder por dívidas dos sócios,por meio do que se denominadesconsideração inversa ouinvertida, mais à frente estudada.

Como é cediço, o atualCódigo Civil Brasileiro acolheu

Page 326: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

expressamente adesconsideração. Prescreve o seuart. 50 que: “Em caso de abuso dapersonalidade jurídica,caracterizado pelo desvio definalidade, ou pela confusãopatrimonial, pode o Juiz decidir,a requerimento da parte, ou doMinistério Público quando lhecouber intervir no processo, queos efeitos de certas edeterminadas relações deobrigações sejam estendidos aosbens particulares dosadministradores ou sócios dapessoa jurídica.” Como adesconsideração da

Page 327: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

personalidade jurídica foiadotada pelo legislador da novacodificação privada, não é maisrecomendável utilizar a expressãoteoria, que constitui trabalhodoutrinário, amparado pelajurisprudência. Tal constataçãotambém é retirada da leitura doCódigo de Defesa doConsumidor.

O art. 28, caput, da Lei8.078/1990, enuncia que “o juizpoderá desconsiderar apersonalidade jurídica dasociedade quando, em detrimentodo consumidor, houver abuso dedireito, excesso de poder,

Page 328: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

infração da lei, fato ou ato ilícitoou violação dos estatutos oucontrato social. Adesconsideração também seráefetivada quando houver falência,estado de insolvência,encerramento ou inatividade dapessoa jurídica provocados pormá-administração; (...) § 5ºTambém poderá serdesconsiderada a pessoa jurídicasempre que sua personalidade for,de alguma forma, obstáculo aoressarcimento de prejuízoscausados aos consumidores”. Fazo mesmo o art. 4º da Lei deCrimes Ambientais (Lei

Page 329: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

9.605/1998), ao prescrever que“poderá ser desconsiderada apessoa jurídica sempre que suapersonalidade for obstáculo aoressarcimento de prejuízoscausados à qualidade do meioambiente”. De qualquer forma, notocante às duas normas, há umadiferença de tratamento, conformeserá demonstrado a seguir.

Mais recentemente, acategoria passou a constar da LeiAnticorrupção (Lei 12.846/2013),que criou uma nova modalidadede desconsideraçãoadministrativa, sem anecessidade de intervenção ou

Page 330: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

decisão judicial. Conforme o seuart. 14, “a personalidade jurídicapoderá ser desconsideradasempre que utilizada com abusodo direito para facilitar, encobrirou dissimular a prática dos atosilícitos previstos nesta Lei oupara provocar confusãopatrimonial, sendo estendidostodos os efeitos das sançõesaplicadas à pessoa jurídica aosseus administradores e sócioscom poderes de administração,observados o contraditório e aampla defesa”. Como odispositivo está inserido dentrodo capítulo relativo ao processo

Page 331: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

administrativo deresponsabilização, forçosoconcluir que se trata de medidaque independe de decisãojudicial.

Julgado publicado noInformativo n. 732 do SupremoTribunal Federal, de novembro de2013, reconhece a importânciadesse novo mecanismo de defesado interesse público e coletivo.De acordo com o relator,Ministro Celso de Mello, “éimportante reconhecer que apessoa jurídica não pode sermanipulada, com o ilícitoobjetivo de viabilizar o abuso de

Page 332: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

direito e a prática de fraude,principalmente no que concerneaos procedimentos licitatórios,pois essas são ideias que serevelam frontalmente contráriasao dever de moralidade e deprobidade, que constituemdeveres que se impõem àobservância da AdministraçãoPública e dos participantes. Olicitante de má-fé, por issomesmo, deve ter a sua condutasumariamente repelida pelaatuação das entidades estatais ede seus órgãos de controle, quenão podem tolerar o abuso dedireito e a fraude como práticas

Page 333: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

descaracterizadoras da essênciaética do processo licitatório”(STF, MS 32.494-MC/D, j.11.11.2013).

Tanto em relação à adoçãoda teoria, quanto à manutençãodas leis especiais anteriores, oumesmo posteriores, expressa oEnunciado n. 51 do CJF/STJ, da IJornada de Direito Civil, que “ateoria da desconsideração dapersonalidade jurídica –disregard doctrine – ficapositivada no novo Código Civil,mantidos os parâmetros existentesnos microssistemas legais e naconstrução jurídica sobre o

Page 334: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

tema”. Eis aqui o argumento peloqual não se pode mais utilizar aexpressão teoria, uma vez que adesconsideração foi abraçadapela codificação privada de2002; o que foi confirmado com aemergência do Novo CPC.

Aprofundando o tema, amelhor doutrina aponta aexistência de duas grandesteorias fundamentais acerca dadesconsideração dapersonalidade jurídica, como bemexposto pela doutrinaespecializada no assunto.3

A primeira delas é a teoria

Page 335: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

maior ou subjetiva, segundo aqual a incidência dadesconsideração, para serdeferida, exige a presença de doisrequisitos: o abuso dapersonalidade jurídica e oprejuízo ao credor. Essa teoria foiadotada pelo art. 50 do CódigoCivil de 2002.

A segunda teoria é a menorou objetiva, pela qual adesconsideração dapersonalidade jurídica exige umúnico elemento, qual seja, oprejuízo ao credor. Essa teoria foiadotada pela Lei 9.605/1998,para os danos ambientais, e,

Page 336: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

supostamente, pelo art. 28 doCódigo de Defesa doConsumidor.

Quanto ao Código de Defesado Consumidor, diz-sesupostamente devido a redaçãodo § 5º do seu art. 28, bastando omero prejuízo ao consumidorpara que a desconsideração sejadeferida, segundo a doutrinaespecializada.4 Esseentendimento por vezes é adotadopela jurisprudência, conforme sedepreende de notória eexplicativa ementa do SuperiorTribunal de Justiça:

Page 337: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

“Responsabilidade civil e Direito doconsumidor. Recurso especial. ShoppingCenter de Osasco-SP. Explosão.Consumidores. Danos materiais e morais.Ministério Público. Legitimidade ativa. Pessoajurídica. Desconsideração. Teoria maior eteoria menor. Limite de responsabilização dossócios. Código de Defesa do Consumidor.Requisitos. Obstáculo ao ressarcimento deprejuízos causados aos consumidores. Art. 28,§ 5º – Considerada a proteção do consumidorum dos pilares da ordem econômica, eincumbindo ao Ministério Público a defesa daordem jurídica, do regime democrático e dosinteresses sociais e individuais indisponíveis,possui o Órgão Ministerial legitimidade paraatuar em defesa de interesses individuaishomogêneos de consumidores, decorrentes deorigem comum. A teoria maior dadesconsideração, regra geral no sistemajurídico brasileiro, não pode ser aplicada coma mera demonstração de estar a pessoa

Page 338: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

jurídica insolvente para o cumprimento desuas obrigações. Exige-se, aqui, para além daprova de insolvência, ou a demonstração dedesvio de finalidade (teoria subjetiva dadesconsideração), ou a demonstração deconfusão patrimonial (teoria objetiva dadesconsideração). A teoria menor dadesconsideração, acolhida em nossoordenamento jurídico excepcionalmente noDireito do Consumidor e no DireitoAmbiental, incide com a mera prova deinsolvência da pessoa jurídica para opagamento de suas obrigações,independentemente da existência de desvio definalidade ou de confusão patrimonial. – Paraa teoria menor, o risco empresarial normal àsatividades econômicas não pode sersuportado pelo terceiro que contratou com apessoa jurídica, mas pelos sócios e/ouadministradores desta, ainda que estesdemonstrem conduta administrativa proba,isto é, mesmo que não exista qualquer provacapaz de identificar conduta culposa ou

Page 339: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

dolosa por parte dos sócios e/ouadministradores da pessoa jurídica. – Aaplicação da teoria menor da desconsideraçãoàs relações de consumo está calcada naexegese autônoma do § 5º do art. 28 do CDC,porquanto a incidência desse dispositivo nãose subordina à demonstração dos requisitosprevistos no caput do artigo indicado, masapenas à prova de causar, a mera existênciada pessoa jurídica, obstáculo ao ressarcimentode prejuízos causados aos consumidores.Recursos especiais não conhecidos” (STJ,REsp 279.273/SP, Rel. Min. Ari Pargendler,Terceira Turma, Rel. p/ Acórdão Min. NancyAndrighi, j. 04.12.2003, DJ 29.03.2004, p.230).

Julgados sucessivos domesmo Tribunal Superior adotama mesma ideia de divisão entre asteorias. Assim deduzindo, por

Page 340: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

exemplo: “a desconsideração dapersonalidade jurídica, à luz dateoria maior acolhida em nossoordenamento jurídico e encartadano art. 50 do Código Civil de2002, reclama a ocorrência deabuso da personificação jurídicaem virtude de excesso demandato, a demonstração dodesvio de finalidade (atointencional dos sócios em fraudarterceiros com o uso abusivo dapersonalidade jurídica) ou ademonstração de confusãopatrimonial (caracterizada pelainexistência, no campo dos fatos,de separação patrimonial entre o

Page 341: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

patrimônio da pessoa jurídica edos sócios ou, ainda, dos haveresde diversas pessoas jurídicas)”(STJ, AgRg no AREsp159.889/SP, Quarta Turma, Rel.Min. Luis Felipe Salomão, j.15.10.2013, DJe 18.10.2013).

Entretanto, no que tange aoDireito do Consumidor, como énotório, o art. 28, § 1º, do CDC,foi vetado, quando, na verdade, oveto deveria ter atingido o § 5º. Odispositivo vetado teria aseguinte redação: “A pedido daparte interessada, o juizdeterminará que a efetivação daresponsabilidade da pessoa

Page 342: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

jurídica recaia sobre o acionistacontrolador, o sócio majoritário,os sócios-gerentes, osadministradores societários e, nocaso de grupo societário, associedades que a integram” (art.28, § 1º). As razões do veto, quenão têm qualquer relação com anorma, são as seguintes: “O caputdo art. 28 já contém todos oselementos necessários àaplicação da desconsideração dapersonalidade jurídica, queconstitui, conforme doutrinaamplamente dominante no direitopátrio e alienígena, técnicaexcepcional de repressão a

Page 343: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

práticas abusivas”.Assim, fica em dúvida a

verdadeira adoção dessa teoria,apesar da previsão legal. Nessesentido, comentando o erro noveto, anota Gustavo Rene Nicolauque, “com este equívoco,manteve-se em vigor o terrível §5º. Entendo que não se podeconsiderar eficaz o referidoparágrafo, prestigiando umengano em detrimento de todauma construção doutrináriaabsolutamente solidificada e quevisa – em última análise –proteger a coletividade”.5 O queé importante dizer é que, apesar

Page 344: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

dos protestos do jovem civilista,o art. 28, § 5º, do CDC vemsendo aplicado amplamente pelajurisprudência como fundamentoda teoria menor ou objetiva.

Em suma, constata-se que adivisão entre a teoria maior e amenor consolidou-se nacivilística nacional. Isso mesmocom críticas formuladas pelopróprio Fábio Ulhoa Coelho, umdos seus principais precursores.Conforme se retira de obra maisrecente do jurista, “em 1999,quando era significativa aquantidade de decisões judiciaisdesvirtuando a teoria da

Page 345: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

desconsideração, cheguei achamar sua aplicação incorreta de‘teoria menor’, reservando àcorreta a expressão ‘teoriamaior’. Mas a evolução do temana jurisprudência brasileira nãopermite mais falar-se em duasteorias distintas, razão pela qualesses conceitos de ‘maior’ e‘menor’ mostram-se, agora,felizmente, ultrapassados”.6 Como devido respeito, acreditamosque a aclamada divisão deve sermantida na teoria e na prática doDireito Privado, especialmentepelo seu claro intuito didático emetodológico. Em complemento,

Page 346: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

a aplicação da teoria menor émais eficiente para a defesa dosinteresses dos consumidores.

Deve ficar claro que adesconsideração dapersonalidade jurídica nãosignifica a sua extinção, masapenas uma ampliação dasresponsabilidades, quebrando-secom a sua autonomia. Em tomsuplementar, a medida é tidacomo excepcional, dependendode autorização judicial, comoregra. Em suma, não se podeconfundir a desconsideraçãocom a despersonificação dapessoa jurídica. No primeiro

Page 347: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

instituto, apenas desconsidera-sea regra pela qual a pessoajurídica tem existência distinta deseus membros. Nadespersonificação, a pessoajurídica é dissolvida ou extinta.Destaque-se que adespersonificação da pessoajurídica está tratada, em termosgerais, pelo art. 51 do CódigoCivil, in verbis: “nos casos dedissolução da pessoa jurídica oucassada a autorização para seufuncionamento, ela subsistirá paraos fins de liquidação, até que estase conclua. § 1º Far-se-á, noregistro onde a pessoa jurídica

Page 348: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

estiver inscrita, a averbação desua dissolução. § 2º Asdisposições para a liquidação dassociedades aplicam-se, no quecouber, às demais pessoasjurídicas de direito privado. § 3ºEncerrada a liquidação,promover-se-á o cancelamento dainscrição da pessoa jurídica”.

Repisando, é possível, nocaso de confusão patrimonial,responsabilizar a empresa pordívidas dos sócios(desconsideração inversa ouinvertida). O exemplo típico é asituação em que o sócio, tendoconhecimento de divórcio,

Page 349: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

compra bens com capital próprioem nome da empresa (confusãopatrimonial). Peladesconsideração, tais benspoderão ser alcançados pela açãode divórcio, fazendo que oinstituto seja aplicado no Direitode Família. Sobre o tema,mencione-se o trabalho de RolfMadaleno, que trata da teoria dadisregard no Direito de Família.

Citando farta jurisprudênciado Tribunal de Justiça do RioGrande do Sul, o doutrinadorutiliza um exemplo muito próximodaquele que aqui fora apontado:“quando o marido transfere para

Page 350: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

sua empresa o rol maissignificativo dos bensmatrimoniais, sentença final decunho declaratório haverá dedesconsiderar este negócioespecífico, flagrada a fraude ou oabuso, havendo, emconsequência, como matrimoniaisesses bens, para ordenar suapartilha no ventre da separaçãojudicial, na fase destinada a suadivisão, já considerados comunse comunicáveis”.7

Admitindo essapossibilidade, na IV Jornada deDireito Civil foi aprovado oEnunciado n. 283 do CJF/STJ,

Page 351: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

determinando que “é cabível adesconsideração dapersonalidade jurídicadenominada ‘inversa’ paraalcançar bens de sócio que sevaleu da pessoa jurídica paraocultar ou desviar bens pessoais,com prejuízo a terceiros”. Dajurisprudência, pode serencontrado julgado publicado noInformativo n. 444 do STJ,aplicando a categoria (STJ, REsp948.117/MS, Rel. Min. NancyAndrighi, j. 22.06.2010).

A desconsideração inversa,do mesmo modo, é possível emdemanda envolvendo uma relação

Page 352: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

de consumo. Imagine-se o caso deum fornecedor ou prestador quetem vários débitos em relação aconsumidores e que, para fraudá-los, passa a transmitir os seusbens para o seu nome próprio.Entendendo desse modo, efazendo menção ao art. 28 doCDC, do Tribunal de São Paulo:

“Bem móvel. Ação de obrigação de fazer c.c.Pedido de indenização. Pedido de aplicaçãoda desconsideração inversa da pessoajurídica. Bloqueio ‘on-line’. Presentes ospressupostos legais (art. 28 do CDC e art. 50do CC de 2002). Agravo improvido.Presentes os elementos de convicção dospressupostos do art. 28 do Código de Defesado Consumidor e do art. 50 do Código Civil de2002, é aplicável a despersonalização da

Page 353: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

pessoa jurídica inversa para alcançar os benssociais ou particulares dos administradores ousócios que a integram” (TJSP, Agravo deInstrumento 990.10.074924-2, Acórdão4630.973/SP, Vigésima Sexta Câmara deDireito Privado, Rel. Des. Norival Oliva,julgado em. 10.08.2010, DJESP 23.08.2010).

Em todos os casos, seja adesconsideração direta ouinversa, dispõe o Enunciado n.281 do CJF/STJ, aprovado na IVJornada de Direito Civil, que asua aplicação prescinde dademonstração de insolvência dapessoa jurídica. Em tom prático,não há necessidade de provar quea empresa esteja falida para que adesconsideração seja deferida.

Page 354: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

Por outra via, o Enunciado n.282 do CJF/STJ aduz que oencerramento irregular dasatividades da pessoa jurídica, porsi só, não basta para caracterizarabuso de personalidade jurídica.Imagine-se a hipótese em que apessoa jurídica fechou oestabelecimento empresarial enão pagou credores, inclusiveconsumidores.

Não há como concordar comessa conclusão, pois oencerramento irregular é exemplotípico de abuso da personalidadejurídica, particularmente dedesvio de finalidade da empresa,

Page 355: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

conforme balizado entendimentojurisprudencial, apesar de amatéria não ser pacífica (nessesentido, ver: TJSP, Agravo deInstrumento 990.09.250776-1,Acórdão 4301323, São Paulo,Vigésima Nona Câmara deDireito Privado, Rel. Des. OscarFeltrin, j. 03.02.2010, DJESP25.02.2010; TJMG, AgravoInterno 1.0024.06.986632-5/0011, Belo Horizonte, DécimaPrimeira Câmara Cível, Rel. Des.Marcos Lincoln, j. 27.01.2010,DJEMG 22.02.2010; TJPR,Agravo de Instrumento 0572154-2, Guarapuava, Terceira Câmara

Page 356: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

Cível, Rel. Des. Paulo Habith,DJPR 17.12.2009, p. 32; TJRS,Agravo de Instrumento70030801385, Lajeado, DécimaNona Câmara Cível, Rel. Des.Guinther Spode, j. 24.11.2009,DJERS 01.12.2009, p. 75; TJDF,Recurso 2009.00.2.005888-6,Acórdão 361.803, Sexta TurmaCível, Rel. Des. Jair Soares,DJDFTE 18.06.2009, p. 87).

Para confirmar apossibilidade da desconsideraçãoem casos tais, anote-se que, noâmbito da execução fiscal, oSuperior Tribunal de Justiçaentende que se presume

Page 357: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

dissolvida irregularmente aempresa que deixar de funcionarno seu domicílio fiscal, semcomunicação aos órgãoscompetentes, legitimando oredirecionamento da execuçãofiscal para o sócio-gerente(Súmula 435). Como se nota, oteor da súmula está na contramãodo entendimento que consta docriticado Enunciado n. 282 doCJF/STJ. Também na direçãooposta desse enunciadodoutrinário, do mesmo SuperiorTribunal de Justiça, cabecolacionar trechos de doisacórdãos recentes. No primeiro

Page 358: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

deles, julgou-se que, “doencerramento irregular daempresa, presume-se o abuso dapersonalidade jurídica, seja pelodesvio de finalidade, seja pelaconfusão patrimonial, apto aembasar o deferimento dadesconsideração dapersonalidade jurídica daempresa, para se buscar opatrimônio individual de seusócio” (REsp 1.259.066/SP, Rel.Min. Nancy Andrighi, DJe28.06.2012). Ou, ainda, paracomplementar esse sentido:“reconhecendo o acórdãorecorrido que a ex-sócia, ora

Page 359: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

recorrente, praticou atos queculminaram no encerramentoirregular da empresa, com desviode finalidade e no esvaziamentopatrimonial, a revisão desteentendimento demandaria oreexame do contexto fático-probatório dos autos, o que évedado em sede de recursoespecial ante o óbice da Súmula7/STJ” (STJ, REsp1.312.591/RS, Quarta Turma,Rel. Min. Luis Felipe Salomão, j.11.06.2013, DJe 01.07.2013).

Todavia, essa forma dejulgar nunca foi pacífica noTribunal da Cidadania. A par

Page 360: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

dessa realidade, em dezembro de2014, a Segunda Seção doSuperior Tribunal de Justiçaacabou por analisar a matéria emsede de incidente de recursosrepetitivos, concluindo, na mesmalinha do Enunciado n. 282 doCJF/STJ, que o meroencerramento irregular dasatividades da empresa não tem ocondão de, por si só, gerar aincidência da desconsideração,especialmente aquela tratada peloCódigo Civil. Conforme arelatoria da Ministra Maria IsabelGallotti, “a criação teórica dapessoa jurídica foi avanço que

Page 361: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

permitiu o desenvolvimento daatividade econômica, ensejando alimitação dos riscos doempreendedor ao patrimôniodestacado para tal fim. Abusos nouso da personalidade jurídicajustificaram, em lenta evoluçãojurisprudencial, posteriormenteincorporada ao direito positivobrasileiro, a tipificação dehipóteses em que se autoriza olevantamento do véu dapersonalidade jurídica paraatingir o patrimônio de sócios quedela dolosamente seprevaleceram para lesarcredores. Tratando-se de regra de

Page 362: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

exceção, de restrição a princípioda autonomia patrimonial dapessoa jurídica, interpretação quemelhor se coaduna com o art. 50do Código Civil é a que rege suaaplicação a casos extremos, emque a pessoa jurídica tenha sidomero instrumento para finsfraudulentos por aqueles que aidealizaram, valendo-se dela paraencobrir os ilícitos quepropugnam seus sócios ouadministradores. Entendimentodiverso conduziria, no limite, emtermos práticos, ao fim daautonomia patrimonial da pessoajurídica, ou seja, regresso

Page 363: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

histórico incompatível com asegurança jurídica e com o vigorda atividade econômica. Comesses fundamentos, não estandoconsignado no acórdão estadualque a dissolução da sociedadetinha por fim fraudar credores ouludibriar terceiros, não seconfigurando, portanto, desvio dafinalidade social ou confusãopatrimonial entre sociedade,sócios ou administradores, acolhoos embargos de divergência paraque prevaleça tese adotada peloacórdão paradigma e, porconseguinte, restabelecer oacórdão especialmente recorrido”

Page 364: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

(Embargos de Divergência noAgravo Regimental no RecursoEspecial 1.306.553/SC).

Feitas tais considerações,também da IV Jornada de DireitoCivil, preconiza o Enunciado n.284 do CJF/STJ que “as pessoasjurídicas de direito privado semfins lucrativos ou de fins nãoeconômicos estão abrangidas noconceito de abuso dapersonalidade jurídica”. Esseenunciado está de acordo com oentendimento jurisprudencialpacífico que, por exemplo, admitea desconsideração dapersonalidade jurídica em face de

Page 365: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

uma associação (nesse sentido,ver: TJSP, Agravo de Instrumento573.072.4/7, Acórdão 3123059,São Vicente, Oitava Câmara deDireito Privado, Rel. Des.Caetano Lagrasta, j. 07.08.2008,DJESP 22.08.2008; TJPR,Agravo de Instrumento 0285267-3, Acórdão 238202, Curitiba,Décima Quinta Câmara Cível,Desembargadora Anny MaryKuss, j. 19.04.2005, publicadoem 06.05.2005).

Ainda naquele evento, foiaprovado o Enunciado n. 285 doCJF/STJ, estabelecendo que adesconsideração da

Page 366: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

personalidade jurídica pode serinvocada pela pessoa jurídica emseu favor. Como não poderia serdiferente, pode uma empresacredora também fazer uso doinstituto contra uma empresadevedora, presentes os requisitosdo art. 50 da codificação privada.Como consequência natural dessaementa doutrinária, acórdão doSuperior Tribunal de Justiçadeduziu que “a pessoa jurídicatem legitimidade para impugnardecisão interlocutória quedesconsidera sua personalidadepara alcançar o patrimônio deseus sócios ou ad-ministradores,

Page 367: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

desde que o faça com o intuito dedefender a sua regularadministração e autonomia – istoé, a proteção da suapersonalidade –, sem se imiscuirindevidamente na esfera dedireitos dos sócios ouadministradores incluídos no polopassivo por força dadesconsideração. (...) Por isso,inclusive, segundo o Enunciado n.285 da IV Jornada de DireitoCivil, ‘a teoria dadesconsideração, prevista no art.50 do Código Civil, pode serinvocada pela pessoa jurídica emseu favor’. Nesse compasso, tanto

Page 368: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

o interesse na desconsideração ouna manutenção do véu protetor,podem partir da própria pessoajurídica, desde que, à luz dosrequisitos autorizadores damedida excepcional, esta sejacapaz de demonstrar a pertinênciade seu intuito, o qual deve sempreestar relacionado à afirmação desua autonomia, vale dizer, àproteção de sua personalidade”(STJ, REsp 1.421.464/SP, Rel.Min. Nancy Andrighi, j.24.04.2014, publicado no seuInformativo n. 544).

Pois bem, analisadas asprincipais regras materiais a

Page 369: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

respeito da desconsideração, ealgumas de suas consequênciaspráticas, vejamos o tratamento doreferido incidente no NovoCódigo de Processo Civil e suasprincipais repercussões para odireito material. Como é notório,o incidente recebeu um títulopróprio no Capítulo IV do TítuloIII, que trata da intervenção deterceiros no processo (arts. 133 a137), sem prejuízo de outrosdispositivos, que aqui serãoabordados.

De início, estabelece o art.133, caput, do Novo Código deProcesso Civil que o incidente de

Page 370: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

desconsideração dapersonalidade jurídica seráinstaurado a pedido da parte oudo Ministério Público, quandolhe couber intervir no processo.Assim, fica afastada, pelo menosa priori, a possibilidade deconhecimento de ofício, pelo juiz,da desconsideração dapersonalidade jurídica. Lembre-se de que a menção ao pedidopela parte ou pelo MinistérioPúblico consta do art. 50 doCódigo Civil.

Apesar disso, o presenteautor entende que, em algunscasos, de ordem pública, a

Page 371: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

desconsideração dapersonalidade jurídica ex officioé possível. Cite-se, de início, ashipóteses envolvendo osconsumidores, eis que, nos termosdo art. 1º da Lei 8.078/1990, oCódigo de Defesa do Consumidoré norma de ordem pública einteresse social, envolvendodireitos fundamentais protegidospelo art. 5º da ConstituiçãoFederal de 1988. A essepropósito, por todos osdoutrinadores consumeristas,como pondera Cláudia LimaMarques, “no Brasil, pois, aproteção do consumidor é um

Page 372: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

valor constitucionalmentefundamental (Wertsystem) e é umdireito subjetivo fundamental (art.5º, XXXII), guiando – e impondo– a aplicação ex officio da normaprotetiva dos consumidores, aqual realize o direito humano(efeito útil e pro homine dostatus constitucional); esteja estanorma no CDC ou em fonte outra(art. 7º do CDC)”.8

Pensamos que também éviável a desconsideração dapersonalidade jurídica de ofíciopelo juiz nos casos de danosambientais, diante da proteçãoconstitucional do Bem Ambiental,

Page 373: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

como bem difuso, retirada do art.225 do Texto Maior. A conclusãodeve ser a mesma nas hipótesesenvolvendo corrupção, por forçada recente Lei 12.846/2013, deinteresse coletivo inquestionável.Em suma, a decretação ex officioé viável nos casos de incidênciada teoria menor.

Em complemento, o § 1º doart. 133 do Novo CPC estabeleceque o pedido de desconsideraçãoda personalidade jurídicaobservará os pressupostosprevistos em lei. Desse modo,devem ser respeitadas pelaspartes e pelos julgadores as

Page 374: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

regras materiais antescomentadas, bem como asinterpretações doutrinárias ejurisprudenciais outroradeduzidas, especialmente quantoàs teorias maior e menor.

Igualmente conformeexposto, com clara origem naevolução doutrinária ejurisprudencial a respeito dotema, enuncia § 2º do art. 133 doNovo CPC que o incidente dedesconsideração é aplicável àshipóteses de desconsideraçãoinversa da personalidadejurídica. Curiosamente, ofundamento legal para a

Page 375: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

desconsideração invertida passoua ser a norma da lei processual, enão a codificação material.

Conforme a cabeça do art.134 da Norma Processual Civilemergente, o incidente dedesconsideração é cabível emtodas as fases do processo deconhecimento, no cumprimento desentença e na execução fundadaem título executivo extrajudicial.Em complemento, a instauraçãodo incidente será imediatamentecomunicada ao distribuidor paraas anotações devidas (§ 1º).Dispensa-se a instauração doincidente se a desconsideração da

Page 376: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

personalidade jurídica forrequerida na petição inicial,situação em que será citado osócio ou a pessoa jurídica (§ 2º).A instauração do incidentesuspenderá o processo, salvo nahipótese de pedido na exordial,com citação do sócio (§ 3º).Parece ter pecado o CPC/2015por mencionar apenas os sócios enão os administradores daempresa, sendo viável fazer umainterpretação extensiva paratambém incluí-los. Orequerimento deve demonstrar opreenchimento dos pressupostoslegais específicos para

Page 377: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

desconsideração dapersonalidade jurídica (§ 4º).

A menção a qualquer fase doprocesso é louvável, afastando odebate anterior dedesconsideração em processoexecutivo, mormente por umsuposto atentado ao contraditórioe à ampla defesa. Com ainstauração do incidente, essadiscussão fica afastada.

Também afasta inquietaçõesanteriores a expressão de que ossócios – e administradores –passam a compor o polo passivoda demanda. Dessa forma, devemser tratados como partes e não

Page 378: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

como terceiros, nos casos dedesconsideração dapersonalidade jurídica. Tanto issoé verdade que o novo art. 790,inciso VII, do Código deProcesso Civil passou a enunciarque, nas situações dedesconsideração dapersonalidade jurídica, ficamsujeitos à execução os bens doresponsável.

Suplementarmente, o art. 674do Novo Código de ProcessoCivil define como legitimadopara opor embargos de terceirosaquele que, não sendo parte noprocesso, sofrer constrição ou

Page 379: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

ameaça de constrição sobre bensque possua ou sobre os quaistenha direito incompatível com oato constritivo. Ademais,conforme o § 2º, inciso III, domesmo artigo, considera-seterceiro, para ajuizamento dosembargos de terceiro, quemsofrer constrição judicial de seusbens por força dedesconsideração dapersonalidade jurídica, de cujoincidente não fez parte. Somentenessas hipóteses fáticas osembargos de terceiro sãocabíveis.

A mudança acaba por

Page 380: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

consolidar o entendimentoanterior segundo o qual, emhavendo desconsideração dapersonalidade jurídica emprocesso de execução, caberiamos embargos do devedor, tese quesempre foi defendida por esteautor. A esse propósito, dajurisprudência superior: “nostermos da jurisprudência iterativadesta Corte, os embargos dodevedor são o meio adequadopara defender interessepatrimonial do ex-sócio incluídono polo passivo da execução porforça da desconsideração dapersonalidade jurídica da

Page 381: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

empresa” (STJ, AgRg no Ag1.378.143/SP, Quarta Turma, Rel.Min. Raul Araújo, j. 13.05.2014,DJe 06.06.2014). Em tomcomplementar, para que nãopairem dúvidas sobre essaconclusão: “havendodesconsideração dapersonalidade jurídica, os sóciospassam a ser parte no processo deexecução, pelo que se mostracabível o oferecimento deembargos do devedor, e não deterceiros. Precedentes” (STJ,AgRg no AgRg no Ag656.172/SP, Quinta Turma, Rel.Min. Arnaldo Esteves Lima, j.

Page 382: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

04.10.2005, DJ 14.11.2005, p.383).

Afastam-se, desse modo,dúvidas atrozes no campoprático, especialmente porqueexistiam julgamentos, inclusivedo Superior Tribunal de Justiça,de cabimento dos embargos deterceiro, caso do seguinte: “Nãorestou caracterizada, em suaverdadeira essência, a aplicaçãoda teoria da desconsideração dapersonalidade jurídica, uma vezque, na presente hipótese, houveapenas a determinação dahipoteca legal dos bens do réu,bem como dos bens de sua

Page 383: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

própria empresa (que, ressalte-se,confunde-se com o seu patrimônioparticular), para a garantia doressarcimento dos danosocasionados à vítima do delito,denominado pelo Tribunal a quode ‘teoria da desconsideração dapessoa jurídica, às avessas’ (fl.488). Sobrevindo condenação emdefinitivo do réu e recaindo osefeitos de tal condenação sobre arecorrente, na esfera cível,poderá ela se valer dos embargosde terceiros, onde serápossibilitada a ampla discussãoda regularidade ou não daconstrição judicial procedida

Page 384: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

sobre seus bens” (STJ, RMS13.675/PR, Quinta Turma, Rel.Ministra Laurita Vaz, j.26.04.2005, DJ 23.05.2005, p.307).

Esclareça-se, por oportuno,que o incidente afasta todo essedebate, pois a defesa do sócio ouadministrador se dará dentro doprocedimento instituído e nãomais em sede de embargos dodevedor, com contraditóriodiferido.

Para findar a abordagem doart. 134 do Novo CPC, o seu § 4ºpreconiza que o requerimento dedesconsideração da

Page 385: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

personalidade deve demonstrar opreenchimento dos pressupostoslegais específicos para a suaincidência. Em suma, o pedidodeve ser bem fundamentado, coma exposição da incidência dasteorias maior ou menor, na linhade todas as lições que no presentecapítulo foram expostas.

Instaurado o incidente, osócio (ou a pessoa jurídica) serácitado para manifestar-se erequerer as provas cabíveis noprazo de 15 dias (art. 135 doNovo Processo Civil), o queevidencia a instauração de umlouvável contraditório, sempre

Page 386: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

defendido pela doutrina.Conforme o novo art. 136 do

CPC/2015, concluída a instrução,se necessária, o incidente seráresolvido por decisãointerlocutória, e não por sentença.Se a decisão for proferida pelorelator, caberá agravo interno,com tratamento específico nopróprio Estatuto Processualemergente.

Como última regra geral arespeito do incidente dedesconsideração, nos termos doart. 137 do Novo CPC, acolhidoo pedido de desconsideração, aalienação ou a oneração de bens,

Page 387: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

havida em fraude de execução,será ineficaz em relação aorequerente. Em suma, a opçãolegislativa é resolver a questãono plano da eficácia, e não davalidade, como constava da partefinal do art. 50 do Código Civil edo art. 28, caput, do Código deDefesa do Consumidor.

Além desses comandosgerais, cabe pontuar a relevânciado art. 792 do Novo Código deProcesso Civil para a matéria. Deacordo com a norma, considera-se fraude à execução a alienaçãoou a oneração de bem: a) quandosobre ele pender ação fundada em

Page 388: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

direito real ou com pretensãoreipersecutória, desde que apendência do processo tenha sidoaverbada no respectivo registropúblico, se houver; b) quandotiver sido averbada, em seuregistro, a pendência do processode execução; c) quando tiver sidoaverbada, em seu registro,hipoteca judiciária ou outro atode constrição judicial origináriodo processo em que foi arguida afraude; d) quando, ao tempo daalienação ou oneração, tramitavacontra o devedor ação capaz dereduzi-lo à insolvência; e e) nosdemais casos expressos em lei.

Page 389: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

Para as hipóteses dedesconsideração dapersonalidade jurídica, determinao seu § 3º, em boa hora, que afraude à execução se verifica apartir da citação da parte cujapersonalidade se pretendedesconsiderar, ou seja, do sócioou administrador. O tema dafraude à execução ainda seráaprofundado em capítulo próprio.

Outro dispositivo quemerece ser citado e anotado é oart. 795 do Novo CPC, segundo oqual os bens particulares dossócios não respondem pelasdívidas da sociedade, senão nos

Page 390: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

casos previstos em lei. Nostermos do seu § 1º, o sócio-réu,quando responsável pelopagamento da dívida dasociedade, tem o direito de exigirque primeiro sejam excutidos osbens da sociedade, o queconfirma a sua responsabilidadesubsidiária e não solidária,presente o benefício de ordem oude excussão. Ao sócio que alegaresse benefício, cabe a nomeaçãode bens da sociedade, situados namesma comarca, livres edesembargados, que bastem parapagar o débito (art. 795, § 2º). Osócio que pagar a dívida poderá

Page 391: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

executar a sociedade nos autos domesmo processo (art. 795, § 3º,do CPC). Por fim, para adesconsideração dapersonalidade jurídica éobrigatória a observância doincidente previsto no próprioCPC, de 2015, o que indica que aresponsabilidade do sócio ouadministrador passa a ser integrale solidária (art. 795, § 4º), nalinha do que vinha entendendo amelhor jurisprudência nacional.

Também em boa hora o novoart. 1.062 do CPC/2015 passa aprever que o incidente dedesconsideração da

Page 392: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

personalidade jurídica aplica-seao processo de competência dosjuizados especiais. Como oincidente não traz grandescomplexidades, não haveriaqualquer óbice para a suaincidência nesses processos,constituindo-se em um importantemecanismo que afasta a má-fé epune os maus sócios eadministradores.

Por fim, uma pequena críticapoderia ser formulada em relaçãoao Novo Codex, pelo fato de terincluído expressamente nosistema a desconsideraçãoinversa e não a teoria de

Page 393: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

sucessão de empresas, quecontinua sendo uma teoria.

Ora, esta constitui umaevolução ou um incremento dadesconsideração, nos casos deabuso da personalidade jurídicaem que for patente a ocorrênciade fraude por meio de outrapessoa jurídica, podendo omagistrado estender asresponsabilidades de umaempresa para outra. Tem-se, incasu, as denominadas empresassucedida e sucessora,respectivamente. A título deexemplo, aplicando a ideia desucessão de empresas, é

Page 394: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

interessante transcrever julgadodo extinto Primeiro Tribunal deAlçada Civil de São Paulo:

“Execução por título extrajudicial.Indeferimento do pedido de reconhecimentode sucessão de empresas. Desconsideraçãoda personalidade jurídica. Admissibilidadeante a existência de prova inequívoca.Caracterização de conluio entre as empresaspara prejudicar credores. Fraude evidenciada.Recurso provido para este fim” (PrimeiroTribunal de Alçada Civil de São Paulo,Processo 1256457-3, Agravo de Instrumento,Sorocaba, Terceira Câmara, Rel. TérsioNegrato, j. 04.05.2004, Decisão: Deramprovimento, v.u.).

Mais recentemente, da CortePaulista, cite-se acórdão em que

Page 395: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

se aplicou a teoria da sucessão deempresas para compensação decréditos e débitos envolvendo ofalido Banco Santos e oconhecido Bank of Europe,utilizado para perpetuartransações e fraudes peloprimeiro. O julgado – que teve aatuação deste autor comoparecerista – foi assim publicado,com a adoção da tese exposta naopinião doutrinária:

“Falência. Ação Monitória. Embargos.Procedência parcial em primeiro grau.Compensação de crédito do devedor do falidoperante banco do mesmo grupo econômicodeste. Possibilidade, no caso, de procedênciaintegral da ação. Não havendo dúvidas nos

Page 396: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

autos de que o Bank of Europe pertence aomesmo grupo econômico do falido, e de que,naquele, um dos apelantes tem crédito líquido,certo e exigível, possível a compensaçãodesse crédito com o débito dos apelantes paracom a Massa Falida. Apelação provida”(TJSP, Câmara Reservada à Falência eRecuperação do Tribunal de Justiça de SãoPaulo, Apelação com Revisão 9134530-70.2009.8.26.0000, São Paulo, Segunda Varade Falências e Recuperações Judiciais de SãoPaulo, Rel. Des. Lino Machado, j.27.11.2012).

Infelizmente, em nossaopinião, o Novo CPC poderiatrazer algumas luzes legais aessas situações, o que não acabouocorrendo. Sendo assim, osproblemas ainda serão

Page 397: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

solucionados com base naspáginas da doutrina e nasdecisões dos nossos Tribunais.

Page 398: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

__________1 COELHO, Fábio Ulhoa. Curso deDireito Comercial. 11. ed. São Paulo:Saraiva, 2008. v. 2, p. 37.2 COELHO, Fábio Ulhoa. Curso deDireito Comercial. 11. ed. São Paulo:Saraiva, 2008. v. 2, p. 41.3 Por todos, ver: COELHO, FábioUlhoa. Curso de Direito Comercial.11. ed. São Paulo: Saraiva, 2008. v. 2,p. 36-47.4 GARCIA, Leonardo de Medeiros.Direito do Consumidor. 3. ed.Niterói: Impetus, 2007. p. 114;PODESTÁ, Fábio Henrique. Códigode Defesa do ConsumidorComentado. São Paulo: RT, 2010. p.177.

Page 399: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

5 NICOLAU, Gustavo Rene.Desconsideração da PersonalidadeJurídica. In: CANEZIN, ClaudeteCarvalho. Arte Jurídica. Curitiba:Juruá, 2006. v. III, p. 236.6 COELHO, Fábio Ulhoa. Curso deDireito Comercial. 15. ed. São Paulo:Saraiva, 2011. v. 2, p. 66-67.7 MADALENO, Rolf. Direito deFamília. Aspectos Polêmicos. 2. ed.Porto Alegre: Livraria do Advogado,1999. p. 31.8 MARQUES, Claudia Lima.Comentários ao Código de Defesado Consumidor. 3. ed. São Paulo: RT,2010. p. 70. No mesmo sentido, ver:TARTUCE, Flávio; NEVES, DanielAmorim Assumpção. Manual deDireito do Consumidor. VolumeÚnico. 4. ed. São Paulo: Método, 2015.

Page 400: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

Capítulos 1 e 2.

Page 401: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

DOS NEGÓCIOSJURÍDICOS

PROCESSUAIS

Novidade festejada pormuitos, e criticada por outros, oNovo Código de Processo Civilpassou a tratar do que sedenomina negócios jurídicosprocessuais, tema abordado por

Page 402: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

Fredie Didier Jr. e PedroHenrique Pedrosa Nogueira, comprofundidade ímpar.1 Cuida-se deprojeção da teoria geral dos atose negócios jurídicos, para oâmbito do processo civilbrasileiro. A propósito, osegundo doutrinador citado, emdissertação de mestradodefendida na UFBA, sob aorientação do primeiro, assimdefine a nova figura: “negóciojurídico processual é o fatojurídico voluntário em cujosuporte fático, descrito em normaprocessual, esteja conferido aorespectivo sujeito o poder de

Page 403: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

escolher a categoria jurídica oude estabelecer, dentro dos limitesfixados no próprio ordenamentojurídico, certas situaçõesjurídicas processuais. Estandoligado ao poder deautorregramento da vontade, onegócio jurídico processualesbarra em limitaçõespreestabelecidas peloordenamento jurídico, comosucede em todo negóciojurídico”.2

Como apontam HumbertoTheodoro Júnior, Dierle Nunes,Alexandre Melo Franco Bahia eFlávio Quinaud Pedron, “diante

Page 404: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

de todo o cenário de grandesmudanças que o Novo CPCpretende instituir, ao lado daideia do gerenciamentoprocessual (case manegement)pelo juiz, aparece para as partesuma modalidade de flexibilizaçãodo procedimento permitindo àsmesmas escolher entre ‘circuitos’processuais”. (...). Aqui, naverdade, acompanha-se umatendência teórica, que já seapresentava na cultura jurídicaprocessual mundial a partir dofinal do século XX, começandona Inglaterra e nos EstadosUnidos, para depois chegar à

Page 405: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

França e à Itália”.3

Antes de se abordarem asregras procedimentais previstasno Estatuto Processual emergente,interessante expor os conceitosfundamentais de direito materialque influem diretamente naabordagem dessa categoria quepassa a fazer parte da normainstrumental. Como é notório, osconceitos de fato jurídico, atojurídico e negócio jurídico sãoessenciais para a compreensão doDireito Privado.

Iniciando-se pelo fatojurídico, este representa uma

Page 406: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

ocorrência que interessa aoDireito, ou seja, que tenharelevância jurídica. O fatojurídico lato sensu ou em sentidoamplo engloba dois conceitos.Inicialmente, pode ser um fatonatural, denominado fato jurídicostricto sensu ou em sentidoestrito. Por outra via, pode serum fato humano, com o elementovolitivo, surgindo o conceito defato jurígeno.

Outra construção primordial,o ato jurídico lato sensu ou emsentido amplo constitui um fatojurídico com elemento volitivo econteúdo lícito. Este autor está

Page 407: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

filiado à corrente doutrinária queafirma que o ato ilícito não éjurídico, por ser antijurídico(contra o direito). Essa é aopinião de Zeno Veloso, citandoainda o posicionamento deOrozimbo Nonato, Vicente Ráo,Pablo Stolze Gagliano e RodolfoPamplona Filho.4 Todavia, aquestão não é pacífica, poisdoutrinadores como Pontes deMiranda sustentam que o atoilícito também é ato jurídico.5Essa igualmente é a posição deJosé Carlos Moreira Alves, autorda Parte Geral do Código Civilde 2002.6

Page 408: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

Expostas tais categorias, apartir de uma construçãoconceitual sucessiva, chega-se àideia de negócio jurídico, quepode ser definido como um atojurídico em que há umacomposição de interesses daspartes com uma finalidadeespecífica. A expressão temorigem na construção da negaçãodo ócio ou do descanso (neg +otium), ou seja, na noção demovimento. Como faz AntônioJunqueira de Azevedo, pode-seafirmar que o negócio jurídicoconstitui a principal forma deexercício da autonomia privada,

Page 409: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

da liberdade negocial: “inconcreto, negócio jurídico é todofato jurídico consistente emdeclaração de vontade, a que todoo ordenamento jurídico atribui osefeitos designados comoqueridos, respeitados ospressupostos de existência,validade e eficácia impostos pelanorma jurídica que sobre eleincide”.7 Ou ainda, como querÁlvaro Villaça Azevedo, nonegócio jurídico “as partesinteressadas, ao manifestarem suavontade, vinculam-se,estabelecem, por si mesmas,normas regulamentadoras de seus

Page 410: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

próprios interesses”.8

Ainda no contexto dedefinição, cabe também expor aposição de Karl Larenz,construída a partir do CódigoCivil Alemão (BGB), precursorno seu tratamento. Para o jurista,o negócio jurídico é um ato – ouuma pluralidade de atos entre sirelacionados entre uma ou váriaspessoas –, cujo fim é produzir umefeito jurídico no âmbito doDireito Privado, isto é, umamodificação nas relaçõesjurídicas entre os particulares.9 Onegócio jurídico é o ponto centralda Parte Geral do Código Civil,

Page 411: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

sendo o seu conceito vital paraconhecer o contrato, o casamentoe o testamento, seus exemplostípicos no plano material. Com oNovo CPC, o negócio jurídicopassa a ter vital importância paraa compreensão de um novomecanismo para o exercício daautonomia privada no campo doprocesso civil brasileiro.

Para os devidos fins decaracterização, insta tambémexpor o conceito de ato jurídicostricto sensu ou em sentidoestrito, configurado quandohouver objetivo de merarealização da vontade do titular

Page 412: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

de um determinado direito, nãohavendo a criação de institutojurídico próprio para regulardireitos e deveres, muito menos acomposição de vontade entre aspartes envolvidas. No atojurídico stricto sensu, os efeitosda manifestação de vontade estãopredeterminados pela lei. ParaMarcos Bernardes de Mello,destacado intérprete da obra dePontes de Miranda, o ato jurídicostricto sensu é um “fato jurídicoque tem por elemento nuclear dosuporte fático a manifestação oudeclaração unilateral de vontadecujos efeitos jurídicos são

Page 413: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

prefixados pelas normas jurídicase invariáveis, não cabendo àspessoas qualquer poder deescolha da categoria jurídica oude estruturação do conteúdo dasrelações respectivas”.10 Podemser citados como exemplos deatos jurídicos stricto sensu aocupação de um imóvel, opagamento direto de umaobrigação e o reconhecimento deum filho. A respeito dos atosjurídicos em sentido estrito, o art.185 do atual Código Civilenuncia a aplicação das mesmasregras do negócio jurídico, noque couber. Ilustrando, as regras

Page 414: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

relativas às teorias das nulidadesou dos defeitos do negóciojurídico subsumem-se ao atojurídico stricto sensu.

Além dessas categorias,parte considerável da doutrinaainda estuda e expõe sobre o ato-fato jurídico ou ato real. ParaPontes de Miranda, “os atosreais, ditos, assim por serem maisdos fatos, das coisas, que doshomens – ou atos naturais, seseparamos natureza e psique, ouatos meramente externos, seassim os distinguirmos, porabstraírem eles do que se passano interior do agente – são os atos

Page 415: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

humanos a cujo suporte fático sedá entrada, como fato jurídico, nomundo jurídico, sem se atender,portanto, à vontade dos agentes:são atos-fatos jurídicos. Nem épreciso que haja querido ajuridicização dêles, nem, afortiori, a irradiação de efeitos.Nos atos reais, a vontade não éelemento do suporte fático (= osuporte fático seria suficiente,ainda sem ela). Exemplos de atosreais. São os principais atosreais: a) a tomada de posse ouaquisição da posse, b) atransmissão da posse pelatradição; c) o abandono da posse;

Page 416: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

d) o descobrimento do tesouro; e)a especificação; f) a composiçãode obra científica, artística ouliterária; g) a ocupação”.11

Em sentido próximo, lecionaPaulo Lôbo que “os atos-fatosjurídicos são atos oucomportamentos humanos em quenão houve vontade, ou, se houve,o direito não as considerou. Nosatos-fatos jurídicos a vontade nãointegra o suporte fático. É a leique os faz jurídicos e atribuiconsequências ou efeitos,independentemente de estes teremsido queridos ou não. O ato ou avontade é esvaziada e é apenas

Page 417: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

levada para juridicização comofato; o ato dissolve-se no fato”.12

Entre os nossos contemporâneos,Pablo Stolze Gagliano e RodolfoPamplona Filho pontuam que,“No ato-fato jurídico, o atohumano é realmente da substânciadesse fato jurídico, mas nãoimporta para a norma se houve,ou não, intenção de praticá-lo”.13

(...) “Excelente exemplo de ato-fato jurídico encontramos nacompra e venda feita por criança.Ninguém discute que a criança, aocomprar o doce no boteco daesquina, não tem vontadedirecionada à celebração do

Page 418: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

contrato de consumo. Melhor doque considerar, ainda que apenasformalmente, esse ato comonegócio jurídico, portador deintrínseca nulidade por força daincapacidade absoluta do agente,é enquadrá-lo na noção de ato-fato jurídico, dotado de amplaaceitação social”.14

Em suma, pode-se dizer queo ato-fato jurídico é um fatojurídico qualificado por umavontade não relevantejuridicamente em um primeiromomento, mas que se revelarelevante por seus efeitos. Alémdo exemplo dos últimos

Page 419: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

doutrinadores, pode ser citada ahipótese em que alguém encontraum tesouro sem querer, ou seja,sem vontade para tais fins. Anote-se que, na opinião deste autor,não há necessidade de se criaruma categoria própria parasolucionar ou enquadrar taissituações. Os institutos do fato,do ato e do negócio jurídicoparecem ser suficientes paratanto. No exemplo da criança,tem-se negócio válido, se elademonstrar discernimentobastante para o ato. No caso dotesouro, há um ato jurídico emsentido estrito, enquadrado no art.

Page 420: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

185 do CC/2002. A simplicidadedeve ser o caminho do intérprete,quando ela for possível esuficiente.

Expostos os conceitosfundamentais da teoria geral dosfatos jurídicos, insta relembrar asdiversas classificações donegócio jurídico, o que podeperfeitamente ser aplicado aosnegócios jurídicos processuais.Pelo que consta no art. 185 daatual codificação material, asclassificações a seguir servemtanto para os negócios quantopara os atos jurídicos em sentidoestrito.

Page 421: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

Inicialmente, quanto àsmanifestações de vontade dosenvolvidos, os negócios jurídicospodem ser unilaterais, bilateraisou plurilaterais.

Os negócios jurídicosunilaterais são atos e negóciosem que a declaração de vontadeemana de apenas uma pessoa,com um único objetivo. Os seusexemplos típicos são otestamento, a renúncia a umcrédito e a promessa derecompensa. Podem ser negóciosunilaterais receptícios aquelesem que a declaração deve serlevada a conhecimento do seu

Page 422: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

destinatário para que possaproduzir efeitos (v.g., promessade recompensa) e negóciosunilaterais não receptícios, emque o conhecimento pelodestinatário é irrelevante (v.g.,testamento).

Nos negócios jurídicosbilaterais, há duas manifestaçõesde vontade coincidentes sobre oobjeto ou bem jurídico tutelado.Podem ser mencionados, porexemplo, o contrato e ocasamento. Os negócios jurídicosprocessuais tratados pelo NovoCPC parecem se enquadrar nessacategoria, pelo menos em regra,

Page 423: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

considerando a presença de duaspartes no processo judicial.

Por derradeiro quanto àprimeira classificação, osnegócios jurídicos plurilateraissão os que envolvem mais deduas partes, com interessescoincidentes no plano jurídico.Como suas concretizações,citamos o contrato de consórcio eo contrato de sociedade entrevárias pessoas. Havendo mais deuma parte no processo, osnegócios jurídicos processuaistambém podem assumir esse viés.

Como segundo critérioclassificatório, quanto às

Page 424: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

vantagens patrimoniais para osenvolvidos, os negócios jurídicospodem ser gratuitos ou onerosos.Os primeiros são os atos deliberalidade, que outorgamvantagens sem impor aobeneficiado a obrigação de umacontraprestação. A título deilustração, cite-se a doação puraou simples, sem elementoacidental. Por seu turno, osnegócios jurídicos onerososenvolvem sacrifícios e vantagenspatrimoniais para todas as partesno negócio, com a presença deuma prestação e umacontraprestação, caso do contrato

Page 425: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

de compra e venda.Neste contexto de divisão, a

doutrina aponta mais duas outrasmodalidades de negócios quetambém devem ser consideradas.A primeira delas é a dosnegócios jurídicos neutros,aqueles em que não há umaatribuição patrimonialdeterminada, não podendo serenquadrados como gratuitos ouonerosos, caso da instituição deum bem de família voluntário ouconvencional (arts. 1.711 a 1.722do CC). Seguindo, os negóciosjurídicos bifrontes são os quetanto podem ser gratuitos como

Page 426: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

onerosos, o que depende daintenção das partes, caso doscontratos de depósito e demandato.15 Para este autor, emuma primeira análise, os negóciosjurídicos processuais podem sertidos como neutros ou mesmocomo gratuitos, o que aindanecessita de uma reflexão maisprofunda.

Quanto aos efeitos, noaspecto temporal, os negóciospodem ser inter vivos ou mortiscausa. Os primeiros sãodestinados a produzir efeitosdesde logo, isto é, durante a vidados negociantes ou interessados.

Page 427: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

Podemos citar os contratos emgeral. Por outra via, os negóciosmortis causa constituem aquelescujos efeitos só ocorrem após amorte de determinada pessoa,caso de um testamento e de umlegado. Não restam dúvidas deque os negócios jurídicosprocessuais se enquadram entreos primeiros.

Quanto à necessidade ounão de solenidades eformalidades, os negóciosjurídicos formais ou solenesobedecem a uma forma ousolenidade prevista em lei para asua validade e aperfeiçoamento,

Page 428: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

caso do casamento e dotestamento. Por seguirem o cursode um processo judicial, aqui sesituam os negócios jurídicosprocessuais. Por outro lado, osnegócios jurídicos informais ounão solenes admitem forma livre,constituindo regra geral, pelo queprevê o art. 107 do CC/2002, emsintonia com o princípio daoperabilidade ou simplicidade.Entre os últimos estão oscontratos de locação e prestaçãode serviços, que podem ser atéverbais.

Quanto à independência ouautonomia, os negócios jurídicos

Page 429: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

principais ou independentes sãoos que têm vida própria e nãodependem de qualquer outronegócio jurídico para teremexistência e validade (v.g.,locação). Mais uma vez, pareceser o caso dos negóciosprocessuais. Eles não se situam,portanto, no âmbito dos negóciosjurídicos acessórios oudependentes, aqueles cujaexistência está subordinada aoutro negócio jurídico,denominado principal (v.g., fiançaem relação à locação).

Levando-se em conta ascondições pessoais especiais dos

Page 430: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

negociantes, os negóciosjurídicos impessoais nãodependem de qualquer condiçãoespecial dos envolvidos, podendoa prestação ser cumprida tantopelo obrigado quanto por umterceiro (v.g., compra e venda).Não é o caso dos negóciosjurídicos pessoais, em que aspartes são as envolvidas noconflito, no litígio, enquadrando-se esses dentre os negóciosjurídicos personalíssimos ouintuitu personae, dependentes deuma condição especial de um dosnegociantes, havendo umaobrigação infungível. Pela

Page 431: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

qualificação especialmenteexistente quanto às partes doprocesso, os negócios jurídicosprocessuais se encaixam nosúltimos.

Quanto à sua causadeterminante, os negócios podemser causais ou abstratos. Osprimeiros, também denominadosmateriais, são aqueles em que omotivo consta expressamente doseu conteúdo, como ocorre, porexemplo, em um termo dedivórcio. Aqui também estariamos negócios jurídicosprocessuais, pois o seufundamento é o conflito existente

Page 432: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

entre os envolvidos. Não há comoenquadrá-los, portanto, entre osnegócios jurídicos abstratos ouformais, aqueles cuja razão nãose encontra inserida no conteúdo,decorrendo dele naturalmente.Situado nos últimos, por exemplo,está o termo de transmissão depropriedade.

Em relação ao momento deaperfeiçoamento, os negóciosjurídicos podem ser consensuaisou reais. Os consensuais são osque geram efeitos a partir domomento em que há o acordo devontades entre as partes, comoocorre na compra e venda pura

Page 433: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

(art. 482 do CC/2002). Os reaissão aqueles que produzem efeitosa partir da entrega do objeto, dobem jurídico tutelado, caso docomodato e do mútuo, que sãocontratos de empréstimo. Nãorestam dúvidas de que osnegócios jurídicos processuaisestão entre os primeiros.

Por fim, quanto à extensãodos efeitos, os negócios jurídicosconstitutivos geram efeitos exnunc, a partir da sua conclusão,pois constituem positiva ounegativamente determinadosdireitos. O exemplo típico é ocontrato de compra e venda. Por

Page 434: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

seu turno, os negócios jurídicosdeclarativos geram efeitos extunc, a partir do momento do fatoque constitui o seu objeto, casoda partilha de bens no inventário.Aqui, os negócios jurídicosprocessuais podem assumir asduas formas, o que depende danatureza da sentença que seráprolatada. Em caso de sentençadeclaratória, com efeitos ex tunc,situam-se nos últimos. Nashipóteses de sentençasconstitutivas, entre os primeiros.

Feitas tais considerações declassificação e categorizaçãojurídica, pontue-se que os

Page 435: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

negócios jurídicos processuaisdevem preencher os requisitos ouelementos estruturais do negócio,como bem observa PedroHenrique Pedrosa Nogueira emseu excelente trabalho sobre otema.16 No mesmo sentido é aopinião de Humberto TheodoroJúnior, Dierle Nunes, AlexandreMelo Franco Bahia e FlávioQuinaud Pedron, para quem,“ainda que pesem divergências,podemos afirmar que além dorespeito ao formalismodemocrático (considerando oâmbito de proteção dos direitosfundamentais correlatos), já

Page 436: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

aludido, o art. 166 do CódigoCivil brasileiro deverá serobservado. Dessa forma, comotodo negócio jurídico em geral,como determina a Teoria Geraldo Direito, deve-se atentar paraos três planos do mundo jurídico:existência, validade e eficácia,conforme a clássica proposta dePontes de Miranda”.17

Como se sabe, o estudo doselementos essenciais, naturais eacidentais do negócio jurídico éum dos pontos mais relevantes econtrovertidos da Parte Geral doCódigo Civil. É fundamentalestudar a concepção desses

Page 437: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

elementos a partir da teoriacriada pelo grande jurista Pontesde Miranda, que concebeu umaestrutura única para explicar taiselementos.18 Trata-se do que sedenomina Escada Ponteana ouEscada Pontiana. É essencialressaltar que os nossos estudosquanto ao tema surgiram a partirdos ensinamentos transmitidospela professora Giselda MariaFernandes Novaes Hironaka,titular em Direito Civil daFaculdade de Direito da USP eorientadora de doutorado desteautor. A partir dessa genialconstrução, o negócio jurídico

Page 438: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

tem três planos, a seguirdemonstrados: a) plano daexistência; b) plano da validade;c) plano da eficácia. Coube àProfessora Giselda Hironaka aconstrução do desenho da escada,como seguimos desde apublicação da 1ª edição da nossaobra Direito Civil. Volume 1, noano de 2004.

Sobre os três planos, ensinaPontes de Miranda que “existir,valer e ser eficaz são conceitostão inconfundíveis que o fatojurídico pode ser, valer e não sereficaz, ou ser, não valer e sereficaz. As próprias normas

Page 439: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

jurídicas podem ser, valer e nãoter eficácia (H. Kelsen,Hauptprobleme, 14). O que senão pode dar é valer e ser eficaz,ou valer, ou ser eficaz, sem ser;porque não há validade, oueficácia do que não é”.19 Dessaforma, a Escada Ponteana podeser concebida conforme odesenho a seguir:

Page 440: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce
Page 441: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

Na esteira das lições dePontes de Miranda, especialmentedesenvolvidas por GiseldaHironaka, o esquema éperfeitamente lógico, eis que, emregra, para que se verifiquem oselementos da validade, é precisoque o negócio exista.

Para que o negócio sejaeficaz, deve ser existente eválido. Entretanto, nem sempreisso ocorre, porque éperfeitamente possível que onegócio seja existente, inválido eeficaz, caso de um negóciojurídico anulável que esteja

Page 442: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

gerando efeitos. Ilustrando, podeser citado o casamento anulávelcelebrado de boa-fé, que geraefeitos como casamento putativo(art. 1.561 do CC/2002).Mencione-se ainda um contratoacometido pela lesão (art. 157 doCC), vício do negócio jurídicoque causa a sua anulabilidade,antes da propositura da açãoanulatória. Nesse caso, se a açãonão for proposta no prazodecadencial previsto em lei, onegócio será convalidado. Pelaconvalidação, o negócio inválidopassa a ser válido. Aconvalidação pode se dar pela

Page 443: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

conversão do negócio jurídico,pela confirmação pelas partes oupelo convalescimento temporal(cura pelo tempo).

Também é possível que onegócio seja existente, válido eineficaz, como é o caso de umcontrato celebrado sob condiçãosuspensiva e que não esteja aindagerando efeitos jurídicos epráticos. Cite-se, também, otermo inicial de um contrato queainda não se iniciou.

Fazendo o devido estudofracionado, e iniciando-se peloplano da existência, aqui estãoos pressupostos para um negócio

Page 444: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

jurídico, ou seja, os seuselementos mínimos, enquadradospor alguns autores dentro doselementos essenciais do negóciojurídico. Constituem, portanto, osuporte fático do negóciojurídico (pressupostos deexistência).

Nesse plano surgem apenassubstantivos, sem qualquerqualificação, ou seja,substantivos sem adjetivos.Esses substantivos são: a) partes(ou agentes); b) vontade; c)objeto; e d) forma. Não havendoalgum desses elementos, onegócio jurídico é inexistente (um

Page 445: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

nada para o direito), conformedefendem aqueles que seguem àrisca a teoria de Pontes deMiranda.

Fundamental notar que oCódigo Civil de 2002, a exemplodo seu antecessor, não adotou deforma separada o plano daexistência. Como se sabe, nãoexistem regras a respeito dainexistência do negócio jurídico.Ademais, o art. 104 do CC/2002trata diretamente do plano davalidade. Por isso, tinha razãoSílvio Rodrigues quandoafirmava que a teoria dainexistência seria inexata, inútil e

Page 446: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

inconveniente. Inexata, pois,muitas vezes, o ato inexistentecria algo cujos efeitos devem serafastados por uma ação judicial.Inútil, porque a noção de nulidadeabsoluta pode substituir a ideiade inexistência muito bem.Inconveniente, uma vez que,sendo considerada desnecessáriauma ação judicial para afastar osefeitos do negócio inexistente, odireito à prestação jurisdicionalestá sendo afastado,principalmente no que concerneàs pessoas de boa-fé.20 Emcomplemento, conformeafirmação de Rubens Limongi

Page 447: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

França, “a divisão bipartidadistingue apenas os atos nulos dosatos anuláveis. Os atosinexistentes se incluem entre osatos nulos”.21

Todavia, cumpre salientarque a maioria dos civilistas adotaa teoria da inexistência do atoou negócio jurídico em suasobras e manuais, caso, porexemplo, de Caio Mário da SilvaPereira, Marcos Bernardes deMello, Renan Lotufo, AntônioJunqueira de Azevedo, Sílvio deSalvo Venosa, Pablo StolzeGagliano, Rodolfo PamplonaFilho, Francisco Amaral, Zeno

Page 448: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

Veloso, José Fernando Simão,entre outros.

Entre os processualistas, adivergência também existe, masnão é tão aprofundada, napercepção do presente autor. Detoda sorte, Fredie Didier Jr.também analisa as invalidadesprocessuais a partir do plano daexistência e assevera: “o atojurídico inválido existe. O atoinexistente não tem defeito”.22

Como se extrai dosclássicos, a teoria dainexistência do negócio jurídicosurgiu em 1808 pelo trabalho de

Page 449: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

Zacarias (ou Zacchariae), parasolucionar o problema docasamento entre pessoas domesmo sexo, eis que não haviaprevisão no Código Francês arespeito da sua nulidade.23

Pontue-se que há forte tendêncianos Países Ocidentais deconhecimento de tais casamentoscomo entidades familiares, o queesvazia o histórico exemplo.

Sintetizando, e com intuitodidático, pode-se até afirmar queo plano da existência estáembutido no da validade.Todavia, a este autor parece sermelhor resolver as questões com

Page 450: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

a invalidade, ou seja, com ateoria das nulidades.

No segundo plano, o davalidade, os substantivosrecebem adjetivos, a saber: a)partes ou agentes capazes; b)vontade livre, sem vícios; c)objeto lícito, possível,determinado ou determinável; ed) forma prescrita ou não defesaem lei. Esses elementos devalidade constam expressamentedo art. 104 do CC/2002, cujaredação segue: “A validade donegócio jurídico requer: I –agente capaz; II – objeto lícito,possível, determinado ou

Page 451: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

determinável; III – formaprescrita ou não defesa em lei”.Não há no dispositivo mençãoexpressa a respeito da vontadelivre, mas é certo que talelemento está inserido seja nacapacidade do agente, seja nalicitude do objeto do negócio.

O negócio jurídico que nãose enquadra nesses elementos devalidade é, por regra, nulo depleno direito, ou seja, haveránulidade absoluta ou nulidade.Eventualmente, o negócio podeser também anulável, presente anulidade relativa ouanulabilidade, como no caso

Page 452: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

daquele celebrado porrelativamente incapaz ouacometido por vício doconsentimento. As hipótesesgerais de nulidade do negóciojurídico estão previstas nos arts.166 e 167 do CC/2002. Os casosde anulabilidade constam do art.171 da atual codificação material.

Insta verificar que ainvalidade pode ser total –quando atinge todo o negóciojurídico – ou parcial – quandoatinge parte do negócio jurídico.Ambas podem ser absolutas ourelativas. A respeito dainvalidade parcial, é fundamental

Page 453: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

a regra do art. 184 do CC/2002,pelo qual, respeitada a intençãodas partes, a invalidade parcialde um negócio jurídico não oprejudicará na parte válida, seesta for separável. Ademais, ainvalidade da obrigação principalimplica a das obrigaçõesacessórias, mas a destas nãoinduz a da obrigação principal.Trata-se de consolidação daantiga máxima pela qual a parteútil de um negócio não prejudicaa parte inútil (utile per inutilenon vitiatur), que tem relaçãodireta com o princípio daconservação dos negócios

Page 454: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

jurídicos.Exemplificando, imagine-se

o caso de um contrato cujacláusula penal seja nula. Anulidade da cláusula penal –invalidade parcial – nãoprejudica a essência do contrato,em regra, diante do seu nítidocaráter acessório. Aindailustrando, o Superior Tribunal deJustiça decidiu que “Nos termosdo art. 184, segunda parte, doCC/2002, ‘a invalidade daobrigação principal implica a dasobrigações acessórias, mas adestas não induz a da obrigaçãoprincipal’. Portanto, eventual

Page 455: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

abusividade de determinadascláusulas acessórias do contratonão tem relevância para odeslinde desta ação. Ainda que,em tese, transgridam osprincípios da boa-fé objetiva, daprobidade e da função social docontrato ou imponham ônusexcessivo ao recorrido, taisabusos não teriam o condão decontaminar de maneirairremediável o contrato, de sortea resolvê-lo. Recurso especialconhecido e provido” (STJ, REsp783.404/GO, Terceira Turma,Rel. Min. Fátima Nancy Andrighi,j. 28.06.2007, DJU 13.08.2007,

Page 456: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

p. 364).A respeito da relação entre

as invalidades processuais e asmateriais, explica Fredie DidierJr. que “o sistema de validadesdo direito civil é diferente dosistema das invalidadesprocessuais. Ao sistema deinvalidades processuais, todavia,aplicam-se todas as noções dateoria geral do direito sobre oplano da validade dos atosjurídicos”.24 De qualquermaneira, ao presente autor pareceque os negócios jurídicosprocessuais estão maissubmetidos à teoria das nulidades

Page 457: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

do Código Civil do que à teoriadas invalidades processuais,especialmente pelo fato de seremexpressões da autonomia privada.Sendo assim, é importanterelembrar o estudo dos requisitosde validade, que constituemelementos essenciais do negóciojurídico, compondo o segundodegrau da Escada Ponteana.

Iniciando-se pelas partescapazes ou pela capacidade doagente, como todo negóciojurídico traz como conteúdo umadeclaração de vontade – oelemento volitivo que caracterizao ato jurígeno –, a capacidade

Page 458: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

das partes é indispensável para asua validade. Quanto à pessoafísica ou natural, aqui figura agrande importância dos arts. 3º e4º do CC/2002, que apresentamas relações das pessoas absolutaou relativamente incapazes,respectivamente.

Enquanto os absolutamenteincapazes devem serrepresentados por seus pais,tutores e curadores, osrelativamente incapazes devemser assistidos pelas pessoas que alei determinar. Todavia, pode orelativamente incapaz celebrardeterminados negócios, como

Page 459: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

fazer testamento, aceitar mandatoad negotia e ser testemunha. Onegócio praticado peloabsolutamente incapaz sem adevida representação é nulo, porregra (art. 166, inciso I, doCC/2002). O realizado porrelativamente incapaz sem acorrespondente assistência éanulável (art. 171, inciso I, doCC/2002). Acreditamos que taispremissas servem para osnegócios processuais.

No tocante à incapacidaderelativa de uma parte, enuncia oart. 105 do CC/2002 que esta nãopode ser invocada pela outra em

Page 460: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

benefício próprio, também nãoaproveitando aos cointeressadoscapazes, salvo se, nesse caso, forindivisível o objeto do direito ouda obrigação comum a todos.Desse modo, não poderão oscredores ou os devedoressolidários ser privilegiados porsuas alegações. Isso porque,como se sabe, a alegação deincapacidade constitui umaexceção pessoal, uma defesa quesomente pode ser alegada pordeterminada pessoa.

No que se refere às pessoasjurídicas, estas devem serrepresentadas ativa e

Page 461: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

passivamente, na esfera judicialou não, por seus órgãos,constituídos conforme asformalidades previstas em lei.Em relação aos negóciosjurídicos processuais firmadospor empresas, a premissa éexatamente a mesma.

Por fim, além dessacapacidade geral, paradeterminados negócios, exige-sea capacidade especial paracertos atos, denominadalegitimação. Como exemplo,cite-se o caso de uma pessoamaior e casada que é plenamentecapaz, podendo dispor sobre seus

Page 462: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

bens imóveis sem representação.No entanto, ela não poderávender um imóvel sem a outorgade seu cônjuge ou o suprimentojudicial deste, salvo se casadosob o regime de separaçãoabsoluta de bens (arts. 1.647 e1.648 do CC/2002). A pena parao ato assim celebrado é a suaanulabilidade conforme o art.1.649 da mesma norma materialcodificada, desde que propostaação pelo outro cônjuge ou peloseu herdeiro no prazodecadencial de dois anos,contados da dissolução dasociedade conjugal. Quanto aos

Page 463: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

negócios jurídicos processuais,em casos de interesses relativos aimóveis, é indispensável aparticipação do cônjuge, salvo secasados no regime da separaçãoabsoluta de bens (art. 73 do NovoCPC).

Partindo para o segundoelemento essencial do negóciojurídico, a manifestação devontade exerce papel importanteno negócio jurídico, sendo seuelemento basilar e orientador.Vale dizer que a vontade é oelemento que diferencia onegócio, enquadrado nos fatoshumanos, fatos jurígenos e atos

Page 464: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

jurídicos, dos fatos naturais oustricto sensu.

O consentimento pode serexpresso – escrito ou verbal, noprimeiro caso de forma públicaou particular – ou tácito – quandoresulta de um comportamentoimplícito do negociante, queimporte em concordância ouanuência. Nesse sentido,preconiza o art. 111 do CC/2002que o silêncio implica anuência,quando as circunstâncias ou osusos o autorizarem, e não fornecessária a declaração devontade expressa. Desse modo,por regra, quem cala não

Page 465: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

consente, eis que, para que sejaválida a vontade tácita, devemestar preenchidos os requisitosapontados. De toda sorte, háexceções especiais a essa regra.Acreditamos que a máxima quemcala não consente também teráincidência para os negóciosjurídicos processuais.

Ainda a respeito da vontadeou consentimento, os arts. 112,113 e 114 trazem três regrasfundamentais quanto àinterpretação dos contratos enegócios jurídicos em geral, quemerecem ser comentadas, comclaras projeções para os negócios

Page 466: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

processuais.Pelo primeiro comando legal

– art. 112 do CC/2002 –, nasdeclarações de vontade seatenderá mais à intenção daspartes do que ao sentido literal dalinguagem. Desse modo, oaplicador do direito deve semprebuscar o que as partes queriam defato, quando celebraram onegócio, até desprezando, emcertos casos, o teor doinstrumento negocial. Esse art.112 do Código Civil relativiza aforça obrigatória das convenções,o pacta sunt servanda. Trazainda, em seu conteúdo, a teoria

Page 467: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

subjetiva de interpretação doscontratos e negócios jurídicos, emque há a busca da real intençãodas partes. Acredita-se que essavontade real igualmente será onorte interpretativo dos negóciosjurídicos processuais.

Ainda no que toca ao art.112 do CC/2002, é interessanteexpor o exemplo construído porKarl Larenz, que demonstra muitobem as dificuldades de se buscaro sentido real do que foipactuado. Expõe o jurista asituação de alguém que comunicaa um hotel a necessidade dereserva de dois quartos com três

Page 468: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

camas. O objetivo do declaranteé reservar um quarto com duascamas e outro quarto com umacama tão somente. No entanto, oatendente do hotel acaba porreservar dois quartos com trêscamas cada um. Como o hotelestá lotado, ao chegar, o hóspedeé cobrado da última forma.25

Quem deve ter razão? Vale dizerque o presente autor passou porsituação semelhante no seucotidiano. Certo dia, em umabarraca de pastel da famosa feiralivre da Vila Mariana, em SãoPaulo, fiz o seguinte pedido: “trêsqueijos, para viagem”. A

Page 469: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

atendente, inexperiente, entregouum pastel de três queijos, quandoo certo seria vender três pastéisde queijo. A própria gerente dabarraca corrigiu o equívoco, umavez que o pedido de três pastéis émais comum, inclusive pelasvendas habituais realizadas a esteautor.

O art. 113 do CC/2002consagra que os negóciosjurídicos, e logicamente oscontratos, devem serinterpretados de acordo com aboa-fé objetiva e os usos do lugarde sua celebração. Conformeenunciado aprovado na V

Page 470: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

Jornada de Direito Civil, ao qualse filia, devem-se incluir nosentido da norma as práticashabitualmente adotadas entre aspartes (Enunciado n. 409 doCJF/STJ). Diante do enunciadodoutrinário, pode-se falar emusos do tráfego, que, segundoLarenz, constituem uma práticahabitual nos negócios, umcostume corriqueiro na constânciadas relações entre as partes.Nesse contexto, são fatos quedevem ser considerados, segundoo jurista: a) os acordospreliminares; b) o caráter habitualdas relações mantidas entre as

Page 471: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

partes; c) as manifestaçõesanteriores do declarante e dodestinatário; d) o lugar, o tempo eas circunstâncias anexas aosfatos.26 Esses parâmetros,acreditamos, deverão serutilizados para os negóciosjurídicos de cunho processual nofuturo.

Seguindo no estudo desseimportante preceito, ele traz, aomesmo tempo, os princípios daeticidade e da socialidade, ambosbaluartes da codificação materialde 2002. O primeiro está noreconhecimento da interpretaçãomais favorável àquele que tenha

Page 472: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

uma conduta ética de colaboraçãoe de lealdade (boa-fé objetiva).O segundo, pela interpretação donegócio de acordo com o meiosocial, dentro da ideia daontognoseologia jurídica deReale, reconhecendo a funçãosocial dos negócios e contratos.Valoriza-se, portanto, conforme aementa transcrita, a teoriaobjetiva da interpretação doscontratos e negócios jurídicos.Cabe lembrar, na linha do expostono primeiro capítulo deste livro,que a boa-fé objetiva representaum dos esteios principiológicosdo Novo Código de Processo

Page 473: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

Civil, sendo perfeitamentepossível a incidência do art. 113do Código Civil para os negóciosjurídicos processuais.

Alguns juristas, contudo,entendem que o dispositivo emcomento traz a boa-fé subjetiva,aquela relacionada com aintenção das partes.27 Discorda-se desse posicionamento, pois aboa-fé-intenção está inserida nocomando legal antes referido (art.112 do CC). O art. 113 do CCtraz, na verdade, a função deinterpretação da boa-fé objetiva.

Assinala-se que os negócios

Page 474: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

jurídicos em geral,principalmente os contratos,devem ser interpretados damaneira mais favorável àqueleque esteja de boa-fé. Em algunscasos, a lei acaba presumindo deforma relativa essa boa-féobjetiva, guiando a interpretaçãodo magistrado. Podem ser citadosos casos de interpretação maisfavorável ao aderente (art. 423 doCC) e ao consumidor (art. 47 doCDC). No campo processual,acreditamos que isso tambémdeve guiar a interpretação donegócio jurídico processual,especialmente nos casos de

Page 475: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

presença de vulneráveisnegociais, como são os aderentese os consumidores.

Em suma, percebe-se quetinha total razão o saudosoMiguel Reale quando afirmavaque o art. 113 do CC/2002 seriaum artigo-chave do Código de2002.28 Em conclusão, odispositivo traz a funçãointerpretativa tanto da boa-féobjetiva quanto da função social.Na jurisprudência brasileira,inúmeros são os julgados deaplicação da boa-fé objetiva e dafunção social em uma relação desimbiose, de ajuda mútua, para a

Page 476: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

mitigação da força obrigatória daconvenção (ilustrando, dentremilhares de ementas: TJMG,Apelação Cível1.0024.08.255985-7/0011, BeloHorizonte, Décima QuintaCâmara Cível, Rel. Des. TibúrcioMarques, j. 12.02.2009, DJEMG18.03.2009; TJSP, Agravo deInstrumento 605.520.4/9,Acórdão 3383957, São Paulo,Quarta Câmara de DireitoPrivado, Rel. Des. ÊnioSantarelli Zuliani, j. 13.11.2008,DJESP 23.01.2009).

Ato contínuo de análise,aduz o art. 114 da atual

Page 477: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

codificação material que osnegócios jurídicos benéficosinterpretam-se estritamente.Desse modo, em contratosgratuitos, como são a doação e ocomodato, à vontade das partesnunca pode se dar um efeitoampliativo, sempre restritivo.Especializando o seu teor, prevêo art. 819 do CC/2002 que afiança não admite interpretaçãoextensiva. Como é notório, afiança é um típico contrato degarantia gratuita, em regra. Aosnegócios jurídicos processuaisque assim se enquadrem odispositivo também pode ser

Page 478: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

aplicado.Sendo o consentimento

inexistente, o negócio jurídicoexistirá apenas na aparência, masnão para o mundo jurídico, sendopassível de declaração deinexistência ou de nulidadeabsoluta. Dentre os que entendempela nulidade estão aqueles quenão são adeptos da teoria dainexistência do negócio jurídico,caso deste autor, pelo simplesfato de o Código Civil somentetratar da nulidade absoluta e darelativa. Não sendo a vontadelivre, por apresentar um vício doconsentimento, o negócio será

Page 479: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

tido como anulável. É o caso dapresença do erro, do dolo, dacoação, do estado de perigo e dalesão, todos plenamenteincidentes para o negócio jurídicoprocessual.

Partindo para o objeto queforma o conteúdo do negócio,somente será considerado válidoo ato que tenha um objeto lícito,nos limites impostos pela lei, nãosendo contrário aos bonscostumes, à ordem pública, àboa-fé e à sua função social oueconômica de um instituto. Comose sabe, ilícito o objeto, nulo seráo negócio jurídico (art. 166,

Page 480: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

inciso II, do CC/2002).Eventualmente pode estarcaracterizado no negócio jurídicoo abuso de direito, justamentepelo desrespeito aos conceitosque constam do art. 187 da atualcodificação material, o que, porsi só, constitui justificativa para adeclaração de nulidade,combinando-se os doisdispositivos legais aquimencionados.

Além disso, o objeto deveser possível no plano fático. Se onegócio implicar prestaçõesimpossíveis, também deverá serdeclarado nulo. Tal

Page 481: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

impossibilidade pode ser físicaou jurídica. A impossibilidadefísica está presente quando oobjeto não pode ser apropriadopor alguém ou quando a prestaçãonão puder ser cumprida poralguma razão. Por outra via, aimpossibilidade jurídica estápresente quando a lei vedar o seuconteúdo.

Segundo o art. 106 doCC/2002, a impossibilidadeinicial do objeto não gera anulidade do negócio se forrelativa, ou se cessar antes derealizada a condição a que eleestiver subordinado. Em suma,

Page 482: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

somente a impossibilidadeabsoluta é que tem o condão denulificar o negócio. Se o negócioainda puder ser cumprido ouexecutado, não há que falar eminvalidade. O comando legal trazem seu conteúdo o princípio daconservação negocial oucontratual, segundo o qual deve-se sempre buscar a manutençãoda vontade dos envolvidos, apreservação da autonomiaprivada. A ideia mantém relaçãodireta com o princípio da funçãosocial do contrato, segundo oEnunciado n. 22 do CJF/STJ,aprovado na I Jornada de Direito

Page 483: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

Civil, cuja redação merecedestaque: “a função social docontrato, prevista no art. 421 donovo Código Civil, constituicláusula geral que reforça oprincípio de conservação docontrato, assegurando trocas úteise justas”.

A título de exemplo deincidência material do art. 106 doCC/2002, cite-se a hipótese deum negócio envolvendo umacompanhia que ainda seráconstituída por uma das partesenvolvidas. Ou, ainda, como querÁlvaro Villaça Azevedo, ailustração da venda de um

Page 484: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

automóvel que não pode serfabricado em um primeiromomento, diante de uma grevedos metalúrgicos; surgindo apossibilidade posterior do objetonegocial pela cessação domovimento de paralisação.29 Nofuturo, concreções como essaspodem servir para os negóciosjurídicos processuais.

O objeto do negócio deveser determinado ou, pelo menos,determinável. O Código Civil de2002 reconhece falha dacodificação anterior, afastando origor da certeza quanto ao objeto.Pertinente apontar que, na

Page 485: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

obrigação de dar coisa incerta, oobjeto é ainda pendente dedeterminação (arts. 243 e 244 doCC/2002), que se dá pelaescolha, também denominadaconcentração. Mesmo assim, nãohá que falar em invalidade donegócio por indeterminação doobjeto, sendo este um exemplo deincidência da regra constante doart. 106 do CC/2002.

Nas típicas situações denegócios jurídicos de alienaçãode coisa, caso dos contratos decompra e venda e de doação, oobjeto deve ser ainda consumíveldo ponto de vista jurídico, o que

Page 486: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

se enquadra na segunda parte doart. 86 do CC/2002, que trata daconsuntibilidade jurídica. Emoutras palavras, o objeto deve seralienável, ao passo que a vendaou a doação de bem inalienável énula, por ilicitude do objeto oufraude à lei (art. 166, incisos II eVI, do CC). Por fim, saliente-seque é melhor utilizar a expressãobem inalienável do que a clássicacoisa fora do comércio – resextra commercium, do DireitoRomano. Como é notório, hámuito tempo superou-se a fasedos atos do comércio do DireitoComercial. Muito ao contrário,

Page 487: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

vivemos a fase do DireitoEmpresarial.

Para o presente autor, todasas regras expostas, a respeito doobjeto do ato jurídico de cunhomaterial, têm incidência, semressalvas, para o negócio jurídicoprocessual. O tempo e a práticadevem trazer exemplos dessaconcretização.

Partindo para o estudo daforma prescrita ou não defesa emlei, cabe trazer à tona as palavrasde Clóvis Beviláqua, para quem aforma seria “o conjuncto desolemnidades, que se devemobservar, para que a declaração

Page 488: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

da vontade tenha efficaciajuridica. É o revestimentojuridico, a exteriorizar adeclaração de vontade. Esta é asubstancia do acto, que a fórmarevela”.30 Como premissa-geral,a validade da declaração devontade não depende de formaespecial, senão quando a leiexpressamente a exigir. Dessemodo, os negócios jurídicos, emregra, são informais, nos termosdo art. 107 do CC/2002, queconsagra o princípio daliberdade das formas.

O Novo CPC repetiu amesma regra, já estabelecida na

Page 489: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

lei instrumental anterior, nosentido de serem os atosprocessuais informais. De acordocom o novo art. 188 do EstatutoProcessual, os atos e os termosprocessuais independem de formadeterminada, salvo quando a leiexpressamente a exigir. O mesmopreceito enuncia que seconsideram válidos os atos que,realizados de outro modo, lhepreencham a finalidade essencial.Em suma, adota-se que a ideia deque o material deve prevalecersobre o formal.

Todavia, não se deveesquecer que continua prevista a

Page 490: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

regra segundo a qual em todos osatos e termos do processo éobrigatório o uso da línguaportuguesa. Em complemento, odocumento redigido em línguaestrangeira somente poderá serjuntado aos autos quandoacompanhado de versão para alíngua portuguesa tramitada porvia diplomática ou pelaautoridade central, ou firmada portradutor juramentado (art. 192 doNovo CPC).

Entretanto, em casosespeciais, visando conferir maiorcerteza e segurança nas relaçõesjurídicas, a lei prevê a

Page 491: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

necessidade de formalidades,relacionadas com a manifestaçãoda vontade. Nessas situações, onegócio não admitirá forma livre,sendo conceituado como negócioformal. É fundamental diferenciarformalidade de solenidade,conforme faz uma parte dadoutrina. Solenidade significa anecessidade de ato público, casoda escritura pública, enquantoformalidade constitui a exigênciade qualquer forma apontada pelalei, por exemplo, a de formaescrita. Assim, pode-se dizer quea forma é gênero; a solenidade éespécie.

Page 492: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

Essa diferenciação entre ascategorias é importante quando seestuda, por exemplo, aclassificação dos contratos. Comtom didático, vale transcrever aspalavras de Sílvio de SalvoVenosa para quem “o contratosolene entre nós é aquele queexige escritura pública. Outroscontratos exigem forma escrita, oque os torna formais, mas nãosolenes. No contrato solene, aausência de forma torna-o nulo.Nem sempre ocorrerá a nulidade,e a relação jurídica gerará efeitosentre as partes, quando se trata depreterição de formalidade, em

Page 493: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

contrato não solene”.31 Em termospráticos, a diferenciação é poucorelevante. Isso porque, havendodesrespeito à forma ou sendopreterida alguma solenidadeprevista para o negócio, este seránulo (art. 166, incisos IV e V, doCC).

Ressalte-se o que dispõe oart. 109 do CC/2002, segundo oqual, “No negócio jurídicocelebrado com a cláusula de nãovaler sem instrumento público,este é da substância do ato”.Portanto, podem as partes, por atode vontade e visando à segurança,prever que o negócio deva

Page 494: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

atender a solenidades. Aimposição do negócio solenepode ser, portanto, convencionalentre as partes. Cabe relembrarque a escritura pública é lavradano Tabelionato de Notas dequalquer localidade do País,estando no plano da validade dosnegócios jurídicos (segundodegrau da Escada Ponteana).Acreditamos que as partes, nonegócio jurídico processual,também poderão impor, para ademanda, alguma solenidade queconsiderem essencial.

Cumpre ainda comentar oimportante art. 108 do CC/2002.

Page 495: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

Prescreve esse dispositivo que aescritura pública somente seráexigida para negócios jurídicosque visam à constituição,transferência, modificação ourenúncia de direitos reais sobreimóveis, com valor superior atrinta vezes o maior saláriomínimo vigente no País. Emrelação ao seu conteúdo, na IVJornada de Direito Civil, foiaprovado o Enunciado n. 289 doCJF/STJ, prevendo que “O valorde 30 salários mínimos constanteno art. 108 do Código Civilbrasileiro, em referência à formapública ou particular dos

Page 496: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

negócios jurídicos que envolvambens imóveis, é o atribuído pelaspartes contratantes, e nãoqualquer outro valor arbitradopela Administração Pública comfinalidade tributária”. Valoriza-sea autonomia privada, o que foipactuado pelas partes. Dequalquer forma, o enunciado podeabrir brecha para preçossimulados, que não são reais.Havendo simulação, o negóciopode ser declarado nulo, nostermos do art. 167 do CódigoCivil.

O art. 108 do CC/2002 temrelação direta com o princípio da

Page 497: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

função social dos contratos. Issoporque presumiu o legislador queuma pessoa que compra umimóvel com valor de até trintasalários mínimos não temcondições econômico-financeirasde pagar as despesas de escritura,estando dispensada de talencargo. Não há função socialmaior do que esta, diante daproteção das classesdesfavorecidas, aflorando oDireito Civil dos Pobres,conforme a notória construção deAntonio Menger.32 Pela relaçãocom a função social doscontratos, por envolver matéria

Page 498: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

de ordem pública (art. 2.035,parágrafo único, do CC/2002),não há no dispositivo legalqualquer inconstitucionalidade,por suposta lesão ao art. 7.º,inciso IV, do Texto Maior, queveda que o salário mínimo sejautilizado para outros fins que nãosejam de remuneração dostrabalhadores. Para rebaterqualquer alegação deinconstitucionalidade, destaque-se que a função social doscontratos está amparada nacláusula pétrea da função socialda propriedade, constante do art.5.º, XXII e XXIII, do Texto

Page 499: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

Maior. Ademais, analisando o fimsocial da norma constitucional,não há qualquer prejuízo aostrabalhadores se fixar o saláriomínimo como parâmetro para aescritura pública.

A encerrar, e por cautela,nunca é demais lembrar que nãose pode confundir a escriturapública com o registro. Aprimeira representa o própriocontrato de compra e venda, quepode ser celebrado em qualquerTabelionato de Notas do País, nãoimportando o local do imóvel.Por seu turno, o registro gera aaquisição da propriedade imóvel,

Page 500: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

devendo ocorrer,necessariamente, no Cartório deRegistro de Imóveis do local emque o bem estiver situado. Alémdisso, a escritura pública, sendoforma, está no plano da validadedo negócio jurídico; o registroimobiliário está no plano de suaeficácia. Os degraus da EscadaPonteana são distintos.

Feitas todas essasconsiderações sobre o plano davalidade do negócio, é importantetratar do seu plano da eficácia.No terceiro degrau da EscadaPonteana estão os elementosrelacionados com a suspensão e

Page 501: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

resolução de direitos e deveresdas partes envolvidas. De outraforma, pode-se dizer que nesseúltimo plano estão os efeitosgerados pelo negócio em relaçãoàs partes e em relação a terceiros,ou seja, as suas consequênciasjurídicas e práticas. Sãoelementos de eficácia osseguintes: a) condição (eventofuturo e incerto); b) termo (eventofuturo e certo); c) encargo oumodo (ônus introduzido em ato deliberalidade); d) regras relativasao inadimplemento do negóciojurídico (resolução), caso dosjuros, da cláusula penal ou multa

Page 502: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

e das perdas e danos; e) direito àextinção do negócio jurídico(resilição); f) regime de bens donegócio jurídico casamento; e g)registro imobiliário. De maneiradidática, pode-se dizer que oselementos que não estão no planoda existência e da validade estãono da eficácia, mormente aquelesrelativos às decorrênciasconcretas do negócio jurídico. Nocampo do negócio jurídicoprocessual, nesse plano estariamas convenções estabelecidas entreas partes sobre prazos, condiçõese limitações na prova, o que foiadmitido pelo Novo CPC, como

Page 503: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

se verá.Antes de partir para esse

estudo, é necessário lembrar queo Código Civil traz uma relevanteregra de direito intertemporal quepode perfeitamente repercutir nosnegócios jurídicos processuais.Nesse contexto, é fundamental aanálise do art. 2.035, caput, doCódigo Civil de 2002,dispositivo de direitointertemporal que resolve umasérie de problemas relativos aonegócio jurídico. Anote-se que odireito intertemporal é o ramo daciência jurídica que visasolucionar os conflitos da lei no

Page 504: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

tempo, principalmente diante dosurgimento de uma nova norma. Éa redação desse importantecomando legal:

“Art. 2.035. A validade dos negócios edemais atos jurídicos, constituídos antes daentrada em vigor deste Código, obedece aodisposto nas leis anteriores, referidas no art.2.045, mas os seus efeitos, produzidos após avigência deste Código, aos preceitos dele sesubordinam, salvo se houver sido previstapelas partes determinada forma deexecução”.

A redação desse dispositivonos traz duas constataçõesimportantes. A primeira é que ocomando não adota

Page 505: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

expressamente o plano daexistência, eis que o artigo jácomeça tratando da validade dosnegócios e demais atos jurídicos.Em verdade, para os devidos fins,deve-se entender que o plano daexistência está subentendido noda validade. A segundaconstatação é de que em relação àvalidade dos negócios jurídicosdeve ser aplicada a norma domomento da sua constituição oucelebração.

Estabelece o comando legalque, se o negócio for celebradona vigência do Código Civil de1916, quanto à sua validade,

Page 506: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

devem ser aplicadas as regrasque constavam na codificaçãoanterior. Isso no que concerne àcapacidade das partes, àlegitimação, à vontade livre, àlicitude do objeto e à formaprescrita em lei. Por outra via, notocante ao plano da eficácia,devem ser aplicadas as normasincidentes no momento daprodução de seus efeitos (“masos seus efeitos, produzidos após avigência deste Código, aospreceitos dele se subordinam”).Nesse contexto, relativamente àcondição, ao termo, aos juros, àsmultas e outras penalidades, às

Page 507: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

perdas e danos, à rescisãocontratual e ao regime de bens decasamento, deve ser aplicada anorma atual, no caso, o CódigoCivil 2002.

Vejamos algumasexemplificações concretas deaplicação de tais premissas. Deinício, imagine-se um caso emque foi celebrado um contrato navigência do Código Civil de1916, ou seja, até 10 de janeirode 2003. O contrato traz umamulta exagerada,desproporcional, estandopresente a onerosidadeexcessiva, a desproporção no

Page 508: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

negócio jurídico no que toca àcláusula penal. Odescumprimento do negócioocorreu na vigência do CódigoCivil de 2002, a partir de 11 dejaneiro de 2003, segundo amaioria da doutrina e dajurisprudência. Pergunta-se: épossível aplicar o art. 413 doatual Código Civil, que consagrao dever do magistrado reduzir acláusula penal que for exagerada,a fim de evitar a onerosidadeexcessiva? Lembrando que essaredução equitativa em caso dedesproporção constitui parcialnovidade, é de se responder

Page 509: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

positivamente. Isso porque oinadimplemento ocorreu navigência da nova lei, estando amulta no plano da eficácia, o quejustifica a aplicação da atuallegislação.

Vale aqui citar a sentençaproferida pela 13.ª Vara Cível doForo Central da Capital de SãoPaulo, no caso envolvendo oapresentador Boris Casoy e aRede Record de Televisão.Diante do descumprimento docontrato por parte da emissora, oapresentador resolveu cobrar amulta compensatória prevista nocontrato, de cerca de 27 milhões

Page 510: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

de reais. Aplicando o art. 413 doCC/2002 ao contrato, celebradoem 12 de abril de 2002, omagistrado reduziu a cláusulapenal para cerca de seis milhõesde reais (Processo583.00.2006.135945-8, Sentençade 18 de outubro de 2006, JuizAndré Gustavo CividanesFurlan). Em junho de 2011, adecisium foi parcialmentereformada pelo Tribunal deJustiça de São Paulo, queaumentou o valor da cláusulapenal para dez milhões de reais,por entender que a multa fixadapela primeira instância era

Page 511: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

insuficiente. Vejamos apublicação da ementa doacórdão:

“Indenizatória. Contrato de prestação deserviços. Apresentador e editor-chefe detelejornal. Rescisão imotivada. Multacompensatória estabelecida em cláusulacontratual. Montante manifestamenteexcessivo. Incidência do art. 413 do CC.Redução equitativa do valor da indenização.Critérios a serem observados. Adoção decálculo aritmético com vista ao tempo faltantede cumprimento do contrato. Insuficiência.Indenização majorada. Recurso dos autoresprovido para este fim. Acolhimento de pedidosubsidiário formulado na inicial.Reconhecimento da sucumbência recíproca.Apelo da ré provido” (TJSP, Apelação0062432-17.2007.8.26.0000, Acórdão5211780, São Paulo, Trigésima PrimeiraCâmara de Direito Privado, Rel. Des. Milton

Page 512: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

Carvalho, j. 21.06.2011, DJESP 28.06.2011).

De qualquer modo, oacórdão mantém a tese desubsunção do art. 413 do CódigoCivil de 2002 a contratocelebrado na vigência do CódigoCivil de 1916, conforme aquisustentado.

Como segundo exemplo deaplicação do art. 2.035 do CC,pode ser citado o teor doEnunciado n. 164 da III Jornadade Direito Civil do Conselho daJustiça Federal e do SuperiorTribunal de Justiça, segundo oqual: “Tendo início a mora do

Page 513: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

devedor ainda na vigência doCódigo Civil de 1916, sãodevidos juros de mora de 6% aoano, até 10 de janeiro de 2003; apartir de 11 de janeiro de 2003(data de entrada em vigor donovo Código Civil), passa aincidir o art. 406 do Código Civilde 2002”. Como se sabe, os jurosestão no plano da eficácia de umaobrigação ou de um contrato.Sendo assim, devem seraplicadas as normas do momentoda eficácia do negócio jurídico. Éjustamente isso que ordena oenunciado, com o qual é de seconcordar integralmente. Vários

Page 514: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

julgados do STJ vêm aplicando oteor desse enunciado (nessesentido, ver, por todos: STJ,AgRg no Ag 714.587/RS,Terceira Turma, Rel. Min. SidneiBeneti, j. 11.03.2008, DJ01.04.2008, p. 1).

Outra ilustração envolve anecessidade da outorga conjugal.Como é notório, o art. 1.647 doatual Código Civil exige aoutorga uxória – da esposa – emarital – do marido – para aprática de alguns atos e negócios,salvo se o regime entre eles for oda separação absoluta. Aexigência abrange a venda de

Page 515: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

imóvel, as doações e a prestaçãode fiança, entre outros atos. Afalta dessa outorga, não supridapelo juiz, gera a anulabilidade ounulidade relativa do atopraticado, conforme prevê o art.1.649 do CC/2002.

O Código Civil de 1916dispunha, nos seus arts. 235, 242e 252, que os atos assimcelebrados, sem a outorga, seriamnulos, presente uma nulidadeabsoluta. No entanto, e se acompra e venda de imóvel foicelebrada na vigência doCC/1916 por um dos cônjuges,sem a outorga do outro? Esse

Page 516: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

negócio é nulo ou anulável? Onegócio será nulo, pois aplica-sea norma do momento dacelebração. Consigne-se que aoutorga conjugal é hipótese delegitimação, uma espécie decapacidade, que está no plano davalidade. O negócio é nulomesmo que a ação tenha sidoproposta na vigência do CódigoCivil de 2002, após 11 de janeirode 2003, pois a questão a seranalisada é de natureza material,e não processual.

Também a título de exemploé imperioso apontar que a EscadaPonteana e o art. 2.035 do

Page 517: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

CC/2002 repercutem no contratode sociedade, típico do DireitoEmpresarial. Enuncia o art. 977do atual Código Civil que:“Faculta-se aos cônjugescontratar sociedade, entre si oucom terceiros, desde que nãotenham casado no regime dacomunhão universal de bens, ouno da separação obrigatória”. Odispositivo citado proíbe quecônjuges casados sob os regimesda comunhão universal ou daseparação total obrigatóriaconstituam sociedade entre si.Trata-se de regra de capacidade,que está no plano da validade.

Page 518: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

Assim, o dispositivo somente seaplica às sociedades constituídasapós a entrada em vigor do atualCódigo Civil. No Código Civilanterior não havia essa restriçãoem relação à capacidade,havendo direito adquirido quantoà não aplicação do comandolegal. Portanto, as sociedadesanteriores não serão atingidas,pois quanto ao plano da validadedeve ser aplicada a norma domomento da constituição donegócio. A tese foi adotada na IIIJornada de Direito Civil doConselho da Justiça Federal e doSuperior Tribunal de Justiça, pelo

Page 519: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

teor do seu Enunciado n. 204: “Aproibição de sociedade entrepessoas casadas sob o regime dacomunhão universal ou daseparação obrigatória só atinge associedades constituídas após avigência do Código Civil de2002”. No mesmo sentido, é oParecer jurídico 125/2003, doDepartamento Nacional deRegistro do Comércio(DNRC/COJUR). Ajurisprudência tem decidido namesma linha de raciocínio (nessesentido, ver: TJSP, ApelaçãoCível 358.867-5/0, São Paulo,Primeira Câmara de Direito

Page 520: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

Público, Rel. Des. Renato Nalini,Data do registro: 26.04.2006,Voto 11.033).

Como última ilustração,agora envolvendo o Direito deFamília, destaque-se que oregime de bens de casamento estáno plano da eficácia, poisrelativo às suas consequências.Sendo assim, é possível alterarregime de bens de casamentocelebrado na vigência do CódigoCivil de 1916, subsumindo aregra do art. 1.639, § 2.º, doCC/2002, que possibilita a açãode alteração do regime, mediantepedido motivado de ambos os

Page 521: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

cônjuges. Esse é o entendimentomajoritário da doutrina,consubstanciado no Enunciado n.260 do CJF/STJ, aprovado na IIIJornada de Direito Civil,realizada em 2004, nos seguintestermos: “Arts. 1.639, § 2.º, e2.039: A alteração do regime debens prevista no § 2.º do art.1.639 do Código Civil também épermitida nos casamentosrealizados na vigência dalegislação anterior”. No planojurisprudencial, a tese é adotadapelo Superior Tribunal de Justiçadesde o ano de 2005 (nessesentido, ver: STJ, REsp

Page 522: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

730.546/MG, Rel. Min. JorgeScartezzini, 4.ª Turma, j.23.08.2005, DJ 03.10.2005, p.279). O tema ainda seráaprofundado em capítuloespecífico deste livro, que tratadas Ações de Direito de Família(Capítulo 12).

Deve restar evidente que oart. 2.035, caput, do CC temgrande relevância prática para osnegócios jurídicos em geral. Quefique claro que este autor é umdos entusiastas do referidocomando legal, um dos melhoresda atual codificação, não havendoqualquer inconstitucionalidade no

Page 523: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

comando por lesão à proteção dodireito adquirido (art. 5.º,XXXVI, da CF/1988). Muito aocontrário.

Feitas todas essasconsiderações de cunho material,e partindo para as regrasinseridas no Novo Código deProcesso Civil sobre os negóciosjurídicos processuais, os seusfundamentos encontram-se no seuart. 190. De acordo com o seucaput, versando o processo sobredireitos que admitamautocomposição, é lícito às partesplenamente capazes estipularmudanças no procedimento para

Page 524: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

ajustá-lo às especificidades dacausa e convencionar sobre osseus ônus, poderes, faculdades edeveres processuais, antes oudurante o processo.

Para o presente autor, pelasua experiência arbitral, pareceque as partes podem transpormuitas das máximas arbitrais paraum processo judicial, o que viriaem boa hora. Haveria, assim, umaminiarbitragem judicial. Talcorrelação foi observada porRodrigo Reis Mazzei e BárbaraSeccato Ruis Chagas33 em artigocientífico sobre o assunto. São asconclusões desse preciso

Page 525: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

trabalho:

“A evolução do processo civil noordenamento jurídico brasileiro direciona paraa flexibilização do procedimento, em prol daefetividade do processo enquanto instrumentoconcretizador de direitos. Nesse sentido,deve-se superar a dicotomia entre público eprivado, para melhor explorar os interstíciosentre esses dois ramos, na construção de umdireito intermediário, conforme defendido pordoutrina.Desta forma, a realização dos negóciosjurídicos processuais, seja antes ou durante oprocesso, estimula o diálogo entre o juiz e aspartes, permitindo-lhes avaliar, nos limitespossíveis, os melhores caminhos a seremtrilhados para o deslinde da controvérsia, oque, conforme Pedro Henrique PedrosaNogueira, torna o exercício da atividadejudiciária muito mais democrático. Aliás, nãopodemos perder de vista que todo o sistema

Page 526: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

processual se submete a um modelodemocrático, devidamente implementado egarantido pela carta Constitucional de 1988.Apontando para tal direção, o processo civilencontra respaldo nas práticas arbitrais. A viaalternativa de resolução de conflitosdemonstra que a experiência com aflexibilização do procedimento e oempoderamento das partes resulta emprocesso mais efetivo, no qual os atoresprocessuais atuam em cooperação para aresolução da controvérsia.Assim, parece rumar para um bom caminho oprocesso civil brasileiro. No intuito deconsolidar os valores e princípiosconstitucionais, conclui-se que o diálogo entrepúblico e privado, entre jurisdição estatal ejurisdição privada, contribui para enriquecer odebate acerca do acesso à Justiça e daconcretização de direitos. Consagrando taisevidências, a teoria do negócio jurídicoprocessual garante sucesso à arbitragem e,almeja-se, pretende revolucionar

Page 527: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

positivamente o novo sistema processual civilque emerge”.

Todavia, apesar desseentusiasmo inicial, que também énosso, cabe lembrar que noprocesso judicial há a figura dojuiz togado, preso à estritalegalidade, ao contrário dosárbitros, com mais liberdade paradecidir. Talvez por isso osnegócios jurídicos processuaisnão vinguem no futuro, comoacredita Fernanda Tartuce, emconversas informais mantidascom este autor.

Alguns enunciados

Page 528: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

aprovados pelo FórumPermanente dos Processualistas(FPPC), promovido pelo Institutode Direito Processual, devem sermencionados. De início, oEnunciado n. 135 estabelece quea indisponibilidade do direitomaterial discutido no processonão impede, por si só, acelebração do negócio jurídicoora analisado. Para o presenteautor, civilista, fica difícilconcordar com o seu teor,especialmente pela necessidadede tutela efetiva dos direitosindisponíveis.

Outros três Enunciados, de

Page 529: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

números 253, 255 e 256, preveemque os negócios jurídicosprocessuais podem sercelebrados por qualquer parte,inclusive pela Fazenda Pública epelo Ministério Público, estequando for autor ou réu, seja ademanda individual ou coletiva.Mais uma vez, os seus teoresficam em xeque, diante dapresença de interesses coletivos esociais, indisponíveis poressência. Cite-se, a título deexemplo, uma ação civil públicaque envolva a tutela dosconsumidores, em escalanacional.

Page 530: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

Entretanto, outrosenunciados aprovados no FórumPermanente dos ProcessualistasCíveis contam com o nosso totalapoio. Cite-se, a propósito, oEnunciado n. 133, segundo o qual,“salvo nos casos expressamenteprevistos em lei, os negóciosprocessuais do caput do art. 189não dependem de homologaçãojudicial”. Ora, se há uma ideia dedesvinculação das partes à estritaprevisão de procedimentos, nãopoderia ser diferente. Todavia, háquem não concorde com oenunciado transcrito, caso deDaniel Amorim Assumpção

Page 531: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

Neves, em obra inédita enviada aeste autor. Pontua o jurista:“acredito que o controle judicialseja indispensável em qualquerhipótese, de forma que a ausênciade homologação pelo juiz impedeque o acordo gere efeitosprocessuais. O processo, afinal,continua a não ser ‘coisa daspartes’ em razão de suaindiscutível natureza pública.Acertado o Enunciado n. 260 doFórum Permanente deProcessualistas Civis (FPPC) aoapontar para a homologaçãojudicial como condição deeficácia do negócio jurídico”. Em

Page 532: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

verdade, este autor não concordaé com o último enunciado,estando filiado ao primeiro. Ora,a exigência de homologaçãojudicial afasta a utilidade práticados negócios jurídicosprocessuais.

Também merece apoio oEnunciado n. 16 do FórumPermanente de ProcessualistasCivis (FPPC), in verbis: “Ocontrole dos requisitos objetivose subjetivos de validade daconvenção de procedimento deveser conjugado com a regrasegundo a qual não há invalidadedo ato sem prejuízo”. O prejuízo

Page 533: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

para as partes deve ser essencialpara o reconhecimento de suainvalidade, o que está na linha doprincípio da conservação dosatos e negócios jurídicos, tãoprestigiado entre os civilistas,pela clara valorização daautonomia privada.

É igualmente perfeito oEnunciado n. 18 do Fórum dosProcessualistas, pelo qual “háindício de vulnerabilidadequando a parte celebra acordo deprocedimento sem assistênciatécnico-jurídica”, o que tem claroobjetivo de tutelar os mais fracos,especialmente os

Page 534: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

economicamente frágeis. Oenunciado guia a aplicação doparágrafo único do art. 190 doCPC/2015, ao estabelecer que, deofício ou a requerimento, o juizcontrolará a validade dasconvenções previstas neste artigo,recusando-lhes aplicação somentenos casos de nulidade ou deinserção abusiva em contrato deadesão ou em que alguma parte seencontre em manifesta situação devulnerabilidade.

Da mesma forma, é correto oEnunciado n. 257 do FórumPermanente de ProcessualistasCivis, segundo o qual o art. 190

Page 535: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

autoriza que as partes tantoestipulem mudanças doprocedimento quantoconvencionem sobre os seus ônus,poderes, faculdades e deveresprocessuais. Tem também a nossaconcordância o Enunciado n. 258,do mesmo evento, segundo o qual,as partes podem convencionarsobre seus ônus, poderes,faculdades e deveres processuais,ainda que essa convenção nãoimporte ajustes àsespecificidades da causa. Osenunciados em questão estãodentro do exercício permitido daautonomia privada nos negócios

Page 536: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

jurídicos processuais.Tem o nosso apoio, assim

como os anteriores, o Enunciadon. 132, aprovado pelosprocessualistas, ao estabelecerque, além dos defeitosprocessuais, os vícios da vontadee os vícios sociais podem darensejo à invalidação dosnegócios jurídicos atípicos dosarts. 190 e 191. Sendo assim, nalinha do que foi antesdemonstrado, têm aplicação paraos negócios jurídicos processuaiso erro, o dolo, a coação, o estadode perigo e a lesão, geradoras desua anulabilidade ou nulidade

Page 537: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

relativa, pela presença de umvício do consentimento (art. 171do CC/2002). Também incidemos vícios sociais da fraude contracredores – gerando também suanulidade relativa (pelo mesmoart. 171 do CC/2002) –, e dasimulação – ocasionando suanulidade absoluta (art. 167).

Vale lembrar, dentro daproposta desta obra, asconsequências da nulidadeabsoluta e da nulidade relativa ouanulabilidade.

Na nulidade absoluta ou tãosomente nulidade, é cabível aação declaratória de nulidade que

Page 538: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

segue, regra geral, o rito comum.Essa ação, diante de sua naturezapredominantemente declaratória,é imprescritível, ou melhortecnicamente, não está sujeita aprescrição ou decadência. Aimprescritibilidade também estájustificada porque a nulidadeabsoluta envolve preceitos deordem pública, impedindo,consequentemente, que o atoconvalesça pelo decurso dotempo (art. 169 do CC). Dessemodo, a este autor parece que,com a emergência do CódigoCivil de 2002, não cabe mais aalegação da prescritibilidade em

Page 539: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

vinte anos (agora, dez anos,conforme o art. 205 do CC/2002)da referida ação de nulidade, teseque não pode mais prosperar.

De toda sorte, cabe deixarclaro que a questão não épacífica, especialmente nadoutrina, sendo pertinente exporas correntes principais a respeitoda controvérsia.

De início, adotando apremissa da imprescritibilidadeseguida por este autor, lecionaÁlvaro Villaça Azevedo que “aação de nulidade, a seu turno, éimprescritível”.34 Segundo Sílvio

Page 540: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

de Salvo Venosa, o art. 169 daatual codificação encerroupolêmica anterior, “para extinguircom a divergência na doutrina, opresente Código é expresso emrelação à imprescritibilidade donegócio jurídico”.35 Na mesmalinha, Jones Figueirêdo Alves eMário Luiz Delgado ponderamque “esclarece o legislador que onegócio nulo ipso iure não podeser confirmado e que o direito depostular a declaração de suanulidade não se sujeita àdecadência”.36 Na jurisprudênciasuperior já se reconhecia, antesmesmo do Código Civil de 2002,

Page 541: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

que “a ausência de consentimentoou outorga uxória em declaraçãode transferência de imóvelpertencente ao patrimônio docasal é ato jurídico absolutamentenulo e, por isso, imprescritível,podendo sua nulidade serdeclarada a qualquer tempo, alémde não produzir qualquer efeitojurídico. Inaplicabilidade àespécie dos artigos 177 e 178 doCódigo Civil. Precedentes destaCorte” (STJ, REsp 38.549/SP,Terceira Turma, Rel. Min.Antônio de Pádua Ribeiro, j.08.06.2000, DJ 28.08.2000, p.70). Ou, ainda, posicionava-se

Page 542: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

que: “as nulidades de plenodireito invalidam o registro (Lei6.015/1973, art. 214). Princípioda continuidade. Segundo boaparte da doutrina, a nulidade,além de insanável, éimprescritível. Conformeprecedente da Terceira Turma doSTJ, ‘Resultando provado que aescritura de compra e venda forforjada, o ato é tido como nulo enão convalesce pela prescrição’(REsp 12.511, DJ 04.11.1991)”(STJ, REsp 89.768/RS, TerceiraTurma, Rel. Min. Nilson Naves, j.04.03.1999, DJ 21.06.1999, p.149). Os acórdãos mais recentes

Page 543: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

da Corte Superior não discrepamde tal solução (por todos: STJ,REsp 1.353.864/GO, TerceiraTurma, Rel. Min. Sidnei Beneti, j.07.03.2013, DJe 12.03.2013).

Entretanto, há outra correnteque entende que os atos nulosestão sujeitos ao maior prazo deprescrição previsto em lei para asua declaração de nulidade,especialmente no que toca aosefeitos patrimoniais. Assim,aplicar-se-ia o prazo geral deprescrição de dez anos, previstono art. 205 da atual codificação.Essa é a opinião, por exemplo, deGustavo Tepedino, Maria Celina

Page 544: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

Bodin de Moraes e HeloísaHelena Barboza, citando CaioMário da Silva Pereira e outrosjulgados do Superior Tribunal deJustiça.37

Por fim, é possível exporuma corrente que representa umaterceira via, pois há quemsustente que a ação para declararo ato nulo é sempreimprescritível, aplicando-se aprescrição para outras pretensõesdecorrentes da nulidade donegócio jurídico. A título deexemplo, eventual pedido dereparação civil estaria sujeito aoprazo de três anos tratado pelo

Page 545: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

art. 206, § 3.º, inciso V, do atualCódigo Civil. Nessa trilha, oEnunciado n. 536, da VI Jornadade Direito Civil, evento de 2013:“Resultando do negócio jurídiconulo consequências patrimoniaiscapazes de ensejar pretensões, épossível, quanto a estas, aincidência da prescrição”. Asjustificativas do enunciado citadomerecem destaque, pordemonstrar a divergência nodebate:

“Parece preponderar na doutrina pátria, nãosem discordância respeitável, o entendimentode que não há prescrição da pretensão aoreconhecimento de nulidade em negócio

Page 546: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

jurídico, embora os seus adeptos optem pelaapresentação de fundamentos distintos.Nesse sentido, argumenta-se que a ação denulidade é de natureza constitutiva e, quandonão se encontra submetida a prazodecadencial específico, é imprescritível. Nadireção contrária, sustenta-se que, quanto àsnulidades, a ação manejável é a declaratória,insuscetível de prescrição ou decadência. Otema, na seara pretoriana, ainda não recebeutratamento uniforme, havendo precedentestanto pela sujeição à prescrição com aaplicação do prazo geral quanto pelaimprescritibilidade. A redação do art. 169 doCódigo Civil, ao explicitar que o negóciojurídico eivado de nulidade não subsiste pelodecurso do tempo, favorece a corrente daimprescritibilidade por qualquer dosraciocínios acima, principalmente diante dofato de que o art. 179, em complemento,somente estabelece o prazo genérico dedecadência para as hipóteses de negóciosanuláveis. Considerada como premissa a

Page 547: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

imprescritibilidade, deve-se proceder àdiferenciação entre o pleito tendenteunicamente ao reconhecimento da invalidadedos efeitos patrimoniais dela decorrentes.Quanto a estes, não se pode desconhecer apossibilidade de surgimento de pretensão, demodo a tornar inelutável a incidência daprescrição”.

Com o devido respeito, opresente autor entende que osefeitos patrimoniais da ação denulidade também não estãosujeitos à prescrição, pois aordem pública relativa ao atonulo prevalece em casos tais. Emsuma, se reconhecida aprescritibilidade da pretensão, adeclaração de nulidade pode não

Page 548: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

produzir qualquer efeito jurídico,inclusive nos casos citados nasjustificativas do enunciadodoutrinário.

As nulidades absolutas, porenvolverem ordem pública,podem ser alegadas por qualquerinteressado, ou pelo MinistérioPúblico, quando lhe couberintervir (art. 168 do CC/2002).Também por envolverem ointeresse de todos, as nulidadesdevem ser pronunciadas pelo juiz,quando conhecer do negóciojurídico ou dos seus efeitos (art.168, parágrafo único, doCC/2002). Trata-se da tão

Page 549: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

comentada declaração de ofícioou ex officio pelo magistrado,sempre indispensável quando osinteresses da coletividadeestiverem em jogo. Pelo mesmodispositivo, a nulidade absolutanão pode ser suprida, sanada,pelo magistrado mesmo a pedidoda parte interessada. Tudo issodeve incidir para o negóciojurídico processual.

O outrora citado art. 169 doCC/2002 enuncia que o negóciojurídico nulo não pode serconfirmado pelas partes, nemconvalesce pelo decurso dotempo. Dessa forma, o ato não

Page 550: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

pode ser convalidado ouaproveitado. Regra geral, anulidade absoluta tem um efeitofatal, liquidando totalmente onegócio. Consequência práticadesse efeito é o que consta do art.367 do CC/2002, pelo qual nãopodem ser objeto de novação asobrigações nulas, eivadas denulidade absoluta.

Como inovação importante,o Código Civil de 2002 admite aconversão do negócio jurídiconulo em outro de naturezadiferente, conforme o seu art.170, que prescreve: “Se, porém,o negócio jurídico nulo contiver

Page 551: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

os requisitos de outro, subsistiráeste quando o fim a que visavamas partes permitir supor que oteriam querido, se houvessemprevisto a nulidade”. De qualquersorte, o dispositivo recebecríticas contundentes da doutrina.

Antes mesmo da entrada emvigor do Código de 2002, o temahavia sido estudado por JoãoAlberto Schützer Del Nero.Comentando o então anteprojeto,o autor já apresentava asseguintes críticas quanto ao atualart. 170 do Código CivilBrasileiro: “a) assim como o §140 do Código Civil alemão e o

Page 552: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

artigo 1.424 do Código Civilitaliano, seria possível aconversão do negócio jurídicoapenas em caso de nulidade, nãode anulabilidade, nem deineficácia, em sentido estritoliteral do texto – à diferença doartigo 293.º do Código Civilportuguês, que refereexpressamente as hipóteses denulidade e de anulabilidade; b) aexpressão ‘permitir supor que oteriam querido’ não é claraporque tanto poderia referir oquerer dirigido ao outro negóciojurídico (e esse parece ser oentendimento mais adequado)

Page 553: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

como o querer dirigido àsubsistência do outro negóciojurídico, ou seja, a chamada‘intenção ou vontade deconversão’ (Konversionsabsicht,Konversionswille ou animusconvertendi); e c) o emprego doverbo ‘subsistir’ poderia sugerirque o outro negócio jurídico jáestava, por assim dizer, contidono primeiro e, portanto, nãohaveria propriamente conversão,mas, sim, apenas manutenção do(outro) negócio jurídico”.38

As críticas se justificam,somando-se o fato de que odispositivo é mal escrito e de

Page 554: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

difícil compreensão pelacomunidade jurídica em geral.Quanto ao tema da conversão donegócio nulo, o seureconhecimento contraria asistemática anterior material, pelaqual não era admitido oaproveitamento do negóciojurídico nulo. Com a nulidadeabsoluta, o negócio eraaniquilado, transformando-se emcinzas. Agora é possível aconversão do negócio nulo emoutro negócio jurídico,aproveitando-o em certo sentido.Para tanto, a lei exige umelemento subjetivo, eis que é

Page 555: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

necessário que os contratantesqueiram o outro negócio oucontrato para o qual o negócionulo será convertido.Implicitamente, devem terconhecimento da nulidade queacomete o pacto celebrado.

Segundo o Enunciado n. 13do CJF/STJ, aprovado na IJornada de Direito Civil, hátambém um requisito objetivo, eisque “o aspecto objetivo daconversão requer a existência dosuporte fático no negócio aconverter-se”. Pelo que consta doenunciado, é necessário que asituação fática permita a

Page 556: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

conversão, particularmente pelacerta similaridade entre oselementos do negócio nulo edaquele para o qual ocorrerá aconversão. Em outras palavras, onegócio a ser convertido deveapresentar os pressupostos deexistência (suporte fático) e osrequisitos de validade, ou seja, osdois primeiros degraus da EscadaPonteana.

Nesse sentido, a conversãodo negócio jurídico constitui omeio jurídico pelo qual o negócionulo, respeitados certosrequisitos, transforma-se em outronegócio, totalmente válido,

Page 557: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

visando à conservação contratuale à manutenção da vontade, daautonomia privada. Constata-seque o art. 170 do CC/2002consagra uma conversãosubjetiva e indireta. Subjetivaporque exige a vontade daspartes; indireta porque o negócionulo é convertido em outro.

Acreditamos que seráviável, no futuro, a aplicaçãodessa conversão para osprocedimentos do negóciojurídico processual. Para tanto,imprescindível que as partes,após manifestações de vontadelivres, denotem as suas intenções

Page 558: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

de celebrar esse novoprocedimento, elemento subjetivosem o qual a conversão não épossível. Além disso, o negócio aser convertido deve ter osrequisitos mínimos do outronegócio, o que possibilita a suaconvalidação, mas com outrosefeitos jurídicos.

A encerrar a análise danulidade absoluta, é pertinenterecordar que a sentença quedeclara a nulidade absoluta temefeitos erga omnes, contra todos,diante da emergência da ordempública. Os efeitos declaratóriosdessa decisão são também ex

Page 559: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

tunc, retroativos ou retro-operantes, desde o momento detrânsito em julgado da decisão atéo surgimento do negócio tidocomo nulo. Em outras palavras eno campo concreto, devem serconsiderados nulos todos os atose negócios celebrados nesselapso temporal.

Deve ser feita a ressalva deque há uma clara tendência de setutelarem terceiros ou negociantesde boa-fé em face dos atos nulos.Seguindo tal esteira, o precisoEnunciado n. 537, da VI Jornadade Direito Civil, in verbis: “Aprevisão contida no art. 169 não

Page 560: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

impossibilita que,excepcionalmente, negóciosjurídicos nulos produzam efeitosa serem preservados quandojustificados por interessesmerecedores de tutela”.

O presente autor é totalmentefavorável à linha adotada peloenunciado doutrinário. Parailustrar, volta-se ao seguinteexemplo geralmente utilizado emaulas e exposições sobre oassunto: imagine-se que alguémcompre um imóvel de certapessoa que parecia estar dotadade condições psicológicasnormais quando da prática do ato.

Page 561: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

Posteriormente, a pessoa éinterditada e o laudo médicoaponta que o vendedor já eraenfermo e deficiente mental semdiscernimento para a prática dosatos da vida civil quando a vendafoi realizada. Pela regra geral denulidade, o contrato serádeclarado nulo, atingindo tambémeventuais terceiros de boa-fé,pelos efeitos erga omnes e extunc da sentença declaratória denulidade absoluta.

Com o devido respeito,como a eticidade é um dosfundamentos da atual codificação,não há como percorrer o último

Page 562: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

caminho, devendo os negócios serpreservados em face das partesque agiram de boa-fé.Notadamente no caso exposto, aboa-fé é cristalina se o vendedornão aparentava a situação deenfermidade quando o ato foicelebrado. Pontue-se que oassunto está aprofundado noCapítulo 16 deste livro, que tratada interdição, e o Novo Códigode Processo Civil parece terresolvido o dilema.

No que diz respeito ànulidade relativa ouanulabilidade, o seureconhecimento deverá ser

Page 563: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

pleiteado por meio dadenominada ação anulatória, quetambém segue, por via de regra, orito comum. Tal ação tem naturezaconstitutiva negativa, estandorelacionada com direitospotestativos, o que justifica osprazos decadenciais a elasreferidos. Esses prazos, regrageral, estão previstos nos arts.178 e 179 do CC, cujatranscrição integral é pertinente:

“Art. 178. É de quatro anos o prazo dedecadência para pleitear-se a anulação donegócio jurídico, contado:I – no caso de coação, do dia em que elacessar;II – no de erro, dolo, fraude contra credores,

Page 564: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

estado de perigo ou lesão, do dia em que serealizou o negócio jurídico;III – no de atos de incapazes, do dia em quecessar a incapacidade.”

“Art. 179. Quando a lei dispuser quedeterminado ato é anulável, sem estabelecerprazo para pleitear-se a anulação, será estede dois anos, a contar da data da conclusãodo ato”.

O primeiro dispositivo deveser aplicado em casosespecíficos, compreendendo acapacidade relativa e os víciosdo negócio jurídico, inclusiveprocessual. Nos casosenvolvendo a incapacidaderelativa e a coação, os prazos são

Page 565: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

contados da cessão, o que parecejusto e correto. Nas situações deerro, dolo, coação moral, estadode perigo, lesão e fraude contracredores, o início do prazo se dácom a realização do negócio, oque deve ser tido comocelebração do ato, ou seja,quando ele passa a ser válido nocampo jurídico.39 Não tem sidodiferente a deduçãojurisprudencial (STJ, REsp1.025.920/RO, Terceira Turma,Rel. Min. Massami Uyeda, j.15.04.2010, DJe 27.04.2010;TJDF, Recurso2004.01.1.019818-2, Acórdão

Page 566: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

400.192, Sexta Turma Cível, Rel.Des. Otávio Augusto, DJDFTE21.01.2010, p. 148; TJSP,Apelação 992.08.063150-8,Acórdão 4834077, Osasco,Trigésima Câmara de DireitoPrivado, Rel. Des. MarcosRamos, j. 24.11.2010, DJESP16.12.2010; e TJRS, Acórdão70023163959, Pelotas, DécimaOitava Câmara Cível, Rel. Des.Pedro Celso Dal Pra, j.13.03.2008, DOERS 24.03.2008,p. 56).

O segundo comandoconsagra um prazo geral dedecadência para se anular o

Page 567: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

negócio jurídico, de dois anos,contados da sua conclusão –também no sentido de celebração–, quando não houver prazoespecial fixado pelo texto legal.

De qualquer modo, há quementenda que os prazos dos arts.178 e 179 do Código Civil devemser contados não da celebraçãodo ato, mas da sua ciênciacorrespondente. Dessa feita, nocaso de uma venda de imóvel, oprazo decadencial para a açãoanulatória deve ser consideradodo registro imobiliário, e não daelaboração da escritura.

Percorrendo tal caminho,

Page 568: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

José Fernando Simão, em suaprimorosa tese de livre-docênciadefendida na Faculdade deDireito da USP, cita comoargumentos a segurança e aestabilidade das relaçõesnegociais.40 Igualmente, ZenoVeloso expõe que, “tratando-se daação pauliana, ou revocatória, nahipótese de fraude contracredores, apesar de o termoinicial do prazo de decadênciacoincidir com o dia em que serealizou o negócio jurídico (art.178, II), a jurisprudência vem sefirmando no entendimento de quetal prazo deve ser contado da data

Page 569: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

da transcrição do título noregistro imobiliário, e não do diada escritura”.41

Adotando a mesma premissaa respeito do art. 179 do CC, oEnunciado n. 538, da VI Jornadade Direito Civil: “No que dizrespeito a terceiros eventualmenteprejudicados, o prazodecadencial de que trata o art.179 do Código Civil não se contada celebração do negóciojurídico, mas da ciência que deletiverem”. Na jurisprudência, defato, podem ser encontradosarestos que também seguem taldedução jurídica. A ilustrar,

Page 570: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

tratando de fraude contracredores:

“Direito civil. Agravo no recurso especial.Ação pauliana. Prazo decadencial. Termoinicial. Registro Imobiliário. A decadência écausa extintiva de direito pelo seu nãoexercício no prazo estipulado em lei, cujotermo inicial deve coincidir com oconhecimento do fato gerador do direito a serpleiteado. O termo inicial do prazodecadencial de quatro anos para propositurada ação pauliana é o da data do registro dotítulo aquisitivo no Cartório Imobiliário,ocasião em que o ato registrado passa a tervalidade contra terceiros. Precedentes.Agravo no recurso especial não provido”(STJ, AgRg no REsp 743.890/SP, TerceiraTurma, Rel. Min. Nancy Andrighi, j.20.09.2005, DJ 03.10.2005, p. 250).

Page 571: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

Mesmo sendo fortes econtundentes os argumentosexpostos, cabe frisar que opresente autor deduz que porconclusão e realização deve-seentender o momento quando onegócio jurídico existe e é válido,ou seja, quando a escriturapública é firmada. Nessa esteira,Paulo Lôbo menciona que o diado começo do prazo decadencialtratado pelos arts. 178 e 179 doCC/2002 é o início do negóciojurídico: “Igualmente, conta-se doinício do negócio jurídico o prazopara anulação em virtude de erro,dolo, fraude contra credores,

Page 572: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

estado de perigo ou lesão, porqueé o momento em que seexterioriza a vontade viciada,abrindo-se a possibilidade para ointeressado pleitear aanulação”.42 Compartilha dessaforma de pensar HumbertoTheodoro Jr., que, comentando oart. 178 do atual Código Civil,ensina: “Aqui não é relevantedefinir quando a pessoaprejudicada tomou conhecimentodo defeito do negócio. Para aregra legal, o mais importante éevitar o dilargamento excessivodo prazo de impugnação àvalidade do contrato. A

Page 573: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

preocupação se refere ànecessidade de serem estáveis asrelações jurídicas e, assim, nãose sujeitarem à anulação, portempo muito prolongado”.43

Superada a análise de mais essacontrovérsia, não se pode maisadmitir o entendimentojurisprudencial, mesmo porsúmulas de Tribunais Superiores,de prazos prescricionais para aanulação de um negócio jurídico,matéria que será devidamentedesenvolvida quando dotratamento da prescrição e dadecadência.

O art. 178, somado ao art.

Page 574: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

177, ambos do Código Civil,justificam o fato de aanulabilidade não poder serreconhecida ex officio pelo juiz,devendo ser sempre arguida oualegada pela parte interessada,mediante ação específica, regrageral. Além disso, diante da suanatureza privada, não cabe aoMinistério Público intervir nasações que a envolvem.

De acordo com o art. 172 doCC/2002, o negócio anulávelpode ser confirmado pelas partes,salvo direito de terceiro,valorização, mais uma vez, daboa-fé objetiva. Trata-se da

Page 575: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

chamada convalidação livre daanulabilidade. No entanto, esseato de confirmação deve conter asubstância do negócio celebradoe a vontade expressa de mantê-lo,elementos objetivo e subjetivo daconvalidação, respectivamente –denominada confirmaçãoexpressa (art. 173 do CC).

Seguindo no estudo dosefeitos da anulabilidade, oCódigo Civil de 2002, em seu art.174, dispensa (“é escusada”) aconfirmação expressa, quando onegócio já foi cumprido em partepelo devedor, ciente do vício queo atingia. A confirmação, assim,

Page 576: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

dar-se-á de forma tácita oupresumida, por meio de condutado sujeito passivo obrigacional.Mais uma vez, denota-se o intuitode conservação do contrato e donegócio jurídico.

O art. 175 da codificaçãomaterial consagra airrevogabilidade daconfirmação, seja ela expressaou tácita. Dessa forma, com aconfirmação, extinguem-se todasas ações ou exceções, de quecontra ele dispusesse o devedor.Não caberá mais, portanto,qualquer requerimento posteriorde anulabilidade do negócio

Page 577: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

anterior, o que está de acordocom a máxima que veda ocomportamento contraditório eque tem relação com a boa-féobjetiva (venire contra factumproprium non potest).

Ato contínuo de estudo,segundo o art. 176 do CódigoCivil, “quando a anulabilidade doato resultar da falta deautorização de terceiro, serávalidado se este a derposteriormente”. Esse artigoconstitui novidade e faz com queo negócio celebrado por menorpúbere, sem a autorização do paiou do tutor, seja validado se a

Page 578: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

autorização ocorrerposteriormente. Trata-se de outrahipótese de convalidação.Também no que concerne aomenor púbere (de 16 a 18 anos),não pode este valer-se da própriatorpeza, beneficiando-se de atomalicioso (a malícia supre aidade). Não pode, portanto, paraeximir-se de uma obrigação,invocar a sua idade sedolosamente a ocultou quandoinquirido pela outra parte, ou se,no ato de obrigar-se, declarou-semaior. O negócio jurídico reputa-se válido e gera efeitos,afastando-se qualquer

Page 579: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

anulabilidade (art. 180 do CC).Complementando esse últimodispositivo, dispõe o art. 181 doCódigo Civil que ninguém podereclamar o que, por umaobrigação anulada, pagou a umincapaz, se não provar quereverteu em proveito dele aimportância paga.Exemplificando, diante davedação do enriquecimento semcausa, reconhece-se apossibilidade de a pessoa reavero dinheiro pago, se provar que omenor dele se beneficiou.

Em relação à sentença daação anulatória, mais uma vez

Page 580: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

diante de sua natureza privada,tem aquela efeitos inter partes.Tradicionalmente, sempre seapontou que os seus efeitosseriam ex nunc, não retroativosou somente a partir do trânsito emjulgado da decisão. Essa teseestaria confirmada pelo art. 177do atual Código, que prevê: “Aanulabilidade não tem efeito antesde julgada por sentença, nem sepronuncia de ofício; só osinteressados a podem alegar, eaproveita exclusivamente aos quea alegarem, salvo o caso desolidariedade ouindivisibilidade”.

Page 581: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

O que poderia parecerpacífico em doutrina ejurisprudência não é tão pacíficoassim. Isso porque háposicionamento orientando que osefeitos da sentença na açãoanulatória também seriamretroativos (ex tunc) parciais,com fundamento no art. 182 daatual codificação material, peloqual “Anulado o negócio jurídico,restituir-se-ão as partes ao estadoem que antes dele se achavam, e,não sendo possível restituí-las,serão indenizadas com oequivalente”.

Esse último posicionamento

Page 582: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

é defendido, na doutrina, porPablo Stolze Gagliano e RodolfoPamplona Filho, citandoHumberto Theodoro Júnior eOvídio Baptista.44 Entretanto,quem melhor demonstra oequívoco é Zeno Veloso. Ensina omestre que “trata-se, sem dúvida,de entendimento equivocado, quedecorre, talvez, da leituradistorcida do art. 177, primeiraparte (...), que corresponde ao art.152, primeira parte, do CódigoCivil de 1916”.45 E arremata ojurista paraense: “O que o art.177, primeira parte, enuncia é queo negócio anulável ingressa no

Page 583: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

mundo jurídico produzindo osrespectivos efeitos e depende deuma ação judicial, da sentença,para ser decretada a suaanulação. Os efeitos do negócioanulável são precários,provisórios. Advindo a sentençaanulatória, os efeitos que vinhamproduzindo o negócio inquinadosão defeitos. Nada resta, nadasobra, nada fica, pois adesconstituição é retroativa, vai àbase, ao começo, ao nascimentodo negócio jurídico defeituoso ecarente, o que, enfática einequivocamente, afirma o art.182, como já dizia, no Código

Page 584: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

velho, no art. 158. Quanto a issonão há mudança alguma, em nossoentendimento. O art. 177,primeira parte, deve ser visto erecebido diante do sistema einterpretado conjuntamente com oart. 182, que transcrevemosacima”.46

Desse modo, há que sedefenderem efeitos retroativosparciais à sentença anulatória, eisque se deve buscar a volta àsituação primitiva, anterior àcelebração do negócio anulado,se isso for possível. Em tomsuplementar de ilustração, cite-seo caso de anulação de um

Page 585: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

casamento, em que as partesvoltam a ser solteiras. Percebe-seclaramente a presença de efeitosretroativos.

Atente-se que, apesar de esteautor seguir esse posicionamentodefendido por Zeno Veloso, nãopoderíamos deixar de esclarecerque, pela visão clássica, aindaprevalece a premissa quanto aosefeitos ex nunc da ação anulatóriade negócio jurídico.

De toda sorte, frise-se que,quando da VI Jornada de DireitoCivil, evento realizado em 2013,foi feita proposta de enunciadodoutrinário no sentido de ser a

Page 586: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

corrente seguida por este autor amajoritária. De acordo com oexato teor da proposição: “Osefeitos da anulabilidade donegócio jurídico, excetuadassituações particulares como asobrigações de trato sucessivo,relações trabalhistas e em matériasocietária, são idênticos aos danulidade e ocorrem de forma extunc. Anulado o negócio, osefeitos se projetam para o futuro etambém de forma retroativa parao passado”. Nas suasjustificativas, o autor da proposta,juiz de direito e professor daUniversidade Federal do Espírito

Page 587: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

Santo Augusto Passamani Bufulin,ressalta que: “No Brasil, apesarde haver uma corrente quedefende a eficácia ex nunc daação anulatória, como MariaHelena Diniz, Carlos RobertoGonçalves e Arnaldo Rizzardo, acorrente majoritária, defendidapor Humberto Theodoro Júnior,Zeno Veloso, Pablo StolzeGagliano, Rodolfo PamplonaFilho, Paulo Nader, Renan Lotufo,Flávio Tartuce, Cristiano Chavesde Farias, Nelson Rosenvald,Leonardo Mattietto, OrlandoGomes e Silvio Rodrigues, afirmaque os efeitos da anulabilidade e

Page 588: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

da nulidade são idênticos noplano da eficácia e operam deforma ex nunc, para o futuro, e extunc, retroativamente ao passado,pois o vício encontra-se presentedesde a formação do negócio.Esse é o entendimento correto aser dado ao art. 182 do CC”.

Em suma, há quem veja quea corrente que apregoa efeitos extunc para o ato anulável é amajoritária. Talvez a nãoaprovação do enunciadodoutrinário em questão demonstraque tal premissa ainda não é averdadeira.

Por fim, ainda no que

Page 589: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

concerne ao art. 182 do CódigoCivil, cabe ressaltar que liçãomajoritária aponta para apossibilidade de aplicar ocomando também às hipóteses denulidade absoluta. Essa é aposição, na doutrina, entre outros,de Maria Helena Diniz,47 Sílviode Salvo Venosa,48 GustavoTepedino, Maria Celina Bodin deMoraes e Heloísa HelenaBarboza.49 Tal forma de pensar éque gera a conclusão segundo aqual os efeitos da nulidade são extunc, conforme antes apontado.Igualmente, na jurisprudência,podem ser encontrados arestos

Page 590: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

que fazem incidir o art. 182 doCC/2002 para a nulidadeabsoluta. Entre tantos julgados,vejamos acórdão assim publicadono Informativo n. 517 doSuperior Tribunal de Justiça:

“Direito civil. Necessidade de ressarcimentono caso de inviabilidade de retorno à situaçãoanterior à nulidade declarada. O credor, nocaso em que tenha recebido em dação empagamento imóvel de sociedade empresarialposteriormente declarada falida, poderá sercondenado a ressarcir a massa pelo valor doobjeto do negócio jurídico, se este vier a serdeclarado nulo e for inviável o retorno àsituação fática anterior, diante datransferência do imóvel a terceiro de boa-fé.Incide, na situação descrita, o disposto no art.182 do CC/2002, de acordo com o qual,anulado o negócio jurídico, restituir-se-ão as

Page 591: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

partes ao estado em que antes dele seachavam, e, não sendo possível restituí-las,serão indenizadas com o equivalente. Trata-se, a propósito, de dispositivo legal que,quanto aos seus efeitos práticos, também temaplicabilidade nos casos de nulidade absoluta,não tendo incidência restrita às hipóteses denulidade relativa. Ademais, deve-se preservara boa-fé de terceiros que sequer participaramdo negócio jurídico viciado” (STJ, REsp1.353.864/GO, Rel. Min. Sidnei Beneti, j.07.03.2013).

Expostas as diferenças entrea nulidade absoluta e a relativa,aplicáveis ao negócio jurídicoprocessual, este autor também sefilia ao Enunciado n. 134 doFórum dos Processualistas, peloqual o negócio jurídico

Page 592: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

processual pode ser invalidadoparcialmente, na linha do queaqui foi explicado a respeito doart. 184 do Código Civil.

Seguindo no estudo dasregras relativas ao tema,prescreve o caput do art. 191 doCPC/2015 que, de comumacordo, o juiz e as partes podemfixar calendário para a práticados atos processuais, quando foro caso; prática muito comum nasarbitragens, geralmente julgadasdentro de um cronograma fixadoao seu início.

Esse calendário vincula aspartes e o juiz, e os prazos nele

Page 593: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

previstos somente serãomodificados em casosexcepcionais, devidamentejustificados (art. 191, § 1º, doCPC/2015). Além disso,dispensa-se a intimação daspartes para a prática de atoprocessual ou a realização deaudiência cujas datas tiveremsido designadas no calendário, oque visa à agilização dosprocedimentos (art. 191, § 2º, doCPC/2015). Há quem denominetais pactos como acordos decalendarização dos atosprocessuais, expressão que deveser continuamente utilizada no

Page 594: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

futuro.50

Como bem expõe DanielAmorim Assumpção Neves emsua obra inédita antes referida,“mais explícito a respeito dotema ora versado é o caput doart. 191, ao permitir que as partese o juiz, de comum acordo,estipulem mudanças noprocedimento para ajustá-lo àsespecificidades da causa. Trata-se de interessante novidade, aindaque o procedimento acordadoentre as partes dependa daanuência do juiz, além derespeitar os limites impostos peloparágrafo único do art. 190, que

Page 595: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

permite ao juiz recusar aconvenção nos casos de nulidadeou inserção abusiva em contratode adesão ou no qual algumaparte se encontre em manifestasituação de vulnerabilidade.Conforme já se manifestou amelhor doutrina, estão entre ospoderes de convenção o poder denão recorrer, ou acordo deinstância, de forma que as partesconvencionem que o processoserá decidido definitivamentesomente em uma determinadainstância. Esse entendimentoafastará a resistência atual naadmissão da renúncia prévia ao

Page 596: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

direito recursal, ainda querealizada mediante acordo daspartes. As partes não terão,portanto, a mesma liberdade quetêm na arbitragem, quando podemlivremente determinar oprocedimento a ser observado,mas já é um avanço as partespoderem contribuir com o juiz natentativa de adequar oprocedimento às exigências docaso concreto”.

Também conta com o nossototal apoio o Enunciado n. 6, doII Fórum Permanente deProcessualistas Civis (FPPC),com a seguinte redação: “O

Page 597: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

negócio jurídico processual nãopode afastar os deveres inerentesà boa-fé e à cooperação”. Eis atão aclamada aplicação do art.113 do Código Civil para osnegócios jurídicos processuais. OEnunciado n. 17, do mesmoevento, completa o seu sentido,ao determinar que isso nãosignifica que as partes nãopossam prever deveres e sançõesconcernentes ao descumprimentoda convenção por elasestabelecida, o que tambémparece correto.

Por derradeiro, merecemdestaque quatro outros

Page 598: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

enunciados do Fórum Permanentede Processualistas Civis quetentam, de maneira meramenteilustrativa, definir os limites doacordo processual celebradoentre as partes. Nos termos doEnunciado n. 19, passam a seradmissíveis os seguintes negóciosprocessuais bilaterais, dentreoutros: a) pacto deimpenhorabilidade; b) acordobilateral de ampliação de prazosdas partes; c) acordo de rateio dedespesas processuais; d) dispensaconsensual de assistente técnico;e) acordo para retirar o efeitosuspensivo da apelação; e f)

Page 599: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

acordo para não promoverexecução provisória. Emcomplemento, são igualmenteadmissíveis os seguintes pactos,nos termos do Enunciado n. 21: a)acordo para realização desustentação oral; b) acordo paraampliação do tempo desustentação oral; c) convenção dejulgamento antecipado do méritoconvencional; d) convenção sobreprova; e e) acordo para reduçãode prazos processuais. Para esteautor, os conteúdos de todos osatos são hígidos e lícitos.

Seguindo nasconcretizações, o Enunciado n. 20

Page 600: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

do mesmo Fórum preceitua quenão são admissíveis os negóciosbilaterais para a modificação decompetência absoluta ou parasupressão da primeira instância, oque esbarra em regras de ordempública e de índoleconstitucional. Essa também é anossa opinião, valendo a mesmapremissa para o Enunciado n.254, também seguida por esteautor: “é inválida a convençãopara excluir a intervenção doMinistério Público como fiscalda ordem jurídica”.

Por fim, gerará grandedebate o teor do Enunciado n. 115

Page 601: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

do Fórum Permanente deProcessualistas Civis (FPPC),com a seguinte dicção: “Onegócio jurídico celebrado nostermos do art. 191 obrigaherdeiros e sucessores”. ParaDaniel Amorim AssumpçãoNeves, em sua obra inédita, “aconclusão de não se tratar dedireito personalíssimo é corretaporque envolve direitosdisponíveis de naturezaprocessual, vinculando aossucessores processuais nahipótese de falecimento da parte”.

Com o devido respeito, aprevisão fica em xeque pela

Page 602: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

proximidade do negócio jurídicoprocessual dos contratos,merecendo incidência o art. 426do Código Civil, segundo o qualnão pode ser objeto de contrato aherança de pessoa viva. Trata-sede transposição atual da antigavedação romana dos pactossucessórios (pacta corvina), aocasionar a nulidade absolutavirtual do negócio, pois a leiproíbe a prática do ato semcominar sanção (art. 166, incisoVII, segunda parte, do CódigoCivil).

Page 603: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

__________1 DIDIER JR., Fredie; NOGUEIRA,Pedro Henrique Pedrosa. Teoria dosFatos Jurídicos Processuais. 2. ed.Salvador: Juspodivm, 2013.2 NOGUEIRA, Pedro HenriquePedrosa. Negócios JurídicosProcessuais. Análise dos ProvimentosJudiciais como Atos Negociais. 2011.Dissertação (Mestrado) –Universidade Federal da Bahia, p. 206.Disponível em:<https://repositorio.ufba.br/ri/bitstream/ri/10743/1/Pedro%20Henrique.pdfAcesso em: 22 jan. 2015.3 THEODORO JÚNIOR, Humberto;NUNES, Dierle; BAHIA, AlexandreMelo Franco; PEDRON, FlávioQuinaud. Novo CPC. Fundamentos eSistematização. Rio de Janeiro:

Page 604: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

Forense, 2015. p. 226.4 VELOSO, Zeno. Invalidade doNegócio Jurídico. 2. ed. BeloHorizonte: Del Rey, 2005. p. 15.5 PONTES DE MIRANDA,Francisco Cavalcanti. Tratado deDireito Privado. 4. ed. São Paulo: RT,1974. t. II, p. 447.6 MOREIRA ALVES, José Carlos. AParte Geral do Projeto de CódigoCivil Brasileiro. 2. ed. São Paulo:Saraiva, 2003.7 AZEVEDO, Antônio Junqueira de.Negócio Jurídico. Existência,Validade e Eficácia. 4. ed. São Paulo:Saraiva, 2002. p. 16.8 AZEVEDO, Álvaro Villaça. TeoriaGeral do Direito Civil. Parte Geral.São Paulo: Atlas, 2012. p. 169.

Page 605: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

9 LARENZ, Karl. Derecho Civil.Parte General. Tradução e Notas deMiguel Izquierdo y Mácias-Picavea.Madrid: Editorial Revista de DerechoPrivado, 1978. p. 422.10 MELLO, Marcos Bernardes de.Teoria do Fato Jurídico. Plano daExistência. 7. ed. São Paulo: Saraiva,1995. p. 137.11 PONTES DE MIRANDA,Francisco Cavalcanti. Tratado deDireito Privado. 4. ed. São Paulo: RT,1974. t. II, p. 373.12 LÔBO, Paulo. Direito Civil. ParteGeral. São Paulo: Saraiva, 2009. p.232.13 GAGLIANO, Pablo Stolze;PAMPLONA FILHO, Rodolfo. NovoCurso de Direito Civil. Parte Geral.

Page 606: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

6. ed. São Paulo: Saraiva, 2005. v. I, p.324.14 GAGLIANO, Pablo Stolze;PAMPLONA FILHO, Rodolfo. NovoCurso de Direito Civil. Parte Geral.6. ed. São Paulo: Saraiva, 2005. v. I, p.325.15 GAGLIANO, Pablo Stolze;PAMPLONA FILHO, Rodolfo. NovoCurso de Direito Civil. Parte Geral.6. ed. São Paulo: Saraiva, 2005. v. I, p.343-344.16 NOGUEIRA, Pedro HenriquePedrosa. Negócios JurídicosProcessuais. Análise dos ProvimentosJudiciais como Atos Negociais. 2011.Dissertação (Mestrado) –UniversidadeFederal da Bahia, p. 206-208.Disponível em:<https://repositorio.ufba.br/ri/bitstream/ri/10743/1/Pedro%20Henrique.pdf

Page 607: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

Acesso em: 22 jan. 2015.17 THEODORO JÚNIOR, Humberto;NUNES, Dierle; BAHIA, AlexandreMelo Franco; PEDRON, FlávioQuinaud. Novo CPC. Fundamentos eSistematização. Rio de Janeiro:Forense, 2015. p. 244.18 PONTES DE MIRANDA,Francisco Cavalcanti. Tratado deDireito Privado. 4. ed. São Paulo: RT,1974. t. III, IV e V.19 PONTES DE MIRANDA,Francisco Cavalcanti. Tratado deDireito Privado. 4. ed. São Paulo: RT,1974. t. III, p. 15.20 RODRIGUES, Sílvio. DireitoCivil. Parte Geral. 24. ed. São Paulo:Saraiva, 1994. v. 1, p. 291-292.

Page 608: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

21 FRANÇA, Rubens Limongi.Instituições de Direito Civil. 5. ed.São Paulo: Saraiva, 1999. p. 157.22 DIDIER JR., Fredie. Curso deDireito Processual. 8. ed. Salvador:Juspodivm, 2007. v. 1, p. 226.23 RODRIGUES, Sílvio. DireitoCivil. Parte Geral. 24. ed. São Paulo:Saraiva, 1994, v. 1, p. 290-291.24 DIDIER JR., Fredie. Curso deDireito Processual. 8. ed. Salvador:Juspodivm, 2007. v.1, p. 228.25 LARENZ, Karl. Derecho Civil.Parte General. Tradução e Notas deMiguel Izquierdo y Mácias-Picavea.Madrid: Editorial Revista de DerechoPrivado, 1978. p. 453.26 LARENZ, Karl. Derecho Civil.Parte General. Tradução e Notas de

Page 609: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

Miguel Izquierdo y Mácias-Picavea.Madrid: Editorial Revista de DerechoPrivado, 1978. p. 461-464.27 NERY JR., Nelson; NERY, RosaMaria de Andrade. Código CivilComentado. 3. ed. São Paulo: RT,2005. p. 231.28 REALE, Miguel. Um Artigo-Chavedo Código Civil. História do NovoCódigo Civil. Biblioteca de DireitoCivil. Estudos em Homenagem aoProfessor Miguel Reale. São Paulo:RT, 2005. v. 1, p. 240.29 AZEVEDO, Álvaro Villaça. TeoriaGeral do Direito Civil. Parte Geral.São Paulo: Atlas, 2012. p. 177.30 BEVILÁQUA, Clóvis. CódigoCivil dos Estados Unidos do Brasil.Ed. histórica. Rio de Janeiro: Ed. Rio,

Page 610: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

1977. t. I, p. 386.31 VENOSA, Sílvio de Salvo. DireitoCivil. Parte Geral. 3. ed. São Paulo:Atlas, 2003. v. 1, p. 415.32 MENGER, Antonio. El DerechoCivil y los Pobres. Tradução deAdolfo Posada. Madrid: LibreríaGeneral de Victoriano Suárez, 1898.33 MAZZEI, Rodrigo Reis; CHAGAS,Bárbara Seccato Ruis. Breve Diálogoentre os Negócios JurídicosProcessuais e Arbitragem. Revista deProcesso. São Paulo: RT, v. 39, n. 237,nov. 2014. p. 223-236.34 AZEVEDO, Álvaro Villaça TeoriaGeral do Direito Civil. Parte Geral.São Paulo: Atlas, 2012. p. 350.35 VENOSA, Sílvio de Salvo. CódigoCivil interpretado. São Paulo: Atlas,

Page 611: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

2010. p. 191.36 ALVES, Jones Figueirêdo;DELGADO, Mário Luiz. CódigoCivil Anotado. São Paulo: Método,2005. p. 108.37 MORAES, Maria Celina Bodin de;BARBOZA, Heloísa Helena. CódigoCivil Interpretado. Rio de Janeiro:Renovar, 2003. v. 1, p. 316.38 SCHÜTZER DEL NERO, JoãoAlberto. Conversão Substancial doNegócio Jurídico. Rio de Janeiro:Renovar, 2001. p. 278.39 DINIZ, Maria Helena. CódigoCivil Anotado. 15. ed. São Paulo:Saraiva, 2010. p. 203.40 SIMÃO, José Fernando. Tempo edireito civil. Prescrição e decadência.

Page 612: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

2011. Tese (Livre-Docência em DireitoCivil) – Faculdade de Direito da USP,São Paulo, p. 290.41 VELOSO, Zeno. Invalidade doNegócio Jurídico. 2. ed. BeloHorizonte: Del Rey, 2005. p. 277.42 LÔBO, Paulo. Direito Civil. ParteGeral. São Paulo: Saraiva, 2009. p.315.43 THEODORO JR., Humberto.Comentários ao Novo Código Civil.Coord. Sálvio de Figueiredo Teixeira.Rio de Janeiro: Forense, 2003. t. I, v.III, p. 595.44 GAGLIANO, Pablo Stolze;PAMPLONA FILHO, Rodolfo. NovoCurso de Direito Civil. Parte Geral.6. ed. São Paulo: Saraiva, 2005. v. I, p.433-434.

Page 613: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

45 VELOSO, Zeno. Invalidade doNegócio Jurídico. 2. ed. BeloHorizonte: Del Rey, 2005. p. 331.46 VELOSO, Zeno. Invalidade doNegócio Jurídico. 2. ed. BeloHorizonte: Del Rey, 2005. p. 331.47 DINIZ, Maria Helena. CódigoCivil Anotado. 15. ed. São Paulo:Saraiva, 2010. p. 204.48 VENOSA, Sílvio de Salvo. CódigoCivil Interpretado. São Paulo: Atlas,2010. p. 198.49 TEPEDINO, Gustavo; MORAES,Maria Celina Bodin de; BARBOZA,Heloísa Helena. Código CivilInterpretado. Rio de Janeiro: Renovar,2004. v. 1, p. 328.50 THEODORO JÚNIOR, Humberto;NUNES, Dierle; BAHIA, Alexandre

Page 614: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

Melo Franco; PEDRON, FlávioQuinaud. Novo CPC. Fundamentos eSistematização. Rio de Janeiro:Forense, 2015. p. 254.

Page 615: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

DA PRESCRIÇÃO E DADECADÊNCIA

Impactos do NovoCódigo de Processo Civil

Como é notório, o exercíciode um direito não pode ficar

Page 616: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

pendente de forma indefinida notempo. O titular deve exercê-lodentro de um determinado prazo,pois o Direito não socorreaqueles que dormem(dormientibus non sucurrit ius).Com fundamento na pacificaçãosocial, na certeza e na segurançada ordem jurídica, é que surge amatéria da prescrição e dadecadência. Pode-se tambémafirmar que a prescrição e adecadência estão fundadas emuma espécie de boa-fé do própriolegislador.

Além de interessar aodireito material, como não

Page 617: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

poderia ser diferente, existemrepercussões instrumentais, razãopela qual o Novo Código deProcesso Civil, a exemplo do seuantecessor, traz preceitos fulcraispara os dois institutos. Em umsentido geral, pode-se dizer que oNovo Estatuto Processualaperfeiçoou e ampliou aregulamentação anterior.

Conforme ensina MiguelReale, na exposição de motivosdo Código Civil de 2002, um dosprincipais baluartes nacodificação material de 2002 foio princípio da operabilidade,primeiramente em um sentido de

Page 618: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

simplicidade, pelo qual se buscafacilitar o estudo dos institutosjurídicos privados. Tal princípiopode ser flagrantementepercebido pelo tratamento dadopela codificação material vigentetanto à prescrição quanto àdecadência, particularmente pelafacilitação de visualização dosinstitutos. O Código Civil emvigor inaugurou um tratamentodiferenciado em relação a essesconceitos, uma vez que aprescrição consta dos seus arts.189 a 206, e a decadência, dosarts. 207 a 211. Aliás, os prazosde prescrição estão concentrados

Page 619: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

em dois artigos do Código Civil:arts. 205 e 206. Os demaisprazos, encontrados em outrosdispositivos da atual codificação,são, pelo menos em regra, todosdecadenciais.

Mas não é só. Como amatéria era demasiadamenteconfusa na vigência do CódigoCivil de 1916, visando aesclarecer o assunto, AgneloAmorim Filho concebeu um artigohistórico, em que associou osprazos prescricionais edecadenciais a açõescorrespondentes, buscandotambém quais seriam as ações

Page 620: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

imprescritíveis.1 Esse brilhanteprocessualista paraibanoassociou a prescrição às açõescondenatórias, ou seja, àquelasações relacionadas com direitossubjetivos, próprios daspretensões pessoais. Nessecontexto, a prescrição mantémrelação com deveres, comobrigações e com aresponsabilidade decorrente dainobservância das regras ditadaspelas partes ou pela ordemjurídica.

Por outro lado, a decadênciaestá associada a direitospotestativos e a ações

Page 621: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

constitutivas, sejam elas positivasou negativas. As açõesanulatórias de atos e negóciosjurídicos, logicamente, têm essaúltima natureza. A decadência,portanto, tem relação com umestado de sujeição, próprio dosdireitos potestativos.Didaticamente, é certo que odireito potestativo, por secontrapor a um estado desujeição, é aquele que encurralaa outra parte, que não tem saída.

Por fim, as ações meramentedeclaratórias, como aquelas quebuscam a nulidade absoluta de umnegócio, são imprescritíveis, ou

Page 622: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

melhor, tecnicamente, não estãosujeitas à prescrição ou àdecadência. A imprescritibilidadedessa ação específica estátambém justificada porque anulidade absoluta envolve ordempública, não convalescendo pelodecurso do tempo, nos termos dodisposto no art. 169 do CódigoCivil.

Não há a menor dúvida deque o Código Civil de 2002adotou a teoria do genialdoutrinador paraibano. Naprópria exposição de motivos danova codificação substantiva,apresentada na Câmara dos

Page 623: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

Deputados, em 1975, pelo juristaJosé Carlos Moreira Alves,membro da sua comissãoelaboradora, constam as seguinteslições:

“Com efeito, ocorre a decadência quando umdireito potestativo não é exercido,extrajudicialmente ou judicialmente (nos casosem que a lei – como sucede em matéria deanulação, desquite etc. – exige que o direitode anular, o direito de desquitar-se só possaser exercido em Juízo, ao contrário, porexemplo, do direito de resgate, na retrovenda,que se exerce extrajudicialmente), dentro doprazo para exercê-lo, o que provoca adecadência desse direito potestativo. Ora, osdireitos potestativos são direitos sempretensão, pois são insusceptíveis de violação,já que a eles não se opõe um dever de quemquer que seja, mas uma sujeição de alguém (o

Page 624: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

meu direito de anular o negócio jurídico nãopode ser violado pela parte a quem aanulação prejudica, pois esta está apenassujeita a sofrer as consequências da anulaçãodecretada pelo juiz, não tendo, portanto, deveralgum que possa descumprir)”.2

Pelo que foi adotado noCódigo Civil, não se pode maisaceitar entendimentosjurisprudenciais, inclusivesumulados por TribunaisSuperiores, que associam prazosprescricionais a ações que visama anular negócios jurídicos, quetêm natureza constitutiva negativa.A título de exemplo concreto, nãotem mais aplicação a antiga

Page 625: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

Súmula 494 do Supremo TribunalFederal, pela qual: “A ação paraanular venda de ascendente adescendente, sem consentimentodos demais, prescreve em vinteanos, contados da data do ato”. Otexto doutrinário por últimotranscrito, por si só, afastaqualquer entendimento nessesentido. Para o caso em questão,portanto, deve ser aplicado oprazo geral de decadênciaprevisto no art. 179 do CC/2002,de dois anos contados dacelebração do ato. Nesse sentido,cite-se o Enunciado n. 368 doCJF/STJ, aprovado na IV

Page 626: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

Jornada de Direito Civil, peloqual o prazo para anular venda deascendente para descendente édecadencial de dois anos (art.179 do CC). Esse, aliás, é oentendimento atual do SuperiorTribunal de Justiça (STJ, REsp771.736-0/SC, Terceira Turma,Rel. Min. Carlos AlbertoMenezes Direito, j. 07.02.2006,v.u.). Mais recentemente, deforma correta, assim seposicionaram o Tribunal Mineiro(TJMG, Apelação Cível1.0518.05.085096-6/0011, Poçosde Caldas, Décima QuintaCâmara Cível, Rel. Des.

Page 627: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

Bitencourt Marcondes, j.08.05.2008, DJEMG04.06.2008), o Tribunal Paulista(TJSP, Apelação com Revisão,Acórdão 3671454, São Caetanodo Sul, Sexta Câmara de DireitoPrivado, Rel. Des. VitoGuglielmi, j. 04.06.2009, DJESP26.06.2009) e o Tribunal Gaúcho(TJRS, Acórdão 70027007053,Giruá, Oitava Câmara Cível, Rel.Des. Rui Portanova, j.19.11.2009, DJERS 26.11.2009,p. 60). Clama-se para que opróprio Supremo TribunalFederal faça a devida revisão daantiga Súmula 494, que data do

Page 628: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

remoto ano de 1969.Superada essa análise

introdutória, parte-se agora àabordagem, em separado, daprescrição e da decadência, coma exposição dos principaisimpactos gerados pelo NovoCódigo de Processo Civil.

a) Da prescriçãoCom o intuito de indicar que

não se trata de um direitosubjetivo público abstrato deação, o Código Civil Brasileirode 2002 adotou a tese daprescrição da pretensão. Deacordo com o art. 189 do

Page 629: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

CC/2002, violado um direito,nasce para o seu titular umapretensão, que pode ser extintapela prescrição. Desse modo, seo titular do direito permanecerinerte, tem como pena a perda dapretensão que teria por viajudicial. Repise-se que aprescrição constitui um benefícioa favor do devedor, pelaaplicação da regra de que odireito não socorre aqueles quedormem, diante da necessidadedo mínimo de segurança jurídicanas relações negociais.

Não se pode esquecer que aprescrição pode ser extintiva –

Page 630: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

caso da tratada na Parte Geral doCódigo Civil e que será agoraestudada – ou aquisitiva, como éa usucapião; divisão que aindapermanece para a maioria doscivilistas. Por todos, lecionaCarlos Roberto Gonçalves que “odecurso do tempo tem grandeinfluência na aquisição e naextinção de direitos. Distinguem-se, pois, duas espécies deprescrição: a extintiva e aaquisitiva, também denominadausucapião. Alguns países tratamconjuntamente dessas duasespécies em um único capítulo. OCódigo Civil brasileiro

Page 631: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

regulamentou a extintiva na ParteGeral, dando ênfase à forçaextintora do direito. No direitodas coisas, na parte referente aosmodos de aquisição do domínio,tratou de prescrição aquisitiva,em que predomina a forçageradora”.3

A prescrição extintiva, fatojurídico em sentido estrito, é,nesse contexto, uma sanção aotitular do direito violado, queextingue tanto a pretensãopositiva quanto a negativa(exceção ou defesa). Trata-se deum fato jurídico stricto sensujustamente pela ausência de

Page 632: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

vontade humana, prevendo a leiefeitos naturais relacionados coma extinção da pretensão. A suaorigem está no decurso do tempo,exemplo típico de fato natural.

Na doutrina nacional, algunsautores, como Maria HelenaDiniz4 e Sílvio de Salvo Venosa,5ainda conceituam a prescriçãoextintiva como a perda do direitode ação ou da própria ação, teseantiga de Clóvis Beviláqua e coma qual não há como concordar,principalmente com a emergênciada codificação material de 2002.Conforme elucida Renan Lotufo,ao comentar o art. 189 do atual

Page 633: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

Código Civil, “não há referênciaà ação no artigo, mas à pretensão,e é esta que se extingue com odecurso do tempo. Além disso, amenção a algum ato ou fatoimpeditivo, ou suspensivo, docurso do prazo não entra noconceito, mesmo porqueimplicará a não tipificação, ou amera forma alternativa nacontagem do prazo”.6 Dessemodo, merece apoio a críticaformulada pelo professor daPUCSP, no sentido de que aprescrição, de fato, constitui aextinção da pretensão. A questãoé de opção legislativa quanto à

Page 634: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

categorização jurídica.Esclareça-se que a ideia depretensão adotada pelo CódigoCivil Brasileiro tem relação coma noção de Windscheid, com ofim de transpor ao DireitoPrivado a actio, oriunda doantigo Direito comum. Trata-sedo conceito de direito subjetivoprocessual, considerado a partirda possibilidade de processo.7

Na prescrição, nota-se queocorre a extinção da pretensão,relativa a direitos subjetivos decunho patrimonial. Todavia, odireito em si permaneceincólume, só que sem proteção

Page 635: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

jurídica para solucioná-lo. Tantoisso é verdade que, se alguémpagar uma dívida prescrita, nãopode pedir a devolução daquantia paga, eis que existia odireito de crédito que não foiextinto pela prescrição. Nessesentido, determina o art. 882 doCC/2002 que não se pode repetiro que se pagou para solver dívidaprescrita, ou cumprir obrigaçãojudicialmente inexigível.

Para tais pretensões, quandonão houver previsão de prazoespecífico, aplica-se a regra geralde dez anos, conforme o art. 205do Código Civil em vigência.

Page 636: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

Esse prazo incide em qualqueração, não havendo mais distinçãoquanto às ações reais e pessoais,como constava do art. 177 doCódigo Civil de 1916 (20 anos,para ações pessoais; 15 anos,para ações reais entre ausentes;10 anos, para ações reais entrepresentes). A premissa temrelação com a facilitação doDireito Privado, a simplicidade.Como exemplo de aplicaçãodesse prazo geral, o SuperiorTribunal de Justiça editou aSúmula 412, enunciando que “Aação de repetição de indébito detarifas de água e esgoto sujeita-se

Page 637: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

ao prazo prescricionalestabelecido no Código Civil”.

No que concerne ao inícioda contagem do prazoprescricional, é o teor doEnunciado n. 14 do CJF/STJ,aprovado na I Jornada de DireitoCivil, realizada em setembro de2002: “Art. 189: 1) o início doprazo prescricional ocorre com osurgimento da pretensão, quedecorre da exigibilidade dodireito subjetivo; 2) o art. 189 dizrespeito a casos em que apretensão nasce imediatamenteapós a violação do direitoabsoluto ou da obrigação de não

Page 638: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

fazer”.A doutrina majoritária

sempre foi favorável ao que serefere o enunciado doutrináriotranscrito, sendo certo que osparâmetros que nele constamdevem ser aplicados para o inícioda contagem dos prazosprescricionais. A título deexemplo do seu conteúdo, deduz-se que, em caso de uma dívida atermo, a prescrição tem inícioquando ela não é paga(vencimento + inadimplemento).Por seu turno, nas hipóteses deato ilícito, a prescrição tem inícioquando ocorre o evento danoso.

Page 639: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

Todavia, esses parâmetrosde início da contagem do prazoprescricional – a partir daviolação do direito subjetivo –,vêm sendo contestadosjurisprudencialmente. Isso porquecresce na jurisprudência doSuperior Tribunal de Justiça aadoção à teoria da actio nata,segundo a qual o prazo deve terinício a partir do conhecimentoda violação ou lesão ao direitosubjetivo. Realmente, a tese émais justa, diante do princípio daboa-fé.

Os primeiros julgadosaplicavam a premissa ao Direito

Page 640: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

Tributário e ao DireitoAdministrativo. Maisrecentemente, surgiram outrasdecisões, incidindo esse novoparâmetro na esfera civil. Parailustrar, cumpre transcreverjulgado em que a teoria da actionata foi aplicada a casoenvolvendo a responsabilidadecivil do Estado:

“Administrativo. Responsabilidade civil doEstado. Pretensão de indenização contra aFazenda Nacional. Erro médico. Danosmorais e patrimoniais. Procedimentocirúrgico. Prescrição. Quinquídio do art. 1º doDecreto 20.910/1932. Termo inicial. Data daconsolidação do conhecimento efetivo davítima das lesões e sua extensão. Princípio da

Page 641: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

actio nata. 1. O termo a quo para aferir olapso prescricional para ajuizamento de açãode indenização contra o Estado não é a datado acidente, mas aquela em que a vítima teveciência inequívoca de sua invalidez e daextensão da incapacidade de que restouacometida. Precedentes da Primeira Seção.2. É vedado o reexame de matéria fático-probatória em sede de recurso especial, a teordo que prescreve a Súmula 07 desta Corte.Agravo regimental improvido” (STJ, AgRg noREsp 931.896/ES, Segunda Turma, Rel. Min.Humberto Martins, j. 20.09.2007, DJ03.10.2007, p. 194).

No campo jurisprudencial, ateoria da actio nata igualmentepode ser retirada do teor daSúmula 278 do mesmo Tribunal,que dita: “O termo inicial do

Page 642: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

prazo prescricional, na ação deindenização, é a data em que osegurado teve ciência inequívocada incapacidade laboral”. Domesmo Tribunal, igualmente parailustrar, vejamos mais recentejulgado, publicado no seuInformativo n. 470, fazendoincidir a actio nata:

“Erro médico. Prescrição. Termo a quo. ATurma, na parte conhecida, deu provimentoao recurso especial da vítima de erro médicopara afastar a prescrição reconhecida emprimeira instância e mantida pelo tribunal deorigem. In casu, a recorrente pleiteouindenização por danos morais sob a alegaçãode que, ao realizar exames radiográficos em1995, foi constatada a presença de uma

Page 643: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

agulha cirúrgica em seu abdome. Afirmouque o objeto foi deixado na operaçãocesariana ocorrida em 1979, única cirurgia aque se submeteu. Nesse contexto, consignou-se que o termo a quo da prescrição dapretensão indenizatória pelo erro médico é adata da ciência do dano, não a data do atoilícito. Segundo o Min. Relator, se a parte nãosabia que havia instrumentos cirúrgicos emseu corpo, a lesão ao direito subjetivo eradesconhecida, portanto ainda não existiapretensão a ser demandada em juízo.Precedente citado: REsp 694.287-RJ, DJ20.09.2006” (STJ, REsp 1.020.801/SP, Rel.Min. João Otávio de Noronha, j. 26.04.2011).

Seguindo nas concretizaçõespráticas, a teoria da actio nata éabstraída da conclusão de que, nocaso de falecimento de pessoa da

Page 644: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

família, o início do prazoprescricional para que osparentes promovam a demandareparatória se dá com ofalecimento do ente querido.Assim, “o termo inicial dacontagem do prazo prescricionalna hipótese em que se pleiteiaindenização por danos moraise/ou materiais decorrentes dofalecimento de ente querido é adata do óbito, independentementeda data da ação ou omissão. Nãoé possível considerar que apretensão à indenização emdecorrência da morte nasça antesdo evento que lhe deu causa”

Page 645: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

(STJ, REsp 1.318.825/SE, Rel.Min. Nancy Andrighi, j.13.11.2012, publicado no seuInformativo n. 509).

Por fim, consigne-se que, noano de 2014. o mesmo Tribunalda Cidadania proferiu acórdãoem sede de incidente de recursosrepetitivos quanto ao termoinicial para a cobrança do seguroDPVAT. Conforme publicaçãoconstante do seu Informativo n.544, “no que diz respeito aotermo inicial do prazoprescricional nas demandas porindenização do seguro DPVATque envolvem invalidez

Page 646: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

permanente da vítima: a) o termoinicial do prazo prescricional é adata em que o segurado teveciência inequívoca do caráterpermanente da invalidez; e b)exceto nos casos de invalidezpermanente notória, a ciênciainequívoca do caráter permanenteda invalidez depende de laudomédico, sendo relativa apresunção de ciência” (STJ,REsp 1.388.030/MG, Rel. Min.Paulo de Tarso Sanseverino, j.11.06.2014). Eis aqui mais umasituação em que a aplicação daactio nata mostra-se mais efetivasocialmente.

Page 647: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

Em sede legislativa, a teoriafoi adotada pelo art. 27 doCódigo de Defesa doConsumidor, pelo qual, emhavendo acidente de consumo, oprazo prescricional de cinco anostem início do conhecimento dodano e de sua autoria. Surge,assim, um novo dimensionamentodo tema da prescrição, mais bemadaptado às ideias de eticidade ede socialidade, valorizando-se aquestão da informação.Realmente, a teoria da actio nataparece mais afeita à realidadesocial contemporânea e à boa-féobjetiva.

Page 648: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

O art. 190 do CC/2002 traznovidade até então, prevendo quea exceção prescreve no mesmoprazo em que a pretensão. Aexceção é vista como umcontradireito diante da pretensão,geralmente com o fim de negá-laou de afastar o seu cumprimento.8Nesse contexto, de acordo com oCódigo Civil, os prazosaplicáveis às pretensõesigualmente devem regulamentaras defesas e exceçõescorrespondentes, de acordo com aequivalência material,consagração, em parte, doprincípio da actio nata, pelo qual

Page 649: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

o prazo também pode ter início apartir da ciência da lesão aodireito subjetivo. Isso porque oréu da ação poderá terconhecimento da lesão ao seudireito subjetivo justamente pelapropositura da ação por alguémque também lhe deve determinadaquantia. Dessa forma, não poderáperder o prazo para alegar, porexemplo, a compensação dasdívidas.

Por razões óbvias, odispositivo em análise tambémserá aplicado às demandascondenatórias. Sobre essainovação, o Código Civil de 2002

Page 650: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

supriu uma omissão dacodificação anterior, sendo certoque “alguns autores chegaram adefender a imprescritibilidade daexceção, o que não faz nenhumsentido. Prescrito o direito deação, não há o que serexcepcionado”.9 Ainda no queconcerne ao art. 190 do CódigoCivil, na V Jornada de DireitoCivil aprovou-se enunciadoestabelecendo que o comandosomente incide nas exceçõesimpróprias, aquelas que sãodependentes ou não autônomas,caso da compensação. Por outravia, as exceções propriamente

Page 651: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

ditas, independentes ouautônomas, são imprescritíveis,como é a alegação de pagamentodireto ou de coisa julgada(Enunciado n. 415). A proposta,de autoria de André Borges deCarvalho Barros, segue a doutrinade Maria Helena Diniz.10

Com o art. 191 do CódigoCivil, passou a ser admitida arenúncia à prescrição por partedaquele que dela se beneficia, ouseja, o devedor. Não é viáveljuridicamente a renúncia prévia,pois ela somente é possível apósse consumar a prescrição.Inicialmente, essa renúncia à

Page 652: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

prescrição poderá ser expressa,mediante declaração comprovadae idônea do devedor, sem vícios.Pode ocorrer, também, a renúnciatácita da prescrição, porcondutas do devedor que induzema tal fato, como o pagamento totalou mesmo parcial da dívidaprescrita, que não pode serrepetida, exemplo que é deobrigação natural (art. 882 doCC/2002). Igualmente, hárenúncia tácita à prescrição nocaso de acordo paraparcelamento da dívida (TJMG,Apelação Cível1.0145.02.003944-5/0011, Juiz

Page 653: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

de Fora, Sexta Câmara Cível,Rel. Des. Edilson OlímpioFernandes, j. 20.10.2009,DJEMG 11.12.2009). Essarenúncia à prescrição ainda podeser judicial – quando manifestadaem juízo – ou extrajudicial – foradele.

Como é notório, os prazosde prescrição não podem seralterados por acordo das partes,outra inovação que foi inseridapelo Código de 2002,especialmente pelo seu art. 192.Pontue-se que o comando legalsomente consolidou oentendimento doutrinário anterior,

Page 654: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

pelo qual a prescrição somenteteria origem legal, não podendoos seus prazos ser alterados porato volitivo. Aqui, reside pontodiferenciador em relação àdecadência, que pode ter origemconvencional, conforme seráexposto ainda neste capítulo.Trazendo interessante aplicaçãoprática do art. 192 do Código,transcreve-se julgado do Tribunalde Justiça do Distrito Federal:

“Prescrição. Execução de contrato definanciamento. Vencimento antecipado. Diesa quo do prazo prescricional. Alteração doprazo prescricional. Impossibilidade. 1) Paraque seja considerado o prazo prescricional do

Page 655: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

Código Civil revogado, é preciso que já tenhahavido a redução do prazo e, ainda, tertranscorrido mais da metade do prazo quandoda entrada em vigor no novo Código. 2) Oprazo prescricional inicia-se da data em queocorreu o vencimento antecipado da dívida,uma vez que é nesta data que o direito éviolado e nasce a pretensão do credor. 3) Ter-se o prazo prescricional como iniciado na datado fim do contrato, e não do vencimentoantecipado, violaria o disposto no art. 192 doCódigo Civil, pois se estaria alterando prazoestabelecido em Lei. 4) Recurso conhecido eimprovido” (TJDF, Recurso Inominado2008.07.1.001151-3, Acórdão 328.066,Segunda Turma Cível, Rel. Des. LucianoVasconcelos, DJDFTE 10.11.2008, p. 100).

Na mesma linha, entendeu oTribunal de Justiça de São Pauloque a previsão de prazo

Page 656: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

prescricional para ressarcimentoinserido em contrato de compra evenda de ações de sociedaderepresenta clara violação ao art.192 do Código Civil, norma deordem pública que não pode sercontrariada por convenção daspartes, premissa que sempre deveprevalecer (TJSP, Apelação9132334-30.2009.8.26.0000,Acórdão 5924801, São Paulo,Sexta Câmara de Direito Privado,Rel. Des. Francisco Loureiro, j.24.05.2012, DJESP 11.06.2012).

Dispõe o art. 193 dacodificação material vigente quea prescrição pode ser alegada em

Page 657: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

qualquer grau de jurisdição, pelaparte a quem aproveita (odevedor ou qualquer interessado).Ilustrando, a prescrição pode seralegada em sede de apelação,ainda que não suscitada emcontestação. Assim julgando doSuperior Tribunal de Justiça:

“Direitos civil e processual civil. Prescrição.Espécie extintiva. Alegação. Apelação.Possibilidade. Art. 162, CC. Silêncio emcontestação. Irrelevância. Precedentes.Recurso especial. Enunciado n. 7 daSúmula/STJ. Recurso desacolhido. I – Aprescrição extintiva pode ser alegada emqualquer fase do processo, nas instânciasordinárias, mesmo que não tenha sidodeduzida na fase própria de defesa ou nainicial dos embargos à execução. II – A

Page 658: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

pretensão recursal, que depende do reexamede documentos apresentados nas instânciasordinárias, não comporta análise nesta Corte,a teor do Enunciado n. 7 de sua Súmula”(STJ, REsp 157.840/SP, Quarta Turma, Rel.Min. Sálvio de Figueiredo Teixeira, j.16.05.2000, DJ 07.08.2000, p. 109).

Em complemento, anote-seque, em recente julgadoenvolvendo o Direito Tributário,concluiu o mesmo Tribunal daCidadania que a prescrição podeser conhecida de ofício emqualquer grau de jurisdição, porenvolver matéria de ordempública, não havendo supressãode instância (STJ, AgRg-REsp1.176.688/RJ, Primeira Turma,

Page 659: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

Rel. Min. Luiz Fux, j. 10.08.2010,DJE 13.10.2010). A premissa éconfirmada pela regra segundo aqual a prescrição deve serconhecida de ofício, assunto queainda será estudado nestecapítulo.

Na prática, é muito comum asua alegação ocorrer em sede decontestação, não como preliminarprocessual, mas como preliminarde mérito, porque, com a suaapreciação, serão analisadasquestões de direito material. OCódigo de Processo Civil de1973, em seu art. 269, inciso IV,estabelecia a resolução de mérito

Page 660: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

quando o juiz pronunciasse adecadência ou a prescrição. Fez omesmo o art. 487, inciso II, doNovo CPC, ampliando o textopara mencionar o conhecimentode ofício da prescrição e dadecadência (“Haverá resoluçãode mérito quando o juiz: (...) II –decidir, de ofício ou arequerimento, sobre a ocorrênciade decadência ou prescrição”).

Como o Código Civil de2002 não trouxe qualquernovidade em relação à matéria,continuava em vigor a Súmula150 do STF, pela qual prescreve“a execução no mesmo prazo de

Page 661: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

prescrição da ação”. Anote-seque o CPC anterior não elencavaa prescrição como geradora daextinção da execução, em seu art.794. O Novo CPC, seguindo oteor da súmula, passou a tratardessa hipótese, reconhecendo,inclusive, a possibilidade deprescrição intercorrente (art.924, inciso V, do CPC/2015).

Cumpre salientar que esteautor nunca foi adepto daprescrição intercorrente naesfera privada, aquela que correno curso de demanda ou ação.Isso porque essa forma deprescrição pode ser injusta em

Page 662: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

muitos casos, prestigiando a má-fé, especialmente diante damorosidade que acomete o PoderJudiciário brasileiro. Com aprescrição intercorrente, odevedor que se esconde conseguefazer extinguir a pretensão que lheé cobrada.

Todavia, infelizmente, oNovo CPC consagrou a categoriae procurou trazer balizasconceituais para o seupreenchimento. O art. 921 doCPC/2015 estabelece, entre ashipóteses de suspensão daexecução, o fato de o executadonão possuir bens penhoráveis

Page 663: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

(inciso III). Nos termos do seu §1º, em situações tais, o juizsuspenderá a execução pelo prazode um ano, durante o qual sesuspenderá a prescrição. Porém,decorrido esse lapso semmanifestação do exequente,começa a correr o prazo deprescrição intercorrente (art. 921,§ 4º, do CPC/2015). O juiz,depois de ouvir as partes, noprazo de 15 dias, poderá, deofício, reconhecer a prescriçãode que trata o § 4º e extinguir oprocesso (art. 921, § 5º, doCPC/2015).

Em verdade, o comando

Page 664: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

detalhou alguns elementos queparte da jurisprudência jáentendia como viáveis para gerara prescrição no curso doprocesso. A ilustrar, entre os maisrecentes arestos, decidiu-se que“não corre a prescriçãointercorrente durante o prazo desuspensão do processo deexecução determinado pelo juízo.Para a retomada de seu curso,faz-se necessária a intimaçãopessoal do credor paradiligenciar no processo, porque éa sua inação injustificada que fazretomar-se o curso prescricional”(STJ, AgRg no AREsp

Page 665: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

585.415/SP, Quarta Turma, Rel.Min. Maria Isabel Gallotti, j.25.11.2014, DJe 09.12.2014). Emcomplemento: “O reconhecimentoda prescrição intercorrentevincula-se não apenas aoelemento temporal, mas também àocorrência de inércia da parteautora em adotar providênciasnecessárias ao andamento dofeito. Consignado no acórdãorecorrido que o credor nãoadotou comportamento inerte,inviável o recurso especial quevisa alterar essa conclusão, emrazão do óbice imposto pelaSúmula 7/STJ” (STJ, AgRg no

Page 666: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

AREsp 33.751/SP, TerceiraTurma, Rel. Min. João Otávio deNoronha, j. 25.11.2014, DJe12.12.2014). Por fim: “de acordocom precedentes do STJ, aprescrição intercorrente sópoderá ser reconhecida noprocesso executivo se, após aintimação pessoal da parteexequente para dar andamento aofeito, a mesma permanece inerte.Precedentes. Conformeorientação pacífica desta Corte, énecessária a intimação pessoal doautor da execução para oreconhecimento da prescriçãointercorrente. Precedentes” (STJ,

Page 667: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

AgRg no AREsp 131.359/GO,Quarta Turma, Rel. Min. MarcoBuzzi, j. 20.11.2014, DJe26.11.2014).

Acreditamos que, empanorama de justiça cível célere,o instituto da prescriçãointercorrente até poderia seradmitido. Sendo assim, se o NovoCPC realmente agilizar osprocedimentos e diminuir ademora das demandas, aprescrição intercorrente poderáser saudável. Caso contrário,poderá ser um desastreinstitucional. Mais uma vez, otempo e a prática demonstrarão se

Page 668: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

o instituto veio em boa hora ounão.

Feitas tais considerações,interessante consignar que oNovo CPC reafirmou apossibilidade de a prescrição serconhecida de ofício pelo juiz,agora de maneira aperfeiçoada.Previa o art. 194 do CódigoCivil, originalmente, que o juiznão poderia suprir, de ofício, aalegação de prescrição, salvo sefavorecesse absolutamenteincapaz. O dispositivo emquestão foi revogado pela Lei11.280, de 16.02.2006.

Com a revogação desse

Page 669: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

dispositivo material pelomovimento anterior de Reformado CPC, perderam sentido doisenunciados do Conselho daJustiça Federal, aprovados nasJornadas de Direito Civil. Oprimeiro é o de número 154, peloqual o juiz deveria suprir deofício a alegação de prescriçãoem favor do absolutamenteincapaz. Já o Enunciado n. 155 doCJF/STJ dispunha que estariarevogado o § 5º do art. 219 doCPC de 1973, que preceituava:“Não se tratando de direitospatrimoniais, o juiz poderá, deofício, conhecer da prescrição e

Page 670: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

decretá-la de imediato”.Pois bem, o último

dispositivo processual do CPCanterior também foi alterado pelaLei 11.280/2006, passando a terredação bem simplificada: “Ojuiz pronunciará, de ofício, aprescrição”. Como se vê, aalteração do texto foi substancial,justamente o oposto do que estavaantes tratado. Naquela ocasião,caiu o mito de que a prescriçãonão poderia ser conhecida deofício. Isso em prol de umasuposta celeridade processualque não chegou a ser alcançadaaté aqui. Em tom crítico, pode-se

Page 671: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

dizer que o Código Civil eraharmônico quanto ao tema deprescrição, principalmente seconfrontado com a decadência.Contudo, essa harmonia foiquebrada pela reformaprocessual.

Em suma, a matéria ficouconsolidada somente na leiprocessual anterior, não havendomais qualquer disposição a ela noCódigo Civil. Foi retirada aexceção a favor do absolutamenteincapaz, que deixou de seraplicada. Além disso, retirou-se amenção à prescrição relativa adireitos não patrimoniais,

Page 672: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

simplesmente porque não existeprescrição que não estejarelacionada com direitossubjetivos com esse caráter.

O Novo Código de ProcessoCivil manteve o reconhecimentoda prescrição de ofício,ampliando essa forma de julgarpara a decadência. De início, oEstatuto Processual emergentepassou a reconhecer apossibilidade de julgamentoliminar do pedido, sendo uma dassuas causas a percepção daocorrência da prescrição ou dadecadência (art. 332, § 1º, doCPC/2015). Em complemento,

Page 673: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

reafirme-se a regra do art. 487 dalei emergente, com a seguinteredação: “Haverá resolução demérito quando o juiz: (...) II –decidir, de ofício ou arequerimento, sobre a ocorrênciade decadência ou prescrição”.

Algumas dúvidas surgiram arespeito dessa importantealteração categórica, mantidascom a emergência do Novo CPC.A primeira delas é saber se aprescrição é matéria de ordempública, tendo em vista o seureconhecimento de ofício. Algunsautores respondem positivamente,caso de Maria Helena Diniz,11

Page 674: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

Roberto Senise Lisboa,12 NelsonNery e Rosa Maria de AndradeNery.13

Entretanto, a este autorparece existir problema em sefazer tal afirmação, pelo fato de aprescrição envolver direitospatrimoniais e, portanto, a ordemprivada. Nessa trilha, entendemque a prescrição não passou a sermatéria de ordem públicaRodrigo Reis Mazzei14 e JoséFernando Simão.15

Como terceira via, masseguindo a segunda corrente,pode-se afirmar que, realmente, a

Page 675: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

prescrição não é matéria deordem pública, mas a celeridadeprocessual o é. Isso porque aConstituição Federal passou aassegurar como direitosfundamentais o razoávelandamento do processo e aceleridade das ações judiciais(art. 5º, LXXVIII, da CF/1988,introduzido pela EC 45/2004). Oreconhecimento da prescrição deofício foi criado justamente paraa tutela desses direitos. Comovisto, o Novo CPC reafirma anecessidade dessa agilização dosprocedimentos, ganhando força atese com o seu surgimento.

Page 676: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

Outro problema doconhecimento da prescrição deofício está relacionado com arenúncia judicial à prescrição.Para concretizar e facilitar acompreensão, imagine-se quealguém cobra judicialmente umadívida, supostamente prescrita.Qual a decisão inicial do juiz?Para um prático, a resposta é quea decisão é uma sentença, em queé reconhecida a prescrição deofício, julgando-se extinta a açãocom resolução do mérito, agorapela forma do julgamentoliminar do pedido (art. 332 doCPC/2015). Para um técnico, o

Page 677: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

juiz deve determinar a citação doréu para que se manifeste quantoà renúncia à prescrição.

Essa resposta técnica, que aeste autor sempre pareceu ser amais correta, foi dada na IVJornada de Direito Civil, com aaprovação do Enunciado n. 295do CJF/STJ, que tem a seguinteredação: “A revogação do art.194 do Código Civil pela Lei11.280/2006, que determina aojuiz o reconhecimento de ofícioda prescrição, não retira dodevedor a possibilidade derenúncia admitida no art. 191 dotexto codificado”. Em sentido

Page 678: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

idêntico, sustentava Rodrigo ReisMazzei ser necessária a intimaçãodo réu (devedor), para que semanifeste quanto à renúncia àprescrição.16 Entre os civilistas, aposição era compartilhada porÁlvaro Villaça Azevedo, juristaque é referência para o presenteautor.17

Em suma, sempre nosfiliamos à posição técnica, pois,caso contrário, a autonomiaprivada – manifestada pelodireito de se pagar uma dívidaprescrita em juízo e renunciandoà prescrição –, estaria seriamenteferida. Sendo a autonomia

Page 679: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

privada um valor associado àliberdade constitucional, pode-seaté afirmar que a inovação éinconstitucional, se este direito derenúncia à prescrição não forassegurado.

Ademais, a primeiraresposta poderia ser injusta, poisafastaria a possibilidade dediscussão, em juízo, das causasimpeditivas, suspensivas einterruptivas da prescrição. Esseentendimento vinha sendoadotado pelo Superior Tribunalde Justiça, com menção aos novosdoutrinadores do Direito Civilbrasileiro. Por todos:

Page 680: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

“Recurso especial. Tributário. Prescrição.Decretação ex officio. Prévia oitiva daFazenda Pública. Nulidade inexistente. 1.‘Apesar da clareza da legislação processual,não julgamos adequado o indeferimentooficioso da inicial. De fato, constata-se umaperplexidade. O magistrado possui uma ‘bolade cristal’ para antever a inexistência decausas impeditivas, suspensivas ouinterruptivas ao curso da prescrição?’ (NelsonRosenvald, Prescrição da Exceção àObjeção. Leituras Complementares deDireito Civil. Cristiano Chaves de Farias(org.). Salvador: Edições Jus Podivm, 2007. p.190). 2. A prévia oitiva da Fazenda Pública érequisito para a decretação da prescriçãoprevista no art. 40, § 4º, da Lei 6.830/1980,bem como da prescrição referida no art. 219,§ 5º, do CPC, ainda que esse últimodispositivo silencie, no particular. 3. Deve-seinterpretar sistematicamente a normaprocessual que autoriza o juiz a decretar ex

Page 681: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

officio a prescrição e a existência de causasinterruptivas e suspensivas do prazo que nãopodem ser identificadas pelo magistradoapenas à luz dos elementos constantes noprocesso. 4. Embora tenha sido extinto oprocesso em primeira instância sem a préviaoitiva da Fazenda Pública, quando dainterposição do recurso de apelação, esta tevea oportunidade de suscitar a ocorrência decausa suspensiva ou interruptiva do prazoprescricional. Assim, não há que serreconhecida a nulidade da decisão quedecretou a extinção do feito. 5. A exigênciada prévia oitiva do Fisco tem em mira dar-lhea oportunidade de arguir eventuais óbices àdecretação da prescrição. Havendopossibilidade de suscitar tais alegações nasrazões da apelação, não deve ser reconhecidaa nulidade da decisão recorrida. 6. Recursoespecial não provido” (STJ, REsp1.005.209/RJ, Segunda Turma, Rel. Min.Castro Meira, j. 08.04.2008, DJ 22.04.2008,

Page 682: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

p. 1).

Tudo isso sob o prisma maistécnico e menos prático, quefelizmente vinha prevalecendo.Aliás, no tocante à supostainconstitucionalidade dainovação, merecem ser lidas ascríticas anteriores contundentesformuladas pelo processualistaAlexandre Freitas Câmara, comos seguintes dizeres:

“Tenho para mim que esta é uma modificaçãoamalucada ou, como disse no título que atribuíao presente estudo, descabeçada. Penso, e odigo aqui sem qualquer pudor, que o legisladorbrasileiro demonstra, agora, que perdeutotalmente o juízo.

Page 683: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

Registro, desde logo, que até mesmo a Bíblia(e não vai aqui nenhuma manifestaçãoreligiosa, frise-se) admite que o sábio perca ojuízo: ‘Verdadeiramente, a opressão fazendoidecer até o sábio, e o suborno corrompeo coração’. Pois parece que o legisladorperdeu, apesar de sua costumeira sabedoria, osiso. Algumas normas jurídicas integrantes doordenamento brasileiro bem mostram isso, e ade que aqui se trata é apenas mais umexemplo, sendo possível lembrar de outros.(...).Verifica-se, pois, que a existência de umaincoerência entre normas jurídicas contrariatrês valores que, no Brasil, sãoconstitucionalmente assegurados: isonomia,adequação, segurança jurídica.O princípio da isonomia, como é notório (e,por isso mesmo, dispensa comprovação), estáconsagrado no art. 5º, caput, da Constituiçãoda República (que afirma que todos são iguaisperante a lei). Já a adequação é um dos

Page 684: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

elementos integrantes do princípio darazoabilidade, o qual tem sua sede materiaeno art. 5º, LIV, da Constituição da República.Por fim, o princípio da segurança jurídica está,também, expressamente consagrado nocaput do art. 5º da Lex Legum.Assim, outra conclusão não há a não ser aque aqui se aponta: sendo a normaautorizadora do reconhecimento ex officio daprescrição incoerente com o sistema jurídicobrasileiro, deve ela ser consideradainconstitucional”.18

Felizmente, o Novo CPCseguiu a corrente mais técnica,dando a oportunidade para a outraparte, o réu da ação, semanifestar, antes do conhecimentoda prescrição. Manteve-se, assim,

Page 685: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

o amparo ao contraditório.Todavia, a este autor pareceexistir um problema no tratamentodado pelo Novo EstatutoProcessual, com certacontradição no texto. Estabeleceo parágrafo único do art. 487 que,ressalvada a hipótese dejulgamento liminar do processo, aprescrição e a decadência nãoserão reconhecidas sem que antesseja dada às partes oportunidadede manifestar-se. Ora, se o juizpercebe a presença da prescrição,não restando dúvidas de suaexistência na convicção dojulgador, deverá reconhecê-la

Page 686: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

liminarmente ou será vital ouvir oréu? Entendemos que o segundocaminho deverá ser percorrido.Vejamos como a jurisprudência sepronunciará no futuro.

Terminada a análise desseimportante tema da prescrição deofício, consagra a norma privadaque os relativamente incapazes eas pessoas jurídicas têm açãocontra os seus assistentes ourepresentantes legais que deremcausa à prescrição, ou não aalegarem oportunamente (art. 195do CC/2002). Desse modo, aatual codificação enuncia apossibilidade de os relativamente

Page 687: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

incapazes e as pessoas jurídicaspromoverem açõescorrespondentes contra seusrepresentantes ou prepostos quederam causa à perda de umapretensão ou não a alegaramquando deviam tê-lo feito. No quetoca ao último caso, o artigo emquestão, sem dúvida, pode seraplicado aos advogados ouprocuradores que têmresponsabilidade subjetiva portais fatos, mediante culpa, nostermos do art. 186 do CC/2002,do art. 14, § 4º, do CDC e doEstatuto da Advocacia.

Comparando-se o art. 195

Page 688: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

do atual Código Civil com o textoanterior (art. 164 do CC/1916),ampliam-se as possibilidades,deferindo direito que antes nãoestava reconhecido também àspessoas jurídicas, tanto deDireito Público quanto de DireitoPrivado.

Seguindo, dispõe o art. 196do atual Código Civil que “Aprescrição iniciada contra umapessoa continua a correr contra oseu sucessor”. A codificação de2002 substituiu a expressãoherdeiro, que constava do art.165 do CC/1916, pelo termosucessor. Dessa forma, alarga-se

Page 689: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

a possibilidade de continuidadeda prescrição, tanto emdecorrência de ato mortis causa(testamento ou legado) quantointer vivos (compra ou sucessãode empresas).

Como é notório, o CódigoCivil consagra, entre os seus arts.197 e 201, hipóteses em que oprazo de prescrição é impedidoou suspenso. Tal efeito diferenciaa categoria da decadência que,em regra, não pode ser suspensa,impedida ou interrompida (art.207 do CC/2002). Vale lembrarque, ao lado das hipóteses desuspensão previstas na lei

Page 690: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

material, o art. 921 do CPC/2015incluiu a suspensão da prescriçãoem decorrência da suspensão daexecução.

Inicialmente, enuncia o art.197 do CC/2002 que não corre aprescrição nas seguinteshipóteses: a) entre os cônjuges,na constância da sociedadeconjugal; b) entre ascendente edescendente, durante o poderfamiliar; c) entre tutelados oucuratelados e seus tutores oucuradores, durante a tutela oucuratela.

O efeito da adoção dodispositivo citado, que denota as

Page 691: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

causas impeditivas da prescrição,equivale ao da suspensão. Dessaforma, se o prazo ainda não foiiniciado, não correrá. Ao revés,cessando a causa de suspensão, oprazo continua a correr do pontoem que parou. Pelo tratamentolegal dos seus incisos, observa-seque as hipóteses em questãoenvolvem situações entrepessoas, não dependendo dequalquer conduta do credor ou dodevedor, ao contrário do queocorre com a interrupção daprescrição.

Pelo inciso I do art. 197 dacodificação material, entre

Page 692: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

marido e mulher não correrá aprescrição ainda não iniciada ou,se iniciada, será suspensa. OCódigo de 2002 substitui aexpressão matrimônio porsociedade conjugal, afastandodúvidas anteriores, uma vez que aúltima é que estabelece o regimede bens. A princípio, a separaçãode fato não impede a aplicação daregra, somente correndo aprescrição a partir do trânsito emjulgado da sentença de separaçãojudicial (consensual ou litigiosa),da sentença de divórcio direto ouda escritura pública de separaçãoou divórcio. Todavia, há forte

Page 693: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

entendimento, na doutrina e najurisprudência, de que aseparação de fato pode pôr fim àsociedade conjugal. Emcomplemento, cabe lembrar queas conclusões referentes àsseparações judicial eextrajudicial devem ser vistascom ressalvas, eis que este autorfilia-se à posição pela qual aEmenda do Divórcio (EC66/2010) retirou do sistema aseparação de direito, mesmotendo sido esta reafirmada peloNovo CPC. O assunto estádesenvolvido em capítulo própriodesta obra (Capítulo 13).

Page 694: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

Diante da proteçãoconstitucional da união estável(art. 226 da CF/1988), na IVJornada de Direito Civil, foiaprovado o Enunciado n. 296 doCJF/STJ, prevendo que “nãocorre a prescrição entre oscompanheiros, na constância daunião estável”. Tal conclusão jáfoi aplicada pela jurisprudêncianacional, contando com o apoiodeste autor (TJMG, ApelaçãoCível 1.0702.08.432531-6/0011,Uberlândia, Décima TerceiraCâmara Cível, Rel. Des. LuizCarlos Gomes da Mata, j.04.06.2009, DJEMG

Page 695: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

29.06.2009). O Novo CPCreafirma a premissa, pois sempremenciona o companheiro ao ladodo cônjuge, em vários de seusartigos, como está demonstradoem outro capítulo desta obra(Capítulo 14).

A prescrição aindapermanece suspensa naconstância do poder familiar,entre ascendentes e descendentes,pais e filhos, em regra, conformeo inciso II do art. 197 doCC/2002. Nota-se a adequaçãodo texto à nova realidade doDireito de Família(despatriarcalização), por

Page 696: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

suprimir-se a expressão pátriopoder, eminentemente patriarcal,superada pela nova dimensãodada à família pelo TextoConstitucional. Utiliza-se,portanto, a expressão poderfamiliar. Nessas circunstâncias, oprazo prescricional inicia-se nadata em que o menor completa 18anos, exceção feita aos casos deemancipação, previstos no art. 5ºda codificação civil ou dedestituição do poder familiar. Atítulo de exemplo, recente julgadodo Superior Tribunal de Justiçaconcluiu que não corre aprescrição entre pai e filho menor

Page 697: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

na hipótese de ação reparatóriade danos decorrentes doabandono afetivo (STJ, REsp1.298.576/RJ, Rel. Min. LuisFelipe Salomão, j. 21.08.2012,publicado no Informativo n. 502).

Por fim, o Código Civilatual mantém a regra anterior,pela qual não corre a prescriçãoentre tutor e tutelado, curador ecuratelado, na vigência da tutela eda curatela, institutos de direitoassistencial relacionados com aadministração de bens dosincapazes menores e maiores,respectivamente (art. 197, incisoIII, do CC/2002). Se por um lado

Page 698: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

essa previsão não constituiqualquer inovação; por outro, éinteressante anotar que não seprevê mais suspensão daprescrição a favor do credorpignoratício, do mandante, dodepositante, do devedor, depessoas representadas e de seusherdeiros, em decorrência debens confiados à sua guarda (art.168 do CC/1916), razão pelaqual, entre essas pessoas,eventuais pretensõescondenatórias terão curso deprescrição normal.

O art. 198 do CC/2002preconiza que também não corre a

Page 699: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

prescrição contra os incapazes(art. 3º do CC); contra osausentes do País em serviçopúblico da União, dos Estados oudos Municípios; e contra os quese acharem servindo nas ForçasArmadas, em tempo de guerra.Este autor está filiado aoentendimento doutrinário queafirma tratar o comando de causassuspensivas da prescrição, eisque, na maioria das vezes, noscasos apresentados, o prazo játerá o seu início em curso.Observa-se, mais uma vez,conforme o comentário anterior,que todos os incisos tratam de

Page 700: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

hipóteses envolvendo situaçõesentre pessoas.

A título de exemplo, o prazoinicialmente corrido em relaçãoaos absolutamente incapazes,apresentados em rol taxativo noart. 3º do Código Civil, ficarásuspenso. Eventualmente, se nãoteve início a contagem do prazo,haverá causa impeditiva, emconsonância com a proteção dosabsolutamente incapazes, queenvolve a ordem pública e osinteresses da coletividade.

Ainda no que diz respeito aoart. 198, sem qualquer inovaçãodo que constava do texto privado

Page 701: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

anterior, há causa suspensiva emrelação àqueles que estiveremfora do Brasil, prestando serviçopúblico aos órgãos daadministração direta ou indiretado Estado. A expressão ausentes,utilizada no comando legal emquestão, não se refereespecificamente à ausênciatratada entre os arts. 22 a 39 dacodificação material, mas àquelesque estiverem fora do País. Dequalquer forma, há entendimentopelo qual a ausência, causa demorte presumida, está incluídanesse art. 198, inciso II, doCC/2002. Esse é o teor do

Page 702: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

Enunciado n. 156 do CJF/STJ,aprovado na III Jornada deDireito Civil, no sentido de que,“desde o termo inicial dodesaparecimento, declarado emsentença, não corre a prescriçãocontra o ausente”. O presenteautor está filiado ao teor doenunciado doutrinário exposto.

Também por questão de bomsenso, suspende-se a prescriçãorelativamente aos militares queestiverem servindo ao exército, àmarinha ou à aeronáutica emtempos de guerra, caso, porexemplo, dos brasileirosenviados a outros países para

Page 703: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

compor os serviços de paz daOrganização das Nações Unidas(ONU). Apesar do nome serviçosde paz, os tempos são de guerra,obviamente. Até por motivospráticos, pela impossibilidade decitação muitas vezes percebidanas situações concretas, o prazodeverá permanecer suspenso.

Ato contínuo de estudo, oart. 199 do CC/2002 elenca, aomesmo tempo, causas impeditivas(incisos I e II) e causa suspensiva(inciso III), que merecem omesmo tratamento prático,envolvendo situações entrepessoas.

Page 704: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

Nos termos do inciso I doart. 199 da norma material, nãocorre a prescrição, pendendocondição suspensiva, o que é umacausa impeditiva. A condição éconceituada como um eventofuturo e incerto que suspende aaquisição de direitos, bem comoa eficácia de um ato ou negóciojurídico. Está, portanto, no planoda eficácia do ato ou do negóciojurídico, no terceiro degrau daEscada Ponteana. Como énotório, o termo inicial tem amesma eficácia dessa condiçãosuspensiva, conforme consta doart. 135 do Código Civil. Desse

Page 705: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

modo, exemplifica-se com o casode um contrato de locação. Antesdo termo inicial, como nãopoderia ser diferente, não correráqualquer prescrição, eis que ocontrato ainda não teve o seuinício. Outro exemplo decondição suspensiva pode serretirado da Súmula 229 doSuperior Tribunal de Justiça, pelaqual o “pedido do pagamento deindenização à seguradorasuspende o prazo de prescriçãoaté que o segurado tenha ciênciada decisão”.

Outra causa impeditiva é onão vencimento do prazo (art.

Page 706: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

199, inciso II, do CC/2002).Deduz-se que o comando legal emquestão refere-se não ao prazo deprescrição, mas àquele fixadopara um ato ou negócio jurídico.Não estando vencido o prazo,pela não ocorrência do termofinal – evento futuro e certo quepõe fim aos direitos decorrentesde um negócio –, assinalado pelalei ou pela vontade das partes,não se pode falar em prescrição,havendo causa impeditiva daextinção da pretensão. Ilustrandode forma ainda mais específica,não vencido o prazo parapagamento de uma dívida, não

Page 707: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

corre a prescrição.Por fim, pelo mesmo

comando legal civil, há causasuspensiva pendendo ação deevicção (art. 199, inciso III). Aevicção constitui a perda da coisaem decorrência de uma decisãojudicial ou de apreensãoadministrativa que a atribui aterceiro, cujo tratamento legalespecífico consta entre os arts.447 a 457 do Código Civil. Sãopartes da evicção: o evictor (ouevincente) – aquele que pleiteia acoisa –, o evicto (ou evencido) –aquele que perde a coisa, oadquirente – e o alienante –

Page 708: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

aquele que transfere a coisalitigiosa, em ato motivado pelamá-fé. De acordo com o primeirodispositivo citado, pendendoqualquer ação entre essaspessoas, a prescriçãopermanecerá suspensa. Alerte-seque a evicção tem estudo emcapítulo próprio deste livro,pelas repercussões geradas peloNovo Código de Processo Civil(Capítulo 8).

Determina o art. 200 doCódigo Civil que, quando a açãose originar de fato que deva serapurado no juízo criminal, nãocorrerá a prescrição antes da

Page 709: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

respectiva sentença definitiva.Trata-se de uma inovação, nosistema civil, que traz causaimpeditiva pela qual, napendência de apuração criminal,não corre a prescrição até otrânsito em julgado da sentença aser prolatada nesse âmbito. Essedispositivo legal tem aplicaçãodireta aos casos que envolvem apretensão indenizatória, comprazo prescricional de três anos,contados da ocorrência do eventodanoso ou do conhecimento desua autoria, conforme o art. 206, §3º, inciso V, do atual CódigoCivil. Entre os vários julgados

Page 710: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

que aplicam o art. 200 do CC,colaciona-se o seguinte, doTribunal de Justiça do Rio deJaneiro, para ilustrar:

“Direito civil. Demanda reparatória. Acidenteautomobilístico. Ocorrência de lesõescorporais, além da morte da companheira.Inocorrência de prescrição, cujo prazo apenascomeça a fluir a partir do trânsito em julgadoda sentença penal condenatória. Inteligênciados arts. 200 e 935, ambos do Código Civil.Raciocínio que se mostra coerente com osistema da reparação civil ex delicto,sobretudo em razão do conteúdo dos arts. 63e 64 do CPP; 91, I, do CP; e 475-N, II, doCPC. Impossibilidade de liquidação dasentença proferida no âmbito criminal apenasporque a demanda reparatória foi propostaem face da concessionária de serviços detransporte. Danos morais configurados.

Page 711: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

Circunstâncias do evento que fornecemelementos capazes de justificar a fixação dacompensação em patamares superioresàqueles estabelecidos na sentença. Autor quecomprova que nos seis meses posteriores aoacidente não teve condições de realizar suasatividades laborativas em razão de graveabalo psicológico, inclusive com o uso demedicamentos. Possibilidade de conhecimentode questão não resolvida inteiramente naprimeira instância, com base no art. 515, § 1º,do CPC. Lesões corporais que, emboracompensáveis, não causaram dano estético aoautor. Reparação fixada em R$ 96.000,00,sendo R$ 80.000,00 relativos à morte dacompanheira do autor e o restante pelaslesões corporais por este sofridas.Desprovimento do recurso do réu e parcialprovimento ao recurso do autor” (TJRJ,Apelação 2009.001.57118, Segunda CâmaraCível, Rel. Des. Alexandre Câmara, j.07.10.2009, DORJ 13.10.2009, p. 126)

Page 712: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

Também da jurisprudência,conforme decisão publicada noInformativo n. 500 do STJ, afinalidade do art. 200 doCC/2002 “é evitar soluçõescontraditórias entre os juízoscíveis e criminais, especialmentequando a solução do processopenal seja determinante doresultado do cível. Sendo assim,permite-se à vítima aguardar asolução da ação penal para,apenas depois, desencadear ademanda indenizatória na esferacível. Por isso, é fundamental queexista processo penal em cursoou, pelo menos, a tramitação de

Page 713: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

inquérito policial até o seuarquivamento” (STJ, REsp1.180.237/MT, Min. Paulo deTarso Sanseverino, j.19.06.2012).

De toda sorte, há certoconflito entre o comando oraestudado e o art. 935 do próprioCódigo Civil, eis que essedispositivo enuncia que aresponsabilidade civil independeda criminal. Consigne-se que areferida independência não étotal, pois o curso do prazoprescricional civil depende daapuração dos fatos no âmbitocriminal.

Page 714: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

Segundo o art. 201 doCC/2002, suspensa a prescriçãoem favor de um dos credoressolidários, esta só aproveitaráaos demais se a obrigação forindivisível. Desse modo, no casode solidariedade ativa, por regra,a suspensão da prescrição quefavorece um dos cocredores nãoatingirá os demais. A únicaexceção feita é para a obrigaçãoindivisível, conceituada pelo art.258 da mesma codificaçãosubstantiva, nos seguintes termos:“A obrigação é indivisívelquando a prestação tem porobjeto uma coisa ou um fato não

Page 715: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

suscetíveis de divisão, por suanatureza, por motivo de ordemeconômica, ou dada a razãodeterminante do negóciojurídico”. Desse modo, sendo aobrigação solidária ou divisível,somente será beneficiado pelasuspensão do prazo prescricionalaquele que se encontrar em umadas situações descritas peloscomandos legais apresentadosanteriormente, que trazembenefícios de naturezapersonalíssima, por envolveremsituações entre pessoas, conformecomentado.

Partindo para o estudo das

Page 716: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

causas de interrupção daprescrição, esta envolvecondutas do credor ou dodevedor. Relativamente aos seusefeitos, é cediço que ainterrupção faz que o prazoretorne ao seu início, partindo doseu ponto zero.

Estatui o art. 202, caput, doatual Código Civil que ainterrupção da prescriçãosomente poderá ocorrer uma vez,novidade que traz algunsproblemas práticos, conformeserá analisado.

Como primeira hipótese deinterrupção (art. 202, inciso I, do

Page 717: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

CC), esta pode ocorrer “pordespacho do juiz, mesmoincompetente, que ordenar acitação, se o interessado apromover no prazo e na forma dalei processual”. De início, éinteressante confrontar essedispositivo com o art. 219 doCPC/1973, que preceituava: “Acitação válida torna prevento ojuízo, induz litispendência e fazlitigiosa a coisa; e, ainda quandoordenada por juiz incompetente,constitui em mora o devedor einterrompe a prescrição. § 1º Ainterrupção da prescriçãoretroagirá à data da propositura

Page 718: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

da ação”. O dispositivo foireproduzido, com alterações arespeito da mora, pelo art. 240 doNovo CPC, in verbis: “A citaçãoválida, ainda quando ordenadapor juízo incompetente, induzlitispendência, torna litigiosa acoisa e constitui em mora odevedor, ressalvado o dispostonos arts. 397 e 398 da Lei 10.406,de 10 de janeiro de 2002 (CódigoCivil). § 1º A interrupção daprescrição, operada pelodespacho que ordena a citação,ainda que proferido por juízoincompetente, retroagirá à data depropositura da ação”.

Page 719: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

No tocante à execução, havianorma no mesmo sentido no CPCanterior, estabelecendo o antigoart. 617 que a propositura daexecução, deferida pelo juiz,interromperia a prescrição, mas acitação do devedor deveria serfeita com observância ao dispostono art. 219 do CPC/1973. O art.802 do Novo CPC foi maistécnico e condizente com arealidade, expressando que, “naexecução, o despacho que ordenaa citação, desde que realizada emobservância ao disposto no § 2ºdo art. 240, interrompe aprescrição, ainda que proferido

Page 720: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

por juízo incompetente. Parágrafoúnico. A interrupção daprescrição retroagirá à data depropositura da ação”.

A dúvida, sempre levantadapor este autor em aulas,exposições e escritos, permanececom o Novo CPC. Existerealmente um conflito entre taisnormas ou antinomia (art. 202,inciso I, do CC/2002 x art. 219, §1º, do CPC/1973 e art. 240, § 1º,do CPC/2015)? O Código Civilde 2002 revogou o Código deProcesso Civil de 1973?Sucessivamente, o Código deProcesso Civil de 2015 revogou

Page 721: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

o Código Civil de 2002 notratamento da matéria? Acredita-se que não.

A melhor resposta semprefoi dada, na suposta colisão entreo CC/2002 e o CPC/1973, porCarlos Roberto Gonçalves19,entre os civilistas, e por FlávioLuiz Yarshell, entre osprocessualistas.20 Entendem essesdoutrinadores que não houverevogação. Na verdade, os doisartigos devem ser interpretadossistematicamente e emcomplemento. O que se procurafazer é um diálogo decomplementaridade entre as duas

Page 722: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

leis, outra aplicação da festejadatese do diálogo das fontes, deErik Jayme e Claudia LimaMarques, explicada no primeirocapítulo deste livro.

A solução, então, é de firmara premissa segundo a qual ainterrupção dar-se-á com odespacho do juiz, nos termos doCódigo Civil; retroagindo essainterrupção ao momento dapropositura da ação, conforme oCódigo de Processo Civil,anterior ou atual. Seguindo aideia, na V Jornada de DireitoCivil, evento promovido peloConselho da Justiça Federal e

Page 723: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

pelo Superior Tribunal de Justiça,em 2011, aprovou-se enunciadocom o seguinte teor: “O art. 202,I, do CC deve ser interpretadosistematicamente com o art. 219,§ 1º, do CPC, de modo a seentender que o efeito interruptivoda prescrição produzido pelodespacho que ordena a citação éretroativo até a data dapropositura da demanda”(Enunciado n. 417).

Frise-se que o entendimentoconstante do enunciadodoutrinário deve ser mantidomesmo com a emergência doNovo CPC. O que constitui

Page 724: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

novidade é apenas a extensãodessa regra para a decadência,como está expresso no § 4º do art.240 do CPC/2015: “O efeitoretroativo a que se refere o § 1ºaplica-se à decadência e aosdemais prazos extintivosprevistos em lei”.

Com essa posição, continuaprejudicado o teor da Súmula 106do STJ, pela qual, “proposta aação no prazo fixado para o seuexercício, a demora na citaçãopor motivos inerentes aomecanismo da justiça nãojustifica o acolhimento daarguição da prescrição ou

Page 725: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

decadência”. Isso porque o que érelevante para se verificar aexistência da prescrição é a datada propositura da demanda. Detoda sorte, a solução a serconsiderada é a mesma que fazparte da ementa sumular.

Voltando à estrutura do art.202 do Código Civil, estatuem osseus incisos II e III que ocorre ainterrupção da prescrição porprotesto judicial (nos termos doinciso I, antes comentado), bemcomo pelo protesto cambiário. Acodificação material inovou aodispor sobre a possibilidade deinterromper-se a prescrição, além

Page 726: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

do protesto judicial – açãoespecífica de jurisdiçãovoluntária que visa a darpublicidade a uma situação fáticaou jurídica (art. 726 do NovoCPC) –, também pelo protestoextrajudicial ou cambiário,aquele realizado perante ocartório extrajudicial de protestode títulos. Dessa forma, ficoutotalmente prejudicada a Súmula153 do STF, pela qual simplesprotesto cambiário nãointerromperia a prescrição. ONovo CPC nada trata da matéria,que continua como dantes.

No entanto, há um problema

Page 727: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

relacionado a essa interrupção,que, segundo o Código Civil de2002, somente poderá ocorreruma vez. Imagine-se umaconcretização em que houve oprotesto cambiário (art. 202,inciso III, do CC/2002), o quegera a interrupção da prescrição.Com a propositura da ação (art.202, inciso I, do CC/2002), oprazo continuará a fluir? Se aresposta for afirmativa, o autordeve receber o seu crédito até ofinal do prazo, sob pena deextinção da pretensão. É essa amelhor interpretação? Este autorpensa que não. Desse modo, dois

Page 728: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

caminhos podem ser traçadospara responder negativamente,não se admitindo a prescriçãointercorrente quando o autor dademanda toma as medidas parareceber o seu crédito. Comovisto, o Novo CPC admite talforma de prescrição no curso doprocesso somente quando issonão ocorre, e nos moldes do queconsta do seu art. 921, §§ 4º e 5º.

O primeiro caminho éapontado por Caio Mário daSilva Pereira, para quem se devejulgar que, nos casos de protesto– judicial ou extrajudicial –, acitação para o procedimento

Page 729: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

definitivo, para uma ação decobrança, por exemplo, não perdeo efeito interruptivo.21 Assim,nessas situações, a interrupçãopode se dar mais de uma vez(dualidade de interrupções daprescrição). Diz Caio Mário,para chegar a essa conclusão, que“nenhuma lei pode receberinterpretação que conduza aoabsurdo”.22

O segundo caminho,sugerido por este autor, é o deentender que a ação propostasuspende a prescrição, conformeo art. 199, inciso I, do CC/2002,eis que a ação é uma condição

Page 730: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

suspensiva. Essa proposta é amais condizente com o textolegal, eis que está amparadanaquilo que a codificaçãomaterial consagra.

Complemente-se que apolêmica surge não só em relaçãoaos dois primeiros incisos do art.202, mas também quanto aossubsequentes, quando existentesatos sucessivos do credor – pararecebimento do seu crédito –, oumesmo do devedor e do credor,alternadamente.

Superada esta discussão,destaque-se que a prescriçãoainda é interrompida pela

Page 731: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

apresentação do título de créditoem juízo de inventário ou emconcurso de credores (art. 202,inciso IV, do CC). Aqui cabesomente destacar que ahabilitação de crédito promovidapelo credor no processo deinventário, falência, ouinsolvência civil interrompe aprescrição, havendo ato praticadopelo credor.

Ainda, qualquer ato judicialque constitua em mora o devedorgera a interrupção da prescrição(art. 202, inciso V, do CC). Nessecontexto, a notificação e ainterpelação judicial, além do

Page 732: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

protesto judicial antes referido,continuam gerando a interrupçãoda prescrição, além de constituiro devedor em mora (morasolvendi ex persona). Nesteponto, do mesmo modo podesurgir hipótese relacionada àúltima polêmica discutida, ouseja, quanto à dualidade dasinterrupções da prescrição.

Deve ficar claro que, nosexatos termos da lei, a notificaçãoextrajudicial, via cartório detítulos e documentos, não gera ainterrupção da prescrição, pelaausência de previsão legalespecífica. O mesmo pode ser

Page 733: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

dito quanto a qualquer atoextrajudicial promovido pelocredor com esse objetivo,hipótese de uma carta enviadapelo correio. O presente autorentende que as citadas medidasextrajudiciais pelo credordeveriam ter o mesmo efeito, deinterrupção da prescrição, nadesejada linha dedesjudicialização dosprocedimentos. Essa é a opinião,por exemplo, de José FernandoSimão, em parecer publicado naRevista comemorativa dos 140anos do Instituto dos Advogadosde São Paulo, no final de 2014. O

Page 734: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

Novo CPC não trouxe essasolução que continua sendoproposta de lege ferenda.

Restou evidenciado que oart. 202, nos seus incisos I a V,prevê hipóteses em que condutasdo credor podem gerar ainterrupção da prescrição.Contudo, o inciso VI traz a únicasituação em que condutas dodevedor têm o mesmo efeito, asaber: “Art. 202. A interrupçãoda prescrição, que somentepoderá ocorrer uma vez, dar-se-á:(...) VI – por qualquer atoinequívoco, ainda queextrajudicial, que importe

Page 735: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

reconhecimento do direito pelodevedor”. Diante desse comandolegal, qualquer atuação dodevedor que importe emreconhecimento total ou parcialda existência da dívida gera ainterrupção da prescrição. Comoexemplos de atos que têm essecondão, podem ser citados opagamento de juros ou decláusula penal, o envio decorrespondência reconhecendo adívida, o seu pagamento parcialou total, entre outros. Como senota, aqui, as condutas podem serextrajudiciais, o que não ocorrecom os atos do credor. Para o

Page 736: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

presente autor, eis mais uma razãopara se acatar a proposta acima,pela falta de igualdade detratamento, resquício da antigamáxima romana in favordebitoris, que não se justifica naatualidade em muitas situaçõesconcretas.

Essas condutas podemocorrer no plano judicial ouextrajudicial, segundo consta dopróprio dispositivo transcrito. Noplano judicial, vejamosconcretização constante doEnunciado n. 416, da V Jornadade Direito Civil do Conselho daJustiça Federal e do Superior

Page 737: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

Tribunal de Justiça: “Apropositura de demanda judicialpelo devedor, que importeimpugnação do débito contratualou de cártula representativa dodireito do credor, é causainterruptiva da prescrição”. Essaposição do enunciado doutrinárioem apreço pode ser encontrada najurisprudência do SuperiorTribunal de Justiça. A ilustrar: “Apropositura de demanda judicialpelo devedor, seja anulatória,seja de sustação de protesto, queimporte em impugnação do débitocontratual ou de cártularepresentativa do direito do

Page 738: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

credor, é causa interruptiva daprescrição. A manifestação docredor, de forma defensiva, nasações impugnativas promovidaspelo devedor, afasta a sua inérciano recebimento do crédito, a qualimplicaria a prescrição dapretensão executiva; além deevidenciar que o devedor tinhainequívoca ciência do interessedo credor em receber aquilo quelhe é devido. O art. 585, § 1º, doCPC deve ser interpretado emconsonância com o art. 202, VI,do Código Civil. Logo, seadmitida a interrupção daprescrição, em razão das ações

Page 739: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

promovidas pelo devedor, mesmoque se entenda que o credor nãoestava impedido de ajuizar aexecução do título, ele nãoprecisava fazê-lo antes dotrânsito em julgado dessas ações,quando voltaria a correr o prazoprescricional” (STJ, REsp1.321.610/SP, Terceira Turma,Rel. Min. Nancy Andrighi, j.21.02.2013, DJe 27.02.2013).

De toda maneira, conformeoutrora exposto, o presente autorentende que é melhor enquadrar apropositura de demanda comocondição suspensiva e não comocausa interruptiva. Isso porque,

Page 740: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

frise-se, a interrupção daprescrição pela própria dicção doart. 202, caput, do Código Civilsomente pode ocorrer uma vez, oque obstaria outra interrupçãocom o ingresso de nova demanda,caso de uma ação de cobrançaposterior, por exemplo.

Superada a análise dashipóteses de interrupção daprescrição, pertinente comentaras regras finais que constam dacodificação material quanto àmatéria.

Inicialmente, prevê oparágrafo único do art. 202 que aprescrição interrompida

Page 741: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

recomeça a correr a partir da datado ato que a interrompeu, ou doúltimo ato do processo para ainterromper. Não há novidadenesse comando, diante CódigoCivil de 1916, ao reconhecercomo o principal efeito dainterrupção o reinício dacontagem do prazo, cessada a suacausa, ao contrário do que ocorrecom a suspensão, em que o prazocontinua a contar de quandoparou. Deve ficar claro que oefeito interruptivo cessa daocorrência do ato que ainterromper, seja no planoprocessual ou fora dele. Em

Page 742: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

continuidade de estudo, nãohouve qualquer mudançaengendrada pelo Novo CPCquanto ao tema.

Por outra via, dispõe o art.203 do CC/2002 que: “Aprescrição pode ser interrompidapor qualquer interessado”. OCódigo Civil de 2002 apresentouum sentido genérico quanto àspessoas que podem, por atopróprio, interromper aprescrição. A expressão genérica“qualquer interessado” substitui orol taxativo previstoanteriormente (CC/1916: “Art.174. Em cada um dos casos do

Page 743: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

art. 172, a interrupção pode serpromovida: I – Pelo própriotitular do direito em via deprescrição; II – Por quemlegalmente o represente; III – Porterceiro que tenha legítimointeresse”). A inovação serevelou mais justa, estandosintonizada com o princípio daoperabilidade. Adota-se umsentido aberto, o que está mais deacordo com a concepçãorealeana, que inspira o nossoCódigo Civil.

Dentro dessa ideia, cabeinterpretação pelo aplicador dodireito consoante as

Page 744: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

circunstâncias fáticas dademanda. Incumbe ao juiz, dentrodas regras de equidade erazoabilidade, apontar quem seriao interessado referido nodispositivo. Obviamente,continuam abarcadas pelo textogenérico atual as situações antesprevistas, envolvendo o titular dapretensão, o seu representante eaquele que tenha legítimointeresse, como os casos dococredor, do codevedor e dossucessores das partes envolvidascom a pretensão. Todavia, omodelo atual é aberto (numerusapertus) e não mais fechado

Page 745: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

(numerus clausus).Enuncia o art. 204, caput, do

CC/2002 que a interrupção daprescrição por um credor nãoaproveita aos outros. Do mesmomodo, a interrupção operadacontra o codevedor, ou seuherdeiro, não prejudica os demaiscoobrigados. A codificação atualcontinua reconhecendo o caráterpersonalíssimo do atointerruptivo, sendo certo que estenão aproveitará aos cocredores,codevedores ou herdeiros destes,nos casos de ausência deprevisão de solidariedade. Semprejuízo dessa previsão, constam

Page 746: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

regras específicas nos parágrafosdo dispositivo.

De acordo com o seu § 1º,excepcionando a regra previstano caput do artigo, a interrupçãoda prescrição atingirá os credorese devedores solidários, bemcomo os herdeiros destes. Isso, sea solidariedade estiver previstaem lei ou no contrato celebradopelas partes, seguindo a lógica doque consta do art. 265 doCC/2002, pelo qual asolidariedade contratual não sepresume nas relações civis.

O § 2º do art. 204 doCC/2002 enuncia que, na hipótese

Page 747: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

dos herdeiros do devedor,entretanto, deve ser observadanorma específica. Em havendointerrupção contra um dosherdeiros do devedor solidário,esta não prejudicará os demais, anão ser que a obrigação sejaindivisível (art. 258 do CC).

Por fim, de acordo com o §3º do art. 204 da codificaçãomaterial, no caso de interrupçãoda prescrição em prejuízo dodevedor principal, esta tambématingirá o fiador. Isso porque,conforme regra básica do DireitoCivil, tudo o que ocorre naobrigação principal repercute na

Page 748: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

obrigação acessória, natureza quepossui o contrato de fiança,acessório por excelência(princípio da gravitaçãojurídica). Merecem o mesmotratamento legal as hipóteses emque o fiador tem a favor de si obenefício de ordem e a situaçãode ele ser devedor solidário, semqualquer distinção (arts. 827 e828 do CC/2002).

Superada a análise dasconcreções jurídicas dainterrupção da prescrição, passa-se ao estudo das regrasfundamentais da decadência,especialmente pelo impacto

Page 749: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

gerado pelo Novo Código deProcesso Civil.

b) Da decadênciaUma das novidades da

codificação material de 2002consistiu no tratamento específicodado à decadência, conceituadacomo a perda de um direitopotestativo, em decorrência daausência do seu exercício.Lembre-se, mais uma vez, doscritérios científicos de Agnelo deAmorim Filho, para quem osprazos decadenciais estãorelacionados com os direitospotestativos e com aquelas ações

Page 750: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

que visam a constituir positiva ounegativamente atos e negóciosjurídicos, caso da ação anulatóriade negócio jurídico.

Esses prazos de anulaçãoestão previstos nos arts. 178 e179 do Código Civil, semprejuízo de outras previsõesespecíficas. Prevê o primeiropreceito que é de quatro anos oprazo de decadência parapleitear-se a anulação do negóciojurídico, contado: a) no caso decoação, do dia em que ela cessar;b) no de erro, dolo, fraude contracredores, estado de perigo oulesão, do dia em que se realizou o

Page 751: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

negócio jurídico; c) no de atos deincapazes, do dia em que cessar aincapacidade. A segunda normaconsagra um prazo geral deanulação ao preceituar que,“quando a lei dispuser quedeterminado ato é anulável, semestabelecer prazo para pleitear-sea anulação, será este de doisanos, a contar da data daconclusão do ato”.

Além dessa diferenciação,fica fácil identificar um prazodecadencial no atual CódigoCivil, eis que estão todosexpostos fora do art. 206 doCC/2002, principalmente na Parte

Page 752: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

Especial da codificação material.Ademais, como vistoanteriormente, os prazos em dias,meses e ano e dia serão sempredecadenciais, uma vez que os deprescrição são sempre em anos,conforme rol dos arts. 205 e 206da Lei Geral Material. Noentanto, fica o alerta de queexistem também prazosdecadenciais em anos, comoaqueles que constam dos arts.178, 179, 501 e 1.649 dacodificação material, entreoutros.

A decadência pode terorigem na lei (decadência legal)

Page 753: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

ou na autonomia privada, naconvenção entre as partesenvolvidas com o direitopotestativo (decadênciaconvencional). Como antesexposto, a prescrição somentepode decorrer da lei. Umexemplo de decadênciaconvencional é aquele fixadopelo vendedor para garantir aestrutura do bem que está sendotransmitido ao comprador, emuma relação de consumo ou não.

Na dicção do art. 207 doCC/2002, salvo disposição legalem contrário, não se aplicam àdecadência as normas que

Page 754: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

impedem, suspendem ouinterrompem a prescrição. Anovidade do tratamento dadecadência pode ser sentidanesse dispositivo, que enuncianão se sujeitar a decadência àscausas de impedimento,suspensão e interrupção daprescrição, já tratadas nopresente capítulo. Entretanto,constam algumas exceções nopróprio Código Civil, como a doartigo subsequente, pelo qual aprescrição não corre contra osabsolutamente incapazesapresentados no art. 3º do Código(menores de 16 anos, enfermos,

Page 755: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

doentes mentais e pessoas que,por uma causa transitória oudefinitiva, não puderemmanifestar sua vontade).

Complementando, o art. 501,parágrafo único, do atual CódigoCivil também apresenta umaespécie de impedimento dadecadência. Isso porque o art.500 da codificação substantivaconsagra as opções do compradorprejudicado para o caso de víciosem uma compra e venda pormedida ou por extensão (vendaad mensuram). O prazodecadencial de um ano estáprevisto no caput do comando

Page 756: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

subsequente (art. 501), contadodo registro do título em cartório.Consoante o seu parágrafo único,o prazo não terá início se houveratraso na imissão de posseatribuível ao alienante.

Na ótica do Código deDefesa do Consumidor,igualmente pode ser percebidaexceção no art. 26, § 2º, incisos Ie III, que tratam dos vícios dosprodutos e serviços, e pelos quaisobstam a decadência dareclamação comprovadamenteformulada e fundamentada peloconsumidor até a resposta dofornecedor ou do prestador, bem

Page 757: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

como a instauração do inquéritocivil. Os efeitos desse óbice sãoiguais aos da suspensão,comentados outrora.

As hipóteses são todas deimpedimento ou suspensão dadecadência. O presente autor nãovisualiza, no momento, regrarelativa à sua interrupção. Comovisto, uma das novidades do CPCde 2015 é estabelecer a aplicaçãodo mesmo efeito retroativo dainterrupção da prescrição para ainterrupção da decadência.Reafirme-se que, na redação doart. 240 do Estatuto Processualemergente, “a citação válida,

Page 758: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

ainda quando ordenada por juízoincompetente, induzlitispendência, torna litigiosa acoisa e constitui em mora odevedor, ressalvado o dispostonos arts. 397 e 398 da Lei 10.406,de 10 de janeiro de 2002 (CódigoCivil). § 1º A interrupção daprescrição, operada pelodespacho que ordena a citação,ainda que proferido por juízoincompetente, retroagirá à data depropositura da ação. (...) § 4º Oefeito retroativo a que se refere o§ 1º aplica-se à decadência e aosdemais prazos extintivosprevistos em lei”. Pendem, então,

Page 759: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

de análise e de enquadramento,pela doutrina pela ejurisprudência, casos deinterrupção de decadência parasubsunção desse novo preceito.

Conforme o art. 208 doCC/2002, “aplica-se àdecadência o disposto nos arts.195 e 198, I”. Na linha do que foiantes exposto, o artigo em questãoapresenta a primeira exceção queanalisamos quanto ao comandoanterior, indicando oimpedimento da decadência emrelação aos absolutamenteincapazes. Fazendo incidir apremissa, ilustre-se com decisão

Page 760: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

do Superior Tribunal de Justiça,publicada no seu Informativo n.482:

“Ação rescisória. Prazo decadencial.Discute-se no REsp se o prazo de dois anosprevisto no art. 495 do CPC para apropositura de ação rescisória flui emdesfavor de incapazes. Noticiam os autos queos recorrentes, ainda menores de idade,ajuizaram ação de indenização visando àcondenação dos recorridos pelos danosmorais sofridos em razão da morte de seuavô, em virtude de acidente em que esteveenvolvido veículo pertencente a um dosrecorridos. O acórdão que julgou o recurso deapelação interposto reformou a sentença parajulgar improcedente o pedido. Alegaram, nainicial da ação rescisória, que os fundamentosda improcedência tomaram o pedido relativoao dano moral como se se tratasse de danomaterial, pois exigiu a dependência econômica

Page 761: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

como requisito para acolhimento do pleito. Orelator, monocraticamente, julgou extinta aação rescisória ao fundamento de ter ocorridodecadência. Alegam os recorrentes que, àépoca, por serem menores absolutamenteincapazes, não fluía contra eles prazo, nem dedecadência nem de prescrição. Admitido oREsp, o Min. Relator entendeu que o prazopara o ajuizamento da ação rescisória é dedecadência (art. 495, CPC), por isso se aplicaa exceção prevista no art. 208 do CC/2002,segundo a qual os prazos decadenciais nãofluem contra os absolutamente incapazes.Esse entendimento foi acompanhado pelosdemais Ministros, que deram provimento aoREsp e determinaram o prosseguimento daação rescisória” (STJ, REsp 1.165.735/MG,Rel. Min. Luis Felipe Salomão, j. 06.09.2011).

Em complemento, o vigenteCódigo Civil consagra o direitode ação regressiva dos incapazes

Page 762: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

e das pessoas jurídicas contraseus representantes ou assistentespara os casos de não alegaçãooportuna da decadência a favordo representado (art. 195 doCC/2002). Essa ação regressivatambém pode ser proposta contrao advogado que vier a representaro incapaz ou a empresa.

Ambos os comandos legaisaqui estudados (arts. 207 e 208do CC) devem ser aplicados tantoà decadência legal quanto àdecadência convencional.

Todavia, existem regras quesão aplicadas, separadamente, àdecadência legal e à

Page 763: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

convencional. Sustentava CaioMário da Silva Pereira, nosistema do Código Civil de 1916,que o tratamento conferido àdecadência convencional deveriaser, pelo menos em parte, omesmo dado à prescrição.23 Issoacabou sendo adotado peloCódigo Civil de 2002,inicialmente pelo seu art. 209,assim escrito: “É nula a renúnciaà decadência fixada em lei”.Desse modo, não é admitida arenúncia à decadência legal, omesmo não se podendo dizerquanto à convencional. Para estaúltima, por analogia, deve ser

Page 764: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

aplicada a regra do art. 191 dopróprio Código Civil, cabendo arenúncia pelo devedor após aconsumação, não sendo tambémaceita a renúncia prévia dadecadência convencional.

Contudo, o que se percebe éque, se Caio Mário da SilvaPereira ainda estivesse entre nós,deveria rever os seus conceitos.Isso porque, de acordo com o art.210 do CC/2002, deve o juiz, deofício, conhecer da decadência,quando estabelecida por lei.Assim sendo, por envolverpreceito de ordem pública, o juizdeveria decretar de ofício a

Page 765: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

decadência legal, julgando a açãoimprocedente com a resolução domérito, conforme estava no art.269, inciso IV, do CPC/1973 e,agora, está no art. 487, inciso II,do CPC/2015. A novidade doNovo CPC é fazer menção aoreconhecimento de ofício dadecadência, sem dizer sobre qualdelas se dará o pronunciamento.

Quanto à decadênciaconvencional, há regra específicavedando o seu reconhecimento deofício pelo juiz. Trata-se do art.211 do Código Civil, segundo oqual: “se a decadência forconvencional, a parte a quem

Page 766: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

aproveita pode alegá-la emqualquer grau de jurisdição, maso juiz não pode suprir aalegação”. Nesse ponto, otratamento da decadênciaconvencional não é mais igual aoda prescrição. Por isso é que, seainda estivesse entre nós, CaioMário teria que rever os seusconceitos. Isso diante da Lei11.280/2006, que revogou aprevisão do art. 194 do CC ealterou o § 5º do art. 219 do CPC,prevendo que o juiz deveriareconhecer de ofício aprescrição.

Aliás, fazendo uma análise

Page 767: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

crítica, percebe-se, aqui, porquea lei processual anterior quebroucom a harmonia do sistema. Aprescrição, agora, deve serconhecida de ofício, como jáocorria com a decadência legal.Então surge a indagação: será queainda merece alento fático a regrapela qual a decadênciaconvencional não pode serconhecida de ofício? A este autorparece que não, fazendo umaanálise sistemática da normacodificada.

Todavia, como visto, o NovoCPC confirmou essa previsão deconhecimento de ofício da

Page 768: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

prescrição. Também reconheceu omesmo caminho para adecadência, sem elucidar paraqual delas. Como o art. 211 doCódigo Civil não foi revogado,tudo continua como dantes. Afalta de harmonia no sistemapermanece, o que não foi atentadopelos legisladores da nova normainstrumental que emerge.

Page 769: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

__________1 AMORIM FILHO, Agnelo. CritérioCientífico para Distinguir a Prescriçãoda Decadência e para Identificar asAções Imprescritíveis. RT 300/7 e744/725.2 MOREIRA ALVES, José Carlos. AParte Geral do Projeto de CódigoCivil Brasileiro. 2. ed. São Paulo:Saraiva, 2003. p. 131.3 GONÇALVES, Carlos Roberto.Direito Civil Brasileiro. Parte Geral.12. ed. São Paulo: Saraiva, 2014. v. 1,p. 511-512.4 DINIZ, Maria Helena. Curso deDireito Civil Brasileiro. Teoria Geraldo Direito Civil. 24. ed. São Paulo:Saraiva, 2007. v. 1, p. 383.5 VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito

Page 770: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

Civil. Teoria Geral do Direito Civil. 5.ed. São Paulo: Atlas, 2005. v. 1, p. 595.6 LOTUFO, Renan. Código CivilComentado. São Paulo: Saraiva, 2002.v. I, p. 519.7 LARENZ, Karl. Derecho Civil.Parte General. Tradução e notas deMiguel Izquierdo y Mácias-Picavea.Madrid: Editorial Revista de DerechoPrivado, 1978. p. 315.8 LARENZ, Karl. Derecho Civil.Parte General. Tradução e notas deMiguel Izquierdo y Mácias-Picavea.Madrid: Editorial Revista de DerechoPrivado, 1978. p. 321.9 ALVES, Jones Figueirêdo;DELGADO, Mário Luiz. CódigoCivil Anotado. São Paulo: Método,2005. p. 122.

Page 771: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

10 DINIZ, Maria Helena. CódigoCivil Anotado. 15. ed. São Paulo:Saraiva, 2010. p. 215.11 DINIZ, Maria Helena. Curso deDireito Civil Brasileiro. Teoria Geraldo Direito Civil. 24. ed. São Paulo:Saraiva, 2007. v. 1, p. 397.12 LISBOA, Roberto Senise.Comentários ao Código Civil. In:CAMILLO, Carlos Eduardo Nicoletti;TALAVERA, Glauber Moreno;FUJITA, Jorge Shiguemitsu;SCAVONE JR., Luiz Antonio. SãoPaulo: RT, 2006. p. 283.13 NERY JUNIOR, Nelson; NERY,Rosa Maria de Andrade. Código deProcesso Civil Comentado. 6. ed.São Paulo: RT, 2006. p. 408.14 MAZZEI, Rodrigo Reis. A

Page 772: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

Prescrição e a sua Pronúncia deOfício. In: DELGADO, Mário Luiz;ALVES, Jones Figueirêdo. QuestõesControvertidas no Novo CódigoCivil. São Paulo: Método, 2007. v. 6, p.533.15 SIMÃO, José Fernando. Prescriçãoe sua Alegação – Lei 11.280 e aRevogação do Art. 194 do CódigoCivil. São Paulo, Jornal CartaForense, n. 34, abr./2006.16 MAZZEI, Rodrigo Reis. APrescrição e a sua Pronúncia deOfício. In: DELGADO, Mário Luiz;ALVES, Jones Figueirêdo. QuestõesControvertidas no Novo CódigoCivil. São Paulo: Método, 2007. v. 6, p.533.17 AZEVEDO, Álvaro Villaça. TeoriaGeral do Direito Civil. Parte Geral.

Page 773: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

São Paulo: Atlas, 2012. p. 183.18 CÂMARA, Alexandre Freitas.Reconhecimento de Ofício daPrescrição: uma ReformaDescabeçada e Inócua. Disponívelem: <www.flaviotartuce.adv.br>.Acesso em: 18 jan. 2015.19 GONÇALVES, Carlos Roberto.Prescrição: Questões Relevantes ePolêmicas. In: DELGADO, MárioLuiz; ALVES, Jones Figueirêdo.Questões Controvertidas do NovoCódigo Civil. São Paulo: Método,2003. v. I.20 YARSHELL, Flávio Luiz. AInterrupção da Prescrição pelaCitação: Confronto entre o NovoCódigo Civil e o Código de ProcessoCivil. Síntese Jornal, Porto Alegre:Síntese, n. 75, p. 13, maio 2003.

Page 774: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

21 PEREIRA, Caio Mário da Silva.Instituições de Direito Civil. 19. ed.Rio de Janeiro: Forense, 2003. v. I, p.700.22 PEREIRA, Caio Mário da Silva.Instituições de Direito Civil. 19. ed.Rio de Janeiro: Forense, 2003. v. I, p.700.23 PEREIRA, Caio Mário da Silva.Instituições de Direito Civil. 19. ed.Rio de Janeiro: Forense, 2003. v. I, p.691-692.

Page 775: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

O TRATAMENTO DASPROVAS NO CÓDIGO

CIVIL E O IMPACTODO NOVO CPC

Uma vez aperfeiçoado, o atoou negócio jurídico podenecessitar de um meio de prova,visando à certeza e à segurança

Page 776: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

jurídica. Nesse contexto, a provapode ser conceituada como “umconjunto de meios empregadospara demonstrar, legalmente, aexistência de negóciosjurídicos”.1 Na divisão donegócio jurídico, a prova, emregra, encontra-se no plano daeficácia, pois mantém relaçãocom as consequências do ato ounegócio (terceiro degrau daEscada Ponteana).

O presente capítuloprocurará analisar as interaçõesexistentes entre o Código Civil eo Novo Código de Processo Civilem relação à prova, tema que tem

Page 777: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

concepção híbrida por interessartanto à matéria substantiva quantoà instrumental. Como é notório,na seara probatória, muitasconfusões surgem na prática,particularmente no âmbito doPoder Judiciário, diante detentativas de se compatibilizar asregras materiais e processuais.

Tentaremos aqui diminuireventuais dificuldades,analisando os meios de prova donegócio jurídico à luz do CódigoCivil de 2002, do Código deProcesso Civil de 1973 e doNovo Código de Processo Civil.Procuraremos, portanto, diálogos

Page 778: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

entre as duas leis, outra aplicaçãoda festejada tese do diálogo dasfontes, explicada no primeirocapítulo deste livro.

O Código Civil de 2002trouxe, entre os seus arts. 212 a232, um capítulo específico sobreos meios de prova do negóciojurídico, em que se buscoufacilitar a matéria regulamentadaanteriormente pelo DireitoProcessual, particularmente peloCódigo de Processo Civilanterior. Seguiu, assim, oexemplo do Código Civil de1916, que cuidava da “Forma dosAtos Jurídicos e da sua Prova”

Page 779: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

entre os seus arts. 129 a 144.Cabe esclarecer que o CódigoCivil não traz regras sobre ateoria geral da prova, tratadapela norma instrumental, massomente quanto às provas emespécie.

Alguns processualistascriticam esse tratamento legal, nalei material, pois o assuntointeressa mais ao Direitoinstrumental. Alexandre FreitasCâmara, por exemplo, expõe que:

“O Código Civil é criticável por diversasrazões, entre as quais não distinguir entre aprova e a forma dos atos jurídicos (sendocerto que o Código Civil de 1916 fazia

Page 780: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

expressamente a distinção). Há, porém, noCódigo Civil de 2002 disposições que, nãoobstante postas no Título ‘Da Prova’, tratamda forma do ato jurídico, como, por exemplo,os parágrafos do art. 215, que tratam dosrequisitos formais da escritura pública. Maiscriticável do que isso, todavia, é a própriainclusão de regras sobre prova no CódigoCivil. Ainda que se admita a ideia de que aprova é instituto de natureza mista, comaspectos processuais e substanciais, é oCódigo de Processo Civil a sede adequada desua regulamentação. Isso se dá porque odireito probatório é o mesmo, qualquer queseja a natureza da matéria de fundo. (...).Além disso, não se pode deixar de dizer quemuitas das disposições do Código Civil de2002 sobre prova são incompatíveis com omodelo processual brasileiro”.2

Na realidade, muito aocontrário do que expõe o

Page 781: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

Desembargador do Tribunal deJustiça do Rio de Janeiro, é de seconcordar com as palavras deSílvio de Salvo Venosa, afastandoqualquer crítica mais contundenteem relação a essa previsão, umavez que, “como é íntimo oconteúdo do negócio jurídico comsua prova, é acertado o enfoquedo Código Civil, ao traçar osprincípios fundamentais e disporsobre os meios de prova. Autilidade de um direito mede-sepela possibilidade de que sedispõe para se realizar a prova deum fato. De nada adianta possuirum direito se não se tem os meios

Page 782: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

para prová-lo. Na verdade, o quese prova não é o Direito. Prova-se o fato relacionado com umdireito. A demonstração daevidência em juízo é a finalidadeelementar do processo na buscada verdade processual. Issoporque nem sempre o que se lograprovar em uma lide coincide coma verdade real. Não há outrasolução para o Direito a não sercontentar-se com a ‘verdadeprocessual’”.3

Pelas últimas palavras,deve-se compreender que ditaprevisão legislativa (o tratamentodas provas no Código Civil) pode

Page 783: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

ser considerada correta, comoponto de apoio conceitual para oestudioso e aplicador do Direito.Com certeza, a prova do negóciojurídico também está na sua searamaterial, tendo as regras dacodificação privada caráter denormas gerais. Na dúvida, devemser subsumidas as regrasprocessuais previstas no Códigode Processo Civil, conforme serádefendido no estudo que se segue(critério da especialidade).Trata-se de importante deduçãopara um possível diálogo entre asduas normas. Desse modo, acrítica primaz de Alexandre

Page 784: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

Freitas Câmara, de uma supostaincompatibilidade entre asnormas, é afastada.

Iniciando-se pelo art. 212 doCC/2002, enuncia o diploma que,salvo o negócio a que se impõeforma especial, o fato jurídicopode ser provado mediante: a)confissão; b) documento; c)testemunha; d) presunção; e e)perícia. Desse modo, a atualcodificação privada prevê que osfatos jurídicos – incluindo-se,logicamente, os atos e negóciosjurídicos – podem ser provadospor confissão, documentos,testemunhas, presunções e

Page 785: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

perícias em sentido genérico. Osprocessualistas semprecriticavam esse dispositivo, eisque estabelece um rol deinstitutos jurídicos de naturezasdiversas, pois os testemunhos eos documentos são fontes deprova; confissões e perícias,meios de prova; e as presunções,meras conclusões de dedução, deraciocínio.4 A crítica, como nãopoderia ser diferente, éigualmente formulada porAlexandre Freitas Câmara,principalmente por essaconfusão.5

Pelo que já constava do art.

Page 786: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

332 do CPC/1973, deve-seentender que o rol do art. 212 doCódigo Civil é meramenteexemplificativo (numerusapertus), uma vez que, segundo alei processual anterior, “todos osmeios legais, bem como osmoralmente legítimos, ainda quenão especificados neste Código,são hábeis para provar a verdadedos fatos, em que se funda a açãoou a defesa”.6 Comaperfeiçoamento de redação,prescreve o art. 369 doCPC/2015 que “as partes têm odireito de empregar todos osmeios legais, bem como os

Page 787: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

moralmente legítimos, ainda quenão especificados neste Código,para provar a verdade dos fatosem que se funda o pedido ou adefesa e influir eficazmente naconvicção do juiz.” A menção àinfluência eficaz noconvencimento do magistrado temrelação direta com o espírito deboa-fé adotado pelo NovoEstatuto Processual, aprofundadono capítulo inaugural deste livro.

Nesse contexto, mesmo poruma suposta impossibilidade deenquadramento como provadocumental, vinha-se entendendoser cabível a prova eletrônica,

Page 788: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

considerada aquela captadalicitamente na internet, no meiodigital. A propósito, na IVJornada de Direito Civil, eventode outubro de 2006, foi aprovadoo Enunciado n. 297 do CJF/STJ,preceituando que “O documentoeletrônico tem valor probante,desde que seja apto a conservar aintegridade de seu conteúdo eidôneo a apontar sua autoria,independentemente da tecnologiaempregada”. Em complemento,foi ainda aprovado, no mesmoevento, o Enunciado n. 298, asaber: “Os arquivos eletrônicosincluem-se no conceito de

Page 789: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

‘reproduções eletrônicas de fatosou de coisas’, do art. 225 doCódigo Civil, aos quais deve seraplicado o regime jurídico daprova documental”.

O Novo CPC admite autilização desse meio de provaem vários de seus preceitos. Abinitio, frise-se a inteligênciaretirada do art. 422,especialmente do seu § 1º, inverbis: “Qualquer reproduçãomecânica, como a fotográfica, acinematográfica, a fonográfica oude outra espécie, tem aptidãopara fazer prova dos fatos ou dascoisas representadas, se a sua

Page 790: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

conformidade com o documentooriginal não for impugnada poraquele contra quem foi produzida.§ 1º As fotografias digitais e asextraídas da rede mundial decomputadores fazem prova dasimagens que reproduzem,devendo, se impugnadas, serapresentada a respectivaautenticação eletrônica ou, nãosendo possível, realizadaperícia”. Outros artigosigualmente merecem ser citados.Conforme o art. 439 do EstatutoProcessual emergente, autilização de documentoseletrônicos no processo

Page 791: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

convencional dependerá de suaconversão à forma impressa e deverificação de sua autenticidade,nos termos da lei. O juizapreciará o valor probante dodocumento eletrônico nãoconvertido, assegurando às parteso acesso ao seu teor (art. 440 doCPC/2015). Com tomsuplementar, serão admitidosdocumentos eletrônicosproduzidos e conservados com aobservância da legislaçãoespecífica (art. 441 do NovoCPC).

Cumpre destacar que ajurisprudência tem admitido

Page 792: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

provas extraídas de sites derelacionamentos e de redessociais, como se retira dosseguintes arestos, relacionados apagamento de alimentos, entremuitos que poderiam ser trazidosà colação:

“Agravo de instrumento. Alimentosprovisórios Liminares. Majoração.Indeferimento. Caso de alguma prova de sinalexterior de riqueza exibido pelo alimentanteem rede social que deve ser considerada.Alimentos liminares majorados para meiosalário mínimo. Deram parcial provimento”(TJRS, Agravo de Instrumento 210386-13.2014.8.21.7000, Capão da Canoa, OitavaCâmara Cível, Rel. Des. Rui Portanova, j.21.08.2014, DJERS 26.08.2014).

Page 793: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

“Agravo de instrumento. Alimentosgravídicos. Fixação. Cabimento. Valor inferiorao postulado. Na análise do pedido de fixaçãode alimentos gravídicos, em face dapeculiaridade da situação, não há exigir muitorigor, sob pena de inviabilizar o atendimento àfinalidade da Lei. Precedentesjurisprudenciais. Conversas em rede socialque demonstram a existência de relaçãoafetiva entre a agravante e o agravado naépoca da concepção fazem prova suficientepara fins de fixação liminar de alimentosgravídicos. Na falta de comprovação maisefetiva das possibilidades do alimentante, nãohá fixar quantum no montante postulado,mas sim em valor inferior, equivalente a 50%do salário mínimo. Deram parcial provimento”(TJRS, Agravo de Instrumento 52567-13.2014.8.21.7000, Nonoai, Oitava CâmaraCível, Rel. Des. Rui Portanova, j. 10.04.2014,DJERS 17.04.2014).

Page 794: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

Partindo para a análiseespecífica dos institutoselencados no art. 212 do CódigoCivil em vigor, à luz do NovoCPC, inicialmente, a confissãopode ser conceituada como umadeclaração feita por uma pessoa,contra quem se procura provar umfato, ato ou negócio jurídico. Namesma linha, preceitua o art. 389do Novo Código de Processo que“há confissão, judicial ouextrajudicial, quando a parteadmite a verdade de fatocontrário ao seu interesse efavorável ao do adversário”. Opreceito reproduz o art. 348 do

Page 795: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

CPC/1973, sem qualquermodificação conceitual.

Essa declaração podeocorrer no plano judicial ouextrajudicial, de formaespontânea ou provada. No queconcerne à confissão judicial,vejamos a confrontação dotratamento nos dois EstatutosInstrumentais:

NovoCódigo deProcesso

Civil

Código de

Processo CivilAnterior

Page 796: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

“Art. 390. Aconfissãojudicial podeserespontâneaouprovocada.

§ 1º Aconfissãoespontâneapode ser feitapela própriaparte ou porrepresentantecom poderespecial.

§ 2º Aconfissão

“Art. 349. Aconfissão judicialpode serespontânea ouprovocada. Daconfissãoespontânea,tanto querequerida pelaparte, se lavraráo respectivotermo nos autos;a confissãoprovocadaconstará dodepoimentopessoal prestadopela parte.

Parágrafo único.

Page 797: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

provocadaconstará dotermo dedepoimentopessoal”.

A confissãoespontânea podeser feita pelaprópria parte, oupor mandatáriocom poderesespeciais”.

Como se percebe, houveuma melhora na organização doantigo comando, passando a terdois parágrafos, mais claros edidáticos. No caso de confissãoespontânea realizada por terceiro,não consta mais o termomandatário, mas representante,por ser mais amplo e melhoradequado tecnicamente. No

Page 798: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

restante, os preceitos seequivalem.

No que diz respeito àconfissão extrajudicial, enuncia oNovo Código de Processo Civilque, quando feita oralmente, sóterá eficácia nas situações em quea lei não exija prova literal (art.394). Trata-se de umaperfeiçoamento do art. 353 doCPC/1973, que enunciava: “aconfissão extrajudicial, feita porescrito à parte ou a quem arepresente, tem a mesma eficáciaprobatória da judicial; feita aterceiro, ou contida emtestamento, será livremente

Page 799: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

apreciada pelo juiz. Parágrafoúnico. Todavia, quando feitaverbalmente, só terá eficácia noscasos em que a lei não exijaprova literal”. Verifica-se quenão houve a reprodução do queestava no caput da normaanterior, o que parece ter perdidosentido com o Novo CPC.Todavia, a questão pende deestudo mais aprofundado peladoutrina e pela jurisprudência,especialmente entre osprocessualistas.

Pode a confissão serexpressa ou tácita, sendo a últimaprevista no art. 341 da lei

Page 800: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

instrumental emergente, segundo aqual, “incumbe também ao réumanifestar-se precisamente sobreas alegações de fato constantes dapetição inicial, presumindo-severdadeiras as não impugnadas,salvo se: I – não for admissível, aseu respeito, a confissão; II – apetição inicial não estiveracompanhada de instrumento quea lei considerar da substância doato; III – estiverem emcontradição com a defesa,considerada em seu conjunto”.Trata-se de reprodução quaseliteral do art. 302 do CPC/1973,com modificações de palavras

Page 801: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

que não alteram o seu sentido.Seguindo na exposição da

categoria, deve-se entender que otermo confissão, constante doinciso I do art. 212 do CódigoCivil, abarca também odepoimento pessoal, comtratamento em separado nalegislação processual (arts. 385 a388 do CPC/2015; arts. 342 a347 do CPC/1973). Nesse trilhar,na III Jornada de Direito Civil,evento promovido pelo Conselhoda Justiça Federal e peloSuperior Tribunal de Justiça em2004, foi aprovado o Enunciadon. 157, com a seguinte dicção: “o

Page 802: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

termo ‘confissão’ deve abarcar oconceito lato de depoimentopessoal, tendo em vista que esteconsiste em meio de prova demaior abrangência, plenamenteadmissível no ordenamentojurídico brasileiro”.

Conforme o art. 385, caput,do CPC/2015, cabe à parterequerer o depoimento pessoal daoutra parte, a fim de que esta sejainterrogada na audiência deinstrução e julgamento, semprejuízo do poder do juiz deordená-lo de ofício. Apossibilidade de determinação deofício pelo juiz foi mantida, na

Page 803: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

linha do que constava do art. 342do CPC/1973, o que vem em boahora, especialmente nos casosenvolvendo matérias de ordempública, caso das nulidadesabsolutas dos atos e negóciosjurídicos.

Ainda no que concerne àconfissão, ela não tem qualquereficácia se provém de quem não écapaz de dispor do direito a quese referem os fatos confessados(art. 213 do CC/2002). Comoregra então inovadora, o atualCódigo Civil passou a tratarespecificamente da matéria.Houve introdução de comando

Page 804: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

semelhante no art. 392, § 1º, doCPC/2015, in verbis: “§ 1º Aconfissão será ineficaz se feitapor quem não for capaz de dispordo direito a que se referem osfatos confessados”.

Inicialmente, nota-se que nãoterá eficácia a confissão sedeclarada por pessoa que nãopoderia dispor sobre o direitorelacionado com os fatosconfessados. Concretizando odiploma, da jurisprudênciatrabalhista paulista, colaciona-se:“Ato jurídico voluntário epessoal do confitente, a quemprejudicam os fatos revelados em

Page 805: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

benefício do seu adversário.Assim, só pode ser praticadopelo titular do direitocontrovertido, não cabendo aludirà confissão de terceiro emprejuízo da parte contrária.Inteligência dos arts. 213 doCódigo Civil e 348 do Código deProcesso Civil” (TRT da 2ªRegião, Recurso 0000156-50.2014.5.02.0055, Acórdão2014/0833174, Quinta Turma,Rel. Des. Fed. José Ruffolo,DJESP 29.09.2014). Ainda aexemplificar, não é eficaz aconfissão feita por absolutamenteincapaz (art. 3º do CC/2002 –

Page 806: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

menores de 16 anos, enfermos edeficientes mentais semdiscernimento para a prática dosatos da vida civil ou pessoas quemesmo por causa transitória oudefinitiva não puderem exprimirsua vontade).

O art. 213 do Código Civildeve ser interpretado de acordocom o que preconiza o caput doart. 392 do CPC/2015, no sentidode que não vale como confissão aadmissão, em juízo, de fatosrelativos a direitos indisponíveis;reprodução literal do art. 351 doCPC/1973. Ilustrando, não valeráa confissão relacionada com os

Page 807: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

direitos da personalidade, peloteor do art. 11 do CC/2002. Emreforço, pelo que está nesseúltimo comando material, quemantém íntima relação com oprincípio de proteção dadignidade da pessoa humana (art.1º, III, da CF/1988), não terávalidade a confissão que acarreterenúncia a direitos inerentes àprópria pessoa.

Seguindo, prevê o parágrafoúnico do art. 213 do CC/2002que, se a confissão for feita porrepresentante de determinadapessoa, somente é eficaz noslimites em que este pode vincular

Page 808: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

o representado. Eis outra normaque não estava tratada no antigoCPC e que passou a integrar onovo diploma (art. 392, § 2º, doCPC/2015). Os aludidoscomandos, como se percebe,classificam a confissão como atonão personalíssimo ouimpessoal, admitindo que sejafeita por representante – caso deum mandatário –, tendo eficáciaapenas nos limites darepresentação. Cumpre lembrarque, para a confissão, énecessário ter o representado(mandante) conferido poderesespeciais ao representante

Page 809: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

(mandatário). A regra tambémvale para a representação legal,tratada especificamente pela atualcodificação civil de 2002, entreos seus arts. 115 a 120.

Mais uma vez a título deexemplo, aplicando esseparágrafo único do art. 213 doCódigo Civil, em exemplo queserve para o Novo CPC, concluiuo Tribunal de Justiça de SãoPaulo, em ação de despejo porfalta de pagamento, que “não seconfere qualquer eficácia jurídicaà confissão feita porrepresentante sem poderesexpressos para tanto ou que vier

Page 810: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

exceder aos poderes recebidos.Inteligência dos arts. 349,parágrafo único, do CPC, e 213,parágrafo único, do CódigoCivil” (TJSP, Apelação 0076744-32.2006.8.26.0000, Acórdão5022181, Ipuã, Vigésima OitavaCâmara de Direito Privado, Rel.Des. Mello Pinto, j. 22.03.2011,DJESP 11.04.2011).

A confissão é reconhecidacomo ato irrevogável eirretratável, não sendo possívelqualquer modalidade dearrependimento, conforme constado art. 214 do Código Civil. Nãohavia previsão no mesmo sentido

Page 811: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

no antigo Código de ProcessoCivil. Porém, no Novo CódigoProcessual foi introduzida amesma premissa na primeiraparte do seu art. 393. Dessaforma, o confitente – aquele queconfessa – não pode tentarcontradizer-se, hipótese típica deaplicação da regra nemo potestvenire contra factum proprium,máxima que veda ocomportamento contraditório,conceito usualmente relacionadoà boa-fé objetiva. A este autorparece que os legisladores, civile processual, não foram felizes aoutilizar o termo revogação, que

Page 812: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

deve ser empregado para ashipóteses de extinção de negóciospor quebra de confiança(promessa de recompensa,mandato, comodato), o que não éo caso. Melhor seria falar emirretratabilidade.

O mesmo art. 214 doCC/2002 admite que se anule aconfissão se houver erro de fatoou coação. Surge, no presenteponto, questão de divergência,possivelmente sanada pelo NovoCódigo de Processo Civil.

Isso porque o art. 352 doCPC/1973 estabelecia também aanulabilidade da confissão por

Page 813: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

dolo. Este autor mudou oentendimento manifestado nas trêsprimeiras edições da sua obraDireito Civil. Volume 1, por estamesma casa editorial, guiado peloparecer de Alexandre FreitasCâmara, no sentido de que “estedispositivo não revoga o art. 352do CPC por não ser com eleincompatível, nem tratar damatéria de forma exauriente (jáque não faz qualquer alusão aodolo, o qual – evidentemente – écausa de anulação de atosjurídicos), e não haveria qualquerrazoabilidade de se afirmar que, apartir da vigência do Código de

Page 814: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

2002, não mais seria impossívelinvalidar a confissão obtida peloinduzimento do confitente emerro”.7

De qualquer forma, aquestão sempre foi polêmica.Entre os civilistas, algunsentendiam que a confissão nãopoderia ser anulada por dolo,justamente porque se deve fazeruma interpretação restritiva doart. 214 do CC/2002.8 Em sentidopróximo, outros doutrinadoressustentavam que a confissão nãoseria anulada por dolo, mantendo-se válida a declaração e gerando-se apenas o direito de

Page 815: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

indenização à vítima.9

Pois bem, o Novo CPC nãofaz mais menção ao dolo, o quetende a sepultar definitivamente apolêmica, adotando a mesmaredação do art. 214 do CódigoCivil. Na dicção do caput do seuart. 393, “A confissão éirrevogável, mas pode seranulada se decorreu de erro defato ou de coação”.

Além disso, nota-se que aúnica hipótese de erro admitidapara a anulação é o erro de fato; oque não engloba o erro de direito,relativamente ao conhecimento de

Page 816: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

uma informação jurídica. Valelembrar que o erro de direito écausa de anulação dos atos enegócios jurídicos, nos termos doart. 139, inciso III, do CódigoCivil, regra que parece nãoalcançar a confissão.

Pelo mesmo art. 393 doCPC/2015, o único caminho paraa anulação da confissão pareceser o da ação anulatória. Issoporque não houve reprodução dosincisos do art. 352 do CPC/1973,pelo qual a confissão, quandoemanasse de erro, dolo oucoação, poderia ser revogada: a)por ação anulatória, se pendente o

Page 817: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

processo em que foi feita; e b)por ação rescisória, depois detransitada em julgado a sentençada qual constituísse o únicofundamento. Em evento de debatesobre as repercussões do NovoCPC para o Direito Civil, DanielAmorim Assumpção Nevescriticou essa alteração, pois, emmuitos casos, não será maispossível rescindir uma sentençabaseada em confissão eivada devício. Desse modo, a parte quealega o problema na declaraçãopode ganhar e não levar, poisnão conseguirá desfazer a decisãotransitada em julgado.10 O jurista

Page 818: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

tem razão e o panorama para ofuturo mostra não ser satisfatório.

Consoante o parágrafo únicodesse art. 393 do CPC/2015, alegitimidade para a açãoanulatória da confissão éexclusiva do confitente – aqueleque confessa – e pode sertransferida a seus herdeiros se elefalecer após a propositura dademanda. Essa legitimação, emregra personalíssima, estava noparágrafo único do art. 352 doCPC/1973, havendo apenaspequenas modificações deredação, sem mudanças no seusentido.

Page 819: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

Para o presente autor, alémdos casos de anulabilidade, deve-se entender que cabe a nulidadeabsoluta da confissão nashipóteses constantes dos arts. 166e 167 do CC/2002. Isso porque anulidade absoluta envolve ordempública e normas imperativas.Uma hipótese a ser citada é a desimulação na confissão. No quese refere à confissão praticadasob coação física (vis absoluta),esta também gera a nulidade,situação que se enquadra noinciso III do art. 3º do CódigoCivil (pessoa que, por causatransitória, não puder exprimir

Page 820: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

sua vontade).Segue-se o entendimento

segundo o qual a açãodeclaratória de nulidade éimprescritível, por envolverordem pública e diante do seucaráter declaratório (critério deAgnelo Amorim Filho). Alémdisso, pode ser suscitada a regraem que a nulidade não convalescepelo decurso do tempo (art. 169do CC/2002).

Depois do tratamento daconfissão, o Código Civilregulamenta a prova documental,que também demonstra um ato,fato ou negócio jurídico, com

Page 821: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

previsão entre seus arts. 215 a226. De qualquer forma, têmrazão os processualistas antescitados quando afirmam que odispositivo tem mais relação coma forma do que com a prova donegócio. E, como se sabe, a formado negócio está no plano de suavalidade, nos termos do art. 104,inciso III, do Código Civil emvigor; enquanto a prova, no planoda eficácia.

Inicialmente, o Código Civilatual consagra no seu art. 215 quea escritura pública, lavrada emnotas de tabelião, é documentodotado de fé pública, fazendo

Page 822: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

prova plena. Esse dispositivosempre recebeu críticas,principalmente entre osprocessualistas, por ainda contermenção segundo a qual a escriturapública faz prova plena dos atose negócios jurídicos. Por certo, aexpressão prova plena não vemsendo mais utilizada tanto nodireito material quanto noprocessual, particularmente pelatendência de relativização deprincípios e direitos.

Tanto isso é verdade que nãohá no Novo CPC qualquerutilização do termo destacado noúltimo parágrafo. O novo art. 405

Page 823: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

cuidou de repetir a ideiaconstante no art. 364 doCPC/1973, no sentido de que odocumento público faz prova nãosó da sua formação, mas tambémdos fatos que o escrivão, o chefede secretaria, o tabelião ou oservidor declarar que ocorreramem sua presença.

Em verdade, a menção aovalor e à força probante dosdocumentos, em cotejo comoutras provas, revela resquíciosdo antigo sistema da provatarifada, pelo qual o juiz ficavaadstrito a valorar maisintensamente alguns meios de

Page 824: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

prova do que outros.11 Como énotório, vige o sistema dapersuasão racional ou do livreconvencimento motivado, desorte que não há mais talvinculação por parte do juiz, aquem compete sopesar oselementos probatórios conforme oseu entendimento fundamentado.

Nessa linha, na III Jornadade Direito Civil, foi aprovado oEnunciado n. 158 do CJF/STJ,pelo qual: “A amplitude da noçãode ‘prova plena’ (isto é,‘completa’) importa presunçãorelativa acerca dos elementosindicados nos incisos do § 1º,

Page 825: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

devendo ser conjugada com odisposto no parágrafo único doart. 219”. Concluindo, a referidaprova plena não é tão plenaassim, pois traz uma presunçãorelativa (iuris tantum), e nãoabsoluta (iure et de iure),conforme entenderam os juristasque participaram daquelaJornada de Direito Civil,realizada no ano de 2004.

Compartilhando dessa formade pensar, preciso aresto doSuperior Tribunal de Justiça,publicado no seu Informativo n.541, segundo o qual, “a quitaçãodada em escritura pública gera

Page 826: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

presunção relativa do pagamento,admitindo prova em contrário queevidencie a invalidade doinstrumento eivado de vício que otorne falso. Com efeito, nostermos do art. 215 do CC, aescritura lavrada em cartório temfé pública, o que significa dizerque é documento dotado depresunção de veracidade. O queocorre com a presunção legal doreferido dispositivo é adesnecessidade de se provar osfatos contidos na escritura (à luzdo que dispõe o art. 334, IV, doCPC) e também a inversão doônus da prova, em desfavor de

Page 827: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

quem, eventualmente, suscite asua invalidade. (...) Portanto, aquitação dada em escriturapública não é uma ‘verdadeindisputável’, na medida em queadmite a prova de que opagamento não foi efetivamenterealizado, evidenciando, ao fim, ainvalidade do instrumento em si,porque eivado de vício que otorna falso. Assim, entende-seque a quitação dada em escriturapública presume o pagamento, atéque se prove o contrário” (STJ,REsp. 1.438.432/GO, Rel. Min.Nancy Andrighi, j. 22.04.2014).

A presunção relativa, em

Page 828: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

suma, refere-se aos elementos quedevem fazer parte da escriturapública (art. 215, § 1º, doCC/2002), a saber: a) a data e olocal de sua realização; b) oreconhecimento da identidade eda capacidade das partes e detodos que hajam comparecido aoato, por si, como representantes,intervenientes ou testemunhas; c)o nome, a nacionalidade, o estadocivil, a profissão, o domicílio e aresidência das partes e dosdemais comparecentes, com aindicação, quando necessária, doregime de bens do casamento, donome do outro cônjuge e da

Page 829: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

filiação; d) a manifestação clarada vontade das partes e dosintervenientes; e) a referência aocumprimento das exigênciaslegais e fiscais inerentes àlegitimidade do ato; f) adeclaração de que a escritura foilida na presença das partes e dosdemais comparecentes, ou de quetodos a leram; e g) a assinaturadas partes e dos demaiscomparecentes, bem como a dotabelião ou seu substituto legal,encerrando o ato. Assim como oseu antecessor, o Novo Código deProcesso Civil não traz oselementos desse ato público,

Page 830: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

devendo o dispositivo materialser considerado para todos osfins.

Pontue-se que a escriturapública será lavrada noTabelionato de Notas, nos termosda organização e regulamentaçãoespecífica prevista na Lei deRegistros Públicos (Lei6.015/1973). Mais recentemente,tendo em vista a celeridade dosatos e a diminuição deburocracias, entrou em vigor emnosso País a Lei 11.441/2007,possibilitando que o divórcio e oinventário sejam celebrados,extrajudicialmente, por escritura

Page 831: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

pública. Os temas estão tratadosnesta obra em capítulosespecíficos, pelas interaçõesexistentes com o Novo CPC.

De qualquer maneira,aprofunde-se que o oficial docartório de notas deverá elaborara escritura pública seguindo essesseus requisitos mínimos,previstos no art. 215, § 1º, incisosI a VII, do Código Civil em vigor.A falta de um dos requisitosacarretará a nulidade absoluta doato, nos termos do art. 166,incisos IV e V, do CC, havendodesrespeito à forma ou àsolenidade, o que comprova a

Page 832: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

tese de que a escritura está noplano da validade do negóciojurídico (segundo degrau daEscada Ponteana).

Vale mais uma vez consignarque a escritura pública pode serlavrada em qualquer Tabelionatode Notas do território nacional,não se confundindo com oregistro imobiliário, que deve serrealizado no Cartório de Registrode Imóveis do local de situaçãodo imóvel. Também pertinentereferir-se ao art. 108 da atualcodificação material, pelo qual aescritura pública somente seránecessária para a alienação de

Page 833: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

imóveis com valor superior a 30salários mínimos. Para os demaiscasos, está dispensada a suaelaboração.

Particularmente quanto àmatéria, o Código Civil de 2002passou a exigir, para a elaboraçãoda escritura pública peloTabelionato de Notas, areferência ao cumprimento dasexigências legais e fiscaisinerentes à legitimidade do ato(art. 215, § 1º, inciso V, do CC).Para tanto, podem ser citadas aquitação de impostos, como oIPTU, e a outorga conjugalexigida pelo art. 1.647 do

Page 834: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

CC/2002. O inciso em comentovaloriza a ética, a boa-fé objetivacomo baluartes da codificaçãosubstantiva, pelo fato de exigir opagamento das dívidas fiscais.

Pelos incisos VI e VII do art.215, § 1º, do CC/2002, alegislação civil continua exigindoa leitura da escritura pública pelonotário aos comparecentes, paraque conheçam o seu teor, bemcomo a assinatura das partes e dopróprio tabelião, mais uma vezsob pena de nulidade do atopraticado (art. 166, IV e V, doCC).

Determina o § 2º do art. 215

Page 835: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

do CC/2002 que, se algumcomparecente não puder ou nãosouber escrever, outra pessoacapaz assinará por ele, a seu rogo(a seu pedido). Por tal norma, aatual codificação privada admiteque outra pessoa assine em nomedo interessado, se este não souberescrever, sendo perfeitamenteválida a escritura pública nessassituações.

A escritura será redigida nalíngua nacional, conforme ordemdo § 3º do mesmo art. 215.Tendente à simplicidade ou àoperabilidade dos atos, negóciose contratos, o Código Civil

Page 836: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

vigente continua exigindo que onotário elabore a escriturapública em língua portuguesa,também sob pena de nulidade daescritura. Recomenda-se, dentrodo bom senso, que a linguagem dodocumento seja acessível àspartes, evitando-se expressõessuperadas, ininteligíveis ou dedifícil compreensão, inclusiveexpressas em latim. Uma escrituramal escrita, com graves defeitosde linguagem, também poderá serdeclarada nula, nos termos do art.166, incisos IV e V, do CC, pordesrespeito à forma ou àsolenidade.

Page 837: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

Igualmente, de acordo com avalorização da informação, emsintonia com a boa-fé objetiva, sequalquer dos comparecentes nãosouber a língua nacional e otabelião não entender o idiomaem que se expressa, deverácomparecer tradutor público paraservir de intérprete (art. 215, §4º, do CC). Pelo mesmodispositivo, não havendo tradutorna localidade, será nomeada outrapessoa capaz que, a juízo dotabelião, tenha idoneidade econhecimento bastantes, caso, porexemplo, de um professor delínguas local. Caso esses

Page 838: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

requisitos não sejam obedecidos,o Código Civil reconhece anulidade do ato, continuando aproteger o princípio dainformação e a confiançadepositada entre as partes.

Por outro lado, se algum doscomparecentes não for conhecidodo tabelião, nem puderidentificar-se por documento,deverão participar do ato pelomenos duas testemunhas que oconheçam e atestem suaidentidade (art. 215, § 5º, do CC).Deve-se entender que esseparágrafo apresenta as regras aserem aplicadas para o ato em

Page 839: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

ordem inversa. Assim sendo, otabelião, inicialmente, devebuscar a identificação docelebrante por documento hábil elícito acompanhado por foto,como cédula de identidade ououtro que o substitua. Não sendopossível, caberá a identificaçãopessoal com base na confiança.No caso de impossibilidadedestas, a identidade docomparecente deverá ser provadapor duas testemunhas, queconheçam e atestem quem é apessoa a celebrar o ato ounegócio.

Todas essas regras

Page 840: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

continuam em vigor com o NovoCPC, que apenas cuidou derepetir o que estava nos arts. 366e 367 do CPC/1973. Nessecontexto, quando a lei exigirinstrumento público como algo dasubstância do ato, nenhuma outraprova, por mais especial queseja, pode suprir-lhe a falta (art.406 do CPC/2015). Além disso, odocumento feito por oficialpúblico incompetente ou sem aobservância das formalidadeslegais, sendo subscrito pelaspartes, tem a mesma eficáciaprobatória do documentoparticular (art. 407 do

Page 841: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

CPC/2015).Superada a análise do art.

215 do CC/2002, enuncia o seuart. 216 que farão a mesma provaque os originais as certidõestextuais de qualquer peçajudicial, do protocolo dasaudiências, ou de qualquer outrolivro a cargo do escrivão, sendoextraídas por ele, ou sob a suavigilância, e por ele subscritas,assim como os traslados de autos,quando por outro escrivãoconsertados. Pelo que consta dodispositivo, o Código Civil de2002 continua reconhecendo a fépública e a força probante das

Page 842: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

certidões textuais com inteiro teor(verbo ad verbum) de peçajudicial, protocolo de audiênciasou livro a cargo de escrivão.Nesse sentido, vale transcreveros conceitos correlatos,apontados por Maria HelenaDiniz:

“Certidão. A certidão textual, seja ‘verbo adverbum’ (inteiro teor), seja em breverelatório, é a reprodução do conteúdo de atoescrito, registrado em autos ou em livro, feitapor pessoa investida de fé pública.Traslado. O traslado de autos é a cópia fiel,passada pelo próprio escrivão ou por outroconcertada, de documentos constantes doarquivo judiciário. O concerto, portanto, nadamais é do que o ato de conferir a cópia com o

Page 843: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

original”.12

Conforme a parte final doart. 216 do Código Civil,observa-se que o documento deveser extraído pelo próprioescrivão ou por terceiro, sob suavigilância, devendo ser subscritopelo primeiro. De acordo com omesmo preceito, as cópiastrasladadas dos autos somenteterão validade quandoconcertadas por outro escrivão. Aexpressão concerto, grafada comc, significa conferir o documentocom o correspondente original.Por um equívoco, constou do

Page 844: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

texto final do dispositivo apalavra conserto, com s, aocontrário do correto texto doCódigo Civil de 1916. Dessaforma, pelo erro de grafia, deveser entendido concerto, com c,conforme aponta a própriaProfessora Maria Helena Diniz,na obra por último transcrita.13

Partindo para a legislaçãoprocessual, com sentido próximo,pelo menos parcialmente, éimperioso expor os seguintesdiplomas, para a devidaconfrontação:

Page 845: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

Novo Códigode Processo

Civil

Código de

Processo CivilAntigo

“Art. 425.Fazem a mesmaprova que osoriginais:

“Art. 365.Fazem a mesmaprova que osoriginais:

I – as certidõestextuais dequalquer peçados autos, doprotocolo dasaudiências oude outro livro acargo do

I – as certidõestextuais dequalquer peçados autos, doprotocolo dasaudiências, oude outro livro a

Page 846: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

escrivão ou dochefe desecretaria, seextraídas porele ou sob suavigilância e porele subscritas;

cargo doescrivão, sendoextraídas porele ou sob suavigilância e porele subscritas;

II – os trasladose as certidõesextraídas poroficial públicode instrumentosou documentoslançados emsuas notas;

II – os trasladose as certidõesextraídas poroficial público,de instrumentosou documentoslançados emsuas notas;

III – asreproduções dos

III – asreproduções dos

Page 847: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

documentospúblicos, desdequeautenticadas poroficial públicoou conferidasem cartório comos respectivosoriginais;

documentospúblicos, desdequeautenticadas poroficial públicoou conferidasem cartório,com osrespectivosoriginais;

IV – as cópiasreprográficas depeças dopróprioprocesso judicialdeclaradasautênticas peloadvogado, sob

IV – as cópiasreprográficas depeças dopróprioprocesso judicialdeclaradasautênticas pelopróprioadvogado sobsua

Page 848: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

suaresponsabilidadepessoal, se nãolhes forimpugnada aautenticidade;

responsabilidadepessoal, se nãolhes forimpugnada aautenticidade(incluído pelaLei 11.382, de2006).

V – os extratosdigitais debancos dedados públicos eprivados, desdeque atestadopelo seuemitente, sob aspenas da lei,que asinformações

V – os extratosdigitais debancos dedados, públicose privados,desde queatestado peloseu emitente,sob as penas dalei, que asinformaçõesconferem com o

Page 849: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

conferem com oque consta naorigem;

que consta naorigem (incluídopela Lei 11.419,de 2006);

VI – asreproduçõesdigitalizadas dequalquerdocumentopúblico ouparticular,quando juntadasaos autos pelosórgãos dajustiça e seusauxiliares, peloMinistério

VI – asreproduçõesdigitalizadas dequalquerdocumento,público ouparticular,quando juntadosaos autos pelosórgãos daJustiça e seusauxiliares, peloMinistérioPúblico e seusauxiliares, pelasprocuradorias,

Page 850: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

Público e seusauxiliares, pelaDefensoriaPública e seusauxiliares, pelasprocuradorias,pelasrepartiçõespúblicas emgeral e poradvogados,ressalvada aalegaçãomotivada efundamentadade adulteração.

pelasrepartiçõespúblicas emgeral e poradvogadospúblicos ouprivados,ressalvada aalegaçãomotivada efundamentadade adulteraçãoantes oudurante oprocesso dedigitalização(incluído pelaLei 11.419, de2006).

§ 1º Os originais

Page 851: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

§ 1º Os originaisdos documentosdigitalizadosmencionados noinciso VIdeverão serpreservadospelo seudetentor até ofinal do prazopara propositurade açãorescisória.

dos documentosdigitalizados,mencionados noinciso VI do caput desteartigo, deverãoser preservadospelo seudetentor até ofinal do prazoparainterposição deação rescisória(incluído pelaLei 11.419, de2006).

§ 2º Tratando-se de cópia

§ 2º Tratando-se de cópiadigital de títuloexecutivo

Page 852: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

digital de títuloexecutivoextrajudicial oude documentorelevante àinstrução doprocesso, o juizpoderádeterminar seudepósito emcartório ousecretaria”.

extrajudicial ououtrodocumentorelevante àinstrução doprocesso, o juizpoderádeterminar oseu depósito emcartório ousecretaria(incluído pelaLei 11.419, de2006).”

Como se nota, as normasprocessuais têm sentido bem maisamplo quanto à força probante dedocumentos copiados, sejampúblicos ou particulares.

Page 853: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

Constata-se, ainda, que o NovoCPC acabou por reproduzir o quejá estava no antigo Codex, com asreformas que foram realizadasnos últimos anos. A sua únicanovidade parece ser oreconhecimento da força probantede documentos emitidos pelaDefensoria Pública, equiparadaao Ministério Público e àsProcuradorias pelo inciso VI donovo art. 425 do CPC/2015.

Nos exatos termos do queconsta do inciso II das duasnormas confrontadas, prevê oCódigo Civil que as certidões eos traslados extraídos por

Page 854: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

tabelião ou oficial de registroterão a mesma força probante deinstrumentos ou documentoslançados em suas notas (art. 217do CC/2002). Em outraspalavras, continuam tendo forçaprobante, dotados de fé pública,os documentos trasladados e ascertidões, extraídos por tabeliãode cartório de notas ou oficialdeste. Em suma, pelo que se retirados dispositivos visualizados,pode-se afirmar que todos osdocumentos referidos têm amesma força probante que aescritura pública e o seucorrespondente traslado.

Page 855: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

Prevê o art. 218 doCC/2002, ainda tratando da provadocumental, que os traslados e ascertidões considerar-se-ãoinstrumentos públicos, se osoriginais tiverem sido produzidosem juízo como prova de algumato. Esse comando equivaliaparcialmente ao art. 364 doCPC/1973, pelo qual, “odocumento público faz prova nãosó da sua formação, mas tambémdos fatos que o escrivão, otabelião, ou o funcionáriodeclarar que ocorreram em suapresença”. O art. 405 doCPC/2015 ampliou ainda mais o

Page 856: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

sentido do preceito anterior,enunciando que “O documentopúblico faz prova não só da suaformação, mas também dos fatosque o escrivão, o chefe desecretaria, o tabelião ou oservidor declarar que ocorreramem sua presença”. A inovação é amenção ao chefe da secretaria e asubstituição da palavrafuncionário por servidor.

Ainda sobre a provadocumental, as declaraçõesconstantes de documentosassinados presumem-severdadeiras em relação aossignatários, segundo o art. 219 do

Page 857: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

CC/2002. Como não poderia serdiferente, continua a toda prova osistema pelo qual os documentosassinados, públicos ouparticulares, têm eficácia entre aspartes que lançaram neles suasassinaturas. Isso porque essecomando material equivalia aoart. 368, caput, do CPC/1973,que tinha a seguinte redação: “Asdeclarações constantes dodocumento particular, escrito eassinado, ou somente assinado,presumem-se verdadeiras emrelação ao signatário”. Houverepetição integral pelo art. 408 doCPC/2015, sem modificações.

Page 858: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

Nos dois dispositivos – materiale processual –, a presunção érelativa (iuris tantum), admitindoprova em contrário, objetivando acerteza e a segurança jurídica.

A ilustrar todas essasdeduções, da jurisprudênciatrabalhista, cabe transcrever: “Oscartões de ponto provam aduração da jornada (§ 2º, art. 74,CLT), pela presunção relativa deveracidade da prova documental,prevista nos arts. 219 do CódigoCivil e 368 do CPC. Como oempregado não provou afalsidade dessa provadocumental, nem demonstrou,

Page 859: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

ainda que por amostragem ousimples indicação, a existência dediferenças de horas extras nãopagas, ônus que lhe cabia, nostermos dos arts. 818, CLT, einciso I, art. 333, CPC, prevalecea quitação exarada nos recibos desalários” (TRT da 3ª Região,Recurso Ordinário 0000572-11.2013.5.03.0092, Rel. Des.Jales Valadão Cardoso, DJEMG05.12.2014, p. 87).

O parágrafo único do art.219 do CC/2002 determina que,“não tendo relação direta, porém,com as disposições principais oucom a legitimidade das partes, as

Page 860: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

declarações enunciativas nãoeximem os interessados em suaveracidade do ônus de prová-las”. Como antes exposto, essaregra deve ser aplicada àescritura pública, completando oart. 215 do atual Código Civil,conforme o Enunciado n. 158,aprovado na III Jornada deDireito Civil do Conselho daJustiça Federal e do SuperiorTribunal de Justiça.

Mas não é só, uma vez que oartigo traz alguns conceitosinteressantes. As disposiçõesprincipais – tambémconceituadas como dispositivas –

Page 861: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

são aquelas que mantêm relaçãodireta com os elementosessenciais do ato – partes, objeto,vontade e forma, estando nosplanos da existência e davalidade do negócio jurídico. Porseu turno, as declaraçõesenunciativas, regra geral, nãomantêm relação imediata com asregras principais do ato ounegócio, muito menos com alegitimidade das partes. Comoexemplos de disposiçõesenunciativas, podem ser citadasaquelas relacionadas com aqualificação dos negociantes, nãosendo esta essencial ao ato.

Page 862: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

Mesmo assim, cabe ao declaranteo ônus de provar a veracidade dasua declaração. Pontue-se queessa distinção consta doparágrafo único do novo art. 408do CPC/2015, que repetiu ocomplemento do art. 368 doCPC/1973 com a seguinteexpressão: “Quando, todavia,contiver declaração de ciência dedeterminado fato, o documentoparticular prova a ciência, masnão o fato em si, incumbindo oônus de prová-lo ao interessadoem sua veracidade”.

Segundo o art. 220 doCódigo Civil em vigor, “a

Page 863: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

anuência ou a autorização deoutrem, necessária à validade deum ato, provar-se-á do mesmomodo que este, e constará, sempreque se possa, do próprioinstrumento”. Em determinadassituações, a lei exige anuência ouautorização de terceiro para aprática de alguns atos, caso danecessidade de outorga conjugal,prevista no art. 1.647 doCC/2002, a englobar a outorgauxória – da mulher – e a outorgamarital – do marido.Exemplificando de outra forma,ainda envolvendo hipótese delegitimação, cite-se a venda de

Page 864: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

ascendente a descendente, quedepende de autorização dosoutros descendentes e do cônjugedo alienante, exceção feita aoregime da separação obrigatória,de acordo com o art. 496 doCC/2002.

Nas duas situaçõesdescritas, consoante determina oart. 220 do CC/2002, para avenda de imóvel medianteescritura pública, a outorgaconjugal ou dos filhos tambémdeverá assumir a mesma forma,fazendo prova do negóciojurídico. O Novo CPC não trazpreceito semelhante, assim como

Page 865: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

o seu antecessor, continuando ater plena subsunção a regramaterial comentada.

Seguindo, na dicção do art.221 do Código Civil, oinstrumento particular, feito eassinado, ou somente assinadopor quem esteja na livredisposição e administração deseus bens, prova as obrigaçõesconvencionais de qualquer valor.Porém, conforme o mesmocomando, os seus efeitos, bemcomo os da cessão, não seoperam, a respeito de terceiros,antes de registrado no registropúblico.

Page 866: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

Em relação a tal dispositivomaterial, debateu-se logo após aemergência da codificaçãomaterial de 2002 se ele revogouou não a então norma do art. 585,inciso II, do CPC/1973, queestabelecia ser título executivoextrajudicial o documentoparticular assinado pelo devedore por duas testemunhas. O debatepode persistir, pois o comandoprocessual anterior foirigorosamente repetido pelo art.784, inciso III, do CPC/2015.

Como o art. 221 da atualcodificação material usa o termodocumento somente assinado,

Page 867: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

estaria afastada a necessidade deassinatura de duas testemunhaspara os negócios jurídicos,visando à ação executiva?Sempre respondeu positivamenteo jurista e magistrado paulistaAntonio Jeová Santos, nosseguintes termos:

“O art. 221 do CC/2002 revogou, de formatácita, o art. 585, II, do CPC, na parte queexige duas testemunhas para que odocumento seja considerado título executivo,porque ‘lex porterior derrogat priorem’ ou novernáculo: ‘lei posterior revoga a anterior’.Aos contratos celebrados na vigência do atualCódigo, não mais será necessária a presençade testemunhas para a existência do títuloexecutivo. Ao deixar de ter este requisitopara a validade de contrato, não pode a regra

Page 868: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

processual subsistir, mantendo a exigênciapara que o contrato seja tido como títuloexecutivo extrajudicial.Contratos firmados depois da vigência doCódigo Civil de 2002 que não tenhamtestemunhas, quando descumpridos e setiverem os demais requisitos para a execução,como a liquidez, certeza e exigibilidade,servirão como título executivo, abstraída aparte do art. 585, II, do CPC que mantinha aobrigatoriedade de que no documentoconstasse a assinatura de duas testemunhas,para que a parte pudesse lançar mão doprocesso de execução”.14

Com o devido respeito, opresente autor nunca se filiou aesse entendimento, desde apublicação da primeira edição doVolume 1 da sua coleção de

Page 869: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

Direito Civil, no ano de 2004. Aocontrário do posicionamento deAntonio Jeová Santos,entendemos que, no caso descrito,não haveria uma antinomia deprimeiro grau aparente, devendoa norma posterior (o CódigoCivil de 2002) prevalecer sobre anorma anterior (o Código deProcesso Civil de 1973), gerandoa revogação do seu art. 585, II. Seassim fosse, a questão igualmenteestaria solucionada com aemergência do Novo CPC, que éposterior.

Na realidade, a nossaposição sempre foi no sentido de

Page 870: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

que o art. 221 do CC/2002constitui uma norma geralposterior, se comparada com oart. 585, II, do CPC/1973, normaespecial anterior. A primeiraconstitui norma geral porque nãotrata especificamente do processode execução, mas da prova donegócio jurídico de maneiragenérica. Aliás, esse é oposicionamento sempre defendidoem relação a todo o tratamentoprevisto no Código Civil quanto àprova do negócio jurídico,conforme se depreende da leiturado presente capítulo, desde o seuinício.

Page 871: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

Por outra via, o art. 585, II,do CPC/1973 constituía normaespecial anterior. Especialporque tratava do processo deexecução, como norma processualespecífica. Anterior porquerealmente o Código de ProcessoCivil antigo entrou em vigor antesdo Código Civil de 2002.

Sendo assim, havia, no casoem questão, uma antinomia,conflito de normas entre os doisdispositivos. No entanto, tratava-se de uma antinomia aparente,uma vez que sempre houvemetacritério para solução desseconflito, devendo prevalecer a

Page 872: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

especialidade do Código deProcesso Civil. A antinomia era,ainda, uma colisão de segundograu, envolvendo, além dessecritério, o cronológico.

Como é notório, o critérioda especialidade deveráprevalecer sobre o critériocronológico, eis que consta daConstituição Federal, na segundaparte do princípio constitucionalda isonomia, consagrado pelo art.5º, caput, da Lei Maior (a leideve tratar de maneira desigualos desiguais).15 Essa é a razãorelevante para que continuasse aser aplicada a regra processual,

Page 873: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

estabelecida no art. 585, II, doCPC.

Por isso, este autorcontinuava a entender pelanecessidade da assinatura de duastestemunhas, para quedeterminado negócio jurídico oucontrato fosse considerado títuloexecutivo extrajudicial. Anote-seque o debate e a conclusão danossa obra Direito Civil. Volume1 constam de acórdãos doTribunal de Justiça de São Paulo.Vejamos duas dessas ementas:

“Execução de título extrajudicial. Contrato decompra e venda de fundo de comércio.Ausência de assinatura de duas testemunhas.

Page 874: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

Extinção do feito sem julgamento do mérito.Sentença mantida. Recurso não provido. 1.Ação executiva fundada em contratoparticular de compra e venda de fundo decomércio, sem assinatura de duastestemunhas. Impossibilidade. 2. Documentoque não constitui título executivo extrajudicial.Art. 585, II, CPC. 3. Antinomia com o art.221, do Código Civil em vigor. Inocorrência.Norma civilista genérica e que diz respeito àprova do negócio jurídico. 4. Prevalência daregra específica do Código de Processo Civil,a qual contém os requisitos para que onegócio jurídico válido e eficaz constitua títuloexecutivo. Precedentes. 5. Sentença deextinção do feito, sem julgamento de mérito,mantida. 6. Apelação da autora não provida”(TJSP, Apelação 0034458-20.2011.8.26.0564,São Bernardo do Campo, Sexta Câmara deDireito Privado, Rel. Des. AlexandreLazzarini, j. 06.09.2012).

“Contrato. Instrumento particular de

Page 875: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

confissão de dívida. Assinatura por duastestemunhas. Imprescindibilidade paraconferir executividade ao documento.Hipótese em que testemunhas, advogados,vieram a propor ação de execução docontrato que subscreveram, representando acredora. Impedimento legal (art. 405, § 2º, III,do CPC). Presunção absoluta de interesse.Título destituído de eficácia executiva.Extinção da execução sem resolução domérito. Embargos do devedor procedentes.Apelação provida para esse fim” (TJSP,Apelação 991.07.085930-1, Acórdão4657409, Mogi Guaçu, Décima Nona Câmarade Direito Privado, Rel. Des. RicardoNegrão, j. 27.07.2010, DJESP 31.08.2010).

Cabe ressaltar que outrosjulgados da mesma Corte Paulistavinham seguindo a mesmapremissa, que acabava

Page 876: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

prevalecendo no TribunalBandeirante, na linha do primeiroaresto transcrito. De toda sorte,como o Novo CPC repetiu aexigência das duas testemunhas, atese anterior e minoritária pareceter perdido totalmente a sua força.

Voltando ao âmago docapítulo da prova do negóciojurídico no Código Civil,interessante relembrar que oinstrumento particular não tem asuposta força probante absoluta,como o escrito público.Eventualmente, aquilo que constado instrumento particular podeser provado por outras formas,

Page 877: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

como por meio de testemunhas(art. 221, parágrafo único, doCC). É notório, por regra, que oinstrumento particular gera efeitosentre as partes negociantes (interpartes). Para valer peranteterceiros, deverá ser registradano Cartório de Títulos eDocumentos, situação em quepassa a ter eficácia erga omnes,nos termos do próprio art. 221 doCC/2002.

O art. 222 da codificaçãomaterial trata do telegrama,prevendo que, quando lhe forcontestada a autenticidade, fazprova mediante conferência com

Page 878: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

o original assinado. Mesmo nãohavendo regra semelhante noCódigo de 1916, compreendia-seque o comando em questão eranovidade parcial, uma vez queconstavam normas sobre otelegrama no Código de ProcessoCivil de 1973 (arts. 374 e 375).O Código de Processo Civil de2015 reproduziu literalmente essetratamento anterior, mantendo odiálogo em relação ao CódigoCivil de 2002. Segundo o seu art.413, caput, o telegrama, oradiograma ou qualquer outromeio de transmissão tem a mesmaforça probatória do documento

Page 879: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

particular, se o original constanteda estação expedidora tiver sidoassinado pelo remetente. Emcomplemento, nos termos do seuparágrafo, a firma do remetentepoderá ser reconhecida pelotabelião, declarando-se essacircunstância no originaldepositado na estaçãoexpedidora. Além disso,conforme o art. 414 do NovoCodex, o telegrama ou oradiograma presume-serelativamente de acordo com ooriginal, provando as datas de suaexpedição e do recebimento pelodestinatário.

Page 880: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

Como destacávamos emnossa obra que analisa a ParteGeral do Código Civil, a entãoinovação desse art. 222 nasceudesatualizada, pela falta demenção ao fax e à mensagemenviada por correio eletrônico (e-mail), via internet. Contudo,mesmo diante da falta de previsãolegal, o art. 222 da atualcodificação material tambémpoderia ser aplicado a essesdocumentos, os quais têm forçaprobante se não houver qualquerilicitude.

Relativamente ao correioeletrônico, é interessante

Page 881: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

observar que a conclusãosemelhante chegou a Comissão deObrigações e Contratos da IJornada de Direito Civil,promovida pelo Conselho daJustiça Federal, pelo teor do seuEnunciado n. 18: “Art. 319: a‘quitação regular’ referida no art.319 do novo Código Civilengloba a quitação dada pormeios eletrônicos ou porquaisquer formas de‘comunicação à distância’, assimentendida aquela que permiteajustar negócios jurídicos epraticar atos jurídicos sem apresença corpórea simultânea das

Page 882: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

partes ou de seus representantes”.O art. 319 do CC/2002 trata daprova do pagamento, dada pelaquitação. Como reforço à questãoda prova eletrônica, podem sermais uma vez mencionados osEnunciados n. 297 e 298 doCJF/STJ, da IV Jornada deDireito Civil. O Novo CPC,como exposto anteriormente, trataexpressamente da provaconstruída na rede mundial decomputadores, especialmente emseu art. 422, § 1º.

Segundo o art. 223 doCC/2002, a cópia fotográfica dedocumento, conferida por

Page 883: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

tabelião de notas, valerá comoprova de declaração da vontade,mas, impugnada suaautenticidade, deverá ser exibidoo original. Apesar da falta demenção de tratamento quanto àcópia fotográfica ou reprográfica(popular xerox), havia regracorrespondente no art. 385 doCPC/1973, pelo qual, “a cópia dedocumento particular tem omesmo valor probante que ooriginal, cabendo ao escrivão,intimadas as partes, proceder àconferência e certificar aconformidade entre a cópia e ooriginal. § 1º Quando se tratar de

Page 884: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

fotografia, esta terá de seracompanhada do respectivonegativo. § 2º Se a prova for umafotografia publicada em jornal,exigir-se-ão o original e onegativo”.

O caput do diplomarevogado foi repetidointegralmente pelo art. 423 doCPC/2015, sem os seusparágrafos, o que merece elogios.Primeiro, porque as exigências donegativo e do original dafotografia eram formalidadesexcessivas, muito exageradas.Segundo, pela prevalência fáticaatual de fotografias digitais, sem

Page 885: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

a existência de negativos.O art. 223 do Código Civil

ainda tinha correspondênciaparcial com o art. 384 do Códigode Processo Civil anterior,relacionado ao art. 423 do NovoCPC. Estabelecem ambos oscomandos processuais que asreproduções dos documentosparticulares, fotográficas ouobtidas por outros processos derepetição, valem como certidões,sempre que o escrivão ou o chefede secretaria certificar suaconformidade com o original.

Pelo que consta de todosesses dispositivos, a conferência

Page 886: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

pelo tabelião estabelece apenas apresunção relativa (iuris tantum)de autenticidade do documento.Na hipótese de impugnação desua autenticidade, torna-seimprescindível a apresentação dooriginal, visando à certeza, àsegurança jurídica e à verdadereal.

Contudo, em alguns casos,para o exercício de umdeterminado direito, a lei exige aexibição do documento originalou do título de crédito (duplicata,cheque etc.). Nessas situações, aprova produzida não dispensará aapresentação do documento

Page 887: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

correspondente, mais uma vez emprol da certeza e da segurançajurídica (art. 223, parágrafoúnico, do CC/2002).

Valorizando a informação,enuncia o art. 224 da codificaçãomaterial privada que osdocumentos redigidos em línguaestrangeira serão traduzidos parao português, para dar a eles osmesmos efeitos legais em nossoPaís. Dessa forma, o atual CódigoCivil continua exigindo que onegócio jurídico seja celebradoem nossa língua vernácula. Paraos documentos estrangeiros, éexigida a tradução por

Page 888: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

especialista juramentado eautorizado juridicamente, visandoà validade e à eficácia do ato emnosso País. Não há dúvidas deque continua em vigor o art. 148da Lei de Registros Públicos (Lei6.015/1973), in verbis: “ostítulos, documentos e papéisescritos em língua estrangeira,uma vez adotados os caracterescomuns, poderão ser registradosno original, para o efeito da suaconservação ou perpetuidade.Para produzirem efeitos legais noPaís e para valerem contraterceiros, deverão, entretanto, servertidos em vernáculo e

Page 889: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

registrada a tradução, o que,também, se observará em relaçãoàs procurações lavradas emlíngua estrangeira”.

Outrossim, continuavamerecendo aplicação o art. 157do CPC/1973, pelo qual, “sópoderá ser junto aos autosdocumento redigido em línguaestrangeira, quando acompanhadode versão em vernáculo, firmadapor tradutor juramentado”. ONovo CPC traz a mesma previsãono seu art. 192, de maneiraaperfeiçoada, ao enunciar que,“em todos os atos e termos doprocesso é obrigatório o uso da

Page 890: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

língua portuguesa. Parágrafoúnico. O documento redigido emlíngua estrangeira somente poderáser juntado aos autos quandoacompanhado de versão para alíngua portuguesa tramitada porvia diplomática ou pelaautoridade central, ou firmada portradutor juramentado”. Como sepercebe, passou-se a admitir aversão elaborada por autoridadediplomática ou afim. Não se podeafastar a relação entre essesdispositivos e o art. 13 daConstituição Federal de 1988,que compara a língua portuguesaaos demais símbolos da

Page 891: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

República Federativa do Brasil(a bandeira, o hino nacional, asarmas e os selos nacionais).

O Projeto de Lei 699/2011,antigo Projeto Ricardo Fiuza (PLn. 6.960/2002), ainda pretendealterar o art. 224 do CC/2002,que passaria a ter a seguinteredação: “Os documentosredigidos em língua estrangeiraserão traduzidos para o vernáculoe registrados em Títulos eDocumentos para terem efeitoslegais no país”. Como se vê, aprojeção exige expressamente oregistro no Cartório de Títulos eDocumentos.

Page 892: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

Não há como concordar coma proposta de alteração, o quedificultaria o trabalho dosinteressados, estando afastada apretensão de mudança doprincípio da simplicidade ouoperabilidade, um dos baluartesda codificação material. Aemergência do Novo CPCconfirma essa constatação, poispretende agilizar osprocedimentos e reduzir aburocracia. É pertinente deixarclaro que a proposta foiinicialmente vetada peloDeputado Vicente Arruda,nomeado na Comissão de

Page 893: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

Redação, Constituição e Justiçada Câmara dos Deputados paraapreciar a questão, pelasseguintes razões:

“Não nos parece procedente a pretendidaalteração. Em primeiro lugar, o próprio Autorda proposição lembra que, nos termos do art.13 da Carta Magna, a língua portuguesa é alíngua oficial do País; em segundo lugar, odispositivo do Código em questão trata davalidade e da eficácia do documentoestrangeiro no Brasil, pois acha-se inserido nocapítulo relativo à prova do fato jurídico, e nãoda sua validade contra terceiros, a qualrequer, aí sim, o competente registro, havendode vigorar, lado a lado, portanto, essadisposição do novo Código com a regrainsculpida na Lei dos Registros Públicos. Pelarejeição”.

Page 894: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

Nos termos do art. 225 doCódigo Civil, as reproduçõesfotográficas, cinematográficas, osregistros fonográficos e quaisqueroutras reproduções mecânicas oueletrônicas de fatos ou de coisasfazem prova plena destes, se aparte, contra quem foremexibidos, não lhes impugnar aexatidão. Mais uma vez, deve-secriticar o uso da expressãodestacada, conforme antesexposto.

Esse comando legal,novidade na codificação civil,equivalia ao art. 383 doCPC/1973, segundo o qual,

Page 895: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

“qualquer reprodução mecânica,como a fotográfica,cinematográfica, fonográfica oude outra espécie, faz prova dosfatos ou das coisas representadas,se aquele contra quem foiproduzida lhe admitir aconformidade. Parágrafo único.Impugnada a autenticidade dareprodução mecânica, o juizordenará a realização de examepericial”. O diploma civilaprimorava a regra processualanterior, estabelecendo que aforça probante das reproduçõesnão depende de autenticação portabelião, desde que a parte contra

Page 896: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

quem forem exibidas não lhesimpugnar a exatidão. Pela LeiProcessual Civil anterior, exigia-se que a parte contrária admitissea autenticidade das reproduções;já pelo Código Civil, essaautenticidade é presumida sempreque a parte contrária nãoimpugnar tais documentos. Trata-se, mais uma vez, de presunçãorelativa, ou iuris tantum, sendointeressante sempre a períciaquando houver dúvidas, na linhado que estava no parágrafo únicodo art. 383 da codificaçãoprocessual civil.

O último dispositivo foi

Page 897: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

ampliado pelo novo art. 422 doCPC/2015, aqui antes transcrito,que aprimora o tratamento,cuidando agora dos documentoseletrônicos obtidos na internet.Para abrandar mais ainda o texto,o novel preceito utiliza o termotem aptidão para fazer prova dosfatos em vez de faz prova dosfatos. A possibilidade deimpugnação do documento passaa compor cabeça da norma, e nãomais o seu parágrafo único.Deve-se entender, em diálogocom o Código Civil, que aautenticidade dos documentos épresumida relativamente, sempre

Page 898: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

quando não houver impugnaçãode alguém.

O § 1º do art. 422 do NovoCPC, como visto, trata dasfotografias digitais e dasextraídas da rede mundial decomputadores, fazendo prova dasimagens que reproduzem. Emsituações de sua impugnação,deverá ser apresentada arespectiva autenticação eletrônicaou, não sendo possível, realizadaperícia, para os devidos finsprobatórios. Seguindo, conformeo § 2º do novo art. 422 doCPC/2015, se se tratar defotografia publicada em jornal ou

Page 899: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

revista, será exigido um exemplaroriginal do periódico, se forimpugnada a sua veracidade pelaoutra parte. Por fim, todas essasregras são aplicadas à formaimpressa de mensagem eletrônica,conhecida popularmente como e-mail (art. 422, § 3º, doCPC/2015).

Encerrando o tratamentoquanto à prova documental,determina o art. 226 do CódigoCivil que os livros e fichas dosempresários e sociedades fazemprova contra as pessoas a quepertencem, e, em seu favor,quando, escriturados sem vício

Page 900: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

extrínseco ou intrínseco, foremconfirmados por outros subsídios.Como novidade, o Código Civilincorporou dispositivosanteriormente presentes noCódigo de Processo Civil de1973, particularmente nos seusarts. 378 a 382. Esses comandosequivalem, com algumasalterações de redação –especialmente pelo uso do termoempresarial, em substituição acomercial, com variantes –, aosarts. 417 a 421 do CPC/2015.Vejamos, em mais uma tabelacomparativa:

Page 901: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

Novo

Código deProcesso

Civil

Código deProcesso

Civil Anterior

“Art. 417. Oslivrosempresariaisprovam contraseu autor,sendo lícito aoempresário,todavia,demonstrar,por todos osmeiospermitidos emdireito, que os

“Art. 378. Oslivroscomerciaisprovam contrao seu autor. Élícito aocomerciante,todavia,demonstrar, portodos os meiospermitidos emdireito, que oslançamentos

Page 902: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

lançamentosnãocorrespondemà verdade dosfatos”.

nãocorrespondemà verdade dosfatos”.

“Art. 418. Oslivrosempresariaisquepreencham osrequisitosexigidos por leiprovam afavor de seuautor no litígioentreempresários”.

“Art. 379. Oslivroscomerciais, quepreencham osrequisitosexigidos por lei,provamtambém a favordo seu autor nolitígio entrecomerciantes”.

Page 903: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

“Art. 419. Aescrituraçãocontábil éindivisível, e,se dos fatosque resultamdoslançamentos,uns sãofavoráveis aointeresse deseu autor eoutros lhe sãocontrários,ambos serãoconsideradosem conjunto,comounidade”.

“Art. 380. Aescrituraçãocontábil éindivisível: sedos fatos queresultam doslançamentos,uns sãofavoráveis aointeresse deseu autor eoutros lhe sãocontrários,ambos serãoconsideradosem conjuntocomounidade”.

“Art. 420. O

“Art. 381. O

Page 904: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

juiz podeordenar, arequerimentoda parte, aexibiçãointegral doslivrosempresariais edosdocumentosdo arquivo:

juiz podeordenar, arequerimentoda parte, aexibiçãointegral doslivroscomerciais edosdocumentos doarquivo:

I – naliquidação desociedade;

I – naliquidação desociedade;

II – nasucessão pormorte de

II – nasucessão pormorte de

Page 905: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

sócio; sócio;

III – quando ecomodeterminar alei.

III – quando ecomodeterminar alei.

“Art. 421. Ojuiz pode, deofício, ordenarà parte aexibiçãoparcial doslivros e dosdocumentos,extraindo-sedeles a sumaque interessar

“Art. 382. Ojuiz pode, deofício, ordenarà parte aexibição parcialdos livros edocumentos,extraindo-sedeles a sumaque interessar

Page 906: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

ao litígio, bemcomoreproduçõesautenticadas”.

ao litígio, bemcomoreproduçõesautenticadas.

Como é notório, a ideia decomerciante foi substituída pelade empresário, especialmentepela revogação do CódigoComercial de 1850 pelo CódigoCivil de 2002, que incorporou amatéria nele tratada no seu livrosobre o Direito Empresarial,unificando parcialmente o Direitodas Obrigações.

Resumindo as regrasprevistas na lei processual

Page 907: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

anterior e emergente, constantesda tabela, e confrontando-as como que está na codificaçãoprivada, pode-se afirmar que oslivros e as fichas dos empresáriosprovam contra as pessoas a elesrelacionadas. Eventualmente, nãohavendo vícios confirmados, ainterpretação poderá serfavorável a essas pessoas,empresários, sócios eadministradores.

Continua ainda vigente aregra pela qual a escrituração éindivisível. Sendo alguns fatosresultantes dos lançamentosfavoráveis aos interesses de seu

Page 908: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

autor e outros desfavoráveis,ambos devem ser consideradosem conjunto, situação em que oaplicador do Direito apreciarácom equidade e razoabilidade.Em situações que envolvam ointeresse público e social, o juizpoderá ordenar, ex officio, aexibição parcial dos livros edocumentos, extraindo deles oque interessar ao litígio.

O art. 226 do Código Civilreproduz, ainda, regra contida noCódigo Comercial de 1850, orarevogada, segundo a qual osregistros lançados nos livrosempresariais fazem prova contra

Page 909: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

os empresários (art. 23). Porestar adaptada à teoria daempresa e à consolidação parcialdo Direito Privado, a codificaçãomaterial em vigor utiliza o termoempresários em vez decomerciantes, na linha do que foiexposto acima.

Por fim, a força probantedos livros e das fichasempresariais não é absoluta,sucumbindo diante das hipótesesem que a lei exige escriturapública ou documento particularpara a prova do fato, ato ounegócio jurídico (art. 226,parágrafo único, do CC/2002).

Page 910: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

Como exemplo do último caso –exigência de escrito particular –,pode-se citar a regra do art. 288do Código Civil de 2002, pelaqual a cessão de crédito somenteserá eficaz em relação a terceirosse forem observados os requisitosmínimos para o mandato (art.654, § 1º, do CC): a) a indicaçãodo lugar onde foi passado; b) aqualificação do cedente e docessionário;c) a data da outorga;e d) o objetivo da cessão, com adesignação e a extensão dospoderes e direitos transmitidos.

Em todas as hipóteses, aindapelo parágrafo único do art. 226

Page 911: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

do Código Civil, a prova podeser afastada (elidida) pelacomprovação da falsidade ouinexatidão dos lançamentos, viaperícia técnica. Mais uma vez, oCódigo Civil privilegia a buscada certeza, da segurança e daverdade real.

Logo em seguida, o CódigoCivil em vigor trata dastestemunhas, que são as pessoaschamadas a depor sobre fatos,visando a atestar a veracidade deato ou negócio jurídico. Astestemunhas convocadas a deporem juízo são denominadastestemunhas judiciárias. Fora

Page 912: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

dele, são chamadas detestemunhas instrumentárias asque se pronunciam sobredeterminado documento.

Iniciando o tratamentoquanto à prova testemunhal,previa o art. 227, caput, doCC/2002 que: “Salvo os casosexpressos, a provaexclusivamente testemunhal só seadmite nos negócios jurídicoscujo valor não ultrapasse odécuplo do maior salário mínimovigente no País ao tempo em queforam celebrados”. Cuidava odispositivo, especificamente, datestemunha instrumentária. Esse

Page 913: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

comando material, na realidade,repetia a regra do art. 401 doCPC/1973, segundo o qual, “aprova exclusivamente testemunhalsó se admite nos contratos cujovalor não exceda o décuplo domaior salário mínimo vigente noPaís, ao tempo em que foramcelebrados”. Acertadamente, comalcance mais genérico, acodificação civil utilizava aexpressão negócios jurídicos emvez de contratos, o que veio emboa hora. De acordo com oprincípio da operabilidade, nosentido de efetividade ouconcretude, o valor estava

Page 914: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

expresso em salários mínimos,afastando a possibilidade de ainflação ou a desvalorizaçãodeclinar a aplicação da regra,como ocorreu com o art. 141 doCC/1916, seu correspondente,que previa o valor de dez milcruzeiros.

O Novo Código de ProcessoCivil revoga expressamente esseart. 227, caput, do Código Civil,conforme consta do seu art.1.072. Além disso, nãoreproduziu o que estava no art.401 do Código de Processo Civilanterior. Em tom ampliado, onovo art. 442 do CPC/2015

Page 915: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

determina que a provatestemunhal é sempre admissível,não dispondo a lei de mododiverso.

Nesse contexto, a provatestemunhal passa a ser utilizadacomo meio de prova de negóciosjurídicos de qualquer valor.Parece não ter sentido apermanência, pois não houverevogação expressa, do parágrafoúnico do art. 227 do CódigoCivil, com a seguinte redação:“qualquer que seja o valor donegócio jurídico, a provatestemunhal é admissível comosubsidiária ou complementar da

Page 916: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

prova por escrito”. Ora, a provatestemunhal não será provasubsidiária, mas sempre meioprincipal e em todas as situaçõesconcretas, não importando mais ovalor do negócio jurídicocorrespondente.16

De qualquer modo, arevogação do caput do art. 227do CC/2002 vem em boa hora, nalinha de redução de burocracia ede busca da verdade real.Ademais, faz desaparecer umaexpressão de prova tarifada, pelaexigência de requisitos para aprova testemunhal. Todavia, podesurgir polêmica se uma lei

Page 917: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

processual tem o condão derevogar norma material.Possivelmente, esse debateexistirá nos próximos anos, entrecivilistas e processualistas.

O art. 228 do CC/2002 vedacomo testemunhas: a) os menoresde 16 anos (inciso I); b) aquelesque, por enfermidade ouretardamento mental, não tiveremdiscernimento para a prática dosatos da vida civil (inciso II); c)os cegos e surdos, quando aciência do fato que se quer provardependa dos sentidos que lhesfaltam (inciso III); d) ointeressado no litígio, o amigo

Page 918: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

íntimo ou o inimigo capital daspartes (inciso IV); e e) oscônjuges, os ascendentes, osdescendentes e os colaterais até oterceiro grau de alguma daspartes, por consanguinidade, ouafinidade (inciso V).

O Código Civil de 2002repetiu regra anteriormenteprevista no art. 142 do CC/1916,dispondo que “não podem seradmitidos como testemunhas” emsentido genérico, ao contrário doart. 405 do CPC/1973, queapresentava a divisão entreincapazes, impedidos e suspeitospara atuarem como testemunhas.

Page 919: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

Fez o mesmo o art. 447 doCPC/2015. Vejamos acomparação dos dois comandos:

Novo Código deProcesso Civil

Código de

Processo CivilAnterior

“Art. 447. Podemdepor comotestemunhas todasas pessoas, excetoas incapazes,impedidas oususpeitas.

“Art. 405. Podemdepor comotestemunhas todasas pessoas, excetoas incapazes,impedidas oususpeitas (redaçãodada pela Lei5.925, de

Page 920: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

01.10.1973).

§ 1º Sãoincapazes:

§ 1º São incapazes(redação dada pelaLei 5.925, de01.10.1973):

I – o interdito porenfermidade oudeficiênciamental;

I – o interdito pordemência (redaçãodada pela Lei5.925, de01.10.1973);

II – o que,acometido porenfermidade ou

II – o que,acometido porenfermidade, oudebilidade mental,

Page 921: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

retardamentomental, ao tempoem que ocorreramos fatos, não podiadiscerni-los, ou, aotempo em quedeve depor, nãoestá habilitado atransmitir aspercepções;

ao tempo em queocorreram osfatos, não podiadiscerni-los; ou, aotempo em quedeve depor, nãoestá habilitado atransmitir aspercepções(redação dada pelaLei 5.925, de01.10.1973);

III – o que tivermenos de 16(dezesseis) anos;

III – o menor de16 (dezesseis)anos (incluído pelaLei 5.925, de01.10.1973);

Page 922: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

IV – o cego e osurdo, quando aciência do fatodepender dossentidos que lhesfaltam.

IV – o cego e osurdo, quando aciência do fatodepender dossentidos que lhesfaltam (incluídopela Lei 5.925, de01.10.1973)

§ 2º Sãoimpedidos:

§ 2º São impedidos(redação dada pelaLei 5.925, de01.10.1973):

I – o cônjuge, ocompanheiro, oascendente e odescendente em

I – o cônjuge, bemcomo o ascendentee o descendenteem qualquer grau,ou colateral, até o

Page 923: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

qualquer grau e ocolateral, até oterceiro grau, dealguma das partes,porconsanguinidadeou afinidade, salvose o exigir ointeresse públicoou, tratando-se decausa relativa aoestado da pessoa,não se puder obterde outro modo aprova que o juizrepute necessáriaao julgamento domérito;

terceiro grau, dealguma das partes,porconsanguinidadeou afinidade, salvose o exigir ointeresse público,ou, tratando-se decausa relativa aoestado da pessoa,não se puder obterde outro modo aprova, que o juizrepute necessáriaao julgamento domérito (redaçãodada pela Lei5.925, de01.10.1973);

II – o que é parte

Page 924: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

II – o que é partena causa;

na causa (incluídopela Lei 5.925, de01.10.1973);

III – o queintervém em nomede uma parte,como o tutor, orepresentante legalda pessoa jurídica,o juiz, o advogadoe outros queassistam outenham assistido aspartes.

III – o queintervém em nomede uma parte,como o tutor nacausa do menor, orepresentante legalda pessoa jurídica,o juiz, o advogadoe outros, queassistam outenham assistido aspartes (incluídopela Lei 5.925, de01.10.1973).

Page 925: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

§ 3º São suspeitos:

§ 3º São suspeitos(redação dada pelaLei 5.925, de01.10.1973):

I – o condenadopor crime de falsotestemunho,havendo transitadoem julgado asentença (redaçãodada pela Lei5.925, de01.10.1973);

II – o que, porseus costumes, nãofor digno de fé

Page 926: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

(redação dada pelaLei 5.925, de01.10.1973);

I – o inimigo daparte ou o seuamigo íntimo;II – oque tiver interesseno litígio.

III – o inimigocapital da parte, ouo seu amigo íntimo(redação dada pelaLei 5.925, de01.10.1973);

IV – o que tiverinteresse no litígio(redação dada pelaLei 5.925, de01.10.1973).

§ 4º Sendo

§ 4º Sendoestritamente

Page 927: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

necessário, pode ojuiz admitir odepoimento dastestemunhasmenores,impedidas oususpeitas.§ 5º Osdepoimentosreferidos no § 4ºserão prestadosindependentementede compromisso, eo juiz lhes atribuiráo valor que possammerecer”.

necessário, o juizouvirá testemunhasimpedidas oususpeitas; mas osseus depoimentosserão prestadosindependentementede compromisso(art. 415) e o juizlhes atribuirá ovalor que possammerecer (redaçãodada pela Lei5.925, de01.10.1973)”.

A interpretação que esseautor seguia – e continuadefendendo – é a mesma antes

Page 928: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

exposta, ou seja, em momentos dedúvida, buscam-se as expressõesdetalhadas que constam da leiprocessual, que têm caráterespecial. Quanto às testemunhasimpedidas e suspeitas, terá plenasubsunção as regras dos §§ 4º e5º do novo diploma, semqualquer contaminação pela leicivil.

Desse modo, sendonecessário – e não maisestritamente necessário –, pode ojuiz admitir o depoimento dastestemunhas menores, impedidasou suspeitas. Entretanto, os seusdepoimentos serão prestados

Page 929: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

independentemente decompromisso e o juiz lhesatribuirá o valor que possammerecer. Pensamos quecontinuará a existir a figura dosinformantes do juízo, cujasoitivas são importantes paraformar o convencimento domagistrado no que concerne àlide.

Partindo para a análisepontual dos incisos do art. 228 doCódigo Civil, inicialmente, osmenores de 16 anos, menoresimpúberes e absolutamenteincapazes (art. 3º, III, do CC),não podem ser ouvidos como

Page 930: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

testemunhas. No CPC anterior,eram considerados comoincapazes para a prova (art. 405,§ 1º, inciso III), o que foireproduzido pelo Novo CPC (art.447, § 1º, inciso III). Para opresente autor, em casos tais, nãomerecerá subsunção a exceçãoreferente à oitiva comoinformante. Os maiores de 16anos e menores de 18 anos,apesar de menores púberes,podem ser ouvidos, desde quedemonstrem discernimento paratanto; premissa que deve ser tidacomo mantida com a emergênciada novel legislação instrumental.

Page 931: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

Para a adaptação do queconsta do art. 3º, inciso II, doCódigo Civil, não são admitidascomo testemunhas as pessoas que,por enfermidade mental, nãotiverem discernimento para aprática dos atos e negócios davida civil (art. 228, inciso II, doCC/2002). Deve-se compreenderque a expressão enfermidademental equivale à antiga loucosde todo o gênero, constante doCódigo Civil de 1916, optando olegislador pela troca de palavraspor entender que a anterior eradiscriminatória e afastada davalorização da dignidade da

Page 932: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

pessoa humana que consta dotexto constitucional (art. 1º, III, daCF/1988).

Em relação a essesincapazes, também houve umamudança no uso de expressões. OCPC anterior estabelecia queeram incapazes para testemunharos interditos por demência e osque, acometidos por enfermidade,ou debilidade mental, ao tempoem que ocorreram os fatos, nãopudessem discerni-los; ou, aotempo em que deveriam depor,não estariam habilitados atransmitir as suas percepções. Oart. 447, § 1º, inciso I, do Novo

Page 933: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

CPC, adaptado ao Código Civil,menciona os interditos porenfermidade ou deficiênciamental. O inciso seguinte passa aexpressar, também com termosmais claros e atuais, “o que,acometido por enfermidade ouretardamento mental, ao tempo emque ocorreram os fatos, não podiadiscerni-los, ou, ao tempo em quedeve depor, não está habilitado atransmitir as percepções”.

De acordo com o art. 228,inciso III, do Código Civil, nãopodem ser admitidos comotestemunhas os cegos e os surdos.Quanto aos últimos, que não

Page 934: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

podem expressar-se, não estãomais incluídos expressamentecomo absolutamente incapazes nacodificação material, preferindoo legislador referir-se a eles daseguinte forma: “os que, mesmopor causa transitória, nãopuderem exprimir sua vontade”(art. 3º, III, do CC/2002). Essadisposição ampla também inclui osurdo-mudo naquelas condições.Já o cego, por regra, éconsiderado capaz, salvosituações especiais. Porém, emrelação à condição de testemunha,há incapacidade nos dois casos,conforme os arts. 405, § 1º, inciso

Page 935: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

IV, do CPC/1973 e 447, § 1º,inciso IV, do CPC/2015, quevedam a possibilidade de apessoa testemunhar quando aciência do fato depender dossentidos que lhe faltam.

Os interessados no litígio,bem como os cônjuges,ascendentes, descendentes ecolaterais até terceiro grau, nãosão admitidos como testemunhas(art. 228, incisos IV e V, doCC/2002). A regra aplica-se tantoao parentesco consanguíneo (pais,avós, filhos, netos, irmãos e tios)como por afinidade (sogro, sogra,madrasta, padrasto, enteados e

Page 936: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

cunhados), e mesmo àqueledecorrente de parentesco civil(adoção, parentalidadesocioafetiva ou inseminaçãoartificial heteróloga).

Relativamente aos parentes,o Código de Processo Civilanterior estabelecia que eramimpedidos para testemunhar (art.405, § 2º, inciso I, do CPC/1973).Diante da proteção constitucionalda união estável, retirada do art.226, § 3º, da CF/1988, o NovoCPC incluiu menção aocompanheiro no seu art. 447, § 2º,inciso I, como ocorreu empraticamente todos os

Page 937: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

dispositivos que fazem menção aocônjuge. Consigne-se, apropósito, que assim vinhaentendendo a melhorjurisprudência, inclusive asuperior (por todos: STJ, REsp81.551/TO, Terceira Turma, Rel.Min. Waldemar Zveiter, j.23.09.1997).

Ainda de acordo com ajurisprudência, esclareça-se queos descendentes podem prestardepoimentos em causas queenvolvam o casamento ou a uniãoestável de seus ascendentes: “Ajurisprudência é pacífica noentendimento de que, a exemplo

Page 938: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

do que ocorre no direitocanônico, os descendentesprestem depoimento em causasmatrimoniais” (TJSP, Ap.224760, Rel. Barbosa Pereira,RF 248/201). Trata-se deaplicação da parte final dodispositivo em análise, oramantido, segundo o qual seadmite a prova testemunhal dosparentes tratando-se de causarelativa ao estado de pessoa, casonão se possa obter de outro modoa prova que o juiz reputenecessária ao julgamento domérito da demanda.

Relativamente ao

Page 939: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

interessado no litígio – primeiraparte do art. 228, inciso IV, doCódigo Civil –, há hipótese desuspeição, de acordo com o queestava art. 405, § 3º, inciso IV, doCPC/1973, confirmado pelo art.447, § 3º, inciso II, do CPC/2015.Destaque-se, a propósito, que nãose menciona mais, como suspeito,o condenado por crime de falsotestemunho, havendo transitadoem julgado a sentença (art. 405, §3º, inciso I, do CPC/1973). Issoporque a mentira declarada emuma demanda não pode,automaticamente, condenar aoutra; o que viola a ideia

Page 940: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

constitucional de presunção deinocência.

Não se declara tambémcomo suspeito aquele que, porseus costumes, não for digno de fé(art. 405, § 3º, inciso II, doCPC/1973), por não estar deacordo com a presunção de boa-fé que guia o sistema privado,seja o material e, agora, oprocessual. Manteve-se a mençãoao inimigo da parte – que nãoprecisa ser mais capital – e aoseu amigo íntimo (art. 405, § 3º,inciso III, do CPC/1973 e art.447, § 3º, inciso I, do CPC/2015).

Conforme o parágrafo único

Page 941: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

do art. 228 do Código Civil, foiampliada a possibilidade de seouvirem pessoas impedidas esuspeitas, a despeito do queconstava do art. 143 do CódigoCivil revogado. De qualquerforma, pelo tom genérico, ahipótese dos ascendentes porconsanguinidade ou afinidadeenquadra-se no parágrafo únicoora comentado, principalmenteem relação àquelas ações queenvolvam o nascimento e o óbitodos filhos. Não se pode esquecer,ademais, da viabilidade sempreexistente de oitiva de pessoascomo informantes do juízo,

Page 942: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

premissa mantida pelo § 5º donovo art. 447 do EstatutoProcessual.

Ainda sobre a provatestemunhal, previa o art. 229 doCódigo Civil que ninguém podeser obrigado a depor sobre fato:a) a cujo respeito, por estado ouprofissão, deva guardar segredo;b) a que não possa responder semdesonra própria, de seu cônjuge,parente em grau sucessível, ouamigo íntimo; c) que o exponha,ou às pessoas referidas no incisoantecedente, a perigo de vida, dedemanda, ou de dano patrimonialimediato. Pelo que constava

Page 943: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

anteriormente, no Código Civil de1916, percebia-se que o textomaterial anterior era genérico aoproteger o sigilo profissional e aética, em total consonância com oTexto Constitucional (art. 5º, XIV,da CF/1988). A regra anterior,constante do art. 144 doCC/1916, era de que “Ninguémpode ser obrigado a depor defatos, a cujo respeito, por estadoou profissão, deva guardarsegredo”. Sempre foi citado oexemplo do padre, que nãopoderia depor sobre fatos a elelevados pela confissão.

O então art. 229 do Código

Page 944: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

Civil de 2002 estava mais bemadaptado à lei processualanterior, particularmente ao art.406 do CPC/1973, que assimdispunha: “Art. 406. A testemunhanão é obrigada a depor de fatos: I– que lhe acarretem grave dano,bem como ao seu cônjuge e aosseus parentes consanguíneos ouafins, em linha reta, ou nacolateral em segundo grau; II – acujo respeito, por estado ouprofissão, deva guardar sigilo”.Em síntese, o Código Civil de2002 afastava a necessidade de apessoa depor em casos quepossam gerar a desonra própria,

Page 945: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

do seu cônjuge, parente em grausucessível – na linha reta, até oinfinito e na linha colateral atéquarto grau – ou amigo íntimo.Em todas essas situações, asregras também deveriam seraplicadas ao companheiro ou àcompanheira. Quanto à menção aoamigo íntimo, inovação entãofestejada, caberia ao juiz dacausa apreciar caso a caso. Umanamorada ou um namoradopoderia ser considerado comoamigo íntimo.

Porém, a exemplo do queocorreu com o caput do art. 227do Código Civil, o art. 229 da lei

Page 946: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

geral material também foirevogado expressamente pelo art.1.072, inciso II, do Novo Códigode Processo Civil. O teor do art.406 do CPC/1973 acabou por serreproduzido pelo art. 448 doCPC/2015, preceituando que atestemunha não é obrigada adepor sobre fatos: a) que lheacarretem grave dano, bem comoa seu cônjuge ou companheiro –mais uma vez incluído – e a seusparentes consanguíneos ou afins,em linha reta ou na colateral, atéo terceiro grau; e b) a cujorespeito, por estado ou profissão,deva guardar sigilo.

Page 947: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

Como se nota, foi mantida atutela relativa ao segredo daprofissão, e o clássico exemplodo padre e da confissão a elerealizada. Quanto à proteção dosinteresses pessoais da testemunhae dos seus parentes, o termograve dano – mais genérico –substituiu a ideia de desonra,mais específica. Por derradeiro, osistema processual nãoreproduziu o afastamento dadeclaração da testemunha que aexpunha, ou seus familiares, aperigo de vida, de demanda, oude dano patrimonial imediato. Aeste autor parece que tais

Page 948: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

conceitos podem perfeitamente seenquadrar no inciso I do art. 448,que menciona a possibilidadefutura de prejuízos, de qualquernatureza. Por isso, nos parece quenão havia a necessidade derevogação expressa do art. 229do Código Civil de 2002.

Superada a análise da provado negócio jurídico, o CódigoCivil, em seus arts. 230 a 232,tratava originalmente dasperícias e presunções. O termo éutilizado no passado, eis que oart. 230 também foi revogadotextualmente pelo art. 1.072,inciso II, do Novo CPC.

Page 949: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

Estabelecia esse diplomamaterial que “as presunções, quenão as legais, não se admitem noscasos em que a lei exclui a provatestemunhal”.

Como presunções devem seentendidas as deduções feitaspela lei, ou pelo aplicador dodireito, que partem de um fatoconhecido para chegar a algodesconhecido. Quando apresunção constar da lei, haverá apresunção legal. Por outro lado,haverá a presunção simples ouhominis quando deduzidas pelojuiz da causa ou pelo aplicadordo direito, deixadas ao seu livre

Page 950: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

critério, guiado pela equidade epela razoabilidade. As últimaspresunções não mereciamaplicação em todas as hipótesesem que a lei proibisse a provaexclusivamente testemunhal,como naqueles envolvendonegócios jurídicos com valorsuperior a dez salários mínimos,nos termos do também revogadoart. 227, caput, do CC/2002.Como esse último preceito foiretirado do sistema jurídicoexpressamente, não pareciaexistir mais fundamento para oart. 229, que tomou o mesmodestino.

Page 951: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

O último dispositivorevogado, porém, não afastava aadoção das presunções legais emcasos tais, classificadas comopresunções relativas (iuristantum), aquelas que admitemprova em contrário; e presunçõesabsolutas (iure et de iure), quenão admitem prova em contrário.As primeiras são mais comuns epodem ser observadas em váriosdispositivos da codificaçãomaterial privada, como no art.322 – presunção de pagamento –e no art. 1.597 – presunções depaternidade.

As últimas – presunções

Page 952: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

absolutas – são mais raras. Comoexemplo de presunção absoluta,pode ser apontada a presunçãoiure et de iure de vulnerabilidadedo consumidor, o que justifica aaplicação do Código de Defesado Consumidor, normaessencialmente protetiva. Nessalinha, Roberto Senise Lisboaaponta que “a presunção absolutade vulnerabilidade doconsumidor deve ser entendidanos limites propostos pelopróprio microssistemapositivado. Assim, entende-seque o consumidor é vulnerável‘no mercado de consumo’, isto é,

Page 953: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

quando sujeita-se às práticas deoferta, publicidade e defornecimento de produtos eserviços, bem como aos contratosreferentes à aquisição deles”.17 Aconclusão é retirada da análise doart. 4º, inciso I, da Lei8.078/1990.

Com a modificaçãoengendrada pelo novo sistemaprocessual, revogando-se o art.230 do Código Civil, tanto aspresunções relativas ou absolutas,sejam elas legais ou simples,podem ser amplamente aplicadaspelo juiz da causa, sem aexistência de qualquer restrição,

Page 954: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

o que merece aplausos.O art. 231 do Código Civil

traz regra importante e muitocomentada nos últimos tempos,enunciando que “aquele que senega a submeter-se a examemédico necessário não poderáaproveitar-se de sua recusa”. Nãohouve qualquer alteraçãoprovocada pela emergência doNovo Código de Processo Civil,que não traz comando comconteúdo semelhante. Então, tudocontinua como dantes...

Nesse dispositivo, a atualcodificação inovousubstancialmente, apresentando

Page 955: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

entendimento outrora consolidadona jurisprudência e relacionandoa presunção com a realização deperícia. Há no comando avedação de que a pessoa crie umasituação para dela tirar proveito(tu quoque). A máxima tuquoque, anexa à boa-fé objetiva,está relacionada com a regra deouro cristã, que enuncia: nãofaça contra o outro o que vocênão faria contra si mesmo. Aexpressão tem origem na frase dedor do Imperador romano JúlioCésar ao seu filho adotivo Brutus,que havia participado do atentadoque o vitimou, querendo dizer

Page 956: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

“Até tu?”.18

Apesar de o comando legalmencionar o exame médico emgeral, o dispositivo tem aplicaçãointensa e imediata às concreçõesenvolvendo o exame de DNA.Como é notório, tendo em vista aproteção dos direitos existenciaise de personalidade,particularmente dos direitos dequarta geração ou dimensão,ninguém pode ser obrigado afazer o referido exame, sendovedada qualquer forma decondução coercitiva determinadapor juiz. Ademais, continua emvigor o princípio pelo qual

Page 957: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

ninguém pode ser compelido afazer prova contra si mesmo.Porém, o Código Civil de 2002apresenta uma primeira presunçãono caso descrito, não podendo opai que se nega a fazer o exameaproveitar-se dessa recusa(presunção relativa ou iuristantum).

Nessa sintonia, há ainda noart. 231 do CC/2002 aconsagração da regra pela qualninguém pode beneficiar-se daprópria torpeza, o que écorolário da boa-fé. O objetivodo legislador é claro no sentidode, mais uma vez, buscar a

Page 958: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

certeza, a segurança jurídica e averdade real.

Completando essa regra,determina o art. 232 dacodificação civil que a recusa àperícia médica ordenada pelo juizpoderá suprir a prova que sepretendia obter com o exame,outra inovação constante da nossacodificação. A exemplo dodispositivo material que oantecede, esse artigo não foialterado pelo Novo CPC, que nãoconsagra conteúdo com o mesmoteor.

Desse modo, ainda em buscada verdade real, o Código Civil

Page 959: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

de 2002 apresenta presunçãorelativa (iuris tantum) em queaquele que se nega a fazer oexame médico ordenado pelo juizterá contra si a presunção daprova a que o exame almeja.Exemplificando, em tons práticos,contra o suposto pai que se nega afazer o exame haverá a presunçãorelativa da paternidade.Complementando, cite-se o teorda Súmula 301 do STJ, segundo aqual, “Em ação investigatória, arecusa do suposto pai a submeter-se ao exame de DNA induz apresunção juris tantum depaternidade”. Um dos julgados

Page 960: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

que gerou a súmula tratou de umcaso em que o suposto pai, pormais de dez vezes, se negou afazer o dito exame.

Mais recentemente, entrouem vigor a Lei 12.004/2009, queacrescentou à Lei 8.560/1992 oart. 2º-A, determinando que, “Naação de investigação depaternidade, todos os meioslegais, bem como os moralmentelegítimos, serão hábeis paraprovar a verdade dos fatos.Parágrafo único. A recusa do réuem se submeter ao exame decódigo genético – DNA gerará apresunção da paternidade, a ser

Page 961: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

apreciada em conjunto com ocontexto probatório”. Discute-sea necessidade prática dessa lei,eis que a conclusão do seuconteúdo já era retirada dosdispositivos do Código Civil aquicomentados e da jurisprudênciaconsolidada.

De toda a sorte, o que sepercebe, portanto, é que não cabemais como outrora, em açõesdesse tipo, a mera provatestemunhal, muitas vezes fundadano relacionamento plúrimo damãe com vários homens aomesmo tempo (exceptio pluriumconcubentium). Essa alegação,

Page 962: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

aliás, pode ser tida comovioladora da dignidade da mãe,podendo até ensejar a reparaçãodos danos morais por elasuportados.

Pela quase certeza absolutado exame de DNA, meio de provados mais eficientes, deve omagistrado determinar arealização do exame. Negando-seo suposto pai a fazer o exame deDNA, poderá o juiz valer-se dareferida presunção, baseadatambém em outros meiosprobatórios. Cabe ao juiz,portanto, a análise do casoconcreto. É interessante deixar

Page 963: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

claro que se trata de umapresunção relativa, afastada pelarealização posterior do exame deDNA. Por uma questão de bomsenso e pela igualdadeconsagrada no Texto Maior, o art.232 do CC/2002 também seaplica à mãe que eventualmentese nega a fazer a perícia médicavisando a identificar amaternidade, situação que setornou comum nos últimostempos, principalmente nashipóteses de troca de bebês emmaternidades e hospitais.Igualmente se aplica aossucessores do suposto pai que se

Page 964: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

negam a fazer o exame ou nãoautorizam a realização denecropsia do falecido, conformeentendeu o Tribunal de SantaCatarina:

“Agravo retido. Cerceamento de defesa.Oitiva de testemunhas. Prova realizada porprecatória. Nulidade refutada.Desprovimento. Apelação cível. Ação deinvestigação de paternidade. Reconhecimentorecaído em pessoa falecida. Negativa pura esimples dos herdeiros em realizar o exame deDNA. Presunção de paternidade. Exegesedos arts. 231 e 232 do Código Civil.Aplicação subsidiária da Súmula 301 do STJ.Sentença mantida. Apelo desprovido. Arecusa desprovida de justificativa dosherdeiros em realizar o exame de DNA, nasações de investigação de paternidade, faz

Page 965: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

incidir a redação dos arts. 231 e 232 doCódigo Civil, de modo que a paternidade doinvestigado convola-se em presumida” (TJSC,Acórdão 2007.060709-4, Rio do Sul, TerceiraCâmara de Direito Civil, Rel. Des. FernandoCarioni, DJSC 16.04.2008, p. 136).

Em relação ao últimodispositivo, foi feita proposta deenunciado na III Jornada deDireito Civil, in verbis: “Aperícia de que trata o art. 232 háde ser realizada por especialistaformado em medicina,justificando-se qualquer recusade submissão a tal exame sempreque os laboratórios e peritos nãopertencerem ao ramo de

Page 966: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

medicina”. Essa proposta deenunciado doutrinário, com o qualhá que se concordar, aplica-seprincipalmente aos exames feitosextrajudicialmente, emlaboratórios especializados, etraz no seu conteúdo a aplicaçãodo princípio da boa-fé para aperícia em questão. No entanto,infelizmente, o enunciadodoutrinário não foi aprovado pelacomissão da Parte Geral na IIIJornada de Direito Civil.

O exame de DNA vem sendoapontado pela doutrina e pelajurisprudência como meio deprova dos mais eficazes,

Page 967: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

justamente porque dá certezaquase absoluta da ausência ou dapresença do vínculo biológico.Compreendemos que oscomandos legais ora estudadosconstituem normas de ordempública, mantendo relação diretacom o princípio de proteção dadignidade da pessoa humana (art.1º, III, da CF/1988), bem comocom a igualdade entre filhos,havidos ou não da relação decasamento (art. 227, § 6º, daCF/1988 e art. 1.596 do CC).

Entretanto, uma questão degrande relevância prática podeser levantada a respeito do tema:

Page 968: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

pode o réu dessa ação negar-se afazer tal exame? Caso ocorra anegativa, caberá a prisão civil?Sobre esse tema, semprediscorreram muito bem PabloStolze Gagliano e RodolfoPamplona Filho.19 Lembram essesdoutrinadores contemporâneosque: “Em artigo publicado no sitedo Conselho da Justiça Federal, oMinistro Moreira Alvesponderou: ‘No Supremo TribunalFederal, não há muito, tivemosuma vasta discussão em habeascorpus, em que uma juíza haviadeterminado, debaixo de vara, acondução de um investigando de

Page 969: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

paternidade que se recusava aextrair sangue para efeito doexame de DNA. A juíza não tevedúvida e disse: conduza-se, aindaque à força. Ele alegava: tenhoterror e pânico até de injeção,quanto mais de tirar sangue.Depois de uma vasta discussão noPlenário do Supremo TribunalFederal, por 6 votos a 5,considerou-se que isso atingia umdireito de personalidade dele denão querer tirar sangue, mascorria contra ele, obviamente, apresunção de que realmente fosseo pai’”.20

Na situação descrita,

Page 970: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

percebe-se um claro choque entredireitos fundamentais ou depersonalidade: direito aoreconhecimento do vínculo depaternidade x direito àintegridade física e intimidade.Qual desses direitos deveprevalecer? A questão parecesimples, mas não o é. Deve-sefazer uma ponderação entre essesdireitos fundamentais, conformeprescreve o Enunciado n. 274 doCJF/STJ, da IV Jornada deDireito Civil, evento promovidopelo Conselho da Justiça Federale pelo Superior Tribunal deJustiça no ano de 2006: “Os

Page 971: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

direitos da personalidade,regulados de maneira nãoexaustiva pelo Código Civil, sãoexpressões da cláusula geral detutela da pessoa humana, contidano art. 1º, III, da Constituição(princípio da dignidade da pessoahumana). Em caso de colisãoentre eles, como nenhum podesobrelevar os demais, deve-seaplicar a técnica da ponderação”.

Vale lembrar, seguindo o quefoi desenvolvido no Capítulo 1desta obra, que a ponderaçãopassou a compor legalmente oNovo Código de Processo Civil,com grandes impactos para o

Page 972: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

futuro, de acordo com a precisadicção do seu art. 489, § 2º, inverbis: “No caso de colisão entrenormas, o juiz deve justificar oobjeto e os critérios gerais daponderação efetuada, enunciandoas razões que autorizam ainterferência na norma afastada eas premissas fáticas quefundamentam a conclusão”.

No caso descrito, há, de umlado, o direito do filho em saberquem é o seu pai, o que envolve asua dignidade (direito à verdadebiológica). Do outro, o direito àintegridade física e à intimidadegenética do suposto pai, o que

Page 973: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

também envolve a sua dignidade(direito à intimidade biológica).Ao presente autor parece nãoexistir outra saída que não seja aadoção da técnica de ponderaçãoou de pesagem.

Partindo para outra técnicapara a solução do problema,clássica, diga-se de passagem,nota-se um claro choque denormas de primeiro grau no planohierárquico, tido como umconflito propriamente dito, casode antinomia real, envolvendodois direitos da personalidade.Sendo assim, deve o aplicador dodireito buscar socorro nos arts. 4º

Page 974: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

e 5º da Lei de Introdução.Aplicando de forma imediata oprincípio de proteção dadignidade da pessoa humana (art.4º da Lei de Introdução c/c o art.1º, III, da CF/1988) e o fim socialda norma (art. 5º da Lei deIntrodução), conclui-se que acondução coercitiva do supostopai não pode ocorrer, pelaproteção indeclinável do direito àliberdade e à intimidade.Conforme aponta a melhordoutrina, que segue os citadoscritérios clássicos, “o pai pode senegar a fazer o teste, por ser umatentado à sua privacidade,

Page 975: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

imagem científica eintangibilidade corporal”.21

Desse modo, há a proteção dosdireitos de quarta geração oudimensão, aqueles relacionadoscom o patrimônio genético dapessoa humana, valorizada a suadignidade à luz do Texto Maior.Assim entendeu o SupremoTribunal Federal, em votaçãoapertada, conforme ementa aseguir transcrita:

“Investigação de paternidade. Exame DNA.Condução do réu ‘debaixo de vara’.Discrepa, a mais não poder, de garantiasconstitucionais implícitas e explícitas –preservação da dignidade humana, da

Page 976: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

intimidade, da intangibilidade do corpohumano, do império da lei e da inexecuçãoespecífica e direta de obrigação de fazer –provimento judicial que, em ação civil deinvestigação de paternidade, impliquedeterminação no sentido de o réu serconduzido ao laboratório, ‘debaixo de vara’,para coleta do material indispensável à feiturado Exame DNA. A recusa resolve-se noplano jurídico-instrumental, consideradas adogmática, a doutrina e a jurisprudência, noque voltadas ao deslinde das questões ligadasà prova dos fatos” (STF, HC 71.373/RS,Tribunal Pleno, Rel. Min. Francisco Rezek,Rel. p/ o acórdão Min. Marco Aurélio, j.10.11.1994, DJ 22.11.1996, p. 45.686, Ement.v. 1851-02, p. 397).

Como aponta MônicaAguiar, professora daUniversidade Federal da Bahia, o

Page 977: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

julgado acaba representando atutela do Habeas Genoma. Suaspalavras merecem destaque,propondo uma nova medidaprocessual para a proteção dosdados biológicos, que não foiadotada pelo Novo CPC,infelizmente:

“Outrossim, há que ressaltar que ainformação genética é única, singular, hajavista que todo indivíduo é geneticamenteirrepetível. Os dados dos genótipos sãoinalteráveis. (...) A proteção desse direito háde ser garantida pela construção de uminstrumento processual próprio intituladoHabeas Genoma, que deve serpreferencialmente preventivo para assegurarque não ocorra o acesso ilícito aos dadospessoais do genoma humano”.22

Page 978: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

Resumindo, ponderou-se afavor do direito do suposto pai,de forma majoritária. Contudo, háquem entenda que deveria terprevalecido o direito do filho.Nesse sentido, filia-se arenomada jurista Maria CelinaBodin de Moraes, que critica adecisão, pois haveria um abusode direito por parte do supostoréu no caso em questão. É o seuparecer: “o direito à integridadefísica configura verdadeirodireito subjetivo dapersonalidade, garantidoconstitucionalmente, cujo

Page 979: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

exercício, no entanto, se tornaabusivo se servir de escusa paraeximir a comprovação, acima dequalquer dúvida, de vínculogenético, a fundamentaradequadamente asresponsabilidades decorrentes darelação de paternidade”.23

De qualquer forma, mesmosendo esse o caminho, depreservação do direito doinvestigado, caso o suposto pai senegue a fazer o exame, correrácontra ele a presunção de quemantém o vínculo, de acordo comas regras previstas nos arts. 231 e232 do CC/2002, o que há tempos

Page 980: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

vem sendo aplicado pela melhorjurisprudência (Súmula 301 doSTJ). A título de exemplo, se umsuposto pai nega-se a fazer oexame por cinco vezes, correrácontra ele tal presunção. De todomodo, uma vez que a presunção érelativa, deve o juiz analisaroutras provas fáticas antes desentenciar a ação de investigaçãode paternidade. Esgotados todosos meios de prova, e sendodeterminada a nova realização doexame, negando-se mais uma vezo suposto pai, pode o juiz dacausa entender que a presunçãopassa a ser absoluta (iure et de

Page 981: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

iure). Tudo isso, reafirme-se, foimantido integralmente com aemergência do Novo CPC.

A encerrar o presentecapítulo, oportuno trazer paracomentários dois temas que nãoestavam tratados no Código deProcesso Civil de 1973 e quepassaram a ser regulados, comimportantes repercussões para odireito material: a utilização daata notarial como meio de provae a carga dinâmica da prova.

Em relação ao primeiroinstituto, o novo art. 384 doCPC/2015 preceitua que aexistência e o modo de existir de

Page 982: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

algum fato podem ser atestadosou documentados, a requerimentodo interessado, mediante atalavrada por tabelião. Conforme oúnico parágrafo da norma, dadosrepresentados por imagem ou somgravados em arquivos eletrônicospoderão constar da ata notarial.Pontue-se que, com importantesconsequências práticas, a atanotarial passou a ser admitidapara a prova da posse adusucapionem, visando àusucapião extrajudicial ouadministrativa (inclusão do novoart. 216-A na Lei de RegistrosPúblicos – Lei 6.015/1973).

Page 983: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

A elaboração de atasnotariais para prova de fatos já érealidade brasileira,especialmente para demonstrardocumentos que são encontradosna internet e cujo conteúdo podeser a vir retirado da grande redede computadores. Com bemobserva Fernanda Tartuce, “ante aefemeridade de dados e ocrescente uso de comunicaçõeseletrônicas, é de suma relevânciaregistrar elementos de provacolhidos no suporte digital, comovídeos, mensagens e imagenspostadas na internet. Nessecenário, registrar a ocorrência do

Page 984: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

fato pela ata notarial é umeficiente meio de perenizarinformações que podemdesaparecer. Por meio da atanotarial, o notário certificaocorrências e acontecimentoscom imparcialidade eautenticidade, pré-constituindoprova sobre páginas eletrônicas,sites ou outros documentoseletrônicos (como e-mails oumensagens de celular), fixandoum fato. Por esse meio também épossível provar fatos caluniosos,injúrias e difamações. Como sepercebe, trata-se de uma formainteressante de registro –

Page 985: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

sobretudo, porque é robustecidapela fé pública com que éconstituída. Sua eficácia juristantum tem o condão de transferiro ônus da prova àquele quepretender provar o equívococontido no documento público; talinversão do ônus probatório, porsi só, é causa suficiente para tirardos cobiçosos o desejo de, naesperança de sucesso, deduziremdemandas infundadas”.24

A doutrinadora demonstraem seu texto a importância da atanotarial para as demandas deDireito de Família – que recebeuum capítulo específico no Novo

Page 986: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

CPC, como ainda será estudado–, especialmente para osvulneráveis que tenhamdificuldade de produçãoprobatória, caso dosalimentandos. Cita, ainda, aviabilidade de sua utilização paraa prova de abusos cometidos porpais e para demonstrar atos dealienação parental.25 E arremata,com palavras às quais este autorse filia totalmente: “há muitosoutros fatos que foram e poderãoser objeto de ata notarial, como aconstatação de mensagem de textoem telefone celular e a existênciade mensagens em programa de

Page 987: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

comunicação pessoal na internet.A inventividade dos advogadosfoi e sempre será essencial paraimaginar e concretizar novaspossibilidades de uso da atanotarial em prol do direito deseus clientes e da concretizaçãodos princípios do Direito deFamília”.26

No que diz respeito à cargadinâmica da prova, era elaapontada como exceção àspremissas fixadas pelo art. 333do CPC/1973, no sentido de queo ônus da prova incumbia: a) aoautor da ação, quanto ao fatoconstitutivo do seu direito; b) ao

Page 988: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

réu, quanto à existência de fatoimpeditivo, modificativo ouextintivo do direito do autor.27

Sabe-se que essas premissasforam reafirmadas pelo art. 373,caput, do Novo CPC. Entretanto,sem prejuízos de outroscomandos que tratam da suaviabilidade, os seus parágrafospassaram a prescrever que “§ 1ºNos casos previstos em lei oudiante de peculiaridades da causarelacionadas à impossibilidadeou à excessiva dificuldade decumprir o encargo nos termos docaput ou à maior facilidade deobtenção da prova do fato

Page 989: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

contrário, poderá o juiz atribuir oônus da prova de modo diverso,desde que o faça por decisãofundamentada, caso em quedeverá dar à parte a oportunidadede se desincumbir do ônus quelhe foi atribuído. § 2º A decisãoprevista no § 1º deste artigo nãopode gerar situação em que adesincumbência do encargo pelaparte seja impossível ouexcessivamente difícil. § 3º Adistribuição diversa do ônus daprova também pode ocorrer porconvenção das partes, salvoquando: I – recair sobre direitoindisponível da parte; II – tornar

Page 990: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

excessivamente difícil a umaparte o exercício do direito”.

Sabe-se que a inversão doônus da prova tratada pelo art. 6º,inciso VIII, do Código de Defesado Consumidor representounotável avanço, teórico e prático,quanto à justa distribuição dosencargos probatórios, facilitandomuito as jornadas processuaisdos consumidores em suascontendas. Porém, era realmentenecessário estender a viabilidadede distribuição diferenciada dosencargos probatórios. Umahipótese a ser citada, inicialmentenão abrangida pela Lei

Page 991: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

8.078/1990, diz respeito aosaderentes contratuais que não sãoconsumidores.

Como é cediço, o contratode adesão não necessariamente éum contrato de consumo, comoreconhece o Enunciado n. 171,aprovado na III Jornada deDireito Civil, do Conselho daJustiça Federal e do SuperiorTribunal de Justiça. O contrato deadesão é aquele que temconteúdo imposto por uma daspartes – o estipulante – a outra –o aderente. O contrato deconsumo é aquele que atende aosrequisitos constantes dos arts. 2º

Page 992: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

e 3º do CDC, configurado pelofornecimento de produtos ou pelaprestação de serviços por umprofissional, que desenvolveatividade no mercado deconsumo, a um consumidor,destinatário final, fático eeconômico, do objeto do negócio.Muitos contratos contemporâneossão de adesão sem serem deconsumo, caso da franquia, dalocação imobiliária, da fiançatípica e da representaçãocomercial. Nota-se, em muitassituações envolvendo tais pactos,a presença de um aderentecontratual, submetido a um

Page 993: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

conteúdo negocial impostounilateralmente, abusivo eextorsivo, como regra.

Nesse diapasão, parece-nosplenamente viável a adoção dacarga dinâmica da prova, emprol desses sujeitos,especialmente para proteger opequeno empresário, que não éconsumidor, por utilizar aquelecontrato como fonte de produçãoe de rendas, não sendodestinatário final fático eeconômico do seu objeto. Ora,amplia-se a proteção do aderenteinaugurada pelo Código Civil de2002, sobretudo pelos seus arts.

Page 994: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

423 (“Quando houver no contratode adesão cláusulas ambíguas oucontraditórias, dever-se-á adotara interpretação mais favorável aoaderente”) e 424 (“Nos contratosde adesão, são nulas as cláusulasque estipulem a renúnciaantecipada do aderente a direitoresultante da natureza donegócio”).

Uma outra utilização dacarga dinâmica da prova dizrespeito, novamente, às ações deDireito de Família. Nessa linha,vejamos as palavras de CaetanoLagrasta, um dos pioneiros afazer tal correlação no Brasil:

Page 995: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

“No Direito de Família, com absoluta certeza,existe o momento da inversão do ônus e daaplicação da carga dinâmica da prova, comocorolários do princípio constitucional dagarantia da dignidade da pessoa humana, emaplicação extensiva do conceito de políticapública em seu mínimo existencial, coroando oreferido princípio na esfera processual, comotratamento igualitário das partes e, reitere-se,a afastar o retrocesso social.A discussão sobre este momento, numaprimeira abordagem, indica não poderultrapassar a fase instrutória, não só diante danatureza da causa, como em razão de suaevidente aplicação caso a caso. Desta forma,não será possível imaginar-se que ao definir ojuiz os pontos controvertidos da demanda,também na incansável busca por uma soluçãoconciliada, em tudo superior àquela dasentença, seja-lhe permitido recorrer aformalismos omissivos.Na linha de raciocínio da aplicação depolíticas públicas ao Direito de Família

Page 996: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

(Lagrasta, 2011) delongas ou omissões irãoconfigurar um retrocesso social, seja porproteger aquele que possuir melhorcapacidade técnica ou econômica, emevidente prejuízo da parte hipossuficiente ouvulnerável. Para Watanabe (2011)independeria até mesmo de sua situaçãoeconômica, diante da manifestavulnerabilidade (op. cit., p. 8) – pois, aorecusar o magistrado a aplicação correta doprincípio da carga dinâmica da prova,assumiria atitude de indisfarçável comodismoou formalismo retrógrado.Assim, no mais das vezes, por evidentevulnerabilidade, a recusa nas ações dealimentos, a ser apreciada antes doencerramento da fase probatória, afeta asobrevivência ou desenvolvimento doalimentando ou da prole, por fazer prevalecero interesse da parte mais capacitada técnicaou economicamente sobre o direito àdignidade dos credores.Outra não é a situação quando do surgimento

Page 997: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

da desconsideração da pessoa jurídica inversaou da pessoa física, quando o participante darelação omite bens, transferindo-os para afamília ou, na condição inversa, os atribui aterceiro para prejudicar o cônjuge oucompanheiro. Ao agir com dolo intenso –característica da fraude – estabelece nexo decausalidade que permite, além dasreprimendas processuais, a indenização pordanos morais”.28

O texto transcrito conta como total apoio do presente autor,cabendo destacar as exataspalavras ditas sobre adesconsideração inversa dapersonalidade jurídica, queigualmente recebeu tratamentoespecífico no Novo Código de

Page 998: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

Processo Civil e estádesenvolvido no Capítulo 2 destelivro.

Acredita-se que a cargadinâmica da prova e a ampliaçãoda sua inversão tornarão maisjusto e efetivo o DireitoProcessual Civil no Brasil, emprol daqueles que merecem serprotegidos. Pensamos que otempo e a prática demonstrarãoessa afirmação logo nos anosiniciais de vigência do NovoCPC.

Page 999: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

__________1 BEVILÁQUA, Clóvis.Comentários ao Código Civil. 4. ed.Rio de Janeiro: Francisco Alves, 1972.v. 1, p. 260.2 CÂMARA, Alexandre Freitas.Lições de Direito Processual Civil. 9.ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2004.v. II, p. 397.3 VENOSA, Sílvio de Salvo. DireitoCivil. Parte Geral. 3. ed. São Paulo:Atlas, 2003. v. 1, p. 549.4 DIDIER JR., Fredie. RegrasProcessuais no novo Código Civil.São Paulo: Saraiva, 2004. p. 37.5 CÂMARA, Alexandre Freitas.Lições de Direito Processual Civil. 9.ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2004.v. II, p. 407.

Page 1000: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

6 Por todos, ver: TARTUCE,Fernanda. Meios de Prova no Códigode Processo Civil e no Código Civil. In:TARTUCE, Flávio; CASTILHO,Ricardo. Direito Civil. DireitoPatrimonial. Direito Existencial. SãoPaulo: Método, 2006. p. 163-175.7 CÂMARA, Alexandre Freitas.Lições de Direito Processual Civil. 9.ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2004.v. II, p. 407.8 CARVALHO NETO, Inacio de.Curso de Direito Civil Brasileiro.Curitiba: Juruá, 2006. v. I, p. 519.9 VENOSA, Sílvio de Salvo. DireitoCivil. Parte Geral. 4. ed. São Paulo:Atlas, 2004. v. I, p. 572.10 Conforme palestra ministrada em20 de janeiro de 2014, sobre o

Page 1001: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

tratamento das provas no Novo CPC,no curso intitulado O Novo CPC esuas Repercussões para o DireitoCivil, por nós coordenado, promovidopela Associação dos Advogados deSão Paulo (AASP) e pela a EscolaNacional da Advocacia do ConselhoFederal da OAB. O curso foiministrado nos sistemas presencial etelepresencial.11 O sistema de provas tarifadas foicriticado por Daniel AmorimAssumpção Neves, no evento antesmencionado (palestra ministrada em 20de janeiro de 2014, no curso intituladoO Novo CPC e suas Repercussõespara o Direito Civil, promovido pelaAssociação dos Advogados de SãoPaulo e pela a Escola Nacional daAdvocacia do Conselho Federal daOAB).

Page 1002: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

12 DINIZ, Maria Helena. CódigoCivil Anotado. 11. ed. São Paulo:Saraiva, 2005. p. 258.13 DINIZ, Maria Helena. CódigoCivil Anotado. 11. ed. São Paulo:Saraiva, 2005. p. 257.14 SANTOS, Antonio Jeová. DireitoIntertemporal e o Novo CódigoCivil. São Paulo: Saraiva, 2003. p. 122.15 Sobre o tema, ver: DINIZ, MariaHelena. Conflito de Normas. SãoPaulo: Saraiva, 2003.16 Seguindo crítica formulada porDaniel Amorim Assumpção Neves napalestra ministrada em 20 de janeiro de2014, sobre o tratamento das provas noNovo CPC, no curso intitulado ONovo CPC e suas Repercussõespara o Direito Civil. Como

Page 1003: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

destacado, o curso foi por nóscoordenado, promovido pelaAssociação dos Advogados de SãoPaulo (AASP) e pela a EscolaNacional da Advocacia do ConselhoFederal da OAB.17 LISBOA, Roberto Senise.Responsabilidade Civil nas Relaçõesde Consumo. São Paulo: RT, 2001. p.85.18 GODOY, Cláudio Luiz Bueno de.Função Social do Contrato. SãoPaulo: Saraiva, 2004. p. 88.19 GAGLIANO, Pablo Stolze;PAMPLONA FILHO, Rodolfo. NovoCurso de Direito Civil. 4. ed. SãoPaulo: Saraiva, 2003. v. I, p. 455.20 GAGLIANO, Pablo Stolze;PAMPLONA FILHO, Rodolfo. Novo

Page 1004: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

Curso de Direito Civil. 4. ed. SãoPaulo: Saraiva, 2003. v. I, p. 455.21 DINIZ, Maria Helena. Curso deDireito Civil Brasileiro – Direito deFamília. 18. ed. São Paulo: Saraiva,2003. v. 5.22 AGUIAR, Mônica. Direito àIntimidade Genética em Face do Art.232 do Código Civil e sua Defesa pelaCriação de um Habeas Genoma. In:DIDIER JR., Fredie; MAZZEI,Rodrigo (coord.). Prova, ExameMédico e Presunção. O Art. 232 doCódigo Civil. Salvador: Juspodivm,2006. p. 203.23 MORAES, Maria Celina Bodin de.Recusa à Realização do Exame deDNA na Investigação de Paternidadee Direitos da Personalidade. In:

Page 1005: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

BARRETO, Vicente. A NovaFamília: Problemas e Perspectivas.Rio de Janeiro: Renovar, 1997. p. 194.24 TARTUCE, Fernanda. Prova nosProcessos de Família e no Projeto doCPC: Ônus da Prova, Provas Ilícitas eAta Notarial. Revista Nacional deDireito de Família e Sucessões PortoAlegre: Lex Magister, n. 2, set./out.2014, p. 48-49.25 TARTUCE, Fernanda. Prova nosProcessos de Família e no Projeto doCPC: Ônus da Prova, ProvasIlícitas eAta Notarial. Revista Nacional deDireito de Família e Sucessões, PortoAlegre: Lex Magister, n. 2, set./out.2014, p. 50.26 TARTUCE, Fernanda. Prova nosProcessos de Família e no Projeto do

Page 1006: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

CPC: Ônus da Prova, ProvasIlícitas eAta Notarial. Revista Nacional deDireito de Família e Sucessões, PortoAlegre: Lex Magister, n. 2, set./out.2014, p. 51.27 Sobre o tema: ZANETTI, PauloRogério. Flexibilização das Regrassobre o Ônus da Prova. São Paulo:Malheiros, 2001; GRINOVER, AdaPelegrini; WATANABE, Kazuo;LAGRASTA, Caetano (coord.).Mediação e Gerenciamento doProcesso. São Paulo: Atlas, 2007.28 LAGRASTA NETO, Caetano.Carga Dinâmica da Prova. A Partevulnerável. In: LAGRASTA NETO,Caetano; TARTUCE, Flávio; SIMÃO,José Fernando. Direito de Família.Novas Tendências e JulgamentosEmblemáticos. 2. ed. São Paulo: Atlas,

Page 1007: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

2012. p. 344-345.

Page 1008: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

DASCONSEQUÊNCIAS DO

NOVO CÓDIGO DEPROCESSO CIVIL

PARA A TEORIAGERAL DAS

OBRIGAÇÕES

Page 1009: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

Como ocorria com o seuantecessor, o Novo Código deProcesso Civil traz váriasconsequências para a TeoriaGeral das Obrigações,especialmente para asmodalidades obrigacionaistratadas entre os arts. 233 a 285do Código Civil brasileiro de2002. A lei material, entre taisdispositivos, consagra aclassificação das obrigaçõesquanto à prestação – obrigaçõesde dar, de fazer e de não fazer –,e trata também das obrigaçõesalternativas, divisíveis eindivisíveis, e solidárias,

Page 1010: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

exatamente nessa ordem.Começando pelas

obrigações alternativas oudisjuntivas, estas são as que seapresentam com duas ou maisprestações – obrigaçõescompostas objetivas –, sendocerto que apenas uma delas deveser cumprida pelo devedor. Emoutras palavras, essa obrigação éidentificada pela conjunção ou.Diferem-se das obrigaçõesconjuntivas ou cumulativas, quetambém são compostas objetivas,com mais de uma prestação,sendo certo que todas elas devemser cumpridas pelo devedor, sob

Page 1011: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

pena de configuração da mora oudo inadimplemento absoluto(identificadas pela conjunção e).

Nas obrigações alternativas,a escolha de qual prestação deveser cumprida cabe ao devedor,salvo se o contrário foideterminado pela lei ou pelaspartes (art. 252 do CC/2002). Atítulo de exemplo, o instrumentoobrigacional pode estabelecer odireito de escolha ao credor paraconcentrar o objeto da relaçãojurídica. Eventualmente,conforme dois parágrafos doúltimo preceito, a escolha podeser efetuada por um terceiro, ou

Page 1012: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

até pelo juiz. Na dicção do § 3ºdo art. 252 do CC/2002, no casode pluralidade de optantes, nãohavendo acordo unânime entreeles, decidirá o juiz, findo oprazo por este assinado para adeliberação das partes. Nostermos do § 4º do mesmodiploma, se o título deferir aopção a terceiro, e este nãoquiser, ou não puder exercê-la,caberá ao juiz a escolha se nãohouver acordo entre as partes. Asnormas civis foram elaboradas nadécada de 70 do século XX,quando o mote era o pleno acessoà justiça. Atualmente, ainda mais

Page 1013: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

com o que foi consagrado peloNovo CPC, os comandos estão nacontramão da tendência dedesjudicialização das contendas.Tanto isso é verdade que osúltimos diplomas nãoencontraram a devida efetivaçãoprática nos mais de dez anos dacodificação material de 2002.

Partindo para o seutratamento processual, prevê oart. 800, caput, do Código deProcesso Civil de 2015 que, nasobrigações alternativas, quando aescolha couber ao devedor, esteserá citado para exercer a opçãoe realizar a prestação dentro de

Page 1014: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

dez dias, se outro prazo não lhefoi determinado em lei ou nocontrato. A norma é repetição doart. 571 do antigo CPC, regulandouma consequência natural daescolha efetuada pelo devedorcomo premissa-regra, uma dasconcretizações da antiga máximaromana segundo a qual o sistemajurídico deve tutelar o sujeitopassivo obrigacional (in favordebitoris). Percebe-se claramenteque os diplomas são normas deordem privada ou dispositivas,pela possibilidade de convençãode um prazo diferente dos dezdias.

Page 1015: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

Também sem qualquernovidade, conforme o § 1º do art.800 do Novo CPC, a opção deescolha será devolvida ao credor,se o devedor não a exercer noprazo determinado, após sercitado para tanto na açãocorrespondente. A escolha seráindicada na petição inicial daexecução quando couber aocredor exercê-la, o que decorredessa atribuição dada pela lei aosujeito ativo obrigacional comoexceção (§ 2º do art. 800 doCPC/2015).

Mais à frente, o NovoCódigo de Processo Civil trata

Page 1016: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

das obrigações de fazer e de nãofazer, com uma regra em comum(art. 814), seguido por umaregulamentação em separado dasduas categorias. Ainda, existempreceitos importantes relativos aessas categorias e também quantoàs obrigações de dar na seçãorelativa ao “Julgamento dasAções Relativas às Prestações deFazer, de não Fazer e de EntregarCoisa” (arts. 497 a 501 doEstatuto Processual emergente).

As obrigações de fazer sãopositivas, tendo como objeto umatarefa a ser desempenhada poralguém, podendo ser infungíveis –

Page 1017: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

insubstituíveis, personalíssimasou intuitu personae – oufungíveis – substituíveis. Osexemplos típicos de negócios quetrazem tais obrigações positivascomo conteúdo são os contratosde prestação de serviços e deempreitada, enquadrando-se nasduas variações descritas, deacordo com a sua essência emconformidade com a pactuaçãoentre as partes.

O art. 247 do CC/2002 tratadas obrigações de fazerinfungíveis ao preceituar que,negando-se o devedor ao seucumprimento, estas se convertem

Page 1018: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

em obrigação de dar, devendo osujeito passivo arcar com asperdas e danos, incluídos osdanos materiais ou patrimoniais(arts. 402 a 404 do CC/2002) eos danos morais (art. 5º, V e X,da CF/1988). Contudo, antes depleitear indenização, o credorpoderá requerer o cumprimentoda obrigação de fazer nas suasduas modalidades, por meio deuma tutela específica com afixação de multa ou astreintespelo juiz, o que era retirado doantigo art. 461 do CPC/1973.

No Estatuto Processualemergente, essa consequência

Page 1019: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

consta, sem prejuízo de outroscomandos, do novo art. 814,dispositivo inicial e comum paraas obrigações de fazer e de nãofazer, como visto. Nos termos dodiploma, na execução deobrigação de fazer ou de nãofazer fundada em títuloextrajudicial, ao despachar ainicial, o juiz fixará multa porperíodo de atraso no cumprimentoda obrigação e a data a partir daqual será devida. Emcomplemento, conforme o seuparágrafo único, se o valor damulta estiver previsto no título efor excessivo, o juiz poderá

Page 1020: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

reduzi-lo. A redução da multasegue a linha material de reduçãoequitativa das penalidades,prevista no art. 413 do CódigoCivil. Para o presente autor,continua tendo plena aplicação oteor da Súmula 410 do SuperiorTribunal de Justiça, de novembrode 2009, com a seguinte redação:“A prévia intimação pessoal dodevedor constitui condiçãonecessária para a cobrança demulta pelo descumprimento deobrigação de fazer ou não fazer”.

Nunca se pode esquecer que,presente uma relação de consumo,a tutela específica para

Page 1021: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

cumprimento das obrigações defazer e de não fazer, inclusivecom a mesma viabilidade demulta, consta do art. 84 doCódigo de Defesa doConsumidor, com a seguintedicção: “Na ação que tenha porobjeto o cumprimento daobrigação de fazer ou não fazer, ojuiz concederá a tutela específicada obrigação ou determinaráprovidências que assegurem oresultado prático equivalente aodo adimplemento. § 1º Aconversão da obrigação emperdas e danos somente seráadmissível se por elas optar o

Page 1022: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

autor ou se impossível a tutelaespecífica ou a obtenção doresultado prático correspondente.§ 2º A indenização por perdas edanos se fará sem prejuízo damulta (art. 287 do Código deProcesso Civil). § 3º Sendorelevante o fundamento dademanda e havendo justificadoreceio de ineficácia doprovimento final, é lícito ao juizconceder a tutela liminarmente ouapós justificação prévia, citado oréu. § 4º O juiz poderá, nahipótese do § 3º ou na sentença,impor multa diária ao réu,independentemente de pedido do

Page 1023: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

autor, se for suficiente oucompatível com a obrigação,fixando prazo razoável para ocumprimento do preceito. § 5ºPara a tutela específica ou para aobtenção do resultado práticoequivalente, poderá o juizdeterminar as medidasnecessárias, tais como busca eapreensão, remoção de coisas epessoas, desfazimento de obra,impedimento de atividade nociva,além de requisição de forçapolicial”. Todos esses preceitoscontinuam em pleno vigor, nãotendo sido atingidos oumodificados pelo Novo Código

Page 1024: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

de Processo Civil.Quanto à obrigação de fazer

fungível, continuamos a entenderque são possíveis as astreintessomente em relação ao devedororiginário, o que visa àconservação do negócio assumidoentre as partes. A conversão emperdas e danos deve ser somenteadmitida em hipótesesexcepcionais, para a preservaçãoda autonomia privada e amanutenção do pacto celebrado.Não se olvide que o princípio daconservação negocial mantémíntima relação com o princípio dafunção social dos contratos, o que

Page 1025: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

é reconhecido pelo Enunciado n.22 do CJF/STJ, aprovado na IJornada de Direito Civil,realizada em 2002.

Segundo o art. 248 doCódigo Civil, caso a obrigaçãode fazer, nas duas modalidades(fungível ou infungível), torna-seimpossível, sem culpa dodevedor, resolve-se a obrigaçãosem a necessidade de pagamentode perdas e danos, assim comoocorre em decorrência de casofortuito (evento totalmenteimprevisível) ou de força maior(evento previsível, masinevitável). Nessas duas

Page 1026: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

hipóteses, como é notório,exceção deve ser feita ao devedorem mora, que responderá poresses eventos, conforme o art.399 da codificação materialvigente, a não ser que proveausência total de culpa ou que oevento aconteceria mesmo se nãoestivesse em mora com aobrigação. A propósito, sobre oart. 248 do CC/2002, entendeu oSuperior Tribunal de Justiça, emconcreção interessante, que,“resolve-se, por motivo de forçamaior, o contrato de promessa decompra e venda sobre o qualpendia como ônus do vendedor a

Page 1027: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

comprovação do trânsito emjulgado de ação de usucapião, nahipótese em que o imóvel objetodo contrato foi declaradoterritório indígena por decretogovernamental publicado após acelebração do referido contrato.Sobrevindo a inalienabilidadeantes do implemento da condiçãoa cargo do vendedor, não há falarem celebração do contratoprincipal de compra e venda, nãose caracterizando como contratodiferido, nem incidindo a teoriada imprevisão. Trata-se de nãoperfazimento de contrato pordesaparecimento da aptidão do

Page 1028: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

bem a ser alienado (art. 248 doCC)” (STJ, REsp 1.288.033/MA,Rel. Min. Sidnei Beneti, j.16.10.2012, publicado no seuInformativo n. 507).

Por outro lado, nos termosdo mesmo art. 248 do CódigoCivil, em havendo culpa dodevedor no descumprimento daobrigação de fazer, este deveráarcar com os danos presentes nocaso concreto. A culpa – não sónesse preceito, mas também emoutros relativos à teoria geral dasobrigações – deve ser entendidaem sentido amplo ou lato sensu,englobando o dolo (intenção de

Page 1029: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

descumprimento) e a culpa strictosensu (ato praticado emimprudência, negligência ouimperícia).

Por outra via, o art. 249 doCC/2002 é o que apresenta oconceito de obrigação de fazerfungível, aquela substituível e quepode ser cumprida por terceiro àcusta do devedor originário.Nessa modalidade obrigacional,resta ainda uma opção ao credor,antes da conversão da obrigaçãoem perdas e danos, que é a deexigir que outra pessoa cumpracom a obrigação, conforme osprocedimentos que sempre

Page 1030: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

estiveram tratados no Código deProcesso Civil, e que serão aseguir estudados.

O parágrafo único dessediploma material trouxe umanovidade para o sistema jurídicoao determinar que, “em caso deurgência, pode o credor,independentemente de autorizaçãojudicial, executar ou mandarexecutar o fato, sendo depoisressarcido”. Trata-se de umaespécie de autotutela civil paracumprimento das obrigações defazer fungíveis que recebeucríticas nos anos iniciais dacodificação material, devido aos

Page 1031: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

perigos que a autotutela podetrazer. Todavia, essa medida estána linha principiológica adotadapelo Novo CPC, que é dedesjudicialização das contendasde disputas. Em havendo abusono exercício dessa autotutela,serve como controle o art. 187 doCódigo Civil, que veda o abusode direito como ato ilícito,prescrevendo que também cometeato ilícito o titular de um direitoque, ao exercê-lo, excedemanifestamente os limitesimpostos pelo fim social oueconômico, pela boa-fé ou pelosbons costumes.

Page 1032: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

Esclareça-se que a situaçãode urgência necessita estardevidamente provada eevidenciada para que sejaaplicada essa autotutela civil doart. 249, parágrafo único, doCódigo Civil. Nessa linha, dajurisprudência estadual, parailustrar:

“Direito processual civil. Processo deexecução. Pressupostos processuais. Títuloexecutivo. Ausência. Nulidade. Execução porquantia certa fundada em acordo onde odevedor assumiu obrigação de fazer e não depagar a quantia exigida. Credor que mandaexecutar o fato sem ingressar em juízo.Situação de urgência não demonstrada. Art.249, parágrafo único, do Código Civil.Necessidade de autorização judicial.

Page 1033: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

Impossibilidade de tomar o valor doressarcimento pretendido como líquido e certopara amparar a execução, seja porquedesprovido de qualquer prova, seja porquenão resultou de conversão feita pelo juízo nodevido processo legal. Ressarcimento quedepende de verificação em processo deconhecimento. Multa diária prevista noacordo que não se mostra líquida e certa,diante da confessada recusa da credora empermitir o acesso dos funcionários darecorrente que para lá se deslocaram a fim deexecutar a obrigação de fazer. Possibilidadede levantamento da importância depositadaem favor da recorrida, eis que declaradaincontroversa pelo depositante. Prejudicado orecurso. Execução extinta de ofício” (TJRS,Recurso Cível 47289-79.2013.8.21.9000,Porto Alegre, Terceira Turma Recursal Cível,Rel. Des. Cleber Augusto Tonial, j.24.07.2014, DJERS 29.07.2014).

Page 1034: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

“Condomínio. Agravo de instrumento contra adecisão que, em demanda cominatória,autorizou a proprietária a contratar, aexpensas do condomínio, os serviçosnecessários ao reparo dos vazamentosocorridos em seu imóvel. Embora existaindicativo de que o agravante não realizouadequada manutenção da área comum docondomínio, certo é que, após a propositurada presente demanda, o condomínio não semanteve inerte. Tanto é assim que o peritoconfirmou a adequação dos primeiros reparos,que, entretanto, não foram suficientes para asolução da infiltração em virtude de novascausas supervenientes (telhas desalinhadas eoxidação do duto de extravasamento da caixad’água), noticiadas no transcorrer dademanda. Diante deste cenário, não seevidencia mora a facultar à agravada arealização de reparos, ‘às suas expensas epor sua conta’, com reembolso posterior pelocondomínio. Tampouco se vislumbra caso deurgência, nos termos do disposto no art. 249

Page 1035: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

do Código Civil. Nessas condições, melhorque a tutela seja cumprida pelo próprioagravante. Agravo interno contra decisão quedeferiu efeito suspensivo ao agravo deinstrumento. Interposição com fundamento noart. 557, § 1º- A, do Código de ProcessoCivil. O exame das razões recursais restouprejudicado diante do julgamento do agravode instrumento que ensejou o presenterecurso. Não cabe o agravo interno contra adecisão do relator que indefere a tutelarecursal ao agravo de instrumento (art. 527,parágrafo único, do Código de ProcessoCivil). Recurso parcialmente provido apenaspara afastar o deferimento da tutela no pontoem que se autorizou a agravada a contratar, aexpensas do agravante, os serviçosnecessários ao reparo dos vazamentos einfiltrações do condomínio, que deve cumprira tutela ratificada na sentença. Agravoregimental não conhecido” (TJSP, Embargosde Declaração 2062876-06.2013.8.26.0000/50001, Acórdão 7511666,

Page 1036: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

São Paulo, Décima Câmara de DireitoPrivado, Rel. Des. Carlos Alberto Garbi, j.11.03.2014, DJESP 16.05.2014).

Partindo para as regrasespecíficas relativas àsobrigações de fazer noCPC/2015, preceitua o seu art.815 que, quando o objeto daexecução for obrigação de fazer,o executado será citado parasatisfazê-la no prazo que o juizlhe designar, se outro não estiverdeterminado no título executivo.Essa norma tem aplicação para asduas modalidades de obrigaçõesde fazer expostas, fungíveis ouinfungíveis, sendo praticamente

Page 1037: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

uma repetição do art. 632 doCPC/1973.

Igualmente, sem qualqueralteração e equivalendo ao art.633 do CPC/1973, dispõe o art.816 do Novo Codex que, se oexecutado não satisfizer aobrigação no prazo designado, élícito ao exequente, nos própriosautos do processo, requerer asatisfação da obrigação à custado executado ou perdas e danos,hipótese em que se converterá emindenização. O valor das perdas edanos será apurado emliquidação, seguindo-se aexecução para cobrança de

Page 1038: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

quantia certa. Como há menção aocumprimento por terceiro, à custado executado, conclui-se que oartigo trata das obrigações defazer fungíveis ou substituíveis,consagrando a antes citadaconversão em perdas e danos ouem obrigação de dar.

O art. 817 do CPC/2015correspondente ao art. 634 doCPC/1973, que já havia passadopor alteração recente. Nos termosdo novo e do superado comando,se a obrigação puder ser satisfeitapor terceiro – obrigação de fazerfungível –, é lícito ao juizautorizar, a requerimento do

Page 1039: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

exequente, que aquele a satisfaçaà custa do executado. Emcomplemento, conforme oparágrafo único das normas, oexequente adiantará as quantiasprevistas na proposta que,ouvidas as partes, o juiz houveraprovado.

Como é notório, houve umamudança substancial no art. 634do CPC/1973 pela Lei11.382/2006. Em sua redaçãooriginal e anterior, enunciava odispositivo que, se o fato pudesseser prestado por terceiros, serialícito ao juiz, a requerimento docredor, decidir que aqueles o

Page 1040: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

realizassem à custa do devedor.Os parágrafos desse comandolegal regulamentavam essa formade execução de maneiracomplexa. Primeiramente, o juiznomearia um perito que avaliariao custo da prestação do fato,mandando em seguida que fosseexpedido edital de concorrênciapública, com o prazo máximo de30 dias (§ 1º). As propostasseriam acompanhadas de provado depósito da importância que ojuiz estabeleceria a título decaução (§ 2º). No dia, lugar ehora designados, abertas aspropostas, escolheria o juiz a

Page 1041: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

mais vantajosa (§ 3º). Se o credornão exercesse a preferência a quese referia o art. 637 do CPC, oconcorrente, cuja proposta fosseaceita, obrigar-se-ia, dentro decinco dias, por termo nos autos, aprestar o fato sob pena de perdera quantia caucionada (§ 4º).Assinando o termo, o contratantefaria nova caução de 25% sobre ovalor do contrato (§ 5º). No casode descumprimento da obrigaçãoeventualmente assumida peloconcorrente ou pelo contratante, acaução seria revertida embenefício do credor (§ 6º). Porfim, a lei consagrava que deveria

Page 1042: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

o credor adiantar ao contratanteas quantias estabelecidas naproposta aceita (§ 7º).

Com a alteração instrumentalde 2006, a redação ficou bemmais simplificada, extinguindo-sea complexa licitação privadaantes existente. Como expunhaGlauco Gumerato Ramos, houveum reajuste do dispositivo, com asupressão da complexa econtraproducente concorrênciapública que era prevista.1 Para omesmo doutrinador, a novaredação do dispositivo introduziuos seguintes procedimentos:

Page 1043: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

“Verificando o juiz que a obrigação de fazer épassível de realização por terceiro, haverádilação probatória onde caberá ao próprioexequente – apesar do silêncio do dispositivo– trazer aos autos eventuais propostas deterceiros interessados na prestação dorespectivo fato. E como isso ocorrerá? Porexemplo, poderá ser através de apresentação,pelo exequente, de alguns orçamentos fixadospelos terceiros eventualmente interessados,não sendo descartada a possibilidade de atémesmo o executado apresentar osorçamentos. O que o art. 634 reformadoparece não querer mais é que se publiquemeditais, ou mesmo que se proceda a qualqueroutra formalidade convocatória, o queatentaria contra o princípio da celeridade (art.5º, LXXVIII, da CF) e aumentaria o custofinanceiro do processo.Diante das propostas elaboradas, o juizestabelecerá o contraditório e deliberará nosentido de aprovação de uma delas, quenecessariamente não precisará ser a mais

Page 1044: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

barata se eventualmente não for essa amelhor proposta para atender o exatocumprimento da obrigação. Essa decisãopoderá ser impugnada por intermédio dorecurso de agravo, sujeitando-se o curso doprocesso às consequências daí advindas.Aprovada a proposta pelo juiz, caberá aoexequente adiantar as quantias nela previstaspara que então o terceiro realize o fato (art.643, parágrafo único). As quantias adiantadaspelo exequente serão por ele cobradas doexecutado através do rito previsto paraexecução de quantia certa (art. 646 e ss.)”.2

Todos esses comentáriosvalem para o Novo CPC, dianteda correspondência entre os arts.817 do CPC/2015 e 634 doCPC/1973. Também houvealteração do art. 637, parágrafo

Page 1045: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

único, do CPC/1973, pela mesmaLei de 2006. As duas redaçõesconstam da tabela a seguir:

CPC/1973 –Redação após

a Lei11.382/2006

CPC/1973 –

Redaçãoanterior

“Art. 637. Se ocredor quiserexecutar, oumandarexecutar, sobsua direção evigilância, asobras e

“Art. 637. Se ocredor quiserexecutar, oumandarexecutar, sobsua direção evigilância, asobras e

Page 1046: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

trabalhosnecessários àprestação dofato, terápreferência,em igualdadede condiçõesde oferta, aoterceiro.

trabalhosnecessários àprestação dofato, terápreferência,em igualdadede condiçõesde oferta, aoterceiro.

Parágrafoúnico. O direitode preferênciaserá exercidono prazo de 5(cinco) dias,contados daapresentaçãoda proposta

Parágrafoúnico. O direitode preferênciaserá exercidono prazo de 5(cinco) dias,contados daescolha da

Page 1047: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

pelo terceiro(art. 634,parágrafoúnico).”

proposta, a quealude o art.634, § 3º.”

A última alteração foisimples, diante das mudanças queatingiram os procedimentos decumprimento da obrigação,contando-se o prazo de cinco diaspara o exercício do direito depreferência, por parte do credor,da apresentação da proposta peloterceiro. O prazo já era tido comodecadencial e, não sendoexercido pelo credor, a prestaçãoficaria a cargo do terceiro que

Page 1048: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

apresentou a proposta.3

O art. 820 do CPC/2015confirmou essa ideia,estabelecendo que, “se oexequente quiser executar oumandar executar, sob sua direçãoe vigilância, as obras e ostrabalhos necessários àrealização da prestação, terápreferência, em igualdade decondições de oferta, em relaçãoao terceiro. Parágrafo único. Odireito de preferência deverá serexercido no prazo de 5 (cinco)dias, após aprovada a propostado terceiro”. Valem, portanto, oscomentários feitos à legislação

Page 1049: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

anterior, alterada em 2006 poruma das reformas recentes doEstatuto Processual. Emconclusão, tendo em vista os finssociais que guiaram as recentesreformas processuais, que são aceleridade e a desburocratização,houve uma importante facilitaçãolegislativa para a efetivação documprimento da obrigação defazer fungível, tudo confirmadopelo Novo Código de ProcessoCivil.

Ainda no que diz respeito àsobrigações de fazer fungíveis, oart. 818 do CPC/2015 enunciaque, realizada a prestação, o juiz

Page 1050: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

ouvirá as partes no prazo de dezdias. Não havendo qualquerimpugnação, considerarásatisfeita a obrigação. Caso hajaimpugnação, o juiz a decidirá. Opreceito equivale ao art. 635 doCPC/1973, que não foi objeto dequalquer modificação anterior.

Porém, se o terceirocontratado não realizar aprestação no prazo ou se a fizerde modo incompleto oudefeituoso, poderá o exequenterequerer ao juiz, no prazo de 15dias, que o autorize a concluí-laou a repará-la à custa docontratante. Ouvido o contratante

Page 1051: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

no prazo de 15 dias, o juizmandará avaliar o custo dasdespesas necessárias e ocondenará a pagá-lo. Essas são aspremissas firmadas pelo art. 819do Novo CPC, equivalente ao art.636 do antigo CPC, compequenas modificações.Primeiro, o prazo para o pleitopelo exequente foi aumentado de10 para 15 dias. Segundo, o lapsopara oitiva do contratanteigualmente foi modificado, de 5para 15 dias. A uniformização deprazos vem em boa hora, tendoem vista o contraditório e aparidade de armas processuais.

Page 1052: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

Encerrando o tratamentoespecífico das obrigações defazer, estatui o novo art. 821 doCodex que, na obrigação de fazer,quando se convencionar que oexecutado a satisfaçapessoalmente, o exequente poderárequerer ao juiz que lhe assineprazo para cumpri-la. Emhavendo recusa ou mora doexecutado, a sua obrigaçãopessoal será convertida emperdas e danos, caso em que seobservará o procedimento deexecução por quantia certa. Trata-se de regra de cumprimentopessoal das obrigações

Page 1053: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

infungíveis, mera repetição doart. 638 do CPC/1973.

Partindo para as obrigaçõesde não fazer, estas são as únicasobrigações negativas admitidaspela teoria geral das obrigações,tendo como objeto a abstenção deuma conduta. Por tal razão,presente o inadimplemento, aregra do art. 390 da codificaçãomaterial merece aplicação, pelaqual, “nas obrigações negativas, odevedor é havido porinadimplente desde o dia em queexecutou o ato de que se deviaabster”. O que se percebe é que odescumprimento da obrigação

Page 1054: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

negativa se dá quando o ato épraticado; ao contrário dasobrigações positivas (dar oufazer), em que o inadimplementoocorre quando o ato não épraticado.

A obrigação de não fazer équase sempre infungível,personalíssima (intuitupersonae), sendo tambémpredominantemente indivisívelpela sua natureza, nos termos doart. 258 do Código Civil. Se oadimplemento da obrigação denão fazer tornar-se impossívelsem culpa genérica do devedor,será resolvida e extinta, o mesmo

Page 1055: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

ocorrendo nas situaçõesenvolvendo o caso fortuito e aforça maior, como regra (art. 250do CC/2002).

A obrigação de não fazerpode ter origem legal ouconvencional. Relativamente àobrigação de não fazer de origemlegal, exemplifica-se com o casodo proprietário de imóvel quetem o dever de não construir atécerta distância do terreno vizinho(arts. 1.301 e 1.303 do CC/2002).Como concretização de obrigaçãode não fazer de origemconvencional, cite-se o caso deum ex-empregado que celebra

Page 1056: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

com a empresa ex-empregadoraum contrato de sigilo industrialpor ter sido contratado peloconcorrente (secret agreement).

Prevê o art. 251, caput, doCC/2002 que, praticado o atopelo devedor, a cuja abstenção seobrigara, o credor pode exigirdele que o desfaça, sob pena dese desfazer à sua custa,ressarcindo o culpado as perdas edanos. Se for praticado o atovedado pelo compromisso deabstenção, o credor pode exigirque ele seja desfeito, caso hajaculpa em sentido amplo dodevedor. Para tanto, poderá

Page 1057: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

ingressar com ação de obrigaçãode não fazer, requerendo afixação de preceito cominatório,ou astreintes (art. 814 doCPC/2015, art. 461 do CPC/1973e art. 84 do CDC).Eventualmente, a pedido docredor e havendo culpa dodevedor, a obrigação de não fazerpoderá ser convertida emobrigação de dar coisa certa, nocaso, em obrigação de arcar comperdas e danos.

No que diz respeito às outrasregras específicas instrumentaisdas obrigações negativas, os arts.822 e 823 do Novo CPC

Page 1058: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

reproduzem os arts. 642 e 643 doantigo CPC. Nos termos daprimeira norma emergente, se oexecutado praticou ato a cujaabstenção estava obrigado pelalei ou pelo contrato, o exequenterequererá ao juiz que assine prazoao executado para desfazê-lo.Conforme o art. 823 doCPC/2015, em havendo recusa oumora do executado, o exequentepleiteará ao juiz que mandedesfazer o ato à custa daquele,que responderá por perdas edanos. Não sendo possíveldesfazer-se o ato, a obrigaçãoresolve-se em perdas e danos,

Page 1059: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

hipótese em que, após aliquidação, se observará oprocedimento de execução porquantia certa. Em outras palavras,a obrigação de não fazer éconvertida em obrigação de darperdas e danos, o que é projeçãomaterial do caput do art. 251 doCC/2002.

Não se pode esquecer queenuncia o parágrafo único do art.251 da codificação materialprivada que, “em caso deurgência, poderá o credordesfazer ou mandar desfazer,independentemente de autorizaçãojudicial, sem prejuízo do

Page 1060: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

ressarcimento devido”. Como sevê, a autotutela civil também estáprevista para a obrigação de nãofazer, na tendência confirmadapelo Novo Código de ProcessoCivil. Todavia, o aplicador doDireito deve ser mais cautelosoem relação a esse dispositivo, eisque o texto pode gerar excessos,tendo em vista a utilização dasexpressões desfazer ou mandardesfazer para uma obrigação queé infungível. Não se olvide queabusos também podem estarpresentes no exercício daautotutela das obrigações de fazerfungíveis, mas com menor

Page 1061: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

gravidade, por conta dapossibilidade de cumprimentopor terceiro. Em todas assituações, repise-se que servemcomo parâmetros para aconfiguração do abuso de direitoo fim social ou econômico, a boa-fé e os bons costumes, queconstam do art. 187 do CódigoCivil.

A propósito de eventuaisexcessos, veja-se o exemplosobre a obrigação de não fazer deorigem legal, relativa ao direitode vizinhança. Tendo sido feita aconstrução pelo vizinho, oproprietário prejudicado,

Page 1062: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

independentemente de permissãojudicial, estará autorizado pelalei a demolir o prédio construídoirregularmente. Quanto aoexemplo citado sobre obrigaçãode não fazer de origemconvencional, caso o ex-empregado revele dados com osquais se comprometeu a nãodivulgar, o credor poderá utilizar-se de meios próprios para calar oprimeiro. Como isso pode serefetivado pela autotutela sem queabusos estejam presentes?

Exposto esse tratamento,como visto, o Novo CPC trata daclassificação das obrigações

Page 1063: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

quanto à prestação na seçãorelativa ao “Julgamento dasAções Relativas às Prestações deFazer, de não Fazer e de EntregarCoisa”, tópico que é inovação naNorma Processual.

Nesse contexto, prescreve oart. 497 do Novo CPC que, naação que tenha por objeto aprestação de fazer ou de nãofazer, o juiz, se procedente opedido, concederá a tutelaespecífica ou determinaráprovidências que assegurem aobtenção de tutela pelo resultadoprático equivalente. Para aconcessão da tutela específica

Page 1064: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

destinada a inibir a prática, areiteração ou a continuação de umilícito, ou a sua remoção, éirrelevante a demonstração daocorrência de dano ou daexistência de culpa ou dolo. Essedispositivo é projeção geral doart. 461 do CPC/1973, comalterações realizadas no ano de1994, tratando da tutelaespecífica para cumprimento dasobrigações de fazer e não fazer.

Seguindo o modeloinaugurado pela Lei 10.444/2002,que introduziu no antigo Códigode Processo Civil o art. 461-A, anorma processual de 2015

Page 1065: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

confirma a viabilidade demedidas de tutela específica nasobrigações de dar coisa certa,ou obrigações específicas. Emtais obrigações positivas, odevedor se obriga a dar umacoisa individualizada, móvel ouimóvel, cujas característicasforam acertadas pelas partes,geralmente em um instrumentonegocial. Na compra e venda, porexemplo, o devedor da coisa é ovendedor; e o credor, ocomprador. Consigne-se que, nasobrigações de dar coisa certa, ocredor não é obrigado a receberoutra coisa, ainda que mais

Page 1066: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

valiosa, consoante prevê o art.313 do Código Civil de 2002,velha aplicação da máximaromana nemo aliud pro alioinvito creditore solvere potest.Assim, conforme o art. 498,caput, do Novo CPC, na ação quetenha por objeto a entrega decoisa, o juiz, ao conceder a tutelaespecífica, fixará o prazo para ocumprimento da obrigação.

Como não poderia serdiferente, não existe a mesmaopção nos casos de obrigaçõespositivas genéricas ou de darcoisa incerta, aquelas que sãoindicadas pelo gênero e pela

Page 1067: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

quantidade, havendo anecessidade de uma escolha – emregra, pelo devedor – para adeterminação do objetoobrigacional (arts. 243 e 244 doCC/2002). Isso porque o gêneronão perece, conforme a máximagenus non perit, não podendo odevedor alegar perda oudeterioração da coisa, mesmo emdecorrência de caso fortuito ou deforça maior (art. 246 doCC/2002). Em outras palavras,não há inadimplemento deobrigações genéricas, o que geraa impossibilidade de se exigir atutela específica. Nessa linha,

Page 1068: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

dispõe o parágrafo único do art.498 do CPC/2015 que, tratando-se de entrega de coisadeterminada pelo gênero e pelaquantidade, o autor ou credorindividualizá-la-á na petiçãoinicial, se lhe couber a escolha, oque é a exceção do Direitomaterial. Porém, se a escolhacouber ao réu ou devedor, o que éa regra do art. 244 do CC/2002,este a entregará individualizada,no prazo fixado pelo juiz. Emoutras palavras, somente cabe atutela específica quando aobrigação genérica transforma-seem específica, hipótese em que se

Page 1069: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

cogita o inadimplementoobrigacional.

Confirmando o princípio daconservação negocial, comrelação íntima com a funçãosocial dos pactos, prescreve oart. 499 do CPC/2015 que aobrigação somente seráconvertida em perdas e danos seo autor o requerer ou seimpossível a tutela específica oua obtenção de tutela peloresultado prático equivalente. Emsuma, a regra deve ser ocumprimento daquilo que foiconvencionado, valorizando-se aautonomia privada, na linha do

Page 1070: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

que outrora constava no § 1º doart. 461 do CPC/1973.

Também confirmando regrado art. 461 do CPC/1973, agorado seu § 2º, enuncia o art. 500 doCPC/2015 que a indenização porperdas e danos dar-se-á semprejuízo da multa fixadaperiodicamente para compelir oréu ao cumprimento específico daobrigação. Em outras palavras, asperdas e danos são plenamentecumuláveis com as astreintes.Porém, como visto, em havendoexcesso na fixação das últimas,sempre caberá a sua redução.

Por fim, quanto ao

Page 1071: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

julgamento das ações que dizemrespeito à classificação tripartidadas obrigações, o art. 501 doCPC/2015 preceitua que, na açãoque tenha por objeto a emissão dedeclaração de vontade, a sentençaque julgar procedente o pedido,uma vez transitada em julgado,produzirá todos os efeitos dadeclaração não emitida. Do pontode vista processual, não hánovidade no preceito,correspondendo ao art. 466-A doCPC/1973, incluído pela Lei11.232/2005, com a seguintedicção: “Condenado o devedor aemitir declaração de vontade, a

Page 1072: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

sentença, uma vez transitada emjulgado, produzirá todos osefeitos da declaração nãoemitida”.

Feitas tais considerações, oNovo CPC traz consequênciasfulcrais para as obrigaçõessolidárias, o que deve seranalisado tendo em vista aproposta dialogal deste livro. Asobrigações solidárias importammuito ao mundo jurídico,particularmente ao DireitoObrigacional e Contratual, eisque têm grande relevânciaprática. Por uma questão lógica, oseu estudo interessa e somente é

Page 1073: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

pertinente quando houverpluralidade de credores e/ou dedevedores (obrigaçõescompostas subjetivas).

Em sintonia com o princípioda operabilidade, um dosbaluartes da codificação materialde 2002, no sentido desimplicidade ou facilitação,prevê o art. 264 do Código Civilque há solidariedade quando namesma obrigação concorrer maisde um credor, ou mais de umdevedor, cada um com direito ouobrigado à dívida toda. Dessaforma, na obrigação solidáriaativa, qualquer um dos credores

Page 1074: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

pode exigir a obrigação porinteiro. Na obrigação solidáriapassiva, a dívida pode ser pagapor qualquer um dos devedores.Em outras palavras, todas aspartes, sejam elas credoras oudevedoras, são tratadas como sefossem uma só (in solidum).

O art. 265 do CC/2002,repetindo a tão conhecida regrado art. 896 do CC/1916, enunciaque a solidariedade não sepresume, resultando da lei ou davontade das partes. Assim,continua vigente a regra pela quala solidariedade contratual nãopode ser presumida, devendo

Page 1075: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

resultar da lei (solidariedadelegal) ou da vontade das partes(solidariedade convencional ouvoluntária). Muito importanteapontar que a solidariedadeprevista nesse preceito é a denatureza obrigacional erelacionada com aresponsabilidade civil contratual,que não se confunde com aquelaadvinda da responsabilidade civilextracontratual ou aquiliana.

A última solidariedade estátratada pelo art. 942, parágrafoúnico, da lei material privada,pelo qual, “são solidariamenteresponsáveis com os autores os

Page 1076: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

coautores e as pessoasdesignadas no art. 932”. Cumpreainda assinalar que asolidariedade obrigacionalconstitui regra no Código deDefesa do Consumidor, aocontrário do que ocorre na atualcodificação civil, em que éexceção. Consta do art. 7º,parágrafo único, da Lei8.078/1990 que, “tendo mais deum autor a ofensa, todosresponderão solidariamente pelareparação dos danos previstosnas normas de consumo”. Essecomando consumerista, segundodoutrina especializada, traz uma

Page 1077: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

presunção de solidariedadecontratual.4

No Novo CPC, uma primeiraregra a ser pontuada quanto àsobrigações solidárias está no seuart. 1.005, pelo qual o recursointerposto por um doslitisconsortes a todos aproveita,salvo se distintos ou opostos osseus interesses. Porém, conformeo seu parágrafo, em havendosolidariedade passiva, entredevedores, o recurso interpostopor um devedor aproveitará aosoutros, quando as defesas opostasao credor lhes forem comuns.Como defesas comuns, de cunho

Page 1078: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

material, podem ser citados opagamento direto ou indireto daobrigação e a prescrição.

Além dessa regra, a NormaInstrumental emergente continua aestabelecer que caberá ochamamento ao processo nashipóteses de solidariedade, comoconstava do art. 77, inciso III, doCPC/1973. A norma foi repetidapelo art. 130, inciso III, doCPC/2015, in verbis: “éadmissível o chamamento aoprocesso, requerido pelo réu: (...)III – dos demais devedoressolidários, quando o credor exigirde um ou de alguns o pagamento

Page 1079: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

da dívida comum”.Como outro importante

diálogo com o direito material,continua tendo aplicação o teordo Enunciado n. 351 do CJF/STJ,aprovado na IV Jornada deDireito Civil, realizada em 2006,segundo o qual: “A renúncia àsolidariedade em favor dedeterminado devedor afasta ahipótese de seu chamamento aoprocesso”. A renúncia àsolidariedade está tratada peloart. 282 da codificação material,estabelecendo o seu caput que “Ocredor pode renunciar àsolidariedade em favor de um, de

Page 1080: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

alguns ou de todos os devedores”.Consigne-se que a expressãorenúncia à solidariedade podeser utilizada como sinônimo deexoneração da solidariedade.

A renúncia é um ato jurídicostricto sensu, em que o sujeitoativo de um direito dele abremão, de forma expressa, sem anecessidade de aceitaçãoexpressa ou tácita da outra parte.Nesse ponto, a renúncia já sediferencia da remissão ou perdãoda dívida, que deve ser aceitapelo devedor, de acordo com oart. 385 do CC/2002.

No entanto, a renúncia à

Page 1081: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

solidariedade também sediferencia da remissão quanto aosefeitos, conforme reconhece oEnunciado n. 350 do CJF/STJ,aprovado também na IV Jornadade Direito Civil, cuja redação é aseguinte: “A renúncia àsolidariedade diferencia-se daremissão, em que o devedor ficainteiramente liberado do vínculoobrigacional, inclusive no quetange ao rateio da quota doeventual codevedor insolvente,nos termos do art. 284”. Com ofim de demonstrar essa premissa,se A é o credor de uma dívida deR$ 30.000,00, havendo três

Page 1082: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

devedores solidários B, C e D, erenuncia à solidariedade emrelação a B, este estaráexonerado da solidariedade, mascontinua sendo responsável porR$ 10.000,00. Quanto aos demaisdevedores, por óbvio, continuamrespondendo solidariamente peladívida.

Pois bem, paracomplementar, o parágrafo únicodo art. 282 do CC/2002 teve novaredação se comparado com aprevisão do parágrafo único doart. 912 do CC/1916, seucorrespondente. As diferençasconstam do esquema abaixo, com

Page 1083: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

destaques:

CódigoCivil de

2002

Código Civil

de 1916

“Art. 282. Ocredor poderenunciar àsolidariedadeem favor deum, dealguns ou detodos osdevedores.

“Art. 912. Ocredor poderenunciar àsolidariedade emfavor de um,alguns ou todosos devedores.

Page 1084: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

Parágrafoúnico. Se ocredorexonerar dasolidariedadeum ou maisdevedores,subsistirá adosdemais.”

Parágrafo único.Se o credorexonerar dasolidariedade umou maisdevedores, aosoutros só lheficará o direitode acionar,abatendo nodébito a partecorrespondenteaos devedores,cuja obrigaçãoremitiu (art.914).”

Como se percebe, o CódigoCivil atual não menciona maisque haverá abatimento da parte

Page 1085: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

correspondente aos devedoresque foram perdoados, eis que aprevisão é desnecessária, por setratar de regra implícita, retiradado art. 284 da atual codificação(correspondente ao art. 914 doCC/1916). Nesse sentido, MariaHelena Diniz continua entendendoque “ao credor, para que se possademandar os codevedoressolidários remanescentes,cumprirá abater no débito oquantum alusivo à parte devidapelo que foi liberado dasolidariedade”.5 Contudo, nadoutrina contemporânea, háposição em sentido contrário, de

Page 1086: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

Jones Figueirêdo Alves e MárioLuiz Delgado, que lecionam: “ainovação está no parágrafo único.Pelo sistema do Código de 1916,se o credor exonerasse dasolidariedade um ou maisdevedores, só poderia acionar osdemais, abatendo no débito aparte dos que foram exonerados.Agora, mesmo exonerando um oumais devedores, poderá o credoracionar os demais devedores pelaintegralidade da dívida, sem anecessidade de abatimento. Nadaobsta, por óbvio, que aqueles quevierem a pagar sozinhos a dívidapor inteiro cobrem,

Page 1087: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

posteriormente, as quotasdaqueles que foram exonerados”.6

A questão é polêmica.Todavia, filia-se à primeiracorrente, defendida por MariaHelena Diniz, que é mais justa eem sintonia com a vedação doenriquecimento sem causa.Também alinhada a essa vertenteestava a maioria dos juristas queparticiparam da IV Jornada deDireito Civil, com a aprovaçãodo Enunciado n. 349 do CJF/STJ:“Com a renúncia à solidariedadequanto a apenas um dosdevedores solidários, o credor sópoderá cobrar do beneficiado a

Page 1088: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

sua quota na dívida,permanecendo a solidariedadequanto aos demais devedores,abatida do débito a partecorrespondente aos beneficiadospela renúncia”. O proponente doenunciado foi José FernandoSimão, professor da Faculdade deDireito da USP. Ilustrando com aconclusão pelo abatimento, noexemplo por último apontado, emque a dívida era de R$ 30.000,00,em havendo três devedores,ocorrendo a renúncia parcial dasolidariedade, por parte docredor (A), em relação a um dosdevedores (B), os demais

Page 1089: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

somente, C e D, serão cobradosem R$ 20.000,00, permanecendoem relação a eles asolidariedade.

Em suma, feitas taisexplicações de cunho civilista,em havendo a renúncia àsolidariedade em favor de um dosdevedores, este não poderá sermais chamado ao processo pararesponder.

Para encerrar o presentecapítulo, outra norma que mereceser comentada é o art. 1.068 doNovo CPC, que deu nova redaçãoao art. 274 do Código Civil. Asduas normas materiais, a anterior

Page 1090: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

e a atual, constam da tabela aseguir:

Art. 274 do

Código Civil.Redação dada

pelo Novo CPC

Art. 274 do

CódigoCivil de

2002.Redaçãooriginal

“O julgamentocontrário a umdos credoressolidários nãoatinge os demais,mas o julgamento

“Ojulgamentocontrário aum doscredoressolidáriosnão atinge os

Page 1091: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

favorávelaproveita-lhes,sem prejuízo deexceção pessoalque o devedortenha direito deinvocar emrelação aqualquer deles”.

demais; ojulgamentofavorávelaproveita-lhes, amenos quese funde emexceçãopessoal aocredor que oobteve”.

O dispositivo já era objetode críticas por civilistas eprocessualistas. A primeira partedo comando legal em questão nãoapresentava problemas, uma vezque se houver, na obrigaçãosolidária ativa, julgamento

Page 1092: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

contrário a um dos credores, estenão atinge os demais, quepermanecem com os seus direitosincólumes. Essa dedução foimantida na redação do comando.

Contudo, restavam dúvidasquando o julgamento fossefavorável a um dos credores,hipótese em que existiam doisposicionamentos na doutrinacivilista.

Como primeiroposicionamento, se um doscredores vencesse a ação, essadecisão atingiria a todos osdemais credores, salvo se odevedor tivesse em seu favor

Page 1093: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

alguma exceção pessoal passívelde ser invocada a outro credorque não participasse do processo.Desse modo, o devedor nãopoderia apresentar defesa contraaquele credor que promoveu ademanda, havendo a instituiçãodo regime da extensão da coisajulgada secundum eventum litis(os credores que nãoparticiparam do processo apenaspodem ser beneficiados com acoisa julgada, mas jamaisprejudicados). Esse entendimentoconstava de obra coletivacoordenada por GustavoTepedino, Heloísa Helena

Page 1094: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

Barbosa e Maria Celina Bodin deMoraes.7

O segundo posicionamentoera sustentado por Pablo StolzeGagliano e Rodolfo PamplonaFilho, que defendiam doiscaminhos que poderiam serpercorridos nessas situações: a)se o magistrado não acolhesse adefesa e se esta não fosse denatureza pessoal, o julgamentobeneficiaria a todos os demaiscredores; b) se o magistrado nãoacolhesse a defesa e se esta forde natureza pessoal, o julgamentonão interferiria no direito dosdemais credores.8

Page 1095: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

Apesar dessas duascorrentes, havia, na doutrinaprocessualista, uma outraposição, que afirmava que a partefinal do art. 274 do CC/2002 nãoteria qualquer sentido. Issoporque a referida exceçãopessoal não existiria a favor docredor, mas somente em relaçãoao devedor. Nesse sentido,comentava Fredie Didier Jr. que“O julgamento favorável aocredor não pode estar fundado emexceção pessoal, alegação dadefesa que é; se assim fosse, adecisão seria desfavorável e, porforça da primeira parte do art.

Page 1096: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

274, não estenderia seus efeitosaos demais credores. Em resumo:não há julgamento favorávelfundado em exceção pessoal;quando se acolhe a defesa, julga-se desfavoravelmente o pedido. Aparte final do art. 274, seinterpretada literalmente, não fazsentido”.9 Também da doutrinaprocessual, entendia de modomuito similar José CarlosBarbosa Moreira.10

Diante desse problema, oprocessualista baiano apresentavaa seguinte solução para odispositivo: “a) se um doscredores vai a juízo e perde,

Page 1097: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

qualquer que seja o motivo(acolhimento de exceção comumou pessoal), essa decisão não temeficácia em relação aos demaiscredores; b) se o credor vai ajuízo e ganha, essa decisãobeneficiará os demais credores,salvo se o(s) devedor(es)tiver(em) exceção pessoal quepossa ser oposta a outro credornão participante do processo,pois, em relação àquele quepromoveu a demanda, o(s)devedor(es) nada mais pode(m)opor (art. 474 do CPC)”.11

Depois de muito refletir sobre ocomplexo assunto, este autor

Page 1098: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

passou a pensar dessa forma,posição que inspirou a mudançado comando, o que veio em boahora.

Para findar o capítulo,consigne-se que essas ideiasconstavam de proposta deenunciado doutrinário formuladapor José Fernando Simão, quandoda IV Jornada de Direito Civil,realizada em 2006 pelo Conselhoda Justiça Federal e peloSuperior Tribunal de Justiça. Erao teor da proposição sobre oentão criticado art. 274 doCC/2002: “O julgamentofavorável a um dos credores

Page 1099: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

solidários aproveita aos demais,sem prejuízo das exceçõespessoais que o devedor tenha odireito de invocar em relação acada um dos cocredores. Como odevedor só pôde opor ao credorsolidário demandante as exceçõesque lhe eram pessoais, poderáoportunamente opor aos demaiscocredores as respectivasexceções pessoais”. Todavia, porfalta de tempo, a proposta, quetrazia interessante soluçãointerpretativa, infelizmente, nãofoi votada. Por bem, o Novo CPCcorrigiu o problema, colocandono texto material a ideia constante

Page 1100: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

dessa proposta de enunciadodoutrinário.

Page 1101: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

__________1 GUMERATO RAMOS, Glauco.Reforma do CPC 2. São Paulo: RT,2007. p. 177.2 GUMERATO RAMOS, Glauco.Reforma do CPC 2. São Paulo: RT,2007. p. 179.3 GUMERATO RAMOS, Glauco.Reforma do CPC 2. São Paulo: RT,2007. p. 184.4 Por todos: MARQUES, ClaudiaLima; BENJAMIM, Antonio HermanV.; MIRAGEM, Bruno. Comentáriosao Código de Defesa doConsumidor. São Paulo: RT, 2003. p.188.5 DINIZ, Maria Helena. Código CivilAnotado. 11. ed. São Paulo: Saraiva,2005. p. 307.

Page 1102: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

6 ALVES, Jones Figueirêdo;DELGADO, Maria Luiz. CódigoCivil Anotado. São Paulo: Método,2005. p. 170.7 TEPEDINO, Gustavo; BARBOSA,Heloísa Helena; MORAES, MariaCelina Bodin de. Código CivilInterpretado. Rio de Janeiro: Renovar,2004. v. I, p. 552.8 GAGLIANO, Pablo Stolze;PAMPLONA FILHO, Rodolfo. NovoCurso de Direito Civil. São Paulo:Saraiva, 2003. v. II, p. 81.9 DIDIER JR., Fredie. RegrasProcessuais no Novo Código Civil.São Paulo: Saraiva, 2004. p. 76.10 BARBOSA MOREIRA, JoséCarlos. Solidariedade Ativa: Efeitos daSentença e Coisa Julgada na Ação de

Page 1103: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

Cobrança Proposta por um ÚnicoCredor. Revista do Advogado daAASP. Homenagem ao Professor JoséIgnácio Botelho de Mesquita. SãoPaulo: AASP, 2005. p. 69.11 DIDIER JR., Fredie. RegrasProcessuais no Novo Código Civil.São Paulo: Saraiva, 2004. p. 76.

Page 1104: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

DAS REGRAS GERAISDE

RESPONSABILIDADEPATRIMONIAL NO

NOVO CÓDIGO DEPROCESSO CIVIL E

SUA INTERAÇÃO COMO DIREITO CIVIL

Page 1105: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

Seguindo a tradição dasNormas Processuais brasileiras,o Código de Processo Civil de2015 consagra regras geraisrelativas à responsabilidade civilpatrimonial, que, como sempre,induzem a consequências pontuaispara o Direito Civil. O própriotermo responsabilidadepatrimonial confirma a ideia deque o sistema jurídico brasileiroadotou a teoria dualista oubinária da obrigação,desenvolvida por Alois Brinz, naAlemanha, no final do séculoXIX.

Nesse contexto, a superação

Page 1106: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

da antiga teoria monista ouunitária obrigacional – segundo aqual a obrigação estaria fundadaexclusivamente na ideia deprestação – pode ser percebida apartir do estudo dos doiselementos básicos da categoria: odébito (do latim debitum ou doalemão Schuld) e aresponsabilidade (do latimobligatio, do alemão Haftung),sobre os quais repousa a teoriadualista ou binária. A últimavisão, mais completa, acabasendo a mais adequada paraexplicar o fenômenocontemporâneo obrigacional.

Page 1107: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

Partindo para as regrasprocessuais emergentes, dispõe oart. 789 do Novo Código deProcesso Civil que o devedorresponde com todos os seus benspresentes e futuros para ocumprimento de suas obrigações,salvo as restrições estabelecidasem lei. Seguiu-se, assim, aliteralidade do que constava doart. 591 do Código de ProcessoCivil de 1973. Os dispositivos, orevogado e o emergente, servempara corrigir o equívoco do art.391 do Código Civil, in verbis:“Pelo inadimplemento dasobrigações respondem todos os

Page 1108: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

bens do devedor”. Obviamente,não são todos os bens do devedorque respondem, presente umaampla proteção aos bensimpenhoráveis, tanto na NormaGeral Processual quanto nalegislação extravagante.

Em complemento, determinao art. 790 do Novo Codex quesão sujeitos à execução os bens:a) do sucessor, a título singular,tratando-se de execução fundadaem direito real ou obrigaçãoreipersecutória, entendida aúltima como a obrigação quesegue a coisa, ambulatória oupropter rem; b) do sócio, nos

Page 1109: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

termos da lei; c) do devedor,ainda que em poder de terceiros;d) do cônjuge ou companheiro,nos casos em que seus benspróprios ou de sua meaçãorespondem pela dívida; e)alienados ou gravados com ônusreal em fraude à execução; f) cujaalienação ou gravação com ônusreal tenha sido anulada em razãodo reconhecimento, em açãoautônoma, de fraude contracredores; g) do responsável, noscasos de desconsideração dapersonalidade jurídica.

As duas últimas previsõessão novidades na norma

Page 1110: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

processual, não constando do art.592 do CPC/1973,correspondente ao novo diplomaem estudo. Quanto à fraude contracredores, confirma-se aexistência de problema relativoao plano da validade, a gerar aanulação do negócio jurídico,conforme está expressamente doart. 171 do CC/2002. Isso, apesarde resistências, pois, em váriasetapas da tramitação do NovoCPC, havia a proposta deinserção de norma prevendo aineficácia do ato praticado comesse vício social.

Como é cediço, há

Page 1111: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

entendimento doutrinário ejurisprudencial antigo de que oato praticado em fraude contracredores deve ser tido comoineficaz e não como anulável,sendo o Código Civil Brasileirode 2002 objeto de críticas porvários estudiosos. Nessa linha,comenta Humberto TheodoroJúnior, em obra com mais de umadécada, que “a circunstância de oatual Código repetir ipsis litteriso rótulo de anulabilidadeaplicado ao negócio em fraude decredores não impede que suanatureza jurídica e seus efeitospráticos sejam, na verdade, os da

Page 1112: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

ineficácia relativa, como antes jádemonstramos perante igual textodo vigente Código Civil”.1 Namesma esteira, entre os civilistas,Carlos Roberto Gonçalvespondera que “o novo CódigoCivil não adotou, assim, a tese deque se trataria de hipótese deineficácia relativa do negócio,defendida por ponderável parcelada doutrina, segundo a qual,demonstrada a fraude ao credor, asentença não anulará a alienação,mas simplesmente, como noscasos de fraude à execução,declarará a ineficácia do atofraudatório perante o credor,

Page 1113: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

permanecendo o negócio válidoentre os contratantes: oexecutado-alienante e o terceiroadquirente”.2

Igualmente, AlexandreFreitas Câmara ensina que osdefensores da tese pela qual afraude contra credores geraanulabilidade do negócio jurídicoencontram dificuldades emexplicar satisfatoriamente ofenômeno, pois “basta pensar noseguinte: nos casos em que se estádiante de um ato anulável, aconsequência da anulação é aretirada do ato do ‘mundojurídico’, retornando-se ao status

Page 1114: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

quo ante. Significa isto dizer que,uma vez anulado um ato jurídico,devem as partes retornar aoestado em que se encontravamantes de o mesmo ter sidopraticado”.3 Ao final, arremata ojurista: “A fraude contracredores, pois, não é causa deanulabilidade, mas sim deinoponibilidade do ato jurídico.O ato é válido, mas ineficaz emrelação ao credor”.4

Pensamos que tem certarazão essa corrente doutrinária,uma vez que alguns problemaspráticos surgem ao se reconhecera anulabilidade do negócio

Page 1115: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

praticado em fraude contracredores. Uma questão quemerece destaque é que, com aanulação, o bem volta para opatrimônio do devedor que agiucom fraude, o que não representaque o credor que promoveu aação anulatória irá conseguir asatisfação patrimonial, pois seabre um concurso de credores emrelação ao bem transmitido.Nesse sentido, não deixa dúvidaso art. 165 do Código Civil,segundo o qual, anulados osnegócios fraudulentos, a vantagemresultante reverterá em proveitodo acervo sobre o qual se tenha

Page 1116: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

de efetuar o concurso decredores.

Em suma, podem surgirhipóteses em que a pessoa ganha,mas não leva, o que deve serevitado pelo Direito, pelanecessária busca da Justiça.Anote-se que, não obstante a leiprever expressamente a soluçãode anulabilidade, alguns julgadosanteriores seguem a tese oraexposta, considerando o ato comomeramente ineficaz (por todos,ver julgado publicado no recenteInformativo n. 467 do STJ, demarço de 2011: REsp971.884/PR, Rel. Min. Sidnei

Page 1117: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

Beneti, j. 22.03.2011).Todavia, frise-se que a lei é

clara ao prescrever que o negócioé eivado pela anulabilidade, oque foi confirmado pela NovaNorma Processual, e assim deveser considerado, comoentendimento majoritário e agoraconsolidado pela legislaçãoemergente, até porque tantosoutros julgados seguem o caminhoexpresso na lei, qual seja ainvalidade (ver, por todos: STJ,REsp 710.810/RS, Quarta Turma,Rel. Min. João Otávio deNoronha, j. 19.02.2008, DJe10.03.2008).

Page 1118: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

Como temos sustentado emaulas e exposições, cabe aolegislador fazer a opção pelainvalidade e ineficácia do ato ounegócio jurídico e, no caso, oCódigo de Processo Civil de2015 adotou o primeiro caminho,pela nulidade relativa ouanulabilidade. Se tivesseutilizado o termo ineficácia,como queriam alguns juristas, umsério problema de conflito denormas estaria formado,especialmente tendo em vista otratamento no Código Civil. Dequalquer modo, de lege ferenda,o tema pode ser debatido, para

Page 1119: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

reforma tanto do Código Civilquanto do agora Novo Código deProcesso Civil.

Feitas tais considerações,consigne-se que a outra inserçãono art. 790 do CPC/2015 dizrespeito à desconsideração dapersonalidade jurídica que, comovisto, passou a ser tratada pelaNorma Processual, com umincidente próprio, abordado emoutro item desta obra, para onderemetemos aqueles que pretendamaprofundar o assunto (Capítulo2).

Como outra novidade, passao Código de Processo Civil a

Page 1120: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

estabelecer, no seu art. 791,caput, que, se a execução tiverpor objeto obrigação de que sejasujeito passivo o proprietário deterreno submetido ao regime dodireito de superfície, ou osuperficiário, responderá peladívida, exclusivamente, o direitoreal do qual é titular o executado,recaindo a penhora ou outros atosde constrição exclusivamentesobre o terreno, no primeiro caso,ou sobre a construção ou aplantação, na segunda hipótese. Anovidade instrumental reside nofato de o Código Civil de 2002ter tratado desse direito real entre

Page 1121: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

os seus arts. 1.369 a 1.377,seguindo o exemplo do Estatutoda Cidade (Lei 10.257/2001, arts.21 a 24).

O direito real de superfíciesurgiu para substituir a enfiteuse,banida pela nova codificaçãocivil, nos termos do art. 2.038 doCC/2002 (“Fica proibida aconstituição de enfiteuses esubenfiteuses, subordinando-se asexistentes, até sua extinção, àsdisposições do Código Civilanterior, Lei 3.071, de 1º dejaneiro de 1916, e leisposteriores. § 1º Nos aforamentosa que se refere este artigo é

Page 1122: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

defeso: I – cobrar laudêmio ouprestação análoga nastransmissões de bem aforado,sobre o valor das construções ouplantações; II – constituirsubenfiteuse. § 2º A enfiteuse dosterrenos de marinha e acrescidosregula-se por lei especial”). Emsuma, nota-se que estão mantidasapenas as enfiteuses anteriores,sendo vedada a estipulação denovas.

Quando do surgimento doinstituto, apontava-se que asuperfície seria bem maisvantajosa do que a enfiteuse,pelas diferenças marcantes entre

Page 1123: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

elas. Primeiro, porque asuperfície pode ser gratuita ouonerosa, enquanto a enfiteuse erasempre onerosa. Segundo, pois asuperfície é temporária ou não,enquanto a enfiteuse énecessariamente perpétua, o queera uma grande desvantagem, poisa perpetuidade não é mais marcados novos tempos. De toda sorte,até a presente data, passados maisde dez anos da vigência doCC/2002, a superfície não teve aconcreção que se esperava, naopinião deste autor e tendo emvista a sua vivência prática.Assim, duvida-se da eficácia da

Page 1124: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

nova norma processual.De qualquer maneira, a

penhora fracionada, tratada pelonovo art. 791 do CPC/2015,justifica-se, eis que a superfície éo instituto real pelo qual oproprietário concede a outrem,por tempo determinado ouindeterminado, gratuita ouonerosamente, o direito deconstruir ou plantar em seuterreno. Tal direito real de gozoou fruição recai sempre sobrebens imóveis, mediante escriturapública, devidamente registradano Cartório de Registro deImóveis (art. 1.369 do CC/2002).

Page 1125: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

Como define RicardoPereira Lira, grande estudioso doassunto, o direito de superfície éum “direito real autônomo,temporário ou perpétuo, de fazere manter a construção ouplantação sobre ou sob terrenoalheio, é a propriedade –separada do solo – dessaplantação ou construção, bemcomo é a propriedade decorrenteda aquisição feita ao dono dosolo de construção ou plantaçãonele já existente”.5 Ou, ainda,como quer Rodrigo Reis Mazzei:“o direito de superfície pode serconceituado como direito real

Page 1126: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

complexo e autônomo, de tertemporariamente construção e/ouplantação em imóvel alheio,conferindo ao titular os poderesde uso, gozo e disposição sobreos implantes”.6

Trata-se do mais amplo dosdireitos reais de gozo ou fruição,em que figuram como partes: a) oproprietário, tambémdenominado fundieiro, aquele quecede o uso do bem imóvel paraoutrem e tem o domínio da coisa;e b) o superficiário, pessoa querecebe o imóvel, a fim de efetivara construção ou plantação, tendoos atributos de uso e gozo. Nesse

Page 1127: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

contexto, observa-se, nasuperfície, a divisão de doispatrimônios distintos entre aspartes, sobre os quais recaemencargos e ônus autônomos.Nessa linha, o Enunciado n. 321do CJF/STJ, da IV Jornada deDireito Civil, assim dispõe: “Osdireitos e obrigações vinculadosao terreno e, bem assim, aquelesvinculados à construção ou àplantação formam patrimôniosdistintos e autônomos,respondendo cada um de seustitulares exclusivamente por suaspróprias dívidas e obrigações,ressalvadas as fiscais decorrentes

Page 1128: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

do imóvel”. Por essa estruturainterna, reafirme-se, a penhoradeve ser fracionada, de acordocom os patrimônioscorrespondentes.

Voltando ao preceitoprocessual que surge, tambémdiante dessa divisão patrimonial,estabelece § 1º do art. 791 doCPC/2015 que os atos deconstrição sobre os patrimôniosdistintos na superfície serãoaverbados separadamente namatrícula do imóvel. Devemconstar, para os devidos finsregistrais, a identificação doexecutado, do valor do crédito e

Page 1129: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

do objeto sobre o qual recai ogravame. Deve também o oficialdo registro imobiliário destacar obem que responde pela dívida –se o terreno, a construção ou aplantação –, de modo a assegurara publicidade daresponsabilidade patrimonial decada um deles, pelas dívidas eobrigações que a eles estãovinculadas.

Para as enfiteuses que aindapersistem, anteriores ao CódigoCivil de 2002, determina o § 2ºdo mesmo art. 791 do CPC/2015a aplicação, no que couber, dessemesmo regime de penhora

Page 1130: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

fracionada, conforme ospatrimônios que são formados.Vale lembrar que o conceito deenfiteuse é retirado do art. 678 doCódigo Civil de 1916, aplicávelà espécie, segundo o qual háenfiteuse, aforamento ouemprazamento, quando por atoentre vivos, ou de última vontade,o proprietário atribui a outro odomínio útil do imóvel, pagandoa pessoa que o adquire e assim seconstitui enfiteuta, ao senhoriodireto uma pensão, ou foro, anual,certo e invariável. Diante daspoucas enfiteuses que aindarestam, não há dúvidas de que o

Page 1131: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

comando tem reduzida aplicaçãoconcreta.

Nos termos do mesmo art.791, § 2º, do CPC/2015, apenhora fracionada, de acordocom a divisão dos bens, tambémtem incidência para a concessãode uso especial para fins demoradia e para a concessão dedireito real de uso, novos direitosreais incluídos nos incisos XI eXII do art. 1.225 do CódigoCivil, pela Lei 11.481/2007. Taisdireitos reais referem-se a áreaspúblicas, geralmente invadidas eurbanizadas por favelas. Houveum claro intuito de regularização

Page 1132: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

jurídica das áreas favelizadas,dentro da política de reformaurbana, para que a situação deantidireito passe a ser tratadapelo Direito.

Anote-se que a concessãoreal de uso constava dos arts. 7ºe 8º do Decreto-lei 271/1967com as alterações da Lei11.481/2007. Enuncia a primeiranorma que “é instituída aconcessão de uso de terrenospúblicos ou particularesremunerada ou gratuita, por tempocerto ou indeterminado, comodireito real resolúvel, para finsespecíficos de regularização

Page 1133: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

fundiária de interesse social,urbanização, industrialização,edificação, cultivo da terra,aproveitamento sustentável dasvárzeas, preservação dascomunidades tradicionais e seusmeios de subsistência ou outrasmodalidades de interesse socialem áreas urbanas”.

Por seu turno, a concessãode uso para fins de moradia estátratada pela Medida Provisória2.220/2001, que ainda continuaem tramitação formal noCongresso Nacional. Dispõe aMedida Provisória em seu art. 1ºque “aquele que, até 30 de junho

Page 1134: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

de 2001, possuiu como seu, porcinco anos, ininterruptamente esem oposição, até duzentos ecinquenta metros quadrados deimóvel público situado em áreaurbana, utilizando-o para suamoradia ou de sua família, tem odireito à concessão de usoespecial para fins de moradia emrelação ao bem objeto da posse,desde que não seja proprietárioou concessionário, a qualquertítulo, de outro imóvel urbano ourural”.

Nos dois casos, deve ficarbem claro que os institutosconstituem alternativas de

Page 1135: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

regularização fundiária possível,eis que não se pode adquirir ascitadas áreas públicas porusucapião (arts. 183, § 3º, e 191,parágrafo único, da CF/1988).Espera-se, por questão de justiçae democrática distribuição dasterras, que as categorias tenham aefetiva concreção prática, o queainda é muito tímido até opresente momento, na nossavisão.

Comentado o art. 791 doCódigo de Processo Civilemergente, o seu dispositivoposterior procurou aperfeiçoar otratamento da fraude à execução,

Page 1136: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

na linha do que caminhou adoutrina e a jurisprudência. Dessaforma, conforme o novo art. 792do CPC/2015, considera-sefraude à execução a alienação oua oneração de bem realizada emcinco variantes possíveis,sabendo-se que o art. 593 doCPC/1973 previa três hipóteses.

A primeira situação, játratada no sistema anterior, dizrespeito à hipótese de pendênciade ação fundada em direito realou com pretensão reipersecutória,desde que a pendência doprocesso tenha sido averbada norespectivo registro público, se

Page 1137: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

houver. Como ação fundada emdireito real, o que não énovidade, entenda-se aquela quetem esteio em um dos direitosprevistos no art. 1.225 do CódigoCivil, a saber: a) propriedade; b)superfície; c) servidões, d)usufruto; e) uso; f) habitação; g)direito do promitente compradordo imóvel (compromisso decompra e venda registrado namatrícula do imóvel); h) penhor;i) hipoteca; j) anticrese; k)concessão de uso especial parafins de moradia; e l) a concessãode direito real de uso. Apesar dafalta de menção, a ação fundada

Page 1138: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

em alienação fiduciária emgarantia, direito real de garantiasobre coisa própria, tem o mesmoefeito. Como temos sustentado, orol dos direitos reais previsto nocitado diploma material émeramente exemplificativo(numerus apertus), havendooutros direitos reais previstos emleis especiais. Em suma, não hámais taxatividade dos direitosreais na codificação, mas simtipicidade, com a necessidade deregulamentação legal. Relembre-se que a alienação fiduciária emgarantia é regulada pela Lei9.514/1997 – para os bens

Page 1139: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

imóveis – e pelo Decreto-lei911/1969 – para os bens móveis.

Sem dúvidas, será debatidose o compromisso de compra evenda não registrado na matrículatem o condão de gerar aconfiguração da fraude àexecução, no caso de alienaçãodo imóvel. O presente autorentende que sim, pela tendênciade aproximação, quanto aos seusefeitos, do compromisso decompra não registrado àquele queé registrado na matrícula. Nessesentido, aliás, cite-se a antigaSúmula 84 do Superior Tribunalde Justiça, que há muito tempo

Page 1140: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

reconhece ao titular desse direitoobrigacional a permissão paraingressar com embargos deterceiro, tendo a ementa aseguinte dicção: “é admissível aoposição de embargos de terceirofundados em alegação de posseadvinda do compromisso decompra e venda de imóvel, aindaque desprovido do registro”.Adotando exatamente a tese pornós seguida, da recentejurisprudência paulista, a sermantida na emergência do NovoCPC: “A transferência do bemimóvel, cujos direitos advindosde compromisso de compra e

Page 1141: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

venda não registrado foramanteriormente penhorados, porquereduz a garantia patrimonial doexecutado, pode caracterizarfraude à execução, consoante aprevisão contida no art. 593 doCódigo de Processo Civil.Recurso provido” (TJSP, Agravode Instrumento 2126309-47.2014.8.26.0000, Acórdão8098042, Campinas, VigésimaPrimeira Câmara de DireitoPrivado, Rel. Des. Itamar Gaino,j. 15.12.2014, DJESP19.12.2014).

Pois bem, a inovação dotratamento do art. 792, inciso I,

Page 1142: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

do Novo CPC diz respeito àexistência de ação reipersecutóriapara a configuração da fraude àexecução, aquela que visa àtomada do bem diante dapresença de uma obrigaçãoambulatória ou propter rem(própria da coisa). A título deexemplo, pode ser citada umaação de cobrança de dívidascondominiais, típica obrigaçãodessa natureza pela regra do art.1.345 do Código Civil, in verbis:“O adquirente de unidaderesponde pelos débitos doalienante, em relação aocondomínio, inclusive multas e

Page 1143: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

juros moratórios”.Outra previsão que

representa novidade na lei é a doinciso II do diploma em estudo,segundo o qual caracteriza fraudeà execução a alienação ou aoneração de bem imóvelrealizada quando tiver sidoaverbada, em seu registro, apendência do processo deexecução. O dispositivorepresenta projeção do que erareconhecido pela jurisprudência,consolidado na Súmula 375 doSuperior Tribunal de Justiça,prevendo que “O reconhecimentoda fraude à execução depende do

Page 1144: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

registro da penhora do bemalienado ou da prova de má-fé doterceiro adquirente”. Como énotório, por conta dessa sumularhouve um giro de cento e oitentagraus quanto ao posicionamentoprático sobre o tema. Isso porque,existindo fraude à execução,sempre se entendeu não havernecessidade de prova do conluiofraudulento entre os envolvidos,presente uma presunção absolutaou iure et de iure da suaconfiguração. Pela ementadestacada, passou-se a entenderque a má-fé não poderia serpresumida, sendo necessária a

Page 1145: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

sua prova.Tal posição foi confirmada

por recente acórdão publicado noInformativo n. 552 do SuperiorTribunal de Justiça, em incidentede recursos repetitivos e pela suaCorte Especial, nos seguintestermos: “No que diz respeito àfraude de execução, definiu-seque: (i) é indispensável citaçãoválida para configuração dafraude de execução, ressalvada ahipótese prevista no § 3º do art.615-A do CPC; (ii) oreconhecimento da fraude deexecução depende do registro dapenhora do bem alienado ou da

Page 1146: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

prova de má-fé do terceiroadquirente (Súmula 375/STJ);(iii) a presunção de boa-fé éprincípio geral de direitouniversalmente aceito, sendomilenar a parêmia: a boa-fé sepresume, a má-fé se prova; (iv)inexistindo registro da penhora namatrícula do imóvel, é do credoro ônus da prova de que o terceiroadquirente tinha conhecimento dedemanda capaz de levar oalienante à insolvência, sob penade tornar-se letra morta odisposto no art. 659, § 4º, doCPC; e (v) conforme previsto no§ 3º do art. 615-A do CPC,

Page 1147: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

presume-se em fraude deexecução a alienação ou oneraçãode bens realizada após aaverbação referida nodispositivo. De início, deveprevalecer a posiçãomajoritariamente adotada por esteTribunal ao longo do tempo, aqual exige a citação válida comopressuposto para caracterizaçãoda fraude de execução (AgRg noREsp 316.905/SP, Quarta Turma,DJe 18.12.2008; e REsp418.109/SP, Terceira Turma, DJ02.09.2002). Quanto ao ônus daprova da intenção do terceiroadquirente, não é razoável adotar

Page 1148: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

entendimento que privilegie ainversão de um princípio geral dedireito universalmente aceito, oda presunção da boa-fé, sendomesmo milenar a parêmia: a boa-fé se presume; a má-fé se prova.A propósito, ensina a doutrinaque, para o terceiro, éperfeitamente possível admitirque tenha adquirido o bemalienado pelo litigante ignorandoa existência do processo e doprejuízo que este veio a sofrer.Vale dizer: é possível que tenhaagido de boa-fé, e à ordemjurídica, em princípio, nãointeressa desprezar a boa-fé.

Page 1149: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

Ademais, o STJ também já seposicionou no sentido de que ‘nãotendo o registro imobiliáriorecebido a notícia da existênciada ação, a presunção de licitudeda alienação milita em favor docomprador. Entendimentocontrário geraria intranquilidadenos atos negociais, conspirariacontra o comércio jurídico, eatingiria a mais não poder aconfiabilidade nos registrospúblicos’ (REsp 113.871/DF,Quarta Turma, DJ 15.09.1997)”(STJ, REsp 956.943/PR, Rel.originária Min. Nancy Andrighi,Rel. para acórdão Min. João

Page 1150: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

Otávio de Noronha, j.20.08.2014). Ao presente autorparece que o art. 792, inciso II,do CPC/2015 somente confirma oentendimento resumido na ementade publicação.

Pontue-se, ato contínuo, quena mesma linha foi convertida emlei, ao início de 2015, a MedidaProvisória 656/2014, que tratavado assunto. Nos termos do art. 54da novel Lei 13.097, de19.01.2015, os negócios jurídicosque tenham por fim constituir,transferir ou modificar direitosreais sobre imóveis são eficazesem relação a atos jurídicos

Page 1151: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

precedentes, nas hipóteses em quenão tenham sido registradas ouaverbadas na matrícula do imóvelas seguintes informações: a)registro de citação de ações reaisou pessoais reipersecutórias; b)averbação, por solicitação dointeressado, de constriçãojudicial, do ajuizamento de açãode execução ou de fase decumprimento de sentença,procedendo-se nos termosprevistos da lei processualvigente; c) averbação de restriçãoadministrativa ou convencionalao gozo de direitos registrados,de indisponibilidade ou de outros

Page 1152: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

ônus quando previstos em lei; ed) averbação, mediante decisãojudicial, da existência de outrotipo de ação cujos resultados ouresponsabilidade patrimonialpossam reduzir seu proprietário àinsolvência, caracterizandojustamente a fraude à execução.

Em complemento, conformeo seu parágrafo único, nãopoderão ser opostas situaçõesjurídicas não constantes damatrícula no Registro de Imóveis,inclusive para fins de evicção, aoterceiro de boa-fé que adquirir oureceber em garantia direitos reaissobre o imóvel, ressalvados os

Page 1153: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

arts. 129 e 130 da Nova Lei deFalências, e as hipóteses deaquisição e extinção dapropriedade que independam deregistro de título de imóvel.

Além disso, a alienação ouoneração de unidades autônomasintegrantes de incorporaçãoimobiliária, parcelamento do soloou condomínio edilício,devidamente registrada namatrícula, não poderá ser objetode evicção ou de decretação deineficácia. Todavia, os eventuaiscredores do alienante ficam sub-rogados no preço ou no eventualcrédito imobiliário, sem prejuízo

Page 1154: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

das perdas e danos imputáveis aoincorporador ou empreendedor,decorrentes de seu dolo ou culpa,bem como da aplicação dasdisposições constantes do Códigode Defesa do Consumidor (art. 55da Lei 13.097/2015).

Constata-se que o NovoCódigo de Processo Civil surgecom a sistemática dessa normaem vigor, devendo com eladialogar, o que é plenamentepossível, pois ambas adotam asmesmas premissas a respeito daboa-fé. Em resumo, acreditamosque intensas serão as interaçõesentre os dois diplomas no futuro.

Page 1155: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

A propósito, no mesmosentido, a terceira hipótese emque se verifica a fraude àexecução, nos termos doCPC/2015, dá-se quando tiversido averbada, no registro doimóvel alienado, hipotecajudiciária ou outro ato deconstrição judicial originário doprocesso no qual foi arguida afraude. A hipoteca judiciária estátratada no art. 495 do mesmoEstatuto Processual de 2015,preceituando a norma que “Adecisão que condenar o réu aopagamento de prestaçãoconsistente em dinheiro e a que

Page 1156: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

determinar a conversão deprestação de fazer, de não fazerou de dar coisa em prestaçãopecuniária valerão como títuloconstitutivo de hipotecajudiciária”.

Pontue-se que, apesar de ahipoteca judiciária estar tratadaanteriormente no art. 466-B doCPC/1973, não havia, na lei,expressa correlação com a fraudeà execução, o que vem em boahora. Tanto isso é verdade que onovo § 1º do art. 495 doCPC/2015 enuncia que a decisãoproduz a hipoteca judiciária,embora a condenação seja

Page 1157: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

genérica, ainda que o credorpossa promover o cumprimentoprovisório da sentença ou estejapendente arresto sobre bem dodevedor e mesmo que essahipoteca seja impugnada porrecurso dotado de efeitosuspensivo.

Voltando às situações em quese configura a fraude à execução,o inciso IV do art. 792 doCPC/2015 estabelece suacaracterização quando, ao tempoda alienação ou oneração,tramitava contra o devedor açãocapaz de reduzi-lo à insolvência.Aqui não houve inovação, sendo

Page 1158: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

esse o sentido do art. 593, incisoII, do CPC/1973, configurando asituação clássica do instituto.Todavia, continua sendo válida acrítica pela qual não é a ação queé capaz de reduzir o devedor àinsolvência, mas a alienaçãorealizada em fraude, aspecto bemobservado por Daniel AmorimAssumpção Neves.7 Emcomplemento, como expõeAlexandre Freitas Câmara, apesarda expressão utilizada pelodispositivo processual, “poucoimporta se a demanda era ou nãocapaz de tornar o devedorinsolvente. A insolvência deve

Page 1159: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

ser resultado do ato de alienaçãoou oneração realizada no cursodo processo para que sejaconsiderada em fraude deexecução”.8

Como quinta e últimahipótese, o art. 792 do CPC/2015prevê que a fraude à execuçãoestará configurada nos demaiscasos expressos em lei. Continuapodendo ser citada, com exemplo,dentre outros, a hipótese do art.185 do Código TributárioNacional, com a seguinte dicção:“presume-se fraudulenta aalienação ou oneração de bens ourendas, ou seu começo, por

Page 1160: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

sujeito passivo em débito paracom a Fazenda Pública, porcrédito tributário regularmenteinscrito como dívida ativa”.Como se percebe, continuaprevista uma cláusula geral parapreenchimento de novas situaçõestipificadas de fraude, inclusivepelas legislações futuras.

Analisadas as situaçõescaracterizadoras de fraude àexecução, o § 1º do art. 792 doCPC/2015, outra previsãoinédita, estatui que a alienaçãoem fraude à execução é ineficazem relação ao exequente. Naverdade, o dispositivo somente

Page 1161: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

confirma a consequência que eraapontada pela doutrina e pelajurisprudência com unanimidade.Agora não paira qualquer dúvidaquanto à solução do problema noplano da eficácia.

Ademais, o § 2º do mesmoart. 792 do CPC/2015 prescreve,também como inovaçãolegislativa, que, no caso deaquisição de bem não sujeito aregistro, o terceiro adquirente temo ônus de provar que adotou ascautelas necessárias para aaquisição, mediante a exibiçãodas certidões pertinentes, obtidasno domicílio do vendedor e no

Page 1162: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

local onde se encontra o bem.Apesar da presunção de boa-fédo terceiro adquirente de bensmóveis, na esteira da Súmula 375do STJ – antes citada –, caberá aeste provar a máxima diligênciana aquisição de bens. Semdúvidas que a nova previsãoacaba por mitigar o teor sumular,invertendo o ônus da prova, poisantes cabia ao prejudicado aprova da má-fé.

Como visto, nas hipóteses dedesconsideração dapersonalidade jurídica,reconhecida no incidente aquiantes estudado, a fraude à

Page 1163: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

execução verifica-se a partir dacitação da parte cujapersonalidade se pretendedesconsiderar (art. 792, § 3º, doCPC/2015). Finalizando, tambémsem previsão expressa no sistemaanterior, antes de declarar afraude à execução, o juiz deveráintimar o terceiro adquirente, que,se quiser, poderá opor embargosde terceiro, no prazo de 15 dias(art. 792, § 4º, do CPC/2015).

Expostas e analisadas asregras quanto à fraude àexecução, continuam vigentes asantigas diferenças expostas noque se refere à fraude contra

Page 1164: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

credores, vício social do negóciojurídico. Interessante, dentro daproposta desta obra, repisar taisdiferenciações.

Inicialmente, a fraude contracredores constitui instituto deDireito Civil, estudada no âmbitoda teoria geral do negóciojurídico, objeto da Parte Geral doCódigo Civil. Por outro lado, afraude à execução é categoria doDireito Processual Civil,abordada no tópico relativo àresponsabilidade patrimonial, queora se estuda.

Na fraude contra credores, énecessária uma ação específica, a

Page 1165: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

ação anulatória de negóciojurídico, denominada de açãopauliana, diante de sua origemromana. Na fraude à execução,não há necessidade de o credorpromover ação pauliana, umavez que o ato não é anulável, masineficaz perante a ação deexecução ou a ação condenatória.Portanto, a alienação ocorrida emfraude à execução pode serdeclarada ineficaz e reconhecidano próprio processo de execuçãomediante simples requerimento daparte lesada. Os bens penhoradospodem, como regra, ser vendidosdesde que o comprador tenha

Page 1166: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

ciência e aceite o fato da penhora.Contudo, independentementedessa venda, os bens penhoradoscontinuam gravados e vinculadosao processo de execução.

Na fraude contra credores,há um atentando à parte,envolvendo esta a ordem privada,ou seja, um interesse particular.Na fraude à execução, estápresente um ato atentatório contraa dignidade da justiça,envolvendo ordem pública. Comodecorrência natural dessadiferenciação, a fraude contracredores não pode ser conhecidade ofício pelo juiz, eis que o art.

Page 1167: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

177 do Código Civil é claro nosentido de que a anulabilidadenão se pronuncia ex officio. Poroutra via, o juiz, tendoconhecimento, pode declarar afraude à execução,independentemente da alegaçãoda parte. Nessa trilha, conformerecente aresto superior, “como éo patrimônio do devedor quegarante suas dívidas, caracterizafraude à execução adisponibilidade de bens pelodemandado, após a citação, queresulte em sua insolvência,frustrando a atuação da Justiça,podendo ser pronunciada

Page 1168: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

incidentalmente nos autos daexecução, de ofício ou arequerimento do credorprejudicado, sem necessidade deajuizamento de ação própria”(STJ, REsp 1.252.353/SP, QuartaTurma, Rel. Min. Luis FelipeSalomão, j. 21.05.2013, DJe21.06.2013).

Por derradeiro quanto àsdiferenças entre a fraude contracredores e a fraude à execução, asentença da ação pauliana éconstitutiva negativa, ou seja,anulatória, sujeita a um prazodecadencial de quatro anos, acontar da realização do ato,

Page 1169: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

previsto no art. 178 do CódigoCivil. A fraude contra credoresenvolve o plano da validade donegócio jurídico. Por outra linha,na fraude à execução, a decisãoque a reconhece tem naturezadeclaratória, podendo serpleiteada a qualquer tempo, semprazo específico. A últimacategoria processual, não deixamais dúvidas o Novo CPC,envolve o plano da eficácia doato praticado.

Seguindo no estudo dosdemais preceitos do EstatutoProcessual emergente, semqualquer novidade, prevê o seu

Page 1170: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

art. 793 que o exequente queestiver, por direito de retenção,na posse de coisa pertencente aodevedor não poderá promover aexecução sobre outros bens senãodepois de excutida a coisa que seachar em seu poder. O diploma éreprodução do art. 594 do CPCde 1973. Continua servindo comoexemplo a hipótese do locatário,que tendo título executivo, exerceo direito de retenção porbenfeitorias necessárias e úteis,como possuidor de boa-fé,consoante o art. 1.219 do CódigoCivil Brasileiro, in verbis: “Opossuidor de boa-fé tem direito à

Page 1171: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce
Page 1172: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce
Page 1173: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce
Page 1174: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce
Page 1175: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce
Page 1176: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce
Page 1177: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce
Page 1178: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce
Page 1179: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce
Page 1180: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce
Page 1181: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce
Page 1182: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce
Page 1183: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce
Page 1184: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce
Page 1185: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce
Page 1186: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce
Page 1187: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce
Page 1188: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce
Page 1189: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce
Page 1190: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce
Page 1191: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce
Page 1192: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce
Page 1193: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce
Page 1194: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce
Page 1195: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce
Page 1196: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce
Page 1197: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce
Page 1198: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce
Page 1199: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce
Page 1200: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce
Page 1201: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce
Page 1202: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce
Page 1203: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce
Page 1204: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce
Page 1205: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce
Page 1206: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce
Page 1207: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce
Page 1208: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce
Page 1209: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce
Page 1210: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce
Page 1211: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce
Page 1212: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce
Page 1213: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce
Page 1214: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce
Page 1215: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce
Page 1216: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce
Page 1217: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce
Page 1218: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce
Page 1219: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce
Page 1220: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce
Page 1221: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce
Page 1222: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce
Page 1223: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce
Page 1224: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce
Page 1225: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce
Page 1226: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce
Page 1227: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce
Page 1228: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce
Page 1229: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce
Page 1230: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce
Page 1231: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce
Page 1232: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce
Page 1233: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce
Page 1234: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce
Page 1235: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce
Page 1236: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce
Page 1237: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce
Page 1238: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce
Page 1239: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce
Page 1240: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce
Page 1241: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce
Page 1242: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce
Page 1243: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce
Page 1244: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce
Page 1245: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce
Page 1246: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce
Page 1247: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce
Page 1248: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce
Page 1249: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce
Page 1250: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce
Page 1251: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce
Page 1252: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce
Page 1253: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce
Page 1254: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce
Page 1255: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce
Page 1256: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce
Page 1257: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce
Page 1258: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce
Page 1259: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce
Page 1260: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce
Page 1261: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce
Page 1262: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce
Page 1263: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce
Page 1264: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce
Page 1265: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

requerido a proteção diversadaquela adequada à solução dainjusta situação criada pelo réu.Aliás, por diversas vezes o autorpromove ação em razão dedeterminada conduta do réu e estavem a ser modificada no curso doprocesso, impondo ao juiz,demonstrada tal circunstância, aconcessão da proteçãopossessória pertinente”.1

Contudo, o novo art. 554 doCPC/2015 traz parágrafos queantes não estavam previstos, comclara preocupação social e nalinha de procedimentos que eramadotados na prática para as

Page 1266: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

situações fáticas de conflitosfundiários.

De início, conforme o seu §1º, no caso de ação possessóriaem que figure no polo passivogrande número de pessoas, serãofeitas a citação pessoal dosocupantes que forem encontradosno local e a citação por edital dosdemais. Ato contínuo, será aindadeterminada a intimação doMinistério Público e, se envolverpessoas em situação dehipossuficiência econômica, daDefensoria Pública.

Para essa citação pessoal, ooficial de justiça procurará os

Page 1267: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

ocupantes no local por uma vez eos que não forem encontradosserão citados por edital (§ 2º doart. 554 do CPC/2015). Por fim,está agora previsto expressamenteque o juiz da causa deverádeterminar que se dê amplapublicidade sobre a existênciadessa ação que envolva váriosocupantes e dos respectivosprazos processuais. Para tanto,poderá o magistrado valer-se deanúncios em jornal ou rádiolocais, da publicação de cartazesna região do conflito, e de outrosmeios (§ 3º do art. 554 doCPC/2015). Como outro meio,

Page 1268: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

pode ser citada uma publicaçãoeletrônica, realizada no sítio doTribunal onde está o conflito deterras.

Em um intenso diálogo entreas fontes, é preciso relacionar asações possessórias àclassificação da posse quanto aotempo. Isso porque, se no casoconcreto, a ameaça, a turbação eo esbulho forem novos, ou seja,tiverem menos de um ano e umdia, será viável juridicamente aação de força nova, fazendo queo respectivo interdito possessóriosiga o rito especial, admitindo-seliminar nessa ação. Por outra via,

Page 1269: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

se a ameaça, a turbação e oesbulho forem velhos, com pelomenos um ano e um dia, caberáação de força velha, que segue orito ordinário, não sendo possívela respectiva liminar.

Essas conclusões sãoorientadas pela redação do art.558 do Novo Código de ProcessoCivil, que repete a essência doart. 924 do Estatuto Processual de1973, de acordo com a tabela aseguir:

Novo

Page 1270: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

Código deProcesso

Civil

Código deProcesso Civil

Antigo

“Art. 558.Regem oprocedimentodemanutenção edereintegraçãode posse asnormas daSeção IIdesteCapítuloquando aação forpropostadentro de ano

“Art. 924.Regem oprocedimento demanutenção ede reintegraçãode posse asnormas daseção seguinte,quando

Page 1271: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

e dia daturbação oudo esbulhoafirmado napetiçãoinicial.

Parágrafoúnico.Passado oprazo referidono caput,será comumoprocedimento,não perdendo,contudo, ocaráterpossessório”.

intentado dentrode ano e dia daturbação ou doesbulho;passado esseprazo, seráordinário, nãoperdendo,contudo, ocaráterpossessório”.

Na doutrina processual,

Page 1272: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

essas decorrências sempre forambem explicadas por Nelson NeryJr. e Rosa Maria de AndradeNery, no sentido de que há umacompatibilidade entre essecomando processual e o art.1.210 do CC/2002. Salientam osjuristas que, como o atual CódigoCivil não reproduziu a antigaregra do art. 523 do CC/1916, amatéria ficou consolidada nodispositivo processual anterior, oque deve ser igualmenteconsiderado no Novo CPC, naopinião deste autor.2 Em suma, aação de força nova é aquela quesegue as regras de procedimento

Page 1273: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

especial previstas entre os arts.560 a 566 do Novo EstatutoProcessual (arts. 926 a 931 dorevogado CPC).

Porém, necessário aquitrazer a lume uma crítica de cunhomaterial, que deve ser repetidacom a emergência do novelCódigo Processual,especialmente pela manutençãodesse tratamento anterior. Aproblemática diz respeito àclassificação da posse quanto aotempo e no que diz respeito aosvícios objetivos.

Em relação ao tempo, oinstituto é assim classificado: a)

Page 1274: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

posse nova, a que conta commenos de um ano e um dia, ouseja, é aquela com até um ano; b)posse velha, a que tem pelomenos um ano e um dia, ou seja,com um ano e um dia ou mais.Esclareça-se, por oportuno, que opresente autor filia-se à doutrinade Maria Helena Diniz e CarlosRoberto Gonçalves, que entendemque a posse que tem um ano e umdia é velha.3 Cabe tambémlembrar que tais critériostemporais têm origem noscostumes, principalmente nosperíodos de colheitas, apesar decerta obscuridade das fontes.4

Page 1275: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

No Código Civil de 1916, acitada classificação era retiradado seu art. 507, pelo qual, “Naposse de menos de ano e dia,nenhum possuidor serámanutenido, ou reintegradojudicialmente, senão contra osque não tiverem melhor posse.Parágrafo único. Entende-semelhor a posse que se fundar emjusto título; na falta de título, ousendo os títulos iguais, a maisantiga; se da mesma data, a posseatual. Mas, se todas foremduvidosas, será sequestrada acoisa, enquanto se não apurar aquem toque”. Além desse

Page 1276: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

comando, estabelecia o art. 523do CC/1916 que “As ações demanutenção e as de esbulho serãosumárias, quando intentadasdentro em ano e dia da turbaçãoou esbulho; e, passado esseprazo, ordinárias, não perdendo,contudo, o caráter possessório.Parágrafo único. O prazo de ano edia não corre enquanto opossuidor defende a posse,restabelecendo a situação de fatoanterior à turbação, ou aoesbulho”.

Como antes destacado, combase na doutrina do casal Nery,os dispositivos não foram

Page 1277: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

reproduzidos pelo Código Civilde 2002, razão pela qual se deveentender que os seus conteúdosencontram-se revogados, semmais aplicação. Sendo assim, emrelação aos efeitos jurídicos daclassificação da posse quanto aotempo, a matéria ficouconsolidada no art. 924 doanterior Código de ProcessoCivil e, agora, no art. 558 doNovo Código de Processo Civil,expostos na última tabela.

Partindo para a classificaçãoda posse quanto aos víciosobjetivos, podem ser retiradasduas categorias do art. 1.200 do

Page 1278: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

CC/2002. De início, a posse justaé a que não apresenta os vícios daviolência, da clandestinidade ouda precariedade, sendo umaposse limpa. Por seu turno, aposse injusta tem os referidosvícios, pois foi adquirida pormeio de ato de violência, atoclandestino ou de precariedade.Por isso, a posse injusta édividida em três submodalidades.

A primeira delas é a posseviolenta, obtida por meio deesbulho, por força física ouviolência moral (vis). A doutrinatem o costume de associá-la aocrime de roubo. A título de

Page 1279: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

ilustração, imagine-se a hipótesede integrantes de um movimentopopular que invademviolentamente, removendo edestruindo obstáculos, umapropriedade rural que está sendoutilizada pelo proprietário,cumprindo a sua função social.

A segunda categoria deposse injusta é a posseclandestina, adquirida àsescondidas, de forma oculta, àsurdina, na calada da noite(clam). É assemelhada ao crimede furto. Para exemplificar,integrantes de um movimentopopular invadem, à noite e sem

Page 1280: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

violência, uma propriedade ruralque está sendo utilizada peloproprietário, cumprindo a suafunção social.

Como terceira e últimasubmodalidade, a posse precáriaé a obtida com abuso deconfiança ou de direito(precario). Tem formaassemelhada ao crime deestelionato ou à apropriaçãoindébita, sendo tambémdenominada esbulho pacífico. Aconcretizar, cite-se a situação deo locatário de um bem móvel quenão devolve o veículo ao final docontrato.

Page 1281: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

Observe-se que basta apresença de apenas um doscritérios acima para que a posseseja caracterizada como injusta,não havendo exigência decumulação. Em outras palavras,os vícios são isolados e nãocumulativos.

Como é notório, a últimaclassificação exposta éimportante e traz algumasconsequências jurídicas querepercutem diretamente naprática. De início, a posse,mesmo que injusta, ainda é possee pode ser defendida por açõesdo juízo possessório, não contra

Page 1282: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

aquele de quem se tirou a coisa,mas sim em face de terceiros.Isso porque a posse somente éviciada em relação a umadeterminada pessoa (efeitos interpartes), não tendo o vício efeitoscontra todos, ou seja, ergaomnes.5 No mesmo sentido, sãoas palavras de Francisco EduardoLoureiro, Desembargador doTribunal de Justiça de São Paulo:“Causa perplexidade o fato de osocupantes violentos ouclandestinos, porque merosdetentores, não terem defesapossessória contra a agressãoinjusta de terceiros. Como,

Page 1283: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

porém, alerta Nelson Rosenvald,essa é a única hipótese em que odetentor, por não ser meroinstrumento da posse de terceiro,tem a tutela possessória contra oataque injusto de terceiros, quenão a vítima, de quem obteve opoder imediato de modovicioso”.6

Além disso, segundo a visãoclássica e pelo que consta do art.1.208, segunda parte, do atualCódigo Civil, as posses injustaspor violência ou clandestinidadepodem ser convalidadas, o quenão se aplicaria à posse injustapor precariedade. Enuncia a

Page 1284: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

norma material em questão que“não induzem posse os atos demera permissão ou tolerânciaassim como não autorizam a suaaquisição os atos violentos, ouclandestinos, senão depois decessar a violência ou aclandestinidade”. Aqui é quesurge o problema de o Novo CPCter mantido a regra do art. 558(antes art. 924 do CPC de 1973).

O dispositivo materialcitado acaba quebrando a regrapela qual a posse mantém omesmo caráter com que foiadquirida, conforme o art. 1.203do CC/2002, e que consagra o

Page 1285: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

princípio da continuidade docaráter da posse. Ato contínuo,reconhece que aqueles que têmposse violenta ou clandestina nãotêm posse plena, para finsjurídicos, sendo merosdetentores. Tal previsão causaperplexidade, pois nega oconceito de posse injusta,entrando em clara contradiçãocom o art. 1.200 da própriacodificação. De toda sorte, opresente autor segue a linha quereconhece na posse injusta aexistência de posse, e não dedetenção.

Diante dessa situação

Page 1286: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

jurídica, é comum afirmar,conciliando-se o art. 1.208 doCC/2002 com o art. 924 doCPC/1973, que, após um ano eum dia do ato de violência ou declandestinidade, a posse deixa deser injusta e passa a ser justa.Entre os civilistas, tal posição édefendida, por exemplo, porMaria Helena Diniz.7

Com o devido respeito, esteautor filia-se à corrente que pregaa análise dessa cessação caso acaso, em consonância com afinalidade social da posse,encabeçada por Marco AurélioBezerra de Melo e Sílvio de

Page 1287: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

Salvo Venosa.8 Trata-se deaplicação do princípio da funçãosocial da posse, interpretando-sea categoria de acordo com o meioque a cerca, o que traz comoconclusão a premissa de que acura da injustiça pode ocorrerantes de um ano e um dia ou atédepois desse prazo.

A princípio, imagine-se ocaso de invasão de um imóvel emque os ocupantes dão umadestinação à área melhorqualificada do que os antigospossuidores, entrando em cena aideia de melhor posse, a partir desua função social. Nesse caso,

Page 1288: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

pensamos, a alteração no caráterda posse pode ocorrer antes deum ano e um dia. Por outra via,pense-se na hipótese em que aobtenção da posse de um veículoocorreu por meio de umhomicídio. Essa posse injusta, naopinião deste autor, nunca poderáser curada.

De qualquer modo, mesmotendo o Novo CPC confirmado adivisão das ações de força nova evelha, acredita-se que seja omomento de rever a utilização doparâmetro objetivo processualpara que a posse injusta passe aser justa. Em apertada síntese, a

Page 1289: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

alteração do caráter da possedeve ter como parâmetro a suafunção social, e não um merorequisito temporal.

Seguindo no estudo dosdemais preceitos processuais, oart. 555 do Novo Código deProcesso Civil estabelece que élícito ao autor cumular ao pedidopossessório o de: a) condenaçãoem perdas e danos; e b)indenização dos frutos. A mençãoàs perdas e danos constava do art.921, inciso I, do antigo CPC, einclui, em regra, os danosemergentes (o que a pessoaefetivamente perdeu) e os lucros

Page 1290: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

cessantes (o que a pessoarazoavelmente deixou de lucrar),nos termos dos arts. 402 a 404 doCC/2002. No entanto, alémdesses danos materiais oupatrimoniais, deve-se entenderque cabe indenização por danosmorais, se o possuidor que sofreuo atentado à posse sofreu umalesão aos direitos dapersonalidade.

A título de exemplo defixação dos danos materiais, cite-se o aluguel-pena devido noscasos de comodato, após anotificação do comodatário pelocomodante, conforme se retira da

Page 1291: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

parte final do art. 582 do CódigoCivil, segundo o qual, “Ocomodatário constituído em mora,além de por ela responder,pagará, até restituí-la, o aluguelda coisa que for arbitrado pelocomodante”. Julgando dessemodo, da jurisprudência paulista:

“Ação de reintegração de posse cumuladacom perdas e danos. Comodato verbal.Imóveis de propriedade da autora.Notificação da ré, sem desocupação doimóvel. Esbulho caracterizado. Pedidos dearbitramento de aluguel e de pagamento dedébitos fiscais incidentes sobre o imóvel.Possibilidade. Sentença reformada. Recursoprovido” (TJSP, Apelação Cível 1000430-44.2014.8.26.0001, Acórdão 8083738, SãoPaulo, Trigésima Sétima Câmara de Direito

Page 1292: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

Privado, Rel. Des. Pedro Kodama, j.09.12.2014, DJESP 19.12.2014).

Como ilustração de danosmorais, mencione-se a situaçãodo proprietário que invade oimóvel quando vigente umcontrato de locação, arrombando-o e trocando a sua fechadura.Configurado o abuso de direitopor parte do locador, poderá olocatário ingressar com ação dereintegração de posse e pleiteardanos morais por lesão àmoradia. Nesse sentido, doTribunal Gaúcho, trecho daseguinte ementa, que reconhece,

Page 1293: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

ainda, a reparação de danospatrimoniais:

“O arrombamento do imóvel e substituição defechaduras por conta própria caracterizaabuso de direito (art. 187, Código Civil) e gerao dever de indenizar danos materiais e moraisdele decorrentes. Danos morais configurados.Indenização devida. Demonstrados os danosmateriais correspondentes à perda de bensmóveis (insumos) que se encontravam noestabelecimento do locatário, bem como aocorrência de lucros cessantes, é devida aindenização correspondente. Deferido opedido de reembolso do valor de serviçosprestados pela locatária aos clientes dolocador, em observância às circunstâncias docaso concreto” (TJRS, Apelação Cível0067563-16.2014.8.21.7000, Porto Alegre,Décima Sexta Câmara Cível, Rel. Des. PauloSérgio Scarparo, j. 20.11.2014, DJERS26.11.2014).

Page 1294: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

Entretanto, deve ser feita aressalva de que tais danosimateriais devem serevidenciados no caso concreto.Como reconhece o Enunciado n.159 do CJF/STJ, aprovado na IIIJornada de Direito Civil (2004),os danos morais não seconfundem com os merosaborrecimentos decorrentes dodia a dia, principalmente comaqueles resultantes de prejuízomeramente material. Do mesmoTribunal do Rio Grande do Sul,em discussão em ação dereintegração de posse, cumpre

Page 1295: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

transcrever:

“Ação de reintegração de posse cumuladacom indenização por danos morais. Aparelhorádio gravador. Conserto em oficina. Demorainjustificada na entrega do objeto. Pretensãoreintegratória reconhecida em sentença.Danos morais. Descabimento. Demandanteque superdimensiona o fato. Incômodo quenão possui relevância. Dano moral nãoconfigurado. Sentença integralmente mantida,inclusive no tocante à verba honorária. Apelodesprovido” (TJRS, Processo 70016062044,São Leopoldo, Vigésima Câmara Cível, JuizRel. José Aquino Flores de Camargo, data:16.08.2006).

O inciso II do art. 555 doNovo CPC determina também aindenização dos frutos pelo réuda ação ao autor, o que não

Page 1296: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

constava da Norma Processualanterior, apesar de estes seremenquadrados como danosmateriais (lucros cessantes). Valelembrar que os frutos são bensacessórios que saem do principalsem diminuir a sua quantidade.Para exemplificar, imagine-se ahipótese de reintegração de possede uma fazenda onde havia umaprodução de laranjas, que foramcolhidas pelos invasores,devendo ser ressarcidas.

O inc. II do art. 921 doCPC/1973 tratava da cominaçãode pena em caso de turbação ouesbulho. Essa pena constituía a

Page 1297: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

multa (astreintes) geralmentefixada nas ações possessórias ede forma diária. Como é notório,no interdito proibitório e na açãode manutenção de posse, essamulta sempre teve um papelfundamental, sendo esse o fim daliminar a ser deferida pelo juiz. Ocaráter dessa multa sempre foicoercitivo, evitando-se aocorrência de novos atentados àposse. No Novo CPC, a multapassa a ser retirada do parágrafoúnico do art. 555, segundo o qualpode o autor da ação possessóriarequerer, ainda, imposição demedida necessária e adequada

Page 1298: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

para evitar nova turbação ouesbulho ou cumprir-se a tutelaprovisória ou final.

Ato contínuo, o inciso III doart. 921 do CPC/1973possibilitava, na açãopossessória, o desfazimento deconstrução ou plantação feita emdetrimento da posse do autor daação, um pedido subsidiário deobrigação de fazer. Não sendopossível essa demolição, o autorda ação poderia pleitear aconversão em perdas e danos,como reconhecia ajurisprudência. Por todos, ademonstrar essa dedução:

Page 1299: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

“Demolitória. Edificação irregular. Açãocumulada com reintegração de posse. Obraedificada pelo requerido. Invasão do imóveldo requerente em 18 (dezoito) centímetros.Desfazimento da obra. Prejuízodesproporcional ao direito. Conversão emperdas e danos. Apropriação pelo requeridoda parte do imóvel do requerente sob aalegação de aquiescência do proprietárioanterior ao projeto apresentado àmunicipalidade. Desacolhimento, eis que aaludida anuência foi dada ao projeto e não àocupação de parte de seu imóvel peloacionado, sendo ainda certo que, para valercontra terceiros ou sucessores, a alteraçãodas medidas do imóvel do requerente, poreventual concordância do antigo proprietário,deveria estar averbada no RegistroImobiliário. Sentença de improcedênciareformada. Recurso parcialmente provido”(TJSP, Apelação Cível com Revisão 876.292-0/4, São José dos Campos, Trigésima QuartaCâmara de Direito Privado, Rel. Des. Irineu

Page 1300: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

Pedrotti, 25.10.2006, v.u., Voto 8.959).

O Novo Código de ProcessoCivil não reproduz essa regra.Todavia, a este autor parece que apossibilidade de desfazimento deconstrução ou plantaçãoenquadra-se no parágrafo únicodo seu art. 555, pela presença deuma medida necessária para ocumprimento da tutela provisóriaou final. Eventualmente, na linhado último aresto, também épossível a conversão final emperdas e danos.

Nos termos do art. 556 doNovo CPC, é lícito ao réu, na

Page 1301: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

contestação, alegando que foi oofendido em sua posse, demandara proteção possessória e aindenização pelos prejuízosresultantes da turbação ou doesbulho cometido pelo autor.Trata-se de reprodução literal doart. 922 do antigo CPC. Pelo queconsta desses dispositivos, e issoé notório e conhecido, as açõespossessórias diretas têm naturezadúplice, cabendo pedidocontraposto em favor do réu paraque a sua posse seja protegida nocaso concreto. Esse pedidocontraposto pode ser deproibição, de manutenção ou

Page 1302: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

mesmo de reintegração da posseem seu favor. Portanto, estátotalmente dispensada anecessidade de uma reconvençãopara a aplicação das medidasprevistas no art. 555 do novelEstatuto Processual, entendimentoque sempre prevaleceu quanto aoart. 922 do CPC/1973. Porém,como adverte a doutrina, caso oréu pretenda outra consequênciajurídica, que não seja a proteçãoda posse ou a indenização porperdas e danos, deverá ingressarcom ação declaratóriaincidental.9

Conforme o art. 557 do

Page 1303: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

Código de Processo Civilemergente, na pendência de açãopossessória é vedado, tanto aoautor quanto ao réu, propor açãode reconhecimento do domínio,exceto se a pretensão fordeduzida em face de terceirapessoa. Em complemento,prescreve o seu parágrafo únicoque não obsta à manutenção ou àreintegração de posse a alegaçãode propriedade, ou de outrodireito sobre a coisa. Fazendo adevida confrontação do preceitocom o art. 923 do antigo CPC, seucorrespondente, constata-se aintrodução da exceção quando a

Page 1304: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

discussão de propriedade dizrespeito a terceira pessoa. Nomais, os dois diplomas sãoequivalentes.

O dispositivo processualrevogado, assim, já previa que aalegação de exceção de domínio(exceptio proprietatis) nãobastava para a improcedência daação possessória. Aquela regrafoi repetida, em sentido próximo,pelo § 2º do art. 1.210 doCC/2002, pelo qual, “Não obsta àmanutenção ou reintegração naposse a alegação de propriedade,ou de outro direito sobre acoisa”. O que se entende é que o

Page 1305: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

Código Civil de 2002 consolidoua inviabilidade da alegação dedomínio, ou de propriedade, emsede de ação possessória, ouseja, trouxe uma divisão entre osjuízos possessório – em que sediscute a posse – e petitório – emque se discute a propriedade.

Nessa linha de raciocínio,estatui o Enunciado n. 78 doCJF/STJ, aprovado na I Jornadade Direito Civil, que, “Tendo emvista a não recepção, pelo novoCódigo Civil, da exceptioproprietatis (art. 1.210, § 2º) emcaso de ausência de provasuficiente para embasar decisão

Page 1306: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

liminar ou sentença finalancorada exclusivamente no iuspossessionis, deverá o pedido serindeferido e julgadoimprocedente, não obstanteeventual alegação e demonstraçãode direito real sobre o bemlitigioso”. Destaque-se que o art.505 do CC/1916, norma que nãotem correspondente no atualCódigo Civil, foi revogado, nãocabendo mais a prevalência dapropriedade e do domínio sobre aposse. Enunciava o dispositivodo Código Civil anterior que“Não obsta à manutenção, oureintegração na posse, a alegação

Page 1307: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

de domínio, ou de outro direitosobre a coisa. Não se deve,entretanto, julgar a posse emfavor daquele a quemevidentemente não pertencer odomínio”. Pode-se dizer que aúltima regra não mais persiste.

Mais do que isso, arremata oEnunciado n. 79 do CJF/STJ, damesma I Jornada de DireitoCivil, que “a exceptioproprietatis, como defesaoponível às ações possessóriastípicas, foi abolida pelo CódigoCivil de 2002, que estabeleceu aabsoluta separação entre os juízospossessório e petitório”. Em

Page 1308: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

outras palavras, a açãopossessória é a via adequadapara a discussão da posse;enquanto a ação petitória é a viaadequada para a discussão dapropriedade e do domínio, nãosendo possível embaralhar asduas vias. Pode-se afirmar, pelasfundamentações expostas, que jáestava prejudicada a redação daSúmula 487 do STF, pela qual,“Será deferida a posse a quem,evidentemente, tiver o domínio,se com base neste for eladisputada”. Isso porque não épossível discutir a posse em açãode discussão do domínio. Tudo

Page 1309: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

isso foi confirmado pelo NovoCódigo de Processo Civil,especialmente pelo parágrafoúnico do seu art. 557.

O art. 559 do EstatutoProcessual emergente prevê quese o réu provar, em qualquertempo, que o autorprovisoriamente mantido oureintegrado na posse carece deidoneidade financeira para, nahipótese de sucumbência,responder por perdas e danos, ojuiz designar-lhe-á o prazo decinco dias para requerer caução,real ou fidejussória (pessoal).Isso sob pena de ser depositada a

Page 1310: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

coisa litigiosa, ressalvada aimpossibilidade da parteeconomicamente hipossuficiente.A norma equivale ao art. 925 doCPC/1973, tratando da caução aser fixada no curso do interditopossessório. Como novidade quevem em boa hora, a caução édispensada para os autores queforem hipossuficientes, devendo omagistrado decidir de acordocom as peculiaridades do casoconcreto. Reafirme-se a posiçãodoutrinária anterior, no sentido dese exigir a idoneidade dessacaução.10

Superadas essas regras

Page 1311: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

gerais, o Código Processual Civilde 2015 continua a trazerprevisões específicas relativas àsações possessórias diretas, comofazia o seu antecessor.

No que toca às ações demanutenção e de reintegração deposse, estabelece o outroracomentado art. 560 que opossuidor tem direito a sermantido na posse em caso deturbação, e reintegrado, no deesbulho (art. 926 do CPC/1973).Para tanto, nos termos do art. 561do Novo CPC, que reproduzintegralmente o art. 927 do antigoCPC, incumbe ao autor da ação

Page 1312: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

provar: a) a sua posse; b) aturbação ou o esbulho praticadopelo réu; c) a data da turbação oudo esbulho; d) a continuação daposse, embora turbada, na açãode manutenção, ou a perda daposse, na ação de reintegração.Esses dados devem constar dapetição inicial, sob pena de suainépcia, conforme o art. 330, § 1º,inciso I, do CPC/2015;equivalente ao art. 295, parágrafoúnico, inciso I, do CPC/1973.

A possibilidade deconcessão de liminar inauditaaltera par, sem ouvir a outraparte, nas ações possessórias

Page 1313: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

diretas por força nova estáconfirmada no novo art. 562 doCPC/2015, caput, cuja redação éa seguinte: “Estando a petiçãoinicial devidamente instruída, ojuiz deferirá, sem ouvir o réu, aexpedição do mandado liminar demanutenção ou de reintegração,caso contrário, determinará que oautor justifique previamente oalegado, citando-se o réu paracomparecer à audiência que fordesignada”. O dispositivocorresponde ao art. 928 doCPC/1973, em sua integralidade.

A audiência mencionada é anotória audiência de

Page 1314: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

justificação, tão comum nasações possessórias. Com relaçãoa ela, prescreve o art. 563 doNovo CPC – equivalente, semalterações, ao art. 929 doCPC/1973 –, que, consideradasuficiente a justificação, o juizfará logo expedir mandado demanutenção ou de reintegração deposse.

Ao discutir a naturezajurídica da liminar, comentamNelson Nery Jr. e Rosa Maria deAndrade Nery que ela “temcaráter de adiantamento doresultado do pedido de proteçãopossessória. A concessão da

Page 1315: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

liminar funciona como se o juiztivesse julgado procedente opedido, liminar, antecipada eprovisoriamente, até que sejafeita a instrução e sobrevenha asentença. A única semelhançacom a cautelar é o atributo daprovisoriedade, já que o juizpode revogar a liminar econcedê-la, novamente, se for ocaso, ou a propósito do juízo deretratação, se for interpostoagravo de instrumento”.11

Também para Alexandre FreitasCâmara, os efeitos da liminar sãoos mesmos dos concedidos poruma sentença de procedência da

Page 1316: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

ação. Trata-se, portanto, de umatutela antecipada.12 O presenteautor também pensa da mesmaforma.

Em complemento, enuncia oparágrafo único do art. 562 doNovo CPC que, contra as pessoasjurídicas de Direito Público, nãoserá deferida a manutenção ou areintegração liminar sem préviaaudiência dos respectivosrepresentantes judiciais. Assim, aUnião, os Estados e osMunicípios devem antes serouvidos para depois serconcedida, eventualmente, aliminar. A norma, sem dúvidas, é

Page 1317: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

protetiva do Estado, não havendoqualquer alteração diante doparágrafo único do art. 928 doCPC/1973, seu equivalente.

Como controvérsia sempredestacada por este autor, e quepermanece perante o Novo CPC,surge dúvida quanto àpossibilidade de liminar em sedede interdito proibitório, se aameaça for nova, ou seja, commenos de um ano e um dia. Emoutras palavras, a pergunta a serformulada é a seguinte: o interditoproibitório também podeconstituir uma ação de forçanova, como antes exposto?

Page 1318: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

A resposta sempre nospareceu positiva, uma vez que oart. 933 do CPC/1973 mandavaaplicar, ao interdito proibitório,as regras relativas às ações demanutenção ou reintegração deposse. Fez o mesmo o art. 568 doCPC/2015. Concluindo dessaforma, aplica-se o atual art. 562do CPC àquela ação, sendo aliminar para a fixação de multa,com o fim de impedir a turbaçãoe o esbulho.

Vale dizer que a ação deinterdito proibitório tem comopedido principal uma obrigaçãode não fazer, qual seja, da outra

Page 1319: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

parte abster-se do atentado àposse. Esse conteúdo da referidaação poderia ser retirado do art.932 do CPC/1973, repetido peloart. 567 do CPC/2015, pelo qual,“O possuidor direto ou indiretoque tenha justo receio de sermolestado na posse poderárequerer ao juiz que o segure daturbação ou esbulho iminente,mediante mandado proibitório emque se comine ao réu determinadapena pecuniária caso transgrida opreceito”. O julgado do Tribunalde Justiça de São Paulo a seguir,bem pitoresco, reconhece, a títulode exemplo, a fixação de liminar

Page 1320: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

em sede de interdito proibitório,confirmando a tese defendida poreste autor:

“Agravo de instrumento. Locação de imóveis.Ação de manutenção de posse cumulada cominterdito proibitório. Decisão que defere opedido liminar ‘para segurar os inquilinos deserem molestados na posse do imóvel alugadodos requeridos’. Inconformismo dos réus, quesustentaram ausentes os elementos deverossimilhança do direito invocado. Nãopode o locador, ou alguém em seu nome, numvestido de malha usado para dormir, adentraro imóvel locado para cobrar dos locatários acessação de atividade naturalmente ruidosaque aquele havia permitido que fossedesenvolvida no local, mormente não havendoprova de que a atividade em tela vemextrapolando o horário limite aceitável,segundo os agravantes, das 22 horas, emesmo os limites legais da poluição sonora

Page 1321: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

que uma Igreja Evangélica notoriamenteproduz. Tal ato destarte, pela violação docontratado, representou turbação da posseque o locador estava obrigado a garantir,agravada pelo traje evidentementeinadequado posto a desfilar ao meio de umacerimônia de noivado, que pressupõe banhotomado e naftalina exalando da melhor roupatirada do armário. Agravo improvido” (TJSP,Agravo de Instrumento 898.465-0/0, SãoPaulo, Trigésima Sexta Câmara de DireitoPrivado, Rel. Palma Bisson, 16.06.2005, v.u.).

Outra questão polêmica dizrespeito à ação de força velha.Como se demonstrou, se oatentado à posse tiver pelo menosum ano e um dia, não caberá maisa ação de força nova, mas apenasa ação de força velha, que segue

Page 1322: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

rito ordinário e em que não cabea liminar. No entanto, fica adúvida, se nessa ação caberá aconcessão de tutela antecipadapara, principalmente, deferir-se areintegração da posse a favor doautor da ação.

A resposta dada pelosjuristas participantes da IIIJornada de Direito Civil foipositiva, conforme o Enunciado n.238 do CJF/STJ, cuja redação é aseguinte: “ainda que a açãopossessória seja intentada alémde ‘ano e dia’ da turbação ouesbulho, e, em razão disso, tenhaseu trâmite regido pelo

Page 1323: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

procedimento ordinário (CPC,art. 924), nada impede que o juizconceda a tutela possessórialiminarmente, medianteantecipação de tutela, desde quepresentes os requisitosautorizadores do art. 273, I ou II,bem como aqueles previstos noart. 461-A e parágrafos, todos doCódigo de Processo Civil”. Oenunciado acaba traduzindo o queentendia a jurisprudência, pois opróprio Superior Tribunal deJustiça já se pronunciou nosentido de ser possível a tutelaantecipada em ação dereintegração de posse, desde que

Page 1324: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

preenchidos os requisitos do art.273 do CPC (STJ, REsp555.027/MG, Terceira Turma,Rel. Min. Carlos AlbertoMenezes Direito, j. 27.04.2004,DJ 07.06.2004, p. 223). Arestosmais recentes do Tribunal daCidadania seguem a mesma linha(ver: STJ, AgRg no REsp1.139.629/RJ, Quarta Turma, Rel.Min. Maria Isabel Gallotti, j.06.09.2012, DJe 17.09.2012; eREsp 1.194.649/RJ, QuartaTurma, Rel. Min. Maria IsabelGallotti, j. 12.06.2012, DJe21.06.2012). Acredita-se queesse entendimento deve ser

Page 1325: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

mantido com a emergência doNovo Código de Processo Civil.

Analisadas essas questõescontrovertidas quanto à liminar,preceitua o atual art. 564 doCPC/2015 que, concedido ou nãoo mandado liminar de manutençãoou de reintegração, o autorpromoverá, nos cinco diassubsequentes, a citação do réupara, querendo, contestar a açãono prazo de 15 dias. Nos termosdo seu parágrafo único, quandofor ordenada a justificaçãoprévia, o prazo para contestarserá contado da intimação dadecisão que deferir ou não a

Page 1326: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

medida liminar. Aqui também nãohouve qualquer mudança, comequivalência absoluta ao art. 930do CPC/1973.

Como outra novidade decunho social inquestionável, háoutra preocupação com osconflitos coletivos de terras, nasnovidades constantes do art. 565do Codex de 2015. Expressa oseu caput que, no litígio coletivopela posse de imóvel, quando oesbulho ou a turbação afirmadona petição inicial houver ocorridohá mais de ano e dia, o juiz, antesde apreciar o pedido deconcessão da medida liminar,

Page 1327: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

deverá designar audiência demediação, a realizar-se em até 30dias. Cabe lembrar que amediação não visa o acordo entreas partes, mas apenas a suaaproximação para o diálogo.

O Ministério Público seráintimado para comparecer a essaaudiência de mediação, o mesmoocorrendo com a DefensoriaPública sempre que houver partebeneficiária de gratuidade daJustiça (art. 565, § 2º, doCPC/2015). Para facilitar acompreensão do conflito,estabelece o § 3º do mesmodiploma que o juiz poderá

Page 1328: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

comparecer à área objeto dolitígio quando sua presença sefizer necessária à efetivação datutela jurisdicional. Essa últimaregra representa concretização domandamento constitucionalretirado do art. 126 do TextoMaior, segundo o qual, “Paradirimir conflitos fundiários, oTribunal de Justiça proporá acriação de varas especializadas,com competência exclusiva paraquestões agrárias. Parágrafoúnico. Sempre que necessário àeficiente prestação jurisdicional,o juiz far-se-á presente no localdo litígio”.

Page 1329: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

Ainda no que diz respeito aessa audiência de mediação,preconiza o § 4º do art. 565 doCPC/2015 que os órgãosresponsáveis pela política agráriae pela política urbana da União,de Estado ou do Distrito Federale de Município onde se situe aárea objeto do litígio poderão serintimados para ocomparecimento, a fim de semanifestarem sobre seu interesseno processo e sobre a existênciade possibilidade de solução parao conflito possessório. Depois deconcedida a liminar, se esta nãofor executada no prazo de um ano,

Page 1330: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

a contar da data de distribuição,caberá ao juiz designar a citadaaudiência de mediação, para osfins de tentar aproximar as partesrelativas ao conflito (art. 565, §1º, do CPC/2015).

Todos esses procedimentostambém são aplicáveis aoslitígios que dizem respeito aodomínio ou propriedade, ou seja,também nos juízos petitórios (art.565, § 5º, do CPC/2015). A títulode exemplo, todos essesprocedimentos devem incidirpara os casos de desapropriaçãojudicial privada por posse-trabalho, expressão cunhada por

Page 1331: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

Miguel Reale para designar acategoria tratada pelo CódigoCivil nos §§ 4º e 5º do art. 1.228.Nos termos do primeiro comandocivil, o proprietário pode serprivado da coisa se o imóvelreivindicado consistir em extensaárea, na posse ininterrupta e deboa-fé, por mais de cinco anos,de considerável número depessoas, e estas nela houveremrealizado, em conjunto ouseparadamente, obras e serviçosconsiderados pelo juiz deinteresse social e econômicorelevante. Em casos tais, deacordo com o segundo comando,

Page 1332: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

o juiz fixará a justa indenizaçãodevida ao proprietário. Pago opreço, valerá a sentença comotítulo para o registro do imóvelem nome dos possuidores.

A categoria constituiimportante restrição ao direito depropriedade, trazendo comoconteúdo a função social da possee do domínio. Os dispositivos e oinstituto, além de não encontraremcorrespondentes na codificaçãoanterior, também não estãoprevistos em qualquer outracodificação do DireitoComparado. Trata-se, assim, deuma criação brasileira. Como

Page 1333: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

esclarece o próprio MiguelReale, na Exposição de Motivosdo Anteprojeto do Código Civilde 2002, “trata-se, como se vê, deinovação do mais alto alcance,inspirada no sentido social dodireito de propriedade,implicando não só novo conceitodesta, mas também novo conceitode posse, que se poderiaqualificar como sendo de posse-trabalho, expressão pela primeiravez por mim empregada, em1943, em parecer sobre projetode decreto-lei relativo às terrasdevolutas do Estado de SãoPaulo, quando membro do seu

Page 1334: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

Conselho Consultivo”. Aspalavras de Reale justificam aterminologia desapropriaçãojudicial privada por posse-trabalho, que deve serconsiderada a melhor a serempregada, pois de uso pelocriador do instituto.

Não há dúvidas de que oinstituto aqui estudado é umamodalidade de desapropriação, enão de usucapião, como pretendeparte da doutrina.13

Isso porque o § 5º do art.1.228 do CC consagra opagamento de uma justa

Page 1335: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

indenização, não admitindo onosso sistema jurídico ausucapião onerosa. A propósitode distinção, Jones FigueirêdoAlves e Mário Luiz Delgadoelencam quatro diferençasfundamentais entre essa forma dedesapropriação e a usucapiãocoletiva urbana, prevista no art.10 do Estatuto da Cidade (Lei10.257/2001).14 A primeiradiferença é que, na usucapiãocoletiva urbana, os ocupantesdevem ser de baixa renda; nadesapropriação judicial privada,não há essa necessidade. Comosegundo ponto diferenciador, na

Page 1336: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

usucapião coletiva urbana, a áreadeve ter, no mínimo, 250 m2,exigência que não está presentena desapropriação judicialprivada, bastando uma extensaárea. A terceira discrepância éque a usucapião coletiva somenteincide aos imóveis urbanos,enquanto a desapropriaçãojudicial privada pode seraplicada aos imóveis urbanos oururais. Por fim, na usucapião, nãohá direito à indenização, aocontrário da desapropriaçãojudicial privada. De toda sorte,apesar dessas diferençascategóricas, é perfeitamente

Page 1337: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

possível sustentar que as regrasprocessuais aqui analisadas paraas demandas coletivas incidemigualmente para a usucapiãocoletiva.

A desapropriação que ora seexpõe é privada, poisconcretizada no interesse direto eparticular daquelas pessoas que,em número considerável,ocuparam extensa área. Estáfundada em uma possequalificada, a posse-trabalho,conceituada por Maria HelenaDiniz como sendo a posse seminterrupção e de boa-fé, por maisde cinco anos, “traduzi-a em

Page 1338: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

trabalho criador, feito emconjunto ou separadamente, querse concretize na realização de umserviço ou construção de umamorada, quer se manifeste eminvestimentos de caráterprodutivo ou cultural. Essa possequalificada é enriquecida pelovalor laborativo de um númeroconsiderável de pessoas(quantidade apurada com base naextensão da área produtiva), pelarealização de obras, loteamentos,ou serviços produtivos e pelaconstrução de uma residência, deprédio destinado ao ensino ou aolazer, ou, até mesmo, de uma

Page 1339: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

empresa”.15 Seguindo a linhafilosófica da atual codificaçãocivil, pode-se dizer que a posse-trabalho constitui uma cláusulageral, um conceito aberto eindeterminado a ser preenchidocaso a caso. Representa talconceito a efetivação da funçãosocial da posse, pelo desempenhode uma atividade positiva noimóvel, dentro da ideia deintervenção impulsionadora, antesexposta.

Além desse, o § 4º do art.1.228 do CC/2002 traz outrosconceitos que são legais eindeterminados e que devem ser

Page 1340: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

analisados de acordo com asituação concreta, caso dasexpressões extensa área,considerável número de pessoas,boa-fé e interesse social eeconômico relevante. Diante daprevisão dessas expressões, oinstituto demanda da comunidadejurídica e do aplicador do direitouma análise aprofundada para atentativa do seu preenchimento.Em verdade, talvez peladificuldade de preenchimentodesses conceitos, a categoria nãoencontrou a devida aplicaçãoprática nos mais de dez anos devigência do Código Civil.

Page 1341: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

Tentando facilitar acompreensão do novo instituto,nas Jornadas de Direito Civil,promovidas pelo Conselho daJustiça Federal e pelo SuperiorTribunal de Justiça, foramaprovados vários enunciadosdoutrinários, com conteúdo beminteressante, que constituemroteiro seguro e eficiente para oestudo da categoria.Comentaremos apenas algunsdeles, para não fugir da principalfinalidade deste livro, que é deinteragir o Direito Civil com oProcesso Civil.

O primeiro a ser destacado é

Page 1342: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

o Enunciado n. 82 do CJF/STJ, daI Jornada de Direito Civil,promovida em 2002, segundo oqual, “É constitucional amodalidade aquisitiva depropriedade imóvel prevista nos§§ 4º e 5º do art. 1.228 do novoCódigo Civil”. O enunciado, àépoca, tinha interessanterelevância prática, pois algunsdoutrinadores defendiam, e aindadefendem, que a desapropriaçãojudicial privada éinconstitucional, por incentivar ainvasão de terras.16 Não se filiaao entendimento dainconstitucionalidade, mas muito

Page 1343: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

ao contrário, eis que o institutotende a dar uma função social àpropriedade em situações nasquais a posse já não vematendendo a essa finalidade deinteresse da coletividade.

Ainda da I Jornada deDireito Civil, dispõe o importanteEnunciado n. 84 que “A defesafundada no direito de aquisiçãocom base no interesse social (art.1.228, §§ 4º e 5º, do novo CódigoCivil) deve ser arguida pelos réusda ação reivindicatória, elespróprios responsáveis pelopagamento da indenização”. Deimediato, percebe-se que a

Page 1344: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

desapropriação judicial privada ématéria de exceção, a ser alegadapelos réus da ação reivindicatóriaproposta pelo proprietário doimóvel. Ademais, em relação àindenização, o entendimentoconstante do enunciado acabousendo o majoritário nos primeirosanos de vigência do CC/2002.Entretanto, na IV Jornada deDireito Civil, aprovou-se outroenunciado, que traz a alternativade pagamento de indenizaçãopelo Estado, e que teve como umdos seus proponentes LucasAbreu Barroso. Vejamos aredação do Enunciado n. 308 do

Page 1345: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

CJF/STJ, que conta com o plenoapoio deste autor: “A justaindenização devida aoproprietário em caso dedesapropriação judicial (art.1.228, § 5º) somente deverá sersuportada pela AdministraçãoPública no contexto das políticaspúblicas de reforma urbana ouagrária, em se tratando depossuidores de baixa renda edesde que tenha havidointervenção daquela nos termosda lei processual. Não sendo ospossuidores de baixa renda,aplica-se a orientação doEnunciado n. 84 da I Jornada de

Page 1346: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

Direito Civil”. Ora, o últimoentendimento doutrinário visa darefetividade prática ao instituto dadesapropriação privada, poisdificilmente os possuidores terãocondições financeiras de arcarcom a indenização. Em reforço,acaba por valorizar a funçãosocial da posse.

Exposta essa importantecategoria material e voltando aoNovo CPC, determina o seu art.566 que se aplica em relação àsreferidas ações possessórias oprocedimento comum, de formaresidual, o que era consagradopelo art. 931 do CPC/1973.

Page 1347: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

No tocante à competênciapara essas demandas fundadas naposse, como se sabe, sempre sereconheceu como competente,seja qual fosse o procedimento aser seguido, o foro de situação dacoisa, o que era tradução do art.95 do CPC/1973, que versavasobre as ações fundadas emdireito real. Isso mesmo nãosendo a posse um direito real,mas um direito de naturezaespecial, segundo a maioria doscivilistas.

O Novo CPC espancaqualquer dúvida quanto a essamesma conclusão, prevendo, no

Page 1348: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

seu art. 47, § 2º, que a açãopossessória imobiliária seráproposta no foro de situação dacoisa, cujo juízo tem competênciaabsoluta. Eventualmente, se oimóvel estiver situado em mais deum Estado ou em mais de umaComarca, aplica-se a regra daprevenção, ou seja, serácompetente o primeiro juiz quetiver conhecimento da causa,conforme se manifestava adoutrina de escol.17

Superadas as regrasprocessuais previstas nos doisCódigos Processuais, devem sercomentados dois dispositivos do

Page 1349: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

Código Civil, que igualmenteinteressam ao aspectoinstrumental.

De início, prevê o art. 1.211do CC/2002 que, “Quando maisde uma pessoa se disserpossuidora, manter-se-áprovisoriamente a que tiver acoisa, se não estiver manifestoque a obteve de alguma das outraspor modo vicioso”. O dispositivotrata do possuidor aparente, quemanterá a coisa enquanto sediscute em sede de açãopossessória, ou mesmo petitória,quem é o seu possuidor ouproprietário de direito.

Page 1350: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

Entretanto, pelo própriocomando, se for demonstrado queo possuidor aparente tem a coisacom um vício, seja objetivo ousubjetivo, poderá esta ser-lheretirada. Filia-se plenamente àdoutrina de Joel Dias Figueira Jr.,quando afirma que “o principalcritério abalizador da manutençãoou reintegração de posse haveráde ser, indubitavelmente, autilização socioeconômica dobem litigioso e não mais o prazode ano e dia de titularidade daposse. Portanto, substitui-se ocritério puramente objetivo doparágrafo único do antigo art. 507

Page 1351: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

pelos critérios sociopolíticos eeconômicos ancorados na funçãosocial da propriedade que, emúltima análise, reside na própriaposse. Não significa dizer,contudo, que os juízes nãopossam considerar em suasdecisões, como elemento deformação de seusconvencimentos, os ‘títulos’ deposse e/ou a sua respectiva data,ou, ainda que não possam, deofício, utilizar-se do poder geralde cautela, autorizadaexpressamente pelos arts. 798 e799 do CPC, determinando, porexemplo, o sequestro cautelar do

Page 1352: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

bem litigioso. O que estamos aafirmar é que o ponto norteadorpara a manutenção oureintegração da posse haverá deser a posse efetiva emconsonância com as suasfinalidades sociais eeconômicas”.18 Em suma, afunção social da posse deve ser oconceito orientador do art. 1.211do CC/2002. Essa posição nãomuda com a emergência do NovoCódigo de Processo Civil.

Como último preceito a sercomentado, o art. 1.212 da atualcodificação material privadadispõe que o possuidor pode

Page 1353: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

intentar a ação de esbulho, ou ade indenização, contra o terceiroque recebeu a coisa esbulhadasabendo que o era. Como seobserva, a norma civil abre apossibilidade de o possuidor quesofreu o atentado definitivo àposse ingressar com ação dereintegração de posse ou comação de reparação de danoscontra o terceiro que estiver coma coisa. Consigne-se queindenização para as situações deesbulho está prevista pelo art.952 do atual Código Civil, cujaredação é a seguinte: “Havendousurpação ou esbulho do alheio,

Page 1354: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

além da restituição da coisa, aindenização consistirá em pagar ovalor das suas deteriorações e odevido a título de lucroscessantes; faltando a coisa,dever-se-á reembolsar o seuequivalente ao prejudicado.Parágrafo único. Para se restituiro equivalente, quando não existaa própria coisa, estimar-se-á elapelo seu preço ordinário e pelode afeição, contanto que este nãose avantaje àquele”.

Ainda no estudo do art.1.212 do CC, na I Jornada deDireito Civil, aprovou-se oEnunciado n. 80 do CJF/STJ,

Page 1355: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

determinando que “Éinadmissível o direcionamento dedemanda possessória ouressarcitória contra terceiropossuidor de boa-fé, por ser partepassiva ilegítima diante dodisposto no art. 1.212 do novoCódigo Civil. Contra o terceirode boa-fé, cabe tão somente apropositura de demanda denatureza real”. Nesse contexto,como não se pode atribuir culpa aquem esteja de boa-fé, nãocaberão as medidas previstas nodispositivo, mas tão somente açãopetitória, para reivindicação dapropriedade.

Page 1356: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

A encerrar o presentecapítulo, é interessantetranscrever e analisar oEnunciado n. 239 do CJF/STJ,aprovado na III Jornada deDireito Civil, que em muitointeressa para a discussão domérito das ações possessóriasdiretas: “Na falta dedemonstração inequívoca deposse que atenda à função social,deve-se utilizar a noção de‘melhor posse’, com base noscritérios previstos no parágrafoúnico do art. 507 do CódigoCivil/1916”.

O enunciado doutrinário

Page 1357: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

começa muito bem e terminamuito mal. Começa muito bem,pois aponta que para acaracterização do que seja melhorposse, em sede de açãopossessória, deve-se levar emconta a sua função social.Justamente por isso, é forte acorrente doutrinária que concluipela falta de legitimidade para areferida ação nas situações dealguém que não vem atendendo aessa função social. Como bemensinam Cristiano Chaves deFarias e Nelson Rosenvald, “Odireito do possuidor de defendera sua posse contra terceiros –

Page 1358: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

incluindo-se aí o proprietário – éuma consequência jurídicaproduzida pela necessidade geralde respeito a uma situação fáticaconsolidada, na qualnecessidades humanasfundamentais são satisfeitas. Adensidade social da posse comomodo revelador da necessidadebásica do homem de apropriar-sede bens primários justifica quenão seja ela reduzida a merocomplemento da tutela dapropriedade, mas sim eminstrumento concreto de buscapela igualdade material e justiçasocial”.19

Page 1359: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

Vale dizer que a tese querelaciona a função social daposse e da propriedade comopressupostos para o ingresso deação possessória e mesmopetitória foi adotada pelajurisprudência do SuperiorTribunal de Justiça no famosocaso da Favela Pullman, queafastou a possibilidade da açãoreivindicatória diante do nãoatendimento a esses regramentos.Nos termos do que consta daementa desse notório julgamento,“o direito de propriedadeassegurado no art. 524 do CódigoCivil anterior não é absoluto,

Page 1360: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

ocorrendo a sua perda em face doabandono de terrenos deloteamento que não chegou a serconcretamente implantado, e quefoi paulatinamente favelizado aolongo do tempo, com adesfiguração das frações earruamento originariamenteprevistos, consolidada, no local,uma nova realidade social eurbanística, consubstanciando ahipótese prevista no art. 589 c/cos arts. 77 e 78 da mesma leisubstantiva” (STJ, REsp75.659/SP, Quarta Turma, Rel.Min. Aldir Passarinho Junior, j.21.06.2005, DJ 29.08.2005, p.

Page 1361: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

344).Contudo, o Enunciado n. 239

da I Jornada de Direito Civiltermina muito mal, pois fazmenção ao parágrafo único do art.507 do CC/1916, que previa aseguinte ordem para acaracterização da melhor posse:“Entende-se melhor a posse quese fundar em justo título; na faltade título, ou sendo os títulosiguais, a mais antiga; se da mesmadata, a posse atual. Mas, se todasforem duvidosas, serásequestrada a coisa, enquanto senão apurar a quem toque”.

No pensar deste autor, não

Page 1362: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

devem ser utilizados, em umprimeiro momento, tais critérios,mas sim o festejado parâmetro dafunção socioeconômica, antesexposto, consoante osensinamentos de Joel DiasFigueira, por último transcritos.Por isso, a parte final doEnunciado n. 239 deveria sercancelada em outra e próximaJornada de Direito Civil.

Page 1363: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

__________1 MARCATO, Antonio Carlos.Procedimentos Especiais. 8. ed. SãoPaulo: Malheiros, 1999. p. 116.2 NERY JR., Nelson; NERY, RosaMaria de Andrade. Código deProcesso Civil Comentado. 9. ed.São Paulo: RT, 2006. p. 994.3 DINIZ, Maria Helena. Código CivilAnotado. 15. ed. São Paulo: Saraiva,2010. p. 828-829; GONÇALVES,Carlos Roberto. Curso de DireitoCivil Brasileiro. São Paulo: Saraiva,2010. v. 5 – Direito das Coisas, p. 101.4 MONTEIRO, Washington deBarros. Curso de Direito CivilBrasileiro. Direito das Coisas. 37. ed.atual. por Carlos Alberto Dabus Maluf.São Paulo: Saraiva, 2003. v. 3, p. 32.

Page 1364: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

5 VENOSA, Sílvio de Salvo. DireitoCivil. 5. ed. São Paulo: Atlas, 2005. v.5 – Direitos Reais, p. 78.6 LOUREIRO, Francisco Eduardo.Código Civil Comentado.Coordenador: Ministro Cezar Peluso.São Paulo: Manole, 2007. p. 1.008.7 DINIZ, Maria Helena. Código CivilAnotado. 15. ed. São Paulo: Saraiva,2010. p. 948.8 MELO, Marco Aurélio Bezerra de.Novo Código Civil Anotado. 3. ed.rev., ampl. e atual. Rio de Janeiro:Lumen Juris, 2004. p. 29; e VENOSA,Sílvio. Código Civil Comentado.Coordenador: Álvaro Villaça Azevedo.São Paulo: Atlas, 2003. v. XII, p. 80.9 NERY JR., Nelson; NERY, RosaMaria de Andrade. Código Civil

Page 1365: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

Comentado. 3. ed. São Paulo: RT,2003. p. 991.10 NERY JR., Nelson; NERY, RosaMaria de Andrade. Código CivilComentado. 3. ed. São Paulo: RT,2003. p. 995.11 NERY JR., Nelson; NERY, RosaMaria de Andrade. Código deProcesso Civil Comentado. 9. ed.São Paulo: RT, 2006. p. 997.12 CÂMARA, Alexandre Freitas.Lições de Processo Civil. 7. ed. Riode Janeiro: Lumen Juris, 2005. v. III, p.394.13 Nesse sentido: GAGLIANO, PabloStolze. Controvérsias ConstitucionaisAcerca do Usucapião Coletivo. JusNavigandi, ano 10, n. 1.063, Teresina,30 maio 2006. Disponível em:

Page 1366: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

<http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=8318>. Acesso em: 21 jul. 2010.14 ALVES, Jones Figueirêdo;DELGADO, Mário Luiz. CódigoCivil Anotado. São Paulo: Método,2005. p. 608.15 DINIZ, Maria Helena. Curso deDireito Civil Brasileiro. Direito dasCoisas. 22. ed. São Paulo: Saraiva,2007. v. 5, p. 195.16 Por todos: MALUF, Carlos AlbertoDabus. Código Civil Comentado. 2.ed. Coordenador: Ricardo Fiuza. SãoPaulo: Saraiva, 2004. p. 1.133.17 MARCATO, Antonio Carlos.Procedimentos Especiais. 8. ed. SãoPaulo: Malheiros, 1999. p. 120.18 FIGUEIRA JR., Joel Dias. CódigoCivil Comentado. Coordenador:

Page 1367: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

Ricardo Fiuza. 2. ed. São Paulo:Saraiva, 2004. p. 1.116.19 FARIAS, Cristiano Chaves;ROSENVALD, Nelson. Curso deDireito Civil. 3. ed. Rio de Janeiro:Lumen Juris, 2006. p. 110.

Page 1368: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

DO TRATAMENTO DAUSUCAPIÃO

IMOBILIÁRIA NONOVO CPC

Da UsucapiãoAdministrativa

Page 1369: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

O Novo Código de ProcessoCivil representa uma verdadeirarevolução na abordagem relativaà usucapião imobiliária. Deinício, porque não há mais umtratamento específico da ação deusucapião, entre osprocedimentos especiais, comoocorria no Código de ProcessoCivil de 1973. Assim, não serepetiu o que constava entre osarts. 941 a 945 do EstatutoInstrumental anterior.

Pontue-se, para os devidosfins de esclarecimentos didáticos,que o art. 941 do CPC/1973dispunha que competiria a ação

Page 1370: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

de usucapião ao possuidor paraque se lhe declarasse, nos termosda lei, o domínio do imóvel ou aservidão predial. O autor dademanda, expondo na petiçãoinicial o fundamento do pedido ejuntando planta do imóvelcorrespondente, requereria acitação daquele em cujo nomeestivesse registrado o bemusucapiendo, assim como dosconfinantes e, por edital, dos réusem lugar incerto e dos eventuaisinteressados (art. 942 doCPC/1973). Seriam intimados porvia postal, para quemanifestassem interesse na causa,

Page 1371: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

os representantes da FazendaPública da União, dos Estados,do Distrito Federal, dosTerritórios e dos Municípios (art.943 do CPC/1973). Interviria,obrigatoriamente e em todos osatos do processo, o MinistérioPúblico (art. 944 do CPC/1973).A sentença que julgasseprocedente a ação seriatranscrita, mediante mandado, noregistro de imóveis, satisfeitas asobrigações fiscais (art. 945 doCPC/1973).

Não obstante a falta dessetratamento específico, entre osprocedimentos especiais, existem

Page 1372: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

duas regras esparsas no NovoCódigo de Processo, relativas aessa demanda de aquisição dedomínio. De início, a citação dosconfinantes na ação estáconsagrada no art. 246 doCPC/2015, a exemplo do queconstava do art. 942 do revogadoCPC. Nos termos do § 3º donovel diploma, na ação deusucapião de imóvel, osconfinantes serão citadospessoalmente, exceto quandotiver por objeto unidadeautônoma de prédio emcondomínio, caso em que talcitação é dispensada, exceção

Page 1373: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

que constitui novidade. Mais àfrente, o art. 259 do CPC/2015estabelece a necessidade depublicação de editais para todasas demandas de usucapião, paraos devidos fins de publicidade.

Pois bem, diante da falta detratamento da ação de usucapiãoentre os procedimentos especiais,continuam tendo aplicação asregras específicas consagradaspor legislação extravagante paraas modalidades de usucapiãoconstitucionais (especial ruralou agrária e especial urbanaindividual) e para a usucapiãourbana coletiva, que serão

Page 1374: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

abordadas a seguir.Para o presente autor, ação

de usucapião imobiliária ainda épossível em qualquer uma de suasmodalidades, inclusive nos casosde usucapião ordinária (art.1.242 do CC/2002) ouextraordinária (art. 1.238 doCC/2002). De acordo com oprimeiro diploma, adquire apropriedade do imóvel aqueleque, contínua eincontestadamente, com justotítulo e boa-fé, o possuir por dezanos. O prazo dessa formaordinária será reduzido paracinco anos, se o imóvel houver

Page 1375: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

sido adquirido, onerosamente,com base no registro constante dorespectivo cartório, canceladoposteriormente, desde que ospossuidores nele tiveremestabelecido a sua moradia, ourealizado investimentos deinteresse social e econômico,presente a chamada posse-trabalho. Conforme o segundopreceito, que trata da modalidadeextraordinária, aquele que, por15 anos, sem interrupção, nemoposição, possuir como seu umimóvel, adquire-lhe apropriedade, independentementede título e de boa-fé; podendo

Page 1376: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

requerer ao juiz que assim odeclare por sentença, a qualservirá de título para o registrono Cartório de Registro deImóveis. O seu prazo também éreduzido, de 15 para 10 anos, emdecorrência da posse-trabalho,se o possuidor houverestabelecido no imóvel a suamoradia habitual, ou nelerealizado obras ou serviços decaráter produtivo.

O fundamento para seentender que a via judicialcontinua possível para qualquerespécie de usucapião está nalegislação material, e não na

Page 1377: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

processual, especialmente nocaput do art. 1.241 do CódigoCivil, pelo qual poderá opossuidor requerer ao juiz sejadeclarada adquirida, medianteusucapião, a propriedade imóvel.Segundo o seu parágrafo único, adeclaração obtida na forma desseartigo constituirá título hábil parao registro no Cartório de Registrode Imóveis. Deve-se entenderque, com o Novo CPC, a ação deusucapião passa a seguir ochamado rito comum, antesdenominado ordinário. Conformeo art. 318 do Estatuto Processualde 2015, “Aplica-se a todas as

Page 1378: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

causas o procedimento comum,salvo disposição em contráriodeste Código ou de lei. Parágrafoúnico. O procedimento comumaplica-se subsidiariamente aosdemais procedimentos especiais eao processo de execução”.

Ficará o debate sobre aobrigatoriedade de atuação doMinistério Público nas ações deusucapião ordinária eextraordinária pela nãoreprodução do art. 944 doCPC/1973. Acreditamos que aresposta será positiva, mesmocom a ausência de previsãoexpressa. E o fundamento para

Page 1379: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

tanto está no art. 178, inciso III,do Novo CPC, segundo o qual, “oMinistério Público será intimadopara, no prazo de trinta dias,intervir como fiscal da ordemjurídica nas hipóteses previstasem lei ou na Constituição Federale nos processos que envolvam:(...) III – litígios coletivos pelaposse de terra rural ou urbana”.Ou, talvez, o amparo resida noart. 176 do CPC/2015, aodeterminar que o MP atuará nadefesa da ordem jurídica, doregime democrático e dosinteresses e direitos sociais eindividuais indisponíveis. Ora, a

Page 1380: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

propriedade sempre desperta uminteresse social, diante do seufundamento na função social,retirada do art. 5º, incisos XXII eXXIII, do Texto Maior. Por fim, aatuação do parquet continuaobrigatória em todas asmodalidades de usucapiãoprevistas em leis específicas,como se verá, sendo incoerenteque a regra não alcance asmodalidades ordinária eextraordinária.

Feitas tais considerações,além da comum utilização dausucapião em sede de petiçãoinicial, o instituto também pode

Page 1381: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

ser alegado no âmbito da defesaou exceção, como estabelece aantiga Súmula 237 do SupremoTribunal Federal, não prejudicadapelo Novo CPC. Dentro dessaideia, preceitua o Enunciado n.315 do CJF/STJ, aprovado na IVJornada de Direito Civil, que “Oart. 1.241 do CC permite aopossuidor que figurar como réuem ação reivindicatória oupossessória formular pedidocontraposto e postular ao juiz sejadeclarada adquirida, medianteusucapião, a propriedade imóvel,valendo a sentença comoinstrumento para registro

Page 1382: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

imobiliário, ressalvadoseventuais interesses deconfinantes e terceiros”. Asentença de improcedência servecomo título de propriedade a serregistrado no Cartório deRegistro de Imóveis, em favor doréu, premissa que permanece navigência do Novo Estatuto.

No entanto, persiste adúvida se realmente o registro dasentença de improcedência comotítulo aquisitivo da propriedadevale para todos os tipos deusucapião. No tocante àusucapião especial rural, não hádúvidas de que a resposta é

Page 1383: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

positiva, pelo que consta do art.7º da Lei 6.969/1981, a saber: “Ausucapião especial poderá serinvocada como matéria de defesa,valendo a sentença que areconhecer como título paratranscrição no Registro deImóveis”. Do mesmo modo, tantoem relação à usucapião especialurbana (a individual) como nausucapião especial urbanacoletiva, pelo que consta do art.13 da Lei 10.257/2001, in verbis:“A usucapião especial de imóvelurbano poderá ser invocada comomatéria de defesa, valendo asentença que a reconhecer como

Page 1384: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

título para registro no cartório deregistro de imóveis”. E nasdemais formas de usucapião,especialmente a ordinária e aextraordinária, a sentença deimprocedência também servecomo título para fins de registro?

O entendimento majoritário,particularmente entre osprocessualistas, sempre foi nosentido de que a usucapiãopoderia ser alegada em defesa,mas que a sentença deimprocedência somente poderiaser registrada nos casosdestacados em lei.Compartilhando dessa ideia,

Page 1385: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

lecionava Alexandre FreitasCâmara que “A sentença quereconhecer o usucapião alegadocomo defesa não poderá serlevada a registro junto a matrículado imóvel no Registro deImóveis. Isto porque acontestação não amplia o objetodo processo. Não tendo havidopedido de reconhecimento daaquisição da propriedade porusucapião, não será a sentençacapaz de declarar, com força decoisa julgada, que o réu éproprietário do bem em razão dousucapião”.1 Em nota de rodapé,o doutrinador fluminense excetua

Page 1386: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

as hipóteses envolvendo ausucapião especial rural e urbana,transcrevendo os dispositivosaqui mencionados.

Em sentido muito próximo,essa também era a opinião deHumberto Theodoro Jr.2 e deTheotonio Negrão,3 trazendoambos farta jurisprudência parabalizar as suas teses.

Apesar de ser essa correnteapegada a valores formais e nãosendo o formalismo dapreferência ideológica desteautor, é pertinente verificar que adiscussão se refere à formação da

Page 1387: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

coisa julgada, razão pela qual oentendimento acaba prevalecendoe deve persistir com a emergênciado Novo CPC. Analisadas essasquestões, passa-se para aabordagem das modalidades deusucapião que têm tratamento emlegislação específica,notadamente por normas de cunhoinstrumental.

Começando pela usucapiãoconstitucional rural, pro laboreou agrária, está ela tratada peloart. 191 do Texto Maior, segundoo qual, “Aquele que, não sendoproprietário de imóvel rural ouurbano, possua como seu, por

Page 1388: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

cinco anos ininterruptos, semoposição, área de terra, em zonarural, não superior a cinquentahectares, tornando-a produtivapor seu trabalho ou de suafamília, tendo nela sua moradia,adquirir-lhe-á a propriedade”. Aregra foi reproduzida, naliteralidade, pelo art. 1.239 doCC/2002, estando igualmenteregulamentada, ainda, pela Lei6.969/1981, especialmente no quetange a regras processuais queinteressam diretamente à presenteobra.

Consigne-se que, para osdoutrinadores do Direito Agrário,

Page 1389: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

a melhor denominação para oinstituto em estudo é usucapiãoagrária, e não usucapiãoespecial rural. Segundo BeneditoFerreira Marques, o termoespecial deve ser usado apenaspara a usucapião indígena,regulamentada pelo art. 33 doEstatuto do Índio (Lei6.001/1973), e não para oinstituto ora objeto de estudo.4 Detoda sorte, o presente autorprefere utilizar a expressãoespecial, majoritária na doutrinacivilista nacional, para as duasmodalidades previstas naConstituição Federal de 1988.

Page 1390: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

Pelo que constam em todosesses preceitos citados, oprimeiro requisito para essausucapião é a existência de áreanão superior a 50 hectares (50ha), localizada na zona rural. Valelembrar que, apesar de o art. 1ºda Lei 6.969/1981 ter previstouma área de 25 ha, este comandonão foi recepcionado pelaCF/1988, devendo serdesconsiderado. O segundoelemento essencial é a presençade uma posse de cinco anosininterruptos, sem oposição e comanimus domini, ou seja, comintenção de dono. O terceiro

Page 1391: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

requisito é a utilização do imóvelpara subsistência ou trabalho (prolabore), podendo ser naagricultura, na pecuária, noextrativismo ou em atividadesimilar. O fator essencial é que apessoa ou a família estejatornando produtiva a terra, porforça de seu trabalho. Por fim,aquele que pretende adquirir porusucapião, não pode serproprietário de outro imóvel, sejaele rural ou urbano. Não háqualquer previsão quanto ao justotítulo e à boa-fé, pois taiselementos se presumem de formaabsoluta (presunção iure et de

Page 1392: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

iure), pela destinação que foidada ao imóvel, atendendo à suafunção social.

Partindo para as regrasprocessuais consagradas pela Lei6.969/1981, e que continuamtendo subsunção com aemergência do Novo CPC,determina o seu art. 4º, caput, quea ação de usucapião especial seráprocessada e julgada na Comarcada situação do imóvel. Destaque-se que essa era a regra decompetência para todas as açõesde usucapião, nos termos do art.95 do CPC/1973, primeira parte,pelo qual, nas ações fundadas em

Page 1393: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

direito real sobre imóveis, seriacompetente o foro da situação dacoisa. Fez o mesmo o art. 47 doCPC/2015, in verbis: “Para asações fundadas em direito realsobre imóveis é competente oforo de situação da coisa”.Cumpre anotar, o que continuatendo aplicação, que a presençada União ou de quaisquer de seusentes, na ação de usucapiãoespecial rural, não afasta acompetência do foro de situaçãodo imóvel. Essa dedução éretirada da antiga Súmula 11 doSuperior Tribunal de Justiça.

De acordo com o § 1º do art.

Page 1394: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

4º da Lei 6.969/1981, observadoo disposto no art. 126 daConstituição Federal – que tratada necessidade de criação devaras especializadas pelosTribunais de Justiça para dirimiros conflitos fundiários –, no casode usucapião especial em terrasdevolutas federais, a ação serápromovida na Comarca dasituação do imóvel, perante aJustiça do Estado, com recursopara o Tribunal Federal deRecursos, cabendo ao MinistérioPúblico local, na primeirainstância, a representação judicialda União. Apesar da menção

Page 1395: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

expressa, doutrina ejurisprudência majoritárias têmentendido que a possibilidade deusucapião rural de terrasdevolutas ou terras sem donos éincompatível com a própriaConstituição Federal. Isso porqueas terras devolutas são benspúblicos dominicais oudominiais, pertencentes aopatrimônio disponível do Estadoque, como tal, não podem serobjeto de usucapião (arts. 183, §3º, e 191, parágrafo único, daCF/1988). Esclareça-se que essejá era o entendimento dajurisprudência superior desde a

Page 1396: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

edição da Súmula 340 doSupremo Tribunal Federal, em1963, com a seguinte dicção:“Desde a vigência do CódigoCivil, os bens dominicais, comoos demais bens públicos, nãopodem ser adquiridos porusucapião”. Alerte-se que oCódigo Civil mencionado é o de1916. No Código Civil de 2002,o art. 102 veda expressamente ausucapião de qualquer bempúblico, seja móvel ou imóvel, deuso comum do povo, de usoespecial ou dominical.

Pela mesmaincompatibilidade, fica totalmente

Page 1397: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

prejudicado o § 2º do art. 4º daLei Agrária (Lei 8.629/1993),pelo qual, no caso de terrasdevolutas, em geral, a usucapiãoespecial poderá ser reconhecidaadministrativamente, com aconsequente expedição do títulodefinitivo de domínio, paratranscrição no Registro deImóveis. A conclusão tambémvale para os dois parágrafosseguintes do mesmo preceito, quetratam de procedimentosadministrativos para a usucapiãode terras devolutas, o que éimpossível desde a ConstituiçãoFederal de 1988, segundo o

Page 1398: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

entendimento que ainda émajoritário.

De toda sorte, cabe deixaranotado que o presente autor éfavorável à usucapião de benspúblicos dominicais, seguindo aantiga tese encabeçada por SilvioRodrigues, para quem esses benssão prescritíveis, pelo fato deserem alienáveis. Para oProfessor das Arcadas,interpretando o art. 188, caput, daCF/1988, “parece-me que olegislador constituinte,distinguindo as terras públicasdas devolutas, criou, como jádisse, um novo gênero de bens

Page 1399: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

públicos dominiais, o das terrasdevolutas, que seriam aquelas queconstituem um acervo que oEstado detém como osparticulares detêm o própriopatrimônio. Tal patrimônioescapa da regra do art. 100 doCC, que declara inalienáveis osdemais bens públicosclassificados no dispositivoanterior, e está sujeito ausucapião”.5 Pontue-se, dequalquer forma, que prevalecelargamente, inclusive najurisprudência superior, apremissa de vedação deusucapião dos bens públicos.

Page 1400: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

Voltando ao rito processualpara a usucapião especial rural,estatui o art. 5º, caput, da Lei6.969/1981 que será adotado oprocedimento sumaríssimo,assegurada a preferência à suainstrução e julgamento. Onde selê procedimento sumaríssimo,sempre se entendeu pelaaplicação do procedimentosumário, nos termos dos arts. 275e seguintes do CPC/1973, que foiexcluído pelo Novo CPC.

A esse propósito, o art.1.046 do Novo EstatutoProcessual é norma de direitointertemporal que não deixa

Page 1401: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

dúvidas, prevendo que, ao entrarem vigor o Novo Código, suasdisposições se aplicarão desdelogo aos processos pendentes,ficando revogada a Lei 5.869, de11.01.1973. Em complemento,nos termos do seu § 1º, asdisposições do antigo CPCrelativas ao procedimentosumário e aos procedimentosespeciais que forem revogadasaplicar-se-ão às ações propostase não sentenciadas até o início davigência do Novo Código. Porém,permanecem em vigor asdisposições especiais dosprocedimentos regulados em

Page 1402: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

outras leis, aos quais se aplicarásupletivamente o Novo CPC (art.1.046, § 2º, do EstatutoProcessual Emergente).

O curioso – e isso ocorretambém com outras leis especiais– é que a Lei 6.969/1981 fazmenção a um procedimento quenão existe mais, o que torna aincidência do último preceito doCPC/2015 sem sentido. Sendoassim, em uma primeira análise,parece que a ação de usucapiãoagrária passa a ser submetida aoque agora se denominaprocedimento comum,observados os preceitos

Page 1403: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

especiais que nela estão tratados.Incide, mais uma vez, a regraconstante do art. 318 do CPC de2015, aqui antes transcrita.

A propósito, estabelece oart. 5º, § 1º, da Lei 6.969/1981que, na ação de usucapiãoespecial rural, o autor, expondo ofundamento do pedido eindividualizando o imóvel, comdispensa da juntada da respectivaplanta, poderá requerer, napetição inicial, designação deaudiência preliminar, a fim dejustificar a posse, e, secomprovada esta, será nelamantido, liminarmente, até a

Page 1404: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

decisão final da causa. Porém,conforme já anotavam TheotonioNegrão e José Roberto F.Gouvêa, a jurisprudência vinhaentendendo pela desnecessidadedessa audiência de justificaçãoda posse na ação de usucapiãoagrária, o que deve ser mantidocom a emergência do Novo CPC.6

Seguindo no estudo da Leida Usucapião Especial Rural,prevê o seu art. 5º, § 2º, que oautor da ação requererá ainda acitação pessoal daquele em cujonome esteja transcrito o imóvelusucapiendo, bem como dosconfinantes e, por edital, dos réus

Page 1405: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

ausentes, incertos edesconhecidos, na forma do art.232 do CPC/1973, que tratava dacitação por edital, valendo acitação para todos os atos doprocesso. A menção aodispositivo anterior equivale,agora, ao art. 257 do CPC/2015.

Sem prejuízo dessa citação,serão cientificados por carta,para que manifestem interesse nacausa, os representantes daFazenda Pública da União, dosEstados, do Distrito Federal, dosTerritórios e dos Municípios, noprazo de 45 dias (art. 5º, § 3º, daLei 6.969/1981). Tal comando

Page 1406: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

continua a ter aplicação plena,sem qualquer interferência doEstatuto Instrumental emergente.

De acordo com o parágrafoseguinte, o prazo para contestar aação correrá da intimação dadecisão que declarar justificada aposse (art. 5º, § 4º, da Lei6.969/1981). Por fim, intervirá,obrigatoriamente, em todos osatos do processo, o MinistérioPúblico (art. 5º, § 5º, da Lei6.969/1981). Do mesmo modo,esses comandos não foramatingidos pelo Novo CPC, tendoaplicação normal, como semprefoi dada.

Page 1407: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

Dispõe o art. 6º da Lei6.969/1981 que o autor da açãode usucapião especial rural terá,se assim pedir, o benefício daassistência judiciária gratuita,inclusive para o Registro deImóveis. Em complemento, sendoprovado que o autor tinhasituação econômica bastante parapagar as custas do processo e oshonorários de advogado, semprejuízo do sustento próprio e dafamília, o juiz lhe ordenará quepague, com correção monetária, ovalor das isenções concedidas,ficando suspenso o registro dasentença até o pagamento devido

Page 1408: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

(art. 6º, parágrafo único, da Lei6.969/1981). Ainda em relação aesse comando, não houvequalquer mudança produzida pelanova norma.

Expostas e analisadas asregras atinentes à usucapiãoespecial rural, passa-se ao estudoda usucapião constitucional ouespecial urbana individual,tratada pelo art. 183 daConstituição Federal, pelo art.1.240 do Código Civil e pelo art.9º da Lei 10.257/2011 (Estatutoda Cidade). Não se podeesquecer, a propósito, da inclusãoda nova usucapião especial

Page 1409: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

urbana por abandono do larconjugal pela Lei 12.424/2011,que introduziu o art. 1.240-A noCódigo Civil de 2002.

A categoria é igualmentedenominada pro misero, pelaclara preocupação com amoradia, enunciando o caput doart. 183 da CF/1988, reproduzidopelos comandosinfraconstitucionais citados, quelhe dão fundamento: “Aquele quepossuir como sua área urbana deaté duzentos e cinquenta metrosquadrados, por cinco anos,ininterruptamente e sem oposição,utilizando-a para sua moradia ou

Page 1410: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

de sua família, adquirir-lhe-á odomínio, desde que não sejaproprietário de outro imóvelurbano ou rural”.

Pelo que se retira dosdispositivos legais mencionados,o primeiro requisito dessausucapião é a existência de umaárea urbana não superior a 250m². Ademais, deve estar presenteuma posse mansa e pacífica decinco anos ininterruptos, semoposição e com intenção de dono(animus domini). O imóvel deveser utilizado para a sua moradiaou de sua família, nos termos dodisposto no art. 6º da CF/1988.

Page 1411: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

Aquele que adquire o bem nãopode ser proprietário de outroimóvel, rural ou urbano; nãopodendo a usucapião especialurbana ser deferida mais de umavez. Cumpre observar, a exemplodo que ocorre com a outramodalidade constitucional, quenão há menção a respeito do justotítulo e da boa-fé pela presunçãoabsoluta ou iure et de iure desuas presenças.

O Estatuto da Cidadetambém traz regrascomplementares processuaissobre essa usucapião especialurbana individual, normas

Page 1412: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

inicialmente mantidas pelo NovoCPC, pelo que está escrito no seuart. 1.046, § 2º. De acordo com oart. 11 da Lei 10.257/2001, napendência da ação de usucapiãoespecial urbana, ficarãosobrestadas quaisquer outrasações, petitórias ou possessórias,que venham a ser propostasrelativamente ao imóvelusucapiendo. O que se percebe éque a ação de usucapião especialurbana tem prioridade em relaçãoàs demais demandas, o que estáfundamentado na proteção dapolítica urbana e, em certamedida, da moradia (art. 6º,

Page 1413: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

caput, da CF/1988). Assim, atítulo de exemplo, em havendoação de usucapião, todas as açõesde reintegração de posse relativasao imóvel ficam suspensas atéque a titularidade do domínio sejaresolvida.

São partes legítimas para apropositura da ação de usucapião,no teor do art. 12 do Estatuto daCidade: a) o possuidor,isoladamente ou emlitisconsórcio, seja ele originárioou superveniente; b) ospossuidores, em composse; c) aassociação de moradores dacomunidade, regularmente

Page 1414: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

constituída, com personalidadejurídica e desde queexplicitamente autorizada pelosrepresentados, atuando comosubstituto processual; previsãoque tem inegável função social,para uma melhor divisão daspropriedades no País. A regrapermanece incólume com o NovoCPC.

Na ação de usucapiãoespecial urbana, assim comoocorria com as demais ações demesma natureza por expressão noantigo CPC, é obrigatória aintervenção do MinistérioPúblico (art. 12, § 1º, da Lei

Page 1415: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

10.257/2001). O autor da açãoterá os benefícios da justiça e daassistência judiciária gratuita, oque inclui o cartório de registrode imóveis (art. 12, § 2º, da Lei10.257/2001).

Por fim, dispõe o art. 14 doEstatuto da Cidade, já adaptado àrealidade processual anterior, queo rito a ser observado seria osumário, conforme os arts. 275 eseguintes do CPC de 1973. Valemas mesmas observações feitasquanto à ação de usucapiãoagrária. Com o desaparecimentodo rito sumário, a ação passa aseguir o procedimento comum,

Page 1416: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

nos termos do art. 318 do CPC de2015, observadas as regrasespecíficas aqui expostas,previstas no Estatuto da Cidadepara a ação de usucapião.

Essa forma de pensartambém alcança a novamodalidade de usucapiãoespecial urbana por abandonodo lar, constante do art. 1.240-Ado CC, incluído pela Lei 12.424,de 16.06.2011. De acordo comesse preceito, “Aquele queexercer, por 2 (dois) anosininterruptamente e sem oposição,posse direta, com exclusividade,sobre imóvel urbano de até 250m²

Page 1417: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

(duzentos e cinquenta metrosquadrados) cuja propriedadedivida com ex-cônjuge ou ex-companheiro que abandonou olar, utilizando-o para sua moradiaou de sua família, adquirir-lhe-áo domínio integral, desde que nãoseja proprietário de outro imóvelurbano ou rural. § 1º O direitoprevisto no caput não seráreconhecido ao mesmo possuidormais de uma vez.”

Como fica claro, o institutotraz algumas semelhanças emrelação à usucapião especialurbana que anteriormente estavatratada, a qual pode ser

Page 1418: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

denominada regular. De início,cite-se a metragem de 250 m², queé exatamente a mesma,procurando o legislador manter auniformidade legislativa. Isso,apesar de que em alguns locais aárea pode ser tida comoexcessiva, conduzindo ausucapião de imóveis de valoresmilionários. Ato contínuo, o novoinstituto somente pode serreconhecido uma vez, desde que opossuidor não tenha um outroimóvel urbano ou rural.

A principal novidade é aredução do prazo para exíguosdois anos, o que faz que a nova

Page 1419: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

categoria seja aquela com menorlapso temporal previsto entretodas as modalidades deusucapião, inclusive de bensmóveis (o prazo menor era de trêsanos). Deve ficar claro que atendência pós-moderna éjustamente a redução dos prazoslegais, eis que o mundocontemporâneo possibilita atomada de decisões com maiorrapidez.

O abandono do lar é o fatorpreponderante para a incidênciada norma, somado aoestabelecimento da moradia composse direta. O comando pode

Page 1420: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

atingir cônjuges ou companheiros,inclusive homoafetivos, diante doamplo reconhecimento da uniãohomoafetiva como entidadefamiliar, equiparada à uniãoestável. Fica claro que o institutotem incidência restrita entre oscomponentes da entidade familiar,sendo esse o seu âmbito deaplicação. Nesse sentido, precisoenunciado aprovado na VJornada de Direito Civil,promovida pelo Conselho daJustiça Federal e pelo SuperiorTribunal de Justiça em 2011, asaber: “A modalidade deusucapião prevista no art. 1.240-

Page 1421: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

A do Código Civil pressupõe apropriedade comum do casal ecompreende todas as formas defamília ou entidades familiares,inclusive homoafetivas”(Enunciado n. 500).

Consigne-se que, emhavendo disputa, judicial ouextrajudicial, relativa ao imóvel,não ficará caracterizada a possead usucapionem, não sendo ahipótese de subsunção dopreceito. Eventualmente, ocônjuge ou companheiro queabandonou o lar pode notificar oex-consorte anualmente, parademonstrar o impasse relativo ao

Page 1422: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

bem, afastando o cômputo doprazo. Desse modo, o requisitodo abandono do lar merece umainterpretação objetiva ecautelosa. Nessa esteira, vejamosoutro enunciado aprovado na VJornada de Direito Civil, queanalisa muito bem a temática:

“A aquisição da propriedade na modalidadede usucapião prevista no art. 1.240-A doCódigo Civil só pode ocorrer em virtude deimplemento de seus pressupostosanteriormente ao divórcio. O requisito‘abandono do lar’ deve ser interpretado demaneira cautelosa, mediante a verificação deque o afastamento do lar conjugal representadescumprimento simultâneo de outros deveresconjugais, tais como assistência material esustento do lar, onerando desigualmente

Page 1423: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

aquele que se manteve na residência familiare que se responsabiliza unilateralmente pelasdespesas oriundas da manutenção da famíliae do próprio imóvel, o que justifica a perda dapropriedade e a alteração do regime de bensquanto ao imóvel objeto de usucapião”(Enunciado n. 499).

Com incidência concretadesse enunciado doutrinário, nãose pode admitir a incidência danova usucapião nas situaçõesconcretas de atos de violênciapraticados por um cônjuge oucompanheiro para retirar o outrodo lar conjugal. Em suma, aexpulsão do cônjuge oucompanheiro não pode sercomparada ao abandono. Outro

Page 1424: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

emprego que pode ser dado àtranscrita ementa doutrinária dizrespeito ao afastamento dequalquer debate a respeito daculpa, com o fim de influenciar ausucapião a favor de um ou outroconsorte. Na verdade, existindoqualquer controvérsia quanto àposse sobre o imóvel, não há quese falar em posse adusucapionem com a finalidade degerar a aquisição do domínio.

No que concerne à questãode direito intertemporal, é corretaposição sustentada por MarcosEhrhardt Jr., no sentido de que “Oprazo para exercício desse novo

Page 1425: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

direito deve ser contado porinteiro, a partir do início davigência da alteração legislativa,afinal não se deve mudar asregras do jogo no meio de umapartida”.7 A conclusão temrelação direta com a proteção dodireito adquirido, retirada do art.5º, XXXVI, da Constituição e doart. 6º da Lei de Introdução. Domesmo modo, o constante emoutro enunciado da V Jornada deDireito Civil: “A fluência doprazo de 2 (dois) anos previstopelo art. 1.240-A para a novamodalidade de usucapião nelecontemplada tem início com a

Page 1426: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

entrada em vigor da Lei12.424/2011” (Enunciado n. 498).Julgados estaduais já vêmseguindo essa correta forma depensar o Direito Privado (ver:TJSP, Apelação00406656920118260100,Terceira Câmara Cível, Rel.Alexandre Marcondes, j.25.02.2014; TJMG, ApelaçãoCível 1.0702.11.079218-2/001,Rel. Des. José Carlos MoreiraDiniz, j. 11.07.2013, DJEMG16.07.2013; e TJSC, ApelaçãoCível 2013.008829-3, Itajaí,Segunda Câmara de Direito Civil,Rel. Des. José Trindade dos

Page 1427: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

Santos, j. 31.05.2013, DJSC07.06.2013, p. 191).

Outro problema processual aser debatido está associado àcompetência para apreciar talmodalidade de usucapiãodecorrente, se da Vara Cível ouda Vara da Família. Existemarestos concluindo, com precisão,pela competência da primeira,diante da presença de questãoeminentemente civil, relativa aoDireito das Coisas. Nessa linha,para ilustrar, do TribunalBandeirante:

“Conflito negativo de competência. Varas

Page 1428: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

Cível e de Família e Sucessões da Comarca.Processamento de pedido de ‘usucapiãofamiliar’ (art. 1.240-A do Código Civil).Instituto que visa à legitimação de domínio deimóvel. Ação real. Existência de instituiçãofamiliar que é apenas um dos requisitoscumulativos previstos em lei. Questão quenão se refere ao estado das pessoas. Efeitosregistrários. Arts. 34 e 37 do CódigoJudiciário de SP. Varas da Família eSucessões que detêm hipóteses decompetência restritas. Tutela de caráterexclusivamente patrimonial, afastando acompetência do Juízo Especializado. Conflitojulgado procedente, para declarar acompetência do MM. Juízo da Vara Cível”(TJSP, Conflito de Competência 0180277-60.2013.8.26.0000, Câmara Especial, Rel.Claudia Grieco Tabosa Pessoa, Franca, datado julgamento: 09.12.2013, data de registro:12.12.2013).

Page 1429: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

Reafirme-se que, para ademanda judicial dessamodalidade emergente, devem sersubsumidos os preceitos doEstatuto da Cidade, seguindo-se orito comum, naquilo em quehouver compatibilidade,conforme o art. 318 do NovoCPC.

Superado o estudo dausucapião especial urbanaindividual, passa-se à usucapiãoespecial urbana coletiva,prevista no Estatuto da Cidade(art. 10 da Lei 10.257/2001).Dispõe a cabeça desse diplomaque: “As áreas urbanas com mais

Page 1430: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

de duzentos e cinquenta metrosquadrados, ocupadas porpopulação de baixa renda parasua moradia, por cinco anos,ininterruptamente e sem oposição,onde não for possível identificaros terrenos ocupados por cadapossuidor, são susceptíveis deserem usucapidas coletivamente,desde que os possuidores nãosejam proprietários de outroimóvel urbano ou rural”.

Assim, como primeirorequisito dessa usucapiãocoletiva, deve haver uma áreaurbana, com limitação mínima de250 m². A posse ad usucapionem

Page 1431: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

deve ser de, no mínimo, cincoanos ininterruptos, sem oposição,com animus domini. Como sepode perceber, não há exigênciade que a posse seja de boa-fé.Devem existir, no local, famíliasde baixa renda, utilizando oimóvel para moradia, nos termosdo art. 6º, caput, da CF/1988.Ainda, deve estar presente aausência de possibilidade deidentificação da área de cadapossuidor. Por fim, aquele queadquire não pode ser proprietáriode outro imóvel, seja rural ouurbano.

Como incidência concreta da

Page 1432: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

norma, cabe trazer a lumeinteressante conclusão doTribunal de Justiça de São Paulo,ao julgar não ser possível ausucapião especial urbanaindividual em caso envolvendoum cômodo em habitação coletiva(o popular cortiço). Para a CorteEstadual, o caminho processual aser percorrido seria o dausucapião coletiva, como se podenotar da ementa a seguirtranscrita:

“Usucapião especial urbano – Ação ajuizadaem caráter individual com a finalidade doreconhecimento de domínio exclusivo sobreum cômodo de habitação coletiva –

Page 1433: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

Inadmissibilidade – Situação a viabilizar emtese a ação de usucapião especial urbanocoletivo, na qual a legitimidade ad causam édeferida a todos os moradores emlitisconsórcio necessário ou à associação queos representa – Aplicação das regras dosarts. 9º, 10 e 12 da Lei 10.257/2001 (Estatutoda Cidade) – Petição inicial indeferida –Recurso do casal autor desprovido” (TJSP,Apelação 283.033-4/0, São Paulo, OitavaCâmara de Direito Privado, Rel. Morato deAndrade, 27.08.2003, v.u.).

Os parágrafos do art. 10 doEstatuto da Cidade trazemimportantes regras de cunhoprocessual, sem prejuízo deoutras normas instrumentais quetambém são subsumidas e queaqui foram estudadas,

Page 1434: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

especialmente os arts. 11 a 14 daLei 10.257/2001.

A usucapião especialcoletiva de imóvel urbano serádeclarada pelo juiz, mediantesentença, a qual servirá de títulopara registro no Cartório deRegistro de Imóveis (art. 10, § 2º,da Lei 10.257/2001). Nessasentença, o juiz atribuirá igualfração ideal de terreno a cadapossuidor, independentemente dadimensão do terreno que cada umocupe, salvo hipótese de acordoescrito entre os condôminos,estabelecendo frações ideaisdiferenciadas (art. 10, § 3º, da

Page 1435: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

Lei 10.257/2001).A última norma consagra o

estabelecimento de umcondomínio a favor dosusucapientes, o que deve constarda sentença declaratória dapropriedade. Esse condomínioespecial constituído é indivisível,não sendo passível de extinção,salvo deliberação favoráveltomada por, no mínimo, doisterços dos condôminos, no casode execução de urbanizaçãoposterior à constituição docondomínio (art. 10, § 4º, da Lei10.257/2001). Por fim, determinao comando legal que as

Page 1436: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

deliberações relativas àadministração do condomínioespecial serão tomadas pormaioria de votos dos condôminospresentes, obrigando também osdemais, discordantes ou ausentes(art. 10, § 5º, da Lei10.257/2001).

Com o fito de encerrar opresente tópico, cabe comentar aprincipal peça da revoluçãoengendrada pelo Novo EstatutoProcessual em matéria deusucapião imobiliária, qual seja,o amplo tratamento da usucapiãoadministrativa. Em qualquer umadas modalidades de usucapião

Page 1437: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

outrora expostas, o caminhoextrajudicial passa a ser possível,o que está em sintonia com aprincipiologia do Novo CPC ecom a tendência dedesjudicialização das contendas,de fuga do Judiciário.

Advirta-se que a efetivaçãodessa aquisição originária dapropriedade pela viaextrajudicial não é novidade nosistema, pois já constava do art.60 da Lei 11.977/2009, conhecidacomo Lei Minha Casa, MinhaVida. Nesse contexto, é possívelque o Poder Público legitime aposse de ocupantes de imóveis

Page 1438: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

públicos ou particulares, naliteralidade do art. 59 da norma(“A legitimação de possedevidamente registrada constituidireito em favor do detentor daposse direta para fins demoradia”). Essa legitimação daposse será concedida aosmoradores cadastrados peloPoder Público, desde que: a) nãosejam concessionários, foreirosou proprietários de outro imóvelurbano ou rural; e b) não sejambeneficiários de legitimação deposse concedida anteriormente. Alegitimação de posse também seráconferida ao coproprietário da

Page 1439: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

gleba, titular de cotas ou fraçõesideais, devidamente cadastradopelo Poder Público, desde queexerça seu direito de propriedadeem um lote individualizado eidentificado no parcelamentoregistrado.

Depois da concessão de taldireito, estabelece o art. 60 daLei 11.977/2009 que o detentordo título de legitimação de posse,após cinco anos de seu registro,poderá requerer ao oficial deregistro de imóveis a conversãodesse título em registro depropriedade, tendo em vista suaaquisição por usucapião,

Page 1440: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

conforme o art. 183 daConstituição Federal. Em outraspalavras, converte-se a meralegitimação da posse empropriedade, por meio dausucapião especial ouconstitucional urbana.

Ressalve-se que, no caso debens públicos, não caberá essaconversão, diante da proibiçãoque consta do § 3º do art. 183 doTexto Maior e do art. 102 doCC/2002. Para requerer aconversão, o adquirente deveráapresentar: I – certidões docartório distribuidordemonstrando a inexistência de

Page 1441: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

ações em andamento que versemsobre a posse ou a propriedadedo imóvel; II – declaração de quenão possui outro imóvel urbanoou rural; III – declaração de que oimóvel é utilizado para suamoradia ou de sua família; e IV –declaração de que não tevereconhecido anteriormente odireito à usucapião de imóveisem áreas urbanas.

Se a área for superior a 250m², não será possível adquiri-lapela modalidade da usucapiãoespecial ou constitucional urbana,mas apenas por outra categoria,caso da usucapião ordinária ou da

Page 1442: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

extraordinária (art. 60, § 3º, daLei 11.977/2009). Por fim, quantoa essa modalidade, o título delegitimação de posse poderá serextinto pelo Poder Públicoemitente quando constatado que obeneficiário não está na posse doimóvel e não houve registro decessão de direitos. Depois doprocedimento para extinção dotítulo, o Poder Público solicitaráao oficial de registro de imóveisa averbação do seu cancelamento(art. 60-A).

Como bem observamCristiano Chaves de Farias eNelson Rosenvald, tal

Page 1443: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

modalidade de usucapiãoconstituiu uma ousada forma deconcretização da proteçãoconstitucional da moradia e dafunção social da propriedade,estando inserida na sadia ideia dedesjudicialização dos conflitoscivis.8 Ou ainda, segundo aspalavras de Melhim NamenChalhub, “O Capítulo III da Lei11.977/2009 transpõe para odireito positivo o reconhecimentoda eficácia jurídica da posse comfunção social, e, para maiorceleridade de sua conversão empropriedade, admite sejaprocessada extrajudicialmente a

Page 1444: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

usucapião de imóveis localizadosem favelas e assentamentosassemelhados. Por esse meio, alei desata amarras que, no âmbitojudicial, dificultam o acesso dopossuidor ao título depropriedade. A extrajudicialidadedo procedimento se justifica,dentre outros fundamentos, pelanecessidade de simplificar edesburocratizar os meios derealização da função social dapropriedade e das cidades, econtribui decisivamente paraconsecução dessas funções, nãohavendo afronta alguma aosrequisitos da aquisição da

Page 1445: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

propriedade por usucapião, nemàs garantias constitucionais dodireito de propriedade, desde quecumprida sua função social, e,ainda, aos requisitos docontraditório”.9

Sem dúvida, muitos desafiossurgirão na prática e najurisprudência a respeito desseinteressante instituto, que nasceupara uma melhor concretização dafunção social da posse e dapropriedade, visando àotimização da distribuição dodomínio nos meios urbanos. Como Novo CPC, os desafios foramainda mais ampliados, o que vem

Page 1446: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

em boa hora, pois a nossaexperiência com o contenciosocível sempre demonstrou asgrandes dificuldades existentespara a efetivação judicial dausucapião.

O art. 1.071 do NovoEstatuto Processual tratou dausucapião extrajudicial, porqualquer uma de suasmodalidades, introduzindo o art.216-A na Lei de RegistrosPúblicos (Lei 6.015/1973). Deacordo com o seu caput, semprejuízo da via jurisdicional, éadmitido o pedido dereconhecimento extrajudicial de

Page 1447: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

usucapião, que será processadodiretamente perante o Cartório doRegistro de Imóveis da comarcaem que estiver situado o imóvelusucapiendo. Como se nota, a viaextrajudicial é uma faculdade enão uma obrigação peremptória, oque confirma a tese antesdefendida, de viabilidade detodas as ações de usucapião,agora pelo rito comum.

Também nos termos com odiploma citado, o pedido deusucapião deve ser feito pelointeressado, devidamenterepresentado por advogado, o queé obrigatório. Lamenta-se a falta

Page 1448: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

de menção ao defensor público,para os mais necessitados.Todavia, a viabilidade de suaatuação, não havendo apossibilidade de o interessadoarcar com os custos advocatícios,pode ser retirada do art. 185 doCPC/2015, in verbis: “ADefensoria Pública exercerá aorientação jurídica, a promoçãodos direitos humanos e a defesados direitos individuais ecoletivos dos necessitados, emtodos os graus, de forma integrale gratuita”.

O art. 216-A, caput,estabelece, ainda, que o pedido

Page 1449: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

deve ser instruído com osseguintes documentos, junto aoCartório de Registro de Imóveis:a) ata notarial lavrada pelotabelião, atestando o tempo deposse do requerente e seusantecessores, conforme o caso esuas circunstâncias; b) planta ememorial descritivo assinado porprofissional legalmentehabilitado, com prova deanotação de responsabilidadetécnica no respectivo conselho defiscalização profissional, e pelostitulares de direitos reais e deoutros direitos registrados ouaverbados na matrícula do imóvel

Page 1450: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

usucapiendo e na matrícula dosimóveis confinantes; c) certidõesnegativas dos distribuidores dacomarca da situação do imóvel edo domicílio do requerente, paraatestar que a posse é mansa epacífica; d) justo título ouquaisquer outros documentos quedemonstrem a origem, acontinuidade, a natureza e otempo da posse, tais como opagamento dos impostos e dastaxas que incidirem sobre oimóvel.

Vale dizer que o justo títulosomente deve ser tido comorequisito essencial na modalidade

Page 1451: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

de usucapião ordinária, pois asoutras o dispensam, como vistoneste estudo. Como exemplo dejusto título, pode ser apontado umcontrato anterior, não maisvigente e eficaz, que demonstre acessão da posse direta. Pode sercitado, ainda, um compromisso decompra e venda do imóvel, sejaele registrado ou não namatrícula.

Conforme o § 1º do novo art.216-A da Lei de RegistrosPúblicos, o pedido será autuadopelo registrador, prorrogando-seo prazo da prenotação até oacolhimento ou rejeição do

Page 1452: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

pedido. Em suma, os efeitos dopedido dependem de umaconfirmação posterior.Eventualmente, consoante o § 2ºda mesma norma, se a planta nãocontiver a assinatura de qualquerum dos titulares de direitos reaise de outros direitos registrados ouaverbados na matrícula do imóvelusucapiendo e na matrícula dosimóveis confinantes, esse seránotificado pelo registradorcompetente, para manifestar seuconsentimento expresso em 15dias. O seu silêncio nãorepresenta consentimento, masdiscordância, o que é aplicação

Page 1453: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

da regra geral do Direito Civil,segundo a qual, o silêncio nãorepresenta anuência, retirada doart. 111 do Código Civil (quemcala, não consente). Essanotificação pode ser realizadapelo registrador pessoalmente oupelo correio, com aviso derecebimento.

Seguindo, o § 3º do art. 216-A prescreve que o oficial deregistro de imóveis dará ciência àUnião, ao Estado, ao DistritoFederal e ao Município, para quese manifestem, em 15 dias, sobreo pedido, o que já era previstopara algumas modalidades

Page 1454: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

judiciais. Essa comunicação seráfeita pessoalmente, porintermédio do oficial de registrode títulos e documentos, ou,ainda, pelo correio, com aviso derecebimento, o que visa a plenaciência do Poder Público, paraque não existam prejuízos aoErário ou que não haja usucapiãode um bem público.

Igualmente para os devidosfins de publicidade, o oficial deregistro de imóveis promoverá apublicação de edital em jornal degrande circulação, onde houver,para a ciência de terceiroseventualmente interessados, que

Page 1455: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

podem manifestar-se em 15 dias(art. 216-A, § 4º, da Lei deRegistros Públicos). Para aelucidação de qualquer ponto dedúvida, poderão ser solicitadasou realizadas diligências pelooficial de registro de imóveis(art. 216-A, § 5º, da Lei deRegistros Públicos). A título deexemplo, podem ser citadas ashipóteses em que há dúvidas deque o bem é público ouparticular. Mencione-se ainda, ailustrar, a divergência quanto aopreenchimento dos requisitos deuma ou outra modalidade deusucapião, entre todas as

Page 1456: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

analisadas no presente capítulo.Transcorrido o prazo de 15

dias para manifestação dosinteressados, sem a pendência dequalquer diligência para soluçãode dúvidas e achando-se emordem a documentação, cominclusão da concordânciaexpressa dos titulares de direitosreais e de outros direitosregistrados ou averbados namatrícula do imóvel usucapiendoe na matrícula dos imóveisconfinantes, o oficial de registrode imóveis registrará a aquisiçãodo imóvel com as descriçõesapresentadas, sendo permitida a

Page 1457: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

abertura de matrícula, se for ocaso (art. 216-A, § 6º, da Lei deRegistros Públicos).

Em todas as hipóteses, élícito ao interessado suscitar oprocedimento de dúvida (art.216-A, § 7º, da Lei de RegistrosPúblicos). A título de exemplo,imagine-se o caso de umproprietário que alegue aexistência de um contrato decomodato, vigente, a afastar aposse com intenção de dono quegera a usucapião. Ao final dasdiligências, prevê o § 8º do novodiploma que, se a documentaçãonão estiver em ordem, o oficial

Page 1458: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

de registro de imóveis rejeitará opedido de usucapiãoextrajudicial. Em suma, passa elea atuar como juiz de fato e dedireito para a apreciação dausucapião, o que representa umagrande evolução na atuação dosCartórios.

A rejeição do pedidoextrajudicial não impede oajuizamento de ação deusucapião, conforme o novo art.216-A, § 9º, da Lei de RegistrosPúblicos, confirmação de que asvias judiciais e extrajudiciais sãototalmente independentes efacultativas. Eventualmente, um

Page 1459: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

pedido extrajudicial rejeitado emum primeiro momento pode seraceito perante o Poder Judiciário.

Por fim, preceitua o § 10 donovel diploma que, nas situaçõesconcretas de impugnação aopedido de reconhecimentoextrajudicial da usucapião,apresentada por qualquer um dostitulares de direitos reais e deoutros direitos registrados ouaverbados na matrícula do imóvelusucapiendo e na matrícula dosimóveis confinantes, por algumdos entes públicos ou por algumterceiro interessado, o oficial deregistro de imóveis remeterá os

Page 1460: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

autos ao juízo competente dacomarca da situação do imóvel,cabendo ao requerente emendar apetição inicial para adequá-la aoprocedimento comum. Eis aquiuma interessante conversão davia extrajudicial para a judicial,seguindo a ação correspondente orito comum.

Esclareça-se que odispositivo não trata da soluçãode dúvida suscitada, mas doesgotamento da viaadministrativa, remetendo-se oproblema para a via judicial. Emregra, a questão deve ser dirimidana Vara de Registros Públicos. Se

Page 1461: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

não houver, a Vara Cível é aresponsável pela contenda.

Para encerrar, acreditamosque essa modalidade deusucapião extrajudicial, pelomenos na teoria, veio em boahora. As ações de usucapiãosempre demoraram muito tempo,chegando a ser até inviáveis emalgumas situações concretas. Se acategoria for bem aplicada,pensamos que trará benefícios àsociedade. Todavia, pode ocorrero contrário, e, em casos deabusos praticados, asimpugnações judiciais manterãoos problemas no âmbito do Poder

Page 1462: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

Judiciário, ou mesmo osintensificarão. Em suma, somenteo tempo e a prática reiteradadessa usucapião poderãodemonstrar se ela será boa ouruim. Aguardemos.

Page 1463: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

__________1 CÂMARA, Alexandre Freitas.Lições de Processo Civil. 7. ed. Riode Janeiro: Lumen Juris, 2005. v. III, p.440.2 THEODORO JÚNIOR, Humberto.Curso de Direito Processual Civil.32. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2004.v. III, p. 188.3 NEGRÃO, Theotonio. Código deProcesso Civil. 37. ed. São Paulo:Saraiva, 2005. p. 930.4 MARQUES, Benedito Ferreira.Direito Agrário Brasileiro. 9. ed. SãoPaulo: Saraiva, 2011. p. 98-99.5 RODRIGUES, Silvio. Direito Civil.São Paulo: Saraiva, 2002. v. 1: Partegeral, p. 148.

Page 1464: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

6 NEGRÃO, Theotonio; GOUVÊA,José Roberto F. Código CivilAnotado. 26. ed. São Paulo: Saraiva,2007. p. 1.489.7 EHRHARDT JR., Marcos. Temosum Novo tipo de Usucapião Criadopela Lei 12.424/2011. Problemas àVista. Disponível em:<http://www.marcosehrhardt.adv.br/index.php/blogAcesso em: 1.º jul. 2011.8 FARIAS, Cristiano Chaves;ROSENVALD, Nelson. Curso deDireito Civil. Reais. 8. ed. Salvador:JusPodivm, 2012. v. 5, p. 450-456.9 CHALHUB, Melhim Namen.Usucapião Administrativa.Disponível em:<http://www.melhimchalhub.com.br/noticia/detalhe/20Acesso em: 24 set. 2012.

Page 1465: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

ALTERAÇÕES NOTRATAMENTO DA

REMIÇÃO DAHIPOTECA PELO

NOVO CPC

O Novo Código de ProcessoCivil introduziu importantesalterações no tratamento da

Page 1466: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

remição da hipoteca, diante darevogação dos arts. 1.482 e 1.483do Código Civil, expressamente,pelo seu art. 1.072, inciso II;dispositivo processual que podeser tido como verdadeiroaniquilador de normas materiais.

Como é cediço, a remiçãoda hipoteca é um dos temas maisimportantes no estudo dessedireito real de garantia sobrecoisa própria. De início, não sepode confundir a remição, escritacom cê-cedilha, com a remissão,com dois esses. O própriolegislador fez tal confusão, emalguns dispositivos da

Page 1467: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

codificação material, como severá a seguir. Remição significaresgate pelo pagamento, oumelhor, “é o direito concedido acertas pessoas de liberar oimóvel gravado, mediantepagamento de quantia devida,independentemente da anuênciado credor (EJSTJ 15:243). Nalição de Pontes de Miranda, érecomprar, readquirir, afastarpagando”.1 Por seu turno, o termoremissão significa perdão dadívida, forma de pagamentoindireto. A remissão é realizadapelo credor, devendo ser aceitapelo devedor, por força do art.

Page 1468: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

385 do Código Civil.Pois bem, três eram as

hipóteses especiais de remiçãoou resgate da hipoteca tratadasoriginalmente pelo Código Civil:a) remição da hipoteca peloadquirente do imóvel; b) remiçãoda hipoteca pelo próprio devedorou por seus familiares; c) remiçãoda hipoteca no caso de falênciaou insolvência do devedorhipotecário. Em relação àremição de sub-hipotecas, estatem tratamento em separado, nãomerecendo abordagem nestecapítulo. Como se verá a seguir, oNovo Código de Processo Civil

Page 1469: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

retirou do sistema parte dasegunda modalidade de remiçãosupramencionada. Ademais,revogou o artigo do Código Civilque cuidava da terceiramodalidade, passando esta a sertratada pelo Estatuto Processualemergente.

A remição da hipoteca peloadquirente do imóvel éregulamentada com detalhes peloart. 1.481 do CC/2002, segundo oqual, dentro do prazo decadencialde 30 dias, contados do registrodo título aquisitivo, tem oadquirente do imóvel hipotecadoo direito de remi-lo, citando os

Page 1470: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

credores hipotecários e propondoimportância não inferior ao preçopor que o adquiriu. Como bempontua a doutrina, tal direito deremição pode ser exercido antesmesmo do vencimento da dívida.2Trata-se de um direitopotestativo, conforme bemreconhece a jurisprudência (STJ,REsp 164.609/ES, TerceiraTurma, Rel. Min. Carlos AlbertoMenezes Direito, j. 24.06.1999,DJ 09.08.1999, p. 167; e TJMG,Agravo de Instrumento 0571127-84.2012.8.13.0000, Rel. Des.Leite Praça, . 0eça, 01 12.8.18.ça, 8. t 2

e

Page 1471: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce
Page 1472: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce
Page 1473: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce
Page 1474: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce
Page 1475: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce
Page 1476: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce
Page 1477: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce
Page 1478: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce
Page 1479: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce
Page 1480: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

“Processual civil. Adjudicação de benspenhorados. Direito da meeira preservado emembargos de terceiro. Ação ajuizada paradesconstituir a adjudicação. Violação dodireito de preferência do cônjuge. Art. 1.482do Código Civil. Aplicação dos §§ 2º e 3º doart. 685-A do CPC. Não mais persiste nalegislação processual o instituto da remição debens, anteriormente previsto nos arts. 787 eseguintes do CPC. No entanto, possui ocônjuge o direito de preferência naadjudicação de bens penhorados, o qual deveser exercido antes da sua transferência aterceiros, por meio do depósito do valor daavaliação em juízo. Exegese do art. 685-A,§§ 2º e 3º, do CPC. Recurso não provido”(TJMG, Apelação Cível 0041551-61.2011.8.13.0672, Sete Lagoas, DécimaSegunda Câmara Cível, Rel. Des. NiloLacerda, j. 29.02.2012, DJEMG 12.03.2012).

Ao presente autor parecia

Page 1481: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

não ser essa a melhorinterpretação, pois o CódigoCivil de 2002 ainda vigeria,propiciando que a remição fossefeita tanto pelo devedor como porseus familiares. Aprofunde-se quea norma da codificação privadatinha natureza processual,podendo perfeitamente substituira regra que foi revogada noEstatuto Processual. Ademais, aremição efetivada pelosfamiliares concretizaria aproteção da família, retirada doart. 226 do Texto Maior. Apropósito, concluindo ainda pelapossibilidade de subsunção do

Page 1482: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

art. 1.482 do CC/2002, dajurisprudência paulista:

“Agravo de instrumento. Execução.Arrematação e adjudicação pelo exequente.Reconhecido o direito de remição adescendente do executado, único pretendente,observados, assim, os termos do art. 1.482 doCódigo Civil cumulado com o art. 685-A, §§2º e 3º, do Código de Processo Civil.Afastada a determinação judicial da licitação.Decisão do Juízo a quo reformada. Agravoprovido (Voto 8017)” (TJSP, Agravo deInstrumento 7274103-4, Acórdão 3308870,Mirassol, Décima Nona Câmara de DireitoPrivado, Rel. Des. Sampaio Pontes, j.13.10.2008, DJESP 03.11.2008).

Na doutrina, FranciscoEduardo Loureiro igualmente

Page 1483: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

entendia pela aplicação do art.1.482 do CC/2002, ao lecionarque, “embora controverso o tema,possível defender que persistaainda, regulada pelo artigo emestudo, a remição da hipoteca,instituto de nítida naturezamaterial, que tem o objetivo nãosomente de extinguir a execução,mas liberar o patrimônio do ônusreal. Nas execuções de créditoquirografário, o regime é o doCPC, de modo que a remição éfacultada apenas ao devedor,devendo seus parentes utilizar-seda adjudicação. Já nas execuçõeshipotecárias ainda se admite a

Page 1484: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

remição da hipoteca não somentepelo devedor, mas também pelosseus parentes”.3 Essa igualmenteera a posição seguida pelodoutrinador em julgamentos emque atuava no Tribunal de Justiçade São Paulo.

Todavia, o Novo CPC nãoseguiu essa forma de pensar, masa primeira, dos arestos antestranscritos, não sendo maispossível, definitivamente, aremição pelos familiares doexecutado, que têm apenas umdireito de preferência para acompra do bem. Consigne-se queessa adjudicação, com direito de

Page 1485: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

preferência a favor dos parentes,foi mantida pelo Novo CPC, porforça do seu art. 876, § 5º, inverbis: “Idêntico direito pode serexercido por aqueles indicadosno art. 889, incisos II a VIII,pelos credores concorrentes quehajam penhorado o mesmo bem,pelo cônjuge, pelo companheiro,pelos descendentes ou pelosascendentes do executado”. Emrelação à remição realizada pelopróprio executado, esta persiste,mas apenas no sistemaprocessual, como se verá.

Feitas tais considerações, epassando para a terceira e última

Page 1486: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

modalidade de remição, tambémhouve alteração no que dizrespeito à remição da hipotecano caso de falência ouinsolvência do devedorhipotecário. Nos termos doCódigo Civil de 2002, essedireito seria deferido à massa, ouaos credores em concurso, nãopodendo o credor recusar o preçoda avaliação do imóvel (art.1.483 do CC). A propósito,nessas circunstâncias, poderia ocredor hipotecário, parapagamento de seu crédito,requerer a adjudicação do imóvelavaliado em quantia inferior

Page 1487: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

àquele, desde que dê quitaçãopela sua totalidade (art. 1.483,parágrafo único, do CC).

Na realidade, constata-seque tal instituto não foi totalmenteretirado do sistema real,passando apenas a ser tratadopelo Novo Estatuto Processual.No capítulo relativo àadjudicação, estabelece o art. 877do Novo CPC que, transcorrido oprazo de cinco dias, contado daúltima intimação, e decididaseventuais questões, o juizordenará a lavratura do auto deadjudicação. Pelo mesmocomando, no seu § 1º, considera-

Page 1488: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

se perfeita e acabada aadjudicação com a lavratura e aassinatura do auto pelo juiz, peloadjudicatário, pelo escrivão ouchefe de secretaria, e, se estiverpresente, pelo executado,expedindo-se: a) se bem imóvel,a carta de adjudicação e omandado de imissão na posse; b)se bem móvel, ordem de entregaao adjudicatário.

A carta de adjudicaçãoconterá a descrição do imóvel,com remissão – no sentido demenção, e não de perdão – à suamatrícula e aos registros, à cópiado auto de adjudicação e à prova

Page 1489: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

de quitação do imposto detransmissão (art. 877, § 2º, doCPC/2015). No caso de penhorade bem hipotecado, o executadopoderá remi-lo até a assinatura doauto de adjudicação, oferecendopreço igual ao da avaliação, senão tiver havido licitantes, ou aodo maior lance oferecido (art.877, § 3º, do CPC/2015). Esseúltimo preceito concretiza aremição realizada peloexecutado, aqui antes exposta econfirmada pelo Novo CPC.

Seguindo o estudo docomando, conforme o § 4º donovo art. 877 do CPC/2015, em

Page 1490: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

havendo falência ou insolvênciado devedor hipotecário, essedireito de remição será deferido àmassa ou aos credores emconcurso, não podendo oexequente recusar o preço daavaliação do imóvel. Trata-se dafigura que antes estava previstano art. 1.483 do Código Civil,totalmente transposta para oEstatuto Processual, não se sabecom qual função.

Nas hipóteses de remiçãoque ainda restam, é lícito aosinteressados fazer constar dasescrituras de instituição dahipoteca o valor entre si ajustado

Page 1491: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

dos imóveis hipotecados, o qual,devidamente atualizado, será abase para as arrematações,adjudicações e remições,dispensada a avaliação (art.1.484 do CC/2002). Em suma, aspartes podem, por exercício daautonomia privada, fixar o valordo bem, para os fins de suatransmissão, o que visa a facilitara efetivação prática da garantia.Esse dispositivo material nãosofreu alteração pelo NovoEstatuto Processual.

De qualquer maneira,entendemos que a última norma éexcessivamente liberal e não está

Page 1492: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

em sintonia com a atualprincipiologia do DireitoPrivado, em especial com a boa-fé objetiva e a função social.Imagine-se, por exemplo, umacláusula que fixa o valor do bemem um terço do seu valor domercado, traduzindo onerosidadeexcessiva. Ou, ainda, a imposiçãode uma cláusula desproporcionalem contrato de consumo ou deadesão. Em todos esses casos, háque se reconhecer a nulidade dacláusula por ilicitude do objeto(art. 166, inc. II, do CC/2002).Serve de apoio o art. 187 dacodificação material, que

Page 1493: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

consagra o abuso de direito comoato ilícito.

Em reforço, podem serutilizados os arts. 51 do CDC e424 do CC/2002, que protegem oconsumidor e o aderente, comopartes vulneráveis da relaçãonegocial, contra cláusulasconsideradas abusivas, que sãonulas de pleno direito. Com oreconhecimento dessa nulidade dacláusula que estabelece o valorda coisa, deve-se proceder a umareal avaliação da coisa, buscandoo seu valor perante a sociedade,concretizando a função social dapropriedade.

Page 1494: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

Cabe, por fim, a revisão dovalor fixado previamente pelomagistrado, o que é reconhecidopor alguns julgados. A título deilustração, admitindoimplicitamente a ideia: “Tendo osimóveis hipotecados sidopreviamente estimados naconstituição da hipoteca, nostermos do art. 1.484 do CódigoCivil vigente, que manteve ocomando instituído pelo art. 818do Código Civil de 1916, e nãohavendo indício trazido pelaspartes de majoração oudiminuição no valor a elesatribuído, mostra-se dispensável

Page 1495: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

sua avaliação, incidindo tão só aatualização monetária, para quepossam ser levados à hastapública. Decisão reformada.Recurso provido” (TJSP, Agravode Instrumento 991.09.012237-3,Acórdão 4385875, Jundiaí,Décima Sétima Câmara deDireito Privado, Rel. Des. WalterFonseca, j. 24.02.2010, DJESP09.04.2010).

Page 1496: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

__________1 DINIZ, Maria Helena. Curso deDireito Civil Brasileiro. Direito dasCoisas. 25. ed. São Paulo: Saraiva,2010. v. 4, p. 1.027.2 LOUREIRO, Francisco Eduardo.Código Civil Comentado.Coordenador: Ministro Cezar Peluso.São Paulo: Manole, 2007. p. 1.585.3 LOUREIRO, Francisco Eduardo.Código Civil Comentado.Coordenador: Ministro Cezar Peluso.São Paulo: Manole, 2007. p. 1.587.

Page 1497: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

AS REGRAS GERAISDAS AÇÕES DE

DIREITO DE FAMÍLIAE O TRATAMENTO

PROCESSUAL DAAÇÃO DE

ALTERAÇÃO DEREGIME DE BENS

Page 1498: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

Como novidade festejada –contando inclusive com o apoio eproposições do InstitutoBrasileiro de Direito de Família(IBDFAM) –, o Novo Código deProcesso Civil traz um tópicoespecífico relativo às Ações deFamília. Segue-se, assim, oexemplo que já constava doprojeto de Estatuto das Famílias,elaborado pelo próprio IBDFAM,atualmente em trâmite no SenadoFederal (PLS 470/2013).

Essas normas comuns àsações de Direito de Família estãotratadas entre os arts. 693 a 699do Novo Codex, prevendo o

Page 1499: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

primeiro preceito que as normasdo capítulo aplicam-se aosprocessos contenciosos dedivórcio, separação,reconhecimento e extinção deunião estável, guarda, visitação efiliação. Forçoso concluir que orol é meramente exemplificativo(numerus apertus), podendo asnormas em questão sersubsumidas a outras ações comconteúdo familiar. Para opresente autor, por exemplo,todos os procedimentos aquiestudados podem ser aplicados auma ação de responsabilidadecivil fundada na conjugalidade ou

Page 1500: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

na parentalidade. Não se olvideque a competência para taisdemandas é das Varas da Família,quando houver essa divisão, pelaorganização interna de cadaTribunal. Assim como estádesenvolvido no Capítulo 13deste livro, lamenta-se o fato de oCPC/2015 continuar tratando daseparação judicial, o que é umtotal retrocesso, na opinião dopresente autor.

No que diz respeito à açãode alimentos e àquela que versarsobre interesse de criança ou deadolescente, deverão serobservados os procedimentos

Page 1501: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

previstos em legislaçãoespecífica, aplicando-se, no quecouber, as disposições do NovoCPC de maneira subsidiária (art.693, parágrafo único, doCPC/2015). Desse modo, quantoaos alimentos, sem prejuízo deoutras normas tratadas peloEstatuto Processual emergente,subsume-se a Lei 5.478/1968,naquilo em que não foi revogada.O tema ainda será desenvolvidoem outro capítulo desta obra.

No que concerne aoprocesso judicial de adoção decriança ou adolescente, têmincidência os preceitos constantes

Page 1502: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

dos arts. 39 a 52 do Estatuto daCriança e do Adolescente (Lei8.069/1990), com as alteraçõesengendradas pela Lei12.010/2009. A manutençãodessas regras justifica-seplenamente diante da existênciade um sistema jurídico totalmentevoltado para a proteção integralda criança e do adolescente.

Nas demandas descritas, aprioridade passa a ser o acordoentre as partes, estabelecendo onovo art. 694 do CPC/2015, emboa hora, que, nas ações deDireito de Família, todos osesforços serão empreendidos

Page 1503: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

para a solução consensual dacontrovérsia, devendo o juizdispor do auxílio de profissionaisde outras áreas de conhecimentopara a mediação e a conciliação.Nesse contexto, serão decisivasas atuações de mediadoresespecializados, inclusive comoutras formações, comopsicólogos e assistentes sociais.Como antes escreveu FernandaTartuce, em texto em coautoria:

“Para que o indivíduo atue de formaautônoma, é importante a consideração desua dignidade enquanto possibilidade deautodeterminação livre e consciente; assim,deve ser disponibilizada plena informaçãosobre sua situação jurídica, sendo-lhe

Page 1504: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

dispensado genuíno respeito à sua liberdade.Quanto ao consenso, é importante haverconcordância dos indivíduos em relação aodestino de suas posições jurídicas. Sobrelevaque sua anuência seja autêntica e nãodecorrente de pressões e desinformações dequalquer uma das partes. A comunicação e odiálogo são essenciais para o afastamento dasanimosidades e o estabelecimento da relaçãoem bases conciliatórias. Como obter oconsenso em momentos de acirramentos,animosidades e perdas? A mediação surgecomo importante técnica em tal contexto aocontemplar uma forma de gerir os conflitoscom enfoque precípuo nas pessoas e em seusverdadeiros interesses. Tal método promoveuma abordagem mais profunda dacontrovérsia ao funcionar como umacompanhamento das partes para que possamgerir seus conflitos e formular uma decisãocélere, ponderada, eficaz e satisfatória emrelação ao impasse instalado.As técnicas para obter tal mister são

Page 1505: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

variadas, tendo por núcleo principal aprovocação da reflexão dos indivíduos,fazendo perguntas pertinentes sobre o objetolitigioso e outros elementos relevantes para odeslinde das questões. Assim, tem-se que aregra básica da comunicação fundamental namediação (assim como na negociação) éescutar com atenção, interrogar para sabermais e ir resumindo o que compreendeu paraesclarecer pontos importantes do conflito. Omediador não impõe decisões, mas dirige asregras de comunicação entre as partes.Com a facilitação do diálogo pelo mediador,os sentimentos das partes podem serenfrentados e compreendidos. Sendo-lhespermitido um espaço apropriado para areflexão e o resgate de suas própriasresponsabilidades, os mediandos poderãoseparar os sentimentos dos reais interesses,deixando para trás o passado e podendo sereorganizar para os tempos futuros.”1

Page 1506: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

Em complemento, prescreveo parágrafo do art. 694 do NovoCPC que, a requerimento daspartes, o juiz pode determinar asuspensão do processo enquantoos litigantes se submetem amediação extrajudicial ou aatendimento multidisciplinar. Há,assim, uma tentativa de substituira cultura da guerra, pela culturada paz, o que demandará não sóuma mudança de atitude dosprofissionais da área, comotambém uma alteração no modode ensino da ciência processualnas Faculdades de Direito doBrasil. A ideia de um

Page 1507: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

superadvogado, semprevencedor, deverá ser substituídapor um bom mediador ou porconciliador de conflitos. Valelembrar que mediação econciliação não se confundem.Como bem expõe FernandaTartuce, a medição não visa purae simplesmente ao acordo, mas,sim, a atingir os interesses e asnecessidades das partesenvolvidas, estimulando aaproximação e o diálogo entre aspartes.2 Em tais aspectos, amediação diferencia-se daconciliação.

Ainda incrementando essa

Page 1508: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

tendência ao acordo, preceitua oart. 695 do Novo Código deProcesso Civil que, recebida apetição inicial, em todas asdemandas citadas, e, se for ocaso, tomadas as providênciasreferentes à tutela provisória, ojuiz ordenará a citação do réupara comparecer à audiência demediação e conciliação.

O mandado de citaçãoconterá apenas os dadosnecessários à audiência e deveráestar desacompanhado de cópiada petição inicial, assegurado aoréu o direito de examinar seuconteúdo a qualquer tempo (art.

Page 1509: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

695, § 1º, do CPC/2015). Oobjetivo do mandadodesacompanhado da exordial,sem a contrafé, é não inflamarainda mais os ânimos do réu,dentro da ideia de cultura de paz.Todavia, essa falta decomunicação, na opinião desteautor, pode aumentar o conflito,especialmente se o réu se sentirsurpreendido pela ação judicial.Além disso, parece existir umacontrariedade ao dever deinformação, corolário da boa-féobjetiva, que é um dos princípiosdo Novo CPC, como está expostono Capítulo 1 deste livro. Como

Page 1510: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

fazer um acordo sem se ter umanoção mínimo daquilo que estásendo pleiteado? Em suma, dúbiaé a inovação e somente a práticairá demonstrar se ela veio em boahora ou apenas para aprofundar acultura da guerra geralmentenotada nas ações de Direito deFamília.

Com o intuito de agilização,a citação ocorrerá comantecedência mínima de 15 diasda data designada para aaudiência (art. 695, § 2º, doCPC/2015). Para que não pairemdúvidas de sua efetivação ediante da pessoalidade das

Page 1511: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

demandas familiares, a citaçãoserá sempre feita na pessoa doréu, não se admitindo a intimaçãopostal ou por edital (art. 695, §3º, do CPC/2015). Além disso, aspartes deverão estarobrigatoriamente acompanhadasde seus advogados ou defensorespúblicos na audiência demediação ou conciliação, paraque esta seja bem conduzida eorientada (art. 695, § 4º, doCPC/2015).

Conforme o art. 696 doNovo CPC, a audiência demediação e conciliação poderádividir-se em tantas sessões

Page 1512: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

quantas forem necessárias paraviabilizar a solução consensual.Isso, sem prejuízo deprovidências jurisdicionais paraevitar o perecimento do direito. Atítulo de exemplo, as sessões demediação não prejudicam aexpedição de uma liminar parapagamento de alimentos. Tambémnão prejudicam a decretação deum divórcio consensual,pendentes outras questões na açãoque podem ser solucionadas poracordo no futuro, como a guardade filhos, a partilha de bens e ouso do nome por um doscônjuges.

Page 1513: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

Sucessivamente, conforme oart. 697 do CPC/2015, sendoinfrutífera a mediação ou aconciliação, ou seja, nãorealizado o acordo, passarão aincidir, a partir de então, asnormas do procedimento comumordinário. Consoante o mesmopreceito, deve ser observado oart. 335 do Codex, que trata dadefesa do réu por meio dacontestação.

Nesse contexto, o réu,segundo a interpretação do últimopreceito e de outros próximos quenele estão citados, poderáoferecer contestação, por petição,

Page 1514: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

no prazo de 15 dias, cujo termoinicial será a data: a) daaudiência de conciliação ou demediação, ou da última sessão deconciliação, quando qualquerparte não comparecer ou,comparecendo, não houverautocomposição; b) do protocolodo pedido de cancelamento daaudiência de conciliação ou demediação apresentado pelo réu,quando as partes manifestarem,em comum, o desinteresse peloacordo; c) da juntada aos autos doaviso de recebimento, quando acitação ou a intimação for pelocorreio; d) de juntada aos autos

Page 1515: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

do mandado cumprido, quando acitação ou a intimação for poroficial de justiça; e) da suaocorrência, quando a citação ou aintimação se der por ato doescrivão ou do chefe desecretaria; f) do dia útil seguinteao fim da dilação assinada pelojuiz, quando a citação ouintimação for por edital; g) do diaútil seguinte à consulta ao seuteor ou ao término do prazo paraque esta se dê, quando a citaçãoou a intimação for eletrônica; h)de juntada do comunicado dacarta precatória, rogatória ou deordem, ou, não havendo este, da

Page 1516: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

juntada da carta aos autos deorigem devidamente cumprida,quando a citação ou a intimaçãose realizar em cumprimento decarta; i) da publicação, quando aintimação se der pelo Diário daJustiça impresso ou eletrônico; ej) do dia da carga dos autos,quando a intimação se der pormeio da retirada dos autos docartório ou da secretaria.

No que diz respeito àintervenção do MinistérioPúblico nas ações de Direito deFamília, esta somente deveocorrer quando houver interessede incapaz, seja ele menor ou

Page 1517: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

maior (art. 698 do CPC/2015).Pelo mesmo comando e nessascircunstâncias, o parquet sempredeverá ser ouvido previamente àhomologação de acordo. A normasegue a tendência prática desomente se exigir a intervençãodo MP quando houver interessede incapazes, o que já eraaplicado para as ações dedivórcio, por regulamentaçãointerna de muitos MinistériosPúblicos Estaduais, amplamenteacatada pela jurisprudência local.

A esse propósito, aliás, asconclusões de interessante textodo Promotor de Justiça de Minas

Page 1518: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

Gerais Leonardo Barreto MoreiraAlves, com as seguintes palavras:“Em face do novo conceito defamília inaugurado pelaConstituição Federal de 1988(família plúrima e eudemonista),não se justifica mais a imposiçãode uma série de restrições àdissolução do matrimônio, comoconsta atualmente no CódigoCivil de 2002, afinal de contas, oente familiar somente deve sermantido enquanto cumprir a suafunção constitucional depromoção da dignidade de cadaum dos seus membros. Em nãosendo mais verificada tal função

Page 1519: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

no seio familiar, não há qualquerinteresse público na manutençãoinócua do mero vínculo jurídicoque o casamento passa a ser, daípor que se defende adesnecessidade de intervenção doMinistério Público em ações deseparação e divórcio(consensuais ou litigiosos),deixando as questõesrelacionadas a estes feitos acargo da autonomia privada doscônjuges (direito potestativoextintivo), exceto quando existirinteresse de incapaz em jogo. Talposicionamento vai ao encontroda atual tendência de

Page 1520: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

racionalização dos trabalhos doParquet na área cível, jáconsagrada na Carta de Ipojuca eem diversos Atos Normativos dosMinistérios Públicos do país, aexemplo do baiano, do paulista edo mineiro. Em sendo elaadotada, haverá benefíciospráticos relevantes aosPromotores de Justiça, que terãomais tempo para atuar em defesados interesses sociais eindividuais indisponíveis demaior relevância à coletividade,adequando-se esta atuação aoverdadeiro perfil ministerialtraçado pela Carta Magna”.3

Page 1521: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

Como se nota, a tendênciadefendida por alguns promotoresde justiça acabou consolidada noNovo Estatuto ProcessualBrasileiro.

Seguindo no seu estudo,conforme o art. 699 do NovoCPC, quando o processo envolvera discussão sobre fatorelacionado a abuso ou alienaçãoparental, o juiz deverá estaracompanhado por especialista aotomar o depoimento do incapaz.O especialista citado pode ser umpsicólogo ou um assistente social,ou ambos.

Vislumbrando as suas

Page 1522: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

concretizações, de início, odispositivo tem aplicação para ashipóteses de abuso no exercíciodo poder familiar. Como énotório, o art. 1.634 do CódigoCivil de 2002, devidamenteatualizado pela Lei 13.058/2014,elenca as atribuições desseexercício que compete aos pais, asaber: a) dirigir a criação e aeducação dos filhos; b) exercer aguarda unilateral oucompartilhada; c) conceder-lhesou negar-lhes consentimento paracasarem; d) conceder-lhes ounegar-lhes consentimento paraviajarem ao exterior; e)

Page 1523: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

conceder-lhes ou negar-lhesconsentimento para mudarem suaresidência permanente para outroMunicípio; f) nomear-lhes tutorpor testamento ou documentoautêntico, se o outro dos pais nãolhe sobreviver, ou o sobrevivonão puder exercer o poderfamiliar; g) representá-los,judicial ou extrajudicialmente, atéos 16 anos, nos atos da vida civil,e assisti-los, após essa idade, nosatos em que forem partes,suprindo-lhes o consentimento; h)reclamá-los de quem ilegalmenteos detenha; e i) exigir que lhesprestem obediência, respeito e os

Page 1524: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

serviços próprios de sua idade econdição.

Essas atribuições devem sertidas como verdadeiros devereslegais dos pais em relação aosfilhos. A sua violação pode gerara responsabilidade civil daautoridade parental por atoilícito, nos termos dos requisitosconstantes do art. 186 doCC/2002. Em complemento,quanto à última atribuiçãodescrita no art. 1.634 da NormaMaterial, o preceito deve ser lidoà luz da dignidade humana e daproteção integral da criança e doadolescente. De início, porque a

Page 1525: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

exigência de obediência não podeser desmedida, sendo vedadosmaus-tratos e uma relaçãoditatorial. Em havendo abusosnesse exercício, estaráconfigurado o abuso de direito, oque pode repercutir, em casos dedanos, na esfera daresponsabilidade civil (arts. 187e 927 do CC/2002).

Como consequência, além dasuspensão ou destituição dopoder familiar, o pai ou a mãepoderá ser condenado a pagarindenização por danos morais aosfilhos se os maus-tratos estiverempresentes. Lembre-se de que

Page 1526: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

como parâmetros para o abuso dedireito devem ser consideradosos previstos no art. 187 doCódigo Civil, que sãoverdadeiras cláusulas gerais: fimsocial, boa-fé objetiva e,principalmente, bons costumes; oque gera a responsabilidadeobjetiva do pai ou mãe abusador,conforme o Enunciado n. 37 doCJF/STJ, aprovado na I Jornadade Direito Civil.

Sobre tão delicada situação,atente-se que entrou em vigor noBrasil a Lei 13.010/2014,conhecida como Lei da Palmadaou Lei Menino Bernardo, em

Page 1527: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

homenagem à vítima deviolências praticadas pelo pai epela madrasta. A nova normaalterou dispositivos do Estatutoda Criança e do Adolescente,passando a prever o seu art. 18-Aque a criança e o adolescente têmo direito de serem educados ecuidados sem o uso de castigofísico ou de tratamento cruel oudegradante, como formas decorreção, disciplina, educação ouqualquer outro pretexto, pelospais, pelos integrantes da famíliaampliada, pelos responsáveis,pelos agentes públicos executoresde medidas socioeducativas ou

Page 1528: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

por qualquer pessoa encarregadade cuidar deles, tratá-los, educá-los ou protegê-los.

A lei define as práticas quesão vedadas. Considera-secastigo físico a ação de naturezadisciplinar ou punitiva aplicadacom o uso da força física sobre acriança ou o adolescente queresulte em sofrimento físico ouem lesão. O tratamento cruel oudegradante é conceituado pelanorma como a conduta ou formacruel de tratamento em relação àcriança ou ao adolescente que oshumilhe, os ameace gravementeou os ridicularize.

Page 1529: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

Em complemento, nostermos do novo art. 18-B doECA, os pais, os integrantes dafamília ampliada, osresponsáveis, os agentes públicosexecutores de medidassocioeducativas ou qualquerpessoa encarregada de cuidar decrianças e de adolescentes, tratá-los, educá-los ou protegê-los queutilizarem castigo físico outratamento cruel ou degradantecomo formas de correção,disciplina, educação ou qualqueroutro pretexto estarão sujeitos,sem prejuízo de outras sançõescabíveis, às seguintes medidas,

Page 1530: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

que serão incidentes de acordocom a gravidade do caso: a)encaminhamento a programaoficial ou comunitário deproteção à família; b)encaminhamento a tratamentopsicológico ou psiquiátrico; c)encaminhamento a cursos ouprogramas de orientação; d)obrigação de encaminhar acriança a tratamentoespecializado; e e) advertência.Todas essas medidas serãoaplicadas pelo Conselho Tutelar,sem prejuízo de outrasprovidências legais, como aresponsabilização civil

Page 1531: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

supramencionada.Essas são hipóteses em que,

sem dúvidas, deve o juiz buscar oauxílio de profissionalespecializado, na dicção do novoart. 699 do Estatuto Processualemergente. Isso sem prejuízo dashipóteses de alienação parentalou de implantação das falsasmemórias. Segundo as precisaslições de Maria Berenice Dias:

“A evolução dos costumes, que levou amulher para fora do lar, convocou o homem aparticipar das tarefas domésticas e a assumiro cuidado com a prole. Assim, quando daseparação, o pai passou a reivindicar a guardada prole, o estabelecimento da guardaconjunta, a flexibilização de horários e a

Page 1532: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

intensificação das visitas. No entanto, muitasvezes, a ruptura da vida conjugal gera na mãesentimento de abandono, de rejeição, detraição, surgindo uma tendência vingativamuito grande. Quando não consegue elaboraradequadamente o luto da separação,desencadeia um processo de destruição, dedesmoralização, de descrédito do ex-cônjuge.Ao ver o interesse do pai em preservar aconvivência com o filho, quer vingar-se,afastando este do genitor. Para isso, cria umasérie de situações visando a dificultar aomáximo ou a impedir a visitação. Leva o filhoa rejeitar o pai, a odiá-lo. A este processo opsiquiatra americano Richard Gardnernominou de ‘síndrome de alienação parental’:programar uma criança para que odeie ogenitor sem qualquer justificativa. Trata-se deverdadeira campanha para desmoralizar ogenitor. O filho é utilizado como instrumentoda agressividade direcionada ao parceiro. Amãe monitora o tempo do filho com o outrogenitor e também os seus sentimentos para

Page 1533: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

com ele. A criança, que ama o seu genitor, élevada a afastar-se dele, que também a ama.Isso gera contradição de sentimentos edestruição do vínculo entre ambos. Restandoórfão do genitor alienado, acaba identificando-se com o genitor patológico, passando aaceitar como verdadeiro tudo que lhe éinformado. O detentor da guarda, ao destruira relação do filho com o outro, assume ocontrole total. Tornam-se unos, inseparáveis.O pai passa a ser considerado um invasor, umintruso a ser afastado a qualquer preço. Esteconjunto de manobras confere prazer aoalienador em sua trajetória de promover adestruição do antigo parceiro. Neste jogo demanipulações, todas as armas são utilizadas,inclusive a assertiva de ter sido o filho vítimade abuso sexual. A narrativa de um episódiodurante o período de visitas que possaconfigurar indícios de tentativa deaproximação incestuosa é o que basta. Extrai-se deste fato, verdadeiro ou não, denúncia deincesto. O filho é convencido da existência de

Page 1534: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

um fato e levado a repetir o que lhe éafirmado como tendo realmente acontecido.Nem sempre a criança consegue discernirque está sendo manipulada e acabaacreditando naquilo que lhes foi dito de formainsistente e repetida. Com o tempo, nem amãe consegue distinguir a diferença entreverdade e mentira. A sua verdade passa a serverdade para o filho, que vive com falsaspersonagens de uma falsa existência,implantando-se, assim, falsas memórias”.4

Além da perda da guarda emalgumas situações, ajurisprudência nacional já vinhareconhecendo que a utilizaçãodesses mecanismos tambémpoderia provocar a entrada emcena de eventual ação em que sediscutiria a destituição do poder

Page 1535: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

familiar. Sobre o tema, éinteressante a análise do seguintejulgado do Tribunal de Justiça doRio Grande do Sul:

“Destituição do poder familiar. Abuso sexual.Síndrome da alienação parental. Estando asvisitas do genitor à filha sendo realizadas juntoa serviço especializado, não há justificativapara que se proceda à destituição do poderfamiliar. A denúncia de abuso sexual levada aefeito pela genitora não está evidenciada,havendo a possibilidade de se estar frente àhipótese da chamada síndrome da alienaçãoparental. Negado provimento” (TJRS, Agravode Instrumento 70015224140, Sétima Câmarade Direito Privado, Rel. Maria Berenice Dias,decisão de 12.06.2006).

O tema do mesmo modo

Page 1536: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

havia sido apreciado peloTribunal de Justiça de São Paulo,cabendo a transcrição da seguinteementa: “Regulamentação devisitas. Guarda da criançaconcedida ao pai. Visitasprovisórias da mãe. Necessidade.Preservação do superior interesseda menor. Síndrome da alienaçãoparental. Sentença deimprocedência mantida. Recursoimprovido, com determinação”(TJSP, Apl. Rev 552.528.4/5, Ac.2612430, Guarulhos, OitavaCâmara de Direito Privado, Rel.Des. Caetano Lagrasta, j.14.05.2008, DJESP 20.06.2008).

Page 1537: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

Acompanhando toda essaevolução da doutrina e dajurisprudência, foi promulgada aLei 12.318, de 26.08.2010,conhecida como Lei da AlienaçãoParental. Nos termos do art. 2ºda dessa norma, “considera-seato de alienação parental ainterferência na formaçãopsicológica da criança ou doadolescente promovida ouinduzida por um dos genitores,pelos avós ou pelos que tenham acriança ou adolescente sob a suaautoridade, guarda ou vigilânciapara que repudie genitor ou quecause prejuízo ao estabelecimento

Page 1538: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

ou à manutenção de vínculos comeste”. O mesmo comandoexemplifica algumas situaçõesconcretas de alienação parental, asaber: a) realizar campanha dedesqualificação da conduta dogenitor no exercício dapaternidade ou maternidade; b)dificultar o exercício daautoridade parental; c) dificultarcontato de criança ou adolescentecom genitor; d) dificultar oexercício do direitoregulamentado de convivênciafamiliar; e) omitirdeliberadamente a genitorinformações pessoais relevantes

Page 1539: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

sobre a criança ou adolescente,inclusive escolares, médicas ealterações de endereço; f)apresentar falsa denúncia contragenitor, contra familiares deste oucontra avós, para obstar oudificultar a convivência delescom a criança ou adolescente; eg) mudar o domicílio para localdistante, sem justificativa,visando a dificultar a convivênciada criança ou adolescente com ooutro genitor, com familiaresdeste ou com os avós.

Em complemento, enuncia-seque a prática de ato de alienaçãoparental fere o direito

Page 1540: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

fundamental da criança ou doadolescente de convivênciafamiliar saudável, prejudica arealização de afeto nas relaçõescom genitor e com o grupofamiliar. Além disso, pelo mesmocomando, a alienação parentalconstitui abuso moral contra acriança ou o adolescente, além dedescumprimento dos deveresinerentes à autoridade parental oudecorrentes de tutela ou guarda(art. 3º da Lei 12.318/2010).Desse modo, não há dúvida deque, além das consequências parao poder familiar, a alienaçãoparental pode gerar a

Page 1541: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

responsabilidade civil doalienador, por abuso de direito,nos termos do outroramencionado art. 187 do CódigoCivil. Mais uma vez, talresponsabilidade tem naturezaobjetiva, independentemente deculpa, na linha do antes citadoEnunciado n. 37 do CJF/STJ, da IJornada de Direito Civil.

Declarado o indício de atode alienação parental, arequerimento ou de ofício, emqualquer momento processual, emação autônoma ouincidentalmente, o processo terátramitação prioritária, e o juiz

Page 1542: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

determinará, com urgência,ouvido o Ministério Público, asmedidas provisórias necessáriaspara preservação da integridadepsicológica da criança ou doadolescente (art. 4º da Lei12.318/2010). Isso, inclusive,para assegurar sua convivênciacom genitor ou viabilizar aefetiva reaproximação entreambos, se for o caso.

Conforme decisão doSuperior Tribunal de Justiça doano de 2014, esta última normagera a conclusão de incidência doCódigo de Processo Civil para oscasos de alienação parental. Nos

Page 1543: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

termos da publicação constantedo Informativo n. 538 doTribunal da Cidadania, “a Lei12.318/2010 prevê que oreconhecimento da alienaçãoparental pode se dar em açãoautônoma ou incidentalmente, semespecificar, no entanto, o recursocabível, impondo, neste aspecto,a aplicação das regras do CPC. Adecisão que, de maneiraincidente, enfrenta e resolve aexistência de alienação parentalantes de decidir sobre o mérito daprincipal não encerra a etapacognitiva do processo na primeirainstância. Portanto, esse ato

Page 1544: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

judicial tem natureza de decisãointerlocutória (art. 162, § 2º, doCPC) e, por consequência, orecurso cabível, nessa hipótese, éo agravo (art. 522 do CPC). Caberessaltar que seria diferente se aquestão fosse resolvida naprópria sentença, ou se fosseobjeto de ação autônoma, comoprevê a Lei 12.318/2010,hipóteses em que o meio deimpugnação idôneo seria aapelação, porque, nesses casos, adecisão poria fim à etapacognitiva do processo emprimeiro grau” (STJ, REsp1.330.172/MS, Rel. Min. Nancy

Page 1545: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

Andrighi, j. 11.03.2014). Espera-se que a conclusão de julgamentoseja a mesma, com a emergênciado Novo CPC.

Ainda de acordo com alegislação sobre alienaçãoparental, deve-se assegurar àcriança ou ao adolescente e aogenitor alienador a garantiamínima de visitação assistida.São ressalvados os casos em quehá iminente risco de prejuízo àintegridade física ou psicológicada criança ou do adolescente.Isso deve ser atestado porprofissional eventualmentedesignado pelo juiz para

Page 1546: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

acompanhamento das visitas (art.4º, parágrafo único, da Lei12.318/2010).

Em havendo indício daprática de ato de alienaçãoparental, em ação autônoma ouincidental, o juiz, se necessário,determinará perícia psicológicaou biopsicossocial (art. 5º, caput,da Lei 12.318/2010). O laudopericial terá base em amplaavaliação psicológica oubiopsicossocial, conforme o caso,compreendendo, inclusive,entrevista pessoal com as partes,exame de documentos dos autos,histórico do relacionamento do

Page 1547: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

casal e da separação, cronologiade incidentes, avaliação dapersonalidade dos envolvidos eexame da forma como a criançaou o adolescente se manifestaacerca de eventual acusaçãocontra genitor (§ 1º). A períciaserá realizada por profissional ouequipe multidisciplinarhabilitados, exigida, em qualquersituação, aptidão comprovada porhistórico profissional ouacadêmico para diagnosticar atosde alienação parental (§ 2º). Operito ou equipe multidisciplinardesignada para verificar aocorrência de alienação parental

Page 1548: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

terá prazo de 90 dias paraapresentação do laudo,prorrogável exclusivamente porautorização judicial baseada emjustificativa circunstanciada (§3º).

No plano concreto,estabelece o art. 6º da Lei daAlienação Parental que, estandocaracterizada a alienação parentalou qualquer conduta que dificultea convivência de criança ouadolescente com genitor, em açãoautônoma ou incidental, poderá ojuiz, cumulativamente ou não, semprejuízo da decorrenteresponsabilidade civil ou

Page 1549: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

criminal e da ampla utilização deinstrumentos processuais aptos ainibir ou atenuar seus efeitos,impor algumas penalidades,segundo a gravidade do casoconcreto.

A primeira delas é declarara ocorrência de alienaçãoparental e advertir o alienador. Asegunda sanção é ampliar oregime de convivência familiarem favor do genitor alienado.Como terceira pena, poderá o juizestipular multa ao alienador, oque já vem sendo aplicado pelamelhor jurisprudência nacional. Atítulo de ilustração:

Page 1550: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

“Agravo de instrumento. Ação declaratóriade alienação parental. Decisão determinou ocumprimento do acordo de visitas.Prevalência do interesse do menor. Imposiçãode multa. Possibilidade. Certo é que oconvívio da figura paterna é necessário para odesenvolvimento psicológico e social dacriança, sendo assim, um contato físico maiorentre pai e filho torna a convivência entre elesmais estreita, possibilitando o genitor darcarinho e afeto a seu filho, acompanhá-lo emseu crescimento e em sua educação. Deve-seimpor multa à genitora pelo descumprimentodo acordo de visitas, haja vista os indícios dealienação parental, visando, inclusive, que estacolabore à reaproximação de pai e filha”(TJMG, Agravo de Instrumento10105120181281001, Quarta Câmara Cível,Rel. Dárcio Lopardi Mendes, j. 23.01.2014).

O juiz pode, ainda, comoquarta penalidade, determinar

Page 1551: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

acompanhamento psicológico oubiopsicossocial do alienador. Aquinta penalidade é a relativa àalteração da guarda unilateralpara guarda compartilhada ou asua inversão. Também existe aviabilidade de se impor a fixaçãocautelar do domicílio da criançaou do adolescente. A sétima,última e mais dura penalidade édeclarar a suspensão daautoridade parental, o que deveser o caminho somente em casosde excepcional gravidade.

Caracterizada a mudançaabusiva de endereço e ainviabilização ou a obstrução à

Page 1552: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

convivência familiar, o juiztambém poderá inverter aobrigação de levar ou retirar acriança ou o adolescente daresidência do genitor, por ocasiãodas alternâncias dos períodos deconvivência familiar (art. 6º,parágrafo único, da Lei12.318/2010).

Como se pode notar, asmedidas são bem mais amplas doque vinha entendendo ajurisprudência anterior, o querepresenta notável avanço. Nãohá previsão da destituição totaldo poder familiar, mas apenas desua suspensão.

Page 1553: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

A respeito da atribuição ouda alteração da guarda, deve-sedar preferência ao genitor queviabiliza a efetiva convivência dacriança ou do adolescente com ooutro genitor nas hipóteses emque seja inviável a guardacompartilhada (art. 7º). Dessemodo, a solução passa a ser aguarda unilateral, quebrando-sea regra prioritária da supostaguarda compartilhada constantedos arts. 1.583 e 1.584 doCC/2002, alterados recentementepela Lei 13.058/2014.

Encerrando o estudo daalienação parental, enuncia-se

Page 1554: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

processualmente que a alteraçãode domicílio da criança ou doadolescente é irrelevante para adeterminação da competênciarelacionada às ações fundadas emdireito de convivência familiar,salvo se decorrente de consensoentre os genitores ou de decisãojudicial (art. 8º). Não se podeesquecer, no contexto processual,do teor da Súmula 383 do STJ,pela qual a competência paraprocessar e julgar as açõesconexas de interesse do menor é,em princípio, do foro dodomicílio do detentor de suaguarda. Reafirme-se que, em

Page 1555: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

casos tais, terá subsunção o art.699 do Novo CPC, devendo ojuiz estar acompanhado porespecialista ao tomar odepoimento do incapaz.

Observadas as regras geraise comuns para as ações deDireito de Família, cumpre trazera comento a regulamentação daação de alteração do regime debens, que, pelo menos em umaanálise preliminar, não estásujeita a esses preceitos legaisgeneralizantes, eis que éregulamentada em outra seção, emconjunto com as ações deseparação, divórcio e extinção da

Page 1556: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

união estável. O tratamentoinstrumental dessa demanda énovidade no sistema processualbrasileiro.

De toda sorte, como écediço, a possibilidade jurídicadessa ação de modificação doregime de bens foi criada peloCódigo Civil de 2002,especialmente pelo seu art. 1.639,§ 2º, segundo o qual: “Éadmissível alteração do regimede bens, mediante autorizaçãojudicial em pedido motivado deambos os cônjuges, apurada aprocedência das razões invocadase ressalvados os direitos de

Page 1557: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

terceiros”. A regra foipraticamente repetida pelo caputdo art. 734 do Novo Código deProcesso Civil, in verbis: “Aalteração do regime de bens docasamento, observados osrequisitos legais, poderá serrequerida, motivadamente, empetição assinada por ambos oscônjuges, na qual serão expostasas razões que justificam aalteração, ressalvados os direitosde terceiros”.

Cumpre destacar que asnormas são claras no sentido desomente admitirem a alteração doregime mediante pedido judicial

Page 1558: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

de ambos os cônjuges, emhavendo uma ação de jurisdiçãovoluntária, que corre na Vara daFamília, se houver. Em projeçõeslegislativas, existe a tentativa dese criar a possibilidade dealteração administrativa doregime de bens, por meio deescritura pública, conforme oPLS 470/2013, conhecido comoEstatuto das Famílias doIBDFAM, que conta com o apoiodeste autor. Na verdade, areafirmação da necessidade deuma demanda judicial no NovoCódigo de Processo Civil jánasce desatualizada diante de

Page 1559: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

outras projeções mais avançadas.A alteração somente é

possível, nos termos literais dasnormas, se for fundada em pedidomotivado, desde que apurada aprocedência das razõesinvocadas. Esse justo motivoconstitui uma cláusula geral, a serpreenchida pelo juiz caso a caso,à luz da operabilidade e dosistema aberto adotado tanto peloCC/2002 quanto pelo CPC/2015.Como primeiro exemplo, podeser citado o desaparecimento decausa suspensiva do casamento(art. 1.523 do Código Civil),sendo possível alterar o regime

Page 1560: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

da separação obrigatória de benspara outro, na linha do que constado Enunciado n. 262 do CJF/STJ,da III Jornada de Direito Civil.Concluindo desse modo, dajurisprudência superior:

“Direito civil. Família. Casamento celebradosob a égide do CC/1916. Alteração do regimede bens. Possibilidade. A interpretaçãoconjugada dos arts. 1.639, § 2º, 2.035 e 2.039do CC/2002 admite a alteração do regime debens adotado por ocasião do matrimônio,desde que ressalvados os direitos de terceirose apuradas as razões invocadas peloscônjuges para tal pedido. Assim, se o TribunalEstadual analisou os requisitos autorizadoresda alteração do regime de bens e concluiupela sua viabilidade, tendo os cônjugesinvocado como razões da mudança acessação da incapacidade civil interligada à

Page 1561: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

causa suspensiva da celebração docasamento a exigir a adoção do regime deseparação obrigatória, além da necessáriaressalva quanto a direitos de terceiros, aalteração para o regime de comunhão parcialé permitida. Por elementar questão derazoabilidade e justiça, o desaparecimento dacausa suspensiva durante o casamento e aausência de qualquer prejuízo ao cônjuge ou aterceiro, permite a alteração do regime debens, antes obrigatório, para o eleito pelocasal, notadamente porque cessada a causaque exigia regime específico. Os fatosanteriores e os efeitos pretéritos do regimeanterior permanecem sob a regência da leiantiga. Os fatos posteriores, todavia, serãoregulados pelo CC/2002, isto é, a partir daalteração do regime de bens, passa oCC/2002 a reger a nova relação do casal. Porisso, não há se falar em retroatividade da lei,vedada pelo art. 5º, inc. XXXVI, da CF/1988,e sim em aplicação de norma geral comefeitos imediatos. Recurso especial não

Page 1562: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

conhecido” (STJ, REsp 821.807/PR, TerceiraTurma, Rel. Min. Nancy Andrighi, j.19.10.2006, DJ 13.11.2006, p. 261).

Como segundo exemplo deum justo motivo, a jurisprudênciapaulista deferiu a alteração,diante de dificuldades contratuaisencontradas por um dosconsortes. Assim julgando, portodos: “Regime de Bens. Pedidode alteração do regime decomunhão parcial de bens para ode separação total. Alegação dedificuldade de contratação definanciamento para aquisição deimóvel residencial, por força dasdívidas contraídas pelo cônjuge

Page 1563: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

varão. Preenchimento dosrequisitos previstos no art. 1.639,§ 2º, do Código Civil verificado.Ausência de óbice à alteração doregime de bens do casamento.Medida que não acarretaráprejuízo algum aos cônjuges ouaos filhos. Terceiros que nãoserão atingidos pela alteração,que gerará efeitos apenas ‘exnunc’. Alteração determinada.Recurso provido” (TJSP,Apelação com Revisão600.593.4/4, Acórdão 4048973,São Paulo, Primeira Câmara deDireito Privado, Rel. Des. LuizAntonio de Godoy, j. 08.09.2009,

Page 1564: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

DJESP 06.11.2009).De toda sorte, há quem

entenda pela desnecessidade demotivação para que o regime debens seja alterado judicialmente,eis que se trata de uma exigênciaexcessiva constante da lei. Emsuma, haveria uma intervençãodispensável do Estado nasquestões familiares, o que feririao princípio da não intervenção,previsto no art. 1.513 doCC/2002 e de outros regramentosdo Direito de Família. Com essesentir, decisão do semprepioneiro Tribunal Gaúcho, derelatoria do Des. Luiz Felipe

Page 1565: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

Brasil Santos, que conta com oapoio do presente autor:

“Apelação cível. Regime de bens.Modificação. Inteligência do art. 1.639, § 2º,do Código Civil. Dispensa de consistentemotivação. 1. Estando expressamenteressalvados os interesses de terceiros (art.1.639, § 2º, do CCB), em relação aos quaisserá ineficaz a alteração de regime, não vejomotivo para o Estado-Juiz negar amodificação pretendida. Trata-se de indevidae injustificada ingerência na autonomia devontade das partes. Basta que os requerentesafirmem que o novo regime escolhido melhoratende seus anseios pessoais que se terá porpreenchida a exigência legal, ressalvando-se,é claro, a suspeita de eventual má-fé de umdos cônjuges em relação ao outro. Trêsargumentos principais militam em prol dessaexegese liberalizante, a saber: 1) não háqualquer exigência de apontar motivos para a

Page 1566: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

escolha original do regime de bens quando docasamento; 2) nada obstaria que os cônjuges,vendo negada sua pretensão, simulem umdivórcio e contraiam novo casamento, comopção por regime de bens diverso; 3) sendoatualmente possível o desfazimentoextrajudicial do próprio casamento, semnecessidade de submeter ao Poder Judiciárioas causas para tal, é ilógica essa exigênciaquanto à singela alteração do regime de bens.2. Não há qualquer óbice a que a modificaçãodo regime de bens se dê com efeito retroativoà data do casamento, pois, como já dito,ressalvados estão os direitos de terceiros. E,sendo retroativos os efeitos, na medida emque os requerentes pretendem adotar oregime da separação total de bens, nada maisnatural (e até exigível, pode-se dizer) querealizem a partilha do patrimônio comum deque são titulares. 3. Em se tratando de feitode jurisdição voluntária, invocável a regra doart. 1.109 do CPC, para afastar o critério delegalidade estrita, decidindo-se o processo de

Page 1567: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

acordo com o que se repute mais convenienteou oportuno (critério de equidade). Deramprovimento. Unânime” (TJRS, ApelaçãoCível 172902-66.2011.8.21.7000, MarcelinoRamos, Oitava Câmara Cível, Rel. Des. LuizFelipe Brasil Santos, j. 28.07.2011, DJERS04.08.2011).

Consigne-se que, em sentidomuito próximo, o TribunalPaulista entendeu que não hánecessidade de detalhamento dasrazões, ou seja, pela“desnecessidade de apresentaçãomuito pormenorizada de razão”para a alteração do regime (TJSP,Apelação 0018358-39.2009.8.26.0344, Acórdão5185207, Marília, Sétima Câmara

Page 1568: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

de Direito Privado, Rel. Des.Gilberto de Souza Moreira, j.01.06.2011, DJESP 09.08.2011).Mais recentemente, pronunciou-seda mesma maneira o SuperiorTribunal de Justiça, conformepublicação que consta do seuInformativo n. 518, com oseguinte tom:

“Nesse contexto, admitida a possibilidade deaplicação do art. 1.639, § 2º, do CC/2002 aosmatrimônios celebrados na vigência doCC/1916, é importante que se interprete a suaparte final – referente ao ‘pedido motivado deambos os cônjuges’ e à ‘procedência dasrazões invocadas’ para a modificação doregime de bens do casamento – sob aperspectiva de que o direito de família deveocupar, no ordenamento jurídico, papel

Page 1569: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

coerente com as possibilidades e limitesestruturados pela própria CF, defensora debens como a intimidade e a vida privada.Nessa linha de raciocínio, o casamento há deser visto como uma manifestação deliberdade dos consortes na escolha do modopelo qual será conduzida a vida em comum,liberdade que se harmoniza com o fato de quea intimidade e a vida privada são invioláveis eexercidas, na generalidade das vezes, nointerior de espaço privado também erguidopelo ordenamento jurídico à condição de ‘asiloinviolável’. Sendo assim, deve-se observaruma principiologia de ‘intervenção mínima’,não podendo a legislação infraconstitucionalavançar em espaços tidos pela própria CFcomo invioláveis. Deve-se disciplinar,portanto, tão somente o necessário e osuficiente para a realização não de umavontade estatal, mas dos próprios integrantesda família. Desse modo, a melhorinterpretação que se deve conferir ao art.1.639, § 2º, do CC/2002 é a que não exige dos

Page 1570: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

cônjuges justificativas exageradas ou provasconcretas do prejuízo na manutenção doregime de bens originário, sob pena deesquadrinhar indevidamente a própriaintimidade e a vida privada dos consortes.Nesse sentido, a constituição de umasociedade por um dos cônjuges poderáimpactar o patrimônio comum do casal.Assim, existindo divergência conjugal quantoà condução da vida financeira da família,haveria justificativa, em tese, plausível àalteração do regime de bens. Isso porque semostra razoável que um dos cônjuges prefiraque os patrimônios estejam bem delimitados,para que somente o do cônjuge empreendedorpossa vir a sofrer as consequências poreventual fracasso no empreendimento” (STJ,REsp 1.119.462/MG, Rel. Min. Luis FelipeSalomão, j. 26.02.2013).

Em suma, tem-se mitigadojurisprudencialmente a estrita

Page 1571: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

exigência normativa do art. 1.639,§ 2º, do CC/2002, o que vem emboa hora, pois são os cônjugesaqueles que têm a melhorconsciência sobre os embaraçosque o regime de bens adotadopode gerar em sua vida cotidiana.A interpretação deve ser a mesmano que diz respeito ao NovoCódigo de Processo Civil.

Ainda nos termos daliteralidade dos dois comandos,material e processual, a alteraçãodo regime de bens não poderáprejudicar os direitos deterceiros, presente uma intençãolegislativa de se proteger a boa-fé

Page 1572: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

objetiva e de desprestigiar a má-fé. De modo algum essa alteraçãodo regime poderá ser utilizadacom intuito de fraude, inclusivetributária. A jurisprudência temexigido cabalmente a prova deausência de prejuízos a terceiros(TJSP, Apelação 644.416.4/0,Acórdão 4168081, Boituva,Quarta Câmara de DireitoPrivado, Rel. Des. ÊnioSantarelli Zuliani, j. 29.10.2009,DJESP 10.12.2009). Na mesmalinha, o Enunciado n. 113 doCJF/STJ, aprovado na I Jornadade Direito Civil: “É admissível aalteração do regime de bens entre

Page 1573: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

os cônjuges, quando então opedido, devidamente motivado eassinado por ambos os cônjuges,será objeto de autorizaçãojudicial, com ressalva dosdireitos de terceiros, inclusivedos entes públicos, apósperquirição de inexistência dedívida de qualquer natureza,exigida ampla publicidade”.

De qualquer forma,destaque-se que, em havendoprejuízo para terceiros de boa-fé,a alteração do regime deve serreconhecida como meramenteineficaz em relação a esses, o quenão prejudica a sua validade e

Page 1574: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

eficácia entre as partes. Comobem explica Débora Brandão, “oresguardo dos direitos deterceiros por si só não tem ocondão de obstar a mutabilidadedo regime de bens. Aponta-secomo solução para ele aelaboração de um sistemaregistral eficiente, tanto do pactoantenupcial como de suasposteriores modificações, paradevida publicidade nas relaçõesentre os cônjuges a terceiros e aprodução de efeitos, ou seja, aalteração só produziria efeitos emrelação a terceiros após a devidapublicidade da sentença, cuja

Page 1575: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

natureza é constitutiva, restandoinalterados todos os negóciosposteriormente praticados.Respeita-se, dessa forma, o atojurídico perfeito”.5

Concluindo nessa esteira, noâmbito jurisprudencial: “aalteração do regime de bens nãotem efeito em relação aoscredores de boa-fé, cujos créditosforam constituídos à época doregime de bens anterior” (TJRS,Agravo de Instrumento70038227633, Porto Alegre,Oitava Câmara Cível, Rel. Des.Rui Portanova, j. 24.08.2010,DJERS 30.08.2010). O acórdão

Page 1576: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

julgou pela desnecessidade deprova, pelos cônjuges, dainexistência de ações judiciais oude dívidas, pois isso nãoprejudica a eficácia da alteraçãodo regime entre os cônjuges. Emsíntese, não se seguiu a linha docitado Enunciado n. 113 doCJF/STJ, pois a perquirição daexistência de dívidas oudemandas não seria umaexigência para a modificação doregime. Houve, nesse contexto,um abrandamento do texto do art.1.639, § 2º, do CC/2002,servindo a mesma conclusão parao art. 734, caput, do CPC/2015.

Page 1577: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

Cumpre ressaltar que outrasdecisões exigem tal prova, paraque a alteração patrimonial sejaconsiderada idônea e, então,deferida pelo juiz da causa (portodos: TJDF, Recurso2006.01.1.036489-5, Acórdão386.017, Sexta Turma Cível, Rel.Des. Luis Gustavo B. de Oliveira,DJDFTE 12.11.2009, p. 121; eTJSP, Apelação 644.416.4/0,Acórdão 4168081, Boituva,Quarta Câmara de DireitoPrivado, Rel. Des. ÊnioSantarelli Zuliani, j. 29.10.2009,DJESP 10.12.2009). A questão,como se vê, é polêmica, devendo

Page 1578: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

ser aprofundada com aemergência do novel EstatutoProcessual.

Aliás, expressa o § 1º do art.734 do CPC/2015 que, ao recebera petição inicial da ação dealteração de regime de bens, ojuiz determinará a intimação doMinistério Público e a publicaçãode edital que divulgue apretendida modificação, somentepodendo decidir o juiz depois dedecorrido o prazo de 30 dias dapublicação do edital. Como se vê,o Novo Estatuto Processualaprofunda a preocupação com apossibilidade de fraudes,

Page 1579: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

determinando a atuação do MP,mesmo não havendo interesses deincapazes. Por todos osargumentos antes expostos, apreocupação parece excessiva edesatualizada frente a doutrina ejurisprudência consolidadasdiante do Código Civil Brasileirode 2002.

No que concerne àpublicidade da modificação doregime patrimonial, no ano de2012, o Superior Tribunal deJustiça decidiu que o meroregistro da sentença transitada emjulgado tem o condão de darpublicidade à alteração do regime

Page 1580: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

de bens, não devendo prevalecernorma da Corregedoria doTribunal do Estado do RioGrande do Sul, que apontava anecessidade de publicação deeditais dessa alteração. Assim,em certo sentido, não se adotou,por igual, a parte final do citadoEnunciado n. 113, que determinaa necessidade de amplapublicidade na modificação doregime. Vejamos a ementa dodecisium:

“Civil. Família. Matrimônio. Alteração doregime de bens do casamento (CC/2002, art.1.639, § 2º). Expressa ressalva legal dosdireitos de terceiros. Publicação de edital para

Page 1581: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

conhecimento de eventuais interessados, noórgão oficial e na imprensa local. Provimento24/2003 da Corregedoria do TribunalEstadual. Formalidade dispensável, ausentebase legal. Recurso especial conhecido eprovido. 1. Nos termos do art. 1.639, § 2º, doCódigo Civil de 2002, a alteração do regimejurídico de bens do casamento é admitida,quando procedentes as razões invocadas nopedido de ambos os cônjuges, medianteautorização judicial, sempre com ressalva dosdireitos de terceiros. 2. Mostra-se, assim,dispensável a formalidade emanada deProvimento do Tribunal de Justiça depublicação de editais acerca da alteração doregime de bens, mormente pelo fato de setratar de providência da qual não cogita alegislação aplicável. 3. O princípio dapublicidade, em tal hipótese, é atendido pelapublicação da sentença que defere o pedido epelas anotações e alterações procedidas nosregistros próprios, com averbação no registrocivil de pessoas naturais e, sendo o caso, no

Page 1582: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

registro de imóveis. 4. Recurso Especialprovido para dispensar a publicação de editaisdeterminada pelas instâncias ordinárias” (STJ,REsp 776.455/RS, Quarta Turma, Rel. Min.Raul Araújo, j. 17.04.2012, DJE 26.04.2012).

Seguindo no estudo damatéria, deve ficar claro que osefeitos da alteração do regimesão ex nunc, a partir do trânsitoem julgado da decisão, o que éóbvio, por uma questão deeficácia patrimonial (nessesentido, além de ementa antestranscrita, do Tribunal Paulista:STJ, REsp 1.300.036/MT,Terceira Turma, Rel. Min. Paulode Tarso Sanseverino, j.

Page 1583: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

13.05.2014, DJe 20.05.2014;TJRS, Apelação Cível 374932-56.2012.8.21.7000, Carazinho,Sétima Câmara Cível, Rel. Des.Sérgio Fernando de VasconcellosChaves, j. 24.10.2012, DJERS30.10.2012; TJSP, Apelação0013056-15.2007.8.26.0533,Acórdão 5065672, Santa Bárbarad’Oeste, Nona Câmara de DireitoPrivado, Rel. Des. VivianiNicolau, j. 12.04.2011, DJESP01.06.2011). Esclareça-se que anatureza desses efeitos é capaz deafastar a necessidade de prova daausência de prejuízos a terceirospelos cônjuges, para que a

Page 1584: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

alteração do regime de bens sejadeferida. Ademais, eventuaisefeitos ex tunc fariam que oregime de bens anterior nãotivesse eficácia, atingindo um atojurídico perfeito, constituído porvontade dos cônjuges.

Superada a análise dessasregras, surge importanteindagação para a prática doDireito de Família e querepercute para o tratamento damatéria no Novo CPC: seriapossível alterar regime de bensde casamento celebrado navigência do Código Civil de 1916e do Código de Processo Civil de

Page 1585: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

1973?Muitos poderiam pensar que

a resposta é negativa, diante doque consta do art. 2.039 da atualcodificação material, norma dedireito intertemporal pela qual:“O regime de bens noscasamentos celebrados navigência do Código Civilanterior, Lei 3.071, de 1.º dejaneiro de 1916, é o por eleestabelecido”. Essa, contudo, nãoé a melhor resposta para osdevidos fins práticos.

Um dos primeiros autores nadoutrina brasileira a perceber areal intenção do legislador foi

Page 1586: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

Euclides de Oliveira. A respeitodo art. 2.039, explica o juristaque esse dispositivo legal“apenas determina que, para oscasamentos anteriores ao CódigoCivil de 2002, não poderão serutilizadas as regras do novoCódigo Civil referentes àsespécies de regime de bens, paraefeito de partilha do patrimôniodo casal. Ou seja, somente asregras específicas acerca de cadaregime é que se aplicam emconformidade com a lei vigente àépoca da celebração docasamento, mas, quanto àsdisposições gerais, comuns a

Page 1587: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

todos os regimes, aplica-se onovo Código Civil”.6

Em síntese, como o art.1.639, § 2º, do CC/2002 é umanorma geral quanto ao regime debens, pode ser aplicada aqualquer casamento, entendimentoesse que foi acatado peloTribunal de Justiça de São Paulo,já em 2004:

“Casamento. Regime de bens. Alteração.Possibilidade de sua alteração mesmo paracasamentos realizados sob a égide dalegislação anterior – Interpretação ampliativae sistemática da norma do art. 2.039 doCódigo Civil que não leva à conclusão davedação da alteração do regime matrimonialnos casamentos anteriores a sua vigência –

Page 1588: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

Recurso provido” (TJSP, Apelação Cível320.566-4/0/São Paulo, Décima Câmara deDireito Privado, Rel. Marcondes Machado,08.06.2004, v.u.).

Contudo, coube ao SuperiorTribunal de Justiça fazer a melhorinterpretação da questão, nonosso ponto de vista. Isso porqueesse Egrégio Tribunal Superiorutilizou o art. 2.035, caput, doCC/2002 e a Escada Ponteanapara deduzir que é possívelalterar regime de bens decasamento celebrado na vigênciada codificação anterior.

Como exposto em capítuloanterior, Pontes de Miranda, em

Page 1589: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

seu Tratado de Direito Privado,dividiu o negócio jurídico em trêsplanos. O primeiro é o plano daexistência, no qual estão ospressupostos mínimos de umnegócio jurídico, que formam oseu suporte fático: partes,vontade, objeto e forma. Osegundo é o plano da validade,em que os elementos mínimos deexistência recebem qualificações,nos termos do art. 104 doCC/2002, a saber: partes capazes;vontade livre; objeto lícito,possível, determinado oudeterminável; forma prescrita ounão defesa em lei. Por fim, no

Page 1590: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

plano da eficácia, estão asconsequências do negóciojurídico, elementos relacionadoscom os seus efeitos (condição,termo, encargo, inadimplemento,juros, multa, perdas e danos, entreoutros).

Relativamente a esses trêsplanos e à aplicação das normasjurídicas no tempo, estabelece oimportante art. 2.035, caput, doCódigo Civil em vigor, cujatranscrição deve ser feita, para aanálise da tese aqui proposta:

“Art. 2.035. A validade dos negócios edemais atos jurídicos, constituídos antes daentrada em vigor deste Código, obedece ao

Page 1591: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

disposto nas leis anteriores, referidas no art.2.045, mas os seus efeitos, produzidos após avigência deste Código, aos preceitos dele sesubordinam, salvo se houver sido previstapelas partes determinada forma deexecução”.

Em resumo, o que odispositivo legal estáestabelecendo é que, quanto aosplanos da existência e davalidade (o primeiro está dentrodo segundo), devem ser aplicadasas normas do momento daconstituição ou celebração donegócio. No tocante ao plano daeficácia, devem incidir as normasdo momento dos efeitos.

Page 1592: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

Pois bem, em qual plano estáo regime de bens e apossibilidade de sua alteração?Logicamente, no plano da eficáciado casamento, pois a suaexistência ou a sua validade nãodepende do regime de bensadotado. Em outras palavras,nota-se que o regime de bens temrelação com as consequênciasposteriores do casamento. Emcomplemento, é notório que, nãohavendo adoção por qualquerregime, prevalecerá o regimelegal ou supletório, qual seja, oda comunhão parcial. Interessantetranscrever a ementa do citado

Page 1593: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

precedente do Superior Tribunalde Justiça, sendo certo que nãoconsta do corpo da decisão todoesse raciocínio que aqui foidemonstrado:

“Civil. Regime matrimonial de bens.Alteração judicial. Casamento ocorrido sob aégide do CC/1916 (Lei 3.071). Possibilidade.Art. 2.039 do CC/2002 (Lei 10.406).Correntes doutrinárias. Art. 1.639, § 2º, c/c oart. 2.035 do CC/2002. Norma geral deaplicação imediata. 1 – Apresenta-serazoável, in casu, não considerar o art. 2.039do CC/2002 como óbice à aplicação de normageral, constante do art. 1.639, § 2º, doCC/2002, concernente à alteração incidentalde regime de bens nos casamentos ocorridossob a égide do CC/1916, desde queressalvados os direitos de terceiros eapuradas as razões invocadas pelos cônjuges

Page 1594: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

para tal pedido, não havendo que se falar emretroatividade legal, vedada nos termos do art.5º, XXXVI, da CF/1988, mas, ao revés, nostermos do art. 2.035 do CC/2002, emaplicação de norma geral com efeitosimediatos. 2 – Recurso conhecido e providopela alínea ‘a’ para, admitindo-se apossibilidade de alteração do regime de bensadotado por ocasião de matrimônio realizadosob o pálio do CC/1916, determinar o retornodos autos às instâncias ordinárias a fim deque procedam à análise do pedido, nos termosdo art. 1.639, § 2º, do CC/2002” (STJ, REsp730.546/MG, Quarta Turma, Rel. Min. JorgeScartezzini, j. 23.08.2005, DJ 03.10.2005, p.279).

Sucessivamente, outrosjulgados surgiram na mesmaesteira desse julgamento, estandoa questão consolidada em nossa

Page 1595: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

jurisprudência (por todos: STJ,REsp 1.112.123/DF, TerceiraTurma, Rel. Min. Sidnei Beneti, j.16.06.2009, DJE 13.08.2009;TJRS, Apelação Cível 383376-78.2012.8.21.7000, Bagé, OitavaCâmara Cível, Rel. Des. LuizFelipe Brasil Santos, j.29.11.2012, DJERS 05.12.2012;TJSP, Apelação 9102946-53.2007.8.26.0000, Acórdão5628185, São Paulo, QuartaCâmara de Direito Privado, Rel.Des. Fábio Quadros, j.17.11.2011, DJESP 24.01.2012;TJPR, Apelação Cível 0413965-9, Astorga, Décima Primeira

Page 1596: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

Câmara Cível, Rel. Des. MárioRau, DJPR 28.03.2008, p. 110;TJMG, Apelação Cível1.0439.06.053252-0/001, Muriaé,Sétima Câmara Cível, Rel. Des.Antônio Marcos Alvim Soares, j.06.03.2007, DJMG 04.05.2007; eTJRJ, Apelação Cível2007.001.08400, Quinta CâmaraCível, Rel. Des. MiltonFernandes de Souza, j.27.03.2007). Cumpre esclarecer,por oportuno, que esseentendimento jurisprudencial játinha amparo doutrinário noEnunciado n. 260 do CJF/STJ,aprovado na III Jornada de

Page 1597: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

Direito Civil, realizada em 2004,nos seguintes termos: “Arts.1.639, § 2º, e 2.039: A alteraçãodo regime de bens prevista no §2º do art. 1.639 do Código Civiltambém é permitida noscasamentos realizados navigência da legislação anterior”.

Então, resta a dúvida: qualseria o alcance da dicção do art.2.039 do CC ao expressar que:“O regime de bens noscasamentos celebrados navigência do Código Civil anterioré o por ele estabelecido”? Aresposta é simples. Para aquelesque se casaram antes da vigência

Page 1598: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

do Código Civil de 2002, noregime da comunhão universal debens, valem as regras contidasnos arts. 262 a 268 do Códigorevogado; no regime da comunhãoparcial, as regras dos arts. 269 a275; no regime da separação, asregras dos arts. 276 e 277, e, porfim, para os que se casaram noregime dotal, as normas dos arts.278 a 311. Como antes apontado,a norma de direito intertemporalem comento somente alcança asregras especiais relativas aosrespectivos regimes, não ospreceitos gerais, caso do art.1.639 do CC/2002.

Page 1599: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

De outra forma, pode-sedizer que todas as novas regrasprevistas no Código Civil de2002 – da comunhão universal(arts. 1.667 a 1.671), dacomunhão parcial (arts. 1.658 a1.666) e da separação de bens(arts. 1.687 e 1.688) – não seaplicam aos casamentoscelebrados antes de 11.01.2003por expressa determinação do art.2.039 da atual codificaçãomaterial, importante norma dedireito intertemporal. Esse é oefetivo alcance da disposiçãoprevista no último comandocitado.

Page 1600: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

Voltando aos preceitos doNovo CPC, conforme o § 2º doart. 734, os cônjuges, na petiçãoinicial ou em petição avulsa,podem propor ao juiz meioalternativo de divulgação daalteração do regime de bens, afim de resguardar direitos deterceiros. Assim, por exemplo,não obsta a divulgação daalteração em um jornal local ouem um sítio da internet. Mais umavez, há, na opinião deste autor,uma preocupação excessiva coma fraude, na contramão dadoutrina e da jurisprudênciaconstruídas sob a égide do

Page 1601: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

Código Civil de 2002.Por fim, demonstrando a

mesma preocupação, após otrânsito em julgado da sentençade alteração do regime de bens,serão expedidos mandados deaverbação aos cartórios deregistro civil e de imóveis. Nostermos do mesmo § 3º do art. 734do CPC/2015, caso qualquer umdos cônjuges seja empresário,deve ser expedido tambémmandado de averbação aoregistro público de empresasmercantis e atividades afins.

Page 1602: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

__________1 TARTUCE, Fernanda; TARTUCE,Flávio. Lei nº 11.441/2007: AlgumasQuestões Polêmicas Processuais. JusNavigandi, Teresina, ano 12, n. 1.478,19 jul. 2007. Disponível em:<http://jus.com.br/artigos/10168>.Acesso em: 26 jan. 2015. Leia maisem:<http://jus.com.br/artigos/10168/lei-n-11-441-2007/2#ixzz3PvaRCzty>.2 TARTUCE, Fernanda. ProcessoCivil Aplicado ao Direito de Família.São Paulo: Método, 2012. p. 29.3 MOREIRA ALVES, LeonardoBarreto. O Ministério Público nasAções de Separação e Divórcio.Revista DE JURE – MinistérioPúblico de Minas Gerais. Disponívelem:

Page 1603: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

<https://aplicacao.mpmg.mp.br/xmlui/bitstream/handle/123456789/242/ensaio%20sobre%20a%20efetividade_Diniz.pdf?sequence=1>. Acesso em: 23 dez.2014.4 DIAS, Maria Berenice. Síndrome daAlienação Parental: O Que é Isso?Disponível em:<www.intelligentiajuridica.com.br>,ano IV, n. 64, out. 2006. Acesso em:27 mar. 2007.5 BRANDÃO, Débora Vanessa Caús.Regime de Bens no Código Civil. 2.ed. São Paulo: Saraiva, 2007. p. 103.6 OLIVEIRA, Euclides de. Alteraçãodo Regime de Bens no Casamento. In:DELGADO, Mário Luiz; ALVES,Jones Figueirêdo (Coords.). QuestõesControvertidas no Novo CódigoCivil. São Paulo: Método, 2003. v. 1, p.389.

Page 1604: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

DO TRATAMENTO DASEPARAÇÃO E DO

DIVÓRCIO NO NOVOCÓDIGO DE

PROCESSO CIVIL

Uma grande infelicidade, umtotal retrocesso. Com essas fortespalavras pode ser resumida a

Page 1605: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

manutenção da separação judiciale extrajudicial no Novo Códigode Processo Civil Brasileiro.Vários dispositivos da normainstrumental emergente continuama tratar das categorias, o que nãodeveria ocorrer, em hipótesealguma.

Não se olvide que, quandoda elaboração do parecer final noSenado Federal, pelo RelatorSenador Vital do Rêgo, foramapresentadas propostas dealteração por meio da Emenda 61– do Senador Pedro Taques –, daEmenda 129 – do Senador JoãoDurval – e Emendas 136, 137,

Page 1606: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

138, 139, 140, 141, 142 e 143 –do Senador Antonio CarlosValadares –, visando a retiradado texto dos tratamentos relativosao malfadado instituto daseparação judicial do texto doNovo Código.

Todavia, as emendas foramafastadas pelo Senador Vital doRego, que assim argumentou:

“As emendas em pauta insurgem-se contra areferência à separação (em todas as suasmodalidades) como forma de dissolução dasociedade conjugal ao longo do texto do SCD.Argumenta que, com a Emenda àConstituição 66, de 2010, esse instituto teriasido abolido do ordenamento jurídico.Não vingam, porém, as emendas.

Page 1607: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

É pacífico que, após a Emenda à Constituição66, de 2010, não há mais qualquer requisitoprévio ao divórcio. A separação, portanto, queera uma etapa obrigatória de precedência aodivórcio, desvestiu-se dessa condição.Todavia, não é remansoso o entendimentoacerca da não subsistência da separação noâmbito da doutrina civilista.Aliás, o Enunciado n. 514, das Jornadas deDireito Civil (que nasceu após debate peloscivilistas mais respeitados do País), dispõe ocontrário, a saber: Enunciado n. 514. ‘Art.1.571: A Emenda Constitucional 66/2010 nãoextinguiu o instituto da separação judicial eextrajudicial’.Afinal de contas, a Constituição Federalapenas afastou a exigência prévia deseparação para o divórcio, mas não repeliuexpressamente a previsão infraconstitucionalda separação e do restabelecimento dasociedade conjugal. Há quem sustente que aseparação continua em vigor como uma

Page 1608: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

faculdade aos cônjuges que, querendo ‘darum tempo’, preferem formalizar essaseparação, sem romper o vínculo matrimonial.Eventual reatamento dos laços afetivosdesses cônjuges separados não haverá depassar por novo casamento, com todas assuas formalidades, mas se aperfeiçoará pelorestabelecimento da sociedade conjugal, atobem menos formal, que pode ocorrer por viajudicial ou extrajudicial.Sublinhe-se que nem mesmo os dispositivosdo Código Civil que tratam de separaçãoforam revogados. Ora, será uma intervençãoindevida, uma invasão científica, utilizar umanorma processual para fazer prevalecer umadas várias correntes doutrinárias queincandescem na seara do Direito Civil.Dessa forma, enquanto o Código Civil não forrevogado expressamente no tocante àprevisão da separação e do restabelecimentoda sociedade conjugal, deve o Código deProcesso Civil – norma que instrumentaliza aconcretização dos direitos materiais –

Page 1609: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

contemplar expressamente as viasprocessuais desses institutos cíveis.No futuro, em outra ocasião, se assim seentender mais adequado, poder-se-á, por vialegislativa própria, modificar dispositivos doCódigo Civil e do Código de Processo Civilpara proscrever a separação como uminstituto de Direito de Família”.

Na votação final dosdestaques no Senado Federal,realizada no dia 17.12.2014,havia uma insurgência pontuadapela Senadora Lídice da Mata arespeito dessa manutenção.Porém, a Ilustre Senadora acaboupor ser convencida pelaconservação da separaçãojudicial no texto, retirando, ao

Page 1610: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

final, o seu destaque.Sendo assim, o Novo

Código de Processo Civil nascecom um instituto morto em váriosde seus dispositivos. De início, onovo art. 53, inciso I, do EstatutoProcessual emergente fixa acompetência do domicílio doguardião de filho incapaz, para aação de divórcio, separação,anulação de casamento,reconhecimento ou dissolução deunião estável. Sucessivamente,caso não haja filho incapaz, acompetência será do foro deúltimo domicílio do casal. E senenhuma das partes residir no

Page 1611: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

antigo domicílio do casal, serácompetente o foro de domicíliodo réu.

Cabe pontuar que, apesar dainfeliz menção à separaçãojudicial, essa norma representaum avanço, por tutelar o incapaz,ao estabelecer o foro privilegiadopara o seu guardião. Abandona-se, assim, a ideia devulnerabilidade da mulhercontida no antigo art. 100, incisoI, do Código de Processo Civil,com privilégio de foro emrelação à sua residência para asações de dissolução docasamento e da sociedade

Page 1612: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

conjugal. Para o presente autor,apesar do entendimentomajoritário diverso, a norma eraflagrantemente inconstitucional,representando um atentado àigualdade entre homens emulheres, constante do art. 5º,inciso I, da Constituição daRepública.

A respeito do segredo dejustiça, estatui o novel art. 189,inciso II, que tramitam, por essemodo não revelado, os processosque versam sobre casamento,separação de corpos, divórcio,separação, união estável,filiação, alimentos e guarda de

Page 1613: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

crianças e adolescentes (comdestaque). Como ressalva, o seuparágrafo único estabelece que odireito de consultar os autos deprocesso que tramite em segredode justiça e de pedir certidões deseus atos é restrito às partes e aosseus procuradores. Porém, oterceiro que demonstrar interessejurídico pode requerer ao juizcertidão do dispositivo dasentença, bem como de inventárioe partilha resultante de divórcioou separação (com destaque).Aqui, não houve grandesalterações, corresponde odispositivo ao antigo art. 155 do

Page 1614: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

Código de Processo Civil de1973, que ainda mencionava odesquite; hoje, separaçãojudicial.

Em termos gerais deincidência das regras atinentes àsações de Direito de Família, oart. 693 do CPC/2015 enunciaque “As normas deste Capítuloaplicam-se aos processoscontenciosos de divórcio,separação, reconhecimento eextinção de união estável, guarda,visitação e filiação”(destacamos). Esse tratamentounificador ainda será comentadonesta obra, em capítulo específico

Page 1615: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

que trata dessas demandasfamiliares.

Na sequência, vêm as regrasespecíficas “Do Divórcio e daSeparação Consensuais, daExtinção Consensual de UniãoEstável e da Alteração do Regimede Bens do Matrimônio”. Emrelação à última demanda, serátratada naquele capítuloespecífico relativo às ações deDireito de Família.

Quanto ao divórcio e àseparação judicial consensuais,como primeiro diploma especial,o art. 731 do Novo CPCestabelece que as suas

Page 1616: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

homologações, observados osrequisitos legais, poderão serrequeridas em petição assinadapor ambos os cônjuges, da qualconstarão: a) as disposiçõesrelativas à descrição e à partilhados bens comuns; b) asdisposições concernente à pensãoalimentícia entre os cônjuges; c) oacordo atinente à guarda dosfilhos incapazes e ao regime devisitas; e d) o valor dacontribuição para criar e educaros filhos. Nos termos do seuparágrafo único, se os cônjugesnão acordarem sobre a partilhados bens, far-se-á esta depois de

Page 1617: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

homologado o divórcio, conformeas normas relativas à partilha debens, constantes dos arts. 647 a658 do mesmo EstatutoProcessual emergente. Todasessas disposições que dizemrespeito ao processo dehomologação judicial de divórcioou de separação consensualaplicam-se, no que couber, aoprocesso de homologação daextinção consensual da uniãoestável (art. 732 do Novo CPC).

O tratamento unificado paraas duas ações – de separação e dedivórcio – constitui novidade,pois os arts. 1.120 a 1.124 do

Page 1618: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

anterior CPC tratavam apenas daseparação judicial. Quanto aosrequisitos, não houvemodificação de relevo,lamentando-se o tratamento atualda separação de direito, como aseguir será desenvolvido.

Eventualmente, o divórcio, aseparação e a extinção consensualde união estável, feitosconsensualmente – não havendonascituro, filhos incapazes eobservados os requisitos legais –,poderão ser realizados porescritura pública, da qualconstarão as disposições de quetrata o art. 731. Assim,

Page 1619: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

confirmando a evoluçãoinaugurada pela Lei 11.441/2007– que inseriu o art. 1.124-A noantigo CPC –, pelo art. 733 doNovo Código de Processo,continua viável juridicamente odivórcio extrajudicial, porescritura pública. A menção àdissolução da união estável porescritura pública é novidade quejá era retirada implicitamente dosistema, pela possibilidade de serealizar a constituição e adissolução da união estável porescritura pública há tempos.Lamenta-se, apenas, que aseparação extrajudicial está

Page 1620: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

expressa no comando.Nos termos do § 1º do art.

733 do Novo Código de ProcessoCivil, a escritura pública nãodepende de homologação judiciale constitui título hábil paraqualquer ato de registro, bemassim para levantamento deimportância depositada eminstituições financeiras. Apossibilidade expressa desselevantamento não estava no art.1.124-A do antigo CPC. No mais,o dispositivo repete o tratamentoanterior.

Ademais, o tabelião somentelavrará a escritura se os

Page 1621: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

interessados estiverem assistidospor advogado comum ouadvogados de cada um deles oupor defensor público, cujaqualificação e assinatura devemestar no ato notarial (art. 733, §2º, do Novo CPC). O novopreceito repete o antigo art.1.124-A, § 2º, do CPC de 1973.

Deve ser criticado o fato denão mais constar a gratuidade daescritura para os que sedeclaravam pobres, como estavano art. 1.124-A, § 3º, da NormaProcessual anterior. Nessepropósito, aliás, a Resolução 35do Conselho Nacional de Justiça,

Page 1622: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

que trata do comportamento dosTabelionatos e Cartórios quanto àLei 11.441/2007, dispõe no seuart. 7º que, para a obtenção desta,basta a simples declaração dosinteressados de que não possuemcondições de arcar com osemolumentos, ainda que as partesestejam assistidas por advogadoconstituído.

Nesse ínterim, pelos altoscustos para a maioria dapopulação brasileira, talvez àspessoas sem condiçõeseconômicas somente reste ocaminho do divórcio judicial.Para o presente autor, há certa

Page 1623: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

contradição entre essa retirada danorma de benefício aos pobres eo espírito da nova codificaçãoprocessual, que adota aagilização e a desjudicializaçãocomo motes principiológicos. Emreforço, a norma está distante deuma desejada tutela dosvulneráveis econômicos, em prolda função social dos institutosjurídicos.

De toda maneira, é viávelsustentar que a norma constantedo art. 1.124-A, § 3º, do antigoCódigo de Processo Civilcontinua em vigor, mesmo tendosido revogada expressamente a

Page 1624: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

antiga norma processual,conforme o art. 1.046 do NovoCódigo de Processo Civil, queassim se expressa: “Ao entrar emvigor este Código, suasdisposições se aplicarão desdelogo aos processos pendentes,ficando revogada a Lei nº 5.869,de 11 de janeiro de 1973”. Comoé notório, o dispositivo foiintroduzido por uma lei especial,qual seja, a Lei 11.441/2007,estabelecendo o § 2º do mesmoart. 1.046 do Novo CPC que“Permanecem em vigor asdisposições especiais dosprocedimentos regulados em

Page 1625: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

outras leis, aos quais se aplicarásupletivamente este Código”. Eisaqui uma interessante questão dedebate, a ser resolvida peladoutrina e pela jurisprudência nospróximos anos.

Em complemento, não sepode esquecer que a gratuidadede justiça para os atosextrajudiciais tem fundamento natutela da pessoa humana (art. 1º,inciso III, da CF/1988) e nasolidariedade social que deveimperar nas relações jurídicas(art. 3º, inciso I, da CF/1988).Mais especificamente, há mençãoexpressa à gratuidade no art. 5º,

Page 1626: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

inciso LXXIV, do mesmo TextoMaior: “o Estado prestaráassistência jurídica integral egratuita aos que comprovareminsuficiência de recursos”. Valelembrar, ainda, da ponteconstitucional realizada pelo art.1º do Novo CPC, ao prever que“O processo civil será ordenado,disciplinado e interpretadoconforme os valores e as normasfundamentais estabelecidos naConstituição da RepúblicaFederativa do Brasil,observando-se as disposiçõesdeste Código”.

Pois bem, vistas as regras

Page 1627: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

instrumentais que passam a regera matéria, analisaremos a questãorelativa à superação daseparação de direito ou jurídica,expressões que englobam tanto aseparação judicial quanto aextrajudicial. Essa superação fazque os novos preceitos sejamconsiderados inconstitucionais,tendo como parâmetro a EmendaConstitucional 66, conhecidacomo Emenda do Divórcio ouPEC do Divórcio. Vale lembrarque a PEC 28/2009 recebeu, noseu trâmite, várias numerações,como PEC 413/2005 e PEC33/2007, sendo a última proposta

Page 1628: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

elaborada pelo Deputado SérgioBarradas Carneiro, com o auxílioteórico e técnico dos juristas quecompõem o Instituto Brasileiro deDireito de Família (IBDFAM).

A referida Emendarepresenta uma verdadeirarevolução para o Direito deFamília brasileiro, sendonecessário rever as categoriasjurídicas relativas ao tema,inclusive as novas normasprocessuais emergentes.1 Comesse fim, vejamos como era aredação original do art. 226, § 6º,da Constituição Federal, de 1988,e como ficou o comando legal

Page 1629: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

com a aprovação da EC 66/2010,que entrou em vigor em13.07.2010:

Art. 226,§ 6º, da

CF/1988– redação

atual –após a

Emendado

Divórcio

Art. 226, § 6º, da

CF/1988 –redação original

“O

“O casamento civilpode ser dissolvidopelo divórcio, após

Page 1630: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

casamentocivil podeserdissolvidopelodivórcio”.

prévia separaçãojudicial por mais deum ano nos casosexpressos em lei,ou comprovadaseparação de fatopor mais de doisanos”.

O presente autor segue acorrente que afirma que ainovação constitucional temaplicação imediata, como normaconstitucional autoexecutável.Desse modo, não há anecessidade de qualquer ponteinfraconstitucional para a suaeficácia, o que está de acordo

Page 1631: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

com a doutrina que reconhece aforça normativa da Constituição.Nesse sentido, cumpre destacaras palavras de Paulo Lôbo, umdos mentores intelectuais dacitada Emenda, em artigocientífico sobre o tema:

“No direito brasileiro, há grande consensodoutrinário e jurisprudencial acerca da forçanormativa própria da Constituição. Sejam asnormas constitucionais regras ou princípiosnão dependem de normas infraconstitucionaispara estas prescreverem o que aquelas jáprescreveram. O § 6º do art. 226 daConstituição qualifica-se como norma-regra,pois seu suporte fático é precisamentedeterminado: o casamento pode ser dissolvidopelo divórcio, sem qualquer requisito prévio,por exclusivo ato de vontade dos cônjuges”.2

Page 1632: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

Constata-se que apenashouve alteração no Texto Maior,sem qualquer modificação ourevogação expressa dedispositivos do CC/2002 ou deleis específicas, cabendo àdoutrina e à jurisprudênciaapontar quais construçõesjurídicas ainda persistem. Apesardessa falta de revogaçãoexpressa, como primeiro impactoda Emenda do Divórcio a serapontado, verifica-se que não émais viável juridicamente aseparação de direito, a englobar aseparação judicial e a separaçãoextrajudicial, banidas totalmente

Page 1633: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

do sistema jurídico.A partir das lições de Paulo

Lôbo, extraídas do texto porúltimo citado, deduz-se que osfins sociais da norma, nos termosdo art. 5º da Lei de Introdução,são de justamente colocar fim àcategoria. Pensar de formacontrária torna totalmente inútil otrabalho parlamentar de reformada Constituição Federal. Vejamostrecho do estudo do jurista quemerece especial destaque:

“No plano da interpretação teleológica,indaga-se quais os fins sociais da nova normaconstitucional. Responde-se: permitir, semempeços e sem intervenção estatal na

Page 1634: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

intimidade dos cônjuges, que estes possamexercer com liberdade seu direito dedesconstituir a sociedade conjugal, a qualquertempo e sem precisar declinar os motivos.Consequentemente, quais os fins sociais dasuposta sobrevivência da separação judicial,considerando que não mais poderia serconvertida em divórcio? Ou, ainda, queinteresse juridicamente relevante subsistiriaem buscar-se um caminho que não pode levarà dissolução do casamento, pois o divórcio é oúnico modo que passa a ser previsto naConstituição? O resultado da sobrevivênciada separação judicial é de palmar inocuidade,além de aberto confronto com os valores quea Constituição passou a exprimir, expurgandoos resíduos de quantum despótico: liberdadee autonomia sem interferência estatal.Ainda que se admitisse a sobrevivência dasociedade conjugal, a nova redação da normaconstitucional permite que os cônjugesalcancem suas finalidades, com muito mais

Page 1635: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

vantagem. Por outro lado, entre duasinterpretações possíveis, não poderiaprevalecer a que consultasse apenas ointeresse individual do cônjuge que desejasseinstrumentalizar a separação para o fim depunir o outro, comprometendo a boaadministração da justiça e a paz social. É datradição de nosso direito o que estabelece oart. 5º da Lei de Introdução ao Código Civil:na aplicação da lei, o juiz atenderá aos finssociais a que ela se dirige e às exigências dobem comum. O uso da justiça para punir ooutro cônjuge não atende aos fins sociais nemao bem comum, que devem iluminar a decisãojudicial sobre os únicos pontos em litígio,quando os cônjuges sobre eles não transigem:a guarda e a proteção dos filhos menores, osalimentos que sejam devidos, a continuidadeou não do nome de casado e a partilha dosbens comuns”.3

Não é diferente a conclusão

Page 1636: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

de Zeno Veloso, que assimresume seu parecer: “numainterpretação histórica,sociológica, finalística,teleológica do textoconstitucional, diante da novaredação do art. 226, § 6º, daCarta Magna, sou levado aconcluir que a separação judicialou por escritura pública foi figuraabolida em nosso direito,restando o divórcio que, aomesmo tempo, rompe a sociedadeconjugal e extingue o vínculomatrimonial. Alguns artigos doCódigo Civil que regulavam amatéria foram revogados pela

Page 1637: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

superveniência da normaconstitucional – que é de estaturamáxima – e perderam a vigênciapor terem entrado em rota decolisão com o dispositivoconstitucional superveniente”.4Na mesma linha, os ensinamentosde Pablo Stolze Gagliano eRodolfo Pamplona Filho: “Emsíntese, com a nova disciplinanormativa do divórcio, encetadapela Emenda Constitucional,perdem força jurídica as regraslegais sobre separação judicial,instituto que passa a ser extinto noordenamento jurídico, seja pelarevogação tácita (entendimento

Page 1638: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

consolidado no STF), seja pelainconstitucionalidadesuperveniente pela perda danorma validante (entendimentoque abraçamos do ponto de vistateórico, embora os efeitospráticos sejam os mesmos)”.5

Anote-se que esta também éa posição firme de Rodrigo daCunha Pereira6 e de MariaBerenice Dias,7 dois dos maioresexpoentes do Instituto Brasileirodo Direito de Família. Do mesmomodo, Álvaro Villaça Azevedoconclui pelo fim da separação dedireito, que, para ele, não teria

Page 1639: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

mais justificativa teórica eprática. Vejamos suas palavras:

“A grande maioria dos juristas tem entendidoque, com a edição da PEC do divórcio,extinguiu-se a separação judicial. Este é omeu entendimento.Estaríamos, agora, como o sistema japonêsque só admite o divórcio.Contudo, há quem entenda que a PEC existiusó para a extinção dos prazos constantes no §6º do art. 226 da Constituição Federal, nãotendo ela objetivado a extinção da separação,que não poderia ser extinta tacitamente.Todavia, a Emenda constitucional é claríssimaao assentar que ‘O casamento civil pode serdissolvido pelo divórcio’. Em verdade, a PECexistiu para instituir, no direito brasileiro, odivórcio direto.Cogita-se, entretanto, que podem os cônjugespreferir sua separação judicial, por exemplo,os católicos, à moda da separação temporal

Page 1640: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

admitida pelo Código Canônico. Sim, porquese o católico levar a sério suas crençasreligiosas, não poderá pretender o divórcio.Não é o que geralmente acontece. Nessecaso, deve o religioso permanecer emseparação de fato.Todavia, para que exista, excepcionalmente, aseparação de fato dos cônjuges, é preciso queambos manifestem-se nesse sentido, pois um,pretendendo o divórcio, não poderá serobstado pelo outro na realização desse direitopotestativo”.8

Da hermenêuticaconstitucional contemporânea,podem ser citados três princípios,apontados por J. J. GomesCanotilho, que conduzem àmesma conclusão, pelo fim daseparação jurídica, geralmente

Page 1641: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

utilizados por este autor emexposições sobre o tema.

O primeiro regramento a sercitado é o princípio da máximaefetividade ou da máximaeficiência do TextoConstitucional, segundo o qual,“a uma norma constitucional deveser atribuído o sentido que maioreficácia lhe dê. É um princípiooperativo em relação a todas equaisquer normas constitucionais,e embora a sua origem estejaligada à tese da actualidade dasnormas programáticas (Thoma), éhoje sobretudo invocado noâmbito dos direitos fundamentais

Page 1642: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

(no caso de dúvidas, devepreferir-se a interpretação quereconheça maior eficácia aosdireitos fundamentais)”.9 Mantera burocracia no fim docasamento, com o modelobifásico (separação e divórcio),não traz essa eficácia pretendida.

Ademais, pelo princípio daforça normativa da Constituição,“na solução dos problemasjurídico-constitucionais, devedar-se prevalência aos pontos devista que, tendo em conta ospressupostos da Constituição(normativa), contribuem para umaeficácia óptima da lei

Page 1643: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

fundamental. Consequentemente,dever dar-se primazia às soluçõeshermenêuticas que,compreendendo a historicidadedas estruturas constitucionais,possibilitam a ‘actualização’normativa, garantindo, do mesmopé, a sua eficácia epermanência”.10 A manutenção daseparação de direito viola esseprincípio, pois colide com aotimização da emenda e com aideia de atualização do TextoMaior.

Por fim, pode ser invocado oprincípio da interpretação dasleis em conformidade com a

Page 1644: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

Constituição, pois, “no caso denormas polissémicas ouplurissignificativas, deve dar-sepreferência à interpretação quelhe dê um sentido emconformidade com aConstituição”.11 De acordo com aCF/1988, não há mais sentidoprático na manutenção daseparação.

Em reforço, constata-se que,como a finalidade da separaçãode direito sempre foi pôr fim aocasamento, não se justifica amanutenção da categoria se aNorma Superior traz comoconteúdo apenas o divórcio, sem

Page 1645: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

maiores burocracias. Não sesustenta mais a exigência de umaprimeira etapa de dissolução, seo Texto Maior trata apenas deuma outrora segunda etapa. Atese da manutenção da separaçãode direito remete a um DireitoCivil burocrático, distante daConstituição Federal, muitoformal e pouco material; muitoteorético e pouco efetivo.

Destaque-se a existência dejulgados que aplicam a premissado fim da separação de direito,notadamente da separaçãojudicial. De início, cumprecolacionar ementa do Tribunal de

Page 1646: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

Justiça do Distrito Federal:

“Civil. Divórcio litigioso. Extinção semjulgamento do mérito. Art. 267, inciso VI, doCódigo de Processo Civil. Ausência detrânsito em julgado da separação judicial. EC66/2010. Supressão do instituto da separaçãojudicial. Aplicação imediata aos processos emcurso. A aprovação da PEC 28, de 2009, quealterou a redação do art. 226 da ConstituiçãoFederal, resultou em grande transformação noâmbito do direito de família ao extirpar domundo jurídico a figura da separação judicial.A nova ordem constitucional introduzida pelaEC 66/2010, além de suprimir o instituto daseparação judicial, também eliminou anecessidade de se aguardar o decurso deprazo como requisito para a propositura deação de divórcio. Tratando-se de normaconstitucional de eficácia plena, as alteraçõesintroduzidas pela EC 66/2010 têm aplicaçãoimediata, refletindo sobre os feitos de

Page 1647: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

separação em curso. Apelo conhecido eprovido” (TJDF, Recurso 2010.01.1.064251-3,Acórdão 452.761, Sexta Turma Cível, Rel.Des. Ana Maria Duarte Amarante Brito,DJDFTE 08.10.2010, p. 221).

Além dessa decisão, merecerelevo o acórdão da OitavaCâmara de Direito Privado doTribunal de Justiça de São Paulo,proferido no Agravo deInstrumento 990.10.357301-3, em12.11.2010, e que teve comorelator o Des. Caetano Lagrasta.O julgado foi assim ementado:“Separação judicial. Pedido deconversão em divórcio. EmendaConstitucional 66/2010.

Page 1648: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

Aplicação imediata eprocedência do pedido.Determinação de regularandamento do feito em relaçãoaos demais capítulos. Recursoprovido”. No corpo do seu voto,preleciona o magistrado relatorque, “Com a promulgação daEmenda Constitucional 66/2010 ea nova redação do § 6º do art.226 da CF/1988, o instituto daseparação judicial não foirecepcionado, mesmo porque nãohá direito adquirido a institutojurídico. A referida norma é deaplicabilidade imediata e nãoimpõe condições ao

Page 1649: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

reconhecimento do pedido dedivórcio, sejam de naturezasubjetiva – relegadas paraeventual fase posterior adiscussão sobre culpa – ouobjetivas – transcurso do tempo”.

Também entendendo pelofim da separação de direito,decisão do Tribunal de Justiça daBahia assim julgou: “Com oadvento da EmendaConstitucional 66, de 13.07.2010,que alterou o art. 226, § 6º, daConstituição Federal, houve umaverdadeira revolução no institutodo divórcio, que passou a serconsiderado um verdadeiro

Page 1650: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

direito, pondo fim à separaçãojudicial e eliminando qualquerprazo para dissolução do vínculomatrimonial. A EmendaConstitucional 66/2010 entrouimediatamente em vigor com asua publicação, tornando-seimpertinente e desnecessáriaquaisquer discussões acerca dorequisito, outrora existente, delapso temporal superior a doisanos para pleitear-se a dissoluçãodo casamento civil, através dodivórcio direto” (TJBA,Apelação Cível 0004074-23.2005.805.0256.0, Teixeira deFreitas, Processo: 0004074-

Page 1651: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

2/2005, Quinta Câmara Cível,Rel. Emilio Salomão PintoResedá, j. 25.01.2011).

Do Tribunal de Justiça doParaná pode ser retirado oseguinte trecho de aresto, comclareza ímpar: “Após o adventoda Emenda Constitucional66/2010, não se pode conhecer depedidos de separação judicialante a impossibilidade jurídica daprestação jurisdicional, devendoa base normativa do direitomaterial das ações em cursoserem corrigidas mediante aconversão do pedido emdivórcio. Recursos de apelação e

Page 1652: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

adesivo prejudicados, comanulação de ofício da sentença”(TJPR, Apelação Cível 0986822-2, Campo Largo, Décima SegundaCâmara Cível, Rel. Des. RosanaAmara Girardi Fachin, DJPR05.06.2013, p. 195).

Anote-se que vários outrosjulgados estaduais concluem domesmo modo, em praticamentetodas as unidades da Federação,servindo os arestos transcritoscomo exemplos da corretainterpretação a respeito damatéria.

No plano superior, de votoprolatado pelo Ministro Luis

Page 1653: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

Felipe Salomão no SuperiorTribunal de Justiça, pode serextraído trecho com a seguintemanifestação acidental: “Assim,para a existência jurídica daunião estável, extrai-se orequisito da exclusividade derelacionamento sólido da exegesedo § 1º do art. 1.723 do CódigoCivil de 2002, fine, dispositivoesse que deve ser relido emconformidade com a recente EC66, de 2010, a qual, em boa hora,aboliu a figura da separaçãojudicial” (STJ, REsp912.926/RS, Quarta Turma, Rel.Min. Luis Felipe Salomão, j.

Page 1654: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

22.02.2011, DJe 07.06.2011). Emjulgado mais recente, seguiamesma linha a Ministra IsabelGalotti, em decisão monocrática:“Após a EC 66/2010, não maisexiste no ordenamento jurídicobrasileiro o instituto da separaçãojudicial. Não foi delegado aolegislador infraconstitucionalpoderes para estabelecerqualquer condição que restrinjadireito à ruptura do vínculoconjugal” (STJ, Documento40398425, Despacho/Decisão,DJE 22.10.2014). Em suma,também no âmbito do Tribunal daCidadania, podem ser

Page 1655: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

encontrados pensamentos pelofim da separação de direito.

Em suma, por todos osargumentos antes deduzidos,devem ser tidos como revogadostacitamente, porincompatibilidade constitucionalsuperveniente os dispositivos doCódigo Civil que tratavam daseparação judicial, a saber:

– Art. 1.571, inciso III, do CC/2002 –ao elencar a separação judicial comomotivo de dissolução da sociedadeconjugal.– Art. 1.572 do CC/2002 – quecuidava das antigas modalidades deseparação judicial litigiosa, a saber: a)

Page 1656: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

separação-sanção ou culposa: porgrave violação dos deveres docasamento, ou seja, por culpa; b)separação-ruptura ou falência: pelaruptura da vida em comum há mais deum ano e a impossibilidade de suareconstituição; e c) separação-remédio: fundada no fato de o outrocônjuge estar acometido de doençamental grave, manifestada depois docasamento, que tornasse impossível acontinuação da vida em comum, desdeque, após uma duração de dois anos, aenfermidade tivesse sido reconhecidade cura improvável.– Art. 1.573 do CC/2002 – queestabelecia um rol de situaçõescaracterizadoras da separação-sanção ou culposa, de formailustrativa, a saber: a) adultério; b)

Page 1657: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

tentativa de morte; c) sevícia ou injúriagrave; d) abandono voluntário do larconjugal, durante um ano contínuo; e)condenação por crime infamante; e f)conduta desonrosa.– Art. 1.574 do CC/2002 – que tratavamaterialmente da separação judicialconsensual ou por mútuoconsentimento, tendo como requisito ofato de os cônjuges estarem casadospor mais de um ano e o manifestaremperante o juiz, sendo por eledevidamente homologada a convenção.– Art. 1.575 do CC/2002 – ao prever,como efeitos da sentença daseparação judicial, a separação decorpos e a partilha de bens.– Art. 1.576 do CC/2002 – quecompletava tais efeitos da sentença daseparação judicial, tratando do fim dosdeveres de coabitação e fidelidade

Page 1658: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

recíproca e do regime de bens.– Art. 1.578 do CC/2002 – estabeleciaa relação entre a sentença deseparação judicial e o uso do nomepelo cônjuge, ao término da sociedadeconjugal. Nos termos dessa norma, orainconstitucional, o cônjuge declaradoculpado na ação de separação judicialperderia o direito de usar o sobrenomedo outro, desde que expressamenterequerido pelo cônjuge inocente e se aalteração não acarretasse: a) evidenteprejuízo para a sua identificação; b)manifesta distinção entre o seu nomede família e o dos filhos havidos daunião dissolvida; ou c) dano gravereconhecido na decisão judicial. Emcomplemento, o mesmo preceitoenunciava que o cônjuge inocente naação de separação judicial poderiarenunciar, a qualquer momento, ao

Page 1659: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

direito de usar o sobrenome do outro.Por fim, nos demais casos, caberia aopção pela conservação do nome decasado.– Art. 1.580 do CC/2002 – que traziaas duas modalidades de divórcios,retiradas da Constituição Federal de1988 pela Emenda 66/2010, a saber: a)divórcio indireto ou por conversão:depois de decorrido um ano do trânsitoem julgado da sentença que houvessedecretado a separação judicial, ou dadecisão concessiva da medida cautelarde separação de corpos; e b) divórciodireto: requerido, por um ou por ambosos cônjuges, nos anteriores casos decomprovada separação de fato pormais de dois anos.

O mesmo deve ser ditoquanto à Lei 11.441/2007, na

Page 1660: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

parte relativa à separaçãoextrajudicial (art. 1.124-A doCPC/1973), e em relação aosantigos arts. 1.120 a 1.124 domesmo Estatuto Processual, quetratavam da separação judicialconsensual. A mesma deduçãovale para todas as regras doNovo Código de Processo Civilque mencionam a separaçãojudicial e a extrajudicial. Todosesses preceitos devem ser tidoscomo inconstitucionais diante daEmenda Constitucional 66/2010,a Emenda do Divórcio.

De toda sorte, a questão nãoera, e continuará a não ser,

Page 1661: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

pacífica na doutrina e najurisprudência nacionais. Antesmesmo do Novo CPC, anote-seque o Conselho Nacional deJustiça não acatou o pedido doInstituto Brasileiro de Direito deFamília de alteração de pontos dasua Resolução 35, que regula osatos notariais decorrentes da Lei11.441/2007. O ConselhoNacional de Justiça decidiu pelaexclusão do art. 53 e conferiunova redação ao art. 52. Rejeitou,contudo, a supressão dos artigosque tratavam da separaçãoconsensual, decidindo: “nemtodas as questões encontram-se

Page 1662: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

pacificadas na doutrina e sequerforam versadas na jurisprudênciapátria; (...) tem-se que, mesmocom o advento da Emenda 66,persistem diferenças entre odivórcio e a separação” (Pedidode Providências 00005060-32.2010.2.00.0000).

De fato, existem juristas quesão favoráveis à manutenção daseparação de direito no sistema,caso, entre outros, de Mário LuizDelgado,12 Luiz Felipe BrasilSantos,13 João Baptista Villela14,Regina Beatriz Tavares daSilva,15 Gustavo Tepedino, Maria

Page 1663: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

Celina Bodin de Moraes, HeloísaHelena Barboza16 e Maria HelenaDiniz.17 Destaque-se oposicionamento da última jurista,que, apesar de entender pelapermanência no sistema dasnormas que tratam da separaçãode direito, acredita napossibilidade de as referidasnormas perderem eficácia social,caindo em desuso (desuetudo). Aprática tem realmentedemonstrado tal realidade, umavez que diminuíramsignificativamente nos últimosanos as demandas de separaçãojudicial.

Page 1664: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

Para essa corrente, aEmenda Constitucional 66/2010não alterou a ordeminfraconstitucional, havendonecessidade de normas pararegulamentá-la. Com o devidorespeito, a tese parece desprezartodo o trabalho de alteraçãoconstitucional, tornando-o inútil.Além disso, a deduçãodesconsidera a força normativada Constituição e toda aevolução engendrada pelo DireitoCivil Constitucional. Anote-seque, adotando tal ideia demanutenção do sistema anterior,há julgados do Tribunal Gaúcho,

Page 1665: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

podendo ser transcrito o seguinte:

“Separação judicial. Viabilidade do pedido.Não obrigatoriedade do divórcio paraextinguir a sociedade conjugal. 1. A EmendaConstitucional 66 limitou-se a admitir apossibilidade de concessão de divórcio diretopara dissolver o casamento, afastando aexigência, no plano constitucional, da préviaseparação judicial e do requisito temporal deseparação fática. 2. Essa disposiçãoconstitucional evidentemente não retirou doordenamento jurídico a legislaçãoinfraconstitucional que continua regulandotanto a dissolução do casamento como dasociedade conjugal e estabelecendo limites econdições, permanecendo em vigor todas asdisposições legais que regulamentam aseparação judicial, como sendo a únicamodalidade legal de extinção da sociedadeconjugal, que não afeta o vínculo matrimonial.3. Somente com a modificação da legislação

Page 1666: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

infraconstitucional é que a exigência relativaaos prazos legais poderá ser afastada.Recurso provido” (TJRS, Agravo deInstrumento 70039285457, Sétima CâmaraCível, Comarca de Sapiranga, Rel. Des.Sérgio Fernando de Vasconcellos Chaves, j.1.º.11.2010).

Em outros TribunaisEstaduais, também podem serencontrados arestos na mesmalinha, pela manutenção daseparação de direito, a englobar aseparação judicial e aextrajudicial. A título deilustração, do Tribunal de Justiçade Minas Gerais, com votovencido em sentido contrário:

Page 1667: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

“A Emenda Constitucional 66/2010 não aboliua separação judicial do ordenamento jurídicopátrio, limitando-se à desconstitucionalizaçãodo tema, conferindo ao legislador ordinárioliberdade para sua regulamentação, emconsonância com os reclamos da sociedadepós-moderna. Deve ser reformada a sentençaque julga procedente pedido de divórciodireto, sem observância do lapso temporalexigido pelo art. 1.580 do Código Civil”(TJMG, Apelação Cível 1.0701.13.005944-0/001, Rel. Des. Afrânio Vilela, j. 05.11.2014,DJEMG 21.11.2014).

Em complemento, conformeantes destacado pela própriaRelatoria do Senador Vital doRêgo, na V Jornada de DireitoCivil, evento promovido peloConselho da Justiça Federal e

Page 1668: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

pelo Superior Tribunal de Justiçaem 2001, foram aprovadosenunciados doutrinários queconcluem pela manutenção daseparação de direito no sistemajurídico nacional. O primeirodeles, de número 514, preceituaque “A Emenda Constitucional66/2010 não extinguiu o institutoda separação judicial eextrajudicial”. Em continuidade,conforme o Enunciado n. 515 doCJF/STJ, “pela interpretaçãoteleológica da EmendaConstitucional 66/2010, não háprazo mínimo de casamento paraa separação consensual”. Ainda

Page 1669: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

tratando da separação judicialconsensual, é a redação doEnunciado n. 516: “Na separaçãojudicial por mútuo consentimento,o juiz só poderá intervir no limiteda preservação do interesse dosincapazes ou de um dos cônjuges,permitida a cindibilidade dospedidos com a concordância daspartes, aplicando-se esseentendimento também aodivórcio”. Por fim, admitindo adivisão do divórcio em direto eindireto, o Enunciado n. 517, inverbis: “A Emenda Constitucional66/2010 extinguiu os prazosprevistos no art. 1.580 do Código

Page 1670: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

Civil, mantido o divórcio porconversão”.

Repise-se que, apesar detais resistências, este autorentende que não vige mais osistema bifásico de extinção dasociedade conjugal e docasamento. As ações em curso deseparação judicial, sejamconsensuais ou litigiosas, emregra, devem ser extintas semjulgamento do mérito, porimpossibilidade jurídicasuperveniente do pedido, salvo sejá houver sentença prolatada.

Esse entendimento deve serreafirmado, mesmo diante da

Page 1671: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

emergência do Novo Código deProcesso Civil. No máximo,aplicando-se os princípiosprocessuais da economia e dafungibilidade, pode o juiz dacausa dar oportunidade para queas partes envolvidas adaptem oseu pedido, da separação judicialpara o divórcio.

No que concerne aosenunciados aprovados naJornada de Direito Civil, éforçoso concluir que nãodeveriam ter sido sequer votados,por encerrarem tema controverso,de grande debate na doutrina e najurisprudência nacionais. As

Page 1672: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

Jornadas de Direito Civil têm ocondão de demonstrar opensamento consolidado dacivilística nacional, o que não foiatendido pelas ementastranscritas. Fugiu-se, portanto,dos objetivos desse grandeevento brasileiro, o maisimportante da área do DireitoPrivado em nosso País. Por outroviés, tem-se ouvido no meiojurídico que os enunciados, aodeduzirem pela manutenção daseparação de direito, constituemum total retrocesso, o que écompartilhado pelo presenteautor. Em reforço, na VI Jornada

Page 1673: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

de Direito Civil, em 2013, foifeita proposta em sentidocontrário aos malfadadosenunciados, que sequer entrou empauta para discussão.

Para findar o presentetópico, cabe trazer a lume aspalavras de Lênio Luiz Streck, umdos maiores juristas brasileirosda atualidade, que, antes mesmoda aprovação do texto final doNovo CPC no Senado Federal, jásustentava a inconstitucionalidadedo que chamou de repristinaçãoda separação judicial.18

Introduzindo o tema, aduz odoutrinador, sobre a Emenda

Page 1674: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

Constitucional 66/2010, que “nãopode haver dúvida que, com aalteração do texto constitucional,desapareceu a separação judicialno sistema normativo brasileiro –e antes que me acusem dedescuidado, não ignoro doutrina ejurisprudência que seguem rotaoposta ao que defendo no texto,mas com elas discordoveementemente. Assim, perde osentido distinguir-se término edissolução de casamento. Isso ésimples. Agora, sociedadeconjugal e vínculo conjugal sãodissolvidos mutuamente com odivórcio, afastada a necessidade

Page 1675: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

de prévia separação judicial oude fato do casal. Nada maisadequado a um Estado laico (esecularizado), que imputainviolável a liberdade deconsciência e de crença(CF/1988, art. 5º, VI). Há, aliás,muitos civilistas renomados quedefendem essa posição, entre elesPaulo Lôbo, Luís Edson Fachin eRodrigo da Cunha. Pois bem.Toda essa introdução me serviráde base para reforçar meuposicionamento e elaborar críticapara um problema que verifiqueirecentemente. E já adianto aquestão central: fazendo uma

Page 1676: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

leitura do Projeto do novo CPC,deparei-me com uma espécie derepristinação da separaçãojudicial. Um dispositivo tipo-Lázaro. Um curioso retorno aomundo dos vivos”.19

E arremata, em palavrasfinais: “O legislador do novoCPC tem responsabilidadepolítica (no sentido de que faloem Verdade e Consenso eJurisdição Constitucional eDecisão Jurídica). Para tanto,deve contribuir e aceitar, tambémnesse particular, a evolução dostempos eliminando do texto todasas expressões que dão a entender

Page 1677: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

a permanência entre nós desseinstituto cuja serventia já se foi enão mais voltará. Não fosse pornada – e peço desculpas pelaironia da palavra ‘nada’ –,devemos deixar a separação defora do novo CPC em nome daConstituição. E isso por doismotivos: a um, por ela mesma,porque sacramenta asecularização do direito,impedindo o Estado de‘moralizar’ as relações conjugais;a dois, pelo fato de o legisladorconstituinte derivado já terresolvido esse assunto. Para otema voltar ao ‘mundo jurídico’,

Page 1678: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

só por alteração da Constituição.E, ainda assim, seria de duvidosaconstitucionalidade. Mas aí euargumentaria de outro modo.Portanto, sem chance de o novoCPC repristinar a separaçãojudicial (nem por escriturapública, como consta no Projetodo CPC). É inconstitucional. Sobpena de, como disse Marshall em1803, a Constituição não ser maisrígida, transformando-se emflexível. E isso seria o fim doconstitucionalismo. Esta é, pois, aresposta adequada à Constituição.Espero que o legislador queaprovará o novo CPC se dê conta

Page 1679: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

disso e evite um périplo dedecisões judiciais no âmbito docontrole difuso ou nos poupe deuma ação direta deinconstitucionalidade. O SupremoTribunal Federal já tem trabalhosuficiente”.20

Infelizmente, o legisladornão se atentou a isso. O trabalhonão será só do Supremo TribunalFederal, mas de toda a doutrina ejurisprudência nacionais. Jácomeçamos a desempenhá-lo,condenando essa triste opçãoconstante do Novo Código deProcesso Civil Brasileiro, queserá duramente combatida por

Page 1680: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

este autor nos próximos anos.

Page 1681: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

__________1 O termo revolução também éutilizado por José Fernando Simão: APEC do Divórcio: A Revolução doSéculo em Matéria de Direito deFamília. Disponível em:<http://www.ibdfam.org.br/?artigos&artigo=652>. Acesso em: 19nov. 2010.2 LÔBO, Paulo Luiz Netto. Divórcio:Alteração Constitucional e suasConsequências. Disponível em:<http://www.ibdfam.org.br/?artigos&artigo=570>. Acesso em: 12fev. 2010.3 LÔBO, Paulo Luiz Netto. Divórcio:Alteração Constitucional e suasConsequências. Disponível em:<http://www.ibdfam.org.br/?artigos&artigo=570>. Acesso em: 12

Page 1682: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

fev. 2010.4 VELOSO, Zeno. O Novo Divórcioe o que Restou do Passado.Disponível em:<http://www.ibdfam.org.br/?artigos&artigo=661>. Acesso em: 14ago. 2010.5 GAGLIANO, Pablo Stolze;PAMPLONA FILHO, Rodolfo. NovoCurso de Direito Civil. Direito deFamília. São Paulo: Saraiva, 2011. v. 6,p. 547.6 PEREIRA, Rodrigo da Cunha.Divórcio. Teoria e Prática. Rio deJaneiro: GZ, 2010. p. 26-31.7 DIAS, Maria Berenice. Manual deDireito das Famílias. 6. ed. SãoPaulo: RT, 2010. p. 300-301.8 AZEVEDO, Álvaro Villaça.

Page 1683: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

Emenda Constitucional do Divórcio.Disponível em:<http://www.flaviotartuce.adv.br/secoes/artigosc/villaca_emenda.docAcesso em: 10 jan. 2011.9 CANOTILHO, J. J. Gomes. DireitoConstitucional e Teoria daConstituição. 7. ed. 3. reimpr.Coimbra: Almedina, p. 1.224.10 CANOTILHO, J. J. Gomes.Direito Constitucional e Teoria daConstituição. 7. ed. 3. reimpr.Coimbra: Almedina, p. 1.226.11 CANOTILHO, J. J. Gomes.Direito Constitucional e Teoria daConstituição. 7. ed. 3. reimpr.Coimbra: Almedina, p. 1.226.12 DELGADO, Mário Luiz. A NovaRedação do § 6º do Art. 226 daCF/1988: Por Que a Separação deDireito Continua a Vigorar no

Page 1684: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

Ordenamento Jurídico Brasileiro.Separação, Divórcio, Partilha eInventários Extrajudiciais.Questionamentos sobre a Lei11.441/2007. 2. ed. Coord. AntonioCarlos Mathias Coltor e Mário LuizDelgado. São Paulo: Método, 2011. p.25-48.13 SANTOS, Luiz Felipe Brasil.Emenda do Divórcio: Cedo paraComemorar. Disponível em:<http://www.ibdfam.org.br/?artigos&artigo=648>. Acesso em: 15dez. 2010.14 Conforme entrevista dada aoJornal Carta Forense, com o título:Emenda do Divórcio. Outrasimpressões. Disponível em:<http://www.cartaforense.com.br/Materia.aspx?id=6075>. Acesso em: 15 dez. 2010.15 TAVARES DA SILVA, Regina

Page 1685: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

Beatriz. A Emenda Constitucional doDivórcio. São Paulo: Saraiva, 2011.16 TEPEDINO, Gustavo;BARBOZA, Heloísa Helena;MORAES, Maria Celina Bodin de.Código Civil Interpretado. Rio deJaneiro: Renovar, 2014. v. IV, p. 129.17 DINIZ, Maria Helena. Manual deDireito Civil. São Paulo: Saraiva,2011. p. 460.18 STRECK, Lênio Luiz. Por Que éInconstitucional “Repristinar” aSeparação Judicial no Brasil.Disponível em:<http://www.conjur.com.br/2014-nov-18/lenio-streck-inconstitucional-repristinar-separacao-judicial>. Acessoem: 21 dez. 2014. Vale lembrar que arepristinação é a restauração devigência de uma norma revogada, pela

Page 1686: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

revogação, por uma terceira norma, desua norma revogadora.19 STRECK, Lênio Luiz. Por Que éInconstitucional “Repristinar” aSeparação Judicial no Brasil.Disponível em:<http://www.conjur.com.br/2014-nov-18/lenio-streck-inconstitucional-repristinar-separacao-judicial>. Acessoem: 21 dez. 2014.20 STRECK, Lênio Luiz. Por Que éInconstitucional “Repristinar” aSeparação Judicial no Brasil.Disponível em:<http://www.conjur.com.br/2014-nov-18/lenio-streck-inconstitucional-repristinar-separacao-judicial>. Acessoem: 21 dez. 2014.

Page 1687: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

DAS REGRASRELATIVAS À UNIÃOESTÁVEL NO NOVO

CPC E ASCONSEQUÊNCIAS

PARA O DIREITOMATERIAL

Page 1688: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

O Novo Código de ProcessoCivil teve a feliz opção deequalizar expressamente a uniãoestável ao casamento em váriosde seus preceitos, o que traráconsequências para o modo comoa comparação dessas entidadesfamiliares é feita no âmbito dodireito material. Vejamos,inicialmente, alguns dessescomandos. Antes dessa exposiçãodos preceitos, não se olvide que,quando da elaboração do EstatutoProcessual anterior, a uniãoestável não era reconhecida comoentidade familiar, o que somenteocorreu, concretamente e no

Page 1689: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

plano legal, com a ConstituiçãoFederal de 1988, por força do seuart. 226, § 3º. De qualquer forma,esclareça-se que a grande maioriadas regras a partir de agoraexpostas já vinha recebendo amesma interpretação peladoutrina e pela jurisprudência.

De início, o art. 144 doCPC/2015, em seus incisos III eIV, ampliou o impedimento dojuiz para os casos em que, noprocesso, for parte ou estiverpostulando, como defensorpúblico, advogado ou membro doMinistério Público, seu cônjugeou companheiro, ou qualquer

Page 1690: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

parente, consanguíneo ou afim,em linha reta ou colateral, até oterceiro grau, inclusive. Como énotório, o art. 134, incisos IV e V,do CPC/1973 somente faziaalusão ao cônjuge do juiz e nãoao seu companheiro. Louva-se,sem dúvidas, a nova norma quepassou a estender o impedimentopara as situações em que figurecomo parte cliente do escritóriode advocacia de seu cônjuge,companheiro ou parente,consanguíneo ou afim, em linhareta ou colateral, até o terceirograu, inclusive (art. 144, incisoVIII, do CPC/2015). O último

Page 1691: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

preceito tem conteúdo éticoindiscutível, na linha da boa-féprocessual adotada pela novalegislação instrumental ecomentada no primeiro capítulodeste livro.

Igualmente no que dizrespeito à suspeição do julgador,é seu motivo o fato de serqualquer uma das partes credoraou devedora de seu cônjuge oucompanheiro ou de parentesdestes, em linha reta até oterceiro grau, inclusive (art. 145,inciso III, do Novo CPC). Maisuma vez, constata-se que o art.135, inciso II, do anterior

Page 1692: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

diploma não mencionava ocompanheiro, mas apenas ocônjuge.

No que diz respeito àcitação, esta não será feita, salvopara evitar perecimento de umdireito de cônjuge, decompanheiro ou de qualquerparente do morto, consanguíneoou afim, em linha reta ou na linhacolateral em segundo grau, no diado falecimento e nos sete diasseguintes; o que visa à proteçãodo luto da família, verdadeirodireito da personalidade. Issoconsta do art. 244, inciso II, doCPC/2015; sendo certo que a

Page 1693: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

menção ao convivente não estavano art. 217, inciso II, doCPC/1973.

Como exposto no capítulo deprovas, o companheiro não éobrigado a depor sobre fatos quegerem a desonra de seu consorte(art. 388, inciso III, doCPC/2015), quando é certo quenão se mencionava o conviventeno CPC anterior ou no CódigoCivil de 2002. Na mesma linha eainda sobre a prova, nas açõesque versarem sobre bens imóveisou direitos reais sobre imóveisalheios, a confissão de umcônjuge ou companheiro não

Page 1694: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

valerá sem a do outro, salvo se oregime de casamento for o daseparação absoluta de bens (art.391, parágrafo único, doCPC/2015). No art. 350,parágrafo único, da normaanterior, não havia regra relativaà união estável, mais uma vez.

Quanto às testemunhas, aindanessa seara probatória, sãoimpedidos para tanto “o cônjuge,o companheiro, o ascendente e odescendente em qualquer grau e ocolateral, até o terceiro grau, dealguma das partes, porconsanguinidade ou afinidade,salvo se o exigir o interesse

Page 1695: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

público ou, tratando-se de causarelativa ao estado da pessoa, nãose puder obter de outro modo aprova que o juiz repute necessáriaao julgamento do mérito” (art.447, § 2º, inciso I, do CPC/2015,com destaque). A lei anteriorfazia apenas menção ao cônjuge(art. 405, § 2º, inciso I, doCPC/1973).

Em matéria de inventário,reconhece-se a legitimidade docompanheiro para abertura doinventário e para ser nomeadocomo inventariante. Isso semprejuízo de outros comandosprocessuais que lhe atribuem os

Page 1696: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

mesmos direitos do cônjuge e queserão aprofundados em capítulopróprio desta obra.

O companheiro também éreconhecido como legitimado aopor embargos de terceiro para atutela da sua meação pelo art. 674do Novo Codex; quando é certoque o art. 1.046 do CPC/1973 nãoo expressava. Seguiu-se, assim, oentendimento que era consolidadopela jurisprudência,especialmente pela superior,cabendo colacionar, por todos: “éparte legítima para embargar aexecução companheira que,garantida com partilha de bens já

Page 1697: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

decretada, deles ainda não dispõepor falta de homologação dapartilha. Legitimidade ativa dapossuidora mediata, garantidacom a partilha, para fazer uso dosinterditos, inclusive embargos deterceiro” (STJ, REsp426.239/RS, Segunda Turma, Rel.Min. Eliana Calmon, j.04.05.2004, DJ 28.06.2004, p.230).

Sem prejuízo de outroscomandos, o que parece gerarmaiores repercussões para odireito material é o art. 73 doCPC/2015, a seguir confrontadocom o art. 10 do Código de

Page 1698: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

Processo anterior, para osdevidos aprofundamentos e comespecial destaque:

Novo Códigode Processo

Civil

Código de

Processo CivilAntigo

“Art. 73. Ocônjugenecessitará doconsentimentodo outro parapropor ação queverse sobredireito realimobiliário, salvo

“Art. 10. Ocônjuge somentenecessitará doconsentimentodo outro parapropor açõesque versemsobre direitos

Page 1699: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

quando casadossob o regime deseparaçãoabsoluta debens.

reais imobiliários(redação dadapela Lei 8.952,de 13.12.1994).

§ 1º Ambos oscônjuges serãonecessariamentecitados para aação:

§ 1º Ambos oscônjuges serãonecessariamentecitados para asações(parágrafo únicorenumerado pelaLei 8.952, de13.12.1994):

I – que versesobre direito realimobiliário, salvo

I – que versemsobre direitos

Page 1700: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

quando casadossob o regime deseparaçãoabsoluta debens;

reais imobiliários(redação dadapela Lei 8.952,de 13.12.1994);

II – resultantede fato que digarespeito aambos oscônjuges ou deato praticadopor eles;

II – resultantesde fatos quedigam respeito aambos oscônjuges ou deatos praticadospor eles(Redação dadapela Lei 5.925,de 1.10.1973);

III – fundadasem dívidas

Page 1701: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

III – fundadaem dívidacontraída porum dos cônjugesa bem dafamília;

contraídas pelomarido a bem dafamília, mas cujaexecução tenhade recair sobreo produto dotrabalho damulher ou osseus bensreservados(redação dadapela Lei 5.925,de 01.10.1973)

IV – que tenhapor objeto oreconhecimento,a constituição oua extinção de

IV – quetenham porobjeto oreconhecimento,a constituição oua extinção deônus sobre

Page 1702: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

ônus sobreimóvel de um oude ambos oscônjuges.

imóveis de umou de ambos oscônjuges(redação dadapela Lei 5.925,de 01.10.1973).

§ 2º Nas açõespossessórias, aparticipação docônjuge do autorou do réusomente éindispensávelnas hipóteses decomposse ou deato por ambospraticado.

§ 2º Nas açõespossessórias, aparticipação docônjuge do autorou do réusomente éindispensávelnos casos decomposse ou deato por ambospraticados(incluído pelaLei 8.952, de13.12.1994)”.

Page 1703: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

§ 3º Aplica-seo dispostoneste artigo àunião estávelcomprovadanos autos”.

Foi mantida a regra anterior,agora no art. 74 do CPC/2015, nosentido de que tal consentimentopara as ações reais sobre imóveispode ser suprido judicialmentequando for negado por um doscônjuges sem justo motivo, ouquando lhe seja impossívelconcedê-lo. Em complemento, a

Page 1704: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

falta de consentimento invalida oprocesso, quando necessário enão suprido pelo juiz. Essas eramas premissas expostas no art. 11do CPC/1973, sem qualquermudança mais substancial.

Sem dúvidas, a grandeinovação é a necessidade devênia ou outorga convivencialpara as ações reais imobiliárias,constante do último parágrafo doart. 73, sem correspondente nodispositivo instrumental anterior,como se percebe.1 A novidadedeve ser confrontada com o art.1.647 do Código Civil de 2002,que tem a seguinte redação:

Page 1705: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

“Art. 1.647. Ressalvado o disposto no art.1.648, nenhum dos cônjuges pode, semautorização do outro, exceto no regime daseparação absoluta:I – alienar ou gravar de ônus real os bensimóveis;II – pleitear, como autor ou réu, acercadesses bens ou direitos;III – prestar fiança ou aval;IV – fazer doação, não sendo remuneratória,de bens comuns, ou dos que possam integrarfutura meação.Parágrafo único. São válidas as doaçõesnupciais feitas aos filhos quando casarem ouestabelecerem economia separada”.

A norma material transcritarepresenta um dos maisimportantes comandos legais doCódigo Civil de 2002, elencandohipóteses de legitimação,

Page 1706: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

capacidade especial exigida porlei para determinados atos enegócios. No caso, a lei prevê anecessidade de concordância dooutro cônjuge, manifestada poruma autorização para o ato. Oinstituto se situa no plano davalidade do negócio jurídico,envolvendo a capacidade (art.104, inciso I, do CC/2002). Porisso é que a lei estabelece comoconsequência da falta da outorgaconjugal a anulabilidade do atocorrespondente (art. 1.649 doCC/2002), não havendo oeventual suprimento judicial (art.1.648 do CC/2002).

Page 1707: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

Como é notório, forçosoutilizar a expressão genéricaoutorga conjugal, a englobartanto a outorga marital (domarido) quanto a outorga uxória(da esposa, do latim uxor).Didaticamente, deve-se evitarmencionar apenas a última, o quetraz o sentido de discriminaçãoque constava da codificaçãomaterial anterior, de 1916,especialmente no seu art. 233,segundo o qual o marido seria ochefe da entidade familiar.

Em relação aos regimes quenecessitam da outorga conjugal, adispensa se dá apenas no regime

Page 1708: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

da separação absoluta. Emoutras palavras, a outorgaconjugal é necessária para os atoselencados nos regimes dacomunhão parcial de bens, dacomunhão universal de bens e daparticipação final nos aquestos,em regra. Quanto ao últimoregime, é possível que o pactoantenupcial traga regra quepreveja a livre disposição dosbens imóveis, conforme o art.1.656 do Código Civil, afastandoa necessidade da outorga se issofor convencionado. De toda sorte,o regime em questão, introduzidopelo Código Civil de 2002,

Page 1709: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

praticamente não encontrouaplicação prática nos seus maisde dez anos de vigência.

A expressão separaçãoabsoluta gerou muito debate entreos civilistas e foi repetida peloNovo CPC no dispositivo aquiexposto (art. 73). Sabe-se que aseparação de bens pode ser,inicialmente, legal ouobrigatória, nos três casosdescritos no art. 1.641 doCC/2002. O primeiro deles estáassociado à presença de uma dascausas suspensivas do casamento,descritas pelo art. 1.523 doCódigo Civil. A segunda hipótese

Page 1710: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

envolve as pessoas que se casamcom idade superior a 70 anos, oque foi modificado pela Lei12.344/2010, pois o sistemaanterior previa a idade de 60anos. A terceira situação deimposição do regime daseparação legal diz respeito àshipóteses de pessoas quenecessitam de suprimento judicialpara o casamento, caso dosmenores que não atingiram aidade núbil de 16 anos (arts.1.517 e 1.520 do CC). Ademais,a separação de bens seráconvencional quando decorrer deopção dos cônjuges, por pacto

Page 1711: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

antenupcial.Expostos tais conceitos, qual

regime seria esse, mencionadotanto no CC/2002 quanto noCPC/2015, o regime daseparação absoluta de bens?Respondendo, não hácontrovérsia quanto ao regime daseparação convencional de bens,uma vez que o art. 1.687 doCódigo Civil é claro no tocante àlivre disposição dos bens,presente uma separação absolutaem casos tais.

A polêmica está naseparação legal ou obrigatória,girando em torno da incidência ou

Page 1712: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

não da antiga Súmula 377 do STF,editada em abril de 1964, com aseguinte redação: “No regime deseparação legal de bens,comunicam-se os adquiridos naconstância do casamento”. Peloseu teor, no regime da separaçãoobrigatória haveria algo próximode uma comunhão parcial,comunicando-se os bens havidosdurante a união pelo esforçopatrimonial dos cônjuges. Emsuma, se ainda incidente asumular, na separação legal, nãohaveria uma separação absoluta,pois alguns bens se comunicam.

Deve ficar claro que este

Page 1713: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

autor segue o entendimento pelanecessidade de prova do esforçocomum para que surja o direito àparticipação do cônjuge naseparação legal ou obrigatória debens (nesse sentido: STJ, REsp442.629/RJ, Quarta Turma, Rel.Min. Fernando Gonçalves, j.02.09.2003, DJ 15.09.2003, p.324, REPDJ 17.11.2003, p. 332).Todavia, a dedução não épacífica, diante da existência deentendimento que dispensa aprova do citado esforço comumpara a aplicação da súmula (STJ,REsp 1.171.820/PR, TerceiraTurma, Rel. Min. Sidnei Beneti,

Page 1714: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

Rel. p/ Acórdão Min. NancyAndrighi, j. 07.12.2010, DJe27.04.2011; REsp 1.090.722/SP,Terceira Turma, Rel. Min.Massami Uyeda, j. 02.03.2010,DJe 30.08.2010; REsp736.627/PR, Terceira Turma, Rel.Min. Carlos Alberto MenezesDireito, j. 11.04.2006, DJ01.08.2006, p. 436). Como senota pelas menções aos julgados,os acórdãos superiores maisrecentes dispensam a prova doesforço comum, transformando aseparação obrigatória de bens emcomunhão parcial, uma vez quetodos os bens havidos durante o

Page 1715: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

casamento se comunicam.Mas a questão a ser

respondida é se a Súmula 377 doSTF ainda tem ou não aplicação,o que repercute diretamente nainterpretação do art. 1.647, caput,do CC/2002. Duas são ascorrentes que podem serapontadas a respeito de tãointrincada questão.

Para uma primeira corrente,a súmula está cancelada, pois oCC/2002 não repetiu o art. 259do CC/1916 que supostamente lhedava fundamento (“Art. 259.Embora o regime não seja o dacomunhão de bens, prevalecerão,

Page 1716: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

no silêncio do contrato, osprincípios dela, quanto àcomunicação dos adquiridos naconstância do casamento”). Nadoutrina, encabeçam esseentendimento Silvio Rodrigues,2Francisco Cahali3 e JoséFernando Simão.4 Para essavertente, haveria separaçãoabsoluta tanto na separaçãoconvencional quanto naseparação legal de bens, poisnos dois regimes nada secomunica.

Para uma segunda corrente,a súmula não está cancelada,

Page 1717: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

diante da vedação doenriquecimento sem causaretirada dos arts. 884 a 886 doCódigo Civil. Assim, urge acomunicação de alguns benshavidos para se evitar olocupletamento sem razão. Essacorrente parece ser a prevalentena doutrina nacional, sendoseguida por Nelson Nery Jr. eRosa Maria de Andrade Nery,5Zeno Veloso,6 Rodrigo Toscanode Brito,7 Paulo Lôbo,8 MariaBerenice Dias,9 Maria HelenaDiniz,10 Sílvio Venosa,11 Eduardode Oliveira Leite,12 Rolf

Page 1718: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

Madaleno,13 Cristiano Chaves deFarias e Nelson Rosenvald,14

Pablo Stolze Gagliano e RodolfoPamplona Filho.15 Destaque-seque alguns doutrinadoresdispensam até a prova do esforçocomum, caso de Paulo Lôbo eMaria Berenice Dias. Nessamesma linha, somente háseparação absoluta naseparação convencional; eisque, na separação legal, haverácomunicação dos bens havidospelo esforço comum,entendimento ao qual se filia.

Apesar da adesão à segunda

Page 1719: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

corrente, que tende a prevalecertambém na jurisprudência, deveser repisado que esse é um dostemas mais divergentes no Direitode Família contemporâneonacional. O Novo CPC manteve acontrovérsia, pois continua autilizar a expressão separaçãoabsoluta. Se tivesse mencionadaapenas a separação convencionalnos comandos transcritos, odebate talvez houvesse diminuídoou se encerrado. Perdeu-se,assim, uma chance de pacificaçãode grande controvérsia.

Problema que se manteve, naconfrontação entre o art. 1.647 do

Page 1720: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

Código Civil e o que consta doEstatuto Processual, é que oinciso II do comando materialcontinua a exigir a outorgaconjugal para que a parte possapleitear, como autor ou réu,acerca de bens imóveis oudireitos sobre eles. A regra éprocessual, envolvendolegitimidade ou capacidadeespecífica para a demanda (art. 3ºdo CPC/1973 e art. 17 doCPC/2015). Dessa forma,interpretando-se o art. 1.649 doCC/2002, a melhor conclusão é ade que a falta da outorga conjugalgeraria a anulabilidade da

Page 1721: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

demanda, o que pode ser suprido,conforme o art. 1.648 do CódigoCivil. Para que não pairequalquer dúvida, vejamos aredação desses dois preceitosmateriais:

“Art. 1.648. Cabe ao juiz, nos casos do artigoantecedente, suprir a outorga, quando um doscônjuges a denegue sem motivo justo, ou lheseja impossível concedê-la”.“Art. 1.649. A falta de autorização, nãosuprida pelo juiz, quando necessária (art.1.647), tornará anulável o ato praticado,podendo o outro cônjuge pleitear-lhe aanulação, até dois anos depois de terminada asociedade conjugal.Parágrafo único. A aprovação torna válido oato, desde que feita por instrumento público,ou particular, autenticado”.

Page 1722: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

Todavia, como visto, o NovoCPC continua a estabelecer, nalinha do art. 11, parágrafo único,do CPC/1973, a consequência dainvalidade do processo (art. 74,parágrafo único, do CPC/2015).A dúvida que surge é a seguinte:essa nulidade processual seriarelativa, nos termos do CódigoCivil; ou absoluta, porinterpretação do Código deProcesso Civil? Entendendotratar-se de nulidade absoluta,por todos, as palavras de NelsonNery Jr. e Rosa Maria AndradeNery: “A presença singular docônjuge no polo ativo das ações

Page 1723: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

reais imobiliárias, sem aautorização conjugal, acarretaincapacidade processual, isto é,falta de pressuposto processual.O juiz deverá assinar prazorazoável ao autor para suprir afalha (CPC 13), sob pena dedeclarar nulo o processo eextingui-lo sem resolução domérito (CPC 267 IV)”.16 De todasorte, esclareça-se que, paraArruda Alvim, Araken de Assis eEduardo de Arruda Alvim, o casonão seria de nulidade absoluta,mas de mera extinção doprocesso sem resolução domérito, como pontuado pelos

Page 1724: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

últimos juristas.17 Constata-se,assim, divergência entre ospróprios processualistas, sobre asconsequências do respeito à regraexposta.

Para o presente autor, a leimaterial deve prevalecer, não porquestão temporal, mas por trazermais clareza à situação,expressando que o caso é deanulabilidade ou nulidaderelativa. Como se percebe, oNovo Código de Processo Civilcontinua a utilizar o termoinvalidade, sem deixar claro ograu de invalidade. Em reforço, aexigência da outorga visa à

Page 1725: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

proteção patrimonial do cônjuge,envolvendo interesse claramenteda parte e não da coletividade, agerar a existência de matéria deordem pública e a consequentenulidade absoluta do processo.

Nesse caminho, julgado doTribunal de Justiça de MinasGerais entendeu que a nulidadeem comento é plenamente sanávelno curso do processo, o que traz aconfirmação de que se trata denulidade relativa, e não absoluta:“Nos termos do art. 1.647, II, doCódigo Civil, nenhum doscônjuges pode, sem a autorizaçãodo outro, pleitear, como autor ou

Page 1726: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

réu, acerca de bens imóveis, oque torna imprescindível na açãoreivindicatória de bem imóvel olitisconsórcio necessário doscônjuges. A posteriordeterminação da citação daesposa do réu na açãoreivindicatória não é causa denulidade processual, podendo amesma ser citada a qualquermomento, o que atende aosprincípios da economia e daceleridade processual, evitandonulidades” (TJMG, Agravo1.0024.07.385249-3/0011, BeloHorizonte, Primeira CâmaraCível, Rel. Des. Vanessa

Page 1727: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

Verdolim Hudson Andrade, j.19.02.2008, DJEMG11.03.2008). De todo modo, acontrovérsia parece mantida, emconfronto das duas codificações,material e processual.

Todavia, o impacto principala ser aqui estudado diz respeito àaplicação da regra do art. 73 doNovo Código de Processo Civilpara os casos de união estável,como é expresso no seu § 3º,desde que a relação deconvivência seja comprovada nosautos. No âmbito do DireitoCivil, existe grande polêmica,doutrinária e jurisprudencial,

Page 1728: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

quanto à incidência ou não do art.1.647 do Código Civil para ashipóteses de união estável,exigindo-se uma outorgaconvivencial para os atos alireferidos. De qualquer maneira, aoutorga do companheiro passa aser exigida nos casos do inciso IIdo art. 1.647, em diálogo com oNovo CPC. E nas situações dosdemais incisos do art. 1.647, quedizem respeito a atos puramentemateriais, caso da venda ououtras alienações de imóvel, dafiança e da doação de benscomuns? Haverá necessidade deoutorga convivencial em tais

Page 1729: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

hipóteses?Entre os civilistas, para uma

primeira corrente, o art. 1.647 doCódigo Civil aplica-se à uniãoestável, pelo fato de que o regimede bens, que é regra tanto docasamento quanto da uniãoestável, é o da comunhão parcialde bens (arts. 1.640 e 1.725 doCC/2002). Nesse sentido, ReginaBeatriz Tavares da Silva afirmaque “devem ser consideradas asregras constituídas pordisposições especiais (arts. 1.658a 1.666) e as disposições gerais(arts. 1.639 a 1.657), em que sedestaca a proibição de alienação

Page 1730: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

de bem imóvel sem oconsentimento do consorte, a nãoser que seja escolhido o regimeda separação absoluta (art.1.647), sob pena de anulação doato”.18 Esse entendimento écompartilhado por Paulo Lôbo, nasua obra Famílias.19 O SuperiorTribunal de Justiça assim jádecidiu anteriormente, conformese depreende da seguinte ementa:

“Processo civil. Execução fiscal. Penhora debem imóvel em condomínio. Exigência deconsentimento dos demais. 1. A lei civil exige,para alienação ou constituição de gravame dedireito real sobre bem comum, oconsentimento dos demais condôminos. 2. Anecessidade é de tal modo imperiosa, que tal

Page 1731: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

consentimento é, hoje, exigido dacompanheira ou convivente de união estável(art. 226, § 3º, da CF), nos termos da Lei9.278/1996. 3. Recurso especial improvido”(STJ, REsp 755.830/SP, Segunda Turma, Rel.Min. Eliana Calmon, j. 07.11.2006, DJ01.12.2006, p. 291).

Porém, o presente autorsegue uma segunda corrente, queresponde negativamente, ou seja,a outorga só pode ser exigida doscônjuges, e não doscompanheiros, pelo fato de ser oart. 1.647 do Código Civil umanorma restritiva de direitos quenão comporta interpretaçãoextensiva ou analogia. Por essalinha, a outorga somente é

Page 1732: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

imposta por expressa previsãolegal, o que não se verifica notocante à união estável, a não seragora, pela regra do art. 73 doCPC/2015, para o que consta doinciso II do art. 1.647 doCC/2002. Reafirme-se que essa éa melhor posição a ser adotada,mesmo existindo contrato deconvivência entre as partes,inclusive celebrado por escriturapública. Concluindo desse modo,da jurisprudência estadual:

“Apelação cível. Ação declaratória denulidade de ato jurídico. União estável nãodeclarada. Venda de bem imóvel a terceiro deboa-fé. Inexistência de hipóteses de

Page 1733: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

invalidade do negócio jurídico. Inexistência denulidade. 1 – Ainda que seja possívelvislumbrar pelas provas carreadas aexistência de união estável entre apelante eprimeiro apelado, a venda de bem imóvel aterceiro de boa-fé não é nula, tendo em vistaque a Lei não exige a outorga uxória dacompanheira. 2 – Não provadas nenhuma dashipóteses de invalidade do negócio jurídico,previstas nos arts. 166 e ss. do CC 2002, nãohá nulidades a serem declaradas” (TJMG,Apelação Cível 1.0284.07.006501-6/0011,Guarani, Nona Câmara Cível, Rel. Des.Pedro Bernardes, j. 17.02.2009, DJEMG16.03.2009).

“Ação declaratória de nulidade. Escriturapública de compra e venda. Imóvel. Sentençade improcedência. Negócio jurídico celebradopelo companheiro sem a anuência dacompanheira. Possibilidade. Outorga uxória.Desnecessidade. Exigência legal que não se

Page 1734: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

aplica à hipótese de união estável. (...)”(TJSP, Apelação com Revisão 396.100.4/6,Acórdão 2567068, Itararé, Segunda Câmarade Direito Privado, Rel. Des. AriovaldoSantini Teodoro, j. 15.04.2008, DJESP16.05.2008).

Esse posicionamento segue alinha de necessidade dediferenciação da união estável emrelação ao casamento. Adotandoessa premissa, e a não subsunçãodo art. 1.647 do Código Civil àunião estável, vejamos recentearesto do Superior Tribunal deJustiça, relativo à fiança, assimpublicado no seu Informativo n.535, do ano de 2014:

Page 1735: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

“Direito Civil. Inaplicabilidade da Súmula 332do STJ à união estável. Ainda que a uniãoestável esteja formalizada por meio deescritura pública, é válida a fiança prestadapor um dos conviventes sem a autorização dooutro. Isso porque o entendimento de que a‘fiança prestada sem autorização de um doscônjuges implica a ineficácia total da garantia’(Súmula 332 do STJ), conquanto sejaaplicável ao casamento, não temaplicabilidade em relação à união estável. Defato, o casamento representa, por um lado,uma entidade familiar protegida pela CF e,por outro lado, um ato jurídico formal e solenedo qual decorre uma relação jurídica comefeitos tipificados pelo ordenamento jurídico.A união estável, por sua vez, embora tambémrepresente uma entidade familiar amparadapela CF – uma vez que não há, sob o atualregime constitucional, famílias estigmatizadascomo de ‘segunda classe’ –, difere-se docasamento no tocante à concepção destecomo um ato jurídico formal e solene. Aliás,

Page 1736: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

nunca se afirmou a completa e inexorávelcoincidência entre os institutos da uniãoestável e do casamento, mas apenas ainexistência de predileção constitucional ou desuperioridade familiar do casamento emrelação a outra espécie de entidade familiar.Sendo assim, apenas o casamento (e não aunião estável) representa ato jurídicocartorário e solene que gera presunção depublicidade do estado civil dos contratantes,atributo que parece ser a forma de assegurara terceiros interessados ciência quanto aregime de bens, estatuto pessoal, patrimôniosucessório etc. Nesse contexto, como aoutorga uxória para a prestação de fiançademanda absoluta certeza por parte dosinteressados quanto à disciplina dos bensvigente, e como essa segurança só é obtidapor meio de ato solene e público (como nocaso do casamento), deve-se concluir que oentendimento presente na Súmula 332 do STJ– segundo a qual, a ‘fiança prestada semautorização de um dos cônjuges implica a

Page 1737: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

ineficácia total da garantia’ –, conquanto sejaaplicável ao casamento, não temaplicabilidade em relação à união estável.Além disso, essa conclusão não é afastadadiante da celebração de escritura públicaentre os consortes, haja vista que a escriturapública serve apenas como prova relativa deuma união fática, que não se sabe ao certoquando começa nem quando termina, nãosendo ela própria o ato constitutivo da uniãoestável. Ademais, por não alterar o estadocivil dos conviventes, para que dela ocontratante tivesse conhecimento, ele teriaque percorrer todos os cartórios de notas doBrasil, o que seria inviável e inexigível” (STJ,REsp 1.299.866/DF, Rel. Min. Luis FelipeSalomão, j. 25.02.2014).

Ao final de 2014, surgiuoutra forma de julgar, que pareceindicar uma terceira via,

Page 1738: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

respondendo depende para anecessidade da outorgaconvivencial. Conforme acórdãopublicado no Informativo n. 554do Tribunal de Cidadania, defevereiro de 2015, a invalidadeda venda de imóvel comum,fundada na ausência de outorgado companheiro, depende dapublicidade conferida à uniãoestável. E essa publicidade se dámediante a averbação de contratode convivência ou da decisãodeclaratória da existência deunião estável no Cartório deRegistro de Imóveis em quecadastrados os bens comuns, ou

Page 1739: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

da demonstração de má-fé doadquirente. Conforme se retira dapublicação do aresto, “ainterpretação dessas normas, ouseja, do art. 5º da Lei 9.278/1996e dos já referidos arts. 1.725 e1.647 do CC, fazendo-as alcançara união estável, não fosse pelasubsunção mesma, esteia-se,ainda, no fato de que a mesmaratio – que indisfarçavelmenteimbuiu o legislador a estabelecera outorga uxória e marital emrelação ao casamento – mostra-sepresente em relação à uniãoestável; ou seja, a proteção dafamília (com a qual, aliás,

Page 1740: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

compromete-se o Estado, sejalegal, seja constitucionalmente).Todavia, levando-se emconsideração os interesses deterceiros de boa-fé, bem como asegurança jurídica necessáriapara o fomento do comérciojurídico, os efeitos dainobservância da autorizaçãoconjugal em sede de união estáveldependerão, para a sua produção(ou seja, para a eventual anulaçãoda alienação do imóvel queintegra o patrimônio comum), daexistência de uma prévia e amplanotoriedade dessa união estável.No casamento, ante a sua peculiar

Page 1741: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

conformação registral, até mesmoporque dele decorre a automáticaalteração de estado de pessoa e,assim, dos documentos deidentificação dos indivíduos, éínsita essa ampla e irrestritapublicidade. Projetando-se talpublicidade à união estável, aanulação da alienação do imóveldependerá da averbação docontrato de convivência ou do atodecisório que declara a união noRegistro Imobiliário em queinscritos os imóveis adquiridosna constância da união” (STJ,REsp 1.424.275/MT, Rel. Min.Paulo de Tarso Sanseverino, j.

Page 1742: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

04.12.2014, DJe 16.12.2014).A este autor parece que, no

plano jurisprudencial, a segundacorrente exposta parece ser atendência da jurisprudênciasuperior. Contudo, não se negueque o Novo Código de ProcessoCivil tende a aprofundar o debatea respeito dessa problemática nospróximos anos, por mencionar anecessidade da outorga conjugalpara a hipótese que está previstano inciso II do art. 1.647 doCódigo Civil.

Para encerrar este capítulo,é interessante trazer algumaspalavras sobre a caracterização

Page 1743: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

da união estável, especialmentecom os fins de provas para aincidência de todos os comandosprocessuais aqui comentados,sem prejuízo de outros.

Analisando o seu conceito eseus elementos caracterizadores,repetindo o art. 1º da Lei9.278/1996, enuncia o art. 1.723,caput, do CC/2002, que éreconhecida como entidadefamiliar a união estável entre ohomem e a mulher, configurada naconvivência pública (no sentidode notória), contínua eduradoura e estabelecida com oobjetivo de constituição de

Page 1744: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

família (animus familiae). Nãose olvide que o conceito expostofoi construído a partir da doutrinade Álvaro Villaça Azevedo. Emtom didático, Pablo StolzeGagliano e Rodolfo PamplonaFilho apresentam elementoscaracterizadores essenciais eelementos caracterizadoresacidentais para a união estável.Entre os primeiros estão apublicidade, a continuidade, aestabilidade e o objetivo deconstituição de família. Comoelementos acidentais, destacam-se o tempo, a prole e acoabitação.20

Page 1745: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

Como se pode notar, asexpressões convivência pública,contínua, duradoura e objetivode constituição de família sãoabertas e genéricas, de acordocom o sistema adotado pela atualcodificação privada, demandandoanálise caso a caso. Isso deveocorrer igualmente no âmbitoprocessual, para a subsunção doscomandos expostos. Por isso,pode-se afirmar que há umaverdadeira cláusula geral naconstituição da união estável.

Em tom suplementar, sobre asua configuração, devem serobservados alguns aspectos.

Page 1746: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

Primeiramente, nota-se que a leinão exige prazo mínimo para asua constituição, devendo seranalisadas as circunstâncias docaso concreto (nesse sentido:TJSP, Apelação com Revisão570.520.5/4, Acórdão 3543935,São Paulo, Nona Câmara deDireito Público, Rel. Des.Rebouças de Carvalho, j.04.03.2009, DJESP 30.04.2009).Também, não há exigência deprole comum (TJMG, Acórdão1.0024.02.652700-2/001, BeloHorizonte, Primeira CâmaraCível, Rel. Des. EduardoGuimarães Andrade, j.

Page 1747: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

16.08.2005, DJMG 26.08.2005).Não se exige que os

companheiros ou conviventesvivam sob o mesmo teto, o queconsta da remota Súmula 382 doSupremo Tribunal Federal, quetrata do concubinato e que eraaplicada à união estável. Ajurisprudência atual continuaaplicando essa súmula para aunião estável (por todos: STJ,REsp 275.839/SP, TerceiraTurma, Rel. Min. Ari Pargendler,Rel. p/ Acórdão Min. NancyAndrighi, j. 02.10.2008, DJe23.10.2008).

Os impedimentos

Page 1748: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

matrimoniais previstos no art.1.521 do CC/2002 impedem acaracterização da união estável,havendo, na hipótese, concubinato(art. 1.727 do CC). Porém, oCC/2002 passou a admitir que apessoa casada, desde queseparada de fato oujudicialmente, constitua uniãoestável. Enuncia o art. 1.723, §1º, do CC que “A união estávelnão se constituirá se ocorrerem osimpedimentos do art. 1.521; nãose aplicando a incidência doinciso VI no caso de a pessoacasada se achar separada de fatoou judicialmente”. A norma

Page 1749: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

deveria ser atualizada paraincluir o separadoextrajudicialmente, nos termos daLei 11.441/2007. Todavia, dianteda entrada em vigor da EmendaConstitucional 66/2010, queretirou do sistema a separaçãojurídica, o panorama mudou. Paraos novos relacionamentos, nalinha seguida por este autor,apenas tem relevância a premissade que o separado de fato podeconstituir uma união estável. Amenção ao separadojudicialmente e a situação doseparado extrajudicialmente têmpertinência apenas para os

Page 1750: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

relacionamentos anteriores,existentes da vigência do CódigoCivil de 2002 até a Emenda doDivórcio (até 13.07.2010).Ilustrando, se alguém, separadojudicialmente ouextrajudicialmente, constituiu umaconvivência com outrem desde oano de 2008, tal relacionamentopode ser tido como união estável.

Pontue-se que podem serencontradas decisões aplicando anovidade do art. 1.723, § 1º, doCC/2002, especialmente quantoao separado de fato (cite-se:TJRS, Acórdão 70035099621,Santo Augusto, Oitava Câmara

Page 1751: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

Cível, Rel. Des. Claudir FidelisFaccenda, j. 10.06.2010, DJERS21.06.2010; TJMG, ApelaçãoCível 1.0003.01.001630-5/0011,Abre-campo, Primeira CâmaraCível, Rel. Des. EduardoGuimarães Andrade, j.09.02.2010, DJEMG 12.03.2010;TJSP, Apelação 994.07.013946-0, Acórdão 4266183, Sorocaba,Primeira Câmara de DireitoPrivado, Rel. Des. Paulo EduardoRazuk, j. 15.12.2009, DJESP08.03.2010). Constata-se,portanto, que se trata de normaque somente concretiza algo queexiste socialmente, como bem

Page 1752: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

observado por Álvaro VillaçaAzevedo em suas aulas epalestras.

Ainda no que concerne àcaracterização da união estável,determina o art. 1.723, § 2º, doCC/2002 que as causassuspensivas do casamento do art.1.523 da própria codificaçãomaterial não impedem aexistência da união estável. Comodecorrência lógica dessapremissa legal, as causassuspensivas do casamento nãoimpõem o regime da separaçãoobrigatória de bens à uniãoestável, na corrente seguida por

Page 1753: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

este autor, na mesma linha do quefoi exposto quanto ao art. 1.647da norma material.

Ora, como o art. 1.641 doCC/2002 é norma restritiva daliberdade e da autonomiaprivada, não admite analogia paraa união estável, aplicando-seapenas ao casamento. Essa pareceser a melhor conclusão, na esteirada mais abalizada doutrina.21

Todavia, cabe ressaltar que ajurisprudência do SuperiorTribunal de Justiça tem entendidopela aplicação do art. 1.641 doCC à união estável diante dasuposta equiparação da união

Page 1754: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

estável ao casamento (por todos:STJ, REsp 1.090.722, TerceiraTurma, Rel. Min. Massami Ueda,j. 02.03.2010; e REsp646.259/RS, Quarta Turma, Rel.Min. Luis Felipe Salomão, j.22.06.2010). Eis aqui outradivergência existente quanto àmatéria.

Como ficou claro, não sepode confundir a união estávelcom o concubinato. Em relaçãoao último, dispõe o art. 1.727 doCC/2002 que as relações nãoeventuais existentes entre ohomem e a mulher impedidos decasar constituem concubinato. As

Page 1755: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

diferenças entre os institutosconstam da tabela a seguir, queresume o tema:

União estável

Concubinato

Constitui umaentidade familiar(art. 226, § 3º, daCF/1988).

Não constituientidadefamiliar, masuma merasociedade defato.

Pode ser

Será constituídaentre pessoas

Page 1756: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

constituída porpessoas solteiras,viúvas, divorciadasou separadas defato, judicialmenteeextrajudicialmente.

casadas nãoseparadas, ouhavendoimpedimentomatrimonialdecorrente deparentesco oucrime.

As partes sãodenominadas companheiros ouconviventes.

As partes sãochamadas de concubinos

Não há direito àmeaçãopatrimonial,direito aalimentos ou

Page 1757: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

Há direito àmeação patrimonial(art. 1.725), direitoa alimentos (art.1.694) e direitossucessórios (art.1.790 do CC).

direitosucessório. Naquestãopatrimonial,aplica-se aantiga Súmula380 do STF, queconsagra direitoà participaçãopatrimonial emrelação aos bensadquiridos peloesforço comum.A jurisprudênciatambém tinha ocostume deindenizar aconcubina pelosserviçosdomésticosprestados.Porém, atendência é

Page 1758: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

afastar taldireito,conformejulgadopublicado no Informativo421 do STJ, defevereiro de2010.

Cabe eventual ação dereconhecimento edissolução daunião estável, quecorre na Vara daFamília. Não sepode denominar ademanda como dedissolução de uma

Cabe ação dereconhecimentoe dissolução desociedade defato, que correna Vara Cível.

Page 1759: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

sociedade de fato,erro comum naprática.

Interessante anotar que, nopassado, a expressãoconcubinato também era utilizadapara denotar a existência de umaunião estável. Álvaro VillaçaAzevedo utilizava o termoconcubinato puro. Entretanto, nopresente, não se recomenda maiso uso dessa expressão para aentidade familiar, sendo certo quea companheira ou conviventenão se confunde com aconcubina. Sugere-se, portanto, a

Page 1760: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

utilização das diferenças queconstam da tabela comparativaantes exposta.

O exemplo típico deconcubinato envolve a amante dehomem casado ou o amante demulher casada, nas hipóteses emque os cônjuges não sãoseparados, pelo menos de fato.Em casos tais, pela literalidadeda norma, não há que sereconhecer a existência de umaentidade familiar.

Todavia, parte da doutrinacontemporânea quer elevar àcondição de companheira aconcubina. É o caso de Maria

Page 1761: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

Berenice Dias, que leciona: “Apalavra concubinato carregaconsigo o estigma derelacionamento alvo dopreconceito. Historicamente,sempre traduziu relação escusa epecaminosa, quase umadepreciação moral. Pela primeiravez, este vocábulo consta de umtexto legislativo (CC 1727), coma preocupação de diferenciar oconcubinato da união estável.Mas não é feliz. Certamente, aintenção era estabelecer umadistinção entre união estável efamília paralela, chamadadoutrinariamente de concubinato

Page 1762: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

adulterino, mas para isso faltoucoragem ao legislador. A normarestou incoerente e contraditória.Simplesmente, parece dizer – masnão diz – que as relaçõesparalelas não constituem uniãoestável. Pelo jeito, a pretensão édeixar as uniões ‘espúrias’ forade qualquer reconhecimento edescoberta de direitos. Não éfeita qualquer remissão ao direitodas obrigações, para que sejafeita analogia com as sociedadesde fato. Nitidamente punitiva apostura da lei, pois condena àindivisibilidade e nega proteçãojurídicas às relações que

Page 1763: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

desaprova, sem atentar que talexclusão pode gerar severasinjustiças, dando margem aoenriquecimento ilícito de um dosparceiros”.22

Em sentido próximo, PabloStolze e Rodolfo Pamplona Filhoigualmente expõem a tendência dese reconhecer direitos ao amante,equiparando-se o concubinato àunião estável, em algumashipóteses.23 O capítulo XX daobra conjunta escrita pelosdoutrinadores é intituladaConcubinato e direitos da(o)amante.

Page 1764: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

Na jurisprudência, podemser encontradas decisões quedeterminam a divisão igualitáriade bens entre a esposa e aconcubina, tratada comocompanheira. As principaisementas são do Tribunal do RioGrande do Sul, onde a últimadoutrinadora citada atuava comoDesembargadora. A primeiradecisão transcrita é interessante,por utilizar o termo triação,expressando a divisão igualitáriados bens entre a esposa e aconcubina:

“Apelação. União estável concomitante aocasamento. Possibilidade. Divisão de bem.

Page 1765: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

‘Triação’. Viável o reconhecimento de uniãoestável paralela ao casamento. Precedentesjurisprudenciais. Caso em que a prova dosautos é robusta em demonstrar que a apelantemanteve união estável com o falecido, mesmoantes de ele se separar de fato da esposa.Necessidade de dividir o único bem adquiridono período em que o casamento foiconcomitante à união estável em três partes.‘Triação’. Precedentes jurisprudenciais.Deram provimento, por maioria” (TJRS,Acórdão 70024804015, Guaíba, OitavaCâmara Cível, Rel. Des. Rui Portanova, j.13.08.2009, DJERS 04.09.2009, p. 49).

“Apelação cível. União estável.Relacionamento paralelo ao casamento. Semesmo não estando separado de fato daesposa, vivia o falecido em união estável coma autora/companheira, entidade familiarperfeitamente caracterizada nos autos, deveser reconhecida a sua existência, paralela ao

Page 1766: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

casamento, com a consequente partilha debens. Precedentes. Apelação parcialmenteprovida, por maioria” (TJRS, Acórdão70021968433, Canoas, Oitava Câmara Cível,Rel. Des. José Ataídes Siqueira Trindade, j.06.12.2007, DOERS 07.01.2008, p. 35).

“Apelação. União dúplice. União estável.Possibilidade. A prova dos autos é robusta efirme a demonstrar a existência de uniãoentre a autora e o de cujus em períodoconcomitante ao casamento de ‘papel’.Reconhecimento de união dúplice.Precedentes jurisprudenciais. Os bensadquiridos na constância da união dúplice sãopartilhados entre a esposa, a companheira e ode cujus. Meação que se transmuda em‘triação’, pela duplicidade de uniões. Deramprovimento, por maioria, vencido o Des.Relator” (TJRS, Apelação Cível70019387455, Oitava Câmara Cível, Rel. RuiPortanova, j. 24.05.2007).

Page 1767: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

Em 2014, gerou muitapolêmica julgado do Tribunal deJustiça do Maranhão. O decisiumreconheceu a simultaneidadefamiliar em hipótese de homemcasado que tinha uma concubina,tratada como companheira, paraos fins sucessórios. Vejamos aementa desse julgamento, que citaa qualificada doutrina de GiseldaMaria Fernandes NovaesHironaka:

“Direito de Família. Apelação cível. Açãodeclaratória de união estável post-mortem.Casamento e união estável simultâneos.Reconhecimento. Possibilidade. Provimento.1. Ainda que de forma incipiente, doutrina e

Page 1768: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

jurisprudência vêm reconhecendo ajuridicidade das chamadas famílias paralelas,como aquelas que se formamconcomitantemente ao casamento ou à uniãoestável. 2. A força dos fatos surge comosituações novas que reclamam acolhidajurídica para não ficarem no limbo daexclusão. Dentre esses casos, estãoexatamente as famílias paralelas, que vicejamao lado das famílias matrimonializadas. 3.Para a familiarista Giselda Hironaka, a famíliaparalela não é uma família inventada, nem éfamília imoral, amoral ou aética, nem ilícita. Econtinua, com esta lição: ‘Na verdade, sãofamílias estigmatizadas, socialmente falando.O segundo núcleo ainda hoje é concebidocomo estritamente adulterino, e, por isso, decerta forma perigoso, moralmente reprovávele até maligno. A concepção é generalizada ecada caso não é considerado por si só, comsuas peculiaridades próprias. É como se todasas situações de simultaneidade fossem iguais,malignas e inseridas num único e exclusivo

Page 1769: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

contexto. O triângulo amoroso sub-reptício,demolidor do relacionamento número um,sólido e perfeito, é o quadro que sempre estáà frente do pensamento geral, quando serefere a famílias paralelas. O preconceito,ainda que amenizado nos dias atuais, semdúvida, ainda existe na roda social, o quetambém dificulta o seu reconhecimento naroda judicial’. 4. Havendo nos autoselementos suficientes ao reconhecimento daexistência de união estável entre a apelante eo de cujus, o caso é de procedência dopedido formulado em ação declaratória. 5.Apelação cível provida” (TJMA, Recurso19.048/2013, Acórdão 149918/2014, TerceiraCâmara Cível, Rel. Des. Jamil de MirandaGedeon Neto, j. 10.07.2014, DJEMA17.07.2014).

De fato, pela literalidade danorma, não há que se reconhecer

Page 1770: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

o paralelismo entre casamento eunião estável. Porém, a questãonão é tão simples, merecendoduas pontuações. Uma primeirapontuação que deve ser feita éque, se a união paralela durarmuitos anos, sendo deconhecimento do outro cônjuge,parece forçoso concluir que oúltimo aceita o relacionamentoparalelo. Sendo assim, pode ofato merecer um outro tratamento,principalmente quanto à divisãode bens, já que há aceitação daunião, até por certo comodismo.

A segunda pontuação quefazemos é que o cônjuge casado

Page 1771: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

pode estar separado de fato daesposa, mesmo com ela residindosob o mesmo teto. A separação defato pode estar configurada pelaquebra do afeto e da comunhãoplena de vida descrita pelo art.1.511 do CC/2002. Ilustrando, aquebra pode ser provada pelacessação das relações sexuais epelo desaparecimento dotratamento das partes como secasados fossem. Pode-se afirmarque, em casos tais, o casamentosomente existe na aparência, enão na essência. Essa conclusãoabre a possibilidade de oconcubino ser elevado à condição

Page 1772: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

de companheiro, eis que ocônjuge casado de fato podeconstituir união estável.24

Destaque-se que o tema doparalelismo entre o casamento e oconcubinato foi tratado peloSupremo Tribunal Federal emquestão envolvendo o DireitoPrevidenciário. Um homemmantinha dois relacionamentos –um casamento e um concubinato–, e ambas as mulherespleiteavam o benefícioprevidenciário com o seufalecimento. Em situação bempeculiar, o de cujus não eraseparado de fato da esposa, tendo

Page 1773: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

com ela 11 filhos. Com aconcubina manteverelacionamento paralelo por 37anos com a qual teve 9 filhos. Aconclusão da relatoria e damaioria dos Ministros foi pelaexistência de um concubinato, enão de uma união estável,devendo o benefícioprevidenciário ser atribuídounicamente à esposa (STF, RE397.762-8/BA, Rel. Min. MarcoAurélio, j. 03.06.2008). Todavia,o Ministro Carlos Ayres Brittovotou de forma divergente,concluindo que a concubinadeveria ser tratada como

Page 1774: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

companheira. Merece destaque oseguinte trecho do seu voto:

“Com efeito, à luz do Direito Constitucionalbrasileiro o que importa é a formação em side um novo e duradouro núcleo doméstico. Aconcreta disposição do casal para construirum lar com um subjetivo ânimo depermanência que o tempo objetivamenteconfirma. Isto é família, pouco importando seum dos parceiros mantém uma concomitanterelação sentimental a dois. No que andoubem a nossa Lei Maior, ajuízo, pois ao Direitonão é dado sentir ciúmes pela partesupostamente traída, sabido que esse órgãochamado coração ‘é terra que ninguémnunca pisou’. Ele, coração humano, a seintegrar num contexto empírico da maisentranhada privacidade, perante a qual oOrdenamento Jurídico somente pode atuarcomo instância protetiva. Não censora ou por

Page 1775: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

qualquer modo embaraçante (...) 17. No casodos presentes autos, o acórdão de que serecorre tem lastro factual comprobatório daestabilidade da relação de companheirismoque mantinha a parte recorrida com o decujus, então segurado da previdência social.Relação amorosa de que resultou filiação eque fez da companheira uma dependenteeconômica do seu então parceiro, de modo aatrair para a resolução deste litígio o § 3º doart. 226 da Constituição Federal. Pelo que,também desconsiderando a relação decasamento civil que o então seguradomantinha com outra mulher, perfilho oentendimento da Corte Estadual paradesprover, como efetivamente desprovejo, oexcepcional apelo. O que faço com as vêniasde estilo ao relator do feito, Ministro MarcoAurélio”.

De fato, o Ministro AyresBritto, na situação descrita,

Page 1776: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

parece ter razão. Certamente aesposa sabia do relacionamentoparalelo, aceitando-o por anos afio. Destarte, deve do mesmomodo aceitar a partilha dosdireitos com a concubina, quedeve ser tratada comocompanheira. Pode até serinvocada a aplicação doprincípio da boa-fé objetiva aoDireito de Família, notadamenteda máxima que veda ocomportamento contraditório(venire contra factum propriumnon potest).

Outro problema relativo àconvivência envolve as uniões

Page 1777: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

estáveis plúrimas ou paralelas,presente quando alguém vivevários relacionamentos quepodem ser considerados uniõesestáveis ao mesmo tempo. A títulode exemplo, imagine-se ahipótese de um homem solteiroque tem quatro companheiras, emquatro cidades distintas nointerior do Brasil, sem que umasaiba da existência da outra.Como resolver a questão? Trêscorrentes doutrinárias podem serencontradas a respeito dasituação descrita.

Uma primeira vertenteafirma que nenhum

Page 1778: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

relacionamento constitui uniãoestável, eis que a união deve serexclusiva, aplicando-se oprincípio da monogamia. Essavertente é encabeçada por MariaHelena Diniz.25 Para essa formade pensar, todos osrelacionamentos descritos devemser tratados como concubinatos.

Para uma segunda corrente,o primeiro relacionamentoexistente deve ser tratado comounião estável, enquanto que osdemais devem ser reconhecidoscomo uniões estáveis putativas,havendo boa-fé do convivente.Em suma, aplica-se, por analogia,

Page 1779: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

o art. 1.561 do CC, que trata docasamento putativo. Essa posiçãoé liderada por Euclides deOliveira26 e Rolf Madaleno27;sendo seguida por este autor,inclusive em obra anterior, escritacom José Fernando Simão.28

Anote-se que essa solução já foidada pela jurisprudênciaestadual, em pelo menos doisjulgados (TJRJ, Acórdão15225/2005, Rio de Janeiro,Segunda Câmara Cível, Rel. Des.Leila Maria Carrilo CavalcanteRibeiro Mariano, j. 10.08.2005; eTJRS, Processo 70008648768,02.06.2004, Lajeado, Sétima

Page 1780: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

Câmara Cível, Rel. Juiz JoséCarlos Teixeira Giorgis).

Por derradeiro, há umaterceira corrente que entendeserem uniões estáveis todos osrelacionamentos, diante davalorização do afeto que deveguiar o Direito de Família;corrente encabeçada por MariaBerenice Dias.29

Das três correntes, noâmbito da jurisprudênciasuperior, o Superior Tribunal deJustiça tem aplicado a primeira,repudiando a ideia de uniõesplúrimas ou paralelas (REsp

Page 1781: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

789.293/RJ, Terceira Turma, Rel.Min. Carlos Alberto MenezesDireito, j. 16.02.2006, DJ20.03.2006, p. 271). Os julgadosaplicam o princípio damonogamia à união estável, tesecom a qual não se filia, pois asentidades familiares não sãototalmente semelhantes. Nota-seque o convivente de má-fé, queestabelece o paralelismo, acabasendo beneficiado, já que não teráobrigações alimentares, pelaausência de vínculo familiar.Confirmando aquele julgadoanterior, transcreve-se recentedecisão publicada no Informativo

Page 1782: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

n. 435 do STJ:

“Família. Uniões estáveis simultâneas.Pensão. In casu, o de cujus foi casado coma recorrida e, ao separar-se consensualmentedela, iniciou um relacionamento afetivo com arecorrente, o qual durou de 1994 até o óbitodele em 2003. Sucede que, com a decretaçãodo divórcio em 1999, a recorrida e o falecidovoltaram a se relacionar, e esse novorelacionamento também durou até sua morte.Diante disso, as duas buscaram, medianteação judicial, o reconhecimento de uniãoestável, consequentemente, o direito à pensãodo falecido. O juiz de primeiro grau,entendendo haver elementos inconfundíveiscaracterizadores de união estável existenteentre o de cujus e as demandantes, julgouambos os pedidos procedentes, reconhecendoas uniões estáveis simultâneas e, porconseguinte, determinou o pagamento dapensão em favor de ambas, na proporção de

Page 1783: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

50% para cada uma. Na apelação interpostapela ora recorrente, a sentença foi mantida.Assim, a questão está em saber, sob aperspectiva do Direito de Família, se háviabilidade jurídica a amparar oreconhecimento de uniões estáveissimultâneas. Nesta instância especial, aoapreciar o REsp, inicialmente se observou quea análise dos requisitos ínsitos à união estáveldeve centrar-se na conjunção de fatorespresentes em cada hipótese, como a affectiosocietatis familiar, a participação de esforços,a posse do estado de casado, a continuidadeda união, a fidelidade, entre outros. Dessemodo, entendeu-se que, no caso, a despeitodo reconhecimento, na dicção do acórdãorecorrido, da união estável entre o falecido esua ex-mulher em concomitância com uniãoestável preexistente por ele mantida com arecorrente, é certo que o casamento válidoentre os ex-cônjuges já fora dissolvido pelodivórcio nos termos do art. 1.571, § 1º, do

Page 1784: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

CC/2002, rompendo-se, definitivamente, oslaços matrimoniais outrora existentes.Destarte, a continuidade da relação sob aroupagem de união estável não se enquadranos moldes da norma civil vigente (art. 1.724do CC/2002), porquanto esse relacionamentoencontra obstáculo intransponível no dever delealdade a ser observado entre oscompanheiros. Ressaltou-se que umasociedade que apresenta como elementoestrutural a monogamia não pode atenuar odever de fidelidade, que integra o conceito delealdade, para o fim de inserir, no âmbito doDireito de Família, relações afetivas paralelase, por consequência, desleais, sem descurardo fato de que o núcleo familiarcontemporâneo tem como escopo arealização de seus integrantes, vale dizer, abusca da felicidade. Assinalou-se que, naespécie, a relação mantida entre o falecido ea recorrida (ex-esposa), despida dosrequisitos caracterizadores da união estável,poderá ser reconhecida como sociedade de

Page 1785: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

fato, caso deduzido pedido em processodiverso, para que o Poder Judiciário não deiteem solo infértil relacionamentos queefetivamente existem no cenário dinâmico efluido dessa nossa atual sociedade volátil.Assentou-se, também, que ignorar osdesdobramentos familiares em suas infinitasincursões, em que núcleos afetivosjustapõem-se, em relações paralelas,concomitantes e simultâneas, seria o mesmoque deixar de julgar com base na ausência delei específica. Dessa forma, na hipótese deeventual interesse na partilha de bensdeixados pelo falecido, deverá a recorridafazer prova, em processo diverso, repita-se,de eventual esforço comum. Com essasconsiderações, entre outras, a Turma deuprovimento ao recurso, para declarar oreconhecimento da união estável mantidaentre o falecido e a recorrente e determinar,por conseguinte, o pagamento da pensão pormorte em favor unicamente dela,companheira do falecido” (STJ, REsp

Page 1786: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

1.157.273/RN, Rel. Min. Nancy Andrighi, j.18.05.2010).

Todas essas questões devemser necessariamente enfrentadaspara a análise do termocompanheiro, que passa acompor vários preceitosprocessuais. Sendo assim,acreditamos que todos os pontosaqui expostos tendem a ter odebate ampliado na emergênciado Novo Código de ProcessoCivil.

Por derradeiro, não se podeesquecer que a união estávelhomoafetiva foi equiparada à

Page 1787: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

heteroafetiva, para todos os fins,por decisão do Supremo TribunalFederal de março de 2011.Conforme consta da ementa finaldo julgamento, publicado noInformativo n. 625 daquelaCorte, “após mencionar que afamília deveria servir de norteinterpretativo para as figurasjurídicas do casamento civil, daunião estável, do planejamentofamiliar e da adoção, o relatorregistrou que a diretriz daformação dessa instituição seria onão atrelamento a casaisheteroafetivos ou a qualquerformalidade cartorária,

Page 1788: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

celebração civil ou liturgiareligiosa. Realçou que famíliaseria, por natureza ou no planodos fatos, vocacionalmenteamorosa, parental e protetora dosrespectivos membros,constituindo-se no espaço idealdas mais duradouras, afetivas,solidárias ou espiritualizadasrelações humanas de índoleprivada, o que a credenciariacomo base da sociedade(CF/1988, art. 226, caput). Dessemodo, anotou que se deveriaextrair do sistema a proposiçãode que a isonomia entre casaisheteroafetivos e pares

Page 1789: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

homoafetivos somente ganhariaplenitude de sentido sedesembocasse no igual direitosubjetivo à formação de umaautonomizada família, constituída,em regra, com as mesmas notasfactuais da visibilidade,continuidade e durabilidade(CF/1988, art. 226, § 3º: ‘Paraefeito da proteção do Estado, éreconhecida a união estável entreo homem e a mulher comoentidade familiar, devendo a leifacilitar sua conversão emcasamento’). Mencionou, ainda,as espécies de famíliaconstitucionalmente previstas

Page 1790: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

(art. 226, §§ 1º a 4º), a saber, aconstituída pelo casamento e pelaunião estável, bem como amonoparental. Arrematou que asolução apresentada dariaconcreção aos princípios dadignidade da pessoa humana, daigualdade, da liberdade, daproteção das minorias, da nãodiscriminação e outros (...)”(STF, ADI 4.277/DF e ADPF132/RJ, Rel. Min. Ayres Britto, j.04 e 05.05.2011).

Nessa esteira, o conviventehomoafetivo também tem todos osatributos processuais expressosno Código de Processo Civil de

Page 1791: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

2015, observados os requisitoscaracterizadores da união estável,retirados do art. 1.723 do CódigoCivil Brasileiro de 2002.

Page 1792: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

__________1 Essa alteração legislativa já eradefendida por: DIDIER JR., Fredie. AParticipação das Pessoas Casadas noProcesso. In: MAZZEI, Rodrigo Reis(coord.). Questões Processuais noNovo Código Civil. São Paulo:Manole, 2006. p. 460-462.2 RODRIGUES, Silvio. Direito Civil.Direito de Família. 28. ed. 3. tir. SãoPaulo: Saraiva, 2004. v. 6, p. 169-173.3 CAHALI, Francisco José. A Súmula377 e o Novo Código Civil e aMutabilidade do Regime de Bens.Revista do Advogado. Homenagemao Professor Silvio Rodrigues. SãoPaulo, Associação dos Advogados deSão Paulo, ano XXIV, n. 76, jun. 2004.4 TARTUCE, Flávio; SIMÃO, José

Page 1793: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

Fernando. Direito Civil. Direito deFamília. 4. ed. São Paulo: Método,2010. v. 5, p. 169-173.5 NERY JR., Nelson; NERY, RosaMaria de Andrade. Código CivilAnotado. 2. ed. São Paulo: RT, 2003.p. 737.6 VELOSO, Zeno. DireitoHereditário do Cônjuge e doCompanheiro. São Paulo: Saraiva,2010. p. 55.7 BRITO, Rodrigo Toscano de.Compromisso de Compra e Venda e asRegras de Equilíbrio Contratual doCC/2002. In: DINIZ, Maria Helena(coord.). Atualidades Jurídicas. SãoPaulo: Saraiva, n. 5, 2004.8 LÔBO, Paulo Luiz Netto. Famílias.São Paulo: Saraiva, 2008. p. 300.

Page 1794: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

9 DIAS, Maria Berenice. Manual deDireito das Famílias. 5. ed. SãoPaulo: RT, 2009. p. 205.10 DINIZ, Maria Helena. CódigoCivil Anotado. 15. ed. São Paulo:Saraiva, 2010. p. 1.169.11 VENOSA, Sílvio de Salvo. CódigoCivil Interpretado. São Paulo: Atlas,2010. p. 1.511-1.512.12 LEITE, Eduardo de Oliveira.Direito Civil Aplicado. Direito deFamília. São Paulo: RT, 2005. v. 5, p.300.13 MADALENO, Rolf. Curso deDireito de Família. Rio de Janeiro:Forense, 2008. p. 46-47.14 FARIAS, Cristiano Chaves;ROSENVALD, Nelson. Direito dasFamílias. Rio de Janeiro: Lumen Juris,

Page 1795: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

2008. p. 221.15 GAGLIANO, Pablo Stolze;PAMPLONA FILHO, Rodolfo. NovoCurso de Direito Civil. Direito deFamília. São Paulo: Saraiva, 2011. v. 6,p. 316.16 NERY JR., Nelson; NERY, RosaMaria de Andrade. Código deProcesso Civil Comentado. 10. ed.São Paulo: RT, 2008. p. 201.17 ALVIM, Arruda; ASSIS, Arakende; ALVIM, Eduardo de Arruda.Comentários ao Código de ProcessoCivil. 3. ed. São Paulo: RT, 2014. p.95.18 SILVA, Regina Beatriz Tavares da.Comentário ao Art. 1.567 do CódigoCivil de 2002. In: FIUZA, Ricardo.Novo Código Civil Comentado. 3.

Page 1796: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

ed. São Paulo: Saraiva, 2004. p. 1.427.19 LÔBO, Paulo. Famílias. SãoPaulo: Saraiva, 2008.20 GAGLIANO, Pablo Stolze;PAMPLONA FILHO, Rodolfo. NovoCurso de Direito Civil. Direito deFamília. São Paulo: Saraiva 2011. v. 6,p. 429-436.21 Concluindo desse modo, com totalrazão: VELOSO, Zeno. DireitoHereditário do Cônjuge e doCompanheiro. São Paulo: Saraiva,2010. p. 171; LÔBO, Paulo. Famílias.São Paulo: Saraiva, 2008. p. 161;SIMÃO, José Fernando. EfeitosPatrimoniais da União Estável. In:CHINELLATO, Silmara Juny deAbreu; SIMÃO, José Fernando;FUJITA, Jorge Shiguemitsu; ZUCCHI,

Page 1797: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

Maria Cristina. Direito de Família noNovo Milênio. Estudos emHomenagem ao Professor ÁlvaroVillaça Azevedo. São Paulo: Atlas,2010. p. 360; DIAS, Maria Berenice.Manual de Direito das Famílias. 5.ed. São Paulo: RT, 2009. p. 170.22 DIAS, Maria Berenice. Manual deDireito das Famílias. 5. ed. SãoPaulo: RT, 2009. p. 163.23 GAGLIANO, Pablo Stolze;PAMPLONA FILHO, Rodolfo. NovoCurso de Direito Civil. Direito deFamília. São Paulo: Saraiva, 2011. v. 6,p. 457-469.24 Conforme conclusão anterior,constante em artigo científico escritopor este autor: TARTUCE, Flávio.Separados pelo Casamento. UmEnsaio sobre o Concubinato, a

Page 1798: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

Separação de Fato e a União Estável.Revista Brasileira de Direito dasFamílias e Sucessões. Porto Alegre:Magister, n. 08, fev./mar. 2009, p. 58-67.25 DINIZ, Maria Helena. Curso deDireito Civil Brasileiro. Direito deFamília. 22. ed. São Paulo: Saraiva,2007. v. 5, p. 364-365.26 OLIVEIRA, Euclides de. UniãoEstável – Do Concubinato aoCasamento. 6. ed. São Paulo: Método,2003. p. 128.27 MADALENO, Rolf. A União(Ins)Estável. Relações Paralelas.Disponível em:<http://www.flaviotartuce.adv.br/secoes/artigosc/Rolf_uniaoestavel.docAcesso em: 21 jun. 2010.28 TARTUCE, Flávio; SIMÃO, José

Page 1799: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

Fernando. Direito Civil. Direito deFamília. 4. ed. São Paulo: Método,2010. v. 5, p. 286.29 DIAS, Maria Berenice. Manual deDireito das Famílias. 5. ed. SãoPaulo: RT, 2009. p. 165-166.

Page 1800: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

DOS ALIMENTOSFAMILIARES NO

NOVO CÓDIGO DEPROCESSO CIVIL

O Novo Tratamento daPrisão Civil

Page 1801: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

Desde a sua mais elementarexistência, o ser humano semprenecessitou ser alimentado paraque pudesse exercer suas funçõesvitais. A propósito, nas lições deÁlvaro Villaça Azevedo, apalavra alimento vem do latimalimentum, “que significasustento, alimento, manutenção,subsistência, do verbo alo, is, ui,itum, ere (alimentar, nutrir,desenvolver, aumentar, animar,fomentar, manter, sustentar,favorecer, tratar bem)”.1 Nessecontexto, os chamados alimentosfamiliares representam uma dasprincipais efetivações do

Page 1802: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

princípio da solidariedade nasrelações sociais, sendo essa aprópria concepção da categoriajurídica.

Esclareça-se que osalimentos também permeiamoutros ramos do Direito Privado,interessando a este estudo osalimentos que surgem do vínculofamiliar, a justificar a expressãosupradestacada. A título deexemplo de alimentos relativos àoutra seara privada, podem sercitados os alimentosreparatórios ou indenizatórios,devidos pelo responsável no casode falecimento de alguém por ato

Page 1803: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

ilícito, e pagos aos dependentesdo falecido. Conforme estabeleceo art. 948, inciso II, do CódigoCivil, nos casos de homicídio,além de outras indenizações, sãodevidos tais alimentos aosdependentes do morto, até olimite de vida provável da vítima,conforme a tabela de expectativade vida do IBGE. A exemplo doque ocorria no EstatutoProcessual anterior, o NovoCódigo de Processo Civilcontinua tratando dessa categoria,de acordo com a comparação aseguir exposta:

Page 1804: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

Novo

Código deProcesso

Civil

Código deProcesso

Civil Anterior.

“Art. 533.Quando aindenizaçãopor ato ilícitoincluirprestação dealimentos,caberá aoexecutado, arequerimentodo exequente,constituircapital cuja

“Art. 475-Q.Quando aindenização porato ilícito incluirprestação dealimentos, ojuiz, quanto aesta parte,poderá ordenarao devedorconstituição decapital, cujarenda assegure

Page 1805: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

rendaassegure opagamento dovalor mensalda pensão.

o pagamento dovalor mensal dapensão.(Incluído pelaLei nº 11.232,de 2005.)

§ 1º O capitala que serefere o caput,representadopor imóveis oupor direitosreais sobreimóveissuscetíveis dealienação,títulos dadívida públicaou aplicações

§ 1º Estecapital,representadopor imóveis,títulos da dívidapública ouaplicaçõesfinanceiras embanco oficial,

Page 1806: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

financeiras embanco oficial,seráinalienável eimpenhorávelenquantodurar aobrigação doexecutado,além deconstituir-seem patrimôniode afetação.

será inalienávele impenhorávelenquanto durara obrigação dodevedor.(Incluído pelaLei nº 11.232,de 2005.)

§ 2º O juizpoderásubstituir aconstituição

§ 2º O juizpoderásubstituir aconstituição docapital pelainclusão dobeneficiário da

Page 1807: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

do capital pelainclusão doexequente emfolha depagamento depessoa jurídicade notóriacapacidadeeconômica ou,arequerimentodo executado,por fiançabancária ougarantia real,em valor a serarbitrado deimediato pelojuiz.

prestação emfolha depagamento deentidade dedireito públicoou de empresade direitoprivado denotóriacapacidadeeconômica, ou,a requerimentodo devedor, porfiança bancáriaou garantia real,em valor a serarbitrado deimediato pelojuiz. (Incluídopela Lei nº11.232, de2005.)

Page 1808: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

§ 3º Sesobreviermodificaçãonas condiçõeseconômicas,poderá a parterequerer,conforme ascircunstâncias,redução ouaumento daprestação.

§ 3º Sesobreviermodificaçãonas condiçõeseconômicas,poderá a parterequerer,conforme ascircunstâncias,redução ouaumento daprestação.(Incluído pelaLei nº 11.232,de 2005.)

§ 4º A

§ 4º Osalimentos

Page 1809: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

prestaçãoalimentíciapoderá serfixadatomando porbase o saláriomínimo.

podem serfixadostomando porbase o saláriomínimo.(Incluído pelaLei nº 11.232,de 2005.)

§ 5º Finda aobrigação deprestaralimentos, ojuiz mandaráliberar ocapital, cessaro desconto emfolha oucancelar as

§ 5º Cessada aobrigação deprestaralimentos, o juizmandará liberaro capital, cessaro desconto emfolha oucancelar asgarantiasprestadas.

Page 1810: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

garantiasprestadas.”

(Incluído pelaLei nº 11.232,de 2005.)”

Constata-se que o NovoCPC acabou por consolidar o queestava na norma instrumentalanterior, especialmente com asmodificações engendradas pelareforma processual de 2005. Detoda sorte, destaque-se o novotratamento do capital de reserva,como patrimônio de afetação,para os devidos fins devinculação pagamento doquantum debeatur. Merecemaplausos também a manutenção da

Page 1811: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

viabilidade de pagamento dessesvalores em salários mínimos, semqualquer afronta ao que consta doart. 7º, inciso IV, da CF/1988,bem como a possibilidade demodificação ou extinção dopagamento se ocorrer a alteraçãodas circunstâncias.

Voltando aos alimentosfamiliares, como se extrai daclássica obra de ClóvisBeviláqua, estão eles fundadosem uma relação familial, masinteressam a toda a sociedade, oque justifica a existência denormas de ordem pública arespeito da matéria.2 Segundo

Page 1812: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

Caio Mário da Silva Pereira,aquele que não pode prover o seusustento pelo próprio trabalhonão pode ser deixado à própriasorte, sendo dever da sociedade“propiciar-lhe sobrevivênciaatravés de meios e órgãos estataisou entidades particulares”. Nessediapasão, para o mesmo jurista “odireito não descura o fato davinculação da pessoa ao seupróprio organismo familiar. Eimpõe, então, aos parentes donecessitado, ou pessoa a elaligada por um elo civil, o deverde proporcionar-lhe as condiçõesmínimas de sobrevivência, não

Page 1813: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

como favor ou generosidade, mascomo obrigação judicialmenteexigível”.3

Partindo para acategorização jurídica doinstituto, com base nosensinamentos de Orlando Gomese Maria Helena Diniz, osalimentos familiares podem serconceituados como as prestaçõesdevidas para a satisfação dasnecessidades pessoais daqueleque não pode provê-las pelotrabalho próprio.4 Aquele quepleiteia os alimentos édenominado alimentando oucredor, sendo o sujeito ativo da

Page 1814: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

relação obrigacional subjacente.Por outro lado, a parte que osdeve pagar é o alimentante oudevedor, o sujeito passivo damesma relação.

O pagamento dessesalimentos visa à pacificaçãosocial, estando amparado nosprincípios da dignidade dapessoa humana e da solidariedadefamiliar, ambos de índoleconstitucional, conformecomentado no início deste texto.Sendo assim, ainda no planoconceitual e em sentido amplo, osalimentos devem compreender asnecessidades vitais da pessoa,

Page 1815: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

cujo objetivo é a manutenção dasua dignidade: a alimentação, asaúde, a moradia, o vestuário, olazer, a educação, entre outros.Em breve síntese, os alimentosdevem ser concebidos dentro daideia de patrimônio mínimo, deacordo com a festejada teseconstruída pelo Professor LuizEdson Fachin.5

Diante dessa proteçãomáxima da pessoa humana,precursora da personalização doDireito Civil, e em umaperspectiva civil-constitucional, éforçoso concluir que o art. 6º daConstituição Federal de 1988

Page 1816: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

serve como uma luva parapreencher o conceitocontemporâneo de alimentosfamiliares. Esse dispositivo doTexto Maior traz como conteúdoos direitos sociais que devem seroferecidos pelo Estado, a saber: aeducação, a saúde, a alimentação,o trabalho, a moradia, o lazer, asegurança, a previdência social, aproteção à maternidade e àinfância, e a assistência aosdesamparados. Anote-se, poroportuno, que a menção àalimentação foi incluída pelaEmenda Constitucional 64, de 4de fevereiro de 2010, o que tem

Page 1817: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

relação direta com o tema aquiestudado.

Cabe destacar, conforme adoutrina contemporâneaconstitucionalista, que os direitossociais também devem ser tidoscomo direitos fundamentais, tendoaplicação imediata nas relaçõesprivadas, o que estáfundamentado no art. 5º, § 1º, damesma Constituição daRepública.6 A par dessasprojeções da Carta Fundamental,aplicando-se a tese da eficáciahorizontal dos direitosfundamentais, tais direitosexistem e devem ser respeitados

Page 1818: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

nas relações privadasparticulares, no sentido de que osalimentos estão muito maisamparados na solidariedadefamiliar do que na própriarelação de parentesco, casamentoou união estável.

Partindo para as suas fontes,no sentido de origem, opressuposto ou fundamento legalpara o dever de prestar alimentosnas relações familiares consta doart. 1.694, caput, do Código Civilde 2002, segundo o qual podemos parentes, os cônjuges oucompanheiros pedir uns aosoutros os alimentos de que

Page 1819: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

necessitem para viver de modocompatível com a sua condiçãosocial, inclusive para atender àsnecessidades de sua educação.Diante do amplo reconhecimentoda união homoafetiva e docasamento homoafetivo comoentidades familiares, deve serfirmada a premissa de que osalimentos também podem serpleiteados em taisrelacionamentos familiares, semqualquer distinção.

O conteúdo dos alimentosvisa, primeiramente, a manter oestado anterior (status quo), oque inclui, pelo sentido textual do

Page 1820: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

dispositivo, a educação. Todavia,deve-se ter em mente que opagamento dos alimentos deve seranalisado de acordo com ocontexto social, não se admitindoexageros na sua fixação.Confrontando o atual texto civilcom o dispositivo anterior (art.396 do CC/1916), a mudançaestrutural é imensa, pois a leianterior apenas previa que “deacordo com o prescrito nestecapítulo podem os parentes exigiruns dos outros os alimentos, deque necessitem para subsistir”.Como comparam JonesFigueirêdo Alves e Mário Luiz

Page 1821: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

Delgado, pelo atual art. 1.694 dacodificação de 2002, “a naturezajurídica dos alimentos assume,desse modo, maior nobrezaporque destina-se a verbaalimentícia assegurar todos osbens jurídicos aos quaisvinculou-se o beneficiário, sesobre cujo modo compatível deviver de acordo com a condiçãosocial adquirida reinam todas asnecessidades que ditam osalimentos requeridos”.7

A propósito da determinaçãodo seu conteúdo, em julgadoparadigmático, o SuperiorTribunal de Justiça analisou os

Page 1822: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

alimentos a partir dessaperspectiva social, merecendodestaque o seguinte trecho dadecisão da Ministra FátimaNancy Andrighi: “No que toca àgenérica disposição legal contidano art. 1.694, caput, do CC/2002,referente à compatibilidade dosalimentos prestados com acondição social do alimentado, éde todo inconcebível que ex-cônjuge, que pleiteie alimentos,exija-os com base no simplistacálculo aritmético que importe norateio proporcional da rendaintegral da desfeita família; istoporque a condição social deve

Page 1823: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

ser analisada à luz de padrõesmais amplos, emergindo,mediante inevitável correlaçãocom a divisão social em classes,critério que, conquantoimpreciso, ao menos aponte norteao julgador que deverá, a partirdesses valores e dasparticularidades de cadaprocesso, reconhecer ou não anecessidade dos alimentospleiteados e, se for o caso,arbitrá-los. Por restar fixado peloTribunal Estadual, de formainduvidosa, que a alimentandanão apenas apresenta plenascondições de inserção no

Page 1824: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

mercado de trabalho comotambém efetivamente exerceatividade laboral, e mais,caracterizada essa atividadecomo potencialmente apta amantê-la com o mesmo statussocial que anteriormente gozava,ou ainda alavancá-la a patamaressuperiores, deve ser julgadoprocedente o pedido deexoneração deduzido peloalimentante em sede dereconvenção e, por consequência,improcedente o pedido de revisãode alimentos formulado pelaentão alimentada” (STJ, REsp933.355/SP, Terceira Turma, Rel.

Page 1825: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

Min. Nancy Andrighi, j.25.03.2008, DJ 11.04.2008, p. 1).

Essa decisão inaugurou,naquele Tribunal Superior, aconclusão segundo a qual osalimentos entre os cônjuges têmcaráter excepcional, pois aqueleque tem condições laborais devebuscar o seu sustento pelo esforçopróprio. O caso ficou conhecidocomo o da psicóloga dos Jardins,sendo certo que uma ex-mulherrecebia pensão do ex-marido porlongos vintes anos, sendo oúltimo valor pago de R$ 6.000,00(seis mil reais). Insatisfeita comtal valor, ingressou ela em juízo

Page 1826: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

para pleitear o aumento daquantia, sustentando a falta decondições para manter o padrãode vida anterior com osrendimentos do seu trabalho.Almejava dobrar o valor dapensão alimentícia, sob aalegação de que não vinha maisaceitando convites para eventossociais, que teve de dispensar seucaseiro, que não mais trocava decarro com a frequência anterior eque não viajava para o exterioranualmente. Além da contestação,o ex-marido apresentoureconvenção, sob a premissa deque a ex-mulher tinha condições

Page 1827: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

de sustento próprio, notadamentepor suas atividades comopsicóloga em clínica própria ecomo professora universitária,bem como pela locação de doisimóveis de sua propriedade.

Após os trâmites no TribunalPaulista, a Corte Estadualaumentou o valor da pensão paraR$ 10.000,00 (dez mil reais),incidindo a ideia de manutençãodo padrão social. No entanto, deforma correta na opinio desteautor, a Ministra Nancy Andrighiacolheu o pleito de exoneraçãodo ex-marido, julgando que, “nãoexistindo nenhum tipo de dúvida

Page 1828: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

quanto à capacidade da recorridade prover, nos exatos termos doart. 1.695 do CC/2002, suaprópria mantença, impende,ainda, traçar consideraçõesrelativas ao teor do disposto noart. 1.694 do CC/2002, do qual seextrai que os alimentos prestadosdevem garantir modo de vida‘compatível com a sua condiçãosocial’. A genérica disposiçãolegal não pode ser entendidacomo parâmetro objetivo, mesmoporque seria virtualmenteimpossível o estabelecimento daexata condição socioeconômicaanterior, para posterior

Page 1829: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

reprodução por meio dealimentos prestados pelo ex-cônjuge devedor de alimentos. Oconceito deve ser interpretadocom temperança, fixando-se acondição social anterior dentrode patamares razoáveis, quepermitam acomodar as variaçõespróprias das escolhasprofissionais, dedicação aotrabalho, tempo de atividade entreoutras variáveis”. A votação foiunânime, na linha da justarelatoria.

Outras decisões do próprioSuperior Tribunal de Justiça e deTribunais Estaduais passaram a

Page 1830: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

seguir tal correto entendimento,consentâneo com a plena inserçãoda mulher no mercado de trabalhoe com o afastamento de alimentoscom caráter parasitário.

Voltando ao âmago do art.1.694 do atual Código Civil,percebe-se que os companheirostambém podem pleitear alimentosuns dos outros. Vale dizer, ainda,que a isonomia incide nessedireito, ou seja, a mulher podepleitear alimentos do marido evice-versa; a companheira podepleitear alimentos docompanheiro e vice-versa. Aprática demonstra que são raros

Page 1831: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

os casos em que o homem pleiteiaalimentos da mulher, apesar denão existir qualquer vedação degênero quanto a tal exigência. Porisso, pode-se dizer que osalimentos constituem umacategoria jurídica feminina, nacivilística no Direito de Famílianacional.

A exemplo da lei anterior, osalimentos devem ser fixadosdentro do binômio necessidadede quem os pleiteia xpossibilidade de quem os deveprestar, ou, nos termos da lei, “naproporção das necessidades doreclamante e dos recursos da

Page 1832: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

pessoa obrigada” (art. 1.694, §1º, do CC/2002). Em tomdidático e simplificado falaremosde forma continuada no binômionecessidade/possibilidade. Emrelação à possibilidade de quempaga os alimentos, esclareça-seque na VI Jornada de DireitoCivil, evento promovido peloConselho da Justiça Federal epelo Superior Tribunal deJustiça em 2011, foi aprovado oEnunciado n. 573, prescrevendoque, “Na apuração dapossibilidade do alimentante,observar-se-ão os sinaisexteriores de riqueza”. A título

Page 1833: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

de exemplo, cabe a prova deinformações colhidas em redessociais, conforme manifestaçõesfeitas pelo próprio devedor,demonstrando patrimôniorelevante. A premissa fixada noenunciado doutrinário emquestão é seguida por muitosarestos estaduais, queigualmente representam umaanálise social do instituto. Ailustrar:

“Processo civil. Agravo de instrumento.Alimentos provisórios. Fixação do quantumde acordo com o binômio necessidade epossibilidade. Inexistência de elementos quecomprovem a insuficiência de recursos. Sinais

Page 1834: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

exteriores de riqueza que autorizam amanutenção da verba alimentar. Dívida civilpretérita. Inaplicabilidade em sede deantecipação de tutela quando não existeobrigação ou acordo anterior para essepagamento. Liminar deferida parcialmente.Necessidade da análise das provas naapreciação do mérito da ação principal porparte do magistrado a quo. Quebra de sigilobancário e fiscal. Descabimento. Medida decaráter excepcional. Recurso a que se dáprovimento parcial. 1. A fixação dosalimentos provisórios deve seguir o binômioda necessidade do alimentado e possibilidadedo alimentante em arcar com os custosfinanceiros. 2. Inexistência de elementos quejustifiquem a incapacidade financeira, e sim apresença de sinais exteriores de riquezapermite a manutenção da verba alimentararbitrada. 3. A quitação do débito civilreferente a mensalidades escolares atrasadasnão deve ser concedida o seu pagamento em

Page 1835: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

sede de antecipação de tutela, em face danecessidade de uma análise de um maioracervo probatório, quando da apreciação domérito da ação principal, para apuração daresponsabilidade. 4. A quebra de sigilobancário e fiscal só deve ser concedida ejustificada quando imprescindível a lide, nãosendo o agravo de instrumento meio hábilpara tal pleito, por ser uma ferramenta decognição sumária e superficial. 5. Recurso aque se dá provimento parcial. Acórdão”.(TJPE, Agravo de Instrumento 0003727-65.2013.8.17.0000, Quinta Câmara Cível, Rel.Des. Agenor Ferreira de Lima, j. 09.07.2014,DJEPE 15.08.2014).

“Ação revisional de alimentos. Argumentosdo alimentante incompatíveis com oselementos dos autos. Sinais exteriores deriqueza. Declaração de retirada pro laboreque deve ser apreciada conjuntamente àsprovas dos autos. Parecer do Ministério

Page 1836: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

Público, pelo provimento do apelo da ré, oraacolhido. Recurso provido” (TJSP, Apelação0053484-59.2008.8.26.0224, Acórdão7527097, Guarulhos, Décima Câmara deDireito Privado, Rel. Des. Cesar Ciampolini, j.29.04.2014, DJESP 30.05.2014).

O binômio alimentar éconfirmado pelo art. 1.695 doCódigo Civil em vigor, que aduz:“são devidos os alimentos quandoquem os pretende não tem benssuficientes, nem pode prover,pelo seu trabalho, à própriamantença, e aquele, de quem sereclamam, pode fornecê-los, semdesfalque do necessário ao seusustento”. Deve-se compreender

Page 1837: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

que o dispositivo inclui domesmo modo aquele que podetrabalhar, mas não consegueemprego, conforme entendimentodoutrinário seguido por esteautor.8 Nesse contexto, a mulherque está fora do mercado detrabalho, enquanto busca a suarecolocação, terá direito aosalimentos por tempo razoável àsua volta ao mercado. Aqui, nãohá dúvidas de que está sendoaplicado o princípio da funçãosocial da família, analisando-seo núcleo familiar de acordo como meio que o cerca. Trata-se dacategoria dos alimentos

Page 1838: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

transitórios, que ainda seráabordada em tópico próprioneste trabalho.

O princípio daproporcionalidade ou darazoabilidade deve sempreincidir na fixação dessesalimentos, no sentido de que a suaquantificação não pode gerar oenriquecimento sem causadaquele que os pleiteia. Por outrolado, os alimentos devem servirpara a manutenção do patrimôniomínimo da pessoa humana, o seumínimo existencial. O aplicadordo direito deverá fazer a devidaponderação entre os valores e

Page 1839: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

princípios envolvidos parachegar ao quantum justo, o querepresenta, por vezes, um enormedesafio. De um lado, leva-se emconta a vedação doenriquecimento sem causa; dooutro, a dignidade humana, sendoesses os pesos fundamentais dabalança (balance). Vale lembrar,por oportuno, que a técnica deponderação foi expressamenteadotada pelo Novo CPC,conforme exposto no primeirocapítulo deste livro.

Em complemento, emsituações de dúvida, compreende-se que o último valor, de tutela da

Page 1840: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

pessoa humana, deve prevalecer.A título de exemplo, o Tribunalde Justiça do Rio Grande do Sulentendeu dessa maneira no caso aseguir:

“Ação de alimentos. Autor portador denecessidades especiais. Réu com grandeparte da renda comprometida, inclusive commais quatro filhos. Consorte que afere renda.Possibilidade de fixação de pensão compatívelcom a necessidade do demandante emdetrimento do demandado, frente à dignidadeda pessoa humana e em busca de umasociedade justa e igualitária. Mesmo diante deprova a embasar a pretensão do apelante-réuno tocante às suas possibilidades, diante docaso concreto em que a genitora estavaarcando sozinha com as despesas do filhomenor que necessita de atenção eatendimentos especiais, cuja renda estava

Page 1841: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

comprometida em 2/3 exclusivamente com otratamento do filho, é plausível que o réualcance valor equivalente à metade dasnecessidades do menor, sacrificando parte desua renda. No cotejo entre o sacrifício decertos gastos do autor (telefone, gasolina etc.)E das necessidades do menor, frente ao quereza a Carta Magna, inclusive diante doprincípio da proporcionalidade, prevalece ointeresse do alimentado. Apelação doalimentante provida, em parte e apelo doalimentando desprovido” (TJRS, Processo70009950445, Sétima Câmara Cível, Rel. JuizJosé Carlos Teixeira Giorgis, origem: SãoGabriel, j. 16.03.2005).

Anote-se que aproporcionalidade ou arazoabilidade na fixação dosalimentos é de tamanhaimportância na atualidade que

Page 1842: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

alguns doutrinadores, caso deMaria Berenice Dias, falam naexistência de um trinômio(proporcionalidade/necessidade/possibilidadee não mais de um binômio, comodantes se concebia.9 Em sentidopróximo, Paulo Lôbo menciona atríadenecessidade/possibilidade/razoabilidadeA jurisprudência também temdestacado a análise conjunturaldesses três elementos em muitosarestos estaduais. Cabe trazer àcolação os seguintes, apenas parailustrar:

“Alimentos. Quantum. Redução. Cabimento.

Page 1843: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

Adequação ao trinômionecessidade/possibilidade/razoabilidadeimpossibilidade financeira do alimentante parao valor fixado. Apelo provido parcialmente”(TJSP, Apelação com Revisão 662.094.4/0,Acórdão 4160175, São Paulo, Sétima Câmarade Direito Privado, Rel. Des. Dimas Carneiro,j. 04.11.2009, DJESP 07.12.2009).

“Agravo de instrumento. Alimentosprovisórios. Quantum fixado conforme oselementos e provas dos autos. Trinômio:Necessidade, capacidade e proporcionalidade.Decisão mantida. Os alimentos provisórioscontemplam cognição sumária e incompleta,sujeitando-se ao prudente arbítrio do juízo,razão pela qual recomendável a manutençãoda objurgada decisão até o provimentodefinitivo de cognição ampla, pois nãoconstam dos autos elementos e circunstânciasfático-jurídicas hábeis, nesta fase processual,à pleiteada redução do benefício, porquanto

Page 1844: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

atendido. Com a superficialidade eprovisoriedade imanentes à espécie. Otrinômio que o justifica: Necessidade,capacidade e proporcionalidade” (TJMG,Agravo de Instrumento 1.0672.07.274160-2/0011, Sete Lagoas, Quinta Câmara Cível,Rel. Des. Nepomuceno Silva, j. 29.05.2008,DJEMG 05.06.2008).

“Família. Ação de alimentos. Filha maior eportadora de Síndrome de Down.Readequação do quantum alimentar. Análisedo chamado binômio alimentar (ou trinômio,para alguns). Necessidades/possibilidades,dependendo de cotejo pelo conjunto dos fatos.Circunstâncias que autorizam certareadequação da pensão. O dever de sustentara prole compete a ambos os genitores, cadaum concorrendo na medida de suadisponibilidade. Pedido de concessão de AJG.Descabimento. Recorrente que não seenquadra na condição de pobreza (Lei

Page 1845: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

1.060/1950). Verba honorária,redimensionamento. Apelação e recursoadesivo parcialmente providos” (TJRS,Apelação Cível 70022268874, Porto Alegre,Oitava Câmara Cível, Rel. Des. Luiz AriAzambuja Ramos, j. 24.01.2008, DOERS01.02.2008, p. 35).

Ao presente autor pareceexistir realmente uma evoluçãoconceitual, diferenciando-se otrinômio do mero binômio pelanecessidade imperiosa de seanalisar a verba alimentar deacordo com contexto social. Aesse propósito, pode ser citado oentendimento do SuperiorTribunal de Justiça, antesdestacado, segundo o qual os

Page 1846: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

alimentos entre os cônjugesteriam um caráter excepcional.Ora, tal conclusão está fundada naposição que a mulher exerce nacontemporaneidade, independentee procurando o seu sucessoprofissional.

De todo modo, acreditamosser melhor falar na razoabilidadedo que na proporcionalidadecomo componente da tríadealimentar. Isso porque arazoabilidade é mais guiada porelementos subjetivos, enquanto aproporcionalidade, por fatoresobjetivos. Em matéria alimentar,as questões pessoais são muito

Page 1847: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

mais relevantes do que aspertinências objetivas. É o casoconcreto que irá guiar não só aatribuição do dever de pagar osalimentos, como também o valora ser pago, o quantum debeatur.

Feitas essas consideraçõesde direito material, vejamos otratamento relativo aos alimentosfamiliares no Novo EstatutoProcessual, culminando com oestudo da regulamentação daprisão civil, tão importante para aprática familiarista.

De início, quanto àcompetência, foi mantida a regrade privilégio em relação ao

Page 1848: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

domicílio ou residência doalimentando, para a ação em quese pedem alimentos (art. 53,inciso II, do Novo Código deProcesso Civil). Reproduziu-se,sem alterações, o que constava doantigo art. 100, inciso II, doCPC/1973. Deve ser preservadoo entendimento de prevalênciadessa regra em casos decumulações com oreconhecimento de paternidade –nos termos da Súmula 1 doSuperior Tribunal de Justiça –, ecom a petição de herança. Nessalinha, a propósito, do próprioTribunal da Cidadania:

Page 1849: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

“Conflito de competência. Inventário jáencerrado. Ação de investigação depaternidade, cumulada com petição deherança e de alimentos. Domicílio doalimentando. 1. A regra especial prevalecesobre a regra geral de competência, daí que,segundo dispõe a Súmula 1/STJ, ‘o foro dodomicílio ou da residência do alimentando é ocompetente para a ação de investigação depaternidade, quando cumulada com a dealimentos’. 2. Encerrado o inventário, comtrânsito em julgado da sentença homologatóriarespectiva, deixa de existir o espólio, e asações propostas contra as pessoas que detêmos bens inventariados não seguem a norma doart. 96 do Código de Processo Civil,prevalecendo, no caso concreto, a regraespecial do art. 100, inciso II, do mesmodiploma, segundo a qual a demanda em quese postula alimentos deve correr no foro dodomicílio ou da residência do alimentando. 3.Conflito conhecido para declarar acompetência do Juízo de Direito de

Page 1850: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

Brasília/DF” (STJ, CC 51.061/GO, SegundaSeção, Rel. Min. Carlos Alberto MenezesDireito, j. 09.11.2005, DJ 19.12.2005, p. 207).

Foi conservada, igualmente,a premissa relativa ao segredo dejustiça da ação de alimentos (art.188, inciso II, do CPC/2015), naesteira do sistema anterior (art.155, inciso II, do CPC/1973). Omesmo se diga quanto aoprosseguimento da ação dealimentos durante as fériasforenses (art. 215, inciso II, doCPC/2015, correspondente ao art.174, inciso II, do CPC/1973). Ovalor da causa da ação dealimentos continua a ser o

Page 1851: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

correspondente a doze vezes ovalor que está sendo pleiteado nainicial (art. 292, inciso III, doCPC/2015, reprodução do art.259, inciso VI, do CPC/1973).

Entre as mudançasintroduzidas, cabe comentar,inicialmente, a possibilidade dequebra da impenhorabilidade dosalário e remunerações em geralpor conta da existência de créditode pensão alimentícia. O novoart. 833, inciso IV, do CPC/2015passou a prescrever que sãoimpenhoráveis “os vencimentos,os subsídios, os soldos, ossalários, as remunerações, os

Page 1852: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

proventos de aposentadoria, aspensões, os pecúlios e osmontepios, bem como as quantiasrecebidas por liberalidade deterceiro e destinadas ao sustentodo devedor e de sua família, osganhos de trabalhador autônomo eos honorários de profissionalliberal, ressalvado o § 2º”.Segue-se, assim, a mesma linhageral presente no antigo art. 649,inciso IV, do CPC/1973, sendo aprópria pensão alimentíciaimpenhorável.

Todavia, a ressalva contidano § 2º do novo comandoinstrumental tem a seguinte

Page 1853: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

dicção: “O disposto nos incisosIV e X do caput não se aplica àhipótese de penhora parapagamento de prestaçãoalimentícia, independentementede sua origem, bem como àsimportâncias excedentes a 50(cinquenta) salários mínimosmensais, devendo a constriçãoobservar o disposto no art. 528, §8º, e no art. 529, § 3º”. Os doisúltimos comandos mencionadosainda serão aqui analisados.

Em suma, nota-se,inicialmente, a possibilidade depenhora das pensões em geral eda quantia depositada em

Page 1854: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

caderneta de poupança, até olimite de quarenta saláriosmínimos (inciso X do art. 833 doCPC/2015), com vistas àsatisfação da obrigação alimentarde natureza familial. Com isso, aobrigação de prestar alimentosganha uma qualificação aindamais especial, ressaltando o seucaráter sui generis, observadopor praticamente todos oscivilistas. O tempo e a práticademonstrarão se a inovação veioem boa hora ou não. De todasorte, o presente autor entendeque a ressalva deve sertemperada em casos de penúria

Page 1855: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

do devedor, sendo sempre viávelutilizar a técnica de ponderação,expressa no próprio Código deProcesso Civil de 2015, eexplicada no Capítulo 1 destetrabalho.

Outra conclusão extraídadesse art. 833, § 2º, do NovoEstatuto Processual é que ospróprios alimentos podem serpenhorados, naquilo que excedero montante de cinquenta saláriosmínimos mensais, valorconsiderado para manter omínimo vital ou o patrimôniomínimo do devedor. Em suma, osalimentos e pensões em geral não

Page 1856: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

são mais absolutamenteimpenhoráveis, como estava noart. 649 do CPC anterior. Tantoisso é verdade que o caput donovo comando não utiliza mais aexpressão destacada, retirada dosistema. Se no parágrafo anteriorficou ressaltada uma força aindamaior dada à obrigaçãoalimentar, no presente aspecto elafica enfraquecida, o que nãodeixa de ser um contrassenso nonovo sistema. Para o presenteautor, os alimentos familiaresdeveriam ser excluídosexpressamente dessa regra depenhora, o que até pode ser a

Page 1857: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

interpretação futura, diante dofundamento constitucional daobrigação alimentar, exposta noinício deste capítulo.

Pontue-se que a Lei 11.382,de 2006, pretendia incluir umanorma em sentido próximo noentão art. 649 do CPC/1973. Noentanto, houve veto do entãoPresidente Lula. A projeção tinhaa seguinte expressão: “Nahipótese do inciso IV do caputdeste artigo, será consideradopenhorável até 40% (quarenta porcento) do total recebidomensalmente acima de 20 (vinte)salários mínimos, calculados

Page 1858: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

após efetuados os descontos deimposto de renda retido na fonte,contribuição previdenciáriaoficial e outros descontoscompulsórios”. E as razões doveto foram as seguintes: “OProjeto de Lei quebra o dogma daimpenhorabilidade absoluta detodas as verbas de naturezaalimentar, ao mesmo tempo emque corrige discriminação contraos trabalhadores não empregadosao instituir impenhorabilidadedos ganhos de autônomos e deprofissionais liberais. Nasistemática do Projeto de Lei, aimpenhorabilidade é absoluta

Page 1859: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

apenas até vinte salários mínimoslíquidos. Acima desse valor,quarenta por cento poderá serpenhorado. A proposta parecerazoável porque é difícil defenderque um rendimento líquido devinte vezes o salário mínimovigente no País seja consideradocomo integralmente de naturezaalimentar. Contudo, pode sercontraposto que a tradiçãojurídica brasileira é no sentido daimpenhorabilidade, absoluta eilimitada, de remuneração. Dentrodesse quadro, entendeu-se pelaconveniência de opor veto aodispositivo para que a questão

Page 1860: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

volte a ser debatida pelacomunidade jurídica e pelasociedade em geral”. Talvez omesmo debate tenha ocorridoquando da tramitação deste NovoCódigo de Processo Civil, o quejustificou sua manutenção, semvetos pela Presidente Dilma.

Entretanto, as principaisinovações relativas aos alimentosdizem respeito ao sistema decumprimento de sentença e deexecução dos alimentos. Há umduplo tratamento dessa satisfaçãona nova legislação processual,tendo sido revogadosexpressamente os arts. 16 a 18 da

Page 1861: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

Lei de Alimentos (Lei5.478/1969), pelo art. 1.072,inciso V, do Novo CPC. Cabetranscrever tais normasrevogadas, que tratavam daexecução de alimentos, para osdevidos fins didáticos e deesclarecimento:

“Art. 16. Na execução da sentença ou doacordo nas ações de alimentos seráobservado o disposto no artigo 734 e seuparágrafo único do Código de Processo Civil.(Redação dada pela Lei nº 6.014, de27.12.1973)”.“Art. 17. Quando não for possível aefetivação executiva da sentença ou doacordo mediante desconto em folha, poderãoser as prestações cobradas de alugueres deprédios ou de quaisquer outros rendimentos

Page 1862: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

do devedor, que serão recebidos diretamentepelo alimentando ou por depositário nomeadopelo juiz.”“Art. 18. Se, ainda assim, não for possível asatisfação do débito, poderá o credor requerera execução da sentença na forma dos artigos732, 733 e 735 do Código de Processo Civil.(Redação dada pela Lei nº 6.014, de27.12.1973)”.

Curiosamente, não foirevogada a regra do art. 19 da Leide Alimentos, que trata da prisãocivil, também regulamentada peloNovo CPC. Por esse preceito,ainda vigente, o juiz, parainstrução da causa ou na execuçãoda sentença ou do acordo relativoaos alimentos familiares, poderá

Page 1863: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

tomar todas as providênciasnecessárias para seuesclarecimento ou para ocumprimento do julgado ou doacordo, inclusive a decretação deprisão do devedor até 60(sessenta) dias (caput). Ocumprimento integral da pena deprisão não eximirá o devedor dopagamento das prestaçõesalimentícias, vincendas ouvencidas e não pagas (§ 1º).Ademais, da decisão que decretara prisão do devedor caberáagravo de instrumento. Essainterposição do agravo deinstrumento não suspende a

Page 1864: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

execução da ordem de prisão (§3º do art. 19 da Lei 5.478/1968).Esses preceitos devem dialogarcom as novas normasprocessuais, que passam a seranalisadas.

Iniciaremos pelas regras quetratam do “cumprimento dasentença que reconheça aexigibilidade de obrigação deprestar alimentos” (arts. 528 a533 do Novo Código de ProcessoCivil). Conforme o primeiropreceito relativo ao tema, nocumprimento de sentença quecondene ao pagamento deprestação alimentícia ou de

Page 1865: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

decisão interlocutória que fixealimentos, o juiz, a requerimentodo exequente, mandará intimar oexecutado pessoalmente para, emtrês dias, pagar o débito, provarque o fez ou justificar aimpossibilidade de efetuá-lo.Como se percebe, o prazo é bemreduzido, visando à agilizaçãodos procedimentos. Caso oexecutado, nesse prazo, nãoefetue o pagamento, não proveque o efetuou ou não apresentejustificativa da impossibilidadede efetuá-lo, o juiz mandaráprotestar o pronunciamentojudicial, aplicando-se, no que

Page 1866: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

couber, as mesmas regras doprotesto de sentença transitada emjulgado, constante do art. 517 doNovo CPC.

Assim, a primeira medida aser tomada é o protesto judicialda sentença, o que ocasionarárestrições creditícias ao devedor.Acredita-se que essapossibilidade de protestoocasionará também a inscrição dodevedor no cadastro negativo,como já vinham admitindo algunsTribunais Estaduais (ver: TJSP,Agravo 990.10.152783-9/50000,Acórdão 4653433, São Paulo,Terceira Câmara de Direito

Page 1867: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

Privado, Rel. Des. Adilson deAndrade, j. 17.08.2010, DJESP09.09.2010; e TJSP, Agravo990.10.088682-7/50000,Acórdão 4525237, São Paulo,Terceira Câmara de DireitoPrivado, Rel. Des. EgidioGiacoia, j. 25.05.2010, DJESP12.07.2010). Consigne-se aexistência anterior deprovimentos dos TribunaisEstaduais regulamentando ainscrição, caso dos Tribunais deJustiça de Pernambuco e deGoiás, o que deve ser ampliadonos próximos anos.

Como bem aponta o

Page 1868: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

Desembargador do TribunalPaulista Caetano Lagrasta Neto,um dos precursores da tese: “Ainsatisfação do credor, em geralfilhos menores, ante a utilizaçãode expedientes processuaiscolocados à disposição dodevedor, com prejuízo aosprincípios da rapidez e economiaprocessuais, impede o regularacesso a uma ordem jurídicajusta, ante a reiteração dosrecursos, ao demonstrar ainviabilidade da ameaça à prisão(art. 733 do CPC) e forrar-se odevedor ao pagamento duranteanos, com prejuízo à subsistência

Page 1869: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

da família. Ao cabo, enfatiza-se anecessidade de cadastrar edificultar movimentação dodevedor de alimentos,equiparando-o a qualquerdevedor da esfera cível”.11 ParaLagrasta, o fundamentoconstitucional de talpossibilidade está no art. 6º daConstituição Federal, que fazmenção ao direito social efundamental aos alimentos, porforça da Emenda Constitucional64. O magistrado idealizouprojeto de lei sobre apossibilidade de inscrição, comSilvânio Covas, superintendente

Page 1870: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

jurídico do SERASA. Aproposição foi apresentada peloentão Senador Eduardo Suplicy,por meio do Projeto de Lei405/2008. Talvez o projeto de leiainda seja necessário paracompletar o sentido do que constado Novo CPC.

Seguindo, estabelece o § 1ºdo art. 528 do Novo CPC quesomente a comprovação de fatoque gere a impossibilidadeabsoluta de pagar justificará oinadimplemento. A título deexemplo, pode ser citada ahipótese de um devedor doente,hospitalizado, com doença grave.

Page 1871: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

Mencione-se, ainda, odesemprego absoluto do devedor,em momento de crise notória egeneralizada. O bom senso dojuiz e as máximas de experiênciadevem ser guias na aplicaçãodesse comando.

Eventualmente, se oexecutado não pagar ou se ajustificativa apresentada não foraceita, o juiz, além de mandarprotestar o pronunciamentojudicial, decretar-lhe-á a prisãopelo prazo de um a três meses(art. 528, § 3º, do CPC/2015).Dessa forma, a prisão civil,prevista no art. 5º, inciso LXVII,

Page 1872: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

da Constituição Federal de 1988,permanece consagrada noEstatuto Processual, ampliadapara os casos de cumprimento desentença. Pontue-se que uma dasdiscussões que permearam oentão projeto de Novo CPC foi asua retirada do sistema, na linhade alguns debates de convençõesinternacionais de direitoshumanos, o que não acabou porprosperar.12 Muito ao contráriopassou-se a estabelecer, commais rigidez em certo sentido emenos rigidez em outro, que aprisão será cumprida em regimefechado, devendo o preso ficar

Page 1873: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

separado dos presos comuns (art.528, § 4º, do CPC/2015).

Confrontando essa prisãocom a que consta do art. 19 daLei de Alimentos, constata-se apermanência de dois prazosdistintos de prisão civil, aexemplo do que ocorria nosistema anterior, diante da regrado antigo art. 733 do CPC/1973.A Lei 5.478/1968 impõe prazo deprisão de até sessenta dias; oNovo Código de Processo Civil,entre um a três meses.Anteriormente, entendia-se que oprazo do antigo art. 733 teriaincidência apenas para os

Page 1874: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

alimentos provisionais, fixadosno curso da lide, nos casos deausência de prova pré-constituídapara a sua fixação, especialmentede uma certidão de casamento oude nascimento. Por outra via, paraos alimentos provisórios – com acitada prova pré-constituída –, oudefinitivos, o prazo seria o da Leide Alimentos.13

No novo sistema, o prazo deprisão civil do Novo CPC –reafirme-se, de um a três meses –,passa a ser aplicado aosalimentos definitivos eprovisórios, por expressaprevisão do seu art. 531, caput.

Page 1875: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

Em relação aos alimentosprovisionais, não há qualquerdisposição no Estatuto Processualemergente, o que pode levantardúvida de sua retirada dosistema. Todavia, em muitoscasos, tais alimentos sãoutilizados para satisfazer osinteresses de filhos nãoreconhecidos, que ainda não têma prova pré-constituída daobrigação alimentar, ou seja, queainda não têm a certidão denascimento para a prova dovínculo de filiação. Ora, soariacomo inconstitucional a nãopossibilidade de prisão em casos

Page 1876: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

tais, por infringência ao princípioda igualdade entre os filhos,retirado do art. 227, § 6º, daConstituição Federal. Sendoassim, parece-nos que osalimentos provisionais continuamno sistema, aplicando-se para taisverbas a regra do art. 19 da Leide Alimentos, especialmente pelouso do termo para a instrução dacausa. Em apurada síntese, anosso ver, para os alimentosprovisionais a prisão deve ser deaté 60 dias.

De toda sorte, continuaráforte a tese de unificação dosprazos para a prisão civil do

Page 1877: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

devedor, incidindo o prazomenor, no caso de até sessentadias, nos termos do aindasobrevivente art. 19 da Lei deAlimentos. Em outras palavras,ainda persistirá o argumento deaplicação da norma maisfavorável ao réu ou executado.Essa última tese vem crescendona jurisprudência brasileira,podendo ser transcritas asseguintes ementas, a exemplificar:

“Habeas corpus. Prisão civil. Dívida dealimentos. Decreto de prisão. Ausência deilegalidade. Manutenção. Prazo máximo. 60(sessenta) dias. Lei de alimentos. Concessãoparcial do writ. Tratando-se de dívida

Page 1878: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

alimentar correspondente aos três mesesanteriores à propositura da ação acrescidosdas parcelas vincendas, perfeitamenteaplicável a execução nos termos do art. 733do CPC. O prazo máximo para a prisão civilpor débito alimentar é de 60 dias, por força dodisposto no art. 19 da Lei 5.478/1968 (Lei dealimentos). Ordem concedida parcialmente”(TJMG, HC 1.0000.09.490625-2/0001, BeloHorizonte, Sétima Câmara Cível, Rel. Desig.Des. Heloisa Combat, j. 24.03.2009, DJEMG22.05.2009).

“Agravo de instrumento. Execução dealimentos. Prisão civil decretada pelo prazode 90 dias. Maioridade do alimentando.Cessação imediata. Impossibilidade. Amaioridade civil do filho, por si só, nãoacarreta a imediata cessação do dever deprestar alimentos. Limite máximo de 60 diasprevisto na Lei Especial 5.478/1968 que deveprevalecer. Redução do prazo de prisão para

Page 1879: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

30 dias determinado de ofício. Recursoparcialmente provido para esse fim” (TJSP,Agravo de Instrumento 582.353.4/0, Acórdão3302923, General Salgado, Terceira Câmarade Direito Privado, Rel. Des. Egidio JorgeGiacoia, j. 21.10.2008, DJESP 25.11.2008).

“Habeas corpus. Prisão civil. Prazo denoventa dias. Ilegalidade. 1. Apesar dodisposto no art. 733 do CPC, o prazo máximode prisão civil por dívida de alimentoscontinua sendo regulado pela Lei 5.478/1968,que contém regra mais favorável ao pacienteda medida excepcional. 2. É ilegal a prisãocivil por dívida alimentar por prazo superior asessenta dias. Ordem concedida” (TJRS,Processo 70011535630, 10.06.2005, Comarcade Santa Maria, Sétima Câmara Cível, Rel.Juiz Sérgio Fernando de VasconcellosChaves).

Essas controvérsias são

Page 1880: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

interessantes, devendo sersanadas nos próximos anos, tantopela doutrina quanto pelajurisprudência.

Voltando ao art. 528 doNovo CPC, prescreve o seu § 5ºque o cumprimento da pena nãoexime o executado do pagamentodas prestações vencidas evincendas, ou seja, a prisão civilnão tem o caráter de satisfazer aobrigação, gerando sua extinção,como já estava no antigo art. 733,§ 2º, do CPC/1973.

Por outra via, se for paga aprestação alimentícia, o juizsuspenderá o cumprimento da

Page 1881: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

ordem de prisão, conforme o § 6ºdo novo art. 528 do CPC/2015;reprodução do art. 733, § 3º, danorma instrumental anterior, coma ressalva sempre importante queessa última era incidente para oscasos da então execução desentença.

Nos termos do que estava naSúmula 309 do Superior Tribunalde Justiça, o § 7º do art. 528 doCPC/2015 estatui que o débitoalimentar que autoriza a prisãocivil do alimentante é o quecompreende até as três prestaçõesanteriores ao ajuizamento daexecução e as que se vencerem no

Page 1882: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

curso do processo. Vale lembrarque a citada sumular teve suaredação original alterada pelopróprio Tribunal da Cidadania. Aalteração da redação se deuporque a súmula falava emcitação, e não em ajuizamento daexecução. Isso geroucontundentes críticas da doutrina,como no caso de Maria BereniceDias, pois seria comum aodevedor furtar-se à citação paraafastar a possibilidade de prisãofutura, o que realmente acabariapor acontecer. Nesse contexto,graças à consciência dosMinistros daquele Tribunal, a

Page 1883: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

súmula foi por bem alterada, eteve o seu texto modificadoconfirmado pelo Novo Código deProcesso Civil.

Consigne-se que ajurisprudência tem determinado aprisão quando o devedor tem ocostume de não pagarintegralmente os alimentosdevidos, sem deixar caracterizaros três meses de inadimplência,visando a furtar-se à prisão. É ocaso, por exemplo, do devedorque costuma deixar de pagar doismeses consecutivos do valordevido, mas paga a dívida noterceiro mês. Para esses casos,

Page 1884: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

vale transcrever o seguintejulgado do Tribunal Capixaba:

“Habeas corpus. Prisão civil. Alimentos.Débito atual e pretérito. Devedor contumaz.Circunstâncias do caso concreto.Constrangimento ilegal. Inocorrência. 1. Oentendimento do Colendo Superior Tribunal deJustiça no sentido de afastar o decreto deprisão civil com relação a dívida alimentarantiga, só se impondo a custódia doalimentando relativamente à falta depagamento das três últimas pensõesalimentícias, não constitui regra absoluta. 2.Inexiste constrangimento ilegal no decreto deprisão fundado em débito alimentar atual epretérito, quando evidenciada a buscaimediata da satisfação do seu crédito porparte do alimentado e a utilização demanobras para procrastinar o feito executório,por parte do alimentante, devedor contumaz”(TJES, Processo 100010015749, Vitória,

Page 1885: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

Primeira Vara de Família, Primeira CâmaraCível, Des. Titular Annibal de Rezende Lima,j. 18.12.2002).

Para o presente autor, esseentendimento deve ser mantidosob a égide do Novo EstatutoProcessual. A contumácia dodevedor, a reiteração deinadimplência alimentar, aliás,sempre foi motivo para novasprisões, conforme vementendendo o Superior Tribunalde Justiça: “Civil. Execução dealimentos. Prisão. Sessenta dias.Cumprimento. Contumácia dodevedor. Novo decreto.Possibilidade. Limite” (STJ,

Page 1886: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

RHC 17.541/RJ, Quarta Turma,Rel. Min. Aldir PassarinhoJunior, j. 04.08.2005, DJ26.09.2005, p. 378).

Seguindo, é precisointerpretar o novo preceito, nalinha do que se fazia com aSúmula 309 do STJ, no sentido denão ser necessário que o devedorcomplete os três meses para que aprisão seja deferida. Um mês deinadimplência pode gerar aprisão do devedor, sendo os trêsmeses apenas um parâmetro paraa execução por meio da prisão. Oentendimento constante dasumular, aliás, sempre foi

Page 1887: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

passível de várias críticas. Comobem resume Fernanda Tartuce,“Afirmam os precedentes queoriginaram a súmula que osalimentos antigos teriam perdidoo caráter de urgência alimentar.Este entendimento, porém, mereceser submetido a certosquestionamentos. Por que apenaso último trimestre deinadimplência autorizaria a penade prisão? O débito perderia ocaráter alimentar no quarto mês,por exemplo? Justifica-se que ointérprete faça tal distinção, se alei não fez”.14 A distinção, agora,foi feita pela lei, sendo

Page 1888: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

interessante observar, no futuro,se as críticas persistirão ou não.

Prosseguindo no estudo doart. 528 do CPC de 2015, enunciao seu § 8º que o exequente podeoptar por promover ocumprimento da obrigaçãoalimentar por meio do capítulorelativo ao “cumprimentodefinitivo de sentença quereconheça a exigibilidade deobrigação de pagar quantia certa”(arts. 523 a 527 do Novo CPC).Uma das vantagens desse caminhoé a incidência de multas, como acorrespondente a dez por cento dadívida, em caso de não

Page 1889: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

pagamento inicial, no prazo dequinze dias. Essa multa pareceser a mesma que estava previstano art. 475-J do CPC/1973,existindo polêmica anterior desua incidência quanto aosalimentos, agora sanada.

Todavia, ressalve-se que,havendo opção por esse caminhoprocessual, não será admissível aprisão civil. Ademais, recaindo aeventual penhora em dinheiro, aconcessão de efeito suspensivo àimpugnação do débito não obstaque o exequente levantemensalmente a importância daprestação, tendo em vista a

Page 1890: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

natureza emergencial e satisfativados alimentos. Tudo isso constado art. 528, § 8º, do Novo Codex.

Por fim, quanto a essecomando, prevê o § 9º do art. 528do CPC/2015 que o exequentepode promover o cumprimento dasentença ou decisão que condenaao pagamento de prestaçãoalimentícia no juízo de seudomicílio. Eis mais uma visatrativa em favor do credor dealimentos, consideradovulnerável para esses fins.

O Novo CPC continua aelencar medidas administrativaspara o recebimento desse débito

Page 1891: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

alimentar. Desse modo, na esteirado que estava no art. 734 doEstatuto Processual anterior, onovo art. 529 expressa que,quando o executado forfuncionário público, militar,diretor ou gerente de empresa ouempregado sujeito à legislação dotrabalho, o exequente poderárequerer o desconto em folha depagamento da importância daprestação alimentícia. Conformeo seu § 1º, ao proferir a decisão,o juiz oficiará à autoridade, àempresa ou ao empregador,determinando, sob pena de crimede desobediência, o desconto a

Page 1892: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

partir da primeira remuneraçãoposterior do executado, a contardo protocolo do ofício. O novopreceito foi ampliado, inclusivequanto à menção ao crime dedesobediência.

Em verdade, o parágrafoúnico do art. 734 do CPC/1973 seresumia a prever que acomunicação seria feita àautoridade, à empresa ou aoempregador por ofício, de queconstariam os nomes do credor,do devedor, a importância daprestação e o tempo de suaduração. O novo § 2º do art. 529do CPC/2015, seu

Page 1893: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

correspondente, também estendeua necessidade de informaçõesdessa comunicação, prescrevendoque “o ofício conterá o nome e onúmero de inscrição no cadastrode pessoas físicas do exequente edo executado, a importância a serdescontada mensalmente, o tempode sua duração e a conta na qualdeve ser feito o depósito”.

Como inovação, semprecedentes, o § 3º do art. 529 doCPC/2015 consagra que, semprejuízo do pagamento dosalimentos vincendos, o débitoobjeto de execução pode serdescontado dos rendimentos ou

Page 1894: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

rendas do executado, de formaparcelada, contanto que, somadoà parcela devida, não ultrapassecinquenta por cento de seusganhos líquidos. O objetivo é asatisfação do credor, sem queisso atinja o patrimônio mínimodo devedor, seu mínimo vital.Mesmo com a revogaçãoexpressa do art. 17 da Lei deAlimentos é possível a satisfaçãosobre aluguéis recebidos pelodevedor, pois a nova normamenciona rendas e rendimentosdo executado, sem qualquerressalva.

Igualmente com o objetivo

Page 1895: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

de obter a satisfação patrimonial,continua em vigor o art. 20 da Lei5.478/1968, que deve dialogarcom tais regras instrumentaisemergentes, ao prescrever que asrepartições públicas, civis oumilitares, inclusive do Imposto deRenda, darão todas asinformações necessárias àinstrução das ações de alimentose à execução do que for decididoou acordado em juízo.

Seguindo no estudo do NovoCódigo de Processo Civil,determina o seu art. 530 que, nãosendo cumprida a obrigação,devem ser observadas as regras

Page 1896: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

relativas à penhora, elencadasentre os seus arts. 831 eseguintes. Em casos tais, incidiráo art. 833 do mesmo Codex, antescomentado. Como visto, todasessas regras de cumprimento desentença são incidentes para osalimentos definitivos ouprovisórios (art. 531, caput, doCPC/2015). Em relação aosprovisionais, mesmo com a suaretirada do Novo CPC – inclusiveno tocante à antiga medidacautelar correspondente –, surgirádebate de sua persistência. Aexecução dos alimentosprovisórios, bem como a dos

Page 1897: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

alimentos fixados em sentençaainda não transitada em julgado,se processa em autos apartados; oque visa a clarear a questãorelativa aos procedimentos (art.531, § 1º, do CPC/2015). Poroutra via, o cumprimentodefinitivo da obrigação de prestaralimentos será processado nosmesmos autos em que tenha sidoproferida a sentença (art. 531, §2º, do CPC/2015).

A encerrar o tratamento dosalimentos familiares – eis que oart. 533 trata dos alimentosindenizatórios, já abordados –,preceitua o art. 532 do Novo CPC

Page 1898: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

que, verificada a condutaprocrastinatória do executado, ojuiz deverá, se for o caso, darciência ao Ministério Público dosindícios da prática do crime deabandono material. O objetivo éde concretização da boa-féprocessual e do espírito decolaboração que deve guiar aspartes, na linha do que estáexposto no Capítulo 1 deste livro.

Esgotado o estudo das regrasrelativas ao cumprimento desentença, nota-se que o NovoCPC não traz nenhum artigo quepreveja os efeitos da sentença quedecreta os alimentos familiares,

Page 1899: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

mas somente quanto aos alimentosindenizatórios (com cláusularebus sic stantibus – art. 533, §3º). Sendo assim, continua a terplena incidência o art. 15 da Leide Alimentos, que tem a seguinteredação: “A decisão judicialsobre alimentos não transita emjulgado e pode a qualquer temposer revista, em face damodificação da situaçãofinanceira dos interessados”.Trata-se de concretizaçãoprocessual da possibilidade derevisão ou exoneração da verbaalimentar, especialmente noscasos de alteração do binômio ou

Page 1900: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

trinômio alimentar, na linha doque consta do art. 1.699 doCódigo Civil, in verbis: “se,fixados os alimentos, sobreviermudança na situação financeira dequem os supre, ou na de quem osrecebe, poderá o interessadoreclamar ao juiz, conforme ascircunstâncias, exoneração,redução ou majoração doencargo”.

Na linha do que já foiexposto, doutrina e jurisprudênciamajoritárias sempre apontaramque se trata da aplicação dacláusula rebus sic stantibus paraa sentença da ação de alimentos,

Page 1901: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

uma vez que, “Enquantopermanecerem as circunstânciasde fato e de direito da formacomo afirmadas na sentença, estapermanece com sua eficáciainalterável. Modificadas ascircunstâncias sob as quais foiproferida a sentença, é possível oajuizamento de nova ação dealimentos (revisão ouexoneração)”.15 Apesar de seresse o entendimento majoritário,com ele não se pode concordar,porque a cláusula rebus sicstantibus foi criada para oDireito Contratual (direitopatrimonial), não sendo

Page 1902: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

conveniente aplicá-la ao Direitode Família, que lida com o direitoexistencial. De todo modo, otermo continuará a ser utilizadono processo civil brasileiro, coma emergência do Novo Código deProcesso Civil.

Partindo para o tratamentoda execução de alimentos, comoexposto, há um capítulo próprionos casos de sua fixação portítulo executivo extrajudicial.Como hipóteses desse caminho deatribuição, podem ser citados,nos termos do art. 784 do NovoCPC, a escritura pública deseparação ou divórcio (inciso II),

Page 1903: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

um documento particular assinadopelo devedor e por duastestemunhas (inciso III) ou uminstrumento de transaçãoreferendado pelo MinistérioPúblico, pela Defensoria Pública,pela Advocacia Pública, pelosadvogados dos transatores ou porconciliador ou mediadorcredenciado por tribunal (incisoIV).

Em casos tais, o juizmandará citar o executado para,em três dias, efetuar o pagamentodas parcelas anteriores ao inícioda execução e das que sevencerem no seu curso, provar

Page 1904: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

que o fez ou justificar aimpossibilidade de efetuá-lo (art.911, caput, do CPC/2015).Conforme o parágrafo único daúltima norma, os procedimentosexpostos a respeito documprimento da sentençaconstantes dos §§ 2º a 7º do art.528 são incidentes a essahipótese, o que inclui a prisãocivil. Somente são excluídas asregras relativas ao caminhopossível da execução de quantiacerta e ao foro privilegiado.

Com esse novo tratamento,algumas polêmicas anteriores sãosanadas. Dentre elas, destacamos

Page 1905: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

a possibilidade de prisão civil,agora viável, nos casos dealimentos fixados em escriturapública de divórcio, o que geravatormentosa discussão entrecivilistas e processualistas. Apropósito, o presente autorsempre foi favorável a essaprisão.

A possibilidade de descontoem folha também é viável emcaso de obrigação de alimentosfundada em título executivofamiliar, não deixando dúvidas onovo art. 912 do CPC/2015:“quando o executado forfuncionário público, militar,

Page 1906: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

diretor ou gerente de empresa,bem como empregado sujeito àlegislação do trabalho, oexequente poderá requerer odesconto em folha de pagamentode pessoal da importância daprestação alimentícia. § 1º Aodespachar a inicial, o juizoficiará à autoridade, à empresaou ao empregador, determinando,sob pena de crime dedesobediência, o desconto apartir da primeira remuneraçãoposterior do executado, a contardo protocolo do ofício. § 2º Oofício conterá os nomes e onúmero de inscrição no cadastro

Page 1907: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

de pessoas físicas do exequente edo executado, a importância a serdescontada mensalmente, a contana qual deve ser feito o depósitoe, se for o caso, o tempo de suaduração”. Louva-se a menção aocrime de desobediência, maisuma vez, visando ao efetivorecebimento do crédito.

Por derradeiro, dispõe o art.913 do Novo CPC que, não sendorequerida a pensão comfundamento em títuloextrajudicial, incidem as regrasrelativas à execução de quantiacerta, com a ressalva de que,recaindo a penhora em dinheiro, a

Page 1908: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

concessão de efeito suspensivoaos embargos à execução nãoobsta a que o exequente levantemensalmente a importância daprestação. Isso, mais uma vez,com vistas à manutenção do seupatrimônio mínimo, o que ébuscado com o pagamento dasverbas alimentares.

Page 1909: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

__________1 AZEVEDO, Álvaro Villaça. Cursode Direito Civil. Direito de Família.São Paulo: Atlas, 2013. p. 304.2 BEVILÁQUA, Clóvis. Código dosEstados Unidos do Brasil. EdiçãoHistórica. Rio de Janeiro: Editora Rio,1977. p. 862.3 PEREIRA, Caio Mário da Silva.Instituições de Direito Civil.Atualizado por Tânia da Silva Pereira.Direito de Família. São Paulo: Forense,2012. v. V, p. 527.4 GOMES, Orlando. Direito deFamília. Rio de Janeiro: Forense,1978. p. 455; e DINIZ, Maria Helena.Código Civil Anotado. 11. ed. SãoPaulo: Saraiva, 2005. p. 1.383.5 FACHIN, Luiz Edson. Estatuto

Page 1910: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

Jurídico do Patrimônio Mínimo. Riode Janeiro: Renovar, 2001.6 Por todos, ver: SARMENTO,Daniel. Direitos Fundamentais eRelações Privadas. Rio de Janeiro:Lumen Juris, 2004. p. 331-350.7 ALVES, Jones Figueirêdo;DELGADO, Mário Luiz. CódigoCivil Anotado. São Paulo: Método,2005. p. 864.8 Ver, por todos: ALVES, JonesFigueirêdo Alves; DELGADO, MárioLuiz. Código Civil Anotado. SãoPaulo: Método, 2005. p. 865.9 DIAS, Maria Berenice. Manual deDireito das Famílias. 4. ed. SãoPaulo: RT, 2007. p. 482.10 LÔBO, Paulo. Direito Civil.

Page 1911: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

Famílias. São Paulo: Saraiva, 2008. p.350.11 LAGRASTA NETO, Caetano.Inserção do nome do devedor dealimentos nos órgãos de proteção aocrédito. In: LAGRASTA NETO,Caetano; TARTUCE, Flávio; SIMÃO,José Fernando. Direito de Família.Novas Tendências e JulgamentosEmblemáticos. São Paulo: Atlas, 2011.p. 311.12 O debate sobre a extinção da prisãocivil do devedor de alimentos ocorreuquando da realização de oficina pelaEscola da Defensoria Pública de SãoPaulo, sobre o Novo Código deProcesso Civil e a assistênciajudiciária, em 3 de agosto de 2012. Oevento foi realizado em convênio coma Secretaria de Reforma do Judiciáriodo Ministério da Justiça, tendo sido

Page 1912: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

convidados membros do InstitutoBrasileiro de Direito de Família(IBDFAM). O presente autorparticipou do evento representando oinstituto, ao lado dos ProfessoresMaria Berenice Dias, ChristianoCassettari e Viviane Girardi.13 Por todos, com clareza:MONTEIRO DE BARROS, FlávioAugusto. Manual de Direito Civil.Direito de Família e das Sucessões.São Paulo: Método, 2005. v. 4, p. 141.14 TARTUCE, Fernanda. ProcessoCivil Aplicado ao Direito de Família.São Paulo: GEN/Método, 2012. p. 206.15 NERY JR., Nelson; NERY, RosaMaria de Andrade. Código CivilComentado. 3. ed. São Paulo: RT,2005. p. 931.

Page 1913: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

A TUTELA ECURATELA E O

TRATAMENTO DAINTERDIÇÃO NO

NOVO CÓDIGO DEPROCESSO CIVIL

A tutela e a curatelaconstituem institutos de direito

Page 1914: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

assistencial para a defesa dosinteresses dos incapazes, visandoà realização de atos civis em seunome. A diferença substancialentre as duas figuras é que a tutelaresguarda os interesses demenores não emancipados, nãosujeitos ao poder familiar, com ointuito de protegê-los. Por seuturno, a curatela é categoriaassistencial para a defesa dosinteresses de maiores incapazes,devidamente interditados.Vejamos, no presente capítulo, asregras materiais fundamentais dosdois institutos e o necessáriodiálogo com o Novo CPC, ao

Page 1915: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

tratar da interdição.Começando pela tutela,

reafirme-se que o seu grandeobjetivo é a administração dosbens patrimoniais do menor.Enuncia o art. 1.728 do CódigoCivil que os filhos menores sãopostos sob tutela com ofalecimento dos pais, ou sendoestes julgados ausentes ou emcaso de os pais decaírem dopoder familiar. Conforme lecionaMaria Helena Diniz, há na tutelaum munus público, ou seja, umaatribuição imposta pelo Estadopara atender a interesses públicose sociais.1 Sem prejuízo do que

Page 1916: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

consta do CC/2002, o ECA (Lei8.069/1990) consagra no seu art.28 que a tutela é uma das formasde inserção da criança e doadolescente em família substituta.São partes da tutela: o tutor,aquele que exerce o munuspúblico; e o tutelado ou pupilo,menor a favor de quem os bens einteresses são administrados.

Como é notório, não se podeconfundir a tutela com arepresentação e a assistência. Atutela tem sentido genérico, sendoprevista para a administraçãogeral dos interesses de menores,sejam eles absolutamente

Page 1917: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

(menores de 16 anos, art. 3º,inciso I, do CC) ou relativamenteincapazes (menores entre 16 e 18anos, art. 4º, inciso I, do CC). Poroutra via, a representação é oinstituto que busca atender aosinteresses dos menores de 16anos em situações específicas,para a prática de determinadosatos da vida civil. Assim tambémo é a assistência, mas em relaçãoaos menores entre 16 e 18 anos.Premissa fundamental que deveser sempre reafirmada é aconclusão de que a tutela e opoder familiar não podemcoexistir, eis que a tutela visa

Page 1918: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

justamente substituí-lo.Quanto à origem, a tutela é

dividida em três categorias. Aprimeira delas é tutelatestamentária, instituída por atode última vontade, portestamento, legado ou mesmo porcodicilo (art. 1.729, parágrafoúnico, do CC/2002). Essanomeação de tutor compete aospais, em conjunto, devendoconstar em testamento ou emqualquer outro documentoautêntico. Há nulidade absolutada tutela testamentária se feita porpai ou mãe que não tinha o poderfamiliar no momento da sua morte

Page 1919: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

(art. 1.730 do CC).Como segunda categoria, a

tutela legítima é a concretizadana falta de tutor nomeado pelospais, nos termos do art. 1.731 doCC/2002; incumbe-a aos parentesconsanguíneos do menor, por estaordem: 1º) aos ascendentes,preferindo o de grau maispróximo ao mais remoto; 2º) aoscolaterais até o terceiro grau(irmãos, tios e sobrinhos),preferindo os mais próximos aosmais remotos, e, no mesmo grau,os mais velhos aos mais moços.Em uma dessas situações, o juizescolherá entre eles o mais apto a

Page 1920: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

exercer a tutela em benefício domenor, tendo em vista o princípiodo melhor ou maior interesse dacriança.

Por fim, há a tutela dativa,presente na falta de tutelatestamentária ou legítima epreceituando o art. 1.732 doCódigo Civil que o juiz nomearátutor idôneo e residente nodomicílio do menor. Essa mesmaforma de tutela é prevista para oscasos de exclusão do tutor, escusada tutela ou quando removidos ostutores legítimos outestamentários por não seremidôneos.

Page 1921: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

Em todas as hipóteses,havendo irmãos órfãos, dar-se-áum só tutor comum (art. 1.733 doCC), o que representa aconsolidação do princípio daunicidade da tutela. No entanto,se for nomeado mais de um tutorpor disposição testamentária esem indicação de precedênciados irmãos, entende-se que atutela foi cometida ao primeiroque constar no testamento. Osdemais lhe sucederão pela ordemde nomeação, se ocorrer morte,incapacidade, escusa do tutor ouqualquer outro impedimento (art.1.733, § 1º, do CC).

Page 1922: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

Além da instituiçãotestamentária, é possível tambémnomear o menor como herdeiroou legatário, pelo própriotestamento ou legado denomeação. Nesse diapasão,caberá ainda a nomeação de umcurador especial para os bensdeixados, ainda que obeneficiário se encontre sob opoder familiar, ou mesmo sobtutela (art. 1.733, § 2º, do CC).

O art. 1.734 do CC/2002tratava, na redação original, datutela do menor abandonado,que teria tutor dativo, ou seja,nomeado pelo juiz. Sendo

Page 1923: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

impossível a nomeação dessetutor dativo, o menor abandonadoseria recolhido a estabelecimentopúblico para esse fim destinado.Na falta desse estabelecimento, omenor ficaria sob a tutela daspessoas que, voluntária egratuitamente, se encarregariamda sua criação, havendo umainserção em família substituta. Odispositivo foi alterado pela Lei12.010, de 2009, conhecida comoNova Lei da Adoção, passando aprescrever que as crianças e osadolescentes cujos pais foremdesconhecidos, falecidos ou quetiverem sido suspensos ou

Page 1924: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

destituídos do poder familiarterão tutores nomeados pelo Juizou serão incluídos em programade colocação familiar, na formaprevista pela Lei 8.069, de 13 dejulho de 1990 (famíliasubstituta). Em suma, não semenciona mais o menorabandonado, substituindo-se aexpressão por outras mais amplase genéricas.

Seguindo no estudo do tema,o Código Civil de 2002, assimcomo o seu antecessor, continuaprevendo aqueles que sãoincapazes de exercer tutela (art.1.735), bem como aqueles que

Page 1925: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

podem escusá-la, ou seja, nãoaceitá-la ou pedir dispensa (art.1.736).

Pelo primeiro dispositivo,não podem ser tutores e serãoexonerados da tutela: a) aquelesque não tiverem a livreadministração de seus bens, comono caso dos menores ou dospródigos; b) aqueles que, nomomento de lhes ser deferida atutela, se acharem constituídos emobrigação para com o menor, outiverem que fazer valer direitoscontra este, e aqueles cujos pais,filhos ou cônjuges tiveremdemanda contra o menor; c) os

Page 1926: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

inimigos do menor, ou de seuspais, ou aqueles que tiverem sidopor estes expressamenteexcluídos da tutela; d) oscondenados por crime de furto,roubo, estelionato, falsidade,contra a família ou os costumes,tenham ou não cumprido pena; e)as pessoas de mau procedimento,ou falhas em probidade, e asculpadas de abuso em tutoriasanteriores, cabendo análise casoa caso; e f) aqueles queexercerem função públicaincompatível com a boaadministração da tutela, caso deum juiz, de um promotor de

Page 1927: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

justiça ou de um delegado depolícia.

As hipóteses expostas, comose pode perceber, são de falta delegitimação para o ato, para oexercício da tutela. Por outra via,as hipóteses de escusa, a seguirdemonstradas, são situações emque a dispensa pode ou nãoocorrer, havendo um direitopotestativo das pessoaselencadas. O procedimento deescusa corre perante a Vara daInfância e da Juventude, sehouver. Não havendo esse juízoespecializado, a competência seráda Vara da Família ou da Vara

Page 1928: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

Cível, pela ordem.De acordo com o art. 1.736

do CC/2002, podem escusar-seda tutela, inicialmente, asmulheres casadas. Há proposta derevogação do dispositivo,conforme o Enunciado n. 136 doCJF/STJ, da I Jornada de DireitoCivil. Isso porque “não háqualquer justificação de ordemlegal para legitimar que mulherescasadas, apenas por essacondição, possam se escusar datutela”. Realmente, é de seconcordar com a proposta, pois odispositivo parece ser herança daperversa distinção entre homens e

Page 1929: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

mulheres, que não mais existe.Também cabe a escusa da

tutela aos maiores de 60 anos.Igualmente nesse ponto há que sediscutir se a norma é ou nãodiscriminatória, assim comoacontece com o art. 1.641, incisoII, do CC/2002, que continua adiscriminar o idoso, impondo-lheo regime da separaçãoobrigatória de bens, agora com 70anos de idade.

Seguindo, o inciso III do art.1.736 do Código Civil estabeleceque podem escusar-se da tutelaaqueles que tiverem sob suaautoridade mais de três filhos. A

Page 1930: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

ideia é que há um excesso deresponsabilidades nessashipóteses, o que podefundamentar a declinação domunus. Por fim, existem outrassituações que dizem respeito amotivos relevantes nos quatroúltimos incisos do preceitomaterial. Assim é o caso dosimpossibilitados porenfermidade; daqueles quehabitarem longe do lugar onde sehaja de exercer a tutela; daquelesque já exercem uma tutela oucuratela e dos militares emserviço (art. 1.735, incisos IV aVII, do CC/2002).

Page 1931: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

Ainda no que diz respeito àescusa, aquele que não forparente do menor não poderá serobrigado a aceitar a tutela, sehouver no lugar parente idôneo,consanguíneo ou afim, emcondições de exercê-la (art.1.737 do CC). Trata-se de maisuma situação de dispensa pessoal,o que a doutrina denomina comorecusa da tutela por estranho.2

O art. 1.738 da codificaçãomaterial de 2002 consagra prazodecadencial de dez dias, contadosda sua designação, para amanifestação da escusa pelo tutor.Não havendo essa manifestação

Page 1932: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

expressa, deve-se entender que aparte renunciou ao direitopotestativo de alegar essadispensa pessoal. No entanto, seo motivo escusatório ocorrerdepois de aceita a tutela, os dezdias serão contados a partir domomento em que sobrevier essemotivo.

O prazo para a manifestaçãoda escusa era de cinco dias,conforme o art. 1.192 doCPC/1973. Pelo mesmodispositivo, contar-se-ia o prazo:a) antes de aceitar o encargo, daintimação para prestarcompromisso; b) depois de entrar

Page 1933: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

em exercício, do dia em quesobrevier o motivo da escusa.Não sendo requerida a escusa noprazo estabelecido neste artigo,reputar-se-ia renunciado o direitode alegá-la (art. 1.192, parágrafoúnico, do CPC/1973). Como oCC/2002 regulamentou igual einteiramente a matéria relativa aoprazo de escusa na tutela, esteautor sempre sustentou queprevaleceria o seu art. 1.738 emrelação ao CPC de 1973.Todavia, a norma processualainda prevaleceria no seguinteponto, por não ter sido tratadapelo Código Civil: o juiz deveria

Page 1934: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

decidir de plano esse pedido deescusa. Se não a admitisse,exerceria o nomeado a tutela oucuratela enquanto não fossedispensado por sentençatransitada em julgado (art. 1.193do CPC/1973).

Pois bem, o Novo Código deProcesso Civil tratou do tema noseu art. 760, estabelecendo que“o tutor ou o curador poderáeximir-se do encargoapresentando escusa ao juiz noprazo de 5 (cinco) dias contado: I– antes de aceitar o encargo, daintimação para prestarcompromisso; II – depois de

Page 1935: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

entrar em exercício, do dia emque sobrevier o motivo da escusa.§ 1º Não sendo requerida aescusa no prazo estabelecidoneste artigo, considerar-se-árenunciado o direito de alegá-la.§ 2º O juiz decidirá de plano opedido de escusa, e, não oadmitindo, exercerá o nomeado atutela ou a curatela enquanto nãofor dispensado por sentençatransitada em julgado”. Como anorma é posterior e mais especialdo que o Código Civil, pareceque sobre ela prevalece, havendouma revogação tácita, nos termosdo art. 2º da Lei de Introdução,

Page 1936: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

notadamente por tratarinteiramente da mesma matéria.Como aspecto de organização dodispositivo, sem modificação deconteúdo, o teor do antigo art.1.193 do Estatuto Processualpassou a compor um parágrafo donovo preceito. No mais, osconteúdos foram mantidos,devendo agora prevalecer.

Por fim, no que concerne àescusa, se o juiz não admiti-la, onomeado exercerá a tutelaenquanto o recurso interposto nãotiver provimento (art. 1.739 doCC/2002). Além disso,responderá desde logo pelas

Page 1937: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

perdas e danos o tutor nomeadoque não atua nesse lapsotemporal, como determina a lei,em relação aos prejuízos que omenor venha a sofrer.

Voltando ao Código deProcesso Civil, ele continua aestabelecer que o tutor ou curadorserá intimado a prestarcompromisso no prazo de cincodias contados: a) da nomeaçãofeita na conformidade da lei civil;e b) da intimação do despachoque mandar cumprir o testamentoou o instrumento público que ohouver instituído. Trata-se donovo art. 759 do CPC/2015,

Page 1938: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

reprodução integral do art. 1.187do CPC/1973.

O Código de Processo Civilanterior cuidava da hipotecalegal quando da nomeação dotutor, categoria que foi extintapelo CC/2002, o que trazia – eainda traz – a dedução de que taisnormas anteriores foramtotalmente prejudicadas (arts.1.188 a 1.191 do CPC/1973). ONovo Código de Processo Civilnão cuidou dessa hipotecaimposta pela norma, o que nãopoderia ser diferente. Emverdade, a citada hipoteca legalfoi substituída por uma caução,

Page 1939: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

regulamentada pelo Código Civil,como ainda será exposto nestecapítulo.

A hipoteca legal constava damesma forma dos arts. 37 e 38 doECA (Lei 8.069/1990). Todavia,tais dispositivos foram alteradospela Lei 12.010/2009, passando atratar de procedimentos da tutelatestamentária. É a redação atualdo art. 37 do ECA: “O tutornomeado por testamento ouqualquer documento autêntico,conforme previsto no parágrafoúnico do art. 1.729 da Lei 10.406,de 10 de janeiro de 2002 –Código Civil, deverá, no prazo de

Page 1940: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

30 dias após a abertura dasucessão, ingressar com pedidodestinado ao controle judicial doato, observando o procedimentoprevisto nos arts. 165 a 170 destaLei. Parágrafo único. Naapreciação do pedido, serãoobservados os requisitosprevistos nos arts. 28 e 29 destaLei, somente sendo deferida atutela à pessoa indicada nadisposição de última vontade, serestar comprovado que a medidaé vantajosa ao tutelando e que nãoexiste outra pessoa em melhorescondições de assumi-la”.

Feitas tais considerações,

Page 1941: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

nota-se que o Código Civil possuinormas que disciplinam oexercício da tutela. A primeiradelas é o art. 1.740, que traz asincumbências do tutor noexercício do seu múnus público,a saber: a) dirigir a educação domenor, defendê-lo e lhe prestar osalimentos, conforme os seushaveres e condição; b) reclamardo juiz que tome as providênciasnecessárias para a correção domenor, caso essa seja necessária;e c) cumprir com os demaisdeveres que normalmente cabemaos pais, sempre ouvida a opiniãodo menor, se este já contar 12

Page 1942: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

anos de idade. Sem prejuízosdesses deveres, que serãoexercidos sem a inspeçãojudicial, incumbe ao tutor, agorasob a referida intervenção dojuiz, administrar os bens dotutelado, sempre em proveitodeste, cumprindo seus deverescom zelo e boa-fé (art. 1.741 doCC/2002).

Tendo em vista afiscalização dos atos do tutor, oCC/2002 admite a nomeação pelojuiz de um protutor (art. 1.742),que igualmente assumirá ummúnus público, norteado pelasmesmas atribuições que tem o

Page 1943: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

tutor, inclusive guiado pela boa-fée pela eticidade. Anotam JonesFigueirêdo Alves e Mário LuizDelgado que se trata de uma“forma de inspeção judicialdelegada, no sentido demonitoramento da tutela, em suafunção de proteger o menortutelado”.3 Aplicando o preceito,o Tribunal de Justiça do DistritoFederal admitiu a nomeação depadrasto como protutor, “noobjetivo de resguardar o melhorinteresse da criança, nomeia-seseu pai afetivo (ex-companheiroda sua mãe) protutor para ajudarna administração de seus bens”

Page 1944: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

(TJDF, Recurso2009.05.1.006057-5, Acórdão586.569, Segunda Turma Cível,Rel. Des. Sérgio Rocha, DJDFTE17.05.2012, p. 89).

De acordo com o art. 1.743da norma material geral, se osbens e os interessesadministrativos exigiremconhecimentos técnicos, foremcomplexos, ou realizados emlugares distantes do domicílio dotutor, poderá este, medianteaprovação judicial, delegar aoutras pessoas físicas oujurídicas o exercício parcial datutela. Como comenta Maria

Page 1945: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

Helena Diniz, o poder do tutor éuno e indivisível, sendo o encargopessoal. Entretanto, isso nãoobsta a cessão da tutela, umaconcessão parcial do encargo, oque se denomina tutela parcial oucotutoria.4 Como se percebe, aúltima hipótese não se confundecom a atuação do protutor, poisaqui a tutela é exercida de formaconcomitante, nos limites do quefor determinado pelo juiz da Varada Infância e da Juventude.

O Código Civil de 2002, aexemplo do anterior, continuatrazendo a responsabilidade dojuiz quanto à tutela havendo

Page 1946: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

prejuízos ao tutelado, podendoessa responsabilidade ser diretaou subsidiária em relação ao tutor(art. 1.744 do CC). Aresponsabilidade do juiz serádireta e pessoal quando não tivernomeado o tutor ou não o houverfeito oportunamente. Por outravia, essa responsabilidade domagistrado será subsidiáriaquando não tiver exigido garantialegal do tutor, nem o removido,tanto que se tornou suspeito. Nosdois casos, exige-se apenas culpado juiz, e não o dolo, que eraregra geral contida no art. 133 doCPC/1973, repetida pelo art. 143

Page 1947: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

do CPC/2015.Ainda no que tange ao

exercício do munus, os bens domenor serão entregues ao tutormediante termo especificadodesses bens e seus valores,mesmo que os pais o tenhamdispensado, o que se denominainventário de bens (art. 1.745 doCC). Entretanto, se o patrimôniodo menor for de valorconsiderável, poderá o juizcondicionar o exercício da tutelaà prestação de uma cauçãobastante para tanto, podendodispensá-la se o tutor for dereconhecida idoneidade (art.

Page 1948: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

1.745, parágrafo único, do CC).Como exposto anteriormente, essacaução substituiu a hipoteca legalque era conferida ao tutelado oucuratelado em razão dos bensimóveis do tutor ou curador, nostermos do art. 827, IV, doCC/1916. Tanto isso é verdadeque o art. 2.040 do CC/2002,norma de direito intertemporal,enuncia que: “A hipoteca legaldos bens do tutor ou curador,inscrita em conformidade com oinciso IV do art. 827 do CódigoCivil anterior, Lei 3.071, de 1º dejaneiro de 1916, poderá sercancelada, obedecido o disposto

Page 1949: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

no parágrafo único do art. 1.745deste Código”. Em suma, todasessas hipotecas legais devem sersubstituídas pela caução, sobpena de não mais valerem, o quetambém pode atingir a validadeda própria tutela.

Se o menor possuir bens,será sustentado e educado aexpensas desses bens existentes,arbitrando o juiz, para tal fim, asquantias que lhe pareçamnecessárias (art. 1.746 do CC).Por conseguinte, o juiz deveconsiderar o rendimento dafortuna do pupilo quando o seupai ou a sua mãe não as houver

Page 1950: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

fixado.Além daquelas atribuições

constantes do art. 1.740 da normageral material, no seu art. 1.747,o Código Civil de 2002 trazoutras funções do tutor quetambém independem deautorização judicial, a saber. Aprimeira delas é a de representaro menor, até os 16 anos, nos atosda vida civil, e assisti-lo, apósessa idade, nos atos em que forparte. Deve também o tutorreceber as rendas e pensões domenor e as quantias a ele devidas,sempre guiado pela boa-fé nesserecebimento. O tutor tem, ainda, a

Page 1951: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

atribuição de fazer as despesas desubsistência e educação emproveito do menor, bem como asde administração, conservação emelhoramentos de seus bens.Pode, também, alienar os bens domenor destinados à venda. Porfim, cabe ao tutor promover,mediante preço conveniente, oarrendamento de bens de raiz, ouseja, dos imóveis do menor quepossam ser locados.

Enquanto nos casosanteriormente listados aautorização judicial não se faznecessária, o art. 1.748 doCC/2002 consagra outras

Page 1952: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

incumbências, que necessitam daanuência do juiz. O primeiroinciso prevê a hipótese depagamento das dívidas do menor,o que tem natureza onerosa,justificando essa fiscalização.Compete também ao tutor, comautorização do juiz, aceitar pelomenor as heranças, os legados ouas doações, ainda que comencargos (doações modais, decaráter oneroso). A ele cabe, comchancela judicial, transigir, ouseja, celebrar contratos visando àextinção de dívidas. O mesmo sediga quanto ao ato de vender osbens móveis do menor, cuja

Page 1953: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

conservação não convier, e osimóveis nos casos em que forpermitido. Por fim, a últimaatribuição do tutor que necessitade autorização do juiz é a depropor em juízo as ações, ounelas assistir o menor, epromover todas as diligências abem deste, assim como defendê-lo nos pleitos contra ele movidos.

As últimas hipótesesapontadas são de outorgajudicial, e a falta desta gera aineficácia do ato, até que ocorraa confirmação posterior (art.1.748, parágrafo único, do CC).Anote-se que a opção legislativa,

Page 1954: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

aqui, não foi pela invalidade doato, como ocorre com a outorgaconjugal, geradora de suanulidade relativa (arts. 1.647 e1.649 do CC/2002).

Sem prejuízo dessassituações, há atos que o tutor nãopode praticar mesmo comautorização judicial, sob pena desua nulidade absoluta, conformedisciplina o art. 1.749 do CódigoCivil. O primeiro deles é deadquirir por si, ou por interpostapessoa, mediante contratoparticular, bens móveis ouimóveis pertencentes ao menor. Asegunda vedação diz respeito a

Page 1955: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

dispor dos bens do menor a títulogratuito. Ao tutor, por fim, évedado constituir-se cessionáriode crédito ou de direito, contra omenor. Como os casos são denulidade absoluta, cabereconhecimento de ofício danulidade e a ação correspondenteé imprescritível (art. 169 doCC/2002), de acordo com acorrente seguida por este autor.

Em relação aos bensimóveis dos menores sob tutela,estes podem ser vendidos quandohouver manifesta vantagem aomenor, mediante prévia avaliaçãojudicial e aprovação do juiz, por

Page 1956: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

meio de alvará judicial (art.1.750 do CC/2002). Em havendoa venda sem essa vantagem eaprovação do juiz, o negóciojurídico é nulo de pleno direito,pois a situação é de nulidadevirtual, eis que a lei acabaproibindo o ato de forma inversa,sem, contudo, cominar sanção(art. 166, inciso VII, segundaparte, do CC/2002). A ilustrar,imagine-se uma hipótese em que omenor mudou sua residência,estando em local diverso daqueleonde está o imóvel de suapropriedade. Nessa outra cidade,vive ele de aluguel, havendo

Page 1957: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

interesse plausível para a vendado seu imóvel, para que os seusrepresentantes comprem outronaquele lugar onde agora mora oincapaz.

Antes de assumir a tutela, ediante do dever de informaranexo à boa-fé objetiva, o tutordeclarará tudo o que o menor lhedeva, sob pena de não lhe podercobrar, enquanto exerça a tutoria,salvo provando que não conheciao débito quando a assumiu (art.1.751 do CC/2002). Se o tutornão cumprir esse seu dever emmomento oportuno, perderá umdireito de cobrança, o que é

Page 1958: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

aplicação do conceito desupressio, relacionado à boa-fé,constituindo esta a perda de umdireito ou de uma posiçãojurídica pelo seu não exercício notempo. Todavia, é importanteressaltar que esse últimodispositivo é aplicado aos casosexcepcionais em que o tutor écredor do tutelado, cabendo umaditivo ou adendo do inventáriodos bens do menor, com ainclusão das dívidas em relaçãoao tutor.

Ainda a respeito doexercício da tutela, dispõe o art.1.752 do Código Civil que o tutor

Page 1959: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

responde pelos prejuízos que, porculpa, ou dolo, causar ao tutelado(responsabilidade civilsubjetiva). Consigne-se, contudo,que pelo ato do tutelado aresponsabilidade do tutor éobjetiva, notadamente se houverprejuízo a terceiros, pelo queconsta dos arts. 932, inciso II, e933 do CC/2002. Há, assim, umaresponsabilidade objetivaindireta ou impura, que dependeda prova de culpa do tutelado.Por outra via, o tutor tem direito aser pago pelo que despender noexercício do munus, o que é umdireito de reembolso, salvo nos

Page 1960: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

casos descritos no art. 1.734 doCC/2002, diante da sua flagranteatuação por liberalidade ougentileza.

Além desse direito dereembolso, o art. 1.752 doCódigo de 2002 consagra a favordo tutor um montante pela suaatuação, proporcional ao valordos bens administrados. Quantoao protutor, o tutor do tutor, seráarbitrada uma gratificaçãomódica pela fiscalização efetuada(art. 1.752, § 1º, do CC). Comoalerta Maria Helena Diniz, e comrazão, essa gratificação do tutornão é uma contraprestação pela

Page 1961: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

sua atuação, mas sim uma espéciede indenização ou compensaçãodiante da sua atuação.5

Em complemento, determinao § 2º do art. 1.752 do CC/2002que são solidariamenteresponsáveis pelos prejuízos aspessoas às quais competiafiscalizar a atividade do tutor e asque concorreram para o dano.Essa hipótese de solidariedadelegal, a respeito dos danos dequalquer natureza – materiais emorais, nos termos da Súmula 37do Superior Tribunal de Justiça –,atinge o protutor, o juiz ouqualquer pessoa que tenha

Page 1962: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

concorrido culposamente para oprejuízo, o que é subsunção daregra do art. 942 do CC/2002.

O Código Civil, aindaquanto à tutela, traz tambémregras quanto aos bens dotutelado e a prestação de contaspelo tutor. De início, em relaçãoaos bens dos tutelados, os tutoresnão podem conservar em seupoder dinheiro dos tutelados alémdo necessário para as despesasordinárias com o seu sustento, asua educação e a administraçãode seus bens (art. 1.753). Emhavendo necessidade, os objetosde ouro e prata, pedras preciosas

Page 1963: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

e móveis serão avaliados porpessoa idônea e, após autorizaçãojudicial, alienados, e o seuproduto convertido em títulos,obrigações e letras deresponsabilidade direta ouindireta da União ou dos Estados(art. 1.753, § 1º, do CC).

Nesses casos, deve-seatender preferentemente àrentabilidade, e recolhidos aoestabelecimento bancário oficialou aplicados na aquisição deimóveis, conforme fordeterminado pelo juiz. Essemesmo destino terá o dinheiroproveniente de qualquer outra

Page 1964: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

procedência, caso de bensrecebidos pelo tutelado porherança (art. 1.753, § 2º). A leienuncia ainda que os tutoresrespondem pela demora naaplicação dos valores acimareferidos, pagando os juros legaisdesde o dia em que deveriam daresse destino, o que não os eximeda obrigação, que o juiz faráefetiva, da referida aplicação(art. 1.753, § 3º).

No que concerne aos valoresque existirem em estabelecimentobancário oficial, na forma do queestatui o art. 1.754 do CC/2002,estes não poderão ser retirados

Page 1965: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

senão com autorização judicial esomente para as seguintesdestinações: a) para as despesascom o sustento e educação dotutelado, ou a administração deseus bens; b) para a compra debens imóveis e títulos, obrigaçõesou letras, nas condições previstasno § 1º do art. 1.753; c) para oemprego em conformidade com odisposto por quem os houverdoado, ou deixado, havendo, porexemplo, uma doação comencargo; e d) para a entrega aórfãos, quando emancipados, oumaiores, ou, mortos eles, aos seusherdeiros. O diploma material em

Page 1966: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

questão trata do levantamento dasquantias depositadas durante oexercício da tutela. O pedido detal levantamento deve ser bemfundamentado, sendo certo quemeras alegações genéricas, semqualquer prova, não dão ensejoao deferimento do requerido.Essa tem sido a melhor conclusãojurisprudencial (TJSP, Agravo deInstrumento 528.683.4/0,Acórdão 2606430, São Paulo,Décima Câmara de DireitoPrivado, Rel. Des. Ana deLourdes, j. 08.04.2008, DJESP06.06.2008).

No que tange à prestação de

Page 1967: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

contas, trata-se de um deverdecorrente da tutela, conformereconhece o art. 1.755 do CódigoCivil, e que subsiste mesmo quehaja uma disposição em contráriofeita pelos pais, quando, porexemplo, da tutela testamentária.A prestação de contas visajustamente àquilo que busca omunus, qual seja, a proteção dotutelado ou pupilo. A lei exigenessa prestação de contas umbalanço anual (art. 1.756 doCC), a ser apresentado pelo tutorao juiz, que deverá aprová-lo,anexando aos autos do inventáriodos bens do menor. Sem prejuízo

Page 1968: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

disso, os tutores prestarão contasde dois em dois anos, e tambémquando, por qualquer motivo,deixarem o exercício da tutela outoda vez que o juiz acharconveniente (art. 1.757 do CC).

Essas contas serão prestadasem juízo e julgadas depois daaudiência dos interessados,recolhendo o tutor imediatamentea estabelecimento bancáriooficial os saldos, ou adquirindobens imóveis, ou títulos,obrigações ou letras, na formadaquele já comentado § 1º do art.1.753 do CC/2002. A prestaçãode contas será processada em

Page 1969: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

juízo, nos próprios autos em queocorreu a nomeação do tutor(Vara da Infância, da Família ouCível, pela ordem, se houver). Hánecessidade de intervenção doMP, diante do interesse deincapazes. Havia umprocedimento especial para aação de prestação de contas entreos arts. 914 a 919 do Código deProcesso anterior. O Novo CPCnão trata dessa medida entre osprocedimentos especiais,seguindo a demanda oprocedimento comum.

Finda a tutela pelaemancipação ou maioridade, a

Page 1970: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

quitação do menor não produziráefeito antes de aprovadas ascontas pelo juiz, permanecendointegral, até então, aresponsabilidade do tutor (art.1.758 do CC/2002). Nos casos demorte, ausência, ou interdição dotutor, as contas serão prestadaspor seus herdeiros ourepresentantes (art. 1.759 doCC/2002). Serão levadas acrédito do tutor todas as despesasjustificadas e reconhecidamenteproveitosas ao menor (art. 1.760do CC/2002), devendo asdespesas com a prestação dascontas ser pagas pelo tutelado

Page 1971: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

(art. 1.761 do CC/2002).O art. 1.762 da Norma Geral

Privada trata do alcance do tutor,que vem a ser “a diferença paramenos verificada na prestação decontas do exercício da tutela”.6Tanto esse alcance quanto o saldocontra o tutelado sãoconsiderados pelo dispositivocomo dívidas de valor, vencendojuros legais e correção monetáriapelo índice oficial desde ojulgamento definitivo das contas.

Para encerrar o estudo datutela, os arts. 1.763 a 1.766 doCódigo Civil em vigor tratam da

Page 1972: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

extinção da tutela. A primeiradelas é relacionada com amaioridade ou a emancipação domenor, uma vez que cessa a suacondição de incapaz. Essashipóteses independem deintervenção judicial. A tutela éigualmente extinta ao cair omenor sob o poder familiar, nahipótese de reconhecimento depaternidade, maternidade ouadoção (parentesco civil), o quetambém independe de atuação dojuiz. A terceira hipótese é relativaao termo final da tutela, em queera obrigado a servir o tutor, semque haja ação judicial. Como

Page 1973: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

quarta situação de extinção, atutela é extinta em havendo escusalegítima prevista nas situaçõesprevistas em lei, conformedecisão do juiz. Por fim, ocorreráo seu fim em havendo remoção dotutor pelo juiz, caso não exerça atutoria como estatui a lei.

No que concerne ao termofinal, o prazo para a atuação dotutor é de dois anos, cabendoexoneração após esse lapsotemporal (art. 1.765 doCC/2002). Entretanto, pode otutor continuar no exercício datutela, além desse prazo, desdeque o queira e o juiz entenda que

Page 1974: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

isso é conveniente ao menor,tendo como parâmetro osprincípios do melhor interesse eda proteção integral do menor(art. 1.765, parágrafo único, doCC/2002).

A remoção ou destituição dotutor cabe quando este fornegligente, prevaricador ouincurso em incapacidade (art.1.766 do CC/2002). Esseprocedimento de remoção podeter iniciativa do MP ou de quemtenha justo interesse. No Códigode Processo Civil de 1973, talprocedimento específico constavaentre os arts. 1.194 a 1.198. No

Page 1975: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

Novo CPC essas antigas regrascorrespondem aos arts. 761 a763, com modificações,especialmente porque não há maisum tópico especial a respeito doprocesso.

Nos termos do art. 761 doNovo Codex, “incumbe aoMinistério Público ou a quemtenha legítimo interesse requerer,nos casos previstos em lei, aremoção do tutor ou do curador.Parágrafo único. O tutor ou ocurador será citado para contestara arguição no prazo de 5 (cinco)dias, findo o qual observar-se-á oprocedimento comum”. O prazo

Page 1976: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

de cinco dias já estava no art.1.195 do CPC/1973. O art. 1.196do CPC/1973 estabelecia aincidência de regras relativas acautelar ao final do prazo. Assim,a conversão ao procedimentocomum é inovação.

Na linha do que enunciava oantigo art. 1.197 do CPC/1973, oart. 762 do Novo CPC estatuique, em caso de extremagravidade, o juiz poderásuspender o tutor ou o curador doexercício de suas funções,nomeando substituto interino.Igualmente sem qualquernovidade. Aqui não houve

Page 1977: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

qualquer modificação substancial.Por derradeiro, conforme o

art. 763, caput, do Novo CPC,correspondente ao art. 1.198 doCPC antigo, cessando as funçõesdo tutor ou do curador pelodecurso do prazo em que eraobrigado a servir, ser-lhe-á lícitorequerer a exoneração doencargo. Não o fazendo dentrodos dez dias seguintes àexpiração do termo, entender-se-áreconduzido, salvo se o juiz odispensar (art. 763, § 1º, do NovoCPC). A única inovação, que jáera exigida na prática, consta do §2º do novo preceito, pelo qual,

Page 1978: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

cessada a tutela ou curatela, éindispensável a prestação decontas pelo tutor ou curador, naforma da lei civil.

Vistas as regras a respeitoda tutela, a curatela igualmente éinstituto de direito assistencial,para a defesa dos interesses demaiores incapazes. Assim comoocorre com a tutela, há um múnuspúblico, atribuído pela lei. Sãopartes da curatela o curador e ocuratelado.

Em regra, estão sujeitos àcuratela os maiores incapazes. Seabsolutamente incapazes (art. 3º,incisos II e III, do CC), serão

Page 1979: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

representados pelo curador para aprática dos atos da vida civil, sobpena de nulidade absoluta do quefor praticado (art. 166, inciso I,do CC). Sendo relativamenteincapazes (art. 4º, incisos II, III eIV, do CC), devem serdevidamente assistidos, sob penade anulabilidade do ato, negócioou contrato celebrado (art. 171,inciso I, do CC). Reafirme-se,como dito quanto à tutela, que acuratela não se confunde com arepresentação e com a assistênciapor ser instituto geral deadministração de interesses deoutrem.

Page 1980: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

A curatela também não seconfunde com a tutela, pois aúltima visa à proteção deinteresses de menores; enquanto aprimeira, à proteção dos maiores.Entretanto, vale dizer que,ocorrendo a interdição de menor,em razão de certas doenças, porexemplo, este passa a ser sujeitoà curatela, o que é melhor para adefesa dos interesses dovulnerável (nesse sentido, ver:TJRJ, Acórdão 6.043/1997,Duque de Caxias, Quarta CâmaraCível, Rel. Des. Wilson Marques,j. 15.06.1999). Todavia, aquestão não é pacífica, pois há

Page 1981: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

julgados que entendem seremmelhores caminhos o poderfamiliar e a tutela para o menorinterditado (TJMG, Acórdão1.0000.00.304048-2/000,Uberlândia, Oitava CâmaraCível, Rel. Des. PedroHenriques, j. 27.12.2002, DJMG30.05.2003). Trata-se, portanto,de questão polêmica.

O art. 1.767 do CC/2002traz o rol taxativo dos interditos,ou seja, daqueles que estãosujeitos a curatela, a saber. Oinciso I menciona aqueles que,por enfermidade ou deficiênciamental, não tiverem o necessário

Page 1982: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

discernimento para os atos davida civil. A norma equivale aoart. 3º, inciso II, da própria normamaterial. Como exemplos podemser citados os casos dospsicopatas graves, dos psicóticos,dos alienados mentais, dosneuróticos graves, entre outros.

O inciso II do art. 1.767 doCC elenca aqueles que, por outracausa duradoura, não puderemexprimir a sua vontade, o quecorresponde ao art. 3º, inciso III,do mesmo Código Civil. Podemser citadas as situações dossurdos-mudos, que não têmqualquer condição de exprimir

Page 1983: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

sua vontade, e das pessoas que seencontram em coma profundo.

Os deficientes mentais, osébrios habituais (alcoólatrasviciados) e os toxicômanos(viciados em tóxicos) igualmentesão interditados por força do art.1.767, inciso III, do Código Civil.A mesma premissa vale para osexcepcionais sem completodesenvolvimento mental, caso doacometido por síndrome de Down(art. 1.767, inciso IV, do CC). Asnormas equivalem ao art. 4º,incisos II e III, da mesma leimaterial, ao tratar dosrelativamente incapazes. Anote-se

Page 1984: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

que correto julgado do SuperiorTribunal de Justiça, do ano de2014, entendeu que essa previsãoengloba o sociopata, que tambémpode ser interditado: “apossibilidade de interdição desociopatas que já cometeramcrimes violentos deve seranalisada sob o mesmo enfoqueque a legislação dá àpossibilidade de interdição –ainda que parcial – dosdeficientes mentais, ébrioshabituais e os viciados emtóxicos (art. 1.767, III, doCC/2002). Em todas essassituações o indivíduo tem sua

Page 1985: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

capacidade civil crispada, demaneira súbita e incontrolável,com riscos para si, queextrapolam o universo dapatrimonialidade, e que podematingir até a sua própriaintegridade física, sendo tambémratio não expressa, desse excertolegal, a segurança do gruposocial, mormente na hipótese dereconhecida violência daquelesacometidos por uma das hipótesesanteriormente descritas, tantoassim que, não raras vezes,sucede à interdição, pedido deinternação compulsória. Comigual motivação, a medida da

Page 1986: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

capacidade civil, em hipótesesexcepcionais, não pode ser ditadaapenas pela mediana capacidadede realizar os atos da vida civil,mas, antes disso, deve ela seraferida pelo risco existente nosestados crepusculares dequalquer natureza, dointerditando, onde é possível seavaliar, com precisão, o potencialde autolesividade ou de agressãoaos valores sociais que oindivíduo pode manifestar, paradaí se extrair sua capacidade degerir a própria vida, isto porque amente psicótica não pendula entresanidade e demência, mas há

Page 1987: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

perenidade etiológica nas açõesdo sociopata” (STJ, REsp1.306.687, Terceira Turma, Rel.Min. Nancy Andrighi, j.18.03.2014).

Os pródigos, pessoas quegastam de maneira destemperadao próprio patrimônio, o que podelevá-los à penúria, são os últimosinterditos, expressos no art.1.767, inciso V, do CC/2002. Emrelação à sua interdição relativa,enuncia o art. 1.782 do próprioCódigo Civil que esta só privaráde, sem curador, emprestar,transigir, dar quitação, alienar,hipotecar, demandar ou ser

Page 1988: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

demandado, e praticar, em geral,os atos que não sejam de meraadministração. Nesse contexto, opródigo pode, livremente, casar-se – sem a imposição de qualquerregime legal ou obrigatório –,fazer testamento, reconhecerfilhos e ser empregado.

Como se sabe, aincapacidade não se presume,havendo a necessidade doreferido processo de interdição,para dele decorrer a curatela.Sendo assim, é fundamental oestudo das regras relativas a esseprocesso, constantes do Códigode Processo Civil.

Page 1989: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

Iniciando-se peloslegitimados para a demanda, oart. 1.768 do Código Civil foiexpressamente revogado pelo art.1.072, inciso II, do Novo Códigode Processo Civil. Previa essecomando: “A interdição deve serpromovida: I – pelos pais oututores; II – pelo cônjuge, ou porqualquer parente; III – peloMinistério Público”. O motivo derevogação foi o de concentrar oslegitimados para a ação deinterdição no Estatuto Processual.Ademais, a expressão deve eracriticada por ser peremptória,tendo sido substituída pelo termo

Page 1990: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

pode.Conforme o art. 747 do

Novo CPC, que unificou otratamento do tema, “a interdiçãopode ser promovida: I – pelocônjuge ou companheiro; II –pelos parentes ou tutores; III –pelo representante da entidade emque se encontra abrigado ointerditando; IV – pelo MinistérioPúblico. Parágrafo único. Alegitimidade deverá sercomprovada por documentaçãoque acompanhe a petição inicial”.Vejamos a confrontação dessecomando com o antigo art. 1.177,seu correspondente na

Page 1991: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

codificação instrumental anterior.O inciso I do art. 747 do

CPC/2015 menciona o cônjuge oucompanheiro, enquanto o inciso IIdo art. 1.177 apenas expressava ocônjuge. Como visto em capítulopróprio, o Novo CPC procuroudar um tratamento uniforme aocasamento e à união estável, oque, em regra, veio em boa hora.Existia proposta no antigo projetoRicardo Fiúza (PL 699/2011) deinclusão expressa da convivente,o que acabou prejudicado. Ajurisprudência já vinha seguindoessa lógica (nessa linha: TJMG,Embargos de Declaração

Page 1992: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

1.0024.06.033131-1/0031, BeloHorizonte, Segunda CâmaraCível, Rel. Des. BrandãoTeixeira, j. 23.09.2008, DJEMG22.10.2008; e TJRJ, Acórdão4.035/1993, Rio de Janeiro,Primeira Câmara Cível, Rel. Des.Paulo Sergio Fabião, j.20.09.1994).

O inciso II do art. 747 doCPC/2015 reconhece alegitimidade aos parentes etutores. Existe, desse modo,correspondência ao art. 1.177,incisos I e II, que expressava opai, a mãe, o tutor e algumparente próximo. Deve-se

Page 1993: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

entender pela inclusão de todas asformas de parentesco, seja porconsanguinidade (todos osascendentes e descendentes,colaterais até quarto grau,inclusive), por afinidade (sogra,sogro, nora, genro, enteado,enteada, padrasto, madrasta) ouem decorrência de parentescocivil (adoção, inseminaçãoheteróloga e parentalidadesocioafetiva).

Em relação à legitimidadedo Ministério Público, esse órgãosomente promoveria a interdiçãoem caso de doença mental grave,se não existisse ou não requeresse

Page 1994: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

a interdição alguma das pessoasdesignadas pela lei ou, ainda, seexistindo tais pessoas, fossemelas incapazes. Essa era a regrado art. 1.769 do CC/2002,revogada expressamente peloNovo Código de Processo Civil(art. 1.072, inciso II, doCPC/2015). Aperfeiçoando aredação do art. 1.178 doCPC/1973, o art. 748 do NovoCodex passou a estabelecer que oMinistério Público só promoveráinterdição em caso de doençamental grave: a) se as pessoasdesignadas nos incisos I, II e IIIdo art. 747 não existirem ou não

Page 1995: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

promoverem a interdição; e b) se,existindo, forem incapazes aspessoas mencionadas nos incisosI e II do art. 747. O que sepercebe é que a legitimidade doMP é somente subsidiária eextraordinária, funcionandocomo substituto processual.Pontue-se que matéria passou aser concentrada somente noestatuto processual.

Estabelecia o art. 1.770 doCódigo Civil que, sendo ainterdição promovida pelo MP, ojuiz nomearia um defensor aosuposto incapaz, que eradenominado curador especial.

Page 1996: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

No mesmo sentido era a norma doart. 1.179 do CPC anterior.Todavia, o último preceito não foireproduzido pelo EstatutoProcessual emergente, querevogou também o dispositivomaterial (art. 1.072, II, doCPC/2015).

Desse modo, parece estarprejudicado o nosso entendimentoanterior, segundo o qual, nosdemais casos, ou seja, sendo ainterdição promovida pelasoutras pessoas elencadas pela lei,o próprio MP seria o defensor dointerdito. Isso porque o art. 752, §1º, do Novo CPC passou a

Page 1997: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

determinar que o MinistérioPúblico intervirá como fiscal daordem jurídica nas ações deinterdição que não propõe. Nosistema anterior, algunsdoutrinadores defendiam, pelomenos em parte, essa tese, peladesnecessidade de atuação doMinistério Público em casos tais.Nesse sentido, Euclides deOliveira comentava decisão doTribunal de Justiça de São Paulo,que assim concluiu:

“Interdição. Pedido do Ministério Público paranomeação de curador especial para defesados interesses do interditando. Nãopossibilidade de a função ser exercida pelo

Page 1998: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

MP, sob pena de conflito de interesses, se ocaso. Agravo acolhido” (TJSP, Agravo deInstrumento 485.078-4/8, agravante oMinistério Público, agravada JGS, QuartaCâmara de Direito Privado do TJSP, recursoprovido por maioria, Rel. José Geraldo deJacobina Rabello, j. 19.07.2007).

São as conclusões do juristae doutrinador, demonstrandointeressante contraponto aoentendimento que antes eramajoritário:

“Em suma, lembrando que o MinistérioPúblico tem sua atuação pautada pela defesade interesses indisponíveis do indivíduo e dasociedade, bem como ao zelo dos interessessociais, coletivos ou difusos, resta imprópriasua investidura para tarefas de outra ordem,especialmente quando conflitantes com sua

Page 1999: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

necessária intervenção como fiscal da lei. É oque sucede nos processos de interdição comobjetivo de curatela de pessoa declaradaincapaz para a regência de sua pessoa e paraa administração de seus bens. Servirá outro, enão o Ministério Público, como curadorespecial do interditando, conforme bemreconhecido no acórdão da lavra do eminenteDes. José Geraldo de Jacobina Rabello, quetem apoio na correta exegese do perfilinstitucional daquele órgão e da sua relevanteatuação no encargo de fiscalizar o exatocumprimento da lei”.7

Os argumentos são louváveise fizeram o presente autor refletirprofundamente sobre a questão nopassado. Em certo sentido, pareceter sido essa a lógica adotadapelo Novo CPC, em seu art. 752,

Page 2000: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

§ 1º, e pela revogação do antigoart. 1.770 do Código Civil.

No que concerne aosprocedimentos de interdição, oart. 749 do CPC/2015 preceituaque incumbe ao autor, na petiçãoinicial, especificar os fatos quedemonstram a incapacidade dointerditando para administrar seusbens e, se for o caso, parapraticar atos da vida civil, bemcomo o momento em que aincapacidade se revelou. Não hámais necessidade de prova dalegitimidade, conforme estava noart. 1.180 do CPC/1973,presumindo-se esta das condições

Page 2001: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

pessoais descritas pelo novo art.747 do CPC/2015.

Como inovação louvável, aNorma Instrumental passou aestabelecer que, justificada aurgência, o juiz pode nomearcurador provisório aointerditando para a prática dedeterminados atos (art. 749,parágrafo único, do CPC/2015).Cite-se, por exemplo, anecessidade de um curador paragerir a empresa do interditando.

Além disso, no que concernea uma prova inicial mínima, o art.750 do Novo CPC passou adeterminar que o requerente

Page 2002: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

deverá juntar laudo médico parafazer prova de suas alegações, ou,pelo menos, informar aimpossibilidade de fazê-lo,dentro dos ditames de boa-fé e decolaboração processual,comentados no primeiro capítulodeste livro.

Seguindo nosprocedimentos, o interditandoserá citado para, em diadesignado, comparecer perante ojuiz, que o entrevistaráminuciosamente acerca de suavida, negócios, bens, vontades,preferências e laços familiares eafetivos e sobre o que mais lhe

Page 2003: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

parecer necessário paraconvencimento quanto à suacapacidade para praticar atos davida civil. As perguntas erespostas devem ser reduzidas atermo (art. 751, caput, do NovoCPC). No mesmo sentido, previao art. 1.771 do CC/2002 que,antes de pronunciar-se acerca dainterdição, o juiz, assistido porespecialistas, examinariapessoalmente o arguido deincapacidade. Todavia, esseúltimo comando material tambémfoi revogado expressamente peloart. 1.072, II, do CPC/2015;estando a matéria concentrada no

Page 2004: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

estatuto processual. Pontue-se queo dispositivo processualemergente é mais minucioso doque o art. 1.181 do CPC anterior,seu correspondente, ao fazermenção às preferências, aos laçosfamiliares e afetivos.

Como outra inovação,prescreve o § 1º do art. 751 doNovo CPC que, não podendo ointerditando deslocar-se, o juiz oouvirá no local onde estiver. Essedeslocamento já ocorria naprática, sendo costume no PoderJudiciário, inclusive em demandado qual este autor participou nopassado, como advogado.

Page 2005: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

Ademais, como outra novaprevisão na lei instrumental,prevê o § 2º do art. 751 doCPC/2015 que a entrevistapoderá ser acompanhada porespecialista. Essa última regraera retirada do art. 1.771 doCC/2002.

Outra novidade é que,durante a entrevista, é asseguradoo emprego de recursostecnológicos capazes de permitirou auxiliar o interditando aexpressar suas vontades epreferências e a responder àsperguntas formuladas (art. 751, §3º, do Novo CPC). Imagine-se,

Page 2006: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

por exemplo, o caso de uminterditando que não conseguefalar, mas sim digitar em umcomputador, podendo fazer usodeste.

Por fim, estabelece o art.751 do CPC/2015, em seu § 4º,que, a critério do juiz, poderá serrequisitada a oitiva de parentes epessoas próximas, o que tambémera praxe, mas não estavaexpressamente regulamentado nopreceito instrumental.

Após todos esses trâmiteslegais, dentro do prazo de 15dias, contado da entrevista, ointerditando poderá impugnar o

Page 2007: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

pedido (art. 752, caput, doCPC/2015). Como antes visto, oMinistério Público intervirácomo fiscal da ordem jurídica(art. 752, § 1º, do CPC/2015).Ademais, o interditando poderáconstituir advogado paradefender-se. Não tendo sidoconstituído advogado pelointerditando, nomear-se-á curadorespecial (art. 752, § 2º, doCPC/2015). Caso o interditandonão constitua advogado, o seucônjuge, companheiro ouqualquer parente sucessívelpoderá intervir como assistente(art. 752, § 3º, do CPC/2015).

Page 2008: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

Confrontando o novel artigocom o seu correspondente noCódigo de Processo Civil de1973 (art. 1.182), algumasmodificações podem serobservadas. O interditando seriarepresentado nos autos pelo órgãodo Ministério Público ou, quandoeste fosse o requerente, pelocurador especial especificamentedesignado. Agora, o MP passa aatuar como fiscal da ordemjurídica. Sem prejuízo disso, ointerditando poderia constituiradvogado para formular a suadefesa, não havendo mençãoanterior ao curador especial.

Page 2009: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

Ademais, qualquer parentesucessível poderia constituir-lheadvogado, com os poderesjudiciais que o interditando teriatransmitido, respondendo esseparente pelos correspondenteshonorários advocatícios. Nonovel preceito apenas semenciona o cônjuge oucompanheiro, atuando comoassistentes.

Decorrido esse prazo de 15dias do art. 752 do CPC/2015,estabelece a norma seguinte que ojuiz determinará a produção deprova pericial para avaliação dacapacidade do interditando para

Page 2010: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

praticar atos da vida civil (caputdo art. 753 do Novo CPC). Aperícia pode ser realizada porequipe composta por expertoscom formação multidisciplinar (§1º). O laudo pericial indicaráespecificadamente, se for o caso,os atos para os quais haveránecessidade de curatela (§ 2º).

Mais uma vez são notadasmudanças perante o art. 1.183 doCPC/1973. Essa norma previaque, decorrido o prazo de cincodias mencionado no caput do art.1.182 do antigo CPC, o juiznomearia um perito, umespecialista, para proceder ao

Page 2011: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

exame do interditando.Apresentado o laudo, o juizdesignaria a audiência deinstrução e julgamento. Peloparágrafo único do próprio art.1.183, sendo decretada ainterdição, o juiz nomeariacurador definitivo ao interdito.Como se observa, osprocedimentos foramaperfeiçoados para a devidacautela, que deve se tomada nainterdição.

A menção à formaçãointerdisciplinar é louvável,apesar de já ocorrer na prática dainterdição. Também deve ser

Page 2012: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

elogiada a referência expressaaos limites da curatela constantedo novo art. 753 do CPC/2015,especialmente no seu § 2º,segundo o qual, “o laudo pericialindicará especificadamente, sefor o caso, os atos para os quaishaverá necessidade de curatela”.

Isso porque, como se sabe,os casos de interdição dedeficientes mentais, ébrioshabituais, toxicômanos epródigos, como a interdição érelativa, deve o juiz determinaros limites da curatela, ou seja, dacuratela parcial. Essa era a regraretirada do art. 1.772 do

Page 2013: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

CC/2002; também revogada peloart. 1.072, II, do CPC/2015.Todavia, o objetivo da revogaçãofoi apenas de concentrar o temano diploma instrumental, sendoesse o mesmo sentido do art. 753,§ 2º, do CPC/2015.

Nesse sentido, conformeprevia o excelente Enunciado n.574 do CJF/STJ, aprovado na VIJornada de Direito Civil, em2013, a decisão judicial deinterdição deverá fixar os limitesda curatela para todas as pessoasa ela sujeitas, sem distinção, afim de resguardar os direitosfundamentais e a dignidade do

Page 2014: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

interdito. A proposta foiformulada pela Professora CéliaBarbosa Abreu, da UniversidadeFederal Fluminense, sendo umadas premissas fundamentaisdefendidas em sua tese dedoutorado.8 As justificativas doenunciado doutrinário explicammuito bem o seu conteúdo,contando com o total apoioanterior deste autor, o que acabousendo previsto no Novo CPC:

“O CC/2002 restringiu a norma que determinaa fixação dos limites da curatela para aspessoas referidas nos incisos III e IV do art.1.767. É desarrazoado restringir a aplicaçãodo art. 1.772 com base em critérios

Page 2015: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

arbitrários. São diversos os transtornosmentais não contemplados no dispositivo queafetam parcialmente a capacidade eigualmente demandam tal proteção.Se há apenas o comprometimento para aprática de certos atos, só relativamente aestes cabe interdição, independentemente dahipótese legal específica. Com apoio na provados autos, o juiz deverá estabelecer os limitesda curatela, que poderão ou não ser osdefinidos no art. 1.782.Sujeitar uma pessoa à interdição total quandoé possível tutelá-la adequadamente pelainterdição parcial é uma violência à suadignidade e a seus direitos fundamentais. Acuratela deve ser imposta no interesse dointerdito, com efetiva demonstração deincapacidade. A designação de curadorimporta em intervenção direta na autonomiado curatelado.Necessário individualizar diferentes estatutosde proteção, estabelecer a graduação daincapacidade. A interdição deve fixar a

Page 2016: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

extensão da incapacidade, o regime deproteção, conforme averiguação casuística daaptidão para atospatrimoniais/extrapatrimoniais”.

Feita tal importanteconsideração quanto à ordempara nomeação do curador,dispõe o caput do art. 1.775 doCódigo Civil que o cônjuge oucompanheiro, não separadojudicialmente ou de fato, é, dedireito, o curador do outro,quando interdito (curador legallegítimo). Sendo o curador ocônjuge e o regime de bens docasamento for de comunhãouniversal, não será obrigado à

Page 2017: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

prestação de contas, salvodeterminação judicial (art. 1.783do CC). A norma é especial e nãose aplica aos demais casos deregime de bens e à união estável.

Ainda de acordo com o art.1.775 do CC/2002, na falta docônjuge ou do companheiro, serácurador legítimo o pai ou a mãe.Na ausência destes, será nomeadocomo curador o descendente quese demonstrar mais apto. Entre osdescendentes, os mais próximosprecedem aos mais remotos.Finalmente, na falta das pessoasmencionadas neste artigo,compete ao juiz a escolha do

Page 2018: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

curador dativo, que deve serpessoa capaz e idônea paraexercer a função.

Deve-se entender que aordem descrita não é obrigatória,prevalecendo sempre o melhorinteresse do curatelado. Nessalinha, concluiu julgado doTribunal Gaúcho que “ex-cunhadoe irmãos concorrendo para oexercício do múnus. Prevalênciado melhor interesse dointerditado. No que se refere ànomeação do curador, sabido éque esta deve recair na pessoa docônjuge ou companheiro e, nafalta desses, ascendentes ou

Page 2019: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

descendentes (art. 1.775, §§ 1º e2º do Código Civil). Caberá aojuiz, ainda, a escolha de umterceiro como curador (art. 1.775,§ 3º, do Código Civil), quando daimpossibilidade daquelescontidos nos parágrafosanteriores. Elementos de provaque indicam que o curadornomeado de forma provisóriavem exercendo de formaresponsável o encargo,desmerecendo qualquer alteração.Sentença reformada. Apelaçãocível provida” (TJRS, ApelaçãoCível 70059203711, SétimaCâmara Cível, Rel. Jorge Luís

Page 2020: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

Dall’Agnol, j. 28.05.2014). Essasposições devem ser mantidas coma emergência do Novo Código deProcesso Civil.

Regulamentando a decisãode interdição, houve revogaçãoexpressa, mais uma vez pelo art.1.072, inciso II, do Novo CPC,do art. 1.773 do Código Civil,cuja redação era a seguinte: “asentença que declara a interdiçãoproduz efeitos desde logo,embora sujeita a recurso”. Essetambém era o sentido do art.1.184 do CPC anterior,igualmente sem mais aplicação. Anorma processual ainda

Page 2021: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

estabelecia que essa sentençaseria inscrita no Registro dePessoas Naturais e publicadapela imprensa local e pelo órgãooficial por três vezes, comintervalo de dez dias, constandodo edital os nomes do interdito edo curador, a causa da interdiçãoe os limites da curatela.

Em verdade, o sistemarelativo à sentença de interdiçãofoi aperfeiçoado pelo NovoEstatuto Processual. De início,passou o seu art. 754, maisdidaticamente, a enunciar que,apresentado o laudo, produzidasas demais provas e ouvidos os

Page 2022: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

interessados, o juiz proferirásentença.

Nessa decisão, o juiz deveatender a alguns requisitos queestão previstos no art. 755 doCPC/2015. Assim, deverá,inicialmente, nomear curador, quepoderá ser o requerente dainterdição. O magistrado tambémfixará os limites da curatela,segundo o estado e odesenvolvimento mental dointerdito. Em complemento,conforme o inciso II do comando,o julgador considerará ascaracterísticas pessoais dointerdito, observando suas

Page 2023: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

potencialidades, habilidades,vontades e preferências, o queserve para a determinação de umacuratela parcial, como antes seexpôs. A curatela deve seratribuída a quem melhor possaatender aos interesses docuratelado, o principalinteressado, que merece a devidaproteção (art. 755, § 1º, doCPC/2015).

Eventualmente, em havendo,ao tempo da interdição, pessoaincapaz sob a guarda e aresponsabilidade do interdito, ojuiz atribuirá a curatela a quemmelhor puder atender aos

Page 2024: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

interesses do interdito e doincapaz, ao mesmo tempo (art.755, § 2º, do CPC/2015). Naverdade, essa regra já eraretirada, pelo menosparcialmente, do art. 1.778 doCC/2002, segundo o qual, aautoridade do curador estende-seà pessoa e aos bens dos filhos docuratelado, observados os casosde emancipação. O dispositivofoi repetido e ampliado peloNovo CPC, consoante o seu art.757, que não constava na leiprocessual anterior, in verbis: “Aautoridade do curador estende-seà pessoa e aos bens do incapaz

Page 2025: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

que se encontrar sob a guarda e aresponsabilidade do curateladoao tempo da interdição, salvo seo juiz considerar outra soluçãocomo mais conveniente aosinteresses do incapaz”. Constata-se, dessa forma, uma unicidadeda curatela nessas situações ecomo premissa geral, assim comoocorre com a tutela, por dicçãodo art. 1.733 do Código Civil. Dequalquer modo, nota-se peloscomandos transcritos que essaregra pode ser quebrada paraatender aos interesses do incapaz.

Na linha parcial do queestava na lei processual anterior,

Page 2026: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

rege o § 3º do art. 755 doCPC/2015 que a sentença deinterdição será inscrita noregistro de pessoas naturais eimediatamente publicada na redemundial de computadores, nosítio do tribunal a que estivervinculado o juízo e na plataformade editais do Conselho Nacionalde Justiça, onde permanecerá porseis meses. Essas formas decomunicação do público sãoinovações que vêm em boa hora.A norma continua a mencionar,ainda, a publicação na imprensalocal, uma vez, e no órgão oficial,por três vezes, com intervalo de

Page 2027: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

dez dias, constando do edital osnomes do interdito e do curador, acausa da interdição, os limites dacuratela e, não sendo total ainterdição, os atos que o interditopoderá praticar autonomamente.

Pois bem, como se percebe,tanto pelo dispositivo materialrevogado expressamente (art.1.773 do CC/2002) quanto peloprocessual anterior (art. 1.184 doCPC/1973), os efeitos dasentença de interdição, cujanatureza é predominantementeconstitutiva, seriam ex nunc, oque não dependia de qualquer atode publicidade. Isso porque as

Page 2028: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

normas expressavam que asentença de interdição produziriaefeitos desde logo. Essasprevisões sempre geraram muitapolêmica, o que parece ter sidosolucionado pelo Novo CPC,silente a respeito desses efeitos, edeixando a sua determinação nasmãos do julgador. Vejamos.

No sistema anterior, existiauma séria dúvida quanto aos atospraticados pelo interditado antesda interdição, ou seja, se estespermaneciam válidos ou sedeveriam ser tidos como nulos.Na doutrina, a questão quanto aosefeitos da sentença de interdição

Page 2029: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

sempre foi muito bem explicadapor Maria Helena Diniz:

“Após sua prolatação, por confirmar asuposição da incapacidade, nulos ou anuláveisserão os atos praticados pelo interdito (RT468:112) conforme a gradação da suainterdição, sendo que os atos anterioresàquela sentença serão apenas anuláveis se secomprovar, judicialmente, que suaincapacidade já existia no momento darealização do negócio (RF 81:213 e 152:176;RT 539:149 e 183, 537:74, 506:75, 503:93,436:74, 280:252, 365:93, 415:358, 483:71,489:75 e 505:82; RTJ 102:359), caso em queproduz efeito ex tunc. Durante a pendênciado recurso interposto válidos serão os atospraticados entre o curador e terceiros, mesmoque a sentença venha a ser reformada eminstância superior”.9

Page 2030: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

O entendimento constantedos julgados citados era tidocomo clássico e majoritário.Entretanto, levando-se em conta aeticidade e a valorização da boa-fé, marcos teóricos importantesdo Direito Civil Contemporâneo,ficava a dúvida se os anterioresnegócios celebrados pelointerditado com terceiros de boa-fé deveriam ou não permanecerválidos. Este autor sempreentendeu que, em regra, a boa-fédeveria prevalecer, sendotendência do CC/2002 – e agorado Novo CPC – a proteção deterceiros guiados por uma boa

Page 2031: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

conduta. Cite-se, por oportuno eno sistema material, a previsãodo art. 167, § 2º, do CC, queconsagra inoponibilidade do atosimulado perante terceiros deboa-fé, bem como a nãoprevalência do casamento nuloperante negócios celebrados comboa-fé (art. 1.563 do CC). Nocampo processual, podem sermencionadas as mudançasrealizadas quanto àcaracterização da fraude deexecução, presumindo-se a boa-fédos terceiros adquirentes. Defato, se terceiro que negocioucom o incapaz antes de sua

Page 2032: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

interdição não percebeu nempoderia perceber a incapacidade,o negócio deve ser tido comoválido.

Concluía-se, portanto, queaquele entendimento anteriortenderia a ser alterado, o queparece, ocorrerá na vigência doNovo CPC. Adotando em parte atese por nós seguida e defendida,o Superior Tribunal de Justiçapostergou a decretação denulidade, justamente paraproteger terceiro que agiu de boa-fé na realização do negóciojurídico.

Page 2033: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

“Nulidade de ato jurídico praticado porincapaz antes da sentença de interdição.Reconhecimento da incapacidade e daausência de notoriedade. Proteção doadquirente de boa-fé. Precedentes da Corte.1. A decretação da nulidade do ato jurídicopraticado pelo incapaz não depende dasentença de interdição. Reconhecida pelasinstâncias ordinárias a existência daincapacidade, impõe-se a decretação danulidade, protegendo-se o adquirente de boa-fé com a retenção do imóvel até a devoluçãodo preço pago, devidamente corrigido, e aindenização das benfeitorias, na forma deprecedente da Corte. 2. Recurso especialconhecido e provido” (STJ, REsp296.895/PR, Terceira Turma, Rel. Min.Carlos Alberto Menezes Direito, j.06.05.2004, DJ 21.06.2004, p. 214; Veja:Incapaz. Ato praticado antes da interdição.Prova: STJ, REsp 9.077/RS; Compra evenda. Incapaz. Boa-fé da outra parte: STJ,

Page 2034: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

REsp 38.353/RJ – LEXSTJ 144/63).

Aguardemos qual será aposição jurisprudencial no futuro,havendo otimismo por parte desteautor, que acredita ter sido muitoboa a alteração engendrada peloEstatuto Processual emergente emtal ponto da matéria.

Seguindo no estudo tema,prevê o art. 1.777 do CC/2002que os enfermos, deficientesmentais, ébrios habituais,toxicômanos e excepcionais semdesenvolvimento completo,devidamente interditados, devemser tratados em estabelecimento

Page 2035: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

apropriado, desde que não sejapossível o seu convíviodoméstico. Nos termos do queconsta de aresto publicado noInformativo n. 533 do STJ, de2013, “é claro o caráterexcepcional da medida, exigindo-se, portanto, para sua imposição,laudo médico circunstanciado quecomprove a necessidade damedida diante da efetivademonstração de insuficiênciados recursos extra-hospitalares. Ainternação compulsória deve,quando possível, ser evitada, demodo que a sua adoção apenaspoderá ocorrer como última

Page 2036: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

opção, em defesa do internado e,secundariamente, da própriasociedade. Nesse contexto,resguarda-se, por meio dainterdição civil com internaçãocompulsória, a vida do própriointerditando e, secundariamente, asegurança da sociedade. Alémdisso, deve-se ressaltar que nãose pretende, com essa medida,aplicar sanção ao interditado sejana espécie de pena, seja na formade medida de segurança, hajavista que a internaçãocompulsória em ação deinterdição não tem caráter penal,não devendo, portanto, ser

Page 2037: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

comparada à medida desegurança ou à medidasocioeducativa” (STJ, HC169.172/SP, Rel. Min. LuisFelipe Salomão, j. 10.12.2013).

Por outra via, havendomeios de recuperar o interdito, ocurador promoverá o seutratamento em estabelecimentoapropriado (art. 1.776 doCC/2002). Essa lógica foiadotada pelo novo art. 758 doCPC/2015, preceito claramentematerial, segundo o qual ocurador deverá buscar tratamentoe apoio apropriados à conquistada autonomia pelo interdito.

Page 2038: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

Esses tratamentos não podemperder de vista a dignidade dapessoa humana, ao contrário doque muito ocorre na prática. Otratamento também pode serefetuado na própria residência dointerditado, junto à sua família, oque é até preferível, não sendo aúltima regra obrigatória.10

Em havendo a recuperaçãodo interdito, ocorreria olevantamento da interdição,agora tratada como levantamentoda curatela, uma vez que cessadaa causa que a determinou.Existiram também alterações arespeito do tema, sendo

Page 2039: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

interessante a confrontação dosseguintes comandos:

Novo Códigode Processo

Civil

Código deProcesso

CivilAnterior

“Art. 756.Levantar-se-á acuratela quandocessar a causaque adeterminou.

“Art. 1.186.Levantar-se-á ainterdição,cessando acausa que adeterminou.

Page 2040: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

§ 1º O pedido delevantamento dacuratela poderáser feito pelointerdito, pelocurador ou peloMinistérioPúblico e seráapensado aosautos dainterdição.

§ 1º Opedido delevantamentopoderá serfeito pelointerditado eseráapensadoaos autos dainterdição. Ojuiz nomearáperito paraproceder aoexame desanidade nointerditado eapós aapresentaçãodo laudodesignaráaudiência deinstrução ejulgamento.

Page 2041: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

§ 2º O juiznomeará peritoou equipemultidisciplinarpara proceder aoexame dointerdito edesignaráaudiência deinstrução ejulgamento apósa apresentaçãodo laudo.

§ 3º Acolhido opedido, o juizdecretará olevantamento da

Page 2042: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

interdição edeterminará apublicação dasentença, após otrânsito emjulgado, na formado art. 755, § 3º,ou, não sendopossível, naimprensa local eno órgão oficial,por 3 (três)vezes, comintervalo de 10(dez) dias,seguindo-se aaverbação noregistro depessoas naturais.

§ 4º A interdiçãopoderá serlevantada

§ 2ºAcolhido opedido, o juizdecretará olevantamentoda interdiçãoe mandarápublicar asentença,após otransito emjulgado, pelaimprensalocal e órgãooficial portrês vezes,comintervalo de10 (dez) dias,seguindo-se

Page 2043: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

parcialmentequandodemonstrada acapacidade dointerdito parapraticar algunsatos da vidacivil.”

a averbaçãono Registrode PessoasNaturais.”

Confrontando-se as regras,além da alteração dasdenominações no caput, nota-seque o Ministério Público poderárequerer o citado levantamento, oque não estava antes previsto,apesar de teses que admitiam ahipótese. Além disso, atualmente

Page 2044: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

há menção a uma equipeinterdisciplinar para analisar ointerdito, visando torná-loincapaz. Por fim, como passou aser possível a curatela parcial,admite-se, agora, o levantamentoparcial da interdição, paradeterminados atos, o quedemandará análise casuística.

Em situações de dúvidas, oCC/2002 continua determinando aaplicação residual à curatela dasregras previstas para a tutela (art.1.774 do CC), particularmente arespeito do seu exercício, com asdevidas restrições (art. 1.781 doCC). A título de exemplo, pode-

Page 2045: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

se dizer que o curador também éobrigado a prestar contas, salvo ajá analisada hipótese do curadorcônjuge casado pelo regime dacomunhão universal com ointerditado (art. 1.783 do CC).

Para encerrar o estudo dotema, é importante salientar que agrande novidade trazida peloCódigo Civil de 2002 no tocanteà curatela refere-se a novasformas de curatela especialprevistas nos arts. 1.779 e 1.780do CC. Não houve qualqueralteração provocada pelo NovoCódigo de Processo Civil arespeito dessas categorias,

Page 2046: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

submetidas às regras geraisinstrumentais aqui analisadas.

O primeiro dispositivo tratada curatela do nascituro,possível se o seu suposto paifalecer e estando grávida amulher, esta não possui o poderfamiliar. Eventualmente, se amulher estiver interditada, seucurador será também o donascituro (art. 1.779, parágrafoúnico, do CC). O dispositivoreforça a teoria concepcionista,pelo qual o nascituro é pessoa,seguida por este autor. Naverdade, ao admitir a curatela donascituro, o Código Civil de 2002

Page 2047: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

dá a este o tratamento de umapessoa absolutamente incapaz.

A outra forma de curatelaespecial é a deferida a favor doenfermo ou portador dedeficiência física, mediante o seuexpresso requerimento (art. 1.780do CC). Não sendo possível esserequerimento, poderá ele serformulado por qualquer pessoaelencada no art. 1.768 do CC, ouseja, pelos pais, pelos tutores,pelo cônjuge, por qualquer outroparente ou pelo MinistérioPúblico.

Ilustrando, imagine-se ocaso de um portador de

Page 2048: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

deficiência física que necessitada nomeação de um curadorvisando a administrar umaempresa de sua propriedade, quese encontra em local de difícilacesso ao deficiente. Em casostais, é possível a nomeação de umcurador, por seu próprio pedido.Essa curatela é denominada poralguns julgadores de curatela-mandato, bastando a atribuiçãode poderes para a meraadministração dos negócios e dosbens da curatelada. Tambémsegundo algumas decisões, édispensável a “autorização para atransferência ou renúncia de

Page 2049: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

direitos, o que continuarádependendo da expressamanifestação de vontade dacuratelada” (TJMG, Apelaçãocível 10024096395116001,Sétima Câmara Cível, Rel.Peixoto Henriques, j.15.10.2013).

Page 2050: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

__________1 DINIZ, Maria Helena. Código CivilAnotado. 15. ed. São Paulo: Saraiva,2010. p. 1.229.2 DINIZ, Maria Helena. Código CivilAnotado. 15. ed. São Paulo: Saraiva,2010. p. 1.235.3 ALVES, Jones Figueirêdo;DELGADO, Mário Luiz. CódigoCivil Anotado. São Paulo: Método,2005. p. 894.4 DINIZ, Maria Helena. Código CivilAnotado. 15. ed. São Paulo: Saraiva,2010. p. 1.238.5 DINIZ, Maria Helena. Código CivilAnotado. 15. ed. São Paulo: Saraiva,2010. p. 1.244.6 ASSUNÇÃO, Alexandre Guedes

Page 2051: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

Alcoforado. Código CivilComentado. Coordenação: RicardoFiuza e Regina Beatriz Tavares daSilva. 6. ed. São Paulo: Saraiva, 2008.p. 1.925.7 OLIVEIRA, Euclides de. DecisãoComentada. Ministério Público naInterdição. Revista Brasileira deDireito das Famílias e dasSucessões, Porto Alegre: IBDFAM-Magister, n. 00, p. 83, out.-nov. 2007.8 ABREU, Célia Barbosa. Curatela eInterdição Civil. Rio de Janeiro:Lumen Juris, 2009.9 DINIZ, Maria Helena. Código CivilAnotado. 15. ed. São Paulo: Saraiva,2010. p. 1.258.10 PEREIRA, Rodrigo da Cunha.Comentários ao Novo Código Civil.

Page 2052: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

Coordenação: Sálvio de FigueiredoTeixeira. Rio de Janeiro: Forense,2003. v. XX, p. 495.

Page 2053: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

DO INVENTÁRIO E DAPARTILHA NO NOVO

CÓDIGO DEPROCESSO CIVIL

O Novo Código de ProcessoCivil, a exemplo do seuantecessor, traz um amplotratamento relativo ao inventário

Page 2054: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

e à partilha, procedimentosatinentes ao Direito dasSucessões e que, como tais,necessariamente devem serabordados por esta obra.

Iniciando-se pela ideia deinventário, categoria essencialpara o presente capítulo, MariaHelena Diniz conceitua o institutocomo “o processo judicial (CC,art. 1.796; CPC, art. 982)tendente à relação, descrição,avaliação e liquidação de todosos bens pertencentes ao de cujusao tempo de sua morte, paradistribuí-los entre seussucessores”.1 Na mesma linha,

Page 2055: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

ensina Zeno Veloso que oinventário tem por objetivo aarrecadação, a descrição e aavaliação dos bens e outrosdireitos pertencentes ao morto,bem como a discriminação, opagamento das dívidas e dosimpostos e os demais atosindispensáveis à liquidação domontante que era do falecido.2

Lecionam Euclides deOliveira e Sebastião Amorimque, “quando morre uma pessoadeixando bens, abre-se asucessão e procede-se aoinventário, para regular apuraçãodos bens deixados, com a

Page 2056: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

finalidade de que passem apertencer, legalmente, aos seussucessores. O inventário é oprocedimento obrigatório para aatribuição legal dos bens aossucessores do falecido, mesmoem caso de partilhaextrajudicial”.3 Em sentidopróximo, esclarece FranciscoJosé Cahali que “O inventário é omeio pelo qual se promove aefetiva transferência da herançaaos respectivos herdeiros,embora, no plano jurídico (efictício, como visto), atransmissão do acervo se opereno exato instante do

Page 2057: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

falecimento”.4

Por fim, no que diz respeitoa essa conceituação inaugural,conforme se retira da obra deDimas Messias de Carvalho eDimas Daniel de Carvalho, “otermo inventário vem do latiminventarium, de invenire, quesignifica agenciar, diligenciar,promover, achar, encontrar. Nosentido amplo, significa oprocesso ou a série de atospraticados com o objetivo de serapurada a situação econômica deuma pessoa ou instituição,relacionando os bens e direitos,de um lado, e as obrigações ou

Page 2058: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

encargos, do outro,assemelhando-se ao balanço deuma empresa, com a verificaçãodo ativo e do passivo. No sentidoestrito, é o relacionamento debens ou de valores pertencentes auma pessoa, ou existentes emdeterminado lugar, anotados earrolados com os respectivospreços sabidos ou estimados,tratando-se, pois, de um meroarrolamento de bens. No direitodas sucessões, entende-se como aação especial intentada para quese arrecadem todos os bens edireitos do falecido, encontradosem seu poder quando de sua

Page 2059: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

morte ou de terceiros, formando-se o balanço com as obrigações eencargos, a fim de seremapurados os resultados que irãoser objetos a partilhar, bem comoreconhecer a qualidade dosherdeiros”.5 O que se almeja,nesse contexto, é a liquidação dosbens e a divisão patrimonial doacervo hereditário, cessando ocondomínio legal pro indivisoexistente entre os herdeiros,situação não desejada pelaspartes envolvidas.

Quanto ao instituto emestudo, há um único dispositivoinicial no Código Civil de 2002,

Page 2060: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

o art. 1.991, segundo o qual:“Desde a assinatura docompromisso até a homologaçãoda partilha, a administração daherança será exercida peloinventariante”. Como é notório, oinventariante é o administradordo espólio, conjunto de bensformado com a morte de alguém,que constitui um entedespersonalizado. Age oinventariante com um mandatolegal, após a devida nomeaçãopelo juiz da causa.

Na realidade, os principaisprocedimentos quanto aoinventário sempre estiveram

Page 2061: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

previstos no Código de ProcessoCivil. No Estatuto Processual de1973, o tratamento estava entre osseus arts. 982 a 1.038. No Códigode Processo Civil de 2015, asregras estão dispostas entre osarts. 610 a 667. Adiante-se deantemão que o Novo EstatutoProcessual acabou por repetir amaioria das regras que estavamna legislação instrumentalanterior, não havendo grandesmodificações estruturais.

O primeiro dispositivoprocessual a ser citado é o art.982 do Código de Processo Civilde 1973, que foi alterado pela

Page 2062: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

edição da Lei 11.441, de 4 dejaneiro de 2007. Em sua redaçãooriginal, determinava a lei que seprocederia sempre ao inventáriojudicial, ainda que todas as partesfossem capazes. Assim, em regra,o procedimento judicial deinventário era tido comonecessário para a partilha de bensdo falecido, mesmo havendoplena capacidade e acordo entreos seus herdeiros.

Por outro lado, com aaprovação pelo CongressoNacional do Projeto de Lei4.725/2004, convertido na Lei11.441/2007, a questão foi

Page 2063: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

modificada de formaconsiderável. A redação anteriordo art. 982 do CPC de 1973, jáalterada pela Lei 11.965/2009,pela menção ao defensor público,era a seguinte: “Havendotestamento ou interessadoincapaz, proceder-se-á aoinventário judicial; se todosforem capazes e concordes,poderá fazer-se o inventário e apartilha por escritura pública, aqual constituirá título hábil para oregistro imobiliário. § 1º Otabelião somente lavrará aescritura pública se todas aspartes interessadas estiverem

Page 2064: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

assistidas por advogado comumou advogados de cada uma delasou por defensor público, cujaqualificação e assinaturaconstarão do ato notarial. § 2º Aescritura e demais atos notariaisserão gratuitos àqueles que sedeclararem pobres sob as penasda lei”.

O Novo Código de ProcessoCivil praticamente repetiu opreceito, no seu art. 610, inverbis: “Havendo testamento ouinteressado incapaz, proceder-se-á ao inventário judicial. § 1º Setodos forem capazes e concordes,o inventário e a partilha poderão

Page 2065: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

ser feitos por escritura pública, aqual constituirá documento hábilpara qualquer ato de registro,bem como para levantamento deimportância depositada eminstituições financeiras. § 2º Otabelião somente lavrará aescritura pública se todas aspartes interessadas estiveremassistidas por advogado ou pordefensor público, cujaqualificação e assinaturaconstarão do ato notarial”.

Como se pode perceber, aúnica diferença substancial dizrespeito à falta de menção àgratuidade do ato para os que se

Page 2066: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

declararem pobres, assim comoocorreu com a separação e odivórcio extrajudiciais. De todomodo, vale o mesmo argumento,antes desenvolvido, de que agratuidade permanece por estarprevista em lei especial anterior,qual seja a Lei 11.441/2007. Emcomplemento, a gratuidade temíndole constitucional, pela tutelada pessoa humana (art. 1º, incisoIII, da CF/1988) e pelo espíritode solidariedade que guia o TextoMaior (art. 3º, inciso I, daCF/1988). Mais especificamente,há referência expressa àgratuidade no art. 5º, inciso

Page 2067: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

LXXIV, da Norma Fundamental,in verbis: “o Estado prestaráassistência jurídica integral egratuita aos que comprovareminsuficiência de recursos”. Comobem escreveu Fernanda Tartuce, oacesso efetivo à justiça dispensaque haja previsão textual em leide gratuidade para determinadoato, devendo as relações legaisde atos gratuitos ser lidas comomeramente exemplificativas(numerus apertus), e não comotaxativas (numerus clausus).6

Vale repisar, mais uma vezcomo outro argumentosubstancial, o que consta no art.

Page 2068: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

1º desse Novo Código deProcesso Civil, comando queaproxima as normas processuaisda Constituição Federal de 1988:“O processo civil será ordenado,disciplinado e interpretadoconforme os valores e as normasfundamentais estabelecidos naConstituição da RepúblicaFederativa do Brasil,observando-se as disposiçõesdeste Código”.

De todo modo, com certeza,a permanência ou não dagratuidade do inventárioextrajudicial para os que sedeclararem pobres será debatida

Page 2069: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

nos próximos anos de formaconstante e profunda, tanto peladoutrina quanto pelajurisprudência. Nessa discussão,o presente autor já firma a suaposição de manutenção dos atosgratuitos para o inventárioextrajudicial.

Pelos dois textosinstrumentais, o anterior e o atual,constata-se que, sendo as partescapazes e inexistindo testamento,poderão os herdeiros optar peloinventário extrajudicial. Orequisito da inexistência dotestamento já vinha sendocontestado por muitos no meio

Page 2070: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

jurídico, existindo decisões deprimeira instância que afastam talelemento essencial, quando todosos herdeiros forem maiores,capazes e concordantes com a viaextrajudicial.

A questão foi julgada pela 2ªVara de Registros Públicos daComarca de Capital de SãoPaulo, tendo sido prolatada adecisão pelo magistrado MarceloBenacchio, em abril de 2014. Adúvida havia sido levantada pelo7º Tabelião de Notas da Comarcada Capital, com pareceresfavoráveis à dispensa do citadorequisito de representante do

Page 2071: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

Ministério Público e do ColégioNotarial do Brasil – Seção SãoPaulo; este último apoiado ementendimento do InstitutoBrasileiro de Direito de Família(IBDFAM).

Ponderou o julgador que asposições que admitem oinventário extrajudicial havendotestamento “são entendimentosrespeitáveis voltados à eficienteprestação do imprescindívelserviço público destinado àatribuição do patrimônio dofalecido aos herdeiros elegatários. Ideologicamente nãopoderíamos deixar de ser

Page 2072: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

favoráveis a essa construção nacrença da necessidade darenovação do Direito no sentidode facilitar sua aplicação eprodução de efeitos na realidadesocial, econômica e jurídica”.

No entanto, seguindo outrocaminho, deduz o magistrado emtrechos principais de sua sentençaque, “não obstante, é necessárioadequar a compreensão aoordenamento jurídico conformenossos estudos e ditames daciência jurídica, pena da ausênciade legitimidade de sua concreçãono meio social. Não estamos aquia defender um retorno ao

Page 2073: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

positivismo e tampouco umainterpretação limitada emconformidade à célebre assertivade Montesquieu o juiz é a bocaque pronuncia as sentenças da lei.(...). Diante disso, a construção einterpretação dos fundamentos dapresente decisão administrativapassará pelo equilíbrio ecomunicação do Direito com suasfinalidades, todavia, semprepreso ao dado legislativo comoemanação das opções estataispelo fio condutor da soberaniaestatal. (...). Mesmo assim,modestamente, no momento,pensamos não ser possível a

Page 2074: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

lavratura de inventárioextrajudicial diante da presençade testamento válido. Hádiversidade entre a sucessãolegítima e testamentária no campoda estrutura e função de cadaqual, para tanto, conformeNorberto Bobbio (Da estrutura àfunção. Barueri: Manole, 2007, p.53), devemos indagar não apenasa estrutura (‘como o direito éfeito’), mas também a função(‘para que o direito serve’) e,nesse pensamento, vamosconcluir pela diversidadeestrutural e funcional dasespécies de sucessão. Somente na

Page 2075: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

sucessão testamentária existe umnegócio jurídico a ser cumprido,o que, por si só, implica nadiversidade dos procedimentosprevistos em lei para atribuiçãodos bens do falecido. (...). Enfim,o ordenamento jurídico aproxima,determina e impõe oprocessamento da sucessãotestamentária em unidade judicialcomo se depreende dosregramentos atualmente incidentese dos institutos que cercam asucessão testamentária; daí arazão da parte inicial do art. 982caput, do Código de ProcessoCivil iniciar excepcionado

Page 2076: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

expressamente a possibilidade deinventário extrajudicial no casoda existência de testamentoindependentemente da existênciade capacidade e concordância detodos interessados na sucessão;porquanto há necessidade de seaferir e cumprir (conforme oslimites impostos à autonomiaprivada na espécie) a vontade dotestador o que não pode serafastado mesmo concordes osherdeiros e legatários”.

Com o devido respeito, osdiplomas legais que exigem ainexistência de testamento paraque a via administrativa do

Page 2077: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

inventário seja possível devemser mitigados, especialmente noscasos em que os herdeiros sãomaiores, capazes e concordamcom esse caminho facilitado. Nostermos do art. 5º da Lei deIntrodução, o fim social da Lei11.441/2009 foi a redução deformalidades, devendo essa suafinalidade sempre guiar ointérprete do Direito. O mesmodeve ser dito quanto ao NovoCPC, inspirado pelas máximas dedesjudicialização e deceleridade.

Consigne-se, a propósito dodebate, que o IBDFAM, com

Page 2078: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

entidades representativas doscartórios, protocolou, em 16 dejulho de 2014, pedido deprovidências junto ao ConselhoNacional de Justiça (CNJ) paraque o inventário extrajudicial sejapossível mesmo quando houvertestamento. O próprio ColégioNotarial do Brasil aprovouenunciado em seu XIX CongressoBrasileiro, realizado entre 14 e18 de maio do mesmo ano,estabelecendo que “é possível oinventário extrajudicial ainda quehaja testamento, desde quepreviamente registrado em Juízoou homologado posteriormente

Page 2079: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

perante o Juízo competente”.Espera-se que, em breve, o CNJdê uma resposta positiva quanto àtemática. Além disso, aguardamosque novas decisões judiciaissurjam no futuro, sob a égide doNovo Código de Processo Civil,pensando o Direito das Sucessõesde outro modo, mais concreto eefetivo socialmente.

Superado tal aspecto dedivergência, o inventárioextrajudicial não é formaobrigatória, e sim facultativa,como ainda será devidamenteaprofundado. Caso as partesprefiram o inventário judicial ao

Page 2080: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

extrajudicial, poderão osherdeiros dele se utilizar,seguindo todas as normas doEstatuto Processual Civil queserão comentadas no presentecapítulo. Essa forma deapreciação persiste com aemergência do Novo CódigoProcessual.

Pois bem, após a edição daLei 11.441/2007, resta claro quea classificação do inventáriosofreu relevantes alterações. Issoporque o inventário deve serdividido, inicialmente, emjudicial e extrajudicial.

Conforme as lições de

Page 2081: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

Euclides de Oliveira e SebastiãoAmorim, o inventário judicial éclassificado em três espécies.7 Aprimeira delas é o inventáriojudicial pelo rito tradicional,tratado nos arts. 982 a 1.030 doCPC/1973 e nos arts. 610 a 658do CPC/2015. A segundamodalidade é o inventáriojudicial pelo rito do arrolamentosumário, previsto no art. 1.031do CPC/1973 e art. 659 doCPC/2015, sendo cabível quandotodos os interessados foremmaiores e capazes, abrangendobens de quaisquer valores. Porfim, o inventário judicial pelo

Page 2082: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

rito do arrolamento comum eraregulamentado no art. 1.036 doCPC/1973, sendo cabível quandoos bens do espólio fossem devalor igual ou menor que 2.000OTN. No Novo CPC está tratadopelo art. 664 que, felizmente,utiliza parâmetro mais fácil de seraferido, qual seja o montante demil salários mínimos. Parte-separa o estudo dessas modalidadesde inventário judicial, de formapontual, seguindo,sucessivamente, a abordagem doinventário extrajudicial.

a) Do inventário judicial,

Page 2083: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

pelo rito tradicionalIniciando-se o estudo do

inventário pelo rito tradicional, oart. 983 do CPC/1973 enunciavaque o inventário e a partilhadeveriam ser requeridos dentrode 60 (sessenta) dias a contar daabertura da sucessão, ultimando-se nos 12 (doze) mesessubsequentes. Deve-se ressaltarque o parágrafo único dessedispositivo, que previa apossibilidade de o juiz da causadilatar o último prazo havendomotivo justo, foi revogado pelaLei 11.441/2007. Com amodificação, determinava o art.

Page 2084: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

983 do antigo CPC que omagistrado poderia prorrogar oprazo, de ofício ou arequerimento das partes.

O Novo Código de ProcessoCivil alterou a menção aossessenta dias para abertura doinventário para dois meses,mantendo-se o que é previstoquanto ao seu encerramento (art.611). Também foi preservada apossibilidade de prorrogação,por pedido do interessado ou deofício pelo juiz.

A crítica que se fazia aodispositivo anterior, e que devepermanecer com o Estatuto

Page 2085: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

Processual emergente, é que elenão consagrava expressamentesanção em caso dedescumprimento do mencionadoprazo. No entanto, a ausência deprevisão não impedia – e nãoimpedirá – que cada Estado daFederação institua uma multa peloretardamento do início ou daultimação do inventário, nãohavendo qualquerinconstitucionalidade nessainstituição, conforme consta daSúmula 542 do Supremo TribunalFederal.

Geralmente é isso o que seimpõe nos casos de

Page 2086: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

desobediência a esses prazos,como bem comentam Euclides deOliveira e Sebastião Amorim,tendo como parâmetro o sistemaprocessual anterior:

“É comum haver atraso na abertura doinventário. Diversas as razões, como otrauma decorrente da perda de um entefamiliar, dificuldades financeiras, problemasna contratação de advogado ou necessidadede diligências para localização dos bens e suadocumentação. A inércia do responsávelpoderá ensejar a atuação de outro interessadona herança, que tenha legitimidadeconcorrente (art. 988 do CPC), ouprovidência ex officio (art. 989 do CPC).Requerimento fora do prazo não implicaindeferimento de abertura do inventário pelojuiz, mesmo porque se trata de procedimentoobrigatório, não sujeito a prazo fatal. Mas o

Page 2087: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

atraso na abertura do processo de inventário,quando superior a 60 (sessenta) dias,acarretará acréscimo dos encargos fiscais,pela incidência de multa de 10% sobre oimporte a recolher, além dos juros de mora.Se o atraso for superior a 180 (cento eoitenta) dias a multa será de 20% (previsãoda Lei paulista 9.591/1966, art. 27, repisadapela Lei 10.705/2000, artigo 21, inciso I)”.8

A legitimidade para requerera abertura do inventário e arespectiva partilha constam doart. 615 do Novo CPC, que repeteo art. 987 do Estatuto Processualrevogado, a favor de quem estiverna posse e na administração doespólio. Sem qualquer novidade,estabelece o parágrafo único do

Page 2088: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

novo preceito que esserequerimento será instruído com acertidão de óbito do autor daherança.

A legitimidade concorrentepara a abertura do inventário estáno art. 616 do CPC/2015,equivalente ao art. 988 doCPC/1973, sendo pertinente aseguinte tabela comparativa:

Novo Códigode Processo

Civil

Código deProcesso

CivilAnterior

Page 2089: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

“Art. 616. Têm,contudo,legitimidadeconcorrente:

“Art. 988.Tem, contudo,legitimidadeconcorrente:

I – o cônjugeou companheirosupérstite;

I – o cônjugesupérstite;

II – o herdeiro;

II – oherdeiro;

III – olegatário;

III – olegatário;

Page 2090: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

IV – otestamenteiro;

IV – otestamenteiro;

V – ocessionário doherdeiro ou dolegatário;

V – ocessionário doherdeiro ou dolegatário;

VI – o credordo herdeiro, dolegatário ou doautor daherança;

VI – o credordo herdeiro, dolegatário ou doautor daherança;

Page 2091: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

VII – oMinistérioPúblico,havendoherdeirosincapazes;

VII – osíndico dafalência doherdeiro, dolegatário, doautor daherança ou docônjugesupérstite;

VIII – aFazendaPública, quandotiver interesse;

VIII – oMinistérioPúblico,havendoherdeirosincapazes;

IX – o

Page 2092: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

administradorjudicial dafalência doherdeiro, dolegatário, doautor daherança ou docônjuge oucompanheirosupérstite.”

IX – aFazendaPública,quando tiverinteresse.”

Partindo para a análisecomparada dos comandos, nota-se a inclusão expressa docompanheiro como legitimado, oque já era reconhecido peladoutrina e pela jurisprudênciaantes do Novo CPC. Como está

Page 2093: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

desenvolvido em outro capítulodesta obra, essa equiparaçãoentre casamento e união estávelguiou a elaboração deste Codex.Entre os arestos anteriores,seguindo essa trilha e a título deilustração: “Descabe extinguir oprocesso de inventário, semexame do mérito, porilegitimidade ativa, quando opedido de abertura foi feito pelasedizente companheira, que,apesar de não ter requerido oreconhecimento da união estávelem ação própria, está com aposse dos bens do espólio, nãotendo sido sequer citados os

Page 2094: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

herdeiros nominados. Alegitimidade para promover aabertura do inventário é tanto dequem estiver na posse eadministração dos bens doespólio como também das demaispessoas a quem o legisladorconferiu legitimação concorrente.Inteligência dos art. 987 e 988 doCPC. Recurso parcialmenteprovido” (TJRS, Apelação Cível459012-50.2012.8.21.7000,Canoas, Sétima Câmara Cível,Rel. Des. Sérgio Fernando deVasconcellos Chaves, j.21.11.2012, DJERS 27.11.2012).

O aresto transcrito já

Page 2095: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

evidencia que a relação constantedo antigo art. 988 do Código deProcesso Civil de 1973 eraexemplificativa (numerusapertus), e não taxativa (numerusclausus), premissa que deveprosperar com a Nova Lei GeralProcessual Privada. A propósito,debatia-se no passado e comgrande intensidade se ocompanheiro homoafetivotambém teria a referidalegitimidade. Com a decisão doSupremo Tribunal Federal, demaio de 2011, não resta a menordúvida quanto à equiparação totalda união homoafetiva à união

Page 2096: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

estável entre pessoas de sexosdistintos, o que engloba as regrasrelativas ao inventário (verInformativo n. 625 do STF).

Outra alteração a serpontuada no atual art. 616 doCodex diz respeito à substituiçãodo termo síndico da falência poradministrador judicial dafalência, na linha das mudançasengendradas pela Nova Lei deFalências (Lei 11.101/2005). Emcomplemento, deve ser mantida aposição jurisprudencial segundo aqual, se o herdeiro não faz aabertura, poderá fazê-lo qualquercredor, justamente pela

Page 2097: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

legitimidade concorrente previstanesse dispositivo processual.Nesse sentido, por todos:

“Inventário. Abertura. Legitimidade docredor, mas que apenas pode requerer aabertura do inventário após decorrido o prazode 60 dias previsto no art. 983 do CPC inalbis para aquele que estiver na posse eadministração do espólio (arts. 983, 987 e 988do CPC). (...)” (TJSP, Agravo deInstrumento 0116275-81.2013.8.26.0000,Acórdão 7210901, Taubaté, Décima Câmarade Direito Privado, Rel. Des. João CarlosSaletti, j. 25.06.2013, DJESP 07.01.2014).

“Inventário. Reclamação. Art. 1.000, inc. II,CPC. Pedido de abertura do processo deinventário e exercício da inventariança.Legitimidade do credor. Existência de

Page 2098: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

herdeiros necessários. Ordem legal. 1.Decorrido in albis o prazo para a aberturado inventário de que trata o art. 983 do CPC,tem legitimidade concorrente qualquerinteressado, inclusive o credor do herdeiro.Inteligência do art. 988, inc. VI, CPC. 2. Noentanto, essa legitimidade para abrir oinventário não afeta a legitimação para oexercício da inventariança, devendo sernomeado para tal múnus o herdeironecessário que estiver na posse dos bens eadministração do espólio, já que não hácônjuge supérstite. Inteligência do art. 990, II,do CPC. Recurso provido, por maioria”(TJRS, Processo 70010615953, Comarca deCaxias do Sul, Sétima Câmara Cível, Juiz Rel.Sérgio Fernando de Vasconcellos Chaves, j.23.02.2005).

Não há mais menção àpossibilidade de abertura do

Page 2099: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

inventário de ofício pelo juizcomo constava do art. 989 doCPC/1973. O fundamento para talretirada é o fato de que oinventário envolve interessessubstancialmente patrimoniais, dedeterminados interessados, e nãoa ordem pública. Ademais, essaimpossibilidade atual segue oprincípio da inércia dajurisdição.

Feitas tais considerações decomparação, reafirme-se que oadministrador do inventário édenominado inventariante. Entreos clássicos, explica Itabaiana deOliveira que o termo “nada mais

Page 2100: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

significava senão a pessoaincumbida de inventariar os bens,independentemente da qualidadede cônjuge meeiro ou de herdeiro,qualidade esta essencial nocabeça do casal, propriamentedito”.9 Entre os contemporâneos,leciona Maria Helena Diniz que“a inventariança é encargopessoal, pois geraresponsabilidade própria daquelaque a exerce, e da investiduraisolada, não podendo serexercida conjuntamente por duasou mais pessoas, mesmo que noinventário se tenha mais de umespólio”.10

Page 2101: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

Até que o inventariantepreste o compromisso, continuaráo espólio na posse doadministrador provisórionomeado pelo juiz. Trata-se doconteúdo do art. art. 613 doCPC/2015, correspondente ao art.985 do CPC/1973, sem qualquermudança. Esse administradorprovisório ou ad hoc representaativa e passivamente o espólio,sendo obrigado a trazer ao acervoos frutos que desde a abertura dasucessão percebeu. Tem eledireito ao reembolso dasdespesas necessárias e úteis quefez. Por fim, responde esse

Page 2102: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

administrador pelo dano a que,por dolo ou culpa, der causa,clara hipótese deresponsabilidade subjetiva.Todos esses efeitos estão no art.614 do CPC/2015, reproduçãoliteral do antigo art. 986 dorevogado Estatuto Processual. Odireito de reembolso e aexistência de umaresponsabilidade subjetiva têmfundamento no fato de ser oadministrador um possuidor deboa-fé e com justo título,investido por um mandato legal.

Ainda no que diz respeito aoadministrador provisório, o art.

Page 2103: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

1.797 do CC/2002 prevê aseguinte ordem para a suanomeação:

I) Ao cônjuge ou companheiro, se com ooutro convivia ao tempo da abertura dasucessão.II) Ao herdeiro que estiver na posse eadministração dos bens, e, se houver mais deum nessas condições, ao mais velho.III) Ao testamenteiro, pessoa responsávelpela administração do testamento.IV) À pessoa de confiança do juiz, na falta ouescusa das indicadas nos incisosantecedentes, ou quando tiverem de serafastadas por motivo grave levado aoconhecimento do magistrado.

Pelos exatos termos dodispositivo legal, pode parecer

Page 2104: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

que a ordem deve serrigorosamente obedecida, pois seutiliza a expressãosucessivamente. Todavia, oCódigo Civil Brasileiro de 2002adota um sistema aberto, baseadoem cláusulas gerais e conceitoslegais indeterminados, com esteiona teoria tridimensional doDireito – segundo a qual Direitoé fato, valor e norma –, e naontognoseologia de seu principalidealizador, o jurista MiguelReale. Dessa forma,filosoficamente, é inconcebívelter as relações que constam dacodificação material privada, em

Page 2105: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

regra, como relações fechadas erígidas. Reafirme-se que a nósparece que o Novo Código deProcesso Civil segue a mesmalinha, aberta e principiológica,conforme desenvolvido noprimeiro capítulo deste livro.

Nesse contexto, melhorconcluir, como fazem Euclides deOliveira e Sebastião Amorim,que a ordem de nomeação doadministrador provisório éapenas uma ordem depreferência, devendo o juizanalisar, de acordo com ascircunstâncias do caso concreto,quem tem melhores condições de

Page 2106: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

exercer o encargo.11 Adotando talpremissa, vejamos aresto doSuperior Tribunal de Justiça,assim publicado no Informativon. 432 daquele Tribunal Superior:

“Representação judicial. Administradorprovisório. A Turma reiterou o entendimentode que, enquanto não nomeado inventariantee prestado o compromisso (arts. 985 e 986 doCPC), a representação ativa e passiva doespólio caberá ao administrador provisório, oqual, usualmente, é o cônjuge supérstite, umavez que detém a posse direta e aadministração dos bens hereditários (art.1.579 do CC/1916, derrogado pelo art. 990, Ia IV, do CPC e art. 1.797 do CC/2002).Assim, apesar de a herança ser transmitidaao tempo da morte do de cujus (princípiosaisine), os herdeiros ficarão apenas com a

Page 2107: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

posse indireta dos bens, pois a administraçãoda massa hereditária será, inicialmente, doadministrador provisório, que representará oespólio judicial e extrajudicialmente, até seraberto o inventário com a nomeação doinventariante, a quem incumbirá representardefinitivamente o espólio (art. 12, V, do CPC).Precedentes citados: REsp 81.173/GO, DJ02.09.1996, e REsp 4.386/MA, DJ29.10.1990” (STJ, REsp 777.566/RS, Rel.Min. Vasco Della Giustina (Desembargadorconvocado do TJRS), j. 27.04.2010).

Como se depreende daleitura da ementa, o julgado,implicitamente, admite a tese deque cabe ao juiz estabelecer quemdeve assumir o encargo, poisafirma que, usualmente e nãoobrigatoriamente, o

Page 2108: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

administrador provisório será ocônjuge do falecido. Sintetizando,traz a conclusão de que a ordemde nomeação não é obrigatória,nem rígida.

Todavia, a questão não épacífica, pois há quem entendapela necessidade de observaçãoda ordem descrita no art. 1.797da Norma Geral Privada. Nessesentido, afirma Zeno Veloso que“o art. 1.797 indica quem deveser o administrador provisório daherança. A ordem é sucessiva”12.Na mesma linha, essa parece sera conclusão de Paulo Lôbo, paraquem “a ordem é obrigatória e o

Page 2109: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

investido legalmente naadministração da herança apenaspode dela se eximir,justificadamente, por decisãojudicial”.13 Também najurisprudência nacional sãoencontradas ementas estaduaisque seguem tal forma de pensar (atítulo de exemplo: TJSP, Agravode Instrumento 0048281-36.2013.8.26.0000, Acórdão6693448, São Paulo, SextaCâmara de Direito Privado, Rel.Des. Paulo Alcides, j.25.04.2013, DJESP 10.05.2013;e TJPR, Agravo de Instrumento351099-2, Acórdão 3340,

Page 2110: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

Curitiba, Décima Sexta CâmaraCível, Rel. Juiz ConvocadoJoatan Marcos de Carvalho, j.19.07.2006, DJPR 04.08.2006).

Com o devido respeito aosprofessores por último citados,verdadeiros ícones doutrináriospara o presente autor, melhordeduzir pela existência de meraordem de preferência, o que estámais bem adaptado aos valoresdo Direito Contemporâneo,material e processual.

O art. 617 do Novo CPCequivale ao art. 990 da normaanterior, o Código de ProcessoCivil, enunciando as pessoas que

Page 2111: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

podem ser nomeadas pelo juizcomo inventariante. Mais uma vezfaz-se necessária uma análiseconfrontada dos dois preceitos,pela importância dessas regras:

Código deProcessoCivil de

2014

Código de

Processo Civilde 1973

“Art. 617. Ojuiz nomearáinventariantena seguinteordem:

“Art. 990. O juiznomearáinventariante:

Page 2112: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

I – o cônjugeoucompanheirosobrevivente,desde queestivesseconvivendocom o outroao tempo damorte deste;

I – o cônjuge oucompanheirosobrevivente,desde queestivesseconvivendo como outro aotempo da mortedeste; (Redaçãodada pela Lei nº12.195, de2010.)

II – oherdeiro quese achar naposse e naadministração

II – o herdeiroque se achar naposse eadministraçãodo espólio, se

Page 2113: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

do espólio, senão houvercônjuge oucompanheirosobreviventeou se estesnão puderemsernomeados;

não houvercônjuge oucompanheirosobrevivente ouestes nãopuderem sernomeados;(Redação dadapela Lei nº12.195, de2010.)

III – qualquerherdeiro,quandonenhum delesestiver naposse e naadministraçãodo espólio;

III – qualquerherdeiro,nenhum estandona posse eadministraçãodo espólio;

Page 2114: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

IV – oherdeiromenor, porseurepresentantelegal;

IV – otestamenteiro,se lhe foiconfiada aadministraçãodo espólio outoda a herançaestiverdistribuída emlegados;

V – otestamenteiro,se lhe tiversido confiadaaadministraçãodo espólio ou

V – oinventariantejudicial, se

Page 2115: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

se toda aherançaestiverdistribuída emlegados;

houver;

VI – ocessionáriodo herdeiroou dolegatário;

VI – pessoaestranha idônea,onde não houverinventariantejudicial.

VII – oinventariantejudicial, sehouver;

Page 2116: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

VIII – pessoaestranhaidônea,quando nãohouverinventariantejudicial.

Parágrafoúnico. Oinventariante,intimado danomeação,prestará,dentro de 5(cinco) dias, ocompromissode bem efielmentedesempenhar

Parágrafo único.O inventariante,intimado danomeação,prestará, dentrode 5 (cinco)dias, ocompromisso debem e fielmentedesempenhar ocargo.”

Page 2117: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

a função.”

Anote-se que o dispositivoanterior, do Código de ProcessoCivil de 1973, já havia sidoalterado pela Lei 12.195, de2010, que trouxe duasinteressantes mudanças.

A primeira é aquela queextirpou do Código de ProcessoCivil anterior a regra pela qualapenas seria nomeadoinventariante o cônjuge casadopelo regime da comunhão debens. A mudança tinha sua razãode ser, pois, pelas regras

Page 2118: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

sucessórias em vigor, ainda que ocônjuge seja casado pelo regimeda separação convencional debens, e inexista meação, poderáser herdeiro em concorrência comos descendentes, nos termosliterais do art. 1.829, inciso I, doCódigo Civil. Ressalve-se queessa dedução pela concorrênciana separação convencional debens é seguida pela maioria dadoutrina, apesar de toda apolêmica existente no âmbitojurisprudencial.14 Por isso, não semenciona apenas a comunhãouniversal de bens. O Novo CPC,como se nota, reproduziu essa

Page 2119: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

alteração, em boa hora.A segunda alteração

engendrada pela Lei 12.195/2010foi a inclusão do companheiro ouconvivente no rol de possíveisinventariantes. Cabe pontuar que,mesmo antes da alteração legal de2010, em razão da proteçãoconstitucional da união estávelconstante do art. 226, § 3º, daCF/1988, era garantido, aoconvivente, tal direito. Por óbvioque a norma do EstatutoProcessual anterior estavadesatualizada, uma vez que foielaborada originalmente emperíodo anterior ao

Page 2120: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

reconhecimento da união estávelcomo entidade familiar. Apropósito, antes da reforma geralprocessual, entendendo pelapossibilidade de o companheiroser inventariante, cabe trazer àcolação, com destaque especialpara o primeiro acórdão:

“Inventariante. Nomeação de companheira,esposa eclesiástica. Não contraria o artigo990 do Código de Processo Civil, que não sereveste de caráter absoluto. A decisão quemantém como inventariante a pessoa que,casada pelo religioso com o extinto, com eleviveu, em união familiar estável, durantelongos anos, tendo o casal numerosos filhos.Improcedência da impugnação manifestadapor alguns dos filhos do leito anterior.Interpretação a mais razoável da lei federal.

Page 2121: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

Recurso não conhecido” (STJ, REsp 520/CE,Quarta Turma, Rel. Min. Athos Carneiro, j.12.09.1989, DJ 04.12.1989, p. 17.885).“Inventário. Companheira do de cujus quepretende nomeação como inventariante.Inteligência do art. 990, inciso I, do CPC.Observados o § 3º do art. 226 da CF e arts.1.790 e 1.797 do Código Civil. Recursoprovido” (TJSP, Agravo de Instrumento378.513-4/9-, São Paulo, Quinta Câmara deDireito Privado, Rel. Francisco Casconi, j.27.07.2005, v.u.).

O Novo CPC tambémrepetiu a previsão, sendopertinente reforçar que a uniãoestável é entidade familiarconstitucionalmente protegida,não havendo qualquer razão paranão se admitir o companheiro do

Page 2122: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

falecido como inventariante. Notocante ao tema, alguns TribunaisEstaduais vinham admitindo,inclusive, a legitimidade docompanheiro homoafetivo,cabendo transcrever as seguintesementas, por todas, comentendimento a ser seguido navigência do Novo EstatutoProcessual:

“Arrolamento de bens. União homoafetiva.Companheiro que quer ser nomeadoinventariante. Cabimento. Inexistência deascendentes, descendentes ou herdeirosconhecidos até o 4º grau. Farta provadocumental carreada, inclusive comdeclaração de convivência de longa data.Presunção legal de que melhor inventariante é

Page 2123: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

aquele que tem a posse e administra os bens,conhecendo mais profundamente o estado dopatrimônio. Agravo a que se dá provimento”(TJSP, Agravo de Instrumento 586.511.4/1,Acórdão 3244598, São Paulo, Sexta Câmarade Direito Privado, Rel. Des. AlbanoNogueira, j. 18.09.2008, DJESP 08.10.2008).

“Sucessões. Inventário. Agravo deinstrumento. União homoafetiva. Nomeaçãodo sedizente companheiro como inventariante.Possibilidade no caso concreto. Ainda que aalegada união homoafetiva mantida entre orecorrente e o de cujus dependa doreconhecimento na via própria, ante adiscordância da herdeira ascendente, osedizente companheiro pode ser nomeadoinventariante por se encontrar na posse eadministração consentida dos bensinventariados, além de gozar de boareputação e confiança entre os diretamenteinteressados na sucessão. Deve-se ter

Page 2124: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

presente que inventariante é a pessoa física aquem é atribuído o múnus de representar oespólio, zelar pelos bens que o compõem,administrá-lo e praticar todos os atosprocessuais necessários para que o inventáriose ultime, em atenção também ao interessepúblico. Tarefa que, pelos indícios colhidos,será mais eficientemente exercida pelorecorrente. Consagrado o entendimentosegundo o qual a ordem legal de nomeação doinventariante (art. 990, CPC) pode serrelativizada quando assim o exigir o casoconcreto. Ausência de risco de dilapidação dopatrimônio inventariado. Recurso provido (art.557, § 1º-A, CPC)” (TJRS, Agravo deInstrumento 70022651475, Sétima Câmara deDireito Privado, Rel. Maria Berenice Dias, j.19.12.2007).

Reafirme-se que com adecisão do Supremo TribunalFederal, de maio de 2011, não

Page 2125: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

resta a menor dúvida sobre alegitimidade do companheirohomoafetivo para o inventário,pois as regras relativas à uniãoestável aplicam-se, por analogia,à união homoafetiva (Informativon. 625 do STF), interpretação quedeve permanecer com aemergência do Novo CPC. Aconclusão também deve atingir oscasos de casamentoshomoafetivos, plenamentepossíveis no Brasil, também porforça da decisão do SupremoTribunal Federal e de outrosTribunais que passaram a seguirtal entendimento. Vale lembrar

Page 2126: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

que o Conselho Nacional deJustiça, por meio da suaResolução 175, de 2013,determinou que os Cartórios deRegistros de Pessoas Naturaistêm o dever de celebrar oscasamentos homoafetivos.

Seguindo no estudo dos doispreceitos, eles tratam doinventariante judicial (art. 617,inciso VII, do CPC/2015 e art.990, inciso V, do CPC/1976),presente “quando exercida pelosórgãos auxiliares do juiz, ondehouver, que assume arepresentação legal do espólio.Somente funcionará se não for

Page 2127: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

possível nomear o legal”.15 Entreos sucessionistas nacionais,Sebastião Amorim e Euclides deOliveira sempre apontaram tratar-se de uma figura que estaria emdesuso entre nós.16 Todavia,apesar da anotação dos últimosjuristas, alguns acórdãos podemser encontrados sobre a figura emapreço, reafirmada pelo NovoCPC, diante de uma supostautilidade.

De início, cite-se acórdãodo Tribunal de Justiça de SantaCatarina, que determinou anomeação do inventariantejudicial diante do grande conflito

Page 2128: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

existente entre os herdeiros.Conforme se retira da ementa doaresto, “patente a situaçãoconflituosa entre os herdeiros, érecomendável a nomeação de uminventariante judicial,consubstanciado na pessoa de umterceiro, que não possua interessedireto na destinação dopatrimônio a ser administrado, eque esteja distante dos contornosdo conflito familiar inerente aoinventário. A respeito da ordemde nomeação do inventariante,esposada no art. 990 do CPC, écerto que não constitui ummandamento absoluto, podendo

Page 2129: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

ser relativizado se ascircunstâncias do caso assim oexigirem. Havendo desavençasentre os sucessores, é forçosoobservar que a nomeação de umdeles para o encargo dainventariança pode gerar outrospontos de discordância,postergando ainda mais aconclusão do feito” (TJSC,Agravo de Instrumento2002.024992-6, Florianópolis,Terceira Câmara de Direito Civil,Rel. Des. José Volpato de Souza,j. 04.04.2003).

Ainda, merece ser citadodecisium do Tribunal Paulista,

Page 2130: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

que afastou o arquivamento doinventário pelo fato de quenenhum dos herdeiros quisassumir a inventariança. Aconclusão final é pelanecessidade de nomeação de uminventariante judicial (TJSP,Agravo de Instrumento612.133.4/9, Acórdão 3630478,São Paulo, Primeira Câmara deDireito Privado, Rel. Des. DeSanti Ribeiro, j. 12.05.2009,DJESP 18.06.2009).

Por fim, cabe trazer àcolação outros julgamentos maisrecentes, igualmente ilustrando aaplicação da categoria do

Page 2131: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

inventariante judicial, que nãoestá tão em desuso assim, tantoque foi confirmada pelo novelEstatuto Processual:

“Agravo interno em agravo de instrumento.Inventário. Falecimento da viúva e dos filhosdo falecido. Nomeação de inventariantejudicial. Inconformismo. Não se pode dizerteratológica a decisão que obedece à ordemestabelecida no art. 990 do Código deProcesso Civil. Decisão que não causou àagravante qualquer ofensa de naturezaprocessual. Recurso a que se negaprovimento” (TJRJ, Agravo de Instrumento0024964-72.2011.8.19.0000, Décima SextaCâmara Cível, Rel. Des. Carlos José MartinsGomes, j. 17.01.2012, DORJ 27.01.2012, p.213).“Agravo de instrumento. Inventário.Impossibilidade de administração dos bens do

Page 2132: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

espólio por um dos herdeiros. Manifestasdesavenças. Nomeação de inventariantejudicial. Indispensabilidade. A teor do art. 990,V, do CPC, cabe ao juiz nomear inventariantejudicial, na condição de auxiliar do juízo,quando manifestas as desavenças existentesentre os herdeiros do de cujus,primitivamente nomeados para tal munus, emnome de regular e célere andamento doinventário. Agravo conhecido e desprovido”(TJGO, Agravo de Instrumento 416664-69.2010.8.09.0000, Aparecida de Goiânia,Rel. Des. Eudelcio Machado Fagundes,DJGO 15.07.2011, p. 192).

Sobre a figura doinventariante dativo – pessoaestranha idônea, quando nãohouver inventariante judicial (art.617, inciso VIII, do CPC/2015 e

Page 2133: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

art. 990, inciso VI, do CPC/1973)–, cabe lembrar que este “assumeos direitos e deveres dainventariança, mas, nos termos do§ 1º do art. 12 do Código deProcesso Civil, não é orepresentante do espólio emJuízo, uma vez que, em talhipótese, ‘todos os herdeiros esucessores do falecido serãoautores ou réus nas ações em queo espólio for parte’”.17 Aplicandoessa forma de pensar, do SuperiorTribunal de Justiça, cabecolacionar: “No caso deinventariante dativo, o legisladorentendeu que não haveria

Page 2134: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

legitimidade para representaçãoplena do espólio, razão pela qualtodos os herdeiros e sucessoressão chamados a compor a lide.Recurso especial não provido”(STJ, REsp 1053806/MG,Segunda Turma, Rel. Min.Herman Benjamin, j. 14.04.2009,DJe 06.05.2009).

Conforme anotam DimasMessias de Carvalho e DimasDaniel de Carvalho, ajurisprudência dominante temexigido que o inventariantedativo seja domiciliado naComarca onde corre o inventário,o que facilita o seu

Page 2135: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

processamento.18 Na prática,assim como ocorre com a figurado inventariante judicial, o dativotem nomeação nos casos em queexistem grandes conflitos entre osherdeiros, ou seja, altalitigiosidade ou beligerância.Nessa linha, igualmente dajurisprudência:

“Civil e processual. Inventariança. Remoção.Nomeação de inventariante dativo.Beligerância entre as partes. Possibilidade deinviabilização do processo. Súmula 7-STJ.Controvérsia afeta em parte a competênciado Supremo Tribunal Federal. Recursoextraordinário não interposto. Súmula 126-STJ. I. A remoção do inventariante,substituindo-o por outro, dativo, pode ocorrer

Page 2136: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

quando constatada a inviabilização doinventário pela animosidade manifestada pelaspartes. II. ‘A pretensão de simples reexamede prova não enseja recurso especial’ –Súmula 7-STJ. III. Pretensão de reforma dojulgado que ademais se sustenta na violaçãode dispositivos constitucionais sem que tenhasido interposto o recurso competente. IV.Recurso especial não conhecido” (STJ, REsp988.527/RS, Quarta Turma, Rel. Min. AldirPassarinho Junior, j. 24.03.2009, DJe11.05.2009).

“Inventariante. Remoção. Nomeação dedativo. Código de Processo Civil, arts. 995 e990. A ordem de nomeação não é absoluta. Ofato de não se observar a ordem não implicaofensa ao art. 990. Precedente do STJ: REsp520, DJ 04.12.1989. Caso em que anomeação do inventariante dativo se deveu ‘anecessidade de eliminar as discórdias atuais eprevenir outras’. Recurso especial não

Page 2137: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

conhecido” (STJ, REsp 88.296/SP, TerceiraTurma, Rel. Min. Nilson Naves, j. 03.11.1998,DJ 08.02.1999, p. 275).

Voltando à essência doquadro de confronto dos doisdispositivos processuais, sãopercebidas duas inclusões no art.617 do CPC/2015, notadamentenos seus incisos IV e VI.

O inciso IV do novocomando estabelece a viabilidadejurídica da nomeação, comoinventariante, de herdeiro menor,por seu representante legal, casodos pais ou tutores. Afasta-se,assim, o entendimento

Page 2138: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

jurisprudencial em contrário, quenão admitia essa possibilidade.Assim, por exemplo, do SuperiorTribunal de Justiça, agorasuperado pela novel legislaçãoinstrumental:

“Herdeiro menor ou incapaz não pode sernomeado inventariante, pois é impossibilitadode praticar ou receber diretamente atosprocessuais; sendo que para os quais não épossível o suprimento da incapacidade, umavez que a função de inventariante épersonalíssima. Os herdeiros testamentários,maiores e capazes, preferem ao testamenteirona ordem para nomeação de inventariante.Existindo herdeiros maiores e capazes, viola oinciso III, do art. 990, do CPC, a nomeaçãode testamenteiro como inventariante” (STJ,REsp 658.831/RS, Terceira Turma, Rel. Min.

Page 2139: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

Nancy Andrighi, j. 15.12.2005, DJ01.02.2006, p. 537).

Para o presente autor, ainovação segue a linha deredução de burocracias e defacilitação dos procedimentos,adotada pela novel legislação,merecendo elogios.Eventualmente, caso os interessesdos menores sejam violados,caberá a intervenção doMinistério Público, conforme osarts. 176 a 178 do Novo Codex.

Seguindo o estudo, o incisoVI do art. 617 do CPC/2015reconhece a legitimidade do

Page 2140: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

cessionário do herdeiro ou dolegatário para figurar comoinventariante, o que vem em boahora, diante da possibilidade decessão de direitos hereditários,admitida pelo art. 1.793 doCódigo Civil de 2002. De acordocom o caput do diploma material,o direito à sucessão aberta, bemcomo o quinhão de que disponhao co-herdeiro, pode ser objeto decessão por escritura pública.Aqui, a novidade segue a linha daanterior jurisprudência doSuperior Tribunal de Justiça, enão a contraria como no caso doinciso anterior, cabendo trazer à

Page 2141: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

colação o seguinte aresto:

“Inventário. Nomeação de inventariante.Alegação de ofensa ao art. 990 do Código deProcesso Civil. Impugnação formulada porum dos herdeiros do de cujus à pessoanomeada, cessionário de direitos hereditáriose dela credor por vultosa soma. Matériafático-probatória. Recurso especialinadmissível. A ordem prevista no art. 990 doCPC não é absoluta, podendo ser alterada emsituação de fato excepcional. Em sede derecurso especial não se reexamina matériafático-probatória. Incidência da Súmula n.7/STJ. Recurso especial não conhecido”(STJ, REsp 402.891/RJ, Quarta Turma, Rel.Min. Barros Monteiro, j. 01.03.2005, DJ02.05.2005, p. 353).

Consigne-se que algunsarestos estaduais seguiam essa

Page 2142: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

mesma forma de julgar, podendoser colacionado o seguinte, ailustrar, do Tribunal Paulista:“Cessionário que também erainventariante. Inexistência deimpedimento legal. Alegação deincapacidade da cedente que nãorestou comprovada. Hipóteses deerro ou dolo igualmente nãoverificadas. Sentença mantida.Recurso desprovido” (TJSP,Apelação 0217534-23.2007.8.26.0100, Acórdão7395033, São Paulo, SextaCâmara de Direito Privado, Rel.Des. Eduardo Sá PintoSandeville, j. 27.02.2014, DJESP

Page 2143: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

06.05.2014).Expostas as duas inovações

do art. 617 do CPC/2015, cabepontuar que o entendimentomajoritário da doutrina semprefoi no sentido de que o art. 990do CPC/1973 traria uma ordemque deveria ser respeitada pelomagistrado, o que possivelmenteserá sustentado em relação aoNovo CPC.19 Assim sendo, paraessa corrente não caberia umanomeação aleatória pelo juiz dacausa, pois a lei presume que aspessoas constantes do dispositivosão, pela ordem, as maisindicadas para assumir a

Page 2144: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

incumbência. Entretanto, dessaconstatação surgem algumasdúvidas práticas.

A primeira delas refere-se, asaber, se essa ordem é absoluta.O Superior Tribunal de Justiça jáentendeu que não, conforme seretira do último aresto aquicolacionado, que reconheceu alegitimidade do cessionário doherdeiro, antes mesmo do NovoCPC (REsp 402.891/RJ).Destaque-se que a premissa foiconfirmada em julgado maisrecente, assim publicado noInformativo n. 373 do STJ, emcaso envolvendo a nomeação de

Page 2145: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

inventariante dativo:

“Nomeação. Inventariante dativo. Noticiamos autos que a justificativa para a nomeaçãode inventariante dativo foi a animosidadeentre as partes: de um lado a viúva, casadasob regime de comunhão universal de bens ea, até então, única filha conhecida do falecido;do outro, o recém-descoberto filho menor,possível herdeiro, representado pela mãe.Apontam que tal animosidade écompreensível e até mesmo esperada, assimcomo o questionamento quanto à filiação domenor, uma vez que a esposa e a filha sósouberam da existência do filho a partir deobservação na certidão de óbito lançada emfunção da apresentação da certidão denascimento do menor, em que o ora falecidoanteriormente o reconhecera como filho.Questiona o REsp se houve violação à ordemlegal de nomeação de inventariante conformeprevista no art. 990 do CPC. Isso posto, a

Page 2146: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

Ministra Relatora observa que este Tribunal jádefiniu não ter caráter absoluto aquela ordempara nomeação de inventariante, podendo seralterada em situação de fato excepcional,quando o juiz tiver fundadas razões paratanto, como no caso de existência delitigiosidade entre partes. Diante do exposto, aTurma não conheceu do recurso, pois a firmeconvicção do juízo formada a partir doselementos fáticos do processo veda oreexame em REsp (Súm. 7/STJ).Precedentes citados: REsp 402.891/RJ, DJ02.05.2005; REsp 283.994/SP, DJ07.05.2001, e REsp 88.296/SP, DJ08.02.1999” (STJ, REsp 1.055.633/SP, Rel.Min. Nancy Andrighi, j. 21.10.2008).

A segunda dúvida é saber sea ordem do dispositivo pode serquebrada por força de testamentoque nomeia o inventariante. O

Page 2147: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

presente autor entende que aprevisão de cláusula que nomeiainventariante não obsta que o juizsiga a ordem estabelecida nas leisinstrumentais, pois esta deve seranalisada de acordo com o casoconcreto. Pode-se até defenderque os dispositivos processuais,o antigo e o novo, constituempreceitos cogentes, de ordempública, que não podem sercontrariados pela últimadisposição de vontade do morto.De qualquer forma, comocontraponto, vale repetir que aordem não é absoluta, mesmosendo as normas cogentes.

Page 2148: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

Como outra última questãocontroversa, reafirme-se que opresente autor segue a premissade que o rol de nomeação doinventariante não é taxativo, masexemplificativo. Nessa linha, valerelembrar os julgados doSuperior Tribunal de Justiça queincluíam o companheiro comoinventariante, antes da alteraçãolegislativa realizada noCPC/1973 pela Lei 12.195/2010.

Por fim, quanto àconfrontação dos dois preceitos,estabelece o parágrafo único doart. 617 do CPC/2015 que oinventariante, intimado da

Page 2149: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

nomeação, prestará, dentro decinco dias, o compromisso debem e fielmente desempenhará afunção. Neste ponto houve asubstituição da palavra cargopelo termo destacado, o que vemem boa hora, pois a expressãoanterior poderia dar a impressãode uma atuação remunerada, oque não ocorre no exercício dainventariança (art. 990, parágrafoúnico, do CPC/1973).

No tocante às atribuições doinventariante, dispunha o art. 12,inciso V, do CPC/1973 que eledeve representar ativa epassivamente o espólio, o que foi

Page 2150: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

totalmente mantido pelo art. 75,inciso VII, do CPC/2015.Também foi repetida a regra doantigo art. 991 do CPC/1973 pelonovo art. 618 do CPC/2015,tratando das incumbências doinventariante.

A primeira atribuição é a derepresentar o espólio ativa epassivamente, em juízo ou foradele, observando-se, quanto aoinventariante dativo, o dispostono art. 75, § 1.º, do CPC/2015, ouseja, no que concerne ànecessidade de intimação dosherdeiros. O inventariante deve,como segunda incumbência,

Page 2151: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

administrar o espólio, velando-lhe os bens com a mesmadiligência como se seus fossem.Na visão atual do DireitoPrivado, pode-se associar a suaconduta à lealdade decorrente daboa-fé objetiva. O seu terceirodever é o de prestar as primeirase últimas declaraçõespessoalmente ou por procuradorcom poderes especiais. Deve ele,ainda, exibir em cartório, aqualquer tempo, para exame daspartes, os documentos relativosao espólio. Incumbe também aoinventariante o dever de juntaraos autos certidão do testamento,

Page 2152: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

se houver. A sexta atribuição é ade trazer à colação no inventárioos bens recebidos pelo herdeiroausente, renunciante ou excluído.O sétimo dever é o de prestarcontas de sua gestão ao deixar ocargo ou sempre que o juiz lhedeterminar. Por fim, como oitavaatribuição, incumbe aoadministrador do inventáriorequerer a declaração deinsolvência do falecido, se for ocaso.

O art. 619 do CPC/2015lista outras de suas incumbências,que necessitam, no entanto, deautorização do juiz da causa e da

Page 2153: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

oitiva dos interessados, comofazia o art. 992 do CPC/1973, sobpena de nulidade absoluta do ato,como sustentado pela doutrinaanterior.20 Esses atos continuamsendo: a) a alienação de bens dequalquer espécie; b) a transaçãoem juízo ou fora dele; c) opagamento de dívidas do espólio;d) o pagamento das despesasnecessárias para a conservação eo melhoramento dos bens doespólio.

Seguindo na análise dosprocedimentos relacionados como inventário judicial, o EstatutoProcessual continua a prever que

Page 2154: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

dentro de vinte dias, contados dadata em que prestou ocompromisso, fará o inventarianteas primeiras declarações, dasquais se lavrará termocircunstanciado (art. 620 doCPC/2015, equivalente ao art.993 do CPC/1973, semmodificação). O dispositivodetermina, ainda, que no termo,assinado pelo juiz, escrivão einventariante, serão exaradosalguns dados.

No primeiro inciso hámenção ao nome, ao estado, àidade e ao domicílio do autor daherança, dia e lugar em que

Page 2155: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

faleceu o de cujus, bem ainda aexpressão se deixou testamento. Asegunda previsão diz respeito aonome, ao estado, à idade e àresidência dos herdeiros e,havendo cônjuge supérstite oucompanheiro, ao regime de bensdo casamento ou da união estável.Pontue-se que a referência àúltima entidade familiar éinovação do comando, na linha deequalização adotada pelo NovoCPC. Devem constar também aqualidade dos herdeiros e o graude parentesco com o inventariado(art. 620, inciso III, doCPC/2015).

Page 2156: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

Quanto aos bens do espólio,inclusive aqueles que devem serconferidos à colação, e dos bensalheios que nele foremencontrados, deve estar incluídarelação completa, nos termos doinciso IV do art. 620 doCPC/2015 A norma estabelece anecessidade de descrição dosseguintes bens: a) os imóveis,com as suas especificações,nomeadamente local em que seencontram, extensão da área,limites, confrontações,benfeitorias, origem dos títulos,números das transcriçõesaquisitivas e ônus que os gravam;

Page 2157: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

b) os móveis, com os sinaiscaracterísticos; c) os semoventes,caso dos animais, seu número,espécies, marcas e sinaisdistintivos; d) o dinheiro, asjoias, os objetos de ouro e prata,e as pedras preciosas,declarando-se-lhesespecificadamente a qualidade, opeso e a importância; e) os títulosda dívida pública, bem como asações, quotas e títulos desociedade, mencionando-se-lheso número, o valor e a data; f) asdívidas ativas e passivas,indicando-se-lhes as datas,títulos, origem da obrigação, bem

Page 2158: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

como os nomes dos credores edos devedores; g) direitos eações; h) o valor corrente de cadaum dos bens do espólio. Como sepode perceber, a relação, semqualquer mudança perante anorma anterior, é bem detalhadapela lei, e deve ser respeitadapara que o processamento doinventário tenha corretoseguimento, sem qualquernulidade processual.

O § 1º do art. 620 do NovoCPC estabelece que nesseprocedimento o juiz determinaráque se proceda: a) ao balanço doestabelecimento, se o autor da

Page 2159: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

herança era empresárioindividual; e b) à apuração dehaveres, se o autor da herança erasócio de sociedade que nãoanônima. Houve uma mudança denomenclatura em confronto com o§ 1º do art. 993 do CPC/1973,que mencionava o comercianteem nome individual. A alteraçãose deu tendo em vista a superaçãodo Direito Comercial peloDireito Empresarial. A título deexemplo de subsunção da últimanorma do preceito anterior, quenão foi alterada, cabe trazer ànota recente aresto do Tribunal deJustiça de São Paulo, com

Page 2160: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

entendimento que vale para onovel diploma:

“Inventário. Impugnação de herdeiro oraagravado Nas primeiras declarações devemser incluídos todos os bens do espólio e asdívidas ativas e passivas (CPC, art. 993, IV).Cotas da Padaria e Confeitaria devem serincluídas, para que sejam partilhadas entre osherdeiros, na proporção da meação do autorda herança, a fim de que se proceda àapuração de haveres, mediante arbitramentopor perito (CPC, art. 993, parágrafo único,inc. II). Dívidas passivas do espólioressentem-se de demonstração convincentequanto à sua existência, devendo serexcluídas das primeiras declarações. Recursoprovido em parte” (TJSP, Agravo deInstrumento 0090761-29.2013.8.26.0000,Acórdão 7111550, São Paulo, PrimeiraCâmara de Direito Privado, Rel. Des. PauloEduardo Razuk, j. 15.10.2013, DJESP

Page 2161: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

08.11.2013).

Como novidade, o § 2º doart. 620 do CPC/2015 passou aenunciar expressamente que asprimeiras declarações podem serprestadas mediante petição,firmada por procurador compoderes especiais, à qual o termose reportará. A nova regra segue aideia de redução de burocracias eagilização, adotada pelo NovoCodex, na linha do que ocorria naprática sucessionista.

Seguindo no estudo damatéria, o Código de ProcessoCivil de 2015, na esteira do seu

Page 2162: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

antecessor, continua a elencaralgumas penalidades contra oinventariante. De início, no queconcerne à pena de sonegados,expressa que só é possível argui-la ao inventariante depois deencerrada a descrição dos bens,com a declaração, por ele feita,de não existirem outros porinventariar (art. 621 doCPC/2015 e art. 994 doCPC/1973, sem alteração).

Vale lembrar que a pena desonegados é imposta ao herdeiroque deixa de informar oinventário sobre a existência deum bem a ser partilhado, caso

Page 2163: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

daqueles recebidos em doação,sem a dispensa de colação. Apenalidade é a perda do direitoem relação a tal bem, comodetermina o art. 1.992 do CódigoCivil. Como se sabe, quando forcitado, nos termos do art. 626 doCPC/2015 e art. 999 doCPC/1973, o inventarianteherdeiro terá a oportunidade deinformar e descrever quais osbens do falecido que estão na suaposse. Se assim não o fizer, estarásujeito a essa e a outras sançõeslegais.

A remoção do inventarianteconsta do art. 622 do Novo

Page 2164: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

Estatuto Processual, equivalenteao art. 995 do CPC anterior. Aprimeira hipótese de remoçãoocorre se não prestar, no prazolegal, as primeiras e as últimasdeclarações. A segunda se efetivase não der ao inventárioandamento regular, se suscitardúvidas infundadas ou se praticaratos meramente protelatórios. Oterceiro caso de remoção ocorrese, por culpa sua, sedeteriorarem, forem dilapidadosou sofrerem danos os bens doespólio, hipótese deresponsabilidade subjetiva.Também será removido o

Page 2165: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

inventariante que não defender oespólio nas ações em que forcitado, deixar de cobrar dívidasativas ou não promover asmedidas necessárias para evitar operecimento de direitos. O quintocaso de remoção está presentequando o inventariante não prestacontas ou se aquelas que prestarnão forem julgadas boas. Por fim,haverá remoção do inventariantese ele sonegar, ocultar ou desviarbens do espólio.

Não houve alteração notocante às hipóteses de remoção.No entanto, como novidade oCódigo de Processo Civil de

Page 2166: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

2015 passa a admitir a remoçãodo inventariante de ofício, comofazia a jurisprudência superior,por exemplo, no caso da seguinteementa:

“Remoção de inventariante. Ausência decerceamento de defesa. 1. Não se configurao cerceamento de defesa no caso de remoçãode inventariante quando está presente ocontraditório, e pode o Juiz, constatadoqualquer dos vícios do art. 995 do Código deProcesso Civil, promover de ofício aremoção. 2. Recurso especial não conhecido”(STJ, REsp 539.898/MA (200300644088),616051 Recurso Especial, Terceira Turma,Rel. Min. Carlos Alberto Menezes Direito, j.29.03.2005, DJ 06.06.2005, p. 318).

Os procedimentos para essa

Page 2167: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

remoção, antes previstos nos arts.996 a 998, foram repetidos pelosarts. 623 a 625 do Novo Codex.Primeiramente, requerida aremoção com fundamento emquaisquer dos motivos elencados,o inventariante será intimadopara, no prazo de cinco dias,defender-se e produzir provas. Oincidente da remoção correrá emapenso aos autos do inventário.Decorrido o prazo, com ou sem adefesa do inventariante, o juizdecidirá. Se remover oinventariante, o juiz nomearáoutro, observada a ordem antesanalisada. Como não poderia ser

Page 2168: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

diferente, o contraditório deve serinstituído no processo deremoção do inventariante. Atéaqui (arts. 623 a 624 doCPC/2015), não houve qualqueralteração perante o sistemaanterior.

Decidindo-se pela remoção,o inventariante entregaráimediatamente ao substituto osbens do espólio. No entanto, sedeixar de fazê-lo, será compelidomediante mandado de busca eapreensão, no caso de bensmóveis, ou de imissão na posse,no caso de bens imóveis (art. 625do CPC/2015, equivalente ao art.

Page 2169: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

998 do CPC/1973). O novopreceito traz um aditivo que nãoexistia no sistema anterior, qualseja a aplicação de uma multa emcaso de não devolução dos bens,a ser fixada pelo juiz, emmontante não superior a três porcento do valor dos bensinventariados.

Na opinião deste autor, amulta pode eventualmente serreduzida em casos de excessos,mesmo sendo fixadajudicialmente, aplicando-se o art.413 do Código Civil de 2002,que trata do controle equitativoda cláusula penal. É a redação

Page 2170: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

desse importante diplomamaterial: “A penalidade deve serreduzida equitativamente pelojuiz se a obrigação principal tiversido cumprida em parte, ou se omontante da penalidade formanifestamente excessivo, tendo-se em vista a natureza e afinalidade do negócio”.

Dando continuidade aoestudo do procedimento deinventário judicial, apresentadasas primeiras declarações, o juizmandará citar, para os termos doinventário e partilha, o cônjuge, ocompanheiro, os herdeiros, oslegatários, a Fazenda Pública, o

Page 2171: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

Ministério Público, se houverherdeiro incapaz ou ausente, e otestamenteiro, se o finado deixoutestamento (art. 626, caput, doCPC/2015). A inclusão docompanheiro constitui novidadeconsiderando o que estava no art.999, caput, do CPC/1973, o quevem em boa hora, pela tutelaconstitucional da união estável,conforme exaustivamentepontuado nesta obra.

A citação do cônjuge, docompanheiro, do herdeiro ou dolegatário, pelo novo sistema, dar-se-á pelo correio (art. 626, § 1º,do CPC/2015). Assim, não se

Page 2172: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

dará mais a citação por oficial dejustiça, nos casos de pessoasdomiciliadas na Comarca poronde corria o inventário ou que aífossem encontradas, e por edital,com prazo de 20 e 60 dias, paratodas as demais, residentes noBrasil ou no estrangeiro (art. 999,§ 1º, do CPC/1973). Sem dúvidaque a mudança visa à agilizaçãodos procedimentos, demoradosem muitas situações concretas, oque até já entrou para o folcloreda prática sucessionista. Visandoa ampla publicidade dos atos deinventariança, o novo sistemadetermina que em todas as

Page 2173: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

hipóteses do procedimento sejampublicados editais.

Consigne-se que em todas assituações concretas em que não háa manifestação do herdeiro, semque se possa concluir pelaaceitação ou recusa, ajurisprudência tem admitido anomeação de um curador especiale provisório, o que deve sermantido com a nova legislação.Assim, concluindo, por todos:

“Citação. Edital. Inventário. Ausência demanifestação das legatárias. Comunicaçãohavida entre as duas legatárias e a advogadado antigo testamento que não permite concluirpela aceitação ou recusa do legado por não

Page 2174: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

aceitação do encargo. Necessidade denomeação de curador especial que deve serestendida na espécie. Art. 9.º, II, do Códigode Processo Civil. Recurso provido em parte,dispensada a expedição de carta rogatória,devendo ser nomeado curador especial àslegatárias citadas por edital” (TJSP, Agravode Instrumento 315.142-4/4-São Paulo,Primeira Câmara de Direito Privado, Rel.Elliot Akel, j. 02.03.2004, v.u.).

Cumpre destacar que oSupremo Tribunal Federaldebateu a constitucionalidade danorma anterior (art. 999, § 1º, doCPC/1973), especialmente peladiscrepância de tratamento deherdeiro, assim concluindo,conforme o seu Informativo n.523:

Page 2175: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

“O Tribunal, por maioria, desproveu recursoextraordinário interposto contra acórdão doTribunal de Justiça do Estado do Rio Grandedo Norte, e declarou a constitucionalidade doart. 999, § 1º, do CPC [“Art. 999. Feitas asprimeiras declarações, o juiz mandará citar,para os termos do inventário e partilha, ocônjuge, os herdeiros, os legatários, a FazendaPública, o Ministério Público, se houverherdeiro incapaz ou ausente, e otestamenteiro, se o finado deixou testamento.§ 1.º Citar-se-ão, conforme o disposto nosarts. 224 a 230, somente as pessoasdomiciliadas na comarca por onde corre oinventário ou que aí foram encontradas; e poredital, com o prazo de 20 (vinte) a 60(sessenta) dias, todas as demais, residentes,assim no Brasil como no estrangeiro.”]. Oacórdão recorrido reputara válida a citação,por edital, de herdeiro e de seu cônjugedomiciliados em comarca diversa daquela emque processado o inventário. Os recorrentes

Page 2176: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

alegavam que não deveriam ter sido citadospor esse modo, haja vista possuírem endereçocerto, e sustentavam ofensa aos princípios daisonomia, da ampla defesa, do contraditório edo devido processo legal no reconhecimentoda constitucionalidade do referido dispositivo– v. Informativo n. 521. Salientando tratar-se de dispositivo vetusto, que já constava doCódigo de Processo Civil anterior, entendeu-se que a citação por edital em processo deinventário seria perfeitamente factível, atémesmo para se acelerar a prestaçãojurisdicional. Ressaltou-se, também, quequalquer irregularidade poderia ser enfrentadanas instâncias ordinárias. Vencido o Min.Marco Aurélio, que dava provimento aorecurso e assentava a inconstitucionalidade doart. 999, § 1º, do CPC, ao fundamento de queo inventário se processa sob o ângulo dajurisdição voluntária, mas, a partir domomento em que a legislação indica onecessário conhecimento de herdeiros,

Page 2177: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

sabendo-se quem eles são e onde estão, aciência não poderia ser ficta, e sim realizadapor meio de carta precatória, sob pena de secolocar em segundo plano a regra segundo aqual se deve, tanto quanto possível, promovera ciência de fato quanto ao curso do processode inventário. Vencido, também, o Min. Celsode Mello, que acompanhava a divergência, eafirmava que a citação ficta, mediante edital,teria caráter excepcional e não viabilizaria oexercício pleno do direito ao contraditório”(STF, RE 552.598/RN, Rel. Min. MenezesDireito, 08.10.2008).

Como se nota, houvedivergência no julgamento naCorte Suprema Brasileira e,talvez por isso, a mudança veioem boa hora, sem qualquerdiferenciação quanto à forma de

Page 2178: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

citação dos interessados noinventário.

Ainda no que interessa aosprocedimentos de citação,preceitua o § 2.º do art. 626 doCPC/2015 que das primeirasdeclarações extrair-se-ão tantascópias quantas forem as partes, nalinha exata do que estava nomesmo parágrafo do antigo art.999. Houve alteração noparágrafo seguinte, pois a citaçãopor oficial de justiça não é mais aregra. Antes, mencionava-se queo oficial de justiça, ao proceder àcitação, entregaria um exemplar acada parte (art. 999, § 3.º, do

Page 2179: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

CPC/1973). Agora apenas seexpressa que a citação por cartaserá acompanhada de cópia dasprimeiras declarações, o queigualmente facilitou oprocedimento (§ 3.º do art. 626do CPC/2015).

No que tange à FazendaPública, ao Ministério Público eeventual testamenteiro, incumbeao escrivão remeter cópias dosautos (art. 626, § 4º doCPC/2015, equivalente ao art.999, § 4.º, do CPC/1973). Aúltima regra do mesmo modo valepara o advogado da parte que jáestiver representada nos autos,

Page 2180: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

visando a dar mais agilidade aoprocessamento do inventário.

Concluídas as citações,abrir-se-á vista às partes, emcartório e pelo prazo comum dequinze dias, para se manifestaremsobre as primeiras declarações(art. 627, caput, do CPC/2015).O prazo foi aumentado dos dezdias anteriores, como estava nacabeça do art. 1.000 doCPC/1973. Sem qualqueralteração, conforme os incisosdos dois comandos, em casostais, cabe à parte do processo deinventário arguir erros eomissões, reclamar contra a

Page 2181: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

nomeação do inventariante econtestar a qualidade de quem foiincluído no título de herdeiro.

Havendo impugnação quantoa erros e omissões, e julgada estaprocedente, o juiz mandaráretificar as primeiras declarações(art. 627, § 1º, do CPC/2015,correspondente ao art. 1.000,parágrafo único, do CPC/1973).Se o juiz acolher o pedido dereclamação da nomeação doinventariante, nomeará outro,observada a preferência legal(art. 627, § 2º, do CPC/2015,também correspondente ao art.1.000 parágrafo único, do

Page 2182: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

CPC/1973).Por fim, verificando o

magistrado que a disputa sobre aqualidade de herdeiro demandaprodução de provas que não adocumental, o juiz remeterá aparte para as vias ordinárias esobrestará, até o julgamento daação, a entrega do quinhão que napartilha couber ao herdeiroadmitido (art. 627, § 3º, doCPC/2015). Aqui houve umaalteração relevante perante aparte final do antigo parágrafoúnico do art. 1.000 do CPC/1973,que fazia menção à matéria dealta indagação, expressão

Page 2183: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

substituída pelo termoanteriormente destacado.

Em suma, um conceito legalindeterminado, com alto grau desubjetividade, foi substituído poruma construção mais objetiva,baseada na produção de provadocumental. Para o presenteautor, a substituição pode trazermais certeza e segurança para oprocedimento do inventário,cabendo elogios em tal aspecto.Entretanto, por outra via, umtermo mais fechado retira apossibilidade de o juiz considerarnovas situações no futuro, como écomum quando se utilizam

Page 2184: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

conceitos legais indeterminados ecláusulas gerais. Em tal ponto, amudança pode ser desfavorável.Somente a prática poderádemonstrar se a alteração foi boaou ruim, tendo este autor dúvidasneste momento.

De qualquer maneira, umasituação que encontrará maiorestabilidade com a mudançaapontada diz respeito aoreconhecimento da união estávele à inclusão da companheira ouconvivente como herdeira noinventário. Nesse contexto,pontue-se que muitos arestos dasCortes Estaduais vinham

Page 2185: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

entendendo que a existência dessaunião livre e informal seria umaquestão de alta indagação, quedeveria ser resolvida no âmbitopróprio, nas citadas viasordinárias. Por todos, cabecolacionar:

“Inventário. O caso encerra típica hipótese dequestão de alta indagação, a qual deve sersolucionada em ação própria, tal comodecorre do artigo 984 do CPC. O fato de aagravante receber benefício previdenciário naqualidade de companheira do falecido éinsuficiente para habilitá-la como herdeira nosautos do inventário, seja porque a uniãoestável é objeto de impugnação consistente,seja pela necessidade de se definirem ostermos inicial e final da convivência, o que édado relevante para a partilha dos bens do

Page 2186: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

autor da herança. Recurso provido em parte”(TJSP, Agravo de Instrumento 0157144-23.2012.8.26.0000, Acórdão 6847896, SãoPaulo, Nona Câmara de Direito Privado, Rel.Des. Piva Rodrigues, j. 25.06.2013, DJESP18.07.2013).

“Agravo de instrumento. Ação de inventário.Reconhecimento incidental de união estável.Impossibilidade, no caso. Questão de altaindagação. Matéria remetida às viasordinárias. Recurso conhecido e desprovido”(TJPR, Agravo de Instrumento 0695525-1,Londrina, Décima Primeira Câmara Cível,Rel. Juiz Conv. Antonio Domingos RaminaJunior, DJPR 16.12.2010, p. 389).

“Inventário. Alegação de união estável.Necessidade de ação própria. Matéria de altaindagação. Recurso improvido” (TJSP,Agravo de Instrumento 990.10.137818-3,Acórdão 4648928, Guarulhos, Oitava Câmara

Page 2187: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

de Direito Privado, Rel. Des. CaetanoLagrasta, j. 18.08.2010, DJESP 07.10.2010).

“Agravo de instrumento. Inventário.Reconhecimento de união estável. Questãode alta indagação. Remessa às viasordinárias. 1. O inventário é um processo comcontornos próprios, não havendo como neleserem discutidas questões de alta indagação.2. Deve a pretensa ex-companheira ajuizar aação própria para o reconhecimento daalegada união estável constituída com ofalecido para ter reconhecido o seu direito,sendo aconselhável a suspensão do processode inventário em razão de aparentemente nãoexistirem ascendentes e descendentes do decujus, caso em que, confirmada aquela união,terá a companheira direito à totalidade daherança (art. 2.º, inc. III, da Lei 8.971/1994).3. Nega-se provimento ao recurso” (TJMG,Proc. 1.0515.05.014147-9/0001, Piumhi,Quarta Câmara Cível, Rel. Célio César

Page 2188: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

Paduani, j. 06.04.2006, v.u.).

Em regra, o presente autorsempre se filiou a essa forma dejulgar, pois os elementoscaracterizadores da união estávelprevistos pelo art. 1.723 doCC/2002 podem levantar dúvidasconcretas, sendo necessária umaação específica para o seureconhecimento e posteriordissolução. Em reforço, muitasvezes existem dificuldades parase determinarem o início e o fimda união estável, o que éfundamental para a questãosucessória. Como é notório, esse

Page 2189: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

comando civil estabelece que sãorequisitos essenciais da uniãoestável a existência de umrelacionamento público, contínuoe duradouro, estabelecido com oobjetivo de constituição defamília. Os conceitos, como senotam, são abertos, havendogrande variação de interpretaçãona doutrina e na jurisprudêncianacionais. O tema estádevidamente aprofundado emoutro capítulo deste livro, quetrata do tratamento docompanheiro no Novo EstatutoProcessual (Capítulo 14).

Todavia, este autor sempre

Page 2190: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

entendeu que, se a união estávelestivesse devidamente provadano feito, tal forma de julgarficaria em xeque. A concretizar,podem ser citadas as hipóteses deexistência de uma escriturapública de união estável. Com aredação do Novo CPC, nãorestam dúvidas de que a inclusãoda companheira deve ser imediataem situações tais, sem anecessidade de debate nas viasordinárias. Seguindo esseentendimento, da jurisprudênciaanterior:

“Agravo de instrumento. Inventário. Decisãoque remete as partes às vias ordinárias para

Page 2191: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

alcançar o reconhecimento de união estávelhavida com o de cujus. Inadequação. Fartaprova documental da convivência e ausênciade contrariedade dos herdeiros. Questão quenão se configura como de alta indagação.Inteligência do art. 984 do Código deProcesso Civil. Decisão reformada. Recursoprovido” (TJPR, Agravo de Instrumento0790238-5, Londrina, Décima SegundaCâmara Cível, Rel. Des. Clayton Camargo,DJPR 06.10.2011, p. 524).

“Agravo de instrumento. Inventário.Insurgência da agravante contra a decisãoque houve por alta indagação os pedidos porela formulados, de meação, participação naherança e direito real de habitação. Uniãoestável é fato e como tal satisfatoriamentecomprovado nos autos, por escritura públicaoutorgada pelo falecido, pela sociedadeigualitária na compra de imóvel, igualmenteconstante de escritura pública e pela

Page 2192: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

declaração de óbito feita pela agravante juntoao cartório civil. Necessidade de interpretar adicção alta indagação com o sentido voltadopara os princípios jurídicos e a realidade davida. Questões decorrentes, como meação,direito sucessório e direito real de moradia,devem, à evidência, ser resolvidas pelo juiz doinventário, por serem exclusivamente dedireito. Agravo provido em parte para afastara existência de questão de alta indagação edevolver a solução das questões jurídicassuscitadas ao juiz do inventário” (TJSP,Agravo de Instrumento 0124334-63.2010.8.26.0000, Acórdão 4938338, NonaCâmara de Direito Privado, São Paulo, Rel.Des. João Carlos Garcia, j. 24.08.2010,DJESP 01.03.2011).

“Agravo de instrumento. Inventário.Reconhecimento de união estável. Ausentequestão de alta indagação. Situaçãoincontroversa. Fartamente comprovada por

Page 2193: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

documentos, a união estável havida entre aagravante e o falecido, não há razão para aremessa da discussão às vias ordinárias.Deram provimento” (TJRS, Agravo deInstrumento 70037325495, São Leopoldo,Oitava Câmara Cível, Rel. Des. Alzir FelippeSchmitz, j. 28.10.2010, DJERS 08.11.2010).

Em outro exemplo que podeser citado, para a devidaconfrontação prática entre oCPC/2015 e o CPC/1973, oTribunal de Justiça do RioGrande do Sul entendeu que eraquestão de alta indagação adiscussão a respeito da existênciade dívidas com empregada docasal envolvido. Vejamos aementa do julgado: “A dívida

Page 2194: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

com a empregada não é doespólio, sendo que a cessão decrédito e as dívidas representadaspor notas promissórias, bemcomo as decorrentes dofornecimento de alimentação,constituem questões de altaindagação, devendo tal discussãoter lugar nas vias ordinárias.Recurso provido em parte”(TJRS, Processo 70011748951,Lagoa Vermelha, Sétima CâmaraCível, Juiz Rel. Sérgio Fernandode Vasconcellos Chaves, j.10.08.2005). Fez o mesmo aquelepioneiro Tribunal Gaúcho quantoàs dívidas médicas relacionadas

Page 2195: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

com o falecido e o seu funeral:

“Inventário. Habilitação de crédito. Despesasmédicas com o inventariado. Discordância. 1.Basta que não se verifique a concordância deum dos herdeiros apenas quanto ao crédito aser habilitado, para que as partes sejamremetidas às vias ordinárias, mesmo que setrate de despesas médicas ou até funeráriascom o inventariado. 2. A impugnação nãonecessita de maior fundamentação, pois adiscussão deve ter lugar nas vias ordinárias,constituindo questão de alta indagação a sersolvida. Inteligência do art. 1.997, § 1.º, doCC, e art. 1.018 do CPC. Recurso do espólioprovido em parte e desprovido o doscredores” (TJRS, Processo 70010714004,Porto Alegre, Sétima Câmara Cível, Juiz Rel.Sérgio Fernando de Vasconcellos Chaves, j.18.05.2005).

Pela mudança do texto

Page 2196: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

processual, nos casos expostos,basta a existência de uma dívidalíquida – certa quanto à existênciae determinada quanto ao valor –,que está vencida e provadadocumentalmente para que haja ainclusão como herdeiro ouinteressado nos autos doinventário. A propósito, pontue-seque os dois últimos casos, comose pode perceber, envolvemhabilitação de crédito noinventário, realizada por terceiro,o que é plenamente possível,sendo o caso típico o relacionadocom o credor que deseja recebero que lhe é devido.

Page 2197: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

Partindo para outraconcreção, como se extrai dearesto do Superior Tribunal deJustiça, “as questões de fato e dedireito atinentes à herança devemser resolvidas pelo juízo doinventário, salvo as exceçõesprevistas em lei, como asmatérias de ‘alta indagação’referidas no art. 984, CPC, e asações reais imobiliárias ou as emque o espólio for autor. Comessas ressalvas, o foro sucessórioassume caráter universal, talcomo o juízo falimentar, devendo,nele, ser solucionadas aspendências entre os herdeiros. O

Page 2198: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

ajuizamento de ação de ritoordinário, por um herdeiro contrao outro, cobrando o aluguel pelotempo de ocupação de um dosbens deixados em testamento pelofalecido, contraria o princípio dauniversalidade do juízo doinventário, afirmada no art. 984do Código de Processo Civil,uma vez não se tratar de questão ademandar ‘alta indagação’ ou adepender de ‘outras provas’, masde matéria típica do inventário,que, como cediço, é oprocedimento apropriado paraproceder-se à relação, descriçãoe avaliação dos bens deixados

Page 2199: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

pelo falecido. Eventual crédito daherdeira pelo uso privativo dapropriedade comum deve seraventado nos autos do inventário,para compensar-se na posteriorpartilha do patrimônio líquido doespólio. O ajuizamento de açãoautônoma para esse fim não temnecessidade para o autor, que sevê, assim, sem interesse de agir,uma das condições da ação, quese perfaz com a conjugação dautilidade e da necessidade” (STJ,REsp 190.436/SP, Quarta Turma,Rel. Min. Sálvio de FigueiredoTeixeira, j. 21.06.2001, DJ10.09.2001, p. 392). Em todos os

Page 2200: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

casos citados no decisium, agora,havendo prova documental, éplenamente possível a inclusãodo interesse na inventariança.

A aludida habilitação decrédito daquele que foi preteridona herança consta do art. 628 doCPC/2015, dispositivo que deveser confrontado com o art. 1.001do CPC/1973, seucorrespondente, conforme tabelaa seguir:

NovoCódigo deProcesso

Código de

Processo Civil

Page 2201: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

Civil Anterior

“Art. 628.Aquele quese julgarpreteridopoderádemandarsua admissãono inventário,requerendo-aantes dapartilha.

§ 1º Ouvidasas partes noprazo de 15(quinze) dias,o juizdecidirá.

“Art. 1.001.Aquele que sejulgar preteridopoderá demandara sua admissãono inventário,requerendo-oantes da partilha.Ouvidas aspartes no prazo

Page 2202: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

§ 2º Se parasolução daquestão fornecessária aprodução deprovas quenão adocumental,o juizremeterá orequerenteàs viasordinárias,mandandoreservar, empoder doinventariante,o quinhão doherdeiroexcluído atéque sedecida olitígio.”

de 10 (dez) dias,o juiz decidirá.Se não acolher opedido, remeteráo requerentepara os meiosordinários,mandandoreservar, empoder doinventariante, oquinhão doherdeiro excluídoaté que se decidao litígio.”

Page 2203: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

De início, nota-se que onovo comando é mais bemorganizado, com dois parágrafosbem separados, e não mais comtodas as regras concentradas emum mesmo preceito. Além disso,o prazo para a manifestação dosinteressados sobre a habilitaçãode crédito, seguindo a linha deoutros diplomas do mesmoCódigo de Processo Civil, foiaumentado de dez para quinzedias.

Ademais, anteriormenteestabelecia a norma processual

Page 2204: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

que, se o pedido de inclusão nãofosse acolhido – e esseacolhimento ou não era atribuídoaos herdeiros –, a questão seriaremetida para as vias ordinárias.Agora esse poder de impugnaçãofoi praticamente retirado dosistema, prevendo a nova normaque, se para solução da questãofor necessária a produção deprovas que não a documental, ojuiz remeterá o requerente para asvias ordinárias.

Sem qualquer alteração, emcasos tais continua sendopossível que o juiz mandereservar, em poder do

Page 2205: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

inventariante, o quinhão doherdeiro excluído até que sedecida o litígio remetido para asvias comuns.

Para o presente autor, odispositivo continuará a seraplicado para a companheira quenão foi incluída no inventário,conforme apontava a doutrinaespecializada.21 Consigne-se queesse também era o entendimentojurisprudencial, a ser mantidocom o Novo CPC (ver, por todos:STJ, REsp 310.904/SP, QuartaTurma, Rel. Min. Jorge TadeoFlaquer Scartezzini, j.22.02.2005, DJU 28.03.2005, p.

Page 2206: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

258; TJRS, Agravo deInstrumento 501239-55.2012.8.21.7000, Porto Alegre,Oitava Câmara Cível, Rel. Des.Ricardo Moreira Lins Pastl, j.28.02.2013, DJERS 06.03.2013;TJMG, Agravo de Instrumento1.0024.10.149948-1/001, Rel.Des. Sandra Fonseca, j.31.07.2012, DJEMG 10/08/2012;e TJSP, Agravo de Instrumento599.873.4/2, Acórdão 3364476,Socorro, Oitava Câmara deDireito Privado, Rel. Des. SallesRossi, j. 19.11.2008, DJESP12.12.2008). O que muda é aanálise da impugnação para a

Page 2207: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

remessa às vias ordinárias.Havendo prova documental queateste a existência da uniãoestável, a habilitação deve serdeferida imediatamente.

Nesse ponto, cabe fazer maisuma confrontação entre os arts.612 do CPC/2015 e o 984 doCPC/2015, para verificar comodeve ser guiado o juiz noprocesso de inventário, presenteoutra alteração significativa:

NovoCódigo deProcesso

Código de

Processo Civil

Page 2208: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

Civil Anterior

“Art. 612. Ojuiz decidirátodas asquestões dedireito desdeque os fatosrelevantesestejamprovados pordocumento,só remetendopara as viasordinárias asquestões quedependeremde outrasprovas.”

“Art. 984. O juizdecidirá todas asquestões dedireito e tambémas questões defato, quando estese achar provadopor documento,só remetendopara os meiosordinários as quedemandarem altaindagação oudependerem deoutras provas.”

Page 2209: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

Como primeira mudança,nota-se que o texto inicial ficoumais claro, pois são mencionadasas questões de direito com fatosrelevantes que estejam provadospor documentos, e não maisquestões de direito e de fatoprovadas por documentos,totalmente desconectadas. Emrelação à remessa às viasordinárias, agora isso somenteocorrerá se houver dependênciade outras provas, que não adocumental, caso da oitiva detestemunhas. Não há maisprevisão quanto às questões dealta indagação, termo

Page 2210: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

indeterminado que foi retirado dosistema processual. Reitere-seque somente a prática terá condãode demonstrar se a mudança foiboa ou não.

Encerrando essa fase,enuncia o art. 629 do NovoCódigo de Processo que aFazenda Pública, no prazo dequinze dias, após a vista para amanifestação quanto às primeirasdeclarações, informará ao juízo,de acordo com os dados queconstam de seu cadastroimobiliário, o valor dos bens deraiz descritos nas primeirasdeclarações. A única

Page 2211: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

modificação, perante o art. 1.002do CPC/1973, é a redução doprazo de vinte para quinze dias,em uniformidade com outrospreceitos relativos ao processode inventário.

Depois dessa previsão, oNovo Estatuto Processualcontinua a seguir o exemplo doanterior, trazendo regras quanto àavaliação dos bens e ao cálculodo imposto (arts. 630 a 638 doCPC/2015, equivalente aos arts.1.003 a 1.013 do CPC/1973).

A primeira delas estatui que,findo o prazo de quinze dias paraa manifestação quanto às

Page 2212: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

primeiras declarações – prazoque era de dez dias no sistemaanterior, repise-se –, e nãohavendo qualquer impugnação oujá decidida a que tiver sidooposta, o juiz nomeará um peritopara avaliar os bens do espóliose não houver na comarcaavaliador judicial (art. 630,caput, do CPC/2015,corresponde ao art. 1.003, caput,do CPC/1973). Anotavam NelsonNery Jr. e Rosa Maria deAndrade Nery, com razão, queessa avaliação seria dispensada,do ponto de vista fiscal, “quandojá há prova do valor dos bens

Page 2213: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

cadastrados pelo poder públicomunicipal para fim de cobrançade IPTU”.22 Imaginamos que esseentendimento será mantido com oNovo CPC, que procurou agilizaros procedimentos judiciais.

Determina a norma, ainda,que, nos casos envolvendoestabelecimento empresarial, ojuiz nomeará um perito paraavaliação das quotas e apuraçãode haveres (art. 630, parágrafoúnico, do CPC/2015). Não hámais menção ao contador, comoestava no parágrafo do antigo art.1.003, pois o expert pode até serde outra área do conhecimento.

Page 2214: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

Também melhor tecnicamente,fala-se em avaliação das quotas,e não mais em levantamento dobalanço.

No que diz respeito aosprocedimentos da avaliação, operito deve seguir, no que foremaplicáveis, as regras previstasnos atuais arts. 872 e 873 doCPC/2015. É o que determina oart. 631 do Novo EstatutoProcessual, equivalente ao antigoart. 1.004 do antigo CPC, comreferência aos seus arts. 681 a683. Vejamos as regrasmencionadas nesse últimodispositivo processual,

Page 2215: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

devidamente confrontadas com anorma anterior.

Conforme o novel art. 872, aavaliação realizada pelo oficialde justiça constará de vistoria ede laudo anexados ao auto depenhora ou, em caso de períciaefetuada por avaliador, de laudoapresentado no prazo fixado pelojuiz, devendo-se, em qualquerhipótese, especificar: a) os bens,com as suas características, e oestado em que se encontram; b) ovalor dos bens. Insta verificar quea norma atual manda aplicar aregra relativa à avaliação feitapor oficial de justiça, o que não

Page 2216: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

ocorria no passado, pois estaestava prevista no antigo art. 680,que não era mencionado peloanterior art. 1.004. Quanto aosrequisitos do laudo, são osmesmos que já estavam no art.681, caput, do CPC anterior.

O § 1º do art. 872 doCPC/2015 estabelece que,quando o imóvel for suscetível decômoda divisão, a avaliação,tendo em conta o créditoreclamado, será realizada empartes, sugerindo-se, com aapresentação de memorialdescritivo, os possíveisdesmembramentos para

Page 2217: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

alienação. A única mudançaperante o art. 681, parágrafoúnico, do CPC/1973 é aexpressão do memorialdescritivo, que já era consideradoanteriormente, na práticasucessionista. Efetivada aavaliação e, sendo o caso,apresentada a proposta dedesmembramento, as partes serãoouvidas no prazo de cinco dias(art. 872, § 2º, do CPC/2015). Ainclusão desse curto lapso énovidade no sistema, com os bonsfins de agilizar o procedimento,mais uma vez.

Outra mudança a ser

Page 2218: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

pontuada é que foi retirada amenção aos títulos da dívidapública, de ações de sociedades ede títulos de crédito negociáveisem bolsa. Previa o antigo art. 682do CPC/1973 que o valor a serfixado seria o da cotação oficialdo dia, provada por certidão oupublicação no órgão oficial. Essaregra não se aplica mais aoinventário. Ademais, muito aocontrário, diante de dúvidasquanto ao seu valor real e paratodos os casos, o EstatutoProcessual emergente passou adispor, em seu art. 871, inciso II,que não se procederá à avaliação

Page 2219: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

quando se tratar de títulos ou demercadorias que tenham cotaçãoem bolsa, comprovada porcertidão ou publicação no órgãooficial.

Como o perito-avaliador édotado de fé pública, a regra é anão repetição da avaliação.Entretanto, essa premissacomporta exceções, pois o art.873 do Novo CPC, equivalenteao art. 683 do CPC anterior, tratada possibilidade de reiteração doestudo quando: a) se provar erroou dolo do avaliador; b) severificar, posteriormente àavaliação, que houve majoração

Page 2220: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

ou diminuição do valor dos bens;c) houver fundada dúvida sobre ovalor atribuído ao bem. Emsentido quase semelhante, aliás,era art. 1.010 do CPC/1973,quanto ao inventário, norma quenão foi repetida, pordesnecessidade.

Também não foi repetida apremissa fixada no art. 1.005 doCPC/1973, segundo o qual oherdeiro que requeresse, durantea avaliação, a presença do juiz edo escrivão, pagaria as despesasda diligência. Pela retirada daregra em questão, parece que nãoserá mais possível ao herdeiro

Page 2221: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

fazer essa exigência o que, aliás,nunca foi usual.

Não se expedirá cartaprecatória para a avaliação debens situados fora da Comarcapor onde corre o inventário, seeles forem de pequeno valor ouperfeitamente conhecidos doperito nomeado (art. 632 doCPC/2015, repetição do art.1.006 do CPC/1973). A normatem a sua razão de ser, visando auma maior agilidade ao processode inventário, eis que, na grandemaioria das vezes, as partes ouherdeiros estão muito ansiosospelo seu fim. Em razão do

Page 2222: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

pequeno valor, a demoradaexpedição da precatória trariamais ônus que benefícios aosinteressados. A análise do queseja bem de pequeno valor deveser feita caso a caso,considerando também opatrimônio objeto da sucessão.

Também visando àfacilitação e à agilidade doprocedimento, preconiza o art.633 do CPC/2015 – semmudanças quanto ao art. 1.007 doCPC/1973 – que, sendo capazestodas as partes, não se procederáà avaliação se a Fazenda Públicaconcordar expressamente com o

Page 2223: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

valor atribuído, nas primeirasdeclarações, aos bens do espólio.Se os herdeiros concordarem como valor dos bens declarados pelaFazenda Pública, a avaliaçãocingir-se-á aos demais, no caso,aos bens móveis (art. 634 doCPC/2015, reprodução literal doart. 1.008 do CPC).

Entregue o laudo deavaliação, o juiz mandará quesobre ele se manifestem as partesno prazo de quinze dias, quecorrerá em cartório (art. 635,caput, do Novo CPC). Mais umavez, o prazo foi aumentado, sendode dez dias na cabeça do antigo

Page 2224: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

art. 1.009 do CPC/1973.Consigne-se que é bem comumque as partes envolvidas com oinventário requeiramesclarecimentos ao peritoavaliador. Os parágrafos docomando legal continuam a trazeroutros detalhamentos importantes.

Em primeiro lugar, havendoimpugnação quanto ao valoratribuído aos bens pelo perito, ojuiz a decidirá de plano, à vistado que constar dos autos (art.635, § 1º, do CPC/2015 e art.1.009, § 1.º, do CPC/1973).Julgando procedente aimpugnação, determinará o juiz

Page 2225: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

que o perito retifique a avaliação,observando os fundamentos dadecisão (art. 635, § 2º, doCPC/2015 art. 1.009, § 2.º, doCPC/1973). Em tais diplomas,também não houve qualquermudança.

O mesmo deve ser ditoquanto ao art. 636 do NovoEstatuto, segundo o qual, sendoaceito o laudo pelas partes, ousendo resolvidas as impugnaçõessuscitadas a seu respeito, lavrar-se-á em seguida o termo deúltimas declarações, no qual oinventariante poderá emendar,aditar ou completar as primeiras.

Page 2226: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

O comando equivale ao art. 1.011do CPC/1973, igualmente semalterações.

Ouvidas as partes sobre asúltimas declarações no prazocomum de quinze dias, proceder-se-á ao cálculo do tributo, quevaria de acordo com a legislaçãoespecífica de cada Estado (art.637 do CPC/2015). Duas foramas modificações, perante o art.1.012 do CPC/1973. Primeiro, oprazo foi aumentado de dez paraquinze dias. Segundo, substituiu-se a expressão imposto portributo, melhor tecnicamenteempregado, na nossa opinião.

Page 2227: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

Não se pode esquecer, o queainda terá aplicação e na linha daSúmula 112 do Supremo TribunalFederal, que o imposto detransmissão causa mortis édevido pela alíquota vigente aotempo da abertura da sucessão, ouseja, da morte do de cujus. Trata-se de decorrência natural do droitde saisine, regra segundo a qual,com a abertura da sucessão,transmitem-se os bens para osherdeiros do falecido.

A encerrar essa fase, feito ocálculo, sobre ele serão ouvidastodas as partes no prazo comumde cinco dias, que correrá em

Page 2228: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

cartório e, em seguida, a FazendaPública (art. 638 do CPC/2015 eart. 1.013 do CPC/1973). Sehouver impugnação julgadaprocedente, ordenará o juiznovamente a remessa dos autos aocontabilista ou contador,determinando as alterações quedevam ser feitas no cálculo.Cumprido o despacho, o juizjulgará o cálculo do imposto.Após, seguem o recolhimento deimposto e das custas e a partilha,que ainda será estudada nestecapítulo. Em relação aos doiscomandos, não houve qualqueralteração, inclusive quanto ao

Page 2229: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

prazo de cinco dias.Para encerrar o estudo do

inventário judicial pelo ritocomum, note-se que, em razão delei especial (art. 1.º da Lei n.6.858/1980, e art. 1.º, parágrafoúnico, inciso I, do Decreto n.85.845/1981), o pagamento dosvalores devidos ao empregado éfeito aos sucessoresindependentemente de inventárioou arrolamento. Em suma,tratando-se de verbastrabalhistas, os valores podem serpartilhados entre os herdeirosdiretamente pelo juízo doTrabalho, independentemente do

Page 2230: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

inventário na esfera cível. Nãohouve qualquer mudança quanto atal regra em face do Novo CPC,continuando ela a ter plenasubsunção.

b) Inventário judicial pelorito sumário

Quanto ao arrolamentosumário, é primaz a confrontaçãoentre o art. 659 do CPC/2015 e oart. 1.031 do CPC/1973, o últimocom a nova redação dada pelaanterior Lei 11.441/2007.Vejamos a tabela comparativa:

Page 2231: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

Novo Códigode Processo

Civil

Código deProcesso

Civil Antigo

“Art. 659. Apartilhaamigável,celebrada entrepartes capazes,

“Art. 1.031.A partilhaamigável,celebradaentre partescapazes, nostermos do art.2.015 da Leinº 10.406, de10 de janeirode 2002 –Código Civil,será

Page 2232: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

nos termos dalei, seráhomologada deplano pelo juiz,comobservância dosarts. 660 a 663.

homologadade plano pelojuiz, mediantea prova daquitação dostributosrelativos aosbens doespólio e àssuas rendas,comobservânciados arts.1.032 a 1.035desta Lei.

§ 1º O dispostoneste artigoaplica-se,também, ao

§ 1º Odisposto nesteartigo aplica-se, também,ao pedido de

Page 2233: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

pedido deadjudicação,quando houverherdeiro único.

adjudicação,quandohouverherdeiroúnico.

§ 2º Transitadaem julgado asentença dehomologação departilha ou deadjudicação,será lavrado oformal departilha ouelaborada acarta deadjudicação e,em seguida,serão expedidosos alvarás

§ 2ºTransitadaem julgado asentença dehomologaçãode partilha ouadjudicação,o respectivoformal, bemcomo osalvarás

Page 2234: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

referentes aosbens e às rendaspor eleabrangidos,intimando-se ofisco paralançamentoadministrativodo imposto detransmissão e deoutros tributosporventuraincidentes,conformedispuser alegislaçãotributária, nostermos do § 2ºdo art. 662.”

referentesaos bens poreleabrangidos,só serãoexpedidos eentregues àspartes após acomprovação,verificadapela FazendaPública, dopagamento detodos ostributos.”

Começando pelo dispositivo

Page 2235: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

anterior, como o art. 1.031 faziaremissão ao art. 1.773 do CódigoCivil de 1916, a Lei 11.441, de 4de janeiro de 2007, apenasalterou sua redação para que semencionasse o artigocorrespondente, qual seja, o art.2.015 do Código Civil de 2002.Frise-se que não houve mudançano conteúdo da norma, massimples adequação ao atualCódigo Civil. Estabelece o art.2.015 do CC/2002 que, “Se osherdeiros forem capazes, poderãofazer partilha amigável, porescritura pública, termo nos autosdo inventário, ou escrito

Page 2236: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

particular, homologado pelojuiz”. No entanto, o Novo CPCnão faz mais menção a essedispositivo civil, o que nãoprejudica a sua incidência. Nomais, os arts. 660 a 663 agorareferidos, que tratamespecificamente do arrolamentosumário, equivalem aos antigosarts. 1.032 a 1.035.

Como bem ensinam Euclidesde Oliveira e Sebastião Amorim,o arrolamento sumário é umaforma abreviada de inventário epartilha de bens, havendoconcordância de todos osherdeiros, desde que maiores e

Page 2237: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

capazes. Observam os juristasque, aqui, não importam osvalores dos bens a serempartilhados.23 Ainda em sededoutrinária, de acordo com DimasMessias de Carvalho e DimasDaniel de Carvalho, trata-se de“um procedimento judicialsimplificado de inventário epartilha e ocorre quando as partessão capazes e podem transigir,estiverem representadas eacordarem sobre a partilha dosbens, qualquer que seja o valor(arts. 1.031/1.035 do CPC). Osherdeiros apresentam o plano departilha ao juiz que somente o

Page 2238: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

homologa, em um procedimentode jurisdição voluntária, portantonão decide”.24 Em suma, pode-sedizer que o seu fatorpredominante é justamente oacordo entre as partes envolvidase a sua capacidade plena.

Para encerrar a confrontaçãoconstante da última tabela, podemser percebidas algumasalterações no § 2º do novocomando instrumental. O antigoart. 1.031 do CPC/1973estabelecia que, transitada emjulgado a sentença dehomologação de partilha ouadjudicação, o respectivo formal,

Page 2239: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

bem como os alvarás referentesaos bens por ele abrangidos, sóseriam expedidos e entregues àspartes após a comprovação,constatada pela Fazenda Pública,do pagamento de todos ostributos. Pelo novel diploma,transitada em julgado a sentençade homologação de partilha ouadjudicação, será lavrado oformal de partilha ou elaborada acarta de adjudicação.

Em seguida, serão expedidosos alvarás referentes aos bens erendas por ele abrangidos,intimando-se o fisco paralançamento administrativo do

Page 2240: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

imposto de transmissão e deoutros tributos porventuraincidentes, conforme dispuser alegislação tributária. Em suma,parece-nos que pela nova normaos documentos mencionados sãoexpedidos antes mesmo daverificação pelo Fisco, cabendo asua entrega se tudo estiver pagoconforme a legislação tributária.

O procedimento, como opróprio nome já diz, é sumário,visando a uma maior celeridadena partilha de bens. Para opresente autor, a nomenclaturadeve ser mantida com o NovoCPC, mesmo tendo sido abolido o

Page 2241: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

procedimento sumário pela novalegislação instrumental. Tantoisso é verdade que o art. 660utiliza a expressão destacada.Nos termos desse preceito, ademonstrar esse intuito célere, osherdeiros, na inicial: a)requererão ao juiz a nomeação doinventariante que designarem; b)declararão os títulos dosherdeiros e os bens do espólio; c)atribuirão o valor dos bens doespólio, para fins de partilha.Não houve qualquer mudançaperante o art. 1.032 do Codexanterior, seu correspondente.

Em regra, o arrolamento

Page 2242: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

sumário não comporta aavaliação de bens do espóliopara qualquer finalidade (art. 661do CPC/2015 e art. 1.033 doCPC/1973). A única ressalvafeita pelos dispositivos refere-seà avaliação da reserva de bens(art. 663 do CPC/2015 e art.1.035 do CPC/1973). Aqui,novamente, tudo sem mudanças.

Também visando a umamaior simplicidade oufacilitação, no arrolamentosumário não serão conhecidas ouapreciadas questões relativas aolançamento, ao pagamento ou àquitação de taxas judiciárias e de

Page 2243: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

tributos incidentes sobre atransmissão da propriedade dosbens do espólio, o que éincompatível com a agilidadebuscada pelo rito (art. 662, caput,do CPC/2015 e art. 1.034, caput,do CPC/1973).

A taxa judiciária, se devida,será calculada com base no valoratribuído pelos herdeiros,cabendo ao Fisco, se apurar emprocesso administrativo valordiverso do estimado, exigir aeventual diferença pelos meiosadequados ao lançamento decréditos tributários em geral (art.662, § 1º, do CPC/2015; art.

Page 2244: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

1.034, § 1º, do CPC/1973). Oimposto de transmissão seráobjeto de lançamentoadministrativo, conforme dispusera legislação tributária, nãoficando as autoridadesfazendárias adstritas aos valoresdos bens do espólio atribuídospelos herdeiros (art. 662, § 2º, doCPC/2015 e art. 1.034, § 2.º, doCPC/1973).

Por fim, encerrando osprocedimentos, determina o art.663 do Novo Estatuto Processualque a existência de credores doespólio não impedirá ahomologação da partilha ou da

Page 2245: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

adjudicação, se forem reservadosbens suficientes para o pagamentoda dívida. Essa reserva de bensserá realizada pelo valorestimado pelas partes, salvo se ocredor, regularmente notificado,impugnar a estimativa. Nesseúltimo caso, é que deverá serexecutada a única forma deavaliação admitida noarrolamento sumário. A exemplode todas as outras regras, nãohouve qualquer mudança, peranteo antigo art. 1.035 do antigoCódigo de Processo Civil.

c) Inventário judicial pelo

Page 2246: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

rito do arrolamento comumAssim como fizemos com o

estudo da modalidade anterior dearrolamento, para a presentecategoria é fundamentalconfrontar os arts. 664 doCPC/2015 e o art. 1.036 doCPC/1973:

Novo Código de

Processo Civil

Antigo Código

de ProcessoCivil

“Art. 1.036.Quando o valor

Page 2247: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

“Art. 664. Quandoo valor dos bens doespólio for igual ouinferior a 1.000(mil) salários-mínimos, oinventárioprocessar-se-á naforma dearrolamento,cabendo aoinventariantenomeado,independentementede assinatura determo decompromisso,apresentar, comsuas declarações,a atribuição devalor aos bens doespólio e o planoda partilha.

dos bens do espóliofor igual ou inferiora 2.000 (duas mil)Obrigações doTesouro Nacional– OTN, oinventárioprocessar-se-á naforma dearrolamento,cabendo aoinventariantenomeado,independentementeda assinatura determo decompromisso,apresentar, comsuas declarações,a atribuição dovalor dos bens doespólio e o planoda partilha.

Page 2248: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

(Redação dadapela Lei nº 7.019,de 31.8.1982.)

§ 1º Se qualquerdas partes ou oMinistério Públicoimpugnar aestimativa, o juiznomeará avaliador,que oferecerálaudo em 10 (dez)dias.

§ 1º Se qualquerdas partes ou oMinistério Públicoimpugnar aestimativa, o juiznomeará umavaliador queoferecerá laudoem 10 (dez) dias.(Incluído pela Leinº 7.019, de31.8.1982.)

§ 2º Apresentado o

§ 2º Apresentado olaudo, o juiz, em

Page 2249: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

laudo, o juiz, emaudiência quedesignar, deliberarásobre a partilha,decidindo de planotodas asreclamações emandando pagaras dívidas nãoimpugnadas.

audiência quedesignar, deliberarásobre a partilha,decidindo de planotodas asreclamações emandando pagaras dívidas nãoimpugnadas.(Incluído pela Leinº 7.019, de31.8.1982.)

§ 3º Lavrar-se-áde tudo um sótermo, assinadopelo juiz, peloinventariante epelas partespresentes ou porseus advogados.

§ 3º Lavrar-se-áde tudo um sótermo, assinadopelo juiz e pelaspartes presentes.(Incluído pela Leinº 7.019, de31.8.1982.)

Page 2250: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

§ 4º Aplicam-se aessa espécie dearrolamento, noque couber, asdisposições do art.672, relativamenteao lançamento, aopagamento e àquitação da taxajudiciária e doimposto sobre atransmissão dapropriedade dosbens do espólio.

§ 4º Aplicam-se aesta espécie dearrolamento, noque couberem, asdisposições do art.1.034 e seusparágrafos,relativamente aolançamento, aopagamento e àquitação da taxajudiciária e doimposto sobre atransmissão dapropriedade dosbens do espólio.(Incluído pela Leinº 7.019, de31.8.1982.)

Page 2251: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

§ 5º Provada aquitação dostributos relativosaos bens do espólioe às suas rendas, ojuiz julgará apartilha.”

§ 5º Provada aquitação dostributos relativosaos bens do espólioe às suas rendas, ojuiz julgará apartilha. (Incluídopela Lei nº 7.019,de 31.8.1982.)”

Em relação ao parâmetro devalor dos bens para oarrolamento comum, reafirme-seque o Novo Código de ProcessoCivil constitui um notável avanço.Isso porque a lei anterior

Page 2252: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

utilizava o montantecorrespondente a 2.000Obrigações do Tesouro Nacional(OTN). Cabia e continua cabendoao inventariante nomeado,independentemente da assinaturade termo de compromisso,apresentar, com suas declarações,a atribuição do valor dos bens doespólio e o plano da partilha.Como se pode perceber, essaforma de arrolamento não leva emconta eventual acordo entre aspartes interessadas capazes, comoé no arrolamento sumário, massim o valor dos bensinventariados.

Page 2253: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

Sobre o malfadado valor de2.000 OTN (Obrigações doTesouro Nacional), tendo emvista a extinção do indexadorpela Lei 7.730/1989, suaquantificação em moeda nacionalcorrente sempre foi conturbada. Oíndice anterior sempre se revelouinadequado e defasado, sendopraticamente impossível saber ovalor exato, como pontuavamEuclides de Oliveira e SebastiãoAmorim, já propondo,anteriormente, a mudança desseparâmetro para 500 saláriosmínimos.25 Para os juristascitados, no ano de 2009, se

Page 2254: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

seguida a Tabela de atualizaçãodo Tribunal de Justiça de SãoPaulo, o valor de 2.000 OTNcorresponderia a cerca de R$38.826,41 (trinta e oito mil,oitocentos e vinte e seis reais equarenta e um centavos).26

Com o fim de demonstrar adivergência anterior sobre talintricado cálculo, Dimas Messiasde Carvalho e Dimas Daniel deCarvalho chegavam a outrosmontantes. Levando em conta asinformações constantes do site doTribunal de Justiça de MinasGerais, ponderavam que, “porsimples operação aritmética, uma

Page 2255: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

OTN, com inclusão dos expurgos,possui o valor de 35,305. Semexpurgos, valor 11,2314. Logo,2.000 OTNS (que substituem asORTNS) com inclusão dosexpurgos inflacionários totalizamR$70.610,00 (setenta mil,seiscentos e dez reais), valoresque devem ser considerados paraautorizar o inventário na forma dearrolamento sumário, por melhorse aproximar da inflação real doperíodo e dos valores quecorresponderiam a duzentossalários mínimos, fixados antesdas modificações promovidaspela Lei 7.019, de 31 de agosto

Page 2256: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

de 1982. Considerando-se a OTNsem os expurgos inflacionários, ovalor de 2.000 OTNs seriareduzido sensivelmente aR$22.462,80; valor insignificantepara fins de direitossucessórios”.27

Diante das enormesdificuldades dos cálculos, em boahora, o novo Código de ProcessoCivil corrigiu tal forma decálculo, adotando o parâmetro demil salários mínimos, conformese depreende da tabela exposta.Diante desse grande avanço,espera-se que o arrolamentosumário atinja a efetividade

Page 2257: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

prática não alcançada na práticado Direito das Sucessões noBrasil.

Aprofundando osprocedimentos, se qualquer daspartes ou o Ministério Públicoimpugnar a estimativaanteriormente realizada peloinventariante, o juiz nomearáavaliador que oferecerá laudo emdez dias (art. 664, § 1º, doCPC/2015 e art. 1.036, § 1.º, doCPC/1973). O que se percebe éque a elaboração desse laudodiferencia o arrolamento comumdo arrolamento sumário.

Apresentado o laudo, o juiz,

Page 2258: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

em audiência que designar,deliberará sobre a partilha,decidindo de plano todas asreclamações e mandando pagar asdívidas não impugnadas (art. 664,§ 2º, do CPC/2015 e art. 1.036, §2.º, do CPC/1973). Lavrar-se-áde tudo um só termo, assinadopelo juiz, pelo inventariante epelas partes presentes (art. 664, §3º, do CPC/2015). A menção àassinatura do inventariante énovidade, pois não constava doart. 1.036, § 2.º, do CPC/1973;formalidade que deve serobservada a partir da vigência doNovo CPC.

Page 2259: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

Podem ser aplicadas aoarrolamento comum,eventualmente, as disposiçõesantes analisadas previstas no art.672 do CPC/2015, relativamenteao lançamento, ao pagamento e àquitação da taxa judiciária e doimposto sobre a transmissão dapropriedade dos bens do espólio.É o que preconiza o § 4º do art.664 da novel norma instrumental,reproduzindo o mesmo parágrafodo antigo art. 1.036 doCPC/1973. As normas em questãoaproximam as duas formas dearrolamento.

Por fim, quanto aos

Page 2260: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

procedimentos, provada aquitação dos tributos relativosaos bens do espólio e às suasrendas, o juiz julgará a partilha(art. 664, § 5º, do CPC/2015 eart. 1.036, § 5.º, do CPC/1973).Como outra novidade a serpontuada, o Novo CPC passa adispor, em seu art. 665, que serápossível o caminho doarrolamento comum para oinventário, ainda que hajaincapaz, desde que concordemtodas as partes e o MinistérioPúblico. O comando pareceintroduzir alternativa para umprocedimento abreviado para

Page 2261: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

casos de menores, caso sejaseguida a literalidade de vedaçãopara o inventário extrajudicial,tema que passa a ser analisado.

d) Inventário extrajudicialou por via administrativa

Conforme ressaltado noinício do presente capítulo, com aedição da Lei 11.441/2007, o art.982 da antiga Norma Processualrecebeu nova redação, atualizadaposteriormente com a Lei11.965/2009, com a introduçãodo inventário extrajudicial. Oantigo comando foi repetido peloart. 610 do CPC/2015, cuja

Page 2262: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

transcrição é primaz, mais umavez, para os devidos finsdidáticos e de aprofundamento:

“Art. 610. Havendo testamento ouinteressado incapaz, proceder-se-á aoinventário judicial;§ 1º Se todos forem capazes e concordes, oinventário e a partilha poderão ser feitos porescritura pública, a qual constituirá documentohábil para qualquer ato de registro, bem comopara levantamento de importância depositadaem instituições financeiras.§ 2º O tabelião somente lavrará a escriturapública se todas as partes interessadasestiverem assistidas por advogado ou pordefensor público, cuja qualificação eassinatura constarão do ato notarial”.

Como visto, infelizmente,não há mais menção à

Page 2263: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

possibilidade de gratuidade parao inventário, como estava noantigo § 2º do art. 982 doCPC/1973. Entretanto, reafirme-se a sua viabilidade, pelosargumentos aqui antes aduzidos,no início do capítulo.

Pois bem, os principaisobjetivos da Lei 11.441/2007 –reafirmados pelo Novo CPC –foram as reduções de burocraciase de formalidades para os atos detransmissão hereditária, bemcomo a celeridade, na linha datendência atual dedesjudicialização das contendase dos pleitos. Assim como

Page 2264: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

ocorreu com o divórcioextrajudicial, a lei de 2007 foiconcisa e trouxe muito pouco arespeito do assunto, cabendo àdoutrina e à jurisprudência sanaras dúvidas decorrentes dessesinstitutos.

No sistema anterior, a sermantido com o Novo Codex, como intuito de facilitar a prática dosinventários extrajudiciais, aResolução 35/2007 do ConselhoNacional de Justiça (CNJ)revelou-se de grande importânciapara a compreensão desse novoinstituto. Vejamos os seusaspectos principais, de forma

Page 2265: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

detalhada.De início, é livre a escolha

do tabelião para lavrar a escriturade inventário, não havendocompetência territorial para tanto(art. 1º da Resolução 35 do CNJ).E não poderia ser diferente, pelofato de não existir a citadacompetência territorial para alavratura de escrituras públicasno País. Esse entendimento, semdúvida, deve ser mantido com oNovo CPC.

O inventário extrajudicialnão é obrigatório, masfacultativo. Pode ser solicitada, aqualquer momento, a suspensão,

Page 2266: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

pelo prazo de trinta dias, ou adesistência da via judicial, parapromoção da via extrajudicial(art. 2.º da Resolução 35 doCNJ). Concluindo pela nãoobrigatoriedade do inventárioextrajudicial, cabe trazer àcolação, da jurisprudência, nalinha principiológica adotadapelo Novo Estatuto Processual:

“Apelação cível. Abertura de inventário.Presença do interesse de agir. Herdeirosnecessários, capazes e concordes.Determinação do uso da via extrajudicial comextinção do processo por falta de interesse deagir. Faculdade dos interessados. Art. 1º daLei 11.441/2007 do CPC. Sentença anulada.Recurso provido. A Lei 11.441/2007, que

Page 2267: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

alterou o art. 982 do CPC, tão somentefacultou a utilização do procedimentoextrajudicial para o inventário, não tornandoobrigatório o uso daquela via para o inventárioquando todos forem capazes e concordes. Avia administrativa é uma opção e umafaculdade dos interessados, não umaobrigação. Assim, não há falar em falta deinteresse de agir quando todos os herdeiros,de comum acordo, optam pela via judicialpara processamento do inventário, devendo ofeito ter seu curso natural perante o juízo aquo. Recurso conhecido e provido paratornar insubsistente a sentença e determinar oprosseguimento do processo” (TJMS,Apelação Cível 2011.019812-7/0000-00,Paranaíba, Quarta Turma Cível, Rel. Des.Dorival Renato Pavan, DJEMS 21.07.2011,p. 31).

“Apelação cível. Inventário cumulado comadjudicação. Extinção do feito, por carência

Page 2268: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

de ação. Lei 11.441/2007. Opção das partes,mediante requisitos, para realização doinventário na via judicial ou fora dele. A Lei11.441, de 2007, que deu nova redação ao art.982 do CPC, confere faculdade às partes depromoverem o inventário na via judicial ou porescritura pública, se não houver testamento einteressado incapaz, estando todos herdeiros einteressados concordes e representados poradvogado. Assim, não pode o juízo extinguir aação proposta para determinar às partes arealização do inventário extrajudicial.Sentença desconstituída para prosseguimentodo inventário. Apelação parcialmenteprovida” (TJRS, Apelação Cível 242983-40.2011.8.21.7000, Candelária, SétimaCâmara Cível, Rel. Des. André Luiz PlanellaVillarinho, j. 19.10.2011, DJERS 26.10.2011).

“Arrolamento de bens. Procedimentoextrajudicial. Faculdade da parte. 1. Oordenamento jurídico faculta, às partes,

Page 2269: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

realizarem inventário extrajudicial, desde queobservados os requisitos estabelecidos emLei. Todavia, não impõe sua observância equiçá veda a realização do inventário judicial.Assim, tendo a parte escolhido a via judicial,impõe-se a cassação da sentença queextinguiu o feito. 2. Recurso provido” (TJMG,Apelação Cível 0034496-07.2010.8.13.0151,Cássia, Oitava Câmara Cível, Rel. Des.Vieira de Brito, j. 31.03.2011, DJEMG20.07.2011).

Seguindo no estudo daResolução 35 do CNJ, asescrituras públicas de inventárionão dependem de homologaçãojudicial e são títulos hábeis parao registro civil e o registroimobiliário, para a transferênciade bens e direitos, bem como

Page 2270: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

para a promoção de todos os atosnecessários à materialização dastransferências de bens elevantamento de valores (art. 3ºda Resolução 35 do CNJ). Nessecontexto, com a escritura públicaé possível realizar a transferênciados imóveis do falecido, bemcomo de ações nominais, valoresdepositados em contas bancáriase veículos de sua propriedade.Sobre os bens móveis, o ColégioNotarial do Brasil aprovou claroenunciado em seu XIX CongressoBrasileiro, realizado em 2014,estabelecendo que “os arts. 982do CPC e 3º da Resolução 35 do

Page 2271: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

CNJ referem-se inclusive aosbens móveis, de forma que asinstituições financeiras devemacatar as escrituras públicas parafins de levantamento de valores,bem como a solicitação dostabeliães de notas para expedirextrato de contas correntes detitularidade do de cujus”. Espera-se que todas essas premissassejam mantidas no futuro, navigência do Código de ProcessoCivil de 2015.

Confirmando adesnecessidade de qualquerhomologação judicial, aresto doTribunal de Minas Gerais aduziu

Page 2272: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

que, “com o advento da LeiFederal 11.441/2007, que alteroudispositivos do CPC, passou-se aadmitir a realização de inventárioe partilha por via administrativa,sede em que se prescinde dahomologação judicial” (TJMG,Agravo de Instrumento1.0708.11.002240-5/001, Rel.Des. Corrêa Junior, j. 20.08.2013,DJEMG 30/08/2013). Ainda atítulo de exemplo, tratando dapossibilidade de levantamento dequantias apenas com a escriturapública de inventário: “Redaçãoda Lei 11.441/2007. Título hábilpara levantamento de valores.

Page 2273: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

Resolução CNJ 35/2007, art. 3º.Outorga de poderes a herdeiropara esse fim. Formação delitisconsórcio com os restantessucessores, concordes no pedidode levantamento de saldoexistente em conta-correntebancária. Retenção indevida”(TJSP, Apelação 0013594-34.2012.8.26.0011, Acórdão6718257, São Paulo, VigésimaSegunda Câmara de DireitoPrivado, Rel. Des. MatheusFontes, j. 25.04.2013, DJESP21.05.2013).

A Resolução 35 tambémreconhece a gratuidade prevista

Page 2274: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

para o inventário extrajudicial.Para a obtenção de tal benefício,sempre bastou a simplesdeclaração dos interessados deque não possuíam condições dearcar com os emolumentos, aindaque as partes estivessemassistidas por advogadoconstituído (arts. 6.º e 7.º daResolução 35 do CNJ). Em suma,não houve maiores formalidadespara tal declaração. Reafirme-sea nossa posição de manutençãodessa gratuidade, na linha danorma do Conselho Nacional deJustiça.

Nos termos da norma

Page 2275: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

anterior e da nova – e também daresolução –, é sempre necessáriaa presença de advogado,dispensada a procuração, ou dedefensor público na lavratura deescritura pública de inventárioextrajudicial (art. 8.º daResolução 35 do CNJ). Dequalquer modo, a questão não épacífica, pois pode serencontrado aresto do TribunalGaúcho exigindo a procuração,também por escritura pública:“no inventário extrajudicial, hánecessidade de a representaçãoser formalizada através deprocuração por instrumento

Page 2276: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

público, insuficiente a procuraçãoapresentada para o fimpretendido. Recurso desprovido”(TJRS, Apelação Cível 75599-81.2013.8.21.7000, Cachoeira doSul, Sétima Câmara Cível, Rel.Des. Liselena Schifino RoblesRibeiro, j. 27.08.2013, DJERS04.09.2013). Com o devidorespeito, não se filia ao acórdão,pois os principais objetivos dalei, ao instituir o inventárioextrajudicial, foram de reduçãode burocracias e de formalidades.

Ato contínuo de estudo, étambém obrigatória a nomeaçãode interessado, na escritura

Page 2277: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

pública de inventário e partilha,para representar o espólio, compoderes de inventariante, nocumprimento de obrigações ativasou passivas pendentes, semnecessidade de seguir a ordemprevista no CPC (art. 11 daResolução 35 do CNJ).

Ademais, admitem-se oinventário e a partilhaextrajudiciais com viúvo/viúvaou herdeiros capazes, inclusivepor emancipação, representadospor procuração formalizada porinstrumento público com poderes(art. 12 da Resolução 35 doCNJ). A possibilidade de

Page 2278: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

emancipação de menores para osfins de possibilitar a lavratura daescritura pública torna acategoria mais eficaz no planoprático. Se seguido esseentendimento, perde um pouco deeficácia prática a regra do art.665 do Novo CPC, segundo oqual será possível o caminho doarrolamento comum para oinventário, ainda que hajaincapaz, desde que concordemtodas as partes e o MinistérioPúblico.

A escritura pública deinventário pode ser retificadadesde que haja o consentimento

Page 2279: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

de todos os interessados. Oserros materiais poderão sercorrigidos, de ofício ou medianterequerimento de qualquer daspartes, ou de seu procurador, poraverbação à margem do atonotarial ou, não havendo espaço,por escrituração própria lançadano livro das escrituras públicas eanotação remissiva (art. 13 daResolução 35 do CNJ). Quanto aorecolhimento dos tributosincidentes, este deve anteceder àlavratura da escritura deinventário (art. 15 da Resolução35 do CNJ).

Além disso, é possível a

Page 2280: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

promoção de inventárioextrajudicial por cessionário dedireitos hereditários, mesmo nahipótese de cessão de parte doacervo. Isso, desde que todos osherdeiros estejam presentes econcordes (art. 16 da Resolução35 do CNJ). Esse entendimentoganhou reforço com o Novo CPCque, como visto, admite que ocessionário do herdeiro oulegatário seja inventariante.Aplicando essa norma daresolução, em caso de dúvidalevantada por tabelião, doTribunal de Justiça do Paraná,cabe trazer para a devida

Page 2281: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

exemplificação:

“Apelação cível. Suscitação de dúvida.Registro de escritura pública de adjudicação.Cessão de parte do acervo hereditário. Parteideal de imóvel. Resolução 35 do ConselhoNacional de Justiça. Ausência da presença econcordância dos herdeiros. Impossibilidadede registro como unidade autônoma. 1.Havendo condomínio decorrente de sucessãohereditária e considerando que a herançatransmitida é indivisível até a efetiva partilhados bens entre os herdeiros, a fração idealnão pode ser registrada como unidadeautônoma. 2. A Resolução 35 do ConselhoNacional de Justiça autoriza a promoção deinventário extrajudicial, por cessionário dedireitos hereditários na hipótese de cessão departe do acervo, desde que todos os herdeirosestejam presentes e concordes. Recursodesprovido” (TJPR, Apelação Cível 0698224-1, Clevelândia, Décima Primeira Câmara

Page 2282: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

Cível, Rel. Des. Vilma Régia Ramos deRezende, DJPR 16.12.2010, p. 390).

Os cônjuges dos herdeirosdeverão comparecer ao ato delavratura da escritura pública deinventário e partilha quandohouver renúncia ou algum tipo departilha que importe emtransmissão, exceto se ocasamento se der sob o regime daseparação absoluta de bens,entendida como a separaçãoconvencional (art. 17 daResolução 35 do CNJ).

Como não poderia serdiferente, diante da proteção

Page 2283: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

constitucional da união estável, ocompanheiro ou companheira quetenha direito à sucessão é partepara a escritura de inventário,observada a necessidade de açãojudicial, se o autor da herançanão deixar outro sucessor ou nãohouver consenso de todos osherdeiros, inclusive quanto aoreconhecimento da união estável(art. 18 da Resolução 35 doCNJ). Em casos tais, a meação docompanheiro pode serreconhecida na escritura pública,desde que todos os herdeiros einteressados na herança,absolutamente capazes, estejam

Page 2284: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

de acordo (art. 19 da Resolução35 do CNJ). Diante daequalização da união estável aocasamento realizada pelo NovoCPC, acreditamos que essas duasnormas administrativas serãointegralmente mantidas no futuro.

As partes e respectivoscônjuges devem estar, na escriturapública de inventário ou partilha,nomeados e qualificados,constando: nacionalidade,profissão, idade, estado civil,regime de bens, data docasamento, pacto antenupcial eseu registro imobiliário, númerodo documento de identidade,

Page 2285: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

número de inscrição no CPF/MF,domicílio e residência (art. 20 daResolução 35 do CNJ). Aescritura pública de inventário epartilha conterá a qualificaçãocompleta do autor da herança; oregime de bens do casamento;pacto antenupcial e seu registroimobiliário, se houver; dia e lugarem que faleceu o autor daherança; data da expedição dacertidão de óbito; livro, folha,número do termo e unidade deserviço em que consta o registrodo óbito; e a menção oudeclaração dos herdeiros de queo autor da herança não deixou

Page 2286: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

testamento e outros herdeiros, sobas penas da lei (art. 21 daResolução 35 do CNJ). Para queo ato seja plenamente válido eeficaz, na lavratura da escrituradeverão ser apresentados osseguintes documentos: a) certidãode óbito do autor da herança; b)documento de identidade oficial eCPF das partes e do autor daherança; c) certidãocomprobatória do vínculo deparentesco dos herdeiros; d)certidão de casamento do cônjugesobrevivente e dos herdeiroscasados e pacto antenupcial, sehouver; e) certidão de

Page 2287: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

propriedade de bens imóveis edireitos a eles relativos; f)documentos necessários àcomprovação da titularidade dosbens móveis e direitos, se houver;g) certidão negativa de tributos; eh) certificado de Cadastro deImóvel Rural (CCIR), se houverimóvel rural a ser partilhado (art.22 da Resolução 35 do CNJ).Acreditamos que todas essasexigências formais serãoconservadas com a égide doNovo CPC.

O mesmo se diga quanto aoutras exigências. Os documentosapresentados no ato da lavratura

Page 2288: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

da escritura devem ser originaisou em cópias autenticadas, salvoos de identidade das partes, quesempre serão originais (art. 23 daResolução 35 do CNJ). Aescritura pública deverá fazermenção a tais documentosapresentados (art. 24 daResolução 35 do CNJ). Seguindo,é admissível a sobrepartilha porescritura pública, ainda quereferente a inventário e partilhajudiciais já findos, mesmo que oherdeiro, hoje maior e capaz,fosse menor ou incapaz ao tempodo óbito ou do processo judicial(art. 25 da Resolução 35 do

Page 2289: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

CNJ).Havendo um só herdeiro,

maior e capaz, com direito àtotalidade da herança, não haverápartilha, lavrando-se a escriturade inventário e adjudicação dosbens (art. 26 da Resolução 35 doCNJ). A existência de credoresdo espólio não impedirá arealização do inventário epartilha, ou adjudicação, porescritura pública (art. 27 daResolução 35 do CNJ).

O inventário negativo podeser efetuado por escritura pública(art. 28 da Resolução 35 doCNJ). Cabe lembrar que o

Page 2290: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

inventário negativo é feito paramostrar que o falecido e ocônjuge supérstite não tinhambens a partilhar, visando a afastara imposição do regime daseparação obrigatória de bens,diante da existência de causasuspensiva do casamento (arts.1.523, inciso I, e 1.641, inciso I,do CC).

Diante da existência de umanorma de direito material eprocessual interno, é vedada alavratura de escritura pública deinventário e partilha referente abens localizados no exterior (art.29 da Resolução 35 do CNJ). A

Page 2291: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

Lei 11.441/2007 pode seraplicada aos casos de óbitosocorridos antes de sua vigência,lavrando-se escrituras deinventário para as pessoasfalecidas antes da lei (art. 30 daResolução 35 do CNJ). Issoporque a sucessão está no planoda eficácia dos atos e negóciosjurídicos, aplicando-se a normado momento da produção dosefeitos, ou seja, a lei em vigor.Essa posição é reafirmadaperante o Novo CPC.

A escritura pública deinventário e partilha pode serlavrada a qualquer tempo,

Page 2292: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

cabendo ao tabelião fiscalizar orecolhimento de eventual multa,conforme previsão em legislaçãotributária estadual e distritalespecíficas (art. 31 da Resolução35 do CNJ). Eis outro preceitoadministrativo que não deve seralterado no futuro.

Por fim, o tabelião poderá senegar a lavrar a escritura deinventário ou partilha se houverfundados indícios de fraude ouem caso de dúvidas sobre adeclaração de vontade de algumdos herdeiros, fundamentando arecusa por escrito (art. 32 daResolução 35 do CNJ). Acredita-

Page 2293: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

se na permanência de todos essespreceitos administrativos com aemergência do Novo EstatutoProcessual. Entretanto, oConselho Nacional de Justiça,sem dúvidas, fará uma revisão daresolução nos próximos anos,diante da atualização do diplomaprocessual.

e) Da partilhaCom é notório, a partilha é o

instituto jurídico pelo qualcessam a indivisibilidade e aimobilidade da herança, uma vezque os bens são divididos entreos herdeiros do falecido. Trata-se

Page 2294: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

do momento pelo qual osherdeiros aguardamansiosamente, sendo certo que apartilha tem efeito declaratório enão constitutivo, como bemensina Zeno Veloso.28 Ou, ainda,é a “repartição ou distribuiçãodos bens do falecido. É o pontoculminante da liquidação daherança, pondo termo ao estadode indivisão, discriminando eespecificando os quinhõeshereditários. Fixa o momento emque o acervo deixa de ser umacoisa comum e se transforma emcoisas particulares”.29

Em relação à matéria, mais

Page 2295: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

uma vez devem ser estudadas asregras previstas tanto no CódigoCivil (arts. 2.013 a 2.022) quantono Código de Processo Civil. Naantiga norma instrumental, otratamento estava entre os seusarts. 1.022 a 1.030. No NovoCPC, sem grandes modificações,devem ser observados os arts.647 a 658.

De início, determina oCódigo Civil que o herdeiro podesempre requerer a partilha, aindaque o testador o proíba, cabendoigual faculdade aos seuscessionários e credores (art.2.013 do CC/2002). Percebe-se

Page 2296: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

que o direito à partilha constituium direito do herdeiro,inafastável pela vontade dotestador; até pelo reconhecimentode que o direito à herança é umdireito fundamental (art. 5º,inciso XXX, da CF/1988). Apartir dos ensinamentos damelhor doutrina, e pelo queconsta do Código Civil, podemser apontadas três espécies departilha: a amigável (ouextrajudicial), a judicial e apartilha em vida.30

Iniciando-se pela primeiracategoria, a partilha seráamigável na hipótese em que

Page 2297: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

todos os herdeiros forem capazes,fazendo-se por escritura pública,por termo nos autos do inventárioou por escrito particular,homologado pelo juiz (arts. 2.015do CC/2002, 657 do CPC/2015 e1.029 do CPC/1973). Nesse caso,não há qualquer conflito entre osherdeiros.

Cabe consignar que a Lei11.411, de 4 de janeiro de 2007,que instituiu o inventárioextrajudicial, alterou a redaçãodo art. 1.031 do então Código deProcesso Civil, para os devidosfins de adequação da remissãolegislativa. Isso porque o CPC

Page 2298: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

anterior fazia remissão ao art.1.773 do Código Civil de 1916 e,com a alteração, a menção quepassou a ser feita foi ao art. 2.015do Código Civil de 2002. Frise-se que não houve alteração deconteúdo e, assim, tal mudançanão produziu qualquer efeitoprático. O Novo CPC não repetiua referência ao dispositivomaterial no seu art. 659, mas é eleque deve guiar a modalidade, naopinião deste autor.

Aliás, a partir dessaconstatação, conforme mensagemeletrônica enviada por Euclidesde Oliveira a José Fernando

Page 2299: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

Simão, então nosso coautor,pode-se dizer que o inventárioextrajudicial feito por escriturapública não necessita deposterior homologação judicial.31

Explica Euclides de Oliveira,nessa mensagem enviada em 19de janeiro de 2007, que, comefeito, o art. 1º da Lei11.441/2007, ao dar novaredação ao art. 982 doCPC/1973, “contém duasdisposições separadas por pontoe vírgula: primeiro, mantém oinventário judicial, ‘havendotestamento ou interessadoincapaz’; depois, abre exceção

Page 2300: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

para a hipótese de serem todos‘capazes e concordes’,proclamando que poderão fazer oinventário e a partilha porescritura pública, ‘a qualconstituirá título hábil para oregistro imobiliário’. Nada falasobre homologação judicial.Sucede que o art. 2º da nova lei,ao modificar o art. 1.031 do CPC,que cuida do arrolamentosumário, diz que a partilhaamigável, celebrada por partescapazes, nos termos do art. 2.105do CC, será ‘homologada deplano pelo juiz’. Então, nessestermos, seria necessária a

Page 2301: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

homologação de todas aspartilhas amigáveis celebradaspor pessoas capazes e concordes?Não. O art. 1.031 do CPCprecisava ser reparado, e por issoa nova redação, mas apenas parasubstituir a antiga referência aoart. 1.773 do CC revogado,pondo, em seu lugar, o art. 2.015do atual CC, que cuida da partilhaamigável”.

Vai além o jurista, pontuandoque “o procedimento judicial,para tais casos, permanece, masfica reservado aos casos deexigência dessa via, quando hajatestamento, ou quando as partes

Page 2302: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

optem pela abertura do inventárioem Juízo. Por outras palavras,mantém-se o art. 1.031 do CPC,com arrolamento sumário pela viajudicial, mas só para as hipótesesem que seja necessária essaforma procedimental ou que essaseja escolhida pelas partes. Nosoutros casos, quando não hajatestamento e as partes maiores ecapazes optem pela viaadministrativa, será bastante aescritura pública, como títulohábil para o registro imobiliário,nos precisos termos da novaredação dada pelo art. 1º da novalei ao art. 982 do CPC. Não fosse

Page 2303: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

assim, teríamos retornado àestaca zero do sistema legalanterior que sempre admitiupartilhas amigáveis por escriturapública nos inventários earrolamentos sob homologaçãojudicial. E a lei, nessa absurdasituação, somente teria inovadocom relação aos processos deseparação e divórcioconsensuais, fazendo tábula rasada extensão ao inventário epartilha, constante da própriaementa que explicita o objetivoda norma inovadora. Anoto queos notários já estão praticandoescrituras de inventário e partilha

Page 2304: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

com plenos efeitos, independentede homologação judicial, e semmaiores questionamentos a esserespeito”.32

Como os principaisobjetivos da Lei 11.441/2007foram a celeridade e a diminuiçãoda burocracia, deve-se concordarplenamente com as palavras deEuclides de Oliveira, na linha datendência atual dedesjudicialização das contendascivis. Esse entendimento deve sermantido integralmente com avigência do Novo CPC, mesmonão havendo mais menção ao art.2.015 do CC/2002 no atual art.

Page 2305: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

659 do CPC/2015, equivalente aoantigo art. 1.031 do CPC/1973.

Partindo para a partilhajudicial, esta é obrigatória paraos casos em que há divergênciaentre os herdeiros ou quandoalgum deles for incapaz (art.2.016 do CC/2002). O NovoEstatuto Processual continua atrazer procedimentos específicos.De início, dispõe o art. 647 doCPC/2015, correspondente aoantigo art. 1.022 do CPC/1973,que, separados os bens parapagamento dos credores para arespectiva praça ou leilão, o juizfacultará às partes que, no prazo

Page 2306: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

comum de quinze dias, formulemo pedido de quinhão. Mais umavez houve aumento de prazo, queantes era de dez dias. Pela mesmanorma, em seguida o juizproferirá a decisão dedeliberação da partilha,resolvendo os pedidos das partese designando os bens que devemconstituir quinhão de cadaherdeiro e legatário. No trechofinal do diploma foram feitasduas alterações. Primeiro, não hámais menção ao prazo de dez diaspara decisão do juiz, o que causaestranheza, pois o Novo CPCprocurou agilizar os

Page 2307: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

procedimentos. Segundo, houve asubstituição do termo despachopor decisão que, de fato, pareceser melhor tecnicamente.

O parágrafo único do art.647 do CPC/2015 traz regra quenão existia no sistema anterior,estabelecendo que o juiz poderá,em decisão fundamentada, deferirantecipadamente a qualquer dosherdeiros o exercício dos direitosde usar e fruir de determinadobem. Todavia, a norma estabelecea condição de que, ao término doinventário, tal bem integre a cotadesse herdeiro. Em continuidade,enuncia-se que, desde o

Page 2308: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

deferimento do exercício dosdireitos de usar e fruir do bem,cabem ao herdeiro beneficiadotodos os ônus e bônus decorrentesdo exercício daqueles direitos.Como se nota, o objetivo do novopreceito é que o herdeiro possafruir plenamente do que temdireito, concretizando-se aherança como direitofundamental. Em suplemento, há aefetivação do droit de saisine,retirado do art. 1.784 do CódigoCivil, pelo qual, aberta asucessão, a herança transmite-se,desde logo, aos herdeiroslegítimos e testamentários.

Page 2309: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

Fernanda Tartuce e RodrigoMazzei levantam polêmica sobrea incidência do comando para olegatário, pois a norma emquestão utiliza o termo herdeiros.Ademais, pontuam que o legatárionão tem a posse imediata daherança, que somente éconcretizada com a partilha, masapenas o domínio do bem, o que éretirado do art. 1.923 do CódigoCivil, especialmente do seu § 1º.De acordo com esse preceitocivil, “Desde a abertura dasucessão, pertence ao legatário acoisa certa, existente no acervo,salvo se o legado estiver sob

Page 2310: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

condição suspensiva. § 1º Não sedefere de imediato a posse dacoisa, nem nela pode o legatárioentrar por autoridade própria”.33

O presente autor segue asmesmas conclusões dos juristascitados, constantes de enunciadosaprovados no Fórum Permanentede Processualistas Civis, comnúmeros 182 e 181. Para eles, anorma em comento é aplicávelaos legatários quando ficarevidenciado que os pagamentosdo espólio não irão reduzir oslegados. Em outras palavras,incide o direito de fruição sobreos bens ao legatário quando não

Page 2311: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

houver prejuízo e herdeiros ecredores. Como consequêncianatural, o mesmo direito deve serassegurado quando a herança fortoda dividida em legados, o quegera a legitimidade para olegatário manifestar acerca dasdívidas do espólio, segundo omesmo Estatuto Processual.34

Feitas tais considerações,observa-se que o art. 648 doNovo CPC inaugura, no sistemaprocessual, regras deinterpretação para a partilha, oque não constava da legislaçãoinstrumental anterior. Acredita-seque tais máximas representarão

Page 2312: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

uma grande revolução notratamento do tema, instituindodefinitivamente a colaboração e aboa-fé processual e material noinstituto em questão, na linha doque foi desenvolvido no Capítulo1 deste livro.

A primeira regra a serconsiderada é a de máximaigualdade possível na divisão,seja quanto ao valor, seja quantoà natureza e à qualidade dos bens.Na verdade, essa premissa jáconstava do art. 2.017 do CódigoCivil de 2002, segundo o qual,“no partilhar os bens, observar-se-á, quanto ao seu valor,

Page 2313: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

natureza e qualidade, a maiorigualdade possível”.

Trata-se do princípio daigualdade da partilha,regramento importantíssimo parao instituto em estudo, aplicandono seguinte julgado, que servecomo exemplo: “Observada aexistência de omissão na sentençarecorrida quanto a caderneta depoupança, a aplicação do art.2.017 do Código Civil se impõe,para integrar aos quinhõespartilhados o equivalente a 1/4(um quarto) cada, do saldoexistente em depósito junto aCaixa Econômica federal,

Page 2314: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

também ressalvados erros,omissões e direitos de terceirospara uma eventual sobrepartilha”(TJMT, Apelação 5455/2014,Capital, Rel. Des. CleuciTerezinha Chagas, j. 15.10.2014,DJMT 23.10.2014, p. 44).

A propósito da confrontaçãoentre os dispositivos, civil eprocessual civil, FernandaTartuce e Rodrigo Mazzeiindagam se a novidadeinstrumental irá causar algumimpacto no sistema. E concluem:“a resposta parece positiva, namedida em que faz ressurgirdiscussão sobre o âmbito de

Page 2315: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

aplicação da regra legal: é elaaplicável a qualquer tipo departilha (amigável ou ‘judicial’)ou apenas quando o juiz tiver quedecidir sobre a partilha(‘judicial’)? Pensamos que aregra legal – reafirmada pelo art.663 do texto proposto – temaplicação restrita às partilhasefetuadas de forma judicial emque não há consenso entre osherdeiros (e até meeiros) capazese/ou quando tratar de partilha queenvolva incapaz. Em outraspalavras, tratando-se de partilhaamigável entre pessoas capazes,os arts. 2.017 do Código Civil e

Page 2316: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

663 do Projeto de novo CPCdevem ser recepcionados comoorientações e não imposições aosinteressados, tendo, em talsituação, natureza dispositiva apermitir que a divisão não se dêde forma desenhada nosdispositivos, notadamente no quetange ‘a maior igualdadepossível’ (seja quanto ao valor,seja quanto à natureza, sejaquanto à qualidade dos bens).Embora a assertiva possa pareceróbvia para alguns, não háconsenso geral quanto ao tema –tanto assim que o enunciado sobreo tema, apesar de aprovado de

Page 2317: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

forma unânime no Grupo deProcedimentos Especiais, restouvetado quando da votaçãoPlenária (que reúne todos osparticipantes do encontro) no IIIFórum Permanente sobre o novoCódigo de Processo Civil (Rio deJaneiro, abril de 2014, IDP)”. 35

Salientam os doutrinadoresque a proposta vetada tinha aseguinte redação: “Art. 663. Asregras do art. 663 têm naturezadispositiva na partilha amigávelcelebrada entre as partes”. Opresente autor concorda com oseu teor e com as palavrastranscritas, mais adequadas com

Page 2318: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

um sistema aberto e dialogaladotada pela nova legislaçãoprocessual, nos termos do queestá desenvolvido no capítuloinaugural desta obra.

A segunda regra deinterpretação da partilha,constante do inciso II do art. 648do Novo CPC, é a de prevençãode litígios futuros, seguindo alinha de diminuição de conflitosadotada pela nova normainstrumental (cultura de paz). Emcasos tais, a mediação e aconciliação sempre poderão serutilizadas para os fins de facilitara partilha.

Page 2319: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

Como terceira premissa paraa interpretação de como se dá apartilha, fixa-se a máximacomodidade dos coerdeiros, docônjuge ou do companheiro (art.648, inciso III, do Novo CPC). Apropósito dessa comodidade,estabelece o art. 649 da NormaInstrumental que os bensinsuscetíveis de divisão cômodaque não couberem na parte docônjuge ou companheirosupérstite ou no quinhão de um sóherdeiro serão licitados entre osinteressados ou vendidosjudicialmente. Em casos tais, serápartilhado o valor apurado, a não

Page 2320: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

ser que haja acordo para seremadjudicados a todos. O objetivoda norma é o de afastar umindesejado condomínio comumentre herdeiros, especialmenteaqueles que não têm uma boaconvivência.

Em verdade, a solução jáestava no art. 2.019 do CódigoCivil de 2002, in verbis: “Osbens insuscetíveis de divisãocômoda, que não couberem nameação do cônjuge sobreviventeou no quinhão de um só herdeiro,serão vendidos judicialmente,partilhando-se o valor apurado, anão ser que haja acordo para

Page 2321: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

serem adjudicados a todos. § 1ºNão se fará a venda judicial se ocônjuge sobrevivente ou um oumais herdeiros requererem lhesseja adjudicado o bem, repondoaos outros, em dinheiro, adiferença, após avaliaçãoatualizada. § 2º. Se a adjudicaçãofor requerida por mais de umherdeiro, observar-se-á oprocesso da licitação”. Como sepode perceber, o Novo CPCavança ao incluir a menção aocompanheiro, na linha de outrosde seus preceitos.

Consigne-se que, como nãohouve revogação expressa,

Page 2322: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

continuam tendo aplicação osparágrafos do art. 2.019 doCódigo Civil, que tratam de umdireito de preferência em relaçãoaos herdeiros. Ora, as regras nãosão incompatíveis com o NovoCPC, não se cogitando arevogação tácita, nos termos doart. 2º da Lei de Introdução àsNormas do Direito Brasileiro.Muito ao contrário, os parágrafosexpostos complementam o sentidodo art. 649 do novel CodexProcessual, em um sadio diálogoentre as fontes. De toda sorte,opinamos que também deve serconsiderado o direito de

Page 2323: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

preferência do companheiro no §1º do art. 2.019 do CC/2002,assim como está na última normaprocessual.

Para concretizar o que passaa constar expressamente do NovoCPC, vejamos alguns julgadosaplicando o art. 2.019 do CódigoCivil, com os cabíveis finspráticos:

“Inventário. Pedido de alvará judicial paravenda de imóvel pertencente ao espólio.Possibilidade. 1. O inventário é o processojudicial destinado a apurar o acervohereditário e verificar as dívidas deixadas pelode cujus, bem como as contraídas peloespólio para, após o pagamento do passivo,estabelecer a divisão dos bens deixados entre

Page 2324: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

os herdeiros, consistindo, assim, noprocedimento destinado a entregar os bensherdados aos seus titulares, fazendo-osingressar efetivamente no patrimônioindividual dos herdeiros. 2. Tratando-se de umestado de administração patrimonialtransitório, cabível liberar a venda do imóvelpostulada, quando existem vários herdeiros eum único bem imóvel, que não comportadivisão cômoda, é cabível autorizar a suaalienação, mormente quando se trata de umimóvel antigo e que demanda gastos com suaconservação. Inteligência do art. 2.019 doCódigo Civil. 4. Para que o bem seja alienadoé imprescindível que seja feita a avaliaçãojudicial do bem, a fim de ser apurado o seuvalor real e o valor deverá ser depositado emconta judicial, somente sendo admitida aliberação dos quinhões hereditários após aexibição das certidões negativas fiscais.Recurso provido” (TJRS, Agravo deInstrumento 287570-45.2014.8.21.7000,Caxias do Sul, Sétima Câmara Cível, Rel.

Page 2325: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

Des. Sérgio Fernando de VasconcellosChaves, j. 24.09.2014, DJERS 01.10.2014).

“Art. 2.019 do Código Civil. Alienação judicialno próprio inventário. Possibilidade. Reformada decisão. Se para a instituição decondomínio das quotas-partes que caberãoaos herdeiros, havendo mais de um bemimóvel, não concordarem os herdeiroscomodamente com a divisão, haverá ofensaao art. 2.019 do Código Civil, a determinaçãojudicial que reconhece a impossibilidade dehasta pública no próprio inventário, mesmoque o magistrado possibilite a alienaçãoatravés de hasta pública a ser providenciadapelos próprios herdeiros, com a extração dealvará para tal, devendo a venda ser judicial,no próprio inventário, não concordando osherdeiros com a venda extrajudicial” (TJMG,Agravo de Instrumento 1.0657.07.000953-2/001, Rel. Des. Vanessa Verdolim HudsonAndrade, j. 29.01.2013, DJEMG 07.02.2013).

Page 2326: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

Tutelando os direitos donascituro, aquele que foiconcebido e ainda não nasceu, oart. 650 do Novo CPC estabeleceque, se um dos interessadosestiver nessa condição, o quinhãoque lhe caberá será reservado empoder do inventariante até o seunascimento. A norma, outranovidade, acaba especializando,no campo processual, o queconsta do art. 1.798 do CódigoCivil, segundo o qual “legitimam-se a suceder as pessoas nascidasou já concebidas no momento daabertura da sucessão”.

Existe profundo debate

Page 2327: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

sobre a atribuição desses bens seo nascituro não nascer ou senascer morto (natimorto). Emcasos tais os bens devem serdestinados aos herdeiros donascituro ou aos herdeiros doautor da herança? Sobre o art.1.798 do Código Civil, sãorelevantes as lições de ZenoVeloso para o debate que seexpõe: “A lei põe a salvo, desdea concepção, os direitos donascituro (art. 2º, segunda parte).Assim sendo, o conceptus(nascituro) é chamado à sucessão,mas o direito sucessório só estarádefinido e consolidado se nascer

Page 2328: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

com vida, quando adquirepersonalidade civil oucapacidade de direito (art. 2º,primeira parte). O nascituro é umente em formação (spes hominis),um ser humano que ainda nãonasceu. Se o concebido nascermorto, a sucessão é ineficaz”.36

Não é diferente a conclusãode Maria Helena Diniz, paraquem a capacidade sucessória donascituro é excepcional, somentesucedendo se nascer com vida,“havendo um estado de pendênciada transmissão hereditária,recolhendo seu representantelegal a herança sob condição

Page 2329: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

resolutiva. O já concebido nomomento da abertura da sucessãoe chamado a suceder adquiredesde logo o domínio e a posseda herança como se já fossenascido, porém, em estadopotencial, como lhe faltapersonalidade jurídica material,nomeia-se um curador de ventre.Se nascer morto, será tido comose nunca tivesse existido, logo, asucessão é ineficaz. Se nascercom vida, terá capacidade oulegitimação para suceder”.37

Seguindo essa forma de pensar,majoritária, na indagaçãoformulada, os bens devem ser

Page 2330: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

destinados para os outrosherdeiros do autor da herança.

O presente autor sempre sefiliou aos ensinamentos daProfessora Titular da PUCSP.Ressalvava, assim, que onascituro é pessoa humana, tendoa personalidade jurídica formal,relativa aos direitos dapersonalidade (teoriaconcepcionista). Faltar-lhe-ia,porém, a personalidade jurídicamaterial, relacionada aos direitospatrimoniais, caso do direito àherança.

Todavia, o autor desta obratende a mudar sua posição. Isso

Page 2331: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

porque, a partir da leitura dostrabalhos de Diogo Leite deCampos e Silmara Chinellato,está inclinado a entender que aonascituro devem ser reconhecidosdireitos sucessórios desde aconcepção, o que representa aatribuição de uma personalidadecivil plena a tal sujeito dedireito.38

Na mesma esteira, ponderaLuiz Paulo Vieira de Carvalhoque: “temos para nós que, se onascituro nascer com vida, apenasconfirma o direito sucessóriopreexistente, não sendo onascimento com vida condição

Page 2332: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

legal para que a personalidadeexista, mas sim para que esta seconsolide”.39 Cabe esclarecer, apropósito, que, apesar datranscrição anterior das palavrasde Zeno Veloso, o jurista tambémparece que tende a mudar deposicionamento, conformepalestra proferida no I CongressoJurídico do Instituto Brasileirode Direito Civil (IBDCivil), emagosto de 2013, na cidade do Riode Janeiro, sem prejuízo deoutros eventos que foramcompartilhados nos últimostempos com este autor. Então,seguindo essa corrente, os bens

Page 2333: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

devem ser destinados aosherdeiros do nascituro nahipótese antes descrita.

De fato, pensar o contrárioparece representar um resquícioda teoria natalista, que negapersonalidade ao nascituro. Dequalquer modo, pontue-se que oentendimento majoritáriopermanece no sentido de que onascituro somente terá direitossucessórios se nascer com vida,pendendo uma condição para talreconhecimento. Eis um tema queainda pende de grande debate nofuturo.

Outro aspecto tormentoso

Page 2334: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

tem relação com a extensão daregra sucessória do Código Civil– e agora também do Novo CPC–, aos embriões havidos dastécnicas de reprodução assistida.Respondendo positivamente, oEnunciado n. 267 CJF/STJ, da IIIJornada de Direito Civil, deautoria do jurista GuilhermeCalmon Nogueira da Gama: “Aregra do art. 1.798 do CódigoCivil deve ser estendida aosembriões formados mediante ouso de técnicas de reproduçãoassistida, abrangendo, assim, avocação hereditária da pessoahumana a nascer cujos efeitos

Page 2335: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

patrimoniais se submetem àsregras previstas para a petição daherança”.

O enunciado doutrinário nãoconta com o apoio de váriosjuristas, que entendem que oembrião está em situação jurídicadiferente em relação ao nascituro,não merecendo tratamentoequânime. Essa é a opinião, porexemplo, de Francisco JoséCahali,40 Jones Figueirêdo Alvese Mário Luiz Delgado.41

O presente autorcompartilhava da última corrente,tida até como majoritária,

Page 2336: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

conforme constava de obraescrita em coautoria com JoséFernando Simão.42 Isso porqueacreditava que o embrião, aexemplo do nascituro, apesar deter personalidade formal (direitosda personalidade), não teria apersonalidade jurídica material(direitos patrimoniais), e só seriaherdeiro por força de disposiçãotestamentária, conforme se verálogo a seguir.

Todavia, aqui também háuma tendência de mudança denossa opinião, pois ao embriãoigualmente deve ser reconhecidauma personalidade civil plena,

Page 2337: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

inclusive no tocante à tutelasucessória, assim como ocorrecom o nascituro. De toda sorte,esclareça-se que o assunto aindaestá em estudo por este autor.Reafirme-se que Zeno Velosotambém parece ter uma inclinaçãoa mudar sua posição anterior,aqui antes citada, conformepalestras ministradas em várioseventos no ano de 2013.

Voltando ao âmago dasregras relativas à partilha,estabelece o novo art. 651 doCPC/2015, correspondente aoantigo art. 1.023 do CPC/1973,que o partidor – denominação

Page 2338: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

dada ao agente do órgão do PoderJudiciário responsável pelaorganização da partilha –organizará o esboço da partilhade acordo com a decisão judicial,observando no pagamento aseguinte ordem: 1º) dívidasatendidas; 2º) meação do cônjuge;3º) meação disponível; 4º)quinhões hereditários, a começarpelo coerdeiro mais velho. Feitoo esboço, dirão sobre ele aspartes no prazo comum de quinzedias. Resolvidas as reclamações,será a partilha lançada nos autos(art. 652 do CPC/2015 e art.1.024 do CPC/1973). Houve

Page 2339: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

alteração no prazo comum paramanifestação das partes,aumentado de cinco para 15 dias.

Enuncia o art. 653 doCPC/2015 que a partilha constaráde: I) um auto de orçamento, quemencionará: a) os nomes do autorda herança, do inventariante, docônjuge ou companheiro, dosherdeiros, dos legatários e doscredores admitidos; b) o ativo, opassivo e o líquido partível, comas necessárias especificações; c)o valor de cada quinhão; e II) deuma folha de pagamento paracada parte, declarando a quota apagar-lhe, a razão do pagamento e

Page 2340: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

a relação dos bens que lhecompõem o quinhão, ascaracterísticas que osindividualizam e os ônus que osgravam. O auto e cada uma dasfolhas serão assinados pelo juiz epelo escrivão. A única alteração,diante do art. 1.025 do CPCanterior é a inclusão docompanheiro ou convivente, nafestejada linha de equalizaçãoadotada pela nova normainstrumental.

Pago o imposto detransmissão a título de morte ejuntada aos autos a certidão ou ainformação negativa de dívida

Page 2341: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

para com a Fazenda Pública, ojuiz julgará por sentença apartilha (art. 654, caput, doCPC/2015 e art. 1.026 doCPC/1973). Trata-se da sentençahomologatória da partilha, que épassível de recurso de apelação.Consigne-se que, como novidade,o parágrafo único do novo art.654 passou a estabelecer que aexistência de dívida para com aFazenda Pública não impedirá ojulgamento da partilha, desde queo seu pagamento estejadevidamente garantido. Trata-sede mais uma norma que visa aagilizar os procedimentos de

Page 2342: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

inventário e partilha, mas queparece atribuir excesso de poderà Fazenda Pública.

A propósito, o presente autorconcorda com a posição segundoa qual, havendo herdeiroshipossuficientes, sem condiçõesde pagar os impostos, a normadeve ser afastada, conformeconsta do Enunciado n. 71 doFórum Permanente deProcessualistas Civis. Essetambém é o pensamento deFernanda Tartuce e RodrigoMazzei, que criticam duramente onovo diploma:

Page 2343: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

“Contudo, ao ainda revelar preocupações coma garantia do pagamento, o legislador revelacondicionar a resposta processual final àFazenda de um modo servil e injustificável.Afinal, dúvida não há que a Fazenda templenas condições de executar o valor devidopor meio do eficiente sistema executivo deque é titular. Como já terá ciência doprocesso de inventário, o que impedirá deexecutar o herdeiro que porventura deixou depagar os tributos sucessórios?Nada justifica deixar o bem em nome domorto e causar graves prejuízos à eficiênciado acesso à justiça, à segurança jurídica e àtransparência nas relações jurídicas por umapendência tributária cuja superação poderáser buscada pela Fazenda posteriormente.É forçoso considerar que os litiganteshipossuficientes, não tendo condiçõeseconômicas, poderão deixar de conseguir aalmejada partilha. Viola a isonomia considerarque, por não terem como garantir o feito, oslitigantes marcados por precariedade

Page 2344: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

econômica deixem de ter acesso à justiçacom eficiência.Da mesma forma que o sistema prevêfacilitações para aquele que pode apresentarem juízo valores significativos, cria óbicesilegítimos a quem, a despeito da pobreza,possa ter razão quanto ao direito material; é,pois, de suma importância que o juiz coteja aimpossibilidade financeira e considere outroselementos para decidir”.43

Transitada em julgado essasentença, receberá o herdeiro osbens que lhe tocarem e um formalde partilha, que serve de prova dadivisão dos bens, do qualconstarão as seguintes peças: I)termo de inventariante e título deherdeiros; II) avaliação dos bens

Page 2345: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

que constituíram o quinhão doherdeiro; III) pagamento doquinhão hereditário; IV) quitaçãodos impostos; V) sentença (art.655 do CPC/2015, equivalente aoart. 1.027 do CPC/1973, semmodificações). Vale dizer que oformal de partilha é fundamentalpara o registro da aquisição dapropriedade imóvel, visandoprová-la.

Se for o caso, o formal departilha poderá ser substituídopor certidão de pagamento doquinhão hereditário, quando estenão exceder cinco vezes o saláriomínimo. Nesse caso, se

Page 2346: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

transcreverá na certidão asentença de partilha transitada emjulgado. Esse é o parágrafo únicodo art. 655 do Novo CPC,reprodução do antigo art. 1.027,parágrafo único, do CPCrevogado.

A partilha, mesmo depois detransitada em julgado a sentença,poderá ser emendada nos mesmosautos do inventário, convindotodas as partes, quando tenhahavido erro de fato na descriçãodos bens (art. 656 do Novo CPC,com pequenas alterações deredação, e não de conteúdoperante o art. 1.028 do CPC).

Page 2347: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

Sem prejuízo disso, preconiza omesmo comando legal que o juiz,de ofício ou a requerimento daparte, poderá, a qualquer tempo,corrigir-lhe as inexatidõesmateriais.

Abordadas as regras sobre apartilha judicial, a últimamodalidade a ser estudada é apartilha em vida, que somentetem tratamento no Código Civil, enão no Código de Processo Civil.Essa constitui a forma de partilhafeita por ascendente adescendentes, por ato inter vivosou de última vontade, abrangendoos seus bens de forma total ou

Page 2348: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

parcial, desde que respeitados osparâmetros legais, caso dareserva da legítima (art. 2.018 doCC/2002). Cite-se, ainda, a tutelado mínimo para que o estipulanteviva com dignidade, na linha datese do estatuto jurídico dopatrimônio mínimo, que pode serretirada, por exemplo, do art. 548do Código Civil, dispositivo queveda a doação universal, de todosos bens, sem a reserva do mínimopara a sobrevivência do doador.

Nesse sentido, também podeo testador indicar os bens evalores que devem compor osquinhões hereditários (art. 2.014

Page 2349: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

do CC). Mais especificamente,determina tal dispositivo quepode o testador deliberar oprocedimento da partilha, queprevalecerá, salvo se o valor dosbens não corresponder às quotasestabelecidas. Segundo MariaHelena Diniz, essa forma departilha facilita a fase deliquidação do inventário noprocesso de partilha,“homologando-se a vontade dotestador que propôs uma divisãolegal e razoável”.44 Emcomplemento, como explica ZenoVeloso, a partilha em vida podese realizar de duas maneiras. A

Page 2350: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

primeira equivale a uma doação,e a divisão dos bens entre osherdeiros tem efeito imediato,antecipando o que estes iriamreceber somente após a morte doascendente (partilha-doação). Asegunda é a partilha-testamento,feita no ato mortis causa, que sóproduz efeitos com a morte doascendente e deve seguir a formade testamento.45 Tratando daprimeira modalidade, a ilustrar,da jurisprudência superior:

“Recurso especial. Sucessões. Inventário.Partilha em vida. Negócio formal. Doação.Adiantamento de legítima. Dever de colação.Irrelevância da condição dos herdeiros.

Page 2351: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

Dispensa. Expressa manifestação do doador.Todo ato de liberalidade, inclusive doação,feito a descendente e/ou herdeiro necessárionada mais é que adiantamento de legítima,impondo, portanto, o dever de trazer àcolação, sendo irrelevante a condição dosdemais herdeiros: se supervenientes ao ato deliberalidade, se irmãos germanos ouunilaterais. É necessária a expressa aceitaçãode todos os herdeiros e a consideração dequinhão de herdeira necessária, de modo quea inexistência da formalidade, que o negóciojurídico exige, não o caracteriza como partilhaem vida. A dispensa do dever de colação sóse opera por expressa e formal manifestaçãodo doador, determinando que a doação ou atode liberalidade recaia sobre a parceladisponível de seu patrimônio. Recursoespecial não conhecido” (STJ, REsp730.483/MG, Terceira Turma, Rel. Min.Nancy Andrighi, j. 03.05.2005, DJ20.06.2005, p. 287).

Page 2352: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

Como outro exemplo departilha em vida, cite-se, ainda, acorriqueira forma deplanejamento sucessório, em queum dos ascendentes –principalmente nos casos defalecimento de seu cônjuge –realiza a doação de todos os seusbens aos descendentes, mantendo-se a igualdade de quinhões e aproteção da legítima. É comum,em caso tais, a reserva para odoador do usufruto dos bens, queserá extinto quando da sua morte,consolidando a propriedade plenaem favor dos herdeiros antesbeneficiados.

Page 2353: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

A encerrar o presentecapítulo, interessante teceralgumas palavras sobre umaalteração efetuada pelo NovoCódigo de Processo, emdispositivo relativo à anulação dapartilha. Vejamos a modificaçãoque foi realizada pelo art. 1.068do CPC/2015 em relação ao art.2.027 do Código Civil de 2002:

CódigoCivil de

2002.Redaçãodada pelo

Código Civil

de 2002.Redaçãoanterior

Page 2354: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

Novo CPC

“Art. 2.027.A partilha éanulávelpelos víciose defeitosqueinvalidam,em geral, osnegóciosjurídicos.

“Art. 2.027. Apartilha, uma vezfeita e julgada, sóé anulável pelosvícios e defeitosque invalidam, emgeral, os negóciosjurídicos.

Parágrafoúnico.Extingue-seem um anoo direito deanular a

Parágrafo único.Extingue-se emum ano o direitode anular apartilha”.

Page 2355: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

partilha”.

O regramento civil eracompletado pelo art. 1.029 doCPC anterior, que foi substituídopelo art. 657 do CPC emergente.Atente-se para os seus parágrafosúnicos, que tratam dos vícios edefeitos do negócio jurídico commais detalhes. Vejamos tambémem quadro de confrontação:

Novo Códigode Processo

Civil

Código deProcesso

Civil Antigo

Page 2356: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

“Art. 657. Apartilhaamigável,lavrada eminstrumentopúblico,reduzida atermo nosautos doinventário ouconstante deescritoparticularhomologadopelo juiz, podeser anulada pordolo, coação,erro essencialou intervenção

“Art. 1.029. Apartilhaamigável,lavrada eminstrumentopúblico,reduzida atermo nosautos doinventário ouconstante deescritoparticularhomologadopelo juiz, podeser anulada,por dolo,coação, erroessencial ouintervenção de

Page 2357: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

de incapaz,observado odisposto no §4º do art. 966.

incapaz.(Redação dadapela Lei nº5.925, de1º.10.1973.)

Parágrafoúnico. O direitoà anulação departilhaamigávelextingue-se em1 (um) ano,contado esseprazo:

Parágrafoúnico. Odireito depropor açãoanulatória departilhaamigávelprescreve em1 (um) ano,contado esteprazo:(Redação dadapela Lei nº5.925, de1º.10.1973.)

Page 2358: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

I – no caso decoação, do diaem que elacessou;

I – no caso decoação, do diaem que elacessou;(Redação dadapela Lei nº5.925, de1º.10.1973.)

II – no caso deerro ou dolo, dodia em que serealizou o ato;

II – no de erroou dolo, do diaem que serealizou o ato;(Redação dadapela Lei nº5.925, de1º.10.1973.)

Page 2359: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

III – quanto aoincapaz, do diaem que cessaraincapacidade.”

III – quanto aoincapaz, do diaem que cessaraincapacidade.(Redação dadapela Lei nº5.925, de1º.10.1973.)”

Na confrontação das normasprocessuais, nota-se que o NovoCPC não menciona mais aexistência de prescrição, pois osprazos são claramentedecadenciais, tratando de

Page 2360: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

anulação do negócio jurídico. Deacordo com o Código Civil de2002 e na linha dos critérioscientíficos de Agnelo AmorimFilho, tratando-se de açãodesconstitutiva, ou constitutivanegativa de ato ou negócio, oprazo é de decadência. Os prazosprescricionais, por seu turno, sãopróprios das ações condenatórias,caso da cobrança e da reparaçãode danos. No mais, não houvealteração substancial nospreceitos adjetivos.

Constata-se, ademais, que oNovo CPC alterou apenas o caputdo dispositivo material,

Page 2361: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

permanecendo o prazodecadencial de um ano paraanular a partilha, constante doparágrafo único do art. 2.027 doCC/2002. O último dispositivo écompletado pelo art. 657 doNovo CPC, no tocante aos iníciosdos lapsos temporais.

Permanece viva umapolêmica instigante, pois odispositivo civil menciona todosos vícios ou defeitos do negóciojurídico para se anular qualquerpartilha, enquanto o Código deProcesso Civil emergente apenasalguns para a anulação da partilhaamigável, na linha do seu

Page 2362: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

antecessor.Em outras palavras, haverá

anulação da partilha amigável noscasos de lesão, estado de perigo efraude contra credores?Pontuava-se que o estado deperigo e a lesão não constavamdo Código de Processo de 1973,pois a lei processual revogadaera anterior ao Código Civil de2002, que introduziu essas duasnovas modalidades de vícios davontade no negócio jurídico. Dequalquer forma, este autor sempreentendeu possível anular apartilha pela presença dessesdefeitos, desde que estes

Page 2363: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

ocorressem na vigência do atualCódigo Civil, o que é outraaplicação do art. 2.035, caput, doCC. Em relação à fraude contracredores, deve-se compreenderque esta pode gerar a anulação dapartilha que não seja amigável,por incidência do art. 2.027 doCódigo Civil.

A nossa posição é mantidamesmo com a emergência doCódigo de Processo Civil de2015, que teve a chance deresolver o dilema, mas,infelizmente, não o fez. Muito aocontrário, pode-se dizer que atéaprofundou o debate, pois surgirá

Page 2364: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

o argumento de que o Código deProcesso é posterior ao CódigoCivil e mais especial que oúltimo por estar relacionado coma partilha amigável, sem amenção a respeito dos dois víciosdo consentimento que nãoestavam na codificação de 1916.

A respeito de se anular apartilha por estado de perigo oulesão, as situações até podem serraras, mas não são impossíveis.Quanto à possibilidade de lesãona partilha, adverte Silvio deSalvo Venosa que “não resta amenor dúvida de que a partilhapode ser anulada por lesão, vício

Page 2365: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

que foi reintroduzido noordenamento”.46 Nesses casos, oaplicador do direito deveprocurar socorro em uma regraanalógica, ou seja, incidente emhipótese próxima. Nessa seara,utilizando-se o art. 657 doCPC/2015 (art. 1.029 doCPC/1973), o prazo a serconsiderado é de naturezadecadencial e é de um ano,contado da data em que serealizou o ato (partilha). Essa é aopinião do presente autor. Detodo modo, vejamos como adoutrina e a jurisprudência seposicionarão a respeito desse

Page 2366: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

assunto no futuro.Além dos casos de anulação

da partilha analisados, o art. 658do CPC/2015 repete o art. 1.030do CPC/1973 e trata da rescisãoda partilha julgada por sentença,por motivo posterior, a saber: a)nos casos de anulação, expressosno comando anterior: b) se apartilha for feita com preteriçãode formalidades legais; e c) se apartilha preteriu herdeiro ouincluiu quem não o seja. Aqui nãohouve alteração substancial.Relativamente ao prazo para essarescisão, a doutrina apontava aaplicação do prazo decadencial

Page 2367: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

de dois anos que era previstopara o ajuizamento de açãorescisória (art. 485 e seguintes doCPC/1973), contados do trânsitoem julgado da homologação dapartilha.47 Esse prazo foi mantidopelo art. 975 do CPC/2015 econtinuará sendo aplicado, pelomenos em uma primeira análise.

Interessante perceber que alei silencia quanto à nulidadeabsoluta da partilha. Por óbvio,aqui devem ser aplicadas asregras de nulidade do negóciojurídico, que envolvem ordempública, previstas nos arts. 166 e167 do Código Civil. Além do

Page 2368: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

próprio Silvio de Salvo Venosa,assim concluem Maria HelenaDiniz,48 Carlos RobertoGonçalves49 e Zeno Veloso,50 quesintetizam a posição majoritária.Como os casos de nulidadeabsoluta não convalescem com otempo (art. 169 do CC), mais umavez, o presente autor entende quea ação de nulidade não estásujeita à prescrição oudecadência.

Em relação ao últimodoutrinador, é sempre citado oseu convencimento de que,independentemente da formacomo foi feita a partilha, se

Page 2369: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

amigável ou judicial, havendoexclusão do herdeiro, a hipótese éde nulidade absoluta, “e oherdeiro prejudicado não ficaadstrito à ação de anulação nem àrescisória, e seus respectivosprazos de decadência, podendoutilizar da querela nullitatis, daação de nulidade ou de petição deherança, existindo decisões doSTF (RE 97.546-2) e do STJ(REsp 45.693-2) que afirmamestar sujeita a prazo deprescrição longi temporis, devinte anos, devendo serobservado que, por este Código,o prazo máximo de prescrição é

Page 2370: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

de dez anos (art. 205)”.51

A única ressalva que deveser feita é que o jurista, ao ladode outros e da posição largamenteprevalecente, defende a aplicaçãoda regra geral dos prazos deprescrição, que antes era de vinteanos (art. 177 do CC/1916), eagora é de dez anos (art. 205 doCC/2002). Nessa linha, aliás, doSuperior Tribunal de Justiça e portodos: “Regimental. Inventário.Partilha. Anulação. Vintenário.Precedentes. Súmula 07. É devinte anos o prazo para oherdeiro que não participou dapartilha pedir sua anulação em

Page 2371: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

juízo” (STJ, AgRg no Ag719.924/RJ, Terceira Turma, Rel.Min. Humberto Gomes de Barros,j. 20.04.2006, DJ 15.05.2006, p.205).

Como antes sustentado, parao presente autor não há prazopara se requerer a nulidadeabsoluta da partilha, pela dicçãodo art. 169 da codificaçãomaterial vigente e pelo fato de sera matéria de ordem pública.

Page 2372: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

__________1 DINIZ, Maria Helena. Curso deDireito Civil Brasileiro. Direito dasSucessões. São Paulo: Saraiva, 2005,v. 6, p. 368.2 VELOSO, Zeno. Código CivilComentado. Coordenação de RicardoFiúza e Regina Beatriz Tavares daSilva. 6. ed. São Paulo: Saraiva, 2008.p. 1.657.3 AMORIM, Sebastião; OLIVEIRA,Euclides. Inventários e Partilhas. 22.ed. São Paulo: Leud, 2009. p. 299.4 CAHALI, Francisco José. Direitodas Sucessões. 3. ed. São Paulo: RT,2007. p. 357.5 CARVALHO, Dimas Messias;CARVALHO, Dimas Daniel. Direito

Page 2373: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

das Sucessões: Inventário e Partilha.3. ed. Belo Horizonte: Del Rey, 2012.v. VIII, p. 215-216.6 TARTUCE, Fernanda. Gratuidadeem Divórcio e InventárioExtrajudiciais. In: REGIS, Mario LuizDelgado; COLTRO, Antonio CarlosMathias (Org.). Separação,Divórcio, Partilhas e InventáriosExtrajudiciais. 2. ed. Rio de Janeiro:Forense, 2010. v. 1, p. 127.7 AMORIM, Sebastião; OLIVEIRA,Euclides. Inventários e Partilhas. 22.ed. São Paulo: Leud, 2009. p. 388.8 AMORIM, Sebastião; OLIVEIRA,Euclides. Inventários e Partilhas. 22.ed. São Paulo: Leud, 2009. p. 328-329.9 ITABAIANA DE OLIVEIRA,Arthur Vasco. Tratado de Direito das

Page 2374: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

Sucessões. São Paulo: Max Limonad,1952. v. III, p. 793.10 DINIZ, Maria Helena. Curso deDireito Civil Brasileiro: Direito dasSucessões. 27. ed. São Paulo: Saraiva,2013. v. 6, p. 415.11 AMORIM, Sebastião; OLIVEIRA,Euclides. Inventários e Partilhas. 22.ed. São Paulo: Leud, 2009. p. 344-345.12 VELOSO, Zeno. Código CivilComentado. Coordenação de RicardoFiúza e Regina Beatriz Tavares daSilva. 8. ed. São Paulo: Saraiva, 2012.p. 2.023.13 LÔBO, Paulo. Direito Civil.Sucessões. São Paulo: Saraiva, 2013.p. 63.14 Polêmica exposta no nosso:TARTUCE, Flávio. Direito Civil.

Page 2375: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

Direito das Sucessões. 8. ed. SãoPaulo: GEN, 2015. v. 6, Capítulo 2.15 CARVALHO, Dimas Messias;CARVALHO, Dimas Daniel. Direitodas Sucessões: Inventário e Partilha.3. ed. Belo Horizonte: Del Rey, 2012.v. VIII, p. 220.16 AMORIM, Sebastião; OLIVEIRA,Euclides. Inventários e Partilhas. 18.ed. São Paulo: Leud, 2004. p. 344.17 AMORIM, Sebastião; OLIVEIRA,Euclides. Inventários e Partilhas. 20.ed. São Paulo: Leud, 2006. p. 345.18 CARVALHO, Dimas Messias;CARVALHO, Dimas Daniel. Direitodas Sucessões: Inventário e Partilha.3. ed. Belo Horizonte: Del Rey, 2012.v. VIII, p. 220.

Page 2376: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

19 Por todos, podem ser citados:NERY JR., Nelson; NERY, RosaMaria de Andrade. Código deProcesso Civil Comentado eLegislação Extravagante. 9. ed. SãoPaulo: RT, 2006. p. 1017; DINIZ,Maria Helena. Curso de Direito CivilBrasileiro. Direito das Sucessões. SãoPaulo: Saraiva, 2005. v. 6, p. 371.20 NERY JR., Nelson; NERY, RosaMaria de Andrade. Código deProcesso Civil Comentado eLegislação Extravagante. 9. ed. SãoPaulo: RT, 2006. p. 1.016.21 AMORIM, Sebastião; OLIVEIRA,Euclides. Inventários e Partilhas. 20.ed. São Paulo: Leud, 2006, p. 366.22 NERY JR., Nelson; NERY, RosaMaria de Andrade. Código de

Page 2377: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

Processo Civil Comentado eLegislação Extravagante. 9. ed. SãoPaulo: RT, 2006. p. 1.021.23 AMORIM, Sebastião; OLIVEIRA,Euclides. Inventários e Partilhas. 20.ed. São Paulo: Leud, 2006, p. 457.24 CARVALHO, Dimas Messias;CARVALHO, Dimas Daniel. Direitodas Sucessões: Inventário e Partilha.3. ed. Belo Horizonte: Del Rey, 2012.v. VIII, p. 225.25 AMORIM, Sebastião; OLIVEIRA,Euclides. Inventários e Partilhas. 22.ed. São Paulo: Leud, 2009, p. 523-524.26 AMORIM, Sebastião; OLIVEIRA,Euclides. Inventários e Partilhas. 22.ed. São Paulo: Leud, 2009, p. 523-524.27 CARVALHO, Dimas Messias;

Page 2378: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

CARVALHO, Dimas Daniel. Direitodas Sucessões: Inventário e Partilha.3. ed. Belo Horizonte: Del Rey, 2012.v. VIII, p. 233-234.28 VELOSO, Zeno. Comentários aoCódigo Civil. São Paulo: Saraiva,2003. v. 21, p. 1.870.29 CARVALHO, Dimas Messias;CARVALHO, Dimas Daniel. Direitodas Sucessões: Inventário e Partilha.3. ed. Belo Horizonte: Del Rey, 2012.v. VIII, p. 291.30 DINIZ, Maria Helena. Curso deDireito Civil Brasileiro. Direito dasSucessões. São Paulo: Saraiva, 2005,v. 6, p. 412.31 TARTUCE, Flávio; SIMÃO, JoséFernando. Direito Civil. Direito dasSucessões. 6. ed. São Paulo:

Page 2379: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

GEN/Método, 2013. v. 6, p. 486.32 TARTUCE, Flávio; SIMÃO, JoséFernando. Direito Civil. Direito dasSucessões. 6. ed. São Paulo:GEN/Método, 2013. v. 6, p. 486.Trecho de mensagem eletrônicaenviada por Euclides de Oliveira.33 TARTUCE, Fernanda; MAZZEI,Rodrigo Reis. Inventário e Partilha noProjeto de Novo CPC: Pontos deDestaque na Relação entre os DireitosMaterial e Processual. RevistaNacional de Direito de Família eSucessões, Porto Alegre: LexMagister, n. 1, p. 92-94, jul.-ago. 2014.34 TARTUCE, Fernanda; MAZZEI,Rodrigo Reis. Inventário e Partilha noProjeto de Novo CPC: Pontos deDestaque na Relação entre os DireitosMaterial e Processual. Revista

Page 2380: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

Nacional de Direito de Família eSucessões, Porto Alegre: LexMagister, n. 1, p. 94, jul.-ago. 2014.35 TARTUCE, Fernanda; MAZZEI,Rodrigo Reis. Inventário e Partilha noProjeto de Novo CPC: Pontos deDestaque na Relação entre os DireitosMaterial e Processual. RevistaNacional de Direito de Família eSucessões, Porto Alegre: LexMagister, n. 1, p. 87, jul.-ago. 2014.36 VELOSO, Zeno. Código CivilComentado. 6. ed. Coord. RicardoFiúza e Regina Beatriz Tavares daSilva. São Paulo: Saraiva, 2008. p.1.971-1.972.37 DINIZ, Maria Helena. CódigoCivil Anotado. 15. ed. São Paulo:Saraiva, 2010. p. 1.276.38 CAMPOS, Diogo Leite de;

Page 2381: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

CHINELLATO, Silmara Juny deAbreu. Pessoa Humana e Direito.Coimbra: Almedina, 2009. A obra écoordenada pelos dois juristas,destacando os artigos de ambos. DeDiogo Leite de Campos, o textointitulado A Capacidade Sucessóriado Nascituro (ou a Crise doPositivismo Legalista). De SilmaraChinellato, ver: Estatuto JurídicoNascituro. A Evolução do Direito doDireito Brasileiro.39 CARVALHO, Luiz Paulo Vieira de.Direito das Sucessões. São Paulo:Atlas, 2014. p. 165.40 CAHALI, Francisco José. Direitodas Sucessões. 3. ed. São Paulo: RT,2007. p. 104.41 ALVES, Jones Figueirêdo;

Page 2382: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

DELGADO, Mario Luiz. CódigoCivil Anotado. São Paulo: Método,2005. p. 918.42 TARTUCE, Flávio; SIMÃO, JoséFernando. Direito Civil. Direito dasSucessões. 3. ed. São Paulo: Método,2010. v. 6, p. 45.43 TARTUCE, Fernanda; MAZZEI,Rodrigo Reis. Inventário e Partilha noProjeto de Novo CPC: Pontos deDestaque na Relação entre os DireitosMaterial e Processual. RevistaNacional de Direito de Família eSucessões, Porto Alegre: LexMagister, n. 1, p. 91, jul.-ago. 2014.44 DINIZ, Maria Helena. Curso deDireito Civil Brasileiro. Direito dasSucessões. São Paulo: Saraiva, 2005,v. 6, p. 415.

Page 2383: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

45 VELOSO, Zeno. Comentários aoCódigo Civil. São Paulo: Saraiva,2003. v. 21. p. 437.46 VENOSA, Silvio de Salvo. CódigoCivil Interpretado. 2. ed. São Paulo:Atlas, 2011. p. 2.087.47 Por todos, novamente: VENOSA,Silvio de Salvo. Código CivilInterpretado. 2. ed. São Paulo: Atlas,2011. p. 2.087.48 DINIZ, Maria Helena. Curso deDireito Civil Brasileiro. Direito dasSucessões. 27. ed. São Paulo: Saraiva,2013. v. 7, p. 479.49 GONÇALVES, Carlos Roberto.Direito Civil Brasileiro. Direito dasSucessões. 8. ed. São Paulo: Saraiva,2014. v. 7, p. 573-574.50 VELOSO, Zeno. Código Civil

Page 2384: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

Comentado. Coord. Ricardo Fiúza eRegina Beatriz Tavares da Silva. 8. ed.São Paulo: Saraiva, 2012. p. 2.226.51 VELOSO, Zeno. Código CivilComentado. Coord. Ricardo Fiúza eRegina Beatriz Tavares da Silva. 8. ed.São Paulo: Saraiva, 2012. p. 2.226.

Page 2385: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

BIBLIOGRAFIA

ABREU, Célia Barbosa. Curatela eInterdição Civil. Rio de Janeiro: LumenJuris, 2009.

AGUIAR, Mônica. Direito à IntimidadeGenética em Face do Art. 232 do CódigoCivil e sua Defesa pela Criação de umHabeas Genoma. In: DIDIER JR.,Fredie; MAZZEI, Rodrigo (coord.).Prova, Exame Médico e Presunção. OArt. 232 do Código Civil. Salvador:

Page 2386: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

Juspodivm, 2006.

ALEXY, Robert. Teoria dos DireitosFundamentais. Tradução de VirgílioAfonso da Silva. São Paulo: Malheiros,2008.

ALVES, Jones Figueirêdo Alves;DELGADO, Mário Luiz. Código CivilAnotado. São Paulo: Método, 2005.

ALVIM, Arruda; ASSIS, Araken de;ALVIM, Eduardo de Arruda.Comentários ao Código de ProcessoCivil. 3. ed. São Paulo: RT, 2014.

AMARAL, Francisco. Direito Civil.Introdução. 5. ed. Rio de Janeiro:Renovar, 2003.

AMORIM, Sebastião; OLIVEIRA, Euclides.Inventários e Partilhas. 18. ed. SãoPaulo: Leud, 2004.

Page 2387: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

–––––; –––––. Inventários e Partilhas. 20.ed. São Paulo: Leud, 2006.

–––––; –––––. Inventários e Partilhas. 22.ed. São Paulo: Leud, 2009.

AMORIM FILHO, Agnelo. CritérioCientífico para Distinguir a Prescrição daDecadência e para Identificar as AçõesImprescritíveis. RT 300/7 e 744/725.

ASCENSÃO, José de Oliveira. Introdução àCiência do Direito. 3. ed. Rio deJaneiro: Renovar, 2005.

ASSUMPÇÃO NEVES, Daniel Amorim.Manual de Direito Processual Civil.São Paulo: Método, 2009.

ASSUNÇÃO, Alexandre GuedesAlcoforado. Código Civil Comentado.Coordenação: Ricardo Fiuza e ReginaBeatriz Tavares da Silva. 6. ed. São

Page 2388: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

Paulo: Saraiva, 2008.

AZEVEDO, Álvaro Villaça. Curso deDireito Civil. Direito de Família. SãoPaulo: Atlas, 2013.

–––––. Emenda Constitucional do Divórcio.Disponível em:<http://www.flaviotartuce.adv.br/secoes/artigosc/villaca_emenda.docAcesso em: 10 jan. 2011.

–––––. Teoria Geral do Direito Civil. ParteGeral. São Paulo: Atlas, 2012.

AZEVEDO, Antônio Junqueira de. NegócioJurídico. Existência, Validade eEficácia. 4. ed. São Paulo: Saraiva, 2002.

BARBOSA MOREIRA, José Carlos.Solidariedade Ativa: Efeitos da Sentençae Coisa Julgada na Ação de CobrançaProposta por um Único Credor. Revistado Advogado da AASP. Homenagemao Professor José Ignácio Botelho de

Page 2389: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

Mesquita. São Paulo: AASP, 2005.

BARROSO, Luís Roberto. Curso de DireitoConstitucional Contemporâneo. OsConceitos Fundamentais e a Construçãodo Novo Modelo. São Paulo: Saraiva,2009.

BEVILÁQUA, Clóvis. Código Civil dosEstados Unidos do Brasil. Ed.histórica. Rio de Janeiro: Ed. Rio, 1977.t. I.

–––––. Comentários ao Código Civil. 4.ed. Rio de Janeiro: Francisco Alves,1972. v. 1.

BOULOS, Daniel M. Abuso do Direito noNovo Código Civil. São Paulo: Método,2006.

BRANDÃO, Débora Vanessa Caús. Regimede Bens no Código Civil. 2. ed. São

Page 2390: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

Paulo: Saraiva, 2007.

BRITO, Rodrigo Toscano de. Compromissode Compra e Venda e as Regras deEquilíbrio Contratual do CC/2002. In:DINIZ, Maria Helena (coord.).Atualidades Jurídicas. São Paulo:Saraiva, n. 5, 2004.

BUSSATTA, Eduardo. Resolução dosContratos e Teoria do AdimplementoSubstancial. Coleção Prof. AgostinhoAlvim. São Paulo: Saraiva, 2007.

CAHALI, Francisco José. A Súmula 377 e oNovo Código Civil e a Mutabilidade doRegime de Bens. Revista do Advogado,Homenagem ao Professor SilvioRodrigues. São Paulo, Associação dosAdvogados de São Paulo, ano XXIV, n.76, jun. 2004.

–––––. Direito das Sucessões. 3. ed. SãoPaulo: RT, 2007.

Page 2391: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

CÂMARA, Alexandre Freitas. Da Evicção –Aspectos Materiais e Processuais. In:HIRONAKA, Giselda Maria FernandesNovaes; TARTUCE, Flávio. DireitoContratual. Temas Atuais. São Paulo:Método, 2008.

–––––. Lições de Direito Processual Civil.9. ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2004.v. II.

–––––. Lições de Processo Civil. 7. ed. Riode Janeiro: Lumen Juris, 2005. v. III.

–––––. Reconhecimento de Ofício daPrescrição: uma Reforma Descabeçadae Inócua. Disponível em:<www.flaviotartuce.adv.br>. Acesso em:18 jan. 2015.

CAMPOS, Diogo Leite de. A CapacidadeSucessória do Nascituro (ou a Crisedo Positivismo Legalista).

Page 2392: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

–––––; CHINELLATO, Silmara Juny deAbreu. Pessoa Humana e Direito.Coimbra: Almedina, 2009.

CHINELLATO, Silmara. Estatuto JurídicoNascituro. A Evolução do Direito doDireito Brasileiro. Pessoa Humana eDireito. Coimbra: Almeida, 2009.

CANOTILHO, J. J. Gomes. DireitoConstitucional e Teoria daConstituição. 7. ed. 3. reimpr. Coimbra:Almedina.

–––––. Estudos sobre DireitosFundamentais. Coimbra: Coimbra, 2004.

CARVALHO, Dimas Messias; CARVALHO,Dimas Daniel. Direito das Sucessões:Inventário e Partilha. 3. ed. BeloHorizonte: Del Rey, 2012. v. VIII.

CARVALHO, Luiz Paulo Vieira de. Direito

Page 2393: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

das Sucessões. São Paulo: Atlas, 2014.

CARVALHO NETO, Inacio de. Curso deDireito Civil Brasileiro. Curitiba: Juruá,2006. v. I,

CAVALIERI FILHO, Sérgio. Programa deResponsabilidade Civil. 7. ed. SãoPaulo: Atlas, 2007.

CHALHUB, Melhim Namen. UsucapiãoAdministrativa. Disponível em:<http://www.melhimchalhub.com.br/noticia/detalhe/20Acesso em: 24 set. 2012.

COELHO, Fábio Ulhoa. Curso de DireitoComercial. 11. ed. São Paulo: Saraiva,2008. v. 2.

–––––. Curso de Direito Comercial. 15. ed.São Paulo: Saraiva, 2011. v. 2.

DELGADO, Mário Luiz. A Nova Redaçãodo § 6º do Art. 226 da CF/1988: Por Que

Page 2394: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

a Separação de Direito Continua aVigorar no Ordenamento JurídicoBrasileiro. Separação, divórcio,partilha e inventários extrajudiciais.Questionamentos sobre a Lei11.441/2007. 2. ed. Coord. AntonioCarlos Mathias Coltor e Mário LuizDelgado. São Paulo: Método, 2011.

DIAS, Maria Berenice. Manual de Direitodas Famílias. 4. ed. São Paulo: RT,2007.

–––––. Manual de Direito das Famílias. 5.ed. São Paulo: RT, 2009.

–––––. Manual de Direito das Famílias. 6.ed. São Paulo: RT, 2010.

–––––. Síndrome da Alienação Parental: OQue é Isso? Disponível em:<www.intelligentiajuridica.com.br>, anoIV, n. 64, out. 2006. Acesso em: 27 mar.

Page 2395: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

2007.

DIDIER JR., Fredie. A Participação dasPessoas Casadas no Processo. In:MAZZEI, Rodrigo Reis (coord.).Questões Processuais no Novo CódigoCivil. São Paulo: Manole, 2006.

–––––. Curso de Direito Processual. 8. ed.Salvador: Juspodivm, 2007. v. 1.

–––––. Editorial 45. Disponível em:<http://www.frediedidier.com.br/editorial/editorial-45/>. Acesso em: 24 jan. 2015.

–––––. Multa Coercitiva, Boa-fé Processuale Supressio: Aplicação do Duty toMitigate the Loss no Processo Civil.Revista de Processo, ano 34, 1. 171,maio 2009.

–––––. Regras Processuais no NovoCódigo Civil. São Paulo: Saraiva, 2004.

Page 2396: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

–––––; NOGUEIRA, Pedro HenriquePedrosa. Teoria dos Fatos JurídicosProcessuais. 2. ed. Salvador: Juspodivm,2013.

DÍEZ-PICAZO, Luís; DE LEÓN, Ponce. LaDoctrina de los Propios Actos.Barcelona: Bosch, 1963.

DINAMARCO, Cândido Rangel.Intervenção de Terceiros. São Paulo:Malheiros, 2006.

DINIZ, Maria Helena. Código CivilAnotado. 15. ed. São Paulo: Saraiva,2010.

–––––. Código Civil Anotado. 11. ed. SãoPaulo: Saraiva, 2005.

–––––. Conflito de Normas. São Paulo:Saraiva, 2003.

–––––. Curso de Direito Civil Brasileiro.

Page 2397: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

Teoria Geral do Direito Civil. 24. ed. SãoPaulo: Saraiva, 2007. v. 1.

–––––. Curso de Direito Civil Brasileiro.Direito das Coisas. 25. ed. São Paulo:Saraiva, 2010. v. 4.

–––––. Curso de Direito Civil Brasileiro.Direito de Família. 18. ed. São Paulo:Saraiva, 2003. v. 5.

–––––. Curso de Direito Civil Brasileiro.Direito de Família. 22. ed. São Paulo:Saraiva, 2007. v. 5.

–––––. Curso de Direito Civil Brasileiro.Direito das Sucessões. São Paulo:Saraiva, 2005, v. 6.

–––––. Curso de Direito Civil Brasileiro.Direito das Sucessões. 27. ed. SãoPaulo: Saraiva, 2013. v. 7.

–––––. Lei de Introdução ao Código Civil

Page 2398: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

Interpretada.8. ed. São Paulo: Saraiva,2001.

–––––. Manual de Direito Civil. São Paulo:Saraiva, 2011.

DUARTE, Nestor. Código CivilComentado. Coord. Ministro CezarPeluso. São Paulo: Manole, 2007.

DUARTE, Ronnie Preuss. A Cláusula Geralda Boa-Fé no novo Código CivilBrasileiro. In: DELGADO, Mário Luiz;ALVES, Jones Figueirêdo. QuestõesControvertidas no Novo Código Civil.São Paulo: Método, 2004. v. 2.

EHRHARDT JR., Marcos. Temos um Novotipo de Usucapião Criado pela Lei12.424/2011. Problemas à Vista.Disponível em:<http://www.marcosehrhardt.adv.br/index.php/blogAcesso em: 1.º jul. 2011.

Page 2399: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

ENGISCH, Karl. Introdução doPensamento Jurídico. 2. ed. Lisboa:Fundação Calouste Gulbenkian, 1964.

FACHIN, Luiz Edson. Direito Civil.Sentidos, Transformações e Fim. Rio deJaneiro: Renovar, 2014.

–––––. Estatuto Jurídico do PatrimônioMínimo. Rio de Janeiro: Renovar, 2001.

FARIAS, Cristiano Chaves; ROSENVALD,Nelson. Curso de Direito Civil. 3. ed.Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2006.

–––––; ROSENVALD, Nelson. Curso deDireito Civil. Reais. 8. ed. Salvador:JusPodivm, 2012. v. 5.

–––––; ROSENVALD, Nelson. DireitoCivil. Teoria Geral. 4. ed. Rio de Janeiro:Lumen Juris, 2006.

Page 2400: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

–––––; ROSENVALD, Nelson. Direito dasFamílias. Rio de Janeiro: Lumen Juris,2008.

FIGUEIRA JR., Joel Dias. Código CivilComentado. Coordenador: RicardoFiuza. 2. ed. São Paulo: Saraiva, 2004.

FRADERA, Vera Jacob. Pode o Credor serInstado a Diminuir o Próprio Prejuízo?Revista Trimestral de Direito Civil, Riode Janeiro: Padma, v. 19, 2004.

FRANÇA, Rubens Limongi. EnciclopédiaSaraiva de Direito. São Paulo: Saraiva,1977. v. 60.

–––––. Instituições de Direito Civil. 5. ed.São Paulo: Saraiva, 1999.

–––––. Princípios Gerais do Direito. 2. ed.São Paulo: RT, 1971.

GAGLIANO, Pablo Stolze. Controvérsias

Page 2401: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

Constitucionais Acerca do UsucapiãoColetivo. Jus Navigandi, ano 10, n.1.063, Teresina, 30 maio 2006.Disponível em:<http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=8318>. Acesso em: 21 jul. 2010.

–––––; PAMPLONA FILHO, Rodolfo.Novo Curso de Direito Civil. 4. ed. SãoPaulo: Saraiva, 2003. v. 1.

–––––; –––––. Novo Curso de DireitoCivil. Parte Geral. 6. ed. São Paulo:Saraiva, 2005. v. I.

–––––; –––––. Novo Curso de DireitoCivil. Parte Geral. 9. ed. São Paulo:Saraiva, 2007. v. I.

–––––; –––––. Novo Curso de DireitoCivil. São Paulo: Saraiva, 2003. v. II.

–––––; –––––. Novo Curso de Direito

Page 2402: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

Civil. Direito de Família. São Paulo:Saraiva, 2011. v. 6.

GARCIA, Leonardo de Medeiros. Direito doConsumidor. 3. ed. Niterói: Impetus,2007.

GODOY, Cláudio Luiz Bueno de. FunçãoSocial do Contrato. De acordo com oNovo Código Civil. Coleção Prof.Agostinho Alvim. São Paulo: Saraiva,2004.

GOMES, Orlando. Direito de Família. Riode Janeiro: Forense, 1978.

GONÇALVES, Carlos Roberto. Curso deDireito Civil Brasileiro. Direito dasCoisas. São Paulo: Saraiva, 2010. v. 5.

–––––. Direito Civil Brasileiro. Parte Geral.São Paulo: Saraiva, 2003. v. 1.

–––––. Direito Civil Brasileiro. Parte Geral.

Page 2403: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

12. ed. São Paulo: Saraiva, 2014. v. 1.

–––––. Direito Civil Brasileiro. Direito dasSucessões. 8. ed. São Paulo: Saraiva,2014. v. 7.

–––––. Prescrição: Questões Relevantes ePolêmicas. In: DELGADO, Mário Luiz;ALVES, Jones Figueirêdo. QuestõesControvertidas do Novo Código Civil.São Paulo: Método, 2003. v. I.

GRINOVER, Ada Pelegrini; WATANABE,Kazuo; LAGRASTA, Caetano (coord.).Mediação e Gerenciamento doProcesso. São Paulo: Atlas, 2007.

GUMERATO RAMOS, Glauco. Reforma doCPC 2. São Paulo: RT, 2007.

HIRONAKA, Giselda Maria FernandesNovaes; TARTUCE, Flávio; SIMÃO,José Fernando. O Código Civil de 2002 ea Constituição Federal: 5 Anos e 20

Page 2404: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

Anos. Os 20 Anos da Constituição daRepública Federativa do Brasil.Alexandre de Moraes (Coord.). SãoPaulo: Atlas, 2009.

ITABAIANA DE OLIVEIRA, ArthurVasco. Tratado de Direito dasSucessões. São Paulo: Max Limonad,1952. v. III.

LAGRASTA NETO, Caetano. CargaDinâmica da Prova. A Parte Vulnerável.In: LAGRASTA NETO, Caetano;TARTUCE, Flávio; SIMÃO, JoséFernando. Direito de Família. NovasTendências e JulgamentosEmblemáticos. 2. ed. São Paulo: Atlas,2012.

–––––. Inserção do nome do devedor dealimentos nos órgãos de proteção aocrédito. In: LAGRASTA NETO,Caetano; TARTUCE, Flávio; SIMÃO,

Page 2405: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

José Fernando. Direito de Família.Novas Tendências e JulgamentosEmblemáticos. São Paulo: Atlas, 2011.

LARENZ, Karl. Derecho Civil. ParteGeneral. Tradução e Notas de MiguelIzquierdo y Mácias-Picavea. Madrid:Editorial Revista de Derecho Privado,1978.

LEITE, Eduardo de Oliveira. Direito CivilAplicado. Direito de Família. São Paulo:RT, 2005. v. 5.

LIRA, Ricardo Pereira. Elementos deDireito Urbanístico. Rio de Janeiro:Renovar, 1997.

LISBOA, Roberto Senise. Comentários aoCódigo Civil. In: CAMILLO, CarlosEduardo Nicoletti; TALAVERA, GlauberMoreno; FUJITA, Jorge Shiguemitsu;SCAVONE JR., Luiz Antonio. São

Page 2406: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

Paulo: RT, 2006.

–––––. Responsabilidade Civil nasRelações de Consumo. São Paulo: RT,2001.

LÔBO, Paulo. Direito Civil. Famílias. SãoPaulo: Saraiva, 2008.

–––––. Direito Civil. Parte Geral. SãoPaulo: Saraiva, 2009.

–––––. Direito Civil. Sucessões. São Paulo:Saraiva, 2013.

–––––. Famílias. São Paulo: Saraiva, 2008.

LÔBO, Paulo Luiz Netto. Divórcio: AlteraçãoConstitucional e suas Consequências.Disponível em:<http://www.ibdfam.org.br/?artigos&artigo=570>. Acesso em: 12 fev.2010.

Page 2407: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

LORENZETTI, Ricardo Luís. Teoria daDecisão Judicial. Trad. BrunoMiragem, com notas e revisão deClaudia Lima Marques. São Paulo: RT,2009.

LOTUFO, Renan. Código CivilComentado. São Paulo: Saraiva, 2002. v.I.

LOUREIRO, Francisco Eduardo. CódigoCivil Comentado. Coordenador:Ministro Cezar Peluso. São Paulo:Manole, 2007.

MADALENO, Rolf. A União (Ins)Estável.Relações Paralelas. Disponível em:<http://www.flaviotartuce.adv.br/secoes/artigosc/Rolf_uniaoestavel.docAcesso em: 21 jun. 2010.

–––––. Curso de Direito de Família. Rio deJaneiro: Forense, 2008.

Page 2408: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

–––––. Direito de Família. AspectosPolêmicos. 2. ed. Porto Alegre: Livrariado Advogado, 1999.

MALUF, Carlos Alberto Dabus. CódigoCivil Comentado. 2. ed. Coordenador:Ricardo Fiuza. São Paulo: Saraiva, 2004.

MANCUSO, Rodolfo Camargo. A CoisaJulgada e sua Recepção no Código Civil.O Código Civil e suaInterdisciplinaridade: os Reflexos doCódigo Civil nos Demais Ramos doDireito. Belo Horizonte: Del Rey, 2004.

MARCATO, Antonio Carlos. ProcedimentosEspeciais. 8. ed. São Paulo: Malheiros,1999.

MARQUES, Benedito Ferreira. DireitoAgrário Brasileiro. 9. ed. São Paulo:Saraiva, 2011.

Page 2409: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

MARQUES, Claudia Lima. Comentários aoCódigo de Defesa do Consumidor.São Paulo: RT, 2003.

–––––. Comentários ao Código de Defesado Consumidor. 3. ed. São Paulo: RT,2010.

–––––. Manual de Direito do Consumidor.Coordenadores: Antonio Herman V.Benjamim, Claudia Lima Marques eLeonardo Roscoe Bessa. São Paulo: RT,2007.

–––––; BENJAMIM, Antonio Herman V.;MIRAGEM, Bruno. Comentários aoCódigo de Defesa do Consumidor.São Paulo: RT, 2003.

MARTINS-COSTA, Judith. A Boa-Fé noDireito Privado. São Paulo: RT, 1999.

–––––. O Novo Código Civil Brasileiro: Em

Page 2410: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

Busca da “Ética da Situação”. In:BRANCO, Gerson Luiz Carlos;MARTINS-COSTA, Judith. DiretrizesTeóricas do Novo Código Civilbrasileiro. São Paulo: Saraiva, 2002.

MAZZEI, Rodrigo Reis. A Prescrição e a suaPronúncia de Ofício. In: DELGADO,Mário Luiz; ALVES, Jones Figueirêdo.Questões Controvertidas no NovoCódigo Civil. São Paulo: Método, 2007.v. 6.

–––––. Direito de Superfície. Salvador:Juspodivm, 2013.

MAZZEI, Rodrigo Reis; CHAGAS, BárbaraSeccato Ruis. Breve Diálogo entre osNegócios Jurídicos Processuais eArbitragem. Revista de Processo. SãoPaulo: RT, v. 39, n. 237, nov. 2014.

MELLO, Marcos Bernardes de. Teoria do

Page 2411: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

Fato Jurídico. Plano da Existência. 7.ed. São Paulo: Saraiva, 1995.

MELO, Marco Aurélio Bezerra de. NovoCódigo Civil Anotado. 3. ed. rev., ampl.e atual. Rio de Janeiro: Lumen Juris,2004.

MENEZES CORDEIRO, António Manuel daRocha e. Da Boa-Fé no Direito Civil.Coimbra: Almedina, 2001.

MENGER, Antonio. El Derecho Civil y losPobres. Tradução de Adolfo Posada.Madrid: Librería General de VictorianoSuárez, 1898.

MONTEIRO, Washington de Barros. Cursode Direito Civil Brasileiro. Direito dasCoisas. 37. ed. atual. por Carlos AlbertoDabus Maluf. São Paulo: Saraiva, 2003.v. 3.

Page 2412: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

–––––. Curso de Direito Civil. Direito dasObrigações. 2ª Parte. 9. ed. São Paulo:Saraiva, 1973.

MONTEIRO DE BARROS, Flávio Augusto.Manual de Direito Civil. Direito deFamília e das Sucessões. São Paulo:Método, 2005. v. 4.

MORAES, Maria Celina Bodin de. Recusa àRealização do Exame de DNA naInvestigação de Paternidade e Direitosda Personalidade. In: BARRETO,Vicente. A Nova Família: Problemas ePerspectivas. Rio de Janeiro: Renovar,1997.

–––––; BARBOZA, Heloísa Helena.Código Civil Interpretado. Rio deJaneiro: Renovar, 2003. v. 1.

MOREIRA, Eduardo Ribeiro.Neoconstitucionalismo – A Invasão daConstituição.São Paulo: Método, 2008.

Page 2413: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

v. 7. Coleção Professor Gilmar Mendes.

MOREIRA ALVES, José Carlos. A ParteGeral do Projeto de Código CivilBrasileiro. 2. ed. São Paulo: Saraiva,2003.

MOREIRA ALVES, Leonardo Barreto. OMinistério Público nas Ações deSeparação e Divórcio. Revista DEJURE – Ministério Público de MinasGerais. Disponível em:<https://aplicacao.mpmg.mp.br/xmlui/bitstream/handle/123456789/242/ensaio%20sobre%20a%20efetividade_Diniz.pdf?sequence=1>. Acesso em: 23 dez. 2014.NEGRÃO, Theotonio. Código deProcesso Civil. 37. ed. São Paulo:Saraiva, 2005.

–––––; GOUVÊA, José Roberto F. CódigoCivil Anotado. 26. ed. São Paulo:Saraiva, 2007.

NERY JR., Nelson; NERY, Rosa Maria de

Page 2414: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

Andrade. Código Civil Anotado. 2. ed.São Paulo: RT, 2003.

–––––;–––––. Código Civil Comentado. 3.ed. São Paulo: RT, 2003.

–––––; –––––. Código Civil Comentado. 3.ed. São Paulo: RT, 2005.

–––––; –––––. Código de Processo CivilComentado e LegislaçãoExtravagante. 9. ed. São Paulo: RT,2006.

–––––; –––––. Código de Processo CivilComentado e LegislaçãoExtravagante. 10. ed. São Paulo: RT,2008.

NICOLAU, Gustavo Rene. Desconsideraçãoda Personalidade Jurídica. In:CANEZIN, Claudete Carvalho. ArteJurídica. Curitiba: Juruá, 2006. v. III.

Page 2415: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

NOGUEIRA, Pedro Henrique Pedrosa.Negócios Jurídicos Processuais.Análise dos Provimentos Judiciais comoAtos Negociais. 2011. Dissertação deMestrado – Universidade Federal daBahia. Disponível em:<https://repositorio.ufba.br/ri/bitstream/ri/10743/1/Pedro%20Henrique.pdfAcesso em: 22 jan. 2015.

NORONHA, Fernando. Direito dasObrigações. São Paulo: Saraiva, 2003.v. 1.

OLIVEIRA, Euclides de. Alteração doRegime de Bens no Casamento. In:DELGADO, Mário Luiz; ALVES, JonesFigueirêdo (Coords.). QuestõesControvertidas no Novo Código Civil.São Paulo: Método, 2003. v. 1.

–––––. Decisão Comentada. MinistérioPúblico na Interdição. RevistaBrasileira de Direito das Famílias e

Page 2416: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

das Sucessões, Porto Alegre: IBDFAM-Magister, n. 00, out.-nov. 2007.

–––––. União Estável – Do Concubinato aoCasamento. 6. ed. São Paulo: Método,2003.

PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituiçõesde Direito Civil. 19. ed. Rio de Janeiro:Forense, 2003. v. I.

–––––. Instituições de Direito Civil. Direitode Família. Atualizado por Tânia da SilvaPereira. São Paulo: Forense, 2012. v. V.

PEREIRA, Rodrigo da Cunha. Comentáriosao Novo Código Civil. Coordenação:Sálvio de Figueiredo Teixeira. Rio deJaneiro: Forense, 2003. v. XX.

–––––. Divórcio. Teoria e Prática. Rio deJaneiro: GZ, 2010.

PERLINGIERI, Pietro. Perfis do Direito

Page 2417: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

Civil. Introdução ao Direito CivilConstitucional. 2. ed. Trad. MariaCristina De Cicco. Rio de Janeiro:Renovar, 2002.

PODESTÁ, Fábio Henrique. Código deDefesa do Consumidor Comentado.São Paulo: RT, 2010.

PONTES DE MIRANDA, FranciscoCavalcanti. Tratado de DireitoPrivado.4. ed. São Paulo: RT, 1974. t. II,III, IV e V.

REALE, Miguel. Lições Preliminares deDireito. 21. ed. São Paulo: Saraiva,1994.

–––––. Teoria Tridimensional do Direito.Situação atual. 5. ed. 5. tir. São Paulo:Saraiva, 2003.

–––––. Um Artigo-Chave do Código Civil.História do Novo Código Civil.

Page 2418: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

Biblioteca de Direito Civil. Estudos emHomenagem ao Professor Miguel Reale.São Paulo: RT, 2005. v. 1.

RODRIGUES, Sílvio. Direito Civil. ParteGeral. 24. ed. São Paulo: Saraiva, 1994.v. 1.

–––––. Direito Civil. Parte Geral. SãoPaulo: Saraiva, 2002. v. 1.

–––––. Direito Civil. Direito de Família. 28.ed. 3. tir. São Paulo: Saraiva, 2004. v. 6.

SANTOS, Antonio Jeová. DireitoIntertemporal e o Novo Código Civil.São Paulo: Saraiva, 2003.

SANTOS, Luiz Felipe Brasil. Emenda doDivórcio: Cedo para Comemorar.Disponível em:<http://www.ibdfam.org.br/?artigos&artigo=648>. Acesso em: 15dez. 2010.

Page 2419: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

SARMENTO, Daniel. DireitosFundamentais e Relações Privadas.Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2004.

SCHREIBER, Anderson. A Proibição deComportamento Contraditório. Tutelada confiança e venire contra factumproprium. 2. ed. Rio de Janeiro:Renovar, 2007.

–––––. A Proibição do ComportamentoContraditório. Tutela de Confiança eVenire Contra Factum Proprium. Riode Janeiro: Renovar, 2005.

–––––. Direitos da Personalidade. SãoPaulo: Atlas, 2011.

SCHÜTZER DEL NERO, João Alberto.Conversão Substancial do NegócioJurídico. Rio de Janeiro: Renovar, 2001.

SILVA, Ovídio Baptista A. da. Comentários

Page 2420: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

ao Código de Processo Civil. 2. ed.São Paulo: RT, 2005. v. 1.

SILVA, Regina Beatriz Tavares da.Comentário ao Art. 1.567 do CódigoCivil de 2002. In: FIUZA, Ricardo. NovoCódigo Civil Comentado. 3. ed. SãoPaulo: Saraiva, 2004.

SIMÃO, José Fernando. A PEC do Divórcio:A Revolução do Século em Matéria deDireito de Família. Disponível em:<http://www.ibdfam.org.br/?artigos&artigo=652>. Acesso em: 19nov. 2010.

–––––. Direito Civil. Contratos.3. ed. SãoPaulo: Atlas, 2008. Série LeiturasJurídicas.

–––––. Efeitos Patrimoniais da UniãoEstável. In: CHINELLATO, SilmaraJuny de Abreu; SIMÃO, José Fernando;FUJITA, Jorge Shiguemitsu; ZUCCHI,

Page 2421: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

Maria Cristina. Direito de Família noNovo Milênio. Estudos em Homenagemao Professor Álvaro Villaça Azevedo.São Paulo: Atlas, 2010.

–––––. Prescrição e sua Alegação – Lei11.280 e a Revogação do Art. 194 doCódigo Civil. Jornal Carta Forense,São Paulo, n. 34, abr. 2006.

–––––. Tempo e Direito Civil. Prescrição edecadência. Tese de Livre-Docência emDireito Civil – Faculdade de Direito daUSP, São Paulo, 2011.

STRECK, Lênio Luiz. Ponderação deNormas no novo CPC? É o Caos.Presidente Dilma, por favor, Veta!.Coluna Senso Incomum. ConsultorJurídico. Publicada em 8 de janeiro de2015. Disponível em:<http://www.conjur.com.br/2015-jan-08/senso-incomum-ponderacao-normas-

Page 2422: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

cpc-caos-dilma-favor-veta>. Acesso em:24 jan. 2015.

–––––. Por Que é Inconstitucional“Repristinar” a Separação Judicial noBrasil. Disponível em:<http://www.conjur.com.br/2014-nov-18/lenio-streck-inconstitucional-repristinar-separacao-judicial>. Acessoem: 21 dez. 2014.

TARTUCE, Fernanda. Gratuidade emDivórcio e Inventário Extrajudiciais. In:REGIS, Mario Luiz Delgado; COLTRO,Antonio Carlos Mathias (Org.).Separação, Divórcio, Partilhas eInventários Extrajudiciais. 2. ed. Riode Janeiro: Forense, 2010. v. 1.

–––––. Meios de Prova no Código deProcesso Civil e no Código Civil. In:TARTUCE, Flávio; CASTILHO,Ricardo. Direito Civil. DireitoPatrimonial. Direito Existencial. São

Page 2423: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

Paulo: Método, 2006.

–––––. Processo Civil Aplicado ao Direitode Família. São Paulo: Método, 2012.

–––––. Prova nos Processos de Família e noProjeto do CPC: Ônus da Prova, ProvasIlícitas e Ata Notarial. Revista Nacionalde Direito de Família e SucessõesPorto Alegre: Lex Magister, n. 2, set.-out. 2014.

–––––; MAZZEI, Rodrigo Reis. Inventário ePartilha no Projeto de Novo CPC:Pontos de Destaque na Relação entre osDireitos Material e Processual. RevistaNacional de Direito de Família eSucessões, Porto Alegre: Lex Magister,n. 1, jul.-ago. 2014.

–––––; TARTUCE, Flávio. Lei nº11.441/2007. Jus Navigandi, Teresina,ano 12, n. 1478, 19 jul. 2007. Disponível

Page 2424: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

em: <http://jus.com.br/artigos/10168>.Acesso em: 26 jan. 2015.

TARTUCE, Flávio. Considerações sobre oAbuso de Direito ou Ato Emulativo Civil.In: DELGADO, Mário Luiz; ALVES,Jones Figueirêdo. QuestõesControvertidas no Novo Código Civil.São Paulo: Método, 2004. v. 2.

–––––. Direito Civil. Lei de Introdução eParte Geral. 11. ed. São Paulo: Método,2015. v. 1.

–––––. Direito Civil. Direito das Obrigaçõese Responsabilidade Civil. 10. ed. SãoPaulo: Método, 2015. v. 2.

–––––. Direito Civil. Teoria Geral dosContratos e Contratos em Espécie. 10.ed. São Paulo: Método, 2015. v. 3.

–––––. Direito Civil. Direito das Coisas. 7.

Page 2425: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

ed. São Paulo: Método, 2015. v. 4.

–––––. Direito Civil. Direito de Família. 9.ed. São Paulo: Método, 2014. v. 5.

–––––. Direito Civil. Direito de Família. 10.ed. São Paulo: Método, 2015. v. 5.

–––––. Direito Civil. Direito das Sucessões.8. ed. São Paulo: Método, 2015. v. 6.

–––––. Manual de Direito Civil. VolumeÚnico. 5. ed. São Paulo: Método, 2015.

–––––. Separados pelo Casamento. UmEnsaio sobre o Concubinato, aSeparação de Fato e a União Estável.Revista Brasileira de Direito dasFamílias e Sucessões. Porto Alegre:Magister, n. 08, fev.-mar. 2009.

–––––; ASSUMPÇÃO NEVES, DanielAmorim. Manual de Direito doConsumidor. Direito Material e

Page 2426: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

Processual. 4. ed. São Paulo: Método,2015.

–––––; SIMÃO, José Fernando. DireitoCivil. Direito de Família. 4. ed. SãoPaulo: Método, 2010. v. 5.

–––––; –––––. Direito Civil. Direito dasSucessões. 6. ed. São Paulo: Método,2013. v. 6.

–––––; –––––. Direito Civil. Direito dasSucessões. 3. ed. São Paulo: Método,2010. v. 6.

TAVARES DA SILVA, Regina Beatriz. AEmenda Constitucional do Divórcio.São Paulo: Saraiva, 2011.

TEPEDINO, Gustavo. NormasConstitucionais e Relações de DireitoCivil na Experiência Brasileira. Temas dedireito civil. Rio de Janeiro: Renovar,

Page 2427: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

2005. t. II.

–––––. Premissas Metodológicas para aConstitucionalização do Direito Civil.Temas de direito civil. Rio de Janeiro:Renovar, 2004.

–––––; BARBOSA, Heloísa Helena;MORAES, Maria Celina Bodin de.Código Civil Interpretado. Rio deJaneiro: Renovar, 2004. v. I.

–––––; –––––; –––––. Código CivilInterpretado. Rio de Janeiro: Renovar,2014. v. IV.

THEODORO JR., Humberto. Comentáriosao Novo Código Civil. Coordenação deSálvio de Figueiredo Teixeira. Rio deJaneiro: Forense, 2003. t. I, v. III.

–––––. Curso de Direito Processual Civil.32. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2004. v.III.

Page 2428: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

–––––. Fraude Contra Credores. BeloHorizonte: Del Rey, 2001.

–––––; NUNES, Dierle; BAHIA, AlexandreMelo Franco; PEDRON, FlávioQuinaud. Novo CPC. Fundamentos eSistematização. Rio de Janeiro: Forense,2015.

VELOSO, Zeno. Código Civil Comentado.6. ed. Coordenação de Ricardo Fiuza eRegina Beatriz Tavares da Silva. SãoPaulo: Saraiva, 2008.

–––––. Código Civil Comentado. 8. ed.Coordenação de Ricardo Fiuza e ReginaBeatriz Tavares da Silva. São Paulo:Saraiva, 2012.

–––––. Comentários ao Código Civil. SãoPaulo: Saraiva, 2003. v. 21.

–––––. Direito Hereditário do Cônjuge e

Page 2429: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

do Companheiro. São Paulo: Saraiva,2010.

–––––. Invalidade do Negócio Jurídico. 2.ed. Belo Horizonte: Del Rey, 2005.

–––––. O Novo Divórcio e o que Restou doPassado. Disponível em:<http://www.ibdfam.org.br/?artigos&artigo=661>. Acesso em: 14ago. 2010.

VENOSA, Sílvio. Código Civil Comentado.Coordenador: Álvaro Villaça Azevedo.São Paulo: Atlas, 2003. v. XII.

–––––. Código Civil Interpretado. SãoPaulo: Atlas, 2010.

–––––. Direito Civil. Parte Geral. 3. ed. SãoPaulo: Atlas, 2003. v. 1.

–––––. Direito Civil. Parte Geral. 4. ed. SãoPaulo: Atlas, 2004. v. 1.

Page 2430: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

–––––. Direito Civil. Contratos em Espécie.12. ed. São Paulo: Atlas, 2012. v. 4.

–––––. Direito Civil. Direitos Reais. 5. ed.São Paulo: Atlas, 2005. v. 5.

–––––. Direito Civil. Teoria Geral do DireitoCivil. 5. ed. São Paulo: Atlas, 2005. v. 1.

VILLELA, João Baptista. Emenda doDivórcio. Outras Impressões. JornalCarta Forense. Disponível em:<http://www.cartaforense.com.br/Materia.aspx?id=6075>. Acesso em: 15 dez. 2010.

YARSHELL, Flávio Luiz. A Interrupção daPrescrição pela Citação: Confronto entreo Novo Código Civil e o Código deProcesso Civil. Síntese Jornal, PortoAlegre: Síntese, n. 75, maio 2003.

ZANETTI, Cristiano de Souza.Responsabilidade pela Ruptura das

Page 2431: O Novo CPC e o Direito Civil - - Flavio Tartuce

Negociações. São Paulo: Juarez deOliveira, 2005.

ZANETTI, Paulo Rogério. Flexibilizaçãodas Regras sobre o Ônus da Prova.São Paulo: Malheiros, 2001.