o natal do burrinho cinzento

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O Natal do burrinho cinzento Sou um pequeno burro, cinzento e coxo. O meu dono nunca gostou de mim, por isso me fui tornando triste e, por vezes, mau. Com ele peno pelas ruas da Judeia. Esta noite, fatigados e cheios de pó, chegámos a uma vila chamada Belém. O meu dono instalou-se no último quarto livre da hospedaria. E eu fiquei num pequeno estábulo tranquilo onde já dorme um boi. De repente, a porta abre-se. ― Isto é um sítio pobre, Maria ― murmura um homem. Não te preocupes, José, ficamos bem. É tão doce esta voz que, pela primeira vez na minha vida, sinto alegria no meu coração. Será que foi um anjo que entrou? Levanto-me e vejo uma encantadora jovem com um belo ventre redondo. O seu olhar brilha sob um véu bordado, os seus olhos imensos parecem reflectir todas as estrelas do céu. Olha-me e sorri com bondade. Volto a deitar-me a bocejar.

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Uma história de Natal...

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O Natal do burrinho cinzento

Sou um pequeno burro, cinzento e coxo. O meu dono nunca gostou de

mim, por isso me fui tornando triste e, por vezes, mau. Com ele peno pelas ruas

da Judeia.

Esta noite, fatigados e cheios de pó, chegámos a uma vila chamada Belém.

O meu dono instalou-se no último quarto livre da hospedaria. E eu fiquei num

pequeno estábulo tranquilo onde já dorme um boi.

De repente, a porta abre-se.

― Isto é um sítio pobre, Maria ― murmura um homem.

― Não te preocupes, José, ficamos bem.

É tão doce esta voz que, pela primeira vez na minha vida, sinto alegria no

meu coração. Será que foi um anjo que entrou?

Levanto-me e vejo uma encantadora jovem com um belo ventre redondo. O

seu olhar brilha sob um véu bordado, os seus olhos imensos parecem reflectir

todas as estrelas do céu. Olha-me e sorri com bondade. Volto a deitar-me a

bocejar.

Já dormito quando o grito de uma criança ecoa. É tão

forte que parece celebrar a alegria do seu próprio

nascimento! Levanto-me com o coração aos pulos. Maria,

maravilhada, veste o recém-nascido. José inquieta-se:

― Não terá frio?

Timidamente, aproximo-me e, com o meu bafo, procuro

aquecer aquela criança aconchegada no colo da mãe.

Estou orgulhoso por poder fazer isto, eu que não passo

de um pequeno burro mal-amado.

Uma estranha claridade invade agora o estábulo. No céu, irrompe o canto

de uma multidão de anjos e, no meio de um alegre burburinho, o povo chega,

trazido pelos pastores.

Nessa noite tudo se passa como se fosse um sonho. Mas, de manhã, chega o

momento que tanto receava.

O meu dono abre a porta e deposita diante da criança um pequeno saco

com moedas de ouro; em seguida, faz-me sinal para o seguir. Não me mexo; o

meu coração estremece.

― Vamos, ― grita ― avança!

Olho para Maria com ar suplicante… Ela diz com doçura:

― Agradeço-lhe o saco de ouro que ofereceu ao meu filho Jesus, mas o seu

burro ser-nos-ia bem mais útil, porque temos ainda um longo caminho a

percorrer.

O meu dono hesita:

― Este burro, por vezes, não é nada manso…

Maria sorri para mim, confiante:

― Não tenha medo! ― responde.

Então, o meu dono saúda-nos e sai. O meu coração dá pulos de alegria;

sinto vontade de saltar.

Está prometido: não abandonarei nunca Maria, José e o pequeno Jesus. Vou

tornar-me bom e doce, porque encontrei alguém que me ama!

Laurence Batz ; Quentin Gréban (ill.)

Le Noël du petit âne gris

In 24 histoires merveilleuses pour attendre Noël

Paris, Ed. Fleurus, 2008

(Tradução e adaptação)