o neodesenvolvimentismo no brasil e os impactos as politicas sociais

Upload: profxavierjr

Post on 08-Mar-2016

11 views

Category:

Documents


0 download

DESCRIPTION

Sistema prisional brasileiro.

TRANSCRIPT

  • O NEODESENVOLVIMENTISMO NO BRASIL E OS IMPACTOS S POLTICAS SOCIAIS

    Eriberto Jos Lessa de Moura 1

    RESUMO Na contemporaneidade, no debate brasileiro, no que se refere a questo social, surgem novas propostas contrrias ao neoliberalismo. E dentre elas, abordaremos, o neodesenvolvimentismo como resposta a crise estrutural do capital propondo hoje uma agenda diferente para as demandas da reproduo da sociedade capitalista. Seria um crescimento econmico com o desenvolvimento social. Com essa configurao, torna-se um modelo de desenvolvimento adotado no Brasil nos governos de Lula da Silva e Dilma Rousseff. Em sntese, torna-se uma falsa alternativa, pois no resolve os problemas estruturais da sociedade capitalista, muito menos atende as condies de trabalho e de reproduo social dos trabalhadores. Palavras-chave: Neodesenvolvimentismo. Poltica social e reproduo do capital. ABSTRACT

    In contemporary times, the Brazilian debate, regarding the "social question", there are new proposals against neoliberalism. And among them, discuss, the neo-developmentism in response to structural crisis of capital today proposing an agenda "different" to the demands of the reproduction of capitalist society. It would be economic growth with social development. With this configuration, it is a development model adopted in Brazil in Lula's governments and Dilma Rousseff. In short, it is a false alternative because it does not solve the structural problems of capitalist society, let alone meet the working conditions and social reproduction of workers. Keywords: Neo-developmentism. Social policy and reproduction of capital.

    1 Estudante de Ps-Graduao. Universidade Federal de Alagoas (UFAL). E-mail:

    [email protected]

  • INTRODUO

    O debate atual sobre o Estado e as polticas pblicas requer considerar vrias

    questes. Dentre elas, destacamos a maior problemtica do sistema capitalista: a crise

    estrutural que afeta o cerne do metabolismo do capital (esferas da produo, circulao e

    consumo) e suas consequncias materiais/ sociais, marcada pela concentrao de capital e

    descentralizao da produo, um processo que vem se desenvolvendo desde o fim dos

    anos gloriosos do Welfare State, em que predominava, nos pases centrais, crescimento

    econmico, pleno emprego e proteo social2. Esse momento de crise estrutural, nas

    palavras de Maranho (2004, p. 42 apud Mota, 2010, p.16): mobiliza a interveno do

    Estado e das organizaes financeiras internacionais3 na tentativa de equacion-la. Para

    Paniago (2014), de modo similar, os gestores capitalistas procuram conduzir medidas com o

    objetivo de sanear essa crise do sistema do capital.

    Esses gestores, nas dcadas de 1980 e 1990 creditam e reorientam polticas

    econmicas objetivando retomar o aumento da produo e acumulao capitalista. Para

    tanto, o Estado apresenta-se como instrumento importante para o alcance de tal ofensiva do

    capital e consequentemente com isso afeta as polticas pblicas e sociais. Essa reao do

    capital direcionada pela esfera financeira.

    No campo ideolgico o velho liberalismo se apresenta ento com uma nova

    configurao: o neoliberalismo.

    Na contemporaneidade, no debate brasileiro, no que se refere a questo social,

    surgem novas propostas contrrias ao neoliberalismo. E dentre elas, abordaremos, nesse

    artigo, o debate sobre o tema do neodesenvolvimentismo4, pois na atualidade os gestores

    retomam a proposta do desenvolvimento posto nas dcadas de 1960, propondo hoje uma

    agenda diferente para as demandas da reproduo da sociedade capitalista, mas, mais

    uma vez, sem realizar as conexes com os direitos materializados em polticas sociais.

    Crise do sistema capitalista e o Neoliberalismo

    2 Mszros (2002) compreende que a crise estrutural difere das anteriores, pois apresenta quatro elementos que a peculiariza: 1. O carter no restrito a uma determinada esfera da economia; 2. A amplitude global de abrangncia; 3. O carter no dramtico da queda na produo, mas determinado por um crescimento dbil e rastejante e; 4. A continuidade/extenso de seu tempo. 3FMI (Fundo Monetrio Internacional), BIRD (Banco Internacional para Reconstruo e Desenvolvimento), BIS (Banco de Compensao Internacionais), BID (Banco Interamericano de Desenvolvimento), entre outros. 4 Apropriamos-nos do termo neodesenvolvimentismo, apresentado nas anlises crticas de: CASTELO, 2010; MOTA, 2010; 2012, GONALVES, 2012 e BOITO, 2014. Ao contrrio disto, Bresser-Pereira e seus seguidores que afirmam os pressupostos liberais, utilizam o termo Novo desenvolvimentismo.

  • Nesse contexto da crise estrutural do sistema capitalista tem-se observado

    mudanas nas esferas sociais, poltica e econmica no Brasil e na Amrica Latina. Efetivas

    alteraes vm ocorrendo a partir das dcadas de 1970 e 1980, afetando os processos de

    produo e acumulao capitalista, pois nesses pases so identificadas quedas

    significativas das taxas de lucratividade na produo industrial. Segundo Mandel (1982), as

    flutuaes das taxas de lucro resultam em ondas longas com tonalidades expansiva e/ou de

    estagnao na tenso entre superacumulao, crise e depresso. Nas palavras do autor,

    Num perodo de oscilao ascendente, h um acrscimo tanto na massa quanto na taxa de lucros, e um aumento tanto no volume quanto no ritmo de acumulao. Ao contrrio, numa crise e no perodo subsequente de depresso, a massa e a taxa de lucros declinaro, e o mesmo acontecer ao volume e ao ritmo da acumulao de capital. O ciclo econmico consiste, assim, na acelerao e desacelerao sucessivas da acumulao (MANDEL, 1982, p. 75).

    Conforme o autor acima citado, no ncleo mais duro da crise estrutural se

    encontra a incapacidade do capital em superar seus efeitos e de conseguir retomar seus

    ciclos expansivos longos. E isto ocorre quando h um esgotamento do padro fordista-

    keynesiano e do Estado de Bem-Estar Social, expresso poltica e econmica

    compreendida como o nico ordenamento sociopoltico, que na ordem do capital, visou

    expressamente compatibilizar a dinmica da acumulao capitalista com a garantia de

    direitos polticos e sociais mnimos (NETTO, 2012, p.75). Assim, o esgotamento desse

    modelo que oportunizava a generalizao, a universalizao das polticas sociais

    propiciadas pela onda longa expansiva do capital perde sua sustentabilidade e, desse modo,

    vai sendo questionado e criticado pelo discurso neoliberal.

    Behring (2003) afirma que o Estado de Bem-Estar Social, entre outros avanos

    conquistados no sculo XX, passou a ser considerado pelo discurso neoliberal um

    problema, quando as taxas de crescimento comeam a decrescer e as dvidas pblicas e

    privadas crescem aceleradamente. Segundo a tica neoliberal, foram os gastos generosos

    do Estado de Bem Estar que causaram os dficits fiscais dos pases que os adotaram,

    fomentando assim uma concepo de Estado paternalista. Assim, recomendado para a

    soluo da problemtica social - a reduo dos gastos pblicos do Estado atravs do

    desenvolvimento de polticas focalizadas para a pobreza.

    , a partir dos anos de 1980, que o capital especulativo se desenvolve

    assustadoramente para enfrentar a crise estrutural e elevar acumulao, com isso, afeta

    as condies de trabalho e de vida dos trabalhadores mundialmente, principalmente com o

    advento do neoliberalismo. O neoliberalismo surge como uma nova ideologia

  • contrarrevolucionria que, na tentativa de anular alguns avanos sociais alcanados ao

    longo dos ltimos 50 anos, afeta o conjunto das relaes sociais. Nos anos de 1980, nas

    palavras de Castelo (2010, p. 21) o objetivo do neoliberalismo era se apresentar como uma

    alternativa ao esgotamento do modelo de industrializao por substituio de importaes e

    da ideologia desenvolvimentista, prometendo acabar com a crise da dvida externa e a alta

    inflao.

    Lembramos que o desenvolvimentismo seria a ideologia da superao do

    subdesenvolvimento atravs de uma industrializao capitalista. Conforme Bielschowsky

    (2000) o projeto desenvolvimentista defendia os seguintes elementos: a) A industrializao

    integral, [que] seria a via de superao da pobreza e do subdsenvolvimento; b) Para

    conquistar uma industrializao eficiente e racional no Brasil seria necessrio partir de um

    planejamento estatal, no a deixando sob o controle das foras espontneas de mercado; c)

    O planejamento deveria definir a expanso desejada dos setores econmicos e os

    instrumentos de promoo dessa expanso; e d) O Estado deveria ordenar tambm a

    execuo da expanso, captando e orientando recursos financeiros, e promovendo

    investimentos diretos naqueles setores em que a iniciativa privada seja insuficiente.

    O foco de combate do neoliberalismo aos pontos fundamentais acima

    advogados pela teoria desenvolvimentista encontra-se na funo do Estado. Assim, para a

    teoria neoliberal seu pressuposto principal est no Estado Mnimo. Isso significa que o

    Estado deveria diminuir seus gastos sociais, sua interveno econmica na dinmica do

    desenvolvimento capitalista e manter sua ao de controle sobre os movimentos sociais e

    sindicatos que reagissem ao novo preceito poltico.

    Os seguidores do neoliberalismo passam a desenvolver diversas iniciativas para

    legitim-lo socialmente. E para tanto se empenham, sob o influxo de suas ideias, criar um

    movimento de contrarreforma favorecendo os espaos para a produo de superlucros

    atravs de prticas ideolgicas tanto nos pases centrais quanto nos pases perifricos

    (MOTA, 2010). A ofensiva neoliberal utiliza-se do seguinte pressuposto: reduzir liberdade a

    liberalismo e a identific-lo com democracia. Sua essncia seria uma argumentao terica

    que restaura o mercado como instncia mediadora societal elementar e insupervel e uma

    proposio poltica que repe o Estado mnimo como nica alternativa e forma para a

    democracia (NETTO, 2012, p. 84).

    Nesse perodo os governos do Brasil, Argentina, Mxico e Colmbia, por

    exemplo, seguiram as medidas preconizadas pelo Consenso de Washington (taxas de juros

    elevada, equilbrio fiscal, privatizao das empresas pblicas, reduo dos gastos sociais,

    liberalizao financeira e comercial e a garantia dos direitos de propriedade). Medidas essas

    como condio dos organismos internacionais (como exemplos: Banco Mundial e FMI) para

  • conceder cooperao financeira externa, bilateral ou multilateral. Conforme Batista (1994)5,

    os governos desses pases operavam na perspectiva de que tudo passaria, parecia que as

    classes dirigentes latino-americanas tiveram, espontaneamente, apreendido que a grave

    crise econmica que enfrentavam no tinha razes externas como - os preos exorbitantes

    do petrleo, as taxas internacionais de juros elevadas, a deteriorao dos intercmbios

    internacionais de produtos , ou seja, como se resultasse apenas de fatores internos, s

    equivocadas polticas nacionalistas que adotavam e s formas autoritrias de governo que

    praticavam. Assim, a soluo residiria em reformas neoliberais apresentadas como

    propostas modernizadoras, contra o anacronismo de nossas estruturas econmicas e

    polticas.

    Diante do esgotamento dessa proposta neoliberal apresentam-se na Amrica

    Latina e no Brasil, na dcada de 1990, programas voltados para o crescimento econmico

    com o desenvolvimento social, porm, no puderam fugir do movimento de

    internacionalizao da economia, incorporando-se dinmica mais geral dos processos

    especulativos (MOTA, 2010, p. 155). Na atualidade, o neodesenvolvimentismo se configura

    nessa proposta de desenvolvimento que supe romper com a proposta neoliberal.

    Assim, o neodesenvolvimentismo se expressa perante a crise neoliberal, iniciada

    nos anos 2000. uma crise econmica e poltica, que se desdobra em diversas crises. O

    neodesenvolvimentismo surge como uma ideologia no Brasil com as formulaes de

    Bresser Pereira6, ento ministro de Fernando Henrique Cardoso. Constitudo sob os

    alicerces da teoria da CEPAL7, segundo Gonalves (2012), o neodesenvolvimentismo tem

    seu arcabouo terico baseado na avaliao dos equvocos do nacional-

    desenvolvimentismo. Torna-se o vetor crtico do Consenso de Washington, sendo que a

    sua diretriz estratgica o crescimento econmico com menor desigualdade, maior

    eficincia das instituies do governo e maior eficincia dos mercados em que o foco as

    polticas macroeconmicas. Com essa configurao, torna-se um modelo de

    desenvolvimento adotado no Brasil nos governos de Lula da Silva e retoma a questo

    central do pensamento ideolgico, criado na Amrica Latina nos anos de 1930, que vai

    5 Ver: Batista, Paulo Nogueira. (1994). O Consenso de Washington: a viso neoliberal dos problemas latino-americanos. Disponvel em: www.fau.usp.br/cursos/graduao/arq_urbanismo/disciplinas/aup0270/4dossie/nogueira94/nog94-cons-washn.pdf. 6 Ver. Bresser-Pereira (1994). O Novo Desenvolvimentismo. Disponvel em http://www.bresserpereira.org.br/view.asp?cod=1454, acesso em 20 de Setembro de 2014. 7 A CEPAL (Comisso Econmica para Amrica Latina) propunha que a industrializao apoiada pela ao do Estado seria a forma bsica de superao do subdesenvolvimento latino-americano. A presena de uma industrializao dinmica (sendo a principal responsvel pela absoro de mo de obra e pela difuso e gerao do progresso tcnico) daria impulso necessrio para uma produtividade maior elevando com isso a renda evitando tambm a transferncia dos ganhos de produtividade para os pases industrializados (COLISTETE, 2001).

  • ganhar fora nos anos de 1950: como superar o subdesenvolvimento? Adiantamos aqui que

    no se trata de uma repetio do desenvolvimentismo nacional dos anos de 1960, mas de

    uma defesa de um desenvolvimento autossustentvel desde o ponto de vista econmico e

    social (MOTA, 2010, p. 155).

    Um grupo de intelectuais8, baseados numa suposta elevao das taxas de

    crescimento e perante a crise da ofensiva neoliberal, defendem o surgimento de uma nova

    etapa de desenvolvimento/avano para o pas sugerindo com isso que o Brasil tem passado

    nos ltimos anos uma nova fase no modelo de desenvolvimento capitalista e equidade

    social. Respeitando as diferenas entre os estudiosos foram identificadas caractersticas

    semelhantes entre os mesmos como: 1. A defesa da autonomia e da soberania nacionais, e

    a industrializao como instrumento de superao das barreiras ao desenvolvimento da

    periferia; 2. O Estado sendo um grande agente estratgico promotor de polticas de

    planejamento e bem-estar-social e; 3. A importncia da presena de pensadores inteligentes

    presentes nos postos chaves do Estado. Objetivava-se com um determinado padro de

    interveno do Estado na economia e na questo social, [...] A reduo da incerteza

    inerente s economias capitalistas (CASTELO, 2010, p. 194).

    A questo principal, colocada em tela pelo neodesenvolvimentismo, que para

    ter uma economia de mercado forte necessria a presena de um Estado forte

    atuando/regulando o mercado, as atividades econmicas. Para os neodesenvolvimentistas a

    reduo das desigualdades sociais passa pelo 1. Controle de capital; 2. Expanso do gasto

    pblico; 3. Cmbio fixo e reduo das taxas de juros e; 4. A promoo da equidade social

    (CASTELO, 2010). Considerando que essas medidas so dependentes de um crescimento

    econmico anual com taxas de juros acima de 5%, os neodesenvolvimentistas defendem,

    conforme expe o autor, a seguinte posio:

    O Estado deve garantir condies macroeconmicas e salvaguardas jurdicas que reduzem a incerteza do ambiente econmico, propiciando um horizonte mais previsvel do clculo de risco do investimento privado e aumentando, por sua vez, a demanda por fatores de produo, o emprego e os ganhos dos trabalhadores. Assim o Brasil reduzir a pobreza e a desigualdade social (CASTELO, 2010, p. 197).

    Para o neodesenvolvimentismo, segundo Castelo (2010), o Estado tem a funo

    de ser um complemento do mercado e, ao mesmo tempo, promotor do bem-estar universal

    8 Conforme Mattei (2011, apud Peroni e Caetano, 2012, p. 04), trs grupos discutem o neodesenvolvimentismo brasileiro: o primeiro liderado por Bresser Pereira, o segundo o grupo de pesquisa sobre Moeda e Sistemas Financeiros, vinculado ao Instituto de economia da UFRJ e o terceiro vinculado ao Instituto de Pesquisa Econmica Aplicada, (IPEA) e foi liderado pelo ento presidente do Instituto Marcio Pochmann.

  • sendo uma instituio com posies acima dos interesses particulares e das classes sociais,

    sendo, portanto, o conciliador entre capital e trabalho.

    Na verdade, segundo o autor acima citado, a atuao desse Estado visa, to

    somente, fortalecer os interesses dominantes sob a hegemonia burguesa industrial. Assim,

    o Estado explicita sua verdadeira funo na contemporaneidade: atuar em favor do capital/

    burguesia rentista.

    Destacamos tambm a existncia de um equvoco na anlise realizada pelos

    neodesenvolvimentistas, quando afirmam a existncia de um embate entre a burguesia

    rentista (setores financistas) e a burguesia produtiva (setores industriais), como se

    houvesse uma separao/ uma contradio entre elas. Isso no ocorre, pois como afirma

    Castelo (2010, p. 200) cada vez mais os grandes oligoplios e monoplios transnacionais

    produtivos operam segundo a lgica da financeirizao, [tornando-se] o padro sistmico de

    gesto da riqueza capitalista. Outro elemento problemtico encontrado na teoria

    neodesenvolvimentista seria o significado de equidade social, pois, segundo os

    neodesenvolvimentistas, as desigualdades sociais estariam sublinhadas pela naturalizao

    das relaes econmicas capitalistas e que a promoo da igualdade de oportunidades

    seria conseguida pela mediao da educao na competio eterna entre os indivduos no

    mercado de trabalho. Assim, os aspectos sociais so tratados como aspectos secundrios,

    sendo que a interveno sobre a questo social, proposta pela poltica econmica,

    funcionaria para neutralizar opositores, direita e esquerda, pacificando as tenses

    sociais (CASTELO, 2010).

    Lembramos que ao analisarmos o governo de Lula da Silva prevalece, em seu

    interior, um discurso ideolgico, formal-abstrato, que d nfase ao crescimento econmico,

    a ampliao e formalizao do emprego e da interveno do Estado como aspectos

    decisivos que combateriam medidas de cunho neoliberais. No entanto, o que vemos

    atualmente de verdade, nas afirmaes de Mota (2010, p. 220) :

    Um discurso da eficincia do setor privado como argumento da privatizao e mercantilizao de servios e empresas pblicas; o do empreendedorismo e da empregabilidade como justificao e estmulo a um suposto trabalhador (empreendedor) sem patro uma das estratgias de reduo consentida da fora de trabalho contratada pelas empresas.

    Na verdade, observamos no governo Lula da Silva, tendo continuidade no

    governo Dilma, respeitando suas particularidades, medidas que minimizam as condies de

    pobreza absoluta da populao atendendo infimamente a dadas necessidades sociais como

    acesso renda e ao consumo. O modelo de desenvolvimento desses governos se

  • expressou no aumento dos gastos sociais, atingindo os setores mais empobrecidos e

    precarizados da populao brasileira. Mas esses ajustes, no plano prtico, no alteraram as

    desigualdades sociais e nem colocam em cheque a explorao capitalista, se a definimos

    sob a tica das disparidades das rendas do trabalho e dos lucros entre outros rendimentos

    do capital (MOTA, 2010, p. 22).

    Diante desse contexto de crise estrutural e de relaes aparentemente no

    contraditrias entre capital e trabalho, operado pelas medidas implementadas pelo novo

    desenvolvimentismo (polticas sociais/expanso da assistncia social), Na verdade essas

    polticas, contribuem para romper com a lgica de acumulao, com a ordem do capital ou

    serviro de instrumento para sua expanso?

    Ofensiva do capital s polticas sociais: o Neodesenvolvimentismo como seu

    instrumento

    Atravs de sinais de esgotamento no plano econmico com a presena de

    medidas contra os direitos sociais e como consequncia disso o aumento da pobreza e do

    desemprego estrutural. Em funo dessas circunstncias surge o neodesenvolvimentismo

    no Brasil como sendo o projeto de superao do subdesenvolvimento atravs da

    industrializao integral, por meio de planejamento e decidido apoio estatal

    (BIELSHOWSKY, 1996, P. 33, apud MOTA, 2010, p. 39). Lembramos que sua base social e

    poltica no se localizam nos movimentos contestatrios da ordem e do poder do capital,

    mas est representada por uma frao da burguesia interna, heterognea e de outros

    segmentos de classe menos representativos, de nosso pas, pois, segundo afirma Boito

    (informao verbal)9,

    A frente neodesenvolvimentista a frente poltica integrada por classes e fraes de classe muito heterogneas que sustentou os governos Lula da Silva e que, agora, sustenta o governo Dilma. Essa frente representa prioritariamente os interesses de um setor importante da burguesia brasileira que a grande burguesia interna. Essa frente contempla tambm, ainda que de maneira perifrica e pontual, alguns interesses das classes populares operariado urbano, baixa classe mdia, campesinato e a massa empobrecida pelo desemprego e pelo subemprego.

    Desse modo, segundo o referido autor, essa burguesia interna, contraditria e

    heterognea teve/tem base social forte para fazer com que seus interesses orientem a

    poltica econmica ao seu modo, realizando um movimento de mudanas restritivas nas

    polticas sociais. Seja atravs de uma poltica de contedo local que obriga o Estado e as

    9 BOITO, A. Manifestaes sociais no Brasil sob o Neodesenvolvimentismo. XIX ENEP Encontro Nacional de Economia Poltica. (Neo) desenvolvimentismo em questo. Florianpolis, 2014.

  • empresas estatais a realizarem at 60% de suas compras produo local, seja atravs do

    aumento exponencial da receita do BNDS com emprstimos de juros subsidiados para as

    grandes empresas nacionais (BOITO, 2014). Somando-se a tais medidas, as polticas

    econmica e social, arquitetadas pelo neodesenvolvimentismo dentro do Governo Dilma,

    conforme Fatorelli (2011, apud Boschetti, 2013, p. 356),

    Integram um conjunto de polticas econmicas e sociais baseadas em tendncias como destinao do fundo pblico para pagamento da dvida pblica, manuteno de elevadas taxas de juros, carga tributria elevada e regressiva, reduo ou no ampliao de recursos para as polticas sociais universais, aumento do gasto social em polticas sociais focalizadas de transferncia de renda, contingenciamento de gastos sociais, congelamento de salrios no setor pblico, prioridade para as metas de supervit primrio e controle da inflao, realizao de reformas de carter neoliberal com reduo de direitos da previdncia social e privatizaes, alm de ausncia de controle de capitais.

    De acordo com Boschetti (2013), as polticas de transferncia de renda

    impulsionaram o aumento do consumo, tornando-se uma das estratgias do

    neodesenvolvimentismo que focalizam as polticas sociais extrema pobreza em detrimento

    do investimento em polticas sociais universais. Estas ltimas assumem um papel

    secundrio na garantia de um sustento mnimo necessrio para garantia de um consumo

    bsico. Consequentemente, h uma supervalorizao sobre o mercado interno consumidor

    brasileiro, o que tem sido utilizado no discurso do atual governo sobre o aumento da

    capacidade de consumo da classe trabalhadora. Desse modo, fica evidente a subordinao

    do desenvolvimento social ao crescimento econmico e acumulao do capital com

    subordinao do Estado ao mercado, ampliando a desigualdade social no Brasil.

    Destacamos tambm que a prevalncia da informalidade e das relaes de

    trabalho conforme Boschetti (2013) excluem proteo social metade das famlias que

    continuaro fora dos sistemas de seguridade social. Destacamos que, nesse processo, os

    programas de transferncia de renda como Bolsa Famlia10 acabou ocupando uma funo

    decisiva para a sociedade, pois passa a expressar um tipo de proteo social que

    redimensiona o contedo e o formato do Sistema de Proteo Social Brasileiro. A

    positividade do modelo de transferncia de renda como forma de oporem-se as condies

    mais precrias e arcaicas de explorao da fora de trabalho fica evidente, pois, ao mesmo

    tempo, revelou-se como parte da dinmica entre produo e reproduo social do capital

    (SITCOVSKY, 2010, p. 237).

    Desse modo, apreendemos que a configurao da poltica social em nosso pas,

    sob os desgnios do iderio neodesenvolvimentista presente no Governo Dilma apostam nos

    10 Dados dos gestores do programa Bolsa Famlia sinalizaram que, em 2009, o programa atingiu cerca de 12 milhes de famlias abrangendo 17% das famlias brasileiras, e atingindo cerca de 24% dos brasileiros.

  • programas de transferncia de renda e numa interveno junto populao localizada no

    nvel de pobreza para que esta incorpore mecanismos ideolgicos que do sustentao a

    estes programas, atravs da conformao de um amplo consenso de classes em torno da

    promessa do crescimento econmico e equidade social (MOTA et al, 2003).

    Por conseguinte, a poltica social restringe-se a sua monetarizao. Nesse

    contexto, origina-se, sob a batuta do neodesenvolvimentismo, o iderio do

    empreendedorismo, do autoemprego, do autonegcio, da necessidade de acumular um

    robusto capital social, oportunizando assim acesso a outros recursos e da ideologia da

    sustentabilidade e a liberdade de escolha individual (MOTA, 2010).

    CONCLUSO

    O neodesenvolvimentismo, carregado de uma densidade sociopoltica e

    ideolgica, apresenta-se como alternativa ao neoliberalismo (taxas de juros elevada, taxa de

    Cmbio e Estado mnimo). Constitudo sob os alicerces da teoria da CEPAL, o

    neodesenvolvimentismo formula seu iderio terico baseado nos erros do nacional-

    desenvolvimentismo. So propostas polticas macroeconmicas de responsabilidade fiscal e

    cambial e o Estado como principal indutor do desenvolvimento econmico sob a direo de

    uma elite composta pelo empresariado industrial interno e coalizo com uma burocracia

    estatal. Sendo que para o seu sucesso h necessidade da existncia de um pacto social

    entre as classes e as diversas camadas da populao. de fundamental importncia a

    presena de uma poltica de distribuio orientada para o consumo de massa. Atravs

    desse quadro favorvel acredita-se na insero do pas no cenrio internacional de maneira

    competitiva.

    Para o neodesenvolvimentismo, conforme discutido neste artigo, o foco so os

    projetos macroeconmicos cuja principal mediao no as reformas sociais com impacto

    na redistribuio de renda e, sim as medidas de combate pobreza, que no afetam a

    dinmica da acumulao capitalista. Para tanto, o Estado deveria impor limites

    concentrao de renda, oportunizados pelos programas de transferncia de renda e com

    isso preservar a apropriao privada da riqueza social. Nesse sentido, o Estado assume

    como caracterstica principal ser forte do ponto de vista fiscal, administrativo e apresentar

    legitimidade poltica. Portanto, para os neodesenvolvimentistas ele no um Estado social.

    No campo das polticas sociais, mais especificamente da Poltica de Assistncia

    Social, verifica-se uma poltica voltada aos pobres com insero precria no mundo do

  • trabalho ou fora dele. As polticas so preconizadas pelo Banco Mundial, representando

    seus interesses atravs do discurso da reduo da pobreza e aceitao de que seus nveis

    e taxas so inaceitveis. O foco dos organismos internacionais, como exemplo importante,

    o Banco Mundial que o fundamento de sua proposta para a poltica social a esfera

    econmica e no a social.

    Tal reflexo se fez presente com mais contundncia por meio das seguintes

    estratgias: a) focalizao de seus programas sociais na pobreza extrema; b) transferncia

    de responsabilidades governamentais para a iniciativa privada (privatizao das polticas

    sociais ocasionada pela desresponsabilizao e desonerao do Estado em relao ao

    enfrentamento da questo social); e c) centralidade dos programas de transferncia de

    renda na poltica de assistncia social (SIQUEIRA, 2012).

    Segundo Castelo (2010), o neodesenvolvimentismo busca conciliar essas

    estratgias descritas acima ao conjunto de medidas (programas de transferncia de renda)

    que atuem sobre a questo social e promovam a equidade e a justia social. Este iderio

    poltico encontra amplo respaldo no atual modelo da poltica de Assistncia Social brasileira,

    resumindo-a ao combate pobreza, deixando de ser uma poltica de Seguridade Social. No

    momento atual, o contexto de desresponsabilizao do Estado Brasileiro com a questo

    social e, ao mesmo tempo, o combate pobreza e as consequncias advindas dela atravs

    de polticas sociais exercidas pela filantropia empresarial e pelas aes das organizaes

    no governamentais do terceiro setor.

    Assim, perceptvel no governo brasileiro atual o desmonte das polticas sociais

    atravs da apropriao privada e dos processos de focalizao, mercantilizao e

    financeirizao das polticas, orientadas pelos organismos internacionais com recursos

    monetrios do Estado administrados por instituies financeiras. O neodesenvolvimentismo

    recoloca a poltica social, desvinculando-a da universalizao dos direitos o que contribui

    para o rearranjo da economia capitalista. O neodesenvolvimentismo acaba sendo uma

    estratgia ideopoltica, baseada em concepes compatveis com as polticas de

    estabilizao macroeconmica. Em sntese, torna-se uma falsa alternativa ao

    neoliberalismo, pois no resolve os problemas estruturais da sociedade capitalista, muito

    menos atende as condies de trabalho e de reproduo social daqueles que

    verdadeiramente produzem a riqueza, os trabalhadores.

    Referncias Bibliogrficas

  • BEHRING, E. R. Brasil em Contra-Reforma - Desestruturao do Estado e Perda de

    Direitos. 1. ed. So Paulo: Cortez Editora, 2003. V. 1. 304p.

    BIELSCHOWSKY, R. (Org.). Cinquenta Anos de Pensamento na CEPAL. 1a. ed. Rio de

    Janeiro: Record, 2000. v. 2. 978p.

    BOSCHETTI, I. Poltica de desenvolvimento econmico e implicaes para as polticas pblicas. SER social, Braslia, v. 15, n. 33, p. 261-384, jul./ dez. 2013.

    CAETANO, M. R. e PERONI, V. M. Redefinies no papel do Estado: terceira via, novo desenvolvimentismo e as parcerias pblico-privadas na educao.IX ANPED SUL Seminrio de Pesquisa em Educao da Regio Sul, 2012.

    CASTELO, R. (Org.). Encruzilhadas da Amrica Latina no sculo XXI. Rio de Janeiro:

    Po e Rosas, 2010.

    COLISTETE, R.P. O Desenvolvimentismo Cepalino: problemas tericos e influncias no Brasil. In: Estudos Avanados, vol. 15, n. 41, So Paulo, Jan./ Abril 2001.

    GONALVES, R. Novo desenvolvimentismo e liberalismo enraizado. Revista Servio Social e Sociedade. So Apulo, n. 112, p. 637-671, out./dez. 2012.

    MANDEL, ERNST. O capitalismo tardio. So Paulo: Abril Cultural, 1982.

    MESZAROS, I. Para alm do Capital: rumo a uma teoria de transio. So Paulo, Boitempo Editorial, 2002. MOTA, A. E. ; AMARAL, A. S. ; PERUZZO, J. F. O novo desenvolvimentismo e as polticas sociais na Amrica Latina IN: BEHRING, E. R. Brasil em Contrarreforma - Desestruturao do Estado e Perda de Direitos. 1. ed. So Paulo: Cortez Editora, 2003. V. 1. 304p NETTO, J. P. Crise do Socialismo e ofensiva neoliberal. 5 Ed. So Paulo: Cortez, 2012 (coleo questes de nossa poca, v. 44).

    PANIAGO, M. C. A crise estrutural e a centralidade das classes sociais. Revista

    Katlysis Estado e Poltica Social. Santa Catarina: editora Ufsc, V. 17, n. 01, 2014. p. 41-

    49.

    SIQUEIRA, M. C. A. A Poltica de Assistncia Social do Governo Lula: entre a inovao e a ortodoxia neoliberal. Dissertao de Mestrado. Programa de Ps-Graduao em Poltica Social do Departamento de Servio Social da Universidade de Braslia/Unb, 2012.

    SITCOVSKY, M. Conciliaes e contradies entre assistncia social e trabalho: o impacto da bolsa famlia. In: as ideologias da contrarreforma e o servio social/organizao: Ana Elisabete Mota. Recife: Ed. Universitria da UFPE, 2010. 437p.

  • TEIXEIRA, R. V. Uma crtica da concepo de poltica social do Banco Mundial na cena contempornea. Revista Servio Social e Sociedade. So Paulo, n. 104, p. 650-680.